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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ RODRIGO FLORINDO DA SILVA PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO: UMA ALTERNATIVA RESSOCIALIZADORA CURITIBA 2015

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

RODRIGO FLORINDO DA SILVA

PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO:

UMA ALTERNATIVA RESSOCIALIZADORA

CURITIBA

2015

RODRIGO FLORINDO DA SILVA

PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO:

UMA ALTERNATIVA RESSOCIALIZADORA

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Direito, da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do titulo de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dalio Zippin Filho

CURITIBA

2015

TERMO DE APROVAÇÃO

RODRIGO FLORINDO DA SILVA

PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

UMA ALTERNATIVA RESSOCIALIZADORA

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do titulo de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná

Curitiba, ____de_______de 2015.

___________________________________

Professor Doutor Eduardo de Oliveira Leite Coordenação do Núcleo de Monografias Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador:

___________________________________ Professor Dálio Zippin Filho Curso de Direito - Universidade Tuiuti do Paraná

Banca Examinadora: ___________________________________ Professor Curso de Direito - Universidade Tuiuti do Paraná

___________________________________

Professor Curso de Direito - Universidade Tuiuti do Paraná

“Como concebem as pessoas, incluindo também os juristas, quanto à condenação, algo de análogo àquilo que ocorre quando um homem morre: a decisão condenatória, com o aparato que todos conhecem mais ou menos, é uma espécie de funeral; terminada a cerimônia, (...) não se pensa mais no falecido. Sob certo aspecto, pode-se assemelhar a penitenciária a um cemitério; mas esquece-se que o condenado é um sepultado vivo.”

Francesco Carnelutti

Dedico o presente Trabalho de Conclusão de Curso sob forma de Monografia, que, com esforço e determinação foi realizado, aos meus pais, Angela Maria Florinda e Nilton Aparecido da Silva. A minha mulher Ana Claudia Fonseca da Silva A todos os meus amigos de coração. Aos colegas de graduação e futuros operadores do Direito. E aos demais alunos da Universidade Tuiuti do Paraná.

Agradeço primeiramente a Deus, o qual sem a sua luz não teria sido possível a realização de mais esta etapa de minha vida. A Jesus Cristo e aos espíritos amigos, que com amor e bondade, auxiliam-se sempre à boa alimentação da alma e da mente. Aos meus pais e familiares, que sempre estiveram presentes e prestaram-me todo o apoio nesta empreitada. Em especial a mulher da minha vida Ana Claudia Fonseca da Silva, que desde o início desta jornada incentiva-me com palavras e atitudes de fé, força e foco. Aos meus amigos e colegas de faculdade, pelo companheirismo e apoio essenciais durante todo o percurso. Aos professores do curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, por estes cinco anos de dedicação e paixão na transmissão dos conhecimentos ao longo da jornada do curso, sobretudo ao professor e orientador Dálio Zippin Filho pelo compartilhamento de sua sabedoria e experiência em todo o decorrer da orientação, tornando possível a efetiva conclusão deste trabalho e a realização de mais um sonho.

RESUMO

Tem o presente trabalho de conclusão de curso a finalidade de, através de pesquisa científica, no âmbito da legislação e na doutrina, realizar a devida análise e discussão acerca da efetividade da aplicação do instituto das Penas Restritivas de direito no que concerne ao ideal de ressocialização do indivíduo criminoso, fazendo-se um paralelo em relação à atual situação carcerária brasileira, o modelo de execução da pena no sistema pátrio, a efetiva e integral reinserção do apenado à sociedade, e o sentimento de justiça social. Para tanto, reportando-se, sobretudo, ao caráter teleológico das penas de uma maneira geral, ou seja, buscando-se observar a real finalidade à respeito da edição e interpretação do preceito secundário da norma penal.

Palavras-Chave: Penas; teleológico; ressocialização.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 8

2 ORIGEM DA PENA .................................. ............................................... 10

2.1 CONCEITO DE PENA ............................................................................. 11

2.2 FUNÇÃO DA PENA ................................................................................. 12

3 DIMENSÃO HISTÓRICA DA APLICAÇÃO DAS PENAS ....... ................ 14

3.1 PERÍODO DA VINGANÇA PRIVADA ...................................................... 14

3.2 PERÍODO DA VINGANÇA DIVINA .......................................................... 15

3.3 PERÍODO DA VINGANÇA PÚBLICA ...................................................... 16

3.4 PERÍODO HUMANITÁRIO ...................................................................... 16

3.5 PERÍODO CIENTÍFICO ........................................................................... 17

4 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA PENAL BRASILEIRO ..... ............... 19

5 SÍNTESE ACERCA DAS ESPÉCIES DE PENA ............. ........................ 21

6 MODALIDADES DE PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO ..... ................ 23

6.1 PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA .................................................................... 24

6.2 PERDA DE BENS E VALORES ............................................................... 26

6.3 PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE ....................................... 27

6.4 INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS .......................................... 29

6.5 LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA .......................................................... 31

7 INEFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL ................. ................................ 32

8 RESSOCIALIZAÇÃO ................................. ............................................. 35

9 CONCLUSÃO ....................................... ................................................... 38

10 REFERÊNCIAS ....................................................................................... 39

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso, sob forma de monografia, tem por

escopo a análise de alguns dos instrumentos de controle do Estado acerca do

Direito Penal, sobretudo, no que diz respeito ao preceito secundário da norma penal

brasileira, visando relacionar os efeitos sociais das Penas Restritivas de Direito,

tanto no campo do “ideal”, quanto na realidade atual.

Foram utilizados métodos sucintos de pesquisa científica e de campo, a fim

de se analisar, refletir e expor as questões relevantes de fatos empíricos e jurídicos

ocorridos no meio social brasileiro, bem como fora dele, no âmbito do direito estatal

de punir, mas, ao mesmo passo, do dever de prevenir e ressocializar.

Inicia-se a exposição das ideias a partir da necessidade de se demonstrar a

origem da sistemática de aplicação das penas como forma de resolução dos

conflitos sociais mais amplos, desde o início da convivência humana em grupos, ou

sociedades. Dentro deste contexto ainda, expõem-se a conceituação da pena sob a

ótica de alguns grandes pensadores do Direito, bem como, demonstra-se a sua

finalidade de acordo com a evolução natural do pensamento social.

Passa-se para uma abordagem acerca da história da aplicação das penas,

bem como do Direito Penal em geral, retratando-o conforme os principais períodos

histórico sociais evidenciados. Parte-se da reflexão a respeito da aplicação das

penas entre os próprios particulares na época denominada vingança privada.

Observa-se o período da vingança divina, onde se impunham as sanções aos

indivíduos infratores em nome da divindade. Refere-se, após, a um determinado

momento social no qual os considerados delinquentes recebiam punições

desproporcionais aplicadas já pelo Estado, era o chamado período da vingança

pública. Chega-se a um período mais moderno, onde a influência de novos

pensadores, bem como a própria evolução da sociedade, exigem formas

humanizadas e conscientes de aplicação do Direito Penal.

Em uma outra etapa, menciona-se brevemente o histórico do sistema penal

brasileiro, fazendo-se referência desde a época do descobrimento até os dias atuais.

Verifica-se no início a forte influência do Direito Europeu, e após, observa-se

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algumas transformações com a vigência do Império e ainda da República,

chegando-se à abordagem das legislações vigentes nos dias atuais.

Verifica-se que foram tecidos alguns comentários acerca das espécies de

pena vigentes no sistema pátrio de maneira geral, e ainda, realizada uma

abordagem mais abrangente no que concerne as modalidades de penal alternativas,

mencionando-se as restritivas de direitos, bem como a pena de multa.

Após, verificou-se as questões inerentes à ineficácia da pena privativa de

liberdade, direcionando-se comentários acerca dos problemas do sistema prisional

em geral, e ainda, abordando-se as precariedades evidenciadas em torno do

sistema carcerário brasileiro.

Por fim, analisou-se da forma mais concentrada a ideia da ressocialização

como importante finalidade da aplicação das penas, demonstrando-se a

necessidade deste objetivo, bem como, os benefícios sociais a ele relativos.

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2 ORIGEM DA PENA

É sabido por todos de que em determinado período da história da

humanidade, período este denominado majoritariamente por primitivo, viviam os

homens de maneira relativamente isolada, onde cada qual cuidava de dar conta do

suprimento de suas próprias necessidades, estas últimas, impostas em regra pela

natureza.

A multiplicação do gênero, no entanto, bem como demais fatores inerentes à

natureza humana, acabaram por culminar na reunião desses homens em grupos,

formando assim, as primeiras sociedades, o que por sua vez, veio, em um primeiro

momento, a facilitar a manutenção da vida, já que se pôde realizar a divisão das

atividades desenvolvidas.

A convivência em sociedades, todavia, naturalmente impôs certos limites à

liberdade individual antes experimentada, tendo em vista os interesses e as

necessidades mútuas que passaram a ser observadas. Nesse sentido, Rousseau

(2001), na eminente obra “O Contrato social”, traz uma ideia de renúncia parcial da

liberdade de cada indivíduo em prol das necessidades e do interesse comum.

A consequência lógica da convivência em sociedades, com a necessidade de

limites às liberdades individuais, foi o surgimento de regras de convívio, a princípio

morais, visando se definir as parcelas de liberdade de cada um em prol coletividade,

esta última, que por sua vez, reflete em cada membro do grupo também de forma

individual.

Mais do que os interesses e liberdades de cada individuo, as regras

originadas pela convivência em sociedade tinham o papel de proteger também os

interesses de cunho comum, público, naturalmente estabelecidos.

Nesse contexto Cesare Beccaria bem expressa:

Não bastava, porém, ter formado esse depósito; era preciso protegê-lo contra as usurpações de cada particular, pois tal é a tendência do homem para o despotismo, que ele procura, sem cessar, não só retirar da massa comum sua porção de liberdade, mas ainda usurpar a dos outros. (BECCARIA, 1999, p.26)

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Foi então, que se viu a necessidade de, além das regras, estabelecer-se

meios eficazes a fim de proteger o interesse comum, fazendo surgir as sanções aos

indivíduos infratores das regras, denominadas penas.

2.1 CONCEITO DE PENA

Conforme já tratado no item anterior, as sanções, denominadas também de

penas, surgiram da necessidade de se estabelecer um controle aos modelos

comportamentais criados a partir da vida do homem em sociedade.

A fim de se garantir a proteção dos interesses comuns, foi necessário a

aplicação de medidas causadoras de determinado desconforto àquele que

ultrapassava os limites impostos a sua liberdade individual.

Etimológicamente, a palavra pena teria derivado do latim “poena”, esta que

por sua vez teria sido derivação da palavra “poiné”, oriunda do vocábulo grego.

Ambas apresentam-se como sinônimo de dor, castigo, punição, sofrimento, entre

outros.

Dissertando a respeito da origem da pena, Beccaria (1999, p. 26) em sua

obra denominada “Dos Delitos e das Penas”, acaba conceituando as penas como

motivos sensíveis suficientes a serem estabelecidos aos infratores das normas,

visando a proteção da coisa comum ou alheia.

Uma ideia mais moderna é trazida por Fernando Capez, que conceitua pena

como sendo:

Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade. (CAPEZ, 2003, p. 332)

Trata-se de um conceito bastante completo e adaptado a realidade atual do

sistema penal Brasileiro.

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Importante destacar ainda, que a pena, ou sanção penal, é juridicamente

classificada também como o preceito secundário da norma penal incriminadora,

aquele que por escopo a cominação da pena em abstrato ao praticante do preceito

primário do tipo legal, este último, que tem por função a descrição da conduta

proibida.

2.2 FUNÇÃO DA PENA

Verificam-se em meio ao universo jurídico penal, sobretudo no campo

doutrinário, inúmeras teorias a respeito da função, ou finalidade da aplicação da

pena.

Nessa toada, antes de expor algumas das teorias referidas acima, tidas como

principais, vale destacar uma ideia de Renato Marcão exposta sucintamente, porém,

brilhantemente em uma de suas obras acerca da execução penal.

A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do internado, já que adota a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e humanizar. (MARCÃO, 2013, p. 31)

A primeira teoria a qual vale se referir é a chamada Teoria Absoluta, também

denominada Retributiva ou Retribucionista, pela qual, tem-se como única função da

pena a repressão, onde o indivíduo que pratica um ato contrário à lei merece a

aplicação de uma sanção como forma de resposta do Estado. Observa-se, que por

esta teoria a ideia que se tem da pena é de que ela representa um fim em si mesma,

onde a devida aplicação de um castigo àquele indivíduo que pratica um fato

delituoso é suficiente para compensar o mal a que deu causa.

Outra importante teoria acerca da função da pena, não mais baseada apenas

na ideia de realização de justiça, mas, tendo como principal objetivo a prevenção ao

cometimento de novas práticas delituosas, é a chamada Teoria Relativa,

denominada não raras as vezes de Preventiva. Essa Teoria apresenta alguns

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desdobramentos interessantes, ao passo que a prevenção objetivada pela pena

tanto pode se dar através de uma coação psicológica, onde os indivíduos

ameaçados pela potencial aplicação de uma sanção abstêm-se da prática do crime,

quanto pode se dar pelo sofrimento causado pela efetiva aplicação da sanção,

motivo esse, que ensejaria ao infrator um determinado desestímulo à prática de

novos delitos. Ainda a respeito da Teoria Relativa, cumpre salientar, que denomina-

se Prevenção Geral, a ideia de cominação de uma pena, que por sua vez intimida os

indivíduos de uma determinada sociedade acerca do cometimento de um fato

criminoso, bem como, chama-se de Prevenção Especial ou Específica, a ideia de

que o indivíduo infrator, após sofrer a punição estabelecida, sente-se desestimulado

à eventual nova prática delituosa.

Por fim, nascida da interpretação da mistura das duas Teorias referidas

acima, não se pode deixar de falar naquela que talvez seja a mais importante das

funções da aplicação da pena, qual seja, a função ressocializadora ou educativa,

através da qual se busca renovar a moral e as práticas sociais do indivíduo que

desviou-se, quebrando o contrato social previamente firmado. Trata-se de uma ideia

que vai além da punição e da prevenção por si só, tendo por escopo a reintegração

do indivíduo à sociedade, de modo que ele mais recorra ao caminho do crime.

Nesse contexto, “Passou-se a entender que a pena, por sua natureza, é

retributiva, tem seu aspecto moral, mas sua finalidade é não só a prevenção, mas

também um misto de educação e correção.” (MIRABETE, 2012, p. 231).

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3 DIMENSÃO HISTÓRICA DA APLICAÇÃO DAS PENAS

Desde o princípio, a organização do homem em grupos ou sociedades, trouxe

não só as vantagens relativas à ideia de divisão do trabalho , mas também, as

desvantagens provenientes da própria natureza humana quando da interação ou

convívio social.

Nesse sentido, destaca Guilherme de Souza Nucci:

O ser humano sempre viveu em permanente estado de associação, na busca incessante do atendimento de suas necessidades básicas, anseios, conquistas e satisfação (cf. Carrara, Programa do curso de direito criminal, v. 1, p. 18; Aníbal Bruno, Direito penal – Parte geral, 1.1, p. 67). E desde os primórdios violou as regras de convivência, ferindo os semelhantes e a própria comunidade onde vivia, tornando inexorável a aplicação de uma punição. (NUCCI, 2011, p. 73)

Todavia, as formas de pensamento, bem como, a forma de convivência

dentro desses grupos denominados sociedades, passou e ainda passa, por certas

modificações ao longo do tempo, fato este, determinado pela evolução natural da

humanidade.

Ocorre que, ao passo em que a sociedade evolui, o Direito Penal, sobretudo

na forma de aplicação das penas, acompanha essa evolução, abarcando sempre as

necessidades de cada época.

Destacam-se alguns dos principais períodos no que toca à aplicação das

penas na história das sociedades, sendo eles, o da vingança privada, vingança

divina, vingança pública e período humanitário.

3.1 PERÍODO DA VINGANÇA PRIVADA

Pode se dizer que neste período originou-se a primeira forma de aplicação de

punição acerca da quebra do contrato social por parte do indivíduo infrator das

normas.

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A sanção era estabelecida e aplicada de forma imediata, quase que

instintivamente, onde o indivíduo ofendido, ou os entes mais próximos de seu grupo

social, reagiam ao mal que porventura lhes era causado pela prática delituosa do

infrator.

Como não poderia ser diferente, levava vantagem sempre aquele que detinha

o maior poder. Verificava-se a vigência da lei do mais forte, já que tratava-se de uma

relação estritamente particular, e portanto, não existia a imposição de limites às

reações que eram manifestadas pelos ofendidos.

Todavia, ainda nesse contexto, surgiu a prática de uma forma de repressão

denominada “Talião”, a qual teve seu princípio encontrado em meados de 1780 a. C,

no chamado Código de Hamurabi, proveniente do Reino da Babilônia. A premissa

partia da máxima “olho por olho, dente por dente”, estabelecendo, portanto, uma

ideia de proporcionalidade entre o mal praticado e o castigo imposto, objetivando a

reciprocidade do crime e a pena.

Em que pese ainda fosse uma forma cruel e primitiva de aplicação da pena,

pautada na ideia de retaliação, a Lei de Talião acabou por mitigar a

desproporcionalidade naturalmente existente entre o poder dos particulares,

objetivando, de certa forma, uma espécie de justiça social.

3.2 PERÍODO DA VINGANÇA DIVINA

Nesta fase, predominavam na sociedade ideais de caráter religioso, místico,

dogmático, onde a razão da aplicação das punições não mais era retaliação como

forma de defesa do ofendido, mas, como um modo de reparar a insatisfação

causada aos deuses.

A punição servia, portanto, para purificar a alma do infrator, fazendo afastar a

ira divina e assim manter a paz social.

Interessante destacar, que atribuía-se à insatisfação divina os acontecimentos

próprios da natureza, como trovões, raios, pestes, entre outros.

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Ainda, vale destacar, que eram aplicadas pelas autoridades religiosas severas

punições, objetivando a intimidação dos indivíduos, face a ideia do desrespeito as

divindades.

3.3 PERÍODO DA VINGANÇA PÚBLICA

Esse período histórico da aplicação das penas revela uma determinada

evolução no que tange à organização da sociedade. Destaca-se o desenvolvimento

de cunho político, com a predominância da figura do Estado e seu poder sobre os

grupos sociais.

As punições aqui, passaram a ser determinadas por aqueles que

representavam o Estado, que por sua vez, em nome de Deus exercia sua autoridade

sob a premissa de resguardar os interesses da sociedade em geral.

O Estado, no entanto, sob a égide de sua soberania, arbitrariamente aplicava

sanções que em nada respeitavam o princípio da proporcionalidade, sendo as penas

de morte e tortura estabelecidas em grande escala. Tem-se ainda, que as punições,

por vezes, eram estendidas aos familiares do infrator.

3.4 PERÍODO HUMANITÁRIO

Conforme já relatado no item anterior, o período da denominada vingança

pública estabelecia, sob o pretexto de cumprimento da lei, de forma absolutamente

arbitrária e desproporcional a aplicação das punições aos indivíduos considerados

delinquentes.

Essas práticas, todavia, acabaram por gerar insatisfação e até saturação aos

povos, em especial à alguns pensadores da época que passaram a contestar os

ideais absolutistas vigentes.

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Os ideais destes pensadores, e até mesmo do cristianismo, caracterizavam-

se pela contrariedade a qualquer tipo de crueldade e arbitrariedade, e foram

essenciais na implementação à aquilo que deu base ao período humanitário,

compreendido em meados de 1750 e 1850.

Esse período é marcado também pela forte influência da Revolução

Francesa, sobretudo no que toca o afastamento das penas cruéis e estabelecimento

da pena de prisão como punição principal.

3.5 PERÍODO CIENTÍFICO

Esse período é compreendido a partir do século XIX, também conhecido por

Período Criminológico, iniciou-se aqui um pensamento que visava ir além daquilo

que envolvia apenas o cometimento do crime e a punição ao individuo infrator.

Os pensadores do início deste período passaram a buscas as razões que

porventura levavam os indivíduos considerados delinquentes à cometerem os fatos

delituosos.

Surgiram teorias acerca das influencias externas e sociais, bem como, de

influencias advindas da própria genética do indivíduo delinquente.

Evidente que com o avanço científico dos estudos em torno do homem e da

sociedade, algumas das ideias dos primeiros pensadores do período criminológico

foram rechaçadas, todavia, os sistemas jurídicos atuais em geral, baseiam-se no

ideal de ir além do crime e do criminoso, ou seja, buscam e consideram as razões

acerca do cometimento do fato delitivo.

Vale destacar, por fim, o que sintetiza Guilherme de Souza Nucci a respeito

dos referidos períodos da evolução do Direito Penal:

[...] nos primórdios, a pena era aplicada desordenadamente, sem um propósito definido, de forma desproporcional e com forte conteúdo religioso. Atingiu-se a vingança privada e, na sequência, a vingança pública, chamando o Estado a si a força punitiva. Aplicou-se o talião (olho por olho,

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dente por dente), o que representou um avanço à época, pois traçou-se o contorno da proporcionalidade entre o crime praticado e a pena merecida. Seguiu-se a fase de humanização do direito penal, após a Revolução Francesa, estabelecendo-se, no mundo todo, a pena privativa de liberdade como a principal sanção aplicada, evitando-se, como meta ideal a ser atingida, as penas consideradas cruéis. (NUCCI, 2011, p. 82)

Observa-se uma adaptação da aplicação das penas de acordo com a

evolução dos pensamentos predominantes relativos ao convívio humano na

sociedade.

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4 BREVE HISTÓRICO DO SISTEMA PENAL BRASILEIRO

O sistema penal brasileiro, inicialmente influenciado pelas normas já vigentes

no território europeu, antes de formar-se como no estágio atual, apresentou algumas

modificações ao longo tempo, sobretudo em decorrência da evolução política e

cultural do país.

No início, o que foi verificado pelos colonizadores portugueses foi o

funcionamento de um sistema baseado na ideia do período da vingança privada,

tendo em vista as sanções, muitas vezes cruéis, de caráter meramente punitivo que

eram aplicadas pelos índios.

Foi então, que rapidamente se implementou em nossa sociedade as normas

oriundas da legislação portuguesa, sendo as primeiras delas provenientes do

sistema formado pelas Ordenações Afonsinas. Posteriormente, passou a vigorar a

sistemática das Ordenações Manuelinas, e por fim aplicaram-se as normas advindas

do sistema das Ordenações Filipinas, as quais vigoraram por maior tempo.

Em decorrência da independência de Portugal, o Brasil, ainda na fase do

império, porém influenciado pelos ideais da Revolução Francesa e Declaração dos

Direitos do Homem, visando mudanças em relação à sistemática cruel de aplicação

de penas ainda vigente, em 1830 estabeleceu o Código Criminal do Império. A partir

daí houve um grande avanço no que diz respeito à humanização do Direito Penal

pátrio como um todo.

O Brasil avançou para uma nova era da história política, denominada

República, proclamada em 1889. Logo em seguida, em 1890, aprovou-se o Código

Penal da Era Republicana, o qual apresentou modificações legislativas bastante

significativas, algumas que ainda vigoram no sistema penal atual, como por exemplo

a pena privativa de liberdade máxima de 30 anos e o instituto da prescrição.

Após a Constituição Brasileira de 1934, mudaram-se alguns conceitos

relativos ao Direito Penal no país, sobretudo pela vedação as penas de morte e

banimento. Foi então, que algum tempo mais tarde, mais precisamente em 1940,

publicou-se o novo Código Penal, que embora com algumas complementações e

modificações, encontra-se vigente até os dias de hoje.

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No que toca as alterações ou ainda as tentativas de modificações ao Código

de 40, vale destacar o Decreto-Lei nº 1.004/69, editado em 1969, porém que nunca

entrou em vigor.

Persistia até o momento, a aplicação da pena privativa de liberdade como

sendo o principal instrumento de sanção a se estabelecer aos indivíduos infratores

da legislação penal.

Todavia, em 1984 editou-se a Lei de Execução Penal, a qual apresentou uma

significativa reforma ao sistema penal brasileiro vigente até então, sobretudo no que

tange a forma de execução das punições.

Deixou-se então, de privilegiar o cárcere como medida mais efetiva em

relação à aplicação das penas num contexto geral. Nesse sentido, versa Norberto

Avena em relação a finalidade da execução penal:

Buscando uma denominação para o ramo do direito destinado a regular a execução penal, a doutrina internacional consagrou a expressão Direito Penitenciário. No direito brasileiro, porém, essa designação revela-se em descompasso com os termos da L. 7210/1984 (Lei de execução Penal – LEP), que, já em seu art. 1º, estabelece como objetivo da execução penal “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. (AVENA, 2015, p. 1)

Justamente com o propósito de propiciar ao apenado uma harmônica

integração social, ou reintegração social, observou-se a implementação das penas e

medidas alternativas à prisão.

Ainda, denota-se que a sistemática da aplicação das penas e medidas

alternativas foi reforçada, com a edição da Lei nº 9.099/95, que instituiu os Juizados

Especiais Criminais, os quais passaram a admitir a aplicação imediata das penas

restritivas de direito, e mais tarde com a publicação da Lei nº 9.714/98, que por sua

vez, trouxe atualizações acerca do tema.

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5 SÍNTESE ACERCA DAS ESPÉCIES DE PENA

A Lei de Execução Penal, já em seu artigo 1º, estabelece de forma sucinta o

objetivo da execução das penas, frisando a ideia de integração social do indivíduo

apenado.

Expõe o artigo 1º da Lei nº 7.210/84, denominada comumente “LEP”, o

seguinte: “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou

decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do

condenado e do internado.” (BRASIL, Lei de Execução Penal).

Nesse sentindo, a Lei nº 7.209/84, publicada à mesma época da Lei de

Execução Penal, alterou o artigo 32 do Código Penal, lá estabelecendo de modo

taxativo as espécies de pena vigentes no Direito pátrio.

Aduz o artigo 32 do Código Penal, que são as penas, privativas de liberdade,

restritivas de direitos e de multa, as aplicáveis dentro do sistema jurídico penal

brasileiro.

Conforme a legislação acima referida, conclui-se que as espécies de pena

vigentes no sistema penal atual brasileiro podem ser classificadas, num contexto

geral, em três.

A primeira delas, elencada no inciso I do artigo 32 do já mencionado diploma

legal Código Penal, trata-se da pena privativa de liberdade, a qual pode se dar sob a

forma de detenção, reclusão, ou ainda, prisão simples. Enquanto esta última refere-

se em geral às contravenções penais, as duas primeiras são aplicadas em

decorrência da prática de crimes.

Outra espécie, visualizada no inciso II da norma referida, é a Restritiva de

Direitos, aplicada, observando-se requisitos impostos pela lei, sob 5 modalidades

diversas, quais sejam, a Prestação de Serviços à Comunidade, a Interdição

Temporária de Direitos, a Limitação de Fim de Semana, a Prestação Pecuniária e a

Perda de Bens e Valores. Em que pese no sentido literal a Prestação Pecuniária não

se refira a uma restrição de direitos propriamente dita, assim ela é compreendida

pela legislação e por grande parte da doutrina. Nesse contexto, Cezar Roberto

Bitencourt (2006) em análise à Lei nº 9.714/98, vai além, dizendo que somente a

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pena de interdição temporária de direitos mereceria a classificação de restritiva de

direitos, ao passo que as demais deveriam ser denominadas como restritivas de

liberdade ou pecuniárias, esta última referente à própria Prestação Pecuniária e a

Perda de Bens e Valores. Vale destacar ainda, que as penas alternativas de

Prestação Pecuniária e Perda de Bens e Valores foram incluídas através da edição

da Lei nº 9.714, de 1998.

A última espécie, denominada pena de multa, é por vezes chamada também

de pena pecuniária, aplicada alternativamente ou cumulativamente às outras

espécies de penas elencadas na norma penal.

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6 MODALIDADES DE PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

Firmou-se na doutrina, de maneira geral, o entendimento de penas

alternativas como sendo, em regra, as penas restritivas de direito, estas elencadas

no artigo 43 do Código Penal.

A referida norma dispõe de maneira taxativa as espécies de Penas Restritivas

de Direitos, sendo elas, a Prestação Pecuniária, a Perda de Bens e Valores, a

Prestação de Serviços à Comunidade ou a Entidades Públicas, a Interdição

Temporária de Direitos, e por fim, a Limitação de Fim de Semana.

Isso, porquê elas tem, essencialmente, a finalidade de, observando-se os

requisitos legais, afastar sempre que possível a aplicação das Penas Privativas de

Liberdade.

Nesse diapasão, Norberto Avena considera:

Também chamadas penas alternativas, as penas restritivas de direitos têm por finalidade evitar, nos casos previstos em lei, a imposição da pena privativa de liberdade a indivíduos que revelam condições pessoais favoráveis e tenham sido condenados pela prática de infrações penais de menos gravidade. (AVENA, 2015, p. 329)

É preciso destacar também, que a pena de multa, classificada no inciso III do

artigo 32 do Código Penal, em que pese ter a sua aplicação realizada também de

forma cumulativa, é por vezes compreendida como pena alternativa, já que em

certos casos determinados pela lei, pode ser ela aplicada em substituição à pena

privativa de liberdade.

Conclui-se então, de modo geral, as penas alternativas como sendo, em

regra, as Restritivas de Direitos, mas podendo-se estender essa interpretação em

relação também à Pena de Multa, sobretudo em relação aos casos em que a lei

admite sua aplicação como substitutiva da Pena Privativa de Liberdade ou ainda

cumulativa com a Pena Restritiva de Direitos.

Como já mencionado nos capítulos anteriores, as Penas Restritivas de

Direitos, referidas neste item, surgiram como forma de aplicação de penas

24

alternativas à de prisão, do mesmo modo que esta última originou-se a partir da

necessidade de afastamento das penas de morte e outras cruéis.

Aplicadas, se preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos impostos pela

lei penal, em substituição às privativas de liberdade, visando, de maneira

humanizada, atingir-se as finalidades da execução penal.

No que tange à prática da execução, vale mencionar que, conforme é comum

à execução das Penas Restritivas de Direito em geral, após o trânsito em julgado de

sentença penal condenatória, expede-se um documento denominado “Guia de

Recolhimento”, conhecido também por Guia de Execução ou ainda Carta Guia. Este,

que por sua vez, contém as informações necessárias à instrução da execução penal,

e é remetido ao juízo competente para a devida fiscalização do processo executório.

A partir daí, efetivamente dá-se início ao processo de execução.

É importante mencionar o que versa o artigo 180 da Lei nº 7210/84 (Lei de

Execução Penal), que evidenciando o caráter ressocializador da aplicação da pena,

possibilita a conversão da Pena Privativa de Liberdade em Restritiva de Direitos,

observando-se alguns requisitos quanto ao regime de cumprimento e

comportamento do condenado.

Contudo, destaca-se também o artigo 181 e seguintes do diploma legal acima

referido, os quais denotam o caráter punitivo da pena ao estabelecer as más

condutas do condenado, que desta vez, ensejarão a conversão da Pena Restritiva

de Direitos em Privativa de Liberdade.

Vale frisar, por fim, que cada modalidade de Pena Restritiva de Direitos tem

suas peculiaridades, conforme será abordado na sequência.

6.1 PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA

A Pena Restritiva de Direitos de Prestação Pecuniária encontra seu conceito

devidamente definido pela lei, conforme se verifica no § 1º do artigo 45 do Código

Penal, o qual dispõe, em suma, que consiste no pagamento em dinheiro, à vítima,

25

aos dependentes desta, ou a entidade com destinação social, de valores de um a

trezentos e sessenta salários mínimos a serem fixados pelo juiz.

Observa-se que a norma referida acima, além de conceituar a Pena de

Prestação Pecuniária, estabelece seus limites máximo e mínimo no que toca aos

seus valores, bem como, expões as consequências acerca de eventual questão

incidente, qual seja, a de ocorrência possível de condenação em ação de reparação

civil, o que por sua vez, enseja a devida dedução do montante.

À respeito da execução, tem-se que após a apuração e liquidação dos

valores, se esclarece as condições ao apenado, bem como, determina-se o

pagamento no prazo de 10 dias. Compreende-se como possível o parcelamento da

Prestação Pecuniária, assim como o é na pena de multa, casos em que o

sentenciado ou até mesmo o Ministério Público, devem requerer em juízo.

O efetivo e devidamente comprovado pagamento integral dos valores

estipulados tem por consequência a extinção da punibilidade em face do apenado,

quando, é claro, não houverem outras penas submetidas à fiscalização no mesmo

processo executório.

Todavia, em caso de não pagamento conforme determinado, incide o

apenado em situação de descumprimento de pena, ocasião em que a prestação

pecuniária aplicada em substituição à pena privativa de liberdade poderá ser

convertida, ou reconvertida, em privação de liberdade na forma determinada em

sentença penal. É o que se verifica no § 4º do artigo 44 do Código Penal: “A pena

restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o

descumprimento injustificado da restrição imposta” (BRASIL, Código Penal),

É preciso destacar uma peculiaridade acerca da Prestação Pecuniária que se

encontra exposta no § 2º do artigo 45 do mesmo diploma legal. Trata-se da

aplicação da “prestação de outra natureza”, conhecida também por prestação

inominada. Consiste na imposição de outra pena, que não de natureza pecuniária,

em forma de substituição à prestação pecuniária anteriormente determinada. Exige-

se, para tanto, a aceitação do beneficiário, sem a qual, não se efetiva a aplicação.

26

A doutrina majoritária, no entanto, entende que a figura da prestação de outra

natureza, ou prestação inominada, é eivada de inconstitucionalidade, tendo em vista

que afronta o Princípio da Legalidade.

Reforça-se esta ideia através das palavras de Renato Marcão:

A pena de prestação de outra natureza ou inominada padece de flagrante inconstitucionalidade, já que equivale a uma pena indeterminada, contrariando a princípio da reserva legal albergado no art. 1º do Código Penal, de prestígio superior, conforme decorre do disposto no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal. (MARCÃO, 2013, p. 279).

6.2 PERDA DE BENS E VALORES

Cumpre expor, antes de mais nada, o fundamento legal e constitucional que

dá vida a esta modalidade de Pena Restritiva de Direitos.

Enquanto o artigo 5º, inciso XLVI, alínea “b”, da Constituição Federal de 1988

prevê a Perda de Bens como pena a ser adotada e regulada pela legislação nacional

infraconstitucional, o § 3º do artigo 45 do Código Penal cumpre seu papel ao dispor

que a perda dos bens e valores do condenado será em favor do Fundo Penitenciário

Nacional, tendo como valor máximo o do montante do prejuízo causado pela prática

delituosa ou ainda o do provento obtido em consequência do crime.

Extrai-se da análise do artigo referido acima, importante questão no que toca

a aplicação da pena de perda de bens e valores, pois tendo em vista que a norma

reguladora do instituto fala apenas em prática de crime, deve-se descartar a

hipótese de aplicação desta pena diante de condenações a respeito de

contravenções penais.

Outra questão de destaque, esta por sua vez discutida no âmbito doutrinário,

refere-se a certa especificidade em relação aos crimes dos quais caberia a aplicação

desta pena, já que de certa forma o disposto no § 3º do artigo 45 do Código Penal

exige, para aferição de valores, a existência de prejuízo causado ou provento obtido

pelo agente ou por terceiro.

27

Vale destacar o que discorre Norberto Avena acerca do assunto:

Discute-se quanto à natureza do crime objeto da condenação que permite a aplicação dessa pena. Majoritariamente, tem-se entendido que sua imposição é restrita aos crimes que tenham causado prejuízo à vítima ou proporcionado vantagem patrimonial ao condenado ou a terceiros, como delitos de furto, estelionato, receptação etc.(AVENA, 2015, p.331)

Nesse contexto, evidencia-se em maior escala aplicação da pena de Perda de

Bens e Valores nos crimes relacionados à ordem econômica e tributária.

Por fim, é necessário apontar as distinções acerca das duas formas de perda

de bens que se verificam na legislação penal. Uma, fundamenta-se pela alínea “b”,

do inciso II, do artigo 91 do Código Penal, e trata-se não de uma pena, mas de um

efeito da condenação. Refere-se, em regra, da perda de bens oriundos de produto

do crime, e justamente por não ter natureza de pena, o perdimento de bens pode vir

a atingir até mesmo o montante da herança deixada pelo apenado falecido. Já a

Perda de Bens e Valores objeto deste trabalho, ou seja, a modalidade de Pena

Restritiva de Direitos disposta no artigo 45, § 3º, do Código Penal, como já dito,

possui natureza pura de pena, e em razão disto, extingue-se com a morte do

sentenciado, sobretudo pelo Princípio da Intranscendência Penal.

6.3 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

Esta modalidade de Pena Restritiva de Direitos encontra fundamento legal no

artigo 46 e seus parágrafos, do Código Penal, bem como, no âmbito constitucional

verifica-se a sua fundamentação no disposto do artigo 5º, inciso XLVI, alínea “d”, o

qual estabelece Prestação Social Alternativa como pena a ser adotada pela

legislação pátria.

Nota-se, portanto, que não há o que se falar a respeito de

inconstitucionalidade desta pena, já que não se pode confundi-la com a pena de

“trabalho forçado”, a qual é vedada pela própria Constituição Federal de 1988.

28

Já o mencionado artigo 46 do Código Penal, por sua vez, além de trazer em

seu conteúdo a conceituação desta modalidade de pena, regula a sua forma de

aplicação, bem como, descreve suas peculiaridades.

Conforme o parágrafo 1º do artigo 46 do Código Penal, a Prestação de

Serviços à Comunidade, ou ainda, a entidades públicas, é compreendida pela

atribuição de tarefas gratuitas ao condenado.

Nesse sentido, verificam-se os dizeres de Cezar Roberto Bitencourt:

A doutrina tem conceituado a prestação de serviços à comunidade como o “dever de prestar determinada quantidade de horas de trabalho não remunerado e útil para a comunidade durante o tempo livre, em benefício de pessoas necessitadas ou para fins comunitários” [...]. (BITENCOURT, 2006, p.137)

Logo no parágrafo 2º da mesma norma já referida, encontra-se a

relação dos ambientes em que deverá se dar a prestação de serviços, podendo-se

concluir que tratam-se tanto de entidades públicas de fato, quanto de entidades

privadas revestidas de caráter público, ou seja, voltadas à programas comunitários,

com destinação social.

A forma de execução da Pena Restritiva de Direitos de Prestação de Serviços

à Comunidade, regulada em geral pelo parágrafo 3º do artigo 46 do mesmo diploma

legal referido acima, denota o caráter humanizador da aplicação da pena, sobretudo

quando estabelece que as atribuições das tarefas deverão adequar-se as aptidões

do condenado e não poderão prejudicar a jornada comum de trabalho do indivíduo

apenado. Ainda, observa-se que a pena deve ser cumprida à razão de uma hora por

dia de condenação, evitando assim, um rigor excessivo da punição.

Vale destacar, uma peculiaridade acerca da referida pena, esta, retratada no

artigo 46, §4º do Código Penal, que se revela como uma exceção à regra geral do

artigo 55 da mesma norma. Observa-se que, enquanto a regra geral do artigo 55

determina que a duração da Pena Restritiva de Direitos aplicada seja igual a da

pena privativa de liberdade substituída, no caso da modalidade de pena alternativa

ora analisada, quando à substituída for superior a um ano, faculta-se ao condenado

cumpri-la em até a metade do tempo.

29

Por fim, depreende-se da análise da Lei nº 7.210/84 (LEP), que a fiscalização

e acompanhamento desta Pena Restritiva de Direitos recai sob a responsabilidade

do juízo da execução, o qual deverá encaminhar o sentenciado ao cumprimento da

reprimenda, bem como, observá-lo durante toda a execução, e ainda, alterar a forma

do cumprimento sempre que houver necessidade devidamente comprovada. É, em

síntese, o que diz a Lei de Execução Penal acerca do tema, sobretudo em seus

artigos 148 e 149.

6.4 INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS

A primeira coisa a se fazer acerca desta modalidade de Pena Restritiva de

Direitos é a diferenciação entre as sanções decorrentes da aplicação da pena, ora

objeto de análise deste trabalho, e as medidas entendidas por efeitos da

condenação, estas últimas, reguladas pelo artigo 92 do Código Penal. Enquanto

estas tratam-se de meras consequências da imposição de uma condenação,

aquelas, dispostas no artigo 47 da norma já referida, são efetivamente consideradas

sanções penais.

No que toca à conceituação desta modalidade de Pena Restritiva de Direitos,

vale destacar uma ligeira explanação de Norberto Avena observada na obra

“Execução Penal Esquematizado”. Segundo Avena (2015, p.332) “trata-se da

proibição quanto ao exercício de direitos legítimos do cidadão”.

Da análise do artigo 47 e incisos do Código Penal, extrai-se a subdivisão

desta modalidade de pena em cinco espécies, quais sejam, a de proibição do

exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandado eletivo;

proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação

especial, de licença ou autorização do poder público; suspensão de autorização ou

de habilitação para dirigir veículo; proibição de frequentar determinados lugares;

proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos. É o que

sistematicamente dispõe a norma legal acima mencionada.

30

A espécie elencada no primeiro inciso do artigo 47 do Código Penal Brasileiro

tem por escopo o impedimento temporário do exercício das atividades públicas as

quais o condenado estava anteriormente autorizado a exercer. A duração da

proibição estende-se ao tempo de pena privativa de liberdade previamente fixada.

A segunda espécie, por sua vez disposta no segundo inciso da mesma

norma, recai não sobre o exercício de função pública propriamente dita, mas, sobre

a prática daquelas atividades que dependem de autorização do poder público. Assim

como no caso da primeira espécie, tem como função a interdição temporária dos

direitos laborativos que antes eram autorizados ao apenado.

Frisa-se, que a aplicação destas duas espécies de pena ficam restritas

àqueles crimes praticados com violação dos deveres inerentes à função ou profissão

do condenado, conforme se verifica da análise do artigo 56 do Código Penal.

No inciso III da norma já destacada acima, observa-se a espécie denominada

“suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo”. Como se observa,

a própria denominação da pena é capaz de conceituá-la, sendo portanto, o

impedimento temporário do direito de dirigir que porventura havia sido antes

conferido ao indivíduo condenado. Cabe salientar, todavia, que esta penalidade

encontra-se disciplinada também, porém de forma especial, no artigo 292 da Lei nº

9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), e por esta razão, a aplicação dela como

forma substitutiva da pena privativa de liberdade deve ser realizada apenas em

relação aos delitos abarcados fora desse contexto.

O inciso IV acaba por facultar ao juiz a especificação dos lugares que deverão

ser proibidos ao condenado frequentar. Tendo em vista a proibição deve se

direcionar a locais que tenham relação com o delito praticado, a medida parece ter o

objetivo principal de evitar a reincidência.

A quinta e última espécie de medida relativa a modalidade de pena de

interdição temporária de direitos trata-se da “proibição de inscrever-se em concurso,

avaliação ou exame público”. Foi ela introduzida no Código Penal pela edição da Lei

12.550 de 2011, e sua aplicação parece ser relativa especialmente à prática do

delito tipificado no artigo 311-A, o qual foi incluído no Código pela mesma lei.

31

6.5 LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA

O artigo 48 do Código Penal tratou devidamente de conceituar esta

modalidade de Pena Restritiva de Direitos, ao estabelecer que “A limitação de Fim

de Semana consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por 5

(cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado.

(BRASIL, Código Penal)”

A referida norma, em seu parágrafo único, aduziu ainda a possibilidade da

ministração de cursos, palestras e atividades com finalidade educativa.

A ideia de restrição ao direito de liberdade plena do indivíduo, somado a

possibilidade de participação em programa educativo, reflete as principais funções

da aplicação da pena, revestidas de caráter punitivo, porém, ressocializador.

Em que pese a boa intenção do legislador em relação a edição desta norma,

a ausência de estabelecimento adequado acaba por dificultar demasiadamente a

aplicação desta medida. Trata-se de situação amplamente mencionada no âmbito da

doutrina e jurisprudência pátria.

Tal situação, por sua vez, acaba fazendo recair sob a responsabilidade do

juízo da execução a tarefa de, com fulcro no artigo 148 da Lei de Execução Penal,

encontrar a alternativa mais adequada a fim de se fazer cumprir o estabelecido na

sentença.

32

7 INEFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL

Conforme já mencionado, a pena privativa de liberdade foi originada em

decorrência de uma evolução social acerca da aplicação do Direito Penal, surgindo

como uma alternativa às punições cruéis antes empregadas.

Tendo em vista os principais objetivos funcionais da aplicação da pena, de

caráter punitivo, porém ressocializador, inicialmente acreditou-se que a pena

privativa de liberdade seria o instrumento ideal a fim de se realizar a satisfação das

necessidades sociais. Todavia, o que se verifica nos dias atuais é justamente o

contrário disso, já que se pode concluir que a pena de prisão, sobretudo no Brasil,

em nada atinge os objetivos perquiridos pelos ideais da aplicação das penas.

A pena privativa de liberdade, além de não cumprir devidamente suas funções

punitivas e ressocializadoras, acaba por trazer determinadas consequências

causadoras de impactos negativos ao apenado e à própria sociedade. Nesse

contexto, sob uma análise crítica da pena prisão, menciona Cezar Roberto

Bitencourt:

Sua incapacidade para exercer influxo educativo sobre o condenado, sua carência de eficácia intimidativa diante do delinquente entorpecido, o fato de retirar o réu de seu meio de vida, obrigando-o a abandonar seus familiares, e os estigmas que a passagem pela prisão deixam no recluso são alguns dos argumentos que apoiam os ataques que se iniciam no seio da União Internacional de Direito Penal (Congresso de Bruxelas de 1889). (BITENCOURT, 2006, p. 2)

Como se vê, não é de hoje que se tecem críticas acerca da pena privativa de

liberdade em sentido geral. Denota-se que, em que pese tenha esta espécie de

pena surgido da necessidade do afastamento de outras mais cruéis, logo tornou-se

aos olhos da sociedade moderna, da mesma forma cruel. Nesse diapasão, vale

destacar um trecho da obra “Dos Delitos e Das Penas” de Cesare Beccaria:

À medida que as penas forem mais brandas, quando as prisões já não forem a horrível mansão do desespero e da fome, quando a piedade e a humanidade penetrarem nas masmorras, quando enfim os executores

33

impiedosos dos rigores da justiça abrirem os corações à compaixão, as leis poderão contentar-se com indícios mais fracos para ordenar a prisão. (BECCARIA, 1999, P. 34).

Cezar Roberto Bitencourt (2006), explanando a ideia de que apena de prisão,

em geral, desmoraliza, denigre e embrutece o apenado, ou seja, reforça seus

valores negativos, propõe que seja ela aplicada apenas e tão somente em casos

excepcionais, quando tratar-se se condenados perigosos e de difícil recuperação.

Discute-se muito a respeito da ineficácia do sistema carcerário, observando-

se como questão principal o afastamento sorrateiro do indivíduo apenado, da

sociedade para o cárcere. Entende-se que esta prática, ao invés de promover a

recuperação do condenado, acaba por marginalizá-lo perante ao meio social a qual

pertencia. Observa-se que a prisão separa por completo, através de muros e grades,

o indivíduo apenado da convivência social, deixando-o marcado por longo tempo

mesmo após o seu retorno, é o que se denomina estigma. Ocorre que,

estigmatizado, este indivíduo enfrentará fortes obstáculos para inserir-se novamente

ao meio social, visualizados pelas dificuldades de obtenção de emprego, problemas

familiares, e a própria discriminação.

Observa-se que fora mencionado até o momento as questões inerentes à

pena privativa de liberdade e sistema penitenciário em sentindo amplo, ou seja,

dentro de um contexto fático e histórico em geral. Acerca do sistema prisional

brasileiro, pode-se dizer que as questões já elencadas agravam-se ainda mais, ao

passo que não é difícil identificar os mais variados problemas ocorrentes e

decorrentes do sistema carcerário de nosso país.

Verificam-se dentre os problemas, o da superlotação da população carcerária,

o da violência interna, o das práticas de maus tratos face aos detentos, o da ação de

grupos participantes do crime organizado, entre outros, ambos que evidenciam o

gritante desrespeito aos Direitos Humanos, elencados na Carta Magna de nosso

país e decorrentes de pactos internacionais. As consequências desta precariedade

do sistema penitenciário brasileiro tornam impossível a ressocialização de qualquer

indivíduo a ele submetido, gerando, portanto, reflexos negativos à sociedade como

um todo.

Nesse sentido, explana Dalio Zippin Filho:

34

As condições de detenção e prisão no Sistema Carcerário brasileiro violam os direitos humanos, provocando uma situação de constantes rebeliões, onde em muitos casos os agentes do governo reagem com descaso, excessiva violência e descontrole ou de que presos são bandidos e devem sofrer no cumprimento de suas penas.

É a mentalidade retrograda de que quanto pior for o castigo, melhores os resultados na recuperação e ressocialização do preso.

As prisões do mundo e, principalmente do Brasil, não proporcionam ao condenado preso a sua recuperação. (FILHO, 2010, p. 2)

Pautado em um dos princípios constitucionais mais relevantes acerca dos

Direitos Humanos, previsto já no artigo 1º da Constituição Federal de 1988, qual

seja, o da dignidade da pessoa humana, a Lei nº 7.210/84 (Lei de execução Penal)

concentrou diversos direitos de cunho humanístico voltados aos condenados à pena

privativa de liberdade. Estão estes direitos ligados à assistência material; à saúde; a

assistência jurídica; à educação; a assistência social; à religiosidade; ao trabalho; a

reinserção ao convívio social, entre outros.

Ocorre que o cenário atual do sistema carcerário brasileiro, observado

diariamente, até mesmo pelas constantes e trágicas notícias advindas da mídia a

respeito da precariedade do espaço físico, da alimentação, e da segurança,

inviabiliza a concessão de qualquer destes direitos mencionados acima.

Fica fácil concluir, a partir disso tudo, que a pena privativa de liberdade,

sobretudo aplicada em tempos de profunda crise do sistema penitenciário, em nada

cumpre com seu papel principal de ressocialização do indivíduo condenado, e, pelo

contrário, acaba por afastá-lo ainda mais do convívio social comum, através da

marginalização ocasionada pela prisão, o que por sua vez, gera consequências

negativas a toda a sociedade, ao passo que este indivíduo agora estigmatizado terá

como melhor opção de escolha para a continuidade da vida a criminalidade.

35

8 RESSOCIALIZAÇÃO

A socialização, no sentido mais primitivo da palavra, pode ser entendida como

o processo através do qual um indivíduo, assimilando constantemente determinados

hábitos de uma cultura, torna-se membro participante de certo grupo de convívio,

este por sua vez, denominado grupo social ou sociedade.

Partindo-se deste princípio, fica fácil compreender o significado literal da

ressocialização, já que o prefixo “re”, adicionado à socialização, atribui

imediatamente à palavra um sentido de repetição, fazendo-se entender, portanto,

que trata-se de uma nova socialização, ou seja, o processo pelo qual um indivíduo

que se dessocializou, socializa-se novamente.

Em suma, a ressocialização traduz-se em trazer de volta ao convívio social

aquele indivíduo que, porventura, tenha se afastado dele por meio da quebra do

contrato realizado com a sociedade a qual pertence.

Observa-se ao longo da história da evolução do Direito Penal, sobretudo no

que diz respeito à aplicação das penas, que a ideia da ressocialização foi se fazendo

presente no âmbito da função e objetivo das penas ao passo em que estas foram se

aperfeiçoando através da vontade social. Conforme já tratado neste trabalho,

verifica-se que no atual sistema penal brasileiro, vige, acerca da aplicação da pena,

o entendimento de que ela deve punir sim, mas sobretudo, ressocializar.

Mesmo sem aprofundar-se na seara dos princípios constitucionais, como por

exemplo o da dignidade da pessoa humana ou ainda o da igualdade, é possível

observar a vontade do sistema penal brasileiro em cumprir os objetivos

mencionados acima. É o que se constata já no artigo 1º da Lei nº 7.210/84 (Lei de

Execução Penal), “Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de

sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração

social do condenado e do internado.”

As concepções legislativas e jurídicas atuais em geral, caminham neste

sentido porque sabem que a reinserção do condenado ao convívio social é, mais do

que a punição por si só, benéfica não só a ele, mas a sociedade com um todo. A

efetiva reeducação, readaptação, reabilitação, ou ainda recuperação do apenado,

36

possibilitando a ele o contato com a família e o meio social, é propicia a ensejar o

afastamento dele das malhas do crime.

Neste contexto, vale destacar algumas considerações de Dalio Zippin Filho:

Ressocializar significa tornar o Ser Humano capaz de viver em sociedade novamente, modificando a sua conduta, socialmente aceita e não nociva à sociedade como a maioria dos homens fazem.

Para ressocializar o condenado pressupõe-se que este possua um mínimo de capacidade de condições de assimilar o processo de ressocialização. (FILHO, 2010, p. 2)

É claro que não se pode olvidar daquilo que se chama de caráter retributivo

da pena, já que a pessoa do condenado certamente cometeu um delito, e portanto,

deve sofrer determinadas consequências, até mesmo para que se satisfaça, em prol

da vontade subjetiva da sociedade, a denominada sede de justiça. Ainda, entende-

se que é importante que o indivíduo infrator submeta-se as sanções, tendo em vista

o cumprimento da função preventiva da pena. Todavia, sem a promoção de políticas

criminais razoáveis, proporcionais e adequadas, no intuito de reinserir o apenado ao

devido convívio social e consequentemente afastá-lo da criminalidade, a aplicação

das penas não traz benefícios objetivos à sociedade em geral.

A pena privativa de liberdade, por si só, já apresenta certa dificuldade quanto

ao cumprimento de seu papel ressocializador, ao passo que o encarceramento cria

uma situação de exclusão do indivíduo apenado em face do seu meio social. Nessa

toada, Cezar Roberto Bitencourt muito bem menciona:

[...] Nessas condições, é utópico pretender ressocializar o delinquente; é impossível pretender a reincorporação do interno à sociedade através da pena privativa de liberdade, quando, de fato, existe uma relação de exclusão entre a prisão e a sociedade. (BITENCOURT, 2006, p. 8)

A questão agrava-se ainda mais em relação ao cenário atual do sistema

prisional brasileiro, através do qual, eivado de precariedade conforme já tratado no

capítulo anterior, torna-se absolutamente impossível a recuperação ou

ressocialização de qualquer indivíduo.

37

Nesse sentido, verificada a necessidade, bem como a plena dificuldade do

cumprimento do papel ressocializador no âmbito da pena privativa de liberdade, esta

por sua vez, tida ainda como pena principal, é que se deposita esperanças nas

Penas Restritivas de Direito como alternativas à prisão.

Ademais, tendo em vista serem as Penas Restritivas de Direitos alternativas

dotadas de maior razoabilidade e proporcionalidade, bem como não afastarem por

completo o indivíduo condenado de seu meio social, conclui-se a aplicação delas,

sempre que possível, como medida mais adequada em benefício da sociedade.

38

9 CONCLUSÃO

A elaboração deste trabalho de conclusão de curso, através das pesquisas

realizadas, bem como de toda a reflexão feita acerca do tema, permite concluir que

a ressocialização é um dos objetivos da aplicação das penas, pelo qual a sociedade

como um todo mais pode ser beneficiada, ao passo que o convívio social é a medida

mais adequada a fim de afastar as práticas criminosas.

A finalidades da pena hoje observadas de maneira positivada através da

legislação pátria, foram lapidadas ao longo da história da humanidade e do Brasil à

medida em que a sociedade foi evoluindo em sua maneira de pensar, ou seja, as

novas medidas punitivas adotadas representam a vontade social.

Neste contexto, verificou-se que as penas privativas de liberdade não

atendem as expectativas relacionadas a real função da pena no pensamento

moderno e humanístico, sobretudo em razão da precariedade observada no sistema

prisional pátrio, que por sua vez, ao invés de proporcionar a recuperação do

indivíduo, acaba por distanciá-lo ainda mais do convívio social, propiciando maiores

chances de reincidência de práticas delitivas.

Vislumbrou-se, no mesmo sentido, a real possibilidade do alcance da

finalidade ressocializadora da pena quando da aplicação das Penas Restritivas de

Direito como alternativa à pena de prisão, já que verificou-se que estas, através da

adoção de princípios como o da proporcionalidade e da razoabilidade, visam a

reintegração gradativa do indivíduo condenado ao convívio social, no entanto, sem

afastá-lo por completo do meio em que vive.

39

10 REFERÊNCIAS

AVENA, Norberto Cláudio Pâncaro. Execução Penal: Esquematizado. 2ª ed. São Paulo: Método, 2015.

BECCARIA, Cessare. Dos Delitos e Das Penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. 12ª ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Novas Penas Alternativas: Análise Político Criminal das alterações da Lei 9.714/98. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

BRASIL. Lei nº 7.209, de 11 de Julho de 1984. Altera dispositivos do Decreto- Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Presidência da República, Brasília, 11 jul. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1980-1988/L7209.html>. Acesso em: 10 jul. 2015.

______. Lei nº 7.210, de 11 de Julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Presidência da República, Brasília, 11 jul. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.html>. Acesso em: 06 jul. 2015.

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