reformas do processo penal - nereu giacomolli importante

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NEREU JOSE GIACOMOLLI Doutor em Direito Processual Penal pela Universidad Complutense de Madrid, Estudos de realizados na Universita degli Studi di Torino, Professor e pesquisador no Programa de P6s-Graduafao em Criminais da Pontificia Universidade Cat6lica do Rio Grande do SuI PUCRS, Magistrado, Desembargador na Camara Criminal do Tribunal de Justir;a do Rio Grande do Sul TJRGS. REFORMAS (?) DO PROCESSO PENAL: CONSIDERAC;:OES CRITICAS Provas Ritos Processuais JUri Sentenc;as EDITORA LUMEN JURIS Rio de Janeiro 2008

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Page 1: Reformas Do Processo Penal - Nereu Giacomolli IMPORTANTE

NEREU JOSE GIACOMOLLIDoutor em Direito Processual Penal pela Universidad Complutense de Madrid,

Estudos de P6s~Doutoradorealizados na Universita degli Studi di Torino,Professor e pesquisador no Programa de P6s-Graduafao em Ci~ncias Criminais da

Pontificia Universidade Cat6lica do Rio Grande do SuI ~ PUCRS,Magistrado, Desembargador na 6~ Camara Criminal do Tribunal de Justir;a do

Rio Grande do Sul ~ TJRGS.

REFORMAS (?) DO PROCESSO PENAL:

CONSIDERAC;:OES CRITICAS

ProvasRitos Processuais

JUriSentenc;as

EDITORA LUMEN JURIS

Rio de Janeiro2008

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Copyright © 2008 Nereu Jose Giacomolli

Categoria: Processo Penal

PRODUC;:Ao EDITORIAL

Livraria e Editora Lumen Juris Ltcla.

A LIVRARIA E EDITORA LUMEN JURIS LTDA.

nao se responsabiliza pelas opini6es emitidas nesta obra.

Eproibida a reproduc;ao total'ou parcial, por qualquer

meio ou processo, inclusive quanta as caracteristicas

graficas elan editoriais. A violac;ao de direitos autoraiseonstitui erime (C6digo Penal, art. 184 e §§, e Lei nQ 6.895,

de 17/12/1980), sujeitando-se abusea e apreensiio eindenizac;6es diversas (Lei nQ 9.610/98).

Todos os direitos ciesta edic;ao reservados aLivraria e Editora Lumen Juris Ltda.

Impressa no Brasil

Printed in Brazil

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A saudade da presen~a, aflorada na ausencia, de algunsmeses, me fazem render homenagem e reconhecimento aBeatriz, Caroline e Felipe Giacomolli.

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Agradecimentos especiais aos colegas Aramis Nassif ePaulo Augusto Irion, pelas discussoes acerca dos temas tratados,mormente as afetos ao Tribunal do Juri e aos amigos que leramas originais e fizeram importantes observa~oes: Andre Maya,Mania Aparecida de Castro Ascoli e Tomas Grings Machado.

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Sumario

Prefiicio .. xi

Introdu~ , 1

Capitulo I - Provas....... 51. Densidade inquisitorial probat6ria no C6digo de Processo Penal de 1941. 52. Modelo probat6rio constitucional e humanitario: bases do processo

penal............................................................................................................ 103. Altera<;6es(?) acerca das provas em 2008 18

3.1. 0 contradit6rio judicial como essencia da prova 203.2. Livre(?) aprecia<;iio da prova 233.3. Cargas e chances probat6rias 293.4. Atua<;iio ex officio do juiz 353.5. 1nadmissibilidade da prova ilkita....................................................... 37

3.5.1. Prova illcita por deriva<;iio 393.5.1.1. Nexo causal entre a primeira prova (ilicita) e a segun-

da (licita) 423.5.1.2. Descoberta inevitave1 da prova 46

3.5.2. Efeitos do reconhecimento da ilicitude 493.6. Particu1aridade acerca das perkias..................................................... 503.7. A inclusiio do ofendido no processo penal........................................ 533.8. InquiriC;ao das testemunhas 55

Capitulo II - Ritos Processuais 591. Crfticas iniciais............................................................................................ 592. Considera~6es introdut6rias....................................................................... 613. Rito comum ordinario 63

3.1. Julgamento antecipado do processo penal: rejei<;ao da acusa<;ao eabsolvi<;ao sumaria............................................................................... 73

4. Particularidades do rito comum sumario 775. 0 rito comum sumariissimo 78

Capitulo III - Tribunal do JUri 831. Introdu<;iio critica 832. A fase pre1iminar 863. Decis6es do juiz presidente 904. Os jurados.................................................................................................... 94

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5. A sessao de julgamento 966. Os quesitos 1017. Particularidades da senten,a do juiz presidente....................................... 104

Capitulo N - Outras Modifica,iies...... 1071. Alterac;ao da irnputac;ao acusat6ria: emendatio e mutatio libelli 1072. Senten,a penal absolutoria 1083. Senten,a penal condenatoria... 1094. Decisao desclassificat6ria e suspensao condicional do processo.............. 1115. Considera,6es de direito intertemporal................ 113

Refe~ncias BibliogrMicas .

ANEXOI

Lei n' 11.689, de 9 junho de 2008 .

Anexoll

Lei n' 11.690, de 9 junho de 2008 ..

ANEXOIII

Lei n' 11.719, de 20 junho de 2008 .

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Prefacio

Reformas do Processo Penal: Considera<;:6es criticas

Ecomum ecoar nas aulas de processo penal antiga li~ao de velhos mes­tres sobre os vinculos entre Constitui~aoe C6digo de Processo Penal.

Tambem e cetta que por imimeras raz6es, que passaro do dominio daideologia do positivismo juridico amaneira COIDO curriculos de processo penalforam desenhados nos cursas de Direito no Brasil, a afirmac;ao do mencionadovinculo soa sempre como declara<;ao meramente ret6rica, muito distante darealidade do sistema de controle social institucionalizado (que diri das formassubterra.neas de atua<;ao de violentos e vigorosos mecanismos de contralesocial informal).

o compromisso entre direitos fundamentais e Constitui~ao da Republicae da essencia do Estado de Direito.

Por iSBa, os ventos de redemocratizac;:ao que varreram a America Latina,entre os anos 80 e 90 do seculo passado, trouxeram consigo demandas de pro­funda transforma~ao do Direito Processual Penal, quase sempre viabilizadaspela edi~ao de inteiramente novos C6digos de Processo Penal! Tratou-se daruptura com as estruturas que tornaram passivel 0 emprego de instrumentosprocessuais como ferramentas elicazes de repressao das dissidencias e desupressao das vozes (e das pessoas) contririas ao status quo.

Juizos de eleic;ao dos governantes, decisoes nao fundamentadas, contraleobrigat6rio de sentenc;as favoraveis ao acusado (por meio do "recurso deoficio"), emprego abusivo da prisao processual e, principalmente, ativismojudicial na condu~ao do processo e na produ~ao da prova sao apenas algunsexemplos das praticas identificadas com 0 arbitrio e com as ditaduras.

Com a transic;:ao democnitica, 0 encerramento de urn ciclo e a renovac;:aodas condi~6es da vida politica neste "cora~ao partido" que e a America Latina,na poesia de Isabel Allende, a supera~ao do esgotado modelo de Justi~a Crimi­nal demandou a "troea das chaves", isto e, a altera~ao dos c6digos de inter­preta<;fio da realidade (Fauzi Hassan Choukr1) em face da tarefa de apura~ao

Processo Penal de Emergencia, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2002.

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da responsabilidade penal das pessoas, elevadas it condi~ao de sujeitos dedireito.

Naturalmente que tal empresa terminou por exigir novos Codigos deProcesso Penal!

a Brasil, porern, naD passou por issa. Einteressante perceber que no casobrasileiro a transi~ao democratica resultou de habilidosa negocia~ao entregovemantes do antigo regime e lideres liberais. 0 centro de tudo localizou-sena previsao de elei~6es diretas e periodicas e em paulatina transferencia dopoder, preservando-se espa~os intocaveis. [sso e sensivel ainda em 2008,quando escrevo a apresenta~ao ao livro do professor Nereu Jose Giacomolli,por conta do debate sobre a responsabilidade pela pratica da tortura durante aultima ditadura.

o aspecto pratico deste estado de coisas consistiu em se perder a"passada" historica, 0 timing, da refortnula~ao plena do processo penal quandoa experiencia dos abusos a que parcela da sociedade brasileira estevesubmetida ainda encontrava-se bastante viva na memoria (e marcada na pele).A seletividade inerente ao funcionamento comum do sistema de justic;acriminal ficara afetada ao longo do regime militar e sua expansao para alem dogrande areo das classes mais vulneraveis (invisiveis sociais) constituiuargumento concreto de valoriza~ao dos direitos humanos.

NaG h:i aqui a pretensao de identificar responsaveis. Talvez ate porque asfatas politicos do continente tenham se misturado as importantes alterac;6essociais, politicas, economicas e tecno16gicas que transformaram a realidadeplanetaria e que, sob 0 signo da globaliza~ao, conquistaram a hegemonia,especialmente no que concerne it tarefa (ideologica) de ditar os termos deinterpreta~ao da realidade.

NaG por Dutra razao as pertinentes investigac;oes das criminologiascriticas, alcunhadas de "ex6ticas", sofreram com a marginaliza<;ao no meioacademico e com 0 mais solene descaso no cotidiano dos tribunais.

Em urn ambiente dominado pelo individualismo possessivo a politicaperdeu sua centralidade e, alem disso, a sensibilidade das classes medias aoabuso, que muito frequentemente acompanha 0 funcionamento do sistemacriminal, deu lugar ao sentimento difuso de inseguran~a, que se pretendeeliminar ainda que aD eusto do sacrificio das garantias processuais (dos maisdebeis economicamente)!

Isso explica nao apenas a prolifera~ao de leis penais especificas, mas abanaliza~ao da prisao processual e a cobran~a pe1a "simplifica~ao" dosprocedimentos, que 0 senso eomum te6rico busca intencionalmenteconfundir com redu~ao drastica das garantias.

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Nao raro 0 discurso dos profissionais do direito esta permeado deexpress6es do tipo de que se "aceita 0 garantismo, mas sem exageros", como sea efetividade de direitos previstos na Constitui<;ao da Republica constituisseprivilegio de classel

Para adiante das boas inten<;oes de todos que participam ou participaramdo projeto de mudan<;a, e il sombra desta cultura que se consolida 0 ambienteem que se inserem as reformas parciais ao C6digo de Processo Penal, vinteanos depois da Constitui<;ao.

Entre os projetos e as leis aprovadas ha significativa distancia. Mesmoentre projetos e leis e a Constitui<;ao da Republica ha reconhecivel hiato, queagora sera (ou nao) preenchido pela capacidade dos profissionais da areajuridica em conferir densidade constitucional as suas praticas.

A teoria juridica contemporanea evoluiu para compreender que a normajuridica nao se esgota tampouco se confunde com 0 texto da norma, com seupreceito dispositivo. A media<;ao em urn processo criativo de interpreta­<;ao/aplica<;ao coloca nos ombros dos profissionais, de agora em diante, aresponsabilidade por fazer deste C6digo de Processo Penal remodelado verda­deiro instrumento concreto de defesa da cidadania ou mera ferramenta deapoio ao aparato repressivo.

Epreciso enxergar para alem das aparencias!E e nisso que reside a qualidade fundamental do livro que 0 professor

Nereu jose Giacomolli oferece ao leitor. Em tempo de glosas ao novo textolegal e indispensavel encontrar textos que iluminem as matrizes te6ricas quesao extraidas da Constitui<;ao da Republica para conferir validade ao direitoordinario.

Indicar 0 significado das palavras da lei, discemir entre prazos maiores emenores e muito pouco para 0 que se pretendia desta refonna e para aspossibilidades derivadas da vigencia das leis em questao.

Nereu jose Giacomolli nao se perde nisso, menos ainda admite demaneira acritica a perpetua<;ao (e amplia<;ao) das pretensoes inquisitoriais detransforma<;ao do juiz em agente da seguran<;a publica e do cambio do Poderjudiciario em agencia policial.

o autor elabora com simplicidade e muita competencia as pautas deinterpretac;ao das novas leis e sua obra reline as condic;6es necessarias parafuncionar como blissola e orientar os profissionais que se vedio as voltas comeste renovado C6digo de Processo Penal.

Quero lembrar 0 leitor que a relevancia de obra dessa envergadura emedida pelo reconhecimento de que hoje 0 Supremo Tribunal Federal naoassiste passivo il edi<;ao de leis que desafiam a Constitui<;ao da Republica. Nossa

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Corte Suprema, ademais, tern empreendido a tarefa de indicar em que tennosdeterminados preceitos dispositivos hao de se consolidar normas juridicas.

Para que 0 leitor, portanto, possa entender e acompanhar estes novostempos, nada mais conveniente que 0 texto que tern em maos.

Parabens professor Nereu!E parabens, tambem, prezado leitor.

Agosto de 2008.Geraldo Prado

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Introduc;ao

Dos varios prajetos de reforma do Codigo de Pracesso Penal, apresen­tados em 2001, tres deles, apos sete anos de incuba~ao, emergem envoltos emuma magia redentora do pracesso penal brasHeira. Essas novas(?) leis frag­mentam, alem da realidade, ainda mais, 0 Codigo de Pracesso Penal e 0 pro­prio pracesso penal, mas nao rampem com a base epistemologica e politicada decada de quarenta: supremacia do ius puniendi sobre 0 direito de liber­dade; busca da verdade material a todo custo, inclusive com a atua~ao exofficio; bases inquisitoriais ofuscantes da Constitui~ao,com alto teor de blin­dagem ordinaria, pratetiva das subestruturas (lei ordinaria e atua~ao dossujeitos pracessuais oficiais). Tudo isso incrementado pela superficialidadedigital da contemporaneidade, quantificadora de resultados, sem percep~ao

do real e da terceira via entre a simplicidade e a complexidade contempora­neas (0 outro, 0 ser humano, a vida, a cidadania).

o ser humano e dotado de dignidade por ser pessoa, constituindo-se, adignidade, nao em urn direito, mas na essencia do ser humano, a qual exigecompreensao e considera~ao. A Republica Federativa do Brasil tern como urnde seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, elemento comum,nucleo essencial de todos os direitos fundamentais e "principio" fundante detoda a ordem juridica. Por isso, nao e a pessoa que existe em fun~ao doEstado, mas este que opera em fun~ao das pessoas. E 0 pracesso penal nao euma mera ordena~aode folhas de papel que van se aglutinando (constru~ao

juridica artificial), mas no seu interior pulsam seres e nele a vida se apresen­ta com toda a sua nudez, miseravelmente fragilizada. Estabelece-se, nodesenvolvimento do pracesso penal, uma situa~ao pracessual de embateentre puni~ao e liberdade, nos efeitos do prablema material e nao em suascausas (equivoco epistemologico, ideologico e de politica legislativa e pren­sar as solu~oes da causa - de todas elas - atraves de regras pracessuais). Deurn lado, 0 Estado desenvolve atividades tendentes a incidencia do iuspuniendi e a defesa, em polo antagonico, labora na preserva~ao do statuslibertatis e/ou na diminui~ao das conseqiiencias dessa interven~ao. Nao havinculos de colaborac;ao entre as sujeitos processuais e estes, quando existi­rem, ofendem 0 devido processo constitucional (separa~ao das fun~oes dossujeitos, defesa tecnica obrigatoria, presun~ao de inocencia, v. g.). Nesse pra-

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Nereu Jose Giacomolli

cessamento dialetico, mesmo que toda a carga acusat6ria atinja ° irnputado,ele continua sendo uma pessoa humana, urn sujeito processual e nao urnobjeto do processo; e sujeito de direitos e de garantias processuais. Nao sepode falar em processo constitucionahnente valida sem respeito adignidadedo acusado.

Apesar da fragmenta~ao e de algumas fissuras provocadas pe1asre(de)formas de 2008, a todo persiste, com frageis interrogantes constitucio­nais e baixo padrao de conectividade com a base, alheio ao existir, em todasas suas dimens6es: biol6gico, cognitivo e social. Alguns padr6es de conexaocom a Constitui~ao Federal e com as diplomas intemacionais humanitarios,em razao de sua debilidade, desaparecem nas for~as da coopta~ao e da res­posta policialesca e penol6gica das reformas, desvinculados funcionalmentedas atribui~6es de cada sujeito processual. Nao ha conectividade entre aspr6prias partes lan~adas no mundo da existencia processual. 0 exigir de urntodo padronizado, mecanica, de conveniencia e utilidades presentes, cedediante da necessidade de uma clara e objetiva dinamicidade, mas organica,funcional e sistemica, para todos e nao s6 para as eleitos (excluidos do siste­ma criminal). A dinamicidade da sociedade produz situa~6es que buscamsolu~6es na organiza~ao politica e juridica do Estado, quem fixa as regras,agora novas(?) regras, mas que, na Law in action recebem uma carga paraaMm de seus criadores. A pena criminal tern aplica~ao exclusiva no proces­so penal, conduzido par urn 6rgao oficial, cujos mecanismos, segundo a poli­tica criminal oficial, devem dar uma resposta rapida, utilitaria e eficiente acriminalidade, pais etida como a unica via asolu~ao da problematica brasi­leira. 0 aumento da criminaliza~ao de condutas e a da criminalidade estaoesgotando a capacidade do processo penal. As arcaicas estruturas permane­cern inc6lumes, numa aparencia de funcionalidade e com poucas interrogan­tes. As solu~6es apresentadas situam-se na superficialidade digitalizada daacelera~ao e da quantidade, na dace ilusao de que quanta mais respostas,mais solu~6es existirao. Reformar por reformar, modificar para satisfazer asmovimentos da tolerancia zero (menos para as eleitos ao banquete - toleriin­cia maxima), da law and order, do direito penal do inimigo, para fortalecere incrementar 0 Estado policialesco (puni~ao pela investiga~ao, independen­temente do contradit6rio e da jurisdi~ao), sem conectividade com aConstitui~ao Republicana, edar uma aparencia de novo avelha casa edifica­da na decada de quarenta.

Trata-se de uma abordagem inicial dos tres projetos, acerca das provas,dos ritos processuais e do Tribunal do Juri, com aproveitamento de parte daspesquisas de p6s-doutorado (sistema probat6rio). realizadas nos meses de

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera<;6es Criticas

dezembro de 2007, janeiro e fevereiro de 2008, na biblioteca do Dipanimen­to di Scienze Giuridiche da UniversitiJ degli Studi di Torino, onde fui recebi­do e acompanhado pelo Prof. Dr. Mario Chiavario. a presente trabalho naoenfoca toda a problem:hica das provas, dos ritas processuais e do Tribunal doJuri, mas centra-se fundamentalmente nas altera~oes produzidas por estastres leis: 11.689 e 11.670, de 9 de junho de 2008, e 11.719, de 20 de junho de2008. A pretensao, tampouco, e a de exaurir as questoes acerca da tem:iticaabardada, embora tenham sido selecionadas as que, a juizo do autar, sao asmais relevantes. H:i necessidade de mais perguntas, de interrogantes e demenos respostas prontas e aceitantes do sistema como perfeito e acabado.

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Capitulo IProvas

1. Densidade inquisitorial probat6ria no C6digo de ProcessoPenal de 1941

o Codigo de Processo Penal. concebido na decada de 40, tern perfilessencialmente inquisitorial, tambem no que tange aprova. Alias, e na ges­tao da prova que se revela a essencia da op~ao pelos modelos processuais.l 0Codigo de Processo Penal disciplina alguns meios de prova e certos meios debusca da prova. Algumas leis esparsas regulam ourros meios de busca de ele­mentos probatorios, tais como as intercepta~6es de comunica~6es, de dadosinformaticos e telematicos, capta~ao e intercepta~ao ambiental, infiltra~ao

de agentes, por exemplo (Leis 9.034/95 e 11.343/06).A ausencia de urn regramento claro de toda a sistematica probatoria,

mormente dos meios de prova e dos limites impostos asua admissibilidade,e urn fenomeno tipico do modelo inquisitorial de processo ou de urn para­digma com forte tendi'ncia inquisitorial. Por outro lado, no modelo acusato­rio de processo, a prova recebe uma objetiva e completa regulamenta~ao.

Nao e 0 que se observa do Codigo de Processo Penal brasileiro da decada dequarenta; tampouco isso se pode inferir das leis que, de forma assimerrica,preveem alguns meios diferenciados para colher a prova. A falta de uma con-

Por isso a modelo inquisitorial napole6nico nao aboliu totalmente a base doutrinaria do modelosacro (Condlium Veronensis de 1184 e Condlium Maleficarum de 1215), na medida em quemanteve a gestao da prova sob a iniciativa judicial (descoberta da verdade) e a instTw;ao secreta,apesar de ter adotado a separao:;ao das funr;6es, a oralidade e tet atribuido a defesa a urn sujeitoproprio. 0 inquisit6rio refonnado (para uns, acusat6rio formal), secular au laico amenizou a pro­blematica do sacro inquisit6rio, sem romper com a essenda do modelo, pois a manuteno:;ao e 0

fortalecimento do poder, bern como a vontade de agradar aos suditos foram as preocupaij:oes donovo modelo politico. Nesse sentido, CORDERO, Franco. Procedura Penale. Mil.io: Giuffre,2003, pp. 38 e 39; COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (org.). "0 papel do novo juiz no pro­cesso penal", em Crftica a Teoria Geral do Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Renovar,2001, p. 24, quando refere que a caracteristica fundamental do sistema inquisitorio esta na gestioda prova, confiada essencialmeme ao magistrado; CARVALHO, Salo. Antimanual de Crimino­logia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 57 a 64.

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Nereu Jose Giacomolli

sistente regulamenta,ao advem do perfil inquisitorial que sustenta 0 nossoCodigo de Processo penal e toda a legisla,ao engendrada posteriormente.2

No processamento ao estilo inquisitorio, anunciado no IV Concilio deLatrao, apresentado organicamente na primeira metade do sec. XIII, cujoapogeu e alcan,ado com a Ordenan,a Francesa de 1679 (segredo, ausencia decontraditorio, passividade do imputado - quem esta obrigado a falar -, con­fissoes sob tortura, atua,ao ex officio do juiz, mormente na busca da prova),o magistrado, comprometido ideologicamente, de expectador impassive!,segundo Cordero, "se converte em protagonista do sistema", em orgao mili­tante, ator, em inquisidor a elaborar "hipoteses paranoides", e "combatepotencias malt~ficas, em uma cruzada cotidiana", sendo "mento seu que 0

mundo termine devorado pelo demonio". Nessa perspectiva, 0 acusado e urnser que nasce culpado e deve ser explorado a fundo. devendo confessar. Bastaescavar em algum lugar para que aflore 0 mal, nele contido.3

Nesse modelo inquisitorial, 0 juiz, senhor, 0 todo poderoso, represen­tante divino ou dos aristocratas e monarcas contemporaneos, urn ser intoca­vel, insuspeito, ungido contra qualquer voz critica, urn ser acima dos demaisagentes processuais, com mais poderes, inclusive probatorios, que as propriaspartes. Por isso, ha justificativa, nesse modelo, para que 0 mesmo sujeito sejamagistrado, acusador e defensor, concomitantemente. Assim, mesmo sempedido das partes, pode ouvir testemunhas, decretar prisoes sem provoca,ao,determinar meios de prova e modificar a metodologia probatoria propostapelas partes e ate recorrer em nome da acusa,ao (mesmo que veladamente eem nome da lei), de sua propria decisao (recursos ex officio).

Nessa senda, 0 julgador busca e, ao mesmo tempo, valora 0 meio deprova e a metodologia da busca dessa prova, como licitas; atua ativamentena busca da prova e depois a processa valorativamente. Como, nesse mode­10 inquisitorial, avaliar negativamente 0 resultado, a prova em si, posterior­mente, no momento da decisao? S6 assim, para esse sistema, chega-se a"verdade" e, indo alem, atingindo-se a "verdade material" (mesmo com atortura, no modele inquisitivo, pois era 0 meio chissico de "arrancar a ver-

2 Vide PRADO, Geraldo. Sistema Acusat6rio. A Confonnidade Consritucional das Leis ProcessuaisPenais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, pp. 197 a 229, sobre 0 sistema acusat6rio e a legisla~ao

processual posterior aConstitui~ao.

3 Vide CORDERO, Franco. Procedura Penale. Miliio: Giuffre. 2003, pp. 21 e 23. Em pp. 24 e 25refere que 0 inquisidor tortura os pacientes como quer e. dentro de seu marco cultural pessimis~ta, 0 animal humano nasce culpado, bastando "escavar em urn ponto qualquer para que aflore 0

mal"; "e urn animal que deve confessar e ser explorado profundamente".

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Reformas (?) do Processo Penal;Considera~6es Criticas

dade"),4 contra a natureza e a realidade das coisas do mundo humano, porisso, imperfeito. Entao, por que regulamentar as quest6es referentes aprova? E 0 magistrado quem determina as regras! Quanto menos regras,menos limites aatua~ao Estatal.

Regulamentar significaria delimitar os poderes das partes e do Estado-)uiz;significa filtrar condena~6es a qualquer pre~o, preconcebidas e tidas comonecessarias por algumas concep~6es de atua~ao ilimitadas dos agentes oficiais.

o atual Codigo de Processo Penal recebeu nitida influencia do ProcessoPenal Italiano de 1930, 0 qual foi gestado por Vincenzo Manzini, "penalistacasuista, raivosamente panidario da tradi~ao inquisitorial italiana", cujasobje~6es foram defendidas pelo Ministro Alfredo Rocco, "de tendencianacionalista, habil jurista, cultivador de uma filosofia politica simples, comfundo paranoide, alem de ser anifice legal da incipiente ditadura". Os traba­Ihos preparatorios concebiam 0 debate contraditorio e as garantias como"animais selvagens que deveriam ser destruidos sem piedade".5

o referido Codigo Rocco, assim denominado, era dotado de urn inveja­vel "espirito reacionario", onde 0 Ministerio Publico era urn "medium doPoder Executivo", "equiparado ao juiz", e a defesa, em nome do segredo,como regra, era considerada superflua. Os acusados, nesse modelo, sao pre­sumidamente culpados e sobre eles recai a regra da prisao, cuja deten~ao pre­ventiva e indefinida; desaparecem as nulidades absolutas (0 silencio do inte­ressado sana toda nulidade), os recursos sao obstaculizados por disposi~6es

taxativas, inclusive quando 0 acusado se oculta ou foge. Segundo Cordero,Manzini e Rocco "trabalharam muito bem".6 Somente em 1955 e que o legis­lador pos-fascista reassumiu algumas garantias, tais como 0 prazo maximo daprisao preventiva, defesa instrutoria, nulidades absolutas. Desenvolveu-seuma "linha inquisitorial com garantias", urn "ambiguo garantismo inquisito­rio", urn "corpo com duas cabec;as", sem alterac;ao das estruturas, 0 que sedenominou de processo misto, com urn estilo inquisitorial na investigac;ao, aqual e valorada na fase judicial (instru~ao secreta e debate contraditorio),7

Esse perfil inquisitorial aparecia no an. 156 do CPP, quando autoriza­va 0 magistrado, no curso da instru~ao, ou antes de proferir senten~a, adeterminar, de oficio, diligencias para dirimir duvida sobre algum pontorelevante. A regra e que na duvida incide 0 in dubio pro reo, com provimen-

4 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 24.5 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, pp. 85 e 86.6 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, pp. 86 e 87.7 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, pp. 69 e 88.

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Nereu Jose Giacomolli

to absolut6rio. Em sua coerencia inquisitorial interna, 0 C6digo de ProcessoPenal autoriza 0 magistrado a inquirir testemunhas nao arroladas pelas par­tes, inclusive as que forem referidas, mesmo sem pedido dos interessados(an. 209 do CPP). Ponanto, como regra, a prova determinada nao e em favordas panes ou da defesa, mas em prol da acusa~ao, representada, na a~ao pro­cessual penal8 de iniciativa publica, pelo Estado-acusa~ao, 0 seu autor. Comisso, hi uma aderencia a acusa~ao, ultrapassando as barreiras do devido pro­cesso constitucional, etico e humanitirio (an. I', III, e 5', LV, da CF). Aautoriza~ao legal ao juiz produzir prova e urn resquicio inquisitorial, forjadona concep~aoda presun~ao de culpabilidade e ni'io na presun~ao de inocen­cia. Por que nao absolver se 0 juiz esti em duvida? Ocorre que a premissainquisitorial e de que, se 0 sujeito foi indiciado, foi denunciado, e porquealgum crime ele praticou ("hi fuma~ado born direito", diriam os atores con­temporaneos), alguma responsabilidade criminal existe e necessita ser desco­bena, devendo, para tanto, ser utilizados todos os meios para confinnar essaceneza, mesmo as custas de algum inocente.9

No ambito criminal, 0 encargo probat6rio e da acusa~ao e nao da paneque faz a alega~ao. Apesar de se inferir de uma leitura estreita do anigo 156do C6digo de Processo Penal (reda~ao atual e anterior a Lei 11.690/08), serda defesa 0 encargo de provar a alega~ao que ela fizer, cabe ao acusador,publico (a~ao processual penal de iniciativa oficial) ou privado (a~ao proces­sual penal de iniciativa panicular), demonstrar, com seguran~a, a autoria e amaterialidade do fato e a existencia de provas suficientes a dar supone a urnjuizo condenat6rio, inclusive as que afastam a viabilidade das teses defensi­vas. Por isso, a defesa nao tern 0 encargo probat6rio, mas apenas uma opor­tunidade processual de provar, no contradit6rio endoprocessual, as suas ale­ga~oes e a fazer a contraprova do afinnado pela acusa~ao. Entretanto, as tesesdefensivas nao sao afastadas pela ausencia de prova defensiva e nem as daacusa~ao sao acolhidas pela carencia probat6ria defensiva.

A aprecia~ao da prova pelo magistrado tambem encontra limites nodevido processo penal constitucional. Ponanto, a liberdade valorativa daprova e limitada. Sim, 0 magistrado fonnari sua convic~ao pela "livre" apre­cia~ao da prova, dizia 0 anigo 157 do C6digo de Processo Penal. Entretanto,

8 LOPES Jr. Aury. Direito Processual e sua Conformidade ConstitucionaL Rio de Janeiro: LumenJuris, 2008, pp. 334 e 335, recolhe de Niceto Alcala-Zamora y Castillo a adequa~ao de aC;ao pro­cessual penal, para sepani-Ia da ac;ao punivel ou delitiva, objetos do direito penal, nao do direitoprocessual penal. Assim passarei a denomirui-la a partir de agora.

9 Segundo CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, pp. 24 e 25.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considerar;6es Criticas

a valora~iio da prova ha de vir demonstrada em motiva~iio fatica (0 que esti~

ver nos autos) e juridica, nos termos do artigo 93, IX, da Constitui~iio Fede~

ral, com inadmissibilidade da prova obtida sem as garantias constitucionaise as regras processuais.

Esse perfil inquisitorial permite a admissibilidade de qualquer meio deprova e a validade de qualquer metodologia empregada, na medida em que,para esse modelo politico e juridico de processo, tudo e possivel para se che~

gar a "verdade material", mesmo pelos caminhos da ilicitude, vedada expres~

samente pela Constitui~iio Federal (art. 5Q, LVI, CF).

A inspira~iio desse paradigma previsto no Codigo de Processo Penal foia legisla~iio italiana da decada de trinta, de corte inquisitorial, segundo a qualurn dos objetivos era a busca da verdade no processo penal. Porem, essa ideo~

logia foi abandonada, ainda que niio totalmente, no atual Codigo de ProcessoPenal Italiano, da decada de oitenta, de tendi'ncia acusatoria. lD

Quando 0 juiz pergunta a testemunha e ao perito se prometem dizer averdade, niio significa que esteja buscando a verdade dos fatos no processo,mas que os declarantes niio poderiio inventar situa~6es, criar fatos, falsear averdade, mas narrar segundo sua percep~iio e 0 que viu. Isso niio significa averdade do que ocorreu (pode ter visto somente 0 suspeito correndo comuma faca na miio e niio saber que matou a vitima porque esta 0 havia agredi~

do, por exemplo).Esta ansia de extrair uma confissao do acusado, de propiciar uma contra­

di~iio, de obter urn juizo condenatorio, advem da concep~iio de que 0 sujeitoe presumidamente cUlpado e niio presumidamente inocente, e permeia todoo sistema, concebido sem contradit6rio, circunstancia propiciadora de verda­deiros quadros paranoides, no dizer de Cordero,ll equiparaveis as fantasiasalucinatorias de Oreste e aos impulsos agressivos liberados por lfigenia.12

Essa alta inquisitorialidade produz urn aumento da carga probatoriaacusatoria, afrontando a ampla defesa e 0 equilibrio processual. Outras situa~

~6es revelam toda a engenharia privilegiadora do ius puniendi sobre 0 status

10 Mesmo assim, 0 artigo 190 do atual cpp italiano, da decada de 80, refere que as provas sao pro­postas pelas partes, mas a lei podera estabeleeer os casos em que 0 juiz pode admiti-Ias ex officio.Portanto, nao excluiu a possibilidade da iniciativa oficia! na busea da prova. Segundo CHIAVA­RIO, Mario. Diritto Processuale Penale: profilo istituzionale. Torino: Utet, 2007, p. 328, as nor­mas que atribuem a inieiativa ofieial ao magistrado sao tais e tantas que, no sistema vigente naose pode dizer que isso euma exeer;ao, embora, geralmente, tal intervent;ao se destine aintegra­r;iio de poderes ja exercitados pelas partes.

11 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milio: Giuffre, 2003, p. 25.12 CORDERO, Franco. Che Cos'e 1a Giustizia? Roma: Luea Sossella Editore, 2007, p. 11.

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Nereu Jose Giacomolli

libertatis: ausencia de obrigatoriedade da defesa previa (art. 396 do CPP); osparentes da vitima prestam compromisso (presun~iio de veracidade), e os doacusado niio (informantes), conforme arts. 206 e 208 do CPP, por exemplo.

A essas automatizac;6es inquisitoriais op6e-se urn modelo acusat6rio,humanitario e constitucionalmente garantido de admissibilidade, busca,produ~iio e avalia~iio da prova.

2. Modelo probat6rio constitucional e humanitario: bases doprocesso penal

No plano internacional, a Declara~iio Universal dos Direitos do Homempreconiza que todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidadee direitos. Entre nos, a Constitui~iio Federal de 1988 erige a dignidade dapessoa humana como um dos fundamentos da Republica Federativa do Brasil(art. IQ, III, da CF).

a ser humano e dotado de dignidade por ser pessoa. Portanto, a digni­dade niio e um direito, mas a essencia do ser humano, a qual exige com­preensao e considera~ao. Sendo essencia, nao e algo acidental e nem cam­biante conforme 0 tempo e 0 espa~o, mas perene e inerente as pessoas e naoso a determinada pessoa, na medida em que sua trajetoria terrena e limitada.

Assim, pode-se falar em respeito ou desrespeito ao ser humano, a dig­nidade humana, cuja conceitua~iio juridico-normativa esta em constanteconstru~ao e desenvolvimento, carecendo "de uma delimita~ao pela praxisconstitucional"13 tais como principios opostos, regras de dignidade e condi­~6es de precedencia.14

Das diversas dimens6es da dignidade do ser humano, destaca-se 0 res­peito a propria condi~ao do ser que existe no plano biologico, cognitivo(mente, consciencia, integridade psiquica e espiritual) e social (integra~ao,

vivencia, participa~ao na sociedade e no Estado).15 Viver dignamente ultra­passa 0 mero existir biologicamente. Por isso, 0 nuc1eo material, 0 minimoexistencial da dignidade da pessoa nao se restringe aos bens e as utilidadespara a subsistencia fisica.

13 SARLET, Ingo Wolfgang. A Efidcia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria doAdvogado Editora, 2004, p. 113.

14 ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Politicos yConstitucionales, 2001, pp. 107 a 109.

15 CAPRA, Fritjof. As Conexoes Ocu1tas, Ciencia para uma Vid. SustentJvel. Sao Paulo: EditoraCultrix, 2002, pp. 48 e 267.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera<;oes Criticas

A fundamenta~ao do Estado de Direito sob 0 pilar da dignidade da pes­soa humana produz imponantes efeitos juridicos, inclusive no ambito crimi­nal, material e instrumental, ou seja, do Direito Penal e do Processo Penal.Prima facie, e possivel afirmar que se veda a instrumentaliza~ao do serhumano. ou seja, de seu tratamento como objeto, como coisa, inclusive noambito criminal e na busca da prova (nemo tenetur se detegere). Assim, 0 serhumano ha de ser reconhecido, acima de tudo, como sujeito de direitos e naocomo mero sujeito de deveres, obriga~6es e encargos.

As esferas de dignidade sao irrenunciaveis e a limita~ao a direitos funda­mentais, monnente os individuais, nao podem fragilizar a dignidade da pessoa,a ser verificada no caso concreto.16 Trata-se de base antropologica,17 principiofundante da ordem juridica, fundamento de todos os direitos e garantias edeveres fundamentais.l 8 Essa base humana alinha 0 supone do ordenamentojuridico, como limite invencivel da interferencia do poder (nao-viola~ao dadignidade - aspecto negativo, direito de defesa, nao aceita~ao da viola~ao) ecomo dever de prote~ao (promo~ao da dignidade - aspecto positivo e presta­cional de respeito e efetiva~ao). Ponanto, inafastavel, tambem, 0 seu caraterlimitador da interven~ao Estatal e como nucleo essencial dos direitos funda­mentais, quando revestidos por tal entidade substancial, nao componando "0

elemento nuclear intangivel da dignidade"19 qualquer especie de restri~ao.

A pessoa nao pode ser tratada como objeto, ser instrumentalizada pelasinstancias judiciais de atua~ao, mesmo sendo acusado ou condenado por umainfra<;ao criminal. 0 processo, a pena e 0 carcere nao podem servir de ins­trumento ou meio it degrada~ao humana, ao aniquilamento da essencia doser, de sua qualidade humana. Em face do principio da dignidade da pessoahumana, e 0 Estado que opera em fun~ao do acusado, do apenado, e nao esteque se submete, silenciosamente, sem possibilidade de impugna~ao, aoEstado. 0 Estado existe em fun~ao do ser humano, e nao este em face doEstado ou, como refere Canotilho, e 0 Estado "que serve ao homem, nao e 0

homem que serve aos aparelhos politico-organizatorios".20

16 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre:Livraria do Advogado Editora, 2001, pp. 120 e 126.

17 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituir;:fio. Coimbra: Almedina,1998. pp. 221 e 222.

18 SARLET, logo Wolfgang. A Eficacia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria doAdvogado Editora, 2004, pp. 107 e 108.

19 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre:Livraria do Advogado Editora, 2001, p. 138.

20 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teona da Constituir;:fio. Coimbra: Alm~dina,

1998, p. 221.

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Diante das injunc;6es que se apresentam nas refonnas processuais crimi­nais, e necessario assentar essas bases do Estado Constitucional e Huma­nitari021 de Direito e proclamar que a Constitui~ao Republicana nao e urnmero enunciado de inten~Des, mas indica urn perfil claro e consistente deprocesso penal acusat6rio (norte para todos os poderes), de forte tensiona­mento dialetico (temas submetidos ao debate emergem e se transformam nodecorrer de todo 0 processado), onde 0 mon610go verticalizado e 0 automa­tismo sao substituidos pelas expectativas e perspectivas de uma decisao favo­ravel (acusa~ao e defesa) e humanitarla. A fenomenologia fatica e juridicaesra inserida num mecanismo estatal artificial onde no minimo quatro sujei­tos22 interagem positiva e negativamente, de forma obrigat6ria (acusador,juiz e defensor) e facultativa (acusado - silencia, fala e recorre, v. g.). Essedesenvolvimento temporal ha de ser regido por principios dinamicos, mascomprometidos com os direitos humanos e com a Constitui~ao Republicana.Ademais, e de ser analisado 0 conteudo do artigo 5Q

, XXXV, da CF, quandonao admite a subtra~ao da aprecia~ao do Poder judiciario as lesDes ou asamea~as aos direitos. Como apreciar licitamente, se quem julgara pode, exofficio, fazer a contraprova e agir sem provocac;ao? Como contraditar semprovas, como contraditar 0 pedido ou a prova, sem a contraprova? 0 direitoaprova e das partes, numa rela~ao dialetica e contradit6ria entre si e nao urndireito e nem uma atividade (poder menos ainda) de quem ira julgar.23 0processo contradit6rio, constitucionalmente garantido, possui uma dialetici­dade no plano horizontal e nao exclusivamente verticalizado. No que tangeaprova, a fun~ao do juiz e avaliar a admissibilidade dos meios e a metodolo­gia proposta, avaliando os resultados da prova, no momento da decisao, comparadigmas constitucionais e humanitarios.

Ecerto que a prova se destina a demonstrar os fatos e as circunstancias,de modo a convencer 0 magistrado a decidir num sentido ou em outro, combase em fatos, pois esses integram a racionaliza~ao judicial, evitando os pro­cessos meramente intuitivos. Provam-se, essencialmente, os fatos24 e as suas

21 Segundo ROXIN, Claus. Derecho Procesal Penal. Buenos Aires: Editores del Puerto, 2000, p. 11,o reconhecimento de direitos fundamentais precedentes ao Estado teve como conseqiiencia 0

reconhecimento do imputado como sujeito do processo, dorado de direitos autonomos, dos quaisos mais importantes foram 0 direito ao respeito da dignidade humana e 0 direito aampla defesa.

22 A concep<;ao iudicius es actus rrium personarum: iudicis, actoris et rei nao desvela toda a feno­menologia do processo penal (Felipe Vaz de Queiroz).

23 Vid. item 3.4, deste capitulo, acerca da atua<;ao ex officio do magistrado.24 Outro mito a ser questionado e 0 de que, no processo penal, 0 reu se defende dos fatos narrados

e que a qualifica<;ao juridica a estes pode ser dada pelo julgador. Mas, se 0 acusado defendeu-se

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Refonnas (7) do Processo Penal:Considerac;:6es Crfticas

circunstiincias, no processo penal, mas nao e s6 isso, pois a dimensao juridi­ca tambem carece do contradit6rio. Evidentemente que a prova do fatonatural, de qual fato, de sua dimensao material, formal, temporal e espacial,quais circunstlmcias, influirao na incidi'mcia da regra juridica. A prova, por­tanto, tern a fun~ao de convencimento, em expectativa e perspectiva(Goldschmidt). Por isso, num processo constitucionalmente valido, a impu­ta~ao hi de vir delimitada, sob pena de prejudicar a dimensao probat6ria e 0

exercicio da ampla defesa.Urn processo etico, limpo, sem surpresas, equilibrado, com regras defi­

nidas e conhecidas dos sujeitos, e que valoriza 0 ser humano, nao admitenenhuma especie ou deriva~ao ilicita da prova.

Diferentemente do estilo inquisitorial, onde 0 acusado era obrigado afalar, nem que fosse sob tortura,25 a Constitui~ao Republicana de 1988, reco­nhece 0 direito ao silencio, 0 direito de calar (art. 5Q

, LXllI, CF), dele deri­vando a ausencia de obriga~ao de produzir prova contra si mesmo (nemotenetur se detegere). 0 direito ao silencio nao abrange somente 0 direito deficar calado, mas todas as modalidades em que a conduta exigida ou determi­nada implique auto-incrimina~ao (reconstitui~ao do delito, interven~6es

corporais invasivas, por exemplo). A obrigatoriedade do comparecimentoaos julgamentos publicos do Tribunal do Juri, mesmo antes do advento daLei 11.689, de 9 de junho de 2008, nao mais encontrava adequa~ao constitu­cional, pois se ao acusado se garante 0 direito ao silencio, tern ele 0 direitode nao atender • intima~ao, de nao comparecer ao plenario do Tribunal doJuri, onde podera ser posto • estigmatiza~ao publica.26

Tabuleiro, picadeiro, persuasao histerica e humilhante nao sao admissi­veis num processo penal republicano e minimamente inserido na pro­te~ao intemacional dos Direitos Humanos.

da imputac;:ao de urn crime doloso e foi condenado par urn delito culposo, como admitir ter exis­tido arnpla ou plena defesa7

25 Segundo CORDERO, Franco. Procedura Penale. Millao: Giuffre, 2003, p. 35, na Ordenanc;:a Fran­cesa de 1670, urn sistema perfeito, havia dois tipos de tortura; uma preparat6ria, com fins instruto­rios, aplicada quando a prova acusat6ria nao era suficiente para obter a pena capital e uma previa,destinada aos condenados apena de marte, para que entregassem os cUmplices e os mandantes.

26 Segundo CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 21, no estilo inquisito­rial, "a tortura estimulava fluxos verbais que 0 sujeito se seutia forc;:ado a repetir, mesmo dianteda irracionalidade e 0 inquisidor, senhor do tabuleiro, elaborava hipOteses, dentro de urn quadroparan6ide" (tabuleiro, picadeiro, persuasao histerica e humilhante nao sao admissiveis num pro­cesso penal republicano e minimamente inserido na protec;:ao intemacional dos DireitosHumanos. Gravatas, bravatas, torram ... ).

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A publicidade dos atos processuais e a regra (art. 5Q, LX, CF), somente

admitindo-se a restri,ao desta quando a defesa da intimidade ou 0 interessesocial 0 exigirem. Isso se aplica tambem it prova, nao encontrando adequa­,ao constitucional a produ,ao probat6ria sob 0 manto do misterio e do segre­do, como ocorria no estilo da investigaC;ao inquisitorial. Por isso, ao que naopuder ser repetido em juizo, aos olhos das partes, ha de garantir-se a publi­cidade, mesmo na fase pre-processual, com nomea,ao de defensor itquelesque nao 0 tiverem, mesmo em se tratando de peritos oficiais. A produ,aoprobat6ria em juizo, iniciado 0 due processo oflaw, vai alem da publicidadee alcanc;a 0 contradit6rio necessario e obrigat6rio. Sua ausencia, no ensina­mento de Cordero, "abre urn vacuo 16gico ao pensamento paran6ico",27 0contato dos julgadores leigos (jurados no Tribunal do Juri) com a prova, emnosso sistema, e apenas superficial e dependente da ret6rica persuasiva dosdebatedores; nao ha a necessaria imersao no conteudo probat6rio, de moldea embasar 0 sentir do julgador; hi urn voo cego na neblina dos debates, semjustificativa conc1usiva, a qual permanece nos labirintos do segredo. 0 sigi­10 das vota,oes (art. 5Q

, XXXVIII,"b", CF) nao se relaciona com 0 retiro secre­to das vota,6es dos jurados. Urn processo penal transparente ha de ser publi­co e ter a coragem de explicar ao condenado, face ro face, os motivos faticose juridicos do resultado.

No due process of law constitucional, os riros e as f6rmulas destinam­se ao estabelecimento de limites ao poder dos agentes estatais, desde a inves­tiga,ao ate que se apaguem os efeitos da senten,a penal condenat6ria. Nessemodele constitucional e etico de processo, alem do resultado, ha de verifi­car-se a metodologia utilizada para se chegar a ele.

o paradigma etico de processo penal valoriza 0 ser humano, 0 outro,reflexo do eu, todos seres imperfeitos, com origem e fim certos. 0 Estado esua ritualistica, ao estimular a dela,ao do outro ou as confiss6es contra os co­reus,28 com promessas de impunidade ou de beneficios penol6gicos, reco­nhece a sua incompetencia em desvendar os crimes, corrompe e descaracte­riza 0 humano.

Urn processo probat6rio etico nao admite 0 segredo, 0 anonimato e nemo absolutismo da fe publica, mormente no que se refere it prova pericial; eurn campo limpo, de purifica,ao e nao de explora,ao, pois sao inurneras as

27 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 25.28 Segundo, CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 21, as confiss6es contra

os co-reus sao "casufsmos impuros".

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera<;6es Crfticas

dimens6es desconhecidas no imputado, muito alem das visiveis e das que saoencontradas e dimensionadas.

Anunciar que urn sujeito processual possui 0 encargo29 de provar deter­minado fato ou alguma circunstancia no processo significa dizer que e ele 0

encarregado de demonstni-Ios, de modo a propiciar 0 convencimento do jul­gador acerca da credibilidade destes. Isso porque provar determinado fato oucircunstancia e demonstrar a sua existencia em determinado tempo (quan­do), espa~o (onde) e modo (como).

Segundo 0 anigo 5Q, LVII, da CF, ninguem sera considerado culpado ate

o transito em julgado de senten~a penal condenat6ria. Nao se trata apenas deuma regra de tratamento do acusado, isto e, de que nao pode ser tratado noprocesso, antes de uma senteu9a condenat6ria definitiva, como se fosse cul­pado, antecipando-se a san~ao ou amaterializa~ao da pena. Desse inciso seextrai uma regra processual no que tange ao encargo probat6rio, isto e, 0

processado e inocente. Panindo-se da inocencia do reu, quando alguem - aacusa~ao -, afirmar que ele nao 0 e, tern 0 encargo de provar a sua culpa. aimputado nao e culpado pelo fato de ter sido denunciado. Caso assim fosse,a ele incumbiria 0 encargo de afastar a pretensao acusat6ria.

Atribuir 0 encargo a uma das panes e impor-Ihe uma situa~ao juridicadeterminada. Isso se quiser obter alguma vantagem nos autos. a direito aprova se insere em seu poder dispositivo, de escolher qual a fonte, 0 meio deprova e a metodologia de sua busca, nela se inserindo a formula~ao de per­guntas ou nao a testemunha, por exemplo.

a C6digo de Processo Penal, no an. 156 atribuia (e ainda atribui) 0

encargo das afirma~6es a quem as fizer. Uma leitura constitucional desse dis­positivo faz com seja aplicado somente aacusa9ao, a quem afirmar uma a9aoem juizo ou deduzir uma pretensao acusat6ria. Quando 0 reu afinna a suainocencia, nao Ihe cabe 0 onus de prova-Ia. a interesse, mas nao 0 encargoe nem onus, da defesa pode ser 0 de provar a falta de credibilidade da prova;provar a duvida. a interesse pode estar em demonstrar que ele nao foi 0

autor, que 0 fato nao ocorreu, 0 seu alibi, que a qualifica~ao juridica nao eadequada, aMm das defesas processuais. a interesse da defesa estara satisfei­to na cria~ao da duvida razoavel no espirito do julgador, em tornar crivel asua alega~ao.

No que tange aprova, como regra, e mais facil a acusa~ao provar a suaafirma~ao, pois se trata de fatos positivos. Dificil e fazer a prova negativa. E

29 Vid. item 3.3, deste capitulo, acerca das cargas e chances probat6rias.

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Nereu Jose Giacomolli

mais feicil provar que 0 fato existiu do que a sua inexistencia. Por isso, tam­bern, a dita "paridade de armas" (basta observar, empiricamente, as estrutu­ras funcionais da acusa~ao e da defensoria publica) e de ser sopesada pelojuiz, no momento da valora~ao das provas e antes de tomar alguma decisaode impulso probat6rio. No processo penal brasileiro afloram todas as dimen­soes da miseria e, como regra nao ha uma equivalencia potencial das panes.Ponanto, 0 imputado nao tern 0 dever, como possui a acusa~ao, de buscar aprova; seu componamento podera ser apenas passivo, de silencio, 0 qualtambem e uma forma de se defender, uma estrategia defensiva.

a encargo probat6rio compona uma dupla dimensao: formal e substan­cial. a formal diz respeito aintrodu~ao das provas no processo e 0 materialou substancial refere-se aaceitabilidade dessa prova pelo magistrado, a suavalora~ao positiva, na linha da afirma~ao fatica realizada na inicial. Naodemonstrar de forma clara, limpida e segura e como nao provar e, deixar 0

magistrado em duvida equivale ainexistencia probat6ria.a encargo de provar a responsabilidade criminal do imputado repre­

senta 0 aspecto substancial deste. Ha urn dever substancial de provar, emrazao da presun~ao de inocencia. Hei 0 encargo de propor os meios, mas tam­bern 0 de carear elementos idoneos ademonstra~ao da responsabilidade cri­minal. a dever estara cumprido quando a acusa~ao conseguir superar, racio­nalmente, qualquer especie de duvida acerca da inocencia do reu. Por isso, aratio mais profunda da presun~ao de inocencia se expressa no principio uni­versal e humanitario do in dubio pro reo.

A duvida, inclusive acerca da presen~a de excludentes, em razao da pre­sun~ao de inocencia e do in dubio pro reo conduz aabsolvi~ao, ou seja, aoseu reconhecimento. Eevidente poder 0 imputado carear elementos idoneose suficientes para avivar a chama da duvida no pensamento do julgador. Aocontreirio, entrariamos numa senda desconhecida, imagineiria e irreal, deencarregar a acusa~ao de pensar todas as possiveis duvidas que possam exis­tir no plano cognitivo do julgador, ou de uma probation diabolica.30

a modelo constitucional e etico nao admite no processo a prova ilicita(an. 5Q

, LVI, CF). as efeitos da inadmissibilidade ultrapassam os limites doprocedimento ou do processo no qual foi verificada a ilicitude, em razao dapotencia de seu conteudo (ordem constitucional), motivo por que naosomente a brasa da ilicitude ha de ser apagada, com a extirpa~ao do proces-

30 Vide CHIAVARlO, Mario. Diritto Processuale Penale: profilo istituzionale. Torino: Utet, 2007,p.354.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Consideras:6es Criticas

so, mas a pr6pria prova h:\ de ser destruida, evitando-se a sua utiliza~ao parainiciar ou embasar outros procedimentos probat6rios. Por isso, 0 efeito, coma adequa~ao constitucional e etica, e 0 da inutiliza~ao da prova (destrui~ao,

inclusive das cinzas). Isso porque as raizes do modelo inquisitorial geram 0

utilitariasm031 de aceita~aode qualquer dado incriminat6rio, independente­mente de seu conteudo e da metodologia utilizada em sua busca e consubs­tancia~ao. Tudo e metabolizado na decisao judicial, inclusive as ilicirudes.

Porem, abaixo da Constitui~ao Republicana, ainda sobrevive, na law inaction, 0 modelo inquisitorial do C6digo de Processo Penal (valem as regrasdo C6digo de Processo Penal ate que uma outra lei ordinaria as modifiquem),

gra~as as alquimias juridicas contemporaneas. Embora a Constirui~ao

Republicana esteja indicando urn modelo acusat6rio, mesmo diferenciado doestilo acusat6rio angloamericano, sobrevive. na praxis cotidiana, urn corte dealta inquisitorialidade. A op~ao constitucional e pelo modelo acusat6rio con­

tinental-europeu e nao angloamericano. Isso porque a a~ao processual penal,como regra, continua sendo obrigat6ria, nao incidindo a ampla discriciona­riedade ou a oportunidade, mas 0 exercicio de urn certo poder de disposi~ao,

nas hip6teses previstas em lei.32 A a~o processual penal de iniciativa publi­ca eirretratavel, embora seu titular possa pedir a absolviC;ao ou a incidenciadiferenciada do ius puniendi (desclassifica~ao)e mesmo conformar-se com a

procedencia parcial ou com a improcedencia do pedido (nao recorrer). Nomodelo acusat6rio puro, alem da oportunidade no exereicio da a~ao proces­sual penal, 0 monop6lio das provas pertence as partes e a decisao ha de sercongruente com 0 petiturn.33

31 OLIVA SANTOS, Andres. Jueces Imparcia1es, Fica1es 'lnvestigadores" y Nueva Refonna para 1aVieja Crisis de 1a Justicia Penal.Barcelona: PPU, 1988, p. 20, pontua 0 utilitarismo das reformasprocessuais, por estarem regidas pelo que as pessoas pensam que lhes convem ou euti! aos orgaosjudiciais, suas necessidades, possibilidades, limitas:6es e conveniencias.

32 Em GIACOMOLLI, Nereu Jose. Legalidade, Oportunidade e Consenso no Processo Penal, naPerspectiva das Garantias Constitucionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 70, sepode ver que 0 principio reitor do processo penal continental-europeu e 0 da legalidade e nao 0

da oportunidade, proprio do modelo da Common Law, motivo por que a expressao "oportunida­de regrada" naO eadequada, por nao ser esta que esta sendo regrada no sistema brasileiro, mas urncerto poder de disposis:ao do sujeito a quem se the atribui a atividade acusatoria. Regula-se urncirculo ou ambito objetivo dentro do qual cabe que se formulem e sejam eficazes os juizos deoportunidade; 0 oportuno nao esta e nem pode ser regrado.

33 Segundo CORDERO, Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 101,0 estilo acusatorio italiano,apresenta-se de forma diversa do estilo anglo-americano, sob diversos aspectos importantes: aIYaoprocessual penal obrigatoria e tambem irretratavel, dedsao extra petita, favoravel ao imputado,subsidiariedade probatoria ex officio.

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Nereu Jose Giacomolli

E certo que a prova se destina ao convencimento do julgador, mas esseconvencimento econstitucional e eticamente admissivel quando resultar dosubstrato probat6rio carreado pelas partes.

3. Altera~5es(?) acerca das provas em 2008

A Lei 11.690/08 modificou os artigos 155 a 159,201,210,212 e 217 doC6digo de Processo Penal. Continuou, 0 legislador de 2008, a trilha domodelo inquisitorial que serviu de base ao processo penal da decada de qua­renta. Isso se observa na autoriza~ao legal ao magistrado detertninar a prova,independentemente de pedido dos sujeitos processuais (art. 156 do CPP),inclusive antes de iniciada a a~ao processual penal (inciso I). Portanto, 0

poder instrut6rio do julgador potencializou-se em rela~ao ao que dispunha 0

art. 156 do CPP, em sua reda~ao anterior, na medida em que se facultou aomagistrado agir de oficio, mesmo antes de formalizada a pretensao acusato­ria pelo Ministerio Publico. Potencializou-se, tambem, a valoriza~ao dos ele­mentos colhidos sem 0 contradit6rio, pois 0 art. 157 do CPP nao autorizavao magistrado a utilizar os elementos colhidos na fase investigat6ria (referiaque 0 juiz fortnara sua convic~ao pela livre aprecia~ao da prova). Sabe-seque, na law in action, esses elementos, mesmo quando eram colhidos sem 0

contradit6rio (portanto, nao eram provas), recebiam considera~ao valorati­va. Porem, 0 legislador de 2008, no art. 156 do CPP (reda~ao dada pela Lei11.690/08), expressamente autoriza, mesmo que subsidiariamente, a funda­menta~ao da decisao judicial nos elementos infortnativos colhidos na inves­tiga~ao. Portanto, a politica criminal, alem de manter 0 perfil inquisitorial(atua~ao de oficio durante a instru~ao), 0 potencializou (atua~ao de oficio nafase investigat6ria e na instru~ao).

Pertnanece a reda~ao do caput do art. 157 do CPP, segundo 0 qual 0 juizfortnara sua convic~ao pela livre(?) aprecia~ao da prova. Entretanto, a reda~ao

do atual art. 155 do CPP contamina a avalia~ao da prova pela considera~ao deelementos colhidos sem 0 contradit6rio, embora 0 inicio da reda~ao conside­re como prova 0 que foi produzido sob 0 crivo do contradit6rio judicial.

Nao havia disposi~ao no CPP acerca da ilicitude probat6ria. Porem, 0

artigo 5Q, LVI, da CF ja era claro (sao inadmissiveis, no processo penal, as

provas obtidas por meios ilicitos). Nao h:i nenhum avan~o legislativo emtemas de licitude ou ilicitude probat6ria, salvo a detertnina~ao de inutiliza­~ao da prova ilicita. Timido avan~o, comparado com a expressa admissibili­dade parcial da prova ilicita por deriva~ao e pela contamina~ao gerada no

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Rcfonnas (?) do Processo Penal:Considera~6es Criticas

processo pelo arsenal da ilicitude, somente extirpado do processo quandopreclusa a decisao de desentranhamento da prova declarada inadmissivel.Ademais, 0 magistrado continuant no processo, diante do veto ao § 49 do art.157 do CPP (0 juiz que conhecer do contelido da prova declarada inadmissi­vel nao podera proferir senten~a au acordao).

Reduziu, a Lei 11.690/08, a espectro de garantias na prova pericial. Osexames de corpo de delito e as pencias, conforme art. 159 do CPP, eram fei­tos par dais pentos oficiais, com a reda~ao dada pela Lei 8.862/94. Embora areda~ao atual do referido dispositivo tenha passado a exigir dos peritos oficiaisa diploma de curso superior, admite a pericia realizada par somente urn peri­to oficial. No que tange aos peritos nao-oficiais, a paragrafo 1° do art. 159 doCPP nao exige diploma~ao na area especifica (preferencialmente), emboradevam ter habilita~ao tecnica nesta.

A nova reda~ao do art. 201 do CPP incrementou 0 ativismo do ofendi­do no processo penal, com nitida mostra do expansionismo do Direito Penale do Processo Penal na politica criminal,34 revelado tambem no artigo 387,IV, do CPP (0 juiz, ao proferir senten~a condenatoria: fixara valor minimapara repara~ao dos danos causados pela infra~ao, considerando os prejuizossofridos pelo ofendido), com a reda~ao dada pela Lei 11.719/08. Ja defendi apossibilidade de a vitima ser reparada no ambito criminal, mas nas infra~6es

penais de menor potencial ofensivo, onde esta repara~ao evita 0 exerdcio daa<;ao processual penal, a incidencia do ius puniendi, mas nao como forma deincrementar 0 polo acusatorio. Ocorre que a reforma potencializa 0 desequi­librio do processo penal, contrariamente adefesa, pois a comunica~ao aviti­rna dos atos processuais, sem que tenha se habilitado no processo (a habilita­~ao da vitima como assistente da acusa~ao e defendida pela doutrina e juris­prudencia majoritarias, com as quais nao concordo), possibilita que constituaadvogado e se habilite no processo, atuando no polo acusatorio. Fixar umaindeniza<;ao com base em que? Haveni busca da prova nesse sentido, desvir­ruando a fun~ao do processo penal. Ademais, a art. 201 do CPP determina areserva de urn espa~o separado II vitima (§ 4Q

), seu encaminhamento paraatendimento multidisciplinar, especialmente psicossocial, de assistencia juri­dica e de salide, a expensas do ofensor ou do Estado (§ 50), bern como a pre­serva~ao da intimidade, vida privada, honra e imagem (§ 60 ), sem reconhe­cer igual tratamento ao acusado.

34 Vide SILVA SANCHEZ, J-M. La Expansion Del Derecho Penal. Aspectos de La PoJitica Criminalen las Sociedades Posindu,~'triales. Madrid: Cuadernos Civitas, 1999, pp. 36 a 43.

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Nereu Jose Giacomolli

Embora 0 CPP esteja se afastando do medievalismo metodologico dabusca da prova, com a admissibilidade do cross examination (perguntas dire~

tas das partes as testemunhas)35 e da ado<;ao do auxilio de novas tecnologias(videoconferencia) este distanciamento nao foi tao representativo, na medi~

da em que 0 art. 212, panigrafo unico, do CPP, autoriza 0 magistrado a com~plementar a inquiri<;ao. Alem disso, nao vern acompanhado de medidas pro~

tetivas dos direitos fundamentais do acusado.No que tange ao cross examination, ha 0 perigo da desvirtua<;ao subje~

tiva no momento dos questionamentos diretos do Ministerio Publico e dadefesa as testemunhas, motivo por que se faz necessaria a filtragem judicial(inadmissibilidade das perguntas sugestivas e indutoras das respostas, per~

guntas que nao interessarem aos fatos e circunstancias do processo, massomente a curiosidade do interrogante, v. g.). Nada se questiona acerca dasvantagens de ser feito 0 relato livre da testemunha. antes das perguntas daspartes.

Assentadas essas bases introdutorias gerais e criticas, as novas(?) dispo~

sic;6es legais acerca da prova carecem de uma considerac;ao individualizada.

3.1. 0 conrraditorio judicial como essencia da prava

A palavra prova, com 0 passar do tempo, no ambito do processo penalpassou a ser empregada para designar tudo 0 que a ela diz respeito: meios uti~

lizados para demonstra<;ao dos fatos ou do thema probandum: atividade uti~

lizada pelas partes para levar ao processo os meios de prova, designando,tambem, 0 resultado do procedimento probatorio, ou seja, 0 proprio conven~

cimento que 0 magistrado extema.36

Provar no processo e demonstrar ao julgador, levar a seu conhecimen­to a existencia de urn determinado fato (que), num espa<;o (onde) e tempo(quando) razoaveis, bern como os impulsos criadores do fato (porque) e as

35 Vide TONINI, Paolo. La Prova Penale. Milao: C('dan, 2000, pp. J30 a 137, accrca das va.rias mod a­lidades do denominado examc cruzado, "csame incrociato~, a qual se origina na pnitica secularoriunda dos ordenamentos juridicas anglo-americanos. Este exame cruzado apresenta tres moda­lidades: exaIDe direto, contra-exame e reexame. No primeiro, a parte que arrolou a tcstemunha equem formula as perguntas; no contra-exame, a outra pane tern a faculdade de perguntar e nor('exame a parte que primeiro perguntou podera formular novas perguntas. Em nosso modelo,nao M previsiio de novas perguntas atestemunha, embora i550 nolo seja vcdado. a imponante ea manuten'Yao de iguais oponunidades as partes.

36 DENTI, V. "Scicntificita della prova e libera valutaziolle del giudice", em Rivista Diritto eProcesso, 1972,p. 414.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considerac;:6es Criticas

circunstancias deste (como), para que possa emitir urn juizo acerca das situa­<;6es processuais que se desenrolam nos autos ed,' responsabilidade criminalou nao do imputado. H" uma exigencia de credibilidade da prova ao juiz, 11convic<;ao do Juiz, quem decide com base na que Ihe e mais crivei.37

Portanto, prova, num sentido totalizante, e 0 resultado. Assim, a teste­munha "A" e fonte de prova; 0 seu depoimento e 0 meio de prova; as infor­ma<;6es que leva ao processo sao os elementos de prova e a metodologia dabusca da prova sao as perguntas que sao feitas atestemunha "A", mais pre­cisamente, a forma de inquiri<;ao. Este resultado parcial das informa<;6es for­necidas pela testemunha e valorado no conjunto das outras fontes, de outrosmeios e dos demais elementos, os quais resultam na prova. Porranto, a provanao e da acusa<;ao ou da defesa, mas do processo. Quando a defesa requer ajuntada de urn documento nos autos esse, enquanto coisa, e a fonte real deprova e 0 que ele representa - fato e circunstancias - e 0 meio de prova. Porisso, rigorosamente, 0 documento nao e meio de prova; 0 meio e a provadocumental. a conteudo do documento sao os elementos de prova.

a que distingue 0 processo dos demais procedimentos e 0 contradit6rio(Fazzalari). Portanto, processo e urn procedimento (sequencia de atos) emcontradit6rio). Mas 0 processo penal apresenta caracteristicas tipicas e dife­renciadoras: soluc;ao penal valida somente em urn processo conduzido porurn 6rgao oficial, obrigatoriedade da defesa tecniea, presun<;ao da inocenciado imputado, regra da oficialidade acusat6ria e das possibilidades personalis­simas do imputado (Iegitima<;ao recursal). Portanto, no processo penal, naose aplica a triangulariza<;ao processual e sua essencia nao reside no contradi­t6rio (acusa<;ao e defesa), mas na presun<;ao de inocencia, com todos os seusconsectarios legais. Nessa concatenac;ao de regras, atos e posi<;6es juridicas,h;i necessidade de urn contradit6rio paritario entre os destinatarios do pro­vimento judicial.38 Na pratica de atos processuais em contradit6rio se inserea produ<;ao da prova, a qual integra essa estrutura dialetica, a metodologiadialetica de aplica<;ao do Direito, no dizer de Montero Aroca.39 Portanto,parte-se da premissa de que prova e 0 que foi produzido sob 0 crivo do con­tradit6rio. Ena forma<;ao da prova que 0 contradit6rio, com a participa<;ao

37 Vide CHIAVARIO, Mario. Diritto Processuale Penale: profilo istituzionale. Torino: Utet, 2007,p.293.

38 Segundo FAZZALARI, Elio. Instituip5es de Direito Processual. Campinas: Bookseller, 2006, p.120, pode-se falar em processo quando em uma ou mais fases do iter de fonnac;:ao de urn ato ha aparticipac;:ao, nao sO de seu autor, mas tambem dos destinatarios dos seus efeitos, em contradit6rio.

39 MONTERO AROCA, Juan. "Principio acusatorio y prneba en el proceso penal", em Proeba yProcesoPenal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador). Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 40.

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Nereu Jose Giacomolli

dos destinatarios de seus efeitos, mormente do acusado, ganha relevancia. 0que estiver despido do contraditorio, nao e ato probatorio, podendo consti­tuir~se em ato de investigaC;ao.

o destinatario dos efeitos da decisao nao e 0 orgao julgador, mas 0 acu­sado. Por isso, no processo penal, para condenar 0 reu, considera-se comoprova 0 que foi produzido pelo contraditorio do polo defensive, admitindo­se, para absolver, os elementos colhidos sem 0 contraditorio defensivo. Aausencia do contraditorio defensivo (relativizac;ao), no momento da forma­c;ao da prova se justifica, segundo alguns, nas hip6teses legalmente previs­tas, nas quais seu asseguramento impediria a propria produc;ao dessa prova(escuta telefOnica, por exemplo).4o Como nao ha possibilidade de ser garan­tido 0 contraditorio? Claro que simi Evidentemente que a ciencia do reque­rido ou de seu advogado inviabilizaria a produc;ao da prova, Ocorre que 0

contraditorio posterior ou diferido nao e contraditorio pleno e, nao sendoassim, excepciona 0 due process oflaw. Esse tema comporta urn aprofunda­mento e uma maior discussao. Mesmo para aqueles que defendem 0 contra­ditorio posterior como apto a garantir 0 due process of Law legal e consti­tucional, entre a produc;ao da prova e sua substanciac;ao (transcric;ao dosdados na interceptac;ao telefOnica, v. g.) e inserc;ao processual, ha urn longocaminho onde nao epossibilitado 0 exercicio do contraditorio.

o art. 155 do cpp, ao permitir que 0 magistrado fundamente suadecisao, mesmo que subsidiariamente, em atos de investigac;ao, e nao ematos de prova, representa uma afirmac;ao da inspiraC;ao inquisitorial deprocesso penal. Desta forma, 0 legislador sacramentalizou 0 que vinhaocorrendo na praxis judiciaria, ou seja, na considerac;ao dos elementoscolhidos na fase inquisitorial para condenar 0 acusado. Autoriza 0 referi­do dispositivo a utilizac;ao pelo juiz, no momento de sua decisao, dos ele­mentos colhidos sem 0 contraditorio judicial, de forma supletiva. Essa

40 Como 0 contraditorio nao pode ser feito no momento da colheira da prova, no momento em queocorre a interccpta~aa telef6nica, ede exigir-se a plenitude do realizado a posteriori. Entao, amesda transcri~iio da conversa~iio, por exemplo, a defesa deve seT intirnada para ouvir, rnanifestar-sesobre a que for pertinente ao fato, conferir a observancia do procedimento na capta~ao e dosdemais requisitos legais. 0 CPP italiano prev€' essa possibilidade (art. 268) e a Corte Europcia dosDirchos do Hornern, na senten~a de 17.10.2003, no caso CRACI contra ITALIA, rcconheceu,nesta regra, uma norma de garantia substancial de prote~ao da vida privada. Entao, se faz neces­saria garantir 0 contraditorio antes de serern extraidas as infonnat;:6es e as dados referentes it cap­tat;:ao do material referente ao processo, aautorizat;:ao dada. Nessa mesrna decisao, a CEDH exor­ta a observancia dos devidos cuidados na prote~ao dos dados captados e na posterior destrui~ao.

Porern, isso nao garante a contraditorio pleno, fazendo-se necessario 0 estabelecimento de urnorgaa proprio para acompanhar a produt;:ao dessa modalidade de prova.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera<;6es Criticas

valora~ao ultrapassa a mera possibilidade de contamina~aodo que foi pro­duzido sob a contradit6rio judicial, pelos elementos inquisitoriais, ealcan~a a considera~ao direta destes. Uma exegese comprometida com apteserva~ao de urn processo penal transparente (art. 5', LX, CF), humani­tario (art. I', III, CF) e constitucional (arts. I', caput,S', caput e 5', § 2',da CF), admitira esses elementos somente quando forem para afastar urnprovimento condenatorio.

o que sao as provas cautelares, nao repetiveis au antecipadas? 0 pro­cesso cautelar se justifica para preservar uma situac;ao processual vincula­da Ii instru~ao (prisao preventiva para assegurar a instru~ao processual, v.g.) au ao merito criminal (prisao preventiva para garantir a aplica~ao dalei penal, sequestro de bens, v. g.) au a extensao dos efeitos a outras esfe­ras juridicas (arresto de bens para garantir a especializa~ao em hipotecalegal, destinada Ii repara~ao do dana causado pelo delito, v. g.). Porem, adispositivo se refere a"prova cautelar", a qual se relaciona com os elemen­tos de prova inviaveis de serem reproduzidos no contradit6rio judicialpr6prio, de urn futuro processa penal, motivo par que ha necessidade deserem produzidas antecipadamente. 0 dispositivo legal autoriza a utiliza­C;ao dessa prova, mesmo que exclusivamente, para condenar 0 reu. E 0

contradit6rio? Essa ressalva do legislador ha que ser entendida comotendo sida produzida em contradit6rio judicial, nas hip6teses em que hou­ver requerimento de produ~ao judicial da prova, antes do contradit6riojudicial de especifico process0, retornando-se Ii regra do inicio do art. 155do CPP (prova e a que foi produzido sob a contradit6rio judicial).Ademais, prova, verdadeiramente, advem dos elementos produzidos sob acontradit6rio judicial pr6prio.

Esse dispositivo se aplica tambern ao magistrado conduror do processode competencia do Tribunal do Juri, pais, nessa fase, aplica-se a principia dalivre aprecia~ao da prova, e nao a da intima convic~ao (Jurados), e agora alegislador passou a considerar prova as elementos produzidos em contradi­torio e a pronuncia se baseia em provas e nao em elementos inquisitoriais.41

3.2. Livre(?) aprecia<;ao da prova

A fun~ao da prova e convencer a julgador. A acusa~ao pretende con­veneer a julgador da existencia do fato, de que a impurado a praticou de

41 Vide Cap. III, item 3.

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Nereu Jose Giacomolli

determinada maneira e mediante certas circunstancias, em determinadolocal e tempo, com uma motiva~iiono agir, ensejadora de certa adequa~iio

juridica ripiea. Porem, 0 encargo niio cessa a1. Ha necessidade de demons­tra~iio inequivoca, robusta e consistente para que seja emitido urn juizo defe (intimo) que, num segundo momento e exteriorizado atraves da funda­menta<;:ao.

o objetivo das partes, no que tange il prova, e demonstrar a veracidadede suas afirma~oes, rebatendo-as e, com isso, convencer 0 julgador de suaraziio ou da falta de raziio da outra parte ou da insuficiencia de elementospara proferir urn juizo de condena~iio. Essa dialetica se destina il forma~iio doconvencimento do juiz, para que ele possa fazer a sua escolha (cemere dolatim e scelta do italiano) conforme 0 seu entendimento no caso concreto. Aprova se destina a convencer 0 julgador de que 0 argumentante tern raziio, alevar os elementos de prova a seu conhecimento, para que os avalie e os con­sidere como prova.

A situa~iio processual penal informa a existencia de varias hipoteses noprocesso (maquina retrospectiva,42 segundo Cordero), formuladas desde afase pre-processual, as quais necessitam de comprova~iio nos autos. A deci­siio se origina da demonstra~iiodas hipoteses (hypothesis - hypo e thesis),das suposi~oes, do que foi cogitado nos autos, mas conforme a cren~a do jul­gador; a decisiio contempla aquilo que 0 julgador acreditou ser 0 mais prova­vel. Niio ha urn juizo de verdadeiro ou falso, de verdade, mas de probabili­dade (probabilem). Ha a emissiio de urn juizo de aprova~iio de determinadahip6tese. em detrimento de outras. nao criveis ou menos criveis. com afasta­mento dos argumentos probatorios menos seguros. Por isso, 0 juizo conde­natorio ha de afastar todas as hipoteses (thesis, teses) sustentadas na rea~iio

(defesa), para ser validamente fundamentada (art. 93, IX, CF) e republicana­mente aceita (art. 1Q da CF).

Portanto, 0 magistrado faz uma escolha. Mas escolhe entre 0 que?Escolhe 0 que? pergunca Camelutti. Eque a duvida esta na raiz da certeza(dubium, duo) e se contrapoe entre dois raciocinios, pois primeiro se decidee apos se fundamenta atraves das provas. 0 magistrado se encontra numaencruzilhada e a duvida niio e eliminada cern por cento (acredito, mas aindaniio sei). 0 juiz, assevera Camelutti, apos ter examinado as provas, depois deter escutado as razoes e as avaliado, continua na duvida. a qual nao sai de seupensamento (dificuldade e tormento). Mas 0 juiz tern que deddir, tern que

42 Vide CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre. 2003, p. 565 e passim.

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Rcfonnas en do Processo Penal:Considerat;6es Criticas

agir e escolher (absolve ou condena), e 0 resultado do processo depende daescolha (dalla banta della scelta dipende i1 risultato del processo). Por isso, adecisao nao e somente urn juizo, mas tambem uma ac;ao. A certeza pertenceao reino da escolha.43 Reconstruir a hist6ria dos acontecimentos nao ea tare­fa mais tarmentosa no processo, mas a escolha do magistrado, a qual implicaurn ato de fe,44 de cren~a na versao que esta elegendo.

A liberdade na aprecia~aoda prova nao e absoluta. Tambem nao 0 e asua avalia~ao. A vincula~ao do juiz a determinado meio de prova (provatarifada, onde a quantidade superava a qualidade ou 0 conteudo desta, a leiescolhia pelo julgador), representou uma evolu~ao (Revolu~aoFrancesa) emrela~ao it liberdade ilimitada da intima convic~ao (Foucault), ainda manti­do no julgamento pelos jurados (decisao confarme convencimento proprio,sem exteriariza~ao da motiva~ao e da fundamenta~ao), apesar de aConstitui~ao garantir a motiva~ao das decisiies (art. 93, IX, CF) de todos osorgaos do Poder judiciario, inclusive das decisiies administrativas dosTribunais (art. 93, X, CF). AJcan~ou-se 0 principio do livre convencimentomotivado ou da persuasao radonal da prova, isto e, valara-se 0 que foi pro­duzido nos autos, com exterioriza~aoda motiva~ao fatica e juridica. Porem,essa liberdade de convencimento nao e absoluta; encontra limite na provaadmissivel, no que pode ser considerado prova. E, com a reforma de 2008(nova reda~ao do art. 155 do CPP), consideram-se como prova os elemen­tos produzidos sob 0 crivo do contraditorio judicial (alias, uma interpreta­~ao a partir da CF ja afastaria, mesmo antes da modifica~ao ordinaria, avaloriza~ao dos elementos colhidos sem 0 contraditorio, coma prova). Alivre aprecia~ao nao significa discricionariedade ilimitada. A considera~ao

valorativa dos elementos colhidos sem 0 crivo do contraditorio, na faseadministrativa, policial ou inquisitorial, desvirtuaram 0 sistema probat6rioe a propria essencia do processo penal.

a julgamento e urn ato do sentire, urn ato de cren~a no que foi demons­trado no processo (salvo juizos baseados na intuic;ao sobre os fatos ou na cer­teza moral da intima convicc;ao dos jurados, os quais nao fundamentam as

43 CARNELUITl, Francesco. "Verita, dubbin, ccrtezza", em Rivista di Diritto Processualc, vol. XX(II serie), 1965, p. 5.

44 Segundo CARNELUITI, Francesco. "Venti'l, dubbio, certczza", em Rivista di Diritto Processuale,vol. XX (II sene), 1965, p. 8, ciencia e fe nao dcvem ser conccbidas como duas linhas paralelasque nao se encontram, como diziam as matematicos antigos, au que se encontram somente noinfinito, como dizcm os matematicos de agora, mas a relac;:ao entre as duas reclama a figura de urncirculo: cada passo da ciencia faz avanc;:ar a fe e vice-versa (Blondel).

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Nereu Jose Giacomolli

suas decisoes). Eurn ato de fe, segundo Cordera.45 a resultado esti sujeito avariiveis prajetadas sobre 0 pracesso, referentes as vivencias pessoais do jul­gadar, seus gostos e desgostos, suas paixoes, seu eu, seu modo de ser nomundo, pois 0 sentido da compreensao nao acontece sem 0 objeto a ser ana­lisado, sem a vivencia do ser, pousado na realidade, na intera~ao com a exis­tencia (dasein). Regras juridicas e fatos recebem a carga de valores sociais, deparadigmas ideol6gicos, filos6ficos, hist6ricos e psicol6gicos, inclusive darede de elementos inconscientes que dao causa a a~ao (decisao).46

Cabe ao magistrado emitir urn juizo de valor no que tange a praposi~ao

dos meios de prava, aos meios de busca da prova, a idoneidade dos elementosde prava, a credibilidade das fontes e, por fim, avaliar 0 resultado probat6rio.a magistrado nao possui liberdade ilimitada para'" convencer, motivo parque tecnicamente a expressao "livre convencimemn" nao e adequada e trans­mite a ideia de perfei~ao, de liberdade absoluta e ,lImitada acerca da prava.

a convencimento tambem encontra limites constitucionais e legaismarmente na licitude, idoneidade e constitucionalidade da prova. A expres­sao "livre convencimento" foi cunhada no iluminismo, com 0 escopo delibena~ao do Ancien Regime, da valora~ao legal das provas, bern como paralibenar 0 magistrado da intrincada malha legal. Pennaneceu, ainda, no sis­tema brasileira, 0 que foi abandonado pela maioria dos sistemas, a excepcio­nalidade do convencimento intimo dos jurados, os quais sao instados a dizer"sim" au "nao" as perguntas feitas, cuja resultado e a condenac;a.o au a absol­vi~ao, sem que se saiba a real motiva~ao, da idoneidade e coerencia desta, sea motiva~ao esti baseada em fatos e circunstancias dos autos ou nao. Mantidaa instituic;ao do juri, cuja previsao e constitucional, 0 seu funcionamento,monnente a vota~ao dos quesitos, hi de ser modificada para atender as exi­gencias constitucionais (fundamenta~ao). Em suma, 0 convencimento domagistrado esti limitado pelo conteudo fidco dos autos, pelo valarar e moti­var, pelas regras da legisla~ao ordiniria e constitucional e pelos principioshumanitarios.

a magistrado se convence em face do material que possui nos autos; elivre, no sentido que pode escolher essa ou aquela prava, dizer qual a que lheconvenceu e parque hi pravas que podem ser descartadas, mas a liberdade,

45 Em CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre. 2003, p. 566.46 Em GIACOMOLLI, Nereu Jose e DUARTE, Liza Bastos. "0 Mira da Neutralidade na Motivar,:ao

das Decis6es Judiciais: aspectos epistemoI6gicos", em Revisra da Ajuris, 2006, nil 102, pp. 2BB e305. Afirmam os autares ser 0 discurso da decisao judicial bastante complexo, pois ha urn campode manipulal;ao consciente e inconsciente na produl;ao do re-HO da decisao.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera~6esCriticas

como diz Mario Chiavario, nao pode servir para justificar escamotages parainfringir as regras estabelecidas.47

Quando se fala em livre convencimento, tem-se a impressao de que 0

magistrado nao necessita motivar a sua decisao. E livre no sentido de que naopode ser coagido em sua capacidade de entendimento e determina~ao, mastern a dever de justificar, de exteriorizar a sua decisao com base na prova dosautos. 0 convencimento tambem obedece a certos criterios e limites: com 0

que est:i nos autos, idoneidade maral e constitucional. Tambem nao se podefalar em livre convencimento motivado, em razao de seus limites. A expres­sao nasceu para refutar a antiga tradi~ao da prova tarifada au da prova legal.Portanto, a livre convencimento se restringe aliberdade de a juiz poder ava­liar, segundo sua compreensao limitada, as provas dos autos.

o juiz nao e urn ser s6, recolhido, isolado, pais e urn ser no mundo(Heidegger), e a presen~a do ser no mundo e perpassada, introjetada, par suacompreensao, pela proje~ao de sua presen~a (0 que traz consigo, a entendi­menta do mundo).48 Assim tambem nao a e em face do direito aprova, dadinamica e dialetica do processo, as quais rompem as barreiras do isolamen­to. 0 julgador nao esta e nem pode estar s6 (impossibilidade). Esta embre­nhado num conjunto de provas, de fatos, de circunstancias, de teses juridi­cas, de outras decis6es, de opini6es, de vozes, conscientes e inconscientes.49

o conteudo tern uma dimensao maior que os pr6prios autos.A decisao judicial e uma opera~ao complexa, a qual envolve aspectos

cognoscitivos e valorativos, relacionados, no ambito criminal, especialmen­te aprova dos fatos e de suas circunstancias, bern como de qual regra e deque dimensionamento da regra juridica incide no caso concreto. Nao e qual­quer a~ao (decisao), qualquer sentir que encontra suparte constitucional,mas aqueles advindos da compreensao de determinado juiz (determinado serno mundo) au de determinado conjunto de juizes, da analise da prova doprocesso, do que foi produzido pelas partes no processo. Assim, restam afas-

47 Em CHIAVARIO, Mario. Dirirto Processuale Penalc: profilo istituzionale. Torino: Utet, 2007, p. 323.48 GIACOMOLLl, Nereu Jose e DUARTE, Liza Bastos. "0 Mito da Neutralidade na Motiva<;ao das

Deds6cs Judiciais: aspectos epistemoI6gicos", em Revista da Ajuris, 2006, nQ 102, p. 292; BOA­VENTURA, Souza Santos. Urn Discurso para as Cicncias. Porto: Afrontamento, 2002, pp. 50 a 55,quando apresenta 0 paradigma emergente das ciencias, afirmando que todo conhecimento cauto­conhecimento e que a nossa trajet6ria de vida pessoal e coletiva, os valores, as cren~as e os pre­juizos que transportam sao prova intima do nosso conhecimento, sem 0 qual as nossas investiga­~6es se constituiriam num emaranhado de diligencias absurdas.

49 Vid. MORAIS DA ROSA, Alexandre. Decisao Penal: A Bricolage de Significantes. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2006, pp. 277 a 280, a defesa de urn dialogo inadiavel entre 0 processo penal e a psi­camilise.

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Nereu Jose Giacomolli

tadas as convic~6es e as hip6teses criadas ou construidas artificialmente. Adecisao insere-se no devido processo constitucional ou no justo processoquando se pode acreditar nela, quando e aceitavel e possa ser controladaatraves da critica. A decisao judicial nao e uma declara~aode verdade, nao euma certidao do que ocorreu no mundo fatico, mas uma declara~aona qualse pode crer, com base no que esta no processo. Podendo-se crer, submete­se ao duplo grau, ao controle intemo das partes e dos interessados, submete­se ao contradit6rio critico, assumindo outro objeto, 0 do recurso, 0 merito dorecurso (coincidente ou nao corn 0 merito da causa).

A decisao nao se restringe asenten~a final de condena~ao ou de absol­vi~ao. A realidade dialetica endoprocessual demonstra 0 constante pedir,contestar, provar e decidir. Antes da decisao final. varios filamentos faticose juridicos. materiais e substanciais, se acomodam (e incomodam) no proces­so, atraves de microdecis6es (liberdade e prisao. recebimento da acusa~ao,

admissao de prova, v.g.), as quais vao aparando as margens do caudal proces­sual, com vistas adecisao final ou, as vezes, encerrar 0 processo (extinc;ao dapunibilidade antecipada, antes da senten~a).

A valora~ao da prova tambern depende do grau de resistencia acon­traprova, bern como de sen contradit6rio. Essa circunstancia e de sumaimportancia as partes, no momento de propor 0 meio de prova, e a metodo­logia de busca dos elementos probat6rios. Urn meio de prova facilmentebatido pela contraprova nao e id6neo para dar suporte a pretensao ou aresistencia processnais.

as dados cognoscitivos constantes nos autos serao valorados pelo jniz,urn ser humano, urn ser no mundo, com snas circunstancias conscientes einconscientes. A valora~ao implica analise do conteudo intemo e extemodos elementos de prova. Portanto, se trata de uma avalia~ao pessoal, de urnconvencimento pr6prio, mas limitado acondic;ao de ser humano e as regrasjuridicas estabelecidas. 0 julgar e uma resposta fragmentaria, porque parciale 0 que esta nos autos e a totalidade e inatingivel pelo humano.

A valoraC;ao da prova, como regra na tomada de decisao sobre 0 meritoda causa au em outra decisao, e antecedida, necessariamente, pela aprecia­~ao das regras de admissibilidade, de veda~ao aquisitiva e das hip6teses deexclusao, bern como da interpreta~ao da prova, ou seja, estabelecer 0 seuconteudo, no dizer de Montero Aroca.so A valorac;ao tern como pressuposto

50 MONTERO AROCA, Juan. "Principio ACUS3tOriO y Prueba en el Proceso Penal", em Prueba yProceso Penal (G6MEZ COLOMER, Juan Luis, organizadori, \'dlencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 49.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Consideral;'oes Criticas

a validade da prova. A inadmissibilidade desta, mais precisamente de deter­minado meio de prova, podera ter sido realizada antes de sua aquisi~ao, nadialetica processual. Tambem podera ter ocorrido a contamina~ao da aquisi­~ao por urn meio vedado (provas adquiridas ilicitamente), circunstancias quedeverao pesar no momento da avaliac;ao. As causas invalidantes da provapoderao ter surgido posteriormente a sua aquisi~ao. Por isso, a amilise dasregras de exclusao da prova e retomada antes de sua valora~ao. Nao se operaa preclusao quando se decide acerca da restri~ao da liberdade e da inciden­cia do ius puniendi. Urn processo penal humanitario e etico recha~a a valo­ra~ao explicita ou implicita, 0 anonimato verbal ou escrito, bern como asinformac;6es extramuros do processo.

Cada meio de prova possui regras especificas de inadmissibilidade, deveda~ao de aquisi~ao e, portanto, de exclusao, sempre que fizerem parte doconteudo do processo (competencia do juizo, intercepta~ao telef6nica dedelitos nao previstos na lei ou sem 0 procedimento previsto).

3.3. Cargas e chances probat6rias

Do processo infere-se uma dinamicidade contrastante com a fixidez dasregras juridicas, impulsionada pelas atividades dos sujeitos processuais, gera­dora de situac;6es processuais. A dinamica dos atos processuais, impulsiona­da pelos quatro sujeitos principais e necessarios do processo penal (juiz, acu­sador, defensor e acusado), no dizer de Goldschmidt, "constituem, modifi­cam ou extinguem expectativas, possibilidades ou cargas processuais ou adispensa destas".51

Edas partes 0 encargo de propor os meios de prova e da metodologiaprobat6ria. Porem, em razao da presun~ao de inocencia, e da acusa~ao acarga da persuasao da prova, de convencer 0 julgador da culpabilidade doacusado. A admissibilidade desses e 0 ato processual pelo qual 0 magistradoexamina a adequa~ao da metodologia probat6ria proposta, ou seja, se a provapodeni ser adquirida atraves dos meios enunciados. lnexistindo regra proces­sual (constitucional ou infraconstitucional) excludente do meio proposto,este e admitido e tern entidade valida para ser produzido. Com a admissibi-

51 GOLDSCHMIDT, James. Principios Generales del Proceso II. Problemas juridicos y Politicos delProceso Penal. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1961, p. 79.

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Nereu Jose Giacornolli

lidade, nasce 0 direito do proponente it aquisi~ao da prova, ou seja, de inte­gni-Ia nos autos.52

A aquisi~ao da prova e urn fen6meno regido por urn conjunto de atosprocessuais que introduzem e instalam a prova, mesmo que provisoriamen­te (isso porque poderao ser demonstradas circunstancias determinantes desua extirpa~ao do processo, como ocorre com a prova ilicita, por exemplo),no amago da situa~ao processual. A prova sera considerada adquirida quan­do, apos ter sido proposta, passar pelo crivo do contraditorio e houver umadecisao judicial acerca da permanencia desta no processo, mesmo de formaimplicita, mormente quando nao houver impugna~ao (podera ocorrer 0

desentranhamento de documento juntado pela parte, apos 0 contraditorioou 0 desentranhamento de uma pericia - levantamento no local dos fatos­sem a intima~ao da defesa constituida para acompanhar 0 ato. Essa provanao constara nos autos e sera considerada como nao adquirida). Portanto,adquirir a prova significa admitir que seu conteudo permanece nos autospara ser valorado.

Num primeiro momento, ha a proposi~ao de urn meio de prova, 0 qualpassa pelo crivo da admissibilidade (antecedente), e apos e introduzida noprocesso (conseqiiente). Por isso, 0 ato de aquisi~ao da prova tambem se sub­mete ao crivo da validade. Assim, invalida e a aquisi~ao de uma prova inad­missivel, na medida em que os defeitos originais contaminam as atos subse~

qiientes53 que se situam dentro de urn parametro de dependencia. Invalidatambem e a aquisi~ao que contrarie da dignidade da pessoa humana (art. IQ,

m, CF), a liberdade moral e as garantias processuais, constitucionais e infra­consritucionais.

a meio probatorio pode ser admissivel (prova testemunhal), mas aaquisi~ao desse ser invalida (manipula~ao psiquica da testemunha, inquiri­~ao indutora das respostas, por exemplo).

a objeto da prova ou thema probandum e representado pelos fatos ecircunstancias levados ao processo, referentes it imputa~ao, it punibilidade eadetermina~ao da pena ou da medida de seguran~a.Tambem dos fatos refe­rentes ainocencia, contraprova fatica da imputa~ao, punibilidade e das con-

52 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 612.53 CORDERO, Franco. Procedura Penale. Milao: Giuffre, 2003, p. 618, refere haver uma rela<;ao de

antecedente e consequente entre admissiio e aquisi<;iio, sendo a invalidade do ato de aquisi<;iio urnfenomeno complexo, situado em trcs classes: invalidade do ato que adquire uma prova inadmis­sivel; invalidade quando houver lesiio a liberdade moral ou ofensa as regras processuais (pressu­pastos e execll<;iio da intercepta<;iio telefonica, por exempln) Oll nulas em sentido tecnico doC6digo de Processo Penal italiano (titulo das nulidades, arh 177 a 186).

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Reformas (7) do Processo Penal:Considerac;oes Criticas

sequencias sancionatonas. A aplica<;ao de uma regra processual tambern

pode ensejar a necessidade de produ~ao de uma prova fatica (amea~as a tes~

temunha, avitima). No processo penal tambem ha uma individualiza~aodostemas das provas, a qual efeita na imputa<;ao acusat6ria, embora a ela nao selimite, pois a defesa tern 0 interesse na contraprova, ademais dos interessesna punibilidade e na individualiza~aodas san~aes. Eobjeto de prova a exis~

tencia do fato e de suas circunsrancias, inclusive de dimensao tipica (tenta­tiva ou consuma~ao, concurso material ou formal, simples, qualificado ouprivilegiado, por exemplo) sua adequa~ao tipica, a causalidade, os aspectossubjetivos de atribui~ao.Tambem, fazem parte do thema probandum os fatose as circunstancias que interessam adefesa (presen<;a de escusat6rias de tipi­cidade, ilicitude ou de pena, v. g). Por isso, segundo Cordero todas as hip6~

teses a serem verificadas integram 0 thema probandum.54 Como regra, amateria fatica recai sobre 0 juizo de culpado ou inocente, sua delimita<;ao eapenamento. Entretanto, 0 objeto da prova tambem podera abranger ques~

taes processuais, quando estas dependerem da situa~ao fatica (qualifica~ao ecapacidade tecnica dos peritos para admitir ou nao esta prova pericial;demonstra~ao de que a perkia foi realizada pelos policiais que trabalharamnas investiga~aes, por exemplo).

Os meios de prova sao os mecanismos, os instrumentos processuais id6­neos, utilizados para introduzir no processo os elementos que emanam dasfontes de prova (perkias, documentos, acarea~ao, testemunho). Por outrolado, os elementos de prova sao as informa~aes, os dados a priori, ainda naoavaliados, que sao extraidos das fontes de prova. Diferentemente do resulta~

do probat6rio, pois quando se fala em resultado probat6rio, ja se tern a emis~

sao de urn juizo valorativo acerea de urn elemento de prova. Ja, as fantes deprova podem ser representadas por pessoas (sujeitos - testemunhas) ou eai~

sas (abjetas - doeumentos) com idoneidade sufieiente para fornecerem re~

sultados a serem valoradas pela juiz. Tambem se poderia dizer que sao aspessaas au eaisas das quais se podem retirar a prova55 au extrair dados cog~

noscitivos relevantes ao processo.56 Nessa perspectiva, as fontes sao pessoaise reais. A doutrina costuma tambern falar de fontes formais e materiais deprova, entendendo aquelas como sendo as mecanismos normativos que

54 Em CORDERO, Franco. Procedura Penale. MiLia: Giuffre, 2003, p. 570.55 CHIAVARLO, Mario. Diritto Processuale Penale: profilo istituzionale. Torino: UTET, 2007, p. 294.56 MARINELLI, Claudio. lntercettazioni processuali e nuovi mezzi di ricerca della prova. Torino:

Giappichelli Editore, 2007, p. 99.

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Nereu Jose Giacomolli

levam os dados cognoscitivos ao processo e estas as que advem desses meca­nismos, ou seja, podendo ser representada por pessoas ou coisas.

Os meios de busca da prova representam a metodologia e as tecnicas decolheita da prova. Em razao do direito a prova, todos os meios id6neos, ouseja, que nao firam a liberdade moral da pessoa, sua liberdade de autodeter­mina,ao, mesmo com seu consenso, aMm dos legalmente previstos e adequa­dos a CF. Cabe ao magistrado, ao ser proposto urn meio de prova nao previs­to na lei, analisar a sua idoneidade moral e constitucional, deferindo ou naoa sua produ,ao.

Num modelo de processo penal que tern pOT escopo maximo e superior,senao 0 principal, a busca da verdade a todo custo (inadmissivel em nosso sis­tema constitllcional), admitem-se todos os meios de prova, inclusive 0 atuarex officio no que tange a estes, numa busca incessante, a qual mio e inofen­siva.57 Entretanto, ha. outros valores que precisam seT balanceados, valoradose considerados no processo, no aspecto formal (defesa) e material (inocenciada pessoa); ha limites as partes (proposi,ao e conforma,ao) e ao pr6priomagistrado (admissao e valora,ao). Por outro lado, 0 direito a prova conduzaadmissibilidade de meios e mecanismos de busca da prova nao previstos emlei, mas ha limites a serem observados tambem no que diz respeito a prova,no modelo de processo contradit6rio, em face do direito a prova e nao dabusca da verdade em todas as suas dimens6es, porque, nesse arcabou,o deprocesso penal dos anos quarenta, de op,ao nitidamente inquisitorial, aliberdade da prova ex oErio se inclinaria ao intuito condenat6rio.

No ambito criminal, em razao da presun,ao de inocencia (art. 5Q, LVII,

CF), 0 encargo probat6rio I' da acusa,ao,58 bastando a defesa tomar crivel asua alega,ao, criar uma duvida razoavel no espirito do julgador. A presun,aode inocencia I' urn principio de elevado potencial politico e juridico, indica­tivo de urn modelo basilar e ideol6gico de processo penal. Quando se parte dainocencia e nao da culpabilidade do acusado, emergem importantes e delimi­tadas regras probat6rias. Primeiramente, a imputa,ao fatica e juridica se cons­titlli para 0 magistrado uma hip6tese a ser demonstrada pela acusa,ao. Nao

57 CORDERO, Franco. Che Cos'e la Giustizia? Roma: Luca Sossella Editore, 2007, p. 10, afinna quea paranoia nunca cinofensiva, e muito menos quando se trata de doutrinas, hierarquias, policiase tribunais.

58 Segundo FERRAJOLI, Luigi. Derecho y RazOn. Madrid: Trotta, 1997, p. 549, em face da distri­buil;ao das cargas no processo penal, a culpa e nao a inocencia deve ser dcmostrada. SegundoMONTERO AROCA, Juan. "Principia Acusatorio y Prueba en el Proceso Penal", em Prueba yProceso Penal (G6MEZ COLOMER, Juan Luis, oTganizadoT. Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008,p. 49, em razao clesse principia, 0 acusado nao precisa pr(w.u ndda.

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obtido exito na demonstra<;ao da hip6tese, e dever do magistrado confirmar aoriginario status de inocencia, com urn provimento absolut6rio.59

Na sistematica do processo penal nao ha reparti<;ao de cargas probat6riase nem escusas probat6rias, tipicas do ambito civil. Adefesa se apresenta umaoportunidade de, alem de suscitar, provar fatas e circunstancias geradoras dadu:vida au ate de exculpat6rias. Porem, nao possui 0 encargo, mas uma chan­ce de influir na situa<;ao processual engendrada na investigac;ao e no processo.

o encargo probat6rio e do sujeito ativo da a<;ao processual penal, doautor, de quem afirma uma pretensao em juizo.60 Ao autor cabe provar aselementos previos a valorac;:ao propriamente dita, ou seja, a existencia dodelita (materialidade, letalidade) e ter sido a acusado a autor do fato, berncomo a existencia de provas suficientes a embasar a juizo condenatorio. Saoas fatos objeta da acusa<;ao. Porem, a encargo probat6rio abrange tambem ademonstra<;ao da adequa<;ao juridica II situa<;ao fatica. Par isso, a prova nao

59 Na senten.:;:a Barbera, Messegue e Jabardo contra Espanha, de 1988, a Corte Europeia assentouque, no desenvolvimento de suas fun.:;:6es, os membros do orgao judicame nao podcm partir daideia prcconcebida de que a sujeito cometeu 0 delito pelo qual esta sendo perscguido e que 0 onusda prova cabe it acusa.:;:ao e a duvida favarece ao imputado. No He 83947, do STF, ReI. Min. Celsode Mello. ju1gado em 07.08.2007. afirma-se que "...as acusa.:;:oes penais nao se presumem prova­das: 0 onus da prova incumbe, exclusivamente, a quem acusa. - Os principios constitucionais queregem a processo penal poem em evidcncia a nexo de indiscutivel vincula.:;:ao que existe entre aobriga.:;:ao estatal de oferecer acusa.:;:ao formalmente predsa e juridicamente apta, de urn lado, e adireito individual it ampla defesa, de que dispoe 0 acusado, de outro. Eque. para 0 acusado exer­cer, em plenitude, a garantia do contraditorio, toma-se indisp'nsavel que a orgao da acusa.:;:aodescreva, de modo preciso, os elementos estruturais ("essentiaJia delicti") que compoem 0 tipopenal, sob pena de se devolver, ilegitimamente, ao reu, a onus (que sabre ele nao indde) de pro­var que e inocente. Esempre importante reiterar - na linha do magisterio jurisprudencial que aSupremo Tribunal Federal consagrou na materia - que nenhuma acusa.:;:ao penal se presume pro­vada. Nao compete, ao reu, demonstrar a sua inocencia. Cabe, ao contd.rio, ao Ministerio Publico,comprovar, de fonna inequivoca, para aMm de qualquer duvida razoavel, a culpabilidade do acu­sado. Ja nao mais prevalece, em nosso sistema de direito positivo, a regra, que, em dado momen­ta historico do processo politico brasileiro (Estado Novo), criou, para a reu, com a falta de pudarque caracteriza as regimes autoritarios, a obriga.:;:ao de a acusado provar a sua propria inod~ncia."

60 Segundo GOLDSCHMIDT, James. Principios Generales del Proceso - Teoria General del Proceso1. Buenos Aires: EJEA, 1961, cabe a acusa.:;:ao fazer a prova da culpabilidade do autar do fato.Goldschmidt pensa a processo como situa~'aa juridica, diferentemente de Biillow (processo comorela.:;:ao juridica) e, tarnbern par isso, assevera serem as expectativas, perspectivas, chances, cargase libera.:;:ao de cargas que induzem as partes a agir dentro do processo e que dao origem aos 1a.:;:os,harnes au vinculos entre as sujeitos processuais. Goldschmidt ensina (tern autoridade para ensi­nar aos que se disp6e a entender) que sao incumbidas as partes onus au cargas processuais, enten­didos como a realiza.:;:ao de atos com a finalidade de prevenir urn prejuizo processual e, conse­quentemente, uma senten.:;:a desfavoravel. Enfatiza que a liberat;:io de uma carga processual podedecorrer tanto de uma agir positivo (praticando urn ato que the c possibilitado) como tambcmquando se encontra em uma situa.:;:ao que lhe permite abster-se de realizar algum ato processualsem receio de que lhe sobrevenha algum prejuizo que soi ser inerente a tal conduta.

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abrange somente a mera dimensao dos fatos e de suas circunstancias, mastoda atividade acusat6ria.61

A defesa nao possui encatgo ptobat6rio (atividade ptobat6ria). Porempossui uma oportunidade, uma chance ptobat6ria (possibilidade) para de­monstrar as sua alegac;6es (situac;6es positivas ou negativas, como OCOITe coma acusac;ao), de fazer a contraptova, suscitando a dtivida (hi quem refira ter adefesa 0 encargo de ptovar a dtivida). Nao tern encargo ptobat6rio, situac;aoque nao acarreta onus e nem consequencias pelo fato de nao ter provado.

Esse encargo ptobat6rio comporta uma dupla dimensao: formal e subs­tancia!' 0 formal diz respeito ainttoduc;ao das ptovas no ptocesso e 0 mate­rial ou substancial refere-se a aceitabilidade dessa ptova pelo magistrado, asua valorac;ao positiva, na linha da afirmac;ao fitica emitida na inicia!' Naoptovar de forma clara, limpida e segura e como nao provar, deixar 0 magis­trado em duvida ecomo nao provar. Nunca e dernais acentuar que no pro­cesso penal, em termos de prava, aplica-se 0 principia universal e humani­tirio do in dubio pro reo. 0 interesse da defesa estari satisfeito e e suficien­te na criac;ao da dtivida razoive! no espirito do julgador.

o encargo de ptovar a responsabilidade criminal do imputado diz res­peito ao aspecto substancial do encargo. Hi urn dever substancial deste, emrazao do principio constitucional da presunc;ao de inocencia. Hi 0 encargode ptopor os meios, mas tamb"m de levar elementos id6neos a ptovar a res­ponsabilidade. 0 dever estari cumprido quando a acusac;ao conseguir supe­rar, racionalmente, qualquer especie de dtivida acerca da inocencia do reu.Por isso, a ratio mais ptofunda da presunc;ao de inocencia se expressa noprincipio in dubio pro reo.

61 Segundo FERRAJOLI Luigi. Derecho y RazOn. Madrid: Trotta, p. 551, a presun\"ao de inocenciaeuma "regra de tratamento" do imputado, no sentido de excluir ou ao menos restringir ao maxi­mo a limita\"ao da liberdade pessoal, quanta uma "regra do juizo", impondo a acusa\"ao a cargaacusat6ria e a absolvi\"ao em caso de duvida. Nesse sentido, LOPES JR., Aury: lntrodw;iio Criticaao Processo Penal- Fundamentos da lnstrumentalidade Garancista. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2005, p. 184, afirma que "ao lado da presun\"ao de inocencia, como criterio pragm<itico de sotu­\"ao da incerteza (duvida) judicial, 0 principia do in dubio pro reo corrobora aatribul\"ao da cargaprobatoria ao acusador. A unica certeza exigida pelo processo penal refere-se aprova da autoriae da materialidade, necessarias para que se prolate uma sentelll;a condenatoria. Do contrario, emnao sendo alcan\"ado esse grau de convencimento (e de libera\"3o de cargas), a absolvi\"ao eimpe­rativa". Para VEGA TORRES, Jaime. Presunci6n de lnocencia y Prueba en el Proceso Penal.Madrid: La Ley, 1993, p. 35, a presun\"ao de inoccncia tambem euma regra referida diretamenteaprova no processo penal, segundo a qua] a demonstra\"3o comptera da culpabilidade do imputa­do incumbe aacusa\"ao, irnpondo-se a absolvi\"ao deste quando il culpabilidade nao ficar suficien­temente demonstrada.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considerat;6es Crfticas

A duvida, inclusive acerca da presen~a de excludentes, em razao da pre­sun~ao de inocencia e do in dubio pro reo, induz a absolvi~ao, ou seja, 0 seureconhecimento. Claro que cabe ao imputado levar elementos id6neos, sufi­cientes da sua existencia, de modo a acender a chama da duvida no julgador.Ao contnirio, entrariamos numa senda desconhecida, imaginaria e irreal, deencarregar a acusac;ao de imaginar todas as possiveis duvidas que possamexistir no plano cognitivo do julgador, ou de uma probation diab6lica.62

3.4. Atua<;iio ex officio do juiz

Quando se fala em processo penal subentende-se 0 seu referendal vin­culado ao modelo acusat6rio, de urn procedimento em contradit6rio, funda­do na presunc;ao de inocencia, com todas as garantias constitucionais ehumanitarias. Montero Aroca afirma que 0 denominado processo inquisiti­vo nunca foi urn verdadeiro processo, nao havendo processo se 0 acusador eao mesmo tempo juiz ou se este assume poderes materiais, inclusive de rea­lizar prova de oficio.63

a legislador de 2008 atribuiu poderes de atua~ao ex officio ao magistra­do, mesmo antes de iniciada a ac;ao processual penal, situac;ao nao prevista nareda~ao anterior do art. 156 do CPP, a qual autorizava 0 juiz a buscar provasdurante a instru~ao do processo. Nao se trata de mera atua~ao subsidiaria,mas de atua~ao tipica de parte no processo penal, incompative1 com a orien­ta~ao constitucional de urn processo acusat6rio (art. 129, I, CF). Nesse mode­10 acusat6rio, incumbe aacusac;ao e nao ao magistrado a proposic;ao e a pro­du~ao da prova condenat6ria. A unica admissibilidade valida eda atua~ao exofficio do magistrado para garantir e proteger os direitos e a liberdade doimputado, como guardiao das liberdades.

A fun~ao do juiz no processo eanalisar a admissibilidade dos meios deprova e da metodologia probat6ria, avaliando 0 que for produzido nos autos.No momento em que 0 magistrado ordena a produ~ao antedpada de provas,

62 Em CHIAVARIO, Mario. Diritto Processuale Penale: profilo istituzionale. Torino: Utet, 2007, p. 354.63 MONTERO AROCA, Juan. "Principio Acusatorio y Prneba en el Proceso Penal", em Prueba y

Proceso Penal (G6MEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008,p. 22. Acrescenta, em p. 23, ser urn pleonasmo (redundancia viciada) falar de processo acusa­torio e haver uma contradictio in terminis referir-se a processo inquisitivo, pais nao eproces­so. Na p. 58 refere que, em paises como Alemanha (§ 244.2 da StPO), Portugal (art. 493 doCPP), Italia (art. 493 do CPP) e Espanha (art. 792 da LECrirn), ha autorizat;ao legal aatuat;aode ofkio na busca da prova.

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Nereu Jose Giacomolli

antes do inicio da ac;ao processual penal, mesmo quando urgentes e reIevan­tes (an. 156, 1, CPP), ou quando determina diligencias, no curso da instru­~iio, para dirimir duvida sobre ponto relevante (an. 156, 11, CPP) esta atuan­do como pane, exercendo uma atividade que niio e sua.

Prava antecipada e aquela prava praduzida antes do contradit6rio judi­cial do pracesso principal. Ao haver referencia a "provas", sua pradu~iio hide obedecer ao contradit6rio (art. 155 do CPP). Na hip6tese do an. 156, I, doCPP, nem sequer houve a formaliza~iio de uma acusa~iio. Exige-se a cumu­latividade de cinco requisitos: urgencia e releviincia da prava, bern como anecessidade, adequa~iio e proporcionalidade da medida de pradu~iio anteci­pada. Portanto, os dois primeiros se relacionam com a prova em si e os tresultimos com a produ~iio antecipada. A urgencia diz respeito ao perigo deperecimento da prava sem que seja realizada sob 0 crivo do contradit6riojudicial. Erelevante a prava quando demonstrada a imponancia de sua fun­cionalidade (peninencia), isto e, sua capacidade de alterar a solu~iio de urnfuturo processo criminal. Estamos na fase de investigac;ao, antes do ofereci­mento da acusa~iio, onde 0 Ministerio Publico e 0 titular exclusivo da a~iio

pracessual penal publica, cabendo a ele, no interesse do Estado-acusa~iio,

requerer a pradu~iio antecipada de pravas e niio ao 6rgiio que analisara esseselementos no momenta de receber ou rejeitar a denuncia. Niio ha adequa~iio

e nem necessidade da medida na ordena~iio de antecipa~iio de prava incri­minat6ria. as requisitos deveriio ser inferidos de situa~6es faticas especiais,concretas, previsiveis, pois a antecipac;ao probat6ria nao ea regra no proces­so penal, a qual ha de ser praduzida, sob 0 contradit6rio, ap6s ter sido for­malizada a acusa~iio. A ordena~iio dessa pradu~iio antecipada, para ser cons­titucionalmente valida, devera ser motivada (an. 93, IX, CF) nesses requisi­tos legais.

As diligencias ex officio, previstas no an. 156, II, do CPP, tambem niioencontram sustentac;ao num processo penal acusat6rio, pois na duvida sobreponto relevante aplica-se 0 in dubio pro reo, com a solu~iio absolut6ria. Adetermina~iio de diligencias, nessas hip6teses significa praduzir prava acusa­t6ria, em prejuizo do acusado. Diferentemente e determinar 0 magistrado,como garante dos direitos fundamentais do acusado, a realiza~iio de diligen­cia para prateger 0 status libertatis (necessidades formadas na realidade endoe extrapracessuais brasileiras).

A atua~iio probat6ria de oficio do juiz, ou com poderes inquisitivos,advem do mito da busca da verdade material ou real no pracesso penal,enquanto 0 processo civil se contentava com a verdade formal ou conven­cional, ainda presentes na doutrina e na jurisprudencia, inclusive euro-

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Refonnas (7) do Processo Penal:ConsideraJ;oes Criticas

peias.64 OCOITe que 0 mito da verdade no processo (fantasia tomada dogma),seja ela farmal ou material, ji foi afastado por Camelutti, quando afirrnouque a verdade esti nell tutto, non nella parte, e 0 todo e muito para nos(mortais, se poderia dizer ~ acrescentei) e foi Cristo quem disse: "Eu sou averdade...". Par isso, Camelutti substituiu "verdade" por "ceneza" (certezza),ariginiria do latim cemere, escolha (scelta), scegliere, escolher.65

Cabe as panes a proposi~ao dos meios de prova, bern como da metodo­logia de busca da prova. Eceno que a prova se destina ao convencimento dojulgador, pois e ele quem decide; entretanto na moldura constitucional acu­satoria e do justo processo, 0 magistrado e quem julga 0 que as panes produ­zem nos autos. Ao juiz nao cabe provar e nem contraprovar; decide com 0

que foi produzido nos autos. Questao imponante diz respeito a possibilida­de de 0 julgador perguntar ao reu, ao ofendido e as testemunhas.66 Penso quenao, nem subsidiariamente ou supletivamente pode 0 magistrado interferirna proposi~ao e busca da prova, pois 0 encargo probatorio e das panes.

Ede ser admitida, em face da prote~ao constitucional e humanitiria,inclusive como direito universal, de prote~ao dos direitos fundamentais, dainviolabilidade do direito a defesa, a atua~ao ex officio, extraordinariamen­te, em favor do acusado. Isso quando for para evitar uma condenac;ao injus­tao Par isso, nao tern validade constitucional a segunda parte do anigo 156do Codigo de Processo Penal, quando autariza a atua~ao ex officio do juizpara dirimir duvidas, sobre ponto relevante, no curso do processo. Ora, aduvida implica absolvi~ao em face do in dubio pro reo.

3.5. Inadmissibilidade da prava ilicita

Inicialmente, faz-se necessario consignar que you tratar neste apartado,da proibi~ao de utiliza~ao da prova (Beweisverwertungsverbote), e nao dasproibi~5es de produ~ao da prova (Beweiserhebungsverbote) seja na perspec­tiva de meios, metodologia de busca da prova ou de tema probatorio, emrazao das pontualizac;6es acerca das reformas.67

64 Vide MONTERO AROCA, Juan. "Principio acusatorio y prueba en el proceso penal", em Proem yProceso Penal (COMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 46.

65 Em CARNELlJITI, Francesco. "Verita, dubbio, certezza", Rivista di Diritto Processuale, vol. XX(II serie), 1965, p. 5.

66 Aplica-se 0 disposto no art. 212 do CPP tambem ao ofendido.67 Vide OLIVERIA, Eugenio Pacelli de. Processo e Hermeneucica na Tutela Penal dos Dircitos

Fllndamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, pp. 181 a 206, acerca da inadmissibilidade das pro­vas obtidas ilicitamente.

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o art. 5Q, LVI, da CF ja consagrava a inadmissibilidade no processo penal

da prova obtida por meios ilicitos. Agora, a Lei 11.690/08 disp6s expressa­mente acerca das provas ilicitas diretas e derivadas. A regra, sem excec;ao,segundo 0 legislador ordinario, e da inadmissibilidade da prova ilicita direta.Ademais, ha uma clara defini~ao do que seja prova ilicita: a obtida com vio­lac;ao as regras legais e constitucionais. Portanto, a inadimissibilidade ultra~

passa a viola~ao constitucional (direitos fundamentais, garantias constitucio­nais) para aIcan~ar, tambem, a viola~ao das regras processuais. Quando ametodologia ou a tecnica de busca da prova limitar a liberdade moral da pes­soa produz resultados inadmissiveis, pois se insere no genero "prova ilicita",por viola~ao ao devido processo legal, que e urn processo etico, respeitadordos direitos humanos. Sao exemplos de tecnicas rnoralmente inadmissiveis anarcoanalise, a detector de mentiras (lie-detectori e a hipnose.

A inadmissibilidade da prova ilicita direta e derivada fundamenta-se namaximiza~ao dos direitos fundamentais e no reconhecimento de elementoscomo prova, quando obedecerem as regras legais transparentes.

Ocorre que a Constituic;ao nao excepciona nenhuma especie de ilicitu­de. Toda ilicitude probat6ria e inadmissivel no processo penal, independen­temente de sua especie.68 Porem, a legislador ordinaria admitiu a prova deri­vada da ilicita, a meu sentir, sem adequa~ao ao artigo 5', LVI, da Constitui­~ao Federal, a qual nao faz nenhuma ressalva.

A prova ilicita, direta ou indireta, nao e, verdadeiramente, prova vali­da. Tanto e verdade que, uma vez reconhecida a ilicitude desta, de formadefinitiva, havera a desentranhamento e sua inutiIiza~ao. Portanto, a provailicita nao e prova e nao se presta para nada; a imprestabilidade e absoluta(no processo onde foi declarada au fora dele), conforme paragrafo 3' do arti­go 157 do CPP. 0 seu desentranhamento somente oeorre ap6s a preclusao dadeclara~ao de sua inadmissibilidade, situa~ao contaminante de todo a pro­cessado, mormente com a permanencia do mesmo juiz no processo, em razaodo veto ao paragrafo 4' do art. 157 do CPP.

Nao ha restri~ao de ser inadmissivel somente quando houver viola~ao

ao micleo essencial do direito fundamental, pais ate a viola~ao de regra pro­cessual e fulminada pela inadmissibilidade.

Nao ha referencia acerca do denominado achado casual (atraves de umaintercepta~ao telef6nica autorizada, se descobre outro delito). A Lei Proces-

68 Vide MAGALHAES GOMES FILHO, Direitoil Prova no Pm(f?"i.'in Penal. Sao Paulo: RT, 1997, pp.107 a 110, acerca das conseqiH:;ncias e extensao da ilicitude cia :'TOva.

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Reformas (7) do Processo Penal:Considerat;oes Criticas

sual Penal alema69 e 0 cpp italiano70 autorizam a sua utiliza<;ao em algumassitua<;oes. Numa busca e apreensao (t6xicos) sao encontradas provas de cri­mes nao autorizados na diligencia (armas, documentos, dinheira falso). Haquem defenda, nessas hip6teses, a sua licitude, pois caberia a prisao em fla­grante. Tambem, nao hci referencias a contamina<;ao atenuada ou purgettaint exception e nem a exce~ao da boa-fe ou good faith exception. Na pri­meira hip6tese, mesmo estabelecido 0 nexo causal entre a ilicitude e a lici­tude, este vinculo e atenuado ou quebrada pela interferencia livre e volun­taria de alguem (intercepta~ao telef6nica ilegal e posterior depoimento con­firmat6rio ou confissao do suspeito), desde que tenha havido uma adverten­cia qualificada, isto e, ciencia da inadmissibilidade da prava anterior (videcaso Won Sun v. US).71 Nas hip6teses da exce~ao da boa-fe, a doutrina nor­te-americana considera admissivel a prova quando os policiais agem pensan­do estarem no caminho da legalidade. Esses dois criterios, em nossa realida­de pracessual e pre-pracessual (investiga~ao), vao acabar por convalidar astransgressoes constitucionais, num retrocesso ao medievalismo inquisitorial,as custas dos imputados.

3.5.1. Prava ilicita por deriva~ao

Em nosso sistema pracessual, nao havia previsao legal acerca da pravailicita por deriva~ao, ou seja, da obten~aode uma prova (licita) por urn meioou metodologia prabat6ria ilicita. E0 denominado efeito expansivo da ilici­tude ou prava reflexa. A prava e aparentemente licita, mas derivou-se deuma ilicitude (efeito expansivo). as frutos da arvore sao aparentementesadios, mas a arvore esta contaminada (the fruits ofthe poissonous tree). Porexemplo, mediante tortura se descobre a localiza~ao dos instrumentos dodelito; a intercepta~ao telef6nica, sem autoriza~ao judicial, permite a apre­ensao de urn carregamento de armas.

a legislador brasileira partiu da premissa de que as pravas ilicitas saoinadmissiveis, inclusive as licitas, reflexo da vulnera<;ao das regras legais e

69 0 § lOOc estabelece as hip6teses em que a fotografia, a capta~a.o de imagens e a interceptat;ao tele­fonica podem ser utilizadas contra outras pessoas, relacionadas com 0 tipo de crime, com a difi­culdade probat6ria (fotografia e captat;'ao de imagens) e conexao com 0 autar do delito (escutatelefOnica).

70 Art. 270. Utiliza~ao em outros procedimentos. 1. Os resultados das interceptat;'oes telef6nicas naopodem ser utilizados em procedimentos diversos daqueles nos quais foram autorizados, salvo seresultarem indispensaveis acomprova~ao de delitos nos quais eobrigatoria a prisao em flagrante.

71 Vide a descri~ao desse caso no item 3.5.1.1, deste capitulo.

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constitucionais, em razao da contamina~ao. Sua admissibilidade foi aceitaem duas hip6teses, excluindo-se as demais e outras linhas de interpreta~ao,

inclusive a da proporcionalidade.72 Isso porque se trata de admitir uma provaderivada incriminadora. cuja interpretac;ao. na esfera criminal. nessas situa­c;6es. erestritiva.

Segundo 0 Tribunal Constitucional Espanhol, "toda prova oriunda deuma prova proibida enula",73 e nao teria sentido vedar 0 uso direto da ilici­tude e tolerar 0 seu aproveitamento indireto. Admitir a prova licita deriva-

72 0 STF, no acordao do He 80949-9IRI. ReI.: Min. SepUlveda Pertence. julgamento de 30.10.2001,assentou "da explicita proscril;ao da prova ilicita, sem distinl;Oes quanto ao crime objeto do pro­cesso (CF, art. 5Q

, LVI), resulta a prevalencia da garantia nela estabelecida sobre 0 interesse nabusca, a qualquer custo, da verdade real no processo: consequente impertinencia de apelar-se aoprindpio da proporcionalidade - aluz de teonas estrangeiras inadequadas a ordem constitucio­nal brasileira - para sobrepor, a vedac;ao constitucional da admissao da prova ilicita, considera­I;oes sobre a gravidade da infral;ao penal, objeto da investigac;ao ou da imputac;ao. Graval;ao clan­destina de "conversa informal" do indiciado com policiais. Ilicitude decorrente - quando nao daevidencia de estar 0 suspeito, na ocasiao, ilegalmente preso ou da falta de prova id6nea do seuassentimento a graval;ao ambiental - de constituir, dita "conversa informal", modalidade de"interrogatorio" sub-repticio, 0 qual- aMm de realizar-se sem as formalidades legais do interro­gatorio no inquerito policial (CPP, art. 6Q

, V) -, se faz sem que 0 indiciado seja advertido do seudireito ao silencio. 0 privilegio contra a auto-incriminal;ao - nemo tenetur se detegere -, erigi­do em garantia fundamental pela Constituic;:ao - aMm da inconstitucionalidade superveniente daparte final do art. 186 CPP. - importou compelir 0 inquiridor. na policia ou em juizo, ao deverde advertir 0 interrogado do seu direito ao silencio: a falta da advertencia - e da sua documenta­c;:ao formal- faz ilicita a prova que, contra si mesmo, fomel;a 0 indiciado ou acusado no interro­gat6rio formal e, com mais razao, em "conversa informal" gravada, clandestinamente ou nao.Escuta gravada da comunical;ao telef6nica com terceiro, que conteria evidencia de quadrilha queintegrariam: ilicitude, nas circunstancias, com relal;ao a ambos os interlocutores. A hipotese naoconfigura a gravac;:ao da conversa telef6nica propria por urn dos interlocutores - cujo uso comoprova 0 STF, em dadas circunstancias, tern julgado licito - mas, sim, escuta e gravac;:ao por tercci­ro de comunicac;:ao telef6nica alheia, ainda que com a ciencia ou mesmo a cooperac;:ao de urn dosinterlocutores: essa ultima, dada a intervenl;ao de terceiro, se compreende no ambito da garantiaconstitutional do sigilo das comunical;oes telef6nicas e 0 sen registro so se admitira como prova,se realizada mediante previa e regular autorizac;:ao judicial. A prova obtida mediante a escuta gra­vada por terceiro de conversa telef6nica alheia e patentemente ilicita em relac;ao ao interlocutorinsciente da intromissao indevida, nao importando 0 conteudo do dialogo assim captado. A ilici­tude da escuta e gravac;ao nao autorizadas de conversa alheia nao aproveita, em principio, aointerlocutor que, ciente, haja aquiescido na operal;ao; aproveita-lhe, no entanto, se, ilegalmentcpreso na ocasHio, 0 seu aparente assentimento na empreitada policial, ainda que existente, naoseria valido. A extensao ao interlocutor ciente da exdusao processual do registro da escuta telc­f6nica clandestina - ainda quando livre 0 seu assentimento nela - em principio, parece inevita­vel, se a participal;ao de ambos os interlocutores no fato probando for incindivel ou mesmo neces­saria acomposic;:ao do tipo criminal cogitado, qual, na espede, 0 de quadrilha. Prova ilicita e con­taminal;ao de provas derivadas (fruits of the poisonous tree). A imprecisao do pedido generico deexdusao de provas derivadas daquelas cuja ilicitude se declara e 0 estagio do procedimento (aindaem cursu 0 inquerito policial) levam, no ponto, ao indeferimento do pedido.

73 Vid. decisoes 85/1994, 86/1995 e 49/1996.

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da de uma ilicitude seria incitar a utiliza~ao de procedimentos inconstitucio­nais que, indiretamente, surtiriam efeito. as frutos da arvore envenenadaestao juridicamente contaminados.74 Pon~m, passou a admitir a prova deri­vada de uma ilicitude, em algumas situa~6es, empregando tres criterios, uti­lizados nos EVA: prava juridicamente independente; descobrimento inevi­tavel e achado casuaJ.75

A Suprema Corte Americana utiliza, basicamente, quatra principios paraadmitir a prova derivada, limitando a exclusionary rules: The IndependentSource Limitation (limita~ao da fonte independente), The InevitableDiscovery Limitation (limita~ao da Descoberta Inevitavel); The Purged TaintLimitation (limita~ao da descontamina~ao) e The Good Faith Exception (limi­ta~ao da Boa-fe).

a legislador brasileira somente autorizou a admissibilidade da pravailicita par deriva~ao em duas hip6teses: quando nao evidenciado a nexo decausalidade entre as duas situa~6es e quando as pravas derivadas puderemser obtidas par uma fonte independente das primeiras (art. 157, § I', CPP).Com isso, praticamente, acabou por admitir a prova ilicita por deriva~ao,

diante dessas duas exce~6es, extremamente amplas,?6 Alem de possibilitar asua admissibilidade, prapicia a contamina~ao de todo a pracessado.

Fontes de prava77 sao as pessoas (sujeitos - testemunhas) ou coisas(objetos - documentos), com idoneidade suficiente para fornecerem resulta­dos valorativos. Tambem se paderia dizer que sao as pessoas au coisas dasquais se pode retirar a prova ou extrair dados cognoscitivos relevantes paraa pracesso (fontes reais e pessoais).

Portanto, em duas hip6teses sao admissiveis as pravas (licitas) derivadasdas ilicitas: inexistencia da conexao entre a ilicitude e a licitude (indepen­dente source) e, derivadas desta regra geral, a segunda exce~ao origina-se doreconhecimento da descoberta inevitavel da prava (inevitable discovery aua hipothetical independent source rule). Aqui se observa a influencia dosprincipios da Common Law na reforma do sistema probat6rio brasileira.Ocorre que, com a vit6ria das potencias aliadas na Segunda Guerra Mundia!,especialmente no caso dos Estados Unidos, a influencia de seu sistema juri-

74 Deeisao do Tribunal Constitucional EspanhoI86/1995.75 Em G6MEZ COLOMER, Juan Luis, "La evolucion de las teorias sabre la prueba", em Prueba y

Proceso Penal (organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 120.76 Vide GOMES FILHO, Antonio Magalhaes. Direito aProva no Processo Penal. Sao Paulo: RT,

1997, pp. 107 a 109, acerca das regras de exclusao na prova derivada de uma ilicitude.77 Vide item 3.3 deste capitulo, acerca das fontes de prova.

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dieD se expandiu.78 Com a erescente domina<;:ao econ6mica, politica e social,inclusive belica, da maior potencia mundial, a expansao de seu sistema juri~

dico foi uma conseqiiencia natural.Hoje, no dizer de Habermas, continua a guerra fria, com meios historio­

graficos, tanto se elegendo como fio condutor 0 desafio que supos a UniaoSovietica para 0 Ocidente capitalista (Eric Hobsbawm), como se elegendo a lutado Ocidente liberal contra os regimes totalitarios (Fran~ois Furet). Ambas asimerpreta~oes explicam de uma forma ou de outra, 0 fato de que so os EstadosUnidos haja saido refor~ado das duas guerras mundiais, tanto economica e poli­ticamente, como colturalmente, e haja sobrevivido a guerra fria como a unicasuperpotencia e que se possa denominar 0 seculo XX como 0 secolo 'ameri­cano'.79 No inicio do seculo XXI, embora com algumas variaveis diferenciadas,continua a influencia americana no planeta, em todas as suas dimens6es.

Siio dois criterios originarios de interpreta~iioda Suprema Corte Norte­Americana, embora Tribunais do sistema cominental-europeu, como 0

Tribunal Constitucional Espanhol, tambem os aplique. No Canada, osTribunais tem adotado varia~oes da proibi~iio norte-americana, tais como aconsidera~iio, quando se tratar de regras de exclusiio, da gravidade do delito,a influencia sobre a reputa~iio da administra~iio da justi~a, a afeta~iio doresultado do julgamento, 0 nivel da viola~ao, a importiincia da prova, a boa­fe da policia, se a prova poderia ter sido obtida sem viola~iio das regras, aexpectativa da privacidade. Mesmo nos Estados Unidos, depois de 45 anos deaplica~ao dessas regras de exclusiio no que tange as provas proibidas, os pre­cedentes sao tao numerosos e confusos que pOUCD resta das premissas estabe~

lecidas nos casos Mapp v. Ohio e Sun v. US.80

3.5.1.1. Nexo causal entre a primeira prova (ilicita) e a segunda (licita)

A primeira exce~ao da regra da inadmissibilidade da prova ilicita porderiva~iio (admissibilidade) ocorre quando nao evidenciado 0 nexo causal.

78 Segundo SAITO, S. "EI proceso penal japones: un compromiso entre el modelo aleman y elangloamericano", em Justicia, 1992, III, pp. 717 e 718, 0 processo penal japones, com a codifica­t;ao processual criminal de 1947, foi fortemente influendado pelo sistema anglo-americana,mesmo que a sistematiza<;ao siga, claramente, 0 modelo alemao, 0 qual havia influenciado dire­tamente a codifica<;ao anterior, de 1922.

79 HABERMAS lurgen. La constelaci6n postnacional, Barcelona: Paid6s, 2000, pp. 64 e 65.80 SALAS CALERO, Luis. "Problemas modemos y complejos de la prueba en el proceso penal: ulti­

mas tendencias en Estados Vnidos sabre las reglas de exclusion probatorias", em Prueba y ProcesoPenal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 498.Vid. a descri<;ao do segundo caso, no item seguinte.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considerac;6es Criticas

uma conexao natural entre a ilicitude e a licitude (conexiio causal). Pri­meiramente, para que seja admissivel, faz-se necessario demonstrar a inexis­tencia de urn nexo causal entre as duas situac;6es. Mas, se nao ha nexo causal,se poderia falar em prova derivada? Penso que nao, pois nao haveria depen­dencia e nem conexao. E, em segundo lugar, hi necessidade de demonstra~ao

de que a inexistencia desse nexo causal seja evidente (potencialidade da cone­xiio). Esse encargo probat6rio e da acusa~ao, pois a regra e a inadmissibilida­de da prova ilkita, mesmo sendo derivada, salvo por reo. Basta a defesa ale­gar que se trata de prova ilicita por deriva~ao, requerendo seu desentranha­menta ou a sua inadmissibilidade. Com a alega~ao de sua admissibilidade,porque nao evidenciado 0 nexo causal, a acusaC;ao tern 0 encargo de demons­trar essas duas situac;6es: ausencia de nexo causal e evidencia dessa ausencia.Evidentes sao as circunstancias ou os fatos que emergem com c1areza, que naoha como serem colocados em duvida, de forma razmivel.

o nexo causal representa a conexiio, a dependencia ou 0 liame entre asduas situa~6es: ilicitude e licitude (fontes, meios ou metadologia de busca daprova). Trata-se de verificar se ha elos com a anterior ilicitude, com entidadevinculante au, como refere Knijnik, trata-se de saber se a prova obtida foiadquirida com abstrac;ao au nao da arvore venenosa.81 Portanto, inexistindoa rela~ao causal entre elas, se pode dizer que as licitas sao independentes dasilicitas e nao mais se falara em prova derivada. Situac;ao diversa ea da ruptu­ra do nexo de causalidade. Este existiu, mas rompeu-se ou foi desfeito. Nessaperspectiva, a debilidade do nexo causal entre as duas situa~6es, mantem ainadmissibilidade (regra geral).

Quando a prova nao tiver vincula~ao com a ilicitude praticada, possuiruma causa diferenciada, sem contaminaC;ao, au seja, quando for totalmentealheia a vulnera~ao constitucional ou processual e puder ser analisada semn6doas, e admissive1.82

81 Em KNIJNIK, Danilo. "A doutrina dos frutos da arvore venenosa e os discursos da Suprema Cortena decisao de 16-12-93". em Revista da Ajuris, 66, ano XX111, marc;o de 1996, p. 78.

82 0 STF, no RHC 90376/RJ, ReI. Min. Celso de Mello, OJ de 18.05.2007, assentou que "ningucmpode ser investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilicitas, querse trate de ilicitude origimiria, quer se cuide de ilicitude por derivac;ao. Qualquer novo dado pro­bat6rio, ainda que produzido de modo valida, em momento subseqiiente, nao pode apoiar-se, naopode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela macula da ilicitude origi­naria. A exclusao da prova originariamente ilicita, au daquela afetada pelo vicio da ilicitude porderivaC;ao, representa urn dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade it garantiado due process of Law e a tamar mais intensa, pelo banimento da prova ilicitamente obtida, atutela constitucional que preserva as direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado emsede processual penal (...). A doutrina da ilicitude por derivaC;ao (teoria dos frutos da arvore enve­nenada) repudia, par constitucionalmente inadmissiveis, as meios probat6rios, que, nao obstante

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No easo Murray v. US (1988), a polieia efetuou, ilegalmente, diligen­cias na casa de urn suspeito de contrabando, sem mandado, mas 0 obteveposteriormente, com base nos indicios que ja possuia, tendo retomado aolocal e apreendido 0 objeto do eontrabando. No easo Segura v. US (1984), ospolieiais permaneeeram na easa do suspeito, por horas, sem mandado,enquanto este era providenciado, com base em informa<;6es anteriores adiligeneia ilega!. Considerou-se nao ter havido liga~ao entre a prova obtidae a i1icitude pratieada, isto e, que a prova foi obtida por urn meio indepen­dente il. ilegalidade inieia!.83

Uma hip6tese especifiea em que foi empregada a auseneia de eonexiiofoi 0 easo Wong Sun, and James Wah Toy v. US, julgado em 1963, pelaSuprema Corte Americana. Os polieiais ingressaram na residencia de "A" e 0

detiyeram. Diante disso, "A" aeusou "B" de ser 0 vendedor das drogas. "B"eonfessou e foi preso, sem mandado e ineriminou "C", que tambem foi presoilegalmente. Posteriormente, "C" eonfessou. "A" e "B" pediram a exclusao daproya, 0 que foi deferido. Entao, "C" tambem pediu a exclusao, 0 que foiindeferido, pois a sua declara~ao foi yoluntiria, pratieada ao abrigo dos direi­tos fundamentais, 0 que atenuou a conexao entre a prisao e a confissao, dis­sipando 0 yeneno (purget taint). Observa-se que, pela interpreta~ao do art.157, parigrafo l Q

, do CPP, hi inadmissibilidade da "proya" ilieita deriyadamesmo na debilidade da conexiio e nas hip6teses em que tenha hayidoatenua~ao dessa eonexao. Isso em face do enraizamento da ilieitude nos atose sujeitos proeessuais. Tambem no easo US v. Ceecolini, urn policial, na hora

produzidos validamente, em momento ulterior acham-se afetados, no entanto, pelo vkio (gravIs­sima) da ilicitude originaria que a eles se transmite, contaminando-os por efeito de repercussaocausaL Hipoteses em que as novos dados probatorios somente foram conhecidos, pelo PoderPublico, em razao de anterior transgressao praticada, originariamente, pelos agentes da persecu­.;ao penal, que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. Revelam­se inadmissiveis, desse modo, em decorrencia da ilicitude por deriva.;ao, os elementos probato­rios a que os orgaos da persecu.;ao penal somente tiveram acesso em razao da prova originaria­mente ilkita, obtida como resultado da transgressao, par agentes estatais de direitos e garantiasconstitucionais e legais, cuja eficacia condicionante no plano do ordenamento positivo brasileiro,traduz significativa limita.;ao de ordem juridica ao poder do Estado, em face dos cidadaos. Se noentanto, 0 orgao da persecu.;ao penal demonstrar que obteve, legitimidade, novos elementos deinforma.;ao a partir de uma fonte autonoma de prova, que nao guarde qualquer rela.;ao de depen­dencia nem decorra da prova originariamente ilicita, com esta nao mantendo vincula.;ao causal,tais dados probatorios revelar-se-ao plenamente admissiveis porque contaminados pela macula dailicitude originaria". No mesmo sentido, HC 82788/RJ, ReI. Min. Celso de Mello, DJ 02.06.2006.

83 Em SALAS CALERO, Luis. "Problemas modemos y complejos de la prueba en el proceso penal:ultimas tendencias en Estados Unidos sabre las reglas de exclusion", em Prueba y Proceso Penal(G6MEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tlranr 10 Blanch, 2008, p. 484.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera~6es Criticas

de seu intervalo, ingressou numa loja e, sem que sua conhecida, que traba­lhava no local, percebesse, inspecionou urn envelope, encontrando docu­mentos incriminatorios de urn terceiro. a policial comunicou tal fato a seussuperiores, que ouviram a funcionaria da loja. Considerou-se que 0 depoi­mento, ato livre e independente, sem referencia il descoberta do policial, ate­nuou 0 vinculo com a ilicitude inicia1.84

No caso Brown v. Illinois (1975), 0 acusado foi detido ilegalmente einformado de seu direito ao silencio, mas acabou confessando, em duas opor­tunidades (90min depois de sua deten~ao e 7 horas apos), enquanto estavadetido. A Suprema Corte Americana afastou a alega~ao do Ministerio Publi­co de que a confissao havia rompido 0 nexo causal. No caso Oregon v. Elstadt(1985), Elstadt foi detido legalmente em sua casa, mas nao foi informado deseus direitos de permanecer em silencio. Acabou confessando. Depois disso,o detido foi informado de seus direitos e voltou a confessar. A prova foiadmitida. No caso Rawlings v. Kentucki (1980), Rawlings foi detido em umacasa, ilegalmente, enquanta a policia providenciava 0 mandado judicial. Aoser detido, foi informado de seus direitos e confessou 0 delito, a!em de teremsido encontradas provas do crime. A Suprema Corte, utilizando as criteriosda ausencia de ma-fe, da voluntariedade da confissao, decidiu nao ser estaurn resultado direto da deten~ao. No caso US v. Patane (2004), dais policiaisforam ate a casa de Patane para cumprir urn mandado judicial que 0 proibiade molestar sua ex-noiva. Quando urn dos policiais iniciou a informar-lheacerca de seus direitos, Patane disse conhece-los e, entao, 0 palicial parou deinformar-lhe. Patane confessou possuir uma arma, a qual foi apreendida eutilizada contra ele. A Suprema Corte nao considerou as declara~6es dePatane, contra ele, mas admitiu a prova material contra ele. Num outro caso,Missouri v. Seibert (2004), entretanto, a Suprema Corte proibiu a utiliza~ao

da confissao do suspeito que foi ouvido sem as advertencias legais (sHencio)e, poucos minutos depois foi advertido e confessou novamente, sob a alega­~ao de falta de efetividade das advertencias.85

Demonstrada a ausencia de reflexo da ilicitude na licitude (contamina­~ao), a prova e admitida. Mas 0 que valorar para considerar a existencia ou

84 Em KNIJNIK. Danilo. "A doutrina dos frutos da arvore venenosa e os discursos da Suprema Cortena decisao de 16-12-93", em Revista da Ajuris, 66, ano XXIII, marl;o de 1996, pp. 79, 80 e 81.

85 Em SALAS CALERO, Luis. "Problemas modernos y complejos de la prueba en el proceso penal:ultimas tendencias en Estados Unidos sobre las reglas de exclusion probatorias", em Prueba yProceso Penal (G6MEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008,pp. 482 a 484.

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inexistencia do nexo causal? Certamente, urn dos criterios e 0 temporal, ouseja, se a prova discutivel (derivada) fai produzida antes, apos au cancami­tantemente com a prova cansiderada ilidta. A regularidade da prodU/;aa daprova e os meios probat6rios sao outros criterios a serem considerados edesenvalvidas. Sempre que hauver conexaa au duvida acerca desta (in dubiopro reo), ha contamina~aa.86

Esta tearia, segunda Gomez Calamer, e muito debil e incansistente,pais nem sempre e passivel saber se a "prova licita" (segunda) fai abtida defarma tatalmente independente da primeira.87 Ademais, haveria de ser feitauma diferen~aentre prava derivada de ilicitude e prova independente desta(inexistencia de nexa causal). A ser trilhada este caminha, havera uma langae ardua tarefa a ser desenvalvida, mas adequada a realidade da processapenal brasileira.

3.5.1.2. Descaberta inevitavel da prava

A lei define quanda a fante (segunda, licita) eindependente da primei­ra (ilicita): cansidera-se fante independente aquela que par si so, seguinda astramites tipicos e de praxe, pr6prios da investiga<;ao ou instruc;ao criminal,seria capaz de canduzir aa fato abjeta da prava (art. 157, § 2Q

, CPP). Na rea­lidade, trata-se da inevitable discavery(descaberta inevitavel). Nas casas em

86 GONzALEZ CUSSAC. Jose 1. "La conexion de antijuridicidad en 1a prueba prohibida", emPrueba y Proceso Penal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10Blanch, 2008, p. 310. Cita como exempIo a busca e apreensao ilegaI de urn documento contabil,cuja copia e entregue par uma testemunha.

87 GOMEZ COLOMER, Juan Luis, "La evoludon de las teorias sobre la prueba", em Prueba yProceso Penal (organizadar), Valencia: Tiraot 10 Blanch, 2008, p. 122, cita como exemp10 a deci­sao do Tribunal ConstitucionaI EspanhoI que, na decisao 86/1995, considerou a confissao do co­reu, juridicamente independente da intercepta<;ao te1ef6nica ilegal; porem, a propria dedsaorccooheceu ter a confissao ocorrido diante da intercepta<;ao ilegal. No ana seguime, na decisao54/1996, de 26 de mar<;o, 0 Tribunal Constitucional Espanhol declarou a imercepta<;ao telef6ni­ca como prova proibida, mas insuficiente para vulnerar a presun<;ao de inocencia, na medida emque existiam as declara<;6es de uma testemunha de fatos acusatorios, independente, e uma dec1a­ra<;ao do proprio acusado, reconhecendo a fato (terrorismo). Em 2000, na decisao 8/2000, de 17de janeiro, 0 Tribunal Constitucional considerou como prova, juridicamente independcnte, osdepoimentos de testemunhas e dedarar,:6es de co-reus, apesar da busca e aprcensao domiciliar ile­gal (tnifico de drogas). 0 Tribunal Supremo e a Tribunal ConstitucionaI Espanhois seguem esseentendimento, segundo a atar supracitado. Considera a Tribunal Constituciona1 Espanhol (ded­soes 13612000, de 29 de maio de 2000; 29912000, de 11 de dezembro de 2000; 13812001, de 18 dejunho de 2001 e 12312006, de 24 de abril de 2006) que em dois casos ocorre 0 rompimemo donexo causal: confissao voluntaria do imputado e a exce<;ao da boa-Fe (good faith) - policial querealiza uma busca e apreensao acreditando ser valida a aUloriza<;iio, a qual, posteriormeme, edeclarada sem validade (vide caso US v. Leon, 1984).

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que a prova derivada de uma ilicitude seria inevitavelmente descoberta paroutros meios juridicos, passa a ser admitida, segundo 0 CPP. Portanto, e pos­sivel haver demonstra~aoprobat6ria atraves de meios licitos (prova testemu­nhal ou documental, par exemplo), mesmo que tenha ocorrido uma ilicitu­de (intercepta~ao telefOnica sem autoriza~ao judicial, por exemplo). Apesarda conexao, da qual resulta a deriva~ao, ela seria descoberta e produzida poroutro modo, seguindo-se os tnlmites costumeiros. Aqui nao se discute aconexao causal com a prova ilicita direta ou derivada, pais, apesar desta, elaseria descoberta e produzida par outro modo, seguindo os tramites de praxe.

Nessa segunda hip6tese, segundo Knijnik, nao se trata "de saber se aprova obtida foi adquirida com abstra~ao ou nao da arvore venenosa", masde "avaliar se, mesmo assim, essa prova seria hipoteticamente encontradapar meios juridicos".88

Na realidade, quando se afasta 0 nexo causal, se esta falando de fonteindependente, de uma origem licita e diferenciada, mas quando se fala emdescoberta inevitavel, se esta mantendo a deriva~ao, a ilicitude anterior con­taminante da prova. Esta e admitida pelo CPP porque, atraves de outrosmeios Hcitos, se chegaria ao mesmo resultado, de forma inevitaveL Entao,quando se fala em descoberta inevitavel, nao ha prova produzida por fonteindependente, mas a ela seria possivel chegar, hipoteticamente, atraves defonte independente (curso causal hipotetico).89

Nao e qualquer curso causal hipotetico que e admissivel, mas 0 que ternalta probabilidade de ocarrer, em razao de circunstancias faticas demonstra­das concretamente, pois uma vez aceita a descoberta inevitavel, a prova seraadmitida. Entao, hi de exigir-se urn grau consideravel de probabilidade dadescoberta (inevitavel) e que 0 curso causal saia da mera abstra<;:ao e sejademonstrado no plano da realidade fatica (concreta e casuistical dos autos.

Para conhecer acerca da inevitabilidade, cabe fazer a indaga~ao: a teseda acusa<;:ao acerca dessa situa<;:ao ete6rica ou possui uma base real? Quandose come<;:a a dizer "podia", "se fizesse", nao ha base concreta e demonstravele a prova e inadmissivel.

88 Em KNIJNIK, Danilo. "A domrina dos frutos da arvore venenosa e os discursos da Suprema Cortena decisiio de 16-12-93", em Revista da Ajuris, 66, ana XXIll, marc;:o de 1996, p. 78.

89 Vid. nesse sentido, GONZALEZ CUSSAC. Jose 1. "La conexion de antijuridicidad en la prucbaprohibida", em Prueba y Proceso Penal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia:Tirant 10 Blanch, 2008, p. 311, e VIVES ANTON, T. S. "Consideraciones constitucionales sabrela exclusion de los frutos del arbol emponzofiado", em Revista ~ur:idica de la ComunidadValcnciana, 2002, nQ 4, pp. 5 e ss.

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No caso Nix v. Williams (1984), a Suprema Corte Americana firmou anecessidade de demonstra~ao da descoberta inevitavel; ficou assentado serda acusa~ao 0 encargo de demonstrar, com fatos e circunstancias concretas,a inevitabilidade da descoberta, e nao por meio de conjecturas. No caso con­creto, a policia ouviu 0 suspeito quando este ja tinha advogado e havia acor­do para que nao fosse ouvido. Nesse "interrogatorio" ilegal, 0 suspeito con­fessou urn homiddio e levou a policia ao local onde havia enterrado 0 corpoda vitima. A Suprema Corte excluiu as declara~6es do acusado, mas aceitoua materialidade (achado do corpo), pois este, inevitavelmente, seria desco­berto, pois estava enterrado na neve, superficialmente, em local onde, como derretimento da neve, 0 corpo seria achado, diante das buscas que estavamsendo efetuadas.9O

o Tribunal Supremo Espanhol (TS), na deClsiio 974/1997, de 4 de julhode 1997, decidiu que 0 processo de vigiliincia e seguimento, a que estava sub­metida a acusada, conforme prova dos autos, conduziria it descoberta doencontro com os fomecedores de droga na cafeteria, independentemente daintercepta~ao telefOnica ilegal.

Assim como a primeira exce~ao, a admissibilidade da prova a que sechega por outros meios, inevitaveis, tambem merece cntica, pois a presun~ao

de inocencia somente pode ser afastada atraves de provas licitas, sendo dificilsaber se a descoberta era evitavel ou nao. Segundo Gomez Colomer, "suamaior inconsistencia reside em fun~ao de que 0 descobrimento inevitavelpode basear-se em meras hipoteses, suposi~6es, conjecturas e nao em fatosclaramente provados".91 Ademais, admitir a regra da descoberta inevitavelnas hipoteses em que a prova ilicita poderia ser obtida por meios licitos, bas­tando para tal que tivesse havido 0 requerimento judicial e utilizar urn juizohipotetico com 0 intuito de diminuir 0 espeetro das garantias processuais.Segundo Salas Calero, VIDOS Tribunais de Apela~o Norte-Americanos ternrecha~ado, nesses casos, a aceita~ao da descoberta inevitavel.92

90 Em KNIJNIK, Danilo. "A doutrina dos frutos da more venenosa e os discursos da Suprema Cortena decisao de 16-12-93", em Revista da Ajuris, 66, ano XXIII, marr;o de 1996, p. 78, e em SALASCALERO, Luis. "Problemas modemos y complejos de la prueba en el proceso penal: ultimas ten­dencias en Estados Unidos sobre las reglas de exclusion probatorias", em Prueba y Proceso Penal(GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 485.

91 GOMEZ COLOMER, Juan Luis, "La evoluci6n de las teorias sobre la prueba", em Proeba yProceso Penal (organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008, p. 124.

92 SALAS CALERO, Luis. "Problemas modemos y complejos de la prueba en el proceso penal: ultj­mas tendencias en Estados Unidos sobre las reglas de exclusion probatorias", em Proeba y ProcesoPenal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis, organizador), ValenCIa Tirant 10 Blanch, 2008, p. 487.

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Primeiramente ha de ser distinguida a prova ilicita por si so e a outraprova, derivada de alguma ilicitude. Somente nessa segunda hip6tese e quese pode alegar e demonstrar a descobena inevitivel. Vencida essa primeirahip6tese, surge 0 questionamento da possibilidade de descobena, da produ­<;ao da prova atraves de outra metodologia ou atraves de outra fonte deprova. No terceiro patamar questiona-se se era possivel ou nao se chegar aoresultado advindo da ilicitude, por outra fonte. lnevitavel significa que naoe possivel evitar, com certeza, necessariamente. Alem disso, ha de ser fixadoo encargo dessa prova. Depois de vencidos esses filtros e que a prova poderaser admitida e avaliada.

Essas regras exdudentes da ilicitude da prova, incorporadas pelo legis­lador de 2008, servirao de canais a contamina<;ao de urn processo penalrepublicano, etico, com todas as garantias legais. Esses dois principios pararesolver a questao da prova ilicita por deriva<;ao, adotados, mesmo em cara­ter nao absoluto pelo adversarial system norte-americano, sao incompati­veis com a problematica processual brasileira. No adversarial system a regrae a atua<;ao perante os jurados, 0 juiz adota uma posi<;ao de arbitro, semfaculdades materiais de dire<;ao do processo durante os debates frente aosjurados. Ademais, 0 Ministerio Publico, diretor da policia, assume a inves­tigac;:ao e e 0 acusador unico. Tambem, 0 processo se desenvolve sob variosprincfpio~ e garantias diferenciadas do processo penal continental-euro­peu.9;\ Mediante juizos hipoteticos e presunc;:oes, estao sendo criados canaisde contaminac;:ao no interior do processo.

3.5.2. Efeitos do reconhecimento da ilicitude

Segundo 0 C6digo de Processo Penal, as provas ilicitas sao inadmissi­veis, devem ser desentranhadas (art. 157, caput, do CPP) e inutilizadas pordecisao judicial, com intima<;ao das panes (acusa<;ao e defesa) para acompa­nharem 0 incidente (an. 157, § 3Q

, do CPP). Criou-se urn incidente de des­trui<;ao da prova ilicita. Ponanto, uma vez predusa a decisao que reconhe­ceu a ilicitude, devera ser designado dia e hora para a destrui<;ao da prova.

93 MO~'TERO AROCA, Juan. "Principio Acusatorio y Prueba en cl Proceso Penal", em Prueba yPmceso Penal (GOMEZ COLOMER, Juan Luis. organizador), Valencia: Tirant 10 Blanch, 2008,pp. 26, 27 e 28, afirma que, na pratica, 90% dos casas penais nao sao resolvidos no processo juris­dicional, pais resultam de um acordo cntre a Ministerio Publico, quem cornandou a investiga~ao

e a defensor. Na pnitica, a regra e a existencia de urn processo inquisitivo, pais a Direito penalnao eaplicado pelos juizes e tribunais e oem par meio de urn processo.

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Portanto, a prova declarada ilicita nao podera integrar nenhum processo,isto e, nao podera ingressar em nenhum procedimento au processo (proce­dimento em contradit6rio) e, uma vez neles inseridas, devera ser desentra­nhada e destruida. Com essa determina~ao legal, a prova ilicita nao poderaservir nem como notitia criminis.

E a prova ilicita que beneficia a acusado? Sendo destruida, nao poderiaser utilizada pro reo. Nessas circunstancias, diante de pedido da defesa, epossivel conservar esta prova, com a objetivo exclusivo de ser utilizado emfavar do reu.

A inutilizac;ao do material ilicitamente colhido e necessaria para evitarqualquer possibilidade de divulga~ao au de utiliza,ao fisica, no mesmo pro­cesso ou em outros.94

3.6. Particularidade acerca das pericias

o art. 158 do CPP foi mantido, com a reda~ao anterior. Assim, semp"e quea infrac;ao deixar vestigios, a materializac;ao desses sera feita atraves da provapericial, direta au indireta. Nao e s6 a tipicidade basica que reclama a pericia,mas toda a deriva~ao qualificadora e circunstancial que deixar vestigios.

As pericias, como regra, no ambito criminal, sao realizadas na fase inqui­sitorial, sem a contradit6rio. A justificativa esta no escudo da fe publica dosperitos, mas 0 consenso de sua relatividade protetora nao e suficiente, mor­mente quando a repeti~ao da prova resultar impossivel au, mesmo na sua pos­sibilidade, situar-se em margens potenciais de resultados diferenciados, parvarios fatores, desde temporais, conservacionais, ate pelos materiais utilizaveis.Par isso, ha necessidade de ser garantida a publicidade e a contradit6rio(nomea~ao de defensor e possibilidade de acompanhamento tecnico) nacolheita desta importante prova no processo penal, desde as pericias mais sim­ples, como a realizada para constatar a potencialidade e efic:icia da arma defogo, da destrui~ao de obst:iculo, bern como a levantamento no local do fato,a constatac;ao da existencia, natureza e circunstancias das les6es e da morte.95

as peritos possuem os mesmos impedimentos e as mesmas causas desuspei~ao dos magistrados. A regra e a realiza,ao da pericia par peritos ofi-

94 PICOTTI, Lorenzo. "Intercettazioni iUegali tra nuove [ecnologie e vecchi strumemi penali",Rivista dell'Internet, fasc. 2, 2007, pp. 115 a 119, comenta a [ipo penal pela faIta de destruit;ao domaterial ilidtamente interceptado, bern como a sant;ao reparat6ria pela divulga<;ao do materialincito, no ordenamemo juridico italiano.

95 Vide. Cap. I, item 3.1, acerca do contradit6rio.

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ciais e a exce~ao ha de ser justificada. Avolumam-se as denominadas periciasrealizadas por agentes policiais, inclusive lotados nas pr6prias unidadesinvestigat6rias, mesmo que tenham participado nas investiga~6es. Isso vernocorrendo em numero consideravel na constata<;ao do rompimento de obs­taculo e da efidcia da arma de fogo.

Questao discutivel na doutrina enos tribunais dizia respeito ao mime­ro de peritos necessarios it realiza~ao da pericia oficial. a art. 159 do CPP,com a reda~ao que Ihe havia sido dada pela Lei 8.862/94, exigia dois peritos.Porem, a nova reda~ao desse dispositivo afastou 0 requisito dos dois peritosoficiais, bastando somente urn experto. Portanto, nao mais sera consideradanula a pericia realizada por urn s6 perito oficial, como proclamava a Sumula361 do STF, embora continue 0 impedimento para servir como perito, dosujeito que tiver funcionando, anteriormente, na diligencia de apreensao.Houve uma redu~ao do espectro das garantias, nesse ponto.

A problemiitica maior esta nas pericias realizadas por peritos nao ofi­ciais. 0 perito e urn auxiliar da justi<;a, corn conhecimentos cientificos e tec­nicos altamente especializados. Eidentificado e presta compromisso, nao s6em face da relevancia processual de seu mister, mas para que as partes pos­sam identificar possiveis incompatibilidades ou impedimentos. No processopenal, ao esclarecimento cientifico e tecnico de quest6es que nao sao juridi­cas, a prova pericial desempenha urn papel cada vez mais relevante e impor­tante, beirando a considera<;ao, na praxis, como urn verdadeiro tarifamentoda prova. Por isso, ha necessidade de maximizar as exigencias estabelecidaspelas regras processuais,96 pois estas sao estabelecidas em favor da cidadaniae nao, necessariamente, so de pessoas culpadas.

Exigia-se, na reda~ao anterior do art. 159, § 1Q, do CPP, dois peritos naooficiais, idoneidade e diploma de curso superior. A habilita~ao tecnica rela­cionada com a natureza do exame nao era fundamental; era facultativa, "depreferencia". A nova reda<;ao apenas acrescenta 0 "preferencialmente naarea especifica". Assim, continua sendo facultado e nao obrigat6rio, pelalegisla~ao, 0 conhecimento tecnico e cientifico do perito em rela~ao aoexame que realizara. Ern razao da importancia da prova pericial ao processopenal, a necessidade do conhecimento tecnico e cientifico relacionado aoexame a ser realizado e uma exigencia do justo processo (processo penal com

% Vide nesse sentido CAMARGO ARANHA. Da Prova no Processo Penal. Sao Paulo: Saraiva, 1987, p.140, e ROXIN, Claus. Derecho Procesal Penal. Buenos Aires: Editores del Puerto, 2000, p. 240, quan­do referem que a pericia e a figura do perito assumiram uma posit;ao dominante no processo penal.

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todas as garantias cidadas). A excepcionalidade da nomea~ao de peritos naooficiais, em razao da centralizac;:ao dos institutos de pericia. tornou-se aregra, ern determinadas especies de infra~ao criminal.

Alem do curso superior e da capacidade cientifica e tecniea especificas,a nomea~ao dos peritos passa pelo filtro das compatibilidades processuais,pois a pencia h:i de ser digna de fe (credibilidade),97 de poder 0 julgadoracreditar ern seu conteudo (convencimento). Aos peritos, nos termos do art.280 do CPP, aplicam-se as mesmas hipoteses de suspei~ao, tipificadas no art.254 do CPP. 0 dispositivo silencia acerca da aplicabilidade das mesmas hipo­teses de impedimento dos magistrados (art. 252 do CPP). Os casos de impe­dimento dos peritos estao no art. 279 do CPP. Porem, uma leitura sistemati­ca e constitucional dos referidos dispositivos permite concluir que as hipote­ses de impedimento dos peritos nao se restringem as especificidades propriasdo art. 279 do CPP. A eles se aplicam os mesmos impedimentos dos magis­trados e nao so os casos de suspei~ao. Portanto, alem de nao ser atribui~ao

dos agentes policiais realizarem perieias (art. 144 da CF), tambem ern rela­~ao a eles tern aplica~ao as regras processuais.

Ademais, a necessidade de urn processo penal etico, isento, transparen­te e sem nodoas, proprias de uma Republica constituida ern Estado Demo­cratico de Direito (artigo 1Q, caput, da Constitui~ao da Republica), que tern acidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos (artigo 1Q, 1I eIII, da Constitui~ao da Republica), admite outras hipoteses de impedimentoe de suspei~ao, alem das elencadas no CPP da decada de 40. Mesmo essediploma legal, havido ern urn caldeirao sociocultural especifico da epoca, noartigo 159, paragrafo primeiro, do CPP faz referencias a "pessoas id6neas".

Facultou ao Ministerio Publico, ao assistente da acusa~ao, ao querelan­te, ao acusado e ao ofendido, 0 legislador de 2008, a formula~ao de quesitose a indica~ao de assistente tecnico (art. 159, § 30 , CPP). De uma primeira lei­tura e exegese literal, resulta a possibilidade, no processo penal, de termostres assistentes tecnieos atuando no polo acusatorio (Ministerio Publico,assistente da acusa~ao e ofendido) e urn no pOlo defensivo (acusado).Primeiramente, 0 ofendido, para requerer ao juiz, ha de ter capacidade pos­tulatoria e habilitar-se como assistente da acusa~ao (admissibilidade contes-

97 Segundo RAMOS MENDEZ, Francisco. E1 Proceso Penal. Barcelona: J. M. Bosch Editor, 1999, p.84, os peritos sao nomeados devido a seus conhecimentos especificos, prescindindo-se sua rela­<;ao com os fatos. Por isso, se opta por nomear pessoas tituladas, ou seja, com diploma de cursosuperior. Ademais, a perkia somente e digna de fe quando P imparcial e independente. Eis 0

motivo para a recusa dos peritos.

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tada por pane da doutrina e jurisprudencia, em razao do principio acusato­rio e da ampla defesa). Na fase investigat6ria, a autoridade policial, dentro dadiscricionariedade investigativa, nao esta obrigada a aceitar postula~6es doofendido (quesitos) e nem os peritos oficiais ou os nomeados, na ausenciadestes (vide ans. 14 - "diligencias" e 176 do CPP - "panes"). Ademais, 0

assistente tecnico atuara a panir de sua admissibilidade pelo juiz e ap6s a ela­bora~ao dos laudos. Disso resulta a inadmissibilidade de 0 ofendido indicarassistente tecnico, salvo quando admitido e habilitado nos autos.

o assistente tecnico nao atuara na colheita da prova, no momento darealiza~ao dos exames, das conclus6es e da elabora~ao do laudo pericial. Seraintimado para apresentar urn parecer escrito ou para prestar depoimento emjuizo (an. 159, § 5Q

, II, CPP). Isso representa apenas urn debil avan~o em ter­mos de prova pericial. Ao serem intimadas acerca do laudo pericial, as par­tes poderao requerer a sua complementa~ao, bern como 0 depoimento dosperitos em juizo (an. 159, § 5Q

, I, CPP).

3.7. A inclusao do ofendido no processo penal

o an. 201 e seu paragrafo unico (agora § 1Q) do CPP continuam com amesma reda~ao. As inova~6es estao nos paragrafos seguintes (§§ 2Q a 6Q

), osquais derivaram as regras do processo penal seja pela incidencia do iuspuniendi ao imputado e/ou pela prote~ao do status libertatis deste, na dire­~ao do ofendido, descaracterizado 0 conteudo finalistico do processo, dese­quilibrando as situa~6es que se consolidam (expectativas e perspectivas) nodesenvolvimento deste.

A incorpora~ao do ofendido no processo penal, na extensao dada pelolegislador, e uma das caracteristicas do expansionismo dos sistemas penaiscontemporaneos,98 permitindo urn desequilibrio na situa~ao processual (ha­bilita~ao do ofendido como assistente da acusa~ao), urn aumento na dura~ao

do processo (intima~6es do ofendido), desnaturando a atividade finaHstica doprocesso (incidencia do ius puniendi e prote~ao do status libertatis), comoanteriormente referido. 0 legislador pretende que 0 ofendido se tome urnsujeito processual, com mais direitos processuais que as proprias panes e queo acusado, contrariando 0 justo processo (an. 5Q

, LV, CF). Isso se observa na

98 SILVA SANCHEZ, Em La Expansion del Derecho Penal. Aspectos de la Politica Criminal en lasSociedades Posindustriales. Madrid: Cuademos Civitas, 1999, pp. 36-43, explica que a identifica­c;ao da maioria com a vitima do delito euma das causas da expansao do direito penal.

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determina~ao de a vitima possuir urn espa~o reservado (an. 201, § 4Q, CPP),

nos locais de realiza~ao das audiencias (Forum), quando sabemos que, emmuitos lugares desse Brasil, nem os defensores e a Defensoria PUblica (ondeexiste) possuem local apropriado nos foros para exercerem sua fun~ao consti­tucional. A nossa realidade, percebida por aqueles que se dispoem a tal atitu­de (perceber, ver e crer nos fatos reais), demonstra a falsa expectativa da assis­tencia e do tratamento ao ofendido (art. 201, § 5Q, CPP). E 0 tratamento aoapenado, 0 que vern ocorrendo? A Lei de Execu~ao Criminal determina a sub­missao do apenado a exame criminologico para fins de classifica~ao e tambemde individualiza~ao da pena (an. 8Q

), que tenha aSSiSlencia material, educacio­nal, juridica, social e asaude (ans. 10 a 24). A realidade fala por si so e dis­pensa maiores referencias a degrada~ao da vida, em todas as suas dimensoes(biologica, cogniliva e social)99 nos carceres brasileiros. A comunica~ao dosatos processuais se destina as partes e ao acusado. nos lirnites da legitirnidadeprocessual e da ampla defesa, e nao a quem nao dispoe dessa faculdade.

o ofendido passou a ser urn sujeito do processo cautelar, do processocognitivo e da execu~ao da pena privativa de liberdade. Isso representa urnretorno aepoca da vingan~a privada, onde 0 direito de punir nao pertenciaao Estado, mas ao ofendido. Observa-se que 0 an. 201, § 2', do CPP, deler­mina a comunicac;ao ao ofendido dos atos processuais relativos ao ingresso esaida do acusado da prisao (prisoes cautelares e prisiio-pena, vinculada aexe­cu~ao criminal). Evidentemente que isso nao lem aplica~ao (para aquelesque aplicarao este dispositivo), nas hipoteses de altera~ao de regime de cum­primento de pena e do livramento condicional, pais a apenado continuapreso. Ademais, as comunica~oes deverao ser feitas pelo juizo de origem enao pelos Tribunais de apela~ao e nem pelos Tribunais Superiores (acordaos

99 CAPRA, Fritjof. As ConexOes Ocultas, ciencia para uma vida sustentavel. Sao Paulo: EditoraCultrix, 2002, propoe urn novo conceito de vida, a partir da teoria da complexidade. Para tanto,apresenta uma estrutura conceitual que integra as dimeos6es biol6gica, cognitiva e social da vida,interligadas em rede, de forma complexa. E representativo da realidade a caso do apenado que per­maneceu durante 13 anos, preso ilegalmente, no Presidio Anibal Bruno, em Recife (PE), conside­rado pelos Ministros do STJ, a "mais grave atentado aviola.;ao humana ja vista na sociedade brasi­Ieira"; "foi simplesmente esquecido no carcere, onde ficou cego de dois olhos e submetido aos diver­sos tipos de constrangimento moral"; "e 0 caso mais grave que ja vi"; "mostra simplesmente umafalha generalizada do Poder Executivo, do Ministerio Publico e do Poder Judiciario"; "esse homemmorreu e assistiu sua mone no dIcere"; "0 pior e que nao teve periodo de Iuro". 0 apenado, ao serpreso, era casado, tinha onze filhos; no presidio, contraiu ruberculose e fiCOli cego dos dais olhos.Em 1998,0 Brasil foi denunciado na Comissao de Direitos Humanos da ONU, pela organizal;ao 0<1.0­

govemamental Human Rights Watch, devidamente autoril.ada para realizar a pesquisa em 70 pai­ses, em face das condil;oes dos presidios brasileiros (Folha de Silt' Paulo, de 17.03.98).

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera<;6es Criticas

que mantem ou reformam a deeisao). Uma interpreta~ao literal do dispositi­vo atinge 0 absurdo da neeessidade de eomunicar ao ofendido inclusive dasfugas e reeapturas de presos.

Essas comunica<;6es processuais desvirtuam 0 processo penal, na medi­da em que 0 direito de aeusar (ius aeusationis) e 0 direito de aplicar a pena(ius puniendi), pertencem a um orgao oficial, estatal e nao ao ofendido.Ademais, essas comunica<;6es criam falsas expectativas no ofendido, reavi­yam os sentimentos em rela<;ao ao causador do dana, aumentando seu sofri­mento, marmente nas situa~6es em que nao disp6e de conhecimentos sufi­cientes acerca do processo penal (regra).

A preserva~ao da intimidade, vida privada, homa, imagem e a necessi­dade de evitar a exposi~ao abusiva aos meios de comunica~ao (art. 201, § 6Q

,

CPP), aplica-se a vitima, mas, como preceito constitucional, aos acusados,em razao da presun~ao de inocencia, que e um principio de elevado poten­cial politico e juridico, indicativo de um modelo basilar e ideologico de pro­cesso penal. Desse principio emanam regras acerca da liberdade dos indivi­duos, sobre 0 encargo probat6rio e regras de tratamento aos suspeitos e acu­sados, da qual se infere nao ser possivel retirar da pessoa a integralidade dostatus que Ihe confere a presun<;ao de inocencia, motivo por que nao seadmite qualquer estigmatiza~aoem face da imputa~ao (tratamento externo),de uma senten~a sem 0 transito em julgado, ou mesmo de uma senten~a

absolutoria ou extintiva da punibilidade.

3.8. Inquiri<;ao das testemunhas

Obstaculiza a celeridade do processo penal a falta de localiza~ao daspessoas arroladas como testemunhas. A repeti~ao dos atos e a dificuldade deloealiza~ao destas sao realidades corriqueiras na praxis forense. A ausenciade eompletude da investiga~ao exclui depoimentos imprescindiveis aomomenta do exerdcio ou nao da a<;ao processual penal, ao desenvolvimen­to do processo e ao julgamento do caso. Outro aspecto relevante diz respei­to ao compromisso das pessoas que comparecem ao jUlzo para prestaremdepoimento. Na contemporaneidade, a potencialidade do depoimento naoesta nos aspectos formais de compromisso ou na ausencia deste, mas no con­teudo interno (proprias declara~6es) e extemo (relacionado as demais pro­vas) do depoimento. Esse independe do compromisso.

Mantiveram-se, tambem no que tange a prova testemunhal, os resqui­cios inquisitoriais do art. 209 do CPP, 0 qual autariza 0 magistrado a inqui-

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Nereu Jose Giacomolli

rir as pessoas nao arroladas pelas partes, bern como as que tenham sido refe­ridas. Ademais, nessa perspectiva de atua~ao ex officio, continua 0 magistra­do com os poderes de remessa das capias dos depoimentos para instaura~ao

de inquerito policial. Nesses casos, 0 Ministerio PUblico sera intimado dasenten~a penal e podeni, entao, diante do conteudo da senten~a e das afir­ma~6es das testemunhas, oferecer a denuncia au requerer a instaurac;ao deinquerito policial. Nos termos do artigo 129, 1, da Constitui~ao Federal, essae uma atribui~ao institucional do Ministerio PUblico e nao do julgador.Tambem, foi mantida a possibilidade de 0 magistrado inquirir de oficio eantecipadamente a testemunha quando esta estiver impossibilitada de com­parecer na epoca da audiencia, por ausencia, enferrnidade ou velhice (art.225 do CPP). Al!:is, a nova reda~ao do art. 156 do CPP subscreveu essa atua­~ao de oficio, afrontando 0 modelo acusatario de processo penal, desenhadopela Constitui~ao Republicana de 1988.

A reda~ao dos arts. 202 a 209 perrnaneceu inalterada, assim como 0

caput do art. 210, todos do CPP. A este ultimo, a reforrna acrescenta 0 para­grafo unico, deterrninando a reserva de espa~os, nos faruns, para abrigar astestemunhas, de modo a garantir a incomunicabilidade destas, antes e duran­te 0 desenrolar da audiencia. Primeiramente, a incomunicabilidade nao sefaz necessaria a separac;ao das testemunhas, circunstancia que podera serinviavel em alguns locais. Basta que sejam criados mecanismos para tal,como a manuten~ao de oficial de justi~a no local, no dia da realiza~ao daaudiencia para zelar pela mesma. Nao e 0 local 0 mais importante, mas aincomunicabilidade, a qual pressupoe ausencia de comunica~ao acerca dofato objeto do processo e nao qualquer veda~ao a comunica~ao entre as pes­soas. A incomunicabilidade passou a ser uma garantia das partes. Uma veznao obedecida, vicia 0 ato processual.

A segunda altera~ao diz respeito a metodologia de inquiri~ao das teste­munhas. Pela sistematica tradicional, quem primeiramente inquiria a teste­munha era 0 magistrado e, posteriorrnente, a parte que a tivesse arrolado e,finalmente, a parte contraria. 0 assistente da acusa~ao perguntava apas 0

Ministerio Publico, na medida de sua subsidiariedade. Dentro de urn sistemaarcaico, as perguntas eram dirigidas ao juiz, quem as elaborava mentalmen­te e as traduzia a testemunha. Esta, por seu tumo, respondia ao juiz que,interpretando as dec1ara~oes, traduzia para sua linguagem, ditando, por fim,ao serventmirio, quem a digitava ou datilografava. Nesse ato teatral, muitasubstancia das dec1ara~oes se esboroava. De ora em diante, as partes pergun­tam diretamente as testemunhas (eros examination) e 0 magistrado e 0 fisea­lizador da inquiri~ao, podendo vetar as perguntas indutoras de respostas, as

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que nao tiverem rela<;ao com os fatos do processo ou nao interessarem aodeslinde deste, a dosimetria das penas ou aos beneficios legais. A razoabili­dade da dura~ao dos depoimentos I' uma garantia constitucional, em face daabrangencia da aplica~ao do art. 5Q

, LXXVII, da CF.Porem, 0 paragrafo unico do art. 212 autoriza 0 magistrado a perguntar

as testemunhas. Mesmo sendo 0 julgador 0 destinatirio da prova, cabe as par­tes perguntar 0 que interessa ao direcionamento do convencimento que dese­jarem, num jogo dialetico entre elas, proprio de urn modelo acusatorio deprocesso penal. A fun~ao do juiz I' manter 0 equilibrio processual na colheitada prova. Entretanto, para os que admitem a atua~ao do magistrado, 0 para­grafo unico do art. 212 h:i de ser interpretado restritivamente, ou seja, a inter­ven~ao do magistrado I' sup1etiva, somente sobre pontos nao esclarecidos, emface do que foi perguntado e respondido pelas testemunhas, vedando-se per­guntas sobre pontos nao levantados pe1as partes em suas perguntas. Sendoadmissivel sua interven<;ao subsidiaria, esta ocorreni ap6s a das partes. lOa

A retirada do reu da sala de audiencias I' medida excepcional, em razaoda ampla defesa, a qual abrange a defesa tecnica (advogado defensor) e a defe­sa pr6pria (infonna<;6es ao defensor acerca da testemunha, de circunstanciasde seu depoimento, por exemp10). A reforma determina (isso se os Estadosimplementarem esses mecanismos tecnologicos) que a retirada do acusado dasala de audiencia, aII'm de ser fundamentada na possibilidade de humilha~ao,

temor ou serio constrangimento atestemunha ou ao ofendido, de modo a pre­judicar 0 depoimento, devera ser realizado quando nao for possive1 a utiliza­~ao da videoconferencia. A decisao, por for~a constitucional (art. 93, IX, CF)e legal (art. 217, paragrafo unico, CPP) devera ser fundamentada numa des­sas hip6teses enunciadas, indicando a situa<;ao fMica que a motiva.

100 Vide cap. III, itens 2 e 5, acerca das particularidades do rito dos crimes dolosos contra a vida.

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Capitulo IIRitos Processuais

1. Criticas iniciais

A ritualistica e 0 simbolico acompanham a vida, 0 ser humano e a socie­dade, desde sua existencia, tendo sido incorporado, politicamente, peloEstado ao exerddo de suas fun~oes. 0 poder de aplicar a san~ao penal eexercido dentro de urn ritual pre-determinado, envolvendo institui~oes,

sujeitos e especies de crimes, distribuidos funcionalmente na dimensao espa­~o-tempo. Sujeitos oficiais, vinculados ao Poder e aos orgaos publicos jul­gam, aplicam a pena (magistrados); acusam (promotores de justi~a e assisten­tes) e defendem (defensores publicos e advogados). Hi regras determinandoas fun~oes de cada sujeito, quando podem agir, como devem atuar para quesejam atingidas suas pretensoes e 0 momento em que estao autorizados aagir. A dimensao do real e permeada pela emo~ao, pelos sentimentos e pelamistica (simbioses insepariveis). No interior do processo aflora e pulsa avida, hci seres humanos que entram, saem e retomam ao banquete proces­sual, em conex6es internas e extraprocessuais. a hornem CriOli a prisao e aela entra pelos rituais do processo, pelas maos do mesmo criador (nega~ao

artificial das pulsoes vitais).Resulta evidente a deforma~ao ritualistica do processo penal (degene­

ra~ao das formas), gerada pelo legislador de 2008 e pela azarama de prontavota~ao dos denominados "projetos setoriais", apos longo periodo de esque­cimento (reclamos midiatizados por situa<;6es pontuais - menina arrastadopor carro, balas perdidas, absolvi~ao num segundo Juri, v. g.). Dificil estabe­lecer uma ordena~aoconcatenada e logica dos atos processuais, no caos esta­belecido nos artigos 394 a 536 do CPP. [SSG se observa pela previsao de duasocasioes distintas ao recebimento da denuncia ou da queixa-crime (art. 396e 399 do CPP). Qual e 0 verdadeiro recebimento? 0 recebimento passou aser duplo, com conteudos e efeitos diferenciados? Aplicar subsidiariamenteo rito comum aos procedimentos especiais (art. 394, § 2Q

, do CPP), sim, maso ordinaria, 0 sumcino ou 0 sumarissirno, ou qualquer urn deles? Hoi algumadiferen~a entre as hipoteses de rejei~ao da denuncia (art. 395 do CPP) e as

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da absolvi~ao sumaria (art. 397 do CPP)? A instru~ao do processo e a senten­~a, pelo mesmo magistrado, nao ignora a atual realidade da administra~ao dajusti~a brasileira e sua propria organiza~ao funcional? Econstitucionalmen­te possivel (art. 5Q

, LV, CF) extrair do art. 536 do CPP uma exegese de que aspessoas que comparecerem na audiencia deveriio ser inquiridas na ordem doart. 531 do CPP?

Ademais, as diferenc;as entre os ritos ordinario e sumario reduzem-se aonumero de testemunhas (8 e 5 testemunhas), aexistencia de expressa opor­tunidade para requerer diligencias (ordinario), prazo arealiza~ao de audien­cia (60 e 30 dias) e previsao de memoriais (ordinario).

o direcionamento unico da ritualistica na acelerac;ao do tempo, commarcos temporais lan~ados no curso do processo, desvinculados da realida­de dinamica temporal propria do processo penal (tempo do processo, dife­rente do tempo social e do tempo subjetivo), precipita atos processuais egarantias constitucionais. 0 processo nao e uma maquina para produzirresultados em serie (senten~as, acordaos),l e nem e urn campo de pouso deconcepc;6es economicistas, imediatistas e superficiais, as quais encobrem aessencia do problema e exigem respostas prontas, aceleradas e subservien­tes (law and order, broken windows, leis topicas e emergenciais). A reali­dade processual criminal brasileira, salvo algumas exce~6es, e a de inclusaoprocessual do excluido pela sociedade (capta~ao pelos mecanismos oficiaisde repressao) e a exclusao do incluido, motivo da incorpora~ao da tritura­~ao dromologica, cujos efeitos (penaliza~ao, degrada~ao no c:ircere) sao sen­tidos pelo "outro". A realidade demonstra acelera~aoda inclusao processual(processos rapidos, potencializa~ao das pris6es processuais, criminaliza~ao

da pobreza e explora~ao midiatica da cenografia inquisitorial) e desacelera­~ao da retirada de seus efeitos (superpenaliza~ao, ausencia de tratamentoinicial e exigencia de cura posterior -Iaudos periciais, diminui~ao do espec­tro das garantias na execuc;ao, v. g.).

Manteve 0 legislador de 2008, tambem no que tange a ritualistica pro­cessual, a tendencia inquisitorial. Isso se observa quando 0 magistrado pode­ra, mesmo que supletivamente, inquirir as testemunhas. Pode-se notar, ainda,essa inquisitorialidade na disposi~aode que a defesa, se pretender a intima~ao

das testemunhas que arrolar devera requerer a sua intima~ao. 0 "se necessa-

Vide LOPES Jr., Aury e BADARO, Gustavo Henrique Ivahy. Direito ao Processo Penal num PrazoRazmivel. Rio de Janeiro; Lumen Juris, 2006, p. 3, e SOUZA, Ricardo Timm de. 0 Tempo e aMaquina do Tempo.Porto Alegre: EDlPUCRS, 1998, pp. 140-14Q, acerca da acelerar;ao vertiginosado tempo, desde a revolur;ao industrial, a qual acaba pOT preopiur e atropelar os acontecimentos.

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rio" e somente atribuido it defesa, mas para a acusa<;ao nao hi a mesma obri­gatoriedade (art. 396-A do CPP). Ademais, possibilita-se a determina<;ao exofficio de diligencias imprescindiveis (an. 404 do CPP), mantendo-se, por­tanto, urn nitido tra<;o inquisitorio, na medida em que, como restou anterior­mente dito, resta mantido 0 poder de gestao da prova com 0 julgador.

2. Considerac;:6es introdut6rias

Inicialmente, em razao da movimenta<;ao que ocone no processo, emtorno de fatos, atos, fases e circunstancias processuais, faz-se mister umapontualiza<;ao previa. Fato juridico e qualquer acontecimento do mundonatural, considerado pelo mundo juridico (calamidade publica, doen<;a,mone, por exemplo). Fazendo-se sentir no Direito Processual, 0 fato passa adenominar-se de fato juridico processual. Dentre esses, hi acontecimentosque sao independentes da vontade das pessoas que atuam no processo (divi­sao do tempo em dias, horas, v. g.). Por outro lado, os atos processuais saoatos dependentes da vontade das partes (hi urn componente psiquico mini­mol, mas sempre com relevancia juridica ao processo. 0 ato processual podeconstituir (cita<;ao), movimentar (intima<;ao), conservar, modificar ou desfa­zer (senten<;a) uma situa<;ao processual (os defensores da teoria da rela<;aojuridica processual (soterrada pelo tempo, pelo menos em sua concep<;ao ori­ginal) diriam uma "rela<;ao juridica processual". Esses atos, dependendo desua finalidade, podem ser agrupados e denominar certas fases no processo(postulat6ria, probat6ria, recursal, por exemplo). A documenta<;ao publica,escrita ou audiovisual do ato processual, recebe 0 nome de termo processual(autua<;ao, assentada, auto, ata, laudo, cenidao, v. g.).

Alem da rela<;ao poder-saber (Foucault), a dinamica no processo penalse estabelece na bipolariza<;ao entre a for<;a exercida it incidencia do iuspuniendi e a resistencia amanuten<;ao da presun<;ao de inocencia, do sta­tus libertatis. Nessa verdadeira luta processual, interferem sobremaneira asestrategias das panes, sem olvidar 0 fator sone (soneio dos jurados, da varacriminal, da camara criminal, da turma recursal, do relator, v. g.). 0 poderde acusar do Estado, atribuido ao Ministerio Publico (an. 129, I, CF), seconsubstancia na dedu<;ao de uma acusa<;ao, direcionada it aplica<;ao desan<;6es criminais, no ambito de urn processo penal estatal. Por isso, 0

poder de aplicar as san<;6es criminais 0 Estado outorga ao magistrado, comexclusividade. A resistencia processual penal se di pela defesa tecnica, aqual e obrigat6ria, bern como pela defesa pessoal facultativa (interrogat6-

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rio, interposi<;ao de recurso, v. g.). A preserva<;ao de iguais oporrunidadese a manuten<;ao dessa dinamica processual dentro da esfera da constitucio­nalidade e tarefa do magistrado. Tudo isso se desenvolve dentro de umaritualistica processual.

Os ritos processuais podem ser classificados em comuns, especiais esecundarios. A Lei n' 11.719, de 20 de junho de 2008, manteve 0 processa­mento das infra<;:6es penais por ritos comuns e especiais, mas ocorreram alte­ra<;6es na dinamicidade interna. A especie de pena, redusao ou deten<;ao,deixou de ser 0 norte distintivo entre os ritos. Optou-se pela quantidade dapena privativa de liberdade maxima, independentemente da previsao ou naoda pena de multa. Entre os especiais, continua a previsao no Codigo deProcesso Penal (arts. 513 a 530, I, do CPP) e em leis especiais (Toxicos, v. g.).o rito sumariissimo, previsto para ser aplicado as infra<;6es penais de menorpotencial ofensivo, era considerado urn rito especial (Lei 9.099/95), mas pas­sou a integrar a ritualistica comum. 0 rito especial para processar os crimesdolosos contra a vida e os que lhes forem conexos, e 0 denominado "Rito doJUri" ou "Rito do Tribunal do juri", agora, de forma dara e objetiva, passoua ser urn rito especial (art. 394, § 3', do CPP). Na situa<;ao anterior ate a ins­tru<;:ao, inclusive, a ritualistica para processar os delitos de competencia doTribunal do juri seguia 0 rito comum ordinario (crimes punidos com redu­sao). Os ritos secundarios continuam sendo os preparatorios (justifica<;6es,hipoteca legal, v. g.), preventivos (prisao e liberdade) e incidentais (exce<;6es,exame de sanidade mental, v. g.).

A ritualistica comum aplica-se aos demais casos, salvo disposi<;aocontraria nos ritos proprios (art. 394, § 2', do CPP). Por exemplo, na Lei10.741/03 (Estatuto do Idoso), 0 art. 94 determina a aplica<;ao do ritosumariissimo aos crimes nele previstos, cuja pena privativa de liberdademaxima nao exceda quatro anos. Portanto, aos crimes cantidos no Esta­tuto do idoso, cuja pena privativa de liberdade maxima nao exceder doisanos, aplica-se 0 rito sumariissimo no juizado Especial Criminal (arts. 96,caput e seus § l' e § 2Q

, v. g.); aos apenados com pena maxima superiordois anos e que nao exceder quatro anos, aplica-se, tambem, 0 rito suma­riissimo, mas fora do juizado Especial Criminal (arts. 98, 99, § 1', v. g.); eos delitos com pena privativa de liberdade superior aos quatro anos se­guem 0 rito comum ordinario, nos termos do art. 394, § 1Q, I, e § 2Q

, doCPP (arrs. 99, § 2' e 107, v. g.). Engenharia juridica desnecessaria e cria­dora de uma complexidade aparente.

A perspectiva para desvendar a ritualistica processual parte de sua pre­visao em lei especial (Toxicos, v. g.), passa, apOs. pelas especialidades do

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C6digo de Processo Penal (propriedade imaterial, v. g.) e, diante da inexis­tencia dessas particularidades, segue-se 0 curso das disposi<;6es comuns, dorito ordinario, sumario ou sumariissirno, com a observa<;ao de que este ulti~

rno deixou de ser rito especial e tornou-se rito cornum.o art. 394, paragrafo 4Q

, do CPP determina a aplica<;ao das disposi<;6esdos arts. 395 a 398 a todos os ritos processuais. No que tange ao rito doTribunal do Juri, aplicam-se as hip6teses da rejei<;ao da acusa<;ao (art. 395 doCPP), mas a absolvi<;ao sumaria ocorre apos 0 tennino da instru<;ao, em razaoda competencia constitucional dos jurados (art. 415 do CPP). As causasextintivas da punibilidade do agente nao guardam vincula<;ao com nenhummomento processual. A Lei 11.101105 (recupera<;ao judicial, extrajudicial efalencia) determinou a aplica<;ao do rito sumario aos crimes nela previstos(art. 185). Nos crimes funcionais pr6prios (arts. 513 a 518 do CPP), a rejei­<;ao e 0 recebimento da acusa<;ao ocorrem ap6s a notifica<;ao para apresenta­<;ao da defesa preliminar. Recebida a acusa<;ao, 0 CPP determina 0 seguimen­to do curso do rito comum ordinario (art. 518 do CPP). Quando a acusa<;aofor deduzida com base em inquerito policial, nao havera maiores indaga<;6es,em face da Sumula 330 do STJ (resposta preliminar desnecessaria). Porem,nas demais hipoteses permanece a resposta preliminar prevista no art. 514 doCPP (fun<;ao de evitar 0 recebimento) e a defesa previa, ap6s 0 recebimentoda acusa<;ao (resistencia completa, inclusive acerca das hip6teses de absolvi­<;ao sumaria). Na ritualistica dos delitos que ofendem it honra (arts. 519 a 523do CPP), a especialidade restringe-se it audiencia de reconcilia<;ao, na quei­xa-crime. Inexitosa a reconcilia<;ao (art. 521 do CPP), recebida, mas naorejeitada a queixa-crime (art. 395 do CPP), segue-se 0 rito comum ordinario,por expressa disposi<;ao do art. 519 do CPP.

Percebe-e, a partir disso, a claro surgimento de verdadeiras formulasmagicas para solucionar a morosidade dos processos: audiencia unica, iden­tidade fisica do juiz, engessamento temporal, supressao de recursos, simpli­fica<;ao superficial, acopladas sobre uma estrutura arcaica, de baixa confor­midade constitucional.

3. Rito comum ordinario

Este rito processual e aplicavel aos crimes com pena privativa de liber­dade maxima igual ou superior a quatro anos (art. 394, § IQ, I, do CPP), berncomo, de forma subsidiaria, aos demais ritos processuais, comuns au espe­ciais (art. 394, § 5Q

, do CPP).

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Nereu Jose Giacornolli

Oferecidas a denuncia ou a queixa-crime, cabeni a rejeic;ao liminar nashipateses do art. 395 do cpp (inepcia manifesta, ausencia de pressupostoprocessual, de condi~ao ou de justa causa ao exercicio da a~ao processualpenal). No projeto nQ 4.207/01, que tratava da suspensao condicional do pro­cesso, da emendatio libelli, da mutatio libelli e dos procedimentos, quandonao rejeitada liminarmente a denuncia ou a queixa-crime, 0 denunciado eracitado para responder il acusa~ao. Apas a resposta e que seria analisada aadmissibilidade da acusa~ao (recebimento ou rejei~ao). A Lei 11.719, de 20de junho de 2008, estabeleceu dois momentos processuais ao recebimento daacusa~ao, antes da cita~ao (art. 396 do CPP) e depois da defesa preliminar(art. 399 do CPP). Desse modo, estipulando a lei, dois momentos processuaisao recebimento da acusa~ao - situa~ao processual que evidentemente militaem beneficio de urn maior conteudo de garantia ao cidadao, visto que impoemais uma barreira processual a ser transposta para somente ap6s ser permi~

tida a transformac;ao da pessoa de ser comum em acusada em urn processopenal -, tal fato prima facie, intuitivamente, leva a crer que somente deve­ria ser considerado valido 0 juizo emitido apas ter 0 acusado se defendido.Isto e, somente deveria ser considerado valido 0 juizo emitido apas a defesapre1iminar, a verdadeira defesa previa. Em razao da propria carga de negati­vidade processual que possui a decisao de recebimento da denuncia, berncomo do exercicio da amp1a defesa prevista na Constitui~ao Federal (art. 5Q

,

LV, CF), 0 indicado seria 0 recebimento da denuncia depois da rea~ao defen­siva preliminar il formaliza~ao da acusa~ao. AMm disso, as u1timas reformasprocessuais, em torno de ritos, avan~aram na dire~ao da defesa preliminarantecedente ao recebimento da denuncia ou queixa-crime, como se podeobservar na Lei 9.099/95 (rito sumariissimo), na Lei 10.409/02 (taxicos), naLei 11.343/06 (taxicos).

Porem, os influxos da doutrina do processo civil no processo penal, amanuten~ao do estilo inquisitorial nas ditas reformas de 2008 (preponderiin­cia do ius puniendi sobre 0 status libertatis) e a baixa aderencia constitucio­nal soterraram as aspirac;:6es de urn processo penal construido estritamentesob orienta~ao constituciona!. as anseios da moderna doutrina do processopenal e dos que pensam e vivem 0 processo penal ruiram diante da reenge­nharia legal. Da maneira como se estruturou a reforma, nao ha como ser SliS­

tentado ser 0 segundo momento 0 verdadeiro momento do recebimento daacusa~ao. E 0 que se infere de uma leitura sistematica do art. 363 do cpp(processo penal se forma com a cita~ao do acusado); do art. 366 do CPP (sus­pensao do processo penal apas a cita~ao por edita!. quando 0 reu nao compa­recer e nem constituir advogado) e do art. 397 do cpp (absolvi~aosumaria).

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Reformas (?) do Processo Penal:Considerai;oes Criticas

Todos esses atos processuais e decisoes ocorrem antes do recebimento dadenuncia que esta no art. 399 do CPP. Portanto, a momenta do recebimen­to da acusa~ao e a que se encontra previsto no art. 396 do CPP.

o art. 363 do CPP refere, expressamente, que a processo tera a sua for­ma~ao completada com a cita~ao do acusado, cujo ato processual esta previs­to unicamente no art. 396 do CPP e nao apos a resposta defensiva obrigato­ria. Ademais, posteriormente, 0 acusado e intimado para a audiencia de ins­tru~ao e julgamento (art. 399 do CPP). Observa-se que ja na Lei nO 10.409/02(anterior lei de toxicos), a imputado era citado para responder it acusa~ao ea recebimento da denuncia ocorria depois da resposta (arts. 38 e 40), mas naLei nO 11.343/06, a acusado, antes de ser recebida a denuncia e notificadopara oferecer defesa previa (art. 55) e, recebida a denuncia, a reu e citadopara a audiencia (art. 56). No rita comum sumariissimo, a reu e citado paracomparecer na audiencia de instrus:ao e julgamento, onde sera oferecida aresposta e, apos, sera analisada a admissibilidade da acusa~ao (arts. 78 e 81).No processo e julgamento dos crimes funcionais proprios (arts. 513 a 518 doCPP), a acusado e notificado para defender-se e, apos, sao analisados asrequisitos da pe~ acusatoria.

A cita~ao, na esfera do processo penal, passou a ser a ato processual que,primordialmente. da conhecimento ao acusado da existencia de uma acusa­~ao recebida e que a esta cientificado de que devera responder it acusa~ao.

Par outro lado, a intima~ao e tambem a notifica~ao sao atos processuais decomunicac;ao. Embora empregados, muitas vezes, como sin6nimos, a intima­~ao da ciencia de urn ato ja realizado (intimar a defesa da senten~a proferi­da, intimar a Ministerio Publico da designa~ao de uma audiencia, v. g.) e anotifica~ao tern a finalidade de dar ciencia a alguem para praticar au se abs­ter da pratica de determinado ato, sob determinada comina~ao (notifica~ao

dos jurados, notifica~ao da testemunha, v. g.). 0 proprio CPP, em seus arts.370 e 396A, fala em intima~aodas testemunhas. Segundo a que se infere doart. 363 do CPP, somente podemos falar em processo formado quando reali­zada a cita~ao do reu. Portanto, a situa~ao processual esta formada com acita~ao do acusado, a qual e a ato processual que cientifica a reu para defen­der-se. Para que isso ocorra, a denuncia au a queixa ja passaram pelo primei­ro filtro: analise dos requisitos do art. 395 do CPP. Assim, nao rejeitada aacusac;ao, 0 juiz recebe a demincia au a queixa-crime e determina a citac;ao,nao sendo caso de suspensao condicional do processo (art. 89 da Lei9.099/95). Cabivel a paralisa~ao condicional do processo, ha necessidade dedesigna~ao de audiencia para tal finalidade, antes de cita~ao do reu. Outraimportante nota diz respeito a existencia de infrac;6es penais de menor

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Nereu Jose Giacomolli

potencial ofensivo, conexas. Nesses casos, em relac;ao a elas, por forc;a do art.60, parigrafo unico, da Lei 9.099/95 e do art. 2', parigrafo unico da Lei10.259/01, deve ser propiciada a composi~ao civil e a transa~ao criminal(reda~ao dada pela Lei 11.313/06). Embara a Lei 11.313/06, modificativa dasduas leis antes citadas, nao tenha feito referencia a suspensao condicional doprocesso, tratamento identico e isonomico hi de ser dado as infra~6es demedio potencial ofensivo quando conexas com outras, adotando-se, sob estaperspectiva, tambem, 0 aumento do conceito de infra~ao penal de mediopotencial ofensivo para penas minimas nao superiores aos dois anos.

o recebimento da denuncia ou da queixa-crime hi de ser fundamen­tado, em face do mandamento constitucional (art. 93, IX, CF). 0 juizo deadmissibilidade da pretensao acusatoria requer a anilise da presen~a de seuselementos pelo orgao jurisdicional, de modo a viabilizar ou nao 0 processopenal (recebimento e cita~ao). 0 recebimento da pe~a acusatoria altera 0

status quo da pessoa que, de cidadao comum passa ao rol dos sujeitos pro­cessados, acusados, reus em processo criminal. Os elementos que serviramde suporte fitico e juridico a dedu~ao da pretensao acusatoria, numaRepublica constituida em Estado Democritico de Direito (art. l' da CF/88),passam, necessariamente, pelo filtro da motiva~ao das decis6es (art. 93, IX,da CF/88), independentemente da existencia ou nao de uma defesa previaantecedente. Motivo e a causa ou a condi~ao de uma escolha, a qual dire­ciona a atividade para urn fim espedfico, arientando a conduta humana,sem, no entanto, fornecer uma explicac;ao ou uma justificac;ao, enquanto 0

fundamento representa a explica~ao ou a justifica~ao racional da coisa daqual e causa; a razao de ser, possibilitando 0 entendimento ou a justifica~ao

racional da coisa, da qual e causa. A motiva~ao se constitui na a~ao deter­minante da razao de ser da decisao, nos instrumentos que orientam a expli­cac;ao da decisao. E0 motivo que direciona a ac;ao nUID sentido au no outro(recebimento ou rejei~ao). Portanto, motivar 0 recebimento da acusa~ao edizer quais as bases faticas e juridicas que permitem a fundamenta~ao, atipifica~ao provisoria, ou seja, trata-se, pois, de explica~ao minimamenteracional da decisao. A motiva~ao desprovida de uma explica~ao racional(fundamenta~ao) que possibilite 0 entendimento, a sua compreensao, naosatisfaz 0 artigo 93, IX, da Constitui~ao Federal. E0 substrato fitico concre­tizado nos autos que fornecera ao magistrado, no momento de fundamentaro recebimento da acusa~ao sua adequa~ao juridica, a sua tipifica~ao provi­soria. 0 resultado deste processo permite 0 recebimento parcial da acusa­<;3.0, com afastamento de varios 6bices impeditivos da garantia dos direitosdos acusados (competencia, veda~ao da prisao processual, par exemplo),

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Refonnas (7) do Processo PenaLConsideral;oes Criticas

inclusive a concessao da suspensao condicional do processo. Este filtro enecessario, nao s6 pelo clever constitucional de motivar e fundamentar asdecisoes, mas tambem pela necessidade de urn iniciat etico do processo,com a valoriza~ao do set humano (0 acusado nao e urn ente abstrato) e naocom a sua descaracteriza\ao atraves de recebimentos automatizados da acu­sa~ao, os quais cetceiam a possibilidade de oferecimento ab initio da sus­pensao condicional do processo.

A praxis demonstra urn abuso do poder de acusar, aproximativo dofenomeno da overcharging (no sistema da common law, a acusa~ao, com afinalidade de obter uma vantagem processual, ou seja urn born acordo ouuma condena~ao, for~a a imputa~ao no direcionamento fatico ou juridico).Tanto e verdade que se acumularam os casos em que apos a produ~ao deprova houve desclassifica~aoe procedencia em parte da acusa~ao, iniciando­se uma intensa discussao acerca do cabimento ou nao da suspensao condicio­nal do processo em momentos processuais diversos dos constantes no artigo89 da Lei 9.099/95, culminando com a edi~ao da SUmula 337 pelo STJ e,agora, com previsao expressa no art. 383, § 19 , do CPP acerca da possibilida­de de suspensao condicional do processo apos 0 recebimento da demincia.

A nova sistematica se refere somente arejei\ao liminar da acusa\ao esilencia acerca de seu recebimento ou nao. Ocorre que 0 art. 395, I, do cpp,

determina a tejei~ao da denuncia por inepcia, na qual se integram os casosdo art. 41 do CPP. Recebida a denuncia ou a queixa-crime, 0 reu sera citadopara responder a acusa~ao. Portanto, a partir da reforma, 0 juiz rejeita ourecebe a denuncia ou a queixa-crime.

A reforma incluiu a cita~ao por hora certa no processo penal, nas mes­mas situa~oes e modalidades do processo civil, inclusive a ele fazendoexpressa referencia (art. 362 do CPP). A cita~ao por hora certa e possivelquando 0 reu se oculta, permanecendo a cita~ao por edital quando 0 reu esti­ver em local incerto e nao sabido, desde que nao esteja se ocultado (arts. 361e 363 do CPP).2 Trata-se de nova modalidade de cita~ao no processo penal,a qual, uma vez completada, nao autoriza a cita~ao por edital.

Nao oferecida a defesa previa no prazo legal, devera ser nomeadodefensor tecnico para tal finalidade, pois a defesa previa e obrigatoria e se 0

acusado nao a apresentar, 0 juiz devera nomear defensor para oferece-Ia (art.

2 0 contetido do an. 366 do CPP, no projeto, havia passado para a art. 363 do CPP. Ocorre que aart. 363 foi vetado. Com a veto, permanece integra a redal;ao do art. 366, dada pela Lei n° 9.271/96.

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396-A, § 2Q, CPP), sob pena de vieio (nulidade) somente superado com a

absolvi~ao do acusado.o prazo para resposta e de dez dias, mas a defensoria publica possui 0

prazo em dobra (art. 5Q, § 5Q

, da Lei 1.060/50), aplicando-se essa possibilida­de tambem ao defensor dativo nomeado pelo juiz, pois 0 mesmo, naquelepracesso passa a atuar como se defensor publico fosse.3

A grande massa dos incluidos no processo penal nao tern condi~iies

financeiras de pagar urn defensor e nem sequer pracuram as defenso­rias publicas para indicarem as testemunhas, circunstancias que dificul­tarao a materializa~ao da defesa preliminar e ate 0 simples oferecimen­to do rol de testemunhas. Na ritualistica anterior, 0 acusado mantinhacontato com a defensoria publica ou com 0 advogado dativo no dia daaudiencia e 0 prazo para arrolar testemunhas ainda nao havia transcor­rido. Com essa nova sistematica. em muitos casos 0 primeiro contato doreu com seu defensor sera no dia da audiencia onde serao inquiridassuas testemunhas. Por isso, nas situa<;6es em que 0 acusado nao consti­tui defensor, deveria haver uma intima~ao para comparecimento nadefensoria publica, ante de iniciados os dez dias para resposta.

A garantia constitucional da ampla defesa afasta 0 prazo preclusivo deoferecimento do ral de testemunhas ao reu que nao constituiu defensor e naolograu exito em contatar com a defensoria publica ou com 0 advogado dativo.

A resistencia pracessual, embora preliminar, abrange toda a materiadeduzivel no juizo criminal em pral da defesa do acusado, desde a proposi­~ao da prova, inclusive testemunhal, ate a materializa~ao de estrategiasdefensivas na contesta<;ao, inclusive as exce<;6es, as quais se processarao emautos apartados. 0 mera cumprimento formal do prazo estabelecido em leinao satisfaz a garantia constitucional da ampla defesa e macula todo 0 pra­cesso penal, sendo esse defeito somente supenivel com urn pravimento judi­cial absolut6rio. A estrategia defensiva ha de resultar de forma clara e con­sistente na defesa previa.

Embora a lei nao esteja prevendo, podera haver necessidade de cienciado Ministerio Publico (alega~iies de preliminares, juntada de docs., v.g. Ap6s

3 Pon~m, 0 entendimento nao e pacifico nos Tribunais. Vid. AgRg no Ag. 765142/SP, ReI. CarlosAlberto Menezes Direito, DJ 12.03.2007; AgRg no Ag 730074/SP, ReI. Min. Jorge Scartezzini. OJ10.04.2006; AgRg no REsp 738185/SP, ReI. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 13.02.2006.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considerac;:6es Criticas

a defesa preliminar a lei estabeleceu outro filtto ptocessual, ou seja, a possi­bilidade de 0 acusado ser absolvido sumariamente. Ha alguma diferen~a

entre as causas de rejei~ao liminar da denuncia ou da queixa-crime (an. 395do CPP) e a absolvi~ao sumaria (an. 397 do CPP)? Observa-se, prima facie arepeti~ao, embora com intensidade diferenciada, de identicas situa~6es nosdois filttos ptocessuais.

Somente depois de vencidos os tres filttos ptocessuais, ou seja, 0 darejei~ao liminar da acusa~ao, 0 da suspensao condicional do ptocesso e 0 daabsolvi~ao sumaria, e que sera designada a audiencia de instru~ao e julga­mento. Segundo 0 an. 400 do CPP, a audiencia devera ser realizada no prazomaximo de 60 dias. 0 crescimento da demanda ptocessual e 0 incremento desua complexidade estao empurrando as pautas dos juizes que exercem exclu­sivamente a jurisdic;ao criminal ou a compartilham com a de natureza civil,para datas alargadas, bern superiores aos 60 dias, preconizados pela lei.Ponanto, esta disposi~ao ha de ser obrigatoria para os acusados presos pto­cessualmente, em razao da garantia da razaavel dura~ao dos ptocessos (an.5Q

, LXXVIII, CF) e do constrangimento ilegal pelo excesso de p"aza, passivelde ser remediado via habeas corpus.

Na audiencia de instru~ao e julgamento apos a oitiva do ofendido,serao inquiridas, nesta ordem, as testemunhas arroladas pela acusac;ao e astestemunhas artoladas pela defesa. Estao excluidos dessa ordena~ao osesclarecimentos dos peritos, as acareac;6es, as testemunhas a serem ouvidasem outra comarca (precatorias), A disposi~ao imponante e acolhedora datese de que 0 interrogatorio integra a garantia da ampla defesa, na modali­dade de defesa pessoal ou autodefesa, e a que detennina a sua realiza~ao

como ultimo ato da audiencia, apos a colheita de toda a ptova, derradeiraoportunidade ao exercicio da defesa pessoal antes do veredicto do magistra­do de primeito grau. Prentende 0 legislador que a audiencia seja una, isto e,que tada a ptova seja colhida na audiencia, seja feita no mesmo ato ptoces­sual, na mesma ocasiao. Porem, acima do criterio da unicidade existemprincipios e garantias constitucionais a serem observadas, num patamar hie­rarquicamente superior as regras ordinarias. Em razao da ampla defesa, 0

ofendido e as testemunhas arroladas na acusa~ao deverao ser inquiridasantes das testemunhas arroladas pela defesa, como elementar expressao docontradit6rio. Ademais, 0 indeferimento de provas, devidamente motivado,emedida extremamente grave a diaJetica processual, tendo aplica~ao 0 an.400, § }Q, do CPP quando evidenciada de modo incontestavel, a irrelevan­cia, a impertinencia ou 0 intuito protelat6rio

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A realidade da demora processual, da migra~ao constante dos atingidospelo processo penal e das pessoas circundantes (testemunhas) mostra asdificuldades invenciveis da realiza~ao de audiencia una. As situa~6es

corriqueiras sao: pessoas nao tern condic;oes de pagar as passagens parair ate a forum; testemunhas sao intimadas e Iutam para nao comparecernas audiencias, par temor de acusados, vitimas e seus familiares; teste­munhas e vitimas nao sao mais encontradas no mesmo enderec;o depoisde determinado tempo e nao existe urn cadastro dos names e enderec;osde pessoas, nas municipalidades, como em outros paises. Ah,m do mais,muitas vezes, a primeiro cantata do acusado com a defesa sera nessedia, nao havendo justificativa constitucional para negar 0 direito deouvir suas testemunhas.

A Lei 11.719/08 deu nova reda~ao ao art. 265 do CPP, no que tange afalta de comparecimento do defensor na audiencia. Anteriortnente, 0 magis­trado que interpretava literalmente este dispositivo, nao estava obrigado aadiar a audiencia. Agora, demonstrado 0 impedimento ate ao momenta daabertura da audiencia, 0 magistrado podera adiar 0 ato. Em razao da garan­tia da ampla defesa, a qual abrange a defesa tecnica escolhida pelo acusado,comprovado 0 impedimento, 0 ato processual, sob pena de vieio somentesanavel pela absolvi~ao, nao podera ser realizado. Nas hip6teses de ausenciade comprova~ao do impedimento e necessidade de realiza~ao do ato, 0

defensor nomeado atua restritivamente afinalidade de sua nomea~ao, cujasdecis6es emanadas deste deverao ser endere~adas ao defensor constituido,em razao da ampla defesa. Por ser regra que atinge uma garantia constitucio­nal, a interpreta~ao no momento da nomea~ao de outro defensor, ha de serrestrita, ou seja, para os atos que seriam praticados na audiencia (inquiri~ao

das testemunhas).No rita comum, a acusac;ao e a defesa poderao arrolar ate oito testemu­

nhas (art. 401 do CPP). Nesse rol, nao se incluem (art. 401, § 10 , do CPP) asque nao prestam compromisso, bern como as referidas (mais uma situa~ao daimpossibilidade de realiza~aode audiencia una). A limita~ao legal ha de con­siderar acusa~ao e defesa de cada reu e nao em cada processo. Epossivel adesistencia de testemunhas (art. 401, § 20 , CPP) desde que haja concordan­cia da outra parte e homologa~ao judicial, na medida em que as pessoas, ap6sterem sido arroladas, desvinculam-se do interesse processual das partes.Evidentemente que, diante da nao-Iocaliza~ao da testemunha, a parte quetiver interesse em sua inquiri~ao devera propiciar sua localiza~ao.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera~6cs Criticas

A ordem das perguntas, em razao do disposto no art. 212 do CPP, sofreualtera~ao. Anteriormente, a testemunha era inquirida pelo magistrado eap6s, pelas partes, na ordem de quem a tivesse arrolado. Agora, as testemu­nhas serao inquiridas pelas partes. "As perguntas serao formuladas pelas par­tes..." e somente ap6s e que a magistrado, segundo a art. 212, paragrafounico, do CPP, podera complementar a inquiri~ao. Para aqueles que admi­tern que a magistrado possa perguntar (nao e a meu entendimento) a lei eclara: as perguntas se limitam aos pontos nao esclarecidos e de forma com­plementar. Portanto, a juiz devera perguntar par ultimo, quando perguntar.4

o interrogat6rio do acusado obedece aos arts. 185 a 196 do CPP, comobservancia das importantes a1tera~6es que haviam sido introduzidas pelaLei 10.79212003, com destaque it previa entrevista do acusado com seudefensor (art. 185, § 2', do CPP), a ciencia do direito ao silencio (art. 186 doCPP), com a veda~ao constitucional de aplica~ao do art. 198 do CPP, berncomo a possibilidade de as partes requererem esc1arecimentos ao acusado,atraves do juiz (art. 188 do CPP).

Findo a interrogat6rio, as partes poderao solicitar diligencias. Naohavendo diligencias a serem realizadas (a atualiza~ao dos antecedentes, dili­gencia mais solicitada no processo penal, pela acusa~ao, podera ser providen­ciada antes da realiza~ao do ato, au ser verificada no momenta da senten~a,

evitado a demora processual), au sendo estas indeferidas, as partes oferece­dio alegac;6es finais orais, por vinte minutos, prorrogaveis por mais dez, e 0

magistrada proferira senten~a. As alega~6es orais poderao ser substituidaspor memoriais, com prazo de cinco dias sucessivos as partes, nas hipoteses decomplexidade au em face do numero de acusados (art. 403, § 3', do CPP). Ede ser observado que tanto a tempo para alega~6es finais, quanta a prazopara a oferecimento dos memoriais deverao ser individualizados a cadadefensor, de modo a garantir a exercicio da ampla defesa (no rito comumsumario ha previsao expressa de que a tempo previsto para a defesa de cadaurn sera individual, no art. 534, § I', do CPP).

Porem, outras situac;6es poderao surgir na law in action, como a exis­tencia de outros compromissos das partes, bern como a aspecto temporal, aimpedirem as alega~6es orais e a veredicto. A interrup~ao da audiencia,inclusive it realiza~ao de diligencias, e medida a ser tomada na excepcionali­dade, e nao como regra, em razao da dura~ao razoavel do processo (art. 5',LXXVlll, CF). Inclusive as diligencias deverao passar pelo crivo da impres-

4 Vide cap. I, itens 3.4 e 3.8, acerca da atividade ex oflicio do juiz e da inquiri~ao das testemunhas.

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cindibilidade (art. 404 do CPP) e da origem de sua necessidade, as quais selimitam apenas aos fatos e as circunstancias surgidos durante a instru<;ao cri­minal (art. 402 do CPP). Substituidas as alega~oes finais por memoriais ouapresentados estes em razao das diligencias deferidas, 0 prazo e de cinco diase sucessivos, de sorte que antes devera ser intimada a acusa<;ao e ap6s, cadadefesa, para apresenta~ao dos memoriais. A senten~a, por sua vez, devera serproferida em dez dias.

A utiliza~ao de mecanismos eletr6nicos para documentar a audiencia,bern como as declara~oes da vitima, testemunhas e acusado propiciam aobten~ao com maior fidelidade do ocorrido na audiencia, mormente nadocumenta~aoaudiovisual, alem de fornecer aos julgadores de segundo grau,os quais nao tiveram contato direto com a prova, elementos mais completosde todas as circunstiincias das audiencias, principalmente dos depoimentosdas pessoas, as quais poderao ser ouvidas e observadas. Pon~m, esses novosmecanismos devem preservar todas as garantias constitucionais, principal­mente 0 exercicio da ampla defesa. Por isso, nas hip6teses da exclusao da eradigital e informatica, a entrega do material, sem transcri~ao (art. 405, § 20 ,

do CPP), podera dificultar 0 exercicio da ampla defesa, situa~oes em quedevera haver transcri~ao, mormente it Defensoria PUblica (alem da falta deDefensoria PUblica e da insuficiencia para atender a demanda, nunca edemais lembrar que esta sequer dispoe de local apropriado ao exercicio desua atividade) e aos defensores dativos.

Segundo 0 art. 399, § 20 , do CPP, 0 mesmo juiz que presidiu a instrn­~ao devera preferir a senten~a. Tal disposi~ao situa-se num plano ideal,aproximativo da perfei~ao, desvinculado da realidade da demanda proces­sual e da movimenta~ao dos magistrados. 0 ideal e que todas as testemu­nhas sejam encontradas e compare<;am na audiencia, que nao seja necessa­rio conduzir testemunhas, que as alega~oes finais sejam orais e que a sen­ten~a seja proferida na audiencia. Entretanto, a realidade processual crimi­nal brasileira e bern diferenciada e nao comporta esferas de obrigatorieda­de hermeticas, de modo que uma interpreta~ao razoavel desse dispositivose direciona na obrigatoriedade de atingir 0 magistrado que colheu e ouviuas alega~oes finais orais.

A imedia<;ao foi concebida como uma altemativa ao processo secreto eescrito. A oralidade, a imedia~ao e 0 julgamento pelo mesmo juiz perante 0

qual foi produzida a prova estao conectados e informam urn modelo de pro­cesso. Ocorre que a reforma mantem esse misto de escritura e oralidade,inserido no contexto do processo e de toda a estrntura judicial. A ado~ao daaudiencia una (concentra~ao)e do julgamento pelo mesmo juiz que presidiu

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Reformas (7) do Processo Penal:Considera~oes Criticas

a colheita da ptova (imedia~aoe identidade fisica) passam por uma reformaestrutural do ptocesso penal, em todas as suas instiincias, bern como da estru­tura da administra~ao da justi~a.5

3.1. Julgamento antecipado do processo penal: rejei~ao da acusa~ao

e absolvi~ao sumaria

Esses dois temas nos remetem it discussao acerca da evolu~ao doutrina­ria e dogmatica dos conceitos de a~ao, jurisdi~ao e ptocesso,6 cujo objetivonao e, nesta ocasiao, aprofunda-los. Temas esses, no ambito da doutrina doptocesso penal, como regra, vinculados it teoria geral do ptocesso civil,incompativeis com a necessidade e urgencia de uma teoria geral do ptocessopenal.? A defendida unidade entre 0 ptocesso civil e 0 ptocesso penal encon­tra-se arraigada no ensino universitario,8 tambem de terceiros niveis (bastaanalisar os curriculos universitarios e seus conteudos, mormente os de teo­ria geral do ptocesso), contribuem aos atrasos e rettocessos cientificos doptocesso penal,9 inclusive em sua abordagem metodologica. lO 0 processopenal possui categorias juridicas proprias e bases epistemologicas destacadasdo processo civil.

Na esfera criminal, a provoca<;ao da jurisdi<;ao, salvo algumas exce<;6es(agir de iniciativa privada) e exclusivo do Estado-Acusa~ao (Ministerio

5 Vide ANDRES IBANEZ, Perfecto. Valoral):ao da Prova e Senrenl):a Penal. Rio de Janeiro: LumenJuris, 2006, pp. 5 a 17, acerca do uso da imedia<;ao no processo penal.

6 Vide COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda (coordenador). Critica a Teoria Ceral do DireitoProcessual Penal, uma abordagem critica da evolu~ao dos conceitos de a~ao e processo. VideCHIOVENDA, Giuseppe. La Acci6n en el Sistema de los Derechos. Bogota: Temis, 1986, acercada evolu<;ao doutrinana do conceito de a<;ao.

7 SCARANCE FERNANDES, Antonio. Teoria Geral do Procedimenco e 0 Procedimenco no ProcessoPenal. Rio de Janeito-Sao Paulo: Renovar, 2001, a Sao Paulo: RT, 2005, e TUCCI, Rogerio Lauria.Teoria do Direito Processual Penal. sao Paulo: RT, 2003, por uma teoria geral do processo penal.

S Vide CARVALHO, Salo. Antimanual de Criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 9­33, sabre 0 ensino e aprendizagem das Ciencias Criminais no Seculo XXI, inclusive do ensino doProcesso Penal.

9 Vide SOARES, Fernando Luso. 0 Processo Penal como jurisdil):ao Voluncaria. Coimbra:Alrnedina, 1981, pp. 13-21, sobre uma diferencia<;ao entre as contetidos processuais da a<;ao penale da a<;ao civil; LOPES Jr. Aury. Direito Processo Penal e sua Conformidade Consricudonal. Riode Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 333-412, uma discussao critica acerca do conceito e das condi­<;oes da a<;ao.

10 Vide CARNELlITTI, Francesco. Metodologia del Diritto. Padova: Cedam, 1990, e GUASP, Jaime.Concepro y Metodo de Derecho Procesal. Madri: Edersa, 1997, sobre 0 conceito, metoda, fontese programa de Direito Processual.

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Publico). 0 Estado individualiza 0 agir processual (direito potestativo) aoMinisterio PUblico. Porem. 0 Ministerio Publico e 0 particular. nas hip6te­ses determinadas na lei. ap6s a demonstra~ao da existencia da pnitica de umainfra~ao criminal e da apura~ao da autoria. nao tern autoriza~ao legal abso­luta para agirem. 0 exercicio processual da a~ao penal passa por varios fil­tros. formais e substanciais. pois ele e limitado. A Lei 11.719/08 criou doismomentos processuais. antes da aprecia~ao do merito, para ser feita esta fil­tragem. 0 primeiro filtro ocorre ja no inicial contato do magistrado com adenuncia ou com a queixa-crime. Neste ato, sao analisados os requisitos doart. 395 do CPP, abrindo-se a possibilidade de duas decis6es: recebimento ourejei~ao da acusa~ao. Trata-se da emissao de urn juizo de possibilidade, deviabilidade acusat6ria. Depois do recebimento da inicial acusat6ria, cita~ao edefesa obrigat6rias (alega~6es, justifica~6es, proposi~ao de prova, juntada dedocumentos, v. g.) e replica da acusa~ao, sendo necessaria, antes da designa­~ao de audiencia de instru~ao e julgamento, ha urn segundo filtro processual,denominado de absolvi~ao sumaria. Pela densidade dos efeitos do recebi­mento da denuncia ou da queixa-crime, a denominada "existencia manifes­ta" contida no art. 397, I e II, deveria estar situada anteriormente ao recebi­mento da acusa~ao, ou seja, no art. 395 do CPP.

A denuncia ou a queixa-crime serao rejeitadas quando forem manifes­tamente ineptas, faltar condi~ao ou pressuposto ao exercicio da a~ao proces­sual penal ou nao houver justa causa para esta. E. os casos de absolvi~ao limi­nar sao: existencia manifesta de causa excludente de ilicitude do fato ou daculpabilidade do agente, salvo os casos de inimputabilidade, evidencia deque 0 fato narrado nao constitui crime e extin~ao da punibilidade do agen­teo As condi~6es da a~ao processual penal, antes da reforma de 2008, eramextraidas do art. 43 do cpp (tipicidade do fato narrado; punibilidade concre­ta; legitimidade da parte e condi~ao exigida pela lei ao exercicio da a~ao pro­cessual penal - justa causa).

Nao e possivel estabelecer, nesse momento e espa~o uma cientifica eclara delimita~ao entre as causas que levam 0 magistrado a rejeitar a acusa­~ao e nem entre estas e as hip6teses de absolvi~ao sumaria, fruto da transfe­rencia de categorias do processo civil ao processo penal. Uma inicial apta(art. 395, I, do CPP) e a que preenche os requisitos formais anteriormenteprevistos no art. 41 do CPP. Acerca dos pressupostos processuais, inviavel aado~ao, no processo penal, da intrincada classifica~ao do processo civil. Ajusta causa compreende elementos indiciarios de autoria, de existencia dofato, de antijuridicidade e de culpabilidade (urn suporte "probat6rio" mini­mol. Ecausa de rejei~ao da acusa~ao a falta de justa causa para a a~ao proces-

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera~6es Criticas

sual penal (art. 395, III, do CPP), mas tambem 0 sao para a absolvi~ao limi~

nar a existencia manifesta de causa exeludente de ilicitude do fato e a exis~

tencia manifesta de causa exeludente de culpabilidade (art. 397, I e II, doCPP). Ademais, a justa causa pode ser enquadrada como uma das condi~6es

ao exercicio processual da a~ao pracessual penal. Quando 0 fato narrado naoconstitui crime e quando estiver extinta a punibilidade, causas de absolvi~ao

liminar (art. 397, III e IV, do CPP), tambem sao condi~6es para 0 exercicioda a~ao pracessual penal (art. 395, II, do CPP).

Ocorre que no pracesso penal ha garantias pracessuais vinculadas aodireito de liberdade e ao status de cidadao (0 recebimento de uma acusa~ao

altera a situa<;ao normal e comum, produzindo efeitos processuais e extra­pracessuais, na vida de rela~ao). Por isso, uma interpreta~aorazoavel e admi~

tir 0 reconhecimento das mesmas causas, quando coincidentes, inclusive emseu conteudo, nos dois momentos processuais: rejeic;ao da acusac;ao e absol­vic;ao sumaria. Alias, a intensidade da denominada "existencia manifesta"deveria ser causa de rejeic;ao e nao de absolvic;ao sumaria.

Mesmo diante do recebimento da acusa~ao, no contradit6rio estabele~

cido na resistencia pracessual poderao ser aventadas hip6teses ja afastadas nadeeisao anterior que deu viabilidade aacusac;ao, circunstancia que nao afas­ta 0 seu reconhecimento no filtra da absolvi~ao sumaria. Quando 0 magis~

trado recebe a dem'mcia ou a queixa~crime e porque ha justa causa para aa~ao pracessual penal (art. 397, III do CPP), mas isso nao torna preelusa adecisao, pois 0 acusado podera ser absolvido liminarmente, depois do contra~

dit6rio defensivo, quando forem manifestamente existentes as exeludentesde ilicitude ou de culpabilidade (art. 397, I e II, do CPP). A a~ao pracessualpenal deve ser compreendida enquanto realidade que se encontra direta~

mente relacionada com a infra~ao penal praticada e com a punibilidade con~

creta. Por isso, nos casos em que sequer hci a narrac;ao de urn fato criminal,quando da formaliza~aoda acusa~ao, temos que tal fato, por si s6 ja e capazde determinar a rejei~ao da dem'mcia ou da queixa~crime, pois a tipicidadeintegra as condi~6es da a~ao, na esfera criminalll (art. 395, II ou III, do CPP)e tambem de absolvi~ao sumaria (art. 397, III e IV, do CPP).

o que se esta afirmando serem "condi~6es da a~ao" sao condi~6es daa~ao ou condi~6es pracessuais a afirma~ao fatica e juridica em juizo? Ouseriam as denominadas condi~6es da a~ao, verdadeiras condi~6es para se pra~

11 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. A lide e 0 Conteudo do Processo Penal. Curitiba: Juru;i,1989, p. 147.

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Nereu Jose Giacomolli

ceder, do processo em si? Para tanto, haveria necessidade de construir emoutras bases, cujo objetivo foge, e muito, desta introdu~ao critica as re(de) for­mas processuais de 2008. Certamente, os obstaculos processuais, relacionadosa a~ao no plano concreto e/ou ao processo, guardam uma distancia epistemo­logica entre os interesses privados da esfera civel e 0 direito de liberdade noprocesso penal. Ha necessidade de reestrutura~ao sistematica (mas a decapi­ta~ao de reis e tarefa ardua, que poucos ousam a se comprometer).

o processo penal orienta-se pelos principios da necessidade da a~ao pro­cessual para que, praticada uma infra~ao penal (coneno com 0 plano da con­cretude),12 incida 0 poder de penar do Estado (exercido por meio de magis­trados, que detem 0 poder de punir, de aplicar as san~6es penais), 0 qual uti­liza, obrigatoriamente, 0 processo penal iniciado, como regra, pelo proprioEstado, atraves do Ministerio PUblico (exclusividade da a~ao processual penalpublica, quem acusa, mas nao quem exerce uma pretensao punitiva).Acusa~ao pelo Estado, decisao pelo Estado e, no ambito criminal que abarcaos miseraveis, defesa pelo Estado, fenomeno proprio do Processo Penal.

Nessa perspectiva, nao ha outra possibilidade juridica de incidencia doius puniendi a nao ser pela necessidade processual do agir penal. Ha sim,obstaculos limitadores dessa interven~ao olicial, ja no plano da concretude(justa causa, v. g.), inclusive previos, como 0 sao a representa~ao e a requisi­~ao, nas hipoteses previstas em lei. A legitima~ao a a~ao processual publica eexclusiva do Ministerio PUblico e decorre do art. 129, I, da CF. Essa e a regra,salvo algumas hipoteses aplicaveis a a~ao processual penal de iniciativa pri­vada. Mas a constru~ao ha de ser pela regra e nao pelas situa~6es excepcio­nais. 0 interesse, seja ele vinculado a adequa~ao, a utilidade ou a necessida­de, da forma construida ate 0 momento, nao tern aplica~ao no processamen­to criminal.13 No que tange aos pressuspostos processuais, 0 MinisterioPublico tern capacidade processual (ser parte, estar em juizo e postular) emdecorrencia da Constitui~ao Federal. No ambito do processo penal, estamosdiante de outra realidade da vida, mas essas considera~6es estao sendo feitasem razao do que consta na re(de)forma processual de 2008.

12 TUCCI, Rogerio Lauria. Teona do Direito Processual Penal. sao Paulo: RT, 2003, p. 84, eLOPESJr. Amy. Direito ProcesSl1al e sua Confonnidade Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2008, p. 345, defendem que ha uma conexao entre 0 plano abstrato da al;ao processual ao planoconcreto, au seja, da pnitica de uma infra(fao criminal. Instrumentalidade conexa com uma situa­(fao conereta (Tucci) e eonexidade instrumental ao caso penal (Lopes).

13 Poder-se-ia cogitar, nas situal.foes em que 0 Ministerio PUbhco nao age? (queixa-erime na al;aoproeessual penal publica).

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera~oes Criticas

As decisoes de rejei~ao da denuncia ou da queixa-crime (art. 395 doCPP) encerram 0 processo sem condenar ou absolver, motivo por que saoimpugnaveis mediante apela~ao, com fundamento no art. 593, II, do CPP.A decisao que absolve sumariamente 0 acusado (art. 397 do CPP) tambernpoe termo ao processo, sendo impugnavel mediante apela~ao, pelo mesmofundamento.

4. Particularidades do rito comum sumario

o rito comum sumario aplica-se aos crimes cuja pena privativa de liber­dade seja inferior a quatro anos, com a exce~ao prevista no Estatuto do Idoso,mencionada no item 3, supra. Poucas sao as situa~oes que 0 diferenciam docomum ordinario, motivo pelo qual nao se entende, racionalmente, os moti­vos de sua previsao em separado.

Assim como ocorre no rito comum ordinario, oferecidas a denuncia oua queixa, nao sendo caso de rejei~ao liminar da acusa~ao (art. 395 do CPP) 0

juiz recebe a acusa<;ao e determina a cita<;:ao do reu para contestar, em dezdias (defesa previa obrigat6ria), nao sendo caso de suspensao condicional doprocesso (art. 89 da Lei 9.099/95). Aqui tambem ha de ser observada a hip6­tese de aplica~ao da composi~ao civil e da transa~ao penal nas infra~oes

penais de menor potencial ofensivo que forem conexas (art. 60, paragrafounico, da Lei 9.099/95, e art. 2". paragrafo unico, da Lei 10.259/01), berncomo da suspensao condicional do processo, como referido no rito comumordinario. A acusa~ao e a defesa poderao arrolar ate cinco testemunhas (pri­meira diferen~a). Oferecida a defesa e nao havendo necessidade de contradi­t6rio do Ministerio PUblico, 0 magistrado decidira se absolve sumariamenteo acusado (art. 397 do CPP) ou designa audiencia de instru~ao e julgamento,num prazo de trinta dias. Prazo este, conforme antes referido, aplicavel aosacusados que estiverem presos processualmente.

o art. 531 do CPP, como 0 fez no rito comum ordinario, estabeleceuuma ordem de oitiva e inquiri~ao: ofendido, testemunhas arroladas na acu­sa~ao e testemunhas arroladas na defesa previa (5 testemunhas - segundadiferen~a). No que tange ao ofendido, diversamente do constante no art.400 do CPP, 0 art. 531 do CPP se refere it oitiva do ofendido "se possivel"(terceira diferen~a). Ora, estando arrolado, e urn direito da acusa~ao ouvi­10, mesmo que nao compare~ana audiencia. Tambem e urn direito da defe­sa que as testemunhas por ela arroladas sejam inquiridas ap6s a oitiva doofendido e das testemunhas arroladas pela acusa~ao. Conforme art. 536 do

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Nereu Jose Giacomolli

CPP a testemunha que comparecer sera ouvida, independentemente dasuspensao da audiencia, mas dever' ser observada a ordem do art. 531 doCPP na inquiri~ao. A ordem a ser observada e em rela~ao as testemunhaspresentes ou se deve considerar a totalidade das testemunhas? Em razaoda ampla defesa, a interpreta~ao caminha no sentido da observancia daordem em relac;ao a todas as testemunhas e nao somente no que tange asque compareceram (comparecem duas testemunhas arroladas pela acusa­~ao e trIOs das arroladas pela defesa, faltando ttl's das arroladas pela acusa­~ao). Mesmo com a designa~ao de nova data para a inquiri~ao das tres tes­temunhas que nao compareceram, arroladas pela acusac;ao, serao ouvidasas duas testemunhas presentes. Entretanto, em face da garantia da ampladefesa (art. 5', LV, CF), da ordem estabe1ecida no art. 531 do CPP e daaplica~ao subsidi'ria do art. 400 do CPP, conforme previsao no art. 533 doCPP, as testemunhas arroladas pela defesa que estiverem presentessomente poderao ser inquiridas antes das testemunhas arroladas pela acu­sac;ao, com a concordancia das partes. Isso se aplica a todas as pessoas aserem ouvidas, compromissadas ou nao, bern como as que comparecerempara declarar acerca dos fatos ou da conduta do acusado, na medida emque as duas partes poderao perguntar sobre os faros, circunstancias e con­duta do reu.

Finda a instru~ao, com interrogat6rio do reu semp"e par ultimo, nao hap"aza para diligencias (quarta diferen~a) e nem possibilidade da substitui~ao

das alega~6es finais orais, de vinte minutos, prorrog'veis por mais dez, parmemoriais (quinta diferen~a). A senten~a dever' ser proferida na audiencia(art. 534 do CPP), pelo mesmo juiz que presidiu a instru~ao (leia-se, ouviuos debates), nos termos do art. 399, § 2', do CPP. Por fim, chamamos espe­cial aten~ao para a questao acerca do carater prescindivel ou nao da prova.Como saber se a prova a ser produzida e imprescindivel para a solu~ao doprocesso, nos termos expressos pelo art. 535 do CPP?

5. 0 rito comum sumariissimo

A reforma nao modifica 0 rito sumariissimo, previsto no artigo 98, I, daCF e nos arts. 77 a 83 da Lei 9.099/95. Apenas 0 transfarma de rito especialpara rito comum para processar e julgar as infra~6es de menor potencialofensivo (art. 394, § l' e III, do CPP). Parem, 0 art. 66, par'grafo unico daLei 9.099/95 restou modificado pelo art. 538 do CPP. Assim, nas hip6teses dedeslocamento da competencia para processar e julgar uma infra~aode menor

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Reforrnas (7) do Processo Penal:ConsideraQ3es Crfticas

potencial ofensivo, do ilmbito do juizado Especial Criminal ao juizo comum(reu nilo encontrado para ser citado ou complexidade da causa), neste seraseguido 0 rito comum sumario para processar e julgar a infra~ilo criminal demenor potencial ofensivo.

Consideram-se infra~6es criminais de menor potencial ofensivo as con­traven~6es e os crimes cuja pena privativa de liberdade maxima nilo sejasuperior aos dois anos, independentemente de rito processual. Nesse concei­to incidem as causas especiais de aumento e de diminui~iio de pena. Divergea doutrina acerca do quantum de aumento. Nas hip6teses da suspensiio con­dicional do processo, a Sumula 723 do STF refere: "niio se admite a suspen­sao condicional do processo por crime continuado, se a soma da pena mini­ma da infra~ilo mais grave com 0 aumento minima de 1/6 for superior a urnano." Portanto, 0 STF considerou no quantum a aumentar a situac;:ao maisfavoravel ao consenso, a medida alternativa da suspensao condicional doprocesso. Esse e 0 entendimento que deveria ser aplicado tambem ao estabe­lecimento do conceito de infra~iio penal de menor potencial ofensivo. Paraa hip6tese de suspensiio condicional do processo, 0 STj editou a Sumula 243:"0 beneficio da suspensiio condicional do processo niio e aplicavel em rela­c;:ao as infrac;:6es penais cometidas em concurso material, concurso formal oucontinuidade delitiva, quando a pena minima cominada, seja pelo somat6rio,seja pela incidencia da majorante, ultrapassar 0 limite de urn ano."Entretanto, niio houve edi~iio de Sumula acerca da transa~iio penal.

No que tange ao cabimento da composi~iio civil e da denominada "tran­sac;:ao" penal nas hip6teses de conerio e continencia, importante inovac;:aoadveio com a Lei 11.313/06, a qual modificou a reda~iio dos artigos 60 e 61da Lei 9.099/95, bern como 0 art. 2', da Lei 10.259/01. Alem de restar defini­do 0 conceito de infra~iio penal de menor potencial ofensivo, a tese adotadapelo legislador foi da reuniiio das infra~6es penais de menor potencial ofen­sivo, na conexao ou continencia com uma infrac;:ao de competencia do juizocomum ou do Tribunal do juri, nestes, mas com a manifesta~iio acerca dacomposi~iio dos danos civis e da "transa~iio" penal com rela~iio a infra~iio

conexa ou continente. Portanto, a considerac;:ao e individual e nao mais emseu conjunto. ldentico tratamento, como antes referido, ha de ser outorgadoa suspensiio condicional do processo.

Aplicam-se as disposi~6es e 0 rito sumariissimo da Lei 9.099/95 tambemas hip6teses de usuario de drogas (arts. 28 e 48, § I', da Lei 11.343/06). Entre­tanto, a Lei 11.340/06, em seus arts. 17 e 41, vedou a aplica~iio da Lei9.099/95 nas hip6teses da violencia domestica. Assim, nas hip6teses em quea pena privativa de liberdade niio for igual ou superior a quatro anos, aplica-

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se 0 rito comum sumario (art. 395, § 1Q, 11, do CPP). Permanece a incidencia

ou nao do art. 88 da Lei 9.099/95 nas situa~oes de vioIencia domestica, namedida em que as 1esoes corporais leves e as culposas, ate 0 advento desta lei,se processavam por iniciativa publica, sem representa~ao, situa~ao modifica­da pelo art. 88 da referida lei. No caso especifico da representa~ao, 0 art. 41da Lei 11.340/06 hi de ser interpretado de forma sistematica, com 0 art. 16da Lei Maria da Penha, 0 qual refere ser aceitavel a renuncia a representa~ao

somente em audiencia. Ao dispor dessa forma, admitiu a representa~ao tam­bern no ambito da violencia domestica.

Nas hip6teses do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), por expressa dispo­si~ao de seu art. 94, quando a pena maxima da infra~ao nao for superior aquatro anos, observa-se 0 rito sumarilssimo, no Juizado Especial Criminal ouno juizo comum.

A Lei 11.705/08 modificou 0 paragrafo unico do art. 291 do C6digo deTransito. Aplicam-se as disposi~oes da Lei 9.099/95 as infra~oes cometidasno transito, no que couber. Porem, a nova redac;ao ao paragrafo unico reduzdrasticamente a aplica~ao dos institutos despenalizadores ao C6digo deTransito. Nas hip6teses de lesao corporal culposa, a composi~ao civil e a"transa~ao" penal estao vedadas quando a infra~ao for praticada sob ainfluencia de alcool ou de qualquer outra substiincia psicoativa que determi­ne dependencia, quando a velocidade foi superior a 50 kmlh ou nas hip6te­se do denominado "racha" ou manobra exibicionista.

Desc1assificado urn delito para uma infra~ao criminal de menor poten­cial ofensivo ou para uma onde caiba a suspensao condicional do processo,tern aplica~ao os institutos despenalizadores da Lei 9.099/95 tendo, no quetange a suspensao condicional do processo, sido editada a Sumula 337 peloSTJ: "e cablvel a suspensao condicional do processo na desc1assifica~aodocrime e na procedencia parcial da pretensiio punitiva."

Com a remessa do termo circunstanciado ou das pe~as investigativas ajulzo, nao sendo caso de arquivamento ou de requisi~ao de diligencias peloMinisterio PUblico, mantida a delimita~ao tipica de infra~ao penal de menorpotencial ofensivo, sera designada audiencia preliminar, com intima~ao doautor do fato, vitima, Ministerio PUblico e advogados. Nesta, havendo danosde natureza civil, sera tentada a composi~ao destes entre a vitima e 0 autor dofato. A composi~ao civil, uma vez homologada, produz efeitos de naturezapatrimonial (decisao irrecorrivel e titulo executivo) e penal (renuncia dodireito de queixa ou de representa~ao). Descumprido 0 acordo civil, os efei­tos limitar-se-ao a respectiva esfera de disponibilidade, nao atingindo arenuncia criminal que se operou. Nao havendo danos indenizaveis, inexitosa

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considera~6es Criticas

a composi~ao civil ou impossibilitada (ausencia da vitima ou do autor do fato),o segundo ato processual e a proposta de cumprimento de uma medida restri­tiva de direitos ou multa ("transa~aopenal"). Esta, uma vez homologada, naoproduz efeitos de natureza dvel e, na esfera criminal, 0 (mico efeito e 0 devedar esta altemativa no prazo de cinco anos (art. 76, § 20 , II, da Lei 9.099/95).

Vencidos os filtros da composi~ao civil e da aplica~ao das medidas des­penalizadoras - restritiva de direitos ou multa -, poded 0 Ministerio Publicodeduzir a denuncia, aralmente, a qual sera reduzida a termo. a acusado ecitado (pode ser citado nesta audienda) para a audiencia de instru~ao e jul­gamento, onde tambem se defended e sera interrogado.

Nesta segunda fase, repetem-se, inicialmente, a composi~ao civil e atransac;ao penal, quando nao tenham sido possiveis na audiencia preliminar(ausencia do autor do fato, v. g.). A ritualistica prossegue com ooferecimen­to da defesa previa aral e analise dos requisitos da denuncia ou da queixa­crime, a qual podera ser rejeitada, nos termos do art. 395 do CPP. Recebidaa acusac;ao, antes de ser iniciada a instruc;ao, ha que ser verificada a hip6te­se do cabimento da suspensao condicional do processo, nos termos do art. 89da Lei 9.099/95. Incabivel ou inviabilizada a suspensao condicional do pro­cesso, sera ouvida a vitima e, posteriormente, serao inquiridas as testemu­nhas arroladas pela acusa~ao e as arroladas pela defesa. Par ultimo, 0 reu einterrogado, com debates orais e senten~a, a qual dispensa 0 relatorio (art.81, § 30 , da Lei 9.099/95).

As decis6es do juiz do Juizado Especial Criminal sao impugnaveis,mediante recurso ou outro remedio juridico, aTurma Recursal Criminal, aqual representa 0 segundo grau em rela~ao ao Juizado Especial Criminal. Parnao serem Tribunais, veda-se 0 Recurso Especial ao STJ, cabendo, de suasdecis6es, a impugnac;ao ao STF, nas hip6teses constitucionalmente previstas.

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Capitulo IIITribunal do JUri

1. Introdu<;:ao critica

A institui<;ao do juri e reconhecida no art. 5", XXXVIII, da CF, mas coma organiza<;ao que Ihe for dada pela lei ordinaria, assegurados a plenitude dedefesa, 0 sigila das vota<;oes, a soberania dos veredictos e a competencia parao julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

Observa-se ser a dimensao da defesa no Tribunal do Juri maior do quedaquela aplicavel aos demais processos criminais. Enquanto 0 art. 5Q

, LV, daCF garante a ampla (lat. amp/urn) defesa, no que tange ao Tribunal do Juri,o art. 5Q

, XXXVIII, "a", da CF assegura a plenitude (plenitudinern) da defesa.Plenitude encerra a ideia de completude, de conduta aproximativa da

perfei<;ao. 1850 porque 0 veredicto nae advem de urn juizo tecnico, nao emotivado e nem fundamentado. 0 juiz presidente do Tribunal do Juri ha degarantir a plenitude defensiva, esclarecendo aos jurados sobre todos os pon­tos debatidos, explicar-Ihes os quesitos e as conseqiiencias do "sim" e do"nao" (efeitos condenat6rios, absolut6rios, cia especie de crime e dimens6esda penal, em plenario e durante a vota<;ao. Embora a reforma nao tenha feitoreferencia a leitura do quesito na sala especial (0 art. 486 do cpp revogadodeterminava que 0 juiz, ap6s a distribui<;ao das cedulas aos jurados, deverialey 0 quesito), da plenitude defensiva jnfere-se ser necessaria nao s6 a Ieitu­ra do quesito, antes de sua vota<;ao, mas tambern a sua explica<;ao aos jura­dos, independentemente disso ja ter sido realizado no plenario de julgamen­to. A explica<;ao devera abranger, inclusive, a possibilidade de contradi<;aona vota<;ao dos quesitos (art. 490 do CPP), com renova<;ao da vota<;ao destes,com 0 intuito de evitar a nulidade do julgamento. Cabe ao magistrado expli­car e alertar aos jurados acerca cia contradi\'ao e de suas consequencias.Entretanto, as jurados decidem por intima convic<;ao e poderao manter acontradi<;ao, apesar da renova<;ao do quesito espedfico, situa<;ao somenteremediada via impugna<;ao recursal, em razao do error in procedendo. Emface dessa garantia, quando a defesa nao for plena, 0 que tambem ocorrequando nao forem rebatidas todas as teses da acusa<;ao, em igualdades de

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condi<;6es fciticas e tecnicas, 0 Conselho de Senten<;a devera ser dissolvido,sob pena de nulidade do julgamento.

Nessa perspectiva, a Lei 11.689/08, somente autoriza a usa de algemasem casos excepcionais, isto e, quando houver motiva<;ao em circunstanciasfaticas concretas e nao em presun<;6es (art. 474, § 3Q

, CPP). Tambem, naopoderao ser utilizados no plenario de julgamento as argumentos constantesna decisao de promincia e nas decisoes posteriores, as quais tenham admiti­do a acusa<;ao, bern como a silencio do acusado (an. 478 do CPP).

Segundo a an. 5Q, LX, da CF, a lei somente podera restringir a publici­

dade dos atos processuais na prote<;ao da intimidade au quando a interessesocial a exigir. Nos julgamentos do Tribunal do Juri, apenas a vota<;ao dosquesitos e feita numa sala especial (an. 485 do CPP). Nao se trata de "salasecreta", pais a vota<;ao e conduzida pelo juiz presidente do Tribunal do Juri,sob a fiscaliza<;ao do Ministerio Publico e da defesa. Nessa sala especial ocar­re a vota<;ao dos quesitos, a qual e imediatamente publicizada em plenario.A presen<;a de estudantes de direito durante a vota<;ao dos quesitos e praxesalutar e, par si s6, havendo concordancia das panes e dos jurados, naomacula a julgamento.

A soberania dos veredictos e apenas relativa, pais a decisao dos juradospodeni ser impugnada mediante recurso e modificada par meio da revisaocriminal. Fosse plena, a decisao nao poderia ser modificada. Sao soberanos asjUlzes leigos para optarem par uma das linhas de argumenta<;ao das panes(persuasao). Quando predomina a argumenta<;ao (persuasao dirigida ao sen­timento, il emo<;ao) sabre a demonstra<;ao (convic<;ao baseada em provas), nalinha da intima convicC;ao e do julgamento de acordo "com a consciencia..."(an. 472 do CPP),l aflaram veredictos (6 anos, 10 anos, 15 anos, 20 anos) sembase probat6ria consistente au em elementos inquisitoriais. Ede ser consig­nado que a Constitui<;ao do Estado Novo de 1937 nao fez referencias aoTribunal do Juri, embora este integrasse a Constitui<;ao anterior. Na Cons­titui<;ao de 1946 a Tribunal do Juri retornou no capitulo dos Direitos e Ga­rantias Individuais, para julgar as crimes dolosos contra a vida (an. 141, § 28,CF). Apesar de ter sido mantida a situa<;ao pela Constitui<;ao de 1967 (an.150, § 18, CF), a Emenda Constitucional de 1969, uma nova Constitui<;aopara uns, nada referiu acerca da soberania dos veredictos (art. 153, § 18, CF).Seguiu-se a Constitui<;ao de 1988, com sua previsi'io expressa no capitulo dos

Vide FAGUNDES, Valda de Oliveira. A Espada de Damode~ da Justir;a: 0 discurso no juri. Itajai:UNIVALI, 2001, pp. 28 a 40, acerca do cemirio do diSCUr$n nt' Tribunal do Juri.

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considerao:;6es Criticas

direitos e das garantias fundamentais, assegurando-se a plenitude de defesa,o sigilo das vota~6es, a soberania dos veredictos e a competencia para 0 jul­gamento dos crimes dolosos contra a vida (art. 5Q, XXXVIII, CF).

A competencia definida na Constitui~aoFederal e a do julgamento doscrimes dolosos contra a vida (art. 5Q, XXXVIII, CF), assim definidos nos arts.121 a 128 do CPo 0 julgamento dos delitos conexos e atribuido ao Tribunaldo Juri pelo art. 78, I, do CPP. Portanto, a lei ordinaria poderia afastar dacompetencia do Tribunal do )Uri os delitos conexos. Porem, essa nao foi aop~ao de politica criminal, circunstancia que podera macular a amplitude dedefesa com a necessidade de sustenta~aodas teses acerca do delito prevalen­te e do conexo, no mesmo espa~o temporal, alem da possivel contamina~aodos jurados pela quantidade delitiva, no momenta do veredicto.

Enquanto a reforma avan~ou acerca da utiliza~ao das algemas (mesmoassim, ha uma discricionariedade no que tange it abrangencia do "absoluta­mente necessario", fazendo-se mister a regulamenta~ao legal) e da elimina­~ao do recurso ex officio da decisao de absolvi~ao sumaria, bern como daimpossibilidade da utiliza~ao circunstancial das algemas e da decisao de pro­nuncia durante os debates, nada disp6s sobre a distribui~ao espacial desigua­litaria no cenario dos debates (acusa~ao ao lado direito do magistrado, namesma linha e a defesa ao lado esquerdo, numa linha lateral, secundaria),bern como nao afastou 0 "banco dos reus", uma potencia estigmatizadora.Ademais, nada se questiona acerca da conveniencia da manuten<;ao do"Jurado Puro" (Australia, Belgica, Canada, Inglaterra, Espanha, EVA eRussia, v.g.) ou da introdu~aodo Escabinato, onde hi a participa~ao conjun­ta de juizes leigos e togados na defini~ao dos fatos, na aplica~ao do direito ena senten~a (Alemanha, Fran~a, Italia, v.g.) ou do sistema misto, onde pri­meiro ha urn veredicto de culpado ou inocente pelos juizes leigos e, numsegundo momento, estes participam, com os juizes togados, da defini~ao juri­dica e da senten~a (sistema austriaco).2 A admissibilidade do assistente deacusa~ao, em plenario, desequilibra a situa~ao processual, pois seus interes­ses sao patrimoniais e a prova a ser produzida, no processo penal, e da cul­pabilidade ou da inocencia do reu. Ademais, e 0 juiz presidente quem deve­ra. dividir 0 tempo entre 0 Ministerio Publico e 0 assistente da acusa<;ao, nostermos do art. 477, § lQ, do CPP.

2 Em MONTERO AROCA, Juan e GOMEZ COLOMER, Juan-Luis (coordenadores). Comentariosa la Ley del Jurado. Pamplona: Aranzadi, 1999, pp. 54 e 55.

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Ainda, coerente com a linha politica e ideol6gica com as outras duasleis (provas e procedimentos), a lei do Tribunal do Juri manteve a inspira,aoinquisitorial, estampada c1aramente no art. 417 do CPP, ao permitir que 0

julgador, explicitamente, exer,a a fun,ao institucional do MinisterioPublico, ofendendo 0 art. 129,1, da CF. Edo Ministerio Publico a fun,ao deacusar, de exercer, privativamente, a a,ao processual penal publica. a adita­mento e ato voluntario do acusador e ao magistrado e vedado exercer as fun­,6es da autoridade policial ou do Ministerio Publico, bern como adiantar seuveredicto. a Estado-acusa,ao I' institucionalmente representado pelo Minis­terio PUblico. Porranto, essa nova disposic;ao nao encontra amparo constitu­cional e nao esta no mesmo direcionamento da nova reda,ao do art. 384 doCPP (eventual erro na escolha da profissao nao justifica 0 exercicio ideol6­gico de outra atividade).3 Mesmo 0 reconhecimento de nova defini,ao juri­dica dos fatas, ex officio, quando desta resultar a possibilidade de aplica,aode pena mais grave, soterra a garantia da plenitude de defesa no Tribunal doJuri. a reu defende-se somente dos fatas? Tenho que nao, pois a imputa,aoI' fatica e juridica. Prec1usa a decisao de pronuncia, 0 art. 421, § 1Q

, do CPPha de restringir-se it mera ciencia do Ministerio Publico acerca da novasitua,ao processual.

2. A fase preliminar

Diante do oferecimento da denuncia ou da queixa-crime subsidiaria, 0

magistrado possui as seguintes alternativas: receber ou rejeitar (art. 395 doCPP) a pe,a acusat6ria. Porem, no que tange aos delitos conexos, devedobservar 0 disposto no art. 60, padgrafo unico, da Lei 9.099/95 e 0 art. 20 daLei 10259/01, pois quando estes forem infra,6es de menor potencial ofensi­vo, antes de ser recebida a pe,a acusat6ria, em rela,ao a eles deved ser ten­tada a composi,ao civil e a transa,ao penal, por expressa disposi,ao legal (Lei11.313/06). Com 0 seu recebimento, 0 reu I' citado para contestar (mandado,hora certa ou edital), no prazo de dez dias, os quais se contam a partir da efe­tiva ciencia da acusa,ao. A defensoria publica possui 0 prazo em dobro (art.5Q

, § 5Q, da Lei 1.060/50), aplicando-se essa possibilidade tambem ao defen­

sor dativo nomeado pelo juiz, pois 0 mesmo, naquele processo, exerce 0

mesmo munus do defensor publico.4

3 Vide cap. IV, item 1, acerca da emendatio e mutatio libel];4 Vide Cap. II, item 3.

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Reformas (?) do Processo Penal:ConsideralYoes Criticas

o conteudo da defesa tern dimens6es diferenciadas das oferecidas norito comum, pois 0 pedido da acusa<;ao, nos processos de competencia doTribunal do Juri era para que a reu Fosse pronunciado, submetido a julga­menta pelos jurados. Com a retirada do libelo (anteriormente era nessa pe~a

em que a Ministerio Publico pedia aos jurados que condenassem a reu) apedido de condena~ao hi de ser feito no plenirio do Tribunal do Juri, na pri­meira fase dos debates, de modo a delimitar a acusa~ao (0 que consta na pro­nuncia e as agravantes). Portanto, nao e necessario que conste na denunciaa pedido de condena~ao, pais este e dirigido ao magistrado e tern par objeti­vo primordial, a pronuncia. Trata~se de mera irregularidade se constar apedido da denuncia a pronuncia do acusado e que, ao final seja a reu conde­nado pelos jurados. 0 pedido da acusa~ao e a pronuncia e a estrategia defen­siva, Dum primeiro momento, dirige-se ao afastamento desta ou a diminui~

<;ao de sua abrangencia, ou seja, a impronuncia, absolvi<;ao sumaria ou a des­classifica~ao. Alem das defesas diretas, no prazo de resposta podem ser adu­zidas as exce<;6es e as preliminares, nos moldes dos ritos comuns. As partespoderao arrolar ate oiro testemunhas. A regra e a intima~ao destas. Somentequando a defesa declarar que as testemunhas comparecerao independente­mente de intima~ao e que esta e dispensada. Faz-se mister uma declara~ao

expressa da desnecessidade da intima~ao (arts. 406 a 407 do CPP).A resposta e obrigat6ria, em razao da garantia da plenitude de defesa (art.

5Q, XXXVIII, "a", CF) e par expressa disposi~ao legal (art. 408 do CPP).

Portanto, quando a reu nao constituir advogado au declinar nao possuir condi­~6es de pagar defensor, e obrigat6ria a designa~ao de urn advogado ao acusado.

o oferecimento das testemunhas pela defesa dos reus pobres que naoconstituirem defensores e que nao mantiverem contato com os nomeadosficara prejudicado nessa fase processual. Por isso, este prazo para arrolar tes­temunhas nao pode ser entendido como preclusivo, em face da plenitude dedefesa preconizada pela Constitui~ao Federal.

Quando forem alegadas preliminares au forem juntados documentos,hi de ser garantido a contradit6rio aacusa~ao (art. 409 do CPP). Ap6s, numprazo de 10 dias (prazo para a juiz), a magistrado decidiri acerca das preli­minares, das diligencias e designa~ao de audiencia (especie de saneador nodizer de Aramis Nassif).5 Nao tern aplica~ao a art. 397 do CPP (absolvi~ao

5 No dia 12 de julho de 2008, nas dependencias da Escola da Magistratura do Rio Grande do Sui,realizou-se urn debate aberto ao publico, com durat;ao de mais de cinco horas, com a present;a demagistrados, promotores, defensores publicos, advogados, professores, antores de obras a serempublicadas, e estudantcs, conduzido pelo Des. Aramis Nassif, ocasiao em que foram discutidas as

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sumaria nos demais ritos processuais), pois 0 processo do Juri possui urnmomento especial para analise das causas de absolvi~ao sumaria (an. 415 doCPP), salvo a declara~ao da extin~ao da punibilidade, a qual podera ser pro­clamada em qualquer fase processual. 0 prazo de 10 dias nao e 0 prazo paraa realiza~ao da audiencia, pois ha necessidade de intima~ao das testemunhase de organiza~ao das pautas das audiencias, circunstancias que tomamimpraticavel a realiza~ao da audiencia em dez dias.

Na audiencia, pela ordem, sera ouvida a viti rna (se houver) e, ap6s,serao inquiridas as testemunhas arroladas pela acusa~ao e as arroladas peladefesa. Os esclarecimentos dos peritos, as acarea~oes, os reconhecimentos,bern como as testemunhas residentes em outra Comarca nao seguem estaordem. Porem, 0 interrogat6rio do reu e 0 ultimo ato da instru~ao. Aseguir, deverao ocorrer os debates e nao 0 ditado, como vern ocorrendo napraxis forense. Aplicam-se as disposi~oes do anigo 201 do CPP, com areda~ao dada pela I.ei 11.690/08, no que tange ao ofendido (quando possi­ve!, pois se tratam de crimes dolosos contra a vida, tentados e consumadose dos conexos).6 0 ofendido que nao comparecer sera conduzido, segundoo art. 201, paragrafo IQ, do CPP. Entretanto, nao presta compromisso pornao ser testemunha e nao estar obrigado a falar, motivo por que einecua asua condu~ao. Tambem no que tange as testemunhas, aplica-se 0 que foidito no item 3.8, do cap. 1 (ans. 210 e 211 do CPP, com a reda~ao dada pelaLei 11.690/08), pois 0 art. 411 do CPP (reda~ao dada pela Lei 11.689/08)nada dispoe sobre a metodologia das perguntas, incidindo, entao, 0 dispos­to aos ritos comuns (art. 394, § 22 , do CPP). Ponanto, as perguntas seraofeitas pelas panes, diretamente as testemunhas, inquirindo, primeiramen­te, a pane que arrolou a testemunha. Ap6s as perguntas da pane contraria,o juiz podera, segundo 0 CPP, subsidiariamente, completar a inquiri~ao,

nos pontos nao esclarecidos.7Isso para os que entendem que 0 juiz continua tendo atividade de per­

guntar ao ofendido e as testemunhas. Tambem tern aplica~ao ao processo doTribunal do Juri, nesta fase, 0 disposto no an. 217 do CPP (reda~aodada pelaLei 11.690/08) acerca da excepcionalidade da retirada do reu da sala deaudiencias. A aplica~ao subsidiiria decorre do disposto no an. 394, paragra­fo 2Q

, do CPP, com a reda~ao dada pela Lei 11.719/08. 0 interrogat6rio do

principais alteral;0es no processo do Tribunal do Juri. Na ocasiao, Nassif se referiu adecisao doart. 410 do CPP, como uma especie de "saneador".

6 Vide cap. I, item 3.7.7 Vide cap. I, itens 3.4 e 3.8.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera<;6es Criticas

acusado segue 0 disposto nos arts. 185 a 196 do CPP, com observancia dasimportantes altera~6es introduzidas pe1a Lei 10.792/2003, com destaque aprevia entrevista do acusado com seu defensor (art. 185, § 2', do CPP), aciencia do direito ao silencio (art. 186 do CPP), com a veda~ao constitucio­nal da aplica~ao do art. 198 do CPP, bern como a possibi1idade de as partesrequererem esclarecimentos ao acusado, atraves do juiz (art. 188 do CPP).

Segundo 0 art. 411, paragrafo 2', do CPP, a audiencia e una (esfera doideal, aproximativa da perfei~ao). A praxis forense, em todos os cantos dessaRepublica, demonstra nao ser a regra a possibi1idade de oitiva do ofendido ea inquiri~ao de todas as testemunhas, num unico ato. A impossibilidade derealiza~ao da audiencia una e mera irregularidade, desde que motivada(ausencia de uma testemunha arrolada pela acusac;ao, sem concordancia coma inversao da ordem, testemunha nao localizada, v.g.). Evidente que ocorre­rao adiamentos de audiencias (alias isso e a regra no processo penal) e difi­cilmente havera. condic;6es de 0 magistrado motivar que nao e necessaria aprodu~ao da prova faltante (art. 411, § 7', do CPP). Como podera 0 juiz ava­liar ser a prova irrelevante, impertinente ou protelat6ria? Ressalvados algunscasos t6picos, essa avalia~ao, prima facie, antes da produ~ao da prova, resul­ta impossivel de ser feita (art. 411, § 2', CPP). Por isso, a nao-realiza~ao daaudiencia, numa unica data, emera irregularidade e devera atender as pecu­liaridades de cada Comarca e de cada unidade processante.

Nao comparecendo todas as testemunhas, serao inquiridas as queestiverem presentes, mas devera ser obedecida a ardem na inquiric;ao emrela~ao a todas as testemunhas arroladas, em razao da garantia da pleni­tude da defesa e nao na ordem das que comparecerem. Por se tratar deregra que podera viciar a plenitude da defesa, sua interpreta~aonao com­porta amplia~6es (art. 411, § 8', do CPP) e nao podera contrariar aConstitui~ao Federal.

o Ministerio Publico podera aditar a denuncia, nos termos dos arts. 411,paragrafo 3' e 384 do CPP (reda~ao dada pela Lei 11.719/08) espontaneamen­te, sem provocac;ao jurisdicianal, sob pena de ofensa ao principio acusatorio,para incluir elementa ou circunstancia da infrac;ao nao cantidos na denuncia,nao podendo 0 magistrado dar defini~ao juridica diversa da constante na ini­cial, em razao da garantia da plenitude de defesa no Tribunal do Juri.8

As alegac;oes finais sao oferecidas na audiencia, oralmente, por vinteminutos, prorrogaveis por mais dez. 0 tempo do assistente da acusa~ao e

8 Vide cap. IV, item 1, acerca da emendatio e mutatio libelli.

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de dez minutos, metade do tempo destinado ao Ministerio Publico, comdevolu~ao de iguais unidades temporais adefesa. Porem, a lei faz referen­cia aos debates e nao ao ditado. Portanto, apos a acusa~ao e a defesa teremfeito as suas considera~oes, a magistrada consigna a resumo do que foisustentado pelas partes. E a suficiente. a juiz que colheu as debates deve­ra ser a mesmo a proferir a decisao, em razao da identidade fisica adotadona reforma (art. 399, § 2Q

, do CPP). Isso nao se aplica na hipotese de subs­tituic;ao dos debates por memoriais, circunstancia que nao viciara 0 atoprocessuaL Emera irregularidade a ser justificada pelas circunstiincias decada situa~ao processuaL

a prazo estabelecido na lei (art. 412 do CPP) ao encerramento dessafase processual e de 90 dias. Quando a reu nao responder no prazo dos 10dias sera nomeada a defensoria publica, com prazo em dobra, mais 20 diaspara oferecer a resposta. So na resposta ja terao transcorrido mais de 30 dias,sem contar 0 tempo despendido nas entranhas burocraticas processuais. as90 dias tern aplica~ao aos reus presos, com a intuito de ser examinado even­tual constrangimento ilegal pelo excesso de prazo.

3. Decis6es do juiz presidente

As decisoes de maior cunho decis6rio, nesta primeira fase do processodo Tribunal do Juri, exceto as decisoes acerca da liberdade e da prisao, sao apranuncia, a desc1assifica~ao, a impranuncia e a absolvi~ao sumaria.

Demonstradas a existencia do crime doloso contra a vida e a presen­c;a de indicios suficientes da autoria ou da participac;ao, 0 acusado serapronunciado para que seja submetido a julgamento pelos jurados (art. 414do CPP). Qual a extensao da suficiencia dos indicios da autoria au da par­ticipa~ao? as elementos colhidos na fase inquisitorial servem para emba­sar a juizo de suficiencia? A carga de positividade desta decisao interlocu­toria ha de ser maior daquela exigivel ao recebimento da denuncia. Tantono recebimento da denuncia, quanto na pronuncia, nao ha emissao de urnjuizo de certeza, pois os juizes naturais para emitir 0 veredicto de absolvi­~ao ou de condena~ao sao os jurados. No ato de recebimento da denunciaau da queixa-crime ha urn juizo de possibilidade de ser a acusado a seuautor, em razao dos elementos colhidos na fase inquisitorial au na ausen­cia de contradit6rio.

Apos 0 recebimento da acusa~ao, e praduzida a prava (contraditoriojudicial). Portanto, as elementos colhidos na fas. anterior ja cumpriram a

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sua fun,ao. 9 A partir dai, sao os elementos colhidos no contradit6rio judi­cial que legitimam, constitucionalmente, a sua utilizat;ao para pronunciar 0

acusado. Estamos diante de urn provimento jurisdicional de outra naturezae com outra finalidade, com efeitos mais negativos dos irradiados pelo rece­bimento da demincia. Por isso, nao basta 0 mero juizo de possibilidade, mashi de ser exigido urn jUlzo de probabilidade de autoria (aproxima,ao daconvic~ao condenat6ria do juiz togado; se urn juizo tecnico absolveria 0 reu,nao tern lugar a promincia).10 Este jUlzo de probabilidade hi de ser busca­do na confronta,ao dos elementos positivos e negativos produzidos no con­tradit6rio judicial. A preponderiincia dos pontos positivos de autoria, sobreos negativos desta, encaminha validamente a pronuncia, ou seja, 0 julga­mento do acusado pelos jurados. 0 mesmo se aplica aos demais elementosda promincia: circunstancias qualificadoras e causas especiais de aumentoda pena. Isso e que fomece a aparencia de probabilidade acusat6ria comentidade suficiente ao julgamento dos jUlzes leigos. ll

Justamente por serem leigos e de ser exigido maior rigor nesse filtroprocessual, pois, a partir daqui, prepondera a persuasao sobre a exterioriza­,ao da convic,ao tecnica probat6ria. A linguagem dessa decisao, bern comodas posteriores que enviam 0 reu a julgamento pelos jurados, deve restringir­se aos limites de sua fun,ao de enuncia,ao da probabilidade, tambem no que

9 Segundo LOPES Jr, Amy, Sistemas de Invcstigarao Preliminar no Proccsso Penal. Rio de Janeiro;Lumen Juris, 2005, p. 130, "as atos praticados na instrul;iio preliminar esgotam sua cficacia pro­bat6ria com a admissao da acusal;ao, isto e, servem para justificar medidas cautelares C outras res­tril;oes adotadas no cursu da fase pre-processual e para justificar 0 processo au 0 niio-processo.Nao podem ser valoradas na sentcnl;a. Como se ve, a efica.cia probatoria mantern uma intima rela­l;ao com 0 objeto e 0 nivel de cognil;iio, de modo que, na instrul;iio plemiria, a sentenl;a toma parbase os elementos obtidos na pre-processual (pois a fase processual eurn mero controle formal).Por OUtrO lado, na instrul;iio preliminar sumaria, a valoral;aO esgota-se com a admissao da acusa­l;ao". Segundo TOVO, Paulo Claudio. "Democratizal;ao do inquerito policial", em Estudos deDireito Proccssual Penal, Vol. II, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, pp. 201 e ss.), "asprovas repetiveis ou renovaveis, enquanto inquisitoriais, tern valor meramente informativo - oschamados atos de investigal;ao - nao podendo servir de base ou sequer apoiar subsidiariamente 0

veredicto condenatorio, mas nada impede que sirvam de alicerce ao veredicto absolutorio".10 E inadmissivel, em urn processo penal constitucionalmente comprometido, urn julgamcnto feito

com suporte em elementos que nao passaram pelo contraditorio, pois nao sao provas, mormentenos casos em que 0 veredicto decorre da intima conviCl;ao, sem fundamental;ao. Manrido 0 siste­ma da intima convicl;ao, este ha de ser fundado em provas, em elementos obtidos no contradito­rio. Para atingir tal finalidade, tudo 0 que nao seja prova deveria ser retirado dos autos, evitando­se a contaminal;ao dos veredictos (e sao soberanos, embora relativos) e sua propria formal;aO emelementos inquisitoriais.

11 Segundo CALAMANDREL Piero. Verdad y Verosimilitlld en el Proceso Civil. Estudios sobre elProceso Civil. Buenos Aires: EJEA, 1962, pp. 325 e 326, "possivel e0 que pode ser verdadeiro, veros­simi! e0 que tern aparencia de verdadeiro e provavel e 0 que se pode provar como verdadeiro".

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tange as causas espcciais de aumento e das qualificadoras (haveria reconhe­cimento por urn juiz togado). Ademais, estabelece-se uma correla~aoentre aimputac;ao maxima constante na pretensao acusat6ria enos eventuais adita­mentos posteriores e a decisao de promincia, circunstancia que potencializaa necessidade de enuncia~6esclaras e objetivas, de modo a garantir a pleni­tude defensiva no decorrer da primeira fase do processo (denuncia), no ple­nario de julgamento e na vota~ao dos quesitos (pronuncia).

Nao se convencendo 0 magistrado da existencia do fato ou da presen~a

de indicios suficientes da autoria ou de participa~ao,a decisao sera de impro­nuncia. Porem, quando provada a inexistencia do fato ou que 0 imputado naotenha sido autor ou dela tenha participado, a decisao e de absolvi~ao sumaria(art. 415, I e II, do CPP). Somente com 0 surgimento de prova nova (nao novaavalia~ao da prova existente) 0 Ministerio PUblico podera oferecer outradenuncia (art. 414 do CPP). Os delitos conexos, na hipatese de pronuncia,seguem atados ao delito prevalente, por for~a processual, embora passempelos mesmos filtros do crime doloso contra a vida, pois 0 juizo de probabili­dade tambem incide sobre eles, e completo e nao parcial (sa os crimes preva­lentes - dolosos contra a vida). Ha necessidade de fundamenta~ao acerca doenvio desses a julgamento pelos jurados. Por outro lado, impronunciado 0

reu, 0 processo, no que se refere a eles, sera remetido ao juizo competente.Viciada e a decisao de pronuncia que subtrai dos juizes leigos a afirma­

~ao categarica da autoria e da existencia do fato, das qualificadoras e das cau­sas especiais de aumento de pena. As agravantes, as causas especiais de dimi­nui~ao de pena e as atenuantes nao sao objeto da pronuncia. Para seremreconhecidas, as agravantes deverao passar pelo crivo da defesa tecnica epessoal (plenitude de defesa), motivo por que deverao estar descritas nadenuncia e serem ratificadas em plenario. Entretanto, 0 afastamento dasqualificadoras na decisao da pronuncia impede a sustenta~ao destas comoagravantes, por ja terem recebido urn juizo negativo. As causas especiais dediminuic;ao de pena e as atenuantes deverao ser sustentadas na primeira fasedos debates, possibilitando 0 contraditario da acusa~ao.

Na decisao de pronuncia, 0 magistrado devera manifestar-se acerca daliberdade e da prisao do acusado, de forma motivada (circunstancias faticase sua adequa~ao a uma das hipateses da prisao preventiva), nao sendo sufi­ciente enunciar a continuayao dos motivos que decretaram a segregac;aoanterior (art. 93, IX, CF), no que tange a prisao processual, ou acerca deoutras medidas restritivas da liberdade, anteriormente decretadas ou a seremdecretadas (prisao domiciliar, v.g.). A decreta~ao da prisao cautelar ha deobservar a existencia de pressupostos minimos - fumus comissi delicti,

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representados pelos indicios suficientes de autoria e pela existencia do fato,bern como pelos requisitos integrantes do pericu/um libertatis, ou seja, dapresen~a de elementos concretos afinnativos de que a liberdade do proces­sado ameace 0 regular desenvolvimento e julgamento do processo ou da apli­ca~ao da lei penal.

o acusado podera ser absolvido nesta fase processual quando: a) resul­tar demonstrada a inexistencia do fato; b) estiver provado nao ser 0 reu 0

autor ou participe do fato; c) 0 fato nao constituir infra~ao criminal; d) esti­ver demonstrada uma causa de isen<;ao de pena ou exclusao de crime (art.415). Para que 0 reu seja absolvido sumariamente, exige-se prova firme esegura, isto e, mais que possibilidades e probabilidades, pois a absolvi~ao

sumaria subtrai 0 julgamento dos juizes naturais (jurados). Esse mesmoraciocinio aplica-se il desclassifica~ao (art. 419 do CPP). Quando, juntamen­te com a inimputabilidade do art. 26, caput, do CP, for sustentada outra tesedefensiva, 0 reu nao sera absolvido sumariamente, pois isso implicaria umarestri~ao illiberdade do imputado, com a aplica~ao da medida de seguran­<;a. Incumbe aos jurados, juizes naturais, decidirem se acatam a outra tese, aqual podera absolver 0 acusado, sem qualquer restri~ao (art. 415, paragrafounico, do CPP).

Ao encerrar a fase preliminar, 0 juiz presidente do Tribunal do juripodera tomar quatro decisoes: pronunciar, impronunciar, absolver sumaria­mente e desclassificar a infra~ao para outra, alheia il competencia doTribunal do juri. As decisoes de impronuncia e de absolvi~ao sumaria saodecisoes definitivas, pois encerram 0 processo, motivo pelo qual, cabfvel e aimpugna~ao mediante apela~ao. Impronunciado 0 acusado, faz-se necessarioa dedu<;ao de outra pretensao acusat6ria, em outro processo, acerca dos mes­mos fatos, sempre que for modificada a situa~ao fatica probatoria existenteno momento do julgamento (art. 414, paragrafo unico, do CPP). Por outrolado, a absolvi~ao sumaria no rito do Tribunal do juri veda uma nova acusa­<;ao pelos mesmos fatos. 0 recurso previsto anteriormente era 0 recurso emsentido estrito, por for~a de sua previsao especifica no art. 58 I, IV e VI, doCPP, combinado com 0 art. 593, II, todos do CPP. As decisoes de pronunciae de desclassifica~ao apenas encerram uma fase processual (interlocutoriasmistas), motivo porque continuam sendo impugnaveis por recurso em senti­do estrito, com fundamento no art. 581, II e IV, do CPP. Quando a decisaopossui conteudo misto (pronuncia por urn delito e absolvi~ao sumaria poroutro), aplica-se 0 art. 593, § 4Q

, do CPP, ou seja, quando cabivel a apela~ao,

este e 0 remedio impugnativo a ser considerado, mesmo que de parte dadecisao recorrida seja possivel interpor outro recurso.

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As intima,oes da pronuncia serao feitas ao reu e as partes (art. 420 doCPP). Antes de a acusado salta ser intimado por edital, devera ser tentada aintima<;ao por mandado, em todos os endere<;os fomecidos nos autos e nos queforem apurados nas necessarias diligencias a sua localiza,ao. a reu que presotiver fugido do estabelecimento prisional podera ser intimado por edital, depoisde realizadas as diligencias para ser citado, em face da garantia da ampla defe­sa. a reu que estiver recolhido em qualquer estabelecimento prisional, inde­pendentemente do regime, devera ser intimado pessoalmente.

4. Os jurados

Observa-se que as que sentam nas cadeiras de jurados sao as "homensbans", heran,a da sociedade escravocrata (proprietarios e as que atingiamuma determinada renda), para julgar as "homens maus", as que sentam nobanco dos reus, situa<;ao a ser reparada no alistamento dos jurados, comobservancia do art. 425, § 2", do CPP. A implementa,ao dessa regra juridi­ca dependera da separa,ao desse cordao umbilical hist6rico. Nao bastarequisitar as autoridades locais, as associa<;6es ou institui<;6es a indica<;aodo nome de pessoas para serem jurados. Enecessario manter urn equilibriarepresentativo de todos esses segmentos sociais (manter a representativida­de da desigualdade social e das diferen,as) na uma geral (que COntem anome de todos as jurados da Comarca au do juizado) au na lista geral.Tambem faz-se necessaria zelar pela transparencia e publicidade do sorteiodos jurados que integrarao a lista geral (art. 426, § 3', do CPP), as quais ser­virao na reuniao peri6dica au extraordinaria (art. 432 do CPP). Igual regraaplica-se aos integrantes do Conselho de Senten,a (arts. 467 a 469 do CPP).Basta ter a jurado sido sorteado uma vez para compor a Conselho deSenten,a (sete jurados), em uma das sessoes do ana para que seja excluidoda lista geral, sob pena de profissionaliza,ao dessa atividade (art. 426, § 4',do CPP). A exclusao da lista geral do ana seguinte, do jurado que tenhafeito parte do Conselho de Senten,a, cumpre a fun,ao de evitar a profissio­naliza<;ao e as possiveis contamina<;6es pelas constantes presen<;as nos jul­gamentos (proximidades com as partes).

A competencia natural para apreciar a causa somente podera ser sub­traida dos Juizes da Terra, em situa<;6es excepcionais, como ocorre com 0

desaforamento, a qual podera ser concedido in limine (arts. 427 e 428 doCPP). a excesso de servi,o nao tern potencialidade suficiente para afastar ajulgamento pelos juizes de fato da Comarca, pais as reus presos terao prefe-

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Reformas (?) do Processo Penal:Considera~6es Crfticas

rencia de pauta (art. 429 do CPP) e 0 tempo flui a favor da plenitude de defe­sa (art. 5', XXXVIII, "a", CF), a qual tambem sera atingida quando for admi­tida a legitimidade do assistente da acusa,ao para requerer 0 desaforamento(art. 427 do CPP).

Da lista geral serao sorteados (e nao escolhidos) 25 jurados para cadareuniao (conjunto de sessoes, de julgamento do mes), cujos nomes seraocolocados na uma da reuniao, da qual, a cada sessao do respectivo mes (jul­gamento de cada reu), serao sorteados os 7 jurados (Conselho de Senten,a).A desobediencia ao sorteio e cOnvOCal;aO do numero maximo limitado de 25jurados ha de receber a carga interpretativa da plenitude de defesa (0 deno­minado estoura da uma podera ser benefico adefesa). Em razao das ausen­cias de jurados, da instala,ao da sessao com no minimo IS jurados, da exclu­sao dos que forem recusados por qualquer das partes, I' insuficiente 0 sorteiode somente 25 jurados para cada reuniao. As convoca,oes dos jurados pode­rao ser realizadas por qualquer meio habil de comunica,ao (e-mail, correiaou mandado). Nao houve modifica,ao do art. 581, XIV, do CPP, de sorte quepermanece a possibilidade de utiliza,ao do recurso em sentido estrita paraimpugnar a decisao que incluiu ou excluiu algum jurado da !ista definitiva,pub!icada no mes de novembro (art. 426, § I', do CPP). Permanece 0 reme­dio juridico da reclama,ao acerca de jurados constantes na lista geral a serpublicada no mes de outubra (art. 426, caput e § I', do CPP).

Em razao da importi\ncia e da responsabilidade do ato de julgar urnsemelhante (servi,o publico relevante, segundo art. 439 do CPP), e por deli­tos que envolvem a vida, cujo resultado condenatorio podera resultar emvarias dezenas de anos de carcere, sem fundamenta,ao, a participa,ao docidadao no Corpo de Jurados deveria ser facultativa e nao obrigat6ria.Estamos obrigando urn cidadao a julgar urn semelhante seu e, ainda, se naojustificar a sua ausencia, a receber uma multa de urn a dez salarios minimos(art. 436, § 2', do CPP).

A recusa a integrar a lista de jurados, nos casos especificos do art. 438do CPP, obrigara 0 jurado a prestar servi,o comunitario altemativo (san,aoao condenado por pratica de algum delito ou que aceita a transa,ao penal emtraca de urn pracesso penal), sob pena de suspensao dos direitas politicos,embora temporariamente. Inclusive, 0 jurado que for sorteado e nao compa­recer (evidentemente se for cientificado do sorteio e das sessoes de julga­menta) sera multado. Porem, nao integrara automaticamente 0 ral dos 25sorteados aproxima reuniao. Ainda, poderao ser processados criminalmen­te, desde que forem convocados para a reuniiio (25 jurados), pois estarao adisposi,iio do juiz presidente no inicio de todas as sessoes e niio s6 quando

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Nereu Jose Giacomolli

forem sorteados para integrarem 0 Conselho de Senten<;a (art. 445 do CPP).Diante dessas possibilidades sancionatorias, a considera<;ao como servi<;opublico relevante, a presun<;ao de idoneidade moral, a prisao especial ate 0

julgamento definitivo (art. 439 do CPP), a preferencia em licita<;6es publicas,provimento de cargos e rema<;6es funcionais em igualdade de condi<;6es comos demais (art. 440 do CPP), sao compensa<;6es infimas.

De algumas contamina<;6es a reforma de 2008 tratou no art. 449 doCPP, mas ha outras mais graves. Mantido 0 dorso da ritualistica atual e 0 tra~

tamento do processo como uma res de somenos importancia, incidirao asvariaveis predispostas a condenar ou a absolver. Q].Jem e 0 jurado? 0 plena~

rio do Tribunal do Juri, para os que sao favoraveis a esta institui<;ao, e urnlocal sagrado, de dialeticidade retorica intensa, mas nao e palco para serexercida a vingan<;a privada (nisso todos estao de acordo, defensores ou naoda modalidade atual de Tribunal do Juri).

5. A sessao de julgamento

Ha de ser ressaltado que, apos as intima<;6es da decisao de pronuncia, aspartes serao cientificadas para arrolarem ate cinco testemunhas para presta­rem depoimentos em plemirio. Antes, as testemunhas eram arroladas nolibelo ou na contrariedade, atos processuais extintos em 2008. Nesse mesmoprazo, as partes poderao juntar documentos e solicitar diligencias. Estando 0

processo em ordem para ser pautado, 0 magistrado fad urn relatorio, porescrito, do processo, sem manifestar sua convic<;ao acerca dos fatos ou emi­tir juizo valorativo sobre a prova, na medida em que os juizes naturais sao osjurados. Esse relatorio sera entregue aos jurados (art. 472, § unico, do CPP)e nao substitui 0 libelo. Alias, a pronuncia tambern nao cumpre essa finali~

dade, na medida em que limita a acusa<;ao; nao a afirma categoricamente ese insere na fun<;ao jurisdicional e nao na atividade acusat6ria.

o processo devera estar devidamente preparado para viabilizar 0 julga~

mento pelos jurados. No plenario, na realidade, nao OCOITe somente 0 julga~

mento, mas uma confirma<;ao instrut6ria (leituras e referencias aos depoi­mentos ja prestados, v.g.), renova<;ao desta (rol com as mesmas testemunhasque depuseram na fase anterior, ou complementa<;ao (outras testemunhas,v.g.). Nao ha mais leitura de pe<;as, salvo aquelas referentes as provas (contra~

ditorio) colhidas fora da Comarca, as cautelares, antecipadas ou as nao repe~

tiveis. Entretanto, nada impede que a acusa<;ao e a defesa leiam, durante 0 res~

pectivo tempo destinado aos debates, os documentos constantes nos autos.

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A panir da aplica~iio da nova lei, os julgamentos de n'u solto (foragidoou niio), realizar-se-iio independentemente de sua presen~a, desde que niiofar justificada a ausencia, bastando sua intima~iio regular (an. 457 do CPP),isto e, par mandado ou mediante edital, depois de cumpridas as diligencias asua localiza~iio. Ponanto, podera haver tres intima~6es par edital: da pro­nuncia, acerca da data do julgamento e da senten~a condenat6ria. Entre­tanto, os processos que estiio paralisados e aguardando a intima~iio pessoal dopronunciado (ans. 413 a 415 do CPP, revogados), permaneceriio esperandoa intimac;ao, por dais motivos: a) a regra que autorizou a intimac;ao par edi­tal tambem possui conteudo de direito material, na medida em que 0 acusa­do podeni ser condenado e receber uma pena, havendo impossibilidadeconstitucional da retroatividade in pejus (an. 5Q

, XL, CF); b) 0 an. 2° do CPPressalva a validade dos atos processuais praticados sob a vigencia da lei ante­rior, emitindo sua eficacia como regra de garantia,12

As panes, para garantirem 0 depoimento da testemunha em plenariodeveriio declarar a imprescindibilidade da presen~a desta no dia da sessiio dejulgamento e indicarem a sua localiza~iio. Sem esta manifesta~iio de vontadeda parte e sem a sua Iocalizac;ao no enderec;o fornecido, a sessao nao seraadiada. Para que haja condu~iio ou adiamento da sessiio, a!em desses doisrequisitos (imprescindibilidade e localiza~iio no endere~o fornecido), a tes­temunha deve residir na Comarca, pois a referenda eda intimac;ao par man­dado e niio par cana precat6ria. Ademais, 0 dever da testemunha e 0 dedepor na Comarca e niio fora desta (an. 461 do CPP).

A sessiio sera instalada com a presen~a de urn numero minimo de 15jurados. Portanto, na urna da sessao deverao constar, pelo menos, os nomesde 15 jurados. Desta urna, depois de instalada a sessiio, lidas as causas exclu­dentes da panicipa~iio do jurado naquele processo, tambern seriio retiradosos nomes daqueles que nao paderao servir na respectiva sessao, abservando­se que os nomes dos impedidos (art. 448 do CPP) integram a contagem domirnero minimo e ingressam na urna de sorteio. Ocorre que sendo urn delessorteado (tio, v.g.), seu sobrinho niio podera compar 0 Conselho de Sen­tenc;a. Dos names que perrnanecerem na urna serao sorteados as sete jura­dos, os quais constituiriio 0 Conselho de Senten~a. Durante 0 soneio, 0Ministerio Publico e a defesa poderiio recusar, imotivadamente, tres jurados.Havendo dois au rnais acusados, urn dos defensores podera recusar em nomede todos. Porem, niio ha obrigatoriedade legal para que somente urn dos

12 Vide no cap. IV, item 5, as considera~6es acerca do direito intertemporal.

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defensores recuse. Aqui, 0 norte, mais uma vez, ha de ser 0 da plenitude dadefesa, pois quem vai ser julgado e 0 imputado e a recusa se relaciona a estra~

tegia defensiva (poderao existir defesas antag6nicas, de sorte a desequilibraros debates). A altera~ao diz respeito a cisao do julgamento nas hip6teses emque urn dos defensores aceitava determinado jurado e 0 outro nao. Com areforma, 0 jurado que for recusado pelo Ministerio PUblico ou por qualquerdefensor, nao compora 0 Conselho de Senten~a. Em face das recusas, quan~do restarem menos de sete jurados na urna, ocorrera. a cisao do julgamento,com observancia do an. 469 do CPP, no que tange a ordem de julgamento.

o mimero minima de jurados na uma deveria ser superior a 15, pais sedois defensores e 0 Ministerio PUblico utilizarem as treS recusas imotivadas etiver comparecido 0 mimero minima de jurados, nao se realizara 0 julgamento(somente restariam seis nomes na uma). As recusas motivadas deverao ser apre­sentadas ap6s a leitura das causas impeditivas do Jurado, salvo as do an. 448 doCPP. 0 jurado que for recusado par qualquer das panes nao podera integrar aConselho de Senten~a daquela sessao. Remanesce a possibilidade de cisao dojulgamento, quando nao for possivel formar a conselho de senten~a. Ademais,podera ser aplicado, pelo juiz presidente, a disposto no an. 80 do CPP, de modoa cindir as julgamentos, preenchidos as requisitos do referido dispositivo.

Alem da decisao de pronuncia, das decis6es posteriores a ela, as quaisviabilizaram a acusa~ao, bern como do relat6rio do processo (an. 472, para~

grafo unko, do CPP), poderao ser distribuidas outras pe~as dos autos, sem~pre que mantido a equilibria processual. Esse equilibria ha ser observadotambem quando da elabora~ao do relat6rio pelo juiz presidente.

Pela ordem, no plenario do julgamento sera ouvido a ofendida, seraoinquiridas as testemunhas arroladas pela acusa~ao e as arroladas pela defesa.Diferentemente dos ritos comuns, a rito especial do Tribunal do Juri estabe~Ieee algumas especialidades tambern no que tange a inquiri~ao das testemu~

nhas. Nos ritos comuns e na fase preliminar do processo do juri (an. 411 doCPP), quem primeiro pergunta e a pane que arrolou a respectiva testemu~

nha e 0 juiz pergunta par ultimo, de forma complementar (an. 212 do CPP,com a reda~ao dada pela Lei 11.690108), diretamente a pessoa que estiversendo ouvida. No plenario do Tribunal do Juri, segundo a ritualistica especi~

fica, 0 juiz presidente pergunta por primeiro e ap6s, a pane que arrolou a tes~

temunha. Por ultimo, atraves do juiz togado, as jurados poderao formularperguntas ao ofendida e as testemunhas, na qualidade de juizes naturais dacausa (art. 473 do CPP). Ocorre que nao e 0 juiz togado quem ira julgar aacusado, mas os jurados. Par isso se justificam as perguntas destes ao reu, aoofendido e as testemunhas, mas nao ha justificativa funcional jurisdicional as

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perguntas no juiz presidente no plenario do Tribunal do Juri, em qualquermomento processual, sob pena de assumir a fun,ao das partes e dos jurados.

No plenario poderao ser realizadas acarea,oes, reconhecimentos, escla­recimentos de peritos (devera haver previa requerimento das partes paraviabilizar a intima,ao destes ao plenario) e leitura de pe,as que digam res­peito exclusivamente aos elementos colhidos por carta precat6ria, as provascautelares, antecipadas ou nao repetiveis (art. 473, § 3', do CPP). Esse dispo­sitivo tern nitida rela,ao com a concep,ao inicial que havia, da instru,aointegral da causa perante 0 Conselho de Senten,a. Em razao dessa falta decoerencia global (varios projetos de reforma) e interna (projeto e lei do juri),cabera as partes, no prazo dos debates, fazer a leitura ou transmitir a cienciaaos jurados das pe,as dos autos. A leitura das pe,as se restringe as provascolhidas fora do juizo processante, ou seja, desde que produzidas sob 0 crivodo contradit6rio judicial (art. 155 do CPP).

Ap6s a oitiva do ofendido e a inquiri,ao das testemunhas e da leituradas pe,as, sera interrogado 0 acusado. Segundo a reforma, primeiro pergun­ta 0 juiz togado e ap6s, 0 Ministerio PUblico, 0 assistente da acusa,ao, 0

defensor e, por ultimo, os jurados. Estes ultimos formularao as perguntasatraves do juiz presidente. Aqui, calha a mesma critica acerca das perguntasdo juiz presidente ao ofendido e as testemunhas, pois nao e 0 juiz da causa.

A ordena,ao e 0 tempo dos debates estao regrados nos arts. 476 a 481do CPP. Cabera ao juiz presidente manter a normalidade e regularidade dosdebates, inclusive no que diz respeito ao tempo e aos apartes (art. 497, XII,do CPP). Nao havendo concordancia na divisao deste entre acusadores edefensores (havendo mais de urn acusador ou mais de urn defensor em p1e­nario, para reus diferentes), 0 juiz presidente devera decidir. No caso dadivergencia entre 0 Ministerio Publico e 0 assistente da acusa<;:ao, urn crite­rio razoavel e a utiliza,ao do parametro da divisao do tempo nos debatesorais da fase preliminar, onde ao assistente da acusa,ao podera ser deferida ametade do tempo destinado ao Ministerio PUblico (art. 411, § 6', do CPP).Embora aqui nao se trate de outorga de mais prazo aos debates, mas da uti­liza,ao do mesmo espa,o temporal, os noventa minutos poderao ser dividi­dos de sorte que 0 Ministerio Publico fale durante uma hora e 0 assistente daacusa<;:ao os restantes trinta minutos. Na replica, quarenta minutos aoMinisterio Publico e vinte minutos ao assistente da acusa<;:ao. Havendo maisde urn acusado, os acrescimos deverao ser proporcionais, na forma do art.477, § 2', do CPP. Justifica-se 0 tempo maior ao Ministerio Publico por ser 0

titular processual da a,ao penal (art. 129, I, CF) e dos interesses restritos doassistente da acusa,ao (via de regra, meramente patrimoniais). No que tange

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adefesa, os eriterios sao outros: plenitude de defesa de cada reu, a ser verifi­cada pela complexidade da situa~ao de cada acusado, devidamente motiva­das em circunstancias fiiticas. A fun~ao do juiz pr~sidente nao e de Dlf'ro

expectador da movimenta<;ao dos atores no plemlrio, mas de garantidorconstitucional e das regras processuais, inclusive no que tange ao nivel derespeito das sustenta<;oes orais com os sujeitos processuais.

Nulidade cominada, capaz de desconstituir 0 julgamento, caso nao hajadissolu~ao do Conselho de Senten~a, e a utiliza~ao da decisao de promincia,das decisoes posteriores de admissibilidade da acusa~ao, inclusive de acor­daos de Tribunais, bern como a determina~ao do uso das algemas, comoargumento de autoridade (auctoritas), isto e, para aumentar, expandir (poisauctoritas vern do verbo augere), a argumenta,ao pelo simbolismo de suaexistencia ("na promincia a juiz disse..."; "ttl's desembargadores, experimen­tados, afirrnaram..."; "se nao fosse perigoso, nao estaria algemado... "; "as alge­mas falam por si so... ", v.g.). Porem, a decisao da pronuncia e as posteriores,as quais admitiram a acusa<;ao deverao ser, obrigatoriamente, entregues aosjurados (art. 472, paragrafo unico, do CPP) e 0 acusado podera estar algema­do no plenario. Emais urn argumento aretirada do processo das pronunciasdesconstituidas e da necessidade de limita~ao da motiva~ao da decisao des­constitutiva, de modo a evitar a contamina<;ao dos jurados, com a entrega dascopias e com as referencias que poderao ser feitas no plenario.

Tambem esta vedada, agora por lei ordinaria, a utiliza~ao do sHencio doacusado au a circunstancia de sua ausencia no interrogat6rio, em seu prejui­zoo Mas isso ja era proibido pela Constitui~ao, em razao da presun~ao de ino­cencia (art. 5Q

, LVII, CF) e da previsao expressa no art. 5Q, LXIII, da Carta

Republicana. Em razao da baixa compreensao da supremacia constitucionalna praxis forense, alem desta, ha necessidade de outras ordinariza,oes. Isso ea que ocorre na Law in action.

Foi necessario que a lei ordinaria determinasse a presenc;a de defensorno interrogat6rio do acusado para que garantias constitucionais (art. 50,LV, CF), como a da ampla defesa - defesa pessoal e tecnica - e do devi­do processo legal- presen~a do Ministerio PUblico e defensor - fossemcumpridas.

o Conselho de Senten~a, sob pena de nulidade do julgamento, tambeme de ser dissolvido quando forem utilizados (lidos ou exibidos), no plenario,documentos ou objetos relacionados com os fatos da causa, nao juntados aosautos no prazo de tres dias uteis, antes do julgamento e, dos quais, tenha havi-

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do ciencia as panes. Ponanto, sao tres os requisitos: vincula~ao dos documen­tos e objetos com os fatos aniculados no pracesso; prazo da juntada e cienciaas panes. a paragrafo unico enumera uma serie de documentos e objetos, deforma exemplificativa. Aqui, a decisao ha de guiar-se, essencialmente pelocontradit6rio, com 0 intuito de ser evitada a surpresa as partes com a atuac;aocontraria (necessidade de urn pracesso penal etico). Outras situa~6es faricaspoderao obrigar 0 juiz presidente a dissolver 0 Conselho de Senten~a.

AMm de indagar aos jurados sobre a necessidade de algum esclarecimentoacerca dos debates, os quesitos deverao ser lidos, com explica~ao do significadode cada urn e das consequencias da resposta "sim" e "nito" a cada pergunta.

6. Os quesitos

as quesitos, a panir de 2008, passa a ser a pranuncia e as decis6es pos­teriores de admissibilidade da acusa~ao, pois essas delimitam a esfera deimputa~ao penal (acusa~ao). A instru~ao plenaria (tese propria do reu) e aprimeira fase dos debates (teses defensivas) sao fontes secundarias e restritasdos quesitos. As agravantes nao fazem parte da pronuncia, motivo por quenao integram 0 ral dos quesitos. Emateria de aplica~ao de pena e devem sersustentadas na primeira fase dos debates.13

as criterios noneadores da formula~ao dos quesitos sao: reda~ao emproposi~6esafirmativas, simples, compreensiveis e objetivas (an. 482, para­grafo unico, do CPP). As perguntas serao formuladas de forma separada, emserie, para cada reu. A imputa~ao de mais de urn delito ao acusado importaformula~aode uma serie de perguntas a cada crime (an. 483, § 6Q

, CPP). Pelaordem, os jurados serao questionados sobre a existencia do fato, autoria, exis­tencia ou nao de animus necandi, inclusive a tentativa (desclassificac;ao pro­pria), se "0 jurado absolve 0 acusado", desclassifica~ao impropria (panicipa­~ao dolosamente distinta - an. 29, § 2Q

, do CP), as causas especiais de dimi­nui~ao de pena, as qualificadoras e, por ultimo acerca das causas especiais deaumento da pena. Nao ha quesitos acerca das agravantes e atenuantes.

Negada a existencia do fato (No dia X, por volta das Y horas, no bairroK, nesta cidade, algw'm, com tiros de revolver, produzir em Z as lesoes des­critas no auto de necropsia de fl. 20, que lhe causaram a morte?) 0 reu esta­ra absolvido. Admitida a existencia do fato, mas afastada a autoria, no segun-

13 Vide neste cap., item 7, acerca do reconhecimento das agravantes e atenuantes no momento ciafixa~ao da pena.

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do quesito (0 reu A concorreu para a pratica do fato?), 0 acusado tambemrestani absolvido. a art. 483, II, do CPP determina a quesita~ao da autoriaou da participa~ao, circunstancia que esta a obrigar a descri,ao da modalida­de especifica da conduta no quesito, quando presente mais de uma modali­dade (tiros, pedradas, pauladas, v.g.), mas afastada a pergunta acerca da par­ticipa,ao "de qualquer modo". Somente assim resta fixada a conduta especi­fica de cada acusado. A separa,ao das modalidades de conduta durante asperguntas atende ao criterio do questionamento acerca de fatos, preservan­do a plenitude defensiva (art. 5', XXXVIII, "i', CF) e a situa,ao mais favora­vel ao acusado (inclusive a impugna,ao da decisao). Por ser a pronuncia afonte essencial dos quesitos, esta devera individualizar a conduta do acusa­do, independentemente da existencia de outros imputados.

Admitida a existencia do fato e a autoria, havendo tese defensiva deafastamento do animus necandi, as jurados SeTaO questionados acerca dodolo direto (0 reu quis a morte da vitima?) e eventual (0 reu assumiu 0

risco de produzir a morte da vitima?), antes do terceiro quesito (0 juradoabsolve 0 acusado?), pois a competencia constitucional dos jurados e parajulgar crimes dolosos contra a vida. Com 0 afastamento do dolo, as juradosafastam a sua competencia para continuarem votando as demais quesitos,salvo se houver outro crime doloso contra a vida, imputado a este acusadoou a outro reu, na mesma sessao, com relac;ao aos quais os jurados seguiraovotando, retomando-se os demais crimes residuais, se for 0 caso, em razaoda conexao ou da continencia.

a quesito da tentativa (Assim agindo, 0 reu tentou matar a vitima?)tambem e feito antes do terceiro quesito, pois, dependendo da resposta(maioria "nao"), estara afastada a competencia do Tribunal do Juri.Entendendo os jurados que 0 reu tentou matar a vitima, em caso de conde­na~ao, pais ha necessidade de vota~ao da tese defensiva, ja estara reconheci­da a causa especial de diminui~ao da pena.

Mastado a dolo au a existencia da tentativa, a juiz presidente poderaabsolver a acusado, firmar a tipicidade do delito residual e aplicar as institutosda Lei 9.099/95 (vide Sumula 337 do STJ), nos termos do art. 492, §§ 10 e 29 ,

do CPP, au condenar a acusado, pais as jurados apenas afirmaram urn juizonegativo acerca da tipicidade. Na desclassifica,ao propria, nao havendo outrocrime da competencia do Tribunal do Juri para ser julgado na mesma sessao, acompetencia no que tange aos conexos tambem passa ao juiz presidente.

Ha de ser observado que neste momenta, apos 0 segundo quesito, pode­ra haver necessidade de ser questionada a tese defensiva desclassificatoriapara outro delito de competencia do Tribunal do Jtiri (art. 483, § 5', do CPP),

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ou seja, de homiddio para infantiddio (0 fa to foi praticado sob influencia doestado puerperal, durante ou logo ap6s 0 parto?), ou de crime consumadopara tentado (Assim agindo, 0 reu somente tentou matar a vitima?), de homi­cidio para auxilio avitima ao suicidio (0 reu apenas prestou auxilio a vitimapara que esta se suicidasse?), par exemplo.

Mantido 0 crime doloso contra a vida, 0 terceiro quesito aglutina asteses defensivas na pergunta legalmente estabelecida no art. 483, § 2Q

, doCPP (0 jurado absolve 0 acusado?). Respondido que sim, por maiaria, 0

acusado estara. absolvido e os jurados votarao os delitos conexos, pois firma­ram a competencia. 0 quesito e unico, por determina~aolegal, pois 0 juizoleigo e de inocente ou de culpado, independentemente dos possiveis refle­xos na esfera civeL Ademais, os jurados sao questionados, essencialmente,sobre materia fatica. Preponderam, como ja afirmado, a compreensao, asimplicidade e a objetividade na formula~aodos quesitos. Admitir urn que­sito para cada tese sustentada (legitima defesa propria e inexigibilidade deconduta diversa, v.g.) contrariaria a garantia da plenitude de defesa (art. 5",XXXVIII, "a", CF), na medida em que dois jurados podem entender presen­te uma das teses e outros tres uma segunda tese.

Tendo os jurados respondido que nao ao quesito "0 jurado absolve 0

acusado?", seguem-se os quesitos acerca das causas especiais de diminui~ao

de pena, alegadas pela defesa em plenario, inclusive a hipotese da semi­impUlabilidade (art. 483, IV, CPP), das qualificadaras nao prejudicadas peloreeanhecimento de alguma causa especial de diminui~ao de pena incompa­rivel com a qualificac;ao de carMer subjetivo e das causas especiais de aumen­to da pena, desde que reconhecidas nas decis6es que enviaram 0 reu a julga­mento pelos jurados (art. 483, V, CPP).

Quando a inimputabilidade do art. 26, caput, do CP for a unica tesedefensiva, oearrera a absolvi~ao sumaria (art. 415, paragrafo unico, do CPP).Porem, quando forem sustentadas outras teses e ocorrer a pronuncia do reu,se os jurados responderem que absolvem 0 acusado, 0 juiz presidente 0 decla­ra absolvido, sem aplica~ao da medida de seguran~a, em razao da plenitudede defesa. Porem, quando os jurados nao acolherem 0 quesito "0 juradoabsolve 0 acusado?", cabe ao magistrado aplicar a medida de seguran~a

(situa,c,. Ja fase da pronuncia, quando a inimputabilidade de caput do art.26 do CP e a unica tese). A semi-imputabilidade e tese defensiva causadorada diminui~ao da pena.

Anteriormente, em face do fracionamento das perguntas aos jurados,quando eram respondidos que "sim" aos primeiros quesitos da excludente deilicitude, mas negado 0 usa moderado dos meios necessarios, os jurados eram

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questionados acerca da modalidade do excesso. Q].J.ando sustentada a tesesubsidiaria do excesso culposo, como nao compona integra~aona absolvi~ao

(0 jurado absolve 0 acusado?), em face da plenitude de defesa, devera haverquestionamento acerca dessa tese secundaria (0 reu excedeu, culposamente,os limites da legitima defesa?),14 logo ap6s 0 denominado terceiro quesito, 0

qual afastou a absolvi~ao. A competencia dos jurados esta finnada, motivopor que ha vota~ao dos quesitos compativeis com a resposta dada a este que­sito pelos jurados.

Q].Iando for sustentada a tese da desclassifica~ao impr6pria, havendo tesedefensiva de merito e negado 0 terceiro quesito. 0 reu estara condenado.Entio, surge a ocasiao ao quesito especifico acerca dessa outra tese, nos termosdo an. 483, § 4Q

, in fine, do cpp (0 reu quis participar de crime menos grave,qual seja, lesiio corporal?).15 Independentemente da resposta, a vota~ao pros­segue porque os jurados ja finnaram a competencia quando afastaram a teseprincipal da defesa e porque emitiram urn juizo positivo acerca da tipicidade.

Na vota~ao dos quesitos devera ser mantida a regra do sigilo das vota~5es,

de modo que, no momenta da abenura das cedulas, atingida a quana resposta,reconhecendo ou afastando detenninada tese, acusat6ria ou defensiva, a vota~ao

seja encerrada. Isto e, nao ha publicidade na sala especial e nem no plenario, doconteudo dos demais votos. Assim, sendo 0 caso, niio poderao ser abenas asdemais cedulas, antes de serem todas misturadas. A fiscaliza~ao do MinisterioPUblico e da defesa devera ocorrer no momenta em que forem distribuidas ascedulas "sim" e "nao" aos jurados (evitar que algum jurado receba duas cedulasidenticas). a sigilo das respostas se aplica as panes, aos jurados e tambem ao juizpresidente. Isso para que seja evitada a contamina~o no momento de realizar adosimetria da pena. A utiliza~ao de dois oficiais de justi~a e nao de urn (art. 487do CPP), como de praxe nas vota~5es, se constitui em mera irregularidade. aimponante e a manuten~ao da nonnalidade da vota~ao, podendo ser necessario,em algumas situa~5es, a presen~a de mais de urn oficia! de justi~a.

7. Particularidades da senten<;:a do juiz presidente

A senten<;a do juiz presidente vincula-se, necessariamente, ao que asjurados decidiram, em razao da garantia da soberania dos veredictos (an. 5Q

,

14 NASSIF, Aramis. 0 Novo JUri Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, equipara 0

excesso it minorante e mio 0 considera como resultado da desdassifical;ao.15 NASSIF, Aramis. 0 Novo JUri Brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, admite a des­

classifical;ao impropria, mas com quesital;ao anterior it te!'e abMlJutoria de mento.

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Reformas (?) do Processo Penal:Considerac;oes Criticas

XXXVIII, "C", CF). Havendo uma das causas da inimputabilidade do art. 26,caput, do CP e outra(s) tese(s) defensiva(s), os jurados nao responderao acer­ca dessa especie de inimputabilidade. A solu~ao depende da resposta ao que­sito: "0 jurado absolve 0 acusadoT'. Afirmativa a resposta, 0 juiz ha de pro­damar a absolvi~ao sem aplica~ao da medida de seguran~a, em nome da ple­nitude de defesa (art. 5Q

, XXXVIII, "a", da CF), situa~ao mais favoravel aoacusado. Negado esse quesito, cabera ao magistrado aplicar a medida deseguran~a.A submissao ao Tribunal do Juri do acusado inimputavel pelo art.26, caput, do CP somente decorte da existencia de outra tese; ao contrario,ja Ihe seria aplicada a medida de seguran~a, na "fase da pronuncia". Entao,quando os jurados respondem, por maioria, que "sim" ao quesito "0 juradoabsolve 0 acusado", estao reconhecendo esta outra tese, afastando a medidade seguran~a que ja poderia ter sido aplicada na absolvi~aosumaria, caso naohouvesse outra tese.

Condenado 0 acusado, cabera ao magistrado individualizar as penas. 0processo de medi~ao das san~6es segue 0 disposto no Codigo Penal, com suastn~s fases bern delimitadas. As agravantes e as atenuantes nao sao mais objetode quesita~ao, motivo por que, para serem reconhecidas, devem ter sido sus­tentadas em plenario, segundo disposi~ao legal (art. 492, I, "b", CPP).Entretanto, a sustenta~ao ha de ser feita na primeira fase, para que seja possi­bilitado 0 contraditorio. Situa~ao importante diz respeito a presen~a de cir­cunstancias atenuantes nao sustentadas em plenano. A plenitude defensiva,prevista constitucionalmente, autoriza 0 magistrado a reconhece-las de oficio.nao sendo necessario dissolver 0 Conselho de Senten~a e nem anular 0 julga­mento, por que se trata de materia de aplica~ao da pena. Muitas das qualifica­doras do homicidio tambem sao circunsrancias agravantes. Com 0 afastamen­to da qualificadora ou a inexistencia de sua descri~ao na denuncia impede 0

reconhecimento de uma potencialidade menor, agora, como agravante.Ademais. na sentenc;:a penal condenat6ria. devera ser fixado urn valor

minima a repara~ao dos danos causados pela infra~ao, em razao dos prejui­zas sofridos ou em decorrencia da morte da vitima (art. 387, IV, CPP, com areda~ao dada pela Lei 11.719/08).16 A estipula~ao desse valor minimo serafeita em razao da prova produzida nos autos, propria da culpabilidade ouinocencia criminal, nao comportando, no processo penal, a produ~ao deprova tendente arepara~ao dos danos.

16 Vide cap. IV, item 3.

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Nereu Jose Giacomolli

A prisao do acusado nao euma decorrencia natural do veredicto con­denatorio e nem da quantidade da pena, mas de sua necessidade, em facedos requisitos da prisao preventiva. Havendo a emissao de urn juizo conde­natorio, ha afirma,ao do fum us comissi delicti, representado pelos indiciossuficientes de autoria e pela materialidade. Entretanto, ah,m disso, a encar­ceramento, antes do trinsito em julgado da senten,a penal condenatoria,ha de ser motivado na necessidade da prisao ao acautelamento do processoou da incidencia do ius puniendi, com a presen<;a de elementos concretos,afirmativos de que a liberdade do processado esteja amea,ando a desenvol­vimento e a julgamento normais do processo au da aplica,ao da lei penal(periculum libertatis).

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Capitulo IVOutras Modifica<;6es

1. Alterac;:ao da imputac;:ao acusatoria: emendatio e mutatiolibelli

Saa as fatas que justificam a existencia de urn pracessa penal, cancebi~do no contradit6rio da existencia destes e/ou da forma como Dcorreram, Durnaspecta abjetiva e, na parte subjetiva, da verifica<;aa da existencia de certaagente respansavel pela resultada. S6 as fatas naa saa suficientes aa aconte~

eer criminal processual, na medida em que sabre estes incidem determinadaregra criminal, a qual lhes autorga relevancia. Fatos e regras juridicas saainseparaveis e se entrela<;am, mativa par que qualquer dualisma entre "ques~

toes de fata" e "questoes de direita" naa encantra justificativas na devidaprocesso constitucional ou no justa processo.

Dizer que a reu se defende s6 da fata descrita e saterrar a principia daampla defesa e, na Tribunal da Juri, da plenitude da defesa. A abedienciadesse principia constitucional ultrapassa 0 contradit6rio fatico; envolve,necessariamente, 0 contradit6rio juridico. Por isso, a decisao condenatoriasabre imputa<;aa juridica, na qual a reu naa se defendeu, naa tern legitimi~

dade canstitucianal (imputa<;aa de dala e candena<;aa par culpa, v.g.).Par issa, naa encantra suparte na devida processa legal a art. 383 da

CPP.1 Entretanta, aqueles que resalverem aplica~la deveraa abservar as seusdais paragrafas. Alias a SUmula 337 da STJ ja determinava a aplica<;aa da sus~

pensaa candicianal da processa na procedencia parcial da pretensaa acusa~

t6ria e na desclassifica<;aa, sempre que preenchidas as requisitas legais, rela~

tivas aa delita residual. [ssa se aplica nas dais graus jurisdicianais.2

Madificada a campetencia, as autos seriia remetidas aa juiz natural dacausa (art. 383, § 2', da CPP).

Vide LOPES JR., Auty. Introdur;Jo Critica ao Processo Penal, Fundamentos da InstrumentalidadeGarantista. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2005, p. 172, quando tambem se insurge contraa possibilidade da emendatio libelli do artigo 383 do C6digo de Processo PenaL

2 Vide item 4, deste capitulo.

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Nereu Jose Giacamalli

A nova defini~ao juridica do fato ha de ser feita, voluntariamente, pelosujeito a quem se atribui a fun~ao de acusar (art. 384 do CPP), independen­temente de provoca~ao do sujeito encarregado de julgar (magistrado), sobpena de indevida interferencia funcional, antecipa~ao do juizo condenato­rio, quebra do due process oflaw e do principio acusatorio,3 em prejuizo dadefesa. Por isso, 0 art. 384, § 1Q, do CPP nao encontra suporte constitucio­na!. 0 magistrado utiliza indevidamente 0 art. 28 do CPP quando entendeque ha elementos suficientes para que 0 Ministerio Publico exer~a a preten­sao acusatoria e nao 0 faz. Aqui, no art. 384, § 1" do CPP, ja houve exerci­cio da pretensao acusatoria, mas 0 julgador entende que poderia ser alarga­da, que a potencialidade do ius puniendi e maior do entendimento do orgaoacusador oficia!'

2. Sentenya penal absolut6ria

Os fundamentos da senten~a absolutoria foram mantidos, com peque­nas modifica~5es. A reda~ao dos tn's primeiros incisos do art. 386 do CPP,referentes a tipicidade do fato permanece a mesma (estar provada a inexis­tencia do fato, nao haver prova da existencia do fato e nao eonstituir a fatoinfra~ao criminal - atipicidade).

No que tange aabsolvi~ao no concurso de agentes, foi mantida a reda­~ao do anterior inciso IV (nao existir prova de ter 0 reu concorrido para ainfra~ao penal), mas no inciso V (reda~ao amal). Vencidos os filtros dosincisos anteriores, na hipotese do concurso de agentes, a absolvi~ao poderaoeorrer par dais motivos. Quando estiver provado que a reu nao eoneorreupara a infra~ao penal, a absolvi~ao sera pelo inciso IV (reda~ao dada pela Lei11.690/08). Justifica-se 0 acrescimo em razao dos reflexos de natureza civelda senten~a penal absolutoria, na medida em que, agora, provado nao ter 0

reu concorrido para a infra~ao penal, fecham-se as portas do civel a umarepara~ao dos danos (mesma situa~ao do inciso I do art. 386 do CPP - estarprovada a inexistencia do fato). De outra banda, a absolvi~ao no ambito cri­minal, pela inexisteneia de provas de ter 0 reu eoneorrido para a infra<;aocriminal (inciso V), permite que 0 interessado na repara~ao prove, na esfe­ra dveL a suficiencia de prova (ambito de valora~ao propria) a repara~ao

3 Vide PRADO, Geralda. Sistema Acusat6rio. A Confonnidade Constitucional das Leis ProccssuaisPenais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, pp. 146-153. il(crta das limitac;:oes da alterac;:aa dosfatos, em face do principia acusat6rio.

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Reformas (?) do Processo PenaLConsideral;oes Criticas

(situa~ao identica a do inciso II do art. 386 do CPP - nao haver prova daexistencia do fato).

A reforma acrescenta a absolvi~ao por fundada duvida sobre a existen­cia de circunstancias que exc1uam 0 crime ou isentem 0 reu de pena, na reda­~ao que Ihe dava 0 inciso V do art. 386 do cpp (atual art. 386, VI, do CPP).Portanto, nos casos de presen~a das excludentes ou mesmo na duvida acercadestas, a absolvic;ao se fundamentani neste ineiso e nao mais, nos casos deduvida, no artigo 386, VII (nao existir prova suficiente para a condena~ao).

o inciso VII reserva-se a inexistencia de prova suficiente para condenar 0

reu, fora dos casos do inciso VI, cuja reda~ao foi dada pela Lei 11.690/80.o magistrado elege 0 que 0 convenceu (sua certeza), pois a certeza perten­

ce ao reino da a~ao e nao ao reino do pensamento. Qp.ando absolve por fulta deprova, lava as maos, nao escolhe, mas admite, segundo Camelutti, a sua incapa­cidade de superar a duvida e isso e prejudicial ao acusado e aadministra~ao dajusti~a.4 Inexistindo provas ou havendo duvida, deveria ser proclamada, clara eobjetivamente a inocencia, mais precisamente, mantida a inoceneia.

Absolvido 0 acusado, independentemente do fundamento do provi­mento absolut6rio, este deve ser solto (paragrafo unico, I - mantido), apli­cando-se tambem a absolvi~ao sumaria dos arts. 397 (crimes que nao foremde competencia do Tribunal do Juri) e 415 (crimes de competencia do Tribu­nal do Juri) do CPP e as medidas cautelares e provisoriamente aplicadas tam­bern deverao cessar (inciso II). Nas hip6teses de absolvi~ao impr6pria, apli­ca-se a medida de seguran~a, permanecendo a reda~ao atual do art. 386,paragrafo unico, III, do CPP.

3. Sentenc;:a penal condenat6ria

A lei passou a exigir que 0 magistrado, no momento em que proferir asenten~a penal condenat6ria, manifeste-se, fundamentadamente, sobre aliberdade do imputado, em atendimento aos requisitos da cautelaridade daprisao preventiva. Nao basta afirmar a persistencia dos motivos da prisaocautelar ja decretada ou "recomendar 0 reu aprisao onde se encontra"; faz­se mister fundamentar a necessidade da manuten~aoda prisao ou sua decre­ta~ao, com base nos requisitos pr6prios da cautelaridade, especificos de cadamedida a ser decretada.

4 CARNELUITI, Francesco. "Verlta, Dubbio, Certezza", em Rivista di Diritto Processuale, vol. XX(II serle), 1965, p. 7.

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Nereu Jose Giacomolli

Havendo danos indenizaveis, de qualquer natureza, na sentenc;a penalcondenat6ria, ha necessidade de 0 magistrado fixar urn valor minima a titu­lo de reparac;ao dos danos causados pela infrac;ao crimina!. Esta detennina­c;ao (que fixara) hayed de ser feita sabre algum sustentacula prabatoriocarreado ao processo. Ocorre que a perspectiva prabatoria, desde a praposi­c;ao de meios de prova ate sua avaliac;ao, e diferenciada no ambito criminale reparat6rio. Na esfera criminal, 0 interesse da acusa~ao e 0 de punir 0 acu­sado, condena-Io a uma sanc;ao criminal e a da defesa e a manutenc;ao dostatus libertatis, a retorno a este (casas de prisao cautelar) au diminuir apotencialidade do ius puniendi. Cabe Ii acusac;ao a encargo de quebrar a pre­sunc;ao de inocencia do acusado e demonstrar a afastamento do minimacensurave!. 0 objetivo da prova e a carga desta. na esfera civil tern outradimensao e poderao desvirtuar as regras probatorias criminais, diante dosdanos do ofendida (condenar para prapiciar a fixac;ao de uma indenizac;ao).

No momenta em que a legislador determinou a estipulac;ao de umaindenizac;ao dos danos de natureza civil no ambito de urn processo crimi­nal, incrementou a polo acusador e fragilizou, ainda mais, a polo defensi­vo. 1sso porque a acusac;ao tera interesse em tambem levar ao processo cri~

minal a prava destinada Ii fixac;ao dessa indenizac;ao e a defesa, par outralado, tera mais uma preocupac;ao, alem da criac;ao da duvida razoavel noprocesso, tendente a sua absolvic;ao, preocupar-se-a com a indenizac;ao.Ademais, do dever de indenizar, a qual flui naturalmente da condenac;ao,ha interesse em sua dimensao, mesmo que provis6ria. Emais urn entrave aresposta da jurisdic;ao criminal dentro do tempo razoave!. Por isso, saoinadmissiveis os meios de prova e a metodologia de busca desta, quandoobjetivarem a reparac;ao dve!. 0 juiz, entendendo que deve fixar urn valorminimo, 0 fara com base na prova produzida na perspectiva criminaLs em

5 Na Inglaterra, Pais de Gales, Esc6cia, Belgica c Noruega, adotam-se criterios de repara~ao as viti­mas, inclusive com a rcnuncia ao corpo de delito, e pagamento de beneficios. Na AJemanha, pos­sibilita-se a obten~iio da rcpara~iio, a protec;ao durante as declara~6es, 0 direito a urn advogado, ainformac;ao cia acusac;ao. Na Itilia, a vitima tern a possibilidade de aportar provas, de constiWir­sc como parte civil, com direito a urn advogado, a comunicar-sc com 0 Ministcrio Publico e como Juiz. A Recomendac;ao R(85) do Comite de Ministros do Conselho de Europa e 0 Convenio 116do Conselho de Europa sobre a Indenizac;ii.o as Vitimas de Delitos Violentos, de 24 de novcmbrode 1983, alem de rccomendar que se examinem as vantagens que podem apresentar os sistemasde mediac;ii.o e de conciliac;ii.o, sinaliza as medidas que seriam adotadas no ambito palida], da per­secuc;ao, da tomada das declarac;6es, das audicncias, da primazia da reparac;ao a vitima sobre amulta recolhida ao Estado, protegendo-se sua privacidade e sua imegridadc contra a delinquen­cia organizada. As conclus6es do VII Congresso das Na~6es Unidas para Prevenc;ao da Crimi­nalidadc e Tratamento aos Autores de Delitos patenciam urn tratamento justa as vitimas, com arepara~iia, indeniza~iia, e ampla assistencia. Nota-se uma pr{'ocupa~iiado Conselho da Europa,

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Refonnas (?) do Processo Penal:Considerayoes Criticas

urn valor determinado, sem, contudo, aceitar a produ~ao probat6ria nessaperspectiva (existencia do dana e sua dimensao). Ademais, a viti rna pode­ra manifestar interesse em que nao deseja 0 arbitramento na esfera crimi­nal, pois ja ingressou no juizo civel ou nele pretende discutir 0 an debea­tur e 0 quantum debeatur. A indeniza~ao esta na esfera de disponibilidadedo interessado, motivo por que, diante da manifesta~ao da vitima, aomagistrado e vedado arbitrar qualquer valor reparat6rio. Aplica-se 0 prin­cipio dispositivo, 0 qual comporta renuncia e transa~ao.

4. Decisao desclassificat6ria e sllspensao condicional do processo

a primeiro momento il ani/ise da suspensao condicional do processoOCOITe logo depois de recebida a denuncia ou a queixa-crime. Antes de prosse­guir 0 processo, faz-se mister verificar 0 cabimento ou nao dessa medida SliS­

pensiva da marcha ordinaria do processual, concebida, para ter aderencia cons­titucional, como estrategia ao exercicio da ampla defesa, cujo direito ha de serassegurado pelos magistrados e Tribunais. Ap6s ter sido instruido 0 processo, nomomento de ser proferida a senten~a, verificada uma tipicidade adequada aocabimento da suspensao condicional do processo, pela desclassifica~ao ou peloafastamento em parte da pretensao acusat6ria, antes de ser proferido 0 veredic­to condenat6rio, h:\ de ser propiciada a suspensao condicional do processo.6

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em varios diplomas, no que tange as vitimas de delitos. Pode seT citada a Resolu~ao mimero (77)27,de setembro de 1977 a respeito da indenizas:ao das vitimas de infra~oes criminais; a Conven~ao

Europeia de 24 de novembro de 1983, a qual se refere especificamemc a indeniza~ao peIo Estado asvitimas de crimes violentos; a Recomenda~ao (85)4, de 26 de mar<;o de 1985, no que tange a inde­niza<;ao das vitimas de vioIencia familiar; a Rccomenda~ao (85) 11, de 28 de junho de 1985, sobre aposi~ao da vitima no ordenamento penal e processual penal; a Recomendac;ao (87)21, de 17 desetembro de 1987, referente a assistcncia as vitimas e a preven~ao da vitimiza~ao. A Resolw:;ao40/34, de 11 de dezembro de 1985, da Organizac;ao das Nas:6es Unidas estabelece os postulados basi­cos em favor das vitimas de crimes. Porem, 0 locus apropriado nao e a esfera do processo penal.

6 Vide GIACOMOLLl, Nereu Jose. Legalidade, Oponunidade e Consenso no Processo Penal, naPerspecriva das Garanrias Constitucionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 381, oca­siao em que foi defendida esta tese, posterionnente admitida pela Sumula 337 do STJ e, agora,acolhida pelo art. 383, § IQ, do CPP, com a reda<;ao dada pela Lei n° 11.719, de 20 de junho de2008. Em pp. 357 a 362 se pode ver que na Alemanha, a suspcnsao condicional do processo podeocorrer na fase preliminar, com ou sem comrole jurisdicional, ou apos a deduc;ao de uma preten­sao acusat6ria. AMm disso, 0 sistema contempla duas modalidades de suspensao incondicional doprocesso e 0 absprechen - aCOTdo sobre a semenc;a, quando nao ha duvida acerca da culpabilida­de, 0 autor do fato colaborar no esclarecimento dos fatos e repaTar 0 dano. 0 modelo alemao foiadotado, em parte, na praxis francesa, embora nao previsto no CPP, mas interpretado a partir doart. 40 do CPP. A suspensao condicional do processo tambem esta prevista no CPP polaeo de1970, no CPP de Portugal de 1988, na Argentina e no Chile. A previsao no sistema continentaI-

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Nereu Jose Giacomolli

o afastamento dos impedimentos do cabimento da suspensao condieio­nal do processo (art. 89 da Lei 9.099/95), pelo reconhecimento de uma qua­lifica~ao menos grave do fata ou pela absolvi~ao do que impedia a suspensaocondicional do processo (concurso material, formal ou crime continuado),purifica e lapida 0 juizo inicial de tipicidade, ainda que de forma parcial. Paraque seja propiciada a suspensao condicional do processo faz-se mister emitirurn juizo de tipicidade, sem a provisoriedade do existente no momento dorecebimento da demincia ou da queixa-crime, na medida em que se realizoua dialetica probat6ria e hi necessidade de ser garantido 0 direita ao recurso.

Esse jUizo de tipicidade hi de ser fundamentado, de modo a propiciarseu controle pela via recursal. Na metodologia da decisao, hi uma delimita­~ao da tipicidade, mas nao da ilicitude e nem da culpabilidade. Assim, naoha uma sentenc;a, nao ha urn juizo condenat6rio e nem absolut6rio, mas umadecisao interlocut6ria mista, sujeita ao duplo grau jurisdicional (apela~ao

residual). Inviabilizada a suspensao condicional do processo, 0 julgamentoprossegue com a analise do merito da causa.

Modificada a tipicidade, pelo juizo a quo, de molde a ser possivel a sus­pensao condicional do processo, havendo impugna~aoministerial, 0 objetado recurso se limitara a esta apreciac;ao, sem exame do merito, mesmo quea solu~ao seja absolut6ria, sob pena de supressiio de urn grau jurisdicional.Procedente ou nao 0 recurso, 0 processo ha de retomar aorigem para serviabilizada a suspensao condicional do processo (negado provimento aorecurso da acusa~ao) ou para prosseguir no julgamento (provimento dorecurso da acusa~ao). Quando a desclassifica~ao ou 0 provimento parcial daacusa~ao, de sorte a afastar 0 6bice da suspensiio condicional do processo,for uma decisao do 6rgao ad quem, 0 juizo condenat6rio hi de ser descons­tituido, mantendo-se a tipicidade, com retorno dos autas ao juizo a quo paraviabilizar a suspensao condicional do processo. Situa~ao identica podedocorrer quando 0 orgao ad quem der provimento ao recurso da aCllSac;aOque pretendia a condena~ao do acusado. Tambem nesse caso, os autos deve­rao retornar ao juizo de origem para ser viabilizada a suspensao condicionaldo processo, sendo esti cabivel. Negada ou nao aceita a suspensao condicio­nal do processo, os autos deverao retornar a Camara julgadora para conti­nua~ao do julgamento. as julgamentos, tanto de primeiro quanto de segun­do graus tambem prosseguirao nas hip6teses de revoga~ao da suspensao

europeu guarda semelham;:a com a probation do sistema anglo-americano (sllspensao da fase pro­cessua! da medic;:ao da pena, mas nao do processo e nem da execuc;:ao da pena).

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Reformas (?) do Processo Penal:Consideral;oes Criticas

condicional do processo. Nas hipoteses de descumprimento das condi~6es,

antes da revoga~ao faz-se mister possibilitar a justifica~ao da falta.Os Tribunais Superiores, ao verificarem a falta de aplica~ao da Sumula

337 do STJ, desconstituirao a senten~a au a acordao, no que tange il conde­na~ao e a aplica~ao da pena, viabilizando a suspensao condicional do proces­so no juizo de primeira grau.

A suspensao condicional do processo inicia sua possibilidade de cabi­menta a panir da comina~ao da san~ao penal. As infra~6es criminais, cujapena privativa de liberdade minima nao seja superior a urn an07 deverao pas­sar pelo filtro do merecimento dessa medida alternativa penal, do an. 89 daLei 9.099/95, na perspectiva da ampla defesa e da presun~ao de inocencia(quebrada somente apos a transito em julgado de uma senten~a penal con­denatoria, dever de atua~ao do magistrado para garantir as direitos dosimputados, seu cabimento na a~ao penal processual de iniciativa privada edeferimento de oponunidade processual il justificativa ao descumprimentodas condi~6es, antes da revoga~ao). Porem, sabre a comina~ao abstrata inci­dem as causas especiais de aumento e de diminui<;ao da pena,8 com interpre­ta<;ao favoravel ao seu cabimento, ou seja, com 0 menor aumento e com amaior diminui~ao,nos tennos da Sumula 723 do STF.9

5. Considera<;5es de direito intertemporal

Como bern acentua Taipa de Carvalho, a doutrina e a jurisprudencia,quanto asucessao de leis do processo penal, ao aplicarem 0 criterio tempus

7 Meu entendimento, contfilrlO ao da doutrina e da jurisprudencia majoritirias (Stimula 243 do SD;He 83.104/RJ, do STF, ReI. Min. Gilmar Mendes, OJ de 21.10.2003; AI-AgR 575376/SP, ReI. Min~Elleo Gracie, OJ de 17.03.2006; Resp. 323938/SP, do STJ, Rel. Min~ Laurita Vaz, OJ de 04.08.2003,e Resp 18.328IRS, ReI. Min. Gilson Oipp, OJ de 28.11.2005) e pel0 cabimento da suspensao condi­cional do processo as infral;6es criminais cuja pena privativa de liberdade minima nao supere aosdois anos, em razao da alteral;ao da base do conceito de infra~ao penal de menor potencial ofensi­vo de urn ano (Lei 9.099/95) para dois anos (Lei 11.313/06, a qual deu nova redal;ao ao art. 61 da Lei9.099/95). Alterada a limita<;ao do conceito de infral;ao penal de menor potencial ofensivo, altera­se, tambem, por simetria e proporcionalidade, 0 conceito de infral;ao de medio potencial ofensivo.

8 Vide STF, He 86.452/RS, ReI. Min. Joaquim Barbosa, OJ de 03.03.2006 e Sumula 243 do STJ.9 Com a introdul;30 do paragrafo tinico ao art. 61 da Lei 9.099/95 e a nova redal;ao ao art. 29 , caput

e paragrafo tinico, da Lei 10.259/01 (Juizados Especiais no ambito da ]ustil;a Federal), 0 entendi­mento da soma das penas no concurso material e da consideral;ao das causas especiais de aumen­to e de diminuil;iio da pena ao es[abelecimento dos conceitos de infral;ao penal de menor poten­cial ofensivo e de medio potencial ofensivo (cabimento da suspensao condicional do processo)passa a set questionado. Isso porgue a consideral;ao ao cabimento do acordo civil e da transa<;aocriminal passou a set de forma individualizada (infra<;ao por infral;30), nos casos de reuniao dosprocessos por concxao ou continencia.

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Nereu Jose Giacornalli

regit actum, partem de uma erronea e precipitada redutora compreensaodestas regras, como sendo de natureza exclusivamente processual, tecnica ouformal. Porem, ha regras que afetam direitos individuais fundamentais, asquais sao regras de garantia. 10

Verifica-se na dinamica interna do processo uma alta conectividadeentre pena e processo, direito material e direito processual, numa dimensaobern diversa do processo civil (tempus regit actum nao incide na mesmadimensao), em razao da blindagem constitucional dos direitos e das garantiasno processo penal. Ha uma liga~ao direta e funcional, entre as regras proces­suais criminais com a incidencia do ius puniendi, com a aplica<;ao de umasan~ao criminal, com 0 direito material. Este, por sua vez, conecta-se direta­mente com os meios de prova, com a metodologia probat6ria e com a admis­sibilidade da prova. 0 direito ao recurso e uma reafirma~aode uma preten­sao inicial ou de uma resistencia processual, mas com reflexos diretos napena criminal.

Segundo Taipa de Carvalho, as implica~6es praticas destes principiosaumentam na propor~ao do aprofundamento e re-consciencializa~ao dasgenuinas e perenes razoes de garantia politica e de maxima restri~ao possi­vel da pena, razoes que determinaram a consagra<;ao daqueles principios.l 1

No processo penal, quando a regra processual interferir na aplica~ao doius puniendi (conteudo de direito material), 0 seu carater instrumental cedea sua for~a em favor do principio constitucional da irretroatividade da leimais severa (art. 5°, XL, CF), em razao da prote~ao ampla ao direito de liber­dade. Nessa mesma perspectiva, quando as regras processuais limitarem direi­tos e garantias constitucionais (liberdade, v.g.), nao tern aplica~ao imediata, 0

que nao ocorre quando se amplia 0 espectro de garantias (limita~ao da prisao).o norte hi de ser a Constitui~ao da Republica. Na esfera do processo penal, 0

sistema a ser adotado e 0 da situa~ao das fases ou dos atos processuais, na pers­pectiva da preserva~ao dos direitos e garantias constitucionais.

Ha casos em que a preserva<;ao das garantias constitucionais indica aaplica~ao da nova lei por fases (preliminar, preparat6ria ou administrativa ede plenario, nos processos de competencia do Tribunal do Juri). Ainda, noque tange aos ritos processuais, aqueles processos onde somente foi recebidaa denuncia ou a queixa-crime, segue-se a nova sistematica, mesmo na vaca-

10 TAlPA DE CARVALHO, America A. Sucessao de Leis Penais. Coirnbra: Caimbra Editara, 1997,pp. 259 c 260.

11 TAlPA DE CARVALHO, America A. Sucessao de Lcj~· Penai.~, Caimbra: Coimbra Editora, 1997,p.261.

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Reformas (?) do Processo Penal:Consideral;oes Criticas

tio legis, em face da irradia,iio dos efeiros protetivos das garantias funda~

mentais. Porem, ja tendo sido interrogado 0 reu, ha necessidade de aguardara defesa preliminar, seguindo~se, apas, conforme dispiie a nova lei (proce~

dentes siio as irresigna,iies defensivas com a antecipa,iio de aros processuaisque deveriio ser repetidos a posteriori - interrogatario, por exemplo). Ja ini~

ciada a audiencia de instru,iio e julgamento, 0 seu termino segue 0 riro ante~

rior, ate a sentenc;a, mas com a necessidade de ser ° reu novamente interro­gado, em face da preserva,iio da ampla defesa (defesa tecnica e defesa pes~

soal). Aqueles processos que ainda niio foram sentenciados, a fase decisariaobedece a nova lei.

No que tange as provas, a admissibilidade da pericia realizada somentepor urn perito oficial (ar. 159 do CPP), por diminuir 0 espectro das garantias,aplica~se somente aos fatos praticados apas a vigencia da Lei 11.690/08, con~trariamente da possibilidade de nomea,iio de assistente tecnico (art. 159, §30 , do CPP).

Entretanto, as regras processuais que extinguem urn recurso (protestopor novo juri - art. 40 da Lei 11.689/08) exclusivo da defesa somente ternaplica,iio aos faros cometidos apas a entrada em vigor da lei restritiva. 0denominado "recurso ex officio" niio foi recepcionado na reforma de 2008.Desde a Constitui,iio de 1988, em raziio de seu art. 129, I, a constitucionali~

dade desde recurso era questionada. 0 magistrado, depois de absolver suma~riamente 0 acusado, mesmo diante da conformidade da acusa,iio, era obriga~

do a enviar os auros ao Tribunal de Justi,a, quem, entiio, validava ou niio suadecisiio. 0 art. 574, II, do CPP, faz expressa referencia ao art. 411 do cpp (daabsolvi,iio sumaria anterior), 0 qual niio mais existe e nem 0 seu conteudoconsta na reforma. Portanto, aplica~se, tambem no caso da absolvi,iio suma~

ria, a regra da voluntariedade recursa!. Assim, a exclusiio do recurso ex offi~

cio, das decisiies que absolvem sumariamente 0 acusado de crime dolosocontra a vida beneficia 0 direito de liberdade, motivo por que tern aplica,iioimediata e retroativa, desde que ainda niio apreciado. Aplica~se ao recurso deprotesto por novo juri. Aplica~se a regra de que 0 direito ao recurso nascecom a publica,iio da decisiio quando 0 recurso niio beneficiar ou prejudicarexclusivamente a defesa.

A cita,iio por hora certa, ao permitir 0 prosseguimento do processo,possibilita a aplica,iio de uma san,iio criminal, em caso de condena,iio,situac;ao que nao acoma anteriormente, na medida em que a citac;ao, nascondi,iies em que se permite a cita,iio por hora cena, era feita por edital,com suspensiio do processo. Assim, essa nova modalidade de cita,iio ternaplica,iio aos delitos que ocorrerem apas a vigencia da Lei 11.719/08.

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Nereu Jose Giacomolli

A nova regra do art. 384 do CPP (mutatio libelll). ao vedar a atua9ao exofficio do juiz beneficia 0 acusado. na medida em que a altera9ao resta ads­trita aatua9ao voluntaria do Ministerio Publico. ja. a fixa9ao de urn valorreparat6rio nao tern conteudo criminal (art. 387. IV, CPP).

A rejei9ao liminar da pe9a incoativa e a absolvi9ao sumaria. nos ritoscomuns (arts. 395 e 397 do CPP) sao regras que beneficiam 0 imputado e t~maplica9ao imediata. inclusive aos processos em andamento que nao ultrapas­saram essas fases processuais. Porem, 0 interrogat6rio do acusado. como ulti­mo ate da audi~ncia, nos processos em andamento, mesmo com interrogat6­rio ja realizado. 0 ate hi de ser repetido ao final, por constituir-se em ele­mento integrante do conceito de ampla e plena defesa.

Os atos processuais praticados sob a egide da lei anterior permanecemvalidos. Entao. os processos suspensos em razao da cita9ao por edital. nos ter­mos do art. 366 do CPP. continuarao suspensos. Prosseguirao quando 0 reufor localizado. aplicando-se. entao. a partir dai, as leis processuais novas. Osprocessos que nao prosseguiram em razao da falta de localiza9ao do reu paraser intimado da decisao da pronuncia. para receber c6pia do libelo ou paracomparecer na sessao de julgamento. tambem permanecerao paralisados.pelos motivos supra elencados.

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ANExo I

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Lei nQ 11.689, de 9 junho de 2008

Altera dispositivos do Decreta-Lei nO 3.689, de 3 de outubro de 1941- C6digo

de Processo Penal, relativos ao Tribunal do JUri, e da outras providencias

o PRESIDENTE DA REPUBUCA Fa~o saber que 0 Congresso Nacio­nal decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 10 0 Capitulo II do Titulo I do Livro II do Decreto-Lei nO 3.689,de 3 de outubra de 1941 - C6digo de Pracesso Penal, passa a vigorar com aseguinte reda~iio:

"CAP!TULO IIDo PROCEDIMENTO RELATIVO AOS PROCESSOS DA COMPETtNCIA

DO TRIBUNAL DO JURI

SE<;:AO IDA ACUSA<;:AO E DA INSTRU<;:AO PRELIMINAR

'Art. 406. 0 juiz, ao receber a denuncia ou a queixa, ordenara a cita~iio

do acusado para responder a acusa~iio, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.§ 10 0 prazo previsto no caput deste artigo sera contado a partir do efe­

tivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juizo, do acusa­do ou de defensor constituido, no caso de cita~iio invalida ou por edital.

§ 20 A acusa~iio devera arrolar testemunhas, ate 0 maximo de 8 (oito),na denuncia au na queixa.

§ 30 Na resposta, 0 acusado podera argiiir preliminares e alegar tudo queinteresse a sua defesa, oferecer documentos e justifica~6es, especificar asprovas pretendidas e arralar testemunhas, ate 0 maximo de 8 (oito), qualifi­cando-as e requerendo sua intima~iio, quando necessario.' (NR)

'Art. 407. As exce~6es seriio pracessadas em apartado, nos termos dosarts. 95 a 112 deste C6digo.' (NR)

'Art. 408. Niio apresentada a resposta no prazo legal, 0 juiz nomearadefensor para ofereciHa em ate 10 (dez) dias, concedendo-Ihe vista dosautos.' (NR)

'Art. 409. Apresentada a defesa, 0 juiz ouvira 0 Ministerio Publico ou 0

querelante sobre preliminares e documentos, em 5 (cinco) dias.' (NR)'Art. 410. 0 juiz determinara a inquiri~iio das testemunhas e a realiza­

~iio das diligencias requeridas pelas partes, no prazo maximo de 10 (dez)dias.' (NR)

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Anexos

'Art. 411. Na audiencia de instru~ao, proceder-se-a atomada de decla­ra~oes do ofendido, se possivel, ainquiri~ao das testemunhas arroladas pelaacusa~ao e pela defesa, nesta ordem, bern como aos esclarecimentos dos peri­tos, as acarea.;6es e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se,em seguida, 0 acusado e procedendo-se 0 debate.

§ 1Q Os esclarecimentos dos peritos dependerao de previo requerimen­to e de deferimento pelo juiz.

§ 2Q As provas serao produzidas em uma s6 audiencia, podendo 0 juizindeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelat6rias.

§ 3Q Encerrada a instru~ao probat6ria, observar-se-a, se for 0 caso, 0 dis­posto no art. 384 deste C6digo.

§ 40 As alega~oes serao orais, concedendo-se a palavra, respectivamen­te, aacusa~ao e adefesa, pelo prazo de 20 (vinte) minutos, prorrogaveis pormais 10 (dez).

§ 5Q Havendo mais de 1 (urn) acusado, 0 tempo previsto para a acusa~ao

e a defesa de cada urn deles sera individual.§ 6Q Ao assistente do Ministerio PUblico, ap6s a manifesta~ao deste,

serao concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se por igual periodo 0

tempo de manifesta~ao da defesa.§ 7Q Nenhum ato sera adiado, salvo quando imprescindivel aprova fal­

tante, determinando 0 juiz a condu~ao coercitiva de quem deva comparecer.§ 8Q A testemunha que comparecer sera inquirida, independentemente

da suspensao da audiencia, observada em qualquer caso a ordem estabeleci­da no caput deste artigo.

§ 9Q Encerrados os debates, 0 juiz proferira a sua decisao, ou 0 fara em10 (dez) dias, ordenando que os autos para isso !he sejam conclusos.' (NR)

'Art. 412. 0 procedimento sera concluido no prazo m:iximo de 90(noventa) dias.' (NR)

SEGAO 11

DA PRONUNClA, DA IMPRONUNclA E DA AllSOLVIGAO SUMARIA

'Art. 413. 0 juiz, fundamentadamente, pronunciara 0 acusado, se con­vencido da materialidade do fato e da existencia de indicios suficientes deautoria ou de participa~ao.

§ 1Q A fundamenta~ao da pronuncia limitar-se-a aindica~ao da materiali­dade do fato e da existencia de indicios suficientes de autoria ou de participa­~ao, devendo 0 juiz declarar 0 dispositivo legal em que julgar incurso 0 acusa­do e especificar as circunstancias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

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Anexos

§ 2' Se 0 crime for afian9avel, 0 juiz arbitrara 0 valor da fian9a para aconcessilo ou manuten9ilo da liberdade provis6ria.

§ 3' a juiz decidira, motivadamente, no caso de manuten9ilo, revoga­9ilo ou substitui9ilo da prisilo ou medida restritiva de liberdade anteriormen­te decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decreta­9ilo da prisilo ou imposi9ilo de quaisquer das medidas previstas no Titulo IXdo Livro I deste C6digo.' (NR)

'Art. 414. Nilo se convencendo da materialidade do fato ou da exist~n­

cia de indicios suficientes de autoria ou de participa9ilo, 0 juiz, fundamenta­damente, impronunciara 0 acusado.

Paragrafo unico. Enquanto nilo ocorrer a extin9ilo da punibilidade,podera ser formulada nova denuncia ou queixa se houver prova nova.' (NR)

'Art. 415. a juiz, fundamentadamente, absolvera desde logo 0 acusado,quando:

I - provada a inexist~ncia do fato;II - provado nilo ser ele autor ou participe do fato;III - 0 fato nilo constituir infra9ilo penal;IV - demonstrada causa de isen9ilo de pena ou de exclusilo do crime.Paragrafo unico. Nilo se aplica 0 disposto no inciso IV do caput deste

artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto­Lei n' 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - C6digo Penal, salvo quando estafor a unica tese defensiva.' (NR)

'Art. 416. Contra a senten9a de impronuncia ou de absolvi9ilo sumariacabera apela9ilo.' (NR)

'Art. 417. Se houver indicios de autoria ou de participa9ilo de outraspessoas nilo incluidas na acusa9ilo, 0 juiz, ao pronunciar ou impronunciar 0

acusado, determinara 0 retorno dos autos ao Ministerio PUblico, por 15(quinze) dias, aplicaveI, no que couber, 0 art. 80 deste C6digo.' (NR)

'Art. 418. a juiz podera dar ao fate defini9ilo juridica diversa da cons­tante da acusa9ilo, embora 0 acusado fique sujeito a pena mais grave.' (NR)

'Art. 419. Qpando 0 juiz se convencer, em discordiincia com a acusa9ilo,da exist~ncia de crime diverse dos referidos no § l' do art. 74 deste C6digoe nilo for competente para 0 julgamento, remetera os autos ao juiz que 0 seja.

Paragrafo unico. Remetidos os autos do processo a outro juiz, adisposi­9ilo deste ficara 0 acusado preso.' (NR)

'Art. 420. A intima9ilo da decisilo de pronuncia sera feita:I - pessoalmente ao acusado, ao defensor nomeado e ao Ministerio

PUblico;

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Anexos

II - ao defensor constituido, ao querelante e ao assistente do MinisterioPublico, na forma do disposto no § IQ do art. 370 deste Codigo.

Panigrafo unico. Sera intimado por edital 0 acusado solto que nao forencontrado.' (NR)

'Art. 421. Preclusa a decisao de pronuncia, os autos serao encaminha­dos ao juiz presidente do Tribunal do Juri.

§ IQ Ainda que preclusa a decisao de pronuncia, havendo circunstanciasuperveniente que altere a c1assifica~ao do crime, 0 juiz ordenani a remessados autos ao Ministerio Publico.

§ 20 Em seguida, os autos serao conc1usos ao juiz para decisao.' (NR)

SE<;AO IIIDA PREPARA<;Ao DO PROCESSO PARA JULGAMENTO EM PLENARIO

'Art. 422. Ao receber os autos, 0 presidente do Tribunal do Jurideterminani a intima~ao do orgao do Ministerio Publico ou do querelan­te, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de 5 (cinco) dias, apre­sentarem rol de testemunhas que irao depor em plenario, ate 0 maximo de5 (cinco), oportunidade em que poderao juntar documentos e requererdiligencia.' (NR)

'Art. 423. Deliberando sobre os requerimentos de provas a serem pro­duzidas ou exibidas no plenario do juri, e adotadas as providencias devidas,o juiz presidente:

I - ordenara as diligencias necessarias para sanar qualquer nulidade ouesc1arecer fato que interesse ao julgamento da causa;

II - fara relatorio sucinto do processo, determinando sua inc1usao empauta da reuniao do Tribunal do Juri.' (NR)

'Art. 424. Q!Iando a lei local de organiza~ao judiciaria nao atribuir aopresidente do Tribunal do Juri 0 preparo para julgamento, 0 juiz competen­te remeter-Ihe-a os autos do processo preparado ate 5 (cinco) dias antes dosorteio a que se refere 0 art. 433 deste Codigo.

Paragrafo unico. Deverao ser remetidos, tambem, os processos prepa­rados ate 0 encerramento da reuniao, para a realiza~ao de julgamento.' (NR)

SE<;AO IVDo ALISTAMENTO DOS JURADOS

'Art. 425. Anualmente, serao alistados pelo presidente do Tribunal doJuri de 800 (oitocentos) a 1.500 (urn mil e quinhentos) jurados nas comarcas

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Anexos

de mais de 1.000.000 (urn milhao) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700(setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cern mil) habitantes e de 80(oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor popula~ao.

§ 1Q Nas comarcas onde for necessario, podera ser aumentado 0 mime­ro de jurados e, ainda, organizada lista de suplentes, depositadas as cedulasem uma especial, com as cautelas mencionadas na parte final do § 3Q do art.426 deste C6digo.

§ 2Q 0 juiz presidente requisitara as autoridades locais, associa~6es declasse e de bairro, entidades associativas e culturais, institui<;:6es de ensinoem geral, universidades, sindicatos, reparti~6es publicas e outros nucleoscomunitarios a indicaC;ao de pessoas que reunam as condi<;:6es para exercer afun~ao de jurado.' (NR)

'Art. 426. A lista geral dos jurados, com indica~ao das respectivas pro­fiss6es, sera publicada pela imprensa ate 0 dia 10 de outubro de cada ana edivulgada em editais afixados a porta do Tribunal do JUri.

§ IQ A lista podera ser alterada, de oficio ou mediante reclama~ao dequalquer do povo ao juiz presidente ate 0 dia 10 de novembro, data de suapublica~ao definitiva.

§ 2Q Juntamente com a lista, serao transcritos os arts. 436 a 446 desteC6digo.

§ 3Q OS nomes e endere~os dos alistados, em cart6es iguais, ap6s seremverificados na presen~a do Ministerio PUblico, de advogado indicado pelaSe~ao local da Ordem dos Advogados do Brasil e de defensor indicado pelasDefensorias PUblicas competentes, permanecerao guardados em uma fecha­da a chave, sob a responsabilidade do juiz presidente.

§ 4Q 0 jurado que tiver integrado 0 Conselho de Senten~a nos 12 (doze)meses que antecederem a publica~ao da lista geral fica dela excluido.

§ 5Q Anualmente, a lista geral de jurados sera, obrigatoriamente, com­pletada.' (NR)

SE<;Ao VDo DESAFORAMENTO

'Art. 427. Se 0 interesse da ordem publica 0 reclamar ou houver duvi­da sobre a imparcialidade do juri ou a seguran~a pessoal do acusado, 0

Tribunal, a requerimento do Ministerio PUblico, do assistente, do querelan­te ou do acusado ou mediante representa~ao do juiz competente, poderadeterminar 0 desaforamento do julgamento para outra comarca da mesmaregiao, onde nao existam aqueles motivos, preferindo-se as mais pr6ximas.

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Anexos

§ 1Q 0 pedido de desaforamento sera distribuido imediatamente e terapreferencia de julgamento na Camara ou Turma competente.

§ 29 Sendo relevantes os motivos alegados, 0 relator podera determinar,fundamentadamente, a suspensao do julgamento pelo juri.

§ 3Q Sera ouvido 0 juiz presidente, quando a medida nao tiver sido porele solicitada.

§ 4' Na pendencia de recurso contra a decisao de pronuncia ou quandoefetivado 0 julgamento, nao se admitira 0 pedido de desaforamento, salvo,nesta ultima hip6tese, quanto a fato ocorrido durante ou ap6s a realiza~ao dejulgamento anulado.' (NR)

'An. 428. 0 desaforamento tambem podera ser determinado, em razaodo comprovado excesso de servi,o, ouvidos 0 juiz presidente e a pane con­traria, se 0 julgamento nao puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses,contado do transito em julgado da decisao de pronuncia.

§ 10 Para a contagem do prazo referido neste anigo, nao se computarao tempo de adiamentos, diligencias ou incidentes de interesse da defesa.

§ 20 Nao havendo excesso de servi~o ou existencia de processos aguar­dando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de aprecia­,ao pelo Tribunal do Juri, nas reuni6es peri6dicas previstas para 0 exercicio,o acusado podera requerer ao Tribunal que determine a imediata realiza,aodo julgamento.' (NR)

SE~AO VIDA ORGANIZA~AODA PAUTA

'An. 429. Salvo motivo relevante que autorize altera,ao na ordem dosjulgamentos, terao preferencia:

I - os acusados presos;II - dentre os acusados presos, aqueles que estiverem ha mais tempo na

prisao;III - em igualdade de condi~6es, os precedentemente pronunciados.§ 1Q Antes do dia designado para 0 primeiro julgamento da reuniao

peri6dica, sera afixada na pona do edificio do Tribunal do Juri a lista dos pro­cessos a serem julgados, obedecida a ordem prevista no caput deste anigo.

§ 2Q 0 juiz presidente reservara datas na mesma reuniao peri6dica paraa inclusao de processo que tiver 0 julgamento adiado.' (NR)

'An. 430. 0 assistente somente sera admitido se tiver requerido sua habi­lita,ao ate 5 (cinco) dias antes da data da sessilo na qual pretenda atuar.' (NR)

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Anexos

'Art. 431. Estando 0 pracesso em ordem, 0 juiz presidente mandani inti­mat as partes, 0 ofendido, se fot possivel, as testemunhas e os peritos, quan­do houver requerimento, pata a sessao de instru~ao e julgamento, observan­do, no que couber, 0 disposto no art. 420 deste C6digo.' (NR)

SEC;Ao VII

Do SORTEIO E DA CONVOCAc;Ao DOS JURADOS

'Art. 432. Em seguida a organiza~ao da pauta, 0 juiz presidente deter­minani a intima~ao do Ministerio Publico, da Ordem dos Advogados doBrasil e da Defensoria PUblica para acompanharem, em dia e hora designa­dos, 0 sorteio dos jurados que atuarao na reuniiio peri6dica.' (NR)

'Art. 433. 0 sorteio, presidido pelo juiz, far-se-a a portas abertas, caben­do-Ihe retirar as cedulas ate completar 0 numera de 25 (vinte e cinco) jura­dos, para a reuniao peri6dica ou extraordinaria.

§ I' 0 sorteio sera realizado entre 0 ISo (Mcimo quinto) e 0 100 (Mci­mo) dia util antecedente a instala~ao da reuniiio.

§ 2' A audiencia de sorteio niio sera adiada pelo niio comparecimentodas partes.

§ 3' 0 jurado niio sorteado podera ter 0 seu nome novamente incluidopara as reuniDes futuras.' (NR)

'Art. 434. Os jurados sorteados seriio convocados pelo correio ou porqualquer ontro meio habil para comparecer no dia e hora designados para areuniao, sob as penas da lei.

Paragrafo unico. No mesmo expediente de convoca~ao seriio transcritosos arts. 436 a 446 deste C6digo.' (NR)

'Art. 435. Seriio afixados na porta do edificio do Tribunal do JUri a rela­~iio dos jurados convocados, os nomes do acusado e dos procuradores daspartes, alem do dia, hora e local das seSSDes de instru~iio e julgamento.' (NR)

SEc;Ao VIII

DA FUNc;Ao DO JURADO

'Art. 436. 0 servi~o do jUri e obrigat6rio. 0 alistamento compreenderaos cidadiios maiores de 18 (dezoito) anos de not6ria idoneidade.

§ 10 Nenhum cidadao podera ser excluido dos trabalhos do juri ou dei­xar de ser alistado em raziio de COt ou etnia, ra~a, credo, sexo, prafissiio, clas­se social ou economica, origem ou grau de instru~ao.

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Anexos

§ 2Q A recusa injustificada ao servi<;o do juri acarretani multa no valorde I (urn) a 10 (dez) sahirios minimos, a criterio do juiz, de acordo com acondi<;ao economica do jurado.' (NR)

'Art. 437. Estao isentos do servi<;o do juri:I - 0 Presidente da Republica e os Ministros de Estado;II - os Governadores e seus respectivos Secretarios;III - os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas

e das Camaras Distrital e Municipais;IV - os Prefeitos Municipais;V - os Magistrados e membros do Ministerio Publico e da Defensoria

Publica;VI - os servidores do Poder Judiciario, do Ministerio Publico e da

Defensoria Publica;VII - as autoridades e os servidores da pollcia e da seguran<;a publica;VIII - os militares em servi<;o ativo;IX - os cidadaos maiores de 70 (setenta) anos que requeiram sua dispensa;X - aqueles que 0 requererem, demonstrando justo impedimento.' (NR)'Art. 438. A recusa ao servi<;o do juri fundada em convic<;ao religiosa,

filosofica ou politica importara no dever de prestar servi<;o altemativo, sobpena de suspensao dos direitos politicos, enquanto nao prestar 0 servi<;oimposto.

§ I Q Entende-se por servi<;o alternativo 0 exercicio de atividades decarMer administrativo, assistencial, filantr6pico ou mesmo produtivo, noPoder Judiciario, na Defensoria Publica, no Ministerio Publico ou em enti­dade conveniada para esses fins.

§ 2' 0 juiz fixara 0 servi<;o alternativo atendendo aos principios da pro­porcionalidade e da razoabilidade.' (NR)

'Art. 439. 0 exercicio efetivo da fun<;ao de jurado constituira servi<;opublico relevante, estabelecera presun<;ao de idoneidade moral e asseguraraprisao especial, em caso de crime comum, ate 0 julgamento definitivo.' (NR)

'Art. 440. Constitui tambem direito do jurado, na condi<;ao do art. 439deste Codigo, prefen'ncia, em igualdade de condi<;6es, nas licita<;6es publicase no provimento, mediante concurso, de cargo ou fun<;ao publica, bern comonos casos de promo<;ao funcional ou remo<;ao voluntaria.' (NR)

'Art. 441. Nenhum desconto sera feito nos vencimentos ou salario dojurado sorteado que comparecer asessao do juri.' (NR)

'Art. 442. Ao jurado que, sem causa legitima, deixar de comparecer nodia marcado para a sessao ou retirar-se antes de ser dispensado pelo presi-

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Anexos

dente sera aplicada multa de 1 (urn) a 10 (dez) salarios minimos, a criterio dojuiz, de acordo com a sua condi~ao economica.' (NR)

'Art. 443. Somente sera aceita escusa fundada em motivo relevantedevidamente comprovado e apresentada, ressalvadas as hip6teses de for~a

maior, ate 0 momento da chamada dos jurados.' (NR)'Art. 444. 0 jurado somente sera dispensado por decisao motivada do

juiz presidente, consignada na ata dos trabalhos.' (NR)'Art. 445. 0 jurado, no exercicio da fun~ao ou a pretexto de exerce-Ia,

sera responsavel criminalmente nos mesmos termos em que 0 sao os juizestogados.' (NR)

'Art. 446. Aos suplentes, quando convocados, serao aplicaveis os dispo­sitivos referentes as dispensas, faltas e escusas e a equipara~ao de responsa­bilidade penal prevista no art. 445 deste C6digo.' (NR)

SE<;AO IX

DA COMPOSI<;Ao DO TRIBUNAL DO JORI E DA FORMA<;AO

DO CONSELHO DE SENTEN<;A

'Art. 447. 0 Tribunal do JUri e composto par 1 (urn) juiz togado, seupresidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serao sorteados dentre os alis­tados, 7 (sete) dos quais constituirao 0 Conselho de Senten~a em cada sessaode julgamento.' (NR)

'Art. 448. Sao impedidos de servir no mesmo Conselho:I - marido e mulher;II - ascendente e descendente;III - sogro e genro ou nora;IV - irmaos e cunhados, durante 0 cunhadio;V - tio e sobrinho;VI - padrasto, madrasta ou enteado.§ 10 0 mesmo impedimento ocorrera em rela~ao as pessoas que mante­

nham undo estavel reconhecida como entidade familiar.§ 20 Aplicar-se-a aos jurados 0 disposto sobre os impedimentos, a sus­

pei~ao e as incompatibilidades dos juizes togados.' (NR)'Art. 449. Nao podera servir 0 jurado que:I - tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, inde­

pendentemente da causa determinante do juIgamento posterior;II - no caso do concurso de pessoas, houver integrado 0 Conselho de

Senten~a que julgou 0 outro acusado;

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Anexos

III - tiver manifestado previa disposi~ao para condenar ou absolver 0

acusado.' (NR)'Art. 450. Dos impedidos entre si por parentesco ou rela~ao de convi­

vencia, servin! 0 que houver sido sorteado em primeiro lugar.' (NR)'Art. 451. as jurados excluidos por impedimento, suspei~ao ou incom­

patibilidade serao considerados para a constitui~ao do numero legal exigivelpara a realiza~ao da sessao.' (NR)

'Art. 452. a mesmo Conselho de Senten~a poden! conhecer de mais deurn processo, no meSillO dia, se as partes 0 aceitarem, hip6tese em que seusintegrantes deverao prestar novo compromisso.' (NR)

SE<;AO XDA REUNIAo E DAS SESSOES DO TRlBU1\AL DO JURI

'Art. 453. a Tribunal do Juri reunir-se-a para as sess6es de !nstru~ao ejulgamento nos periodos e na forma estabelecida pela lei local de organiza­~ao judiciaria.' (NR)

'Art. 454. Ate 0 momento de abertura dos trabalhos da sessao, 0 juizpresidente decidira os casos de isen~ao e dispensa de jurados e 0 pedido deadiamento de julgamento, mandando consignar em ata as delibera~6es.' (NR)

'Art. 455. Se 0 Ministerio Publico nao comparecer, 0 juiz presidenteadiara 0 julgamento para 0 primeiro dia desimpedido da mesma reuniao,cientificadas as partes e as testemunhas.

Para.grafo unico. Se a ausencia nao for justificada, 0 fato sera imediata­mente comunicado ao Procurador-Geral de Justi~a com a data designadapara a nova sessao.' (NR)

'Art. 456. Se a falta, sem escusa legitima, for do advogado do acusado, ese autra naa for por este constituido, 0 fato sera imediatamente camunicadaao presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, com a datadesignada para a nova sessao.

§ I' Nao havendo escusa legitima, 0 julgamento sera adiado somenteuma vez, devendo 0 acusado ser julgado quando chamado novamente.

§ 2' Na hip6tese do § I' deste artigo, 0 juiz intimara a DefensoriaPublica para 0 novo julgamento, que sera adiado para 0 primeiro dia desim­pedido, observado 0 prazo minimo de 10 (dez) dias.' (NR)

'Art. 457. a julgamento nao sera adiado pelo nao comparecimento doacusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sidoregularmente intimado.

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Anexos

§ 10 Os pedidos de adiamento e as justifica~6es de nao comparecimen­to deverao ser, salvo comprovado motivo de far~a maiar, previamente sub­metidos a aprecia~ao do juiz presidente do Tribunal do Juri.

§ 20 Se 0 acusado preso nao for conduzido, 0 ju1gamento sera adiadopara 0 primeiro dia desimpedido da mesma reuniao, salvo se houver pedidode dispensa de comparecimenta subscrito por ele e seu defensor.' (NR)

'Art. 458. Se a testemunha, sem justa causa, deixar de comparecer, 0

juiz presidente, sem prejuizo da a~ao penal pela desobediencia, aplicar-Ihe­a a multa prevista no § 2Q do art. 436 deste Codigo.' (NR)

'Art. 459. Aplicar-se-a as testemunhas a servi~o do Tribunal do Juri 0

disposta no art. 441 deste Codigo.' (NR)'Art. 460. Antes de constituido 0 Conselho de Senten~a, as testemunhas

seriio recolhidas a lugar onde umas nao possam ouvir os depoimentos dasoutras.' (NR)

'Art. 461. 0 julgamento niio sera adiado se a testemunha deixar de com­parecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intima~ao por manda­do, na oportunidade de que trata 0 art. 422 deste Codigo, declarando niioprescindir do depoimento e indicando a sua localiza~ao.

§ loSe, intimada, a testemunha nao comparecer, 0 juiz presidente sus­pendera os trabalhos e mandara conduzi-Ia ou adiara 0 julgamento para 0

primeiro dia desimpedido, ordenando a sua condu~ao.

§ 20 0 julgamento sera realizado mesmo na hipotese de a testemunhanao ser encontrada no local indicado, se assim for certificado por oficial dejusti~a.' (NR)

'Art. 462. Realizadas as diligencias referidas nos arts. 454 a 461 desteCodigo, 0 juiz presidente verificara se a uma contem as cedulas dos 25 (vintee cinco) jurados sorteados, mandando que 0 escrivao proceda a chamadade1es.' (NR)

'Art. 463. Comparecendo, pelo menos, 15 (quinze) jurados, 0 juiz pre­sidente declarara instalados os trabalhos, anunciando 0 processo que serasubmetido a julgamento.

§ 10 0 oficial de justi~a fara 0 pregao, certificando a diligencia nosautos.

§ 20 Os jurados excluidos por impedimenta ou suspei~ao seriio compu­tados para a constitui~ao do numero legal.' (NR)

'Art. 464. Nao havendo 0 numero referido no art. 463 deste Codigo,proceder-se-a ao sorteio de tantos suplentes quantos necessarios, e designar­se-a nova data para a sessao do juri.' (NR)

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Anexos

'Art. 465. Os nomes dos suplentes serao consignados em ata, remeten­do-se 0 expediente de convoca~ao, com observancia do disposto nos ans. 434e 435 deste Cadigo.' (NR)

'An. 466. Antes do soneio dos membros do Conselho de Senten~a, 0

juiz presidente esclarecera sobre os impedimentos, a suspei~ao e as incompa­tibilidades constantes dos ans. 448 e 449 deste Cadigo.

§ I Q 0 juiz presidente tambem advenira os jurados de que, uma vez sor­teados, nao poderao comunicar~se entre si e com outrem, nem manifestarsua opiniao sobre 0 processo, sob pena de exclusao do Conselho e multa, naforma do § 2Q do an. 436 deste Cadigo.

§ 2Q A incomunicabilidade sera cenificada nos autos pelo oficial de jus­ti~a.' (NR)

'An. 467. Verificando que se encontram na uma as cedulas relativas aosjurados presentes, 0 juiz presidente soneara 7 (sete) dentre eles para a for­ma~ao do Conselho de Senten~a: (NR)

'Art. 468. Amedida que as cedulas forem sendo retiradas da uma, 0 juizpresidente as lera, e a defesa e, depois delo, 0 Ministerio Publico poderaorecusar os jurados soneados, ate 3 (tres) cada pane, sem motivar a recusa.

Paragrafo unico. 0 jurado recusado imotivadamente por qualquer daspanes sera excluido daquela sessao de instru~ao e julgamento, prosseguindo­se 0 soneio para a composi~ao do Conselho de Senten~a com os juradosremanescentes.' (NR)

'An. 469. Se forem 2 (dois) ou mais os acusados, as recusas poderao serfeitas por urn sa defensor.

§ I Q A separa~ao dos julgamentos somente ocorrera se, em razao dasrecusas, nao for obtido 0 numero minimo de 7 (sete) jurados para compor 0

Conselho de Senten~a.

§ 2Q Determinada a separa~ao dos julgamentos, sera julgado em primei­ro lugar 0 acusado a quem foi atribuida a autoria do fato ou, em caso de co­autoria, aplicar-se-a 0 criterio de preferencia disposto no an. 429 desteCadigo.' (NR)

'An. 470. Desacolhida a argiii~ao de impedimento, de suspei~ao ou deincompatibilidade contra 0 juiz presidente do Tribunal do Juri, 6rgao doMinisterio PUblico, jurado ou qualquer funcionario, 0 julgamento nao sera sus­penso, devendo, entretanto, constar da ata 0 seu fundamento e a decisao.' (NR)

'Art. 471. Se, em conseqiiencia do impedimento, suspei~ao, incompati­bilidade, dispensa ou recusa, nao houver numero para a forma~ao doConselho, 0 julgamento sera adiado para 0 primeiro dia desimpedido, ap6s

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Anexos

sorteados os suplentes, com observiincia do disposto no art. 464 desteCadigo.' (NR)

'Art. 472. Formado 0 Conselho de Senten~a, 0 presidente, levantando­se, e, com ele, todos os presentes, fara aos jurados a seguinte exorta~iio:

Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidadee a proferir a vossa decisao de acordo com a vossa consciencia e os ditamesda justi~a.

as jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderao:Assim 0 prometo.Paragrafo unico. a jurado, em seguida, recebera capias da pronuncia

ou, se for 0 caso, das decis6es posteriores que julgaram admissivel a acusa~ao

e do relatario do processo.' (NR)

SE~Ao XIDA INSTRU~AO EM PLENARIO

'Art. 473. Prestado 0 compromisso pelos jurados, sera iniciada a instru­~ao plenaria quando 0 juiz presidente, 0 Ministerio Publico, 0 assistente, 0

querelante e 0 defensor do acusado tomarao, sucessiva e diretamente, asdeclara~6es do ofendido, se possive!, e inquirirao as testemunhas arroladaspela acusa~ao.

§ 10 Para a inquiri~o das testemunhas arroladas pela defesa, 0 defensordo acusado formulara as perguntas antes do Ministerio Publico e do assisten­te, mantidos no mais a ordem e os criterios estabelecidos neste artigo.

§ 20 as jurados poderao formular perguntas ao ofendido e as testemu­nhas, por intermedio do juiz presidente.

§ 30 As partes e os jurados poderao requerer acarea~6es,reconhecimen­to de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bern como a leitura depe~as que se refiram, exclusivamente, as provas colhidas por carta precatariae as provas cautelares, antecipadas ou nao repetiveis.' (NR)

'Art. 474. A seguir sera 0 acusado interrogado, se estiver presente, naforma estabelecida no Capitulo III do Titulo VII do Livro I deste Cadigo,com as altera~6es introduzidas nesta Se~ao.

§ 10 a Ministerio Publico, 0 assistente, 0 querelante e 0 defensor, nessaordem, poderao formular, diretamente, perguntas ao acusado.

§ 20 as jurados formularao perguntas por intermedio do juiz presidente.§ 30 Nao se permitira 0 uso de algemas no acusado durante 0 periodo

em que permanecer no plenario do juri, salvo se absolutamente necessario a

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AneXDS

ordem dos trabalhos, a seguran~a das testemunhas ou a garantia da integri­dade fisica dos presentes.' (NR)

'Art. 475. 0 registro dos depoimentos e do interrogat6rio sera feitopelos meios ou recursos de grava~ao magnetica, eletr6nica, estenotipia outecnica similar, destinada a obter maior fidelidade e celeridade na colheitada prova.

Paragrafo unico. A transcri~ao do registro, ap6s feita a degrava~ao,

constara dos autos.' (NR)

SE<;Ao XIIDos DEBATES

'Art. 476. Encerrada a instru~ao, sera concedida a palavra ao MinisterioPublico, que fara a acusa~ao, nos limites da pronuncia ou das dedsoes poste­riores que julgaram admissivel a acusa~ao, sustentando, se for 0 caso, a exis­tencia de circunstancia agravante.

§ 10 0 assistente falara depois do Ministerio PUblico.§ 20 Tratando-se de a~ao penal de inidativa privada, falara em primei­

ro lugar 0 querelante e, em seguida, 0 Ministerio PUblico, salvo se este hou­ver retomado a titularidade da a~ao, na forma do art. 29 deste C6digo.

§ 30 Finda a acusa~ao, tera a palavra a defesa.§ 40 A acusa~ao podera replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a

reinquiri~ao de testemunha ja ouvida em plenario.' (NR)'Art. 477. 0 tempo destinado a acusa~ao e a defesa sera de uma hora e

meia para cada, e de uma hora para a replica e outro tanto para a treplica.§ 10 Havendo mais de urn acusador ou mais de urn defensor, combina­

rao entre si a distribui~ao do tempo, que, na falta de acordo, sera divididopelo juiz presidente, de forma a nao exceder 0 determinado neste artigo.

§ 20 Havendo mais de 1 (urn) acusado, 0 tempo para a acusa~ao e a defe­sa sera acrescido de 1 (uma) hora e elevado ao dobro 0 da replica e da trepli­ca, observado 0 disposto no § 10 deste artigo.' (NR)

'Art. 478. Durante os debates as partes nao poderao, sob pena de nuli­dade, fazer referencias:

I - a decisao de pronuncia, as dedsoes posteriores que julgaram admis­sivel a acusa~ao ou a determina~ao do uso de algemas como argumento deautoridade que benefidem ou prejudiquem 0 acusado;

II - ao silencio do acusado ou a ausencia de interrogat6rio por falta derequerimento, em seu prejuizo.' (NR)

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AnexDs

'Art. 479. Durante 0 julgamento nao sera permitida a leitura de docu­mento ou a exibi~ao de objeto que nao tiver sido juntado aos autos com aantecedi'ncia minima de 3 (tres) dias uteis, dando-se ciencia a outra parte.

Panigrafo unico. Compreende-se na proibi~ao deste artigo a leitura dejomais ou qualquer outro escrito, bern como a exibi~ao de videos, grava~6es,fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado,cujo conteudo versar sobre a materia de fato submetida a aprecia~ao e julga­mento dos jurados.' (NR)

'Art. 480. A acusa~ao, a defesa e os jurados poderao, a qualquer momen­to e por intermedio do juiz presidente, pedir ao orador que indique a folhados autos onde se encontra a pe~a por ele lida ou citada, facultando-se, ainda,aos jurados solicitar-Ihe, pelo mesmo meio, 0 esclarecimento de fato por elealegado.

§ 12 Concluidos os debates, 0 presidente indagara dos jurados se estaohabilitados a julgar ou se necessitam de outros esclarecimentos.

§ 22 Se houver duvida sobre questiio de fato, 0 presidente prestar:, escla­recimentos avista dos autos.

§ 32 as jurados, nesta fase do procedimento, terao acesso aos autos e aosinstrumentos do crime se solicitarem ao juiz presidente.' (NR)

'Art. 481. Se a verifica~ao de qualquer fato, reconhecida como essencialpara 0 julgamento da causa, nao puder ser realizada imediatamente, 0 juizpresidente dissolvera 0 Conselho, ordenando a realiza~ao das diligenciasentendidas necessarias.

Paragrafo unico. Se a diligencia consistir na produ~ao de prova pericial,o juiz presidente, desde logo, nomeani perito e formulara quesitos, facultan­do as partes tambem formula-los e indicar assistentes tecnicos, no prazo de5 (cinco) dias.' (NR)

SE~AO XIII

Do QUESTIONARIO E SUA VOTA~Ao

'Art. 482. a Conselho de Senten~a sera questionado sobre materia defato e se 0 acusado deve ser absolvido.

Paragrafo unico. as quesitos serao redigidos em proposi~6es afirmati­vas, simples e distintas, de modo que cada urn deles possa ser respondido comsuficiente clareza e necessaria precisao. Na sua elabora<;ao. 0 presidente leva­ra em conta os termos da pronuncia ou das decis6es posteriores que julgaramadmissivel a acusa~ao, do interrogat6rio e das alega~6es das partes.' (NR)

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Anexos

'Art. 483. Os quesitos serao formulados na seguinte ordem, indagandosobre:

I - a materialidade do fato;II - a autoria ou participa<;ao;111- se 0 acusado deve ser absolvido;IV - se existe causa de diminui<;ao de pena alegada pela defesa;V - se existe circunstancia qualificadora ou causa de aumento de pena

reconhecidas na pronuncia ou em decisaes posteriores que julgaram admis­sivel a acusa<;ao.

§ 10 A resposta negativa, de mais de 3 (tres) jurados, a qualquer dos que­sitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a vota<;iio eimplica a absolvi<;ao do acusado.

§ 20 Respondidos afirmativamente por rnais de 3 (tres) jurados os que­sitos relativos aos incisos I e II do caput deste artigo sen. formulado quesitocom a seguinte reda<;ao:

o jurado absolve 0 acusado?§ 30 Decidindo os jurados pela condena<;ao, 0 julgamento prossegue,

devendo ser formulados quesitos sobre:I - causa de diminui<;ao de pena alegada pela defesa;II - circunstiincia qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhe­

cidas na promincia ou em decis5es posteriores que julgaram admissivel aacusa<;ao.

§ 40 Sustentada a desclassifica<;iio da infra<;ao para outra de competen­cia do juiz singular, sera formulado quesito a respeito, para ser respondidoapas 0 20 (segundo) ou 30 (terceiro) quesito, conforme 0 caso.

§ 50 Sustentada a tese de ocorrencia do crime na sua forma tentada ouhavendo divergencia sobre a tipifica<;ao do delito, sendo este da competen­cia do Tribunal do Juri, 0 juiz formulara quesito acerca destas questaes, paraser respondido apas 0 segundo quesito.

§ 6Q Havendo mais de urn crime ou mais de urn acusado, os quesitosserao formulados em series distintas.' (NR)

'Art. 484. A seguir, 0 presidente lera os quesitos e indagara das partes setern requerimento ou reclama<;iio a fazer, devendo qualquer deles, bern comoa decisao, constar da ata.

Paragrafo unico. Ainda em plenario, 0 juiz presidente explicara aosjurados 0 significado de cada quesito.' (NR)

'Art. 485. Nao havendo duvida a ser esclarecida, 0 juiz presidente, osjurados, 0 Ministerio Publico, 0 assistente, 0 querelante, 0 defensor do acu-

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Anexos

sado, 0 escrivao e 0 oficial de justi~a dirigir-se-ao it sala especial a fim de serprocedida a vota~ao.

§ 10 Na falta de sala especial, 0 juiz presidente determinara que 0 publi­co se retire, permanecendo somente as pessoas mencionadas no caput desteanigo.

§ 20 0 juiz presidente advenira as panes de que nao sera permitidaqualquer interven~aoque possa penurbar a livre manifesta~ao do Conselhoe fara retirar da sala quem se ponar inconvenientemente.' (NR)

'An. 486. Antes de proceder-se it vota~ao de cada quesito, 0 juiz presi­dente mandara distribuir aos jurados pequenas cedulas, feitas de papel opacoe facilmente dobraveis, contendo 7 (sete) deJas a palavra sim, 7 (sete) a pala­vra nao.' (NR)

'Art. 487. Para assegurar 0 sigilo do voto, 0 oficial de justi~a recolheraem umas separadas as cedulas correspondentes aos votos e as nao utiJizadas.'(NR)

'An. 488. Ap6s a resposta, verificados os votos e as cedulas nao utiliza­das, 0 presidente determinara que 0 escrivao registre no termo a votac;ao decada quesito, bem como 0 resultado do julgamento.

Paragrafo unico. Do termo tambem constara a conferencia das cedulasnao utilizadas.' (NR)

'An. 489. As decisoes do Tribunal do Juri serao tomadas por maioria devotos.' (NR)

'An. 490. Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradi~ao

com outra ou outras ja dadas, 0 presidente, expJicando aos jurados em queconsiste a contradic;ao, submetera novamente avotac;ao os quesitos a que sereferirem tais respostas.

Paragrafo unico. Se, pela resposta dada a um dos quesitos, 0 presidenteverificar que ficam prejudicados os seguintes, assim 0 declarara, dando porfinda a vota~ao.' (NR)

'An. 491. Encerrada a vota~ao, sera 0 termo a que se refere 0 an. 488deste C6digo assinado pelo presidente, pelos jurados e pelas panes.' (NR)

SE<;AO XIVDA SENTEN<;A

'An. 492. Em seguida, 0 presidente proferira senten~a que:I - no caso de condena~ao:

a) fixara a pena-base;

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Anexos

b) considerani as circunstancias agravantes au atenuantes alegadas nosdebates;

c) imponi os aumentos ou diminui~6esda pena, em aten~ao as causasadmitidas pelo juri;

d) observara as demais disposi~6es do art. 387 deste C6digo;e) mandara 0 acusado recolher-se ou recomenda-lo-a a prisao em que

se encontra, se presentes as requisitos da prisao preventiva;f) estabelecera os efeitos genericos e especificos da condena~ao;

II - no caso de absolvi~ao:

a) mandara colocar em liberdade 0 acusado se por outro motivo naoestiver preso;

b) revogara as medidas restritivas provisoriamente decretadas;c) impora, se for 0 caso, a medida de seguran~a cabive!.§ loSe houver desclassifica~aoda infra~ao para outra, de competencia

do juiz singular, ao presidente do Tribunal do Juri cabera proferir senten~a

em seguida, aplicando-se, quando 0 delito resultante da nova tipifica~ao forconsiderado pela lei como infra~ao penal de menor potencial ofensivo, 0 dis­posto nos arts. 69 e seguintes da Lei nO 9.099, de 26 de setembro de 1995.

§ 2' Em caso de desclassifica~ao, 0 crime conexo que nao seja dolosocontra a vida sera julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Juri, aplican­do-se, no que couber, 0 disposto no § 10 deste artigo.' (NR)

'Art. 493. A senten~a sera lida em plenario pelo presidente antes deencerrada a sessao de instru~ao e julgamento.' (NR)

SE<;AO XVDA ATA DOS TRABALHOS

'Art. 494. De cada sessao de julgamento 0 escrivao lavrara ata, assinadapelo presidente e pelas partes.' (NR)

'Art. 495. A ata descrevera fielmente rodas as ocorrencias, mencionan-do obrigatoriamente:

I ~ a data e a hora da instala~ao dos trabalhos;II - 0 magistrado que presidiu a sessao e os jurados presentes;III - as jurados que deixaram de comparecer. com escusa au sem ela, e

as san~6es aplicadas;IV - 0 oficio ou requerimento de isen~ao ou dispensa;V - 0 sorteio dos jurados suplentes;VI - 0 adiamento da sessao, se houver ocorrido, com a indica~ao do

motivo;

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Anexos

VII - a abertura da sessao e a presen~a do Ministerio Publico, do que-relante e do assistente, se houver, e a do defensor do acusado;

VIII - 0 pregao e a san~ao imposta, no caso de nao comparedmento;IX - as testemunhas dispensadas de depor;X - 0 recolhimento das testemunhas a lugar de onde umas nao pudes­

sem ouvir 0 depoimento das outras;XI - a verifica~ao das cedulas pelo juiz presidente;XII - a forma~ao do Conselho de Senten~a, com 0 registro dos nomes

dos jurados sorteados e recusas;XIII - 0 compromisso e 0 interrogat6rio, com simples referenda ao

termo;XIV - os debates e as alega~iies das partes com os respectivos funda-

mentos;XV - os incidentes;XVI - 0 julgamento da causa;XVII - a publicidade dos atos da instru~ao plenaria, das diligencias e da

senten~a.' (NR)'Art. 496. A falta da ata sujeitara 0 responsavel a san~iies administrati­

va e penal.' (NR)

SE<;Ao XVIDAS ATRlBUI<;OES DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL DO JURI

'Art. 497. Sao atribui~iies do juiz presidente do Tribunal do Juri, alemde outras expressamente referidas neste C6digo:

I - regular a policia das sessiies e prender os desobedientes;II - requisitar 0 auxilio da for~a publica, que ficara sob sua exclusiva

autoridade;III - dirigir os debates, intervindo em caso de abuso, excesso de lingua­

gem ou mediante requerimento de uma das partes;IV - resolver as questiies incidentes que nao dependam de pronuncia­

mento do juri;V - nomear defensor ao aensado, quando considera-Io indefeso, poden­

do, neste caso, dissolver 0 Conselho e designar novo dia para 0 julgamento,com a nomeac;ao ou a constituic;ao de novo defensor;

VI - mandar retirar da sala 0 acusado que dificultar a realiza~ao do jul­gamento, 0 qual prosseguira sem a sua presen~a;

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Anexos

VII - suspender a sessao pelo tempo indispensavel it realiza~ao das dili­gencias requeridas ou entendidas necessarias, mantida a incomunicabilidadedos jurados;

VIII - interromper a sessao por tempo razoavel, para proferir senten~a

e para repouso ou refei~ao dos jurados;IX - decidir, de oficio, ouvidos 0 Ministerio PUblico e a defesa, ou a

requerimento de qualquer destes, a argiii~ao de extin~ao de punibilidade;X - resolver as quest6es de direito suscitadas no curso do julgamento;XI - determinar, de ofieio ou a requerimento das partes ou de qualquer

jurado, as diligencias destinadas a sanar nulidade ou a suprir falta que preju­dique 0 esclarecimento da verdade;

XII - regulamentar, durante os debates, a interven~ao de uma das par­tes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder ate 3 (tres)minutos para cada aparte requerido, que serao acreseidos ao tempo destaultima." (NR)

Art. 2· 0 art. 581 do Decreto-Lei n9 3.689, de 3 de outubro de 1941 ­C6digo de Processo Penal, passa a vigorar com a seguinte reda~ao:

"Art. 581 .

IV - que pronunciar 0 reu;

VI - (revogado);..................................................................................." (NR)

Art. 30 Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias ap6s a data de suapublica~ao.

Art. 4<> Ficam revogados 0 ineiso VI do caput do art. 58leo CapituloIV do Titulo II do Livro III, ambos do Decreto-Lei n9 3.689. de 3 de outubrode 1941 - C6digo de Processo Penal.

Brasilia, 9 de junho de 2008; 1879 da Independencia e 12Q<> daRepublica.

LUIZ INACIO LULA DA SILVATarso Genro

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ANExo IT

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Lei nQ 11.690, de 9 junho de 2008

Altera dispositivos do Decreta-Lei nQ 3.689, de 3 de outubro de 1941- C6digode Processo Penal, relativos aprova, e da outras providencias

oPRESIDENTEDA REPUBUCA Fa<;o saber que 0 Congresso Nacional

decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 10 Os am. 155, 156, 157, 159,201,210,212,217 e 386 do Decreto­Lei nO 3.689, de 3 de outubro de 1941 - C6digo de Processo Penal, passam avigorar com as seguintes alterac;6es:

"An. 155. 0 juiz formara sua convic~ao pela livre aprecia~ao da provaproduzida em contradit6rio judicial, nao podendo fundamentar sua decisaoexclusivamente nos elementos informativos calhidos na investigac;ao. ressal­vadas as provas cautelares, nan repetiveis e antecipadas.

Paragrafo unico. Somente quanta ao estado das pessoas serao observa­das as restri~oes estabelecidas na lei civil." (NR)

"Art. 156. A prova da alega~ao incumbira a quem a fizer, sendo, porem,facultado ao juiz de oficio:

I - ordenar, mesmo antes de iniciada a a~ao penal, a produ~ao anteci­pada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessida­de, adequa~ao e proporcionalidade da medida;

II - determinar, no curso da instru~ao, au antes de proferir senten~a, arealiza~ao de diligencias para dirimir duvida sabre ponto relevante." (NR)

"Art. 157. Sao inadmissiveis, devendo ser desentranhadas do processo,as provas ilicitas, assim entendidas as obtidas em viola~ao a normas consti­tucionais au legais.

§ 10 Siio tamb<'m inadmissiveis as provas derivadas das ilicitas, salvo quan­do nao evidenciado a nexo de causalidade entre umas e outras, au quando asderivadas puderem ser obtidas par uma fonte independente das primeiras.

§ 20 Considera-se fonte independente aquela que par si s6, seguindo astramites dpieos e de praxe, pr6prios da investiga~ao au instru~ao criminal,seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.

§ 30 Preclusa a decisao de desentranhamento da prova declarada inad­missivel, esta sera inutilizada par decisao judicial, facultado as panes acom­

panhar a incidente.§ 40 (VETADO)

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Anexos

"Art. 159. a exame de corpo de delito e outras pericias serao realizadospor perito oficia\, portador de diploma de curso superior.

§ 10 Na falta de perito oficia\' 0 exame sera realizado por 2 (duas) pes­soas idoneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente naarea especifica, dentre as que tiverem habilita~ao tecnica relacionada com anatureza do exame.

§ 2' as peritos nao oficiais prestarao 0 compromisso de bern e fielmen­te desempenhar 0 encargo.

§ 3' Serao facultadas ao Ministerio Publico, ao assistente de acusa~ao,

ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formula~ao de quesitos e indica­~ao de assistente tecnico.

§ 40 a assistente tecnico atuara a partir de sua admissao pelo juiz e aposa conclusao dos exames e elabora~ao do laudo pelos peritos oficiais, sendo aspartes intimadas desta decisao.

§ 5° Durante 0 curso do processo judicial, e pennitido as partes, quan­to apericia:

I - requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para res­ponderem a quesitos, desde que 0 mandado de intima~ao e os quesitos ouquestoes a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedencia minimade 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar;

II - indicar assistentes tecnicos que poderao apresentar pareceres emprazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiencia.

§ 60 Havendo requerimento das partes, 0 material probat6rio que ser­viu de base a pericia sera disponibilizado no ambiente do orgao oficial, quemantera sempre sua guarda, e na presen~a de perito oficia\, para exame pelosassistentes, salvo se for impossivel a sua conservac;ao.

§ 7' Tratando-se de pencia complexa que abranja mais de uma area deconhecimento especializado, poder-se-a designar a atua~ao de mais de urnperito oficial, e a parte indicar mais de urn assistente tecnico." (NR)

"CAPITULO V

Do OFENDIDO

Art. 201. Sempre que possivel, 0 ofendido sera qualificado e pergunta­do sobre as circunstancias da infrac;ao, quem seja ou presuma ser 0 seu autor,as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarac;6es.

§ 10 Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo,o ofendido podera ser conduzido a presen~a da autoridade.

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Anexos

§ 20 0 ofendido sera comunicado dos atos processuais relativos aoingresso e it saida do acusado da prisao, it designa~ao de data para audienciae asentenc;a e respectivos acordaos que a mantenham ou modifiquem.

§ 30 As comunica~6es ao ofendido deverao ser feitas no endere~opor eleindicado, admitindo-se, por op~ao do ofendido, 0 uso de meio eletronico.

§ 40 Antes do inicio da audiencia e durante a sua realiza~ao, sera reser­vado espa~o separado para 0 ofendido.

§ 50 Se 0 juiz entender necessario, podera encaminhar 0 ofendido paraatendimento multidisciplinar, especialmente nas areas psicossocial, de assis­tencia juridica e de saude, a expensas do ofensor ou do Esrado.

§ 6Q 0 juiz tomara as providencias necessarias it preservac;ao cia intimi­dade, vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, deter­minar 0 segredo de justi~a em rela~ao aos dados, depoimentos e outras infor­mac;6es constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposic;ao aosmeios de comunica~ao." (NR)

"An. 210. As tesremunhas serao inquiridas cada uma de per si, de modoque umas nao saibam nem ou~am os depoimentos das ourras, devendo 0 juizadveni-las das penas cominadas ao falso testemunho.

Paragrafo unico. Antes do inicio da audiencia e durante a sua realiza­~ao, serao reservados espa~os separados para a garantia da incomunicabilida­de das testemunhas." (NR)

"An. 212. As perguntas serao formuladas pelas panes diretamente it tes­temunha, nao admitindo 0 juiz aquelas que puderem induzir a resposta, naotiverem relac;ao com a causa ou importarem na repetic;ao de outra ja respon­dida.

Paragrafo unico. Sobre os pontos nao esclarecidos, 0 juiz podera com­plementar a inquiri~ao." (NR)

"An. 217. Se 0 juiz verificar que a presen~a do reu podera causar humi­lha~ao, temor, ou serio constrangimento it testemunha ou ao ofendido, demodo que prejudique a verdade do depoimento, fad a inquiri~ao por video­conferencia e, somente na impossibilidade dessa forma, determinara a reti­rada do reu, prosseguindo na inquiri~ao,com a presen~a do seu defensor.

Paragrafo unico. A ado~ao de qualquer das medidas previstas no caputdeste artigo devera constar do termo, assim como os motivos que a determi­naram." (NR)

"An. 386 .

IV - estar provado que 0 reu nao concorreu para a infra~ao penal;

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Anexos

v - nao existir prova de ter 0 reu concorrido para a infra~ao penal;VI - existirem circunstancias que exc1uam 0 crime ou isentem 0 reu depena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 10 do art. 28, todos do C6digo Penal),ou mesmo se houver fundada duvida sobre sua existencia;VIl - nao existir prova suficiente para a condena~ao.

Paragrafo unico .

Il - ordenara a cessa~ao das medidas caurelares e provisoriamente apli­cadas;............................................................................................." (NR)

Art. :zo Aqueles peritos que ingressaram sem exigencia do diploma decurso superior ate a data de entrada em vigor desta Lei continuarao a atuarexclusivamente nas respectivas areas para as quais se habilitaram, ressalva­dos os peritos medicos.

Art. 30 Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias ap6s a data de suapublica~ao.

Brasilia, 9 de junho de 2008; 1870 da 1ndependencia e 1200 da Republica.

LU1Z lNAclO LULA DA SILVATarso Genro

Jose Antonio Dias Toffoli

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ANExo III

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Lei nQ 11.719, de 20 junho de 2008

Altera dispositivos do Decreta-Lei nQ 3.689, de 3 de outubro de 1941- C6digode Processo Penal, relativos a suspensao do processo, em.endatio libelli, mutatioIibelli e aos procedimentos

o PRESIDENTE DA REPUBLICA Fa~o saber que 0 Congresso Nacionaldecreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1. Os arts. 63, 257, 265, 362, 363, 366, 383, 384, 387, 394 a 405, 531 a538 do Decreto-Lei nO 3.689, de 3 de outubro de 1941 - C6digo de ProcessoPenal, passam a vigorar com a seguinte reda~ao, acrescentando-se 0 art. 396-A:

"Art. 63 .Paragrafo unico. Transitada em julgado a senten~a condenat6ria, a exe­

cu~ao podera ser efetuada pelo valor fixado nos tennos do inciso IV do caputdo art. 387 deste C6digo sem prejuizo da liquida~ao para a apura~ao do danoefetivamente sofrido." (NR)

"Art. 257. Ao Ministerio PUblico cabe:1- promover, privativamente, a a~ao penal publica, na fonna estabele­

cida neste C6digo; e11 - fiscalizar a execu~ao da lei." (NR)"Art. 265. 0 defensor nao podera abandonar 0 processo senao por moti­

vo imperioso, comunicado previamente 0 juiz, sob pena de multa de 10 (dez)a 100 (cern) salarios minimos, sem prejuizo das demais san~6es cabiveis.

§ 10 A audiencia podera ser adiada se, por motivo justificado, 0 defen­sor nao puder comparecer.

§ 20 Incumbe ao defensor provar 0 impedimento ate a abertura daaudiencia. Nao 0 fazendo, 0 juiz nao determinara 0 adiamento de ato algumdo processo, devendo nomear defensor substituto, ainda que provisoriamen­te ou s6 para 0 efeito do ato." (NR)

"Art. 362. Verificando que 0 reu se oculta para nao ser citado, 0 oficialde justi9a certificara a ocorrencia e procedera acitac;ao com hora certa, naforma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de1973 - C6digo de Processo Civil.

Paragrafo unico. Completada a cita~iio com hora certa, se 0 acusado naocomparecer, ser-lhe-a nomeado defensor dativo." (NR)

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Anexos

"Art. 363. 0 processo tera completada a sua forma~ao quando realizadaa cita~ao do acusado.

I - (revogado);II - (revogado).§ 10 Nao sendo encontrado 0 acusado, sera procedida a cita~ao por edital.§ 20 (VETADO)§ 30 (VETADO)§ 40 Comparecendo 0 acusado citado por edital, em qualquer tempo, 0

processo observara 0 disposto nos arts. 394 e seguintes deste Codigo." (NR)"Art. 366. (VETADO)§ 10 (Revogado).§ 20 (Revogado)." (NR)"Art. 383. 0 juiz, sem modificar a descri~ao do fato contida na denun­

cia ou queixa, podera atribuir-Ihe defini~ao juridica diversa, ainda que, emconsequencia, tenha de aplicar pena mais grave.

§ 10 Se, em conseqiiencia de defini~ao juridica diversa, houver possibi­lidade de proposta de suspensao condicional do processo, 0 juiz procedera deacordo com 0 disposto na lei.

§ 20 Tratando-se de infra~ao da competencia de outro juizo, a este seraoencaminhados os autos." (NR)

"Art. 384. Encerrada a instru~ao probatoria, se entender cablvel novadefini~ao juridica do fato, em conseqiiencia de prova existente nos autos deelemento ou circunstancia da infrac;ao penal nao contida na acusac;ao, 0

Ministerio PUblico devera aditar a denuncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco)dias, se em virtude desta houver sido instaurado 0 processo em crime de ac;aopublica, reduzindo-se a termo 0 aditamento, quando feito oralmente.

§ l' Nao procedendo 0 orgao do Ministerio Publico ao aditamento, apli­ca-se 0 art. 28 deste C6digo.

§ 20 Ouvido 0 defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admiti­do 0 aditamento, 0 juiz, a requerimento de qualquer das partes, designara diae hora para continua~ao da audiencia, com inquiri~ao de testemunhas, novointerrogatorio do acusado, realiza~ao de debates e julgamento.

§ 3' Aplicam-se as disposi~6es dos §§ l' e 2' do art. 383 ao caput desteartigo.

§ 4' Havendo aditamento, cada parte podera arrolar ate 3 (tres) teste­munhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando 0 juiz, na senten~a, adstrito aostermos do aditamento.

§ 50 Nao recebido 0 aditamento, 0 processo prosseguira." (NR)"Art. 387...................................................... .

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Anexos

II - mencionara as outras circunstancias apuradas e tudo 0 mais quedeva ser levado em conta na aplica~ao da pena, de acordo com 0 disposto nosarts. 59 e 60 do Decreto-Lei nQ 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - C6digoPenal;

III - aplicara as penas de acordo com essas condusoes;IV - f'ixani valor minimo para repara~ao dos danos causados pela infra­

~ao, considerando os prejuizos sofridos pelo ofendido;

Paragrafo unico. 0 juiz decidi"i, fundamentadamente, sobre a manu­ten~ao ou, se for 0 caso, imposi~ao de prisao preventiva ou de outra medidacautelar, sem prejuizo do conhecimento da apela~ao que vier a ser interpos­ta." (NR)

"Art. 394. 0 procedimento sera comum ou especial.§ 1Q 0 procedimento comum sera ordinario, sumario ou sumarissimo:1- ordinario, quando tiver por objeto crime cuja san~ao maxima comi-

nada for igual ou superior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade;II - sumario, quando tiver por objeto crime cuja san~ao maxima comi­

nada seja inferior a 4 (quatro) anos de pena privativa de liberdade;III - sumarissimo, para as infra~oes penais de menor potencial ofensi­

vo, na forma da lei.§ 2Q Aplica-se a todos os processos 0 procedimento comum, salvo dis­

posi~oes em contrario deste C6digo ou de lei especial.§ 3Q Nos processos de competencia do Tribunal do Juri, 0 procedimen­

to observara as disposi~oes estabelecidas nos arts. 406 a 497 deste C6digo.§ 4Q As disposi~oes dos arts. 395 a 398 deste C6digo aplicam-se a todos

os procedimentos penais de primeiro grau, ainda que nao regulados nesteC6digo.

§ 5Q Aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos especial, sumarioe sumarissimo as disposi~oes do procedimento ordinario." (NR)

"Art. 395. A denuncia ou queixa sera rejeitada quando:I - for manifestamente inepta;II - faltar pressuposto processual ou condi~ao para 0 exercicio da a~ao

penal; ouIII - faltar justa causa para 0 exercicio da a~ao penal.Paragrafo unico. (Revogado)." (NR)"Art. 396. Nos procedimentos ordinario e sumario, oferecida a denun­

cia ou queixa, 0 juiz, se nao a rejeitar liminarmente, recebe-la-a e ordenara

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Ancxos

a citac;iio do acusado para responder aacusac;iio, por escrito, no prazo de 10(dez) dias.

Paragrafo unico. No caso de citac;iio por edital, 0 prazo para a defesacomec;ara a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou dodefensor constituido." (NR)

"Art. 396-A. Na resposta, 0 acusado podera argilir preliminares e alegartudo 0 que interesse asua defesa, oferecer documentos e justificat;6es, espe­cificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e reque­rendo sua intimat;ao, quando necessario.

§ I' A excec;iio sera processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a112 deste Codigo.

§ 2' Niio apresentada a resposta no prazo legal, ou se 0 acusado, citado,niio constituir defensor, 0 juiz nomeara defensor para oferece-Ia, conceden­do-Ihe vista dos autos por 10 (dez) dias."

"Art. 397. Apos 0 cumprimento do disposto no art. 396-A, e par"-grafos,deste C6digo, 0 juiz dever"- absolver sumariamente 0 acusado quando verificar:

I - a existencia manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;II - a existencia manifesta de causa excludente da culpabilidade do

agente, salvo inimputabilidade;III - que 0 fato narrado evidentemente niio constitui crime; ouIV - extinta a punibilidade do agente." (NR)"Art. 398. (Revogado)." (NR)"Art. 399. Recebida a denuncia ou queixa, 0 juiz designara dia e hora

para a audiencia, ordenando a intimac;iio do acusado, de seu defensor, doMinisterio Publico e, se for 0 caso, do querelante e do assistente.

§ I' 0 acusado preso sera requisitado para comparecer ao interrogato­rio, devendo 0 poder publico providenciar sua apresentac;iio.

§ 2° 0 juiz que presidiu a instruc;iio dever"- proferir a sentenc;a." (NR)"Art. 400. Na audiencia de instruc;iio e julgamento, a ser realizada no

prazo maximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-a a tomada de declarac;6esdo ofendido, a inquiric;iio das testemunhas arroladas pela acusac;iio e peladefesa, nesta ordem, ressalvado 0 disposto no art. 222 deste Codigo, berncomo aos esclarecimentos dos peritos, as acarea~6es e ao reconhecimento depessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, 0 acusado.

§ I' As provas seriio produzidas numa so audiencia, podendo 0 juizindeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes au protelat6rias.

§ 2° Os esclarecimentos dos peritos dependeriio de previo requerimen­to das partes." (NR)

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Anexos

"Art. 401. Na instru~ao poderao ser inquiridas ate 8 (oito) testemunhasarroladas pela acusa~ao e 8 (oito) pela defesa.

§ 10 Nesse numero nao se compteendem as que nao prestem compro­misso e as referidas.

§ 20 A parte podera desistir da inquiri~ao de qualquer das testemunhasarroladas, ressalvado 0 disposto no art. 209 deste COdigo." (NR)

"Art. 402. Produzidas as provas, ao final da audiencia, 0 MinisterioPUblico, 0 querelante e 0 assistente e, a seguir, 0 acusado poderao requererdiligencias cuja necessidade se origine de circunstancias ou fatos apurados nainstru~ao." (NR)

"Art. 403. Nao havendo requerimento de diligencias, ou sendo indefe­rido, serao oferecidas alega~6es finais orais por 20 (vinte) minutos, respecti­vamente, pela acusa~ao e pela defesa, prorrogaveis por mais 10 (dez), profe­rindo 0 juiz, a seguir, senten<;a.

§ 10 Havendo mais de urn acusado, 0 tempo previsto para a defesa decada urn sera individual.

§ 20 Ao assistente do Ministerio Publico, ap6s a manifesta~ao desse,serao concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se por igual periodo 0

tempo de manifesta~ao da defesa.§ 30 0 juiz podera, considerada a complexidade do caso ou 0 numero de

acusados, conceder as partes 0 prazo de 5 (cinco) dias sucessivamente para aapresenta~ao de memoriais. Nesse caso, tera 0 prazo de 10 (dez) dias paraproferir a senten~a." (NR)

"Art. 404. Ordenado diligencia considerada imprescindivel, de ofieio oua requerimento da parte, a audiencia sera concluida sem as alega~6es finais.

Paragrafo unico. Realizada, em seguida, a diligencia determinada, aspartes apresentarao, no prazo sucessivo de 5 (cinco) dias, suas alega~6es

finais, por memorial, e, no prazo de 10 (dez) dias, 0 juiz proferira a senten­~a." (NR)

"Art. 405. Do ocorrido em audiencia sera lavrado termo em Iivro pro­prio, assinado pelo juiz e pelas partes, contendo breve resumo dos fatos rele­vantes nela ocorridos.

§ 10 Sempre que possivel, 0 registro dos depoimentos do investigado,indiciado, ofendido e testemunhas sera feito pelos melos ou recursos de gra­va~ao magnetica, estenotipia, digital ou tecnica similar, inclusive audiovi­sual, destinada a obter maior fidelidade das informa~6es.

§ 20 No caso de registro por meio audiovisual, sera encaminhado as par­tes c6pia do registro original, sem necessidade de transcri~ao." (NR)

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Anexos

"Art. 531. Na audiencia de instru~ao e julgamento, a ser tealizada noprazo maximo de 30 (trinta) dias, proceder-se-a a tomada de declara~6esdoofendido, se possivel, ainquiri~ao das testemunhas arroladas pela acusa~ao epela defesa, nesta ordem, ressalvado 0 disposto no art. 222 deste C6digo, berncomo aos esclarecimentos dos peritos, as acareac;oes e ao reconhecimento depessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, 0 acusado e procedendo-se,finalmente, ao debate." (NR)

"Art. 532. Na instru~ao, poderao ser inquiridas ate 5 (cinco) testemu­nhas arroladas pela acusa~ao e 5 (cinco) pela defesa." (NR)

"Art. 533. Aplica-se ao procedimento sumario 0 disposto nos paragra-fos do art. 400 deste C6digo.

§ ]Q (Revogado).§ 2Q (Revogado).§ 3Q (Revogado).§ 4Q (Revogado)." (NR)"Art. 534. As alega~6es finais serao orais, concedendo-se a palavra, res­

pectivamente, aacusa~ao e adefesa, pelo prazo de 20 (vinte) minutos, pror­rogaveis par mais ]0 (dez), proferindo 0 juiz, a seguir, senten~a.

§ ] Q Havendo mais de urn acusado, 0 tempo previsto para a defesa decada urn sera individual.

§ 2Q Ao assistente do Ministerio PUblico, ap6s a manifesta~ao deste,serao concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se par igual periodo 0

tempo de manifesta~ao da defesa." (NR)"Art. 535. Nenhum ato sera adiado, salvo quando imprescindivel a pro­

va faltante, determinando 0 juiz a condu~ao coercitiva de quem deva com­parecer.

§ ]Q (Revogado).§ 2Q (Revogado)." (NR)"Art. 536. A testemunha que comparecer sera inquirida, independente­

mente da suspensao da audiencia, observada em qualquer caso a ordem esta­belecida no art. 53] deste C6digo." (NR)

"Art. 537. (Revogado)." (NR)"Art. 538. Nas infra~6es penais de menor potencial ofensivo, quando 0

juizado especial criminal encaminhar ao juizo comum as pe~as existentespara a ado~ao de outro procedimento, observar-se-a 0 procedimento suma­rio previsto neste Capitulo.

§ ]Q (Revogado).§ 2Q (Revogado).

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Anexos

§39 (Revogado).§ 4° (Revogado)." (NR)Art. 2" Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias ap6s a data de sua

publica~iio.

Art. 3" Fiearn revogados os arts. 43, 398, 498, 499, 500, 501, 502, 537,539,540,594, os §§ l' e 20 do art. 366, os §§ l' a 40 do art. 533, os §§ 19 e 29

do art. 535 e os §§ 19 a 49 do art. 538 do Decreto-Lei n' 3.689, de 3 de outu­bra de 1941 - C6digo de Processo Penal.

Brasilia, 20 de junho de 2008; 1870 da Independencia e 12{)!2 da Republica.

LUIZ INAcIO LULA DA SILVATarso Genro

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