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O INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADO NO DIREITO AMBIENTAL CARACTERIZAÇÃO, COMPROVAÇÃO E OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO CAUSADO. Poliane de Brito Batista 1 RESUMO O presente artigo tem por escopo, analisar o instituto da Responsabilidade Civil nos danos causados ao Meio Ambiente. Para tanto se faz necessário uma análise esmiuçada das etapas que compõe a Responsabilidade Civil Ambiental, desde a caracterização (ocorrência de um evento ambiental danoso), a comprovação (identificação do agente causador e nexo de causalidade entre a conduta do agente e o dano causado), até a obrigação de reparar o prejuízo. Em um primeiro momento, importante elucidar que a Responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outrem. Assim, o instituto em comento é de difícil caracterização na matéria ambiental, vez que é imprescindível a comprovação da conduta humana como fato gerador do dano causado. A abordagem do tema é feita, tendo como ponto de partida, o retrospecto histórico da Legislação Ambiental no Brasil, até os dias atuais. No decorrer do trabalho, o instituto da Responsabilidade Civil Ambiental será estudado desde seus critérios de caracterização e reconhecimento até a obrigação de reparar o dano causado, tudo nos termos das leis competentes. Palavras-Chave: Preservação; Responsabilidade Civil; Direito Ambiental; Dano. ABSTRACT This article has the purpose to analyze the institution of civil liability in damages to the environment. Therefore it needs a scrutinized analysis of the steps that make up the environmental liability, from the characterization (occurrence of a harmful environmental event) and verification (identification of the agent and the causal link between the conduct of the agent and the damage) until the obligation to repair the damage. At first, important to clarify that the liability is an obligation to repair the damage that causes a person to another. Thus, the institute under discussion is difficult to characterize in environmental matters, as it is essential to proof of human conduct as a triggering event of damage. The approach to the subject is made, taking as a starting point, the historical retrospect of Environmental Law in Brazil, to the present day. During the work, the Institute of Environmental Liability will be studied since their criteria for characterization and recognition to the obligation to repair the damage, all in accordance with the relevant laws. Keywords: Preservation; Liability; Environmental Law; Damage. SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 Histórico da Proteção Ambiental no Brasil. 3 A Responsabilidade Civil no Direito comum. 3.1 Responsabilidade Civil Objetiva. 3.2 Responsabilidade Civil Subjetiva. 4 Responsabilidade Civil Ambiental. 4.1 Considerações Iniciais. 4.2 Caracterização. 4.3 Comprovação. 4.4 Obrigação de Reparar o Dano. 5 Conclusão. 6 Bibliografia. 1 Graduanda em direito pela AJES Faculdades do Vale do Juruena. Direito VIII Termo.

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O INSTITUTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADO NO DIREITO

AMBIENTAL – CARACTERIZAÇÃO, COMPROVAÇÃO E OBRIGAÇÃO DE

REPARAR O DANO CAUSADO.

Poliane de Brito Batista1

RESUMO

O presente artigo tem por escopo, analisar o instituto da Responsabilidade Civil nos danos

causados ao Meio Ambiente. Para tanto se faz necessário uma análise esmiuçada das etapas

que compõe a Responsabilidade Civil Ambiental, desde a caracterização (ocorrência de um

evento ambiental danoso), a comprovação (identificação do agente causador e nexo de

causalidade entre a conduta do agente e o dano causado), até a obrigação de reparar o

prejuízo. Em um primeiro momento, importante elucidar que a Responsabilidade civil é a

obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outrem. Assim, o instituto em comento é

de difícil caracterização na matéria ambiental, vez que é imprescindível a comprovação da

conduta humana como fato gerador do dano causado. A abordagem do tema é feita, tendo

como ponto de partida, o retrospecto histórico da Legislação Ambiental no Brasil, até os dias

atuais. No decorrer do trabalho, o instituto da Responsabilidade Civil Ambiental será

estudado desde seus critérios de caracterização e reconhecimento até a obrigação de reparar o

dano causado, tudo nos termos das leis competentes.

Palavras-Chave: Preservação; Responsabilidade Civil; Direito Ambiental; Dano.

ABSTRACT

This article has the purpose to analyze the institution of civil liability in damages to the

environment. Therefore it needs a scrutinized analysis of the steps that make up the

environmental liability, from the characterization (occurrence of a harmful environmental

event) and verification (identification of the agent and the causal link between the conduct of

the agent and the damage) until the obligation to repair the damage. At first, important to

clarify that the liability is an obligation to repair the damage that causes a person to another.

Thus, the institute under discussion is difficult to characterize in environmental matters, as it

is essential to proof of human conduct as a triggering event of damage. The approach to the

subject is made, taking as a starting point, the historical retrospect of Environmental Law in

Brazil, to the present day. During the work, the Institute of Environmental Liability will be

studied since their criteria for characterization and recognition to the obligation to repair the

damage, all in accordance with the relevant laws.

Keywords: Preservation; Liability; Environmental Law; Damage.

SUMÁRIO: 1 Introdução. – 2 Histórico da Proteção Ambiental no Brasil. – 3 A

Responsabilidade Civil no Direito comum. – 3.1 Responsabilidade Civil Objetiva. – 3.2

Responsabilidade Civil Subjetiva. – 4 Responsabilidade Civil Ambiental. – 4.1

Considerações Iniciais. – 4.2 Caracterização. – 4.3 Comprovação. – 4.4 Obrigação de Reparar

o Dano. – 5 Conclusão. – 6 Bibliografia.

1 Graduanda em direito pela AJES – Faculdades do Vale do Juruena. Direito VIII Termo.

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1 - INTRODUÇÃO

A conduta humana de degradar o meio ambiente pode ser notada no decorrer da

história. No momento que o homem se estabeleceu como o ser dominante das espécies suas

ações em busca de desenvolvimento e acumulo de capital se intensificaram e a preservação do

meio ambiente se tornou matéria esquecida.

O meio ambiente é o lugar onde vivemos, é de onde tiramos nosso sustento, é de onde

nosso corpo capta o ar que vai para nossos pulmões, a água que mantém nosso corpo

hidratado, o calor que mantém nossa temperatura, enfim, é nosso meio natural de subsistência.

Quando alguém faz ou deixa de fazer algo que consequentemente venha a afetar este

ambiente, seja poluindo o ar, a água, etc, está causando dano a outrem.

Deste modo, é pertinente afirmar que todo homem é ao mesmo tempo culpado e

vítima deste relacionamento maltratado entre o ser humano e a natureza.

Se ainda não estava evidente, nitidamente, toda humanidade deve agora se preocupar

em proteger o meio ambiente, não por altruísmo, mas por questão de mantença da própria

espécie.

Desenvolver a conduta preservacionista, mesmo que disso dependa a própria

sobrevivência do ser humano, não é tarefa simples. Por mais trivial que possa parecer, grande

parte da dificuldade de desenvolver o senso de preservação no homem se deve a sociedade

capitalista na qual estamos inseridos.

A busca por desenvolvimento, acúmulo de capital, dentre outros fatores, muitas vezes

“cegam” o ser humano para questões básicas de sobrevivência como, manter saudável o

ambiente em que vive.

Assim, veremos no decorrer do presente trabalho o que é o instituto da

responsabilidade civil e como ele está inserido no direito Ambiental, punindo aqueles que

degradam o ambiente em que vivem causando danos, não só para si próprios, como também a

outros, que acabam sendo vítimas por simplesmente compartilharem do mesmo ambiente.

2 - HISTÓRICO DA PROTEÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL

A ideia de necessidade de preservação é antiga, entretanto a efetiva pratica desta

ideologia é moderno. Tal afirmação pode ser facilmente corroborada através de um

retrospecto histórico acerca da proteção ambiental no Brasil.

Inicialmente não é preciso se apegar a livros para saber que a proteção do meio

ambiente não estava entre as preocupações das sociedades antigas. Basta fazer um simples

exercício de reflexão e voltar para os tempos de escola para relembrar que tudo que se

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estudava dizia respeito a guerras, lutas de classes, opressão do rico sobre o pobre, ou seja,

questões que nem de longe se coadunavam com a ideologia de preservação do ambiente.

Até mesmo nossa legislação não oferecia muito resguardo ao meio ambiente, o que

existiam eram apenas algumas leis dispersas que tratavam da matéria em sua superficialidade.

Contudo, é perceptível uma mudança neste panorama a partir da década de 1980.

Influenciados por uma da onda concientizadora provinda da Conferência de Estocolmo de

19722, a legislação sobre a matéria tornou-se mais consistente, abrangente e voltada para a

questão da proteção do meio ambiente.

Um marco importante desta nova era preservacionista do nosso ordenamento jurídico

foi a edição da Lei nº 6.938/813, que conceituou o meio ambiente como “o conjunto de

condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite,

abriga e rege a vida em todas as suas formas.”4

Importante ressaltar também que a referida Lei instituiu o Sistema Nacional de Meio

Ambiente5, onde fazem parte os órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito

Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder

Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.

Ainda sobre a Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio

Ambiente - PNMA, dentre tantos méritos atribuídos a esta Lei (vide artigos), destacam-se: o

de trazer para o mundo do Direito o conceito normativo de meio ambiente, como objeto

específico de proteção em seus múltiplos aspectos, bem como os conceitos de degradação

ambiental, poluição, poluidor e recursos ambientais; o de estabelecer a obrigação do poluidor

pagador de reparar os danos causados, segundo o princípio da responsabilidade objetiva (ou

sem culpa), em ação movida pelo Ministério Público; o de propiciar o planejamento de uma

ação integrada de diversos órgãos governamentais segundo uma política nacional para o setor

e instituir o Sistema Nacional do Meio Ambiente.

Outro grande avanço jurídico na luta pela preservação do meio ambiente foi a

promulgação Lei nº 7.347/85, disciplinadora da ação civil pública como instrumento

2 A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, também conhecida como Conferência de

Estocolmo, iniciada em cinco de junho de 1972, marcou uma etapa muito importante na ecopolítica

internacional. Esta foi basicamente a primeira grande reunião organizada para concentrar-se as questões

ambientais e a primeira atitude mundial a tentar preservar o meio ambiente, visto que a ação antrópica gera séria

degradação ambiental, criando severos riscos para o bem estar e sobrevivência da humanidade. Disponível em:

http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12292. 3 Assinada pelo então presidente João Figueiredo, dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins

e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. 4 Art. 3º da Lei nº 6.938/81.

5 Art. 6º da Lei nº 6.938/81.

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processual para a responsabilização dos agentes causadores de danos ao meio-ambiente e de

outros interesses difusos e coletivos6, tendo sido prevista também, posteriormente, pelo art.

129, III, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio

público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

A respeito da Constituição brasileira, insta salientar que esta instigou a consciência da

necessidade do convívio harmonioso com o meio ambiente. A visibilidade cominada a

matéria vai desde os dispositivos da Constituição federal em seu capítulo VI do Título VIII7,

até tantos outros dispositivos inseridos no decorrer dos textos do nosso ordenamento jurídico.

Posteriormente ao surgimento e consolidação da Constituição Federal, desenvolveram-

se bases sólidas para que surgissem também Constituições estaduais8, seguidas das Leis

Orgânicas dos Municípios, que discutiram vastamente sobre as questões referentes proteção

ambiental.

Conforme visto as redações jurídicas começaram a aparecer em etapas. Em primeiro

momento surgiram as leis que coibiam o uso exagerado de alguns recursos naturais, sendo

que, estas leis, apenas tratavam superficialmente da questão da proteção do meio ambiente.

Em seguida surgiram normas que coibiam pontos específicos, já mais especificamente

relacionados a proteção do meio em ambiente, destacando-se a grande importância das leis nº

6.938/81, nº 7.347/85 e a Constituição Federal de 1988.

Após essa longa caminhada em busca da proteção jurídica do meio ambiente, surge a

Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente - Lei nº 9.605/98, que dispõe sanções penais e

administrativas aplicáveis à condutas lesivas ao meio ambiente.

Por fim, cumprir destacar o aparecimento de novas legislações, ampliando e

fortalecendo o trabalho de gestão iniciado pela Lei nº 6.938/81, solidificando a imagem de um

ordenamento moderno, voltado a preservação do meio ambiente, como a Lei nº 9.984/20009

6 Assinada por José Sarney, a Lei disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao

meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico (VETADO) e dá outras providências. 7 CAPÍTULO VI - DO MEIO AMBIENTE - Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à

coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 8 Disponíveis para consulta no seguinte site: http://www4.planalto.gov.br/legislacao/legislacao-

estadual/constituicoes-estaduais 9 Dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas - ANA, entidade federal de implementação da Política

Nacional de Recursos Hídricos e de coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,

e dá outras providências.

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5

que cria a Agência Nacional de Águas, a Lei nº 9.985/200010

, que cria o Sistema Nacional de

Unidades de Conservação, com importantes modificações na legislação esparsa e no Código

Florestal11

, e a Lei nº 10.257/0112

, que cria o Estatuto da Cidade, consagrando, em definitivo,

as conquistas relativas à manutenção da qualidade de vida no meio ambiente urbano.

Assim, conhecendo um pouco do retrospecto histórico da preservação do meio

ambiente em nosso ordenamento jurídico, podemos dar sequencia, adentrando ao Instituto da

Responsabilidade Civil aplicado ao Direito ambiental, mas antes, cabe fazer breves

considerações acerca do instituto em comento no direito comum.

3 - RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO COMUM

A Responsabilidade Civil é a prática de um ato ilícito por qualquer pessoa natural ou

jurídica que gera obrigação de reparar o fato, ato ou negócio danoso através de indenização,

que busca um equilíbrio patrimonial e moral violado.

Segundo o Código Civil em seu artigo 927 a responsabilidade civil, portanto, será

quando “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

O ilustre doutrinador Venosa13

, assim conceitua o ato ilícito:

(...) quando o agente dos negócios e atos jurídicos, por ação ou omissão, pratica ato

contra o Direito, com ou sem intenção manifesta de prejudicar, mas ocasiona

prejuízo a outrem.

3.1 Responsabilidade Objetiva

A responsabilidade objetiva, também chamada de Teoria do

Risco é imposta pela lei ou provocada pelo nexo causal e o dano, fica obrigada, portanto, a

reparar o dano independentemente de culpa.

Assim, a teoria do risco não se importa com a atitude culposa ou dolosa do agente

causador, exige apenas a relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o

ato do agente.

Desta forma, a responsabilidade objetiva é regra, onde o agente causador responderá

pelos danos causados a outrem independentemente de culpa.

3.2 Responsabilidade Subjetiva

10

Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de

Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. 11

LEI Nº 12.651, DE 25 DE MAIO DE 2012 - Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nos

6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006;

revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no

2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. 12

Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá

outras providências. 13

VENOSA, Silvio de Salvo - Direito Civil - Parte IV - 5ª Edição - Responsabilidade Civil, 2005, p. 571.

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6

A responsabilidade subjetiva, também chamada de Teoria da Culpa tem como

pressuposto a culpa para haver obrigação de indenização.

Imperioso ressaltar, a culpa como sendo elemento fundamental para a caracterização

da responsabilidade subjetiva, pois, segundo Venosa14

:

deriva da inobservância de um dever de conduta, previamente imposta pela ordem

jurídica em atenção a paz social. Se está violação é proposital, atuou o agente com

dolo; se decorrer de negligência, imprudência ou imperícia, a sua atuação é apenas

culposa.

Trata-se de hipótese ampla de responsabilidade, de forma que sempre que a vítima

puder demonstrar a existência de um desses elementos, poderá impelir o agente à reparação

pelos danos sofridos.

4 - RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO AMBIENTAL

4.1 Considerações Iniciais.

Em princípio, importante se faz conceituar o que é Direito Ambiental. Citado por uma

grande parcela dos doutrinadores da área, o celebrado mestre Paulo Affonso Leme Machado,

assim define:15

O Direito do Ambiente, construído por um conjunto de regras jurídicas relativas à

proteção da natureza e à luta contra as poluições. Ele se define, portanto, em

primeiro lugar pelo seu objeto. Mas é um Direito tendo uma finalidade, um objetivo:

nosso ambiente está ameaçado, o Direito deve poder vir em seu socorro, imaginando

sistemas de prevenção ou de reparação adaptados a uma melhor defesa contra as

agressões da sociedade moderna. Então o Direito do Ambiente, mais do que a

descrição do Direito existente, é um Direito portador de uma mensagem, um Direito

do futuro e da antecipação, graças ao qual o homem e a natureza encontrarão um

relacionamento harmonioso e equilibrado. Na medida em que o ambiente é a

expressão de uma visão global das intenções e das relações dos seres vivos entre eles

e com seu meio, não é surpreendente que o Direito do Ambiente seja um Direito de

caráter horizontal, que recubra os diferentes ramos clássicos do Direito (Direito

Civil, Direito Administrativo, Direito Penal, Direito Internacional), e um Direito de

interações, que se encontra disperso nas várias regulamentações. Mais do que um

novo ramo do Direito com seu próprio corpo de regras, o Direito do Ambiente tende

a penetrar todos os sistemas jurídicos existentes para os orientar num sentido

ambientalista. (...)

Insta salientar que o presente trabalho segue a linha doutrinária, jurisprudencial e

legislativa no que concerne a matéria da aplicabilidade da responsabilidade civil nos danos

ambientais. Destarte, não se pode perder de vista que a Constituição Federal de 1988

recepcionou o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, que constituiu a responsabilidade objetiva para

os agentes geradores de danos ao meio ambiente, nestes termos:

Art. 14 [...] § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o

poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar

os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O

14

VENOSA, Silvio de Salvo - Direito Civil - Parte IV - 5ª Edição - Responsabilidade Civil, 2005, p. 613. 15

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

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7

Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de

responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

A própria Constituição Federal de 1988 adotou a responsabilidade objetiva ambiental,

como nota-se no § 3º do seu art. 225, que dispõe que as condutas e atividades consideradas

lesivas ao meio ambiente, sujeitarão os agentes causadores a reparar os danos ocasionados,

deixando de fazer qualquer referencia quanto à necessidade de existência ou não de culpa na

atuação do agente degradador, vejamos:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de

uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e

futuras gerações.

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os

infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,

independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Tal predisposição de responsabilizar o agente causar pelo dano independentemente de

culpa, que pode em certo ponto parecer radical ou controversa, se dá, haja vista que a

doutrina, a jurisprudência e o legislador entenderam que os princípios originais que regem a

responsabilidade civil, não eram, em suma, suficientes para garantir a proteção necessária e

adequada às vítimas de dano ambiental.

4.2 Caracterização

Por dano ambiental entendemos ser toda e qualquer diminuição, degradação ou

extinção de um recurso natural ou organismo vivo, ou a alteração em sua situação de

equilíbrio natural.16

É importante estabelecer um senso lógico, deixando de lado pensamentos corrompidos

por estereótipos atribuídos tanto para os preservacionistas extremistas quanto aos agentes que

causam danos ao ambiente, e ter a consciência de que o dano causado não atinge somente o

meio ambiente em si; vai muito mais além. Interfere também no homem, em sua saúde, bem

estar, em questões econômicas e sociais.

Nas palavras de Carvalho17

:

(...) a aplicação objetiva da responsabilidade civil em casos de danos ambientais não

se limita, contudo, às atividades potencialmente poluidoras (atividades de risco),

incidindo sobre qualquer atividade que, direta ou indiretamente, ocasione

degradações ao meio ambiente em razão de sua previsão normativa expressa (art. 14,

§ 1º, da lei nº 6.938/1981). No entanto, a estrutura dogmática da responsabilidade

civil por danos ambientais funda-se na teoria do risco concreto, o que, em outras

palavras, significa a exigência da comprovação de um dano concreto ao meio

ambiente para atribuição da responsabilização civil ao seu causador.

16

Vide lei nº 6.938/81. 17

CARVALHO, Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a responsabilização civil pelo risco ambiental. Rio de

Janeiro: Forense Universitária, 2008, pág. 75)

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8

Assevera o autor que, apesar de não haver um conceito legal do que seria dano

ambiental, por meio de uma construção doutrinária e jurisprudencial, aliada à parâmetros

legais, é possível chegar a uma conclusão.

O art. 3º da Lei nº 6.938/81 cita alguns conceitos que servem de orientação para o

julgador de um caso de dano ambiental se basear, assim podemos extrair do referido

dispositivo, o entendimento do legislador acerca de dano ambiental, senão vejamos:

II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do

meio ambiente;

III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que

direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais

estabelecidos; [...] (grifei).

Assim podemos interpretar tanto pela leitura doutrinaria quanto interpretativa dos

dispositivos legais que o dano ambiental afeta uma pluralidade de vítimas, não as

distinguindo.

O dano ambiental não conhece fronteiras. Apesar do efeito mais intenso do dano

ambiental ser sentido no epicentro do desastre, alguns efeitos se estendem para além de sua

área. Em outros casos, os danos ambientais podem nem ocorrer a olho nu, como é o caso de

contaminação de lençol freático, ou ainda de danos que ocorrem apenas com o passar do

tempo, dificultando ainda mais sua reparação.

Para definir um resultado danoso ao ambiente se faz necessário identificar os agentes

causadores, a existência de um prejuízo real e quantificável, e estabelecer uma relação de

causalidade entre os danos e os agentes contaminadores.

As principais dificuldades para a caracterização da responsabilidade civil no direito

ambiental é a identificação e responsabilização do agente e a consequente reparação do dano

ambiental, geralmente, são a prova de ocorrência do dano ou do nexo de causalidade entre

fato e dano, especialmente quando decorre algum tempo entre eles.

Também quando o dano deriva de ação prolongada de múltiplos agentes, raras vezes

temos um final feliz para o meio ambiente. Ultrapassadas estas dificuldades, o próximo

problema é quantificar o dano. A fixação da extensão do dano e a quantificação dos danos

futuros decorrentes é tarefa de extrema dificuldade, senão impossível em algumas situações.

Paulo Afonso Lemes Machado18

, ao citar Girod, entende que:

18

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.p.214

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9

[...] um ruído ocasional, um odor momentâneo, a fumaça excepcionalmente

expedida por uma combustão moderna não podem ser, adequadamente

falando, qualificada de anormal, nem de poluição. O prejuízo aparece no plano

ecológico, não somente quando uma destruição se manifesta, mas quando, por sua

repetição e por sua inexistência, ela excede a capacidade natural de assimilação, de

eliminação e de reintrodução dos resíduos nos ciclos biológicos.

Apesar de transparecer uma imagem um tanto quanto pessimista, a caracterização da

responsabilidade civil no Direito Ambiental, no fim das contas, é a etapa mais simples do

complexo esquema “agente causador-nexo-dano” que veremos adiante.

4.3 Comprovação

Sem comprovar o dano ambiental, não há como a parte ser condenada a indenizar.

Uma vez caracterizado o dano ambiental, e identificado o agente causador, surge a

responsabilidade civil objetiva, aquela que vige, independentemente da existência de culpa,

sob a modalidade do risco integral, que não admite qualquer excludente de responsabilidade.

Para Paulo Affonso Leme Machado, contudo, são cabíveis as excludentes como a

força maior e o caso fortuito; porém quem alegar “deve produzir prova de que era impossível

evitar ou impedir os efeitos do fato necessário – terremoto, raio, temporal, enchente”. 19

Portanto, uma das etapas mais complicadas é a comprovação, vez que, conforme já

mencionado, é necessário identificar o agente causador e comprovar que seus atos geraram o

prejuízo final ao meio ambiente.

Pelo sistema adotado no Direito Ambiental brasileiro não se discute, necessariamente,

a legalidade do ato. É a potencialidade de dano que o ato possa trazer aos bens ambientais que

servirá de fundamento para a responsabilização. Desta forma, não exonera o poluidor ou

degradador a prova de que sua atividade é normal e lícita, de acordo com as técnicas mais

apuradas. O que se leva em conta, quanto à responsabilidade objetiva, é a doutrina da

normalidade da causa e anormalidade do resultado.

Paulo Affonso Leme Machado, em sua obra Direito Ambiental Brasileiro define que:20

A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o ambiente tem

o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano/reparação. Não se

pergunta a razão da degradação para que haja o dever de indenizar e/ou reparar. A

responsabilidade sem culpa tem incidência na indenização ou na reparação dos

danos causados ao meio ambiente e aos terceiros afetados por sua atividade (art. 14,

§ 1º, da Lei nº 6.938/81). Não interessa que tipo de obra ou atividade seja exercida

pelo que degrada, pois não há necessidade de que ela apresente risco ou seja

perigosa. Procura-se quem foi atingido e, se for o meio ambiente e o homem, inicia-

se o processo lógico-jurídico da imputação civil objetiva ambiental. Só depois é que

19

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 380. 20

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p.

326/327.

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10

se entrará na fase do estabelecimento do nexo de causalidade entre a ação ou

omissão e do dano. É contra o Direito enriquecer-se ou ter lucro à custa da

degradação do meio ambiente.

No Direito brasileiro, a responsabilidade civil pelo dano ambiental independe de um

padrão pré estabelecido ou regulamentar específico. Por isso, não se discute, necessariamente,

a legalidade da atividade. Não pode um agente, por escusa de desenvolver um trabalho,

prejudicar o meio ambiente e sair impune.

Entretanto, o Direito Ambiental não difere dos outros ramos do direito no que

concerne a imprescindibilidade de haver provas para que seja de fato comprovada a

responsabilidade Civil Ambiental, gerando o dever de indenizar.

Sendo assim, a dificuldade da prova do dano ambiental e da sua expansão, tornam

insuficientes as informações contidas apenas através de depoimentos e documentos, os

principais meios de produção de prova no Direito comum.

Destarte, prova pericial, torna-se, então, o grande trunfo para a comprovação do dano

ambiental. Ela será o meio de prova mais contundente nestes casos, na maioria das vezes,

deverá ser feito por vários especialistas de diversas áreas técnicas, dependendo do grau de

complexidade do dano.

Além disso, a prova pericial se tornou extremamente importante nas lides relativas à

desapropriação ambiental, pois será através dela que os valores da indenização serão fixados

pelo magistrado. Ela irá dimensionar a área, descrever suas características e lhe atribuir um

valor.21

Deste modo, apesar das dificuldades que possam surgir na etapa da comprovação, uma

vez comprovado o a responsabilidade civil pelo dano ambiental, surge o dever de indexar,

questão essa que será trabalhada no tópico seguinte.

4.4. Obrigação de Reparar o Dano Causado

Por fim, uma vez caracterizada e comprovada responsabilidade civil em matéria

ambiental, surge para o agente causador do dano a obrigação de reparar o prejuízo causado.

Entretanto, como também já destacado, para que seja alcançada tal pretensão, a

responsabilidade civil nas questões ambientais deve ser reesquematizada, a fim de que seja

ajustada às questões pertinentes à matéria ambiental, já que a responsabilidade civil clássica

fora desenvolvida para outro contexto.

21

Revista âmbito Jurídico, Aspectos Polêmicos sobre a prova pericial ambiental, 2012, pág. 26.

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11

No ordenamento jurídico brasileiro, o dever de reparar os danos causados ao meio

ambiente está expresso nos artigos 225, parágrafo 3º da Constituição Federal e no artigo,

4,inciso VII da Lei 6938/81. Estes dispõem respectivamente:

As condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas

físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente de reparar

os danos causados.

“A política nacional do meio ambiente visará:

(...)

VI- à imposição, ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ ou

indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de

recursos ambientais com fins econômicos.

Paulo Affonso Leme Machado ressalta que, tanto a Constituição Federal, que emprega

os termos "restaurar" e "reparar", como a legislação infraconstitucional, que utiliza termos

como "restauração" e "reconstituição", estão em sintonia no sentido de orientar, tanto as

pessoas físicas quanto as jurídicas que lesarem o meio ambiente, como para a Administração

Pública e para os juízes que intervierem para resguardar o meio ambiente.22

Adentrando ao tema da reparação do dano ambiental, mister salientar, em um primeiro

momento, que as formas de reparação do dano ambiental seguem uma ordem hierárquica.

Inicialmente, a prioridade é a recuperação do bem lesado. No mesmo sentido, a Lei nº

6.938, de 31 de agosto de 1981, em seu artigo 2°, versa que o objetivo maior é a preservação,

melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País,

condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à

proteção da dignidade da vida humana.

Entretanto, é sabido que nem todo dano ambiental pode ser reparado, pelo fato de

alguns serem irreparáveis e infungíveis. É justamente em razão deste fato, que se prioriza a

prevenção dos danos ambientais, porque se há possibilidade de atribuir um valor aos custos

do dano ecológico, dificilmente existe a possibilitado de recuperá-lo tal qual seu estado

original.

A reintegração, recomposição ou recuperação do bem ambiental lesado envolve à

restauração do estado original, ou seja, a pretensão tutela é a de devolver ao bem lesionado as

características que lhe foram tiradas pelo evento danoso.

No que cerne à recuperação das áreas atingidas pelo dano ambiental, o artigo 225,

parágrafo segundo da Constituição Federal versa que:

Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente

degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente,

na forma da lei.

22

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006 p. 324.

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12

Todavia, nos casos em que a restauração é inadequada ou inviável, a legislação

ambiental prevê a compensação.

A compensação pode ser definida como a substituição do bem lesado por um bem

equivalente, desde que o patrimônio natural permaneça inalterado qualitativamente e

quantitativamente.

O valor econômico obtido por meio da compensação deve ser aplicado

prioritariamente no local afetado, a fim de beneficiar tanto o meio ambiente quanto à

comunidade atingida pelo dano ambiental.

Findada as retratações preliminares, nos casos em que a nenhuma das ações iniciais for

possível, existe a indenização pecuniária.

A legislação ambiental brasileira determina no artigo 13 da lei 7347/85 que:

Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um

fundo gerido por um Conselho Federal ou por conselhos Estaduais que participarão

necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus

recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

Constata-se, assim, na prática, que nem a restauração e nem a compensação são

efetivamente capazes de devolver ao meio ambiente aquilo que lhe foi lesado. Assim, surge a

indenização pecuniária como uma forma secundária de compensação ambiental, importante

no aspecto coibir ações danosas ao meio ambiente, entretanto, muitas vezes irrelevante, haja

vista algumas características ambientais lesadas são irrecuperáveis.

Sobre o tema, vejamos o seguinte julgado:

ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

DESMATAMENTO DE VEGETAÇÃO NATIVA (CERRADO) SEM

AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE AMBIENTAL. DANOS CAUSADOS À

BIOTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 4º, VII, E 14, § 1º, DA LEI

6.938/1981, E DO ART. 3º DA LEI 7.347/85. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO

INTEGRAL, DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR.

POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER

(REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA

(INDENIZAÇÃO). REDUCTION AD PRISTINUM STATUM. DANO

AMBIENTAL INTERMEDIÁRIO, RESIDUAL E MORAL COLETIVO.

ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL.

INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA DA NORMA AMBIENTAL.

(STJ - REsp: 1198727 MG 2010/0111349-9, Relator: Ministro HERMAN

BENJAMIN, Data de Julgamento: 14/08/2012, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de

Publicação: DJe 09/05/2013)23

23

1. Cuidam os autos de ação civil pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos

ambientais causados pelo desmatamento de vegetação nativa (Cerrado). O juiz de primeiro grau e o Tribunal de

Justiça de Minas Gerais consideraram provado o dano ambiental e condenaram o réu a repará-lo; porém,

julgaram improcedente o pedido indenizatório pelo dano ecológico pretérito e residual. 2. A legislação de

amparo dos sujeitos vulneráveis e dos interesses difusos e coletivos deve ser interpretada da maneira que lhes

seja mais favorável e melhor possa viabilizar, no plano da eficácia, a prestação jurisdicional e a ratio essendi da

norma. A hermenêutica jurídico-ambiental rege-se pelo princípio in dubio pro natura. 3. Ao responsabilizar-se

civilmente o infrator ambiental, não se deve confundir prioridade da recuperação in natura do bem degradado

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13

com impossibilidade de cumulação simultânea dos deveres de repristinação natural (obrigação de fazer),

compensação ambiental e indenização em dinheiro (obrigação de dar), e abstenção de uso e de nova lesão

(obrigação de não fazer). 4. De acordo com a tradição do Direito brasileiro, imputar responsabilidade civil ao

agente causador de degradação ambiental difere de fazê-lo administrativa ou penalmente. Logo, eventual

absolvição no processo criminal ou perante a Administração Pública não influi, como regra, na responsabilização

civil, tirantes as exceções em numerus clausus do sistema legal, como a inequívoca negativa do fato ilícito (não

ocorrência de degradação ambiental, p. ex.) ou da autoria (direta ou indireta), nos termos do art. 935 do Código

Civil. 5. Nas demandas ambientais, por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum,

admite-se a condenação do réu, simultânea e agregadamente, em obrigação de fazer, não fazer e indenizar. Aí se

encontra típica obrigação cumulativa ou conjuntiva. Assim, na interpretação dos arts. 4º, VII, e 14, § 1º, da Lei

da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), e do art. 3º da Lei 7.347/85, a conjunção "ou" opera com

valor aditivo, não introduz alternativa excludente. Essa posição jurisprudencial leva em conta que o dano

ambiental é multifacetário (ética, temporal, ecológica e patrimonialmente falando, sensível ainda à diversidade

do vasto universo de vítimas, que vão do indivíduo isolado à coletividade, às gerações futuras e aos próprios

processos ecológicos em si mesmos considerados). 6. Se o bem ambiental lesado for imediata e completamente

restaurado ao status quo ante (reductio ad pristinum statum, isto é, restabelecimento à condição original), não há

falar, ordinariamente, em indenização. Contudo, a possibilidade técnica, no futuro (= prestação jurisdicional

prospectiva), de restauração in natura nem sempre se mostra suficiente para reverter ou recompor integralmente,

no terreno da responsabilidade civil, as várias dimensões do dano ambiental causado; por isso não exaure os

deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. 7. A recusa de aplicação ou

aplicação parcial dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e

socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa. Daí a resposta administrativa e judicial

não passar de aceitável e gerenciável "risco ou custo do negócio", acarretando o enfraquecimento do caráter

dissuasório da proteção legal, verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de

fato, mesmo que não de direito, do infrator premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério. 8. A

responsabilidade civil ambiental deve ser compreendida o mais amplamente possível, de modo que a condenação

a recuperar a área prejudicada não exclua o dever de indenizar - juízos retrospectivo e prospectivo. 9. A

cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, em vez

de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano

que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho

futuro, irreparável ou intangível. 10. Essa degradação transitória, remanescente ou reflexa do meio ambiente

inclui: a) o prejuízo ecológico que medeia, temporalmente, o instante da ação ou omissão danosa e o pleno

restabelecimento ou recomposição da biota, vale dizer, o hiato passadiço de deterioração, total ou parcial, na

fruição do bem de uso comum do povo (= dano interino ou intermediário), algo frequente na hipótese, p. ex., em

que o comando judicial, restritivamente, se satisfaz com a exclusiva regeneração natural e a perder de vista da

flora ilegalmente suprimida, b) a ruína ambiental que subsista ou perdure, não obstante todos os esforços de

restauração (= dano residual ou permanente), e c) o dano moral coletivo. Também deve ser reembolsado ao

patrimônio público e à coletividade o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento

degradador, a mais-valia ecológica ilícita que auferiu (p. ex., madeira ou minério retirados irregularmente da área

degradada ou benefício com seu uso espúrio para fim agrossilvopastoril, turístico, comercial). 11. No âmbito

específico da responsabilidade civil do agente por desmatamento ilegal, irrelevante se a vegetação nativa lesada

integra, ou não, Área de Preservação Permanente, Reserva Legal ou Unidade de Conservação, porquanto, com o

dever de reparar o dano causado, o que se salvaguarda não é a localização ou topografia do bem ambiental, mas

a flora brasileira em si mesma, decorrência dos excepcionais e insubstituíveis serviços ecológicos que presta à

vida planetária, em todos os seus matizes. 12. De acordo com o Código Florestal brasileiro (tanto o de 1965,

como o atual, a Lei 12.651, de 25.5.2012) e a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), a flora

nativa, no caso de supressão, encontra-se uniformemente protegida pela exigência de prévia e válida autorização

do órgão ambiental competente, qualquer que seja o seu bioma, localização, tipologia ou estado de conservação

(primária ou secundária). 13. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei

7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp

1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp 1.178.294/MG, Rel.

Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel.

Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana

Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe

3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki,

Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006,

entre outros). 14. Recurso especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação

de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem

lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e

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5 - CONCLUSÃO

Caracterização, Comprovação e Obrigação de Reparar o dano causado, não são de fato

etapas devidamente reconhecidas no processo de responsabilização civil ambiental, entretanto

ao desmembrá-la desta maneira, a sua compreensão e até mesmo sua importância e

objetividade tornam-se mais elucidada.

Como se pôde observar ao longo deste trabalho, a Responsabilidade Civil ambiental

não é tema fácil de se abordar, entretanto, não resta dúvida que tal instituto exerce uma função

de extrema importância para auxiliar na busca pela proteção do meio ambiente.

Conclui-se, portanto, mesmo com a constatação de que a Responsabilidade Civil

Ambiental é de difícil comprovação tendo em vista os vários fatores discorridos no decorrer

do trabalho, este instituto continua sendo um ponto de suma importância nas questões para o

efetivo reparo dos danos causados ao meio ambiente, que por ofenderem interesses difusos da

sociedade, mereceram especial atenção do legislador.

Por fim, mesmo que o Direito Ambiental venha ganhando cada vez mais força com a

elaboração de leis que resguardam o meio ambiente, é importante lembrar que cabe a todos

nós a tarefa de proteção ambiental, até porque, nunca é demais ressaltar que é neste ambiente

que vivemos e que é vital que o mantenhamos saudável.

6 - REFERENCIAS

ANTUNES, Paulo de Bessa. Comentários ao Novo Código Florestal: Lei

12.651/2012 atualizado de acordo com a lei 12.727/2012. São Paulo, Atlas AS 2013.

BRASIL. Lei federal nº 6.938 de 31 de agosto de 1981. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em: 11 de Set. de 2013.

BRASIL. STJ - Recurso Esspecial: REsp 1198727 MG 2010/0111349-9. Relator:

Ministro Herman Benjamin. Data de Julgamento: 14/08/2012, T2 - Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 09/05/2013. Disponível em <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23530894/recurso-especial-resp-1198727-mg-2010-

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CARVALHO, Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a responsabilização civil

pelo risco ambiental. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.

CHAGAS, Ana Paula. Aspectos Polêmicos sobre a prova pericial ambiental.

Disponível em: http://www.ambito-

fixe eventual quantum debeatur. STJ - REsp: 1198727 MG 2010/0111349-9, Relator: Ministro HERMAN

BENJAMIN, Data de Julgamento: 14/08/2012, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/05/2013.

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juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2475>. Acessado

em: 10 setembro 2013.

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 11º

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MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 14. ed. São Paulo:

Malheiros, 2006.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. 5º edição

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SODRÉ, Antônio de Azevedo. Novo Código Florestal Comentado: Lei

12.651/2012, Leme – São Paulo, Mizuno 2013.

VENOSA, Silvio de Salvo - Direito Civil - Parte IV - 5ª Edição - Responsabilidade

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