o recomeço de dona josina e seu josé milton

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 7 • nº1316 Janeiro/2014 São Raimundo Nonato Dentre inúmeras histórias de superação e força no Semiárido Piauiense, a história de dona Josina e de seu José se destaca pela perseverança. Viver o desafio diário de cultivar um pedaço de terra com ameaça de desapropriação é ter fé “O recomeço é desafiador” desabafa dona Josina. Dona Josina Batista Alves Rodrigues, agricultora de 52 (cinqüenta e dois) anos e seu José Milton Rodrigues, agricultor de 57 (cinqüenta e sete) anos, são casados há 32 (trinta e dois) anos e dessa união tiveram 07 (sete) filhos, atualmente, só dois moram com eles na localidade Alegre, município de João costa-PI. Há quinze anos, eles foram deslocados de seu local de origem- comunidade Angical, município de João Costa, em decorrência da área de demarcação do Parque Nacional Serra da Capivara. Seu José Milton conta emocionado como foi difícil recomeçar: “vivíamos tranqüilos na terra que nossos pais nos deixaram. Lá tínhamos grande área de cultivo de frutas e criávamos nossos animais. Tínhamos água potável, inclusive agora foram fazer umas pesquisas em uma nascente que tem lá no Angical, e parece que foi constatada que é água mineral. Recebemos com muita tristeza a noticia que teríamos que deixar nossas terras porque estava dentro da área de preservação do Parque Nacional Serra da Capivara. Tentamos resistir a ameaça de desapropriação por algum tempo, não queríamos sair, mas não podíamos lutar sozinhos para permanecer em nossas terras, então deixamos tudo lá, casa, roça, planta e a memória de nossos avôs. Não fomos indenizados até hoje, 15 anos se passaram e o processo continua em passos lentos, se é que não parou! E nada de notícia de indenização. Compramos essa terra aqui no Alegre, é uma terra boa, mas recomeçar do zero não foi fácil! Construímos primeiro uma casinha bem pequena, não tinha água perto, pegávamos água no jumento de muito distante e, ainda não era potável. Até que Deus ajudou que apareceu a Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato, que nos ajudou a conquista uma cisterna para aparar água da chuva para beber, e as coisas foram ficando mais fáceis, depois conseguimos outra cisterna maior, uma cisterna calçadão, também através da Cáritas Diocesana, só então, que fomos conseguir nos aprumar. Depois da Cisterna calçadão multiplicamos as poucas cabeças de caprinos que tínhamos e O recomeço de Dona Josina e Seu José Milton

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Dona Josina e Seu José Milton, recomeçam uma nova história, em outra localidade e graças as tecnologias de armazenamento de água, eles conseguem recomeçar com muita força e sucesso.

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Page 1: O Recomeço de dona Josina e seu José Milton

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 7 • nº1316

Janeiro/2014

São Raimundo

Nonato

Dentre inúmeras histórias de superação e força no Semiárido Piauiense, a história de dona Josina e de seu José se destaca pela perseverança. Viver o desafio diário de cultivar um pedaço de terra com ameaça de desapropriação é ter fé “O recomeço é desafiador” desabafa dona Josina. Dona Josina Batista Alves Rodrigues, agricultora de 52 (cinqüenta e dois) anos e seu José Milton Rodrigues, agricultor de 57 (cinqüenta e sete) anos, são casados há 32 (trinta e dois) anos e dessa união tiveram 07 (sete) filhos, atualmente, só dois moram com eles na localidade Alegre, município de João costa-PI.

Há quinze anos, eles foram deslocados de seu local de origem- comunidade Angical, município de João Costa, em decorrência da área de demarcação do Parque Nacional Serra da Capivara. Seu José Milton conta emocionado como foi difícil recomeçar:

“vivíamos tranqüilos na terra que nossos pais nos deixaram. Lá tínhamos grande área de cultivo de frutas e criávamos nossos animais. Tínhamos água potável, inclusive agora foram fazer umas pesquisas em uma nascente que tem lá no Angical, e parece que foi constatada que é água mineral. Recebemos com muita tristeza a noticia que teríamos que deixar nossas terras porque estava dentro da área de preservação do Parque Nacional Serra da Capivara. Tentamos resistir a ameaça de desapropriação por algum tempo, não queríamos sair, mas não podíamos lutar sozinhos para permanecer em nossas terras, então deixamos tudo lá, casa, roça, planta e a memória de nossos avôs. Não fomos indenizados até hoje, 15 anos se passaram e o processo continua em passos lentos, se é que não parou! E nada de notícia de indenização. Compramos essa terra aqui no Alegre, é uma terra boa, mas recomeçar do zero não foi fácil! Construímos primeiro uma casinha

bem pequena, não tinha água perto, pegávamos água no jumento de muito distante e, ainda não era potável. Até que Deus ajudou que apareceu a Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato, que nos ajudou a conquista uma cisterna para aparar água da chuva para beber, e as coisas foram ficando mais fáceis, depois conseguimos outra cisterna maior, uma cisterna calçadão, também através da Cáritas Diocesana, só então, que fomos conseguir nos aprumar. Depois da Cisterna calçadão multiplicamos as poucas cabeças de caprinos que tínhamos e

O recomeço de Dona Josina e Seu José Milton

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Piauí

começamos a plantar pastos para alimentar os animais e cultivamos também canteiros, frutas e legumes para nosso consumo. Com a criação de caprinos podemos construir uma casa maior, não temos energia elétrica ainda, mas temos água, o que é mais importante para nós agora.Então conseguimos recomeçar com muita força, mas agora o medo de ter que nos mudar daqui novamente nos preocupa, pois dizem que estamos ainda dentro da área do Parque. Só de imaginar de ter que abandonar tudo novamente para recomeçar sei lá aonde, me entristece, e a ameaça existe! Eu tive que vender toda

minha criação de caprino para investir em ovinos, porque caprinos são criados soltos e perdi muitas cabeças por causa de ataque de onças, agora só crio ovelhas porque ficam presas, temos 26 cabeças que são mantidas graças a água da cisterna calçadão. Nós fazemos a ração aqui mesmo em casa, com mandioca e capim que regamos diariamente, de nosso quintal tiramos o sustento de nossa família, não faltam frutas, legumes e carne”. Relata seu José Milton.

Dona Josina conta feliz que a conquista da água para produção foi uma bênção de Deus, pois se dedica a plantação de canteiros e frutíferas, mas o seu xodó mesmo são suas plantas medicinais:

“Desde quando morava no Angical, eu tinha minhas plantinhas para remédio, mas aqui, depois que conquistamos a cisterna calçadão, eu tenho uma maior variedade de plantas medicinais. Ficamos a 32 km do centro da cidade, muito distante, temos que ter em casa plantas para fazer chá. Além de cuidar dos pés de laranja, manga, acerola, coco, caju, coentro, abóbora, mamão, eu tenho um cuidado especial com minhas plantas medicinais, aqui, por exemplo, eu tenho gastrite, mas é tirar umas folhas de boldo e tirar o sumo e tomar, é um santo remédio! Passar a dor na hora”. Conta dona Josina.

Interessante notar que, o estado tem se mostrado interessado em permitir que mineradoras venham a se instalar no Piauí,nesse território, onde está localizado o Parque Nacional Serra da Capivara, para poluir e destruir, não só o solo e o ar, mas também a água, que no caso do semiárido é difícil, prejudicando assim a saúde dos moradores e animais da região. Importante salientar que a família de D. Josina é praticamente auto-sustentável, na propriedade ela tem 02(duas) cisternas, sendo uma para consumo humano (beber e cozinhar) e uma para produção- Cisterna Calçadão para demais afazeres domésticos e para horta e animais, que atualmente sofre com a ameaça de ataque de onças. Seria de bom tom que, a entidade responsável por toda administração do Parque Nacional Serra da Capivara, viabilizasse uma forma de manter estas pessoas no seu local de origem, que por sinal, nasceram e cresceram neste território. Estas pessoas podem e devem ser “reeducadas” para que continue em suas terras, agora de maneira sustentável, já que tem todo o saber de viver na caatinga, transformando-os em vetores multiplicadores e defensores da mesma área, de onde querem retirá-los. Verdade seja dita, que em muitos casos atualmente tem sido sucesso absoluto, transformar as pessoas em defensores, dando condições justas para que vivam em seu lugar ao invés de removê-los.

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