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JUN/JUL 2019 ANO 5 EDIÇÃO 42 Um jornal a serviço das lutas populares e do socialismo. EDITORIAL PÁGINA 02 Avançar a luta popular para derrotar Bolsonaro e sua política de terra arrasada Imagem: Istock

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JUN/JUL 2019

ANO 5

EDIÇÃO 42

Um jornal a serviço das lutas populares e do socialismo.

EDITORIALPÁGINA 02

Avançar a luta popular para derrotarBolsonaro e sua política de terra arrasada

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da Operação Lava Jato, suas ilegalida-des e imoralidades, sua relação com a eleição de Bolsonaro, bem como a punição de todos os envolvidos, além da libertação do ex-presidente Lula. As experiências dos dias nacio-nais de luta em defesa da Educação Pública (15 e 30 de maio) e da Greve Geral convocada pelas centrais sindica-is, organizações de esquerda e movi-mento sociais, indicam que ainda é necessário investir mais na organiza-ção da luta nos locais de trabalho, mora-dia e estudo e nas ruas para derrotar o projeto antipopular e antinacional de Bolsonaro. Estima-se que 45 milhões de trabalhadores tenham participado de atos ou paralisações nas primeiras horas do dia 14 de junho, primeira gran-de jornada popular contra o governo Bolsonaro. Mais uma vez o recado foi dado em protesto aos ataques sistemáticos do capital e dos governos aos direitos políticos, sociais e trabalhistas histori-camente conquistados em décadas de lutas. Desta vez, além da sempre deci-siva presença da juventude, a classe trabalhadora se fez presente em maior número nas manifestações e, principal-mente, realizando a paralisação da produção em inúmeras fábricas, nos transportes e no comércio em diversas cidades. É preciso manter firme a mobilização, pois a guerra contra a Reforma da Previdência e em defesa do emprego, da soberania nacional e dos nossos direitos está apenas come-çando.

perseguição mesquinha e inescrupulo-sa do Judiciário, da grande imprensa e dos partidos de direita contra o PT desde o segundo governo Dilma Rous-seff, quando se fizeram sentir efetiva-mente, no Brasil, os efeitos da crise mundial do capitalismo. As classes dominantes opta-ram então por um governo puro san-gue da burguesia, no entendimento de que o PT não tinha condições políticas para acelerar o processo de retirada de direitos dos trabalhadores, questão central para garantir a desvalorização da força de trabalho e a manutenção dos lucros do empresariado. Toda a movimentação da Operação Lava Jato fez parte de um plano da burguesia brasileira, em conluio com os centros do capitalismo internacional, com o propósito maior de desbancar do governo aqueles que não eram mais funcionais ao capital. Sabemos que a solução deste caso evidente de desrespeito às regras criadas pela própria burguesia não se dará apenas no âmbito da justiça bur-guesa, comprometida com a defesa dos interesses dos grandes grupos econômicos e dos governantes de plan-tão. É preciso avançar nas lutas contra os ataques aos direitos da classe traba-lhadora e em defesa das liberdades democráticas, para barrar a política de terra arrasada do governo Bolsonaro, com destaque, neste momento, para a luta contra a reforma da previdência. Mas também é necessário exigir uma investigação rigorosa sobre as tramas

As recentes reportagens do site The Intercept Brasil apresentam elementos irrefutáveis do caráter par-cial e politicamente seletivo da chama-da Operação Lava Jato. Ficou clara-mente demonstrada a articulação ile-gal e ilegítima entre o então juiz Sérgio Moro e setores do Ministério Público coordenados por Deltan Dallagnol. As combinações entre juízes e procurado-res são ilegais e antiéticas porque ofe-recem evidentes privilégios à acusação em detrimento do direito de defesa dos réus.Como o PCB vem denunciando desde o início das investigações, sob o disfarce do combate à corrupção, a Lava Jato é apenas a parte visível de um projeto de poder arquitetado por segmentos reacionários e inescrupulosos do Judi-ciário para justificar a estigmatização do Partido dos Trabalhadores (PT), o golpe parlamentar contra Dilma Rous-seff e a prisão do ex-presidente Lula, o que inviabilizou sua participação nas eleições de 2018 e contribuiu para a eleição de Bolsonaro. O PCB desenvolveu, durante os governos petistas, uma política inde-pendente e de oposição à conciliação de classes e ao atendimento às deman-das e aos interesses do grande empre-sariado e dos monopólios capitalistas. Criticamos ainda o atrelamento do movimento sindical às políticas oficiais, tirando das lutas contra a exploração capitalista grande parte da militância antes mais combativa. Mas jamais dei-xamos de denunciar com veemência a

EDITORIAL

O Poder Popular, Um jornal a serviço das lutas populares e do socialismo.Órgão oficial do Partido Comunista Brasileiro (PCB)Conselho Editorial: Ricardo Costa, Eduardo Serra, Edmílson Costa, Roberto Arrais(jornalista responsável – 985/DRT – FENAJ).Diagramação: Mauricio SouzaColaboradores desta Edição: Coordenações Nacionais do Coletivo Negro Minervino de Oliveira e doColetivo LGBT Comunista, Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro de Natal/RN,Marcela Pereira Rosa, Mariana Nogueira e Fração Nacional da Saúde. Charges: Mauro Iasi.Endereço Eletrônico: www.pcb.org.br Contato: [email protected] Nacional do PCB: Rua da Lapa, 180, Gr 801 - Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP.: 20.021-180Telefax.: (21) 2262-0855 e (21) 2509-3843.

Avançar a luta popular para derrotarBolsonaro e sua política de terra arrasada

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O balcão de negócios da bur-guesia funciona a todo vapor; a mídia promove o programa econô-mico do governo escancaradamen-te; os cortes no orçamento da educa-ção anunciados, mesmo após dois dias nacionais de manifestações e greves em centenas de cidades foram mantidos; os acordos sobre o texto do projeto de emenda consti-tucional que pretende destruir nosso sistema previdenciário e implantar o sistema de capitalização estão sendo costurados no congres-so. Em breve virão as privatizações e a ampliação da retirada de direitos trabalhistas por meio da carteira verde e amarela. A correlação de forças entre trabalho e capital nas duas câmaras federais, nas assembleias legislati-vas e em todas as esferas do poder executivo é amplamente desfavorá-vel aos trabalhadores. O saldo das últimas eleições tem sido, na maioria dos casos, de sucessivas derrotas, e a classe trabalhadora encontra-se tão gravemente desorganizada, que setores da extrema direita já dispu-tam e dirigem alguns sindicatos. Aos trabalhadores e às traba-lhadoras não cabe outra alternativa para barrar o projeto da reforma da previdência e iniciar as lutas de resis-tência contra todos os demais ata-ques, que não passe pela construção de um movimento grevista de imen-sas proporções, que paralise a pro-dução, o comércio, os serviços e a circulação de mercadorias. A construção da Greve Geral Contra a Reforma da Previdência, de 14 de junho, marcada pelo Fórum das Centrais Sindicais, provou ser tarefa bastante complexa, pois, ape-sar do ataque frontal aos interesses

com militantes de diversas organiza-ções sindicais e populares, dialoga-mos com trabalhadores e estudan-tes que participam pela primeira vez de ações organizadas, e que estão tendo o primeiro contato consciente com a luta de classes. É principal-mente daí que deriva sua importân-cia. A Greve Geral de 14 de junho, que já representou o produto de uma ação mais consciente e organi-zada, por ter conseguido mobilizar setores destacados do operariado brasileiro, inclusive com paralisa-ções de empresas metalúrgicas, refi-narias, transportes, bancos, serviços públicos, universidades, escolas e comércio, foi um passo importante na luta contra a reforma da previ-dência. Devemos seguir firme no trabalho de organização e prepara-ção das próximas lutas, com o objeti-vo de derrotar a política antipopular e antinacional de Bolsonaro, poten-cializando a construção das bases para a reorganização da classe traba-lhadora brasileira.

Avante, camaradas!Manter a mobilização nacional

contra a Reforma da Previdência!Unidade Classista,futuro socialista!

dos trabalhadores contidos no pro-jeto da reforma, o peleguismo, o banditismo e o apassivamento pro-movido pelas políticas de conciliação de classe difundidas no interior dos sindicatos e movimentos sociais nos últimos anos, além das diversas for-mas de alienação e opressão própri-as da sociedade capitalista, dificulta-ram a mobilização dos trabalhado-res. Não há como reverter um quadro tão desfavorável sem ações políticas bem planejadas, que extra-polem a mera intervenção das dire-ções sindicais junto às bases, pois no caso da maioria delas, este movi-mento significa um retorno ao lugar de onde saíram há muito tempo. Neste contexto, é necessário inten-sificar os esforços e transformar os problemas em oportunidades, para desenvolver consciência de classe e organização de trabalhadores e estu-dantes. Experiências exitosas como a criação dos TERRITÓRIOS SEM MEDO, dos FÓRUNS SINDICAIS, POPULARES E DE JUVENTUDE, dos FÓRUNS DE LUTA EM DEFESA DAS APOSENTADORIAS e das FRENTES SINDICAIS CLASSISTAS precisam ser multiplicadas. Nestes espaços, ao mesmo tempo em que convivemos

MANTER A MOBILIZAÇÃOE REORGANIZAR ACLASSE TRABALHADORA

UNIDADE CLASSISTA

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EDUCAÇÃO PÚBLICA

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pam de alguma política de assistên-cia estudantil, e 32,7% acabam desis-tindo do curso por conta de proble-mas financeiros, já que 70% dos estudantes têm renda familiar até 1 salário mínimo e meio. Hoje, como sempre, se faz necessário fortalecer a luta contra a progressão desse desmonte, para que, cada vez mais, nossa classe (de maioria negra e periférica) acesse o ambiente universitário e obtenha condições objetivas para uma melhor situação econômica e de desenvolvimento intelectual. Nesse sentido, é imprescindível a luta por uma universidade popular, que não seja apenas pública, mas que seja controlada pelos trabalhadores e garanta a plena democratização, e o trabalho científico esteja alinhado com as demandas da população em geral e não do grande capital como é feito hoje. Somente com uma universi-dade de fato popular teremos a população negra acessando de maneira plena os espaços da univer-sidade, seja como estudante e pes-quisador, ou usufruindo dos seus serviços, que terão a qualidade necessária.

O ensino público superior também foi atingido nos últimos meses. Ao contrário das movimenta-ções impostas na educação básica (que tem um caráter de maior pre-sença do Estado na disputa ideológi-ca), a postura em relação ao ensino superior prioriza o corte direto nas verbas destinadas às necessidades básicas das universidades federais. O “contingenciamento” do governo acaba por bloquear 30% do orça-mento das instituições federais. O bloqueio impacta direta-mente o acesso e a permanência dos estudantes, bem como na manuten-ção das estruturas universitárias e contempla tanto o corte de bolsas, auxílios estudantis, quanto energia, água, obras de manutenção, paga-mentos de serviços terceirizados de limpeza e segurança, entre outros.Os ataques à população negra A população negra, historica-mente excluída do ensino superior, tem aumentado sua presença princi-palmente no último período de governo social-liberal petista. Hoje a população negra é maioria nas uni-versidades federais, embora o núme-ro seja ainda aquém se comparar-mos com a proporção de pessoas negras frente às brancas na popula-ção em geral. Os dados mostram também que 30% dos estudantes das universidades federais partici-

O desmonte da educação pública no Brasil, encaminhado pelo governo Bolsonaro, não é produto de uma desorganização, falta de traquejo político ou incapacidade de gestão nos primeiros meses de man-dato. Apesar das narrativas construí-das pelo governo sugerirem respos-tas aos anseios do povo, sua prática demonstra o contrário: movimenta-ções deliberadas que se articulam a todo momento com os interesses de parcelas da burguesia nacional e internacional. Como manda a carti-lha neoliberal, é preciso aniquilar os resquícios de serviços públicos para abrir campos férteis para o capital se apropriar. O atual governo, desde o período eleitoral, já desferia ataques à educação, supondo uma hegemo-nia da esquerda no ensino básico brasileiro, através do projeto de lei “Escola sem partido”. Professores viraram alvos políticos e foram demi-tidos, numa declarada tentativa de minar o pensamento crítico nas esco-las. Tal agenda se intensificou após sua eleição. A investida contra o “Enem” (Exame Nacional do Ensino Médio), ainda em curso, pode preju-dicar diretamente a entrada de jovens negros e negras no ensino superior por todo o Brasil e ainda não sabemos no que mais pode se desdobrar.

Leia o texto na íntegra em:pcb.org.br/portal2/23345/contra-os-cortes-na-educacao-e-rumo-a-greve-geral

DESMONTE DAEDUCAÇÃOREVELA PROJETODE NAÇÃO SUBMISSAAO IMPERIALISMO

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Luta antimanicomial: internação involuntária NÃO!

MOVIMENTO POPULAR

O retorno dos campos deconcentração manicomiais

O que o governo Bolsonaro propõe nada mais é do que o retorno dos campos de concentração brasilei-ros (manicômios como depósitos humanos), agora travestidos de comu-nidades religiosas, ditas terapêuticas. Com a nova lei as internações involun-tárias acontecerão em grande escala. Muitas pessoas, principalmente aque-las que sem encontram em situação de rua, serão indevidamente internadas, e os 'indesejáveis" se transformarão em objetos de lucro para igrejas e empresários do sofrimento alheio.

O intuito não é tratar, mas apenas consolidar a exclusão radical dessas pessoas da socie-dade, lucrar com o trabalho for-çado utilizado como prática cor-riqueira nas comunidades tera-pêuticas e cumprir os acordos eleitoreiros feito com empresá-rios da fé.

Esta lei, profundamente ques-tionada por especialistas da área e comprovadamente ineficaz na maioria dos lugares em que foi utilizada, ape-nas acirra, criminaliza os comporta-mentos pseudodesviantes e atinge com maior intensidade os trabalhado-res e trabalhadores que vivem em condições de pobreza. Devemos cer-rar fileiras contra os ataques aos direi-tos sociais, na defesa do SUS público, universal, do Estado Laico e de uma sociedade sem classes sociais!

tram em situação de rua.

Lucros obtidos como sofrimento alheio

No entanto, o financiamento tímido da parte do Estado e os acordos conciliatórios de governos progressis-tas e liberais aos poucos foram abrin-do espaço para políticas conservado-ras e não laicas ligadas aos interesses empresariais do complexo médico-industrial farmacêutico e hospitalar, incluindo os interesses de alguns seto-res neopentecostais. No governo Dilma se aprovou a entrada das Comu-nidades Terapêuticas Religiosas na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), incluindo o repasse de financiamento público para estas instituições, o que abriu as portas para atual política do governo Bolsonaro, que financia empresas religiosas e tem como viés principal de tratamento a abstinência e a internação compulsória involuntá-ria. Tal política visa apenas a retira-da das ruas de pessoas que são vítimas de um Estado opressor que não quer combater as desigualdades criadas, pois são necessárias para os lucros de poucos. No sistema capitalista proble-mas tão graves como o uso abusivo de drogas são tratados como casos irre-cuperáveis ou simplesmente criminali-zados. Aqueles que são pejorativa-mente chamados de dependentes químicos, na verdade, são pessoas carentes de políticas de saúde, de amparo social, de condições dignas de moradia e de um Estado que as tratem como cidadãs providas de direitos.

A Lei 13840/19, recentemente aprovada pelo governo Bolsonaro, autoriza a internação involuntária - ou internação forçada - de pessoas que fazem uso abusivo prejudicial de dro-gas, aplica a abstinência como forma única de tratamento, além de financi-ar centros de imposição religiosa (co-nhecidas como Comunidades Tera-pêuticas) em detrimento dos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Dro-gas (CAPSad) e Unidades de Acolhi-mento (UAs), equipamentos laicos que compõem o Sistema Único de Saúde (SUS). A maioria das atuais políticas estatais na área da Saúde foram conquistadas através da luta de trabalhadores do setor e usuários do Sistema, portanto, políticas intimamente ligadas aos inte-resses e necessidades populares que se opõem aos interesses do capital. No campo do tratamento de usuários de álcool e outras drogas, o Brasil se des-tacava com a política de redução de danos, mundialmente reconhecida como prática mais eficaz para trata-mento dessas pessoas. Depois de muitas lutas foram criados os CAPSad e os Consultórios na Rua, equipamentos de suporte comunitário e territorial, que se con-trapunham ao tratamento asilar. Além disso, também houve a criação de lei-tos em saúde mental em hospitais gerais e UAs, para as pessoas que por diversas questões (abstinência, risco social etc.) necessitam de cuidados para além de suas residências ou até mesmo para aqueles que devido à pauperização capitalista se encon-

Nenhum passo atrás... comunidade terapêutica jamais!

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2014, os casos de intoxicação notifi-cados junto ao Ministério da Saúde corresponderam a uma média de 3.125 por ano, ou seja, diariamente ocorrem no Brasil 8 casos notifica-dos de intoxicação por agrotóxicos. Calcula-se, no entanto, que para cada caso notificado, há outros 50 não notificados, o que eleva em níveis descomunais os índices de intoxicação por agrotóxicos. Do total anual, 148 levam à morte, o que significa que a cada dois dias e meio uma pessoa morre no Brasil intoxica-da pelo uso de agrotóxicos agrícolas. Na maioria dos estados brasi-leiros, 20% das intoxicações notifica-das dizem respeito a crianças e ado-lescentes. De 2007 a 2014 houve ainda uma média de 42 bebês intoxi-cados por ano. Os gastos com a saúde pública decorrentes de todas as consequências geradas pelo uso de agrotóxicos não são contabiliza-dos na cadeia do agronegócio e, ao fim, quem paga a conta é a própria população.

O veneno servido em nossa mesa

Em 2018, a Anvisa analisou em torno de 2.500 amostras de 18 tipos de alimentos, apontando que cerca de 1/3 dos vegetais mais con-sumidos no Brasil apresentam um nível de agrotóxico acima do permi-

de alimentação humana e transfor-ma-se em commodity, mercadoria a ser negociada no mercado como qualquer outra. O oligopólio de seis empresas – Syngenta (Suíça), Bayer (Alemanha), Basf (Alemanha), Dow (EUA), Monsanto (EUA) e DuPont (EUA) – respondem a cerca de 75% do mercado mundial de agrotóxicos. Recentemente, a Monsanto foi com-prada pela Bayer, a ChemChina com-prou a Syngenta e Dow e DuPont se fundiram, aumentando ainda mais a concentração e os oligopólios no setor. O monopólio se estende às sementes produzidas por essas mes-mas empresas.

A devastação causadapelos agrotóxicos

No Brasil e em outros países do mundo, a agricultura capitalista avança sobre o campo a passos lar-gos e, com ela, o uso massivo de agro-tóxicos. Os efeitos desse uso são danosos e incalculáveis: incluem a devastação da natureza, a contami-nação dos solos e da água, a morte de animais, a aniquilação da diversi-dade produtiva, a intoxicação e morte de milhares de pessoas, preju-ízos ao desenvolvimento físico e cognitivo e o aumento do número de doenças. Entre os anos de 2007 a

O Brasil ocupa hoje a posição de maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Nesse ranking não há nada a ser comemorado. Somos res-ponsáveis pelo consumo de 18%, ou seja, quase 1/5 de todo agrotóxico comercializado mundialmente. Em 1990 o Brasil consumia 3% dos agro-tóxicos no mundo, ou seja, houve um aumento de 9 vezes nesse consumo. Entre 2000 e 2014, o país saltou de um consumo de cerca de 170 mil toneladas de agrotóxicos para 500 mil toneladas, um aumento de 135%. Do total consumido, 52% são utilizados no cultivo da soja. O p r i n c i p a l a g r o t ó x i c o comercializado no Brasil é o glifosa-to, um herbicida aplicado em diver-sos cultivos, como o de soja, milho e algodão, que figuram entre os prin-cipais produtos do país. O glifosato pode causar câncer e é um potencial causador de alterações na estrutura do DNA e nas estruturas cromossô-micas das células humanas. Ainda assim, no ano de 2014 a venda desse herbicida no Brasil foi de 194.877,84 mil toneladas, mais da metade do volume total de agrotóxicos comer-cializados no país. O mercado mundial de agro-tóxicos movimenta atualmente US$ 57 bilhões por ano. Nesta longa cade-ia do agronegócio, o alimento é des-tituído de seu valor enquanto forma

tragédia social nas tramas

do capital imperialista

SOBERANIA ALIMENTAR

O USO DEAGROTÓXICOS

NO BRASIL:

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soja, açúcar, carne de frango, farelo de soja, carne bovina, celulose e café em grão. Nessa longa história de submissão, os interesses externos do capital se sobrepõem aos interes-ses de desenvolvimento e de uma verdadeira soberania nacional, cons-truída pelos trabalhadores e traba-lhadoras. Nas tramas do imperialis-mo seguimos alijados da perspectiva d e n o s s a a u t o d e t e r m i n a ç ã o enquanto povo brasileiro.

Soberania alimentar:uma luta anti-imperialista

Se queremos transformar o catastrófico cenário da exploração imperialista, é preciso olhar com muita atenção para a questão da agricultura brasileira. A tragédia do uso de agrotóxicos é a tragédia humana e ambiental de toda a socie-dade. Os riscos e consequências desse uso não atingem apenas os trabalhadores rurais, mas também os trabalhadores urbanos, já que estamos falando da possibilidade de contaminação por exposição direta, da contaminação pelo consumo de alimentos e água com agrotóxicos, da contaminação do próprio ambi-ente e, portanto, da produção e reprodução da vida humana. Estamos diante de um geno-cídio cotidiano e silencioso que arra-sa terras e águas, precariza nossa alimentação e violenta a própria vida humana. É preciso ter clareza de que a luta contra os grilhões do imperia-lismo é também a construção e a luta por um projeto de soberania alimen-tar e nacional, que passa necessaria-mente por um novo projeto de pro-dução agrícola.

tários da Sementes Tropical, empre-sa que comercializa fungicidas em parceria com a Syngenta. Somente nos cem primeiros dias de governo foram aprovados 121 novos agrotóxicos e outros 31 já foram incluídos na fila de registro. As corporações por trás desses agrotó-xicos têm em comum históricos de conflitos agrários, processos e denúncias de contaminação. Entre as campeãs em novas certificações despontam a Syngenta e a Adama (sétima maior produtora de quími-cos agrícolas do mundo). Tendo em vista que a legisla-ção de países da União Europeia, por exemplo, tem sido cada vez mais rígida, o afrouxamento na legislação dos países periféricos, como o Brasil, permite a recuperação do mercado internacional de agrotóxicos: 30% dos agrotóxicos permitidos no Brasil são proibidos na União Europeia. E há ainda redução de 60% do ICMS e isenção total da contribuição para a Seguridade Social (PIS/COFINS) e do Imposto sobre Produtos Industriali-zados (IPI) para a produção e comér-cio de agrotóxicos. O Estado brasileiro, portan-to, subvenciona o capital das gran-des indústrias de agroquímicos e, com ele, o avanço da degradação ambiental e da saúde humana. Tudo é feito em nome do lucro das empre-sas privadas. O lugar de maior consumidor mundial de agrotóxicos que ocupa-mos desde 2008 está diretamente ligado ao modelo econômico mundi-al, que coloca o Brasil no lugar de produtor e exportador de commodi-ties, produtos primários com baixa tecnologia agregada. Dos dez princi-pais produtos de exportação brasile-ira sete são de origem agropecuária:

tido, sendo que a legislação brasilei-ra já é altamente permissiva. Na lista dos alimentos que mais apresenta-ram problemas estavam o pimentão (91,8% das amostras), o morango (63,4%), o pepino (57,4%), a alface (54,2%) e a cenoura (49,6). O problema estende-se tam-bém à água. Um a cada quatro muni-cípios brasileiros têm sua água con-taminada com agrotóxicos. Entre os agrotóxicos encontrados em mais de 80% dos testes realizados, cinco são classificados como prováveis cancerígenos pela Agência de Prote-ção Ambiental dos Estados Unidos. Do total dos 27 pesticidas encontra-dos na água brasileira, 21 estão proi-bidos na União Europeia devido aos riscos de seu uso e consumo. Ainda no governo Temer, no ano de 2018, 450 novos agrotóxicos foram liberados, ano em que tam-bém foi colocado em pauta o Projeto de Lei 6299/02, conhecido como o PL do Veneno, proposta de Blairo Maggi, ex-ministro de Temer e acio-nista do grupo Amaggi, um dos 20 maiores exportadores de commodi-ties do Brasil. O projeto pretende facilitar a produção, venda e uso de agrotóxicos no Brasil, propondo alterações em diversos pontos, como produção, importação e rotu-lagem.

Bolsonaro liberamais agrotóxicos

Com o governo Bolsonaro, a perspectiva para esse cenário não é nada animadora. À frente do Minis-tério da Agricultura, a ruralista Tere-za Cristina, mais conhecida como a “Musa do Veneno”, teve sua campa-nha a deputada federal em grande parte financiada por um dos proprie-

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SOCIEDADE

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hoje, ainda aguarda julgamento – muitas vezes por anos. Entre as víti-mas do emblemático Massacre do Carandiru, em 1992, cerca de 80% das pessoas encarceradas assassina-das estava em privação de liberdade sem nem ter passado por julgamen-to. A população carcerária cres-ceu assustadoramente nos últimos anos, sendo que em 1990 estima-vam-se 90 mil presos, e em 2016, 26 anos depois, este número chegou a 726 mil (com apenas 368.049 vagas disponíveis, à época), segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Info-pen). Este número nos coloca na posição de terceiro país com mais presos no mundo. Desse número, 64% dos detentos são negros; no Brasil, o número de habitantes negros é de 53%. Das pessoas priva-das de liberdade que trabalhavam em 2015, 33% não recebia remune-ração alguma e 41% recebia menos que ¾ de um salário mínimo, sendo este valor o mínimo exigido pela Lei de Execuções Penais (LEP). A quem serve o estado brasileiro

A questão que nos fica é: como um projeto que tem dado tão certo em sua função de criminalizar a pobreza poderia resolver justamen-te os problemas de uma das parcelas mais pauperizadas da classe traba-lhadora, a população LGBT?? Com u m g o v e r n o d e c l a r a d a m e n t e

os; e sendo hostilizadas por sermos LGBTs dentro de empresas, tanto na posição de funcionárias como de clientes.

Não basta criminalizar,é preciso avançar a luta

Não dá para dizer que uma política que se proponha a criminali-zar algo, e tão somente isto, conse-guirá pôr fim às violências que são fruto da estrutura da sociedade bra-sileira. O direito e sua forma jurídica têm como objetivo a manutenção da engrenagem capitalista e seus insti-tutos – propriedade, trabalho assala-riado, liberdade (em sua acepção burguesa), mercadoria, etc. Com isto, traz segurança e previsibilidade à classe dominante em suas relações de troca. E o direito penal, por sua vez, é a expressão máxima do pró-prio direito: ele escancara as contra-dições da nossa sociedade. Sua fun-ção, primeiramente, é a de trocar equivalentes: do delito decorre uma pena para compensá-lo, e nada além disso. “Nada além disso” do ponto de vista da troca de equivalentes. É sabido que a população encarcerada no Brasil – e no Ocidente como um todo – tem cor e classe social. A justi-ficativa da “ressocialização” é uma mentira, evidenciada tanto pela ine-ficiência do encarceramento em combater a violência quanto pelo fato de que uma parte significativa da população privada de liberdade,

Muitas LGBTs morrem ou são atacadas dia após dia, vítimas da vio-lência movida pelo ódio e pela into-lerância de parte da sociedade brasi-leira. Por causa disso, diversos seto-res do movimento LGBT e progres-sistas têm como demanda histórica a criminalização da LGBTfobia, visan-do que os ataques de cunho LGBTfó-bico diminuam. O que este pedido traz consigo, ainda que de modo não intencional, é uma individualização de um problema que não é pontual. Nós, LGBTs da classe trabalhadora, em medidas variáveis, somos vítimas de um lugar social muito específico. Estamos submetidas a determina-das funções na divisão do trabalho (como é o caso do trabalho sexual às travestis, dos call centers e varejos de shoppings às LGBTs como um todo, etc.), além de sempre termos o desemprego e a informalidade às portas. Na mesma direção, também somos vitimadas por um preconcei-to que parte do Estado. Esse precon-ceito se objetiva de algumas formas: temos a recusa da utilização de nomes sociais, a burocratização do acesso ao processo transexualiza-dor, a falta de profissionais da saúde específicos para o atendimento íntimo de mulheres lésbicas e bisse-xuais (além das pessoas trans), as agressões por parte da polícia mili-tar, etc. E no setor privado o caráter da discriminação pode se dar em dois aspectos: na grande mídia, em programas de auditório e noticiári-

BASTA DELGBTFOBIA!

Criminalização e combatecotidiano às opressões

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mais vulneráveis da nossa classe; é a afirmação de uma posição política emancipatória, em embate direto com o que há de mais conservador e reacionário da política capitalista. No momento político em que vive-mos, cobrar que o Estado reconheça, oficialmente, que a violência por conta de orientação sexual e identi-dade de gênero deve ser repudiada e combatida tem grande peso e sig-nificado, e demonstra também resistência e força dos movimentos de luta popular frente aos ataques que se agravam. Além disso, se o direito bur-guês não é a lei que queremos, a lei que queremos também combateria as violências e discriminações LGBTfóbicas – ou não seria uma lei para nós e por nós. Se nossa crítica ao direito burguês é contundente, também o é nossa postura de intran-sigência quanto à defesa da nossa classe, de toda ela. Há muito ainda a se discutir e aprofundar sobre o tema, mas a luta não para e seguire-mos fazendo isso no seu decorrer. Entendemos, assim e sobretudo, caber ao movimento comunista que siga se somando à defesa dela sem-pre que necessário. Como comunistas: sem dei-xar de colocar as críticas que preci-sam ser colocadas; mas como comu-nistas: agindo na luta diária, ombro a ombro com a nossa classe, contra toda forma de dominação e explora-ção.

de trabalho mais barata e nos colo-car em postos de trabalho precariza-dos. Continuamos a morrer e a ser violentadas cotidianamente. Por isso, urge a necessidade de uma dis-cussão com seriedade e que tome-mos uma série de medidas, fora do âmbito penal, para que a população avance nos debates acerca de discri-minação de gênero e sexualidade.

Nosso apoio à medida é crítico, mas é apoio

Colocadas as críticas acima, cabe também reconhecer que há um embate mais profundo que acompa-nha este projeto. Os movimentos das classes dominantes no último período, pós crise de 2008, vêm sendo de reiteração e reforço da ordem capitalista na sua forma mais eficaz, e isso inclui o seu caráter racista, machista e LGBTfóbico. Os ataques e perseguições direciona-dos, por exemplo, ao feminismo e aos movimentos LGBTI têm como pano de fundo a acentuação de um projeto de dominação. Se setores da classe dominante se opõem à crimi-nalização, não é porque são críticos ao direito penal, mas porque nos querem mais exploradas e mortas! Nesse contexto, a defesa de direitos e avanços para a população LGBTI, por menores que sejam e mesmo que nos limites da institucio-nalidade burguesa, têm o peso da defesa da humanidade dos setores

LGBTfóbico e que está fazendo de tudo para boicotar o avanço da dis-cussão de gênero e sexualidade na sociedade, principalmente através das escolas com o “Escola Sem Parti-do” (PL 7.810/14) e atacando siste-maticamente a inclusão da palavra “gênero” nos Planos Municipais de Educação (PMEs) e no Plano Nacio-nal de Educação (PNE), a eficácia da criminalização da LGBTfobia como medida para combater a discrimina-ção não nos parece viável, mas um tiro no pé. No próprio caso do que tange às violências ligadas a orienta-ção sexual e identidade de gênero no Brasil, existem leis estaduais e municipais em vários lugares desde o começo dos anos 2000 que penali-zam condutas LGBTfóbicas e, mesmo assim, continuamos com dados alarmantes sobre violência contra LGBTs. De nada vale criminali-zar, se ao mesmo tempo, desarticu-la-se o já frágil e sem poder delibera-tivo Conselho de Defesa de Direitos da População LGBT, que não se reu-niu em 2019; se é vetado qualquer debate sobre diversidade sexual nas escolas; se não se criam políticas públicas para as nossas demandas no sistema de saúde e se somos expulsas do mercado formal de tra-balho. A LGBTfobia, no marco da sociedade capitalista, não acabará, posto que ela tem determinada fun-ção – criar um agrupamento de força

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Leia na íntegra o artigo do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro – Natal/RN em https://pcb.org.br/portal2/23322/por-que-defendemos-o-feminismo-classista/

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COLETIVO FEMINISTA CLASSISTA ANA MONTENEGRO

feminismo classista para compreen-der que capitalismo, patriarcado e racismo não se separam. São articu-lados. Um se estrutura e interage com o outro conformando uma reali-dade social de exploração combi-nando a opressão do sexo, da raça e da classe. O racismo e o patriarcado existem porque existe uma base material, a propriedade privada, que impõe concretamente a exploração. Esses sistemas conformam o modo capitalista de produzir nossa vida e determinam a vida das mulheres marcada pelo trabalho extensivo, intensivo e intermitente, pela viola-ção de Direitos, pelas violências domésticas, sexuais, patrimonial, físicas, obstétricas e psicológicas sofridas. Nossa condição só mudará quando nos organizarmos nas filei-ras da luta por um mundo possível e tão urgente que precisa ser pensado e construído no presente. As mulhe-res precisam do feminismo classista para enfrentar as tantas e cotidianas agressões do capitalismo racista hétero patriarcal enquanto negras, imigrantes, lésbicas, transexuais, mães… trabalhadoras que, como já nos disse a camarada Ana Montene-gro – lutando por pão, terra e traba-lho, sendo um país que tem isso, almejamos liberdade!

moradia, saúde, lazer, conhecimen-to.

As opressões a serviço daexploração capitalista

As relações sociais de sexo criam uma divisão sexual do trabalho e do poder em que se constituem atividades legitimadas como femini-nas e outras como masculinas, sendo essas “femininas” as mais precariza-das e desvalorizadas. A divisão sexu-al do trabalho designa como femini-nas profissões que sejam reconheci-das socialmente por sua vinculação ao cuidado e à educação que, por consequência, o patriarcado atribui como naturais do ser mulher. Sobre nós mulheres recai a responsabilidade pelo cuidado e educação dos filhos, o que limita nosso tempo e nossas possibilidades de estudo, trabalho, lazer e organi-zação política. Legitima-se uma cons-ciência social de subordinação da mulher ao homem como sua propri-edade, tolhendo nossa independên-cia e autonomia. E ainda, essas rela-ções sociais obstaculizam nossa liberdade sexual, nos impondo a heterossexualidade como única ori-entação sexual aceita e rejeitando outras identidades de sexo. As mulheres precisam do

O feminismo classista é cons-truído por uma consciência coletiva de que teoria e prática não se sepa-ram. A nossa teoria, materialista, histórica e dialética que, além de única compromissada com a luta da humanidade contra o capital, é a que melhor se aproxima da realidade, complexa e dinâmica que vivemos, deve nortear todas as nossas ações, atividades, diálogos, reflexões, falas… o trabalho de base que preci-samos realizar para que as mulheres, da cidade e do campo, mães, soltei-ras, religiosas, jovens, maduras, cri-anças, despertem a consciência de quem são, de seu potencial de enfrentamento e de quem são os reais inimigos das mulheres. As mulheres precisam da teoria revolucionária para compre-ender que a relação social que funda a sociedade burguesa, essa em que vivemos, é a relação do capital. Isso significa que nessa sociedade perde-mos os meios e as possibilidades de produzir nosso sustento, nossa vida. Fomos obrigadas a vir para os cen-tros urbanos vender nossa força de trabalho em indústrias, fábricas, empresas, em troca de um salário sempre insuficiente para comprar e pagar tudo de que precisamos, pois nessa sociedade tudo é mercadoria, nosso alimento, nossas roupas,

Por quedefendemoso feminismoclassista

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Espanha de Guerra Jurídica) para denunciar as três ativistas. Esta acu-sação foi aceita por um órgão do Tribunal Nacional. Angeles Maestro e as duas companheiras enfrentam um julgamento que não apenas busca mandá-las para a prisão, mas também condenar qualquer tipo de ação em solidariedade à nobre causa do povo palestino. A longa mão do sionismo não deixa canto do mundo sem ser coberto e tem a cumplicidade de um Tribunal Nacional que nada mais é do que herdeira do tribunal de exceção do franquismo, uma cova de juízes e promotores de longa fama por per-seguir militantes das lutas popula-res. Ali reinaram repressores da esta-tura do ex-juiz Baltasar Garzón e do promotor Eduardo Fungairiño. Ago-ra, seus discípulos aproveitam a ofen-siva mundial do imperialismo ianque e seu parceiro sionista, para continu-ar atacando aqueles que os enfren-tam.

Basta de perseguir aqueles que lutam contra a ocupação na Palestina! Exigimos a suspensão e encerramento do caso contra Angeles Maestro e as companhei-ras!

Rede de Intelectuais, Artistas e Movi-mentos Sociais pela Humanidade (REDH).

Tribunal fascista é herdeirodo franquismo

Agora, na Espanha, um tribunal de exceção continuador do franquismo que é o Tribunal Nacional negou sus-pender o processo aberto contra ela e duas outras companheiras, acusa-das de terem reunido duas peque-nas somas de dinheiro e as terem entregue, em 2014 e 2015, em favor da lutadora histórica da Palestina Leila Khaled, quando esta realizou uma turnê de palestras e reuniões públicas em Madri e Barcelona. A acusação é realmente paté-tica, já que esses fundos (que não excedem 8.500 euros e foram cole-tados por meio de colaborações de muitas pessoas) tiveram como desti-no a reconstrução de escolas e hos-pitais, que, como todos sabem, sofrem por falta de insumos e estão sobrecarregados devido à repressão de Israel na Cisjordânia e aos bom-bardeios em Gaza. O fato de que Leila Khaled seja líder da FPLP tem sido a base usada pela associação israelense “The Lawfare Project Spain” (Projeto

O Partido Comunista Brasile-iro (PCB), a Unidade Classista, a União da Juventude Comunista, o Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro, o Coletivo LGBT Comu-nista e o Coletivo Negro Minervino de Oliveira somam-se às vozes das organizações políticas e dos movi-mentos sociais internacionalistas no repúdio à perseguição que neste momento sofre na Espanha a lutado-ra comunista, militante internacio-nalista e defensora da causa palesti-na Angeles Maestro. Angeles Maestro é uma ex-deputada comunista, médica, escri-tora e, acima de tudo, uma militante antifascista e antiguerra, que fez do internacionalismo uma causa per-manente. Ela participou de ações de solidariedade em todos os países do Oriente Médio agredidos pelo impe-rialismo dos EUA e por seu aliado, o governo sionista israelense. Na Palestina, no Iraque, na Síria, com o povo saharaui, mas também em apoio às revoluções e povos da Amé-rica Latina, como a Venezuela, Cuba e Bolívia, Nines Mestre sempre este-ve na linha da frente levando o seu apoio incondicional, colocando o corpo quando necessário ou contri-buindo a partir do campo intelectu-al. já que é também integrante da

Conclamamos todos os militantes e lutadores anti-imperialistas e defensores dos direitos humanos e dasliberdades democráticas a cerrar fileiras na solidariedade a Angeles Maestro e a outras duas ativistas

perseguidas pelo Tribunal Nacional da Espanha e a enviar assinaturas de apoio ao e-mail:

[email protected]

INTERNACIONAL

SOLIDARIDADEINTERNACIONALISTA A

AngelesMaestro!

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ofensiva da ditadura, organizada pelos setores da inteligência militar para des-truir o Partido, por meio da qual foi assas-sinado um terço do Comitê Central e foram presos milhares de militantes. A ditadura sabia quem eram seus inimigos. Possivelmente, a história do movimento operário brasileiro teria sido outra se esses episódios não tivessem acontecido. Depois de solto, Bellentani traba-lhou em várias empresas metalúrgicas, mas quando descobriam sua militância política o demitiam. Na segunda metade dos anos 70, na Ford, em São Paulo, conse-guiu organizar uma das mais ativas Comis-sões de Fábrica do Estado, no período de ascenso da luta de massas no Brasil. Recentemente, a Volks reconheceu a perseguição e a colaboração com a dita-dura e hoje os trabalhadores atingidos pela repressão reivindicam a construção de um memorial em homenagem àqueles que lutaram nos mais difíceis momentos da repressão no Brasil. Há cerca de dois meses, Bellenta-ni esteve num seminário realizado pela Unidade Classista sobre o trabalho nas fábricas, onde estimulou a juventude trabalhadora a realizar o trabalho de base como única forma de organizar os traba-lhadores no interior das empresas. Com dor e tristeza nos despedimos do camara-da Lucio Bellentani, mas nos comprome-temos a seguir o seu exemplo.

ele descrevia a organização de células da resistência vietnamita ao exército dos Estados Unidos. Eram células clandesti-nas, compartimentadas por áreas de atua-ção. Então pensei: se eles lá, enfrentando o exército mais poderoso do mundo, con-seguem organizar a resistência, aqui tam-bém nós poderemos adaptar esse modelo e organizar os trabalhadores no interior das fábricas. Assim, as células eram orga-nizadas por seções dentro da fábrica, com-partimentadas, onde os militantes de uma seção não conheciam os da outra e apenas um deles fazia o contato com o Comitê de Empresa. Dessa forma conseguimos orga-nizar células tanto na Volks, onde tínha-mos a maioria dos militantes, mas em todas as grandes empresas da região”. Esse trabalho sofreu um duro golpe em 1972, quando Bellentani foi preso no interior da empresa, após a pri-são de um dos operários que não aguen-tou as torturas: “Fui algemado e levado para o próprio Departamento Pessoal da empresa, onde começaram as torturas, realizadas por agentes policiais do DOPS (Departamento de Ordem e Política Social da ditadura), o que revela a estreita rela-ção entre a Volks e a polícia”. As bárbaras torturas continuaram no DOPS, mas Bellentani se manteve firme e nada entregou. Ficou um ano e meio na cadeia. Mesmo com as prisões, a repressão não logrou desarticular com-pletamente o trabalho nas fábricas, o que só ocorreu em 1974/75, com a grande

A classe operária perdeu, no dia 19 de junho, um dos seus maiores heróis: o camarada Lucio Bellentani. Valente dirigente operário e ferramenteiro, Bel-lentani foi o principal responsável pela organização dos operários do ABC paulis-ta no início da década de 1970, o período mais selvagem da ditadura no Brasil. A partir de uma estratégia do Comitê Cen-tral do PCB, dentro do plano de organizar o Partido nas grandes empresas metalúr-gicas da região, o camarada Bellentani desenvolveu, com êxito e de maneira clandestina, um paciente e abnegado trabalho de organização no interior das fábricas da região, a começar pela empre-sa em que trabalhava, a Volkswagen. Nos primeiros anos da década de 1970, como secretário político dos comi-tês de empresa da região, Bellentani con-seguiu organizar células do Partido nas principais empresas metalúrgicas, che-gando a distribuir mensalmente cerca de 300 jornais Voz Operária, órgão clandesti-no do PCB. “Os integrantes de nossas células levavam os jornais no fundo falso das marmitas, que era uma das poucas coisas que os seguranças da empresa não podiam revistar”, disse num depoimento feito recentemente para uma equipe do PCB que está documentando a memória do movimento operário. Bellentani conta ainda como se deu o processo de organização das células operárias na região: “Li um livro do Giap, comandante do exército vietnamita, onde

Lucio Bellentani:

HISTÓRIA

Camarada Lucio Bellentani, presente! Agora e sempre!

herOi da classe

operAria brasileira