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1 POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL: O PROGRAMA ESTADUAL DE MICROBACIAS HIDROGRÁFICAS NO MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO DOS ÍNDIOS – SP Douglas Moura dos Santos Faculdade de Ciência e Tecnologia-UNESP [email protected] Antonio Nivaldo Hespanhol Faculdade de Ciência e Tecnologia-UNESP [email protected] Resumo No trabalho é analisado a implementação do Programa de Microbacias Hidrográficas (PEMH) no município de Ribeirão dos Índios – SP. O PEMH se insere numa nova concepção de políticas de desenvolvimento rural, contemplando a sustentabilidade ambiental, e priorizando como público alvo os pequenos produtores rurais. Diversos incentivos foram realizados no município de Ribeirão dos Índios como o controle da erosão, melhoramento das estradas rurais, o controle de voçorocas e erosão, terraceamentos, doação de mudas para restauração da mata ciliar e de Áreas de Preservação Permanentes (APPs), organização dos produtores rurais em associação e na concessão de incentivos financeiros para que os pequenos produtores adquirissem implementos agrícolas e promovam melhorias nas suas unidades produtivas. Palavras-chave: Políticas Públicas. Desenvolvimento Rural Sustentável. Município de Ribeirão dos Índios. Introdução O Programa Estadual de Microbacias teve grande importância e um significativo avanço no desenvolvimento das políticas públicas do Estado de São Paulo, devido aos seus objetivos e diretrizes voltados para o desenvolvimento rural sustentável, sendo o primeiro programa do estado com foco prioritário nos pequenos produtores (até 50 hectares) e na recuperação do meio ambiente (controle de voçorocas/erosões, plantio de mata ciliar), tendo a microbacias hidrográficas como recorte espacial de atuação. O Programa de Microbacias foi fruto de um acordo de empréstimo entre o Banco Mundial e o Governo do Estado de São Paulo. O objetivo principal do artigo é analisar o Programa Estadual de Microbacias Hidrográficas, com base no caso do município de Ribeirão dos Índios – SP, situado no Pontal do Paranapanema e vinculado ao Escritório de Desenvolvimento Rural de Presidente Venceslau – SP. No referido município foram implementados dois projetos de microbacias.

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POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL: O PROGRAMA ESTADUAL DE MICROBACIAS HIDROGRÁFICAS NO MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO

DOS ÍNDIOS – SP

Douglas Moura dos Santos Faculdade de Ciência e Tecnologia-UNESP

[email protected]

Antonio Nivaldo Hespanhol Faculdade de Ciência e Tecnologia-UNESP

[email protected]

Resumo No trabalho é analisado a implementação do Programa de Microbacias Hidrográficas (PEMH) no município de Ribeirão dos Índios – SP. O PEMH se insere numa nova concepção de políticas de desenvolvimento rural, contemplando a sustentabilidade ambiental, e priorizando como público alvo os pequenos produtores rurais. Diversos incentivos foram realizados no município de Ribeirão dos Índios como o controle da erosão, melhoramento das estradas rurais, o controle de voçorocas e erosão, terraceamentos, doação de mudas para restauração da mata ciliar e de Áreas de Preservação Permanentes (APPs), organização dos produtores rurais em associação e na concessão de incentivos financeiros para que os pequenos produtores adquirissem implementos agrícolas e promovam melhorias nas suas unidades produtivas. Palavras-chave: Políticas Públicas. Desenvolvimento Rural Sustentável. Município de Ribeirão dos Índios.

Introdução

O Programa Estadual de Microbacias teve grande importância e um significativo avanço

no desenvolvimento das políticas públicas do Estado de São Paulo, devido aos seus

objetivos e diretrizes voltados para o desenvolvimento rural sustentável, sendo o

primeiro programa do estado com foco prioritário nos pequenos produtores (até 50

hectares) e na recuperação do meio ambiente (controle de voçorocas/erosões, plantio de

mata ciliar), tendo a microbacias hidrográficas como recorte espacial de atuação. O

Programa de Microbacias foi fruto de um acordo de empréstimo entre o Banco Mundial

e o Governo do Estado de São Paulo.

O objetivo principal do artigo é analisar o Programa Estadual de Microbacias

Hidrográficas, com base no caso do município de Ribeirão dos Índios – SP, situado no

Pontal do Paranapanema e vinculado ao Escritório de Desenvolvimento Rural de

Presidente Venceslau – SP. No referido município foram implementados dois projetos

de microbacias.

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Os procedimentos metodológicos utilizados para se alcançar os objetivos propostos

foram feitos levantamentos sobre o programa de microbacias hidrográficas; realizadas

coleta de dados, em fontes secundárias, junto ao Levantamento Censitário das Unidades

de Produção Agropecuária do Estado de São Paulo (LUPA) do ano agrícola 2007/2008

e a publicações da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ou apenas

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Também foi realizada pesquisa de

campo com aplicação de formulários junto a 20% dos produtores rurais nas áreas de

abrangência de dois projetos de microbacias hidrográficas, o que equivale a 17

formulários na microbacia do Córrego do Arco e 13 na microbacia do Ribeirão dos

Índios; foram elaborados roteiros utilizados na realização de entrevistas junto ao chefe

da Casa da Agricultura, ao presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento

Rural (CMDR), técnicos executores dos dois projetos de microbacias, presidentes de

associações de produtores rurais e Secretário de Agricultura do município de Ribeirão

dos Índios.

Modernização agrícola e seus efeitos

O entendimento de modernização agrícola tem duas principais vertentes, uma

caracteriza a modernização como uso intensivo de equipamento, técnicas, máquina e

insumos modernos. Na outra vertente a modernização não se restringe somente ao

emprego de máquinas, equipamentos e insumos, devendo ser levadas em consideração

as modificações nas relações sociais de produção (TEIXEIRA; 2005). Para Teixeira

(2005) não há como separar o emprego equipamentos, máquinas e insumos das

mudanças nas relações sociais de produção: A verdade é que a modernização da agricultura segue os moldes capitalistas e tende a beneficiar apenas determinados produtos e produtores, tendendo a fortalecer a monocultura. Com a modernização ocorre o que vários autores denominam de “industrialização da agricultura”, tornando-a uma atividade nitidamente empresarial, abrindo um mercado de consumo para as indústrias de máquinas e insumos modernos (TEIXEIRA, 2005, p.2).

A partir da década de 1960 ocorreram significativas alterações no meio rural brasileiro

devido ao aprofundamento do processo de modernização viabilizado pelo Sistema

Nacional de Credito Rural (SNCR) criado no ano de 1965. Com o Golpe de 1964, os militares assumiram o poder e foi instituído o Estatuto da Terra, por meio do qual foram criados os mecanismos necessários para converter parte dos latifúndios improdutivos em modernas empresas rurais (HESPANHOL, 2010, p. 566-567).

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Porém essa modernização atingia de forma desigual os produtores rurais. Gonçalves

Neto (1997) salienta que: [...] os recursos atingem de forma privilegiada os grandes produtores e grandes proprietários, em detrimento dos pequenos; serve mais às regiões já desenvolvidas, discriminando, sobretudo com relação ao Nordeste; as culturas mais dinâmicas, ligadas ao mercado externo ou à substituição de importações, abocanham parcelas de crédito muito superiores à sua participação na produção nacional, restringindo o uso do crédito pelas culturas mais ligadas ao mercado e às necessidades internas (GONÇALVES NETO, 1997, p. 179).

Essa perspectiva de inserir modernas tecnologias no campo deriva do predomínio da

concepção desenvolvimentista. Navarro (2001) destaca que: A noção de desenvolvimento rural, naqueles anos, certamente foi moldada pelo “espírito da época”, com o ímpeto modernizante (e seus significados e trajetórias) orientando também as ações realizadas em nome do desenvolvimento rural (NAVARRO, 2001, p. 84).

Tais tecnologias empregadas na produção agrícola faziam parte do chamado pacote

tecnológico da “Revolução Verde”: Tais mudanças tecnológicas redundaram na ampla utilização de maquinas e implementos agrícolas, no emprego de fertilizantes químicos, na aplicação de biocidas para o controle de pragas e combate a doenças, e no melhoramento genético de plantas e animais (HESPANHOL, 2010, p. 584).

A adoção do pacote tecnológico da “Revolução Verde” foi um dos principais

responsáveis pela intensificação da degradação ambiental, e gerador de impactos sociais

negativos, como a concentração fundiária e o êxodo rural. A análise do processo de modernização enseja um debate teórico e pode ser sintetizado em duas consequências: uma os impactos ambientais, com os problemas mais frequentes, provocados pelo padrão de produção de monocultora foram: a destruição das florestas e da biodiversidade genética, a erosão dos solos e a contaminação dos recursos naturais e dos alimentos; a outra, os impactos socioeconômicos, causadas pelas transformações rápidas e complexas da produção agrícola, implantadas no campo, e os interesses dominantes do estilo de desenvolvimento adotado provocaram resultados sociais e econômicos. (BALSAN, 2006, p.2)

Assim também ressalta Gonçalves Neto (1985, p.87): A concentração de terra agravou-se. Mas agravaram-se também os desequilíbrios ecológicos: surgiram pragas e doenças antes desconhecidas, que exigiram maiores doses de venenos, que, por sua vez, desequilibraram mais ainda o ecossistema e comprometeram toda a produção; surgiram problemas de conservação de solo, de erosão. E os problemas sociais e econômicos agravaram-se.

Ehlers (1999) destaca que passada a euforia que as “grandes safras” trouxeram devido

ao novo padrão tecnológico da “Revolução Verde” começa a ter preocupações em

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relação a sua viabilidade pelos impactos socioambientais negativos que estavam

ocorrendo: Dentre as consequências ambientais da agricultura convencional destacam-se: a erosão e a perda da fertilidade dos solos; a destruição florestal; a dilapidação do patrimônio genético e da biodiversidade; a contaminação dos solos, da água, dos animais silvestres, do homem do campo e dos alimentos (EHLERS, 1999, p. 34).

É neste contexto que as políticas de desenvolvimento rural vão incorporar a

preocupação ambiental. No Brasil, os programas de microbacias hidrografias têm este

perfil de desenvolvimento socioambiental.

Os programas de microbacias hidrográficas no Brasil

Na segunda metade da década de 1970 mesmo com os resultados positivos do

crescimento da produção agrícola, torna-se evidente que os impactos socioambientais

negativos o inviabilizava (SABANÉS, 2002).

Durante as décadas de 1960 e 1970 os grupos ecologistas eram marginalizados, e

exerciam pouca influência sobre o tema. A partir das décadas de 1980 e 1990 as

questões ambientais tornam-se mais expressivas. Como resultado deste processo de conscientização da importância dos temas ambientais e da necessidade de também introduzir a ação governamental neste campo, foram criadas, nos ambitos de governos, secretarias e ministérios dedicados à geração de políticas orientadas à conservação dos recursos naturais (SABANÉS, 2002, p.70).

No ano de 1987 foi publicado um documento elaborado pela Comissão Mundial de

Meio Ambiente e Desenvolvimento com o titulo “Nosso Futuro comum” conhecido

como “Informe Brundland”, o qual se tornou um marco importante do

“Desenvolvimento Sustentável”.

Nesse contexto, diversas organizações internacionais intensificaram o debate acerca de um modo de produzir que agredisse menos o meio ambiente. A ONU, em 1983, instituiu a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CMMAD), que, durante o período 1983-1987, elaborou o conceito de desenvolvimento sustentável, contendo propostas para diminuir os impactos ambientais gerados pelo desenvolvimento tecnológico (NEVES NETO, 2009, p. 56).

Nesse novo contexto há a elaboração de projetos para o meio rural, os quais visam

promover o “desenvolvimento rural sustentável”. As agencias de regulação de bacias hidrográfica, por exemplo, assumem um papel cada vez mais importante, no sentido de colocar o problema dos níveis

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territoriais em que devem ser concebidas as políticas e tomadas as decisões (SABANÉS, 2002, p.74).

Dois dos principais recursos naturais impactados foram o solo e a água, como ressalta

Balsan (2006). Nos últimos quinze anos, vem se produzindo uma mudança significativa na ação dos serviços públicos de assistência técnica e extensão rural, através da incorporação da noção de microbacia hidrográfica (MBH) como unidade operacional de planificação e ação. Tal fato colaborou significativamente para a geração de uma nova forma de políticas públicas de conservação e manejo dos recursos naturais e do desenvolvimento rural, crescentemente informadas por uma racionalidade técnica distinta daquelas que prevaleceram no passado (SABANÉS, 2002, p. 78).

De acordo com SABANÉS (2002, p.79): A microbacia hidrográfica é definida por vários autores como área geográfica de captação de água, composta por pequenos canais de confluência e delimitada por divisores naturais, considerando-se a menor unidade territorial capaz de enfocar as variáveis ambientais de forma sistêmica.

Os primeiros países a utilizarem a microbacia hidrográfica como unidades operativas

foram os EUA e a França, ambos no século XIX com o objetivo de planificação dessas

unidades (SABANÉS, 2002).

A primeira experiência que marca a preocupação nacional com os recursos hídricos foi

no governo constitucionalista de Getúlio Vargas, 1934, mesmo de caráter incipiente

buscou a geração de energia e melhorar o gerenciamento das bacias hidrográficas,

visando, principalmente, a prevenção de enchentes (NEVES NETO, 2009).

É na perspectiva de reversão da degradação ambiental, que em meados dos anos oitenta,

no sul do país, foram implementados alguns projetos de manejo e conservação dos

recursos naturais, principalmente baseados na questão problemática da degradação do

solo e das águas, tentando assim reverter os impactos negativos gerados pela

modernização agrícola e também aumentar a produção, produtividade e renda dos

agricultores envolvidos, quais sejam: os programas “Paraná Rural” e o “Microbacias”,

implementados nos Estados do Paraná e em Santa Catarina, respectivamente.

A partir das experiências positivas destes dois programas, o governo do Estado de São

Paulo elaborou o seu programa de microbacias hidrográficas, qual seja: o Programa

Estadual de Microbacias Hidrográficas (PEMH).

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Os programas de “microbacias” no sul do país

No sul do país foram implementados dois programas de significativa importância: o

“Programa de Manejo das Águas, Conservação dos Solos e Controle da Poluição em

Microbacias Hidrográficas” conhecido como “Paraná Rural” (1989-1997), e o

“Programa de Conservação e Manejo Integrado do Solo e da Água” conhecido como

“Microbacias” (1991-1999). Eles foram criados tendo como objetivo conservar o solo e

a água e utilizaram a microbacia hidrográfica como unidade de planejamento

(SABANÉS, 2002). Assim destaca Neves Neto (2009, p. 59). Esses programas inovaram ao introduzir a dimensão ambiental na sua operacionalização; na descentralização das ações, envolvendo diversos setores da sociedade e na adoção da microbacia hidrográfica como unidade de operação.

O projeto “Paraná Rural” conseguiu empréstimo do Banco Internacional para

Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), sendo que este último entrou com a verba de

US$ 63.000.000 e o governo estadual com US$ 86.134.000.

O programa pautou-se no controle das erosões hídricas, incentivando o plantio direto na

palha e a construção de terraços. Com diversas medidas adotadas, o programa visava à

recuperação dos solos e dos demais recursos naturais, aumentando, assim, a

produtividade, reduzindo os custos de manutenção e aumentando a rentabilidade dos

produtores rurais.

Foram quatro as estratégias usadas, conforme SABANÉS (2002, p. 93): 1– aumento da cobertura vegetal do solo; 2– aumento da infiltração de água no perfil do solo; 3– controle do escoamento superficial; 4– controle da poluição.

Os dois programas acima citados foram os de maior importância, porém houve diversos

programas nesses Estados, conforme salientam Neves Neto e Hespanhol (2009). Os principais foram: O Programa Estadual de Conservação dos Solos (1965-1970), o Programa de Conservação e uso da Água e dos Solos (1979-1983), o Programa de Conservação e Manejo Integrado do Solo e da Água (1986-1991) e o Projeto “Microbacias” (1991-1999), que resultou de um acordo entre o governo do estado e o Banco Mundial (2009, p. 103).

Como no “Paraná Rural”, o “Microbacias” conseguiu uma maior participação dos

pequenos proprietários rurais, dos líderes e das autoridades envolvidas. Porém, ao

contrário do “Paraná Rural”, o que foi mais visado no projeto foi à cobertura do solo e

menos práticas mecânicas de conservação.

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O programa “Microbacias” contou com 50% dos recursos vindos do BIRD e a outra

parte do Estado, num total de US$ 70.000.000, pretendendo trabalhar 1.855.500

hectares (25% da área agrícola estadual) atingindo 80.900 agricultores em 143

municípios (SABANÉS; 2002).

O projeto consistia (...) de oito componentes: pesquisa agrícola; mapeamento planejamento e monitoramento do uso do solo; extensão rural; programa de incentivo ao manejo e conservação do solo e controle da poluição; obras de controle da erosão ao longo dos caminhos rurais; desenvolvimento florestal e proteção dos recursos naturais; administração, monitoramento e avaliação do projeto; componente treinamento (SABANÉS, 2002, p. 106).

No projeto tinha como objetivo recuperar e conservar a capacidade produtiva dos solos

e controlar a contaminação ambiental por meio de práticas sustentáveis do uso dos solos

e controlar a contaminação ambiental, utilizando a prática de manejo sustentáveis e

conservação da água e do solo pelos agricultores (SABANÉS, 2002). Esse autor assim

destaca que os três principais objetivos foram “aumentar a cobertura vegetal dos solos; -

melhorar a infiltração dos solos; - controlar o escoamento superficial”

(SABANÉS,2002, p. 105). E ainda segundo este autor o Estado de Santa Catarina desde

1957 já iniciava as primeiras ações de conservação dos recursos naturais.

O PEMH no Estado de São Paulo

O PEMH foi gerenciado pela Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI) e

teve início no ano de 2000, com previsão para se estender até o ano de 2006, porém

houve a prorrogação de dois anos, com isso o programa foi finalizado no ano de 2008.

O Projeto Estadual de Microbacias Hidrográficas (PEMH), Segundo Neves Neto e

Hespanhol (2009, p. 105). (...) caracterizou-se por abranger três princípios básicos: a busca por uma sustentabilidade socioeconômica e ambiental na microbacia (unidade física de intervenção do programa), participação e envolvimento da sociedade civil, descentralização e transparência nas ações governamentais.

O programa teve como meta atingir 1.500 microbacias hidrográficas e 90.000

proprietários rurais. No estado de São Paulo os produtores rurais foram classificados

em: Pequenos: até 50 hectares; Médios: entre 50 e 200 hectares; Grandes: acima de 200

hectares.

De acordo com CATI (2000, p.5) os objetivos principais do programa estadual de

microbacias foram:

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Promover o desenvolvimento rural do Estado de São Paulo, entendendo-se por desenvolvimento rural a ampliação das oportunidades de ocupação, melhorias dos níveis de renda, maior produtividade geral das unidades de produção, redução dos custos e uma reorientação técnica-agronômica. Tudo para propiciar o aumento do bem estar da população rural, através da implantação de sistemas de produção agropecuária que garantam a sustentabilidade socioeconômica e ambiental, com plena participação e envolvimento dos beneficiários e da sociedade civil organizada.

As áreas selecionadas pelo programa, de acordo com o grau de prioridade, levaram em

conta os índices de erosão e de indigência do Estado de SP. Ficaram com 70% a área 1,

27% a 2 e 3% a 3 dos recursos oferecidos pelo PEMH (CATI, 2001), conforme se

verifica na Figura 1.

Figura 1 – Área de atuação dos escritórios de desenvolvimento rural do estado de São Paulo, segundo os níveis de prioridade para a implantação do programa de microbacias hidrográficas.

F

ont

e: Fonte: Carlos de Castro Neves Neto, 2009

O PEMH no município de Ribeirão dos Índios

O município de Ribeirão dos Índios situa-se no Pontal do Paranapanema, possui uma

área de apenas 17.900 hectares, sendo o menor dentre os 11 municípios que integram o

Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Presidente Venceslau (Figura 2)

O povoado de Ribeirão dos Índios com a Lei n. 2.793 de 26 de dezembro de 1936 foi

elevado a distrito pertencente ao município de Santo Anastácio, pelo Doutor Armando

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Sales de Oliveira. O distrito assim permaneceu até o ano de 1995, quando, através da

Lei n. 9.330 de 27 de dezembro de 1995, assinada pelo governador Mário Covas, foi

emancipado de Santo Anastácio e elevado a categoria de Município.

Figura 2- Localização do município de Ribeirão dos Índios

Tabela 1 - características da população do município de Ribeirão dos índios

População total População urbana População rural Densidade demográfica

2.231 1.760 471 124,1_hab./km2 Fonte: IBGE (2010)

O Município de Ribeirão dos Índios está localizado na Bacia Hidrográfica do Rio

Paraná. Todos os seus córregos e ribeirões são afluentes da margem esquerda do Rio do

Peixe (Afluente do Paraná).

Os córregos do município são:

Ribeirão dos Índios

Córrego do Arco

Córrego do Arapuá

Córrego da Cachoeira (Santo Antonio)

Córrego da Lage

No município de Ribeirão dos Índios apenas duas Microbacias se situam inteiramente

na área do município: a Microbacia do Córrego do Arco e a Microbacia do Ribeirão dos

Índios. Elas concentram cerca de 60% das propriedades rurais e a Microbacia do

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Ribeirão dos índios possui maior número de produtores que a do Córrego do arco.

Foram essas duas microbacias selecionadas pelo Programa Estadual de Microbacias

Hidrográficas.

Devido à utilização dos recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos – FEHIDRO

na adequação de estradas rurais, na microbacia hidrográfica Córrego do Arco não foram

utilizados recursos do Programa de Microbacias para a readequação da malha viária na

área rural.

De acordo com o técnico da casa da agricultura de Ribeirão dos Índios: [...] o córrego do arco foi todo terraceado pelo FEHIDRO. O FEHIDRO terraceou uma parte depois terraceou outras duas partes [...] L.L.R. (TRABALHO DE CAMPO, 2012).

Tabela 2 - Incentivos do PEMH destinados ao município de Ribeirão dos índios-SP

PRÁTICAS Nº PRODUT.

QTD. UNID. VALOR TOTAL

(R$)

VALOR APOIADO

(R$) Microbacia: MBH

RIBEIRAO DOS INDIOS

Controle de Voçorocas 10 346,7 Hs 29.267,17 29.267,17 Controle Erosão -

Terraceamento Executado 17 225,5 Há 64.650,00 46.560,63

Kit Plantio Direto - Associações de Produtores

Atendidas

13 1 Um 18.989,00 18.989,00

Mudas de Espécies Florestais Nativas Plantadas (doação)

5 8.850 Um 8.850,00 8.850,00

Roçadeira Costal Adquirida 3 1 Um 1.940,00 1.468,30 Trecho Crítico de Estrada

Adequado 0 4,0 Km 278.300,00 278.300,00

Total - - - 401.996,17 383.435,10 Microbacia: MBH

CORREGO DO ARCO (ITESP)

Controle de Voçorocas 2 40,6 Hs 3.654,00 3.654,00 Controle Erosão -

Terraceamento Executado 1 12,0 Há 3.600 2.664,14

Roçadeira Costal Adquirida 9 3 Um 5.820,00 4.389,42 Total - - - 13.074,00 10.707,56

Fonte: CATI (2008)

Dentre as duas microbacias a que recebeu mais incentivos e teve maior número de obras

realizadas foi a Microbacia do Ribeirão dos Índios, com um total de R$ 401.996,17. As

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obras que beneficiaram esta microbacia foram diversas, tanto para o atendimento de

grupos de produtores como de produtores individualmente. O que mais se destaca nesta

microbacia é o investimento em estradas rurais, diferentemente da microbacia Córrego

do Arco. Na Microbacia do Ribeirão dos Índios a maior parte dos investimentos foi feita

na readequação de estradas rurais. De acordo com o técnico executor foi realizado o

melhoramento de quatro quilômetros de estradas.

O PEMH concentrou seus investimentos no controle de erosão, utilizando técnicas de

terraceamento para o controle de voçorocas, e na construção de poços artesianos.

Também foi comprada uma máquina de plantio direto. O técnico e coordenador do

Departamento de Agricultura, Abastecimento e Meio-ambiente, comentou que a

máquina foi adquirida em um período que a agricultura estava em crise no município, o

que fez com que ela fosse pouco utilizada pelos produtores.

A estrutura fundiária do município possuía a maior quantidade de Unidades de

Produção Agrícola UPA’s concentrada nas pequenas e médias propriedades. Porém a

maior concentração de terra se encontra entre as médias e grandes propriedades que são:

media 50 a 200 ha e grande > 200 hectares, sendo aproximadamente 79% da área total e

30% do número de UPA’s.

Tabela3- Estrutura fundiária do município de Ribeirão dos Índios- SP

Estrato (ha)

UPA’s Área total

Nº % Há % 0 – 10 57 21,19 313,1 1,88 10 – 20 48 17,84 665,6 3,98 20 – 50 83 30,86 2.543,3 15,2

50 – 100 45 16,73 3.138,3 18,75 100 – 200 21 7,81 2.957,6 17,67 200 – 500 11 4,09 3.230,9 19,3

500 – 1000 3 1,12 1.819,1 10,87 1000 – 2000 0 0 0 0 2000 – 5000 1 0,37 2.068,7 12,36

> 5000 0 0 0 0 Fonte: LUPA – CATI/SAA (2008)

Por meio do programa foram efetivados diversos investimentos na área rural como:

terraceamento, controle de voçorocas, construção de poços artesianos, readequação da

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malha viária etc. e foi de grande valia para a recuperação e manutenção do meio

ambiente.

Figura 3: Adequação das estradas Rurais

Fonte: Casa da Agricultura

Verifica-se na Figura 3 o trabalho de readequação de estrada rural realizado com

maquinas na microbacia córrego Ribeirão dos Índios.

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Figura 4: Serviço de terraceamento realizado pelo PEMH no Município de Ribeirão dos Índios

Fonte: Casa da Agricultura

Houve a realização de bastante terraceamento, principalmente na microbacia Córrego

Ribeirão dos Índios, onde o programa realizou o maior número de terraceamentos.

Conclusão

O PEMH trouxe ao pequeno produtor rural do Estado de São Paulo muitos benefícios,

tendo como principais pontos: a recuperação e manutenção do meio ambiente,

utilizando várias técnicas (reflorestamento, terraceamento, curvas de nível, uso do

calcário para recuperação do solo, contenção de erosões, proteção das Áreas de

Preservação Permanente), disponibilizando materiais (implementos, insumos, cercas

para a proteção de áreas degradadas) e também incentivou a criação e/ou fortalecimento

de associações, com o intuito de fortalecer a organização rural e assim elevar a renda

dos produtores.

O incentivo à assistência técnica também foi um dos pontos positivos do Programa de

Microbacias.

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Mesmo com a criação de várias associações pelo programa, muitas delas não funcionam

ou foram criadas apenas para receberem recursos, tornando-se inoperante com o fim

dessa política pública estadual. O técnico da Casa da Agricultura do município deixou

bem claro em sua entrevista, que mesmo com todos os incentivos do Programa de

Microbacias, os produtores rurais ainda possuem muitas dificuldades em se organizarem

e se articularem, que isso é uma das maiores dificuldades deles hoje, conseguir fazer

com que esses produtores rurais se organizem e participem ativamente da associação.

Referências

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