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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA Guanambi, v. 1, n. 1, p. 1-140, jan./jun. 2010

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA

Guanambi, v. 1, n. 1, p. 1-140, jan./jun. 2010

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Publicação semestral para divulgação de pesquisas, ensaios, relatos de experiências, resumos nas áreas de educação, saúde e meio ambiente.

Os pontos de vista apresentados são da exclusiva responsabilidade de seus autores.

COM A CIÊNCIA: Revista Multidisciplinar - Educação, Saúde e Meio Ambiente

Universidade do Estado da BahiaDepartamento de Educação – Campus XII, Guanambi -BA

ReitorLourisvaldo Valentim da Silva

Vice-ReitoraAmélia Tereza Santos Rosa Maraux

Diretora da EDUNEBMaria Nadja Nunes Bittencourt

Conselho Editorial

Diretor do DEDC, Campus XII Marcius de Almeida Gomes

Núcleo de Pesquisa e Extensão Sônia Maria Alves de Oliveira Reis

Editora-chefe Heldina Pereira Pinto Fagundes

Pareceristas Ad HocÂngela Maria Camargo Rodrigues – UNEB –BA

Rosa Maria Maciel –UNICASTELO – SPUildo Batista Oliveira – UNEB - BA

Alex Alves – Ifbaiano – BAAna Cláudia Lemos Pacheco - UESB - BA

Débora Alves Feitosa – UFRB - BAGraça dos Santos Costa – UNEB - BAIvanete Fernandes do Prado - UNEB

Jana Maruska Buuda da Matta UESB - BAJulianeli Tolentino de Lima – UNIVASF – PE

Juarez Vieira do Nascimento - UFSCLino Castellani Filho – UNICAMP - SP

Maria de Fátima da Silva Duarte – UFSC - SC

Maria Reneude de Sá – UFAL - ALMarileide Dias Saba – UNEB - BAMônica Molina – UNB - DFPaulo Roberto Padilha – IPF - SPRaoul Henry – UNESP - SPRegla Toujaguez La Rosa Massahud – UFLA - MG Rita de Cássia Breda – UEFS - BASérgio Stucchi – UNICAMP -SPSilvia Maria Leite de Almeida – UNEB - BASinara Vera – UFRB -BASuraya Cristina Darido – UNESP –SP

Conselho ConsultivoElizeu Clementino de Souza – UNEB – BAJuarez Vieira do Nascimento – UFSC - SC

Patrícia Maria Mitsuka – UNEB -BACarmem Lúcia Eiterer – UFMG - MG

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COM A CIÊNCIA: revista multidisciplinar – educação, saúde e meio ambienteRevista do Departamento de Educação – Campus XII

Publicação semestral para divulgação de pesquisas, ensaios, relatos de experiências, resumos nas áreas de educação, saúde e meio ambiente.

Os pontos de vista apresentados são da exclusiva responsabilidade de seus autores.

Direitos desta edição reservados ao NUPEX – Núcleo de Pesquisa, Ensino e Extensão.Departamento de Educação – DEDC, Campus XII Universidade do Estado da Bahia - UnebAvenida Universitária Vanessa Cardoso e Cardoso da Silva, s/nBairro Ipanema 46430 000 Guanambi –BA –BrasilTel.: (077) 3451-1535E-mail: [email protected]

Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

Normas para publicação: vide últimas páginas.Revisão de Português: Maria Luísa Favret e Belma Gumes FernandesRevisão de Inglês: Reinaldo Ferreira da SilvaColaboração: Júlio César Lemos de Almeida e Osaná Macêdo ReisPermite-se permutaTiragem: 500 exemplares

Coordenação Editorial: Ricardo BaroudCoordenação de Design: Sidney Silva

Projeto Gráfico e Diagramação: CVY Consultoria e Empreendimentos

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Rua Silveira Martins, 2555 - Cabula41150-000 - Salvador - Bahia - Brasil

Fone: +55 71 [email protected]

[email protected]

Com a Ciência: Revista multidisciplinar /Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação, Campus XII, - v.1, n.1 (jun., 2010). – Guanam-bi, BA: EDUNEB, 2010.

Periodicidade semestralISSN 2178-874X1.Educação - Periódicos.2.Saúde – Periódicos.3. Meio Ambiente periódi-cos. II. Universidade do Estado da Bahia. D Educação – DEDC, Campus XII.

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SUMÁRIO

Editorial 9

Paisagem intercultural de brincantes: um ensaio acerca do Maracatu numa abordagem etnográficaJosé Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado 11

A violência na escola: interferência no processo ensino-aprendizagem e formas de enfrentamentoIzailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio 25

A bagagem pessoal como elemento fundamental para a mediação: uma análise feita a partir dos encontros de formação para professores do projeto Descentralizando o Acesso – visitas escolares a InhotimAmanda Carolina Pinto Moreira e Simara de Oliveira Araújo 37

As relações de trabalho e educação diante dos processos de globalizaçãoJamile dos S. Cardoso 43

O ensino superior e a recepção a pessoas com deficiência na ótica de universitários em Jequié, BahiaAdriana Silva Barbosa e Ana Cristina Santos Duarte 53

Teoria e prática: a educação ambiental para uma transformação socialInalice Donato Primo Menezes 69

Cultura corporal e o fenômeno da desterritorialização: o furto da produção cultural localElaine Brito Nunes, Luciano Lima Diniz, Maiala Maria Souza e Nadson Santana Reis 85

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Controle sanitário de epidemias após ameaças de síndrome da angústia respiratória, gripe aviária e gripe suínaKarla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva 99

Parasitos intestinais e aspectos sociossanitários em comunidades do semiárido baianoArtur Dias Lima, Gustavo Cabral Miranda, Aline da Silva Tavares e Katiane Silva Oliveira 111

Conhecimentos adquiridos por primigestas no pré-natal de uma maternidade pública em SalvadorMichelle Araújo Moreira e Itana Isis da Mota 119

COM A CIÊNCIA: revista multidisciplinar em educação, saúde e meio ambienteNormas de Publicação 133

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Editorial

A partir do ano de 2010, a revista que era denominada COMCIÊNCIA, até o volume 2, passa por reformulações que redefinem não apenas sua estrutura, seu conteúdo, mas principalmente seu público-alvo. Por meio de decisão coletiva, o Conselho Departamental do Campus XII da Uneb decidiu pela reestruturação da revista anterior desde que não se afastasse de seu objetivo de divulgação científica. Para isso seria preciso ampliar seu público para outras áreas, retratando também a própria realidade do Campus, que oferece cursos de graduação em saúde, educação e ciências sociais aplicadas, além de diversos projetos de extensão e pesquisa em meio ambiente, saúde e educação.

Partindo dessa compreensão, buscou-se realizar um levantamento entre os grupos de pesquisa do Departamento, observando seus objetivos e a composição das linhas de pesquisa para colher informações que pudessem contribuir com a produção de uma nova revista, com perfil mais contemporâneo. Recomeçamos, então, com uma pequena alteração no nome, que passa a ser Com A Ciência: revista multidisciplinar, com periodicidade semestral e um conselho editorial mais ampliado para dar conta das novas demandas.

Em virtude dessas mudanças, não foi possível dar prosseguimento à numeração iniciada pelo volume 1 (ano 1), feita a partir do ano de 2002. Depois do volume 2 (ano 2), editado em 2008, voltamos ao ano 1, volume 1, em 2010, como se fosse a primeira vez.

Todo o esforço empreendido por nós tem como escopo divulgar o conhecimento nas áreas de educação, saúde e meio ambiente, por meio de um periódico que garanta a qualidade necessária ao meio acadêmico e aos interessados que atuam nas áreas mencionadas.

Como parte da política da revista, publicamos apenas trinta por cento de textos de autores da Uneb e setenta por cento provindos de outras instituições, para garantir que não se limite a uma publicação endógena.

Destacamos também que estamos abertos à publicação de ensaios, artigos de revisão e de resultados de trabalhos de pesquisa, relatos de experiências, resenhas de livros, resumos de teses, dissertações. Todavia, neste número, as seções ainda não estão assim compostas, em virtude do recebimento de artigos mais que outros tipos de textos.

Na expectativa de que as mudanças tenham impactos positivos, acreditamos que esse recomeço possa abrir novos caminhos e, também, consolidar este veículo de socialização de conhecimentos e saberes em níveis local e global.

Heldina Pereira Pinto Fagundes Editora

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PAISAGEM INTERCULTURAL DE BRINCANTES: um ensaio acerca do

Maracatu numa abordagem etnográficaJosé Antonio Carneiro Leão1

Margarete de Souza Conrado2

RESUMO

Este estudo consiste em olhar, no cenário da pesquisa em educação, aspectos interpretativos de percursos teóricos metodológicos da pesquisa etnográfica no contexto comunitário mais amplo. Utilizamos como referencial teórico os estudos de Amálio Pinheiro (2009), relacionados aos processos civilizatórios na América Latina, e adotamos questões de estudos antropológicos da pesquisa etnográfica, baseada em François Laplantine (2004) e Geertz (2008). As paisagens de dentro e fora na América Latina apontam para uma rede de símbolos em mosaicos móveis no corpo como fonte e objeto de informação, sendo um aspecto descritivo na percepção de processos educativos para o saber-formando e o formando-saber na paisagem no corpo de brincantes da cultura.

Palavras-Chave:

Pesquisa Etnográfica. Educação não escolar. Corpo de Brincantes. Endocultura. Símbolos.

1 Professor Assistente efetivo da Universidade do Estado da Bahia – UNEB/Campus XII. Mestre em Gestão de Po-líticas Públicas e Doutorando em Educação / UFBA. Grupos no CNPq: Edu. e Desenv. Sócio-Ambiental e NEPE (UNEB); Rede Coop. de Pesq. e Interv. em (In)Formação, Currículo e Trabalho (UFBA) Email: [email protected] / [email protected]

2 Professora efetiva da Universidade do Estado da Bahia – UNEB/Campus XII. Mestra em Dança e Doutoranda em Educação / UFBA. Grupos no CNPq: Educação e Desenvolvimento Sócio-Ambiental e Núcleo de Estudo Pesquisa e Extensão Educacional Paulo Freire (UNEB) Email: [email protected] / [email protected]

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José Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado

INTERCULTURAL SCENERY OF BRINCANTES: an essay about the Maracatu in an

ethnographic approach

ABSTRACT

This study consists of looking at the scenario of educational research in the wider community context, interpretative aspects of methodological, theoretical ethnographic research. We used as theoretical studies Pinheiro (2009), related to civilizing processes in Latin America, and take questions from anthropological studies of ethnographic research, based on Laplantine François (2004) and Geertz (2008). The scenery in and out in Latin America point to a network of mobile mosaic symbols in the body as the source and object information, and a descriptive aspect in the perception of educational processes to the knowledge-forming and form-knowledge in the scenery in the body players of culture.

Keywords:

Ethnographic research. Non-formation education. Brincantes body. Endo-culture.

INTRODUÇÃO

A paisagem intercultural da pesquisa, no contexto das manifestações culturais a que nos propomos referir neste estudo, compreende o cenário do espaço não escolar, representado por grupos na endocultura3 inseridos nas sociedades na América Latina. Neste estudo especificamos os grupos de Maracatu na sociedade pernambucana do Nordeste brasileiro. A circulação de ideias, significados e sentidos, no interior de uma cultura, e o acesso a essa circulação, são percebidos no contexto formativo mais amplo – no qual as pessoas mantêm um sentido de pertencimento – como processos educativos em ambientes de aprendizado significativo de experiências, sentimentos, estéticas, performatividade, que, através do corpo, possibilita a participação dos indivíduos, construindo e reconstruindo práticas culturais que envolvem faixas etárias, gêneros e povos, para também se constituírem institucionalmente.

Os aspectos interpretativos de percursos teóricos metodológicos da pesquisa etnográfica a serem destacados neste estudo, podem servir de aporte para pesquisas com grupos comunitários da endocultura. Esses aspectos são imbricados sob dois pontos de vista: 1) A formação como

3 Grupos com um conjunto de comportamentos específicos, inseridos dentro da cultura de uma sociedade.

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PAISAGEM INTERCULTURAL DE BRINCANTES: um ensaio acerca do Maracatu numa abordagem etnográfica

experiência de vida (Escola de Vida com diferentes papéis inscritos no corpo – Redes Sociais) e 2) A emancipação sensível na alteridade (autonomia criativa do saber brincante configurada no corpo).

No imbricamento desses aspectos interpretativos, utilizamos o aporte teórico de Amálio Pinheiro (2009), que possibilita uma observação da convivência entre corpos no processo civilizatório da América Latina, e dos antropólogos François Laplatine (2004) e Geertz (2008) ao revelar a incompreensão da “lógica de nossa linguagem” a ser “clarificada”, não pela explicação, mas pelo olhar da descrição da linguagem, de suas ciladas armadas sem cessar, o que possibilita ver o corpo numa “teia simbólica” de fonte e objeto de informação como operador de conhecimento. Portanto, como ocorrem os saberes de experiência de vida, circunscritos em redes sociais de grupos de Maracatu? E, com base em que paisagens ocorre a descrição de processos educativos na pesquisa etnográfica nesses grupos?

As inquietações apresentadas acima nos levam ao objetivo de perseguir, na pesquisa etnográfica, aspectos interpretativos no cenário da educação das manifestações culturais, no ato de saber e no ato de formação do conhecimento como um trabalho de relacionamento de conexões, de autonomia criativa no corpo. Sendo assim, apresentamos a descrição como uma atividade de transformação do visível em sua condição de vida humana, para compreender as inquietações levantadas, aqui sistematizadas como pressupostos a serem discutidos nos tópicos a seguir: Intercombinações do Mosaico Intercultural na América Latina; e a paisagem no contexto da descrição dialógica.

INTERCOMBINAÇÕES DO MOSAICO INTERCULTURAL NA AMÉRICA LATINA

Os elementos comunicacionais que compõem o ato performativo em uma sociedade representam a diversidade na alteridade, necessária ao campo da pesquisa educativa. Essa diversidade consiste nas intercombinações de saberes constituídos nos percursos de aprendizado configurados no corpo, superando o plano da multiculturalidade, para estabelecer funções que não integram identidades fixas das quais excluem o outro, mas estabelecem redes sociais como mosaico intercultural em contínuo deslocamento.

Conceitos, paisagens, critérios rígidos, para criar questões que só dão conta do mundo abstrato na América Latina – por possuir uma avalanche de diferenças culturais no mundo globalizado – requerem recuperar estudos feitos sobre a condição da linguagem deste continente, sem desprezar cada indivíduo ou grupo que fez parte de seu processo civilizatório, com suas situações específicas que se deram de maneira conflituosa e intensa. Para Pinheiro (2009), são duas as

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José Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado

situações de linguagem: a pregação incorporante na América Latina com suas diferenças do índio e do caboclo e a condição ibero-afro-arabizante-tupinizante, como confluências culturais.

O problema político das confluências civilizatórias no continente americano, em especial na América Latina, se acentua nos aspectos ameríndios, africanos, ibéricos, criando certa preguiça em analisar aqueles considerados “bastardos” – negros, índios – pela cultura hegemônica no continente. Essas análises podem ser verificadas na postura do corpo que se expressa em elementos de inspiração, como nos objetos da cultura incorporados por esses povos. Pois esse continente foi feito da incorporação do outro – na necessidade antropofágica da interalimentação entre micro e macrossistemas culturais –, de maneira tensa, grave e também subversiva, com uma proliferação de linguagens corporais. Essa parece ser a circunstância de como ocorrem os saberes de experiência de vida, circunscritos em redes sociais de grupos de Maracatu.

Para Pinheiro (2009), o antropólogo Viveiro de Castro apresenta a predação incorporante como o tráfego entre o dentro e o fora – a casa e a aldeia –, numa atitude de incorporação no movimento de vai e vem das várias culturas num trânsito “ziguezagueante”. Sendo assim, ainda para Pinheiro, ao conviver com as cosmogonias tribais, as tecnociências não evoluíram no olhar sensível do reconhecimento do outro nas diferenças que estão por nossa volta. Será que a ciência quer se envolver com esse olhar?

Sim, os signos e as coisas estão numa relação de proximidade com elementos constitutivos da linguagem. O corpo materializa na linguagem a relação com o mundo material, as cores, os sons, as imagens, a memória, os símbolos e significados de suas paisagens, sem deslocar as tensões existentes nesse contexto. Ou seja, a dimensão do desconhecido invadiu as linguagens e a nossa condição é descrever esse andamento dos feitos na América Latina, reconhecendo o que não foi reconhecido pela prática intelectual, escolar e acadêmica. Para Lotman (1996), a cultura é uma inteligência coletiva, e muitas vezes somos ignorantes quanto ao que a cultura nos diz.

A razão antropofágica é o bote para incorporar o outro, eliminando as dualidades. Nos mosaicos móveis nesse continente complexo, a prática do conhecimento precisa ser situada como epistemologias do Sul, ou seja, da periferia popular para o centro clássico (BOAVENTURA SANTOS, 2006). Não queremos dizer que nos opomos ao clássico, por isso o barroco constitutivo se aproveita do clássico, recorrendo a outros saberes.

A função dominante do pensamento ocidental clássico para a periferia, índios e negros a praticaram como proteção de suas integridades; “folclorizando-se” conviveram com esse pensamento. Para falar desse processo, é preciso ter cuidado para não escamoteá-lo no sentimento de revanchismo não resolvido, refletido pela oposição das tensões causadas pelas grandes descobertas e hoje pelos movimentos sociais com a pretensão, muitas vezes, de criar uma configuração de luta contra um sistema a ser modelo em contextos que são dinâmicos e

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PAISAGEM INTERCULTURAL DE BRINCANTES: um ensaio acerca do Maracatu numa abordagem etnográfica

bem híbridos. A perspectiva deve continuar nas discussões dos conflitos que são uma realidade ainda hoje, mas na diversidade compreendida e discutida pelas diferenças de saberes-fazeres existentes na sociedade.

O olhar para o contexto até aqui apresentado implica em dizer que aprendemos com os saberes que representam os povos que civilizaram a América Latina. São saberes que formam um conjunto de comportamentos que se inscrevem nos corpos dos grupos da endocultura nas sociedades, como as experiências de vida, configurando uma rede social de autonomia criativa nos grupos de Maracatu. Essa autonomia representa estratégias para transformação da condição de vida do brincante que se dá pela descrição do pensamento em permanente questionamento, orientado para o que particulariza a tensão nebulosa, sutil, de difícil compreensão das ações brincantes. Autonomia que ocorre, não na imensidão de detalhes a serem dissolvidos, criando obstáculos, mas do discurso generalizante do que seja espetacular e especulativo para os brincantes, que narram e materializam a memória de ancestralidade no corpo.

Uma nova perspectiva didática (CANDAU, 2002) – que não se propõe a enxergar as contradições sociais, nem criticar os mecanismos produtores dessas contradições, está em propor alternativas para a prática educativa que amenizem as desigualdades, partindo da valorização das culturas, da convivência com as diferenças e do respeito à diversidade – compreende a escola de vida e o campo da pesquisa etnográfica – de interpretação cultural a partir da experiência de campo que visa construir possibilidades de pensamentos para discutir problemas da existência humana como processo educativo simbólico –, que requer entre a descrição e a interpretação a mediação da narrativa, como linguagem de saberes incorporados nos grupos sociais.

A prática de narrativas, com suas diferentes vozes, exige relacionamento social, troca, conexões, aproximações, olho a olho, face a face. Isso ocorre quando passamos a buscar na linguagem simbólica o conteúdo da forma, nunca puramente descritiva, nunca explicando tudo, mas mergulhada no cerne em que ela se constitui, fornecendo informação, ilustrando, como memória descritiva que é. E o conteúdo da forma está inserido no corpo, na intersubjetividade do trabalho intrínseco entre percepção e pensamento, porque o corpo começa dentro de nós mesmos, construído por nossos atos cognitivos, e o avanço na construção do conhecimento existe na subjetividade que damos às coisas, aos fatos, ao fenômeno de ser humano.

Os conteúdos materializados nas manifestações culturais que possuem elementos de inspiração africana, como é o caso dos brincantes do Maracatu Nação ou de Baque Virado e do Maracatu Rural ou de Baque Solto4 em Pernambuco, ambos reafirmam sua manifestação

4 O “Baque Solto” refere-se à batida solta nos instrumentos musicais do tarol e das alfaias. Diferencia-se do Mara-catu de Baque Virado por suas características musicais próprias com orquestra formada por zabumba, surdo, tarol, cuíca, gonguê, ganzá, trompete, clarinete e trombone incorporados em sua forte essência e mistério refletidos no sincretismo de seus personagens.

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José Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado

cultural todos os anos, em especial durante o carnaval. Portanto, nossos focos de pesquisa estão nos cortejos da Nação de Maracatu de Baque Virado e no saber brincante do personagem do Caboclo de Lança do Maracatu de Baque Solto, como elementos simbólicos que se entrecruzam no corpo, criando metáforas corporais a partir de seus contextos de narrativas descritivas dialógicas, de princípio operativo e não explicativo.

A PAISAGEM NO CONTEXTO DA DESCRIÇÃO DIALÓGICA

Ao considerar o campo etnográfico como imbricação do outro (diferentes atores sociais e campos políticos, de cultura artística), com fronteiras movediças, a perspectiva na pesquisa de campo representa expor a compreensão do que está íntimo para o grupo, levando em consideração a esperteza que há no pesquisador ao inquirir seus informantes. Como estranhamento nesse processo, procuramos na paisagem intercultural o contexto da narrativa, investigando o interdito, o incômodo, o drama ocorrido nos atores sociais – nós e os brincantes (Folgazões)5. Dessa forma, procuramos nos autorizar a buscar a nossa narrativa descritiva, como forma do pensamento etnográfico. Ou seja, compreender para tornar compreensivos, aspectos estéticos e éticos nos brincantes de Nação Africana dos dois Maracatus – o Baque Virado e o Baque Solto ou Rural.

A conversação etnográfica se dá como forma de conferir que na tradição africana cada indivíduo nasce para reinar – o nascimento é coroado significando a vida – no universo simbólico da experiência humana, o coroamento possui o sentido de experiência com o mundo invisível e o visível, ele se interpenetra da relação “Ori” (Cabeça), como código pessoal que nasce no mundo físico, como expressão do arquétipo de si mesmo. Portanto, segundo Rodrigues (2009), ninguém tem Ori igual do outro, cada um tem o seu, num diálogo interno de linguagem simbólica, de visão de mundo, o qual penetra no contexto religioso da criatividade na diáspora, secreto, sagrado, consagrado, lúdico, sem juízo de valor, mas registrado na memória do corpo. Sendo assim, quais os símbolos que se expressam no Maracatu e como interpretá-los?

Na difusão do conhecimento, o maracatu representa simbolicamente o sentido de “guerra-bonita” na língua Tupi, como forma de reafirmar a luta pela permanência de significados, estes estão atrelados ao Ori – o que se individualiza como expressão do arquétipo de si mesmo – de onde se conectam as ideias, o imaginário, pensamento e ação contínuos (metáforas

5 Termo utilizado para designar genericamente os indivíduos que brincam como personagens exercendo um papel nos folguedos populares (BENJAMIN, 1989). Eles transitam e interagem no mundo lúdico das manifestações culturais, a exemplo do Maracatu de Baque Virado e Baque Solto, ambos de Nação Africana na América Latina.

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PAISAGEM INTERCULTURAL DE BRINCANTES: um ensaio acerca do Maracatu numa abordagem etnográfica

corporificadas). Tais conexões cognitivas do Orí fazem relação, na religião gege-nagô, com os Orixás, que representam os deuses africanos nos encontros religiosos. Nos terreiros (Egbés) tanto se reverenciavam os orixás, assim como os santos católicos, uma tradução cultural que, segundo Burke (2003), se constitui como um aspecto fundante da mestiçagem.

O transe de possessão desses grupos culturais é uma situação de perfeita autenticidade, como uma paisagem interpretante do invisível. Nessa situação o orixá-ancestral volta à terra para se reencarnar, durante um momento, no corpo de um de seus descendentes. Na cosmologia africana, o mundo começa com a proposição da cabaça igbá-odu, dividida em duas metades ligadas e simbolizando a esfera do invisível (orun) e o plano físico de dimensão do mundo visível (aiyê). Para o adepto do candomblé – religião africana –, o como, principal veículo à manifestação dos orixás, é o elemento que auxilia a suprimir a distância entre esses dois planos, como instância privilegiada dessa relação. Por conta disso são realizadas as obrigações com oferendas para o sucesso na saída dos cortejos nos Maracatus.

Questões de aspecto aplicável aos grupos de Maracatu compõem uma instituição moderna complexa, reativada como uma atitude epistêmica, antropológica, graças à qual o pesquisador logra escapar da ameaça do etnocentrismo e penetrar na interculturalidade do afrocentrismo entre pesquisador e pesquisado. As paisagens nesses grupos surgem, essencialmente, em resposta aos problemas por eles enfrentados, à medida que eles são capazes de interagir e se comunicar entre si de maneira eficaz. Sendo assim, ceder ou não ceder fontes de informações que estão nos corpos desses grupos passa por uma observação participante na pesquisa em situações de trabalho e de lazer, ouvindo e registrando as conversas habituais, a maneira de pensar, sentir e se comportar.

Ao registrarmos os fatos e interpretações, produzimos também formas como conhecimentos que existem a partir de um trabalho de relacionamento de conexões na descrição, que consiste em uma atividade de transformação do visível. Numa teoria científica da cultura “observar é escolher, classificar, isolar, em função da teoria” (MALINOWSKI, 1962, p. 37). Porém, para Laplatine (2004), o que funda a legitimidade do saber antropológico é o ver, o testemunho ocular e não a vigilância teórica, mas a presença da visão global do pesquisador em seu campo de pesquisa, autorizada pela descrição que vai do ver ao saber e do saber ao ver em movimento de idas e vindas, de dentro e de fora do corpo, mas que pode ser percebido na descrição do olhar de cima, de baixo, de frente, de trás, de um lado e do outro, em que as proteções simbólicas dos orixás se dão.

Todas as informações sobre a construção dos brincantes no cortejo de Maracatu vêm sendo repassadas e atualizadas ao longo dos tempos pelos representantes (dirigentes) de cada grupo. Estes mantêm o vínculo com a religião de Xangô (denominada assim em Pernambuco e que

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José Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado

representa o candomblé) e assumem os cargos de sacerdotes babalorixás (Pais de santo) e ialorixás (Mães de santo) no terreiro de cada comunidade, como pais ou mães do segredo, através de uma simbologia ritual própria, constituinte dos preceitos religiosos.

A preocupação desse olhar no brincante, na observação, no sensível, no concreto, representa uma atividade dialógica da autonomia da descrição, pois descrevemos “o que vemos para saber e esse saber deve regressar ao ver permanentemente para evitar os riscos de uma forma dissimulada de etnocentrismo ocidentalizante” (LAPLATINE, 2004, p. 60). Sendo assim, o saber brincante pode ser configurado numa paisagem em que as performances se dão a partir da inter-relação de elementos como extensão do corpo, a exemplo da: calunga6, coroa, lança do caboclo, do cetro, do surrão7, do cravo8, etc., que dialogam, inter-relacionando-se com o sujeito ator e pesquisador, corporificando informações do cotidiano no instante em que a performatividade acontece, configurando-a na memória. São representações de como são os brincantes tanto do ponto de vista intelectual ou moral, quanto do ponto de vista físico, porque “no corpo estão inscritos todas as regras, todas as normas e todos os valores de uma sociedade específica, por ser ele o meio de contato primário do indivíduo com o ambiente que o cerca” (DAOLIO, 1995, p. 39).

TECIDO ETNOGRÁFICO COMO ATIVIDADE DIALÓGICA ENTRE CORPOS

A atividade antropológica é uma atividade dialógica cujo objetivo não é levar a concordar com o ponto de vista do outro, nem tampouco convertê-lo ao nosso, mas o diálogo acontece com certo confronto e cada ponto de vista é de igual importância. Essa emancipação sensível na alteridade permite a autonomia criativa do saber brincante configurada no corpo, que requer o desenvolvimento, isolando algo como foco. Daí, na Teoria Interpretativa da Cultura de Geertz (2008), cabe as ideias relacionadas ao foco escolhido fazerem parte permanente e duradoura do nosso arsenal intelectual, confirmadas no próprio conceito de cultura, onde surgiu o estudo da antropologia preocupando-se em limitar, enfocar, especificar e conter diferentes formas e direções. Portanto, é com base nessa paisagem que ocorre a descrição de processos educativos

6 Boneca enfeitada conduzida pela dama do passo dos Maracatus.

7 Adereço preso nas costas do caboclo de lança com três a cinco grandes chocalhos presos à altura dos rins, coberto com lã de carneiro tingido em cores berrantes ou um tecido atoalhado. Utilizado também como instrumento de percussão. Considero-o como o seu grito organizado.

8 Representa a religiosidade dos caboclos de lança, a origem. Simbologia do sagrado passada de pai para filho.

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na pesquisa etnográfica, do dentro e do fora das manifestações culturais, no momento da festa e no cotidiano da vida desses brincantes.

Para Geertz (2008), algumas discussões apontam um cenário de investigação interpretativa da cultura, a saber: o próprio conceito de cultura; o fazer etnografia; a ação simbólica do comportamento humano; a experiência pessoal na pesquisa etnográfica; o fluxo do comportamento articulado; características da pesquisa etnográfica; a teoria cultural; e a situação das coisas como “essencialmente contestável”. Nesse cenário percorrem os aspectos interpretativos da pesquisa em educação não escolar dos quais tratamos.

No que tange aos diferentes conceitos de cultura,destacam-se o modo de vida, o legado social, a forma de pensar (sentir e acreditar), a abstração, a teoria, o celeiro de aprendizado, o conjunto de orientações e técnicas, o mecanismo para regulamentação, as comparações, aspectos estes relacionados a um povo, um grupo, comportamentos aprendidos, normatizações, elementos comuns, de problemas recorrentes, ajustes a ambientes externos e aos outros seres humanos, um mapa, uma peneira, uma matriz. No conceito defendido por Geertz, ele é essencialmente semiótico, porque o ser humano é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu e a cultura são essas teias, como ciência interpretativa à procura do significado, do fazer etnografia.

O fazer etnografia é estabelecer relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário, etc., sem que estas coisas sejam as técnicas e processos determinados do estudo. O que vai definir a prática etnográfica é o esforço intelectual que ela representa – sua densidade. A análise da informação de fundo é escolher, entre as estruturas de significação, os códigos estabelecidos, como um crítico literário, determinando sua base social e sua importância, como ação simbólica do comportamento humano.

Nesta categoria de análise, ação simbólica do comportamento humano, o que devemos indagar é qual a importância da ação que significa, o que está sendo transmitido com a sua ocorrência, seja ela ridícula, desafiadora, irônica, zangada, debochada, orgulhosa, pois, para Ward Goodenough (1975, p. 157), “a cultura está localizada na mente e no coração dos homens”. Portanto, a cultura representa nossas experiências pessoais localizadas no corpo, corporificadas, simbolicamente, durante o processo de enculturação.

A experiência pessoal na pesquisa etnográfica consiste no alargamento do universo do discurso humano, quando conversamos com o nativo (brincante). Conhecer sua instrução, diversão, moral, é um objetivo no qual o conceito de cultura semiótico se revela, penetra no próprio corpo do objeto com nossas próprias interpretações do que se pretende ou acredita que se pretende para depois passar a sistematizá-las. A cultura como um contexto que pode ser descrito com densidade pelos atos das experiências dos componentes do grupo (Seus símbolos,

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suas convenções), como fluxo do comportamento articulado. Nada como suas experiências pessoais – do pesquisador e do pesquisado – para a compreensão do discurso.

O fluxo do comportamento articulado – como um traçar exploratório da paisagem corpórea – representa o espaço educativo de criação de possibilidades, no que se refere ao aprendizado significativo e ao trato com o conhecimento histórico e memórias da cultura brasileira. A necessidade de discutir temáticas a partir do foco educativo, em parceria com comunidades, associações culturais e instituições de ensino e pesquisa, visa observar o impacto da formação de valores e compreensão da importância do conhecimento científico e cultural para o desenvolvimento socioeducativo. No grupo assistido, o impacto passa a ser imediato, no sentido da compreensão de seus valores culturais, importantes para a melhoria de suas condições de vida e para sua preservação, organização e sistematização para a superação dos problemas dos grupos excluídos historicamente. Portanto, cabe utilizarmos na etnografia a observação participante do processo de linguagens simbólicas, seja imagética, científica, artística e literária, dialogando com a comunidade universitária e grupos na sociedade como característica da descrição etnográfica, em uma perspectiva histórica, valorizando a pesquisa e a tecnologia no campo educativo.

A característica da descrição etnográfica compreende interpretar o fluxo do discurso social, tentando salvar o dito, fixando em formas pesquisáveis grande variação natural de formas culturais, incluindo conhecimentos muito extensivos de assuntos extremamente reduzidos ou delimitados como: Poder, Mudança, Fé, Trabalho, Paixão, Autoridade, Beleza, Violência, Amor, Prestigio (GEERTZ, 2008). As formas pesquisáveis são o que dá suporte à teoria cultural que possui viés interpretativo.

Para Geertz (2008), na teoria cultural as abordagens interpretativas de qualquer coisa – literatura, sonhos, sintomas, culturas – tendem a resistir ou lhes é permitido resistir à articulação conceptual; escapando de modos de avaliação sistemática, é possível realizar pequenos voos de raciocínio que tendem a ser efetivos, sem se perder em sonhos lógicos acadêmicos. No ponto de vista global da abordagem semiótica da cultura, ganhar acesso ao mundo conceptual no qual vivem os nossos sujeitos é possibilitar conversar com eles no universo da ação simbólica entre a necessidade de apreender e a necessidade de analisar. Ou seja, quanto mais longe vai o desenvolvimento teórico, mais profunda se torna a tensão, sem amplidão das abstrações. Nessa teoria cultural, em vez de começar com um conjunto de observações e tentar subordiná-las a uma lei ordenadora, essa inferência começa com um conjunto de significantes (presumíveis). Esses significantes são atos simbólicos ou conjunto de atos simbólicos e o objetivo é a análise do discurso social entre o anotar e o afirmar particularidades dos atores, de modo a investigar a

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importância não aparente das coisas, as essencialmente contestáveis, sobrevivendo às realidades que estão por vir.

Geertz (2004) ainda apresenta algumas fugas de situação das coisas como “essencialmente contestável”, que está em transformar: a captura em folclore e colecioná-lo; em traços e contá-los; em instituições e classificá-las; e em estruturas e brincar com elas. A perspectiva é mergulhar na emoção do olhar das dimensões simbólicas da ação social, colocando à disposição do humano, respostas que outros deram como registro de consultas sobre o que o ser humano falou.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cultura, como se pode ver, é um aspecto importantíssimo a se ter em conta na concepção e execução dos projetos de desenvolvimento humano educativos. Exige-se, para isso, que se leve em conta o sentido (significado) que as comunidades dão aos aspectos de contexto de dimensão visível e invisível que caracterizam o olhar simbólico da ação social do cenário ou paisagem pesquisada.

Ao olhar de paisagem intercultural na América Latina, no corpo dos brincantes do Maracatu, processos híbridos de identificação são marcados por saberes que formam e dessa formação novos saberes se constituem. Isso possibilita dar visibilidade a processos educativos que perpassam através da performatividade e das narrativas que interpretam o fluxo do discurso social, tentando salvar o dito no campo da pesquisa etnográfica, o sentido de pertencimento do mundo conceptual no qual vivem os sujeitos brincantes da cultura.

Ao estabelecer relações de observação e escuta com os informantes brincantes da endocultura, dois aspectos para a pesquisa etnográfica ajudam a estabelecer o norte da pesquisa em educação: a formação como experiência de vida e a emancipação sensível na alteridade. Estes aspectos passam pelo mosaico intercultural na América Latina e pela paisagem no contexto da descrição dialógica do saber fazer educativo, constituído fortemente no âmbito religioso e de luta dos brincantes através da incorporação do outro de maneira lúdica, mas também tensa, grave e subversiva, com uma proliferação de linguagens corporais de necessidade antropofágica na interalimentação entre micro e macrossistemas culturais.

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José Antonio Carneiro Leão e Margarete de Souza Conrado

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas

de Enfrentamento

Izailton Fernandes Silva1

Daniela Gusmão2

Benedito G. Eugênio3

RESUMO

Neste texto apresentamos os resultados de uma pesquisa realizada em escolas de ensino médio da cidade de Vitória da Conquista-Ba. Os dados foram coletados por meio de entrevistas com nove atores do processo educativo, sendo três professores, três alunos e três coordenadores pedagógicos. O objetivo foi verificar de que forma a violência praticada no interior da escola interfere no processo ensino-aprendizagem. Inicialmente tecemos algumas considerações sobre a violência na escola e, em seguida, passamos a discutir os dados das entrevistas.

Palavras-chave:

Violência na escola. Ensino-aprendizagem. Escola pública

VIOLENCE IN THE SCHOOL: interference in the teach-learning process and forms of

coping

ABSTRACT

In this text we present the results of a research carried through high schools education of the city of Vitória da Conquista -BA. The data were collected by means of interviews with 9 actors of the educative process, being 03 teachers, 03 pupils and 03 coordinators. The objective was to verify in which forms the violence practised inside the school interferes in the teaching-learning

1 Discente do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

2Discente do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

3Professor da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Email: [email protected]

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Izailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio

process. Initially some considerations on the violence in the school were analyzed and, after that, we started to discuss the data collected from the interviews.

Keywords:

Violence in the school. Teaching-learning. Public school

INTRODUÇÃO

A violência praticada no espaço da escola tem sido motivo de preocupação para educadores, pais, estudantes, órgãos de segurança pública, dentre outros. Os inúmeros casos de violência na escola têm causado sérias preocupações aos educadores e vêm sendo noticiados na mídia em diferentes localidades brasileiras.

Violência nas escolas ameaça alunos e professoresDuas pesquisas mostram o que pais, alunos e professores pensam sobre a se-gurança. A maioria não se sente totalmente segura nas escolas, principalmente as públicas. (G1 Noticias, 25/07/2007)

Mais um exemplo de violência envolvendo estudantes em Salvador aconteceu numa escola no bairro de Pero Vaz, depois de uma briga entre alunos. Pais e alunos de escolas da rede pública de Salvador estão assustados: em três dias foram três casos de violência. Na última segunda-feira (23), um aluno foi morto dentro da sala de aula. Para a polícia, não falta segurança nas escolas da capital. (Jornal da Manhã, TV Globo Bahia, on line, 29/03/2009).

Bahia: aumenta a violência nas escolas de Salvador.Aumentou a violência nas escolas de Salvador. Em apenas três meses, foram registrados 70 casos, que vão desde agressões físicas a tráfico de drogas.( Uol notícias, 18/05/2009)Escolas tiveram 91 casos de violência em 2009. (Jornal A Tarde On line, 12/07/2009).Violência nas escolasAlunos de uma escola em Jataizinho são apreendidos depois de ameaçar pro-fessores. Professores do Colégio Adélia Antunes sofrem com ameaças e agres-sões dos próprios alunos. Ontem 7 adolescentes foram apreendidos, acusados de furtos, roubos, agressão e até ameaça de morte. Eles foram encaminhados para a delegacia. As famílias foram comunicadas. De acordo com a vice-dire-tora da escola a situação está insustentável. Jornal Tarobá, 31/01/2010

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas de Enfrentamento

Dentro das escolas as práticas de diferentes formas de violência tornam-se cada vez mais constantes. A presença, no ambiente escolar, de alunos armados, as agressões a/de professores e alunos, a vinculação de membros da comunidade estudantil com o tráfico de drogas e a ação nem sempre pacífica da polícia, chamada a intervir em casos mais graves, formam um panorama que acentua o problema e determina novos padrões de comportamento na busca por maior segurança dentro das unidades de ensino.

Neste artigo abordamos as consequências da violência praticada no interior da escola para o processo de ensino-aprendizagem e as possíveis formas de enfrentamento deste fenômeno. Os dados foram coletados por meio de entrevistas com professores, alunos e coordenadores de escolas de ensino médio de Vitória da Conquista-Ba.

A VIOLÊNCIA NA ESCOLA: algumas considerações iniciais

Em sua edição do dia 12/07/1999, o Jornal A Tarde, de Salvador, publicou a seguinte notícia:

O terror vivido numa escola da capital é relatado por uma professora de ensino médio, que pediu para não ser identificada. Ameaçada de morte por um aluno depois de denunciá-lo por tráfico à direção, pediu transferência da unidade. “Enquanto estou lá, vivo em pânico. Ele diz que manda me seguir, diz que sabe onde meu filho estuda. Fora minha situação, conheço vários colegas que sofrem agressão verbal diariamente, até física, mas que não vão peitar mar-ginal”.

Violência4 significa obrigar a pessoa a fazer algo utilizando-se da força e coagindo-a à realização de alguma ação. Portanto, vamos defini-la como o “uso da força física e do constrangimento psíquico para obrigar alguém a agir de modo contrário à sua natureza e ao seu ser. A violência é violação da integridade física e psíquica, da dignidade humana de alguém” (CHAUÍ, 1995, p. 50).

A terminologia violência tomou conta da mídia, refletindo o fenômeno social que não para de crescer e vem determinando ações coletivas e individuais. A qualquer instante podemos estar diante de situações de extrema violência, inclusive através do sistema midiático, que expõe, de forma nem sempre didática, frequentes situações de conflito. Com relação a isso, Hall (apud ABRAMOVAY, 2006, p.54) afirma que:

4 Segundo o dicionário de Língua Portuguesa, a palavra Violência significa: “1. qualidade ou ação de violento. 2 constrangimento físico ou moral. Violento. 1. que age com ímpeto, força, energia. 2. Bruto” (LUFT, 2002, p.675)

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Izailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio

Poucos temas têm merecido tanta atenção hoje, como a violência. Para muitos autores, um dos signos da contemporaneidade é a insegurança, a impotência, o medo de que os mais diversos tipos de violência nos atinjam, quer como membro de uma coletividade, quer no plano da vida privada, desestabilizando individualidades.

Partimos do princípio de que a compreensão da violência ocorre de acordo com as concepções que cada sociedade adota (cultura, tempo, conceitos, normas, etc.). Abramovay et al (2006) destacam que, “além da multiplicidade de formas assumidas pela violência, existem diferenças entre os períodos históricos e culturais no que tange à compreensão sobre o tema”.

Podemos identificar muitas ações consideradas violentas em sociedades diferentes em tempo e espaço, que só podem ser compreendidas ou aceitas se for considerado o contexto histórico, político e social (entre outros aspectos) da sociedade em questão. É preciso verificar o contexto em que essas ações ocorreram, as relações de causa e efeito. Abramovay (2006, p.54) vai dizer que “não necessariamente se fazem necessárias, provas, corpos, para configurar algo como violência”. Nesse sentido, seguindo a autora, é relevante atentar para as relações que desencadeiam violências, sejam estas configuradas em nível material, ou subjetivo.

Abramovay (2002, p. 27-28) nos apresenta três classificações da violência:

A violência direta se refere aos atos físicos que resultam em prejuízo delibera-do à integridade da vida humana [...] envolve todas as modalidades de homicí-dios (assassinatos, chacinas, genocídio, crimes de guerra, suicídios, acidentes de trânsito e massacres civis). A violência indireta envolve todos os tipos de ação coerciva ou agressiva que implique prejuízo psicológico ou emocional [...] a violência simbólica abrange relações de poder interpessoais que cer-ceiam a livre ação, pensamento e conseqüência dos indivíduos.

Tais colocações da autora revelam que a violência pode se evidenciar a partir de prejuízos facilmente à mostra, ou que causam danos ao corpo físico dos sujeitos, a outros danos que podem afetar, por exemplo, o psicológico e as relações sociais dos indivíduos.

Ainda no conceito geral da violência, Costa (1991 apud CANDAU, 1995, p. 19-20) faz a seguinte consideração:

o emprego desejado de agressividade com fins destrutivos. Agressões físicas, brigas, conflitos podem ser expressões de agressividade humana, mas não ne-cessariamente expressões de violência. Na violência a ação é traduzida como violenta pela vítima, pelo agente ou pelo observador. A violência ocorre quan-do há desejo de destruição.

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas de Enfrentamento

A violência, segundo o autor, não se encerra em danos causados por acidente, sem intenção, mas quando existe o objetivo do agressor em causar danos (físicos, morais, psicológicos, e outros), de forma intencional.

Outra classificação de violência é enfatizada por Charlot (2002, p. 435) ao considerá-la como o uso da força, do poder e da dominação. A violência é a “vontade de destruir, de aviltar, de atormentar”. Porém, o autor aponta para a necessidade de diferenciar a questão da violência, da agressão e da agressividade. Charlot (2002) define agressividade como uma predisposição biopsíquica reacional que pode levar a angústia e a agressividade. Já a agressão é um ato que implica brutalidade física ou verbal.

Spósito (1998, p. 3) admite que “violência é todo ato que implica ruptura de um nexo social pelo uso da força”, mas também enfatiza a necessidade de se estabelecer diferenciação entre agressividade e violência.

A violência, segundo Velho e Alvito (1996), não se limita ao uso da força física, mas a possibilidade ou ameaça de usá-la constitui dimensão fundamental de sua natureza. Esses autores relacionam a violência com poder, quando enfatizam a possibilidade de imposição de uma vontade, de um desejo ou projeto de uma pessoa sobre outra.

Para Marilena Chauí (1999), há uma contraposição entre violência, ética e poder, porque seres racionais, dotados de linguagem e de liberdade, são tratados como se fossem coisas. Para a autora, violência é um ato de brutalidade, abuso físico/psíquico contra alguém, caracterizando relações intersubjetivas e sociais definidas pela opressão e intimidação, pelo medo e pelo terror.

Arendt (apud GADELHA, 2001, p. 47) aponta a ocorrência de oposição entre violência e poder. Segundo a autora, poder e violência ocupam dimensões diferentes. A violência só se instaura quando o poder é colocado em xeque-mate.

Com base nos autores citados, consideramos que a violência pode ser expressa por atos que causem prejuízos ao indivíduo em dimensões físicas, psicológicas e sociais, e que a violência ocorre quando há intenção de causar danos. O que determina a violência, ainda de acordo com os teóricos em destaque, é o desrespeito, a coisificação, a negação do outro e a violação dos direitos humanos, que se somam a uma realidade social de miséria, exclusão, corrupção, desemprego, concentração de renda e autoritarismo.

Em pesquisa realizada para sua tese de doutorado, Cristianne Famer Rocha (2005) analisa reportagens veiculadas sobre a violência na escola em duas revistas semanais - Veja e Isto É -, no período de 1998 a 2002. Segundo a autora, um dos objetivos foi problematizar a relação existente entre as reportagens sobre a violência na escola e aquelas que mostram ser os novos mecanismos de controle úteis e necessários para garantirem a nossa qualidade de vida e evitarmos os contínuos riscos a que estamos expostos.

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Izailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio

Outras pesquisas estudando o fenômeno da violência na escola têm sido realizadas por diversos investigadores, seja em programas de pós-graduação, em instâncias governamentais ou em artigos publicados nos principais periódicos da área de educação no Brasil. Esses estudos apontam para a relevância e a atualidade das investigações sobre o fenômeno da violência na escola. Análise preliminar dos estudos realizados nos programas de pós-graduação foi realizada por Spósito (2001).

O QUE DIZEM OS ATORES ESCOLARES SOBRE A VIOLÊNCIA?

Invariavelmente, os entrevistados afirmam que a violência escolar cotidiana interfere na qualidade do trabalho do professor e também no aprendizado dos alunos. Eles declararam que a violência no cotidiano da escola passou a ser rotineira e traz consequências bastante danosas ao andamento das aulas. Batista e Pinto (1999) vão sustentar este pressuposto ao dizer que a rotinização da violência tem consequência sobre a saúde mental das vítimas, além das interferências no processo de ensino-aprendizagem.

De acordo com as entrevistas, a violência atrapalha porque, por mais que o professor aproveite a oportunidade para relacioná-la com outros assuntos, no momento em que ela acontece, o professor tem que parar aquilo que está explicando, o que acaba tirando o foco do andamento da aula e prejudicando a atividade programada para aquele dia. É o que apontam três opiniões transcritas abaixo:

Interfere muito. Você tem que ficar parando a aula para chamar a atenção dos alunos, que de um jeito ou de outro estão em alguma ação de violência; você tem que tentar criar um ambiente de trabalho. A bagunça sempre “quebra” o ritmo da sua aula, atrapalha a atividade que você programou para aquela aula. (Professor A)

Só interfere. Cria uma cultura em que o medo passa a fazer parte das relações e qualquer acontecimento acaba sendo um motivo para que a aula seja inter-rompida. Aqui já aconteceram casos de professor parar a aula no meio por se sentir intimidado ou ameaçado por alunos. (Coordenadora B)

Toda vez que estoura uma confusão, o professor para a aula e, se a briga for em outra sala, todo mundo sai correndo para ver. Isso atrasa a matéria, né? (Estudante B)

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas de Enfrentamento

Sobre o exposto acima, Batista e Pinto (1999) apontam que um dos efeitos mais cruéis da violência na escola é a desorganização do ambiente de trabalho docente, labor este que, para acontecer, depende de organização tanto antes, quanto durante a atuação profissional. Essas autoras consideram ainda que:

a excitação, a desconcentração que o ato violento provoca nos alunos, obriga o professor a um maior esforço, tanto para retomar o interesse no conteúdo mi-nistrado, como para tranqüilizar a turma de alunos, fazer diminuir a dispersão natural em um evento deste tipo. (p. 313).

Além disso, as autoras acima explicam que o próprio fato de trabalhar a violência como tema complementar aos habituais conteúdos escolares exige um esforço redobrado, posto que os educadores não recebem formação adequada para isto.

Para os educadores entrevistados, o professor evita até mesmo chamar a atenção dos alunos que estão atrapalhando a aula, por temer alguma possível atitude de vingança. É o que ilustra a fala de dois educadores:

Uma vez fui chamada a uma sala de aula onde um adolescente com um cani-vete ameaçava outro que tinha mexido com a namorada dele na noite anterior. Aí já não teve mais aula; foi uma confusão. Você fica até com receio de chamar a atenção dele, porque você está sempre de costas para ele. (Coordenadora A)

Como vários professores, sou vítima de violência constantemente. Já fui xin-gada várias vezes. Os alunos nos tratam com desrespeito e temos que ter mui-to cuidado sobre o que podemos dizer a eles, para evitar agressões maiores. (Professor B)

De acordo com Batista e Pinto (1999), o medo de ser agredido fará o professor atuar no limite exato da obrigação, ou seja, tornar-se-á professor stricto sensu e evitará aquilo que o pode agredir, o aluno. Assumirá uma postura indiferente para com este, que poderá ser estigmatizado como vândalo ou marginal. Para as autoras, essa atitude de despersonalização, para evitar um sofrimento maior, é um dos principais propiciadores para o surgimento do burnout, resultante de quadros em que a dificuldade de relacionamento com conflitos frequentes leva educadores a situações estressantes. Esse quadro incide de modo bastante negativo no processo de ensino-aprendizagem, o que significa dizer que contribui para a baixa qualidade do ensino. Dois entrevistados reconhecem a falta de interesse do aluno também como fruto do processo de violência no ambiente escolar:

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Izailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio

Se a qualidade do ensino já é de mal a pior, com essa coisa da violência muita gente vai perdendo o estímulo e deixa de frequentar a escola. À noite isso é ainda pior. (Estudante C)É preciso um mínimo de envolvimento com a aula para que o processo de ensino-aprendizagem se efetive. Isso não está sendo visto nas nossas escolas; com exceção de uns poucos alunos, a maioria promove algazarras em plena sala. Uma situação difícil de ser contornada, por mais firme que seja o profes-sor. (Professor C)

Há relato de um professor que, não suportando as agressões verbais, retrucou no mesmo nível, embora sejam casos isolados. [...] vi um único caso em que um professor ficou estressado e agrediu verbalmente o aluno. (Coordenadora B). Na grande maioria dos casos, o que ocorre entre os educadores é “cultura do medo”. Ou seja, eles evitam confrontos diretos com alunos, seja por medo de represálias, seja por não considerar esse modo de agir como o mais indicado.

FORMAS DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA NO COTIDIANO DA ESCOLA

Quando se trata do enfrentamento da violência, os entrevistados defendem mudanças na estrutura da escola e buscam também abrangência na premissa de que a escola sofre/produz/concentra formas de violência justamente porque a sociedade é violenta. Assim, nas entrevistas há uma tendência a apontar a violência no ambiente escolar como resultado de uma violência que se verifica num contexto mais amplo.

Tem que mudar muita coisa na escola [...] hoje os alunos só vão à escola para botar a mão no diploma. O governo tem de investir mais para melhorar o ensi-no e oferecer mais opções de divertimento e esporte. (Estudante A)

As soluções de uma forma mais satisfatória passam por questões socioeco-nômicas que estão fora da escola. Mas nem por isso a escola deve ficar apá-tica enquanto está sendo tomada de assalto pela violência. Não há soluções prontas, mas precisamos enquanto educadores buscar caminhos de atenuar o quadro, inclusive mudando a estrutura de ensino, se for o caso.(Professor A)

Se a sociedade brasileira estivesse vivendo uma cultura de paz, não haveria a violência que está sendo vista na escola. Portanto, além de investir na quali-dade do ensino, é preciso outras medidas para a sociedade como um todo para frear a violência, inclusive a que acontece na escola. (Professora C).

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas de Enfrentamento

Alguns sujeitos verbalizam que, em caso de uma agressão física grave, por exemplo, o caso ultrapassa a competência da escola. Deve-se, então, acionar as forças de segurança.

A escola ainda não sabe como lidar com essa situação de violência. Vejo que tenta alertar os jovens para as conseqüências dos seus atos, mas isso pouco tem adiantado. Nos casos de agressões mais graves, sou a favor que o autor seja encaminhado para a delegacia. (Coordenadora C)

Outros entrevistados verbalizam a necessidade de a escola trabalhar o tema da violência durante as aulas. Assim, buscar-se-ia criar um ambiente propício para falar sobre a importância de manter um bom relacionamento interpessoal em sala de aula, alertando sobre as diversas manifestações e suas repercussões no ambiente escolar e fora dele. Alguns criticam o modelo escolar defendendo a necessidade de mudança para se ajustar às demandas de jovens e adolescentes.

Tinha de ter mudança grande na escola, porque a gente fica em sala superlo-tada e nem entende direito a aula. Acho que, se a escola melhorar, a violência vai ficar menor. (Estudante B)

Dentro do que a escola pode fazer, eu destaco a necessidade de levar o assunto violência pra discussão em sala e montar um trabalho. Buscar junto com os alunos produzir textos e discutir o assunto “de onde vem essa violência”? É preciso superar o tabu e colocar o assunto para ser estudado em sala de aula, nas suas diversas implicações. (Professora B)

Por si só, pouco a escola pode fazer, já que a violência perpassa por toda a sociedade. No entanto, os educadores podem apostar no diálogo e em ativida-des que levem o aluno a refletir sobre essa violência. Isso pode ser um ponto a favor da paz na escola. (Coordenadora A)

Os dados levantados nas entrevistas demonstram possibilidades de caminho para o enfrentamento da violência no ambiente escolar em Vitória da Conquista. A grande aposta entre os pesquisados é levar as discussões sobre a problemática para a sala de aula, de forma sistematizada, a fim de levar o aluno à reflexão sobre o assunto.

Sabe-se hoje que a violência é uma preocupação geral de toda a sociedade brasileira, o que referenda a ideia de colocá-la como ponto de estudo nas escolas. Placco et al (2002) afirmam que a questão da violência precisa ser estudada a partir do contexto socioeconômico e político da sociedade. De outra forma, corre-se o risco de atribuir ao indivíduo, à sua genética ou a problemas psicológicos a responsabilidade por ações violentas, seja na sociedade, seja na

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Izailton Fernandes Silva, Daniela Gusmão e Benedito G. Eugênio

escola. Além disso, destacam a necessidade de prevenção da violência dentro do espaço escolar e consideram os educadores como parceiros privilegiados nesse processo:

A escola pode atuar na prevenção à utilização da violência por meio de proje-tos que considerem como ponto de partida a vulnerabilidade dos jovens, que mobilizem os professores em torno de uma tarefa coletiva, que se utilizem dos vínculos da escola com a comunidade, valorizando especialmente a participa-ção dos pais (PLACCO e equipe, 2002, p. 364).

Vale observar que a cultura criada pela sociedade para a proteção contra a violência está presente na escola, cujos muros estão cada dia mais altos e as grades, mais grossas. Esse isolamento como estratégia de passar incólume à violência que campeia o meio urbano não consegue dar conta de frear as formas de violência gerada/explicitada dentro do seu próprio âmbito.

Nessa perspectiva, todo esforço para compreender o papel da escola e dos sujeitos que a fazem é importante para determinar meios de enfrentar a crescente violência e estabelecer uma melhor convivência entre aqueles que se inter-relacionam, dia a dia, efetivando o processo de ensino-aprendizagem.

Referências

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A Violência na Escola: Interferência no Processo Ensino-Aprendizagem e Formas de Enfrentamento

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A BAGAGEM PESSOAL COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL PARA

A MEDIAÇÃO: uma análise feita a partir dos encontros de formação para

professores do projeto Descentralizando o Acesso – Visitas Escolares a Inhotim

Amanda Carolina Pinto Moreira1

Simara de Oliveira Araújo

RESUMO

A profissão de professor atualmente encontra inúmeras dificuldades, principalmente no que diz respeito a trabalhos que vão além dos muros da escola. O intuito deste texto é apresentar as potencialidades existentes em locais que promovem a educação não formal e o docente nesse contexto, citando a instituição museológica como um exemplo pertinente, sistematizando uma prática aplicada no Instituto Inhotim por meio do projeto Descentralizando o Acesso. Este projeto visa qualificar a visita dos alunos, oferecendo um programa de formação baseado na vivência do professor que leciona na rede estadual e municipal de ensino de Brumadinho e treze municípios vizinhos, firmando com ele uma parceria e tendo-o como um propositor capaz de “apropriar-se” do acervo de arte contemporânea, desdobrando-a de acordo com seus trabalhos em sala de aula.

Palavras-chave:

Experimentação. Processo e mediação.

1 Formada em Licenciatura Plena em História pela Faculdade Asa de Brumadinho, mediadora de Arte e Educação desde 2008 e atualmente Arte Educadora do Instituto Inhotim em Brumadinho - MG.

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Amanda Carolina Pinto Moreira e Simara de Oliveira Araújo

THE PERSONAL KNOWLEDGE AS FUNDAMENTAL ELEMENT TO MEDIATION:

an analysis made from the meetings for teachers of the project Decentralizing the Access

– school visits to inhotim

ABSTRACT

Teaching occupation nowadays find innumerable difficulties, specially related to research activities that step away from formal school spaces. The aim of this text is to present the possibilities that exist in spaces that work with non-formal education and how teachers can relate to this context, focusing on the museum institution through the example of the applied practice of the project decentralizing the Access in the Instituto Inhotim, Brumadinho, Brazil. The objective of the analyzed project is to qualify students’ visits by offering workshops based on art and the experiences of teachers that work in the state and federal public schools of Brumadinho and thirteen neighboring cities. It is by making a partnership with this teacher and considering them as a proposition agent capable taking Inhotim’s contemporary art collection for themselves and as a possibility to unfold research activities inside the classroom.

Keywords: Experimentation. Process and mediation.

INTRODUÇÃO

Atualmente, a busca por subsídios externos para apoiar o trabalho do professor vem se intensificando no Brasil. Tal questão constitui um desafio, tendo em vista que o ensino encontra inúmeras barreiras, principalmente fora do espaço físico da escola.

Muitos professores que têm interesse em aprofundar questões que necessitam de subsídios externos queixam-se da falta de estrutura e de materiais de apoio pedagógico. Alguns alegam que inúmeras vezes são barrados por dificuldades existentes no sistema para dar continuidade aos trabalhos que acontecem fora do âmbito escolar e, por isso, muitas vezes a visita a museus e outros locais procurados para “extensões” acabam simplesmente em mais um dia agitado, no qual as crianças e adolescentes extravasam suas energias conhecendo outro ambiente, e fica tudo por isso mesmo. Alguns docentes se intimidam por não saberem como aproveitar o espaço visitado, ou por impedimentos por parte da escola, ou por experiências frustradas em outros locais: “Visitei um museu com meus alunos e não entendi nada”, ou “meus alunos não têm nem o que comer em casa, como os levo em um lugar desses?”, e ainda “se eu não

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A BAGAGEM PESSOAL COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL PARA A MEDIAÇÃO: uma análise feita a partir dos encontros de formação para professores

do projeto Descentralizando o Acesso – Visitas Escolares a Inhotim

entendo, imagine meus alunos”. Estas observações caracterizam situações presenciadas em ações educativas que têm como alvo levar o conhecimento aos alunos de diversas realidades, por meio de incentivos como oficinas, visitas a museus e outras atividades. Fazer um trabalho paralelo com os professores antes mesmo da visitação tem gerado ótimos resultados, pois a preocupação atual é entender, ou melhor, intensificar a relação com lugares de educação não formal e a escola, sendo o professor um agente multiplicador da potencialidade neles existente.

Atualmente, a instituição museológica, assim como os demais ambientes educacionais, vem se tornando um elemento capaz de instrumentalizar e instigar quem o explora como local de pesquisa, enriquecimento pessoal e coletivo, constituindo um excelente mecanismo para esses professores que pretendem ir além de uma excursão com seus alunos. Em pesquisa, Marandino analisou o interesse dos docentes por museus de ciências, reafirmando mais uma vez a potencialidade dessas instituições:

Ao analisar os objetivos dos professores ao buscar os museus, verificou-se que esta procura está relacionada, primeiramente, com uma alternativa à prá-tica pedagógica, já que entendem esta instituição como um local alternativo de aprendizagem. Em segundo lugar, os professores consideram a dimensão do conteúdo científico, chamando atenção para o fato de que os temas apre-sentados no museu podem ser abordados de uma forma interdisciplinar ou enfatizando a relação com o cotidiano dos estudantes. Alguns professores, em menor quantidade, se preocupam com a ampliação da cultura como objetivo da visita. (MARANDINO, 2001, p. 89)

A EXPERIÊNCIA E SEU CONTEXTO

A partir de experiências vivenciadas no programa de formação para professores do projeto Descentralizando o Acesso – Visitas Escolares a Inhotim, constatamos a importância de iniciativas que preparem os professores para trabalhar com os alunos antes da visitação a museus e instituições, com o intuito de promoção da educação não formal. O trabalho com esses professores é realizado por meio de uma metodologia experimental. São promovidos dois dias de encontros, com um intervalo de sete dias entre eles. O primeiro no próprio museu, o segundo na cidade ou no município participante, com carga horária de 16 horas. O objetivo é que finalizem em possíveis propostas de desdobramentos a serem executadas antes, durante e após a visita dos alunos. Os temas abordados no programa são especialmente voltados para o conteúdo de arte contemporânea. Os professores participantes de certa forma experimentam e ampliam seus conhecimentos sobre a produção artística atual, de forma dinâmica e não

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Amanda Carolina Pinto Moreira e Simara de Oliveira Araújo

agressiva. É pertinente ressaltar que a grande maioria desse público nunca teve contato com a arte contemporânea, nem os seus alunos, e foi a partir desta constatação que se consolidou uma afirmação: esse professor só se permite essa experimentação porque o conhecimento prévio que traz é respeitado e usado como elemento fundamental para o desenvolvimento do projeto.

Após uma conversa não muito longa no período da manhã, fomos para a visita me-diada. No decorrer da caminhada pedimos que os professores fizessem conexões das obras de arte e do meio ambiente com as matérias lecionadas. As conversas estabele-cidas durante a mediação foram extremamente interessantes. Falamos sobre a obra de arte e o contexto social e político mundial, as aproximações que a arte contemporânea permite devido aos materiais que muitas vezes são corriqueiros do nosso dia a dia, dentre outros. Os lugares visitados foram BoxRead, galeria Mata e galeria Dóris Sal-cedo. (Relatório – Encontro de formação com professores de Rio Manso e Piedade) 2

A MEDIAÇÃO EM AÇÃO

O exercício da mediação, dentro desse projeto, se faz a partir do conjunto de elementos capazes de gerar discussões acerca do acervo de arte contemporânea, podendo culminar em atividades elaboradas pelos próprios participantes, com a necessidade de gerar conhecimento para além da profissão de professor, para o dia a dia desse profissional. O programa de formação baseia-se em três diretrizes: conhecer o Instituto Cultural Inhotim, ler imagens e propor arte. Isto também implica conhecer melhor a realidade desse professor e suas angústias em relação ao ensino. Com base nos encontros, acreditamos que o programa de formação é de suma importância, pois é nele justamente que temos o primeiro contato com esse professor, e ele, com a arte contemporânea. Para tanto, seria inadequado mediar o acervo sem entender o que esse indivíduo pensa, associa, quer.

Acreditamos na mediação como um processo de construção de conhecimentos, em que a troca de informações acerca do objeto de arte e do espaço museológico se torna essencial para as proposições. Sua prática é construída por meio da bagagem do público, sendo de fundamental importância considerar os conhecimentos e as vivências desse professor como fator para a somatória do processo. Durante o programa de formação, procuramos fazer conexões entre a realidade da escola e a do professor, compartilhando com ele também as nossas. Com isso, temos a oportunidade de conhecer um pouco mais as particularidades e os interesses do público que recebemos.

2 Documento encontrado nos arquivos do setor de Arte-Educação do Centro Educativo Roberto Burle Marx, loca-lizado no Instituto Cultural Inhotim, Rua B, 20, Brumadinho, Minas Gerais.

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A BAGAGEM PESSOAL COMO ELEMENTO FUNDAMENTAL PARA A MEDIAÇÃO: uma análise feita a partir dos encontros de formação para professores

do projeto Descentralizando o Acesso – Visitas Escolares a Inhotim

A educação não formal funciona em mão dupla: o educador tanto aprende quanto ensina – o mesmo vale para os participantes das atividades. É funda-mental, assim, que o educador tenha a sensibilidade para entender e captar a cultura local, a cultura do outro, as características exclusivas do grupo e de cada um dos participantes. (SIMSON; GOHN; FERNANDES, 2007, p. 16)

Pensamos no professor como nosso parceiro. Ele é incentivado a todo momento a pensar em proposições para os alunos, como uma extensão das disciplinas lecionadas ou como temas transversais. Contudo, essa escolha demonstra a capacidade de absorção, a potencialidade existente no museu e o que ele significa para a vida desse professor e, consequentemente, para a do aluno.

Será apresentada a mensagem Atitude para promover uma discussão sobre comportamento, amor ao próximo, autocuidado e cuidado dos patrimônios: público e privado. Na sequência da palestra, a professora Ivone trabalhou os conceitos de museu e arte, fazendo uma localização sociotemporal da arte contemporânea. No sentido de instigar a curiosidade dos alunos, foram mos-trados recortes de algumas obras do Instituto Inhotim. Para concluir a pales-tra, as professoras Izabel e Regina trabalharam os conceitos de patrimônio: público, privado, material e imaterial. No dia dezoito de junho de dois mil e nove (18/06/09) os mesmos alunos participarão da excursão ao Instituto Inho-tim para apreciação das obras de arte contemporânea. No dia 19/06/09 será lançado o concurso de redação. O tema será valores e os alunos deverão usar toda a criatividade para relacioná-lo com a visita ao museu. (Projeto Valores – Escola Estadual Nunes Leal – Betim, Minas Gerais)3

A continuidade e o desdobramento do projeto dependem exclusivamente do interesse do professor, que, ao se ver como propositor, investe os dias vivenciados em Inhotim em projetos para que a visitação dos alunos não signifique apenas mais uma visitação. Se ele se sente à vontade com essa parceria, volta ao museu para a visita e depois dela propõe atividades de pós-visita. Ou seja, antes da visitação ao museu, prepara os alunos e, depois da visitação, aprofunda todas as questões que emergiram em um novo retorno para a escola.

Durante a saída de campo, a prática pedagógica será priorizada por meio de vivências e descobertas: caminhadas, observação do ambiente externo, das galerias de arte contemporânea e contato com os elementos da natureza. A interferência do professor/equipe de apoio será fundamental para direcionar e estimular a observação e discussão entre os estudantes, levando-os a tirar suas

3 Documento encontrado nos arquivos do setor de Arte-Educação do Centro Educativo Roberto Burle Marx, loca-lizado no Instituto Cultural Inhotim, Rua B, 20, Brumadinho, Minas Gerais.

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Amanda Carolina Pinto Moreira e Simara de Oliveira Araújo

próprias conclusões. Pós-visita: os estudantes aprofundarão seus conhecimen-tos sobre Inhotim, realizando pesquisas que focalizem a diversidade cultural, os aspectos históricos, a localização geográfica, as características climáticas, a fauna e a flora. Os estudantes montarão um painel com as informações co-letadas, maquetes e releituras de obras, para que o restante da escola participe do processo. (Projeto Educação Ambiental e Diversidade Cultural e Inhotim – Escola Estadual Juscelino Kubtschek – Ibirité)4

CONCLUSÃO

A percepção do espaço e o que ele pode proporcionar é sentida a cada encontro de formação como uma vivência única. Muitos professores veem nos encontros uma oportunidade de expandir as fronteiras da escola, do dia a dia cansativo de ensino formal. Outros os veem como uma alternativa, ou ainda como consequência. Enfim, a verdade é que, quando os professores compreendem a liberdade de propor e a dimensão da bagagem que trazem, que constitui fator decisivo para o projeto, expressam enorme vontade de trabalhar em prol dos alunos, encontrando na arte contemporânea um subsídio a mais para superar as muitas limitações da educação em nosso país.

REFERÊNCIAS

MARANDINO, M. Interfaces da relação museu escola. Disponível em: <http//www.geenf.fe.usp.br/conteudo/arquivo/Interfaces na relação museu escola, abril 2001>. Acesso em: setembro de 2009.

NÃO FRONTEIRAS: universos da educação não formal. São Paulo: Itaú Cultural, 2007.

4 Documento encontrado nos arquivos do setor de Arte-Educação do Centro Educativo Roberto Burle Marx, lo-calizado no Instituto Cultural Inhotim, Rua B, 20, Brumadinho Minas Gerais.

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EDUCAÇÃO DIANTE DOS

PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃOJamile dos S. Cardoso1

RESUMO

Este texto tem como objetivo discutir a relação entre trabalho e educação em um contexto social marcado pelo desenfreado processo de globalização e efetivação do neoliberalismo. Dessa forma, busca-se compreender de que maneira ocorrem os processos educativos e as relações de trabalho sob os imperativos ideais neoliberais. Para tanto, são retiradas, a partir da análise teórica, algumas reflexões e conclusões acerca da função social dada ao trabalho, bem como sobre a utilização da educação como instrumento favorável à reprodução de uma ideologia dominante pautada no aumento da concentração de renda e, consequentemente, da desigualdade social. Nesse contexto, conclui-se que os processos sociais voltados ao desenvolvimento crítico da sociedade têm sido “esquecidos”, dando lugar a práticas favoráveis à manutenção de um sistema capitalista, reducionista e excludente, que faz uso dos mais variados setores sociais, inclusive da educação, para se manter vigente.

Palavras-chave:

Trabalho. Educação. Sociedade. Capitalismo. Globalização.

1 Pós-graduanda no curso Lato Sensu Estudos Culturais, História e Linguagens, pela UNIJORGE. Licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Email: [email protected]

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Jamile dos S. Cardoso

LABOR RELATIONS AND EDUCATION IN FRONT OF THE PROCESSES OF

GLOBALIZATION

ABSTRACT

The aim of this paper is to discuss the relation between work and education in a social context characterized by the uncontrolled process of globalization and by the consolidation of the neo-liberalism. This way, it is intended to understand how the educative processes and the working relations under the imperative neo-liberalist goals occur. In order to do that, some reflections and conclusions about the social function of work and the use of education as a favorable tool to the reproduction of a dominant ideology based on the capital accumulation and, consequently, on the increasing of social inequality are proposed from theoretical analysis. In this context, it is posited that the social processes dedicated to the critical development of the society have been forgotten, providing space to the practices in favor of the maintenance of a capitalist, reducing and excluding system which uses several social sectors, including the education, to keep on force.

Keywords: Work. Education. Society. Capitalism. Globalization.

INTRODUÇÃO

Na tentativa de refletir sobre a maneira como acontece a relação entre trabalho e educação no contexto social neoliberal, busca-se, com este texto, analisar os processos evolutivos das relações sociais de trabalho e observar o papel da educação diante da necessidade do enfrentamento das imposições neoliberais, visto que estas favorecem o domínio social e intelectual, por parte da classe dominante.

É evidente, nos dias atuais, a intencionalidade das políticas neoliberais de ampliar e perpetuar a ordem social vigente, marcada pela desigualdade e exclusão social. Para tanto, a educação tem sido utilizada como instrumento favorável à disseminação da ideologia de dominação. Para compreender melhor a função desempenhada pela educação e seu reflexo nas relações capitalistas de trabalho, este texto encontra-se organizado da seguinte forma: a princípio, são expostas algumas concepções de trabalho vigentes ao longo da história da humanidade, posteriormente, são abordadas as relações de trabalho desenvolvidas no modelo social capitalista, voltado estreitamente para a competitividade e a empregabilidade; e, por fim, são feitas considerações acerca da educação diante dos processos de alienação e dominação

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EDUCAÇÃO DIANTE DOS PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃO

social, destacando-se a necessidade de ressignificação da educação, visto que esta, por ser fruto das relações sociais, tem sido estruturada e desenvolvida de acordo com os anseios da classe dominante, contribuindo para a manutenção da ordem social estabelecida.

O TRABALHO COMO ALIENADOR OU TRANSFORMADOR SOCIAL

O trabalho, em seu sentido de produção de bens materiais e simbólicos ou como criador de valores, é condição constitutiva das relações humanas e imprescindível à vida social. Por isso, é preciso compreender os diferentes modelos sociais de trabalho vigentes ao longo da história das sociedades.

Marx trata, em suas obras, da relevância do trabalho, concebido como suporte à sociedade em suas múltiplas necessidades. Nesse sentido, o trabalho é entendido na sua forma ontológica, estruturante da construção social.

O trabalho, como criador de valores de uso, como trabalho útil, é indispensá-vel à existência do homem – quaisquer que sejam as formas de sociedade –, é necessidade natural e eterna de efetivar o intercâmbio material entre o homem e a natureza, e, portanto, de manter a vida humana. (MARX, 1982, p. 50)

Para o referido autor, por meio da adaptação e da relação com o meio social, os seres humanos criam e recriam, pela prática consciente do trabalho, sua própria existência. Nesse sentido, o trabalho apresenta-se como instrumento de criação e libertação social, socializado naturalmente para responder às necessidades socioculturais dos indivíduos. De acordo com a concepção marxista, Ciavatta observa: “Reconhecemos o trabalho como atividade ontológica fundamental, através da qual se produz a sobrevivência e se reproduz a vida, se cria a cultura e as relações entre os seres humanos” (CIAVATTA, 2002, p. 32).

Segundo a autora citada, a concepção do trabalho como elemento transformador da esfera social tem sido contrariada pela ideia de trabalho como instrumento de alienação. Embora se apresente como elemento imprescindível ao desenvolvimento social, o trabalho não vem sendo assumido pela maioria das sociedades como fonte de vida, apresentando-se também como instrumento de exploração entre classes.

Para Frigotto (2000), a valorização da propriedade privada (advinda do capitalismo) favorece o acúmulo individual de riqueza e dá origem a situações de exploração, aumentando as desigualdades sociais. O processo de produção e acumulação de bens na sociedade capitalista provoca a divisão em proprietários dos meios de produção e não proprietários – trabalhadores que vendem sua mão de obra.

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A busca pelo lucro cria o trabalho assalariado, que possibilita a produção e o acúmulo de riqueza mediante a alienação e a exploração do trabalhador, enquanto a legalização do trabalho domina a ideologia social, legitimando o capitalismo, e torna o trabalho a principal “fonte de virtude humana”.

Como aborda Frigotto (2002, p. 12), a realidade atual revela uma sociedade pautada no capital, inserida em um contexto de crescente desenvolvimento tecnológico, que rompe as fronteiras territoriais e expande-se em um significante processo de globalização, o qual acontece de forma excludente e violenta. Essa nova ordem mundial, em que a riqueza de poucos cresce à medida que a desigualdade aumenta, tem como característica os altos índices de desemprego e pobreza, principalmente nos países menos desenvolvidos, onde as desigualdades são ainda mais evidentes.

Para o autor, a precarização do trabalho constitui-se em um dos principais problemas das sociedades contemporâneas. A classe trabalhadora, que tanto buscou direitos trabalhistas, como redução da jornada de trabalho, férias, dentre outras reivindicações, vê-se hoje, contraditoriamente, na luta para manter-se trabalhando, em alguns casos mesmo abrindo mão dos direitos duramente conquistados.

Segundo Costa e Calvão (2002), a dinâmica da competitividade coloca sobre os indivíduos a responsabilidade de estarem ou não empregados, conforme a sua “qualificação”, reduzindo com isso a culpa do Estado diante do quadro apresentado. A atual conjuntura social impõe a necessidade de os cidadãos se adaptarem ao sistema, inibindo as possibilidades de mobilização e transformação da sociedade.

Não sendo preparado, escolarizado, qualificado, será punido pelo próprio mercado de trabalho, que transfere para o trabalhador a culpa de sua incom-petência para galgar posições mais qualificadas no dito mercado. (COSTA; CALVÃO, 2002, p. 139)

A situação vivenciada na nossa sociedade ratifica a afirmação do Manifesto Comunista:

Tudo que é sólido se evapora no ar, tudo que era sagrado se torna profano, e por fim o homem é obrigado a encarar com serenidade suas verdadeiras con-dições de vida e suas relações como espécie. A necessidade de um mercado constantemente em expansão impele a burguesia a invadir todo o globo. Ne-cessita estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vínculos em toda parte. (MARX e ENGEL, 1982, apud FRIGOTTO, 1999, p. 13)

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EDUCAÇÃO DIANTE DOS PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃO

Nesse contexto de ressignificação social do trabalho, a sua dimensão ontológica e formadora tem sido reduzida basicamente a empregabilidade, assim como no modelo fordista de produção (anos 1950 e 1960), sendo enfatizados os processos de qualificação profissional e formação de capital humano.

Com o advento da globalização, como afirma Santos (2000), prega-se a ideia de um mundo unificado. No entanto, as condições mostram-se perversas para a maioria da população, e estrutura-se a articulação de engrenagens que formam uma “máquina ideológica” favorável à ratificação da ordem vigente e aumentam as distâncias entre as diferentes classes sociais.

Diante de tal conjuntura, o desenvolvimento de ações educativas voltadas à formação de mão de obra apresenta-se como instrumento fundamental ao desenvolvimento social, segundo a ideologia do capital.

Trata-se de uma educação e formação que desenvolvam habilidades básicas no plano do conhecimento, das atitudes e dos valores, produzindo competên-cias para gestão da qualidade, para a produtividade e competitividade, conse-quentemente, para a “empregabilidade”. (FRIGOTTO, 1999, p. 45)

Como defende Costa e Calvão (2002, p. 140), as relações entre educação e trabalho têm sido colocadas de acordo com as demandas de saberes, valores, exigências do mercado de trabalho, dentre outras questões que perpassam as relações sociais. A educação é apresentada como construção de uma sociedade pautada no capital, e esta tende a reproduzir a ideologia posta, desfavorecendo assim a formação de sujeitos críticos, aptos a modificar a ordem social vigente.

Sendo a educação historicamente utilizada como instrumento de imposição dos desejos da classe dominante, esta precisa romper os limites pedagógicos impostos pelo capital, de modo a favorecer a formação de sujeitos autônomos, protagonistas de sua própria história, não se restringindo a paradigmas pedagógicos voltados à competitividade industrial e às vontades do neoliberalismo e da globalização.

CRISE SOCIAL DO TRABALHO

Em uma sociedade em que a dinâmica do trabalho é marcada pela alienação e exploração do trabalhador, as classes dominantes apropriam-se de diversos instrumentos na tentativa de ratificar a ideia de subordinação dos cidadãos. Para Frigotto (2002, p. 14), as práticas destinadas à inculcação ideológica acontecem de forma velada, por meio dos meios de comunicação, da educação desenvolvida nas escolas e passada de pais para filhos, bem como nos ambientes despolitizados de trabalho. De acordo com o autor, o modelo capitalista de produção dá ao

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trabalho um caráter de moralizador social; o indivíduo que trabalha torna-se nobre e indispensável ao desenvolvimento do sistema.

Sob a ótica do capitalismo, o trabalho deixa de ter centralidade nos valores de respostas às necessidades humanas coletivas e passa a desempenhar valor de troca, objetivando o lucro e o acúmulo de capital. O trabalhador é transformado em força de trabalho comerciável.

Segundo Frigoto (2002, p. 14, a legalização da venda de trabalho, mascarada pelo direito contratual (de exploração), coloca à sociedade a falsa ideia de escolhas realizadas. As relações de poder estabelecidas visam ao conformismo social, à medida que justificam o acúmulo de riqueza como mérito individual de quem se esforçou no trabalho e, em contrapartida, associam à pobreza a falta de dedicação pessoal.

Nesse sentido, as relações sociais de trabalho vêm reforçar o modelo social capitalista, em que o trabalho, assim como a natureza, a ciência e a tecnologia, assumem valor de troca, favorecendo os processos de alienação e exclusão social.

Como mostra Frigotto (1999, p. 26), é extremamente racional a ideia de tornar o processo de produção o mais independente possível do “fator humano”, em especial quando ele pode provocar descontentamentos e perturbação social. Entretanto, na medida em que as condições estruturais e as orientações “morais” do trabalho são “racionalizadas” e postas aos indivíduos, os questionamentos e as reivindicações a essas orientações são inibidos. Tal ideologia afirma a visão individualista e equivocada da concepção capitalista do trabalho, enfatizada pela globalização posta, que precisa ser coletivamente repensada.

Embora haja a organização de grupos de trabalhadores em sociedades de todo o mundo lutando de modo consciente pelos direitos sociais e trabalhistas que lhes cabem, como mostra Texeira (2002), a fragilização do trabalhador está fortemente presente nas relações de trabalho atuais.

Para o autor, a globalização e os processos de incentivo à privatização, vistos como garantia de empregabilidade e desenvolvimento humano, incentivados pelo neoliberalismo, acabam por reduzir o incentivo aos meios estatais de educação, emprego e renda, expondo a sociedade a situações de extrema competitividade.

Ao transferir a responsabilidade pelo desemprego para o trabalhador, que teoricamente não se encontra “adequado” para o mercado, individualiza-se a culpa pela crise social do trabalho, o que dificulta a resolução do problema, pois deixa de refletir sobre tal realidade, considerando a funcionalidade dos diversos setores sociais envolvidos, inclusive do Estado.

Como expõe Frigotto (1999, p. 26), o trabalho como fator social formador indispensável ao desenvolvimento social, deve ser garantido pelas autarquias governamentais, visto que estas têm legalmente o dever de proporcionar o bem-estar e o pleno desenvolvimento social da

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EDUCAÇÃO DIANTE DOS PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃO

população. Nessa perspectiva, condições socioeducativas voltadas à reflexão acerca do modelo de produção desenvolvido em nossas sociedades apresentam-se como importantes instrumentos para a reversão do quadro de extrema desigualdade vivenciada nos dias atuais.

EDUCAÇÃO, TRABALHO E SOCIEDADE

A história da humanidade é, de acordo com Marx (1982), marcada por intensas relações de trabalho, indispensáveis à existência humana. No entanto, o predomínio de relações em que classes dominantes escravizam ou alienam outros grupos sociais é evidenciado, segundo Frigotto (1999, p. 51), a partir do século XVIII, quando a maioria das sociedades passam a ser regidas pelo modelo capitalista de produção.

Estruturado em contraposição ao modelo feudal, o capitalismo é caracterizado pelo acúmulo de capital por meio da propriedade privada dos instrumentos e dos meios de produção. A busca constante pelo lucro, pela aquisição de riquezas, “valida” a utilização de todos os meios que possam ser úteis a essa obtenção. A substituição do trabalho humano por máquinas na tentativa de reduzir gastos, as extensas jornadas de trabalho, os baixos salários pagos aos trabalhadores são algumas das características apresentadas pela sociedade capitalista no decorrer da sua história.

Nesse contexto, sendo a educação um processo desenvolvido socialmente e estando inserida em um meio de diferentes relações sociais, podemos afirmar que o fenômeno educativo não é construído isoladamente. Caracterizada de acordo com as sociedades nas quais é estruturada, a educação pode servir como instrumento favorável ao alcance dos objetivos estabelecidos pelas instâncias políticas, econômicas e culturais de tais sociedades. Nesse sentido, os processos educativos podem ratificar as ideologias sociais estabelecidas verticalmente ou favorecer a efetivação de novas relações sociais e de trabalho.

No contexto social neoliberal, marcado pela globalização e descentralização do poder, a educação apresenta-se como instrumento a serviço dos propósitos empresariais e industriais da classe social dominante. Dessa forma, a educação institucionalizada é atrelada aos objetivos estreitos de pequena parcela da sociedade, em detrimento das reais necessidades da grande parte dos cidadãos.

De acordo com Santos (2009), os resultados do neoliberalismo apresentam-se impregnados na sociedade, seja na falta de uma educação pública de qualidade, preocupada com a formação de sujeitos sociais críticos; seja pela falta de políticas públicas capazes de proporcionar situações favoráveis à sobrevivência e ao desenvolvimento da população.

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A elaboração e a sistematização dos processos educacionais têm sido feitas privadamente pelos grupos dominantes. Também no domínio da produção intelectual, o capital faz uso da “escola” para reprodução ideológica. Dessa forma, segundo Frigotto (1999, p. 48), a educação escolar passa por um processo de mercantilização, em que as dinâmicas empresariais são previstas nos currículos e valorizam a competitividade, produtividade, utilidade e individualidade, valores próprios da sociedade do capital.

Para o autor, isso ocorre porque as leis de mercado têm regido as relações sociais, acarretando a diminuição da intervenção do Estado na sociedade e disseminando a falsa ideia de participação e abertura política. A neutralização do Estado diante dos problemas estabelecidos socialmente tem favorecido o aumento da desigualdade e competitividade social, à medida que marginaliza a parcela da população que se vê desamparada e desapropriada no que se refere a direitos sociais.

Como afirma Santos (2000), as políticas sociais passam a ser regidas pelas instituições privadas, e a política do Estado passa à política das empresas. A globalização tem disseminado a ideologia do capital, gerando excessiva competitividade entre os indivíduos e destruindo a ideia de solidariedade social. Segundo o autor, para a mudança desse quadro faz-se necessária a obtenção de uma visão sistêmica, isto é, a possibilidade de enxergar as situações e as causas atuantes como conjuntos e percebê-los como um todo.

Costa e Calvão (2002, p. 137) defendem ações educativas que considerem a contextualização e a diversidade cultural, que se destinem à formação de cidadãos críticos e conscientes, capazes de ler as relações violentas e mutiladoras resultantes do capitalismo desenfreado, as quais fazem parte de uma política de conscientização social, política esta indispensável à desejada e necessária transformação social. Para tanto, a efetivação dos direitos sociais e a conscientização social são fatores imprescindíveis ao desejado processo de redemocratização, visto que a privação desses direitos contribui para a perpetuação das situações de exploração e alienação, intensificando as desigualdades sociais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Inserida em uma realidade social marcada pelos processos característicos do neoliberalismo e do domínio do capital, e sendo resultado das relações desenvolvidas socialmente, a educação acaba por reproduzir a realidade posta. Nesse sentido, os processos de ensino-aprendizagem, institucionalizados ou não, têm servido prioritariamente aos propósitos empresariais da classe dominante.

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AS RELAÇÕES DE TRABALHO E EDUCAÇÃO DIANTE DOS PROCESSOS DE GLOBALIZAÇÃO

Priorizando os objetivos limitados e excludentes da classe social dominante, a educação limita-se aos processos de alienação e reprodução social, desfavorecendo o desenvolvimento social e a formação de cidadãos críticos e conscientes de sua realidade.

De acordo com Santos (2000), na medida em que os homens se tornarem mais conscientes de seu poder de opor-se ao sistema, resistindo aos padrões sociais, eles terão mais força no cenário global. Dessa forma, a criticidade e a consciência social, indispensáveis à transformação e mobilidade social, têm sido combatidas de forma velada em nossa sociedade, na tentativa de manter a realidade injusta e desigual que se apresenta como única alternativa à grande maioria da população.

Nesse contexto, as políticas educacionais, assim como outros setores sociais, têm contribuído para a ampliação e manutenção de relações sociais desiguais, perpetuando situações de trabalho perversas e desumanas e favorecendo os processos excludentes, disseminados pela globalização e pelo incentivo desenfreado ao capitalismo, que enxerga de forma mercantilizada os indivíduos e suas relações.

Nesse sentido, faz-se necessária a reflexão acerca da função social das relações de trabalho e educação, visto que estas se relacionam diretamente e precisam favorecer o desenvolvimento social de forma justa e igualitária.

REFERÊNCIAS

CALVÃO, L.; COSTA, D. H. da. Trabalho infantil. In: CIAVATTA, M. (Org.). A experiência

do trabalho e a educação básica. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

CIAVATTA, M. O trabalho como fonte de pesquisa. Memória, história e fotografia. In: CIAVATTA, M. (Org.). A experiência do trabalho e a educação básica. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

FRIGOTTO, G. A dupla face do trabalho: criação e destruição da vida. In: CIAVATTA, M. (Org.).A experiência do trabalho e a educação básica. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

FRIGOTTO, G. Educação, crise do trabalho assalariado e do desenvolvimento: Teorias em conflito. In: CIAVATTA, M. (Org.). Educação e crise do trabalho: perspectiva de final de século. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

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Jamile dos S. Cardoso

MARX, K. O Capital. 7. ed. São Paulo: Difel, 1982.

SANTOS, A. J. P. dos. Uma abordagem dialética da relação software livre e educação. Salvador: Uneb, 2009.

SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.

TEXEIRA, E. C. O local e o global: limites e desafios da participação cidadã. 3. ed. São Paulo: Cortez, Equip; Salvador: UFBA, 2002.

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O ENSINO SUPERIOR E A RECEPÇÃO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NA

ÓTICA DE UNIVERSITÁRIOS EM JEQUIÉ, BAHIA1

Adriana Silva Barbosa2 Ana Cristina Santos Duarte3

RESUMO

A educação inclusiva envolve o preparo dos professores e das instituições de ensino superior para receber pessoas com deficiência. Com o objetivo de conhecer a concepção de estudantes universitários sobre o preparo dos docentes e dessas instituições para receber pessoas com deficiência,aplicou-se um questionário junto a 147 universitários de duas instituições de ensino superior de Jequié, Bahia. A análise dos dados revelou que 87,07% dos pesquisados acham que a instituição de ensino superior em que estudam não está estruturalmente preparada para receber pessoas com deficiência, enquanto 12,25% consideram que sim. As principais providências apontadas por eles para a inclusão de pessoas com deficiência no ensino superior foram: adequar a infraestrutura da instituição (37,25%) e preparar os professores (23,48%). Estes dados revelam a necessidade de estabelecimento de políticas de acesso e permanência de pessoas com deficiência no ensino superior.

Palavras-chave: Educação inclusiva. Ensino superior. Professores. Estudantes. Recepção

1 Artigo científico elaborado com base em dados da monografia de pós-graduação “Concepções de estudantes uni-versitários sobre a educação inclusiva no ensino superior na cidade de Jequié – BA”, elaborada como requisito à obtenção do título de especialista em Metodologia do Ensino Superior pelas Faculdades Integradas de Jequié (FIJ).

2 Bióloga, mestranda em Enfermagem e Saúde pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), espe-cialista em Metodologia do Ensino Superior pelas FIJ. Analista universitária e secretária do Comitê de Ética em Pesquisa da Uesb (CEP/Uesb). Endereço para correspondência: Rua Afrânio Peixoto, 130, Mandacaru, Jequié, BA. CEP: 45207-380. Telefone para contato: (73) 3525 5919/(73) 81245799. E-mail: [email protected].

3 Bióloga, doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Professora assistente do Departa-mento de Ciências Biológicas (DCB) da Uesb. Professora colaboradora do curso de pós-graduação lato sensu em Metodologia do Ensino Superior das FIJ.

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Adriana Silva Barbosa e Ana Cristina Santos Duarte

COLLEGE EDUCATION AND THE RECEIPT OF HANDICAPPED PEOPLE UNDER

THE VIEW OF COLLEGE STUDENTS IN JEQUIÉ, BAHIA1

ABSTRACT

Inclusive education involves the preparation of teachers and college education institutions to receive handicapped people. In order to identify the conception of preparation of teachers and higher education institutions to receive handicapped people, a questionnaire was applied under 147 students of two of college education institutions in Jequié, BA. Analysis showed that 87.07% of respondents think the college education institution, which they attend, is not structurally equipped to receive handicapped people, while 12.25% think so. The main measures suggested by students were adapt the institution’s infrastructure (37.25%) and prepare teachers (23.48%). These data shows the need for establishment of policies for access and permanence of handicapped people in higher education.

Keywords: Inclusive education. College education. Teachers. Students

INTRODUÇÃO

Incluir é permitir que algumas pessoas, excluídas da sociedade, passem a exercer seus direitos de cidadãs e a fazer parte do contexto social em todos os níveis (educação, saúde, mercado de trabalho e outros). Isto mostra que a inclusão é um processo amplo, que envolve mudanças em vários setores da sociedade, no intuito de que esta reconheça que essas pessoas, tanto quanto as outras, possuem capacidades e habilidades que lhes permitem contribuir para o desenvolvimento social.

Para que a educação inclusiva se torne realidade, é imprescindível que os professores, em todos os níveis de ensino de educação (do ensino básico ao superior), estejam preparados para receber os alunos com deficiência e lidar com suas limitações. Além disso, as instituições de ensino, não apenas as de nível fundamental e médio, mas também as de nível superior, devem criar condições de atendimento às necessidades dessas pessoas (PRIETO, 2002). Assim, atuar em uma classe na qual prevaleça a diversidade dos alunos perpassa pela necessidade de preparação dos professores para o exercício do magistério e implica uma profunda reestruturação do sistema educacional vigente.

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O ENSINO SUPERIOR E A RECEPÇÃO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NA ÓTICA DE UNIVERSITÁRIOS EM JEQUIÉ, BAHIA

Mantoan (1998) aponta a importância do reconhecimento e da valorização das diferenças para a formação dos profissionais da educação e considera que estes devem receber uma formação única, facilitando, assim, a fusão entre a educação regular e a especial. Sant’Ana (2005) destaca também a importância da universidade como ambiente formador do professor, o qual deve desenvolver recursos e pesquisas sobre ensino-aprendizagem de pessoas com deficiência. Ainda segundo essa autora, o processo de formação do docente deve ser contínuo, envolvendo programas de capacitação, supervisão e avaliação que o incentivem a refletir e o tornem pesquisador de sua prática.

Disso se depreende que é inegável a necessidade de repensar o processo de formação docente (já que este é um dos passos fundamentais para a efetiva implantação da educação inclusiva) e de formar professores capazes de lidar com a diversidade, que incentivem as potencialidades de seus alunos e saibam minimizar suas dificuldades, encorajando-os a superá-las (sejam eles deficientes ou não). Assim, poderão contribuir para a formação de cidadãos críticos, preparados para enfrentar os obstáculos impostos por uma sociedade que ainda não aprendeu a conviver com as diferenças e para atuar no mercado de trabalho como pessoas ativas e economicamente independentes.

Nesse contexto em que as pessoas com deficiência deparam com barreiras históricas, estruturais e socioeconômicas para viver em sociedade e atuar no mercado de trabalho, a universidade tem papel fundamental, porque uma de suas funções é a formação de profissionais aptos a lidar com as diferenças existentes entre seus alunos e a aceitá-los como são.

Assim, a universidade também deve ser geradora e incentivadora de discussões e pesquisas que contribuam efetivamente para facilitar e tornar realidade a educação inclusiva. Desse modo, deve adaptar-se e propiciar o acesso e a permanência das pessoas com deficiência nos cursos superiores, bem como favorecer a conscientização da sociedade sobre a importância da valorização do ser humano, inclusive daqueles com limitações físicas, sensoriais e/ou mentais. Isto pode facilitar o ingresso dessas pessoas no mercado de trabalho e contribuir para que elas ocupem seu lugar na sociedade como pessoas completas, que refletem, geram conhecimento, constituem família, são economicamente ativas e financeiramente independentes.

Diante disso, foram elencados os seguintes objetivos: conhecer a concepção de estudantes universitários sobre o preparo dos professores e das instituições de ensino superior para receber pessoas com deficiência; identificar, sob a ótica desses estudantes, as dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiência no ensino superior e as providências que as universidades devem tomar para proporcionar a inclusão dessas pessoas no ensino superior.

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Adriana Silva Barbosa e Ana Cristina Santos Duarte

METODOLOGIA

Submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (CEP/Uesb), sob o número de protocolo 037/2007, este estudo logrou sua aprovação. Foi realizado em Jequié, cidade fundada em 1897, que possui cerca de 145.964 habitantes (IBGE, 2007) e se situa na região Sudoeste do estado da Bahia, distante 365 quilômetros da capital, Salvador. Geograficamente, Jequié tem como municípios limítrofes Aiquara, Apuarema, Boa Nova, Ipiaú, Itagi, Jaguaquara, Jitaúna, Lafaiete Coutinho, Manoel Vitorino e Maracás, com os quais também mantém relações socioeconômicas.

A cidade possui quatro instituições de ensino superior, uma pública e três privadas. Dentre as instituições privadas, em uma o ensino é presencial, outra oferece o ensino presencial e a distância e a terceira, o ensino a distância. Foram escolhidas duas instituições que oferecem ensino presencial (a instituição de ensino superior pública e a instituição de ensino superior privada que oferece apenas o ensino presencial) como campo de coleta de dados, porque, no ensino presencial, os alunos convivem mais tempo uns com os outros. Além disso, as instituições escolhidas possuem significativa abrangência, pois recebem estudantes das cidades limítrofes a Jequié. No ano de 2007, a instituição de ensino superior privada tinha 585 alunos matriculados na graduação, e a instituição pública, 1.893. Esta se destaca por receber também estudantes de municípios baianos não limítrofes com a cidade de Jequié e de outros estados, como Minas Gerais e São Paulo. Em ambas as instituições, na época em que foi realizada a pesquisa, as secretarias de curso não possuíam registro de alunos com deficiência matriculados.

Este estudo caracteriza-se como uma pesquisa quantitativa descritiva. A pesquisa quantitativa traduz em números opiniões e informações para analisá-las estatisticamente (SILVA, MENEZES, 2005). De acordo com Gil (2008), a pesquisa descritiva tem como objetivo estudar as características de determinado grupo. Optou-se por este tipo de pesquisa por ser adequado ao alcance dos objetivos deste trabalho.

A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário, técnica largamente empregada em pesquisas não experimentais, permitindo abranger grande número de participantes e garantir seu anonimato, além de não expô-los à influência do pensamento do pesquisador (Gil, 2008).

O questionário foi elaborado pelas pesquisadoras, considerando o alcance dos objetivos, e contemplou questões sobre os seguintes itens: estrutura das instituições de ensino superior pesquisadas, preparo dos professores universitários para receber alunos com deficiência, dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiência no ensino superior e as providências (na opinião dos estudantes universitários) que as instituições devem tomar para proporcionar a inclusão dessas pessoas nesse nível de ensino.

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O ENSINO SUPERIOR E A RECEPÇÃO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NA ÓTICA DE UNIVERSITÁRIOS EM JEQUIÉ, BAHIA

Participaram da pesquisa 147 estudantes, 74 da instituição pública e 73 da instituição privada. Dos 147 participantes, apenas 5 possuem algum tipo de deficiência. A escolha dos participantes da pesquisa ocorreu de forma aleatória, conforme sua disponibilidade para responder às questões. Ao aceitar participar da pesquisa, eles assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e responderam ao questionário.

Os dados obtidos por meio do questionário foram categorizados e digitados em planilha eletrônica do Microsoft Office Excel 2003, analisados por meio da estatística descritiva (análise univariada) e organizados em gráficos e tabelas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estrutura das instituições de ensino superior pesquisadas

Ao serem questionados se a instituições de ensino superior em que estudam está estruturalmente preparada para receber pessoas com deficiência, 87,07% dos pesquisados afirmaram que não, 12,25% disseram que sim e a resposta de 0,68% foi “mais ou menos”. Ao justificarem suas respostas (Tabela 1), 37,34% afirmaram que a instituição “precisa adequar a infraestrutura”, 8,23% consideram que “precisa capacitar os professores”, 5,06% acham que faltam recursos e materiais didáticos, 3,16% pensam que, “em alguns aspectos, sim” e, na opinião de 1,27% “a infraestrutura da instituição não está preparada para pessoas com e sem deficiência”; cerca de 24,05% dos pesquisados não justificaram sua resposta.

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Tabela 1 - Justificativas dos estudantes universitários em relação à adaptação ou não das instituições em

que estudam ou estudaram.

Fonte: Dados da pesquisa.

Segundo Ross (1998), têm ocorrido alguns avanços na educação formal, no sentido de adequar as estruturas física, administrativa e teórico-metodológica das instituições para atender pessoas com deficiência. Para esse autor, a falta de adequação é um dos fatores que dificultam o acesso dessas pessoas ao ensino superior e, em consequência, ao mercado de trabalho. Este aspecto é corroborado por Moreira (2005), que salienta que muitas pessoas com deficiência não conseguem chegar à universidade por terem sido excluídas da educação básica. Esse autor lembra ainda que as universidades têm enfrentado muitas dificuldades para se tornar de fato um espaço democrático e inclusivo, apesar de serem um local de contribuições incontestáveis para a formação intelectual, cultural e política dos cidadãos brasileiros, tendo importante função social, o que significa que devem contribuir para assegurar o direito à educação e a igualdade de oportunidades aos alunos com deficiência, que tradicionalmente não integram o alunado das universidades.

No que concerne às instituições de ensino superior nas quais esta pesquisa foi realizada, nota-se que, nos últimos anos, elas empreenderam esforços no sentido de adaptar sua infraestrutura para garantir a acessibilidade das pessoas com deficiência às suas instalações. Deve-se ressaltar,

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contudo, que essa adaptação ainda é parcial, devido aos aspectos já citados e também ao fato de que as adaptações existentes, em sua maioria, não condizem com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) , Norma Brasileira Regulamentadora - NBR 9050:2004 e NBR 13994:2000, para a acessibilidade das pessoas com deficiência. As normas preveem, dentre outras coisas, a inclinação correta e piso antiderrapante nas rampas, sinalizações para pessoas com deficiência visual e elevadores adaptados.

PREPARO DOS PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS PARA RECEBER PESSOAS

COM DEFICIÊNCIA

Quando indagados se os professores das instituições em que estudam estão preparados para receber pessoas com deficiência, 54,80% dos alunos disseram que não, enquanto 41,78% afirmaram que sim e 3,42 não sabem ou não responderam à questão. Ao serem convidados a justificar suas respostas, 20,95% dos entrevistados disseram que “os professores precisam de capacitação”, 3,38% consideram que isso “depende da deficiência do aluno”, 3,38% afirmaram que “não há professores que saibam Libras [Língua Brasileira de Sinais] e Braille” e 6,08% pensam que “estão preparados”.

Para ser verdadeiramente inclusiva, a educação deve investir em materiais pedagógicos e na qualificação dos professores (MOREIRA, 2005), dentre outros aspectos, para permitir que as pessoas com deficiência exerçam seu direito de aprender. No aspecto pedagógico, Laplane (2006) salienta a importância da existência de serviços de apoio para os alunos com deficiência que deles necessitam.

Para que essas pessoas possam ingressar e permanecer no ensino superior, é necessário que as instituições façam adequações de seus currículos e sistemas avaliativos para contemplar as especificidades dos alunos, de modo que suas limitações sejam minimizadas e suas potencialidades sejam maximizadas, permitindo-lhes, assim, concluir o ensino superior e ingressar com melhor qualificação no mercado de trabalho. Deve-se ressaltar também que essas adaptações e adequações podem contemplar também alunos sem deficiência que possuem dificuldade de se enquadrar nos moldes tradicionais de ensino.

Além disso, é importante lembrar que, no caso das pessoas com deficiência auditiva e visual, é preciso que as aulas e os livros/apostilas sejam adaptados para Libras e Braille, respectivamente, para uma aprendizagem efetiva. Tais adaptações são um direito dessas pessoas, o que justifica a

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preocupação de 3,41% dos pesquisados em relação ao desconhecimento de Libras e Braille por parte dos professores. Neste sentido, o Decreto 3.298/1999 (BRASIL, 1999) prevê a aquisição de apoio especializado pelas instituições nos casos em que for necessário, além da capacitação de recursos humanos e adequação dos recursos instrucionais e da estrutura física das instituições.

Outro aspecto que deve ser mencionado é o fato de que os cursos de graduação, notadamente os de formação de professores, em geral não prepararam estes profissionais para trabalhar com alunos com deficiência, o que justifica o fato de 20,41% dos pesquisados terem mencionado a necessidade de capacitá-los. A falta de preparação e de disciplinas específicas faz com que os docentes do ensino fundamental, médio e superior muitas vezes não estejam aptos para atender às necessidades dos alunos com deficiência, o que dificulta o acesso e a permanência destes alunos em todos os níveis de ensino.

Deve-se ressaltar também que os professores, sejam eles do ensino fundamental, médio ou superior, ao adentrarem uma sala de aula, deparam com uma multiplicidade de situações e/ou dificuldades. Estas vão desde a existência ou não de infraestrutura e de recursos/materiais didáticos até a diversidade dos alunos, sejam eles pessoas com ou sem deficiência. Ao entrarem em uma sala de aula, os alunos não abandonam sua história de vida e seus conhecimentos prévios, do que se depreende que a inclusão não é apenas física, mas abrange dimensões mais complexas, que envolvem a sensibilização e o acolhimento por parte dos professores e dos próprios alunos, o que significa que perpassa também pelos pensamentos, expectativas, ansiedades, anseios e necessidades de todos os envolvidos nesse processo: professores e alunos com ou sem deficiência.

Assim, cabe às instituições de ensino superior, como incentivadoras e geradoras de conhecimento, não apenas capacitar seus professores e funcionários para receber pessoas com deficiência, mas também realizar pesquisas com o intuito de desenvolver estratégias que facilitem a vida dessas pessoas e favoreçam seu ingresso e a sua permanência nos cursos superiores. No ensino superior, elas podem exercer seu direito de contribuir para a pesquisa e a produção de conhecimento dessas instituições.

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DIFICULDADES DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR E

PROVIDÊNCIAS PARA PROPORCIONAR A INCLUSÃO

Como dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência no ensino superior (Tabela 2), 25,52% dos pesquisados apontaram “a falta de infraestrutura”, 20,92% mencionaram o “preconceito e/ou discriminação” e 10,55%, a “locomoção”, dentre outros aspectos relevantes.

Tabela 2. Dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiência no ensino superior.

Dificuldades % Quantidade

Falta de infraestrutura. 25,52 61Preconceito/discriminação. 20,92 50Outras respostas. 12,53 30Locomoção. 10,55 25Despreparo dos professores. 7,95 19Acesso à universidade. 7,10 17Falta de materiais/recursos didáticos. 7,10 17Descaso/desatenção/despreparo/falta de apoio moral. 2,09 5Despreparo dos funcionários. 1,67 4Ser reconhecida como pessoa normal/ser aceito. 1,67 4Falta de coleguismo. 1,67 4Não respondeu. 1,25 3Total 100,00 239

Fonte: Dados da pesquisa

No que concerne às providências que as instituições de ensino superior devem tomar para proporcionar a inclusão de alunos com deficiência (Tabela 3), 37,25% dos pesquisados sugeriram “adequar a infraestrutura da instituição”; 23,48%, “preparar os professores”; 4,49%, “adquirir recursos, equipamentos e material didático”; 4,05%, “estabelecer cotas para pessoas com deficiência”; segundo 0,81% “não deve haver cotas para pessoas com deficiência. Isso poderia estigmatizá-las de incompetentes”.

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,Tabela 3. Providências para proporcionar a inclusão de pessoas com deficiência no ensino superior.

Providências para proporcionar a inclusão % Quantidade

Adequar infraestrutura da instituição. 37,25 92Preparar os professores. 23,48 58Outras respostas. 9,69 24Fazer campanhas de conscientização. 5,26 13Adquirir recursos/equipamentos/material didático. 4,49 11

Estabelecer cotas para pessoas com deficiência. 4,05 10Aumentar o número de vagas na universidade. 1,22 3Convidar pessoas com deficiência para participar de eventos, cursos da

universidade. 3,64 9

Não respondeu/não sabe. 2,42 6Criar política de acesso e permanência da pessoa com deficiência na universidade

(política de inclusão).2,02 5

Preparar funcionários. 2,02 5Adequar a instituição às mínimas necessidades das pessoas com deficiência. 1,62 4Melhorar a acessibilidade e a locomoção. 1,21 3Não deve haver cotas para pessoas com deficiência. Isto poderia estigmatizá-las

de incompetentes.0,81 2

Proporcionar melhores condições às pessoas com deficiência. 0,81 2Total 99,99 247

Fonte: Dados da pesquisa.

Alguns dos aspectos mais citados pelos universitários que participaram da pesquisa como dificuldades enfrentadas no ensino superior pelas pessoas com deficiência e as providências a tomar para minimizar tais dificuldades já foram discutidos na análise de outras questões, tais como a necessidade de capacitação dos professores e de adequação da infraestrutura da instituição. Desse modo, neste item serão abordados os recursos e materiais didáticos que podem facilitar o aprendizado das pessoas com deficiência e a questão das cotas para essas pessoas.

De acordo com o Decreto 3.298/1999 (BRASIL, 1999), devem ser oferecidos à pessoa com deficiência todos os meios para facilitar o seu aprendizado. Neste sentido, no caso das pessoas com deficiência visual ou baixa visão, a sala de aula e a instituição devem contar com livros e textos em Braille, ampliados, gravados ou digitalizados, para serem lidos via computador, e equipamentos como máquinas de datilografia em Braille, regletes, punções e outros recursos. A adaptação das provas para o Braille ou o serviço de leitor deve ser garantido, uma vez que o

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decreto mencionado afirma que as instituições de ensino devem adaptar seus recursos didáticos e humanos.

De acordo com Cerqueira e Ferreira (s.d.), existem também tecnologias que podem facilitar o aprendizado das pessoas com deficiência visual ou baixa visão, como o circuito fechado de televisão – CCTV, que pode ampliar em até 60 vezes o tamanho de um caractere e funciona acoplado a um microcomputador; programas de computador de ampliação de caracteres, microcomputadores com sistemas adaptados, como o sistema operacional Dosvox, que permite à pessoa com deficiência visual utilizar o computador; sintetizadores de voz para leitura das informações exibidas no monitor; terminal Braille – display Braille, que representa, em uma ou duas linhas, caracteres Braille correspondentes às informações exibidas em um monitor; impressora Braille para uso individual ou para produção em larga escala; e scanner de mesa para transferência de textos impressos para microcomputadores, a fim de que sejam lidos através de um sintetizador de voz de um terminal Braille ou impressos em Braille.

Apesar disso, Silva (2003) alerta que ainda há grande escassez de material didático para as pessoas com deficiência visual, pois os programas de adaptação de livros para o Braille das secretarias de Educação dos estados não dão conta da demanda. Essa autora salienta que, além de cobrar das editoras que os livros sejam publicados também em Braille, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) deveria solicitar que sejam disponibilizados em áudio, para que os leitores com deficiência visual possam ter mais opções de acesso a eles. Assim, percebe-se que, embora haja uma política do MEC no sentido de disponibilizar materiais didáticos para pessoas com deficiência visual, ela ainda se mostra ineficiente e precisa ser reelaborada, visto que não tem dado conta da demanda.

No que concerne às pessoas com deficiência auditiva, o Decreto-lei de Libras estabelece que as instituições federais de ensino superior devem oferecer o ensino de Libras e de língua portuguesa para que essas pessoas tenham acesso a todos os níveis de ensino, inclusive a todas as atividades e conteúdos curriculares. Além disso, devem “disponibilizar equipamentos, acesso às novas tecnologias de informação e comunicação, bem como recursos didáticos para apoiar a educação de alunos surdos ou com deficiência auditiva” (BRASIL, 2005, Art. 14, VIII, p. 2).

As pessoas com deficiência física devem contar, de acordo com o nível de comprometimento físico/motor, com recursos tecnológicos para comunicação alternativa ou aumentativa/ampliada, como microcomputadores com softwares que permitem a comunicação e a escrita, no caso de pessoas com comprometimento motor mais grave. Deve-se ressaltar que as pessoas que possuem apenas deficiência física não apresentam comprometimento visual, auditivo e intelectual e suas dificuldades para aprender, além das dificuldades motoras, em geral se referem à acessibilidade às salas de aula, o que pode ser resolvido com a adaptação da infraestrutura do local e do

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mobiliário utilizado para permitir-lhes transitar livremente, sem transtornos, como preconiza a NBR 9050:2004 (ABNT, 2004), que dispõe sobre normas para o mobiliário da sala de aula.

Muitas instituições de ensino brasileiras têm feito esforços no intuito de incluir pessoas com deficiência no ensino superior, notadamente no que concerne à adaptação do ambiente de sala de aula e aos recursos tecnológicos utilizados. Todavia, é importante lembrar que, apesar dos avanços, ainda são necessárias muitas mudanças, e não apenas nas instituições de ensino, mas também nas cidades e na sociedade para que a inclusão se torne uma realidade.

As pessoas com deficiência mental, apesar de possuírem algum comprometimento intelectual, não devem ser julgadas como incapazes de aprender e têm direito, como qualquer outra pessoa, ao acesso a todos os níveis de ensino. Não se quer aqui negar a existência da deficiência, e sim lembrar que essas pessoas também possuem aptidões que devem ser estimuladas. Devem-se desenvolver novas formas de aprender e novos meios de minimizar as dificuldades dessas pessoas, potencializando o seu aprendizado. Assim, é importante que o professor respeite o ritmo de aprendizagem de seus alunos, pois cada pessoa tem o seu, incluindo os alunos sem deficiência, e aprende em ritmo diferente das outras (SESTARO et al., 2003).

Sestaro et al. (2003) também enfatizam a necessidade de respeitar a diversidade dos alunos e a importância da convivência e da aceitação das pessoas para a formação do ser humano. Os autores lembram que a convivência entre alunos com e sem deficiência mental é produtiva para ambos. Mesmo com um currículo adaptado, a escola ensina coletivamente, e os alunos sem deficiência poderão contar com melhores condições de aprender e também serão beneficiados com a oportunidade de compartilhar o que aprenderam ensinando aos colegas de classe. Além disso, enfatizam ainda que a convivência com a diversidade propicia melhor preparo para a cidadania e maior desenvolvimento humano para todos os alunos.

Assim, para tornar as aulas mais inclusivas, não basta que o professor se capacite, que a infraestrutura esteja adaptada e que existam os recursos didáticos necessários. É preciso que os professores e alunos saibam como se relacionar com as pessoas com deficiência para facilitar o seu aprendizado e para que se sintam incluídas, e não subestimadas em suas capacidades.

As cotas para pessoas com deficiência no ensino superior foram citadas por 4,05% dos estudantes como uma providência que deve ser tomada para facilitar o seu acesso ao ensino superior; já 0,81% dos entrevistados consideram que as cotas não devem ser implantadas, pois poderiam “estigmatizá-las de incompetentes” (Tabela 3). Uma das instituições pesquisadas, após intensas discussões, realizou em 2009 seu primeiro Processo Seletivo Vestibular com Sistema de Cotas, o qual contempla afro-descendentes, indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência.

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Algumas universidades do estado do Rio de Janeiro (a Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Uerj e a Universidade Estadual do Norte Fluminense – Uenf) já destinam 10% de suas vagas para pessoas com deficiência que sempre estudaram em escolas públicas e estabelecem que, se as vagas não forem preenchidas, serão ocupadas por pessoas sem deficiência (Uerj e Uenf, 2003). Isso significa que a inclusão de pessoas com deficiência nas instituições de ensino superior, independente do tipo de deficiência, não se restringe à adaptação dessas instituições e ao estabelecimento ou não de cotas para essas pessoas. Trata-se de questão mais ampla, que envolve também os outros níveis de ensino (o fundamental e o médio), visto que qualquer pessoa, para chegar ao ensino superior, precisa passar antes por esses níveis de ensino.

Não se pretende discutir aqui o mérito do sistema de cotas que vem sendo implantado nas instituições de ensino superior, nem tomar posição a favor ou contra ele, visto que o acesso ao ensino superior, segundo a Constituição brasileira, é direito de todos, independente de qualquer fator (presença ou não de deficiência, etnia, classe social etc.). Assim, entende-se que essas instituições, notadamente as públicas, junto com o governo (que deve estabelecer uma política coerente para isso), precisam criar meios para que o acesso ao ensino superior deixe de ser oportunizado apenas a alguns e se consolide, de fato, como um direito de todos.

Além disso, é importante lembrar que o público para o qual as cotas têm sido destinadas na época atual foi, historicamente, excluído da sociedade e privado de seus direitos de cidadão. Desse modo, entende-se que é inaceitável não oferecer a essas pessoas a oportunidade de ingressar no ensino superior, mas também é inaceitável não criar meios – socioeconômicos, estruturais e didáticos – que garantam sua permanência no ensino superior, uma vez que elas, assim como as pessoas sem deficiência, têm o direito de atuar ativamente na sociedade, inclusive na geração de conhecimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A educação inclusiva no ensino superior vem crescendo gradativamente no Brasil, contudo ainda são poucas as pessoas com deficiência que conseguem ingressar e permanecer no ensino superior, sobretudo em cidades do interior do Nordeste, como mostrou este estudo. A adaptação da infraestrutura das instituições depende da conscientização sobre a importância da inclusão das pessoas com deficiência, de recursos financeiros e do empenho das instituições em adequar-se às normas de acessibilidade da ABNT, o que vem acontecendo aos poucos nas instituições de ensino superior pesquisadas.

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Adriana Silva Barbosa e Ana Cristina Santos Duarte

O processo de adaptação das instituições de ensino superior para atender às necessidades das pessoas com deficiência é demorado, porém essencial, e envolve a sensibilização de professores e alunos, alterações em toda a estrutura física dessas instituições, a participação inicial de uma equipe de apoio, a capacitação de todos os professores em Libras e Braille, a criação de novos métodos de ensino-aprendizagem e a reestruturação curricular de todos os cursos de graduação (sobretudo dos cursos de formação de professores, daqueles relacionados à promoção da acessibilidade, como Engenharia Civil e Arquitetura, e ao fornecimento de diagnóstico e tratamento, como Ciências Biológicas e aqueles da área da saúde), visto que o processo de inclusão não deve restringir-se à educação, mas abranger todos os segmentos da sociedade. Desse modo, nota-se que se torna cada vez mais necessária a elaboração de políticas de inclusão nas instituições de ensino superior, que sejam capazes de garantir o ingresso e a permanência das pessoas com deficiência nesse nível de ensino, o que poderá contribuir para a sua efetiva inclusão na sociedade.

REFERÊNCIAS

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ASSOCIAÇÃO Brasileira de Normas Técnicas. NBR 13994:2000. Elevadores de passageiros. Elevadores para transporte de pessoa portadora de deficiência. Rio de Janeiro: ABNT, 2002.

BRASIL. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21de dezembro de 1999.

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LAPLANE, A. Uma análise das condições para a implementação de políticas de educação inclusiva no Brasil e na Inglaterra. In: Educ. Soc., v. 27, n. 96, out. 2006.

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O ENSINO SUPERIOR E A RECEPÇÃO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NA ÓTICA DE UNIVERSITÁRIOS EM JEQUIÉ, BAHIA

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SESTARO, A. C. et al. O acesso de pessoas com deficiência às classes e escolas comuns da

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma

transformação social

Inalice Donato Primo Menezes1

RESUMO

É indiscutível a importância que a educação ambiental (EA) vem ganhando nos últimos tempos, no intuito de garantir a existência de ambientes saudáveis para a perpetuação e a sobrevivência das espécies. A escola, como centro de produção do conhecimento, assume o suporte essencial para o desenvolvimento da consciência ambiental. O objetivo deste trabalho é analisar a metodologia trabalhada pela Escola Municipal Professora Marlene Flores, a influência da educação ambiental na vida dos alunos, bem como mudanças de comportamento e ações de preservação para com o meio ambiente. O estudo de caso mostrou que a escola propõe atividades relacionadas à educação ambiental, mas que a falta de estrutura e de recursos não permite que os projetos tenham maior abrangência, limitando-se à participação de professores e alunos. Porém, os resultados alcançados representam um avanço frente às tradições e à condição social da comunidade.

Palavras chave: Educação ambiental. Consciência Comportamento. Comunidade. Escola.

THEORY AND PRACTICE: environmental education for social transformation

ABSTRACT

Indeed the importance of environmental education (EE) has been gaining in recent times in order to assure the existence of healthy environments for the perpetuation and survival of the species. Thus, the school as a center of production of knowledge takes the essential support for the development of environmental awareness. The objective of this study is to the methodology

1 Licenciada em Geografia pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e pós-graduada em Educa-ção Ambiental pela Unidade Baiana de Ensino, Pesquisa e Extensão (UNIBAHIA).

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Inalice Donato Primo Menezes

worked out by the Municipal School called “Professora Marlene Flores”, the influence of environmental education in the lives of students as well as changes of behavior and actions to preserve the environment. The case study showed that the school offers activities related to environmental education, but the lack of infrastructure and resources do not allow that the projects to have greater coverage, limited itselves to participation of teachers and students. However, the results represent an advance forward to the traditions and the social condition of the community.

Keywords: Environmental education. Wareness. Behavior. Community. School.

INTRODUÇÃO

No intuito de facilitar a compreensão das relações entre ensino e meio ambiente, este texto tece algumas considerações sobre a metodologia adotada pela Escola Municipal Professora Marlene Flores (EMPMF), localizada no bairro Lagoa das Flores, em Vitória da Conquista, Bahia, analisando a influência da educação ambiental na vida dos alunos do 2º ano do Ciclo IV, bem como as mudanças de comportamento e ações de preservação para com o meio ambiente. Neste estudo, buscou-se observar a importância do fortalecimento da educação ambiental, bem como sua aplicabilidade na instituição escolar e na prática dos alunos.

As culturas de hortaliças e flores no bairro Lagoa das Flores são responsáveis pelo desenvolvimento econômico do local e ao mesmo tempo o único meio de sobrevivência de alguns moradores. A agricultura, em sua maior parte, é praticada por pessoas com baixo grau de instrução e de maneira ainda rudimentar O uso dos defensivos agrícolas é feito com muito pouco cuidado.

Ações já foram desenvolvidas para alertar esses agricultores sobre cuidados básicos ao fazer uso dos agrotóxicos, mas com poucos resultados satisfatórios. A utilização desses produtos de maneira incorreta atinge o meio ambiente, pois provoca a contaminação do solo e do lençol freático, e atinge também os próprios agricultores, ao manterem contato direto e utilizarem a água das cisternas para o consumo, prática até pouco tempo bastante comum.

Partindo dessa realidade e da dificuldade de prosseguir, frente às tradições e costumes da população, acredita-se que, com a educação de base, é possível mudar o modo de pensar e agir dos futuros agricultores. É nesse contexto que se insere o papel da escola como mediadora entre o conhecimento científico e a prática cotidiana, buscando promover, por meio da disseminação de informações, a conscientização ambiental entre seus alunos.

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

Desse modo, o educador deve buscar caminhos que levem o aluno a refletir sobre a importância da preservação do meio ambiente, principalmente, porque o futuro da humanidade depende da relação entre o homem e a natureza, bem como da utilização racional de seus recursos naturais.

Assim, surge a necessidade de repensar as práticas pedagógicas, adotando metodologias mais dinâmicas e estimulantes, que instiguem o educando a construir seus próprios valores ambientais a partir da sua vivência.

O texto tem como principal objetivo analisar se a educação ambiental na EMPMF motiva uma transformação social. Seus objetivos específicos são verificar se o projeto político-pedagógico da escola contempla o proposto nos Parâmetros Curriculares Nacionais sobre educação ambiental; verificar se as práticas docentes adotadas na sala de aula condizem com a realidade do aluno; analisar se a educação ambiental vem provocando ou não mudanças comportamentais entre os alunos.

Os dados foram coletados por meio de entrevistas estruturadas a partir da identificação do sujeito e das questões investigativas. Na classe discente os questionamentos foram realizados por meio do preenchimento de um formulário por cada um dos 69 (Sessenta e nove) alunos das duas turmas de 2º ano do ciclo IV. Posteriormente, foi entrevistado um representante de cada disciplina.

As informações coletadas foram relacionadas com o projeto político-pedagógico da escola, no intuito de identificar como a educação ambiental ensinada pelos professores da Escola Municipal Professora Marlene Flores vem contribuindo para a prática de atitudes conscientes de preservação ambiental na comunidade.

As entrevistas realizadas com a comunidade escolar e o projeto político-pedagógico foram analisados conjuntamente, e demonstraram que, apesar dos esforços dos professores, os ensinamentos adquiridos na escola não resultam em mudanças significativas para a localidade, sendo necessário que a instituição adote uma metodologia mais dinâmica e eficaz.

AS QUESTÕES AMBIENTAIS E A SOCIEDADE

As relações tecidas no âmbito social envolvem as interações dos indivíduos de diversas classes e grupos sociais com a natureza, tendo em vista que as alterações do espaço são alavancadas pela evolução da humanidade, em diferentes tempos e lugares.

As sociedades agrícolas já produziram impactos na dinâmica dos ecossistemas e na distribuição das espécies, na medida em que desmatavam para a utilização do solo. No início da industrialização, a intervenção continuou por meio da exploração e exportação dos recursos

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naturais, de modo a garantir as condições de sobrevivência da população. Hoje, os padrões da sociedade são os principais responsáveis pela crise ambiental.

Desse modo, a formação de uma consciência política e ambiental é um grande desafio para a sociedade. É necessário pensar em modelos de desenvolvimento economicamente viáveis, responsáveis e socialmente aceitáveis, que contribuam para a redução da miséria e para a conservação dos recursos naturais e da biodiversidade.

Surge, então, a noção de desenvolvimento sustentável, que considera que o crescimento econômico deve, no mínimo, conduzir a uma reciclagem dos recursos físicos, ao invés do seu esgotamento, além de reduzir os níveis de poluição. O desenvolvimento sustentável foi definido pelo Relatório de Brundtland como:

O uso de recursos renováveis para promover o crescimento econômico, a pro-teção das espécies animais e da biodiversidade e o compromisso com a manu-tenção da pureza do ar, da água e da terra. Além de ser aquele que “atende às necessidades de hoje, sem comprometer a capacidade de as próximas gerações atenderem às suas próprias necessidades”. (GIDENS, 2005, p. 487)

Os atuais padrões de consumo produzem impactos severos no meio ambiente. Sendo assim,

busca-se no campo educacional expandir o debate ambiental entre as comunidades, visando minimizar os danos causados à natureza e garantir qualidade de vida para as atuais e futuras gerações.

Portanto, o foco da educação, nesse novo paradigma ambiental, é compreender, além do ecossistema natural, as relações socioambientais historicamente configuradas e movidas pelas tensões e conflitos sociais. A seguir, faz-se um resgate histórico, no intuito de facilitar a compreensão dos acontecimentos humanos que permearam o processo de valorização da educação ambiental.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA LEITURA HISTÓRICA

Na história das civilizações, cada vez mais o homem detém o domínio da natureza. Inicialmente, a dependência dele em relação à natureza se resumia à obtenção de alimentos. Com o passar dos tempos, a fixação em determinado lugar o obrigou a desenvolver habilidades essenciais para sua sobrevivência, como: construção de casas, manejo do solo, uso do fogo, entre outras. O grau de modificação é em parte determinado pela necessidade de mudar, em parte pelo modo de se relacionar com o ambiente, surgindo espaços diferenciados ao longo

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

do tempo. Porém, as transformações do meio reduzem a disponibilidade e comprometem a qualidade dos recursos naturais.

A atividade humana gera impactos ambientais que repercutem nos meios fí-sico-biológicos e socioeconômicos, afetando os recursos naturais e a saúde humana, podendo causar desequilíbrios ambientais no ar, nas águas, no solo e no meio sociocultural. Algumas das formas mais conhecidas de degradação ambiental são: a destruição, a desestruturação física (erosão, no caso de so-los), a poluição e a contaminação. (BRASIL, 1998, p. 182)

A materialização dos processos de interação entre a sociedade e a natureza é compreendida em uma dimensão histórica. Neste sentido, até o surto industrial e tecnológico do século XIX, a transformação do meio ambiente era produto das atividades agrícolas, de maneira que a água, o solo e a vegetação eram os mais afetados (DREW, 1989, p. 193).

No século XX, após a Segunda Guerra Mundial, a concentração de capital atingiu níveis altíssimos em decorrência da utilização de conhecimentos científicos e tecnológicos. Os reflexos da expansão capitalista pós-guerra atingiram o Brasil nas décadas de 1950 e 1960, elevando o crescimento do setor industrial e agrícola, bem como acelerando a urbanização.

A irracionalidade do modelo de desenvolvimento capitalista foi questionada após a contaminação do ar em Londres, em 1952, que provocou a morte de milhares de pessoas, e em Nova York, em 1960. Em 1962, foi publicado o livro Primavera silenciosa, no qual Rachel Carson aborda o problema dos agrotóxicos e seus efeitos sobre os recursos naturais.

Todavia, apenas em 1968 surge a primeira publicação abordando as questões ambientais e os limites para o desenvolvimento humano. Com o título Os limites do crescimento, a obra, publicada em Roma, descreve as reservas naturais e discorre sobre a capacidade do planeta de suportar os impactos e o crescimento populacional.

A década de 1970 foi marcada pelo agravamento dos problemas ambientais, e, consequentemente, pela maior conscientização desses problemas em todo o mundo. O 1º Seminário Internacional de educação ambiental aconteceu em Belgrado, em 1975, e produziu um dos mais importantes documentos relativos à educação ambiental: a Carta de Belgrado.

A educação ambiental busca formar uma população mundial consciente e pre-ocupada com o ambiente e com os problemas que lhe dizem respeito, uma população que tenha os conhecimentos, as competências, o estado de espírito, as motivações e o sentido de participação e engajamento que lhe permitam tra-balhar individual e coletivamente para resolver os problemas atuais e impedir que se repitam. (UNESCO, 1975)

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Desse modo, a educação ambiental passa a ser vista como uma ferramenta educativa capaz de gerar novos valores, atitudes e habilidades, enfocando a melhoria da qualidade de vida.

A educação ambiental é parte do movimento ecológico. Surge da preocupa-ção da sociedade com o futuro da vida e com a qualidade de existência das presentes e futuras gerações. Nesse sentido, podemos dizer que a EA [...] está entre as alternativas que visam construir novas maneiras de os grupos sociais se relacionarem com o meio ambiente. (CARVALHO, 2004, p. 51)

A institucionalização da educação ambiental se deu com a formalização da Política Nacional da Educação Ambiental no Brasil. A Lei 9.795/99, em seu artigo 2º, reforça que “a educação ambiental é um componente permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis de ensino e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal”. Em seu artigo 3º, ressalta ainda que “todos têm direito à educação ambiental”.

Essa lei estabeleceu a definição normativa, legalizou os princípios básicos e os objetivos da educação ambiental, transformando-a em objeto de uma política pública. O Ministério da Educação formalizou, em seus pareceres, a necessidade de inclusão da educação ambiental nos conteúdos a serem explorados nas propostas curriculares das escolas de ensino fundamental e médio. Também recomendou a incorporação de temas ambientais da realidade local dos alunos e a integração escola-comunidade como uma estratégia de aprendizagem.

2.2 Educação ambiental na escola

Sob a perspectiva ambiental, o mundo é um emaranhado de inter-relações e interdependências dos distintos elementos na formação e perpetuação da vida. No campo da educação, esse aspecto evidencia um trabalho pautado em uma ampla visão do meio ambiente, cujas transformações envolvem tanto os elementos naturais, físicos e biológicos como os elementos construídos nas relações humanas em sociedade.

A educação ambiental representa um grande desafio para os educadores, na medida em que visa trabalhar o tema meio ambiente como uma contribuição relevante para a formação da cidadania. Seu objetivo maior é preparar o indivíduo para decidir e agir na realidade socioambiental, comprometendo-se com a qualidade de vida de cada um e da sociedade, seja em âmbito local ou global.

Trata-se, então, de desenvolver o processo educativo contemplando tanto o conhecimento científico como os aspectos subjetivos da vida, que incluem as representações sociais, assim como o imaginário acerca da natureza e da relação do ser humano com ela. Isso significa trabalhar os vínculos de identidade com o entorno socioambiental. (BRASIL, 1998, p. 182).

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

A educação ambiental exerce relevante papel, ao buscar uma vinculação entre o contexto próprio do aluno e o saber significativo, crítico e historicamente contextualizado. A escola deve atentar para a inserção da educação ambiental em um projeto político-pedagógico que valorize os ideais de solidariedade, igualdade e diversidade.

Como perspectiva educativa, a educação ambiental deve estar presente no currículo de todas as disciplinas, uma vez que permite a análise de temas que enfocam as relações entre a humanidade, o meio natural e as relações sociais, sem deixar de lado suas especificidades. (VIEIRA, 2008)

Uma educação ambiental crítica e emancipatória colabora para que os educandos se percebam como sujeitos ativos na aquisição do conhecimento, seja ele referente ao meio natural ou cultural, e se vejam como agentes de mudanças da realidade em que vivem, podendo tornar-se essenciais para a sua transformação.

Sob essa perspectiva, cabe à escola propiciar um ambiente adequado e condizente com o que se pretende trabalhar, para que, na prática, os ensinamentos possam contribuir para a formação de uma identidade cidadã, capacitando os alunos para assumir atitudes responsáveis para com o meio ambiente, que resultem em melhorias na sua relação com ele.

Para desenvolver um bom trabalho em educação ambiental, faz-se necessária a aquisição de conhecimentos e informações por parte dos membros da escola envolvidos com o processo de aprendizagem. Para Zakrzevski (2004), o fato de existir mais de uma concepção de educação ambiental não constitui um problema. A questão está no fato de que muitas visões conduzem à sua prática reduzida. Isto é, a falta de clareza entre os fundamentos destas concepções provoca uma ruptura entre teoria e prática.

Vale ressaltar que não apenas a escola é responsável pela educação, mas também a família, a comunidade, os meios de comunicação exercem a função de agentes educativos, mesmo que, às vezes, sejam fontes de informações superficiais e tendenciosas. Cabe à instituição escolar partir desse conhecimento prévio para estabelecer relações entre os dois universos no reconhecimento dos valores de comportamento, técnicas, manifestações artísticas e culturais. Torna-se importante o professor mediar essas mensagens, ao mostrar que elas traduzem um posicionamento diante da realidade, mas existem outros.

Desenvolver essa postura crítica é muito importante para os alunos, pois isso lhes permite reativar essas informações, percebendo os vários determinantes da leitura, os valores a elas associados e aqueles trazidos de casa. Isso os ajuda a agir com visão mais ampla e, portanto, mais segura ante a realidade em que vivem. (BRASIL, 1998, p. 182)

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Com base nesse pressuposto, o ponto de partida para inserir a educação ambiental na sala de aula pode ser o ambiente onde o aluno vive; as proximidades da escola, o bairro, a cidade. Entretanto, deve-se ter o cuidado de não reduzir essa prática pedagógica a eventos isolados, como datas comemorativas e a semana do meio ambiente. Não se deve limitar a questão ambiental a atividades de reciclagem de lixo, ou voltá-la apenas para a preservação do espaço natural.

A escola deve contribuir para a construção de uma sociedade mais equitativa e com responsabilidade ecológica, por intermédio do olhar da educação ambiental. Sendo assim, respeitar e cuidar da comunidade em que se vive é um princípio ético que se reflete na nossa sobrevivência e na das gerações futuras. Assim, observam-se a seguir as práticas educacionais desenvolvidas na escola municipal professora Marlene Flores sobre a educação ambiental.

TEORIA E PRÁTICA NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Diante de práticas sociais que agridem permanentemente o meio ambiente, surge a necessidade de desenvolver uma educação ambiental articulada, buscando integrar os atores educacionais e os moradores da localidade. Assim, os projetos realizados em âmbito escolar tendem a ganhar abrangência social, e a comunidade também assumiria responsabilidade pelo sucesso de sua efetivação.

Levando em consideração os métodos de educação ambiental adotados pela Escola Municipal Professora Marlene Flores (EMPMF), percebe-se que, para que o desenvolvimento de ações integradas aconteça, ainda seriam necessárias muitas reuniões para discussões sobre o tema, além de os moradores desenvolverem uma consciência ambiental. Isto não significa dizer que essa escola não vem se esforçando para desenvolver uma educação ambiental de qualidade, que possa transformar a realidade local.

Seguem-se as reflexões tecidas sobre as respostas obtidas por meio de documentos e de membros da comunidade escolar.

Projeto político-pedagógico

A elaboração do projeto político-pedagógico da EMPMF está pautado nas proposições da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9.394/96. Em seus artigos 12 e 13, a lei determina que cada instituição elabore e execute sua proposta pedagógica, com a participação de toda a comunidade, bem como que organize e operacionalize os planos de estudo e de trabalho do professor, razão pela qual se insere o aspecto legal consubstanciado em uma prática

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

pedagógica comprometida com a realidade da conjuntura social, uma vez que, como afirma Freire (2002), não há possibilidade de ensinar sem comprometimento, sem coerência entre aquilo que é dito e aquilo que é feito.

É pertinente comentar que, apesar de o projeto ter sido elaborado a partir de reuniões do conselho formado pelos representantes da comunidade escolar (alunos, pais de alunos, funcionários, professores, coordenadores, diretores), nem todos conhecem sua proposta. Alguns pais e alunos nem sabem de sua existência.

O último projeto político-pedagógico, elaborado para atender às metas do biênio 2008-2009, intitulado “Educação, seriedade, ação e cidadania”, revela o avanço da educação ambiental na história dessa escola. Na primeira versão do documento, elaborado para os anos de 2005-2006, foi possível identificar um projeto de meio ambiente e palestras sobre consciência ambiental, a utilização e o perigo dos agrotóxicos.

O projeto “A vida é feita de valores e saberes” objetivou a reflexão do aluno na prática educativa, resgatando valores que harmonizam a convivência e conservam o ambiente escolar. O projeto: “Eu sou a natureza – educação ambiental” procurou conscientizar o aluno de seu papel como sujeito transformador de sua história. Com este propósito, a escola incentivou a manutenção da horta orgânica, com a perspectiva de ampliação para uma horta comunitária. Os professores disponibilizaram aos alunos informações sobre reciclagem, cuidados com o lixo, poluição do bairro da Lagoa, alimentos orgânicos, além de sensibilizá-los para o cuidado com as plantas da escola.

Foi possível perceber que a escola busca a qualidade do ensino-aprendizagem e a instalação de um modelo de gestão balizado no princípio democrático, pelo qual todos os envolvidos no processo escolar se sintam motivados a participar de forma ativa e consciente na construção do que se acredita ser uma escola de qualidade.

Na educação, a relação entre teoria e prática é muito complexa, principalmente quando se lida com alunos envoltos em problemas familiares graves, que recebem educação quase que exclusivamente da escola. Dessa forma, a vontade de desenvolver um bom trabalho esbarra em questões estruturais, físicas, sociais e humanas.

Comunidade escolar

Foram entrevistados os professores das seguintes disciplinas: Matemática, Português, História, Geografia, Ciências, Ética, Educação Física, Artes, Inglês, Educação Ambiental que atuam do 2º ano do Ciclo IV. Após a análise das respostas, é característica do grupo docente uma visão de educação ambiental fundamentada na relação do homem com a natureza, que considera que no convívio em sociedade deve haver cuidado e respeito pelo meio ambiente. Isso pode ser observado na tabela a seguir, cuja indagação se refere ao que é educação ambiental em sua opinião.

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DEFINIÇÃO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PELOS DOCENTES.

CATEGORIAS RESPOSTAS Nº (%)

Preservação do meio ambiente.

“EA é a realização de trabalho coletivo no sentido de conscientizar a preservação do meio ambiente”.

“É uma ação de cuidar bem do meio ambiente (casa, escola, bairro, sua cidade, etc)”.

6 (60%)

Relação homem e natureza na vida

cotidiana.

“Relação de respeito e de responsabilidade do homem com a natureza e com seu lugar de vivência”. 4 (40%)

Fonte: Pesquisa de campo, 2009.

Ao comparar a ideia de educação ambiental expressa pelos professores com as informações colhidas nos formulários dos alunos, percebe-se que tanto os primeiros como os últimos a identificam como o trato com o meio ambiente, mesmo que utilizando categorias distintas.

Apesar de a educação ambiental estar sempre relacionada ao cuidado e preservação do meio ambiente, foi possível perceber diferenciações entre as respostas. Os professores compreendem que os ensinamentos devem ter abrangência mais ampla, referindo-se ao meio ambiente como o espaço de interferência social. Segundo Effting, a educação ambiental é aprendizagem de como gerenciar e melhorar as relações entre a sociedade humana e o ambiente, de modo integrado e sustentável. (2007, p.12)

Por outro lado, os alunos criam uma relação mais íntima entre meio ambiente e os aspectos naturais, defendendo o fim dos desmatamentos e da poluição, ou se expressam de forma bastante vaga quando se fala da importância da conscientização, sem abordar os efeitos práticos que isto representa. Por exemplo, “é uma maneira de aprendizagem muito importante para nosso dia a dia”, ou “a educação ambiental é uma coisa que discute sobre o meio ambiente”.

De acordo com Capra (2006), a educação ambiental tem como proposta viabilizar um processo que inclua homem e meio ambiente em uma perspectiva pluralista, a qual facilite a construção da imagem de pertencimento do homem ao sistema planetário. A tabela a seguir ilustra o modo superficial como os alunos tratam o meio ambiente, demonstrando que poucos têm conhecimento das complexas relações que tecem sobre as questões ambientais.

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA.

CATEGORIAS RESPOSTAS Nº (%)

Preservação e cuidado

“A importância é que podemos aprender que temos de cuidar na nossa escola”.

“Preservar a natureza e ensinar o que pouca gente faz”.

“Incentiva os alunos cuidar melhor da natureza”.

39 (56,9%)

Conscientização

“É importante para a conscientização dos alunos e também como saber lidar com tudo ao nosso redor”.

“Conscientizar, educar e orientar os alunos”.“Porque há vários alunos que não têm consciência que

nós dependemos do meio ambiente”.

16 (22,8%)

Aprendizado“É muito bom porque esse tema é como se fosse outra

matéria qualquer”.“A gente aprende várias coisas importantes”.

14 (20,3%)

Fonte: Pesquisa de campo, 2009.

Vale ressaltar que um dos obstáculos enfrentados pela educação ambiental está justamente na falta de consciência e de responsabilidade com relação aos problemas ambientais. Estes, às vezes, são vistos como algo distante da vivência cotidiana, como problemas de competência governamental ou das grandes empresas, e seu enfrentamento e solução, portanto passam longe de uma ação individual.

A inserção da educação ambiental no currículo escolar visa estender suas práticas para além da semana do meio ambiente ou de projetos esporádicos. Assim, o projeto político-pedagógico busca oportunizar sua prática em todo o período letivo, de maneira que ela seja abordada também nas demais disciplinas.

Embora 20% do professores entrevistados não tenham conhecimento do projeto político- pedagógico da escola, todos demonstraram preocupação com as questões ambientais. Trabalham temas relacionados ao cuidado com o meio ambiente, buscam informações sobre problemas que permeiam a vida dos alunos.

Os professores da área das exatas possuem mais dificuldades de inserir a temática ambiental no conteúdo específico de cada disciplina. Por outro lado, as disciplinas que trabalham com leitura e interpretação de textos, bem como as que abordam os espaços naturais, conseguem inserir com maior facilidade a educação ambiental em suas aulas.

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Inalice Donato Primo Menezes

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), o tema meio ambiente deve estar integrado a todas as áreas do conhecimento e deve ser abordado em uma relação de transversalidade, de modo que a prática educativa proporcione uma visão global e abrangente das questões ambientais. Ainda segundo os PCNs:

Trabalhar de forma transversal significa buscar a transformação dos conceitos, a explicação de valores e a inclusão de procedimentos, sempre vinculados à realidade cotidiana da sociedade, de modo que obtenha cidadãos partici-pantes. Cada professor, dentro de especialidade de sua área, deve adequar o tratamento dos conteúdos para contemplar o tema meio ambiente. (BRASIL, 1998)

Com exceção dos projetos propostos pela escola, a prática dos professores mostra-se bastante restrita a textos e discussões, materiais de baixo custo, que incentivam os alunos a questionar, mas que dificilmente os confrontam com a sua realidade ou exigem deles mudanças de atitude.

Os alunos reconhecem que transformações precisam ocorrer principalmente no que diz respeito aos métodos de ensino. Consideram que em sua maioria são muito teóricos e por vezes de difícil compreensão. Afirmam também que o espaço físico limitado dificulta a realização de atividades extraclasse. Mesmo compreendendo as limitações da escola, desejam que as aulas sejam mais práticas e dinâmicas. A preferência dos discentes pode ser vista no gráfico abaixo.

Fonte: Pesquisa de campo, 2009.

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

Nesse contexto, a escola representa um suporte material e humano importante para a prática pedagógica, mesmo que, por vezes, não consiga atuar com eficiência. Mesmo com o trabalho prejudicado, é difícil apontar os responsáveis, pois são conhecidos os problemas estruturais no sistema educacional do país. Apesar disso, a participação de toda a comunidade escolar faz grande diferença no enfrentamento dos problemas detectados.

Para o aluno é muito difícil compreender as complexas relações que estão por trás das instituições educacionais, como agravante a classe docente vem enfrentando dificuldades que atingem diretamente o seu desempenho em sala de aula. A jornada de 60 horas, por exemplo, é um dos artifícios do profissional para melhorar seus rendimentos, mas reflete-se na falta de tempo para planejamento e resulta em aulas improvisadas.

A queda na qualidade de ensino vem se intensificando a cada dia. Acrescentam-se a isto as questões sociais, fruto do sistema capitalista, que, em um ritmo acelerado, desvaloriza as pessoas e os recursos naturais. Em meio a esse emaranhado de relações, faz-se necessário um comprometimento ainda maior de professores e alunos frente ao aprendizado.

Grande parte dos alunos considera que o conhecimento sobre educação ambiental aprendido em sala de aula resultou em mudanças de comportamento em casa e na escola. Por outro lado, os professores acreditam que o retorno dos alunos por meio de ações positivas é bastante restrito. Acreditam que ações para conscientização devam ser intensificadas, pois, mesmo detendo o conhecimento, poucos alunos mudaram seu comportamento.

Os professores apontam também que a escola sozinha não consegue dar conta desse trabalho. Surge, então, a necessidade de intervenção familiar no sentido de cobrar atitudes responsáveis de seus filhos, porém a comunidade ainda é bastante falha nessa questão.

Apenas alguns pais e alunos se veem como agentes transformadores capazes de intervir em sua localidade. Nos questionamentos sobre as ações de redução dos impactos ambientais causados pelos agrotóxicos e pelo lixo, foi possível perceber que poucos se mobilizam em solucionar o problema. Um grande problema enfrentado pela escola é a isenção de responsabilidades por parte dos alunos

Atende-se para esta afirmação: “Eu não posso fazer nada para ajudar o meio ambiente, mas o que devemos fazer é não jogar lixo nas ruas, não poluir os rios, etc”. O aluno que a fez acredita que as outras pessoas fazem mal ao meio ambiente. É bastante comum dizer que o homem polui, mas quem é esse homem? Diante disso, faz-se necessário que os professores criem mecanismos de ensino para que o aluno se veja nesse homem, para assim atuar positivamente em defesa do meio ambiente.

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Considerações finais

No âmbito escolar, a educação ambiental se insere no sentido de articular as ações educativas de proteção, recuperação e melhoria do meio ambiente, potencializando o poder da educação de promover transformações culturais e sociais.

A escola deve optar por métodos mais eficazes, para que o aluno compreenda a relação dos fenômenos naturais com a ação humana e perceba suas implicações para a humanidade como um todo, para os outros seres vivos e o espaço em que habitam. Espera-se que o aluno desenvolva suas potencialidades, adotando posturas construtivas e ambientalmente corretas frente à comunidade.

As dificuldades enfrentadas pela educação pública são recorrentes, porém não se pode abandonar o que já foi construído. Os conteúdos ambientais vão permeando as disciplinas curriculares e contextualizando-se com a realidade do bairro. Mesmo os resultados escassos não podem ser considerados insignificantes, pelo contrário, representam o primeiro passo já dado no longo caminho a percorrer.

Portanto, não se pode desconsiderar que a Escola Municipal Professora Marlene Flores, juntamente com o seu quadro docente, vem desenvolvendo atividades que buscam uma educação ambiental de qualidade e que tenha efeito positivo na transformação da comunidade.

Todavia, é verdade também que muito ainda está por fazer para alcançar os objetivos do seu projeto político-pedagógico, bem como para que o ideal de educação seja efetivado na instituição. A falta de esgotamento sanitário, o uso de agrotóxicos, o descarte de lixo em terrenos baldios, entre outros, devem ser encarados como incentivos para a comunidade escolar implementar ações de educação ambiental.

A escola assume grande relevância nesse cenário, pois cabe a ela romper com paradigmas culturais e promover a formação de cidadãos responsáveis, que consigam transformar a teoria em uma prática construtivista, questionadora e justa. Desse modo, os conhecimentos ambientais representarão ensinamentos para a vida.

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TEORIA E PRÁTICA: a educação ambiental para uma transformação social

REFERÊNCIAS

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_______. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/meioambiente.pdf>. Acesso em: 1 de outubro de 2008.

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CULTURA CORPORAL E O FENÔMENO DA

DESTERRITORIALIZAÇÃO: o furto da produção cultural local

Elaine Brito Nunes1

Luciano Lima Diniz2

Maiala Maria Souza3

Nadson Santana Reis4

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de uma investigação acerca da intervenção dos professores de Educação Física em três escolas municipais da cidade de Guanambi, Bahia, a respeito do trato pedagógico dos elementos da cultura corporal local, bem como dos desdobramentos decorrentes da apropriação da cultura corporal hegemônica, caracterizada como espetacularizada e esportivizada, além dos produtos da indústria cultural. Tal estudo objetiva analisar o fenômeno da desterritorialização da cultura corporal e suas implicações. A análise do objeto discurso, obtido com uma entrevista estruturada aplicada a vinte estudantes de oitava série, permitiu constatar que a cultura local, diante das novas formas de cultura, não consegue produzir, nem reproduzir-se, dificultando a identificação do sujeito como produtor de cultura, assim como interferindo no sentimento de pertencimento social.

1 Graduanda do 6º bloco em Licenciatura Plena em Educação Física – Uneb – Campus XII. Integrante dos Grupos de Estudos Educação & Marxismo e Educação Física, da Cia. de Dança e do Curso de Formação em Agentes de Atividade Física e Saúde.E-mail: [email protected]

2 Graduando do 5º Bloco em Licenciatura Plena em Educação Física – Uneb – Campus XII. E-mail: [email protected]

3 Graduando do 6º Bloco em Licenciatura Plena em Educação Física – Uneb – Campus XII. Integrante dos Grupos de Estudos Educação & Marxismo e Educação Física.E-mail: [email protected]

4 Graduando do 6º Bloco em Licenciatura Plena em Educação Física – Uneb – Campus XII. Integrante dos Grupos de Estudos Educação & Marxismo e Educação Física e do Curso de Formação em Agentes de Atividade Física e Saúde. E-mail: [email protected]

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Elaine Brito Nunes, Luciano Lima Diniz, Maiala Maria Souza e Nadson Santana Reis

Palavras-chave: Educação Física. Cultura local. Cultura corporal. Desterritorialização. Indústria cultural.

BODY CULTURE AND THE PHENOMENON OF DISPLACEMENT: the theft of local

cultural production

ABSTRACT

This article presents the results of an investigation about Physical Education Teacher’s intervention in the city of Guanambi, in the State of Bahia, based on pedagogical elements of local bodily culture, as well as the developments arising from the appropriation of the hegemonic bodily culture, characterized as some think spectacular and sportive, besides the products of cultural industry. This study aims to analyze the displacement phenomenon of bodily culture and its implications. The analysis of the present object, obtained from an interview with twenty students from eighth grade, made it possible to assume that the local culture, in the front of new forms of culture, fails to produce or reproduce, hindering the identification of the subject as a producer of culture, as well as interfering with the sense of social belonging.

Keywords: Physical Education. Local culture. Body culture. Displacement. Cultural industry.

INTRODUÇÃO

Inseridos em um emaranhado de relações globalizadas, nas quais as relações entre as pessoas, o fluxo de informações e de mercadorias e os conhecimentos circulam em escala planetária, muitos indivíduos não percebem nem avaliam o avanço das formas culturais advindas da indústria cultural (ginástica de academia, festivais de dança, pistas de caminhada, shows de música, etc.). As formas alternativas de culturas, especialmente aquelas vivenciadas e ressignificadas no seio das comunidades que as produzem e reproduzem, são destruídas, principalmente em decorrência da ilusão de que se configuram como arcaicas e/ou inadequadas, para um “tempo de modernidade/civilização”. Em contrapartida, os produtos da indústria cultural caracterizam-se como moda, novidade, desfrutando de prestígio socioeconômico, especialmente devido ao enfoque midiático que lhes é atribuído.

O presente artigo busca analisar a intervenção do professor de Educação Física, chamando a atenção para o fato de que há a necessidade de tratar pedagogicamente a produção e os

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elementos da cultura local, bem como de resgatar as formas alternativas de cultura corporal que ainda sobrevivem no seio de pequenos grupos, possibilitando ao sujeito perceber-se como agente produtor e consumidor de cultura, o que é acrescido do sentimento de pertencimento social, permitindo a identificação com o grupo do qual faz parte.

Nesse sentido, busca-se a apreensão da cultura corporal como produto de uma vivência social historicamente construída que, inserida em um processo dialético, é influenciada, construída e reconstruída segundo múltiplos determinismos. Procura-se também compreender os sentidos e significados culturalmente imbuídos nas diversas formas de cultura, passando pelas influências da indústria cultural, da esportivização e da espetacularização.

No que diz respeito à perspectiva metodológica, recorreu-se ao método dialético, visto que permite apreender e compreender a dinâmica social, fundamentando a análise, a discussão e mesmo a forma de questionar a realidade. Com relação à técnica de levantamento dos dados, utilizou-se a entrevista estruturada, a mais adequada para captar valores e formas de compreensão individual.

Nessa perspectiva, considera-se este estudo de suma importância, visto que pode contribuir para que os professores de Educação Física avaliem sua práxis e organizem vivências mais humanas, portanto mais contextualizadas, identificando os estudantes como um grupo social dotado de consciência histórica, constituindo-se como sujeitos históricos. Desse modo, tal análise insere-se entre aquelas que visam discutir, investigar e socializar o que a humanidade produziu de mais avançado.

METODOLOGIA DA COLETA E ANÁLISE DOS DADOS

O estudo mencionado foi desenvolvido em três escolas municipais de Guanambi de ensino fundamental, com estudantes da oitava série. Escolha intencional, já que tais estudantes têm ou pelo menos deveriam ter um acúmulo significativo no que diz respeito aos conteúdos de Educação Física.

Partindo do pressuposto de que a amostra em pesquisas sociais “não se baseia no critério numérico para garantir sua representatividade, [e que a boa] amostragem é aquela que possibilita abranger a totalidade do problema investigado em suas múltiplas dimensões” (MINAYO, 1994, p. 43), optou-se pela amostra por conglomerados, a qual, segundo Gil (2006), é a indicada em situações em que é difícil a identificação dos elementos, além de ser vantajosa por diminuir o elevado custo de preparação. Apolinário (2006) afirma que tal procedimento ocorre quando os

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elementos de uma população são reunidos em grupos e alguns são sorteados para compor toda a amostra.

Cabe ainda ressaltar que tal estudo se pauta no método dialético, visto que este possibilita compreender e apreender o todo em sua dinamicidade e complexidade, como enfaticamente elucida Gil: “a dialética fornece as bases para uma interpretação dinâmica e totalizante da realidade, já que estabelece que os fatos sociais não podem ser entendidos abstraídos de suas influências políticas, econômicas, culturais etc.” (GIL, 2006, p. 32).

Com relação à técnica de levantamento dos dados, utilizou-se a entrevista estruturada, um meio de coletar dados, no qual os agentes sociais, “enquanto sujeitos-objetos da pesquisa que vivenciam uma determinada realidade que está sendo focalizada” (MINAYO, 1994, p. 57), relatarão seus valores, suas atitudes e opiniões acerca de determinada situação, neste caso específico, sobre sua vivência cultural e sua compreensão das atividades culturais da comunidade em que estão inseridos. A opção de utilizar a entrevista estruturada é reforçada por Gil, ao afirmar que ela

é bastante adequada para obtenção de informações acerca do que as pessoas sabem, crêem, esperam, sentem ou desejam, pretendem fazer, fazem ou fi-zeram, bem como acerca de suas explicações ou razões a respeito das coisas precedentes. (SELLTIZ et al., apud GIL, 2006, p. 117)

A análise dos dados se aproximará da análise do discurso, que, segundo Mazière (2007), se constitui em um dispositivo de observação apto a revelar, a permitir a apreensão do objeto discurso pela tarefa de interpretar. Para Gil (2006), configura-se como uma busca de sentido mais amplo para os dados, por meio de ligações com saberes já acumulados, ou seja, relacionando o geral com o particular, o concreto com o abstrato, como sugere Minayo (1994).

Resultados e discussões

O avanço da indústria cultural e o furto da cultura local

A discussão sobre a temática cultura vem, ao longo do tempo, ganhando espaço no campo das ciências humanas. Trata-se de uma análise densa, complexa, social e historicamente necessária, visto que “vozes simultâneas falam de cultura querendo dizer coisas bem diferentes. [...] Por isso mesmo, as discussões sobre os sentidos e limites deste campo de reflexão histórica são não somente bem-vindas, mas necessárias.” (LARA, apud COUCEIRO, in BURITY, 2002, p. 11-2). Além disso, qualquer

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vivência social é sempre simbolicamente mediada (seja pelo discurso, seja pelas manifestações artísticas em sentido amplo). Dessa maneira tanto se pode dizer que tal vivência é culturalmente construída, como dizer que a cultura é uma construção social, que interage de forma complexa com os diferentes lugares e práticas onde se situam ou por onde circulam os agentes sociais, dando sentido e direção – ou questionando-os – a seus pertencimentos e ações. (BURITY, 2002, p. 7)

Conforme Burity (2002), o termo ‘cultura’ diz respeito à percepção que o indivíduo tem do lugar que ocupa ou não no mundo, passando por investimentos simbólicos, pelos quais os sujeitos se afirmam e negociam com os outros sua forma de inserção na sociedade.

Ainda sobre o conceito de cultura, cabe ressaltar que Chauí (1997) a compreende como a produção e criação da linguagem, da religião, da música, da dança, dos sistemas de relações sociais, particularmente os sistemas de relações de parentesco e as relações de poder. Surge a partir das respostas que damos às exigências da vida, de modo que todos somos produto e produtores de cultura. Com base nesta abordagem, a cultura corresponde ao que há de mais humano no ser, aquilo que nos distingue dos outros animais.

A partir de tal esboço, percebe-se a cultura como um todo constituído por partes. Contudo, novos estudos, citados por Alves (2004), apontam para a necessidade de considerá-la em rede, especialmente por vivermos, na atualidade, uma época de grande fluxo de informações, conhecimentos e imagens. Tais elementos acabam por reorganizar os agrupamentos sociais e, ainda, a “relação que estabelecem com as novas territorialidades (ou desterritorialidades), provocando diferentes maneiras de situar nos tempos e espaços culturais” (ALVES, in GOMES, 2004, p. 59).

Qualquer bom observador perceberá, seja na dinâmica em que está inserido ou mesmo por meio de relatos por parte de pessoas mais velhas, a existência ou o desaparecimento de algumas manifestações culturais comuns ao grupo, à comunidade, bem como o crescimento de outras, fruto da sociedade globalizada de consumo, caracterizada como cibernética, neotécnica, tecnológica, etc. Assim, é comum encontrar-se em algumas cidades, em menor escala: o futebol de várzea, as conversas de botequim, o almoço de fim de semana, as folias de reis, as festas juninas, o samba de roda, o soltar pipa, o passeio na praça, etc., embora avancem o futebol espetacularizado, os shows de música, a locação de DVD, o domingo no clube, as pistas de caminhada, a audiência da TV, a ginástica de academia, etc., como elucida Mascarenhas (2003).

Ainda sob essa perspectiva, é indispensável discutir o contexto global, compreendendo a globalização como fenômeno real, produtor de uma cultura global, que nos últimos tempos

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tem intensificado o desgaste das diversas formas de cultura alternativa e, em consequência, das identidades sociopolíticas.

Inseridos nesse processo de intensas transformações, é conveniente compreender que

alguns de nós tornam-se plena e verdadeiramente “globais”, alguns se fixam na sua “localidade” – transe que não é nem agradável nem suportável num mundo que os “globais” dão o tom e fazem as regras do jogo da vida. (BAU-MAN, apud BOSSLE, 2009, p. 26)

Seguindo tal argumentação, Hargreaves, citado por Bossle (2009), afirma que a globalização redesenha as tecnologias de trabalho, os processos laborais e a relação entre produtores e consumidores; a preocupação com o pessoal e o relativo desapreço pelo social e político; a simulação como caráter superficial de representar o mundo de imagens artificiais; o caráter instantâneo das atividades; as estruturas flexíveis de organização, que formam um mosaico manipulativo, na medida em que há responsabilidades para os envolvidos, mas não existe poder de decisão, além de configurar o espaço geográfico flexível, produzindo incertezas nacionais e culturais.

Segundo Marcellino (1990), com o desenvolvimento de tecnologias de comunicação, a produção cultural deixa de atingir um nível local e passa a abranger um mercado consumidor muito mais amplo. Ainda na concepção desse autor, o processo de internacionalização, intensificado pela mídia, acaba aproximando pessoas de diferentes culturas, idades e condições socioeconômicas, potencializando o fenômeno da homogeneização. A internacionalização à qual o autor faz alusão diz respeito ao colonialismo cultural não só entre países, mas também entre as diversas regiões de um mesmo país.

Seguindo o mesmo raciocínio, Sylvia Couceiro escreve:

No bojo das aceleradas transformações do mundo moderno – revolução tec-nológica dos computadores, ressurgimento dos nacionalismos, queda dos regimes comunistas do leste europeu, processo de globalização –, tradições, costumes, enfim, culturas seculares estão sendo esmagadas, desaparecendo como que levadas por uma onda gigantesca, fazendo aparecer um imenso va-zio. Onde estão as danças típicas regionais, os antigos ritos e cerimônias de algumas comunidades, a vivência religiosa das cidades pequenas, o modo de vida e a tradição de tantos povos? No meio de tantas transformações e dúvi-das, uma coisa é certa: “Um certo fio de tradição viva foi sem dúvida algu-ma cortado, e os aprendizados passam agora por outras vias”. (COUCEIRO, 2002, p. 13, in BURITY, 2002; BOUTIER, JULIA, 1998, apud COUCEIRO, 2002, p. 13)

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Assim, inseridas nesse contexto, algumas manifestações não conseguem resistir ao avanço e ao desenvolvimento cultural global, de modo que sua materialização acaba sendo inviabilizada. A constante destruição da cultura popular local acaba por dificultar a identificação de grupo e/ou o sentimento de pertencimento social, atrelada à pouca importância dada à produção cultural, especialmente a local, que por excelência corresponderia àquela que possibilitaria o reconhecimento do sujeito como produtor de cultura, logo capaz de modificar sua realidade ao tempo que modifica a si mesmo, em um contínuo processo dialético.

Ainda para Marcellino (1987), vários fatores acabam por contribuir para a homogeneização da produção cultural: a alienação do trabalho, motivada pela despersonalização, pela ausência de participação e pelo caráter inacabado do produto.

Compreendendo a Educação Física “como matéria escolar que trata pedagogicamente temas da cultura corporal, ou seja, os jogos, a ginástica, as lutas, as acrobacias, a mímica, o esporte e outros” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 18), faz-se indispensável ressaltar que os conhecimentos referentes à cultura corporal abrangem as diversas formas de o ser humano movimentar-se, são carregados de sentidos e significados, construídos em um processo contínuo pelo e para o homem, especialmente na tentativa de satisfazer suas necessidades, bem como expressar suas emoções, seus sentimentos, sua ludicidade, etc. Tendo em vista tais considerações, é indispensável assegurar a todo ser humano o acesso a tais saberes, daí a grande relevância e responsabilidade da Educação Física: oportunizar a apreensão, de forma crítica e democrática, dos elementos da cultura corporal.

É inegável o crescente acesso da população às danças, às lutas e principalmente aos esportes. Este fato pode se explicar pela influência da mídia e por ações governamentais que têm buscado implantar e viabilizar espaços em que seja possível o acesso a tais manifestações culturais. A política de “promoção” das manifestações culturais justifica-se pelo interesse em mascarar a realidade, de modo que a classe trabalhadora experimente “sensações” e “demonstrações” de que está sendo assistida pelo poder público, falseando a superação dos preconceitos, as instabilidades e a precariedade do trabalho, enfim, a inexistência de condições humanas dignas.

As manifestações culturais com as quais a população tem contato estão isentas de seus significados e sentidos advindos da coletividade dos sujeitos históricos. A partir dessas intencionalidades ocorrem a esportivização e a espetacularização, nas quais os elementos da cultura corporal acessados originalmente não foram construídos com esses sentidos (GONZÁLEZ, FENSTERSEIFER, 2005). A perda da “essência”, a despersonalização das manifestações não permitem aos sujeitos reconhecer-se, já que, à medida que diminui a significação social de um elemento culturalmente construído, assiste-se a um divórcio crescente entre o espírito crítico e a fruição da obra, como elucida Mesquita Júnior (2008). Como exemplo, pode-se tomar a capoeira

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e a comemoração aos Orixás, que nos últimos tempos vêm se transformando em divertimento, distração de parte da população brasileira e/ou estrangeira, que lança perfumes e flores ao mar, vazios dos sentidos da religiosidade afro-brasileira.

Para além da perda dos sentidos originais das diversas manifestações culturais, advinda do crescimento da indústria cultural, cabe compreender a espetacularização como fenômeno que as transforma em espetáculo modelado, “de forma a ser consumido por telespectadores que procuram um entretenimento excitante, e é parte cada vez maior da indústria do lazer, sendo fator decisivo para isso o papel desempenhado pela mídia, especialmente a televisão” (HESLING, apud BETTI, 1988, p. 31).

Outra implicação da hegemonia do esporte espetacularizado, enfatizada pelos veículos de comunicação de massa, é a facilidade de extinção dos elementos culturais locais (os jogos, as danças, os ternos de Reis, etc.), em decorrência da hipervalorização dos elementos regionais e globais (a capoeira, a dança, o esporte, a ginástica, as lutas, as quadrilhas, etc.). Para deflagrar esse fenômeno, a mídia é imprescindível, já que materializa as intencionalidades da indústria cultural, em que

a faculdade humana de pensar é destruída e [...] todos os objetos [...] são glo-rificados pela grande mídia. [...] Este novo homem é caracterizado pela renún-cia. Renúncia da sua personalidade, da sua comunidade, da sua vitalidade. O homem da única dimensão “converte o supérfluo em necessidades e as neces-sidades humanas em mercadorias supérfluas”. (BENJAMIM, apud MESQUI-TA JR., 2008, p. 1)

Nesse sentido, a falta de conhecimento, a expropriação por parte do sujeito devido à segregação de classes constituem a égide idiotizante para a manutenção dessa relação neoliberal e encaminham para a estagnação da criação. A população julga estar se apropriando dos bens produzidos historicamente pela humanidade, no entanto encontra-se em total enlevo com o fetiche do capital.

O conceito de cultura corporal, segundo Escobar e Taffarel (2008), deve estar fundamentado na “visão histórica que coloca a atividade prática do homem, o trabalho e as relações [...] dos homens com a natureza e com os outros homens como centro de explicação do real [...] cultura como resultado da vida e da atividade do homem em busca da sua superação” (ESCOBAR e TAFFAREL 2008, p. 9).

Nesse sentido, percebe-se a possibilidade de contribuir para a sociedade, por meio da intervenção na educação dos sujeitos históricos. Falar de sujeito histórico implica falar de sujeitos construtores de cultura. Daí a relevância de oportunizar sua apropriação – ter

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acesso à própria produção. Para isso, é preciso, antes, pensar no valor das criações locais, na territorialidade – que se refere à cultura de determinado povo, criada em um tempo e espaço específicos. Oposto a isso está o fato de que normalmente se observa, nas aulas de Educação Física, a pura reprodução – quando é feita – de manifestações performáticas que não dizem respeito ao cotidiano dos alunos e, às vezes, nem mesmo ao do próprio professor. Isso pode ser explicado pelas “influências da indústria cultural, que tende a gerar necessidades padronizadas, para a maior facilidade no consumo, perpetuando ou dificultando a superação de uma situação de conformismo” (MARCELLINO, 1990, p. 62). É neste cenário que a cultura local vem perdendo seu espaço e seus valores, cedendo lugar aos produtos da indústria cultural. Nota-se um distanciamento, a perda da comunicação, em que seriam gerados os laços afetivos e a solidariedade entre as pessoas, para que elas pudessem materializar sua capacidade de criação, de produção cultural, criando um ambiente propício

para o desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos. Tanto cumprindo ob-jetivos consumatórios, como o relaxamento e o prazer propiciados pela prática ou pela contemplação, quanto objetivos instrumentais, no sentido de contri-buir para a compreensão da realidade, as atividades de lazer favorecem, a par do desenvolvimento pessoal, também o desenvolvimento social, a partir do aguçamento da sensibilidade ao nível pessoal, pelo incentivo ao autoaperfei-çoamento, pelas oportunidades de contatos primários e de desenvolvimentos de sentimentos de solidariedade (MARCELLINO, 1990, p. 60).

A AULA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E O SABER LOCAL

A amostra foi composta por vinte estudantes de 8ª série de três escolas municipais de Guanambi, Bahia, que serão identificadas neste artigo como escolas A, B e C. Buscando identificar os conteúdos tratados nas aulas de Educação Física, os alunos foram questionados sobre a quais elementos da cultura corporal tiveram acesso durante o período de estudos. A pesquisa foi desenvolvida em escolas distintas, e as respostas dos componentes da amostra variaram de acordo com suas experiências: na escola A, os alunos afirmaram ter acesso exclusivamente ao futsal; os estudantes da escola B disseram experienciar as modalidades esportivas futsal, handebol e vôlei; já na escola C os alunos informaram vivenciar futsal, vôlei, handebol, além dos jogos de baralho e dominó.

Tais informações elucidam uma realidade vivenciada pela escola pública brasileira, especialmente em relação à componente curricular Educação Física: a reprodução, quando é feita, das modalidades esportivas, como afirma Dantas Júnior (2008), ao demonstrar que suas origens

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estão diretamente associadas ao surgimento dos esportes, tanto espacial como temporalmente, além de guardarem vínculos com as condições e motivações históricas, sobretudo na segunda metade do século XX, notadamente pelo investimento do Estado ditatorial, visando propagar o ideário do “Brasil grande” pela via educacional e esportiva.

Com relação aos elementos da cultura corporal que mais gostavam de vivenciar, as respostas variaram entre futsal, vôlei e dança. Os estudantes que declararam gostar dessas manifestações não souberam traçar considerações, seja acerca do “poder econômico e poder esportivo, assim como o uso da pessoa humana na busca do lucro” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 72), não percebendo que o fato de alguns não conseguirem participar de um jogo misto, por exemplo – principalmente as meninas –, deve-se à “exacerbação do nível competitivo, onde os valores de natureza ética se perdem frente à busca da vitória a qualquer custo” (COLETIVO DE AUTORES, 1993, p. 72) Dessa forma, jogar com meninos (às vezes mais habilidosos) significa uma ameaça, que pode resultar em empurrões, xingamentos e agressões mais sérias. Entretanto, apenas uma estudante percebeu no esporte a possibilidade de ascensão social: “se quiser ser uma profissional, tem que ter direito de treinar, estudar”.

Quanto aos elementos a que gostariam de ter acesso, os informantes citaram a dança, a ginástica (de academia), o vôlei, a natação, o atletismo, o basquete e a capoeira, os quais gozam de certo prestígio midiático. Segundo Hetkowski: “a força persuasiva da televisão está baseada, sobretudo no poder de mobilizar emoções, de espelhar e, até mesmo, criar desejos” (apud LEIRO, 2004, p. 50), enfatizando que a mídia influencia as escolhas, os conceitos, as concepções e vivências de tais elementos culturais, o que repercute no tratar científica e pedagogicamente os elementos da cultura corporal. Nesse sentido, Medina escreve: ao “vivermos num sistema capitalista, dependente, altamente hierarquizado em níveis sociais não só a escola como também o homem, o corpo e suas manifestações corporais serão produtos ou subprodutos das estruturas que caracterizam esse sistema!” (1990, p. 19).

Já ao serem indagados quanto ao conhecimento a respeito de alguma manifestação da cultura corporal desenvolvida em Guanambi, os estudantes revelaram não conhecer nenhuma manifestação. Além disso, alguns confundiram a vivência de algumas manifestações hegemônicas com a produção cultural local, como o forró, o samba e o futebol. O motivo para tal distanciamento, por eles apontado, variou entre a falta de interesse e a negligência do professor em relação a tal produção; já um número relativamente grande de alunos não conseguiu responder satisfatoriamente à pergunta, em uma proporção de 4:16, respectivamente. Reconhece-se a importância do trato científico e pedagógico da Educação Física nesse resgate da cultura local, entretanto nenhum estudante fez referência ao “desaparecimento de manifestações culturais autênticas, nos vários gêneros, notadamente das festas, tanto lúdico-

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religiosas como lúdico-folclóricas” (MARCELLINO, 1987, p. 70), em decorrência do avanço da indústria cultural.

Sobre as vivências familiares, poucos jogam futebol, porém a grande maioria se satisfaz ao assistir aos jogos na TV, que reúnem toda a família. Neste sentido, Pretto traz que

após os referidos inventos e os recentes avanços dos conhecimentos comuni-cacionais, “a sociedade ainda meio perplexa [...] começa a apresentar sinais de incorporação, aceitação e até de intimidade com os novos procedimentos dessa nova era [...]”. Tal movimento redesenha uma nova geografia, promove a simultaneidade e favorece a possibilidade “de ser tribal e não-tribal, local e não-local, ao mesmo tempo [...] a possibilidade de estar em outro lugar estan-do em sua casa” [...]. (PRETTO, apud LEIRO, 2004, p. 50)

Desse modo, nota-se o interesse dos sujeitos pelo esporte espetáculo, desvinculado dos processos sociais referentes à sua própria realidade. A reprodução do esporte, dentro das intenções e significados dominantes, gera a impossibilidade de sua materialização (performance). Assim, a falta de problematização a respeito do esporte resulta na expropriação, na incapacidade de criar e recriar o esporte como vivência contextualizada.

Outra manifestação citada por apenas uma entrevistada foi a capoeira, que, apesar de estar sofrendo os mesmos processos de espetacularização e esportivização, ainda não se encontra tão difundida quanto o esporte.

Ao tratar da importância da apropriação das manifestações da cultura corporal, os alunos justificaram-na a partir da saúde, associando-a à necessidade de “exercícios físicos”. Nesse sentido, reafirmam um discurso dominante produzido e reproduzido pela mídia, concebendo as manifestações da cultura corporal como “um agente de saneamento público, na busca de uma sociedade livre de doenças [...], e para a qual a saúde poderia ser assegurada [...] independente das determinações impostas pelas condições de existência material” (GHIRALDELLI JR., 1991, p. 17). Além disso, concebem-na como um meio de assepsia social, que possibilita “tirar das drogas”, moldando assim o “praticante aos valores e normas dominantes defendidas para a ‘funcionalidade’ e desenvolvimento da sociedade” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 71).

Com relação à relevância das manifestações culturais locais, os entrevistados falaram sobre o engrandecimento do prestígio cultural de Guanambi. Suas considerações, ao atribuírem juízo de valor à importância da cultura local, giraram em torno do status quo. Deste modo, eles não conseguem perceber a potencialidade de criação, construção cultural dos sujeitos que compõem a sua própria comunidade. Sujeitos estes que, a partir da leitura da sua realidade, constituída de saberes locais, como religiosidade, culinária, danças, jogos, sentimentos, vestimentas, etc., conseguem sintetizá-los, criando as manifestações locais, como a Vai d’virá, dança genuína e

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Elaine Brito Nunes, Luciano Lima Diniz, Maiala Maria Souza e Nadson Santana Reis

folclórica de Guanambi, e o Reisado. Outros disseram não existir relevância nas manifestações locais, o que demonstra uma dificuldade, inclusive, de interpretar os processos socioculturais.

Dentre as escolas pesquisadas, apenas na escola C as alunas entrevistadas tiveram acesso ao Vai d’virá, no período do estágio de estudantes de Educação Física da Universidade do Estado da Bahia. A partir de então, ensaiam para apresentar a dança em ocasiões pontuais. Quanto ao Reisado, três informantes fizeram referência ao Festival de Reisado de Morrinhos. Poucos falaram da importância e da beleza da manifestação. Outros disseram ter ouvido falar sobre a festa, mas não sabiam muito a respeito dela. A grande maioria disse nada conhecer sobre o reisado. Dentre os que conheciam, apenas uma entrevistada conseguiu perceber uma redução na frequência com que o Reisado vem sendo realizado.

Diante da pouca importância atribuída à cultura corporal local, nenhum (a) entrevistado (a) citou um ou outro dos elementos acima referidos como identificador da população guanambiense, mesmo porque tanto o Vai d’virá como o Reisado vêm perdendo e/ou gozando de pouco prestígio social.

Considerações finais

Diante de tal investigação, percebe-se o quão importante e urgente é a necessidade de o professor de Educação Física direcionar sua práxis sob uma perspectiva mais humana e contextualizada, principalmente no que se refere às vivências da cultura corporal local. Nessa perspectiva, é indispensável que o professor tenha uma postura investigativa, buscando formas de problematizar e orientar tanto a cultura contemporânea quanto as culturas intrínsecas de um povo em determinado tempo e espaço.

Nota-se que a cultura corporal local não consegue produzir nem reproduzir-se. Isso se deve ao fato de que os elementos advindos da indústria cultural, especialmente os que recebem enfoque midiático-esportivo, modelam a vivência dos indivíduos. Além disso, nota-se sua institucionalização, na medida em que estabelecem regras e normas inflexíveis, padronizadas.

Em consequência, percebe-se o distanciamento por completo do indivíduo da produção cultural local, resultando na dificuldade de reconhecer-se como sujeito produtor e consumidor de cultura, bem como na ausência de um elemento identificador da própria comunidade, desmobilizando o sentimento de pertencimento comunitário e as redes de solidariedade que caracterizam o grupo sociocultural. Nesse sentido, tais consequências decorrem da pouca ou nenhuma importância dada ao saber local, desembocando na sua expropriação.

Assim, verifica-se a importância do conhecimento popular local na formação do sujeito emancipado, bem como a carência de um trato científico e pedagógico dos elementos da cultura

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CULTURA CORPORAL E O FENÔMENO DA DESTERRITORIALIZAÇÃO: o furto da produção cultural local

corporal por parte do professor de Educação Física, superando a subordinação da escola e da Educação Física aos ditames político-econômicos, ao obscurecer sua lógica organizacional e sua autonomia.

Seguindo a mesma linha, Dantas Júnior assim escreve e sintetiza:

Num país com tantas disparidades regionais, tantas comunidades étnicas, tantos projetos educacionais ligados a distintos grupos religiosos e seculares, sobretudo tantas práticas corporais em circulação, desvelando um amplo e plural espectro cultural, limitar [...] seria reduzir o alcance acadêmico de nos-sos intelectuais, os interesses dos grupos educacionais, as possibilidades dos professores e as artimanhas dos alunos. (DANTAS JR., 2008, p. 217)

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CONTROLE SANITÁRIO DE EPIDEMIAS APÓS AMEAÇAS

DE SÍNDROME DA ANGÚSTIA RESPIRATÓRIA, GRIPE AVIÁRIA E

GRIPE SUÍNAKarla Patrícia Moreira da Silva1

Heliana Leão Silva

RESUMO

O presente artigo faz uma abordagem acerca do controle sanitário perante as epidemias e pandemias que surgiram nos últimos anos no mundo. Traz também um comentário sobre a SARS, influenza H1N1 e influenza H5N1. É de fundamental importância o controle sanitário das epidemias, pois a saúde de toda a população mundial depende dele. A Organização Mundial de Saúde, associada aos governos nacionais, vem interferindo de forma significativa, por meio de medidas de prevenção e controle das patologias.

Palavras-chave: SARS. Influenza H5N1. Influenza H1N1. Controle.

SANITARY CONTROL OF EPIDEMICS AFTER THREATS OF SEVERE ACUTE

RESPIRATORY SYNDROME, AVIAN AND SWINE INFLUENZA

ABSTRACT

The present article makes an approach concerning the sanitary control before the epidermis and pandemics that appeared in the last years in the world. It also brings a comment on SARS, influenza H1N1 and influenza H5N1. It is of fundamental importance the sanitary control of the epidemics, because the health of the whole world population depends on the actions accomplished by this section.

1 Graduadas em Enfermagem pela Faculdade Guanambi, Bahia, Brasil. Pós-graduadas em Assistência em Urgên-cia e Emergência pela Faculdade Guanambi-FG, Bahia. E-mail: [email protected]

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Karla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva

The World Organization of Health associated to the national governments is interfering in a significant way through prevention measures and control of the pathologies.

Keywords: SARS. Influenza H5N1. Influenza H1N1. Control.

INTRODUÇÃO

SARS

A síndrome respiratória aguda grave (SARS) foi reconhecida pela primeira vez como uma ameaça global em meados de março de 2003. Os primeiros casos conhecidos da SARS ocorreram na província de Guangdong, na China, em novembro de 2002 e a Organização Mundial de Saúde (OMS) informou que a última infecção de humano pela SARS aconteceu em 5 de julho de 2003. O agente etiológico do SARS é o coronavírus (SARS - Cov). Em julho de 2003 a propagação internacional da SARS-Cov resultou em 8.098 casos, em 26 países, com 774 óbitos. A epidemia causou grandes perturbações sociais, econômicas e na indústria de viagens internacionais, além do impacto direto sobre os serviços de saúde (OMS, 2006).

O reservatório natural da SARS-Cov não foi identificado, mas um número de espécies selvagens, o Himalaya mascarado ocelote ( Paguma larvata ), o chinês texugo furão (Melogalemoschata ), e os cães raccoon (Nyctereutes procyonoides) – consumidos como petiscos Sul da China, mostraram evidência laboratorial de infecção relacionada com um coronavírus. Gatos domésticos que vivem no prédio Amoy Gardens, em Hong Kong, também foram infectados com SARS-Cov. Recentemente, furões (Mustela furo) e gatos domésticos (Felis domesticus ) que foram infectados com SARS-Cov experimentalmente transmitiram vírus para animais não infectados que ficaram alojados com eles. Estes achados indicam que o reservatório para esse patógeno pode envolver uma variedade de espécies animais (OMS, 2006).

Este estudo se justifica pela importância de abordar o controle sanitário de epidemia após as ameaças de síndrome da angústia respiratória sistêmica (SARS), gripe aviária (H5N1) e, em especial, gripe suína (H1N1). A razão para a escolha desse tema deveu-se ao número de casos confirmados e óbitos provocados por essa patologia no campo de abrangência da DIRES-30. Esta temática é desafiadora, ao aprofundar, ampliar e estabelecer conhecimento nessa área, dada a complexidade do assunto, do desafio diário do manejo das patologias emergentes que afetam a saúde pública.

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CONTROLE SANITÁRIO DE EPIDEMIAS APÓS AMEAÇAS DE SÍNDROME DA ANGÚSTIA RESPIRATÓRIA, GRIPE AVIÁRIA E GRIPE SUÍNA

Discutir essa temática assumiu grande importância, tendo em vista as políticas de saúde pública que preconizam ações de promoção, proteção e recuperação da saúde da população e a escassez de trabalhos científicos sobre ela.

Desenvolvimento

A verificação epidemiológica da patologia respiratória aguda grave é uma atividade que deve ser iniciada nas unidades hospitalares de referência, instituída pela Secretaria de Estado da Saúde. Essa atividade necessita ser realizada, preferencialmente, pelos Núcleos Hospitalares de Epidemiologia (NHE), ligados à vigilância epidemiológica local (BRASIL, 2009).

Definição de caso suspeito

Indivíduos de qualquer faixa etária portadores de patologia respiratória aguda e que apresentem o seguinte quadro clínico: febre superior a 38ºC, tosse e dificuldade respiratória, acompanhada ou não de dor de garganta ou manifestações gastrointestinais.

Sinais e sintomas que devem ser observados

• Aumento da frequência respiratória (> 25 irpm).• Hipotensão em relação à pressão arterial habitual do paciente.• Em crianças, além dos itens acima, observar também: batimentos de asa de nariz, cianose,

tiragem intercostal, desidratação e inapetência.

• O quadro clínico pode ou não ser acompanhado das alterações laboratoriais e radiológicas listadas abaixo:

• Alterações laboratoriais: leucocitose, leucopenia ou neutrofilia.• Radiografia de tórax: infiltrado intersticial localizado ou difuso ou presença de área de

condensação.• Hipoxemia refratária ao tratamento com oxigênio.

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Karla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva

Medidas de contenção da SARS

Perante um acontecimento de patologia respiratória aguda grave, para identificar novos casos com quadro idêntico, é imprescindível realizar a procura ativa desses indivíduos que mantiveram contato contíguo com infectados durante o período de transmissão da patologia.

No caso de indivíduo com manifestações clínicas combinadas com patologia respiratória aguda grave, segundo a ANVISA (2009):

• Usar equipamentos de proteção individual, conforme orientações do Protocolo 46 do Ministério da Saúde.

• Realizar avaliação clínica minuciosa.• Colher amostra de secreção nasofaríngea e de sangue até o 7º dia do começo dos sintomas.• Indicar afastamento provisório das atividades habituais, como trabalho e escola, entre

outras, considerando o período de transmissibilidade da patologia.• Internar o paciente, dispensando-lhe os cuidados que o caso requer.

Outras ações fundamentais

• Pessoas que tiveram contato com indivíduos infectados devem ser isoladas, para que não se tornem agentes transmissores.

• transmission-based precautions instituted.• Exposed staff should be placed on active fever surveillance, and either cohortPessoas que mantiveram contato direto com o vírus devem ser colocadas em regime de quarentenaManagement of community contacts following a SARS Alert.

• O diagnóstico deve ser rápido, para facilitar a investigação de SARS.Public health actions when a SARS Alert is raise• Patient(s) should be immediately isolated and transmission-based precautions instituted, if

• Verificação de pessoas com febre em transportes (aéreos, terrestres ou marítimos), acompanhada de uma educação continuada sobre os sintomas da SARS.

• The diagnosiContatos entre pessoas sob investigação por SARS devem ser identificados, além de ser realizado monitoramento daily fever monitoring until SARS has been ruled out as the cause of the illness.diário, até que a SARS seja excluída como causa da patologia. • All contacts should ideally be given written information on the clinical picture,

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CONTROLE SANITÁRIO DE EPIDEMIAS APÓS AMEAÇAS DE SÍNDROME DA ANGÚSTIA RESPIRATÓRIA, GRIPE AVIÁRIA E GRIPE SUÍNA

• Toda a população deve receber informações acerca do quadro clínico, forma de transmissão etransmission and other features associated with SARS, as well as written information on outras peculiaridades associadas à SARS.respiratory hygiene and contact precautions.

RELATANDO À ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE

• Autoridades nacionais de saúde pública devem relatar cada resultado de exames laboratoriais, se for confirmado caso de SARS, à OMS.

• No entanto, tendo em conta a atenção mundial para a doença, deve-se informar à OMS os grupamentos de enfermidades respiratórias agudas e/ou de alto risco para os indivíduos sob investigação de SARS. Esta cautela irá facilitar a rápida verificação e divulgação de informações precisas ao governo, à mídia e à população.

Comunidade infectada pela SARS

Devem ser tomadas as seguintes ações:

• Ser informada sobre os sintomas mais consistentes, entre eles, febre, e instruir os infectados sobre medidas de controle.

• Comunicar o aparecimento de febre e/ou outros sintomas imediatamente às autoridades sanitárias.

• Ser investigada em local adequado, para os cuidados de saúde e para possibilitar maior facilidade de controle dos sintomas.

GRIPE AVIÁRIA – H5N1

Por volta de janeiro de 2004, surgiu um subtipo do agente influenza A aviário, o H5N1, encontrado em uma criação de aves domésticas na Ásia. O achado provocou importante perda econômica e repercussões na saúde pública em nível mundial. O agente já havia sido identificado nos anos de 1997 e 2003. Foram detectados casos de infecção humana de elevada letalidade por

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Karla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva

esse vírus, o que levou os representantes da saúde pública a permanecerem em alerta, por causa da probabilidade de uma nova pandemia pela influenza (IBIAPINA et al., 2005).

Todos os genes eram de origem aviária, mas o H5N1, agente da epidemia de 2004, mostrou-se antigenicamente distinto dos isolados em humanos em Hong Kong nos anos de 1997 e 2003, o que indica a evolução para uma cepa pandêmica, por ajustamento em humanos, por meio de mutação genética ou recombinação com o vírus influenza humano (MARTINEZ, 2009). Estudos demonstraram que o vírus da gripe aviária, que foi isolado entre os anos de 1999 e 2002, alcançou a capacidade de se replicar entre mamíferos, possivelmente em decorrência da transmissão entre patos e porcos, o que é confirmado por relatos recentes de infecção entre gatos e tigres tailandeses que morreram após deglutir carne de frango contaminada. Todos os tipos de vírus H5N1 possuem uma série de aminoácidos básicos que constituem uma molécula de glicoproteína, a qual tem a função de ancorar o vírus a qualquer célula que ele tente invadir. A hemaglutinina (H) do vírus influenza une-se a um polipeptídio e, depois, cliva-se nas moléculas HA1 e HA2 do hospedeiro. A fragmentação da HA é fundamental para a infectividade do vírus, porque esse evento é o mediador da fusão entre o envelope viral e a membrana endossomal celular. Entretanto, a relevância desse mecanismo para o H5N1 não está clara (IBIAPINA et al., 2005).

Controle

Ações do governo brasileiro no que se refere à sociedade em geral, segundo o Ministério da Saúde (2006):

• Manter o site gripe.gov.br, com informações dirigidas à população.• Orientar viajantes e turistas sobre como proceder em países onde há circulação do vírus.• Difundir informações sobre as diferenças entre gripe sazonal, gripe aviária e pandemia

de gripe.• Informar a imprensa sobre medidas de prevenção adotadas pela indústria avícola;

comunicar sobre a validade da certificação dos produtos brasileiros por organismos internacionais.

• Orientar e informar os consumidores do mercado externo sobre a certificação da produção avícola brasileira.

• Informar e orientar os consumidores do mercado interno, em supermercados, feiras e eventos agropecuários, sobre a higiene da produção avícola nacional e a certificação dos produtos consumidos.

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Após a observação ou o registro de casos de doença ou de mortalidades repentinas, imediatamente devem ser ativadas as estruturas de alerta, entre elas, as autoridades sanitárias e veterinárias, locais ou regionais, de forma que possam ser aplicados os métodos previstos no Plano de Alerta da Gripe Aviária. Em caso de suspeita da patologia, deve-se coletar a amostra, –enviá-la para o laboratório oficial nacional (LNIV) e notificar oficialmente a suspeita. Os algoritmos de profilaxia médica frequente nos diferentes tipos de exploração avícola necessitam ser rigorosamente cumpridos, em observação exata às normas estabelecidas pelo médico veterinário responsável pela operação (MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, 2006).

GRIPE SUÍNA – H1N1

É uma patologia respiratória aguda, ocasionada pelo vírus A (H1N1). Como a gripe comum, a influenza suína é transmitida através da tosse, do espirro e de secreções respiratórias de indivíduos infectados. Os sintomas são febre acima de 38º e tosse, podem ser acompanhadas de dores articulares, de garganta, de cabeça, prostração e dificuldade respiratória. Embora o nome se refira a suínos, não existem evidências de que esse novo subtipo de vírus acometa porcos. Mas a mutação dos vírus acontece provavelmente nos suínos e acomete os humanos, sendo muito perigosa, pois sua transmissão se processa de forma vertical, de humano para humano, tornado-se, assim, uma ameaça global (BRASIL, 2009).

A OMS, no dia 11 de junho de 2009, elevou o nível de alerta de pandemia de gripe fase 5 para a fase 6. Uma nova pandemia de gripe vem surgindo. O vírus H1N1 está se espalhando sob uma estreita e cuidadosa observação, mas a atual pandemia foi detectada logo no início. O mundo agora pode se beneficiar dos investimentos que foram aplicados ao longo dos anos em preparação para possíveis pandemias (OMS, 2009).

SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA DA INFLUENZA A H1N1 NA 30ª DIRES

Segundo o boletim epidemiológico nº06/2009, foram notificados, até 04.11.09, pela 30ª DIRES 199 casos suspeitos de Influenza A-(H1N1), a população mais acometida foi a do sexo feminino, com 53,76% . A distribuição das notificações foi assinalada da seguinte maneira: 100 notificações foram de Guanambi, 49 de Sebastião Laranjeiras, 21 de Urandi, 12 de Iuiú, 03 de Candiba, 02 de Palmas de Monte Alto.Ao mesmo tempo foram notificados casos de clientes de municípios de outras Regionais de Saúde, que foram acolhidos no Hospital Regional de

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Karla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva

Guanambi: 03 de Caetité, 02 de Caculé, 02 de Jacaraci, 01 de Lagoa Real, 01 de Rio de Contas, 01 de Rio do Antônio, 01 de Tanque Novo e 01 de Licínio de Almeida.Tabela01: Resumo dos dados Influenza H1N1-30ºDIRES/Guanambi-BA Ano 2009

Nº DE NOTIFICAÇÕESNº DE AMOSTRAS

COLHIDASÓBITOS RESULTADO

199 22

12

(03 ÓBITOS EM GESTANTES

01 ÓBITO EM PUÉRPERA

01 ÓBITO

EM MENOR)

11 RESULTADOS

CONFIRMADOS EM

LABORATÓRIO PARA

LINHAGEM SUÍNA

Fonte: Vigilância Epidemiológica / 30ª DIRES/ SINAN / SESAB

Das 199 notificações, foi realizada colheita de excreção ou aspirado de nasofaringe em 22 clientes com 11 confirmados laboratorialmente para Influenza A H1N1 procedência Suína, sendo distribuídos da seguinte forma: (03 de Iuiú, 01 de Guanambi, 03 de Urandi, 01 de Caculé, 02 de Sebastião Laranjeiras e 01 de Jacaraci), 09 confirmados por vínculo epidemiológico (Iuiú); 04 rejeitados (01 de Urandi, 01 Caculé, 01 de Rio de Contas e 01 de Rio do Antônio). 08 dos 12 clientes que foram a óbito, tiveram resultado confirmado para Influenza A H1N1- procedência suína, sendo 01 de Guanambi, 03 de Urandi, 01 de Caculé, 02 de Sebastião Laranjeiras e 01 de Jacaraci, sendo que os outros permanecem em investigação. No total de 12 óbitos, 03 foram em gestantes, 01 em puérpera , 01 em menor de 10 anos e os outros em outra faixa etária (BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO, 2009).

O número maior de notificações foi em faixa etária entre 20 e 39 anos, com registro de 39 notificações em menores de 10 anos e 10 notificações em maiores de 60 anos. Entre os sinais e sintomas mais encontrados verificou-se que 98,4% apresentaram febre; 88,9% tosse; 46,2% mialgia; 42,2% dor de garganta; 39,6% calafrio; 39,1% dispnéia; 36,1% coriza, 29,6% artralgia. 53,2% dos clientes cursaram com outros sintomas como cefaleia; diarreia e conjuntivite (BOLETIM EPIDEMIOLÒGICO, 2009).

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Recomendações para a vigilância da influenza A (H1N1) em gestantes e escolas

• Gestante saudável deve evitar contato com indivíduo que apresente síndrome gripal.• Grávida que apresente síndrome gripal deve buscar imediatamente um serviço de saúde,

de preferência o que realiza seu acompanhamento pré-natal.• Os estabelecimentos de ensino (escolas, centros de educação infantil, creches, dentre

outros) devem monitorar as taxas de absenteísmo dos discentes e docentes em decorrência de síndrome gripal (SÃO PAULO, 2009).

Controle

Após o desembarque nos aeroportos brasileiros, os viajantes recebem informações sobre sinais e sintomas, medidas de proteção, de higiene, e orientações para procurar o posto da Anvisa. Essas medidas são consideradas uma forma de educ ação em saúde. No voo, as pessoas que apresentam febre alta repentina (mais elevada que 38º) e tosse, seguidas ou não de dores de cabeça, musculares, nas articulações e dificuldade respiratória, devem comunicar o evento imediatamente (VRANJAC, 2009).

Sugestões aos viajantes que se dirigem a áreas de risco

• Seguir as orientações recebidas das autoridades sanitárias locais.• Cobrir o nariz e a boca com um lenço, de preferência descartável, ao tossir ou espirrar.• Evitar o contato com indivíduos doentes.• Não compartilhar alimentos nem objetos de uso individual.• Lavar as mãos frequentemente com água e sabão, em especial depois de tossir ou espirrar. • Procurar assistência médica em caso de adoecimento e informar sobre contato com

indivíduos doentes e viagens recentes feitas a locais de riscos (ANVISA, 2009).

CONCLUSÃO

As epidemias causadas pelo agente da influenza A aviário, pelo subtipo H5N1 e em especial o H1N1, demonstram a habilidade que esse agente tem de ocasionar patologia grave e letal em humanos, sem nenhuma recombinação entre o vírus humano e o aviário e o hospedeiro mamífero mediador, como no caso do porco. Esse achado nos proporciona o sobreaviso de que

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Karla Patrícia Moreira da Silva e Heliana Leão Silva

qualquer subtipo de influenza A tem a capacidade de cruzar a barreira, adentrar em espécies e ser uma cepa pandêmica dissimulada. O homem pode ser o próprio hospedeiro mediador, no qual tanto os vírus aviários quanto o suíno se recombinam com vírus humanos, resultando, assim, em um vírus com nova glicoproteína de superfície, com probabilidade de difusão rápida entre indivíduos suscetíveis.

Nesse contexto, o empenho para conter os surtos em aves e porcos domésticos e a aproximação entre seres humanos e tais animais necessita ser prioritário no manejo das patologias em plano de saúde pública. As medidas a serem adotadas e a informação acerca das patologias devem ser propagadas.

REFERÊNCIAS

BAHIA, 30ª Diretoria Regional de Saúde de Guanambi/BA. Boletim Epidemiológico. Ano 1, nº 6, 03 de novembro de 2009.

BRASIL, Ministério da Saúde. Protocolo para enfrentamento da influenza a (H1N1) em

portos, aeroportos e fronteiras. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/influenza_a_protocolo_portos_aeroportos_10_06_2009.pdf>. Acesso em: 10 de junho de 2009.

BRASIL, Ministério da Agricultura. Comissão de acompanhamento da gripe aviária. Disponível em:< http://portal.minagricultura.pt/portal/page/portal/MADRP/PT/gripe_das_aves/recom_tecn_plan_vigilanc/recomend_tecnic/MEDIDAS_BIOSEGURANCA.pdf?_template>. Acesso em: 10 de junho de 2009.

BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Plano de Contingência

Brasileiro para uma Pandemia de Influenza. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/plano_flu1.pdf>. Acessado em: 10 de junho de 2009.

BRASIL, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Protocolo de Uso de EPI. Orientações sobre a necessidade do uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) para os serviços de portos, aeroportos, fronteiras e recintos alfandegados. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/hotsite/i>. Acesso em: 10 de junho de 2009.

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CONTROLE SANITÁRIO DE EPIDEMIAS APÓS AMEAÇAS DE SÍNDROME DA ANGÚSTIA RESPIRATÓRIA, GRIPE AVIÁRIA E GRIPE SUÍNA

IBIAPINA, C. da C.; COSTA, G. A.; FARIA, A. C. Influenza A aviária (H5N1): A gripe do frango. In: J. Bras. Pneumol., v. 31, n. 5, set./out. 2005.Sites consultados: MARTINEZ,J. A. B. Influenza e publicações científicas. In: J. Bras. pneumol., v. 35, n. 5, maio 2009.

OMS – ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Disponível em: <http://www.who.int/mediacentre/news/statements/2009/h1n1_pandemic_phase6_20090611/en/index.html>. Acesso em: 10 de junho de 2009.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Disponível em: <http://www.who.int/csr/resources/publications/WHO_CDS_CSR_ARO_2004_1.pdf>. Acesso em: 9 de junho de 2009.

SÃO PAULO. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica. Diário Oficial nº 199 – DOE de 23/10/09 – Seção 1 – p. 18. Resolução SS – 164, de 22-10-2009. Disponível em: <http://ftp.cve.saude.sp.gov.br/doc_tec/resp/gravida_res164_221009.pdf>. Acesso em: 9 de junho de 2009.

VRANJAC, A. Características dos casos notificados de Influenza A/ H1N1. In: Rev. Saúde Pública 43(5):900-4, 2009.

WHO guidelines for the global surveillance of severe acute respiratory syndrome (SARS). Updated recommendations, October 2004. Disponível em: < http://www.who.int/csr/resources/publications/WHO_CDS_CSR_ARO_2004_1/en/index.html>. Acesso em: 9 de junho de 2009.

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PARASITOS INTESTINAIS E ASPECTOS SOCIOSSANITÁRIOS

EM COMUNIDADES DO SEMIÁRIDO BAIANO

Gustavo Cabral-Miranda1

Artur Dias Lima2

Aline da Silva Tavares Katiane Silva Oliveira

RESUMO

Este estudo avalia a prevalência de parasitos intestinais entre grupos de crianças e adolescentes de comunidades de remanescentes quilombolas, indiodescendentes, creches e escolas da Mesorregião Centro-Norte baiana. Esta prevalência foi relacionada aos aspectos socioeconômicos desses grupos. Foram analisadas 814 amostras fecais, obtidas entre 2006 e 2008. O número total de resultados positivos foi de 71,2% (580), com uma frequência mais alta de Giardia lamblia e outros protozoários, em todos os grupos. Esta prevalência é semelhante a outras observadas em diferentes regiões brasileiras, o que demonstra a necessidade de monitorar a vigilância das condições de saúde, educação e as intervenções ambientais, incluindo o saneamento básico.

Palavras-chave: Enteroparasitas. Educação sanitária. Saneamento ambiental. Semiárido.

1Laboratório de Alergia e Acarologia, Instituto de Ciências da Saúde, UFBA; Avenida Reitor Miguel Calmon, S\N, Vale do Canela, Salvador, BA; [email protected];

2Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/EBMSP Rua Silveira Martins, 3386, Cabula. Salvador, BA. CEP: 41.195.001. [email protected] , E-mail para contato: [email protected]

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Gustavo Cabral-Miranda, Artur Dias Lima, Aline da Silva Tavares e Katiane Silva Oliveira

INTESTINAL PARASITES AND SOCIAL AND SANITARY ASPECTS IN

COMMUNITIES OF THE BAHIA SEMI-ARID

ABSTRACT

The aim of the present study is to assess the frequence of intestinal parasites among the groups of children remaining maroons community, descendant indian and day cares, of the Mesorregion Central North of Bahia. This prevalence was related to socioeconomic aspects. Were analyzed 814 stool coproparasitological obtained between 2006 and 2008. The overall frequence was 71,2% (580), with a higher frequency of Giardia lamblia and other protozoarians in all group. This prevalence is similar to that observed in other Brazilian regions, showing the necessity for the monitoring and surveillance of health conditions, educations, environmental intervention including sanitary profiles.

Keywords: Enteroparasites. Sanitary education. Ambiental sanitation. Semi-arid region

INTRODUÇÃO

Estudos populacionais em diferentes regiões do Brasil mostram frequências diversas na ocorrência das parasitoses intestinais (BENCKE et al., 2006). Estimativas recentes indicaram que mais de um terço da população mundial está infectada com um ou mais enteroparasitas, e as crianças são o grupo de maior risco (FERREIRA et al., 2000). Em relação ao Sertão nordestino, Santos-Júnior et al. (2006) demonstraram alta prevalência parasitária associada aos diversos problemas socioeconômicos predominantes na região.

Os enteroparasitas apresentam extensa distribuição geográfica. Ocorrem com maior intensidade nos países em desenvolvimento e sua ampla distribuição é provocada principalmente pelas precárias condições sanitárias e de moradia e pela falta de educação profilática (MASCARINE; DONALÍSIO, 2006). Neves (1997) acrescenta que a geografia parasitária tem fatores intervenientes muito amplos, como a presença de hospedeiros suscetíveis apropriados, condições ambientais favoráveis e potencial biótico elevado. Além disso, maior densidade populacional, hábitos religiosos, deficiências de princípios higiênicos, baixas condições de vida e déficit educacional favorecem a disseminação e podem elevar a incidência das parasitoses em determinadas regiões. Não obstante, a população do Sertão nordestino é conhecida principalmente pela atenção dada à escassez de água. Outras questões que afetam diretamente essa população abordam as condições sociais, em que a falta de investimentos em infraestrutura, a carência de políticas básicas de saúde, de educação e de assistência social, além de fatores

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PARASITOS INTESTINAIS E ASPECTOS SOCIOSSANITÁRIOS EM COMUNIDADES DO SEMIÁRIDO BAIANO

ecológicos e geográficos extremamente danificados por ações antrópicas predatórias, agravam ainda mais as condições de vida dessa população.

Neste trabalho, objetivou-se investigar a prevalência de enteroparasitas e os fatores que favorecem a infecção por eles provocada, em crianças e adolescentes de comunidades quilombolas, indiodescendentes e creches pertencentes aos municípios de Senhor do Bonfim e Jaguarari. Estes municípios localizam-se na Mesorregião Centro-Norte, Semiárido baiano.

METODOLOGIA

Área de estudo e público-alvo:

A presença de enteroparasitas foi investigada em crianças e adolescentes na faixa etária de 2 a 14 anos, de três grupos distintos: um grupo composto de crianças e adolescentes de uma comunidade remanescente de quilombolas (Tijuaçu), um grupo de indiodescendentes (Missão do Sahy) e outro grupo de creches e escolas (em Senhor do Bomfim e Jaguarari).

O distrito de Tijuaçu é constituído por inúmeros povoados, localizados a cerca de 40 quilômetros do centro de Senhor do Bonfim, os quais, juntos, abrigam cerca de 780 famílias. A comunidade desse distrito é formada por remanescentes de escravos oriundos das minas de ouro de Jacobina há mais de 100 anos. O distrito de Missão do Sahy, também localizado no município de Senhor do Bonfim, tem na sua origem antigas aldeias indígenas; sua cultura foi modificada pelos processos de expansão territorial, criação e condução de gado, busca e mineração de ouro e pedras preciosas. Por fim, o grupo de crianças e adolescentes de creches e escolas das comunidades de Lage/Mamoeiro, Cazumba e bairro de Pebinhas, pertencentes à zona rural do município de Senhor do Bonfim, as quais apresentam diversos problemas socioeconômicos e ambientais. No que se refere às comunidades de Jacunã e Gameleira, estão localizadas no município de Jaguarari, Microrregião de Senhor do Bonfim, as quais têm diversos problemas que são comuns às outras áreas estudadas.

Exames laboratoriais e aplicação de questionários

Para investigar a frequência de enteroparasitas, foram obtidas e analisadas amostras fecais do público-alvo dos grupos estudados, entre 2006 e 2008. Para o diagnóstico dos enteroparasitas e comensais, utilizou-se o método parasitológico de fezes de Hoffmann et al. (1934). As amostras foram analisadas em lâminas em triplicata, e para cada indivíduo foi examinada uma única

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Gustavo Cabral-Miranda, Artur Dias Lima, Aline da Silva Tavares e Katiane Silva Oliveira

amostra de fezes. Já os questionários, para levantar as variáveis socioeconômicas e sanitárias, continham perguntas tais como renda familiar, consumo de água tratada, presença de sanitários domiciliares, destino do esgoto domiciliar, e foram aplicados junto aos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes. Estas pessoas assinaram o Termo de Livre e Esclarecido, autorizando a aplicação do questionário, que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNEB (nº. 0603060016956), sob a Coordenação do Prof. Dr. Artur Dias Lima.

RESULTADOS

Dentre as 814 amostras fecais analisadas, obtiveram-se 580 (71,2%) positivas para pelo menos um tipo de protozoário e/ou helminto enteroparasita ou comensal. Isto equivale à presença de enteroparasitas em sete de cada grupo de dez crianças e/ou adolescentes. Os resultados obtidos sobre a presença de enteroparasitas nos grupos estudados são apresentados na Tabela 1 a seguir.

Tabela 1. Espécies e frequências de enteroparasitas em crianças e adolescentes de Tijuaçu, Missão do Sahy, creches e escolas dos municípios de Senhor do Bonfim e Jaguarari, Semiárido baiano.

Número total = 814

Tijuaçu; (quilombola)

N = 348Frequência

Missão do Sahy (indiodescendente)

N = 157Frequência

Creches e escolas N = 299

Frequência

N % N % N %Giardia lamblia 105 30,2 27 17,2 88 39,0

Entamoeba coli 195 56,0 46 29,3 138 61,0

Endolimax nana 122 35,1 14 8,9 84 37,2Ascaris lumbricoides 2 0,6 4 2,5 33 14,6

Ancilostomídeos 40 11,5 3 1,9 39 17,2

Trichuris trichiura 4 1,1 2 1,3 2 0,9

E n t e r o b i u s vermicularis

16 4,6 5 3,2 16 7,0

Hymenolepis nana 32 9,2 2 1,3 34 15,0

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PARASITOS INTESTINAIS E ASPECTOS SOCIOSSANITÁRIOS EM COMUNIDADES DO SEMIÁRIDO BAIANO

Observa-se que as frequências de positividade para enteroparasitas são semelhantes no grupo de Tijuaçu e nas creches, e menores em Missão do Sahy. Observa-se elevada frequência para protozoários não patogênicos, como a Entamoeba coli e a Endolimax nana. Dentre os enteroprotozoários patogênicos, a maior frequência foi da Giardia lamblia, variando entre 17,2% e 39%, conforme apresentado na Tabela 1. Quanto aos helmintos, a maior frequência foi dos ancilostomídeos, em dois dos três grupos de estudos.

Já quanto aos resultados referentes às condições socioeconômicas e ambientais da região, apresentados na Tabela 2 a seguir, nota-se um grave problema relacionado a esses fatores, com destaque para a renda familiar dos responsáveis pelas crianças participantes da pesquisa: nas três comunidades, mais da metade das famílias sobrevive com uma renda per capita inferior a um salário mínimo e mais de 90% delas não contam com rede de esgoto domiciliar.

Tabela 2. Variáveis socioeconômicas e sanitárias de crianças e adolescentes de Tijuaçu, Missão do Sahy, creches e escolas dos municípios de Senhor do Bonfim e Jaguarari, Semiárido baiano.

Número total = 814

Tijuaçu (quilombola)

N = 348Frequência

Missão do Sahy (indiodescendente)

N = 157Frequência

Creches e escolas N = 299

FrequênciaN % N % N %

Renda familiar< 1 salário≥ salário

238110

68,431,6

8572

54,155,9

21584

71,928,1

Água tratada no domicílio

NãoSim

227121

65,434,8

12532

79,621,4

24158

80,619,4

Sanitários no domicílio

NãoSim

187161

53,746,3

57100

36,363,7

185114

61,832,8

Esgoto domiciliarNãoSim

32820

94,35,7

1570

1000,0

27227

90,99,1

Em alguns grupos, como os de Missão do Sahy e de creches e escolas, a ausência de água tratada nos domicílios atinge 80% dos indivíduos. Não muito distante dessa realidade

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Gustavo Cabral-Miranda, Artur Dias Lima, Aline da Silva Tavares e Katiane Silva Oliveira

está Tijuaçu, com 65% dos casos. A ausência de sanitários também é um problema grave, principalmente nos grupos de Tijuaçu e de creches e escolas, atingindo mais de 50% dos domicílios.

DISCUSSÃO

Para entender melhor os fatores de riscos das infecções parasitárias nessas comunidades, optamos por incluir nos resultados os enterocomensais Entamoeba coli e Endolimax nana juntos aos enteroprotozoários patogênicos, visto que eles têm os mesmos mecanismos de transmissão fecal-oral, podendo servir como bom indicador da qualidade da água consumida e das relações sociossanitárias (ROCHA et al., 2000).

A presença da Giardia lamblia foi relativamente alta em todas as comunidades investigadas. Este protozoário provoca danos nas vilosidades intestinais e impede a absorção de nutrientes em nível duodenal, desencadeando quadros de desnutrição e hipovitaminose. Além disso, provoca diarreias frequentes e contínuas, levando à desidratação corporal. Os resultados obtidos com este estudo mostram semelhança com outro trabalho realizado na região do Semiárido baiano, o de Santos-Júnior et al. (2006), que encontrou 48,3% das crianças positivas para esse protozoário. Segundo esses autores, este fato se deve à falta de hábitos higiênicos, à inexistência do hábito de realizar qualquer tipo de tratamento da água antes do seu consumo e aos baixos níveis de escolaridade.

A frequência dos helmintos ancilostomídeos Ascaris lumbricoides, Trichuris trichiura e Enterobius vermicularis mostrou considerável variação. Porém, nota-se que em todas as comunidades encontramos alguém infectado com tais helmintos, tornando o ambiente suscetível à sua disseminação. Uma possível explicação para tal fato diz respeito à automedicação por anti-helmínticos, conforme relatos das famílias entrevistadas. Em contrapartida, como a G. lamblia, uma protozoose, é considerada erroneamente uma verminose, não sofre os efeitos dos anti-helmínticos habitualmente utilizados, permanecendo, assim, prevalente nas referidas comunidades. Rey (2001) chama a atenção para a problemática secular da ancilostomíase no Brasil, salientando que, nas últimas décadas, essa doença perdeu muito de seu caráter dramático, o que tem levado os governos e os serviços médicos a subestimarem sua importância em saúde pública. Ainda segundo esse autor, por seu caráter de padecimento crônico, contribui para a má qualidade de vida de um número considerável de pessoas. Os ancilostomídeos desencadeiam quadros de anemia e hemorragias intestinais, deixando o indivíduo altamente debilitado, podendo inclusive levar ao óbito.

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PARASITOS INTESTINAIS E ASPECTOS SOCIOSSANITÁRIOS EM COMUNIDADES DO SEMIÁRIDO BAIANO

Em relação às questões socioeconômicas e ambientais, nota-se total relação entre elas em todas as comunidades, o que favorece a infecção e disseminação das enteroparasitoses. Como exemplo, a falta de educação profilática das pessoas residentes nessas comunidades, a má estrutura domiciliar e peridomiciliar, as condições inadequadas de saneamento básico e a falta de investimento em engenharia e educação sanitária tornam o meio ambiente totalmente favorável à proliferação das doenças parasitárias.

É de fundamental importância que políticas públicas de saneamento ambiental, educação e saúde sejam implementadas em tais comunidades. A inclusão social é um dos grandes desafios do nosso país, o qual, por razões históricas, acumulou enorme conjunto de desigualdades quanto à distribuição das riquezas, do acesso aos bens materiais e culturais e da apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos (MOREIRA, 2006). Estabelecer condições e ações educativas para que todos os membros dessas e outras comunidades possam viver com adequada qualidade de vida e como cidadãos plenos, dotados de conhecimentos, meios e mecanismos de participação política que os capacitem a agir de forma fundamentada e consciente, é papel de todos, e principalmente nosso, das universidades.

REFERÊNCIAS

BENCKE, A.; ARTUSO, G. L.; REIS, R. S.; BARBIERI, N. L.; ROTT, M. B. Enteroparasitoses em escolares residentes na periferia de Porto Alegre, RS, Brasil. In: Revista de Patologia

Tropical, v. 35(1):31-6, 2006.

FERREIRA, M. U.; FERREIRA, C. S.; MONTEIRO, C. A. Tendência secular das parasitoses intestinais na infância na cidade de São Paulo (1984-1996). In: Revista de Saúde Pública, São Paulo, 34(6), 2000.

HOFFMANN W. A.; PONS J. A.; JANER J. L. The sedimentation concentration method in schistosomiasis mansoni. In: Puerto Rico Journal Health 2: 283-98, 1934.

MASCARINE, L. M.; DONALÍCIO, M. R. Epidemiological aspects of enteroparasitosis at daycarecenters in the city of Botucatu, State of São Paulo, Brazil. In: Revista Brasileira de

Epidemiologia 9(3): 297-308, 2006.MOREIRA, I. C. A inclusão social e a popularização da ciência e tecnologia no Brasil. In: Inclusão Social, v. 1, n. 2, 2006.

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Guanambi, v. 1, n. 1, p. 111-118, jan./jun. 2010118 |

Gustavo Cabral-Miranda, Artur Dias Lima, Aline da Silva Tavares e Katiane Silva Oliveira

NEVES, D. P.; MELO, A. L.; GENÁRIO, O.; LINARDI, P. M. Parasitologia humana. 9. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 1997.

REY L. Um século de experiência no controle da ancilostomíase. In: Revista da Sociedade

Brasileira de Medicina Tropical 34: 61-7, 2001.

ROCHA R. S.; SILVA, J. G.; PEIXOTO, S. V.; CALDEIRA, R. L.; FIRMO, J. O. A.; CARVALHO O. S.; KATZ, N. Avaliação da esquistossomose e de outras parasitoses intestinais em escolares do município de Bambuí, Minas Gerais, Brasil. In: Revista da Sociedade Brasileira de

Medicina Tropical 33: 431-6, 2000.

SANTOS-JÚNIOR, G. O.; SILVA, M. M.; SANTOS, F. L. N. Prevalência de enteroparasitoses em crianças do Sertão baiano pelo método de sedimentação espontânea. In: Revista de Patologia

Tropical, v. 35(3); 233-40, 2006.

Agradecimentos

Agradecemos ao Prof. José Bites de Carvalho, que, quando Diretor do Campus VII – UNEB, Senhor do Bonfim, colaborou administrativamente nas atividades executadas no Laboratório de Parasitologia. À FAPESB pelo auxílio estudantil, por meio de bolsas de iniciação científica. A Angeli Santos Matos, Secretária de Saúde da Prefeitura de Senhor do Bonfim, pelo auxilio no material laboratorial.

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CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS POR PRIMIGESTAS NO PRÉ-NATAL DE

UMA MATERNIDADE PÚBLICA EM SALVADOR

ACQUIRED KNOWLEDGE FOR PREGNANT IN THE PRENATAL OF A PUBLIC

MATERNITY IN SALVADOR

Michele Araújo Moreira 1

Itana Isis da Mota

RESUMO

Trata-se de um estudo qualitativo e descritivo, no qual os objetivos foram identificar e descrever os conhecimentos adquiridos por primigestas no serviço de pré-natal de uma maternidade pública de Salvador-BA. A amostra contou com 10(dez) primigestas selecionadas a partir de critérios de inclusão e que foram submetidas a uma entrevista semiestruturada, em julho de 2009. Os depoimentos foram gravados, transcritos e decodificados pela análise de conteúdo de Bardin. Os resultados revelaram o bebê como foco principal da assistência, que as depoentes não possuíam informações quanto às mudanças fisiológicas e psicológicas da gestação, desconheciam em parte as orientações pertinentes ao aleitamento materno exclusivo, repouso sexual e demonstravam insegurança quanto ao trabalho de parto. Entretanto, compreendiam a importância da alimentação e das práticas educativas para uma gestação saudável. Assim, destacamos a necessidade de uma assistência acolhedora, humanizada e educativa.

Palavras-chave: Pré-natal. Gestante. Conhecimento. Gestação. Assistência de Enfermagem.

ABSTRACT

It is a qualitative and descriptive study, in which the objectives were to identify and to describe the acquired knowledge for pregnant in the service of prenatal of a public maternity of Salvador-

1 Enfermeira, Sanitarista, Mestra em Enfermagem pela Universidade Federal da Bahia. Doutoranda em Enfer-magem pela UFBA. Professora Assistente em Saúde da Mulher na Universidade Estadual de Santa Cruz. E-mail: [email protected]

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Guanambi, v. 1, n. 1, p. 119-132, jan./jun. 2010120 |

Michele Araújo Moreira e Itana Isis da Mota

BA. The sample counted with 10(ten) pregnant selected starting from inclusion criteria and were submitted the semi-structured interview, in July of 2009. The depositions were recorded, transcribed and decoded by analysis of content of Bardin. The results revealed the baby as main focus of the attendance, that the witness didn’t possess information as the psysiologic and psychological changes of the gestation ignored the pertinent orientations partly to the exclusive maternal breastfeeding, sexual resting and they demonstrated insecurity as for the labor. However, they understood the importance of the feeding and of the educational practices for a healthy gestation.This way, we detached the need of a warming, humanized and educational attendance.

Keywords: Prenatal care. Pregnant Women. Knowledge. Pregnancy. Nursing Care.

INTRODUÇÃO

A gestação é um acontecimento singular da existência humana, sendo vivida em sua plenitude pela mulher que a deseja. Dessa maneira, o corpo grávido atua como um ambiente físico e subjetivo para que outro corpo se desenvolva e cresça. Essa experiência única, individual e subjetiva proporciona às mulheres que a vivenciam, sensações, percepções, prazeres, desconfortos, medos e ansiedades de forma integral e intransferível (RAVELLI; MOTA, 2004).

O período gestacional pode ser visto como uma fase transitória na vida da mulher, do parceiro e dos demais familiares, fazendo parte de um processo natural de desenvolvimento em que há uma necessidade de reestruturação e/ou ajustamento, com uma progressiva mudança de papéis, funções e interação no contexto relacional e/ou familiar (MEDINA, 2007).

Sendo assim, buscando uma assistência humanizada para o binômio mãe-filha(o)-pai-família, os cuidados e orientações sobre a gestação são constantemente trabalhados e aprofundados no serviço de pré-natal. Segundo Carvalho (2007, p.13), “a assistência pré-natal é a supervisão médica e de enfermagem que se dá à gestante, desde a concepção até o início do trabalho de parto”. Com isso, o pré-natal representa um momento particularmente especial na vida da mulher, pois, além das modificações fisiológicas pelas quais ela passa, existem alterações psicoafetivas que propiciam um estado de sensibilidade e vulnerabilidade, estabelecido muitas vezes na relação íntima com o bebê, parceiro e família. Desta forma, o acompanhamento e as orientações sobre a gestação têm por função precípua prevenir os agravos e intercorrências durante o ciclo gravídico-puerperal e promover uma assistência qualificada (MEDINA, 2007).

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CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS POR PRIMIGESTAS NO PRÉ-NATAL DE UMA MATERNIDADE PÚBLICA EM SALVADOR

Dentro desta perspectiva, o profissional de saúde que assiste às gestantes, em especial, a(o) enfermeira(o), deve possuir um conhecimento sobre a fisiologia da gravidez, as principais intercorrências clínicas, as alterações psicológicas que podem surgir neste período, seus medos, suas dúvidas quanto ao desenvolvimento da(o) filha(o), os ajustamentos na relação familiar e conjugal, as mudanças relativas à sexualidade, dentre tantas outras. A(o) enfermeira(o) deve buscar conhecer a gestante em todo o seu contexto sócioeconômico e cultural para atender às suas reais necessidades (SILVA; CHRISTOFFEL; SOUZA, 2005; DUARTE; ANDRADE, 2006).

Sendo assim, no primeiro contato da gestante e do seu parceiro com a assistência pré-natal, o profissional de saúde deve buscar estabelecer um vínculo de confiança e segurança, informando sobre condutas e procedimentos a serem realizados, escutando e valorizando o que é dito pela gestante e seu parceiro, garantindo a privacidade e a confidencialidade das informações. Desse modo, a assistência pré-natal torna-se um momento privilegiado para discutir e esclarecer questões, de forma individualizada, independentemente da quantidade de filhas(os) e das experiências pregressas, pois a cada gestação o universo imaginário feminino se reinventa (BRASIL, 2005; DUARTE; ANDRADE, 2008).

METODOLOGIA

O estudo, de caráter qualitativo e descritivo, foi realizado na Maternidade Climério de Oliveira, localizada no bairro de Nazaré, em Salvador – Ba. Esta instituição dispõe de 111 leitos, distribuídos entre cirúrgicos, obstétricos e pediátricos, em níveis de atenção ambulatorial, hospitalar, urgência e emergência, que desenvolvem atividades de atenção básica e de média complexidade.

A escolha por esta Instituição se deu em virtude de ser uma unidade de pesquisa, ensino e assistência especializada no serviço de pré-natal, possibilitando uma melhor acessibilidade para realização de pesquisas em saúde.

Sendo assim, somente após a liberação final do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), iniciamos a etapa de identificação e seleção das gestantes na maternidade em questão, baseada nos critérios de inclusão, descritos abaixo: Entender e aceitar participar voluntariamente da pesquisa, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); Estar gestando pela primeira vez (primigesta); Estar no último trimestre gestacional; Estar com acompanhamento de pré-natal realizado pelo referido serviço, independente do número de consultas; Estar

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cadastrada no acompanhamento de pré-natal através do SISPRENATAL; Residir na cidade de Salvador ou no entorno.

Salientamos que, após o atendimento dos critérios de inclusão e da nossa identificação a essas mulheres, foi realizada a entrevista semiestruturada no próprio serviço com cada primigesta, mediante a assinatura do TCLE. Todas as entrevistas foram gravadas em fitas de áudio e transcritas posteriormente, preservando a fala originária de cada mulher, identificada por um codinome escolhido por ela mesma, caracterizado pelo nome de uma flor. A coleta dos dados foi realizada no mês de julho de 2009, iniciada somente após a aprovação plena do CEP sob o parecer nº 159/2009. Os depoimentos foram analisados sob a perspectiva de Laurence Bardin, constituindo a análise de conteúdo.

RESULTADOS

Posteriormente à etapa das entrevistas, realizamos a leitura exaustiva dos depoimentos transcritos, para assim procedermos à etapa de identificação dos dados e de busca dos significados em consonância com o objeto de estudo. Diante das categorias definidas e dos depoimentos devidamente agrupados por motivos de consonância ou dissonância, passamos a interpretar os resultados, utilizando um referencial teórico pertinente ao assunto. Desta forma, apresentá-los-emos em categorias abaixo:

O SIGNIFICADO DA ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL

A atenção pré-natal deve acolher a mulher desde o início da gravidez, assegurando, ao final da gestação, o nascimento de uma criança saudável e a garantia do bem-estar materno e neonatal. A promoção à saúde no pré-natal ocorre quando possibilitamos à mulher conhecimento sobre seu corpo e compreensão diante das alterações que possam ocorrer, atuando de forma mais consciente e positiva no seu gestar (BRASIL, 2005; BRASIL, 2002).

Dessa maneira, as gestantes que procuram o serviço pré-natal nem sempre o fazem com o firme propósito de assistir a sua gravidez, pois a maioria tem pouco conhecimento sobre a importância desse acompanhamento (BARROS, 2006). Ademais, algumas gestantes atrelam o pré-natal apenas a uma assistência adequada para o desenvolvimento do bebê e acabam por não vislumbrar esta prática como algo que ultrapassa a dimensão biologicista da reprodução e que deveria se coadunar com os desejos, aspirações e o cuidado de si mesmas. Esta ideia é percebida

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CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS POR PRIMIGESTAS NO PRÉ-NATAL DE UMA MATERNIDADE PÚBLICA EM SALVADOR

quando verificamos que as mulheres destacam a importância do pré-natal, relacionando-o, na maioria das vezes, ao desenvolvimento adequado da(o) filha(o) em detrimento da percepção de si mesmas, fato verificado nos depoimentos abaixo:

“[...] esclarecer as coisas sobre o meu filho, o que é que eu devo fazer, como ele tá, saber se ele tem alguma doença, alguma coisa assim, se tá com alguma anormalidade [...]” (ÍRIS)

“[...] Acompanhamento à criança, né, ver o nosso bem-estar, ver o crescimen-to, a saúde se tá bem, se não tá. Também tira algumas dúvidas, que a gente inicialmente tem, né [...]” (ANGÉLICA)

Estas falas ilustraram o foco ao bebê como sendo o principal propósito da assistência, minimizando outros aspectos dessa vivência caracterizada por transformações físicas e/ou psicológicas, descobertas e dúvidas, na qual a mulher deveria ser o sujeito da atenção.

AS ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS E/OU PSICOLÓGICAS DA GESTAÇÃO:

ORIENTAÇÕES DO SERVIÇO DE SAÚDE X SENSO COMUM.

A gestação é marcada por transformações físicas e psíquicas, sendo reconhecidos e compreendidos os aspectos emocionais em cada mulher que a vivencia. O profissional que atua no serviço de pré-natal deve acrescentar à sua avaliação clínica uma percepção da história de vida e dos sentimentos dessas mulheres, bem como possuir um conhecimento em fisiologia materna, visando orientar e esclarecer à gestante, de modo a contribuir no entendimento sobre as mudanças que irão ocorrer nesse período, diminuindo os medos, ansiedades e preocupações (BRASIL, 2005).

As orientações devem ser disponibilizadas nos serviços de saúde, abordadas em forma de diálogo durante as consultas, por todos os profissionais de saúde, em especial, as(os) enfermeiras(os), no intuito de contribuir para o entendimento da gestante, diminuindo o impacto de crendices e mitos no contexto gestacional, os quais, na maioria das vezes, trazem complicações futuras para o binômio. As falas a seguir comprovam a superficialidade das informações durante o acompanhamento da gestação e sinalizadas pelas depoentes sobre as alterações fisiológicas e psicológicas desse período:

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“[...] minha médica me orientou bastante. Ela falou que meu corpo ia mudar, que talvez acontecesse de eu enjoar dele, ou então dele enjoar de mim [...]” (ANGÉLICA)

“[...] Que o meu corpo ia mudar... o psicológico também [...]” (JASMIM)

“[...] Sente enjôo, náuseas, né, essas coisas [...]” (AZALÉIA)

A IMPORTÂNCIA DA ALIMENTAÇÃO NO PERÍODO GESTACIONAL

Durante a gestação, o aporte energético e nutritivo da mãe vai favorecer o desenvolvimento saudável do feto. O consumo de alimentos deve ser controlado, de modo a atender as necessidades, com moderação na ingestão de sal, açúcar, gordura e alimentos prejudiciais, que poderão ocasionar intercorrências clínicas na gestação, provocando o surgimento de patologias e colocando em risco a vida da mãe e do bebê (BAIÃO; DESLANDES, 2006).

Desta maneira, o profissional de saúde deve atentar para os benefícios da alimentação saudável, esclarecendo a gestante sobre a necessidade de incorporar hábitos mais rigorosos e muitas vezes diferentes dos que existiam antes da gravidez, como a ingesta de líquidos, sucos, frutas, verduras, legumes, nutrientes, fundamentais para o binômio mãe e filha(o). Sendo assim, as falas abaixo demonstram o entendimento e a importância que as gestantes atribuem à alimentação:

“[...] Comer bastante frutas, (pausa), não abusar do sal, nem do açúcar, não comer alimentos gordurosos [...]” (JASMIM)

“[...] Não é pra comer... tudo! Pode comer tudo, pode comer um pouco. Tudo, mas um pouquinho... Porque... como tem aquele ditado, “o bebê só engorda depois da barriga”, não pode engordar dentro da barriga (risos) [...]” (ROSA)

“[...] Tem que ser uma alimentação saudável, né? Comer bastante verdura, alimentos que não venham prejudicar o bebê [...]” (ORQUÍDEA)

Com isso, verificamos a importância atribuída pelas gestantes à alimentação, principalmente quando esta se relaciona aos benefícios para o bebê. Os conhecimentos oriundos do serviço de saúde possuem o intuito de manter o peso saudável, que favorecerá a diminuição no surgimento de patologias prejudiciais à mãe e ao bebê, que possam ocorrer em virtude de um déficit alimentar ou de sobrepeso. Algumas substâncias necessárias para o bom desenvolvimento

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CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS POR PRIMIGESTAS NO PRÉ-NATAL DE UMA MATERNIDADE PÚBLICA EM SALVADOR

gestacional dificilmente são ingeridas em quantidades adequadas na alimentação, existindo, assim, a suplementação de sulfato ferroso para todas as gestantes a partir da décima segunda semana de gravidez, o que não foi sinalizado por nenhuma delas como medida complementar. Outra suplementação importante é o ácido fólico, logo no início da gestação até a vigésima semana gestacional, com o objetivo de diminuir a ocorrência de má formação fetal, além de reduzir os sintomas como náuseas e vômitos, que são frequentes nesse período (NASCIMENTO; SOUZA, 2002).

ALEITAMENTO MATERNO E OS CUIDADOS COM AS MAMAS:

SABER CIENTÍFICO X SABER POPULAR

A prática do aleitamento materno oferece inúmeros benefícios, tanto para o crescimento e o desenvolvimento de lactentes como para a mãe, família e sociedade (BRASIL, 2001). Acrescentamos que a tomada de decisão da mulher quanto ao aleitamento materno deve ser valorizada, sem julgamentos e imposições pelo profissional de saúde, que deve acolher as suas opiniões e esclarecer suas dúvidas. Durante o pré-natal, devem existir ações educativas que estimulem o aleitamento materno exclusivo, de forma a valorizar a individualidade, a subjetividade e o poder decisório de cada mulher, com o intuito de diminuir o desmame precoce, que traz danos à saúde da criança (SANDRE-PEREIRA et al., 2000). As gestantes valorizaram o aleitamento materno exclusivo para o desenvolvimento adequado da(o) filha(o), demonstrando algum tipo de conhecimento sobre o assunto, o que se verifica nos depoimentos abaixo:

“[...] O leite materno é ideal para o desenvolvimento da criança, e eu pretendo amamentar até... até um ano... e meio [...]” (LÍRIO)

“[...] O modo de aleitar ele, o carinho... o vínculo olho com olho, o contato entre nós dois [...]” (ÍRIS)

“[...] pelo mínimo seis meses eu quero alimentar meu filho, né, só com leite materno, sem água, sem chá, sem nada, e é isso que é certo [...]” (CRAVO)

Desta maneira, acreditamos que essas orientações sobre o aleitamento materno advêm das atividades educativas promovidas pelos serviços de saúde e executadas pelos profissionais bem como do saber popular, momento em que essas mulheres apreendem essas informações no contato com outras gestantes e com seus familiares, especialmente suas mães e avós.

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Salientamos que o cuidado com as mamas é outra importante ação a ser realizada desde a gestação, constituindo um período de preparo especial para a amamentação, com a utilização de alguns utensílios e estratégias, a exemplo do uso de sutiã com orifício central, o banho de sol diariamente pela manhã para aumentar a resistência da região mamilo-areolar, evitar o uso de sabões, cremes ou óleos na área do mamilo, dentre tantas outras atividades (BRASIL, 2001). Os depoimentos evidenciaram um conhecimento insipiente bem como informações errôneas sobre os cuidados com as mamas, refletindo falhas na transmissibilidade das orientações, o que se verifica nos depoimentos abaixo:

“[...] As mamas, o cuidado deve ser é... tomar banho, né, fazer a higiene mes-mo no seio... direitinho, né... Fazer a higiene. Passar óleo, óleo de amêndoa pra não ter estria, essas coisas, antes, e também depois [...]” (AZALÉIA).

“[...] Geralmente “os pessoal” mandam passar óleo... nos seios, né? Pra não desenvolver assim até uma estria, pra ver se... Como é... Fazer uma limpeza no bico do seio... e ao lado, pra que já venha se... por exemplo, como se fosse uma massagem, pra que ele já venha se endurecendo, pra quando o bebê mamar não ferir [...]” (ORQUÍDEA).

“[...] ela informou que é pra usar sutiã... e lavar o bico do peito antes de dar o... limpar o bico do peito antes de dar o... com água [...]” (GIRASSOL).

Considerando a amamentação como um fenômeno natural e social, entendemos que o sucesso se dará através da escolha da mãe em alimentar a criança da forma mais saudável, valorizando o seu leite como produto do seu corpo, repleto de benefícios. Os mitos e os tabus devem ser respeitados, porém esclarecidos, principalmente em se tratando de primigestas. Deve-se ressaltar a contribuição do aleitamento materno exclusivo para o corpo materno e infantil, mas, sobretudo, permitir que cada mulher escolha entre sua manutenção ou suspensão.

AS PREOCUPAÇÕES DO UNIVERSO GESTACIONAL QUE PAIRAM SOBRE O

TRABALHO DE PARTO E A DOR

O parto constitui um momento em que ocorre uma mistura de sentimentos, carreado de ansiedade, de dúvida, de medos, vivenciado por cada mulher (BRASIL, 2001). Percebemos que, ainda no último trimestre da gestação, quando o imaginário do nascimento vem se aproximando da realidade, o cenário passa a ser amedrontador. As gestantes demonstram total insegurança e

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CONHECIMENTOS ADQUIRIDOS POR PRIMIGESTAS NO PRÉ-NATAL DE UMA MATERNIDADE PÚBLICA EM SALVADOR

desconhecimento sobre o trabalho de parto e suas fases, preferindo muitas vezes não falar sobre o assunto, como ilustram os depoimentos a seguir:

“[...] Nada, (risos) não quero nem saber! (risos) [...] sobre o parto, não (risos) - (silêncio) Não sei o que é que vai acontecer na hora (risos) Na hora H [...]” (MARGARIDA)

“[...] Sobre o trabalho de parto? Tenho medo! (risos) [...]” (ROSA)

“[...] tô morrendo de medo (risos), sei que dói muito (risos) [...] quase todo mundo fala que dói ... Aff, dá medo! Mas quanto a isso não quero me lembrar dessas partes (risos) [...]” (ANGÉLICA)

Observamos que os relatos acima foram pautados no medo da dor e baseados em informações transmitidas por familiares, principalmente amigas e vizinhas que já vivenciaram o processo. Ainda se constitui em temática pouco abordada por parte dos profissionais de saúde durante o desenvolvimento da assistência pré-natal, o que amplia os medos e as incertezas diante do nascimento da(o) filha(o).

REPOUSO SEXUAL APÓS O PARTO: INFORMAÇÃO X DESINFORMAÇÃO

O período pós-parto também é conhecido como “quarentena”, “resguardo”, termos utilizados popularmente, caracterizando cautela para uma boa recuperação. A prestação dos cuidados nessa fase está ligada a padrões culturais, crenças e tabus, momento em que as influências são herdadas pela família. As mulheres obedecem a certas regras, dentre as quais também está inserida a atividade sexual. Na revisão puerperal tardia, que deverá ocorrer entre o trigésimo e o quadragésimo segundo dia, o profissional deve dialogar com o casal sobre o retorno às atividades sexuais, visto que esse período indica a liberação às atividades normais da mulher, independente da via de parto (STEFANELLO; NAKANO; GOMES, 2008; BRASIL, 2001).

No entanto, não existe um prazo estipulado para o retorno às atividades sexuais, visto que esta é uma decisão que deve resultar de comum acordo do casal. Cada contexto gestacional é único, as intercorrências podem surgir ou não, as dores podem ou não estar presentes. Quanto ao repouso sexual, as opiniões relativas ao tempo foram divergentes, segundo os depoimentos abaixo:

“[...] Um mês, 30 dias. Eu acho, não tenho certeza, agora, eu não sei se é mais, depende da mulher, do organismo da mulher [...]” (ORQUÍDEA)

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“[...] Depois do parto? Logo depois? É... tem que esperar passar o resguardo pra voltar a fazer sexo. É... eu acho que é um mês e meio, ou é dois meses, eu acho [...]” (GIRASSOL)

“[...] Eu acho que é um mês, né? Não sei se é um mês e quinze dias... Não é isso? Não ter relação [...]” (AZALÉIA)

Em virtude das falas, acreditamos que, durante as últimas consultas, a orientação sobre o repouso sexual deva ser valorizada e aprimorada não somente com as gestantes, mas, sobretudo, com os parceiros sexuais, de forma que esses atuem como corresponsáveis pelo acompanhamento puerperal.

AS CONTRIBUIÇÕES DA ATIVIDADE FÍSICA NO PERÍODO GESTACIONAL

A participação de exercícios regulares no período gestacional parece beneficiar tanto a mãe quanto o bebê. Perde-se a oportunidade de proteção quando se mantém a inatividade física, que pode causar algumas doenças, como o descontrole nas taxas de glicemia, a obesidade, a elevação na pressão arterial, o aumento nas taxas de colesterol, a diminuição da força muscular e o estresse mental (SILVA, 2007). Todas as mulheres que não apresentam contraindicações patológicas devem ser incentivadas a realizar atividades aeróbicas, de resistência muscular e alongamento (LIMA; OLIVEIRA, 2005).

Os depoimentos a seguir demonstram a importância e a contribuição das atividades físicas na gestação:

“[...] Andar, andar bastante. Não dormir muito, se movimentar. Tem que se movimentar [...]” (GIRASSOL).

“[...] Atividade física é muito bom pra poder... como é que se diz? Movimentar mais a criança, pra na hora de ter, não... é mais... tranquilidade, né? Quanto mais se movimenta, é melhor pra mulher grávida [...]” (ORQUÍDEA).

“[...] Eu continuo fazendo caminhada, pra poder me ajudar até na hora de ter meu neném, ter o eixo [...]” (ÍRIS).

“[...] Sem peso, sem... se esforçar demais, mas é sempre bom uma caminhada-zinha básica [...]” (CRAVO).

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É visível que a atividade física no período gestacional vem se integrando de forma crescente, demonstrando um estilo de vida mais ativo. Tem a ação de promover a diminuição das dores, ajudando as gestantes a tolerar melhor o trabalho de parto (BATISTA et al., 2003). Deve-se estimular a prática de atividade física, até mesmo a caminhada diária, com a finalidade de possibilitar a realização do parto normal, se assim for desejado pela gestante.

Acrescido a estes fatores, os profissionais de saúde, em especial a(o) enfermeira(o), cuidadora direta da assistência pré-natal, tem por função máxima criar e/ou estabelecer o vínculo, de maneira que a assistência passe a ser valorizada e a gestante se sinta satisfeita com o atendimento.

Acreditamos que as condutas durante o pré-natal devem ser esclarecidas às gestantes, aos parceiros e familiares, com o objetivo de transmitir segurança e demonstrar a importância dos procedimentos a serem realizados, visando à qualidade da assistência.

Portanto, diante do exposto, percebemos que o serviço de pré-natal necessita de uma maior implementação assistencial, voltada à promoção e execução de práticas educativas, com atuação de uma equipe multidisciplinar dedicada ao atendimento integralizado de cada mulher, de maneira dinâmica e inovadora, baseada nos fundamentos do Programa de Humanização no Pé-Natal (PHPN) e do Sistema Único de Saúde (SUS), proporcionando a melhoria na transmissão de conhecimentos às gestantes.

Por fim, ressaltamos que os profissionais de saúde, em especial as(os) enfermeiras(os), devem possuir um conhecimento técnico-científico de maneira a tornar o cuidado e a assistência humanizados, através do diálogo e do processo interativo, principalmente quando se trata de primigestas. Assim, destacamos a importância da enfermagem, como sendo a profissão que busca um processo de (re)construção da assistência à saúde das mulheres, sobretudo no cuidado pré-natal, de forma à torná-la acolhedora e humanizada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, entendemos que a assistência pré-natal é de grande relevância para o preparo da maternidade. Deve ser iniciada precocemente, visando oferecer à gestante uma pluralidade de informações e esclarecimentos, com o intuito de reduzir os riscos de intercorrências patológicas e complicações que venham a surgir durante o período. Assim, as orientações devem ser extensivas à mulher, parceiro e família, para que juntos possam compreender as mudanças, adaptações e transformações necessárias para o desenvolvimento de uma nova ordem familiar.

Com isso, percebemos que a assistência prestada no pré-natal ainda se destina ao enfoque no bebê em detrimento da mulher, sendo necessário um olhar mais atentivo para

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ambos, respeitando crenças, desejos e imaginários surgidos durante a gravidez no imaginário das mulheres. Ademais, destacamos que, por se tratar de primigestas, deveriam receber uma atenção minuciosa, visto que a influência da família atua diretamente no cenário gestacional e puerperal, muitas vezes de maneira impeditiva, fazendo-se necessário uma abordagem por parte dos profissionais de saúde para minimizar a execução de práticas oriundas de mitos e tabus.

Acreditamos que a ausência de atividades educativas durante o acompanhamento pré-natal contribui de forma danosa para a perpetuação de dúvidas, medos, receios, incertezas durante o percurso gestacional. Portanto, salientamos que devem ser implementadas práticas colaboradoras na transmissão de conhecimento, ampliando o enfoque gestacional.

Evidenciamos, com este estudo, a insegurança quanto ao parto, através do “medo”, do “não querer falar sobre o assunto”, “não saber o que vai acontecer na hora”, a desinformação no cuidado com as mamas, as orientações superficiais fornecidas pela equipe multidisciplinar no que tange às mudanças fisiológicas e psicológicas da gestação, o desconhecimento sobre o aleitamento materno exclusivo e seus benefícios, as opiniões divergentes quanto ao repouso sexual, enfim, uma amplitude de informações errôneas e/ou limitadas por parte das gestantes sobre o processo gestacional. Desta maneira, faz-se necessária a intensificação do processo educativo no pré-natal até o puerpério, de forma mais adequada e coerente, incentivando a participação familiar na gestação, melhorando o reflexo na qualidade da assistência.

REFERÊNCIAS

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Acta Paulista Enfermagem, v. 21, n.2, 2008, p.275-281.

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COM A CIÊNCIA: revista multidisciplinar em educação,

saúde e meio ambiente

NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

A Revista COM A CIÊNCIA, um periódico semestral, do Departamento de Educação do Campus XII, da Universidade do Estado da Bahia – Uneb publica trabalhos nacionais inéditos e internacionais, relacionados às áreas de Educação, Saúde e Meio Ambiente , sobretudo os decorrentes de pesquisas em andamento ou concluídas, de análises críticas de experiências, assim como ensaios que apresentam contribuições sobre temáticas emergentes. Além de artigos e ensaios, a revista publica resenhas que privilegiam obras recentes, de relevância nas áreas mencionadas e resumos de dissertações e teses.

1) Os originais deverão ser encaminhados por meio eletrônico para [email protected]. Podem ser escritos em Português e Espanhol.2) Todos os trabalhos serão submetidos a dois pareceristas, especialistas na área. No caso de haver pareceres contraditórios, a comissão editorial enviará o trabalho a um terceiro parecerista. É preservado o anonimato dos pareceristas e dos autores do trabalho em processo de avaliação.3) A fim de assegurar o anonimato no processo de avaliação, o nome do autor, da instituição a que pertence, assim como um texto (máximo de 3 linhas) contendo referências com as quais deseja ser apresentado e o e-mail para contato, deverão vir em página de rosto, separados do texto do artigo.4) O texto deverá seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e apresentar as seguintes características:a) 10 a 15 laudas, digitadas em fonte Times New Roman, corpo 12, espaço 1,5 e margens 2,5;b) título com o máximo de 100 caracteres (com espaço), no idioma do artigo e em inglês;d) nos casos de pesquisa com apoio financeiro de alguma instituição, esta deverá ser mencionada em nota de pé de página;e) resumo seguido de cinco palavras-chave, com o mínimo de 800 caracteres (com espaço) e o máximo de 1000 caracteres (com espaço), no idioma do artigo e em inglês;

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f) as resenhas poderão chegar a até 5 laudas.5) As traduções deverão vir acompanhadas de autorização do autor e do original do texto.6) Os mapas e imagens deverão ser apresentados no final do texto, indicando-se em que parte do mesmo devem ser incluídos. As imagens deverão ser digitalizadas com 300 dpi, no formato TIFF ou JPG, ou remetidas junto aos artigos para serem processadas pela Revista.7) A referência a autores no decorrer do texto deverá obedecer à forma (autor, data) ou (autor, data, página). Diferentes títulos do mesmo autor e publicados no mesmo ano deverão ser diferenciados adicionando-se uma letra depois da data (ex. 2001a; 2001b; 2001c).8) As notas de pé de página, destinadas a explicações e informações complementares, deverão ser numeradas sequencialmente.9) A bibliografia deve ser apresentada ao final do artigo, seguindo a última versão das normas da ABNT.10) A Comissão Editorial se reserva o direito de fazer pequenas alterações, visando à manutenção dos princípios de legibilidade e de aceitabilidade da publicação.11) Será enviado a cada autor 1 (um) exemplar do número da Revista, por artigo publicado.12) Trabalhos não publicados ficarão à disposição dos autores, para devolução, até um ano após o envio.

ENVIO DOS TRABALHOS

REVISTA COM A CIÊNCIA

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB, DEDC- CAMPUS XII - NUPEXAv. Antônio Universitária Vanessa Cardoso e Cardoso de Lira, s/n Bairro Ipanema, Guanambi -BA- CEP: 46430000 Fone/Fax: (077) 34511535E-mail: [email protected]

CONDIÇÕES CONTRATUAIS

Os autores dos trabalhos publicados na “Revista COM A CIÊNCIA - revista multidisciplinar em educação, saúde e meio ambiente” deverão abdicar dos direitos autorais sobre o artigo e cada autor receberá doação de 01 (um) exemplar do número do caderno em que ele estiver incluído. Para tanto, junto com os textos, os/as autores/as deverão enviar uma declaração datada e assinada por eles, cedendo os direitos autorais da publicação ao Núcleo de Pesquisa e Extensão – NUPEX do DEDC, Campus XII, Uneb.

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ANEXO 1

(MODELO DE DECLARAÇÂO)

DECLARAÇÃO ABDICANDO DIREITOS AUTORAIS

Por este documento, Eu (nome completo do/a autor/a), CPF Nº _________________________ e RG Nº_____________________________residente na (endereço completo) abdico dos direitos autorais do texto - (Título do Texto) - a favor do NÚCLEO DE PESQUISA E EXTENSÃO – NUPEX, CAMPUS XII, UNEB, GUANAMBI. Ao ser publicado, receberei em troca 01 exemplar terceiro número Revista COMCIÊNCIA - Educação, Saúde Meio Ambiente.

Local e data

Nome completo e assinatura dos(as) autores(as)

Autores(as)

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DEMAIS DIRETRIZES PARA AUTORES

Normas da ABNT

1 Citações (NBR-10520, de 2002)

1.1 Citação direta (textual): significa que se citam as palavras do autor.

1.1.1 Citações curtas (de até três linhas) .Exemplos:

a) Segundo Almeida Filho (2005, p. 93), “são 6 os formantes do construto da abordagem que se equacionam de algum modo em cada caso de ensino/aprendizagem”.b) [Entre parênteses, o nome deve estar em maiúsculas.] “são 6 os formantes do construto da abordagem que se equacionam de algum modo em cada caso de ensino/aprendizagem” (ALMEIDA FILHO, 2005, p. 93).c) Nomes de autores fora de parênteses: dois autores: ... Binon e Verlinde (2000, p. 129); três autores: ... Abaurre, Mayrink-Sabinson e Fiad (2003, p. 302); mais de três autores: ... Binon et al. (2008, p. 117)d) Nomes de autores dentro de parênteses (usa se ponto e vírgula): dois autores: (BINON; VERLINDE, 2000, p. 129); três autores: ... (ABAURRE; MAYRINK-SABINSON; FIAD, 2003, p. 302); mais de três autores: ... (BINON et al., 2008, p. 117)

1.1.2 Citações de mais de três linhas (recuadas, em corpo menor [11]). Os nomes dos autores são colocados entre parênteses após a citação. Veja 1.1.1 (b) e (d). Exemplo:

Um levantamento das investigações realizadas sobre aprendizagem incidental e intencional do léxico, tanto em L1 como em L2, parece indicar que há um contínuo entre os dois, sem uma fronteira precisa onde começa um e termina o outro. A aprendizagem incidental, por definição, deveria ocorrer de modo automático, abaixo do nível da consciência, mas normalmente não é assim. (LEFFA, 2000, p. 33)

1.2 Citação indireta (livre): significa que se reproduzem idéias, opiniões ou informações do(s) autor(es) sem que se transcreva o texto literalmente.Vale o mesmo modo de apresentação visto em 1.1. Exemplos:

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a) Segundo Leffa (2000, p. 33), a aprendizagem incidental normalmente não ocorre de modo automático.

b) Não há uma fronteira precisa entre aprendizagem incidental e intencional do léxico (LEFFA, 2000, p. 33).

Tendo-se encontrado as mesmas ideias, opiniões e informações em mais de uma fonte, os autores devem ser citados – dentro de parênteses – em ordem alfabética, separados por ponto e vírgula. Exemplos: (BLOOME, 1983; WALLACE, 1993). Observe que nesse caso há ponto e vírgula tanto entre vários autores de um mesmo texto quanto entre os autores dos diversos textos (por exemplo: BLACHOWICZ; FISHER, 2002; MCCARTHY, 1990; SCHMITT, 1997). Os nomes podem ser precedidos de “cf.”: (cf. BLOOME, 1983; WALLACE, 1993).Citação de vários autores fora de parênteses; exemplo: Segundo Blachowicz e Fisher (2002), McCarthy (1990) e Schmitt (1997).

1.3 Citação de citação: significa que não se leu o documento original, tendo encontrado uma citação em um documento lido. Podem ser usadas as palavras ou expressões “apud”, “citado(s) por”, “conforme” ou “segundo”, mas preferimos “apud”. Exemplo:

a) Fishman (1972, apud BORTONI, 1981, p. 56) ...;b) Weinrich (1966, p. 24, apud SZENDE, 1996, p. 111); [entre parênteses] ... (WEINRICH,

1966, p. 24, apud SZENDE, 1996, p. 111).

Os dados bibliográficos do documento original podem ser indicados em nota de rodapé ou nas referências bibliográficas. Caso se opte pela segunda solução, devem-se indicar os dados do texto original seguido de “apud” e dos dados do texto lido (cujos dados serão indicados no lugar que lhes cabe na ordem alfabética).

Observação: Segundo a ABNT, a indicação das páginas nas citações livres é opcional. Solicitamos que, na medida do possível, tanto nas citações diretas quanto nas indiretas as páginas sejam indicadas. Isso visa possibilitar que o leitor encontre facilmente os trechos citados caso ele queira conferir o original .

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2 Referências bibliográficas (NBR-6023, de 2002)

Detalhes:Sobrenomes de autores : Consideram-se como sobrenomes: sobrenome simples (KOCH);

sobrenomes ligados por hífen (SERRANI-INFANTI); sobrenome + palavra que significa parentesco (ALMEIDA FILHO); substantivo + adjetivo (CASTELO BRANCO). No caso de autores de língua espanhola, usam-se os dois últimos sobrenomes (a não ser que o próprio autor use apenas um).

Nomes : Segundo a NBR-6023, não é preciso fornecer o primeiro nome dos autores. Entretanto, para que se possa citar o/a autor(a) dizendo “o autor”, “a autora”, “ele” ou “ela”, solicitamos que o primeiro nome seja indicado. Exemplo: LEFFA, Vilson J.

Vários autores: dois ou três: separam-se por ponto e vírgula; mais de três: indica-se apenas o primeiro, seguido de “et al.”.

Editor(es)/Organizador(es)/Coordenador(es): após o(s) nome(s), escreve-se “(Ed.).”, “(Org.).” ou “(Coord.).”.

Título: de artigo ou capítulo: digitado em corpo normal; de livro ou revista: digitado em negrito.

Número de edição: indicar a edição de uma publicação (a partir da segunda), usando-se o idioma da publicação: 3. ed. (português, espanhol); 2nd ed. (inglês); 2e ed. (francês); 2. Aufl. (alemão); 2ª ed. (italiano).

Local de publicação e editora: Exemplos:a) Brasília: Thesaurusb) (indica-se o estado quando o nome da cidade existir em mais de um) Campo Grande, MS:

Ed. UFMSc) (havendo duas editoras) Campo Grande, MS: Ed. UFMS; São Paulo: HumanitasDados Completos

Dissertações, teses, monografiasAUTOR. Título (negrito): subtítulo (se houver). Ano de apresentação. Número de folhas.

Tipo (p.ex.: Dissertação) (entre parênteses: nível e área de concentração; p.ex.: Mestrado em Linguística Aplicada) - Nome da Faculdade, Nome da Universidade, Cidade, Ano da defesa.

Livro : LARSEN-FREEMAN, Diane. Techniques and principles in language teaching. Oxford: Oxford University Press, 2002.

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Livro traduzido: MAINGUENEAU, Dominique. Novas tendências em análise do discurso. Tradução de Freda Indursky. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997.

Capítulo de livro : NUNES, Myriam B. C. Redescobrindo o papel do professor de leitura em língua estrangeira. In: CELANI, M. A. A. (Org.). Ensino de segunda língua: redescobrindo as origens. São Paulo: EDUC, 1997. p. 107-132.

Capítulo em livro organizado pelo próprio autor: CELANI, Maria A. A. Ensino de línguas estrangeiras: olhando para o futuro. In: _____. (Org.). Ensino de segunda língua: redescobrindo as origens. São Paulo: EDUC, 1997. p. 147-161.

Artigo de periódico: DAVIS, James. Reading literature in the foreign language: the comprehension/response connection. The French Review, v. 65, n. 3, p. 359-370, 1992.

Artigo de periódico online: CANTERO, Francisco J. Complejidad y competência comunicativa. Revista Horizontes de Lingüística Aplicada, Brasília, v. 7, n. 1, 2008. Disponível em: www.revistahorizontes.org.br. Acesso em 09 nov. 2009.

Dissertação:

CERVO, Irène Z. S. Tradução e ensino de línguas. 2003. 220f. Dissertação (Mestrado em Lingüística Aplicada) - Instituto de Letras, Universidade de Brasília, Brasília, 2003.

Trabalhos do mesmo autor são colocados em ordem cronológica; ao repetir o nome, é substituído por linha subscrita de 6 espaços: CELANI, Maria A. A. Afinal, o que é lingüística aplicada? In: ______; PASCHOAL, M. Z. de. (Orgs.). Lingüística aplicada: da aplicação da lingüística à lingüística transdisciplinar. São Paulo: EDUC, 1992. p. 15-25.

______. Ensino de línguas estrangeiras: olhando para o futuro. In: _____. (Org.). Ensino de segunda língua: redescobrindo as origens. São Paulo: EDUC, 1997. p. 147-161.

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