16 agroecologia e desenvolvimento rural sustentável

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16 Agroecol.e Desenv.Rur.Sustent.,Porto Alegre, v.1, n1, jan./mar.2000 A rtigo Resumo: O artigo pretende ser um esforço de síntese e sistematização de elementos teóricos e conceituais que estão dando suporte para o que denominamos de uma Exten- são Rural Agroecológica. Nele se busca resgatar um amplo debate teórico sobre susten- tabilidade e sobre estratégias de intervenção capazes de contribuir para a construção de estilos de desenvolvimento rural e de agriculturas sustentáveis, des- tacando o papel diferenciado que precisa ter a extensão rural como instrumento deste processo de construção. Assim mesmo, referen- ciamos, como base empírica, o que vem sendo estabelecido, desde o início de 1999, na Extensão Rural do Rio Grande do Sul. Se conclui que um novo estilo de desenvolvi- mento rural, determinado pelo im- perativo sócioambiental, exige uma Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável: perspectivas para uma Nova Extensão Rural * Caporal, Francisco Roberto** Costabeber, José Antônio*** “Entramos numa época de ilimitação e é nisso que temos o desejo de infinito (...). A sociedade capitalista é uma sociedade que caminha para o abismo, sob todos os pontos de vista, por não saber se autolimitar. E uma sociedade realmente livre, uma sociedade autônoma, deve saber se autolimitar, saber que há coisas que não se pode fazer, que não se deve nem tentar fazer, ou que não se deve desejar. Vivemos neste planeta que estamos destruindo (...). Tantas maravilhas em vias de extinção. Penso que deveríamos ser os jardineiros deste planeta. Teríamos que cultivá-lo. Cultivá-lo como ele é e pelo que é (...). A tarefa é enorme (...). Só que isto está muito longe não só do atual sistema quanto da imaginação dominante. O imaginário de nossa época é o da expansão ilimitada (...). Isso é que é preciso destruir. É nesse imaginário que o sistema se apoia” (Castoriadis, 1999). * *Os autores deste texto foram bolsistas do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), durante a realização do “Programa de Doctorado en Agroecología, Campesinado e Historia” – Instituto de Sociología y Estudios Campesinos, Universidad de Córdoba, Espanha, concluí- do em 1998. ** **Eng. Agr., MSc., Dr., Extensionista rural e Diretor Técnico da EMATER/ RS-ASCAR. Rua Botafogo, n° 1051. Bairro Menino Deus. CEP 90.150- 053 – Porto Alegre (RS). E-mail [email protected] *** ***Eng. Agr., MSc., Dr., Extensionista Rural e Assessor Especial da EMATER/RS-ASCAR. Rua Botafogo, n° 1051. bairro Menino Deus. CEP 90.150-053 – Porto Alegre (RS). E-mail [email protected]

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Resumo: O artigo pretende ser um esforço de síntese e sistematização de elementosteóricos e conceituais que estão dando suporte para o que denominamos de uma Exten-são Rural Agroecológica. Nele se busca resgatar um amplo debate teórico sobre susten-tabilidade e sobre estratégias de intervenção capazes de contribuir para a construção de

estilos de desenvolvimento rural ede agriculturas sustentáveis, des-tacando o papel diferenciado queprecisa ter a extensão rural comoinstrumento deste processo deconstrução. Assim mesmo, referen-ciamos, como base empírica, o quevem sendo estabelecido, desde oinício de 1999, na Extensão Ruraldo Rio Grande do Sul. Se concluique um novo estilo de desenvolvi-mento rural, determinado pelo im-perativo sócioambiental, exige uma

Agroecologia eDesenvolvimentoRural Sustentável:perspectivas para umaNova Extensão Rural*

Caporal, Francisco Roberto**Costabeber, José Antônio***

“Entramos numa época de ilimitação e é nisso que temos o desejo de infinito (...). Asociedade capitalista é uma sociedade que caminha para o abismo, sob todos os pontos devista, por não saber se autolimitar. E uma sociedade realmente livre, uma sociedadeautônoma, deve saber se autolimitar, saber que há coisas que não se pode fazer, que nãose deve nem tentar fazer, ou que não se deve desejar. Vivemos neste planeta que estamosdestruindo (...). Tantas maravilhas em vias de extinção. Penso que deveríamos ser osjardineiros deste planeta. Teríamos que cultivá-lo. Cultivá-lo como ele é e pelo que é(...). A tarefa é enorme (...). Só que isto está muito longe não só do atual sistema quanto daimaginação dominante. O imaginário de nossa época é o da expansão ilimitada (...). Issoé que é preciso destruir. É nesse imaginário que o sistema se apoia”

(Castoriadis, 1999).

* *Os autores deste texto foram bolsistas do CNPq (Conselho Nacional deDesenvolvimento Científico e Tecnológico), durante a realização do “Programade Doctorado en Agroecología, Campesinado e Historia” – Instituto deSociología y Estudios Campesinos, Universidad de Córdoba, Espanha, concluí-do em 1998.

** **Eng. Agr., MSc., Dr., Extensionista rural e Diretor Técnico da EMATER/RS-ASCAR. Rua Botafogo, n° 1051. Bairro Menino Deus. CEP 90.150-053 – Porto Alegre (RS). E-mail [email protected]

*** ***Eng. Agr., MSc., Dr., Extensionista Rural e Assessor Especial daEMATER/RS-ASCAR. Rua Botafogo, n° 1051. bairro Menino Deus. CEP90.150-053 – Porto Alegre (RS). E-mail [email protected]

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práxis social diferenciada por parte dos agen-tes envolvidos e, portanto, uma Nova Exten-são Rural, praticada com base em um “novoprofissionalismo”. Ademais, esse processo demudança constitui-se em um novo desafio paraas instituições de ensino e de pesquisa.

Palavras-chave: Agroecologia, Desenvolvi-mento Rural Sustentável, Extensão Rural.

1 IntroduçãoEm 1994, quando publicamos o texto

intitulado Por uma nova extensão rural: fugin-do da obsolescência (Caporal e Costa Beber,1994), dizíamos: “não podemos nos deixar le-var pelo imobilismo conservador que continuaaprisionando as organizações públicas de ex-tensão rural”. Ao mesmo tempo, propugnáva-mos por uma mudança drástica no papel daextensão rural pública, para que esta pudes-se, de fato, dar conta dos novos desafios socio-ambientais impostos pela sociedade.

Não era sem sentido, portanto, o alerta for-mulado naquela época, quando sugeríamos,também, que “os ensinamentos da Agroecolo-gia (...) poderão se tornar necessidadesinadiáveis”, com vistas a promover a recupe-ração e a conservação dos recursos naturaisno âmbito das unidades familiares de produ-ção. Igualmente, alertávamos para a necessi-dade imediata de um enfoque extensionistaorientado a resolver a problemática socioam-biental decorrente da aplicação do modelo con-vencional de desenvolvimento, em geral, e domodelo químico-mecânico naagricultura, em particular.

Felizmente, ainda que passa-dos cinco anos, vemos agora seconcretizando um conjunto demudanças no extensionismo ru-ral do estado do Rio Grande doSul, que pode vir a tornar-se umnovo paradigma ou uma nova re-ferência para a prática da Exten-são Rural no Brasil.

Com efeito, o presente artigo

procura discorrer sobre algumas das basesteóricas que estão dando suporte para a cons-trução de uma nova Extensão Rural1 - aquidefinida como Extensão Rural Agroecológica - ,que constitui-se num esforço de intervençãoplanejada para o estabelecimento de estraté-gias de desenvolvimento rural sustentável, comênfase na participação popular, na agricultu-ra familiar e nos princípios da Agroecologiacomo orientação para a promoção de estilosde agricultura socioambiental e economica-mente sustentáveis. Na realidade, se trata deum enfoque de intervenção rural oposto aodifusionismo reducionista homogeneizadorque, desde meados do século XX, auxiliou aimplantação do modelo de agricultura de tipoRevolução Verde.

Neste contexto, o artigo inicia abordandoalguns temas-chaves da sustentabilidade,onde se destacam duas correntes principaise antagônicas: a ecotecnocrática e a ecossoci-al. Isso ajuda à compreensão de que o concei-to de desenvolvimento sustentável apresentauma grande ambigüidade e que, portanto,para ser operacional, precisa ser relacionadonão apenas com a sustentabilidade econômi-ca, mas também, e principalmente, com a sus-tentabilidade socioambiental e cultural de so-ciedades concretas, permitindo assim a bus-ca e a construção social de contextos de sus-tentabilidade crescente no curto, médio e lon-go prazos, cabendo à Extensão Rural um im-portante papel neste processo.

Na seqüência, se defende aadoção da Agroecologia comoparadigma diretivo para pro-mover o manejo adequado dosrecursos naturais e para redu-zir os impactos sociais, econô-micos e ambientais negativos,causados pela mal denomina-da agricultura moderna. Apósuma rápida abordagem do con-ceito de Agroecologia e sua gê-nese no pensamento social al-

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ternativo, são mencionadas asbases ou premissas epistemo-lógicas que apóiam e dão sus-tentação a este novo campo deconhecimentos. Se faz referên-cia ainda ao processo de ecolo-gização, que representa preci-samente a essência da transi-ção que a agricultura estaria ex-perimentando a partir deste fi-nal de século.Como entende-mos, a ecologização provavel-mente não será um processo unilinear, po-dendo seguir distintas vias, alinhadas ou coma corrente ecotecnocrática (intensificação ver-de), ou com a corrente ecossocial (transiçãoagroecológica), o que implica também a neces-sidade de a Extensão Rural pública fazer asua opção, definindo qual caminho trilhará.

A opção da Extensão Rural do Rio Grandedo Sul foi bastante clara, no sentido de apoiaro processo de transição agroecológica, por en-tender que a agricultura é um processo deconstrução social e que, portanto, são as fa-mílias rurais que devem assumir o papel desujeitos ativos nos processos de desenvolvi-mento socioeconômico e cultural de suas co-munidades. Por esta razão, o artigo tambémexpõe - em caráter informativo - a nova mis-são, os objetivos e as estratégias de ação queatualmente estão orientando todos os esfor-ços da Extensão Rural gaúcha. A ênfase colo-cada na agricultura familiar (público exclusi-vo), na Agroecologia (base científica) e nosmétodos educativos e participativos (metodo-logia de intervenção democrática) vem demons-trando a sua firme disposição de encarar osdesafios da sustentabilidade como o núcleofundamental de sua mais nobre missão.

Como último ponto, o artigo traz algumasreflexões a respeito dos grandes desafios queenfrenta a nova extensão rural que está sen-do desenhada no Rio Grande do Sul. O seusucesso dependerá do que estamos denomi-nando de um “novo profissionalismo”, capaz

de ver a agricultura e os agri-cultores de modo distinto doque até agora conseguiu ver. Énecessário entender a agricul-tura em sua complexidade, quevai mais além de aspectos me-ramente econômicos para in-cluir dimensões socioambien-tais e culturais importantes,sem as quais dificilmente sepoderá almejar, de fato, a cons-trução do desenvolvimento ru-

ral sustentável em seu sentido mais amplo.Assim, o difusionismo tecnicista precisa sersuperado em favor da Extensão Rural Agroe-cológica, conceito orientador da nova práticaextensionista que apresentamos no final dopresente artigo.

2 A sustentabilidade comoexigência para a construção denovas vias de desenvolvimentoO desenvolvimento, em sua formulação

mais ampla, significaria a realização de po-tencialidades socioculturais e econômicas deuma sociedade em perfeita sintonia com o seuentorno ambiental. Sua conceituação pionei-ra provavelmente se deva a Caspar FriedrichWolff, quando, ainda no século XVIII, se refe-ria ao desenvolvimento embrionário como ocrescimento alométrico (variação das relaçõesentre as partes) em direção à forma apropria-da do ser (Sevilla Guzmán et al., 1999).

No entanto, a partir da construção do pen-samento liberal, a aplicação do conceito dedesenvolvimento passou a conotar uma idéiade crescimento econômico, adotando comoparâmetro definidor do desenvolvimento ospadrões de vida e de consumo alcançados pe-las nações ocidentais industrializadas. O con-ceito de desenvolvimento passaria a signifi-car, portanto, a corrida de sociedades distin-tas e heterogêneas em direção a um modelode organização social e econômica considera-do “desenvolvido”, ou seja, “passar de uma

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condição indigna”, chamada subdesenvolvimen-to, para um modelo de sociedade ocidental,capitalista e industrializada, mediante estra-tégias geradoras de crescimento econômico(Esteva, 1996).

A partir da década de 1970, os resultadosda aplicação das estratégias convencionais dedesenvolvimento já começavam a se mostrarinsuficientes para dar conta das crescentescondições de desigualdade e de exclusão soci-al. Apesar do crescimento do PIB, as análisesdestes resultados passavam a indicar que taisestratégias estavam ocasionando graves da-nos ao meio ambiente. Os efeitos contaminan-tes dos agrotóxicos, dos resíduos, do lixo e dascontaminações gasosas, assim como váriosoutros problemas derivados do estilo de vidapróprio das sociedades altamente industriali-zadas, por exemplo, fariam nascer a consci-ência sobre a incapacidade de controlar-se asexternalidades2 inerentes ao modelo hegemô-nico e, portanto, se impunha a necessidadede “outro desenvolvimento”.

Neste contexto, surgem novas orientaçõesteóricas que, partindo dos impactos negati-vos causados pelo modelo de desenvolvimen-to convencional até então adotado, propõem ouso de conceitos mais abrangentes, tais comoo “desenvolvimento com eqüidade” e o “eco-desenvolvimento”3 . Isto é, dada a comprova-ção de que os modelos centrados no imperati-vo do crescimento econômico não alcançaramos objetivos pretendidos, o que seria posteri-ormente declarado como algo impossível4 ,nascem as correntes ou enfoques da susten-tabilidade como uma resposta aos resultadosdestrutivos dos modelos de desenvolvimentoe das tecnologias implementados depois daSegunda Gerra Mundial.

2.1 Principais enfoques dasustentabilidade

Se crescimento econômico havia sido a pa-lavra mágica das quatro primeiras décadas dodesenvolvimentismo, contemporaneamente o

discurso sobre o desenvolvimento incorporou,definitivamente, a problemática socioambien-tal. Disso decorre que a busca de respostas àproblematização da relação entre natureza esociedade passasse a ser articulada medianteo que Escobar (1995) chama de “diálogo dediscursos” entre três correntes de pensamen-to: a liberal, a culturalista e a ecossocialista.

Apesar da complexidade de cada um des-tes discursos ambientalistas, utilizamos nes-te texto uma classificação mais simplificada,reunindo os discursos culturalista e ecosso-cialista - por seus pontos de convergência -numa só perspectiva, que aqui chamamos decorrente ecossocial. Assim mesmo, o discursoliberal, por sua estreita vinculação com atecnocracia mundial, denominamos aqui cor-rente ecotecnocrática.

Entendemos que é de suma importânciaadotar a classificação e diferenciação dos dis-cursos sobre sustentabilidade, na medida emque o uso do conceito de desenvolvimentosustentável tem permitido toda a sorte deocultações de natureza ideológica, que leva auma profunda confusão, já que esconde asdiscrepâncias de fundo existentes entre asdiferentes escolas de pensamento sobre sus-tentabilidade (Caporal, 1998)5 .

a) Corrente ecotecnocráticaConstruída nos marcos da Teoria do Equi-

líbrio, a corrente ecotecnocrática “nasce docoração da modernidade ocidental” (Escobar,1995), e sua versão mais conhecida é aqueladifundida pelo Relatório Brundtland6 . Partin-do da necessidade de um crescimento econô-mico continuado - ainda que aceitando os li-mites impostos pela Natureza - , tenta, porum lado, resolver a equação entre crescimen-to, sociedade e meio ambiente mediante a ado-

A r t i g oEstratégias convencionais de

desenvolvimento já começavam a semostrar insuficientes para dar conta dascrescentes condições de desigualdade e

de exclusão social

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ção de um otimismo tecnológico e de artifíci-os econômicos. Por outro lado, esta perspecti-va tenta solucionar a problemática socioam-biental e os limites ao crescimento, median-te mecanismos de mercado, como podem sero estabelecimento de preços a produtos e ser-viços da natureza, a cobrança de taxas ou im-postos pela deterioração ambiental ou o arti-fício de internalização das externalidades7 .

No que se refere à agricultura, esta orien-tação teórica se torna operativa através daidéia da “intensificação verde”, ou seja, pres-supõe que é possível seguir o mesmo padrãotecnológico dominante, incorporando umanova geração de tecnologias, teoricamentemenos danosas ao meio ambiente. Entretan-to, sua estratégia está alicerçada no aprofun-damento permanente da intensificação tecno-lógica em áreas de “alto potencial produtivo”,através do “uso abundante de insumos indus-triais”, conformando assim o que vem sendochamado de Revolução Verde Verde ou Revo-lução Duplamente Verde. Por outro lado,desconsidera os já amplamente conhecidosefeitos sociais, econômicos e ambientais per-versos da modernização tecnológica do campo,especialmente no contexto dos ditos países sub-desenvolvidos ou em desenvolvimento.

Esta hipótese tecnicista, calcada no otimis-mo tecnológico, segue sendo excludente sob oponto de vista socioambiental e não enfrentaquestões-chaves da sustentabilidade, na me-dida em que nela não há espaço para pensar-

se a preservação dabiodiversidade e nemmesmo para respeitara diversidade cultu-ral. Deste modo, aRevolução Verde Ver-de seguiria sendo umesforço de homoge-neização do padrãoagrícola dominante,adaptado aos agricul-tores que podem ado-

tar as novas tecnologias, sem haver a preo-cupação com as externalidades negativascomprovadamente inerentes a tal modelo, ouaté mesmo tentando estabelecer preços e ta-xas fictícias a modo de internalizar os custosdestas externalidades mediante formulaçõeseconométricas.

b) Corrente ecossocialQuase ao mesmo tempo em que se confor-

mava o discurso ecotecnocrático do desenvol-vimento sustentável, nasceriam também cor-rentes de pensamento ditas “alternativas”, cujodiscurso - que mais nos interessa neste mo-mento - agrupamos sob a denominação deecossocial. Provavelmente, uma das primeirasabordagens contemporâneas nesta perspecti-va, como novo enfoque para analisar a proble-mática do desenvolvimento, tenha nascido ain-da na década de setenta, a partir do surgimentodo conceito de ecodesenvolvimento8 .

A noção de ecodesenvolvimento sustenta aidéia da necessidade de um novo critério deracionalidade que fosse amparado por duasdimensões de solidariedade: a solidariedadediacrônica, com respeito às gerações futuras,mas sem esquecer a solidariedade sincrônica,que deve ser estabelecida entre as geraçõespresentes. Além disso, supõe o pluralismo tec-nológico, calcado na importância da utiliza-ção das tecnologias tradicionais e modernasde forma adequada, respeitando as condiçõesdo ecossistema local e, ao mesmo tempo, es-tando de acordo com as necessidades e deci-sões conscientes dos atores envolvidos nosprocessos de desenvolvimento. Se adverte, des-de então, que o mercado é imperfeito e inca-paz de resolver todos os problemas - especial-mente os socioambientais -, podendo, inclu-sive, gerar um “mau desenvolvimento” (Sachs,1986).

O enfoque defendido por Sachs e seus se-guidores, de certa maneira, parece estar in-fluenciado pelas “correntes humanistas”, namedida em que se admite a possibilidade de

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que os homens manifestem “comportamen-tos altruístas”, indo contra a idéia do indiví-duo econômico racional, da economianeoclássica. Contudo, o ecodesenvolvimentonão descarta a necessidade de planejamentopara o desenvolvimento nem a influência dosgovernos e suas políticas, particularmentequando se trata de enfrentar as imperfeiçõesdo mercado capitalista. Mesmo assim, está emdesacordo com a noção de globalização defen-dida pelo liberalismo econômico ecológico(Sachs, 1981; Sachs, 1986).

Na seqüência da formulação teórica anta-gônica à perspectiva liberal, encontramos osenfoques culturalista e ecossocialista. O dis-curso articulado sob o enfoque culturalista seopõe à corrente liberal, defendendo uma posi-ção contrária ao desenvolvimento e criticandoa cultura ocidental, a ciência e a tecnologiamoderna, consideradas como as principaiscausadoras da atual crise9 . Os culturalistasenfatizam “a cultura como instância funda-mental de nossa relação com a natureza”, di-rigindo suas críticas aos que tentam subordi-nar a natureza mediante o que vem sendochamado de esverdeamento10 da economia. Nodiscurso culturalista está bem presente a idéiada natureza como um ente autônomo, fontede vida não somente material mas tambémespiritual, existindo, portanto, uma continui-dade indivisível entre os mundos humano, ma-terial e espiritual (Escobar, 1995).

De modo semelhante, a elaboração teóricados ecossocialistas também parte da crítica àcorrente liberal, destacando-se, porém, peloseu interesse e centralidade na Economia Po-lítica. Temas como a teorização da naturezado capital em sua “fase ecológica” e a críticaao mercado - por sua incapacidade de respon-der tanto aos desafios da pobreza como aosdesafios ambientais -, fazem parte do marcoteórico dos ecossocialistas, que também su-gerem estratégias alternativas não apenas noque se refere à organização do trabalho comotambém às formas de produção e comerciali-

zação. Além disso, defendem um desenvolvi-mento que respeite os distintos modos de vidae as diferentes culturas e que favoreça a pre-servação da biodiversidade. Em síntese, pro-põem uma mudança no sistema e nas orien-tações econômicas dominantes, em favor denovas estratégias que, baseadas na descen-tralização dos processos produtivos, sejamcompatíveis com as condições ecológicas ecapazes de incorporar as identidades étnicase seus respectivos valores culturais.

Continuando a acumulação teórica da cor-rente ecossocial, encontramos contribuiçõesvindas da “teoria marxista ecológica”, que ten-ta explicar, a partir de uma nova visão demundo, uma nova perspectiva de transição aosocialismo, determinada pela dupla contradi-

ção do capitalismo. Destacamos, neste senti-do, as contribuições de O’Connor, que, anali-sando as contradições do capitalismo sob aperspectiva do “neomarxismo ecológico”, afir-ma que a continuidade da acumulação capita-lista só é possível mediante a continuidade daexploração e da contaminação da natureza.Assim, pois, já não se trataria simplesmentede um problema de reprodução das condiçõesde produção, senão que estaríamos frente àameaça de viabilidade do ambiente social enatural como meio de vida (O’Connor, 1990)11 .

A modo de síntese, podemos dizer que,embora seus seguidores não formem um gru-

Um desenvolvimento querespeite os distintos modos de

vida e as diferentes culturas e quefavoreça a preservação da

biodiversidade

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po homogêneo, a corrente ecossocial se ca-racteriza por suas reivindicações de mudan-ças estruturais profundas na sociedade e deum novo pacto de solidariedade, permitindo aconstrução de um novo projeto histórico e abusca de novos rumos nas estratégias de de-senvolvimento.

2.2 Noções sobredesenvolvimento sustentávelO que mais encontramos na literatura con-

temporânea sobre sustentabilidade é, por umlado, o esforço de muitos autores em estabe-lecer um conceito de desenvolvimento susten-tável e, por outro lado, o trabalho de outrostantos mostrando as insuficiências dos con-ceitos existentes. Com isso, nãopretendemos negar o avanço doconhecimento científico naconstrução de um novo para-digma ou na tentativa de esta-belecer um conceito consensu-al de desenvolvimento susten-tável, pelo menos entre aque-les que aderem a tal paradig-ma. O que queremos dizer é quenão podemos ficar imobilizadospor esta falta de consenso, atéporque este pressuposto da ci-ência convencional - de que para agir no sen-tido da sustentabilidade é necessário um con-ceito claro e operacionalizável - tem seucontraponto na história de determinados gru-pos sociais que alcançaram importantes con-textos de sustentabilidade, ainda que desco-nhecendo a lógica formal ocidental do signifi-cado de um conceito.

Sendo assim, e no marco das aproxima-ções necessárias para o estabelecimento daExtensão Rural Agroecológica defendida nes-te texto, optamos por fugir da armadilhaconceitual do desenvolvimento sustentável epartir de elementos orientadores que impulsi-onem estratégias de ação dirigidas à constru-

ção de contextos de sustentabilidade compa-tíveis com a noção de “desenvolvimento localagroecológico” (Sevilla Guzmán, 1999). Sobesta perspectiva, iniciamos por negar os con-ceitos ecotecnocráticos, uma vez que, ademaisde serem extremamente vagos, tentam desviaro foco da atenção sobre o desenvolvimento esuas dimensões sociopolíticas, éticas, cultu-rais e ambientais para dimensões mais estri-tamente técnico-econômicas, obviando os com-promissos ideológicos e minimizando as con-tradições internas das estratégias propostas.

Esta negação vem acompanhada da com-preensão de inevitáveis relações entre o de-senvolvimento sustentável da corrente ecotec-

nocrática (liberal) e a globaliza-ção neoliberal baseada no mer-cado, assim como na evidenterelação centro-periferia, que“determina o estabelecimentode pautas de desigualdade soci-al e de distribuição do poder, dapropriedade, da riqueza, dostatus e dos privilégios, tantoem nível internacional como nointerior de uma sociedade es-pecífica” (Sevilla Guzmán eAlonso Mielgo, 1994).

Portanto, o marco teóricopara uma Nova Extensão Rural deverá orien-tar-se pela busca contínua de estratégias queimpulsionem padrões socioculturalmente de-sejáveis e que estejam apoiados na evoluçãohistórica dos grupos sociais em sua co-evolu-ção com o ecossistema em que estão inseri-dos. Isto implica a necessidade de construir“contextos de sustentabilidade” e de resistên-cia etnoecológica compatíveis com a realidadedo público beneficiário da extensão rural. Tam-bém exige compreender, desde o início, que aagricultura familiar12 é, ao mesmo tempo,unidade de produção, de consumo e de repro-dução e que, portanto, funciona mediante umalógica de produção combinada de valores de uso

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e de mercadorias, objetivando sua reprodução.Obviamente, se trata de uma lógica diferentedaquela que impulsiona a agricultura capita-lista.

Por tudo isto, o trabalho com a agriculturafamiliar - sob a ótica da construção de con-textos de sustentabilidade - exige de parte dos“agentes de desenvolvimento” (OGs ou ONGs)a compreensão de que os agricultores tradici-onais (ou camponeses, se se prefere), no pro-cesso de inserção em sua matriz social, estãosubmetidos a um contexto ecológico específi-co e sua socialização ocorre mediante um pro-cesso de aprendizagem, experimentação eerro, mediado pelo conhecimento de proces-sos biológicos e sociais já presentes no seuentorno sociocultural.

Desta forma, como ensina Iturra (1993), osaber dos camponeses se desenvolve na suaheterogênea ligação ao grupo doméstico e aogrupo de trabalho e, portanto, a “condutareprodutiva rural” é o resultado de uma acu-mulação de conhecimentos - uma epistemo-logia - sobre o sistema de trabalho que nãovem de livros e textos, mas sim da relação entreas pessoas, seu ambiente e as interações re-sultantes desta relações. Nesta perspectiva, abusca de sustentabilidade na agricultura e nodesenvolvimento rural implica reconhecer aexistência deste saber - construído medianteuma lógica indutiva - que vai sendo estabele-cido na história dos grupos sociais na medidaem que se vê fazer, se escuta para poder di-zer, explicar e devolver este conhecimento.Sendo, pois, a agricultura uma atividade hu-mana, ela é uma construção social que, alémde ser ambientalmente determinada, está su-bordinada a determinados condicionantessocioculturais, entre os quais se destaca oconhecimento ou o saber local.

Deste modo, a ação extensionista orienta-da ao desenvolvimento sustentável deverá serdesviada de sua histórica concepção difusio-nista (baseada no “ensino”) para dar lugar a

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uma prática social baseada na “aprendiza-gem”, isto é, na construção de saberes ade-quados para impulsionar estilos de agricultu-ra e de manejo dos recursos naturais capazesde estabelecer patamares crescentes de sus-tentabilidade.

Com isso queremos dizer que, mais do quedispor de um preciso conceito de desenvolvi-mento sustentável, necessitamos trabalhar naidentificação e construção de saberes ecológi-cos, agronômicos, econômicos e sociais quenos permitam, de forma participativa, desen-volver processos toleráveis de exploração danatureza e compatíveis com as exigências dereprodução social da agricultura familiar emseus diferentes extratos ou segmentos. Sen-do assim, deveremos estar sempre atentospara as noções de sustentabilidade, produtivi-dade, estabilidade, eqüidade e qualidade devida, tal como estão enunciadas nos objetivosda Extensão Rural do Rio Grande do Sul. Elaspoderão nos ajudar na construção de contex-tos de sustentabilidade, a exemplo do que seindica a seguir.

2.3 Contextos desustentabilidade

A sustentabilidade não é algo estático oufechado em si mesmo, mas faz parte de umprocesso de busca permanente de estratégiasde desenvolvimento que qualifiquem a ação ea interação humana nos ecossistemas. Esteprocesso deve estar orientado por certas con-dições que, no seu conjunto, permitam a cons-trução e a conformação de um contexto desustentabilidade crescente no curto, médio elongo prazos. Como exemplo, citamos as se-guintes condições:

a) Ruptura das formas de dependência que

Sendo, pois, a agricultura umaatividade humana, ela é uma

construção social que, além de serambientalmente determinada, está

subordinada a determinadoscondicionantes socioculturais

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põem em perigo os mecanismos de reprodu-ção, sejam estas de natureza ecológica,socioeconômica e/ou política.

b) Utilização daqueles recursos que permi-tam que os ciclos de materiais e energias exis-tentes no agroecossistema13 sejam o maisparcimoniosos possível.

c) Utilização dos impactos benéficos quese derivam dos ambientes ecológico, econô-mico, social e político existentes nos distintosníveis (desde a propriedade rural até a ‘’socie-dade maior’’).

d) Não-alteração substantiva do meio am-biente quando tais mudanças, através da tra-ma da vida, podem provocar transformaçõessignificativas nos fluxos de materiais e ener-gia que permitem o funcionamento do ecos-sistema, o que significa a tolerância ou acei-tação de condições biofísicas em muitos ca-sos adversas.

e) Estabelecimento dos mecanismosbióticos de regeneração dos materiais deteri-orados, para permitir a manutenção a longoprazo das capacidades produtivas dos agroe-cossistemas.

f) Valorização, regeneração e/ou criaçãode conhecimentos locais, para sua utilizaçãocomo elementos de criatividade que melho-rem a qualidade de vida da população, defini-da desde sua própria identidade local.

g) Estabelecimento de circuitos curtos parao consumo de mercadorias que permitamuma melhoria da qualidade de vida da popu-lação local e uma progressiva expansão espa-cial, segundo os acordos participativos alcan-çados por sua forma de ação social coletiva.

h) Potencialização da biodiversidade, tan-to biológica como sociocultural (SevillaGuzmán, 1999).

Como se pode apreciar, a construção de con-textos de sustentabilidade poderá servir de guiapara que as ações da extensão rural se distan-ciem gradualmente do caminho perverso re-presentado pela intensificação tecnológica quedesconsidera as agressões ao meio ambiente-

e suas conse-qüências demédio e longoprazos - , a ex-clusão socialde importan-tes segmentosda sociedade ea perda de au-tonomia daspopu laçõesrurais em re-lação aos seus anseios e projetos de desenvol-vimento. Além disso, ajudaria recuperar for-mas de organização social e de conhecimentoe saber local, que se contraponham ao modelode desenvolvimento hegemônico, tratando depotencializar a máxima ecológica que propõeagir localmente e pensar globalmente. Em pou-cas palavras, meio ambiente e sociedade cons-tituem os dois pilares básicos de toda e qual-quer proposta de extensão rural dirigida à pro-moção da qualidade de vida, à inclusão sociale ao resgate da cidadania no campo, e isto im-plica a busca permanente de contextos de sus-tentabilidade crescente.

3 A Agroecologia comoparadigma diretivo para a ação

extensionistaO paradigma agroecológico, como um

enfoque de intervenção inovador e multidis-ciplinar, vem sendo construído a partir de umaclara e cientificamente comprovada crise noatual modelo tecnológico e de organização daprodução dominante na agricultura14 . Estacrise se manifesta sob múltiplas dimensõesda atividade humana e, portanto, sua supe-ração depende da produção de novos conheci-mentos e do progresso científico e tecnológi-co adaptado às circunstâncias sócioeconômi-cas e culturais das populações rurais. Nessecontexto, a Agroecologia - entendida comocampo de conhecimento e de investigação -oferece ferramentas importantes para subsi-

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diar a intervenção da Nova Extensão Rural emsuas estratégias de promoção do desenvolvi-mento rural sustentável.

3.1 Conceito de AgroecologiaVem dos estudos camponeses e da recupe-

ração do “populismo agrário russo” a corren-te mais atual e alternativa ao pensamentoecotecnocrático da sustentabilidade. Nestesentido, a partir dos anos oitenta, começariaa se conformar a Agroecologia como perspec-tiva teórica alternativa. Sustentados no “neo-narodnismo ecológico” ou “neopopulismo eco-lógico”, seus autores recuperam, a partir deuma análise científica, a necessidade de con-servação da biodiversidade ecológica e cultu-ral, assim como o enfoque sistêmico para aabordagem dos aspectos relativos ao fluxo deenergia e de materiais nos sistemas econômi-cos. Assim, o neopopulismo ecológico, aindaque faça uma crítica radical à ciência e àstecnologias modernas, não nega a ciência,mas propugna por uma “modernidade alter-nativa”, afastando-se da idéia de progresso aqualquer custo e do entusiasmo cego com res-peito às tecnologias ditas modernas.

No processo de conformação deste novoparadigma, encontramos ainda categoriaschaves para a construção de um modelo al-ternativo de desenvolvimento rural, buscadasem Chayanov15 , tais como a importância dadaà especificidade cultural, a noção de econo-mia moral camponesa e a idéia de desenvolvi-mento desde baixo, assim como o reconheci-mento de um certo “potencial anticapitalis-ta” determinado pela particular racionalidadeeconômica dos camponeses.

Igualmente, dando suporte teórico à pers-pectiva ecossocial, encontra-se o chamado“enfoque termodinâmico da economia” (Gar-rido, 1995), cuja noção de sustentabilidade sevincula à necessidade de considerar o balan-ço energético dos sistemas produtivos. Estesestudos têm contribuído para a conformaçãoda chamada Economia Ecológica, uma corren-

te alternativa à economia convencional que,como assinala um de seus teóricos mais pro-eminentes, “não se trata de um ramo do troncocomum da Teoria Econômica habitual, senãode uma revisão a fundo, talvez um ataquedestrutivo, contra a ciência econômica”(Martínez Alier, 1994), ao recuperar a noçãode oikonomia como um processo destinado “aoaprovisionamento material e energético dascomunidades humanas” (Bermejo, 1994),aproximando, desta forma, a Ecologia e a Eco-nomia16 .

De maneira similar, a partir dos estudosagronômicos encontramos as contribuiçõesdas correntes alternativas ao modelo herdadoda Revolução Verde, as quais propõem umnovo padrão de desenvolvimento agrícola me-diante o manejo ecologicamente adequado dosrecursos naturais e da correta seleção de tec-nologias, de maneira a alcançar-se sustenta-bilidade, estabilidade, produtividade e eqüi-dade nos processos produtivos. A Agroecolo-gia, como síntese e aplicação do pensamentoalternativo, vem recolhendo as contribuiçõesdestas diferentes fontes teóricas e transfor-mando-se num novo paradigma científico,capaz de dar as respostas para as novas edecisivas perguntas que haverão de ser for-muladas a partir deste final de século.

Assim, conceituar a Agroecologia pressu-põe, inicialmente, vincular seus interesses esuas pretensões no campo da agricultura eda sociedade. Num trabalho que já completa10 anos, Hecht (1989) mostra que, por umlado, e sob uma perspectiva mais superficial,a Agroecologia geralmente incorpora idéiasambientais e de sentimento social a respeitoda agricultura. Isso constitui sua caracterís-tica normativa ou prescritiva, uma vez queinclui determinados aspectos da sociedade e

Conceituar a Agroecologia pressupõe,inicialmente, vincular

seus interessese suas pretensões no campo da

agricultura e da sociedade

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da produção que ultrapassam os limites daagricultura propriamente dita17 . Por outrolado, e sob um ponto de vista mais restrito, aAgroecologia se refere ao estudo de fenôme-nos puramente ecológicos que ocorrem noâmbito dos cultivos (relação predador/presa,competição cultivos/ervas invasoras, entre ou-tros), o que traduz o enorme potencial de apli-cação deste campo de conhecimentos pararesolver questões tecnológicas na agricultu-ra, favorecendo assim o desenho e a gestão deagroecossistemas sustentáveis18 .

Tendo-se como referência as contribuiçõesde importantes pesquisadores, podemos defi-nir a Agroecologia como a ciência ou disciplinacientífica que apresenta uma série de princípi-os, conceitos e metodologias para estudar, ana-lisar, dirigir, desenhar e avaliar agroecossiste-mas, com o propósito de permitir a implanta-ção e o desenvolvimento de estilos de agricul-tura com maiores níveis de sustentabilidadeno curto, médio e longo prazos (Altieri, 1995b).

Assim entendida, a Agroecologia proporci-ona as bases científicas para apoiar o proces-so de transição a estilos de Agricultura Sus-tentável19 nas suas diversas manifestações e/ou denominações: Ecológica, Orgânica,Biodinâmica, Agroecológica, Regenerativa,Baixos Insumos Externos, Biológica, entreoutras. Sob esta ótica, não podemos confundira Agroecologia -enquanto disciplina científicaou ciência- com uma prática ou tecnologia agrí-cola, um sistema de produção ou um estilo deagricultura (Altieri, 1995a).

Também podemos dizer quea Agroecologia se aproxima aoestudo da agricultura numaperspectiva ecológica, emborasua estrutura teórica não se li-mite a abordar os aspectos me-ramente ecológicos ou agronô-micos da produção, uma vez quesua preocupação fundamentalestá orientada a compreenderos processos produtivos de uma

maneira mais ampla. Isto é, encara os agroe-cossistemas como unidade fundamental de es-tudo, em que os ciclos minerais, as transforma-ções energéticas, os processos biológicos e asrelações socioeconômicas são investigadas e ana-lisadas em seu conjunto. Dito de outro modo, apesquisa agroecológica preocupa-se não coma maximização da produção de uma atividadeem particular, mas sim com a otimização doagroecossistema como um todo, o que impli-ca uma maior ênfase no conhecimento, naanálise e na interpretação das complexasinterações existentes entre as pessoas, oscultivos, os solos e os animais (Altieri, 1989;Altieri, 1995b).

Uma definição mais ampla é proporciona-da por Sevilla Guzmán e González de Molina(1996), para quem a Agroecologia correspondea um campo de estudos que pretende o ma-nejo ecológico dos recursos naturais, para -através de uma ação social coletiva de caráterparticipativo, de um enfoque holístico e de umaestratégia sistêmica - reconduzir o curso al-terado da co-evolução social e ecológica, me-diante um controle das forças produtivas queestanque seletivamente as formas degradan-tes e espoliadoras da natureza e da socieda-de. Em tal estratégia, dizem os autores, temum papel central a dimensão local como por-tadora de um potencial endógeno que, pormeio da articulação do saber local com o co-nhecimento científico, permita a implementa-ção de sistemas de agricultura alternativa

potencializadores da biodiver-sidade ecológica e da diversi-dade sociocultural.

3.2 Princípios oubases

epistemológicas daAgroecologia

Norgaard, estudioso da agri-cultura numa perspectivaholística e sistêmica, nos ofe-rece importantes ensinamen-

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tos sobre o que ele considera as bases episte-mológicas da Agroecologia. Na realidade, es-tas bases epistemológicas são os princípios ouas premissas que orientam, no todo ou emparte, a ação dos profissionais que abraçam aAgroecologia como campo do conhecimentoem seu sentido mais amplo. No seu conjunto,elas mostram que, historicamente, a evolu-ção da cultura humana pode ser explicada comreferência ao meio ambiente, ao mesmo tem-po em que a evolução do meio ambiente podeser explicada com referência à cultura hu-mana. Ou seja:

a) Os sistemas biológicos e sociais têm po-tencial agrícola; b) este potencial foi captadopelos agricultores tradicionais através de umprocesso de tentativa, erro, aprendizado sele-tivo e cultural; c) os sistemas sociais e bioló-gicos co-evoluíram de tal maneira que a sus-tentação de cada um depende estruturalmen-te do outro; d) a natureza do potencial dossistemas social e biológico pode ser melhorcompreendida dado o nosso presente estadodo conhecimento formal, social e biológico,estudando-se como as culturas tradicionaiscaptaram este potencial; e) o conhecimentoformal, social e biológico, o conhecimento ob-tido do estudo dos sistemas agrários conven-cionais, o conhecimento de alguns insumosdesenvolvidos pelas ciências agrárias conven-cionais e a experiência com instituições e tec-nologias agrícolas ocidentais podem se unirpara melhorar tanto os agroecossistemas tra-dicionais quanto os modernos; f) o desenvol-vimento agrícola, através da Agroecologia,manterá mais opções culturais e biológicaspara o futuro e produzirá menor deterioraçãocultural, biológica e ambiental do que osenfoques das ciências convencionais por sisós (Norgaard, 1989).

Sob esta perspectiva, é oportuno destacarque, atualmente, um importante segmento dapesquisa e da experimentação em Agroecolo-gia ainda se concentra em temas do campoagronômico, ou seja, se apresenta bastante

vinculado aos aspectos tecnológicos da produ-ção agropecuária. No entanto, como já foi ditoantes, a conformação de estilos alternativosde agricultura que incorporem práticas, mé-todos e técnicas mais sensíveis ambiental-mente requer, obrigatoriamente, um repen-sar de todo o modelo tecnológico dominante,uma vez que é preciso pesquisar, identificare difundir métodos, técnicas e procedimen-tos que sejam poupadores de recursos natu-rais não-renováveis que causem menor de-gradação e contaminação do meio ambien-te e que tenham maior sensibilidade socialem relação às possibilidades de incorporaçãodas populações rurais nos processos de desen-volvimento. Nessa ótica, e isto provavelmenteconstitua a principal virtude da Agroecologia -enquanto campo de estudos de carátermultidisciplinar - , suas pretensões e contribui-ções vão muito além dos aspectos meramentetecnológicos ou agronômicos da produção, incor-porando dimensões mais abrangentes e comple-xas que incluem tanto variáveis econômicas, so-ciais e ambientais, como variáveis culturais, po-líticas e éticas da produção agrícola. Estas sãocondições importantes quando se têm em contaas possibilidades de transição da agriculturaconvencional para estilos de produção com baseecológica e, portanto, com maiores graus de sus-tentabilidade no médio e longo prazos.

3.3 A transição agroecológica nocontexto da sustentabilidadeEm sua acepção semântica, o termo tran-

sição pode designar simplesmente a ‘‘ação ouo efeito de passar de um modo de ser ou deestar a outro distinto’’, ou a ‘‘passagem de umestado a outro’’. Sob esta ótica, a transiçãopode se referir tanto a fenômenos naturais(câmbios climáticos, por exemplo) como a fe-

a evolução da cultura humana podeser explicada com referência ao meio

ambiente, ao mesmo tempoem que a evolução do meio

ambiente pode ser explicada comreferência à cultura humana

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nômenos sociais(processos demudança social,por exemplo). Éimportante terclareza de queestes fenôme-nos não sãoe s t á t i c o s ,mas, ao con-trário, sem-

pre incluem a idéia deprocesso ou dimensão dinâmica e, por

conseguinte, a variável tempo ou dimensãotemporal (Costabeber, 1998).

Para falarmos sobre a transição agroecoló-gica, é necessário mencionar inicialmente oque alguns autores consideram como a pri-meira transição da agricultura neste séculoXX. Essa primeira transição foi representadaespecialmente pela passagem da chamadaagricultura tradicional para a agricultura ba-seada em insumos industriais, mais conhe-cida como agricultura moderna ou convenci-onal, o que significou a crescente dependên-cia da agricultura em relação à industria, bemcomo a relativa homogeneização das agricul-turas mundiais e fortes agressões ao meioambiente. Na verdade, esse processo de mu-dança foi relativamente longo, tendo iniciadoainda no final do século passado, a partir dosavanços da mecânica e dos descobrimentosda química agrícola e também da genética ve-getal. De qualquer modo, o principal fenôme-no que marca esta transição ficou conhecidoem todo o mundo como Revolução Verde, queteve seus principais efeitos a partir dos anos1950.

Vários autores sugerem que, a partir des-te final de século, a agricultura mundial es-taria começando a experimentar um novo pro-cesso de transição, cuja essência seria o pro-cesso de ecologização ou ambientalização

(greening process). Este processo de ecologiza-ção ou ambientalização corresponderia à ex-tensão ou à introdução de valores ambientaisnão apenas nas práticas agrícolas, mas tam-bém na opinião pública e nas agendas políti-cas, constituindo assim uma forçasocioecológica combinada, a partir da qual asconsiderações de caráter socioambiental ebiofísico assumem um papel ativo da deter-minação das tecnologias agrícolas (Buttel,1993; Buttel, 1994). Podemos entender issomelhor dizendo que a ecologização é marcadapor uma maior integração entre a Agronomiae a Ecologia, dois campos de estudo até agorapouco explorados em suascomplementaridades para gerar experiênci-as e conhecimentos relevantes e para tornarmais eficiente a intervenção humana comfins agrícolas nos agroecossistemas. No en-tanto, a ecologização da agricultura não ne-cessariamente seguirá um processo unilinear- a exemplo do que se propugnava com a difu-são dos pacotes tecnológicos da RevoluçãoVerde em várias partes do mundo - , podendoseguir distintas vias, alinhadas ou com a cor-rente ecotecnocrática, ou com a corrente ecos-social.

Essas distintas vias da transição que - emmaior ou menor grau - incorporam certos ele-mentos da ecologização, podem ser imagina-das ao longo de um continuum. Mais perto deum dos pólos deste continuum estariam situa-das as formas de intensificação verde que, sebem com algum grau e certo tipo de “ecologi-zação” de seus processos produtivos, continu-ariam muito próximas ao padrão tecnológicodominante. Nesse caso, o atual modelo con-vencional de produção agrícola estaria seadaptando à incorporação de uma nova gera-ção tecnológica da Revolução Verde (ou, comopreferem alguns, uma Revolução Duplamen-te Verde), aproveitando inclusive os avançosmais recentes da Biotecnologia e da Engenha-ria Genética (o uso de sementes transgênicas

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e o plantio direto convencional com herbicidas,por exemplo). Em síntese, a via representadapela intensificação verde prioriza a utilizaçãode insumos externos e de origem industrial,embora admita sua integração equilibradacom insumos localmente disponíveis. O pro-cesso de ecologização seguiria uma lógica queobedece essencialmente aos estímulos demercado (a Natureza como subsistema da Eco-nomia).

Nas proximidades do pólo oposto docontinuum se situariam aquelas formas deagricultura ditas alternativas, que, sob osensinamentos da Agroecologia, estariam bus-cando uma maior aproximação e integraçãoentre os conhecimentos agronômicos, ecoló-gicos, sociais e de outras disciplinas correla-cionadas, com o objetivo de gerar umas basescientíficas e tecnológicas mais afastadas da-quelas que até agora têm apoiado o modeloagroquímico convencional. Suas caracterís-ticas principais seriam: estratégias de pro-dução agrária baseadas em conceitos ecoló-gicos; conhecimento científico integrado aoconhecimento local como forma de gerar umnovo e mais qualificado conhecimento; parti-cipação ativa da população rural na determi-nação das formas de manejo dos agroecossis-temas; maior valorização da biodiversidade eda diversidade cultural. A meta seria, funda-mentalmente, alcançar sistemas de produçãoeconomicamente viáveis, ecologicamenteequilibrados, socialmente justos e cultural-mente aceitáveis. Em suma, a ecologizaçãonão seria essencialmente orientada ao mer-cado, mas incorporaria valores ambientais euma nova ética de relação do homem com aNatureza (a Economia como subsistema da Na-tureza) 20 .

Feitas estas considerações, e dito de umamaneira bastante simplificada, podemos de-finir a transição - caracterizada pelo proces-so de ecologização - como a passagem domodelo produtivista convencional ou de for-

mas de agricultura tradicional para estilos deprodução mais complexos sob o ponto de vistada conservação e manejo dos recursos natu-rais, o que contempla tanto a via da intensifi-cação verde quanto a via da transição combase na Agroecologia. Não obstante, agregan-do mais complexidade ao conceito, podemosentender a transição - neste caso, agroecológi-ca - como o ”processo social orientado à obten-ção de índices mais equilibrados de sustentabi-lidade, estabilidade, produtividade, eqüidade equalidade de vida na atividade agrária”, a úni-ca via capaz de atender requisitos de nature-za econômica e socioambiental, entre outros.

Nesse contexto, e pensando nas bases teó-ricas para a Nova Extensão Rural, a transiçãoagroecológica se refere a um processo gradu-al de mudança, através do tempo, nas formasde manejo dos agroecossistemas, tendo-se comometa a passagem de um modelo agroquímicode produção (que pode ser mais ou menos in-tensivo no uso de inputs industriais) paraoutro modelo ou estilos de agricultura que in-corporem princípios, métodos e tecnologiascom base ecológica.

Essa idéia de base ecológica se refere a umprocesso de evolução contínua, multilinear ecrescente no tempo, porém sem ter um mo-mento final determinado. Porém, por se tratarde um processo social, isto é, por depender daintervenção e da interação humana, a transi-ção agroecológica implica não somente a bus-ca de uma maior racionalização econômico-produtiva com base nas especificidadesbiofísicas de cada agroecossistema, mas tam-bém uma mudança nas atitudes e valores dosatores sociais em relação ao manejo e con-servação dos recursos naturais. Por incluir con-siderações de natureza diversa (econômica,

A ecologização não seriaessencialmente orientada ao

mercado, mas incorporaria valoresambientais e uma nova ética de relação

do homem com a natureza

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social, cultural, política, ambiental, ética, en-tre outras), o processo de transição agroecológi-ca não dispensa o progresso técnico e o avançodo conhecimento científico (Costabeber, 1998).

4 O compromisso social da NovaExtensão Rural ante os desafios e

as perspectivas dodesenvolvimento rural

sustentávelA crise socioambiental com que nos defron-

tamos neste final de século colocou em xe-que as bases teóricas e metodológicas que sus-tentaram o estabelecimento do atual modelode crescimento econômico e sua reiteradainobservância dos limites impostos pela Na-tureza. Entre nós, as irracionalidades do mo-delo hegemônico - que alguns teimam em con-fundir com desenvolvimento - se expressamem forma de miséria, fome, desemprego e ou-tros mecanismos de exclusão social.

Diante da complexidade e gravidade do mo-mento atual, somos levados à perplexidade echamados pelos setores hegemônicos a conti-nuar o processo de “reprodução ampliada” domesmo modelo que, rebatizado com o nome de“Revolução Verde Verde” e aplicado medianteestratégias de Intensificação Verde, continuasendo o catecismo dominante nos centros depoder econômico.

Neste exato momento, entretanto, o exem-plo que aqui tomamos, da Extensão Rural pú-blica do Rio Grande do Sul - demonstrando suacapacidade e sua visão de futu-ro - mostra que, para ser novo,ele busca desatar-se das amar-ras do neoliberalismo e suas cor-rentes ecotecnocráticas e em-preende uma desafiadora jorna-da, propondo-se a realizar umanova missão, assim como novosobjetivos e novas estratégias,todos subordinados aos ideais dasustentabilidade ambiental e daeqüidade social.

A missão de qualquer estilo de ExtensãoRural que se pretenda novo está destinada anos ajudar no direcionamento de ações e ati-vidades que promovam novos estilos de desen-volvimento e de agricultura que respeitemnão só as condições especificas de cada agro-ecossistema, mas também a preservação dabiodiversidade e da diversidade cultural21 .Tendo como base um manejo ecologicamen-te prudente e adequado dos recursos naturais- sustentado na participação ativa dos atoressociais envolvidos -, as ações extensionistasdeverão permitir, entre outras coisas, a pro-dução de alimentos limpos para atender asnecessidades da população urbana e rural.

O ideal de sustentabilidade - apoiado nosprincípios da Agroecologia -, que conforma onúcleo da nova extensão rural gaúcha, exigeque passemos a entender a agricultura comoum processo de construção social e não sim-plesmente como a aplicação de algumas pou-cas tecnologias industriais geradoras de de-pendência. Isso, sem dúvidas, determina umacerta insegurança para todos quantos fomosformados e treinados para atuar comodifusores de tecnologias e a partir de uma vi-são parcializada da realidade e do processoprodutivo agrícola.

Os desafios de uma Nova Extensão Ruralestão consubstanciados na nova missão, nosobjetivos e nas estratégias de ação desenha-dos coletivamente, como orientadores esinalizadores da extensão rural do Rio Grande

do Sul, como podemos ver a se-guir.

4.1 Missãoinstitucional da

EMATER/RS-ASCARPromover a construção do

desenvolvimento rural susten-tável, com base nos princípiosda Agroecologia, através deações de assistência técnica eextensão rural e mediante pro-

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cessos educativos e participativos, objetivandoo fortalecimento da agricultura familiar esuas organizações, de modo a incentivar o ple-no exercício da cidadania e a melhoria da qua-lidade de vida.

4.2. Objetivos estratégicos daEMATER/RS-ASCAR

A missão da extensão rural está orientadapor cinco objetivos principais que, no seu con-junto, expressam o compromisso social de tra-balhar para a obtenção de níveis mais equili-brados de sustentabilidade, estabilidade, produ-tividade, eqüidade e qualidade de vida. Ou seja:

a) Sustentabilidade: buscar um crescenteapoio à conservação, à manutenção e ao ma-nejo de agroecossistemas sustentáveis, demodo que, apesar das restrições ecológicas edas pressões socioeconômicas, possam seralcançados e mantidos níveis adequados deprodução agrícola.

b) Estabilidade: atuar de forma conjuntacom os agricultores familiares e suas organi-zações, com o objetivo de integrar os recursosdisponíveis localmente e outros que estejamao alcance dos mesmos, com vistas a alcan-çar uma estabilidade na produção que sejacompatível com as condições ambientais, eco-nômicas e socioculturais predominantes.

c) Produtividade: apoiar os agricultoresfamiliares na seleção de tecnologias de pro-dução capazes de reduzir riscos e otimizar ouso de recursos internos, de modo a alcan-çar, na totalidade dos sistemas agrícolas, ní-veis de produtividade compatíveis com a pre-servação do equilíbrio ecológico.

d) Eqüidade: contribuir para a consolida-ção de estratégias associativas que fortaleçamos laços de solidariedade e que propiciem ajusta distribuição do produto gerado nos agro-ecossistemas, de modo que atenda requisitosde segurança alimentar e de geração de ren-da para todas as famílias envolvidas.

e) Qualidade de vida: agir interativamentenas áreas econômica, sociocultural e ambi-

ental, de forma a maximizar o emprego e ge-rar renda desconcentradamente, promoven-do a defesa da biodiversidade e da diversidadecultural, o incremento da oferta de produtos“limpos”, a soberania alimentar e a qualida-de de vida da população.

4.3 Estratégias de ação daEMATER/RS-ASCAR

a) Privilegiar o uso de metodologias parti-cipativas que permitam aos agricultores esuas famílias transformarem-se em sujeitosdo seu processo de desenvolvimento, valori-zando os distintos saberes e o intercâmbio deexperiências que permitam a ampliação dacidadania e da inclusão social.

b) Incorporar uma compreensão holísticae sistêmica dos processos socioeconômicoscondicionados pelo ambiente, em substitui-ção à visão compartimentada.

c) Estimular e apoiar formas de diagnósti-co e planejamento capazes de gerar e solidifi-car uma dinâmica de participação ativa nosníveis local, regional e estadual.

d) Apoiar a consolidação de uma rede deparcerias, envolvendo organizações públicas eprivadas comprometidas com a agricultura fa-miliar, dinamizando a construção de propos-tas orientadas ao desenvolvimento sustentá-vel.

e) Estimular e apoiar as formas associati-vas de reflexão e ação, respeitando-se as ques-tões de gênero, as particularidades locais eregionais, assim como a história, a dinâmicade evolução e as aspirações de cada gruposocial envolvido.

f) Tomar o agroecossistema como unida-de básica de análise, planejamento e avalia-ção dos sistemas de produção agrícola.

g) Apoiar a implementação da reforma

maximizar o emprego e gerar rendadesconcentradamente, promovendo a

defesa da biodiversidade e dadiversidade cultural

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agrária como um instrumento concreto dedesenvolvimento rural sustentável.

5 Considerações finaisVale lembrar que, na velha lógica cartesia-

na, o bom profissional da extensão rural eraaquele capaz de acumular mais conhecimen-tos sobre umas poucas especialidades ou téc-nicas e que estivesse apto a desenvolver ashabilidades necessárias para transferir conhe-cimentos aos agricultores, atuando de modo afazê-los adotar aquelas orientações tidas comosuperiores, por sua natureza e validação “ci-entífica”. Neste contexto, o conhecimento dosagricultores era tido como algo obsoleto e elesmesmos eram vistos como atrasados e respon-sáveis pelo atraso da sociedade. Em geral, eramsimplesmente rotulados em categorias de“adotadores” de inovações22 .

A busca do desenvolvimento e da agricul-tura sustentável, a que nos referimos antes,exige de todos nós uma nova postura e umnovo tipo de atuação que estamos definindocomo um “novo profissionalismo”23 . O novoprofissional da Extensão Rural, mais do queum simples difusor de pacotes tecnológicosintensivos em capital, deve estar preparadopara compreender que os agroecossistemas ousistemas agrícolas co-evoluem com os siste-mas sociais e biológicos. Isto é, esta co-evolu-ção está acompanhada pela evolução dos ho-mens e mulheres que praticam a agricultura,os quais, ao longo de sua história e medianteprocessos de tentativa e erro, adaptaram-se eadaptaram as condições mais adequadas paraproduzir nos seus diferentes ambientes soci-ais e biofísicos.

Portanto, épreciso reco-nhecer que en-tre os agriculto-res e suas famí-lias existe umsaber, um con-junto de conhe-

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cimentos que, embora não sendo de naturezacientífica, é tão importante quanto os nossossaberes. Disso resulta que nossa ação - aomesmo tempo em que deve ser respeitosa paracom os saberes dos demais - deve ser capazde contribuir para a integração destes dife-rentes saberes, buscando a construção socialde conhecimentos adequados para o desen-volvimento dos potenciais agrícolas de cadaagroecossistema e dos potenciais de desen-volvimento sustentável presentes em cadacomunidade.

Nesta perspectiva, a participação popularemerge como um direito e passa a exigir umanova prática extensionista, uma verdadeirapráxis social, que só é possível quando adota-mos uma postura democrática e quando rea-lizamos nossa tarefa com base em metodolo-gias e princípios pedagógicos libertadores.Para tanto, necessitamos conformar um novoperfil de extensionistas: por um lado, estamosdesafiados a compreender a agricultura a par-tir dos princípios básicos da Agronomia e daNatureza e, de outro lado, devemos nos capa-citar para atuar potencializando os recursose conhecimentos locais.

O enfoque a ser adotado pela Nova Exten-são Rural também exigirá dos extensionistasa capacidade de compreender os aspectos re-lacionados à vida dos indivíduos e suas rela-ções sociais, assim como os aspectos da his-tória dos diferentes atores individuais e cole-tivos com os quais atuamos. Somente assimpoderemos nos aproximar das verdadeirasnecessidades, valores e aspirações que ori-entam sua busca permanente por melhores

condições devida e bem-estarsocial. Comoapoiá-los naconstrução dodesenvolvimen-to rural susten-tável sem co-nhecer as ne-

É preciso reconhecer que entre osagricultores e suas famílias existe um saber,

um conjunto de conhecimentos que, emboranão sendo de natureza científica,

é tão importante quanto os nossos saberes

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cessidades, os valores e as motivações quesustentam e dão sentido às suas decisões?

Mesmo sem esgotar um tema tão comple-xo, somos levados a reconhecer que, hoje, ex-tensionistas e pesquisadores têm a felicida-de de vivenciar os desafios de novos tempos eque, portanto, não devemos nos intimidarfrente às incertezas e às inseguranças pró-prias dos grandes desafios. Ao contrário, de-vemos usar nossa capacidade, nossa energia,nossa criatividade e nossa inspiração para es-timular o diálogo construtivo e a participaçãode todos os atores sociais com os quais nosrelacionamos. Sem dúvida, isto nos ajudarána construção de uma nova extensão rural.

Nesse contexto, e diante do imperativo só-cioambiental, defendemos a prática de umaNova Extensão Rural e propomos o conceitode Extensão Rural Agroecológica como orien-tação principal para a execução de nossasações em prol do desenvolvimento rural sus-tentável. Esta Extensão Rural Agroecológicapode ser definida como o “processo de inter-venção de caráter educativo e transformador,baseado em metodologias de investigação-açãoparticipante que permitam o desenvolvimentode uma prática social mediante a qual os sujei-tos do processo buscam a construção e siste-matização de conhecimentos que os leve aincidir conscientemente sobre a realidade”. Elatem o objetivo de alcançar um modelo de de-senvolvimento socialmente eqüitativo e am-

bientalmente sustentável, adotando os prin-cípios teóricos da Agroecologia como critériopara o desenvolvimento e seleção das solu-ções mais adequadas e compatíveis com ascondições específicas de cada agroecossistemae do sistema cultural das pessoas envolvidasno seu manejo (Caporal, 1998).

A construção dessa Nova Extensão Ruraliniciou a tomar forma a partir do momentoem que começaram a ser incorporados aosdebates os novos anseios da sociedade rural eurbana, com relação a um novo projeto dedesenvolvimento, e na medida em que forambuscadas orientações teóricas baseadas emum paradigma alternativo ao convencional.

O avanço deste processo de construçãoexige a continuidade da interação da Exten-são Rural com a sociedade civil organizada.No entanto, parece claro que a consolidaçãodo processo de mudança em curso exigirá ain-da o comprometimento e a responsabilizaçãodas instituições de ensino e pesquisa, pois,como todos nós sabemos, a transição do mo-delo agroquímico para estilos de agriculturade base ecológica requer um urgente progres-so tecnológico e um significativo avanço doconhecimento científico. Igualmente, se faznecessária a formação de profissionais quali-ficados para atuarem em projetos de desen-volvimento rural que contemplem o interesselocal e comunitário, orientados pelo imperati-vo sócioambiental.

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1 Estamos nos referindo à EMATER/RS-ASCAR(Associação Riograndense de Empreendimentosde Assistência Técnica e Extensão Rural), entida-de que conta com Escritórios de extensão ruralem 477 municípios do estado do Rio Grande doSul e que congrega uma força de trabalho de2.124 servidores, entre técnicos e administrativos.

2 Externalidade é um conceito utilizado naeconomia para caracterizar os custos e/ou bene-fícios (presentes ou futuros) que são externos aomercado. ‘’Em sentido amplo, define todos osefeitos da atividade econômica que são externosao mercado (...). Em um sentido mais restringidoe habitual, define os efeitos ambientais daatividade econômica, entendendo-se que podemhaver externalidades positivas e negativas’’(Bermejo, 1994).

3 Ver, por exemplo, Sachs (1986).4 Tal como ficaria demonstrado em 1972 por

Meadows et al. (1978) e por trabalhossubseqüentes, como o Informe Global 2000, pu-blicado em 1980, onde se confirma a tese doslimites e se assegura que o estilo de vida dos paísesdesenvolvidos não poderia ser estendido a todosos países do mundo, por que isto suporia umagrave ameaça à vida sobre a terra (Barney, 1982).

5 De maneira similar, Sevilla Guzmán (1997)identifica duas correntes: a) aquela formada pelosseguidores do pensamento científicoconvencional (perspectiva do equilíbrio) e b)aquela identificada com o pensamentoalternativo (perspectiva do conflito).

6 Este relatório, divulgado a partir de 1987,ficou popularizado como Nosso futuro comum(CMMAD, 1992).

7 Tais mecanismos, adotados tanto pela eco-nomia do meio ambiente como pela economiados recursos naturais, têm sua origem na vertenteda economia neoclássica e não passam de umatentativa de “esverdeamento” da economia con-vencional.

8 “O ecodesenvolvimento é um estilo de de-senvolvimento que em cada ecorregião insiste nassoluções específicas de seus problemas particu-

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Notas

lares, levando em conta os dados ecológicos damesma forma que os culturais; as necessidadesimediatas como também as de longo prazo (...)sem negar a importância dos intercâmbios ...”(Sachs, 1986).

9 Para informações mais detalhadas sobreeste tema, ver Sachs (1996).

10 Ver Delèage (1992) e O’Connor (1994),por exemplo.

11 Reforçando esta análise, os autores do“Manifesto Ecossocialista” (Antunes et al., 1993)asseguram que “nenhuma contradição leva emsi mesma a solução para superar de maneiraglobal o atual sistema. Nenhuma contradição éabsoluta. A novidade de nossa época consisteem que afloram ao mesmo tempo a maioria dascontradições”, o que permite crer que podemcrescer diferentes formas de intervenção dedistintos atores sociais, determinandotransformações multidimensionais em direção auma sociedade mais justa e respeitosa ao meioambiente.

12 São três as características essenciais quedefinem a agricultura familiar brasileira: a) agestão da unidade produtiva e os investimentosnela realizados são executados por indivíduosque mantêm entre si laços de parentesco ou dematrimônio; b) a maior parte do trabalho éigualmente proporcionado pelos membros dafamília; e c) a propriedade dos meios deprodução (embora nem sempre a terra) pertenceà família, e é em seu interior que se efetua suatransmissão em caso de falecimento ouaposentadoria dos responsáveis pela unidadeprodutiva (FAO/INCRA, 1996). Apesar daexistência destas características comuns, nãopodemos perder de vista a enormeheterogeneidade existente no seio da agriculturafamiliar brasileira. Conforme sugere o Ministérioda Agricultura e Abastecimento (MAA, 1996),esta se divide em três grandes categorias,segundo o seu estágio de desenvolvimentotecnológico e perfil socioeconômico: a) Agricultu-ra familiar consolidada, constituída por estabele-

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cimentos familiares integrados ao mercado e comacesso a inovações tecnológicas e a políticaspúblicas. A maioria funciona em padrões empre-sariais, alguns chegando até mesmo a integrar ochamado agribusiness; b) Agricultura familiar emtransição, constituída por estabelecimentos que têmacesso apenas parcial aos circuitos da inovaçãotecnológica e de mercado, sem acesso à maioriadas políticas e programas governamentais; em-bora não estejam consolidadas como empresas,possuem amplo potencial para a sua viabilizaçãoeconômica; e c) Agricultura familiar periférica,constituída por estabelecimentos rurais geralmenteinadequados em termos de infra-estrutura e cujaintegração produtiva à economia nacional de-pende de fortes e bem-estruturados programasde reforma agrária, crédito, pesquisa, assistênciatécnica e extensão rural, agroindustrialização,comercialização, entre outros.

13 O agroecossistema corresponde a “umsistema ecológico e socioeconômico que com-preende plantas e/ou animais domesticados e aspessoas que nele vivem, com o propósito de pro-dução de alimentos, fibras ou outros produtosagrícolas” (Conway, 1997).

14 Embora não sendo o principal propósito

deste texto examinar os impactos - positivos ounegativos - causados pelo modelo da RevoluçãoVerde, cremos que é necessário reproduzir a críti-ca ecológica tão bem sintetizada por MartínezAlier, um dos mestres da economia ecológica. Dizeste autor: “Hoje nos damos conta dos efeitosambientais da agricultura moderna (contamina-ção dos alimentos, da água, destruição ou aban-dono dos recursos genéticos, uso de energiasesgotáveis dos combustíveis fósseis). Estes efeitosnão são medidos pelo mercado, e por isso oseconomistas lhes dão o nome de externalidades,ou seja, efeitos externos ao mercado. Então, de-vemos duvidar de que a agricultura moderna sejarealmente mais produtiva, pois os aumentos con-sideráveis de produtividade (por hectare ou ain-

da mais por hora de trabalho) se medem dimi-nuindo o valor dos insumos do valor da produ-ção e dividindo o resultado pela quantidade doinsumo cuja produtividade medimos. Assim, aprodutividade da agricultura moderna é por hec-tare e, ainda mais, por hora de trabalho, maiorque a da agricultura tradicional, porém, claro está,os valores da produção e dos insumos estão malmedidos por não incluir as externalidades e pornão contar a destruição das próprias condiçõesda produção agrária. Esta é, em resumo, a críti-ca ecológica” (Martínez Alier, 1994).

15 Ver, por exemplo, Chayanov (1974);Shanin (1988); Sevilla Guzmán (1990); Sánchezde Puerta (1994); Sánchez de Puerta y SevillaGuzmán (1987).

16 Sobre este tema, ver também Martínez Alier(1995) e Martínez Alier y Schlüpmann (1992).

17 Conforme Hecht, o uso contemporâneodo termo Agroecologia data dos anos setenta.Suas raízes estão nas ciências agrícolas, no movi-mento ambiental, na ecologia, nas análises deagroecossistemas indígenas e em estudos de de-senvolvimento rural (Hecht, 1989).

18 Para que um agroecossistema caminhe emdireção à sustentabilidade, é preciso perseguir sis-tematicamente as seguintes metas: a) uma maiscompleta incorporação de processos naturais,como são a reciclagem de nutrientes, a fixação donitrogênio atmosférico e as relações predador-pre-sa nos processos de produção agrária; b) umaredução no uso de inputs externos e não-renováveiscom maior potencial de dano ao meio ambientee à saúde dos agricultores e consumidores, assimcomo um uso mais objetivo dos demais inputs nosentido de minimizar os custos variáveis de produ-ção; c) um acesso mais eqüitativo aos recursos pro-dutivos e oportunidades, e a evolução em direçãoa formas socialmente mais justas de agricultura; d)um uso mais produtivo do potencial biológico dasespécies animal e vegetal; e) um uso mais produ-tivo das práticas e conhecimentos

Notas

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