wallon - a evolução psicológica da criança

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HENRI WALLON AEVOLlJ AO PSICOLCf leA DACRIANCA Um classico da Psicologla da Crianc;:a, e a obra mals conhecida do celebre pedagogo. Estudada numa perspectiva psicogenetica, a luz de eX'periemcias concretas, a evolu- c;:ao psicol6gica da crianc;:a surge como uma sucessao de etapas claramente caracteri- zadas. No entanto, de etapa em etapa, a crianc;:a e -um unico e mesmo ser ao longo de metamorfoses . E: portanto essencial nao a estudar fragmentariamente;' E: ' a lic;:ao deste iivro em que sao abordados os grandes problemas da Psicologia' da Crianc;:a: 0 jogo, a motricidade. 0 desenvolvimento da afectividade, a linguagem, etc. o r-- bJ 10 a @PERSONISi bJ 10 a @PERSONISi

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Page 1: Wallon - A evolução psicológica da criança

HENRI WALLON

AEVOLlJ AOPSICOLCf leADACRIANCA

Um classico da Psicologla da Crianc;:a, e a obra mals conhecida do celebre pedagogo.Estudada numa perspectiva psicogenetica, a luz de eX'periemcias concretas, a evolu-c;:ao psicol6gica da crianc;:a surge como uma sucessao de etapas claramente caracteri-zadas. No entanto, de etapa em etapa, a crianc;:a e -um unico e mesmo ser aolongo de metamorfoses •. E: portanto essencial nao a estudar fragmentariamente;' E: 'a lic;:ao deste iivro em que sao abordados os grandes problemas da Psicologia' daCrianc;:a: 0 jogo, a motricidade. 0 desenvolvimento da afectividade, a linguagem, etc.

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ABRANGENDO TEMAS QUEV14.0 DA PSICOLOGIA A PSI-QUIATRIA E A PSICANAuSE,DA PEDAGOGIA A PSICOLO-GIA INFANTIL, PASSANDO PE·LA PSICOTERAPIA, PSICOSSO-CIOLOGIA, PSICOMOTRICIDA·DE, PSICOPEDAGOGIA, PUERI·CULTURA E SEXOLOGIA, ESTACOLECQAO, SUBDIVIDIDA EMSERIES, VISA ESSENCIALMEN-TE TRAT AR ASPECTOS RELA-TIVOS A PESSOA HUMANA EA GLOBALIDADE NAO s6DOS PROBLEMAS DA SUAMENTE COMO DO SEU CORPO.

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PERSON~PSICOLOGIA A EVOLUCAO

PSICOLaGICADACRIANCATlTULOS PUBLlCADOS

1. A UNIDADE DA PSICOLOGIAde Daniel Lagache

2. A EVOLUCAO PSICOLOGICA DA CRIANCAde Henri Wallon

3. A TERAPIA SEXUALde PatricIa e Richard Gillan

4. A SAODE MENTAL DA CRIANCAde Celestin Frelnet

5. PSICoLOGOS E SEUS CONCEITOSde Vernon Nordby e Calvin Hall

6. SEXUALIDADE E PODERdir. de Armando Verdlgllone

7. A ESCOLA NA SOCIEDADEde Suzanne Mollo

8. A PSICANALISEde J.-C. Sempe, J.-L. Donnct, Jean Say, Gilbert Lascaulte Catherine Backh

9. A INTERPRETACAO DAS AFASIASde Sigmund Freud

10. FEITICISMO E LINGUA GEMde J.-J. Goux, PhIlippe Sollers e outros

11. COMO AMAR UMA CRIANCAde Janusz Korczak

12. PSICOLOGIA DA. ATRACCAO SEXUALde Olenn Wilson e David Nlas

13. ANALISE DE CONTEODOde Laurence Bardin

14. 0 DESPERTAR DO ESPIRITOde Fran~olse Dalto e Antoinette Muel

15. 0 EXAME PSICOLOOICO DA CRIANCAde Michtle Perron-Bore11l e Roger Perron

16. OS EFEITOS DA EDUCACAOde Michel Lobrot

17. 0 TEMPO DA ADOLEScro-CIAde Guy Avanzlnl

18. PSICOLOGIA SOCIALde J~Pb. Leyens

TtTULOS A PUBLICAR

A TIMIDEZde Phl1lp O. ZimbardoA ESTRUTURA DA PERSONALIDADE HUMANAde H. J. Bysenck

o DESENVOL VIMENTO DO SER HUMANOde Eric RaynerA PERSONALIDADE NORMAL E PATOLoGICAde Jean Bergeret

PSICOLOGOS E PSICOLOGIAde David Cohen

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HENRI WALLONAEVOLU AOPSICOL0 ICADACRIANCA

Titulo original:UE:volution Psychologique de I'Enfant

Traduc;;ao de Ana Maria Bessa

Capa de Aleeu Saldanha Coutinho

Todos os dlreltos reservados para a Lingua Portuguesa

- Av. Duque de Avila, 69 r/e Esq .• Lisboa 1

Tels. 556898 I 572001

Distrlbuldor no Brasil:

LIVRARlA MARTINS FONTESRua Conselheiro Ramalho, 330I 340 - Sao Paulo

Page 5: Wallon - A evolução psicológica da criança

A presente edi<;iioreproduz 0 texto da obra) ja clds-sica) de Henri Wallon) publicada pela primeira vez nacolecr;ao Armand Colin em 1941. Nao 8e julgou neces-saria modificar a «bibliografia sumaria» esiabelecidaentao pelo autO": actualizada) esta bibliografia seriaconsideravel e) por outro Zado) talvez nao deixe de terinteresse saber que obras recomendava Henri Wallonem 1941.

WALLON, psicologo da infancia.Urn nome, uma qualidade, indissoluvelmente unidos.Uma vida, uma obra, cuja riqueza me perturba e me

desconcerta.Como transmitir esta riqueza? Como exprimir, no

tempo limitado desta homenagem, 0 que foi esta obra,sem esquematizar, sem banalizar - sem correr 0 riscode traduzir em frases demasiado unidas, com uma logicasimples de mais, 0 que foi em Wallon um eterno esfor~opara nos arrancar a pregui~a das palavras e dos pen-samentos habituais?

Nao me parece isso possivel, pelo menos para mim.Para aqueles que ja conhecem bem esta obra, 0 meu

discurso sera uma recorda~ao, uma alusao. Para osoutros, sera, segundo espero, uma introdu~ao a estaobra, uma incita~ao a descobrir 0 proprio Wallon.

Para nos todos, uma homenagem fel'vorosa, apesarda minha imperfei~ao e falta de jeito.

Para apreciar a obra de Henri Wallon, 0 que elatem de original, de inovador, seria necessario podersitua-Ia na historia da Psicologia e compara-la com asobras dos seus contemporaneos, outros eminentes psi-c6logos da infancia.

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Urn autor como Gesell, nos Estados Unidos, fez doscomportamentos da crian<;a urn inventiLrio muito maiscompleto que 0 que nos deixou Wallon.

Urn autor como Piaget, na Sui<;a, construiu, numaquinzena de obras, uma teoria da inteligencia cuja sis-tematizaQao nao tern nenhuma comparac;ao na obra deWallon.

Wallon nao e urn autor de sistema como Piaget,Wallon nao e urn coleccionador de fact os como Gesellfoi, alias de forma magistral.

Wallon e urn observador, urn clinico, urn homemde intuic;ao, tanto ou mais que urn experimentador, mastambem um filosofo no sentido mais profundo e maisvalida do termo - quer dizer, urn homem que sabe reflec-tir nas tom adas de posiC;aodo espirito face a realidade -e que sabe fazer uma critica, modificar e6tas tomadasde posic;ao, para se desprender das ideologias e estreitaroreal, cada vez com mais veracidade e eficacia.

Assim, Wallon surge, mais que nenhum outro, comoum inovador, como urn criador da Psicologia, porqueas suas contribuic;oes cientificas nao sac apenas umapedra mais, um novo ladrilho para 0 ed.ificio comum,na medida em que provocam neste ed.ificio uma reorga-nizac;ao, ou melhor, a abertura de perspectivas insus-peitas.

da crian~a sera sempre impenetravel para n6s.» Namesma epoca, esta mesma heterogeneidade era, alias,afirmada noutros dominios, para opor a mentalidadedo primitivo a do civilizado, para opor a conscienciam6rbida do doente mental a consciencia do homem Rao.

No dominio da Psicologia, esta teoria tomava agres-sivamente 0 sentido diametralmente oposto a atitudetradicional, arcaica, que apresentava a crianC;a comouma imagem reduzida e simplificada do adulto.

Na perspectiva deste problema, a obra de Wallonrepre6enta um esforc;o para ultrapassar a contradic;aodas duas teorias em presenc;a: a teoria do homtmculo,em que a crianc;a e como que uma reduc;ao do adulto,e a teoria das mentalidades distintas.

Nao pretendo, evidentemente, afirmar que Wall onfosse 0 tinico a desenvolver este esforc;o. Tambem Piagetse entregou explicitamente a ele (nao sem tel' deixadode contribuir - atraves da sua primeira obra escritaem 1925 - para a vulgarizac;ao da noC;aode egocentrismo,que reforgava a teoria das mentalidades heterogeneas).

Enfim, sem que 0 problema fosse sempre claramenteformulado, toda uma gerac;ao de psicologos contribuiupara explicar a passagem da crianc;a ao homem, descre-vendo minuciosamente as eta pas desta passagem.

Mas descrever nao basta para explicar.E a coerencia de uma explicac;ao nao e suficiente

para assegurar 0 seu valor.E claramente evidente que a crian<;a se vai trans-

formando em adulto. Nenhuma teoria 0 pode evitar oucontradizer. E fazer intervir nao sei que especie demetamorfose para explicar esta passagem e uma soluc;aopuramente verbal. Seria necessario analisar em primeirolugar as condi<;6es e 0 mecanisme desta metamorfose,desta conversao total.

Nao. Se 0 crescimento representa para nos urn pro-blema, se a ideia arcaica do homtinculo apenas sabemosopor a ideia da conversao brutal, e porque nao sabemoscompreender a verdadeira durac;ao, a durac;ao criadora

Em 1925, quando Wallon come~ou a publicar as suasobras, a psicologia da crianc;a encontrava-se numa espe-cie de impasse. Uma longa tradi<;ao pedag6gica e psico-logica, traaic;ao oriunda de Jean-Jacques Rousseau, le-vava a teoria das mentalidades heterogeneas. A forc;ade afirmar a originalidade irredutivel da crianc;a, comDewey, Montessori, Claparede e muitos outros, tmha-sechegado a e6tabelecer a teoria da existencia de urn fossaradical entre a crianc;a e 0 adulto. Dais mundos a parte.Duas mentalidades totalmente diferentes, distintas, hete-rogeneas. De tal modo que urn mectico-psicologo, GilbertRobin, tinha chegado a seguinte conclusao: «0 espirito

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de novas formas, e porque a nossa logica habitual e umalogica estatica, intemporal.

E nao ganhamos nada em dizer, seguindo Bergson,que a duraQao e a base da realidade. A duraQao bergso-niana e ainda uma abstracQao. Com ela, nao sabemosnada dos seres que duram, dos seres na sua incarna~ao,nas condiQoes reais, materiais, da sua existencia.

Urn tal problema nao se resolve com uma pura dia-lectica verbal ou com uma simples acumulaQao de factos.Para a sua soluQao, exige que aos factos se apliqueuma interroga~8oo, uma reflexao, e que ao contacto dosfactos se efectue uma reforma ou uma aboli~8oodas dis-tin~oes ou das categorias intelectuais do passado quese podem opor a nossa compreensao das coisas. Enfim,uma reforma da nossa maneira de pensar ao contactodas coisas e para a sua conquista.

Assim, Wall on vai repensar estas 0POSl~oeSe ultra-pass a-las, procurando ao mesmo tempo as contradi~oesreais e como podem ser estas contradiQoes um motorda evolu~ao da crianQa. 0 seu metodo consiste em estu-dar as condi~Oes materiais do desenvolvimento dacrianQa, condiQOes tanto organicas como socia is, e emver como se edifica, atraves destas condiQoes, urn novoplano de realidade que e 0 psiquismo, a personalidade.

Os comentadores de Wallon n800apreenderam, muitasvezes, mais que urn momento deste metodo. Eles acusam--no, entao, de organicismo, ou entao de sociologismo,outros elogiam 0 seu espiritualismo, pela sua afirmuQaoda existencia de urn plano psiquico original.

Enfim, alguns comentadores, anexando Wallon paraas suas proprias fileiras, apresentam as suas expli-ca~oes neurologic as como urn erro de juventude que maistarde teria renegado.

Ha em todas estas pessoas, e muitas vezes com amaior boa-fe, uma incapacidade para compreender quea dialectica walloniana nao pressupOe de nenhum modouma minimizaQao, ate mesmo urn aniquilamento das com-ponentes neurologicas e sociais do desenvolvimento, embeneficia de nao sei que confuso psicologismo.

No entanto, Wallon explicou varias vezes as suasperspectivas, e as suas descobertas ilustram perfeita-mente 0 metodo que seguiu.

Eu sou «pelo organicismo - diz ele -, mas nao soba forma unilateral e mecanicista do materialismo tra-dicional». :f'; que, acrescenta noutro lado, «as necessida-des do seu organismo e as exigencias sociais sac os doispOlos entre os quais se desenvolve a actividade dohomem».

E, numa controversia com Piaget, que ° acusava,pelo contrario, de sociologismo, Wallon da urn esclare-cimento decisivo:

«Na realidade, nunca pude dissociar a biolugico dosocial, nao porque os julgue redutiveis urn ao outro,mas porque eles me parecem no homem tao estreita-

Com lucidez e paclencia, com este gosto do riscosem 0 qual a Ciencia seria esteril - utilizando todos osrecursos da sua forma~8oo medica, da sua intui~8oo deobservador, mas tambem criticando, dissipando as ilu-sOes ideologicas que pervertem a noSsa vis800 das coi-sas -, Henri Wallon dedicou-se ao problema da genesedo espirito:

Seguindo a sua primeira e mais profunda tendencia,diz que «e comparando-a consigo que 0 adulto pretendepenetrar na alma da crian~». E esta pretens800 e va:deste modo, n800 descobrira na crianQa mais que umaprojecQ8oode si mesmo.

A atitude de J.-J. Rousseau e de todos aqueles queo seguiram nao e igualmente valida. Ela procede de urnespirito de rebeli800 expre&3o no seculo XVIII atravesda oposi~ao ingenua entre ° individuo e a sociedade.

A oposi~8ooda crian~a ao adulto, a oposiQao do bio-logico ao social, sao tao falsas no que tern de absolutocomo a oposi~ao do individuo a sociedade do que elasprocedem ideol6gica e historicamente.

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mente complementares desde 0 seu nascimento, que eimpassivel encarar a vida psiquica sem ser sob a formadas suas rela~oes reciprocas.»

Rela~Oes reciprocas? Isto significa que desenvolvi-mento biologico e desenvolvimento social sao, na crian~a,condi~ao urn do outro. As capacidades biologicas sacascondi~Oes da vida em sociedade - mas 0 meio sociale a condi~ao do desenvolvimento destas capacidades.

Nesta perspectiva, Wallon renova profundamente asteorias cientificas da motricidade e da emo~ao.

Os fisiologistas tinham distinguido dois aspectos nafun~ao motora: 0 movimento propria mente dito ou acti-vidade clonica e 0 estado de tensao varia vel entre 03

musculos ou tonus.A originalidade de Wallon consiste em dar a fun~ao

motora, e sobretudo a tonicidade, urn sentido hurnano.o tonus nao e apenas urn estado de tensao necessarioa execu~ao da contrac~ao muscular, ele e tambem atitu-des, posturas.

Ora, as atitudes, as posturas, sac modeladas peloadulto e sao na crian~a os seus primeiros modos deexpressao. «lncapaz de efectuar seja 0 que for, 0 recem--nascido e manipulado por outros e e no movimento dosoutros que tomarao forma as suas primeiras atitudet3.»

As atitudes, em rela~ao com os seus estados de bem--estar, de indisposi~ao, de necessidade, constituem ainfra-estrutura das suas emo~oes.

Esta e uma descobert a fundamental de Wallon.Estudada no adulto, a emo~ao tinha dado origem

a teorias inultiplas e contraditorias.Recolocada numa perspectiva genetica, ela toma en-

tao 0 seu verdadeiro significado funcional. A em~aoe urn facto fisiologico nas suas componentes humoraise motoras; e um comportamento social nas suas fun~Oesarcaicas de ada pta~ao.

A emo~ao e uma linguagem antes da linguagem.Mas mais ainda. A emo~ao e contraditoria nos seus

efeitos. Ela oscila entre urn estado de comunhao, de

confusao com outrem e de oposi~ao a outrem, de discri-mina~ao. Assim, a emoQao es~a 0 pensamento, a repre-senta~ao que the e contraditoria e nao contraria; esb~a,igualmente, a distinQao entre 0 ego e os outros; preludiaas afirma~oes da personalidade.

Esta 4:muta~ao de reac~Oes puramente fisiologicasem meios de expressao», este enxerto precoce do socialno organico, tern na especie humana uma importanciadecisiva, porque estao ligadas as condi~Oes de existenciado individuo desde 0 seu nascimento.

Desde 0 seu nascimento, geneticamente, a crian~ae urn ser social.

Sera, sem duvida, necessario estudar atraves de quedificuldades e, eventualmente, por meio de que crisesse transforma a crian<.;aem adulto. Mas a oposi<.;aometa-fisica crian<.;a-adulto foi suprimida. 0 caminho estadesobstruido. Abriu-se uma nova perspectiva.

Wallon, psicologo da infancia?PJ verdadeiramente Wallon urn psicologo da crian~a,

ou nao sera antes 0 promotor de uma psicologia geralconsiderada numa perspectiva genetica?

A questao pode parecer insolita. Colocamo-la, no en-tanto, pelo facto de cada vez mais se opor a psicologiada crian~a a psicologia genetica.

Wallon, como e evidente, so se ocupou de crian~as,mas definiu 0 seu dominio e as suas perspectivas de umaforma muito ampla. A psicologia da crian~a - disse -recebeu muito poueo da psieologia tradieionaI. Pelo con-trario, ela modificou as meus pontOlSde vista e ate osseus principios. Confrontando a crian~a e 0 adulto, elaia permitir revelar, de etapa em etapa, 0 verdadeiroplano da vida mental. Enfim, 0 estudo da crian~a, aoanalisar uma genese real, ia permitir descobrir 0 homem.

Wall on definiu-se, pois, a si mesmo, como urn psicO-logo no sentido mais completo do termo.

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Mas precisamente a partir do momento em que acrian~a e ligada ao homem, a nossa interroga~ao deixade ter qualquer sentido.

Rouve urn tempo em que se criavam palavras paracompartimentar as idades da vida como outros tantosdomini os distintos: a paidologia ou ciencia da crian~a,a nipiologia ou ciencia do bebe, a hebelogia ou cienciado adolescente.

Este tempo desapareceu, apesar das especializa~oescontinuarem a ser necessarias.

Wallon e, ao mesmo tempo, psicogenetico e psico-logo da infancia. Para ele, a psicologia da crian~a sub-siste, de facto, na medida em que a crian~a tern carae-teristicas proprias e problemas especificos como os daeduca~ao.

];':nas ultimas linhas da sua obra intitulada A Eva-ZUA}OOPsicol6gica dAt Crian{:a que Wallon declara :

«Em cada idade, a crian~a constitui um conjuntoindissociavel e original.» l!: este conjunto, esta unidade,que 0 psicologo da infancia deve apreender, atraves dasucessao das idades e no dinamismo que conduz a crian~aao estado adulto.

Assim, a imagem da infancia, tal como se desprendedos trabalhos e das reflexoes de Wallon, nao corres-ponde, evidentemente, it imagem tradicional, mas afas-ta-se igualmente da imagem modema ligada ao indivi-dualismo do Renascimento ou de Jean-Jacques Rousseau.Wallon recusa uma e outra como sistemas falsos, cons-truidos com base em ideologias de conformismo ou derebeliao, mas guarda de cada uma - e numa perspec-tiva nova - a sua parte de verdade. Verdade, a afir-magao de que as idades da infancia possuem a suaoriginalidade, 0 seu rosto proprio. Verdade, tambem, aafirma~ao de que a infancia nao tem sentido fora doobjectivo adulto: «A crian~a tende para 0 adulto, dizele, como um sistema para 0 seu est ado de equilibrio.»

No entanto, a conce~ao de Wallon nao e urn ecle-tismo. As verdades parciais, arrancadas aos seus sis-temas, adquirem urn novo sentido.

Se a assimila~ao da crian~a ao adulto e falsa, e par-que 0 proprio adulto e 0 resultado de uma progressivaconstrU~ao, de uma evolu~ao qualitativa, de uma genese.

Se a oposi~ao abstracta do individuo it sociedadee igualmente falsa, e porque, desde a sua origem, desdeo seu nascimento, a necessidade social esta inscrita den-tro do proprio individuo.

o ser humano, diz ele, e social geneticamente. Emfeito de tal maneira que a sua propria sobrevivenciaseria impossivel sem os cuidados constantes daquelesque 0 rodeiam, e isso durante muitos anos.

Desta psicologia da crian~a destacam-se alguns gran-des principios pedagogicos.

Wallon denunciou nas doutrinas da nova educa~ao<abrindo uma excep~ao para Decroly) 0 erro que con-~iste em fazer simplesmente a contrapartida dos defei-tos e dos vicios da pedagogia tradicionai. E, alem disso,como estes vicios nao sac os mesmos para todos osreformadores, resulta dai uma diversidade heter6clitade sistemas.

Uns disseram: «0 ensino e autoritario, provem dema-siado do mestre. Portanto, apaguemos 0 mestre.»

Outros pensaram que «0 ensino e demasiado intelec-tuaI. Suprimamos, pois, 0 mais possivel, 0 esfor~o inte-lcctual e fa~amos passar 0 ensino pelas maos, ligando-oa trabalhos manuais».

Outros ainda, declararam: «0 ensino e demasiadodidactico. Deixemos a crian~a descobrir 0 verdade porsi mesma.»

E cada uma destas afirma~oes, levando ao absolutouma verdade parcial, conduziu a urn sistema utopico.As solu~oes propostas podem ter sido muito felizes nassuas aplicdg6es de pormenor, mas sao insuficientes efalsas como sistema geral de educa<;ao.

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A nova educa~ao deve as suas origens de rebeliaocontra as disciplinas autoritarias uma desconfian~a in-superavel em rela~ao a sociedade. Ela esta viciada pelodesacordo (real ou imaginario) existente entre os direi-to!:!da crian~a e 0 meio em que ela esta destinada a vivere de que se procura preeerva-la.

Mas a nova educa~ao permitiu 0 levantamento deproblemas; foi uma etapa necessaria enquanto se esperaurn conhecimento mais cientifico da crian~a, do escolar,da escola. Passamos actualmente do periodo utopico parao periodo cientifico.

o que hoje sabemos da psicologia da crian~a per-mite-nos compreender que nao se pode, de forma alguma,nem apagar 0 mestre, nem suprimir 0 esfor~o puramenteintelectual, nem contar apenas com a espontaneidade doescolar. As solugOes sac muito mais complexas, exigindouma melhor adapta~o da crian~a a escola, uma melhorapropria~o da escola a crian~a, sem pressupor nemoperar uma oposi~ao metafisica entre a natureza e 0

meio, entre 0 individuo e a sociedade.1!: evidente que entre um e outro pode haver contra-

di~6es e conflitos, mas nao se trata de uma oposi~aoabsoluta, uma vez que a sociabilidade faz parte da pro-pria natureza do homem, uma vez que a crian~a temnecessidade da interven~o do adulto e das pressoesdo meio para afirmar a sua pessoa, para desenvolvertodas as suas virtualidades.

tudo, em tudo isto, uma maneira original de pensar aPsicologia e de reformular os sellS problemas. Na ver-dade, 0 metodo de que nos da apHcag5eg magistraisnao e novo. Jr: 0 do materialismo dialectico, ao qual eleconsagrou numerosos comentarios.

Mas ele e 0 primeiro autor desta for~a, desta enver-gadura, que aplicou este metodo ao dominio da Psico-logia (se se colocar de lade a obra de Pavlov). Wallonmostrou-nos, com toda a honeatidade cientifica, comoos principios do metodo mandsta deviam ser aplicados.Nao procedeu de forma dedutiva a partir de um dogma,de uma ideologia. E e por isso mesmo que ele cnou.E e por isso que 0 seu pensamento se imp6e e se imporasempre cada vez mais, mesmo aqueles que nao sao mar-xistas. Nao sac os argument os de autoridade que valem,mas os faetos devidamente estabelecid06.

Nao poderemos esquecer este ponto no respeito quenos merece 0 proprio Wallon e a sua obra.

A sua voz calou-se. Nenhum de nos tera jamaiso direito de falar em seu nome. Ele deixou-nos umamaneira de trabalhar, uma maneira de pensar, num domi-nio que tambem e 0 nost3o.Mas do modo como 0 utili-zarmos so nos teremos a inteira responsabilidade. ~ a, .li~ao que ele nos deu.

E tanto a esta li~iio como ao exemplo da sua vida€ do seu trabalho nos permaneceremos fieis.

Wallon ja nao esta entre n6s, mas 0 seu pensamentoe a sua obra continuam mais vivos que nunCa.

Qual e 0 seu legado? Poucas coisas disse €.U hoje,mas de qualquer modo nao e possivel fazer urn inven-tario definitivo porque se trata de uma heran~a quedad. novos frutos no futuro.

Ele deixa uma nova concep~ao de motricidade, deemotividade, de inteligencia, da genese humana e sobre-

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No decurso dos ultimos trinta anos, a psicologia dacrian~a assumiu uma importancia e uma influencia cres-centes. Afastando-se de certo modo da I>sicologia tradi-cional, contribuiu sobretudo para modificar os seus pon-tos de vista, os seus principios e para a enriquecer commetodos novos. Com efeito, para atingir «a alma dacrian~a», teve de abandonar os quadros abstract os ,emque a introspec~ao do adulto e 0 seu material verbaltinham dividido as actividades psiquicas do homem.A analise puramente ideologica dum conteudo mentaltipo, mas de facto tiio contingente e provisorio quantaneutro e impessoal, teve de substituir observa~6es e ex-periencias sobre as deficiencias realmente em jogo naactividade e na vida das crianl;;as. Tanto as suas inves-tiga~6es podiam ser perturbadas ou falseadas par umacartografia do espirito, cujas limita~6es se fundavamnuma nomenclatura e emconceitos que ignoram as rela-~6es e as mudan~as de que surge 0 acto psiquico, quantoas diferen~as que ela tinha que constatar entre as con-dutas do adulto e as da crian~a, entre as condutas naadiferentes idades da infancia, eram suficientes para reve-lar, de etapa em etapa, 0 verdadeiro plano da vidamental.

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Foram as necessidades da pratka que em primeirolugar fizeram sentir urn desacordo fundamental entre arealidade e os esquemas utilizados para explicar as ope-ra~ psiquicas.

Foram os problemas pedag6gicos que incitaram a pro-curar outros procedimentos para avaliar e utilizar asfor~ e as form as do desenvolvimento psiquico nacrianc;;a. A simples necessidade de avaliar com algumrigor a aptidao ou inaptidao das crianc;;as de escola fezcom que Binet e Simon elaborassem a sua escala metricade inteligencia, que deu ao emprego sistematico dos tes-tes um impulso de que a psicotecnica e hoje em grandeparte a consequencia.

Sem ser propriamente psicologo, urn educador filo-sofo como Dewey, preconizando 0 acordo entre 0 maislivre desenvolvimento de todas as energias em potenciana crianc;;a e 0 meio, abriu 0 caminho nao somente amUltipios ensaios praticos de educac;;ao como tambema investigac;;6es sobre as necessidades de actividade nacrian~ e sobre a influencia que ela sofre dos meiosem que se encontra. Na obra dum Decroly, e dificildistinguir entre a Pedagogia e a Psicologia: a necessi-dade de adaptar as possibilidades e aos interesses dacrian~a 0 objecto dos seus estudos teve como resultadofazer constatar diferen~as importantes entre as manei-ras de perceber ou de compreender da crian~a e do adulto.Foi a volta do Instituto J.-J. Rousseau em Genebra, ondeo objectivo era dar a cada crian~a uma educa~iio ,~surmesure»,_que se agruparam psicologos como Claparede,Bovet, Piaget. A mesma preocupac;;ao de estrito con-fronta entre a crian~a de escola e a crian~a em geralencontra-se em Bourjade, de Lion.

A compara~ao nao se limitou it da crian~a com 0

adulto ou consigo mesma. Procurou tambem no patolo-gico exempl08 de varia~Oes concomitantes, donde pudes-sem deduzir-se rela~Oes de causalidade apliciveis aonormal. Vma alter~o surgida no decorrer do desenvol-vimento que atinja qualquer urn dos seus factores tera

consequencias muito instrutivas, na medida em que po-dera abolir todo um conjunto de func;;oes, au fixa:c 0

comportamento num estadio incompleto, ou suscitarcompensac;;Oesque porao em evidencia rela~6es habitual-mente dificeis de descobrir. Este metodo de confrontopsicopatol6gico, muito aceite em Franc;;a, desde Ribot,nao podia deixar de suscitar importantes trabalhosno dominio da psicologia infantil. Mas deu tambem pre-ciosos resultados noutros paises, especialmente naU. R. S. S., com Gourevitch, Oseretzki e a sua escola.

Por seu lada, a psicologia comparada do homem eGOSanimais saiu das generalidades funcionais para fazerum paralelismo concreto entre a crian~a e 0 animalmais proximo do homem, 0 macaco. Diante das mesmassitua~Oes, das mesmas dificuldades, 0 seu comporta-mento e semelhante ou difere? Se ha semelhan~a inicial,em que idade, em que fase do desenvolvimento sob Que, .influencias e sob que forma se afirmam as diferen~a.s?Entre as primeiras observa~Oes desta natureza, e precisecitar as de Boutan, entre as mais sistematicas e asmais continuas, as de Kellog e de sua esposa. Sem terrealizado um confronto explicito, Paul Guillaume repar-tiu-se entre a psicologia da crian~a e a do macaco.

Mais vaga, mais contesta-vel tambem nas suas velei-dades de assimila~ao, a comparac;;ao da mentalidade in-fantil e da mentalidade primitiva teve pelo menos 0

merito de chamar a aten~o para os efeitos do cresci-mento gradual das aptidoes na crian~a e os que estaoligados a um certo nivel de civiliza~ao, a urn certo mate-rial ideologico, verbal, tecnico. Isso nao e, alias, maisdo que urn grau extremo das influencias que, no desen-volvimento psiquico duma popula~o ou duma frac~aode popul~ao, podem exercer ° seu regime de vida, ° seumeio social. Para ° periodo que estamos a considerar,empreenderam-se tambem estudos a este respeito, emparticular par psic6logos americanos e sovieticos.

As simples observac;;6esdescritivas tem evidentementeurn lugar importante na psicologia da crian~a e princi-

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palmente na da primeira idade. Frequentes interpre-ta~6es construtivas tern sido feitas. As de W. Stern, porexemplo, que tentou mostrar que entre todas a3 mani-festa~5es psiquicas hi uma especie de unidade profunda,uma liga~ao essencial: a personalidade do individuo, sema qual seria impossivel expliei-Ias. As de Koffka, quese esforga por reconhecer as estruturas de que elas saca manifestaGao.

Toda a percep~ao, mas tambem toda a espeeie deconduta, corresponde a uma «forma» que da a todosos pormenores ou elementos 0 seu lugar, 0 seu papel,o seu significado. E 0 conjunto que e determinante, IlaOas partes. Ele varia, nao so com as circunstancias e assitua~oes, mas segundo as predisposi<;oes ou virtuali-dades dinamicas do proprio sujeito e que dependem doscircuit os susceptive is de se abrirem no seu sistema ner-voso, em estreita continuidade tanto com os seus apa-relhos sensoriais como com os seus aparelhos motores.Entre as diferentes idades da crianga e do homem, dife-rem as possibilidades de estruturas.

Os resultados destes diversos metodos levam a dis-tinguir os aspectos por vezes opostos que a vida psiqUlcaapresenta ao longo do seu desenvolvimento. Estes aspec-tos sao etapas cuja ordem de sucessao tern uma impor-tancia primordial, e psicologos como Gesell intentaramreunir metodicamente documentos, naG so descritivoscomo cinematograficos, sobre a diversidade das reacGoes,segundo a idade. Este genero de observa~6es e de impor-tancia essencial. Porque a sucessao prova a existenciaduma filia~ao, muitas vezes complexa, alias, em razaode interferencias variadas, entre diferentes especies defactores. Factores e filia<;ao correspondem ao proprioprincipio da psict>logia infantil, se e verda de que a infan-cia tern na vida do individuo urn valor funcional, comoperiodo em que se acaba de realizar nele 0 tipo de espe-cie. :Ii: este ponto de vista psicogenetico que e adoptadonesta obra.

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A crianc;a nao sabe senao viver a sua infancia.Conhece-la pertence ao adulto. Mas 0 que e que vaiprevalecer neste conhecimento: 0 ponto de vista doadulto ou 0 da crianc;a?

Se 0 homem sempre eomec;ou por se colocar a simesmo entre os objectos do seu conhecimento, atribuin-do-lhes uma existencia e uma actividade conformes aimagem que faz da sua propria existencia e actividade,quanto nao deve ser forte esta tentac;ao a respeito dumser que dele procede e que a ele se deve tornar seme-lhante - a crianc;a, cujo crescimento vigia e orientae a quem muitas vezes the parece muito dificil naoatribuir motivos ou sentiment os eomplementares dosseus. Quantas ocasi5es, quantos pretextos, quantas apa-rentes justificac;oes para 0 seu antropomorfismo espon-taneo! A sua solicitude e um di81ogo em que, por urnesfor~o de intuitiva simpatia, supre as respostaa que naoobtem, em que interpret a os menores indicios, em queere poder completar manifestac;6es lacunares e inconsis-tentes, reduzindo-as a urn sistema de referencias (1),

(1) MUZAFER SHERIF, The Psychology of Social Norms,Nova Iorque, Harpers and Br., 1938l

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que e feito de que? - dos interesses que sabe ser osda crian~a e a que atribui uma consciencia mais oume?os obscura, das predestina~6es cuja promessa gos-tana de encontrar em si, dos habitos, das convenienciasmentais ou sociais com que mais au menos se identi-ficou, e tambem de recorda~6es que imagina tel' guar-dado da sua propria infancia.

Ora, sabemos que as nossas primeiras recorda~6esvariam com a idade em que sao evocadas e que qual-quer recorda~ao se desenvolve em nos sob a influenciada nossa evolu~ao psiquica, das nossas disposi~6es e dassitua~6es. A menos que esteja solidamente enquadradanum conjunto de circunstancias objectivamente determi-naveis, 0 que e raramente 0 caso quando e de origeminfantil, uma recordagao corre 0 risco de ser mais aimagem do presente do que do passado. It assim, assi-milando-a a si, que 0 adulto pretende penetrar na almada crian~a.

E contudo, entre si e a crianga, ele reconhece dife-ren~as. Mas redu-Ias a maior parte das vezes a umasubtrac~ao: sac diferengas de grau ou quantitativas.Comparando a crianga a si proprio, ve-a, relativa outotalmente, inapta em relagao as ac~6es ou tarefas queele proprio pode executaI'. Sem duvida, estas inaptid6espodem dar lugar a medidas que, convenientemente reu-nidas, poderao pOI' em evidencia propor~oes e uma con-figura~ao psiquica diferentes na crian~a e no adulto.Neste caso, tomarao urn significado positivo. Mas nempOI' isso a crian~a deixa de ser menos uma simplesredu~ao do adulto.

A subtrac~ao pode, no entanto, operar-se de maneiram.ais qualitativa, se as sucessivas diferengas de aptid6esque apresenta a crian~a forem reunidas ern sistemase se a cada sistema for atribuido urn determinado pe_riodo do crescimento. Tratar-se-a, entao, de etapas oude estadios a cada urn dos quais correspondera urn certoconjunto de aptidoes ou de caracteres que a crian~a tleveadquirir para tomar-se adulto. 0 adolescente seria assim

o adulto a quem faltaria 0 estadio mais recente do seudesenvolvimento, e assim par diante, subindo de idadeem idade, ate a primeira infancia.

Porem, pOI' mais especificos que possam parecer osefeitos proprios de cada etapa, continua a haver, nestahipotese, caracteres que se juntam a outros para reali-zarem 0 adulto; e a progressao permanece ainda essen-cialmente quantitativa.

o egocentrismo do adulto pode, enfim, manifestar-seatraves da sua convic~ao de que toda a evolu~ao mentaltern pol' termo ineluta vel as suas proprias maneiras desentiI' e de pensar, as do seu meio e da sua epoca.Se, pOI' outro lado, Ihe acontece reconhecer que as dacrian~a sac especificamente diferentes das suas, entaonao tern outra alternativa senao considera-las como umaaberra~ao. Aberra~ao constante, sem duvida, e pol' estarazao tao necessaria, tao normal, como 0 seu propriosistema ideo16gico; aberra~ao cujo mecanisme e neces-sario procurar demonstrar.

Entretanto, uma questao preliminar se poe: a darealidade desta aberragao. ~ verdade que a mentalidadeda crian~a e a do adulto sao heteronomas? Que a pas-sagem de uma a outra pressupoe uma conversao total?Que os principios aos quais 0 adulto julga estar ligadoo seu proprio pensamento sac uma norma imutavel einflexivel que permite rejeitar 0 pensamento da crian~acomo irracional? Que as conclusoes intelectuais dacrian~a nao tern nenhuma rela~ao com as do adulto?E a inteligencia do adulto teria podido permanecerfecunda se tivesse realmente que se desviar das fontesdonde brota a da crian~?

Uma outra atitude poderia consistir em observara crian~a no seu desenvolvimento, tomando-a pol' pontode partida, acompanhando-a ao longo das suas suces-sivas idades e estudando os estadios correspondentes,sem os submeter a censura previa das nossas defini~oes16gicas. Para quem os considera cada urn na sua tota-lidade, a sua sucessao aparece como descontinua; a pas-

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sagem de um a outro nao e uma simples amplifica~o,mas urna modifica~ao; actividades preponderantes noprimeiro sao reduzidas e por vezes suprimidas aparen-temente no seguinte. Entre os dois, parece surgir muitasvezes urna crise de que a conduta da crian~a pode servisivelmente afectada. 0 crescimento e portanto assi-nalado por conflitos, como se fosse preciso escolherentre urn antigo e urn novo tipo de activi<iade. 0 quese sujeita a lei do outro tem que se transformar, e perdeem seguida 0 poder de regular utilmente 0 comporta-mento do individuo. Mas a maneira como 0 conflitose resolve nao e absoluta nem necessariamente uniformeem todos. E em cada um deixa a sua marca.

Destes conflitos, alguns foram resolvidos pela espe-cie, 0 que significa que 0 simples facto do seu cresci-mento leva 0 indivfduo a resolve-Ios tambem. Para darum exemplo, 0 sistema motor do homem apresenta umaestratificactao de actividades cujos centros se organizama volta do eixo cerebro-espinal pela ordem do seu apa-recimento ao longo da evolu~ao. Elas entram sucessi-vamente em jogo durante a primeira infancia, aproxi-madamente na forma em que se VaG poder integrarnos sistemas que as acompanharam e que as modifica-ram, de tal modo que 0 seu exercicio isolado ja naopode dar senao efeitos parciais e a maior parte dasvezes inuteis. Mais tarde, porem, se acontece que umainfluencia patologica as faz escapar ao controlo dasfungOes que as tinham englobado, enta~ 0 obstaculo queelas lhes opoem demonstra a existencia do confUto la-tente que entre as mesmas existia. Ainda no estadonormal, alias, a integra~ao pode ser mais ou menosestrita entre as diferentes aparelhos do orgao motor.Dai a grande diversidade das complexOes motor as. Mase no dominio das functoes psicomotoras e psiquicas quemuitas vezes ela e mais imprecisa, de tal modo que 0conflito nunca esm completamente resolvido: assim,entre a em0ctaOe a actividade intelectual, que corres-pondem manifestamente a duas categorias distintas de

centros nervosos e a duas eta pas sucessivas da evolugaomental.

Para outros confUtos, pertence ao proprio individuoresolve-Ios. Por vezes 0 seu objecto e de uma impomnciatiio fundamental que uma unica solu~ao e normal; poroutras, pelo contrario, e mais contingente e a solu~aomais facultativa.

Elevando-os a uma especie de generalidade mftica,Freud redu-Ios essencialmente a um conflito entre 0 ins-tinto da especie que em cada um se traduz pelo desejosexuSiI ou libido, e as exigencias da vida em sociedade.Recalcamentos de uma parte, subterfugios de outra, parailudir a vigUancia da censura, faraD da vida psiquicaum drama continuo. Toda a evolu~ao mental da crian~asera comandada pelas fix~5es sucessivas do libido sabreos objectos ao seu alcance. Ela tera portanto que se Hber-tar dos primeiros para progredir em direc~o a outros.Escolha que nao se faz sem sofrimentos, sem queixas,nem sem eventuais regressoes. Escolha que, alias, naoe necessario imputar ao instinto sexual e de que se obser-yam indfcios na crian~a. Apesar da escolha, nada do quese abandona e destruido, nada mesmo do que e supe-rado fica sem ac~o. A cada etapa vencida, a crian~adeixa atras de si possibilidades que nao estao mortas.

A realiza~ao pela crian~a do adulto em que devetornar-se nao segue, pois, um caminho linear, sem bifur-cagOes ou desvios. As orienta~oes mestras a que normal-mente obedece nao BaO menos uma ocasiao frequentede incertezas e de hesitagOes. Mas quantas outras oca-sioes mais fortuitas vem tamoom obriga-Ia a escolherentre 0 esfor~ ea renuncia! Elas surgem do meio-meio das pessoas e meio das coisas. A mae, os amigos,os encontros habituais ou insolitos, a escola: outrostantos oontactos, relagoes e estruturas diversas, insti-tuigOes atraves das quais a crianga, quer queira quernao, deve inserir-se na sociedade. A linguagem entrep3eentre ela e os seus desejos, entre ela e as pessoas, umobsmculo ou um instrumento que pode ser tentado ou

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a evitar, ou a veneer. Os objectos e, em primeiro lugar,os que the estao mais proximos, os objectos fabricados,a bola, a colher, 0 bacio, os fatos, a electricidade a radioas t.ecn,icas mais antigas como as mais recentes 'sao par~ela mcomodo, problema ou ajuda, repelem-na ou atraem--na e modelam a sua actividade.

11';,no fim de contas, 0 mundo dos adultos que 0 meiolhe impoe e dai resulta, em cada epoca, uma certa uni-formidade de forma~ao mental. Mas isso nao significaque 0 adulto tenha 0 direito de nao reconhecer nacrian~a senao aquilo que ele proprio the inculca. E, emprimeiro lugar, a maneira como a crianQa assimila essemundo pode nao tel' nenhuma scmelhanQa com a maneiracomo 0 adulto pOl' sua vez 0 utiliza. Se 0 adulto ultra-passa a crianQa, a crianQa a sua maneira ultrapassao adulto. Ela possui disponibilidades psiquicas que urnoutro meio utilizaria de outro modo. Muitas dificuldadescolectivamente vencidas pelos grupos sociais permitiramja que muitas delas se manifestassem. Com a ajuda dacivilizaQao, nao estarao em potencia na crianQa outrosdesenvolvimentos da razao e da sensibilidade?

Enquanto vastos dominios do conhecimento virama experimenta~ao suplantar a simples observaQao, 0

papel desta mantem-se preponderante em muitos cam-pos da Psicologia. Foi da experimenta~ao que nascerama Fisica e a Quimica. Em Biologia, ela continua a alar-gar 0 seu campo de ac~ao e a Fisiologia pertence-lhequase completamente. A imita~ao da Fisiologia, criou-setambem uma psicologia experimental. Mas a psicologiada infancia, ou pelo menos a da primeira infancia, de-pende quase exclusivamente da observa~ao.

Experimental' e realizar certas condi~oes nas quaisse devem produzir certos efeitos, e pelo menos intro-duzir nas condi~oes uma modifica~ao conhecida e anotaras modifica~Oes correspondentes do efeito. Deste modopoder-se-a comparar 0 efeito a sua causa e medi-los urnpelo outro. Alias nao e necessario intervir na produ~aodo proprio efeito; pode ser suficiente modificar as con-di~Oes da observa~ao. Assim, os objectos que r.os naoatingimos, como os astros, podem dar lugar a verdadei-ras experiencias fisico-quimicas, utilizando a espectros-copia ou a fotografia.

Supondo resolvidas as dificuldades tecnicas da expe.rimenta~ao, apenas ficariam fora do seu akance os objec-

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tos dos quais fosse impossive! modificar as condi~6es,quer de existencia quer de observa~ao, sem que portalmotivo deixassem de existir. Tal seria 0 caso daquelesconjuntos em que e 0 conjunto na sua integridade origi-nal que constitui 0 facto a estudar. Poder-se-iam encon-trar numerosos exemplos destes em Psicologia ou emBiologia.

Mas a contrapartida e que 0 conjunto deve poder serefectivamente apreendido solidariamente em todas 'lS

suas partes. POI' este facto, a primeira infancia e, fiemqualquer duvida, um objecto de escolha para observa~aopura. Ate aos 3 ou 4 anos, a crian~a pode estar l1laisfacilmente a. disposi~8oo do proprio observador. Assim,todas as circunstancias da sua vida e do seu compor-tamento ser800 anotadas. Foi 0 que se esforc;aram pOI'fazer autores como Preyer, Perez, Major, W. Stern,Decroly, Dearborn, Shinn, Scupin, Cramaussel, P. Guil-laume. Dns, como Preyer, publicaram 0 conjunto cTassuas observa~5es, sen800sob a forma de diario continuo,pelo menos agrupando-as em rubricas muito gerais.Outros, como W. Stern, extrairam delas mO::1ografiasrespeitantes a quest5es particulares. Alguns parecemtambem tel' limitado as suas observa<;5es aos dadosde certos problemas, acompanhando todavia a existcnciatotal da crian~a. Estes trabalhos continuam a ser a fontemais preciosa para 0 estudo da primeira idade.

A partir dos 4 anos, faltam completamentc estudosdesta natureza. Sendo apenas fragmentarias as obser-va~5es recolhidas, trata-se de constituir os conjuntosonde possam receber 0 seu significado. Assim se elabo-raram metodos que procedem da observa~8oo pura, masque devem ultrapassa-la e que se julgam prolongar aexperimenta~8oo, cujo objectivo essencial, como alias detodo 0 conhecimento, e pOr em evidencia uma determi-nada rela~8oo.0 experimentador reconstroi esta rela~8ooou .submete-a a varia~6es que permitem isolar do restoos termos que ela une. Quando esta proibida qualquerac~8oo sobre ela, ja n800 resta sen800 ten tar constatar

as suas varia~6es espontaneas ou acidentais. Mas paraas reconhecer e precise compara-Ias a uma norma, redu-zl-las a urn sistema determinado de referencias. A normapode, entre outras coisas, consistir em confrontar osdesvios patologicos com 0 estado normal. 0 sistemade referencias pode ser dado pOl' estatisticas rcsultantesde compara~5es desenvolvidas.

De qualquer modo, llma observagiio nao pode seridentificada como tal, a nao ser que se enquadre numconjunto donde receba 0 seu sentido e inclusivamel1tea sua formula. Necessidade t800fundamental que obrigaa voltar a. chamada observag8oo pura e 2. examinar pOl'que mecanisme e sob que condic;oes cIa se pode torrLarurn meio de conhecimento.

Para falar com propriedade, nao ha nenhuma ob:::er-va~8ooque seja urn decalque exacto e completo da reali-dade. Supondo, alias, que existissem observa~5es dessanatureza, 0 trabalho de observaC;8ooestaria ainda total-mente por empreender. Embora, por exemplo, 0 registocinematografico de uma cena corresponda ja a uma esco-lha frequentemente muito avan~ada - a escolha da pro-pria cena, do momento, do ponto de vista, etc. - esomente sobre 0 filme - cujo mcrito e tornar perm a-nente uma continuaC;8oode pormenores que ao espectadormais atento teriam' escap,ado e aos quais pode voltara. vontade - que vai poder come~ar 0 trabalho directode observa~8oo.

N800ha observa~8oo sem escolha nem sem uma rela~8oo,implicita ou n8oo.A escolha e comandada pelas relac;oesque podem existir entre 0 objecto ou 0 acontecimentoe a nossa expectativa, isto e, 0 nosso desejo, a nos sahip6tese ou mesmo os nossos simples habitos mentais.As suas raz5es podem ser conscientes ou intencionais,mas podem tambem escapar-nos, porque se confundem,antes de l11ais,com 0 nosso poder de formula~8oo mental.S6 podem ser escolhidas as circunstancias que sac pOI'

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si mesmas exprlmlveis. E para as exprimir precisamosde reduzi-Ias a qualquer coisa que nos seja familiar auinteligivel, a tabela de referencias de que nos servimos,quer de proposito quer sem 0 saber.

A grande dificuldade da observa<.;ao pura como ins-trumento de conhecimento consiste em que usamos umatabela de referencia, a maior parte das vezes sem 0 saber-mos, de tal modo 0 seu emprego e irracional, instintivo,indispensavel. Quando experimentamos, 0 proprio dispo-sitivo da experiencia opera a transposi<.;ao do facto parao sistema que permitira interpreta-Io. Se se trata deobserva<.;ao, a formula que damos aos factos correspondemuitas vezes as nossas rela<.;6es mais subjectivas coma realidade, as ncx;6es praticas que para nos utilizamosna nossa vida corrente.

Deste modo, e muito dificH observar a crian<.;a semlhe emprestar alguma coisa dos nossos sentimentos oudas nossas inten<.;oes. Urn movimento nao e urn movi-mento, mas aquilo que ele parece exprimir-nos. E, amenos que estejamos muito habituados a agir em con-trario, e 0 significado suposto que registamos, deixandomais ou menos de indicar 0 proprio gesto.

Todo 0 esfor<.;ode conhecimento e de interpreta<.;aocientifica consistiu sempre em substituir 0 que e refe-rencia instintiva ou egocentrica por uma outra tabelacujos termos sejam objectivamente definidos. Tern acon-tecido, alias muitas vezes, que, tiradas de sistemas deconhecimento anteriormente constituidos, estas tabelasse tenham revelado insuficientes para a ordem nova dosfactos em estudo; acontece, assim, em Psicologia, comreferencias tiradas da Anatomia, supondo-se toda a ma-nifesta<.;iio mental devida a actividade dum certo orgaoou dum certo elemento de orgao. Importa, portanto,em primeiro lugar, definir para todo 0 objecto de obser-va<.;ao qual e a tabela de referencia que correspondeao objectivo da investiga<.;ao.

Para quem estuda a crian<.;a, e incontestavelmentea cronologia do seu desenvolvimento. Todos os ooser-vadores tiveram 0 cuidado de anotar, para cada urndos factos que registam, a idade da crian<.;a em mesesc em dias, como se admitissem que a ordem pela qualaparecem as sucessivas manifesta<.;6es da sua actividadetern uma especie de valor explicativo. E a experienciatern efectivamente verificado que esse valor e 0 mesmode uma crian<.;apara outra. As interven<.;6es que as vezesse verificam nao ultrapassariam, segundo a Sr." Shirley,que seguiu minuciosamente 0 desenvolvimento de viutee cinco crian<.;as pequenas, os 12 '70 dos casas, e sobre-tudo nunca dizem respeito senao a duas aquisi~6es ime-diatamente consecutivas. Somente mais tarde se podemobservar, entre actividades fortemente diferenciadas,casos de precocidade ou de atraso parciais.

A diferen<.;adas reac<.;6esconforme a idade foi postaem evidencia de maneira surpreendente por Gesell, atra-yes do cinema. Sendo proposto a crianc;a 0 mesmoteste de seman.a a semana, ou de mes a mes, pOl' exem-plo, a apresenta<.;ao do mesmo objecto a mesma distancia,a justaposi<.;ao dos seus comportamentos sucessivos, mos-tra as transforma<.;6es rapidas e muitas veres radicaisoperadas em razao do tempo decorrido. No entanto,varios observadores constataram nesta acc;ao do tempo,que implica a propria noc;ao de desenvolvimento ou deevolu<.;ao-ligada tambem ela ao papel que a infanciadesempenha na vida -, exceMoes pelo menos aparentes,cujo exame deve permitir compreender melhor as con-dic;oes e 0 significado dos progressos em vias de reali-zac;ao. Ora surge uma reac~ao nova, sem durac;ao e queso reaparece algumas semanas mais tarde, ora umaaquisi~ao ja antiga parece desaparecer no momento emque a actividade da crianc;a entra num novo dominio.Entre <0 decurso do tempo e 0 do desenvolvimento psi-quico manifestar-se-iam, por conseguinte, discordancias.

Em presenc;a do primeiro casa, certos observadorescomo Preyer comec;aram por interrogar-se se a sua

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descr~<.;aonao teria sido logo de inicio deformada poruma mterpreta<.;ao que se antecipava ao acontecimento.Mas a experiencia tern mostrado que a antecipa<.;ao estamuitas vezes nos proprios factos. Toda a reac<.;ao,explicaKoffka, e urn conjunto cuja unidade pode agrupar partesou condi<.;oesmais ou menos diversas e intercambiaveis.Estas condi<.;oes sao, em propor<.;ao variavel, circuns-tancias externas e disposi<.;5es internas. Quanto maiorfor 0 numero das circunstancias externas, maJOr e 0 riscoda sua realiza<.;ao simultanea ser acidental. Pelo con-trano, quanta mais aumentam as disposi<.;oes intimas,tanto mais a sua contribui<.;iio tende a tornar-se urn todohomogeneo, que se vai encontrar a disposi<.;aoconstantedo sujeito. E precisamente neste senti do que seguem osprogressos da organiza<.;ao atraves das especies animais.o seu comportamento, pelo menos na sua forma,' dependesempre mais de determinantes internas, e em propor<.;ao,deixa de ser comandado imediatamente pelas influenciasdo meio exterior.

Os progressos de organiza<.;ao que correspondem aoperiodo da infancia tern necessariamente' por efeito res-tabelecer as estruturas ancestrais que asseguram aoindividuo a plena posse dos meios de ac<.;ao propriosda especie. E, alias, urn processo que prolonga a activi-dade de cada urn: toda a aprendizagem, toda a aqui-si<.;aode habitos, tende a reduzir a influencia das situ a-<.;oesexternas a de simples signos, executando-se 0 actoconsecutivo como pOl' si mesmo pela entrada em jogode estruturas intimas, que suo 0 efeito da aprendizagem.

A esta explica<.;ao seria necessario acrescentar quea antecipa<.;ao funcional nao e urn simples acidente,mesmo frequente, mas que ela parece ser a regra. E urnfenomeno constante que reac<.;oesnovas sofram urn longoeclipse depois de se terem manifestado que I' uma quermesmo varias vezes durante urn curto periodo. Naoparece portanto suficiente imputar 0 facto unicamenteao concurso favoravel de circunstancias externas. E maisverosimil que em muitos casos 0 primeiro aparecimento

dum gesto ou dum acto resulte de factores sobretudointernos. A diversidade destes e, com efeito, maior doque muitas vezes supomos. Os mecanismos de execu<.;aosaG apenas uma parte deles. 0 que os desencadeia resultade disponibilidades ou de orienta<.;oes energeticas que pol'sua vez tern tambem os seus periodos. Intervem, alemdisso, interesses de natureza muito diversa. POl' exem-plo, a novidade da impressao que um gesto executadopela primeira vez faz experimental' pode ser suficientepara mobilizar durante algum tempo, com vista a suarepeti<.;ao,urn somatorio de energia que ja nao se poderaencontrar quando 0 atractivo se tornar menor. Essa ener-gia desaparecera, portanto, provisoriamente. A falta decoesao entre os factores intimos duma reac<.;ao explicaa irregularidade que esta apresenta para come<.;ar,mesmoem presen<.;a da excita<.;ao apropriada. E preciso tambemconsiderar que 0 limiar duma reac<.;iio no seu inicio eelevado e que, para se produzir, ela exige uma estimu-la<.;aomais energica ou uma quantidade de energia maiscOllsideravel do que na fase em que 0 mesmo limiarse encontra abaixado pela matura<.;ao funcional ou pelaaprendizagem.

A perda de uma aquisi<.;iioja antiga e urn facto dumafrequencia suficiente para ter sido assinalada pol' variosautores. A explica<.;ao que disso dao W. Stern e depoisPiaget e quase semelhante. A mesma opera<.;ao mentalapresenta diferentes niveis entre os quais se fa7. a pas-sagem sempre na mesma ordem no decorrer da evolu~aopsiquica. As condi<.;oesem que a opera<.;ao se deve pro-duzir podem opor-lhe graus de dificuldade muito varia-veis. Se a dificuldade aumenta, a opera~ao corre 0 riscode se fazer a urn myel mais baixo. Assim, no mesmoindividuo, na mesma idade, a mesma opera~o e suscep-tivel de se executar a diversos niveis. Urn exemplo dadopOl' W. Stern e a prova que consiste em descreveruma imagem, quer olhando-a quer depois de a tel'olhado. Na forma das duas descri<.;5es, pode observar-se,

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segundo a idade da crianQa, uma discordancia de urnou dois graus.

o exemplo de Piaget diz respeito a no~6es, comoa de causalidade, das quais as vezes a crianQa sabefazer urn usa objectivo na pnitica quotidiana da vida,enquanto nas suas explicaQ6es, isto e, num «plano ver-ba!», regressa a tipos de causalidade muito mais subjec-tivos, causalidade voluntarista ou afectiva.

A actividade mental nao se desenvolve num (micoe mesmo plano por uma especie de crescimento continuo.Evolui de sistema para sistema. Sendo diferente a suaestrutura, segue-se que nao ha resultado que se possatransmitir tal e qual de urn para cutro. Urn resultadoque reaparece em ligaQao cern urn novo modo de activi-dade ja nao existe da mesma maneira. 0 que 'importanao e a materialidade de urn gesto, mas sim 0 sistemaao qual pertence no instante em que se manifesta.

o mesmo fenomeno pode ser na crianQa que apenasbalbucia 0 simples efeito dos seus exercicios sensorio--motores e, mais tarde, a silaba duma palavra que seesforQa por pronunciar correctamente. Entre os doisintercala-se urn periodo de aprendizagem. A necessidadede reaprender 0 som que se tinha tornado familiar noperiodo sensorio-motor, quando se torna urn elementoda linguagem, faz-se bem sentir a quem quer que expe-rimente falar uma lingua estrangeira, cujos fonemasnao SaG todos como os que teve ocasiao de fixar aoaprender a sua propria lingua materna. A dificuldadede articulaQao pode ate nunca ser completamente ven-cida, se a reaprendizagem se fizer numa idade dema-siado tardia.

Inversamente, sob as aparencias da mesma palavra,o acto mental pode pertencer a dois nlveis diferentesde actividade. E 0 que explica que certos afasicos sejamao mesmo tempo capazes e incapazes de utilizar urnmesmo vocabulo conforme ele pertenQa a uma excla-maQao afediva ou deva entrar na enunciaQao objectivade urn facto.

A linguagem de urn adulto normal comporta umasobreposiQao de pIanos entre os quais nao deixa de sefazer a passagem sem ele dar por isso. A doenQa podefazer desaparecer alguns deles, e a crianQa nao passade urn para outro senao sucessivamente.

A linguagem, porem, e apenas urn exemplo da leique regula a aquisiQao de todas as nossas actividades.As mais elementares integram-se, ora modificadas orasob 0 mesmo aspecto, noutras, atraves das quais aumen-tam gradualmente os nossos meios objectivos de relaGaocom 0 meio. 0 observador deve, pois, evitar atribuiraos gestos da crianQa 0 pIeno significado que poderiamter no adulto. Seja qual for a sua aparente identidade,nao the deve reconhecer outro valor senao aquele quepode ser justificado pelo comportamento actual do su-jeito. 0 da crianQa e, em cada idade, dum tipo quecorresponde aos limites das suas aptid6es, e 0 do adultoe, por sua vez, ern cada momentc, rodeado num cortejode circunstancias que permitem determinar a que nivelda vida mental ele se realiza. Estar atento a esta diver-sidade de significados e uma das principais dificuldades,mas uma condiQao essencial da observaQao cientifica.

Se 0 metodo de observaQao nao pode deixar de terem conta as variaQOes a encontrar no efeito quandomudam as condiQoes, 0 estudo dos casos patologicosfornece uma ocasiao para discernir algumas destas va-riaQOes que a doen~a torn a mais aparentes e, em certamedida, pode suprir a experimentaQao, quando e impos"sivel recorrer a ela para as por artificialmente emevidencia.

As relaQOes entre a Patologia e a experimentaQaoimpuseram-se a atenQao dos psicologos franceses, dequem durante muito tempo inspiraram a maior partedos trabalhos, sob a influencia de Claude Bernard, quedefinia a Fisiologia como uma «medicina experimental»,

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entendenuo pOl' isso que 0 fisiologo devia procurarreproduzir OS cfeitos da dO€n~a at raves da repl'odugao,num organismo sao, da sua suposta causa. Urn meiodirecto de verificar a exactidao das suas hipoteses.

Esta pnltica admitia, pOl' urn lado, que 0 estadode satide e 0 est ado de doen~a estao submetidos asmesmas leis biologicas e que nada ha a mudar senaocertas condi~oes da experiencia, aquelas precisamentecujo efeito sc tl'ata de determinar. POl' outro, exigia,pOl' razoes de humanidade, que a verifica~ao pudesseprosseguir-se noutros organism os que nao 0 do homem.

Ribot e os seus alunos adoptaram 0 postulado, masnao puderam realizar a transferencia da experienc.ia,visto que a maior parte dos factos a estudar pertcnceunicamente a psicologia do homem. Ao contnlrio deCl. Bernard, que operava no experimental, eles operaramno patologico. POl' isso mesmo perdiam a vantagem daverifica~ao expeditiva que Cl. Bernard tinha procuraoo,e voltavam a necessidade de instituir, conforme os encon-tros da clinica, minuciosas e pOl' vezes incertas compa-ra~6es entre casos aproximadamente semelhantes.

Este inconveniente nao foi talvez para eles tao iDle-diatamente evidente como 0 e para nos. Porque era aepoca em que prosperavam as experiencias S'obre a his-teria, que efectivamente tiveram urn grande lugar nostrabalhos dos primeiros psicopatologistas. Os efeitoscada dia mais surpreendentes que the eram atribuidosdavam a ilusao de que, provocando-os, se tornava pos-sivel chegar a atingir a sua causa e explorar assim todoo mecanisme da vida psiquica. Verifica~ao demasiadofacil das hipoteses mais arbitrarias, dado que eram umresultado directo ou da sugestao ou da simu1a~ao.

Contrariamente a histeria, a doutrina organicistamantinha uma ilusao, apesar de tudo bastante seme-lhante. Identificando cada manifesta~ao psiquica com 0

jogo de urn certo orgao, tambem ela admitia a possibili-dade de ana}isar a vida psiquica, efeito pOl' efeito, fun~ao

pol' fun~3.o. Concep~3.o reconhecida depois como inade-quada aos factos. As consequencias duma lesao naG seresolvem puma simples subtrac~ao funcional. Traduzem, f ,::C-o

sim, --uma reac«ao conforme a~ poS'sibili~ades deixadas :.-UIC I J.

intactas ou libertadas pela lesao. Elas sao 0 comporta- (h; •

-;'ento compatiyel com as mudan~as da situa<;ao interna. ii""0-

~3-.~9,~~()~o-!, 031._pr_o.~z:e~s~os,sly. ~cJi~n~a nao _§3.9~~~~~~/,y..>fu~Q~g~ fUPJ,;~e3'0 comportamento. cl.ecada idade e um sistema em que eada uma das ac~-dades ia nossiveis concorre com todas as outras, re(;e-

-~~v~ndo do conjunto 0 seu papel. 0 interesse da psicopa-tologia para 0 estudo da crian~a consiste em pOl' melhorem evidencia os diferentes tipos de comportamento. Por-que 0 ritmo duma evolu~ao mental e, na primeira infan-cia, ta~ precipitado que acontece serem dificilmenteidentificaveis no estado puro, visto as suas manifesta-~i5es se sobreporem de um tipo para outro.

Pelo contrario, uma perturba~ao de crescimento naosomente retard a a evolu~ao como pode tambem travar--lhe 0 desenvolvimento a urn certo nivel. Entao todasas reac<;Oes vem alinhar-se num tinico tipo de compo'!"-tamento, cujas possibilidades realizam completamente,pOl' vezes mesmo com uma especie de perfei<;ao que naopode ser atingida quando se encontram gradualmenteincorporadas a reac<;oes de urn nivel mais elevado. Tenhosempre constatado que uma demasiada virtuosidade par-cial e de mau prognostico para 0 desenvolvimento ulte-rior da crian<;a: porque e 0 indice duma fun<;ao que voltaindefinidamente sobre si mesma, pOl' falta dum sistemamais complexo de actividade que a venha utilizar paz:a

• • , I I II Ifir. '.rO., (f)..' r:J,outros fms e mtegra-Ia (1).-~(.A)'\ '"" " "II 0 ' 0

Ao mesmo tempo que cada fase duma evolu<;ao irun-cada ~ assim encontrar-se despojada de todos ostra~~_que the saQ estranhos, 0 S~~ e?tre a ~oe~aoWima do comportamento (va sua incoerencia pratic~torna-se impr.e~~~()!1apte. Se este comportamento esta

1 .- .•.••.•.••.-' ..••...••....•~-,~ ~.-

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muitas vezes relacionado com circunstancias exteriores,a verdade e que corresponde mal ou de modo algum asexigencias do meio. ~~~~bs~ vai permitir com-preender melhor que especies de pr~ressos seriam indrs-pensaveis para permitii uma' vida normal. 0 regime de

I ~ vida e comandado po!' condi<;6es' que' o-_meio/soCia~Jl~~I transformar. A rela<;ao entre essas condi<;6es e 0 desen-volvimento psiquico e urn dos seus factores essenciais.E portanto necessario comparar a.§ aptid6es sucessivas

I,' ,. j oJ:!~ssoais d'§:3rianQ.§, ~~os objectos e os obsticulos'" ') ,qu,e.~~2..dev~m ou odem encontr~ e em seguida regis-'. I

ri I tar como se faz a adapta<;ao.

, I' I Decroly recomendava que se considerasse, para cadacrian<;a anormal, aual 0 regime de vida que the era ou

f ~ II r f~·V 'L,/\ \. '\J\..../\..."\.... '\. '"/\./VV-""

lh_e poderia tornar-se acessivel. 0 mesmo problema se;'1 (

1 [ii, ' poe para melhor conhecer e melhor dirigir a crian<;anorIlfal.

Urn outro rr::eiode compara<;ao, cujo objectivo e quasesemelhante, e 0-queutiIIza·~aEs.tatistica. Em vez dese considerar directamente 0 individuo e as suas condi-<;6es de existencia, ele e comparado ao grupo dos queestao nas mesmas condi<;6es. ~_~<?mparil:9~2-incide, evi-dentemente, sQ!:?,reurn tra~ bem determinado. Trata-sede anotar as 'varia<;6es deste t--ra~o n'o-~~~J~~to do gl'UpOe de classificar cada individuo em rela<;ao ao grupointeiro. Num grupo de individuos da mesma idade, aposi<;ao que cada urn ocupa entre os outros indicarase, relativamente ao tra<;o considerado, ele esta ematraso, na media, ou adiantado em rela<;ao aos da ~maidade. Mas 0 principio do agrupamento pode ser dife-rente: na~ionalidade, I?~i~_s<?~~al,c~I!..di~e v.~sou IE~.!!ospar:ticul.f!:!:.~~.E assim a compara<;ao do meamotra<;o em grupos diversos e em diferentes tipos de gruposvai permitir reconhecer que factores influem no seu apa-recimento, desaparecimento e eventuais varia<;6es.

I -~L~~ ~9:e, portanto, d,?-r I~Kar a ~sd~ compara<;6es: (3.) de cada individuo em rela<;ao a l:manorma, que ~ dad a pelo conjunto dos resultados obtidos

IN,::!;;,.","". 'rJ".,t.'>", I .~,

/ (2) . _nas essoas da meSilla categoria que ele; a das condl<;oes!:Blf!:..~~vasa cada categoria com 0 efeito estudado. Naosendo ja 0 termo de referencia uma observa<;ao ou umaexperiencia individual, mas uma pluralidade de casasindividuais, ~,.p.1'~ci_~Q_eliminar dest.a _.pluralidade 0 queamea<;a .falseJl.r-lhe 0 justa ~uili.!;>LiQ:..Esta garantia so·pode ser obtida respeitando as condir;6es que 0 ~ls!:!J.~das probabilidades permitiu determinar. E pOl' ele que~se rege 0 estabelecimento das normas e a utilizagaodas compara<;6es proprias deste metodo (1).

o tra<;o estudado pode ser urn efeito natural, como'0 tamanho da crian~a. Mas acontece tambem, comoquando se trata de uma aptidao, que pode ser necessariopaolo em evidencia atraves de uma prova ou teste. A apti-dao sera definida pelo teste,' mas unicamente porqueo proprio teste tera side previamente calculado com basena aptidao. E a garantia desta exacta correspondenciae dada precisamente pelo calculo das probabilidades.A percentagem dos exitos obtidos com individuos dequem praticamente se conhece que apresentam essa apti-dao deve ser substancialmente superior a que apresentamquaisquer outros individuos. Se se trata de conhecer 0

desenvolvimento duma aptidao conforme a idade, a com-para<;ao far-se-a entre 0 numero de exitos em duas idadesconsecutivas.

o teste e da observa<;ao provocada e, nesta q1l8li- _ 'Idade, e uma experiencia. 0 que, no entanto, 0 distingue I (i r

duma experiencia propriamente dita e que entre os dois f r; ,ha uma ili.vergencia de referencia e de~\?)A expe-riencia vale pela sua estrutura, pela exacta rela<;ao dassuas partes; 0 seu resultado depende das condi<;6es rea-lizadas; as suas referencias encontram-se numa situa<;aodefinida, que podeser mais ou menos complexa. 0 teste,pelo contrario, e urn indice cujo significado se baseia

(1) Ver BOREL e DELTHEIL, Probabilites, ETTeurs (Col,Armand Oolin, n.O 34); H. WALLON, Prirncipes de psychologieappliquee, 2," parte (Col, Armand Colin).

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--;'it /" . '7 ~t9/ v/t/~

na sua frequencla relatlva atraves de grupos deUnidos.:h: nestes que esta a estrutura e nao no teste. Se eletivesse uma, mesmo que foss"€ composta de elementosheterogeneos, as comparaQoes de que e instrumento tor-n.ar-se-iam ambiguas e as manipulaQ6es estatisticas pode-r~am revelar anomalias nos seus resultados. Em princi-plO, portanto, deve ser 0 mais depurado possive!. As suasreferencias encontram-se fora dele: no conjunto doscasos em que e experimentado.

. Certamente 0 metodo estatlstico e 0 metodo expe-nmental podem mais ou men os interferir a titulo decontrolo mutuo. Mas as objecQ6es que a urn ou a outrotern sido dirigidas provem muitas vezes do facto de elesnao terem sido suficientemente distinguidos. Existemem Psicologia provas que nao sac testes e cujos resul-tados sac dos mais uteis; sac experiencias mais oumenos complexas cuja prova esta nelas pr6prias. Seriaabsurdo objectar-Ihes que nao se podem justificar pelamesma especie de garantias dos testes. Inversamente,nao se justifica reprovar os testes pela sua abstractasimplicidade.

por uma dependencia comum em relaQao a circunstanciasestranhas, uma concordancia cujo limite ultra passe asprobabilidades do simples acaso pode ser indicio dumaligaQao funcional entre as duas aptidoes postas em corre-laQao. Ela corresponded, portanto, a urn elemento deestrutura. Mas encadear esses elementos, calculandosucessivamente correlaQoes, nao e recompor a estrutura,e os resultados de conjunto depressa se tornam muitoconfusos. A coesao de cada elemento varia, alias, como valor numerico da correlaQao, e 0 seu significadointrinseco permanece indeterminado. 0 estudo das cor-~ortantQ, urn metodo de analise e de v.e~~i-ca<;;ao,mas nao de reconstrugao. II

Enfim, a existencia de urn conjunto nao se confundecom as afinidades mutuas das suas partes. 0 que fazcom que concorram para 0 comportamento de uma deter-minada idade as diferentes actividades que 0 constituemnao e necessariamente 0 facto de se condicionarem entresi. As causas duma evolucao ultranassam 0 insti!Jlte~~.~~~.~~'-..-~~~ Cada uma das suas etapas nao . ~ po.r con- .:.seguinte, formar urn sistema fechado, _~1.!Jil.smamfesta-.Q6es dependeriam todas estritamente urnas das outrasj

Os estadios de que a psicopatologia permite 0 estudosac na verdade conjuntos, mesmo que depurados de qual-quer elemento heterog{meo. Assim e mais facil definir--lhes as traQos essenciais. Porern, nao sac definiveissenao sob 0 aspecto estatico. PedaQos de uma evoluQ-iiotruncada depressa deixam de corresponder as necessi-dades das sucessivas idades que percorre 0 individuo.Nao tern senao uma existencia mecanica, efeitos estereo-tipados e absurdos. 0 seu significado psicobiol6gicodesaparece.

f: essencialmente a sua sucessao cronol6gica que eprecise referir as eta pas do desenvolvimento. As leise os factores de que dependem serao estudados maisadiante. Mas qual e 0 seu modo de sucessao? Paracertos autores, a passagem de urna a outra far-se-ia pOl'transic;6es inse~~iye~E..'Cad a uma estaria ja na prece-

• . / .<, .1;-..... /,0. /.r/ '(/.1,q -:

o estudo da cri;m-~a-:'Tessen'CTal~nre"o-~tudo"d~S-7fases que VaG fazer dela urn adulto. I

E~ que medida' podem os testes contrib'uir pa~a isso?E em que medida nao sao suficientes? Supondo quefossem em numero suficiente para corresponder a todasas aptid6es, permitiriam fazer 0 inventario das mesmaspara cada individuo e para cada idade, com a indicacaodo seu nivel respectivo. Reunidos, dariam aquilo a quese chama «perfil psicoI6gico», grafico de incontestavelutilidade, mas simples junQao de resultados, de que alias

.~se duvida que esgotem todas as possibilidades do sujeito ..' Nao existe portanto nele a verdadeira expressao de uma: estrutur5L m~ntal .

.Entre os testes, no entanto, e possivel investigar seha ou nao correlac;ao, calculando segundo que frequenciaos seus resultados concordam. A nao ser que seja causada

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dente, conteria ja a seguinte. Seria mais urn secciona·mento comodo para 0 psicologo do que uma realidadepsicologica.

Esta continuidade e, sem duvida, tudo 0 que apreendeaquele que se entrega exclusivamente a. descri~3oo dasmanifesta~oes ou aptidoes sucessivas que aparecem nocomportamento da crian~a. 0 desenvolvimento de cadauma pode inscrever-se sob a forma de uma curva conti-nua, desde as tentativas raras e imperfeitas do inicio ateao seu emprego segundo as necessidadese as circuns-tancias, passando pelo periodo em que 0 efeito e pro-curado insaciavelmente por si mesmo no decurso dumaagita~3oo ludica. As novas formas de actividade, C'ujoaparecimento 0 seu proprio acabamento torna possivel,podem seT consideradas como a sua consequencia, emcerta medida mecanica e necessaria. Ao mesmo tempo,ela misturou-se com outras actividades sincronicas oun3oo,que conjuntamente formam uma especie de feltro,no qual se perdem as distin<;oes de etapas.

Pelo contrario, para quem n300 separa arbitraria-mente 0 comportamento e as condi~6es de existenciaproprias de cada epoca do desenvolvimento, cada fase~constitui, :ntre as, p~s~i~ilid3:de~ 3-~/~~@~-S'~~Jurn sistema de rela~oes que os faz especificarem,-se r~i-'. " ,-. " .. '--"J' '.....J" .... ',,/ '"',, "",-__ '. /- •......J'-./., ',.- '''-.j "-/ -.,-'"""-...--

procamente. 0 melO n3oopode ser 0 mesmo em todasas idades. E'i: composto -Pb~--tuCfo=aquiroque-posslbHita';s pr~~~dimentos de que disp6e a crian~a para obtera satisfa~3oo das suas necessidades. Mas por isso mesmoe 0 conjunto dos estimulantes sobre que se exerce e seregula a sua actividade. Cad a etapa e ao mesmo tempourn momenta da evolu~3oo mental e um tipo de com-pOEtaE1~~' (.. oj .-

OS FACTORESDO DESENVOLVlMENTO PSfQUICO

o desenvolvimento psiquico da crian~a apresentaoposi~6es como se observam em qualquer processo detransforma~3oo, mas que devido a. sua amplitude e a.diversidade das suas condi~oes devem suscitar aqui pro-blemas importantes. Partindo, com 0 lactante, de urn esta-dio pouco superior ao do parasitismo, tende para urnnivel, a respeito do qual 0 comportamento das outrasespecies animais nao passa de urn principio, por~2.smotivos que podem surgir das circunstancias naturaiss3oo, n(Lh.~m, :ID1.b.mersos~e procedeI!}-d~--urr;asocied;:-dede form as complexas e instavei§. A in-'fhI~;-~i~que ela e susceptivel ~exercer pressup6e noindividuo urn eq~~r>l\~e?t~-\!e, aptid6es extp~I!!~~n,~eq!~er~~cla~~~ 9~ja {9[n;~~~~5t~nd~~d?-_.~~Il~e. Destemoao, na crian~a; op6e~m-se~ impIicam-se mutuamen~f~ctores de origem biologica e'SOcial. )

Ao mesmo tempo que em cada etapa se realizaurn equilibrio estavel entre as possibilidades actuais e ascondig6es de vida correspondentes, tendem tamMm aoperar-se mudan~as cuja causa e estranha a esta exactarelag300 funcional. Esta causa e organica.

No desenvolvimento do individuo, a fun~3oodespertacom 0 crescimento do org3ooe 0 org3ooprecede-a muitas

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vezes de longe. Desde 0 nascimento, as celulas nervosassao tao numerosas como em qualquer momento futuroe se algumas delas se destruirem, no decurso da vida,nao serao substituidas. Mas durante quantas semanas,meses e anos nao vao muitas delas continual' adorme-cidas? Enquanto nao estiverem realizadas as condi<;6esorganicas do seu funcionamento: a mieliniza~ao do seu

,,, (axonio. Muitos outros org~<:)s d~veJ!1~gu~_rnente com-'\~.ta!:.SL Sll._~,'difereIl2.i~~~L()_est~~tu_~_~lantes de r:~velaremJ ,a, §~_a,_J'!!~~~Q) cujas primeiras manifesta~6es muitas

vezes nao sao mais do que uma especie de exerciciolivre sem qualquer outro motivo alem do proprioexercicio.

A razao do seu crescimento nao esta portanto nopr~~\~r~~,mas n~ tipo' da ~sp'e~ie que pertence ao adultc;realizar. Esta ao mesmo tempo no futuro e no passado.Cada idade da crian~a e como urn estaleiro' '~nde'-~~-;t~sorgaos asseguram a actividade presente, enquanto se

(edificam massas importantes que nao terao a sua razaode ser senao em idades ulteriores.

a objectivo assim perseguido nao e mais do quea realiza~ao daquilo que 0 genotipo, ou germen do indi-viduo, tinha em potencia. a plano segundo 0 qual cadaser se desenvolve depende portanto de disposi<:;6es queele tern desde 0 momento da sua primeira forma~ao.

(A realiza~ao desse plano e necessariamente sucessiva,<\mas pode nao ser total e, enfim, as circunstancias modicficam-na mais ou menos. Assim, distinguiu-se do geno-tipo 0 fenotipo, que consiste nos aspectos em que 0 indi-viduo se manifestou ao longo da vida. A historia de urnser e dominada pelo seu genotipo e constituida pel0 seufenotipa.

Entre os dois existe uma certa margem de variagao.Mas e dificil marcar-Ihe a amplitude, visto que so 0

fenotipo e directamente acessivel a observa~ao. QuantoaQ conteudo do genotipo, e necessario deduzi-Io a partirde uma compara~ao entre progenitores e descendentes,atribuindo-Ihe dos tra~os comuns aqueles que nao podem

ser explicados pela influencia do meio OU dos acon-tecimentos.

A compara~ao entre grupos de gemeos homozigoticose heterozigoticos permitiu que diferentes observadoresatribuissem ao genotipo as aptid6es que sao semelhantesnos primeiros e diferentes nos segundos. Sem duvida, 'J i.'nas condi~6es habituais, ~ e~trema diversidade de vi~a ~0 '2~.r'I()1guaaprellentam as nossas socledades torn a a comparasao i. J;-r1UIP,ad-'!~Lmais complexas, mas a discrimina~ao entre) ""'.l' ~o que permanece constante e 0 que pertence a circuns- ~~':~:t.J,tancias multiplas de varia~ao poderia tamhem tornar-se -,>'" 'mais nitida.

:It preciso, contudo, saber distinguir entre as influen-cias. Umas sao muito circunscritas e fortes, outras tern~~~---"'-~--~--~-

uma ~~3:~n:1,ll&>,~I!!.ela.Os seus efeitos poderiam, por-tanto, manifestar-se nos tra~os dura veis e essenciaisduma ra~a ou nos de grupos fundamentalmente homo-geneos, se a compara~ao nao fosse suficientemente ext en-siva no tempo e no espa~o, ou se nao tirasse proveitodos casos de varia~ao acid ental para fazer urn examerigorosamente diferencial das suas condig6es. Noutrosdominios, a transforma~iio das circunstancias e muitomais rapida, muito mais variada. Entre gerag6es ouentre grupos relativamente proximos, par vezes me~moentre individuos, as variag6es podem ser sensiveis. E pre-ciso ter isso em conta para nao concluir, sem justomotivo, por superioridades ou inferioridades funda-mentais.

o !renotino ,node sP.r, Q0nsideradq ,como 0 interme-~ 1'\_/\..-"-7\/ v\:..__..,j~r"\- '\.:;:::t\ . '\./ ~.-....J'--

diario,' urn pouco variavel alias conforme as filia~6es-;-~ cruzamentos, ~8tJ::e\~. ~~ptcte~e.._~!E~ Neleestaria inscrita a historia da especie, de que a historiado individuo nao faria senao reproduzir os tragosessenciais.

Tal e pelo menos a teoria daqueles para quem a onto-genese e uma repeti~ao da filogenese. Nasceu esta teoriadas semelhan~as morfologicas que apresentariam as

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etapas da vida embrionaria com as form as anima is,cuja sucessao marca a via seguida pela evolu~ao nasespecies. ~guns psicologos j..!:1lgaram.IfOdec..E:Q.!.0~~o_d~~~nvgl~t~!.Ltg_.gQ_tl}.c!ividuoIlas suas rela~5es coma-evolu~ao das civiliza~oes humana~~--e~plicando~lm~e~ellia'r;~a~ 'qu~-;e;bser;~Gm: nas idades suces-sivas da crian~a, entre as formas do seu comportamentoe a sequencia das praticas ou das cren~as pelas quaispassaram as sociedades humanas.

Seriam uma reminiscencia das idades desaparecidasalguns jogos guerreiros da crian~a, por exemplo a suainven~ao ou antes a sua reinven~ao do area e das fle-chas. E do mesmo modo aquilo a que se chamou a sua

(mentalidade magka, isto e." a sua crens;a no po:der da.-J -- ------~;/ .' . '. '--,._._<

"1 yontadE:)sg"b}:e,as c9j.~~se os acontecimentos, qyer (:!~r~c-i tamente quer sobretudo por intermectio de simull'!-<;.r:~s

ou de formulas.A esta revivescencia de pensamentos ancestrais deu

Freud grande importancia na sua psioa.pali-se. Os jogosimaginativos, os contos em que Se compraz a crian~a,os sonhos do adulto, algumas das suas criaQoes esteticas,seriam 1,!!!U:,~~~~!Ys~ sob a qual se expri-

,~i~m ~!!1ais .an1Jgas._~j.Yi1!~a~~ e que utilizariamos desejos reprovados pela nossa pana se manifestarem,

(ainda que disfar~adamente. Situa<;aes que pertenciamas pri~.)ir~~ 12.~??~~"r?ahumanidade e .,q__u_e_a_m~o,_r_a_l~d_05_

! povos' nao deixou de combater poderiam assim sobre-! "lver' e'm cada indfviduo. - "

No seu terreno de origem, 0 da embiogenese, a assi-mila<;ao da ontogenese e da filogenese suscitou objec<;aes.Ela nao e, alias, urn argumento necessario para justi-ficar 0 transformismo. Por que razao as mudangas queacompanham a passagem de lima especie a outra naoatingem igualmente as etapas do crescimento e os carac-teres do animal adulto? Como nao seria a recapitula~aodo passado de certo modo escamoteada pela necessidadebem mais urgente de realizar 0 novo tipo de organiza<;ao?Pelo menos 0 problema tern aqui dados precisos: a com-

para<;ao de formas entre si e a ordem pela qual sesucedem.

No plano da psicogenese, pelo contrario, 0 parale-lismo ontofilogenetico !}.iioso se encontra privado de?riterios objectivos ~omo comporta inverosimilh~ncesl p'o~cY,~::~superaveis. Se as etapas da vida mental na cnan~a r;;1~C,.CL

tivessem por pro,totipo e por condi<;iio as ~ap'as <ia 1'£<-'](; (,civiliza<;iio humaBa, a relaQao entre os termos que se

~rrespandem nas duas series nao poderia ser senaoIf"( Jal4r uma estrutura material cuja posiQao no desenvolvimentor.).<10

1:'-4 quer do individuo quer da especie seria estritamente

7;,:(1: determinada. Entre individuos nertencpnt<>.oa~I ~\~~,~

;; Y~"';,'~IrPnte" rle civili7.a~ao 0 intervalo seria igual ao numero~)1,,~-)1 ~~~ , •

.J'1VJ,- de gera<;oes nec6Ssarias para que se sucedesse a serlede estruturas intermedias, isto e, urn intervalo intrans-ponivel, nao so para os proprios mas tambem para umapor<;ao mais ou menos larga da sua posteridade. Oraa experiencia tern mostrado que, se 0 desacordo podeser irredutivel entre dois adultos ja formados, em crian-Qas suficientemente jovens, pelo contrario, 0 meio emque elas foram educadas enxerta a civilizaQiio corres-pondente.-C~ diferenga das form as embriogenicas, que SaGobjecto de observa<;ao, a existencia de estruturas .9.!:!.e7<:orresponderiam ,aos sistemas ide~logico~ e, por outro rlad~)n..dmstrayel, ou melhor, Imposslvel. Todas asconstata<;oes da psicologia contemporanea provam queo funeionamento da actividade mental tornar-se-ia incon-cebivel Se fosse nec~sario decompor as suas opera<;oesem elementos em que cada urn deles tivesse par sedee por orgao urn elemento ou uma combina<;iio de ele-mentos organicos.

Deste facto, a linguagem fornece urn exemplo quetern side particularmente estudado. Incontestavelmente,ela so e passive I pela existencia de centros especiali-zados - e alias muito amplos, isto e, implicando activi-dades de nivel muito diferente - que fizeram a sua apa-ri<;ao na especie humana. Mas a linguagem nao esta de

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~no.s_1mport~nte~'<!es~s, t~?}~as n~J'~ ~~tecnicas intelectuais, que investem a crian~a logo de- ~ ~-===- ..•••••.- - _.. --infcio e sobretudo por tntermedio da gnguagem, massomente na medida do emprego que dela sabe fazer.Esta aprendlzagem nao termina antes dos ultimos anos

da infancia e pode ser desenvolvida a niveis muito diver-sos. Mas tambem entre as linguagens ha niveis. Segundoo estado das civiliza~oes correspondentes, elas sac ins-trumentos intelectuais mais ou menos elaborados. Destaelabora~ao, 0 trabalho dos pensadores da-nos, alias, urnexemplo explicito ao longo da hist6ria. Para as palavr~s Ie ara as no~oes d ue ~ende a ~sa compreen~ao( ;ll/f· '

9_uo.tidiIDllL d~M~n~9' ~~ntos _esf.2!5QL-<k_~O, ~':';:,",em Descartes Anstoteles e Platao! De urn para outro ,.1,d,,,',.~-- ..,--parece-nos caminhar para 0 menos compreensivel e, pOl'vezes com Platao, ate ao limite do incompreensivel: naodescobre ja algumas vistas no longinquo horizonte doque Levy-Bruhl chama a mentalidade pre-16gica? Masesta elabora~ao, que e deliberada nos filosofos de outrorae nos sabios de hoje, opera-se tambem na conscienciacomum e na linguagem usual, sob a pressao dos costu-mes ou dos objectos que pertencem ao regime de vidae as tecnicas da epoca.

Entre a crian~a e 0 primitivo e nitida a distin~ao.Urn encontra-se em presen~a de tecnicas que nao sabeainda utilizar; ao outro faltam essas tecnicas. A compa-ra~ao de urn e de outro e sem duvida util, nao porquenos fa~a encontrar na crian~a urn estadio do passadomas porque !!2.s permite separar, no exercicio do pensa-:rn~ntp,a parte que pertence aos instrumentos e as teg-nicas da inteligencia. Assim evitamos correr 0 risco'd-~--;;nsiderar uma crian~a de 12 anos mais inteligenteque Platao ou, pelo menos, que urn primitivo eminenteno seu cIa, e de confundir 0 nivel da 16gica com 0 poderdo pensamento, Deve ainda acrescentar-se que, mesmoreduzida a estes term os, ~,aproxima~ao deixa subsistirurn imensa distincia ent~, cujo pensamen~,'privado de uadros, esta su 'eito as ulsoes da e "-~, ~, 9-u~t~onduzido pelo sis~a rigid9£o~~ __~~~~ ~en,t~i~ re .:9~/~~~~~E..~~· J/

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modo algum preformada nestes centros. E do meio quedepende 0 sistema linguistico cujo uso acrian~a adquire.Este sistema pode, alias, nao ser unico, e, quando nomesmo individuo se dooenvolvem varios, as suas rela~oespodem ser psicologicamente muito diferentes: equiva-lencia exacta, ou referencia de todos a urn de entre eles,que sera entao 0 unico a possuir uma liga~ao imediatacom as inten~oes e 0 pensamento. Enfim, forElt!las multosemelhantes podem servir_~~~_xere~§aQ~_?-ctLYi,®g~si-qui cas de nivel muito diverso, conforme as circunstan-cias, 'a:s--d(sposi~Oes-oua:s--possibilidades mentais dosujeito e tambem conforme a idade da. crian~a.

) ~~~:s..a~_,~~~~ ..~~, senao

lsempre no presente, pelo menos pelos seus meios e peloseu conteudo, das circunstancias exteriores, c;1umll-_§i~~ao, do meio. Opor-se-ia assim a uma exact a assimila~ao~-

/ :" !~ do desenvolvimento psiquico com 0 desenvolvimento em-, ;,!;", ,brionario que, pelo contrario, se processa secretamente

sob a influencia exclusiva de factores organicos.A semelhan~a que se pode constatar entre certas

atitudes ou opera~oes mentais das crian~as e as daque-las a quem genericamente se deu 0 nome de primitivos,'par~~~_~xplicavel atra,,:es de uma semelhan~a, muito rela-tiva alias, de sit~~o. 0 meio prove a nossa actividadede instrumentos e de tecnicas, que estao tao intimamenteunidas as praticas e as necessidades da nossa vida quo-tidiana, que muitas vezes nem nos damos conta da suaexistencia. Mas a crian~a nao aprende a dispor delassenao progressivamente. ~ma..da.s.~~s/.:'" ,,,J sucessivas _~ncon~!.'!.~se>por conseguinte, na situa~ao

A:_('::~~'" daquefas"'para quem estas tecnicas nao eXistiriam ainda,. •• ••••'f\lG'~~ --

":',1,, .~.' 1';,. como e 0 caso, em graus diversos, dos pretensos pri-,I•. ;,1Il mitivos.

(('·i_l; "',,.

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Ainda que 0 desenvolvimento psiquico da criangapressuponha uma especie de implicagao mutua entre fac-tores intern os e externos, e contudo possivel distinguirpara cada urn a sua parte respectiva. Aos primeirose atribuida a ordem rigorosa das suas fases, de queo crescimento dos orgaos e a condigao fundamental.

Na diferenciagao que faz nascer do ovo, onde estaoem potencia, mas invisiveis, as estruturas do futuro orga-nismo, corpos de constituiQao quimica relativamente sim-ples parecem desempenhar urn papel decisivo de esti-mulante e de regulador. Sao as hormonas, secrec:;ao dasglandulas endocrinas. Dotadas cada uma duma especifi-cidade rigorosa, ainda que muitas vezes em relac:;ao dedependencia reciproca, tern sob 0 seu controlo 0 apare-cimento e 0 desenvolvimento de cada especie de tecidos.o encadeamento das suas intervenc:;oes corresponde, coma mais exacta precisao, as necessidades de crescimentoe, como ao seu papel morfologico se junta uma acc:;aoigualmente electiva sobre as func:;oes fisiologicas e psi-quicas, Von Monakow via nelas como que urn substractomaterial dos instintos.

Na realidade, parecem exercer uma influencia con-sideravel sobre as correlac:;6es somato-psiquicas. It, pOl'exemplo, a secrec:;aodas gl8.ndulas intersticiais incluidasnos orgaos genitais que esta na origem das mudanc:;asns!~?-s_e psiquicas conhecidas sob o~e de puberdade.A preponderancia de umas ou de outras atribuem-seaquelas diferenc:;as de conformac:;ao flsica e de tempera-men to psicofisiologico que hoje muitos se aplicam a

!f ~~.~~_~_~~s, a fim de sobre eles fundarem 0

estudo do caracter e 0 de divers as perturbac:;6es mentais.Tais estudos poderiam tel' urn duplo interesse na

crianc:;a: em primeiro lugar, identificar durante 0 seudesenvolvimento as sinais anunciadores, as particula-rigades nascentes e talvez, em parte, as causas do tipoque se realizara m3.is tarde; e averiguar tambem se asetapas do seu crescimento, que acarretam variac:;6es

consideraveis nas proporc:;6es relativas da cabec:;a, dotronco, dos membros, das suas partes e dos seus seg-mentos, nao aparentariam sucessivamente a crianc:;a a,diferentes biotipos, aos quais corresponderia a diversi-dade dos seus sucessivos comportamentos.

Entre 0 crescimento dos membros ea sua actividadecaracteristica existe em todo 0 caso uma relac:;ao. Maspode ser de sentido oposto. Uma vezes e positiva, isto e,aumentam simultamente as dimens6es e a habilidadeduma regiao, pOl' exemplo, da raiz ou da extremidadede um membro. E isto deve explicar-se pOl' uma solida-riedade trofica entre os orgaos perifericos e centrais deuma mesma func:;ao: aparelho articular e musculos pOl'um lado, centros nervosos pOl' outro. Outras vezes, pelocontnirio, uma imperfeic:;ao mais ou menos duradoiraacompanha urn aumento rapido das dimens6es. Urn exem-plo bem conhecido e a mudanc:;ade voz na altura da puber-dade: os sons tornam-se bitonais e discordantes, porqueos automatismos adquiridos perdem-se momentanea-mente em virtude das mudanc:;as do orgao.

No primeiro caso, tratava-se duma aptidao bruta,elemental' e como que em potencia; no segundo, de ope-rac:;6es complexas, ja constituidas em sistema, desorga-nizadas pOl' uma transformac:;ao do seu instrumento.A oposic:;aodestes dois efeitos explica-se pela diferenc:;ado seu nivel funcional.

Quando se trata de actividades mais especificamentepsiquicas e sem concomitantes organicos visiveis, a. rela-c:;aodos facto res internos e externos deu lugar a maioresdiscuss6es. A explicac:;ao espontanea consiste em ordenarentre si os factas imediatamente perceptiveis e a ordemda sua sucessao torna-se causalidade. Sao as reacc:;6esde que ja e capaz 0 lactante, que se julga constituiremo material donde sairao, pol' combinac:;6es e adaptac:;6essucessiva.s, as elaborac:;6es ulteriores da vida mental.Acontece, porem, muitas vezes, que este material e maisdecalcado sobre as necessidades da explicac:;ao do que

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sobre uma exacta observa~ao dos factos. Assim, notempo em que 0 edificio psiquico parecia cada vez maisredutivel a sensa~oes, a questao da diferen~a, ainda quecorrecta, da crian~a e do adulto nem sequer se punha.

Agora que uma r3P~~ 9~yida~~l se tornou corrente, ~~~ substi-tuiram as 6ensa~oes, mas sac sempre utilizados comounidad~sq!:1~.J).~~~~~q~l\'.§1:~~~,,-~

/,~t~I!~S,,-Sl~,_~vg!llsa,o~~g~l£;!.Lquando na realidade inte-~i ~",cJA, gra~oes progressivas mudam nao so a ~I J.,>./'> . .

t,; e 0_~gt~~~~ das ,manifestagoes motor.a,s,mas tambem as ~1J-a,s.s-?ne~-, e a s~~~_-t.~~<?J!D~$lIl-,,~!k~,It'

'I Esta integraQao e a condicao, mas nao pode s~~II con~uencia da evolu~ii-;Psico!!~gJ.2r:.a.Poe-se aqui 0 pro-, ~a das r~~~s~~ilfri~a~JP~~~~

~. Sem duvida, imputar sistematicamente a ma-~;!.Jl'~'O:_>"'!tura~ao de orgaos corresponden.te. s ca'~~ progresso cons-l ", tatado, 6eria apenas ~rma modlflcada da~elhas

. explica0es que se contentavam~mJ.e~onguzir~eieiio ~ ~ma entidade decalcada sobre 0 mesmo. Porem,~i-;-p~'io-ri, --;;mo recentemente --ofez Piaget noseu livro f!!:.-!!. ai.~f!32:.(;g_.d.e .. rint~Li9J}_'Jl9}_9h?E~f!!!!:!.)

5' >r'~':'::_b [email protected]_nto ..de. _a.c_tly'i~.,:~t~s_ll()yas na evoln<.;ao psi-J. ,iV, quica, cuja origem necessaria reside no despertar fun-

,.~, cional de estruturas organicas chegadas a maturidade,;",(.:::~.).leva-o a confundir uma simples descri~ao, alias rica,

. penetrante e engenhosa, com as condi~oes profundas davida mental.

Quem fala de maturac;ao funcional deve incontest a-velmente demonstrar a sua existencia. Foi ao que sededicaram ja varios autores. Fizeram-se experiencia6tanto com animais jovens como com crian~as. Os resul-tados sac semelhantes. Entre do is grupos de sujeitos,

/1)uns dos quais foram postos eIrLCQ1!diQoesde se exer-citarem e (6J~rosEriva~cl~ga-.possibilida,de, a dife-

-renc;a de resuitado;'desaparece rapidamente, assim quese atinge ~1~ ~'V'~~9_~ que cessa a ~

1":,1'>'(',i 1,1""

~a~~ 0 nivel funcional atingido pelosprimelros ao fim de algumas semanas, alcanc;am-no ossegundos em alguns dias, prova de que a idade faz mais~~.}hl/""1(.)

Em vez de grupos suficientemente numerosos paraque a diversidade das aptidoes individuais tivesse pos-sibilidades de ser compensada, Gesell pode compara I'

dois gemeos homozigoticos, isto e, dois seres cuja seme-lhanc;a e tao completa quanto possivel: urn foi treinado \ j1Uv~

a subir uma escada desde a idade de 46 semanas e 0 cu/Uu~~,J;8"~

outro apenas quando tinha 53; em duas semanas 0 se- :::~...1.i/gundo alcanGou 0 irmao. Os actos estudados tern side CV'.,@,"

sempre, bem entell'dido, actos naturais, como procuraralimento, andar, agarrar, falar,?c.%i.e-c~\.~,~~~o, ~.59~:tant ara todo 0 individuo norma~~ Para que eles se produzam, sac evidentementenecessarios estimulantes e circunstancias apropriadas,mas a sua utilizacao s6 se torna verdadeiramente efica z~. alt~r~m que as condic;oes b~logicas da funca.o~hegam a maturaGao ..

Quando a aquisic;ao diz respeito a actividade6 maisartificiais, quer dizer, que so em circunstancias excep-cionais aparecem ao longo do desenvolvimento, a impor-tancia da aprendizagem torna-se essencial, embora naosejam menos necessarias condi~oes funcionais adequadas.E, alias, uma lei geral que os efeitos, dos quais nema forma, nem 0 grau, nem a cronologia podem ser sen-sivelmente modificados pelo exercicio, sac reacc;oes pri-mitivas, reacc;oes que pertencem ao equipamento psico-biologico da especie e cuja condic;ao dominante e a matu-rac;ao funcional. Pelo contrario, 0 que 0 exercicio pockgesenvolver ou diversificar ~ende de actiyjdades com-binadas e~se traduzem os 4or~._iMi.Y..~'!-.!~AL~_adapta'Q[o, iniciati'{a., ~ j.n~!J.c;aQ.. /', ','/v·_·· ·"-;'"·.,.·, ·_-..-.-.,~--~ - -' ' "I''''

Na especie humana, 0 adulto dispoe de actividadesque 'lhe permitem subtrair-se as pressoes do ambiente

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I' -,1,,11'; imediato. As circunstancias externas p~d~._~l?.QI. urnmundo de motivos que descobre em si mesmo, qualquer~ue seja a sua origem, e que sac como que o~,~~. It preciso, por conseguinte, supora partida urn equipamento psicobiologico muito maiscomplexo que 0 que possuem as outras especies. Pelocontrario, a crian~a permanece durante muito mais

'--<::'~;"'1' tempo desarmada face as necessidades mais elementa-res da vida, e as ocasioes de aprendizagem que deveencontrar no meio externo tern, entao, uma importanciadecisiva. Existe, assim, uma relacao inversa entre a d-9.ue~~. do equipamento e 0 acabamento das suas partes.Quanto maior e 0 numero das possibilidades, maior ea sua indetermina~ao e maior a margem dos progressos.Uma fun~ao que nao tern que procurar a sua formulanao sabe igualmente adaptar-se a diversas circunstancias.

9 t.<t"i~ I 0 facto de a nascen~a urn ser nao poder subsistirC;,',»,o, por si proprio, pOl' falta de uma suficiente matura~aot' \''''''':.;''-"dos seus orgaos, e considerado urn caso de prematura~ao.

,rt.t-Y\.-~~ -Nenhum exemplo e mais evidente que 0 do canguru,cujo filhote deixa 0 utero da mae para se reintegrar noseu saco marsupial, onde esperara poder, enfim, supor-tar os rudes contactos do mundo exterior. A prematu-ra~ao e normal em varias especies de mamiferos. A suaprecocidade parece aumentar ao mesmo tempo que se

rJ .t",,,,,.,,' eleva 0 nivel evolutivo da especie. Atinge de longe 0 seuo "''''') Oc-' ~au mais elevado no homem e acompanha-se duma("t "",·t£r". invernao na ordem dos meios ao seu alcance, a qual

prepara a orienta~ao completamente nova da sua exis-tencia.

Enquanto 0 jovem animal, a custo por vezes de exem-plos e de provocagaes maternas, ajusta directamente assuas reac~aes as situagaes do mundo fisico, a criangapennanece meses e anos sem nada poder satisfazer dosseus desejos senao pOl' intermedio de outrem. 0 seu unicomstrumento vai oo.rtanto ser o..-que a pae ~m relac;ao

_~ aqueles que a rodeiam 'sto e, ~-~es q~ ~~y's~it~Il},~osAo~tros comP9rt~ID;eI!:to~s_~_~Ej.-

tOSQs"para ela e a~es dos outros que anunciame~to~ 0 .rta~entos~'~~Desde as prlmelras semana6 e desde os primeiros dias,constituem-se encadeamentos{ donde surgirao as baBesdas relaGoes interindividuais. AM~nsoe~j~.~xI?E~~~J2!.t.~~~~0~ Antecipando a lin-

. guagem propriamente dita, sao elas que primeiramentemarc am 0 homem, animal essencialmente social. //../\-A-"' ~~ / /

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·{YJ;-~ ~ () oJ-8 " /)Uk'J -c/~ ~c;.ft ~ d.z.i(,V~p')~~(y t .;.""'/J tA.cov I' II"'>"':?, <;',1P'r'~ ~'1-

uu"s>->d ru :t;,~'1 ~""j;/? d"7'CVJ .RI (,)U -V"1.-~'-rJoJn,(vJ;w. 11 i yvv, (.$' ,fw,':)"Y 0/1 U1v' [lrc1il/) tvYl~r?~pv;'/&~.J C<g 1'.1vJt:rJ:te-()./'i,~ (~ tt r/.;. "t{r.;.,.. ~ rJ.J: )

Entre os tra~os psicofisio16gicos que marcam cada'ietapa do seu desenvolvimento, ha 0 K-Emerode actiyidade.,Q. que se en~ga a" crian~a, e que, por sua vez, se torna ("urn factor da sua evolu~ao mental. Por que meios? E1essac diversos e variam com os sistemas de comportamentoque entram em jogo, com os estimulantes, os interesses,as fun~oes, as alternativas que se manifes-tam. Ao tipomais geral, mais elementar, corresponde 0 que pode serclassificado nas rela~oes entre 0~

o que motiva urn acto pode ser de especie ou denivel variavel. 0 acto mais elementar nao teria aindamotivo psiquico. Nao teria outra razao para se vroduzir~~nao Q facto de ser a actividade dos 6rgiios corre~ J.EQ!ldentes. Seria uma daquelas manifesta~Oes funcionaispor s.i mesmas, sobre cuja frequencia na primeira idadeinsistiu a Sr." ChI BUhler. E sem duvida dificil afirmarcom todo 0 rigor que urn acto ou mesmo u~ simplesmovimento na tern concomitancia psigui a~~~it~::-~~V>l'IJ'( ~·'ti'Vti

igualmente com frequencia que 0 gesto funcional e ~panhado de urn certo ~, 0 que estaria ligado ao exer-cicio da fU!l~ao. Mas esta no~ao nao e tao simples comoa primeira vista podera parecer. Nao ha prazer sem

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i"I, e.u)t'

~,.. I,,-~

.§em uma rela~ao exacta entre cada sistema de COni) (I.••./~~.J.f. t~.sculares e as impreoooes correspondentes, /"1'':r.;~o movimento naD pade entrar na vida psiquica nem cork (.JxlQ.uir para 0 seu desenvolvimento. Em que momento se ~deve situar esta rela~ao? as que reconheceram a sua . ,,0 l·(A~necessidade procuram atribuir-lhe urn principio muito / j ~,/Y"'"

precoce.~ preciso, porem, distinguir dois dominios: 0 do

propriocorpo e 0 das suas rela~oes com 0 mundo exte-rior. A sensibilidade do proprio corpo e a que Sherring-ton chamou ~l V5:lroposicao a s~e~, que esta voltada para 0 exterior e quetern por orgaos os sentidos. A cada uma das duas cor-respondem formas de actividade muscular distintas,ainda que estreitamente conjugadas.

A sensibilidade proprioceptiva esta ligada as ~-goes de equilibrJo'3 as atitudes que tern por objectoa contraccao tonica dos musculos. Entre 0 tonus mus-cular e as sensibilidades correspondentes parece existiruma especie de uniao e reciprocidade imediatas: a loca-liza~ao, a propaga~ao dos seus efeitos, sap estritamentesobreponiveis, e os espasmos, que sap 0 seu aspecto paro-xistico, mostram como a contracgao muscular e a sen-sa~ao parecem sustentar-se mutuamente. ~o como que !I_~~_tr~itamente coaderentes.

~~~~..~ont!:.ario, a ~I!!Pressao exteroceptiva e 0 movi-mento que the corresponde situam-se nas duas extre-midades dum circuito mais ou men os vasto. Entre 0 olho

~~~~~~~~(nenhuma semelhan a e or -os. Entre a impressao visualC as contrac~6es musculares existem sistemas complexosde conexoes nervosas. Sao necessarios longos meses paraque a crianga deles possa dispor. ~~dos centros Le)a~ vao-se completando deetapa para etapa. Mas como se opera, em cada uma, a.relagao entre a sensibilidade e 0 movimento?

Sob 0 nome de reucQiio circular, Baldwin procuramostrar que esta liga~ao e fundamental. Nao ha sensa~ao

( u~speeie de consciencia, Q.~que seria, portanto, neces-1. ~rio determinar 0 grau e a natureza.

No enta~to.' <;p-~~~persegui90~~"; parecem eXist.!r .QE. que pertencem aos efeitos dinamo-

"1(j-:'i:' eJ~ 1g~nic,?.§do ~_ofrirpen!gou do bem-estar~t~a~~ t> , com 0 sono constitui 0 comportamento manifesto dor~ {J..f' ,_,1'1 l. ,0

to< ,"" recem-nascido. Nao poderiam, alias, estar dissociadQs<.I-' ~os es!~~C?~~e£tivos g~~hes G.9rrespo~, como seria

uma expressao do que a mesma exprime. Estao-lhe liga-dos pol' uma especie de ~a e~~~~~-~~..8P~s. ~as njoparecem ser ainda 0 que se pode iglag1t111rde. funcional-mente mais primitivo. ·Uma compara~ao pode demons-tra,-lo.

m costume observarem-se, durante as primeiras sema-nas, movimentos que pela sua intermitencia e dispersaoesponldica atraves dos grupos musculares sac equipa-rados as sacudidelas da coreia (~).

Parecem, com efeito, manifestar-se poruma simplesliberta~ao de energia em fragment os dissociados do apa-relho motor: sinergias ainda fragmentadas no lactantee que recaem em peda~os na coreia. As sensag6es cines-tesicas que lhes podem corresponder surgem e desapare-cern, dando apenas ao sujeito uma impressao de impo-tencia e de enervamento. Sem ligagao nem possibilidadede liga ao entre si, situando-se fora de qJ,llilquer inten-gao, incluindo a uela -lrltenGaQ..J)rganica que-.La atitude:em._q,ue se-prefonIU,LQ.mQ~.!me.nto, nem seguer podem~eixar vestfgios po~~ na9-hL'leSiigi.os...s~gao, sem urn ponto de parti.Qa.Ql!~lo menos.,..sem o.JrJciode cert~s- ~n~xo~~ Se escapam as determinag6es dasensibilidade, nao e, pois, apenas porque esta e estranhaa sua incita~ao, mas sim porque nao podem inserir nelanada de precise ou de definivel.

( *) Sind rom a caracterizado por uma agitat;ao involuntariae desordenada. (N. T.)

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que nao suscite movimentos capazes de a tornaremmais distinta, nem movimentos cujos efeitos sobre a sen-sibilidade nao suscitem novos movimentos ate que sejarealizado 0 acordo entre a percep<;ao e a situa<;ao cor-res ponden te.

A 'perce-E"fao\ ~~,t~~~,~~~; eessencialmente adapta<;ao. Todo 0 edificio da vida mentalse constroi, nos seus diferentes niveis, atraves da ad~ta<;ao da ~~9c.~ct.ivi®d~U!.9_Qhi~to, e.9~.51~~:ige aadaptaQao sap os e~~i~~s d~. actividade.,~9~~~_~_J!r~~actividade ../

Os exemplos de actividade circular sao constantesna crian<;a. A todo 0 instante 0 cfeito produzido pOl' umdos seus gestos suscita um novo gesto destinado a repro-duzi-Io e muitas vezes a modifica-Io ao longo de seriesde varia<;oes sistematicas. Assim, a crian<;a aprcnde atqzer_J.lsQ,..~tQ...sseu,S..or,gios .~()b,9...~()!1.trQ~9__.9~produzidas ...oll.modiJica.das PQJ:' si mesma.Q ..9, identifiCi;l.rmelhor cada uma das sJlas sensagaes, produziIlQQ-aQ.ife-----------. _._-_.----- --. -- ....-------- .-...__ .-rentemente. das anteriores. As emissoes vocais com que,tao abundantemente, pre-anuncia a exa<j:a_12er:Q.ep<;~<L-e

/\/\- ---aepunciag~ __o dos EQ..llSl, muitas das qtlais sao J.~da lingu,agem falada a sua volta, mostram bem J~Q.I!10aprende a realizar todas as relagoes possivels .enir..e.....gsdominios '!.~usticil e c}nes~~i~o, pelo encadeamento mu-tuo dos efeitos e dos actos.

que 0 animal colocado num labirinto acaba pOl' evitaros impasses.

Numa outra expenencia de aspecto toLalmente dife-rente, a crianga que deve reagir a cad a uma das pa.la.vras enunciadas diante dela atraves de um algarismo dasua escolha retem, de preferencia, as associa<;oes arbi-trarias que tiveram uma aprova<;ao do experimentador.

Nas condi<;oes norma is da vida, sao muitos os casosem que 0 efeito pode desempenhar 0 seu pape!. Vmasvezes e imprevisivel e inopinado, outras esperado e pre-visto. Acontece muitas vezes que a crian<;a para, sur-preendida pOl' urn dos seus proprios gestos, de que soparece aperceb~r-se depois. das suas ·cons~q~encias. :f; a1.~ .::,~;;z·.omudanca ocornda no seu campo de actlvldade ou de '" r,,,,,I,;,,

perce~ao que parece fazer-Ihe descobris ~ depois repe-;<'<>1 -'-j?.vtir 0 movimeillJ:Lqu.eJhe esta nCLorigem. 0 vivo despertar.~ sua~riosidade pOl' tudo 0 que e novic1ade leva-aa este retorno a sua propria actividade. Retorno, alias,de tal modo espontaneo que se produz igualmente quandoo efeito e ~. Quantas vezes 0 proprj.o!adulto nao e tentado a verifi~9-r,_acentuando uma atl- C

tude'ou un;-ges:t<),-s~-n~~-'~'-;le 0 autor do ruido ~, .:v'moVlmentO qUedet~cta ~sua_.Yolta! Tudo 0 que pertence'a um'mesmo m~ da nos'sa consciencia pareceparticipar numa mesma existencia indivi~a, e ~ apen.~spelo exercicio da noosa actividade que e posslvel dl~tinguir 0 que nao depende dela.

Outras vezes, 0 efeito produzido era esperado. Vmasvezes previsto, outras imprevisivel. Provocar urn, efeit~conhecido e uma das ocupa<;aes preferidas do bebe. Mm-tas vezes ate 0 faz com uma tal monotonia fatigante queda a impressao dum prazer ligado nao ao efeito parti-cular de que ele e autor, ~'as ao si~ples facto de ser aU-fl'tor de urn efeito.:e ~J~~~~~~5?",~,§'~9-~l:~~'

Noutros casos, pelo contrario, age para vel' 0 quevai produzir a sua acgao. E entao a diversidade dosefeitos possiveis que parece suscitar 0 seu interesse.Esta procura, porem, esta dominada pela certeza, de

A importancia dada a influencia do efeit.o J9.~ Q.progresso mental e hoje muito grande. :It atraves delaque Thorndike explica a aprendizagem. Se as tentativashesitantes do principio dao lugar a um movimento oua uma conduta bem adaptados, ~ porque se operou uma~e~ ~as prim~as tentativas, que eliminou tudoo ..que nao era adcquado a situagao, tudo 0 que era erro.I0 efeito favoravel traz consigo a repetigao do gesto util,1e o~!nsu..~sup.ressiio do gesto nocivo. :It assim

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algum modo natural e necessaria, de que a sua ac~aodeve te~ um efeito, de que nao ha ac~ao sem efeito.~a r~ahdade, a distin~ao entre 0 efeito e a ac~ao naoe ,maIs que u~3. simples abstrac~ao. Em toda a ac~aoha alguma COIsa que e 0 seu conteudo, a sua ocasiaoo seu obj:cti.vo. Toda a ac~ao se mede pelas mUdan~as:quer subJectIvas quer objectivas, que provoca ou pro-cura provOcar.

numa gaiola, donde procura sail', sao duma extrema diver-sidade transformam-se, fazem variar 0 camno e a estru-, ~J'--.;;:J:"~ _

~,l.~toJ~, e variam com ela.Mesmo quando a experi€mcia e construida de maneiraa limitar os possiveis gestos, a deixar, pol' exemplo,a alternativa da escolha apenas entre duas direc<;;oesno labirinto, a semelhan~a assim realizada entre osgestos repetidos nao e senao aparent~.,bI~ '"-,nos vestigios uns dos outros. Nao, existe vestigio que] (/~,,Jlr,,~

'-""'--' -- "'\.";"'r

Inao fa~par..le.-dUlll-...C..QJLjuntO-~.fle ~o r>cllfi.~po que a accao se desenvolve ~, pOl' consequen- (jJ ,.J,}

\cia, ~ao seja diferente de uma fase para outra. y~ ~rag- L, ;. f."

mento do comportamento nao tem nenhuma mdIvIdua- c,.j" \,~lidade, nao tem significado senao no comportamento (~r,C",)Y

e atraves do comportamento de que faz parte. Vma ),"."'",, r<'J!/'«perten~a» comum ~ os term os entre os quais se tenta ~ Iy]

~stabelecer uma.cone.~!~._. ~2'Jrin&.e_c..a,d~pois de tere..!E:I\I ,I ,~

side arbitrariamente dissociados e isolados. Fazem parte) G v:'i/"de um conjuntO·que-t;m a sua estrutura. ~,)s>.,.

~ 10 ~ _ f::o principio desta estrutura, desta perten~a mutua, )-"'t,'pode ser, segundo Koffka, de natureza muito diversa. ,{.A unidade que dai resulta sera, segundo os casos, de umaexacta conveniencia entre os proprios gestos na execu~aomais minuciosa, mais rapida, mais economica, de um mo-vimento,§)ji de um~feita coerencia com a situad,o,!1~.efeito esp-IT,ado. Pode tambem consistir em sim-ples rela~6es de proximidade no tem_DOou no e~.Isso equivaler~a ~-voltar ao ~9.J~~~~!.P~o_ associac~-J~ Mas a lIga~~.o de- q~ataja nao se opera como que automatIcamente, nao tema sua razao suficiente no espa<;;o ou no tempo, depen-dendo antes do poder que tem a unidade para ext rail'dai a sua organiza~ao. No entanto, talvez 0 problematenha side posto de maneira demasiado formal e assolu~oes possuam algo demasiado estatico. 0 exemploda crian~a pode mostrar toda uma hierarquia de efeitosem fun~ao dos quais se organiza a ac~ao.

o mecanismo psicologico do efeito tem sido muitodisclltido. Segundo Thorndike, 0 acto e 0 efeito saotermos primitivamente distintos. Se 0 rato colocado numl,abirinto acaba pOl' tomar, sem erro, a direc~ao exacta,e porque entre esta direc~ao e os seus passos se formou~ma conexao cuja origem e a jnsatisfa~ao sentida nosImpasses e a satisfa~ao duma livre progressao no cami-nho certo. ~a unir os dois terms e ,£ortanto neces-~aria ~,iI2.~erven ao dunu...actor ,~j;:> - ,

~o mesmo modo, na prova dos numeros pelos quaisa cnan~a deve reagir as palavras enunciadas diantedela, e a satisfa~iio de tel' acertado que a fara reteras respostas aprovadas pelo experimentador. Tambemaqui se encontram dois term os primitivamente distintose uma conexao de origem afectiva. A&3ociacionismo eutilitarismo ou hedonismo, duas doutrinas tantas vezescomplementares, colaboram tambem aqui para a ex-plica~ao.

Mas as 9E~0~§.,tem sido numerosas, incidindo emprimeiro lugar soJ?rtl_~~~~~9~<!~Jconexao Que significaela exactamente? Que fundamento fisiologico ou psico-logic? s~ lh~ pode dar? Q9~~~v~~oult~r~o.r_ln~~~ ~a~r~p~!i~SUL~~~~?A CrIttca maIS radIcal e a que inspirou a psicologia daO:stalt. Pode-se!alarg~ CO~xao ~ntre term os que nao~ ~i~te!lS!a ~~~ni<!aJ.. fixa _<?l!-.£~~nt.a.?Quais ~,co~ ?efeIto, esses gestos e essa situ~Qo que se procuraumr. Os ges!os ou 0 comportamento dum rato fechado

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( \:)Os mais primitivos sao os efeitos mais subjectivos.o gesto rode encontrar na sua propria realizaQao, nasua cadencia, no seu-ritino,nasuaracilidade, no pre-ciosismo dos seus pormenores, 0 efeit~ que 0 estimulae que o.dirige. E:: essa uma fonte abundan~ actividadepara a crian~a de tenra idade e para certos idiotas.G~o efeito pode tambem resultar do acordo entre uma

~ ~~~ correspondente. Em q~aritos dos seusdivertimentos espontaneos parece aplicar-se a crian~aa dissociar uma do outro, repetindo-a, prolongando-a,depois deixando fugir 0 gesto, propositadamente ou comoque de improviso! Parece querer b incar com as suas

- r''''l D,QOc,~I' - _ '~Tela~oes. ~ o~~,e:.elaS. J!nem nao sao, comona hipotese associacionista, ~~s;--&sua unidade e intrinseca, nao faz mais do que sobreviver....., ,,",,-,,:v-~~ /'--. ~

ao desdobramento a que precedia.(0A urn nivel mais elevado, 0 efeito pode ser de origem

externa, embora incorporando-se ao gesto. Vma peque-nita de urn ana puxa a toalha da mesa, que opai tern queapanhar para impedir que caia para 0 chao. A segundavez, ele coloca a mao em cima da toalha e segura-a,depois de a crian~a tel' ja puxado urn poueo. Esta para,admirada, e depois recome~a, mas limita 0 seu gestoa ligeira desloca~ao anterior, e recome~a assim pOl'diver-sas vezes. 0 gesto, em vez de continual' a sua maior ampli-tude, como inicialmente, .Qt~z"l!e, pois, !!I!! ..efeito cuja.caus?- inici~J ,era Ullla resis!!ncia estranha. Mede-se a simesmo e substitui a for~a anteriormente dispendida a quee justamente necessaria para reencontrar uma limita~aoque tinha primeiro causado surpresa. Tambem aqui naoe extrinseca a unidade entre 0 acto e 0 efeito E:: uma.~m~!~i~~S,~.<!~~..ze~J;.Q.£ealmente experimentadq que setorna 0 regulador ~_~_~sillLO intermedTrrio E?ntre ele e uma circu~tancia exterior.~~O efeito pode ainda unir dois domi~ios diferentesda .actividade. Como ja muitas vezes tinha acontecidosem suscitar qualquer especie de interesse, a mao dacrian~a passa no seu campo visual. Mas agora ela fixa-a

com 0 olhar, mantem-na imovel, depois afasta-a, depoisvolta a aproxiina-Ia e, durante algum tempo, este torna--se 0 seu exercicio preferido. Sem duvida urn gesto for-tuito foi 0 seu ponto de partida. Mas nao pode repetir-secom vista a reprodu~ao do efeito ~o dia em quese tornou passive] UID_l;Lcoordenac;aoentre a activida,Mdo campo visua~ ~2~movimentos vOluntarios. /I

E esta r:?,y~~ ~~ evidentementeligada a. maturac;ao de centros nervosos, que a crian~adescobre e que se pae a explorar. Assim, as liga~Oes ,,;tv 1]

que ela reconhece e que estabelece nao reunem elementoss ~,(.,~U:\,o

&em relac;ao entre si. Elas nao faiem mais que ubhzar ~montagens disponiveis. Mas sac igualmente susceptiveisde se multiplicarem e de se diversificarem mais au me-nos, conforme as circunstancias e a sua utiliza~ao .

Do mesmo modo, a aptidao para perceber e pararealizar no espac;o ou'-no tempo nao so relacoes de--------~ontiguidade, como indica Koffka, mas tambem c..Q!.!fi-gura~Oes, durac;~~s,Jit!!1.Q§, ~~~_~~~~~a~~s. A do labirinto nao se fazde esquina em esquina, par unidades distintas, mas comoum esb~o do conjunto modificado de prova para prova.E de uma sucessao qualitativa que emergem em seguida

JDo -0;'./"'0

. rCI 'l-, c· (""as unidades, e nao de unidades simplesmente justapos- r "":; I

tas que resulta a aprendizagem do trajecto correcto. C> 1/'''VtC'

DirecQOes e distancias fundem-se numa especie de tododinamico cujo seguimento guia 0 animal. 0 efeito naoe exterior ao acto. Ele e em cada momento e sim!:!lJJ!.-neamente 0 resuTtadO e 0 regulador.

A uniiio do acto e do efeito pode ainda nao tel' parfundo urn plano funcional, mas associar circunstanciasau objectos cuja uniao e contingente, arbitraria, e quedepende unicamente da actividade que as combina. E urncaso semelhante que Thorndike quis realizar com a suaprova palavra-algarismo. Mas tambem aqui, par maisdiscordantes que pare~am, os dois termos nao se ligamposteriormente. Estao ja ligados em potencia pela apre-senta~iio do enunciado, pelo tern a da experiencia, pela

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expectativ~ que ela suscita, pela conclusao que implica.A palavra mdutora cava urn vazio que 0 algarismo vempreencher, mas apena,s a titulo provis6rio. Se nao for~~~inado pela aprova~ao esperada, nao e de sur-preender que ele de~apare~a. E um unico acto continuo~que ~e desenvolve. entre as duas interven~oes inicial etermmal do expenmentador, interven~oes complementa-res uma da outra. A resposta do suj.eito e tao solidaria.duma como da outra. Sem a segunda, a operaGao ficainacabada e nao deixa vestigios.

Sem duvida, a satisfa~iio de ter acertado e, segundoThorndike, 0 que se acrescenta ao duo algarismo-palavrapara 0 ligar. Tolman, porem, mostrou que em certoscasos um result ado semelhante pode ser obtido pOl' umadesaprova~ao, que e tambem uma especie de conclusao.o que e e-ssencial e que 0 acto tenha completado 0 seucicIo e que a expectativa tenha encontrado 0 seu objecto.

{

uma impreSSiiQ~§~ra.d$..vel, um sofrimento. pode, tal~.JJJ1l-p.razer, satisJa~e-la e dar-Ihe um significadoimp~tantE;. Ela pode ser 0 indiced-o que procuramos oudaquilo que queremos evitar. Neste caso, e mesmo muitasvezes desejada. Integra-se em muitas das nossas ac~oescomo um estimulante, como uma advertencia, comoum ingrediente necessario ou habitual, cuja existenciapOl' vezes temos necessidade de verificar a todo 0 custo.

'. 0 sQf.l:lmentQJLuu.LJ~felto entre Jlllli.tOS._o~.e...-QSi quais se pauta a nossa ~Gtividade. e gge_s.erY.e.rn-paralhe\ fixar os resultados.. - ._----~.

Desde as impressoes que acompanham 0 exercicioduma fun~ao ate aos criteri.ps...q.u..e._I:.egulama realizaGaoduma t!!ref~, aquilo a que se chamou a [leI do efeito~a;\~rgo~~c?n~~~r~~e!J.n~.te ~/~ r_e.~~9irculare~ que sac 0 principio dos primeiros eierciciosesponfaneos aos quais se entr~gQ. ll-~~i~~~a' d;-~aidad~. No campo das experiencias possiveis, cIa sus~itaos seus actos de investiga~ao e de aquisi~ao concretas.

{Fa.la pro~se~i~, d: etapa em etapa, um perpetuo tra-balho de ld~ntlflca~ao funcional e objectiva.

Diz-se que 0 jogo e a actividade caracteristica dacrian~a; e porque muitas vezes poe nele uma aplica~aoextrema, alguns aut oree , como W. Stern, chama ram aosjogos da crianc;a ioqos a strio. 0 jogo seria, segundoa Sr." Ch. Buhler, uma etapa da sua evolu~ao total,a qual se decomporia tambem em periodos sucessivos.Efectivamente, confunde-se facilmente com toda a suaactividade, enquanto esta se mantem espontanea e naorecere 0 seu objecto das disciplinas educativas. Na pri-meira fase, estao os jogos puramente funcionais, depoisos jogos de ficc;ao, de aquisic;ao e de fabricac;ao.

Os jOgo8 tuncionais podem ser movimentos muitosimples, como estender e dobrar os brac;os au as pernas,agitar os dedos, toear os objectos, imprimir-Ihes balan-ceamentos, produzir ruidos ou sons. 11:; facH reconheceraqui~ocura e efei os alias aindaelementares, ~ominada pOl' aquela lei do efeit que tern,

• ~.,/')..../"...r--·""..,...~como vImos, uma lmportancia fundamental para prepa-rar a utiliza~o ajustada, cada vez mais apropriada emais diversa dos nossos gestos.

Com os jogos de ficQiio, cujo tipo e brincar com aboneca, montar urn pau como se fosse urn cavalo, etc.,intervem uma actividade cuja interpreta~ao e mais com-

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Lo) ,NiP (Ple~a.' ~as que est~ tam~em ~s proxima de certas;), '1"" \' ~efl.n.!..<l..oesmelhor dlfe!_er1_cjac!-~~~JJl..Ltern .Ai.do~'p-~S

, I I, \ do Jogo.\f\I,U I

U 0" ,",,1. Nos jog os de aquisi9ao, a crianga e, segundo umaexpre~sao corrente, toda olhos e toda ouvidos; observa,e~cuta, esforga-se pOl' perceber e compreender: co is ase seres, ~, ~, contos, cangoe,E, pare cern captl',-latotalmente.

Nos jogos de !abrica9G.o, div<:rte-se a reunir, com-binar, modificar, transformar objectos, e a erial' novos.Longe de serem eclipsados pelos jogos de fabrica<;ao,a fi~~i.o e a §:~~i~~o 1:..e~_aqui, muitas vezes, 0 seu

._p~p~ ..Porque e que se deu a estas diversas actividades 0

nome de jogo? Evidentemente pOl' assimilac;ao do queo jogo e para 0 adulto.

Ele e, antes de tudo, lazer e pOl' isso opoe-se a acti-vidade seria que e 0 tl·abalho. Mas este contraste naopode existir para a crian<;a, que ainda nao trabalha e paraquem 0 jogo constitui toda a actividade. Convem, noen tanto, examinar se a actividade que distrai nao temalguma semelhan<;a com a da crian<;a.

,,' - -~ 0 jogo nao e essencialmente 0 que nao exige esfor~Q.,'M,/I , I pOl' oposi<;ao ao labor quotidiano, porque 0 jogo pode

exigir e fazer libertar quantidades de energia muito maisconsidera veis do que as necessarias para uma tare faobrigatoria: estao neste caso certas competic;oes despor-tivas ou mesmo alguns actos realizados isoladamente,mas livremente. Do mesmo modo, 0 jogo nao utilizaapenas as fOr'{;as deixadas sem emprego pelo trabalho.

~

Em particular, l1~m s~rnpre slL.trata de restabelecero equilibrio entre aptidoes desig-ualmente postas a prova:exercicios motores depois do trabalho intelectual ou no

\trabalhador intelectual; distrac<;5es intelectuais depoisde um trabalho manual ou no trabalhador manual. POI'-que 0 habito das ocupa<;5es intelectuais pode, pelo con-trario, desenvolver 0 gosto pelas distrac<;5es intelectuais,e a aplica<;a~ continuada aos gestos profissionais sus-

citar a inclinagao pelos desportos. Depois de urn trabalhointelectual, a distrac<;ao pode ser um jogo de azar;depois de urn trabalho de esfor<;o fisico, uma leituranem sempre serve de distrac<;ao. Pelo contrario, ~~eitura mais dificil ~ ~~~~ualmente servir de dis-trac<;ao em rela<;ao a outra, desde que nao tenha, comoesta, que se integral' num trabalho, e que scja vmaleitura a margem das tarefus a realizar.

Nao ha actividades, pOl' mais arduas que sejam, que) r *-nao possam servir de motivo para 0 jogo. Muitos jogostem em vista a dificuldade, mas 6 precise que esta sejaconsiderada em si mesma. Os temas que 0 jogo se prop5enao devem tel' raz8.o fora de si mesmas. Pade aplicar-seL~~'.J\\EYao jogo a definig8.o que Kant deu da artc: «uma fin~lidade sem fim», ~~1~1 L..,C/-.fI( d--6nad~Zb Desde que uma actividade l"l/JI/"'~~orne utilitaria e se subordine como meio a um fim, il'i-;;>J;;,perde 0 atractivo e 0 caracter do jogo. (

Com esta defini<;ao concorda a distin<;8.o q11e Janet (i :rp,~),- (fez entre a actividade realista ou pratica e a actividade I L-

ludica ou actividade de jogo. Adaptar a sua conduta as .circunstancias, de maneira a obter resultados conformesa uma necessidade, quer exterior quer intencional, ~-~up5e, segundo Janet, a intervenc;;ao do que ele chamaa «fun!tao do real». sem a qual nao existe uma ac<;ao-'1>( "'j'

verdadeiramente completa. POI' mais simples que seja, !" ' ,',,:,c,J (I-)"""'r'-.

esta ac~ao exige um grau de «tensao psiquica» ~e naoexist~ numa acgao mesmo muito mais complexa, masinadaptada, c com maior razao Burna aC_@Qque nao tem,outro objectivo neJD...Qll!!(l.~!2n_~~<;aosenao eill-.prQQ!:.ia.Ha momentos em que tais aetas sao os unicos que 0

sujeito consente. Existem ca60S de astenia psiquica emque 0 doente nao pode executar outros. Apresentam umaforma degradada da actividacle, mas tambem um estadode repouso no exercicio das fun<;5es psiquicas, que explicao car[lCter recreativo do jogo.

A oposi<;ao entre a activic.lade ludica e a fungao doreal pode mostrar em que sentido a actividade da crian<;a

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se aseemelha ao .jogo. ~eLa.:~~,ntaoA.<l~$, ~~~_g'~;an:::s,-~.no;,conJu~t~ .das ClrCU~!~.~l~~~~J3' clrcunstanclas externas, que lhes permitemmserir-se no curso das coisas, para 0 modificar; circuns-tancias ment9Js, que fazem com que eles sirvam paraa consecu<.;ao dum fim, duma conduta, para a solu<.;aodum problema. A- distin<;ao e, alias, aRenas proyis6ria.P?rque 0 !Ega~ e 0 termo"Qe...t.Qg.~?-J~f!li;gao~~em existk,' afinal, no mundo exterior. Mas 0 cir-cuito das opera<.;oes- ou a serie das Wegra<;oes - queai conduzem podem ser mais ou menos longos mais ou

:menos desenvolvidos, estando as opera<.;oesmedtais maiselevadas ligadas a fun<.;ao dos centros nervosos supe-riores, aos quais sac integradas as fun<;oes de nivel infe-rior, come<;ando pelas proprias fun<.;oesvegetativas.

A compara<;ao das especies na sua serie evolutiva,assim como 0 desenvolvimento individual do sistemanervoso em cada especie, mostram que existe uma suces-sao na forma<;ao das estruturas anatomicas que tornampossiveis as manifesta<;aes de actividade, desde as mais

, imediiitas au mais~l~lILent.~.res ate aquelas -c.i;jQ§"~motivos\pertencem ao dominio da !'~~enta<;ao concreta o~ Slm-\ .=-,.__ ._-~ - ..,"--------IbOlka c das suas combina<;oes. A ordem pela qual secompleta a estrutura dos centros nervosos eleva a matu-ra<;ao as fun<.;oes correspondentes, reproduz a do seuaparecimento na escala das especies. As mais primitivasintegram-se progressivamente nas mais recentes e per-dem ass'im a fma autonomia funcional, isto e, 0 paderde se exercerem sem controlo.

Mas 0 periodo que se segue a sua matura<;ao e queprecede ados centros aos quais devera estar sujeitaa sua actividade i urn periodo de livre exercicio. Pro-visoriamente isoladas, estas fun<;oes nao correspondemao plano de actiyidg.de eficaz Que e agoQ 0 da especie.Por isso, as suas manifesta<;oes tern algo de inutil e de9~' Parecem. nao ter qualquer finalidad~esi proprias. E e assim que elas .Qgdem lembrar os jOgOSjdo adulto. ----

Efectivamente, as etapas seguidas pelo desenvolvi-mento da crian!;a sao marcadas, uma a uma, pela explo-sac de activi~ que, por algum tempo, parecem absor-ve-Ia quase totalmente e das quais a crian<;a nao secansa de tirar todos os efeitos possiveis. Elas assinalam'a sua evolu<;iio funcional e alguns dos seus tra<;os pode-riam ser considerados como uma prova para descobrir ( )ou medir a aptidao correspondente. Alguns jogos aosquais a colabora<;ao entre crian<;as ou a tradi<;ao deramuma forma bem definida, poderiam servir de testes.De idade para idade, eles assinalam 0 aparecimento dasmais diversas fun<;oes. fFUn~essensorio-motora~ comas suas provas de destreza, de precisao, de rapidez,mas tambem de classifica<;ao intelectual e de reac<;3,odiferenciada como 0 l?igeon-voz{:--ru..~9~sjl~u~t.t..u;J!1K'@,de memoria verbal e de enumera<;:ao como essas ca1lti-lenas ou pequenas formulas que as criancinhas aprenaemuma:s com as outras com tanta avidez. Ou ainda(!unc;oef~i"sociaonra-a(f~nos jogos que opaem equipas, clas, ban-dos, nos quais os papeis sac distribuidos tendo em vistaa colabora<;ao mais eficaz para a vitoria comum sobreo adversario.

A progressao funcional que marca a sucessao COSfjogos durante 0 crescimento da crian<;a e regressan noadulto, mas regressao consentida e, em certa medida,excepcional. Porque a que existe e a ~ntegra<;iio globalda sua actividade face ao real. l!: entre elas que muitasvezes 0 jogo !iberta as actividades. 0 bem-estar que subi-tamente provoca e 0 de urn periodo em que nada maisvai contar para alem das incita<;oes, quer intimas querexteriores, relacionadas com 0 exercicio de aptidoes habi-tualmente reprimidas, talhadas segundo as necessidadesdaexistencia, com a consequente perda da sua fisio-nomia, do seu sabor original. Supoe certamente, a res-peito das tendencias e habitos utilitarios, urn poder deadormecimento, em estado de resolu<;ao funcional quenao e 0 mesmo para todos nem em todos as instantes.Nao sabe brincar quem quer, nem quando se quer.

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E precise disposi~ao e pOl' vezes urna aprendizagem ouurna reaprendizagern. Se a cornpanhia das crian<:;as padeser tao repousante, wor~e ela faz voltar 0 adultoa llctLvid?-_<i~~desligadas entr~- si e despreocupadas.

~uma fundo as impcsicoes ou as limita~6es quenormalmente eIa experimenta de adividades de certomodo mais responsaveis, is1:o e, que tern urn lugar mais~minente nos comportamentos de ~I/I~ A desintegracao passageira Sl1-

J20e a integra~ao habitual.Daqui resultaria que todos aqueles «jogos» das crian-

<;as, que sac a primeira explosao das fungoes mais reeen-temente aparecidas, nao poderiam ser chamados jogos,dado que nao existe ainda aquela que poderia integra-Iasem form as superiores de acgao. E 0 que distinguc efec-tivamcnte 0 jogo dos mais novos e que, sendo esta todaa sua actividade, falta-lhe a c s iA

• '0. No Icntanto, esta actividade tende a superar-se a si propria.Toda a paragem no desenvolvimento, que a fixa nasmesmas furmas, slibstitui 0 Jogo pOl' estere6tipos quedao ao comportamento do idiota a mesma monotoniade comportamcnto do psicastenico, e ao seu humor 0

mesmo aspecto de obsessao e de obstinagao tristonha.o jogo da crian<;a normal, pelo contrario, assemelha-

-se a uma exploraGao juhilosa au apaixonada. que ~ !a experimental' a fungao em todas as suas possibilidades.Parece arrastada, pOl' um::l especie de avidez ou deatracgao, a atingir os limites dessa funGao, isto e, 0 ins-tante em que ja nao fariamais que repetir-se, a menosque se integrasse numa forma sup€rior de actividade,cujo aparecimento ela pr6pria torna possivel, alienandoa sua autanomia. Como todo 0 desenvolvimento pressu-poe ~apas ulteriores, estas d.~~mpenham na criant;;ao mesmo rapel que, D..Q-a.du1iQ, as actividades a respeitodas quais, pOl' uma especie de retrocesso, 0 jogo podemomentaneamente libertar 0 exercicio das fungoes tor-nadas escravas pelo seu uso habitual.

Esta manifesta:- relaGao dos iogos com 0 desenvoIVi-lmento das ..arrtidoes na crianGa~ com a sua hierarqui- (za~8.o funcional no adulto inspirou ~ de sen-

1ICfc> contrf..rio, que procuram explica-Ios pela evolu~ao,uma invocando 0 passado e a outra 0 futuro.

o que acabamos de vel' sobre as relagoes que 0 jogomantem com a dinamica e a genese da actividade totalda-nos urna ideia das contradiC}oes que se observam nassuas definiQoes e tambem na sua realidade.I Enquanto para Janet ele e uma forma de actividadeI degradada, Herbert Spencer considerava-o 0 resultadoduma actividadc superabundante, de que as tarefas cor-rentes mio teriam podido esgotar todas as l'esel'vas.Facilmente se objectou que muitas vezes ele sobrevemem momentos de cansaQo em que se tornaria custosaqualquer ocupaQao seria e util; seria pOl' consegninteo jogo uma manifestaQao de esgotamento, pelo menosrelativo.

No entanto, a actividade «ludica» que Janet descreve,na psicastenia, como efeito de uma voltagem demasiadobaixa para produzir um CiCtOque esteja ao nivel dascircunstancias reais, esta bem longe de ser assimiIavelao jogo. Em certos aspectos, e mesmo 0 inverso. Acorn-panhada muitas vezes de angustia, nao tem a sua influen-cia t6nica e nao merece, de modo algum, como ele, 0 nomede distracgcio.

o jogo e, sem dllvida, uma infracQao as disciplinasou as brefas que a todo 0 horn em impoem as neces-sidades praticas da Sua existencia, a preocupaQao da suasituagao, da sua personagem. Mas, bem longe de sera negaQao ou a renuncia dessas necessidad€fl, 0 Jogopressupoe-nas. E em re1:1g8.oa clas que e apreciado comoum periodo de repouso e tambem como um recobrar deenergias, porque, livre das exigencias de tais actividades,o-jogo e 0 livre inventario e a manifestaGao destas audaquelas disponibilidades funcionais. S6 11a jogo se exis-tir a sa~\L~ __g.-.e_sul!trair!l1omentaneamente 0 exer·

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Segundo Stanley Hall, eles seriam, de idade paraidade, a revivescencia das actividades que ao longo dasciviliza~oesse sucederam na especie humana. as lns-tintos de ca~a ou de guerra, pOl' exemplo, teriam 0 seulugar exacto no crescimento psiquico da crianc;a, levan domesmo a reinvenc;ao de tecnicas primitivas, como as dafunda ou do tiro ao arco.L", !2.rem, a chamada reproduc;ao da filogenese pelaontogenese, que' nao deixa de apresentar dificuldades,aplicada a simples sucessao das forfias anatomicas noembriao, torna-se ainda muito mais i~osimil se se~~ ta_.ste__~,~sirpi~~E_.~~,,~_~~p.~,_da.,,~,~jE~,a.~~~~,~el~~.-9.ue.?,~e.'l.~~~envolvimento espontane() faz p'~_r,~gt:r.erfl:.Q."'psi-ql;!~~.Q, ,<i?-, ~r~anga. Porque 0 tra~o de uniao deveria sernecessaria mente biologico. Seria mesmo necessario admi~tir, com 5l<)1Jl!k9J.!Art~-.Rdgdos caracteres adquiridos. queesta longe de se encontrar demonstrada, ~1·tO ..(f)~-

SOW..P!XXy~, ~!p,g.t!.~,~s~ri~~~,~!.cadosLao mefiIDotempo V;;U':Wi,q':le..?~J~:es_to~,-()8.,}I?:st_~~_~~t?s,j,~_,lhSls-c.o~_~_PDUg em· 1f:~vo'1r~Mas, ainda que 0 organismo fosse capaz de fixar seme- 1c,,,,r!J :1lhantes combina~6es, como e que a sua establlizac;ao~ioIogica nao seri~J.!1ILJ2b_staculo a rennv:ac;ao muitasv~~e~_t.~R~(ta_daaJecnicas, s~~ nao hay~~i-;-hist<hria ~l!rp~!!? (1)

Na realidade, esta hipotese de uma recapitula<;;ao au-tomatica pOl' parte da crian~a das epocas vividas pelosseus antepassados procede da velha confusao entre 0 bio-logico e_0 social, que conduz a representaGao do com-portamento do individuo como a consequencia imediatae, de certo modo, mecanica da sua constituic;ao psicofi-siologi ca. Ora. ~1~!!3.:~~lrpY-,,~_~9,_,IE!!i<L.g~0n:.P9~J.a~Jividade de u~_~s.~_~-?J..__~Rs~l'Jl~jos", ?5\ se}1s Qbj.ecj;.o.s,

1/,/( i/..i. o~ se~lStemas, e. quando se trata do homem, Q....illrio

, J !~ocial sobrepOe-se ao n:!.eio,natur?:l para 0 transformarfoA"lO /1/!.:l'uPJ..,L- ,de ~~~_de_~ra .J.9M~bst~do-o totalmente. Quanto, m~is nova e a crianc;a, isto e, quanto mais necessita de

cuidados, mais estritamente depende dele. Toda a seme-lhan~a autentica entre os seus jogos e as praticas dt:maoutra epoca nao poderia,portanto, tel' po~ig.~m senaouma daquelas tradic;oes, cuja lembranc;a 0 adulto pode tel'perdido, mas cuja transmissao entre criangas e tao iJer-sistente quanto sublily/

Mais frequentemente ainda, segundo parece (1), estasemelhanc;a tem pOl' origem a ~s,..4a-t!!Lmodo corren~ que _pert~~..m a todas as ~~,conforme as pcssibilidades e as sugestoes que oferecemas possibilidades motoras, perceptivas, intelectuais, dosujeito .

Este poder de combinac;ao instrumental determina,alias, grandes diferenc;as entre as especies animais, apBr-feic;oa-se com a idade da crianc;a, varia com as S~lasaptidoes individuais. Em igualdade de niveis mentais,nao e para admiral' que as mesmas combinac;6es se rcpi-tam em presenc;a das mesmas situac;6es e das mesrnasrealidades, e que deem lugar a «estruturas» de certomodo especificas entre a actividade e 0 objecto,- pOl' umaespecie de inducao au de criacao reciprocas. Quantosjogos, que alias as crian~as aprendem umas com asoutras, se explicam pela simples ~r~r, a fim de irem buscar a ele os meios.t>ara os seus proprios meios e assimilarem dele partescarla vez maiores.,--,-----'--

Esta incitac;ao directa e constante do meio .sobretodas as veleidades da crianc;a nao poderia deixar dereduzir os vestigios das acc;oes ancestrais, se elas tives-sem efectivamente tendencia para se reproduzirem pOl'si proprias. A indispensavel economia dos instantes e ::tasforc;as faz com que 0 passado inutil desaparec;a di8.Ii.tedo presente, tanto mais completamente quanto maior fora margem dos p:rogressos possiveis na especie humana.

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I d~w'Q-f, ") ~ ~, } I Mas explicar-se-a 0 progresso pela simpIes ac~ao doI ".,(}(, _

!if,rJi';'~ ,I', presente, nao podendo ser arrastado para 0 futuro pOI'",' uma serie de antecipa~oes? Para aquela especie de pro-

JJ " :~~. r, ,gresso que faz sair 0 adulto da crian~a segundo urn ciclo, tl"~ que regul8. unl"estrito encadeament~ de condi~oes fisio-

~?ii~~~~/1;,iR~~~l, AssiITl,"- o;jogo-; ;e-rlama prefigura,~ao e a aprendizagem das actividades quedevem impor-se mais tarde. Sao diferentes, no rapaze na rapariga, segundo as caracteristicas dos papeis queos esperam. Eles estao, sem duvida, ja dominados peladiferencia~ao que se ohserva ao mesmo tempo na mor-fologia e no comportamento de urn e de outro. Sahe-seque essa diferencia~ao depende das influencias de hor-monas, que sac diferentes segundo 0 sexo, e ja se pude-ram mesmo observar, em certas epocas que precedemde longe a maturidade sexual, sinais de actividade dasglandulas genitais. Os pressentimentos funcionais e asantecipa~Oes de instinto em relagao a data da sua ver-dadeira eficiencia explicar-se-iam, portanto, sem difi-culdade. 'N o'ent;;-t;j as tradi~oes e os costumes podem~~ ~ontribuii. E.~r.~__9-por o~.jQg.Q~_<!.~s.~~~osd~s r_~.p~Egas_numa medida que e dificilavaliqr. Mesmocom uma educa~ao perfeitamente semelhante, poderia

(' It ainda subsistir entre eles a diferen~a das ocupac:;oes\' I~' n domesticas e, Bobretudo, 0 exemplo dos adultos, sabre, .,,:,,\ ) 0 qual cada urn, segundo 0 sexo, decalca as suas pre-

vis5es para 0 futuro e a sua orientaQao mental.Inspirando-se, para interpretar os jogos, nos meSl110S

principios evolucionistas que as teorias da recapitulaGaoe da antecipac.;ao funcional, a teoria de Freud contradi·lasnag suas aplicac.;oes. 0 instinto sexual ou libido, seja qualfor 0 seu suporte biologico, imporia as suas exigenciasdesde 0 nascimento. Porem, antes de se poder fixar noseu verdadeiro objecto, que esta em relagao com a matu-rac.;aodas func.;6es genitais e com 0 acto da reprodugao,as .suas fixa~6es obedeceriam a determinagao combinadadas sensibilidades caracterlsticas de cada etapa do desen-volvimento individual, e de influencias que remontam ao

mais longinquo passado da especie. Enquanto os objec-tivos funcionais da sexualidade exigem que a crian~ase desligue a pouco e pouco dos objectos provisorios a quese afei~oou, os «complexos», nos quais sobrevivem situa-~es ancestrais, tendem ,a faze-la reter as fixac.;6es quese relacionam com eles. 0 conflito pode tomar-se tantomais grave quanto menos confessado for 0 complexo pelaconsciencia e quanto mais censurado e recalcado for, PQr:illJ.eem oposic.;aoescandalosa com a moral. Este recalca-mento nao pode suprimir 0 lihido; 9~-~Ao lado das ma~ifesta~6es neuroticas. ou psi-copaticas, e dos sonhos, os Jogos sao urn destes disfarces.,~ d~ serem,. como .nas te~rias precedente~, ~}expressao da func;:~o,~~-=--;:sua utilidade consistiria em operaI', atraves dessassatisfac.;5es desviadas, uma verdadeira catarse. As situa-~6es que eles ofere cern as demonstrac.;oes do libido sacde natureza a nao assustar ninguem. Substituindo-as aoseu objecto verdadeiro, eles dao-lhe no entanto a ocasiaode se manifestar e de se exprimir. l!: evidente que estatransferencia the evita as consequencias reais, mas temi-veis. Conserva-Ihe, todavia, 0 seu significado, que, apesarde inconfessado, nao deixa de estar ainda mais apto parasuscitar, diversificar e satisfazer as necessidades dumasensibilidade avida de se experimental' e de se conhecer.Opera-se assim a passagem da realidade it sua imagempOI' intermedio de figura~6es mais ou menos trans-parentes.

o maior merito desta teoria e, sem duvida, 0 dechamaI' a atenc.;ao para 0 que ha de fic~ao no jogo.Com a ficc.;ao,introduz-se na vida mental 0 uso illutimu--jm~q~~~~~O ~dici~~8JI!~:la_.ltgadoa.. ~o~sa,~ 0 simbolo s~scombinac6es intelectuais Ajudando a crian~a a transpor~~~~ . t teste limiar, 0 jogo desempenha urn papel Impor an ena sua evoluc.;ao psiquica.y

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Se estas diversas teorias nao dao uma explica~aosatisfatoria do jogo, nl:o e pOl' causa das suas contra-diGoes, mas das suas premissas contestaveis e das siste-matiza~6es demasiado fragmentarias que provocam.

fU(!I!~' ) 0 jogo resulta do contraste entre uma actividade liber-.' cv-

J..;/c .' tada ® ~quela~ em que normalmente ela se integra.D).'CA/v' E entre oposi~oes que ele evolui, e e superando-as que

se realiza.\ Ac~ao que se liberta das suas sUJel~oes habituais,

pr. 0 jogo depressa se perdera em repetigoes monotonasV ~~~ ~.fuatidiosas ~na~ se impu~!-regr~, par vezes maist )6 1(' estritas que as necessidades as quais ele se esquiva.

rA " A sua fase puramente negativa deve, pais, suceder uma(;rJ,1((lIJIAloutra, que restaure 0 que tinha sido abolido, mas dando

urn outro conteudo a actividade, urn conteudo puramentefuncional. Porque sac habitualmente dificuldades que assuas regras suscitam, dificuldades tiradas das propriasfun~6es as quais 0 jogo faz apelo. Em vez de quaisquerobstaculos devidos as circunstancias, sac dificuldadesescolhidas, especificas, que e .e.reciso resolver pOl' si_~m.aJL.e j~._~_~.h.._!!.....Q.ressao dos acontecimentos,do interes~e. No entanto, est~icter-gratuito'daobe-diencia as regras do jogo esta longe de ser absoluto,definitivo; a sua observancia pode tel' pOl' efeito a supres-sac do jogo que elas foram feitas para alimental'; por-que se e verdade que 0 seu significado procede da acti-vidade que elas regulam, elas podem tambem, inversa-mente, contribuir para the retirar 0 seu caracter de jogo.

E assim que a sua dificuldade, se inspira mais 0 temordo insucesso do que 0 gosto de triunfar, inflige a ideiade esfor~o urn aspecto de necessidade que repele, quesufoca, 0 livre entusiasmo do jogo e 0 prazer que a eleesta ligado. Pooem as regras tambem dar a impreS3aOduma necessidade exterior, quando elas sac 0 codigoimposto pOl' todos a cada urn, nos jogos em comum.A crian<;;a,que distingue ainda mal entre a causalidadeobjectiva e a causalidade vOluntaria, entre as obriga~oes

inevitiveis e as consentidas, faz muitas vezes os possiveispOl' se subtrair a elas, fazendo batota. Em boa logica,corta assim 0 jogo pela raiz e nega-o no seu principio.Na realidade, tende somente a desloca-lo, substituindourn objectivo pOl' outro. Mas, de facto, a sua tentativade frustrar a vigilancia dos seus companheiros despcrtaneles 0 espirito de contenda, pelo que as regras recebemimediatamente urn caracter oposto ao que 0 jogo exigiria.Tomam urn rigor ~bsoluto e formalista, urn aspecto deconstrangimento, que sac 0 inverso da incita~ao que asmesmas deveriam ser para ac~oes plenamente livres nocampo de fun~oes nitidamente qualificadas. 0 resultadoe convincente: ruptura entrees jogadores, descontenta-mento reciproco. 0 jogo transformou-se no seu contrario.

A batota, que e tao frequente, tao espontanea, sobre-tudo nas crian~as, que nao pode deixar de estar ligadaao jogo pOl' la~es essenciais, poe tambem a questao doexito. Tambem aqui ha oposi<;;oes.0 jogo, que natural-mente pretende ser urn esquecimento momentaneo dosinteresses prementes da vida, nao tarda contudo em esmo-recer se nao intervier a esperan<;;a do exito. POl' estarazao, segundo Janet, ele seria urn tonico, pOl' ocasionarexitos faceis, ao contrario da realidade. Efectivamente,nao e a sua facilidade que parece estar em causa; quantomais dificil e 0 triunfo maior e a sua for<;;atonificante;e em muitos jogos a dificuldade e intencionalmente au-mentada para aumentar 0 entusiasmo. Porem, a vanta-gem assim procurada e diferente das vantagens reais;e-lhes mesmo oposta. As suas consequencias duradoirase globais, que consagram superioridades efectivas, maspOl' vezes sem titulos suficientemente convincentes, elesubstitui 0 exito puro, 0 efeito imediato do merito ou dasorte, de urn certo merito ou de uma certa sorte, 0 qualnao lhes sobrevive. AlUlupremacias habituais, pOl' exem-plo as da fortuna ou da autoridade,.sao provisoriamente

y'ost~e~or;el~ ai~~~_a_est~~~~Eeitose pode considerar ~.x.rj:~~or.

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fie CA(JL

-«(i(..(;-'

Mas, para ser completo, urn triunfo deve fazer-seexperimental', fazer-se conhecer. Dai o~~que muitas vezes the estao associados. Muitas vezes pura-mente demonstrativos e simb6licos, podem tambem con-sistir num beneficio eventual que pode estimular 0 prazerdo jogo, pOl' ser incerto, excepcional ou urn pouco ines-

\\

perado. Mas pode tambem extingui-lo, se e procuradopo: ~i mesmo e entra no dominio dos interesses da vidapratlCa.

E para evitar qu.e os resultados ou as manifesta~6esdo jogo se situem, pela sua grande pl'obabilidade ou pelasua forma demasiado previsivel, entre as coisas que per-tencem ao dominio da vida normall que desde sempreo acaso the foi aSfl~. As regras do jogo sao muitas- VVV'\I

vezes a organiza<;ao do acaso e com~!!sa}p _§.ssi}ILq_~~o_si~~xercicio d~ poderia tel' de dern~siadoseglllar e de demasillQ<2-mon6ton..<?-.:

o acaso e 0 antidoto do destino quotidiano e contri-bill para dele subtrair 0 jogo. Mistura assim aos praze-res funcionais urn certo sabol' de aventura. Porem, sea sua parte se exagera ou se se mantem isolado, maisuma vez 0 jogo e suprimido, nao conhecendo 0 jogadorsenao a anglistia da espera. Jog::J.rcorn as suas emo\<oes,excluindo qualquer outra actividade fisica ou intelectual,e talYe~ um;iQKo, mas duma,_eg~~!:t~~rticular~_~~_._se~parenta mais,.as_,t~~tc'~riiipias dO -q1Jg_J~.l~gi~~J.u!l:cionais.

A fic<;ao faz naturalmente parte do jogo, pois elae 0 que se opoe a crua realidade. Janet mostrou muitobem que a crian~a M..o-§"Lilud~ cO~.3im.ulacro~ queutiliza. Se, pOl' exemplo, brinca as refei<;oes com pedaGosIde papel, sabe muito bern, ao baptiza-Ios de iguarias, queIcontinuam a ser peda<;os da pape!. Diverte-se com a sua;livre fantasia a respeito das coisas e com a credulidadecumplice que as vezes encontra no adulto. Porque, fin-gindo ela pr6pria acreditar, sobrep6e aos outros umanova fic<;ao que a diverte. Mas i5S0 nao e mais que- umafase negativa de que depressa se cansa. Em breve preci-

samos de mais verosimilhan<;a ou, pelo menos, de mais~artificio na figuraciio. Ela .obriga-se a re~lizar uma maior )}.o. f('n

conformidade entre 0 ob]ecto e 0 eqlllvaJepte que the r '}I'CU;

'rrrocura dar. Os seus exit os satisfazem-na como uma vito- c/ .•I;;,::,,,,

ria das suas aptidoes simb6licas. (;~I.~i:";Diz-se que a crian<;a nao cessa de alternar a ficc;ao l' 'e-<' . /.

r\(,ciAO com a observa<;ao. Na realidade, se nao as confunde, ""~~;'J~'(; como pOl' vezes parece, tambem nao as dissocia. Ora 't,~;ff) ,

~Sd>: absorvida pOl' uma ora pOl' outra, nunca se desprende (~fL

Ob rtlJ , N- d'<Jf"-'II' completamente de uma na presen<;a aa outra. ao elxa-::::-7 de as entrela<;ar uma na outra. As suas observaGoes nao

~ f' -fll' estao ao abrigo das suas fic<;oes, mas as suas lCGoes,~I',.#~ b -

{?JJ,l (,..) estao saturadas das suas 0 serva<;oes.

A crian<;a repete nos seus jog-os as impressoes queacaba de viver. Ela reproduz e imita. Para as maisnovas, a imita<;ao e a regra dos jogos, a unica que Ihese acessivel, enquanto nao puderem ultrapassar 0 modeloconcreto, vivo, para atingir a ordem abstracta. Porque~ua compreensao ~e, a principio, mais do gue uma \assimilagao de outrem a si e de si a outrem, n~la imitagao de~empenha precisamente um grande papel.Instrumento desta fusao, ela apresenta uma ambiva1en-cia que explica certos contrastes de que se alimentao jogo. Nao e indefinida, mas muito selectiva na crianGu,.Fixa-se nos seres que tern para si maior prestigio, os queinteressam os seus sentimentos, que provocam uma atrac-<;aodonde a sua afeigao habitualmente nao esta ausente.

Mas, ao mesmo tempo, eIa transforma-se nest as per-sonagens. Sempre total mente ocupada com 0 que €3m

a fazel', a crianga imagina-se, quer-se no lugar delas.o sentimento mais ou menos latente da sua usurpagaocedo 1he inspirara sentimentos de hostilidade contraa pessoa do modelo, que nao ode eliminar cu'a su e-riorI ade continua muitas yeze~entir a ~~~-tante jnevitavel e desconcertaE,lte,. a quem em seguida

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quer mal pela resistencia as suas necessidades de <l9.mi:.nio e de seAp;'~i~ri;-a-~~i ~~s~~.-' , -

-' ---...---Freud foi 0 primeiro que indicou nitidamente est a

ambival€mcia, invertendo parem os termos: 0 ponto departida da crian~a seriam os citimes que sente par causado pai e leva-la-iam a sublimar a sua manifestaQ8,o soba forma de superego. Contudo, 0 pai nao e 0 tinicoobjectivo da crian~a, nem 0 citime sexual 0 tinico motivoque orienta a sua sensibilidade. Pelo menos tao primi-tiva e muito mais insistente e a sua necessidade deestender a sua actividade a tudo 0 que a rodeia, absor-vendo-o e deixando ela propria absorver-se; em seguida,o desejo de apoderar-se, de ser a conquistadora e naoa conquistada.

Esta dupla fase da~os ~1:1ta <!u~a alternativa quese observa nos jogos das crian~as e de que subsistemvestigios no adulto, nos jogos que sao considerados proi-bidos e nos que sac permitidos; a proibi~ao que parecepesar sobre uns traz automaticamente consigo a neces-sidade da autoriza~ao dos outros.

a sentimento de rivalidade que a crian~a pode sentirpara com ~_~_pe~ que imita explica as tendenciasantiadultas de que ela da frequentemente provas nosseus jogos. As vezes _perse_@~~ ~_?_esc~~~, como secorresse 0 risco_de_tlueelas1 d~:l!~~!~ssem as substitui~oesde .e~ESOJ:1aliq9-de_'ie_Sl!:!..~sao,em imagina~ao,.-2.- instru-mento. Sem dtivida, a seu caracter mais ou menos clan-destino nao e muitas vezes mais que urn meio de defE.sacontra a censura au a condescendencia dos adultos, quelimitariam a sua livre fantasia ou 0 credito que a crian~aquer poder atribuir-lhes. a seu mundo privado deve serprotegido das curiosidades ou das interven~oes intem-pestivas. Porem, ao caracter secreto dos jogos vem mui-tas vezes juntar-se a agressividade.

_A forma que ela toma pode as vezes fazer lembraros mais antigos conflitos entre a crian~a e 0 adulto.Alguns factos muito judiciosamente observados pOl' Su-

zanne Isaacs mostram, efectivamente, a frequente liga-~ao que se observa no comportamento da crian~a entre9\ }(~9~.t()}$i/~9e a, i,rv~u_t){:r,?!n~9i()_:Quando satis~az assuas necessidades, manifesta par vezes urn gosto vlOlentode oposi~ao e, inversamente, a sua oposi~ao vai busearas seus meios de expressao ao vocabularill ou mesmo as_.--=:._----- (,.realid~des ~3:!£~~ Sao tantas as 10cu~6es corren- L "1' ~)U

tes, tantas as imagens ou lendas said as dum folclore; ,1r _."..- - rcomum a todos os' povos, a atestarem esta umao, que nao j 'Lit? (,0-,

ha necessidade de insistir mais nela. A sua origem re-monta sem duvida a epoca em que a sensibilidade dosesfincteres, sendo uma das que mais vivamente absor-viam a crian~a, era, ao mesmo tempo, 0 campo em quepela primeira vez se enfrentaram as suas necessidadese as exigencias do meio, muitas vezes acompanhadas desan~oes. Porque a disciplina das suas mic~6es e das SJasdefeca~oes foi 0 primeiro esfor~o que ela teve que dirigircontra si propria sob a imposi~ao de outrem. Nao e, pais,para admirar que as suas posteriores veleidades de rebe-liao evoquem esta associa~ao inicial, com uma formamais ~u menos simb6lica, e que 0 humor de oposi(.aoSLu..~._ac,ompanh~certo_~ __iQgillLt~nha tend~J1.ci_a.l!~utilizar ~(.. -)- 'Mas a agressividade vem habitualmente juntar-seuma inquieta~ao de culpabilidade. A sua origem comume 0 desejo que nutre a crian~a de se substituir aosadultos; as impressoes de que se alimenta sac especiais.Crian~as que brincam «ao papa e a mama» au «aomarido e a mulher» procuram evidentemente reproduziras ac~oes e os gestos dos pais, mas a ~uriosidad~impele-as ~rer sentir os motivos intimos daquilo quel!nitam, e, par falta de conhecimento disso,ea _~_:~~ssoal que VaG recorrer. Nao ha ainda muitotempo que 0 objecto preferido das suas explora~oes trao proprio corp?' ~epois 0 do ou~ro,. segundo a transfe~lrencia do s~~~.3~e.~reciprocidacfe, que sac urn processo constante da evo-~ca da crian~a.

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Des~e modo, sabem proporcionar-se um antegozo das:nsual1dade. Nao e mesmo excepcional que estas curio-slda~e~ autossomaticas e heterossomaticas deem lugara. pratl:as sadomasoquistas, que os participantes man-tern cUldadosamente ocultas, com 0 pressentimento de8ue seriarr: censuradas. Assim, aprofunda-se a oposiQao

I entre ~ ~nanc;a e 0 adulto e confirma-se a intUlc;ao deque ha Jogos proibidos. (.')

POl' contraste, uma especie de exibicionismo assinalaos que pare cern permitidos. A criancinha quer ser vistaqu~ndo os pratica e nao deixa de solicitar a atenc;ao dospals e dos mais velhos. Mais tarde, nao se entregaraa eles sem antes 0 anunciar com grandes demonstrac;6esgesticulatorias ou vocais. E finalmente, sempre que forpossivel, quereni distinguir-se com urn uniforme insio'-

'. .'''vVV'~' ~~lla\s au urn eqUlpamento de jQg:ador.Quanto aos adu(tos:/p~r' muit~livres que sejam do

seu tempo ou da sua pessoa, ha poucas que nao set:nham POI' vezes surpreendido a esboc;ar urn gesto fur-tIvo para dissimular que estavam a jogal'. Para alguns,o jogo pode criar remol'Sos. Mas para a maior parte,sem duvida, e 0 sentimento da autorizaQao que aC8boupOI' vencer 0 da proibiC;ao e que aumenta em muitoa alegria de jogar. Permitir-se 0 jogo, quando parec~ ~chegada a sua hora, nao sera reconhecer-se digno duma )'o[;e)

tregua que pOI' algum tempo suspende as imposic;6es, ,\)I>./A0~rigaQ6es, necessidades e disciplinas habituais da exis- (J:\,Otencia? I\VV I.-

c'- ,j

Entre os 6 e os 7 anos e passivel subtrair a crianQaas suas ocupac;6es espontaneas para fazer com que seentregue a outras. Nao hi muito tempo podia eomec;.arpara ela nessa idade 0 trabalho produtivo e mesmo 0 dafabrica, como e ainda 0 caso em certos paises coloniais.Agora sac as disciplinas da escola que the sac degti-nadas. Estas pressup6em, inevitavelmente, um corres-pondente poder de autodisciplina.

A actividade mais elementar nao conhece, com efetto,outra disciplina senao a das necessidades exteriores;encontra-se sob 0 controlo exclusivo das circunstanciasactuais. Em easo de desvio entre uma reacGao e asexigencias da situaQao. muda-se a eonduta ate realiz;arurn ajustamento satisfat6rio. ~ pOl' isso que nao h30auto-matismo ou reflexo, pOI' mais fixos que pareQam, que naotenham sido ~minados pOI' excitantes apropriados . '" 1'"

e que nao sejam modificaveis na ~ida. ~ arbi-} ~nf'l; /:trario distinguir entre as respostas do organismo e as c>J,t.~1,v'suas eondic;5es externas. Mas quanto mais se complica

'll a sua estrutura, mais elas se podem diversificar con-Iforme as cireunstancias.

Ao mesmo tempo que se acentua a sua diversifica9aO,o campo de excitaQao amplifiea-se e afina-se. A excita~iio

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elemental' da lugar a um conjunto que the precisa 0

significado. Os indicios complementares e discriminado-res do significado podem ser impressoes actuais, mastambem os vestigios de impressOes e de condutas ante-riores. 0 proprio significado pode ser relativo ao mo-menta presente ou a uma eventualidade mais ou men osdif~rida, que implica a previsao. 9~o~j~~!!V~~Y~9--IlP~aSSlm destacar:-se da situa9ao presente. Eles esUio, alias,?eJl1~.lo~K~de ir bus car a sua motiva ao unicamente ao

)1 meio fisico. ge. in.spiragao social ou ~c!-eoJ-~m,eJ~.pode, ~ntrar em conf1i!_o_~()ITl~ _sit.ua.~Q._mat!Orial(to momento.

Deste modo, as disciplinas da acgao sofrem umaespecie de interiorizagao e 0 seu aparelho funcional tomauma tal complexidade que a sua actividade, ou melhor,as suas diversas actividades, podem parecer, em muitoscasos, que se exercem independentemente das circuns-tancias ou pOl' si mesmas. 0 jogo, como vimos, corres-pC1ndeja ao exercicio das fungoes pelas proprias fungoes.Quanto a independencia em relac;ao as circunstflncias,ainda nao e senao a substituic;ao das necessidades actuaispor necessidades fundadas em antecipac;Oes ou conven-

I Qoes. Com efeito, na crianc;a, as fun oes em via de emer-Ige~cia exe:...cem-s_~R.rim~irose~o objecto alem del!!§

.i proprias, Mas chega 0 mom~_~~subordinar a_.!IIQtiyos ll...uelb-e_i:! serao heterogeneos. eentao anuncia-se a idade do trabalho e 0 comportamentoapresenta novas caracteristicas.

~ a inercia que a caracteriza na epoca dos purosexercicios funcionais. A crianc;a e totalmente absorvidapelas suas ocupac;oes do momento e nao tern sobre elasnenhum poder de mudanc;a ou de fixac;ao. Dai resultamdois efeitos contrarios, mas que podem ser simultaneos:a perseveranc;a e a instabilidade. A actividade que seapoderou da crianc;a prossegue fechada sobre si mesma,repetindo-se ou esgotando-se nos seus proprios porme-res, mas sem se estender a outros dominios a nao serpOl' digressao fortuit a ou rotineira. Se se transforma,e pOl' substituic;ao, ou porque, vazia de interesse pela. sua

monotonia, deixa 0 campo livre a que primeil'o aparecer,ou porque uma ligagao acidental a faz alienar-se total-mente numa outra ou, enfim, porque repentinamente cedediante do atractivo duma circunstancia imprevista, dumaestimulac;ao surpreendente ou aliciante. ~ai 0 aspectocontraditorio da crianga, alternativamente absorvida pOl'aquilo _~_.f~z, a ponto de-p;~ecer estranba~~Miy.el •.~o'ambiente que a rodeia;. d~~l!tr.aid.a.-J2e.IQti~~~ ais"ln sjKl}ific~.nte.s_e..B.enLqualq.uer...rec.orda~a..o-.a.parent~do-mom'ento anterior. Mas, numa avalanche de diversoes,~m mesmo tema pode persistir e manifestar-se, querpelas suas repetic;Oes intermitentes quer misturando-seaqueles que se seguem, e contaminando-os de maneiramais ou menos coerente.

Segundo as observac;oes da Sr." Ch. BUhler, dos 3aos4 anos, a media do numero de distracc;oes durante urnmesmo jogo e de 12,4; entre os 5 e os 6, nao vai alemde 6,4. Sera que 0 poder de regresso a ocupac;ao iniciale maior nas crianc;as mais novas? Bem pelo contrario,a durac;ao do jogo aumenta nos mais velhos, ao mesmotempo que diminui 0 numero das distracc;oes. 0 que estaem causa, portanto, e 0 poder de lhes resistir. A persis-tencia do tema atraves das mais numerosas distracc;oesnao e de tel' menos em conta. Denota, contrariamente Ia uma potencia activa, uma potencia de inercia. c~sefeitos nao sac contrariad~ - antes pelo contrario-pela instabilidade concomitante.

o sentido desta evoluc;ao e posta em evidencia pOl'uma outra que esta em parte relacionada com ela.Ao mesmo tempo que aumenta a durac;ao dos jogos,Ch. BUhler nota que os motivos de interesse ou de pr~·zer aos quais a crianc;a reage tern cada vez men~;;Cessidade de pertencer a circunstancias ~uai§. Emesmo este progresso apresenta graus. Leontiev observaque a crianc;a de 8 a 9 anos so e capaz de perseguirobjectivos mais ou men os afastados se tiver estimulan-tes sensoriais que assinalem 0 seu esforc;o com sirnbolosconcretos. Entre os 10 e os 13 anos, estes deixam a pouco

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OS DOMfNIOS FUNCIONAIS:ESTADIOS E TIPOS

As necessidades da descriGao obrigam a tratar sepa-radamente alguns grandes conjuntos funcionais, 0 quenao deixa de ser urn artificio, sobretudo ao principio,quando as actividades estao ainda pouco diferenciadas.Algumas, porem, como 0 conhecimento, surgem mani-festamente tarde. Outras, pelo contrario, SaD aparentesdesde 0 nascimento. Existe entre elas uma sucessaode preponderancia. Alias, para a reconhecer, e necessa-rio saber identificar 0 estilo proprio de cada uma e naolimitarmo-nos a simples enumera~ao dos tra~os que sliosimultaneamen te observa veis.

a que torna a coisa mais necessaria e tambem maisdificil, e que 0 desenvolvimento da crian~a e, sobretudo,nos primeiros tempos, de tal maneira rapido, que assuas divers as manifesta<;Oes se sobrepoem umas as ou-tras, de tal modo que muitas vezes urn mesmo periodo e,em propor~ao alias variavel, de estilo compOsito. Masa individualidade dos sistemas assim justapostos .podeser confirmada pela Patologia (1). Certas interrup~oes&L.desenvol:vimento psi~.i_~Q i~pOem'--a tOdas as reac-~oes do sujeito 0 tipo correspondente de comportamento.

I'J'"\.;. . ., ". \j

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Elas vem todas sucessivamente esbarrar po m_~_s~.n1Q.) Dai resulta nao apenas a sua uniformidade mas tam-

) ) hem 0 facto de poderem atingir uma espeeie de, perfei~aolformal que e habitualmente de mau agoiro. Toda a vir- () iIJV')C,"J\lu~a.<k-_parcial ao longo do crescimento deve fazer' ,: """"'-I;

/ pensar numaactividade que continuaria a exercer-se \:'"I\;~~':';Iindefinidamente por si mesma, j)or na"o ser~,!p,az _d~_§.e '-,1 r)"rt

';',:,',\' ~ntegrar no~ sistemas co~secutivos, que ima evolu?a0.J. r'"" normal devla fazer surglr. 1R0rm~lmente com efelto, "

'. a elabora~ao de uma, desde --que-torne possivel 0 apa- I I

l· d ' ~.,""'t'recimento da seguinte, faz com que e a seJa capta a, ~talhada em vista de necessidades que the sac especifi-

Icamente estranhas; e, consequentemente, o~ ,s~~r ,

lespecific_os veem-se~m~it~ ,:~z~1?li~~~,, So poderao entao encontrar eventualmente uma oportu-

nidade para 0 seu livre desenvolvimento EO jogo ou~I, ~ctividas!~es!etica, que~~t~QJ!.l ..~~nt~.J..!i fun_:-

~~~J~.z:~vizadas ~~x...E.~~ ..k,9-. seu ...e'Se~,:'S~ci,o~9~,.exI?ressao proprias'll 0 I{ (- , 'J

Segundo 0 momento e 0 nivel em que se produz, /,1

( a interrup~ao do desenvolvimento psiquicol p&ie ser ma- 'ci~a ou, pelo contrario, podElnao ser incompativel comuma certa diversidade funcional, mas em que se afirmauma dominante, normalmente caracteristica de um~-'

~/' -" '".' " ....,..idade de crise. No primeiro caso, que e 0 da idiotia, ltodas as manifesta~oes de actividade estao uniforme- ;' /'mente ligadas ao mesmoestadio. Elas nao se sabem iadaptar as -circuns~nc~:~~~~~-e~~~~-Jjam em estreita rela~ao~ consigo me~m~ Quando, pelo,contrario, continua a ser possivel a diferencia~ao das ',?

fun~oes, 0 comportamento ultrapassa os limites do esta- \dio, mas pade ser detectado par urn determinado .tiILO1de efeitos. 'Umas,vezes e marcado pelo excesso persis-~tent~ de uma fun~ao que nao pOde ultrapassar 0 estadoludic'o e que encontra em si mesma as linicas razOesde actividade: e 0 caso da incontinencia e da insanidadeverbais de certos d-ebeis mentais. Outras veze~ 0 efeitoe mais difuso. Sao todos os actos do individuo que

apreeentam, por exemplo, urn caracter infantil, querporque a~~~~o parece estar atrasada em rela<,;aoaos interesses que conviriam a sua idade, quer porquea sua textura e a sua formula apresentam uma fisiono-mia que demonstra uma consciencia ainda pueril da suapessoa.-----

No entanto, a i~suficiencia e tambem muitas vczesmais ~screta e de consequencias mais intermitcntes .

,.,Ela pode ser mesmo susceptivel de compensa<,;ao ou desobrec0.!l1pep!,a~ao e '-;ctuar' como estimulante para sus-citar substit.ui~oes. Por vezes resultam daqui, efectiva-mente, verdadeiras superioridades. Mas este desvio, sepode de certo modo enriquecer a fun<,;ao, pode n[o--Che-gar a suprfmir-a sua fragilidade interna, subitamenterevelada por golpes de surpresa, por influencias depri-mentes ou pela simples fadiga. Em todo 0 caso, 0 equi-librio em que se baseia 0 comportamento de cada urnpode ser muito diverso. Nada poderia dar a conhecermelhor a sua estrutura, ~ seus altos e baixos, ~~. observa ao, na crian a das suas componen e rela-~o~~~ D,e maneira

I geral, IStO tern como consequencla urn conhecImento de-I:alhado das trocas e adapta(}oes reciprocas de que sac\susceptiveis os diferentet3 dominios funcionais.

A sua delimita(}ao pode, alias, nao ser feita semalguma ambiguidade. Com a afectividade se relacionam,segundo parece, as manifesta(}oes psiquicas mais preco-ces da crian!}a. Ela esta automaticamente ligada as suasnecessidades e automatismos alimentares, que ~Q guase J:.l l '~"?(C

imediatamente consecutiyos ao nascimento. Parece difi- \cil nao fazer depender da afectividade, como expressao t

( D~APO'PT"~'"

de indisposi(}ao ou de bem-estar, ~- 1"US( utA

mento mU6cula e vo al a c As gesticula~oes~ \Jo~

a que tambem normalmente se entrega, parecem ser Jao mesmo tempo ~~~ Qe_£.razer. Ela tem ai 0".)

a sua Q.!se proprioceptiya, como nas fUl1!<oesviscer~, l)'~)t f' :><~pecialmente as do tuba digestiYo, a sua base inte- 'tl-\f'Y~

roceptiva.

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Sem duvida outros movimentos, subit06 e intermi-tentes, que sao, pelo menos aparentemente, consequenciade uma excita<;ao espontanea, podem tambem produzir--se, mas como que sem querer. ~~e~s-carg~_s, a semelhan<;a ile-e.stnW.t.ralLj.iL~QILGILt.llidas~'~r;npIes i~con ti~encia dinamica dos centros _nexvoJ,'LQs-e.~iciente para as explicar. Semelhantes impulsos SaGsusceptiveis de se produzir a todos os niveis da activi-dade psicomotora. Sob uma forma mais ou menos disso-dada, eles revelam a sua textura fraccionada. A suacausa evidente e u~lQ9,tQls!!~~!.:l~e ~d./e~~~~~£~t~~lo. Assim sendo, sao ~icis> da falta de 1matura<;ao ou de desequilibfiO do sistema psiquico. Mas i~~;~~~~:~ si I!1.e~z:r29s,~~J~.~~~I}J.f~§ja.<;Q~ __~tQ~s J

Nao e arenas 0 primeiro comportamento psiquicoda crian<;a que e de tipo afectivo, mas tambem 0 daidiotia no seu mais baixo nive!. A agita<;ao cor res-pondente e entao feita s6 de gritos, em que se sucedemas intona<;oes da c6lera, do triunfo, do sofrimento, e ati-tudes ou gestos cujo significado emocional 6 evidente.Estes efeitos desencadeiam-se, muitas vezes, <:.,oma sim-ples p!,~_sen<;adeyutrc!?, mostrando assim a que camadaprimitiva e profunda da sensibilidade pertencem as reac-<;oes a que se pode dar 0 nome de imponencia, porque.e.arecem 0 reflexo da personagem ~q)lL~gda JillLJeya<;l~lltI:.()_.~~_~_!.~a~L.!l todas as I!essoas que 0 _enc~~t:Ea.Isto e, evidentemente, 1:!9~9-9~~~~!l1~-!11o.-~~,QS~i-91_.®-~.t3j~t.9, 1l.fl1a~sp~~le_de vigil?-I}cia ~ifeE~n~~~.~d~ealin:-enta 0 q~e. hi ~.e mai~ _viv.o n9-~e~!!JlE:).rJp~~.~-:jolAalidade. Mas, pelo que toea a propria personalidade,o seu desenvolvimento pres?up'~e ,0 _~e.!!1at~.ja evolu<;aoJ2si.ql:lic.a.

1'1 ihf Ap~'§_9J'A~~r, atraves destes reflexos de aco-,mod~ao a presen<;a de outrem, ~~~f~rll...<io.§._instintos!mais fllndnment~is, ~I2~ss~!!-8.<i.cl!~K1!.<lc.JOrm~Lllm.Jo.dQ..I ' '.--constituido por meio do coniunto das Qutr~s.cD:~I?i!.~f.!:!.~-

cionais. Nos casos de involu<;iio mental, em que as I' ~?o'~,,:""~fun<;6es vao normalmente desaparecendo na ordem in- .; ::,,~c:'••cversa da sua aquisi<;ao, ela e 0 que se altera em primeiro I:,'"""

lugar. Lesoes que pare cern deixar intactas as mais com-plexas opera<;oes perceptivas e ate mesmo intelectuaisatingem, no comportamento do sujeito, 0 que se reta:l\ciona com 0 sentimento queerepossuia da sua dignidade .A sua sede parece ser essencialmente a regiao prefron-tal, que e a mais tardia no desenvolvimento da especiee na maturagao do individuo. ~ pelo sentimento de per-sonalidade que s~ a<?sreflexo.s de ~o.2!'g!!:1.~co,que inserem 0 individu'O-'como tal .no seuamblente, os valores cujo unico ...§.tWorte conslste emno<;oes compret~e abstractas ou ideais, uma vez_w;Seu objecto nao pode ..!epor..t~!-se a uma exi~t~nciamaterflir-- mas'-apenas'a:- consequencias eventuais, cujo---=-;ivel varia, alias, com a civiliza<;ao da epoca e 0 graude evolu<;ao psiquica atingido pelo individuo; umas vezesobjectivas e sensiveis, outras mais estritamente intimase morais.

Os dominios funcionais que se estendem entre. as IP~~~:;\r~Il'

reac<;oes ~ e as 4a,:.p-e~g'L~~~1 SaD "'1 C''''- ~~os que estao voltados para as realldades exterlOres: IC~~realidades umas vezes presentes e actuais, outras vezes ' ,:..

~--~ausentes e imaginarias. No primeiro caso, as rela<;oes \ ~SaD constituidas por reac<;oes motoras, mas cujae com·bina<;oes podem apresentar diferentes niveis: desde a I ~r6o", HM'

simples liga<;ao circular, que liga um movimento as;ensa<;oes exteroceptivas q~e provogl,l..c ~1lli3 sensa~s-------------- .- (f cCA.';'~_Q.Dlovimentoque as..pTI>YQQa,ate a capacidade de reco- (I Q( UtA

nhecer, com vista a urn resultado bem definido, as (2)A\5<oM).

possibilidades espaciais ou mecanicas oferecidas pelo -r,'J V"'O~

campo perceptivo, capacidade que foi descrita. com 0 l'J) I/Jll 11

nome de ~ou~ (~~~~,~~, passando pela sImples mas mUltas vezes dlflCllapropria<;ao das estruturas motoras q~le_sao os nossosautomatismos, _natura,is_..o_u_apTeendil!.os, 'C1.a_.~~Jrutura

dos obj~ct.os~_~ 0 dominio do acto motor.

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No outro caso, n800 8endo 0 objecto ou 0 aconteci-mento directamente perceptiveis e eficazes, tern que ser~~presentados de uma maneira ou de uma forma qual-

.1";' JG'~.I" Iquer. 0~i!-~l que pode corresponder a esta_I" '~,,,,. : !,~~~.~en.t~s.~o so~_ ut!liza V!l_coI? .a condic;8oo.Jiereceberri·..·J ~m_slg~lflCado que se acrescente, ou antes, Clli.ese subs-~',1.1'" ~ titua it sua -m:.QQriaaparencia.1 Detectar e definir estes~~.I)'" ~ignificados, classifica-Ios, dis~£i!~~S:-reuru-los, c~-l .';, r'? frontando as relac;oes logica-s- e e~p'~rilllentg,is,.. te!1tar). ~econstruir Parseu interm&dio -~ pos~i'yel_e~trutura das

coisas: tal e 0 dominio do conhecimento, que apresentar~ ..A./'--_"'.../\.../' -•.•.••••••.••••••..~ ••......•••.•••~

igualmente varios niveis dlferentes e de que a evolu-C;8oomental da crianc;a demonstra os primeiros estadiosdecisivos.

Os dominios funcionais entre os quais se dividirao estudo das eta pas que a crianc;a percorre serao, par-tanto, os da afectividade, do acto motor, do conheci-mento e da pessoa.

o grito do recem-nascido, grito de aflic;ao, segundoLucrece, per ante a vida que se abre diante dele, gritode angUstia, segundo Freud, no momento em que sesepara do organismo materno, nao significa outra coisapara 0 fisiologista que urn espasmo da glote, acompa-nhado dos primeiros reflexos respiratorios. A sua moti- ~ - L,;: .vac;ao psicologica pelo pressentimento ou desgosto e,) :o~".YY>.:L:de facto, urn tanto mitica. Mas a sua reduc;ao a urn w,,,:t&c..~simples facto muscular e tamoom uma abstracc;ao. Elefaz parte dum todo, de urn complexo vital. Ao espasmoesta ligado 0 grito, mas tambem urn conjunto de con-dic;oes e de impressoes simultineas que se exprimemtanto no espasmo como no grito. Ne.ste estadio elemen-Jtar, n~~~~~nte .d~s~~i_~~ir:~,nj;re,.9-~~e~-&.~~

Digamos, de urn modo mais especifico, que nao e lv.' " , tpossivel distinguir no espasmo 0 movimento da sensi- (/Y~"~:j.;l;//1?ilidade, como m~is tarde as sensibilidades dos movi-) elf .J j1£e

mentos de tipo mais evoluido, de circuito'mais extenso /" d.-d,e mais diferenciado. 0 espasmo da iris nao se efectuasem sofrimento e a (mica soluc;ao e paralisar a iris.o espasmn Jo intestino provoca c6licas, tao frequentesna digestao do bebe, que lhe fazem dar gritos, sem

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duvi~a ~exte~sao fi~.Ql9glca do_~sP~_!U2~~parelho_Ee~pl~~torlO-, P5{~~~§ ;nJi~. ta3:d.~.~u~.~~~_~~~o.~?,gnto .c~~o .slI?pl~S~meJ~_ge_ ~xY.r~s~3:9!,-...?~mrelaQao~hrecta com a que e~terioriza .. A generalizaQao dOes-pasmo a todas as visceras. - E*lofago, aparelho respi-ratorio, aparelho circulatorio - traz consigo a angustia.Alguns espasmos, como 0 orgasmo venereo, podem serfonte de prazer. Mas eles rOQam muitas vezes 0 sofri-mento, pois 0 prazer e tanto mais agudo quanta maisproximos estao, sendo muitas vezes a sua estimulaQaoprocurada atraves de excitaQoes dolorosas. Entre a an-gUstia e a excitaQao genital pode, alias, haver confusaoau uma passagem transitoria. 0 desejo erotica frisaa angustia; urn estado de angUstia, mesmo de angUstiamelancolica, dissolve-se eventualmente em praticaseroticas.

o prazer au a allvio parecem acompanhar os espas-mos em que se despende uma tensao excessiva emdemasia. l!: 0 caso dos soluQos, que sao urn rem atehabitual da angUstia, e menos excepcional que a espasmovenereo. 0 riso intermitente e estridente pade ser igual-mente a descarga de uma expectativa au de urn cons-trangimento prolongado, a evasao de energias retidase acumuladas. 0 proprio riso normal e uma cascatadp sacudidelas que consome a tensao dos musculos e quehabitualmente os amolece, suprimindo toda a capaci-dade de esforQo. Ao contrario dos soluGos, desenvolve-semuito mais nos musculos estriados do esqueleto que nosdas visceras, e a sua c.ausa habitual parece ser menosuma elevaQao da tensao que urn abaixamento do limiaracima do qual ela se pode conter.

Mas trata-se aqui de espasmos ja organizados, queultrapassam as simples contracQoes dolorosas, dos apa-relhos viscerais ou motorE*l. Em vez de serem elemen-tares e esporadicos, eles encadeiam-se e sao reguladose ate mesmo reguladores das energias que neles sedespendem. A sensibilid,a?e ~ue ~IE.~~~slelestransfer:e;se J~~~~o~£~.il!~.to e, ge puramen~ganica ----

Ii C<UC\(

,,~~ou~_po~~.~ ~?!:~3!:-~~poral. ;; .. ,o sofnmento bruto que correspondia aos seus par~ 1'.

!!!QLe drenado, deslocado, diluido, subtilizado e final-mente integrado em actos psiquicos que transformam

.' .~. gradualmente a sua tonalidade incomoda em simples<J.~",W.oi .

:.!¥ # ;,1::;- aguilhoes da consciencia. Esta evoluQao pode ocorrer!~l~,,~;IT~:.~na crianc;a ao longo das etapas que assinalam as pro--~ gressos da sua afectividade.

o espasmo alicerc;a-se na actividade tonica dos mus- "./ . , ...culos que recede os movimentos ropn~s. I0'[; "daoA agitac;ao do beM inclui bruscos periodos de ca ma TC,",v'Clque the fazem passar de uma atitude para outra. Em (cada urn dE*ltes periodos as musculos parecem disten-der-se e endurecer-se, em vez de se contrairem au seestenderem em gestos susceptiveis de explorar 0 espac;o.A contrac<;ao e macic;a, tetaniforme, propaga-se comouma onda, atingindo especialmente a musculatura verte-bral e a musculatura proxima, quer dizer, aquela queservira sobretudo para a E*ltabilizaQao dos movimentose para 0 equilibrio do corpo.

Os primeiros reflexos sac reflex Os tonicos de defesaou de atitude. Urn contacto, uma beliscadura na pelaprovoca uma retracc;ao ou uma distenc;ao atetosica domembro. Urn ruido provoca urn estremecimento,,.aem.e:!,!Iante a esses bruscOElrelaxamentos ~ tonus que acar-x~J~~ vezes a sua subita libertaQao pelo ·sono. As( (/I(,:~'t,;

influencias das excitac;oes labirinticas sobre 0 compor-] ("C.; -/7.tamento do recem-nascido sac evidentes. Elas podemser suficientes para modificar sistematicamente a posi-c;ao relativa da sua cabeGa e dos seus membros e expli-earn 0 prazer que ele sente em ser embalado.

l!: a uma estimulac;ao labirintica brutal, a.uma impres-sao de queda, que estao ligadas as reacGOes da primeiraem ao itidamente diferenciada na crian a: ~.TamMm as ou ras, cada uma a seu modo, correspon-dem a variaGOes viscerais e musculares do tonus, proce-dendo eonsequentemente da fungao postJU:al, onde Sher-::.i~gt.<:~r~~niu ~Q.Q_gue~. Bebendo

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deste reservat6rio comum, serao elas tota.lmente redu-tiveis entre si? 11':: a tendencia de alguns, como Watson,para explicaL a diyersidade. d~s emo<;6es pela ac~ao das"circunstancias, que uniriam 0 se"u"nu.cleoinici~l a"excI:!antes e a reac<;6es .varia veis. ~ ~~9.t~stdacie~~t.?~~.s.~ ~ ,d~ fact~ _i!lcontestayel. Sejam quais foremas suas etapas na hist6ria da especie, .e1a.s.d~~_ndem~as de aAtQ~i~J:~9.-<W gue em~!..~rp....!!o_~~.!!1.'portamento dos individuos com u~ _e~ei!.q_d~.Q.l.9-j:~ra..<;aofuncional. 11':: assim que, fora de qualquer ocasiao propicia,elas podem dar lugar, no idiota, a uma serie de mani-festa<;5es que pareeem produzir-se pOl' si mesmas: naoapenas atitudes de agressao, de amea~a ou de medo.mas tambem de defesa, de suplica e gestos propiciatoriosem indiYidl!os~ no entanto, !lunca foram espancadosnem maltratados.,f'---:Xs-em~oes -consistem essencialmente em sistemasde atitudes que correspondem, cada uma, a uma deter-minada especie de situa<;8oo.Atiturle" <> "it"a";;o corres-~-~pondente implicam-se mutua.n1.~nte, constituindo uma ma-ne[ra global de reagir de tip-;;""arcaico, frequente nacrian<;a. Opera-se enta~ uma totaliza<;8oo indivisa entre

{as disl2O..sk~s psiquic.a.s, Q.tie~ mesillo)!,~ntido, (€1<?sinc"iq~y~ e.xteriores. Daqui resulta que}muitas vezes, e a emo<;8ooque da 0 tom ao real. Mas,inversamente, os incidentes exterior6's adquirem quaseseguramente 0 poder de a desencadear, Ela e, com efeito,como que uma especie de preven<;8ooque depende maisou menos do temperamento, dos habitos do individuo,Mas esta preven<;8oo,focando indistintamente a sua voltatodas as circunstancias de facto actualmente reunidas,confere a cada uma, mesmo fortuita, 0 poder de a fazel'ressuscitar mais tarde, como faria 0 essencial da situa<;8oo.

Pelo seu sincretismo, pelo seu exclusivismo em rela-<;800a toda a-Orient~i; diver~Dte:PeI~;u~_viyacid.a.dede i~teresse. e de impress8oo, ?'...~I!J.~...Q.i~~_<jalIl)~.teapta- para suscitar reflexos condicionados (1). Sob a sua. - .. ,. . ,./---

influencia, ela pode muitas vezes opor-se rnanifesta-mente a logica ou a evidencia. A~sim se cQI1l3Jj~..c.om-~xos afectivos irr~l!-tivei§_ a Jaz.a,o. Mas, a. em~otambem fomece as reac<;6es uma n!p!9-e~_~__sobretudouma totalidade que conve!!1 a9s _estadiQs da evoluQaopsiquica e as circunstancias da vid!:..~m que nao ~.E~-sivel a deliberas.8oo. /'~-_•.._--'--~._.~., ...---- .._- ....

As situa<;oes com as quais a emoGao confunde 0 indi-viduo n800sao apenas incidentes materiais, mas tambem ""r~ 0 ambiente human~e j'l1ll-

V"t'.no meio psiquico e substitui-o em grande parte, sobretudo ~. i/><''C'

na crian<;a. Ora compete precisamente as emo<;oes, pelasua orienta<;~o ps~c~genet~ca, desenv~lv:r. estes lagos'll",que se anteclpam a mtengao e ao raClOcmlO. As conse-quentes atitudes, os efeitos sonoros e visuais resultan-tes, representam para as outras pessoas ~~, capaz de mobilizar reacgoes seme-lhantes, complementares ou reciprocas, quer dizer, ~~ corn a_ §"U:~~Q-fle que s80Qo__e.~ e I0 indice ..:.

Entre as atitudes emocionais dos sujeitos que seencontram num mesmo campo de pel'Cep<;8ooe de ac<;ao,institui-se muito primitivamente uma especie de conso-nancia, de acordo ou de oposi<;ao. 0 contacto estabelece--se pelo mimetismo ou contraste afectivos. l1':: assim quese instaura uma primeira forma concreta e pragmaticade compreens8oo, ou melhor, de participacionismo mutuo.o contagio das emo<;5es e um facto comprovado varia-disslmas vezes. ~ende do seu poder __expres_si~, (noqual se basearam as primeiras coopera<;6es de tipo gre-gario)@ que !iIcessantes permu~_~_sem .duvida, ,ri~oscolectivos transformaram de mews naturalS ~ !!llmlCarng~.~~<L-naJ.. 1/

As influencias afectivas que rodeiam a crian<;a desdeo ber<;o nao podem deixar de exercer uma ac<;8oodeter-minante na sua evolu<;8oomental. Nao porque originemcompletamente as suas atitudes e as suas maneiras desentir mas, pelo contrario, precisamente porque se diri-gem, a medida que eles VaG despertando, aos automa-

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tismos que 0 desenvolvimento espontaneo das estruturasnervosas mantem em potencia e, por seu intermedio,as reac~Oes intimas e fundamentais. Assim se misturao social com 0 organico. /~", ,,' /.....,/'-- /'--

\. ,-''-'---Urn exemplo destas interferencias e 0 sorriso, a res-

peito do qual os observadores da infancia deram as maisvariadas opini6es. Atribuindo-Ihe imediatamente 0 seupleno sig}lificado funcional, Ch. Buhler afirma que 0

sorriso tern uma fonte puramente human a e que so seproduz em presen~a de urn rosto. Mas muitas obser-va~Oes contrariam esta asser~ao. Ele parece estar, emprimeiro lugar, ligado a estimulos cutaneos proximosda regiao muscular em que se produz: c6cegas debaixodo queixo (Dearborn) no 1.0 e no 2.0 dia; na face e nonariz (Scupin) no 2.0 dia; no nariz (Ament) no 3.0 dia;na face (Dearborn) no 5.0 dia; pressao na mao e nobra~o para brincar (Major) no 28.0 dia; contacto domamilo com a face (Blanton) no 28.0 dia; depois vemexcita~oes mais gerais e de tonalidade claramente afec-tiva: banho quente (Major) no 4.0 dia; bem-estar (Dear-born) no 6.0 dia (Baldwin) no 7.0 e 9.0 dias; repousodepois da mamada (Preyer) no 26.0 dia; sono depois damamada (Moore) na 5." semana; bem-estar depois dosono (Shinn) na 5." semana; bem-estar depois de fric~aocom oleo (Shinn) na 8." semana.

Urn pouco mais tarde, come~a a ac~o dos estimu-lantes exteroceptivos: chilreio da ama (Valentine) no10.0 dia; luz brilhante (Blanton) no 13.0 dia; sombraazul na luz (Blanton) no 16.0 dia; audi~ao de sons agudos(Darwin) na 6." semana. Por fim, surge, sem duvidaalguma, 0 factor humano: rosto sorridente (Moore)no 20.0 dia; conversa e mimica (Tiedmann) no 28.0 dia;sorrisos de adultos (Jones, Gregoire) no 2.0 mes; amaque balan~a a cabe~a e que canta (Piaget) no 45.0 dia;olhares amigaveis (Moore) na 5." semana; visao damae- (Darwin) na 6." semana; imita~ao dos adultos.situa~ao de jogo (Gregoire), tagarelice da mae, rosto sor-ridente, bugiganga prateada (Dearborn) na 7." semana.

It bastante nitida a ordem de sucessao destas dife-rentes espeeies de excita~Oes. Estao, em primeiro lugar,as que san urn estimulo imediato da tonicidade muscular,e depois urn estado geral de satisfa~ao organica que seexprime por uma reac~ao local. Em seguida, e a vezdas impressoes sensoriais de objecto distante. E, enfim.a 'a;c~ao a distancia de urn rosto ou de uma voz queexprime e inspira contentamento, urn contentamento decausa exterior e ja nao intima. Reac~oes que real~amo significado afectivo do sorriso, mas precedidas dasque se limitam a demonstrar a sua possibilidade fisio-logica: contractilidade do gru po muscular apropriado,subordina~ao deste grupo a impressoes exteroceptivas.E tambem deste modo, como demonstrou Insabato, queo riso e depois os solu~os podem ser provocados meca-nicamente pela impressao resultante de uma estimula~avmusculo-tendinosa profunda, mas eles san igualmentea consequencia e a expressao da afectividade organicae depois de circunstancias morais.

A indu~ao do sorriso pelo sorriso segue tao de pertoo seu aparecimento, tern uma seguran~a de tal modoelectiva, que se pode verdadeiramente admitir uma afi·nidade funci~al! devida a. propria natureza das mani-festa~oes emotivas ~ ~~o-;-~~~ples iogo do.s aCQn-tecimentos e dos reflexos condlClOnados. Mas, seJa comofor,-ele e urn exemplo dos process os pelos quais a sensibi-lidade da crian~a se estende ao ambiente; ~seus tra~os e nao se sabe disting!Jir deles. Esta exten.sao,~"-'-_.'-""~'\,...-\../~""""-'"'--~~ ~que e tambem uma aliena~o de si mesmo face as outraspessoas com quem se assimila, implica uma S~'l1EaI~ C""

fase inversa, e_mque 0 suieito se ~ara s.s:nhor de 8i d.-) .~.,"

opondo-se a outrem. Mas, entao, come~a a evolugao dapersonalidade. A emo~ao compete novamente unir os rv1V0,i"cindividuos, atraves das suas reac~oes mais organicas c ~.-e mais intimas, ~do esta confusao como conse.!l.uencia,as opos~6es e os desdobramentos de que pOdeFaO ir .gradualmente surgindo as estruturas da consciencia...lo 'Y /

(Of\h(1 t;N(.--

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I:,;; . ~ As emo,6e~, que sao a exterioriza,ao da afectividade,L"Ip!ovocam, assI.m, tra,n~forma~6es ~ tendem, pOl' outrolado, ~ reduzI-las. Nelas se baseiam as experienciasgregarias, que sac uma forma primitiva de comunhaoe de comunidade. As rela~6es que torn am possiveis afi-nam os seus meios de expressao, e fazem deles instru-,mentos de sociabilidade cada vez mais especiali~.Mas a medida que, ao irem-se tornando mais precisos/' /' ~: .. ../'"-.-----_./ -/ ------~_._-'o seu sIgnifIcado os torna mais autonomos, eles sepa-

-" /"- -_ ......•..•..--------ramose da propria emo~ao. Em vez de serem a sua ondapropagadora, tendem a reprimi-la, a impor-lhe diquesque destr~am a sua potencia totalizadora e contagiosa.

I' \' •• ~ mimica, IE~l~~~~~g~_m e convencao, Elliill-plica as tonalidades, as simplicidades tacitas, os suben-.tendidos e as enganos'}J J?.9n~r~ri.~/d9J:5~~-!-.a~

; ,,0 unanime que e uma em~ao autentica.,-'" / ....- .-~,.. .....,--/-- ....•...... /--------"'---"" ..•. _-"""""

Entre a emo~ao e a actividade intelectual existea mesma evolu~ao, 0 mesmo antagonismo. Antes de qual-quer analise, 0 significado de uma situa<;ao imp6e-sepelas actividades que suscita, pel as disposi<;6es e atitu-des que provoca. No desenvolvimento psiquico, esta intui-<;ao pratica precede de longe 0 poder de discrimina<;aoe de compara<;ao. Ela e uma primeira forma de com·preensao, mas ainda completamente dominada pelo inte·resse do momenta e baseada em casos particulares.Entre individuos, e 0 acordo ou a reciprocidade dasatitudes que podem em primeiro lugar realizar umaespecie de contacto e de entendimento mUtuo, mas aindatotalmente absorvidos pelos apetites ou pela impulsi-vidade do momento presente. Uma imagem que sirvapar~I....ll~Qm~o e ~~_poderanascer de~tas_rela~o..,gl:Lpragm~!icas e concretM atravesde uma redu~o g!:~~d~~~e~s,quer dizer, das emo~6es e~da/_.9-fect~e.

Inversamente, cada vez que prevale<;am de novo ati-tudes afectivas e a emo~ao correspondente, a imagemperdera a sua .?olivalencia, obnubilar-se-a, desaparecera.

P.: 0 efeito que se observa habitualmente no adulto:redu~ao da em~ao atraves do controlo ou da simplestradu~ao intelectual dos seus motivos ou circunstancias;desordem do raciocinio e das representa<;6es objectivasprovocadas pela em~ao. Na crian~a, e lento 0 progressodas suas reac~6es puramente ocasionais, pessoais, em..2.-cionais, ate alcan~ar uma re~esenta~Q mais estavel das- -7 ---"-----=======-=--------.coisas; e sac continuos os refluxos.

No proprio dominio da afectividade surgem trans-forma<;6es que sac 0 resultado deste conflito. Se forampossiveis as teorias intelectualistas das emo<;6es, issodeve-se ao facto da preponderancia adquirida pelos moti-vos e imagens intelectuais sabre 0 dominio dos senti-mentos e das paix6es. 0 seu enD foi nao terem notadoa redu~ao simultanea do aparelho verdadeiramente emo-cional, de terem confundido ~ c.9.~ sentimen!,:o...Queixa0.J quando afinal daquela para estes se opera umatransferencia funcional que, na crian<;a, depende direc·tamente da idade. Mas os mais emotivos nao se torn amnecessariamente os mais sentimentais ou os mais apai-xonados, longe disso. Trata-se, com efeito, de tipologiasdiferentes, que dependem de urn diferente equilibrio dasactividades psiquicas.

A crian~a que e solicitada pelo sentimento nao tern,perante as circunstancias, as reac<;6es instantaneas edirectas da em~ao. A sua atitude e de absten~ao, e, seobserva, e com urn olhar longinquo ou furtivo que recusaqualquer participa~ao activa nas rela<;oes que se enca-deiam a sua volta. Procurar que participe nessas rela~oesso a fara pOl' rabujenta e de mau humor, pela sua fal a~'V~~~j,4~®y~ ontacto e asiad~~ Parece encerraI' em simesma 0 circuito das suas Impress6es; frequentementeentretida a chupar 0 polegar, rumina-as dentro de si.

fEste periodo inicial, defensivo e negativo, s6 se poderamod~ar ~ ~ repre-~ntac6es mentais que fornecerao aos seus devaneiosmoliVos e temas mais ou menos inactuais.

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'( /-,,'~ r Na crianga, a paixao pode ser viva e profunda, Mascom eIa surge 0 poder de tornar a emogao silenciosa.Ela pressup5e, portanto, para se desenvolver, a capaci-dade de autoco~trolo e nao~pode anteci~~)oposigao~aramen:e se~hda entre 0 ego e a~as pessoas, ~aconSClenCla nao se_Pto_duz_antes dos 3 anos. Entao acrianga torna-se capaz de amadu~ec~~ s;c~~ta-mente fre-net~cos citimes, ligag6es afectivas exclusivas, ambigoesmalS ou menos vagas mas exigentes. Na idade seguinte,as relagoes mais objectivas com 0 ambiente poderaoatenua-Ias. Nao deixam de ser, par isso, menos revela-doras de urn temperamento.

~ indubit:avel que 0 sentimento e sobretudo a paixaoserao tanto mais tenazes, perseverantes, absolutos,qua~to mais irradiem uma afectividade ardente, em quec?~tmuan: a operar certas reacgoes, de certo modo vege ..tahvas, da emogao. Tambem nao deixam de ser a redugaoda emogao actualizada por outras influencias. Sao 0 Iresultado de uma interferencia ou mesmo de conflito~entre efeitos que_p.~!iencem a vida organica e postural

~-xQutros que dependem da represe. ntagao ou conheci-~~-~~_~t<?, .e davee~~~a:. ( ... )

Entre os meios de que 0 ser vivo dispoe para actuarsobre 0 meio, 0 movimento deve aos progressos dasua organiza~o no reino animal e no homem uma tal ,.;..eficacia e preponderancia que os seus efeitos puderaml rl'I:;~/:rser considerados pelos behaviouristas como um objectoJ ~I' 'j;"'"exclusivo da Psicologia. Mas esta propria limitaGao impOe P,r,L,O/""li

que se atribuam ao movimento significados extrema- -Ir- .

I?eI.1t~~:~s. Seria, de factO, 9B!.s-.~' ~'*f; 'Yf~ por exemplo, ~oJ~, nao fazendo uma distingao entre os gestos,ainda que exteriormente semelhantes, segundo as situa-goes que os motivam e 0 tipo de resultados para quetendem. Reduzido as contracgoes muscuIares que 0 pro-duzem ou aos consequentes deslocamentos no espago,~ nao e, de facto, mais que uma abst:r:acgav V\I-1C'

fisiologica ou mecanica. 0 sicologo nao 0 ~oaer~}J W Eo-

sociar dos conjuntos que co respon em aQ~ A TOele_.e 0 _in~truInentQ. -

Atraves do moVimento, 0 acto insere-se no instantepresente. Mas ele pode, pelas suas condig5es e objec·tivos, pertencer apenas ao meio ambiente concreto: eo acto motor propriamente dito; ou tender para finsactualmente irrealizaveis ou pressupor meios que nao

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o movimento comec;a ja. na vida fetal. Na onto·genese, com efeito, as func;oes comec;am a esboc;ar-s(~com 0 desenvolvimento dos tecidos e dos orgios corres-pondentes, antes de se poderem justificar pelo uso. E poraltura do quarto mes de gravidez que a mae comec;aa dar-se conta das primeiras deslocac;oes activas dacrianc;a. Em fetos de diferentes idades, mantidos comvida 0 mais tempo possivel, Minkowsky (de Zurique)procurou averiguar quais eram as sucessivas etapas dD.motilidade pre-natal. Apesar de se alterar imediatamentemal se extingue a vitalidade, ele pode reconhecer queela e constituida pOl' sistemas mais ou menos extensosde gestos e de atitudes, mas susceptiveis, perante amesma excitac;ao, de intermitencias e de variac;aes. 0 seudeterminismo e, pois, inconstante, 0 que sem duvidase explica pela falta de acabamento das estruturas ana-tomicas e funcionais. 0 circuito em que se propaga 0

estimulo nao possui ainda contornos firmes e deixa-ofacilmente difundfr-se noutros, igualmente insuficiente·mente diferenciados. A reacc;ao, ao mesmo tempo, apesarde demasiado extensiva, mantem caracteristicas par·ciais, pOl' falta de coordenac;ao entre os diferentes domi-nios ou sistemas do organismo, 0 qual nao e tambemmais que urn conjunto sem coesao'.

A variabilidade resultante esta em oposic;ao direct acom a que se podera. observar numa organizac;ao maiscomplexa e mais completa do sistema nervoso. Aqui, elatern qualquer coisa de fortuito au, pelo menos, reflecteflutuac;aes muito gerais nas disposic;aes organicas. Elaesta., pelo contrario, apropriada para a diversidade dascircunstancias e das necessidades, quando a integrac;aomutua dos dominios e dos sistemas funcionais tornapossivel urn acordo selectivo entre uma excitac;ao, sejaqual for a sua origem, e os apetites mais variados e asreac<;Oes mais poliformes.

No nascimento continuam a existir, em resposta adeterminados estimulos, sistemas definidos de gestose de atitudes. Sao em especial os reflexos cervicais e osreflexos labirinticos de Magnus e Klijn que sac provo-cados, estes pela excita<;ao vestibular resultante de un:rapido deslocamento do corpo numa determinada direc-<;aodo espa<;o, aqueles pela movimenta<;8.o das primeirasvertebras cervicais. Uns e outros consistem em certasrelac;Oes de posic;ao entre a cabe<;a e os membros. Aindaaqui, como anteriormente no feto, 0 efeito nao seguesempre a excita<;ao apropriada, mas desta vez pOl' umarazao inversa. Ele obtem-se com muito maior certezase se tratar de uma crian<;a prematura ou se houveruma destruigao de certas conexoes nervosas em conse-quencia, pOl' exemplo, de urn traumatismo obstetrico.A causa da sua inconstancia sera entao, pois, a suaeventual suspensao pOl' centros inibidores, a respeitodos quais ainda nao e completa a sua subordinac;ao,mesmo num recem-nascido normal. A intermitencia de

dependem nem das circunstancias brutas nem das capa·cidades motoras do sujeito: de imediatamente eficiente,o movimento torna-se entao tecnico ou simbolic e refe-

, /'.L'-../'-"'- ~

~~~~'/lEsta passagem so parecp produzir-se na especie

humana. Quando se produz na crian<:;a, provoca umabrusca diferenc;a entre as suas aptidoes e as dos ani-mais mais proximos do homem. 0 proprio movimentcapresenta uma dupla progressao: uma respeitante a suaagilidade, frequentemente notavel no animal; a outrarelativa ao nivel da acc;ao que 0 utiliza. Entre as duasseries ha, alias, zonas em que a distinc;ao nao e facil;pOl' exemplo, a adaptac;ao das estruturas motoras asestruturas do mundo exterior esta ligada ao exerciciode centros nervosos que asseguram a regulac;ao fisio-logica do m.ovimento, mas ela tern como segunda con-dic;ao a imagem do objecto e esta pode pertencer a niveismais ou men os elevados da representa<:;ao perceptivaau intelectual.

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uma reac\;ao pode assim depender quer da relativa faltade acabamento e da persistente indetermina~ao do dr-cuito correspondente, quer, pelo contrario, da sua inte-gra\;ao ja iniciada num sistema mais evoluido de mo-vimentos.

As gesticula\;Oes espontaneas do recem-nascido sacacompanhadas quer de substitui~oes subitas e irregula-res de atitudes,' quer de automatismos ou fragmentosde automatismos, que funcionariam ja como mais tardeo exigira a fun~ao plenamente realizada. De facto, asactividades musculares estao ainda mal delimitadas.A tetaniza\;ao rapida do musculo pela excita~ao elec-trica fez com que se comparasse a sua contrac~ao a dafadiga, aproximando-a igualmente da caibra ou do es-pasmo. 0 que significa que ha pouco intervalo entre aagita~ao clonica e a contrac~ao, sendo ainda muito facita fusao entre estas duas actividades fundamentais domusculo: encolhimento e tonus, movimento propriamentedito e postura. Alias, passar-se-ao semanas emeses antesque as condi~oes do exercicio plenamente eficaz e dife-renciado de cada uma delas se possam realizar.

Para 0 musculo, com efeito, converge a ac~ao alter-nante ou combinada de diversos centros. A sua estruturanao bastaria para e~plic'ar os efeitos contracteis de queele e a sede. Segundo Bottazi, os seus dois elemento.5constituintes, as miofibrilas e 0 sarcoplasma, seriaminstrumento, uns da actividade clonica, os outros dotonus; assim se explicaria a diferen~a funcional por umadiferen\;a de orgaos. Mas 0 tonus esta longe de ser sim-ples. Registadas pelo oscilografo, as correntes de ac~aoque the correspondem tern urn ritmo muito varia vel;o seu papel no mecanismo motor e diverso; enfim, a Pato-logia mostra que ele se dissocia em diferentes forrnasde contrac\;ao, conforme 0 nivel das lesoes que isolamos seus centros reguladores. Assim sendo, ele e sempreo resultado, modificavel segundo os casos e as necessi-dades, de influxos de multiplas origens.

Na crian~a, e apenas por etapas sucessivas que cstacomplexa fun~ao do tonus atinge 0 seu acabamentototal. Os centros nervosos de que depende nao alcan-~m todos ao mesmo tempo a matura~ao. 0 seu equili-brio funcional varia com a idade. Pode igualmente apre-sentar diferen~as de individuo para individuo. Daquiresultam tipos motores e tambem tipos psicomotoresdiferentes, sendo estreitas as rela\;oes existentes enlreas manifesta~oes do tonus e 0 psiquismo, rela~oes esta-belecidas por intermedio do equilibrio, das atitudes e,consequentemente, das estreitas conexoes que existemno meio cerebral entre os centros da sensibilidade afec-tiva e os dos diferentes automatismos em que as fun~oesde postura desempenham urn papel consideravel. Foiassim que pude distinguir urn tipo extrapiramidal infe-rior, urn tipo medio e urn tipo superior.

Nao e apenas a natureza mas tambem a distribui~aoperiferica do tonus que se modifica ao longo da infancia.Homburger conseguiu descrever urn tipo motor infantilem individuos que conservam, para alem da idade nor-mal, certas posturas habituais. Os membros inferioresdo recem-nascido sac arqueados e os pes tern tendenciapara se colocarem em forma de tesoura. Os antebra\;osestao curvados. As palmas das maos estao viradas parao queixo e nao para 0 torax; mais tarde, quando osantebra~os se estendem, viram-se para tras e nao para.° eixo do corpo. A extensao dorsal do dedo grande dope, normal nos primeiros meses, tern a especial caracte-ristica de ser assimilavel a urn reflexo descrito porBabinski como sendo patologico no adulto. Com efeito,uma lesao que interrompe a continuidade do feixe pira-midal, por onde sac transmitidas a. medula as incita~Oesmotoras do cortex cerebral, provoca uma inversao naposi~1io reflexa que toma 0 dedo grande quando se tocana parte exterior do pe: ele levanta-se, em vez de securvar para a planta do pe, como seria normal.

Na crian~a, a disten~ao da lugar a. flexao vor voltados 7 ou 8 meses, quando a mieliniza~ao do feixe pira-

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midal, que progride de cima para baixo, the pe'rmiteconduzir as incita~6es do cortex ate aos centros medu-lares dos membros inferiores. lsto e urn exemplo evi-dente da transforma~ao que a integra~ao dos centrosnervosos noutros pode provocar nas reac~oes perifericasAlias, a transforma~ao apresenta muitas vezes alterna-tivas sucessivas: durante algumas horas au mesmo doisou tres dias depois do nascimento, a posi~ao que tomao dedo grande do pe e a flexao; a interven~ao das inci-ta~oes piramidais nao faz, assim, mais que restabelccera reac~ao inicial. Deste modo, 0 mesmo efeito perifericopode corresponder, conforme a estadio de desenvolvl-mento em que se produz, a condi<;oes diferentes.

o estudo dos movimentos propriamente ditos permiteverificar esta tese. Nao ha nenhuma razao, pOI' exem-plo, para vel' na pedalagem do recem-nascido 0 gestototalmente organizado do andamento, pois este so apa-recera ao fim de longos meses, durante os quais entraraosucessivamente em jogo novos centros nervosos, aomesmo tempo que se modificara visivelmente a agita<;aodos membros inferiores, Alias, como se poderia isolaralgum dos automatismos elementares, nos quais se de·comp6e 0 andar, do seu equilibrio total, em que a suafusao e permanente e cuja manuten<;ao pressupoe a maisestrita integra<;ao das actividades musculares nos selli;orgaos reguladores?

o mesmo se podera dizer quanto as maos. Quandoelas se crispam no objecto que toea a palma da mao,nao existe ainda preensao mas, quanto muito, urn reflexode agarrar. 0 gesto de urn pe a procura de urn contacto,de urn suporte, quando 0 outro acabou de poisar, e maisum gesto para se agarrar que para andar. De um actopara outro que se the segue, transmitem-se certamentemovimentos, mas transformados, na medida em que seintegram noutros sistemas e obedecem a outras neces-sidades.

E frequentemente possivel assistir ao conflito de sis-temas suces~ivos. Agitando-se na banheira, a crian~a

ve a esponja afastar-se; a principio, nao e capaz senaode repetir os mesmos gestos; depois, consegue oriental'o movimento do bra~o na direc~ao da esponja, mas man-tendo 0 punho cerrado, e mais uma vez a afasta paralonge de. si. So a seguir conseguira estender a mao abertae fecha-la na esponja. A redu~ao dos obstaculos queestes movimentos op6em exige 0 aparecimento de umaformula nova, que nao e a simples adi<;iio de elementosprimitivamente distintos.

Os exercicios que precedem 0 andar ofere cern urnexemplo semelhante. l!: claro que e facil reconhecer, nasrecupera~oes de que a crian<;a se vai tornando cada vezmais capaz, 0 aparecimento de aptidoes indispensaveisao andar. Mas elas nao sao, como ja dissemos, os frag-mentos antecipadamente constituidos da locom~ao hi-peda e vertical. Pertencem a sistemas actuais de com-portamento no espa~o, ou mesmo de locomo~ao, 1uepoderao urn dia entrar em oposi~ao com 0 andar, comoacontece com aquelas crian~as que tern que ser impe-didas de andar de gatas para lhes fazer sentiI' a neces-sidade de se porem em pe. Urn movimento nao se cons-troi como urn edificio de partes edificadas cada umasegundo urn plano; ele deve substituir 0 seu propriuplano aos das anteriores actividades.

A tendencia comum e para considerar a harmoniamuscular como primitivamente composta de elementossimples cujas diversas combina~oes provocariam todaa serie dos movimentos. Mas se ha efectivamente cen-tros cuja excita~ao permite fazer contrail', por pequenasparcelas, todo 0 aparelho muscular, saoos centros mall;;elevados, os centros do cortex cerebral, quer dizer, osultimos a desenvolverem-se na serie animal, que funcio-nam em Ultimo lugar no individuo. Antes deles, entramem jogo os centrGs que coordenam conjuntos mais oumenos extensos de atitudes e de gestos, aquilo a quese chama, urn pouco confusamente, os automatisrnosnaturais. A circunvolu~ao motora do cortex onde se pro-jectam distintamente as diferentes regioes do apare1ho

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muscular e, sem duvida alguma, urn instrumento quepermite analisar os movimentos. Esta analise exige, noentanto, uma atenta aprendizagem. Ela e uma opera~aosecundaria e, de certo modo, artificial. Se se produzuma ruptura patologica entre a circunvolu~ao motorae os centros subjacentes, 0 individuo encontra-se perantcverdadeiros blocos de contracg6es musculares que ja naopode limitar nem dirigir.

Tambem a crian~a tern a principio bastante dificul-dade para coordenar os gestos. Os primeiros que apa·recem sao os mais difusos e os mais maci~os. So muitomais tarde chega a conseguir dissocia·los em sistemasmais especificos e mais capazes de se adaptarem a diver-sidade das coisas e das circunstancias. Em presen~a deuma nova tarefa, ele tern que lutar contra sincinesias,quer dizer, contra 0 grupo motor a que pertence 0 movi·mento oportuno e que muitas vezes 0 torn a pesado,impreciso e 0 paralisa. Dissolver uma sincinesia e, tantopara 0 adulto como para a crian~a, uma questao detreino, mas que segue e nao poderia antecipar a matu-ra~ao funcional.

Os primeiros gestos sao bilaterais; so ao fim devarias semanas depois do nascimento se constatam ges-tos unilaterais (M. Bergeron): 0 controlo que a crian~apode exercer sobre os seus movimentos, quer di7er,o poder para os inibir, seleccionar, modificar, ou seja,uma progressao regional, que demonstra bem a suadependencia em rela~ao a evolu~ao fisiologica.

Este controlo come~a a exercer-se na regiao superiordo corpo e na parte proxima dos membros; so mais tardese manifesta em baixo e nas extremidades distai.:i(Sr.a Shirley). A ac~ao do feixe piramidal 80 se podeefectivamente fazer sentiI' depois do acabamento da suamieliniza~ao, que vai do corpo celular para a periferia,e que e mais curta nos trajecos curtos e mais Ionga nostrajectos longos. Tournay demonstrou, por outro lado,que ela e, nos destros, mais precoce de algumas semanasa direita q~§ it esquerda.

IUma outra delimita~o dos movimentos, sem a qual

eles nao teriam nenhuma precisao, e a que consiste,sempre que se executam, numa exacta reparti~ao doproprio movimento e das atitudes correspondentes. Estasatitudes sao de duas especies. Umas dependem da con-trac~ao tonica que acompanha a desloca~ao do membl'oem movimento, que sustem as suas sucessivas posi~Oes.sem a qual ele nao teria continuidade nem resistencia.Po de acontecer que, parando bruscamente 0 movimento,a ~titude correspondente se mantenha pOl' si mesma,ou que seja a unica que subsista, entravando 0 movi-mento, como acontece nos estados catatonicos e em eel'-tas manifesta~6es de surpresa. Ela nao existe, pelocontrario nos movimentos da crian~a pequena, que sao,lan~ados no espa~o e recaem assim que se esgota a pri·meira impressao. Inversamente, A. Colin demonstrouno bebe tendencias para a catatonia. As duas fun~oes,tonica e donica, nao estao ainda integradas uma m:.outra.

Uma segunda especie de atitudes resulta das can-trac~oes tonicas que se produzem a proposito de cad amovimento nas partes do corpo que nao estao em movi·mento. Como elas sac inexistentes na crian~a pequena,cIa e arrastada pOl' cada um dos seus gestos. Incapazde se imobilizar, tern outros que a seguram para que naocaia. Esta falta de aptidao dura muito tempo. A imobi·liza~ao das regi6es aparentemente inactivas e, na reali-dade, uma ac<;ao extremamente complexa. Toda a partedo corpo que se desloca tende a deslocar 0 seu centrode gravidade. Para evitar a perda de equilibrio, tem quese produzir uma resistencia, que e precisamente umacontrac~ao compensadora nas restantes partes e de pre-ferencia no eixo do corpo, ao longo do raquis, nosmusculosque a sustem e cuja fun~ao preponderantee tonica: estes sao, essencialmente, os musculos doequilibrio.

A resiste~cia varianao so com a amplitude e enver-gadura do gesto mas tambem com as resistencias que

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ele proprio pode encantrar no espa~o. 0 ajustamentode uma as outras torna-se evidente quando estas cedembruscamente pelo desequilibrio resultante, 0 que e muitofrequente na crian~a por esta ser menos capaz de urnreajustamento rapido.

A dificuldade e ainda maior quando, em vez de sepoder imobilizar, e todo 0 corpo que esm em movimento.Entao as contrac~oes compensadoras de cada deslocagaoparcial tern que se combinar com 0 impulso do conjunto,de modo a fundirem-se nele harmoniosamente, numaespecie de equilibrio fluido e progressivo. ~ 0 que seproduz no andar e nas ac~oos que dele derivam: cor-rida, dan~a, saIto, etc. A menos que haja uma estritasinergia entre as compensa<;oes tonicas e a sucessaocontinua dos gestos, surgem obstaculos capazes de en-travar completamente 0 andar. Assim, na embriaguez,o peso da perna que se levanta arrasta 0 corpo para 0 seulade e a alternancia deste desequilibrio provoca urnandar em ziguezague. A crian~a pequena apresenta efei·tas semelhantes: 0 seu andar e em ziguezague, porquee arrastado pelo peso do corpo lan~ado para a frente.«Ela carre atras do seu centro de gravidade.» Por naosaber ainda manter 0 equilibrio atraves das contrac~oesapropriadas, ela so consegue muitas vezes parar apoian-do-se num obstaculo. So consegue evitar cair OU andarem ziguezague afastando as pernas, de modo a alargara sua base de sustenta~ao.

o acordo das reac~oos posturais e do movimentotraduz-se ainda, nas opera~oes que exigem precisao efirmeza, pela gradual substitui~o da atitude pelo gesto.Se se trata de agarrar ou de manipular urn pequenoobjecto, as grandes desloca~oes do corpo e dos membrosvao-se a pouco e pouco reduzindo a simples agita~odos dedos. Mas' a imobiliza~ao das outras partes nao eneutra; a cada instante ela tern que fornecer 0 suporteflexivel ou rigido, fixo ou p'lastico, que exige cada etapada manipula~o. Falta a crian~a durante muito tempoesta capacidade. Os seus movimentos ultrapassam 0

objectivo, estao sujeitos a oscila~oos demasiado amplas,por causa da sua impotencia para localizar 0 gesto,fixando as partes do corpo que the devem dar urn pontode apoio. A sua mao plana primeiro sobre 0 objecto,depois lan~a-se toda aberta sobre ele e par fim aperta-omaci~amente.

Todas estas insuficiencias de ajustamento entre asac~oes clonicas e as tonicas sao manifesta~6es de assi·nergia. Elas pertencem it patologia do cerebelo e, nacrian~a, ao atraso da sua matura~ao. Este atraso podeem cerlos casos ultrapassar a idade normal e mesmaprolongar-se por uma duradoira debilidade da fun~ao.Por isso, foi possivel descrever urn tipo motor assi-nergico, que nao deixa de ter efeitos psicologicos.

Urn movimento, por mais insignificante que seja, nilOse distingue da sua projec~ao no espa~o. A sua onen·ta~ao pertence a sua estrutura. Existe urn espa~o motor,que alias, contrariamente a opiniao comum, nao e aindao espa~o representado nem 0 espa~o conceptual, que uneos diferentes niveis funcionais, tornando-os uma reali-dade imutavel, necessaria, que se impoe por si mesmait primeira vista. Nao tern cabimento opor ° movimentoa urn meio em que encontraria secundariamente as suasdetermina~oes locais. Pela sua propria existencia, ° mo-vimento implica 0 meio em que se deve desenvolver.Niio se torna apalpador de urn momento para ° outro,pois the e necessaria experiencia. Necessita, indubita-velmente, de ser guiado, mas so 0 pode ser depois detransposto urn certo limiar funcional. Tournay demons-trou que antes de uma data que lheparece corresponderit entrada em fun~ao do feixe piramidal, a mao da crian~cruza 0 seu campo visual sem the despertar 0 maispequeno interesse. Uma vez realizada a jun~ao entre 0

campo visual e ° campo motor, 0 olho segue a maoe depois guia-a.

Vao igualmente surgindo por etapas sucessivas outrosacordos mais complexos entre 0 movimento e os seusobjectivos, tal como a sua adapta~ao a estrutura e ao

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Os impulsos sao os actos de nivel mais baixo, emque as motivag6es sac minimas. Parecem descargasmotoras actuando pOl' si mesmas. 0 seu grau de sim-plicidade ou de complexidade depende dos sistemas quea evolugao natural ou 0 uso foram tornando habituais.No adulto, podem ser compostos pOl' operagoes auto-maticas que se entrelagam umas nas outras. Na crianga,nao entram ainda em jogo mais que simples ejaculag6esmotoras e vocais ou reacgoes que se assemelham aosgestos espontaneos de agressao, de produgao alimental'0U outra, e de defesa. Em todos os casos, 0 motivoe insignificante. Elas sac como que 0 efeito de umaautoactivagao, de uma incontinencia, de uma fuga aoscontrol os habituais do comportamento. Estes controlos,ainda debeis e com falta de organizagao na crianga,

podem ser desorganizados no adulto pOl' vicissitudes in-timas ou fisio16gicas. E passa a tempestade, sem deixarmais motivagoes para a actividade subsequente que asinexistentes na anterior.

As primeiras motivagoes parecem provir de urn efeitosensorial de que a crianga parece de repente dar-se contae que procura reproduzir. POl' exemplo, passando a suamao no seu campo visual, chega a altura em que a imo-biliza diante dos olhos, afasta-a e volta a aproxima-la,e depois aprende a agita-la de diferentes modos, avidade conhecer os seus aspectos e deslocagoes. A sensagaos6 e retida, discriminada, identificada, no momento emque a crianga se torna capaz de a reproduzir atravesde gestos apropriados. De contrario, permanece indis-tinta entre as impressoes indistintas, onde se confundeo que depende da excitagao e 0 que depende da reacgiioreflexa. Assim se combinam reacgoes circulares em quea sensagao suscita 0 gesto capaz de a fazer dural' ourepr~uzir, enquanto 0 gesto se deve adaptar a ela paraa tornar reconhecivel e depois para a diversificar meto-dicamente. Este ajustamento precise do gesto ao seuefeito instaura entre 0 movimento e as impress6es exte-riores, entre as sensibilidades proprioceptivas e extero-ceptivas, sistemas de relag6es que as difel'enciam e opoemna mesma medida em que as combinam em series minu-ciosamente unidas.

As consequencias deste exercicio manual sac con-sideraveis. Ha, em primeiro lugar, a formagao de mate-riais sens6rio-motores que tomarao possivel ultrapassaras actividades brutas dos aparelhos motor e sensorial.o olho e a mao passarao a estar estreitamente asso-ciados para a exploragao e manejo das coisas ambientes.Mas 0 exemplo mais evidente e sem duvida 0 das seriesauditivas e vocais que a criancinha passa long os momen-tos a constituir com os seus gorjeios. 0 som que produziumais ou menos fortuitamente e repetido, afinado, modi-ficado e acaba pOl' se desenvolver em longas series de

uso dos objectos, que nao e 0 simples resultado de ten-tativas fortuitas ou experimentais. Podendo uma lesaode determinados centros nervosos aboli-la no adulto, elaexige, evidentemente, na crianga a possibilidade de osutilizar, de os ordenar, e dai a- sua maturagao funcional.o mesmo se diga para a capacidade para fazer surgirdo campo perceptivo-motor as solug6es que permitamdesviar 0 obsta-culo au remedial' a insuficiencia das fargasnaturais atraves da utilizagao de urn instrumento. Elaapresenta graus muito diferentes segundo as especiesanimais e, na mesma especie, de urn individuo para outro.

A estas actividades carrespondem diferentes niveisde organizagao funcional. Eles sac urn facto de evolu-gaa. POI' muito necessaria que seja, a aprendizagempOl' si so naa e suficiente. Estas actividades sao, alias,actos completos, condutas com urn objectivo pr6prio ea escolha dos meios. A parte das circunstancias quesuportam e que podem constelar aumenta com a suacomplexidade. 0 seu estudo pressupoe a das motivagoesde que dependem.

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fonemas em que as leis e as alegrias do ouvido se VaGreconhecendo cada vez mais na formagao dos sons.

No entanto, a preponderancia inicial das incitagoesmotoras revela-se atraves das eta pas por que passao gorjeio. Vao entrando sucessivamente em cena ossons que podem ser produzidos pelos bibios, cujos movi-mentos estao ja desde 0 nascimento Hio bem reguladosna mamada; os que dao 0 maximo de impressoes mus-culares as partes moveis da cavidade bucal quando ro-gam 0 veu do palato, quer dizer, as guturais (Ronjat);os que sao 0 efeito dos movimentos da lingua contra 0

palato ou 0 lambdacismo; depois, das suas pressoescontra as gengivas sob a influencia, segundo ere P. Guil-laume, da irritagao causada pelo impulso dental. AomeSillOtempo, as vocalizagoes vao-se tornando cada vezmais variadas e muitas vezes delicadas, atingindo pOl'vezes a mais perfeita vocalizagao das consoantes.

A riqueza deste material fonetico corresponderia aomaterial de todas as linguas faladas e ultrapassa-Io-iaindubitavelmente (Grammont, Ronjat). A lingua ma-terna da crianga so tera, portanto, que ir ai bebersegundo as suas necessidades. Mas antes que a criangapossa agrupar os fonemas em palavras, a fina indivi-dualizagao dos sons resultantes destas trocas sensitivo--motoras torna-a capaz de discernir as subtis diferengasa que as palavras devem a sua estrutura e a sua fisio-nomia, aumentando 0 seu interesse a medida que setorna capaz de lhes dar urn significado. Assim, 0 queprocedia em primeiro lugar do movimento da os pri-meiras resultados na percepgao.

Vma outra consequencia da conjuga<;ao entre efeitossensoriais e movimentos e a uniao dos diferentes campossensoriais. 0 movimento constitui 0 seu denominadorcomum, podendo as transforma<;oes que produz ser per-ceptiveis simultaneamente em varios campos sensoriais.Para.. que esta sirp.ultaneidade seja reconhecida, e certa-mente necessaria urn certo grau de matura<;ao funcional.Gordon Holmes mostrou, com efeito, que a simultanei-

dade desaparece em consequencia de certas lesoes cere-brais. Na crianga, e ao movirnento que se devem asefeitos correlativamente registaclos nos diferentes sen-tidos. Ele constitui urn novo meio de coordena<;ao nomundo das impressOes, permitindo agrupar as que sacrelativas a uma mesma presen<;a, a uma mesma exis-tencia, a urn mesmo objecto, seguir 0 que se deslocade urn campo sensorial para outro, enfim, substituira permanencia da causa ao polimorfismo e a fugacidadedas impressOes.

o progressive reconhecimento das coisas segundo asetapas do movimento pode ser ilustrado pela sucessaodos tres espa<;os nos quais W. Stern inscrevia 0 desco-brimento do mundo pela crian<;a. Em primeiro lugar, 0

espa<;o bucal: e a boca que 0 beM leva todos os objectos.nao para comer, mas pOl' ser 0 unico local do corpoem que a concordancia exacta dos movimentos e dassensa<;oes, exigida desde 0 nascimento pela suc<;ao, per-mite igualmente apreciar urn contorno, urn volume, umaresistencia, tudo isso ainda evidentemente confuso e con-fundido com outras qualidades eventuais, tais como atemperatura ou 0 gosto.

Assim que surge 0 momento em que os seus gestosja nao sao pura e simplesmente langados no espa<;o e emque as maos podem seguir uma direc<;ao, agarrar, coor-denar-se, a crian~a entra na posse do espa<;o proximo.Mas e so quando e capaz de autolocomo<;ao que 0 seuespa<;o deixa de ser uma simples colec<;ao de meiosambientes sucessivos. Porque a sua continuidade, a suafusao, a sua redu<;ao a uma mesma extensao, em queos objectos estao distribuidos segundo escalonamentosvariaveis, sac uma operagao irrealizavel enquanto elanao pode, pelos ,seus proprios movimentos, reduzir asdistancias, transmutar entre elas as diferentes areasda sua vida familiar, aventurar-se no desconhecido ereduzir tudo, enfim, a medida dos seus passos actuaisou eventuais.

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Estes resultados nao sao, evidentemente, 0 produtoautomatico de aciividades ou de combina~oes sensorio--motoras. Pelo contrario, estas actividades, entreguesa si mesmas, giram sobre si mesmas, como acontececom uma certa categoria de idiotas que se encer-ram definitivamente no ciclo dos mesmos exercicios,em que alias podem atingir a mais va das perfei~oes.Estas ocupa~6es estel'eotipadas nao deixam, porem, detel' uma certa rela~ao com a aquisi~ao dos habitos.o gosto pela repeti~ao, 0 prazer que sente com os actosou coisas redescobertas, saG manifestos na crian~a pe-quena. A eles deve a sua indispensavel perseveranQa deaprendizagem. Desie modo) durante langos momentos,a crian~a e monopolizac1a pOl' opera~oes puramente ludi-cas. Enquanto a materia e os meios forem os mesmos,clas nao tendem para lhe fazer adquirir mais que umavirtuosidade puramente formal. Mas 0 gosto pela inves-tiga~ao que arrasta toda a crian~a normal incita-a afazer mudanQas, ao longo das quais a formula se separado acto. Myers insistiu na sua importancia. Elas repre-sentam 0 unico progresso que urn habito pode trans-mitir a actividade geral. Podem, pOl' via de assimila~aoou de confusao - mas de confusao adaptada -, aplicaro acto aprendido a novos objectos. Podem igualmentetransmitir a suaexecu~ao a outros 6rgaos: mudan~ade mao na mesma opera~ao, execu~iio com 0 pe do quese fazia com a mao. E, no dizer de Katz, urn acentuadoprogresso poder realizar com uma s6 mao 0 que se faziacom as duas.

Essencialmente virada para 0 estabelecimento de rela-~oes entre os movimentos e tudo 0 que the pode corres-ponder nos diferentes campos sensoriais, para a substi-tui~ao das impressi?es proprioceptivas pOl' efeitos exte-roceptivos ou, inversamente, das circunstancias exterio-res do movimento pol' esquemas proprioceptivos, comoe o-easo da aprendizagem dos automatismos e a aquisi-~ao dos habitos, a actividade sens6rio-motora desenvol-ve-se indubitavelmente no espa~o, que ela contribui para

dar a conhecer como uno e homogeneo, mas nao possuiainda mais que objectivos ocasionais. E a outras acti-vidades que compete estabelecer os objectivos e con-fronta-los com os seus meios.

A atrac~ao que a crian~a sente pelas pessoas que arodeiam e uma das mais precoces e das mais poderosas.A dependencia total em rela~ao a elas em que a colocaa satisfa~ao das suas necessidades cedo a torna sensivelaos mais pequenos indicios das suas disposi<;oes a seurespeito e, reciprocamente, aos resultados obtidos delaspelas suas pr6prias manifestaGoes. Dai que exista, nolimiar da sua vida psiquica, uma especie de consonanciapratica com outrem. De irreflectida, esta consonanciapodera tornar-se mais deliberada a medida que os pro-gressos da sua actividade the forem fornecendo os meiospara se diferenciar a si mesma em contraposi~ao comas outras pessoas. Entao a perten~a dara lugar a indi-vidualiza~ao e 0 simples conformismo a imita~ao. Osprimeiros objectivos, perseguidos pOl' si proprios, queregulam exteriormente a actividade da crian~a, sao osmodelos que ela imita. Esta e uma fonte inesgotavelde inicia~6es, que a fazem exceder, muitas vezes, alias,de um modo completamente formal, 0 quadro das ocupa-~6es a que as suas necessidades a podem incitar direc-tamente.

No animal, ate mesmo no macaco, a imita~ao e rara,pelo menos como emprestimo oportuno de um novoprocesso. Ela nao se deve, de facto, confundir com asreac~oes semelhantes de animais que apresentam umcomportamento analogo em presen~a das mesmas cir-cunstancias. Reflexos identicos, as imperativas exigen-cias de uma situa~ao, as facilidades ou as sugestoes demanipula~ao que urn objecto oferece sao suficientes paraexplicar 0 aparecimento simultaneo ou alternado dosmesmos gestos em dois animais que vivam juntos. No

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entanto, nao e certo que as gestos de um nao exergamqualquer influencia sobre os do outro. Vma criangapequena comeQa por nao saber reproduzir os movimentosou os sons emitidos diante dela, a nao ser que ela propriaos tenha executado espontaneamente. l!: entao necessarioque 0 acto a imitar sobreviva no aparelho motor, paraque a imitagao se efectue. Ela e, no entanto, 0 seu novomotivo. Deste modo, podem-se observar dois animaisrepetir sucessivamente, e aparentemente satisfeitos, urngesto a que cada urn deles por si so nao teria dadonenhuma importancia. 0 que a ocasiao tinha suscitado,a imitaQao reitera-o. Este e urn comeQo que nao deixade ter importancia mesmo quando nao e ultrapassado.Ele da aos gestos espontaneos uma nova motivaQao;opera-se assim entre eles uma selec<;ao segundo se encon-tram ou nao em dois seres que se frequentam habitual-mente. Por seu intermedio instaura-se nos dois umaespecie de conformismo mutuo.

A caracteristica propria e a novidade da imitaQaoe a indu<;ao do acto por um modelo exterior. E, pois,desprovido de sentido atribuir-Ihe como origem «a imi-taQao de si mesmo». Certas lesoes nervosas tornamincoercivel a repeti<;ao pelo sujeito do que ele acabade fazer: segundo se trata de gestos ou de palavras,e a palicinesia ou a palilalia. Ela pode ser igualmenteurn fenomeno de simples distrac<.;ao e as vezes transfor-mar-se num tique. No estado normal, ela utiliza-se se-gundo as necessidades. Mas as suas conexoes nervosasnao correspondem de modo algum a.s da imita'.(3.o. A ten-dencia de urn acto para repetir-se apresenta-se ainda soba. forma de persistencia. Frequente na crianQa, ela denotaurn certo grau de inercia mental e a preponderancia daexecu<;ao sobre a ideagao motora. Encontra-se igual-mente em oposi<.;ao com essa modelagem do movimentoque tern por base uma intuigao ou uma imagem:a imitagao.

Qualquer reprodug5oo de uma impressao sensorial deorigem exteri~r n500merece, aliasl ser considerada como

imitag5oo. Assim, a repetig500 imediatamente consecutiva,como urn eco do gesto ou do som que se acaba de verou ouvir, esta muito mais proxima da simples actividadecircular. 0 efeito sensorial de urn movimento que a incitaa renovar-se depressa se liga t500 estreitamente a ele queo levara a efectuar-se mesmo sem ter side primeiro pro-duzido por ele. Passando a iniciativa a sensaQ5oo, 0 apa-relho motor torna-se capaz de repercutir impressoessonoras ou visuais de qualquer origem, desde que lhesejam familiares. Mas nas duas series motoras e senso-riais a liga'.t5ooso se efectua entre elementos especificos.Par isso, a ecocinesia e a ecolalict nao sac repetiQ5oO,massim termos nos quai~ermina uma sucessao de gestosou de sons, estando impedida a passagem ao movimentodos precedentes, enquanto as impressoes se renovam,pela sua sucessao demasiado rapida. Este genero de inci-dentes sensorio-motores tern urn nivel de tal modo baixoque a sua reactivagao no adulto esta relacionada comuma avan<.;ada dissolugao das actividades mentais. Elacorresponde aos estados de confusiio e por vezes dedistracg5oo, em que se percleu 0 poder de organizar con-juntos e de detectar significados.

Com efeito, nao existe imita<.;ao enquanto nao houverpercepgao, quer dizer, subordinagao dos elementos sen-soriais a um conjunto. E a reconstituiGao do conjuntoque ela se dedica. 0 que poderia causar um engano,e 0 facto dela incluir, entre os seus processos, 0 da copialiteral. Mas a reprodu<;;ao sucessiva de cada trago pres-supae uma intuig500 latente do modele global, quer dizer,a sua apercepgao e a sua compreens5oo previas, sem asquais ela so da resultados incoerentes. Por muito meca-nica que seja na aplicaQ5oo, ela corresponde a urn nivelja complexo da imitagao. Pressupoe 0 poder de seguiruma ordem, uma tecnica, e a capacidade sempre prontapara comparar, quer dizer, para se desdobrar na ac'.(3.o,operaQ5es que s6 uma etapa ja avan<;ada da evo!ugaopsiquica pode tornar possiveis.

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Nas suas imitac;Oes espontaneas, a crianc;a nao possuiuma imagem abstracta ou objectiva do modelo. Longede saber distinguir-se dele, comec;a pOl' se the unir numaespecie de intuic;ao mimetica. So imita as pessoas queexercem sobre ela uma profunda atracc;ao ou as acc;oesque a cativaram. Na base das suas imitac;oes esta 0 amor,a admirac;ao e tambem a rivalidade. Porque 0 seu desejode participac;ao cedo se transforma em desejo de subs-tituic;ao; na maior parte das vezes, ate, coexistem estesdois desejos, inspirando-lhe para com 0 modelo urn sen-timento ambivalente de submissao e de revolta, de fi-defsmo vergonhoso e de denegrimento P).

Inicialmente de raiz afectiva, a imitac;ao encontratambem na participac;ao no modele 0 seu primeiro modode 0 perceber assimilando-se a ele. Ela nao e a repro-duC;ao imediata ou liberal dos trac;os observados. Entrea observac;ao e a reproduc;ao decorre habitualmente urnperiodo de incubac;ao que se pode contar por horas,mas ou semanas. As impressOes que vao amadurecendopara originar os movimentos apropriados nao sac apenasvisuais ou auditivas. Basta observar a crianc;a em pre-senc;a de urn espectaculo que the interessa para reconhe-cer que ela participa nele pOl' to do 0 conjunto das suasatitudes, mesmo quando elas a parecem imobilizar. Detempos a tempos escapam-se-lhe certos gestos furtivos,umas vezes gestos de simples expansao, que assinalatoda a aplicac;ao intima e laboriosa que da as peripeciasda cena, outras, gestos de intervenc;ao disfarc;ada, querpara se antecipar ao que a espera quer para corrigiras insuficiencias ou os erros que the parecem compro-meter a acc;ao a que assiste. Assim, a sua perce~ovem juntar-se uma plasticidade interna que nao e aindamais que vigilancia motora, ou postura, e de que 0 movi-mento efectivo nao podera sail' sem elaborac;ao.

A passagem directa do movimento para 0 movimentonal?..sera possivel a nao ser que 0 movimento imitado

ja se tenha podido espontaneamente produzir no mesmoplano de actividade e nas mesmas circunstancias queo movimento a imitar, condic;ao que l'eduziria a bempoucas coisas 0 papel da imitac;iio, cuja importancia e,no entanto, capital na crianc;a. A aquisic;ao da linguagem,por exemplo, nao e senao urn longo ajustamento imita-tivo de movimentos e series de movimentos ao modeleque, ha ja muitos, dias, permite a crianc;a compreendel'qualquer coisa dos prop6sitos dos que a rodeiam. Estemodele pode mesmo atl'asar-se em l'elac;ao as impressoesauditivas do momento. Gl'ammont cita uma pequenitacujas primeiras palavl'as apal'eceram com uma desinenciaitaliana, apesar de nao ouvir falar italiano ja ha variassemanas. Com urn intervalo muito menos longo entrea formulac;ao postural e a eclosao do gesto, a cambalhotado palhac;o que, dois ou tres dias depois do espectaculo,a crianc;a procura repl'oduzir esta submetida a urn per-cul'so semelhante.

No seu trajecto, a imitac;ao esta sujeita a sofl'el'desvios que mostram que, longe de sel' 0 decalque facilde uma imagem sobre urn movimento, the e necessarioabrir caminho, utilizando-os, atraves de uma massa dehabitos motores e de tendencias que VaGa pouco e poucopertencendo aquele fundo de automatismos e de ritmospessoais que se denotam na actividade de cada sel' edonde brotam tantos gestos espontaneos na crianc;a.Sao eles que servem de intermediario entre a impressaoexterior que acompanham, que procuram captar, e arepetic;ao explicita do modelo. Eles servem sucessiva-mente para a sua interiorizac;ao e para a sua exteriori-zac;ao. Depois de ele tel' sido reduzido a uma intuic;aoque 0 despoja mais ou menos das suas determinac;5eslocais, e em seguida necessario efectuar 0 esforc;o inverso.Onde a imita~ao tropec;a durante muito tempo e na rein-venc;ao, nao sempre dos proprios gestos, mas da suajusta distribuic;ao no tempo e no espac;o; na relac;aoa manter entre a intuic;iio global do acto e a sucessivaindividualizac;ao das partes. Este poder de organizac;ao

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em serie implica a atitude para constelar conjuntos per-ceptivo-motores. A sua necessidade afirma-se tanto maisquanto mais os objectivos da actividade pertenceremmais completamente a realidade exterior.

de outras pessoas. A atrac~ao quase universal que exer-cern os sapatos numa certa idade esta em parte relacio-nada com 0 seu caracter de buraco.

POl' muito fecundo que possa ser este periodo paraa discrimina~ao e inventario das qualidades propriasdas coisas, ele deixa ainda 0 objecto de lado. Trata-seapenas de condutas no sentido que the da Janet. Saocondutas elementares que se inventam a si mesmas,utilizando as mais dispares ocasi6es. f} dai que provema impressao barroca que dao pOl' vezes as associa<.;oese as combina~oes da crian~a, aliisj sobre urn fundo degrande monotonia. So mais tarde surge a explora~aodo proprio objecto. Entao inverte-se 0 interesse: porurn aparente paradoxo, ele parece ir do abstracto parao concreto; na realidade, vai do mais para 0 menossubjectivo.

Ja nao e entao a uma mesma e (mica qualidade quesac reduzidos os objectos; sao as qualidades de urn unicoe mesmo objecto que a crian~a se esfor~a pOl' reconhecere reunir. Estas investiga~oes ultrapassam a simples enu-mera~ao. A unidade do objecto, que faz a unidade dosseus tra~os sucessivamente detectados, nao e uma soma,masFuma estrutura com 0 seu significado. Descobrire~ejar uma estrutura pressup6e a aptidao para com-preender e utilizar as rela~oes que devem tel' comosubstracto duradoiro 0 poder de imaginar cada posi~aocomo fixa enquanto um movimento nao a tiver modifi-cado, e os proprios movimentos como subentendidos pOl'uma serie de posi~oes fixas. -m uma intui~ao de simul-taneidade que se torn a necessaria; a sua expressao serainevitav;elmente 0 espa~, mas em graus variaveis desublima~ao relacionados com cada especie de opera~ao.o significado da propria estrutura, significado de usoou de forma, so pode ser atingido e definido em opo-si~ao ou em rela~ao com outras.

As combina~oes que podem surgir no espa~o senso-rio-motor dependem daquilo a que se chamou inteligenciapratica ou inteligencia das situa~oes, a forma de inteli-

As rela~oes da crian~a com os objectos nao sac taosimples como poderia parecer a primeira vista. A suamaneira de os manejar inclui graus que nao dependemunicamente da sua falta de habilidade ou de experienciamotora. A Patologia mostra que as diferentes quaIidadesde um objecto podem continual' a ser percebidas depoisdele tel' deixado de ser reconhecido no seu conjuntoe na sua utiliza~ao. 0 poder perdido pelo adulto devea crian~a adquiri-lo, com a diferen~a de que ela tern,ao mesmo tempo, que regular e pOl' em funcionamentoos elementos perceptivo-motores que no adulto perderamsimplesmente 0 seu significado comum.

Os objectos que a rodeiam come~am pol' ser paraa crian~a uma ocasiao de movimentos que nao tern muitoa vel' com a sua estrutura. Ela aUra-os para 0 chao,ficando atenta ao seu desaparecimento. Depois de apren-del' a agarra-los, desloca-os com os bra~os, como paraexercitar os olhos a encontra-los em cada nova posi~ao.Se eles possuem partes que se entrechocam, ela nao deixade reproduzir 0 som detectado, agitando-os de novo.Eles sao, em suma, mais um elemento sensorio-motorque entra do exterior na actividade circular. Vem emseguida 0 momento em que 0 efeito que tira dum naopode ser tirado de todos. Nas suas tentativas para 0

obter, ela parece classificar os objectos segundo elesapresentem ou nao a particularidade correspondente.Uma a que liga uma grande importancia, e a rela~aoentre 0 que contem e 0 que e contido. Tendo-a desco-bepto, a crian~a aplica-se a introduzir em tudo 0 que euma abertura os objectos mais heterogeneos. Nao poupasequel' os seus proprios orificios corporais au mesmo os

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gencia mais imediata e mais concreta. Ela parece pre-ceder, na escala animal e no desenvolvl'mento d .. _ a cnanQa,a re~lrzaQao .mental do objecto, mas os seus progressoscontInuam .aInda durante muito tempo. Com cerca deum ano de Idade, a crianQa consegue resolver os mesmosproblemas que 0 chimpanze, mas ha alguns mais com pH-cados que ela nao consegue resolver antes dos 13 ou1~ anos, permanecendo embora, segundo parece, essen-clalmente no mesmo plano de operaQoes mentais (1).

Foram as ~xperiencias de Koehler sobre 0 comporta-mento dos pnmatas superiores que fizeram despertaru~ novo interesse pelo assunto. Nestes animais biolo-gICamente muito proximos do homem, ele demonstroua existencia de uma aptidao, alias muito desigual con-forme os individuos, mas muito superior a das outrasespecies, para conseguir apoderar-se duma presa cobi.Q~da apesar do obstaculo que se opoe a sua preensaodirecta. Sendo a sua forQa ou agilidade surpreendidaspela resistencia duma grade ou pela distancia, a maiorpa~e dos animais renunciam depois de alguns assaltosfunosos. Nos antrop6ides, porem, manifestam-se clara-mente outros comportamentos. Em primeiro lugar sabemafastar-se provisoriamente do objecto ou afasta-io de sipara contornar 0 obstaculo: e 0 procedimento do desvio.Sabem tambem reduzir, lltilizando instrumentos. 0 afas-tamento imposto pela distancia entre 0 alcance maximoque podem atingir os seus gestos e a presa. Estes daiscomportamentos estao frequentemente combinados. 0 seue~tudo demonstrou que eles nao poderiam ser pura eslmplesmente assimilados a representaQao que 0 homemfaz dos seus.

~imitivo ou aperfeiQoado, banal ou especializado,um Instrumento define-se pelos usos que the sac reco-nhecidos. Ele e moldado para eles. Impi5e 0 seu modode emprego a todos os que se querem servir dele. Existede forma duradoira e independente. Quem conhece a sua

existencia, tem que 0 ir procurar em caso de necessidade.~ um objecto constituido, um objecto construido segundocertas tecnicas com vista a outras tecnicas, 0 produtomuitas vezes remodelado de experiencias tradicionais ourecentes cujo fruto transmite aos que 0 utilizam. Estaforte individualizaQao nao pertence ao instrumento dochimpanze.

o instrumento nao e apenas ocasional; e uma simplesparte de um conjllllto provisorio onde vai buscar 0 seusignificado. Se 0 pau, com a ajuda do qual 0 chimpg,nzepodera fazer chegar ate ele 0 bocado de laranja ou abanana, nao for descoberto no proprio instante dos seusesforQos, permanecera inutil e ignorado. Nao so escapaa atenQao do animal se nao estiver nesse momento nocampo perceptivo que 0 une a presa, como pode acon-tecer que, interposto entre ele e ela, pennaneQa durantemuito tempo estranho as suas tentativas, ate que derepente 0 utiliza para conseguir 0 seu objectivQ, comose 0 desejo da guloseima criasse um campo de forQaonde os gestos e as percepQoes se ajustam segundolinhas que se deslocam ate realizarem a estrutura favo-ravel. 0 instrumento so e instrumento na medida em quee descoberto, e so e descobert:o na medida em que edinamicamente integrado na aCQao.

A experiencia, indubitavelmente, nao se perde. Nomomento oportuno, 0 pau entrara mais depressa noutrasestruturas e, alias, as mesmas estruturas terao tendenciapara se repetir. 0 proprio pau, tornando-se familiar-mente manejavel, coleccionara, segundo as circunstan-cias, os mais diversos usos e tornar-se-a uma especiede pau magico, de que 0 macaco aprendera a tirar todasas especies de efeitos que 0 divertem. Ele continua, noentanto, a ser muito indelevelmente individualizado,mesmo pelo que toea a sua morfologia, e, na sua falta,uma simples correia estendida no chao sera utilizadapara os mesmos fins.

Urn outro exemplo po de mostrar a que ponto per-manece 0 instrumento fundido na aCQao: 0 das caixas

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de que se serve 0 chimpanze para chegar a banana queesta suspendida la no alto. A nogao que tern da suaestrutura e tao informe que, se for obrigado a sobrep6--las, coloca-as da maneira mais irregular e no equilibriomais instaveI. Pouco importa, desde que ele tenha tidotempo de tomar balango antes delas cairem. E, alias,nao e debaixo do objecto a agarrar que ele as poe, masprecisamente a distancia que the e suficiente para 0

atingir com urn saIto. Assim, a sua existencia propriadesaparece, em certa medida, na intuigao que 0 animalpossui das suas forgas em ligagao com as distanciase as direcgoes do espago. A este nivel de inteligenciapratica, as relagoes de posigiio, de intervalo e de dimen-sao tornaram-se, de facto, a essencia das coisas, massac ainda medidas pelas capacidades motor as do animal;o seu sistema de referencia permanece essencialmentesubjectivo.

A utilizagao do desvio (1) mostra igualmente estaestreita integragao do meio no acto. Guillaume e Meyer-son compararam a imaginagao que ele pressupoe a dojogador de bilhar, para quem os choques e topadas sofri-dos pela bola se incorpora ao movimento que recebedeles. Existe, evidentemente, nos dois casos, uma intuigaototalmente dinamica do campo operatorio. Mas a subs-tituigao da bola pelo sujeito, mesmo se se admitir atransfusao do sujeito para a bola, introduz uma aprecia-vel diferenga. As tentativas de desvio sao gestos em queo animal nao deixa de estar sempre presentc. Elas naoimplicam, portanto, em algumas minuciosas acomoda-goes motoras a que se entrega 0 jogador no momentode bater na bola, 0 mesmo poder de previsao pura, edepois de extingao absoluta perante os efeitos destaprevisao. Mas os gestos, que comegam pOl' afastar 0 quese quer agarrar para se vir a agarrar mais tarde, naosac menos a realizagao de urn trajecto que, sem estar

ainda separado deles, e ao mesmo tempo determinadopOl' urn conjunto mais ou menos complicado de relag5esno espago.

Efectivamente, na medida em que 0 movimento levaem si 0 meio, confunde-se igualmente com ele. Se essee de facto 0 dominio do acto motor propriamente dito,a ele se the vem juntar. Ja no animal se esboga 0 queno jogo se vai desenvolver amplamente na crianga:o simulacro, quer dizer, urn acto sem objecto real, aindaque parega urn acto verdadeiro. POl' muito total e seria-mente que a crianga se entregue ao jogo, nao deixa, noentanto, de desconhecer as suas ficQoes. Muito pelocontrario, ainda aumenta mais a sua margem. as brin-quedos que mais the agradem nao sac os que melhorse assemelham ao real, mas em que a sua fantasia, a suavontade de invengao e de.criagao estao proporcionalmentelimitadas; sac aqueles cujo significado mais depende dasua propria actividade.

a simulacro nao tern para a crianga nada de ilusorio,pois e a descoberta e 0 exercicio duma fungao. Na ori-gem, era uma simples antecipagao a que fortuitamenteescapou 0 objecto. Mas se ela se repetir pOl' si mesma,entao 0 acto seguinte pode coincidir quase exactamentecom 0 acto original, pois 0 seu objectivo modificou-se.Desprovido de eficacia pratica, pelo menos n'o momentoseguinte, ele nao e mais que a representagao de simesmo. Mas e uma representagao. au antes, ainda iden-tieo aos movimentos que representa, confunde em sitres etapas: 0 real, a imagem e os sinais pOl' que sepode exprimir a imagem. Conforme 0 momento e 0 graude evolugao, e uma 01.1 outra destas tres fungoes queprevalece. A sua coexistencia inicial sob as mesmas espe-cies torna insensiveis, mas mais faceis, as transmutagoesmutuas e cedo tambem, com a diferenciagao funcional,a diferenciagao dos seus efeitos visiveis.

Urn simulacro pode ser uma copia exacta, au urnesquema abstracto e ja convencionaI. A imagem que

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actualiza pode ser uma simples revivescencia, ou lem-bra~~a, evoca~ao, invoca~ao do facto nela gravado.o simulacro transformou-se frequentemente num ritoquer dizer, numa inten~ao de suscitar realmente 0 acon~te:i~ento representado. Dependendo ainda, por seu inter-~~1O, d?s gestos eficazes de que saiu, a irnagem e aIdela facilmente se atribuem urn poder directo sobre ascoisas - 0 que foi baptizado de «poder magico». Semfa~ar ~os primitivos nos quais 0 rito e uma instituic;ao,a ilusao de eficiencia directa que a ideia mantem ternsimplesmente por origem uma delimitac;ao ainda insufi-ciente como na infancia, ou novamente insuficiente comona emo~ao, entre os diferentes dominios da consciencia.

Os gestos de simbolizac;ao, de que 0 simulacro e 0

exemplo mais concreto, podem facilmente contribuir,na medida em que perdem a sua semelhanc;a imediatacom a acc;ao ou 0 objecto, para levar a imagem e a ideiapara alem das pr6prias coisas, para urn plano mentalem que se possam formular relagoes menos individuais,menos subjectivas e cada vez mais gerais. Mas, ao mesmotempo, na medida em que sao necessarios a fixac;ao,evoca~ao e ordena<;.io das ideias, eles impoem-Ihes assuas pr6prias condi~6es especiais. 0 pensamento perde--se quando, na miragem das crescentes abstracc;oes, julgapoder desatar todos os lagos que 0 unem ao espac;o, 0 quale 0 unico que, pOl' graus, 0 pode voltar a fazer encontraras coisas.

o gesto, alias, ultrapassa-se a sj mesmo para ter-minal' no signo. Urn movimento inscreve-se em graffitinuma parede ou em gatafunhos num papel; este efeitopode impressionar a crianga, que 0 tenta repetir, ini-ciando assim uma actividade circular em que 0 gestoe 0 trago se comparam atra yes das suas variagoes. Maso ciclo depressa se desfaz pela necessidade espontaneaou sugerida de encontrar urn significado para os trac;os.A sna relagao mutua e a primeira ideia que surge semnenhuma condigao de sernelhanga. Depois a crianga com-poe 0 seu deseEIho segundo urn tema, mas com elementos

muito mais convencionais que imitativos: e dai que pro-cede aquilo a que se chamou 0 seu realismo intelectual,pOl' oposigao ao realismo visual. Esta intuigao da figu-ragao grafica pode ser entao utilizada em proveito daescritura convencional. A tradugao dos sons em trag osnao criou, mas pressupunha a aptidao e a experienciagraficas.

Os pr6prios sons de que se comp6e a palavra naosao uma simples sucessao; pertencem a conjuntos quejuntam a sucessao pura a previsao simultanea e maisou menos ampla das palavras ou elementos foneticosa enunciar, da sua posigao reciproca, da sua exacta dis-tribuigao. E esta operagao que e defeituosa na afasiae que opoe graves dificuldades a aprendizagem da pala-vra pela crianga. Foi possivel mostrar a concomitanciacom a afasia duma incerteza no poder de distribuir osobjectos no espago segundo urn modelo que, no entanto,podia ser detectado (1). 0 insucesso destas ordenagOesparece tel', nos dois casos, a mesma origem. Ele p6e emcausa urn dinamismo estreitamente subordinado a rela-~oes de posic;ao, uma intuic;ao dinamica destas relagOes.Pode-se imagina-Io como a intima integra~ao reciprocado movimento e do espago projectando-se em todos ospIanos da vida mental. Assim, 0 acto motor nao se limitano dominio das coisas mas, atraves dos meios de expres-sao, suporte indispensavel do pensamento, faz com queeste participe nas mesmas condigoes que ele .. Este e umfactor a tel' em conta na evolugao mental da crianga.

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Os prinClplOS da fala na crianc;a coincidem com urnacentuado progresso das suas capacidades praticas, aque se tornou particularmente manifesto ao comparar-seo seu comportamento com 0 do macaco. Assim, Boutanem prfmeiro lugar e outros depois dele, especialmenteKellog e a sua esposa, colocaram em presenc;a de situa-c;oes identicas e chegaram mesmo a educar em con-junto uma crianc;a, antes e depois da idade da fala, e urnjovem macaco. No periodo inicial, reacc;oes muito ana-logas. Mas quando the surge 0 uso da palavra, a crianc;aafasta-se rapidamente do seu companheiro. Se eles foremcolocados, por exemplo, em presenc;a de caixas 'alinha-das, em que uma contern uma guloseima, 0 adestramentopara a encontrar sem falhas comec;a por dar resultadossemelhantes. Mas se se modifica a ordem das caixas,o macaco, desconcertado, nao faz mais que procurarao acaso, enquanto a crianc;a, a partir da idade em quecomec;a a falar, sabe reconhecer rapidamente a quedeve fazer.

1i: evidente que a linguagem esta ainda demasiadono inicio para que se possa encarar a hipotese de umaordem interior ou de qualquer enumerac;iio mental. Tra-ta-se antes da aptidao para imaginar nos objectos que

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se podem avistar, uma desloca~ao, uma trajectoria,uma direc~ao invisiveis. Ela nao 6 possivel a nao serque a visao, em vez de ser totalmente absorvida pelosproprios objectos, os distribua num plano imaginariode posi~oes csta veis e solidarias. Sem ela, nao ha ne-nhuma possibilidade de representar a ordem mais in-significante, de efectuar uma sequencia. Dela dependetambem 0 poder de ordenar as sucessivas partes uodiscurso. A perda dum poder acarreta a perda de outro.Um afasico nao sabe indicar as direc~oes - alto, baixo,direita, esquerda, etc. - se tiver os olhos fechados. Comos olhos abertos 0 que ele mostra, segundo Sieckmann,e um objecto, nao uma direc~ao: 0 tecto ou 0 ceu, a maoque segura uma navalha de barba, a que nao escreve, etc.

Simples condi<:;ao de base, esta sobreposi~ao ao espa~o,onde estao e se produzem as coisas e os gestos, da intui-~ao que os ve surgir, esta, indubitavelmente, longe deexplicar toda a fun~ao da linguagem, ou as consideraveisconsequencias que del a resultaram para a especie e parao individuo. Sem falar aqui das rela<:;oes socia is que tornapossiveis e que a modelaram, nem 0 que cada dialectocontem e transmite de historia, e a linguagem que fezmudar-se em conhecimento a mistura estreitamente com-binada de coisas e de ac~ao em que se resolve a expe-riencia bruta. Ela nao e, verda de se diga, a causa dopensamento, mas e 0 instrumento e 0 suporte indispen-save is aos seus progressos. Se ha pOl' vezes um atrasonum ou noutro, a sua ac~ao reciproca restabelece rapi-damente ° equilibrio.

Atraves da linguagem, 0 objecto do pensamento deixade ser exclusivamente 0 que, pela sua presen~a, se impoea percep~ao. Ela fornece a representa<:;ao das coisas queja nao existem ou que poderiam existir 0 meio paraserem evocadasl e confrontadas entre si e com 0 que eactualmente sentido. Ao mesmo tempo que reintegrao ausente no presente, permite exprimir, fixar, analisaro presente. Ela sobrepoe aos momentos de experienciavivida 0 mundo dos signos, que sac os pontos de refe-

rencia do pensamento, num meio em que este pode ima-ginal' e seguir livres trajectorias, unir 0 que estava desu-nido, separar 0 que tinha sido simultaneo. Mas esta subs-titui~ao da coisa pelo signo nao se efectua sem dificul-dades, sem conflitos. Ela obriga a resolver na praticaproblemas cuja reflexao especulativa so mais tarde seadquire. Ao individualizar 0 que estava confundido, aoeternizar 0 que era transitorio, a representa<:;ao, que 0

signa ajuda a delimitar-se estritamente, provoca a opo-si~ao entre 0 mesmo e 0 outro, 0 semelhante e 0 diverso,o unico e 0 multiplo, 0 permanente e 0 efemero, 0 iden-tico e 0 variavel, a posi<:;aoe 0 movimento, 0 ser e 0 devil'.Muitas inconsequencias que nos surpreendem na crian<:;atem origem no choque destas no<:;Oescontraditorias, pOl'muito apta que ela esteja para se desviar delas pOl'omissao, pOl' muito ajudada que seja a contorna-las peloshabitos da linguagem e do pensamento que the vemdo adulto.

Mas 0 passe em frente que a linguagem permite aopensamento, e reciprocamente ° esfor<:;o que ela exigedele, podem tornar-se manifestos pelo atraso que elesofre se ela ten de a desaparecer. Goldstein detectou nosafasicos a impotencia para classificar os objectos segundocaracteristicas que no entanto eram evidentes, mas queeram estranhas ao interesse actual do sujeito. Em con-trapartida, agrupara outros tao heteroclitos quanta pos-sivel, sc pertencem de alguma maneira a ac~iio que lheocupa 0 espirito. Um doente recusa-se a juntar um saca--rolhas a uma garrafa cuja rolha nao esta bem presa,com 0 pretexto de que ela ja esta destapada. Uma outrajunta uma caixa de po de arroz com um livro, porquese trata de objectos que conta levar de viagem. A exis-tencia das coisas per de a sua independencia; elas sosac apreendidas na medida em que se relacionam como ego do doente.

Este egocentrisl'Iw e tambem 0 da linguagem. Normalenquanto se trata das circunstancias concretas em queevolui 0 sujeito, deixa de poder ser compreendida na

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d:sCri~ao daq~elas que, POl' muito simples que sejam,sac :stran~as a sua propria vida. Ao mesmo tempo torna--se ImpossIVel a enumera~ao abstracta de nomes que

t ' ,con udo, as necessidades do momento fazem ainda utili-zal' col'rectamente.

~ambem neste aspecto se imp6e a compara~ao coma crIan~a, em quem se observam semelhantes dispari-dades no emprego ou na compreensao das palavrassegundo a situa~ao, e que sabe dissociar mal de simesma 0 curso dos acontecimentos ou a realidade dascoisas, agrupar mal os objectos, se nao existirem asrelag6es que a sua propria actividade neles possa intro-duzil'.

periodo, e a l'elatividade deste ajustamento entre pala-vl'as e coisas pl'essup6e um desdobramento dos pIanosnos quais se pl'ojectam os objectos do pensamento, 0 quepertence a uma evolugao mental ja elevada. Mas e jamuito mais primitivamente que a continuidade, a coe-l'encia, as difel'enciag6es necessarias do pensamento estaolimitadas, na crianga, pelo seu modo de funcionamento.

Exel'cendo-se 'os mecanismos da ac~ao antes dos dareflexao, quando a crian~a se quer represental' umasituagao, nao 0 conseguira se nao se comprometel' pl'i-meiro nela, de qualquer modo, pelos seus gestos. 0 gestoprecede a palavra e depois e acompanhado pOl' ela antesde a acompanhar, para enfim se reahsorver mais oumenos nela. A crianga mostra, depois conta, antes depodel' explicar. Nao imagina nada sem uma encenagao.Nao separou ainda de si 0 espa~o que a rodeia. ~ 0

campo necessario, nao apenas dos seus movimentos,mas dos seus relatos. Pelas suas atitudes e momices,parece fazer urn teatro com as peripecias de que selembra, e tornar presentes e distribuir os objectos, aspersonagens que evoca. Se tern um verdadeiro interlo-cutor, e ele a quem parece querer despel'tal', aproprial'-seda sua pl'esen~a com os seus gestos, com as suas repe-tidas interjei~6es. Ao mesmo tempo, nada e evocado semsel' contado, como se a enuncia~ao de circunstanciasconcretas fosse necessaria a evoca~ao. Alias, acontecemuitas vezes que a influencia destas corta 0 fio a meadaou faz desvial' 0 relato.

Esta etapa corresponde a pel'sistente pl'eponderanciado apal'elho motor sobre 0 aparelho conceptual. Semacgao motora ou verbal, falta a ideia 0 vigor necessario .para se formal' ou para se manter. Os cil'cuitos que lhesac proprios e que pertencem aos sistemas de associagaopel'manecem sujeitos ao reforgo e a coacgao das exte-riorizag6es que tem pol' instrumento 0 aparelho de pl'o-jecgao. Dai 0 nome de «mentalidade projectiva», dadoa este tipo de equilibl'io psicomotor cuja sobrevivencia

Em face destas dificuldades estao as forgas _ ouas fraquezas da crianga. As suas impress6es e reac~6esdo momento come~am pOl' absorve-Ias sem reservas.E indubitavel que elas se modificam e se renovam' masmergulhada no sucessivo, ela nao e capaz de apr~ende;a sucessao. Ate e pouco correcto dizer que ela viveum perpHuo «agora», porque nao possui nada fixo aque 0 opor. E um agora indelimitado, sem focagem, semimagem-recorda~ao e sem previsao. Gradual ou silbita,a transforma~ao sOfre-se, nao e reconhecida. A crian~a,movida pelos seus apetites ou pelas circunstancias, podecertamente sentiI' espectativa ao mesmo tempo que 0

desejo; a mudan~a completa dos seus gestos ao mesmotempo que a atrac~ao pOl' um novo objecto. Mas estassao simples tens6es au simples metamorfoses no jogodas suas atitudes. Ela nao sabe reunir estes diversosmomentos, ainda que com um la~o frouxo e fragmen-tario. J'a fala ha val'ios meses e no entanto ainda lheescapa 0 sentido do antes e do depois. Nao se trataapenas de vocabulos nem mesmo de n~6es demasiadodif~eis. E indubitavel que a designagao do tempo e asua nitida identifica~ao exigem uma integra~ao suces-siva dos tres term os amanhii) hoje) ontem, no mesmo

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se observa em certos adultos. Ela traduz-se pOl' umaaderencia excessiva do pensamento ao seu objecto, a quese chama «viscosidade mental». A ac~ao expressiva queos une, desenvolvendo as suas proprias formulas, man-tern-no prisioneiro, arrasta-o consigo para £)S seus sis-temas de habitos ou de reminiscencias, e atrasa ou desviao seu curso. Suprime os simples relances que permitemque a ideia atinja directamente 0 seu objectivo sem tel'que percorrer todos os relevos intermedios. Impede, peloseu realismo motor, a pronta utiliza~ao dos signos epontos de referencia verbais que podem dispensar depensar a coisa enunciada. Traduz uma insuficiente dife-rencia~ao entre os pIanos pragmatico e conceptual davida psiquica.

Tambem e verdade que na crian~a a interferenciade ou tras insuficiencias confere aos efeitos desta indi-ferencia~ao urn aspecto menos pesado. 0 seu aparelhomotor e disputado pela formula~ao da ideia ainda fragi]e as reac~oes ainda incontroladas que uma excita~aofortuita the arranca. As diversOes suspendem a reali-za~ao em curso e vem juntar-se as distrac~oes em queela tantas vezes se perde. Combinadas a viscosidadee a hiperprossexia (1), 0 pensamento apresenta aparen-cias de mobilidade e de constancia. Na realidade, trata-sede uma simples alternancia. 0 tema cujo recome~o su-cede ao reflexo de curiosidade e-lhe totalmente estranho.Entre eles, a descontinuidade e completa. Perseveran<;ae incontinencia perceptivo-motora, parecendo ao mesmotempo contrariar os seus efeitos, sao igualmente contra-rias ao desenvolvimento da ideia. A sua consequenciae uma fragmenta<;ao, uma simples justaposi<;ao dos mo-mentos intelectuais. Em presen<;a de problemas ligadosao exercicio do pensamento, esta descontinuidade influinecessariamente na maneira de os resolver.

Enfim, a descontinuidade mental da crian<;a tern umaoutra causa de nao menores consequencias. 11'; a debili-

dade da acomoda~o ao objecto que poe em jogo 0 apa-relho motor, perceptivo ou intelectual. A acomoda~aoe vacilante durante muito tempo. Oscila mais ou menosa volta do objectivo, a sua focagem e fugaz e as suasvaria~oes seguem mal as do objectivo. Como urn gatitoa quem a bola desapareceu num local inacessivel, parade repente indeciso, tambem a crian~a mais viva e ale-gre tern os seus momentos de desocupa~ao subita. Nomomento em que Ihe escapa 0 objecto do seu pensa-mento, passa pelo seu rosto urn certo ar d~ :stupide~.E 0 facto e que the acontece muitas vezes delxa-Io fuglre tambem confundi-Io com outros. Dai resulta uma ima-gem vacilante das coisas, que torna dificil identificarcada uma delas e facil mistunl-Ias entre si. A ideia dassuas possiveis metamorfoses, longe de ser diminuida pelocontacto da realidade, encontra antes nela 0 seu funda-mento. Assim, as fantasmagorias em que a crian~a acre-dita nao nos deverao ja surpreender tanto.

o pensamento da crian~a foi classificado de sincre-tico. De facto, nao se podem atribuir os mesmos quali-ficativos as suas opera~oes e as do pensamento adulto.Este denomina, enumera e decompoe 0 objecto, 0 acon-tecimento, a situagao, nas suas partes au nas suas cir-cunstancias. Tem que utilizar term os que tenham urnsignificado definido e estavel, deve controlar a adapta<{3.oexacta a realidade presente, e depois encontrar 0 todopartindo dos elementos, sendo esta reversibilidade dosresultados a unica garantia da sua precisao. 0 pensa-mento adulto actua, pois, pOl' analise e pOl' sintese.Antes de ser capaz de proceder do mesmo modo, 0 pen-samento da crianga tern que veneer dificeis oposi~Oes.

Entre a linguagem e 0 objectol a adapta~ao estalonge de ser imediata. As primeiras frases sao optati~asou imperativas, feitas duma unica palavra e, na ma~orparte das vezes, da mesma silaba repetida. 0 seu senbdo

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pode va rial' segundo as situa~6es. Elas sao, pais, essen-cialmente clipticas e polivalentes. Sao as circunstanciasque tern que as definir e nao a inverso. Apesar da suaestrutura se come~ar a desenvolver, a inten~ao perma-nece ainda voluntarista e expressiva. Traduzem maisa entusiasmo au a estado afectivo do sujeito que a natu-reza au a aspecto do objecto. Quando surge a idadeem que 0 «saber verbal» (Goldstein) se desenvolve rapi-damente, e aincla, ao principio, sob a forma de conjuntosmnemonicos, mais ou menos decOl'ados pOl' si mesmos,au que pelo men os nao tern com a realidade mais quealgumas rela~6es incertas e globais. Sao frequentementel1ece~sft.rias muitas e lentas tentativas para que a crianc;aconsiga penetrar 0 seu sentido, reconhecer as sua;:; partese ajustar cada uma ao seu significado proprio. Entreelas, como entre os conjuntos de que sac destacadas,os la~os permanecem durante muito tempo mais fortesque a sua referencia exacta aos objeetos. A traduc;aoverbal do seu pensamento engana muitas vezes a crian~a,substituindo-se a sua experiencia directa das coisas.Quando mais tarde surgem os conhecimentos escolares,ainda nao terminou 0 conflito entre as palavras e ascoisas. E, para compreender algumas das contradic;aesem que as perguntas do adulto a pod em induzir, e precisesab€r constatar que prodigiosos esforc;os de reduc;aoIhe sac necessarios entre estas tres fontes do conheci-mento: a experiencia imediata, 0 vocabulario e a tradi~aomagistral.

Mas a representa~ao, que desliza inevitavelmenteentre a palavra e a coisa como 0 seu vestigio e evocadorcomum, come~a igualmente pOl' opor as suas propriasexigencias as da experiencia bruta. Ela e delimita~aoe estabilizac;ao. Ao instalar-se no espirito da crianc;a,tende a tornar-Ihe inconcebivel a sua intui~ao dinamicadas situac;aes. Quando antes tudo era fusao do desejoe do objecto, dos automatismos e do instrumento, doespac;o e dos gestos (2), agora ela distingue, divide, imo-

biliza. Ainda estreitamente Iigada as suas origens con-cretas e verbais, tern deficiencias de funcionamento e naosabe variar com a diversidade das relac;oes. Torna inin-teligivel para a crianc;a 0 que ela sente continuamente:a mudanc;a. Em presenc;a das coisas e dos acontecimeptosque se sucedem, ela seria como os eleaticos, para quema imagem de cada posic;ao sucessivamente ocupac1a enco-bre 0 movimento,.ou como os obcecados, que a represen-tac;ao de urn objecto au de uma circunstancia temida tornainsensiveis as relac;aes de distancia, de rapidez e mesmode simples exterioridade (a caravana funebre de um des-conhecido parece-lhes atingir a sua propria pessoa), masque julgam ao mesmo tempo que 0 risco pode ser afas-tado pOl' uma representac;ao em forma de simulacroou de esconjuro.

o sincretismo produz efeitos muito semelhantes.E uma especie de compromisso, a diversos niveis, entrea representa<:;ao que se procura e a complexidade evolu-tiva da experiencia. Para 0 definir, sera melhor compara--10 com 8.S distinc;aes essenciais em que se baseia 0 pen-samento do adulto.

Face a analise-sintese, 0 adulto exprime as relac;aesque a crianc;a e capaz de estabelecer entre as partese 0 todo. A confusao e ainda mais ou men os completa.A percepc;ao das coisas ou das situac;aes continua a serglobal, isto e, 0 pormenor permanece indistinto. Noentanto, a atenc;ao da crianc;a parece-nos muitas vezesincidir sobre 0 pormenor das coisas. Chega inclusiva-mente a detectar pormenores muito especificos, subtisou fortuitos que a nos nos tinham escapado. No entanto,nao e como pormenores dum conjunto que ela asapreende, e e precisamente par isso que lhes e ta~ sen-sivel. Subordinados ao conjunto, imediatamente perderiaa interesse pOl' eles, quer porque deixaria de atingir 0 seusignificado proprio quer porque os consideraria dema-siado aces sari as.

A percepc;ao da crianc;a e, portanto, mais singularque global; dirige-se a unidades su cessivas e mutuamente

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independentes, ou que naa tern entre si outros la~ospara alem da sua propria enumera~ao. A ordem pelaqual a crian~a as detecta pode, alias, deixar mais queurn tra~o bruto na sua apercep~ao ou na sua memoria.Pode organizar-se numa estrutura mais ou menos amorfa ,substituindo a das coisas.

Entre as unidades perceptivas da crianGa ha, noentanto, a diferen~a de que umas sao para nos real-mente conjuntos e as outras, pelo contrario, parecem--nos simples pormenores indecomponiveis. Varias expe-riencias indiferentemente combinadas levaram algunspsicologos a dizer que a visao da crian~a atinge de factoo todo, mas indecomposto, e outros a afirmar que elaisola do todo, que pOl' si mesmo Ihe e inacessivel, urntrac;o elementar. Bourjade demonstrou muito engenho-samente que, no primeiro caso, as formas apresentadastinham ja uma coesao assinalavel e que, no segundo,prevalecia a descontinuidade ou a heterogeneidade.

o poder organizador da percep~ao infantil tern, defacto, diversos graus. Pode variar em extensao e emresistencia, diminuindo as duas a. medida que a formaatingida se baseia numa estrutura, menos coerente oumais complicada, dos dados exteriores da percepGao.A nao-resistencia do agrupamento e 0 que durante muitotempo contribui para impedir a anAJise, porque a coesaodo conjunto e indispensavel durante todo 0 tempo emque opera.

Mas 0 que pode com plical' os efeitos do sincretismoe 0 facto de nao ser uma simples insuficiencia; ele e,a seu modo, uma actividade completa em presen~a dascoisas. Utiliza os procedimentos mais gerais da expe-riencia habitual, como a antecipac;.ao. Ja nos anima isse pode constatar que, levados a reconhecer figuras,podem reagir apenas a uma das suas partes, como sefossem capazes de completar cada uma. Isto nao e maisque a verifica~ao de urn facto constante nos comporta-mentos mesmo elementares, e que se en contra na per-cep~o. Mas a parte que provoca a mesma reacGao ou

a mesma resposta que provocaria 0 todo, nao quernecessariamente dizer que ela implique ou evoque a estru-tura do todo. Urn pormenor acidental daria 0 mesmoresultado que urn traGo essencial, se tive.sse a mesmaconstancia. l!: 0 que acontece com motivos menos sim-ples' e menos despidos, como uma figura geometrica.

A coisa torna-se evidente quando, em vez dumaimagem ou dum objecto, 0 motivo e uma situa~ao com-pleta e concreta. Entao 0 aspecto fortuito nao so se intro-duz mais facilmente como nao tern necessidade de serepetir para ser fixado, desde que 0 interesse suscitadoseja suficiente. Deste modo, vemo-lo muitas vezes mis-turar-se ou substituir 0 essencial na conduta, nos relatos,nas explicaGoes da crian~a. As impressoes que as cir-cunstancias, quer extern as quer intimas, uniram, ba-seiam-se numa espeeie de equilibrio mutuo, de tal modoque qualquer uma delas po de significar ou evocar todoo conjunto. No adulto, certas recordaGoes dao origema algo semelhante: as que guardam a colora~ao unicadum momento ou dum acontecimento, e que alia.s remon-tam habitualmente a. sua inffmcia. Devem-na muitasvezes a tra~os puramente acessorios, mas que calharamser os condensadores dum estado au duma etapa afec-tiva. Essa memoria opoe-se a memoria classificadora eracional. Na crianc;a, as quadros classificatorios nao exis-tern ainda. Dai a particularidade assinalavel e como queirredutivel das suas impressoes e recorda~oes.

Para tais efeitos contribui a falta duma distinGaoque e talvez mais fundamental que a das partes e dotodo: os aspectos subjectivo e objectivo misturam-seainda, dando lugar ao que Levy-Bruhl chamou partici-paGao. A crianGa comeGa pOl' nao saber isolar-se doespectaculo que a cativa ou do objecto que deseja. Destemodo, a sua vida vai-se fragmentando com as divers assitua~oes nas quais se vai confundindo, mas, inversa-mente, elas estao de tal modo imbuidas da sua subs-tancia afectiva, que com frequencia se Ihe assemelhammuito mais aos acontecimentos. Em presen~a de circuns-

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tancias definidas, constata-se normalmente que a crianQalhes insere alteraQoes, nos seus relatos e na sua sensi-bilidade, que as podem opor, como uma mentira, a ver-dade. Se a coisa em si nao tern nenhuma importancia,e simplesmente encarada como urn divertimento da suafantasia. Nos dois casos, ha a mesma intromissao, emdiversos graus, do sujeito no objecto.

A confusao dos aspectos subjectivo e objectivo trans-fere-se, naturalmente, para 0 que traduz as suas rela-!toes: a representaQao e as palavras que a exprimem.Esta e 0 reflexo, no seu plano, das suas ac«oes reciprocas.POl' ela, 0 objecto temido torna-se malefico, mesmo semcontacto fisico; e 0 desejo considera-se eficaz, mesmosem interven«ao material. a simulacro pode-Ihe dar umaaparencia de realidade alegorica; mas e suficiente umasimples formula verbal, ou mesmo a simples inten<;ao:a crian«a acredita firmemente nas consequencias vinga-tivas das suas invectivas; mas limita-se apenas a desejarintensamente 0 castigo do adversario, com a ilusao deque dai resultara alguma coisa. :e 0 que foi chamado«crenQa magica». Ela nao tern, porem, nada de magicona crian!ta, no sentido de que nao tem nada de ritoe que e completamente espontanea. E 0 simples efeitoda indiferencia!tao que persiste entre os pIanos mentaise motores da aC!tao, entre 0 ego e 0 mundo exterior.POI' isso nao se trata nem de uma questao de egocen-trismo nem de exocentrismo, mas de urn estadio ante-cedente.

Esta indiferenciaQao inicial entre 0 ego e 0 outroprovoca tambem uma insuficiente distinQao entre osoutros. Quando a crianQa pequena chama «paph a todoo homem que ve, seria igualmente prematuro dizer queos identifica com 0 seu pai ou que os inclui numacategoria designada pelo nome de uma {mica pessoa, pOl'ignorar 0 nome colectivo. Ela sofre a reacQao de con-jtU}to, motivada pOl' alguns dos seus traQos, em que aspartes se confundem com 0 todo e sao, consequentemente,susceptiveis de provocar a confusao mutua de conjuntos,

de outro modo diferentes. :e so quando se torna c~pazde distinguir as suas proprias reacQOes dos seus motIvosexteriores, que os motivos, individualizando-~e, lhe. p~r-mitem distingui-los uns dos outros, quer dlzer, dlstm.-guir a sua estrutura propria sobre 0 fundo da suanatureza comum.

a individual e 0 geral, de que os filosofos se .dedi-caram a discutir a prioridade relativa, sac na reahdadesimultaneos, porque solidarios, e 0 sincl'etismo f..az comque sejam precedidos par urn outro ~e.rmo que nao podeser nem urn nem outro, porque 0 sUJelto que actua com-preende ou pensa nao poder deixar de. x,nisturar a s~apresenQa com motivos da realidade, prOlbmdo-lhes aSSlmoporas suas identidades e 'ao mesm~ t~mpo. classific~rcada uma em quadros definidos, estavelS e lmpessoals.

Distinguir entre as individuos, pressup~e 0 P?derde opal' 0 identico ao semelhante e de 0 umr ao dlsse-melhante. Vma simples semelhanQa nao deve provocara assimilaQao de dois seres; mas 0 mesmo ser podevariaI' nalgumas das suas caracteristicas, e cad a umadelas pode variaI' dentro de certos limites. Sabe-se comoa menor modificaQao no penteado ou nos fatos daspessoas que lidam habitualmente com ela pode se~ causade terror para a crian!ta pequena. Nao reconheclr.n:n~oe reconhecimento simultaneos produzem urn deseqmhbnopsiquico que provoca 0 medo, como normal~lente acon-tece no desequilibrio psiquico (1). a conheClmento p:e-coce que 0 bebe tern da mae nao e uma v:rdadelraidentificaQao, mas sim a sua resposta ao conJunto dassitua«oes que muitos e apertados laQos entranQaramentre ele e ela.

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A invariancia que a crian~a exige nos objectos quelhe sac familiares tern evidentemente por limite 0 seupoder, em alguns dominios muito obtuso, de discerniras diferenQas. Do mesmo modo, a assimilaQao que fazde object os urn pouco diferentes pode provocar a ilusaoerrada de que ela e capaz de apreciar no seu justo valoruma simples diversidade de tonalidades. Na realidade,a relaQao da coisa com as suas qualidades e extrema-mente estrita e unilateral. Ela torna a sua identidadeextremamente fnigil, sendo susceptivel de se dissociarem tantos seres quantos aspectos sucessivos possui, e deser assimilada a tantos seres diferentes quantas seme-lhan~as parciais possua com eles, podendo urn simplesponto de contacto provocar a coincidencia do todo.A impotencia da crian~a para distinguir entre a coisae os seus aspectos simultaneos au passageiros resultada sua impotencia para imaginal' os aspectos sob a formade qualidades independentes. ou melhor, de categoriasqualitativas.

Ainda aqui 0 estudo da afasia pode par em relevocasos de regressao susceptiveis de esclarecer os prin-cipios do desenvolvimento intelectual na crianc;a. A estritaaderencia da qualidade a coisa permitia a urn doentedizer que a morango e vermelho, enquanto perante amos-tras de la vermelha nao as sabia designar como tal(Goldstein). Dir-se-a qUe se trata de simples associaQaoautomatica duma qualidade ao nome da coisa, coma concomitante impotencia de evocaC;ao verbal em pre-senQa de objectos a descrever. Mas se a evocac;ao verbalera impossivel, e precisamente porque a cor significadanao era indistintamente a cor de todos os objectos ver-melhos actualmente conhecidos ou eventualmcnte aconhecer; ela era apenas a cor deste ou daquele objectoespecifico. A menos que the estivesse ja como que subs-tancialmente unida, nao podia ser evocada a seu respeito.Muito pelo contrario, nao se limitava apenas a' este ouaquele objecto, mas tambem a esta ou aquela tonalidade.Todos os obj~ctos de tonalidade ligeiramente diferente

eram rejeitados como nao vermelhos. DiminuiC;ao daapercepc;ao e do reconhecimento das cores? De formanenhuma, porque em vez de juntar dois vermelhos, acon-tecia que 0 doente aproximava duas cores de tom funda-mental completamente diferente, mas entre as quaishavia uma certa harmonia de brilho, de delicadeza deefeito estetico. As semelhanQas ou conformidades quali-tativas eram bem apreendidas, muitas vezes ate com umagrande subtileza, mas cada uma pOl' si e sem correspon-del' a urn principio identico de classificaQao. As relaQOes,as estruturas de cores, eram detectadas quando a ocasiaoo provocava concretamente, mas as qualidades da cornao podiam tornar-se cada uma urn ponto de referenciapara 0 agrupamento e ordenaQao dos objectos em quese encontrava. Nenhuma era capaz de impor a sua direc-c;ao nem de imprimir a escolha uma orienta~o deter-minada e momentaneamente exclusiva de qualquer outra.Elas estavam diminuidas do seu poder categorial.

Tambem nacrianc;a as qualidades das coisas come-Qam pOl' se combinar com cada uma de per si, naopodendo assim classifica-las atraves de uma comparaQaosistematica. Elas nao passaram ainda para 0 plano fun-cional das categorias. Essa e uma etapa mais ou menostardia conforme a origem mais abstracta ou mais con-creta dos principios classificat6rios. Enquanto nao aatinget a crianc;a sente insuperaveis dificuldades em pre-senQa de problemas que parecem simples. 0 teste queBurt fez com tres pequenitas, umas das quais tinhaos cabelos mais escuros que a segunda mas mais clarosque a terceira, perguntando-lhes: «Qual e a mais es-cura ?», nao pode ser resolvido com facilidade e certezaenquanto a crianc;a nao souber projectar as cores enun-ciadas sobre 0 fundo da cor-categoria, quer dizer, deuma cor que se tenha tornado independente de todos osobjectos particulares e possa servir para os classificar.

Do mesmo modo, 0 absurdo da frase em que a crianc;ase inclui entre as tres irmaos que pretende tel' nao podeser denunciada ou explicada se a qualidade de irmao

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permanecer Jigada ao individuo, em vez de ser umacategoria desligada de cada um e em especial do sujeito,de tal modo que a sua qualificaQao absoluta seja subs-tituicla pOl' relaQoes mutuas entre um C outro.

goglCo talvez contestavel; mas Stern teve, sem duvida,esta ideia influenciado pelo que ele pr6prio chamou«convergencia» a prop6sito da linguagem, quer dizer,das modificaQoes que surgem inconscientemente nas ma-neiras do adulto para se assemelharem as da crianQae the serem mais acessiveis. De resto, muitos exemplose experiencias mostram que na percepc;ao da crian<;ao incompleto, 0 intermedio, 0 acidental, sao l'eduzidosao acabado, ao extremo, ao tipo. 0 0, circulo interrom-pido, e vis to como urn O. S6 gradualmente, com a idade,as pequenas diferenc;as se tornam perceptiveis. 0 meca-nismo desta diversificaQao e, segundo Koffka, 0 mesmaque 0 da normaJizaQao que fixa as qualidades especi-ficas de cada objecto: e a existencia duma estruturaperceptiva, mas que mais ou menos se diferencia.

Pelo que toca as cores, e uma constataQao comumque elas variam com a iluminaQao, que nao sao asmesmas ao meio-dia, de manha e a noite, pOl' nao sera mesma a composiQao da luz. E, no entanto, a tona-lidade pr6pria de cada objecto parece ser a mesma.Trata-se nao duma interpretaQao ou duma correcQaosecundaria, mas dum facto bastante mais primitivo.Koffka cornpara-o com a experiencia realizada pOl'Koehler com galinhas que ele punha a debicar numaarea metade branca e metade cinzenta: os graos daparte cinzenta, que foram colados ao solo, depl'essa obri-gar am 0 animal a s6 apanhar os da parte branca. Sobre-vem depois urn tal obscurecimento que a metade brancada superficie reflecte ainda menos luz que anteriormentea meta de cinzenta, mas e sempre nela que a galinhabusca 0 seu alimento. 0 que desencadeia a reacQao naoe, pois, uma questao de grau, mas sim uma rela<;aode luminosidade. Este facto ja era conhecido ha muitotempo no dominio da percepQao com 0 nome de albedo.As experiencias de Koehler contribuiram para demons-trar que ele ja se obsel'va em comportamentos relati-vamente elementares.

A esta relatividade qualitativa, sem a qual 0 objectodispersa a sua identidade POI' todos os aspectos ou rela-Qoes que 0 podem afectar, parece opor-se uma necessi-dade inversa mas de objectivo semelhante: a de atribuirqualidades fixas, imutaveis, especificas. A cada urn a suacor, a sua forma, as suas dimensaes: e assim que elepermanece igual a si mesmo e se contrapae a todosos outros. Esta identificaQao qualitativa nao e urn dadoprimitivo da percepQao. Obtem-se at raves dos contactosdiversos e fortuit os da sensibilidade com as coisas.Depende de uma evoluQao muito mais precocc que a dascategorias. E-lhe, alias, necessario articular-se em se-guida com elas.

Para a representar na sua simplicidade, na sua rigidezinicial, podem-se ir de novo buscar exemplos e teste-munhos a. Patologia. Em certos estados de depressaoe de obcessao, os doentes afirmam tel' sentido uma esta-bilizaQao, uma singular esquematiza<;ao das suas imp res-saes. Elas confundiam-se todas com uma especie deimagem-limite donde eram eliminados 0 acidente e atonalidade. 0 ceu era absolutamente azul como 0 ceu deItalia. dos postais, a terra castanha, a floresta verde,as casas brancas. A forma das flores era de uma regula-ridade esplendida. E assim acontecia com todos os objec-tos vistos ou imaginados.

Se falta a. crianQa a linguagem e os meios de com-paraQao para confirmar estas descriQaes, pelo menosnao e, segundo parece, sem razao que W. Stern preconizaque...;:;eIhe ensine as cores ligando cad a uma ao objectode que ela seria a marca distintiva e como que essencial:o azul do ceu, _0 verde da arvore, etc. Procedimento peda-

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o sistema de relagoes que man tern em cada objectoa sua cor propria e produto duma estrutura. Nao haimpress6es isoladas. Tudo 0 que e apercebido, e-o soba forma dum conjunto ou duma estrutura. :E do conjuntoque cada elemento recebe 0 seu significado. Mas, dentrodum mesmo mundo de impress6es, tornam-se possiveise mesmo compativeis varias especies de estruturas hete-rogeneas. As do objecto comportam a fixagao mutuadas qualidades que Ihe sao proprias. Contudo, estasqualidades e 0 proprio objecto podem tambem entrarnoutros conjuntos, cuja estrutura faz com que sir-yampara outros efeitos. A estrutura usual e utilitaria parao adulto e a estrutura pOI' objectos, 0 esfon;o do artistaou do inventor consiste muitas vezes em resolve-la nou-tras, em que tende a dissolver-se 0 aspecto convencionale tradicional do objecto. As estruturas acessiveis acrian~a sao diferentes, em divers os graus, das formulasadoptadas pelo adulto.

A progressiva diferenciagao que a crianga fai fazendodas cores e tambem, segundo Koffka, uma questao deestrutura. Quando uma cor e reconhecida ou, pelo me-nos, quando e capaz de suscitar reacgoes unicamenterelacionadas com ela, e porque se come~a a destacardo fun do, ainda indistinto mas consistente, das outras.E 0 contraste que as torna eficazes. As cores clarassao as primeiras a ser distinguidas, pOI' oposi~ao asescuras, que alias depress a sao tambem reconhecidas.As cores quentes come~am pOl' ser separadas em blocodas cores frias; sao, pOl' exemplo, todas denominadas«vermelho», com a diferen~a do claro e do escuro, quesac chamados branco e negro (Hilde Stern)._ A ordem que os autores dao da sucessiva compl'een-

sao das cores explica-se pOI' estruturas que apresentamprimeiro um forte contraste, sendo depois mais subtis.Inversamente, as confus6es correspondem a cores cujocontraste ou concordancia se baseiam em diferengas me-nos acentuadas: azul e verde, verde e branco, amareloe branco, violeta e azul. Em virtu de das rela~oes exis-

tmtes entre as condi~oes fisicas da luz e as fisiologicasclos sentidos, a progressao da visao colorida e sensivel-mente a mesma em todas as crian~as observadas. Noentanto, os dados fornecidos pOI' Shinn e pOI' Stern naosao identicos: num caso, a crian~a vivia nn California,regiao de vegetagao exuberante; no outro, tratava-seduma crian~a educada entre os blocos de cimento dumacidade. 0 meio ambiente poderia, portanto, influenciara ordem que regula 0 discernimento das cores, segundoa diversidade das estruturas habituais a que ele daorigem.

Especialmente essencial para 0 conhecimento doobjecto e a sua forma. A sua imagem na retina e extre-mamente diversa, dado que se modifica com cada des-loca~ao angular do olhar e do objecto. 0 resultado destasdiferentes impressoes e, no entanto, uma forma unicae estavel. A memoria, segundo K. Buehler, explicariaa sua constancia. Koffka contesta-o. A percep<;iio dumaforma nao e uma simples soma de impressoes, a. maneiradas imagens comp6sitas de Galton. Ela e imediata. Cadaimagem do objecto e urn sistema determinado de rela-goes entre 0 conjunto e os seus elementos, produzindocomo tal e nao como 0 resultado de sucessivos aperfei-Qoamentos. Mas entre as diversas imagens estabelece-seuma concorrencia. A imagem predominante e a quepossui uma estrutura 6ptica mais simples. E e destemodo que prevalece 0 aspecto ortoscopico.

Sera, no entanto, legitimo isolar as impressoes visuaisde todas as que estao igualmente em relaGao com a formados objectos? Nao mostram, pelo contnlrio, as obser-va~oes de Koehler sobre os chimpanzes que, na estruturados seus comportamentos em presen~a da presa dese-jada, intervem a totalidade da situagao, quer dizer, aolade dos pontos de referencias 6pticos, a intui~ao queo animal tern dos movimentos de que e capaz, assimcomo ados seus limites e dos instrumentos que osdevem suprir?

Do objecto como tal resulta tambem uma situa~aoCiue implica toda uma sene de condutas que se tornam

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indifere~ciadas da sua imagem visual. A selec~ao de queest a sena 0 resultado pressupoe como selector 0 conjuntodas necessidades e meios que estao ligados ao objectoe que s.e confundem com a sua utiliza~ao e manipula~ao,quer dlzer, com fun~oes e significados em que entramespecialmente factores tacteis e mot ores. Mas nao sese trata, indubitavelmente, dum aglomerado de distintasimpressoes. A perce~ao e de facto imediata, simples(' primitiva, mas e-o no instante em que se produz.As elabora~oes anteriores podem ser integradas na suapresente estrutura sem comprometer a sua unidade. Elae assim 0 resultado, em propor~ao variavel conformeos casos, da matura~ao funcional e da experiencia.

Se .a ~m.agem ortoscopica das coisas, simples aspectonuma mflmdade doutros, pode ser considerada a imagemverdadeira, isso nao se devera a. deficiente manipula~aodess:s aspectos, que ignora as leis, as ilusoes da pers-pectlva; Se a ~ercep~ao e relativa ao objecto, se nao eurn fenomeno slmplesmente sensorial e mesmo unissen-sorial, ~ao. exige a unidade da sua estrutura que hajaconcordanCla entre os seus factores visuais e os outros?Mas a maior simplicidade optica dos aspectos ortosco-picos e em si mesma uma no~ao muito relativa. Pareceque nao se impoe aos chimpanzes que nao sabem colocarimediatamente uma em cima da outra as duas caixasque lhes devem servir de trampolim. Ela implica a in-tui~ao da vertical, a que e talvez apenas correlativa dahorizontal e a da esquadria. Nao tern a crian~a que asaprender? Ela nao as parece descobrir como urn dadobruto das coisas; cada uma das suas mais pequenasdesloca~oes modifica a orienta~ao das suas partes. Naoha, pois, uma direc~ao mais frequente, privilegiada outipo. Pelo contnlrio, 0 equilibrio e urn problema quesurge num certo periodo do seu desenvolvimento: 0

equilibrio das caisas, mas tambem 0 seu proprio equi-librio.. Dedica-se entao com igual paixao a empilhar ver-ticalmente objectos de maneira que nao caiam, e a ten-tar experiencias mais ou menos acrobaticas, que a poem

em risco de cairo Talvez a no~ao da vertical como eixoestavel das coisas esteja em rela~ao com 0 perfodo emque 0 homem se pOe direito, cuja aprendizagem lhecusta tantos esfor~os. Na estrutura ortostatica que re-gula nao so a sua percep~ao mas tambem a sua edifi-cagao, integrar-se-ia, em ultima analise, 0 seu equilibriosubjectivo, que e a condi~ao ultima e indispensavel dasua ac~ao sobre· elas (1).

A consciencia de grandeza vem, enfim, juntar-se asde forma e de cor para conservar a identidade a urnobjecto de percep~ao. 0 tamanho de urn homem parece 0

mesmo a urn metro e a quatro, apesar da correspondenteimagem na retina ser reduzida a urn quarto. No entanto,a uma grande distancia ele parece muito mais pequeno.Vma aldeia numa montanha da inevitavelmente a im-pressao dum brinquedo. Aparentemente, a rectifica~ao sose opera, pois, num certo sistema de pontos de referenciaque devem delimitar uma zona habitual e previsivel daac~ao. Stern fala de associa~ao entre impressoes tacteise visuais. Seria ainda necessaria acrescentar-lhes as im-pressoes motoras e locomotoras. A rectifica~ao da gran-deza segundo a distancia tern urn interesse de tal modourgente no campo da ac~ao irnediata, que nao pode serurn privilegio do hornem. Como nao podia deixar de ser,o macaco e capaz de 0 fazel', e sem duvida muitos ou-tros animais: Koehler habitua urn chimpanze a tomaro seu alimento numa caixa major que outra situada nomesmo plano, e depois coloca-a mais para tras, de talmodo que a sua grandeza na retina se torna. mais pe-quena: 0 macaco nao se equivoca.

Noentanto, nao e exactamente 0 mesmo problemaestabelecer uma correla~ao pratica entre duas variaveis,tais como a distancia, a dimensao, 0 volume ou 0 peso,e fonnar uma imagem em que esta rela~ao seja formu-lada de maneira estavel e objectiva. Koffka calcula quenao e antes dos 7 anos que e de facto obtida a invaria-bilidade da imagem, seja qual for a distancia. Mais que

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urn efeito de aprendizagem, ele ve nisso um fenomenode maturaQao. K. Buehler, pelo contrario, insiste nanecessidade de exercicio para tornar inc1ependentes umada outra a grandeza da retina e a grandeza aparentedos objectos. Como prova da dificuldade de combinar assuas diferentes grandezas de retina do mesmo objecto,ele lembra 0 gosto que a crianQa tem pelos gig antes eanoes das historias: este seria um modo de exercicio--jogo para aplicaQao aos seres da sua verdadeira dimen-sao, partin do dos extremos. Mas, assim, ele confundeevidentemente duas realidades de nivel diferente, a ima-gem da retina e a imagem mental.

A imagem da retina nao tem uma existencia psicol6-gica propria e a imagem mental nao e 0 seu simples de-calque. 0 falso problema da imagem invertida da retina,que mentalmente seria vista direita, nao se repete nasdimensoes sucessivamente diferentes do mesmo objectona retina. Cada uma delas, como tal, nao e urn objectode percep<;ao. Ha que atingir aquilo que e e nao simplesimpressoes subjectivas e ainda menos urn processo pura-mente fisiol6gico da percepQao. Assim como ela se an-tecipa muitas vezes a certas impressoes, ainda invisiveismas essenciais, tambem realiza impressOes integradas,da me sma especie mas imuta veis. A crianQa comeQouilluito cedo a ver os objectos aproximarem-se e afasta-rem-se dela: a medida que 0 seu olhar se ia tornandocapaz de se acomodar a deslocaQao, 0 objecto comeQavaa ser para ela 0 mesmo objecto e. fosse qual fosse asub ita variabilidade das suas dimensoes na retina, eleconservava um unico e mesmo tamanho. Mas segundoo que 0 mede ela?

A sua escala nao parece coincidir com a do adulto.E:: um facto banal que, ao encontrarmos de repente osobjectos ou os locais da nossa infancia, nos admiramosda sua peq\lenez. A crianQa da portanto maiores dimen-soes.. as coisas: isso nao esta evidentemente em relaGaocom as suas imagens da retina, sensivelmente as mes-mas que as do adulto, mas com a campo total da sua

actividade: com a envergadura dos seus movimentos ea despropoq;ao em relaQao a eles dos objectos' feitospara usa do adulto, com a influencia que dai resultapara a imagem dinamica e corporal que ela tem de simesma. Este e 0 padrao subjectivo e pratico que elaaplica as coisas. A diversidade objectiva de tamanhoentre as diferentes imagens da mesma coisa nao a per-turba de maneira nenhuma. Reconhece muito precoce-mente as pessoas nas fotografias. 0 que the interessae a realidade, seja qual for 0 seu aspecto. Mas do paddo,ela ainda nao sabe tirar a escala completa, porque seriapreciso faze-Io passar para 0 plano das categorias, ouseja, extrair dele uma ordem independente de cada rea-lidade particular e sobretudo da realidade subjectiva quelhe serve de origem.

A crianQa nao deixa portanto de se comparar pes-soalmente com cada coisa. Interessa-se pelo muitogrande, e muito mais ainda pelo muito pequeno, quepode dominar e sobre 0 qual pode exercer 0 seu poder.Faz girar durante muito tempo entre os deditos asmigalhas e particulas e desmembra os insectos que con-segue agarrar. As dimensoes das coisas comeQam pOl'Sf) dispor separadamente a sua volta, nao sem que apouco e pouco as va tentando aproximar. 0 gosto quesente pelos gigantes e pelos anoes resulta ainda essen-cialmente da relaQuo que estabelece consigo me sma ; elesformam com ela uma especie de estrutura por contraste.E contudo, a oposiQao que estabelece (0 Pulgarzinho e 0

Ogre) inicia ja uma serie cujos vazios procurara preen-cher. No dia em que as realidades actuais, as intuiQoesconcretas, nao forem ja necessarias a todo 0 momentopara as preencher e pensar, adimensao, de simples es-trutura, tera passado a categoria.

A passagem duma a outra, ou melhor, as suas alter-nancias e combinaQoes, sac evidentej> na aprendizagem€' no uso d3. numeraQao. Os seus principios, dos tres aoscinco anos, sao extremamente lentos. Vao surgindo va-rios esbo~os, primeiro sem nenhuma rela~uo. A crianQa

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parece querer enumerar os objectos que tern na suafrente, repetindo para cada urn sucessivamente umapalavra como inda (ainda) I a que contrapoe uma pala-vra como emboa (embora), para aqueles de que constataa ausencia. Parece agir, portanto, segundo 0 principia daadil;;aO e da subtracl;;ao. Nao the faltarao mais que osnomes necessarios para registar a progressao dos resul-tados? Mas 0 facto e que ela utiliza durante muito tempode qualquer maneira os nomes dos numeros que aprendea enunciar. 0 emprego correcto de «dois» e depo is dedres» precede de longe os seguintes. Quanta mais tardesouber recitar a sua sequencia regular aplicando-a a umaserie de objectos, 0 ultimo termo enunciado s6 valerapara 0 objecto correspondente e nao para a soma inteira:cIa ignora a passagem do numero ordinal ao cardinal.Enfim, 0 numero que designa uma soma aplicar-se-aapenas a ela e nao a uma soma semelhante de object03semelhantes. A crianl;;a sabe que tern cinco dedos ec:onta-os, mas ignora quantos tern a mao do avo. Assim,o numero e ainda uma qualidade especialmente ligada aurn objecto ou a urn grupo de objectos: e a fase precate-gorial do numero; e os termos que 0 designam sao du-rante muito tempo utilizadas ao acaso, porque, comoe evidente, eles nao sac fixados pOl' nenhuma intuil;;aOcorrespondente de grupo, sendo os unicos grupos quesac reconhecidos muito antes dos outros aqueles quetem uma estrutura mais elementar: dois, e depois tres.

Com efeito, as tentativas de enUmeral;;aO nao fazem,a principio, mais que seguir a perCepl;;aO intuitiva e glo-bal das quantidades. Binet foi 0 primeiro a tel' a ideiade procurar em que quantidade maxima de objectos e(m que desigualdade minima e a crianl;;a capaz de re-conhecer. nas suas diferentes idades, qU81 dos dais mon-toes e 0 maior au 0 mais pequeno. Decroly levou a caboexperiencias analogas, ma~ pedindo a crianGa para tor-nar_semelhantes dois grupos que tinham uma diferen<.;aduma au duas unidades. 0 unico processo que ela utilizadurante muito tempo e retirar ao grupo maior sem

nunca acrescentar nada ao mais pequeno; nao que estegesto seja menos facti que ° outro, mas semduvidaporque, antes dele se tornar familiar e de se executarpOl' si mesmo, exige a intuil;;aO de alguma coisa que nao foiainda realizada, enquanto 0 outro e a simples diminui-l;;aO,tao habitual na crianl;;a, de uma determinada coisa.Assim sendo, as intui<;Oes concretas e particulares saoa primeira condil;;ao indispensavel das opera<;6es maissimples. E a experiencia demonstrou que convinha trei-nar a crianl;;a para comparar, fraccionar, recompor quan-tidades reais, fazendo-Ihe adquirir uma intuil;;ao directados grupos e estruturas sucessivamente obtidos, a fimde melhor poder aprender ° significado e 0 uso dosnumeros. S6 mais tarde os sabera utilizar bern, de umamaneira de certo modo indefinida e abstracta: de umamaneira categorial.

A identifica<;ao dos objectos e a sua classifica<;3.osegundo as difel'entes rubricas qualitativas, incluindo ada quantidade, nao sac as unicas exigencias do conhe-cimento. Encel'rar em unidades ou defini<;6es estaticaso conteudo da experiencia e, sem duvida, uma necessi·dade no plano da representa<;ao. Mas 0 contacto realcom as coisas e a necessidade de actual' sobre elas, ousimplesmente de actual', obriga a sail' desse cil'culo. Naoe exacta a afirma<;ao de que a crian<;a se mantem numperpetuo pl'esente. :m antes 0 «agora» que a monopoliza,quer dizel', uma gradual tomada de posse dos instantesque medem a sua perce~ao e a sua ac<;ao. Ela possuio sentimento simultaneo do actual e do transitorio. Maso tl'ansitorio devera igualmente passar para 0 plano darepresenta<;ao, ou seja, recebel' uma f6nnula estabili-zada que tenha em conta a mudan<;a e 0 porvir, que deurn equilibrio ao movimento: e a esta necessidade sub-jectiva e a esta necessidade da ac<;ao objectiva que cor-responde a no<;ao de causalidade. A crian<;a so gradual-mente a con segue atingir.

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As primeiraa ligag6es entre conteudos mentais dacrianga sac do tipo transducQao, seguindo a expressaode Stern. Nao se trata de uma simples sucessao, mas simde uma passagem. 0 lago consiste no sentimento subjec-tivo de pensar ou de imaginal' isto depois daquilo. E urnnovo caso de confusao sincretica entre 0 sujeito e 0

objecto. A consciencia de si mesmo que acompanha aactividade introduz, entre os momentos imediatamentecontiguos, uma especie de dependencia mutua. Nao sendoainda clara a distingao entre 0 acto em si e as coisas,estas sao, ainda que objectivamente diferentes, comoque assimiladas entre si.

A seu respeito, a transducgao tende a traduzir-se pOl'metamorfismo. Tal como nos contos, a mesma coisa podeser sucessivamente varias outras, continuando, no en-tanto, a ser a mesma. Isto e, sem duvida, algo maravi-lhoso para as pr6prias criangas, mas que exige umacerta credulidade, cuja fonte e a obriga~ao que sentemde confudir mudanga com transformagao. A conciliagaodo mesmo e do diferente toma necessariamente umaforma radical, quando a objecto e as suas qualidadesformam urn conjunto indissociavel e singular, em quecada cambiante nao e 0 simples grau duma escala quali·tativa, mas parece ser urn dado de facto da coisa, daqual faz parte como uma realidade substancial. Enquantofor impossivel a anaJise categorial do objecto, ele s6 sepode contra pOl' a todos os outros. Julga-Ios modifica-veis, e mais ou menos a mesma coisa que julga.-los trans-mutaveis de urn para outro.

Para 0 imaginar, a crianga encontra menos obsta-culos, dado que no pr6prio exercicio do seu pensamentoexiste, ao mesmo tempo, mais discontinuidade e maisrepetig6es (a). As faltas de acomodagao mental obri-gam-na a recuperar a objecto, cuja realidade e assim,de certo modo, intermitente. No intervalo, reflexos decuriosidade e diversOes afectivas podem ter alterado 0

campo conceptual, e 0 objecto ja nao encontrara nele

as mesmas condigoes de estrutura que antes, de talmodo que pode ser alternadamente considerado comoo mesmo e como outro. Aos regressos do objecto se so-mam, enfim, regress as de actos jaultrapassados masque sobrevivem no aparelho psicomotor e que combinamas respostas requeridas pelo novo objecto com a res-posta a objectos anteriores. Esta assimilagao subjectiva,sobrepondo-se as mudangas bruscas, pode explicar _asilusoes a que a crianga tern que fazer face e as solugoescxtremas que ela tern que aceitar para a resolugao doproblema do mesmo e do outro.

o seu espirito esta longe de estar inactivo neste entre-lagado dos seus pensamentos. Piaget deu urn belo exem-plo de transduc~ao nas suas experiencias com proverbiose frases de igual numero, que a crianga tinha que agru-par dois a dois segundo a semelhanga de sentido. Cons-tatou que ela junta qualquer proverbio a qualquer frase,e nao se sente nada embaragada para justificar a apro-ximagao mais incoerente. Pass ando de urn para 0 outro,o seu pensamento descobre ou forja analogias que seriamimpossiveis sem 0 eclipse intermitente, alternan~e .0U

parcial dos dois objectos comparados e sem a asslmlla-cao mutua das suas partes, atraves de esquemas intelec-tuais que sac mais de origem subjectiva que suscitadospelos tragos da realidade proposta. As opera~oes do pen-samento substituem mais au menos 0 seu objecto.

o pensamento da crianga poderia ser consideradocomo do tipo narrativo, mas com serias reservas. Elaconta mais do que explica. Nao conhece outras relag6esentre as coisas ou os acontecimentos para alt~m da suasucessao na imagem que deles faz ou no relato que expli-cita. As suas palavras de ligagao preferidas sac «e de-pois», «vezes» (donde certamente saiu 0 «era uma vez»das hist6rias), «quando», «entao». Mas as circunstan-cias s6 se unem umas as outras segundo a ocasiao for-tuita, 0 desejo ou a inspiragao do momento, os esquemashabituais ou recentes. 0 seu resultado nao forma umaverdadeira unidade de realidade ou de senti do. Falta-Ihe

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aquela proporc;;ao entre as partes que confere aos relatose as obras, mesmo as mais carregadas de imprevisto,uma forma mais impressionante ou mais convincente:entre 0 acontecimento em que decorrem e as premissasde todas as especies que 0 provocam, e necessario comoque uma equivalencia, mesmo inesperada e surp!'een-dente. Esta equac;;ao para que tende todo 0 esfon:;o paracompreender as coisas ou para as explicar, e das maisdificeis para a crianc;;a, e e especial mente por isso queela maneja de uma forma tao imperfeita a n~ao decausalidade.

A causalidade esta, contudo, imanente a todos osseus desejos, a todas as suas acc;;6es;guia todas as suasexperiencias; enquadra todas as situac;;6es em que ela semove. Exprime-se na sua vontade de poder; impoe-se--lhe em todos os obstaculos que ela encontra. Mas comec;;apor ser tao particular em cada caso, de tal modo difusaentre todos os termos do acto - 0 sujeito, 0 seu ob·jectivo, os seus meios - que e impossivel individua-liza-Ia, localizando-a nalgum lado, distinguindo-a dosseus efeitos, prolongando-a para la do actual. Ela naose pode dar a conhecer, a menos duma primeira dis-sociaC;;aoentre 0 ego e 0 que se the contrap5e comoeRtranho: 0 outro e 0 exterior. As questoes de causa-lidade: «porque?», so surgem varias semanas depois dasquest5es de local e de simpatia, que sac quase simul-taneas. Com efeito, a distinc;;ao local entre ela e outremP indispensavel para que a participaC;;ao se possa trans-formar 'em simples simpatia. E sem que haja uma ultra-passagem do momento presente, nao ha anterioridadenem sobrevivencia imaginaveis da causa para os seusefeitos.

A primeira causalidade que se desenha na crianc;;aesta nas suas relac;;5es com as outras pessoas. A prin-cipio, nao obtem nada a nao ser pela intervenc;;ao da-queles que a rodeiam, que e a fonte de acc;;oes till) di-versas que nao e sem surpresa que dal resultam osha.bitos mais simples, mas tambem uma espectativa vi·

gilante e pronta para qualquer novidade. Parecia queo animismo, por onde comec;;a a crianc;;a, se explicariapela anterioridade desta causalidade humana sobre to-das as outras, cujos trac;;os transferiria para todas asoutras causas reconhecidas. Mas ela nao a poderia de-tectar antes deser capaz de se aperceber a si mesmacomo distinta das existencias que a rodeiam e como urnser que existe para alem de todas as suas impress6esmomentaneas. Esta causalidade e complementar do sen·timento que a crianc;;a tern de si mesma como sujeito.Este desdobramento comec;;ara a produzir-se no seu con·tacto com as coisas inanimadas. A primeira formulada causalidade e urn duo no qual a acc;;aoe a impressao,primeiro confundidas, se polarizam. Mas as relac;;5es en·tre os dois polos sac a principio incertas ou ambiva-lentes. A crianc;;a que acaba de esbarrar com urn pe deuma mesa, bate-Ihe com rancor, como se fosse 0 pe damesa que tivesse esbarrado com ela.

Em vez de levar a cabo uma enumerac;;ao mais oumenos completa dos tipos de causalidade observaveisna crianc;;a, mais vale, sem duvida alguma, ver de queprincipios eles procedem. Ela corresponde a uma duplanecessidade, a da aCC;;aoutil ou necessaria, e a de ligaro identico ao variavel. No ponto de partida, encontra-se,de urn lado, 0 sincretismo, em que 0 subjectivo, na suaforma activa e passiva, se mistura com 0 objectivo; dooutro, a transducc;;ao e 0 seu corolario: 0 metamorfismo.Trata-se de procurar observar, por ai, a imanencia dacausa para 0 efeito e 0 transitivismo que explica a pas-sagem de urn para 0 outro. As soluc;;i5esdadas a este pro-blema dependerao de urn material de analogi as que acrianc;;a possui da sua experiencia habitual, mas sobre-tudo das dissociac;;i5es que sera capaz de operar nosdados brutos da experiencia, para reduzir cada factorda realidade a serie de que faz parte e para constituirassim series especificas de causas e efeitos. 0 progressoda causalidade na crianc;;a esta, assim, ligado ao desen-volvimento da func;;ao categorial.

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As formas mais primitivas da causalidade serao aque-las em que sao minimas as distinc;6es categoriais: 0

voluntarismo, em que os 'desejos do sujeito parecempretender invadir 0 dominio do real a ponto de 0 substi-tuir; aquilo a que se chamou 0 magismo, em que osmeios ,de exprimir a realidade se confundem ainda comela e parecem, pelas suas modificac;6es, poder modi-fica.-l:a; a simples afirmar;;iio de identidade que faz doobjecto a sua propria causa: «a Lua existe porque e aLua», ou que explica a sua existencia pela de objectossemelhantes actuais ou passados; 0 finaUsmo que, namaior parte dos casos, e mai'S uma afirmac;ao de iden-tidade ou de conveniencia reciproca que a verdadeiraexpressao de uma relac;ao de fins e meios ou de inten-c;6es.Em oposic;ao a estas, 0 metamorfismo, ou aceitac;aodas sucess6es mais heterogeneas como sendo os aspectosde uma unica e mesma coisa.

A urn nivel mais elevado, encontram-se os casos emque a parte e invocada como a causa do todo, a quali-dade como a do objecto, uma circunstancia muitas vezesfortuita como a de uma determinada existencia, umacoisa como a de uma outra coisa, mas com uma motiva-c;ao mais ou menoS' precisa: «a Lua sao os fumos quandoesta frio» (Piaget). Surge entao ° artificialismo, que ea aplicac;ao simples dos processos empregues pelo homema explicac;ao dos fact os naturais, mas que exige urn po-der mais ou menos desenvolvido de discernimento entreos meios e 0 resultado. POl' fim, a crianc;a chega a expri-mil' a causalidade mecanica, que ja maYleja na pratica,mas que nao se pode intelectualmente conceber sem umadespersonalizac;ao completa do conhecimento e sem 0

poder de distinguir os objectos, de analisar as suasestruturas e as suas relac;6es. Urn progresso ulteriorleva-la-a a noc;ao de lei; mas esta e uma tarefa da ado-lescencia: 0 facto absorve-se entao na sua formula comono poder capaz de 0 fazer reproduzir-se, ou de 0 verifi-car, urn numero indefinido de vezes.

Ao longo do desenvolvimento da crianc;a, a sua pes-soa vai-se tambem formando, e as transformac;6es, fre-quentemente desconhecidas que sofre tem,pelo con-trario, uma importancia e urn ritmo acentuados. Entreas etapas anteriores e as que se the seguem, a que sem-pre reteve a atenc;ao geral e a que corresponde a criseda puberdade, onde termina a infancia, porque ela eprecisamente uma crise de consciencia e de reflexao.Mas e nos primeiros vislumbres da vida psiquica, no seuperiodo afectivo, que se encontra a origem da evoluc;aoda pessoa. ~ tamb€m verdade que ela ja estava profun-damente influenciada pelas reacc;6es subjacentes ou an-teriores da vida neurovegetativa: 0 equilibrio visceraldas primeiras semanas ou dos primeiros meses pode jaoriental' as bases profundas do futuro comportamento.Quanto aos primeiros contactos entre 0 sujeito e 0 am-biente, eles sao de ordem afectiva: sao as emoC;6es.

o contacto emotivo, quando se estabelece, e na reali-dade uma especie de contagio mimetico (1), cuja pri-meira consequencia e nao a simpatia mas a participa-

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~ao. 0 sujeito esta totalmente imerso na sua em0<;30;ele e unido, confundido por ela com as situa~oes quelhe correspondem, quer dizer, com 0 ambiente humanede que provem, na maior parte das vezes, as situa<;oesemocionais. Alienando-se nelas, ele e incapaz de se aper-ceber a si mesmo como distinto de cada uma delas edas outras pessoas. Ja nao se trata de saber, segundo aantiga psicologia introspectiva, como e que do conheci-mento de si mesmo 0 individuo pode passar ao conheci-mento de um outro individuo, mas, ao contrario, comoe que ele eliminara reac~oes que 0 fazem misturar-secom 0 meio, com 0 que nao e ele proprio, com 0 que eestranho a sua pessoa. A crian~a tem que operar as ne-cessarias diferencia~oes na sua experiencia real, e naoesfor~ar-se por lhe fornecer um duplo puramente hipo-tetico. Um grande periodo da sua actividade mostra-a,de facto, ocupada, com as pessoas do seu meio ambienteque se prestam a isso, em jogos de reciprocidade oude alternancia, em que ela se inclui sucessivamente nosdois polos, activo e passivo, de uma mesma situa~ao.Nada melhor para a levar a distinguir entre a ac~aoconjungada do seu companheiro e a sua propria ac~ao.Nao se trata ainda, porem, de mais que duas pe<;;as,ajustadas entre si, de um mesmo conjunto.

Apesar do andar e da palavra Ihe fomecerem, noseu terceiro ana de idade, mil ocasioes para diversificaras suas rela<;;Oescom 0 meio que a rodeia, a sua pessoapermanece encaixada nas circunstincias habituais dasua vida, sem conseguir apreender-se fora delas. E indu-bitavel que ela vai e vem pelo meio dos objectos, e des-loca-se, desloca-os, recebe-os, da-os, pega neles, perde-os,encontra-os, parte-os e aprende assim a sua indefinidamutabilidade em rela~ao a sua pessoa, que e sempre amesma. As palavras que se intercambiam dirigem-se aela, falam dela, dirigem-se a outras pessoas, e 0 senti-menta constante da sua propria presen~ contrasta coma variabilidade dos interlocutores. No entanto, ela per-manece como Clueligada a determinado objecto familiar,

a determinada situagao ou ao ponto de vista daqueleque fala. 0 seu ber<;;onao pode servir para 0 seu irmao-zinho, porque e 0 seu ber<;;o,para toda a eternidade, ou,pelo menos, e a ela que compete empresta-lo. Mas, aoingressar na escola, a pequenita da, como se fosse 0

seu, 0 nome da sua Irma mais velha, que tinha entradoantes dela, do mesmo modo que 0 rapazito de Stern,tendo perdido com 0 nascimento duma irmazinha 0 seulugar de mais jovem na familia, se tomava a si mesmopela sua Irma mais velha.

Reciprocamente, alias, as pessoas estranhas nao po-dem ser separadas dos seus locais ou dos seus actoshabituais. Ao seu pai que vai ter com ela ao campo, umapequenita contrapoe-Ihe 0 «seu papa de Viena», semconseguir realizar, de inicio, a assimilagao; ou entao elapergunta a mae que esttt a cantar uma cangao variasvezes ouvida a outra pessoa: «Es tu entao a tia Elsa?»Por outro lado, a crianga entretem-se consigo mesma,diz-se «obrigado», repete a si mesma Lodas as ordensdas outras pessoas, censura-se ou, pelo contrario, fazrecair sobre uma mais nova, sobre a sua boneca, ascensuras que recebeu, cumprimenta-se, desempenha su-cessivamente as diferentes personagens dum dialogo quemantem consigo mesma. Substitui-se ao seu irmaozinhoque joga e, para 0 divertir, tira-lhe 0 seu brinquedo eagita-o, indignando-se ao ver 0 seu descontentamento.

Este confusionismo cessa bruscamente por altura dostres anos, e a pessoa entra num periodo em que a suanecessidade de afirmar, de conquistar a sua autonomia,Ihe vai causar, em primeiro lugar, uma serie de confli-tos. E, para come~ar, uma oposigao muitas vezes total-mente negativa que a faz defrontar-se com as outraspessoas sem outro motivo que 0 de sentir a sua propriaindependencia, a sua propria existencia. 0 unico lucro davitoria e a propria vitoria: vencida por uma vontade maisforte ou pela necessidade, a crianga sente uma dolorosadiminuigao do seu ser; vencedora, uma exaltagao quetambem pode ter os seus inconvenientes. Esta crise e-lhe,

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porem, necessaria: demasiado apagada, pode significaruma mole complacencia, um obtuso sentimento de res-ponsabilidade; demasiado reprimida, pode causaI' umaindiferenga desanimada ou 0 gosto pol' vingangas dis-simuladas; demasiado livre, uma jactancia que the retiraqualquer utilidade, esbatendo a existencia das outraspessoas em lugar de a faze I' ressaltar, 0 qu~ pode serorigem de ulteriores conflitos, donde a crianga se arriscaa sail' bast ante mais humilhada.

Ao mesmo tempo, desaparecem os dialogos consigomesma. Parece que a crianga ja nao sabe falar senaoem seu proprio nome, que a consideragao agora obriga-tori a de outrem torna 0 seu proprio ponto de vista ex-clusivo e irreversivel. 0 mesmo se passa pelo que toeaa posse de objectos. Eles ja. nao sac necessariamentedaquele que os detem nesse momento; ate mesmo umautilizagao duradoira nao os liga indefectivelmente a pes-soa. Agora, 0 que conta saa apenas as relagoes entreas pessoas. A crianga percebe que, se deu 0 seu brin-quedo, tem que renunciar a ele definitivamente, domesmo modo que 0 presente recebido constitui paraela um direito incontesta vel. Sente-se frustrada, nao nasua fruigao das coisas, mas na sua pessoa, se 0 seu beme dado a outra sem 0 seu consentimento. Poe-se a simesma 0 problema da apropriagao e chega a concluirmuitas vezes que a forga faz a lei: se domina, podetomar.

A constante comparagao que efectua entre si e asoutras pessoas torna muito exigente a discriminagaodos que a rodeiam. As relagoes de valor que imaginaentre elas e ela propria predominam sobre a logica maisevidente das situagoes. Se morde na sua irmazinha, es-tara disposta a pedir perdao ao pai, a mae, a. gover-nanta, a cozinheira, mas de modo algum a crianga mor-dida (E. Koehler). A urn companheiro de que tern ciu-mes, recusa-se, paIida e furiosa, a emprestar 0 seubrinquedo, mas confia-o com entusiasmo a sua gover-nanta. Em contra partida, Stern notou que ela pode dar

provas de autentico altruismo, nao s6 partilhando comoutras as seus divertimentos mas tambem sofrendo, embeneficia de outra, urn dissabor ou uma privagao.

Este desdobramento do objectivo colocado noutrapessoa, do desgosto guardado para si, coincide com 0

poder que a crianga adquire de reagir, em oposigao coma situagao presente, a situagoes de que conserva umarecordagiio ou que preve. Ela comega a saber distinguirentre os seus devaneios e a realidade, e sera uma fontede prazer mistura-Ios de novo nos seus jogos (2). Aomesmo tempo, comec;a a ser capaz de duplicidade,torna-se manhosa, dando ares de perseguir uma acgaocontraria aos seus fins reais. Finge ofere eel' os seusbrinquedos para melhor se apossar dos brinquedos dosoutros. Este momento e decisive na sua evolugao. Tomaconsciencia daquilo que cleve parecer e da sua vida se-creta.

Esta idade foi caracterizada pelos psicologos de dife-rentes escolas como sendo a de urn profundo trabalhoafectivo e moral. 0 perfodo de 3 a 5 anos e, segundoFreud, aquele em que 0 libido tern a sua maior activi-dade, em que se elaboram os complexos que poderaoperpetual', pOI' transferencia, at raves das situag6es sem-pre novas da existencia, as atitudes morais, as inconfes-siLveis fixag6es afectivas da infancia. It 0 periodo emque se podem desenvolver paixoes tanto mais carregadasde angtistia quanto mais dissimuladas forem: chImes deum irmaozinho ou dos pais. 0 citime pressup6e, segura-mente, ainda uma certa semiconfusao entre si e asoutras pessoa.s (3). Para se sentiI' ciume, e preciso quea imagem de outrem nos arraste atras de si, como sedevessemos realmente participar nas mesmas situag6es.Mas a intensidade do dano sentido depende igualmentedas vantagens que a pessoa pretende atribuir-se e dovivo sentimento que tern de si mesma.

(') Ver a 2." Parte, Cap. V.(I) Ver L68 origines du caractere chez l'enjant.

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Ora, acontece precisamente que a fase negativa deoposi~ao que surge pOl' altura dos tres anos sucede umade personalismo mais positivo, que tambem se apresentaem dois tempos contrastados. 0 primeiro e assinaladopelo que Homburger denorninou «idade de gra~a». Defacto, aos quatro anos de idade. produz-se uma trans-forma~ao nos movimentos da crian~a. Ate ai eram se-melhantes aos gestos patudos de urn caozito jovem, quepara alcan~ar urn objectivo parece cair a cada passo.Mas, de repente, uma especie de ligagao intima pareceleva-los a sua mais perfeita execugao. Pnrecem perse-guir-se POl' si mesmos e, de facto, a crian<;a parece pres-tar-lhes muitas vezes mais atengao que ao seu motivo,a sua ocasiao, ao seu pretexto exterior. Ela propria sesubstitui como objecto ao objecto. A sua pessoa, queantes era um escudo em rela<;ao as outras pessoas,ocupa-a agora, acima de todas as coisas, preocupando-aa sua propria realizaQao estetica. Este fervor pOl' simesma e, alias, normalmcnte acompanhado de conflitos,inquieta~6es e dece~oes. A crianga nao se pode agradara si mesma se nao liver a sensaQao de que agrada aosoutros, nao se admira se nao se julgar admirada. A apro-vagao de que tern necessidade e a sobrevivencia da par-ticipagao que antes a ligava as outras pessoas. Mas,uma vez enfraquecida, esta participagao deixa urn vaziode incerteza. Na medida em que se observa, sente-seobservada; mas, precisamente na mesma medida, sabeque os dois juizos podem diferir. A idade da graQa etambem a da timidez. 0 gesto arabesco pode ser igual-mente 0 gesto recalcado, envergunhado e falhado.

Este duelo entre a necessidade e a apreensao de seafirmar, de se mostrar, leva a urn segundo tempo maispositivo que 0 primeiro, a urn novo afrontamento entreo ego e outrem, a uma nova forma de participaQao e deoposi~ao. Ao conteudo, demasiado pessoal e endiabradopara --nao deixar de Ihe inspiral' uma certa inquietaQao- os simples gestos ext raid os das suas aptidoes na-turais -, Ira substituir outro conteudo cuja fonte pro-

curara nas suas testemunhas, de quem teme a severi-dade. Para 0 gosto de imitar; que marca este periodo,contribui toda a evolu~ao mental do momento: 0 medoao isolamento que causam a crian~a os seus propriosreflex os de oposigao e de exibi~ao; a sua curiosidade 3

o seu desejo dos seres que rejeita para os confins desi propria, depois de tel' estado misturada com eles atra-yes das suas proprias reacQoes; urn desejo intimo, irre-sistivel, de apego as outras pessoas. Como no Banquetede Platao, 0 arnor nasce da divisao e as partes desunidasprocuram-se umas as outras. Com toda a sua sensibili-dade postural, a crianga guia-se pelas pessoas que arodeiam, que a traem e a quem procura imitar. Masnesta epoca de eretismo pessoal ela nao pode deixar dese preferir a si mesma e de as detestar na medida emque a ultrapassam. A imita~ao e tanto urn desejo de sesubstituir como uma admira~ao amante. Mais tarde,podera haver 0 predomiriio de uma ou de outra.

Dos tr&; aos seis anos 0 apego as pessoas e inextin-guivel necessidade da pessoa da crian~a. Se for privadadisso, sera vitima quer de atrofias psiquicas, de que 0

seu gosto de viver e a sua vontade guardarao a tara,quer de angustias, que a encaminhariio para paixoestristes ou perversas. Nesta idade, 0 guru hindu Nata-rajan diz que a sua educagao deve ser prenhe de sim-patia, devendo 0 desmame comegar a efeetuar-se entreos cinco e os seis anos para estar terminado aos sete.Este e 0 momento em que, no nosso pais, a crian<;apass a do jardim de infa-ncia para a escola prima ria. Estamudan<;a corresponde a uma importante etapa da suavida psiquica.

o perfodo que vai dos sete aos doze ou catorzeanos parece servir com muito menos intensidade para 0

desenvolvimento da pessoa, virando-se a ac~ao e a curio-sidade da crian~a para 0 mundo exterior, onde prosse-gue a sua aprendizagem de pequeno pratico. No entanto,apesar de ser menos evidente, nao deixa de prosseguira sua evolugao a caminho de uma autonomia crescente.

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Aquela cujas necessidades de apego pessoal insistem emprevalecer de urn modo demasiado exclusivo, comec:;a aser vivamente censurada pel os membros do grupo de quedoravante faz parte. E a idade em que se tro<;a daquelesque a escola parece desorientar porque a sua necessidadeda familia e demasiado aparente ou que procuram obteruma atenc:;ao pessoal do mestre.

Face aos adultos, 0 grupo das crian<;as parece, desdeentao, querer constituir uma sociedade igualitaria, emque sem duvida se produzirao diferencia<;6es individuais,mas que nao serao exclusivas e absolutas como e um:tpredilecc:;ao de urn ser pOl' ou tro. A hierarquizac:;ao nascrianc:;as torna-se bastante variavel. a primeiro em arto-grafia pode ser 0 ultimo em corrida. As relac;6es mutuasdivergem segundo 0 momento, as tarefas ou 0 meio.a grupo fracciona-se em 6ubgrupos que intercambiamos seus membros conforme a ocasiao: nasaulas, nojogo, nos diferentes jogos, os camaradas a que a mesmacrianc:;a se junta podem nao ser os mesmos. Deixou de-finitivamente de estar sob urn unico signo, que the davaurn lugar imutavel numa constelac;ao sempre igua!. Pelocontrario, muda agora incessantemente de uma catego-ria para outra. E esta ja nao e uma simples actuac:;aode facto como anteriormente; e uma noc;ao que se inte-gra na sua consciencia pessoa!. Conhece-se a si mesmacomo 0 objecto simultaneo de diversas possibilidades.A sua pessoa esta agora na fase categorial. A propriadiversidade dos cnquadramentos em que Se pode inserir,nos quais se pode imaginal', fornece-Ihe uma maior coc-sao. Qualquer modifica<;ao nas suas qualidades ou nassuas relac;6es nao a obriga a renunciar-se inteiramente,como fazem aquelas crianc:;a5 que se atribuem 0 nomede uma outra quando alguma coisa muda na sua si-tua~ao.

Durante varios anos, a pessoa da crian<;a vai-se as-sim f-amiliarizando com as mais diversas combinac:;6e5,como 0 seu conhecimento das coisas com os seus em-pregos e as suas propriedades. A sua adapta<;iio ao meio

parece ter-5e aproximado da do adulto, quando surgeo impulso pubertario que rompe 0 equilibrio de umaforma mais ou menos subita e violenta. A crise resul-tante pode ser com parada ados tres anos e dos anosque se the seguem. Mas ela e-lhe maia simetrica quesemelhante. Comec:;a igualmente pol' uma oposic:;ao, masque visa menos as pessoas que, atraves delas, os habitosde vida de tal modo costumeiros, as rela~6es de talmodo invcleradas que ate ai a crianc:;a nem sequel' pare-cia dar pela sua existencia. a regresso da aten~ao a suapropria pessoa causa tambem no adolescente as mesmasalternancias de gra~a e de embara~o, de maneirismo ede falta de habilidade. Mas enquanto a crianc:;a tendia,por fim, para a imita~ao do adulto, 0 jovem parece de-sejar distinguir-se dele a todo 0 custo (crise de origi-nalidade de Debesse): nao Be trata de conformismo,mas de reforma e de transforma<;ao. A necessidade deapego pessoal e intensa, mas aspira menos a uma pro-tecc;ao que ao dominio, a substituic:;ao que a posse.a segredo impoe-se de novo a consciencia, mas ja naa12 estritamente solitario, pois deseja ser partilhado, ex-primir-se pOl' meio de sinais ao mesmo tempo evidentese enigmaticos para 0 cumplice. Nao procura disfarc;arurn desejo intimo; projecta-se nas coisas, na natureza, nodestino, sob a forma de urn misterio a esclarecer. a SEU

objecto ja nao e estritamente concreto e pessoal, masmetafisico e universal.

A pessoa parece entao ultrapassar.se a si mesma.Procura urn significado, uma justificac:;ao, para as diver-sas rela~i5es de sociedade que outrora tinha aceite eonde se pare cia tel' apagado. Confronta valores e ava·lia-se a si propria em relac;ao a eles. Com este novo pro-gresso termina a preparac:;ao para a vida que era a in-fanda.

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A idade da crian~a e 0 numero de dias, de meses,de anos, que a separam do seu nascimento. Tem as«idades da infancia» um significado diferente? Segundovarios autores, existe uma continuidade no desenvolvi-mento psiquico a partir de certos dados elementares:sensa~oes ou esquemas motores, por exemplo. Se ascircunstancias e a experiencia ajudarem, eles ordenam-see combinam-se em sistemas que abrem um campo cadavez mais vasto a actividade do individuo. A complexidadedos sistemas fixa a sua ordem de sucessao. 0 seu ritmode desenvolvimento e praticamente 0 mesmo em todos osindividuos, porque na mesma especie eles assemelham-semais do que difereme as condi~oes fundamentais domeio sao identicas. Ha, portanto, uma coincidencia exact aentre 0 nivel de evolu~ao e a idade da crian~a. A suces-sac das idades e a sucessao dos progressos. Cada mo-mento da inf5.ncia e um momento da adi~ao que pros-segue de dia para dia. As idades da crianGa e as dainfancia sao uma e a mesma coisa.

Para outros autores, os sistemas da vida psiquica naosac infra-estruturas que se sobreponham simples menteuns aos outros pela combina~ao de elementos gradual-mente mais organizados, mas no entanto comum a to-

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das. Ha momentos da evoluQao psiquica em que sactais as condiQoes, que uma nova ordem de faetos setorna passive!. Essa ordem nao faz desaparecer as an-teriores formas de vida au de actividade, pais del as pro·cede, mas com ela surge urn modo diferente de de-terminaQao que regula e dirige as determinaQoes maisclementares dos anteriores sistemas: as integraQoes pro-gressivas que se observam entre funQoes nervosas saourn exemplo disso. Estas mutaQoes exigem, para se pro-duzir, periodos de estados latentes; tornam 0 cresci-menta descontinuo, dividem-no em etapas au em idadesque ja nao correspondem, em cada instante, a. adiQaodos dias, dos meses e dos anos. Uma sucessao mais oumenos longa de idades cronologicas pode enquadrar-sena dura~o de uma mesma idade funcional. Aqui ja naoha similitude entre as idades da crianQa e as da infancia.

Estas revoluQoes de idade para idade nao sao impro-visadas par cada individuo. Sao a propria razao da in-fancia, que tende para a edificaQao do adulto comoexemplar da especie. Estao inscritas, no seu momentaoportuno, no desenvolvimento que conduz a esse objec-tivo. :m indubitavel que as incitaQoes do meio sac indis-pensaveis para que elas se manifestem, e quanto maisse eleva 0 nivel da funQao mais determinada e pOl' ele:quantas actividades tecnicas ou intelectuais sac a re-produQao da linguagem, que para cada urn e a do seumeio ambiente! Mas a variabilidade do conteudo con-forme 0 ambiente atesta ainda mais a identidade dafun~ao, que nao existiria sem um conjunto de condi~oesde que 0 organismo e 0 suporte. :m ele que a deve fazeramadurecer para que 0 meio a det:;perte. Assim, 0 mo-mento das grandes muta~oes psiquicas e assinalado, nacrianga, pelo desenvolvimento das etapas biologicas.

No entanto, a sobreposi~ao dos progressos segundoos niveis da funQao parece, a alguns, fazer apagar adistin~ao dos periodos. ~ bem verdade, com efeito, queuma dificuldade nao e simultaneamente resolvida paratodos os pla~os da actividade mental; a solu~ao encon-

trada so a pouco e pouco os vai alcan~ando e, quandoatinge as actividades mais abstractas ou mais comple-xas, acontece que uma outra mais evoluida ja a substi-tuiu ao nivel das simples ou das concretas. Identificaridade e progresso nao seria colocar-se na necetlsidadede fazer convergir para 0 mesma instante varias idadesdiferentes? Sendo diversos as periodos simultaneamenteatingidos, ja nao haveria portanto um limiar correspon-dente as idades sucessivas. No entanto, os planas deaetividade subsistem e, seja qual for a confusao dosprogressos e das formas segundo os niveis funcionais,subsistem conjuntos cada urn com a sua marca distintae a sua orientaQao especifica, e que sac uma etapa ori-ginal no desenvolvimento da crianQa.

As primeiras semanas da vida sao totalmente mono-polizadas pela alternfmcia da necessidade alimental' edo sono. No entanto, nos dias que se seguem ao nas-cimento, tem-se observado uma turgescencia dos orgaosgenitais que, no sexo feminino, pode chegar a perdassanguine as : devida evidentemente it influencia de hormo-nas, 0 seu mecanisme e 0 seu significado sac ainda malconhecidos. :I!: 0 acto de nutri~ao que conjuga e orientaas primeiros movimentos ordenados da crian~a. Mas estecampo ainda muito estreito e largamente ultrapassadop€las gesticulaQoes a que se entrega quando esta des-pida au no banho. A sua anota~ao minuciosa permit2descobrir uma dupla corrente: pOl' urn lado, desapareci-mento de certas reac~Oes espontaneas ou provocadas quesao como que absorvidas ou inibidas par actividades me-nos automatic as ; par outro, emergencia de novos ges-tos, que correspondem frequentemente a uma' dissocia-~ao de ac~oes musculares globais e que tem tendenciapara se ligar uns aos outros por fragmentos suscepti-veis de uma certa continuidade. A partir do terceiromes, estes progressos do movimento tornam-se a prin-cipal ocupaQao do laetante.

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As suas manifesta~Oes afectivas limitavam-se, a prin-cipio, ao vagido da fome ou da colica e ao relaxamentoda digestao ou do sono. A sua diferencia~ao e, a prin-cipio, muito lenta. Mas, aos seis meses, 0 aparelho deque a crian<;a dispoe para traduzir as suas emo<;oes esuficientemente variado para fazer uma vasta superfi·cie de osmose com 0 meio humano. Esta e uma etapacapital do seu psiquismo. Aos seus gestos esta ligadauma certa eficacia pelo que desperta nas outras pessoas;aos gestos destas, previs6es. Mas esta reciprocidade e,a principio, uma completa amalgama; e uma participa-~ao total, em que mais tarde devera delimitar a suapessoa, profundamente fecundada por esta primeira ab-sor<;ao nos outros. Sincronismo a assinalar: e tambemaos seis meses que parece surgir 0 interesse da crian<;apelas cores.

No ultimo ter<;o do primeiro ano come<;am a siste-matizar-se os exercicios sensorio-motores. Atraves deles,os movimentos ligam-se aos efeitos perceptivos resul-tantes. Impressoes proprioceptivas e sensoriais aprendema corresponder-se em todas as suas tonalidades. Enca-deando as suas varia~oes em series prolongadas, elasprocedem a sua mutua explora<;ao. A voz afina a orelhae a orelha moIda a voz; os sons que 0 seu concursopermitiu discernir e identificar sac em seguida reconhe-cidos quando sac de origem exterior. A mao que acrian<;a desloca para a seguir com 0 olhar, em toda afantasia dos seus arabescos, distribui as primeiras si-naliza~6es do campo visual. Assim detectados gra~as asensibilidade proprioceptiva, os campos perceptivos po-dem entao fundir-se e, ao mesmo tempo eliminar, oumelhor, relegar para 0 anonimato a sua iniciadora, quese tinha igualmente adiantado a sensibilidade interocep-tiva ou visceral. De urn para 0 outro, 0 mesmo objectotorna-se identificavel, e 0 seu conjunto ganha suficienterealtdade para que a crian~a possa procurar nele 0 ob-jecto desaparecido ou simplesmente revelado por urnindicio unissensorial.

Mas 0 andar e depois a linguagem, que se desenvol-vem ao longo do segundo ano, vem ainda alterar 0 equi-librio do comportamento. as objectos que a crian<;a podeir buscar e transportar, que sabe que tern urn nome, des-tacam-se do fundo em que estao inseridos e sac mani-pulados por si mesmos. Ela agarra-os, empurra-os, arMrasta-os, desloca-os, quer com a mao quer dentro de urnveiculo, e empilha-os, umas vezes indistintamente e ou-tras por categorias, e enche ou esvazia caixas e sacos.Mas, num outro plano, a independencia que da a crian<;ao poder de ir e vir por si mesma, a maior diversidadede rela<;oes com 0 que a rodeia que a palavra the for-nece, torna possivel uma afirma<;ao mais vincada da suapessoa. Aos tres anos come<;a a crise de oposi<;ao e de-pois a de imita<;ao, que durara ate aos cinco.

Na epoca em que se pretende manifestarcomo dis-tinta das outras pessoas, a crian<;a mostra-se gradual-mente mais capaz de distinguir os objectos e de os selec-cionar segundo a cor, forma, dimens6es, qualidades tac-teis e cheiro (1). Depois vem a idade dos quatro anos,em que as suas atitudes e maneiras a mostram atentaao que elas podem ser e parecer. Come<;a tambem nessaaltura a corar por uma incongruidade ou falta de jeitoe, inversamente, essas inadapta<;oes sac para a crian<;aurn motivo de tro<;a ou de divertimento. As caretas, osgracejos grotescos, divertem-na. Ela gosta de rir e de sever rir. a seu nome, 0 seu apelido, a sua idade, 0 seudomicilio, constroem-Ihe uma imagem da sua pequenapersonagem, de que alias se faz como que testemunhados seus proprios pensamentos. Ja capaz de observar,dispersa-se menos e prossegue a ocupa<;ao encetada commais tranquilidade e perseveran<;a. Reve-se nas suasobras e apega-se aquilo que faz. Nasce a emula<;ao e

(I) Ver a este respeito os artigos da Sr." PIQUEMAL edas Sr." FONTENEAU e TRUILLET, em Organisation et tone-tionnement des /3coles maternelles. A. Colin, pp. 37-51.

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com ela uma primeira necessidade de camaradagem. Noentanto, os grupos que se formam sao ainda do tipogregario, em que cada urn toma espontaneamente 0 lugarde seguidor ou de chefe. Mas a crianc;a ja nao se limitaa ter urn maior discernimento dos objectos e das suasqualidades, pois a sua percepc;ao torna-se mais ahstracta,come~ando a distinguir os desenhos, as linhas, as direc-c;6es, as posiC;6es, os sign os graficos. Seja como for, it

observac;ao propriamente dita das coisas, em que 0 par-menor exige urn perpetuo retorno ao conjunto, e 0 mul-tiplo e 0 diverso ao tinieo e ao permanente, ultrapassaainda as suas capacidades.

Depois dos cinco anos, anuncia-se ja a idade escolar,em que 0 interesse se vai transferir do eu para as coi-sas. A passagem sera, porem, lenta e dificll. Ate aosseis anos e mesmo depois, a crianc;a permanece absor-vida nas suas atitudes e nas suas ocupac;6es presentes,a sua actividade apresenta caracteristicas exclusivistas,S211doincapaz duma evoluC;ao rapida entre os objectosou as tarefas. Para arrancar os seus pequenos alunosas suas ocupac;6es e propor-lhes urn novo tema de aten-~ao, uma professora imaginou urn gesto de interrupc;ao,que eles deviam executar automaticamente mal ela desseo sinal. A crianc;a que aprende a ler perde de repenteos habitos anteriormente adquiridos de manipula~6espraticas e de investigac;6es concretas: uma orientac;aonova pode, pois, suspender completamente a antiga.

A escola, ao contrario, exige uma mobilizac;ao diri-gida das actividades intelectuais para materias sucessivae arbitrariamente diversas: ela chegou inclusivamente a.abusar muitas vezes da permissividade (2). As tarefasimpostas devem desligar mais ou menos a crianc;a dosseus interesses espontaneos; e1 na maior parte das vezes,nao obtem mais que urn esforc;o constrangido, uma aten-~ao artificial ou mesmo urna verdadeira sonoH~nciainte-lectual. Sao, em muitos casos, exercicios de utilidade a

tongo prazo e que niio e de modo algum patente para 0

executante. Por issa, pensou-se que era necessario apoiara sua actividade por meio de estimulantes acessorios;estee 0 objectiva das recompensas e das puni~6es, cujaformula essencial e ainda, para muitos, «0 torrao dea~ucar ou 0 cacete», quer dizer, urn simples procedi-mento de adestramento de animais.

No outro extremo encontram-se os que pretendemfazer basear as actividades obrigatorias da crianc;a noseu sentimento de responsabilidade. Dns atrasam, os ou-tros antecipam. 0 animal adestrado responde com urngesto a urn determinado sinal, segundo as associa~6esque the foram inculcadas; ele nao executa urna tare/a,em que se persegue urn objectivo e existe urn ajusta-mento de meios e regras a observar e urn determinadoalcance do esforc;o, que por isso mesmo tern que serapoiado. Mas, sucessivamente absorvida em cada umadas suas tarefas, a crianc;a tambem nao parece ser capazde fazer suportar 0 seu peso a imagem que ela tinhado que devia dar a si mesma: obriga-Ia prematuramentea isso significa, na pratica, ditar os trac;os dessa ima-gem, impor-Ihe uma dependencia artificial, mal com-preendida, que esta longe de favorecer a evoluc;ao dasua autonomia.

o periodo de sete a doze ou catorze anos e aqueleem que a objectividade substitui 0 sincretismo. As coi-sas e a pessoa vao a pouco e pouco deixando de ser osfragmentos de absoluto que se impunham sucessivamentea intuic;ao. A rede das categorias reflecte as mais diver-sas classificac;6es e rela~6es. Mas 0 animador e a propriaactividade da crian~a, que entra na sua fase categorial:ela atribui-se entao as tarefas pelas quais e capaz de sedistribuir, a fim de extrair delas os efeitos de que cadauma e susceptive!. :m-Iheagora indispensa vel interessar-sepela tarefa, 0 que deixa bem para tras 0 simples ades-tramento. Esse interesse pode ser suficiente e ultrapassade longe a preocupa~ao de comprometer sempre a suapropria personagem na sua conduta.

(') :Ii:este problema que 0 metodo «do centro de interesse»(Decroly) pretende remediar.

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o gosto que a crian~a toma pelas coisas pode-se ava-liar pelo desejo e pelo pader que tern de as manejar,de as moclificar, de as transformar. Destruir ou cons-truir sac as tarefas que ela se atribui a si propria inces-santemente. Assim, explora os pormenores das coisas,as suas rela~Oes, as suas divers as origens. E tambemem fun~ao de determinadas tarefas que escolhe os seuscamaradas. As suas preferencias variam conforme osjogos ou os trabalhos. Tern, certamente, companheiroshabituais, mas os seus encontros reduzem-se aos seusempreendimentos comuns. Eles estao unidos como cola-boradores ou cumplices das mesmas tarefas, dos mes-mos projectos. A emula~ao na realiza~ao de urn trabalhoe 0 meio que possuem para se avaliarem uns aos outros.Ocampo das suas rivalidades e 0 das suas ocupa~6es.Dai resulta uma diversidade de rela~6es que variam depessoa para pessoa, onde cada urn vai buscar a n~aoda sua propria diversidade segundo as circunstancias e,ao mesmo tempo, a n~ao da sua unidade atraves dadiversidade das situa~Oes.

Quando a amizade e as rivalidades deixam de sebasear na comunidade ou no antagonismo das tarefasempreendidas ou a empreender; quando esses sentimen-tos se procuram justificar pOl' afinidades ou repulsasrnorais; quando eles parecem intel'essar mais a intimi-dade do ser que as colabora~Oes ou os conflitos efectivos,isso e urn indicio de que a infancia esta ja a ser minadapela puberdade. Tambem aqui a nova idade se vai reflec-tir em todos os dominios da vida psiquica. Surge urnmesmo sentimento de desacordo e de inquieta~ao nosda ac~ao, da pessoa, do conhecimento; em cada urn exis-tern misterios a desvendar, e surge uma mesma neces-sidade de posse, de certo modo essencial, pois a posseactual nao basta para satisfazer e procura para si pers-pectivas indefinidas.

De. etapa em etapa, a psicogenese da crian~a mostra,atraves da complexidade dos facto res e das fun~6es,atraves da diversidade e da oposi~ao das crises que a

assinalam, uma especle de unidade solidaria, tanto emcada uma como entre todas elas. E contra a naturezatratar a crian~a fragmentariamente. Em cada idade,ela constitui urn conjunto indissociavel e original. Nasucessao das suas idades, ela e urn unico e mesmo serao longo de metamorfoses. Feita de contrastes e de con-£litos, a sua unidade nao deixa pOl' isso de ser susceptivelde desenvolvimentos e de novidade.

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WALLON, PSICOLOGO DA INFANCIA ..(por RENE ZAZZO)

PRIMEIRA PARTE

A INF ANCIA E 0 SEU ESTUDO

CAPITULO IA CRIANQA E 0 ADULTO

CAPITULO IICOMO ESTUDAR A CRIANQA?

CAPITULO IIIOS F ACTORES DO DESENVOL VIMENTO PStQUICO .

AS ACTIVIDADES DA CRIAN<;AE A SUA EVOLU<;AO MENTAL

CAPITULO IVo ACTO E «0 EFEITO»

CAPITULO V..,.. 0 JOGO ...

Page 99: Wallon - A evolução psicológica da criança

CAPiTULO VIAS DISCIPLINAS MENTAIS

CAPiTULO VIIAS ALTERNANCIAS FUNCIONAIS

CAPiTULO VIIIOS DOMtNIOS FUNCIONAIS: ESTADIOS E TIPOS

CAPiTULO IXA AFECTIVIDADE

CAPiTULO Xo ACTO MOTOR

CAPiTULO XIo CONHECIMENTO

CAPiTULO XIIA PESSOA .

CONCLUSAOAS SUCESSIV AS IDADES DA INF ANCIA

'rI93

117

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Execu~ao grafi'cada

T1POGRAFIA LOUSANENSELousa Junho(1981