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Contributo feito pela colega Maria Santos, obrigada!

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A Reviso de 2010 do Cdigo de Processo Penal Portugus.

Jos Manuel Saporiti Machado da Cruz Bucho

Guimares, 8-11-2010.

A Reviso de 2010 do Cdigo de Processo Penal Portugus.Sumrio I. Introduo II. O segredo de Justia: uma reviso falhada1. A evoluo legislativa 2. O novo texto legal 3. A assistncia do pblico [artigo 86., n.6, alnea a)] 4. A identificao no processo (artigo 86., n.10) 5. O regime previsto na Proposta de Lei 5.1. Os textos legais propostos 5.2. A manuteno da regra da publicidade. A deciso do Ministrio Pblico e a interveno judicial 5.3. Dvidas e preocupaes suscitadas pelo regime emergente da Proposta de Lei n. 12/IX a) O mbito do segredo b) O levantamento do segredo c) O mbito da interveno judicial d) A legitimidade para requerer a interveno judicial f) O prazo para requerer a interveno judicial g) A falta de sancionamento dos abusos h) A eliminao da irrecorribilidade 5.4. Consulta de auto e obteno de certido e informao por sujeitos processuais (artigo 89)

III - Prazos de inqurito1. Os prazos de inqurito e a sua violao 2. O novo texto legal. 3. A manuteno da conexo entre os prazos mximos de inqurito e o fim do segredo interno 4. Manuteno do prazo (geral) de 8 meses para o inqurito sem arguidos privados da liberdade 5. Manuteno dos diversos prazos de inqurito com arguidos privados da liberdade

I

6. Criao de prazos especiais para inqurito sem arguidos privados da liberdade, atendendo gravidade do crime e/ou complexidade do processo. a) A lgica dos novos prazos b) Quem declara a excepcional complexidade de inquritos sem arguidos presos (e com arguidos presos). 7. A suspenso do prazo a) Outros instrumentos para alm da carta rogatria b) A proposta de outras causas de suspenso 8. Sucesso de prazos. Aplicao no tempo. Contagem de prazos.

IV - Medidas de CoacoA) Disposies gerais e modos de impugnao 1. Fixao de prazo mximo para aplicao de medida de coaco a arguido no detido 2. Recurso (artigo 219.) B) Priso preventiva. 1. Manuteno da exigncia de pena mxima superior a 5 anos 2. O alargamento da admissibilidade da priso preventiva a crimes punveis com pena de priso de mximo igual a 5 anos, por via do alargamento do conceito de criminalidade violenta [artigos 1, alnea j) e 202, n.1, al. b)] 3. O alargamento da admissibilidade da priso preventiva a crimes punveis com pena de priso de mximo superior a 3 anos, por via do alargamento do conceito de criminalidade altamente organizada [artigos 1, alnea m) e 202, n.1, al. c)] a) O crime de trfico de menor gravidade b) A pretensa inconstitucionalidade da definio de criminalidade organizada 4. O alargamento da admissibilidade da priso preventiva a crimes punveis com pena de priso de mximo superior a 3 anos 5. A codificao do dispositivo constante da Lei das Armas 6. O alargamento da admissibilidade da priso preventiva, em caso de violao de medidas de coaco [artigo 203., n.2, alnea a)]

V. A deteno fora de flagrante delito1. O erro de 2007 e as correces parciaisII

2. A correco de 2010

VI. Processos especiaisA) Processo Sumrio 1. Manuteno do mbito do processo sumrio restrito pequena e mdia criminalidade (artigo 381.) 2. Incio do julgamento no prazo de 15 dias (artigo 382., n.4) 3. Notificaes 4. O processo sumrio e as medidas de diverso (artigos 280., 281. e 282 do CPP) - artigo 384. 5. A manuteno da deteno do arguido (artigo 385., n.1) 6. Princpios gerais do julgamento (artigo 386., n.1) 7. O incio da audincia de julgamento (artigo 387.) 8. Assistentes e partes civis (artigo 388.) 9. Tramitao do processo sumrio (389., n.3) 10. Manuteno da competncia do tribunal competente para o julgamento sumrio em caso de reenvio para outra forma de processo (artigo 390., n.2) 11. A sentena oral [artigos 389.-A, 391, n.2 e 379, n.1, alnea a)] 11. 1. Os novos textos legais. 11. 2. A inovao legislativa. 11. 3. Observaes crticas a) Dvidas sobre os ganhos de celeridade. b) A critica indicao sumria dos factos provados e no provados c) A crtica tcnica da remisso par a acusao e para a contestao d) Exame crtico da prova versus exposio sucinta dos motivos de facto. e) A questo da transcrio da sentena f) A meno da data da prtica do crime g) A questo da entrega da cpia da gravao e do incio do prazo para recurso 12. Manuteno da recorribilidade restrita sentena ou ao despacho que puser termo ao processo e incio do prazo para interposio de recurso. 13. Natureza urgente [artigo 103, n.2, al. c)] B) Processo abreviado

III

1. Quando tem lugar: o fim da tcnica dos exemplos padro. 2. Acusao 3. Reenvio para outra forma de processo 4. Sentena oral (artigo 391.-F), recorribilidade (artigo 391.-G) e natureza urgente (artigo 103, n.2, al. c) C) Processo sumarssimo.

VII. Concluso: da reviso minimalista de 2010 necessidade de elaborao de um novo Cdigo.

IV

A Reviso de 2010 do Cdigo de Processo Penal Portugus.I. IntroduoNo passado dia 29 de Outubro de 2010 entrou em vigor a Lei n.26/2010, de 30 de Agosto, 1que procede dcima nona alterao ao Cdigo de Processo Penal, aprovado pelo Dec.-Lei n. 78/87, de 17 de Fevereiro. Como sabido, a reviso do Cdigo de Processo Penal (CPP), operada em 2007, por via da Lei n. 48/2008, de 29 de Agosto, suscitou as mais diversas crticas, receios e apreenses por parte da comunidade jurdica, em particular, e da sociedade, em geral2 O atribulado processo legislativo que lhe esteve subjacente, o curto perodo de vacatio legis, a extenso das alteraes e, sobretudo, algumas das solues perfilhadas, fizeram da Reforma de 20073 a mais tormentosa

1

Dirio da Repblica, 1 srie, n. 168, de 30 de Agosto de 2010. Segundo o artigo 5 deste diploma legal, A presente lei entra em vigor 60 dias aps a sua publicao. 2 sintomtico que logo em 20 de Setembro de 2007, isto , volvidos apenas cinco dias sobre a entrada em vigor da Reforma de 2007, o Grupo Parlamentar do PCP tenha dado entrada no Parlamento do Projecto de Lei n. 404/X/3, pedindo a suspenso da vigncia da Lei n. 48/2007. Este Projecto de Lei foi rejeitado em 18 de Outubro de 2007. Tambm logo em Novembro de 2007 a Procuradoria-Geral da Repblica fez chegar ao Ministrio da Justia e aos diversos partidos polticos representados na Assembleia da Repblica as denominadas Propostas de Alteraes ao Cdigo de Processo Penal que versavam a matria dos artigos 86, 87 e 89 do Cdigo de Processo Penal. Sobre o impacto desta reforma na opinio pblica pode ver-se uma interessante resenha da comunicao social no relatrio do Observatrio Permanente da Justia Portuguesa intitulado O processo de preparao e debate pblico da reforma, de 31 de Janeiro de 2008, disponvel in http://opj.ces.uc.pt. 3 Discutiu-se entre ns se a alterao ao Cdigo de Processo Penal introduzida pela Lei n. 48/2007, consubstanciava uma reforma ou antes uma mera reviso (cfr. a doutrina citada por Vincio Ribeiro no prefcio do seu valioso Cdigo de Processo Penal Notas e Comentrios, Coimbra Editora, 2008, pg. 7 onde pragmaticamente, anuncia o uso indiferente das expresses reforma ou reviso e, mais recentemente, Figueiredo Dias, Sobre a Reviso de 2007 do Cdigo de Processo Penal Portugus, Revista Portuguesa de Cincia Criminal, ano 18, n.s 2 e 3, Abril-Setembro 2008, pgs. 367 e seguintes. Tambm ns faremos uso indiferenciadamente dos termos reviso e reforma, apenas salientando - porque o assunto, verdadeiramente, no tem qualquer utilidade 1

e controvertida de todas as alteraes, reformas ou revises do Cdigo de Processo Penal de 1987. Em boa hora, porm, o Governo de ento (XVII Governo Constitucional) determinou a monitorizao da reforma, a realizar pelo Observatrio Permanente da Justia Portuguesa, de modo a acompanhar e avaliar a aplicao das modificaes introduzidas pela citada Lei n. 48/2007.4 O XVIII Governo Constitucional assumiu o compromisso de, uma vez realizada a avaliao, proceder apresentao e discusso das correces que se mostrassem necessrias. Essa avaliao culminou na entrega, em 2009, de um relatrio final e de um relatrio complementar que procederem a uma avaliao global da reforma de 2007, assinalando alguns aspectos pontuais que poderiam justificar alteraes cirrgicas no sentido de eliminar estrangulamentos na aco penal, como se l na exposio de motivos da Proposta de Lei n. n.12/XI (1). Para o efeito, foi nomeada pelo Governo uma Comisso, envolvendo personalidades ligadas prtica judiciria e ao estudo universitrio, com o objectivo de propor medidas correctivas cirrgicas para aprofundar a anterior reforma processual penal.5prtica - que a prpria exposio de motivos da Proposta de Lei n. 12/XI usa indistintamente aqueles dois vocbulos. 4 Com o objectivo de avaliar a reforma penal, o Observatrio Permanente da Justia Portuguesa Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra elaborou os seguintes relatrios, todos disponveis in http://opj.ces.uc.pt: - O processo de preparao e debate pblico da reforma, de 31 de Janeiro de 2008; - Relatrio de progresso - Anlise preliminar de dados, de 31 de Maro de 2008; - Primeiro relatrio semestral de monitorizao da reforma penal, de 30 de Maio de 2008; - Actualizao dos dados recolhidos junto da Direco-Geral dos Servios Prisionais e da Direco-Geral da Reinsero Social, de 31 de Agosto de 2008; - Segundo relatrio semestral de monitorizao da reforma penal, de 12 de Dezembro de 2008; - Relatrio Intercalar O impacto da reforma na fase de recurso, de 5 de Maio de 2009; - Relatrio Final - A Justia penal, uma reforma de avaliao, de 10 de Julho de 2009; - Relatrio Complementar, de 2 de Outubro de 2009. 5 Despacho do Ministro da Justia de 12 de Novembro de 2009. Pese embora o tom geral encomistico com que foi recebida, na comunicao social mas no s (assim 2

Aquela Comisso elaborou um conjunto de propostas visando corrigir estrangulamentos evidenciados pela prtica e que impediam a reforma de atingir a plenitude das suas virtualidades. Foi com base nessas propostas que, em 18 de Maro de 2010, o Conselho de Ministros aprovou a Proposta de Lei n.12/XI - Procede dcima nona alterao ao Cdigo de Processo Penal, aprovado pelo Dec.-Lei n. 78/87, de 17 de Fevereiro6, a qual foi formalmente apresentada Assembleia da Repblica por S. Ex. o Ministro da Justia, em 24 de Maro de 2010.7 A referida Proposta de Lei que esteve na base da Lei n. 26/2010 recaiu, essencialmente, em cinco matrias fundamentais: processo sumrio e processo abreviado, regime processual do segredo de justia, prazos em que o inqurito decorre com excluso do acesso aos autos por parte dos sujeitos processuais, priso preventiva e deteno. Simultaneamente, os demais partidos com assento parlamentar apresentaram diversos projectos de lei versando aquelas e outras matrias.8 No mbito do processo legislativo que culminou com a publicao da recente Lei n. 26/2010 foram ouvidos, entre outros, o Sindicato dos Magistrados do Ministrio Pblico (SMMP), a Associao Sindical dos

Maia Costa, Notas muito breves sobre a reviso do Cdigo de Processo Penal, Boletim da Associao Sindical dos Juzes Portugueses, VI. Srie, n. 4, Setembro 2010, pg. 188, refere que a comisso tinha credibilidade e era pluralista) a notcia da publicao deste despacho, a composio da dita Comisso suscitou-me as maiores reservas. Assim, v.g., entre as sete personalidades nomeadas, para alm do Secretrio de Estado da Justia que presidia, ele prprio advogado e de um Procurador-Adjunto, que secretariava, apenas foi nomeado um nico magistrado judicial 6 Dirio da Assembleia da Repblica II srie A, n. 53/XI 1, de 24 de Maro de 2010, pgs. 47-57 7 O respectivo discurso de apresentao encontra-se disponvel in http://www.mj.gov.pt 8 Projecto de Lei n. 38/XI/1 (PCP) Altera o Cdigo de Processo Penal visando a defesa da investigao e a eficcia do combate ao crime; Projecto de Lei n. 173/XI/1 (CDS/PP) Alterao ao Cdigo de Processo Penal; Projecto de Lei n. 178/XI-1 (PCP) - Altera o Cdigo de Processo Penal, garantindo maior celeridade no julgamento da criminalidade de menor gravidade; Projecto de Lei n. 181/XI/1 (BE) Altera o Cdigo de Processo Penal; Projecto de Lei n. 275/XI/1 (PSD) Alteraes ao Cdigo de Processo Penal, disponveis in www.parlamento.pt. 3

Magistrados Judiciais (ASMJ) e o Conselho Superior da Magistratura (CSM), que elaboraram pareceres de elevada valia tcnica.9 Estas modestas e despretensiosas notas de estudo inicial sobre a reviso de 2010, limitam-se a reunir, sem preocupao de estilo, um amontoado de papis com apontamentos, rascunhos e pequenas observaes e visam, fundamentalmente, dar conta das principais alteraes legislativas verificadas e da respectiva fundamentao10, chamando a ateno para alguns pontos menos claros e para algumas questes que se iro suscitar na praxis.

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Cfr. ASMJ, Proposta de Lei n. 94/2010 Alteraes ao Cdigo de Processo Penal, relator Antnio Joo Latas, Maro de 2010 e ASMJ, Alteraes ao Cdigo de Processo Penal (Notas Complementares e de Sntese), Audio na AR-1 Comisso, 22.6.2010, relator Antnio Joo Latas, ambos disponveis no Boletim da Associao Sindical dos Juzes Portugueses, VI. Srie, n. 4, Setembro 2010, pgs. 7-19 e 21-32, respectivamente e em www.asjp.pt, e Parecer do SMMP sobre o Projecto de Proposta de Lei para alterao do Cdigo de Processo Penal, 10 de Maro de 2010, in www.smmp.pt. Lamentavelmente, a quase totalidade das observaes crticas constantes destes valiosos pareceres, algumas delas absolutamente inquestionveis, e que muito poderiam ter contribudo para o aperfeioamento do texto legislativo, foram pura e simplesmente ignoradas. 10 semelhana do que sucedera com a Lei n. 48/2007, tambm a Lei n. 26/2010 no contem qualquer prembulo, exposio de motivos ou nota justificativa. claro que o Parlamento portugus no precisa de se justificar quando exerce competncias que lhe esto constitucionalmente cometidas, mas no deixa de ser confrangedora a comparao com o que se passa no pas vizinho. Veja-se, a ttulo exemplificativo, o extenso e esclarecedor Prembulo da recente Ley Orgnica 5/2010, de 22 de junio por la que se modifica la Ley Orgnica 10/1995, de 23 de noviembre, del Cdigo Penal in BOE 23 Junio. 4

II. O segredo de Justia: uma reviso falhada1. A evoluo legislativa Antes das alteraes de 2007 vigorava a regra segundo a qual o processo era secreto durante toda a fase do inqurito, sendo a publicidade a excepo. Recorda-se que segundo a primeira parte do n.1 do artigo 86. do CPP, na redaco que lhe foi conferida pela Lei n. 59/98, O processo penal , sob pena de nulidade, pblico, a partir da deciso instrutria ou, se a instruo no tiver lugar, do momento em que j no pode ser requerida.11

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Sobre as relaes entre os princpios da publicidade e do segredo a doutrina portuguesa envolveu-se numa querela estril. A maioria dos autores considerava a publicidade como regra e o segredo como a excepo (cfr. v. g., Maria Joo Antunes, O segredo de justia e o direito de defesa do arguido sujeito a medida de coaco, in Liber Discipulorum Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 2003, pg. 1241; M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, Cdigo de Processo Penal Anotado, I voI., 2." ed., reimpresso de 2004, pg. 451. Vejam-se tambm os Pareceres do Conselho Consultivo da P.G.R. n. 46/94, relatado por Souto de Moura, e n. 60/2003, relatado por Fernanda Mas, ambos disponveis in www.dgsi.pt e o segundo no Dirio da Repblica, 2 Srie, n. 240, de 16 de Outubro de 2003). Para outros, como Frederico de Lacerda da Costa Pinto (Segredo de Justia e Acesso ao Processo, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, 2004, pg. 71) e Lus Menezes Leito (O segredo de justia em processo penal, in Estudos comemorativos do 150. aniversrio do Tribunal da Boa-Hora, Ministrio da Justia, Lisboa, 1995, pg. 224) a primeira fase (a do inqurito) tendencialmente secreta e a segunda (a do julgamento) tendencialmente pblica, o que compreensvel em funo dos propsitos e finalidades de cada uma delas. Mas por isso no se pode dizer que, no processo penal portugus, a publicidade a regra e o segredo a excepo, pois na verdade a publicidade a regra s para a fase do julgamento, no sendo razovel descrever como excepo o regime que vigora para uma fase de natureza e funo completamente distintas. O que temos, pois, um modelo de processo penal racionalmente estruturado em duas fases com finalidades distintas e regimes diferentes. Duas fases que, cada uma a seu modo e com as caractersticas, contribuem para a realizao da justia penal(Costa Pinto, loc. cit). Vincio Ribeiro chama a ateno para esta querela e conclui, acertadamente, que a polmica no ter grande razo de ser (Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 146).

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As questes do segredo de justia e da sua violao tinham-se tornado entretanto uma questo de moda, sempre que estivessem em causa pessoas de notoriedade poltica, social ou financeira.12 A reviso do CPP, introduzida pela Lei n. 48/2007, de 29 de Agosto, procedeu a uma mudana de paradigma13 que implicou uma revoluo coperniciana do inqurito.1412

Cfr. Germano Marques da Silva, A Reforma do CPP e as perspectivas de evoluo do direito processual penal, Scientia Iuridica, Janeiro-Junho 1999, tomo XLVIII, n.s 277 a 279, pg. 77. Tambm o Relatrio Complementar assinala que a violao do dever de segredo de justia coloca-se, sobretudo, nos processos mediticos que tm como arguidos pessoas com poder econmico, social ou poltico relevante (cit., pg. 38). Sobre a relevncia destas questes na sociedade portuguesa veja-se desenvolvidamente Vincio Ribeiro, Cdigo de Processo Penal, cit., pgs. 143-144, chamando muito justamente a ateno para o facto da questo do segredo de justia j ter feito entre ns cair dois directores gerais da Polcia Judiciria. 13 Como referiu Ricardo Rodrigues, deputado da bancada parlamentar do Partido Socialista, na reunio plenria da Assembleia da Repblica de 19 de Julho de 2007 mudmos o paradigma, Os processos deixam de estar, por regra, em segredo para passarem a ser pblicos, por regra. Portanto, como mudmos o paradigma, no temos receio quanto ao que diz respeito comunicao social. Ou seja, at hoje o grave problema que tnhamos era que todos os processos estavam sujeitos ao segredo de justia e a divulgao de qualquer um deles era um crime de violao do segredo de justia, Como mudmos o paradigma no vemos qual o problema na conjugao de todos esses artigos (Dirio da Assembleia da Repblica, I Srie, n. 108, de 20-72007, pg. 54). 14 Figueiredo Dias, Sobre a Reviso de 2007 do Cdigo de Processo Penal Portugus, cit., pg. 372. No mesmo sentido, Costa Andrade, assinala que O domnio da publicidade/segredo do processo penal foi uma das reas que sofreu mais profundas e copernicanas transformaes s mos do legislador de 2007 (Bruscamente no Vero Passado, a reforma do Cdigo de Processo Penal, Observaes crticas sobre uma lei que podia e devia ter sido diferente. Coimbra Editora, 2009, pg. 58), e Pinto de Albuquerque alude a uma verdadeira revolutio do processo penal (Comentrio ao Cdigo de Processo Penal luz da Constituio da Repblica e da Conveno Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa, Universidade Catlica Editora, 2007, pg. 241), Frederico Lacerda da Costa Pinto, afirma que o novo regime assenta numa ruptura profunda do direito anterior (Publicidade e segredo na ltima reviso do Cdigo de Processo Penal, Revista do CEJ, n. 9, especial, pg. 15) e Henriques Gaspar, refere-se a uma alterao radical do modelo, a desvios de teleologia a uma inverso sistmica (in Revista Portuguesa de Cincia Criminal, ano 18, n.s 2 e 3, Abril-Setembro 2008, pgs. 350 a 354). O prprio Ac. do STJ de fixao de jurisprudncia n. 5/2010, de 15-4-2010, in Dirio da Repblica, 1 srie, n. 94, de 12 de Maio de 2010, depois de assinalar que as modificaes introduzidas ultima hora alteraram o respectivo paradigma, afirma que a publicidade passou a ser a regra logo a partir da fase preliminar do processo, pondo-se termo, de uma forma radical, 6

Na verdade, inverteu-se a regra do segredo de justia na fase do inqurito, que passou de regra a excepo. A regra passou, assim, a ser a da publicidade (interna e externa) do processo. Com efeito, segundo o n. 1 do citado artigo 86., na redaco que lhe foi conferida pela Lei n. 48/2007, O processo penal , sob pena de nulidade, pblico, ressalvadas as excepes previstas na lei.15

tradio jurdica da derrogao da publicidade durante a investigao da notitia criminis(pg. 1664, 1 e 2 colunas, respectivamente). Em sentido contrrio, negando a existncia de um novo paradigma, pronunciou-se Germano Marques da Silva, sublinhando que tantas so as excepes publicidade, podendo ser impostas simplesmente com o pretexto do normal decurso do acto processual, que me parece que a nica verdadeira mudana que a ltima palavra sobre a publicidade cabe ao juiz de instruo, o que alguns pretendem seja inconstitucional, como referi j (A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia. Um Novo Paradigma?, in Revista Portuguesa de Cincia Criminal, ano 18, n.s 2 e 3, Abril-Setembro 2008, pg. 273). 15 A matria do segredo de justia foi substancialmente alterada em relao Proposta do Governo (sobre o regime da Proposta de Lei n. 109/X, veja-se, v.g., Pinto de Albuquerque, Comentrio ao Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 242 e seguintes). A redaco do artigo 86 aprovada corresponde a uma proposta de substituio subscrita pelo PS e pelo PSD, cujos n.s foram discutidos e votados na reunio plenria da Comisso do dia 18 de Julho de 2007. As alteraes ocorridas em sede de segredo de justia constituram a concretizao do firmado no Acordo Poltico Parlamentar para a reforma da Justia, celebrado entre o PS e o PSD, em 8 de Setembro de 2006 (sobre este acordo veja-se, em geral, Costa Andrade, Bruscamente no Vero Passadocit., pgs. 17-18 e 28-30), nos seguintes termos: I. restringido o segredo de justia, passando, em regra, a valer o princpio da publicidade, s se justificando a aplicao do regime do segredo quando a publicidade prejudique a investigao ou os direitos das sujeitos processuais. A manuteno do segredo de justia na fase de inqurito fica dependente de deciso judicial. Suscitada pela vtima, pelo arguido ou pelo Ministrio Pblico. Quando os interesses da investigao o justifiquem, o MP poder tambm determinar a sujeio a segredo de justia, ficando essa deciso sujeita a confirmao judicial em prazo curto. Nos casos em que seja aplicvel, o segredo de justia no pode perdurar por mais de trs meses para alem dos prazos legais do inqurito. A violao do segredo de justia constitui crime e o respeito pela sua aplicao vincula de igual modo quer aqueles que tenham contacto directo com o processo quer aqueles que a qualquer ttulo tenham conhecimento de elementos que dele constem. 7

A regra da publicidade s quebrada se o juiz de instruo, mediante requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido e ouvido o MP, e se entender que a publicidade prejudica os direitos daqueles sujeitos processuais, determinar, por despacho irrecorrvel, a sujeio do processo a segredo de justia durante a fase do inqurito (n.2 do artigo 86.). O MP pode determinar a aplicao ao processo do segredo de justia, durante o inqurito, se entender que os interesses da investigao ou os direitos dos sujeitos processuais o justificam ficando, porm, essa deciso sujeita a validao pelo juiz de instruo (n.3 do art. 86.). No caso de o arguido, o assistente ou o ofendido requererem o levantamento do segredo de justia mas o Ministrio Pblico no o determinar, os autos so remetidos ao juiz de instruo que decide por despacho irrecorrvel (n.5 do artigo 86.). Este novo modelo foi de imediato objecto das mais severas crticas por parte significativa da doutrina portuguesa e sobretudo por parte de sectores oriundos do Ministrio Pblico ou a ele afectos.1616

Pode ver-se um resumo alargado dessas crticas doutrinais no Ac. do STJ de fixao de jurisprudncia n. 5/2010, de 15-4-2010, in Dirio da Repblica, 1 srie, n. 94, de 12 de Maio de 2010, pgs. 1665-1666. Alguns autores (cfr. Pinto de Albuquerque, Comentrio do Cdigo de Processo Penal, cit., pgs. 243 e 253-255; Manuel Simas Santos, Segredo de Justia e Modelo de Processo Penal, in A Reforma do Sistema Penal de 2007, Garantias e Eficcia, coord. Conceio Gomes e Jos Mouraz Lopes, Coimbra Editora, 2008, pg. 32; Figueiredo Dias, Sobre a Reviso de 2007 do Cdigo de Processo Penal Portugus, cit., pg. 375) vo mesmo ao ponto de suscitar a inconstitucionalidade do regime institudo pelo artigo 86., n.1, por violao do artigo 20., n.3 da Constituio da Repblica que dispe que a lei assegura a adequada proteco do segredo de justia. No partilhamos tal entendimento. Sem prejuzo de entendermos que o regime anterior reforma de 2007 era claramente prefervel, afigura-se-nos, com Germano Marques da Silva, que A Constituio no impe que haja sempre segredo de justia, admite-o desde que adequado. A adequao feita pela lei directamente, ao prever os casos em que ele pode ser estabelecido e o tempo da sua durao, e pela interveno do juiz a quem a lei confia a sua adequao em cada caso. O juiz decidir em cada processo se na concreta situao ou no necessrio e adequado o segredo e quais os seus limites. No nos parece que a Constituio exija mais do que isso. (A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia. Um Novo Paradigma?, cit., pg. 256). Quanto pretensa violao dos artigos 2., 32., n.s 5 e 7 e 219. da Constituio da Repblica tambm invocados por Pinto de Albuquerque e Manuel Simas Santos, por o novo regime conferir ao juiz o poder de decidir oficiosamente e por despacho irrecorrvel a publicidade do inqurito contra a vontade do Ministrio Pblico, Germano Marques da Silva, novamente com a sagesse que o caracteriza e distingue, esclarece que O ncleo 8

Logo em Novembro de 2007 a Procuradoria-Geral a Repblica fez chegar ao Ministrio da Justia, Propostas de Alteraes ao Cdigo de Processo Penal17 que versavam a matria dos artigos 86., 87. e 89. do Cdigo de Processo Penal e em 23 de Janeiro de 2008 o Grupo Parlamentar do PCP deu entrada no Parlamento do Projecto de Lei n. 452/X/3 pretendendo alterar o regime de justia para defesa da investigao, alterando o Cdigo de processo penal, na redaco da Lei n. 48/2007, nomeadamente os seus artigos 86., 88., 89. e 276.. O Relatrio Complementar de forma um pouco lacnica pronunciou-se sobre a manuteno da regra da publicidade em fase de inqurito nos seguintes termos: Uma nota para dizer que a soluo, por muitos defendida no mbito do segredo de justia, de regresso ao modelo anterior no a via adequada num momento em que a reforma comea a ganharessencial do segredo de justia a proteco dos interesses da investigao e da honra dos participantes, mas a tutela desses interesses tem de ser feita em funo das circunstncias concretas do caso e, por isso, que a lei confie, em ltima instncia, essa ponderao ao juiz. A publicidade do processo conformada pela lei como um direito e o garante dos direitos, em ltima instncia, o juiz ou o tribunal (art. 202. da CRP). Por isso que, em caso de conflito, ao juiz que cumpre dirimi-lo e tambm ao juiz que incumbe assegurar a defesa dos direitos dos cidados, desde logo dos sujeitos processuais(ibidem). Quanto pretensa violao do artigo 32., n.1, esquece-se que a efectiva operacionalidade do direito de defesa que o artigo 32, n.1, da Constituio garante ao arguido, exige que em qualquer fase do processo, tambm, por isso, nas fases preliminares, o arguido possa contribuir constitutivamente para a definio do direito no caso, carreando para os autos material probatrio, o que pressupe o conhecimento dos autos. A prpria estrutura acusatria do processo, consagrada no n. 5 do artigo 32. da CRP, aponta no sentido da participao constitutiva dos sujeitos processuais, e no s do arguido, na definio do objecto do processo, o que tambm, pressupe o acesso aos autos por parte dos sujeitos processuais (Germano Marques da Silva, loc. cit, pg. 260). A alegada inconstitucionalidade foi j suscitada perante os tribunais judiciais os quais se pronunciaram, com profundidade, pela constitucionalidade do novo regime - cfr. Ac. da Rel. de vora de 9-12-2008, proc. n. 2234/08-1, rel. Carlos Berguete Coelho, Acs. da Rel. do Porto de 24-11-2008, proc. n. 0814991, rel. Joaquim Gomes, e de 19-11-2008, proc. n. 0815162, rel. Lus Ramos, todos in www.dgsi.pt. O prprio Tribunal Constitucional (Ac. n. 110/2009, in www.tribunalconstitucional.pt) j se pronunciou sobre a constitucionalidade do artigo 86, n. 3, na parte em que sujeita validao pelo juiz de instruo da determinao do Ministrio Pblico em aplicar ao processo o segredo de justia tendo concludo pela inexistncia de violao dos artigos 20., n.3, 32., n.5 e 219., todos da Constituio, luz das questes relativas direco do inqurito, interveno do juiz de instruo na fase pr-acusatria e estrutura acusatria do processo penal. 17 Documento disponvel in www.pgr.pt. 9

estabilidade e se registam dinmicas de mudana de reorganizao e de adaptao das estratgias da investigao. Alm de que no devemos perder de vista que os problemas colocam-se relativamente a um nmero reduzido de processos - os processos de criminalidade grave e complexa.18 No seio da Comisso do Processo Penal no foi possvel obter um consenso em sede de segredo de justia, tendo sido elaborado duas propostas de regime processual da fase de inqurito: uma baseada na regra da publicidade e outra na regra do segredo, tendo esta ltima recolhido a preferncia da maioria dos membros daquela Comisso. O Governo entendeu, porm, manter a regra estabelecida pela reforma de 2007 da publicidade do processo, como princpio legitimador da aco penal e essencial para o controlo democrtico da actividade dos poderes pblicos.19 Simultaneamente, a Proposta de Lei n. 12/IX procurou introduzir inmeras alteraes ao regime do segredo de justia. O resultado foi, porm, politicamente desastroso, uma vez que o Parlamento rejeitou a quase totalidade das alteraes propostas. Com duas nicas excepes, o texto do artigo 86 do CPP manteve-se inalterado. 2. O novo texto legal So as seguintes as alteraes introduzidas ao texto do artigo 86 (Publicidade do processo e segredo de justia): Artigo 86. [] 1.- (). 2 - (). 3 - (). 4 - ().18 19

Relatrio Complementar, cit., pg. 15. Exposio de motivos da Proposta de Lei n. 12/XI. 10

5 - (). 6 - [] a) Assistncia, pelo pblico em geral, realizao do debate instrutrio e dos actos processuais na fase de julgamento; b) []; c) []. 7 - (). 8 - (). 9 - (). 10 - As pessoas referidas no nmero anterior so identificadas no processo, com indicao do acto ou documento de cujo contedo tomam conhecimento e ficam em todo o caso, vinculadas pelo segredo de justia. 11 - (). 12 - (). 13 - ().

3. A assistncia do pblico [artigo 86., n.6, alnea a)] Na redaco anterior, emergente da reforma de 2007, a publicidade implicava a assistncia, pelo pblico em geral, realizao dos actos processuais20 o que tinha suscitado inmeras dvidas e preocupaes no que se referia a actos de inqurito e de instruo.21 Uma interpretao literal daquele texto legal permitia a afirmao de que qualquer cidado tem o direito de se dirigir s instalaes da PJ ou a qualquer esquadra do pas para assistir a actos processuais.2220

Artigo 86., n. 6, alnea a), na redaco conferida pela Lei n.48/2007, de 29 de Agosto. Tambm neste domnio, a soluo legislativa adoptada em 2007 se afastou diametralmente da constante na Proposta de Lei n. 109/X, a qual excepcionava expressamente da assistncia pelo pblico em geral, os actos processuais que tiverem lugar durante o inqurito e a instruo. 21 Cfr. Vincio Ribeiro, Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 155-156, onde o autor prope que o magistrado titular do processo, em caso de publicidade pode, pelo menos por analogia (que no proibida em processo penal) restringir a livre assistncia do pblico ou excluir a publicidade (artigo 87.), em moldes similares ao do juiz na audincia de julgamento (pg. 155) e Germano Marques da Silva A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia. Um Novo Paradigma?, cit., pg. 264. 22 Pinto de Albuquerque, Comentrio do Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 244. O Autor reputa, porm, o artigo 86., n.6, al. a) do CPP de inconstitucional na parte em que no exclui os actos de inqurito e da instruo (ibidem). No subscrevemos este entendimento pelas razes expostas na precedente nota 16. 11

Mais ainda: Quando o juiz ou o Ministrio Pblico despacharem devem abrir a porta para quem quiser entrar se possa acomodar porque tambm os despachos do Ministrio Pblico e do juiz so actos processuais! 23 Esta soluo legislativa, ou pelo menos aquela interpretao, ultrapassava, em muito, os limites do razovel e do bom senso. O novo texto legal veio por cobro irracionalidade da anterior soluo e, nessa medida, merece inteiro aplauso.24 Na verdade, em sede de publicidade esclarece-se, agora, de modo cristalino, que a publicidade nas fases preliminares se limita assistncia pelo pblico realizao do debate instrutrio - art. 86, n.6, al. a) [6. A publicidade do processo implica, nos termos definidos pela lei e, em especial, pelos artigos seguintes, os direitos de: () a) Assistncia, pelo pblico em geral, realizao do debate instrutrio e dos actos processuais na fase de julgamento].25

4. A identificao no processo (artigo 86., n.10) Nos casos previstos no n.9 do artigo 86. em que a autoridade judiciria, no condicionalismo ali previsto, pode dar ou ordenar ou permitir que seja dado conhecimento a determinadas pessoas do contedo de acto ou de documento em segredo de justia, o n. 10 estatua que essas pessoas ficam, em todo o caso, vinculadas pelo segredo de justia.23

A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia. Um Novo Paradigma?, cit., pg. 264. 24 No que se refere ao inqurito, a soluo adoptada afigura-se-nos prefervel adiantada pelo Prof. Germano Marques da Silva, nas alteraes lei por si sugeridas, nos termos das quais, Nas fases de inqurito e de instruo, a possibilidade de assistncia de qualquer pessoa realizao de actos processuais fica dependente de deciso fundamentada da autoridade judiciria ou de polcia criminal responsvel pela realizao das diligncias processuais, tendo, nomeadamente, em considerao a natureza destas e as circunstncias em que forem efectuadas (artigo 87., n.1) - A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia. Um Novo Paradigma?, cit., pg. 275. 25 A nova redaco do preceito, correspondente redaco coincidente da Proposta de Lei n. 12/XI e das propostas de substituio apresentadas pelo PSD, foi aprovada com votos a favor do PS e do PSD e a absteno do CDS/PP, do BE e do PCP. 12

A nova redaco conferida ao n. 10 [10 - As pessoas referidas no nmero anterior so identificadas no processo, com indicao do acto ou documento de cujo contedo tomam conhecimento e ficam em todo o caso, vinculadas pelo segredo de justia26] limitou-se a acrescentar a exigncia de identificao daquelas pessoas no processo. Estamos em crer que esta identificao, agora exigida legalmente, constitua j, por certo, uma prtica corrente. Agora no basta, porm, que essa identificao fique junta no processo administrativo a cargo do Ministrio Pblico, ou conste de qualquer expediente arquivado no Tribunal: necessrio que ela conste do processo, com meno do acto ou documento de que foi tomado conhecimento. Estas exigncias adicionais so perfeitamente compreensveis por com elas se pretender reforar o combate violao do segredo de justia.27 Por isso que a exigncia da identificao, nos moldes acima descritos, tenha sido aprovada no Parlamento por unanimidade.

26

A nova redaco do preceito, correspondente redaco dos Projectos de Lei n.s 38/XI e 178/XI (PCP), foi aprovado por unanimidade. 27 Conforme consta do Prembulo do Projecto de Lei n. 38/XI/1 (PCP) Altera o Cdigo de Processo Penal visando a defesa da investigao e a eficcia do combate ao crime: Cria-se igualmente um mecanismo de identificao de quem tem acesso aos autos como forma de dissuadir e combater eventuais violaes do segredo de justia. 13

5. O regime previsto na Proposta de Lei Embora a questo revista hoje um interesse meramente histrico, no deixaremos de analisar, para memria futura, as alteraes constantes da Proposta de Lei n. 12/XI sobre o regime do segredo de justia. 5.1. Os textos legais propostos So as seguintes as alteraes introduzidas na redaco dos artigos 86. (Publicidade do processo e segredo de justia) e 89. (Consulta de auto e obteno de certido e informao por sujeitos processuais), constantes da Proposta de Lei n. 12/IX: Artigo 86. [] 1. []. 2 - Quando entender que a publicidade prejudica a investigao ou os direitos dos sujeitos ou participantes processuais, o Ministrio Pblico pode determinar, oficiosamente ou a requerimento fundamentado do arguido, do assistente, do suspeito ou do ofendido, a aplicao ao processo, durante a fase de inqurito, do segredo de justia. 3 - No caso de o processo ter sido sujeito a segredo de justia, o Ministrio Pblico, mediante requerimento fundamentado do arguido, do assistente, do suspeito ou do ofendido, pode determinar a sua publicidade, total ou parcial. 4 - O requerente, o arguido, o assistente ou o ofendido, notificados da deciso do Ministrio Pblico, podem requerer a interveno do juiz, que decide tendo em conta os interesses da investigao invocados e a necessidade de proteco de direitos fundamentais. 5. No caso previsto no nmero anterior, o processo fica sujeito a segredo de justia at deciso do juiz ou at ao termo do prazo para requerer a sua interveno. 6 [] a) Assistncia, pelo pblico em geral, realizao do debate instrutrio e dos actos processuais na fase de julgamento; b) []; c) []. 7 - []. 8 - []. 9 - [].14

10 - []. 11 - []. 12 - []. 13 - [].

Artigo 89. [] 1 - [] 2 - Se o Ministrio Pblico se opuser consulta ou obteno dos elementos previstos no nmero anterior, pode o requerente solicitar a interveno do juiz de instruo, que decide tendo em conta os interesses da investigao invocados e a necessidade de proteco de direitos fundamentais. 3 - [] 4. Quando, nos termos dos n.s 1,3 e 4 do artigo 86., o processo seja pblico, as pessoas mencionadas no n.1 podem requerer autoridade judiciria competente o exame gratuito dos autos fora da secretaria, devendo o despacho que o autorizar fixar o prazo para o efeito. 5 - [] 6 - Findos os prazos previstos no artigo 276., o arguido, o assistente, o ofendido e o suspeito podem consultar todos os elementos de processo que se encontre em segredo de justia, salvo se o juiz de instruo determinar, fundamentadamente e a requerimento do Ministrio Pblico, que o acesso aos autos seja adiado por um perodo mximo de quatro meses. 7 - Em processo por terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou que tenha sido declarado de excepcional complexidade, nos termos dos n. 2 a 4 do art. 215, o adiamento previsto no nmero anterior tem como limite um prazo mximo igual ao que tenha correspondido ao respectivo inqurito, nos termos do artigo 276..

5. 2. A manuteno da regra da publicidade. A deciso do Ministrio Pblico e a interveno judicial Tendo em conta a deciso poltica de manter a regra estabelecida pela reforma de 2007 da publicidade (interna e externa) do processo, as alteraes legislativas propostas, em sede de segredo de justia, podem sintetizar-se:

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- na eliminao da necessidade de validao pelo juiz da deciso do MP de sujeitar o processo a segredo de justia (a deciso passou agora a competir ao MP); - na interveno do juiz de instruo nos casos de os intervenientes entenderem que a deciso do MP lesa os seus interesses. Tais alteraes tinham o propsito declarado de clarificar as funes desempenhadas pelo MP e pelo juiz, e de eliminar actos ditos rotineiros ou burocrticos, sem que os direitos dos cidados fossem beliscados. o Ministrio Pblico quem determina a sujeio do inqurito a segredo de justia, sem validao pelo juiz de instruo, assumindo-se aquele como o titular da aco penal e este como o Juiz das liberdades e dos direitos dos cidados, como se l na exposio de motivos da Proposta de Lei.28 A vigncia do regime institudo pela Reforma de 2007 revelou que na quase totalidade dos casos em que o Ministrio Publicou determinou a sujeio a segredo de justia o juiz validou a deciso. De acordo com o modelo proposto, este acto de validao, que foi encarado por alguns como um acto rotineiro ou burocrtico e que colocava o juiz, segundo se dizia, numa funo de defesa dos interesses da investigao e no da defesa dos direitos e liberdades fundamentais, foi eliminado da Proposta de Lei. 2928

Esta concepo parte da ideia errada de que o acto de validao da deciso do Ministrio Pblico de sujeitar o inqurito a segredo de justia traduz uma confuso de funes constitucionais do Ministrio Pblico e do juiz de instruo no mbito do inqurito, tal como foi claramente demonstrado por Germano Marques da Silva e pela jurisprudncia que se pronunciou pela constitucionalidade do regime emergente da Reforma de 2007 cfr. supra nota 16. 29 Esta filosofia que esteve subjacente proposta de eliminao da validao judicial que o Parlamento chumbou - , como bom de ver, inaceitvel. A circunstncia, apontada por Costa Andrade (Bruscamente no Vero Passado, cit., pgs. 59-60 e nota 11), de em Agosto de 2008, decorrido quase um ano de vigncia da reforma, segundo dados conhecidos do Ministro da Justia cerca de 98% dos pedidos do Ministrio Pblico tm conduzido validao do segredo de justia, por deciso do juiz (Expresso, 9-8-2008), no significativo de uma qualquer complacncia por parte do juiz de Instruo, como parece sugerido, embora em termos puramente eventuais, por aquele ilustre Professor. Esta percentagem de validao, que desconhecemos se continua to elevada, pode certamente resultar, como estamos seguros que acontecer, da circunstncia de o Ministrio Pblico, na esmagadora maioria dos casos, ter 16

procedido a uma ponderao rigorosa dos diversos interesses conflituantes em presena. Alis, a este respeito a jurisprudncia dos tribunais superiores bem esclarecedora de que a interveno do juiz assume fisionomia de garantia dos sujeitos processuais e de que essa interveno no pode ter um contedo tabelar ou de chancela(Ac. da Rel. do Porto de 4-3-2009, proc. n. 1224/08.8GCSTS-A P1, rel. Borges Martins), de que a deciso de validao no pode constituir o cumprimento de uma mera formalidade, pois certamente no foi esse a inteno do legislador (Ac. da Rel. do Porto de 26-11-2008, proc. n. 0845208, rel. Pinto Monteiro), de que essa determinao [do juiz de instruo] configura, necessariamente, um acto decisrio do juiz de Instruo, no sendo meramente formal ou tabelar e, por que assim, implica a ponderao dos interesses que subjazem ao afastamento da regra da publicidade, cumprindo pois ao Ministrio Pblico indicar (de forma concreta) as razes pelas quais, no caso , se dever afastar a regra da continuao doa sujeio do inqurito ao regime de segredo de justia (Ac. da Rel. de vora de 4-5-2010, proc. n. 232/09.6TAMNA.E1., rel. Joo Manuel Monteiro Amaro), de que A deciso do juiz no assim meramente formal, como alega o recorrente [no caso o Ministrio Pblico alegara que a validao daquela determinao da aplicao do segredo de justia ao inqurito (deciso matria) , necessariamente, uma deciso formal (sob pena de absurda concorrncia de duas decises materiais)] mas, exige que o juiz exera efectivamente as suas funes de garante dos direitos fundamentais da pessoa, ponderando os interesses e/ ou direitos em conflito em cada caso concreto, de modo a encontrar um ponto ptimo de equilbrio e a compatibilizar os interesses e os direitos em conflito (Ac. da Rel. de vora, de 31-3-2009, proc. n. 3154/08-1, rel. Martins Simo, este, como os demais, disponvel in www.dgsi.pt). Os tribunais superiores no se limitaram a proclamar o carcter no formal, tabelar ou de chancela, do despacho de validao, antes souberam extrair as devidas consequncias deste entendimento nos casos que estiveram sob a sua apreciao, como bem ilustrado pelo que pode designar-se o caso de Santo Tirso. Efectivamente, numerosa jurisprudncia da Relao do Porto vem sendo proferida em recursos provenientes da comarca de Santo Tirso, visando impugnar a deciso judicial de no validao do segredo de justia em casos em que esto em causa fundamentalmente crimes de violncia domstica e de maus tratos (localizmos ainda um caso de roubo e um outro de trfico de estupefacientes), e em que o Ministrio Pblico se limitou a fundar o pedido de validao do segredo de justia na indicao sobre poltica criminal constante da Lei n. 17/2006, de 23 de Maio conjugada com a Directiva de 9-1-2008 definida pela Procuradoria Geral da Republica, remetida com o Oficio-Circular n. 5/2008. Desta numerosa jurisprudncia da Relao do Porto possvel extrair duas concluses da maior relevncia: a) No pode bastar a mera indicao do tipo legal de crime em investigao. Se assim fosse, o legislador teria indicado expressamente os tipos legais de crime relativamente aos quais vigoraria sempre o segredo de justia - cfr. os Acs da Rel. do Porto de: 7-52008, proc. n. 0811925, rel Manuel Braz; 28-5-2008, proc. 0842007, rel. Maria Elisa Marques; 4-6-2008, proc. 0813660, rel. Jos Carreto;11-6-2008, proc. n. 0842068, rel. Lus Gominho; 24-9-2008, proc. n. 0814991, rel. Joaquim Gomes; 22-10-2008,

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No novo regime emergente da Proposta de Lei n. 12/IX passa a ser o Ministrio Pblico quem, em primeira linha, decide, oficiosamente ou a requerimento e sempre de forma fundamentada, se o caso concreto justifica que o processo fique sujeito regra do segredo, seja em defesa das necessidades de investigao seja em defesa dos direitos fundamentais dos sujeitos e participantes processuais. Entendeu-se, agora, que o novo regime do segredo de justia conjugado com o alargamento dos prazos em que o inqurito decorre com excluso de acesso aos autos, acautela suficientemente as necessidades da investigao. Por isso o Governo no vislumbrou a necessidade de criar um regime excepcional para o terrorismo, a criminalidade violenta, especialmente

proc. n. 0815207, rel. Manuel Braz; 19-11-2008, proc. n. 0816224, rel. lia So Pedro; 19-11-2008, proc. n. 0815162, rel. Lus Ramos; b) Na deciso que determina a aplicao do segredo de justia ao processo na fase de inqurito, nos termos do artigo 86., n.3 do CPP, o Ministrio Pblico em vista validao dessa deciso pelo juiz de instruo, no pode limitar-se a invocar uma qualquer directiva emanada da Procuradoria-Geral da Repblica, que no vincula os tribunais portugueses, tendo de indicar as razes, os elementos concretos que, em seu entender, justificam no caso, a aplicao do segredo de justia, por ser essa fundamentao que h-de permitir ao juiz de instruo fazer o seu prprio juzo sobre se o segredo de justia justificado pelas necessidades da investigao, com vista a validar ou no a determinao do Ministrio Pblico Neste sentido, podem ver-se, para alm dos supra referidos em a), os Acs da Rel. do Porto de: 25-6-2008, proc. n. 0812926, rel. Lus Teixeira; 26-11-2008, proc. n. 0845208, rel. Pinto Monteiro, com 1 voto de vencido; 19-11-2008, proc. n. 0815162, rel. Lus Ramos; 15-10-2008, proc. n. 0815570, rel. Maria do Carmo Silva Dias [afigura-se-me muito duvidosa a afirmao constante deste douto acrdo segundo a qual Se, porm, essa fundamentao concreta no constar do despacho do Ministrio Pblico mas, consultando os elementos do inqurito, o juiz de instruo poder concluir que caso de excepcionalmente sujeitar a segredo de justia, ento cremos que lhe incumbir validar (com uma fundamentao concisa) aquele despacho que lhe apresentado nos termos do art. 86., n.3 do CPP Cremos que a natureza do acto de validao impede que o mesmo seja proferido com fundamentos diversos dos invocados. Trata-se, porm, de questo cujo desenvolvimento no compatvel com a dimenso deste trabalho e que, por isso, no abordaremos aqui]; 4-3-2009, proc. n. 12224/08.8GCSTS-A.P1, rel. Borges Martins, com 1 dec. de voto; No mesmo sentido, da necessidade de invocao de razes concretas, cfr. tambm o Ac. da Rel. de Coimbra de 10-2-2010, proc. n. 167/08.0GACB-A.C1, rel. Orlando Gonalves e os Acs. da Rel. de vora de 4-5-2010, proc. n. 232/09.GTAMMN-A.E1, rel. Joo Manuel Monteiro Amaro e de 31-3-2009, proc. n. 3154/08-1, rel. Martins Simo, estes como todos os demais in www.dgsi.pt . 18

violenta ou organizada, como fora preconizado nos Projectos do PSD e do BE e fora j anteriormente proposto pelo Procurador-Geral da Repblica. Entendeu-se, deste modo, que mesmo naquelas situaes as especiais necessidades de investigao que se fazem sentir encontram-se salvaguardadas, no se vendo que pudessem, por si s, impossibilitar ou dificultar a obteno de elementos ou informaes ao abrigo da cooperao internacional.

5.3. Dvidas e preocupaes suscitadas pelo regime emergente da Proposta de Lei n. 12/IX No obstante o Exm. Secretrio de Estado da Justia ter declarado publicamente a satisfao do Governo como resultado obtido30, o regime proposto suscitou diversas dvidas e preocupaes. Parafraseando um dos maiores crticos da reforma de 2007, agora membro da Comisso cujo labor tanta satisfao proporcionou ao Governo da Repblica, sobram-nos dvidas sobre se os autores da reforma (de 2010) tiveram conscincia actualizada do significado da mudana em toda a sua medida e na pletora das suas implicaes, mais ou menos expostas mais ou menos latentes Vejamos algumas dessas dvidas e preocupaes.

a) O mbito do segredo O n.3 do artigo 86 da Proposta de Lei, relativo ao levantamento do segredo de justia permite que o Ministrio Pblico determine a publicidade total ou parcial.

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A reviso de 2010 do Cdigo de Processo Penal, 2010-06-19, Interveno do Secretrio de Estado da Justia no encerramento da conferncia A reviso de 2010 do Cdigo de Processo Penal em Lisboa, disponvel em www.portugal.gov.pt: () estamos muito satisfeitos com o resultado obtido, fruto do empenho e da postura a todos os ttulos notvel de todos os membros da Comisso. A proposta da comisso, adoptada pelo Governo, reflecte precisamente as cedncias associadas procura de solues que maximizem os valores conflituantes presentes no processo penal. 19

J o n. 2 do mesmo preceito apenas estatui que o Ministrio Pblico pode determinar a aplicao ao processo, durante a fase de inqurito, do segredo de justia. Do n.3 do artigo 86. no parece poder inferir-se, a contrario, que quando o Ministrio Pblico, nos termos do n.2, determina a aplicao ao processo durante a fase de inqurito do segredo de justia, este deva abranger a totalidade do processo. Note-se que quando o Ministrio Pblico determina a publicidade parcial nos termos do n.3 est, expressa ou implicitamente a determinar que parte do processo continue sujeito a segredo. E, tambm neste caso no se justifica, ao nvel dos poderes/deveres conferido ao Ministrio Pblico, qualquer distino entre o mbito inicialmente decretado e o mbito do segredo que permanece, decorrente do seu levantamento parcial. Por outras palavras, parece que se o Ministrio Pblico pode determinar o levantamento parcial do segredo nada obsta que ab initio decrete o segredo apenas parcial. Questo diversa a de saber em que situaes pode ocorrer o levantamento parcial do segredo (ou, na nossa perspectiva, tambm o decretamento inicial do segredo parcial), o que, como foi justamente reconhecido no Parecer da Comisso de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias pode gerar algumas dificuldades de aplicabilidade prtica, a que acresce a dificuldade de preservao apenas parcial do segredo

b) O levantamento do segredo Enquanto o n.2 do artigo 86. da Proposta permite claramente que o Ministrio Pblico, a todo o tempo e oficiosamente, determine a aplicao do segredo de justia ao inqurito, da letra do n.3 do mesmo preceito parece resultar que o Ministrio Pblico s pode determinar a publicidade (total ou parcial) do inqurito previamente sujeito a segredo, a requerimento fundamentado do arguido, do assistente, do suspeito ou do ofendido , de resto, flagrante a diferena de redaco do n.3 da Proposta no confronto com o n. 4 na redaco emergente da Reforma de 2007: No

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caso de o processo ter sido sujeito, nos termos do nmero anterior, a segredo de justia, o Ministrio Pblico, oficiosamente ou mediante requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido, pode determinar o seu levantamento em qualquer momento do inqurito. Esta questo no passou despercebida Comisso de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdade e Garantias a qual, no seu parecer assinalou: Estranhamente no se prev, tal como consta da lei actualmente em vigor (cfr. artigo 86., n.4) que o Ministrio Pblico possa oficiosamente determinar, em qualquer momento do inqurito, o levantamento do segredo de justia, s podendo faz-lo mediante requerimento fundamentado do arguido, do assistente, do suspeito ou do ofendido.31 Mas, a este nvel, a distino entre a deciso que decreta o segredo de justia e a deciso que decreta o seu levantamento, no parece ter qualquer fundamento ou significado til. Na verdade, seria absolutamente incongruente que o Ministrio Pblico pudesse determinar ou decretar o regime excepo (o segredo), sem qualquer limitao, isto , oficiosamente e em qualquer momento do inqurito e no lhe fosse reconhecido igual poder-dever quando se tratasse de fazer renascer o regime regra (a publicidade). Afigura-se-nos, pois, que deveria continuar a entender-se que o Ministrio Pblico pode a todo o tempo, isto , em qualquer momento do inqurito, e oficiosamente, alterar a deciso que anteriormente adoptara, impondo-se, deste modo, uma interpretao extensiva do n. 3 do citado artigo 86 da Proposta de Lei.

c) O mbito da interveno judicial Tambm o incidente regulado nos nmeros 3, 4 e 5 do artigo 86. da Proposta nos suscitou algumas dvidas ou preocupaes.

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Parecer de 23 de Maro de 2010. O referido Parecer, relatado pelo Deputado Carlos Peixoto, foi publicado no Dirio da Assembleia da Repblica, II Srie-a, N. 54/XI/1, de 25 de Maro de 2010, pgs. 30-65, e encontra-se tambm disponvel em www.parlamento.pt . 21

A articulao entre os nmeros 3, 4 e 5 deveria ter merecido por parte do Governo uma maior ateno e um maior rigor de redaco. As dificuldades de interpretao destes preceitos derivam desde logo do facto de o segredo ou a publicidade serem decretados pelo Ministrio Pblico, oficiosamente ou a requerimento, e de o requerente da interveno judicial poder ser pessoa diferente do requerente perante o Ministrio Pblico. Ao contrrio do que a conjugao dos n. 4 e 5 poder, primeira vista, sugerir, a interveno judicial pode ser provocada - no caso de o Ministrio Pblico ter determinado, oficiosamente ou a requerimento, o segredo de justia (incidente de levantamento do segredo de justia propriamente dito); - no caso de ter sido indeferido o requerimento apresentado pelo arguido, pelo assistente, pelo suspeito ou pelo ofendido, no sentido de ser determinado o segredo; - no caso de o Ministrio Pblico, a requerimento, ter determinado a publicidade depois de o processo ter sido sujeito a segredo. No caso de vigorar a publicidade, por ser esse o regime regra, sem que tenha havido qualquer deciso do Ministrio Pblico, para requerer a interveno do juiz, qualquer dos sujeitos ou participantes processuais afectados tem de provocar previamente uma deciso por parte do Ministrio Pblico.

d) A legitimidade para requerer a interveno judicial No obstante se reconhecer ao suspeito32 legitimidade para requerer ao MP que determine a aplicao do segredo de justia (n.2) e para que proceda ao levantamento total ou parcial do segredo (n.3), o n. 4 no lhe confere legitimidade para requerer a interveno do juiz, salvo se tiver sido ele (o suspeito) o autor do requerimento.32

Recorda-se que, na definio legal constante da alnea e) do artigo 1 do Cdigo de Processo Penal, suspeito toda a pessoa relativamente qual exista indcio de que cometeu ou se prepara para cometer um crime, ou que nele participou ou se prepara para participar. Sobre a distino, meramente formal, entre suspeito e arguido e sobre o estatuto processual do suspeito ver Pinto de Albuquerque, Comentrio do Cdigo de Processo Penal, cit., Lisboa, 2007, pgs. 176-177. 22

A este respeito a exposio de motivos da Proposta de Lei n. 12/IX (1) nada esclarece, porquanto se limita a assinalar que Caso a deciso do Ministrio Pblico, de deferimento ou no, lese os interesses do requerente ou de outro interessado, poder ser pedida a interveno do juiz, que decide ponderando os direitos fundamentais e os interesses efectivos da investigao. Tambm a apresentao feita pela Comisso do Processo Penal ao Conselho Consultivo da Justia se limitou a aludir ao Reforo da funo do juiz como ltimo garante dos direitos liberdades e garantias dos cidados, intervindo a requerimento do arguido, do assistente, ofendido ou suspeito que no se conformem com a deciso do Ministrio Pblico. O texto actual (n. 4) reproduz ipsis verbis a redaco constante das propostas de redaco final elaboradas pela referida Comisso, na Verso 1-Regra da publicidade do processo, que era, de resto, exactamente idntico ao da Verso 2-Regra do segredo de justia na fase de inqurito Quando da sua audio pela Comisso parlamentar o CSM chamou expressamente a ateno para este ponto. Por isso, no obstante no ser inteiramente lquido que existam razes ou fundamentos para este tratamento diferenciado para com o suspeito no requerente, parece-nos que caso aquela proposta tivesse sido aprovada nada autorizaria a interpretar extensivamente aquele texto no sentido de tambm ao suspeito ser reconhecida legitimidade para requerer a interveno do juiz nos casos em que no requereu o levantamento ao Ministrio Pblico. Questo diversa - que nem o Governo nem a Comisso explicitaram minimamente - seria, naturalmente, a bondade e /ou necessidade do alargamento da legitimidade ao suspeito.

f) O prazo para requerer a interveno judicial Na ausncia de norma expressa, iriam, por certo, suscitar-se dvidas sobre o momento at ao qual poder ser suscitada a interveno judicial.

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Esta uma dvida que os textos da Proposta no permitem resolver com a facilidade desejvel. Alguns iriam, por certo, argumentar que a lei no fixa qualquer prazo para que seja requerida a interveno judicial, pelo que a mesma poder ser requerida a todo o tempo, sempre que alegada a afectao de direitos fundamentais nomeadamente os direitos presuno de inocncia, imagem, ou honra e considerao do arguido, o que, pode ocorrer a todo o tempo no decurso do inqurito. No cremos, porm, que fosse essa a melhor interpretao do texto da Proposta. A interveno judicial tem como pressuposto uma deciso do Ministrio Pblico a qual dever ser notificada a todos os sujeitos ou participantes processuais. Essa deciso, proferida oficiosamente ou a requerimento, deve ser notificada. S aps essa notificao que o requerente, o arguido, o assistente ou o ofendido podem requerer a interveno do juiz (n. 4). No faria qualquer sentido que uma vez efectuada essa notificao pudesse vir a ser requerida a interveno judicial a todo o tempo Para a exigncia de um prazo parece concorrer a redaco da parte final do n. 5 do citado artigo 86., embora restrito s situaes em que a deciso do Ministrio Pblico tenha decretado o segredo: at ao termo do prazo para requerer a sua [do juiz] interveno. Na ausncia de um prazo especial cremos que a interveno judicial dever ser requerida no prazo (geral) de dez dias, a contar da notificao da deciso do MP. claro que o processo uma realidade dinmica. A evoluo das investigaes pode alterar-se a todo o tempo, pelo que tambm a todo o tempo poder sobrevir uma afectao de direitos fundamentais nomeadamente os direitos presuno de inocncia, imagem, ou honra e considerao.

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Nessa situao, caso j se tenha esgotado o prazo geral de dez dias, pessoa em causa nada mais restar do que apresentar ao Ministrio Pblico um requerimento fundamentado requerendo o segredo ou a publicidade, conforme os casos. Provocada, deste modo, nova deciso do Ministrio Pblico, desta deciso ser ento possvel requerer a interveno judicial. Por outro lado, embora tivesse sido vantajosa a existncia de norma expressa nesse sentido, parece que a deciso do Juiz s deve ser proferida depois de exercido o contraditrio.

g) A falta de sancionamento dos abusos No sendo possvel estabelecer qualquer limite ao nmero de requerimentos dirigidos ao Ministrio Pblico, teria sido prefervel que, semelhana do que sucede no mbito do habeas corpus (artigos 221., n.3 e 223., n.6) e das medidas de coaco (artigo 212, n.4), a Proposta tivesse consagrado a condenao no pagamento de uma soma em caso de indeferimento de requerimento manifestamente infundado. No existindo qualquer limite, nem qualquer sano, est aberta a porta a todos os abusos, potenciados pela recorribilidade da deciso.

h) A eliminao da irrecorribilidade Um ponto verdadeiramente problemtico da Proposta de Lei n. 12/IX a eliminao da irrecorribilidade das decises do Juiz de Instruo, consagrada na reviso de 2007.3333

Em rigor, a lei s exclui a recorribilidade relativamente aos despachos proferidos ao abrigo dos n.s 2 e 5 do artigo 86. e do n.2 do artigo 89. Todos os demais despachos proferidos no mbito daqueles preceitos so recorrveis atento o princpio geral da recorribilidade de todas as decises que no forem excludas por lei (artigos 399. e 400.). Cfr., neste sentido, Germano Marques da Silva, A Publicidade do Processo Penal e o Segredo de Justia, cit., pgs. 265-266, Vncio Ribeiro, Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 153 (a propsito do n. 3 do artigo 86), o Despacho do Vice-Presidente da Rel. de vora de 27-12-2007, proc. n. 3209/07-1, e os Acs. da Rel. do Porto de 25

Na exposio de motivos daquela Proposta de Lei, assinala-se que no foram detectados quaisquer problemas na aplicao prtica da regra da publicidade. Estamos em crer que essa ausncia de problemas decorreu em grande medida da irrecorribilidade das decises do Juiz de Instruo.34 A partir do momento em que tais decises passassem a ser recorrveis, conforme resultava do texto proposto, os problemas comeariam a surgir com grande acuidade, o que poderia levar a uma excessiva problematizao do processo logo no seu incio, sobretudo no caso de processos com vrios arguidos, com manifesto prejuzo para a economia e celeridade processuais. Sem dvida que a possibilidade de recurso refora os direitos fundamentais dos cidados, como se assinala na exposio de motivos da Proposta de Lei n. 12/X!(1), mas nem aquela recorribilidade imposta pela Constituio nem se v necessidade, nesta fase e em face dos interesses conflituantes em presena, de um reforo dos direitos dos cidados.35

27-2-2008, proc. n. 0747210, rel. Cravo Roxo, e da Rel. de vora de 9-12-2008, proc. n. 2234/08-1, rel. Carlos Berguete Cpelho, todos in www.dgsi.pt. 34 No uniforme a posio da doutrina perante a irrecorribilidade dos despachos proferidos ao abrigo do n.s 2 e 5 do artigo 86. do CPP. Assim, Pinto de Albuquerque, como vimos, considera tal irrecorribilidade inconstitucional no que foi frontalmente contrariado por Germano Marques da Silva (cfr. supra nota 16). Costa Andrade (Bruscamente no Vero passado, cit., pg. 63) ao abordar o regime de decretamento do segredo de justia em benefcio dos direitos do arguido ou do assistente e a requerimento deles, assinala de forma algo lacnica que Em aberto fica apenas a questo da bondade e acerto do regime na parte em que denega ao Ministrio Pblico a possibilidade de recorrer. Finalmente, Maia Costa criticou o projectado fim da irrecorribilidade dos despachos proferidos ao abrigo dos n.s 2 e 5 do artigo 86. nos seguintes termos: Creio que esse despacho no dever ser recorrvel, pois, poder perturbar a marcha do inqurito logo na sua fase inicial. A garantia da interveno de um juiz j suficiente (Notas muito breves sobre a reviso do Cdigo de Processo Penal, cit., pg. pg. 189). 35 Como justamente se salientou no Parecer da ASMJ retoma-se uma lgica maximalista, capaz de agradar a todas as partes no processo, mas incapaz de assumir o sacrifcio de vantagens ou direitos processuais onde os princpios constitucionais o permitam como condio de ganhos em termos de celeridade e finitude dos processos, nomeadamente os mais complexos, com custos elevados na degradao da imagem da administrao da justia (cit. pg. 7). 26

5.4. Consulta de auto e obteno de certido e informao por sujeitos processuais (artigo 89) No que se refere ao regime constante do artigo 89 da Proposta de Lei n. 12/XI, para alm da mera alterao da remisso constante do n.4 do artigo 86 (que passa a fazer-se para os n.s 1, 3 e 4 do mesmo preceito) e do que adiante se dir quanto aos prazos de inqurito com excluso de acesso aos autos, merece particular destaque a nova redaco conferida ao n. 2: Se o Ministrio Pblico se opuser consulta ou obteno dos elementos previstos no nmero anterior, pode o requerente solicitar a interveno do juiz de instruo, que decide tendo em conta os interesses da investigao invocados e a necessidade de proteco de direitos fundamentais. A legitimidade para requerer a interveno judicial aqui limitada ao requerente da consulta do processo ou de elementos dele constantes ou da obteno dos correspondentes extractos, cpias ou certides. No regime emergente da Reforma de 2007 e que permanece inalterado se o Ministrio Pblico se opuser consulta ou obteno daqueles elementos, o requerimento presente ao juiz que decide por despacho irrecorrvel. Agora, segundo a Proposta no basta que o Ministrio Pblico se oponha pretenso do requerente para que se desencadeia a interveno judicial. O texto da Proposta de Lei claro: pode o requerente solicitar a interveno do juiz de instruo. Se, no obstante a oposio do Ministrio Pblico, o requerente no a solicitar no h lugar interveno judicial. claro que nada obsta que o requerente, no mesmo requerimento que dirige ao Ministrio Pblico, requeira, subsidiariamente, a interveno do juiz de instruo caso a sua pretenso no merea satisfao por parte do Ministrio Pblico. Mas, sempre teria sido prefervel que o Proposta de Lei em vez de, preguiosamente, ter aproveitado a primeira parte do anterior n. 2 (Se o Ministrio Pblico se opuser consulta ou obteno dos elementos previstos no nmero anterior, tivesse feito um esforo adicional, redigindo ex novo a totalidade do novo n.2.

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Por outro lado, a deciso do Juiz de instruo proferida ao abrigo do artigo 89, n.2 deixa de ser irrecorrvel, o que se nos afigura criticvel pelas razes j anteriormente expostas em. 6.4 J o regime decorrente da redaco conferida aos n.s 6 e 7 do artigo 89. da Proposta revela-se francamente mais simples do que o regime vigente, que tantas dvidas suscitou, mesmo com a soluo emergente do Ac. do STJ de fixao de jurisprudncia n. 5/201036, e permitiria um alargamento considervel do perodo em que o processo permanece em segredo.

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Como sabido, a questo de saber por quanto tempo pode ser prorrogado o perodo mximo de adiamento do acesso aos autos suscitou grandes divergncias na doutrina e jurisprudncia nacionais. Segundo uma orientao representada na doutrina por Pinto de Albuquerque, Lobo Moutinho, Sandra Oliveira Silva e Costa Andrade e de que so exemplos paradigmticos na jurisprudncia dos tribunais superiores os Acs. da Rel. de Guimares de 14-4-2008, rel. Teresa Baltasar e da Rel.de Lisboa de 6-1-2009, proc. n.6085/08-5, rel. Jos Adriano, ambos in www.dgsi.pt, a prorrogao do prazo, precisamente porque se trata de uma prorrogao e por uma s vez no pode ser por tempo superior ao perodo inicial de adiamento de 3 meses. Para outra corrente, representada na doutrina por Frederico da Costa Pinto, Vaz Patto e Germano Marques da Silva e na jurisprudncia pelos Acs. da Rel. de Lisboa de 17-92008, proc. n. 5036/08-3, rel. Conceio Gonalves e de 24-9-2008, proc. n. 6650/08-3, rel. Margarida Ramos de Almeida, ambos sumariados in www.pgdlisboa.pt, o prazo de prorrogao no tem limite temporal previsto na lei, ficando ao critrio do juiz de instruo, mediante promoo do Ministrio Pblico, definir qual o tempo objectivamente indispensvel concluso do inqurito, podendo estender-se para alm de trs meses. Foi esta ltima posio que fez vencimento, na medida em que o Ac. do STJ n. 5/2010, de 15 de Abril de 2010 fixou a seguinte jurisprudncia: O prazo de prorrogao do adiamento do acesso aos autos a que se refere a segunda parte do artigo 89., n.6 do Cdigo de Processo Penal fixado pelo juiz de instruo pelo perodo de tempo que se mostrar objectivamente indispensvel concluso da investigao, sem estar limitado pelo prazo mximo de trs meses, referido na mesma norma. 28

III - Prazos de inqurito1. Os prazos de inqurito e a sua violao. A durao do inqurito est sujeita a prazos mximos, indicados no artigo 276.37 At reviso de 2010 os prazos eram os seguintes: O prazo regra mximo para a durao do inqurito de 8 meses no havendo arguidos presos ou sob obrigao de permanncia na habitao, e de 6 meses, havendo-os (artigo 276., n.1) Aquele prazo de 6 meses elevado (art. 276., n.2): a) para 8 meses, quando o inqurito tiver por objecto um dos crimes previstos no artigo 215., n.2; b) para 10 meses quando, independentemente do tipo de crime, o procedimento se revelar de excepcional complexidade, nos termos do artigo 215, n.3, parte final; c) para 12 meses, nos casos previstos no n. 3 do artigo 215., n. 3.38 Conforme a doutrina e os comentadores assinalavam os referidos prazos no eram peremptrios, por no ser possvel demarcar o tempo de durao de uma investigao. As diligncias de investigao - esclarece o Prof. Germano Marques da Silva que decorram para alm do prazo de durao mxima do inqurito, enquanto este no for encerrado, so, por isso vlidas.3937

Sobre a justificao da existncia de prazos veja-se Souto Moura, Inqurito e Instruo, in Centro de Estudos Judicirios, Jornadas de Direito Processual Penal - O Novo Cdigo de Processo Penal, Coimbra Almedina, 1988, pgs.100-102. Veja-se tambm o que a este respeito consta do Relatrio Complementar, cit., pg. 21-24, onde se salienta, nomeadamente, que A previso de um prazo para a concluso do inqurito e a sindicncia pelo seu no cumprimento visa defender os interesses dos sujeitos processuais a um processo clere. Mas visa, igualmente, responder a interesses sociais de transparncia, eficcia e de prestao de contas da aco penal(pg. 21). 38 O n. 2 tem o texto introduzido pela Lei n. 59/98, de 25 de Agosto, que passou a incluir a situao intermdia constante da actual alnea b). 39 Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. III, 2ed. revista e actualizada, Lisboa/ S. Paulo, Editorial Verbo, 2000, pg.92. No mesmo sentido, cfr. Maia Gonalves, Cdigo de Processo Penal Anotado, 15. ed. Coimbra, Almedina, 2005, pg. 555, Pinto de Albuquerque, Comentrio do Cdigo de Processo Penal, cit., pg. 695, Magistrados do Ministrio Pblico do Distrito Judicial do Porto, Cdigo de Processo Penal, Comentrios e notas prticas, Coimbra Editora, 2009, pgs.691-692 e 29

Os referidos prazos sempre foram entendidos como prazos meramente ordenadores ou indicativos, por a sua violao apenas acarretar medidas de acelerao processual que podem ser determinadas pelo Procurador-Geral da Repblica, nos termos do artigo 109.40, para alm de eventual responsabilidade disciplinar.41 A Reforma de 2007, para alm de reforar o controle hierrquico42, retirou queles prazos a natureza meramente indicativa que sempre tinham tido naDespacho do PGR de 20-3-1989 (circular n. 7/89), disponvel em www.pgr.pt, segundo o qual o excesso dos prazos de inqurito estabelecidos no artigo 276., n.s 1 e 2 do CPP no produz a inexistncia, nulidade ou ineficcia dos actos praticados. Refira-se, com interesse histrico, que o n. 2 do Projecto dispunha que o inqurito era igualmente arquivado se chegado ao termo do prazo para a sua realizao, no tivesse sido possvel ao Ministrio Pblico obter indcios suficientes da verificao do crime ou de quem foram os seus agentes, mas essa orientao foi afastada. Segundo o Relatrio Complementar, A opo do legislador portugus, no que acompanhado pela maioria dos pases europeus (a grande excepo a Itlia, onde se prev que, findo o prazo mximo do inqurito, as provas produzidas depois desse prazo no possam se utilizadas em julgamento), vai no sentido de o decurso do prazo mximo no ter especiais consequncias na limitao do dever do Estado em exercer a aco penal (cit., pg. 22). O mesmo Relatrio salienta ainda que H quem entre ns defenda o arquivamento obrigatrio decorrido certo prazo. H vrios argumentos contra esta posio, o principal de natureza dogmtica, uma vez que tal significaria colocar em causa o princpio da legalidade consagrado no nosso sistema jurdico-penal. Estando o inqurito aberto, o legislador presume que a investigao no terminou, que o MP est a desenvolver diligncias necessrias ao apuramento da verdade, por isso no o encerra. nesse sentido o disposto no artigo 283. do CPP, que determina que, finda a recolha da prova, o MP tem 10 dias para arquivar ou acusar(cit., pg. 23). 40 Assim Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. III, cit., pg. 92. Tambm Costa Pimenta, Cdigo de Processo Penal Anotado, Lisboa, Reis do Livro, 1987, pg. 821, aludia a prazos de natureza meramente ordinatria, e no peremptria 41 Como bem assinalava o Cons. Maia Gonalves, a propsito da violao dos prazos um excesso para alm do que razovel pode desencadear responsabilidade disciplinar e um incidente de acelerao processuais (Cdigo de Processo Penal, Anotado, 15ed, cit, pg. 555). Em caso de atraso considervel no est tambm excluda a possibilidade de os sujeitos processuais poderem instaurar uma aco de responsabilidade civil contra o Estado (cfr. artigo 12 da Lei n. 67/2007, de 31 de Dezembro). 42 Cfr. n.s 4, 5 e 6 do artigo 276, na redaco que lhes foi conferida pela Lei n. 48/2007, de 29 de Agosto. Podem ver-se mais desenvolvimentos sobre esta matria em Pinto de Albuquerque, Comentrio do Cdigo de Processo Penal, cit., pgs. 695-695 e Magistrados do Ministrio Pblico do Distrito Judicial do Porto, Cdigo de Processo Penal, Comentrios e notas prticas, cit., pgs.691-692. 30

medida em que veio atribuir um relevantssimo efeito processual violao dos prazos mximos de inqurito que se encontre em segredo de justia: o fim do segredo interno. Com efeito, de acordo com o n. 6 do artigo 89, ressalvadas as possibilidades de adiamento por um perodo mximo de trs meses e eventual prorrogao por um prazo objectivamente indispensvel concluso da investigao, findos os prazos previstos no artigo 276., o arguido, o assistente e o ofendido podem consultar todos os elementos de processo que se encontre em segredo de justia. 43 Posteriormente, o Tribunal Constitucional, por via do seu Ac. n. 428/2008, de 12 de Agosto de 2008, decidiu julgar inconstitucional, por violao do artigo 20., n.3 da Constituio da Repblica Portuguesa, a interpretao do artigo 89., n.6, do Cdigo de Processo Penal, na redaco dada pela Lei n. 48/2007, de 29 de Agosto, segundo a qual permitida e no pode ser recusada ao arguido, antes do encerramento do inqurito a que foi aplicado o segredo de justia, a consulta irrestrita de todos os elementos do processo, neles incluindo dados relativos reserva da vida privada de outras pessoas, abrangendo elementos bancrios e fiscais sujeitos a segredo profissional, sem que tenha sido concluda a sua anlise em termos de poder ser apreciado o seu relevo e utilizao como prova, ou, pelo contrrio, a sua destruio ou devoluo, nos termos do n. 7 do artigo 86. do Cdigo de Processo Penal 44 Aquela soluo legislativa fora, ao que parece, sugerida por Frederico da Costa Pinto45 e trata-se de um modo de no prejudicar os sujeitos processuais em virtude de atrasos que lhes no so, em geral, imputveis e, ao mesmo tempo, de um mecanismo de presso sobre o MP e os rgos de

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Sobre a controvrsia relativa ao prazo da prorrogao cfr. supra nota 36. O referido acrdo, acessvel in www.tribunalconstitucional.pt, encontra-se publicado no Dirio da Repblica, II srie, de 30-9-2008. Para alm do voto de vencido do Cons. Benjamim da Silva Rodrigues, o referido aresto - proferido no mbito de um recurso interposto de um acrdo desta Relao de Guimares - foi objecto de uma acesa crtica por parte do Prof. Jos Lobo Moutinho, em A limitao temporal do segredo do processo relativamente ao arguido. O ps- Acrdo n. 428/08 do Tribunal Constitucional, disponvel em www.servulo.pt. 45 Segredo de Justia e Acesso ao Processo, in Maria Fernanda Palma (coord.), Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Coimbra, Almedina, 2004, pgs. 97-98. 31

polcia criminal no sentido de uma utilizao mais racional do tempo que o legislador entendeu ser razovel conceder-lhe para encerrar o inqurito46 Mas esta conexo entre os prazos mximos do inqurito e o fim do segredo interno foi - e continua a ser fortemente criticada pelas associaes sindicais, das magistraturas47 e das polcias, e por amplos sectores da doutrina.46

Andr Lamas Leite, Segredo de Justia Interno, Inqurito, Arguido e seus Direitos de Defesa, in Revista Portuguesa de Cincia Criminal, 16, 2006, pgs. 570-571. No mesmo sentido se pronunciou Sandra Oliveira e Silva, Um primeiro olhar sobre as alteraes ao regime do Segredo de Justia, Maia Juridica, Ano V, n. 2, Julho Dezembro 2007, pg. 8. 47 Cfr. Parecer do SMMP, cit., pgs. 10-13. Como ali se refere: No possvel investigar a criminalidade econmica e complexa sem que exista um regime de segredo de justia que proteja a confidencialidade da investigao. Como bvio, se um suspeito de um crime de corrupo souber que ser alvo de uma intercepo telefnica ou que se ir realizar uma busca no seu escritrio tomar as devidas precaues e a investigao ficar votada ao fracasso. Por esta razo, extremamente perigoso estabelecer uma relao directa entre o prazo mximo legal dos inquritos e o regime do segredo de justia, sob pena de se fazerem naufragar as investigaes dos crimes que mais corroem o Estado de Direito. Como regra, se o Ministrio Pblico apenas entende que o regime do segredo de justia dever ser aplicado a um pequeno nmero de inquritos, tal regime deveria assim permanecer at ao encerramento do inqurito ou at ao momento em que o titular do inqurito entenda que j no se justifica a manuteno do segredo. No temos dvidas: este o regime que deveria ser consagrado no Cdigo de Processo Penal, pelo que dever ser revogado o artigo 89., n. 6, deste cdigo (cit., pg. 11). Tambm a ASMJ se pronunciou expressamente contra a referida conexo, salientando que que inaceitvel, sobretudo nos processos por crimes mais graves e complexos, pr em risco a investigao com a publicidade interna precoce, afigura-se-nos, porm, que a opo de fazer depender a durao do segredo interno da durao legal do inqurito no a nica e no ser mesmo a melhor opo. Tal como o art. 215. estabelece prazos prprios de durao mxima da priso preventiva em funo da gravidade e complexidade dos crimes, tambm o art. 89. poderia faz-lo para o acesso aos autos, nomeadamente nos casos de adiamento, enquanto os prazos, indicativos, de durao mxima do Inqurito, se manteriam inalterados ou sofrendo alterao menor que a prevista actualmente em funo dos perigos da abertura interna do processo, soluo esta que nos parece prefervel. Evitar-se-ia, assim, o risco de o aumento geral dos prazos mximos de durao do Inqurito poder levar, por via da tendncia natural para esgotar os prazos legais, ao aumento efectivo do tempo de durao dos Inquritos, no obstante os mecanismos de controlo estabelecidos nos n.s 6 a 8 da nova redaco (Parecer, cit., pg. 18-19).

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Curiosamente o Relatrio Complementar no se pronunciou sobre a manuteno ou eliminao da referida conexo, a qual foi mantida no texto constante da Proposta de Lei. Contudo, o referido Relatrio Complementar identificou duas incoerncias normativas, com base nas quais elaborou recomendaes de alterao legislativa. Como ali se referiu: No que respeita aos prazos do inqurito so duas as incoerncias normativas: a) O princpio regra do artigo 276., n. 1, do CPP e da alnea a), do n. 2, do mesmo normativo, que determina que havendo arguidos presos o prazo mximo menor, perde a coerncia no regime previsto para os crimes de excepcional complexidade. Nestes casos, a elevao do prazo mximo de durao do inqurito para 10 meses ou 12 meses s possvel se existirem arguidos sujeitos a medida de coaco privativa da liberdade. O que significa que o legislador prev no texto da lei (diferente a prtica) que os processos em que no haja arguidos presos tenham uma tramitao mais clere do que os processos em que tal no ocorre; b) Uniformidade dos prazos de durao mxima do inqurito quando no haja arguidos sujeitos a medidas de coaco privativa da liberdade. Independentemente da complexidade do procedimento criminal o prazo sempre de 8 meses48 Embora as recomendaes constantes do Relatrio Complementar no tenham sido plenamente adoptadas, nem na Proposta de Lei, nem posteriormente no texto aprovado, o conhecimento do diagnstico daquelas incoerncias revela-se essencial para a compreenso do novo texto legal emergente da Reforma de 2010.

2. O novo texto legal So as seguintes as alteraes ao texto do 276. (Prazos de durao mxima do inqurito), resultantes da lei n. 26/2010:48

Relatrio Complementar, cit., pg. 21. 33

Artigo 276 [] 1 - [] 2 - [] 3 - O prazo de oito meses referido no n. 1 elevado: a) Para 14 meses, quando o inqurito tiver por objecto um dos crimes referidos no n. 2 do artigo 215.; b) Para 16 meses, quando, independentemente do tipo de crime, o procedimento se revelar de excepcional complexidade, nos termos da parte final do n. 3 do artigo 215.; c) Para 18 meses, nos casos referidos no n. 3 do artigo 215. 4 - [Anterior n.3]. 5 - Em caso de expedio de carta rogatria, o decurso dos prazos previstos nos n.s 1 a 3 suspende-se at respectiva devoluo, no podendo o perodo total de suspenso, em cada processo, ser superior a metade do prazo mximo que corresponder ao inqurito. 6 - O magistrado titular do processo comunica ao superior hierrquico imediato a violao de qualquer prazo previsto nos n.s 1 a 3 do presente artigo ou no n.6 do artigo 89., indicando as razes que explicam o atraso e o perodo necessrio para concluir o inqurito. 7 - [Anterior n. 5]. 8 - [Anterior n. 6].

3. A manuteno da conexo entre os prazos mximos de inqurito e o fim do segredo interno No obstante o coro de crticas 49 que se ergueu contra a referida conexo, a reviso de 2010 deixou-a inalterada.49

Assim, Sandra Oliveira e Silva interroga-se se num regime em que o segredo interno uma figura residual ainda tem sentido uma soluo como a do n.6 do artigo 89. Para a autora, No podemos esquecer que, na ideia original, este mecanismo tinha como pressuposto um sistema processual que no estabelecia limites srios (temporais ou outros) ao segredo interno do inqurito. Diversamente, no modelo actual, assente no paradigma contrrio, o segredo interno s determinado quando se mostre, em concreto, necessrio. Pergunta-se: razovel eliminar o segredo, mesmo quando ele indispensvel, pelo simples motivo de se terem esgotado os prazos de durao do inqurito? certo - continua aquela autora - que o arguido no deve, em princpio, ser prejudicado por atrasos processuais que no lhe so imputveis; mas no menos certo nem todos os atrasos processuais podem ser imputados a uma deficiente organizao 34

ou, at, a uma eventual falha de diligncia dos servios de investigao criminal. A realizao de percias forense delicadas e complexas - como a anlise de vestigios biolgicos e comparao de perfis genticos -, a necessidade de colaborao com entidades estrangeiras - p. ex., o cumprimento de rogatrias internacionais -, para referir s algumas hipteses mais notrias, podem protelar significativamente o encerramento do inqurito, criando uma situao de impasse investigatrio para a qual a declarao de especial complexidade e a correspondente extenso dos prazos (cf. art. 215., n. 4, e 276., n. 2, als. b) e c)) no oferecem resposta cabal. Uma soluo defensvel, a ponderar numa eventual reavaliao da reforma legislativa, seria a de estabelecer um elenco de causas de suspenso da contagem dos prazos de durao do inqurito, que acautelasse esses casos especiais, sobretudo no domnio da criminalidade mais grave(Um primeiro olhar sobre as alteraes ao regime do Segredo de Justiacit., pg.10). Tambm Costa Andrade, chama a ateno para a natureza da cominao constante do n. 6 do artigo 89 a qual assume o significado de uma sano pela ultrapassagem dos prazos de inqurito (Bruscamente no Vero Passado, cit, pg. 74) que provoca espanto e perplexidade: (cit. pg. 75): Uns (Ministrio Pblico) violam as normas; outros (a comunidade em geral e, em particular, todos os interessados numa investigao eficaz) suportam os custos da sua possvel reafirmao(loc. cit).O mesmo autor chama ainda a ateno para um provvel efeito perverso: o mais natural que uma soluo normativa ditada como protesto contra a lentido e o atraso do inqurito, acabe por potenciar, ela prpria, o arrastamento daquela fase processual (loc. cit). Finalmente, para Joo Conde Correia Inqurito: A manuteno do paradigma ou uma reforma encoberta, in Revista Portuguesa de Cincia Criminal, ano 18., n.s 2 e3, Abril-Setembro 2008, pg.190, a soluo legal, apesar do louvvel interesse da proteco dos direitos do arguido, prejudicados pela demora da investigao criminal em curso, parece, assim, esquecer, quase por completo, o interesse contraditrio da descoberta da verdade e da realizao da justia penal tambm co-natural ao processo penal de um Estado de direito. Em bom rigor, a sua consagrao significa, como o tempo se encarregar de demonstrar, uma sria entorse s capacidades funcionais da investigao.

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4. Manuteno do prazo (geral) de 8 meses para o inqurito sem arguidos privados da liberdade Manteve-se inalterado o prazo de 8 meses para o inqurito sem arguidos presos ou sob obrigao de permanncia na habitao (artigo 276., n.1) A manuteno do referido prazo de 8 meses foi assim justificada no Relatrio Complementar: Para a criminalidade em geral, os indicadores qualitativos e quantitativos includos sobre esta matria no relatrio final mostram que o prazo de durao de 8 meses adequado s necessidades de investigao da maioria das infraces criminais. Em obedincia aos princpios da eficincia e da qualidade, que devem presidir realizao da investigao, aquele prazo deve ser cumprido pela investigao criminal (pg. 27). A nica e significativa alterao resulta da circunstncia de at 2010 aquele prazo ser nico, isto , aplicar-se qualquer que fosse o crime, independentemente da sua gravidade e/ou complexidade, e de aps 2010 se ter transformado num prazo geral, ao lado de outros prazos especiais.

5. Manuteno dos diversos prazos de inqurito com arguidos privados da liberdade A Proposta de Lei previa alteraes redaco das alneas b) e c) do n. 2 do artigo 276., especificando que a declarao de excepcional complexidade era declarada pelo juiz e acrescentando meno do n. 3 do artigo 215., constante daquelas alneas, a referncia ao n. 4 do mesmo artigo 215.. Tais propostas foram rejeitadas pelo Parlamento, pelo que o n. 2 do artigo 276 no sofreu qualquer modificao. Mantiveram se, assim, inalterados os diversos prazos de inqurito com arguidos presos ou sob obrigao de permanncia na habitao: 6 meses (art. 276., n.1), 8 meses (art. 276., n. 2, al, a), 10 meses (art. 276., n.2, al. b) e 12 meses (art. 276., n.2, al. c). 50

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No Relatrio Complementar entendeu-se que os prazos de durao mxima do inqurito com arguidos presos no deveriam ser alterados. Caso o legislador 36

6. Criao de prazos especiais para inqurito sem arguidos privados da liberdade, atendendo gravidade do crime e/ou complexidade do processo Pondo cobro uniformidade dos prazos de durao mxima do inqurito sem arguidos privados da liberdade (presos ou sob obrigao de permanncia em habitao), o legislador de 2010 seguiu um critrio idntico ao que vigorava para inquritos de arguidos presos, estabelecendo trs novos prazos especiais, atendendo gravidade do crime e/ou complexidade do processo. Assim, para alm do prazo de 8 meses para a criminalidade em geral (prazo-regra), foram criados trs novos prazos especiais de: - 14 meses [artigo 276, n.3, al. a)]; - 16 meses [artigo 276, n.3, al. b)]; - 18 meses [artigo 276, n.3, al. c)].

considerasse conveniente o seu alargamento, a elevao era admitida at ao limite de 12 meses, prazo de durao mxima da priso preventiva(cit., pg. 26). Como ali se consignou, com inteiro acerto: certo que a previso autnoma dos prazos do inqurito permitia essa alterao sem que se afectasse o prazo de durao mxima das medidas de coaco. Contudo, a natural associao entre uns prazos e outros tornaria dificilmente compreensvel o alargamento do prazo do inqurito sem um correspectivo aumento dos prazos daquelas medidas de coaco. Uma vez que tais medidas se justificam para tutela de necessidades cautelares relacionadas com o processo, a concesso ao MP de um prazo mais lato para investigar, com a justificao de que o mesmo seria em princpio necessrio para melhor alcanar a descoberta da verdade material, poderia acabar por no ter o efeito til pretendido sendo legalmente imposta a libertao do arguido em momento ainda distante do prazo limite para a concluso do inqurito. Ora, considerando os desgnios de poltica criminal e de tutela dos direitos e liberdades que motivaram a reduo dos prazos mximos de durao da priso preventiva pela reviso de 2007 do CPP seria incompreensvel uma nova subida dos prazos daquelas medidas de coaco com fundamento na necessidade de os articular com uma elevao dos prazos do inqurito(ibidem). J anteriormente, chamando a ateno para a necessidade de conjugao da elevao do prazo de durao de inqurito, previsto no n.2 do artigo 276. com o regime dos prazos de durao mxima da priso preventiva, cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. III, 2ed. revista e actualizada, Lisboa/ S. Paulo, Editorial Verbo, 2000, pg. 93. Cfr. tambm Simas Santos, Leal-Henriques e Borges de Pinho, C