a evolução da administração pública no brasil

Download A Evolução Da Administração Pública No Brasil

If you can't read please download the document

Upload: ana-ramos

Post on 22-Dec-2015

47 views

Category:

Documents


25 download

DESCRIPTION

Gestão Pública

TRANSCRIPT

1. A ADMINISTRAO PBLICA NO BRASIL

A evoluo da administrao pblica Brasileira passou por trs modelos bsicos diferentes: A administrao patrimonialista, a administrao burocrtica e a administrao gerencial. Modalidades que surgiram sucessivamente ao longo do tempo e que no foram abandonadas. Na administrao pblica patrimonialista, prpria dos Estados absolutistas europeus do sculo XVIII, o aparelho do Estado a extenso do prprio poder do governante e os seus funcionrios so considerados como membros da nobreza. O patrimnio do Estado confundese com o patrimnio do soberano e os cargos so tidos como prebendas (ocupaes rendosase de pouco trabalho). A corrupo e o nepotismo so inerentes a esse tipo de administrao.A administrao pblica burocrtica surge para combater a corrupo e o nepotismo do modelo anterior. So princpios inerentes a este tipo de administrao a impessoalidade, o formalismo, a hierarquia funcional, a idia de carreira pblica e a profissionalizao do servidor, consubstanciando a idia de poder racionallegal. Os controles administrativos funcionam previamente, para evitar a corrupo. Existe uma desconfiana prvia dosadministradores pblicos e dos cidados que procuram o Estado com seus pleitos. So sempre necessrios, por esta razo, controles rgidos em todos os processos, como na admisso de pessoal, nas contrataes do Poder Pblico e no atendimento s necessidades da populao.A administrao burocrtica, embora possua o grande mrito de ser efetiva no controle dos abusos, corre o risco de transformar o controle a ela inerente em um verdadeiro fim do Estado, e no um simples meio para atingir seus objetivos. Com isso, a mquina administrativa voltase para si mesmo, perdendo a noo de sua misso bsica, que servir sociedade. O seu grande problema, portanto, a possibilidade de se tornar ineficiente, autoreferente e incapaz de atender adequadamente os anseios dos cidados. A administrao pblica gerencial apresentase como soluo para estes problemas da burocracia. Priorizase a eficincia da Administrao, o aumento da qualidade dos servios e a reduo dos custos. Buscaseb desenvolver uma cultura gerencial nas organizaes, com nfase nos resultados, e aumentar a governana do Estado, isto , a sua capacidade de gerenciar com efetividade e eficincia. O cidado passa a ser visto com outros olhos, tornandose pea essencial para o correto desempenho da atividade pblica, por ser considerado seu principal beneficirio, o cliente dos servios prestados pelo Estado.A administrao gerencial constitui um avano, mas sem romper em definitivo com aadministrao burocrtica, pois no nega todos os seus mtodos e princpios. Na verdade, o gerencialismo apiase na burocracia, conservando seus preceitos bsicos, como a admisso de pessoal segundo critrios rgidos, a meritocracia na carreira pblica, as avaliaes de desempenho,o aperfeioamento profissional e um sistema de remunerao estruturado. Adiferena reside na maneira como feito o controle, que passa a concentrarse nos resultados, no mais nos processos em si, procurandose,ainda, garantir a autonomia do servidor para atingir tais resultados, que sero verificados posteriormente.Evoluo da Administrao Pblica no Brasiltambm uma maior participao da sociedade civil na prestao de serviosque no sejam exclusivos de Estado. So as chamadas entidades paraestatais, que compem o terceiro setor, composto por entidades da sociedade civil de fins pblicos e no lucrativos, como as organizaes sociais e as organizaes da sociedade civil de interesse pblico(OSCIPs). Este setor passa a coexistir com o primeiro setor, que o Estado, e com o segundo setor, que o mercado.Na administrao gerencial, a noo de interesse pblico diferente da que existe no modelo burocrtico. A burocracia v o interesse pblico como o interesse do prprio Estado. A administrao pblica gerencial nega essa viso, identificando este interesse com o doscidados, passando os integrantes da sociedade a serem vistos como clientes dos servios pblicos.Atualmente, o modelo gerencial na Administrao Pblica vem cada vez mais se consolidando, com a mudana de estruturas organizacionais, o estabelecimento de metas a alcanar, a reduo da mquina estatal, a descentralizao dos servios pblicos, a criao dasagncias reguladoras para zelar pela adequada prestao dos servios etc. O novo modelo prope se a promover o aumento da qualidade e da eficincia dos servios oferecidos pelo Poder Pblico aos seus clientes: os cidados.Vista esta pequena teoria, vamos a alguns exerccios de provas anteriores.

ADMINISTRAO PBLICA NO BRASIL

1. A EVOLUO DA ADMINISTRAO PBLICA NO BRASILAntes de passarmos a discorrer sobre a evoluo da Administrao Pblica, vamos relembrar alguns conceitos importantes:1.1 O Estado e as Organizaes Mas afinal de contas, o que um Estado?O Estado uma parte da sociedade, uma estrutura poltica e organizacional que se sociedade, ao mesmo tempo que dela faz parte.Celso Ribeiro Bastos define Estado como a Organizao Poltica sob a qual vive o homem moderno. Isto , O Estado a resultante de um povo vivendo sobre um territrio delimitado e governando por Leis que se fundem em um poder no sobrepujado externamente e soberanointernamente. (Curso de Teoria do Estado e Cincia Poltica, 1995, p. 10).Mas o que Sociedade?Eduardo Ramos Ferreira da Silva define sociedade assim:A Sociedade o conjunto de cidados que mantm relao entre si, compartilhamdeterminadas regras da vida coletiva e que se diferenciam segundo os seus interesses e o poder polticoque possuem, inclusive o poder organizacional. A sociedade a fonte de poder real do Estado.grifamosO mundo moderno e Contemporneo formado por organizaes. Mas como secaracteriza esse mundo de organizaes?Etizioni (1967) ensina que:Nossa sociedade uma sociedade de organizaes. Nascemos em organizaes,somos educados por organizaes, e quase todos ns passamos a vida atrabalhar para organizaes. Passamos muitas de nossas horas de lazer a pagar, ajogar, a rezar em organizaes. Quase todos ns morreremos numa organizao,e quando chega o momento do funeral, a maior de todas as organizaes - oEstado - precisa dar uma licena especial.O Estado a uma estrutura organizacional e poltica formada por:povo Soberaniaterritrio governo (finalidade)Essa classificao tem diversas vezes sido cobrada em concursos pblicos. No entanto interessante saber que e em alguns momentos, os examinadores citam como formadores do Estado opovo, o territrio e o governo, subentendendo que governo e soberania no podem sobreviverseparadamente. Mas tenham cuidado com essa questo e o contexto na qual ela for inserida na prova.Celso Antnio de Barros um dos defensores dessa ltima tese.Mas o que povo?Povo um conjunto de indivduos que possuem direitos e deveres iguais perante a lei.Mas o que territrio?Territrio a base fsica sobre a qual se estende a jurisdio do poder soberano do Estado.Mas o que soberania?Soberania o poder imperativo e extroverso do ordenamento jurdico do Estado, frenteaos outros Estados, no mbito externo.Mas o que governo? Governo o ncleo decisrio do Estado, a manifestao do podersoberano do Estado, o responsvel pela gesto da coisa pblica. Observem que j estamos falandode uma Repblica, ou seja res pblica.

2. UM BREVE PARALELO HISTRICO DA EVOLUO DA ADMINISTRAO PBLICANO BRASIL

Antes de comearmos a falar sobre a evoluo da Administrao Pblica no Brasil, necessriose faz que relembremos um pouco da recente Histria Geral e da Histria do Brasil, uma vez que o editalpara o nosso concurso exige que saibamos a estruturao da mquina administrativa no Brasil desde1930, sob as dimenses estruturais e culturais.Para que possamos entender o contexto do nosso estudo, falaremos da Amrica Latina noincio do sculo XIX e do Brasil: nesse mesmo perodo, bem como de Getlio a FHC, com enfoque nareforma administrativa proposta no Plano Diretor da Reforma do Estado/95.A partir do final do sculo XIX comearam a ocorrer grandes mudanas econmicas na AmricaLatina:Causas Conseqncias- Vinda de imigrantes estrangeiros;- Substituio do trabalho Escravo pelo assalariado.- Crescimento do mercado interno;- Provocando transformaes sociais epolticas.No Brasil, os efeitos da Guerra do Paraguai e os movimentos abolicionistas e republicanopuseram fim ao imprio em 1889, sob as presses do bares do caf de So Paulo.Lembram-se quando o TCU surgiu no Brasil? O TCU surgiu com a Repblica, por meio de Decretode 1890, sem ter sido institucionalizado.S em 1891, ocorreu a institucionalizao do TCU, no Governo do Marechal Floriano Peixoto, soba gesto do Ten Cel Serzedelo Corra.Voltando Amrica Latina, apesar das grandes mudanas econmicas, ela continuavadependente de seus produtos primrios (algodo, salitre, banana e caf) de exportao, alvos deimportao pelo mercado internacional.A qualquer queda na demanda desses produtos, inmeros problemas surgiam, abalando aeconomia do continente.No Brasil, por exemplo, lembram-se da crise da borracha? A borracha brasileira foi arruinadapela instalao de latifndios de ltex nas colnias britnicas da Malsia e do Ceilo, com mudascontrabandeadas da Amaznia em 1913.A queda na exportao de produtos tradicionais reduzia a capacidade latino-americana deimportao.Assim, comerciantes e proprietrios rurais comearam a diversificar os investimentos,montando indstrias para substituir os bens de consumo. O processo de industrializao ganhou foradurante a primeira Guerra Mundial, em face da reduo de exportaes de manufaturados pelaspotncias europias, voltadas para o esforo de guerra.Houve um crescimento das cidades com as novas indstrias, porm formou-se o proletariadoindustrial, alm de novas camadas sociais mdias.At os anos 20, a Amrica Latina continuava sendo uma grande fazenda., pois a estruturabsica da produo continental pouco foi alterada.O poder econmico, poltico e social estava concentrado na mo dos latifundirios, de talmaneira que quando ocorria queda de preos das matrias-primas no exterior, o Estado garantia osrendimentos ao setor agrrio, comprando produtos excedentes para manter os preos.2.1 Teoria da mo invisvel do Estado - Adam Smit (1723-1790) - Teoria Econmica ClssicaAdam Smith publicou o livro A riqueza das naes em 1776. Em sua teoria, ele acreditava que sese deixasse atuar a livre concorrncia, uma mo invisvel levaria a sociedade perfeio, assim todosos agentes buscando maximizar os seus lucros, promoveriam o bem-estar de toda comunidade.Esses argumentos eram baseados na livre iniciativa, ou seja, no laissez-faire.Se em algum concurso cair uma questo afirmando que a Repblica Federativa do Brasil temcomo fundamento o laissez-faire. A resposta correta, porque dentre os fundamentos da nossaRepblica enquadra-se: Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. (IV, art. 1 CF). Cuidado: parao CESPE o incompleto pode est correto.Para Adam Smith, o papel do Estado na economia deveria corresponder apenas proteo dasociedade como eventuais ataques e criao e manuteno de obras e instituies necessrias, masno interveno nas leis de mercado e, consequentemente, na prtica econmica.Por muito tempo diversos pases adotaram a teoria de Adam Smith. Mas o paradigma da moinvisvel do Estado, perdurou nos E.U.A at o Crash da Bolsa de Nova York.2.2 A dcada de 30 e o Governo Getlio VargasLembram-se da crise capitalista e a quebra da Bolsa de Valores de Nova York?Causas Ao Conseqncias-Crescimento econmico;- liberalismo;- superproduoE.UA suspendembruscamente asimportaes.Graves conseqnciaspara a economiainternacional.Em decorrncia da interrupo brusca das importaes americanas, as oligarquias queimaramestoques e desvalorizaram a moeda, agravando as dificuldades internas brasileiras, disparando odesemprego e a inflao.Nos E.U.A a soluo para a crise do capitalismo comeou a ser adotada com o governo dopresidente Roosevelt, com a aplicao do New Deal.O New Deal foi a poltica econmica criada pelo economista Keynes, fundada nointervencionismo estatal e na busca do pleno emprego, razes da poltica de bem-estar-social ou EstadoProvidncia: Welfare State.A premissa do Welfare State era a incorporao de direitos sociais, visando garantir a todosos indivduos um padro mnimo de bem-estar econmico e social, como direito ao trabalho, tutela dasade, educao e assistncia social.No Brasil, estvamos no comeo da Repblica Vargas, em decorrncia da Revoluo de 1930. Emnosso pas, o Estado Desenvolvimentista fazia s vezes do Estado de Bem-Estar Social.Em 1934, com legitimao popular, tivemos a nossa 3 Constituio, que possua caractersticassociais, libertria, programtica, tendo sido inspirada na Constituio Alem de 1919. Essa Constituiofoi promulgada, tendo assim caractersticas democrticas ou populares, caracterizando a passagem deuma Constituio Jurdica para Constituio Social, garantindo, por exemplo, direitos educao, sade e famlia.Em 1936, a Lei n. 284 criou o Conselho Federal do Servio Pblico Civil, que em 1938 foitransformado no DASP (Departamento Administrativo do Servio Pblico).A criao do DASP foi considerado o primeiro processo de planejamento da reformaadministrativa no Brasil, pois tinha como objetivo a criao do ncleo estratgico na AdministraoPblica.A reforma administrativa iniciada pelo DASP marca a constituio do Estado moderno no Brasiltrazendo a concepo de modernizao do Estado com vistas a combater o patrimonialismo. Com acriao do DASP, o governo pretendeu estimular, desenvolver e coordenar esforos no sentido deracionalizar e aperfeioar a ao do Estado no mbito da Administrao geral (VIANA, 1953).O DASP era o rgo Central de polticas de servio pblico pautadas nos princpios daAdministrao Cientfica e do modelo Weberiano de Burocracia.A abordagem clssica da administrao refere-se s das Escolas da Administrao Cientfica nosE.U.A e Teoria Clssica na Frana, que por mais incrvel, que possa parecer, em face da escassez derecursos tecnolgicos, foram desenvolvidas concomitantentemente.Os principais autores da Escola da Administrao Cientfica nos E.U.A foram:(Taylor (1856-1915), Gant (1861-1919), Ford (1863-1947), Gilbreth (1828-1924) , HarringtonEmerson (1853-1931).Na Frana (Teoria Clssica) foram: Fayol (1841-1925), James D. Mooney, Lyndall F. Urwick (n.1981) e Gulic.Aqui temos que ter um cuidado, porque os examinadores tm feito uma mistura quando sereferem aos autores da Administrao Cientfica. Voc poder encontrar questes verdadeirasafirmando que Taylor Fayol e Gulic, por exemplo, foram as inspiraes do DASP.Antes de prosseguirmos no assunto, importante esclarecer, sobretudo, as principaiscaractersticas da Administrao Cientfica e da Teoria Clssica da Administrao, visto que, como jdestacamos, o assunto tem sido cobrado nas provas de concurso.Pessoal, vamos nos ater apenas nas principais caractersticas dessas duas escolas da Teoria daAdministrao, para facilitar o entendimento posterior acerca do nosso principal assunto.

Voltando ao Governo Vargas, em 1937 ele se deu um autogolpe, ampliando os seus limites deatuao e transformou-se em um ditador: O Estado Novo.Foi nessa poca que alguns direitos sociais foram assegurados aos trabalhadores:- Salrio mnimo;- Frias remuneradas;- Estrutura sindical nacional: (como forma de atrelar ao Estado os sindicatos j existentes);-Unificao da legislao trabalhista: Consolidao das Leis do Trabalho (CLT).A era Vargas ficou marcada pela expanso do Estado Intervencionista. O Estado no maisdeveria somente garantir os contratos, como afirmava Adam Smith (Teoria da Mo invisvel do Estado,que j somos doutores no assunto).3.Referncias BibliogrficasBRASIL. Decreto no 83.740, de 18 de julho de 1979. Institui o Programa Nacional de Desburocratizao e doutras providncias. Dirio Oficial da Unio, 18 jul. 1979. Disponvel em Acesso em 18 ago. 2007, 14:53:00.BRASIL. Decreto no 5.378, de 23 de fevereiro de 2005. Institui o Programa Nacional de Gesto Pblica eDesburocratizao - GESPBLICA e o Comit Gestor do Programa Nacional de Gesto Pblica eDesburocratizao, e d outras providncias. Dirio Oficial da Unio, 24 fev. 2005. Disponvel em Acesso em 18 ago. 2007,14:55:00.CARAVANTES, Geraldo, Teoria Geral da Administrao: Pensando em Fazendo. Porto Alegre: AGE/UCS, 1998.CHIAVENATO, Idalberto, Introduo Teoria Geral da Administrao. So Paulo: Makron Books, 1997.____________. Administrao Geral e Pblica. Rio de Janeiro: Campus, 2006.ETIZIONI, Amitai. Organizaes Modernas, So Paulo: Pioneira, 1967.LUZ Rodrigo Teixeira, Relaes Econmicas Internacionais. Rio de Janeiro: Campus, 2005.PAZINATO, Alceu Luiz; SENISE, Maria Helena Valente, Histria moderna e contempornea. So Paulo: tica, 1997.PEREIRA, Luiz Carlos Bresser; SPINK Peter, Reforma do Estado e Administrao Pblica Gerencial. Rio de Janeiro:FGV 2006.Brasil, Plano diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Cmara da Reforma do Estado. Braslia: 1995.Postado por MARCELO CARIOCA s 17:39 Enviar por e-mailBlogThis!Compartilhar no TwitterCompartilhar no FacebookCompartilhar com o Pinterest

Marcadores: A EVOLUO DA ADMINISTRAO PBLICA NO BRASILNenhum comentrio:

RESUMO PRA CONCURSO

DOMINGO, 15 DE AGOSTO DE 2010DA ADMINISTRAO PBLICA BUROCRTICA GERENCIALLuiz Carlos Bresser PereiraRevista do Servio Pblico, 47(1) janeiro-abril1996. Trabalho apresentado ao seminrio sobreReforma do Estado na Amrica Latina organizadopelo Ministrio da Administrao Federal eReforma do Estado e patrocinado pelo BancoInteramericano de Desenvolvimento (Braslia,maio de 1996).A reforma da administrao pblica que o governo Fernando Henrique Cardoso estpropondo desde 1995 poder ser conhecida no futuro como a segunda reformaadministrativa do Brasil. Ou a terceira, se considerarmos que a reforma de 1967 mereceesse nome, apesar de ter sido afinal revertida. A primeira reforma foi a burocrtica, de1936. A reforma de 1967 foi um ensaio de descentralizao e de desburocratizao. Aatual reforma est apoiada na proposta de administrao pblica gerencial, como umaresposta grande crise do Estado dos anos 80 e globalizao da economia - doisfenmenos que esto impondo, em todo o mundo, a redefinio das funes do Estado eda sua burocracia.A crise do Estado implicou na necessidade de reform-lo e reconstru-lo; aglobalizao tornou imperativa a tarefa de redefinir suas funes. Antes da integraomundial dos mercados e dos sistemas produtivos, os Estados podiam ter como um de seusobjetivos fundamentais proteger as respectivas economias da competio internacional.Depois da globalizao, as possibilidades do Estado de continuar a exercer esse papeldiminuram muito. Seu novo papel o de facilitar para que a economia nacional se torneinternacionalmente competitiva. A regulao e a interveno continuam necessrias, naeducao, na sade, na cultura, no desenvolvimento tecnolgico, nos investimentos eminfra-estrutura - uma interveno que no apenas compense os desequilbrios distributivosprovocados pelo mercado globalizado, mas principalmente que capacite os agenteseconmicos a competir a nvel mundial.1 A diferena entre uma proposta de reformaneoliberal e uma social democrtica est no fato de que o objetivo da primeira e retirar oEstado da economia, enquanto que o da segunda aumentar a governana do Estado, dar1 - Conforme observou Fernando Henrique Cardoso (1996: A10), a globalizaomodificou o papel do Estado... a nfase da interveno governamental agora dirigidaquase exclusivamente para tornar possvel s economias nacionais desenvolverem esustentarem condies estruturais de competitividade em escala global.2ao Estado meios financeiros e administrativos para que ele possa intervir efetivamentesempre que o mercado no tiver condies de coordenar adequadamente a economia.Neste trabalho concentrar-me-ei no aspecto administrativo da reforma do Estado.Embora o Estado seja, antes de mais nada, o reflexo da sociedade, vamos aqui pens-locomo sujeito, no como objeto - como organismo cuja governana precisa ser ampliadapara que possa agir mais efetiva e eficientemente em benefcio da sociedade. Osproblemas de governabilidade no decorrem de excesso de democracia, do pesoexcessivo das demandas sociais, mas da falta de um pacto poltico ou de uma coalizo declasses que ocupe o centro do espectro poltico.2 Nosso pressuposto o de que o de que oproblema poltico da governabilidade foi provisoriamente equacionado com o retorno dademocracia e a formao do pacto democrtico-reformista de 1994 possibilitada peloxito do Plano Real e pela eleio de Fernando Henrique Cardoso.3 Este pacto noresolveu definitivamente os problemas de governabilidade existentes no pas, j que estesso por definio crnicos, mas deu ao governo condies polticas para ocupar o centropoltico e ideolgico e, a partir de um amplo apoio popular, propor e implementar areforma do Estado.Depois de uma breve seo em que analisarei a grande crise dos anos 80 como umacrise do Estado e as respostas da sociedade brasileira a essa crise, farei um brevediagnstico da crise da administrao pblica burocrtica brasileira e dos seus mitos. Emseguida definirei os princpios da reforma do aparelho do Estado em direo a umaadministrao pblica gerencial, e delinearei as formas mais adequadas de propriedadepara as diversas atividades que o Estado hoje realiza, em funo da redefinio de suasfunes. Para esta redefinio, de um lado, distinguirei trs formas de propriedade - apblica estatal, a pblica no-estatal e a privada, e, de outro, dividirei as aes hojerealizadas pelo Estado em quatro setores: ncleo estratgico, atividades exclusivas deEstado, servios sociais competitivos ou no-exclusivos, e produo de bens e serviospara o mercado.Crise e ReformaNo Brasil a percepo da natureza da crise e, em seguida, da necessidade imperiosa dereformar o Estado ocorreu de forma acidentada e contraditria, em meio ao desenrolar daprpria crise. Entre 1979 e 1994 o Brasil viveu um perodo de estagnao da renda percapita e de alta inflao sem precedentes. Em 1994, finalmente, estabilizaram-se os preosatravs do Plano Real, criando-se as condies para a retomada do crescimento. A causafundamental dessa crise econmica foi a crise do Estado - uma crise que ainda no est2 - Para uma crtica do conceito de governabilidade relacionado com o equilbrio entre asdemandas sobre o governo e sua capacidade de atend-las, que tem origem em Huntington(1968), ver Diniz (1995).3 - Est claro para ns que, conforme observa Frischtak (1994: 163), o desafio crucialreside na obteno daquela forma especfica de articulao da mquina do Estado com asociedade na qual se reconhea que o problema da administrao eficiente no pode serdissociado do problema poltico. No centraremos, entretanto, nossa ateno nessaarticulao.3plenamente superada, apesar de todas as reformas j realizadas. Crise que se desencadeouem 1979, com o segundo choque do petrleo. Crise que se caracteriza pela perda decapacidade do Estado de coordenar o sistema econmico de forma complementar aomercado. Crise que se define como uma crise fiscal, como uma crise do modo deinterveno do Estado, como uma crise da forma burocrtica pela qual o Estado administrado, e, em um primeiro momento, tambm como uma crise poltica.A crise poltica teve trs momentos: primeiro, a crise do regime militar - uma crisede legitimidade; segundo a tentativa populista de voltar aos anos 50 - uma crise deadaptao ao regime democrtico; e finalmente, a crise que levou ao impeachment deFernando Collor de Mello - uma crise moral. A crise fiscal ou financeira caracterizou-sepela perda do crdito pblico e por poupana pblica negativa.4 A crise do modo deinterveno, acelerada pelo processo de globalizao da economia mundial, caracterizousepelo esgotamento do modelo protecionista de substituio de importaes, que foi bemsucedido em promover a industrializao nos anos de 30 a 50, mas que deixou de s-lo apartir dos anos 60; transpareceu na falta de competitividade de uma parte pondervel dasempresas brasileiras; expressou-se no fracasso em se criar no Brasil um Estado do Bem-Estar que se aproximasse dos moldes social-democratas europeus. Por fim, a crise daforma burocrtica de administrar um Estado emergiu com toda a fora depois de 1988,antes mesmo que a prpria administrao pblica burocrtica pudesse ser plenamenteinstaurada no pas.A crise da administrao pblica burocrtica comeou ainda no regime militar noapenas porque no foi capaz de extirpar o patrimonialismo que sempre a vitimou, mastambm porque esse regime, ao invs de consolidar uma burocracia profissional no pas,atravs da redefinio das carreiras e de um processo sistemtico de abertura de concursospblicos para a alta administrao, preferiu o caminho mais curto do recrutamento deadministradores atravs das empresas estatais.5 Esta estratgia oportunista do regimemilitar, que resolveu adotar o caminho mais fcil da contratao de altos administradoresatravs das empresas, inviabilizou a construo no pas de uma burocracia civil forte, nosmoldes que a reforma de 1936 propunha. A crise agravou-se, entretanto, a partir daConstituio de 1988, quando se salta para o extremo oposto e a administrao pblicabrasileira passa a sofrer do mal oposto: o enrijecimento burocrtico extremo. Asconseqncias da sobrevivncia do patrimonialismo e do enrijecimento burocrtico,4 - No confundir crdito pblico com credibilidade do governo. Existe crdito pblicoquando o Estado merece crdito por parte dos investidores. Um Estado pode ter crdito eseu governo no ter credibilidade; e o inverso tambm pode ocorrer: pode existir umgoverno com credibilidade em um Estado que, dada a crise fiscal, no tem crdito.5 - Esta foi uma forma equivocada de entender o que a administrao pblica gerencial.A contrao da burocracia atravs das empresas estatais impediu a criao de corposburocrticos estveis dotados de uma carreira flexvel e mais rpida do que as carreirastradicionais, mas sempre uma carreira. Conforme observa Santos (1995), assumiu o papelde agente da burocracia estatal um grupo de tcnicos, de origens e formaesheterogneas, mais comumente identificados com a chamada tecnocracia que vicejou, emespecial, na dcada de 70. Oriundos do meio acadmico, do setor privado, das (prprias)empresas estatais, e de rgos do governo - esta tecnocracia... supriu a administraofederal de quadros para a alta administrao. Sobre essa tecnocracia estatal ver ostrabalhos clssicos de Martins (1973, 1985) e Nunes (1984).4muitas vezes perversamente misturados, sero o alto custo e a baixa qualidade daadministrao pblica brasileira.6A resposta da sociedade brasileira aos quatro aspectos da crise do Estado foidesequilibrada e ocorreu em momentos diferentes. A resposta crise poltica foi aprimeira: em 1985 o pas completou sua transio democrtica; em 1988, consolidou-acom a aprovao da nova Constituio. J em relao aos outros trs aspectos - a crisefiscal, o esgotamento do modo de interveno, e a crescente ineficincia do aparelhoestatal - o novo regime instalado no pas em 1985 pouco ajudou.7 Pelo contrrio, em umprimeiro momento agravou os problemas, constituindo-se em um caso clssico de respostavoltada para trs. Em relao crise fiscal e ao modo de interveno do Estado, as foraspolticas vitoriosas tinham como parmetro o desenvolvimentismo populista dos anos 50;em relao administrao pblica, a viso burocrtica dos anos 30.Da Administrao Burocrtica GerencialA administrao burocrtica clssica, baseada nos princpios da administrao do exrcitoprussiano, foi implantada nos principais pases europeus no final do sculo passado; nosEstados Unidos, no comeo deste sculo; no Brasil, em 1936, com a reformaadministrativa promovida por Maurcio Nabuco e Lus Simes Lopes. a burocracia queMax Weber descreveu, baseada no princpio do mrito profissional.A administrao pblica burocrtica foi adotada para substituir a administraopatrimonialista, que definiu as monarquias absolutas, na qual o patrimnio pblico e oprivado eram confundidos. Nesse tipo de administrao o Estado era entendido comopropriedade do rei. O nepotismo e o empreguismo, seno a corrupo, eram a norma. Essetipo de administrao revelar-se- incompatvel com o capitalismo industrial e asdemocracias parlamentares, que surgem no sculo XIX. essencial para o capitalismo aclara separao entre o Estado e o mercado; a democracia s pode existir quando asociedade civil, formada por cidados, distingue-se do Estado ao mesmo tempo em que ocontrola. Tornou-se assim necessrio desenvolver um tipo de administrao que partisseno apenas da clara distino entre o pblico e o privado, mas tambm da separao entre6 - Nas palavras de Nilson Holanda (1993: 165): A capacidade gerencial do Estadobrasileiro nunca este to fragilizada; a evoluo nos ltimos anos, e especialmente a partirda chamada Nova Repblica, tem sido no sentido de uma progressiva piora da situao; eno existe, dentro ou fora do governo, nenhuma proposta condizente com o objetivo dereverter, a curto ou mdio prazo, essa tendncia de involuo.7 - Constitui exceo a essa generalizao a reforma do sistema financeiro nacionalrealizada entre 1983 e 1988, com o fim da conta-movimento do Banco do Brasil, acriao da Secretaria do Tesouro, a eliminao de oramentos paralelos, especialmente dooramento monetrio, e a implantao de um excelente acompanhamento e controlecomputadorizado do sistema de despesas: o SIAFI (Sistema de InformaesAdministrativas e Financeiras@). Estas reformas, realizadas por um notvel grupo deburocratas liderados por Mailson da Nbrega, Joo Batista Abreu, Andra Calabi e PedroParente, esto descritas em Gouva (1994).5o poltico e o administrador pblico. Surge assim a administrao burocrtica moderna,racional-legal.A administrao pblica burocrtica clssica foi adotada porque era umaalternativa muito superior administrao patrimonialista do Estado. Entretanto opressuposto de eficincia em que se baseava no se revelou real. No momento em que opequeno Estado liberal do sculo XIX deu definitivamente lugar ao grande Estado social eeconmico do sculo XX, verificou-se que no garantia nem rapidez, nem boa qualidadenem custo baixo para os servios prestados ao pblico. Na verdade, a administraoburocrtica lenta, cara, auto-referida, pouco ou nada orientada para o atendimento dasdemandas dos cidados.Este fato no era grave enquanto prevalecia um Estado pequeno, cuja nica funoera garantir a propriedade e os contratos. No Estado liberal s eram necessrios quatroministrios - o da Justia, responsvel pela polcia, o da Defesa, incluindo o exrcito e amarinha, o da Fazenda e o das Relaes Exteriores. Nesse tipo de Estado, o serviopblico mais importante era o da administrao da justia, que o Poder Judiciriorealizava. O problema da eficincia no era, na verdade, essencial. No momento,entretanto, que o Estado se transformou no grande Estado social e econmico do sculoXX, assumindo um nmero crescente de servios sociais - a educao, a sade, a cultura, aprevidncia e a assistncia social, a pesquisa cientfica - e de papis econmicos -regulao do sistema econmico interno e das relaes econmicas internacionais,estabilidade da moeda e do sistema financeiro, proviso de servios pblicos e de infraestrutura,- nesse momento, o problema da eficincia tornou-se essencial. Por outro lado aexpanso do Estado respondia no s s presses da sociedade mas tambm s estratgiasde crescimento da prpria burocracia. A necessidade de uma administrao pblicagerencial, portanto, decorre de problemas no s de crescimento e da decorrentediferenciao de estruturas e complexidade crescente da pauta de problemas a seremenfrentados, mas tambm de legitimao da burocracia perante as demandas da cidadania.Aps a II Guerra Mundial h uma reafirmao dos valores burocrticos, mas, aomesmo tempo, a influncia da administrao de empresas comea a se fazer sentir naadministrao pblica. As idias de descentralizao e de flexibilizao administrativaganham espao em todos os governos. Entretanto a reforma da administrao pblica sganhar fora a partir dos anos 70, quando tem incio a crise do Estado, que levar crisetambm a sua burocracia. Em conseqncia, nos anos de 1980 inicia-se uma granderevoluo na administrao pblica dos pases centrais em direo a uma administraopblica gerencial.Os pases em que essa revoluo foi mais profunda foram o Reino Unido, a NovaZelndia e a Austrlia.8 Nos Estados Unidos essa revoluo ir ocorrer principalmente anvel dos municpios e condados - revoluo que o livro de Osborne e Gaebler,Reinventando o Governo (1992) descrever de forma to expressiva. a administraopblica gerencial que est surgindo, inspirada nos avanos realizados pela administraode empresas.98 - A melhor anlise que conheo da experincia inglesa foi escrita por um professoruniversitrio a pedido dos sindicatos de servidores pblicos britnicos (Fairbrother, 1994).9 - O livro de Osborne e Gaebler foi apenas um dos trabalhos realizados na linha daadministrao pblica gerencial. Entre outros trabalhos lembramos Barzelay (1992),6Aos poucos foram-se delineando os contornos da nova administrao pblica: (1)descentralizao do ponto de vista poltico, transferindo recursos e atribuies para osnveis polticos regionais e locais; (2) descentralizao administrativa,10 atravs dadelegao de autoridade para os administradores pblicos transformados em gerentescrescentemente autnomos; (3) organizaes com poucos nveis hierrquicos ao invs depiramidal, (4) pressuposto da confiana limitada e no da desconfiana total; (5) controlepor resultados, a posteriori, ao invs do controle rgido, passo a passo, dos processosadministrativos; e (6) administrao voltada para o atendimento do cidado, ao invs deauto-referida.As Duas Reformas AdministrativasNo Brasil a idia de uma administrao pblica gerencial antiga. Comeou a serdelineada ainda na primeira reforma administrativa, nos anos 30, e estava na origem dasegunda reforma, ocorrida em 1967. Os princpios da administrao burocrtica clssicaforam introduzidos no pas atravs da criao, em 1936, do DASP - DepartamentoAdministrativo do Servio Pblico.11 A criao do DASP representou no apenas aprimeira reforma administrativa do pas, com a implantao da administrao pblicaburocrtica, mas tambm a afirmao dos princpios centralizadores e hierrquicos daburocracia clssica.12 Entretanto, j em 1938, temos um primeiro sinal de administraopblica gerencial, com a criao da primeira autarquia. Surgia ento a idia de que osservios pblicos na administrao indireta deveriam ser descentralizados e noobedecer a todos os requisitos burocrticos da administrao direta ou central. Aprimeira tentativa de reforma gerencial da administrao pblica brasileira, entretanto, iracontecer no final dos anos 60, atravs do Decreto-Lei 200, de 1967, sob o comando deAmaral Peixoto e a inspirao de Hlio Beltro, que iria ser o pioneiro das novas idias noBrasil. Beltro participou da reforma administrativa de 1967 e depois, como Ministro daDesburocratizao, entre 1979 e 1983, transformou-se em um arauto das novas idias.Definiu seu Programa Nacional de Desburocratizao, lanado em 1979, como umaproposta poltica visando, atravs da administrao pblica, retirar o usurio da condiocolonial de sdito para investi-lo na de cidado, destinatrio de toda a atividade doEstado (Beltro, 1984: 11).Fairbrother (1994), Kettl (1994), Kettl e Dilulio (1994). No Brasil, alm dos trabalhos deHlio Beltro, cabe citar um artigo pioneiro de Nilson Holanda (1993).10 - Os franceses chamam a descentralizao administrativa de desconcentrao paradistingui-la da poltica, que chamam de descentralizao.11 - Mais precisamente em 1936 foi criado o Conselho Federal do Servio Pblico Civil,que, em 1938, foi substitudo pelo DASP.12 - O DASP foi extinto em 1986, dando lugar SEDAP - Secretaria de AdministraoPblica da Presidncia da Repblica -, que, em janeiro de 1989, extinta, sendoincorporada na Secretaria do Planejamento da Presidncia da Repblica. Em maro de1990 criada a SAF - Secretaria da Administrao Federal da Presidncia da Repblica,que, entre abril e dezembro de 1992, foi incorporada ao Ministrio do Trabalho. Emjaneiro de 1995, com o incio do governo Fernando Henrique Cardoso, a SAF transformaseem MARE - Ministrio da Administrao Federal e Reforma do Estado.7A reforma iniciada pelo Decreto-Lei 200 foi uma tentativa de superao da rigidezburocrtica, podendo ser considerada como um primeiro momento da administraogerencial no Brasil. Toda a nfase foi dada descentralizao mediante a autonomia daadministrao indireta, a partir do pressuposto da rigidez da administrao direta e damaior eficincia da administrao descentralizada.13 O decreto-lei promoveu atransferncia das atividades de produo de bens e servios para autarquias, fundaes,empresas pblicas e sociedades de economia mista, consagrando e racionalizando umasituao que j se delineava na prtica. Instituram-se como princpios de racionalidadeadministrativa o planejamento e o oramento, a descentralizao e o controle dosresultados. Nas unidades descentralizadas foram utilizados empregados celetistas,submetidos ao regime privado de contratao de trabalho. O momento era de grandeexpanso das empresas estatais e das fundaes. Atravs da flexibilizao de suaadministrao buscava-se uma maior eficincia nas atividades econmicas do Estado, e sefortalecia a aliana poltica entre a alta tecnoburocracia estatal, civil e militar, e a classeempresarial.14O Decreto-Lei 200 teve, entretanto, duas conseqncias inesperadas e indesejveis.De um lado, ao permitir a contratao de empregados sem concurso pblico, facilitou asobrevivncia de prticas patrimonialistas e fisiolgicas. De outro lado, ao no sepreocupar com mudanas no mbito da administrao direta ou central, que foi vistapejorativamente como burocrtica ou rgida, deixou de realizar concursos e dedesenvolver carreiras de altos administradores. O ncleo estratgico do Estado foi, naverdade, enfraquecido indevidamente atravs de uma estratgia oportunista do regimemilitar, que, ao invs de se preocupar com a formao de administradores pblicos de altonvel selecionados atravs de concursos pblicos, preferiu contratar os escales superioresda administrao atravs das empresas estatais.15Desta maneira, a reforma administrativa embutida no Decreto-Lei 200 ficou pelametade e fracassou. A crise poltica do regime militar, que se inicia j em meados dos anos70, agrava ainda mais a situao da administrao pblica, na medida que a burocraciaestatal identificada com o sistema autoritrio em pleno processo de degenerao.13 - Conforme Bertero (1985: 17), subjacente deciso de expandir a administraopblica atravs da administrao indireta, esta o reconhecimento de que a administraodireta no havia sido capaz de responder com agilidade, flexibilidade, presteza ecriatividade s demandas e presses de um Estado que se decidira desenvolvimentista.14 - Esta aliana recebeu diversas denominaes e conceituaes nos anos 70.`FernandoHenrique Cardoso referiu-se a ela atravs do conceito de anis burocrticos; GuillermoODonnell interpretou-a atravs do regime burocrtico autoritrio; eu me referi sempreao modelo tecnoburocrtico-capitalista; Peter Evans consagrou o conceito de trplicealiana.15 - No obstante o Decreto-Lei 200 contivesse referncias formao de altosadministradores (art.94,V) e criao de um Centro de Aperfeioamento do DASP(art.121).8A Volta aos Anos 50 e aos Anos 30A transio democrtica ocorrida com a eleio de Tancredo Neves e posse de JosSarney, em maro de 1985, no ir entretanto apresentar perspectivas de reforma doaparelho do Estado. Pelo contrrio significar no plano administrativo uma volta aosideais burocrticos dos anos 30, e no plano poltico, uma tentativa de volta ao populismodos anos 50. Os dois partidos que comandam a transio eram partidos democrticos, maspopulistas. No tinham, como a sociedade brasileira tambm no tinha, a noo dagravidade da crise que o pas estava atravessando. Havia, ainda, uma espcie de euforiademocrtico-populista. Uma idia de que seria possvel voltar aos anos dourados dademocracia e do desenvolvimento brasileiro, que foram os anos 50.Nos dois primeiros anos do regime democrtico - da Nova Repblica - a crisefiscal e a necessidade de rever radicalmente a forma de intervir na economia foramignoradas. Imaginou-se que seria possvel promover a retomada do desenvolvimento e adistribuio da renda atravs do aumento do gasto pblico e da elevao forada dossalrios reais, ou seja, atravs de uma verso populista e portanto distorcida dopensamento keynesiano. O modelo de substituio de importaes foi mantido. Os salriose o gasto pblico, aumentados. O resultado foi o desastre do Plano Cruzado. Um planoinicialmente bem concebido que foi transformado em mais um clssico caso de ciclopopulista. Logo aps o fracasso do Plano Cruzado, houve uma tentativa de ajuste fiscal,iniciada durante minha rpida passagem pelo Ministrio da Fazenda (1987), a qual,entretanto, no contou com o apoio necessrio da sociedade brasileira, que testemunhava,perplexa, a crise. Ao invs do ajuste e da reforma, o pas, sob a gide de uma coalizopoltica conservadora no Congresso - o Centro - mergulhou em 1988 e 1989 em umapoltica populista e patrimonialista, que representava uma verdadeira volta ao capitalmercantil. 16O captulo da administrao pblica da Constituio de 1988 ser o resultado detodas essas foras contraditrias. De um lado ela uma reao ao populismo e aofisiologismo que recrudescem com o advento da democracia.17 Por isso a Constituio irsacramentar os princpios de uma administrao pblica arcaica, burocrtica ao extremo.Uma administrao pblica altamente centralizada, hierrquica e rgida, em que toda aprioridade ser dada administrao direta ao invs da indireta.18 A Constituio de 198816 - Examinei esse fenmeno em um artigo em homenagem a Caio Prado Jr. (BresserPereira, 1988). O primeiro documento do governo brasileiro que definiu a crise fiscal foi oPlano de Controle Macroeconmico (Ministrio da Fazenda, 1987).17 - O regime militar sempre procurou evitar esses dois males. De um modo geral, logrouseu intento. O fisiologismo ou clientelismo, atravs do qual se expressa modernamente opatrimonialismo, existia na administrao central no perodo militar, mas era antes aexceo do que e regra. Este quadro muda com a transio democrtica. Os dois partidosvitoriosos - o PMDB e o PFL - fazem um verdadeiro loteamento dos cargos pblicos. Adireo das empresas estatais, que tendia antes a permanecer na mo dos tcnicos, tambm submetida aos interesses polticos dominantes.18 - Segundo Marcelino (1987: 11, citado por Pimenta, 1994: 155): havia um claroobjetivo de fortalecer e modernizar a administrao direta, a partir do diagnstico de que9ignorou completamente as novas orientaes da administrao pblica. Os constituintes e,mais amplamente, a sociedade brasileira revelaram nesse momento uma incrvel falta decapacidade de ver o novo. Perceberam apenas que a administrao burocrtica clssica,que comeara a ser implantada no pas nos anos 30, no havia sido plenamente instaurada.Viram que o Estado havia adotado estratgias descentralizadoras - as autarquias e asfundaes pblicas - que no se enquadravam no modelo burocrtico-profissional clssico.Notaram que essa descentralizao havia aberto espao para o clientelismo,principalmente ao nvel dos estados e municpios - clientelismo esse que se acentuara apsa redemocratizao. No perceberam que as formas mais descentralizadas e flexveis deadministrao, que o Decreto-Lei 200 havia consagrado, eram uma resposta necessidadede o Estado administrar com eficincia as empresas e os servios sociais. E decidiramcompletar a revoluo burocrtica antes de pensar nos princpios da modernaadministrao pblica. Ao agirem assim aparentemente seguiram uma lgica linearcompatvel com a idia de que primeiro seria necessrio completar a revoluo mecnica,para s depois participar da revoluo eletrnica.A partir dessa perspectiva, decidiram, atravs da instaurao de um regimejurdico nico para todos os servidores pblicos civis da administrao pblica direta edas autarquias e fundaes, tratar de forma igual faxineiros e professores, agentes delimpeza e mdicos, agentes de portaria e administradores da cultura, policiais e assistentessociais; atravs de uma estabilidade rgida, ignorando que este instituto foi criado paradefender o Estado, no os seus funcionrios; atravs de um sistema de concursos pblicosainda mais rgido, inviabilizar que uma parte das novas vagas fossem abertas parafuncionrios j existentes; atravs da extenso a toda a administrao pblica das novasregras, eliminar toda a autonomia das autarquias e fundaes pblicas.Por outro lado, e contraditoriamente com seu esprito burocrtico racional-legal, aConstituio de 1988 permitiu que uma srie de privilgios fossem consolidados oucriados. Privilgios que foram ao mesmo tempo um tributo pago ao patrimonialismo aindapresente na sociedade brasileira, e uma conseqncia do corporativismo que recrudesceucom a abertura democrtica, levando todos os atores sociais a defender seus interessesparticulares como se fossem interesses gerais. O mais grave dos privilgios foi oestabelecimento de um sistema de aposentadoria com remunerao integral, sem nenhumarelao com o tempo de servio prestado diretamente ao Estado. Este fato, mais ainstituio de aposentadorias especiais, que permitiram aos servidores aposentarem-semuito cedo, em torno dos 50 anos, e, no caso dos professores universitrios, de acumularaposentadorias, elevou violentamente o custo do sistema previdencirio estatal,representando um pesado nus fiscal para a sociedade. 19 Um segundo privilgio foi terpermitido que, de um golpe, mais de 400 mil funcionrios celetistas das fundaes ehouve uma fuga ou escapismo para a chamada administrao indireta, por motivosjustificados ou no.19- Estes privilgios, entretanto, no surgiram por acaso: fazem parte da heranapatrimonialista herdada pelo Brasil de Portugal. Conforme observa Luiz Nassif (1996): Aanlise da formao econmica brasileira mostra que uma das piores pragas da heranacolonial portuguesa foi o sonho da segurana absoluta, que se entranhou profundamente nacultura social brasileira. No plano das pessoas fsicas, a manifestao mxima dessasndrome foi o sonho da aposentadoria precoce e do emprego pblico.10autarquias se transformassem em funcionrios estatutrios, detentores de estabilidade eaposentadoria integral. 20O retrocesso burocrtico ocorrido em 1988 no pode ser atribudo a um supostofracasso da descentralizao e da flexibilizao da administrao pblica que o Decreto-Lei 200 teria promovido. Embora alguns abusos tenham sido cometidos em seu nome, sejaem termos de excessiva autonomia para as empresas estatais, seja em termos do usopatrimonialista das autarquias e fundaes (onde no havia a exigncia de processoseletivo pblico para a admisso de pessoal), no correto afirmar que tais distorespossam ser imputadas como causas desse retrocesso. Na verdade ele foi o resultado, emprimeiro lugar, de uma viso equivocada das foras democrticas que derrubaram oregime militar sobre a natureza da administrao pblica ento vigente. Na medida que, noBrasil, a transio democrtica ocorreu em meio crise do Estado, esta ltima foiequivocadamente identificada pelas foras democrticas como resultado, entre outros, doprocesso de descentralizao que o regime militar procurara implantar. Em segundo lugar,foi a conseqncia da aliana poltica que essas foras foram levadas a celebrar com ovelho patrimonialismo, sempre pronto a se renovar para no mudar. Em terceiro lugar,resultou do ressentimento da velha burocracia contra a forma pela qual a administraocentral fora tratada no regime militar: estava na hora de restabelecer a fora do centro e apureza do sistema burocrtico. Essa viso burocrtica concentrou-se na antiga SAF, que setornou o centro da reao burocrtica no pas no apenas contra uma administraopblica moderna, mas a favor dos interesses corporativistas do funcionalismo.21Finalmente, um quarto fator relaciona-se com a campanha pela desestatizao queacompanhou toda a transio democrtica: este fato levou os constituintes a aumentar oscontroles burocrticos sobre as empresas estatais, que haviam ganhado grande autonomiagraas ao Decreto-Lei 200.Em sntese, o retrocesso burocrtico da Constituio de 1988 foi uma reao aoclientelismo que dominou o pas naqueles anos, mas tambm foi uma afirmao deprivilgios corporativistas e patrimonialistas incompatveis com o ethos burocrtico. Foi,alm disso, uma conseqncia de uma atitude defensiva da alta burocracia, que, sentindoseacuada, injustamente acusada, defendeu-se de forma irracional.20 - Na verdade a Constituio exigiu apenas a instituio de regime jurdico nico. A leidefiniu que este regime nico seria estatutrio. Em alguns Municpios a lei definiu pararegime nico o regime celetista. A Constituio, alm disso, no art. 19 do ADCT, quandoconferiu estabilidade a celetistas com mais de cinco anos no os transformou emocupantes de cargos pblicos. Bem ao contrrio, exigiu, para que fossem os mesmosinstalados em cargos pblicos, que prestassem concurso de efetivao. Neste concursode efetivao, o tempo de servio seria contado como ttulo. O STF tem concedidoliminares sustando a eficcia a leis estaduais que repetiram o modelo da lei federal quetransformou celetistas em estatutrios de chofre. At o momento ningum, porm sedisps a argir a inconstitucionalidade da lei 8.112, um monumento ao corporativismo.21 - Conforme observa Pimenta (1994: 161) O papel principal da SAF no perodoestudado foi o de garantir o processo de fortalecimento e expanso da administrao diretae defender os interesses corporativistas do funcionalismo, seja influenciando a elaboraoda nova Constituio, seja garantindo a implantao do que foi determinado em 1988.11Estas circunstncias contriburam para o desprestgio da administrao pblicabrasileira, no obstante o fato de que os administradores pblicos brasileiros somajoritariamente competentes, honestos e dotados de esprito pblico. Estas qualidades,que eles demonstraram desde os anos 30, quando a administrao pblica profissional foiimplantada no Brasil, foram um fator decisivo para o papel estratgico que o Estado jogouno desenvolvimento econmico brasileiro. A implantao da indstria de base nos anos 40e 50, o ajuste nos anos 60, o desenvolvimento da infra-estrutura e a instalao da indstriade bens de capital, nos anos 70, de novo o ajuste e a reforma financeira nos anos 80, e aliberalizao comercial nos anos 90, no teriam sido possveis no fosse a competncia e oesprito pblico da burocracia brasileira.22Evoluo Recente e PerplexidadeA crise fiscal e a crise do modo de interveno do Estado na economia e na sociedadecomearam a ser percebidas a partir de 1987. nesse momento, depois do fracasso doPlano Cruzado, que a sociedade brasileira se d conta, ainda que de forma imprecisa, queestava vivendo fora do tempo, que a volta ao nacionalismo e ao populismo dos anos 50 eraalgo esprio alm de invivel.23 Os constituintes de 1988, entretanto, no perceberam acrise fiscal, muito menos a crise do aparelho do Estado. No se deram conta, portanto, queera necessrio reconstruir o Estado. Que era preciso recuperar a poupana pblica. Que erapreciso dotar o Estado de novas formas de interveno mais leves, em que a competiotivesse um papel mais importante. Que era urgente montar uma administrao no apenasprofissional, mas tambm eficiente e orientada para o atendimento das demandas doscidados.Ser s depois do episdio de hiperinflao, em 1990, no final do governo Sarney,que a sociedade abrir os olhos para a crise. Em conseqncia as reformas econmicas e oajuste fiscal, ganham impulso no governo Collor. Ser esse governo contraditrio, senoesquizofrnico - que afinal se perdeu em meio corrupo generalizada -, que dar ospassos decisivos no sentido de iniciar a reforma da economia e do Estado. nesse governoque, afinal, ocorre a abertura comercial - a mais bem sucedida e importante reforma que opas conheceu desde o incio da crise. nele que a privatizao ganha novo impulso. nogoverno Collor que o ajuste fiscal avanar de forma decisiva, no apenas atravs demedidas permanentes, mas tambm atravs de um substancial cancelamento da dvidapblica interna.Na rea da administrao pblica, porm, as tentativas de reforma do governoCollor foram equivocadas. Nesta rea, da mesma forma que no que diz respeito ao22 - Sobre a competncia e o esprito pblico da alta burocracia brasileira ver Schneider(1994) e Gouva (1994). Escrevi os prefcios dos dois livros em 1994, antes de pensar emser Ministro da Administrao Federal.23 - Foi nesse momento, entre abril e dezembro de 1987, que assumi o Ministrio daFazenda. Embora tenha estado sempre ligado ao pensamento nacional-desenvolvimentista,no tive dvida em diagnosticar a crise fiscal do Estado e em propor o ajuste fiscal e areforma tributria necessrios ao enfrentamento do problema. O relato dessa experinciaencontra-se em Bresser Pereira (1992).12combate inflao, governo fracassar devido a um diagnstico equivocado da situaoe/ou porque no teve competncia tcnica para enfrentar os problemas. No caso daadministrao pblica, o fracasso deveu-se, principalmente, tentativa desastrada dereduzir o aparelho do Estado, demitindo funcionrios e eliminando rgos, sem antesassegurar a legalidade das medidas atravs da reforma da Constituio. Afinal, alm deuma reduo drstica da remunerao dos servidores, sua interveno na administraopblica desorganizou ainda mais a j precria estrutura burocrtica existente, edesprestigiando os servidores pblicos, de repente acusados de todos os males do pas eidentificados com o corporativismo. Na verdade o corporativismo - ou seja, a defesa deinteresses de grupos como se fossem os interesses da nao - no um fenmenoespecfico dos funcionrios, mas um mal que caracteriza todos os segmentos da sociedadebrasileira.24No incio do governo Itamar a sociedade brasileira comea a se dar conta da criseda administrao pblica. H, entretanto, ainda muita perplexidade e confuso. Umdocumento importante nessa fase o estudo realizado pelo Centro de Estudos de CulturaContempornea - CEDEC - para a Escola Nacional de Administrao Pblica - ENAP(Andrade e Jacoud, orgs., 1993). Na introduo de Rgis de Castro Andrade (1993: 26), oresumo do diagnstico:A crise administrativa manifesta-se na baixa capacidade de formulao,informao, planejamento, implementao e controle das polticas pblicas. Orol das insuficincias da administrao pblica do pas dramtico. Osservidores esto desmotivados, sem perspectivas profissionais ou existenciaisatraentes no servio; a maior parte deles no se insere num plano de carreira.Os quadros superiores no tm estabilidade funcional. As instituies deformao e treinamento no cumprem seu papel. A remunerao baixa.Diagnstico era em grande parte verdadeiro, mas pecava por uma falhafundamental. O mal maior a ser atacado segundo o documento era o intenso egeneralizado patrimonialismo no sistema poltico; o objetivo fundamental a ser atingido,o de estabelecer uma administrao pblica burocrtica, ou seja, um sistema deadministrao pblica descontaminado de patrimonialismo, em que os servidores seconduzam segundo os critrios de tica pblica, de profissionalismo e eficcia (Andrade,1993: 27) . Ora, no h qualquer dvida quanto importncia da profissionalizao doservio pblico e da obedincia aos princpios da moralidade e do interesse pblico. indiscutvel o valor do planejamento e da racionalidade administrativa. Entretanto, aoreafirmar valores burocrticos clssicos, o documento no se dava conta que assiminviabilizava os objetivos a que se propunha. No se dava conta da necessidade de umamodernizao radical da administrao pblica - modernizao que s uma perspectivagerencial poder proporcionar. Conforme observou Hlio Beltro (1984: 12), existe entrens uma curiosa inclinao para raciocinar, legislar e administrar tendo em vista um pasimaginrio, que no o nosso; um pas dominado pelo exerccio fascinante doplanejamento abstrato, pela iluso tica das decises centralizadas... Ora, quando24 - A incompetncia tcnica na rea da estabilizao econmica revelou-se naincapacidade do governo de diagnosticar a alta inflao ento existente como uma inflaoinercial, que exigia remdio especfico, que combinasse heterodoxia e ortodoxia.13comeamos a trabalhar com mitos ou com um pas imaginrio, a nossa capacidade de agirsobre a realidade diminui radicalmente.Na verdade o documento da ENAP de 1993 expressava uma ideologia burocrtica,que se tornou dominante em Braslia a partir da transio democrtica (1985) at o final dogoverno Itamar. Essa perspectiva burocrtica levou transformao da FUNCEP naENAP - Escola Nacional de Administrao Pblica - tendo como modelo a ENA - EcoleNationale dAdministration - da Frana. Levou em seguida criao da carreira dosgestores pblicos (Especialistas em Polticas Pblicas e Gesto Governamental) - umacarreira de altos administradores pblicos, que obviamente fazia falta no Brasil, mas querecebeu uma orientao rigorosamente burocrtica, voltada para a crtica do passadopatrimonialista, ao invs de voltar-se para o futuro e para a modernidade de um mundo emrpida mudana, que se globaliza e se torna mais competitivo a cada dia.25Sob essa tica o documento da Associao Nacional dos Especialistas em PolticasPblicas e Gesto Governamental (1994: 7-8), que rene os gestores governamentaispblicos, afirmava: o verdadeiro problema a ser enfrentado a pesada herana de umprocesso de recrutamento e alocao dos quadros marcado simultaneamente pela falta decritrios, clientelismo e heterogeneidade na sua constituio. Ora, esse sem dvida umproblema grave, que o documento aponta bem. Mas um problema antigo e bvio, que,embora devendo ser equacionado, dificilmente poder se transformar no centro de umaproposta de reforma.Mais adequada a afirmao, nesse documento contraditrio e abrangente, que areforma do Estado no Brasil dever refletir as novas circunstncias emergentes, entre asquais:Novos Paradigmas Gerenciais: a ruptura com estruturas centralizadas,hierrquicas formalizadas e piramidais e sistemas de controle tayloristas soelementos de uma verdadeira revoluo gerencial em curso, que impe aincorporao de novos referenciais para as polticas relacionadas com aadministrao pblica, virtualmente enterrando as burocracias tradicionais eabrindo caminho para uma nova e moderna burocracia de Estado. (1994: 3)Dois Mitos Burocrticos: Carreiras e DASsNa medida que a Constituio de 1988 representou um retrocesso burocrtico, revelou-seirrealista. Em um momento em que o pas necessitava urgentemente reformar a suaadministrao pblica, de forma a torn-la mais eficiente e de melhor qualidade,aproximando-a do mercado privado de trabalho, o inverso foi realizado. O servio pblicotornou-se mais ineficiente e mais caro, e o mercado de trabalho pblico separou-secompletamente do mercado de trabalho privado. A separao foi proporcionada noapenas pelo sistema privilegiado de aposentadorias do setor pblico, mas tambm pelaexigncia de um regime jurdico nico, que levou eliminao dos funcionrios celetistas,25 - Um exemplo competente dessa perspectiva ou ideologia burocrtica encontra-se naanlise abrangente realizada por um jovem gestor, Aldino Graef (1994), envolvendo umaproposta de reforma administrativa democrtica.14e pela afirmao constitucional de um sistema de estabilidade rgido, que tornou invivel acobrana de trabalho dos servidores.A estabilidade dos funcionrios uma caracterstica das administraesburocrticas. Foi uma forma adequada de proteger os funcionrios e o prprio Estadocontra as prticas patrimonialistas que eram dominantes nos regimes pr-capitalistas. NoBrasil, por exemplo, havia, durante o Imprio, a prtica da derrubada. Quando caia ogoverno, eram demitidos no apenas os portadores de cargos de direo, mas tambmmuitos dos funcionrios comuns.A estabilidade, entretanto, implica em um custo. Impede a adequao dos quadrosde funcionrios s reais necessidades do servio, ao mesmo tempo que inviabiliza aimplantao de um sistema de administrao pblica eficiente, baseado em um sistema deincentivos e punies. Era justificvel enquanto o patrimonialismo era dominante e osservios do Estado liberal, limitados; deixa de s-lo quando o Estado cresce em tamanho,passa a realizar um grande nmero de servios, e a necessidade de eficincia para essesservios torna-se fundamental, ao mesmo tempo que o patrimonialismo perde fora, deixade ser um valor para ser uma mera prtica, de forma que a demisso por motivos polticosse torna algo socialmente inaceitvel. Se, alm de socialmente condenada, a demisso pormotivos polticos for tornada invivel atravs de uma srie de precaues como aquelaspresentes na proposta de emenda constitucional do governo Fernando Henrique, nohaver mais justificativa para se manter a estabilidade de forma absoluta, como ocorre naburocracia clssica.26No Brasil a extenso da estabilidade a todos os servidores pblicos, ao invs delimit-la apenas s carreiras onde se exerce o poder de Estado, e o entendimento dessaestabilidade de uma forma tal que a ineficincia, a desmotivao, a falta de disposio parao trabalho no pudessem ser punidos com a demisso, implicaram em um forte aumentoda ineficincia do servio pblico. Conforme observa o documento da AssociaoNacional dos Especialistas em Polticas Pblicas e Gesto Governamental (1994: 19):Relativamente questo da estabilidade, essencial a reviso da suasistemtica de aquisio e manuteno. Mantida, como deve, a regra de que osservidores somente podem ser demitidos por processo judicial ouadministrativo, onde lhes seja assegurada ampla defesa, impe-se tornar oprocesso administrativo mais gil e flexvel e menos oneroso...O grande mrito da Constituio de 1988 foi ter tornado obrigatrio o concursopblico para a admisso de todo e qualquer funcionrio. Este foi sem dvida um grandeavano, na medida que dificultou o empreguismo pblico. Tambm a, entretanto,26 - Ou melhor, as justificativas s podero ser dogmticas como, por exemplo, aencontrada em Gurgel (1995: 85): A idia de flexibilizar a estabilidade no serviopblico, mantendo-o apenas para algumas funes designadas como funes de Estado,confunde Estado com Repblica. No percebe que, alm e acima do Estado, as funesque se destinam a atender a necessidades ou direitos pblicos so funes separadas doprivado e devem ser cumpridas com inseno e equidade. Devem ser conduzidas comimpessoalidade - preservadas das presses polticas e sociais... A questo da impunidadedos servidores desidiosos ou o problema do excesso de contingente no podem serargumentos para uma medida que pe em cheque um princpio da moderna burocracia.15verificaram-se exageros. Acabou-se com a prtica condenvel dos concursos internos, masisto implicou na impossibilidade de se promoverem funcionrios internamente. Enquantono setor privado a promoo interna uma prtica consagrada, no servio pblicobrasileiro tornou-se invivel. Por outro lado, nos cargos para os quais seria maisapropriado um processo seletivo mais flexvel ainda que pblico e transparente passou-sea exigir todas as formalidades do concurso. Autarquias, fundaes e at empresas deeconomia mista foram constrangidas a realizar concursos, quando poderiam ter sidosimplesmente obrigadas a selecionar seus funcionrios de forma pblica e transparente.A promoo interna foi reservada exclusivamente para a ascenso dentro de umacarreira. Esta reserva partiu do pressuposto de que para a instaurao de um regimeburocrtico clssico essencial o estabelecimento de um sistema formal de ascensoburocrtica, que comea por um concurso pblico, e depois passa por um longo processode treinamentos sucessivos, avaliaes de desempenho e exames formais. Ocorre,entretanto, que carreiras burocrticas dignas desse nome no foram instaladas no serviopblico brasileiro. Apenas entre militares pode-se falar de carreira no Brasil.27Uma carreira burocrtica propriamente dita dura em mdia 30 anos, no final daqual o servidor dever estar ganhando cerca de 3 vezes mais do que comeou a ganhar noincio da carreira. Para chegar ao topo da carreira ele demorar no mnimo 20 anos.28 Essetipo de carreira est obviamente superado em uma sociedade tecnologicamente dinmica,em plena Terceira Revoluo Industrial. Nem a Constituio de 1988, nem os servidoresfederais e polticos brasileiros, entretanto, foram capazes de reconhecer abertamente estefato. Continuaram a afirmar que o estabelecimento de carreiras, acompanhado de umcorrespondente sistema de treinamento e de avaliao, resolveria, seno todos, a maioriados problemas da administrao pblica brasileira. A carreira tornou-se, na verdade, ogrande mito de Braslia. Mito porque se prega a instaurao das carreiras, ao mesmotempo que, de fato, no se acredita nelas, e se as destri na prtica. 29A destruio das carreiras realizada atravs da introduo de gratificaes dedesempenho que reduzem radicalmente a amplitude das carreiras - ou seja, a distnciapercentual entre a remunerao inicial e a final. Essa amplitude deveria ser de 200 ou 300por cento, mas nos ltimos anos passou a girar no Brasil em torno de 20 por cento, excetono caso das carreiras militares. A amplitude da carreira de auditor do tesouro nacional, por27 - Era possvel tambm falar-se em carreira entre os diplomatas. A introduo de umagratificao de desempenho em 1995, porm, reduziu drasticamente a amplitude dacarreira diplomtica, que, assim ficou equiparada s demais carreiras civis.28 - Na Frana, por exemplo, a diferena entre o salrio inicial de um egresso da ENA e osalrio no final da carreira, descontados os adicionais por ocupao de cargo de direo, de duas vezes e meia.29 - Segundo Abrucio (1993: 74), por exemplo, na administrao pblica federalbrasileira a questo dos planos de carreira fundamental na medida que a maioria dosservidores pblicos brasileiros carece de um horizonte profissional definido. Nessetrabalho o autor enumera de forma realista os obstculos existncia de carreiras. Nopercebe, porm, como alis praticamente ningum percebia no Brasil na poca, que essesobstculos derivavam menos do patrimonialismo ou da incompetncia dos dirigentespolticos, e mais das mudanas tecnolgicas dramticas ocorridas no mundo, comprofundas implicaes na reformulao da administrao pblica.16exemplo, reduziu-se a 6 por cento. A de uma carreira recm criada, como a dos gestores,reduziu-se a 26 por cento. Atravs desse processo de reduo da amplitude das carreiraselas foram na prtica reduzidas a simples cargos.Por que ocorreu esse fato? Principalmente porque Braslia na verdade no acreditano seu prprio mito. Porque, em um mundo em transformao tecnolgica acelerada, emque a competncia tcnica no tem qualquer relao com a idade dos profissionais, osservidores jovens no esto dispostos a esperar 20 anos para chegar ao topo da carreira.Como, por outro lado, no possvel eliminar as etapas e as correspondentes carncias detempo das carreiras, nem se pode aumentar facilmente o nvel de remunerao de cadacarreira, o mais prtico foi reduzir sua amplitude, aumentando a remunerao dos nveisinferiores.Isto no significa, entretanto, que no existam carreiras na administrao pblicabrasileira. Sem dvida elas existem, conforme muito bem as analisou Ben Ross Schneider(1994, 1995). So antes carreiras pessoais do que carreiras formais. So carreirasextremamente flexveis, constituda por funcionrios que formam a elite do Estado. Estesfuncionrios circulam intensamente entre os diversos rgos da administrao, e, ao seaposentarem, tendem a ser absorvidos pelo setor privado. Se Schneider acrescentasse quea ocupao de DAS faz parte integrante desse processo instvel e flexvel, mas maisbaseado no mrito do que ele supe, teramos um bom quadro do sistema de carreirasinformais existentes na alta burocracia brasileira. Um quadro que poder ser aperfeioadocom a adoo de uma concepo moderna de carreira que compreenda: ampla mobilidadedo servidor, possibilidade de ascenso rpida aos mais talentosos; estruturas em Y quevalorizem tanto as funes de chefia quanto de assessoramento; versatilidade de formaoe no treinamento permitindo perfis bem diferenciados entre os seus integrantes.A relao entre os DASs e as carreiras nos leva a um outro mito burocrtico deBraslia: o mito de que os DASs so um mal. Seriam a forma atravs da qual o sistema decarreiras seria minado, abrindo espao para a contratao, sem concurso, de pessoal semcompetncia. Na verdade, os DASs, ao permitirem a remunerao adequada de servidorespblicos - que constituem 75 por cento do total de portadores de DAS, conforme podemosverificar pela Tabela 1, constituem-se em uma espcie de carreira muito mais flexvel eorientada para o mrito. Existe em Braslia um verdadeiro mercado de DASs, atravs doqual os ministros e altos administradores pblicos, que dispem dos DASs, disputam comessa moeda os melhores funcionrios brasileiros. Se for concretizado o plano, ainda emelaborao, de reservar de forma crescente os DASs para servidores pblicos, o sistema deDAS, que hoje j um fator importante para o funcionamento da administrao pblicafederal, transformar-se- em um instrumento estratgico da administrao pblicagerencial.A Tabela 1 nos oferece, alis, um bom quadro da alta administrao pblica federalpresente no Poder Executivo. A remunerao mdia dos administradores varia da mdia de2.665 para os portadores de DAS-1 para 6.339 reais de mdia para os portadores de DAS-6. A porcentagem mdia de portadores de DAS que so servidores pblicos baixa de 78,5por cento para o DAS-1 para 48,4 por cento para os portadores de DAS-6. O nvel deeducao aumenta com o aumento do DAS enquanto que a porcentagem de mulheresdiminui medida que transitamos de DAS-1 para DAS-6. No total so 17.227 osportadores da DAS, correspondendo a cerca de 3 por cento do total de servidores ativos.17Tabela 1: Ocupantes de DASQtde.ServidoresIdadeMdiaSexoFemininoNvelSuperiorServidoresPbicosRemuneraoMdiaDAS-1 7.206 41 45,2% 50,8% 78,5% 2.665DAS-2 5.661 42 39,0% 61,8% 77,7% 3.124DAS-3 2.265 44 36,0% 71,0% 71,4% 3.402DAS-4 1.464 46 28,8% 81,3% 65,4% 4.710DAS-5 503 48 17,3% 86,1% 60,6% 6.018DAS-6 128 50 16,4% 85,9% 48,4% 6.339TOTAL 17.227 42 39,5% 61,0% 75,5% 3.112Fonte: Ministrio da Administrao Federal e da Reforma do Estado (1995).Obs.: Inclui remunerao do cargo e da funo; esto considerados no clculo somente osservidores efetivos.Atravs dos seus mitos Braslia justifica a ineficincia e a baixa qualidade doservio pblico federal. Ao mesmo tempo, entretanto, revela a falta de uma poltica clarapara o servio pblico. Enquanto se repetem mitos burocrticos, como o caso do mitopositivo da carreira e do mito negativo de que os DASs constituem um mal, o serviopblico brasileiro no logra se tornar um sistema plenamente burocrtico, j que esse umsistema superado, que est sendo hoje abandonado em todo o mundo, em favor de umaadministrao pblica gerencial. E por esse mesmo motivo no consegue fazer a suapassagem para uma administrao pblica moderna, eficiente, controlada por resultados,voltada para o atendimento do cidado-cliente. Ao invs disso, fica acariciando um idealsuperado e irrealista de implantar no final do sculo XX um tipo de administrao pblicaque se justificava na Europa, na poca do Estado liberal, como um antdoto aopatrimonialismo, mas que hoje no mais se justifica.Os Dois Objetivos e os Setores do EstadoA partir de 1995, com o governo Fernando Henrique, surge uma nova oportunidade para areforma do Estado em geral, e, em particular, do aparelho do Estado e do seu pessoal. Estareforma ter como objetivos: a curto prazo, facilitar o ajuste fiscal, particularmente nosEstados e municpios, onde existe um claro problema de excesso de quadros; a mdioprazo, tornar mais eficiente e moderna a administrao pblica, voltando-a para oatendimento dos cidados.O ajuste fiscal ser realizado principalmente atravs da exonerao de funcionriospor excesso de quadros, da definio clara de teto remuneratrio para os servidores, eatravs da modificao do sistema de aposentadorias, aumentando-se o tempo de servioexigido, a idade mnima para aposentadoria, exigindo-se tempo mnimo de exerccio noservio pblico e tornando o valor da aposentadoria proporcional contribuio. As trsmedidas exigiro mudana constitucional. A primeira ser aplicada nos estados emunicpios, no na Unio, j que nela no existe excesso de quadros. A segunda e a18terceira tambm na Unio. Uma alternativa s dispensas por excesso de quadros, queprovavelmente ser muito usada, ser o desenvolvimento de sistemas de exoneraodesligamento voluntrio. Nestes sistemas os administradores escolhem a populao defuncionrios passveis de exonerao e propem que uma parte deles se exonerevoluntariamente em troca de indenizao e treinamento para a vida privada. Diante dapossibilidade iminente de dispensa e das vantagens oferecidas para o desligamentovoluntrio, um nmero substancial de servidores se apresentar.30J a modernizao ou o aumento da eficincia da administrao pblica ser oresultado a mdio prazo de um complexo projeto de reforma, atravs do qual se buscar aum s tempo fortalecer a administrao pblica direta ou o ncleo estratgico do Estado,e descentralizar a administrao pblica atravs da implantao de agncias autnomase de organizaes sociais controladas por contratos de gesto. Nestes termos, a reformaproposta no pode ser classificada como centralizadora, como foi a de 1936, oudescentralizadora, como pretendeu ser a de 1967. Nem, novamente, centralizadora, comofoi a contra-reforma embutida na Constituio de 1988. Em outras palavras, a propostano a de continuar no processo cclico que caracterizou a administrao pblicabrasileira (Pimenta, 1994), alternando perodos de centralizao e de descentralizao,mas a de, ao mesmo tempo, fortalecer o a competncia administrativa do centro e aautnoma das agncias e das organizaes sociais. O elo de ligao entre os dois sistemasser o contrato de gesto, que o ncleo estratgico dever aprender a definir e controlar, eas agncias e organizaes sociais, a executar.31A proposta de reforma do aparelho do Estado parte da existncia de quatro setoresdentro do Estado: (1) o ncleo estratgico do Estado, (2) as atividades exclusivas deEstado, (3) os servios no-exclusivos ou competitivos, e (4) a produo de bens eservios para o mercado.No ncleo estratgico so definidas as leis e polticas pblicas. um setorrelativamente pequeno, formado no Brasil, a nvel federal, pelo Presidente da Repblica,pelos ministros de Estado e a cpula dos ministrios, responsveis pela definio daspolticas pblicas, pelos tribunais federais encabeados pelo Supremo Tribunal Federal e30 - A primeira experincia importante e bem sucedida de demisso voluntria no serviopblico brasileiro ocorreu no Banco do Brasil em 1995. O banco possua 130 milfuncionrios. Apontou 50 mil como passveis de demisso e ofereceu indenizao para quecerca de 15 mil funcionrios se demitissem voluntariamente. Depois de uma agitadainterveno dos sindicatos, obtendo liminares em juizes de primeira instncia imbudos deesprito burocrtico, a poltica foi declarada legal. Apresentaram-se 16 mil para a demissovoluntria.31 - Segundo Pimenta (1994: 154): A institucionalizao do funo-administrao nogoverno federal ocorre durante todo o perodo republicano brasileiro de forma cclica... OBrasil viveu um processo de centralizao organizacional no setor pblico nas dcadas de30 a 50, com o predomnio da administrao direta e de funcionrios estatutrios. J nasdcadas de 60 a 80 ocorreu um processo de descentralizao, atravs da expanso daadministrao indireta e da contratao de funcionrios celetistas. O momento iniciadocom a Constituio de 1988 indica a inteno de se centralizar novamente (regime jurdiconico - estatutrio).19pelo Ministrio Pblico. A nvel estadual e municipal existem correspondentes ncleosestratgicos.As atividades exclusivas de Estado so aquelas em que o poder de Estado, ouseja, o poder de legislar e tributar exercido. Inclui a polcia, as foras armadas, os rgosde fiscalizao e de regulamentao, e os rgos responsveis pelas transferncias derecursos, como o Sistema Unificado de Sade, o sistema de auxlio-desemprego, etc.Os servios no-exclusivos ou competitivos do Estado so aqueles que, emborano envolvendo poder de Estado, o Estado realiza e/ou subsidia porque os considera dealta relevncia para os direitos humanos, ou porque envolvem economias externas, nopodendo ser adequadamente recompensados no mercado atravs da cobrana dos servios.Finalmente, a produo de bens e servios para o mercado realizada pelo Estadoatravs das empresas de economia mista, que operam em setores de servios pblicos e/ouem setores considerados estratgicos.Em cada um desses setores ser necessrio considerar (1) qual o tipo depropriedade e (2) qual o tipo de administrao pblica mais adequados. Examinemos oprimeiro problema. A Figura 1 resume as relaes entre essas variveis.Propriedade Estatal e PrivatizaoNo ncleo estratgico e nas atividades exclusivas de Estado a propriedade dever ser, pordefinio, estatal. O ncleo estratgico usar, alm dos instrumentos tradicionais -aprovao de leis (Congresso), definio de polticas pblicas (Presidncia e cpula dosministrios) e emisso de sentenas e acrdos (Poder Judicirio) - de um novoinstrumento, que s recentemente vem sendo utilizado pela administrao pblica: ocontrato de gesto. Atravs do contrato de gesto o ncleo estratgico definir os objetivosdas entidades executoras do Estado e os respectivos indicadores de desempenho, egarantir a essas entidades os meios humanos, materiais e financeiros para suaconsecuo. As entidades executoras sero, respectivamente, as agncias autnomas, nosetor das atividades exclusivas de Estado, e as organizaes sociais no setor dos serviosno-exclusivos de Estado.As atividades exclusivas de Estado devero ser em princpio organizadas atravsdo sistema de agencias autnomas. Uma agncia autnoma dever ter um dirigentenomeado pelo respectivo Ministro, com o qual ser negociado o contrato de gesto. Umavez estabelecidos os objetivos e os indicadores de desempenho no apenas qualitativosmas tambm quantitativos, o dirigente ter ampla liberdade para gerir o oramento globalrecebido; poder administrar seus funcionrios com autonomia no que diz respeito aadmisso, demisso e pagamento; e poder realizar compras apenas obedecendo osprincpios gerais de licitao.20Figura 1: Setores do Estado, Formas de Propriedade e de AdministraoFORMA DE PROPRIEDADE FORMA DEADMINISTRAOEstatal PblicaNo-EstatalPrivada Burocrtica GerencialNCLEOESTRATGICOLegislativo, Judicirio,Presidncia, Cpula dosMinistriosATIVIDADESEXCLUSIVASPolcia, RegulamentaoFiscalizao, Fomento,Seguridade Social BsicaSERVIOSNO-EXCLUSIVOSUniversidades, Hospitais,Centros de Pesquisa,MuseusPublicizaoPRODUO PARA OMERCADOEmpresas EstataisPrivatizaoFonte: Ministrio da Administrao Federal e Reforma do Estado (1995) Plano Diretor daReforma do Estado.No outro extremo, no setor de bens e servios para o mercado, a produo deverser em princpio realizada pelo setor privado. Da o programa de privatizao em curso.Pressupe-se que as empresas sero mais eficientes se controladas pelo mercado eadministradas privadamente. Da deriva o princpio da subsidiariedade: s deve ser estatala atividade que no puder ser controlada pelo mercado. Alm disso, a crise fiscal doEstado retirou-lhe capacidade de realizar poupana forada e investir nas empresasestatais, tornando-se aconselhvel privatiz-las. Esta poltica est de acordo com aconcepo de que o Estado moderno, que prevalecer no sculo XXI, dever ser umEstado regulador e transferidor de recursos, e no um Estado executor. As empresaspodem, em princpio, serem controladas pelo mercado, onde prevalece o princpio datroca. O princpio da transferncia, que rege o Estado, no se aplica a elas; por isso edevido ao princpio da subsidiariedade, as empresas devem ser privadas.Este princpio no absolutamente claro no caso dos monoplios naturais, em queo mercado no tem condies de funcionar; nesse caso, a privatizao dever seracompanhada de um processo criterioso de regulao de preos e qualidade dos servios.No tambm totalmente claro no caso de setores monopolistas, em que se possamrealizar grandes lucros - uma forma de poupana forada - e em seguida reinvesti-los noprprio setor. Nessas circunstncias poder ser economicamente interessante manter a21empresa na propriedade do Estado. Os grandes investimentos em infra-estrutura no Brasilentre os anos 40 e os anos 70, foram financiados principalmente dessa forma. Finalmenteesse princpio pode ser discutido no caso de setores estratgicos, como o caso dopetrleo, em que pode haver interesse em uma regulao estatal mais cerrada, implicandoem propriedade estatal. Essa uma das razes da deciso do governo brasileiro de mantera Petrobrs sob controle estatal.Propriedade Pblica No-EstatalFinalmente devemos analisar o caso das atividades no-exclusivas de Estado. Nossaproposta de que a forma de propriedade dominante dever ser a pblica no-estatal.No capitalismo contemporneo as formas de propriedade relevantes no so apenasduas, como geralmente se pensa, e como a diviso clssica do Direito entre DireitoPblico e Privado sugere - a propriedade privada e a pblica -, mas so trs: (1) apropriedade privada, voltada para a realizao de lucro (empresas) ou de consumo privado(famlias); (2) a propriedade pblica estatal; e (3) a propriedade pblica no-estatal. Aconfuso no deriva da diviso bipartite do Direito, mas do fato de que, em seguida, oDireito Pblico foi confundido ou identificado com o Direito Estatal, enquanto o DiretoPrivado foi entendido como englobando as instituies no-estatais sem fins lucrativos,que, na verdade, so pblicas. 32Com isto estou afirmando que o pblico no se confunde com o estatal. O espaopblico mais amplo do que o estatal, j que pode ser estatal ou no-estatal. No plano dodever-ser o estatal sempre pblico, mas na prtica, no : o Estado pr-capitalista era, emltima anlise, privado, j que existia para atender s necessidades do prncipe; no mundocontemporneo o pblico foi conceitualmente separado do privado, mas vemos todos osdias as tentativas de apropriao privada do Estado. pblica a propriedade que de todos e para todos. estatal a instituio quedetm o poder de legislar e tributar, estatal a propriedade que faz parte integrante doaparelho do Estado, sendo regida pelo Direito Administrativo. privada a propriedade quese volta para o lucro ou para o consumo dos indivduos ou dos grupos. De acordo comessa concepo uma fundao de Direito Privado, embora regida pelo Direito Civil, 32 - Conforme observa Bandeira de Mello,(1975: 14) para o jurista ser propriedade privadaou pblica no apenas um ttulo, a submisso a um especfico regime jurdico: umregime de equilbrio comutativo entre iguais (regime privado) ou a um regime desupremacia unilateral, caracterizado pelo exerccio de prerrogativas especiais deautoridade e contenes especiais ao exerccio das ditas prerrogativas (regime pblico).Saber se uma atividade pblica ou privada mera questo de indagar do regime jurdicoa que se submete. Se o regime que a lei lhe atribui pblico, a atividade pblica; se oregime de direito privado, privada se reputar a atividade, seja, ou no, desenvolvidapelo Estado. Em suma: no o sujeito da atividade, nem a natureza dela que lhe outorgamcarter pblico ou privado, mas o regime a que, por lei, for submetida. Estoureconhecendo este fato ao considerar as propriedade pblica no-estatal como regida peloDireito Privado; ela pblica do ponto de vista dos seus objetivos, mas privada sob ongulo jurdico.22uma instituio pblica, na medida que est voltada para o interesse geral. Em princpiotodas as organizaes sem fins lucrativos so ou devem ser organizaes pblicas noestatais.33 Sem dvida poderamos dizer que, afinal, continuamos apenas com as duasformas clssicas de propriedade: a pblica e a privada, mas com duas importantesressalvas: primeiro, a propriedade pblica se subdivide em estatal e no-estatal, ao invsde se confundir com a estatal; e segundo, as instituies de Direito Privado voltadas para ointeresse pblico e no para o consumo privado no so privadas mas pblicas noestatais.34O reconhecimento de um espao pblico no-estatal tornou-se particularmenteimportante em um momento em que a crise do Estado aprofundou a dicotomia Estadosetorprivado, levando muitos a imaginar que a nica alternativa propriedade estatal aprivada. A privatizao uma alternativa adequada quando a instituio pode gerar todasas suas receitas da venda de seus produtos e servios, e o mercado tem condies deassumir a coordenao de suas atividades. Quando isto no acontece, est aberto o espaopara o pblico no-estatal. Por outro lado, no momento em que a crise do Estado exige oreexame das relaes Estado-sociedade, o espao pblico no-estatal pode ter um papel deintermediao ou pode facilitar o aparecimento de formas de controle social direto e deparceria, que abrem novas perspectivas para a democracia. Conforme observa Cunil Grau(1995: 31-32):A introduo do pblico como uma terceira dimenso, que supera a visodicotmica que enfrenta de maneira absoluta o estatal com o privado, estindiscutivelmente vinculada necessidade de redefinir as relaes entreEstado e sociedade... O pblico, no Estado no um dado definitivo, mas umprocesso de construo, que por sua vez supe a ativao da esfera pblicasocial em sua tarefa de influir sobre as decises estatais.Finalmente, no setor dos servios no-exclusivos de Estado, a propriedade deverser em princpio pblica no-estatal. No deve ser estatal porque no envolve o uso dopoder-de-Estado. E no deve ser privada porque pressupe transferncias do Estado. Deveser pblica para justificar os subsdios recebidos do Estado. O fato de ser pblica noestatal,por sua vez, implicar na necessidade da atividade ser controlada de forma mistapelo mercado e pelo Estado. O controle do Estado, entretanto, ser necessariamenteantecedido e complementado pelo controle social direto, derivado do poder dos conselhosde administrao constitudos pela sociedade. E o controle do mercado se materializar nacobrana dos servios. Desta forma a sociedade estar permanente atestando a validadedos servios prestados, ao mesmo tempo que se estabelecer um sistema de parceria ou deco-gesto entre o Estado e a sociedade civil.33 - So ou devem ser porque uma entidade formalmente pblica, sem fins lucrativos,pode, na verdade, s-lo. Nesse caso trata-se de uma falsa entidade pblica. So comunscasos desse tipo.34 - Essas instituies so impropriamente chamadas de organizaes nogovernamentaisna medida que os cientistas polticos nos Estados Unidos geralmenteconfundem governo com Estado. mais correto falar em organizaes no-estatais, ou,mais explicitamente, pblicas no-estatais.23Na Unio os servios no-exclusivos de Estado mais relevantes so asuniversidades, as escolas tcnicas, os centros de pesquisa, os hospitais e os museus. Areforma proposta a de transform-los em um tipo especial de entidade no-estatal, asorganizaes sociais. A idia transform-los, voluntariamente, em organizaessociais, ou seja, em entidades que celebrem um contrato de gesto com o PoderExecutivo e contem com autorizao do parlamento para participar do oramento pblico.Organizao social no , na verdade, um tipo de entidade pblica no-estatal, mas umaqualidade dessas entidades, declarada pelo Estado.O aumento da esfera pblica no-estatal aqui proposto no significa em absoluto aprivatizao de atividades do Estado. Ao contrrio, trata-se de ampliar o carterdemocrtico e participativo da esfera pblica, subordinada a um Direito Pblico renovadoe ampliado. Conforme observa Tarso Genro (1996):A reao social causada pela excluso, pela fragmentao, a emergncia denovos modos de vida comunitria (que buscam na influncia sobre o Estado oresgate da cidadania e da dignidade social do grupo) fazem surgir uma novaesfera pblica no-estatal... Surge, ento, um novo Direito Pblico comoresposta impotncia do Estado e dos seus mecanismos de representaopoltica. Um Direito Pblico cujas regras so s vezes formalizadas, outrasno, mas que ensejam um processo cogestionrio, que combina democraciadireta - de participao voluntria - com a representao poltica prevista pelasnormas escritas oriundas da vontade estatal.A transformao dos servios no-exclusivos de Estado em propriedade pblicano-estatal e sua declarao como organizao social se far atravs de um programa depublicizao, que no deve ser confundido com o programa de privatizao, na medidaque as novas entidades conservaro seu carter pblico e seu financiamento pelo Estado.O processo de publicizao dever assegurar o carter pblico, mas de direito privado danova entidade, assegurando-lhes, assim, uma autonomia administrativa e financeira maior.Para isto ser necessrio extinguir as atuais entidades e substitu-las por fundaespblicas de direito privado, criadas por pessoas fsicas. Desta forma se evitar que asorganizaes sociais sejam consideradas entidades estatais, como aconteceu com asfundaes de direito privado institudas pelo Estado, e assim submetidas a todas asrestries da administrao estatal. As novas entidades recebero por cesso precria osbens da entidade extinta. Os atuais servidores da entidade transformar-se-o em umacategoria em extino e ficaro disposio da nova entidade. O oramento daorganizao social ser global; a contratao de novos empregados ser pelo regime daConsolidao das Leis do Trabalho; as compras devero estar subordinadas aos princpiosda licitao pblica, mas podero ter regime prprio. O controle dos recursos estataispostos disposio da organizao social ser feito atravs de contrato de gesto, alm deestar submetido superviso do rgo de controle interno e do Tribunal de Contas.Tipos de Administrao Mais AdequadosO objetivo geral da reforma administrativa ser transitar de uma administrao pblicaburocrtica para a gerencial. Esta mudana, entretanto, no poder ser realizada de um diapara o outro. Nem dever ocorrer com a mesma intensidade nos diversos setores. Na24verdade a administrao pblica gerencial deve ser construda sobre a administraopblica burocrtica. No se trata de fazer tbula rasa desta, mas aproveitar suas conquistas,os aspectos positivos que ela contm, ao mesmo tempo que se vai eliminando o que j noserve.Instituies burocrticas como a exigncia de concurso ou de processo seletivopblico, de um sistema universal de remunerao, de carreiras formalmente estruturadas, ede um sistema de treinamento devem ser conservadas e aperfeioadas, seno implantadas,visto que at hoje no o foram, apesar de toda a ideologia burocrtica que tomou conta deBraslia entre 1985 e 1994. Nestes termos, preciso e conveniente continuar os esforosno sentido da instalao de uma administrao pblica burocrtica no pas.Estas instituies, entretanto, devem ser suficientemente flexveis para noconflitar com os princpios da administrao pblica gerencial. Devem, principalmente,no impedir a recompensa do mrito pessoal desvinculado de tempo de servio e noaumentar as limitaes iniciativa e criatividade do administrador pblico em administrarseus recursos humanos e materiais. E o treinamento, conforme observa Oslak (1995), deveesta