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E-book Ondivíduos Autor: Marcos HillerTRANSCRIPT
Marcos Hiller
ONDIVÍDUOSMarcas, consumo e cena digital
Biblioteca Pública de Nova York - maio de 2013. Foto de Érico Hiller.
Projeto gráfico
Lillian Vidigal
e Maurício F. Santana
Diagramação
Maurício F. Santana
| Power Black Art |
Capa
Lillian Vidigal
| Lift Design |
Revisão técnica
Marcos Hiller
Dedico esse livro à Teka, o meu amor.
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Marcos Hiller nasceu em Belo Horizonte em 1978. Cresceu em São
Paulo, onde vive até hoje.
É mestre em comunicação e práticas do consumo pela ESPM, escola
onde se graduou em 2001. Hoje coordena o MBA em Marketing,
Consumo e Mídia Online na Trevisan Escola de Negócios, e coordena
também os cursos de mídias digitais e de branding avançado na
Escola São Paulo.
Atuou por mais de 10 anos de terno e gravata, mais precisamente
na indústria financeira. Foi Gerente de Marketing do BankBoston e
Coordenador de Comunicação do Grupo Santander Brasil.
Hiller é professor convidado de instituições como FIA-USP, FAAP,
Business School SP e PUC/PR, e hoje viaja todo o Brasil com
palestras sobre branding, redes sociais, cibercultura e demais temas
inquietamente desse ecossistema digital que habitamos.
www.marcoshiller.com.br
twitter.com/MarcosHiller
facebook.com/Marcos.Hiller78 instagram.com/MarcosHiller
DEPOIMENTOS
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO
Benvindo ao Mundo da Ficção.
Facebook: uma marca de US$ 100 bilhões.
Quem tem saudade do ORKUT?
E um domingo qualquer da TV brasileira, queremos conteúdo sem conteúdo.
Calabresa versus Veuve Clicquot.
Quem sai ganhando com a decisão da Anatel? Nós, consumidores!
Londres colocou o sarrafo lá cima, mas vamos dar conta do recado.
O ecossistema digital.
Afinal, o que é Branding?
Desintoxicação digital? Ainda não!
Por que amamos Avenida Brasil? Porque é uma obra de arte!
Santo Google.
Diga-me onde dá check-in, e eu te direi quem és.
Obama 3.0 venceu Romney 1.0.
Nova York pulsa mais do que nunca.
O Hopi Hari vai virar Disney?
Just don’t do it.
Marcas e Celebróides.
Twitter 7 anos: a maturação da Internet.
The FACEBOOK Power.
Lucia Santaella no SIMC 2013.
O “reality show fitness” no Instagram.
Google Glass: um debate tecnológico, mercadológico e ético.
Não existe almoço gratis (muito menos likes)!
Tinder: você ainda vai baixar este aplicativo.
Quer entender o consumo? Estude a cultura!
O protagonismo das manifestações está no social, e não no Facebook.
A nova conjugação verbal das redes sociais.
ARTIGOS ACADÊMICOS
COMUNICAÇÃO, CONSUMO E ESPETÁCULO: um olhar debordiano para a Nova Iorque de 2012.
Referências Bibliográficas.
COMUNICAÇÃO, CONSUMO E CIBERESPAÇO: Convergências e simbiose na nova arena digital.
Referências Bibliográficas.
COMUNICAÇÃO, TECNOLOGIA E CIBERCULTURA: usos e consumos de sites de rede sociais digitais.
Referências Bibliográficas.
COMUNICAÇÃO, CIBERCULTURA E O CONSUMO TECNOLóGICO DA AppLE.
Referências Bibliográficas.
o “reality show fitness” no aplicativo móvel Instagram.
Referências Bibliográficas.
Um olhar reflexivo sobre estratégias de marcas na cena digital.
Referências Bibliográficas.
pOSFÁCIO. Sensibilidade, perspicácia e reflexão.
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Sumário
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Bruno MelloEditor Executivo | Mundo do Marketing
“Poucas empresas hoje estão trabalhando exatamente como trabalhavam há cinco anos e certamente não estarão atuando da mesma forma daqui a mais cinco. O que fazer diante desta realidade? O que você e sua empresa estão fazendo num futuro não muito distante? As respostas estão nas próximas páginas, quando Hiller dá um grande apanhado do que vivemos recentemente e nos municia de um radar para enxergar o horizonte.”
André Marchesin GonçalvesPublicitário | Sócio da Yes+Emigê
“Marcos Hiller está online. Sempre. 24/7. 365 dias e 6 horas/ano. Pois para conhecer o comportamento das marcas há de se viver as duas vidas intensamente. Nao só de Google (mas também) vive o homem. E como diria Odorico Paraguaçu, sem “churrumelismos puxasaquistas”, o Hiller é daquelas pessoas que se engajam de cor-po, alma e perfil do face no assunto. Não sabe quem é Odorico paraguaçu? procura no Google...”
Bruno Toledo Reitor do Centro Universitário Toledo | UniToledo em Araçatuba
“O formato digital representa o presente. É contemporâneo, ecologicamente susten-tável, ajuda a democratizar e a compartilhar a informação de forma mais rápida. Sou fã desse modelo de distribuição de conteúdo que sabiamente Hiller escolheu para apresentar ao público o ecossistema digital e conduzir o webleitor a uma reflexão crítica capaz de fazê-lo entender as novas lógicas do mercado, das marcas e do consumo. ONdivíduos revela a transformação ocorrida no mundo analógico e como o comportamento do consumidor não é mais passivo, mas altamente ativo e poten-cializado frente aos recursos tecnológicos. Por ser escrita pela autoridade brasileira quando o assunto é marca, esta obra é essencial para quem quer entender o cenário digital e descobrir como agir e lidar com os ONdivíduos”.
DepoimentosDesigners | projeto gráfico
Mauricio Santana Criativo-Designer | Power Black Art
Desenhista Industrial por formação (Mackenzie) e Designer Gráfico por convicção (vida). No portifolio, centenas de trabalhos para a classe artística popular (teatro de rua), editoriais para a Cooperativa de Teatro, UNESP e outros mais. No mais, havendo um job urgente, pode contar.
Lillian VidigalBrand Designer | Lift Design
Foi uma das pioneiras do Brand Design no Brasil. Desde 2001, está à frente da Lift Branding & Design, responsável pela criação de mais de 150 Marcas nacionais e internacionais. Prestou consultoria em Branding para o mercado de Luxo, junto à MCF, em Branding digital, com a Diretta, e em Branding Gastronômico, para a Tasty. Atualmente se dedica à democratização do Branding.
“Foi uma honra ter sido chamada pelo Hiller para fazer o design desta capa. Primeiro porque ele veio se tornando um dos ‘Papas’ do Branding no Brasil. Então é claro que um convite vindo dele deixaria qualquer Brand Designer lisonjeado. Depois porque achei o título que ele criou genial! Imediatamente imaginei esta capa. E ele imediatamente escolheu esta ao ver as alternativas apresentadas. Espero que a capa, mesmo que minimalista, traduza a força e a sofisticação do conteúdo deste livro.”
“Tomei conhecimento deste grande profissional que é o Hiller através do seu ex-professor, para quem cola-borei em alguns jobs em uma agência de comunicação. Participei de um workshop sobre branding e depois disso fizemos contato para que eu diagramasse este livro, e aqui estamos. É sempre bom ter contato com uma pessoa que sabe a que veio para poder compartilhar conhecimento.”
“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.”
(Paulo Freire)
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Vicente Martin (Vince Vader) Professor da ESPM onde também supervisiona o departamento de criação
“O novo livro do Hiller coloca teoria acadêmica de peso com exemplos bem detalha-dos e reais. Para o leitor é uma oportunidade única de, literalmente, aliar teoria com a prática. As páginas, carregadas de boas referências, transitam em aspectos cru-ciais para entendermos minúcias da contemporaneidade e das plataformas digitais.”
Marcelo TrevisaniDigital Marketing, Social Media and Brand Specialist at Tecnisa
“Hiller aborda com maestria temas importantes para construção e gestão da marca, consumo, era da informação e a forte conexão que impacta as nossas vidas. O ponto forte é o olhar e o posicionamento assertivo e muitas vezes polêmico, mesclado com pensamentos de grandes pesquisadores e professores para assuntos relacionados ao nosso cotidiano, indo direto ao ponto, orientando o leitor e explanando sobre a importância de não apenas refletir sobre todas as oportunidades de ter uma marca forte, trabalhando o tangível e o intagível, mas também que ela consiga gerar o real valor para as pessoas e negócios.”
Karlan MunizProfessor da PUC-PR e Católica de Santa Catarina
“Respire, e deixe o Marcos Hiller ser seu guia neste ambiente aparentemente hostil e maravilhoso que é o ambiente digital. Se a internet fosse uma selva que vai inva-dindo cada espaço da vida das pessoas (e não está?) não há melhor companhia que o Sr. Hiller. Ele se parece com um Jaques Cousteau do universo representado pela tecnologia da comunicação, um pesquisador e “vivenciador” capaz de absorver e se encantar com cada nova espécie, cada nova página dessa história, cada centelha de revolução embutido nas novidades que se mostram permanentes. Se topar percorrer as páginas deste conjunto de textos, vais poder viajar a diversos lugares e para a padaria aí do lado, para conversar com ele entre um gole de café e um vislumbre por dentro dessa Matrix. O Marcos é desbravador e pensador bem humorado dessa nova era. Tanto que faz o marketing e a gestão de marcas se sentirem em casa, quando você percebe que faz parte desse território. Pare de ser turista. Deixa o Hiller te empurrar pra dentro do furacão digital. Boa leitura!!”
Depoimentos
Igor CaitanoAnalista Sênior de Comunicação | Santander
“Recebi o draft do livro do amigo Marcos Hiller há alguns meses, pedindo uma opi-nião. Como muitos dos textos contidos nessa coletânea já eram de meu conhecimen-to, por meio do “Blog doHiller”, não seria tarefa das mais árduas. Dono de um humor “sacana”, de tiradas mais ácidas que limão e de uma capacidade ímpar de enxergar o mundo à sua volta, Hiller consegue trazer em seus artigos um ar de conversa de bar, mas sem perder o foco nas informações e sem deixar de traçar um paralelo básico com os grandes teóricos e pensadores, até mesmo os menos conhecidos do grande público. Estudiosos ou leigos, da área da comunicação ou das ciências exatas, não importa, os temas abordados não possuem contra indicação. Pelo contrário. São um sopro de sarcasmo inteligente em um mundo em que a intelectualidade às vezes anda monótona demais! para finalizar, respondendo à pergunta do início: ler ONdiví-duos (marcas, consumo e cena digital) para se divertir e estar muito bem informado sobre branding, redes sociais e tudo o mais!”
Emerson SanglardRegional Marketing Manager | South America l Copa Airlines
“De forma absolutamente leve , mas ao mesmo tempo envolvente, o novo livro de Marcos Hiller aborda temas e casos de um novo em plena evolução sob o ponto de vista social, comportamental e tecnológico. As novas fronteiras e os desafios para organizações e respectivas marcas, que convivem em um ambiente altamente com-plexo sob o ponto de vista dos meios de comunicação e estratégias de marketing são destaque nessa obra. Esse novo mundo é retratado sob uma ótica hibrida, na qual individuos com um formação sócio-cultural analógica precisam se adaptar ao dinâmico mundo digital, no qual a concepção de tempo e espaço são cada vez mais implacáveis e não perdoam àqueles que não acompanham tal dinâmica. Leitura re-comendada para todos os profissionais de comunicação e marketing, acadêmicos e pesquisadores em geral.”
1514
E nada melhor que um inquieto para lidar com as modernas teorias
de marketing, hoje tão volúveis, dinâmicas e absolutamente cercadas de
incertezas. Há alguns anos, Kotler, Ries e cia eram portos-seguros para os
aprendizes de marketing. Seus livros e palestras eram instituições consolida-
das, inquestionáveis. No ambiente atual de marketing, tudo é questionável e
deve ser questionado. Teses e teorias duram cada vez menos ou se reinven-
tam cada vez mais.
Se você tem saudades ou sente falta de teorias que são verdades
absolutas, o marketing atual vai afugentar você. Agora, se você quer ser
parte de discussões sempre em aberto, de incertezas deliciosas e de um dia
desafiando o outro, não há melhor praça que o marketing que hoje vivemos.
O tema que o Marcos coloca em discussão – e não como verdade
– é um perfeito exemplo desses tempos. As redes sociais merecem análises
profundas todos os dias, por todos os experts de plantão. Para o marketing,
elas já foram a grande revolução, a solução de todos os problemas, a subs-
tituição inequívoca da mídia tradicional e a forma consagrada de se conectar
com os “mais jovens”. Mas as redes sociais já foram também uma decepção
para o marketing. E o tão falado ROI em Redes Sociais, onde está? E a queda
vertiginosa das ações do Facebook pós-IPO? E a hipótese de que marcas, em
redes sociais, atraem essencialmente os promonautas – gente oportunista
buscando uma recompensa instantânea – e não verdadeiros adeptos delas?
A cada dia, surgirá uma nova visão, um novo argumento. Ao invés de se
desesperar com essa volatilidade, participe dela, surfe junto.
Os “ONdivíduos”, feliz expressão criada pelo Marcos, é uma forte
tese nesse marketing em eterna e gostosa crise existencial. Ao conectar-
mo-nos freneticamente, estamos nos conectando ou nos desconectando?
Seriam as redes sociais apenas uma forma “pro-forma” de se conectar, já que
o investimento emocional e físico é baixo quando comparamos um click de
“parabéns” a pegar o carro, cruzar a cidade e dar um abraço verdadeiro no
aniversariante, com uma boa e longa conversa? Será que a “rede” social não
é, na verdade, o lugar em que preguiçosos sociais gostam de se balançar e
descansar?
O inquieto Marcos e sua tese são perfeitas para que nós, marque-
teiros, continuemos a desfrutar do desconforto sobre as teorias atuais de
marketing. Vale a pena a minha marca ingressar nas redes sociais quando de
fato o público está absolutamente ensimesmado e não aberto a verdadeiras
conexões? Mas será que a minha marca pode ficar de fora desse ambiente?
Quem souber a resposta, não terá entendido o que é o marketing hoje.
O Marcos Hiller
é um inquieto
Prefácio
Ricardo SapiroSócio Diretor da Touch Branding
Foi Vice-Presidente Regional de Laundry da Unilever e um dos
responsáveis pelo posicionamento “Omo, porque se sujar faz bem”
1716
Obrigado por fazer o download do meu livro.
Espero que ele lhe seja útil de alguma forma. Conhecimento
só vira conhecimento a partir do momento em que se compartilha. E
é o que estou fazendo aqui. Compartilhando minhas ideias e de forma
gratuita. Esse livro está sendo disponibilidade grátis na rede.
Lancei BRANDING: A ARTE DE CONSTRUIR MARCA, meu pri-
meiro livro, em setembro de 2012 na Livraria Cultura em São Paulo.
Uma noite especial. Um momento inesquecível de minha vida. E agora
você tem em mãos, ou melhor, na tela do seu tablet, laptop ou smar-
tphone o meu segundo livro. Hoje é assim que uma boa parcela de
pessoas lêem. Escrevi esse livro pensando nisso. É o início do fim dos
livros físicos de papel? Odeio profecias e futurologistas de plantão, rs...
mas eu acho que sim. A leitura não vai morrer nunca. Mas pra mim, os
livros de papel respiram por aparelhos. Livro de papel pesa na mochila
e dói as costas. Livro de papel pega fogo. Livro de papel ocupa espaço
físico. E o livro digital não pesa, não dói e ocupa apenas nosso cada
vez mais espaçoso HD. Espero que esse meu livro contribua para uma
eutanásia dos livros físicos.
Esse neologismo ONdíviduos nasceu sem querer. Estava eu
um dia escrevendo um texto qualquer, quando, de repente, tive um
mero erro de digitação. Não foi nada de mero. Fui escrever a palavra
“indivíduo” e quando vi saiu “ondivíduos”. para minha surpresa, antes
sair pressionando o back space, parei e pensei: opa! temos algo aqui.
São os ONindíviduos. Essa pessoa cada mais conectada, cada vez mais
ON e, ao mesmo tempo, cada vez mais conectada, mais ligada, mais
online. Mais que um novo termo que criei (sem querer querendo), os
ONdivíduos são esses novos personagens advindos de uma cultura di-
gital cada vez mais presente, viva, intensa e urgente.
Ao longo desse livro, eu penso sobre muitas coisas. Trago
textos que escrevi ao longo dos últimos meses sobre os mais diversos
temas desse inquietante ecossistema digital que habitamos.
Boa leitura! E depois me mande um email dizendo o que você
achou. Aliás, email não, email é uma coisa muito oldfashioned. Me man-
de um inbox no meu Facebook, ou um Tweet.
Introdução
1918
Em 1964, o visionário professor Marshall McLuhan disse que “na espaçonave Terra, não há passageiros,
somos todos tripulação”. Impressionante a nitidez da fala do pesquisador canadense, que estaria com um século
de vida esse ano, em trazer uma visão tão lúcida e contemporânea como essa já na década de 60. E essa célebre
frase de McLuhan traduz de forma muito pertinente esse verdadeiro universo de ficção científica que vivemos
hoje. Não somos meros passageiros passivos e olhando pela janelinha dessa imensa espaçonave, mas sim seres
humanos altamente participativos, prontos para performar, e modulando o tempo todo a cena em que estamos
inseridos.
Vivemos hoje em um mundo conectado, mas norteado pela constante interrupção. Ao mesmo tempo
que estamos hiperconectados, somos interrompidos o tempo todo por toques, notificações, pop-ups sirenes e
alarmes. Estamos em um mundo veloz, sintético e ansioso, regido por 140 caracteres. Se concentrar por mais de
20 minutos em uma única atividade é tarefa para poucos. Os jovens, ou nativos digitais, só conseguem ser criati-
vos com 17 abas abertas em suas telas, com a TV ligada, atirando passarinhos com um estilingue e com iPod no
ouvido para nossa alegria. Nós nascemos em uma era analógica e estamos migrando para uma era digital, e eles
já nasceram dentro do processo digital.
Estamos entrando de forma contundente numa nova cultura do espetáculo, em uma nova configuração
da economia, sociedade, política e vida cotidiana, que envolve novas formas culturais e de novos modelos de
experiência. “A chamada era da informação é, na realidade, a era do excesso de informação”, disse com muita
serenidade Paulo Vaz, pesquisador da UFRJ, há 10 anos. Nosso cérebro e nossa cognição simplesmente não dão
conta de tamanho volume de informação que nos tenta impactar por dia. Por exemplo, um exemplar da edição de
domingo do The New York Times contém mais informação do que a absorvida ao longo da vida por um indivíduo
culto no século XVIII.
Vive-se hoje em um universo hiperconectado, onde as máquinas falam e os homens se comunicam por
meio de próteses artificiais. As novas gerações incorporam plenamente essas tecnologias e as colam ao corpo
como um elemento a mais de suas roupas: calças, jaquetas e mochilas são fabricados com lugar para o celular.
A moda faz com que a corporabilidade abrigue as tecnologias. Quando chego diante da porta de um shopping e
ela se abre sozinha, ou quando abro meu carro como o botãozinho e o bip do chaveiro, não é o chaveiro que está
abrindo a porta, é meu corpo, é uma extensão do meu braço, como se eu fosse Anakin Skywalker, provido de uma
força sobrenatural.
Benvindo à era do YouTube, a canal de televisão mundial. O Twitter é a maturação da internet e posso
me conectar e ser ouvido por qualquer pessoa do planeta. Estamos o tempo todo diante de telas, de painéis, de
tecnologias touch-screen, e entramos no epicentro da era do consumo simbólico. Quando as pessoas adquirem
um iPhone, por exemplo, estão não apenas comprando um aparato tecnológico, como também vivenciando certo
estilo de vida (digital) e se inscrevendo num imaginário tecnológico que enfatiza as ideias de inovação, elegância
e distinção econômica, diz com muita sabedoria o pesquisador Erick Felinto da UERJ.
As pessoas, nessa sociedade intensa e paradoxal, buscam uma fixação narcísica por meio das redes
sociais, e as marcas também procuram adotar jogos discursivos sedutores nesses novos e envolventes espaços
digitais, dizia também McLuhan há 50 anos. E com a explosão das redes sociais, fenômenos desse século, vemos
essa sábia frase de McLuhan cristalizada de forma sublime. Esses novos ambientes virtuais são baseados em
plataformas digitais e dispositivos interativos móveis de compartilhamento de arquivos e informações, é são um
Benvindo ao mundo da ficção científica.
20
exemplo muito claro dessa condição social-histórica imprecisa, hesitante e incompleta, complementa Felinto.
Já Sherry Turkle, uma brilhante cientista do MIT, diz que com muita pertinência que nós estamos “always
on”. E quando estamos conectados, estamos na verdade, negando uma certa solidão. Se estou sozinho em casa
logado no meu Facebook, eu não estou mais sozinho, estou fazendo parte da vida de outra centena de pessoas
e de forma muito íntima. A tecnologia ao mesmo tempo que nos aproxima de pessoas queridas, nos distancia
delas. Outro grande pensador contemporâneo, o argentino Nestór Garcia Canclini diz que “chega-se a fenômenos
de autismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar na frente da tela do que relacionar-se
com interlocutores em lugares fisicamente localizados”. O fato de eu estar conectado o tempo todo não significa
que estou interagindo o tempo todo. E nesse universo, muito mais importante do que estarmos simplesmente
presentes nas atraentes e viciantes redes sociais, é preciso saber o que fazer lá, saber estar presente de forma
relevante e coerente.
Vive-se em um mundo de histórias que se iniciam e não finalizam, cada vez mais interligado por inter-
câmbios de ordem mercadológica. Todo mundo praticamente está ocupado all the time fazendo business com
tudo: diversão, conhecimento, avatares, casamento, sexualidade, estética, reprodução, saúde, beleza, identidade,
ideias. As pessoas se tornam um verdadeiro empreendimento comercial nesse novo contexto que vivemos, e com
a cauda longa de Chris Anderson mais forte do que nunca. As sociedades vivem hoje um processo de reorgani-
zação, sobretudo no âmbito cultural, social, econômico e político, e fica muito evidente como esses fenômenos
tecnológicos, como e explosão de redes sem fio, por exemplo, acelera a dinâmica das relações, onde posso postar
tudo que eu quiser, onde eu quiser e na hora que quiser. Não queremos mais estar sucumbidos na impessoalidade
massa, pois agora quero estar conectado apenas com pessoas e marcas que ajam como eu ajo.
Benvindo! Estamos inseridos no chamado Turbocapitalismo, uma saborosa mistura de Blade Runner, com
2 xícaras de Segredo do Abismo, 3 colheres de Avatar, e uma pitada de Matrix. May the force be with us!
2322
Sinal dos tempos. Há apenas oito anos em um simples dormitório da Universidade de Harvard nascia
uma marca que vale hoje U$$ 100 bilhões, se tornando o segundo maior IPO na história dos EUA. A estreia do
Facebook dominou o Vale do Silício e Wall Street nas últimas semanas, já que a empresa e os mercados financeiros
se preparavam para o IPO mais esperado desde o Google Inc. em 2004.
As ações da empresa de Mark Zuckerberg foram abertas à US$ 42 na manhã dessa sexta-feira, quase
11% a mais da oferta pública inicial de US$ 38. Nesse sentido, o Facebook foi avaliado inicialmente em cerca de
US$ 115 bilhões, mas as ações da empresa começaram a cair logo depois, comprovando que o natural hype do
preço de oferta é apenas um ponto de partida. Outras grande empresas da arena online também sofreram tur-
bulências significativos em sua estreia: LinkedIn, o primeiro a ir a público, quase duplicou o seu preço de oferta
inicial, abrindo em US$ 83 por ação. Já o Groupon saltou 27% na sua oferta de abertura, a US$ 28 por ação. Mas
o fato é que o valor do IPO do Facebook ficou mesmo em torno dos US$ 100 bilhões, não pelo fato do Facebook
realmente valer esta quantia, mas por causa dos mecanismos de IPO. O Facebook não será para sempre avaliado
com esse valor astronômico. No longo prazo, os preços das ações tendem a voltar ao valor fundamental, assim que
o mercado for assentando e se acomodando. Funcionou assim por diversas vezes ao longo da última década. Mas
o hype dos US$ 100 bi surpreendeu todo mundo, e vamos acompanhar de que forma o barômetro dos mercados
vão sentir essa dinâmica.
Quase 1 bilhão de terráqueos usam o Facebook todos os dias. Sherry Turkle, uma brilhante cientista
do MIT, diz com muita pertinência que nesses novos ambientes virtuais, como o Facebook, nós ficamos “always
on”. E quando estamos conectados, estamos na verdade, negando uma certa solidão. Se estou sozinho em casa
logado no meu Facebook, eu não estou mais sozinho, estou fazendo parte da vida de outra centena de pessoas
e de forma muito íntima. Outro grande pensador contemporâneo, o argentino Nestór Garcia Canclini diz que com
as redes sociais “chega-se a fenômenos de autismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar
na frente da tela do que relacionar-se com interlocutores em lugares fisicamente localizados”. O fato de eu estar
conectado o tempo todo não significa que estou interagindo o tempo todo. E nesse universo, muito mais impor-
tante do que estarmos simplesmente presentes nas atraentes e viciantes redes sociais, é preciso saber o que fazer
lá, saber estar presente de forma relevante e coerente. As pessoas, nessa sociedade intensa e paradoxal, buscam
uma fixação narcísica por meio das redes sociais como o Facebook, e os anunciantes (exceto a GM) também pro-
curam adotar jogos discursivos sedutores nesses novos e envolventes espaços digitais. Enquanto isso, o fundador
do Facebook, Mark Zuckerberg tocou o sino de abertura da Nasdaq sede da companhia em Menlo Park, Califórnia.
Facebook: uma marca de US$ 100
bilhões.
2524
O Brasil adora as redes sociais. Estamos no top five dos países que mais usam Twitter, Facebook e Orkut
no mundo. No entanto passamos pra lá do 100º lugar quando falamos de percentual de usuários diante do número
total da população. É claro, a Internet no Brasil ainda é muito cara e muito lenta, e certamente demorará ainda
para ser usada pelas empresas como mídias de massa. A televisão, jornais e revistas ainda são as mídias que
dominam nosso mercado publicitário.
Por volta de 2005 eu entrei no Orkut, aquela nova rede social que nos viciamos rapidamente e que nos
magnetizava para ir em busca de reencontrar amigos, bisbilhotar vidas alheias e praticar nascisismo nos nossos
álbuns e perfis. O Orkut era muito legal, a gente criava comunidades, interagia muito nas comunidades existentes,
fuçava os scraps (praticamente uma caixa pública de emails que possuíamos). O Orkut nos ensinou a brincar de
rede social e a modular nosso comportamento nesses novos ambientes virtuais. Quem nunca passou por alguma
saia justa no Orkut que atire a primeira pedra.
Há alguns anos eu estive em uma palestra que Orkut Büyükkokten, o criador da rede, foi ministrar na
USP. Logicamente ele faz questão de pisar em solo brasileiro sempre quando pode, afinal o Brasil ainda era o maior
usuário de Orkut no planeta. Logo no começo da palestra ele deu a mão à palmatória que disse que não pensou
como ganhar como publicidade com aquele negócio. Criou a rede apenas para se conectar com amigos, e anos
depois que foi pensar como capitalizar em cima daquilo, criou banners, links patrocinados, etc. A parte mais di-
vertida da palestra foi quando ele começou a apresentar as correlações de comunidades. Disse que 80% das pes-
soas que estavam comunidade “amo sushi”” também estavam na comunidade “amo fotografia”, concluindo que
pessoas que tiravam foto gostavam também de comida japonesa. Mostrou também que 90% das mulheres que
estavam na comunidade “sofro de TPM” também estavam na “amo chocolate”, comprovando uma correlação que
já sabemos há anos que faz todo sentido. E por fim mostrou que caso a foto principal estive com a pessoa “sem
camisa”, a probabilidade dele ser do Brasil era de 90%. A plateia caía na gargalhada e o Sr. Orkut não entendia
aquela suposta fixação por nós brasileiros gostarmos de posar sem camisa para fotos. Aliás ele sempre fornece o
email dele que é muito fácil [email protected].
O Orkut perde usuários de forma significativa todos os meses. E a principal hipótese é meio obvia: todos
estão ao poucos migrando para o Facebook, essa genial rede social usada por quase 1 bilhão de terráqueos. Mas
o Orkut ainda é muito forte. Mas como assim que a grande parte de meus amigos só usa Facebook? Pois é, temos
o hábito de usarmos como referência e nos balizarmos por nossos amigos mais próximos. O Brasil é muito grande,
temos vários Brasis dentro do Brasil. Temos diversos São Paulos dentro de São Paulo. Recentemente perguntei
para uma turma de alunos de uma faculdade que leciono no centro de São Paulo. Perguntei se alguém ainda usava
Orkut. Cerca de meia dúzia levantaram a mão, e eu questionei por que não usavam o Facebook. E a resposta veio
na lata: “ah não professor, acho o Facebook muito chique”. Mas o rede de Mark Zuckerberg veio pra ficar, cresce
cada vez mais no Brasil e alguns institutos de pesquisa já colocam que o Orkut foi ultrapassado pelo Facebook.
Ali podemos ser nós mesmos, expor nossas opiniões, sem as exigências do relacionamento pessoal. Para dar
parabéns para amigos no Facebook é muito mais cômodo: eu escrevo uma mensagem padrão como “parabéns
e felicidades”, copio e vou colando nos murais de meus amigos aniversariantes. Mais conveniente e mais barato
do que ligar para a pessoa e desejar tudo de bom. Seja saudosista. Ressuscite do orkuticídio que você cometeu e
comece a postar tudo lá de novo. O Orkut mudou e está com um visual muito mais moderno. Até o aplicativo para
iPhone disponível na app store está mais bacana e intuitivo.
Quem tem saudade do
ORKUT?
2726
Viva o controle remoto, essa extensão de nosso braço que nos dá um poder de filtrar os mais diversos
conteúdos e selecionar aqueles que melhor se conectam ao nosso intelecto e ao nosso interesse. E no final do dia
de um domingo qualquer, onde já estamos com a cabeça querendo concentrar para mais uma semana de trabalho,
não queremos conteúdo complexo, queremos pedir uma pizza de bairro e sermos impactados por conteúdo sim-
ples, temas lúdicos, que nos faça rir, que não exija muito de nós e que minimamente nos atualize para as principais
conversas do escritório no dia seguinte. E hoje ficamos zapeando de canal em canal, e com nosso smartphone na
mão, onde em tempo real vamos comentando e lendo comentários de pessoas. As redes sociais se tornam am-
bientes onde depositamos legendas com nossas opiniões sobre as programações. Os trend topics do Twitter e os
comentários do Facebook se tornam o diapasão que modela e modula os gostos da conectada audiência brasileira.
Vivemos a Cultura do Espetáculo! No final da tarde desse último domingo em especial, o midiático Fausto
Silva mostrava suas velhas vídeos cassetadas, assim como faz há décadas. Logo depois, na Rede TV, mais uma
edição do Saturday Night Live (em um domingo à noite?), o novo programa de Rafinha Bastos com todas as suas
cotas de patrocínio vendidas e que não vê a audiência decolar. Enquanto isso, o Pânico na TV da Band, ancorava
sua pauta do programa ressuscitando o personagem Clô (interpretado por Ceará) que visitou uma exposição do
falecido Clodovil Hernandez. Logo em seguida, também na Rede TV, mais um episódio do novo programa do Dr.
Rey, onde o pitoresco cirurgião de Beverly Hills, fica analisando mulheres como se fossem mercadorias em uma
prateleira. Já o Fantástico trazia à tona o caso de uma moça que desejava congelar o corpo do pai falecido, e lo-
gicamente trazia mais desdobramentos do midiático caso Yoki. O grisalho oldfashioned Silvio Santos reprisava pe-
gadinhas com Ivo Holanda da década de 90, e em seguida passava o bastão para Marília Gabriela que entrevistou
as irmãs gêmeas do nado sincronizado. Para o mais intelectuais, e cerca de 20% da população que possui TV por
assinatura em casa, há conteúdo “mais cabeça”: sintonize na Globo News para assistir ao Manhattan Connection
com o âncora Lucas Mendes e sua bancada nova-iorquina que discute política, economia e cultura. Pra variar, o
mal-humorado Diogo Mainardi não economizava críticas ao monstro do cinema Ridley Scott.
É muito fácil ouvir comentários das pessoas que a programação dominical da televisão brasileira é de
péssimo nível, que aquilo é subcultura, que entorpece a população, que a noite do último domingo em especial
reuniu conteúdo de baixíssima qualidade, etc. Mas podemos analisar todo esse conteúdo que nos foi despejado
pelas emissoras como o simples retrato do que nós assistimos, decodificamos e nos entretemos. A cultura, ou o
acervo de conhecimento das pessoas, é que ajuda a modular o processo de recepção de todo esse conteúdo. To-
dos nós estamos inseridos dentro uma cultura, e que foi construída durante anos. E é nesse ecossistema cultural
onde as emissoras de televisão se baseiam para gerar conteúdos. A própria TV Globo está no ar com “Avenida Bra-
sil” e “Cheias de Charme”, duas telenovelas que estão claramente tentando se conectar com públicos emergentes,
ou a grande parcela da população brasileira. O fato é que as novelas são grandes produtos culturais, que fazem
parte da educação das pessoas. Algumas delas são verdadeiras obras de arte. Nessa semana, a Globo deposita
fichas no remake de Gabriela, dessa vez interpretada por Juliana Paes (#eunãovouassistirgabriela).
Os anunciantes e agências logicamente não sou neutros quando discutem o poder dos meios de co-
municação. Em evento recente sobre integração de mídias que aconteceu em São Paulo, diversos profissionais
debateram como a TV, mídias sociais, entre outras, poderiam coexistir de forma integrada e aproveitando o que
cada uma tem de melhor. Em dado momento do evento, após diretores de criação de grandes agências mostrarem
cases belíssimos sobre mídias sociais, tomou a fala Ricardo Esturaro, o diretor de planejamento de marketing da
E um domingo qualquer da TV
brasileira, queremos conteúdo sem
conteúdo.
28
TV Globo. Ele mostrou dados para justificar que ainda demorará um bocado para as chamadas redes sociais serem
usada como mídia de massa. Ele mostrou que 47% dos brasileiros lêem somente o básico, 21% são analfabetos
rudimentares, 7% são analfabetos e apenas 25%, ou ¼ de nossa população são alfabetizados plenos, ou seja,
que compreendem e interpretam textos. E disse que a TV atinge 100% dos lares do Brasil e as novelas da Globo
têm alcance de 158 milhões de lares. Não é à toa que a disparada parcela dos orçamentos de marketing das
empresas ainda
vão para essas mídias de massa como TV e revistas. Mídias digitais recebem cerca de míseros 10% das
verbas das empresas. O modelo de remuneração das agências de publicidade no Brasil ainda privilegia essas mí-
dias de maior alcance. Mesmo porque, cerca de 40% do faturamento de médias e grandes agências no Brasil hoje
vêm do chamado bônus de veiculação.
É esse o cenário midiático da TV brasileira e que impacta milhões de lares brasileiros. Queremos con-
teúdo sem conteúdo. Queremos nos entreter com conteúdo leve, tolo e que não exija muito de nosso intelecto.
Afinal, é o que se encaixa melhor no nosso repertório.
3130
Calabresa versus Veuve Clicquot
Nesse último final de semana fui testemunha ocular de dois simbólicos centros de consumo da cidade de
São Paulo. No sábado estive no Shopping Metrô Itaquera, um enorme centro de consumo popular acoplado a es-
tação de metrô Corinthians-Itaquera, no extremo da Zona Leste e pertinho do estádio que sediará a Copa de 2014.
Nos corredores do shopping Itaquera, o baile do consumo acontecia de maneira fervorosa. Lojas cheias,
famílias andando pra lá e pra cá. Eu não resisti e tive que passar por uma experiência de compra naquele local.
Precisava comprar um ferro de passar roupa. Não hesitei e fui até as Casas Bahia. A vendedora super simpática,
sem parecer pegajosa e sem aquele discurso enlatado que vemos em 90% das lojas de shopping. Acabei com-
prando aquele modelo clássico da Black & Decker. Fiquei realmente impressionado a forma como me tratou, de
uma forma simples, porém amistosa. De uma forma espontânea, mas direta e focando na conclusão da venda.
Saindo do império do consumo de Samuel Klein, continuei passeando pelos amplos e lotados corredores.
Tomei meu mate com leite no Rei do Mate. Continuei andando. Deparei-me com uma loja na Adidas Outlet, onde
saí de lá com um par de meias por R$ 4,63. Isso sim é preço de outlet de verdade. Passando pela enorme praça
de alimentação, edulcorada por marcas como Giraffas, McDonald’s e Vivenda do Camarão, vejo dois amigos, com
penteados e indumentárias no melhor estilo Neymar, e sentados numa mesa da praça com uma garrafa de Jack
Daniel’s. Sim, eles estavam sentados numa praça de shopping tomando uísque caubói. Cena pitoresca. Estava
adorando aquilo. Entrei na loja do Hipermercado Extra para passear e observar. Logo na entrada da loja, uma
promotora me aborda com uma bandeja cheia de calabresa fatiada recém-assada. Ela estava demonstrando o
novo micro-ondas Brastemp que acabara de assar a calabresa fatiada. Ela me ofereceu e não aceitei, enquanto
outros fregueses iam pegando seus palitinhos e espetando nas finas fatias de calabresa. Achei aquilo o máximo!
Na saída do shopping, uma série de quiosques instalados no caminho para o Metrô. Pequenas lojas da Gol Linhas
Aéres, da Subway, do Chopp Brahma, entre outros tantos. Era um cardápio de marcas visivelmente interessadas
em arrebanhar aqueles ávidos e cada vez mais poderosos consumidores emergentes.
No dia seguinte, fui o conhecer o finalmente recém-inaugurado Shopping Iguatemi JK. É o novo epicen-
tro do consumo de luxo da cidade de São Paulo. Após tanta polêmica de alvarás de abre-não-abre, ele foi aberto
e pra mim, toda esse impasse, só magnetizará ainda mais consumidores para o novo reino de consumo da família
Jerreissati. O extremo cuidado com detalhes já é percebido nos primeiros passos dentro do shopping. O piso intei-
ro branco e cirurgicamente asseado recebe os consumidores. Todos caminham e olhando com ar de vislumbre e de
novidade para as vitrines. A rede wi-fi aberta, rápida e grátis para todos darem seus check-ins e legitimarem suas
presenças ali juntos aos seus amigos do Facebook e Twitter. As marcas estavam todas ali, lindas, maravilhosas,
lustradas. Tinha Bvlgari, TopShop, Etiqueta Negra, Zara Home, Dolce & Gabbana, Sephora e tanta outras marcas
globais que aterrisavam ali e se tornavam locais para nós. Em uma das lojas, era servida Champanhe Veuve Clic-
quot para seus clientes. Na hora, lembrei da Calabresa do dia anterior.
Está com fome? Você tanto pode ir no Burger King na linda praça de alimentação, como pode ir saborear
a carne do Varanha, a preferida do Boni. Eu almocei no mediterrâneo Ráscal com seu vasto e saborossísimo buffet
à módicos R$ 58 reais per capita. E depois tomei meu café de R$ 4,20 na sorveteria argentina Freddo. Saindo de
lá, peguei o trem na Margin Marginal e voltei pra casa.
Viva o consumo na sexta economia do planeta. Vamos às compras?
3332
Dia histórico para nós consumidores. A Anatel tomou a decisão de suspender a venda a partir de segun-
da-feira (23 de julho de 2013) de novas linhas de três das maiores operadoras de telefonia móvel do país: TIM, Oi
e Claro (que somadas, detêm 70% do mercado). A Anatel tomou a decisão após avaliar dados das três empresas
pelos últimos meses e um dos mais recorrentes problemas é que as chamadas são interrompidas no meio da liga-
ção. Logicamente, a medida da Anatel fez as ações das empresas despencarem na Bolsa.
A medida já havia sido adotada contra a Telefônica no passado, mas esta é a primeira vez que a agência
suspende as vendas de três operadoras de uma só vez. A nossa torcida é que essa medida da Anatel sirva não
somente para que as operadoras suem a camisa em entregar um serviço à altura do que pagamos, mas também
que seja um momento de reflexão. Todos nós (sem exceção) iremos passar por algum tipo de aborrecimento na
condição de consumidor no dia de hoje, seja no banco, na cafeteria, na padaria, no aeroporto, no cartório, na
lavanderia, etc. Legalmente falando, o consumidor pode ter inúmeros direitos e munições para se proteger, no
entanto, no frigir dos ovos do dia-a-dia, o consumidor sempre pendia para o lado mais fraco da corda. Mas hoje
nós vencemos. O momento é histórico, é de celebração.
O editor da aclamada revista americana Wired, Chris Anderson, criador do brilhante conceito da cauda
longa, escreveu anos atrás o livro intitulado FREE, que trata da evolução nos modelos de negócios e geração de
receita na era digital, e fala que em um futuro próximo tudo tende a um custo zero para o consumidor. E é bem
isso que estamos observando acontecer. Em inúmeros locais que estamos hoje em dia já encontramos sinal de
internet wi-fi, ou seja, precisamos cada vez menos dos caríssimos e lentos pacotes de dados das operadoras para
navegar. Hoje eu tenho, por exemplo, aplicativos no meu iPhone com o Viber, o Skype ou o Whatssup, todos eles
permitem que eu fale com meus amigos simplesmente de graça, tudo por meio da internet. As operadoras que
não bobas, e eu já perceberam que tudo realmente tende a custo zero para o consumidor, já estão investindo em
telefonia fixa e até canais de TV por
assinatura. Quer conhecer mais esse conceito do custo zero? Logicamente, o livro FREE do lúcido Chris
Anderson está disponível gratuitamente na web. Baixe e leia!
A Vivo, que não teve suas vendas suspensas, deve não somente celebrar a decisão, mas também poderia
aproveitar para fazer um chamado anúncio de oportunidade. Eu sugiro aqui a chamada da campanha: “Ei consu-
midor, venha pra Vivo! Ou você prefere ir para as outras que a Anatel suspendeu vendas pela má qualidade de
serviço.” Fica a dica para os gerentes de marketing da Vivo que, certamente, não deixarão passar desapercebido
essa decisão histórica da Anatel.
A promessa é que na Copa das Confederações no ano que vem, já tenhamos a internet 4G disponível
nas cidades que receberão jogos. Ora, eles precisam primeiro fazer a lição de casa, fazer funcionar muito bem o
3G para depois pensar em avanços tecnológicos. Que essa pertinente e merecida decisão da Anatel sirva de alerta
para empresas de outros segmentos como bancos, TVs por assinatura, planos de saúde, etc. pensem duas vezes
antes de não entregarem o que prometem.
Quem sai ganhando com
a decisão da Anatel? Nós,
consumidores!
3534
As duas semanas rápidas e intensas dos Jogos Olímpicos de Londres se foram. O que fica na nossa me-
mória são os momentos inesquecíveis, as performances de Usain Bolt, as medalhas de ouro do Brasil, as nossas
pratas doloridas, entre outros inúmeros momentos que nos emocionaram. Agora a bola está com o Brasil, melhor
ainda, a tocha está com o Rio de Janeiro. E olha que a responsabilidade se tornou ainda maior, pois Londres elevou
a barra, colocou o sarrafo lá em cima mostrando nos jogos e nas cerimônias de abertura e de encerramento toda
a magia, elegância e seriedade dos ingleses. Justo eles, que são simbolizados pelo mundo com um povo meio frio,
com uma gastronomia pouco convincente e um céu sempre nublado. O que vimos nessas últimas suas semanas
não foi nada disso, muito pelo contrário, por meio de performances de The Who, Paul McCartney, Annie Lennox,
eles mostraram ao planeta o quanto rica é a cultura pop da Grã-Bretanha. E deram show também no quadro de
medalhas (terminaram em terceiro).
Agora cabem aos brasileiros e cariocas provarem que saberão fazer bonito também, pois o céu aqui é de
brigadeiro, o povo é alegre e a gastronomia tem torresmo e cerveja trincando no copo americano. Quando Edu-
ardo Paes ontem recebeu a bandeira olímpica, os comentários dos brasileiros no Twitter eram norteados por um
certo frio na barriga, um sensação de medo de não fazer bem feito. Isso era refletido nos comentários em redes
sociais. Um corrente de pessoas dizia que o Brasil seria bem esteriotipado no Rio 2016 por meio de cenografias de
favelas, tucanos e araras voando pelo estádio olímpico, ao som de Michel Teló e mulatas sambando. E o gostoso
couvert que vimos ontem mostrou ao o Rio é algo a mais que apenas isso. A própria escolha do gari Renato Sorri-
so para abrir o “aperitivo” do Rio 2016 ontem já baixou a guarda dos críticos de plantão. O gari deu a largada na
parte verde-amarela da festa e “ensinou” um gringo a dançar no palco.
De forma sublime, ele simboliza impecavelmente o Brasil e o Rio de Janeiro. Um homem do povo, negro,
trabalhador, com um espontâneo sorriso no rosto e com samba no pé. Logo depois nada de Ivete Sangalo, Daniela
Mercury ou Claudinha Leitte, vimos Marisa Monte entrando no palco representando Iemanjá e interpretando um
trecho da Bachiana número 5, do genial Villa Lobos. Os povos indígenas brasileiros também foram lembrados,
com tambores e ciber-dançarinos espalhados pelo palco. Em seguida BNegão, da banda Black Alien, representou o
Maracatu Atômico de Chico Science, e com a participação da bela Alessandra Ambrósio. Seu Jorge pegou o bastão
do revezamento e interpretou “Nem vem que não tem”, letra de Carlos Imperial imortalizada na voz de Wilson Si-
monal. Para fechar com chave de ouro, o atleta do século Pelé distribuía abraços, enquanto Marisa Monte cantava
com seu Jorge “Aquele abraço”, de Gilberto Gil.
Depois do que vimos ontem, se algum atleta brasileiro ainda estava na dúvida se tentaria ou não os
jogos olímpicos Rio 2016, as dúvidas não existem mais. Todo mundo vai querer fazer parte dessa festa. A marca
Brasil não poderia ter sido melhor representada do que ontem. Em recente pesquisa feita, perguntaram para di-
versas pessoas do resto do mundo uma palavra que representasse o Brasil, e logicamente a palavra que venceu
foi: alegria. O que vimos ontem foi um gostinho de nossa cultura e o que o Brasil tem de melhor. Temos inúmeros
defeitos, mas nossas virtudes falaram mais alto. Falem o que quiser, mas esse é o Brasil que temos para mostrar.
E quem não arrepiou ontem, que atire a primeira pedra.
Londres colocou o sarrafo lá cima, mas vamos dar conta do
recado.
3736
Eu moro sozinho. Mas quando chego em casa todas às noites, vou comer alguma coisa, ligo minha tele-
visão e faço log in no meu Facebook. Com um passe de mágica: eu não estou mais sozinho. Estou fazendo parte
da vida e da intimidade de outras pessoas. Nesse momento, a solidão não existe mais. É o que acontece com boa
parte das pessoas hoje em dia. Vivemos em um mundo hiperconectado. Vive-se hoje rodeado por telas, é a tela
do smartphone, da TV, do iPod, do GPS, do iPad, do relógio. E a tendência é que tudo isso se torne uma única tela,
pelo menos quando estamos em casa. Aqui na minha humilde residência por exemplo, já tenho a minha Apple TV
(paguei 99 dólares) e me permite acessar YouTube, ver fotos do meu celular, tudo por meio da tela de minha TV
LG de 40 polegadas. Genial!
Um grande pesquisador contemporâneo, Nestór Garcia Canclini, diz que nas redes sociais evidencia-se
até mesmo fenômenos de autismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar na frente da tela
do que relacionar-se com interlocutores em lugares fisicamente localizados. Sou obrigado a concordar carinhosa-
mente com o pensador argentino. E é exatamente assim que nos comportamos às vezes. Hoje em dia quando saio
para jantar com minha namorada, a primeira coisa que ela faz e pedir meu celular e guardar na bolsa dela, porque
senão ela diz que eu não interajo e não curto aquele momento a dois. E ela está coberta de razão! Eu dou meu ce-
lular a ela gentilmente (com o modo silencioso devidamente ativado). Ela diz que eu tenho mania de dar check-in
no Foursquare em tudo que é canto, na rua, no Starbucks, na padaria, e até na casinha do cachorro. Check in no
Ráscal é bacana. Mas check-in no Habib’s, não é. Check in no novo Shopping JK Iguatemi, show de bola. No Sho-
pping Metrô Itaquera, nem pensar! A sensação é que as pessoas gostam de demarcar território apenas em lugares
chiques. No aeroporto é cool, o cara é viajado. Na rodoviária, não! Ele é classe C. Será que é assim que funciona?
Os celulares nasceram, comercialmente falando aqui no Brasil, há cerca de 15 anos e eram gigantes,
pesados e feios. Com o tempo, foram reduzindo de tamanho e ficando mais finos. Curiosamente, hoje em dia,
estão voltando a crescer de novo, com telas cada vez maiores e mais nítidas. Senhores engenheiros e designer,
o limite é o tamanho do bolso da minha calça jeans ok? Os celulares colam a nosso corpo como um elemento a
mais de nossa indumentária. A corporabilidade abriga as novas tecnologias. O fato de eu estar conectado o tempo
todo não significa que estou interagindo o tempo todo. Conectividade não é sinônimo de interatividade. E nesse
universo, muito mais importante do que estarmos simplesmente presentes nas atraentes e viciantes redes sociais,
é preciso saber o que fazer lá, saber estar presente de forma relevante e coerente. Muitos autores importante hoje
se debruçam em todas essas questões. O fato é que temos que criar uma estratégia de como se comportar nessa
nova arena online, nesse novo ecossistema digital. Por mais que sejamos atores-sociais hoje em dia, não dá para
separar mundo online do mundo offline. Afinal, somos um só.
Redes Sociais é um assunto novo, magnético e muito fértil. Atrai gente de tudo que é tipo. No meu
email por dia chegam dezenas de mensagens me convidando para eventos, cursos, palestras, simpórios, ofici-
nas e lançamento de livros sobre mundo digital, redes sociais e afins. Confesso que deleto a maioria sem abrir,
pelo simples motivo de não conseguir decodificar esse excesso de conteúdos. Tem muita gente surfando nessa
onda. Gente boa e gente ruim. Cabe a nós sermos criteriosos ao extremo e olharmos a fundo quem está dando
o curso, quem é blogueiro, quem assina o videocast. A internet permite que as pessoas escrevam o que quiser a
bel-prazer. Take care! Analise a bagagem acadêmica de quem você lê, de quem você assiste, de quem você ouve.
Leia bons livros, procure autores com “pedigree”, e não simples aventureiros do Facebook. Quer dicar de bons
autores? Então vamos lá! Afinal tem muito gente fera no mundo hoje debruçada em enteder a fundo todas essas
O ecossistema digital
38
questões: Sherry Turkle, pesquisadora do MIT, escreveu “Alone Together” e “Life on the Screen” (assista ela no
TED Talks e veja com que lucidez que ela analisa o impacto dessas novas tecnologias na vida das pessoas: http://
youtu.be/t7Xr3AsBEK4). Erick Felinto, super pesquisador da UERJ que estuda a cibercultura (aqui o blog do Erick:
http://poshumano.wordpress.com/). Dê uma olhada no grupo Socio Tramas, formado por pesquisadores do Mestrado
da PUC e liderado pela diva da semiótica Lucia Santaella (aqui o link: http://sociotramas.wordpress.com/). Conhece o
blog de Seth Godin, um dos maiores pensadores de marketing da contemporaneidade (acesse aqui e assine para
receber a inspiradora newsletter que ele manda todo dia no nosso email: http://www.sethgodin.com/sg/.)
Quer se capacitar? Então procure bom cursos, como por exemplo o inédito MBA em Marketing, Consumo
e Mídia Online que esse que vos escreve está coordenando na Trevisan Escola de Negócios aqui em São Paulo. O
curso conta com um corpo docente de elite, com excelente bagagem acadêmica e com o pé no mercado digital.
Montei uma proposta metodológica exclusiva, com um repertório teórico contundente, cases de mercado e com
visita técnicas programadas em agências digitais e grandes agências de publicidade. No cardápio de disciplinas,
alguns temas mais ligados a ciências sociais como Sociologia e Antropologia do Consumo, Semiótica e Pós-Moder-
nidade; outros mais técnicos do mundo web: Redação Web, Google Analytics, SEO/SEM; e outros assuntos mais
avançados como: Gestão de Reputação de Marca, Guerrilha Digital, Ativação de Eventos com foco em digital. Aqui
está o link onde você poderá ter acesso a todas as informações do curso: http://trevisan.edu.br/posgraduacao/1783/
mba-em-marketing-midia-e-consumo-on-line.
4140
Afinal, o que é Branding?
Muito cuidado quando se lê o termo “Branding” por aí. De cada 10 empresas que usam esse bonito
termo no seu nome hoje em dia, 4 delas talvez sejam empresas de pesquisa, 4 provavelmente são agências de
design, 1 certamente não sabe o que faz, e talvez apenas 1 trabalhe efetivamente com Branding. Lembrando que
a pesquisa de mercado e o design podem ser, e geralmente são, importantes etapas do processo de Branding, mas
construção de marca é um conceito um pouco mais amplo.
Papo reto! Branding nada mais é que uma postura empresarial, ou uma filosofia de gestão que coloca a
marca no centro de todas as decisões da organização. Lembrando que a marca vai muito além daquele símbolo
no topo da sua loja, ou aquele logo no canto superior esquerdo de seu site, a sua marca é o sentimento que seus
consumidores têm por você. Uma marca é composta por dezenas de elementos: nome, símbolo, slogan, mascote,
fama, tradição, história, jingle, embalagem, entre outros. Nosso desafio, como donos de marcas, é: como calibrar
todos esses elementos, no sentido que todos estejam devidamente alinhados, e isso gere força para sua marca.
E a importância estratégica de se fazer uma devida gestão de sua marca torna-se um dos desafios mais
vitais no atual contexto empresarial. Seja qual for a indústria, tipo de cliente, segmento de mercado, país de
atuação, as estratégias de Branding devem ser cada vez mais encaradas como um dos passos mais importantes
no processo de gestão de uma empresa. A implementação de uma cultura de Branding não é uma agenda de
marketing, como vemos nas poucas empresas de entendem isso no Brasil. Branding deve estar na agenda no CEO,
tamanha a importância de se enxergar a marca como esse ativo estratégico e com riqueza de significado.
Basicamente, o Branding prega que as interferências sobre uma marca devem ser cuidadosamente pla-
nejadas e executadas, e ações de Branding bem ou mal sucedidas são automaticamente sentidas e refletidas na
imagem que uma marca tem na mente do consumidor. E todos os passos que sua marca dá devem sempre levar
em conta resultados de longo prazo, pois uma marca não constrói em semanas, ou em seis meses, uma marca se
consolida em anos e décadas de trabalho de um trabalho consistente.
Puxando a brasa para o nosso contexto brasileiro, vemos que pouquíssimas marcas praticam o Branding
em sua forma mais plena. A forte concorrência e uma exigência cada vez maior dos consumidores no Brasil, força,
os empresários e não insistirem em uma identidade única por muito tempo. De seis em seis meses, as marcas
adquirem uma cara nova, um posicionamento novo e associações novas. Todos esses movimentos até podem ser
muito bem intencionados logicamente, mas vão ao contrário do que prega o Branding. Todo mundo quer ver resul-
tados rápidos, claro. Mas geralmente não funcionam na mesma velocidade e ansiedade que o mercado responde.
O Branding prega que tudo comunica a sua marca. Por exemplo, a cor que você pinta os caminhões
de sua empresa está comunicando sua marca, a forma como seus funcionários se vestem está comunicando sua
marca, o jeito que sua recepcionista atende o telefone está comunicando sua marca, o que você conversa sobre
a empresa com seu colega durante um chope está comunicando sua marca, ou seja, absolutamente tudo comu-
nica a sua marca. E vender a filosofia do Branding, ou seja, inserir no chip de um empresário brasileiro toda essa
importância que uma marca representa é um dos desafios mais árduos que se vê nos dias de hoje. Percebe-se
que pouquíssimas marcas executam o Branding em sua forma mais plena. Todos querem uma marca forte que
conquiste o coração de seus stakeholders e não podemos esquecer, de forma alguma, que o principal stakeholder
de uma empresa é o seu capital humano – seu grupo de colaboradores –, que será encarregado de levar os valores
da empresa para fora. Além de cativar o coração dos clientes finais, uma marca bem construída conquista também
o coração dos que procuram um bom lugar para trabalhar e das pessoas que já fazem parte do time da empresa.
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Os funcionários serão os mais importantes advogados de defesa da marca muito antes dos clientes terem contato
com ela.
Fazer Branding não é exclusividade de grandes e prestigiadas empresas multinacionais. É perfeitamente
possível praticamente o Branding em pequenas e médias empresas, ou seja, a esmagadora maioria das empresas
do Brasil. Fazer Branding é simplesmente entender que tudo comunica a marca e ter paixão aos detalhes, desde
conferir se há pó nas plantas de sua loja (não pode ter) e se o esmalte de sua recepcionista está descascado (não
pode estar).
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Por que temos que estar em todas as redes sociais? Por que desconfiamos de alguém que não está no
Facebook? Por que, ao chegar uma notificação em nosso smartphone que fomos marcados em uma foto, temos
que parar tudo naquele exato instante para conferir? Por que nos intoxicamos com essas novas redes digitais e
ficamos online praticamente o dia inteiro? Pra mim, todas essas são perguntas ainda sem respostas claras. O fato
é que essas chamadas redes sociais fazem parte de uma nova revolução digital que impacta nossas relações com
as pessoas e com as marcas. Sim, há pensadores contemporâneos que classificam esse cenário que vivemos hoje
como uma verdadeira revolução. A exemplo do que foi a revolução do surgimento da escrita, a revolução indus-
trial, a revolução gutemberguiana da imprensa ou a revolução francesa séculos atrás, enxerga-se esse fenômeno
da web e seus desdobramentos digitais como uma verdadeira revolução. Eu sou obrigado a concordar.
Podemos dar um zoom out e analisar as redes sociais sob diversos aspectos. Desde uma ideia que sur-
giu dentro de um dormitório de Harvard, onde o judeu neoliberal Mark Zuckerberg criou uma das empresas mais
inovadoras do mundo, e que recentemente contratou o multipremiado arquiteto Frank Gehry – responsável pelo
emblemático edifício do Museu Guggenheim de Bilbao – para desenvolver o projeto de expansão da sede de sua
empresa em Palo Alto. Ao mesmo tempo que as ações da empresa sofrem uma certa turbulência, Zuckerberg
encomendou um conjunto que ocupará um terreno de 90 mil m², na área conhecida como Menlo Park, onde está
o quartel-general da gigante das redes sociais. Zuckerberg concebeu o Facebook para conectar as pessoas entre
si? Eu prefiro acreditar que não.
Podemos também analisar as redes sociais como meras plataformas mercadológicas onde as marcas
criam, nada mais nada menos, do que mais um ponto de contato com seus consumidores e demais públicos de
interesse. A partir do momento que uma empresa decide criar um fanpage ou um perfil no Twitter ela precisa estar
ciente e preparada que está abrindo a guarda, pois ela acaba de deixar escancarada uma porta “digital”, ou seja,
um porta mais online, mais exposta e mais mensurável. Ela acaba de criar um “touch-point” tão importante quanto
o seu 0800, tão importante quanto ao balcão de sua loja ou um anúncio publicitário, e até mesmo tão importante
como a forma que se relaciona com um fornecedor, afinal tudo comunica a marca. Quer expor sua marca nas
redes sociais? A receita de bolo é: prepare-se, capacite-se, planeje-se, crie um processo, atue de forma relevante
e muito, mas muito criteriosa. E contrate um nerd.
Por fim, pode-se analisar as redes sociais como esses novos ambientes digitais onde se constroem jogos
discursivos e narrativas envolventes. O magnetismo criado pelas redes sociais é intenso pois no mundo online não
há todas as exigências do mundo real, certo? Ligar para dar parabéns a cada um dos meus 7 aniversariantes custa
dinheiro, custa tempo e custa ter que ficar pendurado do celular ouvindo histórias dele que não estou afim de
ouvir naquele momento. Prefiro escrever um “parabéns e tudo de bom” e viva o Ctrl+C e Ctrl+V. A quem prefira
nem ligar e nem dar parabéns via Facebook, e simplesmente “curte” a mensagem de parabéns de um terceiro.
Assunto resolvido!
Nesse novo ecossistema digital, todos tendem a criar um discurso narcísico, afinal a troco de quê eu
deveria expor nesses espaços que eu estou triste, ou que terminei meu namoro, ou então dizer que aquele novo
emprego que consegui não vai nada bem. Muito pelo contrário, nesses novos espaços digitais minha vida é bela,
estou sempre jantando em lugares transados, as minhas piadas e frases clichês são as mais originais e a minha
filha vestida de caipirinha é mais bonitinha do bairro. Todos estão fazendo vigília sobre tudo que posto, publico e
compartilho.
Desintoxicação digital?
Ainda não!
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A quem tenha adotado recentemente o chamado “detox digital” ou processo de desintoxicação digital,
afinal essas coisas viciam e ceifam nossa atenção durante boa parte do dia, certo? Uma conhecida minha me re-
latou recentemente que saiu do Facebook. Logicamente, ela me disse que eu suspeitava: quando você pede para
sair, a rede social não mata sua conta e te dá a opção de deixar sua conta adormecida. Você pode voltar quando
bem entender e como se nada tivesse acontecido. Problema é que se você sair do Facebook e ninguém perceber,
como um colega de sala meu sabiamente ponderou.
Todo mundo está no Facebook hoje, certo? Errado! Cerca de apenas 30% de nossa população brasileira
usa a rede. Recentemente em uma rápida sondagem que fiz em uma sala de aula que eu leciono, perguntei a
todos: “Quem não usa Facebook, levante a mão!”. Cerca de uns 10 estudantes levantaram a mão e as justificativas
que ouvi foram: o Facebook é muito chique (parei para pensar depois, e eles tem total razão, o “look-and-feel” do
Facebook é azul, e na teoria das cores azul é nobreza; o próprio nome “Facebook” é um rebuscado nome gringo);
já outra parcela disse que preferia a fazendinha do velho e bom Orkut.
Detox digital? Obrigado, mas ainda não. Afinal, como é que eu iria divulgar esse texto sem o meu Facebook?
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Por que amamos Avenida Brasil?
Porque é uma obra de arte!
Uma telenovela que fez tudo diferente. Uma ficção que inovou em diálogos, em cenários, em elenco, em
tudo. Uma obra de ficção onde uma personagem fala para a outra: “Menina, desliga esse pré-pago”. Uma novela
onde a personagem Janaína (que representa a empregada doméstica de Carminha) também tem uma empregada
doméstica na sua casa. Assim como em grande parte dos lares brasileiros, o seu sofá possui um plástico transpa-
rente que o protege contra a sujeira. O plástico foi retirado do sofá apenas no capítulo em que Tufão foi visitá-la.
Genial!
Avenida Brasil subiu a barra do quesito qualidade de telenovelas produzida pela TV Globo. A ambien-
tação dos cenários era cirurgicamente produzida com gatos de porcelana ao melhor estilo kitsch e tangibilizava
trejeitos típicos do povo brasileiro de forma sublime. Trouxe a tona o espetacular ator Marcos Caruso e seu incom-
parável personagem Leleco, e Juliano Cazarré, que nos brindou com o hilário Adauto, e que também protagonizou
um excelente papel no último filme do aclamado diretor brasileiro Fernando Meirelles.
A trama de José Emanuel Carneiro, que certamente teve seu passe valorizadíssimo após Avenida Brasil,
catalisou nos internautas do Brasil um novo hábito. Hoje assistimos a telenovela diante de mais de uma tela. Esta-
mos agora com um olho na televisão e com outro no nosso smartphone, onde em tempo real vamos comentando
e lendo comentários de pessoas. As redes sociais digitais se tornam ambientes online onde depositamos legendas
com nossas opiniões sobre as programações. Os trend topics do Twitter e os comentários do Facebook se tornam
o diapasão que modela e modula os gostos da conectada audiência brasileira. Todos os dias por volta das 21hs o
termo “oi oi oi” pipocava nas timelines das redes sociais. A própria equipe do Twitter nos Estados Unidos demorou
para entender essas intrigantes publicações. Alguns até acharam, erradamente, que fosse um flash mob.
Todos nós estamos inseridos dentro uma cultura, e que foi construída durante anos. E é nesse ecossis-
tema cultural onde as emissoras de televisão se baseiam para gerar conteúdos. A TV
Globo colocou no ar “Avenida Brasil” e a recém-terminada “Cheias de Charme”, duas telenovelas que
assumidamente tentaram se conectar com públicos emergentes, ou a grande parcela da população brasileira. O
fato é que as novelas são grandes produtos culturais, e que fazem parte da educação das pessoas. Mas há quem
possa definir as telenovelas como produtos sub-culturais e que alienam ou emburrecem o telespectador. Alguns in-
telectuais inclusive esculhambam o gênero. Com o que vi em Avenida Brasil, eu evidenciei exatamente o contrário
de tudo isso. Foi sim uma verdadeira obra de arte. Parafraseando uma das maiores pensadoras de telenovelas no
Brasil, a professora Maria Aparecida Baccega, quem pensa que telenovela aliena está chamando o povo de débil
mental. Ela sempre foi extremamente educativa e de qualidade técnica altíssima. A telenovela está sempre um
passo a frente da sociedade. Ela vai além dos limites morais de grande parte da população. Vemos personagens
que representam atores-sociais de todos os estilos e todos os tipos.
5150
Todos nós, sem exceção, já usamos o Google hoje para alguma coisa. É mais que um mero site de
buscas. O Google é um universo de intenções humanas. E saber usar o Google é saber entender as intenções
humanas de compra. Um dos aspectos mais interessantes do Google é que ele pune, de certa forma, que não
sabe usá-lo de forma correta para alavancar negócios. Se eu tenho um e-Commerce de vinhos por exemplo e
decido comprar Adwords, a maiorias das pessoas geralmente vão nas palavras óbvias como: rótulo, rolha, vinho,
taça, safra, uva, etc. Já as pessoas que entendem as intenções humanas, comprariam palavras como : sedução,
romance, namoro, etc. E o Google cobra mais caro que escolha essas palavras mais previsíveis.
Mas a maioria das pessoas não clica nos resultados pagos (esses onde compramos palavras-chave).
A maioria das pessoas clica nos resultados orgânicos (aqueles não pagos), e as pessoas decidem o clique nas
primeiras páginas. Quer colocar teu site na primeira página do Google? O nome desse trabalho de otimizar sites
é SEO (do inglês, SEO search engine marketing, ou motor de buscas de marketing). O que o Google leva em
consideração em um site para deixá-lo numa boa colocação em suas buscas? Os critérios são vários. Até o tempo
de vida do site (sim, o Google gosta de sites velhinhos), até mesmo o quanto o seu endereço na URL é amigável,
além de outras variáveis como: conteúdo relevantes, quantos outros sites direcionam para o seu, usabilidade,
acessibilidade do site, entre outros vários aspectos.
O Google dá consultoria grátis para nós. Você possui um site que vende botas femininas e decide um
dia abrir lojas físicas. Vá no Google Analytics e verifique em que região do Brasil o termo “botas femininas” é mais
buscado. Quem acredita que seja São Paulo ou o Sul do país, errou feio. É no Mato Grosso onde “botas femini-
nas” é mais buscado. Imagino que a razão disso se deve a ser um Estado com um elevado número de fazendas.
Começarei a procurar pontos comerciais no Mato Grosso. Obrigado, Google.
Se eu tenho uma pousada na cidade de Itacaré, por exemplo, e o meu site aparece em primeiro lugar
no Google quando as pessoas buscam por “pousada Itacaré”, eu terei não só mais
hóspedes me ligando para reservar, como também irei gerar na cabeça de todos eles que a minha pou-
sada é a melhor de todas. Mas não necessariamente é. Minha pousada pode ser “mais uma” dentre as centenas
que existem no sul da Bahia. Mas a percepção deles é que a minha pousada é a melhor. Afinal, ela apareceu em
primeiro lugar no Google. Percepção é realidade.
O Google não é bobo. Anos atrás, comprou o YouTube e o colocou com o segundo maior site de buscas
do planeta. Vá no YouTube e digite “palestra redes sociais”. A primeiro resultado orgânico (não pago) é uma pa-
lestra desse cidadão que vos escreve. Qual a impressão que você terá de mim ao saber que minha palestra é a
primeira nessa busca do YouTube? Que eu sou o melhor do assunto! E eu não sou. Eu sou longe disso. Sou um
mero professor universitário. Mas percepção é realidade.
Qual a palavra mais buscada no Bing? Quem respondeu “Google”, acertou!
Santo Google
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O novo ecossistema digital faz com que criemos novos hábitos, novas maneiras de nos relacionar e novas
formas de habitarmos o mundo em que vivemos. Nesse sentido, usamos as redes sociais digitais para tentar cons-
truir narrativas envolventes por meio de jogos discursivos, e com isso, tentamos obter a validação de terceiros so-
bre os conteúdos (emocionais ou não) que construímos em rede. Aplicativos de geolocalização tem sido a grande
vedete desse novo, inquieto e hesitante universo online que habitamos hoje em dia. Por meio desses aplicativos,
como o Foursquare ou o Facebook, eu vou construindo essas narrativas e demarcando o território onde estou.
Afinal, o lugar onde vou comunica muito sobre quem sou, o que eu penso, como eu ajo, ou até mesmo como eu
quero que as pessoas me percebam no mundo.
O homem é um ser narcísico por natureza. Sempre foi. O ser humano adora um espelho. As pessoas
têm pré-disposição a um certo narcisismo no ambiente em rede. Fato. Evidencia-se que na maioria das vezes, as
pessoas dão check-in em lugares transados, descolados, bonitos, atraentes e que quero que as pessoas saibam
que eu estou ali. Check-in no aeroporto é legal, afinal as pessoas vão ter a percepção que sou viajado, ocupado,
entupido de milhas, um homem de negócios. Check-in na rodoviária, nem pensar! Afinal a troco de quê, eu vou
querer que meus amigos saibam que eu estou prestes a pegar um busão no, nada atraente, Terminal Rodoviário
da Barra Funda. Is not cool! Check-in no MoMa de Nova York, UAU! Demais! Além de descolado, antenado, o cara
aprecia e adoro artes, e está lá saboreando obras de Andy Warhol, Matisse, Monet e Marcel Duchamp. Agora,
dar Check-in no novo MAC (Museu de Arte Contemporânea de São Paulo) que recentemente inaugurou seu novo
endereço no belíssimo prédio que ocupava o Detran-SP, no complexo do Parque do Ibirapuera, e foi projetado por
Oscar Niemeyer, em sua época mais áurea (entre Pampulha e Brasília), melhor não, afinal, nunca foi nesse museu,
nem sabia que existia e não entendo nada daquelas malucas instalações de arte contemporânea. O local líder
de check-ins na cidade de São Paulo é o Parque do Ibirapuera, afinal é super maneiro fazer com que as pessoas
saibam que estou no maior parque da cidade fazendo exercícios físicos, malhando e desestressando um pouco.
Há quem não obedeça o status quo e dê check-in apenas em lugares não tão prestigiados assim, como
por exemplo no restaurante Ragazzo, no Habib’s, no Shopping Interlagos, no Largo 13 de Maio, nas Lojas Mari-
sa. Não apenas para compartilhar com a turma que está nesses locais, mas sim justamente para “tirar onda” da
ferramenta e agir contra a massa. Apenas 30% das pessoas compartilham seus check-ins no Facebook ou Twitter.
Os 70% dão o check-in e deixam ele apenas ao conhecimento dos amigos do Foursquare mesmo. O Facebook
logicamente está percebendo a força e o ganho de audiência exponencial do Foursquare e tem aperfeiçoado visi-
velmente a sua funcionalidade para check-ins.
Eu sou usuário assumido dessas ferramentas, pelo simples fato que estudo e pesquiso tudo isso, e
procuro enteder como essas coisas impactam as pessoas e como elas se relacionam entre si. Recentemente, eu
dei meu milésimo check-in no Foursquare, sim já cliquei no “Check-in Here!” mais de 1000 vezes. Ao dar meu
milésimo check-in, o Foursquare me mandou um email, agradecendo por tantos check-ins dados, e mandou um
código promocional, para que eu fosse no site deles e comprasse um camiseta exclusiva da rede social com um
desconto. Não pensei duas vezes, e foi lá para efetivar a compra. Comprei não somente e camiseta, mas também
um pacotinho de adesivos. Paguei cerca de 25 dolares em tudo. No entanto, o custo do Fedex para envio foi de
mais 30 dolares, e tive o azar de ter minha compra retida na Receita Federal, e fui taxado em mais 80 reais para
liberar meu produto na aduana. Bem feito! Nisso que dá ser viciado nessas coisas.
Diga-me onde dá check-in, e eu te
direi quem és
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Um presidente negro, com sobrenome muçulmano, que possui conta no Instagram, que matou Bin La-
den, que adora basquete e que apostou boa parte das fichas de sua campanha em mídias digitais. Esse é Barack
Hussein Obama, re-eleito o presidente da nação mais poderosa do planeta. A mensagem enviada pelo perfil @
BarackObama anunciando a vitória foi a mensagem mais retuitada de todos os tempos (veja a mensagem aqui:
http://bit.ly/Wy05fr). E a imagem que o partido democrata publicou no Facebook foi a mais curtida e compartilha-
da da história (veja aqui: http://on.fb.me/Rg2jdF). Isso mostra a potência midiática que Obama é. Paralelo isso, a
campanha do Mitt Romney também fez o que pode no mundo online para angariar votos, no entanto, ao longo do
percurso, alguns passos da campanha foram desastrosos. Como é que ninguém avisou ou como Mitt Romney não
sabe que hoje em dia todo mundo literalmente carrega um celular que filma e grava? Meses atrás, o republicano
ter sido filmado por um garçom cometendo uma gafe durante um discurso para empresários. Esse fato certamente
subtraiu votos de Romney.
Há 4 anos, Obama e o seu partido democrata adotaram em 2008 o discurso do Change (“Mudança”)
como mote da campanha. Na ocasião, o partido democrata utilizou-se do que havia de mais impactante no que
tange estratégias de comunicação de marketing político. Os eleitores foram informados via torpedo SMS que o
vice-presidente seria Joe Biden. Em videogames de basquete via-se placas publicitárias de Obama na quadra.
Ações de SEO em sites de busca (o chamado “Search Engine Optmization”) foi feito, comerciais de 30 segundos,
documentários, ações via mídias sociais como YouTube, Twitter, Aplicativos de iPhone, Facebook,e tudo mais
que uma ação convencional de marketing de uma marca de sabão em pó, por exemplo, faz para seduzir novos
consumidores, e nesse caso, eleitores. O resultado não poderia ser diferente. Obama virou o Mr. President e a
campanha de marketing que o elegeu ganhou Leão no Festival de Cannes, na categoria “Titanium” ou campanha
de marketing integrado, onde se utiliza o maior número de ferramentas do processo de comunicação de marketing
360 graus. Veja aqui o vídeo de 3 minutos que explica como foi a premiada campanha de 2008 (em inglês: http://
bit.ly/RFs0Wn).
Dessa vez, o mote era outro, se focaram no termo “Forward” (do inglês: adiante, avante, pra frente). O
desafio agora foi não somente aproveitar todos os méritos e aprendizados da aclamadíssima campanha de 2008
mas sim fazer bombar a corrida de 2012. As redes sociais agora estão ainda mais poderosas e disseminadas pelos
Estados Unidos, e o desafio foi utilizá-las a bel-prazer. O Twitter, em especial, foi muito bem utilizado pelo partido
democrata para mobilizar correligionários entre os 50 estados americanos. A quem possa interessar, siga @Bara-
ckObama e junte-se aos 22,6 milhões (até o presente momento que digito esse despretencioso texto) de seguido-
res. Assim como há 4 anos, na campanha atual tudo foi cirurgicamente calculado para a vitória de Obama. Foram
utilizadas logicamente mídias mais tradicionais para arrebanhar o eleitorado, como por exemplo rádios para chegar
às audiências do interior dos Estados Unidos. Obama fez uma inteligente divulgação junto a comunidade negra por
meio de emissoras de rádio dirigidas ao público de afro-americanos. Já Romney tentou uma variação desta ideia, e
fez algumas entrevistas em rádios de esportes, ele e sua esposa Ann. Não funcionou tão bem assim. A campanha
do republicano tentou apoiar-se em programas de rádio mais conservadores ou estações de notícias locais para
ajudar a espalhar a mensagem do candidato. Já Obama adotou um discurso eclético, falava desde cultura pop até
sobre a NBA, logicamente para se conectar com diferentes tipos de público. Obama foi o mais votado na Califórnia,
o estado mais rico dos Estados Unidos, e em outros como Nova York, Florida, Nevada e Massachusets. Já Romney
venceu em estados pouco representativos e coadjuvantes como Arizona, Texas, Tennesse, Missouri, Idaho, entre
Obama 3.0 venceu
Romney 1.0
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outros. No gelado Alaska deu Romney, e no quente Havaí, deu Obama na cabeça.
Os aplicativos mobile para Facebook das campanhas de Obama e Romney também foram decisivos nas
estratégias online de ambos os candidatos. Por meio dos aplicativos, foi possível absorver uma grande quantidade
de informações sobre os usuários. Como é feito em muitos aplicativos no Facebook, eles reuniram os “Likes” e
com isso postavam conteúdos personalizados para os eleitores conectados. O app de Obama começava com uma
solicitação criptografada do perfil do usuário, ou seja, se ele estiver usando uma conexão sem fio pública, qualquer
pessoa com acesso poderia ver como ele estava usando o aplicativo. Como qualquer aplicativo móvel, eles têm
pequenos pedaços de código embutidos para permitir o rastreamento do usuário. Tanto Obama, como os aplica-
tivos móveis de Romney, enviavam dados do usuário para uma variedade de empresas, para veicular anúncios e
analisar o comportamento do usuário. Esses dados nos evidenciam a potência desses dispositivos hoje em dia.
Boa sorte, Obama! Que sejam 4 anos blessed!
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No início desse ano de 2012 estive na Califórnia, e montei um SlideShare com imagens que produzi na
viagem sobre tendências de branding, marketing, varejo e consumo (aqui o link para você visualizar as fotos:
http://slidesha.re/z9749m). E nesse mês de novembro fui para Nova York, onde montei um novo material. Mais do
que nunca, a cada passo que dava pelas ruas de Manhattan, procurava entender a dinâmica daquela cidade como
um pesquisador, como um observador do consumo, tendências de branding, marketing, varejo e pessoas. É um
prato cheio para quem quer estar up-to-date o que acontece de melhor nessas áreas. Reflexos do furacão Sandy?
Não senti absolutamente nada. A cidade estava bela, linda, pulsante, intensa.
A Apple Store da quinta avenida continua muito visitada. Recentemente fez uma reforma na sua facha-
da: antes eram 90 placas de vidro cirurgicamente montadas, agora são apenas 15, mais clean, mais moderna e
arquitetonicamente mais bela. Continua aberta 24 horas por dia e 365 dias por ano. A novidade na cidade é a
recém-inaugurada loja da Apple Store na Grand Central Station, belíssima estação de trem do início do século pas-
sado. No final do mês de outubro, a Microsoft também inaugurou sua nova loja também para divulgar o Windows
8 e seu tablet, o Surface. Eu não gostei, não achei bonito, nem mesmo intuitivo. Testei durante alguns minutos.
Fui tentar digitar meu nome no super teclado imantado que funciona como capa. Não deu certo. Os vendedores
bancam ser amigáveis e não são nada espontâneos, são meio forçados, e passam uma falsa impressão de que
são descolados e geeks moderninhos. Pra mim, não conseguiram. Exatamente como a marca Microsoft tenta se
mostrar ultimamente, até por conta de sua releitura de logotipo que foi esse ano, após anos. Tenta passar uma
impressão de uma coisa que não é e, na minha percepção, tentando copiar descaradamente a proposta de valor
da Apple, eles ferem seu próprio DNA de marca.
Fui conhecer o Whole Foods Market. Trata-se de um mercado 100% orgânico (acesse o site deles e
inspire-se: http://www.wholefoodsmarket.com/). É o mercado onde Gisele Bundchen faz suas compras semanais.
Simplesmente maravilhoso. Nestlé, Unilever, Kraft Foods e Pepsico passam longe da lá. Iogurtes gregos orgâni-
cos são a sensação por lá. Inclusive em outros varejos que visitei, como a farmácia Duane Reade, só vi o tal do
iogurte grego que, pelo visto, virou febre por lá. Parece que os iogurtes convencionais estão sendo aos poucos
substituídos pelos saborosos gregos e que são mais light e gostoso do que as marcas brasileiras que encontramos
aqui, que são praticamente “danoninhos de adulto” e altamente gordurosos. A onda de vida saudável exala pela
cidade que nunca dorme, tudo é light, tudo é orgânico, anti-oxidante e com menos açúcar. Apesar do frio, muitas
pessoas praticando running pelas ruas.
Por fim, deixo aqui a marca que mais me impressionou. A nova flagship store da marca UNIQLO que
foi inaugurada recentemente no coração da quinta avenida. Anotem esse nome: UNIQULO. Vamos ouvir falar
muito dessa empresa nos próximos anos. Uma marca japonesa de moda casual, moderna e atual. O estilo é uma
mistura de GAP com H&M e com uma pitada de Zara. Em novembro de 1998, eles abriram sua primeira loja em
Tóquio, e depois foi se espalhando para as grandes cidades em todo o Japão. Em novembro de 2006, UNIQLO
abriu sua primeira flagship store no SoHo em Manhattan, Nova York. Novos estilistas se juntaram equipe da loja
para impulsionar o renascimento de conceitos de moda. Em outubro de 2011, Uniqlo abriu sua emblemática loja
na Fifth Avenue e depois na 34th Street, perto da Macy’s. Uma loja linda, ampla, moderna e hightec. Usam os
mais diversos pantones de cores para vender todas as peças de roupas. Tudo é meio pasteurizado, mas é lindo. O
posicionamento da marca é “Made for All” (ou “Feito para todos). Muito parecido com o feliz posicionamento que
Havaianas usa no Brasil (“Todo mundo usa”). A processo de venda e o portfolio de produtos é um tanto quanto
Nova York pulsa mais do
que nunca
60
homogeneizado, assim como outras grandes do varejo de moda, mas UNIQLO leva à risca a premissa do processo
de Branding de que tudo comunica a marca, a forma como os funcionários se vestem, como eles te abordam, a
apresentação dos produtos nas araras, a cor com que eles pintam os corrimãos das escadas rolantes, absoluta-
mente tudo comunica a marca.
Acesse o meu Slide Share e divirta-se! Fique absolutamente à vontade de usar essas imagens para
saber o que acontece na capital do mundo ou logicamente para utilizar em aulas, cursos, palestras, debates.
Conhecimento só vira conhecimento a partir do momento em que se compartilha (o link está aqui: http://slidesha.
re/10I47kL). Have fun!
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Nunca foi tão forte o rumor que a Disney, um dos maiores impérios do entretenimento no planeta,
estivesse em franca negociação para compra do parque Hopi Hari, na região de Vinhedo em São Paulo. Há pelo
menos 3 anos, o assunto já é discutido amplamente, e um possível acordo para a compra do parque estaria para
ser concretizado a qualquer momento. Para o Hopi Hari, que nos últimos anos sofreu sérias crises de imagem de
marca, seria um alento esse suposto processo de renascimento do parque pela marca Disney. E nada melhor do
que ser substituído por uma marca tão admirada como essa, e uma das mais valiosas do mundo, segundo o último
ranking da Millward Brown.
O conceito original do Hopi Hari é fantástico. Um parque temático, com uma marca bem montada, com
funcionários bem treinados, com um idioma próprio, brinquedos sensacionais e com outros vários detalhes fun-
damentais para construção consistente de uma marca. Perfeito! No entanto, após anos de operação, em fevereiro
de 2012, o Hopi Hari sofreu uma de suas piores crises de imagem de marca. A morte da adolescente Gabriela
Nichimura, após queda do ‘La Tour Eiffel’, fez com que o parque ficasse fechado por 22 dias. O Ministério Público
denunciou 12 pessoas por homicídio culposo. Logo após o acidente, o parque permaneceu aberto, demonstrando
total despreparo diante de uma situação gravíssima como aquela. A vítima foi atendida prontamente, mas infeliz-
mente faleceu em seguida antes de chegar ao hospital em Jundiaí. O que vimos foi uma fatalidade e que impactou
de forma contundente a marca Hopi Hari. Os números de visitação do parque sofreram quedas e outros parques
como o “Beto Carrero World” em Santa Catarina receberam excelentes índices de visitação. Isso é um movimento
meio natural das pessoas, assim como alguns turistas estão preferindo outras opções de roteiros românticos em
vez de cruzeiros marítimos pelos mares mediterrâneos, em virtude do emblemático acidente marcado pelo “Vada
a bordo, cazzo”, ouvido pelo comandante Francesco Schettino do navio de cruzeiro italiano.
Uma ação simples que o Hopi Hari poderia ter adotado após a morte da menina é a retirada do brin-
quedo “La Tour Eiffel” do parque. Sob a ótica de gestão de crise de marca, a permanência do enorme brinquedo
protagonista do acidente fatal, só reacende o fato todas as vezes que se passa de carro diante no parque na
Rodovia dos Bandeirantes em São Paulo. Mas no que tange ações digitais, ou o chamado SEO reverso, foi feito.
O SEO (sigla da Search Engine Marketing) é o trabalho que se faz em um site para que ele apareça nos primeiros
resultados da busca orgânica (não-paga) do Google. E o SEO reverso é o trabalho que se faz que um resultado
específico saia das primeiras páginas do Google. No dia de hoje por exemplo, quase 1 ano depois do acidente fatal
no parque, quando se digita o termo “Hopi Hari” o Google, o resultado com a notícia relatando o incidente já está
mais na primeira página do Google.
No dia 4 de julho do ano passado também, o Hopi Hari foi condenado pela Justiça do Trabalho de Jundiaí
a pagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil por submeter trabalhadores a revista íntima
e a revista de armários, bolsas e outros pertences. Em 2012 também o parque de diversões e a empresa GT Ultra-
lights foram condenados pela Justiça do Trabalho a indenizar em R$ 1,5 milhão o esquiador norte-americano Ryan
Mitchel Bergeron, por danos morais e materiais. O jovem, de 24 anos, perdeu o movimento das pernas ao bater a
cabeça e fraturar a coluna durante um show de esqui aquático promovido por grupo especializado, em 2008. Ou
seja, uma série de incidentes e que certamente trazem riscos de imagem gravíssimos a uma marca. E crises de
imagem de marcas são como manchas de óleo no oceano, algumas são mais graves, outras menos graves. Mas
o que vem acontecendo com a marca Hopi Hari nos últimos anos trata-se de uma mancha gigantesca. Incidentes
como esses deixarão uma cicatriz profunda e eterna na marca Hopi Hari e que, se não bem estancada, pode cau-
O Hopi Hari vai virar Disney?
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sar um sangramento fatal da marca. Só o tempo e a habilidade dos gestores da marca Hopi Hari nos darão um
diagnóstico. E nada melhor nesse momento nefrálgico do que uma das marcas mais amadas do planeta possivel-
mente aterrissar em Vinhedo para que todas essas manchas de óleo sejam instantaneamente limpadas do oceano.
Para os olhos da Disney, nada mal ter um parque no Brasil, hoje a sétima economia do mundo, e a exemplo do
que eles já fizeram levando filiais da Disney para a Europa e Japão. A Copa do Mundo do Mundo e as Olímpiadas
já estão a caminho do Brasil, nos resta assistir que camarote se Mickey Mouse pretende vir também. Tomara!
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A maior farsa de todos os tempos. Um falso atleta que enganou gerações de esportistas, a opinião públi-
ca e simplesmente a Nike, uma marca reconhecida e admirada mundialmente, e uma das mais valiosas do planeta.
Lance Armstrong foi um espetáculo midiático nos últimos anos com vendas de livros, roupas, pulseiras, é hoje o
protagonista de uma dos maiores caso de doping e de “unbranding” da história, se não o maior. A Nike enxergou
em Armstrong um casamento perfeito. Sob a ótica de branding, tudo conspirava a favor. Lance Armstrong possuía
claramente atributos como superação, alta performance, conquistas, vitórias, ou seja, tudo que se encaixava como
uma luva no DNA da Nike, que também vende todos esses atributos no seu processo de comunicação de marca. A
parceria foi feita e rendeu ganhos relevantes para ambas as partes. A pulseirinha amarela virou marca registrada
de Lance Armstrong e era vendida nas lojas Nike por 1 dólar. Milhões delas foram vendidas pelo mundo afora e
estampava simbolicamente o pulso de atletas, das mais diversas modalidade esportivas, que também queriam ser
identificados como um atleta que rompe barreiras, que é bom no que pratica, que não é mais um. O fato é que
todo encanto acabou nas últimas semanas. Desde o final do ano passado, por exemplo, nas lojas da Nike em Or-
lando já se nota as araras com peças da marca Livestrong com descontos agressivos e que, até então, não eram
feitos. Na própria Nike Town, a loja de 5 andares próxima à quinta avenida em Nova Iorque, a Livestrong tem um
belíssimo espaço exclusivo para venda de seus produtos. Nike e Lance Armstrong foi um case de branding muito
bem construído e que agora desmorona diante dos olhos de todo o mundo.
O uso de celebridades-ícones é uma prática muito habitual. A atriz Michele Pfifer com a marca Lux Luxo
nos anos 80, Cindy Crawford com a marca Rolex nos anos 90, e mais recentemente Gisele Bundchen associando
sua imagem a marca como Colcci e Pantene. Elas possuem uma aura mítica, bela e sedutora sempre desejável,
afinal a beleza pode ser um prenúncio da felicidade. Uma marca quando toma a decisão de se associar a uma
celebridade está claramente assumindo riscos em nome de um calculado ganho exponencial de lembrança de
marca e que, logicamente, se reverte em vendas. Mas por menos que possa parecer, o risco sempre existe. Outros
casos similares ainda estão na lembrança da opinião pública. Nos Estados Unidos temos casos parecidos de outros
atletas que se envolveram em escândalos como OJ Simpson, Magic Johnson e mais recemente, o golfista Tiger
Woods. Aqui no Brasil mesmo temos casos emblemáticos como Ronaldo Fenômeno. Quem poderia imaginar que
Ronaldo, até então um craque-ícone de superação, que sempre foi visto com belas mulheres e maior goleador da
história das Copas, fosse supostamente se envolver em prostituição homossexual? Ninguém. Pois é, mas isso infe-
lizmente aconteceu. E certamente quando esse episódio veio à tona, as diretorias de marketing de Nike e de Am-
bev reavaliaram com muito cuidado os seus respectivos e gordos contratos publicitários com o R9. O craque agiu
rápido, foi dar explicações para Patrícia Poeta no Fantástico, além de outras ações que contiveram rapidamente a
mancha de óleo no oceano. Ronaldo conseguiu passar uma borracha em tudo. Brasileiro esquece fácil das coisas.
A prova disso é que Ronaldo foi para o Corinthians e já sabemos o resto da história. Ronaldo é hoje adorado por
todos, acabou de ser estrela do quadro “Medida Certa” do Fantástico e hoje ele é um dos embaixadores da Copa
do Mundo no Brasil.
Só o tempo nos dirá como a Nike irá se comportar diante desse escândalo com Lance Armstrong e se isso
afetará negativamente a imagem da marca. Por maior que possa ser a gravidade do ocorrido, a marca Nike perma-
nece blindada. Fica o arranhão, fica um sangramento na marca que só o tempo nos dirá quando será entancado.
Nike tem um legado consistente, possui um símbolo com fortes alicerces de marca e está acima de tudo isso. Mas
certamente Nike pensará mais de cem vezes antes de associar novamente sua marca a celebróides do esporte.
Just don’t do it
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Reinaldo Gianechinni está hoje na campanha do Banco do Brasil e do site de empregos Catho. Neymar
foi utilizado em campanhas recentes de Lupo, Nextel, Baruel Claro, Panasonic, Guaraná Antarctica, Santander, Uni-
lever, Nike e Volkswagem Gol. O âncora do CQC Marcelo Tas está com You Move, Universidade Anhembi Morumbi
e agora com Kaiser Barril, diga-se de passagem, marca de categorias absolutamente distintas. O global Luciano
Huck está em Centrum e Banco Itaú. Ivete Sangalo foi garota-propaganda de 11 campanhas: L’Oréal, Avon, TAM,
Schincariol, Giraffas, Insinuante, Governo da Bahia, Credicard Hall, Conselho Nacional de Procuradores e Tramonti-
na. Rodrigo Faro estampa as campanhas da Oral B e das câmeras Cybershot da Sony. Já Gisele Bündchen estrelou
campanhas para C&A, ONU, P&G e Sky e, curiosamente, a modelo havia liderado a lista em 2011 das celebridades
mais vistas na publicidade.
Sim, todos eles atraem consumidores para essas marcas, e com isso enchem seus bolsos com cachês
advindos dos gordos orçamentos de marketing dos anunciantes. E ao observarmos esse vasto cardápio de marcas
e as suas celebridades escolhidas a dedo, percebemos que a maioria delas escolhem nomes que simplesmente es-
tão em evidência no momento. Sendo que deveriam sim escolher pela evidência logicamente, mas principalmente
também pelo nível de conexão que a celebridade dialoga com seu respectivo público-alvo, e mais que isso, o
quanto o DNA da marca está alinhado com o DNA da celebridade. Aliás essa última variável deveria ser o principal
critério de seleção de uma celebridade para protagonizar a campanha de uma marca.
A marca-ícone Loius Vuitton, que atua no segmento de moda há décadas, nunca tinha feito campanhas
em mídias mais tradicionais. Mas no início dos anos 2000 começou a fazer... escolheu, de forma cirúrgica pessoas
como Madonna, Francis Ford Coppola e sua filha Sophia Coppola, Bono, Maradona, Zidanne, Keith Richards, Pelé,
Sean Connery, Angelina Jolie e até mesmo o ex-líder soviétivo Mikhail Gorbachev. O que todos têm em comum?
Um perfeito alinhamento de DNA com a marca francesa. Todas são pessoas ícones no que fazem, e são raramente
vistas em campanhas publicitárias. A marca de cafés especial da Nestlé, a Nespresso, também faz um trabalho
impecável nesse sentido. George Clooney é a perfeita personificação da marca. Um homem meia idade, grisalho,
charmoso, discreto, examente valor que estão presentes no DNA da boutique de cafés espressos em cápsulas.
No entanto o que observamos, de forma mais latente aqui no Brasil, são marcas se associando a artistas simples-
mente pela suposta potencia midiática que ele carrega, e não pelo perfeito alinhamento da essência de ambas as
partes.
Associar marcas a celebridade é uma prática antiga. O uso de celebridades-ícones sempre foi muito
habitual. A atriz Michele Pfifer com a marca Lux Luxo nos anos 80, Cindy Crawford com a marca Rolex nos anos
90, e mais recentemente Gisele Bundchen associando sua imagem a marca como Colcci e Pantene. Elas possuem
uma aura mítica, bela e sedutora sempre desejável, afinal a beleza pode ser um prenúncio da felicidade. Uma
marca quando toma a decisão de se associar a uma celebridade está claramente assumindo riscos em nome de
um calculado ganho exponencial de lembrança de marca e que, logicamente, se reverte em vendas.
Construção de marca é longo prazo, é consistência, é paixão aos detalhes. E não simplesmente pegar
os celebróides do momento e usá-lo como endosso para a marca. E o mais surpreendente nessa história é que,
quando uma empresa escolhe uma celebridade simplesmente pela suposta exposição que ela tem de arrebanhar
consumidores e não pela sinergia das duas partes, percebemos que não há um processo consistente de branding.
Mais que isso, há um processo de desconstrução da marca. Marca que pensa em campanha, como a maiorias das
que citamos no inicio desse texto, e não pensam em construção de marca, na verdade constroem marca sim, mas
o líder de categoria, não para elas mesmas.
Marcas e Celebróides
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Twitter 7 anos: a maturação da Internet
Há 7 anos nascia o Twitter. O microblog que faz com que pessoas se conectem por meio de 140 carac-
teres. O Twitter é a maturação da rede mundial de computadores em seu estado mais pleno, pois faz com que
consigamos ser lidos e ouvidos por usuário que nunca imaginávamos ter contato um dia na vida. Por exemplo, eu,
um mero professor universitário brasileiro, já troquei tweets com Marc Gobé (@mgobe), o autor do “Emotional
Branding” um das maiores autoridades mundiais no assunto marca. Gobé foi quem criou as emblemáticas bolinhas
de gás no logo da Coca-Cola e foi também um dos responsáveis pela campanha Dove Real Beauty. Outro dia,
também conversei com Jennifer Aaker (@aaker), renomada autora de marca e filha de David Aaker, hoje professor
emérito da Universidade de Berkeley, e um dos primeiros autores no mundo a escrever sobre marca. Quando que
eu imaginei conversar e me conectar com esses grande pensadores? Nunca! Mas a potência midiática do Twitter
me proporciona isso hoje, e eu adoro.
A chamada era da informação é, na realidade, a era do excesso de informação. Nesse sentido, o Twitter
me cai como uma luva. Somos bombardeados hoje em dia com um volume de informação que nunca presencia-
mos, e simplesmente nosso cérebro não dá conta de absorver e decodificar tudo. Mas no Twitter, eu seleciono
(sigo) apenas aqueles perfis que fazem parte do meu interesse. E recebo o dia inteiro informações na minha time
simplesmente e exclusivamente daqueles perfis que fazem parte do meu interesse de conhecimento. E que são
diferentes dos interesses do fulano e do beltrano. Pra mim, disparado, esse é o grande diferencial do Twitter.
Mas nem tudo são flores. O Twitter fez nascer um grupo de perfis fake: pessoas que se fazem passar
por outras pessoa na tentativa de magnetizar pessoas e buscar um minuto de fama que elas nunca teriam se não
fosse dessa forma. E tudo isso, na grande maioria das vezes, à revelia das pessoas que elas personificam. Outro
comportamento condenável do Twitter são os chamados Trolls, ou seja, perfis de pessoas que gostam de criticar,
apedrejar e repudiar outros perfis (geralmente, celebridades) pelo simples prazer de ver a pessoa “sair do sério”.
Hoje, eu tenho cerca de 2.600 seguidores. Faço parte do edulcorado grupo de 1% de perfis que possuem
mais de mil seguidores. Essas pessoas de que me seguem diariamente e lêem minhas mensagens, minhas dicas
de livros, cursos, etc. Se de repente, de um dia pra noite, você não gostar mais das coisas que escrevo, simples-
mente deixe de me seguir. Esse é o grande barato do Twitter. Diferentemente da vida real, onde se desconectar
de uma pessoa pode se transformar numa tarefa não tão fácil, e que envolve às vezes até desgaste emocional. No
Twitter, isso é simples: baste aperta um botão chamado “unfollow” e pronto. Como um passe de mágina, aquela
pessoa, que talvez tenha deixado de ser relevante para vc, deixa de fazer parte de sua timeline.
Parabéns, Twitter! Que venham mais e mais anos de vida. Quer me seguir? Meu twitter é @MarcosHiller.
Mas fique sabendo não sei para onde estou indo. Obrigado.
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As chamadas redes sociais digitais fazem parte de uma nova revolução digital que impacta nossas re-
lações com as pessoas e com as marcas. Há pensadores contemporâneos que classificam essa cena digital que
vivemos hoje como uma verdadeira revolução. A exemplo do que foi a revolução do surgimento da escrita, a
revolução industrial, a revolução gutemberguiana da imprensa ou a revolução francesa séculos atrás, enxerga-se
esse fenômeno da web e seus desdobramentos digitais como uma verdadeira revolução.
Nesse sentido, essas novas plataformas digitais colocam o consumidor não mais como um mero recep-
tor do clássico processo de comunicação, mas sim como protagonista, cada vez mais cético, exigente e menos
leais às marcas. Há alguns anos, as ações do chamado processo de comunicação integrada de marketing eram
mensuradas apenas por meio de variáveis como: volume de vendas, ganhos de market share ou a pré-disposição
de um consumidor comprar o detergente A, B ou C. Agora novas métricas residem nas cabeças dos executivos de
marketing, dos consultores e dos profissionais de agências. Inéditos desafios são colocados nos briefings como
ambições de uma campanha de marketing: quantos “curtir” (ou “likes”) no Facebook essa ação busca gerar?
Quantos views no YouTube pretende-se conseguir? Ou então, quantos seguidores esperamos conquistar com essa
promoção no Twitter?
Mas será que o caminho é por aí? Na incessante busca de likes, views, followers e fans hoje em dia, as
marcas são capazes de tudo. De tudo! Por exemplo, uma das formas mais frequentes de se tentar magnetizar
usuários nas redes sociais, sobretudo aqui no Facebook, é publicar conteúdos aleatórios, engraçadinhos e com
alta capacidade de disseminação (e que na maioria das vezes não evidencia claramente nenhum elemento único
da marca, e sim da categoria), e escrevem algo do tipo: “quem gostou, curte; e quem curtiu, compartilha, blá,
blá, blá”. Marcas de cervejas têm feito muito isso: “Hoje é sexta-feira, que está feliz, curte aê”. E dessa forma, o
números de likes cresce, e é super legal contar isso pro chefe. Todos ficam felizes! Até mesmo o Mark Zuckerberg
(mesmo porque boa parte dessas publicação são pagas).
Mas o fato é que pega muito bem mostrar para o chefe que determinada ação no Facebook gerou
mais de mil dedinhos para cima curtindo aquilo. Ou então gerou mais de 500 seguidores ou 350 retweets. Mas
a pergunta é: “Esse comportamento on-line está sendo refletido em ações de marketing efetivas, que fazem o
consumidor ir ao supermercado, pegar o produto na gôndola e ir para o check-out? Não? Então, desculpe-me,
pois se nenhum ponteiro mexeu, o que acabou de acontecer é o desperdício do investimento de marketing. Em
alguns momentos, vejo marcas agindo até como verdadeiras mercenárias, oferecendo participação em sorteios
ou envio de brindes simbólicos como uma espécie de recompensa ao usuário que curtiu determinada coisa. Oras,
não é por aí que as coisas funcionam. A ação deve ser relevante, interessante e que produza conteúdo de verdade
para receber a recompensa de ser curtida automaticamente. Seja no universo on-line, seja no off-line. Acho que a
maioria das empresas não sabem, ou fingem que não sabem, que esse tipo de ação não constrói marca de forma
clara e consistente na mente do consumidor. Na verdade se constrói marca sim, mas para o líder de categoria. E os
gordos orçamentos de marketing dos anunciantes são incinerados despudoradamente. Outra estratégia adotada
de forma habitual por um número significativo de marcas é o uso de verbos conjugados no imperativo para arreba-
nhar fans, como por exemplo que marcas de bens de consumo fazem em suas embalagens, com o uso de “CURTA
BIS”, “SIGA TRIDENT”. Oras, Brand Managers, sejam mais relevantes nas redes sociais que eu, fatalmente, irei
curtir suas marcas. Não é necessário usar verbos no imperativo. Mesmo porque eu curto se eu quiser, tudo bem?
Devemos analisar as redes sociais como meras plataformas mercadológicas onde as marcas criam, nada
The FACEBOOK
Power
74
mais nada menos, do que mais um ponto de contato com seus consumidores e demais públicos de interesse. A
partir do momento que uma empresa decide criar um fanpage ou um perfil no Twitter ela precisa estar ciente e
preparada que está abrindo a guarda, pois ela acaba de deixar escancarada uma porta “digital”, ou seja, um porta
mais online, mais exposta e mais mensurável. Ela acaba de criar um “touch-point” tão importante quanto o seu
0800, tão importante quanto ao balcão de sua loja ou um anúncio publicitário, e até mesmo tão importante como
a forma que se relaciona com um fornecedor, afinal tudo comunica a marca. Quer expor sua marca nas redes so-
ciais? A receita de bolo é: prepare-se, planeje-se, crie um processo, atue de forma relevante e muito, mas muito
criteriosa. Contrate um nerd. Outra dica de outro é se capacitar. Na Trevisan Escola de Negócios, eu coordeno um
MBA em marketing, consumo e mídia on-line, e a minha inquietação desse artigo está presente de certa forma em
todos nossos debates que promovemos na sala de aula.
Enfim, quem concorda comigo, curte. Quem discorda, comente. E que não achou nada, compartilhe.
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Assistir a Lucia Santaella falando é um grande prazer. E pra mim foi um enorme prazer ouvi-la falar aqui
na noite de abertura do SIMC 2013 (Seminário de Interação Mediado por Computador) realizado na Fabico/UFRGS
(abril 2013).
Santaella ancorou sua fala sobre as construções intersubjetivas nas redes sociais digitais e, para ela,
rede sociais são o mais recente estouro do universo digital. Só tem besteira no facebook? Segundo ela, não! O
Facebook é um ambiente afetivo. A pessoa põe lá fotos do filhinho que acabou de nascer. O Facebook é um oce-
ano de afetos. O que as redes estão fazendo conosco? Segundo a autora, as redes sociais provocam um abalo
sísmico, sobretudo as transformações que estão sendo provocadas na educação. O que esta acontecendo com o
humano? Como se caracterizam essas formas de subjetivação na rede? Percebe-se uma multiplicação de “eus”nas
redes sociais. Cada usuário desenvolve uma maneira de uso e de apropriação das redes que lhe é próprio. Cada
um decide o que ver, consumir ou com quem quer conviver. Hábitos e usos funcionam como pistas das silhuetas
subjetivas de cada usuário.
As redes sociais encorajaram os jovens a mostrarem identidades discursivas. Desenvolvem uma compre-
ensão mais rica de seus papeis e os intercâmbios são mais ricos. A auto-representação fica evidentes das redes
sociais, permitem e encorajam o modo de como se dá a ver. Por exemplo, uma frequência cada vez maior de como
as pessoas mudam sua foto no perfil do Facebook. As relações nas redes sociais são efêmeras, evanescentes...
É uma maravilha saber o que o outro estar pensando, o que está fazendo... O eu é fruto de uma construção tão
imaginária, é tão social. No Facebook a gente tem ilusão que temos alguma autonomia. O narcisismo que vemos
no Facebook é absolutamente compreensível. As redes estão no ensinando uma realidade que ficava meio opaca
pra nós. O narcisismo nas redes é um fato relevante. As pessoas sempre foram narcísicas e encontram a possi-
bilidade expor esse narcisismo nas redes. Ele é colocado pra fora agora! Algo muito novo esta surgindo na redes
digitais. Somos todos agora performáticos! A identidade humana é múltipla por naturaza. Ficou mais difícil lidar
com a subjetividade agora do que antes . . . ela ficava enclausurada. Agora não!
A gente posta e o outro comenta, critica, elogia, refuta: temos que aprender a lidar com isso. Vivemos
em um mundo em que não mais tempo nem lugar para a nostalgia.
A proliferação das identidades múltiplas inauguram uma nova metodologia de pesquisa: não tem como
pesquisar as redes sem estar nelas. Não tem como observar de fora. Expulsa os falsos pesquisadores!
Viva, Lucia Santaella!
Lucia Santaella no SIMC 2013
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A cena digital faz surgir novos modos de ser e de apresentar nesse ecossistema que habitamos, e nos faz
refletir sobre certas performances identitárias que se fundamentam na retórica radical do fitness como qualidade
de vida e seu compartilhamento nas redes sociais digitais, mais precisamente no Instagram. Na era do espetáculo
e do culto ao corpo em que vivemos, gostaria de trazer para a nossa inquieta reflexão a atriz-social Gabriela Pu-
gliesi, dona do blog (http://www.tips4life.com.br) e que tem feito relativo sucesso por meio de seu perfil no aplica-
tivo de fotos Instagram. A blogueira está arrebanhando uma legião de seguidoras (sim, a maioria são mulheres,
logicamente) por conta de uma estratégia de fotos e textos baseada no oferecimento de um profícuo cardápio
que visa a aumentar a “qualidade de vida”. No momento que escrevo esse despretensioso texto, Gabi tem mais de
130 mil seguidores. Ela é uma dessas personagens que protagoniza hoje o fenômeno que entendo como “reality
show fitness”, pois se trata de uma cidadã comum que adquire status de celebridade de forma abrupta e meteórica
por meio de um processo de espetacularização de suas práticas cotidianas, principalmente àquelas associadas ao
condicionamento físico do corpo e ao discurso da qualidade de vida.
Especialmente no Brasil, é relativamente compreensível o sucesso do site da moça pois, de acordo com
as pesquisas da antropóloga Mirian Goldenberg, o corpo humano se apresenta como um verdadeiro capital físico,
simbólico, econômico e social. Nesse sentido, mesmo tendo à sua disposição um poderoso arsenal, fornecido
aparentemente de forma gratuita por marcas de roupas e alimentos funcionais, Pugliesi apresenta o tempo todo
técnicas e dicas de como cultuar os corpos humanos desencantados de suas potências simbólicas para além de
uma simples boa aparência. O consumo moderno define-se pela proeminência de atributos simbólicos dos pro-
dutos em detrimento de suas qualidades estritamente funcionais e pela manipulação desses atributos na compo-
sição de estilos de vida. Ao examinar boa partes de suas fotos e textos, percebe-se que a relações passam a ser
geridas por meio da lógica do custo-benefício e nesse regime de visibilidade hipertrofiada, proposto por uma série
de blogueiras, especialmente por Pugliesi, a boa forma física assume importância chave como capital simbólico
pessoal. A moça procura apresentar uma chamada moral da boa forma: aquela que não se envergonha e nem
se preocupa em ocultar a sensualidade, mas exige de todos os corpos que exibam contornos planos e relevos
bem sarados, como os da pele plástica de uma boneca Barbie, como diz Paula Sibilia, pesquisadoras da UFF. Nas
legendas das narcísicas fotos publicadas no Instagram evidencia-se nas entrelinhas um discurso norteado por um
feroz julgamento que aponta indiretamente para aquelas usuárias que sucumbem no esforço de se enquadrar sob
as coordenadas da boa forma. E tudo com uma retórica especializada em garantir as mais desvairadas certezas.
Inevitavelmente, cria-se nas suas seguidoras uma auto-intensa vigilância.
Com o uso do Instagram, percebe-se novas formas de se apresentar nessa cena midiática e com isso,
construir potências simbólicas de corpos, sobretudo por meio de uma prática de fitness hiperbólica, pois extrapola
o simples ato do condicionamento físico. Prega-se que a forma física idealizada = qualidade de vida = felicidade,
um verdadeiro misto de entretenimento e auto-ajuda. O fato é que o ecossistema digital que habitamos hoje é um
solo fértil. De lá, brotam ideias, inovações, insights e novos formas de se comunicar. A explosão das mídias digitais
provoca fenômenos que potencializam a bel-prazer as mais diversas estratégias de se apresentar na arena online.
Bom, deixa eu ir ali na padaria da esquina comer uma nega maluca e tomar uma coca-cola pra ver se
me ajuda a refletir ainda mais sobre essas novas apropriações sociais das redes digitais. Depois é só pular corda
durante umas 3 horas e fazer uns 2 mil abdominais que tá tudo certo.
O “reality show fitness” no Instagram
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Google Glass: um debate
tecnológico, mercadológico
e ético
O ecossistema comunicacional que habitamos é um solo fértil onde a cada dia surge uma miríade de
produtos tecnológicos desenvolvidos para atrair e magnetizar ávidos consumidores. A SAMSUNG que, há poucos
anos, era simplesmente mais uma marca de artigos eletroeletrônicos, fez um super evento para mostrar ao mer-
cado o sensacional Galaxy S IV. A Samsung agora é uma marca bem construída, bem posicionada e incomoda a
gigante Apple. Quem diria que isso poderia acontecer? Pois é, aconteceu. Assim como a outra coreana Hyundai,
que até outro dia era uma mera montadora condjuvante, hoje protagoniza a vanguarda de design e tecnologia
automotiva no Brasil, e incomoda o sono de executivos da Fiat, Ford e Volkswagem. Sinal dos tempos.
Consumir hoje em dia vai muito além de um mero processo de troca. Consumimos o tempo todo, desde
uma latinha de coca-cola, ou um plano de saúde, uma tele-novela ou um smartphone. E quando consumidos por
exemplo, o Galaxy S IV, estamos não apenas adquirindo um aparato tecnológico para se comunicar com amigos.
Quando compramos o novo celular da Samsung, estamos nos inscrevendo num imaginário de consumo que deno-
ta elementos de elegância, inovação e distinção econômica. Dentre as inúmeras novas características do produto,
o recém-lançado modelo de smartphone de marca coreana irá rastrear os olhos do usuário para determinar para
onde se deslocar. Por exemplo, quando o usuário começa a ler um texto na tela e seus olhos chegam ao fundo da
página, o software vai automaticamente rolar para baixo para revelar os próximos parágrafos do texto.
Além do novo brinquedo da Samsung que recém chegou no Brasil, na arena online que transitamos,
outro dispositivo que têm gerado uma enorme expectativa é o Google Glass. Não se trata apenas de um mero
novo gadget, pois assim como o iPhone e iPad revolucionaram as suas respectivas categorias, o Google Glass é
realmente algo rompedor e diferente. Primeiro que o novo produto da Google será usado no nosso rosto. Ele é
composto de uma parte que se conecta aos ouvidos e outra ao longo da linha da sobrancelha. Nada mais é que
um computador razoavelmente completo, ou talvez um smartphone que você nunca tenha que tirar do seu bolso.
Uma série de pessoas ao redor do mundo estão eufóricas com o seu lançamento, desde quando Nick
Bilton escreveu um texto sobre os óculos em fevereiro no The New York Times. Algumas pessoas, selecionadas
a dedo, estão tendo a chance de experimentar um par. O Google Glass é um projeto absolutamente impressio-
nante de miniaturização e integração. Dentro do fone de ouvido direito, isto é, o suporte horizontal que passa
sobre a orelha, tem embalado uma memória, um processador ultra veloz, uma câmera, alto-falante e microfone,
Bluetooth e antenas Wi-Fi, acelerômetro, giroscópio, bússola e uma bateria. Tudo dentro do fone de ouvido. O
maior triunfo é que a tela pequena é completamente invisível quando você está falando ou dirigindo ou lendo. O
usuário simplesmente esquece da tela. Pode-se controlar o software passando um dedo em diferentes direções, é
um touchpad. Seus toques podem guiá-lo por meio de um menu simples e intuitivo. Em diversas apresentações,
o Google propôs ícones para funcionalidades como tirar uma foto, gravar um vídeo, fazendo uma chamada de
telefone, navegar no Google Maps, verificar o calendário e assim por diante.
O advento do Google Glass já insinua até mesmo algumas discussões da ordem ética. Dizem que já es-
tão desenvolvendo aplicativos para Google Glass que simplesmente eliminam de nossa visão os mendigos da rua.
Além de outras questões de privacidade, ou seja, você pode estar conversando com uma pessoa que está usando
os óculos e ela estar lhe fotografando sem que você perceba, e compartilhando sua imagem no Google Plus. O fato
é que ainda é muito precoce tentar prever como as pessoas irão se apropriar dessa novidade e seria uma leviana
tentativa minha de futurologia prever o sucesso ou o fracasso do Google Glass. Mas é absolutamente possível que
ele carregue um potencial que nenhuma outra máquina já teve antes. E viva o consumo simbólico!
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Não existe almoço grátis
(muito menos likes)!
Quando nosso amigo Mark Zuckerberg criou o Facebook em um simples dormitório de Harvard, ele não
criou um site para conectar as pessoas. Cá entre nós, ele criou uma mídia. Uma potente mídia que hoje atinge
mais de 1 bilhão de usuários e onde as marcas, por exemplo, se apropriam desse espaço comunicacional para
tentar construir histórias relevantes e com isso seduzir e arrebanhar consumidores. Ou seja, criam uma fanpage,
investem em design, desenvolvem um planejamento de conteúdo, e com isso, criam mais um “touch point” de
conexão com os seus mais diversos públicos. Mas de novo, o que Zuckerberg criou ali foi uma mídia à serviço
de agências de publicidade e de anunciantes com gordos orçamentos de marketing para atingir suas respectivas
metas de vendas, engajamento, reputação, envolvimento, likes ou como queira chamar.
E quando se cria a uma mídia, ainda mais no ecossistema digital que habitamos, é preciso que se pense
na forma de como ganhar enormes volumes dinheiro com aquilo. E no final do ano passado, o Facebook arquitetou
uma manobra e que gerou críticas por todo o mundo. Ele virou uma chave e, de uma hora para outra, apenas uma
pequena fração de usuários passou a enxergar os posts que uma marca publicava em sua fanpage. Há quem diga
que míseros 16% de nossos “curtidores” vêem o que nossa marca publica. Quer que mais usuários (ou “likers”)
visualizem uma publicação de uma promoção, ou foto ou frase do dia? É muito simples? Pague! Vou usar uma
analogia terrível aqui nesse texto, mas é exatamente assim que enxergo essa polêmica manobra do judeu neo-li-
beral Zuckerberg. Ele fez o papel de um traficante que tenta viciar seus usuários com um baseadinho grátis, e vai
viciando e vai oferecendo drogas mais leves de forma gratuita. Depois que o usuário está devidamente viciado, o
traficante aparece com drogas mais potentes, mais atraentes, que dão mais barato, e não cobra pouco por isso.
E guardada as proporções dessa triste analogia que fiz, foi exatamente assim que muitas marcas se sentiram.
Começam a pagar e a investir alto para poder conversar com um número cada vez maior de fãs.
Nesse sentido, as marcas começaram a se questionar: por que colocar uma grande quantidade de
energia para a construção de uma presença online consistente e sedutora no Facebook, se isso não atinge 100%
de nossos fãs? E as taxas cobradas pelo Facebook não são baratas. O que nos conforta é que vivemos num ca-
pitalismo livre. Isso não é extorsão de dinheiro, é apenas capitalismo. Um capitalismo feroz, mas é assim que a
banda toca hoje. Não existe almoço grátis. Eles estão certos e escorados em uma simples lógica de livre mercado.
Do ponto de vista de um CEO ou de um Diretor de Marketing de uma grande empresa, esse é um grande dilema.
Investir? Quanto investir? Como mensurar? Dezenas de questionamentos como esses são feitos nas mesas de
reuniões nesse exato instante que você lê esse meu despretensioso texto.
O curioso dessa história é que não foram apenas as chamadas “páginas de fãs” que sofreram com essa
mudança, pois começamos a perceber que as nossas publicações em páginas de perfis (de usuários individuais do
Facebook, gente como a gente) também não estavam sendo vistas por 100% de nossos amigos. Sim, isso mes-
mo, eu, como o meu perfil pessoal, posso pagar e também promover meus posts. Basta dar o número de cartão
de crédito que os likes se multiplicam. Vemos aqui uma intenção clara do Facebook em induzir que as pessoas se
enxerguem como marcas. E ao analisarmos o comportamento online de marcas nessas plataformas, percebemos
que algumas delas também se humanizar, se personificar, justamente para ir atrás do tão almejado polegar pra
cima de seu consumidor-fã. O marca Ponto Frio é um clássico exemplo nesse sentido que, criou um pinguim para
tentar humanizar a marca. Com uma certa dose de bom humor, a marca tenta se aproximar cada vez mais com
seus usuários. A estratégia é ousada. O problema é que esse tom de comunicação da marca Ponto Frio nas redes
sociais destoa completamente dos demais pontos de contato da marca, como por exemplo o 0800, a propaganda,
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a postura de um vendedor da loja, etc. Dessa forma, a marca não somente não constrói marca, mas constrói sim,
para o líder de categoria. As marcas tentando se humanizar e as pessoas tentando se transformar em marca.
Pessoalmente, como um blogueiro (blogdohiller.blogspot.com), eu jogo o jogo e dou dinheiro para o
Facebook no sentido de promover os meus textos, cursos, debates sobre branding e demais projetos que tento
promovo. Vejo como um acordo de reciprocidade nos dois sentidos, porque eu divulgo a minha marca (meu blog)
no Facebook e ele reforça a percepção da marca Facebook por meio de widgets de destaque em meu blog. Mesmo
assim, estou quebrando a cabeça e tentando achar outras maneiras de direcionar o tráfego para o meu blog. En-
quanto isso, vou utilizando meu Twitter (twitter.com/MarcosHiller) que ainda não virou essa chave (se virou, ainda
não percebi) e o Google+, que come pelas beiradas. Com essa forma feroz de ganhar dinheiro, Mark Zuckerberg
está matando as presença online de nossas marcas? É uma boa pergunta.
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Tinder: você ainda vai baixar esse
aplicativo!
Como um palco das mais diversas manifestações midiáticas contemporâneas, o mundo digital tem se
apresentado como um ambiente tecnológico que abarca múltiplas facetas de uso e significados culturais. E em
meio a uma potente repercussão de conteúdos e de holofotes apontados às supostas celebridades que surgem
a cada dia nesses espaços comunicacionais, a Internet é, sobretudo, um ambiente aberto para o nascimento de
novos atores e novas plataformas, especialmente por conta do advento de tecnologias móveis que nos concede
a possibilidade de estar “always on”. Fenômenos como esses nos comprovam que essa mobilidade virtual não
apenas se potencializou e se diversificou com o advento da internet e mídias móveis, como também adquiriram
novos significados e fez surgir novas habilidades humanas para fazer uma entidade abstrata fluir eletronicamente.
Na cena digital vigente, o aplicativo Tinder ganha uma relevância que nos inquieta aqui nessa reflexão.
O conceito do aplicativo faz com quem pessoas se comuniquem e se conheçam por meio de imagens. O Tinder é
fundamentalmente uma rede social digital móvel concebida em torno da fotografia e da geolocalização. Os usuá-
rios publicam até 5 fotos de si mesmo no seu respectivo perfil e, a partir daí, elas ficam disponíveis para demais
usuários do aplicativo. Você brifa por meio de características demográficas qual o seu desejo: conhecer homens
ou mulheres? De qual idade? E em que raio de distância? Feito isso, surgem na tela do nosso smartphone uma
espécie de “cardápio” com fotos de outros usuários. É possível visualizar as fotos da pessoa, a distância que ela
está de você, além dos amigos e interesses em comum que ele busca no nosso Facebook (com a nossa autorização
prévia, logicamente). Feito isso, vai aparecendo em sua tela uma imensidão de rostos em que você vai clicando
em LIKE ou DON’T LIKE. Caso você curta determinada pessoa, e ela também curta você, pronto! O Tinder dá a
opção de que se abra um chat entre os dois usuários. E a partir daí tudo pode acontecer. Mais que isso, vemos que
essas ferramentas tornam possíveis uma comunicação em tempo real, criando um sentimento de simultaneidade
e de imediatismo que transcende as barreiras de tempo e espaço.
Nota-se como essa nova dinâmica midiática acelera as mudanças ocasionadas pela mobilidade virtual
e uma enorme influência das tecnologias móveis na vida cotidiana. O Tinder, uma criação concebida puramente
para o universo mobile, nos evidencia que a mobilidade virtual não apenas se potencializou e se diversificou, com
também adquiriu novos significados a partir do momento em que se vê a habilidade humana para fazer uma en-
tidade abstrata, a informação, fluir eletronicamente. Nas entrelinhas das (quase sempre) narcísicas e insinuantes
fotos publicadas no Tinder, evidencia-se uma retórica norteada por um sentimento de “estou à disposição” ou até
mesmo uma suposta busca de um “amor a lá carte”. O sucesso desse tipo de iniciativa pode ser compreendido
dentro do contexto cultural brasileiro, onde o corpo humano se apresenta como um verdadeiro capital físico,
simbólico, econômico e social. A partir da argumentação de autora israelense Eva Illouz, que escreveu em 2007 o
livro “Amor em Tempos de Capitalismo”, pode-se claramente compreender a recente valorização desta perspectiva
como sintoma de uma cultura que elege rituais para evitar a solidão a qualquer custo. Dessa forma, diversas es-
tratégias de comportamento se tornam passíveis de monetização, instrumentalização e promoção pessoal, entre
eles a empatia, a pré-disposição e o bem-querer implícitos às nossas amizades e namoros.
Norteada por uma lógica de otimizar, nossa sociedade passa a se perguntar como a intimidade, a ami-
zade e o amor podem ser socialmente distribuídas e alocadas em prol de benefícios fundamentalmente tangíveis.
Afinal, estarmos com alguém pode nos benquistos e fomenta a ampliação de nossas redes sociais, e consequen-
temente, dos recursos que podemos acessar a partir delas. Mais que isso, o Tinder nos evidencia que a comu-
nicação interpessoal e as relações passam a ser geridas por meio da lógica do custo-benefício. Afinal, vivemos
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na época do capitalismo afetivo, no qual os cálculos de custo-benefício norteados pelos discursos clássicos de
marketing e branding passam a vigorar também no âmbito pessoal. E nesse regime de visibilidade hipertrofiada,
a boa forma física assume importância chave como capital simbólico pessoal. A vinculação dos bens culturais e
midiáticos às identidades no Tinder é muito comum. Em boa parte das fotos, nota-se fotos dos usuários em em
cenas de viagens para o exterior, ou estampando marcas de moda. Esse processo endossa o entendimento das
práticas de consumo na contemporaneidade como práticas de construção identitárias cotidianas, que se dão tanto
no âmbito material quanto simbolicamente. Nesse sentido, vale lembrar que o consumo moderno define-se pela
proeminência de atributos simbólicos dos produtos em detrimento de suas qualidades estritamente funcionais e
pela manipulação desses atributos na composição de estilos de vida. O Tinder nos mostra que estamos inseri-
dos em um universo do hiperconsumo que traz uma multidão de benefícios, bem estar material, melhor saúde,
informação e comunicação, e isso contribui para tornar possível uma maior autonomia dos indivíduos em suas
ações cotidianas. Afinal, as atividades mais elementares da vida cotidiana tornam-se problemas e causadoras de
interrogações perpétuas, como os romances e nossos relacionamentos. Paralelo a essas constatações, deve-se
atentar aqui que ao criar um perfil em um site de rede social digital, sobretudo em sites que privilegiam elementos
imagéticos, como o Tinder, as pessoas passam a responder a atuar como se esse perfil fosse uma extensão sua,
uma presença daquilo que constitui sua identidade. Esses perfis passam a ser como estandartes que representam
as pessoas que os mantêm.
A busca do indivíduo de destacar-se no ciberespaço como uma prerrogativa de auto-afirmação diante
dos outros é uma apropriação, na web, de características culturais já atrelada ao capitalismo afetivo e a uma so-
ciedade hipermoderna cada vez mais urgente. Nota-se relações sociais cada vez mais complexas, baseadas em
uma competição por ser mais notado, mais seguido e principalmente de conquistar uma tão almejada visibilidade,
reputação ou até mesmo uma alma-gêmea (ou um “match”, como sugere o Tinder). Em rede, cada usuário desen-
volve uma maneira de uso e de apropriação das redes que lhe é próprio. Cada um decide o que ver, consumir ou
com quem quer conviver. Hábitos e usos funcionam como pistas das silhuetas subjetivas de cada usuário. Nesse
sentido, percebe-se novas formas de se apresentar na cena midiática e construir potências simbólicas de corpos.
As redes sociais digitais, sobretudo o Tinder, encorajaram as pessoas a mostrarem identidades discursivas. E com
isso desenvolve-se uma compreensão mais rica de seus papéis nesse ecossistema digital difuso, inquieto e com-
plexo. Baixe o aplicativo e boa sorte!
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Quer entender o consumo? Estude a
cultura!
Só no Brasil fogão tem tampa. No sul do Brasil, uma parcela da população come pizza com maionese. No
Rio de Janeiro se tem o hábito de colocar catchup na pizza. Peça catchup numa pizzaria tradicional da cidade de
São Paulo para você ver a olhada de repressão que o garçom te dará. Em algumas regiões do Nordeste se têm o
costume de comer catchup no meio do feijão com arroz. Só no Brasil, alguns carros modelo SUV, como a EcoSport
por exemplo, possuem aquele pneu do step afixado na traseira do veículo à mostra para os demais motoristas da
rua verem e, geralmente, envolvidos com capas estilizadas ou até personalizadas. Só no Brasil máquina de lavar
tem a abertura na parte superior e, geralmente com tampa de vidro, para a dona de casa brasileira poder ver a
roupa revirando pra lá e pra cá e limpando e lavando. Há quem diga que uma parcela de pessoas que usam den-
tadura no estado de Sergipe tem o costume de colocar aparelho dentário na dentadura, justamente para que o
fato de possuir aparelho tente negar a existência de uma prótese dentária. No Brasil a cor do luto é o preto e no
Japão a cor do luto é o branco (vi isso outro dia numa cena de funeral em um dos filmes do Bruce Lee).
Todos esses fatos, por mais esquisitos e, até mesmo pitorescos que possam parecer, se dão fortemente
por conta de um elemento chamado: cultura. Estudar marketing, comunicação, branding e práticas do consumo
em geral, nos requer cada vez mais na contemporaneidade que compreendamos a cultura do consumidor. E o
que é a cultura? Nada mais é do que esse acervo de conhecimentos que modela e modula boa parte das relações
entre as pessoas. Cultura é aquele elemento central formado por uma mistura de questões sociais, econômicas,
políticas de um determinado grupo. E na cultura onde encontramos as respostas mais profundas para desafios e
dilemas do processo de marketing hoje em dia. Ferramentas mercadológicas, teoremas de Paretto, cinco forças
de Porter, teorias de estratégia competitiva, os exaustivos quatro “pês” de marketing, entre outros modelos são
fundamentais para entender os processos de marketing e consumo em dia? Acho que sim. Mas quer compreender
um pouco mais a fundo as verdadeiras motivações, desejos e comportamentos das pessoas? Vá estudar a cultura.
Tire o snorkell e coloque o tudo de oxigênio. E nada melhor do que se ancorar em outras áreas do conhecimento.
Vamos com outro exemplo! Recentemente um amigo que trabalha na área de pesquisa de mercado da
Kibon/Unilever me disse que fizeram algumas seções de pesquisa, por meio da técnica de grupo focal (ou focus
group, como habitualmente se fala no mercado), com grupos de crianças para se detectar novas cores de picolé
que a Kibon deveria lançar no Brasil. E após as discussões com a criançada, quais foram as cores preferidas? Rosa?
Laranja? Vermelho? Verde? Amarelo? Azul? Quem respondeu alguma dessas, errou. A cor favorita da molecada
foi o preto. Sim, um picolé de cor preta. Absolutamente imprevisível e inusitado. E se lançarmos um picolé preto
seria um tremendo sucesso? Eu não apostaria nisso. E justamente por isso que esse negócio chamado pesquisa
é tão fascinante. Mas por que o preto? Confesso que não sei a razão exata. Precisaria se aprofundar um pouco
mais para encontrar respostas críveis. Mas acredito que a razão do porquê o preto foi a cor vencedora não esteja
no marketing, mas sim na antropologia, na sociologia, na psicologia, na semiótica. No chamado Neuromarketing
talvez? Eu acho que também não. Aliás, não quero soar como uma percepção leviana, mas eu acho que misturar
Marketing com Medicina é forçar um pouco a barra. Pra mim, mergulhar nas ciências sociais e ler autores como
Nestor Garcia Canclini, Jesus Martín Barbero, Gilles Lipovetsky, Gisela Castro, Rose de Melo Rocha e Maria Apa-
recida Baccega tem me dado respostas bastante lúcidas para todos esses dilemas e complexidades das relações
entre pessoas e marcas. Aliás, estudar mais a fundo do porquê o preto foi a cor favorita das crianças na pesquisa,
talvez nos traga evidências porque a meninas piram hoje em dia nessas bonecas vestidas de vampiras e monstros.
Isso particularmente me inquieta.
92
Muito de minha visão nesse despretensioso texto é fruto de um curso de mestrado que estou para con-
cluir hoje na ESPM/SP na área de comunicação e práticas do consumo. Estudamos o consumo não como consu-
mismo, não como uma mera relação de troca entre bens e valores monetários. Discutimos o consumo não à luz de
teorias clássicas de comportamento do consumidor, como a de Abraham Maslow e tantos outros. Pensamos o con-
sumo como uma apropriação social, sinérgica e simbólica. Consumir hoje em dia é estar na sociedade. Consumir
é se inscrever em algo. Consumimos o tempo todo, desde um maço de cigarros que compramos na esquina, até
mesmo uma lata de Coca-Cola que seguramos na mão ou até mesmo uma telenovela que assistimos. Consumimos
sempre. Negar o consumo é negar que vivemos em sociedade.
Ah, por que diabos só no Brasil fogão tem tampa? Oras, por conta de uma questão cultural. Mais que
isso: para a dona de casa brasileira, e só para a brasileira, por mais que a cozinha não esteja com aquele brilho
impecável, o ato sígnico de se abaixar uma tampa de fogão significa: “Pronto! Missão cumprida! Posso curtir minha
novela e meu maridão”.
9594
O protagonismo das manifestações está no social, e não no
Facebook.
Ao se analisar o que está acontecendo hoje no Brasil, devemos ter um cuidado extremo para não cair em
análises simplistas das manifestações e de todas essas movimentações sociais que assistimos diante de nossas jane-
las, televisores e telas de smartphones. Muitas das coisas que ando lendo colocam, por exemplo, o Facebook como
um fator fundamental e protagonista do que estamos presenciando. Eu não parto dessa lógica. Colocar o Facebook
como ferramenta principal de tudo isso que estamos vendo é, para mim, um argumento míope, raso e inconsistente.
O próprio uso do termo revolução, que aparece em textos, comentários e opiniões nas mídias e sobretu-
do nas nossas timelines, deve ser repensado. Será que estamos diante de uma revolução? Acho que não e ainda
é muito cedo para concluir isso. Compreender essas interações mediadas pelas tecnologias digitais tem sido para
mim uma questão central para a reflexão da sociedade contemporânea na medida em que se evidenciam trans-
formações de ordem social, cultural, política e econômica. Olhando no retrovisor da história, tivemos sim uma
revolução da escrita no oriente médio no século V, ou então a revolução da imprensa de Johannes Gutemberg
no século XV e até mesmo a tão estudada revolução industrial no século retrasado. Revolução significa ruptura.
Significa que antes era de uma forma, e depois ficou de outra forma. Na própria revolução industrial, coloca equi-
vocadamente a máquina como o protagonista desse acontecimento. O protagonismo está assim na apropriação
social das pessoas sobre o surgimento da máquina, e não na máquina. É o mesmo que colocar, equivocadamente,
o microblog Twitter como protagonista do que vimos acontecer na chamada Primavera Árabe. A queda de gover-
nos no Oriente Médio foi causada pelas pessoas e pela apropriação social das pessoas sobre essas redes sociais
digitais. Sempre no social.
Vive-se hoje uma nova revolução? Uma revolução, ainda em curso, implementada pelas tecnologias digi-
tais e ocasionando importantes transformações no interior dos distintos aspectos da sociedade? Há quem acredite
que sim, que há uma revolução. Eu não partilho dessa opinião. Podemos ver sim contundentes transformações em
todos os campos sociais, econômicos, políticos e culturais. Diferentemente de outras manifestações similares no
Brasil e no mundo, dessa vez, vemos produtos culturais sendo apropriados pelas pessoas (sempre pelas pessoas)
como, por exemplo, a música da banda O Rappa (“Vem pra rua”), utilizada em um filme publicitário da montadora
FIAT e com o mote da Copa do Mundo, mas que já virou uma espécie de hino desses levantes. Ou então a máscara
branca do grupo “Anonymous”, sendo utilizada como símbolo central e mascarando e ocultando rostos de muitas
pessoas. Sem falar dos cartazes com frases de protesto e algumas dizeres bem humorados.
Neste texto, eu coloco a minha reflexão sobre o que estamos vendo, e opto pela não-adoção do termo
revolução para classificar essas transformações que evidenciamos. Os argumentos de algumas pessoas carregam
um tom radicalmente revolucionário, fazendo crer que tudo aquilo que antes era passado, passa a ser agora de
forma diferente, antagonizando e contradizendo o que passou. Se não existisse Facebook, estaria acontecendo
toda essa mobilização social nas ruas? Certamente sim. Não é uma página de web, na verdade uma grande mídia
originada em um dormitório de Harvard, que deve ser colocada no centro dessas transformações sociais, políticas
e econômicas que podem estar por vir. Tudo bem que o Facebook e outras plataformas podem contribuir de forma
interessante no sentido de articular encontros e mobilizar pessoas. Mas o ator principal dessa história toda ainda
são e sempre serão as pessoas, o povo, o social. Oras, nem metade do Brasil possui acesso à Internet e cerca de
um terço do país acessa o Facebook, sendo que desses, cerca de 30 milhões acessam o site de Mark Zuckerberg
na palma na mão. O fato é que ainda é muito cedo para prever no que resultará toda essa mobilização. O preço
das passagens já voltaram ao valor anterior. Mas o que realmente está por vir, eu não me arrisco a prever nada.
9796
A nova conjugação verbal das
redes sociais
Eu tuíto. Tu curtes. Ele compartilha. Nós respondemos. Vós comentais. Eles se expõem.
Eu publico. Tu retuítas. Ele cutuca. Nós curtimos. Vós favoritam. Eles compartilham.
Eu escrevo. Tu comentas. Ele curte. Nós lemos. Vós retuítas. Eles cutucam.
Eu me logo. Tu deslogas. Ele finge que trabalha. Nós compartilhamos. Vós retuitais. Eles se deslogam.
Eu leio. Tu postas. Ele favorita. Nós cutucamos. Vós comentais. Eles trolam.
Eu cutuco. Tu cutucas de volta. Ele uploada. Nós trolamos. Vós logais. Eles curtem.
Eu postava. Tu não curtias. Ele fingia que lê. Nós lemos. Vós trolais. Eles favoritam.
Eu filmo. Tu publicas. Ele comenta. Nós assistimos. Vós tuitais. Eles não assistem.
Eu dou check-in. Tu não percebes. Ele curte. Nós não lemos. Vós cutucais. Eles dormem.
Eu me vicio. Tu também. Ele se desloga. Nós nos intoxicamos. Vós publicais. Eles não lêem mais.
Eu trolo. Tu trolas. Ele trola. Nós trolamos. Vós trolais. Eles trolam.
Eu posto. Ninguém curte. Eu choro.
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A seguir, alguns artigos acadêmicos
que publiquei no ano de
2012 e 2013
101100
ResumoO objeto de estudo aqui proposto é a cidade de Nova Iorque (Estados Unidos) e mais precisamente
a representação da marca de moda japonesa Uniqlo. O conceito do espetáculo do pensador fran-
cês Guy Debord nesse artigo serve de alicerce para refletir sobre como o universo midiático que o
homem moderno está inserido.
Palavras-chaveconsumo, Nova Iorque, Uniqlo
COMUNICAÇÃO, CONSUMO E ESPETÁCULO:um olhar debordiano para a Nova Iorque de 2012
“Antes tudo era vivido, e agora se esvai na representação”
Guy Debord, 1967
Primeiras reflexões
Entender as lógicas do consumo na contemporaneidade requer
uma compreensão de fatos históricos emblemáticos e que, fundamen-
talmente, serviram de alicerce para moldar o universo midiático que o
homem moderno está inserido hoje. E entre os vários pensadores que
dedicaram seus estudos no entendimento dessa lógica, destaca-se aqui
nesse estudo o francês Guy Debord que, por meio de um recorte crítico,
efetuou uma lúcida leitura da modernidade. Guy Ernest Debord (Paris, 28
de dezembro de 1931 - 30 de novembro de 1994) foi um dos pensadores
da Internacional Situacionista e da Internacional Letrista, e seus textos
foram a base das manifestações do chamado Maio de 68. Debord analisou
acintosamente essa etapa econômica-cultural norteada pela luta de classes e pelo surgimento de novos modos
de ser do homem social. Por meio de sua aclamada obra “A Sociedade do Espetáculo” (e que depois viraria um
documentário cinematográfico), o pensador francês imprime um olhar acerca do chamado “espetáculo”, conceito
cunhado por ele mesmo e que serve de inspiração acadêmica para inúmeros pesquisadores por todo o mundo.
Para Guy Debord, o espetáculo não é um mero conjunto de imagens para sim uma relação entre pes-
soas, mediatizada por imagens. É o modelo presente da vida socialmente dominante e a justificativa total das
condições e dos fins do sistema existente (DEBORD, 1997). O pensador francês se apropria do conceito de espe-
táculo para batizar aquele novo momento, de incertezas, de novidades e do surgimento do consumo. O espetáculo
é visto por Debord como a afirmação da aparência, e a afirmação de toda vida humana, socialmente falando. É
o que nos legitima como cidadãos, aptos para consumir. Espetáculo é palco social onde existimos e o sentido da
prática total da formação do econômico social (DEBORD, 1997).
E dentro desse conceito de espetáculo e do manancial teórico aportado por Debord, a despretensiosa
intenção desse artigo é relacionar os conceitos do autor com uma experiência exploratória efetuada na cidade
de Nova Iorque no mês de novembro do ano de 2012. A pesquisa bibliográfica envolveu fundamentalmente Guy
Debord, além de outros prestigiados autores que estudaram a modernidade e foram pertinentemente utilizados
nesse artigo, tais como: Mary Douglas, Walter Benjamin, Georg Simmel e Douglas Kellner.
A cidade de Nova Iorque não é estudada com tanta profusão por pesquisadores brasileiros do campo
da comunicação, por isso se fez necessário ampliar a metodologia partindo-se para pesquisa de campo, do tipo
exploratória, na metrópole norte-americana. O critério de escolha da cidade teve em conta o protagonismo e a
representatividade que a metrópole ocupa no universo do consumo global. Para atender aos objetivos iniciais da
pesquisa que eram: a) entender as lógicas de consumo na cidade de Nova Iorque e b) evidenciar o conceito de
espetáculo de Guy Debord na cena midiática nova-iorquina, mais precisamente nas manifestações da marca de
moda Uniqlo; estruturou-se o seguinte roteiro de investigação. Visitas e interação, que se materializaram na forma
de compra e de busca de informações para que fosse possível identificar as recorrências. Ao final da pesquisa de
campo que levou 3 dias, foram visitados 3 estabelecimentos comerciais da marca Uniqlo dentro da cidade de Nova
Iorque (nos bairros do Soho e Midtown), cerca de 20 lojas de outras marcas e captadas mais de 120 fotos digitais,
no período de 15 à 17 de Novembro de 2012. Cabe dizer que o trabalho de campo contou com o apoio operacional
fundamental de Camila Fernanda Conte no momento de captura de fotografias.
Nova Iorque: a cidade das mercadorias
Nova Iorque é a cidade mais populosa dos Estados Unidos e o centro da Região Metropolitana de Nova
Iorque, uma das áreas mais populosas do mundo. É também a terceira cidade mais populosa da América, atrás de
São Paulo e Cidade do México. A cidade exerce um impacto significativo sobre o comércio, finanças, mídia, arte,
moda, pesquisa, tecnologia, educação e entretenimento de todo o planeta. A cada passo que um pesquisador da
área de comunicação imprime pelas ruas da ilha de Manhattan, procura-se refletir e entender a dinâmica daquela
cidade como um observador do consumo e de tendências sócio-culturais. Por exemplo, observa-se um número
expressivo de cidadãos solitários andando nas ruas e, praticamente todos eles, munidos de aparelhos auditivos
103102
como um iPod, além de inseparáveis smartphones e um copo, hermeticamente vedado, da marca de cafeterias
Starbucks. Vive-se hoje em um universo de ficção científica, onde as máquinas falam e os homens se comunicam
por meio de próteses artificiais (SFEZ, 2007). Todos andando sempre de forma frenética, com pressa, falando ao
celular e, com isso, formando uma típica identidade social do “new yorker”. E em meio a uma imensidão de pos-
sibilidades de compra de produtos e adesão a serviços, aliada ao acesso à informação e a melhoria tecnológica, o
homem contemporâneo encontra-se cada vez mais crítico e exigente nas suas escolhas. Nas palavras de Debord:
“Quando o mundo real se transforma em simples imagens, as simples imagens tornam-se seres reais e motivações
eficientes de um comportamento hipnótico” (DEBORD, 1997). E é exatamente essa a sensação de um pesquisador
do campo da comunicação e consumo quando se observa um típico transeunte nova-iorquino, de que ele está
hipnotizado e entorpecido pela emergência consumista da grande metrópole global.
Os onipresentes cafés da marca Starbucks são vistos como espaços sociais e paradas obrigatórias duran-
te todo o dia, seja para usar a internet com tecnologia wi-fi (que agora é gratuita), seja para degustar uma dentre
as dezenas de opções de bebidas. O excesso de mercadorias é quem dita a dinâmica de consumo na megalópole.
De forma muito planejada, a marca inaugura lojas em esquinas estratégicas da cidade, que passam a sensação
de que realmente há lojas Starbucks em toda esquina. A rede possui mais de 16 mil lojas nos Estados Unidos. O
consumo de bens e mercadorias é o amálgama que une todos os cidadãos da metrópole. As práticas do consumo
que, no século 19, começaram a mediar a construção de identidades, ali também são evidenciadas como uma
representação estética da vida urbana (SIMMEL, 1995). E para serem bem-sucedidas no ultracompetitivo mercado
global, as corporações precisam fazer circular suas representações por meio de marcas em um mecanismo de
divulgação que se faz sob a forma de espetáculo. Infinitas promoções fazem circular os ícones de marcas. E na
guerra das marcas entre as mercadorias, as corporações precisam transformar seus logotipos em pontos de refe-
rência conhecidos na cultura contemporânea. As empresas colocam suas representações imagéticas nos produtos
e anúncios, nos espaços da vida cotidiana e em eventos esportivos importantes, programas de TV, merchandising
em filmes e onde quer que consigam atingir os olhares do comprador em potencial. A publicidade e o marketing,
por sua vez, são partes essenciais do espetáculo das mercadorias no mercado global. A experiência e a vida coti-
dianas são assim mediadas pelos espetáculos da cultura da mídia e pela sociedade de consumo.
Sob essa ótica, a cidade apresenta inúmeros projetos arquitetônicos icônicos, como a loja da Apple Store
da quinta avenida e que continua com índices de visitação elevados. Recentemente a loja sofreu uma reforma na
sua fachada: antes eram 90 placas de vidro cirurgicamente montadas, agora são apenas 15. Continua aberta 24
horas por dia e 365 dias por ano. A novidade na cidade é a recém-inaugurada loja da Apple Store na Grand Central
Station, uma tradicional estação de trem do início do século passado. Novas expressividades de marcas constan-
temente passam a fazer parte da cena midiática, o espaço urbano nova-iorquino evidencia claramente fenômenos
inaugurados pela modernidade como a utilização excessiva de ferro, aço, vidro, além de nova experiência de vida:
mobilidade, velocidade, deslocamento. Novos paradigmas que a modernidade trouxe são evidenciados de forma
contundente em Nova Iorque, e o progresso ainda é visivelmente medido pela capacidade de consumo. Ali fica
muito claro que o consumo não é subjetivo, o consumo é coletivo, é social. Percebe-se um sujeito que é regulado
por uma identidade socialmente estabelecida e economicamente regulada (DOUGLAS, 2009).
Um olhar debordiano para a marca UNIQLO
O conceito de “sociedade do espetáculo”, desenvolvido pelo teórico francês Guy Debord, tem provocado
grande impacto nas várias teorias contemporâneas sobre sociedade e cultura. Para Debord, o espetáculo “unifica
e explica uma grande diversidade de fenômenos aparentes” (DEBORD, 1997). O conceito de Debord, apresentado
pela primeira vez nos anos 60, descreve uma sociedade de consumo, organizada em função da produção e consu-
mo de imagens, mercadorias e eventos culturais. Baseado neste conceito, espetáculos são aqueles fenômenos de
cultura da mídia que representam os valores básicos da sociedade contemporânea, determinam o comportamento
dos indivíduos e dramatizam suas controvérsias e lutas, tanto quanto seus modelos para a solução de conflitos
(KELLNER, 2006). Enquanto Debord apresenta a noção do espetáculo de forma generalizada, chamo a atenção
aqui nesse estudo para exemplos específicos do espetáculo e como eles são produzidos, construídos, como circu-
lam e funcionam na atualidade, mais precisamente na cidade de Nova Iorque. No momento em que adentramos
num novo milênio, o consumo se torna ainda mais importante na vida cotidiana. Sob a ordem de uma cultura
imagética multimídia, os espetáculos sedutores fascinam a sociedade de consumo.
A intenção aqui é efetuar uma análise ancorada na manifestação marcária mais incisiva que foi presen-
ciada na visita à cidade de Nova Iorque, mais precisamente a nova flagship store da marca Uniqlo que foi inaugu-
rada recentemente na Quinta Avenida, considerada por muitos o epicentro do mundo capitalista. A Uniqlo é uma
marca japonesa de roupas que adota a chamado “moda casual”. Em novembro de 1998, eles abriram sua primeira
loja em Tóquio, e depois foi se espalhando para as grandes cidades em todo o Japão. Em novembro de 2006,
Uniqlo abriu sua primeira loja no bairro do SoHo em Manhattan, Nova York. Novos estilistas se juntaram equipe da
loja para impulsionar o renascimento de conceitos de moda. Em outubro de 2011, Uniqlo abriu sua emblemática
loja na Quinta Avenida (ou “Fifth Avenue”) e depois na rua 34 (ou 34th Street), perto da edulcorada loja Macy’s.
Os estilistas de moda da marca Uniqlo se utilizam dos mais diversos pantones de tons de cores para
vender todas as peças de roupas. Evidencia-se um processo de excesso e pasteurização do consumo de moda. A
moda é historicamente um aspecto central do espetáculo e os produtores e modelos constituem um setor atraente
da cultura da mídia. A moda de hoje, indiscutivelmente, é um espetáculo de consumo, pois percebe-se a utilização
de efeitos com neon, luzes e shows com raios laser. A participação de personalidades do rock e de superestrelas, e,
também, grande divulgação a cada nova estação, geram desfiles altamente elaborados e espetaculares. Vis-à-vis a
participação da popstar Madonna protagonizando um anúncio da marca Louis Vuitton no início da década passada.
O show de consumo é fundamentalmente interligado com a moda, que estabelece o que é válido ou não, o que é
quente ou frio, no agitado mundo dos estilos e das tendências (KELLNER, 2006).
O discurso publicitário da marca é “Made for All” (ou “Feito para todos). Evidencia-se aqui um discurso
que enfatiza um processo de pasteurização das coisas, uma sociedade que se consome nela mesma por meio
de templos do consumo. O próprio processo de comercialização de produtos é um tanto quanto homogeneizado,
assim como outras grandes do varejo de moda. Claramente são lugares destinados ao consumo de mercadorias e
também de imaginários do consumo. O consumo da moda funciona como educação dos cidadãos, regendo o que
se deve usar. Já o apropriação simbólica da marca Uniqlo é visto como algo novo, visto que a marca claramente
coloca suas mercadorias como uma potência que ocupa a vida social, sendo que o espetaculo é quem transforma
o bem em mercadoria. A marca lança anualmente um produto único que protagoniza sua coleção de mercadorias.
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Nesse ano de 2012, o produto é uma jaqueta térmica que dobrada cabe dentro de uma pequena caixa de 20 cm2.
Percebe-se muitos transeuntes na cidade usando a jaqueta. Há claramente uma razão mercantil dominando os
modos de ser e estar do cidadao nova-iorquino. Evidencia-se ondas de estusiasmo pelo lançamento e relança-
mento. Há algo de libertador, os atores-sociais olhando as coisas como se fosse a primeira vez (BENJAMIN, 1994).
O conceito de mercadoria, discutido amplamente por Debord, é cristalizado de forma intensa nas narra-
tivas da publicidade hoje em dia, sobretudo na marca Uniqlo. A mercadoria é vista por Debord como uma potência
que ocupa a vida social, e é o espetáculo quem transforma o bem em mercadoria. O processo de espetaculariza-
ção não só aumenta o consumo, como também aumenta a banalização. E imprimindo um olhar para as práticas
de consumo na contemporaneidade, evidencia-se hoje expressões de marcas como a Uniqlo que se servem dessa
mesma lógica. Vale ressaltar aqui outras categorias do consumo que são regidas por essa dinâmica. Marcas de
aparelhos celulares que geram uma rápida obsolescência programada e lançam mais de 50 modelos por ano.
Marcas de automóveis que lançam e relançam modelos a bel-prazer com mudanças mínimas entre as versões e,
por meio da publicidade, criam narrativas envolventes e que catapultam a aceleração do consumo. A sociedade
espetacular dissemina seus produtos manufaturados principalmente por meio de mecanismos culturais de lazer e
consumo, serviços e entretenimento regulamentados pelos critérios da publicidade e de uma cultura da mídia co-
mercializada. Este esquema estrutural para uma sociedade do espetáculo envolve uma comercialização de setores
da vida social que ainda permanecem intactos e a extensão do controle burocrático aos campos do lazer, do desejo
e da vida cotidiana (KELLNER, 2006).
Nesse sentido, percebe-se que, na modernidade, e com reverberações até os dias de hoje há uma lógica
mercantil dominando as mais diversas atividades e práticas sociais. Ondas de entusiasmo pelo lançamento de
mercadorias e uma cultura do excesso e abundância da mercadoria de uma mesma categoria. O prestígio de um
produto surge de uma colocação dele no centro de um contexto social. Uma pasteurização das coisas. Tudo isso
são exemplos de prática de consumo nascidas com a modernidade e que regem o funcionamento de nossa so-
ciedade contemporânea, fundamentalmente na cidade norte-americana aqui analisada. O conceito do espetáculo
de Debord está completamente ligado ao conceito de separação e passividade, pois, em espetáculos consumistas
submissos, o homem é afastado de sua vida ativamente produtiva. A sociedade capitalista separa os trabalhadores
dos produtos de seu trabalho, a arte da vida, o consumo das necessidades humanas e das atividades autodirigi-
das, como se os indivíduos observassem, inertes, os espetáculos da vida social de dentro de suas próprias casas
(KELLNER, 2006).
Para concluir
A sociedade contemporânea está visivelmente entrando em uma numa nova etapa da cultura do espe-
táculo que constitui uma nova configuração da economia, política e vida cotidiana. Essa nova dinâmica envolve
novas formas de cultura, relações sociais e novos modelos de experiência. E isso está produzindo uma nova
cultura do espetáculo e de forma muito evidente nos Estados Unidos. E a utilização da teoria social crítica, mais
precisamente a de Guy Debord, como um anteparo para refletir sobre o consumo, também é deparada com novos
desafios na análise dessas novas formas de cultura e de sociedade.
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, Walter. Walter Benjamin: sociologia. São Paulo: Ática, 1991.
_________. Obras escolhidas. Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994.
DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
DOUGLAS, Mary e ISHERWOOD, Baron. O mundo dos bens. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2009.
KELLNER, Douglas. Cultura da mídia e triunfo do espetáculo. IN: MORAES, Denis de (Org.). Sociedade midiatizada.
Rio de Janeiro: Mauad X, 2006, p. 119 – 148.
SFEZ, Lucien. A comunicação. São Paulo: Martins Fontes, 2007
SIMMEL, Georg. As grandes cidades e a vida do espírito (1903). Mana [online]. 2005, vol.11, n.2
Por meio da metodologia empregada na pesquisa, foi possível traçarmos algumas conclusões sobre
como a sociedade do espetáculo de Guy Debord ainda permanece de forma intensa nas lógicas do consumo con-
temporâneo, sobretudo nas representações simbólicas e sinérgicas da marca Uniqlo na cidade de Nova Iorque.
Finalizado esta argumentação, importante concentrarmos nossa atenção para a necessidade de trazer de forma
ainda mais próxima para o debate acadêmico a diversidade de estratégias de marcas globais dentro de um pro-
cesso de espetacularização do consumo.
Cabe ainda frisar que a opção metodológica escolhida, que agregou a pesquisa bibliográfica com o mé-
todo de pesquisa de campo, trouxe limitações às conclusões uma vez que a análise teve em conta os contextos
de marcas de maior expressão como Uniqlo, Apple e Starbucks, e isso implica que os resultados não possam ser
inferidos ao universo das marcas como todo. Além disso, a imersão aconteceu na cidade de Nova Iorque por um
período de apenas 3 dias, durante o mês de novembro de 2012, o que implica em limitação temporal.
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ResumoO objetivo do presente artigo é fazer uma reflexão sobre os acontecimentos relevantes que nor-
tearam o campo recente da comunicação, sobretudo em função de movimentos ciberculturais.
Além disso, pretende-se aqui também evidenciar fatos que podem ser articulados com fenômenos
contemporâneos do campo da comunicação no mercado globalizado, como por exemplo a união de
empresas da nova arena digital que aqui conceituamos de simbiose. Por meio de pensadores con-
temporâneos do campo da comunicação, principalmente ancorado em nomes como Lúcia Santaella
e Erick Felinto, propõem-se aqui um diálogo reflexivo sobre o impacto de novas mídias na produção
de novos hábitos de consumo.
Palavras-chaveCibercultura, consumo, tecnologia, Facebook, Instagram, simbiose
COMUNICAÇÃO, CONSUMO E CIBERESPAÇO:Convergências e simbiose na nova arena digital
“Conectividade não é sinônimo de interatividade”
Nestór Garcia Canclini, 2007
Introdução
Entender e aprofundar-se nos estudos do campo da comuni-
cação exige na contemporaneidade uma transdisciplinaridade e uma in-
terdisciplinaridade. E em toda história mais recente, pesquisadores das
áreas de ciências sociais, linguagem e cultura, concentraram seus esforços
em entender os fenômenos do processo comunicacional e da cibercultu-
ra. Compreender os fenômenos da sociedade contemporânea em meio
à imensidão de possibilidades no acesso à informação e a melhoria tec-
nológica, exige um recuo histórico no campo teórico da comunicação. Desde os primeiros teóricos da Escola de
Frankfurt, corrente teórica do século passado, evidencia-se que caminhavam lado a lado os fenômenos da mídia
e um caráter mercantil do processo cultural. Mais precisamente na primeira metade do século passado, autores
como Adorno e Horkheimer criaram o conceito de “indústria cultural”, referindo-se à inserção de bens culturais no
sistema de produção industrial. Nesse contexto, o domínio dos meios de produção originaria a possibilidade de
manipulação e controle dos meios por parte dos produtores de bens culturais.
Nesse contexto sócio-cultural, o esquema emissor-mensagem-receptor foi objeto de pesquisa e apresen-
tou relevância junto a correntes teóricas da comunicação social dentro das culturas do consumo. Evidencia-se aqui
as contribuições de Lasswell e Schramm, que apontam que, entre emissores e receptores interpõem-se “filtros”
como a sociedade, a cultura, o mundo, os modos de produção (SOARES, 2009). Já as contribuições de Marshall
McLuhan, pensador da Escola de Toronto mostrava que a chamada cultura letrada estava oferecendo lugar para
uma formação cultural de teor mais audiovisual, o que trazia consigo profundas transformações no aparato mental
e sensorial dos indivíduos.
Já as interações humanas em ambientes de interface digital e, que congregam milhões de usuários, têm
sido objeto de pesquisa de esquisadores do campo da comunicação na contemporaneidade. E a partir do final
dos anos 1980, o termo “hibridismo” tornou-se palavra-chave para caracterizar as sociedades latino-americanas
contemporâneas, e dentre os pesquisadores da comunicação destaca-se a pensadora brasileira Lucia Santaella.
Ainda seguindo a intuição de McLuhan – imortalizada na clássica formulação “o meio é a mensagem” – o des-
lumbramento provocado pelos novos meios digitais, atraindo legiões internautas para o ciberespaço, reafirma de
forma contundente a pertinência dessas ideias no mundo atual (CASTRO, 2009).
Múltiplas formas de comunicação
As sociedades vivem hoje um processo de reorganização no âmbito cultural, social, econômico e político,
e fica muito evidente como os fenômenos tecnológicos, como a explosão de redes sem fio, por exemplo, acelera
a dinâmica das relações, onde posso postar tudo que eu quiser, onde eu quiser e na hora que quiser (CASTELLS,
2009). Além disso, pode-se afirmar que temos hoje mais formas de comunicação do que em qualquer outro mo-
mento da história. No entanto, muito mais do que simplesmente entender cada um dos novos ambientes de pro-
dução midiática, deve-se refletir como esses fenômenos impactam a sociedade contemporânea, e especificamente
como as marcas procuram dialogar com consumidores cada vez mais protagonistas. Assim como as pessoas que,
na sociedade homogeneizada, buscam uma fixação narcísica (McLUHAN, 1964), as marcas também procuram
adotar jogos discursivos envolventes e sedutores nesses novos espaços digitais.
Vive-se hoje em um universo de ficção científica, onde as máquinas falam e os homens se comunicam
por meio de próteses artificiais (SFEZ, 2007). E em meio a uma imensidão de possibilidades de compra de pro-
dutos e adesão a serviços, aliada ao acesso à informação e a melhoria tecnológica, o homem contemporâneo
encontra-se cada vez mais crítico e exigente nas suas escolhas. Há uma proliferação de espaços sociais, como sites
de relacionamentos e blogs onde fica muito evidente o conceito de mass self communication (CASTELLS, 1999) e
cristaliza-se o conceito do processo comunicacional nesses ambientes discursivos é regido por um efeito da tacada
109108
inicial de uma bola no jogo de bilhar, onde uma bola em movimento faz com outras várias bolas se dispersam na
mesa, cada uma com sua dinâmica de tempo e espaço (SFEZ, 2007).
Aqui vale um olhar sobre a definição de ciberespaço como um espaço de interação, cujo acesso se dá
por meio de interfaces dos mais diversos tipos que permitem navegar a bel-prazer pela informação midiática e
reenviá-la para quem quer que seja, de qualquer e para qualquer lugar do planeta (SANTAELLA, 2010). Os meios
de comunicação hoje podem ser compreendidos como verdadeiras extensões do homem, como próteses destina-
das a expandir suas capacidades de seus vários membros, não chega a ser elevada ao status de um paradigma de
pesquisa normalizado – pretensão alimentada precisamente pelos estudiosos nas materialidades da comunicação
(FELINTO, 2001). Quando a nossa simples presença abre a porta automática de um shopping ou quando o aperto
de um botão de um chaveiro abre ou fecha um automóvel, evidencia-se a tangibilização desse conceito do pes-
quisador fluminense.
Nota-se hoje um mundo hiperconectado e regido por mudanças ocasionadas pela mobilidade virtual.
Aqui destaca-se a enorme influência das tecnologias móveis na vida cotidiana (SANTAELLA, 2010) do cidadão
contemporâneo. Nesse sentido, nota-se como panorama atual a forma pela qual é possível a existência de uma
cultura da virtualidade real, um sistema em que a própria realidade é inteiramente captada, totalmente imersa em
uma composição de imagens virtuais do mundo da imaginação (CASTELLS, 1999).
Dentro desse contexto sócio-cultural, estamos rodeados de condições adversas à habilidade de desen-
volver relações autenticas com os lugares, e uma das causas mais agudas para esse estado das coisas, encon-
tra-se na aceleração da mobilidade nas sociedades contemporâneas (SANTAELLA, 2012). Os chamados gadgets
como iPhone, iPad, iPod, iMac, HD TV, GPS, BlackBerry surgem de forma avassaladora, com números de vendas
exponenciais, e fazem parte da vida do consumidor contemporâneo de forma muito próxima e íntima.
O consumo é simbólico, pois quando as pessoas compram um iPhone, por exemplo, estão não apenas
adquirindo um aparato tecnológico, como também vivenciando certo estilo de vida (digital) e se inscrevendo num
imaginário tecnológico que enfatiza as ideias de inovação, elegância e distinção econômica (FELINTO, 2010).
Fenômenos como esse apenas tangibilizam em atípicas manifestações ciberculturais e reorganizam sociedades
no âmbito cultural, social e patê político, e nos deixa muito evidente como esses fenômenos tecnológicos como e
explosão do wireless catalisa a dinâmica da Web, onde posso postar tudo, texto, vídeo (CASTELLS, 1999).
O mercado é o novo paradigma do consumo e surge com proeminência nas dinâmicas sociais atuais.
Nossas sociedades são, portanto denominadas sociedades de consumo (CASTRO, 2009). Os jovens adquirem nas
telas extra-curriculares uma formação mais ampla em que conhecimento e entretenimento se combinam (CANCLI-
NI, 2008). Os jovens que incorporam plenamente essas tecnologias as colam ao corpo como um elemento a mais
de indumentária, calças, paletós, jaquetas e mochilas são fabricadas com lugar para o celular, e a corporabilidade
deve abrigar as tecnologias (QUEVEDO, 2007).
Facebook & Instagram: uma simbiose do ecossistema digital
No meio ambiente global, regido pelo diapasão da cibercultura, o tom das comunicações entre empresas
e consumidores está em visível mutação. A tecnologia parece carregar consigo um apelo mais sedutor (CASTELLS,
2000) e para entender os fenômenos da cibercultura em meio à imensidão de possibilidades que cidadãos dis-
põem hoje, temos que defini-la como um processo de socioespacialização profusa de movimentações nacionais
e internacionais de contestação baseadas em tecnologias digitais (FELINTO, 2010). A “cibercultura”, se torna
sinônimo de cultura contemporânea ou pós-moderna, e entendê-la nos permite estabelecer uma compreensão do
termo que envolve tanto discursos sociais e narrativas ficcionais quanto realidades tecnológicas e práticas com-
portamentais e de consumo. Estes múltiplos modos de interação viriam animar e alimentar dispositivos funcionais
caracterizados pela ação mútua e simultânea de usuários e sistemas (LEVY, 1995).
Os chamados sites de relacionamento como Facebook, Twitter, Instagram e Foursquare estão presentes
diariamente nas vidas de boa parte dos cidadãos como espaços onde as pessoas validam seus conteúdos emocio-
nais. Novas tecnologias como Blueray, Bluetooth e Webcams ajudam esse consumidor a se entreter como nunca
visto antes. O YouTube, por exemplo, muito mais que um mero site de hospedagem de vídeos, está ajudando
pessoas a se promoverem, a se conhecerem, e está contribuindo para trazer à tona assuntos mundialmente
relevantes, e fomentando o compartilhamento de informação. O presidente do país mais rico do planeta, por
exemplo, é Barack Obama, um homem de raça negra, com sobrenome muçulmano e 20% de sua verba de cam-
panha publicitária foi destinado às mídias digitais, como o YouTube. Dados como esses nos comprovam que essa
mobilidade virtual não apenas se potencializou e se diversificou com o advento da internet e mídias móveis, como
também adquiriu novos significados e a habilidade humana para fazer uma entidade abstrata fluir eletronicamente
(SANTAELLA, 2010).
O site de relacionamento Facebook foi lançado em 2004 pelo estudante da universidade de Harvard,
Mark Zuckerberg e tinha como meta criar uma rede de contatos em um momento crucial da vida de um jovem
universitário: o momento em que ele sai da escola e vai para a universidade (RECUERO, 2009). Desde seu lança-
mento até os dias de hoje, muitas foram a transformações pelas quais esse ambiente de jogos discursivos passou
como: remodelações de layout e design da interface, acréscimo ou remoção de aplicativos e até reestruturação
de sua filosofia empresarial (atualmente a missão da empresa é dar às pessoas o poder de compartilhar e fazer o
mundo mais aberto e conectado). Um levantamento recente mostra em agosto de 2012, o Facebook poderá atingir
a marca de um bilhão de usuários ativos1.
O funcionamento do site é relativamente simples e se dá por meio de perfis, comunidades e persona-
lizações de página realizadas por meio da utilização de aplicativos. Sua estrutura, de forma geral, se assemelha
bastante à organização proposta pelo Orkut, líder no ranking de número de usuários ativos entre os sites de redes
sociais no Brasil até o meio do ano de 2011. Sobre os sites que se enquadram nesse mesmo grupo de Orkut e
Facebook, o sistema é muitas vezes percebido como mais privado do que os outros sites de redes sociais, pois
apenas usuários que fazem parte da mesma rede podem ver o perfil uns dos outros (RECUERO, 2009).
Já o Instagram, outra rede social de compartilhamento de imagens, merece foco em nossa reflexão. Nos
primeiro dias de sua recente história, o Instagram era apenas quatro funcionários, 1 Disponível em: http://g1.glo-
bo.com/tecnologia/noticia/2012/01/facebook-chegara-1-bilhao-de-usuarios-em-agosto-diz-pesquisa.html incluindo seus dois
co-fundadores, e que trabalhavam nos primeiros escritórios do microblog Twitter no bairro de South Park de San
Francisco. E o Instagram, mais uma start-up da California e que não gera receita, foi adquirido por Mark Zucker-
berg (fundador da maior rede social do mundo: o Facebook). Por trás dessa aquisição do Instagram percebe-se
uma visível intenção do Facebook em se tornar ainda mais forte nos dispositivos móveis e com isso nota-se como
111110
essa nova dinâmica mercantil catalisa as mudanças ocasionadas pela mobilidade virtual e uma enorme influencia
das tecnologias móveis na vida cotidiana, quando o celular fez emergir uma síntese inédita do tempo mecânico
com o tempo orgânico (SANTAELLA, 2012).
Um dos grandes destaques da cena midiática cibercultural, o Instagram é um aplicativo gratuito que
permite aos usuários tirar uma foto, aplicar um filtro para ela, e depois compartilhá-la em uma variedade de
redes sociais, incluindo próprio Instagram. Projetado pelo brasileiro Mike Krieger e Kevin Systrom, o Instagram
inicialmente foi idealizado para uso em dispositivos móveis Apple iOS; posteriormente disponibilizado no sistema
Android. O aplicativo permite aos seus usuários compartilharem imagens, bem como aplicarem nelas uma grande
variedade de filtros e efeitos disponíveis. Eles podem compartilhá-las através do aplicativo e em redes sociais como
Twitter, Facebook, Foursquare e Tumblr.
O Instagram provoca um magnetismo em seus 30 milhões de usuários que fazem uploads de mais de 5
milhões de fotos ao dia. O conceito do aplicativo é simples: faz com pessoas se comuniquem por meio de imagens.
Mais do que nunca, a imagem digitalizada pode ser decomposta, recomposta, indexada, ordenada, comentada,
associada ao interior de documentos multimídia (LEVY, 1995). O Instagram é fundamentalmente uma rede social
concebida em torno da fotografia, e disponibilizado apenas para uso em celulares (para iPhones da Apple, e agora
já disponível também para o Android, o sistema operacional da Google), onde as pessoas adicionam efeitos as
suas fotos produzidas com a câmera do celular e compartilham com os amigos. O fato da humanidade ser pro-
gramada por superfícies (imagens) pode ser considerado, no entanto, não como uma novidade revolucionária,
mas parece tratar-se de uma volta ao seu estado original pois antes da escrita, as imagens era os meios decisivos
de comunicação (FLUSSER, 2007). O Instagram, uma criação concebida puramente para o universo mobile, nos
evidencia que a mobilidade virtual não apenas se potencializou e se diversificou, com também adquiriu novos sig-
nificados a partir do momento em que se vê a habilidade humana para fazer uma entidade abstrata, a informação,
fluir eletronicamente (SANTAELLA, 2012).
Com a aquisição do Instagram pelo Facebook, evidencia-se um movimento de convergência total de mí-
dia ou até mesmo um fenômeno de simbiose. Segundo ensinamentos da Ecologia, a palavra simbiose, referência
maior para o neologismo em questão designa uma “associação que promovem entre si dois sistemas vivos em
busca de mútuos benefícios” (PEREIRA, 2003) e propomos aqui o uso do termo como uma analogia ao universo da
comunicação. É possível que haja uma clara relação de simbiose entre a recente aquisição de empresas Instagram
pelo Facebook, onde as partes se beneficiam mutuamente, e cada uma aproveita as virtudes da outra. Se fizermos
um recuo histórico vemos que essas parcerias entre marcas e organizações tem o objetivo de buscar alianças e
uma sinergia benéfica para ambas as partes envolvidas, como o ocorrido, por exemplo, com o carro de marca
Smart, que uniu Swatch com todo o seu knowhow em design, com a expertise da Mercedes Benz em produzir
automóveis O ponto central nessas estratégias é encontrar a adequação perfeita ao aproveitamento máximo das
partes envolvidas sem que estas percam suas características essenciais e distintivas.
Com a simbiose promovida por Facebook e Instagram, pode-se inventar novas estruturas discursivas,
descobrir as retóricas ainda desconhecidas do esquema dinâmico, do texto de geometria variável e imagem ani-
mada, conceber ideografias nas quais as cores, o som e o movimento irão se associar para significar, estas são
as tarefas que esperam os autores e editores do próximo século (LEVY, 1993). Essas parcerias simbióticas estão
ancoradas na sinergia e no reconhecimento das marcas envolvidas, construídos a partir de suas áreas de atuação,
o que lhes possibilitaram atingir tal posição de notoriedade.
Considerações finais
No artigo presente evidenciou-se de forma clara um número cada vez mais crescente de usuários nas
redes colaborativas, assim como o surgimento de novas práticas comunicacionais no ciberespaço (LEMOS, 2003),
assim como uma constante dúvida quanto aos verdadeiros efeitos da disseminação dessa “teia”, comumente inti-
tulada de internet. E todos esses elementos são apenas alguns dos fatores que inspiram pesquisadores das mais
diversas áreas a investigar e tentar compreender as características e as especificidades daquilo que classificamos
hoje como sendo a cibercultura.
Por meio da metodologia empregada, meramete ancorada em uma pesquisa bibliográfica, neste artigo
foi possível traçarmos algumas conclusões sobre fenômenos contemporâneos da cibercultura. Os dispositivos mó-
veis começam a tomar gradativamente conta da cena comunicacional e cultural, assim como se pode evidenciar
um processo de convergência total onde se pode desempenhar múltiplas tarefas ao mesmo tempo, distribuir nossa
atenção entre diferentes mídias e rotinas de comunicação (SANTAELLA, 2012). A convergência digital incentiva os
consumidores a explorar as mídias em busca da informação desejada, desafiando sua atenção, percepção e ca-
pacidade associativa para fazer conexões de conteúdos dispersos em diferentes suportes midiáticos (SANTAELLA,
2003).
E por meio do emblemático exemplo da simbiose entre Facebook e Instagram foi possível identificar uma
nova onda de parcerias que engloba a busca de exclusividade e diferenciação máximas. No entanto, o advento
das chamadas “redes sociais”, forjadas deste século pela apropriação social sinérgica de plataformas virtuais e
dispositivos interativos (especialmente móveis) de compartilhamento de arquivos e informações é um exemplo
indubitável e abastado dessa condição social-histórica imprecisa, hesitante e incompleta (FELINTO, 2010).
Com os exemplos descritos nesse artigo, evidencia-se que temos um mundo cada vez mais interligado
e regido por intercâmbios de ordem mercantil (CANCLINI, 2007) e todo mundo está ocupado fazendo business
com tudo: casamento, sexualidade, procriação, saúde, beleza, identidade, conhecimento, relações, ideias, onde a
pessoa se torna um empreendimento (LEVY, 1999) na sociedade homogeneizada, e busca uma fixação narcísica,
onde as marcas também procuram adotar jogos discursivos envolventes e sedutores nesses novos espaços digi-
tais (MCLUHAN, 1964). E concluindo esta argumentação, chamo a atenção para a necessidade de discutirmos a
diversidade de estratégias no contexto das redes digitais de comunicação, sociabilidade e consumo, pois no limite,
chega-se a fenômenos de autismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar na frente da tela
do que relacionar-se com interlocutores em lugares fisicamente localizados (CANCLINI, 2007).
Tratando-se aqui de uma pesquisa meramente bibliográfica, naturalmente algumas questões ficam em
aberto. Nesta direção, o aprofundamento da análise de material empírico tanto uma pesquisa exploratória, se fa-
zem necessárias para imergir de forma ainda mais profunda no impacto do consumo tecnosimbólico desse debate.
112
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SOARES, Rosana de Lima. Margens da Comunicação: discurso e mídias. São Paulo: Anna Blume, 2009
115114
ResumoO presente artigo tem como escopo investigar o impacto que ambientes virtuais como os chamados
sites de redes sociais e o consumo simbólico tecnológico dessas plataformas interferem na forma
como as pessoas se relacionam entre si. Por meio de um recorte bibliográfico, e uma pesquisa
empírica, se propõe um profundo entendimento da forma as pessoas estão mudando suas formas
de se relacionar, de consumir e se entreter em um mundo regido por um nível de mercantilização
jamais visto. Em um contexto norteado pela cibercultura, em que meios de comunicação visam o
entretenimento de receptores, as pessoas exigem experiências digitais cada vez mais relevantes e
alinhadas com seu estilo de vida.
Palavras-chavecibercultura; comunicação; tecnologia; redes sociais; Twitter.
COMUNICAÇÃO, TECNOLOGIA E CIBERCULTURA:usos e consumos de sites de rede sociais digitais
“Eu sei que deveria, mas isso não vai acontecer. Se eu receber
uma mensagem no Facebook ou algo postado no meu mural, eu tenho
que ver isso. Tenho que ver...”
(depoimento de Roman, um jovem de 18 anos, extraído do livro
“Alone Together” de Sherry Turkle, ao admitir que envia mensagens de texto
enquanto dirige seu carro, e diz que não vai parar)
Introdução
O presente artigo surgiu de uma inquietação teórica com inten-
ção de reunir o pensamento de contemporâneos estudiosos do campo da
comunicação e, com isso, entender de uma forma interdisciplinar o fenô-
meno dos chamados sites de redes sociais como uma emergência da cena
cibercultural, assim como imergir no entendimento dos efeitos dessas tecnologias de comunicação e informação
na sociedade contemporânea. E em toda história mais recente, inúmeros pesquisadores das áreas de ciências so-
ciais, linguagem e cultura, concentraram seus esforços em entender os fenômenos do processo comunicacional. E
entre os pensadores contemporâneos do campo da comunicação, neste artigo será efetuado um diálogo principal-
mente ancorado em nomes como Erick Felinto, Lúcia Santaella, Raquel Recuero e Sherry Turkle, aqui citados em
ordem alfabética, que se dedicam hoje grande parte de suas pesquisas no entendimento da cibercultura e outros
inquietantes fenômenos da comunicação.
Gostaria de partir com uma breve definição de ciberespaço como “um espaço de interação, cujo acesso
se dá por meio de interfaces dos mais diversos tipos que permitem nevegar a bel-prazer pela informação midiática
e reenviá-la para quem quer que seja, de qualquer e para qualquer lugar do planeta” (SANTAELLA, 2010). Evi-
dencia-se aqui que temos hoje mais formas de comunicação do que em qualquer outro momento da história. No
entanto, muito mais do que simplesmente entender cada um de novos ambientes de produção midiática, devemos
refletir como esses fenômenos impactam a sociedade contemporânea.
Os meios de comunicação que hoje podem ser entendidos como verdadeiras extensões do homem, são
como próteses destinadas a expandir suas capacidades de seus vários membros. No entanto, não chega a ser ele-
vada ao status de um paradigma de pesquisa normalizado – pretensão alimentada precisamente pelos estudiosos
nas materialidades da comunicação (FELINTO, 2001).
Dentro desse contexto comunicacional, os sites de redes sociais surgiram no anos 2000 e com uma
maior audência a partir de 2003, quando sites como MySpace nos Estados Unidos, o Orkut junto aos usuários
brasileiros, entre outros, conquistaram milhares de usuários. Ali se evidenciava a disseminação de sites de redes
sociais como um novo fenômeno importante da cibercultura, interferindo em práticas sócio comunicativas cotidia-
nas de sujeitos em âmbito mundial e, dessa forma, atraindo a atenção de comunidades acadêmicas.
Em um ambiente cada vez mais saturado de mensagens publicitárias dentro e fora de seus espaços mais
tradicionais, o desafio para os profissionais de mercado está em procurar oferecer conteúdo relevante que seja
capaz de capturar a atenção sempre fugaz do cliente em potencial (CASTRO, 2012). Por isso, propõem-se nesse
artigo uma compreensão de como a apropriação estratégica dos sites de redes sociais digitais mais difundidos
como o Twitter interferem na produção de novos tipos de atores sociais.
Em meio a esse debate acerca de novas mídias e de formas de atuar no ecossistema comunicacional.
Evidencia-se na contemporaneidade uma espécie de universo de ficção científica, “onde as máquinas falam e os
homens se comunicam por meio de próteses artificiais” (SFEZ, 2007) e e entre muitas outras mudanças ocasiona-
das pela mobilidade virtual, a da dimensão do espaço-tempo destaca-se e desenvolve-se sob a enorme influência
das tecnologias móveis na vida cotidiana (SANTAELLA, 2012). Nesse sentido, nota-se como panorama atual a
forma pela qual é possível a existência de uma cultura da virtualidade real, um sistema em que a própria realidade
é inteiramente captada, totalmente imersa em uma composição de imagens virtuais do mundo da imaginação
(CASTELLS, 1999).
Os chamados gadgets como iPhone, iPad, iPod, iMac, GPS, BlackBerry surgiram nos últimos anos e al-
cançam volumes de vendas exponenciais. Muito mais que do que meros aparatos tecnológicos, eles adquirem uma
carga simbólica e fazem parte da vida dos consumidores contemporâneos, sobretudo os jovens, contribuindo para
a formação de uma identidade social. Quando as pessoas compram um iPhone, por exemplo, “estão não apenas
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adquirindo um aparato tecnológico, como também vivenciando certo estilo de vida (digital) e se inscrevendo num
imaginário tecnológico que enfatiza as ideias de inovação, elegância e distinção econômica” (FELINTO, 2010).
Nota-se a proliferação de novos espaços sociais como blogs e sites com conteúdo mais autoral, onde fica
evidente o conceito do pesquisador catalão Manuel Castells batizado de “mass self communication” (traduzido aqui
de “auto-comunicação de massa”) e até mesmo tangibiliza-se o conceito trazido com muita lucidez pelo pensador
da comunicação Lucien Sfez (2007) onde “o processo comunicacional nesses ambientes discursivos é regido por
um efeito da tacada inicial de um bola no jogo de bilhar, onde uma bola em movimento faz com outras várias bolas
se dispersam na mesa, cada uma com sua dinâmica de tempo e espaço”.
Paralelo a essas constatações ciberculturais, o argentino Nestór Garcia-Canclini (2007), argumenta que
estamos situados em “um mundo cada vez mais interligado e regido por intercâmbios de ordem mercantil”, e que
convertem-se “todos os cenários em lugares de compra e venda”. Nesse contexto, evidencia uma mercantilização
das práticas cotidianas dos cidadãos, onde o canadense Pierre Levy (2005) diz que “todo mundo está ocupado
fazendo business com tudo: casamento, sexualidade, procriação, saúde, beleza, identidade, conhecimento, rela-
ções, ideias. A pessoa se torna um empreendimento”. No meio ambiente global, regido pelo diapasão da ciber-
cultura, o tom das comunicações entre empresas e consumidores está em visível mutação. A tecnologia parece
carregar consigo um apelo mais sedutor (CASTELLS, 2000).
Cibercultura, comunicação e tecnologia
Parte-se aqui da afirmação que comunicação, cultura e tecnologia formam uma tríade inseparável e
indispensável para o entendimento de nossa situação contemporânea (FELINTO, 2010) e a busca de um enten-
dimento mais preciso acerca dos fenômenos comunicacionais da cibercultura que permeia esse artigo nos leva
em consideração de que há na contemporaneidade uma relação indissociável entre cultura e tecnologia, assim
como a força do binômio homem-máquina, que adquire um elo jamais visto. Aqui vale trazer a lúcida visão que
Jesus Martín-Barbero (2008) coloca sobre esses fenômenos cibercultruais, ao dizer que “a tecnologia hoje é uma
das metáforas mais potentes para compreender o tecido de construção da subjetividade, e que os sujeitos com
os quais vivemos, especialmente entre as novas gerações, percebem e assumem a relação social como uma ex-
periência que passa fortemente pela sensibilidade”. Desse modo, torna-se fundamental que visualizemos de uma
forma interdisciplinar o pano de fundo desse debate, agora permeado pelo conceito da cibercultura, pois é dentro
de um contexto cibercultural onde se constroem todos esses jogos discursivos e envolventes entre marcas e pes-
soas nos sites de redes sociais.
Na tentativa de reunir alguns dos principais conceitos do termo “cibercultura” como o objetivo de ilustrar o
cenário que rodeia as interações nesses novos espaços discursivos e informacionais, partimos do olhar do pesquisa-
dor fluminense Erick Felinto (2007), que vê “a cibercultura como herdeira de diversas questões da modernidade, e ao
elaborar uma cartografia da cibercultura significa também, portanto, desenhar linhas de tempo, paisagens temporais
estranhas que conectam épocas distantes e se enraízam no secular projeto tecnológico do Ocidente”.
Já para o também prestigiado pesquisador baiano André Lemos (2007), no contexto cibercultural nota-
se que “o acesso à informação e as possibilidades de comunicação foram estendidas, reconfigurando a concepção
de mundo virtual paralelo, fundindo o espaço ciber com o mundo físico, criando territórios informacionais. Agora
o acesso e o controle informacional realizam-se a partir de dispositivos móveis e redes sem fio”. Aqui nota-se uma
íntima aproximação do conceito de cibercultura com elementos de mobilidade e faz-se necessário trazermos a
visão que a pesquisadora Lúcia Santaella (2010), imprime sobre esse debate ao dizer que “nas redes sociais a
informação funde-se com o usuário em um contexto em que a interface visual se torna mais simples e a interface
manual, mais complexa”.
Ainda para Lemos (2007), “a partir do uso dos computadores pessoais, já era possível admitir duas
dimensões da presença on line: a primeira, vinculando-se à forma extensiva do corpo situado, e uma outra, que
inaugura a perspectiva de uma presença localmente distribuída, que permanece e circula entre dados, sites, blogs
ou games simultaneamente”. Ele ainda ressalta que outros importantes aspectos da cibercultura quando nos diz
que “a fase pós-industrial da sociedade não é a ruptura com a dinâmica monopolista de capitalismo, mas uma
radicalização do desenvolvimento de sua própria lógica”. É exatamente a radicalização da lógica capitalista e a
possibilidade de cada indivíduo interferir nas trocas de mercado a partir da reprodução não autorizada permitida
pela Internet que interessa aos nossos estudos sobre redes sociais digitais.
As redes sociais como espaços comunicacionais
A proliferação dos chamados sites de rede social são um fenômeno informacional da segunda metade
dos anos 2000 e se tornaram importantes objetos de pesquisa no campo da comunicação, cibercultura e diversas
outras áreas do conhecimento. É de fundamental importância aqui trazermos também uma visão transdisciplinar
de como prestigiados pensadores contemporâneos do campo da comunicação, cultura e consumo enxergam e
definem esse novos e magnéticos ambientes comunicacionais.
Para Erick Felinto (2010), “o advento das chamadas redes sociais, forjadas deste século na e pela apro-
priação social sinérgica de plataformas virtuais e dispositivos interativos (especialmente móveis) de compartilha-
mento de arquivos e informações é um exemplo indubitável e abastado dessa condição social-histórica imprecisa,
hesitante e incompleta”. Nota-se aqui que Felinto, de forma enfática porém contundente, relaciona o surgimento
desses websites de massa como um fenômeno que carrega um viés social importante.
A pesquisadora gaúcha, Raquel Recuero, em sua mais recente obra “Conversações em Rede (2012)”, nos
traz de forma profunda um recorte das redes sociais e como grupo de atores que utilizam determinada ferramenta
para publicar suas conexões e interagir. Recuero enxerga essas redes como uma “ferramenta social usada para
usos conversacionais e de fundamental importância para compreensão da sociabilidade na contemporaneidade”.
São essas conversas publicas e coletivas que hoje influenciam a cultura, constroem fenômenos sociais e espalham
informações. As conversações que acontecem em sites como Facebook, Orkut ou Twitter são muito mais públicas,
permanentes e rastreáveis do que outras (RECUERO, 2012) e trazem informações sobre sentimentos coletivos,
tendências, interesses e interações de grandes grupos.
Em sua obra, Recuero nos traz também uma visão de que a conversação em rede segue alguns rituais
culturais e que faz parte de dos processos de interação social. A mediação digital, ou seja, a intermediação da con-
versação por suportes de informações digitais transforma essa conversação pois o meio interfere profundamente
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também no sentido da mensagem (aqui fazendo alusões à célebre frase do pesquisador canadense Marshall
McLuhan - “o meio é a mensagem” de 1964).
O antropólogo Nestór Garcia-Canclini (2007) argumenta que “no limite, chega-se a fenômenos de au-
tismo e desconexão social, devido às pessoas preferirem antes ficar na frente da tela do que relacionar-se com
interlocutores em lugares fisicamente localizados. Conectividade não é sinônimo de interatividade”. Aqui nota-se
que o pesquisador, que vive hoje no México, entende que o efeito dessa disseminação de novos ambientes virtuais
podem ser nocivos ao processo de ensino-aprendizagem de jovens, pois “cada vez se lê menos livros e mais xerox
de capítulos isolados, textos curtos obtidos na internet, que comprimem a informação. Diminuem os “leitores for-
tes” (extensivos ou intensivos), enquanto aumentam os “leitores fracos” ou “precários” (CANCLINI, 2007). É em
virtude disso que evidencia-se fechamento de livrarias pois os jovens estão lendo menos e com novos parâmetros
de comportamento. No ano de 2010, por exemplo, a Borders (até então, a segunda maior livraria dos Estados
Unidos) entrou em falência. O ato de ler perde valor em uma vida rodeada por telas e aqui nota-se o magnetismo
dos míseros cento e quarenta caracteres que norteias as conversas e interações no microblog Twitter.
É evidente que as redes sociais são as que mais atraes usuários de todos as classes sociais. Segundo o
Comscore (um dos mais renomados institutos de pesquisa quantitativa em redes sociais, em julho de 2010, os dez
países mais populosos do mundo nas redes sociais já somavam um total de quase de 1 bilhão de usuários. Entre
eles, alguns crescen a taxas superiores a 70% ao ano (Russia). O Brasil, que cresce seus usuários em redes sociais
a uma taxa de quase 50% ao ano, se encontra entre os principais líderes de consumo se considerarmos o ranking
de países con mais população nas redes sociais. No Brasil, um em cada seis habitantes já consome alguma rede
social. Um outro levantamento recente do Kantar WorldPanel mostrou que 32% dos domicílios do Río de Janeiro e
São Paulo se conectam a sites de redes sociais digitais, e que os habitantes de 51% conhecem as redes mas não
se conectam com freqüência. Mas 20% da população se diz usuário freqüente. Em 11% das residências em que
se navega, alguém se considera “viciado” pelas redes. Em 30% dos domicílios, os internautas utilizam as redes
para “estar em contato com alguém”, em 23% para compartilhar conteúdos, em 10% para conhecer pessoas do
exterior e 9% para fazer novos “amigos”.
Ainda segundo o Comscore, em 2010 o Facebook cresceu 479% no Brasil. Apesar do crescimento do
Twitter ter sido menos expressivo (86% em 2010), já é no Brasil que a rede de microblogging atinge sua maior
penetração entre usuários de internet: 23%. São Paulo, por exemplo, é a segunda cidade que mais twitta no
mundo, perdendo apenas para Nova Iorque (EUA).
Os espaços comunicacionais do Twitter
As redes estão claramente adotando configurações muito complexas, pois elas multimediatizam rapida-
mente e adquirem funções onde se convergem interesses diversos, desde estar em contato (típico hábito do cha-
mado “networking”), até produzir e compartilhar conteúdos. Nesse ecossistema digital, destaca-se o site Twitter,
criado em 2006, e definido como um site de acesso gratuito e que permite ao usuário o envio de micromensagens
com limite de 140 caracteres por meio da internet, de SMS e de softwares específicos instalados em dispositivos
portáteis. De modo colaborativo e lúdico, compartilha-se um volume sem precedentes de conteúdo nas redes in-
formacionais que congregam pessoas e negócios ao redor do mundo. A ambição de envolver o consumidor como
parceiro e fã de determinada marca, produto ou serviço está presente com maior ou menor grau de transparência
na comunicação mercadológica atual, tornando indispensável problematizar a participação dita “espontânea” nas
redes sociais (CASTRO, 2012).
Desenvolvido para que os usuários respondessem à pergunta “o que vc está fazendo”?, ele também
desviou-se de seus usos originais, tornando-se uma das plataformas populares no Brasil ao longo de 2009. É no
Brasil por exemplo, onde o Twitter alcança a maior penetração de uso entre usuários de Internet (fonte: ComS-
core). Por meio de recursos bastante simples e intuitivos, acessados após a inscrição e a criação de uma página
com nome de usuário, o site permite a postagem de micromensagens e os recursos de “seguir” e/ou ser seguido
por outros usuários.
Além da dimensão pública, pois as mensagens que podem ser lidas por qualquer usuário, o site de mi-
croblog permite a intercomunicação privada por meio das chamadas “mensagens diretas” entre dois usuários que
se sigam mutuamente, permitindo a troca privada em tempo real. Desta maneira, ao permitir a personalização e
a troca de mensagens entre seus usuários, o Twitter tem sido apontado como um site de rede social, entendido
como “espaços da web que permitem aos seus usuários construir perfis públicos, articular suas redes de contato
e tornar visíveis estas conexões (RECUERO, 2009). O Twitter ainda permite que minha mensagem seja ao menos
lida por qualquer outro usuário do ciberespaço, independente de qual for seu capital social e/ou notoriedade. Essa
é uma das características mais interessantes desse site de rede social, pois consigo ter acesso, não só à intimidade
de celebridades, mas também me permite interagir com elas, ou catalisam uma interconexão entre as pessoas,
mantendo canais permanentes de circulação de informação. Essas práticas tomam forma principalmente através
dos retweets (ou RTs ou retuítes). Retuitar uma informação é engajar-se em uma busca pelo capital social, geran-
do valores para o grupo e para o indivíduo.
A rede social do Twitter, por sua vez, fornece uma infraestrutura que garante que as mensagens escritas
pelos usuários sejam transmitidas para todo o público no Twitter Public Timeline. A incidência de mensagens mais
aptas nas redes digitais é tão parecida com o contágio epidemiológico de um vírus que a rápida difusão de uma
mensagem é tratada como um viral. O Twitter, por sua vez, proporciona um ambiente ideal para a replicação viral
de mensagens, oferecendo inclusive uma seleção dinâmica de temas emergentes na seção Trending Topics. A
identificação desses tópicos é realizada por metadados incorporados às palavras ou frases, usualmente prefixadas
com o símbolo cardinal (#) — em inglês, hash — que formam um link denominado hashtag.
No Twitter por exemplo, a dinâmica diferente de conversações, uso de símbolos como o “arroba” (@) e
“hashtags” (#) e o contexto pode ser rapidamente modificado e negociado pelos interagentes (RECUERO, 2012).
E por conta da presença de sites como o Twitter é muito fácil, menos custoso, espalhar informações, ideias,
conversar com outros que estão fisicamente distantes. Recuero (2012) ainda traz também com muita clareza os
rituais que marcam a conversação, marcadores, termos, onomatopeias, emoticons que, de certa forma, são res-
ponsáveis por reproduzir o ambiente da conversação, guiando os atores em relação a cultura estabelecida e as
normas. Nota-se que o compartilhamento deve ser controlado ao mesmo tempo em que é difundido. Ao gerir o
compartilhamento, há uma dinâmica nova de comandar a produção de conteúdos, mas de controlar a circulação,
gerir o tempo da socialização do conhecimento, do saber, da criação.
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Conclusões
Por meio de um manancial teórico aqui apresentado, o que nos fica evidente é que cada rede social apre-
senta potenciais que lhe são próprios, por exemplo as especificidades do Orkut em relação ao Facebook, e este
em relação ao Twitter, embora todas as redes sociais tenham um fio condutor marcado pela intersubjetividade. E
quando imprimimos nosso olhar esses novos ambientes discursivos e informacionais, pode-se observar inúmeras
facetas como, entre elas, as múltiplas identidades que se pode adotar nesses espaços plurais e possibilidade do
anonimato. Sherry Turkle (2010) nos trouxe um nítida reflexão ao dizer que o mundo online provoca atração dos
usuários, pois não carrega as exigências do relacionamento pessoal. Ao evidenciarmos o comportamento de ciber-
nautas em usos cotidianos dessas plataformas, vemos que boa parcela de pessoas preferem desejar a um outro
usuário palavras de feliz aniversario com mais frequência pela rede social do que por meio de contato telefônico
ou pessoal.
E a partir de trabalho bibliográfico, nosso objetivo foi entender aspectos da comunicação nos sites de
redes digitais e discutir como determinados sujeitos sociais produzem conteúdos em sites como o microblog Twit-
ter. Dessa forma, nosso propósito foi demonstrar que se evidencia um processo auto-reflexivo através do qual os
usuários ressaltam determinados aspectos de suas identidades. Esse processo, assim como todos de construção
identitária, é necessariamente voltado para o olhar do outro e requer uma negociação com ele de modo a obter
uma aprovação daquele conteúdo emocional. Neste sentido, a expressividade do usuário no ciberespaço, combi-
nada com suas características simbólicas, são usadas para atingir a coerência almejada pelo ator-social.
Finalizado esta argumentação, importante concentrarmos nossa atenção para a necessidade de trazer
para o debate acadêmico a diversidade de estratégias no contexto das redes digitais de comunicação e implicam
na formação de subjetividades. A intenção aqui não se limitou somente mostrar a relevância dos estudos da co-
municação para a compreensão das dinâmicas socioculturais pós-modernas, mas também contribuir para o debate
sobre consumo midiático na contemporaneidade.
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Resumoo objetivo do presente artigo é fazer uma reflexão sobre os acontecimentos relevantes que nortea-
ram a exposição da Apple nos anos de 2011 e início de 2012, sobretudo em função de emblemáticos
produtos da marca que foram lançados e do falecimento de Steve Jobs, o fundador da companhia.
Além disso, pretende-se aqui também evidenciar como esses fatos podem ser articulados com fenô-
menos contemporâneos do campo da comunicação no mercado globalizado em virtude do impacto
midiático que provocaram na produção de novos hábitos de consumo.
Palavras-chavecibercultura, consumo, tecnologia, Apple, iPhone, Steve Jobs.
Comunicação, cibercultura e o consumo tecnológico da Apple.
“Os botões da tela ficaram tão bonitos que o usuário teria von-
tade de lambê-los”
Steve Jobs em 2001, no lançamento do novo
sistema operacional Mac OS X
Introdução
Vive-se hoje em um mundo cada vez mais interligado e regido
por intercâmbios de ordem mercantil (CANCLINI, 2007) e a chamada era
da informação é, na realidade, a era do excesso de informação (VAZ,
2002). Um único exemplar da edição dominical do New York Times con-
tém mais informação do que a adquirida ao longo da vida por um indi-
víduo culto no século XVIII. A era do excesso é também denominada de
fim da geografia ou globalização. As grandes transformações tecnológicas
na produção e distribuição de informações acumuladas na década de 80
e espraiadas na década de 90 respondem por essa nossa singularidade.
No meio ambiente global, regido pelo diapasão da cibercultura, o tom das comunicações entre empresas
e consumidores está em visível mutação. A tecnologia parece carregar consigo um apelo mais sedutor (CASTELLS,
2000) e para entender os fenômenos da cibercultura em meio à imensidão de possibilidades que cidadãos dis-
põem hoje, temos que defini-la como um processo de socioespacialização profusa de movimentações nacionais
e internacionais de contestação baseadas em tecnologias digitais (FELINTO, 2010). A “cibercultura”, se torna
sinônimo de cultura contemporânea ou pós-moderna e entender toda a cibercultura como uma formação cultural
nos permite, estabelecendo uma compreensão do termo que envolve tanto discursos sociais e narrativas ficcionais
quanto realidades tecnológicas e práticas comportamentais e de consumo. Estamos entrando numa nova cultura
do espetáculo que constitui uma nova configuração da economia, sociedade, política e vida cotidiana, que envolve
novas formas de cultura e de relações sociais e novos modelos de experiência. Isso está produzindo uma nova
cultura do espetáculo com o surgimento de diversos espetáculos, de megaespetáculos e de espetáculos interati-
vos. Isso é evidente nos Estados Unidos, neste novo milênio, e pode muito bem constituir novas formas de cultura
global (KELLNER, 2006).
Pode-se afirmar que temos hoje mais formas de comunicação do que em qualquer outro momento da
história. No entanto, muito mais do que simplesmente entender cada um de novos ambientes de produção midiáti-
ca, devemos refletir como esses fenômenos impactam a sociedade contemporânea e o processo do consumo, bem
como compreender como as marcas procuram dialogar com consumidores cada vez mais protagonistas. Os meios
de comunicação hoje podem ser entendidos como verdadeiras extensões do homem, como próteses destinadas
a expandir suas capacidades de seus vários membros, não chega a ser elevada ao status de um paradigma de
pesquisa normalizado – pretensão alimentada precisamente pelos estudiosos nas materialidades da comunicação
(FELINTO, 2001). Quando a nossa simples presença abre a porta automática de um shopping ou quando o aperto
de um botão de um chaveiro abre ou fecha um automóvel, evidencia-se a tangibilização desse conceito do pes-
quisador fluminense. Vive-se hoje em um universo de ficção científica, onde as máquinas falam e os homens se
comunicam por meio de próteses artificiais (SFEZ, 2007) e entre muitas outras mudanças ocasionadas pela mobili-
dade virtual, a da dimensão do espaço-tempo destaca-se e desenvolve-se sob a enorme influência das tecnologias
móveis na vida cotidiana (SANTAELLA, 2012). Nesse sentido, nota-se como panorama atual a forma pela qual é
possível a existência de uma cultura da virtualidade real, um sistema em que a própria realidade é inteiramente
captada, totalmente imersa em uma composição de imagens virtuais do mundo da imaginação (CASTELLS, 1999).
Na mesma pessoa combinam-se a leitura que se ouve num disco, livros escaneados, publicidade da televisão,
iPods, enciclopédias digitais que mudam todo dia, uma variedade de imagens, textos e saberes que formigam na
palma de sua mão, com a qual você liga o celular (CANCLINI, 2008). E em meio a uma imensidão de possibilidades
de compra de produtos e adesão a serviços, aliada ao acesso à informação e a melhoria tecnológica, o homem
contemporâneo encontra-se cada vez mais crítico e exigente nas suas escolhas.
Nesse contexto sócio-cultural, estamos rodeados de condições adversas à habilidade de desenvolver
relações autenticas com os lugares, e uma das causas mais agudas para esses estados das coisas, encontra-se
na aceleração da mobilidade nas sociedades contemporâneas (SANTAELLA, 2012). Os chamados gadgets como
iPhone, iPad, iPod, iMac, HD TV, GPS, BlackBerry surgem de forma avassaladora, com números de vendas expo-
nenciais, e fazem parte da vida desse consumidor contemporâneo de forma muito próxima e íntima. Quando as
pessoas compram um iPhone, por exemplo, estão não apenas adquirindo um aparato tecnológico, como também
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vivenciando certo estilo de vida (digital) e se inscrevendo num imaginário tecnológico que enfatiza as ideias de
inovação, elegância e distinção econômica (FELINTO, 2010). Fenômenos como esse apenas tangibilizam em atí-
picas manifestações ciberculturais e reorganizam sociedades no âmbito cultural, social e patê político, e nos deixa
muito evidente como esses fenômenos tecnológicos como e explosão do wireless catalisa a dinâmica da Web,
onde posso postar tudo, texto, vídeo (CASTELLS, 2009).
Consumo, Publicidade e as Marcas
Vivemos em um mundo onde as histórias começam e não terminam (CANCLINI, 2008). Você está
dirigindo o carro enquanto ouve um áudio-livro e é interrompido por uma ligação no celular. Ou você está em
casa, sentado numa poltrona, com o romance que acabou de comprar, enquanto na televisão ligada à espera do
noticiário passam um anúncio sobre as novas funções do iPod. Você se levanta e vai até o computador para ver
se compreende essas novidades que não estão mais nas enciclopédias de papel e, de repente, percebe quantas
vezes, mesmo para procurar dados sobre outros séculos, recorre a esses novos patrimônios da humanidade que
se chamam Google e Yahoo (KLEIN, 2002).
E ao analisar esses fenômenos de novas práticas culturais no contemporâneo, pode-se entender que
a conectividade e o consumo hoje representam as vias preferenciais de emancipação de nossas juventudes em
relação aos modos vigentes de organização social. Diversos jovens entendem o consumo não apenas como a
apropriação de um novo bem, mas sim o ingresso num imaginário simbólico e que tornam mais viável seu acesso a
bens globalizados (CANCLINI, 2008). Nesse sentido, a publicidade, ao revestir de significações o mundo do traba-
lho por meio de sua linguagem, lança-o no mercado simbólico, como mercadoria de consumo cultural, legitimando
modos de leitura dessa atividade humana que constituem discursos hegemônicos. A publicidade proporciona
representações, visões de mundo, recortes do cotidiano que lançam nossa experiência humana no universo das
marcas, dos produtos e instituições com fins comerciais. Percebe-se que a publicidade é caracterizada por cons-
tituir uma espécie de sistema filosófico, uma vez que nos fornece uma interpretação do mundo baseada em sua
ótica (BERGER, 1974). Nesse sentido, compreendemos a publicidade como entrada em cena da marca no mercado
de trocas simbólicas (BOURDIEU, 2001), como representação da lógica de si – apesar de a identidade da marca
ser mais ampla – no diálogo com as apreensões desenvolvidas por seus vários públicos. A proposta dos mundos
possíveis da marca utiliza o trabalho como figurativização das formas como a marca quer ser vista, expondo sua
lógica para consumo simbólico de seus públicos.
Em meio à disputa que as marcas protagonizam entre as inúmeras mercadorias existentes, as empresas
precisam transformar seus logotipos em pontos de referência conhecidos na cultura contemporânea (KELLNER,
2006). Justifica-se aqui trazer a tona o conceito de marca que (KAPFERER, 2003) também se refere à diferen-
ciação quando discute sobre a “lógica da marca”, ou seja, a razão de ser das marcas. E essa existência parte,
inicialmente, do entendimento da missão da marca. Paralelo ao conceito de marca, a publicidade, ao revestir de
significações por meio de sua linguagem, lança-o no mercado simbólico, como mercadoria de consumo cultural,
legitimando modos de leitura.
Nesse universo, muito mais importante do que as marcas simplesmente estarem presentes em redes
telemáticas, é preciso saber estar presente na rede, assim como também interagir a tempo e de forma adequada
na arena digital (CASTRO, 2012). A proposta dos mundos possíveis da marca utiliza o trabalho como figurativiza-
ção das formas como a marca quer ser vista, expondo sua lógica para consumo simbólico de seus públicos. Elas
integraram o conceito da gestão de marca com o próprio tecido de suas empresas. Sua cultura corporativa era
tão estreita e enclausurada que de fora parecia ser um cruzamento entre uma fraternidade universitária, um culto
religioso e um sanatório (KLEIN, 1999).
A própria expressão “think different” idealizada para a marca Apple em uma histórica campanha publi-
citária lançada pela Apple em 1997, traduz com concisão um importante aspecto do imaginário daquilo que tem
sido definido com o termo cibercultura. Considerada por alguns como uma impropriedade gramatical – a forma
correta seria think differently (“pense de modo diferente”), para outros se trata de um idiomatismo. Em lugar do
advérbio “diferentemente”, teríamos o equivalente em português a algo como “pense em diferença”. No caso em
pauta, naturalmente, a diferença oferecida pela marca Apple em seus produtos, associados costumeiramente a
valores como inovação, ousadia, criatividade e ruptura (FELINTO, 2010).
No imaginário do consumo, conceitos de marca ou construção de marca são ressignificadas, de modo a
transformar a compreensão das práticas cotidianas. O produto final não é atestado de compromisso entre o trabalha-
dor e sua criação. É, na perversa inversão, uma criação comprometida com a ausência da marca humana (CARRAS-
COZA, 2011). O consumo de um produto da marca Apple carrega um forte apelo simbólico, muito ancorado na figura
Steve Jobs, o fundador da companhia e principal executivo da empresa durante anos. Grande parte desse sucesso da
Apple advém de uma bem articulada logística de terceirização de serviços, onde ela contrata empresas para serviços
específicos, em um tempo limitado e por preços minimizados. No entanto, evidencia-se que a característica dessa
economia de serviços é perversa, onde ela implica, pela sua própria lógica, na concentração de massa salarial numa
faixa muito estreita de cargos gerenciais e de diretoria, e fora desse núcleo privilegiado a realidade é muito dramá-
tica, na medida em que esse mesmo sistema força a dispersão e a desqualificação ocupacional (SEVCENKO, 2002).
Uma das mais recentes criações da equipe de Jobs é o iPad 2 e que chegou ao Brasil em 2011. Quando
lançado em 2010, o iPad 1 foi a vanguarda tecnológica no recente mercado de tablets e se tornou item de desejo
por uma boa parcela de consumidores. Na ocasião, com a habitual forma sutil de ironizar os concorrentes, Jobs
na apresentação oficial do novo produto para o mundo, disse que os demais competidores ficariam “flummoxed”
(traduzindo: desconcertados). Em relação ao primeiro modelo, o iPad 2 era mais leve, mais fino e mais rápido. No
que diz respeito ao design, carrega elementos que denota sofisticação, uma extrema atenção aos detalhes e tudo
muito intuitivo. O iPad 2 logicamente não possui manual de instruções, pois se aprende a operá-lo sozinho. O ma-
nual do produto encontra-se disponível para download no site da Apple. Aqui, evidencia-se uma queda da ênfase
na produção material em favor da imaterialidade das marcas e outros intangíveis. Mais uma vez os pilares publici-
dade e marketing entram em cena, buscando moldar de forma favorável a percepção da imagem através da qual
uma marca venha a ser reconhecida e valorizada. Se antes vendiam-se coisas, atualmente vendem-se, sobretudo,
imagens e modos de ser. Verifica-se um investimento mais sutil do mercado nos próprios processos de subjetiva-
ção. Nesse sentido, a mídia desempenha uma função primordial ao veicular e induzir ideias, atitudes e padrões de
comportamento que podem servir de modelo para a construção de identidades em nossos dias (CASTRO, 2009).
A chegada do iPad 2 no Brasil mostra como a Apple, que dita a vanguarda tecnológica, gera uma rápida
obsolescência de produtos. O iPad 1 que, até 2010, era item de desejo, hoje já está obsoleto, pesado e lento. Essa
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rapidez com que novos modelo são lançados, nos leva a crer que a equipe de designers e engenheiros da Apple já
estão com o iPad 3 pronto, e o iPad 4 já no protótipo, e o iPad 17 já idealizado. E cabe a nós cidadãos globais, cada
vez mais ávidos pelo consumo tecnológico, sermos magnetizados por esse espetáculo do consumo. O mercado é
o novo paradigma do consumo e surge com proeminência nas dinâmicas sociais atuais. Nossas sociedades são,
portanto denominadas sociedades de consumo (CASTRO, 2009). Os jovens
adquirem nas telas extra-curriculares uma formação mais ampla em que conhecimento e entretenimento
se combinam (CANCLINI, 2008). Os jovens que incorporam plenamente essas tecnologias as colam ao corpo como
um elemento a mais de indumentária, calças, paletós, jaquetas e mochilas são fabricadas com lugar para o celular,
e a corporabilidade deve abrigar as tecnologias (QUEVEDO, 2007).
Falecimento de Steve Jobs e os últimos lançamentos da Apple
Steve Jobs começou sua carreira na Atari, onde ficou estigmatizado pela sua arrogância e pelo seu mau
cheiro. Na manhã de 6 de outubro de 2011, Jobs faleceu, após uma longa e histórica jornada à frente do mundo da
tecnologia. Ao mesmo tempo em que demitia funcionários dentro dos elevadores da Apple, em Cupertino/Califó-
nia, de lá eram lançados produtos como o iPad, e ao mesmo tempo em que não fazia pesquisa com consumidores
para lançar seus produtos, Jobs levava seus designers para conhecer a Casa da Cascata de Frank Lloyd Wright, na
Pensilvânia, para lhes inspirar o processo criativo. Jobs dizia com naturalidade que o trabalho de mil engenheiros
que se debruçaram em um projeto durante três anos de nada valeu, mas também sentava com funcionário de fá-
brica para discutir o processo de abrir a caixa dos produtos da Apple pelo consumidor. Ele fazia isso, pois entendia
que aquele era um momento mágico.
Apenas dois dias a antes do falecimento de Steve Jobs, no dia 4 de outubro de 2011, acontecia o lan-
çamento mundial do novo iPhone 4S onde tudo podia será acompanhado pela rede de microblog Twitter e pela
cobertura de blogueiros do ecossistema digital. Era o primeiro grande lançamento da Apple após a saída de Steve
Jobs. O fato de não ter Steve Jobs no palco com todo seu carisma, o novo lançamento perdeu o brilho. Quando
olhamos o que nos foi apresentado vemos: um novo iPhone 4s apenas com um processador mais veloz, uma
câmera com oito mega-pixels (que o Galaxy SII da Samsung já possuía), novos aplicativos (por exemplo, o novo
aplicativo, “Find My Friends”, que permite localizar amigos que também têm iPhone) e uma política de preços de
iPhone bem convidativa. Como suporte para um conjunto de representações características do imaginário tec-
nológico contemporâneo, o iPhone nos permite divisar com clareza as profundas contradições da cibercultura e
de forma paradigmática, o celular da Apple condensa as dimensões materiais e tecnológicas da cibercultura com
sua contraparte imaterial, formada por um imaginário em que a tecnologia é dualisticamente lugar da razão e da
imaginação, da ciência e da religiosidade, da unidade e da multiplicidade, da utopia e da distopia (FELINTO, 2010).
Um fato inusitado é que nesse dia em que a Apple apresentava ao mundo o iPhone 4s, no encontro
da 5th Avenue com o Central Park, em Nova York, a loja da Apple Store, ou a “Meca” da tecnologia mundial,
estava passando por reformas. A famosa fachada (há quem diga que ironiza a pirâmide do Museu do Louvre em
Paris) estava completamente coberta por tapumes com os seguintes dizeres: “We’re simplifying the Fifth Avenue
cube. By using larger, seamless pieces of glass, we’re using Just 15 panes instead of 90”. (traduzindo: “Estamos
simplificando o cubo da Quinta Avenida. Por meio de pedaços placas de vidros transparentes e maiores, vamos
usar apenas 15 painéis em vez de 90”). O caso do iPhone, como de muitos outros produtos da Apple, é exemplar,
pois nele encontramos um perfeito casamento entre a materialidade do fato tecnológico (sua interface sensorial
e seu design sensual) e as múltiplas camadas discursivas que o sobredeterminam, destacando os valores típicos
da cibercultura (FELINTO, 2010). Na verdade, jornalistas, estudiosos de tecnologia e bloggers através de todo o
ciberespaço têm frequentemente apelidado o iPhone como “Jesus phone”. Essa comparação evoca a imagem de
Steve Jobs (presidente da Apple) como Salvador de todas as nossas necessidades tecnológicas e do iPhone como
divindade. Já se argumentou que os usuários do “Jesus Phone” são como os seguidores de um culto, demonstran-
do tendências de caráter religioso, por exemplo, o culto do Jesus Phone. (CAMPBELL, 2007).
O último midiático lançamento da Apple foi o iPad 3, ou “The New iPad” como foi chamado. Ele foi
lançado na quarta-feira dia 7 de março de 2012 em San Francisco às 15:27hs (horário de Brasília), pesando 635
gramas e medindo 9,4 milímetros de espessura. Tim Cook, o novo principal executivo da Apple, visivelmente não
possuía a luz própria que Steve Jobs possuía no palco, mas coube a ele apresentar o novo produto para o mundo.
Tudo era publicidade para a marca: a tentativa de um novo CEO superstar, atenção fanática à coerência do design,
uma propensão à construção de monumentos e declarações de missão no estilo Nova Era (KLEIN, 1999). A nova
criação de Tim Cook e seus engenheiros vem com as seguintes novidades: câmera de 5 mega pixels com auto foco
e detecção de faces, chip A5X (com núcleos de CPU, e 4 núcleos de processamento gráfico para os amantes de
games), processador gráfico Quad Core, tela com a tecnologia de retina-display (dobro de resolução do anterior),
terá conectividade 4G (que para os brasileiros ainda é uma característica inútil), permite downloads em até 21MB
por segundo e bateria com duração de 10 horas. O novo iPad começou a ser vendido nos Estados Unidos no dia
16 de março de 2012 por $499 dólares.
Considerações Finais
Essa discussão centrou-se na articulação entre o consumo de produtos tecnológicos da Apple no mercado
globalizado, destacando a veiculação de modelos e padrões midiáticos que atuam como moduladores identitários
e como parte dos estilos de vida característicos desses novos tempos. Percebe-se um novo contexto mundial com
uma consolidação de um núcleo de empresas que, beneficiadas por medidas de desregulamentação, se tornaram
extremamente fortes em suas negociações (SEVCENKO, 2002) e definitivamente entramos em uma nova cultura
do espetáculo que constitui uma nova configuração da economia, sociedade, política e vida cotidiana, que envolve
novas formas de cultura e de relações sociais e novos modelos de experiência (VAZ, 2002).
A intenção aqui foi a de demonstrar a relevância dos estudos da comunicação para a compreensão das
dinâmicas socioculturais em circulação e como isso norteia nossos esforços para contribuir neste importante de-
bate sobre consumo e tecnologia na contemporaneidade. Estamos vivendo a emergência de uma nova forma de
consumo, aquela definida pela apropriação simbólica de bens tecnológicos e regidos pelas complexas fronteiras
fluidas da cibercultura. Enfrentar e entender adequadamente essa hesitante dinâmica do consumo nos exigirá
concepções epistemológicas renovadas e uma forma de produzir conhecimento menos avessa à incerteza e ao
imaginário.
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ResumoO objetivo do presente artigo é imprimir uma reflexão teórica sobre novas práticas de apropriação
social de aplicativos digitais em dispositivos móveis de compartilhamento de fotos, como o Insta-
gram. A intenção aqui é trazer para a discussão acadêmica uma análise de como indivíduos constro-
em peculiares estratégias de produção de conteúdo e que chamamos aqui de “reality show fitness”,
protagonizado pela blogueira Gabriela Pugliesi, criadora do blog Tips 4 Life e que vem conquistado
uma destacado reconhecimento por meio da criação de um perfil no Instragram que incita usuárias
comuns à práticas diárias de atividade física e à conquista de uma tão almejada qualidade de vida.
Por meio de uma pesquisa de caráter empírico e ancorado em pensadores contemporâneos do
campo da comunicação, principalmente nomes como Lúcia Santaella, Paula Sibilia e Gilles Lipovet-
sky, propõem-se aqui um diálogo reflexivo sobre como essas novas web-celebridades se apropriam
dessas mídias na produção de novos hábitos de consumo da cena digital.
Palavras-chavecibercultura, consumo, Instagram, fitness, qualidade de vida.
O “reality show fitness” no aplicativo móvel digital Instagram.
“A interação social surge a partir dos propósitos individuais que
incluem, entre outros, os interesses de poder, vaidade e riqueza.”
Georg Simmel, 1983, p.166
Uma mirada cibercultural para a contemporaneidade
Como um palco das mais diversas manifestações midiáticas contemporâneas, o ciberespaço tem se apre-
sentado como um ambiente tecnológico que abarca múltiplas facetas de uso e significados culturais. Em meio a
uma potente repercussão de conteúdos e de holofotes apontados às supostas celebridades que surgem a cada dia
nesses espaços comunicacionais, o ciberespaço é um ambiente aberto para o nascimento de novos atores, locali-
zados muitas vezes ao acaso e lançados a uma fama imediata. Nesse sentido, no meio ambiente contemporâneo
que residimos, regido pelo diapasão da cibercultura, o tom das comunicações entre consumidores está em visível
mutação, pois a tecnologia parece carregar consigo um apelo mais sedutor (CASTELLS, 2000) e para entender os
fenômenos da cibercultura em uma imensidão de possibilidades que cidadãos dispõem hoje, temos que defini-la
como um processo de socioespacialização profusa de movimentações nacionais e internacionais de contestação
baseadas em tecnologias digitais (FELINTO, 2010). A “cibercultura” se torna sinônimo de cultura contemporânea
ou pós-moderna, e entendê-la nos permite estabelecer uma compreensão do termo que envolve tanto discursos
sociais e narrativas ficcionais quanto realidades tecnológicas e práticas comportamentais e de consumo.
Enquanto alguns usuários do ecossistema comunicacional online são “early addopters”, outros são exclu-
ídos digitalmente, o que nos leva a crer que apropriação de mídias está intimamente ligada a questões de classe
social, idade, gênero, especialmente nos jovens e onde se evidencia um aumento significativo de fenômenos como
o “user-generated content” (COULDRY, 2012), ou seja, o conteúdo cada vez mais gerado pelo próprio usuário,
especialmente por conta do advento de tecnologias móveis que lhe concede a possibilidade de estar “always on”
(TURKLE, 2011). Fenômenos como esses nos comprovam que essa mobilidade virtual não apenas se potencializou
e se diversificou com o advento da internet e mídias móveis, como também adquiriram novos significados e fez
surgir novas habilidades humanas para fazer uma entidade abstrata fluir eletronicamente (SANTAELLA, 2010).
Dentro da cena digital, o aplicativo Instagram é quem merece nosso foco de reflexão nesse artigo. Trata-
se de um aplicativo móvel que pode ser definido como uma rede social digital de compartilhamento de imagens, e
que desde junho de 2013 inseriu a possibilidade de também se publicar vídeos. Nos primeiro dias de sua recente
história, o Instagram era apenas quatro funcionários, incluindo seus dois co-fundadores. Mais uma start-up nas-
cida no estado da Califórnia (Estados Unidos), foi adquirida por Mark Zuckerberg (fundador do Facebook, a rede
social digital que mais congrega pessoas hoje no mundo). Por trás dessa aquisição do Instagram percebe-se uma
aparente intenção do Facebook em se tornar ainda mais possante nos dispositivos. Considerado um dos grandes
destaques da arena online contemporânea, o Instagram é um aplicativo gratuito que permite aos usuários tirar
uma foto, aplicar um filtro para ela, e depois compartilhá-la em uma variedade de redes sociais, incluindo o próprio
Instagram. Projetado pelo brasileiro Mike Krieger e Kevin Systrom, o Instagram inicialmente foi idealizado para uso
em dispositivos móveis. A peculiar intuitividade e o conceito do aplicativo é destacadamente simples, pois permite
aos seus usuários compartilharem imagens, bem como aplicarem nelas uma grande variedade de filtros e efeitos
disponíveis. A arquitetura de informações, símbolos e ícones do aplicado na tela de uma smartphone é cirurgica-
mente construída para que até novos usuários já aprendam a utilizá-lo em poucos minutos. Esses usuários podem
compartilhar as fotos tratadas por meio do próprio aplicativo em redes sociais digitais como Twitter, Facebook,
Foursquare e Tumblr. Assim como também se pode visualizar fotos de outros usuários que estejam devidamente
conectados à sua rede. O Instagram provoca um certo magnetismo em seus 30 milhões de usuários que fazem
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uploads de mais de 5 milhões de fotos ao dia.
O conceito do aplicativo faz com quem pessoas se comuniquem por meio de imagens. O Instagram é
fundamentalmente uma rede social concebida em torno da fotografia, e disponibilizado apenas para uso em ce-
lulares (para iPhones da Apple, e agora já disponível também para o Android, o sistema operacional da Google),
onde as pessoas adicionam efeitos as suas fotos produzidas com a câmera do celular e compartilham com os
amigos. Mais que isso, vemos que “as ferramentas informáticas tornam possíveis uma comunicação em tempo
real, criando um sentimento de simultaneidade e de imediatismo que transcende as barreiras de tempo e espaço”
como enxerga com muita lucidez o pensador francês Gilles Lipovetsky (2010, p.16) em sua recente obra “A Cultu-
ra-Mundo”. Nota-se como essa nova dinâmica midiática acelera as mudanças ocasionadas pela mobilidade virtual e
uma enorme influência das tecnologias móveis na vida cotidiana, quando o celular fez emergir uma síntese inédita
do tempo mecânico com o tempo orgânico (SANTAELLA, 2012). O Instagram, uma criação concebida puramente
para o universo mobile, nos evidencia que a mobilidade virtual não apenas se potencializou e se diversificou, com
também adquiriu novos significados a partir do momento em que se vê a habilidade humana para fazer uma en-
tidade abstrata, a informação, fluir eletronicamente (SANTAELLA, 2012).
Nesse aspecto, as interações humanas em ambientes de interface digital que congregam milhões de
usuários têm sido objeto de pesquisa no campo da comunicação, notadamente em grupos e laboratórios criados
especialmente para esse fim nas principais universidades do país. Nesse sentido, podemos compreender os fenô-
menos da cibercultura como “um processo de socioespacialização profusa de movimentações nacionais e interna-
cionais de contestação baseadas em tecnologias digitais” (TRIVINHO, 2010, p.25), porém nem só de contestação
vive a cultura digital. Entender essas interações mediadas pelas redes digitais nos permite estabelecer “uma
compreensão do termo que envolve tanto discursos sociais e narrativas ficcionais, quanto realidades tecnológicas
e práticas comportamentais e de consumo” (FELINTO, 2010, p.43).
Considerações sobre o método
À luz de pensadores como Erick Felinto, Eva Illouz, Gilles Lipovetsky, Lúcia Santaella, Maria Eduarda Mota
Rocha, Miriam Goldenberg e Paula Sibilia, dentre outros autores, propõe-se aqui um diálogo reflexivo sobre novas
práticas de consumo propiciados pela apropriação social das redes digitais, articuladas às mídias móveis. A parte
empírica desta investigação irá se centrar em certas performances identitárias que se fundamentam na retórica
radical do fitness como qualidade de vida e seu comparecimento nas redes digitais, sendo o Instagram o lócus
selecionado para a pesquisa.
Como um fenômeno relativamente recente, a estratégias de produção midiática dentro do aplicativo
móveis de fotografias digitais, como o Instagram, não são estudadas ainda com tanta profusão pelo campo da
comunicação. Diante disso, foi necessário ampliar a metodologia partindo-se para uma pesquisa do tipo empírica.
A intenção da investigação foi refletir sobre a produção e o consumo de imagens nesse espaço comunicacional
digital, como ênfase na performance de Gabriela Pugliesi, criadora do blog Tips 4 Life.
Por meio da observação não participante, foram monitorados durante todo o mês de março de 2013
os posts exibidos no perfil selecionado. O material empírico foi composto tanto dos elementos textuais quanto
imagéticos. Vale ressaltar aqui que o cruzamento dos aportes teóricos e a análise do material empírico foram fun-
damentais para propiciar um melhor entendimento do consumo tecnosimbólico que caracteriza esse nosso objeto
de pesquisa.
No dia 11 de abril de 2013, a usuária contava com 115 mil seguidoras (aqui usa-se o termo “seguidoras”
pois na sua maioria são usuárias do sexo feminino) e foram publicadas mais de 2,7 mil fotos publicadas até esse
período. No dia 13 de julho, Gabriela conta com mais de 255 mil seguidoras, mais que o dobro do que foi obser-
vado três meses atrás.
A lógica do fitness e a retórica da qualidade de vida no Instagram
Considerada pelo portal Ego (Globo.com) como “um fenômeno do Instagram”, Gabriela Pugliesi, uma
moça de 27 anos e que abandonou um emprego formal em joalheria para se dedicar exclusivamente aos posts em
uma rede social digital. As dicas da baiana, que mora hoje em São Paulo, vão desde receitas light de alimentos,
tirinhas com anedotas, fotografias de situações cotidianas, e em sua maioria, todas na Academia Reebok, uma das
melhores e mais bem equipadas da cidade, localiza no terraço do Shopping Cidade Jardim, o epicentro do consu-
mo de luxo no país. O aparente sucesso do seu blog não só magnetizou uma legião de seguidoras e algumas capas
de revista (hoje Gabriela Pugliesi assina uma coluna mensal na prestigiada Revista Women’s Health da Editora
Abril), mas também uma miríade de marcas de roupas, alimentos funcionais e suplementos que se aproximaram
da blogueira com a intenção de que ela fosse patrocinada, e com isso endossasse determinados produtos.
Interessa aqui examinar o perfil de Gabriela Pugliesi que exibe um discurso norteado pelo formato mi-
diático aqui chamado de “reality show fitness”. Entendemos como “reality show” esse fenômeno de uma cidadã
comum adquirir status de celebridade de forma abrupta e meteórica por meio de um processo de alta visibilidade
de suas práticas cotidianas, principalmente àquelas associadas ao universo fitness, ou seja, àquele destinado ao
condicionamento físico do corpo. A blogueira está angariando uma legião de seguidoras por conta de uma es-
tratégia de fotos e textos baseada no oferecimento de um profícuo cardápio que visa a aumentar a qualidade de
vida. O próprio texto que descreve o perfil de Pugliesi já sintetiza o inquietante mote desse objeto de pesquisa. Os
dizeres são os seguintes: “Gabriela Pugliesi - healthy lifestyle - estilo de vida saudável e feliz! Nosso corpo é nosso
templo! Se ame! #geracaopugliesi #tips4life”. Em seu texto inicial do aplicativo, Gabriela já associa claramente a
questão de felicidade com o condicionamento físico, além de uma exacerbação do corpo humano.
Pretende-se focalizar nesse estudo as estratégias midiáticas nas quais se ancoram a performances iden-
titárias de Gabriela. Vale frisar aqui que outras dezenas de personagens, com um propósito similar ao de Gabriela
proliferam no Instagram. No entanto, a protagonista dessa pesquisa foi uma das pioneiras, tem um estilo único
e é a usuária que detém no Brasil a quantidade mais elevada de seguidoras. Na era do culto ao corpo e da es-
petacularização da imagem de si como estratégia de visibilidade, pretende-se aqui estimular uma reflexão sobre
as performances identitárias de personagens como essa. Com uma retórica fortemente fundamentada no ideal
máximo do fitness, Pugliesi tem sido bem sucedida em chamar a atenção por meio de seu perfil no aplicativo de
fotos. No momento em que esse artigo foi elaborado, o blog em questão possui mais de 50 mil seguidoras. Nas
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legendas das (quase sempre) narcísicas fotos publicadas no Instagram evidencia-se uma retórica norteada por
um feroz julgamento que aponta indiretamente para aquelas usuárias que sucumbem no esforço de se enquadrar
nas coordenadas da extremada boa forma física. O sucesso desse tipo de iniciativa pode ser compreendido dentro
do contexto cultural brasileiro, onde o corpo humano se apresenta como um verdadeiro capital físico, simbólico,
econômico e social (GOLDENBERG, 2007). Nesse sentido, mesmo tendo à sua disposição um diversificado arsenal
de insumos fornecidos, aparentemente de forma gratuita, por marcas de roupas e alimentos funcionais, Pugliesi
prima por apresentar técnicas, poses que lembram movimentos contorcionistas e dicas sobre fitness radical. Seus
posts exibem uma retórica que visa persuadir sobre o que se poderia considerar como desvairadas certezas, es-
timulando nas suas seguidoras um intenso regime de auto-vigilância que nos inquieta e instiga a esta reflexão
(SIBILIA, 2012).
Gabriela Pugliesi sagazmente adota uma estratégia muito clara para alcançar um notório reconhecimen-
to no Instagram. A busca da boa forma, uma suposto aumento de qualidade de vida e o bom humor se tornam
o tripé discursivo que alicerçam a retórica da web-celebridade. Evidencia-se um discurso norteado pelo formato
midiático aqui chamado de reality show fitness, pois a protagonista desse tipo de representação cibercultural era
uma cidadã comum há meses atrás, e após adotar uma estratégia apenas no aplicativo Instagram adquiriu consi-
derável repercussão em termos de número de seguidoras e conseguiu status de celebridade servindo-se do mote
da forma física idealizada como indispensável para a qualidade de vida e, no limite, mesmo à elusiva felicidade.
A partir da argumentação de Eva Illouz (2007), pode-se claramente compreender a recente valorização
desta perspectiva como sintoma de uma cultura que elege rituais para evitar o sofrimento a qualquer custo. Dessa
forma, diversas estratégias de comportamento se tornam passíveis de monetização, instrumentalização e promo-
ção pessoal, entre eles a empatia, a pré-disposição e o bem-querer implícitos às nossas relações com os amigos.
Norteada por uma lógica de otimizar, nossa sociedade passa a se perguntar como a intimidade e amizade podem
ser socialmente distribuídas e alocadas em prol de benefícios tangíveis. Afinal, ser feliz nos torna benquistos e
fomenta a ampliação de nossas redes sociais, e consequentemente, dos recursos que podemos acessar a partir
delas. A competência emocional (ILLOUZ, 2007), que envolve a adoção do discurso terapêutico para a resolução
de problemas, fornece aos indivíduos uma ferramenta cultural para atribuição de sentido aos momentos de difi-
culdade e um repertório comum para alcançar o bem estar na esfera privada. Assim, o campo das emoções não
só se torna público, mas é requisitado como forma de otimizar a capacidade dos indivíduos de alcançar formas de
felicidade historicamente e socialmente situadas.
Dentre às milhares de fotos já publicadas por Gabriela, aqui a seguir destaca-se algumas. Há posts em
que Gabriela mostra uma foto dela mesma puxando com os dedos a fina pele da parte superior de sua mão com
os dizeres: “projeto barriga que nem pele de mão”. A blogueira, de uma certa forma, incita suas seguidoras a
buscarem uma forma de emagrecimento abdominal semelhante à pele de mão. Com um usual tom de humor,
evidencia-se aqui até mesmo um certo exagero pois o nível de adiposidade de região das mãos não se assemelha
ao da região abdominal. Aqui justifica-se o uso do termo “radical” para essas manifestações. Já em outra foto ela
demoniza marcas de fast food como o McDonald’s ao dizer que “toda vez que vocês comem batata-frita pensem
que elas estão rindo da sua cara pensando: vamos furar essa bunda”. Nota-se aqui uma retórica norteada por um
feroz julgamento que aponta indiretamente para aquelas usuárias que sucumbem no esforço de se enquadrar nas
coordenadas da extremada boa forma física (SIBILIA, 2012).
Nota-se que em boa parte dos textos produzidos por Gabriela, o “discurso neoliberal se espraia pela co-
municação interpessoal e as relações passam a ser geridas por meio da lógica do custo-benefício (ILLOUZ, 2011).
Para Eva Illouz (2011), vivemos na época do capitalismo afetivo, no qual os cálculos de custo-benefício norteados
pelos discursos clássicos de marketing e branding passam a vigorar também no âmbito pessoal. E nesse regime de
visibilidade hipertrofiada, a boa forma física assume importância chave como capital simbólico pessoal. Mais que
isso, evidencia-se “a reluzente moral da boa forma em plena ação: aquela que não se envergonha nem se preo-
cupa por ocultar a sensualidade mais escancarada, mas exige de todos os corpos que exibam contornos planos e
relevos bem sarados, como os da pele plástica da boneca Barbie.” (SIBILIA, 2012).
Por diversas vezes, Pugliesi apresenta sugestões de marcas de alimentos saudáveis que supostamente
patrocinam a blogueira. A vinculação dos bens culturais e midiáticos às identidades nos sites de redes sociais é
muito comum. Esse processo endossa o entendimento das práticas de consumo na contemporaneidade como
práticas de construção identitárias cotidianas, que se dão tanto no âmbito material quanto simbolicamente. Nesse
sentido, vale trazer as relevantes contribuições da pesquisadora Maria Eduardo Mota Rocha quando diz que o
“consumo moderno define-se pela proeminência de atributos simbólicos dos produtos em detrimento de suas qua-
lidades estritamente funcionais e pela manipulação desses atributos na composição de estilos de vida” (ROCHA,
2010, p.37). Outro apontamento do sociólogo Gilles Lipovertsky se faz necessário aqui ao dizer que estamos inse-
ridos em um “universo do hiperconsumo que traz uma multidão de benefícios, bem estar material, melhor saúde,
informação e comunicação, ele contribui para tornar possível uma maior autonomia dos indivíduos em sua ações
cotidianas (2012, p.58). O pensador francês também nos oferece outro pensamento de forma muito pertinente
ao especular que na sociedade do hiperconsumo, as atividades mais elementares da vida cotidiana tornam-se
problemas e causadoras de interrogações perpétuas, como a alimentação, pois “a hora é da desorganização das
condutas alimentares, da cacofonia das referências e critérios... trata-se não mais tanto de comer quanto de saber
o que comer, de tanto presos que estamos entre os estímulos gulosos e modo de se alimentar mal, de consumir
muito açúcar, muita gordura, corantes, de tornar-se obeso em uma sociedade que apresenta como modelo a ma-
greza.” (LIPOVETSKY, 2000, p.59).
Figura 1 e 2: ao lado vemos 2 exem-
plos genéricos de típicas imagens que Gabriela
Pugliesi costuma publicar em seu Instagram.
Na primeira ela exibe duas fotos pulando cor-
da e ser exercitando com os dizeres: “Pra não
sobrar nada do bolo de ontem”. Já na segunda
foto uma tirinha de quadrinhos onde a anedo-
ta sintetiza a retórica da Gabriela, pois associa
que felicidade = ser magra.
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No manancial de fotos e texto que Gabriela publica na timeline de seu Instagram, evidencia-se nas
entrelinhas um discurso norteado pelo suposto prolongamento da duração da vida, onde ela colhe os frutos da
eficácia tecnológica da medicina e de sua condição sócio-econômica aparentemente bem sucedida. Pugliesi surge
para milhares de seguidoras em um cenário da existência luxuriante de um mundo que promete e felicidade de
satisfações incontestáveis e sempre renovadas. Mais que isso, o discurso da blogueira encaixa-se hermeticamente
em “um mundo tão depressivo, cheio de ansiedades, gerador de inquietações de toda natureza, e pela primeira
vez menos otimista quanto à qualidade de vida por vir” (LIPOVETSKY, 2010, p. 23). As formas desse neoindividu-
alismo centrado na primazia de si são incontestáveis. Paralelamente à autonomia subjetiva, ao hedonismo, desen-
volve-se uma nova relação com o corpo: obsessão com a saúde, culto do esporte, boa forma, magreza, cuidados
com a beleza, cirurgia estética, manifestações de uma cultura tendencialmente narcísica.
Paralelo a essas constatações, deve-se atentar aqui que ao criar um perfil em um site de rede social
digital, sobretudo em sites que privilegiam elementos imagéticos, como o Instagram, as pessoas “passam a
responder a atuar como se esse perfil fosse uma extensão sua, uma presença daquilo que constitui sua identi-
dade. Esses perfis passam a ser como estandartes que representam as pessoas que os mantêm” (SANTAELLA,
2013, p.43). Gabriela utiliza hashtags ironicamente construídas como por exemplo: #projetoxotodinho, #nadade-
bundinhamequetrefe, #projetobarrigaquenempeledemão #projetobundalisa #aquiébundadura #sermagraéfacil
#projetobatatafritaemextinção #diganãoabundacascadelaranja. Esses novos vocabulários criados no ciberespaço
se difundem entre pessoas que os acompanham e conseguem entendê-los e reproduzi-los, em detrimento dos
indivíduos que estão fora da rede.
Considerações finais
A partir de trabalho empírico, o objetivo aqui foi entender aspectos da comunicação nos sites de redes
sociais digitais e discutir como se dão novas lógicas de construção de discursos nesses espaços. Pretendeu-se nes-
te artigo refletir sobre a produção e o consumo de imagens em nosso ecossistema comunicacional digital, como
ênfase na performance de certos atores sociais em redes de compartilhamento de imagens, como o Instagram. A
busca do indivíduo de destacar-se no ciberespaço como uma prerrogativa de auto-afirmação diante dos outros é
uma apropriação, na web, de características culturais já atrelada ao capitalismo afetivo e a uma sociedade hiper-
moderna cada vez mais urgente. Nota-se relações sociais cada vez mais complexas, baseadas em uma competição
por ser mais notado, mais seguido e principalmente de conquistar uma tão almejada visibilidade e reputação.
Em rede, cada usuário desenvolve uma maneira de uso e de apropriação das redes que lhe é próprio.
Cada um decide o que ver, consumir ou com quem quer conviver. Hábitos e usos funcionam como pistas das si-
lhuetas subjetivas de cada usuário (SANTAELLA, 2013). Nesse sentido, no caso do “reality show” aqui investigado,
Gabriela Pugliesi não é mais uma pessoa comum, está se tornando celebridade (as pessoas se magnetizam a ela
e se inspiram nela) e com o uso do Instagram, e com isso percebe-se novas formas de se apresentar na cena mi-
diática e construir potências simbólicas de corpos. Assim como uma prática de fitness hiperbólica, pois extrapola o
simples ato do condicionamento físico. Nesse sentido, forma física idealizada significa “qualidade de vida” e insinua
a conquista de felicidade. Tanto no discurso imagético quanto textual de Gabriela percebe-se um misto de entre-
tenimento e auto-ajuda, e até mesmo uma espécie de efeito de narciso às avessas: o discurso de Pugliesi é inter-
minável e incansável, e produz em suas seguidoras uma não necessariamente verdadeira percepção de sempre
se achar feio o que se vê refletido no espelho. Nunca está bom. As redes sociais digitais, sobretudo o Instagram,
encorajaram as pessoas a mostrarem identidades discursivas. E com isso desenvolve-se uma compreensão mais
rica de seus papéis nesse ecossistema digital difuso, inquieto e complexo.
Por enquanto, não há como prever se esse tipo de comportamento atingirá um grau de saturação, pois
são inúmeras as possibilidade de estudo a esse respeito no ecossistema cibercultural e praticamente boa parte
deles evidenciando o impacto da hibridação entre dispositivos e pessoas à experiência cotidiana.
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141140
ResumoO objetivo do presente artigo é fazer uma reflexão sobre como marcas de diversos segmentos
constroem estratégias de conteúdo no site de rede social digital Facebook. Por mais que se tente
medir como estratégias de marcas repercutem em espaços digitais, é sempre na apropriação do
social onde reside o efeito de determinada ação de uma empresa, e sempre com um viés cultural
norteador. Por meio de uma pesquisa de caráter empírico e ancorado em pensadores contemporâ-
neos do campo da comunicação digital, principalmente em nomes como Henry Jenkins, Elizabeth
Saad e Manuel Castells, propõem-se aqui um diálogo reflexivo sobre como marcas se utilizam das
chamadas mídias sociais na produção de novos hábitos de consumo da cena digital.
Palavras-chave: Cibercultura; Convergência; Marca.
Um olhar reflexivo sobre estratégias de marcas na cena digital
Introdução
Compreender as interações que surgem por meio da comunica-
ção mediada pelas tecnologias digitais tem sido questão central do campo
da comunicação para a reflexão da sociedade contemporânea, na medida
em que se evidenciam transformações de ordem social, cultural, política
e econômica.
Uma corrente de pensadores da comunicação contemporânea
enxerga que após a revolução da escrita no oriente médio no século V, a
revolução da imprensa de Johannes Gutemberg no século XV e a revolu-
ção industrial no século retrasado, vive-se hoje “uma quarta revolução,
ainda em curso, implementada pelas tecnologias digitais e ocasionando
importantes transformações no interior dos distintos aspectos do convívio humano” (DE FELICE, 2008, p.22). Ou-
tros pensadores também fazem questão de utilizar o termo “revolução” para classificar essa era que vivemos, ao
dizer que “o milênio terminou marcado por uma Revolução Tecnológica Informacional que está reconfigurando o
conjunto das sociedades humanas em todos os seus aspectos, implodindo barreiras de Tempo e Espaço, colocando
a Informação como elemento central de articulação das atividades humanas” (LEMOS, 2001, p.5). Até mesmo,
“verdadeiros abalos sísmicos têm sido provocados em todos os campos sociais – economia, política, cultura e arte
– desde que a implementação do processo digital, naquilo que ficou conhecido como Internet, alcançou o terminal
do usuário” (SANTAELLA, 2013, p.33).
Neste artigo, optou-se pela não-adoção do termo revolução, ou seja, será utilizado aqui um olhar menos
radical dessas transformações digitais que evidenciamos, pois os “argumentos carregam um tom radicalmente
revolucionário, fazendo crer quer tudo aquilo que antes era passa a ser de forma diferente, antagonizando e
contradizendo o que passou” (PRIMO 2013, p.13). Pode-se afirmar que temos hoje mais formas de comunicação
do que em qualquer outro momento da história. No entanto, muito mais do que simplesmente entender cada um
de novos ambientes de produção midiática, devemos refletir como transformações sócio-culturais interferem na
forma que a linguagem publicitária se expressa e sobre a comunicação da marca, esse ativo intangível que repre-
senta e identifica organizações. E em meio a uma imensidão de possibilidades de compra de produtos e adesão a
serviços, aliada ao acesso à informação e a melhoria tecnológica, as marcas procuram dialogar com um cidadão
contemporâneo que se encontra cada vez mais crítico e exigente nas suas escolhas.
Vive-se hoje em um mundo cada vez mais interligado e regido por intercâmbios de ordem mercantil
(CANCLINI, 2007) e no meio ambiente global, regido pelo diapasão da cibercultura, o tom das comunicações entre
empresas e consumidores está em visível mutação. A tecnologia parece carregar consigo um apelo mais sedutor
(CASTELLS, 2000) e para entender os fenômenos da cibercultura em meio à imensidão de possibilidades que ci-
dadãos dispõem hoje, temos que defini-la como um processo de socioespacialização profusa de movimentações
nacionais e internacionais de contestação baseadas em tecnologias digitais (FELINTO, 2010). A “cibercultura”,
se torna sinônimo de cultura contemporânea e entendê-la como uma formação cultural nos permite estabelecer
uma compreensão mais pertinente do termo que, envolve tanto discursos sociais e narrativas ficcionais, quanto
realidades tecnológicas e práticas comportamentais e de consumo.
Nesse sentido, nota-se como panorama atual a forma pela qual é possível a existência de uma cultura
da virtualidade real, um sistema em que a própria realidade é inteiramente captada, totalmente imersa em uma
composição de imagens virtuais do mundo da imaginação (CASTELLS, 1999). Na mesma pessoa combinam-se
o que se ouve num disco, livros escaneados, publicidade da televisão, iPods, enciclopédias digitais que mudam
todo dia, uma variedade de imagens, textos e saberes que formigam na palma de uma mão, com a qual se liga o
celular (CANCLINI, 2008). Fenômenos como esses apenas tangibilizam em atípicas manifestações ciberculturais e
reorganizam sociedades no âmbito cultural, social e político, e nos deixa muito evidente como essas transforma-
ções tecnológicas e como a explosão de redes sem fio potencializam a dinâmica da web, onde posso postar tudo,
texto, vídeo (CASTELLS, 2009).
Ao abordar a complexificação do ambiente comunicacional contemporâneo, Manuel Castells (2009) es-
pecula que a proliferação das redes sociais digitais inaugura um novo modelo de comunicação que combina de
modo paradoxal características da comunicação interpessoal com a distribuição em circuitos potencialmente ca-
143142
pazes atingir escalas massivas. As interações mediadas pela comunicação interpessoal de massa podem aqui ser
entendidas como modalidade contemporânea de participação social. O tema tem merecido peculiar atenção no
campo da comunicação e no mercado, sendo que alguns profissionais costumam denominar como ‘mídias sociais’
os sites e serviços de rede social como Facebook, Twitter etc.
Considerações sobre o método
À luz de pensadores como Henry Jenkins, Clay Shirky, Manuel Castells, Elizabeth Saad e Gisela Castro,
dentre outros autores, propõe-se aqui um diálogo reflexivo sobre novas práticas que marcas adotam em novos
espaços comunicacionais, como elas tentam construir jogos comunicacionais e narrativas envolventes, e como são
provocadas reverberações pela apropriação social.
Como um fenômeno relativamente recente, a estratégias de produção midiática de marcas dentro de
redes informacionais não são estudadas ainda com tanta profusão pelo campo da comunicação. Diante disso, foi
necessário ampliar a metodologia partindo-se para uma pesquisa do tipo empírica. Por meio da observação não
participante, foram selecionadas emblemáticas ações de comunicação de três anunciantes distintos durante os
anos de 2010 e 2012. Vale ressaltar aqui que o cruzamento dos aportes teóricos e a análise do material empírico
foram fundamentais para propiciar um melhor entendimento das estratégias marcárias que caracterizam esse
nosso objeto de pesquisa.
A seguir algumas considerações teóricas a respeito do fenômeno sob investigação.
Estratégias midiáticas de marcas na arena online
Vivemos em um mundo onde as histórias começam e não terminam (CANCLINI, 2008). Você está
dirigindo o carro enquanto ouve um áudio-livro e é interrompido por uma ligação no celular. Ou você está em
casa, sentado numa poltrona, com o romance que acabou de comprar, enquanto na televisão ligada à espera do
noticiário passam um anúncio sobre as novas funções do iPod. Você se levanta e vai até o computador para ver
se compreende essas novidades que não estão mais nas enciclopédias de papel e, de repente, percebe quantas
vezes, mesmo para procurar dados sobre outros séculos, recorre a esses novos patrimônios da humanidade que
se chamam Google e Yahoo (KLEIN, 2002).
E ao analisar esses fenômenos de novas práticas culturais no contemporâneo, pode-se entender que
a conectividade e o consumo hoje representam as vias preferenciais de emancipação de nossas juventudes em
relação aos modos vigentes de organização social. A publicidade proporciona representações, visões de mundo,
recortes do cotidiano que lançam nossa experiência humana no universo das marcas, dos produtos e instituições
com fins comerciais. No atual cenário, o desafio para a comunicação nestas organizações é especialmente maior
ao se levar em conta as incertezas que representa a interatividade nas redes sociais digitais. Destaca-se o caráter
fundamentalmente difuso e volátil dos ambientes permeados pelas interfaces digitais (CASTRO, 2013) e, no âm-
bito dessas diversas transformações sócio-culturais que evidenciamos nas últimas décadas, vemos a disseminação
dos mais variados códigos identitários de marcas e que englobam padrões de linguagem, modos de vestir e de se
comunicar entre pessoas, maneiras de se comportar, relativos a diferentes tipos de subjetividade e modos de ser.
Estilos de vida manifestam-se por meio de práticas, hábitos e signos que a cultura midiática das marcas veicula e
fomenta, haja visto a criação de celebridades e ícones de consumo (CASTRO, 2012).
O poder do produtor de mídia e do consumidor interage de maneiras imprevisíveis para os que apostam
numa história linear de superação das velhas mídias pelas novas (JENKINS, 2008). E em meio à disputa que as
marcas protagonizam entre as inúmeras mercadorias existentes, as empresas precisam transformar seus logotipos
em pontos de referência conhecidos na cultura contemporânea (KELLNER, 2006) e o próprio conceito de marca
também se refere à diferenciação quando discute sobre a lógica da marca, ou seja, a razão de ser das marcas, ou
por qual motivo elas existem (KAPFERER, 2003). Dentro dessa perspectiva, muito mais importante do que as mar-
cas simplesmente estarem presentes em redes telemáticas, é preciso saber estar presente na rede, assim como
também interagir a tempo e de forma adequada na arena digital (CASTRO, 2012). E dentro desse complexo ecos-
sistema que reside o site de rede social digital Facebook como um potente protagonista e plataforma tecnológica
que abarca esses discursos. O site idealizado por Mark Zuckerberg tem sido um dos mais proeminentes espaços
onde marcas buscam construir jogos discursivos envolventes para se conquistar os chamados fãs.
Nesse ecossistema inquieto e volátil, acompanhar de perto a presença na mídia de uma dada empresa
ou marca é uma tarefa extremamente complexa dentro das estratégias empresariais de comunicação devido
à capilaridade e abrangência das redes sociais digitais. É fundamental saber monitorar nestas redes qualquer
mensagem que mencione a marca e sobre a qual se deva agir prontamente. Logicamente, nem todo conteúdo é
colaboração, elogio ou endosso nas mensagens sobre marcas, serviços e produtos que circulam nas redes sociais.
É de extrema importância saber responder de modo assertivo, veloz, demonstrando atenção e respeito ao consu-
midor usuário de internet.
A ambição de envolver o consumidor como parceiro e fã de determinada marca, produto ou serviço está
presente com maior ou menor grau de transparência na comunicação empresarial atual, tornando indispensável
evidenciar a participação das corporações nas redes sociais (CASTRO, 2013). Para as corporações, as redes sociais
digitais se apresentam como ambientes propícios para gerar repercussão a partir de certas experiências – positi-
vas ou negativas – ligadas às marcas, produtos ou serviços. Vale lembrar que, hoje, os brasileiros são o segundo
maior público de usuários do Facebook e que nesse contexto o ‘curtir’ funciona como endosso, que pode ser ainda
mais eficaz se for seguido do ‘compartilhar’. No entanto, segundo Jenkins (2013), algumas empresas continuam a
ignorar as potencialidades deste ambiente participativo, fazendo uso de recursos legais para restringir, e não esti-
mular, a comunicação que emerge das comunidades, ou ainda, evitando escutar o público com quem se relaciona.
Jenkins propõe, especialmente para os comunicadores corporativos e suas ações de branding, que foquem muito
mais na qualidade de sua presença na rede e na coerência de seu discurso do que nas ações que eventualmente
estimulariam a audiência na viralização das mensagens de uma marca. Seu mais recente livro “Spreadable media”
nos indica que a cultura da participação deve ser reconsiderada e reposicionada, integrando o conceito de reela-
boração de mensagens e conteúdos e, dessa forma, entende a cultura de participação como algo relativo diante
das constantes mutações socioculturais (SAAD, 2013).
145144
A presença das marcas em redes sociais digitais
A criação do site de relacionamento Facebook em um simples dormitório de Harvard no início dos anos
2000 nos abre questões pertinentes. Foi criado ali potente mídia que hoje atinge mais de 1 bilhão de usuários. Ou
seja, quando marcas criam uma fanpage, as empresas investem em design, desenvolvem um planejamento de
conteúdo, e com isso, esperar criam mais um touch point de conexão com os seus mais diversos públicos. Nesse
sentido, o Facebook se transforma em uma mídia a serviço de agências de publicidade e de anunciantes. E quando
se cria a uma mídia, ainda mais no ecossistema digital que habitamos, é preciso que se pense na forma de como
angariar enormes volumes dinheiro com aquilo. No final do ano de 2012, o Facebook arquitetou uma manobra e
que gerou críticas por todo o mundo. De uma forma súbita, apenas uma pequena fração de usuários passou a en-
xergar os posts que uma determinada marca publicava em sua fanpage. Para que determinados posts ganhassem
um maior alcance, seria necessário que se investisse volumes de dinheiro. Para Shirky (2011), a tecnologia nunca
é a novidade, pois a novidade é como as pessoas se apropriam socialmente daquilo. Nesse caso, a apropriação
social se deu de uma forma previsível: o Facebook congrega hoje mais de 1 milhão de clientes que injetam verbas
de comunicação de marketing para que suas respectivas marcas se apropriem desse espaço comunicacional com
o objetivo de se tentar construir histórias relevantes e, dessa forma, seduzir e atrair consumidores.
No entanto, uma ferramenta pode ser usada pelo usuário por um jeito que seus criadores jamais imagi-
naram. E ao analisarmos o comportamento online de marcas nessas plataformas, percebemos que algumas delas
tentam se humanizar, se personificar, justamente para ir atrás do tão almejado fã. Curiosamente, enquanto mais
e mais indivíduos abraçam o ideário do empreendedor de si próprios mais e mais empresas investem no intan-
gível das marcas. Pode-se afirmar, como o faz Naomi Klein (2010) de modo contundente e um tanto exagerado,
que criar uma identidade de marca bem estruturada é hoje mais importante do que preocupar-se com a solidez
da empresa por trás dessa marca. Nas regras das ultracompetitivas disputas corporativas, tem mais valor aquela
marca que atrair maior fatia de público (CASTRO, 2013).
A seguir, serão descritos alguns exemplos de estratégias que marcas conhecidas do grande público e que
apropriaram da rede social digital Facebook para criar visibilidade:
• As embalagens da Coca-Cola Zero foram customizadas com 150 nomes mais comuns de pessoas.
Quem não estivesse entre os 150 nomes, poderia participar de uma votação na fanpage da marca, que escolheu
os próximos 50 nomes a serem estampados na embalagem de Coca-Cola Zero. Nessa votação, os consumidores
tentavam emplacar seu nome com a ajuda de seus amigos. Ainda nas redes sociais, um aplicativo permitiu que o
consumidor pudesse personalizar a sua lata de Coca-Cola Zero com palavras que representem o “quanto mais me-
lhor” nas suas vidas, em uma experiência virtual interativa, e logicamente com possibilidade de ser compartilhada
pela rede. A forma como as pessoas se apropriaram dessa ação da Coca-Cola Zero foram as mais distintas: desde
o comportamento clássico de pessoas publicarem no Facebook a foto da lata com seu próprio nome estampado,
até pessoas que ocultavam determinada letra de nomes para resignificá-lo para outros nomes, ou até mesmo
pessoas que compraram todas as latas para se ostentar em prateleiras de residências;
• Um filme publicitário da marca Água Azul sobre um empreendimento imobiliário na Paraíba, foi apre-
sentado pelo próprio dono e onde ele destacava que fez questão de reunir a família toda para apresentar o lança-
mento do novo prédio, “menos a Luíza, que está no Canadá”. A despretensiosa frase dita no anúncio foi apropriada
socialmente de forma inesperada e potente. A frase passou a ser disseminada e virou trend topics no site de
microblog Twitter durante semanas. O retorno da garota (filha do dono da empresa) do Canadá para o Brasil foi
comemorado em clima de euforia. O vídeo do anúncio publicitário virou o maior viral do mês de janeiro de 2012
com 6.227.879 milhões de views no mesmo mês e a construtora vendeu três apartamentos em menos de seis dias;
• Em uma de suas mais recentes ações publicitárias, a marca de carros japonesa Nissan, lançou uma
campanha de propaganda que continha desenhos animados infantis, intitulada “Pôneis Malditos”. Foram utilizados
elementos de irreverência e a utilização da Internet como mídia principal nas estratégias de viralização e, com
isso, gerar repercussão da mensagem central da campanha, que era divulgar a alta potência do veículo Nissan
Frontier (o carro possui um motor com força de 172 cavalos). O comercial consistiu numa analogia, na qual, ao
invés de cavalos o carro da concorrência possuiria a potência de pôneis. Os pôneis em questão são animais lúdicos
e coloridos. Na ocasião, os pôneis cantam uma música exaustiva por vozes infantis, tendo com refrão: “Pôneis
Malditos/ Pôneis Malditos/ lálálálálá...”. Toda estratégia da campanha dos Pôneis Malditos estava ancorada no
chamado marketing viral que tem como ponto central encontrar elementos comuns às motivações humanas e isso
provocar um incentivo necessário para que os consumidores compartilhem ou repassem a mensagem adiante. O
fato de ser uma música repetitiva estimularia os consumidores a passá-la adiante. A versão digital continha mais
uma sequência, com duração de mais de um minuto, enquanto a veiculada na TV durava os clássicos trinta segun-
dos. Nessa sequência da web, um dos pôneis voltava no final do comercial com os olhos vermelhos, e com uma
expressão diabólica, proferindo uma possível “praga” ao espectador. A mensagem recomendava que o internauta
repassasse o vídeo da campanha a mais dez pessoas, caso contrário ele ficaria com a música do comercial afixada
na memória. Após o envio da mensagem, o pônei voltava ao seu estado natural, novamente lúdico e infantilizado,
e terminava cantando a música novamente. Por meio dessa campanha, a Nissan nos evidenciou alguns fenômenos
nos dispositivos comunicacionais que a publicidade se ampara na contemporaneidade, assim como a utilização
da rede mundial de computadores como a mídia central da campanha. Em recente entrevista no site do Jornal do
Carro com Murilo Moreno, Diretor de Marketing da Nissan no Brasil, sobre o efeito pós-campanha (link: http://bit.
ly/r8qd0l) foi dito que: na primeira fase da campanha a Nissan tinha 7% de lembrança de marca pelo consumidor
e eles mostravam as marcas de carros rivais; antes da campanha dos Pôneis, as pessoas confundiam a marca
Nissan com a marca de macarrão Nissin; e eles saíram 0,8% em 2010 para 2% de market share no ano seguinte.
Disse também que o filme dos pôneis termina com a expressão “Te quiero” e que “foi uma das sugestões que a
agência deu e achamos legal. O curioso foi que o consumidor associou não apenas à Hilux, mas também à Ranger
e à Amarok, que são argentinas.”
Nos exemplos citados acima, podemos evidenciar que, independente do que se espera em determinada
ação de marketing que envolva uma rede social digital, é sempre no social onde as verdadeiras interações e reper-
cussões da ação se darão. Como foi visto, Manuel Castells (2009) propõe que a nova modalidade de comunicação
característica das redes sociais digitais torna ainda mais no inquieto ecossistema comunicacional contemporâneo.
Esse novo modelo de comunicação assemelha-se à comunicação de massa em termos do seu potencial alcance,
porém mantém certo controle na mão do emissor individual o qual decide, ele próprio, quando, como e para quem
147146
irá direcionar sua mensagem. Por sua vez, o receptor pode também nesse caso controlar com quais mensagens
irá interagir, de que modo e quando.
Pensando na comunicação organizacional, as redes sociais digitais apresentam importantes desafios.
Conforme nos pondera Castells (2009, p. 66) qualquer mensagem postada na internet, a despeito da intenção de
quem a produziu, é passível de ser apropriada e reprocessada de formas totalmente inesperadas. O sociólogo se
serve da metáfora da mensagem na garrafa que boia no oceano para enfatizar a indeterminação e a imprevisibi-
lidade da recepção desse tipo de comunicação no contexto global potencialmente alcançado pelas redes sociais
digitais (CASTELLS, 2009). Mais que isso, definitivamente entramos em uma nova cultura do espetáculo que
constitui uma nova configuração da economia, sociedade, política e vida cotidiana, que envolve novas formas de
cultura e de relações sociais e novos modelos de experiência.
Considerações Finais
A intenção aqui foi a de demonstrar a relevância dos estudos da comunicação para a compreensão das
dinâmicas ciberculturais em circulação e como isso norteia nossos esforços para contribuir neste importante deba-
te sobre consumo de marcas e tecnologia na contemporaneidade.
Estamos vivendo a emergência de uma nova forma de consumo, aquela definida pela apropriação sim-
bólica de bens tecnológicos e regidos pelas complexas fronteiras fluidas da cibercultura. Enfrentar e entender
adequadamente essa hesitante dinâmica do consumo nos exigirá concepções epistemológicas renovadas e uma
forma de produzir conhecimento menos avessa à incerteza e ao imaginário. O advento da Internet possibilitou
à sociedade contemporânea ultrapassar barreiras geográficas e constituir novas configurações comunicacionais.
Surgem novos espaços cada vez mais potentes, ordenados pela cibercultura e que questionam os paradigmas da
comunicação publicitária, no sentido de dar voz ao receptor, e com isso propagar suas ideias, interagir com seu
emissor e escolher a que conteúdo ter acesso. Na análise das campanhas publicitárias como a dos “Pôneis Mal-
ditos”, “Luiza no Canadá” e “Nome na Lata Coca-Cola Zero” demonstramos que o receptor de conteúdo pode ser
agora um forte aliado do mercado da comunicação, já que pode divulgá-la de forma espontânea. São estratégias
cada vez mais utilizadas por empresas na comunicação e construção de suas marcas. No entanto, quando obser-
vamos a repercussão gerada por esses casos, evidenciamos que não apenas o consumidor é quem protagoniza
a imprevisibilidade de certas ações, mas também sempre modelada e modulada por razões culturais que se dá a
apropriação social de uma determinada ação.
Tratando-se aqui de uma pesquisa fundamentalmente bibliográfica, naturalmente algumas questões
ficam em aberto. Nesta direção, o aprofundamento da análise de material empírico tanto uma pesquisa explorató-
ria, se fazem necessárias para imergir de forma ainda mais profunda no impacto desse debate.
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149
Já faz cerca de dez anos que o sociólogo Zygmunt Bauman cons-
tatou que o celular instalava no ser humano a capacidade de “estar ao
lado e não estar junto”. Isso em um tempo em que os smartphones ainda
não eram onipresentes como hoje e acessar a internet pelo celular era
para poucos. Foi também Bauman quem, pela mesma época, disse que a
grande novidade das relações mediadas pela tecnologia não era a possibi-
lidade de se conectar com novas pessoas, mas a de se desconectar delas,
bloqueando-as, recusando-lhes uma ligação, não abrindo uma mensagem
etc. Momentos de lucidez e criticismo como esses – que nos desconser-
tam, que nos fazem ver a realidade do dia-a-dia com outros olhos, que nos
surpreendem pela estupefação com o comezinho – são frequentes neste
livro que você tem nas mãos (que você acabou de ler).
É rara a capacidade de se surpreender com o cotidiano e dos
fatos corriqueiros extrair reflexões pertinentes. Hiller não é sociólogo, não
tem a pretensão de estabelecer um tratado teórico sobre a internet, as
marcas e o consumo... e tudo isso só faz de ONdivíduos um livro ainda
melhor! Porque não se sentem as amarras cansativas do texto acadêmico
tradicional e, no entanto, não lhe faltam lucidez, perspicácia, crítica, par-
cialidade e vida. Os textos aqui presentes, provavelmente por terem sido
pensados em sua maioria para um blog, têm um ritmo interno acelerado,
um tamanho abreviado, um tom de posicionamento bem marcado, de
modo que se trata de um livro lindamente adequado ao contemporâneo.
E não tinha como ser diferente: se o assunto é algo que explode à nossa
frente justamente no hoje; textos, linguagens, temas e formatos adequa-
dos ao hoje.
As marcas, o consumo e a presença do digital em nossas vidas
são três temas por si só vastos – mas que se entrelaçam o tempo todo.
O maior valor deste livro de Marcos Hiller talvez seja justamente flagrar
essas três esferas no momento exato em que se fundem em uma só. E
essa fusão se dá precisamente no comportamento humano, nas atitudes
individuais de pessoas conhecidas, na rotina do próprio autor e também
Sensibilidade, perspicácia e
reflexão
Posfácio
Bruno PompeuDoutor em Comunicação
pela ECA/USP Lisboa, 06 de junho de 2013
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nas cenas anônimas que Hiller observa e analisa com a sagacidade dos pesquisadores inatos. Tudo pode virar
assunto, tudo vai se transformar em análise, tudo deve ser exemplo deste tempo em que vivemos, marcado pela
lógica do consumo, pelo culto às marcas e pela transversalidade do digital.
É, talvez uns possam dizer, depois de ler o livro, que Marcos Hiller é parcial demais, que exalta as tecno-
logias, que não consegue esconder seu encantamento com certas marcas etc. Outros, por sua vez, podem achar
que o autor é crítico demais, que vê problema onde não tem, que aponta conflitos em casca de ovo. Só que tudo
isso é mérito, não é defeito. Porque tomar uma posição, hoje em dia, é mais do que necessário, é obrigatório. E,
goste das marcas ou não, seja a favor do consumo ou não, veja a presença do digital com olhos de crítica ou de
exaltação, tanto faz, você merece ler ONdivíduos. Porque, se é para criticar, também é necessário conhecer. E, se
for para exaltar, melhor que tenhamos mais argumentos.
ONdivíduos é um livro de hoje, ágil, profundo e ao mesmo tempo vivaz, adequado, necessário, indispen-
sável, surpreendente, delicado. Por trás de seus textos, a realidade que nos envolve, o dia-a-dia que nos provoca,
o cotidiano que nos assusta, a vida que nos desafia. E feliz a comunidade que tem um Marcos Hiller para nos
ajudar a entender tudo isso.
Foto de Érico Hiller - viaduto do “Minhocão” em São Paulo / outubro de 2013”