ver, ler, tocar e participar do anÚncio impresso...
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VER, LER, TOCAR E PARTICIPAR DO ANÚNCIO IMPRESSO DA CERVEJA
SOL.
Fernanda Rodrigues Pucci1
Resumo
Este artigo é uma pequena parte de um trabalho maior e apresenta uma análise teórica, e
de certo modo técnica, de um dos anúncios de lançamento da cerveja SOL no Brasil.
Resgata alguns conceitos de análise da imagem (icônica) e retórica publicitárias com
foco no anúncio impresso que possui elementos interativos (exige manipulação). O
objetivo principal é conhecer como ocorre a formação de sentido nas mensagens
publicitárias que usam da interação com o receptor. O estudo é embasado por Peirce,
Eco e Barthes.
Palavras-chave Publicidade; semiótica; imagem; interação.
Resumen
Este artículo es una pequeña parte de una obra más grande y presenta un análisis
teórico, y técnico de uno de los anuncios para el lanzamiento de la cerveza SOL en
Brasil. Señala algunos conceptos de análisis de imagen y la retórica de publicidad
enfocada en un anuncio impreso que cuenta con elementos interactivos (requiere la
manipulación). El objetivo principal es conocer cómo se da la formación de significado
en los mensajes publicitarios que utilizan la interacción. El estudio se basa en Peirce,
Barthes y Eco.
Palabras claves
Publicidad, semiótica, imagen, interacción.
Abstract
This article is a small part of a larger work and presents a theoretical and technical
analysis from one of the ads for the launch of SOL beer in Brazil. For that draws some
theoretical concepts of image analysis and advertising rhetoric focused on a interactive
press add (requires manipulation). The main objective is to know how does the
formation of meaning in advertising messages that use the interaction with the receptor
occurs. The study is based on theories by Peirce, Barthes and Eco.
Keywords Advertising, semiotics; image; interaction.
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1. INTRODUÇÃO
As imagens fazem cada vez mais parte da comunicação contemporânea com diferentes
características, pois nossa cultura tem um substrato predominantemente visual. Se
analisarmos criticamente, essa “civilização de imagem” pode ser entendida como uma
“civilização do clichê”, ou então do estereótipo, por estar focada na persuasão, seja ela
implícita ou explícita. Toda imagem parece trazer em si o desejo de convencer, o que
significa que a exploração da dimensão visual (icônica) é resultado de uma estratégia
significativa e como tal persuasiva. Cada imagem esforça-se em convencer à sua
maneira, seja representando coisas que existem no mundo ou outras que nunca
existiram, podendo ser publicitária, institucional, educativa, etc. Por outro lado,
qualquer representação da realidade sofre sempre a interferência da técnica utilizada por
quem a cria e o ponto de vista do observador. Para analisar anúncios publicitários
semioticamente é importante que sejam levadas em consideração algumas outras
abordagens sobre estas mensagens, para que possam dialogar entre si, e posteriormente
serem aplicadas ao objeto de estudo. Segundo Lúcia Santaella,
... para uma análise afinada, a aplicação semiótica reclama pelo
diálogo com teorias mais específicas dos processos de signos que
estão sendo examinados. Assim, por exemplo, para se analisar
semioticamente filmes, essa análise precisa entrar em diálogo com
teorias específicas de cinema. ... Não se pode fazer análise de peças
publicitárias sem algum conhecimento de sintaxe visual, design, etc..
(2002, p. 06)
Dessa maneira, este artigo toma como objeto de estudo um tipo específico de
publicidade impressa que possui elementos interativos, ou seja, o que se pretende
analisar é uma peça publicitária que utiliza a forma e o suporte como parte integrante da
mensagem, principalmente pelo fato de exigir uma certa manipulação para que se possa
compreender a mensagem por inteiro. Trata-se de uma propaganda de cerveja veiculada
na mídia impressa: uma das peças da campanha publicitária de lançamento da nova
cerveja SOL, no Brasil.
Partindo da idéia de que a análise semiótica permite a compreensão das múltiplas
dimensões e manifestações das diferentes linguagens que se apresentam em diferentes
esquemas perceptivos, como palavras, imagens, formas, cores ou texturas, sons e
silêncios, cada um deles envolvendo variados efeitos, que vão do puramente emocional
até elaborações metafóricas e simbólicas. A abordagem da peça publicitária da cerveja
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SOL levará em conta que todos estes efeitos podem ser intencionalmente aproveitados
para a persuasão, considerando-se o repertório do público-alvo.
Para isso serão tomadas como base as teorias dos signos (Charles Sanders Peirce,
Umberto Eco e Roland Barthes), os estudos das imagens (Martine Joly e outros) assim
como a semiótica aplicada, por meio dos textos de Lúcia Santaella e Denise Guimarães,
entre outros. A questão da interatividade será embasada por textos de Arlindo Machado
e Alex Primo.
2. CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS
Para uma análise semiótica, devem ser considerados os três tipos de efeitos de uma
mensagem: efeitos interpretativos emocionais, efeitos reativos - ou seja, aqueles que
levam a uma ação - e, ainda, efeitos lógicos, que têm a natureza do pensamento
racional. A pluralidade da própria base intersemiótica de uma mensagem publicitária
prevê a operação integradora dos diversos signos e, portanto, exige uma recondução à
unidade, que é função do Interpretante peirceano. Para Peirce,
A referência a um interpretante é tornada possível e justificada por
aquilo que torna possível e justifica a comparação, e isto é claramente
a diversidade de impressões. ..., mas como existe uma pluralidade de
impressões temos um sentimento de complicação ou confusão, que
nos conduz a diferenciar esta impressão daquela, e então, tendo sido
diferenciadas, elas exigem ser conduzidas à unidade. Agora elas não
são conduzidas à unidade até que as concebamos conjuntamente como
sendo nossas, isto é, até que as refiramos a um conceito que seja seu
interpretante. Assim, a referência a um interpretante surge a partir da
junção de diversas impressões, e conseqüentemente não reúne um
conceito à substância, como as outras duas referências fazem, mas une
diretamente a pluralidade da própria substância. (2001, p.288-289)
Portanto, verifica-se que no processo interpretante, as diferentes impressões decorrentes
da percepção dos fenômenos ou objetos podem ser unidas por um conceito: o
interpretante do signo.
Roland Barthes, em Elementos de Semiologia, define que “o signo é composto de um
significante e um significado. O plano dos significantes constitui o plano de expressão e
o dos significados o plano de conteúdo.” (1985, p.43). Na publicidade, podem ser
utilizados tanto os signos que tem uma analogia direta com o objeto representado, como
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aqueles que têm sentidos simbólicos, culturais e determinados pela convenção. O
símbolo pode ser metáfora e metonímia ao mesmo tempo. E na comunicação
(propaganda/publicidade) o processo da construção da mensagem utiliza da figuração de
sentido, o que explica a presença de símbolos.
É preciso um empenho publicitário sistemático para criar um vínculo semiótico entre
uma imagem e determinado produto. O caráter da representatividade simbólica não é
uma mera convenção. A simbolização tem força quando utiliza-se de algo que existe na
mente para ajudar a fortalecer a idéia ou conceito simbolizado. Em alguns casos, o
nome do produto vem escrito em tipos e cores especiais que tem a função de simbolizar
o produto. O exemplo mais famoso é o da Coca-Cola, onde a cor vermelha foi escolhida
com o fim de criar uma relação com o objeto já definida no inconsciente coletivo, o que
caracteriza uma predisposição. Tais estratégias são muito exploradas nas marcas,
rótulos, embalagens e propagandas de cervejas, por exemplo.
Há imagens que têm um significado óbvio e único, não oferecendo outras possibilidades
de leitura além do que aparece representado. A publicidade se vale deste tipo de
imagens para reduzir o nível de ambigüidade da mensagem, quando o objetivo é
apresentar, ou até mesmo impor, um determinado produto no mercado.
A ambigüidade pode ser, por outro lado, intencional, quando a proposta é uma
apresentação mais estética e original do produto. Nesse caso, diversas conotações são
possíveis, permitindo leituras múltiplas. Tudo depende do produto e do repertório
específico de seu público-alvo.
No caso da propaganda da cerveja SOL, analisada a seguir, percebe-se que a
ambigüidade foi evitada, pois o grau de figuração, os apelos formais e cromáticos são
bastante óbvios. Podemos identificar, no anúncio, alguns estereótipos das propagandas
deste tipo de produto, entretanto, percebe-se a utilização de elementos redundantes no
contexto das propagandas de cervejas somados a elementos originais que constituem o
apelo à manipulação do material impresso pelo leitor/receptor. Este é o diferencial da
peça aqui estudada.
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Dentre as atividades do sistema capitalista, a publicidade é a que mais se vale do
princípio de incentivar, cada vez mais, o consumo. Além de ter um bom produto a
oferecer, é preciso torná-lo conhecido e, também, fazer com que possíveis compradores
passem a desejar sua aquisição. É neste ponto que entra a Retórica. Considerando que a
publicidade tem por objetivo principal convencer o público a consumir e a Retórica é
exatamente a arte da persuasão, não é difícil compreender porque o discurso publicitário
recorre aos procedimentos retóricos para atingir seus objetivos.
Antigamente, a Retórica visava mais do que um assentimento racional, pretendia
também promover uma concordância emocional. Umberto Eco afirma que, com o
passar do tempo, a retórica deixou de ser vista como uma fraude sutil, como era
considerada por muitos, para atingir a posição de
... técnica de um raciocinar humano controlado pela dúvida e
submetido a todos os condicionamentos históricos, psicológicos,
biológicos de qualquer ato humano. ... a retórica procedia a um
recenseamento desses modos de pensar, dessas opiniões comuns e
adquiridas, e desses argumentos já assimilados pelo corpo social,
correspondentes a sistemas de expectativas pré-constituídos. (1997,
p.73- 74)
Em outras palavras, para certificar-se de que seus argumentos seriam aceitos, o orador
deveria utilizar um conjunto de idéias de consenso geral antes de introduzir um novo
conceito. Ou seja, para ter a receptividade esperada a mensagem deveria equilibrar
informação nova com informação já conhecida. O autor explica que há diferentes graus
retóricos e diferentes tipos de discurso, que vão desde o discurso filosófico até as
técnicas da propaganda e da persuasão de massa.
O pensador italiano salienta ainda que, quando as figuras de retórica são usadas de
modo criativo, elas não servem apenas para ornamentar um conteúdo, mas “contribuem
para delinear um conteúdo diverso”. (Eco, 2000, p.236)
Em diversas obras e por décadas, Umberto Eco tem utilizado conceitos e caminhos
distintos para se alcançar os sentidos conotados. De modo geral, os resultados finais são
muito similares aos apontados por Barthes e Joly. A retórica da imagem indica sempre
uma possibilidade de um sentido segundo, o que Barthes denomina de sentido conotado
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e Joly explica dizendo que “uma imagem pretende sempre dizer algo diferente do que
representa no primeiro grau, isto é, no nível da denotação” (Joly, 1996, p.83).
Denise Guimarães refere-se a outros efeitos de sentido, que podem ser observados
nas peças publicitárias, em termos de recursos retóricos - tais como ambigüidade,
metáforas, metonímias, antíteses, hipérboles, paradoxos, etc. – que funcionam na
publicidade da mesma forma que nas outras manifestações artísticas. “Neste caso, o
jogo retórico pode traçar conexões imprevisíveis ou escassamente previstas e
desfrutadas.” (Guimarães, 2007, p.151) A autora entende que os recursos retóricos
podem redimensionar o texto publicitário em suas qualidades artísticas, assim como
ocorre num quadro, ou mesmo num poema, delineando novos significados nas
imagens e entre as imagens. Essas novas percepções dependem de um conceito
imediato ligado a outro mais mediato que permite as distinções: é a representação
mediadora que Peirce denomina Interpretante.
Martine Joly comenta um anúncio publicitário de extrato de tomate, como exemplo para
o entendimento retórico da conotação:
A fotografia (significante) que me permite reconhecer
tomates,pimentões ou cebolas (significados) constitui um signo pleno
(um significante ligado a um significado). Contudo, esse signo pleno
prossegue sua dinâmica significativa tornando-se o significante de um
significado segundo, „frutas e legumes mediterrâneos, Itália. (1996,
p.83)
Partindo do exemplo citado e levando para o caso da propaganda de cerveja aqui
analisada, é possível perceber a necessidade do conhecimento dos códigos para haver
uma leitura eficiente. Os códigos precisam ser conhecidos e de domínio social. Saber
utilizar as conotações em termos retóricos significa estar atento aos contextos em que os
signos se encontram, pois, qualquer leitura depende dos grupos sociais em que os
destinatários estão inseridos; dos lugares que eles habitam e de seu repertório.
Os sentidos e as representações podem ser variados conforme as características
particulares de cada grupo social, o que deve orientar as estratégias persuasivas de uma
mensagem publicitária. É grande a diferença entre significante e significado em
sociedades diferentes. Segundo Roland Barthes: “Cada sistema de significantes
corresponde, no plano dos significados, a um corpo de práticas e técnicas; esses corpos
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de significação implicam, por parte dos consumidores de sistemas, diferentes saberes,
[...] (Barthes, 1971, p.49).
Enfim, o mais importante, no caso da publicidade, é estar atento às diversas
possibilidades de leitura que são decorrentes do repertório do público-alvo escolhido,
pois a chamada retórica conotativa dependente diretamente do contexto em que ela foi
produzida, e em conseqüência, disso depende sua eficácia.
3. INTERATIVIDADE: A MANIPULAÇÃO DO OBJETO
A interatividade pode ser definida como o ato de interferir e provocar uma reação, ou
desencadear um processo de reação em bidirecionalidade, onde “os pólos, emissor e
receptor são intercambiáveis e dialogam entre si durante a construção da mensagem”
(Machado apud. Primo, Moura, Silveira, Santos, 2004, p.2). Essa reação ou intervenção
qualificam o processo da interatividade.
A manipulação de um objeto de forma a alterá-lo de seu estado de inércia e assim,
produzir algum sentido, pode ser enquadrada nesse processo. E o objeto, neste caso,
situa-se como instrumento mediador entre o homem e a mensagem. Santaella diz que,
“A ação lógica do signo é funcionar como mediador entre o objeto e o efeito que produz
numa mente atual ou potencial.” (2000,p.24). O que deve ser enfatizado aqui, é que a
publicidade impressa interativa, que hoje se apresenta como um recurso a ser usado em
busca do despertar da atenção, fixa-se como bem mais do que isso. As campanhas que
buscam o tipo de interação “física” (através da manipulação da peça) além de chamarem
a atenção conseguem alterar a maneira de percepção da mensagem em seu ponto de
aproximação cognitiva com o receptor. Em tempos de internet (que, aliás, firma-se por
possuir esta característica tão peculiar que é a interatividade), cada meio novo provoca
certa transformação nos hábitos das pessoas, alterando a dinâmica de suas vidas e
desenvolvendo um outro tom perceptivo.
Na evolução dos meios de comunicação, acentua-se com naturalidade a intervenção do
homem e para com eles; da fotografia ao cinema, da linearidade da televisão à
pluralidade da internet – interativa por excelência, com suas escrituras hipertextuais.
Cada meio novo provoca certa transformação nos hábitos das pessoas, alterando a
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dinâmica de suas vidas e desenvolvendo uma nova ordem perceptiva. A pluralidade da
linguagem interativa e a pluralidade sígnica apresentam-se implícitas umas nas outras,
uma vez que, assim como o signo está para a representação do real, o hipersigno está
para o virtual. Quando se fala de signo atribui-se a ele o caráter de agente postulador do
pensamento que opera no universo da cognição e está ligado ao seu objeto por uma
conexão de fato, ou uma representação, indução ou simbolização. Da mesma forma, ao
se falar de hipersigno (ligado ao conceito de hipermídia) compreende-se que cumpre seu
papel de signo, ao apresentar-se primeiramente como simulação do signo real.
O signo integra e desencadeia estruturas de análise semelhantes e correspondentes, por
isso, estabelecer um paralelo da análise do signo com os meios interativos é estabelecer
uma relação entre sua ação interativa e suas relações semióticas. É preciso comparar o
signo no sentido de como se relaciona com outros signos, despertando uma leitura
bidirecional e interativa.
Assim como no signo, as qualidades do hipersigno revelam-se em função de sua
aparência primeira, porém o hipersigno é objeto principal da mediação hipermidiática e
soma características como mutação, dinamicidade, volatilidade, sincronicidade,
efemeridade, enfim características do universo da hipermídia que vão além do signo; e
ainda, se relaciona com três universos: o real, o virtual e o hipotético e por isso estende
sua condição de signo para hipersigno.
Ao verificar modelos artificiais de interação, tem-se a possibilidade de modificação de
conteúdos e espaços, uma vez que os signos podem ter diferentes interpretações. Nesse
sentido, pode também, ser identificada uma relação de proximidade entre o hipersigno
multimidiático com os signos utilizados em campanhas publicitárias impressas, apesar
desses últimos terem base em apenas um suporte. A interação caracteriza-se, nesses
casos, não apenas pela intervenção de um intérprete, mas também pelo diálogo entre
linguagem e suporte. “O hipersigno, sendo objeto dinâmico, virtual e direto das
linguagens interativas, é reflexo do signo e o representa. O signo é reflexo e objeto do
hipersigno, pois espelha o sentido próprio indutivo dinâmico direcional, ambos se
espelham como representantes do mesmo objeto”. (Guimarães, 2009, em aula)
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A peça escolhida para este artigo revela de imediato o componente da interatividade,
por se tratar de uma análise semiótica voltada à funcionalidade da propaganda e
portanto focada no fato de estar em constante adaptação. Seus elementos não apenas
pedem a atenção, mas a exigem, pois sua compreensão depende desta manipulação, ou
interação física do receptor, apresentando apelos ao tato e texturas, com ênfase na
dinâmica da resposta gestual.
4. O PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DA PEÇA DE LANÇAMENTO DA
CERVEJA SOL
Os conceitos metodológicos que norteiam este artigo permitem decodificar os sentidos
das imagens que compõem a peça estudada, facilitando a compreensão dos elementos
que a constituem. A abordagem dada à propaganda da cerveja SOL levará em conta as
funções de cada um dos registros explorados pela peça em questão: o visual, o verbal e
o tátil, bem como seu cruzamento, buscando integrá-los à interpretação.
4.1 O registro visual
Como as mensagens publicitárias têm configurações privilegiadas, Martine Joly, explica
as diversas possibilidades do percurso do olhar, que, segundo ela, orientam a leitura de
um anúncio (1996, p.98):
a construção focalizada, quando as linhas de força convergem para um
ponto que representa o núcleo da mensagem (um ponto estratégico) e puxam
o olhar para aquele ponto;
a construção axial, quando o eixo do olhar é o centro da mensagem;
a construção em profundidade, quando a figura principal está à frente e é
integrada a uma cena dentro de um cenário em perspectiva;
a construção seqüencial, quando o olhar é conduzido (na maioria das vezes
por uma construção em Z) do alto, à esquerda, formando um Z até o final da
mensagem, no canto inferior direito.
A autora lembra que existem padrões de leitura visual, os quais conferem valores
diferentes às diversas localizações na página (ou tela), onde a direção do olhar seleciona
as informações-chave. Além disso, também deve ser lembrada a importância das cores
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na comunicação visual. Cada cultura efetua a valorização do espectro cromático às
necessidades da vida prática que assentam em princípios culturais simbólicos, como
mostrou Umberto Eco (1985), ou seja, princípios culturais e raciais que se situam no
espaço de percepção entre as categorias semióticas e os processos sensoriais.
Outros elementos relevantes numa mensagem publicitária são a diagramação e a
exploração das letras como comunicação visual. Tanto esses elementos quanto as
imagens em si estão ligados a certas características que nos permitem abordar
criticamente uma imagem publicitária ou analisá-la, como, por exemplo o grau de
iconicidade. Uma imagem é mais icônica que outra na medida em que tem mais
propriedades comuns com o próprio objeto, em termos de similaridade. Podemos citar
um conjunto de características que permitem uma diferenciação das diversas
propriedades de uma imagem:
qualidades técnicas
grau de figuração
grau de iconicidade
grau de complexidade
grau de ocupação do campo visual
espessura da trama e do grão
presença ou ausência da cor
dimensão estética e/ou originalidade
Nossa análise procurará levar em conta tais propriedades, lembrando ainda a
importância da originalidade que está diretamente ligada à proposta estética de uma
mensagem publicitária. Denise Guimarães (2007) lembra que, embora a publicidade e
arte sejam diferentes, ambas dividem o ideal estético da beleza e da inventividade.
Desse modo, muito embora a criação publicitária submeta-se a
diretrizes (do cliente, da agência, do público-alvo, entre outros), um
cartaz, um banner ou um anúncio esteticamente mal resolvido, por
exemplo, não atinge plenamente seus objetivos comunicacionais e
persuasivos. (2007, p.157)
Na peça em análise, é preciso salientar o papel da sinestesia, pois em se tratando de
propaganda de cerveja, é indispensável que as impressões ligadas ao tato (algo gelado) e
ao sabor apareçam nas imagens em questão. São estratégias de certa forma, bastante
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comuns ligadas ao imaginário ocidental. Da mesma forma, o clima do verão, época
ideal para o consumo da bebida, é enfatizado pelo uso das cores e pela imagem do calor
do SOL, que foi escolhido como nome do produto.
4.2 O registro verbal
A partir do nome do produto, observamos sua sonoridade e a exploração visual da
imagem formada pelas letras, ou seja, seus elementos icônicos. Deve ser enfatizada
também a diagramação das páginas que compõem o anúncio, onde se verifica uma
distribuição dos caracteres tipográficos muito adequada, informações precisas e
predominantemente denotativas sobre o produto.
As mensagens, de uma maneira geral, procuram fugir à redundância entre as
informações icônicas e os significados dos signos verbais, porém temos que admitir
que, no caso do anúncio em questão, a redundância observada é uma estratégia
necessária para que o efeito desejado seja conseguido.
4.3 O registro tátil
A interatividade da peça estudada depende basicamente do tato e por meio dele leva à
manipulação das páginas em sua materialidade.
Observa-se que a peça exige a alteração do seu estado de inércia para poder produzir
vários sentidos, que vão muito além de uma leitura passiva de uma propaganda
impressa. O que se apresenta então é a natureza complexa da linguagem interativa que
aproxima a natureza dos fenômenos da hipermídia, em função do volume de
informações a serem assimiladas e também dos percursos (links) possíveis de serem
seguidos.
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5. A INTERPRETAÇÃO,E A INTEGRAÇÃO DOS REGISTROS
Fig. 1: imagem inicial (por Fernanda R.
Pucci)
Figura 2: O gesto induzido (foto da
interação com a mensagem)
Figura 3: Imagem que ocupa 2 páginas
Figura 4: As três embalagens
A imagem da figura 1 e as que se seguem são de uma das peças da campanha
publicitária de lançamento da cerveja SOL no Brasil, desenvolvida pela agência Fisher
América. Trata-se de um encarte de revistas com papel diferenciado, mais grosso e mais
pesado que as páginas das revistas. Ao passar as folhas da revista o primeiro contato é
visual. A página salta aos olhos por suas cores fortes de amarelo em diferentes tons,
também laranja e vermelho da mensagem escrita. A imagem passa uma idéia de fogo,
de calor, e com um pouco mais de atenção nos remete ao SOL.
Em seguida o que nos chama a atenção são os buracos que a página possui e com o
toque das mãos já se sente a diferença de papel. Facilmente entende-se que os
buraquinhos estão ali para colocarmos nossa mão, idéia que se reforça ao lermos o texto
“Coloque seus dedos aqui e veja uma grande vontade se realizar.”
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Muitas pessoas, por curiosidade, colocam os dedos ali para ver a mensagem se
completar e descobrir, conforme sugere o texto, qual é o desejo, por outro lado há
pessoas que preferem ver logo a página seguinte mesmo sem colocar a mão no local
indicado.
Depois de tomarmos a atitude proposta e virarmos a página, o que acontece
naturalmente ao colocar os dedos nos buracos, vemos que estamos segurando naquela
mão uma garrafa de cerveja SOL. Mesmo aquelas pessoas que passaram a página sem
colocar a mão no lugar proposto acabam voltando e colocando para ver a mensagem e
ter a impressão de estar segurando a garrafa.
A imagem da garrafa posicionada ao centro da primeira metade da página é bastante
fiel, inclusive nas cores, a uma garrafa de cerveja, porém se nota que o fundo continua
amarelo cor de fogo, tom que ilumina a garrafa, dando uma sensação de calor, de verão.
Essa idéia de calor é transmitida também pelo suor da garrafa e pelo vapor que ela
expele como se o calor do ambiente estivesse criando um choque de temperaturas,
derretendo a água de fora da garrafa. Podemos notar facilmente as gotinhas escorrendo.
Tais gotas e outros elementos similares são os chamados iconogramas ou signos
iconográficos (segundo Umberto Eco). A representação iconográfica pode ser
reconhecida mundialmente, fazendo parte de um repertório de imagens já conhecidas o
que reforça o sentido de determinadas mensagens visuais.
No rótulo, visualizamos a logomarca SOL em vermelho, devidamente destacada com
contornos em preto e dourado, acima os símbolos de dinheiro e valor, ligados à idéia de
qualidade do produto, e um pouco mais acima o escrito indicativo de que a cerveja é do
tipo pilsen, a qual naturalmente possui uma coloração dourada.
Abaixo da logomarca está escrito apenas “Desde 1899”, o que demonstra certa tradição
na fabricação de cerveja, apesar de ser um lançamento no Brasil.
A garrafa não aparece nesta página por inteiro, seu fundo foi cortado e a boca também,
mas na página ao lado vemos a tampinha com gotas, como se também estivesse
molhada de suor. Seu formato é de SOL, como os de desenhos infantis, o que deixa
claro a intenção de relacionar com o nome da bebida e com o verão. Com isso
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percebemos que a mensagem ocupa a página dupla e a página direita complementa a
esquerda. A tampinha não está centralizada, e sim ao rodapé da página, o que faz
referência a um pôr do SOL, momento bastante oportuno para se consumir o produto no
verão. Nela está escrito “Essa vontade é demais” em uma fonte bastante grande e sóbria,
padrão até, por isso chama mais à atenção do que o texto que completa a mensagem. O
texto está logo acima da imagem da tampinha, no mesmo padrão da indicação da
primeira página. Está posicionado com certa inclinação para a esquerda como se
acompanhasse os raios do SOL. Nele tem os dizeres “Chegou SOL. Uma cerveja como
você sempre teve vontade de pedir. Nem forte, nem fraca. No ponto.” A mensagem
escrita não complementa as intenções da imagem, mas passa as informações básicas
sobre características da nova cerveja.
Este tipo de imagem que evoca um significado convencionalmente estabelecido
enquadra-se no que Umberto Eco classifica como artifícios próprios para suscitarem
emoções, por se tratarem de situações retóricas que não estão tradicionalmente
catalogadas entre os argumentos retóricos verbais. São bastante utilizados pela
publicidade em conjunto com os códigos verbais.
O fato de serem três imagens do mesmo produto, em diferentes embalagens que
conservam a identidade visual, pode também remeter à simbologia do número três, com
suas associações á ideia da perfeição, cujo exemplo marcante é a Santíssia Trindade.
Além disso, as opções cromáticas remetem às simbologias do fogo, quando ligadas à
fatores positivos de criação e vida.
Para concluir a mensagem viramos a página e ainda no mesmo fundo vemos as
variedades de embalagem da bebida. Agora a garrafa mais comum da cerveja aparece ao
centro e por inteira, não conseguimos ver seu fundo por ela estar com a base imersa em
gelo, ainda vemos ao lado esquerdo a embalagem de latinha e a versão long kneck à
direita, ambas também no gelo. Nesta página a bebida é o centro, inclusive a iluminação
em torno dela é bastante evidente com branco. O centro do SOL que compõe o fundo
está atrás da imagem das embalagens fazendo com que se evidenciem ainda mais em
primeiro plano.
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No canto inferior direito da página foi colocada a advertência obrigatória por lei para
bebidas alcoólicas, dizendo “Beba com moderação” em letras vermelhas de acordo com
o padrão de alerta.
6. CONCLUSÃO
Retomando a força da interação e o fato de exigir uma manipulação, com apelos ao tato,
texturas e a ênfase na dinâmica da resposta gestual do leitor podem concluir que a
mensagem publicitária analisada é bem construída. Percebe-se o uso eficiente de uma
retórica persuasiva, tanto no nível visual quanto no verbal. Devemos, contudo, assinalar
o uso repetido da imagem do produto, como uma redundância estratégica, porém muito
próxima aos estereótipos. O que realmente torna a mensagem original é o apelo ao
manuseio, que é bastante eficaz ao conduzir o leitor a interagir com a peça publicitária
aqui analisada.
O sucesso de qualquer marca depende de como ela se comunica com o seu público. É
preciso saber primeiro como o consumidor pensa, fala, sente e age, para despertar sua
atenção e penetrar em sua mente, tornando-se algo memorável e talvez até uma espécie
de mito. A propaganda analisada demonstra a consciência de que uma mensagem
original e adequadamente construída, quando eficazmente veiculada, pode assegurar o
melhor desempenho e rentabilidade do produto no mercado. Os componentes da cadeia
de valor da marca da cerveja SOL revelam, portanto, eficácia comunicativa e
persuasiva.
Referências bibliográficas
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RAZÓN Y PALABRA Primera Revista Electrónica en América Latina Especializada en Comunicación www.razonypalabra.org.mx
Libros Básicos en la Historia del Campo Iberoamericano de Estudios en Comunicación NÚMERO 75 FEBRERO - ABRIL 2011
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http://usr.psico.ufrgs.br/~aprimo/pb/tv.htm . Acesso em: 12/02/2008.
1 Mestranda do PPGCOM/UTP, coordenadora e professora do curso de Tecnologia em Marketing
INESUL/FIPAR, e professora de Publicidade e Propaganda FAPAR e-mail:[email protected].
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