revista estradas n° 16

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Revista técnica sobre rodovias, publicada pela Sociedade dos Técnicos Universitários do DAER/RS - SUDAER e pela Sociedade dos Engenheiros Civis do DAER/RS - SECDAER.

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1Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

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editorial

www.sudaer.com.br

10 anos! No meio dos veículos impressos alcançar 10 números já é uma vitória. Chegar aos

10 anos de existência é uma conquista e motivo de orgulho, não só para nós que fazemos

a Revista Estradas, mas para todos os engenheiros, técnicos e funcionários do DAER, em

especial, e, também, todos aqueles que colocam o seu conhecimento, a sua dedicação e o

seu esforço, para oferecer à sociedade um infraestrutura rodoviária de qualidade.

Quando lançamos o primeiro número tínhamos a convicção de que a Revista Estradas

surgia para oferecer ao meio rodoviário um instrumento que lhe fazia muita falta: um

canal de comunicação para que o conhecimento e a informação circulassem entre as

instituições, órgãos públicos, empresas e profissionais da área. Um meio para que obras e

trabalhos realizados, pesquisas em desenvolvimento ou concluídas, inovações tecnológicas

fossem compartilhadas, debatidas e assimiladas, integrando esses diversos segmentos e

contribuindo para o crescimento e a qualificação do setor rodoviário.

Assim, a Revista Estradas cresceu e chegou ao seu décimo aniversário. Temos a

convicção de que todo o esforço valeu a pena, pois ela se consolidou, cumpriu seus

objetivos com correção, ética e idealismo. Alcançou o reconhecimento no meio rodoviário e o

respeito de seus leitores e colaboradores. Fez isso a partir da dedicação e comprometimento

dos membros das Comissões Editoriais que se sucederam ao longo desses anos, do apoio

das diretorias da SUDAER e SECDAER, da parceria de seus anunciantes e da colaboração

de todos aqueles que nos prestigiaram enviando seus trabalhos e artigos, compartilhando

seu conhecimento.

O espaço é pequeno para nominar todos aqueles que doaram seu tempo, seu talento

e sua dedicação à Revista Estradas. Assim, lembrando aquela que foi a idealizadora

da Revista e sua maior incentivadora e defensora, a engenheira Sayene Paranhos Dias,

homenageamos e agradecemos a todos. Embora não esteja mais fisicamente entre nós, essa

conquista também é dela. E seu exemplo e entusiasmo é nosso combustível para seguir

mantendo esta estrada aberta e em condições de tráfego.

A lembrança da trajetória e a comemoração das conquistas, no entanto, não nos

fazem esquecer o futuro. Ao completarmos uma década de promoção e divulgação do setor

rodoviário em seu estado da arte, queremos, neste número, debater as perspectivas para a

infraestrutura de transportes na próxima década e que papel os diversos segmentos, que

compõem o setor, deverão desempenhar para fortalecê-lo e valorizá-lo.

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3Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

REVISTA ESTRADASISSN 1807-426X

Ano 10 - N° 16 - dezembro 11

Publicação da Sociedade dos Técnicos

Universitários do DAER/ Sociedade dos

Engenheiros Civis do DAER

Av. Borges de Medeiros, 1555 - Prédio Anexo

CEP 90110-150 - Porto Alegre - RS

(51) 3210.5076

SUDAERPRESIDENTEEng. Carlos Alexandre Pinto Toniolo

VICE-PRESIDENTEEng. Aldo Luiz Grassi

SECRETÁRIOEng. Janete Colombo

TESOUREIROEng. Alexandre José Garcia Sório

SECDAERPRESIDENTEEng. Jorge Henrique Vieira Fernandes

VICE-PRESIDENTEEng. Dalton Freitas Garcia

SECRETÁRIOEng. Diná Fernandes

TESOUREIROEng. Raul Carlos Py de Hires

IDEALIZADORAEng. Sayene Paranhos Dias

COMISSÃO EDITORIALEng. Bibiana Cardoso Fogaça

Eng. Christine Tessele Nodari

Eng. Jayme Tonon

Eng. José Augusto de Oliveira

Eng. José Octávio Guimarães Rodrigues

Eng. Marlova Grazziotin Johnston

Eng. Tatiana Gomes Tedesco

JORNALISTA RESPONSÁVELFrancisco Canabarro

Mtb 8569

DIAGRAMAÇÃO E FINALIZAÇÃOJean Grivot

COMERCIALIZAÇÃOPadda Comunicação

(51) 3475.8812 / 7811.9666

sumário

Mensagens dos PresidentesSECDAER 4 SUDAER 6

Ponto de Vista Perspectivas para a infraestrutura de transportes na próxima década 10Segurança viária: o desafio multidisciplinar de uma década menos intuitiva 12Ferrovias 16Transportes e Sustentabilidade: tendência ou modismo? 20Transporte hidroviário no Rio Grande do Sul 26

EntrevistaEng. Luis Antonio LindauA contribuição do transporte para uma cidade mais sustentável. Repensando o espaço urbano. 28

ArtigosReminiscências do DAER-RS e da Revista Estradas (2001) e perspectivas de infraestrutura de transporte e mobilidade urbana (2011/2020) 34

Avaliações da estabilidade e do desempenho de sistemas de proteção de taludes rodoviários em uma encosta litorânea instrumentada 40

Análise estatística de resultados do Indicador da Qualidade dos Pavimentos (IQP) 48

Avaliação do pavimento de concreto em diversas ruas de Curitiba 54

Trabalhos TécnicosO Gerenciamento Ativo de Tráfego e suas possibilidades de aplicação no Brasil 60

Análise da capacidade e nível de serviço em rodovias rurais de pista simples 68

Equipamentos e TecnologiaMicronivelamento em Pavimento de Concreto 76

Resgate HistóricoA Ponte do Guaíba 78

Agenda 83

As informações, os conceitos e as opiniões emitidos nos textos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores.

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4

m 15 de Setembro deste ano, a SECDAER completou

25 anos de existência. Entre as suas finalidades, a

SECDAER foi criada para representar e lutar pela defesa

da valorização e do interesse profissional/funcional de

seus associados, perante os poderes públicos, autoridades

administrativas e judiciais, em qualquer instância e visar

sempre os interesses de toda classe, da comunidade e

do público em geral. Diante de objetivos tão relevantes,

desejamos longa vida a esta entidade e agradecemos a

colaboração de todos os membros ativos e inativos ao

longo de mais de duas décadas .

Estivemos a frente da SECDAER na primeira gestão

com mandato de dois anos – condição imposta pela

alteração estatutária ocorrida na associação. Entendemos

que este período se constituiu numa das fases mais

turbulentas dentro do Departamento Autônomo de Estradas

de Rodagem.

No início de 2010, a queda da Ponte sobre o Rio Jacuí

escancarou as nossas fragilidades na área de conservação

de obras de arte. O DAER possui cerca de 1000 obras

sob sua responsabilidade e o espetáculo de mídia fazia

parecer que todas estavam à beira do colapso. Enquanto

era construída a nova estrutura, procedia-se à perícia

pelo Instituto Geral de Perícias do Estado de RGS e o

inquérito, que apurava as circunstâncias em que ocorrera

o tombamento da estrutura, presidido pela Delegacia de

Polícia Civil de Agudo. O relatório final do inquérito não

apontou nenhuma responsabilidade aos técnicos do DAER

pela tragédia.

Ao longo daquele ano, inúmeros contratos de

conservação de rodovias e construção de novos trechos

eram assinados. Neste sentido, podemos falar o mesmo

quanto às assinaturas de convênios com os municípios.

E naquele momento, através da elaboração da

“Proposta de Melhoria e Modernização do DAER” em 2008,

já havíamos assinalado a ausência de uma estrutura mínima

de fiscalização destes contratos nas Superintendências

Regionais. A falta de pessoal e equipamentos é uma

verdade incontestável dentro do DAER. Tal situação é

fruto do pensamento daqueles que acreditam num Estado

mínimo e que se regozijam de suas ações pródigas ao

esfacelamento do setor público. Aqui não falaremos da

degradação das máquinas ... afinal de contas, estas , nós

posicionamos em qualquer canto ...

Agora, em 2011, fomos surpreendidos pela criação de

uma Força Tarefa agindo dentro do DAER. Não bastando

o constrangimento gerado junto aos servidores, sua ação

coloca sob suspeição o trabalho de longos anos dos

técnicos, que mesmo em condições adversas quanto

aos salários, pessoal e equipamentos, planejamento e

Construindo casas ou pontes, igrejas ou hospitais, pintando, curando doentes, voando ou varrendo as ruas, fazendo política ou amor, morrendo e, porque não, matando, a vida importa somente pela doação que se faz dela, pelo sentido e pela direção.

Geraldo Vandré *

Engº Jorge Henrique Vieira Fernandes Presidente da Sociedade dos Engenheiros Civis do DAER

*Texto extraído da obra Canto Geral, Março de 1968, EMI-ODEON S.A .

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SECDAER

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disponibilidade de recursos, nunca se furtaram de suas

responsabilidades.

Sobre esta questão, a SECDAER apóia a apuração

das eventuais ou pontuais irregularidades, no entanto,

entende que o bom resultado das atividades realizadas

pela Força Tarefa não deva se restringir somente à entrega

de um relatório e sim, a junção de esforços por parte dos

integrantes da mesma e do Departamento para coibir a

repetição das inconformidades.

A questão a ser respondida é:

“ Como podemos atuar e desempenhar nossas funções

com as condições atuais ? Qual o caminho ? ”

De qualquer forma, um número considerável de

experientes profissionais continuará exercendo suas

atividades dentro do Departamento nos próximos anos. Sendo

assim, aguardamos um chamamento do Governo do Estado

do RGS para participar da remodelação proposta ao DAER,

conforme notícias veiculadas na imprensa que tratam da

contratação de uma consultora para a elaboração de estudos

a respeito do assunto. Não somos contra as mudanças, no

entanto, é legítimo sermos agentes ativos e participativos

neste processo. Trata-se de um direito que nós temos, assim

como, um dever junto à sociedade que defendemos e com

aqueles profissionais que nos sucederão!

Por outro lado, cumpre-nos destacar neste período,

a visão difundida dentro do Fórum de Infraestrutura

das Entidades de Engenharia que coloca o DAER como

instituição de Estado , distante das inserções políticas

eventuais, dotado de uma gestão com viés de longo prazo

e fundamentada no mérito de nosso qualificado corpo

funcional, seguindo um Plano Rodoviário atualizado com

força de lei.

Dito isso, abordaremos a pertinência do tema

proposto pela Revista Estradas nº 16 “Perspectivas para

a Infraestrutura de transportes 2011-2020”. São aspectos

notórios de fácil percepção, o crescimento atual da economia

no Brasil e o aumento da necessidade de investimentos

em obras de infraestrutura, em função de dois eventos

programados nesta década: a Copa do Mundo de 2014 e os

Jogos Olímpicos de 2016. No tocante às rodovias, em razão

destes empreendimentos, entendemos que o estado precário

de conservação e a manutenção dos trechos existentes

aliados aos custos dos pedágios, constituem-se em

elementos chaves a serem inevitavelmente debatidos dentro

da logística de transportes.

Por fim, em relação à citação inicial de Geraldo

Vandré, acreditamos que aquelas palavras simbolizam

nossa escolha pela Engenharia Civil e pela missão assumida

dentro do DAER, PELO SENTIDO E PELA DIREÇÃO!!!

Saudações Rodoviárias,

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ste ano de 2011 traz contornos muito especiais para

nossas associações. A SUDAER completou 50 anos

de existência em 15 de abril, tendo surgido como a

Sociedade dos Engenheiros do DAER – SEDAER. Veio

depois a associação dos engenheiros civis, hoje com seus

25 anos, da qual o Jorge Fernandes nos traz suas palavras

nesta seção. Em 2001, surge a REVISTA ESTRADAS,

pelo que comemoramos seus 10 anos de existência.

Nossa Revista foi idealizada para ampliar os horizontes

e buscar sustentabilidade na sua publicação, pois

outro veículo da nossa entidade, o Boletim da SUDAER

(depois contando com o apoio também da SECDAER),

não poderia ser mantido com a qualidade exigida de uma

publicação técnica só com recursos próprios. A idéia

sempre foi de ocupar o espaço deixado pelos Boletins do

DAER, publicação oficial da instituição que deixou de ser

editado, visando ser um veículo para trazer informações

para os nossos associados e levar ao meio rodoviário aquilo

que é produzido no DAER em termos de engenharia e

gestão rodoviária.

Por isso, através da Revista Estradas nº 16 e em nome

dos associados e integrantes dos Conselhos Deliberativo

e Fiscal, cumprimentamos a todos aqueles visionários

que perceberam que a melhor coisa a fazer era unir

esforços pela manutenção da prestação de bons serviços

à sociedade gaúcha pelo DAER, com a valorização do

quadro de servidores em todos os níveis e da engenharia

rodoviária do estado, pautando sua atuação pela técnica e

planejamento de longo prazo, assim como a todos os que os

sucederam, empunharam as mesmas bandeiras e conduziram

as entidades até aqui. Àqueles que integraram as Comissões

Editoriais da Revista ao longo desses 10 anos, e àqueles que

iniciaram a publicação do Boletim, nossos cumprimentos

especiais pelo trabalho realizado, sempre num crescente,

exigindo um trabalho minucioso de idealização, seleção de

matérias e elaboração de cada edição. Ao nosso jornalista

Francisco, incansável na busca de parceiros e muitas vezes

fazendo o “meio de campo” entre a comissão editorial

e as Juntas Executivas da SUDAER e SECDAER, nossos

cumprimentos e agradecimento pelo trabalho realizado.

Cumprimentos e agradecimentos aos nossos parceiros que

acreditaram todo este tempo na Revista, apresentando seus

trabalhos e artigos que só enriqueceram nosso veículo, bem

como aos anunciantes que se apresentam para o mercado

e ajudam na efetivação de cada edição. Quem puder reler a

edição nº 12, alusiva ao aniversário de 70 Anos do DAER,

encontrará no texto “A força de um movimento”, de autoria do

associado e ex-Diretor-Geral Élio Seganfredo, um breve resumo

dos motivos que levaram à criação da então SEDAER. Percebe-

se que ainda hoje as motivações daquela época são atuais.

No tocante às atividades desenvolvidas pelas

associações, fazemos um resgate do que foi trabalhado

desde 2008, quando na Revista nº 13 os então Presidentes

Ana Paula e Toralles, referiram a nossa mobilização na luta

contra a alteração da lei nº 11.090 no tocante à formação

exigida do ocupante do cargo de Diretor-Geral, e a elaboração

do trabalho “Proposta de Melhoria e Modernização do

DAER”. Em 2009 continuamos mobilizados, juntamente

SUDAER

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Engº Carlos Alexandre Pinto Toniolo Presidente da Sociedade dos Técnicos Universitários do DAER

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com o SISDAER, contribuindo na elaboração do plano

de reestruturação administrativa do Departamento e

do plano de cargos e salários. Foram muitas propostas,

discussões, reuniões, assembléias, planilhas de salários e

repercussão financeira, expectativas frustradas, risco de

reajustes ridículos na faixa de 3 a 4%, prazos longínquos

para implementação das tabelas finais, reuniões no

GAE quase no fim do prazo, enfim, diversas alternativas

de encaminhamento que culminaram em projetos com

resultados possíveis no momento, especialmente pela maior

recuperação dos vencimentos do nível médio, ainda que

o nível superior ficasse com o básico abaixo do mínimo

profissional. A necessidade de encaminhamento dos projetos

para a Assembléia Legislativa e sua aprovação nos levou a

fazer visitas à Casa Civil, aos líderes de bancadas e outros

deputados para informar da urgência dos projetos e o apoio

dos servidores, visando aprová-los antes do início do período

eleitoral, sem o que não receberíamos reajustes em 2010. E

conseguimos o reajuste em uma parcela no próprio mês de

abril e a GPR parcial até a sua regulamentação. No dia da

votação, a participação dos técnicos e servidores do DAER

foi decisiva, lotando as galerias do plenário da AL. E o ano

seguiu com a implantação da nova estrutura administrativa,

em especial das novas Diretorias e Superintendências na

sede, mas outro governo terminou sem que fosse concluído o

Regimento Interno, que daria forma ao restante da estrutura

administrativa. Sem ele, continuamos com boa parte dos

problemas apontados em 2008.

Mas o ano de 2011 nos guardava um “tsunami” de

denúncias de irregularidades e também de um governo contra

o outro, num claro “terceiro tempo da eleição para o governo

do Estado”, com críticas que atingiam diretamente o corpo

técnico do Departamento. Lembramos que somente depois

das entidades publicarem um apedido na Zero Hora de 05

de abril (ver nota nesta página) é que o tom das críticas

diminuiu, especialmente quanto à generalização de até

então. Mas veio o relatório da Força-tarefa e o que se viu foi

a falta de orientação para os técnicos de como atuar frente

ao documento, vendo-se colegas envolvidos em processos

judiciais sem qualquer sindicância ou manifestação ou

defesa prévia. Em junho, um grupo de 27 técnicos se

reuniu e teve audiências com o Diretor-Geral e o Secretário

de Infraestrutura, aos quais novamente se apresentou o

trabalho com as propostas para o Departamento e pedimos

orientações. O tempo passou e nova mobilização ocorreu em

agosto, desta feita com encaminhamento de um Manifesto

(ver o teor do mesmo no quadro) no dia 23 à direção do

DAER, à SEINFRA, à Casa Civil, ao Governador do Estado,

a diversos outros órgãos do Estado, à Assembléia Legislativa

e a diversas entidades e imprensa, como nosso “grito de

socorro”! Dia 30, ante a falta de informações, protocolamos

novos ofícios e, na segunda quinzena de setembro,

novamente oficiamos os escalões superiores clamando por

orientações. Ao final do mês houve alterações nos titulares da

DG e outras três diretorias, decorrendo um tempo natural de

ajustes das novas equipes, o que nos deixou até o momento

sem uma posição oficial quanto aos nossos ofícios.

Por outro lado, uma das ações propostas em 2008, já

provisoriamente atendida com os contratos emergenciais,

se concretiza com a realização do concurso público para

reposição de pessoal, com provas realizadas em novembro.

É um passo importante, tanto pelo tempo passado desde

o último, como pela condição mais favorável de atração de

interessados, com a atualização havida nos vencimentos, mas

que se mostrará insuficiente em curto prazo, em virtude das

aposentadorias ocorridas nestes últimos anos. Alertamos para

a necessidade de mais nomeações neste concurso além das

vagas indicadas, ou a realização de novo certame em breve.

Mas não podemos ficar parados. Precisamos deixar

as divergências de lado, olhar para um mesmo horizonte

e continuar buscando nossa valorização profissional e

melhores condições para o DAER desempenhar os serviços

exigidos pela sociedade gaúcha que, como há 74 anos atrás,

motivou a criação do Departamento para ser a alavanca do

desenvolvimento do Estado. Várias carreiras do executivo

e outros poderes estão reivindicando reposições salariais.

Temos que voltar à busca de um básico compatível com o

mínimo profissional e uma maior diferença entre os níveis de

progressão horizontal (as letras), de modo a tornar a carreira

mais atrativa durante seu desenvolvimento, entre outras coisas.

Para finalizar, ao chegar ao fim de mais uma gestão

na Presidência, que muito me honrou ser indicado pelos

colegas, gostaria de agradecer àqueles que participaram

das Juntas Executivas pelo apoio, bem como aos membros

dos Conselhos Deliberativos e Fiscais de cada gestão pelo

suporte nas decisões tomadas pela entidade. Aos novos

integrantes que assumirão no próximo ano, os votos de um

trabalho profícuo, com a certeza de que muito ainda há que

se caminhar nas estradas do DAER. Aos nossos dirigentes do

DAER, SEINFRA e Governo do Estado, que aceitem nossa

parceria na reorganização do DAER e consigam os recursos

necessários à plena recuperação desta importante autarquia

para o Estado do Rio Grande do Sul. Que tenham todos um

feliz e abençoado Natal e um ano novo com muita saúde.

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Prezados,

Nós, técnicos do DAER, através das nossas associações SUDAER e SECDAER, há mais de dez

anos vimos discutindo a atuação do nosso Departamento, culminando em 2008 com a elaboração

de uma “Proposta de Melhoria e Modernização do DAER”, na qual foi realizado um diagnóstico

minucioso da situação do Departamento, identificando os problemas e deficiências operacionais, hoje

apontados pela Força Tarefa e que, até o momento, pouco foi considerado.

As deficiências operacionais e de procedimentos persistem e muitas delas se agravaram, como

a imensa carência de pessoal e de equipamentos, a falta de definição de diretrizes na condução da

política rodoviária do Estado, ausência de planejamento das ações do DAER a curto, médio e longo

prazo, ausência, desde 1998, de Regimento Interno compatível com a estrutura vigente, falta da

definição de procedimentos operacionais e administrativos, não cumprimento dos cronogramas das

obras e serviços, por falta de regularidade na disponibilização de recursos. Dentro deste cenário não

contamos com as condições mínimas de trabalho necessárias para o desenvolvimento das atividades

exercidas em cada um dos setores que compõem este Departamento.

Em face do exposto, inúmeras vezes somos demandados pelo Ministério Público a executar

atividades que competem ao DAER para as quais não dispomos das condições operacionais e

administrativas suficientes e necessárias para realizá-las, sendo chamados a responder por situações

cujas soluções, muitas vezes, não estão ao nosso alcance.

Entendemos que o bom resultado das atividades realizadas pela Força Tarefa não deva se

restringir somente a entrega de um relatório e sim, a junção de esforços por parte dos integrantes da

Força Tarefa e do Departamento para buscar a solução para esta situação.

A questão a ser respondida é:

“Como podemos atuar e desempenhar nossas funções com as condições atuais? Qual o

caminho?”

Enquanto não obtivermos estas respostas e, em conjunto, definirmos como este Departamento

deve atuar, nós técnicos do DAER abaixo assinados, julgamos que está inviável a continuidade das

nossas atividades dentro do cenário que ora se apresenta.

Este é nosso “grito de socorro”, para que as instâncias superiores do setor rodoviário do Estado do

Rio Grande do Sul se conscientizem da situação de crise institucional que estamos vivenciando, haja

vista os apontamentos da Força Tarefa e Comissão Processante e seus desdobramentos.

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9Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Jantar anual marca as comemorações dos 50 anos da Sudaer e 25 anos da Secdaer.

SECDAER e SUDAERPRESIDENTE

Jorge Henrique Vieira FernandesVICE-PRESIDENTE

Dalton Freitas Garcia PRESIDENTE

Carlos Alexandre Pinto TonioloVICE-PRESIDENTE

Aldo Luiz Grassi

COMISSÃO ORGANIZADORAEdelweis Zandona

Vera Lucia JungAna Paula Cardoso

Lia MartinazzoJanete Colombo

Aldo GrassiCarlos Toniolo

Jorge Henrique FernandesAlexandre Sório

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Page 10: Revista Estradas n° 16

10

Brasil é o quinto maior país do mundo em área, cerca de 8,5 milhões de km².

Para atender as grandes distâncias do país é necessária uma boa infraestrutura de

transportes. O Brasil conta com quase dois milhões de quilômetros de rodovias, cerca

de 4.000 aeroportos (34 internacionais), 37 grandes portos, 50.000 quilômetros de

hidrovias e cerca de 30.000 quilômetros de ferrovias. Entre todas essas opções, a

forma mais utilizada pelos brasileiros para o transporte ainda são as estradas. A malha

rodoviária brasileira comporta uma frota de aproximadamente 60 milhões de veículos

(entre carros, caminhões, ônibus, etc.), segundo dados do Denatran/2009.

O quadro atual da estrutura de transportes de cargas brasileiro tem apresentado

importantes limitações à expansão e ao crescimento econômico do País. Essa

situação não é um problema atual, há vários anos o transporte de cargas brasileiro

vem apresentando sintomas que apontam para graves problemas de deterioração,

decorrentes da falta de investimentos, pelo menos nas duas últimas décadas. Os

problemas estruturais comprometem a eficiência operacional, tornando-se um

entrave ao desenvolvimento econômico e social do país.

O Brasil acaba desperdiçando bilhões de reais, devido aos acidentes, aos roubos

de carga, às ineficiências operacionais e energéticas. Como causas principais,

no setor de transporte, estão as enormes deficiências de regulação, as políticas

governamentais de investimento e, também, a distorção da matriz de transporte,

acarretando em significativa perda econômica e de competitividade.

O uso inadequado dos modais gerou uma enorme dependência do modal

rodoviário, que acaba suprindo lacunas dos demais modais, porém apresenta uma frota

ultrapassada e as rodovias em condições precárias. A malha ferroviária existente, em

boa parte construída no início do século passado, sofre resquícios de falhas no processo

Perspectivas para a infraestrutura de transportes na próxima década

O

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11Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

da recente privatização que a impede de impulsos maiores. A

participação do modal hidroviário é praticamente inexistente.

Uma das causas deste cenário é a limitação na capacidade

de planejamento setorial e de execução do governo, pela

progressiva deterioração da qualidade da administração pública.

Contribuíram para isto a politização de instâncias diretamente

envolvidas na implementação dos investimentos, a exemplo do

Dnit e Companhias Docas, e a falta (ou alocação ineficiente)

de recursos para requalificação e atualização dos quadros

públicos. Também a ausência ou fragilidade de marcos legais

e regulatórios capazes de dar segurança jurídica e assegurar a

estabilidade e a transparência das regras.

Em transportes, os investimentos públicos definharam ao

esbarrarem na escassez de recursos, falta de projetos e limitada

capacidade de execução. Nas ferrovias, desde o final da década

de 1990, esses investimentos têm sido marginais, apesar de sua

importância para a expansão do modal, da remoção das invasões

da faixa de domínio e a da construção de contornos críticos.

Ainda assim, a privatização da RFFSA deu grande impulso ao

investimento privado e levou ao aumento da capacidade de

transporte ferroviário.

No caso dos portos, a natureza incompleta das

reformas, a ambiguidade do poder regulatório e a

politização das Companhias Docas, no conjunto conspiraram

para limitar fortemente o valor, o âmbito e mesmo a eficácia

dos investimentos privados em anos recentes.

No caso de rodovias, o setor público permanece na

liderança, com aportes orçamentários crescentes, embora

ainda bastante tímidos em relação às necessidades. O

sucesso do processo de concessões, retomado em 2007,

indica que os investimentos públicos serão direcionados

para as rodovias que não suportam o regime de concessões,

principalmente pela baixa intensidade do tráfego. Em todos

os casos, o planejamento de Estado – ausente nos últimos

anos e reconhecido como essencial para a otimização da

participação de cada modal em uma nova logística de

transportes – terá de ser organizado, as agências reforçadas,

assim como será fundamental a despolitização radical das

instâncias de execução.

Ao completar seu décimo ano de existência, a Revista

Estradas quer trazer este tema ao debate. Os textos a

seguir procuram apresentar algumas visões de profissionais

renomados do setor sobre passado, presente e futuro da

infraestrutura de transportes em seus vários aspectos, modais

e contextos. O objetivo é promover a reflexão e a crítica, na

busca de caminhos que tragam ao país uma infraestrutura

de transportes moderna, eficiente e capaz de promover o

desenvolvimento econômico e social que todos desejam.

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12

pont

o de

vis

ta

conceito associado à qualidade de um sistema de transportes é percebido de forma

heterogênea entre seus usuários, mas pode ser de maneira geral, atribuído a uma

combinação dos atributos custo, rapidez e segurança. Os profissionais envolvidos

com o planejamento de transportes almejam o equilíbrio entre essas características

procurando, sob a ótica da mobilidade, maximizar seu desempenho operacional

garantindo, entretanto, um nível aceitável de segurança viária. Alcançar esse

equilíbrio tem se mostrado um desafio desde o primeiro acidente de trânsito com

vítima fatal ocorrido ainda no século XIX, entre 1886 e 1896.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (2008), os acidentes de

trânsito produzem anualmente mais de um milhão de vítimas fatais além de 50

milhões de pessoas feridas em todo o mundo. No Brasil, apesar de divergências

entre fontes, aponta-se um número em torno de 37.000 vítimas fatais em

decorrência de acidentes de trânsito em 2005. O IPEA - Instituto de Pesquisa

Econômica e Aplicada (2006) (sub)estima que os custos totais dos acidentes

ocorridos em um período de um ano no Brasil ultrapassam R$ 20 bilhões de reais.

De maneira geral, esses indicadores de desempenho da segurança viária (DSV) vêm

justificando dezenas de estudos, programas e outras ações governamentais como a

recém instituída “década de ação pela segurança viária” pela ONU (2011) de 2011

a 2020, cujo objetivo geral é estabilizar, ou mesmo reverter, o número de vítimas

fatais através de ações em níveis regionais, nacionais e mundial.

Apesar da problemática descrita e do esforço visível no sentido de redução dos

acidentes de trânsito, observa-se, de forma angustiante, que os resultados são quase

sempre efêmeros e insignificantes. Uma premissa importante para o avanço nessa

área é, ao invés considerar o problema como sem solução, “um efeito colateral da

motorização”, admitir que exista uma lacuna entre o estágio atual de conhecimento

sistematizado sobre o fenômeno (segurança viária) e o nível necessário para a

obtenção de resultados concretos. Investigar os motivos dessa discrepância parece

Segurança viária: o desafio multidisciplinar de uma década menos intuitiva

Flávio Cunto, Ph.D.Universidade Federal do Ceará

O

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13Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

então uma abordagem promissora na busca por métodos de

análise do DSV mais objetivos e confiáveis.

O objetivo deste artigo é apresentar uma breve discussão

sobre os principais desafios metodológicos observados nas

análises de segurança viária das últimas décadas e como

avanços nas técnicas de aquisição de dados veiculares e

modelagem microscópica do tráfego podem contribuir para a

avaliação do DSV nos próximos anos.

ACIDENTES DE TRÂNSITO COMO MEDIDA DE DESEMPENHO

De maneira geral duas questões fundamentais são

abordadas nas análises de segurança viária: (i) Quais são

os locais com os maiores riscos de colisões que justifiquem

intervenções de engenharia de segurança viária (análise

de pontos críticos)?; (ii) Quais são as intervenções que

produzirão a maior redução no risco de acidentes em

relação ao investimento necessário para a introdução de tal

melhoria (estudos do tipo “antes” e “depois”)?

Essas análises têm sido fortemente baseadas em bancos

de dados contendo séries históricas de acidentes de trânsito

além de informações sobre características do veículo, da

via e do meio ambiente. Apesar de ser a manifestação

mais explícita da (in)segurança viária, adotar os acidentes

de trânsito como única medida de desempenho incorpora

uma série de desafios metodológicos que dificultam a

confirmação de forma científica (não intuitiva) de relações de

causa e efeito que expliquem o DSV em função de atributos

físicos e operacionais das entidades viárias.

De acordo com Hauer (2002), os pesquisadores

por motivos operacionais e éticos não podem desenhar

experimentos onde variáveis são deliberadamente alteradas

para verificar sua influência na frequência de acidentes

(estudos observacionais). Acidentes de trânsito são

considerados ainda como fenômenos aleatórios raros,

e, além disso, quando analisado de forma isolada, um

acidente normalmente decorre de uma cadeia complexa

única de eventos temporais dependentes e sobre os quais

se sabe pouco. Essas características, associadas à baixa

qualidade dos bancos de dados, levam à ocorrência de

uma série de problemas como a dispersão excessiva

dos dados (variância maior que a média), o fenômeno

de regressão à média e colinearidade entre variáveis de

modelos estatísticos (Hauer, 2002). Além disso, Davis

(2004) ressalta que as possíveis relações observadas em

um nível agregado, seja temporal (vários acidentes em um

mesmo local), seja espacial (interseções ou segmentos

com atributos similares), podem não ser válidas para um

determinado acidente de forma isolada (falácia ecológica).

Os trabalhos mais recentes sobre a modelagem

estatística da segurança viária procuram impor um controle

mais rigoroso sobre os fatores de confusão (variáveis

colineares), além de lidar com a presença de tendências

temporais e representar melhor a variabilidade encontrada

nos acidentes de trânsito (Elvik e Vaa, 2004). Nesse

sentido, a calibração de modelos de previsão de acidentes

(MPA) ou funções de desempenho de segurança viária têm

sido alvo de pesquisas em várias jurisdições (Hauer et al.,

1988, Bélanger, 1994).

Os MPA, que possuem estrutura compatível com os

modelos lineares generalizados, estimam o número de

acidentes de trânsito em um grupo de entidades a partir de

variáveis que reflitam a exposição veicular e outros atributos

físicos e operacionais das vias. Os valores estimados pelos

MPA (grupo de interseções ou segmentos viários) são,

então, combinados com a informação histórica de uma

entidade específica utilizando princípios da estatística

bayesiana. O resultado obtido é uma estimativa menos

viesada do número esperado de acidentes de trânsito

de uma entidade. A primeira edição do Highway Safety

Manual (AASHTO, 2010) dedica parte considerável de seu

conteúdo à justificação, aos preceitos e ao desenvolvimento

dos MPA em todas as etapas do planejamento estratégico,

tático e operacional dos sistemas de transportes.

REVISITANDO A TÉCNICA DE ANÁLISE DOS CONFLITOS DE TRÁFEGO

Perkins e Harris, no final da década de 60, começaram a

delinear as bases para o desenvolvimento de uma técnica que

utiliza situações de risco entre veículos que não culminaram

em acidentes, chamados de conflitos de tráfego. A ideia era

utilizar um evento bem mais frequente do que os acidentes,

tornando análises estatísticas mais precisas e confiáveis.

A técnica evoluiu de forma diferente em vários países,

entretanto, na Suécia, Hydén (1987) foi responsável por

grande parte de sua sistematização ao introduzir o conceito de

continuum de segurança viária. Dentro desse novo paradigma

o conceito de segurança passa a ser visto como uma sequência

de eventos cronologicamente dependentes que variam desde

passagens sem distúrbio até a ocorrência de acidentes.

Indicadores de conflitos de tráfego foram então definidos

a partir de medidas de proximidade espaçotemporal entre

veículos como o tempo para a colisão (TTC), tempo para o

acidente (TA), dentre outros (Hydén, 1987; Archer, 2005).

Infelizmente a consolidação dessa técnica esbarrou em duas

questões fundamentais:

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14

a) Como estimar de forma precisa os indicadores de

conflito em estudos de campo?

b) Qual a relação entre esses indicadores e outros mais

objetivos como os acidentes de trânsito?

Recentemente, uma versão mais moderna dessa

técnica vem sendo desenvolvida com ferramentas de

visão computacional e algoritmos avançados de detecção

de trajetórias veiculares. A detecção semiautomática de

indicadores de conflitos veiculares foi apresentada para

interseções não semaforizadas no trabalho de Archer

(2005) e para rotatórias por Guido et al. (2009). A

metodologia compreende basicamente a aquisição dos dados

(filmagem), as correções angulares e os ajustes de escala na

imagem obtida, o estabelecimento de linhas virtuais em

pontos estratégicos para extração das trajetórias veiculares

e a estimação dos indicadores de conflito. A Figura 01

apresenta uma visão geral do experimento descrito no

trabalho de Guido e seus colaboradores.

Saunier e Sayed (2007) apresentam uma proposta

de análise automática de conflitos veiculares com base

em filmagens veiculares utilizando modelos de Markov. Na

metodologia proposta, as trajetórias veiculares são extraídas

individualmente e comparadas entre si de forma automática

após a calibração inicial de um algoritmo de detecção de

conflitos. Apesar de a metodologia ter sido testada em uma

amostra relativamente pequena (10 conflitos de tráfego), os

resultados indicam a potencialidade da dessa ferramenta na

detecção automática de conflitos veiculares.

A SIMULAÇÃO MICROSCÓPICA EM ESTUDOS DE SEGURANÇA VIÁRIA

A simulação microscópica tem sido investigada

recentemente como plataforma de análise do desempenho

da segurança viária em virtude da evolução das técnicas

de modelagem do comportamento humano no processo de

Figura 1 Esquema de detecção semi-automática de trajetórias e conflitos veiculares (Fonte: Guido et al, 2009).

Figura 2 Esquema conceitual do processo de condução, turbulência e interações veiculares (adaptado de Cunto, 2008)

pont

o de

vis

ta

condução veicular e da maior disponibilidade de informações

desagregadas sobre o fluxo de veículos ao longo de uma

corrente de tráfego (Gettman e Head, 2003; Archer, 2005;

Cunto e Saccomanno, 2010).

Assim como na técnica de análise de conflitos de tráfego,

a medida de desempenho é obtida através de interações

veiculares cuja severidade é representada por indicadores

proxy como o TTC, a taxa de desaceleração para evitar a

colisão (DRAC) e o índice de potencial para acidentes (CPI).

Cunto (2008) apresenta uma estrutura conceitual que

permite a utilização da microssimulação como plataforma

em estudos de segurança viária através do conceito de

turbulência e interações veiculares (Figura 02).

Alguns dos componentes exógenos na Figura 2, como

as características dos condutores, as condições de tráfego

e a geometria, correspondem aos dados de entrada dos

microssimuladores. O processo de condução é representado

pelos algoritmos de carro seguidor (car following),

aceitação de brecha (gap acceptance) e mudança de faixas

(lane change) presentes nos pacotes de simulação. Os

fatores ambientais por sua vez são obtidos pela calibração

de atributos como velocidade média e brecha em função

das condições ambientais experimentadas.

A informação de saída no modelo proposto é o nível

de turbulência obtido para uma determinada intervenção

de engenharia. A medida objetiva da turbulência é a

quantidade e a severidade das interações veiculares, ou

seja, a exposição temporal de um veículo a uma situação

em que exista uma trajetória conflitante, seja por um

veículo líder desacelerando (colisão traseira), mudando de

faixa (colisão lateral), seja por um veículo aceitando uma

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brecha insegura na via secundária (colisão transversal).

Apesar do potencial para o uso da microssimulação

em estudos de segurança viária, a consolidação dessa

ferramenta necessita ainda de modelos microscópicos mais

representativos do comportamento humano no processo de

condução e de metodologias de calibração e validação dos

Referências bibliográficas

AASHTO (2010) Highway Safety Manual. American Association of State Highway and Transportation Officials. 1st. Edition, Washington, D.C.Archer, J. (2005) Methods for the assessment and prediction of traffic safety at urban intersection and their application in micro-simulation modelling. Tese de Doutorado, Department of Infrastructure. Royal Institute of Technology, Sweden.Bélanger, C. (1994) Estimation of safety of four-legged unsignalized intersections. Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, No. 1467, TRB, National Research Council, Washington, D.C., p. 23-29.Cunto, F.J.C. (2008) Assessing Safety Performance of Transportation Systems using Microscopic Simulation Tese de Doutoramento, Department of Civil and Env. Engineering, Universidade de Waterloo, Ontário.Cunto, F.J.C. ; Saccomanno, F.F. (2010) Modelo para Avaliação do desempenho da Segurança Viária Através da Simulação Microscópica. Transportes (Rio de Janeiro), v. XXI, p. 1-13, 2010;Davis, G.A. (2004) Possible Aggregation Biases in Road Safety Research and a Mechanism Approach to Accident Modeling. Accident Analysis and Prevention, v. 36, p. 1119-1127.Elvik, R., Vaa T. (2004) The Handbook of Road Safety Measures. (1a ed.), Elsevier.Gettman, D. e Head, L. (2003) Surrogate safety measures from traffic simulation models. Federal Highway Administration report RD-03-050. McLean, VA, USA.Guido, G.P., Saccomanno, F.F., Astarita, V., Vitale, A. (2009). Measuring Safety Performance at Roundabouts Using Videotaped Vehicle Tracking Data. TRB 88th Annual Meeting Compendium of Papers DVD. Washington, D.C.Hauer, E. (2002) Observational Before-after Studies in Road Safety. (1a ed.), Pergamon.Hauer, E., Ng Jerry, C.N., Lovell, J. (1988) Estimation of safety at signalized intersections. Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, No. 1185, TRB, National Research Council, Washington, D.C., p. 48-61.Hydén, C. (1987) The development of a method for traffic safety evaluation: The Swedish traffic conflicts technique. Bulletin 70. Department of Traffic Planning and Engineering, Lund University, Lund, Sweden.Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Impactos sociais e econômicos dos acidentes de trânsito nas rodovias brasileiras – Relatório Executivo. IPEA/DENATRAN/ANTP, Brasília, 2006.Organização das Nações Unidas (ONU) (2011). United Nations Decade of Action for Road Safety 2011-2020. http://www.un.org/en/roadsafety/. Acessado em 6 de setembro de 2011.Organização Mundial de Saúde (OMS). Road safety: A public health issue. http://www.who.int/features/2004/road_safety/en/, 2008. Acessado em 17 de Março de 2008.Perkins, S. e Harris, J. (1967) Criteria for traffic conflict characteristics. Report GMR 632. Technical report, General Motors Coorporation.Saunier, N. e Sayed, T. (2007) Automated road safety analysis using video data. In Transportation Research Record: Journal of the Transportation Research Board, No. 2019, TRB, National Research Council, Washington, D.C., p. 57-64.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não obstante o considerável número de iniciativas para a redução da acidentalidade viária nas diversas jurisdições, os

resultados alcançados são quase sempre pouco significantes e raramente conseguem perdurar de forma consistente. Uma

reflexão sobre as metodologias de avaliação e previsão do desempenho da segurança viária utilizadas nas últimas décadas

mostra-se essencial para o desenvolvimento de novas ferramentas que permitam uma abordagem mais racional, quantitativa e

consequentemente mais completa sobre o fenômeno da segurança viária.

Dentre os caminhos mais promissores da pesquisa em segurança viária nos próximos anos ressaltam-se os avanços na

modelagem estatística dos acidentes de trânsito através da estatística Bayesiana, a utilização de metodologias de visão

computacional e os algoritmos avançados de detecção de trajetórias veiculares no aperfeiçoamento da técnica de conflitos de

tráfego e o emprego da simulação microscópica na estimação do desempenho da segurança viária.

parâmetros dos modelos utilizando os indicadores proxy

de segurança viária. Assim como na técnica de análise

dos conflitos de tráfego, faz-se necessária uma validação

dos indicadores obtidos com situações “observáveis” no

campo que possam refletir o nível de segurança em um

determinado local.

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16

ANTECEDENTES

Os recursos destinados aos investimentos em infraestrutura de transportes no Brasil, até

a Constituição Federal de 1988, eram provenientes do Imposto Único sobre Combustíveis e

Lubrificantes e tinham percentuais relativamente altos, em relação ao PIB, em valores que

atingiram em torno de 1,8 % em 1975 a 0,8 % em 1987.

Com a proibição constitucional da vinculação de impostos, os valores necessários à

construção e à manutenção dos modais ligados à área de transportes tiveram que concorrer

com os demais investimentos do País no Orçamento Geral da União (OGU). Esse fato

ocasionou uma diminuição drástica dos investimentos no setor, atingindo em 2002-03 um dos

menores índices da história (0,2% do PIB).

Essa situação somente foi revertida com a edição da Lei nº 10.336, de 19 de dezembro

de 2001, que criou a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), da qual

parte da arrecadação foi destinada aos projetos de logística de transportes. A partir de 2003 os

recursos disponibilizados voltaram a atingir de 0,4% a 0,6% do PIB.

Esses baixos níveis de investimento em infraestrutura geraram problemas em todos os

modais, ocasionando ineficiências, custos adicionais e acidentes. O Governo começou, então,

um programa de desestatização, que envolveu o pedagiamento das rodovias federais e a

concessão da Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA).

A Rede Ferroviária Federal S.A. foi incluída no Programa Nacional de Desestatização

(PND), em 10 de março de 1992, por meio do Decreto nº 473. Isso representou um marco

histórico para o PND, tendo em vista que, com a inclusão do primeiro setor de serviço público,

além de o programa entrar em uma nova fase, significava a expectativa de superar importante

gargalo para o crescimento econômico do País na área de infraestrutura. Com essa medida, o

Governo Federal estaria estimulando a iniciativa privada a fazer investimentos num setor que,

dada a escassez de recursos públicos, se deteriorava a passos largos. Em 1998, foi realizada

uma licitação e as ferrovias brasileiras foram concedidas a empresas privadas por um prazo

de 25 anos, prorrogáveis por idêntico período. Esses contratos trataram somente de carga,

ignorando totalmente o transporte de passageiros.

Ferrovias Eng Daniel Lena Souto

pont

o de

vis

ta

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17Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

A CONCESSÃO

As ferrovias do Estado estão concedidas hoje

à America Latina Logística (ALL). O contrato de

concessão, no entanto, como todos os realizados na

ocasião foi mal concebido, pois fez praticamente

apenas duas exigências: aumento da meta de produção

e diminuição do número de acidentes. Não há cláusula

prevendo investimentos em infraestrutura para aumento

de capacidade ou para a solução de gargalos.

Como a ALL é uma empresa que atua nos estados

do sul, a sua estratégia operacional é a de aumentar

sua produção em trechos com grande demanda e

abandonar os trechos restantes. Essa política, tem

gerado reclamações dos governos de todos os estados e

dos usuários da ferrovia, pois essa atitude não só tem

prejudicado o escoamento da produção como tem causado

o aumento do custo para os produtores, a deterioração

da malha rodoviária e o aumento no número e da

gravidade dos acidentes rodoviários. A transferência das

cargas, antes transportadas por ferrovia, para as rodovias

tem provocado um aumento sensível na poluição com

prejuízos incomparáveis ao meio ambiente.

Os aspectos positivos da concessão foram os

investimentos realizados no aumento da força de tração,

com a aquisição de locomotivas recuperadas, aquisição de

novos vagões e aumento da capacidade de armazenagem

em alguns entroncamentos, visando à intermodalidade.

Outro ponto positivo foi a modernização das

comunicações, que hoje se realizam através de satélite,

quando, antigamente, se realizavam por linha física.

O principal aspecto negativo da concessão, é a

falta de investimento na infraestrutura, não sendo

agregado durante esse período nenhum dos avanços

tecnológicos que vemos nas modernas ferrovias de

outros países, principalmente os da Europa e Ásia, nem

foram melhorados ou eliminados quaisquer dos gargalos

logísticos sempre apontados.

No Rio Grande do Sul, a malha concedida foi de

3.259 km, sendo, hoje, utilizados plenamente apenas

1.952km, ou seja, 60% da mesma.

A fiscalização da Agencia Nacional de Transportes

Terrestres (ANTT) é ineficiente, o que tem provocado uma

série enorme de reclamações públicas das comunidades

abandonadas. O Ministério Público Federal tem acionado

constantemente a Justiça, objetivando obrigar a

concessionária a cumprir o contrato, que não permite o

abandono imotivado dos ramais concedidos.

NOVO MARCO REGULATÓRIO

A ANTT realizou recentemente um estudo sobre

as concessões ferroviárias, o qual aponta as seguintes

conclusões:

o esforço de produção ferroviária é dirigido a uma única

mercadoria, produzida por uma única empresa;

a movimentação em TU apresenta evolução inferior ao

PIB, tanto em carga própria, quanto de terceiros;

a carga própria cresceu 72,4%, mais que o dobro do

PIB, enquanto a carga de terceiros cresceu 33,1%,

praticamente o mesmo do PIB;

a carga própria é 51,1% da produção total, que

corresponde ao minério de ferro da Vale;

a partir de 2007, a evolução acumulada do PIB é superior

à movimentação da carga ferroviária;

a tarifa sobre a carga de terceiros variou 117,6% no

produto médio, superior ao total do setor.

EVOLUÇÃO DA MALHA FERROVIÁRIA NO ESTADO

A Agência Reguladora (ANTT), observando que a produção

ferroviária estava favorecendo grandes empresas sócias das

concessionárias, em detrimento dos outros usuários, resolveu

modificar os contratos existentes e criar um novo marco

regulatório para o setor. Para tanto, editou três resoluções

que estabelecem novas regras do setor ferroviário, pois a

ociosidade da malha atinge 62%, determinando que os 12

contratos existentes sejam revistos.

Dessa maneira, no próximo ano, já deverá haver

modificações importantes nas concessões, o que, por certo,

provocará uma reconquista de trechos ferroviários abandonados

e um aumento na produção ferroviária do País.

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18

O FUTURO : O RESGATE DA FERROVIA?

A partir de 2005, o Governo brasileiro começou a

mudar a sua política de transportes para o País, quando

reiniciou a reativação do Planejamento no Ministério dos

Transportes, que havia sido extinto juntamente com o

órgão responsável pela sua execução, o GEIPOT.

Esse planejamento resultou na elaboração do

Plano Nacional de Logística de Transportes (PNLT)

baseado em princípios e diretrizes orientadores de uma

política para o setor e que objetiva corrigir as distorções

apontadas na logística brasileira e na sua matriz de

transporte fortemente dominada pelo transporte rodoviário

(o rodoviário representa 58%, o ferroviário, 25%, o

aquaviário, 13%; e o aéreo e o dutoviário, 4%).

As obras e investimentos projetados pelo PNLT até o

horizonte de 2025, procuram:

atender à demanda do crescimento interno e

comércio exterior;

reduzir os níveis de ineficiência quanto a custos,

tempos de viagem e acidentes;

estruturar corredores para escoamento da produção;

estimular a maior participação dos modos

hidroviário e ferroviário, com melhor utilização da

intermodalidade;

apoiar o desenvolvimento da indústria do turismo;

consolidar a ligação do Brasil com os países

limítrofes, fortalecendo a integração da América

Latina.

Além de organizar os Investimentos nos Vetores

Logísticos, o PNLT dá ênfase aos modais ferroviário e

hidroviário e pretende servir de diretriz para elaboração do PPA

e, por consequência, do Orçamento Geral da União (OGU).

No resumo abaixo apresentado, aparecem os

investimentos necessários à logística de transportes do

País, relacionados por período e por modal. O exame

da planilha mostra um aumento significativo nos

investimentos do setor ferroviário, atingindo no final da

projeção, 51,63%, contra 23,98% do rodoviário e 13,39%

dos portos.

Pelo Planejamento elaborado, no horizonte de 20

anos, será possível equilibrar e racionalizar a Matriz de

Transportes do País (o rodoviário será de 30%; o ferroviário,

de 35%; e o aquaviário, de 29%).

pont

o de

vis

ta

A segunda medida tomada pelo Governo Federal foi,

ao se dar conta de que dificilmente a iniciativa privada

iria investir no aumento da malha ferroviária do país e

considerando a necessidade de que a mesma fosse expandida

para novas fronteiras agrícolas e realizasse as obras

previstas no PNLT, modificar a sua política em relação à

desestatização, criando, em 17/09/2008, pela Lei nº 11.772,

a Engenharia, Construções e Ferrovia S.A. (VALEC).

Essa nova empresa, que é vinculada ao Ministério dos

Transportes e tem por objeto a construção e a exploração da

infraestrutura ferroviária do País, recebeu a concessão de

9.700km de novas ferrovias, envolvendo as regiões Norte,

Nordeste e Centro-Oeste.

Atualmente, a Valec está construindo 5.680km de

ferrovias novas a seguir relacionadas: Açailândia a Palmas –

720km, Palmas a Estrela D’Oeste – 1.480km, Oeste-Leste

BA – 1.490, Transnordestina – 1.728km e Alto Araguaia a

Rondonópolis – 262km.

Além disso, o Ministério dos Transportes está com

3.687km de novas ferrovias em estudo e outros 6.522km em

avaliação. Dentre os trechos que estão em estudo, destaca-se o

de Panorama (SP) a Porto do Rio Grande (RS), com 1.590km,

correspondendo à extensão sul da ferrovia norte-sul que é de

grande interesse dos estados da Região Sul.

Essas novas ferrovias estão trazendo para o País um grande

avanço tecnológico, com bitola larga (1,60m), dormentes de

concreto, fixação elástica, trilhos soldados e sistema operacional

com controle via satélite. Abaixo, vemos a foto de um trecho.

PERÍODO MODO DE TRANSPORTE RECURSO (MILHARES DE REAIS)

PARTICIPAÇÃO MODAL NO TOTAL DE INVESTIMENTOS

2008-2011

AEROPORTUÁRIO 5.248.326

TOTAL NO PERÍODO

109.204.304

FERROVIÁRIO 33.752.072

HIDROVIÁRIO 3.825.381

PORTUÁRIO 17.894.178

RODOVIÁRIO 46.844.347

OUTROS 1.640.000

2012-2015

AEROPORTUÁRIO 4.010.390

TOTAL NO PERÍODO

84.309.774

FERROVIÁRIO 53.056.942

HIDROVIÁRIO 7.124.932

PORTUÁRIO 8.123.177

RODOVIÁRIO 10.443.393

OUTROS 1.550.940

APÓS 2015

AEROPORTUÁRIO 3.762.960

TOTAL NO PERÍODO

97.294.202

FERROVIÁRIO 63.327.062

HIDROVIÁRIO 4.833.977

PORTUÁRIO 12.915.500

RODOVIÁRIO 12.440.135

OUTROS 14.568.000

TOTAL MODAL

AEROPORTUÁRIO 13.021.676 4,48

FERROVIÁRIO 150.136.076 51,63

HIDROVIÁRIO 15.784.290 5,43

PORTUÁRIO 38.932.855 13,39

RODOVIÁRIO 69.727.875 23,98

OUTROS 3.205.508 1,10

TOTAL BRASIL 290.808.280 100

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19Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

As principais modificações serão:

altera o perfil das atuais concessões, aproximando-se do

modelo padrão europeu e lembrando o rodoviário;

disciplina o uso da capacidade ociosa e a realização de

investimentos de expansão;

institui o Operador Ferroviário, que poderá levar

seus vagões e locomotivas para onde houver carga,

independentemente da malha. As metas globais da

concessão serão estabelecidas por trecho. O trecho que

não tiver meta será oferecido a outro interessado;

cria a figura do usuário dependente e usuário investidor;

estabelece Metas de produção e de segurança por trechos.

TRENS DE PASSAGEIROS

Além do Trem de Alta Velocidade (TAV), que está em vias

de ser construido entre Rio de Janeiro e Campinas, o governo

já está planejando os estudos de viabilidade dos trechos:

São Paulo (S.P.) – Curitiba (PR);

Campinas (SP) – Triângulo Mineiro (MG);

Campinas (SP) – Belo Horizonte (MG);

visando à conexão dos principais centros urbanos do País,

proporcionando melhorias de mobilidade, conforto, tempo

e segurança.

Em conclusão, as ações e as obras previstas para o setor

ferroviário nos próximos anos, irão alterar profundamente o

transporte ferroviário no País, no que correspondente tanto

às cargas como aos passageiros, atualizando as ferrovias

tecnologicamente, aproximando-as do desenvolvimento dos

países que estão investindo no setor.

No Rio Grande do Sul, a expectativa é de que a

construção da nova ferrovia, que ligará o Porto de Rio

Grande ao resto do País, inicie no sentido sul-norte,

permitindo, assim, a agregação dos trechos já consolidados

imediatamente à sua matriz de transportes.

Deve-se lutar, ainda, para que seja incluída nos

estudos do Ministério dos Transportes, a ligação por Trem

de Alta Velocidade (TAV) entre Curitiba e Porto Alegre,

permitindo, assim, a integração do Estado à malha de alta

velocidade do país.

Por sua vez, na elaboração do seu orçamento do Plano de

Aceleração do Crescimento (PAC), já se nota uma preocupação

da alocação de recursos para o modal ferroviário, conforme se

constata na previsão preliminar de investimentos do PAC 2:

Os R$ 46 bilhões previstos para a ferrovia serão

destinados a expansão de 4.696km, ao estudo de 2.985kmde

novas linhas e aos estudos de mais 1.991km de Trens de Alta

Velocidade (TAV), no País.

A RETOMADA DOS RAMAIS ABANDONADOS: NOVO MARCO REGULATÓRIO

Os investimentos em novas linhas irão aumentar

radicalmente a participação ferroviária na matriz de transportes,

mas a necessidade de serem restabelecidos ramais abandonados

pelas concessionárias e sua melhoria tecnológica é também

relevante para a logística do país.

No novo marco regulatório criado pela ANTT, foram

editadas três resoluções que estabelecem novas regras para

o setor ferroviário, pois a ociosidade da malha atinge 62%,

determinando que os doze contratos existentes sejam revistos.

EIXOS 2011-2014 PÓS 2014 TOTAL

RODOVIAS 48,4 2,0 50,4

FERROVIAS 43,9 2,1 46,0

PORTOS 4,8 0,3 5,1

HIDROVIAS 2,6 0,1 2,7

AEROPORTOS 3,0 - 3,0

EQUIPAMENTOS

PARA ESTRADAS

VICINAIS

1,8 - 1,8

TOTAL 104,5 4,5 109,0

PREVISÃO PRELIMINAR DE INVESTIMENTO

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título deste texto levanta uma dúvida: a preocupação com a sustentabilidade veio para

ficar ou passará como todas as modas passam?

Marx ensinou sobre a possibilidade de o sólido se desfazer no ar; a vida nos mostra

que o que era bom e útil até pouco tempo, em poucas décadas torna-se ruim e inútil.

Pensamentos, objetos, relações vão tornando-se obsoletos com o passar do tempo;

então, por que a relação dos transportes com o meio ambiente se sustentaria com o

suceder das gerações?

Tentemos responder, se é que é possível responder alguma coisa para o futuro em

tempos em que ele, para o bem e para o mal, é cada vez mais incerto.

Falaremos no passado, como se erros e acertos das duas ou três últimas décadas

tivessem sido superados. Esse período é muito curto para produzir novas atitudes que

substituam as que estavam erradas. Outra observação é que qualquer revisão histórica

desvinculada de seu contexto é inequivocamente incompleta, seus resultados serão

incompletos, o que, do ponto de vista contemporâneo está errado podia estar certo no

passado, mesmo recente.

Os sistemas de transportes (meios, vias terminais e complementos) eram encarados,

projetados e operados como se não existisse mais nada além deles. Não fazia parte das

preocupações dos projetistas das ferrovias, por exemplo, saber como as cargas chegariam

aos vagões, como deles sairiam e onde seriam depositadas. Os responsáveis pelos

transportes urbanos eram motivados pela eficiência operacional do que planejavam.

Questões como ruído, poluição, acidentes eram acessórias, não cabia a eles resolvê-las, o

êxito de suas soluções estava associado ao aumento de velocidade.

Os problemas causados pelas soluções dos problemas antigos passavam a exigir novas

soluções, sempre parametrizadas nos referenciais. Resultado: nada era resolvido ao longo

Transportes e Sustentabilidade: tendência ou modismo?

José Carlos Mello

O homem, dito sapiens, é o único animal capaz de destruir irremediavelmente seu próprio habitat, que é a nossa frágil biosfera, mas, também, é o único com habilidade para reverter esse processo que ele próprio deflagrou. - Arnold Toynbee.

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prazo. A degradação das cidades aumentava com a pretensão

de resolver a questão da fluidez do trânsito, uma única variável

numa equação com múltiplas incógnitas.

O que essas pessoas, muitas vezes bem intencionadas,

fizeram foi produzir as cidades sul-americanas modernas:

desprovidas de transportes de massa e de integração intermodal,

poluídas, barulhentas, faveladas, sem saneamento básico, com

toda a sorte de carências bem conhecidas de todos.

Resta especular o que ocorrerá daqui para a frente, mesmo

correndo o risco de cometer graves erros, ao tentar imaginar

um futuro cada vez mais incerto, não devemos esquecer que

hoje vivemos cercados por aparelhos que não existiam há 10

anos e que, em mais 10 anos, os computadores serão mais

inteligentes que os humanos.

A sustentabilidade deve ser não apenas em relação ao meio

ambiente, no sentido mais amplo, mas, também, em relação

à opinião das pessoas e dos tomadores de decisão. Projetos

sustentáveis de transportes que venham a ser mal sucedidos

frustrarão usuários, formadores de opinião, eleitores e eleitos.

Ideias boas podem ser sepultadas. O círculo vicioso do

relacionamento precário entre os transportes e aqueles a quem

eles devem servir não será rompido. Lembrando o passado,

ainda que recente, não mais que 20 ou 30 anos, tentaremos

enxergar o futuro.

TRANSPORTES URBANOS

O pensamento dominante entre as a décadas de 50 e

70 era tornar mais fácil a circulação dos automóveis em

detrimento dos ônibus. Alguns técnicos e prefeitos entenderam

que somente realizando obras no sistema viário provocariam

melhoria no trânsito.

Essas melhorias atraiam mais carros para as novas vias,

que, em pouco tempo, estavam congestionadas. Não foi difícil

perceber que a solução para um bom convívio entre os veículos

e a população requeria outras soluções.

Os olhares voltaram-se para os transportes por

ônibus, que, em muitas cidades, ganharam prioridade nos

investimentos. Foi a época das faixas exclusivas para o

transporte coletivo — os resultados foram bons. No Brasil,

apesar do seu sucesso, essa solução foi descontinuada

em várias cidades e, em outras, passou ser gerenciada

com negligência. Poucas administrações municipais as

mantiveram e as ampliaram. Teriam saído da moda?

Deve-se observar que, em países de baixa maturidade

política, continuar projetos do antecessor pode desqualificar

o novo governo, que pode ser taxado de “continuísta”,

principalmente se for de oposição ao anterior. Não há país

na América Latina que não exiba obras inacabadas —

grandiosos monumentos ao atraso. Essas demonstrações de

subdesenvolvimento estão sendo lentamente ultrapassadas.

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Elas acarretam desperdício de recursos públicos e expõem a

incúria administrativa.

Algo de bom restou desses erros e acertos: todos

aprenderam que a prioridade deve ser dada à fluidez do

transporte coletivo. É melhor para os eleitores, é desse modo

que os políticos veem as pessoas, priorizar a circulação de

ônibus com 80 passageiros em detrimento dos carros, que, na

maioria das vezes, levam apenas seu motorista.

TRANSPORTES EM ÁREAS RURAIS

A circulação de cargas e de passageiros é realizada,

e assim deverá ser nas próximas décadas, por caminhões

e ônibus.

As ferrovias devem ser voltadas ao transporte de

mercadorias e implantadas onde as condições de demanda,

topográficas e geológicas possibilitem construções a custos

razoáveis. Ultrapassar montanhas, regiões pantanosas

ou selvas onde as florestas se misturam com as águas

requereria gastos tão elevados que inviabilizariam a solução.

As rodovias, naturalmente, devem ser de melhor

qualidade do que as predominantes nos países sul-

americanos, mesmo nos mais ricos. Uma vez implantadas,

devem ser conservadas e operadas de modo a aumentar sua

vida útil — não o que ocorre.

As ferrovias brasileiras, todas estatais até o final do

século passado, foram privatizadas quando já demonstravam

total incapacidade de servir a economia: 90% da sua

carga eram minério de ferro e produtos siderúrgicos, pouca

utilidade apresentava aos demais setores da economia. A

privatização promoveu, em prazo curto, a recuperação do

sistema e da indústria de material ferroviário.

O milagre foi produzido pela nova gestão técnica,

que substituiu as famigeradas indicações políticas,

pela incorporação de novos clientes e pelo aumento de

investimentos que, entre 2000 e 2008, passaram de R$

673 milhões para R$ 4.610 milhões. O volume transportado

no mesmo período passou de 288 para 532 milhões de

toneladas. A produção de vagões saltou de 96 em 1996 para

7.349 em 2005.

TRANSPORTE INTERMODAL

Há muito pouco tempo, predominava a idéia de

que os sistemas de transportes se bastavam para realizar

suas operações. As escolas de engenharia formavam técnicos

em rodovias, ferrovias, portos, vias navegáveis, jamais em

transportes. Os currículos não abordavam as limitações de

cada sistema nem a necessidade de complementação de

suas operações.

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Atualmente, o pensamento dominante é que os sistemas de

transportes não são concorrentes, são complementares, o que

representa um enorme avanço no planejamento dos transportes.

É provável que esse modo de pensar se consolide, se aperfeiçoe

e não sofra retrocessos.

Cada sistema de transporte possui características que o

torna mais adequado a certas cargas, em tipo e volume, às

características geográficas, topográficas e econômicas do país.

As ferrovias, por exemplo, são essenciais para o transporte

de grandes volumes cargas de baixo valor específico como

grãos e minérios. Elas são muito eficientes em trajetos planos

ou aplainados por obras caras: pontes, viadutos e túneis.

Apresentam baixo rendimento nas subidas, até em declives

médios, e são impensáveis para cargas de alto valor específico,

como produtos eletrônicos.

Por outro lado, é profundamente antieconômico levar cargas

típicas ferroviárias por caminhões, como ocorre no Brasil. Na

Região Centro-Oeste, grande produtora de soja, o escoamento

das safras desse grão por caminhões custa US$ 40 por tonelada.

Em distâncias de transportes semelhantes nos Estados Unidos,

o mesmo grão transportado por ferrovias e embarcações fluviais,

gasta US$ 10 por tonelada escoada.

São incontáveis os exemplos do uso inadequado dos

transportes. Não deve ser esquecido que o prazo de maturação

dos projetos é diferente. São necessários poucos anos para

transformar uma região remota em produtora de grãos, e são

precisos muitos anos para construir as ferrovias necessárias e

prover os rios de condições de navegabilidade.

Durante anos, o Governo dificultou as operações intermodais

através de leis e regras obsoletas. No final dos anos 90, entrou

em vigor uma legislação que, entre outras coisas, criou a figura

do agente intermodal e a possibilidade de toda operação de

transporte de carga ser realizada com um único conhecimento.

LOGÍSTICA

Conhecida nas artes da guerra há centenas de anos, foi

só na década de 1950 que ela passou interessar o mundo

econômico, chegando ao nosso meio há menos de 30 anos.

O que é a logística? Podemos conceituá-la como sendo o

uso integrado e harmônico entre os transportes e os meios de

regulagem das demandas: armazenagem, controle de estoques,

operações intermodais e tudo o mais que diga respeito ao

melhor escoamento das cargas. A logística busca reduzir os

custos envolvidos da origem ao destino das safras, bem como

evitar perdas de produção.

Cada país tem seus custos logísticos: elevados nos países

organizados, mais altos nos razoavelmente governados, e

elevadíssimos nos países caóticos. Nestes últimos, é impossível

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23Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

o uso de terras férteis por impossibilidades de transportar a

produção, seja do que for, a custos razoáveis.

Nos Estados Unidos, admite-se que os custos

provenientes de perdas ao longo da cadeia logística

representem 12% da produção, sendo que 70% são devidos

aos transportes. A partir dessa constatação, não será difícil

estimar o que ocorre em cantos do mundo não tão bem

servidos por transportes, armazéns e silos.

As operações logísticas tornaram-se tão comuns nas

últimas décadas que elas têm sido usadas como sinônimo de

“transportes”, ainda que não sejam. Esse modo de encarar o

escoamento da produção é mais amplo que o de integração

intermodal, vai além, à medida que acrescenta mais

elementos às cadeias produtivas.

TRANSPORTES E A NATUREZA

A preocupação com o meio ambiente natural — fauna,

flora, fontes de água — era rigorosamente zero. Os projetos

de transportes, também os de geração de energia e irrigação,

tinham prioridade sobre tudo; uma espécie de licença para

matar, derrubar, invadir, secar rios, lagos e mangues.

Há poucas décadas, não mais que três, começaram a

ocorrer reações a esse tipo de atitude. Para isso, contribuíram

a globalização e o fim da maioria das ditaduras ocidentais e

do leste europeu. A ideia dominante passou a ser de que o

nosso mundo pode acabar antes da nova era do gelo.

Muitas dessas reações envolvem ações radicais, como se

os humanos pudessem passar sem energia, voltar aos tempos

primitivos, ou viver como os Amishs da Pensilvânia. O difícil

não é seguir o rumo da ortodoxia, o difícil é encontrar o meio

termo que permita compatibilizar as necessidades humanas e

preservar os elementos naturais essenciais à vida no planeta.

Daí surgiu o conceito de “desenvolvimento sustentável”,

posto, pela primeira vez, em relatório das Nações Unidas nos

anos 80.

A ideia contida nesse conceito é a de que devemos

utilizar os recursos naturais de modo que as próximas

gerações possam fazê-lo. Recursos exauríveis, como os

combustíveis fósseis, encontrarão na tecnologia seus

substitutos; os essenciais e irrecuperáveis por mau uso —

florestas, nascentes, oceanos, terras agrícolas — deverão ser

manejados de modo a continuarem sendo úteis no futuro.

A história comprova que todo radicalismo provoca

reações de igual intensidade na direção oposta e acaba por

desmoralizar a causa defendida, por melhor que ela seja.

O papel do que abraçam as causas ambientais deveria

ser combater pecados contra a natureza, mas apontando

alternativas que permitam o convívio equilibrado entre os

projetos que geram conforto e empregos com a preservação do

meio ambiente. Isso é possível.

É de se observar que as distorções nesses movimentos,

às vezes, se distanciam muito das realidades locais. É mais

comum encontrar na Alemanha defensores de distantes

florestas topicais que da sua floresta Negra, bastante destruída

pelas chuvas ácidas das usinas a carvão, e, no Brasil, há

mais preocupação com o uso da energia nuclear na Europa e

no Japão, que com a falta de esgotos no país, o paraíso dos

coliformes fecais. Sem deixar de se preocupar com o global,

não custa dar alguma atenção ao local.

Causas defendidas com radicalismo frequentemente

desmoralizam boas ideias, criando inimigos em vez de

aumentar o número de aliados. No Brasil, já se observam

algumas reações contra o “ecoxiitismo”; leis ambientais

começam a ser “flexibilizadas” pelos órgãos ambientais,

o que não é bom. Isso é feito para combater o radicalismo

que encurrala a sociedade, pretendendo que ela não se

desloque nem utilize energia elétrica. No fundo, é o uso

velha recomendação bíblica: “olho por olho” — o mal sendo

combatido pelo mal.

Não se deve “flexibilizar” o uso das leis, deve-se modificá-

las quando não atendem ao interesse da população. É

reconhecida a superposição de direitos e deveres da União,

estados e municípios na questão ambiental. Os governantes

reconhecem isso como um entrave a ser removido, no entanto,

o projeto de lei para delimitar o campo de ação de cada esfera

de poder repousa no Congresso, sem que nem o legislativo nem

o executivo se preocupem com sua tramitação.

De qualquer modo, não deverá haver retrocessos na

questão dos transportes e do meio ambiente. Devemos

entender o atual momento como de busca de um ponto de

equilíbrio. Ele deverá ser encontrado.

GLOBALIZAÇÃO

Essa deverá ser a marca mais forte e de difícil remoção

que será legada às próximas gerações. Ela poderá ser

entendida como o ato final, o parto de uma longa gestação,

que iniciou na era das descobertas, seguida pela ocupação

do novo mundo, pelo colonialismo na África e na Ásia, pela

revolução industrial, pelas duas grandes guerras do século

passado, pela guerra fria, pela introdução da economia de

mercado na China, pelo fim da guerra fria, pelo surgimento das

novas economias emergentes e assim por diante; é impossível

relacionar tudo que moldou o mundo atual, mesmo limitando a

busca a apenas cinco séculos.

O fenômeno, mal iniciado, está criando novos conceitos:

soberania compartilhada, defesa unificada, uma moeda servindo a

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vários países, mercados comuns, redes sociais, universalização

das informações e a revolução mais abrangente da história

humana: a internet e o repúdio às ditaduras.

É claro que nem tudo é bom no mundo global. O

fenômeno mais marcante é a interligação das economias

nacionais, conectadas nos ciclos tanto de prosperidade

quanto de depressão. Há países que entram nos tempos

ruins sem desejar, ficam aprisionados às crises alheias e

delas só saem de mãos dadas. Disso, escapam apenas as

economias de países miseráveis e aquelas que optaram por

se voltar para si mesmas, se isolar do resto do mundo e

produzir suas próprias mazelas.

Nos transportes, observamos o fim das sempre

ineficientes reservas de mercado na navegação marítima e

no transporte aéreo. São tempos de mares e céus abertos,

liberdades tarifárias, beneficiando os usuários e modificando

antigos conceitos de segurança nacional que alimentavam

dispendiosas guerras frias locais.

Um exemplo bizarro, visível até hoje, um museu de

tempos longínquos, é o sistema ferroviário do Estado do Rio

Grande do Sul, planejado, desde os tempos do Império, para

deslocar tropas para a Argentina em caso de conflito armado

— essa foi, por décadas, a principal hipótese de guerra dos

dois países —, e não do interior do Estado para os portos. No

momento, o lógico seria tentar integrar os sistemas ferroviários

dos dois países.

Se, no auge da guerra fria, os gasodutos soviéticos foram

direcionados à Europa, o que não deve ser esperado hoje em

integração dos transportes entre o oeste e o leste da Europa?

A globalização veio para ficar. As decisões serão cada vez

mais conjuntas e menos isoladas, exceto nas porções mais

atrasadas do planeta, dominadas por superstições e conceitos

ultrapassados de nacionalismo.

TENDÊNCIA OU MODISMO?

O conceito de sustentabilidade surgiu em relação ao

meio ambiente, mas o que se observa é sua extensão a todos

os setores da sociedade. Projetos baseados em artifícios,

sem bases sólidas, em algum momento ruirão. Esses frutos

da imprevidência, da falta de visão estratégica e de planos

que tracem cenários que permitam ver o futuro, em algum

momento, perecerão. A queda acontecerá quanto for atingido

o limite de competência, comum nas empresas familiares, ou

quando ocorrerem mudanças radicais na sociedade. Exemplo

recente ocorreu no Brasil, com a falência das três empresas

aéreas que dominaram o mercado por mais de quatro décadas.

Elas admitiam que os parâmetros nos quais suas

existências se baseavam eram imutáveis. Quais eram esses

parâmetros? Citaremos apenas alguns: proibição de novas

empresas no mercado; cartel abençoado pelo poder concedente;

tarifas fixadas em função dos seus custos; certeza que nunca

iriam à falência, pois se tratava de uma reserva estratégica

em caso de guerra; acordos bilaterais que impediam a maior

presença de empresas estrangeiras; monopólio da bandeira

brasileira; ausência de transparência nas relações entre as

empresas e os órgãos do Governo. Quem perdia? A população

brasileira; o uso dos aviões era restrito aos membros do Governo,

das pessoas jurídicas e das altas classes de renda.

O transporte aéreo brasileiro amesquinhou-se, não

guardando relação entre o PIB, o número de habitantes e a

quantidade de passageiros transportados. O cartel e o monopólio

apresentavam elevado endividamento, uso de aeronaves obsoletas

e antieconômicas, parâmetros operacionais baixíssimos, excesso

de funcionários e incapacidade gerencial, ao ponto de entrarem no

século XXI ignorando o uso da internet na gestão da empresa, nas

operações aéreas e no relacionamento com os usuários.

Nesse meio tempo, o mundo mudava, tendo surgido o Código

do Consumidor, o combate às reservas de mercado, aos cartéis e

aos monopólios, acordos mais flexíveis com outros países, liberdade

tarifária. Resultado: apareceu uma empresa com parâmetros

operacionais modernos, e o sólido se desfez no ar. Em 10 anos, o

número de passageiros transportados dobrou e as tarifas caíram,

em média, 40%.

Será possível responder a questão posta no título desse

trabalho com reduzida margem de erro? Os projetos sustentáveis de

transportes derrotarão os insustentáveis? Com a mesma cautela que

as cartomantes fazem suas previsões, cuidando para não perderem

a credibilidade e o cliente, vamos tentar ver o futuro na nossa

embaçada bola de cristal.

Do exposto, dá para encarar o futuro dos transportes no

Brasil com otimismo. Eles serão planejados e operados dentro de

parâmetros compatíveis com o que se passa no mundo. O difícil

será recuperar o imenso atraso em relação ao que já deveria

estar pronto e que sequer foi projetado; esperar que os homens

públicos voltem a se motivar a servir ao país e não a seus interesses

pessoais, familiares e grupais, que a política atraia pessoas

de bem, como ocorria no passado; e que os juízes comecem a

entender que eles devem contribuir com o progresso e não ser

uma âncora presa ao passado, aguardando os anos para darem

suas sentenças e vendo crimes prescreverem, notadamente os

daqueles com foro privilegiado, os brasileiros que não são iguais

aos demais, como se prega há mais de 200 anos. As inseguranças

e as omissões jurídicas são o que mais elevam custos, afastam os

empreendedores e dificultam a sustentabilidade.

Como sempre, há senões em qualquer planejamento. No

caso, devem ser observados os longos prazos de maturação e

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25Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

a necessidade de pesados investimentos, o que limitaria a

participação do setor privado em projetos de transportes, mesmo

as parcerias público-privadas, que são lucrativas em muitos

projetos, mas pouco atraentes nos de transportes, devido ao longo

prazo de maturação dos projetos, aos elevados investimentos

iniciais e às incertezas que podem ocorrer ao longo da vida útil

dos projetos, com sucessivas mudanças de governos, ou seja, dos

sócios, mudando regras estabelecidas e contratos e deixando o

investidor sem ter a quem recorrer.

O caminho natural é o da concessão com regras bem

estabelecidas em editais e contratos, limitando a participação

estatal a desapropriações e investimentos que tornem atraentes

alguns projetos com grandes inversões iniciais, como os dos

transportes urbanos sobre trilhos.

O papel dos empresários é perseguir o lucro, para não

acabarem falidos.

O maior problema brasileiro é que a poupança interna

está muito distante da dos países asiáticos, notadamente

da China. No Brasil, os gastos públicos impostos pela

Constituição de 1988, e aumentados com vigor por

sucessivos governos, inviabilizam poupanças públicas

elevadas. A cada orçamento, os gastos aumentam mais que

os investimentos — não é difícil fazer as contas e prever

quando eles se aproximarão de zero. Outro entrave relevante

é degradação progressiva da administração pública: os

piores, em nome da governabilidade, têm sido escolhidos

para gerir as atividades públicas.

Alguns países vizinhos não possuem, ou perderam, a

credibilidade para atrair o capital externo. O Brasil atrai

devido à madura política fiscal praticada e pelas altas taxas

de juros pagas. O investidor, antes de boas remunerações,

quer regras estáveis e respeito aos contratos — poucos países

oferecem esses requisitos tão simples.

Não havendo poupança interna nem investimentos

estrangeiros, o subdesenvolvimento persistirá por muito

tempo. Para sempre? Quem sabe? A resposta é que a

sustentabilidade dos projetos de transportes está mais para

tendência que para modismo, ainda que um longo caminho

tenha que ser percorrido pelos entes públicos.

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2626

exame da matriz de transportes do Rio Grande do Sul nos

mostra uma concentração muito grande no transporte

rodoviário (85,3%) seguido do ferroviário (8,80%) e do

hidroviário (3,6%).

Esta distorção tem preocupado os sucessivos governos

que passam pelo Palácio Piratini, pois a situação apontada

tem prejudicado o escoamento da produção do estado,

aumentado o custo das mercadorias para os produtores, bem

como vem acelerando a deteriorização da malha rodoviária

e causando um aumento no número e na gravidade dos

acidentes rodoviários. Esta concentração no modal rodoviário

tem causado, também, um aumento sensível na poluição com

prejuízos insanáveis ao meio ambiente.

Nos anos recentes, a partir de 2005, foram contratados

estudos visando propor ações e investimentos necessários

a incentivar o uso dos modais ferroviário e hidroviário, dos

quais destacamos o RUMOS2015, que apresentou um Plano

de Logística para oestado e o MASTERPLAN, realizado

através de Convênio com o Governo da Holanda e tratou

especificadamente da modalidade aquaviária.

Com as ações e investimentos propostos no

RUMOS2015, deveria o estado alterara participação do

modal hidroviário na sua matriz de transportes, crescendo

constantemente até atingir 15% em 2015.

Por sua vez, o MASTERPLAN, que pretende atingir o

mesmo objetivo, é mais pragmático nas ações propostas.

Os diagnósticos apresentados por ambos estudos,

apontam que a rede hidroviária gaúcha possui instalações

apropriadas para navegação interior em termos de calado e

navegabilidade, havendo apenas limitações nas dragagens de

Transporte hidroviário no Rio Grande do Sul

alguns canais e na sua sinalização, bem como na proibição

da navegação noturna de cargas perigosas.

Mas o fator que mais tem influenciado na baixa utilização

do modal hidroviário, é a intermodalidade. Sabidamente o

transporte é um elo crucial na cadeia logística dos produtos

e pode representar uma parcela significativa do valor final

das mercadorias. Isso é especialmente significativo no caso

do Rio Grande do Sul que está geograficamente afastado do

centro do país e tem uma economia vinculada a exportação

dependente de insumos oriundos de outros estados.

Uma das principais alternativas para aumentar a

competitividade e estimular o crescimento do Estado

é a redução dos custos logísticos. Isso pode ser obtido

através do incremento da intermodalidade no transporte

das cargas. No entanto, o transporte de mercadorias

integrando mais de uma modalidade não é usado em

toda potencialidade no estado. Uma série de aspectos

relacionados com infraestrutura das redes e terminais, bem

como questões operacionais e gerenciais limitam até agora

o transporte multimodal principalmente a situações em

que seu uso é compulsório.

Também é constatável que não é percebida pela

indústria o papel de organismos governamentais (incluindo

a autoridade portuária) como facilitador e incentivador desse

setor de transporte, notadamente a intermodalidade.

Observa-se hoje, que o maior fluxo de carga consiste do

transporte de fertilizantes no sentido Rio Grande - Interior,

e de soja, derivados e combustíveis no sentido Interior –

Rio Grande. Além destes produtos, o transporte hidroviário

é utilizado por empresas que estão localizadas junto as

Eng. Daniel Lena Souto

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27Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011 27Revista Estradas N°13 | Novembro 2008

margens dos rios, como o Polo Petroquímico e a indústria de

celulose, antiga Aracruz, em Guaíba.

Uma característica do estado, é que produção e o

consumo industrial estão largamente concentrados na área

metropolitana de Porto Alegre, aproximadamentea 150 km

em torno da cidade. Este fato gera óbices para utilização de

outros modais que não o rodoviário, pois a intermodalidade

neste caso, apresenta um custo significativo considerando a

pequena distância ao Porto do Rio Grande.

Uma análise do desenvolvimento do modal nos últimos

dez anos nos mostra que as políticas até agora realizadas,

como a redução de alguns gargalos logísticos e legais

institucionais, não provocou uma maior participação do

mesmo na matriz de transportes do estado. O aumento

na quantidade de novas embarcações agregadas a

frota circulante no estado, e a melhoria na sinalização,

balizamento e na operação de descarga no Porto de Rio

Grande, embora tenha ocasionado um pequeno aumento no

total da carga transportada anualmente, não se reflete no

percentual da matriz, tendo em vista o aumento significativo

da produção gaúcha.

Foram implantados alguns avanços tecnológicos nas

embarcações novas incluídas na frota da Navegação Aliança

e no sistema de comunicação e navegação com a utilização

do GPS. A infraestrutura pouco evoluiu nas questões

de sinalização e balizamento, bem como não houve a

implantação nova carta náutica.

Apesar de o transporte hidroviário interior no Rio Grande

do Sul estar passando por uma fase de pouca competitividade

em relação a outras modalidades, principalmente a

rodoviária, suas perspectivas futuras são boas. Mas, para isso

é necessário que se implante uma infra-estrutura compatível

com os moldes internacionais, se promova a capacitação

da mão-de-obra envolvida, e se defina uma estrutura de

governança e gestão que permita a efetiva integração

intermodal, dentro de um padrão de competitividade e de

custos adequado.

O caminho para o futuro aponta que o principal fator

que influenciará no aumento da participação hidroviária no

transporte do estado, passa pela localização da produção e

áreas industriais junto a rios e canais.

Entre as Diretrizes Estratégicas apresentadas pela

Agenda 2020, se nota a ênfase dada a este fator:

Envolvimento/comprometimento dos municípios

hidroviários;

Levantamento dos territórios marginais aos rios e

avaliação dos impactos ambientais e socioeconômicos;

Criação de um modelo de financiamento continuado

(com linhas de crédito exclusivas para a região da Bacia

do Sudeste);

Fomento para instalação às margens das hidrovias de

empreendimentos;

Criação de consórcios de municípios para atrair

investimentos;

Delegação ao Estado para autorizar a instalação de

empreendimentos às margens dos rios e canais.

Além destas medidas de localização, que evitarão a ponta

rodoviária, há necessidade de implantação de sistema que

permita o tráfego hidroviário em quaisquer circunstâncias

climáticas nas 24 horas do dia e devem ser diminuídas ou

adequadas as exigências em normatização das embarcações.

Existem dois investimentos previstos que influenciarão

nos próximos anos no aumento na produção hidroviária:

O primeiro é a previsão de aumento da produção de

celulose em Guaíba, que utilizará grandemente o modal

hidroviário na sua cadeia logística. Será instalado um porto

em Rio Pardo, que concentrará a produção de madeira da

região que posteriormente será transportada para Guaíba

através de barcaças. O ciclo se completará com o escoamento

da produção de celulose de Guaíba, para o porto que será

construído em São José do Norte, também por este modal.

O segundo é a construção da hidrovia do MERCOSUL,

programa financiado pelo governo federal, que pretende

ligar a Lagoa Mirim ao Porto de Estrela, incentivando o

escoamento da produção daquela região, edo Uruguai para o

norte do país.

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Page 28: Revista Estradas n° 16

28

As cidades são pensadas para atender aos automóveis. Como se equaciona esse problema?

Se grande parte da população continua usando o transporte coletivo, particularmente o sobre pneus que

predomina no Brasil, por que nossas cidades são pensadas para o carro, para oferecer cada vez mais espaço

para o carro que é um veiculo muito ineficiente no uso do espaço? Em algumas cidades onde avançam as

obras para a Copa e Olimpíadas, e onde desapropriações são necessárias para abrir novas avenidas, alguns

chegam a atribuir o ônus das desapropriações aos corredores de ônibus. Então quem está pagando o ônus da

desapropriação é o BRT. É muito injusto, um carro ocupa muito espaço e transporta pouca gente e quando se

precisa de uma faixa a mais ou alargar uma avenida o culpado é o transporte coletivo.

Nós já passamos da fase em que se dizia que engarrafamento era bom, pois era sinal de progresso, mas

de qualquer forma, quem anda de automóvel ainda quer mais espaço. Os dados mostram que a motorização

vai crescer bastante, que o Brasil tem hoje por volta de 150 carros para cada 1000 habitantes. A EMBARQ

Brasil montou uma relação entre PIB per capita e a frota por mil habitantes para algumas capitais brasileiras.

Chamando a atenção que é a frota registrada, e que boa parte dessa frota nunca sai dos registros. Essa

relação mostra que Porto Alegre ocupa a terceira posição, na ordem dos 350, só ficando abaixo de São

Paulo não considerando o fenômeno de Curitiba, que apresenta uma distorção nos números por apresentar

ter impostos mais baixos e assim contar com veículos de outras cidades registrados em Curitiba. Como a

incidência dos carros nas cidades já aumentou desde 2006, devemos contar hoje com aproximadamente 400

carros por mil habitantes nas grandes cidades. Estamos, mais ou menos, com a média nacional portuguesa

mas com grande espaço ainda para crescer. O Brasil vai se motorizar muito nas periferias de suas grandes

cidades. E, por exemplo, a frota de Gravataí, Cachoeirinha e Alvorada vão acabar circulando em Porto Alegre.

É possível que a frota de carros duplique nos próximos anos. Ou seja, nós temos um desafio enorme pela

frente, que é como acomodar mais um carro para cada carro que já existe na cidade. Difícil dizer quando isso

vai acontecer, mas estamos caminhando para isso, a tendência é essa.

A contribuição do transporte para uma cidade mais sustentável. Repensando o espaço urbano.

¹Luis Antonio Lindau é Eng Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, PhD em Transportes - University of Southampton, pós-doutorado pela University College London. Atualmente é professor associado III da Universidade Federal

do Rio Grande do Sul, consultor ad-hoc da CAPES, CNPq e FAPERGS. Sócio fundador da ANPET, ex-presidente, ex-diretor, membro do conselho consultivo. É membro de Comite de Países em Desenvolvimento do TRB, pesquisador associado do

WRI e diretor presidente da EMBARQ Brasil.

Todas as imagens provém do entrevistado sendo em maior parte de sua autoria. As fontes dos dados e informações constam das imagens.

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Entrevista Luis Antonio Lindau¹

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Page 29: Revista Estradas n° 16

29Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Como arrumar espaço para acomodar mais esses veículos?

Esse é o cenário. Vão aparecer mais carros, os carros

vão ser mais utilizados e vai cair a demanda pelo transporte

coletivo. Deixando como está, vai cair o número de usuários

do transporte coletivo, esse é o quadro, digamos, dramático,

que temos nas áreas urbanas. Então, vai aumentar o

congestionamento, que deve contribuir para a perda de

competividade e para uma estagnação econômica nas

grandes cidades.

A questão que se impõe é: qual a capacidade de uma

faixa com três metros e meio de largura, a largura típica de

uma faixa de trânsito? Com carros estacionados a capacidade

é zero, ninguém anda. Com carros andando, dá mais ou

menos 1350 pessoas por hora. Destinada a ciclistas,

baseando-se na experiência do leste asiático, se consegue

3,3 vezes mais pessoas, cerca de 4500 pessoas por hora.

Com pedestres, usando também as teorias de circulação

em calçadas, chega-se a 13500, 10 vezes mais. O mesmo

usando BRT. Ou seja, precisa-se de 10 vezes mais faixas ou

de espaço para o automóvel do que se precisa para pedestres

ou para ônibus de alta capacidade. É um uso muito irracional

do espaço da superfície.

Com a preocupação com o meio ambiente, com as emissões, se

esperava que o carro perdesse espaço?

Uma consideração que se fazia era: será que no futuro

os veículos serão menores, imaginava-se isso no passado,

que surgiriam veículos menores, menos poluentes. É uma

questão que temos que pensar, a indústria está trabalhando

“Vão aparecer mais carros, os carros vão ser mais utilizados e vai cair a demanda pelo transporte coletivo. Deixando como está, vai cair o número de usuários do transporte coletivo, esse é o quadro, digamos, dramático, que temos nas áreas urbanas.”

para fazer carros limpos, ou carros “verdes”, como se quiser

chamar. A indústria automobilística está indo para esse

lado. Mas, o conceito do automóvel não mudou em nada. O

automóvel, com porta-malas, levando várias pessoas, com

espaço, resultou de um processo de 100 anos evolução. Por

que o automóvel elétrico com baterias deveria se parecer

com a poltrona da sala com rodas? A indústria, de certa

forma, lava as mãos dizendo “meus carros são limpos e o

problema do congestionamento não é o nosso problema,

é problema das cidades, dos estados, do setor publico e

do próprio mercado”. Quer dizer, o mercado, e em última

palavra, a sociedade, vai ter de descobrir uma forma de

Efeito do automóvel na evolução humana.

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Page 30: Revista Estradas n° 16

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consertar isso, daqui a pouco o nível de congestionamento

será tão alto que alguma coisa precisará ser feita.

Estamos caminhando para essa situação que eu chamaria

de congestionamento limpo. Baixas emissões, ar bem mais

limpo, mas ninguém anda. Isso não é mobilidade sustentável,

ao reduzir emissões atendendemos somente uma dimensão

da sustentabilidade nos transportes.

Além disso, a dependência do automóvel gera outros

problemas. A Organização Mundial da Saúde, no ano

passado, começou a se interessar pela relação transporte

privado/sedentarismo/problemas de saúde. As pessoas

precisam caminhar todos os dias e o carro não ajuda, nos

tornamos dependentes dele para tudo.

Outra questão que tem sido bastante debatida é o

aumento da frota de motocicletas e seu reflexo no tráfego.

Antes do novo código de trânsito a moto tinha um espaço

de circulação equivalente ao de um carro, ela tinha que se

comportar como o carro. Antes do novo código de transito,

o percentual de motos que circulava nas nossas cidades era

baixo. Com o veto ao artigo 56 do novo código de transito, as

motos ficaram liberadas para andar entre os carros. Então,

o trânsito não anda, mas as motos sim. Em função disso as

vendas de motos cresceram abruptamente. Em relação a

1997 houve um aumento de 461% na venda de motocicletas

contra 139% na venda de carros. Os carros até sofreram com

a depressão econômica nos anos 2000, houve queda nas

vendas, as motos não.

E a migração para as motos gera um problema

adicional. Por que alguém que largou o transporte coletivo

pela moto vai voltaria ao transporte coletivo. Essa é

a maior dificuldade, trazer usuários da moto de volta

para o transporte coletivo. A moto apresenta um custo

de desembolso bem inferior ao carro e ônibus para um

mesmo percurso. Por outro lado, a moto apresenta o maior

custo social O que pesa para a sociedade, é a morte, é o

hospital, é o custo de tratamento, todas essas questões.

Como o novo código influenciou na segurança viária?

O que aconteceu com as mortes no trânsito depois

do novo código? Houve uma queda e números absolutos,

depois voltou a crescer de novo. Essa queda pode ser

computada a varias coisas, os motoristas temiam a

pontuação na carteira e houve, no início, uma maior

fiscalização. Mas, o mais impressionante é o gráfico

que revela a evolução histórica das mortes no trânsito e

apresenta uma tendência para o futuro. Mortos por motos

cresceram muito mais que usuários de carros, pedestres

e ciclistas. Estamos falando de 10 mil mortos por ano,

sendo que 67% das vitimas usam a moto como modo de

transporte. Não estamos falando apenas em motoboys,

estamos falando também daqueles ex-usuários do

transporte coletivo.

REPENSANDO O ESPAÇO URBANO

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Page 31: Revista Estradas n° 16

31Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Qual a solução para este problema?

Não é uma solução fácil a das motos, essa discussão

acontece em várias partes do mundo e não se encontrou

ainda uma solução. A solução deve passar, inclusive, por

melhorar o transporte coletivo sem aumentar a tarifa e

lhe dar agilidade, torná-lo mais atraente para o usuário.

Os dois pontos principais de reclamação do usuário são

o tempo e o custo. Designando faixas viárias para o uso

exclusivo do ônibus, o sistema não precisaria frotas tão

grandes. O congestionamento tem um efeito estimado no

custo do transporte coletivo da ordem de 30%. Ou seja,

tirando o ônibus do congestionamento já reduziria em 30%

o custo da tarifa, já que o usuário do transporte coletivo

acaba tendo que pagar toda conta. Aliás, esta é outra

discussão, por que o usuário tem que pagar toda a tarifa

do transporte coletivo? Existe solução para isso, a nossa

sociedade ainda vai clamar por aquilo que já aconteceu no

mundo desenvolvido.

Então, qual seria a contribuição do transporte para uma cidade

mais sustentável?

Acredito que essa contribuição esteja baseada em

quatro pilares: o desestímulo ao uso do carro, a melhoria do

transporte coletivo, o estimulo ao transporte não motorizado

e a integração do uso do solo com o transporte.

Desestimular o uso do caro não é simplesmente

proibir o uso. Infelizmente é a experiência que temos no

Brasil, em São Paulo, que de certa forma é semelhante

a de outras grandes cidades da América Latina, como

a Cidade do México, Bogotá e Santiago. Essas cidades

implantaram um sistema chamado de pico e placa, em que

no horário de pico há a proibição de circulação de carros

com determinados números de placa. Isso não dá para usar

mais. Verificou-se que aumentou a frota de carros nessas

cidades, as pessoas aumentaram suas frotas domésticas,

para ter uma alternativa de placa para usar. Ora, na medida

em que você tem mais veículos em casa, outros que antes

não dirigiam pensam: “já que estão parados nesses dias,

por que eu não posso usar?” Ou seja, o sistema pico e placa

criou um potencial problema maior ainda, porque na medida

em que desmanchando esse sistema se teria mais carros

circulando nas áreas urbanas.

REPENSANDO O ESPAÇO URBANO

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Page 32: Revista Estradas n° 16

32

A medida correta é a taxação do congestionamento, uma medida que está

sendo implantada em cidades do mundo todo. Começou em Cingapura nos anos

70, está em Londres e Estocolmo, entre outras. Ou seja, a cobrança de um valor

para circular em determinadas ruas ou em determinados horários. O sistema

mais evoluído é o de Cingapura, porque carros pagam de acordo com o grau de

congestionamento das vias. Os gestores da mobilidade de Cingapura especificam

a velocidade que as vias devem ter e conforme essa velocidade vai aumentando

ou diminuindo eles vão ajustando o valor da taxa, de tal forma que se tem como

resultado essa velocidade pretendida e se evitam os congestionamentos.

Nós precisamos descobrir formas de sair do congestionamento e melhorar

o transporte coletivo. Temos a solução do metrô que é bastante cara para

implantar e operar e que acaba requerendo décadas para que tenhamos uma

rede. São Paulo ainda está longe de ter uma rede metroviária condizente com

o tamanho da cidade. Já se pensou em colocar o ônibus debaixo do solo, em

túneis, o que depende muito do tipo de combustível a ser usado. Mas, também

é preciso se fazer um túnel, o que também o torna bastante caro. Além disso, o

ônibus é tipicamente o nosso veículo de transporte coletivo da superfície. Com

o BRT ele se apresenta muito mais competitivo em termos de capacidade de

transporte e desempenho do que os VLT, então ele reina na superfície. Também

temos a discussão do que fazer acima da superfície. Ônibus em vias elevadas

são muito intrusivos visualmente. Em via elevada operam os people movers que

vem sendo gradativamente implantados em conexões aeroportuárias. Dentro

desse quadro referencial, o ônibus continua muito atraente na superfície, apenas

precisamos melhorar as suas condições de circulação.

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“ O congestionamento tem um efeito estimado no custo do transporte coletivo da ordem de 30%. Ou seja, tirando o ônibus do congestionamento já reduziria em 30% o custo da tarifa, já que o usuário do transporte coletivo acaba tendo que pagar toda conta. Aliás, esta é outra discussão, por que o usuário tem que pagar toda a tarifa do transporte coletivo? ”

REPENSANDO O ESPAÇO URBANO BOGOTÁ - COLÔMBIA

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Page 33: Revista Estradas n° 16

33Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

O estímulo ao transporte não motorizado passa por

designar aos pedestres e às bicicletas, um espaço digno na

superfície viária. Gosto dessas duas imagens, uma de Bogotá

e outra de Nova Iorque, que mostram como as grandes

cidades estão inovando no resgate do espaço público.

Precisamos inverter as prioridades atuais e devolver o espaço

do carro para a população.

O quarto pilar da mobilidade sustentável contempla a

integração uso do solo com o transporte. Ao se implantar um

sistema de transportes de capacidade elevada, seja metrô ou

BRT, precisamos adensar a cidade no entorno das paradas

e grandes terminais, para fazer o maior uso dos recursos

investidos. Com esses sistemas de grande capacidade, tem

que vir junto um grande projeto de reformulação da cidade,

dos seus índices construtivos, bem como a instalação de

serviços e comércio.

Precisamos romper os paradigmas atuais do asfaltamento

das vias em áreas de menor renda. Algo que tipicamente

se faz no Brasil é asfaltar uma via de ponta a ponta, sem

consolidar calçadas e ciclovias. Se asfalta tudo, “vamos

asfaltar por que ali passa ônibus”. Depois temos as pessoas

obrigadas a caminhar sobre esse asfalto, porque afinal

as calçadas nunca foram tratadas. E também crianças

brincando na superfície asfaltada. Com o processo tradicional

de asfaltamento levamos junto os acidentes e as mortes.

Necessitamos consolidar espaços urbanos e não vias urbanas.

Voltando a questão do tempo e do custo do transporte coletivo.

A taxação do congestionamento poderia ser uma maneira de

financiar o transporte público, subsidiar a tarifa?

Financiaria o transporte coletivo e, assim, desoneraria o

bolso do usuário. Seria uma medida justa de transferência

de renda, de subsídio cruzado. De certa forma é o que nós

temos hoje com a tarifa única urbana, quando os usuários

de trechos curtos pagam parte do custo dos usuários de

trechos longos. O grande problema é forma como se dá essa

transferência de renda. Em muito casos acaba o usuário de

menor renda subsidiando os isentos, idosos, estudantes. Via

de regra o isento é alguém que poderia pagar. Quem sabe

se, taxando o congestionamento urbano, não conseguiríamos

recursos para implantar e operar um transporte coletivo

muito melhor?

O valor da passagem está chegando num ponto crítico

no Brasil. Já temos a tarifa mais elevada da America

Latina mas o nosso ônibus está cada vez mais preso no

congestionamento. Assim precisamos de mais veículos para

ofertar o mesmo serviço. A isso chamamos de espiral da

morte, ou seja, estamos chegando num ponto em que o preço

da passagem não cobre os custos do serviço e não há como

aumentar mais, pois perderemos usuários. Aumentando a

passagem, incentivamos a migração para a moto e até para o

carro barato. Temos que reverter logo isso, e a melhor e mais

justa saída passa pela taxação do congestionamento. Essa

é uma discussão ainda complicada nas esferas técnicas e

políticas.brasileiras. Apesar do usuário do carro ser minoria

quando comparado ao conjunto que usa o transporte coletivo,

sem falar nos pedestres, de estarmos presos cada vez mais

em congestionamentos que se alastram no tempo e no

espaço, existem ainda barreiras para discutir esse tema no

nosso país. Porém, a taxação das externalidades pelo custo

marginal e a inversão desses recursos no transporte coletivo é

algo que apresenta uma lógica muito interessante. Sinto que

em algum momento vamos ter que encarar essa discussão, e

que esse momento está cada vez mais próximo.

REPENSANDO O ESPAÇO URBANO NOVA IORQUE - EUA

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Page 34: Revista Estradas n° 16

34

ui nomeada no serviço público federal, em 28 de outubro de 2008, para o cargo de

especialista em infraestrutura sênior, na área transportes, especialidade rodoviário e

urbano, por meio de concurso público do Ministério do Planejamento, Orçamento e

Gestão, após 22 anos de atuação como servidora pública no Estado do Rio Grande

do Sul, na área de infraestrutura aeroportuária e rodoviária. Atualmente, estou lotada

na Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana (SNTMU/SEMOB) do

Ministério das Cidades, em Brasília/DF.

No Estado, atuei, de 1997 a 2003 no Departamento Autônomo de Estradas de

Rodagem (DAER-RS), na Equipe de Economia Rodoviária da Divisão de Planejamento,

cedida da Secretaria dos Transportes, atual Secretaria de Infraestrutura e Logística.

Em 2001, no DAER, como sócia da SUDAER e da SECDAER, após a publicação

na Revista Estradas do resumo da minha Dissertação de Mestrado do Programa de

Pós-Graduação em Engenharia de Produção (modalidade profissionalizante, área

de concentração: Sistemas de Transportes e Logística) da Escola de Engenharia da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), intitulada Custos da Infraestrutura

Rodoviária – Análise e Sistematização, elaborada sob orientação do Prof. Dr. Luiz Afonso

dos Santos Senna, fui convidada pela Eng. Sayene Paranhos Dias, para fazer parte da

Comissão Editorial da Revista Estradas, experiência que foi muito gratificante e mais

uma das diversas oportunidades que a Eng. Sayene me proporcionou.

Também atribuo à Eng. Sayene e à Eng. Marilene Ragagnin a indicação para

participação no Curso de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – Transportes

na UFRGS.

As oportunidades do Mestrado e na Comissão Editorial da Revista Estradas

possibilitaram, além da ampliação dos meus conhecimentos, interagir com importantes

grupos, como os integrantes multidisciplinares da Comissão Editorial, os professores,

os acadêmicos, os profissionais de empresas tanto privadas quanto públicas, de várias

áreas de transportes, o que gerou trocas de informações muito produtivas.

Reminiscências do DAER-RS e da Revista Estradas (2001) e perspectivas de infraestrutura de transporte e mobilidade urbana (2011/2020)

Lucia Gonçalves PedrozoEngenheira Civil/Mestre em Engenharia/Especialista em Infraestrutura Sênior do Ministério das Cidades

[email protected] ou [email protected]

artig

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Page 35: Revista Estradas n° 16

35Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Da Comissão Editorial da Revista, ficaram inúmeras

lembranças. Destaco a reportagem técnica Preços dos Materiais

Asfálticos – As Novas Tecnologias são a Solução?, da qual

muito me orgulho, desenvolvida em conjunto com o Jornalista

Francisco Canabarro, em 2003. Por sugestão da Comissão

Editorial, e, principalmente do Eng. Joel Silveira e do Eng.

José A. de Oliveira, que trabalhavam, à época, no Centro de

Pesquisas Rodoviárias do DAER-RS, tendo em vista o excessivo

aumento dos materiais asfálticos na época, e, considerando

a minha experiência em custos, formatou-se a reportagem,

na qual entrevistamos técnicos da área. Foram entrevistados

técnicos da Ipiranga Asfaltos, Petrobrás Distribuidora,

Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de

Asfalto, Gerência de Produtos Especiais da empresa Petróleo

Brasileiro S.A. e, para nossa surpresa o principal destaque dos

entrevistados foi no sentido de tentar amenizar o problema

através de utilização de novas tecnologias.

Técnicos altamente qualificados, que acompanhavam

o que acontecia no mundo ressaltaram e descreveram

novidades tecnológicas na área de pavimentação, inclusive,

propuseram programas nacionais de recuperação de rodovias.

Em visita a Porto Alegre, deparei-me com a chamada

da Revista, com o tema Perspectivas Para a Infraestrutura

de Transporte – 2011-20, incluindo os transportes públicos

(metrôs, BRTs, etc). Decidi escrever este artigo sobre

investimentos em transporte e mobilidade urbana como forma

de reconhecimento e prestando homenagem à Eng. Sayene

Paranhos Dias, falecida em 05/10/2009, pois ela sempre

foi fundamental para a existência da Revista Estradas e sua

preservação – vejo que escolheu pessoas competentes para dar

continuidade - e pela importância da Sayene em nossas vidas.

As perspectivas para a infraestrutura de transportes no

período 2011-20, na área de transporte e mobilidade urbana,

são positivas, visto o expressivo aporte de recursos para a área.

O Ministério das Cidades atua nas áreas de Habitação,

Saneamento, Programas Urbanos e Transporte e Mobilidade

Urbana. Já a Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade

Urbana (SeMOB) foi instituída no Ministério das Cidades com a

finalidade de formular e implementar a política de mobilidade

urbana sustentável, entendida como “[...] a reunião das políticas

de transporte e de circulação, e integrada com a política de

desenvolvimento urbano, com a finalidade de proporcionar o

acesso amplo e democrático ao espaço urbano, priorizando os

modos de transporte coletivo e os não-motorizados, de forma

segura, socialmente inclusiva e sustentável”.

A necessidade de implantação de melhorias na

infraestrutura de mobilidade urbana nas cidades-sede da

Copa do Mundo de 2014 e o ingresso da área no Programa de

Aceleração do Crescimento do Governo Federal possibilitaram

que mais recursos fossem direcionados para a área de

infraestrutura urbana.

Os recursos de financiamento do Programa de

Infraestrutura de Transporte e da Mobilidade Urbana – Pró-

Transporte foram ampliados de R$ 1 bilhão, em 2009, para R$

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Page 36: Revista Estradas n° 16

36

8 bilhões, em 2010. O Programa tem como gestor da aplicação

o Ministério das Cidades, sob a responsabilidade da Secretaria

Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana e como agente

operador, a Caixa Econômica Federal. Os recursos são do Fundo

de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

O Pró-Transporte tem por objetivo financiar, para os

setores público e privado, a implantação de sistemas de

infraestrutura de transporte coletivo urbano e à mobilidade

urbana, contribuindo na promoção do desenvolvimento

físico-territorial, econômico e social, da melhoria da

qualidade de vida e da preservação do meio ambiente.

Apoia o financiamento de implantação, ampliação

de infraestrutura de sistemas de transporte coletivo,

incluindo, além das obras civis, a possibilidade de

aquisição de veículos dos sistemas de transporte sobre

trilhos, pneus e hidroviário. Possibilita construção

de terminais, bicicletários, abrigos de pontos de

parada, equipamentos e sistemas de informática e/ou

telecomunicações que otimizem a integração, o controle e

a modernização do sistema de transporte público coletivo

urbano, incluindo a possibilidade de financiar estudos e

projetos de concepção, desde que incluídos no escopo da

proposta de implementação.

Os proponentes que podem demandar recursos são

os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, os órgãos

públicos gestores e as respectivas concessionárias ou

permissionárias do transporte público coletivo urbano, bem

como as Sociedades de Propósitos Específicos (SPE).

Foram definidos 55 projetos de mobilidade urbana

associados à Copa do Mundo de 2014 nas 12 cidades-

sede do evento. Em todos os casos, foi destacado que

as obras incorporassem os preceitos de acessibilidade e

mobilidade urbana, de forma a promover a inclusão social

das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida.

Nos meses de maio, junho e agosto de 2010, foram

publicadas no Diário Oficial da União, pelo Ministério

das Cidades, como gestor da aplicação, as seleções de

54 projetos na área de mobilidade urbana nas cidades

de Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza,

Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Salvador e São

Paulo, conforme apresentado na Tabela 1.

É importante salientar que, das 12 cidades-

sede, escolhidas pela FIFA, cada uma possui mais de

uma modalidade de projeto, em contratos diferentes,

artig

os

perfazendo o total de 55 projetos, incluindo o Rio de

Janeiro. Algumas obras são de responsabilidade dos

Estados, e outras, dos municípios.

As obras são de implantação de corredores exclusivos

para transporte coletivo, Bus Rapid Transit (BRT), Veículo

Leve sobre Trilhos (VLT), implantação e readequação de

vias, estações, terminais e sistemas de monitoramento de

controle de tráfego.

Entende-se por BRT, o sistema de transporte de ônibus

de alta qualidade, que realiza mobilidade urbana rápida

e eficiente e com custo adequado, através da provisão de

infraestrutura segregada com prioridade de passagem,

operação rápida e frequente e excelência em marketing e

serviço ao usuário.

Tem, ainda, como principais características: poucas

linhas, com alta frequência e terminais de integração;

estações especiais, com acesso em nível entre a plataforma

e o veículo; embarque e desembarque rápidos, com ampla

capacidade para demanda de passageiros ao longo do

corredor; cobrança tarifária na entrada das estações; locação

no principal eixo de desenvolvimento da cidade, atuando

sob o Sistema Tronco Alimentador com Rede Integrada.

Com exceção do contrato do projeto de mobilidade

urbana associado à Copa do Mundo de 2014 do Rio de

Janeiro, que foi assinado pela Prefeitura Municipal do

Rio de Janeiro com o Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social (BNDES), com recursos do Fundo

de Amparo ao Trabalhador (FAT) do programa Projetos

Estruturadores de Transporte Urbano, os demais foram pelo

Pró-Transporte.

A Matriz de Responsabilidades é o documento que

consolida os compromissos firmados pelos Governos

Federal, Estaduais e Municipais, e também por clubes de

futebol, destacando os papéis assumidos pelos envolvidos

na liberação de recursos e na execução de cada uma das

ações. Envolve obras em estádios, aeroportos, portos,

mobilidade urbana entre outras.

A coordenação do Comitê Gestor para definir, aprovar

e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das

Ações do Governo brasileiro para a realização da Copa do

Mundo FIFA 2014 é do Ministério do Esporte.

Os valores dos projetos de mobilidade urbana

referentes à Copa do Mundo FIFA 2014 estão apresentados

na Tabela 1 a seguir.

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37Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

TABELA 1 Resumo dos projetos de mobilidade urbana associados à Copa do Mundo FIFA 2014 no Brasil

Fonte: Matriz de Responsabilidade e publicações no Diário Oficial da União em 2010 e 2011 - Secretaria Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana -

SNTMU/SeMOB - Ministério das Cidades (Dados atualizados até Agosto/2011)

Além desses recursos, foram alocados, em 2010, R$

3 bilhões para o Programa de Aceleração do Crescimento

2 (PAC 2), eixo Pavimentação e Qualificação de Vias

Urbanas. Foram selecionadas propostas perfazendo o total

de R$ 2,4 bilhões.

Adicionalmente, lançado em fevereiro de 2011, na

segunda etapa do PAC, o Governo Federal definiu o PAC

Mobilidade Grandes Cidades, visando apoiar projetos de

mobilidade urbana, tendo como público alvo os municípios

com população superior a 700.000 habitantes. O PAC

Mobilidade Grandes Cidades dispõe de recursos plurianuais

no valor de R$ 12 bilhões para financiamento de R$ 6

bilhões de recursos do Tesouro-Orçamento Geral da União.

Tem por objetivo requalificar e implantar sistemas

estruturantes de transporte público coletivo, visando à

ampliação da capacidade e promovendo a integração

intermodal, física e tarifária do sistema de mobilidade nos

grandes centros urbanos.

Permite obras de melhorias na infraestrutura existente

e implantação nova de infraestrutura de sistema de

transporte público coletivo urbano e equipamentos visando

integração, controle e modernização dos sistemas de

transportes públicos coletivos.

Atualmente, as propostas estão em análise, com

previsão de divulgação da seleção antes do final do ano.

Nesse caso, há previsão de seleção de sistemas de média

e alta capacidades e, diferentemente dos projetos de

mobilidade urbana associados à Copa do Mundo FIFA

2014, prevê a implantação de metrôs, além de BRTs,

corredores, VLTs.

A demanda foi bem superior aos recursos

disponibilizados, revelando a necessidade de destinação

de recursos para o setor. Assim, o valor de investimentos

em mobilidade urbana disponibilizados pelo Governo

Federal, incluindo a contrapartida dos entes federados

para os projetos associados à Copa do Mundo de 2014, é

de R$ 11,923 bilhões, e a disponibilidade de recursos a

serem selecionados no PAC Mobilidade Grandes Cidades

é de R$ 18 bilhões. Preveem-se recursos superiores a R$

30 bilhões na área de transporte e de mobilidade urbana,

conforme demonstrado no Quadro 1.

CIDADE-SEDE Nº DE PROJETOS PRINCIPAIS PROJETOS VALOR TOTAL INVESTIMENTO(R$ MILHÕES)

VALOR FINANCIAMENTO(R$ MILHÕES)

BELO HORIZONTE 8 BRT E CORREDOR 1.466 1.023

BRASÍLIA 1 VLT 380 361

CUIABÁ 3 BRT E CORREDOR 489 455

CURITIBA 9BRT, MONITORAMENTO E

CORREDOR464 441

CURITIBA 7 VLT, CORREDOR E BRT 562 410

MANAUS 2 MONOTRILHO E BRT 1.716 800

NATAL 2 CORREDOR 441 361

PORTO ALEGRE 10BRT, MONITORAMENTO E

CORREDOR480 427

RECIFE 5 BRT E CORREDOR 885 678

RIO DE JANEIRO 1 BRT 1.610 1.190

SALVADOR 1 BRT 570 542

SÃO PAULO 1 MONOTRILHO 2.860 1.082

TOTAL 50 11.923 7.769

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Page 38: Revista Estradas n° 16

38

QUADRO 1 Resumo do Total de Recursos Federais para Mobilidade Urbana

A Constituição Federal de 1988

atribui ao município a incumbência

de principal ente federativo para o

exercício das atividades relacionadas

ao planejamento e à gestão do espaço

urbano. O artigo 30 da Constituição

enumera as competências do município

que evidenciam essa importância.

Aos Estados e à União, cabem

competências secundárias, sendo

que especificamente à União, de

acordo com o inciso XX do artigo 21,

compete a instituição de diretrizes para

o desenvolvimento urbano, inclusive

habitação, saneamento básico e

transportes urbanos.

Como conseqüência dessa

distribuição de competências,

as ações e a política do Governo

Federal, ou seja, da União, na área

de mobilidade urbana, possuem um

caráter predominantemente indutor,

mas importante.

Esse caráter de atuação da

União, estabelecido na Constituição,

meramente indutor, faz com que, para

a infraestrutura de mobilidade urbana

efetivamente ser implantada, se torne

necessário que os entes federados

sejam estruturados, institucionalmente

e tecnicamente, na área de mobilidade

urbana, pois irão executar as

artig

os

obras, seja por meio de contrato

de financiamento, seja, no caso de

recursos do Orçamento Geral da União,

por meio de contratos de repasse.

A estrutura deve ser suficiente

para conceber os projetos de sistemas

de média e alta capacidades,

licitar e executar por meio da

empresa vencedora da licitação o

empreendimento propriamente dito.

Os entes federados, em poucos locais,

contam com estrutura suficiente para a

viabilização de obras de vulto nas suas

respectivas atuações geográficas.

As críticas da mídia com relação

ao início e aos atrasos nas obras são

frequentes; porém, a sua complexidade,

as diversas variáveis envolvidas na

implantação de infraestrutura urbana,

entre elas as grandes necessidades de

desapropriações, em áreas com grande

valorização imobiliária e de liberações

ambientais intrincadas, fazem com que

as dificuldades sejam grandes.

Os órgãos de controle, no seu

papel, questionam os procedimentos.

A falta de investimentos no setor

por longos anos fez com que não se

tivessem disponíveis projetos com

nível de confiabilidade suficiente

para uma imediata retomada de

empreendimentos na área.

Os vultosos investimentos

disponibilizados atualmente no setor

podem fazer com que se restabeleça

e se torne corriqueira a execução de

obras de infraestrutura de sistemas de

infraestruturas de transporte coletivo,

melhorando a mobilidade urbana e

tornando os deslocamentos mais fáceis.

As políticas públicas de incentivo

à melhoria da mobilidade urbana, o

estímulo ao transporte coletivo, em

detrimento do transporte individual,

bem como ao transporte não-

motorizado e as implantações de

sistemas de infraestrutura na área

devem contribuir para as reduções

de emissões de gases de efeito

estufa (GEEs) e os locais (GELs), que

influenciam diretamente nas mudanças

do clima.

Os projetos e termos de referência

devem prever soluções de redução de

emissões gases de efeito estufa e local,

poluição visual e sonora, minimizando

as externalidades negativas.

Entendo que a ação deve ser

conjunta, com muito esforço e

comprometimento de cada uma das

partes, para viabilizar a execução de

obras de infraestrutura de mobilidade

urbana que realmente venham a

contribuir para a sua melhoria nos

PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO - PAC 2 - MOBILIDADE GRANDES CIDADES

VALOR (EM BILHÕES) VALOR CONTRAPARTIDA ESTIMADA DE 5%

FINANCIAMENTO R$ 12 BILHÕES R$ 0,60 BILHÕES

OGU R$ 6 BILHÕES -

PROJETOS ASSOCIADOS À COPA DO MUNDO FIFA 2014

VALOR FINANCIAMENTO VALOR INVESTIMENTO (INCLUINDO CONTRAPARTIDA)

FINANCIAMENTO R$ 7,76 BILHÕES R$ 11,92 BILHÕES

TOTAL GERAL

VALOR FINANCIAMENTO/REPASSE VALOR TOTAL (INCLUINDO CONTRAPARTIDA)

TOTAL GERAL R$ 25,76 BILHÕES R$ 30,52 BILHÕES

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Page 39: Revista Estradas n° 16

39Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

grandes centros, até porque merece

destaque no contexto internacional o

grande volume de recursos nessa área.

Nesse sentido, a regulamentação

da Mobilidade Urbana pode ser

reforçada com a aprovação do Projeto

de Lei Consolidado - PLC 166/2010,

que dispõe sobre a Política Nacional

da Mobilidade Urbana, bem como

sobre os instrumentos necessários à

sua implementação, definindo o Marco

Regulatório da Mobilidade Urbana.

Os projetos de infraestrutura e os

termos de referência para aquisição de

equipamentos devem prever soluções

que atendam à legislação que dispõe

sobre acessibilidade universal no

ambiente urbano e acessibilidade no

transporte coletivo de passageiros:

Leis n°10.048, de 8 de novembro

de 2000, e n°10.098, de 19 de

dezembro de 2000, Decreto n°5.296,

de 2 de dezembro de 2004, e às

normas da Associação Brasileira de

Normas Técnicas (ABNT) – NBR nº

9050/2004, NBR nº 14.022/2006 e

NBR nº15.570/2008.

Além disso, os projetos

devem ter compatibilidade com as

legislações municipal, estadual e

federal de preservação ambiental,

de tombamento e de preservação do

patrimônio cultural, histórico, artístico,

paisagístico ou arqueológico das

áreas de intervenção e seu respectivo

entorno, prevendo melhorias no

tratamento urbanístico da área de

intervenção, baseados nos conceitos

da mobilidade urbana sustentável,

garantindo a segurança e melhoria

da qualidade de vida da população

beneficiada e não somente os aspectos

específicos relacionados à circulação

viária e ao sistema de transportes.

E especial atenção tem que ser

dada à frota de veículos dos sistemas

de transporte coletivo, em especial

no que se refere à acessibilidade e à

sustentabilidade.

Pretendi, neste artigo, mostrar as

perspectivas de investimentos na área

de transporte e da mobilidade urbana no

Governo Federal para os próximos anos.

Informo que os valores

apresentados são de domínio público,

visto já constarem em publicações no

Diário Oficial da União, e referem-se

à situação atualizada até setembro

de 2011. As revisões da matriz de

responsabilidade em andamento não

foram consideradas.

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Page 40: Revista Estradas n° 16

40

O presente artigo descreve as etapas iniciais de um projeto de pesquisa que foca as encostas situadas no Morro do Boi, em Balneário Camboriú-SC (Pista Sul da BR-101). Propõe-se o desenvolvimento de uma modelagem digital do terreno, gerando-se mapas geológicos, de declividades, de uso e ocupação do solo e de fatores de segurança. O projeto contemplará ainda a investigação de pontos de interesse no local (entre os km 140 e 141) através de sondagens geofísicas e coleta de amostras para avaliação de parâmetros em laboratório, obtendo-se assim informações mais detalhadas sobre o comportamento do terreno em estudo. Nesses locais, a encosta será modelada computacionalmente com abordagens determinística e probabilística. A instalação de instrumentos permitirá validar o modelo estabelecido e acompanhar o desempenho das soluções de estabilização executadas no local. O conhecimento gerado no trabalho buscará também subsidiar análises de risco geotécnico e decisões de engenharia em locais com condições geológicas semelhantes às do estudo de caso objeto da pesquisa.

artig

os

Avaliações da estabilidade e do desempenho de sistemas de proteção de taludes rodoviários em uma encosta litorânea instrumentada

Alessander KormannUniversidade Federal do Paraná

Liamara SestremUniversidade Federal do Paraná

Sergio AsakawaOHL Brasil

implantação de rodovias, que consistem em obras lineares de

grande extensão, pode envolver diferentes regiões ao longo

de seu traçado, com características específicas em termos de

relevo, vegetação, geologia, geotecnia e condições climáticas.

No Brasil, as rodovias instaladas ao longo da Serra do

Mar assumem particular interesse, não apenas em função

de seu papel na interligação de importantes centros urbanos

e industriais, mas também devido aos desafios que as

condições naturais presentes trazem à sua construção e

operação. Os maciços da Serra do Mar são compostos por

solos de origem coluvionar e residual, cujo comportamento

é bastante influenciado por agentes ambientais, dentre eles

a ação da precipitação pluviométrica, com processos de

movimentação do solo sendo observados com frequência.

À medida que diversas rodovias estão implantadas nesse

meio sujeito a uma dinâmica complexa, assume particular

importância o estudo de metodologias de avaliação de

segurança e a consequente adoção de técnicas de engenharia

eficazes, buscando-se maximizar o conforto dos usuários e

minimizar custos de manutenção.

Estudos relacionados à segurança de taludes em áreas

costeiras brasileiras têm sido realizados, podendo-se ter

uma ideia geral dos tipos de movimentos de massa mais

importantes. Acidentes de grande monta, acarretando perdas

ambientais, financeiras e humanas significativas ocorreram e

ainda representam desafios concretos à operação segura de

rodovias no País.

Com base nesse contexto, iniciou-se, em março de

2011, uma pesquisa da Autopista Litoral Sul que possui

o objetivo de aumentar o nível de segurança na operação

de rodovias situadas em áreas da Serra do Mar sujeitas a

escorregamentos, investigando-se os fenômenos naturais

envolvidos e a adequação de soluções tecnológicas para

a estabilização das encostas. Para tal, o estudo foca um

caso na BR-101, no maciço conhecido como Morro do Boi

(Balneário Camboriú-SC).

A pesquisa busca alavancar um maior entendimento

das condicionantes presentes, no intuito de se reduzir

os riscos da ocorrência de acidentes futuros em locais

de geologia semelhante. Para tanto, serão aperfeiçoadas

as informações referentes a parâmetros de resistência e

deformabilidade dos solos residuais e coluvionares locais,

que são típicos dos encontrados em outras rodovias situadas

na Serra do Mar. O estudo dará ênfase ao desempenho de

soluções de estabilização, em particular ao uso combinado

de ancoragens passivas e telas de proteção para a contenção

de massas coluvionares e/ou de tálus. A adequação desse

tipo de intervenção será avaliada através de instrumentação

geotécnica e ambiental, sendo as informações geradas

analisadas em modelos computacionais que simularão o

A

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Page 41: Revista Estradas n° 16

41Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

comportamento dos taludes e das

técnicas de estabilização.

O presente artigo descreve

condições geológico-geotécnicas

presentes no Morro do Boi e as estapas

iniciais dos estudos.

ENCOSTAS DA SERRA DO MAR: CONTEXTO GEOLÓGICO E GEOTÉCNICO

O continente sul-americano

constitui-se em toda a sua borda pelas

Serras do Mar e da Mantiqueira. A Serra

do Mar estende-se do Rio de Janeiro

ao norte de Santa Catarina, formando

um conjunto de escarpas escalonadas

com cerca de 1000 km de extensão

(ALMEIDA, 1998). Esses terrenos,

que se originaram através de processos

geológicos e geomorfológicos diversos,

constituem-se por maciços terrosos,

rochosos ou mistos (solo e rocha) e vêm

passando por modificações antrópicas

tais como cortes, desmatamentos e

introdução de cargas (SILVA, 2005).

Os solos residuais, dada sua

gênese ligada à intemperização in situ,

sem a ação de qualquer agente de

transporte, resultam de intemperismo

químico e caracterizam-se pela

minerologia variada e alto índice de

vazios. Tais processos de intemperismo

relacionam-se a fatores como: clima

(precipitações, temperatura, umidade

do ar, evaporação e regime de

ventos), agentes biológicos (vegetais

e animais), composição da rocha

matriz, relevo e tempo decorrido desde

sua formação. Um fator relevante no

comportamento desses materiais é o

tipo de rocha de origem, que afeta a

composição mineralógica do solo e,

consequentemente, a granulometria

e a plasticidade do mesmo (VAZ,

1996). A importância disso pode

ser exemplificada com a ocorrência

dos argilo-minerais conhecidos

como esmectitas, que podem levar

ao desenvolvimento de superfícies

de ruptura com baixa resistência ao

cisalhamento residual (VAUGHAN,

1988 apud DENARDIN, 2005).

Lacerda e Sandroni (1985)

definem os solos coluvionares como

sendo depósitos compostos por blocos

e/ou grãos de qualquer dimensão,

transportados por gravidade e

acumulados no sopé ou à pequena

distância de taludes mais íngremes

ou escarpas rochosas. Originam-se

em encostas de formações geológicas

diversas, caracterizando-se como

materiais com grande variabilidade

de textura, comportamento mecânico

dúctil-plástico sem pico definido e com

rede de fluxo bem estabelecida nos

períodos chuvosos. Quando situados

acima do nível freático, estão sujeitos

ainda à ação de processos físico-

químicos e biológicos complexos,

podendo-se citar a lixiviação de sílica

e bases, bem como de argilo-minerais,

que se movem das camadas mais altas

para as camadas mais profundas,

resultando em uma superfície com solo

rico em óxidos hidratados de ferro e

alumínio (MASSAD, 2003).

Lacerda (2002) e Rodriguez

(2005) associam a formação dos solos

coluvionares ao seu modo de ruptura.

Quando se originam de movimentos

lentos e contínuos, caracterizam-

se por acrescentar apenas alguns

centímetros à camada superficial

da encosta em cada evento. Tais

movimentos tendem a se acelerar

após períodos de chuvas intensas,

acentuando o processo de infiltração

de água e, consequentemente,

causando aumentos significativos de

poropressão. Tem-se ainda eventos

onde uma porção do solo residual

escorrega e se deposita sobre a própria

encosta, originando uma nova camada

de material de grande espessura em

um único episódio.

Os processos de movimentos de

massa ocorrem por uma combinação

de fatores/condicionantes, estando,

portanto o seu entendimento

relacionado a uma combinação de

variáveis climáticas, geológicas,

antrópicas, geotécnicas, pedológicas

e geomorfológicas, que atuam

simultaneamente na formação desses

processos (SESTINI, 1999). Dentre

eles, a intensidade e frequência das

precipitações interferem de maneira

significativa na instabilidade das

encostas: chuvas de longa duração

caracterizam infiltrações contínuas,

responsáveis pela saturação do solo

e pela consequente redução de

sua resistência ao cisalhamento,

resultando em uma superfície

com pontos de fraqueza favoráveis

à ocorrência de deslizamentos.

Precipitações intensas e de

curta duração, entretanto, estão

frequentemente mais relacionadas

a processos de erosividade e à

consequente transporte de material.

A presença de fraturas (tectônicas

ou resultantes de alívio de pressão)

pode representar importantes pontos

de descontinuidade e de menor

resistência, constituindo-se em

caminhos preferenciais à erosão e aos

movimentos de massa. Muitas destas

continuidades são formadas pelo alívio

de tensões, podendo-se encontrar

intemperizadas, o que favorece

processos de deslizamento (WOLLE

apud SESTINI, 1999).

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Page 42: Revista Estradas n° 16

42

artig

os

O CASO DO MORRO DO BOI (BALNEÁRIO CAMBORIÚ-SC)

O maciço do Morro do Boi está inserido na porção

sudeste do Município de Balneário Camboriú, entre as

coordenadas S 27° 05’ 00” e S 26° 58’ 00”; O 48° 37’

00” e O 48° 34’ 00” (Figuras 1 e 2), compreendendo

as praias de Laranjeiras, Taquarinhas, Taquaras, Pinho,

Estaleiro, Estaleirinho e os bairros Barra e Nova Esperança.

É delimitado, a leste, pelo oceano Atlântico; a noroeste,

pela presença de escarpas e morros do Complexo Cristalino;

a nordeste, pela BR-101; e, ao sul, pelo Município de

Itapema (TORRES, 2004).

Ao longo da extensão da BR-101 que intercepta o

Morro do Boi, o maciço alcança cerca de 160m de altitude.

Entre os quilômetros 140+700m e 140+950m, que são

pontos de interesse para a pesquisa, devido às soluções

de contenção ali instaladas, o terreno apresenta desníveis

de até 40m, sendo que a declividade média da estrutura

de corte executada por ocasião da construção da rodovia

se situa entre 1,0V:1,5H e 1,0V:2,0H. O histórico dessas

encostas é caracterizado pela ocorrência de processos de

Figura 1 Localização do Morro do Boi. Figura 2 Morro do Boi – Vista Geral entre Balneário Camboriú e Itapema.

movimentação, com o consequente acúmulo de detritos

sobre a rodovia e interrupção de tráfego. Em particular,

foram registradas rupturas em novembro de 2008, em

decorrência das precipitações pluviométricas de extrema

intensidade que ocorreram no Estado de Santa Catarina

naquele mês.

Estudos geotécnicos desenvolvidos contemplaram a

necessidade de se estabilizar o colúvio e os detritos em

sua posição remanescente. Tal decisão ateve-se à premissa

de minimizar transtornos aos usuários da rodovia, pois

uma alternativa simples sob uma ótica geotécnica poderia

envolver a remoção de centenas de metros cúbicos de solo/

rocha, intervenção que foi descartada, devido aos impactos

que acarretaria ao tráfego. Assim, convergiu-se para a

adoção de uma solução que, além de contemplar sistemas

de drenagem e contenção com muros de concreto, envolve o

uso de um sistema combinado de ancoragens passivas e tela

metálica específica (GEOBRUGG, 2011) para a contenção

de material instável.

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Page 43: Revista Estradas n° 16

43Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Figura 2 Morro do Boi – Vista Geral entre Balneário Camboriú e Itapema.

INVESTIGAÇÕES GEOTÉCNICAS E PROJETO DE SOLUÇÕES DE ESTABILIZAÇÃO

De maneira a subsidiar o desenvolvimento de projetos de

contenção para as encostas dos quilômetros 140+700m e

140+950m, conforme histórico descrito no item precedente,

as ações conduzidas envolveram a realização de algumas

campanhas de investigações geotécnicas.

No km 140+700m, foram realizadas três sondagens à

percussão (SP-01 e seus deslocamentos SP-01A e SP-01B),

quatro ensaios penetrométricos dinâmicos leves (do tipo

DPL) e cinco sondagens mistas. Os dados das sondagens

à percussão permitiram identificar uma camada de solo

residual de migmatito com espessura da ordem de 3,0m,

representado por fácies silto-areno-argilosas, com índices

NSPT variando entre 16 e 27 golpes (G4U ENGENHARIA,

2010a). Informações sobre o solo abaixo dessa camada foram

obtidas com equipamento rotativo através de sondagens

mistas (SM-01, SM-02, SM-03, SM-04 e SM-05), onde se

pôde identificar uma espessura média de 6,0m de solo a

montante da ruptura (SM-02, SM-03 e SM-04) e de 3,0m

Figura 3 Perfil geológico-geotécnico interpretado - km 140+700 m.

no local da ruptura (SM-01 e SM-05) (G4U ENGENHARIA,

2010a). Nessa etapa, o N.A. foi encontrado em todas as

sondagens, variando entre 3,5m e 6,7m de profundidade.

No contexto da presente pesquisa, as investigações

disponíveis foram interpretadas no sentido de se delinear

um perfil geológico-geotécnico com vistas à definição de um

conjunto de instrumentos/sensores a serem instalados no

km 140+700m (Figura 3), o qual será descrito no item 5.

Deve-se notar que a presença sistemática de blocos de rocha

torna difícil uma delimitação clara de camadas na massa

de colúvio/tálus, devendo-se considerar o perfil em questão

apenas como orientativo, até que informações obtidas ao

longo do estudo permitam refinar o modelo geológico-

geotécnico da área.

No km 140+950m, o levantamento planialtimétrico

identificou um desnível da ordem de 30m e declividade

média do talude situada entre 1V:1,5H e 1V:2,0H. A

campanha de investigação compreendeu quatro sondagens à

percussão (SP-03 e SP-04 com seus deslocamentos SP-03A

e SP-04A), alguns ensaios DPL e nove sondagens mistas

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Page 44: Revista Estradas n° 16

44

artig

os

(SM-01, SM-02, SM-03, SM-04, SM-05, SM-06, SM-07,

SM-08 e SM-09). Os resultados das sondagens identificaram

condições semelhantes àquelas do km 140+700m, diferindo

apenas nos índices NSPT, os quais variaram entre 9 e 45

golpes. A análise das sondagens mistas mostrou pontos

com espessura de solo da ordem de 3,0m, sendo que as

sondagens SM-04 e SM-06 indicaram 8,1m e 5,6m de solo

respectivamente. Destaca-se que esses dois furos estão

localizados a montante da crista de ruptura. O N.A. foi

encontrado em apenas três sondagens (SM-04, SM-08 e

SM-09), variando entre 2,0m e 3,7m de profundidade (G4U

ENGENHARIA, 2010b).

Para a execução do trabalho científico proposto, as

informações do subsolo serão complementadas com coletas

de amostras/ensaios laboratoriais, descrição de materiais

atravessados em perfurações para a instalação de ancoragens/

instrumentos e, em particular, levantamentos geofísicos.

Isso permitirá um melhor entendimento da estratigrafia, das

condicionantes ambientais, do comportamento geotécnico

Figura 5 Seção típica do sistema de tela metálica e ancoragens passivas (G4U ENGENHARIA, 2010a).

do subsolo e, consequentemente, dos processos de

movimentação de massa.

As soluções de contenção concebidas para os

quilômetros 140+700m e 140+950m propuseram estabilizar

o terreno utilizando uma solução de grampos com tela

metálica (G4U ENGENHARIA 2010a, G4U ENGENHARIA

2010b, GEOBRUGG 2011). Nesse sistema, uma malha de

aço é posicionada junto ao material instável, de forma que as

deformações do material sejam controladas pela flexibilidade

da tela metálica e seus esforços sejam redistribuídos para

grampos chumbados no maciço rochoso. A estrutura possui

ainda uma placa de fixação posicionada na cabeça dos

grampos, de maneira a se evitar o efeito de puncionamento

provocado pela concentração de esforços. As Figuras 4 e 5

detalham a solução proposta.

Por ocasião da elaboração do presente artigo,

a execução das obras de estabilização descritas já se

encontrava contratada pela concessionária, com seu início

previsto no curto prazo.

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Page 45: Revista Estradas n° 16

45Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Figura 4 Vista frontal do sistema de contenção com tela metálica (G4U ENGENHARIA, 2010a).

PLANO DE INSTRUMENTAÇÃO

Ao longo da pesquisa, o desempenho do sistema de

estabilização descrito no item precedente será monitorado na

encosta do km 140 + 700m da BR-101. O desenvolvimento

de um plano de instrumentação, realizado no contexto

do presente estudo, teve como critérios aspectos tanto

geológico-geotécnicos como hidrológicos, com sensores

sendo selecionados de maneira a identificar variações de

poropressões, deslocamentos da massa de solo e deformações

do sistema de contenção.

Tais instrumentos podem ser classificados de acordo com

seus objetivos principais:

medição das cargas nos grampos ao longo da massa

de solo reforçada, com a utilização de extensômetros

elétricos (strain gages) e células de carga;

medição dos esforços e deslocamentos da tela metálica,

com a utilização de crackmeters para leitura de

deslocamentos;

medição do comportamento geotécnico da encosta,

com a utilização de piezômetros (leituras de

poropressões positivas), inclinômetros (deslocamentos)

e tensiômetros (leituras de poropressões negativas);

medição de precipitação pluviométrica mediante a

utilização de pluviógrafo.

A distribuição dos instrumentos pode ser observada

na Figura 6 (seção) e na Figura 7 (planta). A definição

dos sensores, bem como das profundidades em que os

mesmos serão instalados, baseou-se nas informações das

sondagens existentes nos furos mais próximos.

Para a instrumentação geotécnica, serão instalados

inclinômetros em dois pontos da encosta. Esses

instrumentos deverão ficar embutidos 3,0m em

rocha sã, visando-se garantir uma boa ancoragem e,

consequentemente, um referencial estático para as leituras

de deslocamentos.

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Page 46: Revista Estradas n° 16

46

artig

os

A instrumentação geotécnica compreenderá também

a instalação de piezômetros elétricos de corda vibrante

(GEOKON, 2011). Esses instrumentos serão instalados

em dois pontos da encosta, sendo que, em cada posição,

a leitura será realizada em três profundidades distintas

(2,5m, 5,0m e 6,8m). Prevê-se, ainda, a instalação de um

piezômetro do tipo Casagrande, com o objetivo de comparar

leituras obtidas nos equipamentos automatizados. Com o

arranjo de piezômetros, pretende-se obter leituras no centro

da camada de solo, na interface da camada de solo/rocha

alterada e no contato da rocha alterada com a rocha sã.

Outra característica que será monitorada na encosta

consistirá na sucção das camadas superficiais e não

saturadas do solo. Esse monitoramento será realizado

através da instalação de tensiômetros em três posições

distintas. Em dois desses pontos, serão instalados dois

sensores (profundidades de 1,0m 2,0m), e, no terceiro,

serão instalados quatro sensores, nas profundidades de

0,5m, 1,0m, 2,0m e 3,0m.

Está prevista, ainda, a utilização de um pluviógrafo para

monitoramento detalhado das precipitações pluviométricas.

Esse tipo de instrumento tem a vantagem de registrar os

dados ao longo do tempo, ou seja, não apenas o volume

precipitado em milímetros por dia ou por episódio de

Figura 6 Plano de instrumentação do km 140 + 700 m – seção típica.

Figura 7 Plano de instrumentação – planta.

chuva, mas, sim, a intensidade com que determinada

precipitação aconteceu.

Para a instrumentação dos grampos, serão utilizadas

células de carga, posicionadas entre a cabeça da ancoragem

e a tela de contenção. Estão previstas quatro células de

carga (GEOKON, 2011). O dispositivo selecionado consiste

em um cilindro de aço de alta resistência, com 3-6 sensores

de corda vibrante que permitem monitorar as tensões de

compressão. O projeto prevê, ainda, a instrumentação de

quatro chumbadores (ancoragens passivas), com strain

gages ao longo de seu comprimento: um sensor na porção

central da camada de solo, um no contato entre a camada

de solo e a camada de rocha alterada, um no contato entre

a camada de rocha alterada e rocha sã e, por fim, um sensor

na parte do grampo que ficará embutido em rocha sã.

Com o intuito de monitorar o comportamento da

tela metálica, serão instalados ainda instrumentos

denominados crackmeters. Esses sensores medem o

movimento (deslocamento) através de articulações e

poderão identificar solicitações na malha de aço que

compõe o sistema de contenção. A instalação dos mesmos

deverá dar-se em seis pontos da encosta, com um

posicionamento em pares, objetivando-se o monitoramento

em duas direções ortogonais.

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Page 47: Revista Estradas n° 16

47Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Figura 7 Plano de instrumentação – planta.

CONCLUSÕES

No presente artigo, o contexto desafiador da encostas

da Serra do Mar foi discutido descrevendo-se o contexto da

pesquisa em curso e resumindo-se o desenvolvimento dos

estudos, os quais foram iniciados em março de 2011.

O levantamento das informações disponíveis até

o momento reforça a necessidade de se aprofundar o

entendimento das condicionantes geológico-geotécnicas

presentes no maciço do Morro do Boi, com a avaliação de

parâmetros de resistência e deformabilidade do solo local.

Deve-se observar que etapas subsequentes do projeto

contemplam o desenvolvimento de um modelo digital do

terreno, com a geração de mapas geológicos, de declividades,

de uso e ocupação do solo e de fatores de segurança.

Os dados existentes (sondagens mistas) serão

complementados através de métodos geofísicos, os quais

possibilitam investigar maciços com um ganho de escala,

melhorando-se o entendimento da estratigrafia e das

descontinuidades do embasamento rochoso, com ênfase

na distribuição espacial dos materiais e das transições que

ocorrem em profundidade.

As investigações envolverão, ainda, a realização

de ensaios laboratoriais, com ensaios de cisalhamento

direto com reversão múltipla e triaxiais. Os mesmos serão

Referências ALMEIDA, F. F. M.; CARNEIRO, C. D.R.. Origem e evolução da Serra do Mar. Revista Brasileira de Geociências. 1998.DENARDIN, A. P.. Estudo do comportamento mecânico de um solo saprolítico de basalto de teutônia, RS. Porto Alegre, 2005. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.GEOBRUGG (2011). TECCO ® - Slope Stabilization. Geobrugg AG Protection Systems. GEOKON (2011). Products. Geokon, Incorporated. G4U ENGENHARIA (2010a). MC-07-101-SC-140-7-C05-001. Projeto de Contenção – Memória de Cálculo da Contenção de Estrutura de Corte no km 140+700 da Rodovia BR-101/SC. G4U ENGENHARIA (2010b). MC-07-101-SC-140-9-C05-001. Projeto de Contenção – Memória de Cálculo da Contenção de Estrutura de Corte no km 140+950 da Rodovia BR-101/SC. LACERDA, W. A. & SANDRONI, S. S.. Movimentos de massas coluviais. Mesa Redonda sobre aspectos geotécnicos de taludes. Rio de Janeiro, 1985. ABMS, Clube de Engenharia, pp.III-1 a III-19.LACERDA, W. A.. Comportamento geotécnico de massas coluviais. III Simpósio de prática de Engenharia da Região Sul, GEOSUL. Joinville, 2002. ABMS. p.219-231.MASSAD, F.. Obras de terra – Curso Básico de Geotecnia. São Paulo, 2003. Oficina de Textos.RODRIGUEZ, T. T.. Proposta de classificação geotécnica para colúvios brasileiros. Rio de Janeiro, 2005. Tese (Doutorado). Programa de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.SESTINI, M. F.. Variáveis geomorfológicas no estudo de deslizamentos em Caraguatatuba – SP utilizando imagens TM_LANDSAT e SIG. São José dos Campos , 1999. Dissertação (Mestrado). UNPE, 1999. 140p. – (INPE-7511-TDI/724).SILVA, A. L.. Deslizamentos nos morros do brejo da Guabiraba, Recife/PE: Uma visão para desenvolvimento local sustentável. Recife, 2005. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Ciência da Administração de Pernambuco.TORRES, R. R.. Caracterização espacial e as principais implicações ambientais das atividades de exploração do granito entre os anos de 2000 e 2004, na porção Sudeste do município de Balneário Camboriú. Itajaí, 2004. Monografia (Graduação). Graduação em Engenharia Ambiental da Universidade do Vale do Itajaí.VAZ, L. F. Classificação genética dos solos e dos horizontes de alteração de rochas em regiões tropicais. Revista Solos e Rochas, São Paulo, n.2/v.19, p. 117-136, ABMS/ABGE, 1996.

conduzidos sob circunstâncias variadas de tensões efetivas,

podendo fornecer subsídios importantes do comportamento

tensão-deformação e da resistência ao cisalhamento, com

vistas a análises computacionais.

Será realizada uma retroanálise das rupturas já

ocorridas, utilizando-se modelos determinísticos. Isso

possibilitará a reavaliação de parâmetros de resistência do

talude e a comparação com os dados obtidos nos ensaios

de resistência em laboratório. Análises determinísticas

de fatores de segurança do talude serão realizadas em

diferentes cenários (flutuação do nível do lençol freático,

fluxo subterrâneo saturado e diferentes parâmetros de

resistência das camadas).

Os dados a serem monitorados com a instrumentação

aqui descrita permitirão avaliar o desempenho do sistema

de contenção utilizado nos quilômetros 140+700m e

140+950m da BR-101, incluindo a identificação de

eventuais vantagens e desvantagens do uso desse método na

mitigação de movimentos de massa. Por fim, será possível

realizar uma análise crítica da metodologia utilizada na

avaliação do tipo de maciço em questão, objetivado-se

consolidar diretrizes práticas para a aplicação em outras

encostas de interesse.

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Page 48: Revista Estradas n° 16

48

artig

os

A qualidade de serviços de pavimentação é frequentemente avaliada a partir do grau de compactação das camadas executadas. Para os revestimentos asfálticos não é diferente, sendo que esse parâmetro é obtido pela razão entre a densidade de campo e a de projeto. Este artigo apresenta os resultados de medições com o indicador da qualidade dos pavimentos (IQP), também conhecido como densímetro não nuclear, com o objetivo de avaliar os resultados obtidos estatisticamente e propor correções a partir dos dados de saída do equipamento. Foram realizadas análises de variância (Anova), a fim de verificar a influência do valor relativo da água (H2O) e da temperatura (T) nas densidades obtidas. Foi observado que ambos os parâmetros influenciam os resultados, tendo sido proposta uma correção a partir de um ajuste polinomial do terceiro grau para H2O e linear para T. Com o procedimento proposto, as densidades tornam-se menos dispersas, facilitando a sua interpretação.

Análise estatística de resultados do Indicador da Qualidade dos Pavimentos (IQP)

Rodrigo Malysz, Valter de Oliveira Bochi e Liz Helena Costa Varella

Engenheiros Civis – Ecoplan Engenharia Ltda.

qualidade de serviços de pavimentação é frequentemente avaliada a partir do grau de

compactação das camadas executadas. Para os revestimentos asfálticos não é diferente,

sendo que esse parâmetro é obtido pela razão entre a densidade de campo e a de

projeto. A densidade de campo pode ser medida ou estimada de diversas formas, como:

extração de corpos de prova e ensaios de laboratório, utilização de densímetro nuclear

ou densímetro não nuclear. Como o densímetro nuclear apresenta muitas restrições de

uso e requer mão de obra especializada, os demais métodos mostram-se mais práticos e

atrativos. Além disso, no estudo de Micaelo et al. (2006), foi observada maior dispersão

nos resultados com o densímetro nuclear em relação ao não nuclear.

Neste estudo, são apresentados resultados de um levantamento com o densímetro

não nuclear, ou Indicador da Qualidade dos Pavimentos (IQP), em uma rodovia

pavimentada federal, integrante do programa Crema 1ª etapa, de jurisdição do

DNIT. São apresentados também os procedimentos e os resultados de calibração. Os

resultados obtidos são analisados estatisticamente, utilizando-se ferramentas como:

estatística descritiva, testes de hipóteses, regressões e análise de variância.

Este artigo tem o objetivo geral de apresentar e interpretar os resultados obtidos

em um levantamento com o IQP. Para isso, os trabalhos foram conduzidos de forma a

atender os seguintes objetivos específicos:

apresentar a calibração do IQP para a mistura asfáltica avaliada;

apresentar os resultados de campo;

avaliar estatisticamente os resultados obtidos;

propor uma correção dos resultados.

A

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Page 49: Revista Estradas n° 16

49Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

METODOLOGIA

Este item descreve o densímetro não nuclear utilizado para a obtenção dos dados deste artigo e a estatística utilizada nas

análises. Destaca-se aqui a observação de Nascimento et al. (2009), segundo a qual não devem ser realizadas comparações

ponto a ponto entre o IQP e os resultados das pesagens hidrostáticas dos corpos de prova. O equipamento só dá bons resultados

quando analisados estatisticamente.

O Indicador da Qualidade dos Pavimentos

O equipamento denominado Indicador da Qualidade dos Pavimentos, também conhecido como densímetro não nuclear, é

um equipamento destinado à obtenção de medidas indiretas da densidade de misturas asfálticas. A Figura 1(a) apresenta uma

fotografia do equipamento. O equipamento emite ondas que formam um campo elétrico, captado pelos componentes eletrônicos

conforme o esquema da Figura 1(b). A intensidade do campo captado pelos sensores é função da constante dielétrica do

material medido.

Figura 1 (a) equipamento indicador da qualidade dos pavimentos e (b) esquema de funcionamento

O equipamento apresenta elevada

variabilidade nos resultados, de acordo

com a composição do material que

está sendo medido. Para diminuir essa

variabilidade, o manual do usuário

recomenda que, antes de iniciar uma

campanha de medição, seja feita uma

calibração, comparando as leituras do

IQP com a densidade de corpos de

prova extraídos.

Figura 2 Posicionamento das leituras para a calibração do IQP

Para a calibração, devem ser

marcados na pista, longitudinalmente,

cinco pontos espaçados de 1m,

preferencialmente na trilha de roda.

Em cada ponto, devem ser feitas cinco

leituras com o densímetro, denominadas

1.0, 1.1, 1.2, 1.3, 1.4, 2.0, 2.1,

2.2, 2.3, 2.4, 3.0, ..., 5.4. A Figura 2

apresenta um esquema da calibração,

com a localização e a denominação dos

pontos. No centro das leituras 1.0, 2.0,

3.0, 4.0 e 5.0, devem ser extraídos os

corpos de prova para a determinação da

densidade em laboratório, conforme o

DNER-ME 117/94.

Esse procedimento gera um

coeficiente de calibração k, conforme a

equação 1. As leituras do levantamento

com o IQP devem ser multiplicadas por

esse coeficiente.

Onde:- k é o coeficiente de calibração- DIQP é a densidade medida pelo equipamento- DCP é a densidade dos corpos de prova extraídos

(a) (b)

k = DCP

DIQP

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Page 50: Revista Estradas n° 16

50

artig

os

Os dados de saída fornecidos pelo IQP são: (i) densidade

do material asfáltico, (ii) valor relativo da água (H2O) e (iii)

temperatura da superfície (T). Observa-se que o equipamento

é popularmente conhecido como densímetro, entretanto o

parâmetro de saída é, de fato, a massa específica aparente da

mistura asfáltica, apresentada em kg/m³ ou lb/ft³. Segundo

TransTech (2003), o equipamento apresenta o resultado da

medição compensando internamente as variações do H2O e T.

No entanto, foram observadas algumas tendências de variação

em função desses parâmetros, conforme será apresentado e

analisado no item 3.

Regressão múltipla, testes de hipóteses e análises de variância

No item anterior, foram definidas e apresentadas as

quatro variáveis envolvidas na interpretação dos resultados,

a saber: (i) a densidade dos corpos de prova extraídos

(DCP), a densidade medida pelo equipamento (DIQP), o valor

relativo da água (H2O) e a temperatura da superfície (T).

Neste item, são apresentadas as ferramentas estatísticas

utilizadas para a análise da interdependência dessas

variáveis, sendo que o resultado do levantamento é a DIQP,

a qual será considerada a variável dependente, e as demais

serão as variáveis independentes.

Para a interpretação da calibração, conforme o esquema

da Figura 2, é utilizada apenas uma estatística descritiva

básica, calculando-se as médias para cada ponto e

comparando com os resultados do corpo de prova.

Para a verificação da influência do H2O e da T nos

resultados do IQP, é proposta uma análise de variância

(Anova) dos resultados de regressão múltipla. A regressão

múltipla, ou a múltiplas variáveis, é a obtenção de uma

equação que represente comportamento dos parâmetros.

Genericamente, a regressão múltipla pode ser representada

pela equação 2. Para iniciar a análise, deve ser proposto

um teste de hipóteses. Para este caso, são definidas duas

hipóteses: a hipótese nula (H0) e a hipótese alternativa

(H1). Segundo Hines et al. (2006), a rejeição da hipótese

nula é considerada uma conclusão estatisticamente forte,

e a aceitação é considerada uma conclusão fraca. Sendo

assim, as hipóteses devem ser formuladas de forma que as

conclusões obtidas sejam estatisticamente consistentes.

A ferramenta que testa a hipótese formulada é a

análise de variância. O procedimento verifica se as variáveis

independentes têm influência na variável dependente. O

resultado final do procedimento é o F0 , calculado como a

relação entre a média quadrática dos tratamentos (níveis da

variável independente) e a média quadrática dos erros (dentro

de cada tratamento). A rejeição ou a aceitação da hipótese

testada é feita comparando-se F0 com a distribuição F para o

nível de significância desejado. Os procedimentos utilizados

para análise de variância em planilhas eletrônicas são descritos

detalhadamente por Lapponi (2005).

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

O Indicador da Qualidade dos Pavimentos destaca-se

pela praticidade na sua utilização. Uma vez calibrado para

a utilização com a mistura asfáltica que se deseja avaliar,

as medições podem ser realizadas com produtividade muito

elevada.

Levantamento de campo

O levantamento de campo inicia com a calibração do

equipamento para utilização com a mistura asfáltica em

análise. Sendo assim, foram feitas as medições com o IQP,

conforme o esquema apresentado na Figura 2, e extraídos

corpos de prova nos pontos 1.0, 2.0, 3.0, 4.0 e 5.0. Os

resultados obtidos permitem a determinação do coeficiente de

calibração k, conforme o Quadro 1, na página seguinte.

Os dados utilizados neste artigo foram obtidos em

levantamento no qual as medidas foram obtidas a cada 100m.

O levantamento foi realizado em uma rodovia que sofreu

intervenções de fresagem e recomposição com 4cm de concreto

betuminoso usinado a quente (CBUQ). Observa-se que não

foram realizadas medições entre os km 28+000 e 69+200, uma

vez que esse trecho foi alvo apenas de um rejuvenescimento

com microrrevestimento asfáltico. Os resultados obtidos, já

multiplicados pelo coeficiente de calibração, são apresentados

graficamente na Figura 3, na qual é observada a elevada

dispersão dos resultados. O Quadro 2, por sua vez, apresenta

uma estatística descritiva dos resultados obtidos. Observa-se

que o grau de compactação varia entre 87,6% e 109,0%,

correspondendo a uma amplitude de 21,4%.

Onde:- y é a variável dependente- βj são os coeficientes de regressão de ordem j em que 0 ≤ j ≤ k- xj são as variáveis independentes de ordem j em que 0 ≤ j ≤ k

y = β0 + β1.x1+ β2.x2+ ... + βk.xk

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51Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Quadro 1 – Determinação do coeficiente de calibração

Figura 3 – Resultados obtidos com o IQP

Quadro 2 – Estatística descritiva dos dados de campo

PONTO H2O T (°C) DIQP GCIQP (%) GCIQP,med (%) GCCP,med (%) k

1.1 32,4 26,8 2,060 87,9

87,5 98,6 1,13

1.2 31,3 27,2 2,054 87,7

1.3 30,8 27,0 2,031 86,7

1.4 30,0 26,3 2,065 88,1

1.5 30,5 26,5 2,037 86,9

2.1 31,1 25,7 2,043 87,2

87,4 98,9 1,13

2.2 31,9 26,3 2,047 87,4

2.3 33,2 26,6 2,051 87,5

2.4 32,2 25,0 2,072 88,4

2.5 30,1 25,2 2,029 86,6

3.1 32,6 26,3 2,075 88,6

87,6 98,7 1,13

3.2 31,2 26,3 2,042 87,2

3.3 31,9 27,0 2,058 87,8

3.4 31,2 26,8 2,055 87,7

3.5 29,9 26,7 2,033 86,8

4.1 33,0 26,2 2,072 88,4

88,4 99,0 1,12

4.2 33,8 26,4 2,085 89,0

4.3 33,2 26,6 2,060 87,9

4.4 31,8 26,3 2,059 87,9

4.5 35,0 26,1 2,080 88,8

5.1 32,8 25,9 2,077 88,6

88,6 99,0 1,12

5.2 32,7 25,8 2,111 90,1

5.3 34,1 25,4 2,099 89,6

5.4 30,8 25,7 2,044 87,2

5.5 31,7 25,4 2,052 87,6

MÉDIA 32,0 26,2 2,1 87,9 87,9 98,8 1,12

DISCRIMINAÇÃO H2O T (°C) DIQP GCIQP (%)

MÍNIMO 3,9 11,2 2,052 87,6

MÉDIA - DESVIO PADRÃO 17,9 15,9 2,182 93,1

MÉDIA 24,7 21,7 2,257 96,3

MÉDIA DESVIO PADRÃO 31,4 27,6 2,332 99,5

MÁXIMO 39,5 36,1 2,554 109,0

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52

artig

osAnálise de variância

Os resultados do levantamento são apresentados pelo IQP como uma massa específica aparente. As Figuras 4(a) e 4(b) apresentam

DIQP em função de H2O e T respectivamente, a fim de verificar a existência de alguma tendência e, eventualmente, propor uma correção. As

tendências obtidas são apresentadas pelas equações 3 e 4, cujos coeficientes de determinação (R²) foram respectivamente 0,7634 e 0,0761.

Observa-se, na Figura 4(a), uma tendência claramente

curva, que inicialmente foi tratada como potencial e

exponencial, porém os ajustes não foram eficientes. A curva

que melhor se ajustou aos dados foi uma polinomial do terceiro

grau. O procedimento, além de quantificar a influência do H2O

nos resultados, permite identificar pontos espúrios.

A influência de T nos resultados não é tão marcante, e

os resultados são consideravelmente dispersos. Ainda assim,

é possível identificar visualmente alguma influência, pela

declividade da reta ajustada. Também se observa que, a partir

da temperatura de aproximadamente 30°C, DIQP torna-se

ligeiramente mais elevada e mais dispersa.

A verificação da influência de H2O e T em DIQP foi feita

pela análise de variância da hipótese nula. A hipótese nula

deve ser formulada de modo a se obter uma conclusão

estatisticamente forte, conforme apresentado no item 2.2.

Se a hipótese nula for definida como o parâmetro (H2O ou

T) influencia os resultados do IQP, então a sua aceitação é

considerada como uma conclusão estatisticamente fraca. Como

a expectativa é de que os parâmetros, de fato, influenciam

os resultados, é mais atrativo propor o teste de hipóteses,

considerando os parâmetros da equação 2 da seguinte forma:

• H0: β1 = β2 = ... = βk = 0;

• H1: βj ≠ 0 para pelo menos um j

Figura 4 Densidades: (a) em função de H2O e (b) em função da temperatura

Proposição de fatores de correção para os resultados

Observa-se que o coeficiente de calibração foi obtido

em condições de H2O e T de 32°C (adimensional) e 26°C

respectivamente. Portanto, o coeficiente de calibração é

suficiente para a interpretação dos resultados. Caso as

condições do levantamento não forem sempre essas, o que

ocorre com muita frequência, o levantamento necessita de

uma nova correção, como mostram as tendências das Figuras

4(a) e 4(b).

Quadro 3 Anova para o parâmetro H2O

Quadro 4 Anova para o parâmetro T

Onde:- DIQP é a densidade medida pelo equipamento- H2O é o valor relativo da água- T é a temperatura da superfície asfáltica

A Anova para o H2O é apresentada no Quadro 3, no qual

se verifica que F0 = 776,4. Para a verificação da hipótese

nula, esse valor deve ser comparado com F0,001,3,722 = 3,78.

Nesse caso, a hipótese nula é rejeitada, com uma conclusão

estatisticamente forte e, portanto, conclui-se que H2O influencia

os resultados do IQP. O Quadro 4 apresenta os resultados

obtidos para T, com F0 = 59,66, também rejeita a hipótese

nula, quando comparada com F0,001,1,724 = 6,63, e a conclusão

estatisticamente forte é que o parâmetro influencia os

resultados. O fato de haver muitos graus de liberdade (gl) para

os resíduos torna o resultado mais representativo.

(a) (b)

DIQP = 5.10-6.H2O3-2.10-5.H2O2+0,0023.H2O+1,8806

DIQP = 0,0032.T + 1,9385

DISCRIMINAÇÃO GL SQ MQ F0

TRATAMENTOS 3 3,134542 1,044847 776,4

RESÍDUO 722 0,971561 0,001346

TOTAL 725 4,106102

DISCRIMINAÇÃO GL SQ MQ F0

TRATAMENTOS 1 0,312576 0,312576 59,66

RESÍDUO 724 3,793527 0,00524

TOTAL 725 4,106102

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53Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Onde:- CH2O é a correção devida ao valor relativo da água- CT é a correção devida à temperatura da superfície asfáltica- H2O é o valor relativo da água- T é a temperatura da superfície asfáltica

Figura 5 Correções para DIQP: (a) em função de H2O e (b) em função da temperatura

Trata-se de corrigir os valores de campo para a condição

de H2O e T médios da campanha de calibração. Para propor as

correções, foi calculada a diferença de densidade entre cada

ponto e o valor de referencia adotado, tanto para H2O quanto

A correção pelo H2O foi proposta a partir de uma equação

polinomial do terceiro grau, que mostrou um ajuste bastante

satisfatório aos resultados. Para a amplitude de H2O observada no

levantamento, foram obtidas correções de densidade entre -0,47

e +0,21, que representam, respectivamente, 20,1% e 9,0% em

relação à densidade de projeto.

A correção pela T foi proposta a partir de uma equação

linear, que mostrou um ajuste apenas razoável aos resultados

e pode requerer uma análise mais detalhada, eventualmente

com uma amplitude maior de temperaturas. Para a amplitude

de T observada no levantamento, foram obtidas correções de

Figura 6 Resultados obtidos do IQP com correção

CH2O = -5.10-6.H2O3+2.10-5.H2O2-0,0023.H2O+0,217

CT = 0,0032.T + 0,0832

ReferênciasDNER-ME 117/94 – Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. Método de Ensaio. Mistura Betuminosa – Determinação da Densidade Aparente. Hines, William W.; Montgomery, Doluglas C.; Goldsman, David M.; Borror, Connie M. (2006). Probabilidade e Estatística na Engenharia. Rio de Janeiro, LTC 4ª edição. Tradução de Vera Regina Lima de Farias e Flores. Revisão Técnica de Ana Maria Lima de Farias.Lapponi, J. C. (2005). Estatística Usando Excel. Rio de Janeiro, Elsevier: 4ª edição.Micaelo, Rui; Ribeiro, Jaime; Azevedo; M. Conceição M. (2006). A Influência dos Parâmetros da Compactação na Qualidade Final de Misturas Betuminosas. V Jornadas Luso-Brasileiras de Pavimentos: Políticas e Tecnologias. Recife/PE.Nascimento, Luis Alberto Herrmann do; Chacur, Marcos; Rocha, Sérgio Murilo Nunes; Fritzen, Marcos Antônio (2009). Uso do Densímetro Eletromagnético no Acompanhamento das Pistas Experimentais da Cidade Universitária do Rio de Janeiro. IV Simpósio Internacional de Avaliação de Pavimentos e Projetos de Reforço. Fortaleza/CE.TransTech (2003). Indicador da Qualidade dos Pavimentos. Manual do Operador.

CONCLUSÕES

Os resultados do IQP mostraram-se bastante dispersos e, somente com a calibração sugerida pelo manual de usuário,

a interpretação dos seus resultados fica prejudicada. Nessas circunstâncias, são necessárias outras correções, a partir dos

parâmetros de saída do equipamento. As correções propostas diminuem a dispersão dos resultados e permitem conclusões

mais efetivas.

As análises estatísticas mostraram uma influência marcante do Valor Relativo da Água (H2O) nos resultados e uma

influência mais discreta da temperatura (T). Isso se reflete na proposição das correções dos resultados. Ainda assim, as

análises de variâncias mostraram influência significativa para ambos os parâmetros nos resultados obtidos.

densidade entre -0,08 e +0,08, ambas representando 3,4% em

relação à densidade de projeto. Assim, verificam-se correções

consideravelmente menores em função da T do que em relação à

H2O.

Os resultados do levantamento multiplicados pelo coeficiente

de calibração e corrigidos pelas equações 4 e 5 são apresentados

na Figura 6. Observa-se que o grau de compactação varia entre

93,2% e 107,7%, correspondendo a uma amplitude de 14,5%,

sensivelmente inferior à amplitude observada na Figura 3.

para T, o que resultou nos gráficos das figuras 5(a) e 5(b) e

nas equações 4 e 5. A correção proposta ocorre somando-se o

resultado das equações 4 e 5 à densidade já multiplicada pelo

coeficiente de calibração.

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54

artig

os

Uma solução que está sendo utilizada para a pavimentação de vias urbanas ou rodoviárias, com consistente e constante crescimento, é o pavimento de concreto de cimento Portland. A bibliografia sobre pavimentação faz referência ao pavimento de concreto demonstrando as vantagens de durabilidade e o baixo custo de manutenção ao longo de sua vida útil. Neste momento pelo qual o Brasil passa, em que os investimentos na recuperação e na ampliação da infraestrutura estão viabilizando grandes empreendimentos, é de fundamental importância considerar esse tipo de pavimentação como opção viável, tanto técnica como economicamente. Assim sendo, este trabalho contribui para a análise do desempenho e da qualidade desse tipo de pavimento em diversas ruas da cidade de Curitiba. O pavimento de concreto está sendo executado em Curitiba desde 1996, com uma extensão aproximada de 60km, com larguras variadas. Para levantamento das condições atuais das diversas ruas com pavimento de concreto, foram utilizadas as normas técnicas e o Manual de Pavimentos Rígidos do Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (DNIT). O objetivo deste trabalho é apresentar o desempenho e a qualidade do pavimento de concreto das diversas ruas de Curitiba, os resultados obtidos com a aplicação das diversas normas do DNIT, dentre elas o Índice de Condição do Pavimento (ICP).

Avaliação do pavimento de concreto em diversas ruas de Curitiba

Carlos Roberto Giublin

Engenheiro Civil, Mestre em Construção Civil, CRG Engenharia Ltda,

e-mail: [email protected]

Alex Maschio

Engenheiro Civil, Associação Brasileira de Cimento Portland,

e-mail: [email protected]

Cleverson Boeno Moro

Engenheiro Civil, Associação Brasileira de Cimento Portland,

e-mail: [email protected]

Fernando Papisch Druck

Engenheiro Civil, Associação Brasileira de Cimento Portland,

e-mail: [email protected]

uso de pavimentos rígidos com superfície de concreto de cimento Portland

vem apresentando um consistente e constante crescimento no Brasil. É uma

solução que pode ser utilizada em vias urbanas e rodoviárias, bem como em

pátios de caminhões e aeronaves, terminais de contêineres, dentre outros.

De uso corrente em países como EUA, Alemanha, Bélgica e em

diversos países da América Central e do Sul, o pavimento de concreto tem-

se mostrado competitivo principalmente em vias de tráfego alto e pesado.

Em muitas cidades do Brasil, que tem sistema coletivo baseado em linhas

de ônibus expressas, com tráfego segregado e canalizado, o pavimento de

concreto está sendo aplicado em grande quantidade, principalmente pelas

vantagens de alta durabilidade, baixa manutenção, menor espessura de

escavação, maior segurança na frenagem e menor consumo de iluminação

pública ao longo da sua vida útil (CARVALHO, 1998). Em tempos em que

os investimentos na recuperação e na ampliação da infraestrutura do País

são propagados, é de fundamental importância considerar esse tipo de

pavimentação como uma opção viável, tanto técnica como economicamente.

Com as vantagens acima descritas, esse pavimento ganha destaque

em projetos de urbanização de algumas regiões do País, como, por exemplo,

na cidade de Curitiba, onde os corredores de ônibus e as vias com tráfego

pesado estão recebendo esse tipo de pavimentação desde 1996.

Assim sendo, este trabalho contribui para a análise do desempenho

e da qualidade dos pavimentos de concreto executados em Curitiba ao longo

desta última década, utilizando as Normas do Departamento Nacional de

Infraestrutura Terrestre (DNIT). Ressalta-se que a vida útil de projeto dos

pavimentos de concreto é de 20 anos e que muitas vias em Curitiba já se

encontram com a metade da vida útil projetada.

O

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Page 55: Revista Estradas n° 16

55Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

Os pavimentos de concreto das ruas listadas na

Tabela 1, executados em diversos períodos, na cidade de

Curitiba, foram avaliados por engenheiro experiente, de

acordo com as orientações das Normas do DNIT, no início

de 2011.

Tabela 1 Relação das avenidas e ruas avaliadas

Tabela 2 – Espessuras das sub-bases e placas de concreto

PAVIMENTOS DE CONCRETO EM CURITIBA

O crescente aumento da frota de veículos nas grandes

cidades está criando problemas estruturais ao tráfego,

principalmente pela dificuldade de ampliação das vias.

Outro fator que tem dificultado o tráfego são as constantes

interrupções das vias para manutenção do pavimento. A cidade

de Curitiba não foge à regra, e, por isso, está investindo uma

parcela significativa de recursos em melhoria das suas vias

urbanas, com uso de várias alternativas de pavimentação.

No transporte coletivo, onde Curitiba se destaca

nacionalmente pelas inovações e pela competência, o seu

maior problema é manter as suas vias segregadas, chamadas

de canaletas expressas de ônibus, em perfeitas condições

de tráfego, em contraponto ao aumento da população que

utiliza esse meio de transporte e de outro ponto importante

que é o tempo de viagem dos ônibus. Nesse cenário,

buscando alternativas mais duráveis, iniciou-se, em 1996, o

desenvolvimento de projetos em pavimentos de concreto. Com

uma extensão executada em pavimento de concreto com mais

de 60km, Curitiba destaca-se, de novo, no Brasil como uma

das que mais utiliza essa tecnologia nas suas vias urbanas.

As características principais do pavimento de

concreto são as seguintes: vida útil maior que 20 anos,

custos baixos de manutenção, menores espessuras de

escavação, maior segurança nas frenagens e menor consumo

de iluminação pública. Os estudos comparativos com

alternativas, levando-se em consideração não apenas o custo

inicial, mas também a vida útil, os custos de manutenção e

a operação da via, mostram que a solução de pavimento em

concreto simples com barras de transferência é competitiva

em tráfego pesado e canalizado.

Os pavimentos de concreto executados em Curitiba

normalmente são projetados utilizando o Método de Cálculo

da Portland Cement Association (PCA), versão de 1984,

quando foi introduzida a analise de erosão das sub-bases

(PITTA, 1992). A Tabela 2 apresenta as diversas espessuras

das sub-bases e das placas de concreto das avenidas e ruas

contempladas neste estudo.

Na Avenida Afonso Camargo, foi projetado o pavimento

de concreto utilizando-se a técnica de Whitetopping-

inlay, onde a placa de concreto é colocada sobre o

material remanescente da escavação e da regularização

do pavimento asfáltico existente. Nesse caso, escava-se o

pavimento existente na espessura da placa de concreto,

e o material remanescente substitui a necessidade de

colocação de uma sub-base.

AVENIDA/RUA EXTENSÃO (M) EXECUÇÃO EM USO (ANOS)

RUA PRESIDENTE FARIA 560 1996 15

AV. WENCESLAU BRÁZ 435 1998 13

AV DAS INDÚSTRIAS 1.100 2000 11

RUA ANNE FRANK 1.100 2000 11

RUA TEM. ANTONIO MARQUES 775 2000 11

AV. AFONSO CAMARGO 4.000 2000 11

AV. MASCARENHAS DE MORAIS 1.900 2006 5

AV. SANTA BERNADETHE 1.750 2006 5

AVENIDA/RUAESPESSURA (CM)

SUB-BASE PLACA

RUA PRESIDENTE FARIA 10 23

AV. WENCESLAU BRÁZ 10 22

AV DAS INDÚSTRIAS 10 22

RUA ANNE FRANK 10 22

RUA TEM. ANTONIO MARQUES 10 23

AV. AFONSO CAMARGO - 25

AV. MASCARENHAS DE MORAIS 10 23

AV. SANTA BERNADETHE 10 24

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Page 56: Revista Estradas n° 16

56

artig

os

MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DE PAVIMENTOS DE CONCRETO

Diversos métodos são utilizados para avaliação de pavimentos. Para o estudo em questão, definiu-se pela escolha de um

índice de qualidade associado aos defeitos, podendo ser um dos seguintes:

Índice de serventia atual (ISA)

Serventia é definida como sendo a medida da qualidade de um pavimento, em um dado instante de sua vida de serviço,

atendendo ao tráfego misto, com suavidade e conforto de rolamento, em qualquer condição climática, na opinião dos usuários.

Dessa definição, são extraídos dois elementos fundamentais: a serventia é uma variável no tempo para uma seção de pavimento

e trata-se de um índice que pode ser avaliado subjetivamente, com base na opinião dos usuários.

O uso desse parâmetro para medição da condição do pavimento remonta aos experimentos da AASHTO Road Test,

planejado nos anos 50. Seu grande valor como índice reside exatamente em refletir a opinião dos usuários quanto ao estado

de um pavimento. Mais ainda, deve ser tomado como um critério de ruptura, que, além de expressar o conforto percebido pelo

usuário, realiza a importante ponte de relações existentes entre o estado do pavimento e os custos operacionais dos veículos.

Índice do Perfilógrafo Califórnia

A irregularidade longitudinal do pavimento é um índice relacionado ao conforto de rodagem do pavimento e deve ser

determinado pela utilização e pela operação do Perfilógrafo em cada faixa de tráfego a ser inspecionada. Como parâmetro da

condição da superfície, deve resultar o Índice de Perfil (IP), cuja unidade é fornecida em mm/km. No Brasil, tem-se utilizado o

Perfilógrafo tipo Califórnia. O equipamento deve ser deslocado longitudinalmente sobre o pavimento, à velocidade máxima de

5 km/h, para minimizar saltos. A superfície avaliada é considerada apropriada, no que tange a essa avaliação, quando o valor

de IP não ultrapassar 240 mm/km. Os perfis dos pavimentos são obtidos a 90cm de cada borda do pavimento ou de cada junta

longitudinal e, paralelamente a elas, ou seja, nas trilhas de rodas interna e externa de cada faixa de tráfego. O levantamento

deve ser realizado em todas as faixas de tráfego e nas duas trilhas de roda.

Índice Internacional de Irregularidade (IRI)

O índice proposto pelo Banco Mundial é chamado International Roughness Index (IRI), ou Índice Internacional de

Irregularidade. Trata-se de um padrão de medida relacionado àqueles fornecidos pelos sistemas medidores de irregularidade

tipo resposta, sendo definido como o índice entre o somatório dos deslocamentos na suspensão de um veículo dividido pela

distância percorrida pelo veículo durante o teste, sendo expresso nas unidades m/km ou mm/m. O equipamento normalmente

utilizado no Brasil para esse levantamento consiste em um medidor de irregularidade do tipo resposta, modelo Maysmeter, em

conjunto com o coletor de dados/microprocessador Rough Rider, instalados em um veículo.

Quociente de Irregularidade (QI)

Trata-se de um índice representativo da irregularidade da superfície do pavimento. É expresso na unidade de “contagens

por km”. Como indicação geral, no Brasil, os pavimentos recém construídos apresentam valores de QI próximos de 30

contagens/km; valores maiores que 60 contagens/km, por outro lado, são indicadores de necessidade de reabilitação. O QI é

semelhante ao IRI em relação ao objetivo, à finalidade e à maneira de obtenção. Porém as unidades são diferentes, sendo o QI

em cont./km, e o IRI em m/km.

Pode-se correlacionar o QI com o IRI através da seguinte fórmula: QI = 13 x IRI

Índice de Condição do Pavimento (ICP)

Este método é especifico para pavimentos de concreto. A inspeção visual de pavimentos consiste no preenchimento de

ficha de inspeção contendo os diferentes tipos de defeitos de pavimentos de concreto para a posterior determinação do Índice

de Condição do Pavimento (ICP). O ICP é a medida da condição funcional do pavimento, capaz de fornecer informações para

a verificação das condições da via (avenidas, rodovias, pátios, etc.) e para o estabelecimento de políticas de manutenção,

prevenção e recuperação. O ICP pode ser quantificado através de uma escala que varia de 0 a 100, onde a quantidade 100

representa uma excelente condição do pavimento.

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Page 57: Revista Estradas n° 16

57Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

AVALIAÇÃO DOS PAVIMENTOS DE CONCRETO

Dos métodos avaliados, o Índice de Condição do

Pavimento foi escolhido para avaliação de condição estrutural

do pavimento de concreto por ser um parâmetro voltado para

defeitos característicos de placas de concreto, por não ter

restrições para aplicação e também por ser recomendado pelo

DNIT. Em três estudos recentes, foram realizadas as inspeções

e a determinação dos Índices de Condição do Pavimento para

os pavimentos de concreto das estações-tubo da Avenida Sete

de Setembro, da Av. Iguaçu e da Avenida dos Trabalhadores

em Curitiba, obtendo-se resultados que validam a escolha

desse método de avaliação (GIUBLIN, 2007; GIUBLIN, 2010;

SOUZA, 2011).

O ICP é um parâmetro definidor da condição de

superfície de pavimento de concreto baseado em metodologia

desenvolvida pelo U.S. Army Construction Engineering

Research Laboratory (CERL). A norma brasileira outorgada pelo

DNIT que define a avaliação objetiva do estado de conservação

de pavimentos de concreto é a DNIT 062/2004 — PRO.

Segundo essa norma, a avaliação objetiva é a “[...] avaliação

da condição estrutural do pavimento baseada na determinação

do ICP (Índice de Condição do Pavimento)”. Esse índice

é definido como a “[...] medida da condição estrutural do

pavimento, capaz de fornecer ao engenheiro de pavimentação

informações para a verificação das condições da rodovia e

para o estabelecimento de políticas de manutenção, prevenção

e de recuperação”. A avaliação objetiva é constituída pela

análise dos dados obtidos na inspeção visual, cálculo dos

ICP, atribuição dos conceitos (varia, de modo crescente, de

“Destruído” até “Excelente”), análise do cadastro documental

(quando houver acesso a esse) e emissão do laudo final.

A escala de avaliação do ICP está representada

na Tabela 3.

Tabela 3 – Faixas dos Índices de Condições do Pavimento

A Norma DNIT 061/2004 – TER define os termos

técnicos empregados para caracterizar os defeitos que

aparecem nos pavimentos de concreto, sendo eles:

alçamento de placas;

fissura de canto;

placa dividida;

escalonamento ou degrau de juntas;

falha nas selagens das juntas;

desnível pavimento de concreto - acostamento;

fissuras lineares;

grandes reparos;

pequenos reparos;

desgaste superficial;

bombeamento nas juntas transversais e longitudinais;

quebras localizadas;

passagem de nível;

rendilhado e escamação da superfície do concreto;

fissuras de retração plástica;

esborcinamento ou quebra de canto;

esborcinamento de juntas;

placa bailarina;

assentamento;

buracos.

A mesma norma define defeito como a anomalia observada

no pavimento, decorrente de problemas na fundação, de má

execução ou de uso do pavimento. Podem-se adicionar a essa

definição os projetos mal dimensionados e o uso de tecnologia e

de equipamentos inadequados.

De acordo com o Manual de Pavimentos Rígidos do

DNIT — IPR-714/2005, a inspeção do pavimento de concreto,

para levantamento dos defeitos e de seus respectivos graus de

severidade deve ser feita com uma criteriosa avaliação das suas

condições atuais, especialmente do seu ICP. Esse procedimento

deve ser conforme as diretrizes da Norma DNIT 062/2004-PRO

— Avaliação Objetiva de Pavimentos Rígidos.

A amostragem das placas para inspeção deve

ser definida de acordo com as orientações da Norma DNIT

060/2004-PRO, mas, no estudo em questão, por opção dos

autores, foi definido que a amostragem seria de 100% das placas

dos trechos avaliados.

FAIXA DE ICP

0 10 DESTRUÍDO

11 25 MUITO RUIM

26 40 RUIM

41 55 RAZOÁVEL

56 70 BOM

71 85 MUITO BOM

86 100 EXCELENTE

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Page 58: Revista Estradas n° 16

58

TIPOS DE DEFEITO1 ALÇAMENTO DE PLACAS 7 FISSURAS LINEARES 13 PASSAGEM DE NÍVEL

2 FISSURA DE CANTO 8 GRANDES REPAROS 14 RENDILHADO DE ESCAMAÇÃO

3 PLACA DIVIDIDA 9 PEQUENOS REPAROS 15 FISSURAS DE RETRAÇÃO PLÁSTICA

4 DEGRAU DE JUNTA 10 DESGASTE SUPERFICIAL 16 QUEBRA DE CANTO

5 DEFEITO DE SELAGEM DAS JUNTAS 11 BOMBEAMENTO 17 ESBORCINAMENTO DE JUNTAS

6 DESNÍVEL PAVIMENTO ACOSTAMENTO 12 QUEBRAS LOCALIZADAS 18 PLACA BAILARINA

FICHA DE INSPEÇÃO DE PAVIMENTO RÍGIDOCÁLCULO DO ÍNDICE DE CONDIÇÃO DO PAVIMENTO (ICP)

PAVIMENTO/ PRESIDENTE AFONSO CAMARGO EXTENSÃO: 4000 m

COMPRIMENTO: DATA: 02/12/2010

ID PLACA A B C D E F TIPOS DE DEFEITOS

GRAU DE SEVERIDADE

N° DE PLACAS AFETADAS

% PLACAS AFETADAS

VALOR DEDUZÍVEL

1 5 B17 B

5 B17 B

5 M 10 50,0% 4,0

9 B 4 20,0% 1,0

17 B 2 10,0% 2,0

2 5 M9 B

5 M9 B

3 5 M 5 M

4 5 M 5 M

5 - - - -

6 - - - -

7 - - - -

8 5 B9 B

5 B9 B

9 - - - -

INTERVALO DE PLACAS: 1 A - 10 B

10 - - - -

SUBTRECHO:

VALOR DEDUZÍVEL TOTAL: 7,0

VALOR DEDUZÍVEL CORRIGIDO: 7,0

ICP 93,0 CONCEITO EXCELENTE

As seguintes fases fizeram parte da avaliação objetiva de

pavimentos rígidos:

inspeção dos pavimentos de concreto;

análise dos dados obtidos em inspeção;

cálculo dos ICP´s;

atribuição de conceitos; e

emissão de laudos.

CÁLCULO DO ICP – RESULTADOS DAS AVALIAÇÕES

Seguindo as diretrizes apontadas pela Norma, foram

elaboradas Fichas de Inspeção para cada intervalo de 20 placas,

dentro de seus respectivos subtrechos, obtendo-se, para cada

uma dessas fichas, um valor de ICP. Na figura 2, apresenta-se

um exemplo de ficha resumo, com os valores finais da avaliação

da Rua Anne Frank.

A Tabela 4 apresenta os resultados das avaliações das ruas,

com os Índices de Condição do Pavimento e os conceitos que

cada rua obteve.

Figura 1 Modelo de ficha de inspeção de campo

artig

os

A inspeção dos pavimentos de concreto, com objetivo

de avaliar as condições dos pavimentos dos diversos

trechos que fazem parte do objeto deste estudo, foi

realizada no início de 2011.

Os dados obtidos nas inspeções visuais de campo

foram registrados em Fichas de Inspeção de cada amostra.

Informações complementares foram acrescentadas caso a

caso. A figura 1 apresenta um modelo de Ficha de Inspeção,

em concordância com a norma DNIT 062/2004- PRO.

Tabela 4 Resultados das avaliações das ruas – ICP e conceitos

AVENIDA/RUAICP

VALOR CONCEITO

RUA PRESIDENTE FARIA 91,7 EXCELENTE

AV. WENCESLAU BRÁZ 93,4 EXCELENTE

AV DAS INDÚSTRIAS 92,4 EXCELENTE

RUA ANNE FRANK 87,8 EXCELENTE

RUA TEM. ANTONIO MARQUES 90,4 EXCELENTE

AV. AFONSO CAMARGO 94,2 EXCELENTE

AV. MASCARENHAS DE MORAIS 90,8 EXCELENTE

AV. SANTA BERNADETHE 95,7 EXCELENTE

Tabela 4 – Resultados das avaliações das ruas - ICPs e conceitos

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59Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

N° SUBTRECHO COMP. (m) INTERVALO DE PLACAS N° DE PLACAS ICP CONCEITO1 AV. MARECHAL FLORIANO - RUA ANNE FRANK 50 1A - 10B 20 88,0 EXCELENTE

2 AV. MARECHAL FLORIANO - RUA ANNE FRANK 50 11A - 20B 20 68,0 BOM

3 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 21A - 30B 20 58,0 BOM

4 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 31A - 40B 20 78,0 MUITO BOM

5 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 41A - 50B 20 84,0 MUITO BOM

6 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 51A - 60B 20 90,0 EXCELENTE

7 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 61A - 70B 20 93,5 EXCELENTE

8 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 71A - 80B 20 83,0 MUITO BOM

9 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 81A - 90B 20 95,0 EXCELENTE

10 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 91A - 100B 20 85,0 EXCELENTE

11 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 101A - 110B 20 79,0 MUITO BOM

12 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 111A - 120B 20 95,5 EXCELENTE

13 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 121A - 130B 20 95,0 EXCELENTE

14 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 131A - 140B 20 98,0 EXCELENTE

15 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 141A - 150B 20 89,0 EXCELENTE

16 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 151A - 160B 20 92,5 EXCELENTE

17 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 161A - 170B 20 77,0 MUITO BOM

18 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 171A - 180B 20 89,0 EXCELENTE

19 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 181A - 190B 20 99,0 EXCELENTE

20 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 191A - 200B 20 98,0 EXCELENTE

21 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 201A - 210B 20 98,0 EXCELENTE

22 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 211A - 220B 20 100,0 EXCELENTE

23 RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS 50 221A - 230B 20 86,5 EXCELENTE

QUADRO RESUMO DE INSPEÇÃO DE PAVIMENTO RÍGIDOCÁLCULO DO ÍNDICE DE CONDIÇÃO DO PAVIMENTO (ICP) ICP = MÉDIO 87,8 CONCEITO

MÉDIO EXCELENTE

PAVIMENTO: RUA ANNE FRANK MEDIDA (m): VARIÁVEL EXTENSÃO: 1100 m N° DE PLACAS: 460

TRECHO: AV. MARECHAL FLORIANO - RUA MAESTRO CARLOS FRANK DATA: 10/03/2011 N° DE SUBTRECHOS: 23

ANÁLISE ESTATISTICA DOS VALORES DE ICP

x = MEDIA 87,78

s = DESVIO PADRÃO 10,51

n = 68 DIST. NORMAL 95% DE CONFIANÇA z = 1,96

ICP (LIMITE INFERIOR) = x - z . s 67,19

CONCLUSÃO SUBTRECHO INTERVALO DE PLACAS ICP

DOS 23 SUBTRECHOS INSPECIONADOS, 1 SUBTRECHO APRESENTOU VALOR DE ICP ABAIXO DO LIMITE INFERIOR

RUA ANNE FRANK - RUA MAESTRO CARLOS FRANK 21A - 30B 58,00

Figura 2 Modelo da ficha resumo da avaliação da Rua Anne Frank

CONCLUSÃO

A aplicação da normatização atualmente vigente mostrou-se adequada para a execução deste estudo, pois utiliza

parâmetros e definições coerentes e de fácil entendimento e utilização. O método utilizado mostrou-se satisfatório, pois é

especifico para pavimentos de concreto e de fácil aplicação na avaliação das ruas.

Apresentando valores de ICP superiores a 87, todos os trechos foram classificados como excelentes. Considerando

a vida útil de 20 anos para os pavimentos de concreto, o uso ininterrupto dos diversos trechos estudados e a quase nula

manutenção realizada até o momento da avaliação, pode-se afirmar que a opção adotada pela Prefeitura de Curitiba, quando da

implantação desse tipo de pavimento, foi acertada pelos seguintes pontos:

manutenção muito pequena até o momento;

vida útil do pavimento está sendo confirmada, com tendência de atender as especificações dos projetos;

diminuição das interrupções do tráfego, com pouco ou quase nenhum transtorno aos usuários;

diminuição dos custos de reconstrução de pavimentos, pela durabilidade apresentada pelos pavimentos de concreto

avaliados.

ReferênciasCARVALHO, M.D.. Vantagens e competitividade dos pavimentos rígidos. Pós-Congresso Purdue sobre Projeto, Avaliação, Desempenho e Reabilitação Estrutural dos Pavimentos de Concreto. São Paulo, São Paulo, 1998.DNIT 060/2004 – PRO. Pavimento rígido – Inspeção visual. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.DNIT 061/2004 – TER. Pavimento rígido – Defeitos - Terminologia. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.DNIT 062/2004 – PRO. Pavimento rígido – Avaliação objetiva. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.DNIT 063/2004 – PRO. Pavimento rígido – Avaliação subjetiva. Rio de Janeiro, Rio de janeiro, 2004. DNIT. Manual de pavimentos rígidos. 2ª Edição. DNIT. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005.GIUBLIN, C.R., et al.. Inspeção e determinação do índice de Condição do Pavimento (ICP) para o pavimento rígido de concreto das estações-tubo da Avenida Sete de Setembro em Curitiba. 3º Encontro de Engenharia e Tecnologia dos Campos Gerais, Ponta Grossa, Paraná, 2007.GIUBLIN, C.R., et al.. Avaliação do Pavimento de Concreto da Avenida Iguaçu em Curitiba. 52º Congresso Brasileiro do Concreto – IBRACON, Fortaleza, Ceará, 2010.PITTA, M.R.. ET-97 Estudo Técnico de Dimensionamento de pavimentos rodoviários e urbanos de concreto pelo método da PCA/84, ABCP, São Paulo, São Paulo, 1992.SOUZA, J.M., et al.. Determinação do índice de condição do pavimento da avenida dos trabalhadores em Curitiba, TCC- trabalho de final do curso de Patologias em Obras Civis, Instituto IDD, Curitiba, Paraná, 2011.

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Page 60: Revista Estradas n° 16

60

trab

alho

s té

cnic

os

O Gerenciamento Ativo de Tráfego e suas possibilidades de aplicação no Brasil

Haroldo Mata Engenheiro Civil, Coordenador da Unidade Regional do Rio Grande

do Sul – Agência Nacional de Transportes Terrestres (URRS/ANTT). [email protected]

Lélio Brito Engenheiro Civil, PhD, Consultor em Tecnologia de Transportes –

Prime Engenharia e Consultoria LTDA [email protected]

Eduardo Bergmann Engenheiro Civil, Especialista em Regulamentação – Unidade

Regional do Rio Grande do Sul – Agência Nacional de Transportes Terrestres (URRS/ANTT) [email protected]

Thiago Vitorello Engenheiro Civil, MSc, Diretor de Engenharia e Operações –

Concessionária da Rodovia Osório-Porto Alegre (Triunfo|CONCEPA) [email protected]

Gerenciamento Ativo de Tráfego (GAT), também

conhecido por faixas gerenciadas ou faixas

inteligentes, é um sistema que permite a melhoria

da fluidez do tráfego com redução dos níveis de

congestionamento, permitindo a incorporação do

acostamento externo como faixa de rolamento.

O GAT, ou Active Traffic Management (ATM),

já foi implantado em diversos países, incluindo

Alemanha, Reino Unido, Estados Unidos e Holanda.

O sistema consiste essencialmente de um conjunto

de dispositivos automatizados que criam, com

ajuda de intervenção de um centro de controle de

operações, um ambiente controlado de velocidade e

disponibilidade das faixas em função da ocupação da

via. Exemplos como a rodovia britânica M42 sugerem

um aumento dos níveis de segurança e redução

do tempo de viagem com a implantação do GAT.

Entre os benefícios dessa tecnologia, o aumento de

capacidade sem incorporação de novas faixas de

rolamento é extremamente atrativo e mostra-se com

um grande potencial de aplicação no Brasil. Neste

artigo, são descritos em maior detalhe o uso dessa

ferramenta, os resultados obtidos na experiência

britânica, bem como as possibilidades de aplicação

de um sistema de GAT no Brasil.

OALTERNATIVAS DE MELHORIAS DE TRÁFEGO

O desenvolvimento econômico dos países está

grandemente associado ao desenvolvimento da sua

malha rodoviária. Nos dias de hoje, disponibilidade

de rotas, tempo de viagem e condições de conforto

e segurança são itens essenciais à engenharia de

tráfego, que vem crescentemente sendo desafiada

com os atuais índices de crescimento de demanda.

Notadamente, em países como o Brasil, onde a

malha rodoviária ainda carece de um grande aporte

de recursos para ampliação do modal rodoviário,

os principais investimentos estão voltados às

novas rodovias, às duplicações, às ampliações e às

restaurações de rodovias existentes.

No entanto, há uma premente necessidade

de se atentar às rodovias com alto volume de

tráfego, para as quais tais soluções tradicionais

podem, muitas vezes, não estar disponíveis,

ou mesmo não serem economicamente

interessantes.

Há várias alternativas sendo empregadas

mundo afora para melhorar o escoamento de

rodovias saturadas, aproveitando técnicas

alternativas que utilizam o patrimônio rodoviário

existente de uma maneira otimizada. Alguns

exemplos podem ser citados.

A opção pela unidirecionalidade do fluxo de

pistas de sentidos prioritariamente opostos em

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horários restritos já é bastante conhecida.

Essa opção, normalmente voltada ao

trânsito urbano, certamente apresenta

benefícios, mas, indiscutivelmente,

também acarreta transtornos à

mobilidade da região. Para um

âmbito rodoviário, a operacionalização

é extremamente complicada,

principalmente se o objetivo é o uso

contínuo, tornando-se até mesmo

inviável.

Já num horizonte menos usual no

País, está o uso da restrição de faixas.

Há aquelas em que apenas veículos

de alta ocupação podem trafegar

— usualmente chamadas de Faixas

de Veículos de Elevada Ocupação,

ou High Occupancy Vehicle Lanes

(HOV) —, ou também as chamadas

Vias Expressas Locais. Estas últimas

representam um arranjo de faixas

que disponibilizam, em uma mesma

pista, algumas faixas para entrada e

saída, e outras cujo acesso é restrito

para promover a melhoria de fluidez

naquele segmento.

Outro interessante exemplo

de melhoria de mobilidade pelo

uso de gerenciamento operacional

de via é o exemplo do Pedágio de

Congestionamento (Congestion

Charge), implantado em Londres, em

2003, ou ainda as Zonas de Baixa

Emissão — Low Emission Zones

(LEZ) —, operadas desde 2008,

que representam a segmentação

do tráfego por zonas a partir da

atribuição de uma sobretaxação para

uso daquelas áreas.

Sob a ótica das rodovias de

elevado volume de tráfego, ou

autopistas (freeways, motorways,

autobahns, etc.), algumas dessas

soluções nem sempre estão

disponíveis, ou apresentam baixo

potencial de sucesso. Nesse contexto,

a concepção do Gerenciamento Ativo

de Tráfego concatena os tradicionais

elementos da engenharia de tráfego —

Engenharia, Fiscalização e Educação

(EEE), ou Engineering, Enforcement

& Education —, que, associados

ao fator Motivação — ou quarto

“E” (Encouragement) —, formam o

sistema que, nos dias de hoje, parece

estar mais talhado à solução de vias

congestionadas de elevado volume de

tráfego rodoviário.

O conceito fundamental utilizado

pelo GAT pode ser, sob certo aspecto,

comparado ao avanço da velocidade

de acesso à internet. Com o uso de

diferentes técnicas de empacotamento

dos dados sob a mesma infraestrutura

— cabeamento estruturado de

telefonia —, foi possível que, nos

últimos 20 anos, a capacidade de

transmissão de dados fosse aumentada

em mais de 100.000 vezes.

De forma semelhante, uma

distribuição mais ordenada dos

veículos entre as faixas disponíveis,

com a velocidade média permitida

pela ocupação da via naquele

momento, permitirá por si só um

aumento de capacidade. Como o fluxo

passa num regime mais ordenado, e

a velocidade de tráfego é mais baixa

(normalmente caindo de 15% a 30%

da velocidade máxima), atinge-se um

menor distanciamento seguro dos

veículos, possibilitando, também,

o uso do acostamento como faixa

de rolamento. A Figura 1 ilustra o

conceito de Gerenciamento Ativo

de Tráfego. A partir dos elementos

fundamentais da engenharia de

tráfego, é possível organizar o fluxo

de veículos numa rodovia e, com

isso, permitir o uso de acostamento

— elementos estes que culminam,

portanto, num direto aumento da

capacidade da via.

Figura 1 Conceito de Gerenciamento Ativo de Tráfego – O escoamento de fluxo organizado promove um ambiente seguro e com maior capacidade

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O CASO DA RODOVIA M42 – ENTORNO DE BIRMINGHAM

O GAT foi introduzido nas rodovias

britânicas como um importante resultado

da busca de soluções alternativas. Não só

a concepção do sistema teve como alvo a

redução nos níveis de congestionamento,

mas também visou a uma série de outras

melhorias que trariam como benefícios o

mesmo resultado, quais sejam: redução

no tempo de atendimento aos acidentes,

mais rápida desobstrução de pista,

aumento da confiabilidade dos tempos

de viagem e melhoria nos níveis de

segurança das rodovias.

Com o sucesso dos projetos de

rodovias controladas — cuja diferença,

essencialmente para as ditas rodovias

gerenciadas, é o uso do acostamento

como faixa de rolamento nestas

últimas —, a exemplo da M25, o

Governo britânico iniciou, em 2002,

os estudos para implantação de uma

rodovia inteligente. A rodovia orbital de

Londres (M25), com uso do controle de

velocidade variável, chegou a registrar

196.000 veículos em suas apenas quatro

faixas de rolamento — uma capacidade

expressiva para uma rodovia com esse

número de faixas.

A ideia foi de, então, estender o

conhecimento do controle de limite

de velocidade variável empregado na

M25 para embasar o desenvolvimento

do projeto de GAT, que viria a ser

implantando, em 2005, na rodovia M42,

nos arredores de Birmingham, elevando,

assim, o conceito de rodovia controlada

para rodovia gerenciada.

Com um intenso fluxo de veículos e

entorno de uma área conurbada, a M42

atende também um dos aeroportos de

maior tráfego da Europa — Birmingham

International Airport — e um centro de

exibição nacional (NEC) também no

entorno. Devido ao elevado custo da

terra naquela localidade, associado às

dificuldades operacionais de se executar

um alargamento de pista, a opção do uso

do acostamento como faixa de rolamento

foi a mais atrativa opção.

A Figura 2 mostra o regime

operacional do GAT nessa rodovia. O

projeto foi iniciado em 2002, mas,

apenas em dezembro de 2005, iniciou-se

o controle da rodovia com implantação

do limite de velocidade variável

mandatório (LVVM), porém sem o uso

do acostamento. Nove meses depois,

passou-se a utilizar o acostamento como

faixa de rolamento apenas quando o GAT

foi ativado, usualmente nas horas de

pico, a uma velocidade máxima de 80

km/h (50mph). O uso do acostamento

pode ser chamado de “acostamento

dinâmico”. Aproximadamente um

ano e meio após, com o sucesso do

acostamento dinâmico e do GAT, elevou-

se a velocidade máxima durante o seu

funcionamento para 96 km/h (60mph).

Atenta-se ao fato de que, no Reino

Unido, há dois limites de velocidade:

112 km/h (70mph) para veículos

classificados como leve e 96 km/h

(60mph) para os veículos de carga.

Figura 2 Regime Operacional do Sistema de Gerenciamento Ativo de Tráfego na M42 – Abertura ao tráfego com 3 faixas e limite de velocidade variável em Setembro de 2006.

Figura 3 Infraestrutura instalada para o GAT na M42 em uma situação com o sistema ativo

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A Figura 3 ilustra a rodovia M42

com o sistema de GAT ativo. Entre os

principais elementos necessários para

a implantação do sistema, podem ser

citados: pórticos com espaçamento

aproximado de 500m, com painéis

de mensagem variável e painéis e

sinalização da velocidade em força;

analisadores de tráfego (MIDAS);

circuito fechado de televisão; refúgios

para paradas de emergência; etc.

Todo o sistema possui um sofisticado

centro de controle operacional, que

auxilia sistemas computadorizados a

fazerem o ligamento e o desligamento

do GAT, bem como o controle da

velocidade variável em função do nível

de ocupação da via.

administração das rodovias naquele

país, relatou as melhorias relativas

ao impacto ambiental gerado, com

observação de uma sensível melhora

dos níveis de ruído e poluição. Já em

relação aos índices de acidentes com

vítimas, houve uma redução de 50%,

baseados em dados estatísticos para

um período de três anos. Salienta-se

que, para o mesmo período, não houve

registro de nenhum acidente com

vítima fatal ou lesão. A Figura 4 ilustra

o cenário de acidentes observados na

Inglaterra e na M42, antes e após a

implantação do sistema.

No que se refere à capacidade da

via, foi observado um aumento médio

de 7% a 9% para o GAT ativo com

velocidade de 80 km/h e de até 13%

com o uso do acostamento dinâmico

de 96 km/h, sem qualquer prejuízo à

segurança do usuário. Já em relação à

redução no tempo de viagem, esta foi

de 24% na direção norte da rodovia e

9% na direção sul. O Quadro 1 resume

os vários aspectos observados com o

novo sistema implantado.

Benefícios observados com o GAT na M42

Inúmeros foram os benefícios

observados em aproximadamente seis

anos de operação do GAT na M42. A

Highways Agency (HA), agência do

Governo britânico responsável pela

Quadro 1 Benefícios observados com o GAT na M42 em função de vários aspectos

Figura 4 Acidentes com vítimas observados nas rodovias britânicas com detalhe da M42

POSSÍVEIS APLICAÇÕES NO BRASIL

Diante do exposto, verifica-

se que pode haver consideráveis

ganhos de capacidade em rodovias

congestionadas através de

intervenções de natureza operacional,

sem necessidade de se recorrer

à sua ampliação física, apenas

racionalizando e organizando melhor o

uso do espaço disponível.

Inúmeras rodovias brasileiras

poderiam beneficiar-se dessa nova

e importante ferramenta, capaz

de melhorar a fluidez e a própria

segurança do tráfego; especialmente

aquelas próximas dos grandes centros

urbanos, sujeitas a importantes

variações nos fluxos de veículos, quer

sejam ao longo do dia, quer sejam

em períodos sazonais ao longo do

ano. Dentre elas, podem ser citados o

Rodoanel de São Paulo, a via Dutra, a

ponte Rio-Niterói, as rodovias Anchieta

e Imigrantes, a BR-101 na área da

grande Florianópolis, etc.

ASPECTOS AMBIENTAIS ASPECTOS DE SEGURANÇA ASPECTOS OPERACIONAIS

REDUÇÃO DA EMISSÃO DE CO EM 4%REDUÇÃO EM 50% DO ÍNDICE DE ACIDENTES COM

VÍTIMAS AUMENTO DE CAPACIDADE MÉDIA DE 7 A 9% COM USO

DO ACOSTAMENTO DINÂMICO A 80KM/H

REDUÇÃO DE CO2 EM 4%SEM REGISTRO DE VÍTIMAS FATAIS NUM PERÍODO DE

TRÊS ANOSAUMENTO ADICIONAL DE 4% COM USO DO

ACOSTAMENTO DINÂMICO A 96KM/H

REDUÇÃO DOS ÓXIDOS DE NITROGÊNIO EM 5% SENSAÇÃO DOS MOTORISTAS DE RODOVIA MAIS SEGURARESPEITO À VELOCIDADE FISCALIZADA EM MÉDIA DE

97% (80 KM/H) E 93% (96KM/H)

REDUÇÃO DO CONSUMO DE COMBUSTÍVEL EM 4%REDUÇÃO NO TEMPO DE VIAGEM DE 22% (SENTIDO

NORTE) E 9% (SENTIDO SUL)

REDUÇÃO DOS NÍVEIS DE RUÍDO ENTRE 1,8dB E 2,4dB.REDUÇÃO DA VARIABILIDADE DO TEMPO DE VIAGEM

DE 22%

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O Caso da BR-290/RS no Trecho entre Osório (km0) e o Pedágio de Santo Antônio da Patrulha (km20) - Freeway

Um exemplo ainda mais próximo de avançados níveis de congestionamentos

sazonais, é o da BR-290, no trecho Freeway, durante os retornos de verão

do litoral. São bastante conhecidos dos gaúchos os elevados níveis de

congestionamento, que forçam os usuários da via a procurarem soluções

alternativas ao seu retorno, devido ao expressivo aumento de duração da viagem

até a Capital, Porto Alegre.

Há uma série de características disponíveis na Freeway que sugerem

que a implantação de um gerenciamento ativo de tráfego poderá beneficiar

expressivamente a redução desses congestionamentos. Assim, já se encontram

em fase avançada os estudos para implantação de um segmento piloto na

BR-290-Freeway. A Figura 5 ilustra o trecho da BR-290/RS sob concessão da

Concessionária da Rodovia Osório-Porto Alegre (Concepa), com detalhe da área

proposta para implantação do GAT.

A disponibilidade de acostamentos tanto interno quanto externo e a existência

de refúgios ao longo de todo o trecho remetem essa rodovia a um cenário bastante

propício a implantação do GAT. Em adição, o segmento já é monitorando por

um centro de controle de operações, bem como já dispõe de cabeamento de

fibra ótica e CFTV em uma grande parte de sua extensão, facilitando, assim, a

instalação das novas tecnologias necessárias e da ampliação da existente.

A implantação do GAT foi proposta

para o segmento compreendido entre

o km 0 e km 20 da Freeway pelos

seguintes motivos: trata-se de trecho

com elevadíssimos picos de tráfego

num curto espaço de tempo na época

de verão, o que não justificaria a

construção de uma quarta faixa apenas

para atendimento dessa demanda

sazonal; o referido segmento, nos

horários de retorno para Porto Alegre

em época de veraneio, recebe os

fluxos da Estrada do Mar, da RS-040

Tramandaí-Osório em pista dupla e da

BR 101 Torres-Osório, também em

pista dupla; parte do fluxo da Estrada

do Mar também ingressa na Freeway

através do novo acesso disponibilizado

no km 5 da rodovia.

Todas essas correntes de tráfego

demandam uma extensão razoável

para se acomodarem nas três faixas

disponíveis da autoestrada, gerando

um fluxo turbilhonado que se estende

até a praça de pedágio do km 19. A

Figura 6 ilustra o nível de ocupação do

segmento em questão para o dia 30 de

janeiro de 2011 (domingo).

Dessa forma, esse segmento

apresenta as condições ideais para a

implantação do Gerenciamento Ativo de

Tráfego, por possuir as características

que permitem a aplicação integral dos

benefícios que essa ferramenta pode

proporcionar, a saber: a incorporação

física do acostamento durante os

horários de pico, proporcionando um

total de quatro faixas de rolamento

— ampliação em 25% da capacidade

teórica de escoamento, além da

organização do fluxo de veículos,

que pode aumentar a capacidade de

escoamento em até 15% em média,

além de contribuir para a redução de

acidentes.

Figura 5 Trecho da BR-290/RS com detalhe da área proposta para implantação do GAT – km0 ao km20 da rodovia.

Figura 6 Retorno a Porto Alegre – segmento entre os km 0 e km 20–verão de 2011

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Dentre as características notáveis do segmento

compreendido entre os km 0 e 20 da freeway que favorece

a implantação de um sistema de gerenciamento ativo de

tráfego, podem-se notar:

geometria adequada, com curvas de grandes raios,

intertangentes longas e relevo plano;

acostamentos externos com 3m de largura e internos

com 2m, mais refúgios ao longo da rodovia;

fluxo sazonal, facilitando a implantação de

infraestrutura para um projeto-piloto;

baixo nível de criticidade durante o inverno;

possibilidade de processo gradual;

controladores de fluxo;

interatividade com órgãos fiscalizadores;

radiovia;

rodovia classe 0, com poucos acessos;

site, blog e Twitter;

fibra ótica instalada com CFTV e PMVs;

CCO e call boxes instalados.

A Figura 7(a) evidencia também o maior número de

atendimentos nesse segmento. Como discutido anteriormente,

o fluxo de entrada da BR-101 em conjunto com a entrada da

Estrada do Mar no km1, bem como a entrada alternativa no

km5, acaba por tomar alguns vários quilômetros, até que os

motoristas se adaptem ao novo fluxo. A Figura 7(b) mostra

que grande parte dos acidentes ocorridos concentra-se nas

saídas de pista, como colisões traseiras e quedas de motos —

muitos são favorecidos pelos congestionamentos registrados.

Trafegam, em média, na Freeway, entre Osório e Porto

Alegre, 350.000 veículos por feriado, chegando a 217.000

veículos por final de semana. Nas condições atuais, com três

faixas, a ocupação da via tangencia a sua capacidade teórica

ao final dos domingos de retorno do litoral (Figura 7c).

Figura 7 (a) Atendimentos por trecho, (b) Tipos de Acidente (c) fluxo médio de retorno aos domingos na Freeway (Janeiro/2011)

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Figura 9 Projeção do funcionamento do GAT em ação

Figura 8 Esquemático da rodovia antes e depois da implantação do GAT na Freeway

O PROJETO-PILOTO PROPOSTO NA FREEWAY

Considerando-se esse cenário, a Concepa vem

desenvolvendo, em parceria com a Agência Nacional de

Transportes Terrestres, um estudo para implantação de um

projeto-piloto do sistema de Gerenciamento Ativo de Tráfego

A primeira etapa do estudo refere-se à infraestrutura

necessária, bem como à delimitação da tecnologia a ser

desenvolvida. Apesar de parte dessa infraestrutura já estar

disponível, há necessidade de uma adequação da quantidade e

posicionamento.

Para que se promova um ambiente controlado, é

necessário que sejam instalados pórticos a distâncias

inferiores a 1km, de maneira a se manter o princípio da

“intervisibilidade”. Ao se passar por um pórtico, é necessário

que outro já possa ser avistado. Assim, o espaçamento entre

eles é variável, em função das condições geométricas da via.

Usualmente, ficam espaçados ao redor de 500m a 800m.

Como demonstrado na Figura 3, esses pórticos permitem

a instalação dos placares que indicam a condição de

funcionamento do GAT. Neles, ficam instalados os sensores de

fiscalização eletrônica de velocidade, os placares informando

a velocidade máxima em força, a disponibilidade das faixas,

sobretudo do acostamento, e os Painéis de Mensagem Variável

(PMV) que fornecem indicações aos motoristas. A Figura 8

mostra um esquema da rodovia antes e depois da implantação

do sistema. A Figura 9 ilustra o sistema em ação, demonstrado

as diferentes etapas do seu funcionamento.

(a) (b)

(c) (d)

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67Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

REFERÊNCIAS Freeman, Mike & Driver, Neil Taylor (2007). Reaction to Active Traffic Management (ATM). Transport & Travel Research Ltd. Janeiro 2007. UK.HCG HRG - Highways Consultancy Group/Highways Research Group (2009). ATM Monitoring and Evaluation. Toolkit Report. Setembro 2009. Highways Agency – UK.HCG HRG - Highways Consultancy Group/Highways Research Group (2009). M42 ATM Monitoring and Evaluation Ramp Metering Evaluation Report. Setembro 2009. Highways Agency – UK.HCG HRG - Highways Consultancy Group/Highways Research Group (2009). M42 ATM Monitoring and Evaluation 4-Lane Variable Mandatory Speed Limits HSR60 6 Month Operation Report. Agosto 2009. Highways Agency – UK.Highways Agency. Department of Transportation. Interim Advice Note 111/09 (2009). Managed Motorways implementation guidance – Hard shoulder running. Novembro 2009. Highways Agency – UK.Highways Agency. Department of Transportation. Interim Advice Note 112/08 (2008). Managed Motorway Implementation Guidance. Through Junction Hard Shoulder Running. Junho 2009. Highways Agency – UK.Jones, J.; Knopp, M.; Kay, F.; Doctor, M.; Howard, C.; Laragan, G.; Rosenow, J.; Struve, B.; Thrasher, B. and Young, E. (2010). Freeway Geometric Design for Active Traffic Management in Europe. The International Technology Scanning Program. U.S. Department of Transportation, FHWA, AASHTO & NCHRP. Outubro 2010.Mott MacDonald & Highways Agency (2009). M42 ATM Monitoring and Evaluation Project Summary Report. Novembro 2009. Highways Agency – UK.Mouchel Co. (2011). Birmingham Box Managed Motorways Phase 1 & 2. Phase 2 Hard Shoulder Running As-Built Safety Report. 718217/WS02/S03/DOC/026. Fevereiro 2011. UK.

PRINCIPAIS DESAFIOS E CONCLUSÃO

O Gerenciamento Ativo de Tráfego evidencia-se hoje como uma das ferramentas

mais completas disponíveis em termos de operação rodoviária. Sua avançada

tecnologia, no entanto, requer que as etapas de sua implantação sejam investigadas

antecipadamente, em detalhe, para melhores resultados.

As experiências internacionais com o GAT são motivadoras. Com o cenário

brasileiro inspirando grande crescimento econômico nos anos em frente, o uso

dessa poderosa ferramenta de operação rodoviária é promissor também no Brasil.

Seu potencial de oportunizar o uso dos acostamentos com o benefício de gerir uma

operação ágil e segura é atrativo.

O GAT pode vir a ser uma importante ferramenta para uso em rodovias

congestionadas, especialmente nas proximidades dos grandes centros urbanos do

País. Entretanto sua introdução nas rodovias brasileiras deve ser feita de forma

cautelosa, tendo em vista as peculiaridades da nossa frota, dos nossos motoristas e

da nossa infraestrutura.

Finalmente, a grande interdisciplinaridade do assunto demanda uma

liaison entre os diversos órgãos e departamentos envolvidos. A educação dos

usuários sobre o sistema e a inovação em termos de legislação serão grandes

desafios a serem trabalhados, mas que certamente serão frutíferos para a tecnologia

rodoviária nacional.

O estudo, já em estágio avançado de conceituação, necessitará também

passar por um embrionamento tecnológico, para desenvolvimento das tecnologias

necessárias ainda não disponíveis no Brasil, bem como de estudos aprofundados

da operação da via. Para tanto, estão sendo programadas extensas campanhas de

coleta de dados durante o verão 2011-2012, com vistas à implantação do projeto-

piloto para o verão 2012-2013.

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Análise da capacidade e nível de serviço em rodovias rurais de pista simples

Juliana Dias WutkeProfessora MSc. no Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC)

Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC) da

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

e-mail: [email protected]

Lenise Grando GoldnerProfessora Dra. do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC)

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

e-mail: [email protected]

A análise da capacidade e do nível de serviço de uma rodovia é de extrema importância para sua gestão. Através dela, é possível quantificar o grau de suficiência da rodovia para acomodar e escoar os volumes de tráfego previstos em condições aceitáveis. Nesse contexto, este artigo contribui com o tema em questão através de uma apurada revisão dos métodos para avaliação da capacidade e do nível de serviço em rodovias rurais de pista simples, que vem sendo desenvolvidos e aplicados por diversos países. Com base nessa pesquisa, um modelo é proposto. Tal modelo vem sendo desenvolvido em ambiente Sistema de Informação Geográfica (SIG), mostrando-se uma ferramenta útil em estudos de capacidade e nível de serviço.

malha rodoviária em um país é de fundamental importância

econômica e social, pois favorece seu desenvolvimento e sua

integração. No Brasil, conforme dados do Plano Nacional de

Logística e Transportes (PNLT), o modal rodoviário é responsável

por 58% da matriz brasileira de transporte de cargas e mais de

90% da matriz de transporte de passageiros (PNLT, 2007).

Conforme a Rede Rodoviária do Plano Nacional de Viação

(PNV), as rodovias de pista simples representaram 94,58% dos

217.833,2km de rodovias pavimentadas em todo Brasil, o que

demonstra sua importância para a economia nacional (DNIT,

2009). As rodovias de pista simples são definidas pelo HCM-

2000 (TRB, 2000) como sendo rodovias formadas por duas

faixas de tráfego, uma em cada sentido, sem separação central

entre faixas.

Assim como no Brasil, em diversos países a maior parte

da malha rodoviária é composta por rodovias de pista simples.

Nos Estados Unidos, elas representam 80% de todas as

rodovias rurais pavimentadas e transportam cerca de 30% de

todo o tráfego do País (Yu, 2006). Na Alemanha, as rodovias

de pista simples representam 90% da malha rodoviária (Brilon;

Weiser, 2006).

A capacidade de uma rodovia é expressa pelo número

máximo de veículos que pode passar por um determinado

trecho de via durante um período de tempo estipulado (TRB,

2000). Sua importância dá-se em quantificar o grau de

suficiência da rodovia para acomodar e escoar os volumes

de tráfego previstos em condições aceitáveis. O conceito de

nível de serviço possibilita a avaliação da qualidade do serviço

oferecido, desde um volume de trânsito quase nulo até o

volume máximo ou capacidade da via. Através dessa análise,

é possível determinar as condições atuais da malha e ainda

estimar a capacidade necessária para atender às demandas

futuras. Além disso, a crescente consciência pública para

problemas ligados à infraestrutura e à segurança do transporte

rodoviário, bem como ao conforto na condução, criou uma

atmosfera na qual o usuário percebe a viabilidade do serviço

como um direito, exercendo uma comparação permanente

entre a percepção da qualidade do serviço oferecido e o

que é esperado ou desejado. Isso significa que, atualmente,

as estradas não podem mais ser consideradas como única

prerrogativa dos gestores, mas também dos usuários e do bem

coletivo (Colonna et al., 2008).

O objetivo deste artigo é realizar uma revisão sobre

os principais métodos de análise de capacidade e nível

de serviço em rodovias de pistas simples existentes, e

complementarmente realizar uma análise crítica dos mesmos.

Além disso, tem o intuito de apresentar de maneira sucinta

o modelo para análise de capacidade e nível de serviço em

ambiente Sistema de Informação Geográfica (SIG), que

vem sendo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em

Engenharia Civil (PPGEC) da Universidade Federal de Santa

Catarina (UFSC).

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69Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

MÉTODOS PARA ANÁLISE DA CAPACIDADE E NÍVEL DE SERVIÇO

Nível de serviço global (GLS): experiência italiana

Colonna et al. (2008) descrevem um

modelo para avaliação do desempenho

de rodovias, o nível de serviço global. O

método apresenta índices de qualidade

para análise de rodovias interurbanas.

Para cada indicador, é associado um

único parâmetro numérico (entre 0 e

1), para avaliar a qualidade do serviço

de cada segmento da rodovia. O

procedimento é baseado em um conceito

fundamental: a qualidade do serviço

rodoviário é a soma das categorias que

podem ser atribuídas a uma totalidade de

qualidades básicas, cada uma tendo uma

importância diferente na avaliação global.

A partir do processo analítico hierárquico,

denominado Analytical Hierarchic Process

(AHP), são atribuídos pesos e valores

numéricos para cada segmento da rodovia

examinada. A manutenção da rodovia é

realizada em função dessa avaliação da

qualidade.

Segundo Colonna et al. (2008), para

a avaliação de desempenho das rodovias,

seis grupos compõem o nível de serviço

global: segurança (S), tempo de viagem

(T), serviços (R), meio ambiente (A),

condições de tráfego (Q) e conforto (C).

No total, são 54 parâmetros indicadores,

e o grupo de maior destaque é o de

segurança, com 36 parâmetros. A análise

é realizada, inicialmente, por segmento de

rodovia e atribuição de valores para cada

parâmetro. Então, é obtido um índice para

cada segmento (GLSn), e, a partir deste,

obtém-se o nível de serviço global da

rodovia (GLSroad), conforme a Equação 1:

Onde:GLSn : nível de serviço global do segmento n;Ln : extensão do segmento n;Lroad : extensão da rodovia;

Durante os estudos, Colonna

et al. (2008) atribuíram um valor

máximo do GLS relacionado a cada

tipo de rodovia, conforme apresentado

na Tabela 1. Para se ter uma visão

global da qualidade do serviço

oferecido por uma infraestrutura

rodoviária, foi introduzido o conceito

de eficiência do GLS (hGLS), dado pela

Equação 2.

Tabela 1 Valor máximo do GLS segundo os tipos de rodovia

Fonte: Colonna et al, 2008.

Tabela 2 Escala de eficiência do nível de serviço Global

(i) k indica o tipo de rodovia (classificação)

Fonte: Colonna et al, 2008.

Onde:GLS é igual ao valor real do GLS;GLSmax é igual ao valor do GLS máximo que é possível para aquele tipo de rodovia.

A escala de eficiência do GLS

(hGLS) varia de A a G, conforme

observado na Tabela 2. Dependendo

da função da rodovia, o seu nível

de serviço global pode variar de um

valor máximo teórico (correspondente

à presença de todos os serviços

possíveis, caracterizada pela máxima

eficiência, de cada ponto de vista),

para um valor mínimo aceitável

(capaz de garantir, pelo menos,

funcionalidades essenciais).

Colonna et al. (2008),

desenvolveram um software para

ser visualizado em plataforma SIG.

Para testar o método desenvolvido,

foi realizado um estudo de caso

nos arredores da cidade de Bari,

na Itália. O estudo-piloto incluiu

rodovias de vários tipos: principais,

secundárias e locais, totalizando

108,15km. Em ambiente SIG, é

possível visualizar os valores do nível

de serviço global numa escala de

cores, onde GLS melhores aparecem

em verde, e, conforme o GLS vai

diminuindo, as cores passam para

amarelo, laranja até chegar ao pior

nível, na cor vermelha.

Estimativa de Índice de congestionamento (CI) em segmento de rodovia: experiência norte-americana

Zhang e Lomax (2006)

apresentam um procedimento baseado

em SIG para estimar o índice de

congestionamento para trechos de

rodovias em nível. O método atribui

como entrada volumes de tráfego

determinados por modelos de

demanda de viagens regionais, calcula

o índice de congestionamento para

cada trecho da rodovia e apresenta os

resultados de duas formas distintas.

Uma delas é o resumo estatístico de

valores de níveis de congestionamento

em trechos agregados por tipo de

área e por classes funcionais de

rodovias. A outra é uma síntese visual

com mapas em que trechos da rede

na área de estudo são agrupados

TIPOS DE RODOVIA GLSmax

RODOVIÁRIA PRINCIPAL (TRÂNSITO FLUINDO E FUNÇÕES)

1,00

RODOVIA MÉDIA (FUNÇÃO DE DISTRIBUIÇÃO)

0,90

RODOVIA SECUNDÁRIA (FUNÇÃO DE PENETRAÇÃO)

0,70

RODOVIA LOCAL (FUNÇÃO DE ACESSO)

0,40

NÍVEL DE EFICIÊNCIA hGLS

K(1) = GLS EFICIÊNCIA

A 0,85 < HGLS < 1,00

B 0,67 < HGLS < 0,85

C 0,50 < HGLS < 0,67

D 0,30 < HGLS < 0,50

E 0,20 < HGLS < 0,30

F 0,13 < HGLS < 0,20

G HGLS < 0,13

GLSn . Ln

Lroad

GLSroad = ∑n

hGLS = GLS

GLSmax

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os

e sombreados por cinco níveis de

congestionamento indicado pelo CI.

Conforme a formulação de Zhang e

Lomax (2006), o cálculo do índice

de congestionamento é dado pela

Equação 3:

Onde:tc é igual ao tempo de viagem estimado sob a condição congestionada;td é igual tempo de viagem adicional devido ao atraso resultante do congestionamento;tf é igual ao tempo de viagem na velocidade de fluxo livre;r é igual ao benefício de redução no tempo de viagem (%), resultante das diversas práticas locais de melhorias técnicas do congestionamento.

O método de estimativa de

índice de congestionamento

proposto por Zhang e Lomax (2006)

foi implementado em plataforma

SIG, onde é possível a geração de

mapas, tabelas e outras formas de

apresentação. O usuário pode gerar

mapas temáticos para visualizar a

distribuição espacial dos trechos de

rodovia congestionados na área de

estudo, destacar o congestionamento

através de pontos coloridos em

locais específicos, ou descrever

níveis médios de congestionamento

como indicado pelos índices de

congestionamentos, através de

diferentes métodos de agregação de

dados, como, por exemplo, por classe

funcional da rodovia, por tipo de área

e por hora do dia.

Análise da capacidade e nível de serviço segundo o Highway Capacity Manual (HCM)

O HCM é um manual do Transportation Research Board (TRB) que fornece

procedimentos para estimativa da capacidade e do nível de serviço para diversos

componentes do sistema viário. Sua primeira edição foi publicada nos Estados

Unidos, em 1950. Ao todo, foram publicadas cinco edições completas do

HCM: 1950, 1965, 1985, 2000 e 2010 (TRB, 2010). Embora tenha sido

desenvolvido para aplicação nos Estados Unidos, o manual é utilizado em

diversos países, principalmente naqueles que ainda não possuem um manual de

capacidade nacional, como o Brasil.

O nível de serviço é uma medida de qualidade operacional em uma

rodovia de pista simples e é representado por letras de “A” a “F”, sendo que

“A” representa o melhor nível de serviço, “E” representa a operação próxima da

capacidade e “F” significa rodovia congestionada. Conforme TRB (2000), em

rodovias de pista simples, o nível de serviço “F” ocorre quando o fluxo excede a

capacidade, ou seja, quando for maior que 3.200 cpe/h (carros de passeio por

hora) somando-se as duas direções; ou 1.700 cpe/h, numa única direção.

Segundo o HCM-2000, para a análise operacional de rodovias de pista

simples, dois parâmetros refletem adequadamente a satisfação dos motoristas

em relação à qualidade da operação (TRB, 2000):

a velocidade média de percurso ATS (do inglês, average travel speed), ou seja,

a razão entre a distância de um segmento de rodovia e o tempo médio de

percurso dos veículos nesse trecho; e

a porcentagem de tempo viajando em pelotão PTSF (percent time spent

following), ou seja, o percentual de tempo em que os veículos trafegam

em pelotões numa rodovia, aguardando por uma oportunidade de realizar

manobras de ultrapassagem sobre os veículos mais lentos.

Os níveis de serviço são distintos para as duas classes de rodovias. Nas

rodovias Classe I, os motoristas têm a expectativa de viajar em altas velocidades,

na Classe II não. Para as rodovias Classe I, as medidas de desempenho

consideradas são PTSF e ATS. Para as rodovias Classe II, o nível de serviço é

dado somente a partir de PTSF, como pode ser observado na Tabela 3.

Tabela 3 Critério de nível de serviço para rodovias de pista simples Classes I e II

Nota: O nível de serviço F se aplica-se sempre que o fluxo exceder a capacidade.

Fonte: TRB, 2000.

NÍVEIS DE SERVIÇOCLASSE I CLASSE II

PTSF (%) ATS (km/h) PTSF (%)

A ≤ 35 > 90 ≤ 40

B > 35 – 50 > 80 – 90 > 40 – 55

C > 50 – 65 > 70 – 80 > 55 – 70

D > 65 – 80 > 60 – 70 > 70 – 85

E > 80 ≤ 60 > 85

CI = =tc

tf

tf + td . (1-r)

tf

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Onde:ATS é igual à velocidade média de percurso (km/h);FFS é igual à velocidade de fluxo livre observada ou estimada (km/h);vp é igual ao fluxo equivalente para ambos os sentidos de tráfego (cp/h);fnp é igual ao fator de ajuste para a porcentagem de trechos com ultrapassagem proibida.

Onde:PTSF é igual à porcentagem de tempo trafegando em pelotão (%);BPTSF é igual à porcentagem de tempo básico trafegando em pelotão (%); (Equação 6)fd/np é igual ao fator de ajuste para o efeito combinado da distribuição direcional do tráfego e da porcentagem de zonas de ultrapassagem proibida

Onde:BPTSF é igual à porcentagem de tempo básico trafegando em pelotão;vp é igual ao fluxo equivalente (cp/h).

Considerando a análise bidirecional

de rodovias de pista simples, são

apresentadas as equações para a

determinação da velocidade média

de percurso (Equação 4) e para

a determinação da porcentagem

de tempo trafegando em pelotão

(Equações 5 e 6):

Para a aplicação das equações

citadas, são necessários alguns ajustes,

pois o método foi desenvolvido baseado

em condições básicas de geometria e

tráfego, que diferem de local para local.

Adaptação do HCM-2000 para rodovias de pista simples brasileiras

O Highway Manual Capacity é

uma referência básica para a análise

da qualidade de serviço em rodovias

em todo o mundo. Entretanto, para

a elaboração dos procedimentos

descritos no HCM, os dados coletados

foram de rodovias norte-americanas

e canadenses, o que sugere que os

parâmetros desses procedimentos

devem ser adaptados para outros

países, quando as características do

tráfego, dos veículos e das rodovias

forem diferentes. No Brasil, o HCM

vem sendo utilizado ao longo dos anos,

com pouca ou nenhuma adaptação,

para a análise da capacidade e do

nível de serviço de rodovias. É o caso,

inclusive do órgão responsável pelas

rodovias nacionais, o DNIT. Isso pode

ser constatado na publicação Manual

de Estudos de Tráfego (DNIT, 2006),

que reúne informações e procedimentos

necessários para diversos estudos de

tráfego, com base no HCM.

Alguns países já

desenvolveram adaptações próprias,

como o HBS2001, manual equivalente

ao HCM, desenvolvido na Alemanha

(Brilon; Weiser, 2006). No Brasil, os

estudos para adaptação do HCM são

recentes, podendo ser destacados

dois trabalhos voltados especialmente

para rodovias rurais de pista simples.

No primeiro estudo, Egami (2006)

apresenta uma adaptação do

procedimento para análise do nível

de serviço e da capacidade proposto

pelo HCM-2000 para rodovias de

pista simples no Brasil. A adaptação

consistiu em obter novos valores para

os fatores de ajuste utilizados no

HCM2000. Para tal, foram realizados

estudos com simulação de tráfego,

calibrados através de algoritmo

genético para representar uma rodovia

típica do Brasil. Mon-Ma (2008)

também apresenta uma adaptação

do processo de estimativa do nível

de serviço de segmentos de pista

simples, neste caso, incluindo faixas

adicionais. Para tal estudo, foram

consideradas as condições de tráfego

típicas do Estado de São Paulo. Para

obter novos valores dos parâmetros

para os fatores de ajuste, Mon-Ma

(2008) também utilizou um modelo de

simulação calibrado com um algoritmo

genético. As adaptações do método

incluem modificações nas relações

fundamentais para análise bidirecional,

que são “fluxo versus velocidade” e

“fluxo versus porcentagem de tempo

trafegando em pelotão”. Um resumo

das modificações propostas podem ser

observadas no Quadro 1.

Quadro 1 Medidas de desempenho fundamentais para a análise do nível de serviço em rodovias de pista simples

MÉTODO/ADAPTAÇÃO VELOCIDADE MÉDIA DE PERCURSO (ATS) % TEMPO BÁSICO TRAFEGANDO EM PELOTÃO (BPTSF)

HCM-2000 ATS = FFS - 0,0125 . V BPTSF = 100 ( 1 - e - 0,000879 v )

ADAPTAÇÃO EGAMI (2006) ATS = FFS - 0,0119 . V BPTSF = 100 ( 1 - e - 0,000520 v )

ADAPTAÇÃO MON-MA (2008) ATS = FFS - 0,0098 . V BPTSF = 100 ( 1 - e - 0,0011 v )

ATS = FFS - 0,0125 . vp - fnp

PTSF = BPTSF + fd/np

BPTSF = 100(1-e-0,000879vp)

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Highway Manual Capacity HCM-2010

A mais recente edição do Manual

é o HCM-2010, que apresenta

mudanças significativas para a análise

da capacidade e do nível de serviço

em rodovias de pista simples. Nessa

versão, foi incluída a análise do nível

de serviço para viagens de bicicletas

ANÁLISE CRÍTICA

Entre os métodos analisados, o

que se pode observar é que todos,

a princípio, segmentam a rodovia

em trechos com características

geométricas e funcionais semelhantes

(trechos homogêneos) para análise

da capacidade e do nível de serviço.

Somente um dos métodos, o do nível

de serviço global (GLS), é que, ao final

da análise, sugere agregar os trechos

e definir um nível de serviço para a

rodovia como um todo.

Com relação ao principal

parâmetro ou variável de análise

para o nível de serviço, os métodos

apresentados diferem entre si. O

método do HCM-2000 considera como

principais parâmetros a velocidade

média de percurso e a porcentagem de

tempo viajando em pelotão. O método

de índice de congestionamento (CI)

destaca o parâmetro do tempo de

viagem em situação congestionada

comparado com o tempo de viagem em

condição de fluxo livre. Já o método do

nível de serviço global não destaca um

parâmetro principal, pois atribui 54

parâmetros indicadores com diferentes

pesos, divididos em seis grupos, com

destaque para o grupo composto com

parâmetros indicadores de segurança,

Com base nas novas simulações,

os fatores de ajustes que sofreram

alterações foram: fator de ajuste

para o efeito de rampas (fG); fator de

ajuste para veículos pesados (fHV);

fator de ajuste para porcentagem

de zonas de ultrapassagem proibida

(fnp); e fator de ajuste para o efeito

combinado da distribuição direcional

do tráfego e da porcentagem de

zonas de ultrapassagem proibida

(fd/np). Tanto Egami (2006) como

Mon-Ma (2008) calcularam o

fator de pico horário (PHF), que

resultou em valores idênticos aos

sugeridos pelo HCM. Ambos estudos

comprovam que as adaptações

propostas fornecem estimativas mais

adequadas e realistas do nível de

serviço para rodovias brasileiras, do

que estimativas com o HCM-2000

tradicional.

realizadas em rodovias rurais de pista

simples. Além disso, a análise do nível

de serviço para veículos automotores

do HCM-2010 também conta com

modificações. As rodovias agora são

classificadas em três classes. Além

das Classes I e II, foi adicionada a

Classe III. As rodovias Classe I servem

como principais rotas entre cidades;

as Classe II são rotas de acesso a

outras rodovias, ou rotas turísticas e

recreacionais; e as rodovias Classe III

passam por trechos desenvolvidos,

cruzando cidades ou áreas

recreacionais (TRB, 2010). O nível

de serviço é definido em função da

classe da rodovia, conforme apresenta

a Tabela 4. Os principais parâmetros

para análise do nível de serviço em

cada classe de rodovia são:

Classe I - percentual do tempo em

espera para ultrapassar (PTSF) +

velocidade média de viagem (ATS);

Classe II - percentual do tempo em

espera para ultrapassar (PTSF);

Classe III - percentual da

velocidade de fluxo livre (PFFS).

Representa a capacidade dos

veículos viajarem próximo da

velocidade limite determinada.

Tabela 4 Critério de nível de serviço para rodovias de pista simples Classe I, II e III

Fonte: TRB, 2010.

NÍVEIS DE SERVIÇOCLASSE I CLASSE II CLASSE II

PTSF (%) ATS (mi/h) PTSF (%) PFFS (%)

A ≤ 35 > 55 ≤ 40 >91,7

B > 35 – 50 > 50 – 55 > 40 – 55 > 83,3 – 91,7

C > 50 – 65 > 45 – 50 > 55 – 70 > 75,0 – 83,3

D > 65 – 80 > 40 – 45 > 70 – 85 > 66,7 – 75,0

E > 80 ≤ 40 > 85 ≤ 66,7

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73Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

que possui o maior números de

indicadores (36 no total).

A escolha do melhor método

vai depender das condições locais e

principalmente da disponibilidade

e da viabilidade para a coleta das

informações de tráfego e de geometria

necessárias. Pois quanto mais

parâmetros analisados e dados coletados

houver, maior pode ser o nível de

detalhamento da análise. É notório que

isso implica elevados custos, que nem

sempre os gestores de rodovias estão em

condições de assumir.

No Brasil, não existe um método

de análise de capacidade e nível

de serviço definido como padrão,

cada órgão gestor estabelece sua

metodologia, normalmente com base

em estudos de outros países. Nos

últimos anos, vêm sendo desenvolvidos

estudos de adaptações de métodos

já conceituados para a realidade

brasileira. É o caso das adaptações das

equações e fatores de ajuste do HCM-

2000, desenvolvidas para o Estado

de São Paulo (Egami, 2006; Mon-

Ma, 2008). Através de tais estudos

e adaptações, foi possível avaliar e

comparar as peculiaridades entre os

sistemas rodoviário norte-americano e

o brasileiro. As diferenças vão desde

os tipos de veículos utilizados, até o

comportamento dos motoristas. Essa

análise mais específica reflete-se em

resultados mais adequados e próximos

da realidade brasileira.

Outro ponto que merece destaque

são as implementações dos métodos

para análise do nível de serviço

em plataforma SIG. Um sistema

de informação geográfica oferece

inúmeras vantagens com relação à

visualização da rede viária como um

todo, facilitando sobremaneira a análise

crítica e conjunta da malha viária de

transporte. Esse tipo de tecnologia

aparece empregada somente em dois

dos métodos apresentados, o método

de nível de serviço global (GLS) e o

método de índice de congestionamento

(CI). Tendo em vista tal necessidade,

vem sendo desenvolvido um modelo

para estudos de capacidade e nível de

serviço implementado em um sistema

de informação geográfica. O modelo

é baseado no método HCM e em suas

adaptações para a realidade brasileira e

é descrito na sequência.

MODELO PROPOSTO PARA ESTUDO DE CAPACIDADE E NÍVEL DE SERVIÇO (SIG-NS)

O Sistema de Informação

Geográfica para Nível de Serviço

(SIG-NS) é um modelo que serve de

apoio para estudos de capacidade e

nível de serviço em rodovias rurais de

pista simples. É implementado em um

Sistema de Informação Geográfica,

onde é possível armazenar, recuperar,

transformar e visualizar dados gráficos

e alfanuméricos da malha rodoviária.

O sistema é baseado no método

desenvolvido pelo HCM e contempla

três tipos de análise da capacidade e

nível de serviço:

análise segundo o HCM-2000

(TRB, 2000);

análise segundo as adaptações

do HCM-2000 para rodovias

brasileiras realizadas por Egami

(2006);

análise segundo o HCM-2010

(TRB, 2010).

Dessa maneira, o SIG-NS oferece

a praticidade de se obter resultados

comparativos entre os métodos

HCM-2000 e HCM-2010, além das

adaptações brasileiras para o HCM-

2000. A análise da capacidade e do

nível de serviço em rodovias de pista

simples pode ser obtida de modo

rápido e prático, com visualizações

em mapas temáticos, por trechos

de rodovias, facilitando muito a

análise crítica. O desenvolvimento

do modelo em plataforma SIG tem

o objetivo de auxiliar o processo

de planejamento e tomada de

decisão para gestores do sistema de

transporte rodoviário, já que propicia

uma visualização ampla através de

mapas temáticos e não somente

planilhas de dados. A plataforma

de desenvolvimento do modelo é

implementada em linguagem de

programação JAVA. Para a elaboração

e a organização do banco de dados,

é utilizada a biblioteca PostgreSQL.

A visualização é realizada no sistema

de informação geográfica open source

(código aberto) Quantum GIS, que

oferece suporte para dados gráficos e

alfanuméricos.

O modelo proposto é capaz de

realizar análises de capacidade

e nível de serviço de rodovias

de pista simples, com base em

informações georreferenciadas,

gerando relatórios de saída com

informações de operação e qualidade

do tráfego. Além disso, podem ser

disponibilizados mapas temáticos

da malha rodoviária, ilustrando, com

diferentes cores, a escala de níveis

de serviço oferecido em cada trecho

homogêneo das rodovias analisadas.

A Figura 1 apresenta um exemplo de

aplicação do SIG-NS para as rodovias

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CONCLUSÕES

Tendo em vista a importância do nível de serviço oferecido pelas rodovias e desejado pelos usuários, foram expostos alguns

dos principais métodos de análise da capacidade e do nível de serviço. É percebido que cada um oferece suas particularidades

e que a opção pelo melhor método vai depender das condições técnicas e financeiras para coletas de dados de tráfego e da

geometria da malha viária que cada órgão gestor possui para rodovias rurais de pista simples. Um método que possui muitos

parâmetros vai exigir um maior detalhamento na coleta de dados, o que implicará um custo maior, que nem sempre poderá ser

assumido pelo órgão gestor. Quanto mais precisa e detalhada for a coleta de informações, mais precisa e próxima da realidade

será a análise. É necessário saber equilibrar, da melhor maneira possível, o nível de precisão da análise e o custo dispendido

com a mesma. Em países em desenvolvimento, que não possuem investimentos constantes em infraestrutura rodoviária,

como é o caso do Brasil, é recomendável a utilização de métodos que necessitem de coleta de dados menos frequentes, onde

possam ser utilizados dados estimados ou padronizados em função das características geométricas e funcionais das rodovias.

Em decorrência disso, o método HCM vem sendo utilizado há muitos anos por inúmeros órgãos rodoviários brasileiros. Para

uma análise mais precisa, é necessário um maior investimento em pesquisas para uma completa adequação do HCM para as

condições e características típicas brasileiras, a exemplo do que foi realizado por Egami (2006) e Mon-Ma (2008) para as

rodovias do Estado de São Paulo. Ainda assim, é mais que necessária uma junção de esforços tanto do meio acadêmico como

dos órgãos gestores para melhorar este cenário.

do Estado de Santa Catarina. Vale ressaltar que o trabalho

ainda está em fase de desenvolvimento e que os resultados

apresentados são parciais.

A partir do modelo desenvolvido, pretende-se fornecer

subsídios para resolver questões como a determinação

da qualidade de operação de rodovias de pista simples,

oferecendo uma visão da real capacidade de operação

do sistema rodoviário, tendo em vista a implantação de

melhorias físicas e operacionais da malha. Sendo assim,

pretende-se contribuir com uma nova forma de percepção

para o planejamento, a gestão e a operação rodoviária por

parte dos órgãos gestores e demais agentes envolvidos.

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75Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

AGRADECIMENTO

As autoras agradecem ao Departamento Estadual de Infraestrutura (DEINFRA) de Santa

Catarina, pelo fornecimento de informações de tráfego das rodovias estaduais para fins de

pesquisa. Agradecem também ao Eng.º Dr. Alexandre Hering Coelho, pela programação do

SIG-NS e pelas discussões técnicas enriquecedoras.

REFERÊNCIAS

Brilon, W. e Weiser, F. (2006) Two-Lane Rural Highways – the German Experience. Transportation Research Board, The 85th Annual Meeting. Washington, D.C., USA.Colonna, P.; V. Ranieri e S. d’Amoja (2008) The Modern Vision Of The Performance Assessment Of The Roads: The Global Level of Service (GLS) as a Tool for its Determination. Transportation Research Board, The 87th Annual Meeting. Washington, D.C., USA.DNIT (2006) Manual de estudos de tráfego. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes. Diretoria de Planejamento e Pesquisa. Coordenação Geral de Estudos e Pesquisa. Instituto de Pesquisas Rodoviárias. Rio de Janeiro/RJ Brasil. 384 p. (IPR. Publ., 723). 2006.DNIT (2009) Rede Rodoviária do PNV – Divisão em Trechos 2009. Ministério dos Transportes. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes. Diretoria de Planejamento e Pesquisa. Coordenação de Planejamento. Brasília/DF Brasil. 371 p. 2009.Egami, C. Y. (2006) Adaptação do HCM-2000 para determinação do nível de serviço em rodovias de pista simples sem faixas adicionais no Brasil. Tese de Doutorado. Escola de Engenharia de São Carlos. Universidade de São Paulo. São Carlos, 2006.

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76

equi

pam

ento

s e

tecn

olog

ia

Micronivelamento em pavimento de concreto, também conhecido como cepilhamento

no Brasil, ou Grinding como é conhecido nos EUA, é uma técnica de restauração do

pavimento de concreto que permite a correção de irregularidades e melhora a macro

textura da superfície de rolamento do pavimento, em conseqüência aumenta a vida útil

deste e as condições operacionais, proporcionando conforto e segurança aos usuários.

Em obras de implantação de rodovias de pavimento rígido, a execução do Grinding

é essencial para adequar a superfície de rolamento ao Índice de Perfil (IP) conforme

determina a Norma DNIT 049/2009 ES – Pavimento Rígido – Execução de pavimento

rígido com equipamento de forma-deslizante - Especificação de Serviço. Nos pavimentos

existentes, o Grinding geralmente é utilizado em conjunto com outras técnicas de

reabilitação de pavimentos de concreto, recuperando a capacidade funcional e estrutural

do pavimento. No caso de reparo da capacidade estrutural do pavimento, os reparos

profundos e estabilização de lajes devem ser executados antes do micronivelamento.

Algumas vantagens da execução do Grinding são:

Fornece uma superfície sem irregularidades onde o conforto muitas vezes é tão

bom ou melhor do que em um pavimento novo;

Aumento significativo da aderência, pneu pavimento, reduzindo o potencial de

aquaplanagem de veículos e o efeito spray, aumentando assim a segurança ;

Melhora da macro textura da superfície, reduzindo o ruído;

Não afeta significativamente a resistência do pavimento;

Pode ser aplicado de forma pontual, porém recomenda-se executar ao longo de

toda faixa de rolamento.

Micronivelamento em Pavimento de Concreto

O

Eng. Alexandre Machado CorreaPaulifresa Fresagem Reciclagem

EQUIPAMENTO PC5000

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77Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

O EQUIPAMENTO E A EXECUÇÃO DO SERVIÇO

O equipamento de Grinding utiliza discos diamantados,

montados em um cilindro em uma máquina dirigível,

auto-propelida que é projetada especificamente para este

serviço. Os três aspectos mais importantes do equipamento

são o peso da máquina, a potência disponível e os discos

utilizados.

Durante a execução, as rodas da frente do equipamento

passarão pelo pavimento ainda com falhas, que depois será

micronivelado pelos discos, já as rodas traseiras seguem pelo

bom caminho deixado pelo cilindro de corte.

As máquinas mais novas, apresentam cilindros de corte

com até 1200mm. A textura desejada é produzida usando um

espaçamento de 164 a 194 discos por metro.

Na execução do serviço, o equipamento utiliza água

para resfriar os discos, que juntamente com o material

resultante da raspagem gera uma lama de cimento e pó

de pedra. Esta lama é continuamente retirada através de

um sistema de vácuo do equipamento que a leva até o

caminhão reservatório, com capacidade de até 30m³. Este

processo permite que a pista seja liberada imediatamente

após a execução do serviço, sem necessidade de limpeza

complementar.

O Grinding é executado sempre longitudinal (paralelo ao

eixo da via), deve iniciar e terminar na linha normal à linha

central do pavimento e ser realizado continuamente ao longo

de uma faixa de rolamento para obter melhor qualidade de

rolamento, resistência à derrapagem e aparência uniformes.

DESEMPENHO

Estudos recentes realizados nos Estados Unidos,

mostram uma extensão da vida útil dos pavimentos onde o

Grinding foi realizado. Uma possível explicação é a redução

da carga dinâmica, ou impacto, sobre o pavimento. O

carregamento dinâmico é criado através do trabalho das

suspensões dos veículos, principalmente de cargas, e é

maior do que seu carregamento estático (peso do veículo). Ao

proporcionar uma superfície lisa, o grinding reduz os limites

da carga dinâmica, prolongando a vida útil do pavimento.

Considerando que a resistência do concreto ao longo de

sua vida útil é significativamente maior que a resistência

do projeto, pode-se desconsiderar a pequena redução da

espessura durante a sua vida útil.

O mesmo estudo, mostra que 98% das superfícies

microniveladas, duram até 8 anos antes de exigir outra

reabilitação e que pavimentos já tiveram até três intervenções

de Grinding sem relatar quaisquer problemas.

É importante reconhecer que o Grinding soluciona

apenas problemas funcionais do pavimento. Se o pavimento

existente é estruturalmente deficiente, o Grinding deve ser

executado após a utilização de outras técnicas de restauração

de pavimentos de concreto.

Referênciashttp://www.fhwa.dot.gov/pavement/concrete/diamond.cfmhttp://www.igga.net

EQUIPAMENTO PC5000

Discos diamantados montados no cilindro do equipamento.

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o

A Ponte do Guaíba

onte do Guaíba, como é conhecida a primeira das quatro pontes que compõem a

Travessia Régis Bittencourt, foi inaugurada em 28 de dezembro de 1958 e tornou-se

um dos símbolos de Porto Alegre. A Ponte é a concretização da ousadia e do avanço

tecnológico do projeto, para a época. Único na América Latina, o vão móvel foi utilizado

em função do tráfego de petroleiros que sobem o rio Gravataí até o terminal da Petrobrás

e, posteriormente, também para a passagem dos navios que se dirigem ao Pólo

Petroquímico de Triunfo.

Foi a maior obra de engenharia feita no país até então e a primeira ponte do

Brasil a ser realizada em concreto protendido - que em vez de usar ferros, como o

concreto armado, usa aços especiais que comprimem o concreto, permitindo vãos

maiores. A visão dos seus dos projetistas fez com que fosse construída já com o dobro

da capacidade de tráfego, demandando oito anos de trabalho. O então DNER delegou

ao DAER a administração da obra, cujos trabalhos ficaram a cargo da construtora

porto-alegrense Azevedo, Bastian e Castilhos. Três mil e quinhentos trabalhadores

participaram da obra.

Na década de 40 a travessia entre Porto Alegre e Guaíba era feita por balsas com

capacidade para 22 automóveis ou nove ônibus. Com um único acesso e complicadas

manobras de atracação, as balsas levavam uma hora e meia, em média, para fazer um

percurso de pouco mais de 5km. Ao longo do tempo, o movimento foi aumentando e no

início da década de 50 seis barcas transportavam cerca de 246 mil veículos e 827 mil

passageiros ao ano. O sistema se mostrava esgotado.

Já em 1948 se buscava soluções para solucionar o crescente problema de

congestionamento. A primeira solução apresentada foi um túnel sob o Guaíba, ligando

a ponta do Gasômetro à ilha da Pintada. A ideia gerou tanta discussão e polêmica que

uma comissão foi criada pelo DAER para estudar e comparar alternativas. O trabalho

da comissão foi apresentado e debatido na Sociedade de Engenharia. O debate era

acompanhado pela sociedade local através dos jornais.

Evidentemente a primeira solução estudada foi a melhoria e ampliação do sistema

de balsas. No entanto, tendo em vista as diretrizes do Plano Rodoviário Nacional, a

P

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travessia a seco foi priorizada. Três

alternativas se destacaram. Uma ponte

na Vila Assunção, com um pilar na ilha

do presídio; a ideia já citada de um

túnel ou ponte na ponta do Gasômetro

e a ponte sobre o delta do Jacuí.

A solução sobre o delta acabou

sendo a escolhida. Cinco empresas

participaram de uma concorrência

pública internacional em 1953. Foram

apresentados doze anteprojetos e

uma variante. As concorrentes eram:

A Sociedade Técnica de Engenharia

e Representações S.A.; a Société de

Grands Travaux de Marseille, a Azevedo

Bastian e Castilhos S.A., a Campenon

Bernard, Estudos e Obras S.A. e a

Companhia Construtora Nacional.

A vencedora foi a Azevedo Bastian

e Castilhos com um projeto do escritório

de engenharia Leonhardt und Andrä de

Stuttgart, Alemanha. O projeto inicial

previa mais de 2000m de viadutos, uma

ponte sobre o canal de navegação do

Guaíba, com 777m de comprimento e

um vão móvel de 50m, com capacidade

de elevação de 40m. Uma ponte de

344m sobre o Furado Grande; outra

de 774m sobre o Saco da Alemoa e

uma ponte sobre o canal do Jacuí com

1.756m, vão livre de 50m e altura de

20m para a navegação.

Um minucioso estudo do delta foi

encomendado ao laboratório francês

Laboratoire Dauphinois D’Hydraulique

para analisar o comportamento das

águas na presença das fundações da

ponte. Os franceses chegaram a montar

uma maquete reproduzindo todo o

sistema do Delta e simularam diversas

situações de cheias.

As obras de arte da travessia

foram projetadas em concreto armado

protendido pelos engenheiros alemães

Fritz Leonhardt, W. Andrä e W. Baur.

O vão móvel foi projetado em aço

pela J. Gollnow & Sohn, também da

Alemanha. O sistema de elevação

foi projetado pela AEG – Allgemeine

Elektricitäts-Gesellschaft.

O momento nacionalista vivido

pelo país, no governo de Getúlio

Vargas, e a proibição pela Cacex da

importação de aço, protegendo a

nascente indústria siderúrgica nacional,

levou a nacionalização do projeto com

a Companhia Brasileira de Construção

Fichet, Schwartz-Haumont, de São

Paulo, adaptando o projeto de acordo

com o projeto original em parceria com

a Siemens do Brasil, que importou da

Alemanha os sistemas eletrônicos de

controle, sem similares no Brasil. A

plataforma de aço do vão móvel ficou

a cargo da Companhia Siderúrgica

Nacional, de Volta Redonda.

O engenheiro Lélio Araújo,

iniciando sua carreira no DAER na

época, trabalhou na equipe que

acompanhou e fiscalizou a execução

da obra, lembra que a siderúrgica

de Volta Redonda enviou um de

seus engenheiros à Alemanha para

garantir que o aço tivesse as mesmas

características do aço alemão.

O vão móvel é composto pela

estrutura de aço e quatro torres, que

exigiram um cuidadoso projeto para

combinar o concreto armado comum com

o concreto protendido. Da mesma forma

que foi preciso um delicado e preciso

trabalho para coincidir a altura das vigas

metálicas com as vigas de concreto

protendido dos demais vãos. As bases

das torres abrigam os compartimentos

para as máquinas que içam a ponte.

Dentro das torres correm os contrapesos

que auxiliam no trabalho de erguer as

460 toneladas da plataforma de 57,54m

de comprimento e 18,30m de largura,

através do sistema de cabos e polias, até

uma altura de 23m.

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HISTÓRIAS DA CONSTRUÇÃO

O Engenheiro Lélio Soares Araújo lembra de algumas histórias curiosas e

interessantes da construção da Ponte.

O vão móvel foi montado juntando-se as partes metálicas com rebites. O

engenheiro Lélio lembra: “O pessoal de Volta Redonda trouxe duas equipes

de rebitadores. Eram especialistas no assunto. Verdadeiros craques. O rebite

é aquela peça pequena, aquecido a mil graus, eles conheciam a temperatura

pela cor. Eles tinham uma espécie de pequenos fornos, onde colocavam os

rebites e iam tirando com um tipo de garfo e jogavam lá para cima e outro

cara pegava com uma caneca, já encostava no furo e outro colocava com um

martelete. Eram verdadeiros artistas.”

Momentos de tensão também ocorreram. “A inauguração foi marcada

para o dia 28 de dezembro e o vão móvel não ficava pronto. Foi trazido

um eletricista da Alemanha para fazer a montagem de todo o circuito

elétrico da ponte, só que na hora de testar o içamento não funcionou. O

Alemão enlouqueceu. Queria passar o natal com a família na Alemanha.

Ficou dois ou três dias revisando todo o sistema até que se descobriu que

havia um erro no desenho dos esquemas de uma ligação. Descoberto o

erro, passamos ao teste. O problema foi encontrar um voluntário para subir

junto com o vão móvel. Acabei sendo eu o piloto de provas. Ainda bem

que tudo correu sem problemas.”

Outro problema que causou preocupação foi o rompimento dos cabos

de protensão. Não se descobria a causa, então se acionou o Instituto

Tecnológico do Rio Grande do Sul: “Levamos ao professor Werner Grundig

que realizou uma série de testes e acabou descobrindo que o problema ela a

liberação de hidrogênio liberado por uma massa sulfurosa fundida empregada

no tratamento da superfície dos cabos. A descoberta do Grundig acabou

solucionando um mistério ocorrido na Alemanha. Eles haviam tido o mesmo

problema com algumas bobinas de cabos e não tinham ideia do porque. É

que os cabos tinham ficado armazenados próximos a uma fábrica de enxofre.”

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o

O FUTURO

Passadas mais cinquenta anos a Ponte teve de ser adaptada a

uma nova realidade, o aumento da frota e do fluxo de veículos e o

seu papel estratégico para a ligação com a metade sul do estado,

o porto de Rio Grande e os países do Mercosul, aumentaram ainda

mais a sua importância. Hoje se discute se ela ainda atende às

necessidades de fluidez do tráfego, os custos do tempo de espera

gerado pelos içamentos e o temor de panes que isolem a metade sul.

Uma nova ponte para o Guaíba está no foco das discussões.

No final da década de 90 a ponte foi assumida pela

concessionária da BR-290 e passou por uma profunda reforma,

com a substituição dos cabos, roldanas e motores que promovem o

içamento do vão. Os cabos originais foram substituídos por quatro

conjuntos de 4 cabos cada, assim cada torre possui um conjunto de

16 cabos, o que trouxe maior segurança para o sistema.

A Ponte passou por dois episódios que abalaram sua estrutura.

Na década de 70 um navio bateu em um dos pilares e em 2008 uma

embarcação atingiu a viga inferior. A embarcação atrasou sua saída

e chegou ao canal quando o nível da água havia subido. Acabou

colidindo com a viga e causando seu empenamento. A Concepa

trabalha atualmente para restabelecer o balanceamento da ponte e

garantir a confiabilidade do sistema.

Quanto á questão do tempo de espera dos içamentos a Concepa

gestiona junto às autoridades a homologação do canal do Jacuí,

uma vez que 25% das embarcações que passam pela Ponte do

Guaíba podem passar pela ponte do canal do Jacuí. Este canal não

era utilizado, pois durante a construção da travessia um vão caiu e

causou sua obstrução. Uma das obrigações contratuais da concessão

foi desobstruir o canal. Isso foi feito. Só que para utilização do canal

é preciso haver a homologação.

O tempo de operação do vão não se restringe ao tempo de

subida e descida. Envolve também o tempo de passagem da

embarcação e a liberação da pista. O içamento e a descida do

vão demoram em torno de seis minutos. Se você contar o tempo

de operação, que inclui parar os veículos e a passagem das

embarcações esse tempo sobe para 30 minutos até mesmo uma

hora, dependendo do número de embarcações.

Esses fatores contribuem para a necessidade de uma rota

alternativa. A Concepa tem um projeto já com estudos bastante

adiantados para uma nova ponte, que estava ligado á renovação da

concessão. Com o anúncio do Governo Federal de que a nova ponte

fará parte da nova licitação das concessões, essa questão continuará

em aberto.

No entanto, mesmo com uma nova ponte, a Ponte do Guaíba

continuará existindo, até o fim de sua vida útil, lembrando, com as

subidas e descidas do vão móvel, a competência técnica, a ousadia

e a capacidade de criar e superar desafios da engenharia rodoviária e

seus profissionais.

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83Revista Estradas N°16 | Dezembro 2011

janeiro22-26

TRB 91st Annual MeetingWashington - EUA www.trb.org

26-27 Transforming Transportation 2012 Washington - EUA

21-24

Public–Private Partnerships (PPP) DaysGenebra - Suíç[email protected]

11-14

2nd Annual Road Planning, Design and Construction

Doha - Qatarwww.iqpc.com

27-30

Intertraffic 2012

Amsterdam - Holanda www.amsterdam.intertraffic.com

2-4

Brazil Road Expo 2012 e 6° CONINFRA

São Paulo, SP - Brasilwww.brazilroadexpo.com.br - andit.org.br

19-21Hillhead International Quarrying and Recycling Show Buxton, próximo a Manchester - Inglaterra [email protected]

22-27

Conference on Advanced Systems for Public Transport

Santiago - Chilewww.caspt.org/registration

fevereiro

março

abril

2012

2012

2012

2012

julhojunho

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1. Morro Agudo, Santa Catarina 2. Copacabana, Rio de Janeiro3. Kelstein, Alemanha

1 2

3

Geobrugg protege pessoas e infra-estruturas contra as forças da natureza

Tecnologia Suíça de sistemas testados e certifi-cados para proteção de pessoas e infra-estrutu-ras contra queda de rochas, deslizamentos, corridas detríticas e instabilidade de taludes de solo ou rocha. Feitos de arame de aço de alta resistência (1770N/mm2) e com galvanização especial nossos sistemas são alternativas segu-ras e ecologicamente corretas à estruturas de concreto, sendo custo-eficientes e de rápida e prática instalação. • Barreiras Contra Queda de Rochas • Barreiras contra Corridas Detríticas • Barreiras para deslizamentos Superficiais • Estabilização de Taludes • Cortina contra desmoronamentos • Envelopamento de grandes blocos Para um estudo preliminar de solução para o problema ou risco natural que você enfrenta nas obras que atua entre em contato consoco através do e-mail [email protected]

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