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SUMÁRIO

1. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – LEI Nº 8.078 DE 11.09.1990 ......................................... 32. COMPETÊNCIALEGISLATIVA ......................................................................................................... 43. MICROSSISTEMAJURÍDICO .......................................................................................................... 43.1. MICROSSISTEMA COMO NORMA PRINCIPIOLÓGICA ................................................................ 54. APRECIAÇÃO DAS MATÉRIAS DE OFÍCIO PELO JUIZ .................................................................... 65. DIREITO CONSUMERISTA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................................ 76. ENTENDIMENTO DO STF E DO STJ – NÃO INCIDÊNCIA DO CDC AOS CONTRATOS CELEBRADOS ANTES DE SUA VIGÊNCIA ................................................................................................................. 77. DOS PRINCÍPIOS DO CDC – POLÍTICA NACIONAL DE RELAÇÕES DE CONSUMO ........................ 88. PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE (Artigo 4º, I) ........................................................................... 99. PRINCÍPIO DA HIPOSSUFICIÊNCIA ............................................................................................. 1110. PRINCÍPIO DA DEFESA DO CONSUMIDOR PELO ESTADO (Artigo 4º, II) ................................... 1111. PRINCÍPIO DA HARMONIZAÇÃO (Artigo 4º, III) ......................................................................... 1212. PRINCÍPIO DO PROTECIONISMO .............................................................................................. 1213. PRINCÍPIO DA GARANTIA DE ADEQUAÇÃO .............................................................................. 1314. PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO ..................................................... 1315. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA ............................................................................................. 1316. PRINCÍPIO DA CONFIANÇA OU DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA .............................................. 1817. PRINCÍPIO DA EDUCAÇÃO E INFORMAÇÃO (Artigo 4º, IV) ....................................................... 1818. PRINCÍPIO DO INCENTIVO AO AUTOCONTROLE OU PRINCÍPIO DO CONTROLE DE QUALIDADE E MECANISMO DE ATENDIMENTO PELAS EMPRESAS (Artigo 4º, V) .............................................. 2019. PRINCÍPIO DA REPRESSÃO DE ABUSOS (Artigo 4º, VI) ............................................................. 2120. PRINCÍPIO DA RACIONALIZAÇÃO E MELHORIA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS (Artigo 4º, VII) .... 2221. PRINCÍPIO DO ESTUDO DAS MODIFICAÇÕES DO MERCADO (Artigo 4º, VIII) ........................... 2222. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL DOS DANOS ................................................................ 2223. INTEGRAÇÃO COM OUTRAS NORMAS. DIÁLOGO DAS FONTES. (Artigo 7º) ............................ 24

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1.CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – LEI Nº 8.078 DE 11.09.1990.

O artigo 1º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que a norma de proteção é de ordem pública e de interesse social, nos termos do artigo 5º, XXXII, artigo 170, V, da CF e artigo 48 do ADCT.

Além desses artigos enumerados anteriormente, merecem destaques o seguintes dispositivos da CF: artigo 24, VIII, que atribui competência concorrente a União, Estados e DF para legislar sobre produção e consumo; o artigo 150, § 5º, que determina: “medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerda dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços”; o artigo 175, parágrafo único, II, que estabelece que a lei disporá sobre usuários de serviços públicos; o artigo 220, § 4º, que dispõe sobre a propaganda comercial de tabaco, bebi-da alcoólicas etc; e o artigo 221, que trata das diretrizes a serem observadas na produção e na difusão de programas de rádio e televisão.

Diante disso, as normas do CDC são de ordem pública e interesse social, prevalecen-do sobre a vontade das partes. “São, portanto, indisponíveis e inafastáveis, pois resguardam valores básicos e fundamentais da ordem jurídica do Estado Social, daí a impossibilidade de o consumidor delas abrir mão ex ante e no atacado” (STJ, REsp 586316/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 19/03/2009).

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

Foi considerada FALSA a seguinte alternativa cobrada pela banca FCC na prova para cargo de Juiz de Direito Substituto – PE/2013: “As normas consumeristas são de natureza dispositiva e de interesse individual dos consumidores. ”

A defesa do consumidor é um dos princípios da ordem econômica, conforme prevê o artigo 170, V, da CF:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho huma-no e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princí-pios:(…) V - Defesa do consumidor;

Sua finalidade é assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da jus-tiça social, evitando os abusos que o sistema capitalista, baseado na livre iniciativa do mercado, poderia gerar no mercado de consumo. A Constituição Federal, introduziu a figura do consumi-dor como agente econômico e social (artigo 170, V, CF), possibilitando a intervenção do Estado na relação privada, com o fito de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos.

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“A intervenção do Estado na atividade econômica encontra autorização constitucio-nal quando tem por finalidade proteger o consumidor” (STJ, MS 4251/SP, J. 23/09/1998, Rel. Min. José Delgado, DJU 18.12.1998).

Aliado a isso, o artigo 5º, XXXII, da CF dispõe:

O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.

A regulamentação dessa defesa, conforme determinado pelo artigo 48 do ADCT, se deu com a Lei n. 8.078/1990 (CDC), tendo por objetivo a proteção da pessoa humana em relação aos interesses produtivos, mediante a edição de normas cogentes, de ordem pública, inafas-táveis pela vontade das partes. Tem, pois, previsão constitucional a intervenção do Estado nas relações privadas para a proteção do consumidor.

2. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

Compete à União estabelecer as normas gerais sobre a proteção ao consumidor. Aos Estados e Distrito Federal compete a edição das normas específicas, de forma suplementar. Ine-xistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender as suas peculiaridades. Mas a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (art. 24, VIII, e §§ 1º, 2º e 3º, da CF):

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar con-correntemente sobre:(…)VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagís-tico;(…)§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

3. MICROSSISTEMAJURÍDICO.

O CDC é um microssistema jurídico multidisciplinar, porquanto contém normas que regulam todos os aspectos da proteção ao consumidor, coordenadas entre si, o que permite a estrutura de um conjunto das relações de consumo. Portanto, o CDC outorga tutelas específicas nos campos civil (Artigo 8º a 54), administrativo (Artigo 55 a 60 e 105/106), penal (Artigo 61 a 80)

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e jurisdicional (Artigo 81 a 1004).

Nelson Nery Junior leciona que, havendo lacuna no microssistema, esta deve ser preenchida com os mecanismos próprios, desde que a aplicação de norma subsidiária seja compatível com o microssistema. Assim, não se poderia aplicar, por exemplo, norma subsidiá-ria de lei especial, que trate de responsabilidade subjetiva, quando o CDC tem como Princípio fundamental a respondabilidade objetiva.

3.1. MICROSSISTEMA COMO NORMA PRINCIPIOLÓGICA.

O microssistema do CDC será caracterizado como norma principiólogica, ou seja, ele não é lei especial e nem lei geral, pois, estabelece os fundamentos sobre os quais se funda-mentam a relação de consumo, de modo que toda e qualquer relação de consumo deverá se submeter as normas jurídicas do CDC.

Em consequência, as leis especiais, como de seguros, bancos, transporte etc. devem disciplinar suas respectivas matérias em consonância e obediência aos princípios fundamen-tais do CDC.

Nesse diapasão, o CDC não é lei geral, e se houver conflito aparente entre as suas normas e a de alguma lei especial, não se aplica o princípio da especialidade, tendo em vista que irá prevalecer a regra principiológica do CDC.

Ressalta-se que o código tratado é de mandamento constitucional. Dessa forma, terá superioridade em relação às demais legislações de mesma hierarquia, o que também é extraído de seu caráter principiológico.

Assim, pode-se considerar o Direito do Consumidor como direito fundamental? Sim, o direito do consumidor é direito fundamental, vinculando o Estado e todos os demais opera-dores a aplicar e efetivar a defesa do ente mais vulnerável da relação.

Em complemento, há a Força Normativa da Constituição: os direitos assegurados pela Constituição, em especial os direitos fundamentais, não serão meros programas ou dis-cursos, mas terão força de norma, que devem ser executadas e exigídas.

Atualmente, os direitos fundamentais tornam-se presentes nas relações privadas, sendo observados os princípios constitucionais nas tratativas entre as partes. É o que chama-mos de eficácia horizontal dos direitos fundamentais, em que deverá ser respeitado os direi-tos fundamentais entre os indíviduos como particulares nas suas tratativas.

Ademais, José Ernesto Furtado de Oliveira defende que o CDC, por ser legislação complementar à Constituição, criou direitos que já definitivamente pertencem ao patrimô-

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nio de todo consumidor (cláusula pétrea), de modo que nenhuma lei que venha a alterar in pejus tal situação jurídica ou restringir esses direitos consagrados será recepcionada pelo or-denamento jurídico, e muito menos com ele viverá.

4. APRECIAÇÃO DAS MATÉRIAS DE OFÍCIO PELO JUIZ.

O Juiz poderá intervir de ofício em matérias de ordem pública, independente do requerimento da parte. Não haverá julgamento extra, infra ou ultra petita quando o juiz ou o tribunal pronunciar-se de ofício.

Podemos citar algumas matérias de ordem pública, como: cláusulas contratuais abusivas (CDC, 1º e 51); simulação de ato ou negócio jurídico (CC 166, VII e 167), incompetência absoluta (CPC 113, § 2º), entre outras. Além disso, o juiz poderá inverter o ônus da prova de ofício (artigo 6, VIII, CDC).

É válido ressaltar que a declaração de nulidade de cláusulas abusivas de ofício pelo juiz é matéria de relevante discussão no STJ. Atualmente, o órgão não aceita a decretação de ofício das cláusulas abusivas nos contratos bancários, argumentando ofensa ao princípio “tantum devolutum quantum appelattum”.

O STJ, no REsp 1061530/RS, definiu que “É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no artigo 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários”.

Posteriormente, tal entendimnto foi consolidado na Súmula nº 381: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.” Dessa for-ma, Leonardo Garcia se posiciona no sentido de ter ocorrido o retrocesso no posicionamento do STJ.

Ora, as normas do CDC são de ordem pública e o artigo 51 declara expressamente que são nulas de pleno direito as cláusulas abusivas nas relações de consumo. Contudo, as questões de concurso, após a Súmula 381 do STJ, optam pelo entendimento de que o magis-trado NÃO poder agir de ofício na decretação de cláusulas abusivas nos contratos bancários.

Em complemento, existe a possibilidade de declaração de nulidade ex officio em re-lação às cláusulas de eleição de foro estipuladas pelo fornecedor unilateralmente em contratos de adesão: “O magistrado pode, de ofício, declinar sua competência para o juízo do domicílio do consumidor, porquanto a jurisprudência do STJ reconheceu que o critério determinativo da competência nas ações derivadas de relações de consumo é de ordem pública, caracterizan-do-se como regra de competência absoluta” (STJ, REsp 132876/ MG, DJe 09/02/2009, Rel. Min. João Otávio de Noronha, J. 18.12.2008).

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Nelson Nery Junior fundamenta que o juiz pode, inclusive, deliberar contra um úni-co recorrente, reformando a decisão recorrida para pior, ocorrendo assim o que é chamado de reformatio in pejus admitida, já que se trata de tema de ordem pública a cujo respeito a lei não exige iniciativa da parte, mas ao contrário, determina que o Juiz examine de ofício.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

A banca CESPE considerou FALSA a seguinte alternativa na prova para cargo de Promotor de Justiça – MPE-RR – Ano 2012: “Nos contratos bancários, cabe ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas contratuais”.

A banca CESPE considerou FALSA a seguinte alternativa na prova para cargo de Defensor Pú-blico – ES – Ano 2012: “Consideram-se abusivas e nulas de pleno direito as cláusulas contra-tuais que coloquem o consumidor em descantagem exagerada em relação ao fornecedor, cabendo ao juiz de direito competente conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas dos contratos, incluindo-se as dos contratos bancários”.

5. DIREITO CONSUMERISTA E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

A dignidade da pessoa humana, como fundamento da República (art. 1º, III, CR), também permeia as relações consumeristas. Primeiramente, a dignidade da pessoa humana está vinculada a regra de interpretação da lei segundo seus fins sociais.

Nesse diapasão, o STF restringiu a prisão civil por dívida à hipótese de inadimplên-cia em obrigação de pagar alimentos. Neste sentido, o verbete n. 25 da Súmula Vinculante: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Na mesma linha, a Súmula 419 do STJ: “Descabe prisão civil do depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito”.

Dessa forma, “Não cabe prisão civil do devedor que descumpre contrato garantido por alienação fiduciária”. STJ, Corte Especial, Resp 149.518/GO, DJU 28.2.2000, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, J. 5.5.1999).

6. ENTENDIMENTO DO STF E DO STJ – NÃO INCIDÊNCIA DO CDC AOS CONTRATOS CELEBRA-DOS ANTES DE SUA VIGÊNCIA.

No sistema jurídico Brasileiro, a regra é de que a lei nova não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CR). Assim, por ter caráter constitucional, fica impedido que a legislação infraconstitucional, mesmo que de ordem públi-ca, retroaja para alcançar os referidos direitos.

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“Conquanto o CDC seja norma de ordem pública, não pode retroagir para alcançar o contrato que foi celebrado e produziu seus efeitos na vigência da lei anterior, sob pena de afronta ao ato jurídico perfeito” (STJ, REsp 248155/SP, j. 07/08/2000, rel. Min. Sálvio de Figueireo Teixeira).

Outrossim, o entendimento do STJ é no sentido de aplicação imediata do CDC em re-lação aos contratos de execução diferida e de prazo indeterminado. Diante disso, os contratos de longa duração celebrados antes da entrada em vigor do CDC, são aplicados de imediato as normas consumeristas, uma vez que o contrato é renovado a cada pagamento efetuado.

No mesmo sentido, Gustavo Tepedino afirma que, ao se tratar de contratos de exe-cução diferida ou de trato sucessivo, não há de se cogitar da existência de direitos adquiridos a efeitos futuros, sendo legítima a intervenção legislativa que venha a alcançá-los.

Portanto, nos contratos de prazo indeterminado, por exemplo, de previdência priva-da e de plano de sáude, o consumidor poderá discutir a validade das cláusulas ou requerer sua revisão durante o período de vigência do CDC mesmo para os contratos celebrados anterior-mente ao CDC.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

Foi considerado CORRETO pela banca CESPE na prova para cargo de Juiz Federal do TRF 5ª Região – Ano 2009 – o seguinte item: “Considerando a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro-sáude, o CDC rege as renovações que se derem sob sua vigência, não se podendo falar em retroação da lei nova, na hipótese de contrato firmado antes do início da vigência desse código”.

7. DOS PRINCÍPIOS DO CDC – POLÍTICA NACIONAL DE RELAÇÕES DE CONSUMO.

A Política Nacional das Relações de Consumo está disposta no artigo 4º do CDC, sen-do um artigo de grande relevância, isso porque traz os objetivos a serem perseguidos pela po-lítica de proteção ao consumidor, assim como disciplina os princípios norteadores do código consumerista. Vejamos:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômi-cos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)I - Reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

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II - Ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consu-midor:a) por iniciativa direta;b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações represen-tativas;c) pela presença do Estado no mercado de consumo;d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de con-sumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessida-de de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Cons-tituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de con-sumo;V - Incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de con-trole de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo;VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização inde-vida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo.

8. PRINCÍPIO DA VULNERABILIDADE (Artigo 4º, I).

O CDC só existe porque o consumidor é vulnerável, é a parte mais fraca na relação de consumo, a qual se mostra desequilibrada, justificando-se a intervenção do Estado no contrato, mediante edição de normas cogentes cujo objetivo é o restabelecimento do equilíbrio contra-tual.

Há presunção de vulnerabilidade quando se tratar de consumidor pessoa física, en-quanto a vulnerabilidade do consumidor pessoa jurídica pode ser objeto de discussão proces-sual.

A vulnerabilidade do consumidor foi mundialmente reconhecida no ano de 1985, durante a 106ª Sessão Plenária da ONU, onde, através da Resolução 39/248, foi estabelecido o Princípio da Vulnerabilidade do consumidor, sendo reconhecido como a parte mais fraca da relação, e por isso, merecedor de tratamento especial.

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Segundo Antônio Herman Benjamin, a vulnerabilidade é um traço universal de todos os consumidores, ricos ou pobres, educadores ou ignorantes, crédulos ou espertos.

Nesse diapasão, a vulnerabilidade do consumidor lhe confere algumas prerrogativas, como a propositura da demanda no foro do seu domicílio. Assim, a CF consagra o princípio da isonomia, reconhecendo a desigualdade entre consumidor e fornecedor no mercado. Contudo, não ofende a igualdade priorizada pela Constituição, tendo em vista que o código consumeris-ta protege o elo mais fraco, e equilibra os participantes da relação de consumo, é a chamada igualdade material.

A vulnerabilidade pode ser:

• Técnica: é a falta de conhecimentos específicos sobre o bem ou serviço adquirido, sendo o consumidor facilmente iludido no momento da contratação;

• Jurídica: é a falta de conhecimento jurídico acerca da relação de consumo, como também a falta de conhecimento em contabilidade, matemática financeira ou economia;

• Fática: é a supremacia do fornecedor decorrente do seu poder econômico ou do fato de ser o titular da prestação de um serviço essencial;

• Informacional: é a falta de informações necessárias sobre o conteúdo do produto ou serviço.

Presentes uma dessas vulnerabilidades impõe-se a incidência do CDC, lembrando

que, para o consumidor pessoa física, há presunção de vulnerabilidade. De fato, o objetivo do CDC é disciplinar uma relação contratual desequilibrada, protegendo a parte mais fraca, vulne-rável, por normas cogentes, superando ou diminuindo a desigualdade entre as partes, não se justificando a sua incidência nos contratos em que as partes atuam em igualdade de condições.

A vulnerabilidade é elemento posto da relação de consumo e não um elemento pres-suposto, em regra. Constata-se que a expressão “consumidor vulnerável” é pleonástica, uma vez que todos os consumidores têm essa condição, decorrente de uma presunção que não ad-mite discussão ou prova em contrário.

A vulnerabilidade do consumidor constitui presunção legal absoluta. Ou seja, em qualquer relação de consumo, a vulnerabilidade do consumidor é presumida pela lei, sem pos-sibilidade de afastamento.

A partir desse princípio, dá-se proteção especial ao consumidor, garantindo a igual-dade formal-material aos sujeitos da relação jurídica de consumo.

Porém, em relação às pessoas jurídicas, a incidência do CDC em seu favor somente seria viável quando demonstrada a sua situação de vulnerabilidade.

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Além disso, existirá a hipervulnerabilidade: vulnerabilidade agravada em algumas circunstâncias, como no caso de doença, gravidez, turistas, crianças e idosos. Assim, o fornece-dor poderia se aproveitar dessas condições e oferecer contratações abusivas, e o consumidor aceitaria sem tomar as devidas cautelas.

Luiz Araújo também comenta sobre outro tipo de vulnerabilidade, que seria chama-da de vulnerabilidade do acesso, no caso de pessoas com deficiência.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

A banca CESPE considerou ERRADA a afirmativa na prova para cargo de Juiz do TJ/PA – Ano 2012: “A vulnerabilidade do consumidor, prevista no CDC, não guarda relação com a aplicação do princípio da igualdade, expresso na CF”.

9. PRINCÍPIO DA HIPOSSUFICIÊNCIA.

A hipossuficiência, por outro lado, não é requisito das relações de consumo. Ela pode ser econômica ou processual.

A primeira consiste nas dificuldades financeiras que o consumidor tem para a aqui-sição do bem ou serviço. A segunda é a dificuldade de o consumidor provar o fato em juízo. Hipossuficiência é, no dizer de Roberta Densa, a inferioridade cultural, técnica ou financeira.

Importante ressaltar a diferença entre vulnerabilidade e hipossuficiência, sendo a primeira um fenômeno de direito material com presunção absoluta – jure et de juris – enquanto a segunda, é um fênomeno processual que deverá ser analisado pelo juiz segundo as regras de experiência.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

Foi considerada FALSA a alternativa na prova para cargo de promotor de justiça – MPE-GO – Ano: 2016: “Por serem os princípios da hipossuficiência e da vulnerabilidade conceitos jurídi-cos, pode-se afirmar que todo consumidor é vulnerável e, logicamente, hipossuficiente”.

Foi considerada CORRETA a alternativa na prova para MP/MG – XLIV Concurso Público: “A dou-trina consumerista faz distinção entre vulnerabilidade e hipossuficiência”.

10. PRINCÍPIO DA DEFESA DO CONSUMIDOR PELO ESTADO (Artigo 4º, II).

Esse princípio, previsto no artigo 4, II, do Código de Defesa do Consumidor, consiste na efetiva atuação do Estado na defesa dos interesses dos consumidores, mediante a adoção de medidas concretas e determinadas.

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Salienta-se que a própria Constituição Federal consagra a defesa do consumidor como direito fundamental, impondo ao Estado o dever de defesa desse direito. Exemplo: edição de normas protetivas cogentes; instituição de órgãos públicos de defesa ao consumidor, como o PROCON e o MinistérioPúblico.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

A banca CESPE considerou CORRETA a alternativa na prova para cargo de juiz do TJ/PA – Ano 2012: “O CDC autoriza a intervenção direta do Estado no domínio econômico, para garantir a proteção efetiva do consumidor.”

11. PRINCÍPIO DA HARMONIZAÇÃO (Artigo 4º, III).

Está previsto no artigo 4, III, do CDC, indicando a necessidade de se conciliar os inte-resses dos participantes das relações de consumo (consumidor e fornecedor).

A proteção do consumidor deve ser na exata medida do necessário para compatibilizar o desenvolvimento econômico e tecnológico do qual ne-cessita toda a sociedade e harmonizar as relações entre consumidores e fornecedores. Novos produtos e tecnologias são bem-vindos ao merca-do, desde que seguros e eficientes.

Dentre os vários instrumentos que podem garantir a harmonia das relações de con-sumo, vale apena lembrar o serviço de atendimento ao consumidor instalado em várias empre-sas, denominado marketing de defesa ao consumidor, a convenção coletiva de consumo (pacto entre as associações de consumidores e de fornecedores ou sindicatos de categorias econômi-cas). Outrossim, há as práticas de recall (convocação dos consumidores para reparo de algum vício ou defeito do produto ou serviço adquirido).

12. PRINCÍPIO DO PROTECIONISMO.

Esse princípio impõe ao Estado o poder-dever de proteger efetivamente o consumi-dor, intervindo na atividade econômica (artigo 1º, CDC). Essa proteção do Estado ao consumi-dor pode se dar:

• Por incentivo à c riação e desenvolvimento de associações representativas. Exem-plos: benefícios fiscais a esses entes, como é o caso do IDEC, ADECON etc.

• Pela presença do Estado no mercado de consumo. Exemplo: o próprio Estado presta diretamente o serviço público.

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• Pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, se-gurança, durabilidade e desempenho. Para tanto, o Estado edita as normas de segurança e qua-lidade que o produto ou serviço deve atender.

13. PRINCÍPIO DA GARANTIA DE ADEQUAÇÃO.

Significa que o produto ou serviço deve atender às necessidades do consumidor, em segurança e qualidade. Este princípio, na verdade, integra o princípio da harmonização dos interesses.

14. PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES DE CONSUMO.

O princípio do equilíbrio busca estabelecer uma relação de equilíbrio entre consumi-dor e fornecedor, tendo em vista principalmente a vulnerabilidade do consumidor.

Assim, é aplicado não apenas nos contratos de consumo, mas também nas relações extracontratuais, como por exemplo, na responsabilidade civil, em que há previsão da inversão do ônus da prova e da responsabilidade objetiva do fornecedor.

No campo contratual, busca o equilíbrio econômico do contrato, isto é, a existência de uma relativa proporcionalidade entre prestação e contraprestação.

De acordo com esse princípio, na relação de consumo, as prestações não podem ser desproporcionais ou injustas. Trata-se da equidade contratual. A proteção contratual ao consu-midor é prevista em inúmeros dispositivos legais. O art.6º, V, do CDC, por exemplo, lhe assegura o direito à revisão contratual por onerosidade excessiva advinda de fato superveniente.

No CDC, quando o imóvel é adquirido na planta, isto é, direto da incorporadora, a venda, em relação ao consumidor, é sempre ad mensuram, por medida e nunca ad corpus, me-ramente enunciativa, de modo que a diferença na área, ainda que inferior a 5% da extensão total, autoriza a pleitear o abatimento no preço.

15. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.

Previsto expressamente no artigo 4, III, do CDC, compreende um modelo de compor-tamento social, verdadeiro standard jurídico ou regra de conduta.

É o dever de agir em conformidade com determinados padrões sociais de ética, honestidade, lealdade e correção, de modo a não frustrar as legítimas expectativas da outra parte.

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É importante diferenciar a boa-fé objetiva da boa-fé subjetiva. Boa-fé subjetiva diz respeito a dados internos, fundamentalmente psicológicos, atinentes direta e exclusivamente ao próprio sujeito. Já a boa-fé objetiva, princípio aqui tratado, diz respeito a elementos externos, que determinam como o contratante deve agir.

O princípio da boa-fé objetiva deve ser observado como algo dinâmico, a orientar a conduta das partes antes mesmo da formalização do negócio, durante a execução da avença e depois de sua extinção formal.

Esse princípio cria deveres anexos à prestação principal, ou seja, deveres diferentes daqueles expressamente previstos no contrato, e cuja violação também implica em inadimple-mento contratual.

Dentre os deveres anexos, destacam-se os relacionados ao cuidado, à informação e à cooperação.

Dever anexo de cuidado ou proteção – impõe ao fornecedor o dever de adotar uma conduta protetiva, voltada à prevenção de danos ao patrimônio e à pessoa do consumidor. A propósito, a Súmula 130 do STJ:

A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículos ocorridos em seu estacionamento.

Dever anexo de informação – significa que o fornecedor deve prestar todas as infor-mações necessárias ao esclarecimento do consumidor sobre as características dos produtos e serviços, assim como sobre as condições, as consequências e os riscos da contratação.

O princípio da boa-fé objetiva é aplicável: na fase pré-contratual (negociações preli-minares); na fase da formação do contrato; na fase de execução do contrato; na fase pós-contra-tual, isto é, após o término da execução do contrato.

Por sua vez, prevê o artigo 48 do CDC:

Art. 48. As declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o for-necedor, ensejando inclusive execução específica, nos termos do art. 84 e parágrafos.

Fica evidenciada a função de integração da boa-fé objetiva em todas as fases contra-tuais: fase pré-contratual, fase contratual e fase pós-contratual.

Nessa linha, os enunciados das Jornadas de Direito Civil:

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Enunciado n. 26. A cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de com-portamento leal dos contratantes.

Enunciado n. 25. O art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós-con-tratual.

Enunciado n. 170. A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quan-do tal exigência decorrer da natureza do contrato.

As menções constantes do artigo 48 do CDC se aplicam a qualquer escrito, pré-con-trato ou recibo. Assim, fica clara a total abrangência do regramento, visando interpreter o negó-cio de acordo com a lealdade e a confiança. A força vinculante da boa-fé é marcante, uma vez que não sendo respeitado o que se espera do negócio celebrado, caberão às medidas de tutela específica tratadas pelo artigo 84 do CDC.

Nas relações consumeristas, a oferta deve conter a informação ou publicidade su-ficientemente precisa (art.30); o fornecedor deve assegurar ao consumidor o conhecimento prévio do conteúdo do contrato (art.46) e garantir a continuidade da oferta de componentes e peças de reposição, após o contrato de aquisição do produto (art.32).

A boa-fé, objetiva e subjetiva, exerce tríplice função: interpretativa, integrativa e de controle.

A função interpretativa, que é típica da boa-fé subjetiva, consiste em revelar a von-tade dos contratantes segundo os preceitos de lealdade e confiança. Dessa função, decorrem os seguintes princípios:

a) princípio da preservação dos contratos, de modo que, em regra, a nulidade de uma cláusula, que contiver conteúdo desleal, não invalidará todo o negócio;

b) princípio da conversão dos contratos, consistente na transformação de um con-trato nulo noutro válido, de espécie diferente, quando presentes os requisitos formais e subs-tanciais deste, desde que a intenção das partes tenha sido realmente a celebração desse último negócio. Assim, a compra e venda de imóvel celebrado por instrumento particular pode ser convertida em compromisso de compra e venda;

c) princípio do menor sacrifício do devedor. Anote-se, porém, que a boa-fé objetiva, à medida que cria novos direitos e deveres contratuais, acaba também auxiliando na interpre-tação sistemática doscontratos.

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A função integrativa, ao revés, consiste na explicitação dos direitos e deveres ane-xos, isto é, não previstos expressamente no contrato. Assim, a despeito da omissão do contrato, compete ao vendedor colaborar com a retificação no Registro de Imóveis, fornecendo os docu-mentos necessários.

Essa função integrativa, que é típica da boa-fé objetiva, às vezes também é exercida pela boa-fé subjetiva. Com efeito, conforme salienta Nelson Nery Junior, às vezes a boa-fé sub-jetiva amplia as obrigações contratuais já existentes e as integra com obrigações primárias e secundárias de conservação e respeito do direito alheio.

Finalmente, a função de controle contratual, consistente na delimitação dos direitos que uma parte pode exercer contra a outra, é baseada na boa-fé subjetiva e na boa-fé objetiva. Com efeito, a boa-fé subjetiva, na qual se enfatiza a crença, alivia ou tempera as obrigações assumidas no contrato, evitando, por exemplo, o agir contra os próprios atos, isto é, o exercí-cio de um direito em contradição com o comportamento exercido anteriormente (venire contra factum proprium non valet).

Vejamos uma tabela extraída do Livro de Leonardo de Medeiros Garcia:

FUNÇÕES DA BOA-FÉ OBJETIVA.TELEOLÓGICA OU INTERPRETATIVA (Artigo 113 CC). A função interpretativa da boa-fé, a mais utilizada pela jurisprudência, serve de norte para o juiz, devendo este sempre prestigiar, diante de convenções e contra-tos, a teoria da confiança, no qual as partes deverão agir com lealdade.

Jurisprudência: “As expressões assistência in-tegral e cobertura total, são manifestações que têm significado unívoco na compreensão co-mum e, não podem ser referidas num contrato de seguro de saúde, esvaziadas de seu conteúdo próprio, sem que isso afronte o princípio da boa--fé na avença” (TAPR, Agravo de Instrumento nº 0147580-2, Rel. Juiz Lauro Augusto, 09/11/01.)

CONTROLE OU LIMITADORA DE DIREITOS (Artigo 187 CC). A função de controle da boa-fé visa evitar o abuso do direito subjeti-vo, na qual irá limitar a conduta das partes, com o fito de reduzir as práticas comerciais abusivas.

Jurisprudência: “Independentemente de ex-pressa previsão legal posterior ao contrato, a cláusula que nega cobertura de segurado em caso de prorrogação da internação, fora do seu controle, é abusiva, pois não pode a estipulação contratual ofender o princípio da razobalidade, anotando-se que a regra protetiva do CDC veda a contratação de obrigações incompatíveis com a boa-fé e a equidade”. (Apelação Cível nº0320314-1, TGAM, j. 14/11/00)

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INTEGRATIVA OU CRIADORA DE DEVERES ANEXOS (Artigo 422 CC). A função inte-grativa insere novos deveres para as par-tes diante das relações de consumo, pois além da verificação da obrigação principal, surgem novas condutas a serem também observadas. A violação desses deveres im-plicará em inadimplência contratual (Viola-ção Positiva do Contrato ou Adimplemen-to Ruim). Exemplos: Proteção, cuidado, informação e cooperação.

Jurisprudência: “O dever de informação e, por conseguinte, o de exibir a documentação que a contenha, é obrigação decorrente de lei, de inte-gração contratual compulsória. Não pode ser ob-jeto de recusa nem de condicionantes, em face do princípio da boa-fé objetiva”. (REsp. 330261/SC, 3ª turma do STJ, Rela. Mina. Nancy Andrighi, j. 08/04/02).

Acrescente-se, ainda, que com a boa-fé objetiva, na qual se destaca a lealdade, am-plia-se o conceito de abuso do direito, que doravante passa também a compreender:

a) a manifesta desproporção entre o exercício de um direito e o sacrifício imposto à outra parte;

b) o desleal exercício ou não-exercício de um direito;c) a desleal constituição de um direito.

São, pois, nulas as cláusulas abusivas, desleais e leoninas que:

• Exonerarem ou atenuarem a responsabilidade do fornecedor por vícios dos pro-dutos e serviços ou transferirem sua responsabilidade a terceiros;

• Estabelecerem a inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;• Deixarem ao consumidor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigan-

do o consumidor;• Autorizarem o fornecedor a cancelar, modificar o contrato ou avariar o preço uni-

lateralmente;• Impossibilitarem o direito de indenização por benfeitorias necessárias.

A nulidade da cláusula que contiver conteúdo desleal não invalidará o negócio, nas relações de consumo, exceto quando de sua ausência decorrer ônus excessivo a qualquer das partes (art.51, § 2º, CDC).

O princípio da boa-fé é constantemente invocado pela jurisprudência para a prote-ção do consumidor. A propósito, dispõe a Súmula 302 do STJ:

É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita o tempo da internação hospitalar do segurado.

A propósito, o Enunciado 169 da III Jornada de Direito Civil do CJF:

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O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamen-to do próprio prejuízo.

O enunciado retrata o instituto chamado duty to mitigate the loss. É, pois, dever do Banco avisar o cliente que a sua conta não vem sendo movimentada, questionando-o sobre o desejo de encerrá-la, em vez de deixar fluir as taxas bancárias.

16. PRINCÍPIO DA CONFIANÇA OU DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA.

Não está previsto expressamente no CDC. Trata-se de um desdobramento do princí-pio da boa-fé objetiva. É o dever de respeito às legítimas expectativas do consumidor, seja em relação ao conteúdo do contrato, seja no que se refere à esperada segurança e qualidade dos produtos e serviços que constituem o objeto da relação de consumo.

Assim, tem o fornecedor o dever de promover o adequado esclarecimento ao consu-midor a respeito do produto ou serviço que está adquirindo e, em determinadas situações, das consequências patrimoniais e pessoais para ele consumidor.

Além disso, fixa o dever de respeito a um padrão de qualidade e segurança, levando--se em consideração o uso e os riscos que razoavelmente deles se esperam.

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

A Banca CESPE considerou ERRADA a alternativa na prova para cargo de Defensor Público – TO – Ano 2013: “O princípio da confiança está expressamente previsto no CDC”.

17. PRINCÍPIO DA EDUCAÇÃO E INFORMAÇÃO (Artigo 4º, IV).

Os consumidores e fornecedores devem ser informados e educados quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo, visando a construção de uma sociedade mais justa e equilibrada, diminuindo, por consequência, os litígios nas relações de consumo.

A informação gera a educação, isto é, o aprendizado. Este princípio deve ser obser-vado:

Pelo Estado. A Lei nº 12.291/2010 obriga os estabelecimentos empresariais, sob pena de multa, a manterem ostensivamente um Código de Defesa do Consumidor. O ideal é que o Estado promova a educação formal, incluindo a matéria nos currículos escolares;

A Lei 12.741/2012 dispõe sobre medidas de esclarecimento ao consumidor sobre os tributos incidentes nos preços dos produtos e serviços, relacionado com o § 5º do artigo 150 da CF.

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A Lei 13.179/2015 dispõe sobre o direito de o consumidor adquirir ingressos de meia--entrada para eventos culturais nas compras feitas pela internet, bem como para garantir que sejam prestadas as informações necessárias no site e na entrada do evento.

A Lei 13.305/2016 determina que os rótulos de alimentos que contêm lactose devem, necessariamente, indicar a presença do produto no rótulo do alimento.

Pelas entidades privadas de defesa do consumidor. Exemplos: elaboração de carti-lhas, palestras etc.

Anote-se ainda que o fornecedor deve realizar a educação informal do consumidor sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, para que lhe seja assegurada a liberdade de escolha e igualdade nas contratações.

Assim, enquanto o Estado tem o dever de informar os direitos e deveres, tanto do consumidor quanto do fornecedor, este tem o dever de informar o consumidor sobre o consu-mo adequado e não sobre os direitos e deveres.

Sobre o tema, interessante julgado do STJ publicado no Informativo n. 466:

A questão posta no REsp cinge-se em saber se, a despeito de existir regulamento classificando como “sem álcool” cervejas que possuem teor alcoólico inferior a meio por cento em volume, seria dado à socie-dade empresária recorrente comercializar seu produto, possuidor de 0,30g/100g e 0,37g/100g de álcool em sua composição, fazendo constar do seu rótulo a expressão “sem álcool”. A Turma negou provimento ao recurso, consignando que, independentemente do fato de existir nor-ma regulamentar que classifique como sendo “sem álcool” bebidas cujo teor alcoólico seja inferior a 0,5% por volume, não se afigura plausível a pretensão da fornecedora de levar ao mercado cerveja rotulada com a expressão “sem álcool”, quando essa substância encontra-se presen-te no produto. Ao assim proceder, estaria ela induzindo o consumidor a erro e, eventualmente, levando-o ao uso de substância que acreditava inexistente na composição do produto e pode revelar-se potencialmen-te lesiva à sua saúde. Destarte, entendeu-se correto o tribunal a quo, ao decidir que a comercialização de cerveja com teor alcoólico, ainda que inferior a 0,5% em cada volume, com informação ao consumidor, no ró-tulo do produto, de que se trata de bebida sem álcool vulnera o disposto nos arts. 6º e 9º do CDC ante o risco à saúde de pessoas impedidas do consumo. REsp 1.181.066-RS, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembar-gador convocado do TJ-RS), julgado em 15/3/2011.

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COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

A banca CESPE considerou ERRADA a seguinte alternativa na prova para cargo de Defensor Público Substituto – DPU – Ano 2015: “Considere que, em determinado supermercado cons-tem nas prateleiras informações referentes à quantidade, às características, à composição, à qualidade e ao preço dos produtos, bem como os referentes aos riscos a eles associados, mas não conste informação sobre os tributos incidentes sobre trais produtos. Nessa situação, o supermercado estará infringido regra constante no CDC.”

18. PRINCÍPIO DO INCENTIVO AO AUTOCONTROLE OU PRINCÍPIO DO CONTROLE DE QUALI-DADE E MECANISMO DE ATENDIMENTO PELAS EMPRESAS (Artigo 4º, V).

O Estado deve estimular o fornecedor na criação de:

Meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços. Tra-ta-se de uma postura preventiva da empresa para evitar ou atenuar os conflitos com o consumi-dor. O Estado cumpre esse princípio ao impor as exigências necessárias à colocação do produto ou serviço no mercado, forçando o fornecedor a realizar testes prévios, rejeitando o produto ou serviço prejudicial à saúde ou segurança do consumidor ou nocivo ao meio ambiente;

Mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo. Exemplo: a empresa cria o serviço de atendimento ao consumidor (SAC). Outro exemplo: o recall, isto é, a empresa convoca os consumidores que adquiriram o produto com defeito, detectado posteriormente, propondo-se a trocá-lo ou consertá-lo, sem qualquer ônus.

Ademais, visando incentivar mecanismos alternativos, foi criado pela Secretaria Na-cional do consumidor (Senacon/MJ), uma plataforma tecnológica de informação, interação e compartilhamento de dados chamada de consumidor.gov.br. Dessa forma, o consumidor po-derá registrar a reclamação sobre a empresa desejada e acompanhar a resposta no sistema. Além disso, o Decreto 8.573/2015, dispõe sobre o consumidor.gov.br e estipula objetivos a se-rem alcançados, instituindo um comitê de gestão e manutenção do sistema.

Sob essa ótica, vejamos alguns enunciados aprovados na I Jornada “Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios”, CJF:

Enunciado n. 9: O poder público, os fornecedores e a sociedade deverão estimular a utilização de mecanismos com a plataforma CONSUMIDOR.GOV.BR, política pública criada pela Secretaria Nacional do Consumidor – Senacon e pelos Procons, com vistas a possibilitar o acesso, bem como a solução dos conflitos de consumo de forma extrajudicial, de maneira rápida e eficiente.

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Enunciado n. 12: O Estado e a sociedade deverão estimular soluções consensuais nos casos de superendividamento ou insolvência do consu-midor pessoa física, a fim de assegurar a sua inclusão social, o mínimo existencial e a dignidade da pessoa humana.

19. PRINCÍPIO DA REPRESSÃO DE ABUSOS (Artigo 4º, VI).

Esse princípio é o que ordena a punição, civil, penal ou administrativa, do fornecedor que, no mercado de consumo, age com deslealdade.

A coibição e repressão devem recair sobre todos os atos de abusos praticados no mercado de consumo. Exemplo: as práticas abusivas previstas no art. 39 do CDC.

Concorrência desleal. Exemplo: proibição do uso indevido de inventos, marcas, no-mes comerciais e signos distintivos, que possam confundir os consumidores. Assim, o Poder Judiciário pode proibir, sob pena de multa diária, a distribuição de produto com marca similar a outra, além de determinar a busca e apreensão dos produtos já distribuídos.

Diante disso, o que se quer é resguardar a proteção da ordem econômica prevista no artigo 170 da CF. Assim, pode-se possibilitar uma concorrência livre e leal, garantindo também os direitos dos consumidores.

Diante disso, é válido destacar a prática de dumping, na qual consiste em uma ou mais empresas venderem seus produtos ou mercadorias por preços menores do que os encon-trados no mercado de consumo. Essa prática é vedada e visa prejudicar e eliminar a concorrên-cia. Em complemento, vejamos uma jurisprudência aplicada ao caso:

Multa aplicada por Procon em decorrência de prática de dumping (..) Não há como se afastar a legitimidade do PROCON na hipótese sub judice, tendo em conta, principalmente, a determinação contida no Código de Defesa do Consumidor no sentido de coibir de forma eficiente todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal. (STJ, REsp 938607 / SP, DJ 08/10/2007 P. 234, Rel Min. Francisco Falcão, J. 04/09/2007.

Além disso, teremos a publicidade comparativa, em que a propaganda indentificará de maneira implícita ou explícita um concorrente de produtos ou serviços afins. Segundo a óti-ca de Priscila Romero Gimenez, a publicidade comparativa é válida, contudo, deve ser observa-do os princípios e os limites delineados pelo artigo 2º do estatuto da CONAR. Esta prática seria importante para os consumidores decidirem por qual produtor optar, estimulando o mercado atual.

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A publicidade comparativa não pode mencionar a marca de concorrência, e não pode contribuir para a degenerescência da marca. Se não ocorrer nenhuma dessas hipóteses, a comparação não ofenderá o dreito de propriedade industrial.

20. PRINCÍPIO DA RACIONALIZAÇÃO E MELHORIA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS (Artigo 4º, VII).

De acordo com esse princípio, os serviços públicos devem ser prestados de forma eficiente, competindo ao Poder Público organizar-se e realizar o planejamento logístico para a melhoria constante do serviço.

Aludido princípio afasta qualquer dúvida acerca da possibilidade de o Estado figurar como fornecedor nas relações de consumo. É, pois, direito do consumidor, quando se tratar de serviço público (exemplos: água, luz, transporte etc), exigir do prestador do serviço público (Es-tado, Concessionário ou Permissionário, autarquias etc): que o serviço seja prestado de forma racional, isto é, eficiente; que o serviço esteja sempre em constante melhoria.

21. PRINCÍPIO DO ESTUDO DAS MODIFICAÇÕES DO MERCADO (Artigo 4º, VIII).

Esse princípio obriga o Estado a analisar e pesquisar, de forma constante, as trans-formações ocorridas na sociedade de consumo, conhecendo os problemas e disciplinando, por meio de lei, as novas relações contratuais. Com o avanço da internet, o mercado de consumo se modificou. Boa parte das vendas se tornou virtual e, no cenário atual, ainda paira uma série de dúvidas sobre a responsabilidade civil e penal decorrentes dessas transações, justamente porque esse Princípio não vem sendo cumprido a contento pelo Estado.

Assim, evita-se que as normas instituídas para regrar as relações de consumo se tor-nem ultrapassadas e sem eficácia.

22. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL DOS DANOS.

O regramento fundamental é a reparação integral dos danos, que assegura aos con-sumidores efetiva prevenção e reparação de todos os danos suportados, sejam eles materiais ou morais, individuais, coletivos ou difusos.

Sobre o tema, julgado do TJ/RS:

TOTO BOLA. SISTEMA DE LOTERIAS DE CHANCES MÚLTIPLAS. FRAUDE QUE RETIRAVA AO CONSUMIDOR A CHANCE DE VENCER. AÇÃO DE REPA-RAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. DANOS MATERIAIS LIMITADOS AO VALOR DAS CARTELAS COMPROVADAMENTE ADQUIRIDAS. DANOS MORAIS PUROS NÃO CARACTERIZADOS. POSSIBILIDADE, PORÉM, DE EX-CEPCIONAL APLICAÇÃO DA FUNÇÃO PUNITIVA DA RESPONSABILIDADE

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CIVIL. NA PRESENÇA DE DANOS MAIS PROPRIAMENTE SOCIAIS DO QUE INDIVIDUAIS, RECOMENDA-SE O RECOLHIMENTO DOS VALORES DA CON-DENAÇÃO AO FUNDO DE DEFESA DE INTERESSES DIFUSOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não há que se falar em perda de uma chan-ce, diante da remota possibilidade de ganho em um sistema de loterias. Danos materiais consistentes apenas no valor das cartelas comprovada-mente adquiridas, sem reais chances de êxito. Ausência de danos morais puros, que se caracterizam pela presença da dor física ou sofrimento mo-ral, situações de angústia, forte estresse, grave desconforto, exposição à situação de vexame, vulnerabilidade ou outra ofensa a direitos da perso-nalidade. Presença de fraude, porém, que não pode passar em branco. Além de possíveis respostas na esfera do direito penal e administrativo, o direito civil também pode contribuir para orientar os atores sociais no sentido de evitar determinadas condutas, mediante a punição econô-mica de quem age em desacordo com padrões mínimos exigidos pela ética das relações sociais e econômicas. Trata-se da função punitiva e dissuasória que a responsabilidade civil pode, excepcionalmente, assu-mir, ao lado de sua clássica função reparatória/compensatória. O Direito deve ser mais esperto do que o torto, frustrando as indevidas expectati-vas de lucro ilícito, à custa dos consumidores de boa fé. Considerando, porém, que os danos verificados são mais sociais do que propriamente individuais, não é razoável que haja uma apropriação particular de tais valores, evitando-se a disfunção alhures denominada de overcompen-santion. Nesse caso, cabível a destinação do numerário para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, criado pela Lei 7.347/85, e aplicável também aos danos coletivos de consumo, nos termos do art. 100, parágrafo úni-co, do CDC. Tratando-se de dano social ocorrido no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a condenação deverá reverter para o fundo gaúcho de defesa do consumidor. Recurso parcialmente provido. (Recurso Cível Nº 71001281054, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Re-lator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 12/07/2007)

Em relação aos danos, é necessário a seguinte distinção:

Danos morais coletivos: atingem vários direitos da personalidade; direitos indivi-duais homogêneos ou coletivos em sentido estrito – vítimas determinadas ou determináveis; indenização destinada para as próprias vítimas;

Danos sociais ou difusos: causam um rebaixamento no nível de vida da coletividade; direitos difusos – vítimas indeterminadas, toda a sociedade é vítima da conduta; indenização para um fundo de proteção ou instituição de caridade.

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De outro norte, são princípios da publicidade:

• Identificação da publicidade: não se admite a publicidade clandestina ou sublimi-nar;

• Vinculação contratual da publicidade: diante da regra do artigo 30;• Veracidade: vedação da publicidade enganosa;• Não abusividade: pela proibição da publicidade abusiva, tida também como ilíci-

ta;• Inversão do ônus da prova: artigo 38 do CDC, segundo o qual o conteúdo da publi-

cidade deve ser provado por quem a patrocina;• Transparência: a publicidade deve estar sintonizada com a boa-fé objetiva e a leal-

dade negocial;• Correção do desvio publicitário: além da reparação civil, presente o desvio, cabem

medidas administrativas e penais, bem como a necessidade de veiculação de uma contrapro-paganda (artigo 56, XII, CDC);

• Lealdade publicitária: artigo 4º, VI, do CDC, que dispõe como fundamento da política nacional das relações de consumo a “coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores”;

• Identificação publicitária: pela vedação da publicidade mascarada ou simulada--dissimulada. Atenção! Não obstante a vedação em comento, admite-se o merchandising, que é uma forma de publicidade não muito evidente, propagada principalmente durante programas de televisão (novelas, por exemplo). Contudo, para que a prática seja considerada lícita, é pre-ciso que, antes do início do programa, sejam os telespectadores informados de que publicidade na forma de merchandising será realizada.

23. INTEGRAÇÃO COM OUTRAS NORMAS. DIÁLOGO DAS FONTES (Artigo 7º).

Nada obsta a aplicação simultânea de mais de uma lei no mesmo caso concreto. O diálogo das fontes visa a conciliar as normas jurídicas oriundas de diplomas legislativos distin-tos, aplicando- as simultaneamente, distinguindo- se das antinomias, cujo objetivo é afastar a incidência de uma norma para que outra discipline com exclusividade o caso concreto.

A essência da teoria consiste no fato de que as normas jurídicas nao se excluem – su-postamente porque pertencentes a ramos jurídicos distintos –, mas se complementam. A prin-cipal aplicação se dá no âmbito da interação entre o CDC e o CC, em matérias como a responsa-bilidade civil e o direito contratual.

No âmbito legislativo a teoria encontra amparo no artigo 7º, caput, do CDC, que ado-ta um modelo aberto de interação legislativa:

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Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorren-tes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signa-tário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade.

No caso concreto é possível que a norma mais favorável ao consumidor esteja fora da legislação consumerista, sendo autorizado ao intérprete fazer a opção por esse preceito es-pecífico.

Em síntese, houve uma aproximação principiológica entre o CDC e o CC, conforme reconhecido pelo Enunciado n. 167 da III Jornada de Direito Civil:

Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação princi-piológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor no que respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma nova teoria geral dos contratos.

Com efeito, Cláudia Lima Marques, a partir dos ensinamentos de Erik Jayme, propõe diálogos de interação entre o CDC e o CC, buscando estabelecer premissas para um diálogo sistemático de coerência, complementaridade e subsidiariedade, de coordenação e adaptação sistemática.

Segundo Cáudia Lima Marques, são três os tipos de diálogos entre o CC e o CDC:

Aplicação Simultânea das duas Leis – Diálogo Sistemático de Coêrencia: Uma lei poderá servir de base conceitual para a outra, principalmente no caso de uma lei geral e uma lei especial.

Aplicação Coordenada das duas leis – Diálogo Sistemático de Complementaridade e Subsidiariedade em Antinomias Aparentes ou Reais: Uma lei poderá complementar a outra, dependendo do seu campo de aplicação no caso concreto, a indicar a aplicação complementar tanto de suas normas, quanto de seus princípios, no que couber ou for necessário.

Diálogo das Influências Recíprocas – Diálogo de Coordenação e Adaptação Siste-mática: Tem repercussão no caso de possível redefinicação do campo de aplicação da lei. Tra-ta-se da influência do sistema especial no geral e do geral no especial, em um diálogo de duplo sentido. Nesse sentido, a definição de consumidor stricto sensu e de consumidor equiparado podem sofrer influência finalísticas do Código Civil.

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COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

MP/GO – 2010.

No caso dos transportes aéreos, quando há atraso de voos ou questões que envolvem o des-cumprimento da programação de pacote turístico, o Superior Tribunal de Justiça não tem aplicado o art. 26, inciso I, do CDC, que dispõe caducar em 30 (trinta) dias o direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação nos fornecimentos de seriços e de produtos não duráveis. A opção pela prevalência da regra do art. 205 do Código Civil (prescrição) para ação de reparação de danos materiais e morais decorrentes de atraso de voo harmoniza-se com o seguinte fundamento teórico:

a) Ab-rogação da lei velha pela nova.b) Diálogo de coordenação e adaptação sistemática.c) Diálogo sistemático de complementariedade e subsidiariedade.d) Diálogo sistemático de coerência.

Alternativa C.

Conclue-se que, pela teoria do diálogo das fontes, supera-se a interpretação insular do direito, sendo a qual cada ramo do conhecimento jurídico representaria uma ilha. O direito passa a ser visualizado como um sistema solar – interpretação sistemática e planetária – em que os planetas são códigos, os satélites são os estatutos próprios (caso do CDC) e o sol é a CF, irradiando seus raios solares – seus princípios – por todo o sistema.

Sobre o tema, julgado do STJ:

CONSUMIDOR E CIVIL. ART. 7º DO CDC. APLICAÇÃO DA LEI MAIS FAVORÁ-VEL. DIÁLOGO DE FONTES. RELATIVIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESPECIALI-DADE. RESPONSABILIDADE CIVIL. TABAGISMO. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. O mandamento constitu-cional de proteção do consumidor deve ser cumprido por todo o sis-tema jurídico, em diálogo de fontes, e não somente por intermédio do CDC. Assim, e nos termos do art. 7º do CDC, sempre que uma lei garantir algum direito para o consumidor, ela poderá se somar ao microssiste-ma do CDC, incorporando-se na tutela especial e tendo a mesma pre-ferência no trato da relação de consumo. Diante disso, conclui-se pela inaplicabilidade do prazo prescricional do art. 27 do CDC à hipótese dos autos, devendo incidir a prescrição vintenária do art. 177 do CC/16, por ser mais favorável ao consumidor. Recente decisão da 2ª Seção, porém, pacificou o entendimento quanto à incidência na espécie do prazo pres-cricional de 05 anos previsto no art. 27 do CDC, que deve prevalecer, com

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a ressalva do entendimento pessoal da Relatora. Recursos especiais providos. (REsp 1009591/RS Recurso Especial 2007/0278724-8 – Ministra Nancy ANDRIGHI)

Diante disso, poderão ocorrer conflitos entre a aplicação de uma norma em detri-mento da outra, vejamos o caso da Convenção de Varsóvia, deverá ser aplicada a referida Con-venção ou o CDC?

Nesse sentido, o julgado do STJ, AgR g no AREsp 607.388/RJ, Rel. Ministro Moura Ri-beiro, Terceira Turma, DJe 23/06/2016, decidiu: “A jurisprudência desta Corte firmou entendi-mento de que a responsabilidade civil das companhias aéreas em decorrência da má prestação de serviços após a entrada em vigor da Lei n. 8.078/90 não é mais regulada pela Convenção de Varsóvia e suas posteriores modificações (Convenção de Haia e Convenção de Montreal) ou pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, subordinando-se ao Código de Defesa do Consumidor.”

Além do já abordado sobre o Diálogo das Fontes, o parágrafo único do artigo 7º do CDC define a responsabilidade solidária dos fornecedores pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.

Assim, pode-se concluir que o consumidor poderá escolher os fornecedores solidá-rios que irão integrar no polo passivo da demanda. Além de que poderá entrar com a ação con-tra todos ou apenas contra a alguns, conforme melhor preferir.

Ademais, o artigo 34 do CDC trata da responsabilidade solidária entre prepostos e representates autônomos, in verbis:

Art. 34. O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsá-vel pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos.

Nesse diapasão, o julgado do STJ, Resp 1077911/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., Dje 14.10.2011, trata sobre a responsabilidade solidária entre a seguradora e corretores de se-guro pela cobertura securitária: “Consumidor. Contrato. Seguro. Apólice não emitida. Aceitação do Seguro. Respondabilidade. Seguradora e Corretores. Cadeia de Fornecimento. Solidarieda-de”.

Ainda sob essa ótica, é válido mencionar que os integrantes da cadeia de fornecedo-res não podem alegar que o dano foi gerado por culpa exclusiva de um dos integrantes. (STJ, AgRg no AREsp 207.708/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta turma, DJe 03/10/2013).

Segundo Ruy Rosado de Aguiar Jr, a Entidade Privada de Assistência à sáude, que associa interessados atráves de planos de sáude e mantém hospitais ou credencia outros para a prestação dos serviços a que está obrigada, tem responsabilidade solidária pela reparação dos

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danos decorrentes de serviços médicos ou hospitalares credenciados.

Existe uma diferença importante em relação à responsabilidade anterior, tendo em vista que, se a escolha do profissional ou hospital for do consumidor, com reembolso das des-pesas efetuadas, não há responsabilidade da operadora (seguro-saúde). Se o hospital ou o pro-fissional for credenciado do plano, ou seja, a escolha do consumidor so é feita entre os creden-ciados, existirá a responsabilidade da operadora.

Um julgado que merece atenção e pode cair em prova foi em sede de Recurso Repe-titivo, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTRO-VÉRSIA. ART. 543-C DI COC. SEGURADORA LITISDENUNCIADA EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MOVIDA EM FACE DO SEGURADO. CONDENA-ÇÃO DIRETA E SOLIDÁRIA. POSSIBILIDADE. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação de reparação de danos movida em face do segurado, a Se-guradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente junto com este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados na apólice. (STJ, REsp 925130/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Se-gunda Seção, julgado em 08/02/2012, DJe 20/04/2012).

COMO ESSE ASSUNTO FOI COBRADO EM PROVA.

Foi considerada CORRETA pela banca CESPE para cargo de defensor público – SE – Ano 2012: “Todos aqueles que participam da introdução do produto ou serviço no mercado devem res-ponder solidariamente por eventual defeito ou vício, ficando a citério do consumidor a esco-lha dos fornecedores solidários que integrarão o polo passivo da ação”.

Uma exceção da regra da solidariedade está prevista no artigo 19, § 2º, do CDC que fala sobre a responsabilidade exclusiva do fornecedor imediato ou comerciante quando fizer à pesagem ou medição do produto e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais.