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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PROCESSO PENAL: OS PRINCÍPIOS SOB A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL Por: Alexandra Santangelo Fernandes Orientador Prof. Carlos Afonso Leite Leocadio Rio de Janeiro 2009

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Page 1: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco, “jurisdição é ao mesmo tempo, poder função e atividade”.7 Segundo Moacyr

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PROCESSO PENAL: OS PRINCÍPIOS SOB A LUZ DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Por: Alexandra Santangelo Fernandes

Orientador

Prof. Carlos Afonso Leite Leocadio

Rio de Janeiro

2009

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PROCESSO PENAL: OS PRINCÍPIOS SOB A LUZ DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

Mestre – Universidade Candido Mendes como

requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Direito e Processo Penal.

Por: Alexandra Santangelo Fernandes

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AGRADECIMENTOS

A minha família, pelo suporte sempre,

aos professores, pelo saber e pelos

ensinamentos, aos companheiros de

turma, a Galera do Crime, pelas

incríveis horas de diversão, amizade e

harmonia proporcionadas e aos

amigos, tão solidários nos momentos

mais complicados.

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DEDICATÓRIA

Dedica-se a meus pais, aos

professores, aos amigos e aos

companheiros de turma.

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RESUMO

Os Princípios são pontos nevrálgicos da doutrina jurídica. Apesar de sua reconhecida importância, tanto para o estudo quanto para a aplicação em casos concretos, muitos operadores e até mesmo magistrados, desconhecem seus significados. A controvérsia sobre o assunto abordado no presente trabalho se inicia com a sua conceituação. Doutrinadores de renomado saber, se curvam a complexidade do tema, sempre apontando um novo aspecto a ser inserido e estudado. O caminho percorrido é permeado com diversos outros conceitos que irão complementá-lo, porém também poderão causar severos conflitos. O Processo Penal se inserirá neste bojo, dimensionando a importância da evolução histórica de seus procedimentos, demonstrando com isto, a necessidade e coerência de um aprofundamento nos estudos e na aplicação dos Princípios com o objetivo de trazer ao concreto a abstração doutrinária. Complementando a pesquisa, se faz primordial a esperada convergência à seara Constitucional, apresentando o equilíbrio máximo entre estes e suas normas, hierarquicamente, magnas em sua essência.

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METODOLOGIA

A presente monografia tem como pretensão focal e primeira, o

complemento de estudo e pesquisa àqueles que, em suas sagas pelo saber e

pelo melhor exercício operacional do Direito, clamam pelo entendimento de tão

nobre assunto.

O estudioso se apoia didaticamente, através da leitura de moderna

doutrina jurídica, associada e complementada pelo conhecimento histórico que

a permeia.

O primeiro capítulo versa sobre as considerações gerais do Processo

Penal, enfocando os conceitos fundamentais sobre Jurisdição, seus elementos

e suas características, o Processo Penal propriamente dito, concluindo com

densa explicação sobre os Sistemas Processuais, inquisitivo, acusatório e

misto, através de sua ordem cronológica de aparecimento.

O segundo capítulo disserta sobre a força normativa dos Princípios

Constitucionais. Se inicia com um breve relato de sua evolução histórica,

atravessando sobre a complexa conceituação de Princípio e sua controversa

diferenciação deste significativo, Regras e Normas, finalizando com a

importante interseção entre as searas do Processo Penal e da Constituição.

O terceiro e derradeiro capítulo condensa a importância dos Princípios

para o bom funcionamento do Ordenamento Jurídico, fazendo a exposição

clara e explicativa sobre os Princípios do Devido Processo Legal, do Estado de

Inocência, do Juiz Natural, do Contraditório e da Ampla Defesa, da Verdade

Real, da Vedação das Provas Ilícitas, da Publicidade, da Oficialidade e do

Duplo Grau de Jurisdição.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I – Breves Considerações Acerca do Processo Penal 10

CAPÍTULO II - A Força Normativa dos Princípios Constitucionais 20

CAPÍTULO III - Princípios Constitucionais do Processo Penal 27

CONCLUSÃO 39

BIBLIOGRAFIA 40

ÍNDICE 43

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INTRODUÇÃO

Como um consenso inicial, o princípio surgiu posteriormente ao

costume. Este possui sua fundamentação básica no Direito Natural, visto que

sua vigência não se vincula a existência de documentos ou preceitos escritos.

Os princípios se apresentam tão enraizados na cultura de uma

sociedade que poderá o leigo invocá-los por pura intuição. Porém, o operador

do Direito o fará pela sapiência do alcance e eficácia que estes postulados

possuem.1

Plácido E. Silva conceitua,

Princípio. É, amplamente, indicativo do começo ou da

origem de qualquer coisa. Princípios. No sentido jurídico,

notadamente no plural, quer significar as normas

elementares ou os requisitos primordiais instituídos como

base, como alicerce de alguma coisa. (...) Princípios

jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que

servem de ponto de partida ou de elementos vitais do

próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito.2

Os princípios são enunciados que apontam o entendimento do

ordenamento jurídico de uma sociedade, seja para sua aplicação e

composição, seja para a alteração ou criação de novas normas.

Esta compreensão poderá surgir de forma explícita, isto é, através de

citação clara em lei, poderá vir de forma implícita, ou seja, extraídas da

interpretação de todo um conjunto.3

1 ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Breves anotações sobre o princípio da ampla defesa. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em : http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3166. Acesso em: 31 jul. 2009. 2 SILVA, Plácido E. Vocabulário jurídico, Vol. III e IV. 1.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989. 3 OLIVEIRA, Flávio Cardoso de. Direito processual penal. Coleção OAB nacional primeira fase. São Paulo: Saraiva, 2009., p.19

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A finalidade mediata do processo penal, assim como a do direito penal,

é a proteção da sociedade, a paz social, a defesa dos interesses jurídicos, a

convivência harmônica. O fim mediato é a realização da pretensão punitiva do

Estado, através da intervenção do Juiz, advinda da prática de ato criminoso.

Assim, na seara processual penal, os princípios alcançam um status

ainda mais profundo. Nesta, o bem fundamental a ser protegido e/ou atacado é

o da liberdade do indivíduo. Logo, demonstra-se neste ponto, a interseção com

a demanda constitucional, sendo esta tutela uma garantia fundamental.

A presente monografia possui o propósito de clarificar o assunto. Se

iniciará com uma abordagem diretiva ao Processo Penal, passando pela força

normativa dos Princípios Constitucionais e finalizando com os Princípios

Constitucionais do Processo Penal.

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CAPÍTULO I

BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PROCESSO

PENAL

1.1 – INTRODUÇÃO

É sabido que, ao ser praticada uma conduta tipificada como crime,

surgirá para o Estado o chamado jus puniendi, ou seja, a pretensão deste de

puni-lo. A partir deste momento, criar-se-á um conflito de interesses, uma vez

que esta ação se chocará com o status libertatis do indivíduo, tido como autor

da referida conduta.

A este conflito de interesses, dar-se-á o nome de lide penal, a qual

deverá ser resolvida em juízo, impondo o Estado ou o particular, em casos

devidamente especiais, sua pretensão através da provocação da tutela

jurisdicional, isto é, a ação penal, e o indivíduo sua pretensão de permanecer

em liberdade.4

Toda pessoa possui o direito de provocar o exercício da jurisdição

para que vislumbre a solução do conflito em que é parte. Partindo desta

premissa, serão objetivamente abordados no decorrer deste capítulo, os temas

basilares acerca do Processo Penal.

1.2 – JURISDIÇÃO

4 MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. 3.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002, p. 54.

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1.2.1 - Conceito

A palavra jurisdição deriva do latim jurisdictio, ou seja, é a dicção ou

ato de dizer (dictio) do que é direito (juris). Simplificando, o exercício da

jurisdição é o dizer qual e como é o direito, isto é, administrar a justiça.5

O Promotor Edilson Mougenot Bonfim relata que a doutrina moderna,

traz a jurisdição através de 03 (três) acepções: Poder, atividade e função.

Primeiramente, o termo em questão é utilizado para designar o próprio

poder investido em determinada entidade que praticará o ato, em outras

palavras, poder estatal de aplicar o direito objetivo a um caso concreto, com o

objetivo de restaurar a paz social, através da solução justa do conflito de

interesses.

Seguindo este raciocínio, o exercício do poder de dizer o direito não é

realizado em apenas um ato e, sim, um conjunto de atos indiretamente

relacionados à determinação de qual norma jurídica a ser aplicada e à

imposição desta decisão. Atividade jurisdicional é este conjunto de atos

próprios ao órgão que exerce a jurisdição, constituindo portanto a segunda

acepção do termo.

E, por último, mais do que um poder e/ou uma atividade, a jurisdição é

um serviço que, de forma obrigatória, deve ser disponibilizado à sociedade,

tendo também o poder de invocar a manifestação do Poder Judiciário,

diretamente, ou através dos órgãos que a represente.6

Desta concepção também compactuam Ada Pellegrini, Antônio Carlos

de Araújo Cintra e Cândido Rangel Dinamarco, “jurisdição é ao mesmo tempo,

poder função e atividade”.7

Segundo Moacyr Amaral dos Santos,

A jurisdição é uma das funções da soberania do Estado, função de poder, do poder judiciário. Consiste no poder

5 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006, p.15. 6 Id. Ibid., p.16-17. 7 GRINOVER, Ada Pellegrini; CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Candido Rangel. Teoria geral do processo. 21.ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.139.

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12de atuar o direito objetivo, que o próprio Estado elaborou, compondo os conflitos de interesses e dessa forma resguardar a ordem jurídica e a autoridade da lei.8

A Drª. Gisele Leite recorre à história para explicar a origem da função

estatal da jurisdição:

A jurisdição (jus dicere), dicção do direito, sempre foi considerada uma função estatal. Era exercido pelo próprio rei, imperador, por seus delegados, ministros ou funcionários, como sucedeu em Roma, ou pelo povo como acontecia entre os germânicos nas suas assembléias Ding, fato que tais pessoas personificavam o poder soberano que compreendia a jurisdição. É inegável o seu caráter público bem como o interesse do Estado em declarar e atuar o direito objetivo em relação a uma concreta pretensão.9

Finalizando, o saudoso professor Ovídio Baptista da Silva corrobora

afirmando que “o ato jurisdicional é praticado pelo Juiz, que o realiza por dever

de função” 10, se realizando por meio do devido processo legal.

1.2.2 – Elementos que compõe a jurisdição

O poder jurisdicional é composto por um rol de poderes concretos

atribuídos a pessoa do Juiz, que lhe permitem a interferência efetiva na lide

processual. Esta lista possui 05 (cinco) elementos - cognitio ou notio, vocatio,

coertio ou coertitio, judicium e executio - que serão expostos a seguir.

Cognitio ou notio significa conhecimento. É o poder atribuído ao Juiz

para que este se faça conhecer do processo, ou seja, para que este determine

a prática de atos que o colocará em contato com fatos que compõem o litígio.

Assim, este terá condições de aplicar o direito cabível a determinado caso

8 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 24.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p.67. 9 LEITE, Gisele. Desenvolvimento do direito processual. Jus Vigilantibus. Vitória, 19 ago. 2004. Disponível em: http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/2165. Acesso em 28 jul. 2009. 10 BAPTISTA DA SILVA, Ovídio. Teoria geral do processo civil. São Paulo: RT, 2002, p.73.

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13concreto, através das decisões de mérito, exercendo o controle sobre a

regularidade do processo, investigando a ocorrência dos pressupostos de

existência e de validade desta relação processual, além das condições de

procedibilidade e de ação.

Vocatio designa o chamamento. É o poder do órgão investido da

jurisdição fazer as pessoas comparecerem em juízo, quando esta presença se

torna fundamental ao andamento do processo.

Coertio ou coertitio determina coerção. É o poder de impor a

realização dos atos necessários para a eficácia dos provimentos judiciais,

mediante a aplicação de medidas coercitivas.

Judicium quer dizer juízo. É o poder de julgar os fatos concretos

através da abstração da lei, determinando-os a devida qualificação jurídica.

Executio significa execução. É o poder de fazer cumprir as sentenças

e/ou acórdãos proferidos jurisdicionalmente.11

1.2.3 – Características da jurisdição

A jurisdição possui 04 (quatro) características importantes:

Substitutividade, definitividade, inércia e indivisibilidade.

Entende-se por substitutividade, o poder do Estado de solucionar o

conflito, impondo-o coativamente. Salvo em casos expressamente autorizados

por lei, é defesa às partes a autotutela para o seu litígio, isto é, o que o Estado

determina ser o direito, substitui-se à vontade das partes, frente ao caso

concreto.

Por definitividade, assegura-se o poder do Estado da imutabilidade de

decisão já proferida em juízo, ou seja, as decisões jurisdicionais finais fazem

coisa julgada (res judicata), não podendo ser atacadas novamente. Vale

ressaltar que, na seara Penal, enquanto uma decisão final absolutória adquire

a imutabilidade ao transitar em julgado, as decisões condenatórias não se

submetem ao mesmo efeito, podendo ser rescindidas quando houver novos

11 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.17-18.

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14fatos a serem apurados (revisão criminal), desde que os efeitos sejam

favoráveis ao condenado, visando proteger o direito fundamental da liberdade.

Explicando a inércia, o pronunciamento do Estado, exercendo a

jurisdição, não ocorre de forma espontânea, isto é, depende da provocação do

interessado em obter a manifestação deste poder.

Indivisibilidade, ou seja, a jurisdição é uma e indivisível, sendo uma

manifestação soberana. Esta visa facilitar a distribuição do trabalho entre os

diversos órgãos do Estado, além de facilitar a abordagem didática dos temas a

ela relacionados.12

1.3 – FUNDAMENTOS SOBRE O PROCESSO PENAL

A ação é direito inerente a todo e qualquer indivíduo, independente de

sexo, credo, cor ou nível social. Sua provocação se faz necessária a jurisdição,

para que esta possa vir a solucionar o conflito entre as partes.

Jurisdição, como já pautado anteriormente, é função constitucional do

Estado, sendo esta inerte, demandando de solicitação da parte interessada.

O processo é o instrumento de atuação da ação, sendo a ação o

elemento detonador da jurisdição.

A tutela jurisdicional é o objeto do processo penal. A lide se origina da

colisão entre a pretensão de punir do Estado e o estado de liberdade do autor

do fato.13

A finalidade mediata do processo penal se mistura com a do direito

material penal, uma vez, que ambas visam a proteção da sociedade, a paz

social, a defesa dos interesses jurídicos e o bem-estar harmônico no território

da nação. O fim imediato é lograr, mediante a intervenção do Juiz, a realização

da pretensão punitiva do Estado em face de uma prática criminosa.

12 Id. Ibid., p.18-19. 13 MALCHER, José Lisboa da Gama., Op. Cit.,p.54.

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15

O alcance conclusivo desejado para solucionar o litígio penal, deverá

estar calcado o mais próximo possível da verdade dos fatos, tendo que o Juiz

apurar com exatidão e parcialidade, a fim de aplicar com justiça os sabores da

lei.14

1.4 – SISTEMAS PROCESSUAIS

Ao longo da evolução histórica do Direito, 03 (três) sistemas

processuais se destacaram seguindo as formas como se apresentam e os

princípios que os informam: Inquisitivo, acusatório e misto.

1.4.1 – Sistema Inquisitivo ou Inquisitorial

O Sistema Inquisitivo ou Inquisitorial tem sua origem no Direito

Romano que, através da influência da organização do Império, se permitiu ao

Juiz a iniciação do processo de ofício.

Na Idade Média se revigorou, visando repelir a repressão criminal dos

acusadores privados.

Se expandiu pela Europa a partir do século XV, frente a influência do

Direito Penal Canônico, tendo entrado em declínio com a Revolução

Francesa.15

Esta é uma forma de processo que oferece poucas garantias às partes

quanto a imparcialidade da decisão e sua devida objetividade. Aqui não existe

a figura de Búlgaro, o qual distingue as partes em órgão acusador, órgão

julgador e réu.

14 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 16.ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.43. 15 Idem.

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16O Juiz se confunde com o órgão acusador, pois pode criar suas

próprias suspeitas, inexistindo forma de imparcialidade. O inquisidor não busca

convencer ou ser convencido. Este visa convencer os demais de sua certeza

íntima já pré-formada. É um pré-julgamento, exercido por uma das partes.

A relação neste tipo de sistema é linear, ou seja, em uma ponta se

encontra o Juiz-autor e na outra o réu. Enquanto a um cabe a decisão, ao

outro somente restará a sujeição. Não há quaisquer pretensões das partes,

examina-se tão somente a presunção da parte dominante. Há o poder e a

sujeição, não havendo justiça.16

No Sistema Inquisitivo ou Inquisitorial inexistem regras de igualdade e

liberdade processual. O processo é, geralmente, escrito e secreto, se

desenvolvendo em fases por impulso oficial. A confissão é elemento suficiente

para a condenação, admitindo, inclusive, a tortura. Não há atuação das

garantias individuais, impossibilitando de vigorar em um sistema democrático

de Governo.17

1.4.2 – Sistema Acusatório

O Sistema Acusatório tem sua origem na Grécia em Roma. Floresceu

na Inglaterra e na França, após a Revolução Francesa. Fundamenta-se na

acusação oficial, embora se permita, excepcionalmente, a iniciativa da vítima,

de parentes próximos e do povo.

No direito moderno, este implica o estabelecimento de uma relação

processual verdadeira (actum trium personarum), com a trilogia distinta das

figuras do Juiz, autor e réu, os 02 (dois) últimos em igualdade de garantias e o

1° se sobrepondo a estes, como órgão imparcial da lei.18

O Direito Brasileiro, em parte, adota este tipo de sistema para sua

seara processual penal. Este assegura os direitos individuais constitucionais e

a plena defesa, parificado Estado e acusado, situando-os em um mesmo plano

16 MALCHER, José Lisboa da Gama., Op. Cit.,p.55-56. 17 MIRABETE, Julio Fabbrini., Op. Cit., p.43. 18 Id. Ibid., p.43-44.

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17de interesses e pretensões. Exemplos claros estão nos dispositivos

constitucionais 5°, incisos LIII, LV, LIX, LX e 92 a 126.

A titularidade da pretensão punitiva recai sobre o Estado-

Administração ou ao particular a quem a lei defira o exercício da ação. Ao réu

cabe a pretensão de manter sua liberdade frente a pretensão punitiva

mencionada. Ao Estado-Juiz, no encargo de função superior e de natureza

constitucional, caberá decidir o litígio.

Neste sistema, o juiz impulsionará o processo em busca da formação

da certeza, da Verdade Real, de maneira imparcial, absorvendo-o e

abastecendo-o de elementos que visam contribuir para a solução do conflito. O

Juiz não tem contato com as partes, e sim com suas pretensões, conhecendo-

as através dos pedidos manifestados no processo.19

Segundo o doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho, são traços

marcantes do Sistema Acusatório:

a) o contraditório, como garantia político-jurídica do cidadão; b) as partes acusadora e acusada, em decorrência do contraditório, encontram-se em pé de igualdade; c) o processo é público, fiscalizável pelo olho do povo; excepcionalmente permite-se uma publicidade restrita ou especial; d) as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas e, logicamente, não é dado ao juiz iniciar o processo (ne precedat judex ex officio); e) o processo pode ser oral ou escrito; f) existe, em decorrência do contraditório, igualdade de direitos e obrigações entre as partes, pois non debet licere actori, quod reo non permittiur; g) a iniciativa do processo cabe à parte acusadora, que poderá ser o ofendido ou seu representante legal, qualquer cidadão do povo ou um órgão do Estado.20

De acordo com o Procurador Júlio Fabbrini Mirabete,

A doutrina tem procurado distinguir certos princípios característicos do Processo Penal Moderno,

19 MALCHER, José Lisboa da Gama., Op. Cit.,p.56. 20 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. São Paulo: Javoli, 1980, p. 63-64.

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18principalmente no que se refere ao Sistema Acusatório. Tais princípios, porém, não são exclusivos desse sistema e a ausência ou atenuação de alguns deles não o descaracterizam. Os principais são os do estado de inocência , do contraditório, da verdade real, da oralidade, da publicidade, da obrigatoriedade, da oficialidade, da indisponibilidade do processo, do juiz natural e da iniciativa das partes.21

1.4.3 – Sistema Misto ou Acusatório Formal

O Sistema Misto ou Acusatório Formal teve suas primeiras regras

introduzidas com as reformas da Ordenança Criminal de Luiz XIX, em 1670.

Porém, foi em 1808 com o Code d’Instruction Criminelle (Código Processual

Francês) que este tomou reais proporções. Sob a égide da época napoleônica,

espalhou-se pela Europa Continental no século XIX.22

Este sistema é constituído de 02 (duas) partes, uma instrução

inquisitiva, de investigação preliminar e instrução preparatória, realizada de

forma secreta pelo Juiz, e de um posterior juízo contraditório, de julgamento,

com a oralidade, admitindo o contraditório entre as partes e a publicidade.

O Sistema Misto existiu no Direito Pátrio, através dos procedimentos

de contravenções e dos crimes de homicídio e lesão corporal culposa sujeitos

à Lei n° 4.611/65, até o advento dos Juizados Especiais. 23

Este é ainda o sistema utilizado em vários países da Europa e da

América Latina.

21 MIRABETE, Julio Fabbrini., Op. Cit., p.44. 22 Idem. 23 MALCHER, José Lisboa da Gama., Op. Cit.,p.57.

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CAPÍTULO II

A FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS

CONSTITUCIONAIS

2.1 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Após a superação do Jusnaturalismo, ou seja, a corrente filosófica que

acreditava na existência de um Direito Natural legitimado por uma ética

superior, e o fracasso político do Positivismo Jurídico, isto é, a corrente

filosófica que apostava na vinculação estrita do Direito à norma como um ato

estatal de caráter imperativo e coercivo, sem vínculos com os valores morais,

surgirá uma nova ordem jurídica, o Pós-Positivismo.24

Na segunda metade do século XX, o Pós-Positivismo vem como uma

resposta aos fundamentos abstratos do Jusnaturalismo e à destoante

separação do Direito e da ética, proposta pelo Positivismo Jurídico. Esta

promoverá um retorno aos valores basilares, reaproximando a ética ao Direito,

considerando os novos conceitos e resgatando a idéia da justiça e da

legitimidade originárias da corrente jusnaturalista.

No âmbito deste contexto, os valores compartilhados por toda uma

sociedade também passam a vigorar e a constituir no ordenamento jurídico.

Estes se apresentam tanto de forma explícita quanto de forma implícita,

materializando os princípios ideológicos sociais e seus postulados. A corrente

24 BARROSO, Luis Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. Fortaleza: Revista Diálogo Jurídico, 2001, p. 13 e 24.

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20pós-positivista traz em seu bojo o reconhecimento da normatividade dos

princípios.25

2.2 – CONCEITUAÇÃO

A expressão Princípio, na ciência do Direito, é fruto de grande

controvérsia. Etimologicamente, origina-se do latim, principium, compondo-se

de 02 (dois) significantes: primus (primeiro) e cipium, que provém de capio

(pegar ou considerar). Logo, seria o ponto de partida de um conhecimento,

sua devida análise e interpretação.26

Nos primórdios de 1952, o jurista italiano Vezio Crisafuli , através de

seus estudos na seara constitucional, trouxe a seguinte conceituação:

Princípio é, com efeito, toda norma jurídica, enquanto considerada como determinante de uma ou de muitas outras subordinadas, que a pressupõem, desenvolvendo e especificando ulteriormente o preceito em direções mais particulares (menos gerais), das quais determinam, e portanto resumem, potencialmente, o conteúdo: sejam, pois, estas efetivamente postas, sejam, ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as contém.27

De forma catedrática, o professor Celso Antônio Bandeira de Mello

define o tema como um:

Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência,

25 DIAS, Clara. Princípios norteadores do processo penal brasileiro. Web Artigos. Goiânia, 08 abr. 2008. Disponível em: http://www.webartigos.com/articles/5262/1/principios-norteadores-do-processo-penal-brasileiro/pagina1.html. Acesso em 29 jul. 2009. 26 YACOBUCCI, Guilhermo J. El sentido de los princípios penales. Buenos Aires: Ábaco de Rodolfo Desalma, 2002, p.58-59. 27 Apud BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7.ed.. São Paulo: Malheiros, 1998, p.230.

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21exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico (...).28

O Dr. Manoel Gonçalves Ferreira Filho ensina que,

(...) os juristas empregam o termo ‘princípio’ em 03 (três) sentidos de alcance diferente. Num primeiro seriam ‘supernormas’, ou seja, normas (gerais ou generalíssimas) que exprimem valores e que por isso, são pontos de referência, modelos, para regras que as desdobram. No segundo, seriam standards, que se imporiam para o estabelecimento de normas específicas – ou seja, as disposições que preordenem o conteúdo da regra legal. No último, seriam generalizações, obtidas por indução a partir das normas vigentes sobre determinada ou determinadas matérias. Nos 02 (dois) primeiros sentidos, pois, o termo tem conotação prescritiva; no derradeiro, a conotação é descritiva: trata-se de uma ‘abstração por indução’.29

Visando um conceito mais didático e condizente a doutrina brasileira,

Edílson Mougenot Bonfim entende,

Os princípios do processo penal – ou princípios informativos do processo penal – como aquelas normas que, por sua generalidade e abrangência, irradiam-se por todo o ordenamento jurídico, informando e norteando a aplicação e a interpretação das demais normas de direito, ao mesmo tempo em que conferem unidade ao sistema normativo e, em alguns casos, diante da inexistência de regras, resolvendo diretamente os conflitos. Destarte, quando tais normas (princípios) conferem garantias de cunho fundamental (direitos fundamentais) aos jurisdicionados, alude-se então às garantias fundamentais, que, em sede de processo penal, configuram as garantias processuais. Bem se vê, daí, o diálogo constante e a difícil separação da expressão ‘princípios’ e ‘garantias’.30

28 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: RT, 1991, p.230. 29 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direito constitucional do trabalho – Estudos em homenagem ao prof. Amauri Mascaro do $ascimento. Vol. I. São Paulo: LTR, 1991, p.73-74. 30 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p. 34-35.

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22

2.3 – NORMAS, PRINCÍPIOS E REGRAS

Por longo tempo, a doutrina fez uma dissociação entre os conceitos de

normas e princípios. Com os estudos de Robert Alexy e de Ronald Dworkin,

esta diferenciação foi ultrapassada.

O professor Luis Roberto Barroso disserta que a teoria geral do Direito

Moderno avaliza que as normas jurídicas (gerais) e as normas constitucionais

(em particular) podem ser enquadradas em 02 (duas) categorias: Normas-

disposição e normas-princípio.

Por normas-disposição, entendem-se as regras, isto é, aquelas de

eficácia restrita a situações específicas. Por normas-princípio, entendem-se os

princípios propriamente ditos, ou seja, aquelas que possuem grande poder de

abstração e finalidade clara e objetiva.31

O jurista italiano Norberto Bobbio associa os princípios do Direito no

vasto conceito de normas, como se apresenta:

Os princípios gerais são apenas, a meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha a questão entre juristas se os princípios gerais são normas. Para mim não há dúvida: Os princípios gerais são normas como todas as outras.32

A classificação pós-positivista encara a norma como gênero do qual

são espécies as regras e os princípios, sendo que estes se diferenciam de

forma lógica e qualitativa.

O jurista português José Joaquim Gomes Canotilho estabelece os

seguintes critérios para esta diferenciação:

31 BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e aplicação da constituição. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p.141.

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23a) O grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstracção relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstracção relativamente reduzida;

b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador ? do juiz ?), enquanto as regras são susceptíveis de aplicação direta;

c) Carácter de fundamentalidade no sistema de fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito);

d) ‘Proximidade da idéia de direito’: os princípios são standards juridicamente vinculantes radicados nas exigências de ‘justiça’ (DWORKIN) ou na ‘idéia de direito’ (LARENZ); as regras podem ser normas vinculantes com um conteúdo meramente formal;

e) Natureza normogenética: os princípios são fundamentos de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.33

O doutrinador Willis Santiago Guerra Filho explica que a distinção

entre regras e princípios repousa em uma resposta simples. As primeiras

descrevem uma situação jurídica, vinculando hipóteses específicas e

preenchendo pressupostos definitivos. Já os últimos expressam um valor ou

uma diretriz, sem possuir uma situação jurídica específica. Há aqui um alto

grau de abstração. Estas são diferenças quantitativas e qualitativas.34

2.4 – PRINCÍPIOS, PROCESSO PENAL E CONSTITUIÇÃO

32 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 7.ed. Brasília: UNB, 1996, p. 159. 33 Apud ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. São Paulo: RT, 1999, p. 65. 34 GUERRA FILHO, Willis Santiago (coord.). Direitos fundamentais, processo e princípio da proporcionalidade. In: Dos Direitos Humanos aos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p.17.

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24

Os princípios representam os postulados fundamentais de uma política

processual penal de um Estado. Estes sofrem oscilações e mudanças

conforme o regime político adotado pela máquina estatal.

No Brasil, vivemos sob a égide do regime democrático. Com isso, os

princípios que regem o Processo Penal deverão estar de acordo com liberdade

individual do indivíduo (jus libertatis), tido como valor absoluto pela

Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988.35

Deve-se ter, ainda, especial atenção aos conceitos contidos no artigo

1°, incisos II e III da CRFB/88 respectivamente. Não é possível se conceber um

processo penal que não possua seu norte através da cidadania, seja da vítima

ou de seus familiares, quanto do indiciado, réu ou sentenciado. Este sistema

deverá ser inclusivo e não exclusivo. Também se torna inimaginável este

mesmo processo sem o respeito a dignidade da pessoa humana.

Segundo a coletânea de explicações citadas no livro de Práticas de

Cidadania de Jaime Pinsky,

Cidadania, o direito a ter direitos na clássica visão de Hannah Arendt, é um conceito técnico para as ciências jurídicas. Para Alexandre de Moraes, “a cidadania representa um status do ser humano, apresentando-se, simultaneamente, como objeto e direito fundamental das pessoas”. “ Cidadania (““...) qualifica os participantes da vida do Estado, é atributo das pessoas integradas na sociedade estatal, atributo político decorrente do direito de participar no governo e direito de ser ouvido pela representação política”, segundo José Afonso da Silva.36

A pessoa humana é o sujeito do processo penal e não o seu objeto. A

solução da lide penal, vinculada através do processo, deverá estar atrelada a

35 DIAS, Clara. Idem. 36 PINSKY, Jaime. Práticas de cidadania. 1.ed., São Paulo: Contexto, 2004, p. 11-12.

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25recuperação e inserção social do condenado. Não se admite mais um Direito

Penal reativo e vingativo.37

Inúmeros são os princípios que norteiam o Processo Penal Brasileiro,

encontrando-se determinados tanto pela Constituição da República Federativa

do Brasil quanto pelo Código de Processo Penal.

A presente monografia, em seu próximo e derradeiro capítulo, tratará

tão somente dos princípios que vislumbram o processo penal através da visão

constitucional, sendo este o ponto principal desta pesquisa.

37 ARAS, Vladimir. Princípios do Processo Penal. Jus Navigandi. Teresina, ano 6, n.52, nov. 2001.

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26

CAPÍTULO III

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO

PENAL

3.1 – A IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS

Todo e qualquer ordenamento jurídico bebe das fontes seguras dos

princípios basilares que os norteiam. Estes estão para o Direito, assim como os

acordes estão para uma música ou o amor para um romance.

Segundo o mestre Geraldo Ataliba,

Os princípios são a chave e essência de todo direito; não há direito sem princípios. As simples regras jurídicas de nada valem se não estiverem apoiadas em princípios sólidos.38

Celso Bandeira de Mello reafirma a importância dos princípios ao dizer

que violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma, pois

isto implicará em uma ofensa não somente a um mandamento obrigatório

específico, mas a todo um sistema se comandos.39

Seguindo esta linha de raciocínio, os princípios que espelham a carta

magna de uma sociedade, vislumbram de um status ainda de maior

importância e grandeza.

Explicitando de maneira conclusiva, Luis Roberto Barros informa que,

Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2416. Acesso em: 29 jul. 2009. 38 Apud LEMES, Selma Maria Ferreira. Princípios e origens da lei de arbitragem, n° 51. São Paulo: Revista dos Advogados de São Paulo, 1997, p.32. 39 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Op. Cit., p.300.

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27Os princípios constitucionais são, precisamente, a síntese dos valores principais da ordem jurídica. A Constituição (...) é um sistema de normas jurídicas. Ela não é um simples agrupamento de regras que se justapõem ou que se superpõem. A idéia de sistema funda-se na de harmonia, de partes que convivem sem atritos. Em toda ordem jurídica existem valores superiores e diretrizes fundamentais que ‘costuram’ suas diferentes partes. Os princípios constitucionais consubstanciam as premissas básicas de uma dada ordem jurídica, irradiando-se por todo sistema. Eles indicam o ponto de partida e os caminhos a serem percorridos.40

Nessa perspectiva, se encontram inseridos os Princípios

Constitucionais do Processo Penal. Estes podem ou não estar previstos

legalmente, porém, todos são positivados, visto que possuem vigência

sociológica.

O rol dos princípios constitucionais que serão expostos a seguir não se

é taxativo, pelo contrário, modifica-se e amplia-se constantemente, dado o

caráter aberto e abstrato que qualifica a sua textura.

3.2 – PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

Sua origem remota à Carta Magna inglesa de 1215, que estabelecia a

garantia da aplicação de sanção só poderia ser efetuada de acordo com a lei

da terra (by the law of the land).

A expressão foi alterada em 1355, pelo Rei Eduardo III. Esta garantia

passou para as colônias americanas e, posteriormente foi incorporada pelo

sistema constitucional federal dos EUA .41

40 BARROSO, Luis Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição Brasileira. 2.ed., Rio de Janeiro: Renovar, 1983., p. 285. 41 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. Cit., p.29.

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28Possui seu fundamento legal no artigo 5°, inciso LIV da CRFB/88,

“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo

legal”.42

A expressão Devido Processo Legal é derivada da expressão inglesa

due processo of law. Esta garante que o conteúdo da jurisdicionalidade é a

legalidade (nullus actum sine lege), isto é, a obediência rígida ao previamente

estabelecido em lei.43

Inicialmente, sua finalidade era a proteção individual, através de uma

limitação ao poder.

A doutrina moderna considera este princípio como uma cláusula

aberta e indeterminada, porém possui conteúdo, o qual a jurisprudência

reconhece e aplica aos casos concretos.44

Vista também como uma cláusula de segurança do sistema jurídico,

esta possui 02 (dois) importantes aspectos ínsitos: Devido processo legal em

sentindo material ou substancial e devido processo legal em sentido formal ou

processual.

O devido processo legal em sentido material ou substancial se refere

ao direito material de garantias fundamentais do cidadão, ou seja, protege o

particular contra qualquer atividade estatal arbitrária, desproporcional ou não

razoável que constitua violação a qualquer direito fundamental.

O devido processo legal em sentido formal ou processual possui como

conteúdo, certas garantias de natureza processual, conferidas às partes tanto

no trâmite processual quanto em sua relação com o Poder Judiciário. O

acusado assegura-se de ser processado, através de forma legalmente

prevista, reconhecendo no processo penal sua instrumentalidade e sua

natureza constitucional.

Assim, o Princípio do Devido Processo Legal constitui um conjunto de

garantias que possibilitam às partes, o exercício pleno de seus direitos,

poderes e faculdades processuais.45

42 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Código penal, código de processo penal, legislação penal e processual penal, constituição federal. 10.ed. ver., ampl. e atual., São Paulo: RT, 2008. 43 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.38-39. 44 MIRABETE, Julio Fabbrini. Idem.

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29

3.3 – PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA, DA PRESUNÇÃO

DE INOCÊNCIA OU DA NÃO-CULPABILIDADE

Aparece como conseqüência direta do Princípio do Devido Processo

Legal46

Este princípio se positiva pela primeira vez no artigo 9° da Declaração

dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, em Paris. Teve como base

inspiratória a era iluminista. Foi reafirmado através do artigo 26 da Declaração

Americana de Direitos e Deveres e do artigo 11 da Declaração Universal dos

Direitos Humanos, ambas de 1948 em Paris.47

Possui seu fundamento legal no artigo 5°, inciso LVII da CRFB/88,

“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença

penal condenatória”.48

Baseando-se na dissertação deste dispositivo, a terminologia

‘presunção’ não seria a mais adequada, visto ter como significado o liame

entre o fato provado ou indício e o fato probando.

O princípio referido reconhece um estado transitório de não-

culpabilidade, visto este alegar uma permanência de status processual até o

trânsito em julgado de uma sentença condenatória.49

A partir do exposto, o doutrinador Julio Fabbrini Mirabete chega a 03

(três) conclusões:

a) a restrição à liberdade do acusado antes da sentença definitiva só deve ser admitida a título de medida cautelar, de necessidade ou conveniência, segundo estabelece a lei processual; b) o réu não tem o dever de provar sua inocência; cabe ao acusador comprovar a sua culpa;

45 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.39-40. 46 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. Cit., p.44. 47 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.44. 48 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem. 49 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.44-45.

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30c) para condenar o acusado, o juiz deve ter a convicção de que é ele responsável pelo delito, bastando, para a absolvição, a dúvida a respeito de sua culpa (in dúbio pro reo).50

3.4 – PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL

Possui seu fundamento legal no artigo 5°, incisos LIII e XXXVII da

CRFB/88, “Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade

competente” e “Não haverá juízo nem tribunal de exceção”.51

Os dispositivos são auto-explicativos, ou seja, é vetada a criação de

qualquer outro órgão para julgar causa penal já estabelecida, senão o juiz

natural, derivando seu poder da própria constituição.

3.5 – PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

Apesar de serem 02 (dois) princípios independentes, estes se

apresentam de forma complementar. Devido a esta particularidade, serão

abordados em um mesmo tópico.

Ambos possuem o fundamento legal no artigo 5°, inciso LV da

CRFB/88, “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos

acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os

meios e recursos a ela inerentes”.52

O Princípio do Contraditório tem como corolário o fato que cada ato

praticado durante o processo deverá ser resultante da participação ativa das

partes (audiatur et altera pars). É relevante que, antes de proferir a decisão, o

Juiz ouça as partes, dando-lhes igual oportunidade para que se manifestem,

50 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. Cit., p.45-46. 51 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem.

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31com a devida apresentação dos argumentos e contra-argumentos. Estas

poderão se posicionar, ainda de forma igualitária, em via recursal, caso

acreditem ser necessário. Há aqui uma bilateralidade de atos e termos

processuais.

O Princípio da Ampla Defesa se consubstancia no direito das partes

de oferecer argumentos em seu favor e de demonstrar-los nos limites da

possibilidade processual. Esta defesa poderá ser exercida de 02 (duas)

formas: Defesa técnica e autodefesa.

Entende-se por defesa técnica aquela exercida por um advogado

habilitado, constituído ou nomeado, em nome do acusado. É indisponível e

garante a paridade de armas no processo.

Por autodefesa, compreende-se aquela exercida diretamente pelo

acusado. É dispensável, tendo como objetivo assegurar ao réu o direito de

influir diretamente na formação da convicção do Juiz (Direito de Audiência) e o

direito de se fazer presente nos atos processuais (Direito de Presença).53

3.6 – PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

Este princípio tem a finalidade de estabelecer que o jus puniente seja

exercido, somente, em face daquele que praticou o ato criminoso e nos exatos

limites do ocorrido.

No processo penal, se busca algo além da verdade formal. O bem

maior em jogo nesta seara é o da liberdade do indivíduo, sendo esta uma

garantia constitucional.

Decorre do Princípio da Verdade Real, o dever do Juiz de dar o

seguimento à relação processual quando da inércia da parte e de determinar

ex officio as provas necessárias à instrução do processo.54

52 Idem. 53 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.41-43. 54 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. Cit., p.47.

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32Segundo Flávio Cardoso de Oliveira, este princípio comporta algumas

exceções no processo penal:

a) impossibilidade de apresentar documentos no Plenário

do Júri, sem ter dado ciência à outra parte, no mínimo,

três dias antes (art. 479 do CPP);

b) impossibilidade de revisão criminal em favor da

sociedade (art. 621 do CPP);

c) inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos

(art. 5°, LVI da CF);

d) transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/95);

e) extinção de punibilidade (art. 107 do CP).55

3.7 – PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DAS PROVAS ILÍCITAS

Possui seu fundamento legal no artigo 5°, inciso LVI da CRFB/88,

“São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.56

Apesar de o dispositivo ser deveras explícito, cabe aqui uma

explicação. Este princípio é uma vedação a que o juízo adote como elemento

de convencimento, no curso do processo, provas não obtidas de forma legal.57

3.8 – PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE

Possui seu fundamento legal nos artigos 5°, inciso LX e 93, inciso IX

da CRFB/88, “A lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais

55 OLIVEIRA, Flávio Cardoso de. Op. Cit., p.13. 56 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem. 57 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.49.

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33quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem” e “Todos os

julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentados

todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público

o exigir, limitar a presença em determinados atos, às próprias partes e a seus

advogados, ou somente a estes”. Se encontra também disposto no artigo 792,

primeira parte, do CCP, “As audiências, sessões e os atos processuais serão,

em regra, públicos e se realizarão nas sedes dos juízos e tribunais”.58

A publicidade é uma garantia para o indivíduo e para a sociedade,

advinda do próprio princípio democrático. Está ligado à humanização do

processo penal, contrapondo-se ao procedimento secreto, característica do

sistema inquisitório.

O Princípio da Publicidade é regra no ordenamento pátrio. Este visa

frear a fraude, a corrupção, a compaixão e as indulgências fáceis.59

A doutrina apresenta a publicidade sob 02 (dois) aspectos: Geral ou

absoluta ou plena ou externa e especial ou restrita ou interna.

A publicidade geral ou absoluta ou plena ou externa é a garantia

assegurada à sociedade em geral livre acesso aos atos processuais, isto é,

poderá ser assistido por qualquer pessoa.60 Também chamada de publicidade

popular.61 É a regra do Direito Brasileiro.

A publicidade especial ou restrita ou interna é aquela aberta somente

aos interessados, isto é, quando estiver presente interesse social ou a

necessidade da defesa da intimidade, ou ainda o dissertado no parágrafo 1° do

artigo 792 do CCP62, “puder resultar escândalo, inconveniente grave ou perigo

de perturbação da ordem”63 Também chamada de publicidade das partes.

A publicidade poderá ser, ainda, imediata, quando se toma

conhecimento dos atos diretamente, e mediata, quando os atos públicos

somente serão conhecidos através de informe ou certidão.64

58 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem. 59 MIRABETE, Julio Fabbrini. Op. Cit., p.48-49. 60 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.52. 61 MIRABETE, Julio Fabbrini. Idem. 62 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.53. 63 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem.

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343.9 – PRINCÍPIO DA OFICIALIDADE

Possui seu fundamento legal nos artigos 129, inciso I e 144, parágrafo

4° da CRFB/88, “São funções institucionais do Ministério Público: I -

promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;” e “A

segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é

exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas

e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: § 4º Às polícias civis, dirigidas

por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvadas a competência da

União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais,

exceto as militares. Se encontra também disposto no artigo 4° do CPP, A

polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas

respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da

sua autoria.65

É função essencial do Estado a repressão ao criminoso. Este deverá

instituir órgãos oficiais que assumam a persecução penal. Porém, isto não é

absoluto, prevendo-se exceção na ação penal privada (vide artigo 30 do CPP)

e na ação privada subsidiária (vide artigo 5°, inciso LIX da CRFB/88 e artigo 29

do CPP).66

3.10 – PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

Este princípio tem por finalidade a revisão das decisões de 1°

(primeiro) grau, através de órgão de grau superior, por meio da interposição de

recursos. Sua abrangência abarca tanto as questões de fato quanto as

questões de direito, alcançando as sentenças e as decisões interlocutórias.

64 MIRABETE, Julio Fabbrini. Idem. 65 GOMES, Luis Flávio (Org.) . Idem. 66 MIRABETE, Julio Fabbrini. P.50.

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35O Princípio do Duplo Grau de Jurisdição não possui previsão expressa

na Carta Magna, porém a doutrina sustenta que este se consagrou,

implicitamente, a partir da organização do Poder Judiciário em instâncias.

Este princípio tem abarca 02 (duas) exceções: Decisões de

competência originária do Supremo Tribunal Federal e aquelas proferidas

pelos Juizados Especiais.67

67 BONFIM, Edílson Mougenot. Op. Cit., p.59.

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CONCLUSÃO

De acordo com todo o discurso proferido no presente trabalho, é certa

a premissa a qual afirma que a Ciência do Direito é constituída por um rol de

preceitos básicos, os Princípios, apostos como alicerces dos juízos concebidos

sobre o fenômeno do jus.

Logo, estes se encontram em permanente trânsito com o sistema

jurídico que o comporta, trocando informações, criando e/ou alterando regras.

Quando aplicado de forma coesa, seu posicionamento influencia de forma

significativa em todo o ordenamento jurídico de uma sociedade.

Os Princípios surgem como forma a guiar as normas já inscritas nos

diplomas ou, em sua ausência, a saná-las a falta.

Quando estes se apresentam inseridos no contexto do Processo

Penal, e mais ainda, quando acompanhados de devida proteção constitucional,

assumirão uma postura de amplificada importância.

Os Princípios Constitucionais do Processo Penal assegurarão, sempre,

a tutela da liberdade do indivíduo, bem mais precioso em nosso ordenamento

jurídico. Estes conferirão as garantias fundamentais e processuais, visando a

justa verdade.

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BIBLIOGRAFIA

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40

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO

02

AGRADECIMENTO

03

DEDICATÓRIA 04

RESUMO 05

METODOLOGIA 06

SUMÁRIO 07

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PROCESSO PENAL 10

1.1 – Introdução 10

1.2 – Jurisdição 11

1.2.1 – Conceito 11

1.2.2 – Elementos que Compõe a Jurisdição 13

1.2.3 – Características da Jurisdição 14

1.3 – Fundamentos sobre o Processo Penal 15

1.4 – Sistemas Processuais 16

1.4.1 – Sistema Inquisitivo ou Inquisitorial 16

1.4.2 – Sistema Acusatório 17

1.4.3 – Sistema Misto ou Acusatório Formal 19

CAPÍTULO II

A FORÇA NORMATIVA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

21

2.1 – Evolução Histórica 21

2.2 – Conceituação 22

2.3 – Normas, Princípios e Regras 24

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412.4 – Princípios, Processo Penal e Constituição 26

CAPÍTULO III

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL 28

3.1 – A Importância dos Princípios 28

3.2 – Princípio do Devido Processo Legal 29

3.3 – Princípio do Estado de Inocência, da Presunção de Inocência

ou da Não-Culpabilidade 31

3.4 – Princípio do Juiz Natural 32

3.5 – Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa 33

3.6 – Princípio da Verdade Real 34

3.7 – Princípio da Vedação das Provas Ilícitas 35

3.8 – Princípio da Publicidade 36

3.9 – Princípio da Oficialidade 37

3.10 – Princípio do Duplo Grau de Jurisdição 38

CONCLUSÃO 39

BIBLIOGRAFIA 40

ÍNDICE 43