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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
ÉRIKA KANETA FERRI
POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
MATO GROSSO DO SUL
CAMPINAS 2015
ÉRIKA KANETA FERRI
POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Ensino e Práticas Culturais.
Orientador(a):Prof. Dra. Maria Helena Salgado Bagnato
O ARQUIVO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA ÉRIKA KANETA FERRI E ORIENTADA PELA PROF. DRA. MARIA HELENA SALGADO BAGNATO
CAMPINAS 2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
TESE DE DOUTORADO
POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
Autor: ÉRIKA KANETA FERRI
COMISSÃO JULGADORA:
Orientadora Profa Dra MARIA HELENA SALGADO BAGNATO
Profa Dra EUNICE ALMEIDA DASILVA
Profa Dra DÉBORA CRISTINA JEFFREY
Prof Dr GERSEM JOSÉ DOS SANTOS LUCIANO
Profa Dra MARIA BEATRIZ ROCHA FERREIRA
A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.
CAMPINAS 2015
Dedico esta pesquisa à população indígena
do estado de Mato Grosso do Sul e em especial aos acadêmicos indígenas, os quais
tive o privilégio de conhecer e conviver.
AGRADECIMENTOS
A Deus !
À Maria Helena, minha orientadora, pela amizade, pela lição de vida, pela gentileza e
doçura. Com sabedoria e discernimento me conduziu nesta trajetória.
À minha família pelo apoio incondicional, pela compreensão da árdua e prazerosa
trajetória de vida do pesquisador. Em especial ao meu marido Alencar e meus filhos Barbara e
Victor.
Às professoras Gisele, Débora, Maria Beatriz pelas contribuições e sugestões durante
a banca de qualificação contribuindo com a trajetória de construção da finalização tese.
Aos professores Eunice, Gersem, Heloisa Helena e Marta por aceitarem a compor a
banca de defesa desta tese.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação Doutorado em Educação da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), que muito colaboram para a construção/
reconstrução da tese.
Aos amigos do grupo de Pesquisa PRAESA, pelo aprendizado contínuo e eterna
amizade. Em especial aos amigos Eunice, Lúcia, Maria Carolina e Marcia pelas colaborações
e acolhimento.
Aos colegas estudantes do Programa de Pós-Graduação Doutorado em Educação da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) pela convivência e amizade.
Aos amigos Jair, Fátima e Silvana pelo apoio em todos os momentos de cansaço,
angústias e desânimo.
À Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado
de Mato Grosso do Sul (FUNDECT) pelo apoio financeiro para o desenvolvimento da
pesquisa.
À Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e aos participantes da pesquisa, pela
contribuição e colaboração na coleta de dados.
À minha amiga Eunice, pela contribuição, pela amizade e pelo apoio.
E a todos aqueles que de alguma forma ou outra colaboraram para a conclusão desta
pesquisa.
Minha Gratidão a todos e todas!
... A universidade é pública, não é lugar de quem? Não é lugar de índio?
Não é lugar de negro? Não é lugar de gay e lésbica?
É lugar de quem? (Àgata)
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos
Capes – Ano e quantidade de publicações – 1992 a 2014 (n. 149)
34
GRÁFICO 2 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Gênero dos textos e Quantidade – 1992 a 2015 (n. 149)
35
GRÁFICO 3 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Áreas de Conhecimento – 1992 a 2015 (n. 149)
36
GRÁFICO 4 Revisão Bibliográfica – Base de dados: Scielo – Gênero e Natureza – Ação Afirmativa – Janeiro 2015
40
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Revisão bibliográfica Periódicos CAPES -Fontes e revistas-janeiro de 2015
37
QUADRO 2 Revisão bibliográfica na base de dados Scielo: descritores Ação Afirmativa, Cotas e Cotas Raciais, janeiro de 2015
38
QUADRO 3 Periódicos na base de dados Scielo: descritor Ação Afirmativa, janeiro de 2015
39
QUADRO 4 Cursos com maior número de acadêmicos indígenas matriculados e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Ano 2013
50
QUADRO 4A Instituições de Educação Superior no Mato Grosso do Sul, por organização acadêmica e categoria – Ano base 2013
103
QUAD
RO 5
Instituições de Educação Superior – Federais e Estaduais – vagas suplementares e cotas para indígenas
109
QUADRO 6 Número total de estudantes matriculados e de cotas nas Universidades Federais-- Ano 2013 -2014
113
QUADRO 7 Número de matriculas na Educação indígena por modalidade e etapa de ensino – Brasil: 2007-2012
118
QUADRO 8 Pessoas indígenas de 10 anos ou mais e de 15 anos ou mais de idade, por localização do domicílio, segundo algumas características educacionais e o sexo Brasil – 2010.
119
QUADRO 9 Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 (um) salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as Grandes Regiões - Brasil – 2010.
120
QUADRO 10 População Indígena - 2012 cadastrada no SIASI por região, UF, Região e Município – Mato Grosso do Sul
121
QUADRO 11 Distribuição da população indígena do estado de Mato Grosso do Sul, por faixa etária – ano 2012
124
QUADRO 12 População indígena por etnia cadastrada no SIASI – Mato Grosso do Sul -2012
125
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 Modelo do processo de implementação das políticas
61
FIGURA 2 Distribuição do Tipo de Reserva de Vagas – Ingressos por Processo Seletivo das IES Públicas – Graduação Presencial – Brasil – 2010
73
FIGURA 3 Taxa de analfabetismo para pessoas indígenas de 10 ou mais anos de idade, segundo Unidade de Federação – 2010
126
FIGURA 4 Mapa do estado de Mato Grosso do Sul
131
FIGURA 5 Localização das Unidades Universitárias da UEMS no estado
132
FIGURA 6 Sede Administrativa Dourados – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
133
FIGURA 7 Organograma da Estrutura Organizacional da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
135
FIGURA 8 Número de Acadêmicos matriculados por etnia no ano de 2008 – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
139
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Evolução do Número de Instituições de Educação Superior por categoria Administrativa- Brasil: 2001-201
72
TABELA 2 Crescimento das instituições de educação superior - Brasil, Região Centro-Oeste e Mato Grosso do Sul - 1991-2004
98
TABELA 3 Crescimento das Instituições de Educação Superior, por categoria administrativa - Mato Grosso do Sul 1991-2004
98
TABELA 4 Vagas oferecidas, ingressantes e percentual de ociosidade nas instituições privadas - Região Centro-Oeste 2004
100
TABELA 5 Número de jovens que poderiam pagar mensalidades nas escolas privadas e número de estudantes matriculados nas IES privadas, em 2004
100
TABELA 6 Presença da cor/raça na sociedade e no campus - Mato Grosso do Sul 2005
101
TABELA 7 População Indígena E Distribuição Percentual Por Localização de Domicílio e Condição de Indígena, segundo as grandes regiões, 2010 – Brasil
116
TABELA 8 Progressão na Oferta de Vagas - UEMS relativo ao ano de ingresso - 2005 a 2013
136
TABELA 9 Número de Ingressantes e Concluintes Negros e Indígenas cotistas da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul entre os anos de 2004 a 2014
137
TABELA 10 Número de bolsas por programas oferecidos na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013
185
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AGRAER Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural APIRR Associação dos Povos Indígenas de Roraima ANAI Associação Nacional de Apoio ao Índio BID Banco Interamericano de Desenvolvimento CAFI Centro Amazônico de Formação Indígena CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEDI Centro Ecumênico de Documentação e Informação CE Câmara de Ensino CEE/MT Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso CEPE/UEMS Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão UEMS CEPPIR/MS Coordenadoria de Políticas Para a Promoção da Igualdade Racial CPI/SP Comissão Pró-Índio de São Paulo CERA Centro de Educação Rural de Aquidauana CIMI Conselho Indigenista Missionário CINEP Centro Indígena de Estudos e Pesquisas CIR Conselho Indígena de Roraima CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico CNEEI Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena COAB Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia
Brasileira COES Comissão de Estágio COUNI Conselho Universitário CTI Centro de Trabalho Indigenista CUIA Comissão Universidade para os Índios DID Divisão de Inclusão e Diversidade DPs Dependências DRA/UEMS Diretoria de Registro Acadêmico/ UEMS EEOC Comissão para a Igualdade de Oportunidade no Emprego EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EUA Estados Unidos da América FIES Fundo de Financiamento estudantil FLASCO Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais FUNAI Fundação Nacional do Índio
FUNASA Fundação Nacional de Saúde FUNDECT Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e
Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação ee
Serviços IES Instituições de Ensino Superior IESPs Instituições de Ensino Superior Públicas IESALC Intercultural e Diversidade Cultural no Ensino Superior na
América Latina e Caribe INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ISA Instituto Socioambiental LACED Laboratório de Pesquisa em Etnicidade, Cultura e
Desenvolvimento LI Licenciatura Intercultural MEC Ministério da Educação NEI-SECD Núcleo de Educação Indígena da Secretaria Estadual de
Educação, Cultura e Desportos NI Núcleo Insikiran de Formação Superior Indígena NEAB Núcleo de estudos Afro-Brasileiros OAB Ordem dos Advogados do Brasil ODIN Observatório de Direitos Indígenas CINEP Centro Indígena de Estudos e Pesquisas OMIR Organização das Mulheres Indígenas de Roraima ONGs Organizações Não Governamentais ONU Organização das Nações Unidas OPAN Operação Anchieta OPIR Organização dos Professores Indígenas de Roraima OUI. Organização Universitária Interamericana PAE Programa de Apoio estudantil PPP Projeto Político Pedagógico PIBIC Programa de Bolsas de Iniciação Científica PIBIC -AF Programa Institucional de Iniciação Científica - PIBIC nas Ações
Afirmativas PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PROEC/UEMS Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Assuntos
Comunitários UEMS PROEIB-Andes Programa de Formación em Educación Intercultural Bilingue
para los Países Andinos
PROUNI Programa Universidade para Todos PUC-São Paulo Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-Goiás Pontifícia Universidade Católica de Goiás PUMC Programa Universitário Nacional e Multicultural PVUI Programa Vale Universidade Indígena, RIF-FOEI Rede Interamericana de Formação de Formadores em Educação
Indígena SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão SAU Sistema Acadêmico da UEMS SEPPIR Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural SPI Serviço de Proteção ao Índio SETAS Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social SISU Sistema de Seleção Unificada TCC Trabalho de Conclusão de Curso TI Terra Indígena UCDB Universidade Católica Dom Bosco UEL Universidade Estadual de Londrina UEMS Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro UFAM Universidade Federal do Amazonas UFGD Universidade Federal da Grande Dourados UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFMS Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFSCAR Universidade Federal de São Carlos UNB Universidade de Brasilia UFPR Universidade Federal do Paraná UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRR Universidade Federal de Roraima UFT Universidade Federal do Tocantins UNAM Universidade Autônoma do México UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura UNI União das Nações Indígenas UNIGRAN Centro Universitário da Grande Dourados UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
URACCA Universidad de las Regiones Autonomas de la Costa Caribe Nicaraguense
USP Universidade de São Paulo
RESUMO
POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR PARA INDÍGENAS: ESTUDO DE CASO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
O estudo teve como objetivo analisar a implementação de política públicas de
Ação Afirmativa para indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
Caracterizou-se como estudo qualitativo, estudo de caso político histórico
organizacional. Para coleta dos dados empíricos, utilizou-se de entrevistas, as quais
foram analisadas numa perspectiva da educação crítica e nos estudos de implementação
de políticas públicas. Os sujeitos da pesquisa foram: Pró-Reitores, Membros da
Comissão de Acompanhamento dos alunos cotistas e coordenadores de cursos com o
maior número de alunos indígenas. Os resultados apontam que os participantes da
pesquisa buscam saídas e alternativas, com ações e atividades, mesmo que pontuais,
como por exemplo: as monitorias, as atividades em grupo, disciplinas e optativa que
contemplem a temática indígena, criação Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em
Educação, Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE, somados as atividades de apoio
desenvolvidas no Projeto de extensão Rede de Saberes. Bem como na projeção de
inseri-los em programas de pós–graduação. Discorrem sobre as dificuldades e desafios
enfrentados, ora afirmando que entre os indígenas há dificuldades de aprendizagem, ora
reiterando que existem barreiras na compreensão do português, especialmente entre
aqueles que têm a língua materna como princípio. Conclui-se que a Política de Ação
Afirmativa na referida IES é inédita, mesmo diante das adversidades, movimentos
contra hegemônicos têm ocorrido na busca por uma educação híbrida e multicultural.
Palavras-chave: Ações afirmativas, Indígenas, Educação superior.
ABSTRACT
PUBLIC POLICIES OF AFFIRMATIVE ACTION IN HIGHER EDUCATION:
THE INCLUSION OF INDIGENOUS PEOPLES IN THE SOUTH MATO
GROSSO STATE UNIVERSITY
The study aimed to analyze the implementation of public policy of affirmative action
for indigenous peoples at the State University of Mato Grosso do Sul. It was
characterized as a qualitative study, study of organizational historic political event. For
collection of empirical data, we used interviews, which were analyzed from the
perspective of critical education and implementation of public policy studies. The
subjects of the research were: Pro-Rectors, members of the Monitoring Committee of
quota students and course coordinators with the largest number of indigenous students.
The results indicate that the survey participants seek outlets and alternatives, actions and
activities, even though point, for example, the tutoring, group activities, disciplines and
elective that address indigenous issues, creation Studies Center, Research and extension
Education, Gender, Race and Ethnicity - CEPEGRE, added support activities developed
in the extension project Knowledge Network. As well as on the projection insert them
into graduate programs. Discuss about the difficulties and challenges faced, sometimes
stating that among the natives there learning difficulties, now reiterating that there are
barriers in understanding the Portuguese, especially among those who have a mother
tongue as a principle. We conclude that the Affirmative Action Policy in that IES is
unprecedented, even in the face of adversity, against hegemonic movements have
occurred in the search for a hybrid and multicultural education.
Keywords: Affirmative action, Indigenous, Higher Education.
SUMÁRIO
CAMINHOS E ESCOLHAS
INTRODUÇÃO.............................................................................................................26
CAPÍTULO I – .............................................................................................................. 31
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA ............................................... 31
CAPÍTULO I – TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA ................... 32
1.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 32
1.1.1 Trajetória metodológica da revisão bibliográfica .......................................... 32
1.1.2 Revisão Bibliográfica Portal Periódicos Capes ............................................. 33
1.1.3 Revisão bibliográfica periódicos Scielo ......................................................... 38
1.1.4 Apontamentos sobre os achados da revisão bibliográfica ............................. 40
1.2 POR ONDE CAMINHAMOS? ...................................................................................... 44
1.3 O CENÁRIO E OS SUJEITOS DA PESQUISA ................................................................. 48
FONTE: ELABORADO PELA AUTORA A PARTIR DOS DADOS DA PRÓ –
REITORIA DE EXTENSÃO E ASSUNTOS COMUNITÁRIOS (UEMS, 2013). . 50
CAPÍTULO II ............................................................................................................... 51
MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS 51
CAPÍTULO II – MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................................................. 52
2.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 52
2.2ANÁLISE DE POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................................... 52
2.3ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS .......................................... 57
CAPÍTULO III – .......................................................................................................... 63
EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE DEMOCRATIZAÇÃO E
ACESSO ........................................................................................................................ 63
CAPÍTULO III – EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE
DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO ............................................................................ 64
3.1 APRESENTAÇÃO ...................................................................................................... 64
3.2 APROXIMAÇÕES: POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR, DEMOCRATIZAÇÃO
E ACESSO ...................................................................................................................... 65
3.3 AÇÃO AFIRMATIVA: ASPECTOS HISTÓRICOS E CONCEITUAIS ................................. 74
3.4 EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO CENÁRIO BRASILEIRO ...................................... 85
3.5 EDUCAÇÃO SUPERIOR NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL ............................... 94
3.6 INDÍGENAS NAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS ..................................................... 105
CAPÍTULO IV ............................................................................................................ 114
POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO
DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E
EDUCACIONAIS ....................................................................................................... 114
CAPÍTULO IV – POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE
MATO GROSSO DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS,
DEMOGRÁFICOS E EDUCACIONAIS ................................................................. 115
4.1 APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 115
4.2 A REALIDADE DAS POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL ....................................... 115
4.3 A REALIDADE DAS POPULAÇÕES INDÍGENAS DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
................................................................................................................................... 121
CAPÍTULO V ............................................................................................................. 128
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A
IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA
PARA INDÍGENAS ................................................................................................... 128
CAPÍTULO V – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A
IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA
PARA INDÍGENAS ................................................................................................... 129
5.1APRESENTAÇÃO .................................................................................................... 129
5.2 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: O LÓCUS ......................... 129
5.3 IMPLEMENTADORES: PERFIL E CONSIDERAÇÕES .................................................. 140
5.4 MARCO MOBILIZADOR: LEI ESTADUAL Nº 2.589, DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, A
UEMS ........................................................................................................................ 144
5.4.1 A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente ..................................... 154
5.4.2 Parcas ações e/ou inexistência de discussões sistemáticas nos cursos ........ 157
5.4.3 Adversidades ................................................................................................. 158
5.4.4 Intolerância e Resistências ........................................................................... 162
5.4.5 Povos que possuem a língua falada como princípio .................................... 165
5.4.6 Os interstícios.... os entre lugares ................................................................. 166
5.4.7 Desafios apontados ....................................................................................... 169
5.4.8 Avaliando a política de Ação Afirmativa ...................................................... 171
5.4.9 Reconhecimento de uma formação elitista ................................................... 172
5.5 PROJETO DE EXTENSÃO REDE DE SABERES: ......................................................... 174
5.6 PROGRAMAS DE APOIO ESTUDANTIL .................................................................... 177
5.6.1 Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) .............................. 179
5.6.2 Programa Vale Universidade Indígena (PVUI) ........................................... 180
5.6.3 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) ............. 184
5.6.4 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) .......... 185
5.6.5 Programa Ciência Sem Fronteiras ............................................................... 186
5.6.6 Serviço de Atendimento Psicológico (SAP) .................................................. 186
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 187
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS* .................................................................... 191
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......................... 217
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................................ 218
ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA
PESQUISA ............................................................................................................... 220
ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA
PESQUISA ................................................................................................................ 221
Entrevista 1 – MCAAC 1/ OCPR ........................................................................... 223
Entrevista 2 – OCPR / CC .................................................................................... 232
Entrevista 3 – OCPR2 ........................................................................................... 238
Entrevista 4 – CC 1 ............................................................................................... 248
Entrevista 5 – PR .................................................................................................. 256
Entrevista 6 – OCC 1r ........................................................................................... 269
Entrevista 7 – OCC 2 ............................................................................................. 274
Entrevista 8 – CC 3 ................................................................................................ 279
Entrevista 9 – CC 4 ................................................................................................ 288
Entrevista 10 – CC 2 .............................................................................................. 291
Entrevista 11 – CC ................................................................................................. 300
Entrevista 12 - MCAAC 2 ...................................................................................... 305
ANEXO 1: ................................................................................................................ 315
LEI ESTADUAL Nº 2.589 DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, COTAS PARA
INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
................................................................................................................................... 315
ANEXO 2: ................................................................................................................ 317
LEI ESTADUAL Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003, COTAS PARA
NEGROS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL . 317
ANEXO 3: ................................................................................................................ 319
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, DE 17 DE JULHO DE 2003 ................... 319
ANEXO 4: ................................................................................................................ 322
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, DE 31 DE JULHO DE 2003 ................... 322
ANEXO 5: ................................................................................................................ 324
RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, DE 30 DE JULHO DE 2004 ..................... 324
ANEXO 6: ................................................................................................................ 336
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, DE 11 DE JUNHO DE 2014. ........................ 336
ANEXO 7 – PARECER COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL NÚMERO 814.869/
2014 ........................................................................................................................... 338
ANEXO 8: ................................................................................................................ 342
PORTARIA NORMATIVA NO 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012 .................. 342
ANEXO 9: ................................................................................................................ 356
LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012 ....................................................... 356
ANEXO 10: .............................................................................................................. 359
RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*) .......................... 359
ANEXO 11: .............................................................................................................. 363
ESTATUTO DO ÍNDIO .......................................................................................... 363
CAMINHOS E ESCOLHAS
...que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balanças, nem barômetros, etc.
Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.
(Manoel de Barros)
Venho do estado de Mato Grosso do Sul, terra de Manoel de Barros, sua poesia
aborda sobre a importância e o encantamento que os fatos de nossa história nos provoca.
O poeta enfoca sobre as “coisas miúdas”, sobre a terra, nos convidando a mergulhar e
nos introjetar nos pequenos espaços, nos entrelaçarmos nas fissuras.... Nos convida a
“desver”.
A partir das leituras e reflexões a cerca da poesia de Manoel de Barros, ao iniciar
uma escrita de uma tese considerei importante que na produção textual sejam
contempladas questões como: de que lugar estou falando? Em que contexto produzo
este texto? Minha trajetória pessoal está intimamente imbricada na minha forma de
pensamento, produção de sentidos e subjetivações.
Procurar memórias e explicações lógicas para minhas escolhas profissionais não
somente é uma viagem ao passado, como também uma passagem melancólica por
minha infância com algumas tribulações e um pensamento já divergente da sociedade
contemporânea. Penso ser válido ressaltar que apareceram várias perguntas em minha
cabeça quando me dispus a recordar, tais como: De onde vim? Por que fiz estas escolhas
e trilhei estes caminhos?
A escolha pelo curso de Pedagogia, no vestibular do ano de 1988, se deu por
conta do encantamento que tenho pelo ensino e pelas possibilidades de atuação no
mercado de trabalho, mas não atuei imediatamente.
Já a escolha pela Enfermagem foi um sonho guardado na gaveta do tempo por
alguns anos. Trabalhando na atenção especializada na dispensação de medicamentos de
alto custo, vivenciei por inúmeras vezes o descaso no trato com os pacientes, o que me
levou à decisão de pedir demissão e cursar Enfermagem.
Fui aprovada no vestibular em 1997; naquele mesmo ano, num projeto de
extensão, fui desenvolver trabalhos nas aldeias de Dourados e me encantei com o que
vi. Lembro-me que em visita ao Hospital Porta da Esperança, na reserva Indígena
Francisco Horta Barbosa, falei ao diretor: vou trabalhar com índios.
Em 2001, após a conclusão da graduação em Enfermagem fui selecionada e
ingressei na FUNASA, hoje SESAI, e passei a trabalhar nas Aldeias de Caarapó, no sul
do estado de Mato Grosso do Sul.
Essa experiência profissional foi deveras marcante e permitiu que eu conhecesse
e reconhecesse as dificuldades que os povos indígenas vivenciavam. Encontrei um
espaço de crescimento profissional e pessoal, e alguns fatos foram extremamente
importantes: o acolhimento da equipe e dos agentes indígenas de saúde, a forma como
fui recebida pelas comunidades, a amizade estabelecida, especialmente com os povos
indígenas.
Como enfermeira, esta convivência me impactou muito, especialmente quando
fui atuar nas comunidades indígenas de Dourados, na Aldeia Bororó, no ano de 2002.
Deparei-me com um quadro de mortalidade infantil considerado um dos mais altos entre
crianças indígenas de 0 a 5 anos da época, se aproximava de 140 por 1.000 nascidos
vivos.
As causas de mortalidade infantil eram: pneumonia, diarreia e desnutrição, ou
seja, doenças evitáveis e relacionadas aos determinantes sociais. O quadro social que
assolava tais comunidades era marcado por condições de moradia precárias, ausência de
saneamento básico e, ainda, pela falta de alimentos. O que fazer diante deste cenário? O
conhecimento adquirido na universidade ajudaria a mudá-lo?
Apesar dos meus questionamentos, nesta equipe de trabalho encontrei um
grande amigo Dr. Zelik Trajber, pediatra de formação e indigenista de coração. Sua
história de vida já revela bastante do seu compromisso com a causa indígena. Quando
ainda era estudante, foi deportado do país, perseguido e torturado, e ficou exilado em
Cuba. Retornou ao Brasil após o fim da ditadura, concluiu a graduação em medicina na
USP e, em 2001, foi convidado a trabalhar em comunidades indígenas do Mato Grosso
do Sul. Esse colega foi extremamente importante para as mudanças de paradigmas em
mim construídas.
Nosso trabalho não se limitou a ações assistenciais, mas incluiu articulações com
diversos setores. Foram inúmeras as vezes que atendi crianças em estágio terminal de
desnutrição severa e, em alguns casos, já em óbito. Era, portanto, necessário pensar em
outros caminhos!
A preocupação maior era garantir que as crianças em risco ou em desnutrição
severa pudessem ser acompanhadas semanalmente e tivessem acesso a alimentos
adequados para a sua idade. Foi assim que, depois de uma reunião exaustiva, nossa
equipe criou o que chamávamos de sopão e pesagem das crianças, que eram grandes
encontros com mulheres e crianças indígenas, acompanhados de uma equipe
multiprofissional (formada por agentes comunitários indígenas, auxiliares de
enfermagem, médico, nutricionista, dentista e vacinadores).
A ideia principal não era oferecer alimentos, mas identificar o que elas
produziam e poderiam incluir na alimentação dos filhos, e dessa forma, conhecermos
quais eram os alimentos que faziam parte da dieta dos guaranis e a forma de preparo dos
mesmos. E a partir disso, junto com as mães produzir a sopa e trabalhar os conceitos dos
alimentos e suas propriedades.
Lembrando que nem todas as famílias indígenas têm a possibilidade de produzir
alimentos, pois, especialmente entre os guaranis, as condições socioeconômicas e de
acesso à terra são muito precárias. É uma reserva de cerca de 14.000 indígenas para uma
área de aproximadamente 3.5000 hectares, na qual existe ainda uma disputa interna
entre as famílias de maior poder.
Diante da necessidade de buscar parcerias, mobilizamos o comércio do
município de Dourados para arrecadar alimentos. Nessa situação, pude perceber e sentir
a discriminação e o preconceito presente nos discursos. Recebemos “não” e “passa
amanhã” por diversas vezes, mas isso não nos desanimava. Depois de muitas discussões
e reivindicações, conseguimos que a administração municipal efetuasse a compra dos
alimentos para o sopão.
Paralelamente a isso, comecei, também, a vivenciar o preconceito dos colegas,
que me dirigiam perguntas como: Por que está fazendo isso? Por que quer trabalhar com
índios? Enfrentei muitos outros estereótipos, que prefiro não descrever.
Posso dizer que essa experiência marcou profundamente minha vida, pois uma
coisa é conhecer a realidade dos povos indígenas por meio dos livros e artigos, outra é
vivenciar a negligência e o descaso com esses povos. Após esta experiência
profissional, tinha uma convicção pessoal e um compromisso de estar nessa luta,
contribuindo nesse embate.
Já enquanto pesquisadora, essa aproximação se deu pela possibilidade de
conhecer a realidade das mulheres da Aldeia Bororó. Os momentos do tereré, das trocas
e conversas informais me tocaram profundamente, pois apesar das dificuldades
relatadas, todas as mulheres indígenas são enfáticas ao afirmarem que priorizam a busca
de um futuro melhor para seus filhos.
A pesquisa também me oportunizou algumas aproximações aos aspectos
antropológicos e conceituais, aspectos estes necessários para melhor entendimento das
formas de vida e de organização social dos povos indígenas.
Mas algumas inquietações ainda estavam presentes: porque só existem não
índios nas equipes de saúde profissionais? E me perguntei: Se somos iguais, por que não
temos as mesmas oportunidades?
Posteriormente, em 2004, ingressei como docente do curso de Enfermagem no
Centro Universitário da Grande Dourados, e em 2007, na Universidade Estadual de
Mato Grosso do Sul (UEMS), onde tenho contato com os acadêmicos indígenas.
Já como docente na universidade, a convivência com os acadêmicos indígenas
permitiu-me acompanhar suas histórias e testemunhar as dificuldades, os sofrimentos, as
desistências, os “silêncios” e o preconceito que eles enfrentam. Tais inquietações e
observações somam-se às discussões pedagógicas e ao acompanhamento da
reformulação do projeto pedagógico do curso, em que temas como a interculturalidade
ou a diversidade étnica sequer são mencionados, especialmente no que diz respeito à
proposta institucional de Ação Afirmativa.
Portanto, minhas inquietações acerca da temática deste estudo se construíram a
partir da minha atuação como enfermeira nas comunidades indígenas do sul do estado
de Mato Grosso do Sul e a minha inserção como docente na Universidade e o convívio
com acadêmicos indígenas nas atividades de ensino, pesquisa e extensão (nas Aldeias
Bororó e Jaguapiru) reafirmaram estas inquietações.
26
INTRODUÇÃO
As inquietações tornaram-se mal-estar, neste sentido, utilizo as palavras da
autora Rolnik (1995):
“É o mal-estar que nos invade quando forças do ambiente em que vivemos (e que são a própria consistência de nossa subjetividade), formam novas combinações, promovendo diferenças de estado sensível em relação aos estados que conhecíamos e nos quais nos situávamos“(p.1).
Minhas inquietações acerca da temática deste estudo se constroem a partir da
atuação enquanto enfermeira nas comunidades indígenas do sul do Estado de Mato
Grosso do Sul e na Universidade através do convívio com acadêmicos indígenas nas
atividades de ensino, extensão (nas Aldeias Bororó e Jaguapiru) e também como
pesquisadora a partir de 2001. Posteriormente, em 2004, iniciei como docente do curso
de Enfermagem do Centro Universitário da Grande Dourados e, em 2007, na
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), onde tenho contato com os
acadêmicos indígenas1.
O desempenho dos papéis de enfermeira e pesquisadora nas reservas indígenas
de Dourados e Caarapó permitiram que eu me aproximasse do modo de vida, de
produção de saúde, da cultura e da forma de organização social de povos indígenas, em
especial dos Guaranis Kaiowás. Povos de uma riqueza cultural2 singular.
A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e o estado de Mato Grosso do
Sul são pioneiros na oferta de cotas para negros e índios, com a proposta institucional de
política de Ação Afirmativa. A política de Ação Afirmativa vai ao encontro das
reivindicações dos movimentos da liderança indígena, indigenistas, movimentos de
1
Optou-se na tese por utilizar o termo indígena, termo aceito por diversos pesquisadores e antropólogos. Indígena: (lat indigena). Pessoa natural de um país em que habita; aborígine; originário ou próprio de um país ou de uma localidade (MICHAELIS, 2008, p. 467). 2 O conceito utilizado de cultura no texto se apoia em Giroux (1992, p. 65), considerada uma forma de produção, especificamente como formas nas quais os seres humanos compreendem suas formas de vida, sentimentos, crenças, pensamento e a sociedade mais ampla.
27
professores indígenas, Organizações Não Governamentais (ONGs) e instituições de
ensino em prol da causa indígena. Em relação aos estudantes indígenas, a política inclui
o desenvolvimento de programas para apoia-los na trajetória acadêmica.
Segundo dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (2012), o estado de
Mato Grosso do Sul concentra a segunda maior população de indígenas do Brasil, de
aproximadamente 70.383 mil pessoas, que enfrentam precárias condições de vida e
possuem indicadores sociais alarmantes. Essa situação possui uma longa trajetória
histórica, que tem como pano de fundo a luta fundiária, pois o estado tem como
principal fonte de renda e desenvolvimento a agricultura e a pecuária, o que provoca
inúmeras tensões entre indígenas e parte da sociedade envolvida.
Nas palavras de Gersem dos Santos Luciano, índio Baniwa, a educação tornou-
se uma das condições e uma das causas da formação da consciência de cidadania. Ela
pode possibilitar o domínio dos códigos básicos estruturantes da sociedade não
indígena, a consequente capacidade de reformulação de estratégias de resistência e de
promoção de culturas, valores e conhecimentos, e a apropriação de outros saberes úteis
e necessários à melhoria das condições de vida (LUCIANO, 2006, p. 165). Nesse
sentido, a educação superior tem sido um dos caminhos que os indígenas procuram para
se apropriarem de outros conhecimentos e saberes e, dessa maneira, viabilizarem a
ocupação de espaços na formulação de estratégias contra hegemônicas.
A educação superior é um espaço de discurso e, como tal, detém o poder porque
produz conhecimento, detendo também parte do controle simbólico, pois controla o
texto, a produção e comercializa esse mesmo conhecimento. Ter acesso à educação,
principalmente a superior, é adquirir formas de empoderamento, é assumir poder, é ter a
possibilidade de ocupar novas posições na divisão social do trabalho, de classes. Saber é
Poder. Discurso é, então, objeto de poder porque o realiza, constrói o poder, conforme
nos aponta Boaventura de Sousa Santos (2009).
Ao longo e a cada momento da história, as instituições, as forças e os processos
estruturados constrangem e interferem todo o tempo nas relações e ações dos sujeitos,
mas, aquelas, simultaneamente, são produzidas, instituídas e estruturadas pela práxis
desses mesmos sujeitos. Dessa forma, os sujeitos são, ao mesmo tempo, produtores e
produtos de relações e instituições que eles mesmos engendram e pelas quais são
engendrados. Cabe, neste caso, estudar profundamente, em toda a complexidade, as
dimensões micro e as suas relações com a estruturada macropolítica.
28
Referindo-me ao autor Dias Sobrinho (2010), instituições e estado são
construídos por seres humanos, carregam as contradições sociais e os diferentes
projetos existenciais e coletivos. Portanto, na implementação e na implantação de uma
política institucional é necessário identificar: que lugares os atores das políticas
ocupam; quais os compromissos numa dada formação social; quais as concepções de
mundo e; o papel que atribuem às políticas referidas.
Um problema de pesquisa supõe a possibilidade de buscar informações a fim de
esclarecê-lo e compreendê-lo. Portanto, não deve ser tratado pelo senso comum ou pela
simples especulação.
Pois,
A fase de formulação, de explicitação do problema de pesquisa, é uma fase crucial em qualquer pesquisa, pois dela dependerão todas as demais decisões, o que significa dizer que a busca de clareza em relação ao problema é fundamental não apenas na elaboração do projeto, mas em todo o processo da pesquisa (LEAL, 2002, p. 237).
Nessa perspectiva, a presente pesquisa permeou as seguintes indagações:
Como a política de Ações Afirmativas está sendo implementada na UEMS?
Quais ações/atividades afirmativas e discussões sistemáticas ou ações
programadas são desenvolvidas nos cursos e IES?
Quais são as concepções dos coordenadores, pró-reitores e membros da
Comissão de Acompanhamento de alunos cotistas sobre a implementação da política de
Ação Afirmativa na IES.
A partir dessas questões a presente tese de doutoramento aborda sobre a
implementação das Políticas de Ações Afirmativas para populações indígenas, numa
indagação de que forma se dá e se deu o processo histórico dos 10 anos de
implementação de tal política sob o olhar dos diversos membros da Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul. Dessa forma, buscou-se identificar e compreender
como circulam os discursos, a compreensão de gestores, pró-reitores, membros de
comissões de acompanhamento de Ações Afirmativas e coordenadores sobre a referida
política. Portanto, o interesse desta tese é investigar sob quais condições tais políticas
funcionam e como estão sendo implementadas.
Destarte, mergulhando na micropolítica proposta pela pesquisa, buscou-se
compreender o movimento dialético e as razões que, em alguns casos usam, globalizam
e, em outros se colocam em oposição.
29
A presente tese tem como objetivo geral analisar a implementação das políticas
públicas de Ações Afirmativas direcionadas aos povos indígenas na Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul, considerando:
O período entre os anos de 2003 a 2014;
Graus e formas da implementação;
Comportamentos dos agentes envolvidos na implementação;
A estrutura de operação envolvendo as dimensões organizacionais, jurídicas,
financeiras e apoio logístico.
Os objetivos específicos são:
Situar as políticas de Ações Afirmativas para indígenas presentes no Brasil e no
estado de Mato Grosso do Sul;
Compreender de que maneira as políticas de Ações Afirmativas são
implementadas pelos diversos segmentos da Universidade (Pró-Reitorias, Membros da
Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas, Coordenadores de Curso,
Conselhos);
Identificar as dificuldades e facilidades no processo de implementação das
políticas de ações afirmativas;
Mapear as Ações/atividades Afirmativas, discussões sistemáticas ou ações
programadas desenvolvidas nos cursos e da IES.
Na abordagem da implementação de políticas educacionais, partimos da
concepção que a educação é entendida como prática social, envolvendo diversos atores:
o educando, o educador e a política institucional. Neste universo é que se tecem as
articulações políticas permeadas e definidas por condições objetivas e subjetivas
Os estudos sobre o processo de implementação de Políticas Públicas são parcos
e na grande maioria se centram nos resultados, ou seja, nas consequências. Os
resultados destes estudos têm demonstrado hiatos entre o que é formulado e o que é
implementado, sendo que, os efeitos alcançados são totalmente distintos dos objetivos e
metas previamente almejados. Nesta assertiva, o estudo da implementação a partir do
“olhar” dos implementadores3 acrescenta uma nova dimensão na análise de Políticas
Públicas, oferece-nos um “ponto de vista”. Colaborando dessa forma, com o debate e o
intercâmbio por meio da análise de dados e informações da experiência da Instituição de
Ensino Superior (IES) pesquisada, que se destaca pelo fato de ser uma das primeiras
IES com a iniciativa da implantação de cotas e da Política de Ação Afirmativa.
3 Implementadores são todos os envolvidos no processo de implementação.
30
Para esse movimento de aproximação e com o intuito de atender aos objetivos
propostos pelo estudo, a tese foi organizada em cinco capítulos.
O primeiro capítulo trata do Percurso Metodológico da Pesquisa, iniciando
com revisão bibliográfica sobre a temática, delineamento metodológico e percurso do
estudo, bem como os sujeitos e o cenário da pesquisa.
O segundo capítulo intitulado Marco Teórico de Análise de Implementação
de Políticas Públicas discorre sobre os principais marcos teóricos de análise de
implementação de políticas públicas que nortearam o pensamento epistemológico da
tese.
O terceiro capítulo trata das Ações Afirmativas: Políticas Públicas para
Inclusão de Indígenas na Educação Superior, buscando elementos para
contextualizar os aspectos históricos conceituais de Ação Afirmativa e a relação com as
políticas públicas de democratização e inclusão de indígenas na educação superior.
O quarto capítulo, aborda as Populações Indígenas do Brasil e do Estado de
Mato Grosso do Sul: Aspectos Socioeconômicos, Demográficos e Escolarização,
contextualiza os aspectos socioeconômicos, demográficos e a escolarização das
populações indígenas do Brasil e, em especial, as idiossincrasias dos povos de Mato
Grosso do Sul,
Já o quinto capítulo Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul: A
Implementação de Políticas Públicas de Ação Afirmativa para Indígenas, aborda o
processo de implementação, a partir da descrição e detalhamento das características da
IES pesquisada, bem como as percepções e narrativas dos implementadores que
permeiam e entrelaçam o processo histórico da implantação das políticas de Ações
Afirmativas da referida política na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
31
CAPÍTULO I –
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA
32
CAPÍTULO I – TRAJETÓRIA METODOLÓGICA DA PESQUISA
1.1 Apresentação
Para atender aos objetivos propostos da pesquisa, organizou-se o presente
capítulo a partir de uma revisão bibliográfica e da definição do marco teórico e
metodológico da pesquisa.
No intuito de subsidiar esta tese, foi realizada uma revisão bibliográfica com o
objetivo de mapear as publicações sobre a temática. Dessa forma, buscou-se identificar
o número de textos encontrados na base de dados eleita, o número de publicações por
ano, gênero, áreas de conhecimento, principais revistas e periódicos.
1.1.1 Trajetória metodológica da revisão bibliográfica
A referida revisão bibliográfica foi realizada em janeiro de 2013 e
revisada/atualizada em janeiro de 2015. Foi feita busca no Portal CAPES – Periódicos
CAPES – e Scielo, e incluíram-se todas as publicações do tipo textos completos e
resumos disponíveis virtualmente, opção esta devido ao acesso à recente publicação
sobre a temática pesquisada.
A busca deu-se por meio de descritores e por assunto; após leitura detalhada, os
resumos foram lançados em planilha Excel e os resultados, descritos em gráficos e
tabelas.
O período escolhido para a busca foi entre os anos de janeiro de 1999 a janeiro
de 2015, período onde começam a se despontar no país as primeiras iniciativas de cotas
e ampliação das políticas de Ações Afirmativas na educação superior no Brasil.
Os descritores utilizados por assunto foram:
“Ação Afirmativa”;
“Indígenas” and “Educação Superior”;
“Indígenas” “Ensino Superior”;
“Indígenas” “Universidade”
“Cotas Raciais”;
“Cotas Sociais”;
“Affirmative actions” “Indigenous”.
33
Foram incluídas na revisão todos os artigos disponíveis com os descritores
“Ação Afirmativa” por se considerar uma temática ainda recente em nosso país e com
escassas publicações.
Para a análise foram considerados os seguintes elementos dos artigos: ano de
publicação, título, palavras-chave e gênero. Considerou-se a abrangência das áreas de
conhecimento, como ciências sociais, educação, psicologia, sociologia, administração,
entre outras, bem como a natureza das pesquisas, como qualitativa, quantitativa e
qualitativa/quantitativa.
1.1.2 Revisão Bibliográfica Portal Periódicos Capes
Na revisão bibliográfica no Portal Periódicos Capes foram encontrados na
primeira busca 221 títulos. Após leitura detalhada dos resumos, selecionaram-se 149
textos. Consideraram-se os textos que tratavam em seus resumos da temática das Ações
Afirmativas no contexto da educação superior com o foco nas cotas raciais e
especificamente indígenas.
Dos 149 textos selecionados entre os anos de 1999 a 2015, identificou-se entre
os anos de 2007 e 2012 um aumento de produção, como ilustra o Gráfico 1 a seguir.
Esse aumento pode estar relacionado à adoção das primeiras experiências de políticas de
cotas e outras formas de inclusão, aumentando o interesse de pesquisadores pela
temática.
34
Grafico 1. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Ano e quantidade de publicações – 1992 a 2014 (n. 149)
Quanto ao gênero, após a leitura dos resumos e seleção dos textos, encontraram-
se: 58 artigos, 39 teses, 31 dissertações, 15 ensaios teóricos, três que não continham
registro, dois dossiês, uma resenha e uma revisão de literatura, como se observa no
Gráfico 2 a seguir.
35
Grafico 2. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Gênero dos textos
e Quantidade - 1992 a 2015 (n. 149)
Há variedade entre as áreas do conhecimento com o maior número de textos,
sendo que a Educação apresentou 69 textos; Ciências Sociais 28; Direito: dez;
Sociologia: nove: Psicologia e a Antropologia oito; Filosofia: três; História e
Administração: dois; Comunicação, Economia, Relações Internacionais e Bioética: um;
e; seis não declararam, conforme se observa no Gráfico 3 a seguir.
36
Gráfico 3. Revisão Bibliográfica – Base de dados: Periódicos Capes – Áreas de Conhecimento – 1992 a 2015 (n. 149)
*Optou-se por manter separado as áreas filosofia e sociologia.
A partir das áreas de conhecimento se observam as possibilidades e diversidade
de integração e perspectivas nos estudos selecionados, o que pode contribuir para uma
visão mais ampla e significativa da temática.
Entre as fontes também havia diversidade de revistas, como podemos observar
no quadro 1, abaixo. Na fonte Banco de Teses e Dissertações foram encontrados 70
textos; a Revista Estudo Feministas e Cadernos de Pesquisa possuía seis artigos;
Educação e Pesquisa, Práxis Educativa e Revista Brasileira de Educação, quatro artigos;
as revistas Australian Aboriginal Studies, Ensaio, Horizontes Antropológicos,
Universitas Humanística e Vértices, possuíam dois artigos, e as demais apresentaram
um artigo cada.
37
Quadro 1: Revisão bibliográfica Periódicos CAPES -Fontes e revistas-janeiro de 2015.
Revistas / Fonte Quantidade Australian Aboriginal Studies 2 Australian Journal of Indigenous Education 1 Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações 70 Cadernos de Pesquisa 6 Cadernos de Saúde Pública 1 Cadernos Pagu 1 Ciências Sociais Unisinos 1 Civitas 1 Desenvolvimento em Questão 1 Educação 1 Educação e Pesquisa 4 Educação Temática Digital 1 Educar em Revista 1 Ensaio 2 Espacio Abierto: Cuaderno Venezolano de Sociología 1 Estudos Avançados 1 Estudos de Sociologia 1 Estudos Econômicos 1 Exame 1 Horizontes Antropológicos 2 Journal of Latin American Studies 1 Latin American Perspectives 1 Latin American Research Review 1 Motricidade 1 Nuances: Estudos sobre Educação, 1 Organizações & Sociedade 1 Práxis Educativa 4 Psicologia & Sociedade 1 Psicologia: Ciência e Profissão, 1 Reflexão & Ação 1 Revista Antípoda 1 Revista Brasileira de Educação 4 Revista Brasileira de Estudos de População 1 Revista Brasileira de Política Internacional 1 Revista de AdministraçãoContemporânea 1 Revista de Cultura e Política: Lua Nova 1 Revista do Centro de Educação UFSM 1 Revista de Estudios Sociales 1 Revista de Filosofia do Direito, do Estado e da Sociedade 1 Revista de História da África e de Estudos da Diáspora Africana: Sankofa 1 Revista Direito e Práxis 1 Revista Espaço do Currículo 1 Revista Estudo Feministas 6 Revista Gestão Universitária na América Latina 1 Revista do Departamento de História e Ciências Sociais- OPSIS 1 Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales 1 Revista Psicología Política 1 Revista Thema 1 Roteiro 1 Semina 1 Tempo Social 1 Tribal College Journal of American Indian Higher Education 1 Universitas Humanística 2 Varia História 1 Vértices 2 World Journal of Education 1
Total 149 Fonte: Periódicos da Capes, atualizado em janeiro de 2015.
38
Elaborado pela autora.
1.1.3 Revisão bibliográfica periódicos Scielo
Encontraram-se 79 artigos que continham as palavras–chave: Ação Afirmativa,
cotas e cotas raciais. Após leitura minuciosa, foram selecionados 26 artigos que
tratavam especificamente sobre o tema das ações afirmativas, e entre os 26 encontrados,
um foi excluído por tratar de tema contrário ao interesse desta pesquisa, como podemos
observar no Quadro 2 a seguir. Entre os 25 incluídos, o ano de publicação variou do ano
de 2002 ao ano de 2014.
Quadro 2: Revisão bibliográfica na base de dados Scielo: descritores Ação Afirmativa, Cotas e Cotas Raciais, janeiro de 2015.
Base de Dados/ Descritores Base de Dados Scielo: Artigos completos
Ação Afirmativa 26
Cotas 46
Cotas Raciais 07
Total 79
Elaborado pela autora
Como se observa no Quadro 3 a seguir, a variedade de periódicos totalizou 17,
entre os quais o mais frequente foi a revista Cadernos de Pesquisa (periódico da
Fundação Carlos Chagas), com cinco textos. Possuíam dois textos as revistas Ensaio:
Avaliação de Políticas Públicas em Educação, Estudos Afro-Asiáticos, Revista
Brasileira de Ciências Sociais e a Revista de Estudos Feministas, e um, Cadernos Pagu,
Educação & Sociedade, Educação e Pesquisa, Estudos Econômicos, Psicologia &
Sociedade, Revista Brasileira de Ciência Política, Revista Brasileira de Educação,
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Revista Brasileira de Política Internacional,
Revista de Administração Mackenzie, Revista de Sociologia e Política, e a Revista
Tempo Social.
39
Quadro 3: Periódicos na base de dados Scielo: descritor Ação Afirmativa, janeiro de 2015.
Periódicos Número de artigos
Cadernos de Pesquisa 05 Cadernos Pagu 01 Educação & Sociedade 01 Educação e Pesquisa 01 Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas em Educação 02 Estudos Afro-Asiáticos 02 Estudos Econômicos 01 Psicologia & Sociedade 01 Revista Brasileira de Ciência Política 01 Revista Brasileira de Ciências Sociais 02 Revista Brasileira de Educação 01 Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos 01 Revista Brasileira de Política Internacional 01 Revista de Administração Mackenzie 01 Revista de Estudos Feministas 02 Revista de Sociologia e Política 01 Tempo Social 01 Total 25
Em relação ao gênero e à natureza, conforme se observa no Gráfico 4 a seguir,
foram identificados entre os 25 textos: 11 artigos, nove ensaios, um estudo de caso, uma
interpretação textual, um relato, uma revisão de literatura e uma análise documental
40
1.1.4 Apontamentos sobre os achados da revisão bibliográfica
Realizar uma revisão bibliográfica exige do leitor vários movimentos: leituras,
releituras, aproximações, afastamentos. Tais movimentos são permeados por
questionamentos, comparações, inquietações e refutações.
Foi possível identificar vários pesquisadores que se destacam na temática e
trazem contribuições com suas pesquisas, mas aqui citaremos apenas alguns estudos, os
quais foram considerados relevantes e com relação direta a temática proposta. Os
demais estudos levantados permeiam e se entrelaçam na tese, ora no aporte teórico, ora
no aporte metodológico, ora nas definições epistemológicas e ora nas discussões dos
achados da pesquisa.
Entre os estudos destaco a autora Moehlecke, que ano de 2000 mapeou as
propostas de Ações Afirmativas voltadas à população negra no Brasil, levantou questões
sobre os embates e conquistas do movimento negro e realizou levantamento dos
41
aspectos conceituais e históricos no cenário americano e brasileiro. Em 2002 publicou o
artigo “Ação Afirmativa: história e debates no Brasil”, no qual abordou a legalidade e
abrangência das Ações Afirmativas, a discriminação e a garantia de direito. Já em sua
tese de doutoramento, em 2004, apresentou as teorias norte-americanas e brasileiras
sobre políticas de Ações Afirmativas e confrontou com as percepções observadas entre
estudantes da Universidade de São Paulo (USP).
Silvério (2002), por sua vez, faz uma abordagem sobre racismo e os
fundamentos jurídicos da igualdade de oportunidades.
Entre os textos encontrados há aqueles que tratam das experiências das IES
pioneiras nas Ações Afirmativas, por exemplo, o caso da Universidade de Brasília
(UNB), abordado em artigo do autor Sansone (2005).
No que se refere ao estado de Mato Grosso do Sul, destaca-se o artigo produzido
por Valente (2005), que realizou atividade de pesquisa em Campo Grande (MS) e Belo
Horizonte (MG), com o foco nas relações entre Ação Afirmativa, relações raciais e
educação básica.
Ainda sobre o estado de Mato Grosso do Sul, no ano 2006 as autoras Bittar e
Almeida publicaram o artigo intitulado “Mitos e controvérsias sobre a política de cotas
para negros na educação superior”, cujo objetivo foi analisar o processo de implantação
das cotas na referida IES a partir das perspectivas dos acadêmicos negros da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
Em relação a outras experiências, o estudo da autora Silva (2006) consistiu em
uma descrição e comparação de Ações Afirmativas na educação superior no Brasil e na
África. Participaram da pesquisa IES brasileiras e africanas que na época haviam
implantado cotas, e funcionários do governo federal e estadual.
Guarnieri e Melo-Silva em 2007, abordaram as produções brasileiras sobre a
temática das Ações Afirmativas entre os anos de 2002 a 2007 e identificaram três
características: (a) dicotomia entre artigos a favor ou contra as medidas; (b)
enriquecimento do debate sobre “diversidade”; e (c) visualização dialética, mais
integrada e reflexiva.
Outro estudo comparativo entre Estados Unidos e Brasil sobre Ações
Afirmativas foi realizado por Oliven (2007). O autor comparou a sociedade brasileira e
a norte-americana no que diz respeito a relações raciais e formação da elite. Apresentou
também argumentos a favor e contra cotas na seleção para universidades nos dois países
(p. 29).
42
A mesma autora em 2009 no artigo intitulado “Ações Afirmativas na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul e o seu significado simbólico” trouxe a
experiência e o significado simbólico da implementação das Ações Afirmativas na
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Naquele mesmo ano a autora Moehlecke publicou o artigo “As políticas de
diversidade na educação no governo Lula”, no qual analisou como o Ministério da
Educação durante o governo Lula, em sua primeira gestão (2003-2006), se posicionou
diante da questão da diversidade. Apontando que:
[...] apesar de as chamadas “políticas de diversidade” terem alcançado maior grau de institucionalização no governo Lula, as concepções que norteiam suas ações ainda são muito díspares e apropriadas de forma fragmentada pelas secretarias (MOEHLECKE, 2009,p.461)
Já o artigo de autoria de Oliveira (2009) traz o enfoque da Ação Afirmativa
como medida de justiça corretiva, de reconhecimento e auto respeito.
Com o foco nas desigualdades sociais e na relação com a desigualdade racial,
Teixeira (2008) faz uma discussão em torno das políticas de Ações Afirmativas como
forma de combater a desigualdade racial.
No ano de 2010, o artigo de Matta fez uma análise da implantação de cotas para
negros na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, comparando com
um estudo realizado na Universidade Federal Fluminense.
Com o mesmo enfoque as autoras Winther e Golgher (2010) realizaram
investigação sobre a aplicação de bônus adicional como política de Ação Afirmativa na
Universidade Federal de Minas Gerais.
Sobre experiências de outras IES, o autor Tragtenberg (2011) descreve o
Programa de Ações Afirmativas da Universidade Federal de Santa Catarina implantado
no ano de 2007. O que se destaca no texto é a abordagem do indígena, mas de forma
bastante breve e sem maiores detalhamentos, fazendo alusão somente ao número de
inscritos no vestibular e matriculados.
Na pesquisa de doutoramento a autora Furtado (2011) descreveu a representação
de professores e discentes sobre a inclusão de negros na Universidade Federal do Rio de
Janeiro por meio das cotas.
Cruz (2011) desenvolveu pesquisa de doutorado cujo objetivo foi investigar
como a Universidade Federal do Maranhão utilizam sistema de cotas para negros, bem
como identificar as concepções sobre políticas de Ação Afirmativa por parte dos
43
gestores, apreender o sentido político do sistema de cotas e averiguar se a ideologia da
meritocracia tem ressonância nos rendimentos acadêmicos.
Orientado por Munanga, precursor no Brasil nas publicações sobre relações
raciais e ações afirmativas, a pesquisa de Cruz (2011) enfocou a igualdade e a Ação
Afirmativa a partir dos princípios jurídicos.
No que se refere à implementação, no ano de 2011 a autora Melo realizou um
estudo cujo objetivo foi analisar o processo de implementação das cotas raciais nos
cursos de graduação da Universidade Federal do Pará.
No ano de 2012, Santos discutiu o conjunto de relações políticas institucionais
entre movimentos negros no Brasil e Colômbia entre os anos de 1991-2006 numa
perspectiva comparada.
Naquele mesmo ano Aranha et al fizeram uma análise do impacto da adoção do
programa de bônus no processo de seleção da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG) sob a perspectiva da inclusão racial, da educação pregressa e da faixa de renda.
Ainda no ano de 2012, autora Silva realizou pesquisa com o objetivo de analisar
as dissertações defendidas em Universidades Federais de 2001 a 2011 com o foco nas
ações afirmativas. Tendo analisado 22 dissertações, os resultados apontaram que:
[...] foram identificados os conceitos de Ações Afirmativas presentes nas dissertações, o argumento da justiça social conjugado com o argumento da reparação ocorreu em mais da metade das dissertações e também foi identificado temas como “Ações Afirmativas e democratização do acesso”, “comparações entre cotistas e não cotistas”, “contexto das ações afirmativas” e “trajetória de vida”(SILVA, 2012, p.7).
Em relação à UEMS, em 2013 o artigo “Ações Afirmativas na Universidade
Estadual do Mato Grosso do Sul: uma análise dos efeitos para as identidades negras”, de
autoria de Santana e Backes, analisou os efeitos da educação superior nas identidades
dos negros da referida IES.
No que se refere à inserção de indígenas na educação superior, a pesquisa de Paz
(2013) analisa os aspectos significativos das itinerâncias do grupo multiétnico de
estudantes indígenas ingressos nos cursos de graduação da Universidade de Brasília por
meio do Convênio de Cooperação FUB/FUNAI 001/2004.
Na temática das Ações Afirmativas o autor Sito (2014) analisa dois manifestos
que foram entregues ao Congresso Nacional, no ano de 2006, por intelectuais brasileiros
que se posicionaram publicamente em relação à política de cotas. Na análise, o autor
44
mostra que o conceito de “ações afirmativas” se mostrou em disputa: de um lado, é
tomado como uma medida racialista e desigual; de outro, é entendido como uma medida
de desconstrução do racismo.
Após a revisão e exaustiva leitura dos artigos, observa-se que a grande maioria
das publicações está centrada na temática do negro, cota racial para negros, racismo e
preconceito. Dentro da temática das políticas públicas de Ações Afirmativas no ensino
superior a maioria dos estudos se centram nos negros.
As leituras nos apontam que ainda são parcas as publicações específicas sobre
Ações Afirmativas para indígenas na educação superior. No entanto, mesmo com uma
visão em alguns momentos periférica e específica de algumas IES e grupos indígenas do
país, os estudos me permitiram aproximações significativas com a temática.
1.2 Por onde caminhamos?
O presente estudo se configura como descritivo e analítico, aplicando-se a
análise documental e bibliográfica de um caso concreto. Assume uma perspectiva
político-cultural e possui caráter qualitativo. Caracteriza-se como um estudo de caso,
numa perspectiva político organizacional, ou seja, o interesse do pesquisador recai
sobre a vida de uma instituição (GIL, 2006).
Um estudo de caso consiste na triangulação de pessoas, eventos e circunstâncias. Apresentando em forma de história um tema relacionado a uma política pública acompanhada por informações contextuais e de fundo. É uma forma estruturada para compartilhar experiências, revelar desafios e oportunidades com as quais uma organização se depara e comunica lições aprendidas e práticas pioneiras que podem auxiliar outras em situações similares (GRAHAM, 2010, p. 27).
Os princípios éticos atenderam às exigências da Resolução 196/1996 e da
Resolução nº 304/2000 (BRASIL, 2002). Esta resolução incorpora:
Sob a ótica do indivíduo e das coletividades os quatro referenciais básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça, entre outros, e visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado (BRASIL, 2002, p. 1).
45
A pesquisa somente ocorreu após autorização da Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul, consubstanciado no parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa
da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul sob número 814.869/ 2014 (ANEXO
7), bem como do consentimento e assinatura do entrevistado do Termo de
Consentimento Livre Esclarecido (APÊNDICE 1).
Inicialmente foi realizada busca dos textos e legislações institucionais que
contemplassem a política de Ações Afirmativas da Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul, com o intuito de nos aproximarmos dos documentos oficiais que
abordassem a temática. A análise documental favorece a observação do processo de
maturação ou de evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos,
comportamentos, mentalidades, práticas, entre outros (CELLARD, 2008).
Dessa forma, a análise documental apoiou-se em documentos tais como:
Ø Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002 (ANEXO 1);
Ø Lei Estadual nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003 (ANEXO 2);
Ø Resolução COUNI-UEMS nº 241, de 17 de julho de 2003 (ANEXO 3);
Ø Resolução COUNI-UEMS nº 250, de 31 de julho de 2003 (ANEXO 4);
Ø Resolução CEPE-UEMS nº 430, de 30 de julho de 2004 (ANEXO 5);
Ø Resolução COUNI-UEMS nº 437, de 11 de Junho de 2014 (ANEXO 6);
Ø Relatório Físico Financeiro ano 2014-2018;
Ø Projeto de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2012- 2014.
Optou-se por analisar a implementação de políticas de Ações Afirmativas para
indígenas na UEMS por meio do modelo empírico utilizado pela equipe do Núcleo de
Estudos em Políticas Públicas da Unicamp (NEEP/Unicamp) (1995) apud Rus Perez
(2010, p. 71), que inclui as seguintes dimensões:
Primeira dimensão: Trata das relações entre o desenho ou a formulação da política, de um lado, e o formato que os programas adquirem no final do processo, de outro;
Segunda dimensão: A dimensão temporal do processo e seus efeitos diferenciados no tempo sobre a organização em que se processam, sobre os atores que implementam (resistências e adesões) e as modificações das condições iniciais;
Terceira dimensão: Refere-se às condições que propiciam ou entravam o processo de implementação.
46
Utilizaram-se como descrição de “implementadores” da política de Ação
Afirmativa os funcionários da IES que cumprem ou cumpriram funções administrativas
e pedagógicas. Entre eles: coordenador de curso no momento, membros da Comissão de
Acompanhamento dos acadêmicos indígenas e Pró-Reitores de ensino e extensão.
Para nos aproximarmos das percepções dos implementadores, optou-se pela
entrevista e utilizou-se como instrumento de coleta de informações o roteiro
semiestruturado (APÊNDICE 2). Segundo Minayo, a entrevista (2010)
[...] é utilizada como fonte de informação, fornece dados secundários e primários, referentes a fatos, ideias, crenças, maneira de pensar, opiniões, sentimentos, maneiras de sentir, maneiras de atuar, conduta ou comportamento presente ou futuro, razões conscientes ou inconscientes de determinadas crenças, sentimentos, maneira de atuar ou comportamentos (p.262).
Após contato pessoal e explanação dos objetivos da pesquisa, as entrevistas
foram agendadas, gravadas e transcritas na íntegra, com a utilização de gravador iPad e
armazenadas em Drive.
Os discursos produzidos a partir das entrevistas foram analisados à luz da
Educação Crítica, utilizando como referência autores como Henry Giroux (1992, 1997,
2003), Luis Armando Gandin (2002), Michael Apple (2006, 2008, 2011) e João
Paraskeva (2001, 2002, 2005). Dentro da perspectiva da educação como prática social,
foram realizadas aproximações e buscou-se compreender a maneira como as políticas de
Ações Afirmativas foram implementadas na IES, a partir do olhar dos coordenadores,
professores, membros da comissão de acompanhamento de alunos cotistas e Pró-
Reitores.
A Educação Crítica, na corrente do pensamento crítico, traz à tona a reflexão sobre o caráter político da educação, desvelando referenciais epistemológicos, filosóficos, políticos e pedagógicos que orientam as práticas sociais e que, por isso, não são referenciais neutros e, consequentemente, tais práticas também não são neutras (SILVA, 2011, p.8)
Apple et al (2011) em sua obra “Educação crítica: análise internacional”
afirmam que estudos educacionais críticos envolvem muito mais do que a
problematização das relações de poder e das desigualdades sociais, pressupõem um
47
enfrentamento radical dessas questões, o que estabelece um compromisso individual
(político) com a transformação social.
Nessa ótica, ao desenvolver estudos sobre instituições de ensino, Apple (2006)
reitera que “as escolas têm uma história e estão conectadas, por meio de suas práticas
diárias, a outras instituições poderosas de um modo frequentemente oculto e complexo
(p.102)”. Portanto, “[...] a história e essas conexões precisam ser entendidas para que
saibamos das reais possibilidades de nossas ações sobre as escolas (p.102)”.
As escolas, nesse sentido, são esferas democráticas, portanto, é imperativo
entender os papéis contraditórios que os intelectuais transformadores (os educadores)
ocupam nos vários níveis do sistema escolar (GIROUX, 1992, p. 39).
Enquanto intelectual transformador, os pesquisadores podem desvelar as formas
tanto positivas quanto negativas, do funcionamento do poder na escola; nesse sentido o
poder é
[...] considerado como uma força dialética, cujo modo de operação não são apenas repressivos. Em outras palavras, a dominação nunca é tão complexa que o poder seja experienciado exclusivamente como uma força negativa. Ao contrário, o poder é a base de todas as formas de comportamento, por meio das quais as pessoas resistem e lutam por sua concepção de um mundo melhor (GIROUX, 1992, p. 39).
Dessa forma, Giroux nos recomenda que é essencial compreender as formas
contraditórias que o poder assume ao se manifestar na escola.
Nos primeiros momentos de agendamento e contatos nos diversos setores da
universidade para a realização das entrevistas, algumas resistências e conflitos
apareceram, esbarrei em questionamentos sobre as mudanças ocorridas no setor de
apoio ao estudante da atual administração. Além de dificuldades de agendar horários
para as entrevistas devido agenda de compromissos dos entrevistados.
Também é importante esclarecer que, mesmo com todos os cuidados no que se
refere aos aspectos éticos, há sempre que se considerar e se reconhecer que nenhuma
pesquisa é neutra. Minhas inquietações permearam os cenários e questionamentos,
imbricados pela minha experiência e vivência pessoal. Os paradigmas do pesquisador se
mesclam na pesquisa, sempre guiada por seu conjunto de pensamentos, crenças em
relação ao “outro” e ao “mundo”.
O período do estudo compreendeu os anos de 2003 a 2014, período posterior à
data da publicação da Lei de cotas para negros e índios na IES estudada e também
48
período do governo no qual se dá a ampliação das políticas de Ações Afirmativas na
educação superior no Brasil.
1.3 O cenário e os sujeitos da pesquisa
A pesquisa foi realizada na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, com
sede administrativa no município de Dourados, localizada à rodovia Dourados-Itahum,
Km 12, Cidade Universitária de Dourados, Caixa Postal 351 e nas unidades
universitárias localizadas nas cidades de Aquidauana, Amambai, Campo Grande e
Maracaju.
Inicialmente, os questionamentos sobre os sujeitos da pesquisa centraram-se em
identificar quais foram e são os sujeitos que participaram ou participam da
implementação das políticas de Ações Afirmativas na UEMS e também quais os cursos
que agregam o maior número de acadêmicos indígenas.
A partir da estrutura administrativa e também do processo histórico da UEMS no
decorrer da última década, foi considerado relevante incluir sujeitos com mais de 10
anos na IES, que estiveram ou estão no cargo de Pró-Reitor de Extensão e Assuntos
Comunitários, Pró-Reitor de Ensino, Membros da Comissão de Acompanhamento das
Ações Afirmativas e também coordenadores de cursos com maior número de
acadêmicos indígenas.
Conforme verificado junto à Secretaria Acadêmica da IES, a Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul conta com 56 cursos de graduação, sendo 39 com
presença de acadêmicos indígenas, conforme se observa no Quadro 4, a seguir.Do total
de 39 cursos com presença de acadêmicos indígenas, foram incluídos na pesquisa os
respectivos coordenadores de cursos com 10 alunos ou mais regularmente matriculados:
• Direito - Município sede Dourados;
• Letras, habilitação português/espanhol e suas literaturas - Município sede
Campo Grande;
• Enfermagem- Município sede Dourados;
• Engenharia Florestal - Município sede Aquidauana;
• Geografia - Município sede Campo Grande;
• História - Município sede Amambai;
• Licenciatura em Letras - Município sede Dourados;
• Pedagogia - Município sede Campo Grande;
49
• Pedagogia - Município sede Maracaju;
• Pedagogia - Município sede Dourados;
• Zootecnia - Município sede Aquidauana.
Além dos Coordenadores de Cursos, foram incluídos na pesquisa membros da
comissão de acompanhamento de alunos indígenas, bem como professores que se
encontravam e se encontram nos cargos de Pró-Reitor de Ensino e Extensão e Assuntos
Comunitários.
Para preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa foram utilizados codinomes,
cujo critério de escolha foram cargos e funções ocupadas durante o processo de
implementação das Ações Afirmativas na IES pesquisada, bem como os cargos e
funções ocupadas durante a fase da coleta de dados. Assim, foram descritos como:
Membro da Comissão de Acompanhamento de Alunos Cotistas: MCAAC 1; Ocupou
cargos de Pró-Reitorias (OCPR); Coordenadores de Curso (CC); Pró- Reitor (PR) PR;
Ocupou cargo de Coordenador (OCC).
50
Quadro 4: Cursos com maior número de acadêmicos indígenas matriculados e da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Ano 2013.
Curso / Sede do Curso Quantidade de Alunos indígenas
Administração (Maracaju) 8 Agronomia (Aquidauana) 8 Artes Cênicas e Dança (Campo Grande) 8 Ciências Biológicas (Dourados) 8 Ciências Sociais (Amambai) 9 Direito(Dourados) 17 Letras, habilitação português/espanhol e suas literaturas (Campo Grande) 14 Enfermagem (Dourados) 11 Engenharia Florestal (Aquidauana) 11 Geografia (Campo Grande) 10 História (Amambai) 16 Letras, habilitação português/inglês e suas literaturas (Campo Grande) 9 Licenciatura em Letras (Dourados) 23 Licenciatura em Letras (Jardim) 6 Pedagogia (Campo Grande) 10 Pedagogia (Maracaju) 17 Pedagogia (Dourados) 10 Sistema de informação (Dourados) 8 Tecnologia em Agroecologia (Glória deDourados) 6 Tecnologia em Produção Sucroalcooleira (Glória deDourados) 6 Turismo (Campo Grande) 6 Zootecnia (Aquidauana) 10
Fonte: Elaborado pela autora a partir dos dados da pró – reitoria de extensão e assuntos comunitários (UEMS, 2013).
51
CAPÍTULO II MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS
PÚBLICAS
52
CAPÍTULO II – MARCO DE ANÁLISE DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
2.1 Apresentação “Notei que descobrir novos lados de uma palavra era o mesmo que descobrir novos lados do Ser.”
(BAKHTINE, 1970, p. 263)
Deleuze recomenda-nos a não mais adotar o pensamento de um filósofo e/ou
cientista como doutrina, mas tomá-lo como uma máquina conceitual construída para
resolver problemas que enfrentamos e façam sentido aos pesquisadores
(FEUERWERKER, 2014, p. 18).
Neste aspecto, nos apoiaremos em marcos teóricos selecionados descritos a
seguir, considerando que os mesmos são importantes para uma análise das políticas de
ações afirmativas, pois permitem uma reflexão sobre a própria lei e os dispositivos que
esta tem para o alcance de seus objetivos, bem como os desdobramentos que se dão
junto ao processo político, correlacionando aspectos da macropolítica com a
micropolítica.
Nessa perspectiva, para este estudo de análise de políticas públicas nos
ampararemos em pesquisadores brasileiros das ciências políticas e educacionais que
dialogam com teóricos internacionais e, em suas pesquisas, fazem a conexão com a
realidade brasileira. Entre eles destacamos: Azevedo (1997), Marques (1997), Frey
(2000), Muller & Surel (2002), Silva e Melo (2006), Souza (2006), Arretche (2007),
Costa e Alves (2009), Rus Perez (2007, 2010), Gomes (2012).Também nos apoiaremos
em pesquisadores internacionais como: Bobbio, Matteucci & Pasquino (1992), Van
Meter e Van Horn (1996), Sabatier & Mazmanian (1996), Aguilar Villanueva (1996 a e
b), Berman (1996), Elder e Cobb (1996), Dror (2003), Garson (2003).
2.2Análise de Políticas Públicas
Partimos do conceito de que a análise de políticas públicas pode ser definida
como “exame da engenharia institucional e dos traços constitutivos de um programa.
Busca reconstituir suas diversas características, apreendê-las de forma coerente e
compreensível”(ARRETCHE, 2007, p. 30).
Para iniciarmos essa discussão, é necessário nos aproximarmos dos conceitos
teóricos de política pública, definida como “tudo o que o governo decide fazer ou não
53
fazer”, sendo um constructo social (conjunto de medidas a se atingir), mas também um
constructo de pesquisa (trabalho de análise e reconstrução dos objetivos da ação
pública) (MULLER & SUREL, 2002).
Nas palavras de Azevedo (1997), política pública corresponde ao “Estado em
ação”, e pode ser determinada a partir de uma situação expressa pela sociedade, ao qual
exige atuação do Estado. Configurando dessa forma, a articulação entre estado e
sociedade.
As aproximações da definição de política na literatura são de dois tipos:
descritiva e teórica:
Na construção da definição descritiva, o debate centra-se em saber se a política é só nem sobretudo a decisão (do governo) ou implica algo mais. Na construção teórica, as posições variam de acordo com a teoria de ciência política maior que adere ou como pressupostos básicos com os quais as ocorrências da política são explicadas (AGUILAR VILLANUEVA, 1996a, p. 21)4.
Apoiamo-nos nas contribuições de pesquisadores como Wildavsky, que propõe
que “a análise deve ser um esforço sistemático para encontrar um equilíbrio entre o
mundo rigoroso e pensativo de teoria [...] e o mundo mais desordenado e espontâneo da
ação social e do processo político”5. Dessa forma, entende-se a política como um curso
de ação integrada por decisões interdependentes e complementares (AGUILAR
VILLANUEVA, 1996b, p.78, p.18).
Neste sentido,
Há que se elaborar uma análise que pode ser convincente para aqueles que estão interessados em resolver um problema, mas não porque ela foi feita para atender os desejos, preconceitos e gostos dos autores ou dos governantes. É uma atividade de educação pública convincente, que contraria erros e desvios de decisões públicas passadas induz mudanças nos desejos e percepções, expectativas e instrumentos de cidadania e governo. Portanto, uma análise que pode transformar as relações sociais, instituições, padrões culturais (AGUILAR VILLANUEVA, 1996a, p. 83)6.
4 Tradução da autora. 5 Tradução da autora. 6 Tradução da autora.
54
Com o objetivo de promover aproximações teóricas entre as análises de políticas
públicas, a seguir serão apresentados de forma sintética a contextualização dos
principais conceitos, primeiros estudos e os pesquisadores da temática.
O termo política deriva do adjetivo grego polis (politikos) e diz respeito a tudo o
que se refere à cidade, ao público, ao civil e, inclusive, ao que é sociável e social
(BOBBIO, MATTEUCCI & PASQUINO, 1992). Os verbetes trazidos pelo dicionário
online Aurélio esclarecem que a política é “Ciência do governo dos povos”, “Direção de
um Estado e determinação das formas de sua organização”, “Conjunto dos negócios de
Estado”, maneira de os “conduzir”, “Maneira hábil de agir; astúcia; civilidade”,
“Ciência política, ramo das ciências sociais que trata do governo e da organização dos
Estados” .
Muller e Surel (2002) definem política pública como “tudo o que o governo
decide fazer ou não fazer”, sendo um constructo social (conjunto de medidas a se
atingir), mas também um constructo de pesquisa (trabalho de análise e reconstrução dos
objetivos da ação pública). Nas palavras de Azevedo (1997), trata-se do “Estado em
ação”, e pode ser determinada a partir de uma situação expressa pela sociedade, a qual
exige atuação do Estado. Configurando dessa forma a articulação entre Estado e
sociedade.
O autor Aguilar Villanueva (1996a) afirma que as aproximações da definição de
política na literatura são de dois tipos, descritiva e teórica:
Na construção da definição descritiva, o debate centra-se em saber se a política é só nem sobretudo a decisão (do governo) ou implica algo mais. Na construção teórica, as posições variam de acordo com a teoria de ciência política maior que adere ou como pressupostos básicos com os quais a ocorrência da política explicada (p. 21)7.
No que se refere aos aspectos históricos, os primeiros estudos sistemáticos de
análise de políticas públicas se deram nos Estados Unidos, por volta dos anos 1950, e
posteriormente nos anos 1970, na Europa. São considerados como fundadores os
autores H. Lasswell, H. Simon, C. Lindblom e D. Easton (SOUZA, 2006).
Já no Brasil, os estudos são mais recentes, a partir da década de 90, e voltados
para a implementação das políticas. Rus Perez (2010, p. 2) afirma que os fatores que
contribuíram para esse cenário podem estar relacionados:
7 Tradução da autora.
55
A consolidação democrática, o ajuste econômico e consequente redução dos recursos para a área social, as maiores exigências impostas pelos órgãos financiadores, especialmente internacionais, em relação ao controle de gastos e resultados etc. Uma dinâmica de racionalização, que incluiu a observância dos critérios de eficácia, efetividade e eficiência na utilização dos recursos financeiros, e uma preocupação crescente com ccountability passaram a envolver a gestão pública brasileira (RUS PEREZ, 2010, p. 2).
Harold D. Lasswell, considerado fundador da ciência política, afirma que as
ciências políticas devem tratar dos problemas fundamentais do homem em sociedade,
numa perspectiva global, enfatizava o contexto histórico da política, o estudo das
mudanças, difusão, invenção e revolução. Em sua obra The Policy Sciences (1951) o
autor inseriu problemas e conflitos sociais, e se preocupou com as dificuldades
metodológicas sobre políticas, sem descuidar dos fatores contextuais. Trouxe inovações
paradigmáticas como a ruptura das fronteiras tradicionais entre ciências sociais e as
ciências administrativas, a dimensão histórica das ciências políticas e o compromisso
com o conhecimento tácito e da experiência vivida (DROR, 2003; GARSON, 2003).
Frey (2000) afirma que a ciência política diferencia políticas em três dimensões,
observando que tais dimensões são entrelaçadas e mutuamente influenciadas, aspectos
importantes para a policy analysis:
• A dimensão institucional – polity (sistema jurídico e estrutura
institucional);
• No quadro processual – politics (processo político);
• A dimensão material – policy (conteúdos concretos, ou seja, o conteúdo
material das decisões políticas).
Nesse enfoque o autor reforça que é importante que as policy analysis sejam
inovadoras e incluam dimensões do conteúdo, do processo e da estrutura, com
abordagens combinadas com categorias de abordagens que atendam às especificidades
do Brasil.
Em relação à formação de agenda, Elder e Cobb, em Aguilar Villanueva (1996b,
p. 77), definem que é “O processo através do qual determinados problemas ou questões
chamam a atenção séria e ativa do governo como potenciais questões de política
pública”8. O autor Aguilar Villanueva (1996b, p. 24) indaga: “O que realmente faz uma
questão social e emissão pública circunscrita torna-se temas da agenda do governo?”9.
8 Tradução da autora. 9 Tradução da autora.
56
Os autores chamam a atenção para o papel dos atores nesse processo: “A arena
pública não é um campo em que todo o jogo tem as mesmas regras; alguns têm mais
acesso do que os outros e também exercem maior poder de moldar a definição de
problemas públicos”10 (GUSFIELD, 1981 apud ELDER; COBB, 1996, p. 84).
A perspectiva neoinstitucionalista11reconhece que o Estado, assim como as
demais instituições, “influenciam diretamente a cultura política, a estratégia dos atores e
a produção da própria agenda de questões a ser objeto de políticas, enquadrando a luta
política através das suas instituições” (MARQUES, 1997, p. 81).
O aumento de demanda por este ou aquele tema, ou seja, o fato de um tema ou
uma questão entrar na pauta da agenda de governo é determinado por vários fatores,
entre eles o impacto na sociedade envolvida no tema e os movimentos sociais
envolvidos. A presença de certos atores em posições estratégicas parece ser, de fato,
essencial para influenciar a definição da agenda e mesmo apontar tendências de ação do
governo.
Desta forma, a formação da agenda determina ou permite compreender que as
tomadas de decisão dependem de uma conjuntura política que dê subsídio para que as
políticas sejam elaboradas (COSTA; ALVES, 2009, p. 2).
O início de toda e qualquer política pública atravessa um momento inaugural,
uma etapa de representação de uma perspectiva que se abre à sociedade, denominada
implantação. Depois dessa etapa inaugural, ganha destaque a capacidade política de
execução de um plano, a estruturação de um projeto que leve à sua prática por meio de
providências concretas; essa etapa é denominada implementação (GOMES, 2012, p.
26).
10 Tradução da autora. 11 Para Frey (2000), o neoinstitucionalismo remete não somente às limitações de racionalidade do processo de decisão como consequência de uma falta ou de um excesso de informações , mas salienta a existência de regras gerais e entendimentos fundamentais que prevalecem em cada sociedade e que exerceriam uma influência decisiva sobre as interpretações e o próprio agir das pessoas. Isso significa que os atores políticos e sociais agem não somente de acordo com os seus interesses pessoais.
57
2.3Análise de implementação de políticas públicas
A implementação de políticas públicas apresenta várias definições na literatura,
entre elas:
“[...] A implementação de políticas que abrange as ações realizadas por indivíduos (ou grupos), públicas e privadas, com vista a atingir os objetivos previamente determinados”12 (VAN METER e VAN HORN, 1996, p. 99).
“[...] A implementação está em conformidade com a decisão da autoridade .... A análise de implementação é o estudo das condições em que as decisões da autoridade efetivamente levar aos resultados desejados13” (BERMAN, 1996, p.285-286).
Nesse enfoque, o estudo da implementação tem como objetivo investigar como
as organizações/empresas/serviços públicos ou uma política combinam recursos
humanos e materiais, como são envolvidos e motivados os implementadores e a
capacidade de os objetivos propostos serem executados.
Ou seja, “o estudo de implementação examina os fatores que contribuem para
que se realizem ou não os objetivos da política” (VAN METER e VAN HORN, 1996, p.
100)14:
De forma geral, uma investigação sobre a implementação [...] pretende estabelecer se uma organização é capaz de conjuntar recursos humanos e materiais em uma unidade organizativa coerente e se pode motivar os operadores de maneira tal, que sejam capazes de levar a cabo os objetivos explícitos de uma organização (WILIANS, 1971, apud VAN METER e HORN, 1996,p. 100).
A fase de implementação não começa até depois que as decisões prévias tenham
sido estabelecidas (ou identificadas), bem como os objetivos e as metas. Ainda citando
os autores acima, afirma-se que há uma clara distinção entre a implementação da
política, a execução ou desempenho, e o que geralmente se denomina impacto da
política. De um lado, o estudo do impacto se ocupa das consequências das decisões
políticas, de outro, o estudo da implementação destaca as forças que vão determinar o
impacto das políticas.
12 Tradução da autora. 13 Tradução da autora. 14 Tradução da autora.
58
Portanto, analisar a implementação da política tem a perspectiva de dar subsídios
para promover as modificações necessárias para que o problema desencadeador da ação
governamental seja de fato solucionado na sua totalidade ou parcialmente, como é mais
provável de acontecer. Como mecanismos dessa análise são propostos esquemas
teóricos, marcos conceituais que balizem ou mesmo conduzam o olhar do avaliador.
Em relação às pesquisas na área de implementação de políticas públicas, na
atualidade ainda são escassas as pesquisas que tratam dessa temática. Alguns dos fatores
que podem contribuir com este cenário são a ingenuidade de alguns legisladores em
considerar que uma vez estabelecida uma lei os membros e instituições irão acatá-la; o
fato de que a maioria dos analistas políticos da década de 1960 ignoravam os problemas
da implementação, concentrando os estudos na análise das decisões da cúpula do
governo; e a dificuldade de se estabelecer um marco teórico de análise da
implementação (VAN METER e VAN HORN, 1996).
Na década de 1960, os estudos de implementação de políticas se centravam em
programas específicos de educação, planejamento urbano, criação de empregos, direitos
civis, qualidade ambiental e serviços de saúde (SABATIER & MAZMANIAN, 1996).
Os estudos sobre implementação de políticas públicas abarcam várias áreas de
conhecimento, entre elas as ciências sociais, a administração pública, a psicologia social
e a ciência política. Com a influência dessas áreas, os estudos se apresentam dentro das
seguintes categorias:
i) Na teoria da organização: mais especificamente em trabalhos sobre o controle
e as mudanças das organizações (enfocando a inovação);
ii) No impacto das políticas públicas, particularmente nas decisões judiciais;
iii) Em estudos seletos sobre relações intergovernamentais (VAN METER &
VAN HORN, 1996).
Van Meter e Van Horn (1996) destacam publicações importantes que abordam a
implementação de políticas: Kaufman (1960) desenvolveu pesquisa sobre o serviço
florestal nos Estados Unidos, Bailey e Mosher (1968) examinaram a administração da
Lei de Educação elementar e secundária, Derthick (1970) analisou os programas
federais de subvenção de fundos, Gross et al (1971) investigaram a inovação planejada
das organizações, Berke e Kirst (1972) investigaram o apoio federal aos programas
educativos, Derthick (1972) pesquisou sobre a intenção da administração Johnson de
criar terrenos em áreas metropolitanas na cidade de Oakland. Apesar das grandes
59
contribuições dos estudos citados, estes ainda são limitados, pois há uma carência de
uma perspectiva teórica mais consistente.
Sabatier & Mazmanian (1996) afirmam que a função da análise da
implementação consiste na identificação dos fatores que levam ao alcance dos objetivos
normativos ao longo do processo. Tais fatores podem se dividir em três categorias de
variáveis independentes:
Tratabilidade do ou dos problemas aos quais se dirige uma lei - cada problema
tem soluções possíveis diferentes que podem ser mais ou menos complexas do que
outras;
Capacidade da lei para estruturar o processo de implementação da política – a
estruturação se dá por meio da seleção das instituições responsáveis, da influência sobre
funcionários e mediante a regulação das oportunidades de participação dos atores.
Efeito das diversas variáveis políticas no apoio aos objetivos legais – os
resultados da implementação são efeitos da interação entre a estrutura legal e o processo
político.
Sabatier & Mazmanian (1996) apontam algumas pesquisas desenvolvidas que se
aproximam da integração conceitual descrita anteriormente, entre eles os autores Rein e
Rabinovitz, que examinaram o processo de implementação colocando em prática os
imperativos de respeito à intenção da lei, a preocupação com os empregados e a
expectativa com a ação. Abordaram a implementação na perspectiva do comportamento
estratégico dos diversos autores: Berman enfatiza os ajustes que exigem os programas à
medida que se abrem às organizações locais de prestação de serviços; Bardach já
oferece uma perspectiva diferente ao enfocar os obstáculos que o programa pode
enfrentar na realização dos objetivos normativos; Van Meter e Van Horn oferecem um
modelo sistêmico do processo de implementação, atentando aos fatores que
condicionam o desempenho do programa, entre eles os critérios que regem as políticas e
os recursos, o apoio político, as condições econômicas e sociais, as características das
agências encarregadas da implementação, a comunicação entre as agências e as decisões
políticas dos funcionários responsáveis pela implementação.
Sabatier & Mazmanian (1996) consideram que os estudos acima citados trazem
suas contribuições, contudo, destacam três pontos importantes de crítica: primeiro, é
preciso haver esforços adicionais para contextualizar e explorar empiricamente a
vinculação entre o comportamento individual e o contexto político, econômico e legal
da ação; segundo, destacam que os estudos subestimam a capacidade da lei de estruturar
60
o processo de implementação; e terceiro, que nenhum deles trata da tractability
(tratabilidade) dos problemas. No que se refere à tratabilidade, os autores questionam
por que algumas políticas são mais fáceis de se implementar e outras não, especialmente
aquelas relacionadas a direitos civis.
Destaca-se que na análise empírica de políticas públicas, o cenário é carregado
de incertezas que se manifestam em vários níveis, entre elas, a dificuldade cognitiva
sobre os fenômenos os quais se intervém, a ausência de controle dos formuladores e a
impossibilidade de prever os desdobramentos da proposta, o amplo espaço de
discricionariedade dos agentes implementadores e as influências políticas que podem
minar a racionalidade técnica dos planos e programas (SILVA & MELO, 2006).
Rus Perez (2010), em seu artigo “Por que pesquisar implementação de políticas
educacionais atualmente?”, distingue as fases da política em agenda, formulação,
implementação e avaliação, e afirma também que os estudos de implementação se
tornaram ferramentas imprescindíveis para governos elaborarem políticas públicas.
Ainda nas palavras de Rus Perez (2007, p. 65), pesquisador do Núcleo de
Estudos de Políticas Públicas da Universidade Estadual de Campinas (NEPP/Unicamp),
o estudo da avaliação do processo de implementação é uma subárea específica de
pesquisa de avaliação de política que, dentre outras, inclui a avaliação de processo.
A eficiência da implementação de uma política pública está relacionada à
comunicação entre as organizações e as atividades de indução, às características da
entidade responsável pela execução, às condições sociais, políticas e econômicas, bem
como ao padrão e aos objetivos propostos pela política e aos recursos financeiros e
humanos necessários. Essas relações podem ser observadas no modelo sugerido por Van
Meter e Van Horn (1996, p. 118), conforme se observa na Figura 1 a seguir:
61
Figura 1: Modelo do processo de implementação das políticas
Fonte: Van Meter e Van Horn, 1996, p.
Portanto, a partir dessa multiplicidade de fatores, é importante que no estudo do
processo de implementação se esteja atento a essas características, que a análise seja
feita por um período de tempo significativo, bem como que se estabeleçam claramente
quais atores são importantes para compreendê-lo.
No Brasil, o Núcleo de Estudos em Políticas Públicas da Unicamp
(NEEP/Unicamp), coordenado pelo pesquisador Rus Perez (2010, p. 71), tem focado
nos estudos de implementação, especialmente no que se refere às:
Relações entre o desenho ou a formulação da política, de um lado, e o formato que os programas adquirem no final do processo, de outro;
Dimensão temporal do processo e seus efeitos diferenciados no tempo sobre a organização em que se processam, sobre os atores que implementam (resistências e adesões) e as modificações das condições iniciais;
Condições que propiciam ou entravam o processo de implementação.
O modelo desenvolvido pela equipe do NEPP baseou-se em obras literárias,
pesquisa e insights envolvendo o processo de implementação. Esse modelo especifica as
relações entre o desenho da política e o formato que os programas adquirem no final do
processo, levando em consideração a dimensão temporal e as condições que propiciam
ou entravam o processo de implementação (RUS PEREZ, 2010).
Os autores Sabatier & Mazmanian (1996) afirmam que é no âmbito da
implementação que se manifestam as concepções pessoais e profissionais dos
funcionários sobre o deve ser a política pública. Consideram que a função central da
62
análise da implementação consiste em identificar os fatores que condiciona, a efetivação
dos objetivos normativos ao longo de todo o processo.
Nesta pesquisa, interessou-nos enfocar o plano da micropolítica e a produção dos
sentidos pelos atores envolvidos nesse processo, ou seja, como se processam as
subjetivações relacionadas à temática estudada, considerando o contexto político e
econômico a partir dos cenários de exclusão racial.
63
CAPÍTULO III –
EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE
DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO
64
CAPÍTULO III – EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PÚBLICAS DE DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO
3.1 Apresentação
Neste capítulo trataremos inicialmente dos aspectos conceituais e históricos
sobre Ações Afirmativas e a relação com as políticas públicas para a educação superior,
com o foco na democratização e acesso de indígenas, identificando a mobilização dos
movimentos indígenas na luta por uma educação diferenciada e específica, as
interlocuções entre o desenho/formulação e o formato que adquiriram até os dias atuais
no Brasil.
Para realizar estudo sobre a implementação de uma política pública para
educação consideraremos que ela se expressa nos programas governamentais, nos
projetos, nos planos, tanto para a área econômica como social, e estabelecem
determinadas relações entre Estado e sociedade.
Consideramos que,
As políticas sociais se referem a ações que determinam o padrão de proteção social implementado pelo Estado, voltadas, em princípio, para a redistribuição dos benefícios sociais visando à diminuição das desigualdades estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico (HOFLING, 2001, p. 1).
A política educacional, definida como policy – programa de ação –, se produz no
contexto das relações de poder expressas nas politics – política no sentido de
dominação. Educação, nesse sentido, entendida como uma política pública social, uma
política pública de corte social, de responsabilidade do Estado, mas não pensada
somente por seus organismos (AZEVEDO, 1997; HOFLING, 2001).
Nessa mesma lógica, Dias Sobrinho (2010) acrescenta que a educação é um bem
público, direito social e dever do Estado. A sociedade democrática é fundada no
princípio ético da equidade e, portanto, deve assegurar o direito de todos à educação. Na
mesma linha, os autores Jeffrey e Aguilar (2013, p.10) afirmam que políticas
educacionais de Ação Afirmativa não devem, para o caso específico brasileiro, ser
dissociadas das discussões acerca do papel da sociedade civil.
Com base na afirmação que a educação é um bem público, e, portanto, direito de
todos e dever do Estado, é que se pauta a política de Ação Afirmativa, como forma de
65
assegurar e garantir que grupos minoritários tenham acesso a bens e serviços até então
não acessados.
3.2 Aproximações: políticas públicas de educação superior, democratização e acesso
As políticas públicas de Ações Afirmativas para a educação superior são aquelas
ações que visam a promover o acesso e a permanência de estratos sociais menos
privilegiados (COSTA & ALVES, 2009).
Para retratar a temática da democratização da educação superior brasileira serão
realizadas abordadas as principais políticas educacionais implementadas no Brasil a
partir dos anos de 1990 até os dias atuais, no contexto das políticas neoliberais.
A escolha desse período está diretamente relacionada à necessidade de
estabelecer de onde partiremos, de delimitarmos o objeto de estudo e compreendermos
os fatores que marcaram o processo de construção histórica e política da temática sob
análise. Para tanto, utilizamos como base teórica os estudos realizados pelos autores
Torres (1995), Oliveira (1999), Dourado (2002), Sguissardi (2002), Luciano (2006),
Michelotto et al (2006), Trevisol et al (2009), Dias Sobrinho (2010), Santos (2010),
Ferreira e Oliveira (2010), Cordeiro (2010), Silva e Real (2011) e Lima (2011).
A década de 1980 foi marcada por uma intensa crise econômica decorrente de
altos índices de inflação e da desestabilização da moeda nacional. Esse cenário
alavancou mobilização intensa dos movimentos sociais reivindicando melhorias em
vários setores, entre eles a educação e a saúde.
Especificamente no caso do Brasil, a eclosão da crise do endividamento nos
anos 1980 criou um espaço para uma ampla transformação do papel do Banco Mundial
(BM) e outros organismos internacionais na regularização da educação brasileira
(DOURADO, 2002). Além do BM, as orientações nas publicações dos organismos
internacionais como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) têm balizado as reformas e transformações na educação e no papel do Estado,
especialmente nos países chamados “em desenvolvimento” (FERREIRA e OLIVEIRA,
2010).
Esse quadro, associado à globalização do capitalismo e sua repercussão nos
países em desenvolvimento, deu início à passagem do modelo de Estado
intervencionista e de Bem Estar para o neoliberal, que atua como “regulador” do
66
mercado. A busca pela capacidade tecnológica e domínio do mercado de trabalho
implicou na obtenção de novos espaços e meios de acesso ao conhecimento, e também
em uma nova determinação dos seus objetivos/fins. Como ‘porta de acesso’ ao
conhecimento tecnológico e base da Revolução Industrial, a educação tornou-se
primordial para o capitalismo contemporâneo demandante de um novo tipo de
profissional: “a nova economia reclama por trabalhadores com grande capacidade de
aprender a aprender, capazes de trabalhar em equipe não só de maneira disciplinada,
mas criativa” (TORRES, 1995).
No Brasil, pode-se afirmar que as bases legais e políticas para a expansão da
educação foram a Constituição Federal de 1988 e a lei nº 9.394/1996, a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDB). A Constituição Federal de 1988 é um marco
importante na garantia do direito à educação, que está previsto no Capítulo II, dos
Direitos Sociais, no Art. 6º, que afirma que: “São direitos sociais a educação”. Já o
artigo 205, inserido no Título VII, Capítulo III, Seção I, prevê que:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
A gratuidade da educação está prevista em seu artigo 206, inciso IV, que
estabelece a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais como um dos
princípios do ensino.
Como se pode observar, a Carta Magna, nas palavras de Oliveira (1999, p.61),
representa um salto qualitativo com relação à legislação anterior, mas temáticas como
acesso e permanência ainda ficaram no plano das promessas.
A Constituição Federal de 1988 refere-se à privatização do ensino em seus
artigos 209 e 213: “O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes
condições: cumprimento das normas gerais da educação nacional; autorização e
avaliação de qualidade pelo Poder Público”.
E, em seu artigo 213, a Constituição abre a possibilidade de destinar recursos
públicos:
[...] às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que: comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação; assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola
67
comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de suas atividades (BRASIL, 1988, p. 125).
Portanto, podemos afirmar que no Brasil, as bases legais e políticas para a
expansão da educação foram a Constituição Federal de 1988 e a lei nº 9.394/1996, a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
O processo de indução de expansão e democratização da educação superior no
país se dá por dois movimentos:
Um promovido pelas políticas públicas que vem contribuindo para a expansão tanto das instituições públicas, e o outro que é o próprio mercado, que vem induzindo a expansão das instituições privadas por meio de processo de “oligopolização” (SILVA & REAL, 2011, p. 152).
A democratização da educação superior entrou fortemente na agenda dos
governos nas últimas décadas, porém, não escondeu seus fundamentos marcadamente
mercantilistas, restringindo a educação em função da economia (DIAS SOBRINHO,
2010, p. 1231).
Portanto, as políticas educacionais devem ser entendidas à luz dos
acontecimentos históricos no país e as influências internacionais. O processo de
mundialização, acumulação de capital e a reconfiguração do papel dos Estados e das
políticas públicas vêm impactando, nas últimas décadas, fortemente as universidades
públicas. Trata-se de uma reconfiguração do papel do Estado ou, como afirmam
Trevisol et al (2009), de uma nova articulação entre o princípio do Estado e do
mercado, conferindo ao Estado outros papéis, ajustados aos interesses globais.
Nas palavras de Boaventura de Sousa Santos (2010), a universidade entrou em
crise, apesar de que a crise já se instalava há cerca de duas décadas, mas se evidenciou
na década de 1990, movida por inúmeros fatores. Nesse sentido, a globalização e o
neoliberalismo, modelo global do capitalismo, induziram à perda de prioridade das
políticas sociais de educação, saúde e previdência.
A globalização e o neoliberalismo são fatores e acontecimentos que podem ser
considerados desencadeadores da mudança do conceito de Estado e de suas funções,
chamada por alguns autores de reforma do Estado.
A defesa ideológica dessa reforma é implementada pelo discurso de modernização e racionalização do Estado, objetivando, desse modo, a superação das mazelas do mundo contemporâneo (desemprego,
68
hiperinflação, redução do crescimento econômico, entre outros) e a adaptação às demandas pelo processo de globalização em curso (DOURADO, 2002, p. 235).
Gramsci (2004) afirma que o Estado, em sentido amplo, comporta duas esferas
principais, a primeira, o Estado em sentido estrito, formada pelo conjunto dos
mecanismos por meio dos quais a classe dominante detém o monopólio legal do
controle e da execução das leis (burocracia executiva, polícia, forças militares). A
segunda esfera é formada pela sociedade civil e organizações responsáveis pela
elaboração e difusão de concepções de mundo e ideologias.
A década de 1990 foi marcada pela chamada modernização conservadora e
também pela inserção subalterna do país na economia global, iniciadas pelo governo de
Fernando Collor de Mello (1990-1991) e seguidas por Itamar Franco (1992-1994)
(SGUISSARDI, 2002).
Nessa mesma lógica no discurso e na defesa ideológica de reforma, de
modernização e racionalização do Estado, o governo de Fernando Henrique Cardoso
(FHC) (de 1995 a 2002) reforça e propõe o enxugamento da máquina estatal e a
privatização de bens e serviços. Na lógica do Estado moderno, os serviços como a
saúde, educação e a cultura fazem parte dos serviços não exclusivos, ou seja, o Estado
provê, mas também podem ser executados pelo setor privado (DOURADO, 2002).
Para Dourado (2002), é particularmente notável a condição do Brasil como “fiel
depositário” das prescrições internacionais.
As recomendações do Banco Mundial (BM) para a educação superior, contidas
no documento La enseñanza superior: Las lecciones derivadas de la experiencia
(publicado em 1994),destacam: a privatização da educação superior, estímulo à
implementação de novas formas de regulação e gestão, aplicação de recursos públicos
nas instituições privadas, eliminação de gasto com políticas compensatórias e
diversificação (DOURADO, 2002).
Após extenso debate, em 1996, foi aprovada a lei nº 9.394/1996, de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB), na qual se detalharam as atribuições de autonomia
para as universidades. Porém, a lei não explicitava a origem dos recursos para expansão,
somente anunciava: “a estas fica garantida a decisão de criar cursos, aumentar suas
vagas e estruturar-se em mais de uma unidade ou campus, além de elaborar seus
orçamentos anuais e plurianuais” (SILVA & REAL, 2011).
69
No que se refere à educação superior privada, o art. 45 da LDB traz a seguinte
redação: “A educação superior será ministrada em Instituições de Ensino Superior,
públicas ou privadas, com variados graus de abrangência ou especialização”.
O § 2º do art. 54 da lei nº 9.394/1996 abriu a possibilidade de autonomia para
outras instituições que comprovassem qualificação para o ensino ou para a pesquisa.
Tal autonomia foi afirmada por meio do decreto nº 2.306 de 19 de agosto de
1997, que estabelece liberdade na forma de organização das entidades mantenedoras
privadas de ensino superior, propiciando, dessa forma, condições facilitadoras para a
implantação dessas instituições. Seu artigo 8º estabelece:
Quanto à sua organização acadêmica, as Instituições de Ensino Superior do
Sistema Federal de Ensino classificam-se em:
I - Universidades;
II - Centros universitários;
III - Faculdades integradas;
IV - Faculdades;
V - Institutos superiores ou escolas superiores.
O Decreto estabelece que obrigatoriamente as universidades se caracterizem
pela indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Enquanto que, aos Centros
Universitários, é dada autonomia para criar, organizar e extinguir cursos e programas.
O Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, lançado em 1997 pelo BM,
tratava especificamente da reformulação do papel do Estado: “O Estado é fundamental
para o processo de desenvolvimento econômico e social, porém não enquanto agente
direto do crescimento, mas sim como um sócio, elemento catalisador e impulsionador
desse processo” (BANCO MUNDIAL, 1997).
Em relação à educação superior, a Conferência Mundial sobre a Educação
Superior, em 1998, da UNESCO, em Paris, resultou em uma tese que estimulava a
abertura do mercado de educação superior no Brasil à iniciativa privada ou à livre
iniciativa empresarial, ou seja, com características de um bem privado (WORLD
BANK, 1998).
Em 1999, foi lançado outro documento pelo BM: “Estratégia para o setor
educacional – documento estratégico do Banco Mundial: A educação na América Latina
e Caribe”. Tal documento trazia em seu conteúdo avaliações da educação durante a
década de 1990 e recomendações a serem implementadas no século 21, reforçando a
70
ideia do papel da educação para “alívio da pobreza”, ampliação do setor privado e
atualização da força de trabalho (LIMA, 2011).
O documento lançado pelo BM em 2002, intitulado “Construir sociedades de
conocimiento: nuevos desafíos para la educación terciaria”, intensifica a
mercantilização e diversificação da educação superior e desloca a educação superior
para educação terciária:
Aumentar a diversificação institucional (aumento do número de instituições não-universitárias e privadas) para expandir a cobertura em uma base financeiramente viável e estabelecer um quadro da formação contínua com vários pontos de acesso e uma variedade de rotas de treinamento (BANCO MUNDIAL, 2002, p. 27).
Em 2002 foi lançado o Programa Diversidade na Universidade, por meio da lei
nº 10.558, de 13 de novembro de 2002.
Já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, de 2003 a 2010, ao contrário do que
muitos esperavam, mesmo com intenso foco nos programas sociais, as reformas na
educação superior deram-se de forma incipiente, vistas por alguns autores como
continuidade às orientações dos organismos internacionais. Neste governo, podemos
citar algumas ações e projetos:
Houve expansão de vagas nas universidades federais, através da criação do Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão Universidades Federais (Reuni); contratação de professores e funcionários; criação da Universidade Aberta do Brasil; implementação de bolsas para estudantes em IES privadas por meio do Programa Universidade para Todos (ProUni) e do Programa de Financiamento Estudantil (Fies); criação e expansão dos Institutos Federais de Educação, Ciências e Tecnologia (IFs); criação de programa e ações voltadas para as Ações Afirmativas (FERREIRA & OLIVEIRA,2010, p. 61).
Segundo resultados do estudo da autora Michelotto et al (2006), no período
1991-2004, o número de instituições privadas cresceu 267% no território nacional. Em
relação ao número de matrículas, a diferença é bem maior. A média brasileira nesse
quesito apresenta uma variação positiva de 311% no período de 1991 a 2004.
Após sucessivas normas revogadas, o Decreto nº. 5.773/2006, o último que
regulamenta essas instituições, manteve a possibilidade de as Instituições de Ensino
Superior se organizarem como faculdades, centros universitários e universidades.
Apesar desses avanços, direitos igualitários no Brasil ainda são um bem a ser
conquistado, principalmente no que se refere ao direito à educação superior de forma
gratuita, que ainda é profundamente excludente, discriminadora e colonizadora.
71
A cultura política e acadêmica sempre foi o baluarte do processo dominador e colonizador das sociedades ocidentais europeias, razão pela qual sempre mantiveram as portas das universidades cerradas para os povos colonizados. Basta olhar à volta para perceber o quanto o sistema atual que abrange oportunidades e condições é injusto, desigual e excludente, mesmo com a vigência da famigerada lei de direitos iguais que aparentemente fundamenta os princípios de seletividade universal dos vestibulares universitários (LUCIANO, 2006, p. 164).
Dessa forma, o vestibular é uma forma de promover um afunilamento pautado
na meritocracia, sob a alegação da falta de vagas. O vestibular pode ser uma maneira de
manter a reprodução social marcada pela hierarquia de classes (CORDEIRO, 2010).
Um dos caminhos apontados seria disponibilizar vagas suficientes aos
interessados. Dessa forma, seriam superadas as desigualdades de condições e
oportunidades por um serviço educacional de qualidade, sem privilégios, ao alcance de
todo cidadão brasileiro e, sobretudo e fundamentalmente, intercultural e interétnico em
todos os níveis de ensino.
Para os povos indígenas a educação tornou-se uma das condições e uma das
causas da formação da consciência de cidadania, na medida em que pode possibilitar o
domínio dos códigos básicos estruturantes da sociedade não-indígena, a consequente
capacidade de reformulação de estratégias de resistência e de promoção de culturas,
valores e conhecimentos, e a apropriação de outros saberes úteis e necessários à
melhoria das condições de vida. Isto prova que a escola pode ser um instrumento
poderoso de afirmação de identidades, de valores e de conhecimentos indígenas
(LUCIANO, 2006, p. 165).
Dias Sobrinho (2010) afirma que democratização, qualidade e crise são núcleos
temáticos que ocupam a agenda da educação superior em todo o mundo. Nesse sentido,
democratizar a educação superior remete à expansão de matrículas e à inclusão social de
jovens até então desassistidos, seja por condições econômicas ou preconceitos. No
entanto, democratizar não se limita à ampliação, é necessário garantir a permanência.
Podemos observar, na Tabela 1 a seguir, que a evolução do número de IES se
deu de forma crescente; o total de instituições passa de 1.391, em 2001, para 2.378, em
2010. Em 2010, desse total 88,3% é de instituições privadas, 4,5%, estaduais, 4,2%,
federais e 3,0%, municipais. Dessa forma, pode-se concluir que a educação superior
brasileira é privada.
72
Tabela 1: Evolução do Número de Instituições de Educação Superior por categoria Administrativa- Brasil: 2001-2010.
Ano
Total
Pública Privada
% Tota
l %
Feder
al %
Estadua
l %
Munic
ipal %
2001 1.391 183 13,2 67 4,8 63 4,5 53 3,8 1.20
8 86,8
2002 1.637 195 11,9 73 4,5 65 4,0 57 3,5 1.44
2 88,1
2003 1.859 207 11,1 83 4,5 65 3,5 59 3,2 1.65
2 88,9
2004 2.013 224 11,1 87 4,3 75 3,7 62 3,1 1.78
9 88,9
2005 2.165 231 10,7 97 4,5 75 3,5 59 2,7 1.93
4 89,3
2006 2.270 248 10,9 105 4,6 83 3,7 60 2,6 2.02
2 89,1
2007 2.281 249 10,9 106 4,6 82 3,6 61 2,7 2.03
2 89,1
2008 2.252 236 10,5 93 4,1 82 3,6 61 2,7 2.01
6 89,5
2009 2.314 245 10,6 94 4,1 84 3,6 67 2,9 2.06
9 89,4
2010 2.378 278 11,7 99 4,2 108 4,5 71 3,0 2.10
0 88,3
Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), 2012.
O número de matrículas em cursos de graduação atingiu, em 2010, o total de
6.379.299 matrículas, o dobro das registradas em 2001. A expansão se dá, notadamente,
pela via privada, e também por um crescimento do setor público por meio das categorias
federal e estadual (INEP, 2012).
No entanto, apesar da significativa expansão do atendimento na educação
superior entre 2001 e 2009, a taxa de escolarização líquida da população de 18 a 24
anos correspondeu a 14,4%, segundo o estudo desenvolvido pelo IBGE em 2010.
(IBGE, 2010).
Conforme o relatório do INEP (2012) no ano de 2010 foram registrados 51.494
ingressos em IES públicas, considerando-se o universo de ingressos por processo
seletivo na graduação presencial por meio de programa de reserva de vagas; esse total
representa um aumento de 41,9% em relação ao ano anterior.
73
Os dados da Figura 2 abaixo apresentam os percentuais coletados em 2010
correspondentes aos diferentes tipos de programas de reserva de vagas: 64% são
procedentes do ensino público, 27% étnico, 6% social/renda familiar e 3% restantes por
outros programas. Além disso, há que se destacar que o estudo apontou que a
porcentagem de pessoas com deficiência na educação superior é de 0%, conforme
observamos na Figura 2. Esse dado indica que ainda há muito a ser feito para a inclusão
deste grupo populacional. Em relação ao grupo étnico, o estudo do INEP não traz
informações detalhadas sobre os grupos étnicos.
Figura 2: Distribuição do Tipo de Reserva de Vagas – Ingressos por Processo
Seletivo das IES Públicas – Graduação Presencial – Brasil – 2010.
Fonte: INEP (2012)15.
Considerando o referido relatório, apesar de haver avanços no acesso
considerando o critério raça, ainda são necessários maiores aprofundamentos nesses
dados, pois eles revelam informações generalizadas, não levando em consideração as
diferenças e lacunas regionais, pois existe no país uma grande diversidade de 15
Oalunopodeingressarpormaisdeumtipodereservadevagas.
74
necessidades e oportunidades quando comparamos, por exemplo, a Região Sudeste e
Norte do país.
A temática sobre o número de acadêmicos na educação superior será explorada
quando discorrermos sobre as primeiras experiências nas políticas de Ações Afirmativas
educacionais para indígenas.
Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012 (ANEXO 10), regulamenta o sistema de
ingresso de alunos de escolas públicas em seu artigo primeiro:
Art. 1o. As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Em relação à temática da inserção indígena no ensino superior, estabelece seu
artigo 7º:
Art. 7o O Poder Executivo promoverá, no prazo de 10 (dez) anos, a contar da publicação desta Lei, a revisão do programa especial para o acesso de estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, às instituições de educação superior.
Como observamos, o programa de reserva de vagas é uma das formas de Ação
Afirmativa, promovendo a grupos minoritários o acesso a bens e serviços, nesse caso a
educação.
3.3 Ação Afirmativa: Aspectos Históricos e Conceituais
Ao iniciar uma discussão acerca da temática das Ações Afirmativas na
educação, é necessário identificarmos historicamente a origem desse conceito, bem
como o entrelaçamento da educação com os direitos humanos por meio da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e da Constituição Federal de 1988.
O termo Ação Afirmativa tem origem americana, mas, dependendo do lugar e do
idioma, as denominações variam entre políticas de Ação Afirmativa, equal opportunity
policies e affirmative action, derivadas da língua inglesa; e discriminação positiva
(denominação adotada na Europa), positive discrimination, ação positiva, políticas
inclusivas, dentre outras (GOMES, 2000; SANTIAGO et al, 2008, p. 138).
75
O país pioneiro a adotar o termo Ação Afirmativa foram os Estados Unidos da
América (EUA), por meio do Decreto Presidencial de 6 de março de 1961, que fazia
referência a contratos de trabalho com o Governo Federal daquele país e discorria que
“o contratante [...] adotará uma Ação Afirmativa para assegurar que os candidatos sejam
empregados, como também tratados durante o emprego sem consideração a sua raça,
credo, cor ou nacionalidade” (TEIXEIRA, 2008).
A segregação racial contra negros marcou os EUA e mobilizou a sociedade
negra americana, lideranças políticas, liberais e brancos progressistas. Os conflitos
raciais eclodiram nas grandes cidades norte-americanas após o assassinato de Martin
Luther King, resultando em um forte movimento por melhores condições de vida para
populações negras e busca de soluções que minimizassem as desigualdades entre
brancos e negros. A autora afirma que:
Esta expressão ganha força no fim desta mesma década quando a National Commission on Civil Disorders – Comissão Nacional sobre Distúrbios Civis, passa a examinar as razões dos conflitos raciais. As conclusões deste estudo evidenciavam a urgência de se elaborar estímulos especiais que, de alguma forma, respondessem às demandas da população negra. Mais tarde, estes estímulos se estenderam a minorias como as mulheres, os asiáticos, os hispânicos e os indígenas (TEIXEIRA, 2008, p. 221).
Nos EUA, esse movimento se fortalece após a promulgação das leis dos direitos
civis em 1964, como tentativa de garantir o welfare state16, isto é, o estado como o
agente de proteção e promoção social.
Já a Índia, marcada por um histórico de discriminação e diferenças sociais, a
partir da Constituição de 1950, reservou um percentual de vagas em suas universidades
públicas a castas consideradas inferiores, os dalits17, ou “intocáveis”. Para a Índia, as
políticas de Ação Afirmativa se justificam por quatro princípios: a) compensação ou
reparação por injustiças cometidas no passado; b) proteção aos segmentos sociais
16 Welfare state pode ser definido como um conjunto de serviços e benefícios sociais de alcance universal promovidos pelo Estado com a finalidade de garantir uma certa "harmonia" entre o avanço das forças de mercado e uma relativa estabilidade social, suprindo a sociedade de benefícios sociais que significam segurança aos indivíduos para manterem um mínimo de base material e níveis de padrão de vida, que possam enfrentar os efeitos deletérios de uma estrutura de produção capitalista desenvolvida e excludente (GOMES, 2006, p.1) 17 Dalits são uma categoria de pessoas cujo toque é considerado ritualmente poluidor, cujas ocupações são tidas como impuras e degradantes e que tradicionalmente foram proibidas de residir nas mesmas áreas que os demais indianos, usar as mesmas fontes de água e frequentar os mesmos templos (DAFLON, 2008,p. 4).
76
minoritários; c) igualdade; e d) justiça social a partir da constatação de desigualdade
social (FERES JÚNIOR; ZONINSEIN, 2005).
Outro país a adotar as ações afirmativas foi a Malásia, a partir de 1971, por meio
de um sistema de cotas similar a adotada na Índia, voltado para os malaios e membros
de determinadas tribos, como os bamiputras ou bumiputeras, que se encontravam em
situação de desigualdade socioeconômica (SANTOS, 2012b).
Ainda podemos citar outros países que adotaram tais políticas:
Bósnia – em cargos políticos, as mulheres devem estar representadas com um percentual mínimo de 29%; China – cotas para representação de minorias na Assembleia Nacional em Pequim e cotas para minorias ingressarem nas universidades; Macedônia – minorias, como os albaneses, têm cotas para acesso a universidades do Estado e no serviço público; Nova Zelândia – indivíduos descendentes de grupos polinésios e indígenas maori têm acesso preferencial a cursos universitários e bolsas; Indonésia – programa de Ação Afirmativa dirigido a grupos nativos que migraram para o país; Eslováquia – Ação Afirmativa para indivíduos de grupos raciais ou minorias; Reino Unido – lei indica recrutamento igual de católicos e não católicos no serviço policial na Irlanda do Norte; África do Sul – cotas e metas para promover equidade no mercado de trabalho entre brancos e negros (SANTOS, 2012b, p. 403).
Portanto a expressão Ação Afirmativa deriva de um conjunto de recomendações,
normas e leis com o intuito de proteção aos direitos de grupos em situação de exclusão
social ou grupos minoritários.
O Brasil está entre os signatários da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, elaborada após o término da Segunda Guerra Mundial, em 1948, e que
contempla a proteção e promoção do direito de todos os seres humanos, expressando em
seu Art. 1º: “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.
Outros seis instrumentos fundamentais de defesa dos direitos humanos podem
ser citados:
• Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965); • Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966); • Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966); • Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979); • Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes (1984); • Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) (FISCHMANN, 2009, p.156).
77
Mesmo com tais tratados, os direitos fundamentais ainda são um bem a ser
conquistado. No Brasil, ainda está presente a desigualdade de renda, de oportunidades
de trabalho, de acesso à saúde, à justiça, à escola, à cultura, ao lazer, à segurança, à
escolha e à cidadania.
Na assertiva dos direitos fundamentais, Bobbio (2004, p. 1) afirma “que o
problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de
justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas
político”.
Ainda nos referindo à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948,
garantir a igualdade não é mecanismo suficiente para assegurar condições de vida digna,
pois as minorias e camadas sociais menos favorecidas economicamente continuam à
margem da sociedade, sem acesso aos bens e serviços essenciais.
Dessa forma, Bobbio (2004) nos aponta que,
[...] os indivíduos são iguais genericamente, mas não especificamente. Com relação aos direitos políticos e aos direitos sociais, existem diferenças de indivíduo para indivíduo, ou melhor, de grupos de indivíduos para grupos de indivíduos, diferenças que são até agora (e o são intrinsicamente) relevantes [...]. Isso quer dizer que, na afirmação e no reconhecimento dos direitos políticos, não se podem deixar de levar em conta determinadas diferenças, que justificam um tratamento não igual (p.35).
Nesse sentido, é necessário um olhar diferenciado ao conceito estabelecido,
designado como igualdade dinâmica e militante, na busca de se garantir igualdade de
oportunidades e condições.
Gomes (2003, p.19) afirma que
[…] em lugar da concepção «estática» da igualdade extraída das revoluções francesa e americana, cuida-se nos dias atuais de se consolidar a noção de igualdade material ou substancial, que, longe de se apegar ao formalismo e à abstração da concepção igualitária do pensamento liberal oitocentista, recomenda, inversamente, uma noção «dinâmica», «militante» de igualdade, na qual necessariamente são devidamente pesadas e avaliadas as desigualdades concretas existentes na sociedade, de sorte que as situações desiguais sejam tratadas de maneira dessemelhante, evitando-se assim o aprofundamento e a perpetuação de desigualdades engendradas pela própria sociedade.
Desse modo, as políticas de ações afirmativas, em uma perspectiva complexa de
igualdade, são baseadas nos direitos individuais, propõem uma redefinição da igualdade
de oportunidades liberal, introduzindo a utilização de particularidades grupais e dando
uma ênfase positiva à construção de identidades raciais. Visam à democratização do
78
acesso a meios fundamentais – como emprego e educação– por parte da população em
geral. O principal objetivo dessas medidas consiste em promover condições para que
todos na sociedade possam competir igualmente pela conquista de tais meios
(MOEHLECKE, 2004; GUARNIERI &MELO-SILVA, 2007, p.1).
Acrescenta-se também, que as Ações Afirmativas podem ser definidas como
políticas públicas e também privadas, com o objetivo de concretizar o princípio
constitucional da igualdade material e garantir a neutralização dos efeitos da
discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física. Ou
seja, correspondem a uma forma jurídica para se superar o isolamento ou a diminuição
social a que se acham sujeitas as minorias (GOMES, 2003; CORDEIRO, 2005).
Com relação à questão indígena, o retrato de exclusão e discriminação é fruto do
passado colonial, trazendo consigo os legados institucionais da monarquia, da
escravidão, e da fusão entre a Igreja e o Estado. Nesse sentido, a exclusão, obviamente,
não é natural, e sim reflexo de uma construção histórica (POCHAMANN et al, 2006;
LIMA, 2007).
No ano de 1971, em Barbados, ocorreu o Simpósio de Fricção Interétnica na
América do Sul não andina, que resultou no documento “Declaração de Barbados”, no
qual se denunciavam as condições de dominação dos índios sul-americanos,
responsabilizando os Estados pela visão distorcida da sociedade não índia que os
considerava indivíduos inabilitados (ALBUQUERQUE, 2007).
Outro fato também em destaque foi a Reunião de Peritos sobre
Etnodesenvolvimento e Etnocídio na América Latina, promovida pela UNESCO e
FLACSO, em dezembro de 1981, na Costa Rica, trazendo em seu bojo projetos de
futuro de etnodosenvolvimento (LIMA, 2007).
A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 7 de junho de 1989,
aprovou a Convenção número 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países
Independentes, que assegura os direitos indígenas em âmbito internacional. Em 20 de
junho de 2002, no Brasil, o texto da Convenção 169 foi aprovado pelo Congresso
Nacional e incorporado ao conjunto de leis vigentes no país.
A referida Convenção refere-se à educação em seu artigo 23: 1. Será ministrado às crianças pertencentes às populações interessadas ensino para capacitá-las a ler e escrever em sua língua materna, ou, em caso de impossibilidade, na língua mais comumente empregada pelo grupo a que pertençam. 2. Deverá ser assegurada a transição progressiva da língua materna ou vernacular para a língua nacional ou para uma das línguas oficiais do país.
79
3. Serão tomadas, na medida do possível, as devidas providências para salvaguardar a língua materna ou vernacular.
Assim como no Brasil, na América Latina as políticas afirmativas
intensificaram-se a partir da década de 90, impulsionadas pelos movimentos dos
organismos internacionais em favor da discussão sobre a oportunidade de acesso das
camadas sociais de baixa renda. Entre esses organismos podem ser citados o Banco
Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) e a UNESCO (COSTA &
ALVES, 2009).
No Brasil, a ditadura militar que se instalou em 1964 criou obstáculos para as
lutas democráticas, e a Constituição Federal de 1988 (que veremos a seguir) representa
um momento fundador da reconstrução democrática no Brasil (FISCHMANN, 2009)
Numa visão retrospectiva, podem-se elencar alguns instrumentos normativos,
mais especificamente a Constituição Federal de 1988, que tratam de ações afirmativas.
Entre eles destacamos:
• Carta do Rio, derivada da III Conferência Mundial contra o Racismo,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na
África do Sul, em setembro de 2001;
• Lei n. 7.668, de 22 de agosto de 1988, instituiu a Fundação Cultural
Palmares;
• Lei n. 649, de 27 de maio de 1998, criou o Conselho Nacional de
Combate à Discriminação, CNCD, no âmbito do Ministério da Justiça;
• Decreto-Lei n. 5.452/43 (CLT), que prevê, em seu art. 354, cota de dois
terços de brasileiros para empregados de empresas individuais ou
coletivas;
• Decreto-Lei n. 5.452/43 (CLT), que prevê, em seu art. 373-A, a adoção
de políticas destinadas a corrigir distorções pela desigualdade de direitos
entre homens e mulheres;
• Lei n. 8.112/90, que estabelece, em seu art. 5º, § 2º, cotas de 20% para os
portadores de deficiência no serviço público civil da União;
80
• Lei n. 8.213/91, que estabelece, em seu art. 93, cotas para os portadores
de deficiência no setor privado;
• Lei 9.504/97, que estabelece, em seu art. 10, § 2º, cotas para mulheres
nas candidaturas partidárias;
• Lei n. 10.172, de9 de janeiro de 2001, que institui o Plano Nacional de
Educação, o qual estabelece a necessidade de políticas de inclusão de
minorias étnicas (RICHTER & TERRA, 2007).
Como podemos observar a partir desse elenco de leis e decretos, a temática das
Ações Afirmativas só se fortalece no Brasil por volta dos anos 1990, alavancada pelos
movimentos sociais, impulsionados pelos organismos internacionais de defesa dos
Direitos Humanos e combate à discriminação racial e social. Essas estratégias podem
ser percebidas, sobretudo, em momentos específicos, como a mobilização em torno da
comemoração do centenário da abolição (1988) e do tricentenário de Zumbi dos
Palmares (1995) (VERISSIMO, 2003).
No que se refere à questão indígena, dentre as Ações Afirmativas nas
Instituições de Ensino Superior brasileiras cita-se o sistema de cotas, o qual, mesmo
sendo considerado uma medida compensatória, ainda é, neste momento da educação
superior do Brasil, uma forma de mitigar as mazelas produzidas há mais de 500 anos
aos povos indígenas.
É importante destacar que o sistema de cotas é apenas uma das formas de Ação
Afirmativa; existem outros instrumentos e mecanismos que podem garantir o acesso e
permanência das minorias nas Instituições de Educação Superior, como, por exemplo: a
reserva de vagas para alunos oriundos de escolas públicas, pontos adicionais no
processo seletivo para alunos oriundos de escola pública, bolsas de extensão e bolsas de
pesquisa.
Sob a ótica da igualdade, o Brasil é o país que amarga há décadas os piores
índices de desigualdade social, econômica e racial. Portanto, a desigualdade social está
intimamente ligada à desigualdade econômica e étnica.Como se refere Freyre (2005, p.
157), “com a intrusão europeia, desorganiza-se entre os indígenas da América a vida
social e econômica; desfaz-se o equilíbrio nas relações do homem com o meio físico”.
81
Em relação às desigualdades sociais, o Relatório do Desenvolvimento Humano
(2005), elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, indicou
que em 2000 a população branca do Brasil apresentava um Índice de Desenvolvimento
Humano - Municipal (IDH-M) de 0,814, enquanto o IDH-M da população negra era de
0,703, destacando que:
Caso formassem uma nação à parte, os brancos, com um nível de desenvolvimento humano alto (acima de 0,800), ficariam na 44ª posição no ranking do IDH das nações, entre Costa Rica e Kuwait, segundo o Relatório do Desenvolvimento Humano global de 2002. A população negra, com um nível de desenvolvimento humano médio (entre 0,500 e 0,799), teria IDH-M compatível com a 105ª posição – entre El Salvador e Moldávia. A distância entre brancos e negros, portanto, seria enorme: 61 posições no ranking do IDH mundial (p.59).
Apesar de esforços para minimizar as mazelas da discriminação e da exclusão
históricas a tais povos, muito ainda deve ser feito. Carvalho (2002, p.122) afirma que os
direitos sociais estão sob ameaça, apontando que:
A democracia política no país não resolveu os problemas econômicos mais sérios, como a desigualdade e o desemprego. Continuam os problemas da área social, sobretudo na educação, nos serviços de saúde e saneamento.
A desigualdade é, sobretudo de natureza regional e racial [...]
A escandalosa desigualdade que concentra nas mãos de poucos a riqueza nacional tem como consequência níveis dolorosos de pobreza e miséria.
Impulsionado pelos organismos internacionais e forte pressão dos grupos
especialmente relacionados ao movimento negro brasileiro, por ocasião de uma
manifestação em homenagem aos 300 anos de Zumbi dos Palmares, o tema da
discriminação entrou na agenda política do governo Fernando Henrique Cardoso, que
instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra,
no dia 20 de novembro de 1995 (TELLES, 2003 apud MAIO & SANTOS, 2005, p. 3).
Naquele mesmo ano foi lançado Programa Nacional de Direitos Humanos
(PNDH), pelo Governo Federal. Ao anunciar o Programa o então Presidente da
República, Fernando Henrique Cardoso, destacou:
E agora, que nós estamos nos aproximando do século XXI, essa luta pela liberdade e pela democracia tem um nome específico: chamam-se direitos humanos. Esse é o novo nome da luta pela liberdade e pela democracia. E nesta data simbólica do Brasil, nós estamos assistindo também a esta vontade do
82
nosso povo, de não apenas falar de direitos humanos, mas também de garantir a sua proteção (MESQUITA NETO, 1997, p.1).
Além do aparato legal, é importante destacar, a realização de eventos,
alavancados pelos movimentos sociais, ligados à temática, como o encontro em
Durban18, no qual o então Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, declarou:
[...] todas essas lutas que universalizam a oportunidade do acesso e do tratamento ao conjunto da população são louváveis. Mas também é inegável que algumas ações especiais têm que ser tomadas para que, na questão de gênero, na questão da raça, haja um movimento efetivo de maior igualdade. (VERISSÍMO, 2003, p. 12).
Munanga (2001) enfoca que o relatório do Comitê Nacional para a Preparação
Brasileira na III Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo,
Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, África
do Sul, abordava medidas governamentais que deveriam ser tomadas em favor dos
índios:
• Criação, no âmbito do Ministério da Educação, da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena;
• Estabelecimento de 1666 escolas indígenas, que contam com 3041 professores indígenas;
• Realização do projeto Tucum, de formação e capacitação de professores indígenas em nível de magistério, para as comunidades de Mato Grosso (Xavante, Paresi, Apiaká, Irantxe, Nambikwara, Umotina, Rikbaktsa, Munduruku, Kayabi, Borôro e Bakairi, entre outras). É coordenado pela Secretaria de Estado da Educação – MT, além da Funai, e tem convênio com a Universidade Federal do Mato Grosso e prefeituras municipais do Estado;
• Realização do Projeto 3o Grau Indígena, visando à implantação de três cursos de Licenciatura Plena na Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) [...] (MUNANGA, 2001, p.39).
A Conferência de Durban ocorrida em 2001 foi um marco importante no
combate à discriminação racial, devido aos acordos firmados entre os países presentes;
o discurso do Presidente conseguia expressar a amplitude do problema, porém não
refletia a opinião do conjunto do governo. Havia no governo posições contrárias às
cotas, entre elas a do próprio Ministro da Educação, que se declarou publicamente
18 III Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na África do Sul, em setembro de 2001.
83
contrário às cotas para negros nas universidades, alegando que seria necessário focar no
problema da base do ensino público (ALMEIDA, 2008).
Destaca-se que o governo brasileiro, no evento, assumiu que o Brasil é um país
em que, certamente, a discriminação encontrava-se escondida dentro de um discurso de
“paz” entre as raças. Neste sentido, Ação Afirmativa pode ser entendida também como
uma política de afirmação étnica e racial.
O documento originado da Conferência, denominado Carta do Rio (2001),
elenca treze eixos temáticos, sendo que a questão indígena só é mencionada em quatro
deles: “questão indígena”, obviamente; “raça e etnia”; “acesso à justiça e defesa dos
direitos humanos”; e “gênero”.
No referido documento os povos indígenas parecem constituir mais uma espécie
de adendo ao debate mais amplo, que não contemplou as especificidades de tais povos.
Temáticas como “cultura e comunicação”, “religião”, “educação”, “saúde e trabalho”,
“juventude”, temas tão caros aos povos indígenas e às suas organizações, não são
mencionados.
Em relação à temática do direito à igualdade e combate a todas as formas de
discriminação, o movimento negro brasileiro tem importância crucial, e entre as
conquistas deste movimento foi criação da Secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial (SEPPIR) da Presidência da República, através da Medida Provisória
n° 111, de 21 de março de 2003, convertida na Lei 10.678. A Secretaria nasce do
reconhecimento das lutas históricas do Movimento Negro brasileiro. A data é
emblemática, pois celebra-se em todo o mundo o Dia Internacional pela Eliminação da
Discriminação Racial, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), em
memória do Massacre de Shaperville19 (SEPPIR, 2015).
Entre as diversas ações do SEPPIR está a criação da Secretaria de Políticas de
Ações Afirmativas, cujo objetivo é coordenar e articular a formulação e o
acompanhamento de políticas públicas com vistas à inclusão da perspectiva racial no
conjunto das ações do governo, destacando-se ações de enfrentamento ao racismo e
Ações Afirmativas (SEPPIR, 2015).
19 Em 1960 o Congresso Nacional Africano (CNA) organizou uma campanha antipasses - o negro que era pego sem o seu passe, um livrinho de quase cem páginas, era preso e punido. Em 21 de março, uma multidão de voluntários foi arregimentada para se apresentar sem seus passes em frente a delegacia de polícia de Sharperville, em uma demonstração pacífica de resistência. A manifestação foi reprimida com extrema violência, gerando 67 mortos. Desde então chamado de massacre de Sharperville (PINTO, 2007, p. 398).
84
A inclusão social e as diversidades étnica e cultural começaram a fazer parte da
agenda governamental, como sugere a autora Moehlecke (2009, p.470):
[...] o MEC instituiu ainda, por meio de portarias, duas comissões relacionadas à questão da diversidade: a Comissão Assessora de Diversidade para Assuntos Relacionados aos Afrodescendentes – Cadara –, criada em 2003, e a Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena – CNEEI –, em 2004, ambas com as funções de assessorar a Secretaria e o Ministério na formulação de políticas de inclusão social e combate à discriminação étnica e racial nos sistemas de ensino, e de subsidiar ações que envolvam a adoção de procedimentos relacionados à educação para afrodescendentes e indígenas.
Mesmo fazendo parte da agenda do governo e fruto de lutas e entraves dos
movimentos organizados, o sistema de cotas no Brasil foi e ainda é questionado por
alguns grupos como “inconstitucional”, caso este de repercussão nacional, onde o
Partido Político Democratas (DEM), propos junto ao Supremo Tribunal Federal (STF),
Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental contra atos
administrativos da Universidade de Brasília que instituíram o programa de cotas raciais
para ingresso naquela universidade, onde se invoca ofensa aos artigos 1º, caput e inciso
III; 3º, inciso IV; 4º, inciso VIII; 5º, incisos I, II, XXXIII, XLII, LIV; 37, caput; 205;
207, caput; e 208, inciso V, da Constituição de 1988, a qual teve indeferido pedido de
medida cautelar (ADPF 186 MC / DF) e foi julgada totalmente improcedente
(BAYMA, 2012).
Entre os argumentos apontados pelos ministros podemos citar o de Ricardo
Lewandowski argumentando que o princípio da igualdade descrito na Constituição
Federal de 1988, deve ser visto sob dois pontos: o formal e o material.
Para possibilitar que a igualdade material entre as pessoas seja levada a efeito, o Estado pode lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminado de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estas certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares (LEWANDOWSKI, 2012, p.5)
A Constituição de 1988, ao mesmo tempo em que consigna a meritocracia para o
acesso aos níveis mais elevados do ensino, pesquisa e criação artística, efetivados
segundo a capacidade de cada um; também acolhe a igualdade de acesso e o pluralismo
de ideias.
85
Desse modo, o constituinte teria almejado “temperar o rigor da aferição do
mérito dos candidatos que pretendem acesso às universidades com o princípio da
igualdade material que permeia todo o Texto Magno” (LEWANDOWSKI, 2012, p. 13).
3.4 Educação escolar Indígena no cenário brasileiro
Inicialmente, ao se discutir a questão das políticas de Ações Afirmativas no
contexto da inclusão de indígenas nas universidades brasileiras, é necessário considerar
os aspectos históricos envolvidos na questão das políticas públicas e da escolarização
dos povos indígenas do país. Pois a intensa mobilização no cenário brasileiro
influenciou na luta e nas reivindicações para a inclusão dos povos indígenas na
educação superior.
A autora Ferreira (2001), em seu artigo “A educação escolar indígena: um
diagnóstico crítico da situação no Brasil”, divide a história da educação escolar entre
indígenas em quatro fases:
A primeira, o Brasil Colônia, através dos missionários católicos e jesuítas. A segunda, a criação do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), em 1910, que se estende à política de ensino da FUNAI e à articulação com o Summer Institute of Linguistics (SIL) e outras missões religiosas. A terceira, entre os anos 60 e 70, do período da ditadura militar. A quarta fase, da iniciativa dos próprios povos indígenas, a partir da década de 80, que decidem definir e autogerir os processos de educação formal (p.72).
O período colonial é o mais longo da história da educação escolar para índios no
Brasil, marcado por práticas de negação da identidade e diversidade, com o objetivo de
assimilar o índio à civilização cristã pela ação dos jesuítas, que desorganizavam a
estrutura social e a cultura em geral dos índios (SCHADEN, 1972).
Para os europeus colonizadores, os índios eram desprovidos de “língua”,
“pacíficos” e “medrosos”, viviam sem lei e sem religião, privados de características
distintivamente humanas. Essa interpretação dos europeus, em relação aos indígenas,
possui um forte conteúdo etnocêntrico20.
20 Etnocentrismo é uma visão do mundo em que o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos; os outros são pensados e sentidos mediante nossos valores, nossos modelos e nossas definições do que é a existência. Nesse sentido, a cultura adquire seu próprio sentido, dependendo dos olhos de quem a vê, a partir do momento em que se opõe à natureza, ou seja, é um contexto construído. Construído com identidade própria, instituído internamente em repúdio ao que lhe é estranho, em contraste, é a atitude que traduz e identifica ingenuamente a diversidade cultural (WILLIAMS,1969). Ou
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“Após o período colonial, emerge o Brasil republicano (1899) trazendo consigo
os legados institucionais e simbólicos da monarquia, da escravidão, e da fusão entre
Igreja e o Estado” (LIMA, 2007, p. 3). O país, à época, contava com um contingente
humano composto de imigrantes vindos da Europa do norte, negros de origem africana,
negros crioulos, populações indígenas e uma massa de mestiços.
Em 1908, o Brasil fora publicamente acusado de massacre aos índios no XVI
Congresso dos Americanistas ocorrido em Viena, devido às formas de extermínio por
meio das guerras contra os índios e pelo processo de expansão para o interior do país
invadindo os territórios tradicionais (RIBEIRO, 1970; CUNHA, 1992).
A partir de 1910, a responsabilidade das ações educativas junto às comunidades
indígenas passou para o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão vinculado ao
Ministério da Agricultura, cuja a finalidade era de proteger as comunidades indígenas e
transformá-las em comunidades de pequenos produtores (ALBUQUERQUE, 2004).
Essa política, pautada numa lógica positivista, entendia as comunidades
indígenas como um grupo de pessoas atrasadas e distantes do padrão de civilização,
cabendo às sociedades mais adiantadas dirigir os povos indígenas rumo ao progresso.
Mesmo com esse pensamento integracionista, os índios continuaram excluídos e a
assistência a eles prestada permanecia esporádica, desorganizada e ineficiente.
Em 1928 foi aprovada a lei nº 5.484, que atribuiu ao SPI “a tarefa de executar a
tutela de Estado sobre o status jurídico genérico de índio, sem deixar claros os critérios
que definiam a categoria sobre a qual incidia”. A partir dessas ideias assimilacionistas,
inaugurou-se então o regime tutelar sobre os povos indígenas (LIMA, 2007).
A função educativa, sob responsabilidade do SPI, em 1936, era a incorporação
do indígena ao território brasileiro, sob duas bases de formação: como pequeno produtor
rural, por meio do ensino primário com iniciação para o trabalho agrícola ou pecuário, e
a de defesa nacional, na ênfase da disciplina militar, por meio do ensino moral e cívico,
e da educação física (COSTA, 2001, p.236).
Este processo de escolarização provocou desinteresse nas comunidades
indígenas e, a partir de 1953, foi criado um programa de reestruturação das escolas de
acordo com as necessidades de cada grupo étnico. Em 1956, o SPI permitiu que o
seja, a visão sobre culturas diversas é constituída a partir de contrastes e diferenças que se estabelecem a partir de referenciais exteriores ao contexto cultural originário dos indivíduos.
87
Summer Institute of Linguistics21 (SIL) desenvolvesse um programa de educação
indígena, com um modelo de educação bilíngüe (ALBUQUERQUE, 2004).
Em 1967, o SPI foi extinto e foi criada a Fundação Nacional do Índio (FUNAI),
a qual também considerou importante o ensino bilíngue; foi criado o Estatuto do Índio,
por meio da lei n º 6.001 de 1973, que tornou obrigatório o ensino de línguas nativas nas
escolas indígenas, iniciando-se o incentivo para a capacitação de professores indígenas
para assumir tal responsabilidade.
O Estatuto do Índio, em seu artigo 49, estabelece que “a alfabetização dos índios
far-se-á na língua do grupo a que pertençam, e em português, salvaguardando o uso da
primeira”.
É necessário também recordar que o país estava em um regime autoritário
extremamente centralizador e necessitava mostrar à opinião pública internacional a sua
preocupação com os indígenas, assim como a existência de uma política indigenista
(LEITÃO, 1993; LIMA, 2002).
Também é importante destacar que tais iniciativas governamentais eram
impulsionadas por pressões de organismos internacionais; por exemplo, as diretrizes
básicas da FUNAI, legalmente fundamentadas no Estatuto do Índio, respeitavam a
Convenção 107 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 1957. O artigo nº
23 dessa convenção estabelece que:
1. Será ministrado às crianças pertencentes às populações interessadas ensino para capacitá-las a ler e escrever em sua língua materna, ou, em caso de impossibilidade, na língua mais comumente empregada pelo grupo a que pertençam.
2. Deverá ser assegurada a transição progressiva da língua materna ou vernacular para a língua nacional ou para uma das línguas oficiais do país.
3. Serão tomadas, na medida do possível, as devidas providências para salvaguardar a língua materna ou vernacular.
A FUNAI, porém, não possuía linguistas e pedagogos para lidar com a imensa
variedade linguística brasileira, tendo repassado, na década de 70, esse dever
21 Organização missionária que implantou a educação bilíngue nas Américas, usando um método de descrição de línguas indígenas muito eficaz para traduzir a Bíblia pretensamente para todos os idiomas do planeta (LIMA, 2007, p.9).
88
governamental ao Summer Institute of Linguistics (SIL)22, por meio de convênio.Essa
instituição enfrentou várias críticas, devido, sobretudo, ao fato de os professores não
serem índios e não haver materiais didáticos bilíngues, como cartilhas e livros. O
objetivo maior dessa instituição era a conversão ao protestantismo, por meio de leituras
bíblicas. Devido a tais críticas, o convênio com a FUNAI foi rompido em 1977.
No final dos anos 70, durante o período do regime militar, surgiram, no cenário
nacional, as Organizações Não Governamentais (ONGs) voltadas especialmente para a
defesa das causas indígenas. Entre elas, destacam-se: Comissão Pró-Índio de São Paulo
(CPI/SP), o Centro Ecumênico de Documentação e Informação (CEDI), a Associação
Nacional de Apoio ao Índio (ANAI) e o Centro de Trabalho Indigenista (CTI).
Também foram criados, pela Igreja Católica, a Operação Anchieta (OPAN), em
1969, e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), em 1972, ambos com o objetivo de
prestar serviços de educação escolar aos índios (FERREIRA, 2001, p. 87).
No Brasil, durante a década de 70, ocorreram no país assembleias que resultaram
na criação de organizações indígenas, entre elas, destaca-se a União das Nações
Indígenas (UNI), fundada no ano de 1980.
No âmbito internacional, os países da América Latina, entre eles o Brasil, foram
palco da ação intensas críticas, notadamente do Banco Mundial, especialmente por
conta da inação desses países na defesa dos povos indígenas, com isso também
mobilizando forçadamente o governo a promover ações nas questões relacionadas a tais
povos.
No âmbito latino-americano, a anteceder este momento, as críticas dos efeitos etnocidas das políticas desenvolvimentistas encontraram na Reunião de Barbados, em 1971, e depois na “Reunião de Peritos sobre Etnodesenvolvimento e Etnocídio na América Latina”, promovida pela articulação entre UNESCO e FLACSO, em dezembro de 1981, em San José de Costa Rica, momentos especiais na formulação de propostas para um “desenvolvimento alternativo”, marcado pelos projetos de futuro próprios aos povos indígenas, o etnodesenvolvimento, proposta da qual o antropólogo mexicano Rodolfo Stavenhagen foi um dos principais formuladores (LIMA, 2007, p. 7).
22 Summer Institute of Linguistics (SIL) é uma instituição indigenista evangélica norte-americana, criada no México na década de 1930. Depois da experiência no México, tornou-se padrão de atuação do SIL nos demais países o de se apresentar publicamente como linguista e o de procurar atuar na área da educação pública indígena por meio de convênios com os órgãos indigenistas estatais. Exemplos desse modelo de atuação ocorreram na entrada do SIL no Peru e no Brasil. As características da atuação do SIL nesses dois países foram: (a) o papel facilitador do movimento indigenista na entrada da missão; (b) a secularização do programa de escola da missão através da inserção da linguística; e (c) o uso do instrumento do convênio entre missão e governo como forma atualizada de concordata (BARROS, 2004, p. 3).
89
As articulações e mobilizações, tanto da sociedade indígena quanto das ONGs
pró-índio, bem como os mecanismos de pressão internacional promoveram no país um
movimento político paralelo favorável aos direitos indígenas no que se refere à terra,
educação e saúde. Esse movimento contou com a assessoria e participação de
instituições de ensino do país de renome, como a Universidade de São Paulo (USP),
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Também é importante destacar a criação da educação indígena no Mato
Grosso e Núcleos de Estudos Indígenas (NEIs) nas Universidades Federais de
Pernambuco, Roraima e Rio de Janeiro.
No ano de 1987, ocorreu, na cidade do Rio de Janeiro, o “Encontro Nacional de
Educação Indígena”, ao qual estiveram presentes vinte e sete representantes de ONGs e
instituições nacionais. Tal encontro resultou em um documento dirigido às autoridades
educacionais, no qual foi solicitada a “criação de organismos próprios de educação
indígena para executar, acompanhar e avaliar a implementação de uma política
educacional indígena [...]”.
Conjuntamente a essas atividades, foi criado o grupo de trabalho “Mecanismos
de Ação Coordenada” (BONDE), composto por membros de organizações e
instituições nacionais, tendo como motivação a necessidade de incorporar a educação
indígena à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e de se encaminhar
com urgência uma proposta de educação escolar para índios à Assembleia Constituinte.
No dia 19 de abril de 1980, foi criada a União das Nações Indígenas (UNI) e, no
ano de 1981, o indígena Marcos Terena foi eleito presidente, sendo apoiado por 32
líderes indígenas de todo o país.
A partir dessa data, vários encontros foram acontecendo no país, entre eles, os
organizados pelo Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas (MEIAM),
professores do povo indígena MURA (OPIM) (SILVA, 2007). Tais encontros foram
marcados por discussões acerca do direito à terra, denúncias e reivindicações por
melhor assistência à saúde e educação, além de fortes críticas à administração da
FUNAI. Esses movimentos foram iniciados no norte do país, e de forma geral
impulsionaram os professores indígenas a iniciarem articulações e formarem
associações, comissões em prol de melhorias na educação escolar indígena e também
comissões para a discussão ao acesso à educação superior.
As organizações indígenas buscavam formação específica para professores
indígenas, como forma de atender às necessidades das comunidades e também capacitá-
90
los para gerenciar seus territórios, manejar instrumentos para a construção de
autonomia, promover a sustentabilidade e a construção de novos quadros de
interlocução com o Estado brasileiro, sem a mediação de outros profissionais (SOUZA
LIMA & HOFFMAN, 2004; BROSTOLIN & CRUZ, 2010).
Paralelo a este movimento, os organismos internacionais (BIRD, ONU, entre
outros) em prol dos direitos humanos, da diversidade cultural e do princípio da
alteridade, pressionava o Estado para que garantisse tais direitos por meio de
mecanismos regulatórios, como leis e decretos.
Um marco regulatório importante neste aspecto é sem dúvida, a Constituição
Federal de 1988, a qual definiu princípios que reconhecem a diversidade sociocultural e
asseguram a manutenção linguística dessas sociedades, cabendo ao Estado proteger:
“As manifestações das culturas populares indígenas e afro-brasileiras, e as de outros
grupos participantes do processo civilizatório nacional” (art. 215). Nesse processo de
mudança na concepção da educação indígena, a Constituição Federal de 05 de outubro
de1988 estabeleceu que: “[...] é assegurada às comunidades indígenas também a
utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”
(BROSTOLIN, 2007).
A referida Constituição Federal, conhecida, inclusive, como Constituição
Cidadã, estabeleceu alguns princípios fundamentais que se refletem no campo
educacional:
Art. 3º, IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação[...];
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...];
Art. 23, V - é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência [...];
Art. 205 - A educação é direito de todos e dever do Estado [...];
Art. 206 - O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; [...];
III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino [...];
91
Art. 210 - Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais [...];
Art. 215 - O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais [...];
Art. 216 - Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira [...];
Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão [...];
Art. 242, § 1º - O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro. (BRASIL, 1988).
A partir da Constituição Federal de 1988, houve mudanças na legislação
educacional, impulsionadas por pressões dos organismos internacionais, pelas forças do
movimento das organizações não governamentais, das entidades em defesa da causa
indígena e lideranças indígenas (ALBUQUERQUE, 2004).
De acordo com o Decreto Presidencial n. 26 de 4 de fevereiro de 1991, o
Governo Federal passou a responsabilidade pela educação indígena da Fundação
Nacional do Índio (FUNAI) para o Ministério da Educação (MEC) e, de acordo com o
artigo 1º, “Ao Ministério da Educação com a competência para coordenar as ações
referentes à educação indígena, em todos os níveis e modalidades de ensino, ouvida a
FUNAI” (BRASIL, 1991).
No sentido de regulamentar a competência do Ministério da Educação para
coordenar ações referentes à educação indígena foi criada a Portaria Interministerial
número 559, de 16 de abril de 1991. Tal dispositivo permite que os índios tenham
garantidas características específicas de educação no que se refere à formação de
professores, currículos, calendários, metodologias, avaliação e materiais didáticos. O
documento garante às “comunidades indígenas uma educação escolar básica de
qualidade, laica e diferenciada, que respeite e fortaleça seus costumes, tradições, língua,
92
processos próprios de aprendizagem e reconheça suas organizações sociais” (BRASIL,
1991).
Fortalecendo o movimento indígena e sua relação com as conquistas
internacionais na área da educação, foi realizada, em paralelo à Conferência Mundial
das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a “Rio-92”, a
Conferência Mundial dos Povos Indígenas, liderada por Marcos Terena, indígena
(FISCHMANN, 2009).
A Conferência resultou na “Carta da Terra”, que incorporou 109 recomendações
feitas por 700 indígenas de todo o mundo, e a “Declaração da Kari-Oca”, assim
denominada por ter sido realizada na denominada “Aldeia Kari-Oca”, na cidade do Rio
de Janeiro (TERENA, 2008)
Dessa forma, a referida Conferência:
[...] se afirmou como marco internacional, fortaleceu a emergência de novos participantes indígenas e de novas relações políticas na arena social, sendo que alguns dos protagonistas têm gradativamente sido reconhecidos como interlocutores na arena educacional, assumindo cada vez mais significado e espaço nos debates sobre a educação nacional (FISCHMANN, 2009, p.160).
Em 1993, o MEC lançou as Diretrizes para a Política Nacional de Educação
Escolar Indígena, pela qual o Estado tem a responsabilidade de fornecer subsídios para a
implantação de escolas indígenas, respeitando as particularidades de cada grupo
(BARÃO, 2003).
Nessa ótica, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) reafirma,
nos artigos 78 e 79, que tratam especificamente da educação escolar indígena, que
“deve ser assegurada às comunidades indígenas a utilização da língua materna no ensino
fundamental regular e a valorização das culturas e etnias”. Ressalta também a
importância da participação das comunidades no planejamento dos programas
educacionais (BROSTOLIN, 2003; ALBUQUERQUE, 2004).
A autora Fischmann (2009, p. 161) considera um avanço a conquista da
participação indígena no contexto das decisões políticas:
[...] por meio de representação indígena no Conselho Nacional de Educação, sendo a primeira representante indígena a professora Francisca Novantino D'Angelo, a Chiquinha Pareci, no mesmo momento em que pela primeira vez o Conselho Nacional de Educação passava a ter representação afrodescendente, na pessoa da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva; inclusão dos Referenciais Curriculares Indígenas como parte das diretrizes curriculares
93
nacionais; cursos de formação de professores indígenas, além de outras medidas correlatas.
Fischmann considera que “este é um dos impactos mais evidentes de integração
das garantias jurídicas internacionais com as conquistas nacionais” (2009, p.161).
O Plano Nacional de Educação (PNE), lei n. 10.172 de 9 de janeiro de 2001,
destina um capítulo específico à Educação Indígena. Entre os 21 objetivos e metas do
referido documento, destacamos:
6. Criar, dentro de um ano, a categoria oficial de “escola indígena” para que a especificidade do modelo intercultural e bilíngue seja assegurada.
15. Instituir e regulamentar, nos sistemas estaduais de ensino, a profissionalização e o reconhecimento público do magistério indígena, com a criação da categoria de professores indígenas como carreira específica do magistério.
17. Formular, em dois anos, um plano para a implementação de programas especiais para a formação de professores indígenas em nível superior, através da colaboração das universidades e de instituições de nível equivalente.
No escopo da formação de professores indígenas e das propostas de educação
superior, destaca-se a I Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, I
CONEEI, realizada em Luziânia, Goiás, em 2009, sob a responsabilidade do MEC, em
parceria com a Fundação Nacional do Índio, FUNAI, e o Conselho Nacional de
Secretários de Educação, CONSED. No documento “Das Modalidades de Ensino na
Educação Escolar Indígena”, foram feitas 10 recomendações relativas ao tema da
educação superior (BRAND & CALDERONI, 2012, p.87).
Destaca-se entre elas:
O MEC e a FUNAI devem garantir recurso orçamentário e financeiro para o acesso, permanência e acompanhamento do estudante indígena durante todo o curso superior, através de programas de apoio pedagógico e bolsas de estudo condizentes com a realidade das cidades.
E, em especial, o estado de Mato Grosso do Sul é citado entre as
recomendações:
O MEC e CNE devem iniciar processo de elaboração das diretrizes para educação superior indígena, contando com ampla participação dos povos e associações indígenas, assegurando, na educação superior, o diálogo entre os saberes científicos e saberes tradicionais indígenas (Dourados, Nordeste I,
94
Roraima) (I Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena – I CONEEI, 2009).
3.5 Educação Superior no Estado do Mato Grosso do Sul
A seguir destacaremos os principais fatos e acontecimentos históricos e políticos
que marcam a expansão e ampliação da educação superior no estado de Mato Grosso do
Sul.
Abordar a história de Mato Grosso do Sul implica, de pronto, um olhar de alcance mais largo que deve ir às fronteiras onde o Brasil foi Paraguai, mas impõe também estender a vista até Mato Grosso que abrigou, desde a Colônia, as terras e povos hoje divididos em duas unidades federativas distintas (BITTAR, 1997, p. 12).
A expansão e a interiorização da educação superior no estado de Mato Grosso
do Sul foram fortemente influenciadas pelas questões políticas em nosso país. O
movimento expansionista e a interiorização já eram intenções governamentais desde
1900, conforme afirmam Villas Boas e Villas Boas (1994).
A necessidade de controle do território nacional foi balizada pelo autoritarismo,
a partir do capitalismo, que inicia na década de 1930 e se consolida na necessidade de
expansão e ocupação territorial. No estado do Mato Grosso, essa ideia foi lançada por
Getúlio Vargas na década de 1940, com o objetivo de implementar o imperialismo
brasileiro, baseado na expansão demográfica e econômica (BITTAR, 1997).
Já na gestão do general Ernesto Geisel, entre os anos de 1974 a 1979, o projeto
separatista tinha somente a finalidade de redividir o território, com o propósito de
otimizar áreas com potencial de desenvolvimento.
O movimento divisionista no sul do então estado do Mato Grosso era liderado
pela classe dominante sul-mato-grossense.Os fatores socioeconômicos e políticos
determinantes para o nascimento das ideias autonomistas do sul foram:
[...] distanciamento do sul em relação ao centro decisório; falta de comunicação eficiente entre as duas porções do estado, bem como favorecimento de municípios e políticos nortistas pela proximidade a Cuiabá; além do controle da burocracia pelo norte, foram fatores que propiciaram o nascimento de ideias autonomistas no sul. Na verdade, tão logo consolidou-se o seu povoamento iniciaram-se os conflitos, de tal forma que as raízes históricas da divisão aí se encontram (BITTAR, 1997, p. 32).
95
Os estudos realizados por Bittar (1997) revelam que, no que se refere à
educação, os municípios do sul do Estado, mesmo com superioridade demográfica,
contavam com poucas unidades escolares.
Outro fator que a autora destaca é a representatividade de Deputados Estaduais
no ano de 1959: das 30 vagas existentes, 21 foram preenchidas por candidatos do sul do
Estado. Portanto, a história da educação superior no Mato Grosso do Sul foi marcada
pela acirrada disputa política, econômica e geográfica. O antigo estado do Mato Grosso
estava marcado por disputas acirradas pela hegemonia de poder político e econômico,
entre o sul e o norte, representados, respectivamente, pelas cidades de Campo Grande e
Cuiabá. Sendo comum Campo Grande aparecer em reportagens encabeçando as
arrecadações do Estado, superando a capital Cuiabá (BITTAR, 2006).
Em meados da década de 1950, padres salesianos fizeram tentativas de iniciar o
ensino superior no Estado (ainda Mato Grosso); no entanto, somente em 1961 foi
autorizada a instalação dos cursos de Pedagogia e Letras, na recém-criada Faculdade
Dom Aquino de Filosofia, Ciências e Letras, na cidade de Campo Grande (FEDAFI)
(BITTAR et al, 2003).
Em 1965, o estado do Mato Grosso, governado por Pedro Pedrossian, foi
condecorada como “capital do ensino” pelo Presidente Fernando Corrêa da Costa.
No ano de 1966, foi fundada em Campo Grande a faculdade de Direito pelos
salesianos.
Em fins de 1969, foi criada a Universidade Federal de Mato Grosso, com sede
em Cuiabá. Com isso, contrariava-se a vontade do então governador Pedro Pedrossian,
que era sulista e defendia que Campo Grande se encontrava em pleno desenvolvimento
e expansão econômica. Fato esse que gerou grande insatisfação.
As características geográficas do Estado dificultavam o acesso dos estudantes à
educação superior. O estudo realizado por Pistori (2004) aponta que:
A maioria da população estudantil estava localizada na zona rural, o que dificultava a frequência aos centros urbanos para estudar, além de possuir instituições apenas em Cuiabá e em Campo Grande. Assim, esse número de 23.808 matriculados não corresponde à total demanda pelo ensino superior (p. 80).
Na tentativa de promover a interiorização da educação superior a Missão
Salesiana de Mato Grosso criou mais três faculdades na região sul: Faculdade de Direito
de Campo Grande, (FADIR) criada em 1965, a Faculdade de Ciências Econômicas,
96
Contábeis e Administração (FACECA), criada em 1970, e a Faculdade de Serviço
Social (FASSO), criada em 1972.
Na década de 1970, foram criadas outras Instituições de Ensino Superior no sul
do Mato Grosso, entre elas a Sociedade Civil de Educação da Grande Dourados
(SOCIGRAN), na região da Grande Dourados (BITTAR et al, 2006).
Em janeiro de 1970, ainda no governo de Pedro Pedrossian, foi criada a
Universidade Estadual do Mato Grosso em Campo Grande (atualmente Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul).
Segundo Vieira (1995)
Um fator importante que impulsionou a expansão da Educação Superior no estado foi na presidência de Emilio Garrastazu Médici (1969-1974). Sua política visava a aceleração do desenvolvimento e contenção da inflação. As medidas tendiam a fortalecer empresas privadas nacionais e estrangeiras; estimulavam o desenvolvimento social, valorizando a educação e ampliando as oportunidades de emprego (p.204).
Em 11 de outubro de 1977, por meio da Lei Complementar nº 31, foi assinada a
divisão do Estado pelo presidente Ernesto Geisel, criando o estado de Mato Grosso do
Sul. Harry Amorim Costa foi nomeado como governador.
A década de 1980 foi marcada pela expansão quantitativa no ensino superior no
novo estado da federação. Mas foi nos anos 1990 que as características da expansão e da
privatização mais se acentuaram, como destacam as autoras Bittar et al (2006):
• Em 27 de outubro de 1993 a FUCMT transformou-se em Universidade
Católica Dom Bosco, por meio da Portaria MEC nº 1.547;
• Em 1994 iniciava suas atividades a União da Associação de Educação
Sul Mato-Grossense (UNAES), mantenedora da Faculdade de Campo
Grande (FIC), com os cursos de Ciências Contábeis, Direito, Ciências
Econômicas e Pedagogia;
• A Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, instituída pela Lei
Estadual n° 1461, de 20 de dezembro de 1993, iniciou suas atividades no
ano de 1994, sendo oficialmente credenciada em 1997;
97
• No ano de 1996, o CESUP transformou-se em Universidade para o
Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP), por
meio do Parecer nº 153, de 2 de dezembro de 1996;
• Em 1999 a Sociedade da Grande Dourados (SOCIGRAN) transformou-
se em Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN), nos
moldes do Decreto nº 2.306, de 19 de agosto de 1997.
E na última década
• Em 2005 - transformação da FIC em Centro Universitário de Campo
Grande (UNAES);
• Em 2006 – criada a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
Como se pode observar, o contexto histórico da educação superior no estado de
Mato Grosso do Sul se inicia concomitantemente tanto pela iniciativa pública quanto
pela privada.
Conforme estudo realizado por Bittar et al (2006) “Educação Superior Brasileira
1991 - 2004: Mato Grosso do Sul”, organizado pelo INEP, no ano de 1991, o estado de
Mato Grosso do Sul possuía 11 IES e, no ano de 2004, chegou a 41, ou seja, um
crescimento de 86,4%. Esse crescimento foi menor do que o conjunto da região Centro-
oeste – de 128,7% -e do Brasil, que apresentou um crescimento de 118,3%, como se
observa na Tabelas 2 e 3 a seguir.
98
Tabela 2: Crescimento das instituições de educação superior - Brasil, Região Centro-Oeste e Mato Grosso do Sul - 1991-2004.
Fonte: MEC/Inep/Deaes in Bittar et al (2006).
Tabela 3: Crescimento das Instituições de Educação Superior, por categoria administrativa - Mato Grosso do Sul 1991-200423
Fonte: MEC/Inep/Deaes 2005, in Bittar et al (2006).
23 Embora a UEMS tenha iniciado suas atividades em 1994, somente em 1997 passa a constar nos dados do INEP.
99
No que se refere ao número de IES por categoria administrativa, o estado de
Mato Grosso do Sul, no ano de 1991, contava com 11 IES, das quais uma era pública e
dez eram privadas. Em 1996, esse número dobrou, chegando a 22 IES, permanecendo
com uma IES pública e 21 IES privadas. No ano de 1997 foi autorizado o
funcionamento da UEMS e o estado passou a ter duas IES públicas e duas IES
particulares foram fundidas, adquiridas por um grupo educacional do estado de São
Paulo.
Sobre a fusão do estado de Mato Grosso do Sul, o autor Sguissard (2008, p.
1006) apud Almeida(2008) enfoca
[...]a rede Anhanguera, fundada e presidida pelo professor Antonio Carbonari Netto. Com ações na BOVESPA, onde teria captado em um ano quase um bilhão de reais. Entre suas últimas aquisições está a UNIDERP, universidade de Campo Grande (MS).
Entre as IES privadas, nos anos de 1991 a 1996, o Estado contava com uma
universidade privada, a Universidade Católica Dom Bosco, reconhecida pelo MEC em
1993, e, no período de 1996 a 2004, passou a contar com a Universidade para o
Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (BITTAR et al, 2006).
Outro fato que também é destacado pelo estudo é o que o processo de
interiorização da educação superior, desencadeado tanto pelo setor público, que
registrou no ano de 2004 a instalação de 18 campi no interior e dois na capital, quanto –
principalmente – pelo setor privado, com 60 campi no interior e oito na capital. No setor
público, esse resultado está relacionado ao início das atividades da Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul, por sua característica multicampi, ofertando cursos de
graduação em vários municípios do interior do Estado, como veremos no capítulo V, no
qual nos deteremos na análise do processo de implementação da política de Ação
Afirmativa, abarcando aspectos da descrição histórica da referida IES.
100
Em relação às vagas ociosas entre as IES públicas do estado de Mato Grosso do
Sul, esse número é praticamente nulo entre os anos de 1991 a 2004. Já entre as privadas,
das 23.319 vagas oferecidas, 14.787 ingressaram na educação superior, representando
um percentual de ociosidade de 36,6%, conforme se observa na Tabela 4.
Tabela 4: Vagas oferecidas, ingressantes e percentual de ociosidade nas instituições privadas - Região Centro-Oeste 2004
Fonte: MEC/Inep/Deaes, in Bittar et al (2006).
No estudo, os autores levantam duas hipóteses para esse cenário: a primeira
considera a criação da UEMS e sua característica multicampi, que atendia e atende os
municípios do interior do Estado; e a segunda, que a renda per capta dos sul mato-
grossenses era incompatível com a condição de pagar uma IES particular, conforme
dados do IBGE-Pnad(2004), em relação ao número de jovens com idade entre 18 e 24
anos, pertencentes às classes mais elevadas de renda e que poderiam pagar
mensalidades nas escolas privadas, conforme se observa na Tabela 5.
Tabela 5: Número de jovens que poderiam pagar mensalidades nas escolas privadas e número de estudantes matriculados nas IES privadas, em 2004
Fonte: MEC/Inep/Deaes, in Bittar et al (2006).
101
Portanto, o desafio do Estado está não só em expandir o número de vagas em
instituições públicas, é também garantir condições de permanência e acesso.
No que se refere à presença do critério raça/cor nas IES do Mato Grosso do Sul,
assim como a situação verificada no Brasil, as universidades do Estado têm realizado
parcerias, especialmente no que diz respeito ao oferecimento de cursos voltados para a
formação de professores índios. No ano de 2003, a Universidade Estadual do Mato
Grosso do Sul (UEMS) realizou o primeiro vestibular com o sistema de cotas para
negros e índios em uma universidade pública do Estado (BITTAR et al, 2006).
O primeiro impacto da política de inclusão da UEMS se expressa no percentual
de indígenas presentes nos campi, 1,7%, maior que sua presença na sociedade, de 0,2%,
conforme se observa na Tabela 6. Esse percentual positivo é significativo e está
relacionado à implantação de cotas para indígenas na Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul. No entanto, os dados do estudo são gerais e não revelam, por exemplo,
qual a representatividade de etnias nesse universo ou qual o percentual dos que
concluem a graduação.
Tabela 6: Presença da cor/raça na sociedade e no campus - Mato Grosso do Sul 2005
Fonte: Inep/Deaes, 2005 in Bittar et al (2006).
Uma das formas de ingresso dos acadêmicos indígenas nas Instituições de
Educação Superior (IES) particulares foi, especialmente na década de 1990, por meio do
convênio firmado entre a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e as instituições que
tivessem interesse, garantindo a isenção de pagamento de 50% do valor da mensalidade.
O acesso de estudantes indígenas a programas como o ProUni e Enem não tem
funcionado bem, por uma série de motivos, em especial devido às dificuldades de se
obter informações sobre os programas mencionados, assim como de acesso à Internet,
conforme afirmação do estudo desenvolvido por Brand e Calderoni (2012).
102
O referido estudo dos autores acima citados também revela que a busca pelas
IES particulares decorre das dificuldades dos acadêmicos em ingressarem nas IES
públicas, somadas à opção pelo horário noturno de alguns cursos e/ou à proximidade
dos campi.
Levantamento realizado pelo Projeto Rede de Saberes, em 2008, relata que a
Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) oferecia bolsa de 50% na mensalidade para
todos os alunos indígenas, e a FUNAI arcava com bolsa de 25% da mensalidade para 25
acadêmicos dessa universidade. Já o Centro Universitário da Grande Dourados –
UNIGRAN, no ano de 2007, oferecia bolsa de 50% para os seus 46 alunos indígenas
matriculados. A Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do
Pantanal – UNIDERP – contava com bolsas de 25% de desconto na mensalidade pela
FUNAI, oferecidas para 15 acadêmicos indígenas, dos 19 matriculados, em 2007.
Estudo realizado por Brand e Calderoni (2012) constatou que, no Estado, a
UCDB e a UNIGRAN, no ano de 2011, contavam com 130 acadêmicos indígenas em
cursos regulares, que recebiam descontos especiais de 50% nas mensalidades. E a
UEMS, naquele mesmo ano, possuía 284 acadêmicos indígenas inseridos em diversos
cursos regulares de graduação.
Inicialmente esses números podem representar um aumento na quantidade de
ingressantes, mas ainda nos questionamos sobre alguns aspectos do acesso à educação
superior. Entre eles, a necessidade de estudos mais aprofundados que possam nos
apontar alguns caminhos para a seguinte questão: dos alunos indígenas concluintes do
ensino médio, quantos ingressam na educação superior?
De acordo com o último levantamento realizado pelo INEP (2013), o estado de
Mato Grosso do Sul conta com 44 Instituições de Educação Superior (IES) do Estado,
das quais, 40 são privadas e quatro públicas. Das 40 IES privadas, na classificação por
organização acadêmica há duas universidades, dois centros universitários e 36
faculdades. Das quatro IES públicas, três são universidades e um, instituto tecnológico.
Em relação à categoria, das 40 IES privadas, sete são privadas com fins lucrativos e 33
privadas sem fins lucrativos. Das quatro IES públicas, três são públicas federais e uma,
pública estadual, conforme se observa no Quadro 4a.
Como se observou o acesso à educação superior de indígenas no Estado tem se
dado tanto através da IES públicas e privadas.
103
Quadro 4a: Instituições de Educação Superior no Mato Grosso do Sul, por organização acadêmica e categoria – Ano base 2013 INSTITUIÇÃO (IES) ORGANIZAÇÃO
ACADÊMICA CATEGORIA
CENTRO UNIVERSITÁRIO ANHANGUERA DE CAMPO GRANDE
Centro Universitário Privada com fins lucrativos
CENTRO UNIVERSITÁRIO DA GRANDE DOURADOS (UNIGRAN)
Centro Universitário Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE ANHANGÜERA DE DOURADOS (FAD)
Faculdade Privada com fins Lucrativos
FACULDADE CAMPO GRANDE (FCG) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE CHAPADÃO DO SUL (FACHASUL)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE FÁTIMA DO SUL (FAFS)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE NOVA ANDRADINA (FANA)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO DE NOVA ANDRADINA - FANOVA (FANOVA)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE AMAMBAI (FIAMA) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS DE NAVIRAI (FACINAV)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS DE NOVA ANDRADINA - FACINAN (FACINAN)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE EDUCAÇÃO DE COSTA RICA (FECRA)
Faculdade Privada com fins lucrativos
FACULDADE DE EDUCAÇÃO DE NOVA ANDRADINA (FENA)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE EDUCAÇÃO, TECNOLOGIA E ADMINISTRAÇÃO DE CAÇÕES AFIRMATIVASRAPÓ (FETAC)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE LETRAS DE NOVA ANDRADINA (FALENA)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE PEDAGOGIA (ANAEC) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE PONTA PORÃ (FAP) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE SELVÍRIA (FAS) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE TECNOLOGIA DE NOVA ANDRADINA
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE TECNOLOGIA DE PONTA PORÃ (FATEP)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE TECNOLOGIA SENAI CAMPO GRANDE
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE DE TURISMO DE NOVA ANDRADINA (FATUR)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE ESTÁCIO DE SÁ DE CAMPO GRANDE (FESCG)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE MATO GROSSO DO SUL (FACSUL)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE SALESIANA DE SANTA TERESA (FSST)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE CASSILÂNDIA (FIC)
Faculdade Privada com fins lucrativos
104
INSTITUIÇÃO (IES) ORGANIZAÇÃO ACADÊMICA
CATEGORIA
FACULDADES INTEGRADAS DE FÁTIMA DO SUL (FIFASUL)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE NAVIRAÍ (FINAV)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE PARANAÍBA - FIPAR (FIPAR)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE PONTA PORÃ (FIP)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE RIO VERDE (FIRVE)
Faculdade Privada com fins Lucrativos
FACULDADES INTEGRADAS DE TRÊS LAGOAS (AEMS)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADES MAGSUL (FAMAG) Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE SUPERIOR DE RIBAS DO RIO PARDO (FASURP)
Faculdade Privada com fins Lucrativos
FACULDADE TEOLÓGICA BATISTA ANA WOLLERMAN (FTBAW)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FACULDADE UNIGRAN CAPITAL (UNIGRAN CAPITAL)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS (UFGD)
Universidade Pública Federal
INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA FUNLEC (IESF)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR DA FUNLEC DE BONITO (IESF)
Faculdade Privada Sem fins lucrativos
INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MATO GROSSO DO SUL (IFMS)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
Pública Federal
UNIVERSIDADE CATÓLICA DOM BOSCO (UCDB)
Universidade Privada Sem fins lucrativos
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL (UEMS)
Universidade Pública Estadual
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL (UFMS)
Universidade Pública Federal
UNIVERSIDADE ANHANGUERA UNIDERP Universidade Privada Com fins lucrativos
Elaborado pela autora Fonte:NEP (2013) http://emec.mec.gov.br/
105
3.6 Indígenas nas universidades brasileiras
A seguir discorreremos sobre as primeiras iniciativas de políticas de Ações
Afirmativas como o foco na educação para indígenas presentes na Federação e no
estado do Mato Grosso do Sul.
A Constituição Federal de 1988 é um marco importante no reconhecimento das
diversidades culturais e étnicas, pois assegura aos povos indígenas o respeito às
diferenças. Conforme afirma Januário (2002):
A educação intercultural valoriza o desenvolvimento de estratégias que promovem a construção das identidades particulares e o reconhecimento das diferenças. Trabalha na perspectiva de que as instituições educativas reconheçam o papel ativo do educando na elaboração, escolha e atuação das estratégias pedagógicas. Essa prática educacional está constantemente repensando as funções, os conteúdos e os métodos escolares, de modo a afastar-se do caráter monocultural presente no universo escolar (p. 18).
Para assegurar essa educação intercultural, iniciou-se a formação superior de
professores indígenas, abrindo um leque para as questões relacionadas ao ensino
superior. No Brasil, várias universidades iniciaram com o curso Normal Superior, que
normalmente ainda é oferecido durante as férias escolares.
Como vimos anteriormente, os movimentos e encontros organizados pelos
professores indígenas somaram-se às forças das ONGs e associações que impulsionaram
e obrigaram o país a discutir o estabelecimento de uma política de inclusão e de
permanência de indígenas nas universidades.
Os povos indígenas buscam a formação superior para o fortalecimento dos
conhecimentos indígenas, reelaboração de mecanismos de produção e negociação de
conhecimentos para que possam gerir seus territórios, planejar e desenvolver projetos
em proveito de suas comunidades.
No que se refere à formação de professores indígenas, a Resolução nº 3 de 10 de
novembro de 1999 do Conselho Nacional de Educação estabeleceu, naquela data, o
prazo de 10 anos para que todos os professores indígenas possuam o ensino superior .
É nesse cenário que foi criado pelo Ministério da Educação o Programa
Diversidade na Universidade (PDU), instituído por meio da lei n. 10.558, de 13 de
novembro de 2002, por meio de recursos internacionais do Banco Interamericano de
Desenvolvimento. O objetivo primordial do Programa Diversidade na Universidade
106
era“promover la equidad educativa y la diversidad en la enseñanza superior para los
afro descendientes y indígenas y otros grupo socialmente desfavorecidos del país” (BID,
2002, p. 1) e também pretendia:
[...] dar contar das pressões internacionais sobre apolítica de cotas, a Diversidade na Universidade, ao atuar nos cursos preparatórios para o vestibular, entre o ensino médio e o superior, pretendia dar conta também das demandas provenientes de setores do movimento negro que estavam mobilizados com a construção desses cursos pré-vestibulares (ALMEIDA, 2008, p 62).
A proposta do PDU destinava-se, inicialmente, a afrodescendentes, mas
pressões dos movimentos indígenas e indigenistas ligados especialmente à educação
questionaram que a diversidade sugerida pelo Programa não incluísse os povos
indígenas, de modo que os atores envolvidos na elaboração das propostas passaram a
inclui-los.
A autora acima citada aponta:
Algumas experiências importantes, que se constituíram como marcos para esse tipo de movimento, são os cursos do Instituto Cultural Steve Biko que vêm sendo realizados desde 1992 em Salvador/BA, o Movimento Pré-Vestibular para Negros e Carentes (PVNC), no Rio de Janeiro, e o Movimento dos Sem-Universidade (MSU) (ALMEIDA, 2008, p 62).
O Programa previa auxílio financeiro para bolsas de estudo para alunos
indígenas, e em alguns casos, para professores e coordenadores. As instituições
interessadas deveriam concorrer ao programa via editais públicos.
Com o objetivo de atender aos princípios de igualdade, mas, principalmente
,atentar ao contexto da equidade e diversidade sociocultural, assim como tentar
responder aos desafios da inclusão, foi criada no Brasil, no ano de 2004, no Ministério
da Educação e Cultura (MEC), a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade (SECAD).
O objetivo institucional do SECAD era contribuir para a redução das
desigualdades educacionais com políticas públicas que assegurassem a ampliação do
acesso e da educação continuada, valorizando a diversidade social, cultural e étnico-
racial da população.
107
Naquele mesmo ano foi realizado, no Distrito Federal, o seminário “Desafios
para uma Educação Superior para os Povos Indígenas”, reafirmando que as políticas de
Ações Afirmativas que objetivam a inclusão social do indígena no ensino superior
devem conjugar uma perspectiva pluricultural, que respeite a diversidade e as
perspectivas indígenas diferenciadas, sob pena de tornarem-se expediente de controle e
regulação burocrática das demandas de cidadania indígena (RELATÓRIO
SEMINÁRIO, 2004).
Em 2004, o projeto de lei nº 3627/04, aprovado em novembro de 2008, no dia
em que se comemora a Consciência Negra, assegurava que as instituições públicas
Federais de educação superior deveriam reservar, no mínimo, 50% de vagas para alunos
que cursaram integralmente o ensino médio em escolas públicas, incluindo, nessa cota,
os afrodescendentes e indígenas, de acordo com a proporção de negros, pardos e índios
na população do estado, conforme os dados do censo do IBGE.
Mesmo sendo considerada uma medida compensatória, o sistema de cotas ainda
é a única forma de acesso dos indígenas aos cursos superiores, principalmente aos
cursos mais prestigiados, como Direito, Medicina e outros, nos quais a concorrência no
vestibular é mais desigual do que em qualquer outro grupo social.
Destacam-se iniciativas como
Em julho de 2001, foi implantada a primeira licenciatura indígena do país pela Universidade do Estado do Mato Grosso (UNEMAT), de forma intervalar. Em dezembro do mesmo ano, a Universidade Federal de Roraima (UFRR) também implantou cursos específicos para formar professores índios, com a criação do Núcleo Insikiran (DAVID, 2013, p. 114).
Naquele mesmo ano a UEMS criou o Curso Normal Superior, inicialmente para
professores indígenas das etnias Terena e Kadwéu e, a partir de 2003, para os
professores Guaranis Kaiowás. Nesse mesmo movimento foi criada a licenciatura
Guarani Teko Arandu, uma parceria entre a Universidade Católica Dom Bosco e a
Universidade da Grande Dourados, construída a partir de encontros com professores
indígenas das etnias Guaranis Kaiowás.
Também nessa perspectiva, o Projeto Trilhas do Conhecimento, implantado
desde o ano de 2004, com o apoio da Fundação Ford e Pathways to Higher Education,
tem contribuído para o estímulo ao ingresso e permanência de estudantes indígenas nas
universidades brasileiras. O Programa realiza encontros, produz materiais didáticos e
pesquisas. Apoia também o projeto de extensão Rede de Saberes da Universidade
108
Estadual de Mato Grosso do Sul, que será discutido detalhadamente no capítulo 4
(LÁZARO et al, 2013).
A Declaração Universal sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada na
Assembleia Geral da ONU, no dia 13 de setembro de 2007, é considerada uma das mais
importantes medidas sobre a questão étnica e racial no âmbito do direito internacional
(ALMEIDA, 2008) (ANEXO 5). Entre os vários aspectos de garantia dos direitos
humanos universais, a referida Declaração aborda a educação indígena no seu artigo 14:
1. Os povos indígenas têm direito de estabelecer e controlar seus sistemas e instituições docentes que os eduquem em seus próprios idiomas, em consonância com seus métodos culturais de ensino e aprendizagem.
2. As pessoas indígenas, em particular as crianças indígenas, têm direito a todos os níveis e formas de educação do Estado sem discriminação.
O estudo realizado por Cajueiro (2008) entre os anos de 2001 e 2007 constatou
que existiam no país 30 IES estaduais e federais que contemplavam populações
indígenas com alguma forma de Ação Afirmativa. Entre as modalidades de Ação
Afirmativa estavam inclusos o sistema de cotas para vestibular e pontos adicionais,
conforme se observa no Quadro 5.
109
Quadro 5: Instituições de Educação Superior – federais e estaduais – vagas suplementares e cotas para indígenas.
INSTITUIÇÃO
ESTADO DESCRIÇÃO SELEÇÃO
UFPR Resolução n. 37/2004
Paraná 07 vagas suplementares aos Indígenas residentes no Paraná
Vestibular Específico
UEL Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UEM Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UEPG Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UNICENTRO Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UNESPAR Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UENP Lei Estadual 14.995/2006
Paraná 06 vagas suplementares aos indígenas residentes no Paraná Vestibular Específico
UFSC Resolução n. 37/2004
Santa Catarina
Para candidatos pertencentes aos povos indígenas, serão criadas 5 vagas suplementares que serão preenchidas pelos candidatos melhor classificados no vestibular
Vestibular geral
UFSM Resolução 011/2007 de 03/08/2007
Rio Grande do Sul
Sistema cidadão presente: para candidatos indígenas; serão criadas até 5 novas vagas, distribuídas nos cursos de graduação em que houver procura
Vestibular geral
UFRGS Decisão do CEPE n. 039/2007
Rio Grande do Sul
Oferta de 10 vagas suplementares àquelas ofertadas no concurso vestibular 2008, a serem disputadas pelos estudantes indígenas do território nacional
Vestibular específico
UNIMONTES Lei n. 15.259 de 27/07/2004
Minas Gerais
Portadores de deficiência e indígenas: 5% de reserva em cada curso
Vestibular geral
UEMG Lei n. 15.259 de 27/07/2004
Minas Gerais
Portadores de deficiência e indígena: 5% de reserva em cada curso
Vestibular geral
UFSCar Resolução CEPE n. 563 de 05/11/2007
São Paulo 01 vaga suplementar em cada curso de graduação para candidatos indígenas
Vestibular geral
UNIFESP Resolução 42 de 12/07/2007
São Paulo Para candidatos que optarem pelo sistema de cotas e que se autodeclararem com cor de pele preta, parda ou indígena e tenham cursado o Ensino Médio integralmente em escolas públicas, são oferecidas mais 10% de vagas em cada curso
Vestibular geral
UFABC Resolução UFABC n. 02 de 28/04/2006
São Paulo Em cada entrada de 500 vagas, serão reservadas 250 como cotas para egressos de escola pública e negros, sendo 01 para indígena
Vestibular geral
UNICAMP Deliberação A12-04 de 28/04/2004
São Paulo Após a 2ª fase do vestibular, acréscimo de 30 pontos à Nota Padronizada se forem egressos da escola pública, para os indígenas ainda mais 10 pontos
Vestibular geral
UFT Tocantins 5% das vagas de cada curso, são disponibilizados para indígenas
Vestibular geral
UFRR Resolução n. 08/07 do CEPE de 16/10/2007
Roraima Reserva de 23 vagas para indígenas Vestibular específico
UEA Art. 5º caput da lei 2.894 de 31/05/2004
Amazonas Reserva de 170 vagas para candidatos indígenas do estado Vestibular geral
UNEB Resolução n. 468/2007 do CONSU de 16/08/2007
Bahia 5% de vagas para candidatos indígenas Vestibular geral
110
INSTITUIÇÃO
ESTADO DESCRIÇÃO SELEÇÃO
UEFS Resolução do CONSU 034/2006
Bahia 02 vagas por curso para indígenas Vestibular geral
UESC 63ª Reunião Ordinária do CONSEPE, realizada no dia 20/12/2006
Bahia Admitidas o acréscimo de até 02 vagas em cada curso, para indígenas reconhecidos pela FUNAI
Vestibular geral
UFBA Resolução CONSEPE n. 01/04 de 2004
Bahia
Abertura de até 02 vagas extras para indígenas aldeados e egressos da escola pública; além de 2% das vagas para os que se declararem descendentes de índios e forem egressos de escola pública
Vestibular geral
UFRB Resolução Consepe n. 01/04
Bahia
6,45 das vagas para candidatos de escola pública que se declararem de qualquer etnia ou cor; e, acréscimo de até 02 vagas para os que se declararem descendentes de índio
Vestibular geral
CEFET-BA Resolução n. 10 de 01/06/2006 do Conselho Diretor
Bahia Reserva de 5% para estudantes que se declararem índios ou seus descendentes
Vestibular geral
UFMA Resoluções 568 e 569 do CONSEPE de 24/10/2007 e Resoluções n. 48/2005 e 69/2006 do CONSAD
Maranhão 01 vaga adicional para índio por curso, a partir de 2008 Vestibular geral
UFMT Resolução CONSEPE n. 083 de 12/09/2007
Mato Grosso
Reserva de vagas nos cursos de agronomia (02); engenharia sanitária e ambiental (03); engenharia florestal (03) e nutrição (02)
Vestibular específico
UEG Lei n. 14.832 de 12/07/2004
Goiás
Reserva de 5% de vagas para indígenas e portadores de deficiência
Vestibular geral
UnB Convênio firmado em 13/05/2004 entre a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e a Fundação Universidade
Distrito Federal
Criação de vagas suplementares nos cursos de agronomia (02); enfermagem e obstetrícia (02); engenharia florestal (02); medicina (02) e nutrição (02)
Vestibular específico
UEMS Lei estadual n. 2.589 de 26/12/2002
Mato Grosso do
Sul
Cotas de 10% das vagas para indígenas Vestibular geral
Fonte: Cajueiro (2008).
Destaca-se que entre as IES do país, em 2002, a Universidade Estadual do Rio
de Janeiro (UERJ) foi a primeira instituição estadual a determinar cotas universitárias
para o ingresso diferenciado de negros e pardos.Em seguida, em 2003, a Universidade
Estadual da Bahia (UNEB), as estaduais do Paraná e a Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul (UEMS) adotaram o mesmo sistema.
A UEMS, no entanto, é pioneira, pois destina à população indígena 10% das
vagas. Já a Universidade Estadual da Bahia (UNEB)reserva 5% para estudantes que se
declararem índios ou seus descendentes, conforme se observa no quadro acima.
A Universidade de Brasília (UnB), em 2004, foi a primeira universidade federal
a adotar uma política de Ação Afirmativa, destinando uma reserva de cotas para negros
e de vagas suplementares para acadêmicos indígenas (BRAND & ATHAYDE, 2009).
111
Em relação ao apoio estudantil, no dia 23 de dezembro do ano de 2009, com o
apoio do SECAD, foi aprovada a Lei 12.155, regulamentada pelo Decreto 7.416 de
dezembro de 2010, cujos artigos 9º a 13 dispõem:
Art. 9o Fica o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE – autorizado a conceder bolsas para alunos e professores vinculados a projetos e programas de ensino e extensão voltados a populações indígenas, quilombolas e do campo.
Art. 10.Ficam as instituições federais de educação superior autorizadas a conceder bolsas a estudantes matriculados em cursos de graduação, para o desenvolvimento de atividades de ensino e extensão, que visem (Regulamento):
I - à promoção do acesso e permanência de estudantes em condições de vulnerabilidade social e econômica; e
II - ao desenvolvimento de atividades de extensão universitária destinadas a ampliar a interação das instituições federais de educação superior com a sociedade.
E no:
Art. 12.As bolsas previstas nos arts. 10 e 11 adotarão como referência os valores das bolsas correspondentes pagas pelas agências oficiais de fomento à pesquisa, bem como as condições fixadas em regulamento do Poder Executivo, que disporá, no mínimo, sobre (Regulamento):
I - os direitos e obrigações dos beneficiários das bolsas;
II - as normas para renovação e cancelamento dos benefícios;
III - a periodicidade mensal para recebimento das bolsas;
IV - as condições de aprovação e acompanhamento das atividades, programas e projetos no âmbito das instituições de educação superior ou pesquisa;
V - a avaliação das instituições educacionais responsáveis pelos cursos;
VI - a avaliação dos bolsistas; e
VII - a avaliação dos cursos e tutorias.
Parágrafo único. O quantitativo de bolsas concedidas anualmente observará o limite financeiro fixado pelas dotações consignadas nos créditos orçamentários específicos existentes na respectiva lei orçamentária anual.
Art. 13.As despesas com a execução das ações previstas nos arts. 9oe 10 desta Lei correrão à conta de dotação orçamentária consignada anualmente aos respectivos órgãos e entidades, considerando os recursos próprios captados, observados os limites de movimentação, empenho e pagamento da programação orçamentária e financeira anual.
112
Em relação ao número de estudantes indígenas na educação superior os dados
ainda são escassos. Os estudos encontrados apontam que levantamento realizado pelo
Ministério da Educação em 2003 revelou um percentual de 1.300 indígenas que
ingressaram na educação superior. Desses, 60 a 70% estavam em Instituições de
Educação Superior privadas (SANTIAGO et al, 2008; PALADINO,2012).
Já no ano de 2011 havia cerca de 7.000 indígenas nas universidades brasileiras
frequentando os cursos de licenciatura específicos e os cursos regulares em
universidades públicas e particulares. Naquele mesmo ano, o estudo realizado pelo
Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA)24 registrou que 70
das 98 Universidades públicas estaduais e federais adotavam políticas de Ação
Afirmativa e, entre elas, 36 especificamente para indígenas (FERES JÚNIOR et al,
2011; PALADINO, 2012).
Outro estudo desenvolvido em 2013 pelos autores David et al (2013) apontam
que:
Segundo dados fornecidos pela Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (CGEEI/ SECADI/MEC), há 6.336 alunos indígenas em instituições de ensino superior, o que corresponde a 0,1% dos 6,3 milhões de matrículas em cursos de graduação no país (p.113).
O que nos chama atenção nessas informações é a presença indígena na educação
superior, que é de 0,1%, número pequeno quando comparado ao percentual de índios no
Brasil que é de 0,5%. Portanto, há ainda um número importante de jovens e
adolescentes fora das universidades.
Estudo divulgado pela Secretaria de Ensino Superior (Sesu/MEC) em novembro
de 2014 aponta que, em 2013, o total de estudante nas universidades federais era de
221.650, sendo 70.849 estudantes cotistas. Já no ano de 2014, o número total cresceu
cerca de 10%, ou seja, chegou a 243.383, e o número de cotistas subiu cerca de 30%,
num total de 98.121 estudantes negros e indígenas, conforme se observa no Quadro 6 a
seguir.
24 Vinculado Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual de Rio de Janeiro. Importante Grupo nos estudos com o enfoque em Ação Afirmativa voltada para negros e indígenas.
113
Quadro 6: Número total de estudantes matriculados e de cotas nas Universidades Federais - Ano 2013 -2014
ANO NAS UNIVERSIDADES
TOTAL COTAS
2013 221.650 70.849
2014 243.383 98.121
TOTAL 465.033 168.970
Fonte: Secretaria de Ensino Superior (Sesu/MEC). Novembro 2014.
114
CAPÍTULO IV
POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO
DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E
EDUCACIONAIS
115
CAPÍTULO IV – POPULAÇÕES INDÍGENAS DO BRASIL E DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL: ASPECTOS SOCIOECONOMICOS, DEMOGRÁFICOS E EDUCACIONAIS
4.1 Apresentação
Diante da diversidade e complexidade das populações indígenas no território
nacional, considerou-se importante contextualizar aspectos sobre os povos que habitam
o Brasil e, em especial, aqueles localizados no estado de Mato Grosso do Sul.
Nesse sentido, serão descritas, a seguir, aspectos gerais relacionados à temática
de escolarização, condições sociodemográficas e econômicas das populações indígenas
localizadas no Brasil e, em especial, do estado de Mato Grosso do Sul, na tentativa de
aproximações ao panorama atual de exclusão social que assola tais povos. Ressalto que
não se objetiva, neste capítulo, a aprofundamentos sobre as especificidades de cada uma
das etnias presentes no Estado, uma vez que não se trata do objetivo deste estudo.
4.2 A realidade das populações indígenas do Brasil
De acordo com os resultados do Censo Demográfico realizado pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), 817,9 mil pessoas se declararam, no
quesito cor ou raça, indígenas, representando 0,4% da população total do Brasil.
Agregando-se àquelas pessoas que não se declararam, no quesito cor ou raça, indígenas,
mas se consideraram indígenas, captadas dentro das terras indígenas, o total de
população indígena residente no território nacional passou a 896,9 mil pessoas, o que
corresponde a um acréscimo de 78,9 mil indígenas, conforme se observa na Tabela 7 a
seguir.
116
Tabela 7: População indígena e distribuição percentual por localização de domicílio e condição de indígena, segundo as grandes regiões, 2010 – Brasil.
Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio
Grandes Até 1 salário mínimo Sem rendimento nominal mensal Regiões
Nas Terras Indígenas
Fora das Terras
Indígenas
Nas Terras Indígenas
Fora das Terras Indígen
Brasil 27,9 32,8 65,8 39,5 Norte 22,6 32,2 72,6 53,2 Nordeste 36,5 40,3 58 40 Sudeste 30,7 25,3 59,1 31,3 Sul 35,7 28,4 53,7 31,8 Centro-Oeste 27,3 31,3 64,1 36,6 Fonte: IBGE, 2012.
Outro dado igualmente expressivo é o número de pessoas que se declararam
indígenas e estão fora de seus territórios: 379.534. Muitos grupos vêm se organizando
fora dos territórios indígenas em busca de trabalho e educação, fatores estes associados
à perda de espaço para a produção e conflitos territoriais.
Há também 82 referências de grupos indígenas não contatados, das quais 32
foram confirmadas. Na região da Amazônia Legal, habitam 60% dos indígenas do
Brasil, sendo cerca de 15% nas cidades. Existem, ainda, grupos em fase de
reconhecimento de sua condição indígena junto ao órgão federal indigenista.
Os povos indígenas do Brasil possuem uma grande diversidade, não somente em
termos de distribuição geográfica, mas também no que se refere à diversidade
linguística, configurações particulares de costumes, crenças, formas de inserção no meio
ambiente, de história de interação com os colonizadores e de relação com o Estado
nacional brasileiro.
A diferença étnica provém do reconhecimento étnico, que se pauta em critérios
definidos pela consciência da identidade indígena e de pertencimento a um grupo
117
diferenciado dos demais segmentos populacionais do Brasil e também por parte dos
membros do próprio grupo25.
Além da diversidade, outro ponto que merece destaque que muitas informações
sobre os indígenas no país ainda são inconsistentes, especialmente quando comparamos
as informações fornecidas por órgãos oficiais, como a FUNAI, SESAI e o IBGE. Neste
estudo optou-se pelos dados trazidos pelo IBGE.
Em relação aos níveis educacionais das populações indígenas do Brasil, o estudo
realizado pelo IBGE aponta que:
[…] com informações mais gerais provenientes do Questionário Básico, investigada para todas as pessoas, que conceitualmente consiste em considerar como alfabetizada a pessoa capaz de ler e escrever pelo menos um bilhete simples no idioma que conhece, é possível identificar os primeiros aspectos. É importante ressaltar que a educação indígena envolve aspectos específicos que os procedimentos de captação de informações nos Censos Demográficos não permitem aprofundamentos, com destaque para os currículos diferenciados, o conhecimento dos saberes tradicionais e, principalmente, o uso das línguas indígenas, entre outros (IBGE, 2012, p. 69).
No cenário da desigualdade ao acesso à educação, o Fundo das Nações Unidas
para a Infância (UNICEF, 2012) aponta que 500 mil crianças e adolescentes de 7 a 14
anos estão fora da sala de aula. Desse total, os povos indígenas constituem um dos
contingentes mais atingidos.
Outro fato que se configura como um desafio é a continuidade do processo de
escolarização. Estudo desenvolvido pelo Anuário Brasileiro da Educação Básica (2014)
demonstra esta realidade: em 2012, um total de 167.338 jovens estavam matriculados
nos anos iniciais do ensino fundamentais; este número caí para uma proporção bem
menor nos anos finais nesta etapa de ensino (53.843), conforme observarmos no Quadro
7 abaixo. Entre os matriculados no ensino médio, este número se reduz drasticamente
para 17.586. Representando, desta forma, a grande lacuna de oportunidades escolares,
muitos jovens e adolescentes indígenas são obrigados a abandonar a escola para
trabalhar e garantir a sua subsistência (VEIGA & D’ANGELIS, 2010).
25 Lei nº. 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio); Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988; e Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT (Convenção sobre os Povos Indígenas e Tribais), adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989.
118
Quadro 7: Número de matriculas na Educação indígena por modalidade e etapa de ensino – Brasil: 2007-2012
Fonte: Anuário Brasileiro da Educação Básica (2014)
O levantamento do IBGE também apontou, conforme Quadro 8 abaixo, que a
taxa de alfabetização entre pessoas de 10 anos em terras indígenas é de 69,7%, e, fora
dessas terras, de 86,2%. Para as pessoas de 15 anos ou mais, o total é de 67,7% dentro
das terras indígenas e 86,5% fora. Em relação à taxa de analfabetismo, entre aqueles de
10 anos ou mais, esta é de 30,3% nas terras indígenas, e de 13,8% fora das aldeias; entre
aqueles de 15 anos ou mais, é de32,3% dentro e de 14,5% fora das aldeias.
119
Quadro 8: Pessoas indígenas de 10 anos ou mais e de 15 anos ou mais de idade, por localização do domicílio, segundo algumas características educacionais e o sexo Brasil – 2010.
Características Pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade e de 15 anos ou mais
de idade por localização do domicílio Educacionais e sexo 10 anos ou mais 15 anos ou mais
Total
Nas Terras indígenas
Fora das Terras indígenas
Total
Nas Terras indígenas
Fora das Terras indígenas
Pessoas
indígenas 677 570 356 164 321 406 573 349 286 789 286 560
Homens 340 881 185 455 155 426 287 832 149 956 137 876
Mulheres 336 689 170 709 165 980 285 517 136 833 148 684
Taxa de alfabetização 77,5 69,7 86,2 76,6 67,7 85,5 Homens 78,5 71,5 86,8 78 70,3 86,4 Mulheres 76,5 67,7 85,6 75,2 64,9 84,7 Taxa de analfabetismo 22,5 30,3 13,8 23,4 32,3 14,5 Homens 21,5 28,4 13,2 22 29,7 13,6 Mulheres 23,5 32,3 14,4 24,8 35,1 15,3 Fonte: IBGE, 2012.
Dessa forma, observa-se que a taxa de analfabetismo é maior nas terras
indígenas. Esse fato está associado a inúmeros fatores questões como, por exemplo:
dificuldades de acesso às escolas dentro das reservas, falta de documentos para efetivar
matrículas, migração constante das famílias, entre outros
As dificuldades encontradas pelas populações indígenas brasileiras de manter
sua subsistência por meio da produção da terra, em algumas aldeias em que estão
extintas práticas culturais, como a caça e a pesca, têm acarretado, em algumas
comunidades, a busca por trabalhos remunerados, alguns dentro das próprias aldeias,
como professores, funcionários da FUNAI, Secretaria Especial de Saúde Indígena
(SESAI) e outros órgãos públicos localizados nas reservas indígenas, atuando como
agentes comunitários de saúde, agentes de saneamento, enfermeiros, assistentes sociais,
psicólogos, cozinheiras, merendeiras, faxineiras. E muitos outros fora da aldeia, como,
por exemplo, nas usinas, nas fazendas, na construção civil, entre outros.
120
A forma de subsistência tem configurado um cenário de pobreza em algumas
comunidades, conforme afirmação do estudo do IBGE (2012):
[…] comparados à população brasileira em geral, os resultados revelados pelo Censo Demográfico 2010 indicam distribuições de rendimentos muito desfavoráveis aos indígenas. Metade das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade não possuem qualquer tipo de rendimento, sendo a proporção para os residentes na área rural bastante expressiva. No Brasil, como um todo, 83,0% das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade recebem até 1 salário mínimo ou não possuem rendimentos (p.101).
Ainda em relação às questões de subsistência, o referido estudo do IBGE aponta
a proporção de pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade, com até um salário
mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as
Grandes Regiões. Na região Centro-Oeste, 27,3% recebiam até um salário mínimo nas
terras indígenas e 31,3% fora delas; sem nenhum rendimento, 64,1% nas terras
indígenas e 36,6% fora (Quadro 9). Este dado pode revelar a busca por outras formas de
sobrevivência de tais povos fora dos espaços territoriais das reservas indígenas.
Quadro 9: Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até 1 (um) salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio, segundo as Grandes Regiões - Brasil – 2010.
Grandes Proporção das pessoas indígenas de 10 anos ou mais de idade com até
Regiões 1 salário mínimo e sem rendimento nominal mensal, por localização do domicílio
Até 1 salário mínimo Sem rendimento nominal mensal
Nas Terras indígenas
Fora das Terras indígenas
Nas Terras indígenas
Foras das Terras indígenas
Brasil 27,9 32,8 65,8 39,5 Norte 22,6 32,2 72,6 53,2 Nordeste 36,5 40,3 58 40 Sudeste 30,7 25,3 59,1 31,3 Sul 35,7 28,4 53,7 31,8 Centro-Oeste 27,3 31,3 64,1 36,6 Fonte: IBGE, 2012.
121
4.3 A realidade das populações indígenas do estado de Mato Grosso do Sul
Discorreremos a seguir sobre as populações indígenas do estado de Mato Grosso
do Sul, para tanto foi realizado levantamento de publicações cujo tema central tratava
das condições de vida e a escolarização de tais povos.
O estado de Mato Grosso do Sul, segundo informações da Secretaria Especial de
Saúde Indígena (2012), possui a segunda população indígena do Brasil,
aproximadamente 70.383 pessoas, conforme o Quadro 10 abaixo, das etnias Guarani
Ñandeva, Guarani Kaiowá, Terena, Kadiwéu, Kinikinau, Guató, Kamba e Ofaié.
Quadro 10: População Indígena de 2012 cadastrada no SIASI por região, UF, Região e Município – Mato Grosso do Sul.
REGIÃO BRASIL UF
REGIÃO SAÚDE MUNICÍPIO
TOTAL DE INDÍGENAS
Aquidauana 6.890 Bodoquena 877 Bonito 892 Macrorregião Campo Grande 2.874 de Campo Grande Corumbá 152 Miranda 7.072 Sidrolândia 3.521 CENTRO MS Três Lagoas Brasilândia 103 OESTE Amambai 12.810 Antônio João 1.954 Caarapó 6.197 Dourados Dourados 14.246 Iguatemi 4.679 Paranhos 4.726 Tacuru 3.390 Total 70.383 Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.
Tal qual no plano nacional, o processo histórico de integração monocultural e o
confinamento e imposto pelo estado nacional e a perda territorial trouxeram
consequências nefastas aos povos indígenas do estado de Mato Grosso do Sul.
Terras que, para esses povos, são:
... sagradas, um patrimônio étnico em cujas dimensões espaciais se traduzem formas de viver e de se organizar diferenciadas da sociedade envolvente. São áreas onde o exercício da posse da terra não corresponde à lógica de produção capitalista, a ser utilizada como um mero instrumento de mercado, mas sim
122
onde se verificam significados culturais peculiares no usufruto de seus recursos, bem como nas dinâmicas de organização social, permanência e trânsito de seus habitantes e suas relações de poder, sendo marcante a necessidade de preservação da biodiversidade existente e a recomposição de áreas que foram desmatadas. Por fim, são os locais onde se reproduzem a diversidade linguística e os conhecimentos tradicionais destes povos (HECK & MACHADO, 2011, p.48).
No estado de Mato Grosso do Sul, os indígenas, em sua maioria, vivem um
contexto marcado pela expropriação territorial e correspondente confinamento em terras
indígenas exíguas, com recursos naturais profundamente comprometidos. Este cenário
obriga a uma dependência externa por meio de novas formas de sobrevivência como
assalariados, especialmente nos canaviais e usinas de produção de açúcar e álcool, nas
fazendas, e, dentro das próprias aldeias, como professores, serviços gerais em escolas,
postos da FUNAI, agentes de saúde, agentes de saneamento, entre outros (BRAND,
2003).
A escassez de território e o confinamento dos indígenas, geram condições
insuficientes para suprir as suas necessidades socioeconômicas, gerando desorganização
social, desconstrução dos laços familiares, perda da mata nativa, da riqueza dos rios e
dos solos, afetando as formas tradicionais de subsistência e impactando diretamente na
cultura, na língua, na religião, enfim, no modo de ser de cada povo.Com a saída dos
homens para o trabalho fora do território indígena cabe à mulher a responsabilidade da
educação dos filhos e cuidado das famílias, comprometendo, desta forma, as práticas
culturais, assim como a organização social e política (BRAND, 2007; LÁZARO &
TAVARES, 2013).
O estudo da situação dos indígenas do Estado organizado por Sauer (2014)
aponta que:
A difícil situação dos indígenas no Mato Grosso do Sul se insere num cenário nacional de expropriação territorial. Inclusive é um processo que percorre toda a América Latina, numa disputa por recursos naturais. O que alarda no caso investigado é a dimensão do problema e o grau de acirramento que a questão assume no Estado com a segunda maior população indígena do país (p.11).
O referido relatório aponta que a população indígena de Mato Grosso do Sul tem
enfrentado uma grave situação de violação de seus direitos fundamentais, que se iniciam
com a negação de seus territórios, de exclusão social até a negação de seus direitos
básicos, como o direito à água e à alimentação. No Estado, os Guaranis Kaiowás – a
123
maioria residente nas reservas indígenas de Amambai e Dourados – registram os
maiores índices de pobreza.
O relatório do Conselho Indigenista Missionário (2014, p. 17) aborda as
condições de vida e violação dos direitos dos povos indígenas do estado de Mato Grosso
do Sul:
O reflexo mais perverso desse contexto está na realidade dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, onde a maioria das comunidades vive em situação de conflito com os fazendeiros – como é o caso das terras do povo Terena e de grande parte das áreas reivindicadas pelos Guarani-Kaiowá –, em acampamentos improvisados nas margens das rodovias, nas áreas de preservação obrigatória – faixa de domínio – dentro das fazendas, ou confinados em reservas criadas pelo Serviço de Proteção aos Índios (SPI), no início do século passado.
Em relação às condições sociais, o relatório citado acima também enfoca que
somente no ano de 2013 registrou-se 33 vítimas de assassinatos, 16 casos de tentativas
de assassinatos, 50 vítimas de suicídios e 90 vítimas de mortalidade na infância no
estado de Mato Grosso do Sul.
Boa parte dessa população é dependente de programas assistenciais, como o
Bolsa Família, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), aposentadoria e o
programa de cesta básica do Governo do Estado, entre outros. No entanto, tais
programas, apesar de necessários e emergenciais, contribuem para uma dependência e
não avançam para discussões visando superar os problemas. Somando-se à dependência,
também há incoerências na gestão de tais programas, que nem sempre levam em
consideração as realidades indígenas. Por exemplo, cestas básicas com alimentos que
não fazem parte de hábitos e costumes das comunidades indígenas.
O perfil de morbimortalidade de tais comunidades está estritamente relacionado
às condições de vida, sendo acometidos por doenças e agravos, como a pneumonia,
tuberculose, desnutrição infantil, alcoolismo, drogas e a violência. Além de outras como
as Doenças Sexualmente Transmissíveis, hipertensão e Diabetes (PICOLI et al, 2006;
GUIMARÃES & GRUBITS, 2007; FÁVARO et al, 2007; MARQUES et al, 2010;
FERREIRA et al, 2010a; FERRI & GOMES, 2011).
Em relação às condições sociais, o relatório do CIMI (2014) citado acima
também enfoca que somente no ano de 2013 registrou-se 33 vítimas de assassinatos, 16
casos de tentativas de assassinatos, 50 vítimas de suicídios e 90 vítimas de mortalidade
na infância no estado de Mato Grosso do Sul.
124
Em relação à demografia, o que nos chama atenção no estado de Mato Grosso
do Sul, ao contrário da pirâmide populacional não indígena brasileira, conforme se
observa no Quadro 12 a seguir, é o fato da população indígena ser constituída
predominantemente de crianças em idade escolar, jovens e adultos jovens. Dados que
merecem estudos ao se considerar a expectativa de vida e também as necessidades
diferenciadas para cada faixa etária.
Quadro 11: Distribuição da população indígena do estado de Mato Grosso do Sul, por faixa etária – ano 2012.
Sexo Feminino Masculino 75 + 776 835 70 a 74 anos 513 419 65 a 69 anos 467 417 60 a 64 anos 436 464 55 a 59 anos 576 645 50 a 54 anos 719 860 45 a 49 anos 1.003 1.034 40 a 44 anos 1.339 1.416 35 a 39 anos 1.758 1.878 30 a 34 anos 2.311 2.336 25 a 29 anos 2.723 2.469 20 a 24 anos 3.387 3.282 15 a 19 anos 4.252 4.128 10 a 14 anos 5.093 5.205 05 a 09 anos 5.046 5.244 0 a 4 anos 4.633 4.719
Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.
Ao compararmos com as populações indígenas no Brasil, 45% da população estão
na faixa etária de 0 a 14 anos, o dobro da área urbana (22,1%). Em 93,6% das terras
indígenas, mais da metade da população tem até 24 anos de idade. O perfil etário das
sociedades indígenas é de uma pirâmide de base larga que vai se reduzindo com a idade
(LÁZARO & TAVARES, 2013).
Portanto, este perfil também indica a importância da educação escolar indígena,
utilizado também como mecanismo de preservação da cultura, no preparo de jovens
para se inserir em postos de decisão política sobre a causa indígena e também para lidar
com a sociedade envolvente.
125
No estudo desenvolvido por Brostolin e Cruz (2010) aponta que, no ano de
2010, havia no estado de Mato Grosso do Sul, cerca de 300 escolas de Ensino
Fundamental e 12 escolas de Ensino Médio.Conforme se observa Quadro 11 a seguir, as
etnias presentes no estado são: Guarani Ñandeva, Guarani Kaiowá, Terena, Kadiwéu,
Kinikinau, Guató, Kamba e Ofaié.
Quadro 12: População Indígena por etnia cadastrada no SIASI - Mato Grosso do Sul – 2012.
ETNIA TOTAL DE
INDÍGENAS Kaiowá 34.500 Terena 22.979 Guarani 11.043 Kadiwéu 1.350 Guato 175 Kinikinawa 137 Ofaie 60 Bororo 53 Guarani Kaiowá 48 Atokum 30 Xavante 6 Cinta Larga 2 Total 70.383
Fonte: Sistema de Informação de Saúde Indígena, SESAI, 2012.
O censo do IBGE (2012) apontou que, no estado de Mato Grosso do Sul, a taxa
de analfabetismo entre as pessoas indígenas de 10 anos ou mais é de 18,9% nas terras
indígenas e 12,6% fora delas, conforme se observa na Figura 3. O que pode revelar a
preocupação ou valorização da escolarização fora dos territórios indígenas.
126
Figura 3: Taxa de analfabetismo para pessoas indígenas de 10 ou mais anos de idade,
segundo Unidade de Federação – 2010.
Fonte IBGE, 2012.
O estudo desenvolvido pelo Grupo Internacional de Trabalho sobre Assuntos
Indígenas (IWGIA/FMUSP) aponta que:
[...] enquanto no ano 2000 os indígenas com 10 anos ou mais tinham em média de 3,9 anos de escolaridade, as crianças da mesma idade da população em geral, alcançavam em média de 5,9 anos. A baixa qualidade do ensino proporcionado a crianças indígenas pode ser explicada pelo fato de que somente 13% dos professores de escolas indígenas possuíam ensino superior (AYWIN, 2009, p.10).
Outros fatores também podem estar relacionados à baixa escolaridade entre
indígenas, como, por exemplo, locais improvisados das escolas (como galpões, casas de
rezas, somando-se a falta de pertinência cultural), além dos fatores relacionados às
questões socioeconômicas (AYWIN, 2009). Dentre as consequências desse cenário
estão a procura de trabalho fora da aldeia, a busca por novos territórios e a falta de
documentos (como o registro de nascimento) que impedem a matrícula mesmo em
127
escolas dentro das aldeias. Este último acesso vem, recentemente, sendo regularizado
pela FUNAI.
Mesmo diante deste cenário adverso, as comunidades indígenas vêm buscando
formas de resistência e de luta por seus direitos. No estado de Mato Grosso do Sul
podemos citar o movimento das comunidades indígenas em prol de melhorias na
educação e na saúde. Com a organização dos movimentos promovidos pelos professores
e lideranças, além do envolvimento de jovens nas questões políticas relacionadas aos
direitos humanos.
Outro exemplo: em 2012 foi eleito pela primeira vez na história do Município de
Dourados um vereador indígena guarani, Aguilera de Souza, professor e residente da
Reserva Francisco Horta Barbosa, Aldeia Jaguapiru (ARAUJO, 2012). No estado de
Mato Grosso do Sul e em todo o Brasil a comunidade indígena vem elegendo
representantes indígenas, especialmente vereadores.
Por esta e por outras razões éticas, sociais e econômicas, como a situação de
pobreza extrema em que se encontram a maioria dos povos indígenas do estado de Mato
Grosso do Sul, a política de Ação Afirmativa é uma das formas de combater, em parte,
o quadro de iniquidade em que vivem tais comunidades.
As comunidades indígenas têm buscado a Educação Superior para adquirir
conhecimentos que eles consideram fundamentais para a melhoria de suas condições de
vida e de suas comunidades. No atendimento às necessidades sociais do Estado, a
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul é pioneira entre as IES estaduais na
política de cotas para indígenas, atendendo, em parte, a missão social junto a estes
povos.
No entanto, diante do quadro alarmante em que se encontra a grande maioria dos
povos indígenas do estado de Mato Grosso do Sul, podemos nos indagar que ações
efetivas estão sendo desenvolvidas em outros âmbitos, como, por exemplo, na
segurança, na saúde, na demarcação de terras, entre outros.
128
Capítulo V
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A
IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO
AFIRMATIVA PARA INDÍGENAS
129
Capítulo V – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL: A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE AÇÃO AFIRMATIVA PARA INDÍGENAS
5.1Apresentação
Os resultados da pesquisa foram ancorados pelo autor Aguilar Villanueva
(1993,1996), compondo um conjunto de obras dos autores: Elmore, Berman, Van Meter
e Van Horn, Sabatier e Mazmanian, Rein e Rabinovitz, Elmore, Stocker e O. Toole Jr.
Além de estudos brasileiros desenvolvidos por Rus Perez (2007, 2010).
Apoiar-nos-emos também na perspectiva dos estudos da Educação Crítica,
especialmente nos autores Giroux (1992, 1997), Gandin (2002), Apple (2006, 2008,
2011, 2013) e Paraskeva (2002, 2005). Optou-se igualmente para a discussão das
relações de poder, conhecimento e direito e a relação com a Universidade os estudos
desenvolvidos por Boaventura de Souza Santos (2003, 2009, 2010, 2014).
A apresentação dos resultados a seguir expostos foram organizados a partir da
descrição e detalhamento das características da IES pesquisada, bem como as
percepções e narrativas dos implementadores que permeiam e entrelaçam o processo
histórico da implantação e implementação das políticas de ações afirmativas.
As entrevistas foram organizadas a partir de dimensões temáticas: a) O Lócus; b)
Implementadores: Perfil e Considerações; c) Marco mobilizador: Lei Estadual Nº 2.589,
de 26 de dezembro de 2002; d) A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente; e)
Fixidez e Fragmentos; f) Adversidades; g) Intolerância e Resistência; h) Povos que
possuem a língua falada como princípio; i) Os interstícios e os “entre lugares”; J)
Avaliando a Política de Ação Afirmativa; k) Reconhecimento de uma formação elitista;
l) Projeto de Extensão Rede de Saberes e; m) Programas de Apoio Estudantil.
5.2 Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul: O lócus
Desde sua criação e ao longo de sua trajetória histórica e política a UEMS tem
enfrentado muitos desafios, é pioneira em muitos sentidos, entre eles pode-se destacar a
sua característica multicampi, denominada na IES como Unidades, além de ser uma das
primeiras IES estaduais do país a implantar a Política de Ações Afirmativas.
130
A UEMS está localizada no estado de Mato Grosso do Sul. Esse estado foi
criado em outubro de 1977, após a divisão do antigo estado do Mato Grosso, tendo seu
governo instalado em 1º de janeiro de 1979.
Localizado na região Centro-Oeste do Brasil, o estado de Mato Grosso do Sul
possui uma área total de 358.159 Km2, correspondendo a 18% da região Centro-Oeste e
4,19% do território brasileiro, sendo o sexto maior estado do país.O Pantanal sul-mato-
grossense corresponde a cerca de 25% da área do estado, com 89.319 Km2. O estado
limita-se ao norte com o estado de Mato Grosso, a nordeste com os estados de Goiás e
Minas Gerais, a leste com o estado de São Paulo, a sudeste com o estado do Paraná, ao
sul e sudeste com o Paraguai e a oeste com a Bolívia, conforme se observa na Figura 4 a
seguir (MS, 2015).
Além das características geográficas, o Estado guarda suas especificidades. Sua
economia é baseada na pecuária, na agricultura e também ocupa uma importante parte
do seu território com plantio de cana-de-açúcar, com presença de usinas canavieiras e de
álcool (TEIXEIRA, 2010).
Em relação à população indígena, o Estado possui o segundo maior contingente
do Brasil, conforme discutido no capítulo anterior, embora seja a Unidade da Federação
com a menor proporção de terra para os mesmos. O Mato Grosso do Sul possui
aproximadamente 600 acadêmicos indígenas nas várias IES, sendo que o maior grupo
frequenta a UEMS, situando-se como um dos estados brasileiros com a maior
quantidade de indígenas no Ensino Superior (URQUIZA et al, 2011).
131
Figura 4: Mapa do estado de Mato Grosso do Sul
Fonte: <http://www.guianet.com.br/ms/mapams.htm>.
A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, com sede e foro na cidade de
Dourados, foi criada pela Constituição Estadual de 1979, ratificada pela Constituição
Federal de 1989 (conforme disposto no artigo 48 do Ato das Disposições
Constitucionais)e instituída pela Lei nº 1.461, de 20 de dezembro de 1993 (UEMS,
2013).
Em 1993, o governo do Mato Grosso do Sul nomeou a Comissão de Implantação
da UEMS para que “se delineasse uma proposta de Universidade voltada para as
necessidades regionais objetivando superá-las e contribuir por meio do ensino, da
pesquisa e da extensão para o desenvolvimento científico, tecnológico e social do
estado”.26
O Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul, em fevereiro de
1994, deu parecer favorável à concessão da autorização para implantação do Projeto da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e aprovação de seu Estatuto e Regimento
Geral.
26 Mais informações em http://www.uems.br/portal/historia.php
132
Após aproximadamente dois anos de trâmites no Ministério de Educação e
Desporto, em 27 de Agosto de 1997, foi publicada pelo Conselho Estadual de Educação
a Deliberação CEE/MS Nº 4.787 de 20/08/97, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, Lei nº 9394/96.
As Unidades Universitárias estão localizadas em outros 14 municípios,
distribuídas nos seguintes Municípios: Aquidauana, Amambai, Cassilândia, Coxim,
Glória de Dourados, Ivinhema, Jardim, Maracaju, Mundo Novo, Naviraí, Nova
Andradina, Paranaíba, Ponta Porã e Três Lagoas (Figura 5). Em 2001, por meio da
Resolução COUNI-UEMS n. 184, de 10 de outubro de 2001, foi criada a Unidade
Universitária de Campo Grande, inicialmente, com a finalidade de atender à demanda
do curso de graduação Normal Superior (UEMS, 2014).
Figura 5: Localização das Unidades Universitárias da UEMS no estado.
Fonte: <http://www.uems.br/portal/mapa.php>.
Esta característica multicampi apresenta muitas vantagens, pois oportuniza o
ingresso a universidade a pessoas residentes de cidades do interior do Estado. Cabe
destacar também, que a sede da IES se localiza no interior do estado, ou seja, a UEMS
se configura como uma IES do interior para o interior (MELLO e REAL, 2009).No
133
entanto, mesmo se considerando os mecanismos de gestão e administração baseadas na
democracia, acesso, participação e transparência, é possível levantar a hipótese que esta
característica tende a promover realidades e necessidades diferenciadas em cada
campus.
A UEMS foi implantada, com sede em Dourados, conforme Figura 6 a seguir.
Ao observarmos a figura do prédio sede da UEMS disponível no site oficial da IES, nos
deparamos como uma imagem de estudantes caminhando para o prédio principal da
reitoria e alguns poucos saindo. Observa-se que a escolha por esta imagem é
representada não somente por uma imagem de um prédio frio e inerte, mas sim, por
estudantes. Fato este que nos convida a refletir e a nos indagar: Quem são estes
estudantes? Quais deles são indígenas? Quais deles são negros?
Figura 6 : Sede Administrativa Dourados – Universidade Estadual de Mato Grosso do
Sul
Fonte: UEMS, 2015 (http://www.portal.uems.br/historia)
Durante a pesquisa de campo e coleta das entrevistas, este fator foi impactante.
A cada unidade que visitávamos nos deparávamos com um universo diversificado. Estas
diferenças não se referiam exclusivamente ao plano das edificações e da estrutura
organizacional da IES, mas no plano de das subjetivações, das relações, da organização
local.
134
No que se refere a estrutura organizacional, a entidade mantenedora da UEMS,
em conformidade com a legislação vigente, é o governo do estado de Mato Grosso do
Sul. Em relação à autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e
patrimonial da UEMS, ela está amparada no art. 207 da Constituição brasileira:
Art. 207 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Na esfera estadual, a autonomia encontra respaldo no art. 2o da Lei no 1.461 de 20 de dezembro de 1993, que autoriza o Poder Executivo a instituir a Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Em relação aos recursos financeiros, o Art. 8o, inciso I, determina que estes serão provenientes de dotação consignada, anualmente, no Orçamento do Estado de Mato Grosso do Sul. (UEMS, PDI 2008-2013, 2008, p. 76).
A lei nº 2.583, de 23 de dezembro de 2002, estabelece a regulamentação da
autonomia da UEMS. Entretanto:
[…] os parágrafos 1º, 2º e 3º do art. 3o desta Lei, que dispõem sobre o percentual assegurado anualmente, a partir de 2003, de forma gradativa, partindo de dois por cento até alcançar três por cento da receita tributária estadual até o ano de 2008, e garantindo um repasse nunca inferior para o ano subsequente, foram revogados pela Lei no 3.485, de 21 de dezembro de 2007 - art. 13 (UEMS, PDI 2008-2013, 2008, p. 76).
Dessa forma, o repasse financeiro para a UEMS passou a ser mensal e pré-
definido anualmente. Fato esse que tem gerado até então inúmeras insatisfações,
especialmente nos meios acadêmicos e organizações sindicais de professores e técnicos
administrativos, principalmente no tocante autonomia e isonomia universitária.
Quanto à estrutura organizacional da IES pesquisada, conforme se observa na
Figura 6 a seguir, as instâncias colegiadas são compostas pelo Conselho Universitário
(COUNI)27 e Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE)28. Por meio da
configuração e da representação nas Instâncias a IES busca a democratização por meio
de decisões colegiadas. Como podemos observar há uma forma de organização
complexa e democrática. Neste aspecto, a dimensão da IES e sua rede de interlocuções
27 14O COUNI é o órgão colegiado de instância superior da UEMS, de caráter normativo e deliberativo, composto por 60 membros, entre eles: Reitoria; Vice-Reitoria, Pró-Reitorias, órgãos da Administração Central e Órgãos da Administração Setorial (RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 392, de 29 de setembro de 2011). 15O CEPE é composto por 79 membros. Composto pela Reitoria, Pró-Reitorias de Extensão, de Pesquisa e de Pós Graduação. Bem como dos Coordenadores de Curso. 28
135
entre os diversos setores e atores a configuram como complexa, engendradas de tensões,
interesses pessoais e políticos. Aspectos estes presentes em outras instituições.
Figura 7: Organograma da Estrutura Organizacional da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018
De acordo com o Plano de Desenvolvimento Institucional Projeto Pedagógico
Institucional 2014 – 2018, a UEMS em 2014, considerando as 15 Unidades
Universitárias, conta com 61 cursos de graduação, sendo que são 31 licenciaturas, 26
bacharelados e 4 (quatro) tecnológicos. Num total de 8.224 alunos regularmente
matriculados (UEMS, 2013, p. 27).
Uma das características destacadas da UEMS refere-se à responsabilidade social,
assim entendida como:
Inclusão Social diz respeito à implementação das Leis Estaduais no 2.589, de 26 de dezembro de 2002 e 2.605, de 06 de janeiro de 2003, que dispõem sobre a reserva de vagas para indígenas e negros respectivamente, e as Resoluções COUNI-UEMS que normatizaram o ingresso nos cursos de graduação da UEMS por meio do Sistema de Cotas. Esta ação visou atender grupos étnicos historicamente excluídos do contexto educacional do Brasil (UEMS, 2012, p. 9). Destaca-se também que dos alunos matriculados na UEMS, 82% destes alunos são oriundos de escolas públicas (UEMS, 2013, p. 23).
136
A UEMS já vem tentando promover a interlocução com os povos indígenas
desde 2001, quando criou o Curso Normal Superior, inicialmente para professores
indígenas das etnias Terena e Kadwéu e a partir de 2003 para os professores Guaranis
Kaiowás. No ano de 2004 formaram-se 26 indígenas Terena na Unidade Universitária
de Aquidauana, e em 2006 27 Guaranis na Unidade Universitária de Amambai
(CORDEIRO, 2005).
Ao analisarmos o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018
(UEMS, 2013) a respeito da Política de Ação Afirmativa destinada a indígenas, o
referido documento cita que após 10 anos da instituição da mesma, constatou-se que
ingressaram 3.071 negros e 856 indígenas, e entre os concluintes 637 negros e 93
indígenas, como se observa na tabela 8, abaixo.
Tabela 8: Progressão na Oferta de Vagas - UEMS relativo ao ano de ingresso - 2005 a 2013. Variáveis
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Vagas Gerais 1.078 1.148 1.169 1.239 1.295 1.645 1.680 1.659
1.643
Negros 308 328 334 354 370 480 480 474 470
Indígenas 154 164 167 177 185 240 240 237 237
TOTAL 1.540 1.640 1.670 1.770 1.850 2.400 2.400 2.370 2.3 Fonte: Relatório Anual de atividades físicos financeiros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul– janeiro a outubro de 2013.
O referido documento também faz ressalvas às devidas condições que envolvem
o acesso e a permanência no ensino superior. No entanto, não explicita quais são os
mecanismos utilizados e planejados para minimizar tais dificuldades.
Boaventura de Sousa Santos (2010, p.69) enfoca que:
Talvez seja correto designar a área do acesso como acesso/permanência ou mesmo acesso/permanência/sucesso, uma vez que o que está em causa é garantir, não só o acesso, mas também a permanência e o sucesso dos estudantes oriundos de classes ou grupos sociais discriminados.
Em relação à oferta de vagas, podemos observar na Tabela 9, a seguir, que
houve um aumento considerável na oferta de vagas, recorte entre os anos 2005 e 2012.
Entende-se que a oferta de vagas se dá na UEMS, pela criação de novos cursos,
portanto, aumentaram-se as possibilidades de escolhas dos vestibulandos indígenas e
137
também de novos cursos em campus diferentes. Por exemplo, o curso de História no
município de Amambai que se iniciou em 2008, Engenharia Florestal em Aquidauana
em 2006, Geografia na unidade de Campo Grande no ano de 2010, municípios estes que
concentram povos e aldeias indígenas29.
Tabela 9: Número de Ingressantes e Concluintes Negros e Indígenas cotistas da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul entre os anos de 2004 a 2014 Cotistas Ingressantes Concluintes % de Concluintes
Negros 3.071 637 20,74%
Indígenas 856 93 10,86%
Total 3.927 730 31.60 %
Fonte: Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2014-2018 Elaborado pela autora
Após a Lei de Cotas para indígenas em 2004, 186 se inscreveram para o
vestibular, 116 foram classificados e 67 efetuaram a matricula, dos 67 matriculados, 37
eram do sexo masculino e 30 do sexo feminino, e apenas oito concluíram os cursos em
2007, Zarpelon e Cordeiro (2011) afirmam “que este índice em grande parte é devido ao
fator econômico e a relação com os professores no não entendimento as especificidades
culturais indígenas”.
Corroboram com esse pensamento os estudos desenvolvidos por Giroux (1992)
sobre evasão, afirmando que, embora as origens deste quadro estejam na sociedade em
geral, há no universo escolar práticas materiais e ideológicas que colaboram para
produzir diferenças de classes, raça e sexo. Nos ateremos sobre esta temática nas
próximas páginas.
Em relação ao número de ingressantes e concluintes negros e indígenas cotistas
entre os anos 2004 a 2014, observa-se na tabela a seguir que entre dos 856 indígenas
ingressantes 93 concluíram a graduação, ou seja, 10,86 %. E entre negros dos 3.071 que
ingressaram na IES, 637, ou 20,74%, concluíram os cursos de graduação. Neste
enfoque, é preciso considerar que ao se analisar os grupos minoritários sejam
considerados os contextos sociais nos quais cada grupo está inserido. Demonstrando que
29 Os povos indígenas destes municípios podem estar residindo fora dos territórios tradicionais (Reservas Indígenas).
138
mesmo com implementação da Política de Ação Afirmativa na IES estudada, avanços
ainda são necessários para garantir a permanência dos mesmos.
Levantamento realizado pelo Centro Indígena de Estudos e Pesquisas (CINEP)
em 2009 já apontava para esta situação, revelando que pelo menos 20% (1,2 mil) dos
cerca de seis mil estudantes indígenas de cursos de graduação de todo o país não
conseguiam terminar seus estudos, a entidade aponta
[...] como fatores determinantes de evasão indígena nas universidades, o preconceito, a língua, a ausência de conteúdo básico das etapas iniciais da atividade escolar, além do baixo valor das bolsas. Na tentativa de conter esta evasão, as etnias reivindicam a criação de universidades indígenas, bem como, a inserção de disciplinas com temáticas específicas para eles (COUTO, 2009,p.1)
Outra questão que nos chama atenção é a representação dos grupos étnicos entre
os acadêmicos indígenas, o relatório do Rede de Saberes (2009) aponta que há ainda
diferenças significativas, onde estavam presentes 243 Terenas, 89 Kaiowás, 68
Guaranis, 12 Kadwéu, sete não informados, e 3 Xavantes, dois Kaingang e um
Kinikinau, conforme se observa na Figura 8. Ao compararmos com os dados
demográficos das etnias do estado (discorrido no capítulo IV) observa-se uma sub-
representatividade de alguns grupos étnicos, que pode estar relacionada à dificuldade de
acesso e a baixa escolaridade, conforme nos aponta os estudos desenvolvidos por Bittar
et al (2006) e Brand e Calderoni (2012).
139
Figura 8: Número de Acadêmicos matriculados por etnia no ano de 2008 – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
Fonte: Relatório Rede de Saberes, 2009.
Diante da complexidade que envolve a temática, permeados e imbricados por
este cenário complexo e desafiador no contexto das características organizacionais e
políticas, discorremos nas próximas páginas sobre o processo de implementação da
política de ação afirmativa a partir do “olhar” dos implementadores.
Sob essa ótica, objetiva-se buscar o que estes sujeitos são, fazem e sabem
realmente. Bem como, que significados subjetivos que atribuem as suas atividades e
ambientes de trabalho (FLICK, 2004, p.33; DENZIN, 2007, p.116).
140
5.3 Implementadores: Perfil e Considerações
A partir da estrutura administrativa e também do histórico da implementação da
Política de Ação Afirmativa na UEMS no decorrer da última década, foi considerado
relevante incluir sujeitos com mais de 10 anos na IES, que estiveram ou estão no cargo
de Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários, Pró-Reitor de Ensino, Membros da
Comissão de Acompanhamento das Ações Afirmativas e também coordenadores de
cursos com maior número de acadêmicos indígenas. Participaram da pesquisa 12
sujeitos, entre eles seis pessoas do sexo masculino e seis do sexo feminino.
A idade variou entre 32 a 62 anos, com uma média de idade de 48,08 anos. Em
relação ao período de tempo de atuação na UEMS variando entre 02 (dois) anos a 20
anos, numa média de anos de 13 anos de atuação. Os cargos de Pró-Reitor são
designados pelo Reitor, como cargos de confiança. Tempo no cargo de Coordenador
variou entre três meses a 14 anos. Na UEMS, os cargos os coordenadores de curso são
escolhidos por votação pelo corpo docente e representantes discentes dos cursos, com
período de atuação de 2 anos. Podendo ser renovados.
Em relação à pós-graduação, entre os entrevistados oito são doutores, cinco com
mestrado e um está cursando doutorado.
Em relação à formação dos profissionais participantes da pesquisa foi
representada pela diversidade, entre eles: História (2), Psicologia (1), Engenharia Física
(1), Agronomia (2), Ciências Sociais (1), Pedagogia (2), Administração de Empresas
(1), Enfermagem (1), Direito (1).
O perfil dos implementadores revelam a diversidade das áreas de formação e
tempo de atuação na UEMS, um indicativo importante para a compreensão da
implementação da política de Ação Afirmativa na UEMS em diferentes fases do
processo. Os participantes da pesquisa possuem formação diversa, e esta característica
pode de certa forma ter contribuído a estruturar a política e promover o debate de Ação
Afirmativa num enfoque racial e social na IES pesquisada. Somando-se a fato de três
deles serem negros. Mesmo que relatam não efetivamente participarem de movimentos
negros, promovem a discussão e se engajam em enfrentamentos de discussões e/ou
pesquisas de cunho racial.
Considerando a afirmação de Elmore (1996), a partir da abordagem de análise
de implementação o modelo Retrospectivo (backward mapping), os “fazedores” de
141
políticas não controlam a implementação e que a mesma não se define no topo da
administração, mas no ponto em que as ações administrativas interceptam escolhas
privadas. Portanto, é no âmbito da implementação que se manifestam as concepções
pessoais e profissionais dos funcionários a respeito do que deve ser a política pública. E
neste sentido, buscou-se identificar as percepções dos atores que a implementam, suas
dificuldades, adesões e as modificações das condições iniciais.
Pois, a implementação das políticas de Ações Afirmativas na UEMS abarca
aquelas ações efetuadas por indivíduos (ou grupos de indivíduos) que tem como foco a
realização dos objetivos previamente decididos (VAN METER & VAN HORN in
AGUILAR VILLANUEVA, 1996, p.99).
Há três elementos do comportamento dos atores envolvidos que podem afetar a
sua capacidade e a vontade de implementar uma política: o conhecimento (compreensão
e discernimento), a sua aceitação, neutralidade ou rejeição e; a intensidade de sua
resposta (VAN METER & VAN HORN, 1996, p. 128).
É importante destacar que, quanto maior o número de pessoas envolvidas no
processo de implementação, maior o número de possibilidades de dificuldades durante o
processo. No entanto, a complexidade também pode ser uma forma de mecanismo de
proteção e negação ao programa ou a uma política proposta.
Os analistas implementação compreendem e afirmam que a instalação uma
tecnologia, a realização de um plano ou a imposição de uma lei não são automáticos,
não possuem um futuro seguro e são imprevisíveis. Portanto, é neste cenário que
investigação se foca, procurando compreender a multiplicidade de fatores e decisões,
que limitam e explicam a incerteza que caracteriza os resultados (BERMAN, 1993)
O autor também enfoca que no processo de implementação há duas vertentes a
serem consideradas: a macroimplementação e a microimplementação.
Sendo que as principais diferenças entre os processos de microimplementação e macroimplementação se referem aos os seus contextos institucionais. Enquanto o contexto institucional microimplementação é uma organização local e prestador de serviços, o contexto institucional da macroimplementação é todo um setor da política, que vão desde a federal para os níveis locais30(BERMAN, 1993, p.292).
Ainda nos referindo ao autor acima, a microimplementação de uma política
geralmente envolve a necessidade de mudança organizacional no nível local. A
execução dos programas de governo requer mudanças, que há vezes não ocorrerem
30 Tradução nossa.
142
facilmente. Os membros das organizações podem se adaptar às novas exigências em
formas inesperadas, e este é o cerne do problema de microimplementação e é
caracterizada por uma interação mútua.
Desse modo, a implementação a nível local depende da relação entre o projeto e
as características adotadas pela organização responsável pela execução.
Ao nos projetarmos para o mundo do trabalho dos sujeitos da pesquisa da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, nos deparamos com sujeitos que
transitam neste espaço, que ora são coletivos e ora são individuais. Que estabelecem
relações e modos de agir de acordo com seus pensamentos e mundos internos. Trazem
também para os cenários de suas práticas profissionais suas crenças, valores, percepções
e concepções. Suas formas de pensar e agir são oriundas de um modo complexo, frutos
de uma construção histórica e social, permeadas por suas histórias de vida,
espiritualidade, formação profissional e cultural.
Portanto, o universo das instituições de ensino é composto por sujeitos, ou seja:
[...] o sujeito (o ser humano) não é um dado e sim o resultado de uma construção (teórica, social, cultural). De novo, descentrar o sujeito não significa afastar qualquer possibilidade de fazer política, mas apenas daquele tipo de política que tem como pressuposto justamente tal noção de sujeito. A política não se faz no terreno do dado, do fixo, do absoluto, do transcendental, mas justamente no terreno do questionável, do variável, do ordinário, do imanente (GANDIN, 2002, p.11).
Corrobora com este pensamento o autor Guerra (2012) afirmando que “nothing
in the workplace is culturally neutral. Culture influences how we think, communicate,
relate to each other, and so much more”.
Nesta assertiva a autora Bagnato (2012) nos aponta que:
A universidade existe e tem vida através de pessoas e para pessoas que possuem histórias de vida concretas, biografias, com origens sociais, culturais diversificadas, com variados interesses e necessidades, condicionadas por um contexto. Há imbricados elementos do passado e do presente da história, dos sujeitos e da instituição delineando permanências e rupturas (p.181).
Além de suas construções e percepções próprias, os ambientes de trabalho
podem produzir ou serem carregados por tensões, relações de poder e interesses
pessoais. Na perspectiva do poder, conhecimento e direito, Santos (2009) refere que:
[...] nas sociedades, há uma pluralidade de ordens jurídicas, de formas de poder e de formas de conhecimentos. Mas apenas reconhecê-las somente é uma
143
falácia, é preciso reconstruir teoricamente o reconhecimento, uma construção que deve ser reflexiva.
Instituições de ensino representam e fazem parte de outras instituições:
políticas, culturais e de maior poder, também desiguais. Os espaços escolares, assim
como qualquer organização, são lócus de bases conflitivas, frutos de processos
históricos, que conformam o terreno político e organizativo que se movem cada
comunidade escolar concreta (APPLE, 2006; MOLINA, et al 2011).
Neste mesmo pensamento Dias Sobrinho (2010, p. 1228) refere que instituições
e Estado são constituídos e construídos por seres humanos e carregam contradições
sociais e diferentes projetos existenciais e coletivos.
A implicação dos envolvidos nos processos de implementação de uma política
numa referida IES, sejam eles autoritários ou democráticos, manifesta uma
característica sociológica desses atores sociais, própria dos momentos nos quais se
consolidam estratégias de poder (MOLINA et al, 2011).
Portanto, a implementação de políticas públicas envolve uma complexidade de
fatores. Pois, nas palavras de Berman (1993, p. 307):
É certamente apropriado considerar sistemas de prestação de serviços públicos, precisamente como sistemas, como a organização responsável pela execução (ou escola, hospital ou dependência de bem-estar social) é inserido em um contexto local que fornece serviços (os estudantes, pacientes ou beneficiários) e com o qual interage. Uma vez que, o contexto local está imerso em um ambiente mais amplo e composto, entre outros, pelas condições sociais e econômicas [...].
Neste sentido, Berman (1993) menciona à microimplementação, sobre a qual os
estudiosos apontam e sugerem a importância de uma observação empírica em três
momentos: “mobilização”, “implementação por parte dos prestadores de serviços ” e a
“institucionalização”. Nas próximas páginas nos deteremos em cada uma delas.
Utilizaremos como marco mobilizador do processo de implementação da
política de ação na UEMS a promulgação da Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro
de 2002.
144
5.4 Marco mobilizador: Lei Estadual Nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, a UEMS
O uso do termo "mobilização" se propõe como uma imagem e mistura complexa
de atividades políticas e burocráticas, que constituem o núcleo real do início de uma
nova política pública, sendo particularmente relevante para a descrição da rota de um
projeto (BERMAN, 1993).
Por intermédio da Lei Estadual nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, a UEMS
(ANEXO 3) passa a oferecer reserva de vagas em seus cursos para indígenas. A
proposta parlamentar foi sugerida pelo Deputado Estadual Murilo Zauith, que fazia
parte da Comissão de Inclusão de Negros e Índios nas Instituições de Educação
Superior na Câmara de Deputados em Brasília, compondo com Deputados como Nice
Lobão, que defendia a inclusão das minorias raciais nas IES públicas do país.
A regulamentação para cotizar estudantes negros se deu por meio da Lei nº
2.605 (ANEXO 4), de 6 de janeiro de 2003, projeto de lei do Deputado Estadual Pedro
Kemp.
No estudo desenvolvido por Cordeiro (2010) a autora afirma que esta ação
política foi resultado de reivindicações dos povos indígenas e também do movimento
negro de Mato Grosso do Sul, e outras instituições de defesa dos direitos do negro, em
parceria com a Coordenadoria Estadual de Políticas Para a Igualdade Racial (CEPPIR)
do governo do estado (na época, do Partido dos Trabalhadores).
Esse movimento no estado também é fruto das pressões e influências das fortes
discussões no país sobre acesso e democratização da Educação Superior, especialmente
dos movimentos de grupos em defesa a causa indígena.
Nessa ótica, acrescenta-se que uma lei específica é aquela decisão política
fundamental que se deve implementar, no entanto, indica um problema a enfrentar e
estipula os objetivos a alcançar (SABATIER & MAZMANIAM, 1996). Neste caso, o
propósito de implantar cotas na UEMS visa reduzir as mazelas de ordem
socioeconômicas, promovendo a inclusão de minorias com o enfoque racial.
A partir da sanção da lei pelo Governador do estado, a UEMS passa a reservar
cotas a negros e indígenas, e, em relação à Lei Estadual nº 2.589, se referindo à
população indígena, aborda:
145
Art. 1º: Fica a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) obrigada a cotizar vagas destinadas ao ingresso de vestibulandos índios31.
E em seu artigo segundo:
Art.2º: A UEMS deverá divulgar, a partir do próximo vestibular, o número de vagas que serão oferecidas em cada um de seus cursos.
Sancionada a lei, a política de cotas é instituída na UEMS, trazendo consigo o
desafio de promover no âmbito institucional e também com a comunidade externa dos
mecanismos para o processo de implementação das referidas leis.
No entanto, na implementação de uma lei, as resistências e as polêmicas podem
ser geradas por inúmeros fatores, por exemplo, quando uma decisão não foi amplamente
discutida com aqueles diretamente envolvidos. Ou quando há situações onde as normas
são incompatíveis com a visão dos responsáveis.
Conforme nos revelam os relatos abaixo, a UEMS não participou das discussões
e não foi consultada pelos parlamentares da Assembleia Legislativa do estado de Mato
Grosso do Sul sobre a proposta de criação de cotas para negros e índios.
Eu lembro que a grande polêmica que surgiu da Legislação. É que ambas as leis, tanto as leis tanto a dos indígenas quanto a do negro, elas vieram sem consulta prévia da Universidade.
A grande questão é que toda vez que vem uma coisa que de cima pra baixo, mesmo que ela seja boa, é a questão da discussão da autonomia da universidade.
O corpo docente que estava envolvido se sentiu menosprezado no princípio da autonomia da universidade, esta era a grande discussão (OCPR/ CC).
Sabia da discussão que estava ocorrendo, mas muito brevemente (MCAAC 1 / OCPR).
Houve a discussão após a promulgação da lei e que estaríamos recebendo estes alunos, não houve esta discussão sobre o que a gente achava, isto foi imposto para nós (OCC 1).
Pode ser que alguns grupos podem ter discutido, mas conosco não teve uma discussão muito grande sobre isso (OCC 2).
[...] foi recebida “ goela abaixo”, veio de cima pra baixo(CC).
31 Grifosnossos.
146
Gross et al (1971, p. 24) apud Van Meter e Van Horn (1993, p. 113-114) ao
realizarem revisão bibliográfica sobre mudanças previstas, identificaram que nas
organizações:
[...] Vários dos fatores que influenciam um consenso sobre as metas e, desta forma, afetam a própria implementação. Um desses fatores é a medida em que os subordinados ou tomadores de implementação têm participado na preparação da decisão política. O estudo bibliográfico considerou que existem motivos para apoiar as seguintes afirmações:
1) participação fomenta o surgimento de um bom espírito de equipe entre os funcionários, e um bom espírito é uma condição necessária para a implementação bem-sucedida;
2) A participação permite um maior compromisso, e um alto grau de comprometimento é necessário para fazer a mudança;
3) a participação pode compreender melhor as razões para a introdução de uma determinada inovação, requisito claramente essenciais para a implementação;
4) tendo em conta o postulado básico da resistência à mudança, pode-se argumentar que a participação vai reduzir a resistência inicial e, consequentemente, facilitar a implementação bem-sucedida; e
5) subordinados tendem a se opor a qualquer inovação, quando foi lançado por iniciativa exclusiva dos superiores32.
Também os autores apontam que nem sempre o consenso em torno dos objetivos
e a participação dos subordinados nas decisões resultam em um consenso sobre as metas
ou que os problemas serão minimizados. Temas polêmicos tendem a provocar maiores
resistências se comparados àqueles que requerem menos mudanças e impactos.
O que se observa nos relatos dos participantes da pesquisa é que a implantação
das cotas, marco da implantação das políticas de Ações Afirmativas para indígenas na
UEMS provocou inúmeras discussões e tensões nos espaços da universidade.
Também destaca-se que o texto da referida lei é bastante breve e não explicita de
que forma ocorreria a sua regulamentação, quais seriam os critérios de inserção de
alunos indígenas e principalmente os objetivos propostos. Ficando a cargo da UEMS a
função de regulamentar a lei e discutir tais pontos. Conforme se observa no relato de um
membro das Pró-Reitorias na época:
Nós teríamos que regulamentar, fui buscar as instituições que já faziam isso, por exemplo: a UERJ, eu verifiquei que não havia do ponto de vista da
32 Tradução nossa.
147
regulamentação da lei nada muito claro. Nós tínhamos que regulamentar (MCAAC 1/ OCPR).
A regulamentação da lei ocasionou diversas reuniões: com lideranças indígenas
locais, regionais e estaduais. Bem como, com os movimentos de professores indígenas
do estado, conforme o relato a seguir:
Neste momento busquei as lideranças do movimento negro, indígenas, principalmente os terenas e os guaranis, porque eram eles que mais se aproximaram da universidade, por conta do normal superior e iniciamos um processo de discussão (MCAAC 1 / OCPR).
Como se pode observar no discurso acima houve uma preocupação em discutir
amplamente as ações e também de envolver os movimentos representativos da
sociedade indígena na discussão.
Nesse sentido, é fundamental incorporar os grupos envolvidos nas políticas e
nelas interessados ao processo de formulação e implementação de políticas.
Promovendo mecanismos de envolvimento na política por setores estratégicos e que
lhes deem sustentação política e legitimidade. Incluindo a identificação dos atores que
dão sustentação à política e mecanismos de negociação entre tais atores.
Também foi criada comissão com o propósito de discutir a regulamentação:
No mês de fevereiro criamos uma comissão dentro do Conselho (CEPE), para trabalhar essa questão. A gente se reunia, mas as pessoas não sabiam, não havia estudos científicos, na época tinha a professora M.L.F., era militante do movimento negro, mas não tinha estudos, trabalhos intelectuais na área, era mais na área da militância (MCAAC 1 / OCPR).
Encontrando dificuldades de discutir a temática no âmbito da UEMS:
A Comissão que foi montada no CEPE, somente com professores e internos da universidade, aquelas reuniões intermináveis e um dia disse: Não dou conta de discutir isso, a comissão um dia ‘jogou a toalha ‘e disse não temos condições de discutir isso. Vamos fazer audiências públicas (MCAAC 1 / OCPR).
Eu participei da comissão de implantação das cotas dentro da universidade, foram momentos de muitos debates, pois tínhamos muitos grupos dentro da universidade que não era a favor, então a gente tinha que apresentar e fazer o debate antropológico, histórico e também educativo para a formação destes grupos, com estes professores, para a gente fazer esta implementação (CC 1).
148
A Comissão promoveu e organizou audiências públicas que ocorreram nas
cidades de Dourados, Ponta Porã e Aquidauana. Nas audiências públicas foram
convidados os representantes dos movimentos negros e indígenas (CORDEIRO, 2012,
p. 21). Estiveram presentes Dr. Aleixo Paraguassu, ativista social, Presidente do
Instituto Luther King em Campo Grande-MS e lideranças indígenas.
Nas audiências públicas os alunos compareciam, segundo o relato:
Os alunos iam para brigar, porque na concepção dos alunos, que já estavam matriculados estavam tirando as vagas deles, eles diziam que estavam tirando a vaga deles. E naquele dia, quando ouvi isso, eu disse: como tirar a sua vaga? Se você já está matriculado (MCAAC 1 / OCPR).
Encontrando dificuldades para promover discussão com as comunidades e
lideranças indígenas:
Tive que fazer reuniões, buscar recursos, quantas vezes com dinheiro do próprio bolso, para pagar o lanche dos indígenas e o almoço.
Por exemplo, a prefeitura deu a Combi ao pessoal de Caarapó, e eles diziam: mas, não temos como almoçar, quem custearia a alimentação?
Tínhamos que resolver as coisas de forma pessoal, eu e outras pessoas que estavam envolvidas. Conseguimos parceiros da UCDB.
Tínhamos apoio muitas vezes mais de fora do que de dentro da IES (MCAAC 1 / OCPR).
As resistências existiam e ainda existem e com o objetivo de promover este
debate entre professores, acadêmicos, gestores e técnicos administrativos da referida
IES foram realizados seminários e Fóruns de Discussão: Reserva de Vagas para
indígenas e negros na UEMS: vencendo preconceitos, entre os anos de 2003 e 2004,
cujo objetivo se centrou em esclarecer, divulgar e construir coletivamente os critérios de
inscrição nas cotas e também discutir a preocupação institucional quanto à permanência.
Os Fóruns e seminários foram realizados em todas as 15 unidades da UEMS do
estado. Entre os convidados para os fóruns e seminários estavam os principais
estudiosos do país sobre a temática:
[...] José Jorge de Carvalho (Universidade de Brasília), Prof.ª Dr.ª Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (Universidade Federal de São Carlos e na época Membro do Conselho Nacional de Educação), Prof. Dr.Wilson Roberto de Mattos (UNEB e ABPN), Prof. Dr. Antônio Carlos de Souza Lima (Museu Nacional – LACED e Trilhas de Conhecimentos), Dr. Ivair Augusto dos Santos (SEDH) e outros que estiveram na UEMS (CORDEIRO, 2012, p.31).
149
No dia 8 de julho de 2003 reuniu-se no Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão (CEPE) representantes do Movimento Negro Estadual, o Conselho Estadual
de Direito do Negro, Lideranças Indígenas e a Coordenadoria de Políticas para a
Promoção da Igualdade racial (CEPPIR/MS) com o objetivo de discutir e definir os
critérios para inscrição nas cotas da UEMS.
Entre as falas das lideranças indígenas:
[...] alegaram que não se poderia identificar o índio somente pelo documento de identificação indígena (RG), uma vez que se sabia que havia não-indígenas que possuíam documento emitido pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI. Era importante, mas não o único. Propunham ainda, a autodeclaração em uma das etnias e que, pai e mãe fossem indígenas, bem como morar na aldeia, porque havia entre seu povo muita descrença com aqueles que moravam fora da aldeia, ou com os que saiam para estudar, porque não mais voltavam para ajudar a comunidade. Também mostraram preocupação com os mestiços que recorreriam da decisão (CORDEIRO, 2012, p. 22).
Após intenso debate, representantes indígenas resolveram retirar o critério de
morar na aldeia, porque muitos indígenas viviam e vivem na periferia da cidade de
Dourados e de outros municípios.
Expressaram também preocupações quanto ao:
[...] número de escolas nas aldeias e a possibilidade de haver ou não candidatos indígenas para preencher o percentual estabelecido; a distância das aldeias até as unidades universitárias da UEMS; a sobrevivência destes fora da aldeia; as diferenças culturais, entre outros (CORDEIRO, 2012, p. 22).
Como podemos observar as lideranças indígenas manifestavam suas
preocupações quanto à permanência dos acadêmicos indígenas na universidade e os
principais desafios a serem enfrentados por este grupo.
O autor Lima (2007) também aponta que em termos de diferenças culturais, é
preciso reconhecer que os indígenas possuem um sistema de valores, de pensamento,
conhecimentos, redes de parentesco, relacionamento e visões de mundo extremamente
diversos. E as suas identidades, na maioria dos grupos, são apoiadas em direitos
coletivos.
No dia 17 de julho por meio de reunião ordinária o Conselho Universitário
(COUNI) se reúne, estiveram presentes cerca de 300 pessoas, entre eles: conselheiros,
representantes discentes, representantes de organizações do movimento negro e
lideranças indígenas.
150
Foi um dia, uma reunião conjunta entre CEPE e COUNI. Uma reunião diferenciada. A plateia do auditório estava cheia, com as lideranças indígenas e os movimentos dos negros (MCAAC 1 / OCPR).
Nenhum conselheiro votou contra, tinha conselheiro que a gente sabia que era contra, mas na hora do voto, todos votaram a favor, pois a votação foi aberta, eu solicitei a reitora e ela atendeu. Porque a gente precisava saber quem era contra e saber com quem estávamos trabalhando. Aconteceu o contrário (MCAAC 1 / OCPR).
Mesmo com raiva eles votaram a favor. E isso foi muito interessante (MCAAC 1 / OCPR).
151
A lei foi regulamentada na IES pelos seguintes documentos:
Resolução COUNI-UEMS nº 241, de 17 de julho de 2003
Art. 1º As vagas ofertadas para o ingresso aos cursos de graduação da Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, pelo processo de seleção, serão aprovadas e normatizadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão, distribuídas por curso, obedecendo a seguinte proporção:
a) setenta por cento aos aprovados que concorreram de forma geral;
b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para negros;
c) dez por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para índios.
Resolução COUNI-UEMS nº 250, de 31 de julho de 2003, o referido documento altera a redação da alínea “b” do art. 1º da Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003
b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas ofertadas no regime de cotas para negros, oriundos de escolas da rede pública de ensino ou bolsistas da rede privada de ensino.
Resolução CEPE-UEMS nº 430, de 30 de julho de 2004
Art. 10. Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 10% (dez por cento) para indígenas, além dos incisos II, III, e IV do art. 8º, serão exigidos:
I - fotocópia da cédula de identidade indígena (frente e verso);
II - declaração de descendência indígena e etnia, fornecida pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI, em conjunto com uma Comissão Étnica, constituída em cada comunidade.
Resolução CEPE-UEMS nº 431, de 30 de julho de 2004.
Aprova as normas para a realização do Processo Seletivo de ingresso de candidatos às vagas do Curso de graduação Normal Superior – Habilitação em Magistério na Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
152
A IES transforma uma decisão política em um programa específico que passa a
ser nomeado como política de Ação Afirmativa.
Como relatado pelos entrevistados, as discussões promovidas na IES foram
marcadas por um intenso debate em torno da temática, tanto professores quanto a
comunidade acadêmica se manifestavam a favor e outros contra as cotas para negros e
indígenas.
No grupo de professores e da IES de forma geral as manifestações se deram,
conforme relato dos entrevistados:
Tinha e tem muitos grupos ferrenhos que são contra as cotas (CC 1).
O grupo a favor defendia a inclusão, os contras diziam que retirariam vagas regulares que seriam distribuídas para todas as pessoas e que o critério raça ou cor definiria a capacidade do indivíduo para ingressar no curso (OCC 1).
Entre os alunos:
Eu percebia que havia certa resistência por parte de parte dos acadêmicos, principalmente acadêmicos do primeiro ano, eles questionavam a questão da sua legalidade, questionavam a questão das cotas para negros e indígenas. Até algumas situações constrangedoras, questionamentos, da legalidade, coisas assim (CC 2).
O objetivo aqui não é aprofundarmos nas discussões de posições contra e a favor
a cotas e sim identificarmos os pontos de tensão gerados em detrimento da
implementação de Políticas de Ações Afirmativas na referida IES. Tais discursos
refletem posições ideológicas dos grupos presentes nas Instituições e as formas de poder
instituídas nos espaços acadêmicos, fruto de um pensamento hegemônico eurocêntrico e
meritocrático.
Estas discussões também ocorrem em outros espaços da sociedade brasileira e
também em outras IES pelo país afora. Além de ter sido também, no referido período de
implantação das cotas na UEMS, alvo de notícias nos principais veículos de
comunicação no país. Podemos citar a pesquisa desenvolvida por Campos et al (2013)
em que os autores analisam como o jornal “O Globo” traz em seus textos a abordagem
em torno das cotas raciais. Destacam que no ano 2003 o índice de títulos de reportagens
favoráveis às cotas era maior e a partir do ano de 2004 este número se inverte. Afirmam
também que a escolha pela temática polêmica já induz o leitor a conclusões
153
tendenciosas. Os autores nos chamam atenção para o cuidado de serem criados dois
grupos antagônicos: aqueles que são contrários e aqueles que são favoráveis, este fator
pode ser um impeditivo de se promoverem discussões mais profundas sobre a temática.
As discussões em torno das cotas são a “ponta do iceberg”. Mesmo sem assumir
que o país ainda dá sinais de ser um país racista e preconceituoso, o que se observa é a
resistência para discussões sobre raça, etnia, classe e gênero. Relações até então forjadas
pela harmonia, harmonia esta até então velada. Nesta ótica, trazer a discussão de raça
para dentro de universidade vem se constituindo como um desafio.
Outra questão também importante é que ao se considerar políticas de Ações
Afirmativas como políticas redistributivas, levanta-se questões agudíssimas das relações
de propriedade, poder e prestígio social; relações estas historicamente estabelecidas no
âmbito das IES. Portanto, tendem a ser a arena mais tensa e frontalmente conflitiva
(AGUILAR VILLANUEVA,1996).
A política de cotas para indígenas não causou tanta polêmica quanto a que se baseou no recorte racial, que beneficiou pardos, negros ou afrodescendentes provavelmente por serem percebidos como um segmento numericamente insignificante da população brasileira, a não ser nas universidades localizadas em regiões onde as relações indígenas e não indígenas são muito conflitantes, como acontece nos estados do Mato Grosso do Sul e Roraima (PALADINO, 2012 apud SOUZA LIMA, 2009).
Além de se considerar que além da manifestação de posicionamentos binários
entre contrários ou favoráveis ao acesso diferenciado das populações indígenas nas
universidades brasileiras, é preciso também estar atento às modulações ou modos como
tal inserção diferenciada está concebida e praticada.
Em 2008 foi criada a Comissão de Acompanhamento de cotistas na UEMS, esta
comissão contou com representantes das 15 unidades, em Dourados houve um número
maior de representantes devido ao maior número de cursos instalados. O principal
objetivo da Comissão era realizar estudos e análise da política, por meio do
acompanhamento dos alunos cotistas indígenas, realizando uma avaliação.
Em relação à comissão de acompanhamento de cotistas, a entrevistada a seguir
enfoca:
Não funcionou, pois a comissão tinha que fazer os levantamentos, buscar e verificar juntos aos cotistas, ou seja, tinham que levar trabalho para casa. Também não conseguia se reunir. Não se conseguiu e a comissão encerrou os trabalhos e nem executou o que se propôs. Muitas vezes os representantes não tinham nenhuma afinidade pela temática (OCPR2).
154
O acompanhamento dos alunos indígenas é extremamente importante, pois os
mesmos ao adentrarem uma universidade se deparam com um ambiente novo, e dessa
forma, podem encontrar dificuldades e barreiras de diversas ordens.
Além dos aspectos de ser contra ou a favor das cotas, havia também
preocupações entre os professores:
Logo de início me posicionei favorável as cotas, porque o entendimento que a gente tinha era que era insuficiente você criar cotas. Enquanto para muita gente o debate era só: cotas, sim ou não? As discussões pouco avançavam para outras questões (PR).
Como garantir a permanência? (PR).
Havia a preocupação entre os professores do grau de compreensão, será que o nível de compreensão seria o mesmo para acompanhar o curso? (OCPR/ CC).
Nós recebemos a cota e tivemos uma grande dificuldade, porque a gente não sabia como tratar essa situação. Primeiro porque que vieram pessoas de outra cultura e de outra língua (OCC 1).
Essa preocupação também foi refletida em pesquisa realizada em 2010 pela
autora Emerich, intitulada: A percepção dos professores sobre o sistema de cotas para
negros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – Curso de Pedagogia de
Dourados (2004-2008), onde se constatou a preocupação dos docentes com o
despreparo da Instituição para acolher e promover a permanência dos negros cotistas.
Também havia e há a preocupação quanto à permanência do acadêmico na IES,
a permanência ser garantia além das necessidades materiais, pois, uma boa parte dos
acadêmicos indígenas deixam suas aldeias e possuem fortes laços culturais com seu
povo.
5.4.1 A dualidade: Visível e Invisível – Igual e Diferente
“Temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza;
temos o direito a ser diferentes quando a igualdade
nos descaracteriza” (Boaventura de Sousa Santos, 2009).
O que se observa em alguns relatos dos entrevistados é a dualidade entre o
indígena como visível e invisível, igual e diferente. Ao mesmo tempo consideram
155
importante a presença indígena no meio universitário, para “desnudar” as pessoas e
consideram que os acadêmicos indígenas são “porta vozes”:
No plano imediato, o projeto de cotas dentro da UEMS, vem dar conta de um problema imediato, desnudar as pessoas, desnudar um problema que estava visível (PR).
[...] Esses programas e Ações Afirmativas conseguem trazer essas pessoas, elas são os porta vozes [...] (PR).
O autor Lima (2007, p.21) afirma que é preciso ter muito claro que os
acadêmicos indígenas são jovens que podem ser fenotipicamente muito parecidos com
os habitantes regionais com que convivem. Chegam ao ponto de serem até mesmo
invisíveis enquanto integrantes de coletividades etnicamente diferenciadas para seus
professores e para a estrutura universitária em que se inserem.
A forma como eles foram se formando, eles me parecem acostumados, a serem invisíveis e também a ser tratados como invisíveis (CC 4).
É preciso considerar que a forma como eles (indígenas) foram se formando
invisíveis e ficando acostumados é fruto de uma longa trajetória histórica que os
colocou nesta condição e os obrigaram a permanecer submersos por meio do
silenciamento ou do esquecimento, mediante as diversas formas de supressão dos seus
direitos fundamentais (SANTOS, 2009).
Bourdieu (1997) nos afirma que ao tratar todos da mesma forma – inclusive o
“diferente” – a escola privilegia dissimuladamente quem já é privilegiado por sua
bagagem familiar.
Nesta ótica, a inércia ou o tratamento de todos como iguais podem carregar
representações previamente construídas, estereótipos e prejulgamentos de uma
sociedade impregnada pela imagem do índio de forma generalizada. Conforme se
observa no relato a seguir, existem professores que acolhem e outros que tratam os
acadêmicos como outro aluno qualquer.
Professores mais sensíveis acolhem e outros professores tratam de maneira normal, como outro aluno qualquer (OCPR/ CC).
156
A normalização é um processo sutil no qual o poder se manifesta no campo da
identidade e na diferença. Normalizar significa eleger uma identidade para parâmetro
em relação às demais, e dessa forma, servindo para avaliações e hierarquizações
(SILVA, 2011).
Os acadêmicos, e em especial os acadêmicos indígenas, trazem a sua
diversidade, reflexos do seu desenvolvimento cognitivo, afetivo e social, na maioria das
vezes marcadas por experiências e relações sociais já excludentes ao longo de suas
trajetórias de vida. Um tratamento uniforme só vem a consagrar as desigualdades e as
injustiças das origens destes. Neste aspecto, o autor afirma:
Uma outra forma de compreender esses jovens que chegam à escola é apreendê-los como sujeitos socioculturais. Essa outra perspectiva implica em superar a visão homogeneizante e estereotipada da noção de aluno, dando-lhe um outro significado. Trata-se de compreendê-lo na sua diferença, enquanto indivíduo que possui uma historicidade, com visões de mundo, escalas de valores, sentimentos, emoções, desejos, projetos, com lógicas de comportamentos e hábitos que lhe são próprios (DAYREL, 1996, p.5).
Compreendê-lo, a partir da sua diferença, representa uma abordagem que
permite acolher o diverso, a diversidade promove na prática a troca de saberes. Neste
enfoque, não podemos dar prioridade ao reconhecimento somente da igualdade, há que
se buscar movimentos que se discutam as diferenças. Mas que possam: Qualquer luta
concebida sob a égide de um desses princípios deve ser organizada de maneira a abrir o
espaço ao outro princípio (SANTOS, 2009, p. 96).
Portanto, manter um diálogo baseado no respeito às diferenças é complexo,
exige movimentos e mecanismos como formas de conhecimento/reconhecimento deste
outro.
Numa sociedade onde impera a supremacia branca, por exemplo ser branco não é considerado uma identidade étnica e racial. Num mundo governado pela hegemonia cultural estadunidense, étnica é a música ou a comida dos outros países. A força homogeneizadora da identidade é diretamente proporcional à sua invisibilidade (SILVA, 2011, p. 83).
Nessa ótica, uma política de Ação Afirmativa versa no atendimento
constitucional do direito à diferença, tal direito ainda sendo questionado:
Devemos tratar todo mundo igual. Procurar fazer que a lei seja para todos. Porque os índios devem ser tratados diferentes? Porque o índio deve ter cota? (CC5).
157
Como podemos observar, o discurso ideológico de igualdade denota uma
tentativa de diluir a noção de diferença, numa lógica de pluralismo conservador e
integrador.
5.4.2 Parcas ações e/ou inexistência de discussões sistemáticas nos cursos
A educação exerce um papel fundamental no combate e na ressignificação de
identidades que são marginalizadas por processos que levam à inferiorização e exclusão
do sujeito. Ainda que hajam esforços, uma parte das escolas não contemplam, em suas
práticas pedagógicas, questões que cercam os estudos relacionados à pluralidade
cultural.
Tal fato pode ser entendido considerando-se que a educação superior, por
diversas vezes, tem se tornado um “[...] veículo de projeção, de padrões e modelos que
impedem o verdadeiro conhecimento, privilegiando um conhecimento dado e
assimilado [...]” (GUSMÃO, 2003, p. 92), representando o colonizado sempre como
uma população de tipos degenerados (BHABHA, 1998).
Nessa ótica Giroux (1997, p.16) nos aponta:
[...] o que vale como conhecimento, o que é importante ensinar, a forma como se julga o objetivo e a natureza do ensino, da forma como se vê o papel da escola na sociedade e a compreensão dos interesses sociais e culturais que modelam todos os níveis da vida escolar.
Entre os entrevistados se observa a exígua discussão sistemática sobre a
temática:
No curso não há discussões sistemáticas para discutirmos isso, está se passando ano e ano e não houve e não há nada discutido sobre isso. Nunca houve uma discussão do que fazer, por exemplo... (OCC 1).
Não existem ação sistemáticas, fica a cargo de cada professor, como é hoje, no sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino (OCPR/ CC).
Os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) mantêm uma lógica da formação profissional, eles contemplam o que diz na legislação, não tem o cuidado a situação do negro e do índio no Brasil. O PPP não contempla absolutamente nada de Ações Afirmativas (OCPR/ CC).
Nos cursos na verdade, quando percebem estas dificuldades, não tem ações para isso, nada instituído (OCPR2).
158
O que se observa a partir dos relatos dos entrevistados acima é que a presença
indígena não significou, nestes casos, a promoção de discussões sobre a situação do
índio e do negro no Brasil, abrindo espaços para um diálogo pautado na alteridade.
Neste enfoque,
Como se pode falar de uma ‘conquista do valor da diversidade’, quando estamos perante um currículo comum? Tal como tivemos ocasião de deixar dito num outro espaço, e como está mais do que demonstrado, “o currículo nacional, como documento, é um erro [uma vez que] coarcta a verdadeira essência dialética do processo de ensino aprendizagem”. Por outro lado, o triunfalismo de um currículo comum – ainda que besuntado com os eufemismos do flexível, da autonomia, entre outros-, é ele próprio, mais do que um obstáculo à valorização da diversidade, ou o comprovativo da desvalorização dessa mesma diversidade, ou ainda, pior do que a anterior, uma estratégia de valorização de um ‘determinado comum’ que perpetue determinados quadros econômicos e culturais em detrimento de outros (PARASKEVA, 2005, P.11).
Portanto, o desafio é a construção de um currículo que leve em conta as
características étnico-raciais e culturais dessas populações, rompendo com o modelo
hegemônico e repetitivo para uma população urbana, branca e de classe média.
Diversidade entendida como riqueza e não como um problema. “É imprescindível,
portanto, uma política educacional que reconheça que é no conjunto das diferenças que
encontramos nossa própria identidade de brasileiros”(SILVA & SOUZA, 2008, p.185).
Um currículo multicultural e diferenciado é baseado no respeito à diferença e na
tolerância, com capacidade de transcender os obstáculos epistemológicos e as ideologias
de poder fundados no preconceito e no etnocentrismo.
5.4.3 Adversidades
É recorrente a fala dos entrevistados quanto às dificuldades apresentadas pelos
estudantes indígenas e apontam como origem de tais dificuldades a qualidade do ensino
fundamental e médio:
Se as pessoas tivessem as mesmas condições para se entrar na universidade, então eles não precisariam das cotas. A atuação do governo deveria ser na base, na qualidade do ensino público. Se as escolas públicas fossem de qualidade, independentemente de ser índio, branco ou negro. Teriam as mesmas condições (OCPR/ CC).
159
A autora Moehlecke (2002) nos chama atenção para os cuidados quanto a estas
afirmações que podem traduzir a defesa de políticas universalistas; é necessário olhar a
raiz do problema, no caso, entre eles a baixa qualidade do ensino básico na esfera
pública, saúde, moradia, saneamento básico, segurança, emprego e renda, por exemplo.
Portanto, as cotas e as políticas de Ações Afirmativas não excluem a
necessidade de discussões sobre o compromisso de se melhorar a educação em todos os
níveis. E também combinadas com outras políticas para de fato combater a exclusão
social presente em nosso país.
É preciso, no entanto, encarar as dificuldades e desafios a serem superadas na
educação básica nas comunidades indígenas, e neste aspecto, as dificuldades podem
estar relacionadas a fatores como: somente 13% dos professores de escolas indígenas
possuíam ensino superior; locais improvisados das escolas como galpões, casas de
rezas; somando-se a falta de pertinência cultural; além dos fatores relacionados às
questões socioeconômicas (AYWIN, 2009, p.10).
Também é necessário considerar que o conhecimento dos acadêmicos indígenas
é construído sobre arcabouços culturais distintos. Portanto, o desafio é como se pensar
uma aprendizagem significativa a partir de significados tão distintos?
Nesta ótica, Paraskeva (2002) apoiado por Apple enfoca que conhecimento é
poder, desta forma são necessários questionamentos sobre as formas de conhecimentos
hegemônicos e dominantes, levantando algumas indagações:
[...] De quem é esta cultura? A que grupo social pertence este conhecimento? E de acordo com o interesse de quem é que se transmite determinado conhecimento (fatos, destrezas, propensões e disposições) em instituições culturais como a escola? (PARASKEVA, 2002, p.113)
Portanto, é fundamental que no processo de formação de profissionais críticos
concebam o conhecimento como prática social, exercendo papéis políticos ideológicos
(SILVA, 2011).
Ainda sobre as dificuldades apontam:
[...] principalmente entre indígenas muitas dificuldades. Pois, os alunos indígenas têm muitas dificuldades, eles chegam à universidade com um nível de escolaridade muito baixo (OCC 1).
Alguns professores fazem correlação com as cotas, dizendo que eles são fracos, que não conseguem acompanhar, são preguiçosos (OCC 2).
160
É comum nos discursos docentes o argumento de que muitos alunos apresentam
dificuldade em aprender, explicado por uma séria de fatores, estereótipos
preestabelecidos, como por exemplo: mal alimentadas, negras, imaturas, seus pais serem
analfabetos, alcoolistas, favelados, filho de prostituta, índios, dentre outros
(ATHAYDE, 2010).
É assim que a educação, não só das universidades, mas em âmbito geral tem sido “o veículo de projeção de padrões e modelos que impedem o verdadeiro conhecimento, privilegiando um conhecimento dado e assimilado pela ordem institucional” que nem sempre é percebido por aqueles que produzem os processos educativos (GUSMÃO, 2003, p. 92).
Esta percepção dos acadêmicos é expressa pelos indígenas, como se vê no
estudo desenvolvido por Brand e Calderoni (2012), que trazem relatos
Eliel Benitez, professor e acadêmico Kaiowá, da Terra Indígena Te`yikue, município de Caarapó, referindo-se à presença indígena nas IES, reconhece que “nossa maior dificuldade foi desestruturar aquilo que estava fixado”.
Na mesma perspectiva, segue outro professor e acadêmico, Joaquim Adiala, guarani da Terra Indígena de Porto Lindo, município de Japorã: “Muitas vezes as Universidades não querem aceitar o tipo de conhecimento, organização política, social e economia dos nossos povos (...). Os professores (das IES) não conhecem os nossos anseios e por isso não conseguem trabalhar com os acadêmicos indígenas” (p. 92).
O autor Oliveira filho (2004) apud Urquiza et al (2011, p. 87) aponta que “o
problema das populações indígenas não é a baixa escolaridade, mas sim o
reconhecimento e promoção de valores e visões de mundo diferenciados [...] e ao
empoderamento das sociedades”.
Os entrevistados também reconhecem que:
[...] indígenas e não indígenas apresentam dificuldades de aprendizagem:“tem outros alunos que não são cotistas e também têm dificuldades” (OCC 2).
Outro fato destacado pelos entrevistados se refere à evasão e desistência dos
acadêmicos indígenas:
[...] a gente precisa investigar a questão da evasão porque muitas vezes as pessoas assim,é o que sinto ouvindo pessoas que são especialistas. Às vezes o pessoal tem um certo temor dos dados da evasão, porque você investe em um programa e uma das coisas que se esperava é que ele obtivesse sucesso com o maior número de alunos que permanecessem (PR).
161
[...] eles têm muitas dificuldades, eles reprovam e este é um ponto de muita desistência e de muita evasão. Passa o primeiro, passa o segundo e passa para o terceiro. Porque eles vão carregando as disciplinas, eles estão no terceiro ano e carregando disciplinas do segundo, do primeiro e aí eles desistem. É isto que está acontecendo (OCC 1).
Os alunos indígenas têm dificuldades e problemas, assim como os demais alunos, por exemplo, nos estágios, nos TCCs, a evasão é um pouco maior entre os indígenas, mas não tenho este número. Mas eles têm tempo pra isso, eles têm 7 anos para concluir o curso, uma parte dos alunos indígenas não conclui o curso no tempo regular. Não saberia em números quanto é a evasão (CC 4).
A gente faz um trabalho, gente faz um trabalho diuturno de acompanhamento com eles aqui. Mesmo assim não conseguimos formar muitos aqui. Entre as mulheres, tem a questão da gravidez, e elas amamentam por mais tempo que nós não indígenas. A mulher terena e a mulher indígena é muito maternal, ela muito doméstica e ela é da família, dá prioridade para a família, depois ela prioriza os estudos. Dependendo se é uma mulher casada ela vai dar prioridade à família e depois ela prioriza os estudos (CC2).
Alguns apontamentos sobre evasão e desistência são discutidos no estudo
desenvolvido pelos autores Veiga (2000, p. 45-47) apud Veiga e D’Angelis (2010)
relatando que “(...) a evasão escolar pode não ser um problema, mas uma forma de
resistência à escola”. No entanto, tal afirmação não pode ser generalizada levando em
consideração a diversidade e complexidade da temática. Portanto necessitam de estudos
aprofundados.
A questão da evasão é discutida na IES de forma geral, centradas na
culpabilização da qualidade da educação básica. Neste aspecto, considera-se que, são
necessários esforços para melhoria da qualidade da educação do ensino médio e básico,
no entanto, paralelamente a este movimento é preciso maiores discussões e ações
efetivas no combate à evasão.
Outro fator de destaque que os entrevistados apontam é um declínio do número
de alunos indígenas na UEMS
Hoje Campo Grande está com um grande número de alunos, mas a UEMS de Dourados continua tendo o maior número. Mas isso tende a equilibrar. Em função das bolsas das universidades federais que é de maior valor (OCPR2).
[...] hoje vejo que o número de alunos nos cursos aqui diminuiu, nós já tivemos muitos alunos e hoje já são menos [...] reduzindo a procura pelos cursos aqui pelos alunos indígenas (OCC 2).
Eu tenho notado assim, mas preciso me certificar disso no SAU, mas me parece que tem diminuído o número de indígenas que tem ingressado no nosso curso (CC 2).
162
Este fato pode estar relacionado em parte à criação dos cursos de licenciatura
intercultural na Universidade Federal da Grande Dourados, somando-se também ao
valor da bolsa empregada pelo governo federal ser de R$ 900,00 reais, fator que pode
estar contribuindo para que os indígenas busquem cursos em universidade federais.Tal
afirmação é sustentada pelos relatos dos próprios indígenas em conversas informais.
O mesmo também foi observado pela entrevistada:
[...] com certeza terá um aumento na UFMS e UFGD. A bolsa lá é de 900,00 reais, não precisa fazer nada (OCPR2).
5.4.4 Intolerância e Resistências
No relato de uma das entrevistadas, emerge a situação do preconceito. Julgamos
importante inserir o relato completo, por considerarmos que não se trata somente de
uma situação explícita de preconceito e racismo, mas também de uma desqualificação
do saber do outro:
[...] vivi um preconceito na escola onde tinha o estágio em relação a uma aluna indígena. Era uma implicância exagera, porque eu tinha outras estagiárias, promovendo até aquém daquela da aluna indígena e não foi tão criticada.... Tem professores que pegam a ficha e preenche com os quesitos máximos. Mas tem outros que são criteriosos e preenchem com cuidado todos os campos. No caso da aluna indígena a professora sempre colocava, sempre ampliava alguma “falta”, algum esquecimento.
E no ano seguinte quando eu fui tentar renovar o vínculo com aquela escola para fazer o estágio uma das coisas que a coordenadora me disse: tivemos uma professora que se queixou muito da sua estagiária. E aí eu perguntei que queixa era aquela, porque a mim não chegou, porque se fosse uma queixa construtiva teria chegado a mim. Ela solicitou algumas coisas para a estagiária e ela não fez. E aí eu perguntei qual professora e ela me disse, então pensei: já sei. Porque se a professora solicita algumas coisas para a estagiária que estão na cabeça e ela não fez, é porque ela é indígena. Na realidade, se não fez do jeito que a professora fez, é porque a aluna é indígena.
O trabalho que esta aluna fez, foi um trabalho inédito. Elas estavam fazendo o período de regência do mês agosto. Esta aluna é terena e nós trabalhamos as lendas terenas. As crianças aprenderam cinco lendas inéditas e aprenderam também os nomes dos animais na língua terena. Ela qualificou aquele projeto de modo diferenciado. Ela qualificou aquele projeto de folclore. Eu senti que para a escola do que aqueles alunos trazem alguma coisa, um pedaço daqui e dali, mesmo da internet, muitas vezes já foram desenvolvidas e não fazem parte do
163
nosso meio. E aquele aluno que trabalhou coisas da sua própria cultura e que levou algo que é do nosso meio.
Eu sinto uma resistência das escolas em receber o estagiário indígena. Um olhar diferente, será que ele vai dar conta? Esta professora chegou a insinuar isto para mim, me dizendo assim: esta aluna vai dar conta? Será que ela vai dar aula aqui ou na comunidade dela. Será que ele vai dar conta? (CC 2).
Mas o que vejo é a questão do preconceito, da resistência e do preconceito, porque este movimento de deslocamento de sair da aldeia e vir para a universidade tem que aprender com isto, dialogar, se aceitar também porque esta identidade étnica deles é muito viva, porque ele tem uma ligação muito forte com este espaço territorial, com a família, com a cultura e com os rituais, ele tem laços consanguíneos muito fortes (CC 1).
O esperado ingresso na universidade dá lugar a novos desafios referentes à
permanência e inserção na universidade. É importante destacar que os desafios nesse
momento não se restringem aos aspectos relativos exclusivamente à diferença de classe,
mas a um escopo de marcação de diferenças que passam pela raça, gênero e história de
vida. A limitação da utilização do conceito de classe já foi identificada como um
problema nos estudos sobre as desigualdades escolares, campo em que o economicismo,
criticado por Bourdieu (1997), reduzia a multidimensionalidade do campo social às
questões econômicas. Surgem também diferenças e preconceitos fundamentados na
origem periférica, no modo de falar e na diferença de cor/raça (MAYORGA & SOUZA,
2012).
Em relação às situações vivenciadas de preconceito, a marcação da exclusão de
pode ser dada pela via do modelo hegemônico branco e rico, pobre discriminado por ser
pobre, índio ser discriminado por ser índio, negro discriminado por ser negro, e entre
outros grupos minoritários e excluídos.
Na pesquisa intitulada “Ações Afirmativas, Cotas e a Inserção de acadêmicos
indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)”, desenvolvida por
Athayde (2010), os acadêmicos indígenas são enfáticos ao relatarem as situações de
preconceitos vivenciado na ambiência universitária.
Alertam-nos Lázaro e Tavares (2013, p. 9), organizadores do livro intitulado
“Rede de Saberes: Políticas de Ação Afirmativa no Ensino Superior para indígenas no
Mato Grosso do Sul”, que o acolhimento:
[...] dos acadêmicos indígenas deveria considerar não apenas suas urgentes demandas materiais, mas, também, especialmente, sua visão de mundo, sua visão de mundo, sua cosmologia e os desafios subjetivos que esses jovens indígenas experimentam quando adentram instituições universitárias.
164
Há nitidamente uma desqualificação do saber indígena, nas palavras de Antonio
J. Brand “os cursos não estão abertos para dialogarem com saberes locais ou também
tão pouco incluir essas questões nos currículos”(LÁZARO & TAVARES, 2013, p. 15).
A inclusão de novos saberes nos espaços universitários tem sido um desafio
eminente, ainda pouco valorizado e explorado pelos professores, como uma
possibilidade de integrar um conjunto de novos conhecimentos indígenas, entre ele
pode-se destacar: os conhecimentos e tecnologias de manejo ambiental, de cuidado a
saúde e agricultura, entre outros (ATHAYDE, 2010).
Os entrevistados também apontam para as situações de resistência nas atitudes,
na fala dos colegas professores e também situações com os alunos:
Temos professores que tem resistência ao acadêmico indígena e toda vez que você toca nesta questão ele diz: eu não oriento TCC, não oriento Iniciação Cientifica e eu não sou obrigado (CC 2).
Nesta semana mesmo recebi duas alunas para falar de uma aluna indígena que está se sentindo excluída dentro da sala de aula [... ] (CC 2).
Como se observa na situação descrita acima o preconceito e discriminação são
evidenciados pela entrevistada. Este fato pode estar relacionado a crenças, visões
distorcidas e estereótipos construídos a partir de contexto de uma sociedade envolvente,
preconceituosa e racista.
Silva (2011) nos aponta que uma estratégia pedagógica para estas situações seria
tratar essas atitudes como desvio de conduta e proporcionar atividades, dinâmicas de
grupo, exercícios corporais e dramatizações que promovam processos de
conscientização que permitissem que os estudantes mudem suas atitudes. O autor aponta
que, ao tratar o tema da diversidade por meio do currículo e ações pedagógicas, as
instituições de ensino o discutem como categorias de exotismo e curiosidade.
Além de não questionar as relações de poder envolvidas na produção da identidade. Em geral, a apresentação do outro, nessas abordagens, é sempre o suficiente distante, tanto no espaço quanto no tempo, para não apresentar nenhum risco de confronto e dissonância (SILVA, 2011, p.99).
Nesta ótica, o argumento do autor se centra na defesa de uma pedagogia e um
currículo baseados na identidade e diferença como uma questão política e na discussão
165
aprofundada de como ela foi produzida. No entendimento de que as relações sociais
entre índios e não-índios no Brasil vêm ocorrendo historicamente em contextos
assimétricos de distribuição de poder (SILVA & SOUZA, 2008).
Portanto, propor discussões sobre diferenças culturais é reconhecê-las e também
assumir que o país traz um ranço da retórica desenvolvimentista. Reconhecer a
discriminação é sempre confuso, difícil e sutil (LIMA, 2007, p. 23)
Munanga (2007) aponta que nos espaços universitários, em alguns casos pela
primeira vez em sua vida, alguns alunos negros, índios e brancos terão a oportunidade
de conviver, ao frequentarem a mesma faculdade. Esta aproximação das diferenças ou de convivência das diversidades pode desarmar os preconceitos recebidos na educação familiar e escolar, penso eu. Os preconceitos estão no tecido social, na cultura, nos livros didáticos, em nossos imaginários e representações coletivas, em nossa psicologia do relacionamento independentemente da classe social à qual pertencemos. É nesses terrenos privilegiados que devemos lutar para transformar as mentes e as consciências individuais e coletivas (MUNANGA,2007, p.8).
Nesta assertiva, as IESs no seu trabalho cotidiano podem influir decisivamente
sobre a consciência da sociedade brasileira, de modo a que ela seja provocada,
subvertida em seus valores etnocêntricos.
5.4.5 Povos que possuem a língua falada como princípio
Apoiando-nos no pensamento de Silva (2011), identidade e diferença são
resultados de atos de criação linguística, por meio de atos de linguagem e são
ativamente produzidas nos contextos de relações sociais e culturais. Portanto, identidade
e diferença são criações sociais e culturais.
Giroux (1997, p.26) afirma que “longe de ser neutra, a cultura dominante na
escola é caracterizada por um ordenamento e legitimação seletivos de formas
privilegiadas de linguagem, modos de raciocínio sociais e experiências vividas”.
Nesta afirmação os entrevistados abaixo relatam que
[...] o mesmo fenômeno pode ser interpretado de maneiras diferentes dependendo de quais são os códigos até os linguísticos, para aqueles que gostam dessa parte de linguística ( PR).
Embora eles falem o português, mas falar é uma coisa e entender a língua é outra, mas compreender no sentido amplo, conseguir contextualizar num
166
sentido mais amplo. Muitas vezes os alunos tinham e tem estas dificuldades (OCC 1).
[...] tem a questão da língua, o português que ele vai ter que se adequar em textos que já são difíceis em outra língua (CC 3).
Se questionando
[...] eu sinto falta, e nós já discutimos isto dentro do curso, de algo, primeiro que se leve em consideração a necessidade de olhar para a diferença para aquele aluno que não tem o português como língua materna (CC 2).
Estava dando aula e uma delas (das estudantes indígenas) era muito simpática e muito falante. E uma vez ela ficou me olhando e quando terminei a aula perguntei para ela o que ela não tinha entendido. E ela me falou que não entendeu uma palavra. Então eu disse: você, por favor, me interrompa. E ai, comecei a ter cuidado do que eu falava na aula e sempre que acabava a aula eu perguntava pra ela se ela entendeu, ela me explicou como ela estudava: Ela copiava tudo, colocava tudo no guarani, ela estudava e depois passava tudo para o português para saber responder na prova. E aí eu fiquei pensando: todo este trabalho e eu não sei nenhuma palavra em guarani (OCPR/ CC).
Os povos indígenas possuem uma cosmovisão diferenciada, de aprendizagem
predominantemente de base oral, aprender significa e envolve sentimento,
espiritualidade, pensamento e concretização, ou seja, que têm seus processos próprios
de aprendizagem (PAZ, 2013).
No entanto, estas dificuldades com a língua portuguesa não se centram somente
nos espaços acadêmicos, mas também o encontram no âmbito das provas do vestibular
ou do Exame do Ensino Médio (ENEM). Em pesquisa realizada na UFSC pelo autor
Tragtenberg (2011), constatou que em relação a prova do vestibular, o aumento da nota
de corte ligada ao Português contribuiu para a exclusão dos candidatos indígenas. Se as
notas de corte fossem as de 2008 e os indígenas pudessem zerar na soma das questões
discursivas, haveria mais indígenas na UFSC em 2008 e 2009 (p. 11).
5.4.6 Os interstícios.... os entre lugares33
O trabalho fronteiriço da cultura exige um encontro com “o novo” que não seja parte do continuum de passado e presente. Ele cria uma idéia do novo como ato insurgente de tradução cultural. Essa arte não apenas retoma o passado como causa social ou precedente estético; ele renova o passado, refigurando-o como um “entre-lugar” contingente,
33 Utilizaremos o conceito de entre- lugar proposto por Bhabha (1998).
167
que inova e interrompe a atuação do presente (BHABHA, 1998, p. 27).
Lynch et al (2013), afirma que ao realizar uma mudança, e neste caso a
implantação da política na referida IES pesquisada, nos recomenda da necessidade de
compreender e identificar os interstícios (citando Habermas), ou seja, aqueles lugares
entre os espaços que permitem mudanças e resistências ocorram em momentos
diferentes.
Diante das dificuldades relatadas pelos entrevistados, alguns cursos buscam
saídas, ora ofertando projetos de ensino ou monitorias. No entanto, essas ações e
projetos não são lineares e na maioria dos casos não contam com recursos financeiros.
[...] tem um projeto, que está com o apoio de um professor [...] que presta atendimento aos alunos do primeiro ano, não especificamente com cotista, alunos que são indicados pela professora. Principalmente para a leitura e interpretação de texto (CC 2).
Não existem ação sistemáticas, fica a cargo de cada professor, como é hoje, no sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino (OCPR/ CC).
Na IES não tem incentivos, mas nós precisamos desenvolver as atividades, então é a hora que a gente senta para ver os editais, tantos os editais nacionais quanto os do Fundect. E nós vamos procurando (CC 1).
Na Agronomia, em 2006 e 2007, onde recebemos um número maior de alunos indígenas, tivemos uma experiência boa, e tivemos que separar os alunos. Eu dava aula no primeiro ano, na aula de Botânica. Pois eles tinham muitas dificuldades, dificuldades de entender, mas percebi que era porque eles tinham vergonha de perguntar. E este foi o jeito que achei para resolver esta situação e que eles pudessem acompanhar a turma.
E às vezes eles ficavam retraídos, aí eu decidi fazer aulas práticas só pra eles, fazia aulas com toda turma de manhã e fiz aulas práticas à tarde, era só pra eles, aí era como se fosse outra turma. E foi muito bom, eles conversavam e tiravam dúvidas. Eu tinha cinco alunos indígenas. A discussão se iniciou como os alunos trabalhavam os nomes das plantas e na língua, o que eles enxergavam e isto foi interessante. E este foi o jeito que encontrei pra resolver as dificuldades deles (OCC2).
Os avanços não são rápidos, com já apontado pelos pesquisadores
(BROSTOLIN & CRUZ, 2010). Mas alguns já percebidos, como os descritos pelos
entrevistados e também pelas tentativas dos cursos, na busca se alternativas e
possibilidades:
168
Outro exemplo que podemos destacar, durante a fase de coleta de dados o Curso
de Enfermagem em vias de discussão de reestruturação do Projeto Político Pedagógico
do Curso propõe a inclusão de uma disciplina de Antropologia da Saúde, fazendo um
intenso debate em torno das questões da diversidade e cultura, com a participação de um
grupo de docentes com formação na área de antropologia e também pesquisadores da
temática.
Também no sentido de atender a esta crescente demanda e necessidade de
discussões foi inserida na estrutura curricular como optativa uma disciplina que
permeasse o etnocuidado34.
No processo de discussão da mesma fui convidada a participar e solicitei que
fossem ouvidos os acadêmicos indígenas, bem como os profissionais enfermeiros
egressos indígenas do Curso de Enfermagem da UEMS que atuavam nas aldeias
indígenas de Dourados35, para que pudessem opinar e construir junto com os
professores os temas propostos.
Esta experiência foi bastante intensa, os discursos dos indígenas era uma
retórica: estavam surpresos, pois, pela primeira vez alguém queria saber o que eles
julgavam importante se saber e se conhecer sobre etnocuidado. Foram realizadas
também reuniões com os acadêmicos e da mesma forma enfatizavam que raramente
havia interesse dos professores de se conhecer formas de produzir cuidado em seus
territórios.
|Julgou-se importante a presença dos indígenas nesta discussão, para que os
mesmos pudessem nos auxiliar na construção e elaboração da disciplina, considerando
que qualquer que seja a iniciativa junto aos povos indígenas, ela deve ser, nas palavras
de Brand et al (2008), cercada de muito respeito a sua organização social e visão de
mundo
34 Madeleine Leininger cunhou o termo enfermagem transcultural e o termo etnocuidado, focalizada em diferentes culturas, no cuidado cultural, nos fenômenos da saúde e da enfermagem. Foi Leininger também quem cunhou o termo cuidado culturalmente congruente (nos idos de 1960). Leininger ha tomado a la antropología el concepto de cultura, como ya se indicó y que define: «La cultura son los valores, las creencias, las normas y los modos de vivir compartidos, aprendidos y transmitidos que guían los pensamientos, las decisiones y las acciones de un grupo de manera específica». La cultura caracteriza a cada grupo cultural y para respetar y reconocer una cultura es necesario estudiar y comprender como se expresa el cuidado (Leininger, 1991: 47 apud ROHRBACH-VIADAS, 1998). 35 A escolha pelo município de Dourados se deu pelo maior número de egressos enfermeiros da UEMS atuando em aldeias indígenas.
169
Entre os entrevistados há preocupação em conhecer e se aprofundar na temática
indígena:
Atualmente estou fazendo um curso de Educação intercultural Indígena, mas são coisas que eu fui atrás. Porque eu fui atrás? Embora a gente tenha no curso que aborde a questão indígena, que trazem estas discussões sobre a escola indígena. Nós formamos dentro do curso de Pedagogia formamos professores que vão atuar em escolas da área urbana e nas comunidades indígenas (CC 2).
Na busca de se promover o debate sobre a temática da inclusão na perspectiva de
raça, etnia e gênero foi em criado em 11 de junho de 2014, por meio da RESOLUÇÃO
COUNI-UEMS Nº 437, o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação,
Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE. De acordo com a referida Resolução, o objetivo do
centro é:
Art. 2º O CEPEGRE tem como objetivo propor, subsidiar, articular monitorar e avaliar as políticas públicas de Ação Afirmativa na UEMS, ligadas às questões de educação, gênero e sexualidade, raça e etnia, com foco no processo de inclusão para o acesso, permanência e conclusão na Educação Superior, por meio do diálogo e participação efetiva, junto aos demais sistemas de educação, órgãos governamentais, não governamentais e Movimentos Sociais, na luta contra os processos de discriminação, racismo, homofobia, violência doméstica e contra a mulher.
Portanto, se observa iniciativas, caminhos e propostas na busca de responder as
demandas e necessidades de cada curso.
5.4.7 Desafios apontados
Os entrevistados apontam os principais desafios:
[...]acho que os programas que a nossa universidade tem neste momento ainda estão muito aquém a dar acesso aos sujeitos (PR).
Chegou à universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm que discutir isso. Deveriam dizer: esse é o nosso cenário, e o que a gente vai fazer? (OCPR2).
Teria que preparar os professores para compreender essa lei (10.639 e 11.645), que torna obrigatório este enfoque lá na educação básica, e entender esta caminhada histórica desses grupos índios, negros e LGBT e deficientes ao longo do século XX (OCPR2).
No que se refere ao preparo dos professores, a líder indígena Kaingang Azelene
afirma: “Não somos nós os únicos que devemos nos preparar para entrar na
170
universidade; ela também tem que se preparar para nos receber e nos entender”
(DAVID et al, 2013, p. 118).
Portanto, avanços são necessários na relação entre os saberes escolares e a
diversidade étnica e racial, sendo imprescindível que os educadores que o processo
pedagógico é mediado por diversas dimensões, entre elas a identidade, a ética, a
sexualidade e as relações étnico-raciais. A partir desta compreensão é possível construir
relações humanas e políticas educacionais pautadas no respeito e na tolerância.
Precisamos integrar estes alunos. Principalmente com os professores, pois nós fizemos assim, trabalhando com erro e acerto. Primeiro entender como são e quem são estas pessoas, o que passa com eles, o que eles pensam (OCC 1).
[...] temos uma luta por reconhecimento em uma esfera cultural, mas nós precisamos abrir uma luta por reconhecimento da esfera econômica também, você formar e propor uma abertura para o mercado de trabalho [...] (CC 3).
Chegou na universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm que discutir isso (OCPR2).
Neste âmbito, a universidade começa a ser questionada:
Que discussão está fazendo a Universidade para juntar os conhecimentos que estas pessoas trazem (índios, negros, etc.)? (OCPR2).
Se questionar e se mobilizar, mesmo que sejam movimentos pequenos, são
avanços para se repensar o papel da universidade a partir do conceito de
multiculturalismo emancipatório trazido por Boaventura de Souza Santos, em entrevista
a Gandin e Hipolito (2003, p.1).
Um dos grandes objetivos das universidades é estabelecer um diálogo
intercultural, um espaço intercultural onde acontecem os encontros e as relações entre as
pessoas, seres da natureza, seres do mundo não visível. O espaço acadêmico deve
permitir o debate público e a politização, por meio do respeito à diferença.
Um espaço que promova o hibridismo, a mistura, a junção, a conjunção, o
intercurso entre as diferentes nacionalidades, entre diferentes etnias, entre diferentes
raças (SILVA, 2011, p. 97). Nas palavras de Bhabha (1998) chamada como terceiro
espaço, introduzindo a diferença como possibilidade de questionamento. Pois, uma das
grandes riquezas de nosso país é a sua cultura e a diversidade, porém ainda pouco
reconhecida e valorizada e, em algumas IES, ignorada.
171
Portanto, emerge ainda a necessidade de uma universidade que abra espaços
para o diálogo e perceba a realidades dos povos indígenas.
5.4.8 Avaliando a política de Ação Afirmativa
Na avaliação da política de Ações Afirmativas desenvolvida na IES referida nesta
pesquisa, os entrevistados consideram relevante apontar:
[...] se não fosse as cotas eles não teriam como chegar na universidade. Já está cumprindo seu papel. Mesmo que não tenha atingido as nossas expectativas em termos de quantidade. Estes poucos que estão conseguindo se formar, transformar a vida dele e também retornar a sua comunidade, eu acho que está excelente, já é válido (OCC 1).
Eu acho que as cotas contribuem para que uma fatia significativa da sociedade comece a participar disso que é a democracia, começa a entender quais são seus direitos e poder usufruir do espaço de voz da arena política (CC 3).
Passados dez/onze, passado este tempo, todos estes anos, acho que os resultados são excelentes, embora, os resultados não sejam tão expressivos quanto se esperava [...] (OCC 1).
A presença dos indígenas ocupa um espaço de luta política, pressionando as
ações políticas, curriculares e as relações pedagógicas. Portanto, repercute para a
formação de todos e todas.
Nesse sentido, para além de se verificar somente quantitativamente o número de
acadêmicos indígenas que concluíram a graduação, é importante a avaliação dos
impactos de uma política, o processo que deve ser amplamente discutido com os atores
envolvidos, embasado em objetivos claros e específicos.
Nesta ótica, a identificação de indicadores adequados de desempenho é uma
etapa decisiva nas análises, permitindo determinar o grau de cumprimento das normas e
objetivos. As normas e os objetivos estão contidos nas metas gerais enunciadas na
decisão política. E, sem dúvida, transcendem as generalidades do documento legislativo,
como proporcionam regras concretas e mais específicas para a evolução da execução do
programa (VAN METER & VAN HORN, 1996).
Ainda citando os autores acima, se as normas e objetivos não estão claramente
estipuladas é muito mais difícil identificar e medir o desempenho. Portanto, a
172
implementação de uma política não pode ter êxito nem fracassar se não existe alguma
meta em relação com a qual pode ser avaliada (VAN METER & VAN HORN, 1996).
5.4.9 Reconhecimento de uma formação elitista
A educação superior tem enfrentado uma dualidade, por um lado tem sido
mobilizadora da luta por uma educação de qualidade e para todos, e de outro ainda
conserva ranços de uma formação conservadora e elitista.
Mesmo que o objetivo da presente tese não seja comparar, agrupar e classificar
os relatos dos entrevistados, há nítidas posições ideológicas, frutos da formação
universitária.
Paz (2013) afirma que algumas instituições educativas se organizam sob uma
lógica capitalista e com um discurso neoliberal, onde o conhecimento válido é o que é
produzido pela ciência hegemônica.
Boaventura de Sousa Santos aponta:
[...] que as estruturas (nelas aqui incluímos a Universidade) não são incompatíveis com uma concepção retórica do conhecimento [...]. Sem serem necessariamente, as estruturas locais de produção de lugares comuns e de senso comum. Uma vez construídas retoricamente, as estruturas tanto podem constituir premissas a argumentação, zonas de forte consenso sobre possibilidades de ação, como argumentos sobre a solidez e a resistência na prática social...(SANTOS, 2009, p. 263).
Neste mesmo pensamento para Luciano (2006), indígena e pesquisador na área
de educação dos povos indígenas, essa resistência já era esperada, se considerarmos o
secular sistema educacional brasileiro profundamente excludente, discriminador e
colonizador.
A cultura política e acadêmica sempre foi o baluarte do processo dominador e colonizador das sociedades ocidentais europeias, razão pela qual sempre mantiveram as portas das universidades cerradas para os povos colonizados (p. 163).
Há, entre os entrevistados, o reconhecimento que as IES são carregadas de
marcas de uma formação para a elite:
173
A Universidade não entendeu que tinha gente lá fora se mobilizando. Não se deram conta, é muito difícil, de que grupo você vem? (OCPR2).
Muitos professores vieram de grupos historicamente excluídos. Mas ascendem e omitem, não fazem mais parte desse grupo. Quando este grupo chega à universidade e se depara com estes grupos até se chocam (OCPR2).
Eu lembro que quando levantaram as cotas, uma das preocupações que eu tinha era o discurso de onde estava impregnado do lugar da onde eu vinha, ou seja, o que era importante era investir na educação básica de todos, independente do recorte social, assim de renda, de cor, aliás o importante era que todos tivessem uma escola de qualidade na base (PR).
A universidade é uma instituição social, ou seja, o papel da universidade vai
além das necessidades técnicas, científicas e formação de recursos humanos para o
mercado de trabalho; inclui essencialmente o compromisso com os direitos humanos,
entrelaçados pelas questões de qualidade de vida, qualidade ambiental, democracia,
respeito, inclusão, solidariedade, num contexto globalizado e de paz mundial.
Neste sentido, Santos (1999) nos aponta que
….a universidade está sendo duplamente desafiada pela sociedade e pelo estado, e não parece estar preparada para se defrontar com os desafios, muito menos com as transformações profundas necessárias e também não para simples reformas parcelares. Este cenário, em parte, é originário da rigidez funcional organizacional e estrutural das IESs públicas do Brasil.
Portanto, enquanto instituição social, é um lugar composto de uma estrutura do
espaço social onde estão as rigorosas estruturas do espaço físico. Segundo Bourdieu
(1997, p. 167),
Os agentes sociais que são constituídos como tais em e pela relação com um espaço social (ou melhor, com campos) e também as coisas na medida que são apropriadas pelos agentes, portanto, constituídas como propriedades, estão situadas num lugar do espaço social que se pode caracterizar por sua posição relativa pela relação com os outros lugares (acima, abaixo, entre, etc.) e pela distância que os separa deles [...] também pode ser definido pela exclusão mútua, isto é, como uma justaposição de posições sociais (p. 167).
A estrutura do espaço manifesta e exprime as hierarquias e as distâncias sociais,
e o poder sobre o espaço, de certa forma, tem relação com a posição social. As
universidades públicas, durante décadas e ainda até os dias atuais, continuam sendo um
espaço ocupado pelas elites e burguesia.
174
Para romper com este modelo hegemônico, Lima (2007, p.20) afirma que:
Ao incluir os indígenas nas universidades há que se repensar as carreiras universitárias, as disciplinas, abrir novas (e inovadoras) áreas de pesquisa, selecionar e repensar os conteúdos curriculares que têm sido ministrados, e testar o quanto estruturas, que acabaram se tornando tão burocratizadas e centralizadoras, podem suportar se colocar ao serviço de coletividades vivas, histórica e culturalmente diferenciadas.
Nesta ótica, a reforma da universidade deveria estar centrada no combate a todas
as formas de discriminação racial, com ações específicas e abrangentes, no sentido de
romper ao tradicional elitismo social presentes nas IES.
5.5 Projeto de Extensão Rede de Saberes:
O Programa Rede de Saberes foi criado com o objetivo de desenvolver ações de
apoio aos alunos indígenas em sua trajetória acadêmica, com atividades desde o final de
2005, em conjunto com o Núcleo de Estudos e Pesquisas das Populações Indígenas–
NEPPI, vinculado à Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) e UEMS e que incluiu,
a partir de 2008, a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e a Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) – Campus de Aquidauana.
Nas palavras de Boaventura Souza Santos (2010), a rede visa fortalecer a
universidade e criar mais polivalência e descentralização, implica na solidariedade, na
cooperação e na partilha.
Esse programa contou com financiamento da Fundação Ford e do Programa
Pathways to Higher Education, e integrava, até o ano de 2007, o programa Trilhas de
Conhecimentos, vinculado ao Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e
Desenvolvimento do Departamento de Antropologia do Museu Nacional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (RELATÓRIO REDE DE SABERES, 2007;
LÁZARO e TAVARES, 2013).
O Projeto de Extensão Rede de Saberes vem sendo acompanhado por um grupo
de pesquisadores na área de educação, nela inclusos pesquisadores da Universidade
Católica Dom Bosco, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e da
Universidade Federal da Grande Dourados, gerando discussões sistemáticas,
seminários, bem como a produção de estudos com o envolvimento dos acadêmicos
indígenas.
175
Segundo a entrevistada o Rede se inicia a partir de uma proposta:
[...] em 2004, a discussão do Rede começou Antonio Carlos Lima do Museu Nacional veio com esta proposta, pois ele tinha um projeto aprovado junto a Fundação Ford, com a implantação de núcleos para atender esta questão indígena. Um era em Roraima, outro era no estado de Mato Grosso do Sul, por conta desses conflitos e também em função das cotas, que a UEMS já tinha aprovado, que foi implantado em 2003 e os indígenas efetivamente começaram a cursar em 2004 (OCPR2).
O Projeto Rede de Saberes foi recebido com certo descrédito pelos acadêmicos
indígenas, comportamento que pode estar relacionado à vivência de parcos projetos e
ações para atendimento de suas necessidades, como observamos no relato a seguir.
O Rede começou efetivamente suas ações em 2006, nosso primeiro secretário foi um indígena, o Tonico Benites, só ficou 4 ou 5 meses, depois veio a Antônia de Souza. Começou esta execução, toda a proposta que foi feita para a Fundação Ford com a UCBD, foi muito discutida com os alunos. Eu tenho até um depoimento de uma aluna que dizia: Professora, quando a senhora veio, uma desconhecida, chegou falando sobre o projeto, um projeto de apoio ao indígena. E eles diziam: Isso ai não vai acontecer, mais um projeto. Nós não acreditávamos. Nós discutíamos, dizendo isso não vai dar em nada (OCPR2).
Ainda segundo o relatório Rede de Saberes (2007, p. 7), as principais ações
desenvolvidas são “o apoio à participação dos acadêmicos em atividades de pesquisa,
capacitação de docentes, estudantes e pessoal administrativo das IES, apoio à
participação e/ou organização de eventos acadêmicos voltados para a temática
indígena”.
Para a entrevistada, o objetivo do Rede é:
[...] apoiar. Monitoria e tutoria devem ser institucionalizadas por pessoas que tenham sensibilizadas pela causa. Nossos tutores são sensibilizados para as questões indígenas, são professores da rede (OCPR2).
Além destas ações, o Projeto também realiza levantamento sobre a situação dos
acadêmicos, situação esta que era desconhecida pela sociedade e órgãos públicos.
Conforme afirmação de Urquiza e Nascimento (2008), as atividades
desenvolvidas pela UEMS por meio do Programa Rede de Saberes “têm ajudado a
articular relações interétnicas, baseadas no respeito à diversidade cultural e no dinâmico
processo de se tomar consciência sobre a necessidade de se estabelecer maior equidade
e justiça em uma sociedade multiétnica como a nossa”.
176
É importante destacar que o Rede de Saberes também promove uma visibilidade
do acadêmico indígena dentro da IES. Além de ser um espaço que promove o
acolhimento dos mesmos.
Pois, diziam: a gente fica pelos cantos, a gente se reúne e fica pelos cantos. A gente não tem um lugar Uma vez eu vi escrito na parede do Rede: A oca dos índios (OCPR2)
No início de suas atividades, o Rede contava com cerca de 150 acadêmicos
indígenas (LAZARO & TÁVARES, 2013). Um projeto, nas palavras da entrevistada,
ousado:
[...] essa proposta era muito ousada. Criar uma estrutura. Tem um acompanhamento efetivo, permitir que os alunos pudessem ser apoiados em projetos de ensino, pesquisa e extensão, e criar um laboratório para que eles se sentissem no lugar deles (OCPR2).
Também enfrentou e enfrenta muitas críticas:
Porque a UEMS tem computadores para índios? Os alunos indígenas nos diziam que os outros alunos diziam assim: Por que só vocês têm acesso? (OCPR2).
O Projeto Rede de Saberes também enfrenta dificuldades. O programa, mesmo
com amplo apoio da IES, enfrenta problemas para a sua manutenção e também para se
estender para todos os campi. Trata-se de um projeto de extensão, não um programa
institucional, ou seja, dependente de financiamento externo.
Neste sentido, aponta o entrevistado:
O Rede de Saberes funcionou bem aqui, mas agora nem sei. Tinha aulas extras, hoje que eu saiba não tem nada do Rede funcionando. Funcionava bem melhor. Acho que hoje está tudo parado (OCC 2).
Na defesa que o Programa poderia ser institucionalizado:
Algumas coisas deram muito certo, outras nem tanto. Porque é um trabalho que deveria ser institucional [...] vamos e estamos tentando fazer uma rede (OCPR2).
Mesmo com as dificuldades o Rede de Saberes se configura como um espaço
importante e indica uma forma concreta de acolhimento e apoio fora dos contornos
limitadores dos programas institucionalizados de apoio ao estudante, conduzido por
pessoas que são conhecedoras da questão indígena. E também considerado um espaço
de afirmação de identidade e valorização cultural.
177
No entanto, Berman (1993, p. 313) afirma que a prática não implementada, pode
gerar um fluxo contínuo de resultados, a menos que se torne uma operação de rotina
sistemática de prestação de serviços locais, ou seja, é necessário que seja
institucionalizado.
5.6 Programas de Apoio Estudantil
A UEMS hoje conta com programas de apoio destinados aos alunos de forma
geral. Os programas visam democratizar as informações e o acesso a projetos que
permitam a permanência do aluno na Universidade.
A IES estudada conta com Programa de Assistência Estudantil (PAE), que oferta
bolsas e apoio estudantil. As bolsas estão distribuídas nas modalidades: Bolsa
Permanência, Auxílio-Alimentação e Auxílio-Moradia. No Brasil, nas IES públicas
estaduais e federais, de forma geral, os programas e ações de apoio estudantil se
sustentam no tripé: Bolsa Permanência, Auxílio-Alimentação e Auxílio-Moradia
Observou-se que, entre os entrevistados, há uma dualidade daqueles que
conhecem e aqueles que alegam que conhecem parcialmente os programas, ações para o
apoio estudantil e o projeto de extensão Rede de Saberes.
Fica difícil dizer que o coordenador esteja amparado para orientar o acadêmico indígena em todas as possibilidades e ofertas que a Instituição traz [...] Às vezes os professores não conhecem os programas (CC 1).
Apontando que pode estar relacionado a:
A função de Coordenação está sempre em rotatividade, tem pessoas que entram na universidade e em seis meses ele é coordenador, e nem sempre é porque ele quer. Porque a UEMS está crescendo e chegando muitos professores, sinto falta dessa circulação de informações e de comunicação dentro da instituição. Nisso somos falhos (CC 1).
Na estrutura organizacional da UEMS, o Programa de Apoio estudantil está
vinculado à Pró-reitora de Extensão e Assuntos Comunitários (PROEC). Na estrutura
organizacional da PROEC está o departamento Divisão de Inclusão e Diversidade
(DID), cujo objetivo é orientar, coordenar, controlar, avaliar e executar as atividades
desenvolvidas na UEMS com a finalidade de implementar as políticas institucionais
para a inclusão social. Suas atividades também visam à prevenção e ao combate a toda
forma de discriminação de gênero, classe, raça, etnia, orientação sexual, pessoas com
178
necessidades especiais e respeitando as especificidades de cada Unidade Universitária
(Relatório do Projeto de Desenvolvimento Institucional /UEMS, 2014).
Em relação às atividades e funções da DID, os participantes da pesquisa
consideram que:
[...] a DID (Divisão de Inclusão e Diversidade) foi criada para dar conta disso, por um bom tempo deu conta disso, mas hoje não está cumprindo sua função, por falta de funcionário, por uma outra visão. Tem uma política interessante, muitas vezes não tem continuidade, precisa criar, não digo em todos os lugares, mas deve ter acompanhamento pari passo desses acadêmicos. Se nós temos cotas, devemos acompanhar isso ( OCPR2).
A responsável pela Divisão afirma:
Esse acompanhamento deveria ser de uma forma que não está sendo feito (MCAAC 2)
Há um reconhecimento que
[...] deveria ter uma comissão própria de acompanhamento, multidisciplinar da área da assistência, para assessorar e fazer essas discussões. Não é uma coisa formalizada (MCAAC 2).
Tem que ter esse acompanhamento, essa assistência, que é essencial, tem que alguém acompanhando do ponto de visto pedagógico para mexer em currículo (MCAAC 2).
A entrevista ainda enfoca as dificuldades do convênio com a FUNAI:
Tem uma comissão que mexe só com esse auxílio da FUNAI existe um termo de colaboração FUNAI e UEMS que ela bancaria o translado do aluno casa faculdade. Faculdade casa e toda a UEMS, em todas as unidades, mas a FUNAI disse que não há recursos financeiros pra isso. Eles não pagam […], não é algo sistemático […] (MCAAC 2).
Esse termo é assinado desde 2010, eles nunca pagaram, eles têm mil e umas ligações que você bem imagina (MCAAC 2).
Segundo informações da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários,
responsável pelo programa, em 2014 foram oferecidas 100 Bolsas Permanência, 32
Bolsas Auxílios Alimentação e 32 Bolsas Auxílios Moradia.
Os programas de apoio estudantil oferecidos na IES são: Programa Nacional de
Assistência Estudantil (PNAES), Programa Vale Universidade Indígena (PVUI),
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC); Programa
179
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID); Programa Ciência Sem
Fronteiras e Serviço de Atendimento Psicológico (SAP).
Sobre os programas de apoio estudantil, nos deteremos com maior detalhe sobre
o PVUI, por se tratar de programa específico a acadêmicos indígenas.
5.6.1 Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES)
O Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAEST) para as
Universidades Estaduais é uma ação do Governo Federal, administrado pelo Ministério
da Educação, e tem como finalidade ampliar as condições de acesso, permanência e
sucesso dos jovens na educação superior pública estadual (PDI, 2014-2018).
A referida IES é inserida no Programa PNAEST a partir da adesão ao SISU e
segundo o relatório de 2013, o objeto do convênio atendeu e executou:
[...] ações nas quinze unidades universitárias (Aquidauana, Amambai, Campo Grande, Cassilândia, Coxim, Dourados, Glória de Dourados, Ivinhema, Jardim, Maracaju, Mundo Novo, Naviraí, Nova Andradina, Paranaíba, Ponta Porã) que promovam e ampliem a permanência e sucesso dos alunos, e diminuam as taxas de retenção e evasão nos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (RELATÓRIO PARCIAL DE CUMPRIMENTO DE OBJETO, 2013, p. 2)
Segundo o referido relatório as ações desenvolvidas se incluem aquisição de
materiais e equipamentos, livros, auxílio para compra de passagens para eventos,
diárias, hospedagens, material e equipamentos para inclusão digital, cultura, esporte,
apoio pedagógico e acessibilidade.
Em relação à temática acessibilidade, foram desenvolvidas, conforme relatório,
duas oficinas para a Comunidade Acadêmica, referentes a deficiências e inclusão no
Ensino Superior.
O referido documento destaca a inclusão de acadêmicos indígenas e negros na
IES, porém não menciona ações específicas direcionadas a estes grupos minoritários no
planejamento e na execução orçamentária do respectivo convênio.
180
5.6.2 Programa Vale Universidade Indígena (PVUI)
O Programa Vale Universidade Indígena (PVUI), criado a partir do Decreto n°.
11.856, de maio de 2005, apoiado pela Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência
Social do Estado de Mato Grosso do Sul, beneficia acadêmicos de baixa renda. O
Governo do Estado executa o repasse da bolsa em forma de benefício social, que é
depositado em espécie na conta bancária do acadêmico de Universidade Pública (PDI,
2014-2018).
O acadêmico indígena também recebe auxílio referente ao transporte, como
ajuda para se deslocar até a universidade.
Os critérios para o ingresso no programa:
• Comprovar sua condição indígena por meio do Registro Administrativo
(RANI), da Fundação Nacional do Índio (FUNAI);
• Estar matriculado em curso presencial de bacharelado ou licenciatura
autorizado pelo Ministério da Educação (MEC), na UEMS (PDI, 2014-
2018, p. 43).
São oferecidas 120 bolsas, 54 acadêmicos indígenas foram beneficiados pelo
programa em 2014.
A bolsa é um avanço, mas tem estes fatores que impedem. Anualmente um número de 120 bolsas, começou sendo preenchido, mas depois nunca mais foi preenchido ( OCPR2).
As pessoas podem olhar as bolsas e ver só os números e dizer que os índios não querem. Não é que eles não querem, o programa é excludente de início ( PR).
O PVUI hoje tem enfrentado muitas críticas, pois no entendimento da
comunidade acadêmica não supre as necessidades de manutenção do aluno na
universidade e é agravado por seu caráter excludente e meritocrático, onde o aluno é
excluído do Programa se não atender os critérios do Programa no decorrer dos anos da
graduação: não acumular mais de três disciplinas em regime de dependência e cumprir
carga horária em locais que nem sempre atendem e complementam a formação
acadêmica.
Santos (2010, p. 69), recomenda que as bolsas devem concedidas:
[...] mediante contrapartidas de trabalho nas atividades universitárias no campus ou fora do campus. Por exemplo, estudantes de licenciaturas poderiam
181
oferecer algumas horas semanais em escolas públicas, como tutores, ajudando alunos com dificuldades de aprendizagem.
As atividades extramuros e atividades relacionadas/ligadas à área de atuação são
formas diversas e oportunas de aprendizagem, propiciando trocas de saberes e vivências
que auxiliaram na formação cidadã e profissional.
Em relação ao valor da Bolsa, a entrevistada refere que:
[...] a bolsa foi criada com um valor e não houve aumento, ainda são R$ 300 reais e R$ 46 reais para se deslocar [...] (OCPR2).
Os entrevistados expuseram críticas e posições contrárias aos critérios
estabelecidos pela bolsa, bem como quanto aos valores mensais repassados aos alunos,
conforme se observa a seguir:
Os alunos dizem: Olha professora, nós não vamos ficar com essa bolsa, “eles” vão lá pra ver se tu está lá, e se você não está lá eles nem perguntam: por quê? É uma burocracia. A gente ganha mais fazendo qualquer outra coisa, por exemplo: como ajudante de pedreiro [...]. Esta é uma opção nossa (OCPR2).
[...] não encaixava nos nossos cursos: nosso curso tem 28 horas e a semana tem 40, como é que os alunos vão cumprir 20 horas? Então precisamos adequar horários. Ajustar, ajustar os sábados. Porque não pode trabalhar a noite. Conseguimos adequar, mas precisou alguns anos. E faço isso, porque entendo, porque é uma forma de manter o aluno carente na universidade, pois eu fiz universidade com muita dificuldade e por isso eu faço isso. Hoje tem 34 com vale e 9 no Vale Universidade Indígena. Mas tem alguns alunos que acabam perdendo a bolsa. Por exemplo, tem uma aluna que perdeu, que teve a terceira reprovação, e nós vamos fazer um trabalho com ela. Para que ela possa concorrer novamente o ano que vem (OCC 2).
Além da efetividade do Programa:
[...] os programas que a nossa universidade tem nesse momento agora eles ainda estão muito aquém a dar acesso ao sujeito para alcançar esse mérito. Então hoje a gente muitos alunos perdendo bolsa no vale universidade indígena do estado, por quê? Porque tem três reprovações e ele é convidado a se retirar (PR).
[...] o programa é excludente (OCPR2).
Os alunos utilizam a bolsa para custear as despesas pessoais e
[...] ele pegava uma bolsa e tinha que sair quatro ou cinco horas da manhã passar o dia todo, não comer, ficar suado, chegar meia noite na casa dele pegar uma bicicleta. É óbvio que esse menino não vai sobreviver por muito tempo, ai até que um dia esse menino some e ele foi trabalhar com o tio dele de auxiliar
182
de pedreiro, porque ele trabalhar na cidade ele estará próximo da comunidade da sua casa, aquilo faz sentido para a vida dele.
E a universidade? Não conseguiu dar conta. Porque o programa da política ela não pode ser de uma maneira generalista que olha as pessoas e é difícil fazer isso, mas ela não pode olhar a massa, o amorfo (PR).
Os autores Van Meter e Horn (1996) apontam que as políticas contêm outros
elementos além das normas e dos objetivos para promover a implementação. É
igualmente necessário a provisão de recursos para administrá-las. Estes recursos podem
ser fundos ou outros incentivos para estimular ou facilitar a implementação efetiva. A
escassez de recursos financeiros podem se somar aos obstáculos para o processo de
implementação de uma lei, e também promover grandes dificuldades de coordenar
ações dentro de uma dependência governamental.
Corroborando com esta afirmação, Kaufman (1971) aponta impedimentos para
inovações nas estruturas das organizações como, por exemplo, as limitações de
recursos, custos irrecuperáveis, benefícios coletivos, custos psíquicos e acumulo de
restrições oficiais e não oficiais no comportamento dos envolvidos.
A dependência governamental e programas de apoio que não atendem às
demandas e especificidades dos grupos eleitos como foco das ações propostas, podem
representar um grave obstáculo na implementação de uma política. Especialmente no
Programa de Bolsas específico para indígenas, o que se observa é um descompasso no
propósito do governo estadual, impondo obstáculos e dificuldades de toda ordem para a
permanência dos acadêmicos nos programas de apoio estudantil.
Neste mesmo pensamento, Lima (2007, p.25) afirma que:
Algumas dessas universidades, por vias variadas (governo estadual, Funai, fundos próprios) concedem bolsas aos alunos indígenas. No caso da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS), a IES que abriga o maior número de alunos indígenas cotistas, eles ficam obrigados a trabalhar em atividades administrativas, funcionando como mão de obra remunerada por “bolsas de trabalho”, tendo parte de seu tempo roubado da possibilidade de superar dificuldades de adaptação. A administração superior da universidade não tem sido sensível aos pedidos de docentes envolvidos com o acompanhamento dos alunos indígenas de que estes tenham a carga horária das bolsas voltadas para a sua própria formação e para trabalhos de Ação Afirmativa.
Sem questionarmos os benefícios trazidos pela variedade de possibilidades de
apoio estudantil, há de se considerar que tais programas apresentam lacunas. São
183
necessárias estratégias e avanços para promoção de inclusão e garantia da permanência
dos acadêmicos na universidade.
Sustenta-se que essas ações diretas para os estudantes exigem uma mudança de
referência qualitativa e quantitativa quando se considera a existência de modalidades de
Ação Afirmativa no ingresso de estudantes à universidade.
[...] a assistência estudantil não pode se resumir a uma ação direta para o estudante, como o repasse de verba, por exemplo, mas precisa se constituir como um conjunto de ações ampliadas que considere a especificidade do estudante indígena que acessa a universidade e uma leitura sobre as dinâmicas de inclusão e exclusão dentro dessa instituição (MAYORGA & SOUZA, 2012,p. 273).
Ao se considerar o indígena e uma parcela importante de jovens pobres que
fazem parte da IES estudada, é preciso discussões que problematizem o acesso e
permanência nestes programas, pois ao contrário, ainda serão excludentes. O programa
se torna excludente quando cria critérios de não acúmulo de uma ou mais bolsas, dois
irmãos não podem ser beneficiados, incompatibilidade de cumprimento de carga horária
com cursos de graduação em horário integral e excesso de burocracia.
Situação similar não é um caso isolado, problemas e queixas semelhantes têm
ocorrido em outras IES, como por exemplo, no estudo por David et al (2013),
analisando a experiência de inclusão de indígenas na Universidade Federal do Pará,
constatou que os programas de apoio ao estudante ainda são pouco eficientes.
O cumprimento da carga horária pode ser feito em locais destinados pela Pró-
Reitoria de Extensão ou o aluno estar vinculado a alguma atividade de extensão ou
pesquisa com professores da IES. E quando encontra professores que os acolhem em
seus projetos de extensão e de pesquisa, se deparam com a desconfiança, situação esta
relatada pela entrevistada:
Tem uma desconfiança muito grande do mau uso do recurso público, que índio protege índio, ou que professor da universidade protege os índios (OCPR2).
Por muitos anos na IES fui orientadora de bolsistas PVUI e recebia ligações dos
responsáveis pelo setor para se certificarem se os alunos estavam presentes nas ações
propostas. Como se o fato de ser um acadêmico índio fosse razão suficiente para
desconfiança. Ou seja, é persistente o ranço do discurso hegemônico do índio
preguiçoso e que não gosta de trabalhar.
184
Diante destas questões, vários questionamentos podem ser apontados: Quais são
os movimentos políticos verdadeiros que o governo do estado de Mato Grosso do Sul
faz em defesa aos povos indígenas? Levantando hipóteses que o cenário político do
Estado é desfavorável a uma discussão e proposição para as questões indígenas, a
bancada “ruralista” e as pressões tendem a manter na inércia boa parte dos
representantes legislativos no estado de Mato Grosso do Sul.
Neste sentido, é necessário repensar os programas de apoio estudantil e adaptá-
lo aos novos sujeitos que ingressam na universidade, considerando as suas
particularidades. Pois apoio político externo a política de Ações Afirmativas
desenvolvida pela IES fica centrada em discursos, propostas e ações efetivas não
ocorrem e quando ocorrem são extremamente tímidas e não promovem discussões que
possam auxiliar em estratégias que garantam a permanência dos acadêmicos indígenas
na universidade.
Nas palavras de Paraskeva (2005), o que se observa é um “desinvestimento
intencional no campo da escolarização”:
[...] a sociedade contemporânea pautada pelos ritmos e compassos do frenesim neoliberal ao diminuir o protagonismo do Estado e do bem público e comum ‘empurrou’ também as escolas para uma posição ingrata. O desinvestimento intencional no campo da escolarização (campo este crucial para a consubstanciação de uma sociedade verdadeiramente justa e igual) revela-se como um processo seletivo que de todo não é aleatório. Na verdade, pese embora a política de sistemático desinvestimento que temos vindo a assistir atravesse todos os quadrantes do fenomeno da escolarização, o facto é que há determinadas áreas que têm sido ‘cautelosamente’ privilegiadas (p.7).
5.6.3 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC)
O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) visa, entre
outros objetivos, despertar a vocação científica, proporcionar aprendizagem de técnicas
e métodos científicos, estimular o desenvolvimento do pensamento científico e da
criatividade decorrentes das situações geradas pelo confronto direto com os problemas
de pesquisa e incentivar talentos potenciais entre alunos de graduação (UEMS, PDI,
2014-2018).
Na Tabela 10 podemos observar o número de bolsas por programas oferecidos
na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013.
185
Tabela 10: Número de bolsas por programas oferecidos na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, de 2010 a 2013
ANO 2010-2011 2011-2012 2012-2013 Bolsas
UEMS 178 178 178 Bolsas
CNPq 61 66 66 EIC-MA
(sem bolsa) * 51 62 51 Trabalhos
no ENIC** 245 262 328 Fonte: Relatório Anual de atividades físicos financeiros da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul– janeiro a outubro de 2013. *Encontro de Iniciação Científica **Estágio de Iniciação Científica – Modalidade Avançada
Em relação a orientações de bolsas de iniciação científica, a entrevistada relata:
Porque tem professores com muita resistência para orientar os alunos indígenas para a pesquisa. Tem muito aquela ideia de que eu vou levar meus alunos para uma atividade de extensão, porque se for pesquisa vai ter que produzir um artigo, um relatório, um resumo, seja lá o que for. Ainda vejo assim que o PIBIC AF tem uma procura inferior, tendo em vista ao número de alunos indígenas presentes na UEMS (CC 2)
Segundo o Ministério da Educação e Cultura (2015), o Programa Institucional de
Iniciação Científica - PIBIC nas Ações Afirmativas é dirigido às universidades públicas
que são beneficiárias de cotas Programa de Iniciação Científica e que têm programa de
ações afirmativas. Cujos objetivos são:
Ampliar a oportunidade de formação técnico-científica de estudantes, cuja inserção no ambiente acadêmico se deu por uma ação afirmativa para ingresso no Ensino Superior; Contribuir para a formação científica de recursos humanos entre os beneficiários de políticas de ações afirmativas de qualquer atividade profissional; Ampliar o acesso e a integração dos estudantes beneficiários de políticas de ações afirmativas à cultura científica, e Fortalecer a política de ação afirmativa existente nas instituições (p.1).
5.6.4 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)
O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), criado
pelo Ministério da Educação,é desenvolvido pela Coordenação e Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES). O programa insere os alunos no cotidiano de
escolas, com o objetivo de valorizar o magistério, fomentando a iniciação à docência de
186
alunos dos cursos de licenciatura, promovendo integração entre educação superior e
educação básica.
São oferecidas bolsas em cinco modalidades:
a) Bolsistas de iniciação à docência;
b) Para alunos dos cursos de licenciatura;
c) Bolsistas de supervisão, para professores das escolas públicas;
d) Bolsas de coordenação de área de conhecimento, coordenação de gestão e;
e) Coordenação institucional para docentes das universidades (PDI/UEMS,
2014, p. 45).
5.6.5 Programa Ciência Sem Fronteiras
É um programa do Governo Federal com o objetivo de realizar a mobilidade
acadêmica de alunos de graduação das instituições de ensino superior no país. A meta
do programa é promover a consolidação, expansão e a internacionalização da ciência e
tecnologia.
A forma de concessão de bolsas do Programa foi realizada por meio da
Chamada Nacional e por Cotas das IES (PDI/UEMS, 2014-2018).
5.6.6 Serviço de Atendimento Psicológico (SAP)
O serviço de Atendimento Psicológico está vinculado à Pró-Reitoria de Extensão
e Assuntos Comunitários, que como objetivo:
[...] integrar o aluno à vida acadêmica, auxiliando-o na busca de soluções para questões problemáticas de ordem psíquica, social, educacional e profissional. As práticas utilizadas variam de acordo com cada caso e incluem psicoterapia breve, aconselhamento psicológico, psicoterapia individual e/ou em grupo (http://www.portal.uems.br/pro_reitoria/extensao/atendimento_psicologico).
187
‘
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A trajetória e elaboração desta pesquisa me permitiram a compreensão, a partir
do “olhar” dos implementadores, do processo histórico da implementação da Política de
Ação Afirmativa para indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul,
tendo como marco a criação das cotas para negros e indígenas, que no ano de 2014
completou 10 anos.
Sem a pretensão de exaurir a discussão sobre a temática, considerou-se que as
universidades, como qualquer organização, é lócus de bases conflitivas e complexas,
frutos de processos históricos, que conformam o terreno político e organizativo e é
composta por sujeitos singulares, com formas de pensar e agir oriundos de um modo
complexo, frutos de uma construção histórica e social.
Neste cenário complexo e muitas vezes adverso é que se propõe configurar a
política de Ação Afirmativa para indígenas na referida IES, imbricada por um cenário
político local centrado num ranço histórico de negação aos direitos fundamentais da
população indígena do estado. Pois, no estado de Mato Grosso do Sul, local que
concentra a segunda população indígena do Brasil, os conflitos pela posse da terra
contribuí imensamente para criar imagens distorcidas dos mesmos.
Destaca-se que, a partir dos achados da pesquisa, os primeiros momentos da
promulgação da Lei de Cotas foram marcados por intensa discussão e embates.
Momento também importante para que se discutissem as questões de raça e etnia no
cenário acadêmico, por meio de seminários com a participação da comunidade
acadêmica, representantes dos movimentos negros, de representantes e lideranças
indígenas e pesquisadores da área.
Dessa forma, a presença dos indígenas na universidade já se configura como
representativo, pois parte da população como um todo desconhece por completo a
temática e os determinantes que envolvem todas as questões indígenas.
Observou-se também que, transcorrido o período inicial após a promulgação e
implantação das cotas, as discussões e ações tenderam a decair na IES. Este fato foi
ocasionado por alguns fatores que podem estar relacionados, entre eles as mudanças na
gestão estadual.
188
Constata-se que em sua trajetória histórica, a Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul, num movimento contra-hegemônico, vem tentando promover mudanças
nesse cenário, mesmo com as dificuldades enfrentadas. Tentando minimizar a exclusão,
não somente no sentido de acesso, mas também com atividades e ações que possam
promover permanência e acompanhamento na trajetória universitária de alunos
indígenas. E também na projeção de inseri-los em programas de pós–graduação.
Os participantes relatam que buscam saídas, com ações e atividades, mesmo que
pontuais, e alternativas, como as monitorias, as atividades em grupo, disciplinas e
optativa que contemplem a temática indígena, criação Centro de Estudos, Pesquisa e
Extensão em Educação, Gênero, Raça e Etnia – CEPEGRE, somados as atividades de
apoio desenvolvidas no Projeto de extensão Rede de Saberes.
Discorrem sobre as dificuldades e desafios enfrentados, ora afirmando que entre
os indígenas há dificuldades de aprendizagem, ora reiterando que existem barreiras na
compreensão do português, especialmente entre aqueles que têm a língua materna como
princípio.
Parece-nos uma incoerência bastante acentuada, pois a Constituição Federal de
1988 assegura uma educação diferenciada, bilíngue, de acordo com as especificidades
de cada povo. No entanto, quando os estudantes indígenas ingressam no ensino
superior, não encontram profissionais preparados que conheçam as formas de aprender e
ensinar indígenas, bem como ações instituídas, por meio de um currículo multicultural,
que articule com os diversos saberes de tais povos.
Observa-se também que há uma dualidade/dissenso entre o indígena como
visível e invisível, igual e diferente. Ao mesmo tempo, consideram importante a
presença indígena no meio universitário, para “desnudar” as pessoas e consideram que
os acadêmicos indígenas são “porta vozes”.
Constata-se que a bolsa de permanência do governo do estado (PVUI) não supre
e não respeita as necessidades e as especificidades dos alunos indígenas, além de ter um
caráter excludente. Bem como os incentivos financeiros recebidos pela IES para fins de
implementação efetiva da política são insuficientes. Dessa forma, não se assegura a
inclusão, sendo necessária uma estrutura consolidada para que a universidade possa
desenvolver Ações Afirmativas consistentes e institucionalizadas. Portanto, é necessário
avanços e busca de mecanismos que garantam não somente a inclusão, mas também de
um aparato que possa assegurar condições minímas de permanência:
189
[...] que a partir dela surjam campi universitários dotados, por exemplo, de alojamentos, bibliotecas, acesso à internet etc; e docentes equipados com treinamento intelectual – e formação cultural – capazes de reverter os preconceitos que e geral avultam em regiões interioranas ( LIMA, 2007, p. 26).
Relatam que avanços são necessários principalmente para inserção de discussões
sistemáticas nos cursos sobre interculturalidade. Neste aspecto, ressalta-se que política
de Ação Afirmativa não pode ser confundida com democratização, acesso, cotas ou
bolsas, engloba um leque de ações que permeiam o acesso e a permanência dos
indígenas nas universidades fundadas no respeito às diferenças desses povos.
O respeito à diferença perpassa as garantias dos direitos humanos, entre elas, por
exemplo, as políticas de assistência, habitação e trabalho, saúde, moradia, acesso a bens
e serviços e ao direito a terra, entre outras. Há que se pensar em estratégias que
garantam os princípios constitucionais de igualdade e respeito às diferenças de forma
articulada.
No caso das populações indígenas, especialmente as localizadas no sul do estado
de Mato Grosso do Sul, se encontram em um cenário de luta para garantias mínimas de
sobrevivência, situação que revela a violação de seus direitos humanos. Portanto, pode-
se afirmar que a política de Ação Afirmativa deve ser mais ampla, além de atender às
minorias no enfoque educacional a partir da perspectiva racial, deve se estender a
extinguir as mazelas de ordem socioeconômica que afetam o país. Portanto, muito ainda
há que ser feito para uma ação política emancipatória.
Nesse sentido, Apple (2006) afirma que
Mais do que analisarmos as influências da restauração conservadora é preciso criar alternativas para superá-las por meio de um projeto político de longo prazo e que se ambiente nas transformações locais, mas abrangentes. Olhar para o passado não basta. É preciso travar a disputa ideológica (senso comum). É preciso auxiliar na reconstrução da moralidade densa e a democracia plena, aquela que inclui todos.
Nesta ótica, os resultados da implementação são efeitos das interações entre a
estrutura legal e o processo político. Uma lei que possua um apoio financeiro adequado
somado às iniciativas de mobilização, consolidação e orientações das diretrizes políticas
bem desenhadas e suficientemente claras aos funcionários responsáveis pela
implementação pode representar um marco de resistência às pressões que se façam
190
presentes da opinião pública, e mudanças desejadas, mesmo que pequenas, podem
ocorrer.
Destaco que a política da IES é inédita e enfrenta mecanismos e forças
opositoras, no entanto, é preciso criar caminhos e novas formas de superá-las.
191
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192
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217
APÊNDICE 1:
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
218
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado a participar em uma pesquisa. Este estudo está
sendo conduzido pela pesquisadora Érika Kaneta Ferri. - Participarão desta pesquisa, profissionais da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, entre eles: Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Comunitário, Pró – Reitor de Ensino, Membros da Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas e Coordenadores de Curso que tenham maior número de acadêmicos indígenas.
A finalidade deste estudo é analisar as políticas públicas de Ações Afirmativas direcionadas a inclusão dos povos indígenas na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Bem como, situar as políticas de Ações Afirmativas presentes na Federação e no estado de Mato Grosso do Sul; Compreender de que maneirAções Afirmativas s políticas de Ações Afirmativas estão sendo recebidas e implementadas pelos diversos segmentos da Universidade (Pró-Reitorias, Membros da Comissão de acompanhamento dos alunos cotistas, Coordenadores de Curso, Conselhos); Descrever as políticas de incentivo financeiro que a Instituição recebe do governo federal, do governo estadual e outras parcerias; Identificar o envolvimento dos diferentes atores na implantação e implementação da política institucional de Ações Afirmativas ; Identificar as dificuldades e facilidades no processo de implantação e implementação das políticas de Ações Afirmativas ; Mapear as ações/atividades afirmativas, discussões sistemáticas ou ações programadas desenvolvidas ao nível dos cursos e IES
Sua participação não é obrigatória. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a Instituição.
Você será entrevistado e todas as entrevistas serão gravadas e o que disser será registrado.
Você estará no estudo até que sejam colhidas todas as informações pertinentes ao mesmo, podendo acontecer em uma única entrevista ou em quantas se fizer necessário.
Você será informado periodicamente de qualquer nova informação que possa modificar a sua vontade em continuar participando do estudo.
Esta pesquisa não trará riscos de ordem física e/ou moral, relacionados à sua saúde, porém, você poderá experimentar constrangimento ao responder algumas perguntas.
Você será avisado/ informado previamente sobre o local e horário da entrevista.
Se você concordar em participar do estudo, seu nome e identidade serão mantidos em sigilo. A menos que requerido por lei, somente o pesquisador, o orientador e o Comitê de ética independente, terão acesso a suas informações para verificar as informações do estudo.
Os resultados do estudo promoverão subsídios para repensar as práticas e o papel da Universidade e do estado no contexto sócio político e cultural.Contribuindo dessa forma para análise das políticas de Ações Afirmativas e no fomento das discussões em um campo ainda pouco problematizado.
Para perguntas ou problemas referentes ao estudo ligue para Érika Kaneta Ferri, telefone 67-9971-8062. Para perguntas sobre seus direitos como participante no
219
estudo chame o Comitê de ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFMS, telefone 67-3387-3093-Ramal 2299.
Você poderá se recusar a participar ou pedir para sair da pesquisa a qualquer momento
Todas as informações colhidas neste estudo são sigilosas e sua participação é voluntária, ou seja, não receberá nenhuma remuneração para participar da mesma. Se você desistir do estudo, não será proibido de participar de novos estudos.
.Você receberá uma via assinada deste termo de consentimento. Declaro que li e entendi este formulário de consentimento e todas as minhas
dúvidas foram esclarecidas, e que sou voluntário a tomar parte neste estudo. Assinatura do voluntário__________________________________________ Data: ____/___/____ Assinatura do pesquisador________________________________________ Data: ____/___/____
220
APÊNDICE 2:
ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
221
ROTEIRO DE ENTREVISTA E CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
Caracterização dos sujeitos da pesquisa: Nome (iniciais): Idade: Função: Tempo na Função: Formação: Tempo de atuação na UEMS: Roteiro de Entrevista: (Pró-Reitorias, Presidente da comissão de acompanhamento dos alunos cotistas
e coordenadores de curso) 1. Na sua opinião, como está sendo implementadas as políticas de Ações Afirmativas
na UEMS? 2. De que maneira as políticas de Ações Afirmativas têm sido recebidas pelos diversos
segmentos da Universidade (Administrativos, Pró-Reitorias, Conselhos, entre outros)?
3. Que política de incentivo financeiro a Instituição recebe do governo federal, do governo estadual e de outras fontes?
4. De que maneira os diferentes profissionais (inclusive docentes) foram envolvidos na implementação nas políticas de Ações?
5. Que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas no curso? 6. Existem discussões sistemáticas ou ações programadas no curso acerca desses
temas? 7. Quais as dificuldades, facilidades e desafios verificados no processo de
implementação das políticas de Ações Afirmativas ? 8. Como foi sua participação no processo de implementação das políticas de Ações
Afirmativas na UEMS? 9. Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?
222
APÊNDICE 3:
ENTREVISTAS
223
Entrevista 1 – MCAAC 1/ OCPR
Dados de identificação
Nome (iniciais): M. J. A.C.
Idade: 51
Função: Docente
Tempo na Função: 08/11/1994
Formação: Pedagogia – Mestrado/Doutorado/Educ/Currículo
Tempo de atuação na UEMS: 19 anos
Ø Na sua opinião, como está sendo implementadas as políticas de Ações
Afirmativas na UEMS?
Erika, na verdade é bem assim, vou contar um pouco da minha história. Eu já
estava no estado desde 1980, era concursada como professora na rede municipal e
trabalhava na direção da maior escola estadual do Mato Grosso do Sul. E, na época
quando foi criada a UEMS, a L. me convidou para trabalhar com ela. Assumi o setor de
legislação e normas. Sou muito estudiosa, leio muito e talvez por isso tenha sido
convidada, e, no aspecto legal, dominava muito bem.
Passados alguns meses, em 1995, entrou a professora S.F, que imediatamente
me devolveu para o estado, porque ela e alguns achavam que eu era os “ olhos” da L.
Apesar de nossa relação ser apenas profissional. Essa atitude da S. me causou muitos
problemas, que ainda hoje estou resolvendo.S. era professora de educação especial no
CEUD36. Eu fui uma das primeiras professoras a se capacitar e a dar aula em uma sala
especial quando foi criado no Estado do Mato Grosso do Sul nos anos 1980. Tenho mais
de 400 horas de curso. Ou seja, quando ela foi procurar uma substituta, ela se deparou
com meu currículo, e quis que eu voltasse.
Enfim, voltei. Trabalhei na UEMS, porém depois de um tempo tive de trabalhar
no CEUD, o que atrapalhou muito minha vida funcional na época. Trabalhei os anos de
95 e 96 no CEUD, porém quando S. foi deposta pela L., teve de voltar ao CEUD, e os
alunos não a quiseram. Ela foi para a Assembleia e eu continuei a trabalhar no CEUD
até 97, quando comecei meu mestrado na PUC-SP. Pedi demissão dos meus dois cargos
36 Centro Universitário de Dourados.
224
na rede estadual, fiquei seis meses fora do estado. Fiz concurso na UEMS, e assumi a
primeira leva de professores, que dava aula em Amambai e Ivinhema. Fui chamada para
montar o Núcleo de Pesquisa e Educação, o que a gente chama hoje de Pró-Reitoria.
Assumi o Projeto Tereré, que era gerenciado por outra pessoa, logo depois a
UEMS foi convidada a participar do programa da reforma agrária no estado. A
Professora incumbida negou a participar do programa e eu acabei assumindo. Então eu
trabalhava com mais de 80 assentamentos, dava aula em Amambai, Ivinhema e fazia
mestrado. Em 1999 defendi meu mestrado e, no final do mesmo ano, a professora L. me
convidou para assumir a Pró-Reitoria de Ensino. Quando ela me convidou eu já havia
terminado meu mestrado e acabei saindo da unidade de Amambai.
Em relação à Legislação:
Lei dos nossos deputados, através da Assembleia Legislativa que cria a lei de
Cotas. Cotas para índios de autoria do nosso atual prefeito Murilo Zauith.
O deputado Pedro Kemp, também criou cotas para negros, tem um histórico de
envolvimento com as questões raciais, é um deputado do PT. Mas na lei não
especificava muito bem as questões de cor, sem esclarecer as questões de raça, que é um
conceito sociológico.
Uma lei foi sancionada no dia 26 de dezembro de 2002 e a outra, dia 6 de janeiro
de 2013, pelo governador da época.
O governador na época era José Orcírio Miranda dos Santos (vulgo Zeca do PT),
ele ligou no final do ano, no dia 6 de janeiro, para a reitoria, com o objetivo de falar
com a professora L. Ela recebe o telefonema do governador e ele diz: “Estou com duas
leis na minha mesa, para sancionar, já foi aprovado na Assembleia, eu quero saber de
vocês, assino ou não assino?”. Até aquela época não tinha muito envolvido nestas
discussões, pois estava muito envolvida com a Pró-Reitoria e com o mestrado.
Sabia da discussão que estava ocorrendo, mas muito brevemente, pois não tinha
muito envolvimento com o movimento negro. Que é algo que vem da formação. Por
exemplo, a minha mãe não trabalhou com a gente isso, ela chorava e sofria com a
discriminação mas não trabalhava isso com a gente.
E disse: “Lei é lei, devemos cumprir. Só não sei o que vai acontecer quando os
professores voltarem”
E ela falou: “O senhor é o governador, se os deputados aprovaram por
unanimidade, quem somos nós pra ir contra?”. A partir daí ele nos deu 90 dias, porém
225
percebemos que precisávamos de mais de 90 dias. Usamos oito meses, fomos
regularizar lá pelo mês de agosto.
E quando ela desligou o telefone e ela olhou pra mim e disse: “Agora é com
você, você é a Pró-Reitora”.
A partir daí, tive que parar pra pensar, pois tudo é novo. Tudo começando.
Nós teríamos que regulamentar. Fui buscar as instituições que já faziam isso, por
exemplo, a UERJ. Eu verifiquei que não havia do ponto de vista da regulamentação da
lei nada muito claro. Nós tínhamos que regulamentar.
E foi aí que busquei as lideranças do movimento negro, as lideranças indígenas,
principalmente os terenas e os guaranis, porque eram eles que mais se aproximaram da
universidade, por conta do normal superior e iniciamos um processo de discussão.
Peguei o mês de janeiro para arquitetar, digamos assim, para pensar na forma
como faríamos isso, a metodologia de trabalho.
No mês de fevereiro criamos uma comissão dentro do CEPE37, para trabalhar
essa questão. A gente se reunia, mas as pessoas não sabiam, não havia estudos
científicos, na época tinha a professora M.L.F., era do militante do movimento negro,
mas, não tinha estudos, trabalhos intelectuais na área, era mais na área da militância.
Tive que estudar muita coisa. Tive que busca muitas coisas. Também tive que
fazer um processo pessoal, quanto mais você estuda, mais vai adquirindo a necessidade
de rever uma séria de conceitos. Desvestir as ideologias das quais te vestiram desde a
infância até a idade adulta, é como se eu ganhasse outro processo de autonomia, para
além da profissional e educadora, tinha alguma coisa que não estava combinando com o
resto.
Pois tinha uma luta enquanto diretora de escolas: eu criei o primeiro colegiado
de curso, criei a primeira APM38 de escola, criei o primeiro grêmio estudantil quando
não era permitido, bati de frente com os secretários. Fui punida várias vezes, com
demissão.
Então, quando chegou a hora das cotas, pensei que estava faltando alguma coisa,
eu ainda não estou completa. É a questão da identidade, estava faltando alguma coisa:
era uma questão étnica racial. Fui rever toda a minha infância, toda minha vida, toda
minha escola, meus professores e nunca tinha visto nada e nunca tinha ouvido nada
sobre isso. Fui fazer análises pessoais. E isso é muito sofrido porque, quando você faz
37 ConselhodeEnsino,PesquisaeExtensão. 38 AssociaçãodePaisMestres.
226
isso de fora para dentro, machuca profundamente quando você não recebe tudo isso ao
contrário, por exemplo, os filhos, hoje escreve e está no doutorado, eles são diferentes,
eles não vão lidar com a questão do racismo como eu lidei: ter sido agredido e ter que
agredir de volta. De chorar e de sofrer. Aí você começa a fazer este retorno, como se
você tivesse que fazer um retorno, e é obrigada a se reconstituir.
Essa luta da implantação das Ações Afirmativas , as cotas da UEMS, agradeço
todos os dias por ter caído no meu colo quando eu era Pró-Reitora. Porque me
transformei em outra profissional. Em termos de luta e de militância. Mesmo não sendo
militante de bandeira, fui até homenageada. É uma luta diferenciada.
Foi aí que chamei para dentro da universidade os movimentos, tanto o negro
quanto os indígenas.
Tive que fazer reuniões, ia buscar recursos, quantas vezes com dinheiro do
próprio bolso, para pagar o lanche dos indígenas e o almoço. Por exemplo, a prefeitura
deu a Kombi ao pessoal de CAções Afirmativas rapó, e eles diziam: “Mas não temos
como almoçar, quem iria custear a alimentação?”. Tínhamos que resolver as coisas de
forma pessoal, eu e outras pessoas que estavam envolvidas. Conseguimos parceiros da
UCDB39.
Tínhamos apoio muitas vezes mais de fora do que de dentro. Contamos com as
pessoas da UCDB (Professores B e Adir) que lidavam muito com a questão indígena,
nos auxiliando nessas discussões.
A comissão que foi montada no CEPE, somente com professores e internos da
universidade, aquelas reuniões intermináveis e um dia disse: “Não dou conta de discutir
isso”. A comissão um dia “jogou a toalha “e disse: “Não temos condições de discutir
isso”. Então eu falei: “Vamos fazer audiências públicas”.
Foram feitas várias audiências públicas. Trouxe o Dr. Aleixo Paraguassú, trouxe
lideranças indígenas. Pessoas que tinham condições de estar no embate e no combate.
Os alunos iam para brigar, porque na concepção dos alunos, que jáestavam
matriculados estavam tirando as vagas deles, eles diziam que estavam tirando a vaga
deles. E naquele dia, quando ouvi isso, eu disse: “Como tirar a sua vaga, se você já está
matriculado”.
Uma defesa, que é ideológica, de manutenção do status quo, 2% de pretos nas
universidades, somando tudo isso com pardos dá cerca de 12%. Basta ver os censos.
39 Universidade Católica Dom Bosco.
227
Fizemos audiência pública em Aquidauana, Campo Grande, Ponta Porã,
Dourados, entre outros lugares. Ainda aliada a isso fizemos vários seminários, 15
unidades ao mesmo tempo. Com uma mesa com pessoas que eram contra e os pró-cotas.
É claro que levei para estas mesas e reuniões os que eram pró e a favor das
cotas. Procurei pessoas dentro do meio acadêmico que tinham condições para enfrentar
o debate, em alguns lugares não consegui ninguém para falar contra. Tinha um contra
estabelecido. Foi bastante interessante, como apoio do deputado João Grandão.
Junto com a coordenadoria das questões raciais, Ana Cema, era coordenadora,
nós trabalhávamos juntos, muito organizados. Nós trabalhávamos juntos, consegui
muito apoio dos movimentos, e isto foi aprendizagem.
Foi uma aprendizagem pra mim. Eles não cobraram por eu não ser militante.
Mas eles enxergavam que na minha pessoa, que toda aquela luta que estava externa à
universidade, havia uma possibilidade de entrar para a universidade.
Pra isso o movimento conseguiu enxergar tudo isto, e me envolveu de tal forma
e até hoje eu trabalho com eles. Eles diziam que quando o pessoal da universidade
participa a academia acabava legitimando isso. Eles aproveitaram o movimento
Diziam também: “Agora a gente tem uma Pró-Reitora negra que está
encarregada de implementar as cotas para negros e índios, já tem trabalhos anteriores lá
com a questão dos indígenas e ela tem condições para isso. Ela tem condições de
implementar isso na universidade”. Então, eles compareceriam nas reuniões do
COUNI40 e CEPE.
E, em agosto de 2003, conseguimos aprovar a resolução, que até hoje continua a
mesma coisa, muda uma coisa ou outra, mas os fundamentos prevalecem:
A questão fenótipo;
A questão da escola pública, de ser bolsista; e
A questão da declaração para os indígenas.
Foi um dia, uma reunião conjunta entre CEPE e COUNI. Uma reunião
diferenciada. A plateia do auditório estava cheia, com as lideranças indígenas e os
movimentos negros.
Nenhum conselheiro votou contra, tinha conselheiro que a gente sabia que era
contra, mas, na hora do voto, todos votaram a favor, pois a votação foi aberta, eu
solicitei à reitora e ela atendeu. Porque a gente precisava saber quem era contra e saber
com quem estávamos trabalhando. Aconteceu o contrário.
40 Conselho Universitário.
228
Mesmo com raiva eles votaram a favor. E isso foi muito interessante.
Neste mesmo ano criamos uma comissão. Essa comissão existe até hoje e ela
analisa as inscrições, com a presença do movimento negro, que existe até hoje.
Para indígenas a declaração dada pelas lideranças (cacique ou outro) e a
FUNAI41, declara que ele realmente é descendente. Muitas coisas eu aprendi. Por
exemplo: entre os guaranis, a descendência se dá pela maternidade; entre os terenas,
pela paternidade.
Hoje é a professora Bia e o professor Rogério que acompanham mais isso.
Mas havia a preocupação de como eles seriam recebidos aqui.
Ainda com os recursos da Fundação Palmares, com o apoio do deputado J. G.,
houve uma convocação pela Reitora para um seminário geral.
Eles ficaram bravos, quando há uma convocação, mas:
1. Era um dia de trabalho;
2. Foram pagas todas as despesas, diárias e deslocamentos; e
3. Era uma situação nova.
Teve uma preocupação de fazer uma capacitação, foram realizadas em 2004-
2005 com professores e administrativos. Para que ninguém alegasse ignorância no
futuro e você ter que responder por isso.
Cada vez que temos algo novo devemos divulgar e foram feitas as capacitações.
Trouxemos pessoas renomadas, por exemplo, em Dourados, o professor Jorge
Carvalho, que criou a Ação Afirmativa na UnB42.Trouxe o professor Wilson Matos, que
é da UNEB43, é conselheiro do CNE44. A professora Petrolinha, ícone do movimento
negro, é da UFSCAR45.Montamos um polo em Paranaíba, além de outros convidados da
UFG, em São Paulo. Fomos buscando parcerias.
Montamos outro polo em Campo Grande, agregando, nesses três locais, uma
capacitação de 3 dias com todos os administrativos e professores. Nós não trouxemos
intelectuais negros e também brancos. Nós trouxemos também intelectuais brancos que
discutiam e defendiam a cota. Não é só negros e indígenas.
41 Fundação Nacional do Índio. 42 Universidade de Brasília. 43 Universidade do Estado da Bahia. 44 Conselho Nacional de Educação. 45 Universidade Federal de São Carlos.
229
Em 2005, a professora L. deixa a Reitoria e o professor L. A. assume e me
convida para permanecer, mas havia dito pra ele que iria para o doutorado, pois tinha
passado no doutorado. Saí em maio de 2005, com a pesquisa sobre a cotas, porque eu
precisava contar isso, pois tenho obrigação moral.
E me propus a estudar isso no doutorado, eu posso contar isso, com todo o pano
de fundo de tudo que aconteceu comigo dentro desse processo. Eu disse: “As cotas
foram criadas para que os índios e negros pudessem ser os protagonistas de sua própria
história”. Porque, até aquele momento, quem escrevia sobre os indígenas? Os
intelectuais brancos falando sobre os índios.
Os índios queriam cursos interculturais. E, quando surgiram as cotas, eles não
perderam a oportunidade. É uma oportunidade. Ninguém vai criar um curso só para
índios e sim vai criar sempre a interculturalidade, da Matemática, das Letras, da
Enfermagem.
Eles concorrem muito na Enfermagem e no Direito, eles tinham essa
necessidade. E diziam: “Nós precisamos ir para a universidade para nos apropriar das
mesmas ferramentas e conhecimentos que os brancos usam para tomar a nossa terra e
destituir os nossos direitos”.
Eles precisavam conhecer e formar também índios para dar aulas para índios,
pois ainda tem muitos brancos na reserva dando aulas nas reservas. E diziam que
estavam acabando com a cultura. Eles têm uma forma de ver a escola de forma
diferenciada.
Na tese trabalhei com todos os alunos que ingressaram, este levantamento eu fiz
manualmente. Por exemplo: curso de Direito, tinha que identificar quem era cotista,
imprimi tudo aquilo, trabalhei com as atas. Primeiro ano de Direito, olhei quem era
negro, quem era índio, quais eram as disciplinas e assim ano por ano. No segundo ano
precisava identificar, por exemplo, cadê o João, pra onde ele foi? Que disciplinas ele
ficou retido?
Para trabalhar com os não cotistas, alunos de vestibulares anteriores, deu
bastante trabalho.
Ø Você fez uma avaliação na sua tese naquele ano e, hoje, como você avalia as
Ações Afirmativas na UEMS?
230
Dez anos se passaram de cotas. Pra mim um exemplo de pergunta interessante:
por que entre os indígenas há um grande número de evasão”
Na primeira turma entraram 63 e saíram oito. Mas, não importa, se nos primeiros
anos foi mais difícil, dos 63 que entraram, formamos só oito em 2007, mas se não
houvesse as cotas, nem esses oito teriam se formado, não haveria nem oito indígenas
com curso de graduação.
Dois ou três anos depois formamos três ou quatro no Direito. Eles estão todos
enfiados nos movimentos e brigando pela causa. Eles estão trabalhando, mesmo não
tendo passado na OAB46, eles estão auxiliando os colegas advogados que passaram.
Se formar um já é uma grande coisa. Pois não tinha nenhum. É uma diferença
imensa, já pensou? Imagina na Enfermagem.
É a mesma coisa entre os negros, porque, com o passar do tempo, começamos a
ver mais professores negros, por exemplo, nas escolas. Porque na minha época de aluna
só tive dois professores negros que eu me lembro. Ou seja, eu não tinha em quem me
espelhar para dizer:“É vantajoso ser professora”.
E o indígena? Dentro da aldeia ainda tem professores não indígena.
Naquela época, os números eram importantes, pois nós estávamos numa
discussão no Brasil de que negros e indígenas entravam pela porta dos fundos, eles nem
iam conseguir chegar até o final. Eles demostram que precisavam de oportunidades de
entrar.Mesmo que tenha toda a rejeição, perseguição e má vontade.
Ainda vejo dentro da UEMS, principalmente em relação aos indígenas. Existe
uma má vontade, principalmente entre os docentes, porque tem professor que age assim:
“deixa pra lá, aqui não é seu lugar”. Tem professor que diz assim: “Não sei o que estes
índios estão fazendo aqui. Lugar de índio na aldeia”.
Mas a universidade é pública, é para todo mundo. Quem sou eu para dizer que
não é lugar?Não é lugar de índio?Não é lugar de negro?Não é lugar de gay e lésbica?É
lugar de quem?O velho fenótipo da ideologia eurocêntrica, branco e a branca, de
preferência não pobre e heterossexual. Esta sempre foi a visão do intelectual.
Você está dando aulas no curso de Pedagogia, quais são as ações desenvolvidas
no curso.
Na verdade, dentro da UEMS, nós tivemos muitas discussões, por exemplo,
ampliar número de bolsas, principalmente para aqueles que vem das escolas públicas de
46 Ordem dos Advogados do Brasil.
231
condição econômica muito baixa, nós nunca conseguimos isso, pois é rechaçado nos
conselhos até hoje.
O que temos são alguns programas, que, nós professores, não vamos atrás. Por
exemplo: O PNAES47, porque a UEMS tem cotas, porque se a UEMS não tivesse cotas,
não poderia entrar e acessar este recurso.
A Rede de Saberes também foi uma luta e financiada, pela Fundação Ford, o
Antonio Carlos Lima veio pra cá e fez toda a discussão, montou e inseriu.Ou seja, é
algo de um grupo. É uma ideia e uma luta de um grupo que tem isso como ideal.
47 Programa Nacional de Assistência Estudantil.
232
Entrevista 2 – OCPR / CC
Dados de identificação
Nome (iniciais): M.A.
Idade: 54
Função: Docente
Tempo na Função: Coordenador de Curso: 2 meses e como docente 15 anos
Formação: Enfermeira
Tempo de atuação na UEMS: Desde 1999 (já foi coordenadora e Pró-Reitora de
Ensino)
Ø Na sua opinião, como está sendo implementada as políticas de Ações
Afirmativas na UEMS?
A gente não guarda as datas.Mas eu lembro que a grande polêmica que surgiu da
legislação. É que ambas as leis, tanto as leis dos indígenas quanto a do negro, elas
vieram sem consulta prévia da universidade.
Então houve uma sessão. O legislativo já estava trabalhando em relação a essa
legislação, para a instituição de cota. A Assembleia (os deputados) já estava fazendo
esta discussão, na Assembleia. E a universidade nunca foi chamada para fazer esta
discussão na Assembleia.
Então, quando a universidade ficou sabendo, pelo menos a maioria. Pode ser que
tenha tido alguma conversa. Se houve discussão o nível administrativo, entre reitor e
deputados outras instâncias. Mas com os professores, vamos dizer assim, na esfera dos
docentes esta conversa não aconteceu.
Quando a universidade ficou sabendo, pelo menos os professores, isto não
aconteceu.
Quando nós soubemos, ficamos sabendo quando a lei foi instituída, e assim
como a lei aí já estava instituída e ela tinha um prazo para que a UEMS se adequasse,
surgiram e aconteceram várias reuniões para saber como isso seria normatizado.
A grande questão é que toda vez que quando vem uma coisa que de cima pra
baixo, mesmo que ela seja boa, é a questão da discussão da autonomia da universidade
233
Este foi o grande, vamos dizer assim, o grande entrave, isto foi muito discutido.
Eu me lembro da fala do Cleverson, ele fez uma fala, fez uma fala numa reunião,
acho que ele quando era coordenador de curso.
Dizendo assim: Os embates não estavam no posicionamento de cada um se era
favorável ou não e sim que todos tínhamos que cumprir a lei, sendo favorável ou não.
Mas acho que a grande questão não é questão de ser favorável ou não na
discussão da lei, é a questão de estar ferindo o princípio da autonomia da universidade,
ou seja, isto não ter sido discutido antes, e a gente se preparar.
Ou seja, a gente teria que se preparar num espaço curto. Na realidade a lei
chegou no início do ano, nós tínhamos que nos adequar num prazo máximo de seis
meses, a gente teria que adequar até o próximo vestibular. Para que isso estivesse
garantido. O que eu lembro, foi isso, que marcou muito foram estes debates.
O corpo docente que estava envolvido se sentiu menosprezado no princípio da
autonomia da universidade, esta era a grande discussão.
Passado esta etapa, vamos dizer assim de choque, uma lei que teríamos que
cumprir, passado este período, estas discussões todas que aconteceram.
Inclusive, inclusive reuniões não só interna, mas também com a presença de
movimentos instituídos, especialmente com presença dos movimentos negros, pois eles
são mais organizados que o dos movimentos que defendem a causa indígena.
Várias reuniões também aconteceram com estas pessoas, que representam estes
movimentos, justamente para que quando a Resolução, quando passasse pelo CEPE,
tivesse o aval desses movimentos.
Então passado este período de indignação em relação a não termos sido
comunicados antes. Surgiu a resolução de como isso seria, e como seria o processo do
vestibular a partir daí foi tranquilo.
Ø Como foi visto entre os professores e outras esferas da universidade?
A mesma coisa. A reação foi igual, nós tínhamos professores que ficaram
indignados por não terem sido consultados e depois teriam que se adequar a esta
questão. Sempre houve aquela discussão, no sentido...na questão assim, da pessoa entrar
pela cota e depois ela permanecer na universidade.
Outra questão é que foi levantada, como posso dizer, do grau de compreensão,
será que o nível, o nível de compreensão seria o mesmo para acompanhar o curso?
234
Sempre teve aquele clima no sentido assim:
Entrar pela cota significa que tem um potencial menor de quem entrou pelas
vagas universais.
Quem era da ampla concorrência teria uma nota mais alta e quem entra pela cota
tem nota menor e teria maior dificuldade para acompanhar o curso.
Esta discussão com relação a entrada e acompanhar o curso não só aconteceu na
Enfermagem, mas aconteceu em todos os cursos. Todos os cursos tinham o mesmo
receio. O corpo docente tinha este receio. Ter pessoas com maior dificuldade e se
manter no curso com este grau de dificuldade.
Existia o discurso, daqueles: se entrou o curso tem se adequar. Quais seriam as
atividades que o curso estaria disponibilizando para atender, caso estes alunos
apresentavam dificuldades isto também aconteceu na Enfermagem.
Existiam aqueles que defendiam isso, ou seja, se adequar, ou seja, quais os
instrumentos que teríamos que disponibilizar. Isto também aconteceu
O preconceito existe não é relação ao indivíduo: existe preconceito em relação à
cota, no sentido assim.
Existe preconceito em relação à cota, para que a pessoa entrar na universidade é
no topo da pirâmide, quando se coloca que a ação do Estado seja na base.
Se as pessoas tivessem as mesmas condições para se entrar na universidade,
então elas não precisariam das cotas. A atuação do governo deveria ser na base, na
qualidade do ensino público. Se as escolas públicas fossem de qualidade,
independentemente de ser índio, branco ou negro. Teriam as mesmas condições.
O que se questionava também a qualidade da escola pública no estado. Esta
discussão é até hoje.
Então, eu diria que o preconceito, não é no sentido da pessoa, se está chegando
uma pessoa negra ou indígena. Mas, sim, se ela está chegando sem condições, pois com
dificuldades da escola pública ela vai entrar com dificuldades. Este era o receio que os
professores tinham.
Ø Existem ações sistemáticas no curso para atender estas dificuldades?
Não existem ação sistemáticas. Ficou a cargo de cada professor, como é hoje, no
sentido de trabalhar com monitorias e com projetos de ensino. Porque é o que tem
235
instituído. Trabalhar com monitores com aqueles acadêmicos com maiores dificuldades.
Quando o professor identifica dificuldades.
Da mesma forma que o projeto de ensino, o professor pode propor um projeto
de ensino, para atender esta demanda. Fica a cargo de cada professor, não tem assim
uma norma instituída, por exemplo: aqueles acadêmicos que apresenta dificuldade, por
cota ou não, o curso deve atender. Não existe isto, porque já tem os projetos de ensino e
de monitoria, que tem duração de 3 meses, que tem dentro de seu escopo esta finalidade.
Ø Que política de incentivo financeiro a instituição recebe do Governo Federal,
do Governo Estadual e de outras fontes?
O que se tem instituído, tem projetos que atendem melhor a comunidade
indígena do que candidatos que entraram como negros.
Tem a rede de saberes, financiado por recurso externo, pela Fundação Ford,
programa de bolsa do governo do Estado: Vale Universidade Indígena e Vale
Universidade.
Por exemplo: A rede de saberes tem uma sala, com computadores, para fazer
consultas, tem um funcionário designado para orientação. Tem aqueles que criticam,
dizendo que a gente está segregando, defendem e apontam que eles ficam separados dos
demais, outros dizem que separe. Outros que defendem, dizendo que eles não têm
acesso a computadores e que precisam de uma estrutura e apoio. Enfim, eles têm este
recurso.
Além do Governo Estadual que é o programa Vale universidade Indígena. Não
tenho conhecimento a comunidade negra de ter este tipo de apoio. Entra como tudo,
pois as bolsas de permanência, moradia, alimentação ela é igual, não faz separação
diferença entre ampla concorrência, é igual.
Todos concorrem igualmente e somente os indígenas que têm, aí você observa
que a questão do recurso é fundamental para a manutenção do aluno carente, seja ele
índio e negro.
236
Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?
Eu entro no rol, eu lembro que quando participava da discussão. Continuo com a
opinião que precisamos dar uma escola pública de qualidade, para que todos tenham as
mesmas oportunidades, essa questão e chegar no topo da pirâmide com dificuldades.
Hoje eu percebo que não é uma diferença tão grande. Hoje a gente consegue
fazer uma avaliação melhor, com o Sistema de Seleção Unificada (SISU). Hoje a gente
consegue comparar com as outras Instituições de Ensino Superior (IES), por conta do
SISU. Pois é a mesma prova.
Agente sempre se questiona, na Pró-Reitoria de ensino, aonde está os melhores
alunos do Mato Grosso do Sul?Porque quem entra na universidade, não é só na UEMS,
UFMS, Universidade de Goiás, eles têm a nota muito baixa. Não é só na UEMS, então
quando a gente compara as notas, quando a gente compara as notas, são notas baixas.
Cadê os melhores alunos do Mato Grosso do Sul? E quando você compara com
as cotas, você vê que não tem muita diferença. Todos terão dificuldades. A gente tem
observado no curso de Enfermagem que os alunos têm mais dificuldades que há 10 anos
atrás.
Antes a gente tinha turmas diferenciadas, hoje nós temos alunos diferenciados.
Hoje você tem alguns alunos que se sobressaem. Hoje está mais difícil de manter um
nível mais alto. Atribuo isto a uma conjuntura de fatores, não é somente à cota.
Entendo que a cota foi e é necessária, e entendo que ainda precisamos dela por
um bom tempo.
Ø Quanto ao curso que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas?
O curso está sempre se modificando, mas, apesar de estar com esta estrutura a
mais de dez anos, a hora que pegamos o PPP48a gente percebe que não tem nada
O PPP não contempla absolutamente nada de Ações Afirmativas . Não é só
Enfermagem, o curso de Enfermagem, todos os cursos, quando estava em frente da Pró-
Reitoria, fui obrigada a ler todos os PPPs dos cursos da UEMS.
Os PPPs mantêm uma lógica de formação profissional, eles contemplam o que
diz na legislação, não têm o cuidado com a situação do negro e do índio no Brasil. Por
exemplo, nas licenciaturas, no caso da cultura afro.
48 Projeto Político Pedagógico.
237
No nosso curso de Enfermagem, ele não trabalha estas questões importantes, por
exemplo, da questão indígena, ela está dentro da saúde coletiva, mas ela não trabalha
estas questões específicas.
Uma coisa que me chamou atenção quando voltei do doutorado. Quando voltei
do doutorado, entrei numa turma que tinha 4 indígenas. Estava dando aula e uma delas
era muito simpática e muito falante.
E, uma vez, ela ficou me olhando e quando terminei a aula perguntei pra ela o
que ela não tinha entendido. E ela me falou que não entendeu uma palavra, você, por
favor, me interrompa. E aí, comecei a ter cuidado do que eu falava na aula e sempre que
acabava a aula eu perguntava pra ela se ela entendeu.
Ela me explicou como ela estudava: ela copiava tudo, colocava tudo no guarani,
ela estudava e depois passava tudo para o português pra saber responder na prova. E aí
eu fiquei pensando: caramba, todo este trabalho e eu não sei nenhuma palavra em
guarani. Não temos isso na universidade. E a universidade não tem esta preocupação,
não tem nenhum incentivo, pelo menos poderíamos ter alguma coisa, por exemplo
aprender guarani. Não faz parte do projeto do curso.
A gente não tem no curso nada específico, nada voltado específico, para atender
uma sala diferenciada, que faça que a gente entenda melhor a população indígena, se
tiver algum projeto, mas é específico do curso. Não faz parte do PPP do curso. Como
não faz parte de nenhum curso da UEMS.
Isto faz com que quando entra um negro ou um índio na universidade, mas não
temos nada no nosso PPP que faça com que a gente entenda melhor estas questões. E
tão pouco a gente trabalha estas questões no curso. Professores mais sensíveis acolhem
e outros professores tratam de maneira normal, como outro aluno qualquer.
238
Entrevista 3 – OCPR2
Dados de identificação
Nome (iniciais): B. L
Idade:56
Função: Docente
Tempo na Função: 15 anos
Formação: História
Tempo de atuação na UEMS: 15 anos
Ø Na sua opinião, como está sendo implementada as políticas de Ações
Afirmativas na UEMS?
Na verdade quando eu vim do Rio Grande do Sul, já trabalhava com a questão
indígena. Primeiramente eu sou arqueóloga também, meu primeiro contato com a
questão indígena foi na arqueologia, que é o índio morto, que a gente faz uma
construção do índio. Tem uma expressão que é o índio de papel.
E depois de certo tempo, eu participei de um projeto Mbya Guarani, Ong PMG,
lá do Rio Grande do Sul. Estive à frente um período PMG. Este projeto parou, porque as
pessoas foram fazer outras coisas e este projeto se extinguiu.
Quando eu vim morar no Mato Grosso do Sul em 1988, fui morar em Mundo
Novo, tem um município do lado que é Japorã. Mundo Novo não tem indígena hoje.
Mas o município de Japorã tem indígena, que congrega uma das reservas até 1928,
naquele período. Foi criada em 1915, hoje ela tem uma população indígena. Tem uma
população muito grande de indígenas. Tanto que 60% da população de Japorã é de
indígenas, e de Guarani Nhandeva, diferentes do que tem aqui, que fica na bacia do rio
Iguatemi.
Fiz contatos com a liderança, e comecei a trabalhar com índio vivo, passei a
trabalhar e depois eu fui para o doutorado. Devido aos conflitos territoriais, não pude
trabalhar com Arqueologia, mas não foi possível, tive que mudar de Arqueologia para
Etnoarqueologia.
239
A partir de 2002 fiz orientações com alunos, orientei alunos. Não sou bióloga,
Sou historiadora. Uma forma de agregar alunos, trabalhei com Etnobiologia e
Etnobotânica e uso dos espaços e conhecimentos tradicionais na Porto Lindo.
Fiz o doutorado, a defesa foi em 2005.Acompanhei o primeiro grande conflito, a
retomada Ivykatu. Que hoje está bastante tenso, vez por outra aparece um conflito,
fecha a estrada, ora os índios, ora os produtores. Está bem complicado por lá.
Daí eu conheci o pessoal da UCDB, o Professor Brand do Rio Grande do Sul,
somente de vista e por conta de outros projetos a gente acabou ficando bastante amigos.
E quando em 2004 a discussão do Rede começou Antonio Carlos Lima do
Museu Nacional veio com esta proposta, pois ele tinha um projeto aprovado junto à
Fundação Ford, com a implantação de núcleos pra atender esta questão indígena. Um
era em Roraima, outra era no Mato Grosso do Sul, por conta desses conflitos e também
em função das cotas, que a UEMS já tinha aprovado, que foi implantado em 2003 e os
indígenas efetivamente começaram a cursar em 2004.
Aí ele me convidou. Na época, a gente não tinha um relacionamento estreito, a
partir disso a gente começou a elaborar e discutir o projeto durante o ano de 2005, o que
a gente queria dentro das propostas da trilha de conhecimentos.
Foi esse núcleo de Mato Grosso do Sul e o núcleo de Roraima. E o Roraima
extinguiu em 6 anos, porque foi institucionalizada.
Acho que assim, a rede de saberes permanece enquanto não se avançam nas
políticas institucionais. Roraima criou todo um sistema, avançou porque avançou nas
políticas institucionais, esses avanços ocorreram mais a nível federal. Já a nível estadual
temos avanços, mas são bastante complexos e complicados.
A rede começou efetivamente suas ações em 2006. Nosso primeiro secretário foi
um indígena, o Tonico Benites, só ficou 4 ou 5meses, depois veio a Antonia de Souza.
Começou esta execução, toda a proposta que foi feita para a Fundação Ford com
a UCBD, foi muito discutida com os alunos. Eu tenho até um depoimento de uma aluna
que dizia:“Professora, quando a senhora, veio uma desconhecida, chegou falando sobre
o projeto, um projeto de apoio ao indígena. E eles diziam: Isso aí não vai acontecer,
mais um projeto. Nós não acreditávamos. Nós discutíamos, dizendo isso não vai dar em
nada.”
Até porque essa proposta era muito ousada. Criar uma estrutura. Tem um
acompanhamento efetivo, permitir que os alunos pudessem ser apoiados em projetos de
ensino, pesquisa e extensão, e criar um laboratório para que eles se sentissem no lugar
240
deles. Pois, diziam:“A gente fica pelos cantos, a gente se reúne e fica pelos cantos. A
gente não tem um lugar!”.
Pois naquela época eles eram os primeiros alunos. Foram os primeiros alunos,
nos anos 2004 e 2005, foram anos muito difíceis. Eram completamente invisíveis, e eles
estavam sofrendo muito por conta das cotas. Aquela efervescência! Para que criar essa
diferenciação de raça e etnia? Isso vai criar mais conflito na sala de aula. Aí tinha
aquela discussão que iria diminuir a qualidade da universidade, enfim uma discussão
muito ruim. E que, na verdade, nas universidades, passados 10 anos, ainda permeia de
maneira absurda.
Não consegui avançar, porque a educação básica. O aluno quando chega no
ensino superior e o professor que sai do ensino superior, é formado dentro dessa lógica
hegemônica. Todo mundo deve ser igual. Igualdade de direito de maneira forma, não é
uma igualdade material.
Então é assim, naquela época foi muito mais difícil. Uma vez eu vi escrito na
parede do Rede: A oca dos índios. Quando chegaram os computadores, eram os mais
modernos que tinha na universidade. Por que a UEMS tem computadores para índios?
Os alunos indígenas nos diziam que os outros alunos diziam assim: Por que só vocês
têm acesso?
Eu dizia para eles responderem: Está cheio de projetos na universidade, é
público, as pessoas se agregam conforme querem. Eu respondia: Não é proibido, todos
podem entrar desde que venham contribuir.
Por exemplo, já tivemos professores e que usaram a estrutura da rede de saberes,
até o ano passado os alunos de Enfermagem, eles chamaram de aldeinha, de não
indígenas, porque eles contribuíram para a formação dos indígenas.
A gente nunca disse: não pode. Mas perguntava: o que você vai trazer de
contribuição? O projeto foi muito conversado.
Na época tínhamos reuniões em vários locais: Dourados, Aquidauana, Amambai
e Maracaju, com gravações e assinaturas de todos os presentes.
Até mesmo dentro da UEMS, a diversidade é muito grande. Porque cada
realidade tem uma necessidade, uma especificidade, por exemplo, o horário dos cursos e
horário de atendimento do Rede. Amambai somente cursos noturnos, e os alunos só
vem para as aulas, que estrutura tem que ter? E em alguns locais não tem, por exemplo,
Maracaju não tem. Aquidauana foi estruturada, os alunos tinham computadores, foi
241
garantido pela direção. O projeto foi caminhando. Depois a Fundação Ford, no segundo
financiamento disse: a estrutura a gente não dá mais.
No primeiro financiamento, foi um investimento muito grande, cerca de 700 mil
reais. Era muito dinheiro naquela época.Depois em 2008, entram a UFGD49 e a
UFMS50. A gente sempre acreditava que deveria ter esta relação com as outras IES que
tivessem indígenas.A UFGD tinha um número de alunos importante, em torno de 30 a
40 em Aquidauana. A UFGD sempre foi menos. Isto tudo é verba federal. A UFGD tem
uma faculdadeintercultural indígena e lá a rede se institucionalizou, sempre era essa a
chave.
Pois a Fundação Ford ela vem nos financiando pelo reconhecimento que ela teve
da ação. Em muitos momentos vamos aos encontros para dizer: O que vocês fizeram
para apoiar estes acadêmicos?
Algumas coisas deram muito certo, outras nem tanto. Ninguém quer ser super
herói, porque é um trabalho que deveria ser institucional. Porque este trabalho é um
trabalho, é um trabalho profissional, deveria ter mais gente, e a cada ano vamos e
estamos tentando fazer uma rede.
Hoje Campo Grande está com um grande número de alunos, mas a UEMS de
Dourados continua a sendo o maior número. Mas isso tende a equilibrar. Em função das
bolsas das universidades federais que é de maior valor.
A UEMS tem uma bolsa, foi criada como Programa Bolsa Universitária
Indígena criada na gestão do Zeca do PT (cerca de 7 anos), e quando o André
Puccinelli, do PMDB, assumiu ele dá uma nova roupagem ao nome de nome de Vale
Universidade Indígena, já tá completando 8 anos.
E o que a gente vê na implantação dessa bolsa, a bolsa foi criada com um valor e
não houve aumento, ainda são 300 reais e 46 reais para se deslocar até o local que ele
vai cumprir.
Uma discussão que a gente fez com o pessoal da SETAS51, que não colocasse
em serviços pesados e em locais que não tem nada a ver. Teve anos que a gente
conseguiu, mas hoje está muito difícil. Colocam eles em cargos burocráticos. Os alunos
dizem: Olha professora, nós não vamos ficar com essa bolsa, É uma enche... de saco,
eles vão lá pra ver se tu este lá, e se você não está, eles nem perguntam porquê? É uma
49 Universidade Federal da Grande Dourados. 50 Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. 51 Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social.
242
burocracia A gente ganha mais fazendo qualquer outra coisa, por exemplo, como
ajudante de pedreiro.
Eles dizem: É uma burocracia. Esta é uma opção nossa. Ao mesmo tempo isto
não ajuda na formação. Por exemplo: um aluno de turismo, ficar na secretaria de
turismo. Um da Enfermagem num local da saúde, enfim.
Tem uma desconfiança muito grande do mau uso do recurso público, que índio
protege índio, ou que professor da universidade protege os índios.
Mas essa discussão muito... Mas ao mesmo tempo nós avançamos muito,
quando estive à frente da Pró-Reitoria foi o não encerramento da bolsa no final do ano.
Pois todos os anos, ele teria que se matricular e era desligado no final do ano e passar
por todo o processo. Deve ficar os 4 ou 5 anos que está no curso. Por exemplo: Ele
aluga, acumula dívidas, e não tem como pagar se não tem bolsa nas férias.
Outo fato também que é muito ruim, por exemplo: Se tem dois irmãos, que é um
fato comum, só pode um receber, impede que outro receba. É um critério excludente.
Isto é um fator que impede, tem fatores bastante complicadores.
A bolsa é um avanço, mas tem estes fatores que impedem. Anualmente um
número de 120 bolsas, começou sendo preenchido, mas depois nunca mais foi
preenchido. As pessoas podem olhar as bolsas e ver só os números e dizer que os índios
não querem. Não é que eles não querem, o programa é excludente de início. Nós
trabalhamos e tentamos discutir isso, mas não teve como entrar esta discussãona UEMS,
éo que teve em relação as bolsas para indígenas. Eles dizem que não pode mudar.
Outro fato que ocorreu foi a criação da Comissão de Acompanhamento de
cotistas. Esta comissão (acho que foi entre 2008 ou 2009), a ideia que teria
representantes das 15 unidades, mas em Dourados teria que ter mais. A ideia era que se
fizessem estudos, análises, que políticas deveriam ter em cada local e fazer a avaliação
de como estava tudo isso. Não funcionou, pois a comissão tinha que fazer os
levantamentos, buscar e verificar juntos aos cotistas, ou seja, tinham que levar trabalho
para casa. Também não conseguia se reunir. Não se conseguiu, a comissão encerrou,
com trabalhos e nem executou o que se propôs. Muitas vezes os representantes não
tinham nenhuma afinidade pela temática. Sabemos que as temáticas estão perpassando
as áreas.
Esses novos sujeitos de direitos, Hoje eles têm direitos, essa população, os
índios, negros, a população LGBT, enfim, foram direitos conquistados pelos
movimentos.
243
A universidade não consegue se preparar para. Isso não é só na UEMS, quando a
gente vai em encontros, fui num encontro com várias universidades para discutir a
formação universitária indígena e, apesar de todos os avanços, são coisas individuais e
não são institucionalizadas.
Deve ser encarada, estamos tentando institucionalizar isso. Para que tenha um
funcionário. Por exemplo, Campo Grande está com um número grande de indígenas,
cerca de 70, poderia agregar cotista, porque são pessoas que precisam de um olhar
diferenciado. Temos que trabalhar com aqueles que foram excluídos historicamente.
Temos que torná-lo forte, e isso dá igualdade.
Isso o trabalho da Maju apresenta, eles entram com uma nota muito menor, não
são todos, por exemplo, tem aluno indígena e negro que não precisa de cota, o que é
importante, para mostrar que é fruto de uma luta. A gente trabalha com o indígena
dizendo que isso não é benesse e sim luta. A UEMS precisa começar a olhar pra isso
com um olhar diferenciado.
Tanto que foi criado a DID (Divisão de Inclusão e Diversidade) para dar conta
disso. Por um bom tempo deu conta disso, mas hoje não está cumprindo sua função, por
falta de funcionário, por uma outra visão. Tem uma política interessante, muitas vezes
não tem continuidade, precisa criar, não digo em todos os lugares, mas deve ter
acompanhando pari passo desses acadêmicos. Se nós temos cotas, devemos acompanhar
isso. Afinal de contas, para que foi implantado as cotas, só para dizer que tem cota?
Hoje, podemos dizer que um dos problemas é a educação básica, não tem
professores indígenas suficientes nas aldeias, mas hoje os indígenas estão se graduando.
Isso é importante. Esse movimento, esse resultado, vamos ver daqui a uns 20 anos e o
que os alunos indígenas estão fazendo.
A UEMS tem a cota, dentro das vagas regulares, que nunca foram supridas. Ter
cotas, não significa que tem acesso. O ingresso hoje não é o problema, e sim a
permanência. Até por conta do SISU, que democratizou o acesso. O problema continua
a ser a permanência.
As licenciaturas continuam a absorver todos que se formam, mas os
bacharelados, este é um estudo que estamos fazendo, levam dois anos para entrar no
mercado efetivamente.
Tem alunos indígenas da UEMS já no mestrado. É algo importante que se diga.
244
Quando saí da Pró-Reitoria a gente deixou uma resolução que dentro das bolsas
de permanência, que contemplassem o que tinha dentro da legislação das cotas: 10%
para indígenas, 20% para negros e isso parou. Não avançaram as discussões.
Tem alunos que optam pela bolsa PAE (Programa de Apoio Estudantil), e a
gente pede pra eles que eles estudem, o tempo que eles estão aqui é para estudar. Eles
têm acesso à internet, têm espaços para estudo e aos livros. Para que eles possam suprir
as deficiências, muitos vêm com deficiência, principalmente na compreensão da língua
portuguesa, nas exatas, que a gente sabe que é um problema, mas isso é para todos.
Ø Como a política foi recebida?
Quando foi aprovado no COUNI, eu estava afastada para o doutorado, eu estava
em Mundo Novo e o que via era que ninguém se preocupava com as questões indígenas,
eles diziam: índios não vão entrar na universidade. A grande discussão era para os
negros, eles diziam que isso iria acirrar a discriminação e o preconceito. Eles diziam:
para que esta diferenciação, isso é preconceito. Como assim: ninguém é preconceituoso,
ninguém é racista, essa discussão era meio esquizofrênica, mas tudo isso virá à tona?
Houve uma discussão na UEMS de Mundo Novo, município pequeno com 15 mil
habitantes, com representantes negros e índios, mas ninguém questionou os índios.
E na UEMS, com a criação do Rede, foi essa discussão: criar um espaço só para
índios? Para quê? Por que não tem para os demais? Hoje só tem o DCE. Não tem um
centro de convivência.
A gente trabalha com os acadêmicos indígenas dizendo: Ações Afirmativas ,
cota é Ação Afirmativa, mas não é isso, é tu dar condições para que ele entre,
permaneça e ele saia capacitado.
Mas, tem outro discurso do coitadinho, que é pior. Teve um discurso de uma
professora que me disse: nós formamos esse aluno e ele não tem condição nenhuma. Eu
falei porque você fez isso, isto é um desfavor.
Por isso que existe o Rede, é para apoiar. Monitoria e tutoria deve ser
institucionalizada, por pessoas que tenham sensibilidade pela causa. Nossos tutores são
sensibilidades para as questões indígenas, são professores da rede. Isso nossos relatórios
demonstram.
245
Por exemplo: se fizer uma tutoria e ele não aprova, mas se teve um ganho e vai
mais fortalecido para o outro ano, para que ele possa entender a disciplina. Esse ganho é
que nos importa, muitos conseguem. Isso deve ser institucionalizado na UEMS. O
grande número de evasão é por conta disso, pois tem uma deficiência da educação
básica.
Chegou à universidade, entrou por cota ou não, mas tem deficiência, o curso tem
que discutir, a comissão estruturante do curso tem que discutir isso. Os professores têm
que discutir isso. Deveriam dizer: esse é o nosso cenário, e o que a gente vai fazer?
Daqui a 4, 5 anos eles vão sair e devem sair com qualidade.
Senão não conseguimos dar o salto de qualidade que a universidade precisa, se a
gente formar o coitadinho, é preferível dizer ele não tem condições. Não está certo!
Ø Existem ações/ atividades sistemáticas – Ações Afirmativas em Pedagogia e
Biologia?
Nesses cursos na verdade quando percebem estas dificuldades, não tem ações
para isso, nada instituído. Na verdade os alunos indígenas procuram apoio na Rede. Os
demais, quem sabe a partir de agora, a partir a criação do CDE, ele ainda é novo e é
importante, a partir desses primeiros estudos, a partir do SISU, vai ajudar nisso.
O curso de Pedagogia discute estas questões, nas disciplinas de políticas
públicas também é discutido. Mas, vai depender de cada professor que ministra, tem um
despreparo geral, tanto na educação básica quanto no ensino superior.
Teria que preparar os professores para compreender essa lei (10.639, 11.645),
que torna obrigatório este enfoque lá na educação básica, e entender esta caminhada
histórica desses grupos índios, negros e LGBT e deficientes ao longo do século XX.
A universidade não entendeu que tinha gente lá fora se mobilizando. Não se
deram conta, é muito difícil, de que grupo você vem?
Isso também parte de uma formação do sujeito. Muitos professores vieram de
grupos historicamente excluídos. Mas ascendem e omitem, não fazem mais parte desse
grupo. Quando este grupo chega à universidade e se depara com estes grupos até se
chocam.
246
Os dados demonstraram que aumentou o número de negros e índios na
universidade, o MEC52, SECADI53 e a FUNAI não têm estes dados.
Sabe que no Brasil tem cerca de 6 mil índios nas universidades. Mas não sabem
onde estão. Em Mato Grosso do Sul se calcula entre 800 e 900, nas públicas, nas
comunitárias, particulares e na EAD54.
Um exemplo de Ação Afirmativa, é o que está acontecendo hoje aqui, eles têm
essa bolsa PVUI55, a inscrição tem que ser no computador, tem que ser online e
imprimir, principalmente os que chegam aqui com 17-18 anos são bastantes perdidos.
Isso é uma Ação Afirmativa. Muitas vezes perde a bolsa, pois não sabe disso.
O Rede está fechado, pois não tem funcionário, e aí o pessoal da SETAS me
ligaram para abrir, pois não havia nenhuma inscrição. Aí eles dizem que os índios não
querem. “Como assim? Não tem como”. A gente trabalha com pessoas nas unidades,
para que eles possam ajudar os alunos, inclusive alunos que têm algum conhecimento de
informática, eles se apoiam, a gente cuida os prazos, períodos... A gente cuida da
questão da presença, quando eles estão doentes... Enfim, precisa de um olhar
diferenciado. Tem período de cumprimento de prazos, dar presença, enfim.
Ø Recursos financeiros
O governo federal hoje, em função da experiência do Rede de Saberes, a
discussão das bolsas federal começa em Mato Grosso do Sul, pelo grande número.
Em 2009 começamos a fazer uma mobilização, para pressionar o SECADI,
governo federal, em 2011 tivemos uma reunião com o secretário, iria montar uma
comissão e foi entregue na SECADI e no SISU um documento com esta reinvindicação.
Foi criado uma bolsa para indígenas/quilombolas que estão nas universidades
federais, ficando de fora as estaduais. Então a mobilização é para que seja universal.
Na UEMS, ainda não temos ainda os resultados, mas com certeza terá um
aumento na UFMS e a na UFGD. A bolsa lá é de 900reais, não precisa fazer nada. O
MEC achou que, na ansiedade de lançar a bolsa, não definiu critérios, basta receber e
não definiu critérios.
52 Ministério da Educação e Cultura 53 Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. 54 Educação a Distância. 55 Programa Vale Universidade Indígena.
247
Para os indígenas e quilombolas a bolsa é 900reais. Este valor não é desprezível.
PIBIC56 todas são menores.
Inclusive quando eles me perguntam eu digo: vai pra lá (para as federais).
Inclusive os professores das federais estão muito preocupados, porque é dinheiro
público, tem que ter critério, ou seja, estudar.
A UFMS, apesar de estar no Rede, além de Aquidauana, nunca se soube quantos
indígenas tem. Os alunos nessa instituição são invisíveis.
No Rede os alunos tornam-se visíveis. No momento que se torna visível, se
torna alvo, e nós trabalhamos isso: que isto foi uma luta, lá de 1988, quem lutou foram
os iletrados da aldeia, lutaram pra isso.
Para a UEMS, não tem nada de incentivo financeiro. Esta bolsa poderia ser para
as estaduais, talvez para aquelas que já vêm desenvolvendo ações a muitos anos, como
nós, a do Paraná, entre outras. Se ampliasse seria só para Mato Grosso do Sul seriam
800 bolsas.
Outra preocupação também são os cursos EAD, estamos fazendo estudos, que
estão sendo feitos por instituições que surgem que nunca ouvíamos falar. Que tipo de
formação é essa? E tem alunos indígenas nelas?
Então, o que se pergunta é: Que discussão está fazendo a universidade para
juntar os conhecimentos que estas pessoas trazem (índios, negros, etc.)? Que
contribuição a universidade está levando para estas comunidades?
Em nível de curso isso fica restrito ao número de horas, preocupados com o
mínimo, colocam, porque é uma obrigatoriedade. Perguntam: aonde vamos colocar?
Não há discussão da efetividade das ações. Isso não é só na UEMS. Lógico, se colocar
mais horas, o currículo ficaria inchado, deve ter então disciplinas optativas, pois em 34
horas não é possível compreender estes aspectos.
As federais partiram do zero para um mil, e as estaduais partiram de um zero e
agora estão num 40, o governo oferece essa bolsa e acha que é o suficiente. Como se a
bolsa resolvesse todos os problemas, e a gente sabe que só a bolsa não resolve.
56 Programa de Bolsas de Iniciação Científica.
248
Entrevista 4 – CC 1
Dados de identificação:
Nome (iniciais): L. T. L.
Idade: 47
Função: Coordenadora e Docente do Curso de Pedagogia – Campo Grande
Tempo na Função: 4 anos e 8 meses
Formação: Graduação em Psicologia. Mestrado em História e Psicologia,
Doutorado em Educação
Tempo de atuação na UEMS: 14 anos e 8 meses
Ø Em sua opinião, como está sendo implementada a Política de Ações
Afirmativas na UEMS?
Estou na UEMS há 14 anos, trabalhei na região de Dourados, Ponta Porã,
Aquidauana e Mundo Novo.
Eu entrei para trabalhar no Normal Superior, ele era oferecido nas unidades e as
coordenações, uma em Dourados e a outra em Campo Grande. Campo Grande que
atendia Aquidauana e uma em Coxim. Nós formamos 42 indígenas, a maior parte deles
professores, que hoje estão em cargos de lideranças nas comunidades em que residem,
muitos deles estão em cargos de gestores, lideranças. Nós temos registro de dois
mestres, atuando na região de Aquidauana e Miranda.
Eu participei da comissão de implantação das cotas dentro da universidade,
foram momentos de muitos debates, pois tínhamos muitos grupos dentro da
universidade que não era a favor, então a gente tinha que apresentar e fazer o debate
antropológico, histórico e também educativa para a formação destes grupos com estes
professores para a gente fazer esta implementação. Ela é uma lei estadual do Pedro
Kemp, como seria esta seleção destes negros e destes indígenas. A maior preocupação
era como a gente iria fazer para a permanência deles.
Hoje gente tem algumas atividades e ações de implementação da permanência
destes alunos, mas a gente ainda precisa ainda avançar, especialmente os indígenas, pois
quando eles entram na universidade ficam longe da família, nós recebemos alunos
249
indígenas da região de Sidrolândia e Aquidauana, mas a gente sabe hoje que em Campo
Grande tem 15 mil indígenas que residem em áreas urbanas, que temos por exemplo a
Marçal de Souza, um dos mais antigas, ele não tem uma escola indígena, ele tem uma
escola intercultural e sensível para recebê-los, porque tem uma demanda pelo
reconhecimento da categoria de escola indígena.
São alunos que chegam pra nós, principalmente nós temos muitos deles terenas,
a gente também faz o acompanhamento dos desistentes. Mas, do ano passado pra cá,
nós tivemos um índice muito grande com a aprovação das cotas nas federais, por conta
do valor que me aprece de 800e ele pode acumular com bolsas de extensão e de ensino,
chegando a 1.300, o que ajuda muito. Os nossos que permanecem hoje são alunos que já
estavam na metade do curso, hoje a gente precisa fazer o monitoramento dessa
implementação dessas políticas de Ações Afirmativas .
Porque o que a gente ainda vê, através de conversas com os alunos, a falta de
sensibilidade por parte dos professores que ministram os conteúdos universais.
No curso de Pedagogia, especialmente, nós temos reuniões periódicas a cada 15
dias, nós temos um movimento de sensibilidade muito grande, porque nós temos um
grupo de educação, cultura e diversidade que é um grupo de pesquisa, a gente tenta
fazer esta sensibilização e o que é liderado pela professora Maira Leda e tem produção
com todos os temas da diversidade.
Mas o que vejo é a questão do preconceito, da resistência e do preconceito,
porque este movimento de deslocamento de sair da aldeia e vir para a universidade tem
que aprender com isto, dialogar, se aceitar também porque esta identidade étnica deles é
muito viva, porque ele tem uma ligação muito forte com este espaço territorial, com a
família, com a cultura e com os rituais, ele tem laços consanguíneos muito fortes. A
gente faz um trabalho, gente faz um trabalho diuturno de acompanhamento com eles
aqui. Mesmo assim não conseguimos formar muitos aqui. Entre as mulheres, tem a
questão da gravidez, e elas amamentam por mais tempo que nós não indígenas.
A mulher terena e a mulher indígena é muito maternal, ela muito doméstica e ela
é da família, dá prioridade para a família, depois ela prioriza os estudos. Dependendo se
é uma mulher casada ela vai dar prioridade à família e depois ela prioriza os estudos.
Esta implementação ela deveria ser institucional, acho que nós deveríamos ter
algumas capacitações, nós temos este grupo aqui, o grupo da Professora Maju, da
professora Bartolina Ramalho Catalanti, e entender estes elementos que dificultam o
processo de aprendizagem e também principalmente chamar os nossos professores à
250
responsabilidade. O que eu tenho visto é que tem alguns professores que não conhecem
a formação do povo brasileiro e origem da história brasileira, as suas próprias origens,
principalmente os professores da área das exatas.
Ø Como foi recebida?
Tinha e tem muitos grupos ferrenhos que são contra, primeiro que a
universidade não é pra todos, porque pensam que a universidade para um grupo, que é
para as elites e de intelectuais que vai constituir uma nova elite.
A UEMS tem estas caraterísticas de se trabalhar com populações e grupos
vulneráveis, não só no ponto de vista da vulnerabilidade da saúde, mas, do ponto de
vida da vulnerabilidade social e econômica, e estes grupos são antigos dentro da
universidade, tem um grupo grande de professores que trabalham da área que trabalha
com a questão étnico racial e diversidade, liderado pela professora Eliza Cesco, já se
aposentou, mas continua no escritório. Gradativamente nós fomos trabalhando isso no
cotidiano.
Eu vejo que a coisa do preconceito e da resistência desses professores que não
têm esta sensibilidade, a gente vai ganhando também à medida que nós nos
posicionamos.
Por exemplo, toda semana nos cursos, como na nossa semana e os demais
cursos, na nossa jornada acadêmica nós temos o grupo da diversidade, e o grupo vai
com tudo, aproveita para falar, para apresentar trabalho, para ministrar minicursos e
fazer oficinas pedagógicas.
Nós temos as leis antirracistas, temos todas as diretrizes curriculares, está dentro
de todas as diretrizes curricular a gente ainda vê que a discussão sobre temas como a
questão de gênero, que está em todas as diretrizes curriculares nacionais.
Mas ainda vê que esta discussão da formação e origem do povo brasileiro é
antiga, mas muito nova para a formação dos professores.
Então assim, as Pró-Reitorias, para acontecer alguma coisa dentro da
universidade tudo deve ser regulamentado por meio de resolução, dentro dos projetos
pedagógicos. Nós tivemos, por exemplo, no Normal Superior que já contemplava a
educação especial, que foi uma luta, pra pensar todos os currículos, posteriormente com
as diretrizes nacionais, hoje todos os currículos possuem um componente da
251
diversidade, todos estas ações, educação no campo, étnico racial, libras, educação
especial no caso do pedagogo tem isto em três anos, com disciplinas anuais.
A gente também incentiva também os projetos de extensão, de ensino.PIBID
teve um avanço, como formato de política, pois contemplar o aluno que trabalha, desde
que este aluno contemple 16 horas dentro da escola.
A gente também tem corrido muito atrás dos editais, porque este trabalho não
dissocia da pesquisa e do ensino. Todo módulo da diversidade foi ampliado, sempre
articulando com a história destes grupos e do processo de escolarização deles.
O PINAEST, todo o recurso, nós recebemos agora no mês de agosto, mas se
puder prorrogar e der pra gente fazer as viagens técnicas. Eu trabalho com todos os
povos do Pantanal e a gente vê que os próprios índios não conhecem todos os povos do
Estado. O ensino não pode estar dissociado da pesquisa e da extensão, eu acredito que o
Pinaest é um recurso.
É lógico que tem uma série de questões que estão dentro da agenda que precisam
ser pensadas. Por exemplo: hoje no cenário, por exemplo, na televisão, todo mundo
falando. O ebola pode chegar a um caso como a AIDS, e a gente fica bastante
preocupada.
Quando a política é regulamentada, a gente tem como recorrer aos fóruns e aos
debates. Esta política de incentivo financeiro, que a gente e não tem, porque é muito
pequeno, é preciso começar com coisas pequenas, pequenas coisas, para que a gente
possa atrair maiores recursos. Que o hoje tudo circule em cima dos editais.
Nós aqui incentivamos continuamente os editais, pois nós temos dois grandes
projetos aqui, mas não são todos os professores que têm este perfil. E os grupos estão
vendo, nós incentivamos os professores.
Na IES não tem incentivos, mas nós precisamos desenvolver as atividades, então
é a hora que a gente senta para ver os editais, tantos os editais nacionais quanto os do
FUNDECT57. E nós vamos procurando.
O centro que foi criado pela Maju vai ajudar, vai fomentar muita coisa do ponto
de vista não só de Dourados, mas também com as outras unidades, pois trabalha com
negros e indígenas.
Quando eu entrei na UEMS a gente tinha recurso para compra de materiais e
para viagens e hoje não temos. Hoje se a gente precisa de material ele vem pra unidade
57 Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul.
252
e na medida que a gente precisa, os gerentes vão liberando. As xerox são licitadas para
todas as unidades e cada curso tem uma cota.
Nosso orçamento deveria retornar. Mas por exemplo para as viagens, no nosso
orçamento deveria voltar, porque recentemente fui a um evento e recebi 200 reais e não
pude ficar lá todos os dias, por conta do valor, fora de casa você tem muito gasto, todas
as despesas de passagem, hospedagem e alimentação ficaram sob minha
responsabilidade e eu estava lá representando dois cursos de pós-graduação e
apresentando dois trabalhos.
Quando entrei na UEMS, no tempo da Leocádia a gente tinha e depois, mas no
tempo do Luiz Antonio houve o corte geral e generalizado. As semanas acadêmicas a
gente recebia 2.500 e foi eliminado, hoje se você tem que fazer uma reunião científica
tem que ir atrás de patrocínio, não que isto seria ruim, mas nem todos os professores
possuem este perfil. Então a IES deveria dar sua contrapartida. Porque todo o material
de consumo, nós recebemos 800 reais do PINAES, por exemplo, se for comprar um
pendrive de 18 gigas custa 45 reais.
Os datashows, todos sucateados, com as luzes queimadas, os laboratórios
pedagógicos precisam ser pensados e implementados, não é só levar o aluno para a
escola, e muitas vezes, tem a contrapartida para a escola. A UEMS deve repor o
material para esta escola.
Nós colocamos no PDI e muitas coisas que nós colocamos foram retiradas, a
gente fez esta retomada coletiva com os coordenadores, porque a gente precisa deste
incentivo.
O professor precisa SIG projete entrar no FUNDECT, ele não quer e acha um
sofrimento. Aí ele não vai. Sempre fica o mesmo grupo captando recurso e não dá pra
captar tudo de uma vez, porque você deve desenvolver as ações.
A IES poderia prever, incentivar e pensar em algum produto, os cursos guardam
suas especificidades, por exemplo aqui no curso estamos utilizando recursos de um
projeto de autoria da professora Leda, a maior parte das jornadas é utilizado estes
recursos.
Por exemplo, na nossa jornada não é mercantilista, os alunos pagam 20 reais,
para incentivar os alunos a participar, uma parte é para pagar o pró-labore do convidado
e outra parte para comprar outras coisas para o funcionamento de algumas atividades do
curso e visitas, por exemplo.
253
A gente tem em todas as salas da Pedagogia tem datashow, ele vem e dá sua
aula, estes equipamentos foram comprados por recursos de projetos e extensão. A IES
deve pensar nestas tecnologias, pois as tecnologias estão totalmente anacrônicas, porque
ninguém tem saúde para dar aulas no quadro-negro por horas, podendo até desenvolver
uma LER e tudo mais... A IES precisa pensar num incentivo financeiro em todas as
esferas, com outras fontes, para que possamos desenvolver da melhor maneira possível
atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Ø De que maneira os diferentes profissionais (inclusive docentes) foram
envolvidos na implementação nas políticas de ações?
Eles são envolvidos por meio das ações dos projetos, ou por projetos de ensino,
extensão... nosso curso, por exemplo, aborda tanto a questão da diversidade sexual,
gênero da educação ambiental e hoje estamos em duas escolas, que é coordenado pelo
professor Airton, por exemplo, eu envolvi professores, um da área de Letras, e dois da
Educação e História, mensalmente eles vêm para as palestras, discutir textos nassessões
de estudos. Porque não têm bolsas para todos. A gente convida e todas as produções
eles são envolvidos.
A professora Leda também tem um projeto na área da obra de Manoel de Barros,
porque ela é estudiosa da análise do discurso do homem pantaneiro, desenvolvemos no
primeiro semestre para crianças da obra deste
Não é projeto de ensino, mas também extensão, trabalha em duas frentes.
Então é a mesma coisa, articulados na linha, envolvendo alunos e professores,
no mestrado temos duas linhas, seminários temáticos,cada linha coordena suas áreas,
nas temáticas da diversidade, articulado com a formação de professores, a Pedagogia
também faz seminário de pesquisa no início do ano, todas as defesas de TCC58 são
coordenados por este grupo de pesquisa, todos os alunos e professores vem assistir. A
agente tem todo um trabalho de estimulo e incentivo, porque com esta ausência de
recursos fica difícil.
58 Trabalho de Conclusão de Curso.
254
Hoje os editais requerem que envolvam outras IES, hoje temos outras como, por
exemplo, a UCDB,UNIGRAN59, História da Educação. Estas IES estão envolvidas, este
ano envolvemos sete IES e convidamos nossos ex-orientadores... solicitamos para eles
venham trabalhar conosco, com as mesas redondas, fizemos/criamos a revista. Ela é
uma revista interdisciplinar, temos que fazer as parcerias com os nossos grupos internos,
por exemplo, o grupo de Letras, Educação, Geografia eLetras. Articulando as
discussões em grupo.
A gente também prima pela participação dos alunos nas reuniões de colegiado,
inclusive do primeiro, inclusive na COES60. Tanto nas avaliações, na elaboração dos
instrumentos. Nosso curso foi avaliado como muito bom. Foi recomendado pelo guia do
estudante com quatro estrelas.
A gente também estabelece algumas cotas para os diretores para participar das
nossas semanas acadêmicas, em algumas mesas redondas. Também aqueles alunos que
chegam pra gente e diz que não tem como pagar, a gente traz ele paranos ajudarna
semana, já que eles têm que cumprir 200 horas de atividades extra curriculares.
Existem reuniões periódicas e extraordinárias, estamos longe da sede e algumas
vezes precisamos convocar para discutirmos alguma questão urgente.
59 Centro Universitário da Grande Dourados. 60 Comissão de Estágio.
255
256
Entrevista 5 – PR
Dados de identificação:
Nome (iniciais): E. S
Idade: 41
Função: Pró– Reitor de Extensão e Assuntos Comunitários
Tempo na Função: desde agosto de 2011
Formação: Graduado em Física, Mestrado e Doutorado em Engenharia
Mecânica
Tempo de atuação na UEMS: 15 anos
Bom, vou fazer por ordem cronológica. Primeiro que a UEMS quando eu entrei
na universalidade no primeiro ano em 1996, trabalhei em 1997 da UFMS. Na UEMS
entrei em 1999, no ano seguinte já estava trabalhando na Pró-Reitoria de Ensino, a
convite da Pró-Reitoria da época para trabalhar no setor de capacitação docente, depois
dos parâmetros curriculares. Setores que nem existem mais, quer dizer, capacitação
existe, mas em outra Pró-Reitoria. Estou dizendo isto porque em 1999 tudo era
incipiente na UEMS, por exemplo, a capacitação docente não tinha programa, as
pessoas ainda discutiam um programa para liberar professores e técnicos para poderem
se capacitar, nessa questão existem algumas lideranças.
A visão que eu tinha na época era trazida de faculdades que eu estudei na época,
eu fui uma pessoa ativa do movimento estudantil nas universidades, eu passei na
UNESP61 e na UEL62. Essas discussões lá na universidade paulista, as coisas eram mais
arrefecidas, a impressão que eu tenho até hoje, depois eu posso dizer um pouco da
vivência que eu tive recentemente na USP63 na época do doutorado, enquanto na UEL
essas discussões eram muito acaloradas, elas estavam adiantadas no Paraná, na unidade
paulista elas não aconteciam e eu fiquei curioso que na UEMS algumas pessoas já
debatiam isso, eu posso citar algumas pessoa como a professora Maria José, que foi uma
pessoa que eu fiz amizade aqui na universidade que a gente criou uma certa
identificação por conta de uma vez que eu passei pelo movimento estudantil.
61 Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho”. 62 Universidade Estadual de Londrina. 63 Universidade de São Paulo.
257
O estudante de maneira geral, pelo menos na minha época, a gente sentia a
condição de sujeito dentro daquela cadeia de coisas, sentia que a gente era importante
porque na verdade a universidade tá ali pra formar profissionais, eu não gosto do termo,
mas, alguns usam "clientes".
A universidade existe para o estudante e parecia estranho que a universidade não
pensasse em algumas coisas que fizessem com que o estudante tivesse sucesso dentro da
empreitada. Por exemplo, enquanto na UEL, eu lembro algumas vezes eu viajei e a
universidade pagava para você ir, participar de eventos.
Dentro da universidade estadual, eu fui trabalhar em um setor que nem os
professores tinham isso. Isso estava começando, então isso era meio estranho, quanto
mais pensar em direitos dos estudantes para que pensassem em políticas para que eles
permanecessem na universidade. Então uma coisa é o seguinte, minha opinião naquele
momento era que era estranho não ver na universidade muitas pessoas negras, eu via
aqui em Dourados, por exemplo, eu vim pra cá e nunca tinha visto índios na cidade de
onde eu venho. Foi uma experiência nova e, apesar da população indígena grande na
cidade, na universidade não tinha índios, mas a questão que eu acho mais interessante é
que tinha gente na universidade interessada nisso, querendo discutir isso enquanto no
resto do Brasil isso ainda era incipiente. Mas na UEMStinha gente qualificada pra
discutir. Eu lembro que quando levantaram as cotas, uma das preocupações que eu tinha
era o discurso de onde estava impregnado do lugar da onde eu vinha, ou seja, o que era
importante era investir na educação básica de todos independente do recorte social,
assim de renda, de cor, aliás o importante era que todos tivessem uma escola de
qualidade na base.
Mas, aqui, as discussões que tínhamos na UEMS era que, embora as pessoas, e
eu fazia parte desse grupo, porque logo de início me posicionei favorável as cotas, por
exemplo, porque o entendimento que a gente tinha era que era insuficiente você criar
cotas. Enquanto pra muita gente o debate era só: cotas, sim ou não?
E assim, algo veio acontecer, agora no momento sou Pró-Reitor porque quando
eu vim como Pró-Reitor eu já entrei com esse discurso de que isso era insuficiente, que
a política abrange algo muito maior do que dar somente o acesso. A opinião que tinha
na época eu continuo. As discussões pouco avançavam para estas questões.
Era favorável às cotas porque não consegue enxergar na realidade brasileira,
independentemente de qualquer política é que o acesso à universidade simplesmente
não acontecia. E uma coisa que acho curiosa é que quando você olha filmes como, por
258
exemplo, a escola francesa, de filmes que retratam a universidade francesa é comum
você ver, é um país que colonizou países da África, não é incomum você encontrar uma
quantidade razoável de gente negra nas universidades, enquanto aqui era um pouco mais
difícil.
Eu, por exemplo, nunca me dei conta que no curso que eu fiz de Física eu tive
dificuldade para me lembrar de um aluno que fosse negro. Eu nunca me identifiquei,
não me via negro, a família da minha mãe é negra, mas a família do meu pai é loira de
olhos azuis, então a gente criou nessa mistura, eu não consigo lembrar disso como uma
questão que a gente gastasse tempo pensando nisso, preconceito era uma coisa muito
estranha para nós. E esse debate na universidade embora já tivesse no movimento
estudantil.
Na UEMS foi o primeiro lugar na verdade aonde eu posso dizer assim: aqui
aconteceu pra valer pensar sobre isso, por mais que na Universidade Estadual de
Londrina houvesse discussões, era um incipiente, na UNESP também. Mas eu vi pela
primeira vez na UEMS mesmo, então quando as pessoas disseram a UEMS foi uma das
primeiras universidades, é pioneira, ela foi de fato porque eu estava vindo para um
Estado novo, passei por um experiência, não lembrava disso e não existia isso, e eu era
representante estudantil, não tinha essa discussão, simplesmente não acontecia, então
assim eu acho que é importante dizer isso que o discurso que eu vinha que era investir
na escola básica que é o caminho que é o discurso forte muitas vezes das universidades
paulistas, eu vi isso recentemente quando estava lá.
Para nós o que acontecia era que essas pessoas, elas simplesmente não chegam,
os alunos indígenas, por exemplo, em Dourados, os nossos alunos do processo de cotas
na Física, que é considerada uma ciência difícil, não é uma ciência simples porque a
linguagem dela é diferente. Primeiro que ela é mal ensinada, você não tem contato, os
alunos têm contato com os profissionais formados em Física mesmo, né,então são
profissionais muitas vezes leigos em Física, se você aprende Física com um bom sujeito
você acaba gostando de Física mas no geral não é isso que acontece. Os alunos que
escolheram Física nas cotas, eu tive a oportunidade de acompanhar alguns, e as
dificuldades de alguns eram imensas.
Não era a dificuldade de Física e sim a integração deles no ambiente novo, esse
lugar novo e uma das coisas que eu percebi no início do programa que eu acho que a
professora Maju estava atenta a isso, né. Mas poucas pessoas achavam, a luta era cotas
ou não cotas, contra ou a favor. E eu lembro que durante esse processo de discussão
259
teve vários movimentos que trouxeram a voz deles então eu lembro de uma coisa assim
que era curiosa pra mim, existia uns movimentos, movimento negro que era contra as
cotas, e eu achava curioso isso porque para mim era evidente a segregação que tinha.
Essa palavra pode ser forte, mas, para mim, ela estava evidente que assim você tem um
percentual da população negra ou índio e essa população não reflete em todos os locais
porque a princípio das oportunidades não são criadas mesmo, não só oportunidades, a
oportunidade para poder concluir aquilo que você está se colocando e como isso não
acontecia estava claro que dentro da universidade, então as cotas é o primeiro ponto.
Agora, as cotas em si, e é essa opinião que eu tenho hoje, na época não resolvia.
As pessoas que estavam engajadas tinham consciência, a gente dizia isso, só que a luta
ficou muito no plano de conseguir aprovar as cotas dentro da universidade.
Tinha outras discussões, para nós sempre foi claro que isso não ia dar conta, mas
assim como as pessoas não se convenciam disso e, na minha opinião, a discussão ela é
uma discussão na minha opinião sobre a qualidade de ensino e uma discussão
totalmente irreal. Assim, porque mudar a qualidade de ensino é algo que você não muda
só investindo, a qualidade do professor é importante, a formação do professor. Mas
assim esse não é a item, você pode colocar mais um, por exemplo, a valorização do
professor, ganhar mais, infraestrutura da escola outro item. Mas se você começar a olhar
para outras coisas que permeiam a escola e a vida do aluno enquanto ele está na escola
aí vai começar a enumerar uma série de itens e a gente descobre que o assunto é mais
complexo do que você oferecer bolsa escola, que é importante em minha opinião, e
outros itens que você vai oferecendo para os alunos, mas que isso sozinho não resolve.
Então, por exemplo, têm pessoas que eu visitei, um caso no nordeste, na região
do Cariri, que assim, ali naquela região não tinha universidade, hoje tem, tem a
Universidade do Cariri, as pessoas que conseguiram bolsa e passaram dez anos, tiveram
dez anos de bolsa nunca tiveram acesso à universidade. Então, dos oito aos dezoito
anos, uma parte dessa população entrou na universidade, agora lá no Cariri o recorte é
praticamente esse, a sobrevivência então independentemente de cor ou não eu acho que
tem esse recorte mais detalhado, se a pessoa é negra, mas eu não tenho informação, mas
a situação que eu presenciei foi essa de que quando o sujeito recebeu aquela bolsa, a
família recebeu a obrigação da escola uma parcela daquele pessoal entrou na
universidade. Só que eles não teriam condições de ir para uma Fortaleza, por exemplo,
eu estou dando este exemplo porque eu conheço.
260
No Mato Grosso do Sul, pra falar das cotas daqui, a gente tem alguns dados, mas
esses dados que inclusive da professora Maju e da professora Bia Landa sobre a evasão
que é um problema. Não vou dizer que está muito cedo para a gente avaliar, eu acho que
já tem dados suficientes para poder avaliar. Mas vou fazer, que não é bem uma crítica, a
gente tem um programa que chama Vale Universidade da Parte Indígena (PVPI) que o
Estado tem, que é um programa interessante, só que é um programa que pensa do ponto
de vista quase que exclusivamente do mérito. O aluno com três, eu assinei semana
passada aqui um documento três reprovações, um aluno é retirado do programa. Então
ele ganha um valor, um transporte e é retirado. Esses programas, assim como as cotas,
existem críticas muito fortes porque eles não conseguem reverter esses problemas. Eu
acho que aí os problemas não se revolvem só com isso mas sem isso eu acho que
haveria um recuo para o irreal.
Como você vai mudar a educação brasileira? Eu acho que a educação brasileira
na educação básica, você investe quando você tem um projeto para cinquenta anos, para
vinte, trinta anos, três décadas. Quando você tem um investimento forte. Daí eu acho
que uma coisa que eu acho que é bom seria pensarmos como brasileiro, né, e é o
pensamento que eu tenho aqui dentro da universidade como Pró-Reitor que eu posso
falar depois. Na universidade nós temos uma parcela de gente, gente que pensa e pensa
em um plano muito bem imediato.
As pessoas, então você vai construir uma política, a avaliação que eu tenho é que
uma política você não cria ela para dar resultado em um ou dois anos, porque os
fenômenos que vão acontecer de ordem social assim, que levam uma geração para
perceber. Acho que necessita de uma observação, um acompanhamento pelo menos,
uma década ou duas décadas. Por exemplo, os programas: o Bolsa Família e o Bolsa
Escola, todos esses programas se a gente olha os dados que o Ministério do
Desenvolvimento Social tem, eles têm dados lá que mostram claramente que, quando
você e essa que é a questão, quando você transfere uma renda para as pessoas talvez não
necessariamente em alguns lugares do estado de São Paulo, mas quando você vê em
regiões carentes quando você transfere uma renda para o sujeito com o compromisso
dele estudar e melhorar os conhecimentos dele e isso acaba refletindo na melhoria das
condições da vida dele, né.
No Brasil é curioso como a gente tem não como plano de fundo, mas quase uma
regra, como a gente tem um tensionamento dos programas políticos partidários, porque
cada vez mais a impressão que eu tenho que com o governo de esquerda, o projeto
261
nacional de um governo de esquerda ele se firmou e está há mais de uma década quando
você tem um programa de curto prazo da minha opinião de dez anos, né, mas esse
programa já deu tempo de se consolidar.
Existe um discurso de que os governos de esquerda vão usar de uma política
populista que eles vão usar para poder se firmar, mas, assim, esses programas na
verdade e é a pergunta que eu sempre faço é que se essas pessoas elas se colocaram em
condições melhores na vida dela? Não na minha vida ou sua, porque eu costumo dizer,
nós professores de universidades, por mais que a gente possa ter tido uma carreira difícil
para poder chegar aqui, existem segmentos na população que são muito mais
complicados. O governo de esquerda já teve um tempo assim para poder firmar essa
política na minha opinião.
Não é uma questão de só um projeto só para se manter. Essa é uma leitura que a
direita faz, mas não é só um projeto para de manter é no poder mas é um projeto que se
ele tem resultado, porque se fosse um projeto de direita e tivesse resultado esse projeto
acaba de mantendo. Mas a questão é que ele só se mantém porque ele consegue
mobilizar uma parcela da população para poder ter mais renda. Mas que parcela da
população tem mais renda? Olha, as Ações Afirmativas é justamente quem está na
parte marginalizada justamente com as minorias uma grande parcela que forma a massa
que forma as minorias. Então quando esses programas e Ações Afirmativas conseguem
trazer essas pessoas elas são os porta-vozes e, assim, é isso que as vezes é difícil em um
pais onde a classe média ela cresceu menos do que essa massa, ela teve menos, e se nós
pudéssemos comparar com a classe média acessou bens, claro que o que a gente acessa
mesmo com a classe menos alto ou baixa, ela acessou proporcionalmente menos coisa
que transformou a vida deles do que a classe mais baixa, então a transformação é muito
grande coisas assim.
Eu lembro que eu fui professor do ensino fundamental no Paraná e uma das
coisas que mais me espantava era crianças da periferia que nunca que não sabiam como
era o centro da cidade, que não sabiam o que era um shopping center. Como as crianças
das escolas de periferia têm um certo anseio de entrar no shopping center e até acham
que há lugares proibidos de entrar para ela. Aquela loja ali eu fico acanhado de entrar
então esse tipo de sentimento que parece até uma coisa tola na leitura de outras pessoas,
da classe média que eu vou a hora que eu quiser, entro aonde eu quiser. As pessoas
usam uma linguagem comum, olha o sujeito vai “goiabar” em uma loja, né, essa coisa
simples e até bobinha, para uma parcela da população isso não é possível porque o
262
sujeito internamente tem uma barreira, como se aquilo não fosse feito para você. Então
eu acho assim, as políticas afirmativas fizeram com que, e aí aonde que está o grande
apoio do governo de esquerda, que é muito difícil para a classe média entender qual é,
por que que essas pessoas permanecem ainda olhando e entendendo que por mais que a
gente, eu fico vendo, acompanho nas redes sociais, né, então assim eu mapeei, porque a
gente faz isso aqui na PROEC, olha os estudantes, o que as pessoas estão publicando e a
gente vê assim que quem reclama das políticas, porque tem lugares aonde as pessoas
falam: tem que acabar esse negócio de dar bolsa para essa povo, então essas pessoas
foram as que menos acessaram com essas políticas. No entanto ele percebe que teve
uma parcela da população, por exemplo, o programa de geladeira que o governo faz
isso, talvez para quem pode pagar e se programar ou tem mecanismos internos que
aprendeu a poupar, isso pode parecer besteira, mas essas coisas a gente tem que
aprender, culturalmente tem que aprender. Então se a gente não aprendeu a poupar, se
eu não sei, mas não porque eu não sei poupar talvez porque eu não tenha condições de
poupar nada, o que eu ganho é o mínimo para me manter vivo.
Então essa percepção que tem uma classe que na minha visão não percebe isso
com facilidade e infelizmente eu acho que dentro da universidade é uma parcela das
pessoas que não percebem isso, é justamente uma parcela que eu já fiz parte desse
grupo, né, justamente a parte que olha para a educação de uma maneira utópica de que
você tem que, utópico eu estou dizendo assim, não estou negando que investir na
educação básica é o que realmente precisa ser feito. Agora a questão é que dentro da
massa das minorias tem pequenas correções que podem ser feitas, eu lembro que na
época uma das preocupações que algumas pessoas tinham era que assim: o preconceito
no Brasil não existe e nós vamos inflamar as pessoas a perceberem isso, nós vamos
provocar isso. E isso era muito estranho porque as pessoas, essas pessoas que estavam
dizendo isso, elas nunca sofreram isso de verdade. E assim, olha, eu, por exemplo, tenho
um caso como professor da universidade, fui apresentar um trabalho em Joinville, eu
nunca tinha ido lá e fui apresentar um trabalho em um congresso de materiais fiquei em
um hotel onde, no hotel, lá o sujeito eu vi uma cena que não era comigo mas parecia ser
comigo né,depois o gerente, o rapaz foi falar comigo: “o senhor me desculpa, depois o
gerente vai falar com o senhor, talvez a gente compense isso que aconteceu e o rapaz do
lado falava; esse hotel caiu de nível, está aceitando qualquer um e eu não sei o que, esse
povinho que trabalha na cozinha”. E eu achei estranho, eu não sabia do que ele estava
falando, mas quando eu percebi que no lugar todo mundo era branquinho, só eu que era
263
diferente, falei que não era possível, eu não podia acreditar nisso. Então foi a primeira
vez que um caso desse aconteceu assim comigo e eu fiquei estarrecido, a minha reação
ela foi de surpresa porque eu não conseguia entender a reação dele, né, e depois até falei
para o povo do hotel: “olha eu não quero isso não, eu tenho os dias para eu ficar só vim
a trabalho”.
Mas assim, quando a pessoa sofre isso, eu fico imaginando alguém que passou a
vida inteira sofrendo com isso, né, então assim para essas pessoas eu não sei se dá para
esperar tanto, então tem uma parcela. Então a gente precisa ter programas de imediato,
de médio prazo e de longo prazo. Eu acho que naquele momento na UEMS, eu acho que
o interessante não foi mais um problema porque eu via muito isso aqui na UEMS na
época, o pessoal falava: Edmilson não entra nessa porque na UEMS é assim passa
bonde e todo mundo quer entrar e depois não sabe aonde vai dar. Então eu falei assim,
isso realmente me parece uma coisa que mais que justificada e eu sempre usava esse
exemplo que eu falei para você.
Olha eu passei por uma situação assim e eu fiquei imaginando como seria se
uma pessoa tivesse que passar uma vida toda, uma juventude toda, alguém colocando
apelido, por exemplo, eu tive um apelido na universidade, e eu estudei em uma
universidade paranaense, né, e assim eu morava com o pessoal todo branquinho, né, e
meu apelido era, eu nunca me identifiquei como negro, né, por exemplo, meu avô nunca
teve esse tipo de problema esse negócio de aí, eu tenho primos negrinhos e primos
loirinhos nunca teve isso a gente cresceu junto e não era uma coisa que era importante
para nós. No Paraná meu apelido era bola oito, eu não entendia, eu ficava: gente por que
bola oito? Porque eu não jogava bilhar. Até o dia que eu descobri que a bola oito era a
preta do jogo. Que coisa.
Então assim, essas coisas que parecem piadas elas são extremamente agressivas
e o fato da gente olhar para elas e entender que elas não são hoje é isso que me
preocupa. Quando a gente olha para uma situação e entende que não tem nenhum
problema.
Eu tive um colega de trabalho aqui na UEMS que teve problemas, um professor
da área de Física que ele inclusive teve um processo em uns anos atrás por conta disso
na universidade e como era difícil e eu fiquei como um mau na história porque eu fui
uma das pessoas que disse que aquela piada era preconceito mesmo. Eu falei
assim:“aquele sujeito que se sentiu ofendido ele está olhando para isso e ele está
fazendo uma releitura da uma vida toda de pessoas dizendo que existia uma diferença
264
entre eu e você pelo fato de você ter a pele de um jeito e a minha de outro”. E essas
coisas se davam no campo da competência mesmo, a diferença que a gente tem em
termos de competência está relacionada a isso. Essas coisas que pareciam veladas eu
acho que foi o grande ganho que a gente teve e, quando eu olhava para o movimento,
por exemplo, as opiniões dos movimentos negros que eram contrários, né, eu olhava
eles, o discurso relacionado com mérito, e esse discurso do mérito eu achava que era
bastante complicado porque a universidade de qualquer forma ela é uma construção de
competência de mérito, é pra isso. Mas não era isso que a gente estava discutindo, não é
isso, a questão é que você criou uma impossibilidade de alcançar o mérito. Por exemplo,
hoje, vou tentar trazer para hoje, hoje mesmo com cotas eu ainda acho que os programas
que a nossa universidade tem nesse momento agora eles ainda estão muito aquém a dar
acesso ao sujeito para alcançar esse mérito. Então hoje a gente tem muitos alunos
perdendo bolsa no Vale Universidade Indígena do Estado, por quê? Porque tem três
reprovações e ele é convidado a se retirar.
Agora, se a gente olhar para a história e quando eu olho para a história de
formação do sujeito e não somente a formação dentro da escola, mas a formação dele,
como ele lê o mundo, quais os elementos que permitiram com que ele olhasse para o
mundo e percebesse o mundo que vai me fazer assim, entrar dentro dessa universidade,
firmar um compromisso com as disciplinas com a dinâmica da escola onde ele fala: olha
eu vou, vale a pena eu gastar cinco, seis horas estudando essas coisas nesses cadernos
ouvindo aquele pessoa que está falando na frente para que de alguma forma segundo
eles como eu estou aprendendo, mudar a minha vida que é tão diferente desse povo.
Então o sujeito entra aqui e alguém começa a dizer, por exemplo, um sujeito que
faz Direito: eu vou trabalhar no Ministério Público, eu vou trabalhar. Esses alunos, os
não índios, por exemplo, estão dentro da cidade, eles têm uns códigos, eles aprenderam
a viver dentro de um lugar onde os valores são muito diferentes daqueles meninos.
Na Física uma vez um colega falou que eu estava insinuando que ele teria que
criar uma Física para o índio, uma Física pro negro e eu falei: não, não é isso. A Física,
a ciência, é a mesma, nós vamos ensinar a mesma coisa, mas, acontece que aquilo que
permiti o estudante enxergar.
Porque é o seguinte, as pessoas podem não concordar, mas, o mesmo fenômeno
pode ser interpretado de maneiras diferentes dependendo de quais são os códigos, até os
linguísticos, para aqueles de gostam dessa parte de linguística. Então esses códigos, para
quem domina esses códigos linguísticos e de jeito culturais, eles vão olhar, por exemplo,
265
o garoto mesmo Ícaro Junior, um aluno indígena que eu tive, ele tinha dificuldade de
chegar até a universidade e ficar durante o dia aqui.
A universidade fica a doze ou dez quilômetros da cidade e assim ninguém acha
estranho que não tenha chuveiro aqui, eu lembro que teve uma discussão para colocar
chuveiros aqui e as pessoas e eu ouvi eles falarem: o que esses alunos querem?
Chuveiro para quê? E, mais uma vez, esses discursos fazem sentido, quando eu venho
eu não preciso de chuveiro, pois, venho da minha casa de carro, faltando quinze minutos
para estar aqui,fico aqui, almoço aqui, ou, de repente, saio para almoçar aqui ou lá.
Eu tive alunos que, por exemplo, esse menino que acordava muito cedo, ele
precisava ir para CAções Afirmativas rapó, ele ia de bicicleta e lá pegava o ônibus que
ele não conhecia ninguém, as pessoas eram diferentes, provavelmente as pessoas o
colocam em uma posição diferente das dela, eu sou da cidade e você é de outro lugar. O
aluno indígena vinha e ficava o dia inteiro aqui, ele tinha que comer alguma coisa, esse
aluno indígena e outros muitas vezes nem comiam ou às vezes, e aí sumiam na hora do
almoço porque não queriam ser vistos não comendo nada né. E ficavam, não tinha
banho, e tinham que ficar até a noite porque o curso era a noite e pronto, tinha que
cumprir o horário do programa que pagava um dinheiro e as vezes as pessoas falam: a
bolsa é a melhor. Mas quatrocentos reais? Assim, se você olhar na verdade esse dinheiro
é para ele ajudar na casa dele, na sobrevivência.
E aí é aonde tem um problema com mérito. Porque aí algumas pessoas vão usar
assim, olha a bolsa é para esse aluno comprar um livro pra ele, para pagar uma viagem
de algum congresso, o evento que anualmente tem da UEMS que é obrigatório ir e ele já
tem que se programar. Então eles sempre estiveram distantes de entender e de visualizar
o que realmente, assim do que realmente as Ações Afirmativas querem dar conta. Então
elas no plano imediato, o projeto de cotas dentro da UEMS, ele vem dar conta deum
problema imediato que ele era assim, desnudar as pessoas de um problema que ele
estava visível. Porque as pessoas não enxergavam isso, o aluno ficava o dia todo, estava
fedendo na sala de aula porque ele pegava uma bolsa e tinha que sair quatro ou cinco
horas da manhã passar o dia todo, não comer, ficar suado, chegar meia noite na casa
dele, pegar uma bicicleta. É óbvio que esse menino não vai sobreviver por muito tempo,
aí até que um dia esse menino some e ele foi trabalhar com o tio dele de auxiliar de
pedreiro, porque ele trabalhar na cidade ele estará próxima da comunidade próximo de
casa, aquilo faz sentido para a vida dele.
266
E a universidade? Não conseguiu dar conta. Porque o programa da política ela
não pode ser de uma maneira generalista que olha as pessoas e é difícil fazer isso, mas
ela não pode olhar a massa, o amorfo.
Então, tem um monte de gente ali e isso não pode acontecer, a política tem que
olhar o sujeito, cara a cara mesmo, então mesmo que você tenha trezentos ou duzentos
alunos, o programa na universidade, eu sei que isso na prática é extremamente difícil de
ser feito, mas é o que a gente tenta fazer hoje.
Então nossa assistência social hoje, a gente tenha conhecer por mais difícil que
seja caso a caso. Então a gente tem um prontuário onde as pessoas conhecem o trabalho
deles, o trabalho deles é muito bonito, muito aquém a gente sabe disso. Por exemplo, o
próprio PVUI eu não sei exatamente, eu sei que o nosso era 120 vagas, mas a gente
nunca consegue atingir. Até o final do ano passado a gente estava efetivamente com
quarenta ou cinquenta, mas então assim essas pessoas conhecem o caso lá de mundo
novo do fulano, as pessoas sabem quem é aluno que está lá e tem alguém que cuida
dele, por mais que isso parece aos olhos de algumas pessoas, não é questão de direita
não, quase como um paternalismo, como você vai criar um programa.
Eu acho que é isso mesmo, eu acho que essa coisa de personalizar o plano é esse
que eu chamo de imediato. O plano imediato é que se você não mostra a cara das
pessoas, o restante não cria consciência sobre a existência disso porque hoje na
universidade se você vai na formatura dos alunos indígenas e eu fui por duas
oportunidades a convite da professora B.L, uma coisa que é recorrente no discurso de
todos é a discriminação que eles sofrem pelos outros alunos de curso.
Então, os colegas de curso, não digo que eles têm obrigação de saber, mas a
universidade precisa de um programa e por isso que a gente tem o Rede de Saberes mas
eu acho que ainda está aquém, né, onde ele traz para o meio de todo mundo quais são os
caras, não como uma mentira de expor os caras.
Mas assim, olha, essas pessoas existem, esses casos existem e na verdade o
sucesso disso depende de uma consciência nossa daqueles que não estão ai e que de
certa forma a gente ajuda muito a potencializar a exclusão dessas pessoas quando eu me
recuso, por exemplo, a entender o problema dele mesmo que seja pontual.
Eu tenho um colega da minha classe que é assim, ou ele é índio ou ele é negro,
ou esse cara entrou pelas cotas, esse cara a nota de corte dele era menor e às vezes nem
isso, às vezes e aí eu queria só assim falar um pouco do problema que muitas pessoas
não querem enfrentar porque eu trabalho aqui, a gente precisa investigar a questão, a
267
evasão, porque muitas vezes as pessoas, assim, é o que sinto ouvindo pessoas que são
especialistas. Às vezes o pessoal tem um certo temor dos dados da evasão porque,
assim, você investe em um programa e uma das coisas que se esperava é que ele
obtivesse sucesso com o maior número de alunos que permanecessem. E aí, eu sou da
área e a gente da Física tem mania de desconfiar dessas hipóteses que simplesmente
deveriam ser sim, só para atender a um critério convencionado. Então esse negócio de
que o sucesso só seria se todo mundo, mas seria, pode ter fenômenos aí dentro que eu
estou desconsiderando, então a evasão ela acontece com quem? Então quando eu crio
um programa aí eu vou pensar em um programa a curto prazo para desnudar, tirar do
invisível. Então quando a UEMS cria um projeto, ela luta pela questão das cotas, e você
pode ver que as outras universidades as coisas são mais recentes, mas quando a UEMS
coloca essa questão a universidade estão dizendo, olha essas pessoas aqui existem e, na
minha opinião, sem muita avaliação a resistência que se tem, elas não são
necessariamente, olha, a resposta é assim: olha vão tirar nossas vagas, vão fazer reserva.
Mas a leitura que eu tenho é outra, é que isso é uma resistência, olha não pode mostra
isso, isso é o tipo de coisa que tem que tirar as crianças da sala para falar, nós não
vivemos em um Brasil que tem preconceito então na verdade o imediato era fazer isso.
Desnudar, colocar as pessoas aí, como elas são. E, agora, o outro momento era
pensar em uma política de, assim, já com médio prazo que é essa em que eu não posso
cair no imediato, isso seria um superficial, falar assim: olha o dado da evasão confirma
o insucesso do programa.
Mas, por quê? Primeiro, você tem um programa que é para corrigir um
problema histórico, mas a gente está falando isso, mas não é só isso. Eu acho a gente
tem uma sociedade que a gente diz, olha, o sujeito que é negro, que é a minoria, então
todos têm que acessar as mesmas coisas que a sociedade produz, a mesma riqueza, os
mesmos bens, ter o acesso que eles na verdade não acessam e eu acho que no médio
prazo a questão é que a evasão ela não representa outros fenômenos que estão
acontecendo e esses fenômenos são, justamente, e eu vou dizer que a gente precisa olhar
com carinho. Não é porque eu tive na minha formação o desenvolvimento de
mecanismos internos que me permitiram visualizar o mundo e reagir ao mundo de uma
maneira que eu tenho que atende como um dado que foi assim com os outros.
Então, as pessoas podem não ter desenvolvido esses mecanismos que faz eu ver
o mundo e reagir como eu reajo. Então, quando eu tenho um programa que vai dizer
assim: Edmilson, você tem aqui uma chance, você entrou na universidade, talvez por
268
outra maneira fosse um pouco mais difícil de você entrar, mas, você entrou. Então eu
vou me agarrar naquilo e eu vou fazer de tudo para que tenha sucesso. A questão é que
esses mecanismos internos eu não posso e é isso que não posso entender como um dado
em todos as pessoas então por exemplo naquele aluno que eu citei o menino. O que é
que fez eu desenvolver esses mecanismos internos que me faz olhar para essas
oportunidades da maneira que eu olho.
Então aquele garoto, olha eu entendo que a universidade de alguma forma é algo
que traz algum benefício a ele, mas a que custo? Então eu às vezes topo sair da minha
casa, ir morar em uma cidade a quinhentos quilômetros de distância porque eu, na
minha formação, eu fui entendendo que era algo natural e que eu fui sendo preparado,
olha tem um curso que tem que ficar longe da família que vai ter que passar algumas
dificuldades e isso eu fui preparado. Mas o menino anda cinquenta quilômetros, né,
como eu vi, “olha professor esse menino olha, eu viajei trezentos quilômetros, minha
família não está aí, não tenho bolsa, o cara tem uma bolsa e mora a cinquenta
quilômetros e desiste” né, não pode aceitar isso. Mas as formas de visão são diferentes,
as formas de você ver de ter as oportunidades são diferentes da dele. Então que tipo de
mecanismos junto com aquela comunidade os valores que ele tem, como, por exemplo,
porque é que pra ele é tão importante voltar para a comunidade dele, trabalhar naquela
função e desistir da universidade. É, não é possível que ele diga: olha, eu não quero ter
sucesso na vida, entendendo que universidade é uma forma de atingir um certo sucesso
na vida aquele menino não vai dizer eu quero abrir mão ou não quero sucesso, eu acho
muito difícil acontecer isso. Mas tem coisas que naquele modo de vida que eu encontro
ali que me diz olha eu prefiro abrir mão disso.
Então eu acho que universidade não está se preocupando com esse tipo de coisa
que para alguns pode parecer um paternalismo, eu acho que não, aquilo que faz eu
culturalmente entender que a universidade me trata um certo sucesso dependendo da
minha formação eu posso enxergar isso.
269
Entrevista 6 – OCC 1r
Dados de identificação
Nome (iniciais): F. E. T.
Idade: 50
Função: Docente já foi coordenador do Curso de Agronomia
Tempo na Função: 15 anos
Formação: Engenheiro agrônomo
Tempo de atuação na UEMS: 13 anos
Fui coordenador do Curso de Engenharia Agronômica da UEMS, dou aulas no
curso de agronomia e dava aula até o ano passado no curso de Zootecnia e Mestrado em
Agronomia. Estou na UEMS desde sua fundação, antes mesmo da sua fundação, do
tempo da CERA64 e SENAR65.
Ø Conte-me como foi a implementação das políticas de Ações Afirmativas na
UEMS?
Em 2003, foi instituída na UEMS a política de cotas. Houve a discussão após a
promulgação da lei e que estaríamos recebendo estes alunos, não houve esta discussão
sobre o que a gente achava, isto foi imposto pra nós. Houve a discussão no COUNI, eu
fazia parte do COUNI, pois era coordenador da Agronomia, lá sim a gente discutia na
sede em Dourados e trazia a discussão pra cá. Mas com os professores não houve
nenhuma discussão para o preparo.
O clima nas reuniões do COUNI era um pouco de tensão, algumas pessoas eram
contra e outras a favor. Os contra não era no sentido de ser contra, mas se centravam na
preocupação como isso iria acontecer. Outros defendiam veemente a cota. Enfim.
64 Centro de Educação Rural de Aquidauana. 65 Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
270
Mas como a UEMS já tinha aceitado, e todas as pessoas tiveram que aceitar,
mesmo contra ou favor. Todo mundo teve que se ajeitar, mesmo contra ou a favor. Teve
que aceitar.
O grupo a favor defendia a inclusão, os contras diziam que estariam retirando
vagas regulares que seriam distribuídas para todas as pessoas e que o critério raça ou cor
estaria definindo a capacidade do indivíduo para ingressar no curso. Outros defendiam
veementemente esta condição. Não contra as cotas, uns falavam que não era justo.
Havia muita preocupação. Foi uma coisa rápida e foi só naquele momento esta
discussão, depois já passou.
Aqui no campus também foi do mesmo jeito, tinha mais gente simplesmente
aceitando a situação e menos gente contra. Havia muita discussão, era uma discussão
sadia. É importante se discutir sim. A discussão foi bastante sadia e eu acho que é bom,
porque estamos numa universidade, para trocar ideias. Foi uma discussão sadia, porque
é importante. Até hoje ainda existem conversas que surgem de vez em quando, não é ao
nível de confrontação, e sim a nível de expor sentimentos, muitas vezes.
A gente tem tido, não no caso dos negros, principalmente entre indígenas muitas
dificuldades. Pois os alunos indígenas têm muitas dificuldades, eles chegam à
universidade com um nível de escolaridade muito baixo.
Você pega já de cara as disciplinas básicas, na Agronomia eles são muito fortes,
tem carga horária muito alta, elas que são pré-requisito para as demais das engenharias,
eles têm muitas dificuldades, eles reprovam e este é um ponto de muito desistência e de
muita evasão. Passa o primeiro, passa o segundo e passa para o terceiro. Porque eles vão
carregando as disciplinas, eles estão no terceiro ano e carregando disciplinas do
segundo, do primeiro e aí eles desistem. É isto que está acontecendo.
As dificuldades que eu vejo deles é isso, não é nenhum pouco relacionamento,
nada disso e sim destas dificuldades. Mais ao nível de conhecimentos destas disciplinas
que eles precisam para chegar até o final do curso.
Eu vejo que o problema é mais sério, é o que dá para enxergar é que a escola do
ensino fundamental e médio deles é muito fraca. A carga que eles trazem é pouca.
A gente vê professores de Matemática, de Física e de Química dizendo que eles
não conseguem desenvolver coisas muito simples, e isso eles, coitados, não fazer, por
exemplo, as contas básicas, não conseguem.
O que vamos fazer? Talvez um semestre, um nivelamento paralelo, um curso
paralelo ao primeiro semestre. Não só pra eles, também tem outros alunos chegando
271
com estas dificuldades. Pode ser que entre todos, entre eles isto é nítido. Pois, entre eles
a maioria tem dificuldades, talvez todos. É o que a gente percebe.
No curso não há discussões sistemáticas para discutirmos isso, está se passando
ano e ano e não houve e não há nada discutido sobre isso. Nunca houve uma discussão
do que fazer, por exemplo, do que eu me lembro a gente nunca teve uma discussão para
discutir isso.
Não sei se o nivelamento daria conta destas dificuldades. É tão profunda a coisa.
Pois foi um tempo muito grande perdido, não perdido, mas mal aproveitado. Como nós
vamos voltar lá e trazer esses conceitos. Eles têm dificuldades com operações simples.
Eu trabalho com zootecnia, fitotecnia e pastagens e é uma coisa mais palpável. É
uma coisa mais palpável, a gente mexe com a planta. Mesmo assim, alguns não
conseguem escrever, não conseguem passar para o papel. Tenho vários alunos que não
conseguem escrever, não são todos...alguns vão pra frente, outros ficam pra trás.
Ø Como avalia a implementação destas políticas?
Eu, quando começaram as discussões, eu não tinha certeza se eu era a favor ou
contra, a gente tem um sentimento crítico frio, que percebe assim: este negócio corre o
risco de não dar certo. Ao mesmo tempo, tem um sentimento, uma percepção que
também é justo e seria uma oportunidade que estaria sendo dado a este grupo de
pessoas.
Passados dez, onze, passado este tempo, todos estes anos acho que os resultados
são excelentes, embora os resultados não sejam tão expressivos quanto se esperava, a
gente tem estas decepções que são a evasão e a reprovação, que é alta.
Eu vejo assim: se a gente tem a oportunidade de fazer um curso superior, estou
falando especificamente a Zootecnia e a Agronomia, se não fosse as cotas eles não
teriam como chegar na universidade. Já está cumprindo seu papel. Mesmo que não
tenha atingido as nossas expectativas em termos de quantidade. Acho que já se cumpriu
seu papel. Estes poucos que estão conseguindo se formar, transformar a vida dele e
também retornar a sua comunidade, eu acho que está excelente, já é válido. A bolsa é
válida, elas devem ser dadas, eles utilizem isso para se manter na universidade e se
manter na cidade.
Em Aquidauana tem o lar dos estudantes indígenas, ficam no centro da cidade,
com acesso fácil ao ônibus. Também é válido e necessário. O que facilita, pois senão
272
não teria como eles se manterem na universidade. Necessário, senão eles não teriam
como se manter aqui.
Eu acredito que ele deve ser um projeto finito, ele não pode ser perpetuado, pois
se acredita que melhorando o ensino básico, fundamental e médio, que é um problema
não só deles, mas do Brasil inteiro, não precisa mais de cotas, pois eles terão condições
de igualdade para ingressar na universidade. Vejo que é um projeto importante, mas por
um tempo limitado. Não que eu seja contra a cota, mas que eles tenham condições de
igualdade de ingressar na universidade.
Por isso é necessário que se melhore o ensino básico, fundamental e médio,
porque é aí que está o problema. É um projeto importante, mas com um tempo limitado.
Ø Recursos financeiros?
Qualquer discussão sobre bolsas de uma forma geral, não existe nenhuma
discussão negativa em relação a bolsas para indígenas, pelo contrário, todos acham que
deve aumentar o número de bolsas para indígenas. E que ela é função do Estado, uma
universidade estadual, pública, deve favorecer a permanência dos estudantes na
universidade. É obrigação do Estado.
O Rede de Saberes funcionou por alguém tempo aqui na unidade deAquidauana,
mas agora parou e eu não sei nada sobre ele hoje, funcionou no tempo da professora
Beatriz Landa, não sei muita coisa sobre o Rede pois estava afastado para o doutorado
no período que estava funcionando.
Eu sempre penso nisso, a gente faz muitas coisas, eu acho que se tivesse um
curso paralelo desde a entrada deles aqui na universidade, um reforço ao longo dos anos
da universidade, isto seria muito bom para atender as necessidades destes alunos.
Estava falando com a minha esposa, que é professora de Matemática, Física. Ela
está para se aposentar, se ela ministrasse cursos voluntários, se reuníssemosdez, quinze,
e conseguíssemos ensinar alguns, salvar um ou dois, já seria muito bom. É a forma de se
ensinar Matemática.
O professor aqui não tem tempo pra isso, pra voltar para os conteúdos básicos,
porque tem que cumprir a carga horária e seus conteúdos, que é pesada e extensa. Ele
não pode parar, eu vejo assim, precisa muito disso aqui. É o ponto de estrangulamento
hoje.
273
Estou orientando no mestrado uma aluna indígena, ela tem muitas dificuldades
na escrita e estamos tentando trabalhar com ela, para superar isso. Mas é um desafio
constante.
Por exemplo, ela tem disciplina estatística avançada, testes estatísticos, e o
professor já veio falar comigo: a.... está com muita dificuldade. Mas eu disse pra ele que
ela tá indo atrás, procurando, ela vai fazer e vai conseguir, mas será com muita
dificuldade. Porque não teve aquela base lá no início. Acho isto uma dificuldade.
Mas isto não é só com indígenas, minha mulher, como eu disse, é professora de
Matemática, e está dando aulas na periferia aqui do município e ela diz que tem
enfrentado coisas absurdas, ninguém sabe operações básicas de matemática, são os
analfabetos funcionais. E ela dá aulas numa escola particular e a diferença é muito
grande. Acho e acredito que na escola nas aldeias está muito pior. São lacunas que a
universidade não deu conta de resolver. Agora, não sei o porquê disso, já que todos os
professores estão trabalhando. O que fazer?
Eu acho que imediatamente o que se pensa é fazer um paralelo com os alunos
desde o primeiro para se tentar trabalhar estas questões!
274
Entrevista 7 – OCC 2
Dados de identificação:
Nome (iniciais): N.H.R
Idade: 48
Função: Gerente da Unidade de Aquidauana
Tempo na Função: desde 2012
Formação: Graduado Agronomia
Tempo de atuação na UEMS: 13 anos
Estou na UEMS desde que não existia a UEMS. Desde a Fundação CERA.O
CERAexistiu até outubro de janeiro de 2000. A Fundação CERA começou em 1974 e
existiu até outubro de 2004. A UEMS inicia suas atividades aqui em 1994.
Em 2000, com a reforma administrativa do Estado, a Fundação CERAfoi extinta
e a UEMS incorporou-se com o CERA. De 1998 a 2000, foi a mudança. No início havia
dois prédios e duas instituições.
Extinguiu-se a fundação CERA e toda a estrutura foi incorporada para a UEMS.
A estrutura e os funcionários foram passados para a UEMS.
Enquanto professor coordenador e gerente durante todos estes anos como foi
recebida a política de Ações Afirmativas pelos diversos segmentos da universidade:
professores, coordenadores, administrativos?
Em relação às cotas, antes da Lei das Cotas não havia alunos indígenas, eu não
me recordo de ver índios na UEMS, a não ser alguns no CERA no curso técnico. Os
alunos indígenas vieram com as cotas.
Foi recebida com muito receio e um certo preconceito, a cota foi discutida e
muitas pessoas foram contra, a cota não foi discutida amplamente. Pode ser que alguns
grupos aí fora, grupos temáticos podem ter discutido, mas conosco não teve uma
discussão muito grande sobre isso. Nós recebemos a cota e tivemos uma grande
dificuldade, porque a gente não sabia como tratar essa situação. Primeiro porque que
vieram pessoas de outra cultura e de outra língua. Embora eles falem o português – mas
falar é uma coisa e entender a língua é outra, mas compreender no sentido amplo –
conseguir contextualizar num sentido mais amplo. Muitas vezes os alunos tinham e têm
estas dificuldades.
275
Muitas vezes eles ficavam isolados, em grupo e ficavam isolados...
Os professores diziam que eles não estudavam, eram preguiçosos, ficavam
isolados e não se integravam. Porque também não foi feito um trabalho para se receber
as pessoas, simplesmente disseram: “teremos cotas”, e que a gente precisava fazer para
trabalhar com estes grupos. Era necessário um trabalho.
A cota de negros é diferente. Eles estavam à margem da universidade mas, o
negro está inserido nas escolas pública, estudavam juntos.
O indígena é diferente, estudava na aldeia, falam outra língua. Então havia uma
distância cultural muito grande. Tinham dificuldades imensas. Dificuldade, por
exemplo, de ir aos banheiros, porque não tinham costume de ir ao banheiro. Muitos não
entendiam o que você falava. São mais tímidos assim.
Mesmo depois de 10 anos ainda alguns professores continuam com o mesmo
discurso. As pessoas ainda não assimilam tanto assim, dizem que os indígenas não
passam, são fraquinhos, embora hoje vejo que o número de alunos nos cursos aqui
diminuiu, nós já tivemos muitos alunos e hoje já são menos... reduzindo a procura pelos
cursos aqui pelos alunos indígenas.
Os alunos indígenas procuram mais o curso de Agronomia, a Zootecnia é pouco
procurada. Não sei se tem algum aluno indígena que se formou na Zootecnia. Não me
recordo.
Da Agronomia formaram os primeiros alunos indígenas, já formamos alguns,
não tenho certeza de quantos. Mas lembro que formamos vários.
Na Engenharia Florestal tivemos uma experiência diferente, vários alunos
entraram e muitos desistiram. Porque a maioria eram meninas e eram casadas, tinham
filhos e moravam na aldeia, e isso levou a eles a desistirem no primeiro ano, não porque
tinham notas ruins, mas sim por estes motivos. E formaram três alunos, eram alunos
bons, liderança da nossa1ª turma da florestal e muito respeitado entre os alunos, hoje
está trabalhando numa grande empresa e está muito bem. Como vimos... para este grupo
foi bom e valeu a pena. Acho que já é valido, tirou da aldeia, veio pra universidade, se
destacou no curso, foi bolsista do Vale Universidade, que é a bolsa mais chata da pessoa
manter, mais difícil, pois não pode ter reprovação. Pode ter somente duas reprovações,
uma terceira já perde. Não há justificativa e não tem nada. Eles trabalharam sem
reprovação. Sempre com destaque e sempre com notas boas.
Mas tem que ter um trabalho a ser feito e tem que fazer. E aí que faltou um
trabalho, um treinamento com os professores, ou seja, o que fazer com estes alunos.
276
Precisamos integrar estes alunos. Principalmente com os professores, pois nós fizemos
assim, trabalhando com erro e acerto...primeiro entender como são e quem são estas
pessoas, o que passa com eles, o que eles pensam.
Na Agronomia, em 2006 e 2007, onde recebemos um número maior de alunos
indígenas, tivemos uma experiência boa, e tivemos que separar os alunos. Eu dava aula
no primeiro ano, na aula de Botânica. Pois eles tinham muitas dificuldades, dificuldades
de entender, mas percebi que era porque eles tinham vergonha de perguntar. E este foi o
jeito que achei para resolver esta situação e que eles pudessem acompanhar a turma.
E às vezes eles ficavam retraídos, aí eu decidi fazer aulas práticas só pra eles,
fazia aulas com toda turma de manhã e fiz aulas práticas à tarde, era só pra eles, aí era
como se fosse outra turma. E foi muito bom, eles conversavam e tiravam duvidasse
tinha cinco alunos indígenas. A discussão se iniciou como os alunos trabalhavam os
nomes das plantas e na língua, o que eles enxergavam e isto foi interessante. E este foi o
jeito que encontrei pra resolver as dificuldades deles.
Ø Existem no cursoreuniões e discussões sistemáticas?
Nós não fizemos isso, a gente não fez um trabalho, foi colocado as cotas e
pronto, mas não foi trabalhado, não há uma orientação institucional pra se trabalhar com
isso. A gente fez aqui, conversava muito, uma vez veio aqui a Pró-Reitora a Beatriz,
mas foram conversas. Não havia/existia trabalho/ações institucionais que promovessem
discussões profundas de como trabalhar estas questões. Temos que trabalhar isto no
projeto pedagógico e formas de como trabalhar para receber estes alunos.
A gente trabalha de forma individual com os professores, em forma de conversa,
dizendo pra eles para trabalhar os grupos, tentar integrá-los com os demais, mesclando.
Não podemos tratar eles diferente, não vamos estratificar a sala. Fazer grupos.
Hoje os problemas são menores, antigamente eram grupos fechados, tinha as
castas, as lideranças, nos intervalos eles se isolavam. Isso foi se quebrando. Na florestal
isso se quebrou mais fácil, os próprios alunos foram trabalhando os outros que já
estavam aqui, quebrando isso.
O Rede de Saberes funcionou bem aqui, mas agora nem sei. Tinha aulas extras,
hoje que eu saiba não tem nada do Rede funcionando. Funcionava bem melhor. Acho
que hoje está tudo parado.
277
A única coisa que trabalho com eles é a bolsa Vale Universidade Indígena, a
bolsa é do governo do Estado. Eles são muito criteriosos, não pode ter rasuras, não pode
ter reprovação, os horários devem ser certinhos.
Foram alguns anos, porque, por exemplo, não encaixava nos nossos cursos:
nosso curso tem 28 horas e a semana tem 40, como é que os alunos vão cumprir 20
horas? Então precisamos adequar horários. Ajustar, ajustar os sábados. Porque não pode
trabalhará noite. Conseguimos adequar, mas precisou alguns anos. E faço isso, porque
entendo, porque é uma forma de manter o aluno carente na universidade, pois eu fiz
universidade com muita dificuldade e por isso eu faço isso. Hoje tem 34 com vale e 9 no
Vale Universidade Indígena. Mas tem alguns alunos que acabam perdendo a bolsa. Por
exemplo, tem uma aluna que perdeu, que teve a terceira reprovação, e nós vamos fazer
um trabalho com ela. Para que ela possa concorrer novamente o ano que vem.
Eles pagam o ônibus, eles usam o recurso da bolsa para pagar o transporte. A
FUNAI também ajuda com algum recurso.
Em Aquidauana é mantida a casa do estudante indígena, uma casa onde eles
ficam, com vários quartos que eles ficam lá, um recurso da Prefeitura de Aquidauana,
somente para os universitários. No final do ano eles fizeram até uma festa de
confraternização. Eles se articulam para conseguir estas coisas.
Ø Tem conhecimento de incentivo financeiro/orçamento para esta temática?
Pouquíssima coisa foi feita na época da Beatriz, recurso para comprar
ferramentas. Recebiam bolsa PAE66para adquirir as ferramentas para que ele possa
desenvolver horas atividades da bolsa. Mas faz tempo.
Não existem ações continuas, que você vai fomentando, fomentando. Sempre
discutindo, as coisas vão acontecendo, e depois não tem recurso e para, não há
continuidade.
Em relação à unidade não há discussão para que se entre no nosso orçamento.
Nós entramos no sistema de cotas, estamos numa unidade, onde não temos esão
poucos professores com licenciaturas, ou seja da Zootecnia, da Agronomia, Veterinária.
Poucos passaram pelas licenciaturas. Discutir estas questões é bastante complicado.
66 Programa de Apoio estudantil.
278
E se você falar: vamos discutir Filosofia e Sociologia? Ninguém quer! Vamos
discutir didática? Ninguém quer! Acham que o estágio docente que fez no doutorado
que já é suficiente. Mas outros acham que precisam.
Por exemplo, se chegar no final de ano e tiver 50 alunos reprovados, referem que
os alunos é que conseguem. Ou seja, não querem refletir. Alguns professores fazem
correlação com as cotas, dizendo que eles são fracos, que não conseguem acompanhar,
são preguiçosos. Mas isto também tem outros alunos que não são cotistas e também têm
dificuldades.
Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?
Primeiro a coisa que faltou e falta discussão como tratar esta questão, já que
temos esta questão das cotas como inclusão, porque tem gente que não aceita. Nós
precisamos estar melhor preparados. Isso foi uma falha muito grande porque as pessoas
não conseguiram entender. Não consegue enxergar de onde partiu.
Acho que o que pode ser implementado é ainda fazer uma discussão neste
sentido. Pois a cota vai continuar e é importante saber como receber estes alunos. Nós
temos alunos indígenas fazendo mestrado e doutorado. Você conseguiu despertar nas
comunidades e há interesse nas comunidades em vir para as universidades. A
universidade precisa discutir mais isso. As coisas não são tão lineares assim.
279
Entrevista 8 – CC 3
Dados de identificação
Nome (iniciais): F. A. D.
Idade: 32
Função: – Coordenador do Curso de Ciências Sociais – Amambai / MS
Tempo na Função: 1 ano e meio
Formação: Ciências Sociais (graduação, mestrado e doutorado e Ciências
Sociais)
Tempo de atuação na UEMS: 2 anos e meio
As políticas aparecem no curso de Ciências Sociais como um avanço, essas
políticas reduziram não somente no tempo que eu estava aqui mas no tempo anterior dos
professores, elas reduziram o número de evasão e retenção do curso, são alunos que
podem dedicar maior tempo ao curso e ao mesmo tempo eles ficam mais próximo da
universidade uma vez que eles assumem responsabilidades nas iniciações científicas de
estágio tendo essa bolsa eles podem de dedicar a várias atividades.
Esse é um problema que a gente tem no curso e que ele se agrava bastante,
porque nós temos uma cobrança em relação à quantidade e nós somos obrigados a
responder essa cobrança.
O nosso perfil de alunos de Amambai é bem diferente dos que encontramos
aqui em Dourados, alunos que já tem uma estrutura familiar, estão casados, tem filhos,
estão inseridos de algum no mercado de trabalho e eles veem o curso pelo menos no
início como uma opção de transitar para a docência, apenas isso e chega um
determinado momento que eles desistem porque começam a perceber que a docência
não é para eles e isso gera uma evasão e baixa retenção dentro do curso.
Nós começamos paralelamente com o curso a criar mecanismos para diminuir
essa evasão e baixa retenção como, por exemplo, alimentar uma vontade de um
mestrado, então nós abrimos uma pós-graduação no incentivo de pensar numa
verticalização do curso e, agora, já estamos pensando em mestrado, pensamos em criar
uma mentalidade que seja para além da graduação numa formação continuada.
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O aluno tem um espaço maior quando ele consegue por meio do incentivo, com
maior disponibilidade de bolsa ele consegue já atuar na escola, né, já faz um ensaio
dentro da escola e isso motiva bastante na continuidade do estudo e também amadurece
alguns conceitos que ele viu na sala de aula e que depois ele leva pra escola fazendo um
movimento hermenêutico entre a escola e faculdade. Então nós temos essas estratégias
paralelas justo com as bolsas para evitar essa retenção de evasão.
A realidade indígena é algo inédito. Uma realidade acadêmica como São Paulo e
o próprio Paraná ou Santa Catarina. Então quando nós estamos falando de cota, falamos
de cotas para negros e, quando você chega a Mato Grosso do Sul, é algo diferente, se
fala das cotas para indígenas, e aí você tem um forte preconceito, um distanciamento,
pré-conceito é quando você não tem um conceito definido. Você tem a visão do
indígena como o bom selvagem, aquele que está lá na mata, fechado, isolado, então
você tem um preconceito com as cotas indígena por achar que ele está associado a uma
cultura da natureza e não a ummovimento da cultura ocidental, então tem um
distanciamento quanto a isso, quando você não tem essa aproximação do indígena como
em São Paulo e Santa Catarina.
Em relação às cotas para negros na universidade eu penso que hoje a uma
“coletivação”, uma militância muito grande que emana também de dentro da
universidade, ou seja, o movimento negro está muito próximo da universidade e ele
consegue fazer um trabalho de conscientização do que as cotas dentro de uma
perspectiva histórica cultural e política.
As cotas representam um mecanismo de equidade social em função de um
passado que nós tivemos no Brasil, marcado pela exclusão social. Eu acho que, em
relações às cotas em São Paulo, Paraná e Santa Catarina, já se tem uma politização de
modo a esclarecer essa compensação histórica, compensação eu acho que é um conceito
ruim, o melhor seria essa equidade.
Amambai é uma cidade bastante atravessada pelo ódio porque você está lidando
com propriedade privada, o grande conceito do mundo moderno é a propriedade privada
e quando a gente fala em demarcação de terras a gente traz o óbvio: o ódio. Então, antes
mesmo de ter uma percepção de cotas para indígenas dentro da universidade, eu sempre
tinha dentro da sociedade, da realidade de Amambai, um ódio de mão dupla, né, as
pessoas da cidade que assumem um discurso de agronegócio e os outros. Esse ódio vem
quando se fala da demarcação de terras, você tem duas mentalidades, forjadas,eu acho,
um processo de forjar essas duas mentalidades e o elemento central é a demarcação de
281
terras, por um lado você tem a mentalidade indígena que gradativamente ela é forjada e
por outro lado uma mentalidade idealista do agronegócio que também é forjada, só que
há um poder de se forjar uma mentalidade por parte daqueles que têm a propriedade
privada.
Então, em diferentes momentos em Amambai, em audiências públicas na
Câmara, conversando com a população local, escutando o rádio você percebe que os
idealistas eles generalizam, eles como os que serão excluídos da sua vida social caso
percam as terras, eu falo todos e ele vai lá e pega o pequeno lavoureiro, o comerciante,
ele vai lá e pega o funcionário público, eles pega todos, engloba nessa mentalidade de
que todos teriam suas vidas estraçalhadas, o discurso do desastre social, é claro que ele
tem mais força social para fazer isso.
Agora, sem avaliar sem valorar esse discurso, apenas pensando na
consequências desse discurso, isso gera um ódio direcionado ao indígena, o indígena se
passa como aquele que não trabalha, não é dado ao trabalho e esse discurso está na
teoria social quando a temática é o indígena, logo o indígena não trabalha e quer destruir
a família, por outro lado você tem o indígena que está se revoltando com aquele que
odeia ele, então você tem um ambiente tenso, que não fica toda hora um discurso em
voga, mas o ambiente fica sempre tenso. E as cotas vão passar por esse ódio, porque a
sociedade vai começar a ver as cotas como algo absurdo por uma parcela significativa
da população porque são benefícios para os indígenas, não só as cotas, mas também as
políticas sociais voltadas para os indígenas.
Isso é curioso, que fica de um lado “entre linhas”, como algo não dito que o
comércio de Amambai é mantido pelos indígenas em função dessa transferência de
renda feita pelo Estado, o comércio local fica entre a ponte do abismo, ou você fica com
ódio do indígena ou contente que ele gasta ali. Mas eu acho que acaba sobressaindo esse
ódio que é constituído a partir da ideia branco.
Amambai a população de negros é pequena, o próprio IBGE mostra. Então eu
acho que as cotas para negros hoje eu penso que Amambai começa a discutir isso dentro
da universidade, hoje o movimento negro começa a se aproximar da realidade local e
isso começa a aparecer, por outro lado as cotas para indígenas estão bem presentes na
nossa agenda em Amambai, nós temos projetos de extensões, nós temos projetos de
pesquisa, nós temos não só na graduação como na pós-graduação, nós temos hoje 4
acadêmicos indígenas e temos professores que trabalham nas aldeias, então a UEMS se
aproxima por meio dessas ações, também por meio das semanas acadêmicas, nós temos
282
espaços para debates onde aparece a questão das cotas. Nessa semana acadêmica do dia
20 de outubro uma noite será para juventude e educação nas aldeias, nós temos maior
proximidade com aldeia Amambai geograficamente e porque a maior parte dos alunos
vem dessa aldeia, mas eu acho que são várias as formas de aproximação que a UEMS
promove.
Nós temos um perfil de aluno cotista que tem mudado de uns anos pra cá, eu
lembro que, quando eu cheguei aqui, nós tínhamos alunos prestes a se formar que
tinham dificuldades principalmente na leitura e escrita. Nos cotistas indígenas essa
dificuldade há alguns anos atrás quando eu cheguei aqui ela aparecia com maior força,
eu acho que a gente está eliminando essa diferença porque não havia uma preparação
para o aluno indígena entrar na universidade, ele fazia uma passagem muito rápida.
Qual que era a dificuldade? É, eu lembro que o antropólogo Henrique de...,
quando foi, que ele era jesuíta, ele foi fazer duas lógicas de pensamentos, o indígena e o
ocidental que é quando ele vai ter que entrar, porque na universidade tem o pensamento
ocidental, os indígena vai chegar ali e ter que entra na Ciência Social, ficar analisando o
contratualismo político de como se formou o Estado na lógica de pensamento dele, a
princípio isso não faz sentido, essa formação burocrático legal como diz Weber, né,
daquele que é o Estado moderno e isso não pra ele não faz nenhum sentido. Então ele
tem que fazer essa passagem de uma lógica de pensamento para outra, como dizia Lima
Vaz, quando os jesuítas chegaram no Brasil começaram a ensinar o silogismo
aristotélico: todo homem é mortal, Sócrates é homem logo Sócrates é mortal,ok, todo
pajé é homem logo todo pajé é mortal? Não. Então essa lógica que pensamento do
indígena não é a mesma lógica do pensamento ocidental, que em grande parte das vezes
ele é forçado a entrar, então, qual era a maior dificuldade? Eram nestas duas lógicas
distintas que ele tinha que fazer a passagem, hoje eu acho que tem um processo de
inclusão ou de apresentação dessa lógica ocidental mais cedo pra ele.
Então quando ele chega na universidade, ele já sabe o que se passa aqui dentro,
tem a questão da língua, o português que ele vai ter que se adequar em textos que já são
difíceis em outra língua. Hoje eu acho que há um trabalho de transição para o aluno
indígena e a realidade é que existem já alunos indígenas melhores do que os não
indígenas, eu tenho alunos do primeiro aluno, três alunos indígenas que despontam na
turma. Então eu acho que há um trabalho.
Agora em relação aos não indígenas, nós temos uma grande dificuldade no nível
superior que não diz respeito a uma área somente, um lugar ou alguma universidade
283
específica, temos um problema na ampliação em quantidade de alunos que chegam na
universidade e índices muitas vezes quantitativos no ensino fundamental e médio, então
nós temos em números uma realidade satisfatória mas em termos qualitativos não temos
uma avaliação eficaz. Eu falo para os meus colegas que nós fazemos no ensino superior
um trabalho que deveria ter sido feito lá no ensino médio, não deveria ter sido repassado
esse trabalho de alfabetização, nós temos muitos analfabetos funcionais que chegam na
universidade com dificuldades de ler e interpretar um texto. Nós temos, nas salas de
aula em Amambai, datashows que projetamos os textos na parede e aí você pede ao
aluno ler o texto e ele não consegue ler o texto e, se ele não consegue ler o texto, não
consegue interpretar o texto, ele não vai conseguir produzir um texto e isso é uma
situação de analfabetismo funcional que vai ter que ser corrigida na universidade porque
ele entrou na universidade. Porque há uma demanda por quantidade de demanda e a
quantidade não acompanha a qualidade.
Seriam vários caminhos, um deles é uma maior valorização do professor no
ensino médio. O professor passa por uma desvalorização muito grande, eu penso que às
vezes o governo paga um psicólogo para acompanhar professor, e não, o professor tem
que ter melhor qualidade de trabalho, maior salário, ele tem que se sentir valorizado na
profissão de ser professor.
Em Amambai eu percebo um fenômeno curioso. Ele deixa asala de aula para
prestar concurso para trabalhar na AGepen67, nós chegamos a um pontoem que seria
cômodo se não fosse trágico, chegamos em um ponto onde o professor prefere trabalhar
no presídio do que em sala de aula. Isso é um absurdo e isso é a desvalorização do
professor perante o Estado.
Nós precisaríamos ter um espaço maior na escola, onde o aluno ficaria mais
tempo na escola, educação integral seria uma saída, uma aproximação maior entre
universidade e escola, eu penso que hoje nós conseguimos isso com o Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência(PIBID), que tem uma participação
significativa dentro da escola. Mas eu penso que o primeiro passo seria a maior
valorização do profissional professor.
Ø Como você avalia as políticas de Ações Afirmativas na UEMS?
67 Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário.
284
Eu a avalio com uma crítica muito positiva porque você consegue apresentar de
maneira concreta uma equidade social. Nós falamos, nós vivemos em um país
democrático, o exercício da cidadania, mas a educação é a base para uma sociedade
melhor principalmente quando você já tem a democracia. Democracia é só um ponto de
partida onde você tem que colocar conteúdo nela e a democracia é um sistema que te dá
direitos e te dá voz mas tu não consegue entender os direitos que tem, apesar dessa voz
se tu não consegue receberessas informações e como diz Nietzsche: ruminar essas
informações. A democracia ela é apenas um vaso bonito na estante de casa, ela só vai
ser efetivada quando você tiver uma educação que proponha a crítica acerca dessas
informações, uma educação constante, uma educação permanente. Eu acho que as cotas
contribuem para que uma fatia significativa da sociedade comece a participar disso que
é a democracia, começa a entender quais são seus direitos e poder usufruir do espaço de
voz da arena política.
Tem um acadêmico do segundo ano de Ciências Sociais, indígena, nós temos
em Amambai um jornal que sai uma tiragem mensal que é caderno de Educação, nós
temos um espaço mensal desse jornal que é da UEMS e nós professores escrevemos
textos nesse caderno. Algum tempo nós chegamos à conclusão que seria legal abrir para
os alunos também esse espaço e agora a última tiragem desse caderno nós nos
deparamos com um texto dessa acadêmica indígena do segundo ano de Ciências
Sociais. E o texto dele coloca bem essa situação: como a educação pode contribuir para
o exercício dos direitos indígenas? Quais são os direitos dos indígenas? Como estar
dentro da universidade pode contribuir para o exercício da democracia? Então as cotas
eu penso que é mais que compensação, pagar uma dívida e sim você promover o
exercício da democracia, fato que nós temos hoje, fazer com que todos tenham acesso à
compreensão dos seus diretos e simultaneamente acesso à voz, ao espaço na arena
política.
Eu penso que nós temos na nossa sociedade atual uma grande luta por
reconhecimento. Uma luta por reconhecimento que é muito importante, mas eu penso
que nós temos um problema significativo, uma organização social neoliberal, temos
uma luta por reconhecimento em uma esfera cultural, mas nós precisamos abrir uma luta
por reconhecimento da esfera econômica também, você formar e você propor uma
285
abertura para o mercado de trabalho, nós falamos de valores, de emancipação mas
temos que falar de um reconhecimento econômico.
O que hoje está vinculado às políticas sociais? As cotas? Falta você ampliar o
mercado de trabalho para a atuação desses profissionais que estão se formando, então
nesses casos específicos de cotas indígenas, falta a gente pensar em como esses
profissionais vão voltar para suas aldeias e ter condições de trabalho, condições ótimas
de trabalho ou, no caso deles, não quererem voltar para a aldeia, qual o mercado de
trabalho que eles podem atuar? Então falta pensar as políticas sociais de modo
integrado, nós pensamos nas políticas sociais muito separadas aqui no Brasil, nós
pensamos em políticas sociais para educação, uma para a saúde, uma para geração de
renda. Mas essas políticas não conversam entre elase uma vai para um caminho e outra
para outro e em longo prazo você não tem algo significativo emergindo dessas políticas
porque elas estão muito separadas umas das outras. Eu penso que as políticas sociais de
cotas deveriam dialogar com as demais políticas.
Eu penso que o próximo passo é a verticalização, acho que a graduação se
consolida com a verticalização, o mestrado. Nós temos que fazer o aluno pensar na
graduação como algo que não é o limite, há um além e sempre assim. Nós não podemos
pensar no modelo de educação onde eu estudo quatro anos e beleza e eu estudei pra
atuar a vida inteira ainda mais os cursos que tem licenciatura, nós estamos sempre
estudando e estudando, nos atualizando.
Eeu acho que nós podemos fazer pelo curso quando passa pela questão dos
investimentos e aí envolve a instituição onde nós sempre corremos atrás, mais
professores efetivos, manutenção da biblioteca, laboratórios, essas coisas tem mais a ver
com a instituição. Mas questões que tem a ver com o curso e de como nós pensamos o
próximo passo seria a verticalização. Consolidar, junto com a verticalização, centros de
pesquisas em Amambai. Amambai é uma realidade ótima para as ciências sociais, ótima
para ser observada pelas ciências sociais. Nós temos hoje recursos hídricos que então aí
na crista da onda, são os desafios ambientas e as ciências sociais é um curso
extremamente para pensar em recursos hídricos, nós temos lá, por exemplo, o rio
Amambai, nós não temos por exemplo um diagnóstico do rio Amambai: onde ele está
mais danificado, onde ele tem que ser recuperado, quais seriam as estratégias para tais
recuperações. Então um centro de pesquisa seria ideal para explorar os recursos
hídricos, as questões ambientais de Amambai e isso poderia estar vinculado a uma linha
de pesquisa de algum mestrado a própria temática indígena porque nós temos em
286
Amambai, uma população que ultrapassa dez mil indígenas. O curso não tem números
de pesquisas para quantificar o número de indígenas.
Vamos voltar lá pro começo, primeiro UEMS Mato Grosso do Sul, aonde tem
singularidade desse Estado. Eu fiz um projeto de pesquisa quando eu cheguei aqui, eu
sempre fui muito encantado com a questão da modernidade, da modernização não me
considerado marxista, mas eu adoro aquela frase dele: a burguesia fez maravilhas que
nada tem a ver com as pirâmides do Egito. Então eu acho que a modernidade sempre me
fascinou e, quando eu cheguei aqui em Maro Grosso do Sul, a primeira coisa que eu
percebi que tinha uma modernidade diferente, uma modernização melhor dizendo
bastante diferente, você olha e tem mais cabeça de gado do que cabeça de pessoa, você
tem a partir do desmembramento da época de setenta, você tem um projeto que não é
muito claro de modernização, porque quando a gente pensa em modernização pelo
menos a partir da terceira revolução industrial você pensa em industrialização, vamos
industrializar esse negócio, mas você olha o ICMS68 do Estado, é um absurdo, as
estradas, você não tem um incentivo para que a modernização ocorra pela
industrialização mais você tem um incentivo para que a modernização ocorra pelo
agronegócio. Então Mato Grosso do Sul tem uma modernização muito singular e é claro
que a política sempre reflete os anseios da economia, a gente não pode achar que as
ideias são produzidas em um vazio atmosférico sem nenhuma relação com a economia,
não, a política ela é produzida a partir dos interesses econômicos. Então os interesses
econômicos associados ao agronegócio nem sempre são interesse econômicos daqui,
são de grupos que vem de fora.
E nessa singularidade do MS nós temos uma relação muito singular também
entre a política, a economia e a UEMS porque se entende que a UEMS é forte só
quando o curso atende ao agronegócio e quando na verdade não é isso, porque a UEMS
já nasce muito forte, a UEMS é a maior política social do Estado e isso é muita coisa,
ser a maior política e social do Estado já é muito coisa. A UEMS poderia hoje estar
apenas em Dourados e seria uma universidade muito grande se você juntasse todas suas
unidades, a estrutura se você pensar que cada polo tem seu auditório, você junta os
recursos que foram utilizados para fazer quatorze auditórios ou quinze, junta tudo e
você tem um auditório que uma universidade do país teria, mas qual o problema de você
fazer tudo junto? Porque daí ela não seria a maior política social de educação de Mato
Grosso do Sul, ela seria apenas uma outra universidade do país buscando ser um grande
68 Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços.
287
centro de pesquisa, talvez no agronegócio, e não seria da população de Mato Grosso do
Sul sendo que essa é uma virtude da UEMS, de ser da população de Mato Grosso do Sul
e não tem como pensar diferente que a economia e política estão vinculados e a
economia decidida por grupos que não correspondem exatamente a população de Mato
Grosso do Sul, às vezes o interesse político não é a UEMS porque a UEMSrepresenta a
população de Mato Grosso do Sul e não aquilo que é a economia dos pequenos grupos.
Mas acho que medida que a gente começa, esse seria um diagnóstico, um prognóstico
seria em outra direção na medida em que a gente começa a formar um pensamento
crítico, uma ideia um tanto paradoxal de uma massa crítica no Mato Grosso do Sul, uma
vez que está espalhada em quinze unidades do Estado e essa é a força da UEMS, a gente
começa a formar essa massa crítica e ela começa a ver que essa massa tem direitos, e aí
começa a reivindicar mais ela UEMS.
No modo prático, o que vai acontecer nesse processo eleitoral nós começamos a
perceber que alguns candidatos começam a assumir a UEMS como causa porque a
imagem da UEMS pelo menos agora em quinze cidades está presente, então se eu quero
ser um candidatado a deputado estadual forte, eu posso assumir a UEMS como causa.
Então eu começo a pensar estrategicamente dentro dessa democracia competitiva,
começo a se pensar na UEMS como um elemento estratégico e talvez esse seja um
elemento positivo para a UEMS porque ai nós começamos a ampliar a UEMS para além
empenho dos funcionários, professores e o bem dos que são da casa. Porque esse
empenho é admirável também, nós temos professores que trabalham além das quarenta
horas no plano de atividades, e não são alguns professores, são a maioria que trabalha
além do proposto.
E o que é maravilhoso é que as vezes você vai em uma grande universidade e o
professor está ali sem entusiasmo de estar ali na universidade e isso é um fator muito
forte na UEMS, os professores e funcionários têm satisfação e entusiasmo de estar ali na
UEMS porque a veem como algo sendo construído ainda.
288
Entrevista 9 – CC 4
Dados de identificação
Nome (iniciais): J.L.A.
Idade: 47
Função: Coordenador do curso de História da UEMS Amambai e Docente
Tempo na Função: março de 2014
Formação: História
Tempo de atuação na UEMS: 7 anos
Sou coordenador do curso de História desde março de 2014, portanto minha
atuação é muito recente.
A UEMS é pioneira nesta política, especialmente as cotas, na reserva de vagas
de escolas públicas, a cota racial para negros, adicionando a questão indígena.
No caso de Amambai é bastante significativo, pensando no contexto histórico e
social destas populações, porque praticamente um terço da população do município é
indígena. O município hoje tem 33 mil habitantes, destes 33 mil, 10 mil são indígenas.
Ø Como a política foi recebida?
O que eu percebo é que há um consenso em relação a quanto a política de cotas,
consenso de que é necessário, agora nem todos concordam, muitos são assim, alguns
pensam que é algo mais pontual e provisório e outros acham que pensam que deve ser
algo por maior tempo, fazer a inclusão de forma mais ampla precisa de maior tempo.
De fato ela é ainda, a gente pode perceber que ela ainda não faz a inclusão por
completo, precisam de mais ações ainda, mas de fato eles estão lá. Eles têm muitas
dificuldades, principalmente a língua, não podemos considerar que são maiores que os
demais, porque existem as dificuldades de terem vindo de escolas públicas, são
trabalhadores. As cotas são ações que podemos perceber que ao longo do tempo.
289
Ø Como o curso tem pensado, discutido....
Existem discussões, mas elas não caminham para soluções, elas não caminham
para propostas mais elaboradas e sim algumas inquietações. A UEMS tinha o Rede de
Saberes, que tinha o objetivo de acompanhar estes alunos.
A instituição não tem estrutura para tanto, depende de verbas, nosso orçamento é
bastante limitado. Por outro lado, nós temos colegas que desenvolvem ações, fazem
pesquisas, alguns alunos indígenas desenvolvem/participam pesquisas, iniciação à
docência, algo que era inimaginável há bem pouco tempo atrás.
Uma dificuldade que eles têm é na escrita, trabalho eu acho que eles devem ter
um complemento. Eles devem ter um acompanhamento da produção da escrita do
português, porque eles escrevem em guarani.
Estágio supervisionado quando o aluno deu aula em guarani e foi bastante
interessante. Nós queremos trabalhar a interação dos professores com os alunos. O
nosso acadêmico indígena é bastante introspectivo, mas quando ele estava dando aula é
outra coisa.
Alguma pessoa que falasse bilíngue, que fosse acompanhando e monitorando,
acho que este acompanhamento deveria ser com um indígena, que falasse e escrevesse o
português. Eles são bilíngues e nós não somos, mas na escrita não.
A forma como eles foram se formando, eles me parecem acostumados, a serem
invisíveis e também a ser tratados como invisíveis. Não percebemos. Não todos, mas
alguns foram ficando no meio do caminho. Não percebo discriminação.
Mas, quando a discussão sobre as questões fundiárias, principalmente fora do
âmbito da universidade, por exemplo, nas redes sociais, a crítica é grande. Mas na sala
de aula e nos corredores a gente não percebe, explicitamente. Amambai é uma região da
agropecuáriae aí as questões fundiárias são fortes. A questão do confinamento deve ser
pensada.
Muitos deles são bolsistas, de forma variada tanto do PIBIC, do Vale
Universidade Indígena. As bolsas são importantes para mantê-los na universidade. Faz
um diferencial na vida deles. Temos alunos que estão já dando aulas na aldeia, esta
semana estava comentando com um aluno que vai fazer estágio na aldeia.
290
Ø Se fosse fazer uma avaliação desta política
Além das cotas, mas também pensando nas bolsas, na quantidade de bolsas que
nós temos, pela primeira vez começamos a sonhar com algo que é o pensado.
O acadêmico trabalhador é difícil, devemos pensar nos valores das bolsas, mas
já é um alento. Por exemplo, em Amambai onde há uma carência de emprego, locais de
trabalho é precário. Por exemplo, o PIBID69, ele é flexível e que não faz reserva para o
aluno trabalhador, basta que ele cumpra as horas que o programa exige. Isto tudo é um
ganho. Refere um estado ampliado.
Precisamos pensar em ampliação desta política. Sem estas condições ficaria
difícil, por exemplo, o caso de Amambai e Sapucaia, sem as bolsas não teria como o
aluno se manter na universidade.
As cotas são muito importantes, de certa forma medidas paliativas, veio para
corrigir um fato, porque as oportunidades não são oferecidas de forma igualitária.
Quando as condições de formação estiverem mais aproximadas em diversos níveis da
população, talvez precisaríamos abolir as cotas, mas por enquanto não. Enquanto ainda
temos estas diferenças. A gente tem uma média de 3 a 4 alunos indígenas formados a
cada ano.
Os alunos indígenas têm dificuldades e problemas, assim como os demais
alunos, por exemplo, nos estágios, nos TCCs, a evasão é um pouco maior entre os
indígenas, mas não tenho este número. Mas eles têm tempo pra isso, eles têm 7 anos
para concluir o curso, uma parte dos alunos indígenas não conclui o curso no tempo
regular.Não saberia por número quanto é a evasão. Mas no TCC eles têm dificuldade de
produzir e de escrever.
69 Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência.
291
Entrevista 10 – CC 2
Dados de identificação
Nome / Iniciais: Maria Eduardo Ferro /M. E. F.
Idade: 46
Função: coordenadora do Curso de Pedagogia – Dourados – MS Docente
Tempo na Função: 4 meses
Tempo de atuação na UEMS:10 anos
Ø Como foi implementada esta política na UEMS? Como foi esta trajetória na
UEMS desta política de Ações Afirmativas ? Como aconteceu este movimento? O
que se lembra?
Quando entrei na UEMS em 2004, eu vim do interior de São Paulo e foi a minha
primeira experiência no ensino superior. Então eu cheguei aqui, foi uma novidade, uma
realidade de uma universidade com cotas para negros e indígenas, uma novidade que
sempre considerei positiva.
Pelo menos na unidade em que eu fui, pelo menos no primeiro ano, eu fui
ministrar uma disciplina numa unidade no curso de Direito. Eu percebia que havia certa
resistência por parte de parte dos acadêmicos, acadêmicos do primeiro ano, eles
questionavam a questão da sua legalidade, questionavam a questão das cotas para
negros e indígenas. Não me recordo se nesta época havia indígenas, mas me recordo que
havia negros. Até algumas situações constrangedoras, questionamentos, da legalidade,
coisas assim...
Coisas que hoje, pelo menos explicitamente eles não ocorrem. Pelo menos não
ocorrem explicitamente.Não sei se por serem alunos do Direito, que traziam este tipo de
discussão.
Uma coisa que você falou que as duas leis foram implantadas em conjunto, na
mesma época. Mas, quando se fala em cotas, as pessoas colocam na mesma sacola,
negros e indígenas, como se não houvesses especificidades. Como se não houvesse
diferenças. Às vezes vejo que isto acontece, nos discursos, principalmente entre aqueles
292
que querem desqualificar as cotas. Pra mim era uma novidade, mas não acho que era
uma novidade só pra mim. Mas também para a IES.
Em 2005 eu vim pra Dourados, comecei a ter mais contato com alunos
indígenas, pois onde estava era uma unidade pequena. Então, e percebo assim, que
embora nós tenhamos esta política há 10 anos na UEMS, eu acho que ainda há carência
de discussões sobre as condições de permanência destes acadêmicos dentro das
universidades.
A lei tem uma força de implementar uma situação, mas não basta somente
colocar eles pra dentro da universidade. E você não estar atento para as diferenças para
que as cotas fossem criadas.
Eu sinto falta como professora, eu estou na condição de coordenadora há seis
meses, mas como professora e como coordenadora de que nós tenhamos mais acesso e
mais respaldo para criar condições de permanência do acadêmico dentro da
universidade.
Aqui em Dourados, por exemplo, nós temos mais contato com 3 etnias, que
estão principalmente aqui, mas também temos outras, por exemplo, temos uma
acadêmica que veio do Amazonas.Então,nós não temos, não digo capacitação, mas algo
assim, que nos aproximasse da realidade dos acadêmicos indígenas.
Porque é aquela ideia da cosmovisão, eles têm uma diferente visão de mundo, e
mesmo aqueles professores, aquelas pessoas, que concordam com as cotas, que querem
que eles permaneçam na universidade, enfim. Muitas vezes a gente sente dificuldades,
sem querer você fere a cultura do outro.
Vou dar um exemplo. Uma vez estava falando na sala de aula sobre o folclore,
enfim, questão relacionada ao folclore e tocou-se no assunto do saci. Para uma aluna
indígena o saci é uma realidade, enquanto que para os alunos não indígenas é algo
alegórico, folclore e não existe. Eu senti assim, depois disso, eu procurei conhecer,
entender, depois que ela veio falar comigo em reservado, não na presença de outros
alunos, que falta agente conhecer um pouco mais sobre a cultura desses acadêmicos,
para que inclusive aproveite esta possibilidade interlocução de culturas.
O que seria para os não-indígenas, por exemplo, isso é lenda, isso não faz parte
do nosso universo, entre os indígenas também as especificidades, suas diferenças e seus
povos.É outra realidade, o professor pode falar: a vocês não acreditam, como assim... o
público é plural, não é homogêneo. Que bom que seja plural e homogêneo.
293
Como a universidade de modo geral, vê e viu a presença do acadêmico indígena,
eu sei/conheço por conversas com professores e em reuniões do colegiado de cursos. Eu
não participei até ano corrente de órgãos colegiados superiores, participo do CEPE a
partir deste ano. Mas, participo do comitê de pesquisa há muitos anos, não me lembro.
Lembrei-me doPIBIC AF70, que podemos considerar como Ação Afirmativa,
que inclusive também demorou, pois tem pouca procura. Porque tem professores com
muita resistência para orientar os alunos indígenas para a pesquisa. Tem muito aquela
ideia de que eu vou levar meus alunos para uma atividade de extensão, porque se for
pesquisa vai ter que produzir um artigo, um relatório, um resumo, seja lá o que for.
Ainda vejo assim que PIBIC AF tem uma procura inferior, tendo em vista ao número de
alunos indígenas presentes na UEMS.
Ø Como a política foi recebida pelos diversos segmentos da universidade?
De modo geral grande parte dos professores percebe com bons olhos esta
política, mas não podemos ignorar que tem os casos de professores que questionam, que
dizem que porque eles estão aqui na UEMS. Principalmente quando temos uma
faculdade intercultural aqui do lado. Porque ele não vai para a faculdade deles, como se
a UEMS fosse de segmentos da sociedade. Mas é claro que a pessoa fala isso em rodas
pequenas, quando muito em reuniões de colegiado. Mas não podemos ignorar que
existem alguns professores que falam isso.
Eu tenho notado assim, mas preciso me certificar disso no SAU71, mas me
parece que tem diminuído o número de indígenas que tem ingressado no nosso curso.
Nós temos alguns exemplos, uma aluna que está devendo somente o TCC, ela
jubila senão entregar. Nós temos egressos indígenas no nosso curso, da região e de
Aquidauana. Também temos alunos que estão no curso, mas estão cumprindo
disciplinas em outras sérias. Costumo dizer que isto acontece também entre os não-
indígenas. Mas me parece para algumas pessoas que fica expressiva quando acontece
entre os indígenas, que ficou, que está pagando dependência, como se costuma dizer.
70 Programa Institucional de Iniciação Científica - nas Ações Afirmativas. 71 Sistema Acadêmico da UEMS.
294
Ø Existem discussões sistemáticas...
Atualmente, nós temos a professora Marina que ela ministra uma disciplina no
primeiro ano, tem um projeto, que está com o apoio de um professor que está sendo
readaptado.Que presta atendimento aos alunos do primeiro ano, não especificamente
com cotista, alunos que são indicados pela professora. Principalmente para a leitura e
interpretação de texto, são momentos apóso horáriode aula, nosso curso é no horário
vespertino, que visa o atendimento individualizado não diria, com pequenos grupos.
Este projeto não está só vinculado ao curso de Pedagogia, mas presente nos cursos onde
esta professora está.
Mas, eu sinto falta, e nós já discutimos isto dentro do curso, de algo, primeiro
que se leve em consideração a necessidade deolhar para a diferença para aquele aluno
que não tem o português como língua materna. Existe um preconceito linguístico. Para
aqueles alunos que não utilizam o plural, não utilizam o artigo. Ele entrou e saiu assim.
E aí temos aqueles questionamentos: o que nos contribuímos para a formação deste
aluno? E não é este elemento.
Mas tem aqueles questionamentos: ele está sendo habilitado pela UEMS vai
poder dar aula na escola urbana. Como nós vamos certificar este aluno?
E uma experiência curta como professora de estágio, mas está sendo válida,
especialmente em relação aos alunos indígenas, porque vivi um preconceito na escola
onde tinha o estágio em relação à aluna indígena. Era uma implicância exagerada,
porque eu tinha outras estagiárias, promovendo até aquém daquela da aluna indígena e
não foi tão criticada. Sempre levamos uma ficha para que o professor da sala preencha
sobre aqueles estagiários. Eu sempre estou presente, já fecho com uma escola só para
que eu possa estar presente sempre. Têm professores que pegam aquela ficha e preenche
com os requisitos máximos. Mas têm outros que são criteriosos e preenchem com
cuidado todos os campos. No caso da aluna indígena a professora sempre colocava,
sempre ampliava alguma “falta”, algum esquecimento. Eu penso assim: a aluna está em
processo de formação, eu não posso esperar que ele chega para dar uma aula como uma
professora.
E no ano seguinte quando eu fui tentar renovar o vínculo com aquela escola para
fazer o estágio uma das coisas que a coordenadora me disse: tivemos uma professora
que se queixou muito da sua estagiária. E aí eu perguntei que queixa era aquela, porque
295
a mim não chegou, porque se fosse uma queixa construtiva teria chegado a mim. Ela
solicitou algumas coisas para a estagiária e ela não fez. E aí eu perguntei qual professora
e ela me disse, então pensei: já sei. Porque se a professora solicita algumas coisas para a
estagiária que estão na cabeça e ela não fez, é porque ela é indígena. Na realidade, se
não fez do jeito que a professora fez, é porque a aluna é indígena.
O trabalho que esta aluna fez, foi um trabalho inédito. Elas estavam fazendo o
período de regência do mês agosto. Esta aluna é terena, e nós trabalhamos as lendas
terenas. As crianças aprenderam cinco lendas inéditas e aprenderam também os nomes
dos animais na língua terena. Ela qualificou aquele projeto de modo diferenciado. Ela
qualificou aquele projeto de folclore. Eu senti que para a escolado que aqueles alunos
traz alguma coisa, um pedaço daqui e dali, mesmo da internet, muitas vezes já foram
desenvolvidas e não fazem parte do nosso meio. E aquele aluno que trabalhou coisas da
sua própria cultura eque levou algo que é do nosso meio.
Eu sinto uma resistência das escolas em receber o estagiário indígena. Um olhar
diferente, será que ele vai dar conta? Esta professora chegou a insinuar isto para mim,
me dizendo assim: esta aluna vai dar conta? Será que ela vai dar aula aqui ou na
comunidade dela. Será que ele vai dar conta? Esta forma já demonstra isso.
Estas situações algumas vezes são trazidas ao curso como discussões que
tangenciam no curso, quando você traz estas questões, por exemplo para as reuniões de
colegiado. Elas não assumidas da forma como deveriam ser, você traz as dificuldades
dos alunos. Quando a gente faz avaliações, por exemplo, da aprendizagem dos alunos,
estas questões aparecem. Elas acontecem às vezes ou no meio e no final do ano. Elas
estão presentes.
Eu ainda sinto falta, que eu já falei, mesmo não sendo coordenadora, do curso
assumir mesmo, ter uma...talvez minha visão seja restrita, principalmente em relação à
língua. Nós temos dois profissionais do curso que são profissionais da área de Letras,
uma que há muito tempo está afastada do curso para se capacitar e quando voltou ela
está na área administrativa. Então todo ano no curso sempre temos um professor
convocado nesta área. E a outro profissional da área de Letras que tem uma disciplina,
mas vamos dizer assim não é o tronco da lotação.
Eu sinto falta, não que eu esteja atribuindo como função do outro, pois este
projeto deveria ser encabeçado por um professor da área de Letras, para se pensar com
as questões da línguado português, mas deve ser abraçado por todo o curso. Todo o
296
curso teria que abraçar. Mesmo que se pese as especificidades, em relação à língua
portuguesa.
De certa forma, eu diria assim, que há assim, não sei se seria esta a palavra, um
conforto como se bom já temos algum projeto. Sinto falta que o curso precisa abraçar
estas questões. Temos professores que têm resistência ao acadêmico indígena e toda vez
que você toca nesta questão ele diz: eu não oriento TCC, não oriento iniciação científica
e eu não sou obrigado.
E você sabe que este professor é do curso, inevitavelmente este aluno vai passar
por aquele professor. Quando se tem disciplina com dois professores e tutores, por
exemplo, no caso do estágio há aquela preocupação: “será que eu vou fazer com este ou
aquele professor”. Se o aluno já chega com esta preocupação, ele tem medo de ser
reprovado. Esta aluna que eu te falei ela fez o estágio mais de uma vez. Curiosamente
também alunos não indígenas também reprovam. Mas será que ela precisou fazer três
vezes? Será que ela teria que fazer três vezes? São coisas que o grupo vê, tem ciência e
enxerga.
Nós não temos medidas permanentemente que amparam estas questões, projeto
longitudinal, que tivesse que avaliar, por exemplo: quais as contribuições. Para
avaliarmos isso, não temos, por ser um Curso de Pedagogia nós deveríamos ter. Nós
deveríamos ter pensado nisso. Nós temos este projeto, mas não é pensado
especificamente.
Ø Avaliando a política?
É difícil dizer, como eu te falo assim, eu acho que muita coisa poderia ser
melhorada, a comunicação dentro da universidade, por exemplo, o Rede nós sabemos
que existe, mas os alunos nãoindígenasnão sabem nem sequer a função. Eu, como
coordenadora, digo que sei parcialmente.
A função de coordenação está sempre em rotatividade, tem pessoas que entram
na universidade e em seis meses ele é coordenador, e nem sempre é porque ele quer.
Fica difícil dizer que o coordenador esteja amparado para orientar o
acadêmicoindígenaem todas as possibilidades e ofertas que a instituição traz.
Nós precisamos viver mais a cultura do indígena dentro da universidade, para
aqueles que tiverem interesse. Eu sei que podem estudar por conta própria. Mas, para
aqueles que tivessem interesse, um ponto de apoio para se buscar.
297
Como eu faço: tudo que chega amim eu divulgo. Talvez chegasse a mim
informação de, por exemplo, abriu vagas para isso e para aquilo. Será que tudo que
chega a mim todas as atividades na extensão? Às vezes os professores não conhecem o
programa. Como há esta rotatividade? Porque a UEMS está crescendo e chegando
muitos professores, sinto falta dessa circulação de informações e de comunicação dentro
da instituição. Nisso somos falhos.
Eu sinto falta de se conhecer mais, de saber mais, porque quando você vai
buscar e entender mais os acadêmicos. Eu não sou conhecedora das etnias de Mato
Grosso do Sul.Eu vim fazer história em Mato Grosso do Sul, o que me colocou um
pouco mais em contato.
Atualmente estou fazendo um curso de Educação Intercultural Indígena, mas são
coisas que eu fui atrás. Porque eu fui atrás? Embora a gente tenha no curso que aborde a
questão indígena, que trazem estas discussões sobre a escola indígena. Nós formamos
dentro do curso de Pedagogia formamos professores que vão atuar em escolas da área
urbana e nas comunidades indígenas.
Nós temos como proposta de formar um profissional com competências
humanas, se você não faz uma interlocução ampla com a realidade local e com as
comunidades indígenas. Porque eu tenho pra mim. Você pega como local de estágio
uma escola urbana de Dourados, mesmo o aluno indígena, ele vai para a escola da
realidade urbana de Dourados, mas eu não acho que ele tem que fazer estágio só lá.
Todos tinham que conhecer a escola indígena e tem algumas coisas que às vezes, por
exemplo, o professor fala: eu avalio pela participação,pelo envolvimento,pelo isso e
pelo aquilo, e pelas provas. Mas de espera aí, como? Se você tem um pouco de
conhecimento sobre a cultura do outro não falar em público, pode ser da cultura dele. É
comum não se jogar quando não está entre os seus.
É comum você ouvir assim: aquele aluno não fala. Mas se você conhecer um
pouco e ver não é assim. Não que eu esteja rotulando, que todo indígena vai falar pouco,
para mim foi uma aprendizagem. Pra mim muito bom ter ido fazer este curso
intercultural, lá só tem indígena. E algumas coisas estou aprendendo:por exemplo, nós
falamos alto, pra eles isto é uma falta de educação, o desrespeito aos mais velhos, não
ficar interrompendo. Quer dizer, conhecendo um pouco o outro nos aproximaria mais.
Mas não pode ficar na dependência de alguns professores que querem fazer isso.
Muitos dizem: o que você está fazendo lá? Por exemplo, se você estivesse fazendo um
curso por exemplo, novas técnicas pedagógicas, as pessoas achariam chique, mas como
298
estou fazendo um curso com o foco na escola intercultural, me perguntam o que estou
fazendo lá. Para pensar a escola indígena.
Eu sinto assim, não estou esperando sentada e acomodada, eu estou correndo
atrás. E eu estou correndo, mas ainda é pouco. Mas não adianta se orgulhar, falar que
tem cotas, falar de números, etc. Que bom que nós temos. Maseu volto a dizer,ainda é
um desafio sabermos o que fazer para garantir a permanência do acadêmico indígena
dentro da universidade.
Nós temos uma acadêmica, por exemplo, ela mora no Panambizinho e quando
chove ela diz que não tem como sair dela. Eu confesso que eu não conheço onde ela
mora, mas eu acredito, porque eu já morei em lugares na cidade de Dourados que
quando chove era difícil de sair de lá, eu penso que é incomparável.
Será que todos os professores estão sensíveis a esta realidade? Ele falta, por
exemplo, no dia da prova, e o professor dize marquei esta prova a dois meses atrás e ela
faltou e ponto. Não quero saber.
Quem conhece um pouco da educação escolar indígena? Já é difícilter um ensino
médio. Pra eles é difícil ter uma escola indígena com ensinomédio.Até eles conseguem
fazer o ensino fundamental. Se eles conseguiram fazer o ensino médio e eles já
venceram uma barreira. As pessoas têm a mentalidade que as escolas estão do lado de
suas casas, deve ser assim pra todo mundo e não é assim.
Eu vejo que há resistências, não nego que há resistências dentro do nosso corpo
docente. Inclusive as pessoas falam isso. Nesta semana mesmo recebi duas alunas pra
falar de uma aluna indígena que está se sentindo excluída dentro da sala de aula, e é
uma questão que será discutida na reunião de colegiado amanhã, pra ver qual será o
encaminhamento e o que nós vamos conversar e fazer com a turma. Me preocupa
bastante, é uma aluna que a gente acompanha pelos corredores, uma hora e outra por
conversas, pelas redes sociais, onde ela posta mensagens depressivas e eu me preocupo
bastante. Ela está matriculada no terceiro e cumprindo disciplinas do segundo, do
primeiro ano. Eu me preocupo e, às vezes, eu não sei se a palavra é, me culpo. Mas acho
que ainda a gente faz pouco.Teria que fazer mais.
Falta conhecer experiências de outras universidades, conhecer o que deu certo,
conhecer não para copiar, mas conhecer...as propostas de outros cursos, o que eles estão
fazendo. Porqueassim como coordenadores, que a PROE chama, aqui as reuniões
ocorrem duas reuniões por ano e é muito pouco. Gostaria de saber o que está
funcionando no outro curso, eu não me negoa fazer, muito pelo contrário, estou em
299
busca de propostas e de novas ideias. Não porque somos da Pedagogia, nós não
sabemos de tudo e temos as respostas.
Sinto falta de sentar, de conversar. Por exemplo, aqui no nosso curso estamos
pensando assim, porque se você tem pelo menos entre os coordenadores mais sensíveis,
é triste seo coordenador, ou professor que coloca obstáculos, que é assim, enfim...
Acho que há coordenadores com vontade, não necessariamente o que pode
funcionar com um curso poderá funcionar com outro,eu sinto necessidade... mas com
dificuldades de saber o que fazer.Por exemplo, agora, como eu vou sensibilizar esta
turma? Na qual esta acadêmica está cumprindo estas disciplinas e ela não está sendo
bem aceita. Por exemplo: um professor pede um trabalho...
Como nós vamos sensibilizar estes alunos? Se ele faz esta diferença, amanhã
aqui ele fará isso dando aulas, porque temos crianças indígenas nas escolas urbanas de
Dourados.
Eu penso, por exemplo: a aluna,professor, pede um trabalho em grupo e a aluna
sempre sobra sempre. Não adianta fecharmos os olhos, está acontecendo uma
segregação. Mas, se a aluna pede pra fazer sozinha e o professor permite que ela faça, é
a naturalização da segregação, porque resolve o problema e o que estáde pano de fundo?
E a questão de base a ser discutida? Que é a presença desta pessoa que não se
sentecomo parte? Não se sente pertencente? Como isto está acontecendo em outros
cursos? É uma situação delicada. O que será que está acontecendo nos outros cursos?
Eu não sei, mas, emboraeu não tenha respostas, mas acho que não é de todo
ruim, mas significa que eu esteja pensando sobre esta questão. Mas eu não tenho
respostas a estas questões.
Porque mexe com a subjetividade do outro, o outro que se nega ao
envolvimento. Mas, quando nós estamos falando do professor, acho mais delicado
ainda, porque ele é um profissional. Em que pese se ele concorda ou não com a política
de cotas, a política de cotas está aí, ele é profissional com todos e elenão escolhe a quem
ele vai dar aulas, tem que ser professor e de todos.
Embora tudo me choca, quando a aluna se sente excluída pelos colegas, me
choca mais ainda quando o professor faz isso, me choca mais ainda, porque ele não tem
este direito, ele está ferindo duplamente a questão, porque naquele momento é
profissional, e o profissional não escolhe a quem ele vai dar aula, não pode fazer
diferença entre um aluno ou outro. São coisas muito complicadas e complexas, há que
se pensar caminhos.
300
Entrevista 11 – CC
Dados de identificação
Nome (iniciais): A.M.B
Idade: 51
Função: Coordenador do curso de Direito – Unidade de Dourados /UEMS e
Docente
Tempo na Função: 3 anos
Formação: Pedagogia Direito/ Mestrado/ Doutorado
Tempo de atuação na UEMS: desde de 1997
O processo das cotas na UEMS, estou aqui desde 1997, foi uma integralização
de uma lei, houve uma discussão aqui na UEMS para a implementar esta lei com os
órgãos colegiados superiores e os professores foram dar a sua opinião.
Na minha fala eu disse que seria a favor da cota, mas não do jeito que estava
sendo proposto, eu tive um debate com a Maju, eu falava que a cota tinha que ser para
as crianças, dar cotas para as escolas, se fizesse um processo seletivo nas escolas de
primeiro grau e colocasse esses alunos nas melhores escolas, Bandeirantes, Imaculada
ou Salesiano. Ao invés de dar cotas para 4 anos eu daria a cota para 8 anos, estes alunos
entrariam para a universidade pela porta da frente. Começar o edifício da educação pelo
telhado. E aí tá ai o problema
Estão aí tapando o sol com a peneira, não do negro, pois o negro vem de boa
formação, de nível socioeconômico bom, classe média. Não é o hipossuficiente. Eu tive
duas alunas, irmãs gêmeas, as duas fizeram vestibular normalmente, e uma passou e a
outra não passou, então aquela que não passou entrou com uma liminar para entrar pela
cota.E uma entrou com uma liminar, e estudou na UEMS e até agora este processo não
foi julgado. Estas alunas são de classe social boa, abastada, têm carro, 3 ou 4 carros.
Outros são professorese tenho alunos negros de classe média, um doutor, vem
de carro para a universidade. E do negro, o problema é um indígena que não tem
formação adequada no ensino médio, temos que montar todo uma estrutura, aqui nós
temos uma forma de aprovação continuada. Não se fala, mas é uma realidade.
301
Só que existe uma coisa que é um gargalo, que é mortal, que é o exame da
OAB72 e nenhum indígena não passou até agora. Creio que já se formaram entre dez e
quinze alunos. Alguns a gente incentiva dando bolsas em cursinhos para a prova da
OAB, dando livros e incentivando. Pra mim vai ser um troféu se um indígena passar na
OAB.
Como foi recebida, foi recebida “goela abaixo”, veio de cima pra baixo, os
professores neste nível aqui não discutem estas coisas. A partir do momento que foi
implantado a norma, a gente tem feito o que foi possível, se você vê no curso as evasões
ocorrem mais tarde.
Aqui no curso ingressa mais Kaiowá, porque aqui tem mais Kaiowá, tem
terenas, os Kaiowá desistem menos, mas deve ver a proporção da população no local.
Paradizer se entra mais este ou aquele.
Ø Recursos financeiros
Tem apoio financeiro através de bolsas, por exemplo a Fundação Ford, por
exemplo para ingressar nos programas de doutorado e mestrado, se for pesquisar isso
tem todo apoio. Sem este apoio até certo ponto, não entrava.
Principalmente para pesquisa, por exemplo, aqui temos dois professores loiros e
de olhos azuis que pesquisam índios. Como assim? Não sei. Por exemplo, existe uma
possibilidade de criar umaUnidade de Apoio Jurídicono Cachoeirinha, não terá
dificuldades, se fazer um projeto para um Núcleo aqui na UEMS, sem problemas.
Mas se for na Aldeia, dentro da comunidade indígena, com uma doação de um
espaço doado pela União, fizemos esta visita e entreguei aqui na UEMS e até agora
nada, é um apoio “intracorpore”, na polícia a gente chama de Operação H, conversa
fiada, que não tem efetividade que não leva a nada. Por exemplo, o curso de
Enfermagem não tem um posto de saúde para fazer estágio lá na aldeia, o curso de
Direito não tem um Núcleo Jurídico para fazer o atendimento ao índio.
Todo mundo quer pesquisar índio, mas, efetivamente fazer algo pelo índio
ninguém quer. Todo mundo ganhando em cima do coitado do índio. Fazendo uma
analogia, isto é uma porífera, na linguagem da biologia, um corpo que é oco e em volta
tem os nutrientes e todo mundo sugando.O índio tá lá abandonado e vai continuar
72 Ordem dos Advogados do Brasil.
302
abandonado, é só conversa. Pelo discurso que se tem nós deveríamos ter índios numa
outra realidade.
Esta conversa é antiga, por exemplo, os primeiros doutorados e pesquisas, por
exemplo, na UCDB os primeiros programas se referiam a indígenas, e os indígenas
continuam com a mesma realidade e os pesquisadores ascenderam socialmente. Ao
nível de curso que ações/atividades afirmativas são desenvolvidas? Existem discussões
sistemáticas ou ações programadas no curso acerca desses temas?
O curso tem feito a aprovação continuada, isto não é discutido. Não temos no
curso o acompanhamento dos alunos. Mas a coisa é de forma informal, vou orientando
os professores de como auxiliar os alunos indígenas. E aí vai se fazendo.
No Núcleo Jurídico, por exemplo, nas ações trabalhistas, nós temos atendido, a
OAB não queria, não queria permitir, mas temos atendido. Fizemos um convênio com a
Procuradoria Jurídica e estamos atendendo. Porque na verdade nós temos que incluir os
pobres. Este é um diferencial. Pois se analisarmos mesmo não existem índios, se
analisarmos friamente, pobres que moram na periferia da cidade. Tem muitos indígenas
que sonham em sair da aldeia, ter um carro e uma casa na cidade de Dourados. Quando
eles podem, tenho uma aluna que mora no Cachoeirinha, é um bairro.
O indígena daqui – que é a maior aldeia urbana do Estado – é totalmente
diferente dos índios, por exemplo, do pirakua, de Antonio João, Limão Verde, são
situações completamente diferentes. Ainda ocultando os problemas da migração dos
índios do Paraguai, porque aqui tem assistência, estamos recebendo problemas de outras
nacionalidades, ninguém fala, aFUNAI e o governo não se manifestam. Porque está
dobrando o número de indígenas nesta aldeia? Fala-se muito dos haitianos, mas não se
fala dos paraguaios.
Como delegado da polícia também atendi muito índio. Nenhum ponto vai
resolver todo este problema. Porque esta política veio de cima pra baixo.Isto faz parte
do desmantelamento da universidade pública. O que mantém a universidade em pé: a
sua gratuidade e a sua excelência na formação.
A gratuidade vem sendo feita pelo financiamento das IES privadas, de alguma
forma a população está pagando e estudando. A excelência através de vários
mecanismos, facilitando os alunos que não têm boa formação, dessa forma prejudicando
a qualidade. Assim como as atividades de extensão, pesquisa e ensino que o professor
não em dado conta de atender nenhuma com qualidade. Isto não aparece nas pesquisas.
Pois temos que fazer o discurso que está dando certo.
303
Ø Quais seriam os caminhos?
Creio que não há caminhos, é um beco sem saída. O caminho é privatizar, levar
para as universidades privadas darem conta disso e teriam que pagar, porque se pagar
eles fazem. É o modelo neoliberal. Quero implantar o apadrinhamento para cada aluno,
cada professor acompanhará este aluno.
Este negócio de reuniões demais nós evitamos, porque os professores devem
estar preparados para dar aulas. Tenho que fazer o professor preparar bem a aula e
passar conteúdo para o aluno. O que faz o aluno estar preparado para o mercado de
trabalho, ele fazendo, ele aprende criticar. Evitar disciplinas inúteis, que mais
atrapalham que ajudam.
Tem, por exemplo, um posto de atendimento, centro de atendimento caiuas, eles
têm estagiado lá. Fora isso, tem um indígena, que tem cara de índio, mas não é índio,
que mora na cidade, que entra na cota e faz estágio em outros locais. Tenho uma aluna
que me causa o maior problema e ela mora na cidade, não se comporta como índia, mas
quando encontra dificuldades ela quer ser índia.
Com relação à bolsa, aquela velha situação, se for dar400 reais é insuficiente, se
der 800 será insuficiente, se der 1.400 será insuficiente. A bolsa deve estar vinculada a
alguma atividade ou estágio, é trabalho, ele assina matrícula. Se vai cursar Enfermagem,
ele deve dar assistência lá na aldeia no posto de Enfermagem, por exemplo, pois o aluno
é pobre.E o aluno que veio, por exemplo, de Aral Moreira, que mora numa pocilga,
precisa da bolsa para sobreviver.
O que leva à evasão é um conjunto de fatores: ele não tem formação básica, não
teve acesso ao jornal, à televisão, à internet, o pai e a mãe são analfabetos, então ele não
tem ambiente. Eu tenho que inserir este cara aqui e dar uma bolsa, para ele trabalhar na
sua área específica, mas não é o suficiente. Deve ter uma casa, uma república. Este seria
o esqueleto, o que manteria ele na universidade, para dar condições para ele se manter
na universidade.
Os salesianos já faziam isso, porque pegaram eles na aldeia, colocavam para
estudar e formaram doutores. Portanto, não estamos inventando a roda. Foi assim que
eles conseguiram, nós também podemos.
304
Ø Como você avalia a política de Ações Afirmativas ?
Primeiro não tem política, e sim politicagem, política é uma coisa mais séria.
Como é uma politicagem é um tiro no pé. O resultado é a universidade mancando. Por
exemplo, eu tenho uma porcentagem na prova da OAB de alunos que não fazem, não
passam. Dos doze alunos indígenas que fizeram não passaram.
Vai ter fazer a cota no serviço público? Cotas para promoção no serviço
público? Isto é uma política neoliberal! Todo mundo diz amém, pra não contrariar? Para
manter seus cargos? Tem uma política dentro da FUNAI que diz não se pode contatar
com os índios sem contato.As pessoas não dizem nada, pra manter seus cargos, seus
empregos.
Devemos tratar todo mundo igual? Procurar fazer que a lei seja para todos.
Porque os índios devem ser tratados diferentes? Porque o índio deve ter cota? Deve
tratar a causa do problema, que é a qualidade da escola fundamental e média. Devemos
resolver o problema. Vamos fortalecer a escola fundamental.
Esta é uma política neoliberal de rachar o país e dividir as pessoas. Não tem uma
unidade. Não tem meta. Politicagem para ocultar os problemas reais, as pesquisas não
são para mostrar isso, porque se eu mostrar isso eu não entro nos programas, por
exemplo, de doutorado que exigem recursos.
305
Entrevista 12 - MCAAC 2
Dados de identificação
Nome (iniciais) M. B.S
Idade: 58
Função: Chefe de Departamento DID, Membro da Comissão de
Acompanhamento de alunos cotistas
Tempo na Função: 4 anos
Formação: Pedagogia
Tempo de atuação na UEMS: desde de 2001
Eu entrei no normal superior, aqui na DID, eu entrei outubro de 2011, só tem
esses três anos que eu estou aqui.
A função da Divisão de Inclusão e Diversidade (DID) é assessorar, acompanhar
e avaliar, eu repito isso é porque ela não é um órgão executor, ela não tem estrutura para
ser executor. Ela acabou colocando, na verdade a história da DID eu não sei se você
conhece, eu posso mandar um histórico pra você, a história da DID não é a DID, a
história da DID é o Núcleo de Educação Especial (NER), uma assessoria de educação
especial e aí modéstia nenhuma a parte, pioneira a ideia porque naquela época em que a
Amélia era a assessora ainda não se falava de atendimento educacional (AE), nem se
usava essa expressão, e não se falava em um núcleo de atendimento, tinham algumas
conversas aqui e ali e aí a UEMS fez, o núcleo acabou se transformando em uma
assessoria que a Amélia coordenava, mas da educação especial, para atender as pessoas
naquela época portadores de necessidades especiais.
Com as mudanças e uma concepção de gestão com a qual eu não concordo,
colocar todo mundo misturado, aí tinha a educação especial e o NER era específico para
a questão étnica racial, negros e pardos, aqui a gente usa pretos, é porque hoje eu estava
na federal e eles usam negros e pardos porque o IBGE usa, daí uns estavam repetindo,
eu tenho que olhar isso na comissão, sempre tem que olhar.
Essa expressão pretos para gente não é equivocada, é certa na UEMS, nos
documentos da UEMS. E esse núcleo não existe mais, quem gerenciava era a Lurdinha,
ela era professora só lá em Campo Grande e me parece, pelo o que eu entendi, que não
306
foi exatamente extinto esse núcleo da estrutura, pelo o que eu sei a Maju tem reformado
porque ela já tem um grupo financiado pelo MEC, sei lá, então vai retomar esse núcleo
que é um grupo que vai fazer acompanhamento dos cotistas negros e etc.
E as cotas para indígenas ficava misturado, nunca teve um programa
especializado porque o Rede é um programa de extensão que pode acabar a qualquer
hora, um projeto dos professores, inclusive a Bia enfatiza essa questão, eu acho pouco
provável que o Rede vá acabar, até porque tem muitas universidades envolvidas no
Rede, já consolidadas tudo mais.
Quando eu entrei em 2001 tinha Aquidauana e nós (Dourados), porque era o
grupo de alunos indígenas e eu sei porque dava aulas pra eles lá em Aquidauana,
funcionava só lá. Foi por conta Normal superior indígena. Não nasceu só para ser
indígena, mas acabou sendo só para isso.
Ø Como foi recebida a política de cotas?
Olha eu cheguei e já estava estabelecida a cota em 2001, não vi nenhum
movimento, eu não participava desse movimento, eu era só docente do Normal
Superior, eu não tinha envolvimento com gestão, coordenação, erarecém-chegada.
A primeira turma havia chegado, o primeiro vestibular se eu não me engano foi
em 2004. Não participei, só participei agora como divisão porque a divisão, por uma
série de exigências, ela acaba pertencendo à função de cotas pela própria nomeação de
acompanhar as políticas afirmativas dentro da universidade, vamos dizer assim, as
ações.
Eu faço parte da comissão que acompanha os cotistas mais para os negros e
indígenas. A comissão de acompanhamento é feita pela DID pela Maju, na verdade pelo
movimento étnico racial, agora para ser bem sincera essa comissão ela trata da situação
do negro só, não deveria, teria que ter outra na minha opinião que tratasse dessa
questão. Mas porque essa comissão existe e a do indígena não? Porque a questão do
negro passa pelo fenótipo que é a avaliação e a do indígena não, porque ele tem a
documentação da FUNAI. Porém o papel da DID em uma estrutura qualquer deveria ter
que é previsto que nem tem para deficiente, deveria ter um acompanhamento emonitorar
os alunos e é isso que eu tento fazer na divisão.
Esse acompanhamento deveria ser de uma forma que não está sendo feito, o
único contato que eu tive com os alunos indígenas porque a gente tem um contato com a
307
FUNAI para garantir o transporte diário, ou seja, o passe de ônibus e nesse processo tá,
eu tive como o termo na FUNAI para a garantia desse auxílio passa parava verificação
se ele teve um número x de DP73, se ele faltou ou não. Então eu selecionei porque eu
estou sozinha nessa divisão, estou sozinha faz dois anos nessa divisão, isso não existe.
Ontem mesmo eu comentei isso, a federal tem na estrutura dela duas psicólogas,duas
psicopedagogas, mas aDID? Quem é psicólogo, doutora e especialista na área e com o
curso de psicologia (na esquina) para acompanhar os alunos então ela tem um
monitoramento bem bom, ela sabe cada aluno indígena e nem é o foco dela porque ela
não é da educação especial mas para o indígena e o negro ela pegou nota por nota dos
meninos, ela sabe.
Então o que eu fiz aqui? Sentei com cada um e selecionei quem não tem DP eu
eliminei, não vou pegar, quem não reprovou não vou pegar e sentei cada um aqui só de
Dourados porque não dei conta disso em outros lugares, só aqui em Dourados. E
perguntei: por que você faltou? Fiz alguns combinados mas eu não tenho pernas para
cobrar ou auxiliar no combinado, por exemplo, em alguns eu falava: olha você vai
participar no grupo de estudo e um mês depois eu perguntava: e aí, você entrou no
grupo de estudo? Ele respondia: entrei professora. Mas daí é verificar isso, esse
nivelamento não há condições, o bom dessa situação com os alunos indígenas é que eu
pude conversar com eles, eu acho que esse papo com os alunos é extremamente
importante, mas tem que ter gente pra isso, um plano de trabalho, não pode ser uma
coisa assim: se der eu faço.
O aluno cotista ou qualquer aluno ou, sobretudo esses, porque não vamos ser
hipócritas que existe uma diferença cultural, alunos que vem da aldeia pro município e
ficam sozinhos aqui, enfim, uma série de diferencial que requer esse acompanhamento
para que o aluno não repita de ano entre outras coisas. E foi bom também, porque eu
observei que os alunos começam a acumular um monte de DP e isso eu cheguei a
comentar internamente aqui na DID, ele pega um ano e faz quinze disciplinas, é o
caminho inverso do que tem que ser. Se eu tenho condições de fazer oito disciplinas por
ano se espera que eu seja capaz disso, mas, por uma série de barreiras que eu tenho
passar eu acabo fazendo seis.
Nessa discussão sobre a educação especial a questão que a gente tem que
discutir é que a permanência desses alunos aqui não é só uma questão financeira, é
currículo, mexer em currículo, o que é mexer em currículo? E olha que a gente já está
73 Dependências.
308
na periferia de mexer em currículo, agora como é que deixa um aluno indígena que tem
todas as dificuldades da barreira linguística e tudo mais, do ensino médio que a gente
tem que mexer no ensino médio se não vai ser uma loucura, e a gente também tem que
fazer nossa parte e o cara fazendo quinze disciplinas por ano? E nessa entrevista eu
falei: filho, você vai reprovar de novo, que tal a gente diminuir isso? Mas isso eu fiz, a
gente tem que ter um aconselhamento dentro do curso, quem tem que chegar e falar:
olha você quer fazer a faculdade em cinco anos? Olha, sinto muito, mas não vai dar.
Tem vários entraves, mas o fato é que esse aluno indígena de 2014 não vai fazer em
seis, vai fazer em oito, se não vai acumular DP, quinze matérias? Ele não dá conta nem
de decorar o nome do professor dele, não dá.
Então nessa trajetória que a DID faz e tem que fazer é esse acompanhamento
com o indígena, deveria ter uma comissão própria de acompanhamento, multidisciplinar
da área da assistência, para assessorar e fazer essas discussões. Não é uma coisa
formalizada, por exemplo.
Eu fiz uma entrevista com diversos alunos, detectei algumas dificuldades, mas
eles têm outra perspectiva, fazem acompanhamento burocrático, dão bolsa, tudo mais, é
lógico que a assistência social em alguns casos conversa. A Miriam, que é a única
assistente social, ela também atende os alunos, trava alguns diálogos, sabe de algumas
coisas, mas isso acaba sendo não sistemático e muito mais do perfil do profissional que
está sentado aqui na mesa e dela lá do que como uma ação que tem que ser
desenvolvida, uma ação que eu te falei que acontece na lá federal, em alguns aspectos,
eles foram lá e fizeram mesmo. Agora eles têm estrutura para fazer isso, mas também
não precisa disso tudo, eu acho que esse acompanhamento dá e que aos poucos e é por
isso que eu acho que isso deveria ser assessoria porque essa coisa que tem assumida lá
na ponta, lá na coordenação quem conhece o aluno é o coordenador, ele sabe até o
fulano que assim é etc., é mas o sicrano mora lá naquela aldeia que é um problema.
Não sei como funciona com a psicóloga. A princípio dentro do que está proposto
você encaminha para que ela faça a terapia, tem um caso que eu acho que eu vou
encaminhar porque o problema daqui do grupo, aqui do grupo psicológico, porque eu
sou uma psicóloga, e além do mais eu não sei, eu não sei a universidade quer discutir
atendimento psicológico dentro da universidade. Se tivesse por exemplo, eu trabalhei
muitos anos em uma faculdade no curso de Psicologia, fui tutora de um curso de
Psicologia. Psicologia tem que ser feita lá na clínica, que é mais adequado, tem uma sala
ali, igual essa aqui, na questão acústica e tudo mais. Eu acho quepsicologia dentro da
309
faculdade tem que ser psicologia institucional, que tem uma outra forma de atuação,
mas isso aí quem sou eu?
Como está instituído atende só os alunos de Dourados, é uma ação pra atender a
todos.
Eu acho que ter a cotas, bom elas existem. E as cotas já são de entendimento
comum que dá um vasto acesso, aí a gente volta para a questão das bolsas, por exemplo,
esse convênio que a gente tem com a FUNAI, eu fiquei em uma reunião de três horas, e
até agora eu não consegui viabilizar esse?Na sua plenitude, pagou os meses só os alunos
de Dourados, nós temos alunos aqui de Aquidauana indígena que eu falei aqui na
reunião, são os alunos que mais carecem desse apoio.
Porque eles pagam do próprio bolso. Lá tem o campus e a prefeitura deu o
diesel e eles tinham o ônibus e eles pagavam cento e pouco por mês que pra eles é
diferente e em Amambai a prefeitura paga e coisa que semana passada eu tentei
telefonar e isso vai ser um problemão, dois irmãos de Buriti a prefeitura bancava esses
ônibus e segundo a informação que me passaram, que não é certa ainda, a prefeitura
deixou de pagar, mas o líder indígena lá ele tem bom trânsito, tem meu número, me liga
a qualquer hora.
Tem que ter esse acompanhamento, essa assistência que é essencial, tem que
alguém acompanhando do ponto de vista pedagógico para mexer em currículo, chegar
pro coordenador e falar: o cara está fazendo quinze, não vai dar conta.
Então quer dizer, um olhar multiprofissional, agora, a universidade tem isso,
mas precisa de mais bolsa, precisa desse olhar, precisa monitorar esse aluno, saber, por
exemplo, a questão da FUNAI como eu disse me deu oportunidade por conta dessas
reuniões, quem vai e quem fica, eu chegava pro aluno e falava: para saber essas
questões das disciplinas, por que você falou justamente quando você ia receber o
dinheiro da FUNAI? Agora explica aqui pra FUNAI. E agora, amigo, o que eu vou
dizer? Olha, amigo, a próxima vez eu não vou poder dar o seu nome, olho o histórico
dos meninos aqui que receberam e etc. Mas esse acompanhamento sendo ele pouco ou
muito pessoal tem que acontecer e ele não acontece.
Nós temos alunos que, por conta desse convênio, temos alunos de Manaus, e é
ótimo, então por conta do convênio financeiro, essas meninas de Manaus me procuram,
pedem ajuda, elas conseguiram, a FUNAI bancou a passagem delas de ida e volta, a
menina lá de glória de Dourados que manda e-mail perguntando como está e etc. e por
310
conta desse intercâmbio eu fiz banca por acaso de uma menina negra que ela ia pra lá,
17 anos, São Luís do Maranhão que não conhece nada.
A professora falou: socorre essa aluna minha,17 anos, perdida, não tem onde
morar.Eu falei: pode deixar. Daí no final deu que elas moraram juntas. Então além desse
acompanhamento burocrático, nota e etc., tem esse acompanhamento nas reuniões, essa
aproximação do aluno.
A DID com a PROEC74 ela tem se aproximado mais, deveria ser mais, por isso
que eu acho que DID é acessória pra mim, ela está no lugar errado inclusive, ela não
deveria estar na Pró-Reitoria de Extensão. No encontro de ontem ficou isso meio
colocado entre as universidades, todo mundo tem a impressão que está no lugar errado,
que os setores das universidades, eles é, por exemplo, embora as federais tenham, a
divisão das Ações Afirmativas fica com tudo, é a mesma coisa aqui, a diferença deles é
que eles têm uma sala que é o núcleo de acessibilidade, a federal aqui, a UFGD, tem
essa sala de acessibilidade e o (NEAB75 no negro e como tem um grupo de pesquisa
forte do grupo indígena, está separado.
Agora tem até, bom, não sei, eu desconheço, tenho até que fazer uma visita, eu
desconheço se tem um grupo por exemplo uma DID para a questão indígena também.
Na educação especial não tem porque, é o núcleo que faz essa política, não tem uma
divisão porque eles têm um núcleo, então nós chegamos à conclusão lá, todo mundo,
inclusive das particulares, que essa divisão ela teria que ter, teria que estar em outro
lugar na gestão e que ela articule e essa foi minha fala lá, que ela articule essas políticas,
que essas políticas sejam incorporadas por cada Pró-Reitoria né.
A PROEC tem muito relacionamento com a lei que a gente troca com os alunos
das cotas na hora da banca, tudo mais, e muito no acompanhamento do aluno com
deficiência porque o aluno com deficiência tem uma especificidade que exige
acompanhamento, providências específicas, como provas diferenciadas, materiais
diferentes, diferente do aluno indígena e negro, talvez uma capacitação para ele lidar
com a questão linguística e isso deveria ser feito, uma orientação do professor. Então a
fala nas outras universidades é essa, a minha ideia, eu penso em resgatar, e essa vai ser
minha proposta para a próxima gestão, resgatar, não como foi no primeiro momento,
mas que isso seja uma assessoria, que a ideia seja exatamente essa, assessorar todo
mundo, eu não posso, ir em um lugar para me chamarem para ver piso, piso de
74 Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitário. 75 Núcleo de estudos Afro-Brasileiros.
311
acessibilidade, eu sou professora, eu não entendo nada da rua. Aí é que tá, se por um
lado você tem esse setores de política por outro lado você também divididos recursos,
eu já trabalhei na Secretaria de Educação, justamente quando fizeram essa bobagem e aí
você acaba não atendendo ninguém, né, e justamente essa coisa de você acabar
segregando fazendo uma universidade para segmentos, da visibilidade eu posso até
contestar filosoficamente a existência da universidade para indígenas, para surdos, para
negros – como a zumbi que nós temos aqui – mas dá visibilidade, concentra, Há a
contradição da coisa. Não tem recursos, tem recursos como qualquer setor da PROEC
recursos para DID, diárias e tudo mais. Para a questão indígena que é o seu foco nós
temos a PVUI, não sei se você teve a oportunidade de entrevistar o pessoal de lá, eles
têm uma equipe de umas quatro pessoas para acompanhar isso, eles têm uma estrada já
com essa questão indígena, nesses dois anos nós fizemos reuniões com eles para saber
como que evitar trocar, passaram informações pra nós e nós pra eles, vê a questão, e eu
fui à assistência, o pró-reitor fomos lá juntos pra conversar pra ver quem faz a gerência
do PVUI, que é a bolsado nosso aluno indígena o que tem de específico além do Rede,
apenas que tem o programa, está lá atendendo os alunos com os computadores, a
professora B.L. vira e mexe está conversando com a gente também mas eles não, não
posso dizer oRede faz parte da minha gestão em específico, lógico a professora é daqui,
a universidade autorizou que ela participasse com instalação aqui, mas não é
institucional. O que é institucional pro aluno é a bolsa, gestada por nós aqui, que acaba
abrigando os alunos indígenas aqui também, alimentação, moradia e aquela coisa toda,
tem agora as políticas PIBICAF que tem poucos alunos indígenas, eu não tenho os
números agora.
Não seria desinteresse, por exemplo, eu vou dizer a minha impressão porque eu
não fiz nenhuma levantamento, nenhuma sistemática, a bolsa alimentação, o valor é
muito baixo e o, por exemplo, o PIBID é mais alto, é federal e ai teve até uma aluna,
nesses atendimentos que eu fiz com os indígenas, ela tinha essa bolsa alimentação,
menina ótima essa, fazia Pedagogia, e até o C. ficou sabendo que tinha umas bolsas lá
na federal e eu disse corre, porque é quase o dobro, ele entrou no projeto e de vez em
quando eu encontro ela e ela diz: o professora não acontece nada lá, os equipamentos
estão quebrados, até agora eu só fico sentada lendo e eu disse: fica quieta lá, não sai de
lá.
Daí fui lá com ela, acompanhei e era para microfilmar documentos, daí vira e
mexe a máquina quebra, fica lá que você está aprendendo e é dois anos de bolsa. E os
312
alunos, você não pode acumular bolsa, esse auxílio tinha que ter um mecanismo de
rever isso ai, eu lembro da nossa bolsa, a gente, ninguém cortou meu salário e eu ganhei
bolsa, agora por que que não pode sim trabalhar e ter essa bolsa? Esse dinheirinho do
vale aqui, esse pessoal da FUNAI me apertou: ah, mas esse dinheiro faz falta? Porque a
FUNAI e o MEC têm uma briga de quem paga a conta do indígena por conta da
mudança, mas eu acho que enquanto a FUNAI está no comando ela tem que arcar com
as responsabilidades para com o aluno aqui.
Eu não posso dizer se esse dinheiro está ou não fazendo falta pro aluno porque
são muitas variáveis que levam o indígena à evasão, mas com certeza pergunta pra mim
que se você me desse um auxílio de passagem, pagando minha passagem para trabalhar
se esse dinheiro não ia fazer falta. Eles queriam que eu tivesse uma análise para definir
de aqueles cento e poucos reais que o aluno recebe leva a evadir, eu disse: me poupe.
Tem vários alunos que vêm me procurar dizendo:me ajuda.E eu digo: senta aí
mas eu não prometo nada, os alunos não conseguem entender qual o papel da UEMS e
qual o papel da FUNAI, penso eu que eles já compreenderam bastante apesar da
confusão inicial, tem uma comissão que trata do tema da FUNAI, tem uma aluna
envolvida.
Tem uma comissão que mexe só com esse auxílio da FUNAI, existe um termo
de colaboração FUNAI e UEMS que ela bancaria o translado do aluno casa-faculdade.
Faculdade-casa e toda a UEMS, em todas as unidades, mas a FUNAI disse que não
recursos financeiros pra isso. Eles não pagam, eles pagaram a passagem de umas
meninas da Amazônia, de uns daqui, não é algo sistemático, nós estamos em junho e
semana passada eu fui em uma reunião para estudar isso que ouviu de mim aqui, quem
faz uma pergunta dessas quer pagar? Não, né.
Como que eu posso provar que os cento e poucos reais fazem falta pro menino
para ele pagar? Se a FUNAI tem dúvida disso, quem sou eu? Agora a FUNAI até me
ligou e eles vão ver passes com a medianeira, mas o termo é claro, é para todo mundo,
mas eles nunca pagaram. Esse termo é assinado desde 2010, eles nunca pagaram, eles
têm mil e umas ligações que você bem imagina. Eu mando relatórios de pedidos pela
primeira vez e eu disse: vocês querem mesmo que eu faça relatórios?
A primeira vez em uma reunião foi lá em Campo Grande no início de 2012,
sentamos com toda a FUNAI e tiramos o termo da gaveta e colocamos em cima da
mesa, esse foi o movimento e o que eles fizeram? Eles tiveram uma discussão danada
sobre jurisdição porque a questão deles é operacional também, por exemplo: o aluno de
313
Ponta Porã é de quem? Quem vai fazer o serviço? Por quê? Porque existe um
monitoramento pela FUNAI também então eles não querem, está lá, a menina falou,
eles não têm nem pernas para fazer isso.Eu disse: pode deixar que a UEMS faz isso, é
só vocês pagarem. O que fazer? Monitorar os alunos? Acompanhar notas? Ver se ele
ainda é merecedor do benefício? Ponto. Lógico que isso não é o ideal. Os alunos
assinam um acordo de responsabilidade e etc. Inventaram mil e uma, não saiu e o
pessoal aqui de Dourados resolveu em setembro pagar através de auxílio financeiro
direto na conta do menino, aí eles só beneficiaram os alunos deles da jurisdição deles
entendeu? De Dourados.
O que eu consegui é que eles bancassem os alunos de fora do Amazonas e de
Glória para ir e voltar para casa, ano passado foi só ela. Daí como que a FUNAI quer
que eu faça avaliação? Se eu fizer avaliação, a avaliação que eu for fazer é que não foi
cumprido, né, não foi, os alunos não foram beneficiados, somente os de Dourados.
Daí eu quero ver como que a FUNAI vai explicar para Aquidauana porque que
o aluno daqui de Dourados pode e ele não pode, daí eu explico: porque tem uma
burocracia, diga que os alunos de Aquidauana não serão beneficiados porque existem
problemas burocráticos que nós não damos conta de solucionar, em Dourados nós só
solucionamos porque existe uma medianeira que eu faço uma solicitação e etc., e eu
coloquei isso no papel, pouco provável. Então essas ações dentro da universidade,
voltando porque eu acho que esse é o foco, as bolsas eu acho que, na minha opinião,
devem ser ampliadas, 10% a lógica até aonde eu sei é que a população negra e parda era
maior que a indígena, mas eu acho que merece outro número já que é o segundo Estado
com maior população indígena do Brasil, não só 10%, poderíamos rever isso com novos
estudos e segundo aumentar o número de bolsas e solucionar de alguma forma para que
o menino possa ter um trabalho, que ele trabalha tem outro tipo de auxílio, por que que
no caso da pós-graduação esse acúmulo é possível? A gente recebe bolsa de estudo e
continua com o salário, por que não? É uma coisa das universidades, com fóruns
maiores e é nesse esforço político que a DID deveria estar envolvida mais concentrada
do que conversar com o aluno, também a função do assessor nesses assuntos é fomentar
a discussão, fazer como política mesmo, ver as necessidades, fortalecer as políticas de
afirmação, não ficar no“fazer”, a execução é importante? É, mas você fazer essas
discussões aprofundadas para que as coisas tomem um rumo que você possa consolidar,
uma política de vida, você tem que ter debate, você tem conversar, cutucar, provocar e é
isso que o seminário vai fazer.
314
Você não pode dar assistência se não monitorar direito, e é complicado essa
coisa toda e separar o que é assistência e o que não é assistência, monitorar não é ver se
está com nota boa ou não isso não é assistência. Nós somos educação, não somos
assistência, você está vendo a caixinha onde você está? Então essas ações da questão do
aluno indígena servem para o aluno com deficiência, para o aluno negro, talvez menos
por ter outras especificidades.
315
ANEXO 1:
LEI ESTADUAL Nº 2.589 DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002, COTAS PARA INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
LEI Nº 2.589, DE 26 DE DEZEMBRO DE 2002.
Dispõe sobre a reserva de vagas aos
vestibulandos índios na Universidade Estadual
de Mato Grosso do Sul (UEMS).
316
O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte
Lei:
Art. 1º Fica a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS)
obrigada a cotizar vagas destinadas ao ingresso de vestibulandos índios.
Art. 2º A UEMS deverá divulgar, a partir do próximo vestibular, o
número de vagas que serão oferecidas em cada um de seus cursos. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário. Campo Grande, 26 de dezembro de 2002.
JOSÉ ORCÍRIO MIRANDA DOS SANTOS
Governador
317
ANEXO 2:
LEI ESTADUAL Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003, COTAS PARA NEGROS NA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL
LEI Nº 2.605, DE 6 DE JANEIRO DE 2003.
Dispõe sobre a reserva de vagas para
negros nos cursos de graduação da Universidade
318
Estadual de Mato Grosso do Sul, e dá outras
providências.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte
Lei:
Art. 1º A Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul deverá reservar uma
cota mínima de 20% de suas vagas nos cursos de graduação destinada ao ingresso de
alunos negros.
Art. 2º O Poder Executivo, por meio da Universidade Estadual de Mato
Grosso do Sul, regulamentará a matéria no prazo de noventa dias a contar da publicação desta Lei.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário. Campo Grande, 6 de janeiro de 2003.
JOSÉ ORCÍRIO MIRANDA DOS SANTOS
Governador
319
ANEXO 3:
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, DE 17 DE JULHO DE 2003
320
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003.
Dispõe sobre a oferta das vagas em regime de cotas dos cursos de graduação da UEMS.
O CONSELHO UNIVERSITÁRIO da FUNDAÇÃO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso de suas atribuições legais, em reunião ordinária realizada em 17 de julho de 2003 e,
CONSIDERANDO a Lei nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002,
que dispõe sobre a reserva de vagas aos vestibulandos índios na UEMS; CONSIDERANDO a Lei nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003, que
dispõe sobre a reserva de vagas para negros nos cursos de graduação da UEMS,
R E S O L V E Art. 1º As vagas ofertadas para o ingresso aos cursos de
graduação da Fundação Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, pelo processo
de seleção, serão aprovadas e normatizadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão, distribuídas por curso, obedecendo a seguinte proporção:
a) setenta por cento aos aprovados que concorreram de forma
geral;
b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas
ofertadas no regime de cotas para negros;
c) dez por cento aos aprovados que concorreram às vagas
ofertadas no regime de cotas para índios.
Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
publicação, revogadas as disposições em contrário.
Prof.ª LEOCÁDIA AGLAÉ PETRY LEME
321
Presidente COUNI/UEMS
322
ANEXO 4:
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, DE 31 DE JULHO DE 2003
323
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 250, de 31 de julho de 2003.
Altera a redação da alínea “b” do art. 1º da Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003, que dispõe sobre a oferta das vagas em regime de cotas dos cursos de graduação da UEMS.
A PRESIDENTE DO CONSELHO UNIVERSITÁRIO da FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso das atribuições conferidas pelo inciso XV do art. 55 do Regimento Geral,
R E S O L V E “ad referendum”:
Art. 1º Fica alterada a redação da alínea “b” do art. 1º da
Resolução COUNI-UEMS Nº 241, de 17 de julho de 2003, publicada no DO/MS Nº
6051, de 1 de agosto de 2003, p. 21, que dispõe sobre a oferta das vagas em regime
de cotas dos cursos de graduação da UEMS, que passa a vigorar como segue:
“Art. 1º
b) vinte por cento aos aprovados que concorreram às vagas
ofertadas no regime de cotas para negros, oriundos de escolas da rede pública de
ensino ou bolsistas da rede privada de ensino.
Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
publicação, revogadas as disposições em contrário.
Prof.ª LEOCÁDIA AGLAÉ PETRY LEME Presidente COUNI/UEMS
324
ANEXO 5:
RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, DE 30 DE JULHO DE 2004
325
RESOLUÇÃO CEPE-UEMS Nº 430, de 30 de julho de 2004.
Aprova as normas para a realização do processo seletivo de candidatos às vagas nos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
A VICE-PRESIDENTE, EM EXERCÍCIO DA
PRESIDÊNCIA, DO CONSELHO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MATO GROSSO DO SUL, no uso das atribuições legais conferidas pelo art. 55, inciso VIII e inciso XXVI, e,
CONSIDERANDO que a Reunião Extraordinária do Conselho
Pleno convocada para o dia 28 de julho de 2004 não se realizou por falta de quórum; CONSIDERANDO que os assuntos constantes da ordem do dia
caracterizam-se pela urgência de normas para a oferta de cursos e a realização do processo seletivo;
CONSIDERANDO que estas normas referente ao processo
seletivo de candidatos aos cursos pressupõe datas e cronograma de execução cujo cumprimento fora da época comprometem o Calendário Acadêmico do próximo ano;
CONSIDERANDO que os projetos de resoluções foram
publicizados na página da Secretaria dos Órgãos Colegiados e através de correspondência eletrônica à comunidade universitária;
CONSIDERANDO que não foi registrada nenhuma proposta de
emenda para os referidos projetos de resoluções;
R E S O L V E: Art. 1º Ficam aprovadas as normas para a realização do
Processo Seletivo de candidatos às vagas nos cursos de graduação da Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul, conforme anexo que integra esta Resolução.
Art. 2º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 3º Revoga-se a Resolução CEPE-UEMS Nº 382, de 14 de
agosto de 2003, e demais disposições em contrário. Profª ELEUZA FERREIRA DUARTE Vice-Presidente - em exercício da presidência - CEPE/UEMS
326
Anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004 NORMAS PARA REALIZAÇÃO DO PROCESSO SELETIVO DE
CANDIDATOS ÀS VAGAS NOS CURSOS DE GRADUAÇÃO DA UEMS CAPÍTULO I DO PROCESSO SELETIVO
Art. 1º O ingresso aos cursos de graduação, oferecidos pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, será feito mediante Processo Seletivo classificatório, com aproveitamento dos candidatos até o limite de vagas fixado no Edital de Abertura do Processo Seletivo.
Art. 2º O planejamento, a organização e a execução do Processo Seletivo de
candidatos para ingresso aos cursos de graduação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul obedecerão às normas contidas nesta Resolução.
Art. 3º O Processo Seletivo de candidatos será planejado, executado e
coordenado pelo Núcleo de Processo Seletivo da Pró-Reitoria de Ensino da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.
Art. 4º O número de vagas, por curso e turno, a ser oferecido na seleção de
candidatos, será proposto pela Pró-Reitoria de Ensino e aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
Art. 5º A Universidade poderá firmar convênios com instituições que
disponham de agências de atendimento com abrangência nacional para a realização das inscrições.
Art. 6º No manual do candidato constará: I - o programa exigido para a seleção; II - os critérios de classificação dos candidatos; III - as normas para efetivação da matrícula; IV - a ficha de inscrição; V - o formulário socioeconômico.
CAPÍTULO II DAS INSCRIÇÕES
Art. 7º As inscrições serão realizadas nas datas, horários e locais fixados no
Edital de Abertura do Processo Seletivo. § 1º A publicação do edital a que se refere o caput deste artigo deverá ocorrer
com antecedência mínima de 15 (quinze) dias da realização das provas de seleção. § 2º No edital, além dos requisitos necessários à inscrição, constarão: a) locais de inscrição; b) número de vagas ofertadas por curso, turno, Unidade Universitária e a
respectiva distribuição no regime de cotas;
327
(Fls. 02/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) c) especificação das provas, datas, horários e locais de realização; d) critérios de pontuação e classificação dos candidatos; e) período de matrícula para primeira e segunda chamadas. Art. 8º Para a efetivação da inscrição, serão exigidos do candidato: I - fotocópia de documento oficial de identificação com foto (frente e verso); II - comprovante do pagamento da taxa de inscrição ou comprovante de
isenção; III - ficha de inscrição, devidamente preenchida; IV - caso o candidato tenha participado do Exame Nacional do Ensino Médio –
ENEM, nos últimos 3 (três) anos, poderá aproveitar a pontuação do referido exame, desde que não tenha zerado na Prova de Redação, devendo, para tanto, requerer e apresentar no ato da inscrição uma fotocópia do comprovante de participação no referido exame, em que conste o número de sua inscrição e o ano de realização.
§ 1º Os candidatos de nacionalidade estrangeira, sem visto permanente no país,
deverão apresentar fotocópia do passaporte com visto temporário.
§ 2º A isenção que trata o inciso II refere-se somente à taxa de inscrição.
§ 3º Serão considerados documentos oficiais de identificação, conforme o
disposto no inciso I deste artigo, os seguintes documentos:
a) carteiras de identidade expedidas pelos Comandos Militares, pelos
Institutos de Identificação/Secretarias de Segurança Pública;
b) carteiras expedidas pelos órgãos fiscalizadores de exercício profissional
(ordens e conselhos);
c) carteira nacional de habilitação – CNH (somente o modelo aprovado pelo
art. 159 da Lei Nº 9.503, de 23 de setembro de 1997);
d) carteira de trabalho e previdência social – CTPS.
Art. 9º Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 20% (vinte por cento) para negros, além dos incisos I, II, III e IV do art. 8º, serão exigidos:
I - uma foto colorida recente 5x7 cm; II - autodeclaração constante na ficha de inscrição; III - fotocópia do histórico escolar do Ensino Médio ou atestado de matrícula
expedidos por escola da rede pública de ensino; IV - declaração da condição de aluno bolsista fornecida por instituição da rede
privada de ensino, quando for o caso. § 1º Os candidatos inscritos no percentual de vagas para negros terão suas
inscrições avaliadas por uma comissão instituída pela Pró-Reitoria de Ensino da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, composta por representantes da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul e do Movimento Negro, indicados pelo
328
Fórum Permanente de Entidades do Movimento Negro do Mato Grosso do Sul e pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Negro, que as deferirá ou não, por decisão fundamentada, de acordo com o fenótipo do candidato.
§ 2º Os candidatos que tiverem suas inscrições indeferidas concorrerão
(Fls. 03/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)automaticamente nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais.
§ 3º No ato da inscrição, o histórico escolar de origem estrangeira, referente ao
Ensino Médio, deve estar convalidado pelo Conselho Estadual de Educação correspondente.
§ 4º Os candidatos com histórico escolar de origem estrangeira que lograrem
aprovação no processo seletivo deverão, no ato de matrícula, apresentar prova de conclusão de escolaridade do Ensino Médio no Brasil ou declaração de processo de equivalência de estudos realizados no exterior, concedida pelo Conselho Estadual de Educação competente.
Art. 10. Aos candidatos que optarem por concorrer no regime de cotas de 10%
(dez por cento) para indígenas, além dos incisos II, III, e IV do art. 8º, serão exigidos: I - fotocópia da cédula de identidade indígena (frente e verso); II - declaração de descendência indígena e etnia, fornecida pela Fundação
Nacional do Índio – FUNAI, em conjunto com uma Comissão Étnica, constituída em cada comunidade.
Art. 11. Os candidatos que não declararem concorrer, formalmente na ficha de
inscrição, ao regime de cotas para negros ou indígenas, concorrerão automaticamente nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais.
§ 1º Fica vedada a inscrição em mais de um regime de cota. § 2º Em caso de dupla opção, o candidato concorrerá automaticamente nos
70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais. Art. 12. No ato da inscrição, o candidato optará pelo curso, turno, Unidade
Universitária e regime de cotas pretendidos, dentre os constantes do Edital de Abertura do Processo Seletivo, indicando seus códigos e uma língua estrangeira, dentre as ofertadas.
§ 1º Para o atendimento ao disposto neste artigo, serão oferecidos os seguintes
idiomas na prova de língua estrangeira: a) inglês; b) espanhol. § 2º O candidato que não indicar sua opção de língua estrangeira fará
obrigatoriamente a prova de inglês.
329
CAPÍTULO III DAS PROVAS
Art. 13. Os candidatos querealizaram o Exame Nacional do Ensino Médio,
nos últimos 3 (três) anos, poderãoutilizar o resultado obtido, desde que requeiram, (Fls. 04/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)
Preenchendo o campo destinado a esse fim na ficha de inscrição, podendo optar por realizar a primeira prova e/ou aproveitar a pontuação do Exame Nacional do Ensino Médio.
§ 1º A maior pontuação obtida pelo candidato, seja na prova do Exame
Nacional do Ensino Médio (através da soma da nota de redação e dos acertos da
prova de conhecimento gerais) ou o resultado da primeira prova da Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul, terá efeito para contagem de pontos.
§ 2º A informação do número da inscrição do Exame Nacional do Ensino
Médio não desobrigará o candidato a realizar a segunda prova, correspondente ao
curso de sua inscrição
Art. 14. A seleção de candidatos consistirá na realização de 2 (duas) provas com o seguinte formato:
I - a primeira prova constituir-se-á de: a) Redação; b) Prova de Conhecimentos Gerais, composta de 63 (sessenta e três) questões,
divididas em 7 (sete) questões em cada disciplina, abrangendo os conteúdos das seguintes disciplinas:
1. Língua Portuguesa; 2. Literatura Brasileira; 3. Língua Estrangeira (inglês ou espanhol); 4. Matemática; 5. Biologia; 6. Química; 7. Física; 8. Geografia; 9. História. II - a segunda prova constituir-se-á de Conhecimentos Específicos por área: a) Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde para os inscritos nos
cursos de Ciências Biológicas, Enfermagem, Zootecnia e Agronomia, com a seguinte constituição:
1. Biologia - 25 (vinte e cinco) questões; 2. Química - 15 (quinze) questões; 3. Física - 10 (dez) questões. b) Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas para os inscritos nos cursos de
Matemática, Física, Química e Ciência da Computação, com a seguinte constituição: 1. Física - 15 (quinze) questões; 2. Matemática - 20 (vinte) questões;
330
3. Química - 15 (quinze) questões.
c) Área 3 – Ciências Humanas e Sociais para os inscritos nos cursos de
Letras – Habilitação Português/Espanhol, Letras – Habilitação Português/Inglês,
Pedagogia, Direito, Turismo, Administração – Habilitação Comércio Exterior,
Administração – Habilitação Administração Rural, História, Geografia e Ciências
Econômicas, com a
(Fls. 05/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) seguinte constituição:
1. Língua Portuguesa - 20 (vinte) questões; 2. Literatura Brasileira - 10 (dez) questões; 3. História - 10 (dez) questões; 4. Geografia - 10 (dez) questões. Art. 15. As provas serão elaboradas abrangendo os conteúdos do Ensino
Médio. Art. 16. Com exceção da Redação, as questões das provas de seleção de
candidatos serão de múltipla escolha, num total de 5 (cinco) proposições em cada questão.
Art. 17. O candidato à seleção nos cursos de graduação da Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul não poderá ausentar-se da sala onde esteja realizando a prova, antes de completados 60 (sessenta) minutos do início da prova.
Art. 18. Será eliminado do Processo Seletivo dos cursos de graduação da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul o candidato que obtiver índice menor que 20% (vinte por cento) na prova de Conhecimentos Gerais, nota 0 (zero) na Redação ou em qualquer uma das disciplinas constituintes da segunda prova.
Parágrafo único. Será atribuída nota 0 (zero) à prova que o candidato não
realizar. Art. 19. Caberá pedido de reconsideração do gabarito de respostas das provas
do Processo Seletivo, mediante requerimento do interessado protocolizado junto ao Núcleo de Processo Seletivo, devidamente justificado, até o prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após a divulgação do mesmo.
Parágrafo único. O pedido de reconsideração será analisado por uma banca de
revisão designada pelo Núcleo de Processo Seletivo. Art. 20. Em nenhuma hipótese haverá revisão de prova do Processo Seletivo. Art. 21. O processo classificatório será realizado por cotas e constituído pela
soma do resultado obtido pelo candidato nas 2 (duas) provas, obedecendo a seguinte
331
fórmula: PF = Pontuação Final = PP1+PP2
Prova 1 PP1 = NR x PR + NCg x PCg, onde: PP1 Pontos obtidos na Prova 1 (Redação e Conhecimentos Gerais) NR Nota da Redação PR Peso da Redação NCg Número de acertos das questões da Prova de Conhecimentos Gerais PCg Peso da Prova de Conhecimento Gerais
(Fls. 06/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)
Prova 2 PP2 = Sn(NEn x PEn), onde: n Número de provas PP2 Pontos obtidos na Prova 2 (Conhecimentos Específicos) Sn Somatório dos pontos obtidos nas n provas NEn Número de acertos das questões da Prova Específica por disciplina PEn Peso por disciplina da Prova Específica
Art. 22. Para o cálculo da pontuação final será aplicada a seguinte regra:
Tabela 1 DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Redação -- 3,7 Conhecimentos Gerais 63 1
Tabela 2 (Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Biologia 25 3 Química 15 1 Física 10 1
Tabela 3 (Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Física 15 2 Matemática 20 2 Química 15 2
Tabela 4 (Área 3 – Ciências Humanas e Sociais) DISCIPLINAS NÚMERO DE QUESTÕES PESO Língua Portuguesa 20 3 Literatura Brasileira 10 2 Geografia 10 1 História 10 1
§ 1º Para efeito do disposto neste artigo, observar-se-á que:
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a) a Redação será considerada como uma disciplina cuja pontuação será de 0 (zero) a 10 (dez);
b) a pontuação total da prova 1 será obtida através da soma da nota de redação e os acertos correspondentes à prova 1, perfazendo um total máximo de cem pontos;
c) a pontuação total obtida na prova 2 corresponderá a um total máximo de 100 (cem) pontos nas seguintes áreas:
1. Área 1 – Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde: 100 (cem) pontos; 2. Área 2 – Ciências Exatas e Tecnológicas: 100 (cem) pontos; 3. Área 3 – Ciências Humanas e Sociais: 100 (cem) pontos. § 2ºA classificação dos candidatos por curso, turno e regime de cotas far-se-á
(Fls. 07/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)
pela ordem decrescente do total de pontos padronizados pela soma das 2 (duas) provas. § 3º Havendo empate no total de pontos padronizados pela soma das 2 (duas)
provas por 2 (dois) ou mais candidatos a uma mesma vaga, curso, turno e regime de cotas, dar-se-á preferência, pela ordem, ao candidato que:
a) obtiver maior pontuação bruta nas disciplinas das áreas em ordem decrescente de peso;
b) obtiver maior pontuação bruta na Redação; c) obtiver maior pontuação bruta na Prova de Conhecimentos Gerais,
excluindo-se a nota da Redação; d) for o mais idoso. § 4ºNa hipótese de pesos iguais em 2 (duas) ou mais disciplinas, será
considerada, para efeito do que dispõe a alínea a do parágrafo anterior, a média aritmética da pontuação bruta obtida nessas disciplinas.
CAPÍTULO IV DA DIVULGAÇÃO DOS RESULTADOS
Art. 23. O resultado do Processo Seletivo dos cursos de graduação da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul será divulgado pelo Núcleo de Processo Seletivo, por ordem decrescente de pontuação dos classificados, dentro de cada regime de cota, especificando os períodos de matrícula de acordo com o estabelecido no Manual do Candidato.
Art. 24.Observada a ordem de classificação dos candidatos, a Universidade
Estadual de Mato Grosso do Sul reserva-se o direito de fazer tantas convocações quantas julgar necessárias, para o preenchimento das vagas dos cursos oferecidos.
Art. 25. O resultado do Processo Seletivo será válido apenas para o período a
que se refere.
CAPÍTULO V DAS CONVOCAÇÕES PARA MATRÍCULA
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Art. 26. As convocações para efetivação da matrícula dos candidatos
classificados no Processo Seletivo obedecerão ao disposto nesta Resolução e no Edital de Abertura do Processo Seletivo.
§ 1º Os classificados, no limite das vagas por cotas correspondentes, ficarão
automaticamente convocados em primeira chamada para a matrícula, com a publicação dos resultados do Processo Seletivo em data e horário conforme Calendário Acadêmico.
§ 2º Após a matrícula dos classificados em primeira chamada, será feita pela
Divisão de Assuntos Acadêmicos a publicação de uma convocação nominal, dos (Fls. 08/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004) subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas, no limite das vagas ainda existentes.
§ 3º Após as convocações previstas nos §§ 1º e 2º deste artigo, as vagas
oriundas de cancelamento de matrícula, efetuadas no prazo estabelecido em Calendário Acadêmico, serão destinadas às chamadas extraordinárias de subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas.
§ 4º Entende-se por subseqüentes do mesmo curso, turno e regime de cotas, os
candidatos classificados que não tenham ainda sido convocados para a matrícula, na forma deste artigo.
§ 5º Ainda havendo vagas remanescentes dos regimes de cotas proceder-se-á
da seguinte maneira: a) as vagas remanescentes do regime de cotas para negros serão preenchidas
por candidatos das cotas para indígenas, obedecendo à ordem de classificação; b) as vagas remanescentes do regime de cotas para indígenas serão preenchidas
por candidatos da cota de negros, obedecendo à ordem de classificação; c) ainda havendo vagas remanescentes nos regimes de cotas, as mesmas serão
preenchidas pelos classificados nos 70% (setenta por cento) referentes às vagas gerais, obedecendo à ordem de classificação.
§ 6º Não havendo candidato aprovado no regime de cotas, as vagas destinadas
às cotas serão preenchidas conforme o parágrafo anterior, devendo as mesmas ser
publicadas em primeira chamada pelo Núcleo de Processo Seletivo.
§ 7º Havendo vagas remanescentes na oferta geral as mesmas serão
preenchidas por candidatos classificados nos regimes de cotas.
§ 8º Após as convocações previstas neste artigo, se ainda restarem vagas e não houver candidatos subseqüentes serão essas vagas publicadas pela Divisão de Assuntos Acadêmicos, para ingresso de portadores de diploma de curso superior, conforme legislação vigente.
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Art. 27. O candidato convocado para matrícula em qualquer etapa ou chamada
que deixar de efetuá-la no prazo estabelecido perderá o direito à vaga. Art. 28. Esgotadas todas as convocações, as vagas provenientes do
cancelamento de matrículas serão destinadas ao processo de transferência para o ano subseqüente, de acordo com as normas específicas estabelecidas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 29. Os candidatos que não concluírem o Ensino Médio até a data da
(Fls. 09/09 do anexo da RESOLUÇÃO/CEPE-UEMS Nº 430, de 30/7/2004)
matrícula farão o Processo Seletivo a título de experiência, na modalidade de “treineiros”, sem direito à classificação, podendo se inscrever em uma das seguintes áreas: a) Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde, b) Ciências Exatas e Tecnológicas, c) Ciências Humanas e Sociais, recebendo apenas a pontuação final de cada área.
§ 1º O candidato “treineiro”, que não se identificar como tal e for
classificado no curso da área inscrita e que não tiver concluído o Ensino Médio ou
equivalente (conforme inciso II do art. 44 da Lei nº 9394/96) até a data da matrícula,
não terá direito à efetivação da matrícula.
§ 2º O candidato “treineiro” não terá direito à isenção das taxas. Art. 30. Ao candidato portador de necessidades especiais será concedido o
recurso especial de que precisa, desde que requerido em conformidade com o estabelecido no Edital de Abertura do Processo Seletivo e no Manual do Candidato.
Art. 31. Os recursos só poderão ser interpostos nos casos de infringência às
disposições desta norma. § 1º O recurso a que se refere o caput do artigo anterior será interposto perante
o Núcleo de Processo Seletivo, no prazo de 3 (três) dias úteis, contados da data de divulgação dos resultados do Processo Seletivo.
§ 2º Recebido o recurso, será este remetido à decisão do Pró-Reitor de Ensino,
ouvida a Procuradoria Jurídica, acompanhado de parecer do Núcleo de Processo Seletivo.
§ 3º O Pró-Reitor de Ensino deverá decidir a respeito do recurso, no prazo de
dez dias contados da data do protocolo inicial. Art. 32. Independente de outras sanções aplicáveis, será excluído da
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Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, em qualquer época, o candidato classificado e matriculado que tenha realizado o Processo Seletivo usando informações ou documentos falsos ou outros meios ilícitos.
Art. 33. Qualquer irregularidade cometida por pessoa envolvida com o
Processo Seletivo, em qualquer de suas etapas, será objeto de apuração nas esferas pertinentes.
Art. 34. O Manual do Candidato e os Editais referentes ao Processo Seletivo,
constituir-se-ão em normas complementares desta Resolução. Art. 35. Os casos omissos serão resolvidos pela Pró-Reitoria de Ensino, ouvido
o Núcleo de Processo Seletivo.
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ANEXO 6:
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, de 11 de junho de 2014.
RESOLUÇÃO COUNI-UEMS Nº 437, de 11 de junho de 2014.
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Cria o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação, Gênero, Raça e
Etnia - CEPEGRE da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. O CONSELHO UNIVERSITÁRIO da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
MATO GROSSO DO SUL, no uso de suas atribuições legais, em reunião ordinária realizada em 11 de junho de 2014 e,
CONSIDERANDO a Lei Estadual nº 2.589, de 26 de dezembro de 2002, que dispõe sobre aReservadas vagas aos vestibulandos índios na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS);
CONSIDERANDO a Lei Federal nº10.639, de 9 de janeiro de 2003, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”;
CONSIDERANDO a Lei Estadual nº 2.605, de 6 de janeiro de 2003, que dispõe sobrea reserva de vagas para negros nos cursos de graduação da UEMS;
CONSIDERANDO a Lei Federal nº 11.645, de 10 de março de 2008, que altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”;
CONSIDERANDO a Resolução CNE/CP nº 1, de 17 de junho de 2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana;
CONSIDERANDO o Plano Plurianual da União 2012-2015, instituído nos termos da Lei 12.593, de 18 de janeiro de 2012,
R E S O L V E: Art. 1º Criar o Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão em Educação, Gênero,
Raça e Etnia (CEPEGRE), vinculado administrativamente à Reitoria, e didática, técnica e cientificamente às Pró-Reitorias da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).
Art. 2º O CEPEGRE tem como objetivo propor, subsidiar, articular monitorar e avaliar as políticas públicas de Ação Afirmativa na UEMS, ligadas às questões de educação, gênero e sexualidade, raça e etnia, com foco no processo de inclusão para o acesso, permanência e conclusão na Educação Superior, por meio do diálogo e participação efetiva, junto aos demais sistemas de educação, órgãos governamentais, não governamentais e Movimentos Sociais, na luta contra os processos de discriminação, racismo, homofobia, violência doméstica e contra a mulher.
Art. 3º O CEPEGRE deverá obedecer às legislações vigentes específicas do Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPEX) da UEMS, regulamentadas
pelos órgãos colegiados superiores. Art. 4º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário. Dourados, 11 de junho de 2014. FABIO EDIR DOS SANTOS COSTA Presidente COUNI-UEMS
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ANEXO 7 – PARECER COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL NÚMERO 814.869/
2014
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ANEXO 8:
PORTARIA NORMATIVA No 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012
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PORTARIA NORMATIVA No 18, DE 11 DE OUTUBRO DE 2012 Dispõe sobre a implementação das reservas de vagas em instituições federais de ensino de que tratam a Lei no 12.711, de 29 de agosto de 2012, e o Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012. O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e o art. 9º do Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012, e tendo em vista o disposto na Lei no 12.711, de 29 de agosto de 2012, resolve: CAPÍTULO I DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 1o A implementação das reservas de vagas de que tratam a Lei no 12.711, de 29 de gosto de 2012, e o Decreto no 7.824, de 11 de outubro de 2012, por parte das instituições federais de ensino vinculadas ao Ministério da Educação que ofertam vagas de educação superior e pelas instituições federais de ensino que ofertam vagas em cursos técnicos de nível médio observará o disposto nesta Portaria. Art. 2o Para os efeitos do disposto na Lei no 12.711, de 2012, no Decreto nº 7.824, de 2012, e nesta Portaria, considera-se: I - concurso seletivo, o procedimento por meio do qual se selecionam os estudantes para ingresso no ensino médio ou superior, excluídas as transferências e os processos seletivos destinados a portadores de diploma de curso superior; II - escola pública, a instituição de ensino criada ou incorporada, mantida e administrada pelo Poder Público, nos termos do inciso I, do art. 19, da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996; III - família, a unidade nuclear composta por uma ou mais pessoas, eventualmente ampliada por outras pessoas que contribuam para o rendimento ou tenham suas despesas atendidas por aquela unidade familiar, todas moradoras em um mesmo domicílio; IV - morador, a pessoa que tem o domicílio como local habitual de residência e nele reside na data de inscrição do estudante no concurso seletivo da instituição federal de ensino; V - renda familiar bruta mensal, a soma dos rendimentos brutos auferidos por todas as pessoas da família, calculada na forma do disposto nesta Portaria. VI - renda familiar bruta mensal per capita, a razão entre a renda familiar bruta mensal e o total de pessoas da família, calculada na forma do art. 7o desta Portaria. CAPÍTULO II DAS MODALIDADES DE RESERVA DE VAGAS Art. 3o As instituições federais vinculadas ao Ministério da Educação - MEC que ofertam vagas de educação superior reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em
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escolas públicas, inclusive em cursos de educação profissional técnica, observadas as seguintes condições: I - no mínimo 50% (cinquenta por cento) das vagas de que trata o caput serão reservadas aos estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; e II - proporção de vagas no mínimo igual à da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição, segundo o último Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, será reservada, por curso e turno, aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas.
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Parágrafo único. Os resultados obtidos pelos estudantes no Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM poderão ser utilizados como critério de seleção para as vagas mencionadas neste artigo. Art. 4o As instituições federais que ofertam vagas de ensino técnico de nível médio reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de nível médio, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escolas públicas, observadas as seguintes condições: I - no mínimo 50% (cinquenta por cento) das vagas de que trata o caput serão reservadas aos estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; e II - proporção de vagas no mínimo igual à da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição, segundo o último Censo Demográfico divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, será reservada, por curso e turno, aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas. CAPÍTULO III DAS CONDIÇÕES PARA CONCORRER ÀS VAGAS RESERVADAS Seção I Da Condição de Egresso de Escola Pública Art. 5o Somente poderão concorrer às vagas reservadas de que tratam os arts. 3o e 4o: I - para os cursos de graduação, os estudantes que: a) tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, em cursos regulares ou no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos; ou b) tenham obtido certificado de conclusão com base no resultado do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM, do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos - ENCCEJA ou de exames de certificação de competência ou de avaliação de jovens e adultos realizados pelos sistemas estaduais de ensino; e II - para os cursos técnicos de nível médio, os estudantes que: a) tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escolas públicas, em cursos regulares ou no âmbito da modalidade de Educação de Jovens e Adultos; ou b) tenham obtido certificado de conclusão com base no resultado do ENCCEJA ou de exames de certificação de competência ou de avaliação de jovens e adultos realizados pelos sistemas estaduais de ensino. § 1o Não poderão concorrer às vagas reservadas os estudantes que tenham, em algum momento, cursado em escolas particulares parte do ensino médio, no caso do inciso I do caput, ou parte do ensino fundamental, no caso do inciso II do caput. § 2o As instituições federais de ensino poderão, mediante regulamentação interna, exigir que o estudante comprove ter cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. Seção II Da Condição de Renda Art. 6o Somente poderão concorrer às vagas reservadas de que tratam o inciso I do art. 3º e o inciso I do art. 4º os estudantes que comprovarem a percepção de renda familiar bruta mensal igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita. Art. 7o Para os efeitos desta Portaria, a renda familiar bruta mensal per capita será apurada de acordo com o seguinte procedimento: I - calcula-se a soma dos rendimentos brutos auferidos por todas as pessoas da família a que pertence o estudante, levando-se em conta, no mínimo, os três meses anteriores à data de inscrição do estudante no concurso seletivo da instituição federal de ensino;
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II - calcula-se a média mensal dos rendimentos brutos apurados após a aplicação do disposto no inciso I do caput; e
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III - divide-se o valor apurado após a aplicação do disposto no inciso II do caput pelo número de pessoas da família do estudante. § 1o No cálculo referido no inciso I do caput serão computados os rendimentos de qualquer natureza percebidos pelas pessoas da família, a título regular ou eventual, inclusive aqueles provenientes de locação ou de arrendamento de bens móveis e imóveis. § 2o Estão excluídos do cálculo de que trata o §1o: I - os valores percebidos a título de: a) auxílios para alimentação e transporte; b) diárias e reembolsos de despesas; c) adiantamentos e antecipações; d) estornos e compensações referentes a períodos anteriores; e) indenizações decorrentes de contratos de seguros; f) indenizações por danos materiais e morais por força de decisão judicial; e II - os rendimentos percebidos no âmbito dos seguintes programas: a) Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; b) Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano; c) Programa Bolsa Família e os programas remanescentes nele unificados; d) Programa Nacional de Inclusão do Jovem - Pró-Jovem; e) Auxílio Emergencial Financeiro e outros programas de transferência de renda destinados à população atingida por desastres, residente em Municípios em estado de calamidade pública ou situação de emergência; e f) demais programas de transferência condicionada de renda implementados por Estados, Distrito Federal ou Municípios; Art. 8o A apuração e a comprovação da renda familiar bruta mensal per capita tomarão por base as informações prestadas e os documentos fornecidos pelo estudante, em procedimento de avaliação sócio-econômica a ser disciplinado em edital próprio de cada instituição federal de ensino, observado o disposto nesta Portaria. § 1o O edital de que trata o caput estabelecerá, dentre outros: I - os prazos e formulários próprios para a prestação e a comprovação dos dados sócio-econômicos pelo estudante, após a confirmação de sua classificação dentro do número de vagas reservadas para o critério de renda; II - os documentos necessários à comprovação da renda familiar bruta mensal per capita, observado o rol mínimo de documentos recomendados que consta do Anexo II a esta Portaria. III - o prazo e a autoridade competente para interposição de recurso em face da decisão que reconhecer a inelegibilidade do estudante às vagas reservadas para o critério de renda; e IV - o prazo de arquivamento dos documentos apresentados pelos estudantes, que será no mínimo de cinco anos. § 2o O edital poderá prever a possibilidade de realização de entrevistas e de visitas ao local de domicílio do estudante, bem como de consultas a cadastros de informações sócio-econômicas. § 3o O Ministério da Educação poderá firmar acordos e convênios com órgãos e entidades públicas para viabilizar, às instituições federais de ensino, o acesso a bases de dados que permitam a avaliação da veracidade e da precisão das informações prestadas pelos estudantes. Art. 9o A prestação de informação falsa pelo estudante, apurada posteriormente à matrícula, em procedimento que lhe assegure o contraditório e a ampla defesa, ensejará
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o cancelamento de sua matrícula na instituição federal de ensino, sem prejuízo das sanções penais.
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CAPÍTULO IV DO CÁLCULO DAS VAGAS RESERVADAS Art. 10. O número mínimo de vagas reservadas em cada instituição federal de ensino que trata esta Portaria será fixado no edital de cada concurso seletivo e calculado de acordo com o seguinte procedimento: I - define-se o total de vagas por curso e turno a ser ofertado no concurso seletivo; II - reserva-se o percentual de 50% (cinquenta por cento) do total de vagas definido no inciso I, por curso e turno, para os estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental ou médio, conforme o caso, em escolas públicas; III - reserva-se o percentual de 50% (cinquenta por cento) do total de vagas apurado após a aplicação da regra do inciso II, por curso e turno, para os estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita; IV - reservam-se as vagas aos estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita, da seguinte forma: a) identifica-se, no último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE, o percentual correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição; b) aplica-se o percentual de que trata a alínea "a" deste inciso ao total de vagas apurado após a aplicação do disposto no inciso III; V - reservam-se as vagas destinadas aos estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita, da seguinte forma: a) apura-se a diferença entre os números de vagas encontrados após a aplicação do disposto nos incisos II e III; b) identifica-se, no último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE, o percentual correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação do local de oferta de vagas da instituição; c) aplica-se o percentual de que trata a alínea "b" deste inciso ao número de vagas apurado após a aplicação do disposto na alínea "a" deste inciso. § 1o Os cálculos de que tratam os incisos do caput serão efetuados a partir da aplicação das fórmulas constantes do Anexo I a esta Portaria. § 2o Diante das peculiaridades da população do local de oferta das vagas, e desde que assegurado o número mínimo de vagas reservadas à soma dos pretos, pardos e indígenas da unidade da Federação do local de oferta de vagas, apurado na forma deste artigo, as instituições federais de ensino, no exercício de sua autonomia, poderão, em seus editais, assegurar reserva de vagas separadas para os indígenas. Art. 11. Sempre que a aplicação dos percentuais para a apuração da reserva de vagas de que trata o art. 10 implicar resultados com decimais, será adotado, em cada etapa do cálculo, o número inteiro imediatamente superior. Parágrafo único. Deverá ser assegurada a reserva de, no mínimo, uma vaga em decorrência do disposto em cada um dos incisos IV e V do art. 10. Art. 12. As instituições federais de ensino poderão, por meio de políticas específicas de Ações Afirmativas , instituir reservas de vagas: I - suplementares, mediante o acréscimo de vagas reservadas aos números mínimos referidos no art. 10; e II - de outra modalidade, mediante a estipulação de vagas específicas para atender a outras Ações Afirmativas . Art. 13. Os editais dos concursos seletivos das instituições federais de ensino de que trata esta Portaria indicarão, de forma discriminada, por curso e turno, o número de
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vagas reservadas em decorrência do disposto na Lei nº 12.711, de 2012, e de políticas de Ações Afirmativas que eventualmente adotarem. CAPÍTULO V DO PREENCHIMENTO DAS VAGAS RESERVADAS
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Art. 14. As vagas reservadas serão preenchidas segundo a ordem de classificação, de acordo com as notas obtidas pelos estudantes, dentro de cada um dos seguintes grupos de inscritos: I - estudantes egressos de escola pública, com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita: a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas; b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas. II - estudantes egressos de escolas públicas, com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita: a) que se autodeclararam pretos, pardos e indígenas; b) que não se autodeclararam pretos, pardos e indígenas. III - demais estudantes. Parágrafo único. Assegurado o número mínimo de vagas de que trata o art. 10 e no exercício de sua autonomia, as instituições federais de ensino poderão, em seus concursos seletivos, adotar sistemática de preenchimento de vagas que contemple primeiramente a classificação geral por notas e, posteriormente, a classificação dentro de cada um dos grupos indicados nos incisos do caput. Art. 15. No caso de não preenchimento das vagas reservadas aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas, aquelas remanescentes serão preenchidas pelos estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental ou médio, conforme o caso, em escolas públicas, da seguinte forma: I - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "a" do inciso I do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "b", do inciso I do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso II do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; II - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "b", do inciso I do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "a", do inciso I do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso II do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; III - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea a, do inciso II do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "b", do inciso II do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso I do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea "a" do mesmo inciso; IV - as vagas reservadas para o grupo de estudantes indicado na alínea "b", do inciso II do art. 14 serão ofertadas, pela ordem: a) aos estudantes do grupo indicado na alínea "a", do inciso II do art. 14; e b) restando vagas, aos estudantes do grupo indicado no inciso I do art. 14, prioritariamente aos estudantes de que trata a alínea a do mesmo inciso; Parágrafo único. As vagas que restarem após a aplicação do disposto nos incisos I a IV do caput serão ofertadas aos demais estudantes. CAPÍTULO VI DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS Art. 16. A classificação dos estudantes no âmbito do Sistema de Seleção Unificada - Sisu observará o disposto nas normas de regência daquele sistema. Art. 17. As instituições federais de ensino que ofertam vagas de educação superior implementarão, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) da reserva de vagas a cada
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ano, e terão até 30 de agosto de 2016 para o cumprimento integral do disposto nesta Portaria.
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§ 1o Até que sejam integralmente implementadas as reservas de vagas de que trata esta Portaria, os estudantes que optarem por concorrer às vagas reservadas e que não forem selecionados terão assegurado o direito de concorrer às demais vagas. § 2o Após a integral implementação das reservas de vagas, as instituições federais de ensino poderão estabelecer regras específicas acerca do disposto no § 1º deste artigo. Art. 18. As instituições federais de ensino que, na data de publicação desta Portaria, já tiverem divulgado editais de concursos seletivos, promoverão a adaptação das regras desses concursos, no prazo de trinta dias, contado da data de sua publicação. Art. 19. Esta Portaria entra em vigor na data da sua publicação. ALOIZIO MERCADANTE OLIVA
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ANEXO I FÓRMULAS PARA CÁLCULO DAS VAGAS RESERVADAS 1.Cálculo do número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas (art. 10, inciso II) VR = VO * 0,5 onde: VR = vagas reservadas VO = vagas ofertadas no concurso seletivo 2.Cálculo do número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita (art. 10, inciso III) VRRI = onde: VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VR = vagas reservadas 3.Cálculo do número de vagas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita (art. 10, inciso III) VRRS = onde: VRRS = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VR = vagas reservadas VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita 4.Cálculo de número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita que se autodeclararem pretos, pardos e indígenas (art. 10, inciso IV) VRRI-PPI = onde: VRRI-PPI = vagas reservadas para os estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita VRRI = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita PIBGE = proporção de pretos, pardos e indígenas no local de oferta de vagas da instituição federal de ensino 5.Cálculo de número mínimo de vagas reservadas para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita que se autodeclarem pretos, pardos e indígenas (art. 10, inciso V) VRRS-PPI = onde: VRRS-PPI = vagas reservadas para os estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com renda familiar superior a 1,5 salário-mínimo per capita VRRS = vagas reservadas para estudantes com renda familiar bruta superior a 1,5 (um vírgula cinco) salário-mínimo per capita PIBGE = proporção de pretos, pardos e indígenas no local de oferta de vagas da instituição federal de ensino
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ANEXO II ROL DE DOCUMENTOS MÍNIMOS RECOMENDADOS PARA COMPROVAÇÃO DA RENDA FAMILIAR BRUTA MENSAL 1. TRABALHADORES ASSALARIADOS 1.1 Contracheques; 1.2 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 1.3 CTPS registrada e atualizada; 1.4 CTPS registrada e atualizada ou carnê do INSS com recolhimento em dia, no caso de empregada doméstica; 1.5 Extrato atualizado da conta vinculada do trabalhador no FGTS; 1.6 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos. 2. ATIVIDADE RURAL 2.1 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 2.2 Declaração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ; 2.3 Quaisquer declarações tributárias referentes a pessoas jurídicas vinculadas ao candidato ou a membros da família, quando for o caso; 2.4 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos, da pessoa física e das pessoas jurídicas vinculadas; 2.5 Notas fiscais de vendas. 3. APOSENTADOS E PENSIONISTAS 3.1 Extrato mais recente do pagamento de benefício; 3.2 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 3.3 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos. 4. AUTÔNOMOS E PROFISSIONAIS LIBERAIS 4.1 Declaração de IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver; 4.2 Quaisquer declarações tributárias referentes a pessoas jurídicas vinculadas ao candidato ou a membros de sua família, quando for o caso; 4.3 Guias de recolhimento ao INSS com comprovante de pagamento do último mês, compatíveis com a renda declarada; 4.4 Extratos bancários dos últimos três meses. 5. RENDIMENTOS DE ALUGUEL OU ARRENDAMENTO DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS 5.1 Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF acompanhada do recibo de entrega à Receita Federal do Brasil e da respectiva notificação de restituição, quando houver. 5.2 Extratos bancários dos últimos três meses, pelo menos.
5.3 Contrato de locação ou arrendamento devidamente registrado em cartório acompanhado dos três últimos comprovantes de recebimentos.
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ANEXO 9:
LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012
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LEI Nº 12.711, DE 29 DE AGOSTO DE 2012.
Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências.
APRESIDENTA DA REPÚBLICA. Faço saber que o Congresso Nacional decreta
e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1o As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da
Educação reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.
Art. 2o (VETADO). Art. 3o Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art.
1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios
estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser completadas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Art. 4o As instituições federais de ensino técnico de nível médio reservarão, em cada
concurso seletivo para ingresso em cada curso, por turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que cursaram integralmente o ensino fundamental em escolas públicas.
Parágrafo único. No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50%
(cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e meio) per capita.
Art. 5o Em cada instituição federal de ensino técnico de nível médio, as vagas de que
trata o art. 4o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios
estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser preenchidas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino fundamental em escola pública.
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Art. 6o O Ministério da Educação e a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, da Presidência da República, serão responsáveis pelo acompanhamento e avaliação do programa de que trata esta Lei, ouvida a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Art. 7o O Poder Executivo promoverá, no prazo de 10 (dez) anos, a contar da
publicação desta Lei, a revisão do programa especial para o acesso de estudantes pretos, pardos e indígenas, bem como daqueles que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, às instituições de educação superior.
Art. 8o As instituições de que trata o art. 1o desta Lei deverão implementar, no
mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) da reserva de vagas prevista nesta Lei, a cada ano, e terão o prazo máximo de 4 (quatro) anos, a partir da data de sua publicação, para o cumprimento integral do disposto nesta Lei.
Art. 9o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 29 de agosto de 2012; 191o da Independência e 124o da República.
DILMA ROUSSEFF
Aloizio Mercadante Miriam Belchior Luís Inácio Lucena Adams Luiza Helena de Bairros Gilberto Carvalho
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ANEXO 10:
RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*)
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RESOLUÇÃO CEB Nº 3, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999(*) Fixa Diretrizes Nacionais para o funcionamento das escolas indígenas e dá
outras providências. O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação, no uso desuas atribuições regimentais e com base nos artigos 210, § 2º, e 231, caput, da Constituição Federal,nos arts. 78 e 79 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, na Lei 9.131, de 25 de novembro de 1995,e ainda no Parecer CEB 14/99, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação, em 18 deoutubro de 1999,
RESOLVE: Art. 1º Estabelecer, no âmbito da educação básica, a estrutura e o funcionamento
das Escolas Indígenas, reconhecendo-lhes a condição de escolas com normas e ordenamento jurídico próprios, e fixando as diretrizes curriculares do ensino intercultural e bilíngüe, visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e à afirmação e manutenção de sua diversidade étnica.
Art.2º Constituirão elementos básicos para a organização, a estrutura e o funcionamento da escola indígena:
I - sua localização em terras habitadas por comunidades indígenas, ainda que se estendam
por territórios de diversos Estados ou Municípios contíguos; II – exclusividade de atendimento a comunidades indígenas; III – o ensino ministrado nas línguas maternas das comunidades atendidas, como
uma dasformas de preservação da realidade sociolingüística de cada povo; IV – a organização escolar própria. Parágrafo Único. A escola indígena será criada em atendimento à reivindicação
ou por iniciativade comunidade interessada, ou com a anuência da mesma, respeitadas suas formas de representação.
Art. 3º Na organização de escola indígena deverá ser considerada a participação da
comunidade, na definição do modelo de organização e gestão, bem como: I- suas estruturas sociais; II- suas práticas sócio-culturais e religiosas; III- suas formas de produção de conhecimento, processos próprios e métodos de
ensinoaprendizagem; IV- suas atividades econômicas; V- a necessidade de edificação de escolas que atendam aos interesses das
comunidadesindígenas; VI- o uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo com o
contexto sóciocultural de cada povo indígena. Art 4º As escolas indígenas, respeitados os preceitos constitucionais e legais que
fundamentama sua instituição e normas específicas de funcionamento, editadas pela União e pelos Estados,desenvolverão suas atividades de acordo com o proposto nos respectivos projetos pedagógicos eregimentos escolares com as seguintes prerrogativas:
I – organização das atividades escolares, independentes do ano civil, respeitado o fluxo dasatividades econômicas, sociais, culturais e religiosas;
II – duração diversificada dos períodos escolares, ajustando-a às condições e especificidadespróprias de cada comunidade.
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Art. 5º A formulação do projeto pedagógico próprio, por escola ou por povo indígena, terá porbase:
I – as Diretrizes Curriculares Nacionais referentes a cada etapa da educação básica;
II – as características próprias das escolas indígenas, em respeito à especificidade étnicoculturalde cada povo ou comunidade;
III - as realidades sociolíngüística, em cada situação; IV – os conteúdos curriculares especificamente indígenas e os modos próprios
de constituiçãodo saber e da cultura indígena; V – a participação da respectiva comunidade ou povo indígena. Art. 6º A formação dos professores das escolas indígena será específica,
orientar-se-á pelas Diretrizes Curriculares Nacionais e será desenvolvida no âmbito das instituições
formadoras de professores. Parágrafo único. Será garantida aos professores indígenas a sua formação em
serviço e,quando for o caso, concomitantemente com a sua própria escolarização. Art. 7º Os cursos de formação de professores indígenas darão ênfase à
constituição decompetências referenciadas em conhecimentos, valores, habilidades, e atitudes, na elaboração, nodesenvolvimento e na avaliação de currículos e programas próprios, na produção de material didático ena utilização de metodologias adequadas de ensino e pesquisa.
Art. 8º A atividade docente na escola indígena será exercida prioritariamente por professoresindígenas oriundos da respectiva etnia.
Art. 9º São definidas, no plano institucional, administrativo e organizacional, as seguintes esferasde competência, em regime de colaboração:
I – à União caberá legislar, em âmbito nacional, sobre as diretrizes e bases da educaçãonacional e, em especial:
a) legislar privativamente sobre a educação escolar indígena; b) definir diretrizes e políticas nacionais para a educação escolar indígena; c) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino no provimento dos
programas deeducação intercultural das comunidades indígenas, no desenvolvimento de programas integrados deensino e pesquisa, com a participação dessas comunidades para o acompanhamento e a avaliação
dos respectivos programas; d) apoiar técnica e financeiramente os sistemas de ensino na formação de
professoresindígenas e do pessoal técnico especializado; e) criar ou redefinir programas de auxílio ao desenvolvimento da educação, de
modo a atenderàs necessidades escolares indígenas; f) orientar, acompanhar e avaliar o desenvolvimento de ações na área da
formação inicial econtinuada de professores indígenas; g) elaborar e publicar, sistematicamente, material didático específico e
diferenciado, destinadoàs escolas indígenas. II - aos Estados competirá: a) responsabilizar-se pela oferta e execução da educação escolar indígena,
diretamente ou pormeio de regime de colaboração com seus municípios; b) regulamentar administrativamente as escolas indígenas, nos respectivos
Estados, integrandoascomo unidades próprias, autônomas e específicas no sistema estadual;
c) prover as escolas indígenas de recursos humanos, materiais e financeiros, para o seu plenofuncionamento;
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d) instituir e regulamentar a profissionalização e o reconhecimento público do magistérioindígena, a ser admitido mediante concurso público específico;
e) promover a formação inicial e continuada de professores indígenas. f) elaborar e publicar sistematicamente material didático, específico e
diferenciado, para uso nasescolas indígenas. III - aos Conselhos Estaduais de Educação competirá: a) estabelecer critérios específicos para criação e regularização das escolas
indígenas e doscursos de formação de professores indígenas; b) autorizar o funcionamento das escolas indígenas, bem como reconhecê-las; c) regularizar a vida escolar dos alunos indígenas, quando for o caso. § 1º Os Municípios poderão oferecer educação escolar indígena, em regime de
colaboração comos respectivos Estados, desde que se tenham constituído em sistemas de educação próprios,disponham de condições técnicas e financeiras adequadas e contem com a anuência das comunidadesindígenas interessadas.
§ 2º As escolas indígenas, atualmente mantidas por municípios que não satisfaçam asexigências do parágrafo anterior passarão, no prazo máximo de três anos, à responsabilidade dosEstados, ouvidas as comunidades interessadas.
Art.10 O planejamento da educação escolar indígena, em cada sistema de ensino, deve contarcom a participação de representantes de professores indígenas, de organizações indígenas e de apoioaos índios, de universidades e órgãos governamentais.
Art. 11 Aplicam-se às escolas indígenas os recursos destinados ao financiamento público daeducação.
Parágrafo Único. As necessidades específicas das escolas indígenas serão contempladas porcusteios diferenciados na alocação de recursos a que se referem os artigos 2º e 13º da Lei 9424/96.
Art. 12 Professor de escola indígena que não satisfaça as exigências desta Resolução terágarantida a continuidade do exercício do magistério pelo prazo de três anos, exceção feita ao professorindígena, até que possua a formação requerida.
Art. 13 A educação infantil será ofertada quando houver demanda da comunidade indígenainteressada.
Art. 14 Os casos omissos serão resolvidos: I - pelo Conselho Nacional de Educação, quando a matéria estiver vinculada à
competência daUnião; II - pelos Conselhos Estaduais de Educação. Art. 15 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Art. 16 Ficam revogadas as disposições em contrário. ULYSSES DE OLIVEIRA PANISSET Presidente da Câmara de Educação Básica (*)CNE. Resolução CEB 3/99. Diário Oficial da União, Brasília, 17 de
novembro de 1999. Seção 1, p. 19.
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ANEXO 11:
ESTATUTO DO ÍNDIO
LEI Nº 6.001, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1973.
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Dispõe sobre o Estatuto do Índio. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , faço saber que o Congresso Nacional
decreta e eu sanciono a seguinte Lei: TÍTULO I Dos Princípios e Definições Art. 1º Esta Lei regula a situação jurídica dos índios ou silvícolas e das
comunidades indígenas, com o propósito de preservar a sua cultura e integrá-los, progressiva e harmoniosamente, à comunhão nacional.
Parágrafo único. Aos índios e às comunidades indígenas se estende a proteção das leis do País, nos mesmos termos em que se aplicam aos demais brasileiros, resguardados os usos, costumes e tradições indígenas, bem como as condições peculiares reconhecidas nesta Lei.
Art. 2° Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos órgãos das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a preservação dos seus direitos:
I - estender aos índios os benefícios da legislação comum, sempre que possível a sua aplicação;
II - prestar assistência aos índios e às comunidades indígenas ainda não integrados à comunhão nacional;
III - respeitar, ao proporcionar aos índios meios para o seu desenvolvimento, as peculiaridades inerentes à sua condição;
IV - assegurar aos índios a possibilidade de livre escolha dos seus meios de vida e subsistência;
V - garantir aos índios a permanência voluntária no seu habitat , proporcionando-lhes ali recursos para seu desenvolvimento e progresso;
VI - respeitar, no processo de integração do índio à comunhão nacional, a coesão das comunidades indígenas, os seus valores culturais, tradições, usos e costumes;
VII - executar, sempre que possível mediante a colaboração dos índios, os programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades indígenas;
VIII - utilizar a cooperação, o espírito de iniciativa e as qualidades pessoais do índio, tendo em vista a melhoria de suas condições de vida e a sua integração no processo de desenvolvimento;
IX - garantir aos índios e comunidades indígenas, nos termos da Constituição, a posse permanente das terras que habitam, reconhecendo-lhes o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes;
X - garantir aos índios o pleno exercício dos direitos civis e políticos que em face da legislação lhes couberem.
Parágrafo único. (Vetado). Art. 3º Para os efeitos de lei, ficam estabelecidas as definições a seguir
discriminadas: I - Índio ou Silvícola - É todo indivíduo de origem e ascendência pré-
colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional;
II - Comunidade Indígena ou Grupo Tribal - É um conjunto de famílias ou comunidades índias, quer vivendo em estado de completo isolamento em relação aos outros setores da comunhão nacional, quer em contatos intermitentes ou permanentes, sem contudo estarem neles integrados.
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Art 4º Os índios são considerados: I - Isolados - Quando vivem em grupos desconhecidos ou de que se possuem
poucos e vagos informes através de contatos eventuais com elementos da comunhão nacional;
II - Em vias de integração - Quando, em contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservam menor ou maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão necessitando cada vez mais para o próprio sustento;
III - Integrados - Quando incorporados à comunhão nacional e reconhecidos no
pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura.
TÍTULO II Dos Direitos Civis e Políticos CAPÍTULO I Dos Princípios Art. 5º Aplicam-se aos índios ou silvícolas as normas dos artigos 145 e 146, da
Constituição Federal, relativas à nacionalidade e à cidadania. Parágrafo único. O exercício dos direitos civis e políticos pelo índio depende da
verificação das condições especiais estabelecidas nesta Lei e na legislação pertinente. Art. 6º Serão respeitados os usos, costumes e tradições das comunidades
indígenas e seus efeitos, nas relações de família, na ordem de sucessão, no regime de propriedade e nos atos ou negócios realizados entre índios, salvo se optarem pela aplicação do direito comum.
Parágrafo único. Aplicam-se as normas de direito comum às relações entre
índios não integrados e pessoas estranhas à comunidade indígena, excetuados os que forem menos favoráveis a eles e ressalvado o disposto nesta Lei.
CAPÍTULO II Da Assistência ou Tutela Art. 7º Os índios e as comunidades indígenas ainda não integrados à comunhão
nacional ficam sujeito ao regime tutelar estabelecido nesta Lei. § 1º Ao regime tutelar estabelecido nesta Lei aplicam-se no que couber, os
princípios e normas da tutela de direito comum, independendo, todavia, o exercício da tutela da especialização de bens imóveis em hipoteca legal, bem como da prestação de caução real ou fidejussória.
§ 2º Incumbe a tutela à União, que a exercerá através do competente órgão
federal de assistência aos silvícolas. Art. 8º São nulos os atos praticados entre o índio não integrado e qualquer
pessoa estranha à comunidade indígena quando não tenha havido assistência do órgão tutelar competente.
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Parágrafo único. Não se aplica a regra deste artigo no caso em que o índio revele consciência e conhecimento do ato praticado, desde que não lhe seja prejudicial, e da extensão dos seus efeitos.
Art. 9º Qualquer índio poderá requerer ao Juiz competente a sua liberação do
regime tutelar previsto nesta Lei, investindo-se na plenitude da capacidade civil, desde que preencha os requisitos seguintes:
I - idade mínima de 21 anos; II - conhecimento da língua portuguesa; III - habilitação para o exercício de atividade útil, na comunhão nacional; IV - razoável compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional. Parágrafo único. O Juiz decidirá após instrução sumária, ouvidos o órgão de
assistência ao índio e o Ministério Público, transcrita a sentença concessiva no registro civil.
Art. 10. Satisfeitos os requisitos do artigo anterior e a pedido escrito do
interessado, o órgão de assistência poderá reconhecer ao índio, mediante declaração formal, a condição de integrado, cessando toda restrição à capacidade, desde que, homologado judicialmente o ato, seja inscrito no registro civil.
Art. 11. Mediante decreto do Presidente da República, poderá ser declarada a
emancipação da comunidade indígena e de seus membros, quanto ao regime tutelar estabelecido em lei, desde que requerida pela maioria dos membros do grupo e comprovada, em inquérito realizado pelo órgão federal competente, a sua plena integração na comunhão nacional.
Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste artigo, exigir-se-á o preenchimento, pelos requerentes, dos requisitos estabelecidos no artigo 9º.
CAPÍTULO III Do Registro Civil Art. 12. Os nascimentos e óbitos, e os casamentos civis dos índios não
integrados, serão registrados de acordo com a legislação comum, atendidas as peculiaridades de sua condição quanto à qualificação do nome, prenome e filiação.
Parágrafo único. O registro civil será feito a pedido do interessado ou da autoridade administrativa competente.
Art. 13. Haverá livros próprios, no órgão competente de assistência, para o registro administrativo de nascimentos e óbitos dos índios, da cessação de sua incapacidade e dos casamentos contraídos segundo os costumes tribais.
Parágrafo único. O registro administrativo constituirá, quando couber documento hábil para proceder ao registro civil do ato correspondente, admitido, na falta deste, como meio subsidiário de prova.
CAPÍTULO IV Das Condições de Trabalho
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Art. 14. Não haverá discriminação entre trabalhadores indígenas e os demais trabalhadores, aplicando-se-lhes todos os direitos e garantias das leis trabalhistas e de previdência social.
Parágrafo único. É permitida a adaptação de condições de trabalho aos usos e costumes da comunidade a que pertencer o índio.
Art. 15. Será nulo o contrato de trabalho ou de locação de serviços realizado
com os índios de que trata o artigo 4°, I. Art. 16. Os contratos de trabalho ou de locação de serviços realizados com
indígenas em processo de integração ou habitantes de parques ou colônias agrícolas dependerão de prévia aprovação do órgão de proteção ao índio, obedecendo, quando necessário, a normas próprias.
§ 1º Será estimulada a realização de contratos por equipe, ou a domicílio, sob a
orientação do órgão competente, de modo a favorecer a continuidade da via comunitária.
§ 2º Em qualquer caso de prestação de serviços por indígenas não integrados, o
órgão de proteção ao índio exercerá permanente fiscalização das condições de trabalho, denunciando os abusos e providenciando a aplicação das sanções cabíveis.
§ 3º O órgão de assistência ao indígena propiciará o acesso, aos seus quadros, de
índios integrados, estimulando a sua especialização indigenista. TÍTULO III Das Terras dos Índios CAPÍTULO I Das Disposições Gerais Art. 17. Reputam-se terras indígenas: I - as terras ocupadas ou habitadas pelos silvícolas, a que se referem os artigos
4º, IV, e 198, da Constituição; II - as áreas reservadas de que trata o Capítulo III deste Título; III - as terras de domínio das comunidades indígenas ou de silvícolas. Art. 18. As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de
qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade indígena ou pelos silvícolas.
§ 1º Nessas áreas, é vedada a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou
comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa.
§ 2º (Vetado). Art. 19. As terras indígenas, por iniciativa e sob orientação do órgão federal de
assistência ao índio, serão administrativamente demarcadas, de acordo com o processo estabelecido em decreto do Poder Executivo.
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§ 1º A demarcação promovida nos termos deste artigo, homologada pelo Presidente da República, será registrada em livro próprio do Serviço do Patrimônio da União (SPU) e do registro imobiliário da comarca da situação das terras.
§ 2º Contra a demarcação processada nos termos deste artigo não caberá a
concessão de interdito possessório, facultado aos interessados contra ela recorrer à ação petitória ou à demarcatória.
Art. 20. Em caráter excepcional e por qualquer dos motivos adiante enumerados,
poderá a União intervir, se não houver solução alternativa, em área indígena, determinada a providência por decreto do Presidente da República.
1º A intervenção poderá ser decretada:
a) para pôr termo à luta entre grupos tribais; b) para combater graves surtos epidêmicos, que possam acarretar o extermínio
da comunidade indígena, ou qualquer mal que ponha em risco a integridade do silvícola ou do grupo tribal;
c) por imposição da segurança nacional; d) para a realização de obras públicas que interessem ao desenvolvimento
nacional; e) para reprimir a turbação ou esbulho em larga escala; f) para a exploração de riquezas do subsolo de relevante interesse para a
segurança e o desenvolvimento nacional. 2º A intervenção executar-se-á nas condições estipuladas no decreto e sempre
por meios suasórios, dela podendo resultar, segundo a gravidade do fato, uma ou algumas das medidas seguintes:
a) contenção de hostilidades, evitando-se o emprego de força contra os índios; b) deslocamento temporário de grupos tribais de uma para outra área; c) remoção de grupos tribais de uma para outra área. 3º Somente caberá a remoção de grupo tribal quando de todo impossível ou
desaconselhável a sua permanência na área sob intervenção, destinando-se à comunidade indígena removida área equivalente à anterior, inclusive quanto às condições ecológicas.
4º A comunidade indígena removida será integralmente ressarcida dos prejuízos
decorrentes da remoção. 5º O ato de intervenção terá a assistência direta do órgão federal que exercita a
tutela do índio. Art. 21. As terras espontânea e definitivamente abandonadas por comunidade
indígena ou grupo tribal reverterão, por proposta do órgão federal de assistência ao índio e mediante ato declaratório do Poder Executivo, à posse e ao domínio pleno da União.
CAPÍTULO II Das Terras Ocupadas
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Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas a posse permanente das terras que habitam e o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes.
Parágrafo único. As terras ocupadas pelos índios, nos termos deste artigo, serão
bens inalienáveis da União (artigo 4º, IV, e 198, da Constituição Federal). Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que,
de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil.
Art. 24. O usufruto assegurado aos índios ou silvícolas compreende o direito à
posse, uso e percepção das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes nas terras ocupadas, bem assim ao produto da exploração econômica de tais riquezas naturais e utilidades.
§ 1° Incluem-se, no usufruto, que se estende aos acessórios e seus acrescidos, o
uso dos mananciais e das águas dos trechos das vias fluviais compreendidos nas terras ocupadas.
§ 2° É garantido ao índio o exclusivo exercício da caça e pesca nas áreas por ele
ocupadas, devendo ser executadas por forma suasória as medidas de polícia que em relação a ele eventualmente tiverem de ser aplicadas.
Art. 25. O reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse
permanente das terras por eles habitadas, nos termos do artigo 198, da Constituição Federal, independerá de sua demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas, atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República.
CAPÍTULO III Das Áreas Reservadas Art. 26. A União poderá estabelecer, em qualquer parte do território nacional,
áreas destinadas à posse e ocupação pelos índios, onde possam viver e obter meios de subsistência, com direito ao usufruto e utilização das riquezas naturais e dos bens nelas existentes, respeitadas as restrições legais.
Parágrafo único. As áreas reservadas na forma deste artigo não se confundem
com as de posse imemorial das tribos indígenas, podendo organizar-se sob uma das seguintes modalidades:
a)Reserva indígena; b) parque indígena; c) colônia agrícola indígena. Art. 27.Reserva indígena é uma área destinada a servidor de habitat a grupo
indígena, com os meios suficientes à sua subsistência.
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Art. 28. Parque indígena é a área contida em terra na posse de índios, cujo grau de integração permita assistência econômica, educacional e sanitária dos órgãos da União, em que se preservem as RESERVAS de flora e fauna e as belezas naturais da região.
§ 1º Na administração dos parques serão respeitados a liberdade, usos, costumes
e tradições dos índios. § 2° As medidas de polícia, necessárias à ordem interna e à preservação das
riquezas existentes na área do parque, deverão ser tomadas por meios suasórios e de acordo com o interesse dos índios que nela habitem.
§ 3º O loteamento das terras dos parques indígenas obedecerá ao regime de propriedade, usos e costumes tribais, bem como às normas administrativas nacionais, que deverão ajustar-se aos interesses das comunidades indígenas.
Art. 29. Colônia agrícola indígena é a área destinada à exploração agropecuária,
administrada pelo órgão de assistência ao índio, onde convivam tribos aculturadas e membros da comunidade nacional.
Art. 30. Território federal indígena é a unidade administrativa subordinada à União, instituída em região na qual pelo menos um terço da população seja formado por índios.
Art. 31. As disposições deste Capítulo serão aplicadas, no que couber, às áreas em que a posse decorra da aplicação do artigo 198, da Constituição Federal.
CAPÍTULO IV Das Terras de Domínio Indígena Art. 32. São de propriedade plena do índio ou da comunidade indígena,
conforme o caso, as terras havidas por qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil.
Art. 33. O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos
consecutivos, trecho de terra inferior a cinqüenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena.
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às terras do domínio da
União, ocupadas por grupos tribais, às áreas reservadas de que trata esta Lei, nem às terras de propriedade coletiva de grupo tribal.
CAPÍTULO V Da Defesa das Terras Indígenas Art. 34. O órgão federal de assistência ao índio poderá solicitar a colaboração
das Forças Armadas e Auxiliares e da Polícia Federal, para assegurar a proteção das terras ocupadas pelos índios e pelas comunidades indígenas.
Art. 35. Cabe ao órgão federal de assistência ao índio a defesa judicial ou
extrajudicial dos direitos dos silvícolas e das comunidades indígenas.
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Art. 36. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, compete à União adotar as medidas administrativas ou propor, por intermédio do Ministério Público Federal, as medidas judiciais adequadas à proteção da posse dos silvícolas sobre as terras que habitem.
Parágrafo único. Quando as medidas judiciais previstas neste artigo forem propostas pelo órgão federal de assistência, ou contra ele, a União será litisconsorte ativa ou passiva.
Art. 37. Os grupos tribais ou comunidades indígenas são partes legítimas para a defesa dos seus direitos em juízo, cabendo-lhes, no caso, a assistência do Ministério Público Federal ou do órgão de proteção ao índio.
Art. 38. As terras indígenas são inusucapíveis e sobre elas não poderá recair
desapropriação, salvo o previsto no artigo 20. TÍTULO IV Dos Bens e Renda do Patrimônio Indígena Art 39. Constituem bens do Patrimônio Indígena: I - as terras pertencentes ao domínio dos grupos tribais ou comunidades
indígenas; II - o usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes
nas terras ocupadas por grupos tribais ou comunidades indígenas e nas áreas a eles reservadas;
III - os bens móveis ou imóveis, adquiridos a qualquer título. Art. 40. São titulares do Patrimônio Indígena: I - a população indígena do País, no tocante a bens ou rendas pertencentes ou
destinadas aos silvícolas, sem discriminação de pessoas ou grupos tribais; II - o grupo tribal ou comunidade indígena determinada, quanto à posse e
usufruto das terras por ele exclusivamente ocupadas, ou a ele reservadas; III - a comunidade indígena ou grupo tribal nomeado no título aquisitivo da
propriedade, em relação aos respectivos imóveis ou móveis. Art. 41. Não integram o Patrimônio Indígena: I - as terras de exclusiva posse ou domínio do índio ou silvícola, individualmente
considerado, e o usufruto das respectivas riquezas naturais e utilidades; II - a habitação, os móveis e utensílios domésticos, os objetos de uso pessoal, os
instrumentos de trabalho e os produtos da lavoura, caça, pesca e coleta ou do trabalho em geral dos silvícolas.
Art. 42. Cabe ao órgão de assistência a gestão do Patrimônio Indígena,
propiciando-se, porém, a participação dos silvícolas e dos grupos tribais na administração dos próprios bens, sendo-lhes totalmente confiado o encargo, quando demonstrem capacidade efetiva para o seu exercício.
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Parágrafo único. O arrolamento dos bens do Patrimônio Indígena será permanentemente atualizado, procedendo-se à fiscalização rigorosa de sua gestão, mediante controle interno e externo, a fim de tornar efetiva a responsabilidade dos seus administradores.
Art. 43. A renda indígena é a resultante da aplicação de bens e utilidades integrantes do Patrimônio Indígena, sob a responsabilidade do órgão de assistência ao índio.
§ 1º A renda indígena será preferencialmente reaplicada em atividades rentáveis ou utilizada em programas de assistência ao índio.
§ 2° A reaplicação prevista no parágrafo anterior reverterá principalmente em benefício da comunidade que produziu os primeiros resultados econômicos.
Art. 44. As riquezas do solo, nas áreas indígenas, somente pelos silvícolas
podem ser exploradas, cabendo-lhes com exclusividade o exercício da garimpagem, faiscação e cata das áreas referidas.
Art. 45. A exploração das riquezas do subsolo nas áreas pertencentes aos índios, ou do domínio da União, mas na posse de comunidades indígenas, far-se-á nos termos da legislação vigente, observado o disposto nesta Lei.
§ 1º O Ministério do Interior, através do órgão competente de assistência aos índios, representará os interesses da União, como proprietária do solo, mas a participação no resultado da exploração, as indenizações e a renda devida pela ocupação do terreno, reverterão em benefício dos índios e constituirão fontes de renda indígena.
§ 2º Na salvaguarda dos interesses do Patrimônio Indígena e do bem-estar dos silvícolas, a autorização de pesquisa ou lavra, a terceiros, nas posses tribais, estará condicionada a prévio entendimento com o órgão de assistência ao índio.
Art. 46. O corte de madeira nas florestas indígenas, consideradas em regime de
preservação permanente, de acordo com a letra g e§ 2º, do artigo 3°, do Código Florestal, está condicionado à existência de programas ou projetos para o aproveitamento das terras respectivas na exploração agropecuária, na indústria ou no reflorestamento.
TÍTULO V Da Educação, Cultura e Saúde Art. 47. É assegurado o respeito ao patrimônio cultural das comunidades
indígenas, seus valores artísticos e meios de expressão. Art. 48. Estende-se à população indígena, com as necessárias adaptações, o
sistema de ensino em vigor no País. Art. 49. A alfabetização dos índios far-se-á na língua do grupo a que pertençam,
e em português, salvaguardado o uso da primeira. Art. 50. A educação do índio será orientada para a integração na comunhão
nacional mediante processo de gradativa compreensão dos problemas gerais e valores da sociedade nacional, bem como do aproveitamento das suas aptidões individuais.
Art. 51. A assistência aos menores, para fins educacionais, será prestada, quanto possível, sem afastá-los do convívio familiar ou tribal.
Art. 52. Será proporcionada ao índio a formação profissional adequada, de acordo com o seu grau de aculturação.
Art. 53. O artesanato e as indústrias rurais serão estimulados, no sentido de elevar o padrão de vida do índio com a conveniente adaptação às condições técnicas modernas.
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Art. 54. Os índios têm direito aos meios de proteção à saúde facultados à comunhão nacional.
Parágrafo único. Na infância, na maternidade, na doença e na velhice, deve ser assegurada ao silvícola, especial assistência dos poderes públicos, em estabelecimentos a esse fim destinados.
Art. 55. O regime geral da previdência social será extensivo aos índios, atendidas as condições sociais, econômicas e culturais das comunidades beneficiadas.
TÍTULO VI Das Normas Penais CAPÍTULO I Dos Princípios Art. 56. No caso de condenação de índio por infração penal, a pena deverá ser
atenuada e na sua aplicação o Juiz atenderá também ao grau de integração do silvícola. Parágrafo único. As penas de reclusão e de detenção serão cumpridas, se
possível, em regime especial de semiliberdade, no local de funcionamento do órgão federal de assistência aos índios mais próximos da habitação do condenado.
Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.
CAPÍTULO II Dos Crimes Contra os Índios Art. 58. Constituem crimes contra os índios e a cultura indígena: I - escarnecer de cerimônia, rito, uso, costume ou tradição culturais indígenas,
vilipendiá-los ou perturbar, de qualquer modo, a sua prática. Pena - detenção de um a três meses;
II - utilizar o índio ou comunidade indígena como objeto de propaganda turística ou de exibição para fins lucrativos. Pena - detenção de dois a seis meses;
III - propiciar, por qualquer meio, a aquisição, o uso e a disseminação de bebidas alcoólicas, nos grupos tribais ou entre índios não integrados. Pena - detenção de seis meses a dois anos.
Parágrafo único. As penas estatuídas neste artigo são agravadas de um terço, quando o crime for praticado por funcionário ou empregado do órgão de assistência ao índio.
Art. 59. No caso de crime contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não integrado ou comunidade indígena, a pena será agravada de um terço.
TÍTULO VII Disposições Gerais Art. 60. Os bens e rendas do Patrimônio Indígena gozam de plena isenção
tributária. Art. 61. São extensivos aos interesses do Patrimônio Indígena os privilégios da
Fazenda Pública, quanto à impenhorabilidade de bens, rendas e serviços, ações especiais, prazos processuais, juros e custas.
Art. 62. Ficam declaradas a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos dos atos de qualquer natureza que tenham por objeto o domínio, a posse ou a ocupação das terras habitadas pelos índios ou comunidades indígenas.
§ 1° Aplica-se o disposto deste artigo às terras que tenham sido desocupadas pelos índios ou comunidades indígenas em virtude de ato ilegítimo de autoridade e particular.
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§ 2º Ninguém terá direito a ação ou indenização contra a União, o órgão de assistência ao índio ou os silvícolas em virtude da nulidade e extinção de que trata este artigo, ou de suas conseqüências econômicas.
§ 3º Em caráter excepcional e a juízo exclusivo do dirigente do órgão de assistência ao índio, será permitida a continuação, por prazo razoável dos efeitos dos contratos de arrendamento em vigor na data desta Lei, desde que a sua extinção acarrete graves conseqüências sociais.
Art. 63. Nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse de silvícolas ou do Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio.
Art. 64 (Vetado). Parágrafo único. (Vetado). Art. 65. O Poder Executivo fará, no prazo de cinco anos, a demarcação das terras
indígenas, ainda não demarcadas. Art. 66. O órgão de proteção ao silvícola fará divulgar e respeitar as normas da
Convenção 107, promulgada pelo Decreto nº 58.824, de 14 julho de 1966. Art. 67. É mantida a Lei nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967. Art. 68. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário. EMÍLIO G. MEDICI
Alfredo Buzaid Antônio Delfim Netto José Costa Cavalcanti
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