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Psicologia e Educação 15 Vol. VI, nº 2, Dez. 2007 Abordagens ao desenvolvimento da carreira das mulheres Ana Daniela Silva* Sara Isabel Ferreira** Maria do Céu Taveira*** Luisa Saavedra**** Resumo: O estudo do desenvolvimento da carreira das mulheres contribuiu de forma significativa para o enriquecimento da investigação em Psicologia Vocacional (e.g. Fitzgerald, Fassinger & Betz, 1995; Betz & Fitzgerald, 1987; Osipow, 1983; Betz & Hackett, 1981, 1983). Apesar da investigação e teoria neste âmbito terem tomado exclusivamente a figura masculina como objecto de estudo, posteriormente, alguma investigação focou-se também na aplicabilidade de teorias do desenvolvimento de carreira existentes às mulheres (e.g. Holland, 1973; Super, 1957), o que forneceu avanços conceptuais significativos na descrição e explicação do desenvolvimento da carreira naquele grupo da população. Neste artigo apresentamos uma revisão dos modelos e variáveis que caracterizam o desenvolvimento da carreira das mulheres, reflectindo sobre as tendências mais recentes de investigação neste domínio, bem como, sobre a pertinência do estudo desta temática para a intervenção psicológica individual e social. Palavras-Chave: Mulheres; Desenvolvimento de Carreira; Revisão de Estudos. Women Career Development framework Abstract: The study of women career development has brought a large contribution for the empowerment of Vocational Psychology research (e.g. Fitzgerald, Fassinger & Betz, 1995; Betz & Fitzgerald, 1987; Osipow, 1983; Betz & Hackett, 1981, 1983). Although the research and theory in this field has taken exclusively the male figure as a subject of study, later on, some research focused also on the applicability of the career development theories to women (e.g. Holland, 1973; Super, 1957). This provided significant conceptual advances in the description and explanation of the career development in that group of the population. This article presents a review of the patterns and variables that characterize the career development of women, reflecting about the most recent trends of research in this domain as well as about the relevance of the study of this issue for the individual psychological and social intervention. Keywords: Women; Career Development; Literature Review. _______________ * Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail: [email protected] ** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail: [email protected] *** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail: [email protected] **** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail: [email protected]

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Psicologia e Educação 15

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Abordagens ao desenvolvimento da carreira das mulheresAna Daniela Silva*Sara Isabel Ferreira**Maria do Céu Taveira***Luisa Saavedra****

Resumo: O estudo do desenvolvimento da carreira das mulheres contribuiu de formasignificativa para o enriquecimento da investigação em Psicologia Vocacional (e.g.Fitzgerald, Fassinger & Betz, 1995; Betz & Fitzgerald, 1987; Osipow, 1983; Betz& Hackett, 1981, 1983). Apesar da investigação e teoria neste âmbito terem tomadoexclusivamente a figura masculina como objecto de estudo, posteriormente, algumainvestigação focou-se também na aplicabilidade de teorias do desenvolvimento de carreiraexistentes às mulheres (e.g. Holland, 1973; Super, 1957), o que forneceu avançosconceptuais significativos na descrição e explicação do desenvolvimento da carreiranaquele grupo da população. Neste artigo apresentamos uma revisão dos modelos evariáveis que caracterizam o desenvolvimento da carreira das mulheres, reflectindosobre as tendências mais recentes de investigação neste domínio, bem como, sobrea pertinência do estudo desta temática para a intervenção psicológica individual esocial.Palavras-Chave: Mulheres; Desenvolvimento de Carreira; Revisão de Estudos.

Women Career Development framework

Abstract: The study of women career development has brought a large contributionfor the empowerment of Vocational Psychology research (e.g. Fitzgerald, Fassinger& Betz, 1995; Betz & Fitzgerald, 1987; Osipow, 1983; Betz & Hackett, 1981, 1983).Although the research and theory in this field has taken exclusively the male figureas a subject of study, later on, some research focused also on the applicability ofthe career development theories to women (e.g. Holland, 1973; Super, 1957). Thisprovided significant conceptual advances in the description and explanation of thecareer development in that group of the population. This article presents a reviewof the patterns and variables that characterize the career development of women, reflectingabout the most recent trends of research in this domain as well as about the relevanceof the study of this issue for the individual psychological and social intervention.Keywords: Women; Career Development; Literature Review.

_______________* Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail:

[email protected]** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail:

[email protected]*** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail:

[email protected]**** Instituto de Educação e Psicologia. Universidade do Minho Campus de Gualtar. E-mail:

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Introdução

Uma das áreas de maior interesse daPsicologia Vocacional, ao longo dos tem-pos, tem sido a explicação e predição demodelos de escolha e desenvolvimentovocacional ao longo da vida. As teoriase a investigação em torno dos factoresindividuais e ambientais relacionados coma escolha vocacional e com o ajustamentoao trabalho e carreira têm contribuído deforma significativa para a compreensãoteórica do fenómeno e para a prática deaconselhamento vocacional (Osipow,1983).Devido ao facto da investigação e teorianeste âmbito se terem focado, primeiramen-te, no estudo do desenvolvimento decarreira dos homens, não existe aindaconsenso acerca da possibilidade de umainfluência diferencial, em homens e mu-lheres, das variáveis que explicam asescolhas de carreira. Do mesmo modo, nãohá acordo entre os autores quanto à exis-tência de variáveis ou dimensões que serelacionam exclusivamente com o desen-volvimento da carreira das mulheres(Fitzgerald, Fassinger & Betz, 1995; Betz& Fitzgerald, 1987).Autores consagrados da PsicologiaVocacional focaram-se na aplicabilidade deteorias do desenvolvimento de carreiraexistentes às mulheres, permitindo avan-ços conceptuais significativos relacionados,especificamente, com a descrição e expli-cação do desenvolvimento da carreira dasmulheres (e.g. Holland, 1973; Super, 1957).Neste artigo revêem-se os modelos evariáveis que têm sido utilizados paradescrever o desenvolvimento da carreiradas mulheres e reflectir acerca das tendên-cias mais recentes de investigação nestedomínio, assim como sobre a pertinênciado estudo desta temática para a interven-ção psicológica individual e social.

Neste sentido, iniciaremos com uma refe-rência aos estudos que se debruçam, noâmbito do desenvolvimento da carreira, sobrea dicotomia orientação doméstica versusorientação para a carreira. De seguida,passaremos a apresentar o conjunto deinvestigações que se dedicaram à identifi-cação e explicação de variáveis relacionadasexclusivamente com a orientação para acarreira. Finalmente, dedicar-nos-emos aosmodelos de carreira das mulheres que, decerta forma, tentaram organizar os resulta-dos da investigação até então encontrados.

Orientação Doméstica vs Orientaçãopara a Carreira nas Mulheres

Os primeiros estudos sobre o desenvolvi-mento de carreira das mulheres procura-ram descrever e analisar este processo emtermos de orientação para o lar/domésticaversus orientação para a carreira.O primeiro estudo que tenta levar a caboeste objectivo é o de Hoyt e Kennedy(1958), que procura avaliar estes dois tiposde orientação comportamental e de vida,através das respostas das mulheres a umquestionário destinado a avaliar a impor-tância atribuída pelas mulheres aos papéisde vida conjugal versus carreira (SVIB –W, Strong Vocational Interest Blank-Women). O uso desta medida descritivapermitiu evidenciar que as mulheres ori-entadas para a carreira obtinham elevadaspontuações nas escalas que se referiam àscarreiras de advogada, artista, psicóloga,física e professora de educação física,enquanto que as participantes com orien-tação doméstica pontuavam alto nas esca-las que incluíam profissões como: serdoméstica, secretária, professora de eco-nomia doméstica e dietista.O paradigma de investigação descrito,desenvolvido por Hoyt e Kennedy (1958),

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foi utilizado em muitos estudos subsequen-tes, que usaram o SVIB – W como va-riável independente (eg., Munley, 1974;Wagman, 1966). Nesses estudos, verifica-se uma replicação dos resultados queevidenciam que as mulheres orientadaspara a carreira tendem a obter altas pon-tuações em escalas com ocupações tradi-cionalmente dominadas por homens, en-quanto que as mulheres orientadas para avida doméstica tendem a obter pontuaçõeselevadas na escala de “dona-de-casa” e/ou não profissional, ou em escalas queincluem profissões tradicionalmente femi-ninas.Baseados na consistência destes resultados,a partir do uso do SVIB-W, outros estudosusaram o mesmo inventário para agruparas mulheres e examinar diferenças nas suascapacidades (e.g. Watley & Kaplan, 1971;Rand, 1968), personalidade (e.g. Rand,1968), origem familiar e história de vida(e.g. Gysbers, Johnston & Gust, 1968),motivação e realização (e.g. Oliver, 1974;Rand, 1968; Tyler, 1964), e valores (e.g.Goldsen, Rosenberg, William, 1966;Wagman, 1966; Simpson & Simpson,1961), em função da pertença a essesmesmos grupos.Entretanto, nos finais dos anos 70 do séculopassado, autores como Tinsley e Faunce(1978, 1980) estudaram as diferenças nasatitudes, interesses e necessidadesvocacionais e as atitudes face ao papelconjugal e estatuto familiar nos mesmosgrupos de mulheres. Este e outros estudostêm vindo a demonstrar que a descriçãodo desenvolvimento da carreira das mu-lheres a partir destas duas categorias temsido progressivamente abandonada, assis-tindo-se mais à concepção que orienta oestudo da conjugação entre papéis fami-liares e de carreira pelas mulheres (e.g.Oliver, 1974; Levitt, 1972). Com efeito,a assumpção de que as mulheres escolhem,

em geral, em termos de carreira, entre acasa ou o trabalho, tem vindo a ser subs-tituída por uma outra, que defende que,ao longo vida adulta, a maioria dasmulheres ocidentais aspira combinar ospapéis familiares e os da carreira (Yogev,1982).O enfoque na orientação e escolhas decarreira das mulheres. Os estudos reali-zados em 1960 sugerem que a maioria dasmulheres jovens não planeia trabalhar forade casa (e.g., Matthews & Tiedeman,1964), enquanto os estudos realizados apartir de 1970 sugerem já que a maioriadas mulheres jovens planeia combinar acarreira e o casamento, ao longo da vida(Rand & Miller, 1972; Watley & Kaplan,1971).Rand e Miller (1972), por exemplo, de-fendem a ideia já referida que o novoimperativo cultural de combinar carreirae casamento veio substituir a ênfase pre-viamente colocada na centralidade dospapéis relacionados com o casamento ecom a maternidade. Devido ao registo deum crescente número de mulheres jovensque planeavam combinar casamento ecarreira, a distinção entre orientação paraa vida doméstica versus orientação paraa carreira, enquanto variável dependente,foi menos considerada pelos autoresvocacionais, ao longo dos anos setenta(Oliver, 1974; Levitt, 1972). O foco dainvestigação passa a ser a natureza e o grauda orientação para a carreira, das mulhe-res, de modo a compreender melhor as suasescolhas.A principal abordagem da descrição danatureza das escolhas de carreira dasmulheres envolve a classificação das pre-ferências ou opções de carreira, tendo emconta sobretudo o grau de correspondên-cia destas com papéis de vida tradicional-mente femininos ou tradicionalmentemasculinos.

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Rossi (1965) é o primeiro autor a eviden-ciar a utilidade em se diferenciar o conceitode orientação para carreiras tradicionalmentefemininas, ou seja, profissões em que asmulheres predominam, do conceito deorientação para carreiras “pioneiras”, istoé, profissões em que os homens têm pre-dominado. Mulheres que ocupam carreiraspioneiras foram também definidas como“inovadoras” quanto aos papéis de género(Almquist, 1974; Tangri, 1972).Os estudos que procuraram definir ascaracterísticas que diferenciam as mulheres“pioneiras” das mulheres “tradicionais”,dominantes, nos anos 70, evidenciaram aexistência de diferenças entre estes dois tiposde mulheres (e.g. Betz, 1984; Betz &Hacket, 1881, 1983; Standley & Soule,1974; Tangri, 1972; Astin & Myint, 1971;Nagely, 1971).Relacionado com a noção de profissões tra-dicionais/não-tradicionais para as mulheres,estão as descrições acerca do grau de orienta-ção das escolhas de carreira das mulheres,quer para a Ciência, quer para a Matemática.Na realidade, o facto de as mulheres estaremsub-representadas em carreiras de Ciências,de Matemática e de Engenharia levou a queum conjunto de investigações importantesneste domínio se focasse nesta problemática(e.g., Nacional Science Foundation, 1984;Pfafflin, 1984; Humphreys, 1982; Fox, Brody& Tobin, 1980).Além da comparação entre mulheres tra-dicionais versus pioneiras e dos domínioscientíficos versus domínios não científicosde escolha, o conceito de orientação decarreira foi igualmente alargado e refina-do, com o trabalho de Eyde (1962). Maisdo que considerar a orientação de carreiracomo um estado único e indiferenciável,construído por oposição à orientaçãodoméstica, a orientação para a carreiracomeça por ser concebida, por aquele autor,como uma variável contínua, que reflecte

o grau ou preferência de envolvimento como trabalho, com ou sem o envolvimentono papel de “dona de casa”. A escala“Desire to Work” construída por Eyde(1962) representa a primeira tentativasistemática de avaliar a orientação decarreira como uma variável contínua. Estaescala requer que os sujeitos avaliem o seudesejo para trabalhar, considerando variá-veis como as condições de estado civil,o número e idade dos filhos e o rendi-mento do marido, as que definiriam a forçada orientação para a carreira, neste caso,sobretudo no que se refere ao desejo ouintenção da mulher para continuar a traba-lhar mesmo quando é casada e mãe.Surge, então, desta forma, ganhando terreno,o conceito de Saliência de Carreira que Masih(1967) define como não só o grau em quea pessoa está motivada para a carreira, comoainda, o grau em que a profissão é uma fonteimportante de satisfação e a prioridade dadaà carreira relativamente a outras fontes de sa-tisfação.Marshall e Wijting (1980), por sua vez, nestemesmo âmbito, definem outros dois concei-tos importantes - o de “career-centeredness”,isto é, uma orientação que privilegia asactividades de carreira - e o de “compromissocom a carreira”, ou seja, o envolvimento comuma carreira estável ao longo da vida.Paralelamente, Richardson (1974), distin-gue “motivação para o trabalho” de “orien-tação para carreira”. Para esta autora, a“motivação para o trabalho” define o desejode ter um trabalho fora de casa, contudo,não privilegia o papel de trabalhador. A“orientação para a carreira”, por sua vez,é definida como o desejo de possuir umtrabalho como um foco primário de vida,sendo os interesses da vida domésticavistos como secundários. Perun e Bielby(1981), por seu lado, distinguem “compor-tamento ocupacional”, demonstrado portodas as mulheres que trabalham, de

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“desenvolvimento de carreira”, reveladopor uma minoria de mulheres, nas quaiso trabalho segue uma sequência de níveisou estádios progressivamente superioresdentro de uma determinada profissão. Emsuma, estas definições de saliência decarreira têm em comum a ideia que oconceito se refere ao privilégio dado pelapessoa à sua carreira, o qual parece serinconsistente com as expectativas sociais degénero que vão mais no sentido de que amulher simplesmente trabalhe fora de casa.Vários estudos sobre o desenvolvimento decarreira das mulheres usaram como variáveldependente a distinção bipolar entre casa/carreira, profissões tradicionais/ não tradicio-nais, ou ainda, medidas de orientação ou desaliência da carreira. Contudo, a falha destasvariáveis na distinção ou descrição do de-senvolvimento da carreira das mulheres foisendo detectada (eg. Osipow, 1983). Porexemplo, mulheres que possuíam profissõestradicionais como Enfermeira ou ProfessoraPrimária poderiam ter um comprometimen-to com a carreira tão ou mais elevado doque outras mulheres com profissões não-tradicionais como Advogada ou Médica. Poristo, Osipow (1983) sugere a necessidade dese definirem desenhos de investigação queutilizem as várias combinações possíveis dasvariáveis que têm sido definidas para des-crever o desenvolvimento de carreira nasmulheres.

Modelos de Carreira das Mulheres

Um dos primeiros autores a centrar a suaatenção no comportamento vocacional dasmulheres foi Donald Super. No texto ThePsychology of Careers, de 1957, Superrealça dois temas relacionados que carac-terizam a vida das mulheres. Começa porrealçar o papel central que cuidar da casajoga na definição das actividades dasmulheres, para depois contrapor com a

grande participação das mulheres na forçalaboral. Relacionando estes dois temas,deduz sete categorias mutuamente exclu-sivas para descrever modelos de carreirade vida nas mulheres, a saber:(a) o modelo da “dona de casa” estável,o qual descreve mulheres que casaram cedoe não tiveram experiências de trabalhosignificativas;b) o modelo convencional, que define asmulheres que começaram a trabalhar quan-do terminaram a sua formação e trabalha-ram até se casarem;(c) o modelo de trabalho estável, que ca-racteriza mulheres que não casaram mas tra-balharam continuamente durante a sua vida;d) o modelo de carreira de dupla trajectóriaque descreve mulheres que combinam tra-balho e família de uma forma continua;(e) o modelo de carreira interrompida,caracterizado por um regresso ao trabalhoem idade mais avançada, normalmenteapós os filhos deixarem de necessitar decuidados tão permanentes;(f) o modelo de carreira instável, descreveum ciclo irregular de movimentos dentroe fora da força de trabalho;e, (g) finalmente, o modelo de carreira detentativas múltiplas que reflecte essenci-almente uma história de trabalho instável(Super, 1957).1

_______________1 Mais recentemente, Super (1990) sugere que

tais caracterizações eram pouco válidas para asmulheres das sociedades ocidentais modernas eaplicou os princípios da sua teoria a ambos os sexosdefinindo quatro padrões possíveis para o desenvol-vimento dos indivíduos, a saber: (a) o padrão es-tável, caracterizado pela entrada precoce no merca-do de trabalho precedida por um pequeno períodode ensaio; (b) o padrão convencional, caracterizadopor um período de ensaio seguido por um padrãoestável; (c) o padrão instável, caracterizado por umasérie de ensaios que podem conduzir a períodos deemprego temporário, seguidos de novos períodos deensaio; e, (d) o padrão de múltiplos ensaios, carac-terizado pela instabilidade profissional e pela mu-dança constante de emprego.

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Vetter (1973) estudou a frequência deocorrência destes modelos numa amostrade mulheres norte-americanas, tendo ve-rificado que os modelos convencionais ede “dona de casa” estável, registaramfrequências mais elevadas do que os res-tantes, sendo o modelo de carreira de duplatrajectória o menos frequente. Apesar doseu valor conceptual e empírico, não foramrealizados, em anos seguintes, outrosestudos que utilizassem a categorização deSuper, devido ao surgimento de outrascategorizações do desenvolvimento decarreira das mulheres, nomeadamente, osmodelos de Harmon (1967) e Zytowski(1969), entre outros, e que seguidamenteanalisaremos também.Harmon (1967) acompanhou, num estudolongitudinal, o desenvolvimento de carrei-ra de mulheres da Universidade doMinnesota. No follow-up, que realizou 25anos depois destas estudantes terem ter-minado o curso, classificou-as em cincomodelos de carreira:(a) mulheres sem experiência profissional;(b) mulheres com experiência profissionalsó até ao casamento e/ou à maternidade;(c) mulheres que combinam a profissãocom o casamento/maternidade;(d) mulheres que fazem a reentrada naforça de trabalho quando os filhos cres-cem;e, (e) as mulheres solteiras e dedicadassomente à carreira.Enquanto Super (1957) tentou estender asua teoria da carreira às especificidades dodesenvolvimento da carreira das mulheres,Zytowski (1969) propõe um modeloheurístico de base para descrever osmodelos de desenvolvimento de carreirafemininos.Zytowski (1969) propôs postulados paracaracterizar o modelo e determinantes daparticipação vocacional das mulheres. Foio primeiro autor vocacional a defender a

necessidade de uma teoria de desenvolvi-mento vocacional para as mulheres sepa-rada da dos homens, atendendo ao factode que o papel tradicional das mulheresé frequentemente o de dona de casa, maseste papel não é estático, sendo que asmudanças sociais e tecnológicas verificadasnos últimos tempos resultam em papéissimilares para homens e mulheres. Aten-dendo à ordem e sequênciadesenvolvimentista do comportamentosócio biológico das mulheres (i.e., a alturae sequência das tarefas de vida, como terfilhos e vê-los crescer), aquele autor pro-pôs que a participação no papel profissio-nal, pelas mulheres, representa um aban-dono do papel de dona de casa, conce-bendo estes dois papéis de vida comomutuamente exclusivos. O mesmo autor,sugere também que estes modelos departicipação vocacional das mulherespodem distinguir-se com base na idade deentrada das mulheres no trabalho, a ex-tensão da sua participação nesse papel eo carácter tradicional da ocupação. Com-binando estas três variáveis, Zytowski(1969) sugere então três modelos de car-reira distintos:(a) o modelo brando - entrada muito cedoou muito tarde no mundo de trabalho,pouca participação, e ocupação tradicio-nal;(b) o modelo moderado - entrada cedo nomundo do trabalho, participação intensa eocupação tradicional;e, (c) o modelo não usual - entrada cedono mundo do trabalho, participação inten-sa e ocupação não tradicional.Por último, Zytowski (1969) propõe quea preferência das mulheres por um ou poroutro modelo é determinada por factoresinternos motivacionais, ao passo que aparticipação efectiva num ou noutromodelo é determinada por preferências,considerações ambientais e características

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pessoais não motivacionais, como a capa-cidade.As ideias de Zytowski (1969) e, particu-larmente, os modelos de participaçãovocacional por ele propostos, foram inves-tigados em dois estudos importantes dodesenvolvimento da carreira. No primeiro,Wolfson (1976) dirigiu um estudo a partirdo qual se seguiu 306 mulheres que ti-nham recebido aconselhamento vocacionalna Universidade há 25 anos atrás. Combase no sistema de classificação deZytowski (1969), Wolfson (1976) classi-ficou a sua amostra em cinco subgrupos:aos modelos brando, moderado e não usualretirados do sistema original, somou ogrupo das mulheres que nunca trabalha-ram e, ainda, um grupo moderado eleva-do. Este último grupo diferencia-se dogrupo moderado original pela sua parti-cipação prolongada e contínua no merca-do de trabalho, isto é, 18 ou mais anosde emprego fora de casa, nos 25 anos apósa saída da Universidade. Os resultadosdeste estudo indicam que, destas mulhe-res, a maioria das que estudaram até aosanos 30, demonstravam, cerca de duasdécadas mais tarde, um comportamento denão comprometimento com a carreira,marcado quer pela ocupação a tempointeiro como “dona de casa”, quer pelotrabalho fora de casa somente até aonascimento do primeiro filho. Estes resul-tados apoiam os resultados obtidos porHarmon (1967) e Vetter (1973) nos seusestudos, segundo os quais, a maioria dasmulheres americanas (classe média e alta)não tinha um envolvimento sério com acarreira.Mais tarde, Betz (1984), ao examinar asmulheres que se graduaram na Universi-dade em 1968, notou a mudança docomportamento de carreira das mulheres,desde os trabalhos de Wolfson (1976). Betzcomeça por afirmar que a classificação de

Zytowski-Wolfson (1976) é incompleta,pois não permite classificar mulheres quetrabalham numa ocupação não tradicionale que tiveram uma participação limitadanessa profissão. A mesma autora propôssete classes de desenvolvimento de carrei-ra das mulheres, acrescentando às cincode Wolfson (1976) e três de Zytowski(1969), novas classes, que considera se-rem necessárias para acomodar todas ascombinações possíveis do grau e ampli-tude de participação das mulheres nacarreira. Assim, adoptou o termo “com-promisso” usado por Harmon (1967) - queconsiderou como o mais acertado, e re-flectiu sobre os vários tipos deenvolvimento das mulheres com a carreirana cultura contemporânea. Em continua-ção, Betz propõe diversos modelos comonecessários e suficientes para descrever aparticipação das mulheres no trabalho. Sãoeles:(a) nunca trabalhou;(b) baixo compromisso-tradicional;(c) baixo compromisso-pioneiras;(d) moderado compromisso-tradicional;(e) moderado compromisso-pioneiras;(f) alto compromisso-tradicional;e (g) alto compromisso-pioneiras.Os grupos (b), (d), e (g) representam osmodelos brando, moderado e não usual deZytowski (1969), enquanto o grupo (f)representa o grupo moderado alto deWolfson (1976) e os dois restantes cons-tituem categorias que anteriormente nãotinham sido previstas. O estudo conduzidopor Betz forneceu dados concretos acercada mudança do comportamento vocacionaldas mulheres no século XX porque estamudança se verificou na contraposição dosresultados obtidos face a estudos anteri-ores no mesmo domínio. Esta mudançareflecte-se sobretudo no facto de a maioriadas mulheres licenciadas em 1968 e exa-minadas por Betz, se encontrarem a tra-

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balhar continuamente fora de casa e al-gumas terem enveredado por ocupaçõespioneiras.Recentemente, Zytowski (2005) interessou-se em desenvolver uma taxionomia com-preensiva dos componentes relacionais quecontribuem para o desenvolvimento decarreira das pessoas. Para tal, numa nar-rativa autobiográfica, referiu-se à funçãodos elementos relacionais nos estádios dedesenvolvimento de Donald Super. ParaZytowski (2005) é compreensível que umnúmero significativo de pessoas desempe-nhe muitos e variados papéis, mas a formacomo esses papéis actualmente influenci-am ou afectam uma pessoa, é uma questãoque permanece em aberto na literatura dodesenvolvimento da carreira. O mesmoautor chama a tenção para o facto de Supernão ter enfatizado a forma como as pes-soas tomam decisões à medida que vãopassando pelos estádios de vida. Comefeito, passados quase quarenta anos des-de que desenvolveu o seu modelo, ummodelo heurístico para descrever osmodelos de desenvolvimento de carreirafemininos, Zytowski continua a darcontributos importantes, indicando trilhosde estudo relevantes neste domínio e quecom certeza poderão ajudar a perceber edescrever a carreira de mulheres e homensnas sociedades modernas da actualidade,com exigências diferentes daquelas em queZytowski iniciou os seus estudos.

Estudo do desenvolvimento da carreiradas mulheres: Tendências Actuais

O estudo da carreira das mulheres temenvolvido o uso de várias variáveis de-pendentes. Provavelmente, este é um dosprincipais aspectos diferenciadores dodesenvolvimento de carreira das mulherescomparativamente ao desenvolvimento de

carreira dos homens. A investigação, nesteâmbito, realizada com a população mas-culina exigia unicamente a análise directado conteúdo das escolhas de carreira.Contudo, com a população feminina esteprocesso é necessariamente mais comple-xo. As expectativas de vida das mulheresnormalmente incluíam os papéis de cuidardo lar e das crianças. A noção de com-petição de papéis não foi consideradainicialmente nas teorias de carreira porquenão era relevante no estudo do desenvol-vimento de carreira dos homens. Contudo,nos finais dos anos 70, a par de umconjunto de mudanças sócio-económicas,a ideia de que o mundo do trabalho e omundo da família não podem ser enten-didos como dicotómicos (Kanter, 1977 inGreennhaus, Callanan & Godshalk, 2000),nem mesmo para as mulheres, ganhaconsistência e conceitos como o de “con-flito família-trabalho” (Greenhaus &Beutell, 1985 in Greenhaus, Callanan &Godshalk, 2000) assumem especial impor-tância. Numa sociedade que foi progres-sivamente impondo uma estrutura familiarapelidada de “famílias de dupla carreira”(Hall & Hall, 1979 in Greenhaus, Callanan& Godshalk, 2000) não será de estranharque numa revisão dos estudos realizadosem Psicologia Vocacional em 2005, seencontre um corpo significativo de inves-tigações, incluindo ambos os sexos,dedicadas à compreensão deste conflitofamília-trabalho, nomeadamente, adireccionalidade do conflito, os efeitos emediadores desta relação, com importan-tes implicações práticas (Harrington &Harrigan, 2006). A título de exemplo,Perrone (2005) estudou os efeitos dacongruência/conflito entre os papéis dotrabalho e da família, na satisfação como trabalho, com o casamento e com a vidaem geral, tendo encontrado resultados queapontam no sentido de a satisfação em cada

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um dos papéis (trabalho e família) enca-rados individualmente, estar directamenterelacionada com a satisfação com a vidaem geral, sugerindo que a resolução doconflito trabalho-família constitui umaspecto essencial na promoção do bem-estar pessoal.Um outro dado que nos parece importantesalientar é o facto de, neste estudo, ho-mens e mulheres não se distinguiremquanto aquilo que consideram ser umaparticipação ideal nos papéis do trabalhoe da família, mas, de facto, serem asmulheres a despender mais tempo nastarefas domésticas e familiares em relaçãoaos homens. Voydanoff (2005) analisou aespecificidade do conflito família-trabalho,demonstrando que há uma relação positivaentre três tipos de conflito (baseado notempo, no stress psicológico e no compor-tamento) e o conflito trabalho-família (otrabalho a interferir na família). O conflitobaseado no stress psicológico apresenta arelação mais forte com o conflito família-trabalho (a família a interferir no traba-lho).Além disso, o conflito trabalho-famíliamedeia a relação entre os vários tipos deconflito e o conflito família-trabalho. Umoutro estudo levado a cabo por Keene eReynolds (2005), demonstrou que entre ostrabalhadores casados, as mulheres têmuma probabilidade duas vezes maior, emrelação aos homens, de relatar efeitosnegativos do contexto familiar no seudesempenho no trabalho. Este aspectoestará relacionado, por um lado, com ofacto de as mulheres realizarem maisajustes em relação ao trabalho, por exi-gências familiares. Outro dado importan-te, diz respeito ao facto de as caracterís-ticas do trabalho aparecerem mais salien-tes do que os factores familiares quandose tenta predizer a probabilidade de asexigências familiares afectarem o desem-

penho no trabalho e na explicação dasdiferenças de sexo, no conflito família-trabalho. Trabalhar num contexto exigenteou ter pouca autonomia estará associadoa um maior conflito, independentementedo sexo, enquanto que uma maior flexi-bilidade em termos de horário de trabalhosó parece funcionar como atenuante doconflito para as mulheres. Estes estudose muitos outros que poderiam ser referi-dos, servem de base a um outro conjuntode investigações que tenta, de algumaforma, apresentar dados que fundamenteme impulsionem mudanças a nível organi-zacional (Anttila, Natti & Vaisanen, 2005;Behson, 2005; Cooper, 2005; Mauno,Kinjumen & PiituJainen, 2005; Moshavi& Koch, 2005; Sahibzada, Hammer, Neal,& Kuang, 2005).Os próprios modelos que caracterizavama carreira das mulheres parecem estar adar lugar a modelos mais abrangentes queclassificam homens e mulheres quanto àimportância atribuída aos papéis do tra-balho e da família (e.g. Cinamon & Rich,2000a).Concluindo, parece-nos inevitável incluira temática do conflito família-trabalhoquando nos referimos ao desenvolvimentoda carreira das mulheres dos nossos dias.Para a maioria das mulheres, a carreiradesenvolve-se em paralelo com a vidadoméstica e familiar, umas vezes emsintonia, outras com maior conflito. Masa verdade é que a gestão de um papel temimplicações directas na gestão do outro eé um equilíbrio entre ambos, que estáfortemente associado a factores, culturais,sociais e económicos, que proporcionaráàs mulheres uma postura mais saudável eum desempenho mais competente em cadaum dos contextos. Atrevemo-nos a ir maislonge ainda, afirmando que, do nosso pontode vista, mulheres e homens não serão tãodiferentes assim no que respeita às aspi-

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rações de carreira. Talvez aquilo que osdiferencia e que merece a nossa atençãoseja os constrangimentos e oportunidadesdo contexto cultural e sócio-económico queinfluenciam o desenvolvimento das suascarreiras. Mais do que nunca, a investi-gação deverá tratar esta temática do de-senvolvimento da carreira, incluindo ho-mens e mulheres, salientando barreiras epromotores e assumindo uma intervenção,não apenas individual, mas, sobretudo, decarácter sócio-político.

Conclusões

A revisão da investigação no âmbito dodesenvolvimento da carreira das mulherespermite-nos tecer algumas conclusõesimportantes acerca da forma como estaquestão tem sido abordada ao longo dotempo. Apesar de nos últimos 30 anos, estaárea de conhecimento ter vindo a evoluire ter sofrido mudanças significativas,constituindo um campo de pesquisa sig-nificativo, as constantes mudanças sociaise políticas por um lado, e a complexidadedos processos inerentes ao desenvolvimen-to de carreira das mulheres fazem com queeste seja um campo de investigação quenecessita de actualização e aprofundamen-to permanente. Como refere Osipow(1983), “… so much social change isoccurring in the area of sex and vocationthat any theoretical proposal made nowis likely to be premature, as would be anygeneralization about women’s careerdevelopment” (p.271).Apesar do objectivo central deste artigonão incluir uma abordagem aos factoresque têm sido estudados para explicar odesenvolvimento de carreira das mulheres,estes factores (familiares, pessoais, educa-cionais…) são utilizados pelo grosso dosestudos realizados para caracterizar gru-

pos específicos de mulheres (e.g., orien-tadas para a carreira versus orientadas paraa vida doméstica). Por este motivo, oestudo destas variáveis que historicamentetêm sido utilizadas para descrever padrõesespecíficos de desenvolvimento de carrei-ra das mulheres torna-se muito relevante.Contudo, este facto traduz-se numa lacunade investigação, pois são escassos osestudos que contribuíram para caracterizartodas as mulheres em geral ou para iden-tificar os factores que influenciam umamulher particular.O foco da Psicologia Vocacional no quese refere ao estudo do desenvolvimento decarreira das nulheres exigiu que se exami-nassem variáveis e se incorporassem con-ceitos que anteriormente eram considera-dos irrelevantes para as questõesvocacionais (e.g., o papel da família, asatitudes e papéis de género e as preferên-cias…). O estudo do desenvolvimento de carreiradas mulheres começou como um estudode um “grupo especial” e como umatentativa de integrar o conhecimento acer-ca desse grupo no conhecimento maisamplo da Psicologia Vocacional. Com aevolução destes estudos começou a sernotória a ideia de que o que se estudavanão era o grupo “mulheres” per se mastambém o “género” e o sua influênciadiferencial no desenvolvimento de carrei-ra de ambos os sexos. À medida que oestudo das mulheres e do género começaa ser integrado no estudo da PsicologiaVocacional, começa a tornar-se evidenteque as mulheres não são um grupo ho-mogéneo e a investigação deve tomar issoem conta.Por outro lado, a forma como os factorese variáveis identificadas como pertinentespara o desenvolvimento de carreira dasmulheres interagem de forma a afectar odesenvolvimento de carreira das mulheres

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e a relativa importância dos seus efeitostem sido pouco estudada de uma formaholística e integrativa.Contudo, alguns autores da perspectivasócio-cognitiva da carreira têm dado pas-sos importantes neste sentido (Lent, Brown& Hackett, 2002). Trata-se de uma posi-ção que procura traçar as relações com-plexas que existem entre as pessoas e osseus ambientes escolares e profissionais,entre os factores pessoais e interpessoaise, entre as influências impostas internamen-te e externamente às pessoas, no querespeita a sua vida de estudante e traba-lhador. É uma abordagem construtivista dacapacidade humana para influenciar o seupróprio desenvolvimento e os ambientesque a circundam, inspirada nas teoriascognitivas da psicologia humana e nasteorias da aprendizagem e do desenvolvi-mento da carreira.As pessoas, mulheres e homens, sãoencarados, cada vez mais, como agentesactivos, modeladores do seu próprio de-senvolvimento da carreira. Este acento naagência pessoal ou auto-direcção enfatizaque as crenças sobre si próprio/a, osambientes e possíveis trajectórias e padrõesde carreira, têm um papel fundamental noprocesso de desenvolvimento e escolhaescolar e profissional. Não somos merasvítimas/beneficiários da estrutura social oudo nosso mundo intra-psíquico, do nossotemperamento, ou de forças situacionais(Lent, Brown, & Hackett, 2002, p.255).O comportamento humano é, muitas ve-zes, flexível e susceptível a esforços demudança.Neste contexto, consideramos que é rele-vante o estudo destas temáticas, procuran-do descrever, na sociedade actual altamen-te vocacionada para o trabalho, quais ospadrões ou variáveis que descrevem odesenvolvimento de carreira de mulherese homens.

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