auto-conceito, auto-regulação da aprendizagem e rendimento...

16
Psicologia e Educação 45 Vol. VI, nº 2, Dez. 2007 Auto-conceito, auto-regulação da aprendizagem e rendimento escolar: Análise das suas relações Helena Bilimória* Leandro Almeida* Fátima Simões** Resumo: A literatura tem relatado a associação entre o auto-conceito e os resultados académicos. Os modelos actuais de auto-conceito apontam para um dinamismo, no sentido de uma troca constante de informação com o meio de modo a avaliar e integrar informações auto-relevantes. Assim, e tomando a auto-regulação da aprendizagem como uma série de processos associados à área cognitiva, mas também afectiva/motivacional, comportamental e contextual, impõe-se conhecer a repercussão e relação do auto-conceito e dos processos auto-regulatórios no rendimento escolar. Para tal, aplicamos no início do ano lectivo, a escala AME (Vasconcelos & Almeida, 2000) e a Escala Piers-Harris Children Self-Concept Scale (adaptada por Veiga, 1989) a 59 alunos do 8º ano da cidade do Porto. Os resultados não salientam, salvo no caso da disciplina de Educação Física, uma associação entre os resultados escolares em cada disciplina e as dimensões do auto-conceito. Também, ao nível dos processos auto-regulatórios, salienta-se a associação entre as expectativas e os resultados escolares e entre as atribuições e os resultados escolares. Investigações que conduzam a uma análise mais profunda das relações causais ou cíclicas entre as variáveis impõem-se. Palavras-chave: Auto-conceito, processos de auto-regulação da aprendizagem, ren- dimento académico. Self-concept, Self-regulated learning processes, and Academic achievement: Its relationships analysis Abstract: The relation between self-concept and school results has been enlightened in the scientific literature. Contemporary models of self-concept refer to its dynamic nature, interacting with the environment in order to appraise and integrate self-relevant information. So, taking self-regulated learning as series of processes taking place within the cognitive area, as well as the motivational/affective, behavioural and contextual one, it’s urgent to understand the relation between the self-concept, the self-regulated learning processes and school achievement. To do so, in the beginning of the school year, we applied to 59 Oporto 8 th grade students the AME (Vasconcelos & Almeida, 2000) and Piers-Harris Children Self-concept Scale (Veiga, 1989). We didn’t found any significant associations between self-concept and school results but between the discipline of Physical Education and the school results in some of the academic areas. Also, concerning the self-regulated learning processes we found associations only between the expectations and attributions and the school results. Further investigations must be carried on, in order to understand the causal or cyclical relations between the variables. Key-words: Self-concept; Self-regulated learning processes, Academic achievement. _______________ * Universidade do Minho. E-mail: [email protected] ** Universidade da Beira Interior.

Upload: lamduong

Post on 30-Nov-2018

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Psicologia e Educação 45

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Auto-conceito, auto-regulação da aprendizagem e rendimentoescolar: Análise das suas relaçõesHelena Bilimória*Leandro Almeida*Fátima Simões**

Resumo: A literatura tem relatado a associação entre o auto-conceito e os resultadosacadémicos. Os modelos actuais de auto-conceito apontam para um dinamismo, nosentido de uma troca constante de informação com o meio de modo a avaliar e integrarinformações auto-relevantes. Assim, e tomando a auto-regulação da aprendizagem comouma série de processos associados à área cognitiva, mas também afectiva/motivacional,comportamental e contextual, impõe-se conhecer a repercussão e relação do auto-conceitoe dos processos auto-regulatórios no rendimento escolar. Para tal, aplicamos no iníciodo ano lectivo, a escala AME (Vasconcelos & Almeida, 2000) e a Escala Piers-HarrisChildren Self-Concept Scale (adaptada por Veiga, 1989) a 59 alunos do 8º ano dacidade do Porto. Os resultados não salientam, salvo no caso da disciplina de EducaçãoFísica, uma associação entre os resultados escolares em cada disciplina e as dimensõesdo auto-conceito. Também, ao nível dos processos auto-regulatórios, salienta-se aassociação entre as expectativas e os resultados escolares e entre as atribuições e osresultados escolares. Investigações que conduzam a uma análise mais profunda dasrelações causais ou cíclicas entre as variáveis impõem-se.Palavras-chave: Auto-conceito, processos de auto-regulação da aprendizagem, ren-dimento académico.

Self-concept, Self-regulated learning processes, and Academic achievement:Its relationships analysis

Abstract: The relation between self-concept and school results has been enlightenedin the scientific literature. Contemporary models of self-concept refer to its dynamicnature, interacting with the environment in order to appraise and integrate self-relevantinformation. So, taking self-regulated learning as series of processes taking place withinthe cognitive area, as well as the motivational/affective, behavioural and contextualone, it’s urgent to understand the relation between the self-concept, the self-regulatedlearning processes and school achievement. To do so, in the beginning of the schoolyear, we applied to 59 Oporto 8th grade students the AME (Vasconcelos & Almeida,2000) and Piers-Harris Children Self-concept Scale (Veiga, 1989). We didn’t foundany significant associations between self-concept and school results but between thediscipline of Physical Education and the school results in some of the academic areas.Also, concerning the self-regulated learning processes we found associations only betweenthe expectations and attributions and the school results. Further investigations mustbe carried on, in order to understand the causal or cyclical relations between the variables.Key-words: Self-concept; Self-regulated learning processes, Academic achievement.

_______________* Universidade do Minho. E-mail: [email protected]** Universidade da Beira Interior.

Psicologia e Educação46

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Introdução

Num contexto de democratização do en-sino e procura de uma maior escolarizaçãode toda a população, o insucesso escolarassume contornos pessoais, familiares,sociais e políticos relevantes. Por este facto,torna-se importante a investigação e aintervenção deliberadas nesta problemáti-ca. Se é importante salientar a necessidadede um ensino individualizado e centradonas necessidades educativas especiais dosalunos, por outro lado, é também relevan-te pensar os factores determinantes doproblema e, numa lógica preventiva, ac-tuar na redução do seu impacto. Algunsfactores de índole psicológica assumemrelevância na análise do insucesso escolar.Não se pretendendo “psicologizar” o pro-blema, ou as formas de avaliar e de intervirneste domínio, este artigo analisa as re-lações entre auto-conceito do aluno, osprocessos de auto-regulação da aprendiza-gem a que recorre e o rendimento escolar.Tentando definir auto-conceito, Shavelsone Bolus (1982) referem-no como umadimensão interna ao indivíduo, devidamen-te estruturada e permanente no tempo, econtemplando diversas áreas na sua orga-nização. Nesta linha, assume-se que a parde um auto-conceito geral, possamos falarem auto-conceitos académico, social,emocional e físico, podendo o auto-con-ceito académico especificar-se pelas diver-sas disciplinas curriculares (Shavelson,Hubner & Stanton, 1976). O auto-conceitoapresenta deste modo, uma naturezamultidimensional e acompanha, os contex-tos de vida e as vivências pessoais de cadaindivíduo nas situações de realizaçãosusceptíveis de alguma auto-avaliação.Efectivamente, o auto-conceito reporta-seà percepção, aqui tomada como conheci-mento e à avaliação que a pessoa faz dassuas características pessoais (Paradis &

Vitaro, 1992; Galand & Gregoire, 2000).De acordo com Shavelson e Bolus (1982),a formação do auto-conceito é determina-da pelas experiências, pelas interpretaçõesdo meio ambiente, pelas atribuições cau-sais que a pessoa faz dos seus compor-tamentos e pelas avaliações e reforços depessoas significativas. Fontaine (1988), porsua vez, reforça esta ideia acrescentandoque é pela integração afectivo-cognitiva dasexperiências que se processa a formaçãoda imagem de si próprio e do mundo, bemcomo a maneira de se situar face às si-tuações de realização futura. Cada novaexperiência, através da interpretação e daatribuição, integra-se no conjunto dasexperiências anteriores susceptíveis deinfluenciar o auto-conceito do indivíduo(Fontaine, 1985).Bandura (1986) diferenciou o auto-conceitoda percepção de auto-eficácia, consideran-do auto-conceito como uma perspectivaglobal, compósita de si próprio, enquantoa auto-eficácia é concebida como umjulgamento da pessoa sobre a sua capa-cidade para organizar e executar cursos deacção necessários para alcançar tipos dedesempenho definidos. Ou seja, enquantoa eficácia pessoal é uma avaliação dacompetência para desempenhar uma tarefaespecífica, ou seja, um julgamento dascapacidades próprias pessoais para execu-tar comportamentos específicos em situ-ações específicas, já o auto-conceito sereporta a um constructo que avalia aspec-tos globais e integra as crenças sobre ovalor próprio, mesmo que também asso-ciado à auto-competência percebida(Pajares & Miller, 1994). Por este mesmomotivo, pode-se considerar que o auto-conceito emerge de outros sentimentosmais específicos, designadamente a percep-ção de eficácia pessoal (Bandalos, Yates& Thorndike-Christ, 1995).

Psicologia e Educação 47

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Podemos considerar que existe uma rela-ção entre o auto-conceito, e em particularo auto-conceito académico, com o desem-penho académico. Por exemplo, as auto-avaliações negativas e as baixas expecta-tivas de eficácia pessoal conduzem areacções de fuga, tais comodesinvestimento, menor exercício de esfor-ço, aumento da ansiedade perante as ta-refas e, consequente, quebra do desempe-nho (Barros & Almeida, 1991; Fontaine,1985). A existência de uma correlação entreestas duas variáveis tem sido referida naliteratura (Chapman, Lambourne & Silva,1990; Hay, Ashman & Kraayenoord, 1998;Garcia, Musitu & Veiga, 2006; Rodriguez,Cabanach, Valle, Nuñez & González-Pienda, 2004). Deste modo, podemosconsiderar o auto-conceito como umdeterminante da aprendizagem (Galand &Gregoire, 2000).Esta relação pode assumir uma duplainterpretação. Por um lado, o auto-concei-to pode resultar dos desempenhos anteri-ores mais do que contribuir para estes. Poroutro, podemos aceitar que o rendimentodepende, não só do sucesso anterior, mastambém do auto-conceito tendo em contaos comportamentos de aprendizagem eestudo, nomeadamente a nívelmotivacional, que despoleta. É nesta úl-tima orientação que se integram algumasdas formas de actuação psicológica orga-nizada, baseadas na crença de que umaumento ou melhor auto-conceito poderácontribuir favoravelmente para o rendimen-to académico (Helmke & Aken, 1995).Mais concretamente, propõe-se que apercepção de auto-eficácia e as expecta-tivas daí resultantes são consideradas comomediadores da relação entre o auto-con-ceito e o rendimento académico, orientan-do o tipo de intervenção mais apropriadanestes casos (Pajares & Miller, 1994). Defacto, o auto-conceito parece influenciar

a activação de estratégias cognitivas e aauto-regulação da aprendizagem escolar,bem como as atribuições (Rusillo & Arias,2004). Desta feita, tendencialmente, osalunos com uma auto-regulação mais eficazfazem atribuições que mantêm a percep-ção de eficácia pessoal, o esforço, apersistência e a aprendizagem (Bandalos,Yates & Thorndike-Christ, 1995; Rosário,Soares, Núñez, González-Prienda, &Simões, 2004; Schunk, 1994; Zimmerman,2000). Para o efeito, jogam papel decisivoas auto-avaliações que acompanham arealização ou a análise do sucesso oufracasso finais pois que influenciam, noreinício de um novo ciclo e perante umatarefa similar, as expectativas de eficáciapessoal, a definição de objectivos na fasede planeamento, o auto-controlo e a auto-observação (Boekaerts, 1996; Boekaerts &Niemivirta, 2000; Simões, 2001). Porexemplo, as avaliações negativas condu-zem a uma definição de objectivos ego-protectores, enquanto que uma avaliaçãopositiva acarreta a definição de objectivosde aprendizagem, ou de mestria. Assim,o auto-conceito parece desempenhar umpapel importante como regulador do com-portamento, constituindo-se como umapercepção que o indivíduo tem das suasdiferentes facetas quer quando se confron-ta consigo em situações que envolvem osistema cognitivo-afectivo, quer quando eminteracção com os outros. Do sistemacognitivo afectivo constam as auto-repre-sentações englobando também processoscomo por um lado, o processamento deinformação de estímulos congruentes eauto-relevantes, a regulação do afecto, quepermite a estabilidade do auto-conceitoatravés da avaliação e integração da in-formação proveniente do meio em auto-concepções existentes e, finalmente, amotivação (Markus & Wurf, 1986; Simões,2001, 1997).

Psicologia e Educação48

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Estas considerações justificam o treino dosalunos em estratégias de auto-regulação,não no sentido de um receituário dedestrezas de aquisição mecânica, mas antesno sentido de uma apropriação pessoal decomportamentos e estratégias que o sujei-to avalie como apropriados ao seu casoe às diferentes situações de aprendizagem(Almeida, 1993). Por outro lado, aestruturação das práticas educativas e aspráticas avaliativas dos próprios professo-res têm também repercussão não só nadefinição de orientação motivacional (ori-entação para a aprendizagem ou para odesempenho), como no próprio auto-con-ceito através da interpretação que o alunofaz das mesmas (Crooks, 1988; Galand &Gregoire, 2000, Simões, Franco, & Bran-co, 2002, Simões e Ferrão, 2005) e darepercussão na auto-avaliação (Eccles,Wigfield & Schiefele, 1998; Sá, 2007,Rosário et al., 2004). Apologizamos, destemodo, práticas pedagógicas que favoreçamum ambiente escolar propício à manuten-ção de orientações motivacionais para aaprendizagem e de um auto-conceitopositivo, bem como promotoras do desen-volvimento de processos auto-regulatórios.Os processos auto-regulatórios são uma dasdimensões da auto-regulação da aprendi-zagem. Zimmerman (1994, 1998) eZimmerman e Risemberg, 1997, apresen-taram uma sistematização tomando comodimensões da auto-regulação académica:i) as questões científicas de base, ii) asdimensões psicológicas, iii) as condiçõesda tarefa, iv) os atributos auto-regulatóriose, v) os processos auto-regulatórios. Destaforma, à questão porquê, corresponde adimensão psicológica motivo, que dizrespeito a quanto e como o aluno querestudar, envolvendo a auto-motivação e,como processos auto-regulatórios, o esta-belecimento de objectivos e auto-eficácia.À pergunta como corresponde a dimensão

psicológica do método, implicando o pla-neamento ou, quando a tarefa é muitofamiliar, a rotina, e o recurso a processosauto-regulatórios tais como a selecção deestratégias adequadas à tarefa, o imagerye a auto-instrução. À pergunta quando,subjaz a dimensão psicológica temporal econcerne à regulação do tempo, sendo queos alunos auto-regulados se apresentammais eficientes no processo auto-regulatório de gestão do tempo. À pergun-ta o quê está subjacente a dimensão psi-cológica do comportamento aberto, dodesempenho. Envolve a autoconscienciali-zação do desempenho e está associada aprocessos auto-regulatórios como a auto-monitorização, auto-avaliação e a defini-ção e atribuição de auto-consequências. Àpergunta onde está associada a dimensãopsicológica do ambiente físico de realiza-ção da tarefa, envolvendo a escolha de umcontexto ajustado à realização da mesma,quer ao nível dos recursos, quer ao níveldas condições físicas (ruído, mobiliárioimpróprio) que oferece e implica os pro-cessos auto-regulaórios associados àestruturação do ambiente, integrando-senestes processos a estruturação da própriaactividade, ou seja a preparação do ma-terial necessário e a escolha do contextoque o oferece. Por fim, a pergunta comquem reporta-se à dimensão psicológica deordem social, implicando a escolha demodelos, de professores e de pares detrabalho, ou seja, os processos auto-regulatórios reportam-se a uma procuraselectiva de ajuda.Este modelo é, de certa forma, comple-mentado pelo modelo de integração defases e áreas de auto-regulação da apren-dizagem apresentado por Pintrich (2000,2004). Este autor considera que a auto-regulação da aprendizagem se processa aolongo de quatro fases: i) o planeamentoe activação; ii) a monitorização; iii) o

Psicologia e Educação 49

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

controlo; e, iv) reacção e reflexão. Estasfases envolvem processos auto-regulatóriosque se manifestam em quatro áreas: i)cognição, motivação/afecto, comportamen-to e contexto.Desta forma, na fase de planeamento e aonível da cognição os processos auto-regulatórios envolvidos são: i) o estabe-lecimento de objectivos, o que ao nívelda motivação se traduz na orientação deobjectivos adoptada, envolvendo, em ter-mos comportamentais o planeamento dotempo e esforço que se pensa seremnecessários e ao nível do contexto apercepção da tarefa; ii) a activação doconhecimento anterior, que envolve, aonível motivacional os julgamentos deeficácia e ao nível comportamental oplaneamento de auto-observações do com-portamento, implicando, ao nívelcontextual as percepções do contexto; e,iii) a activação do conhecimentometacognitivo, o que implica em termosmotivacionais as percepções da dificulda-de da tarefa e a activação do valor da tarefae do interesse, mantendo os mesmosprocessos auto-regulatórios já menciona-dos ao nível comportamental e contextual.Na fase de monitorização, ao nívelcognitivo ocorre uma vigilânciametacognitiva e monitorização dacognição, implicando, em termosmotivacionais a monitorização dos afectose ao nível comportamental a monitorizaçãodos esforços, do uso do tempo, da neces-sidade de ajuda, bem como a auto-obser-vação do comportamento aberto. Em ter-mos contextuais, nesta fase o aluno pro-cede à monitorização das condições docontexto e das mudanças na tarefa.Na fase de controlo, ao nível cognitivo,os processos auto-regulatórios envolvem aselecção e adaptação de estratégiascognitivas que permitam a aprendizageme o pensamento, o que envolve, ao nível

motivacional a selecção e adaptação deestratégias para gerir e manter a motiva-ção e os afectos positivos. Traduz-se emtermos comportamentais no aumento oudecréscimo do grau de esforço e ao nívelcontextual pela mudança ou renegociaçãoda tarefa.Por fim, na fase de reacção e reflexão oaluno procede, por um lado a julgamentoscognitivos que conduzem a reacçõesafectivas, à escolha de um comportamentoe à avaliação do contexto; por outro lado,o aluno faz, quer ao nível cognitivo, quermotivacional e afectivo, atribuições que serepercutem ao nível contextual por umaavaliação da própria tarefa. Deste modo,é inextricável a interligação entre ascomponentes mais afectivas e as maiscognitivas, sendo também importante adimensão contextual, quer nas avaliaçõesque o aluno faz de si próprio, quer datarefa.Tomando esta interligação como baseteórica, neste artigo pretendemos analisar,no quadro de um pequeno grupo de alunosque foram alvo de uma intervenção em prolda melhoria das suas habilidades cognitivase estratégias de aprendizagem, a relaçãoentre os métodos e atitudes dos alunos faceao estudo, consubstanciados nos processosauto-regulatórios utilizados, o auto-concei-to e seu o rendimento escolar.

Método

ParticipantesOs sujeitos desta investigação foram 59alunos de uma escola dos arredores doPorto, seleccionados de modo aleatório,tendo-se como critério de selecção a ins-crição voluntária dos alunos num progra-ma de intervenção na área dos métodosde estudo. Os alunos frequentavam o 8ºano de escolaridade (3º Ciclo do Ensino

Psicologia e Educação50

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Básico), e as suas idades oscilavam entreos 12 e os 17 anos, sendo maioritariamente(58%) de 13 anos. Em relação ao género,24 alunos pertenciam ao género masculinoe 35 alunos pertenciam ao género femi-nino. Quanto ao nível sócio-económico,constatou-se que 35 sujeitos (59,3%)pertenciam ao nível sócio-económico alto,16 sujeitos (27,1%) pertenciam ao nívelsócio-económico médio e 8 sujeitos(13,6%) pertenciam ao nível sócio-econó-mico baixo.InstrumentosO estudo envolveu a aplicação da Escalade Auto-Conceito de Piers-Harris(PHCSCS), adaptada por Veiga (1989), ea Escala de Avaliação dos Métodos deEstudo (AME; Vasconcelos & Almeida,2000). A avaliação do auto-conceito con-sidera uma nota global na escala e umanota para cada uma das suas sub-escalas(os seus 58 itens repartem-se por 6 sub-escalas: aspecto comportamental; controloda ansiedade; estatuto intelectual e esco-lar; popularidade; aparência e atributosfísicos; e satisfação/felicidade. Também naescala AME se considerou uma nota glo-bal e a nota das suas várias sub-escalas.Esta escala é do tipo Likert, com cincoopções de resposta entre “sempre” e“nunca” e 125 itens relativos a 10 sub-escalas: atitudes e comportamentos nostestes; motivação; expectativas de auto-eficácia; atribuições causais; espaço deestudo; material de estudo; tempo deestudo; aquisição da informação; compre-ensão da informação; e memorização dainformação. Recolheram-se, ainda, osresultados escolares em diversas discipli-nas curriculares relativos ao 1º período doano lectivo.

ProcedimentoAs provas psicológicas foram aplicadascolectivamente no início do ano lectivo ao

nível do grupo turma, seguindo asinstruções dos respectivos autores. Asdúvidas surgidas quer durante o períodode leitura das instruções, quer durante aresolução das provas e das escalas foramesclarecidas. Os alunos foram informadosdo objectivo do estudo previamente ao seuconsentimento em participar. Aconfidencialidade das informações foigarantida aos alunos, até como forma dese aumentar a sinceridade nas respostas,em particular, nas escalas de percepção decomportamentos pessoais.

Resultados

Para uma melhor organização da informa-ção, os resultados nas diversas disciplinascurriculares foram organizados em quatrogrupos disciplinares: i) Línguas, integran-do a Língua Portuguesa, a Língua Estran-geira I, e a Língua Estrangeira II; ii)Ciências Humanas, englobando a Históriae a Geografia; iii) Ciências Exactas eNaturais, contendo as Ciências Físico-Químicas, Ciências Naturais e Matemáti-ca; e iv) Expressões, incluindo a EducaçãoVisual e Tecnológica, e a Educação Física.Considerou-se, ainda, uma nota global.Também os resultados relativos aos pro-cessos auto-regulatórios da aprendizagemforam organizados em três grupos: i) aspercepções pessoais e envolvimento noestudo, integrando as dimensões da mo-tivação, das expectativas de auto-eficáciae das atribuições causais; ii) as atitudese comportamentos no estudo, incluindo agestão do tempo, materiais e espaço deestudo; iii) os processos cognitivos noestudo, que envolve as dimensões daaquisição, da compreensão e damemorização da informação.Na tabela 1 apresentam-se as medidas des-critivas relativas à variável auto-conceito.

Psicologia e Educação 51

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Por sua vez, na tabela 2 apresentam-se asmedidas descritivas das dimensões dasvariáveis resultados escolares e processosde auto-regulação da aprendizagemTomando as variáveis resultados escolarese o auto-conceito, bem como as suasdimensões, tentámos verificar as associa-ções existentes entre elas. Ao invés do queera esperado, não foram encontradas as-sociações estatisticamente significativas

entre os diferentes agrupamentos de dis-ciplinas e as dimensões do auto-conceito.De facto, globalmente, o valor da corre-lação entre os resultados escolares toma-dos como um todo e o auto-conceito é r=.040, p>.05. As disciplinas integradas nogrupo das Línguas apresentam uma cor-relação com o auto-conceito global no valorde r=.090, p>.05; as Ciências Humanas eo auto-conceito apresentam uma correla-

otiecnoc-otualeváiravadseõsnemidsadsavitircsedsadideM-1alebaT

sadideMsavitircsed

sieváiraV

N ominíM omixáM aidéM oãrdap-oivseD

otcepsAlatnematropmoc

95 03 54 7.83 67.3

olortnoCedadeisnaad

95 31 63 0.72 14.4

otutatsElautceletnI

ralocsee95 22 93 8.92 18.3

edadiralupoP 95 61 03 2.62 39.2

socisífsotubirtA 95 8 81 8.31 36.2

oãçafsitaS 95 11 12 2.81 39.2

otiecnoc-otuAlabolg

95 321 581 7.351 51.41

sodatlusersieváiravsadseõsnemidsadsavitircsedsadideM-2alebaTmegazidnerpaadoãçaluger-otuaedsossecorpeseralocse

sadideMsavitircsed

sieváiraV

N ominíM omixáM aidéM oãrdap-oivseD

saugníL 95 6 21 1.8 83.1

saicnêiCsanamuH

95 4 01 9.5 21.1

satcaxEsaicnêiCsiarutaNe

95 6 31 4.8 95.1

seõsserpxE 95 5 8 6.6 77.

labolGatoN 95 22 04 0.92 69.3

sossecorPsovitingocodutseon

95 901 371 4.731 67.31

sedutitAodutseon

95 501 271 9.531 60.31

otnemivlovnEodutseon

95 89 181 4.441 02.61

Psicologia e Educação52

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

ção com o valor de r= -.085, p>.05; asCiências Exactas e Naturais e o auto-conceito estão associados, também deforma negativa e não significativa: r= -.014, p>.05 e, por fim, as Expressões eo auto-conceito associam-se de forma nãosignificativa também: r= .196, p>.05.Contudo, analisando cada disciplina per seconstata-se que a dimensão estatuto inte-lectual e escolar do auto-conceito seencontra positiva e significativamenteassociada ao desempenho na disciplina deLíngua Estrangeira I (Inglês): r=.314,p<.05. Por outro lado, foram tambémencontradas associações com a disciplinade Educação Física e as seguintes dimen-sões do auto-conceito: estatuto intelectuale escolar (r=.407, p<.01); popularidade(r=.338, p<.01) e satisfação (r=.309,p<.05); uma associação com o auto-con-ceito, tomado globalmente foi tambémencontrada ao nível desta disciplina (r=.380, p<.01). Também, e relativamente àdimensão da satisfação no auto-conceito,foi encontrada uma associação estatistica-mente significativa, embora de sentidonegativo com a disciplina de EducaçãoVisual e Tecnológica (r= - .285, p<.05).Ao nível da associação entre as discipli-nas, o que mais se salienta são os elevadosvalores de correlação entre as dimensõesde cada uma das variáveis. Desta forma,constata-se que as disciplinas integradasno agrupamento das Línguas,correlacionam-se com todos os outrosagrupamentos: com as Ciências Exactas eNaturais (r=.669, p<.01), com as CiênciasHumanas (r=.665, p<.01) e, mesmo, comas disciplinas associadas às Expressões(r=.311, p<.05), o que salienta a enormeimportância de possuir quer um bomléxico, quer um bom desenvolvimento dasregras gramaticais. Por seu turno, encon-trou-se uma associação significativa epositiva entre as Ciências Humanas e as

Ciências Exactas e Naturais (r=.825,p<.01), relevando a transdisciplinaridademental interna associada à metodologia epensamento científicos.Relativamente às dimensões do auto-con-ceito, constata-se que a dimensão popu-laridade se encontra associada de formaestatisticamente significativa e positivacom as demais dimensões do constructo:aspecto comportamental (r=.522, p<.01),controlo da ansiedade (r=.463, p<.01),estatuto intelectual e escolar (r=.339,p<.01), atributos físicos (r=.442, p<.01) ecom a satisfação (r=.651, p<.01). Natural-mente, a correlação é elevada com o auto-conceito, tomado globalmente (r=.799,p<.01). Por sua vez, outra dimensão bas-tante associada às restantes do auto-concei-to é a satisfação. Foram encontradascorrelações estatisticamente significativascom a dimensão do aspectocomportamental (r=.522, p<.01), com ocontrolo da ansiedade (r=.447, p<.01), como estatuto intelectual e escolar (r= .316,p<.05), com os atributos físicos (r=.415,p<.01) e com o auto-conceito na suaglobalidade (r=.782, p<.01). O estatuto in-telectual e escolar parece tambémcorrelacionar-se com algumas das outrasdimensões, em particular, além das já cita-das, com os atributos físicos (r= .325, p<.05)e com a medida de auto-conceito global(r=.556, p<.01). Também, a dimensão doaspecto comportamental está associadapositivamente com o controlo da ansiedade(r=.551, p<.01). bem como com a medidaglobal de auto-conceito (r=.707, p<.01).Encontrou-se também uma associação entrea dimensão controlo da ansiedade com amedida do auto-conceito global (r=.743,p<.01). Finalmente, há uma associação entrea dimensão dos atributos físicos e o auto-conceito global (r=.556, p<.01).Por outro lado, tentámos verificar a exis-tência de associações entre os resultados

Psicologia e Educação 53

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

escolares e os processos de auto-regulaçãoda aprendizagem. Constatou-se que, detodos os processos auto-regulatórios envol-vidos no processo de aprendizagem, pa-rece que são os processos que integramas percepções e envolvimento no estudoque mais se associam aos resultados nasdiferentes disciplinas. Efectivamente, po-demos verificar que este agrupamento deprocessos se encontra associado positiva-mente e de forma significativa com asdisciplinas que integram o grupo dasLínguas (r=.304, p<.05), com as discipli-nas que se inserem no grupo das CiênciasHumanas (r=.284, p<.05) e com as disci-plinas englobadas no grupo das CiênciasExactas e Naturais (r=.295, p<.05); nãoforam encontrados, porém correlaçõessignificativas com as disciplinas associa-das às Expressões (r=.185, p>.05). Con-tudo, ao nível global, as percepções eenvolvimento no estudo associam-se deforma significativa com os resultadosescolares no global (r=.341, p<.01). Deforma mais específica, pode-se afirmar quedas percepções associadas ao estudo asatribuições e a auto-eficácia parecemassociar-se de forma evidente com osresultados escolares. Desta forma, verifi-ca-se que a auto-eficácia se encontraassociada às disciplinas integradas nogrupo das Línguas (r=.264, p<.05), bemcomo às disciplinas integradas no grupodas Ciências Exactas e Naturais (r=.272,p<.05). Embora, ao nível das Expressõesnão tivessem sido encontradas associaçõesestatisticamente, a um nível mais especí-fico, verifica-se uma associação positivae bastante significativa com a disciplinade Educação Física (r=.386, p<.01). Porseu turno, as atribuições causais parecemestar associadas com todos os agrupamen-tos de disciplinas, salvo as Expressões:Línguas (r=.340, p<.01), Ciências Huma-nas (r=.298, p<.05) e Ciências Exactas e

Naturais (r=.322, p<.05). Com os resul-tados escolares tomados globalmente ve-rifica-se uma associação positiva e es-tatisticamente significativa: r=.369, p<.01.A motivação apenas se associa com asCiências Humanas: r=.277, p<.05.Nenhum dos outros processos auto-regulatórios de aprendizagem se revelouassociado de forma estatisticamente sig-nificativa aos resultados nas diferentesdisciplinas, embora, a um nível maisespecífico, encontrou-se uma associaçãopositiva e significativa entre os processoscognitivos envolvidos no estudo e a dis-ciplina de Matemática (r=.268, p<.05),contribuindo para esta correlação a asso-ciação entre o processo de compreensãoe a disciplina de Matemática (r=.321,p<.05).Realizou-se, ainda, uma análise de regres-são, tomando os quatro grupos de disci-plinas: Línguas, Ciências Humanas, Ciên-cias Exactas e Naturais, e Expressões,assim como uma Nota Global dos resul-tados escolares. Utilizou-se o MétodoStepwise.Da análise dos dados constata-se que omodelo estatisticamente significativo: F=5.44, p<.01, que explica 13% da variânciados resultados obtidos nas disciplinas nogrupo das Línguas (R2 =.16; R2 adjust=.13;∆R2 = .07), é aquele que integra a dimen-são das percepções pessoais eenvolvimento no estudo dos processos deauto-regulação da aprendizagem (ß= .49,t =3.28, p<.001), e a dimensão do aspectocomportamental do auto-conceito (ß = -.33, t = -2.17, p<.05). Por sua vez, omodelo matemático estatisticamente signi-ficativo: F =5.14, p<.01, que explica 13%dos resultados nas disciplinas integradasno grupo das Ciências Humanas (R2 =.15;R2 adjust=.13; ∆R2 = .07) é o modelo queassocia a dimensão das percepções pesso-ais e envolvimento no estudo (ß = .45, t

Psicologia e Educação54

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

= 3.13, p<.01) e o auto-conceito, tomadoglobalmente (ß = -.32, t = -2.22, p<.05).Em relação às disciplinas integradas nogrupo das Ciências Exactas e Naturais, omodelo matemático, estatisticamente sig-nificativo: F = 4.88, p<.01, que explica12% da variância dos resultados nestasdisciplinas (R2 =.15; R2 adjust=.12; ∆R2 =.06) é aquele que considera a dimensãodas percepções pessoais e envolvimento noestudo dos processos de auto-regulação daaprendizagem (ß = .41, t = 3.01, p<.01),e a dimensão da popularidade do auto-conceito (ß = -.27, t = -2.01, p<.05). Aonível das expressões nenhum modelomatemático se revelou estatisticamentesignificativo. Ao nível dos resultadosescolares tomando uma nota global, ve-rifica-se que o modelo significativo: F =7.48, p<.01, é aquele que explica 12% davariância das notas escolares tomadas comoum todo (R2 =.12; ∆R2 = .12) e que apenasconsidera uma variável: a dimensão dosprocessos de auto-regulação da aprendiza-gem: percepções pessoais e envolvimentono estudo (ß = .34, t = 2.74, p<.01).A análise de regressão anteriormenteexplicitada ressalta o peso evidente dasvariáveis associadas às percepções pesso-ais e de envolvimento no estudo, tais comoas expectativas de eficácia pessoal, amotivação e as atribuições causais, emtodos os resultados obtidos nos diferentesconjuntos de disciplinas escolares.Releva-se também, o facto de que, con-soante o tipo de disciplinas, diferentesdimensões do auto-conceito vão assumin-do importância preditiva dos resultadosescolares. Deste modo, enquanto que nasdisciplinas que integram o grupo dasLínguas, assume valor preditivo dos resul-tados a dimensão do aspectocomportamental do auto-conceito, já nasCiências Exactas é a dimensão da popu-laridade que assume valor preditivo dos

resultados nas disciplinas que integram estegrupo; finalmente, nas Ciências Humanas,é o auto-conceito no seu todo que con-tribui para os resultados escolares nestasdisciplinas. Contudo, o peso das dimen-sões do auto-conceito na predição dosresultados escolares é sempre inferior aopeso das variáveis integradas no grupo daspercepções pessoais e envolvimento noestudo.Finalmente, salienta-se que os resultadosnas disciplinas integradas no grupo dasExpressões não são predizíveis por nenhu-ma destas variáveis, implicando que, pro-vavelmente, existirão outras variáveis quecontribuem de forma mais evidente paraesses resultados.

Discussão e conclusões

As análises anteriores salientaram que,ainda que os resultados escolares no seutodo, ou agrupados por categorias dedisciplinas, não pareçam a priori estarassociados ao auto-conceito, nem a nenhu-ma das suas dimensões, verifica-se queexistem disciplinas, em particular a Edu-cação Física que está associada a algumasdimensões, de certo relevo nesta faixaetária, como seja a popularidade, o esta-tuto intelectual e escolar e, também asatisfação. De facto, estudos existem quereferem o contributo da Educação Físicapara o envolvimento com actividades fí-sicas que, por natureza, proporcionam aparticipação do indivíduo num ambientesocial, sem perda da identidade pessoal(Moreno, Cervelló, Hernández, Lacárcel &Pérez, 2007). Aliás, noutra investigação(Whitehead, 1993), salienta-se o efeito queas percepções de controlo sobre o meiosocial têm sobre as auto-percepções du-rante a prática desportiva e física. Alémdisso, diversas investigações tendem a

Psicologia e Educação 55

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

realçar resultados similares relativamenteao aumento de auto-estima e de auto-confiança, gerado através da prática deactividade física (Alexander, Nickel,Boreskie, and Searle, 2000; Boyd andHrycaiko, 1997). Por seu turno, Poulsen,Ziviani e Cuskelly (2006) também salien-tam a mediação da relação entre a coor-denação física e a satisfação pelo grau departicipação em actividades de desporto emequipa.Apesar de não se terem elaborado análisesque o atestem, pode-se assumir um carác-ter cíclico de influências entre o auto-conceito e os resultados escolares, pelo queé aceitável referir que os bons resultadosescolares promovem um auto-conceito denível elevado o que, por sua vez, irácontribuir para um maior investimentoescolar, que, consequentemente, redunda-rá em bons níveis de desempenho escolar,reiniciando o ciclo. Contudo, e atendendoaos resultados propõe-se que se desenvol-vam mais estudos no âmbito das relaçõesentre auto-conceito e rendimentoacadémico de modo a perceber melhor osentido causal ou cíclico desta relação.Efectivamente, a análise de regressão aquiapresentada parece apontar para o contri-buto do auto-conceito, ou de algumas dassuas dimensões, para os resultados esco-lares, é importante perceber se é o auto-conceito que influi nos resultados escola-res ou se são estes que influem no auto-conceito, não só pela literatura difusaquanto a esta temática, como tambémporque a intervenção delineada na promo-ção do sucesso escolar pode passar peladefinição de uma relação causal ou cíclicaentre estas duas variáveis.Além disso, e dado que neste estudo seevidenciaram associações entre os resul-tados escolares e, por um lado, as expec-tativas de eficácia pessoal e as atribuiçõescausais, e, por outro, se encontraram

modelos matemáticos que combinavam aspercepções pessoais e algumas dimensõesdo auto-conceito na predição dos resulta-dos escolares, torna-se necessário definira relação entre auto-conceito, percepção deeficácia pessoal, atribuições causais erendimento académico, designadamente emtermos de escrutínio das variáveis quemediatizam e das variáveis que intervêmdirectamente, uma vez que a literatura éambígua a este nível, embora se tenda paracompreender a auto-eficácia e as atribui-ções causais como variáveis mediadorasentre o auto-conceito e o rendimentoacadémico (Leppin et al., 1987; Pajares eMiller, 1994). Importante será tambémconsiderar sub-dimensões do auto-concei-to (por ex., auto-conceito académico oumesmo auto-conceito académico verbal,matemático) uma vez que os resultadosescolares poderão estar mais associados aauto-conceitos específicos.Por outro lado, o papel dos processoscognitivos, bem como da estruturação docontexto nos resultados académicos neces-sita de mais investigações, uma vez que,se há autores que defendem a importânciadestas áreas (Pintrich, 2000; 20004;Zimmerman, 1994, 1998; Zimmerman &Risemberg, 1997), neste estudo não con-seguimos provar a associação entre estesprocessos e os resultados escolares, salvoentre a disciplina de Matemática e oprocesso cognitivo de compreensão. Aliás,a investigação baseada nas diferenças entreperitos e novatos na realização de proble-mas salienta a representação mental doproblema e a integração da informaçãosobre o problema em esquemas (Matlin,1989; Van Lehn, 1989), como a fonte dediferença entre os dois grupos deresolutores. Os esquemas guiam a com-preensão dos textos e conduzem à orga-nização da informação do episódio deaprendizagem (Torres, Mejias & Milán,

Psicologia e Educação56

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

2001), pelo que a Matemática, sendo umadisciplina que envolve a resolução deproblemas se correlaciona com o processocognitivo de compreensão.Consideramos também pertinente sugerirum estudo diferencial, tomando o géneroe o nível sócio-económico, com vista amelhor estudar a associação entre as di-ferentes variáveis em jogo nesta investi-gação aqui apresentada.Finalmente, e tomando os resultadosobtidos na análise de regressão nos quaisse salientava o poder preditivo de variá-veis de carácter motivacional e cognitivo-motivacional relativamente aos resultadosescolares propõe-se, em tom de implica-ção educativa deste estudo, que a peda-gogia das nossas salas de aula tenha emconsideração a interacção entre as variá-veis cognitivo-motivacionais e afectivas demodo a que as técnicas instrutivas visema promoção do auto-conceito e de umapercepção de eficácia pessoal positiva. Apromoção do sucesso escolar passa pelapromoção e desenvolvimento de ambien-tes de sala de aula promotores do desen-volvimento de processos auto-regulatóriosda aprendizagem. Deste modo, é necessá-rio apostar em técnicas de instrução ino-vadoras que enfatizem a compreensãorelacionada com os processos, através dadiscussão e diálogo, mais do que umaênfase na procura da resposta correcta emdetrimento da incorrecta. (Paris & Paris,2001; Paris & Winograd, 1999; Pekrun,Goetz, Titz & Perry, 2002; Perry,VandeKamp, Mercer & Nordby, 2002;Randhawa, Beamer e Lundberg, 1993).Cada vez mais se justifica a importaçãodas componentes motivacionais e emoci-onais para a sala de aula, para além dascognitivas, e o treino dos alunos na suaregulação de modo a permitir que os alunosse tornem progressivamente auto-regula-dos e o seu desempenho escolar seja cadavez melhor.

ReferênciasbibliográficasAlexander, M. J. L., Nickel, R., Boreskie,

S. L., & Searle, M. (2000). Comparisonof the effects of two types of fitness/flexibility programs on gait, mobilityand self-esteem of older females.Journal of Human Movement Studies,38, 235-268.

Almeida, L. S. (1993). Rentabilizar oensino-aprendizagem escolar para osucesso e o treino cognitivo dos alu-nos. In L. Almeida (Coord.), Capaci-tar a Escola para o Sucesso (pp. 59-110). V.N.G.: Edipsico.

Bandalos, D. L., Yates, K., & Thorndike-Christ, T. (1995). Effects of math self-concept, perceived self-efficacy, andattributions for failure and success ontest anxiety. Journal of EducationalPsychology, 87 (4), pp. 611-623.

Bandura, A. (1986). Social Foundations ofthough and action: A Social CognitiveTheory. Englewood Cliffs, NJ: PrenticeHall.

Barros, A.M. & Almeida, L.S. (1991).Dimensões sócio-cognitivas do desem-penho escolar. In L. S. Almeida (ed.),cognição e Aprendizagem escolar.Porto: APPORT

Boekaerts, M. (1996). Coping with stressin childhood and adolescence. In M.Zeidner & N. S. Endler (Eds.),Handbook of coping: Theories,research, applications (pp.452-484).New York, NY: Wiley.

Boekaerts, M., & Niemivirta, M. (2000).Self-regulated learning. Finding a ba-lance between learning goals and ego-protective goals. In M. Boekaerts, P.R. Pintrich, & M. Zeidner (Eds.),Handbook of self-regulation (pp. 417-449). San Diego: Academic Press.

Psicologia e Educação 57

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

Boyd, K. R., & Hrycaiko, D. W. (1997).The effect of a physical activityintervention package on the selfesteemof pre-adolescent and adolescentfemales. Adolescence, 32, 693-709.

Chapman, J. W., Lambourne, R. & Silva,P.A. (1990). Some antecedents ofacademic self-concept: A longitudinalstudy. British Journal of EducationalPsychology, 60,p. 142-152.

Crooks, T. J. (1988). The impact ofclassroom evaluation practises onstudents. Review of EducationalResearch, 58, p. 438-481.

Eccles, J. S., Wigfield, A. & Schiefele, U.(1998). Motivation to succeed. In W.Damon & N. Eisenberg (Vol. Ed.),Handbook of Child Psychology: Vol. 3. Social, Emotional and Personalitydevelopment (5ªed., pp. 1017-1095).New York: Wiley.

Fontaine, A.M. (1985). Motivação para arealização de adolescentes: PerspectivaCognitivo-Social das diferenças de sexoe classe social. Cadernos de ConsultaPsicológica, 1, p. 53-69.

Fontaine, A.M. (1988). Práticas educativasfamiliares e motivação para a realiza-ção dos adolescentes. Cadernos deConsulta Psicológica, 4, p. 13-30.

Galand, B. & Grégoire, J. (2000). L’impactdes pratiques scolaires d’évaluation surles motivations et le concept de soi desélèves. L’Orientation Scolaire etProfessionnelle, 29(3), p. 431-452.

Garcia, J. F., Musitu, G. & Veiga, F. (2006).Autoconcepto en adultos de España yPortugal.Psicothema, 18(3), pp. 551-556.

Hay, I., Ashman, A. F. & Kraayenoord, C.E. (1998). Educational characteristicsof students with high or low self-concept. Psychology in the schools,35(4), p. 391-399.

Helmke, A. & Aken, M.A.G. (1995). Thecausal ordering of academic

achievement and self-concept of abilityduring Elementary School: A longitu-dinal study. Journal of EducationalPsychology, 87(4), p. 624-637.

Leppin, A., Schwarzer , R. Belz, D.,Jerusalem, M & Quast,H.H.(1987)Causal attribution patternsof high and low test-anxious students.In R. Schwarzer, H. Van der Ploeg &C. Spielberger (Eds.), Advances in testanxiety research, (Vol. 5, pp. 97-106).Hillsdale, NJ: Erlbaum.

Markus, H. & Wurf, E. (1986). Thedynamic self-concept: A socialPsychological perspective. AnnualReview of Psychology, 51(4) p. 858-866.

Matlin, M.W.(1989). Cognition (2nd ed.).New York: Holt, Rinehart, Winston.

Moreno, J. A. Cervelló, E., Hernández, M.,Lacárcel, J.A.V. & Pérez,L.M.R.(2007). Physical Self-Concept ofSpanish Schoolchildren: Differences byGender, Sport Practice and Levels ofSport Involvement. Journal ofEducation and Human Development,1(2), p.1-17.

Pajares, F., & Miller, M. D. (1994). Roleof self-efficacy and self-concept beliefsin the mathematical problem solving:A path analysis. Journal of EducationalPsychology, 86(2), 193-203.

Paradis, R. & Vitaro, F. (1992).Définitionet mesure du concept de soi chez lesenfants en difficulté d’adaptationsociale : Une recension critique desécrits. Revue Canadienne de Psycho-Éducation, 21, p.93-114.

Paris, S. G. & Paris, A. (2001). Classroomapplications of research on self-regulated learning. EducationalPsychologist, 36 (2), p. 89-101.

Paris, S. G. & Winograd, P. (1999). Therole of self-regualted learning incontextual teaching: principles and

Psicologia e Educação58

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

practises for teacher preparation.Contextual teaching and learning:preparing teachers to enhance studentsuccess in the workplace and beyond(information Series nº 376). Colombus,OH: ERIC Clearinghouse on Adult,Career, and vocational education;Washington, D. C.: ERIC clearinghouse on teaching and teachereducation.

Pekrun, R., Goetz, T, Titz, W, & Perry,R.P. (2002). Academic emotions instudents´self-regulated learning andachievement: A program of qualitativeand quantitative research. EducationalPsychologist, 37(2), p. 91-105.

Perry, N. E., VandeKamp, K. O., Mercer,L. K. & Nordby, C. J. (2002).Investigating teacher-studentinteractions that foster self-regulatedlearning. Educational Psychologist,37(1), p. 5-15.

Pintrich, P. R. (2000). The role of goalorientation in self-regulated learning. InM. Boekaerts, P. R. Pintrich, & M.Zeidner (Eds.), Handbook of self-regulation (pp. 451-502). San Diego:Academic Press.

Pintrich, P. R. (2004). A conceptualframework for assessing motivation andself-regulated learning in Collegestudents. Educational PsychologyReview, 16(4), p. 385-407.

Poulsen, A., Ziviani, J.M. & Cuskelly,M.(2006) General self-concept and lifesatisfaction for boys with differinglevels of physical coordination: The roleof goal orientations and leisureparticipation. Human MovementScience, 25(6), p. 839-860.

Randhawa, B. S., Beamer, J. E., &Lundberg, I. (1993). Role ofmathematics self-efficacy in thestructural model of mathematicsachievement. Journal of EducationalPsychology, 83(1), 41-48.

Rodriguez, S., Cabanach, R. G., Valle, A.,Nuñez, J. C. & González-Pienda, J. A.(2004). Differences in use of self-handicapping and defensive pessimismand its relation with achievement goals,self-esteem and self-regulationstrategies. Psicothema, 16, p. 625-631.

Rosário, P. Soares, S., Núñez, J.C. ,González-Prienda, J. & Simões, F.(2004).

Ansiedade face aos testes e auto-regulaçãoda aprendizagem: variáveis emocionaisdo aprender. Psicologia e Educação, 3(1), 77-112

Rusillo, M.T.C. & Árias, P.F.C. (2004).Gender differences in academicmotivation of Secondary Schoolstudents. Electronic Journal ofResearch in Educational Psychology,2(1), p. 97-112.

Sá, I. (2007). A auto-regulação da apren-dizagem : O papel da auto-eficácia nastransições escolares. Psychologica, 44,p. 63-76.

Shavelson, R. J., & Bolus, R. (1982). Self-concept: The interplay of theory andmethods. Journal of EducationalPsychology, 74(1), 3-17.

Shavelson, R.J., Hubner, J. J. & Stanton,G. C.(1976). Self-concept: validation ofconstruct interpretations. Review ofEducational research, 46, p.407-441

Schunk, D. H. (1994). Self-regulation ofself-efficacy and attributions inacademic settings. In D. H. Schunk &B. J. Zimmerman (Eds.), Self-regulationof learning and performance: Issuesand educational applications (pp.75-99). Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum.

Simões, F., & Ferrão, M.E. (2005). Com-petência percebida e desempenho es-colar em Matemática. Estudos emAvaliação Educacional, 16 (32), 25-41.

Simões, F., Franco, C., & Branco, M. L.(2002). Papel da Resolução de Confli-

Psicologia e Educação 59

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007

tos e auto-regulação socioemocional.Inovação, 15 (1,2,3), 131-148.

Simões, F, (2001a). Abordagemdesenvolvimentista na identificação dealunos sobredotados. Sobredotação,2(1), 57-67.

Simões, F. (1997). Auto-conceito e forma-ção pessoal em contexto escolar. Re-vista Portuguesa de Pedagogia, AnoXXXI, n.os , 1, 2 e 3, pp. 195-210.

Torres, J.S., Mejias, F.T. & Milán,E.G.(2001). Procesos psicológicosbásicos. Madrid: McGraw-Hill.

VanLehn, K. (1989). Problem solving andcognitive skill acquisition. In M.I. Posner(Ed.), Foundations of Cognitive Science(pp. 527-579). Massachusetts: MIT Press.

Vasconcelos, C.. & Almeida, L. S. (2000).Escala de avaliação dos métodos deestudo (AME): Sua utilização na prá-tica dos professores. Psicologia, Edu-cação e Cultura, 4 (1), 65-78.

Veiga, F. H. (1989). Escala deAutoconceito: Adaptação Portuguesa da“Piers-Harris Children`s Self-EsteemScale”. Psicologia, VII, 3, 27-35.

Whitehead, J. R. (1993). Physical activityand intrinsic motivation. Research

digest, Series 1; 2 . Washington, DC:President´s Council on Physical Fitnessand Sports.

Zimmerman, B. J. (2000). Attaining self-regulation: A social cognitiveperspective. In M. Boekaerts, P. R.Pintrich, & M. Zeidner (Eds.),Handbook of self-regulation (pp. 13-36). San Diego: Academic Press.

Zimmerman, B.J. (1994). Dimensions ofacademic self-regulat ion: Aconceoptual framework foreducation. In D.H. Schunk & B.J.Zimmerman (Eds.). Self-regulation oflearning and performance: Issuesand educational applications (pp.3-21. Hillsdale, NJ: Lawrence ErlbaumAssociates, Inc..

Zimmerman, B.J. (1998). Academicstudying and the development ofpersonal skill: A self-regulatoryperspective. Educational Psychologist,33(2/3), pp.73-86.

Zimmerman, B.J. & Risemberg, R. (1997).Becoming a self-regulated writer: ASocial Cognitive perspective.Contemporary Educational Psychology,22, p.73-101.

Psicologia e Educação60

Vol. VI, nº 2, Dez. 2007