responsabilidade civil resumo

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  Secção III  FONTES DAS OBRIGAÇÕES BASEADAS NO PRINCÍPIO DO RESSARCIMENO DOS DANOS A responsabilidade civil como fonte das obrigações. Classificações de responsabilidade civil. Denomina-se responsabilidade civil o conjunto de factos que dão origem à obrigação de indemnizar os danos sofridos por outrem. A responsabilidade civil consiste, por isso, numa fonte de obrigações baseada no princípio do ressarcimento dos danos. A responsabilidade civil pode ser classificada em responsabilidade por culpa, pelo risco ou pelo sacrifício, consoante o título de imputação a que recorra para transferir o dano da esfera do lesado por outrem. Na responsabilidade por culpa, que é a regra geral (483.º/1), a responsabilização do agente pressupõe um juízo moral da sua conduta, que leve a efectuar uma censura ao seu comportamento. Na responsabilidade pelo risco, admitida só nos casos previstos na lei (483.º/2 e 499.º e ss.), prescinde-se desse juízo de desvalor, efectuando-se a imputação de acordo com critérios objectivos de distribuição do risco. Já na responsabilidade pelo sacrifício, também se prescinde de um  juízo de desvalor da conduta do agente, sendo a imputação base ada numa compensação ao lesado, justificada pelo sacrifício suportado. Esta classificação é importante para esclarecer as funções da responsabilidade civil. No caso da responsabilidade pelo sacrifício é manifesto que a responsabilidade desempenha exclusivamente funções de reparação do dano. Tal acontece também primordialmente na responsabilidade pelo risco que, no entanto, desempenha ainda limitadamente funções acessórias de prevenção. No caso de responsabilidade por culpa, além da função principal de reparação do dano, existe também uma clara função preventiva e punitiva, a qual se demonstra pela diminuição da indemnização em caso de negligência (494.º); pela repartição da indemnização em função da culpa dos agentes, em caso de pluralidade de responsáveis (497.º/2); pela redução ou exclusão da indemnização em caso de culpa do lesado (art 570.º), e pela normal irrelevância da causa virtual na responsabilidade civil. A responsabilidade civil pode ainda ser classificada em responsabilidade civil delitual (ou extracontratual) e responsabilidade obrigacional (ou contratual). Na responsabilidade delitual está em causa a violação de deveres genéricos de respeito, de normas gerais destinadas à protecção doutrem, ou à prática de delituais específicos. Já a responsabilidade obrigacional resulta do incumprimento das obrigações. O nosso CC tratou separadamente estas duas categorias de responsabilidade nos arts 483.º e ss. e 798.º e ss., ainda que tenha sujeitado a obrigação de indemnização delas resultante a um regime unitário (arts 562.º e ss.). Mantêm-se, no entanto, diferenças menores entre os dois regimes: a) Presume-se a culpa na responsabilidade obrigacional (799.º/1), mas não na delitual (487.º/1); b) A responsabilidade delitual tem prazos para prescrição mais curtos (498.º), enquanto a responsabilidade obrigacional é sujeita aos prazos de prescrição gerais das obrigações (309.º e ss.); c) É diferente o regime de responsabilidade por actos de terceiro (art 500.º e 800.º); d) Em caso de pluralidade de responsáveis na responsabilidade delitual o regime aplicável é o da solidariedade (497.º), ao passo que na responsabilidade obrigacional tal só acontecerá se esse regime vigorar para a obrigação incumprida; Natureza responsabilidade delitual da obrigacional  pág. 269. A responsabilidade civil por factos ilícitos.

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  • Seco III FONTES DAS OBRIGAES BASEADAS NO PRINCPIO DO RESSARCIMENO

    DOS DANOS

    A responsabilidade civil como fonte das obrigaes. Classificaes de responsabilidade civil.

    Denomina-se responsabilidade civil o conjunto de factos que do origem obrigao de indemnizar os danos

    sofridos por outrem. A responsabilidade civil consiste, por isso, numa fonte de obrigaes baseada no princpio do

    ressarcimento dos danos.

    A responsabilidade civil pode ser classificada em responsabilidade por culpa, pelo risco ou pelo sacrifcio,

    consoante o ttulo de imputao a que recorra para transferir o dano da esfera do lesado por outrem. Na

    responsabilidade por culpa, que a regra geral (483./1), a responsabilizao do agente pressupe um juzo moral da

    sua conduta, que leve a efectuar uma censura ao seu comportamento. Na responsabilidade pelo risco, admitida s nos

    casos previstos na lei (483./2 e 499. e ss.), prescinde-se desse juzo de desvalor, efectuando-se a imputao de acordo

    com critrios objectivos de distribuio do risco. J na responsabilidade pelo sacrifcio, tambm se prescinde de um

    juzo de desvalor da conduta do agente, sendo a imputao baseada numa compensao ao lesado, justificada pelo

    sacrifcio suportado.

    Esta classificao importante para esclarecer as funes da responsabilidade civil. No caso da responsabilidade

    pelo sacrifcio manifesto que a responsabilidade desempenha exclusivamente funes de reparao do dano. Tal

    acontece tambm primordialmente na responsabilidade pelo risco que, no entanto, desempenha ainda limitadamente

    funes acessrias de preveno. No caso de responsabilidade por culpa, alm da funo principal de reparao do

    dano, existe tambm uma clara funo preventiva e punitiva, a qual se demonstra pela diminuio da indemnizao

    em caso de negligncia (494.); pela repartio da indemnizao em funo da culpa dos agentes, em caso de pluralidade

    de responsveis (497./2); pela reduo ou excluso da indemnizao em caso de culpa do lesado (art 570.), e pela

    normal irrelevncia da causa virtual na responsabilidade civil.

    A responsabilidade civil pode ainda ser classificada em responsabilidade civil delitual (ou extracontratual) e

    responsabilidade obrigacional (ou contratual). Na responsabilidade delitual est em causa a violao de deveres

    genricos de respeito, de normas gerais destinadas proteco doutrem, ou prtica de delituais especficos. J a

    responsabilidade obrigacional resulta do incumprimento das obrigaes. O nosso CC tratou separadamente estas duas

    categorias de responsabilidade nos arts 483. e ss. e 798. e ss., ainda que tenha sujeitado a obrigao de indemnizao

    delas resultante a um regime unitrio (arts 562. e ss.).

    Mantm-se, no entanto, diferenas menores entre os dois regimes:

    a) Presume-se a culpa na responsabilidade obrigacional (799./1), mas no na delitual (487./1);

    b) A responsabilidade delitual tem prazos para prescrio mais curtos (498.), enquanto a responsabilidade obrigacional

    sujeita aos prazos de prescrio gerais das obrigaes (309. e ss.);

    c) diferente o regime de responsabilidade por actos de terceiro (art 500. e 800.);

    d) Em caso de pluralidade de responsveis na responsabilidade delitual o regime aplicvel o da solidariedade (497.),

    ao passo que na responsabilidade obrigacional tal s acontecer se esse regime vigorar para a obrigao incumprida;

    Natureza responsabilidade delitual da obrigacional pg. 269.

    A responsabilidade civil por factos ilcitos.

  • A responsabilidade delitual

    Pressupostos genricos da responsabilidade delitual

    O art. 483. vem estabelecer um clusula geral de responsabilidade civil subjectiva, fazendo depender a

    constituio da obrigao de indemnizao da existncia de uma conduta do agente (facto voluntrio), a qual represente

    a violao de um dever imposto pela ordem jurdica (ilicitude), sendo o agente censurvel (culpa), a qual tenha

    provocado danos (dano), que sejam consequncia dessa conduta (nexo de causalidade entre o facto e o dano).

    Pressupostos da responsabilidade civil: Facto voluntrio do agente; ilicitude; culpa; dano; nexo de causalidade

    entre o facto e o dano;

    O facto voluntrio do lesante

    Tratando-se de responsabilidade civil subjectiva, esta nunca poderia ser estabelecida sem existir um

    comportamento dominvel pela vontade, que possa ser imputado a um ser humano e visto como expressai da conduta

    de um sujeito responsvel. No se exige, porm, que o comportamento do agente seja intencional ou sequer que consista

    numa actuao, bastando que exista uma conduta que lhe possa ser imputada em virtude de estar sob o controle da sua

    vontade. No so, por isso, factos voluntrios, por estarem fora do contrle da vontade do agente, os acontecimentos

    do mundo exterior causadores de danos (queda de raios, tremores de terra, ciclones). Mas mesmo fenmenos

    respeitantes ao agente podem no constituir factos voluntrios sempre que ao agente falte a conscincia ou no possa

    exercer domnio sobre a sua vontade. No envolve, por isso, a responsabilidade civil a situao do agente destruir um

    vaso de porcelana precioso, porque cai sobre ele em consequncia de uma sncope cardaca, ou foi submetido a coaco

    fsica para esse efeito. Se existir algum domnio da vontade j pode, porm, haver responsabilidade como na hiptese

    de a destruio do vaso ter resultado de um gesto brusco do agente.

    O facto voluntrio do agente pode revestir duas formas: a aco (483.) e a omisso (486.). Tratando-se de uma

    aco, a imputao da conduta ao agente apresenta-se como simples. J no caso da omisso essa imputao ao agente

    exige algo mais: a sua onerao com um dever especfico de praticar o acto omitido. Efectivamente, se existe um dever

    genrico de no lesar os direitos alheios, j no existe um correspondente dever genrico de evitar a ocorrncia de danos

    para outrem, uma vez que a sua instituio multiplicaria exponencialmente as ingerncias na esfera jurdica alheia,

    tornando a vida em sociedade impossvel. Da que para algum ser responsvel por omisso pelos danos sofridos por

    outrem se exija, para alm dos outros pressupostos da responsabilidade delitual, um dever especfico, que torne um

    particular sujeito garante da no ocorrncia desses danos.

    Conforme resulta do art. 486., esse dever especfico de garante pode ser criado por contrato (algum se obriga

    a vigiar um doente mental por forma a evitar que este se suicide) ou pode mesmo ser imposto por lei (491., 492.; 493.).

    A ilicitude

    Para o Prof. ML a leso de bens jurdicos s imediatamente constitutiva de ilicitude no caso de o agente ter

    actuado com dolo. No caso de actuaes meramente negligentes no se mostra suficiente a simples leso de bens

    jurdicos, tendo que lhe acrescer a violao do dever de cuidado por parte do agente.

  • A) A ilicitude por violao de direitos subjectivos

    A primeira variante de ilicitude prevista no art 483./1 do CC consiste na violao de direitos subjectivos. Esta

    modalidade de ilicitude tem como caracterstica especial o facto de, ao se exigir uma leso de um direito subjectivo

    especfico, se limitar a indemnizao frustrao das utilidades proporcionadas por esse direito, no se admitindo

    assim nesta sede a tutela dos danos puramente patrimoniais. Efectivamente, neste caso a funo da primeira variante

    de ilicitude prevista no art 483./1, no se reconduz tutela genrica do patrimnio do sujeito, mas antes tutela das

    utilidades que lhe proporcionava o direito subjectivo objecto de violao.

    So abrangidos por esta modalidade de ilicitude os direitos sobre bens jurdicos pessoais como a vida, corpo,

    sade e liberdade, cuja proteco tem, alis, dignidade constitucional (24. da CRP). A leso de qualquer um destes bens

    assim sancionada com a indemnizao pelos prejuzos causados.

    Tambm os outros direitos absolutos como os direitos reais, os direitos de propriedade industrial e os direitos

    de autor se encontram regulados pela responsabilidade civil. Haver ilicitude sempre que o agente venha a lesar alguma

    das utilidades proporcionadas por esses direitos.

    J os direitos de crdito no so abrangidos pelo art 483. (a sua tutela efectua-se pelo 798. ou pelo 334.).

    Relativamente aos direitos familiares parece possvel aqui incluir os direitos familiares de natureza patrimonial,

    como o direito dos cnjuges meno dos bens comuns, e os direitos de administrao sobre os bens dos menores. J

    quanto aos direitos familiares de natureza pessoal (como direito fidelidade do cnjuge ou o poder paternal sobre os

    filhos), no parece admissvel a sua tutela atravs da responsabilidade civil delitual, em virtude de a lei estabelecer

    sanes de outra ordem para a sua violao.

    Para alm disso, haver ilicitude sempre que sejam violados direitos de personalidade, como o direito ao nome

    (72.), no divulgao de escritos confidenciais (75. a 78.), imagem (79.), etc..

    Entre ns, tem-se vindo a sustentar a excistncia de um direito geral de personalidade, atendendo consagrao

    da tutela jurdica da personalidade fsica e moral no art 70. e a previso expressa da sua proteco pela responsabilidade

    civil (art. 70./2).

    B) A ilicitude por violao de normas de proteco

    Outra variante da ilicitude constante do art 483./1, refere-se s disposies legais destinadas a proteger

    interesses alheios, e que poderamos designar de normas de proteco. Trata-se de normas que, embora dirigidas

    tutela de interesses particulares no atribuem aos titulares desses interesses um verdadeiro direito subjectivo, por no

    lhes atriburem em exclusivo o aproveitamento de um bem (exs : Violao de regras do Cdigo da Estrada, Disposies

    do Cdigo Penal).

    Pressupostos:

    a) a no adopo de um comportamento, definido em termos precisos pela norma;

    b) que o fim dessa imposio seja dirigido tutela de interesses particulares;

    c) a verificao de um dano no mbito do crculo de interesses tutelados por essa via;

    C) Os tipos delituais especficos

  • Para acm da previso geral da responsabilidade civil subjectiva no art 483., estendida omisso do 486.,

    encontram-se espalhados pelo CC diversas previses delituais que permitem estabelecer tipos delituais especficos, para

    alm das categorias gerais de ilicitude (pg. 282 a 288).

    a) O abuso de direito (334.);

    b) A no cedncia em caso de coliso de direitos (335.);

    c) A ofensa ao crdito ou ao bom nome (484.);

    d) A responsabilidade por conselhos, recomendaes e informaes (485.);

    D) As causas de excluso da ilicitude

    A lei prev que, para haver responsabilidade, a violao dos direitos subjectivos ou das normas de proteco

    tem que ser realizada ilicitamente (art 483.), admitindo assim a possibilidade de essa violao ser efectuada licitamente.

    Essa situao ocorrer sempre que o agente tenha actuado no mbito de uma causa de excluso de ilicitude indiciada ,

    no caso concreto, excluda em virtude de o agente se encontrar no mbito de uma situao especfica que produz a

    justificao do facto.

    Tradicionalmente, a doutrina admite as seguintes causas de justificao:

    a) exerccio de um direito baseia-se num exerccio de um direito considerando-se que, se algum tem um direito

    subjectivo e o exerce, no deve responder pelos danos da resultantes para outrem. Assim, por ex., se algum tiver uma

    licena de caa poder caar numa determinado terreno em que tal lhe seja permitido, sem que o seu proprietrio possa

    reclamar pelas peas de caa abatidas Contudo, o caador que pode caar no terreno no deixar de responder pelos

    danos em coisas ou pessoas que provocar em virtude de no ter tomado as devidas precaues;

    b) cumprimento de um dever efectivamente, vigorando para o sujeito o dever de adoptar determinada conduta, este

    pode ver-se forado a acat-la ainda que para isso tenha que infringir outros deveres relativos a posies jurdicas

    alheias, e cuja infraco normalmente acarretaria a ilicitude do facto. Nestas situaes, est-se perante o que se denomina

    de conflito de deveres, que deve ser resolvido dando preponderncia ao dever que se considere de natureza superior.

    Assim, por ex., o mdico que apenas dispe de um nmero limitado de unidades para efectuar transfuses de sangue

    pode, em caso de excesso de sinistrados, optar por privilegiar os doentes de maior risco, sem que actue ilicitamente.

    Para haver excluso da ilicitude , porm, necessrio que o dever seja efectivamente cumprido, no bastando a simples

    coliso. Assim, se o agente em caso de conflito de deveres opta por no cumprir nenhum, naturalmente que ser

    responsvel pelo incumprimento dos dois. para alm disso, necessrio que a impossibilidade no resulte de um culpa

    anterior do agente, j que nesse caso ele no deixar de ser responsabilizado. Por ex., se as unidades de sangue no

    existem no hospital por o mdico se ter esquecido de as solicitar na altura devida;

    c) legtima defesa (art 337. e 21. da CRP) - consiste numa atitude defensiva do agente, que estando a ser vtima de

    uma agresso pe termo a essa agresso pelos seus prprios meios. So pressupostos da legtima defesa a existncia de

    uma agresso, contra a pessoa ou patrimnio do agente ou de terceiro, actualidade e contrariedade lei dessa agresso,

    impossibilidade de recurso aos meios normais e o prejuzo causado pelo acto no seja manifestamente superior ao que

    pode resultar da agresso (+ pg. 291). A lei prev ainda que o acto possa ser igualmente justificado, ainda que haja

    excesso de legtima defesa, desde que esse excesso corresponda a perturbao ou medo culposo do agente (art. 337./2).

  • Para o Prof. ML no estamos perante uma causa de excluso da ilicitude, mas antes perante uma causa de excluso da

    culpa, consistente no medo invencvel causado pela agresso;

    d) aco directa (336.) pg. 292/293;

    e) estado de necessidade (339.) pg. 294;

    f) consentimento do lesado (340./1, 2 e 3) pg. 294/295;

    A culpa

    A) Noo

    Ao prever que o agente tenha actuado com dolo ou mera culpa a lei exige ainda a culpa como pressuposto

    normal da responsabilidade civil (art. 483., n1), considerando excepcionais os casos de responsabilidade sem culpa

    (art. 483., n2).

    A culpa pode ser assim definida com o juzo de censura ao agente por ter adoptado a conduta que adoptou,

    quando de acordo com o comando legal estaria obrigado a adoptar conduta diferente. Deve, por isso, para o Prf. ML

    ser entendida em sentido normativo como a omisso da diligncia que seria exigvel ao agente de acordo com o padro

    de conduta que a lei lhe impe. Nestes termos, o juzo de culpa representa um desvalor atribudo pela ordem jurdica

    ao facto voluntrio do agente, que visto como axiologicamente reprovvel.

    B) A imputabilidade como pressuposto da culpa e o regime da responsabilidade dos inimputveis

    No entanto, para que o agente possa ser efectivamente censurado pelo seu comportamento sempre necessrio

    que ele conhecesse ou devesse conhecer o desvalor do seu comportamento e que tivesse podido escolher a sua conduta.

    Da que se considere existir falta de imputabilidade quando o agente no tem a necessria capacidade para entender a

    valorizao negativa do seu comportamento ou lhe falta a possibilidade de o determinar livremente. Sendo a

    imputabilidade pressuposto do juzo de culpa, naturalmente que o agente fica isento de responsabilidade se praticar o

    facto em estado de inimputabilidade (art. 488., n1), o que a lei presume que se verifica sempre que o agente seja menor

    de sete anos ou interdito por anomalia psquica (art. 488., n2).

    Conforme resulta do art.488., n1, a falta de imputabilidade no exclui, no entanto, a responsabilidade sempre

    que sendo transitria seja devida a um facto culposo do agente. Assim quem causou inconscientemente danos a outrem

    em virtude de ter ingerido substncias psicotrpicas, ou se ter deixado adormecer a conduzir um automvel, no deixa

    de responder pelos danos. No entanto, a responsabilidade continuar a ser excluda se a inimputabilidade, ainda que

    resultante de um facto culposo do agente, seja definitiva. Ser, por exemplo, o caso de algum sofrer leses cerebrais

    que o tornam inimputvel como resultado de um facto culposo seu. Naturalmente que no faria sentido que esse facto

    culposo bastasse para responsabilizar o agente por todos os danos que futuramente viesse a causar em estado de

    inimputabilidade.

  • O art. 489. levanta vrias questes. Em primeiro lugar, manifesta a sua subsidiariedade em relao

    responsabilidade dos vigilantes (art. 491.), exigindo se portanto para a sua aplicao ou que no exista vigilante, ou

    que, existindo, ele no seja responsvel pela situao, ou ainda que, sendo responsvel, no tenha meios para pagar a

    devida reparao.

    Por outro lado, parece que esta norma pressupe que a responsabilidade apenas no tenha ocorrido em razo

    da inimputabilidade do agente, pelo que ter este que ter praticado um facto ilcito que seria considerado culposo se o

    seu autor fosse imputvel. No parece, por isso, que exista aqui uma situao de responsabilidade pelo risco, como j

    tem sido defendido, tratando-se antes de uma responsabilidade baseada na ilicitude objectiva, em que, por motivos de

    equidade, se dispensa a imputabilidade como pressuposto da culpa.

    C) O dolo e a negligncia

    O art.483. ao fazer referncia ao dolo e mera culpa admite duas formas de culpa: o dolo e a negligncia. O

    dolo, para efeitos de responsabilidade civil corresponde inteno do agente de praticar o facto. J na negligncia no

    se verifica essa inteno, mas o comportamento do agente no deixa de ser censurvel em virtude de ter omitido a

    diligncia a que estava legalmente obrigado.

    A distino entre dolo e negligncia tem uma grande importncia para efeitos da dogmtica civil. que se o

    agente agir com dolo actua logo ilicitamente, desde que lese algum direito subjectivo alheio ou um interesse objecto de

    uma norma de proteco (art. 483.). Se, porm, no existir uma actuao dolosa do agente, s haver ilicitude, nos

    termos acima referidos, se o agente violar um dever objectivo de cuidado na leso de bens jurdicos o que implica

    reconhecer estar presente na negligncia um requisito suplementar de ilicitude e no apenas uma forma de culpa.

    A negligncia admite as seguintes modalidades:

    a) negligncia consciente: o agente, violando o dever de diligncia a que estava obrigado, representa a verificao do facto

    como consequncia possvel da sua conduta, mas actua sem se conformar com a sua verificao.

    b) negligncia inconsciente: o agente, violando o dever de diligncia a que estava obrigado, no chega sequer a representar

    a verificao do facto.

    Em ambas as situaes o agente no deseja efectivamente a verificao do facto, ainda que a omisso do dever

    de cuidado a que estava obrigado o torne responsvel. No primeiro caso, o agente chega a representar a possibilidade

    de se verificar o facto, mas essa possibilidade por ele afastada (ex. algum, que conduz em desrespeito s regras de

    trnsito, admite a possibilidade de provocar um acidente, mas convence-se que tal no acontecer). No segundo caso,

    o agente infringe o seu dever de diligncia sem que tenha qualquer representao em relao ao facto (ex. algum

    infringe as regras de trnsito sem sequer equacionar a possibilidade de provocar um acidente).

    J o dolo admite as seguintes modalidades:

    a) dolo directo: o agente quer a verificao do facto, sendo a sua conduta dirigida directamente a produzi-lo.

    b) dolo necessrio: o agente no dirige a sua actuao directamente a produzir a verificao do facto, mas aceita-o como

    consequncia necessria da sua conduta.

    c) dolo eventual: o agente representa a verificao como consequncia possvel da sua conduta e actua, conformando-

    se com a sua verificao.

    No dolo directo, clarssima a inteno do agente em praticar o facto, como no exemplo de algum pretendendo

    a morte de outrem o atingir a tiro.

  • No dolo necessrio essa inteno no to clara mas encontra-se igualmente presente. Assim, por exemplo, o

    indivduo que coloca uma bomba numa embaixada no intuito de protestar contra determinado pas estrangeiro sabe

    que a sua actuao ir inevitavelmente implicar a morte ou ferimentos graves para os que se encontram no respectivo

    edifcio pelo que a sua aco deve tambm considerar-se como intencional em relao a essas leses.

    J no dolo eventual, a sua distino da negligncia consciente mais fluida mas no deixa de existir, uma vez

    que a actuao do agente, no visando o facto como consequncia directa nem necessria da sua conduta, representa

    uma conformao to grande com a possibilidade da sua verificao que chocaria considerar a situao como de mera

    negligncia, ainda que consciente. Imagine-se, por exemplo, que a violao das regras de trnsito pelo agente consiste

    em ele entrar conscientemente na auto-estrada a alta velocidade em contra-mo, comportamento que toda a gente sabe

    que, salvo hipteses excepcionais, conduz necessariamente a um acidente. Neste caso, a qualificao do acidente como

    meramente negligente ofenderia o senso comum, pois dificilmente se poderia dizer que o agente estava convencido de

    que o seu comportamento nunca conduziria ao facto.

    Dvidas existem, no entanto, sobre o critrio que deve ser adoptado para distinguir o dolo eventual da

    negligncia consciente. De acordo com a teoria da verosimilhana, essa diferena reside no grau de de probabilidade com

    que o resultado representado pelo agente, havendo dolo eventual quando o agente representasse o resultado como

    extremamente provvel e negligncia consciente no caso contrrio. De acordo com a frmula hipottica de Frank, haver

    dolo eventual se o agente, na hiptese de ter considerado como certo o resultado da sua conduta, no tivesse adoptado

    comportamento diferente. De acordo com a frmula positiva de Frank, haver dolo eventual se o agente, tendo previsto o

    resultado da sua conduta como possvel, conforma-se com esse resultado, no alterando consequentemente o seu

    comportamento.

    Para o Prof. Menezes Leito parece que a frmula positiva de Frank se encontra consagrada no art. 14., n3 do

    Cdigo Penal e corresponde efectivamente melhor forma de resolver casos controversos como o clssico exemplo dos

    mendigos que estropiavam crianas para as melhor explorarem na caridade pblica, acabando por causar a morte de

    algumas. A frmula positiva resolve a questo: o agente que pratica esse tipo de leses representa claramente a

    possibilidade de elas virem a causar a morte das crianas, e conforma-se com a sua verificao.

    D) Critrios de apreciao e graduao da culpa

    O juzo de censura ao agente pode ser estabelecido por duas formas, que assim se reconduzem a diferentes

    critrios de apreciao da culpa. Um primeiro critrio aponta para a apreciao da culpa em concreto, exigindo ao agente

    a diligncia que ele pe habitualmente nos seus prprios negcios ou de que capaz. Um segundo critrio aponta para

    a apreciao da culpa em abstracto, exigindo a lei ao agente a diligncia padro dos membros da sociedade, a qual

    naturalmente a diligncia do homem mdio ou bonus pater famlias.

    O Cdigo Civil veio estabelecer no art. 799., n 2 que o critrio de apreciao de culpa na responsabilidade

    obrigacional comum responsabilidade delitual. Esse critrio encontra-se formulado no art. 487., n 2. Aponta-se a

    para o critrio tradicional da apreciao em abstracto segundo a diligncia do homem mdio, definida pela frmula

    romana do bom pai de famlia.

    Esse padro abstracto no deixa de exigir, no entanto, uma anlise das circunstncias do caso, ou seja, do

    condicionalismo da situao e do tipo de actividade em causa. Compreende-se que a diligncia exigida a um profissional

    qualificado na sua actividade no seja a mesma que a que exigida a um transeunte em passeio, e que a ocorrncia de

    uma situao de emergncia implique uma apreciao da culpa distinta da que seria efectuada numa situao normal.

  • Em diversos preceitos considerada relevante no s o estabelecimento de culpa mas tambm a sua graduao.

    Tradicionalmente era estabelecida uma graduao da culpabilidade entre estdios: culpa grave, culpa leve e

    culpa levssima. De acordo com o critrio da apreciao da culpa em abstracto, a culpa grave corresponde a uma situao

    de negligncia grosseira em que a conduta do agente s seria susceptvel de ser realizada por uma pessoa especialmente

    negligente, uma vez que a grande maioria das pessoas no procederia da mesma forma. J a culpa leve corresponde

    situao em que a conduta do agente no seria susceptvel de ser realizada por um homem mdio, correspondendo

    assim a sua actuao omisso da diligncia do bom pai de famlia.

    Em virtude de o art. 487., n 2 s considerar como culposa a omisso da diligncia do bom pai de famlia, tal

    implica que a culpa levssima no seja considerada actualmente como culpa j que implica uma actuao negligente que

    mesmo um homem mdio no conseguiria evitar.

    E) Prova da culpa

    Nos termos do art. 487., n 1 incumbe ao lesado a prova da culpa do autor da leso, salvo havendo presuno

    legal de culpa. Regra geral corre, portanto, por conta do lesado o nus da prova da culpa do agente s adquirindo este

    ganho de causa se conseguir demonstrar em tribunal o carcter objectivamente censurvel da conduta deste. Esta prova,

    apesar de ser difcil de realizar, assegura a funo sancionatria da responsabilidade civil, s responsabilizando o agente

    perante uma demonstrao efectiva da sua culpa.

    Por vezes, no entanto, a lei estabelece presunes de culpa. Nesses casos verifica-se uma inverso do nus da

    prova (art. 350., n 1), que passa a correr por conta do lesante. Apesar de as presunes serem genericamente ilidveis

    (art. 350., n 2), a verdade que as dificuldades de prova neste domnio tornam, em caso de presuno de culpa, muito

    mais segura a obteno de indemnizao pelo lesado, levando assim a que na responsabilidade por culpa presumida a

    funo indemnizatria praticamente apague a funo sancionatria.

    O Cdigo civil prev as seguintes presunes de culpa: danos causados por incapazes; danos derivados de

    edifcios ou outras obras; danos causados por coisas ou animais; danos derivados do exerccio de actividades perigosas.

    Todas estas presunes de culpa correspondem a situaes em que se verifica uma fonte especfica de perigo, cuja

    custdia se encontra atribuda a determinado sujeito, resultando assim a sua responsabilizao da violao de deveres

    de segurana do trfego, que lhe impunham evitar a ocorrncia de danos resultantes dessa fonte de perigo.

    a) danos causados por incapazes: o art 491. vem regular a responsabilidade pelos danos causados pelos incapazes

    naturais, estabelecendo uma presuno de culpa das pessoas a quem, por lei ou negcio jurdico, incumbe a sua

    vigilncia, que pode ser ilidida atravs da demonstrao de que cumpriram o seu dever de vigilncia, ou que os danos

    continuariam a produzir-se, ainda que o tivesse cumprido (relevncia negativa da causa virtual). A responsabilizao

    parte da presuno de no cumprimento do dever de vigilncia por parte das pessoas sobre as quais este recai, seja por

    lei (caso dos pais ou tutor), seja por negcio jurdico (contrato de trabalho ou prestao de servios, que tenha o dever

    de esse objecto) indiciada atravs da prtica de um facto danoso pelo incapaz natural (menor ou deficiente fsico ou

    menral). No se trata, por isso, de uma responsabilidade objectiva, admitindo-se que a presuno de culpa possa ser

    ilidida atravs da prova que se exerceu a adequada vigilncia sobre o incapaz.

    A responsabilidade do vigilante no pressupe a inimputabilidade do vigiado, mas apenas a sua incapacidade natural.

    Pode assim, o vigiado ser considerado imputvel (488.) e continuar a existir a responsabilidade do vigilante, caso em

    que ambos respondero solidariamente (497.). Se o vigiado for inimputvel, em princpio s o vigilante responder

  • (491.), s se admitindo aco contra o vigiado, por motivos de equidade, no caso de ser impossvel exigir a

    responsabilidade ao vigilante (489.).

    b) danos causados por edifcios ou outras obras: o art 492./1, contempla a situao da responsabilizao pelos danos

    causados pela runa de edifcios ou de outras obras, devido a vcio de construo ou defeito de conservao,

    estabelecendo nesse caso uma presuno de culpa que recai sobre o proprietrio ou possuidor do edifcio, presuno

    essa que no caso de danos devidos exclusivamente a defeitos de conservao, se transfere para a pessoa obrigada, por

    lei ou negcio jurdico, a conservar o edifico ou obra (n.2) + pg. 307.

    c)danos causados por coisas ou animais (art 493./1) trata-se de uma norma bastante importante, que pressupe, em

    face da perigosidade imanente de certas coisas ou de animais o surgimento de um dever de segurana no trfego, que

    impe automaticamente a sua custdia em relao ao seu detentor.

    d) danos resultantes de actividades perigosas (art. 493./2) a responsabilizao prevista neste art. Parece ser

    estabelecida a nvel mais objectivo do que o que resulta das disposies anteriores, uma vez que, alm de no se prever

    a iliso de responsabilidade com a demonstrao da relevncia negativa da causa virtual, parece-se exigir ainda a

    demonstrao de um grau de diligncia superior das disposies anteriores uma vez que, em lugar da simples prova

    da ausncia de culpa (487./2), o legislador exige a demonstrao de que o agente empregue todas as providncias

    exigidas pelas circunstncias com o fim de prevenir os danos.

    F) Causas de excluso da culpa

    semelhana do que sucede com a ilicitude, tambm a culpa pode ser excluda sempre que o agente se encontre

    em determinada situao que afaste a possibilidade de a ordem jurdica estabelecer um juzo de censura em relao ao

    seu comportamento. Seguindo Pessoa Jorge temos como causas de excluso de culpa:

    a) erro desculpvel: Ocorre erro desculpvel sempre que a actuao do agente resulte de uma falsa representao da

    realidade, que no lhe possa, em face das circunstncias, ser censurada. A lei refere esta hiptese no art. 338.. Imagine-

    se, por exemplo, que algum anda a ser perseguido numa floresta por um grupo de assaltantes e na fuga se depara com

    dois homens armados que julga fazerem parte do grupo pelo que os resolve atingir a tiro vindo, porm, mais tarde a

    descobrir que esses dois homens eram simples caadores. Neste caso ocorrer a excluso da culpa do agente, uma vez

    que a sua reaco compreensvel naquelas circunstncias.

    b) medo invencvel: Esta situao ocorre sempre que a actuao do agente tenha sido provocada por um medo que ele

    no conseguiu ultrapassar sem que tal lhe possa, em face das circunstncias, ser censurado. Uma das situaes em que

    a lei prev o medo como causa de excluso da culpa diz respeito ao excesso de legtima defesa. Este qualificado no

    art. 337., n 2 como uma forma de justificao do acto mas a interpretao correcta a de que se trata de uma causa de

    excluso de culpa.

    c) desculpabilidade: admite-se ainda a excluso de culpa do agente sempre que embora no se verificando medo nem

    erro, em face das circunstncias do caso no lhe fosse exigvel comportamento diferente. Imagine-se, por exemplo, a

    situao de um mdico que causa danos ao doente numa interveno cirrgica de emergncia, em virtude de num

    estado de emergncia geral provocado por uma catstrofe ter sido obrigado a trabalhar 18 horas seguidas. Neste caso,

  • no obstante o erro mdico as circunstncias concretas em que ele ocorreu tornam-no desculpvel, excluindo assim a

    indemnizao.

    G) O concurso da culpa do lesado

    A culpa do lesante pode concorrer com a existncia simultnea de culpa do lesado, entendendo-se essa nos

    termos do art. 487., n 2 como a omisso da diligncia que teria levado um bom pai de famlia, nas circunstncias do

    caso, a reduzir ou evitar os danos sofridos. Tendo sido demonstrada a culpa do lesante, aplica-se o disposto no art. 570.,

    n 1. No caso da culpa do lesante no ter sido provada, mas ser apenas presumida a culpa do lesado, salvo disposio

    em contrrio, excluir o dever de indemnizar (art. 570., n 2), preceito que tambm se deve considerar aplicvel

    hiptese de responsabilidade pelo risco. No caso da responsabilidade por culpa caber ao tribunal apreciar se e em que

    medida a concorrncia da culpa do lesante com a do lesado deve relevar para efeitos de indemnizao.

    Para este regime se aplicar necessrio que a actuao do lesado seja subjectivamente censurvel em termos de

    culpa, no bastando assim a mera causalidade da sua conduta em relao aos danos. A actuao culposa do lesado que

    contribui para os danos no corresponde, porm, a um acto ilcito, mas apenas ao desrespeito de um nus jurdico uma

    vez que no existe um dever jurdico de evitar a ocorrncia de danos para si prprio.

    No parece que a existncia de dolo do lesante exclua a possibilidade de ponderao da culpa do lesado, uma

    vez que o art. 570. no estabelece esse requisito, ao contrrio do art. 494.. Assim se algum atingir outrem com uma

    faca no intuito de lhe causar danos, e estes vm a ser consideravelmente agravados por o lesado se recusar a tratar o

    ferimento, o agravamento dos danos sofridos deve ser-lhe imputado e no ao lesante.

    A lei estabelece ainda uma equiparao entre a culpa do lesado e a dos seus auxiliares e representantes (art.

    571.). Em termos de prova da culpa do lesado ver o art. 572..

    O dano

    A) Dano em sentido real e em sentido patrimonial

    O dano consiste na frustrao de uma utilidade que era objecto de tutela jurdica.

    Em sentido real o dano corresponde avaliao em abstracto das utilidades que eram objecto de tutela jurdica,

    o que implica a sua indemnizao atravs da reparao do objecto lesado (restaurao natural) ou da entrega de outro

    equivalente (indemnizao especfica). Em sentido patrimonial, o dano corresponde avaliao concreta dos efeitos da

    leso no mbito do patrimnio do lesado, consistindo assim a indemnizao na compensao da diminuio desse

    patrimnio, em virtude da leso. Assim, por exemplo, se algum embate no carro de outrem o dano em sentido real

    consistir na perda ou deteriorao do mesmo. J o dano em sentido patrimonial corresponder s alteraes que se

    verificam no patrimnio do lesado em consequncia dessa perda ou deteriorao, designadamente as despesas do

    conserto e importncias que deixou de auferir em consequncia da no utilizao do bem em causa.

    O princpio geral estabelecido no art. 562. implica que a lei d primazia reconstituio natural do dano ou

    sua indemnizao em espcie, no mbito da obrigao de indemnizao. Neste sentido pode dizer-se que o critrio

    predominante o da determinao do dano em sentido real. Deve proporcionar-se ao lesado as mesmas utilidades que

    ele possua antes da leso.

  • Quando j no possvel reparar o bem ou entregar outro equivalente, ou quando essa forma no seja suficiente

    para reparar todos os danos sofridos, ou ainda quando se torna excessivamente onerosa para o devedor (art. 566, n 1).

    Neste caso, em virtude do art. 566., n 2, partimos de um conceito de dano em sentido patrimonial, determinado pela

    diferena entre a situao patrimonial real do lesado e a sua situao hipottica se no existissem danos.

    B) Danos emergentes e lucros cessantes

    O dano ou prejuzo emergente corresponde situao em que algum em consequncia da leso v frustrada

    uma utilidade que j tinha adquirido. O lucro cessante corresponde quela situao em que frustrada uma utilidade

    que o lesado iria adquirir se no fosse a leso. O art. 564., n 1 determina que ambos devem ser abrangidos pelo dever

    de indemnizar. Em certos casos a lei determina que s haja indemnizao de danos emergentes (arts. 899. e 909.).

    C) Danos presentes e futuros

    Os danos consideram-se presentes se j se encontram verificados no momento da fixao da indemnizao,

    sendo futuros no caso contrrio.

    Resulta do art. 564., n 2 que o facto do dano ainda no se ter verificado no fundamento para excluir a

    indemnizao bastando-se o tribunal com a previsibilidade da verificao do mesmo para a fixar. A fixao da

    indemnizao depende naquele momento da determinabilidade do dano futuro.

    D) Danos patrimoniais e no patrimoniais

    Os danos patrimoniais so aqueles que correspondem frustrao de utilidades susceptveis de avaliao

    pecuniria, como na destruio de coisas pertencentes ao lesado. Os danos no patrimoniais so aqueles que

    correspondem frustrao de utilidades no susceptveis de avaliao pecuniria, como o desgosto resultante da perda

    de um ente querido. Assim, se algum causa uma leso no corpo de outrem este sofre danos no patrimoniais

    correspondentes dor e sofrimento fsico suportados, mas pode tambm sofrer danos patrimoniais correspondentes

    reduo da sua fora de trabalho.

    Entre os danos patrimoniais inclui-se a privao do uso das coisas ou prestaes, como sucede no caso de

    algum ser privado da utilizao de um veculo.

    Durante imenso tempo foi objecto de controvrsia atribuir indemnizao por danos no patrimoniais.

    Actualmente, a situao encontra-se resolvida em virtude do art. 496., n 1 estabelecer que na fixao da indemnizao

    deve atender-se aos danos no patrimoniais que pela sua gravidade meream a tutela do direito. Desta norma resulta

    claramente a admissibilidade genrica do ressarcimento dos danos no patrimoniais.

    A lei refere-nos que a indemnizao pelos danos no patrimoniais fixada equitativamente tomando em

    considerao no apenas a extenso dos danos causados mas tambm o grau de culpabilidade do agente, a situao

    econmica deste e do lesado e as demais circunstncias do caso (arts. 496., n 3, 1 parte, e 494.). Daqui resulta que a

    indemnizao por danos no patrimoniais no reveste natureza exclusivamente ressarcitria, mas tambm cariz

    punitivo, assumindo-se como uma pena privada estabelecida no interesse da vtima por forma a desagrav-la do

    comportamento do lesante.

  • E) A morte como dano

    Um dos problemas que se tem colocado relativamente ao dano consiste em determinar a possibilidade de

    indemnizao da morte de uma pessoa. As ofensas de que resulte a morte de uma pessoa podem dar origem aos

    seguintes danos:

    a) a perda da vida da prpria vtima;

    b) danos no patrimoniais sofridos pelos familiares da vtima em consequncia da sua morte;

    c) no caso de a morte no ser instantnea, danos no patrimoniais sofridos pela vtima e pelos seus familiares at

    ocorrncia da morte.

    Leite de Campos vem numa posio original sustentar a hereditabilidade do dano morte considerando que com

    a leso o lesado j suporta um dano que conduzir potencialmente morte, o qual indemnizvel nos termos do art.

    564., n 2. Entende, porm, que o art 496., n 2 no resolve a questo da hereditabilidade do dano morte na medida em

    que a expresso por morte da vtima aparece como uma mera referncia ao momento temporal da abertura da

    sucesso. O dano encontrar-se-ia antes previsto no art. 496., n 3 tendo o legislador esclarecido atravs da expresso

    no caso de morte que o dano morte era autonomamente indemnizvel no meio dos restantes danos no patrimoniais.

    O Prof. Menezes Leito adere a esta tese.

    Cabe perguntar a que situao se refere o art. 496., ns 2 e 3 in fine, quando refere a indemnizao por morte

    da vtima. Parece claro que no poder ser ao dano morte e sentido prprio pois este gera um direito de indemnizao

    que se transmite aos herdeiros da vtima. O art. 496., n 2 refere-se por isso a uma outra situao: aos danos no

    patrimoniais sofridos por outras pessoas em consequncia da morte da vtima. Naturalmente que no seria aceitvel a

    multiplicao de pretenses indemnizatrias em consequncia da mesma leso pelo que a lei veio restringir o crculo

    de pessoas que pode pedir indemnizao pelos danos no patrimoniais que sofreram em consequncia da morte da

    vtima.

    J o art. 496., n 3, no parece referir-se aos danos causados pela morte da vtima mas antes atribuio da

    indemnizao por danos no patrimoniais ocorridos antes dessa morte. Efectivamente, a leso que causou a morte, no

    caso de esta no ter sido instantnea, pode ter produzido dor e sofrimento quer na vtima quer nos parentes mais

    prximos prevendo o art. 496., n 3 que o direito indemnizao se estende igualmente a esses danos.

    Naturalmente que no haver obstculo cumulao no mesmo sujeito de direito indemnizao relativamente

    a estes 3 tipos diferentes de danos uma vez que se trata de pretenses indemnizatrias com contedo distinto.

    O nexo de causalidade entre o facto e o dano.

    O art 483., ao estabelecer a obrigao de indemnizao como sano para o comportamentro ilcito e culposo

    do agente, limita no entanto essa indemnizao aos danos resultantes da violao, o que implica exigir que esse

    comportamento seja causa dos danos sofridos, ou seja, que haja um nexo de causalidade entre o facto e o dano.

    O problema que se coloca diz respeito aos limites em que se admite esse nexo, j que o facto pode ser causa do

    dano em termos muito remotos, que tornam difcil responsabilizar o agente. Esta situao visvel num exemplo

    clssico: um comerciante vendeu a um lavrador uma vaca que ele sabia padecer de uma doena contagiosa, tendo

    dissimulado esse facto. O lavrador coloca-a junto dos seus outros animais, acabando todos por padecer da mesma

    doena. O lavrador v-se impedido de lavrar as suas terras, perdendo o rendimento agrcola que habitualmente auferia,

  • da que os seus credores decidam executar os seus bens so vendidos judicialmente ao desbarato. Tem sido ainda

    acrescentada para cmulo a situao de o lavrador, desesperado, ter posto termo vida.

    Naturalmente que no faria sentido que o comerciante por ter vendido uma vaca doente seja responsabilizado

    por todos os infortnios do lavrador.

    B) As diversas concepes relativas ao nexo de causalidade

    Os critrios para o estabelecimento do nexo de causalidade tm consistido nas seguintes teorias:

    a) teoria da equivalncia das condies

    Igualmente designada como teoria da conditio sine qua non, considera causa de um evento toda e qualquer

    condio que tenha concorrido para a sua produo em termos tais que a sua ocorrncia implicaria que o evento deixasse

    de se verificar.

    De acordo com a presente teoria, o que caracteriza o conceito de causa de um evento apenas a

    imprescindibilidade de uma condio para a sua verificao (sem a qual no) no se justificando estabelecer qualquer

    apreciao da relevncia jurdica dessas condies, uma vez que todas elas so equivalentes para o processo causal

    mesmo que o evento s resulte da aco conjugada de ambas. Assim se 2 empregadas de restaurante, actuando

    isoladamente uma da outra, colocarem veneno na comida de uma pessoa em doses individuais insuficientes para lhe

    causar a morte mas vindo esta a ocorrer em resultado do efeito conjugado das duas doses, qualquer dessas doses

    considerada causa da morte uma vez que se qualquer delas fosse retirada o evento deixava de se verificar.

    Aplicada ao direito a teoria conduz a resultados absurdos. Efectivamente ao se afirmar a relevncia de todas as

    condies para o processo causal, j que por si nenhuma teria fora suficiente para afastar a outra o resultado

    abdicar-se de efectuar uma seleco das condies juridicamente relevantes.

    b) teoria da ltima condio

    A teoria da ltima condio ou da causa prxima s considera como causa do evento a ltima condio que se

    verificou antes de este ocorrer e que, portanto, o precede directamente.

    A teoria no , porm, aceitvel uma vez que a aco no tem que produzir directamente o dano, podendo

    produzi-lo apenas indirectamente, e nem sequer h obstculos a que decorra um lapso de tempo considervel entre o

    facto ilcito e os danos (art. 564., n 2 CC). Seria, por outro lado, altamente injusto colocar toda a relevncia do processo

    causal numa ltima condio, que muitas vezes provocada por uma condio antecedente, que se apresenta como a

    verdadeiramente decisiva para efeitos causais. Pense-se no exemplo de algum prender um inimigo numa jaula de lees

    e que este vem a ser morto por estes. manifesto que a ltima condio (o ataque dos lees) no afasta a relevncia

    causal do ilcito antecedente (a priso na jaula).

    c) teoria da condio eficiente

    Esta teoria pretende que para descobrir a causa do dano ter que ser efectuada uma avaliao quantitativa da

    eficincia das diversas condies do processo causal, para averiguar qual a que se apresenta mais relevante em termos

    causais.

    Conforme se pode verificar esta teoria no fornece um verdadeiro critrio para o estabelecimento do nexo

    causal. Efectivamente, escolher a condio mais eficiente em termos causais apenas possvel remetendo para o ponto

  • de vista do julgador, o que acaba por redundar num subjectivismo integral, totalmente inadequado para a construo

    jurdica.

    d) teoria da causalidade adequada (MC tem duas excepes)

    a posio que tem sido maioritariamente defendida na nossa doutrina.

    De acordo com esta concepo, para que exista um nexo de causalidade entre o facto e o dano no basta que o

    facto tenha sido em concreto causa do dano, em termos de conditio sine qua non. necessrio que, em abstracto, seja

    tambm adequado a produzi-lo, segundo o curso normal das coisas.

    A averiguao da adequao abstracta do facto a produzir o danoso pode ser realizada a posteriori, atravs da

    avaliao se seria previsvel que a prtica daquele facto originasse aquele dano (prognose pstuma). A doutrina da

    adequao aceita que essa avaliao tome por base no apenas as circunstncias normais que levariam um observador

    externo a efectuar um juzo de previsibilidade, mas tambm circunstncias anormais, desde que recognoscveis ou

    conhecidas pelo agente. Assim, ocorrendo a morte da vtima, no deixaria de haver causalidade no apontar de uma

    arma descarregada ou na ingesto de acar se o agente soubesse ou devesse saber que a vtima tinha uma grave leso

    cardaca, no 1 caso, ou era diabtica, no 2 caso.

    Em qualquer caso, essa teoria encontra-se subjacente ao art. 563. do CC. A formulao do art. parte da teoria

    da conditio sine qua non, em termos tais que at poderamos dizer que a consagraria. No entanto, a introduo do

    advrbio provavelmente faz supor que no est em causa apenas a imprescindibilidade da condio para o

    desencadear do processo causal exigindo-se ainda que essa condio, de acordo com um juzo de probabilidade, seja

    idnea a produzir um dano, o que corresponde consagrao da teoria da causalidade adequada.

    e) teoria do escopo da norma violada

    Esta concepo defende, pelo contrrio, que para o estabelecimento do nexo de causalidade apenas necessrio

    averiguar se os danos que resultaram do facto correspondem frustrao das utilidades que a norma visava conferir ao

    sujeito atravs do direito subjectivo ou da norma de proteco. Assim, a questo da determinao do nexo de

    causalidade acaba por se reconduzir a um problema de interpretao do contedo e fim especfico da norma que serviu

    de base imputao dos danos.

    Para o prof. Menezes Leito parece ser esta a melhor forma de determinar o nexo de causalidade. Efectivamente

    a obrigao de reparar os danos causados constitui uma consequncia jurdica de uma norma relativa imputao de

    danos, o que implica que a averiguao do nexo de causalidade apenas se possa fazer a partir da determinao do fim

    especfico e do mbito de proteco da norma que determina essa consequncia jurdica.

    C) Os processos causais virtuais

    Um outro problema que se coloca no mbito do nexo de causalidade diz respeito denominada relevncia da

    causalidade virtual. Esta verifica-se sempre que o dano resultante da causa real se tivesse igualmente verificado, na

    ausncia desta, por via de outra causa, denominada a causa virtual. o que acontece no exemplo de algum ter

    envenenado um cavalo no intuito de lesar o seu proprietrio sendo, porm, antes disso o animal abatido a tiro por outra

    pessoa com as mesmas intenes. Neste caso o disparo a causa real do dano sofrido pelo lesado constituindo o

    envenenamento uma causa virtual que iria da mesma forma produzi-lo.

  • Em abstracto seria possvel conceber trs solues jurdicas para o problema da causa virtual. A 1 seria a da

    relevncia da causa virtual, segundo a qual o autor da causa virtual seria responsabilizado pelo dano, nos mesmos

    termos que o autor da causa real. A 2 seria a da relevncia negativa da causa virtual, segundo a qual o autor da causa

    virtual no seria responsabilizado, mas a existncia dessa causa virtual serviria para afastar a responsabilidade do autor

    da causa real. A 3 seria a da irrelevncia da causa virtual, segundo a qual a responsabilidade do autor do dano no

    seria minimamente afectada pela existncia de uma causa virtual.

    O prof. Menezes Leito adere a esta ltima, alis como a maioria da doutrina, considerando que efectivamente

    verificando-se a imputao delitual de um facto ao agente naturalmente que ele h de responder pelos danos causados

    (art.483.), no prevendo a lei como regra geral que essa responsabilidade seja perturbada pela causa virtual, o que se

    afiguraria absurdo face s funes preventivas e punitivas prosseguidas na responsabilidade delitual. Se a lei d

    relevncia causa virtual em situaes especficas, como as dos arts. 491.; 492.; 493.,n 1; 616.,n2 e 807.,n 2, como

    causa suplementar de excluso de responsabilidade que concede em situaes restritas de responsabilidade agravada.

    A responsabilidade obrigacional

    A responsabilidade obrigacional encontra-se genericamente prevista no art. 798.. Desta norma resulta uma

    clara equiparao dos pressupostos da responsabilidade obrigacional aos da responsabilidade civil, uma vez que

    tambm se estabelece uma referncia a um facto voluntrio do devedor cuja ilicitude resulta do incumprimento da

    obrigao exigindo-se da mesma forma a culpa, o dano e o nexo de causalidade.

    Recentemente essa equiparao veio a ser contestada por Menezes Cordeiro que considerou que enquanto na

    esfera delitual o legislador tinha adoptado o sistema alemo baseado na distino entre culpa e ilicitude , na esfera

    obrigacional j se tinha influenciado pelo sistema francs que unifica culpa e ilicitude num conceito nico de faute.

    Haveria assim por fora do art. 799.,n 1 uma presuno de faute.

    O prof. Menezes Leito considera que so efectivamente reduzidas as diferenas entre a responsabilidade

    delitual e a responsabilidade obrigacional. A diferena essencial reside no diferente regime do nus da prova face

    presuno de culpa que recai sobre o devedor (art.799.), mas tal tambm sucede em certas situaes delituais. Para

    alm disso verifica-se que na responsabilidade obrigacional so tutelados todos os prejuzos sofridos e os benefcios que

    o credor deixou de obter pelo facto de lhe no ter sido realizada a prestao devida (art. 798.), o que permite a tutela

    nesta sede dos danos puramente patrimoniais. J vimos, no entanto, que se tal no sucede na ilicitude por violao de

    direitos subjectivos (art. 483.), sucede nas outras categorias de ilicitude delitual. O prof. pensa por isso que as diferenas

    entre a responsabilidade delitual e obrigacional no justificam que se prescinda de uma considerao unitria dos

    pressupostos da responsabilidade civil subjectiva uma vez que, conforme se verificou, eles so absolutamente idnticos

    nas duas categorias de responsabilidade.

    A terceira via na responsabilidade civil

    A admisso de uma terceira via na responsabilidade civil

    Modernamente tem-se vindo a ensaiar a defesa de uma nova categoria da responsabilidade civil, entre a

    responsabilidade contratual e a delitual, para abranger a violao de deveres especficos que embora constituindo um

    plus relativamente proteco delitual no chegam a constituir obrigaes em sentido tcnico. Tratar-se-ia assim de

  • situaes de responsabilidade quase obrigacional, ou de uma terceira via na responsabilidade civil. O prof. Menezes

    Leito adere a esta concepo.

    So 4 as situaes onde poderemos equacionar a autonomizao desta 3 via:

    a) responsabilidade pr-contratual

    Tradicionalmente entendia-se que antes da celebrao do contrato as partes no adquiriam qualquer direito

    uma vez que no se tinha verificado um vlido exerccio da autonomia privada. Assim o facto de se terem iniciado

    negociaes, ou mesmo a emisso de declaraes negociais, no poderia conduzir nunca a uma situao de

    responsabilidade no caso do contrato no se vir a concluir, o que s ocorre quando obtido um consenso sobre todas

    as clusulas.

    Esta soluo veio ser posta em causa por Jhering com o instituto da culpa in contrahendo. Actualmente este

    instituto torna-se imprescindvel uma vez que a evoluo da sociedade tornou cada vez mais complexo o processo de

    formao de contratos. Esta complexidade vai criando sucessivas situaes de confiana nas partes que seria inaceitvel

    que no viessem a ser juridicamente protegidas atravs da responsabilidade civil. essa a funo da responsabilidade

    pr-contratual consagrada no art. 227. do CC. Este art. ao referir-se aos preliminares e formao do contrato esclarece-

    nos que a responsabilidade pr-contratual abrange simultaneamente a fase negociatria, que vai desde o incio das

    negociaes at emisso da proposta contratual, e a fase decisria, que vai desde a emisso da proposta at concluso

    do contrato com a respectiva aceitao. Aplica-se a qualquer tipo de contratos.

    A lei impe o respeito pela boa f em todo o processo de formao do contrato, entendendo que o mero facto

    de se entrar em negociaes susceptvel de criar uma situao de confiana na outra parte que deve ser tutelada mesmo

    sem ter surgido qualquer contrato. Caso esta confiana venha a ser lesada com violao das regras da boa f verifica-se

    um facto ilcito que constitui o lesante no dever de indemnizar os danos sofridos pelo lesado. A ilicitude deriva da

    violao de deveres acessrios de conduta.

    Segundo Menezes Cordeiro, do dever de actuar de boa f derivam 3 tipos de deveres pr-negociais:

    - deveres de proteco, que determinam que as partes na fase negocial devem evitar qualquer actuao susceptvel de

    causar danos outra parte sejam eles pessoais ou patrimoniais.

    - deveres de informao, em especial quanto s circunstncias que possam ser relevantes para a formao do consenso da

    outra parte e com especial intensidade quando uma das partes se apresenta como mais fraca.

    - deveres de lealdade, por forma a evitar comportamentos que se traduzam numa deslealdade para com a outra parte aqui

    se incluindo a prpria ruptura das negociaes quando a outra parte tinha adquirido justificadamente a confiana de

    que eles iriam conduzir celebrao do contrato.

    a violao desses deveres que gera a culpa in contrahendo que abrange fundamentalmente 3 situaes:

    1) a interrupo ou ruptura das negociaes, levando a que o contrato no se venha a celebrar;

    2) a celebrao do contrato em termos tais que este venha a padecer de invalidade ou ineficcia;

    3) a celebrao vlida ou eficaz do contrato mas em termos tais que o modo como foi celebrado gere danos para uma

    das partes;

    Relativamente ruptura das negociaes ela constitui um caso que tem vindo a ser objecto de ampla discusso

    na doutrina. A maior parte dos autores salienta que no se pode considerar as partes vinculadas a uma obrigao de

    concluir o contrato apenas pelo facto de terem entrado em negociaes, alis as partes devem estar prevenidas para a

    hiptese inversa. Apenas quando na outra parte tenha sido criada a confiana justificada de que o contrato iria ser

  • concludo e ocorre uma ruptura de negociaes sem motivo legtimo que se pode considerar ter ocorrido uma violao

    das regras da boa f.

    Cabe, porm perguntar quais os danos que devem ser indemnizados. No se tendo constitudo um direito de

    crdito, por no se ter celebrado qualquer contrato, no parece possvel que o lesado possa reclamar os danos

    provenientes da no celebrao do contrato ( interesse contratual positivo). Os danos indemnizveis sero os que a parte

    sofreu em virtude da confiana que lhe tinha sido gerada pela outra parte (interesse contratual negativo), como por

    exemplo despesas infrutferas ou a perda de ganhos que de outra forma teriam sido obtidos.

    O regime aplicvel dever ser dever ser construdo a partir da aplicao de normas da responsabilidade deltual

    ou contratual consoante o que se considerar mais adequado soluo do caso. Em relao culpa in contrahendo o

    regime aplicvel ser preponderantemente o da responsabilidade obrigacional, sujeitando-se por isso presuno de

    culpa prevista no art. 799. e ficando a responsabilidade por actos dos auxiliares sujeita ao regime do art. 800.. Haver,

    no entanto, a aplicao de algumas solues da responsabilidade delitual uma vez que no se dever aplicar culpa in

    contrahendo a exigncia da capacidade negocial, e a lei manda expressamente aplicar a regra da prescrio da

    responsabilidade delitual (art. 227.,n 2).

    b) a culpa post pactum finitum

    Esta consiste na responsabilizao das partes aps a extino do contrato pelos danos causados outra parte

    em consequncia de comportamentos que lhe seriam vedados por fora da boa f. Efectivamente aps a extino do

    contrato pode prolongar-se a necessidade de observncia de certas condies para que se mantenha a satisfao do

    interesse do credor ou no resultem danos para as partes. A boa f impe que aps o cumprimento o devedor no venha

    retirar ou reduzir consideravelmente as vantagens que o cumprimento proporcionou ao credor. Caso o venha fazer

    justifica-se a responsabilizao pelos danos sofridos pela outra parte.

    A responsabilizao reside na violao dos deveres acessrios de boa f. Os deveres acessrios que vigoram

    entre as partes por fora do principio da boa f podem manter-se aps a extino do vnculo obrigacional uma vez que

    a sua funo extravasa da simples realizao do programa obrigacional. o que acontecer, por exemplo, se uma das

    partes resolver aps a extino do contrato revelar os segredos industriais da outra parte aos seus concorrentes; ou se

    aps o trespasse de um estabelecimento decidir abrir outro para fazer-lhe concorrncia directa (violao de um dever

    de lealdade). A base legal dos deveres de boa f ps contratuais residir no art. 239. do CC.

    Tambm no caso de culpa post factum finitum a situao de responsabilidade assim gerada no se deixa

    reconduzir a nenhuma das situaes tradicionais.

    c) contrato com eficcia de proteco para terceiros

    Os deveres acessrios que vigoram entre as partes podem abranger a tutela da posio de terceiros. Esta situao

    ocorrer sempre que o terceiro apresente uma posio de tal proximidade com o credor que se justificar a extenso em

    relao a ele do crculo de proteco do contrato. Temos, como exemplo, a situao de um arrendamento de uma

    habitao sem condies que vem lesar os familiares do inquilino. No se trata, nestes casos, de um contrato a favor de

    terceiro (art.443.) uma vez que o terceiro no adquire qualquer direito prestao, sendo apenas tutelado pelos deveres

    de boa f que a lei impe em relao s partes e cuja violao lhe permite reclamar indemnizao pelos danos sofridos.

    Tambm, neste caso, a indemnizao no corresponde aos pressupostos da responsabilidade delitual uma vez

    que no se reconduz a deveres genricos de respeito; nem aos da responsabilidade obrigacional uma vez que o devedor,

  • em relao a terceiro, tem apenas uma relao de proteco. Estamos no mbito da terceira via da responsabilidade

    civil.

    d) a relao corrente de negcios

    Ela consiste na situao que se verifica sempre que as partes esto de tal forma habitualmente ligadas por

    vnculos contratuais que qualquer prestao realizada por uma delas outra, mesmo que no corresponda a qualquer

    dos contratos celebrados, toma por referncia uma vinculao especfica entre as partes Essa vinculao especfica

    independente de qualquer declarao negocial nesse sentido, ainda que tcita, baseando-se antes na perenidade, em

    termos fcticos, da relao que as partes vinham mantendo no mbito da qual existe uma disponibilidade permanente

    para a celebrao de negcios. Esta vinculao especfica fundamento para o surgimento de deveres de proteco,

    informao e lealdade cuja violao pode dar origem ao dever de indemnizar.

    Um exemplo tpico de relao corrente de negcios a que liga os bancos aos seus clientes. Imagine-se que

    algum tem habitualmente uma conta num banco mas solicita ou recebe do seu gestor de conta servios que nada tm

    a ver com o depsito bancrio em questo. Naturalmente que o servio prestado no aparece desgarrado da relao

    habitualmente existente entre as partes atravs da qual criada uma situao de confiana na esfera do cliente cuja leso

    deve envolver responsabilidade civil pelos danos causados. Essa responsabilidade apresenta-se igualmente como

    intermdia admitindo a ressarcibilidade dos danos puramente patrimoniais bem como a responsabilidade pelos actos

    dos auxiliares nos termos do art.800..

    A responsabilidade pelo risco

    O fundamento da imputao pelo risco

    O risco consiste num outro ttulo de imputao de danos que se baseia na delimitao de uma certa esfera de

    riscos pela qual deve responder outrem que no o lesado. Essa esfera de riscos pode ser estabelecida atravs de diversas

    concepes que por vezes se cumulam entre si. De acordo com a concepo do risco criado cada pessoa que cria uma

    situao de perigo deve responder pelos riscos que resultem dessa situao. Por sua vez segundo a concepo do risco

    proveito a pessoa deve responder pelos danos resultantes das actividades que tira proveito. Na concepo do risco de

    autoridade deve responder pelos danos resultantes das actividades que tem sob o seu controle.

    Casos de responsabilidade pelo risco

    A responsabilidade do comitente

    No art. 500. a lei vem estabelecer a situao da responsabilidade do comitente.

    A responsabilidade do comitente uma responsabilidade objectiva pelo que no depende de culpa sua na

    escolha do comissrio, na sua vigilncia ou nas instrues que lhe deu. No entanto essa responsabilidade objectiva

    apenas funciona na relao com o lesado (relao externa) j que posteriormente o comitente ter na relao com o

    comissrio (relao interna) o direito a exigir a restituio de tudo quanto pagou ao lesado, salvo se ele prprio tiver

    culpa, em que se aplicar o regime da pluralidade de responsveis pelo dano (art. 500.,n 3). Pode-se dizer, por isso,

    que esta responsabilidade tem por funo especfica a garantia do pagamento da indemnizao ao lesado dada a

  • circunstncia de os comissrios serem pessoas normalmente desprovidas de patrimnio susceptvel de suportar o

    pagamento de elevadas indemnizaes e actuando eles no interesse e por conta do comitente deve caber a este garantir

    ao lesado a indemnizao.

    Temos um regime de responsabilidade objectiva do comitente pelos factos danosos praticados pelo seu

    comissrio que possui os seguintes pressupostos:

    a) Existncia de uma relao de comisso

    A nossa doutrina tem vindo a estabelecer a exigncia de algumas caractersticas especficas na relao de

    comisso tais como a liberdade de escolha do comissrio pelo comitente e a existncia de um nexo de subordinao do

    comissrio ao comitente.

    No parece que qualquer destas caractersticas seja legalmente exigida para caracterizar o conceito de comisso.

    Parece manifesto que a responsabilidade do comitente no pode surgir em relao a toda e qualquer prestao

    de servios em sentido amplo. Necessrio ser que a funo praticada pelo comissrio possa ser imputada ao comitente

    por os actos nela compreendidos serem praticados exclusivamente no seu interesse e por sua conta, ou seja, suportando

    ele as despesas e os ganhos dessa actividade. Essa situao acontecer no mbito do contrato de trabalho (art.1152.),

    mas tambm no contrato de trabalho (art.1157.) e noutras situaes em que os resultados da funo confiada ao

    comissrio se repercutem directamente na esfera do comitente.

    J no haver, porm, comisso nas situaes em que apesar de ser encomendado um servio a outrem, esse

    servio corresponda a uma funo autonomamente exercida pelo devedor a qual no lhe por isso delegada por um

    comitente. Estaro neste caso as prestaes de servios em que a actividade sempre imputada ao prprio devedor

    ainda que o resultado dessa actividade seja objecto de uma prestao ao credor como no depsito (art.1185.),

    empreitada (art.1207.) ou no contrato de transporte.

    b) Prtica de factos danosos pelo comissrio no exerccio da funo que lhe foi confiada

    A razo deste requisito clara: se a imputao ao comitente se justifica por ele ter confiado ao comissrio uma

    funo que lhe cabia desempenhar, no deve a sua responsabilidade extravasar da funo que foi efectivamente

    confiada funcionando esta assim como delimitao da zona de riscos a cargo do comitente.

    A doutrina tem realizado uma interpretao restritiva deste requisito considerando que a expresso no

    exerccio das funes exclui os danos causados por ocasio da funo, com um fim ou interesse que lhe seja estranho

    exigindo-se assim um nexo instrumental entre a funo e os danos. Para Menezes Leito essa interpretao retiraria

    grande parte do alcance responsabilidade do comitente e no tem suporte legal j que a lei apenas se refere ao

    causamento de danos no exerccio da funo, no exigindo tambm que os danos sejam causados por causa desse

    exerccio. Por outro lado incluem-se na responsabilidade os danos intencionais e os danos causados em desrespeito das

    instrues em relao aos quais seguramente se poderia sempre falar de um desvio aos fins pelos quais foi conferida a

    comisso.

    Bastar, por isso, para ML um nexo etiolgico entre a funo e os danos no sentido de que seja no seu exerccio

    que os danos sejam originados. Efectivamente, tirando o comitente proveito da funo exercida pelo comissrio justo

    que responda por todos os danos que o comissrio causa a outrem enquanto exerce essa funo. Por exemplo, o

    empregado bancrio que resolve burlar os clientes do banco, naturalmente que se justifica que o banco responda como

    comitente ao abrigo do art. 500..

  • Note-se que, desde que no exerccio da funo, a responsabilidade do comitente abrange tambm os actos

    intencionais do comissrio ou praticados em desrespeito das instrues. Assim naturalmente que o comitente

    responder se o segurana de uma discoteca resolve intencionalmente agredir quem l pretendia entrar.

    c) desde que sobre o comissrio recaia tambm a obrigao de indemnizar

    A doutrina diverge sobre se para a responsabilidade objectiva do comitente se exige culpa do comissrio ou se

    basta qualquer imputao ao comitente, mesmo que a ttulo de responsabilidade pelo risco ou por factos lcitos. No

    sentido da 1 soluo pronunciou-se, entre outros, Antunes Varela. No sentido da 2 pronunciou-se, entre outros,

    Menezes Cordeiro.

    A interpretao da lei suscita fundadas dvidas. O n 1 do art. 500. refere que para que o comitente responda

    pelos danos pelo comissrio, necessrio que sobre este recaia tambm a obrigao de indemnizar, parecendo admitir

    por isso que alm do nexo de causalidade entre a conduta do comissrio e os danos apenas se exige que o comissrio

    responda por esses danos a qualquer ttulo. Mas o n 3 do art. 500. ao estabelecer o direito de regresso do comitente

    parece pressupor a culpa do comissrio, j que se estabelece que este direito se exclui se ele tiver tambm culpa.

    Para ML, parece que a lei no exigir uma demonstrao efectiva da culpa do comissrio, bastando-se o art.

    500., n 1 com uma culpa presumida. J parece, porm, duvidosa a possibilidade de aqui serem abrangidas a

    responsabilidade pelo risco ou por sacrifcio praticado pelo comissrio. Efectivamente, nos casos de responsabilidade

    pelo risco, a lei quase sempre exige um benefcio prprio retirado da actividade (arts. 502. e 503.), que no pode recair

    no comitente por intermdio do comissrio. Na verdade, ou esse benefcio retirado pelo comitente e ento ele responde

    logo com base nas referidas previses de risco, ou compete antes ao prprio agente e est por natureza excluda a

    existncia de uma relao de comisso. J na responsabilidade pelo sacrifcio o comitente pode responder como

    beneficirio no caso de tirar proveito do acto (ex: algum manda 1 empregado seu arrombar um carro pertena de

    outrem para o levar ao hospital), mas essa responsabilidade resultar da aplicao dos critrios do art. 339.,n 2 e no

    do art. 500..

    Para alm disso convm recordar que a lei estabelece a responsabilidade do comitente apenas para garantia do

    pagamento de indemnizao, uma vez que depois cabe ao comitente direito de regresso integral sobre o autor do dano,

    a menos que haja concorrncia de culpas (art. 500., n 3). Ora esse regime do direito de regresso do comitente adequa-

    se muito mal aos outros ttulos de imputao que recaiam sobre o comissrio, onde no se compreenderia qual o critrio

    para estabelecer esse direito de regresso, e mesmo que esse critrio fosse estabelecido, qual a razo para o comitente

    funcionar nesses casos como garante da indemnizao.

    Por isso, ML adere 1 soluo.

    A responsabilidade do Estado e de outras pessoas colectivas pblicas

    Vem prevista no art. 501.

    O contedo desta norma essencialmente remissivo, destinando-se a fazer aplicar igualmente o art. 500.

    quando o comitente seja o Estado ou outra pessoa colectiva pblica. No entanto, essa remisso limitada aos actos de

    gesto privada, ou seja, aqueles em que as entidades pblicas actuam desprovidas de poderes de autoridade ou ius

    imperii, como no exemplo do militar que conduz um camio ou do funcionrio que vai buscar material de escritrio.

  • Efectivamente, se a actuao das entidades pblicas corresponder ao exerccio de poderes de autoridade (gesto

    pblica), j no ser aplicvel o art. 501., estabelecendo-se a responsabilidade das entidades pblicas com base no

    direito constitucional e administrativo.

    Danos causados por animais

    Vm previstos no art. 502.. Neste caso a lei determina a responsabilidade pelo risco do utilizador de animais

    no seu prprio interesse, depois de no art. 493., n 1, ter estabelecido em relao ao vigilante de animais uma

    responsabilidade por culpa presumida. Naturalmente que nada impede a cumulao das 2 responsabilidades, caso em

    que os dois respondero solidariamente perante o lesado.

    O 1 requisito desta responsabilidade a utilizao dos animais no prprio interesse, o que abrange

    naturalmente o proprietrio dos animais, mas tambm todos os titulares da faculdade de utilizao prpria do animal

    como o usufruturio, locatrio, comodatrio ou o simples possuidor sendo que a utilizao por estes excluir a

    responsabilidade daquele. No caso da locao, porm, parece que tanto o proprietrio como o locatrio se podero

    utilizadores no seu prprio, o 1 em virtude da percepo do preo locativo e o 2 em virtude da utilizao prpria do

    animal.

    O 2 requisito que os danos resultem do perigo especial que envolve a utilizao do animal, restringindo-se

    assim a responsabilidade a uma zona de riscos normalmente conexos com a sua utilizao. Desta zona de risco no so

    excludos os casos de fora maior (ex: o cavalo que derruba algum a fugir de um incndio) nem os factos de terceiro

    (como na hiptese de o animal ter sido aulado por 3), ainda que nesta ultima hiptese possa concorrer tambm a

    responsabilidade deste. Ocorrendo culpa do lesado (ex: algum, desrespeitando um aviso vai fazer uma festa a um co

    feroz), aplicar-se- o regime do art. 570.. Pelo contrrio, estaro excludos os danos que embora causados pelo animal

    so exteriores aos perigos da sua utilizao. Assim, se algum sofre uma queda por se assustar ouvindo ladrar um co

    preso, que no tinha qualquer hiptese de o atingir no haver qualquer responsabilidade do dono do animal.

    Danos causados por veculos

    A) Pressupostos da responsabilidade pelo risco

    503/1: responsabilidade objectiva do utilizador de veculos, limitada aos riscos prprios do veculo.

    Direco efectiva do veculo causador do dano: poder de facto, ou exercer controlo sobre o veculo,

    independentemente da titularidade ou no de algum direito sobre o mesmo; por outro lado, essa

    pessoa tem de ser imputvel.

    Sempre que falte esse poder de facto, excluir-se- a direco efectiva (ex: proprietrio a quem o

    veiculo foi furtado, cliente do txi ou aluno da escola de conduo).

    AV: tem a direco efectiva do veculo o proprietrio, o usufruturio, o adquirente com reserva de

    propriedade, o comodatrio, o locatrio, o que furtou, o condutor abusivo e, de um modo geral,

    qualquer possuidor em nome prprio.

    Tem a direco efectiva a pessoa que, de facto, goza ou usufrui as vantagens dele, e a quem, por

    essa razo, cabe controlar o seu funcionamento (luzes do carro, afinar traves, verificar pneus) =

    detentor (1253)

    ML + AV: no corresponde ideia de quem tem o volante nas mos na altura do acidente.

  • Utilizao no seu prprio interesse: exclui a responsabilidade objectiva daqueles que conduzem o

    veculo por conta de outrem (comissrio, que o utiliza em proveito ou s ordens do comitente),

    recaindo a responsabilidade sobre o prprio comitente.

    Danos provenientes dos riscos prprios do veculo: danos resultantes da circulao do veiculo (quer em

    via publica, quer em recintos privados ex: atropelamento, embate, coliso), como os danos

    causados pelo veiculo quando imobilizado (ex: curto circuito do motor)

    B) Causas de excluso da responsabilidade

    505: responsabilidade pelo risco excluda sempre que o acidente seja imputvel ao prprio lesado ou

    a terceiro, em que no se exige culpa destes ltimos mas, antes, que a sua conduta tenha sido a nica causa

    do dano.

    Concorrncia de causalidade em relao ao dano, entre:

    Facto do lesado e a conduo do veculo:

    - culpa no do lesado: lesado no responde, mas sim o condutor

    - culpa do lesado e do condutor: 570

    Culpa do lesado concorrer com rico prprio do veiculo: 570/2 excluda a responsabilidade

    do condutor do veiculo, se no se demonstrar a culpa do condutor.

    C) Benefcios da Responsabilidade

    D) Limites da Responsabilidade pelo Risco

    E) Hiptese de ocorrncia de responsabilidade por culpa

    F) Coliso de veculos

    G) Pluralidade de Responsveis pelo dano

    1. O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA

    1.1 O enriquecimento sem causa como fonte das obrigaes

  • A clusula geral do art. 473. n. 1 permite o exerccio da aco de enriquecimento sempre que algum obtenha

    um enriquecimento, custa de outrem, sem causa justificativa. Teramos ento os seguintes pressupostos constitutivos

    do enriquecimento sem causa (ESC):

    a) existncia de um enriquecimento;

    b) obteno desse enriquecimento custa de outrem;

    c) ausncia de causa justificativa para o enriquecimento.

    Estes pressupostos so to amplos e genricos que seria possvel uma aplicao indiscriminada desta clusula.

    Por essa razo, o nosso legislador decidiu consagrar expressamente no art. 474. a subsidariedade do instituto do ESC.

    Esta norma pretende estabelecer que a aco de enriquecimento seja o ltimo recurso a utilizar pelo empobrecido. Mas

    esta regra da subsidariedade no tem um alcance absoluto, pois a aco de enriquecimento no pressupe que o

    empobrecido tenha perdido a propriedade sobre as coisas obtidas pelo empobrecido, pelo que esta pode concorrer com

    a reivindicao; pode tambm concorrer com a responsabilidade civil, sempre que esta no atribua uma proteco

    idntica da aco de enriquecimento; o 472. admite uma opo entre a aplicao do regime da GN e o do ESC. Assim,

    parece que o que o 474. consagra uma incompatibilidade de pressupostos entre as situaes referidas e essa aco.

    Efectivamente, se a lei determina a subsistncia do enriquecimento porque lhe reconhece causa jurdica e, se atribui

    algum direito ao empobrecido em consequncia da situao ocorrida, fica excluda a obteno de enriquecimento

    custa de outrem. No existe, por isso, uma verdadeira subsidariedade do ESC.

    1.2 Configurao dogmtica do instituto

    So apontadas as seguintes posies:

    - a teoria unitria da deslocao patrimonial;

    - a teoria da ilicitude;

    - a doutrina da diviso do instituto.

    A) A teoria unitria da deslocao patrimonial

    De acordo com esta doutrina tradicional, a clusula geral de ESC institui uma pretenso geral de aplicao

    directa, bastando para tal nica e simplesmente que se verificasse a deteno injustificada de um enriquecimento custa

    de outrem. Deve verificar-se uma deslocao patrimonial sem causa directamente entre o enriquecido e o empobrecido,

    independentemente da forma que revista essa deslocao. Galvo Telles sustenta esta posio, para este autor, s existe

    empobrecimento se o lesado tiver sofrido a perda de um valor que pertencia ao seu patrimnio, correspondendo a

    ausncia de causa justificativa descoberta da vontade profunda da lei, sendo o ESC quando, segundo os princpios

    legais, no haja razo para ele.

    B) A teoria da ilicitude

    Schulz coloca pela primeira vez a questo jurdica da aplicao do instituto ao problema da interveno em bens ou

    direitos alheios. A base do ESC consiste numa aco contrria ao direito. A seu ver, existiria um princpio de que

  • ningum deveria obter um ganho atravs de uma interveno ilcita num direito alheio. Desse princpio resultaria que

    quem efectuasse uma interveno objectivamente ilcita no direito alheio deveria restituir o resultado dessa interveno.

    Schulz aproxima assim o ESC responsabilidade civil, pela referncia a um conceito de ilicitude delitual.

    Com base na doutrina de Schulz, surge a chamada teoria da ilicitude, segundo a qual o ESC tem como elemento

    decisivo a aquisio em desconformidade ao Direito de um benefcio a partir de um patrimnio alheio.

    C) A doutrina da diviso do instituto

    A tese principal desta doutrina reside na diviso do instituo do ESC em duas categorias principais, sendo uma

    delas relativa s situaes de enriquecimento geradas com base numa prestao do empobrecido e outra abrangendo

    as situaes de enriquecimento no baseadas numa prestao, atribuindo-se nesta ltima papel preponderante ao

    enriquecimento por interveno.

    D) Posio adoptada

    Menezes Leito opta pela doutrina da diviso do instituto, por isso distingue as seguintes situaes:

    - enriquecimento por prestao;

    - enriquecimento por interveno;

    - enriquecimento por despesas realizadas em benefcio doutrem;

    - enriquecimento por desconsiderao de um patrimnio intermdio.

    1.3 Modalidades de Enriquecimento Sem Causa

    1.3.1 O enriquecimento por prestao

    1.3.1.1 Conceito e modalidades tpicas

    O enriquecimento por prestao respeita a situaes em que algum efectua uma prestao a outrem, mas se verifica

    uma ausncia de causa jurdica para que possa ocorrer por parte deste a recepo dessa prestao. Nesta categoria, o

    requisito fundamental do ESC a realizao de uma prestao, que se deve entender como uma atribuio

    finalisticamente orientada.

    Este conceito de prestao seria composto pelos seguintes requisitos:

    - um elemento real consistente numa atribuio patrimonial que produza no receptor um enriquecimento;

    - dois elementos, um cognitivo e outro volitivo, os quais se traduzem no facto de esse incremento do patrimnio

    doutrem exigir uma conscincia da prestao e a vontade de prestar;

    - elemento final, segundo o qual a atribuio tem que visar a realizao de um fim especfico (o incremento do

    patrimnio alheio).

    H vrias modalidades possveis de no obteno do fim visado com a prestao:

    1.3.1.2 A repetio do indevido

  • So pressupostos comuns repetio do indevido :

    - a realizao de uma prestao com inteno de cumprir uma obrigao (animo solvendi);

    - sem que exista uma obrigao subjacente a essa prestao (indevido objectivo);

    - ou sem que esta tenha lugar entre solvens e accipiens (indevido subjectivo);

    - ou deva ser realizada naquele momento (cumprimento antecipado).

    O primeiro pressuposto referido no art. 476. n. 1 que algo tenha sido prestado com inteno de cumprir uma

    obrigao, a lei exige uma inteno solutria especfica.

    O segundo pressuposto o de que a obrigao no existisse no momento da prestao, por no se ter chegado a

    constituir ou porque j estava extinta.

    O indevido subjectivo acontece quando a prestao respeita a sujeitos diferentes daquele que recebeu ou realizou a

    prestao. O indevido subjectivo ex latere accipientis ocorre quando a prestao realizada a terceiro, e no ao seu

    verdadeiro credor. O ex latere solventis ocorre quando a prestao realizada por terceiro, e no pelo verdadeiro

    devedor. Neste caso, h que tomar em considerao a posio do credor, uma vez que este recebe o que lhe devido,

    pelo que se torna dificilmente sustentvel obrig-lo pura e simplesmente restituio. Essa restituio s , por isso,

    admitida em casos excepcionais, referidos nos arts. 477. e 478., pressupondo-se um erro do terceiro, cujos efeitos

    variam consoante ele julgue cumprir uma obrigao prpria ou julgue estar obrigado perante o devedor a cumpri-la.

    Verificando-se que o terceiro cumpriu a obrigao alheia por a julgar prpria, o art. 477. faz depender a restituio de

    o erro ser desculpvel. J no art. 478. regula-se a situao de o terceiro cumprir obrigao alheia na convico

    errnea de estar obrigado para com o devedor a cumpri-la. Est-se perante uma atribuio patrimonial indirecta, j que

    o patrimnio do credor aparece como meramente interposto em relao ao patrimnio do devedor.

    A lei estabelece ainda no art. 476. n. 3 o caso do prestao realizada antes do tempo. Esta, obtm o fim visado (a

    extino da obrigao), pelo que no admitida a sua restituio. No entanto, uma vez que o devedor possui, em virtude

    do prazo da prestao, uma excepo material dilatria, o facto de renunciar a ela enriquece o credor. Se, porm, essa

    renncia no voluntria e resulta antes de um erro desculpvel, verifica-se um incremento do patrimnio do credor

    sem causa jurdica, o que permite ao devedor exigir a sua restituio.

    1.3.1.3 A restituio da prestao por posterior desaparecimento da causa

    O art. 473. n. 2 inclui entre as modalidades de ESC por prestao a hiptese de algum ter recebido uma prestao

    em virtude de uma causa que deixou de existir. So casos da sua aplicao:

    - posterior extino do direito prestao j recebida;

    - a restituio do sinal em caso de cumprimento do contrato ou a sua extino por impossibilidade ou revogao

    (art. 442. n. 1);

    - a restituio do ttulo da obrigao aps a extino da dvida (art. 788.);

    - a restituio da prestao em virtude da extino do contrato por impossibilidade causal da contraprestao

    (art. 795. n. 1);

    - casos de extino do casamento, quando um dos cnjuges realizou ao outro atribuies patrimoniais que

    excedam o cumprimento dos seus deveres conjugais e no revistam a natureza de uma doao.

  • 1.3.1.4 A restituio da prestao por no verificao do efeito pretendido

    O art. 473. n. 2 inclui tambm a hiptese de algum realizar uma prestao em vista de um efeito que no se

    verificou. Tem como pressupostos de aplicao:

    - a realizao de uma prestao visando um determinado resultado;

    - correspondendo esse resultado ao contedo de um negcio jurdico;

    - sendo que esse resultado no se vem posteriormente a realizar.

    Em primeiro lugar, necessrio que seja realizada uma prestao, visando um resultado determinado. Exige-se que

    o resultado, ou seja, o fim da prestao, no respeite ao cumprimento de uma obrigao ou no se esgote nesse

    cumprimento. O resultado visado com a prestao tem assim que corresponder a um comportamento da outra parte,

    mais precisamente uma contraprestao, cuja realizao se esperava quando se verificou a prestao.

    Em segundo lugar, necessrio que esse resultado corresponda ao contedo de um negcio jurdico. Esse negcio

    no pode ser considerado como juridicamente vinculante, uma vez que nesse caso a frustrao do fim da prestao no

    poderia dar lugar a uma restituio por ESC, dado que relevaria antes do regime do no cumprimento de contratos.

    Apenas quando o autor da prestao no tem qualquer possibilidade jurdica de exigir o cumprimento da

    contraprestao que lhe ser permitido recorrer a esta modalidade. O que se exige antes um acordo das partes sobre

    o fim da prestao.

    Finalmente necessrio que o resultado visado no se venha a verificar.

    possvel sustentar a aplicao desta figura realizao de prestaes antecipadamente constituio do contrato

    gerador das obrigaes; realizao de prestaes para provocar determinada actuao do receptor, a que este no

    pode ou no quer obrigar-se; e realizao de prestaes com destinao do fim.

    Esta modalidade excluda sempre que o autor da prestao sabe que o resultado por ela visado impossvel ou,

    agindo contra a boa f, impede a sua realizao (art. 475.).

    1.3.1.5 O problema das atribuies patrimoniais indirectas

    A prestao, no ESC, muitas vezes no se refere imediatamente a uma nica relao de atribuio entre duas

    pessoas, mas antes comporta vrias relaes de atribuio. Essas situaes so denominadas de atribuies patrimoniais

    indirectas, podendo ocorrer em situaes como a delegao; o contrato a favor de terceiro; a cesso de crditos; a

    assuno de dvida; e a fiana. Em todos estes casos geram-se relaes trilaterais, compostas por 3 relaes obrigacionais:

    a relao de cobertura, a relao de atribuio e a relao de execuo.

    A determinao do onerado com a obrigao de restituio passar por uma ponderao das regras relativas ao risco

    da prestao e do concurso de credores, atravs dos seguintes pontos de vista valorativos:

    - manuteno das excepes;

    - proteco contra as excepes de terceiro;

    - justa repartio do risco de insolvncia.

    1.3.2 O enriquecimento por interveno

  • 1.3.2.1 Conceito e situaes abrangidas

    O 473. n. 2 omite, mas deve ser considerada como situao d