revista empoderar n01

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1 emPODERar Discutindo as relações étnico-raciais LARISSA CRISTINA UM ENSAIO FOTOGRÁFICO DA ALUNA DO 2ºD COM MUITA ATITUDE. SOCIEDADE GLOBAL E PRECONCEITO: OS DESAFIOS PARA O SÉCULO XXI QUEBRANDO TABUS: “SOU MULHER, NEGRA E ACADÊMICA” UMA ENTREVISTA COM: KATUCHA BENTO E CLÁUDIA REGINA FILME: “NA QUEBRADA” CO-DIRETOR DO FILME, PAULO EDUARDO VISITA O NEWTON COM DIREITO A PALESTRA E FILME E MAIS: VEJA NOSSAS DICAS DE LIVROS, FILMES, MÚSICA E O QUE ESTÁ ACONTECENDO DE INTERESSANTE NA ESCOLA. EDIÇÃO: 01

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Primeiro número da Revista emPODERar em 2016, realizado a partir de atividades desenvolvidas no ano letivo de 2015. A edição conta com ensaio fotográfico em moda com a aluna Larissa Cristina; artigos dos professores Ivo D. Alves (Sociologia) e Renato S. Lima (História); Entrevistas com a doutoranda Katucha Bento em Sociologia pela University of Leeds (Inglaterra) e Claudia Regina Vieira doutoranda em Educação Especial pela Universidade de São Paulo; Registros de atividades realizadas por alunos e professores; Artigo da aluna Jaqueline falando sobre a visita do Co-diretor do filme " Na Quebrada" Paulo Eduardo; Artigos sobre Candomblé e tatuagem na pele negra escritos por membros da comunidade.

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emPODERarDiscutindo as relações étnico-raciais

LARISSA CRISTINAUM ENSAIO FOTOGRÁFICO DA ALUNA DO 2ºD COM MUITA ATITUDE.

SOCIEDADE GLOBALE PRECONCEITO:OS DESAFIOS PARA O SÉCULO XXI

QUEBRANDO TABUS:“SOU MULHER, NEGRA E ACADÊMICA” UMA ENTREVISTA COM: KATUCHA BENTO E CLÁUDIA REGINA

FILME: “NA QUEBRADA”CO-DIRETOR DO FILME, PAULO EDUARDO VISITA O NEWTON COM DIREITO A PALESTRA E FILME

E MAIS:VEJA NOSSAS DICAS DE LIVROS, FILMES, MÚSICA E O QUE ESTÁ ACONTECENDO DE INTERESSANTE NA ESCOLA.

EDIÇÃO: 01

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3. Editorial

4. Entrevista - Quebrando Tabus

10. Ensaio: Larissa Cristina: Influência da moda africana para juventude de São Paulo.

14. Sociedade Global e Preconceito: Desafios para o século XXI

17. Newton, “Na Quebrada” - Filme

19. Aconteceu no Newton

20. Tatuagem na pele negra

21. Dicas: Filmes e Livros

22. O Candomblé: A religião que conecta o indivíduo à Natureza.

Conselho editorial: Ivo D. Alves, Vânia Santos

e Renato S. Lima

Colaboradores: Paulo Eduardo, Gustavo Barros

Alunos colaboradores: Larissa 2 D, Gabriel Neves 1 F, Nathaly Ventura 1F, Daniel Elias 1F, Aline 2F e Samuel Salles 3D

Fotografia editorial de moda: Dalila Cruz

Modelo: Larissa Cristina - 2D (noturno)

Figurinista:Gil Santos

Produção de moda: Vânia Santos

Designer Gráfico: Denis Atico

Sumário emPODERarDiscutindo as relações étnico-raciais.

Assumi a responsabilidade de escrever um editorial para a primeira edição da Revista emPODERar produzida pelos professores e alunos da E.E. PROF NEWTON ESPÍRI-

TO SANTO AYRES, durante o ano letivo de 2015. Seguindo orientação da Diretoria de

Ensino da Região de Osasco para que se trabalha se a Lei 10.639/03 publicada em março de 2003 na qual o mote e a “Con-

sciência Negra” comemorada no dia 20 de novembro, data da morte de Zumbi dos

Palmares. O trabalho pedagógico propos-to, cujo resultado é esta revista apresen-

tada na data símbolo de uma reflexão que sempre estará em pauta. Foi construído e conduzido de maneira que todos tivessem uma parcela de ensino e aprendizado em

processo contínuo. A revista será eletrôni-ca para que todos tenham acesso livre e democraticamente imperfeito que quere-

mos perfeito. Isabel

Isabel De Fátima Do Carmo Gutierres

Diretora da E.E. Professor Newton Espirito Santo Ayres

EDITORIAL

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entrevistaQuebrando tabus: “Sou mulher, negra e acadêmica”Matéria de: Ivo D. Alves

Após se tornar a primeira negra a ganhar o Emmy de melhor atriz em série dramáti-ca em 67 anos Viola Davis deu visibilidade a uma questão que cerca o mercado de tra-balho (aqui o televisivo ame-ricano) a falta de oportunida-de para mulheres negras. Em seu emocionante discurso, na premiação ela citou a ativista negra Harriet Tubman (1822 — 1913), conhecida como Black Mose:— “Em meus sonhos e visões, eu via uma linha, e do outro lado da linha estavam cam-pos verdes e floridos e lin-das e belas mulheres brancas,

que estendiam os braços para mim ao longo da linha, mas eu não poderia alcançá-las”. Deixem-me dizer uma coisa: a única coisa que separa as mulheres negras qualquer ou-tra pessoa é oportunidade. Nessas entrevistas feita por alunos do período noturno do colégio Newton vamos apre-sentar mulheres que através de muito trabalho tiveram opor-tunidade e ter pessoas que acreditaram em seus traba-lhos, assim vem se destacan-do em suas áreas de atuação no meio acadêmico um lugar elitista, machista e eugenista mostrando que competência, não tem gênero, classe social

ou cor. As entrevistadas são Katu-cha Bento, socióloga formada pela Fundação Escola de So-ciologia e Política de São Pau-lo, Mestra em pela Universi-dade de Barcelona (Espanha) e doutoranda em Sociology and Social Polices University of Leeds (Inglaterra) e Claudia Regina Vieira, pedagoga pela Universidade Estadual de São Paulo, Mestra em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba e doutoranda em Educação Especial pela Universidade de São Paulo, professora na Universidade Federal de São Carlos.

“A meritocracia é uma falácia,

não existe para todos e é muito

facilitada de acordo com a classe social,

raça, gênero e nacionalidade de uma pessoa.”

Katucha Bento

Gabriel 1 F – Quais foram suas dificuldades enfren-tadas em seu caminho para conseguir chegar na posição que você está hoje? Katucha Bento - Gosto de ver as dificuldades como algo positivo em nossas vidas. As dificuldades nos fortalece e ajuda a crescer. Muitas vez-es as dificuldades também envolve os nossos próprios medos. Citarei 3 dificuldades: Ser uma mulher negra pro-veniente da América Latina é um simbolo hiperssexualizado às vistas do povo europeu. A minha experiência na Es-panha, onde estudei o me-strado, me fez viver momen-tos em que fui aliciada para prostituição, sofrer assédio físico e verbal na rua e ser insultada por colegas em um grupo de pesquisa que suge-riam que eu seria uma profis-sional do sexo (ou puta, como preferirem). O ponto mais importante sobre isso não está em ser considerada puta, mas sim da imagem negativa que a sociedade faz deste tipo de profissionais, sobretudo a partir da raça e nacionalidade. Esta dificuldade leva ao se-gundo item: Dificuldade em encontrar trabalho. Em quase três anos vivendo na Espanha, onde a maior parte do tempo vivi em Barcelona, não encon-trei trabalho fixo em nenhum momento. Isso dificultou no andamento dos meus estu-dos, já que tinha que pagar a matrícula do mestrado na Uni-versidade de Barcelona além dos custos de vida (alimen-tação e transporte, por ex-

emplo). Aos poucos encontrei trabalhos pontuais através de amigos e professores. Gosto de acreditar que fiz mais do que 12 trabalhos de Hércules, uma das histórias que me inspira para falarmos de como alcançar os objetivos com a força interior. Tive mais de 20 trabalhos diferentes na minha estadia na Espanha, sendo que dois deles acrescentaram muitas coisas positivas em meu currículo acadêmico: par-ticipei como pesquisadora em um estudo internacional sobre migração na Europa e outro sobre mulheres transsexu-ais na Espanha. Xenofobia. A atitude negativa e violen-ta para com pessoas fora da Espanha, sobretudo fora da Europa Ocidental foi um desafio que encarei no meu dia a dia. Não apenas direta-mente à mim, como contei no tópico 1, mas ver e conviver com a xenofobia direcionada aos nossos amigos é também um sofrimento uma vez que, como também imigrante, pou-co eu podia ajudar naquelas situações. Uma das situações que mais me marcou foi ver um amigo negro senegalês, o Rahou, sendo violentamente abordado pela polícia sem que nada tivesse feito - ele tra-balhava comigo repartindo fly-ers de baladas em uma zona turística da cidade. Foi uma cena horrível e eu não podia intervir naquele momento. Nessa noite esse amigo foi re-vistado mais de 5 vezes pela polícia, com o mesmo tom ameaçador e violento. Horas mais tarde o mesmo policial da primeira abordagem volta

e diz “sinto muito pela for-ma de abordagem, mas você sabe que temos que fazer isso porque a gente da tua cor é mais violenta, né?”. Lembrar disso me corta o coração até hoje. Todas essas dificuldades foram um impacto negati-vo na minha produtividade acadêmica, já que sempre precisei dividir minha atenção dos estudos e nunca pude es-tar imersa completamente na minha carreira acadêmica. Por outro lado, as dificuldades me ensinaram a conhecer mais o mundo e a perseverar para alcançar meus objetivos. Val-orizo cada vez mais o fato de ser uma das poucas mulheres negras que hoje recebe bolsa integral do governo brasileiro para estudar o doutorado na Inglaterra e tenho a convicção que sempre lutarei contra o racismo que até hoje fecha tantas portas de oportuni-dades para a população negra no mundo todo.

Nathaly 1F – Mesmo que o mundo tenha mudado, vocês acham que o papel da mulher negra na socie-dade ainda é destinado à escravidão, pobreza entre outros preconceitos? Katucha - Acho que o pa-pel da mulher negra está ainda muito relacionado aos esteriótipos da escravidão, dentro das expectativas soci-ais da empregada doméstica (sobretudo aquelas que vivem dentro da casa dos patrões, dando um novo contexto de escravização, por ter um servente individual ao seu dispor), cozinheira (e não

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chefs!), cuidadoras (e não en-fermeiras ou médicas). Entre-tanto, o feminismo negro vem há anos denunciando essas visões como algo reducionista que essencializa a mulher ne-gra como algo menor do que ela realmente é. Acredito que essas reivindicações irão con-tribuir muito para trazer um novo olhar à representação da mulher negra na sociedade.

Daniel 1F - O que vocês acham das emissoras e programas de televisão e a relação com a comuni-dade negra?Katucha - Os programas de televisão brasileiros não se comprometem a ser educati-vos ou passar uma mensagem positiva sobre a participação cidadã da comunidade negra no Brasil. Infelizmente repro-duzem a imagem que men-cionava anteriormente: “es-sencializada e reduzida” que localiza o negro sempre na favela, fazendo ações ilícitas e violentas. Quando finalmente estão presentes na trama de uma novela, seus papéis são pequenos, pontuais e rela-cionados à algum estereótipo negativo endereçado à pop-ulação negra. Isso fragiliza a os processos de socialização, auto-estima e opiniões em relação aos negros, sobretudo porque sabemos da influência que a televisão exerce so-bre nossas formas de agir e pensar. Por enquanto temos muito caminho pela frente para que tenhamos um canal aberto que mostre formas diferentes e positivas em que o negro pode atuar.

Gisele 1 Eja – Nesse período em que vocês estudaram, se formaram e hoje exercendo suas profissões, qual foi a maior atitude preconceituo-sa qe tiveram contra vocês? Como vocês reagiram? Katucha - A maior atitude preconceituosa contra mim foi enquanto vivia na Espanha e trabalhava distribuindo flyers com o Rahou e em uma das minhas voltas pelo quarteirão da praça principal de onde trabalhávamos, um jovem de cerca de 25 anos me aborda com um copo de cerveja na mão e pergunta de onde eu sou. Eu falo que sou brasile-ira, e como já estava acos-tumada com o ambiente de festas da região não temi em nenhum momento. De re-pente ele agarra o meu bum-bum e diz “hummm negrita!”. Pela invasão do meu corpo, por ver meu corpo como um objeto e por fazer tudo isso com base na cor da minha pele, tenho essa experiência como algo muito grave, não apenas para a minha vida, mas a de todas as mulheres negras, cujas potencialidades são negligenciadas em nome do tamanho de seus bum-buns, seios, quadril etc. A minha reação foi de gritar porque eu sabia que havia muitos vendedores ambulan-tes por perto que logo apare-ceram e amedrontaram esse tarado, que saiu rapidamente. Esse evento não me impediu e não me impede em sair sozinha à noite porque estou consciente que a população precisa ser educada com a informação de que mulher

sozinha, com a roupa que for, não significa convites para que os homens venham des-frutar e saciar seus desejos.Aline 2F – O que vocês pensam sobre os dias 13 de maio e 20 de novem-bro? Katucha - O dia 13 de maio de 1888 foi um dia muito importante que comemora-mos a “Lei Áurea” ou seja, a abolição da escravatura. Uma data que tem muito a ver com as relações de mercado entre Portugal e Inglaterra, posicio-namento político internacio-nal, entre outros fatores que mudaram a forma de produzir e de se socializar no Brasil. Sabemos que é uma data que simbolicamente representa a nossa luta constante contra a escravidão dos povos não brancos no Brasil, sobretu-do do povo negro. Digo isso porque o dia 13 de maio aju-da a lembrar que a escravidão não pode ser repetida, mas infelizmente encontra-se grupos de pessoas que tem sido escravizadas de forma sistemática em todo o Brasil. Atualmente isso tem se torna-do um problema que vem de mãos dadas com o racismo, que é a xenofobia contra os povos vizinhos da América Latina. Um exemplo disso é o grupo de bolivianos sendo es-cravizados na região do Brás, em São Paulo. Seus traços indígenas e suas condições de imigrantes, muitas vezes irregulares, “justifica” o rac-ismo e a xenofobia que é tão perversa e corrói a sustent-abilidade de qualquer socie-dade. Portanto, essa data é

de extrema importância para a memória do povo brasileiro: para não repetir, para super-ar e para nunca esquecer o que a escravatura foi e como prejudica a nossa nação. No caso do dia 20 de novembro, trata-se também de uma data relacionada à memória da população negra. No ano de 1695 Zumbi dos Palmares foi violentamente assassinado, degolado e sua cabeça foi exposta na praça pública de Olinda para servir de exemplo aos escravos “fujões”. Zumbi foi um grande líder político, escravizado, que fugiu dos seus senhores para formar uma grande comunidade quilombola sustentável, de pessoas escravizadas livres do Brasil. Além de produzir o que consumiam, também tinham uma forte técnica de segu-rança e organização baseadas na cultura africana (sobretudo Bantu - uma das etnias africa-nas que foram sequestradas e escravizadas durante o perío-do colonial). Celebrar essa data é celebrar a importância de resistir e persistir na luta contra o racismo e a todas as formas de exclusão social determinada pela raça. 20 de novembro é dia do Zumbi que vive dentro de cada um de nós: negros, brancos, amare-los, vermelhos que acreditam na justiça social a partir do fim do racismo. Samuel 3D – Vocês com todo o seu esforço para entrar na universidade e se solidificar no mercado de trabalho sentem - se

confortável com o sistema de cotas?Katucha - Sim. O fato de eu ser uma mulher negra, estu-dante de doutorado com bolsa de estudos que lutei para che-gar até aqui não significa que basta lutar para conseguir. A meritocracia é uma falácia, não existe para todos e é mui-to facilitada de acordo com a classe social, raça, gênero e nacionalidade de uma pessoa. Dito isso, explico um pouco o que é o sistema de cotas para que eu possa explicar o motivo pelo qual sou a favor. O sistema de cotas é um dos projetos de lei que compõe as AÇÕES AFIRMATI-VAS, ou seja, é apenas uma lei das várias que procuram ser medidas compensatórias pelo racismo que a população negra sofreu e sofre até hoje. As propostas de Ação Afirma-tivas são: estabelecer cursos de história sobre a cultura e história afro-brasileira nas escolas de ensino fundamen-tal e médio de todo o país, que resultou na lei 10.639/03; reconhecimento de terras quilombolas; livre atividade de religiões afro-brasileiras como a Umbanda e o Candomblé; políticas de saúde pública para a população negra, por exemplo a facilitação do processo de diagnóstico da anemia falciforme que em sua maioria aparece na população negra; cotas laborais para negros, ou seja, ajudar na inserção de negros no mer-cado de trabalho; cotas raci-ais nas universidades. Estes

tópicos estão presentes no projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados para estabelecer leis de Ações Afir-mativas no Brasil. Há muitas críticas positivas e negativas sobre a redação do documen-to, mas é preciso ver como parte de uma vitória da longa luta do movimento negro no Brasil. Não interpreto como projetos que irão acabar com o racismo. Isso depende das pessoas fazerem sua parte, mas minimiza as diferenças sociais em que o negro é inferiorizado e cria oportuni-dades para que alcance uma maior mobilidade social. As cotas raciais nada mais são do que parte de um projeto de compensação para a pop-ulação negra que luta para o reconhecimento da exclusão social promovida com base em raça no Brasil. Apoio todas as políticas sociais que recon-heçam o racismo como uma grave “doença” no nosso país. Uma forma de tratar é a lei de cotas raciais na universidade. Precisamos reconhecer o problema, precisamos procu-rar saídas para que todos ten-ham oportunidades de viver em parâmetros de igualdade, justiça e qualidade de vida. A entrada na universidade por todas as pessoas é uma forma de promover isso afinal de contas, todos tem o direito de ser diferente sem precisar pagar o preço da discrimi-nação e exclusão social todos os dias.

¹ Mestre em Educação e Saúde, Sociólogo e cursando licenciatura em geografia Professor de sociologia.Alunos colaboradores Gabriel Neves 1 F, Nathaly Ventura 1F, Daniel Elias 1F, Aline 2F e Samuel Salles 3D

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“Vivemos num país preconceituoso e a maioria da população negra é a pobre então as pessoas já pressupõem nossos lugares sociais”

Claudia Regina Vieira

Gabriel 1 F – Quais foram suas dificuldades enfren-tadas em seu caminho para conseguir chegar na posição que você está hoje?Claudia Regina - Acredito que as dificuldades são as enfrentadas pela maioria das pessoas, a econômica princi-palmente porque como nunca tive muito dinheiro sempre precisei trabalhar para conse-guir o que desejava, algumas

vezes foi difícil pagar cursos de especialização, bancar viagens para aperfeiçoamen-to, mas comecei a trabalhar com 15 anos e estudava a noite, enfim foi preciso muita perseverança para continuar. Muitas vezes a vontade foi de desistir mas sempre pude contar com a presença da minha família, principalmente na figura da minha mãe que sempre acreditou em mim.Nathaly 1F – Mesmo que

o mundo tenha muda-do, vocês acham que o papel da mulher negra na sociedade ainda é destinado à escravidão, pobreza entre outros preconceitos?Claudia Regina - A mulher negra ainda é vista como “menos”. Nossa imagem está ligada diretamente a limpeza de casa, cuidado dos filhos e submissão, quando não é o corpo per-feito da mulata que samba. No meio acadêmico onde

estou vejo pequenas conquis-tas, mas ainda é pequena, a gente precisa provar a todo momento que somos tão capazes como qualquer outra pessoa, o olhar para a gente é sempre de desconfiança ou as vezes como de neces-sidade de uma prova para saber se realmente somos capazes. Vivemos num país preconceituoso e a maioria da população negra é a pobre

então as pessoas já pres-supõe nossos lugares sociais. Outro dia no elevador do prédio onde moro, um mora-dor que estava no elevador onde entrei me deu um cartão para entregar para minha patroa, quando eu disse a ele que eu morava no prédio e não trabalhava nele ele ficou muito sem graça e me deu o cartão mesmo assim, me dizendo que se precisasse era só ligar para ele (corretor de imóveis), mas ficou muito desconfortável.Daniel 1F - O que vocês acham das emissoras e programas de televisão e a relação com a comuni-dade negra? Claudia Regina: Acho que na maioria dos pro-gramas a imagem do negro é estereotipada, estamos nos mesmos lugares (emprega-das, serviçais, gostosas) os homens são (os bem dotados, garanhões, ladrões, malan-dros, rappers ou sambistas) quando aparecemos como empresários, ricos, ou re-cebemos herança de algum patrão bonzinho ou a ideia é passar a “superação”, como se estivesse unicamente nas nossas mãos uma mudança sem depender da mudança do nosso entorno e das ide-ias criadas ao nosso respeito. Os lugares ainda estão muito pré-definidos e a representa-tividade é muito pequena. Em alguns anúncios aparecemos como cota, mas não somos os bebês limpinhos, mas os com assadura, não somos os sadi-os, mas os pobres e doentes dos programas governamen-

tais.Gisele 1 Eja – Nesse perío-do em que vocês estuda-ram, se formaram e hoje exercendo suas profissões, qual foi a maior atitude preconceituosa qe tiveram contra vocês? Como vocês reagiram? Claudia Regina: No meu ambiente de trabalho acredito que a maior atitude precon-ceituosa foi desacreditarem da minha capacidade, mas sempre tenho uma atitude muito positiva e realizo o meu trabalho com garra. Gosto de-mais do que faço e ensinar é muito bom, eu aprendo todos os dias sobre várias coisas. Não consigo me lembrar de algo muito pontual, mas em congressos, seminários impor-tantes, às vezes vejo a cara de espanto de algumas pes-soas.Aline 2F – O que vocês pensam sobre os dias 13 de maio e 20 de novem-bro?Claudia Regina: Apenas datas, parece que ser negro é permitido nestes dois dias. As pessoas “discutem” precon-ceito, oportunidades, pensam sobre a história nestes dois dias e apagam o que acontece nos outros 363 dias do ano, quando oprimimos alguns alunos pela cor da pele, pelo cabelo, nestes dois dias as pessoas acham lindo os cabe-los, elogiam a comunidade e depois voltam a vida hipócrita de sempre, fazendo as mes-mas coisas. Samuel 3D – Vocês com todo o seu esforço para entrar na universidade e

se solidificar no mercado de trabalho sentem - se confortável com o sistema de cotas?Claudia Regina: Eu acredito que as cotas são necessárias e penso como um sistema provisório, porque a popu-lação negra tem sim mais dificuldades para continuar os estudos e empreender esforços para isso, não se trata de esforço pessoal, mas condições. Socialmente falan-do as cotas são necessárias para que as pessoas possam acessar o ensino superior e conseguir organizar uma ma-neira para mudar a condição, penso que em alguns muitos anos isso pode mudar, quan-do os negros tiverem de fato uma condição de igualdade, já vivi muitas discussões em torno deste tema e algumas pessoas dizem que as cotas deveriam ser para os pobres, eu acredito que deve ser para os negros mesmo porque é uma reparação histórica, as perguntas que vocês me fizeram até agora prova o quanto nossa sociedade ainda discrimina a população negra e isso é uma herança históri-ca que precisa ser revista, as cotas são uma das soluções encontradas para que isso seja realmente reparado.

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Ensaio:Influência da moda africana para juventude de São Paulo.

LARISSA CRISTINAUM ENSAIO FOTOGRÁFICO DA ALUNACOM MUITA ATITUDE.

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Ensaio:Influência da moda africana para juventude de São Paulo.

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V Vivemos em uma socie-dade com ampla difusão de informações, inúmeros canais virtuais de relacionamento, uma variação cada vez maior de ferra-mentas digitais que nos levam por uma miríade de visões dif-erentes de um mes-mo tema. Nunca na história de humani-dade nos aproxi-mamos tanto da dimensão global de fatos, acontecimentos, opiniões, visões de mundo e profusão de ideias. Um mundo que já foi encoberto de fantasias e impressões fantásticas sobre povos e territórios distantes pela geografia e cultura, hoje é descrito com novos termos, como: aldeia global, socie-

dade digital, mundo global, entre outros. O século XXI não apenas carrega a her-ança da diversidade histórica e cultural de povos, culturas,

nações e nacionalidades, como integra, através de uma rede online de interações durante 24 horas por dia.Porém este “Novo Mundo” não se concretiza na di-mensão social da forma que se põe, vivemos com grandes desafios, como transitar

entre um universo vasto de informações e a formação do conhecimento. Existe um abismo que tem dimensões históricas e sociais que de-

mandam para o século XXI um papel cada vez mais impor-tante para ed-ucação como mediação e superação de problemas que estão postos. A informação massificada, monopoliza-da e que su-perficializa os fenômenos sociais em apenas fatos midiáticos, lei-turas rasas da

realidade, descrições mol-dadas em valores imutáveis, em verdades absolutas, em impressões carregadas de estereótipos acabam fazendo dos meios de interação um transmissor de discursos e visões de mundo carregados de preconceitos, intolerância,

Desafios para o Século XXIPor: Renato Silva Lima

Sociedade Global e Preconceito:

xenofobia e diversas formas de discriminação. Isto se dá porque ao mesmo tempo em que vivemos numa “al-deia global” de informações e interações não superamos graves problemas históricos que se normatizaram ao lon-go do tempo como naturais. Uma sociedade que deveria aliar a diversidade nos canais de informação com a diver-sidade étnica, cultural ou religiosa, acaba segregando, através de padrões deten-tores de uma única verdade, que se mantêm apenas pelo discurso que padroniza e separa. Vejamos as raízes históricas dos problemas que precisamos enfrentar no Brasil:O Brasil chegou ao século XXI como uma nação con-struída por uma diversidade racial formada principalmente por três matrizes étnicas: Índios, Negros e Europeus. Esta integração sempre foi conflituosa, durante grande parte de sua história índios e negros foram dominados, explorados, subjugados pelo colonizador dominante. Mais de 80% dos grupos indígenas nativos foram exterminados, negros advindos de diversas partes do continente africano foram escravizados e tiveram sua cultura e forma de vida afetadas pela imposição do colonizador. Durante todo o período colonial a formação jesuítica impôs sua crença. Os negros foram inferioriza-dos e os índios romantizados pela literatura do século XIX. Durante todo estes períodos existiram formas de re-

sistência destes grupos que deixavam clara a tensão de uma sociedade permeada de contradições.Chegamos ao período re-publicano com valores de Nação exportados da Euro-pa e arraigados de ideolo-gias de raça e interiorização do negro na sociedade. O preconceito tinha embasa-mento cientifico e também uma posição histórica que herdada da escravidão. Te-oria de embranquecimento, darwinismo social, Eugênia e o mito da democracia ra-cial. A posição em serviços subalternos levava a inferi-orização econômica e social afastando este grupo das oportunidades advindas com a formação da República. A perseguição da cultura afro-brasileira era caso de polícia: o samba, a capoei-ra e as religiões de matrizes africanas como a Umbanda e o Candomblé eram perse-guidos e criminalizados. Durante todo este período os movimentos negros se or-ganizaram para lutar contra o preconceito e a posição social que lhe eram impostas, mesmo após a Proclamação da República em 1889, es-tes movimentos organizados criaram uma imprensa rep-resentativa e combativa com jornais como: O Mulato, O Menelick, A Rua, A Liberdade. Em 1930 foi criada a FNB ( Frente Negra Brasileira) com mais de 20 mil membros, em 1940 foi criado o Teatro Experimental Negro; terreiro de Umbanda tinha seu papel crucial na manutenção, rep-

resentação e difusão cultural, religiosa e simbólica da cul-tura afro-brasileira e artistas com seus talentos ampliavam sua posição no protagonismo da cultura nacional ( Carto-la, Ismael Silva, Pixinguinha, entre outros.).Chegamos ao século XXI diante de uma sociedade com diversos instrumentos de interação. Em uma so-ciedade construída a partir de sua diversidade, porém uma situação que abarca a maioria de sua população e não podem ser ignorada ou harmonizada por discursos de condições de igualdade, meritocracia, ou mito do racismo. Existe uma história que precisa a condição da população negro na so-ciedade atual e a contínua posição de luta por igual-dade de condições. O ensi-no da cultura afro-brasileira e africana na maioria das vezes é lembrada nas aulas de História com o tema da escravidão negra africana, a escravidão esta vinculada a uma condição de trabalho. Nos equivocamos, pois nin-guém é escravo, as pessoas foram e são escravizadas, este termo acaba naturali-zando uma condição. É condição fundamental de formação do conheci-mento do cidadão que as informações se tornem con-hecimento, que se tornem conceitos contextualizados para que se criem instrumen-tos de leitura da realidade, que mesmo diante de con-quistas é a maioria negra e jovem que mais são vítimas

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de morte por arma de fogo no Brasil, que ainda existe um abismo salarial e de oportunidade de empregos entre negros e brancos, que os bancos das faculdades do Brasil é representado por uma minoria negra e que busca cada vez mais mu-dar este quadro nos últimos tempos, que entendam a importância da Lei de Co-tas Raciais como direito de equiparação histórica para condições igualitárias, que as religiões de matrizes af-ricanas cotidianamente são vestidas por estereótipos preconceituosos e persegui-

das, que existe Racismo e ele é muitas vezes violento e segregador, e que o conhec-imento é o maior combate ao que nos impede de vivermos em um mundo estreitado pela intolerância.A lei 10.639/09 ( advinda das lutas e pressão politica dos movimentos negros no Brasil) propõe novas diretrizes cur-riculares para o estudo da história e cultura afrobrasilei-ra; valorizando o pensamento de importantes intelectuais negros brasileiros, a cultu-ra e as religiões de matrizes africanas. É fundamental que a educação se ponha como

protagonista formativa do conhecimento que valoriza a diversidade, porém que dif-erencie a condição de cada um com sua especificidade histórica, cultural, social e in-dividual, só assim estaremos preparados para esta “Aldeia Global”.

“Na Quebrada”.Aluna Jaqueline

No dia 08 de outubro de 2015, nós alunos da escola E.E Newton Espirito Santo Ayres fomos surpreendidos

com uma visita ilustre em nossa escola, Paulo Eduardo codiretor do filme “Na Que-brada”. Ele foi passar o filme

para nós assistirmos e tam-bém ministrar uma palestra para nós. O filme é baseado em fatos reais e mostra a tra-jetória de um grupo de jov-ens que moram na periferia, como Junior que é talentoso em consertar televisões, Zeca que presenciou uma chacina, Gerson cujo pai esta preso desde de que nasceu, Mônica que tinha seus pais e irmão cegos e Joana que sonha com a mãe desconhecida. Todos esses jovens partilham de sonhos mas não sonhos iguais como Zeca que queria ser um cineas-ta, Gerson queria ter uma confecção de roupas etc. O filme foca nos sonhos desses jovens e como o local, seu passado e a vida de seus pais podem influenciar seu futuro. Na palestra que Paulo ministrou ele contou sobre como foi feito o filme, como foi a escolha dos atores etc., mas o que todos não sabía-mos era que a historia dele foi representada no filme e é muito interessante. O mais legal de toda a palestra é que quando ele estava con-tando sua história muitas pessoas se identificaram com ela, como por exemplo ele

Newton,

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tirar notas baixas e morar na periferia. Particularmente a ida dele até nossa escola foi muito importante, pois par-tilho do mesmo sonho que ele, que é ser uma cineasta, e

ver quantas dificuldades ele enfrentou mas não desistiu, hoje seu sonho foi realizado me inspirou muito. Agradeço a Professora Vânia Santos que o levou até nossa escola para ministrar

essa palestra e agradeço ao Paulo Eduardo por me mostrar que devemos acred-itar e nunca desistir de nos-sos sonhos.

Foto: com o co-diretor Paulo Eduardo do filme e alunos do Newton.

Foto com o co-diretor Paulo Eduardo, professora Vânia, de Artes e alunos do colégio Newton.

Aconteceu

Atividade desenvolvida na aula de Arte da Professora Vânia

Santos,2D/E/G. com a propos-ta de pesquisar as diversas

manifestações da Cultura afro brasileira e africana. A apre-

sentação contou ainda com a participação do educador convi-

dado Nitiren Queiroz Castro.

Palestra com o Co-diretor do filme “Na Quebrada” Paulo Eduardo com a turma do en-sino médio matutino no dia 8 de Outubro de 2015.

Nas aulas de Geografia Prof. Maria Euda Barros, trabalho

:Revelar toda luta do povo ne-gro para garantir seu espaço na sociedade ,revista Criada

por alunos do 1°, 2° e 3°Ano

no Newton

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Foto: MC Soffia, rapper Paulista, 11 anos.A jovem rapper vem chamando a atenção para as músicas com temas atuais da juven-tude negra, a música: “ Menina Pretinha” é um ótimo exemplo.

Cd. Tributo a Nina Simone, vários inter-pretes cantando músicas que ficaram famosas na voz dessa grande cantora, atenção para a música Feeling Good can-tada pela Ms. Lauryn Hill.

Livro

Um livro da autora Chi-mamanda Ngozi Adichie

que parte de uma história de amor para debat-

er questões prementes e universais como imi-

gração, preconceito racial e desigualdade de gêne-

ro.

Filme Filme “Na Quebrada” baseado em fatos reais, o filme segue a trajetória de um grupo de jovens de classe baixa, como Júnior, talentoso no conserto de televisões, Zeca, que testemunhou uma chacina, Joana, garota que sonha com a mãe desconhecida e Gerson, cujo pai está na prisão desde que nasceu. Entre histórias de perdas e violência, eles descobrem uma nova maneira de ex-pressar as suas ideias e as suas emoções

DICASTATUAGEMNA PELE NEGRA.

A tatuagem em pele negra é um pouco mais difícil de pigmentar, mas não é impossível.

A pele negra contém mais melanina e a pele age como se fosse um “filtro” escondendo alguns pigmentos mais claros que a pele.

Não é toda a cor que fica boa na pele negra. Dependendo do seu tom de pele, algumas cores podem ficar boas, outras não. Recomen-da-se cores mais fortes como: Vermelho, azuis, violeta e o preto. Cores mais claras podem até ficar boas dependendo da tonalidade de sua pele.

Você deve pesquisar se na sua família já houve algum caso de quelóides, pois a pele negra pode ser bem propensa a ter essa pequena complicação. Uma visita ao dermatologista sempre é legal nestes casos de dúvidas.

ART EMPIREAvenida dos Autonomistas, n 500, fone 11-3447-3070 (Dentro do Top Shop - Terminal de ônibus da Vila Yara/Osasco-SP - setor das lojas)FACEBOOK:www.facebook.com/artempiretattoostudio

Essas dicas são do Tatuador Denis Ático, que trabalha no estúdio Art Empire Tattoo em Osasco. Para maiores informações, entre em contato com o estúdio:

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A religião que conecta o indivíduo à Natureza.

Pintura da aluna Rosilene do 1B

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.” (N. Mandela)

O candomblé é uma religião de resistência, em sua in-tegralidade, isso porque já nasceu no afã de acolher o povo ne-gro, em forma de sociedade, para tirá-lo da vilania imposta pela sociedade cristã e branca que gover-nava o Brasil. Vindos de sua terra natal, a África, os escraviza-dos encontraram um locus diferenciado, com cultura difer-enciada e, consi-go mesmo, traziam apenas, porém muito significante, a sabe-doria. Em meio ao sofrimento, torturas físicas e emocionais e, à sucessivas ten-tativas de deletar o seu cerne, o Negro construiu uma cultu-ra, que em terreno diferen-ciado ganha novas formas e assim, se redescobre nos no-vos domínios. É por volta de 200 anos após sua chegada que nasce o Candomblé, uma religião cujo principal objeti-vo é reconectar os indivídu-os aos seus ancestrais e à

Natureza. Com objetivo de libertar seus irmãos de cor, um negro juntava dinheiro e

bancava a compra de outro, formavam assim uma socie-dade que, em cadeia, pagava pela liberdade sucessiva de, cada vez mais, irmãos. Dessa forma, percebemos que os africanos e seus descen-dentes jamais foram sub-

metidos intelectualmente e aceitaram sua condição de escravizados, como a história

insiste em nos mostrar nas escolas. Assim, com o cresci-mento sucessivo da união de libertos, Iyá Nassò Oká, princesa de Oyó funda a re-ligião no Brasil, junto com Iyá Adetá e Iya Akalá, nos fundos da Igreja da Barroquinha (hoje extinta). Na-sce assim o terreiro de candomblé, cujo nome exemplifica o lugar (um terreno de fundo), pois, a so-ciedade cristã não poderia perceber as manifestações da religiosidade ne-gra exercidas, ou seriam mortos por crimes de bruxaria,

ou presos, pois o exer-cício da macumba foi apenas legalizado após o Gover-no de Vargas no Brasil. O fato de nascer nos fundos de uma igreja, revela o fru-to do sincretismo religioso tão evidente dentro dos Ilês (terreiros) e também a plural-

POR: GUSTAVO BARROS

O CANDOMBLÉ: idade de crença que o brasileiro tem.

Por questões militares, invasão da polícia, problemáticas cristãs e sociais, por cau-sa ódio aos negros e prenoção às suas tradições, o terreiro da Barroquinha fora desconstituído. Iyá Nassò retorna à África, porém deixa sua filha brasileira Marcelina de Jesus, conhecida no meio religioso como Obatossiy, que funda, com apoio legal e proteção de toda uma comunidade Negra, o primeiro terreiro oficial de Candomblé de nome Ilê Axé Iya Nassô Oká, ou simples-mente, Casa Branca do Engenho Velho. Até hoje, no mesmo lugar e uma das mais res-peitadas instituições da religiosidade negra no mundo.

Obviamente, a luta negra foi árdua, houveram assassinatos, incriminações e toda a de-manda de processos possíveis para que não se desenvolvesse a cultura no país, histori-adores chegavam a admitir biologicamente que, logo o país se embranqueceria. Que a questão da negritude seria temporária, pens-amento este que minou no mundo inteiro, com objetivo de deslustrar a capacidade dos africanos e seus descendentes. Mas, apesar de toda contraposição, o tempo mostrou que a sabedoria do africano e dos afro-brasile-iros se construía de modo sem igual, a ponto de enaltecer-se aqui o que há de mais bril-

hante nas tradições, que hoje atraem bran-cos, amarelos e toda a gama de populações.

O candomblé (casa de refugiados) hoje é a casa da ligação do homem consigo mesmo. O fogo, a água, o vento, a terra são ener-gias que vivem dentro de cada indivíduo. A folha, a flor, a árvore, os rios e os mares são magnificas formações da natureza Divina que estabelecem conexão com todos os seres viventes. A natureza, a mata, a pedreira, são exemplos de espaços sagrados dos Orixás. Orixá não é um espíritos, ou demônios, como sonha a vã filosofia por ai a fora. Orixá é o próprio vento, trovão, paz, equilíbrio, amor, busca de prosperidade.

Não há demônios, não há adoração ao que não é divino. O candomblé não tem espaço para o que não encanta, sublima e eleva, não é religião de conflitos e maniqueísmos, esses aspectos são cristãos, assim como não há pecado e culpa. O candomblé é o paraíso da paz interior, da conexão do homem consi-go mesmo e com o espaço que está em sua volta. Os orixás são os deuses, criados por Deus (ao qual denominamos Oba N’la – Sen-hor dos Altos). Os orixás são nossos pais, irmãos, amigos e conselheiros. São acima de tudo os braços que nos acolhem.

Festa do Pilão de Oxalá - desenho de Carybé da série Iconografia dos Deuses Africanos.

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