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www.neomondo.org.br NEOMON DO UM OLHAR CONSCIENTE Ano 3 - Nº 25 - Agosto 2009 - Distribuição Gratuita Diversidade EDIÇÃO ESPECIAL Gilberto Freyre “Um Pensador “ 08 Identidade Cultural Espelho de um povo 34 Índio Terra, respeito e vida 16

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www.neomondo.org.br

NeoMoNdoum olhar conscienteAno 3 - Nº 25 - Agosto 2009 - Distribuição Gratuita

Diversidade

EDição EspEcial

Gilberto Freyre“Um Pensador “

08

identidade culturalEspelho deum povo

34

Índio Terra, respeito e vida

16

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neo mondo - maio 2008 2Uma obra gerenciada pela Dersa.

Lua

Bran

ca

O Governo de São Paulo está fazendo a maior obra viária do país. O Rodoanel. Nossa preocupação com o meio ambiente também é muito grande. Para se ter uma

ideia, somente no Trecho Sul 2,5 milhões de mudas de espécies nativas da Mata Atlântica serão replantadas, em mais de 1.000 hectares de terra. Serão criados 8 novos

parques e unidades de conservação. Além disso, os mananciais das represas Billings e Guarapiranga ganharam monitoramento em tempo real, e os animais que vivem na

mata terão segurança e proteção graças aos cuidados que estão sendo tomados, como a criação de túneis de passagem que permitem sua locomoção por toda a área.

Rv_Neomodo_MeioAmbiente_410x275.indd 1 8/12/09 8:28:49 PM

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3neo mondo - maio 2008

Uma obra gerenciada pela Dersa.

Lua

Bran

ca

O Governo de São Paulo está fazendo a maior obra viária do país. O Rodoanel. Nossa preocupação com o meio ambiente também é muito grande. Para se ter uma

ideia, somente no Trecho Sul 2,5 milhões de mudas de espécies nativas da Mata Atlântica serão replantadas, em mais de 1.000 hectares de terra. Serão criados 8 novos

parques e unidades de conservação. Além disso, os mananciais das represas Billings e Guarapiranga ganharam monitoramento em tempo real, e os animais que vivem na

mata terão segurança e proteção graças aos cuidados que estão sendo tomados, como a criação de túneis de passagem que permitem sua locomoção por toda a área.

Rv_Neomodo_MeioAmbiente_410x275.indd 1 8/12/09 8:28:49 PM

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neo mondo - maio 2008 4

Centro de Convenções Frei CanecaRua Frei Caneca, 569 - Consolação - São Paulo/SP

01 à 04 de Setembro 2009Das 09h00 às 20h30

Programação: 01 à 04/09/2009 - 2ª FIBoPS

Mais informações: www.fibops.com.br

Evento Aberto e Gratuíto. Participe.

SEMINÁRIOS

Dias Temáticos

Intercâmbio de Cases

Dia da SaúdeSustentável

Dia Arquitetura& CostruçãoSustentável

Dia Benchmarking,Compartilhar para

CrescerDia Ecomídia

Painéis Temáticos Temas Técnicos Gerenciais

2a

2a

Feira Internacional paraIntercâmbio das Boas Práticas

Socioambientais

O Mel

as

ho

d

rli

dbi

ata

sustenda e p sa por aqui

A MAIOR CONCENTRAÇÃO DE ESPECIALISTAS E LIDERANÇASATUANTES EM SUSTENTABILIDADE

POR M DO PAÍS2

Fotos da 1ª FIBoPS

Realização:

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5neo mondo - maio 2008

Centro de Convenções Frei CanecaRua Frei Caneca, 569 - Consolação - São Paulo/SP

01 à 04 de Setembro 2009Das 09h00 às 20h30

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A MAIOR CONCENTRAÇÃO DE ESPECIALISTAS E LIDERANÇASATUANTES EM SUSTENTABILIDADE

POR M DO PAÍS2

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Seções

Diretor Responsável: Oscar Lopes LuizDiretor de Redação: Gabriel Arcanjo Nogueira (MTB 16.586)Conselho Editorial: Oscar Lopes Luiz, Takashi Yamauchi, Marcio Thamos, Terence Trennepohl, João Carlos Mucciacito, Luciana Stocco de Mergulhão, Daniela Durante, Denise de La Corte Bacci, Dilma de Melo Silva, Natascha Trennepohl e Rosane Magaly MartinsRedação: Gabriel Arcanjo Nogueira (MTB 16.586), Rosane Araújo (MTB 38.300) e Sandra Regian do Nascimento Santos (MTB 21.028)Estagiário: Caio César de Miranda MartinsRevisão: Instituto Neo MondoDiretora de Arte: Renata Ariane RosaProjeto Gráfico: Instituto Neo MondoDiretor Jurídico: Dr.Erick Rodrigues Ferreira de Melo e SilvaInformações sobre a Foto da Capa:Criança indígena da Etnia KuikuroNome: Lilika Kuikuro

Nome dos Pais: Aunú Kuikuro e Akuku KuikuroLocal da Foto: Juquitiba (Intercâmbio Cultural com a Toca da Raposa mês 04/2007)Data: 01/04/2007 Fotógrafa: Rita Barreto (a fotógrafa não cobrou honorários pela foto)

Correspondência: Instituto Neo MondoRua Primo Bruno Pezzolo, 86 - Casa 1 - Vila Floresta - Santo André – SPCep: 09050-120Para falar com a Neo Mondo:[email protected]@[email protected]

Para anunciar: [email protected]. (11) 4994-1690

Presidente do Instituto Neo Mondo:[email protected]

Expediente PublicaçãoA Revista Neo Mondo é uma publicação do Instituto Neo Mondo, CNPJ 08.806.545/0001-00, reconhecido como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), pelo Ministério da Justiça – processo MJ nº 08071.018087/2007-24.

Tiragem mensal de 50 mil exemplares com distribuição nacional gratuita e assinaturas.

Os artigos e informes publicitários não representam necessariamente a posição da revista e são de total responsabilidade de seus autores. Proibido reproduzir o conteúdo desta revista sem prévia autorização.

PerfilGilberto Freyre, um pensador do “ser brasileiro”Autor de “Casa- grande & Senzala” é reconhecido mundialmente pelo pioneirismo dos estudos da cultura brasileira

Dia de índio é sempreConvidamos você a entrar nessa floresta e ficar sabendo de uma ponta a outra do país sobre o orgulho de um povo

O Fator imigraçãoA entrada de imigrantes no brasil e seus impactos na cultura brasileira

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08

Artigo: Meio ambiente cultural no BrasilReflexos da identidade de um povo

Saltos demográficos do PaísExpectativa de vida do brasileiro e processo de urbanização são características marcantes

12esPecial - DiversiDaDe cultural

Quilombo, sim!Fique por dentro da agenda social quilombola e do plano nacional de promoção da igualdade racial, no palácio do planalto, em Brasília

Artigo: Uma língua latina com certezaA língua materna é muito mais do que um instrumento de comunicação.

Artigo – Diversidade CulturalModelo de desenvolvimento excludente e os meios de comunicação

Artigo: Pobreza, Analfabetismo, Exclusão e DoençasUm quadro alarmante, fatores que marcam o envelhecimento na América Latina

Diversidade cultural resguardadaPara garantir a preservação do patrimônio cultural brasileiro, surgem novas propostas e mecanismos

Identidade cultural expressa em palavrasA formação do português brasileiro, suas influências e seu papel como espelho da diversidade cultural

6 Neo Mondo - Agosto 2009

Compromisso com a diversidadeEstado fixa as bases que norteiam relacionamento com povos e comunidades tradicionais

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Artigo: Gestão com sutentabilidade socioambientalQual a responsabilidade dos produtores e dos consumidores para a produção e consumo de bens e de serviços em bases ecologicamente apropriadas?

biomas -caatinga

As diversas faces do semi-árido nordestinoVisto como um tipo de vegetação pobre e como uma fronteira, o bioma abriga uma das maiores biodiversidades brasileiras

Artigo: Bicho MãeQue bicho é esse?

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Um olhar consciente

InstitutoInstituto

NeoMondo

NeoMondo

A “Declaração universal sobre a diversidade cultural”, adotada pela UNESCO, em

2001, a fim de estimular o diálogo entre os povos e o desenvolvimento harmonioso de todas as nações, re-conhece a diversidade cultural como o patrimônio comum da humanida-de, proclamando, entre outros, os seguintes princípios:

“Fonte de intercâmbios, de inovação e de criatividade, a diversidade cultural é, para o gênero humano, tão necessária como a diversidade biológica para a natureza” (Artigo 1).“As políticas que favoreçam a inclusão e a participação de todos os cidadãos garantem a coesão social, a vitalidade da sociedade civil e a paz” (Artigo 2).“A diversidade cultural amplia as possibilidades de escolha que se oferecem a todos; é uma das fontes do desenvolvimento, entendido não somente em termos de crescimento econômico, mas também como meio de acesso a uma existência intelectual, afetiva, moral e espiritual satisfatória” (Artigo 3).“As forças do mercado, por si sós, não podem garantir a preservação e promoção da diversidade cultural, condição de um desenvolvimento humano sustentável. Desse ponto de vista, convém fortalecer a função primordial das políticas públicas, em parceria com o setor privado e a sociedade civil” (Artigo 11).

Pensando na importância de aprofundar o debate a respeito desse assunto entre nós, a equipe Neo Mondo preparou esta publicação especial sobre a diversidade cultural brasileira, cuja riqueza é hoje reconhecida e valorizada em todo o mundo.

Inaugurado em 2006, o Museu da Língua Portuguesa, localizado na Estação da Luz, em São Paulo, consolidou-se como um dos museus mais visitados do Brasil e da América do Sul. Apresentamos o trabalho ali realizado, discutindo o surgimento e a importância do português brasileiro.Na investigação da Identidade Cultural do brasileiro, mostramos as diversas etnias que compõem nossa nação e como está o nível de consciência da sociedade sobre o assunto. Renomados especialistas nos ajudam na tarefa de entender o que representam alguns dados estatísticos, como índices de fecundidade, natalidade, e urbanização. Ainda nesse tema, fomos atrás das comunidades quilombolas da região do Vale do Ribeira, no interior do Estado de São Paulo, para desvendar a cultura desses grupos.Entre os diferentes povos que formam esta nação, os indígenas ganham importância crescente. Procuramos esclarecer o que é mito e o que é realidade, como funcionam os órgãos oficiais de defesa, e como está a organização dessa gente, com destaque para os Yanomamis.Em outra matéria, abordamos a PNCT – Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, criada em 2007. Mostramos a importância desse mecanismo e o que ele representa para o país, discutindo sua viabilidade e necessidade de aprimoramento.Nesta edição da Revista Neo Mondo, como convém ao próprio tema, a questão da diversidade cultural brasileira é desenvolvida em seus vários aspectos e analisada sob diferentes pontos de vista.

Boa leitura!

Editorial

Márcio Thamos é Colunista e Conselheiro da Revista Neo Mondo

Neo Mondo - Agosto 2009 7

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Autor de “Casa-grande & Senzala” é reconhecido mundialmente pelo pioneirismo dos estudos da cultura brasileira

Rosane Araujo

Perfil

Em 2010, completarão 110 anos de nascimento de um dos primeiros intelectuais a discutir o “ser brasi-

leiro”: Gilberto Freyre.Nascido em Recife, Pernambuco,

em 15 de março de 1900, formou-se ba-charel em Ciências e Letras e posterior-mente mestre em Ciências Sociais pela Columbia University de Nova Iorque, realizando doutorado em diversas insti-tuições no decorrer da carreira.

Sua principal obra foi publicada em 1933: “Casa-grande & Senzala”, livro que revolucionou a intelectualidade da épo-ca ao apresentar novos conceitos sobre a formação da sociedade brasileira, consi-derando a mistura de “três raças”: índios, africanos e portugueses.

Durante o período de estudos na universidade americana, Freyre teve contato com o antropólogo Franz Boas, que viria a ser a principal referência na elaboração de uma linha de pensamento que diferenciava raça e cultura, separa-va herança cultural de herança étnica e considerava o conceito antropológico de cultura como o conjunto dos costumes, hábitos e crenças do povo brasileiro.

Hoje, mesmo tendo aspectos de sua obra criticados (veja abaixo), Gilberto

Divulgação

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Neo Mondo - Agosto 2009 9

Freyre ainda inspira estudos e conquis-ta admiradores.

Ele foi tema de exposição majesto-sa no Museu da Língua Portuguesa, en-tre novembro de 2007 e maio de 2008, que reuniu acervo da Fundação que leva seu nome, criada meses antes de sua morte, ocorrida em 18 de julho de 1987. E, no ano passado, foi tema do livro “Gil-berto Freyre-Social theory in the tropics”, lançado pelo conhecido historiador da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, Peter Burke e sua mulher, a brasileira Ma-ria Lúcia Garcia Palhares Burke, do Centro de Estudos Latino-americanos da mesma universidade. A obra situa-o em seu con-texto cultural e político, sem ocultar as críticas, mas reconhecendo também suas enormes contribuições à compreensão da sociedade brasileira.

Mas, afinal, quais são essas con-tribuições?

Certamente são muitas, mas destaca-se, no aspecto da historiografia, a manei-ra inovadora de considerar a história, não por meio de grandes feitos, mas sim pela análise da vida cotidiana, incluindo-se aí relatos orais e documentos manuscritos.

Teria sido ele, então, um dos primei-ros a pensar em “patrimônio imaterial”?

Muitos acreditam que sim. “Ele foi o pre-cursor do conceito de patrimônio ima-terial, conceito este que se concretizou com enorme sucesso”, afirmou Antonio Carlos Sartini, superintendente-executi-vo do Museu da Língua Portuguesa, no site da Fundação Gilberto Freyre.

Outra contribuição da obra de Freyre foi a tentativa de desmistificar a noção de determinação racial na for-mação de um povo, apontando a mis-cigenação conferida no país como ele-mento positivo.

Em “Casa-Grande”, o papel de índios e negros na formação do povo brasileiro é valorizada de forma praticamente inédita.

Autor não é unanimidadeMesmo tendo alcançado sucesso

dentro e fora do país, as ideias defen-didas por Gilberto Freyre não são una-nimidade.

Membro da classe dominante per-nambucana (o pai era juiz de Direito e catedrático de Economia política da Faculdade de Direito do Recife, e o avô senhor de engenho), é por vezes acusa-do de manter postura elitista, mostran-do-se benevolente com a escravidão, na qual via consequências positivas do

Gilberto de Mello Freyre

Nasceu no Recife, Pernambuco, em 15 de março de 1900, filho do Dr. Alfredo Freyre - educador, Juiz de Direito e catedrático de Economia Política da Faculdade de Direito do Recife - e Francisca de Mello Freyre.

Sociólogo, antropólogo, escritor, pioneiro da Antropologia Cultural Moderna Brasileira com a obra “Casa-grande & Senzala”.

Foi doutor pelas Universidades de Paris (Sorbonne), Colúmbia (EUA), Coimbra (Portugal), Sussex (Inglaterra) e Münster (Alemanha). Em 1971, a Rainha Elizabeth lhe conferiu o título de Sir (Cavaleiro do Império Britânico).

Obras:

Casa-Grande & Senzala, 1933.

Sobrados e Mucambos, 1936.

Nordeste: Aspectos da Influência da Cana Sobre a Vida e a Paisagem..., 1937.

Assucar, 1939.

Olinda, 1939.

O mundo que o português criou, 1940.

A história de um engenheiro francês no Brasil,1941.

Problemas brasileiros de antropologia, 1943.

Sociologia, 1945.

Interpretação do Brasil, 1947.

Ingleses no Brasil, 1948.

Ordem e Progresso, 1957.

O Recife sim, Recife não, 1960.

Vida social no Brasil nos meados do século XIX, (1964).

Brasis, Brasil e Brasília, 1968.

O brasileiro entre os outros hispanos, 1975.

Influências

Franz Boas (18598-1942) – crítico feroz dos determinismos biológicos e geográ-ficos. Apontava que cada cultura é uma unidade integrada, fruto de um desen-volvimento histórico peculiar. Dentre suas obras principais, destacam-se: “The Mind of Primitive Man”, 1938 (A Mente do Homem Primitivo), e “Race, Language and Culture”, 1940 (Raça, Linguagem e Cultura).

Todo brasileiro traz na alma e no corpo a sombra do indígena

ou do negro“

Ficha

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Perfil

Neo Mondo - Agosto 2009

Casa-Grande & Senzala foi a resposta à seguinte indagação que eu fazia

a mim próprio: o que é ser brasileiro? E a minha principal fonte de informação fui eu

próprio, o que eu era como brasileiro, como eu respondia a certos estímulos.

Gilberto Freyre

ponto de vista cultural, no contato de brancos e negros.

Apesar do termo nunca ter aparecido em sua obra, seus estudos foram inter-pretados como defensores da miscigena-ção como mecanismo desencadeador da “democracia racial”.

Outros estudiosos da época, porém, refutavam esta ideia, ressaltando a in-justiça e violência do regime escravista, no qual não vinham qualquer ponto po-sitivo. Era o caso do sociólogo paulista Florestan Fernandes.

No ponto de vista defendido por Flo-restan, não há igualdade racial no Brasil e a miscigenação é um mecanismo, não de ascensão social para negros e mulatos, mas, ao contrário, que promove a hegemo-nia da raça dominante.

O embate de ideias dava-se porque, enquanto Freyre baseava-se na escola cul-turalista da antropologia de Franz Boas, Florestan utilizava o método histórico dia-lético de Karl Marx.

A discussão continua, mas não dimi-nui a importância do legado de Gilberto Freyre, ainda considerado um dos melho-res “intérpretes do Brasil”.

Jorge Amado

“Felizmente o Brasil futuro não vai ser o que os velhos

historiadores disseram e os de hoje repetem. Vai ser o que

Gilberto Freyre disser. A grande vingança dos gênios é essa”.

Monteiro Lobato

“O que o Brasil e os brasileiros devem a Gilberto Freyre poderia

ser definido como tomada de consciência histórica. Através da

interpretação gilbertiana, o Brasil ‘reconhece-se’ e foi ‘reconhecido’ pelo mundo, o que é, por sua vez,

um fato decisivo, uma data na história brasileira”.

Otto Maria Carpeaux

Fonte: Biblioteca Virtual – Fundação Gilberto Freyrehttp://bvgf.fgf.org.br/

“E então apareceu Casa-Grande & Senzala. Saíamos do terreno da ficção, da pura criação literária, agora abria-se um nôvo caminho para o estudo, para a

ciência. Foi uma explosão, um fato nôvo, alguma coisa como ainda não possu-íamos e houve de imediato uma consciência de que crescêramos e estávamos

mais capazes. Quem não viveu aquêle tempo não pode realmente imaginar sua beleza. Como um deslumbramento. Assisti e participei dêsses acontecimentos, posso dar testemunho. O livro de Gilberto, foi fundamental para tôda a trans-formação sofrida no país, verdadeira alavanca. O abalo produzido na opinião

pública por CasaGrande & Senzala foi decisivo. Uma época começava no Brasil, o aparecimento de tal livro era a melhor das provas”.

Depoimentos

Fonte: Foto de Arquivo pessoal, da família AguiarAutor: Eduardo Adonias Aguiar

Gilberto Freyre com a amiga Rachel de Queirós

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Neo Mondo - Setembro 2008 A

Casa-Grande & Senzala foi a resposta à seguinte indagação que eu fazia

a mim próprio: o que é ser brasileiro? E a minha principal fonte de informação fui eu

próprio, o que eu era como brasileiro, como eu respondia a certos estímulos.

Gilberto Freyre

an_planeta_oleo_205x275_af.pdf 19.06.09 10:22:30

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Expectativa de vida do brasileiro e processo de urbanização são características marcantesGabriel Arcanjo Nogueira

A correta percepção da diversidade cultural brasileira passa pelo co-nhecimento da evolução demo-

gráfica do País. Se é comum referir-se ao Brasil como um continente, de várias na-ções numa só, importa, porém, saber que população nele habita.

Estudo da professora doutora Elza Salvatori Berquó, publicado no Almana-que Brasil Socioambiental, é esclarecedor nesse sentido. Fundadora e coordenadora da Área de População e Sociedade - Cen-tro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), fundadora e coordenadora do Programa de Saúde Reprodutiva e Sexua-lidade - Núcleo de Estudos de População (Nepo), da Unicamp, Elza Berquó aponta características marcantes de nossa gente, tiradas da sua análise dos censos dos úl-timos 60 anos. Entre outras, o que chama de transições nos níveis e tendências da mortalidade e da natalidade, de 1940 a 2000; e a urbanização crescente, acentua-da na década de 1991 a 2000.

“Nos últimos 60 anos, as mulheres no Brasil reduziram sua prole, em mé-

dia, em 4 filhos, enquanto houve um ganho de 30 anos, em média, na expec-tativa de vida ao nascer dos brasileiros”, diz. Já na década em que se realizou o último censo, “o País teve aumentado seu grau de urbanização, com 81,2% de sua população vivendo em cidades, em comparação com os 75,6% correspon-dentes a 1991. Situação que contrasta com aquela registrada em 1940, quando 69% da população do País vivia em áre-as rurais”, lembra. O que dá a dimensão do salto, quando se trata da urbaniza-ção nos últimos 60 anos.

Urbanos ou não, os brasileiros, de acordo com o censo de 2000, se definem como maioria branca (54,6% da popu-lação do País), com apenas 6,3% reco-nhecendo-se de cor preta, 39% conside-rando-se pardos, 0,4% amarelos e 0,4% indígenas. Esta última categoria não era apurada, no critério de autoidentifica-ção, em censos anteriores, o que foi feito apenas nos últimos dois levantamentos: 1991 e 2000 (leia matéria sobre Povos Indígenas nesta edição).

Especial - Diversidade Cultural

Neo Mondo - Agosto 200912

Mudança na pirâmideDois outros aspectos são destacados

por Elza Berquó em sua análise. Em regiões urbanas, existem mais mulheres do que ho-mens, enquanto, nas rurais, predominam os homens. Fenômeno que, segundo ela, é ex-plicado pelas migrações internas e diferen-ciais em níveis de mortalidade. Além disso, apesar de caracterizado como um país de po-pulação jovem, a especialista detecta um au-mento da importância relativa de idosos nos últimos dois censos: eram 7,1 milhões em 1991 e passaram a 9,8 milhões em 2000.

A especialista explica que “as transi-ções nos níveis de tendências da morta-lidade e da fecundidade afetaram direta-mente e de forma significativa a estrutura etária da população”.

O que fica evidente no que chama de pirâmide etária: a de 2000 é mais uniforme e de base reduzida, característica de regi-mes com grande redução na fecundidade. Ao contrário das anteriores, própria de regimes demográficos com altas taxas de fecundidade e de mortalidade, com base larga e de forma triangular.

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Divulgação

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Homens Mulheres

10 8 6 4 2 0

80 a +

70-74

60-64

50-54

40-44

30-34

20-24

10-14

00-04 0 2 4 1086 %

2000

Elza, do Cebrap e da Unicamp: estudo ajuda a entender a evolução demográfica

Colonizados e colonizadores A presidente do Instituto Socioam-

biental (ISA), do qual é sócia fundado-ra, Neide Esterci, considera que, nesse contexto, “somos uma nação multiétnica - fruto de um processo violento de co-lonização que dominou e quase exter-minou por completo os povos que aqui existiam como nações independentes. Temos, hoje, colonizados e colonizado-res, um só Estado, um território e uma língua oficial. Felizmente, muitos povos sobreviveram e tiveram força e apoio de

aliados para reivindicar direitos basea-dos na sua especificidade, de modo que, dentro do território nacional, há outros territórios e muitas outras línguas”.

Doutora em antropologia e pesqui-sadora do Conselho Nacional de De-senvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Neide esclarece porque é mais correto falar-se em etnias, e não raças. Ela lembra que a noção de raça tem a ver com as tentativas de estabelecer diferenças fundadas em características físicas e biológicas. O que embutia o conceito de que uma hierarquia poderia ser estabelecida entre raças tidas como naturalmente mais e menos dotadas. “Idéia que não merece mais crédito. Pensadores mundialmente reconheci-dos se insurgiram contra essas noções e, depois da tragédia da Segunda Guerra e das consequências das ideologias na-zi-fascistas, organismos internacionais, como a ONU, recusaram explicitamente essas idéias”, assegura.

Percepção positivaCom pesquisas e trabalhos publicados

sobre conflito de terra, trabalho escravo, projetos comunitários na área rural e tex-tos sobre unidades de conservação, Neide é didática quando fala do nível de cons-ciência do brasileiro sobre o que é ser ci-dadão em meio a essa diversidade toda. Seríamos vários povos num só?

Feita a ressalva de que não possui pesquisas nem dados estatísticos nos quais basear qualquer generalização, ela recorre ao que chama de manifes-tações de uma percepção positiva com relação à nossa diversidade. E cita dois exemplos, vindos de uma esfera da vida social que já foi usada na tentativa de demonstrar a superioridade da “raça branca” - os esportes.

A antropóloga cita: “Ao final dos jogos Pan-Americanos no Rio, um re-pórter entrevistava uma das campeãs - uma lourinha vinda do Sul do País, e perguntou sobre o que ela achava dos efeitos da nossa diversidade nos jogos. A pergunta já se expressava num tom positivo, e a resposta foi uma manifes-tação de orgulho por fazer parte dessa diversidade. Algo semelhante aconte-ceu ao final dos jogos da Liga das Na-ções. Ao entrevistar as jogadoras da Se-leção Brasileira de Vôlei, vencedora dos jogos, o comentarista destacou, positi-vamente, a diversidade de tipos bioló-gicos”. E conclui: “Podemos considerar, a partir desses exemplos, que continu-amos a pensar a cor da pele, a textura dos cabelos e outros caracteres físicos como diferenciadores. Mas as duas ma-nifestações expressam formas de lidar positivamente com a nossa diversidade, valorizando-a em termos de identidade e autoestima nacionais”.

Especial - Diversidade Cultural

Fonte: IBGE – Censo demográfico de 2000

Pirâmide etária da população residente – Brasil

Divulgação

Page 15: Neomondo 25

SERVIÇO

O Almanaque Socioambiental, edição de 2008, é uma das publicações do ISA (www.socioambiental.org.br), que também pode ser contatado pelo fax 3515-8922

Neo Mondo - Agosto 2009 15

Somos uma nação multiétnica, em que, felizmente, muitos povos sobreviveram“ ”

Neide, do ISA: lidar com a diversidade é valorizar identidade

e autoestima nacionais

necessário pensar as duas ciências como complementares”.

Para tornar o País mais viável so-cioambientalmente, a presidente do ISA deixa um recado que vale muito, apesar de ela própria considerar que fala no atacado:• Aos governos, por exemplo, aconselha

abrir espaços legais e garantir os direi-tos para que a diversidade se expresse, garantindo territórios que acolham o social e o culturalmente diverso e os proteja; escolas e programas escolares que valorizem os conhecimentos, a lín-gua e a identidade de cada povo, assim como suas expressões culturais.

• As empresas, por sua vez, acredita, têm de ser realmente responsáveis pe-los efeitos de seus empreendimentos e, se eles são lucrativos porque usam os recursos e mão- de-obra de um lu-gar, tem de haver retornos relevantes sem deixar tantos estragos ecológicos e tantas pessoas na miséria, quan-do se retiram para outros lugares ou abandonam seus empreendimentos.

• Quanto às ONGs, lembra que, quan-do fazem corretamente a sua parte,

em muitos e muitos casos – como instituições da sociedade civil organi-zada - têm sido, há décadas, aliadas de camponeses, povos indígenas e trabalhadores. “A estas devemos, em parte, a sócio e a biodiversidade que temos”, reconhece.

CensosGrupos Etários

Até 14 anos 15 a 64 anos 65 anos ou mais

1940 42.65 54.9 2.4

1950 41.8 55.6 2.6

1960 42.7 54.6 2.7

1970 42.6 54.3 3.1

1980 38.2 57.7 4.0

1991 34.7 60.4 4.8

2000 29.6 64.5 5.8

Distribuição Relativa da PopulaçãoBrasil 1940 a 2000 (por grandes grupos etários)

Fonte: IBGE – Censos demográficos de 1940 a 2000

Ciência do concreto aplicada à nossa realidade

A antropóloga discorre sobre uma tese - defendida, entre outros, pelo livro A Amazônia que não conhecemos, (edi-ção da Comunidade dos Servos de Maria de Sena Madureira), de que quem vive em determinado lugar e dele tira a sua subsis-tência é que saberá preservá-lo. Pergunta-da se a tese é correta e o que deve ser feito para respeitá-la plenamente no País, Neide fala de cátedra: “Há certo consenso em tor-no da compreensão de que, vivendo por gerações em um ambiente físico, os povos aprendem a lidar com os seres e coisas desses lugares, não apenas porque vivem lá, mas porque observam, dão nomes, clas-sificam e registram os processos, os efeitos do uso, as interações desses seres e coisas. Como magistralmente descreveu Claude Lévi-Strauss, eles dominam uma espécie de ciência do concreto que, mediante a observação das propriedades sensíveis dos elementos da natureza que habitam, são capazes de antecipar, muitas vezes, os resultados da ciência moderna ocidental. É preciso reconhecer e conferir status aos saberes dessa outra ciência e é possível e

Divulgação

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Mais que dono da própria terra, ele quer é ser respeitado e viver sua realidade

Gabriel Arcanjo Nogueira

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Dia de Índio é sempre

Tentar entender o que são povos indí-genas, como vivem e o que fazem é embrenhar-se num emaranhado de

etnias, costumes, organismos oficiais e não oficiais, de uma ponta a outra do País, mais intricado do que adentrar a própria floresta amazônica - ou o que vier a sobrar dela. Con-tribuição fundamental é a dos irmãos Villas Bôas, que iniciaram seus contatos com povos indígenas em meados do século 20 - trata-dos por eles com o respeito, a dignidade e a seriedade merecidos - e, de lá para cá, foram fiéis ao ideal de marechal Rondon, pioneiro na caminhada: “morrer se for preciso, matar nunca”. Noel Villas Bôas, um dos filhos de Orlando, mantém vivo o legado indigenista e, gentilmente, nos cedeu imagens que enri-quecem esta edição da NEO MONDO.

O censo de 2000 traz um dado que chegou a surpreender estudiosos: 734.131 mil brasileiros se definiram como índios,

em 26 Estados e no Distrito Federal, mais que o dobro do número do censo de 1991. A Fundação Nacional do Índio (Funai) confirma a tendência crescente da popu-lação indígena, ao estimar que são hoje cerca de 1 milhão de índios agrupados em centenas de etnias que se distribuem por todo o País. E atesta que a taxa de cres-cimento demográfico desse segmento da sociedade supera o crescimento da popu-lação não-índia.

Dá para dizer que a letra da música de Jorge Ben Jor faz sentido cada vez mais: em todo dia do ano, nossos índios podem comemorar seu dia. Importa mais, porém, conhecer um pouco mais do que pensam representantes dos próprios indígenas brasileiros, de instituições que trabalham diretamente com eles, para que a parte boa da música citada seja preservada: “Antes que o homem aqui chegasse/As Terras

Brasileiras/Eram habitadas e amadas/Por mais de 3 milhões de índios/Proprietários felizes/Da Terra Brasilis”...”Amantes da natureza/Eles são incapazes/Com certeza/De maltratar uma fêmea/Ou de poluir o rio e o mar/Preservando o equilíbrio eco-lógico/Da terra, fauna e flora/Pois em sua glória, o índio/É o exemplo puro e perfei-to/Próximo da harmonia/Da fraternidade e da alegria/Da alegria de viver!”

Identidade retomadaO Conselho Indigenista Missioná-

rio (Cimi) entende que existe uma reto-mada da identidade étnica por parte de alguns grupos indígenas. Embora reco-nheça que o organismo, da Conferência Na-cional dos Bispos do Brasil (CNBB), não disponha de dados sobre a citada autoiden-tificação, nos últimos anos, diversos gru-pos têm reassumido sua identidade étnica.

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Um desses grupos são os Tukanos, do qual faz parte Estevão Lemos Barreto (Kemarõ, em sua língua materna). Para ele, “a cres-cente autoidentificação de indígenas no País se deve a vários fatores sociais e polí-ticos graças a algumas lideranças indíge-nas que levantaram a bandeira do direito a uma terra demarcada, desde os tempos da ditadura militar”. Nascido na Aldeia Mio-nã Pitó, na Terra Indígena Alto Rio Negro, município de São Gabriel da Cachoeira, a noroeste do Estado do Amazonas, e pai de 6 filhos, Estevão Tukano é formado em Ciências Sociais e iniciou pós-graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia. Um dos fatores que motiva a autoidentifi-cação, acredita, é a visibilidade que o movi-mento indígena conquista na mídia impres-sa e eletrônica. Outros são os programas de benefícios sociais de governos, ao reconhe-cer o direito diferenciado a povos indígenas

como sociedade de cultura de características próprias. Num momento em que “a conjun-tura política do País se afunda numa profun-da crise de estrutura social e política, onde quem não grita não é ouvido, quem não aparece não é visto, a estratégia indígena é muito bem utilizada”, avalia. O que, a seu ver, “tem despertado e motivado dezenas ou centenas de pessoas que até então viviam oprimidas, discriminadas, marginalizadas e muitas delas no anonimato a se autoidentifi-car como indígenas ou seus descendentes”.

Tática contra o etnocídioEstevão Tukano ressalta que não se tra-

ta de uma questão de mera sobrevivência: “Quem sobrevive são os que migraram para centros urbanos de municípios e capitais dos estados, em busca de melhores condi-ções de vida – ou da ilusão de que viver na cidade é privilégio -, e outros em busca de

aprimorar cada vez mais seus conhecimen-tos”. Não que não haja os que se adaptam e vivem bem em centros urbanos. Mas, “uma coisa é certa: indígenas que vivem na sua terra de origem, estes não sobrevi-vem e sim vivem dentro da realidade que o ambiente lhes proporciona, atendendo a aspectos culturais de cada povo”.

Uma análise próxima da do Cimi, ao lembrar que, por muitas décadas, alguns povos indígenas tiveram de usar como mecanismo de resistência o ocultamento de sua identidade. O que, no entender da instituição, era necessário como um meio de proteção para que as pessoas sobrevi-vessem a diversas agressões. Houve casos em que muitos negaram sua identidade por medo, como os Koiupanká, em Ala-goas. Outros se isolaram ou se integraram a outros povos para continuar existindo, como os Xetá do Paraná.

Indios do Alto Xingu dançando em homenagem ao Kuarup de

Orlando Villas Bôas, 2003

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Nos últimos 30 anos, é que muitos po-vos voltaram a assumir publicamente suas identidades. A partir daí, reapareceram no cenário nacional diversos povos que, por muito tempo, não eram conhecidos ou eram considerados extintos pelos regis-tros oficiais do Estado brasileiro.

Na visão do Cimi, é possível dizer que essa tática tenha sido a principal e mais eficiente estratégia na luta contra o etno-cídio incentivado por políticas integracio-nistas. Ao fingir não ser mais indígena, o indivíduo pertencente a um determinado povo conseguia preservar sua integridade física. Ele deixava de ser perseguido por políticos e outras pessoas da região com interesses econômicos sobre suas terras e recursos naturais.

Diversidade cultural expressivaA Funai cita alguns aspectos impor-

tantes, como o fato de a população in-dígena do Brasil representar uma das maiores diversidades culturais do plane-ta. São 220 povos diferenciados, falantes de 180 línguas, distribuídos em todo o território nacional. A instituição lembra que, para os povos que vivem em seus territórios tradicionais, o governo promo-veu a regularização de mais de 400 áreas, totalizando 12% do território nacional. Se muitas dessas áreas enfrentam proble-mas de invasões, exploração ilegal dos re-cursos naturais e outras formas de pressão, a Funai - para conter os abusos e garantir os direitos dos povos indígenas - executa o Programa de Proteção e Promoção dos Povos Indígenas. O que é feito em ações que procuram considerar as especificida-des culturais de cada povo, valorizando a autonomia e a participação dos indígenas nos processos políticos que definem suas condições de vida.

Firmeza YanomamiPara quem já foi consultor-antropólogo

em convênio Funai-Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), atua em vários conselhos socioam-bientais, é membro fundador do Instituto de Empreendedorismo Indígena do Ama-zonas e presidente da Confederação das Or-ganizações Indígenas e Povos do Amazonas (Coiam), pode-se dizer que Estevão Tukano é legítimo representante de povos indígenas.

Ele fala com desenvoltura tanto de as-pectos geográficos e históricos da região que mais conhece, o Amazonas - Estado que con-centra o maior número de população indíge-na, algo em torno de “27% do seu total no Brasil e, portanto, a maior diversidade de po-vos indígenas” - como dos Yanomamis, etnia, segundo ele, mais focada pelos holofotes da mídia. O presidente da Coiam é cauteloso. “Se quem aparece na mídia é conhecido, todavia a mesma mídia que elitiza, destrói ou aca-ba com a imagem de qualquer cidadão”, diz. Estevão Tukano lembra que, entre suas ca-racterísticas, os Yanomamis se destacam pela manutenção da cultura mediante o grafismo facial e a preservação ambiental. Habitantes de um território quantitativamente superior à área de muitos países europeus e sob a li-derança de Davi Copenawa, esse povo, como “guardiões da floresta, trabalha duro para ter uma condição digna para viver”.

O Cimi, por sua vez, destaca que os Yano-mamis se mostram firmes contra a exploração mineral (por garimpeiros ou empresas) em suas terras. Ao lembrar que a terra Yanomami foi e continua sendo constantemente vítima de in-vasão de garimpeiros, que gera diversas conse-quências negativas para o povo, como vírus de doenças e contaminação de rios, o organismo da CNBB considera que muito da força Yano-mami está nas lideranças desse povo, que não

toleram a exploração mineral em suas terras.

Amazonas, um espelhoPor contar com 178 terras indígenas

demarcadas oficialmente, corresponden-do a 29% do território do Estado, com 45.977.834 hectares, o Amazonas bem que pode ser um espelho para as demais unida-des da Federação. O reconhecimento dessas terras, ressalta Estevão Tukano, representa papel fundamental na proteção das cultu-ras dos povos indígenas e na conservação ambiental em vista do fator agravante de mudanças climáticas.

O nível de organização indígena a que se chegou nesse Estado do Norte do País é fru-to de muita consciência étnica e persistência, além de tudo. O presidente da Coiam afirma que, em sua trajetória, “lideranças indígenas das federações e organizações regionais do Amazonas discutiram em suas reuniões lo-cais a necessidade de ampliar a articulação política do Movimento Indígena em outros Estados da Amazônia Brasileira”.

Estatuto e relatórioQuando já estávamos com esta matéria

pronta, a Organização das Nações Unidas di-vulgou relatório, em que, entre outros aspec-tos, alerta para condições precárias em que vi-vem populações indígenas. Isto porque muitas delas não controlam suas terras e recursos. Se 15% da população brasileira vie na pobreza, en-tre os índios, a taxa sobe para 38%.

O relatório, resultado de trabalho coor-denado por James Anaya, descendente de apache, aponta sobretudo problemas em de-marcações de terra, falta de recursos em pro-jetos educacionais, pouca participação de po-vos indígenas em cargos políticos e, embora reconheça avanços nas iniciativas da Funai, defende que a Fundação abandone posturas

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Em sua glória o índio é o exemploperfeito da alegria de viver“ ”

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Indígenas que vivem em sua terra de origem preservam a própria cultura num aprendizado constante

Telmo Ribeiro Paulino

Estevão Tukano: “trabalho duro para ter condição digna”

Orlando, Leonardo e Cláudio Villas Bôas, década de 1950

Primeiros contatos com os Txikão, em 1967

Chegada dos Txikão ao Parque Indígena do Xingu, década de 1970

Claudio e Orlando com um índio xinguano, década de 1970

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paternalistas, para se tornar mais efetiva na defesa dos interesses indígenas.

O relatório diz ainda que o novo Esta-tuto do Indio, que está em debate, limitará a proteção dos direitos dos povos. No to-tal, são 19 propostas no Senado e 15 na

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SERVIÇO

Para saber mais sobre as organizações indígenas citadas e ajudá-las em seus projetos, contatar:Fundação Villas-Bôas - www.expedicaovillasboas.com.brCoração da Terra - www.yvykuraxo.org.brCoiam - [email protected]; [email protected]ãos Villas Bôas: www.estadao.com.br/ext/especial/villasboas/; [email protected] site da Funai é www.funai.gov.br; e o do Cimi é www.cimi.org.br

Entre as organizações envolvidas com a diver-sidade cultural estão a Fundação Villas-Bôas e a Yvy Kuraxo (Coração da Terra) - a primeira, do Pará; a segunda, do Rio Grande do Sul. A Fundação Villas-Bôas, presidida por Paulo Celso Villas-Bôas, está empenhada em um projeto da mais alta significância para tornar a Amazônia - e o País - sustentável: a Expedição Villas-Bôas pelo Brasil. Para isso, busca parcerias com áreas do setor produtivo, que lhe permitam viabilizar o projeto. Na empreitada, ele conta com sua “fiel escudeira” Liana Utinguassú, índia Guarani que preside a Yvy Kuraxo. Escritora e consultora, ela é autora do livro O Chamado da Terra. Paulo Celso esclarece: “A Fundação/Expedição Villas-Bôas pelo Brasil prima pelo conceito de Responsabilidade Social correlacionando-o com o amor ao próximo e ao planeta em um único tripé: o homem e sua família protegido pela força divina; a economia com o setor

produtivo; e a natureza e o trabalho com responsabilidade socioambiental”. Em que pese o sobrenome, Paulo Celso não é da família dos irmãos Villas Bôas, Orlando e Cláudio, indigenistas históricos. Mas o

IDEAl cOnSERVAcIOnISTA E pOVOS InDÍgEnAS

Orlando Villas Bôas

Em sua glória o índio é o exemploperfeito da alegria de viver“ ”

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Paulo Celso e Liana: os dois se dizem fiéis escudeiros; para ele, a Guarani é uma guerreira; ela o trata como irmão

Acervo de Paulo Villas Bôas

ideal conservacionista, implícito em seu projeto, e a evolução dos povos indígenas caminham juntos. Assim como Paulo Celso e Liana, incansáveis à frente de ações pró-indígenas, como esta expedição.

Câmara para modificar a forma pela qual as terras são demarcadas.

Para Liana Utinguassú (saiba mais sobre ela no quadro abaixo), é triste constatar que o que se lê no relatório é mais e mais visto entre os índios brasileiros.

Orlando, Leonardo e Cláudio Villas Bôas, década de 1950

Primeiros contatos com os Txikão, em 1967

Chegada dos Txikão ao Parque Indígena do Xingu, década de 1970

Claudio e Orlando com um índio xinguano, década de 1970

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Serrote do Gado Bravo, comunidade quilombola localizada na zona rural de São Bento do Una, interior de Pernambuco

N as grandes metrópoles – nas es-colas e universidades inclusive – muitos imaginam um quilom-

bo como um lugar específico, isolado. Mas no Vale do Ribeira, sul do Estado de São Paulo – zona limítrofe entre as regiões sudeste e sul do país – está a maior concentração de comunidades quilombolas do Estado. E é o município de Eldorado – registrado como instância turística pela Embratur – um ponto de partida privilegiado para quem quer co-nhecer estas comunidades.

Eldorado possui cerca de 15 mil ha-bitantes e um centrinho simpático, cuja maior construção é a Igreja Matriz. Por isso, ainda atende pelo apelido carinhoso de “cidadezinha do interior”, onde se pode manter a tradicional sesta – parada de duas horas entre a manhã e a tarde – e cultivar o agradável hábito das conversas informais. Todos se conhecem e, quando chegam tu-ristas, a recepção é alegre, festiva e fácil.

Atrás da igreja fica a pequena rodo-viária, referência importante para quem quer se distanciar da ditadura das agên-cias de viagem. Quer ir ao quilombo? Todos podem informar o caminho,

Comunidades Quilombolas no Brasil

Sandra Regian do Nascimento Santos

Especial - Diversidade CulturalFoto: Osmario Marques

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Até 202comunidades

Até 100comunidades

Até 40comunidades

Até 10comunidades

Acre

Roraima

DF

cresceu. A preocupação com essas comuni-dades ressurgiu no Brasil com a promulga-ção da Constituição Brasileira de 1988 que, em seu artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, passou a permitir que comunidades quilombolas, remanescentes de ocupações territoriais ocorridas no período escravista, solicitas-sem o reconhecimento legal de suas posses. Seriam demarcadas e tituladas como “sítios de valor histórico” e patrimônio cultural.

Depois disso, várias discussões ocor-reram: como seria possível comprovar que determinada comunidade, efetivamente, era composta por descendentes de escravi-zados fugitivos se a ocupação, nestes casos, não era documentada? Aliás, era todo esse um movimento ilegal, pois realizado por pessoas que, transformadas em mercado-rias, procuravam se livrar de tal situação.

Hoje se reconhece que quilombo, muito mais que um esconderijo para os antepassados, foi o lugar onde o negro, na pós-escravidão, reconstruiu sua vida, sua autoestima, deixando de ser mercadoria para se transformar num trabalhador ru-ral inserido social e comercialmente. Para que as comunidades sejam consideradas remanescentes de quilombos, então, não é preciso que tenham sido constituídas por escravizados fugitivos, nem que te-nham se mantido em total isolamento por muito tempo.

Além destas formas clássicas de ocupa-ções, outros fatores levaram à emancipação do negro, sua organização e ida para tais re-dutos fortificados: a alforria, comprada pelo escravo ou doada pelo senhor; a compra de terras ou cessão de espaço em vida ou via testamento; a conquista de terreno por serviços prestados em lutas oficiais (como a guerra do Paraguai) ou empreendimen-tos particulares; a fixação em locais ermos e distantes após fuga. Todas estas formas de conquistas – conhecidas, genericamen-te, como “terras de pretos” – tem direito ao reconhecimento e titulação. Até mesmo as ocupações realizadas após 1888, quando os ex-escravizados, expulsos das fazendas – substituídos pelos imigrantes europeus – e inadaptados ao meio urbano, voltam ao campo em busca de sobrevivência, en-grossando o contingente já aquilombado e ocupando outros espaços livres.

Essa situação – que não é exclusiva do Brasil, pois marca todos os locais onde houve escravização de seres humanos – se espalha por todo o território nacional. Mui-tos grupos ainda reivindicam, na justiça, o direito às suas terras. O que lhes conferirá segurança contra ações de fazendeiros, gri-leiros e advogados de agroindústrias diver-sas que assolam os territórios quilombolas com ameaças de expulsão, propostas de venda por preços aviltantes, recuo ilegal de cercas e até assassinatos.

é só perguntar no bar, no guichê da em-presa de ônibus que liga a cidade à capi-tal; pode perguntar também para a dona de casa que aguarda o ônibus para vol-tar para sua comunidade, para o senhor que fita sentado no banquinho jogando dominó, para o menino de uniforme que acabou de sair da escola. Na verda-de, quase todos são quilombolas... e vão acabar dizendo que, ali, tudo que não é perímetro urbano é quilombo – reconhe-cido ou tentando reconhecimento – nada mais que um bairro pertencente ao muni-cípio, incorporado à região política como paisagem. Olhando em volta, dá para perceber que o perímetro urbano é muito pequeno. Tem verde para todo lado.

É só pegar o ônibus, que passa pelo cen-tro quatro vezes por dia, e descer num dos pontos existentes ao longo dos 72 quilôme-tros da estrada que vai margeando o Rio Ri-beira de Iguape até o município de Iporanga. Atração principal de outrora, a Caverna do Diabo hoje divide as preferências com as ca-choeiras, os esportes radicais de montanha, as caminhadas e, mais recentemente, os qui-lombos. Mas o que é mesmo um quilombo?

Inicialmente, quilombo é uma palavra que, historicamente, designa os acampa-mentos onde se escondiam as pessoas que conseguiam fugir do cativeiro durante o período escravista brasileiro (entre 1549 e 1888). Hoje, o sentido político desse termo

Zero

Comunidades quilombolas

Cerca de 1,1 mil quilombos estão certificados pela Função Palmares.Confira a concentração de comunidades por estado

Fonte: Fundação Palmares

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Foto: Osmario Marques

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Os reconhecimentos e titulações não são realizados com mais presteza porque al-gumas dessas comunidades estão situadas em áreas definidas como espaço particular, das quais não se sabe quem é o verdadeiro proprietário; outras já estão tituladas para pessoas estranhas à comunidade; ou são terras devolutas, parques estaduais, territó-rios para preservação ecológica etc...

O Vale do Ribeira é, ainda hoje, a região mais pobre do Estado – muitas comunida-des só receberam iluminação elétrica muito recentemente e, mesmo assim, como se diz por lá, ao longo da “pista” – aquela estrada que sai do núcleo principal do município de Eldorado e chega até Iporanga. Estreita, mas de mão dupla; sinuosa; esburacada em alguns trechos; mas, no geral, bem conser-vada. Dá acesso a mais de dez comunidades quilombolas (Batatal, Pedro Cubas e Pedro Cubas 2, Sapatu, André Lopes, Nhunguara, Ivaporunduva, Castelhanos, Galvão, São Pe-dro, Maria Rosa e Pilões) em vários estágios de reconhecimento. Os grupos mais afasta-dos para dentro da mata, ainda contam, à noite, somente com a luz do luar e das estre-las. Mas é cada vez mais comum, para os que já conseguiram o benefício da eletricidade, a utilização de televisores (que só funcionam com a utilização de antenas parabólicas), re-

frigeradores e outros eletrodomésticos. Na outra ponta da estradinha, está Ipo-

ranga. Pequenina, menor que Eldorado (perto de 5 mil habitantes), mas pouco discreta: todo fim de semana há uma revoada de turistas que procuram esportes radicais: canoagem, rapel, caminhadas ecológicas, cachoeiras e acampa-mentos. Lá, vários outros quilombos, como Praia Grande – uma hora e meia de viagem de barco rio acima – e Porto Velho – duas horas de carro por estradas precárias, sinuosas e sujeitas a deslizamentos em épocas chuvosas.

Área de preservação ambiental – abrigan-do o Petar, Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira – muito se tem discutido sobre a práti-ca de plantio dos quilombolas. Mas as famílias e muitos participantes de ONGs e igrejas que atuam na região, e até mesmo órgãos do go-verno, reconhecem que, se a região mantém a maior parcela de mata atlântica preservada, é devido à atuação dos quilombolas que, há sé-culos, mantém uma forma não predatória de cultivo da terra. Sempre em sistema de rodízio, permitindo o descaso do solo, sem agressão e em comunhão com a natureza. O que provoca aumento das preocupações ecológicas na atua-lidade é a ação predatória das agroíndústiras, implantadas durante todo do século XX.

Em meados do século XX, quando as florestas paulistas já apresentavam estado

avançado de devastação, o Vale do Ribeira mantinha, como ainda hoje, grandes porções de mata nativa intocada que guardava rique-zas ainda inexploradas. Por isso, a indústria do beneficiamento de palmito migrou para a região. Contava ainda, a favor do lucro dos empresários, a grande quantidade de mão-de-obra disponível, barata e facilmente co-optável, aproveitada com relativa facilidade no trabalho de coleta: os quilombolas.

Até os anos 50, as comunidades realizavam trabalhos exclusivamente agrícolas, cultivando arroz, feijão, milho, mandioca, cana-de-açúcar, banana em pequenas extensões de terra e com instrumentos agrícolas rudimentares – como faziam desde o século XVIII, data das primei-ras ocupações de terra. A alimentação era com-plementada com a criação de galinhas e por-cos, além da coleta realizada na mata, da pesca e da caça. O principal objetivo do trabalho era a manutenção da independência das famílias, mas, esporadicamente, um pequeno exceden-te poderia ser comercializado.

Com o início do extrativismo, orientado pela indústria do beneficiamento do palmito, o cultivo da terra foi progressivamente sendo abandonado, pois, para encontrar os gomos da palmeira, era necessária considerável dis-persão demográfica, abandono das roças e das criações e enfraquecimento dos padrões tra-

Especial - Diversidade Cultural

Fotos: Osmario Marques

Crianças brincando na comunidade quilombola Serrote do Gado Bravo, no interior de Pernambuco

A Comunidade Serrote do Gado Bravo vive em situação de pobreza extrema e luta para que seja reconhecida pelo governo federal

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gramas de fortalecimento das associações. O MOAB participa da resistência contra a cons-trução de barragens no Rio Ribeira.

Com as demarcações e titulações de-finitivas da terra, a agricultura tende a ser resgatada como principal atividade. Com o incentivo governamental, de ONGs e de se-tores da Igreja, roças de arroz, feijão, milho, mandioca, além de frutas e verduras têm sido incentivadas e intensificadas – inclusive para venda em grande escala e não só para sobre-vivência do grupo. Tudo isso além, é claro, da bananicultura tradicional da região – que, an-tes plantada em propriedades de fazendeiros, tem sido realizada em terras quilombolas.

Os anseios dos jovens podem ser ca-nalizados para o estudo superior. ONGs, como a Educafro, têm estimulado a entrada dos jovens nas universidades. O intuito é se graduar e regressar para aplicar os conheci-mentos na reorganização das comunidades que hoje trabalham com agricultura orgâni-ca, artesanato, turismo, resgate e manuten-ção da cultura ancestral e do espaço familiar e necessitam de agrônomos, turismólogos, educadores, médicos, advogados...

Aliás, os quilombolas começaram a inves-tir num nicho econômico importante para a re-gião – o Turismo. Aproveitando, eles mesmos, o surto de interesse ecológico e Histórico.

Busto de Zumbi dos Palmares em Brasília

dicionais de solidariedade grupais. Essa nova atividade colocou toda a comunidade sob o controle do comprador de palmito, além de torná-la dependente de um único produto.

Quanto mais os moradores se entregavam ao trabalho semi-escravo – seduzidos por ga-nhos relativamente mais fáceis do que o con-quistado com a agricultura – maiores se torna-vam as dificuldades para retornarem à situação anterior. Foram também introduzidos hábitos, necessidades e estilos de vida e trabalho dife-rentes. Interesses econômicos foram desperta-dos e a expropriação de terras tornou-se inten-sa. Contribuiu para isso a disponibilidade de grandes extensões de terras inexploradas, pra-ticamente desocupadas, cujo aproveitamento surgia como promissor e lucrativo. Na maior parte, tratava-se de terras devolutas, ocupadas por população rarefeita, legalmente desampa-radas ou, quando muito, explorados por famí-lias portadoras de títulos de posse dos terrenos em que se estabeleceram há muitos anos.

Ao mesmo tempo, aumentam os pro-blemas financeiros da população que vê, na venda de suas posses, solução imediata para problemas, como dívidas, alimentação, do-enças. Por outro lado, poderia significar paz diante do assédio do fazendeiro que utilizava variadas artimanhas para vencer a resistência do trabalhador agrícola. O popular “abraço” –

técnica de avançar as cercas sobre as “terras dos pretos” durante a noite – fazia o terreno do pobre “encolher” dia após dia; soltar ani-mais na terra do vizinho indesejado estragava a plantação e sujava a água que servia para consumo humano; também valiam as amea-ças pessoais ou familiares – através de jagun-ços ou advogados contratados.

O estilo de vida havia, definitivamen-te, mudado. Recuperá-lo não seria fácil. As plantações e as criações estavam arruina-das devido ao período do corte do palmito; o trabalho assalariado, então, passou a ser imprescindível – cresceu a dependência em relação ao dinheiro e ao mercado para satisfação das necessidades básicas e das criadas pelo contato maior com a cidade.

A situação era esta quando, no final da década de 80, surge a possibilidade de recupe-ração com a posse definitiva da terra comunal. As comunidades se organizam e, hoje, existem muitas entidades que trabalham com os qui-lombos. São ONGS, grupos religiosos e órgãos do governo. O ISA (Instituto Socioambiental) organiza trabalhos de desenvolvimento sus-tentável, incentiva os trabalhos artesanais e a bananicultura. O SEBRAE também incentiva a entrada no mercado através do empreen-dedorismo. O ITESP realiza empréstimos de sementes, desenvolve planos de ação e pro-

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Os moradores mais antigos do Serrote ainda hoje lembram das histórias

de senzala e da abolição contadas por seus ancestrais

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P obres, analfabetos, portadores de três ou mais doenças crônicas e com alto índice de maus tratos e agres-

sões. Assim é que os idosos da América Lati-na e do Caribe estão envelhecendo de forma invisível aos olhos de governos, empresas e instituições que não se comprometem com ações efetivas, nem possibilitam que estas pessoas possam ter suas garantias mínimas asseguradas em políticas de estado.

A quantidade de pessoas de 60 anos ou mais que vivem na América Latina e no Ca-ribe aumentará de 42 milhões, no ano 2000, para 100 milhões, em 2025, e 190 milhões, em 2050. Em 2000, estes idosos representavam 8% da população total (um idoso para 12 pes-soas). Já em 2025, serão 14%, ou seja, teremos um idoso para cada sete pessoas da região.

O envelhecimento é muito mais que cifras ou percentuais. Os idosos trazem desafios para a saúde, previdência e assis-tência social, economia e todos os demais segmentos. Neste espaço, iremos abordar as questões relacionadas à saúde, enfoque cen-tral de nosso estudo. Os dados estatísticos apresentados foram colhidos do informe “El estado de envejecimiento y salud em Ameri-ca Latina y el Caribe”, publicado pela Organi-zação Panamericana de Saúde em 2008.

O crescimento da população idosa na América Latina e Caribe dá-se graças aos avanços da medicina, da farmacologia e de ações de saúde pública, em especial a re-

dução da mortalidade infantil e melhoria na qualidade de vida das pessoas, com me-lhores condições sanitárias, água tratada e até campanhas nacionais de vacinação.

Diferente do que ocorre em países de-senvolvidos e industrializados, a explosão na quantidade de idosos se dá em meio de economias frágeis, com crescentes ní-veis de pobreza e desigualdades sociais e econômicas (que se expandem ao invés de reduzir), além do menor acesso a serviços e recursos financeiros coletivos. Em consequ-ência, teremos em toda a América Latina o aumento do número de pessoas acima dos 60 anos com pior saúde, que apresentam mais incapacidades e enfermidades que os idosos de países desenvolvidos.

Quem são nossos idosos?Todos os países da América envelhecem

de maneira acelerada. Entretanto, na Amé-rica Latina e no Caribe, esta transição não está associada ao crescimento econômico favorável, como acontece em países desen-volvidos. Se envelhece demograficamente, sendo pobre economicamente. Quase 50% dos idosos entrevistados na pesquisa SABE1

disseram não possuir recursos econômicos para satisfazer suas necessidades diárias, um terço não é aposentado, não recebe auxílio governamental nem exerce trabalho remu-nerado. Os níveis de escolaridade são mais baixos que da maioria da população, com

níveis de analfabetismo muito altos. Nos Es-tados Unidos, 77% das pessoas acima de 65 anos indicam ter boa saúde. Já na América Latina e Caribe, menos de 50% dos idosos acima de 60 anos dizem ter boa saúde e as mulheres afirmam ter pior saúde que os ho-mens. Na América Latina e Caribe, 20 % dos idosos tem afetada a capacidade funcional básica, que exige cuidados permanentes em suas residências ou em instituições.

Cerca de 60% dos idosos da America Lati-na e Caribe são mulheres. A maioria vive em áreas urbanas e possui educação primária. Os 40% de homens idosos ainda trabalham, en-quanto somente 8% das mulheres possuem algum emprego remunerado. Uma proporção maior de mulheres que de homens vive na companhia de um filho ou outro parente. O perfil dos idosos na America Latina varia em cada região, conforme descrito abaixo:• Países Andinos: A quantidade de ido-

sos duplicará em duas décadas e pos-suem grande percentual de idosos que vivem em zonas rurais e indígenas, com alto índice de analfabetismo.

• América Central, Caribe hispano e Hai-ti: Nestes países, há grandes contrastes na velocidade e crescimento no número de idosos, como Cuba e Porto Rico, que possuem 14% da população com mais de 60 anos, enquanto Guatemala e Honduras possuem apenas 5%. Cuba terá até, o ano de 2025, mais idosos que crianças com

marcam o envelhecimento na América Latina

Pobreza, Analfabetismo, Excl usão e Doenças

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MEio AMbiEntE CulturAl no brAsil:

Neo Mondo - Agosto 2009 25

na expectativa de vida. O câncer é a segun-da principal causa de morte de idosos.

O desafio da saúde pública para as pró-ximas décadas é complexo. Por um lado, deve-se diminuir a taxa de mortalidade prematura por enfermidades cardiovas-culares. De forma simultânea, espera-se encontrar formas de melhorar a saúde e a qualidade de vida dos idosos naqueles anos ganhos depois dos 60 anos. • Riscos de morrer por enfermidades

transmissíveis: houve redução entre os idosos.

• Risco de morrer por câncer: O câncer é a segunda causa de morte na Améri-ca Latina e Caribe, com prevalência do câncer de próstata e de mama.

• Risco de morrer por enfermidades do sistema circulatório: é a principal causa de morte prematura de idosos.

• Risco de morrer por causas externas: Acidentes de trânsito, homicídios e suicí-dios são as principais causas externas de morte para os homens. As idosas apresen-tam maior risco de morte após sofrerem quedas em ruas e transportes coletivos.

• Outras causas: morte decorrente de dia-betes mellitus cresce entre homens e mu-lheres, a menos que se reduza a taxa de obesidade e sedentarismo entre idosos. En-fermidades pulmonares e câncer de pulmão ainda são importantes causa de morte entre idosos que fumam e/ou fumaram.

menos de 15 anos. As enfermidades nu-tricionais e metabólicas se constituirão no principal risco de morbidade nesta região.

• Caribe anglo e Antilhas Holandesas: Terão uma das taxas de envelhecimento mais rápidas do hemisfério. Em Barbados e Martinica já há um idoso por cada criança menor de 15 anos. Teremos pelo menos três países da região com mais idosos que crianças, que sofrem grandes impactos com a migração das pessoas mais jovens. Idosas passam a ser responsáveis pela educação e cuidado dos netos com cada vez menos sis-temas de apoio familiar e social.

• Cone Sul e México: Esta região conta com dois terços da população de idosos de toda a América Latina. Só Brasil e México possuem 50% de todos os idosos da região. Nas próximas duas décadas, a região terá um idoso por cada criança menor de 15 anos. Em torno de 90% dos idosos vivem em áreas urbanas.

saúde dos idososEm toda a América Latina e Caribe, a

esperança de vida está aumentando sig-nificativamente na última metade do sé-culo XX. A enfermidade cardiovascular é a principal causa de morte prematura em pessoas acima de 60 anos. Sua prevenção produzirá maior impacto sobre o aumento

barreiras para Promoção da saúdeOs idosos enfrentam inúmeras barreiras

para os serviços de saúde, incluída a pobreza, a falta de informação e falta de profissionais devidamente capacitados. Um dos objetivos é motivá-los a adotar estilos de vida saudáveis.• Barreiras relacionadas com as políticas:

Faltam na ALC políticas que definam e garantam explicitamente ao idoso o acesso a serviços de saúde adequados. Também há falta de planos nacionais para desenvolver profissionais capaci-tados em aspectos básicos da medici-na geriátrica.

• Barreiras relacionadas com profissio-nais de saúde: Lamentavelmente os profissionais de atenção à saúde não recebem capacitação adequada acerca do envelhecimento. Muitos médicos crêem equivocadamente que enfermi-dades crônicas, dor e incapacidades são consequências do envelhecimento e deixam de aconselhar, tratar e con-trolar os problemas de saúde apresen-tados pelos idosos.

• Barreiras relacionadas com pacientes: Há uma generalizada falta de informa-ção sobre a saúde e crenças culturais re-lacionadas com a saúde e enfermidades de idosos. Deste modo, os estereótipos de envelhecimento são assumidos pela sociedade. Há necessidade de motivar os idosos para mudança de hábitos,

Reflexos da Identidade de um Povo

Rosane Magaly Martins

marcam o envelhecimento na América Latina

Pobreza, Analfabetismo,

Fonte dos índices: NU (2002) Envejecimiento de la población mundial 1950-2050

Excl usão e Doenças

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26 Neo Mondo - Agosto 2009

Rosane Magaly Martins, escritora, advogada pós-graduada em Direito

Civil, com especialização em Mediação de Conflitos pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Pós-graduada em

Gerontologia (FURB/2005) e Gerencia em Saúde para Adultos Maiores (OPS/

México) com formação docente em Gerontologia (Comlat/Colômbia). Fun-dadora e presidente da ONG Instituto

AME SUAS RUGAS, participando desde 2007 na Europa e na América Latina de congressos, cursos e especialização que envolve o tema. Organiza a publicação da coleção de livros “Ame suas rugas”

lançados no Brasil e em Portugal.E-mail: [email protected]

comportamentos e crenças. Isto se obtém através de estratégias de infor-mação, comunicação e educação que promovam estilos de vida saudável.

novos profissionais de atenção a saúdeOs idosos enfrentam condições de saú-

de e desafios únicos. Lamentavelmente a maioria dos prestadores de serviço não está capacitada para reconhecer as necessidades de saúde dos idosos. Há um vazio entre o que os profissionais sabem e o que neces-sitam saber para prestar um tratamento digno aos idosos. Há pesquisas que com-provam que a pessoa acima de 60 anos que recebe atendimento adequado apresenta melhor qualidade de vida que os demais.

Somente 14% das escolas de medicina na América Latina e Caribe possuem quali-ficação em Geriatria e menos de 2% dos pro-gramas de estudos avançados em enfermaria possuem docentes em tempo integral capa-citado em enfermaria geriátrica. A inclusão da disciplina de Geriatria em todas as esco-las de Medicina da América Latina seria uma decisão acertada a fim de preparar os novos profissionais para esta demanda social.

A grande maioria dos profissionais de saúde não está capacitada para reconhecer as necessidades de saúde dos idosos. Os pro-blemas relacionados com os medicamentos, incluída a administração de doses inadequa-das e as reações adversas, são frequentes. Do mesmo modo existem muitos profissionais sem capacitação para distinguir entre enfer-midade e deficiência derivada das mudanças fisiológicas normais relacionadas ao envelhe-cimento. Em geral, os médicos consideram condições, como perda da memória e incon-tinência, efeitos colaterais normais do enve-lhecimento, enquanto poderiam prevenir e até melhorar estas condições caso tivessem feito a intervenção e orientação adequadas.

Para isso, é necessário oferecer serviços de saúde adequados e necessários aos ido-sos, assim como implementar programas com protocolo definido de serviços de pre-venção e tratamento para prestação de servi-ços primários de saúde para idosos. Deve-se

garantir que o idoso tenha na rede de saúde pública o profissional especializado em aten-ção de saúde, capacitado em conceitos e ha-bilidades básicas de medicina geriátrica.

indígenas e negrosNa América Latina e no Caribe, exis-

tem entre 33 e 40 milhões de indígenas divididos entre 400 grupos étnicos, cada um com seu idioma, sua organização so-cial, seu sistema econômico e modelo de produção adaptado ao seu ecossistema. Cinco países agrupam quase 90% da po-pulação indígena regional: Perú (27%), México (26%), Guatemala (15%), Bolívia (12%) e Equador (8%).

A população negra e mestiça afro-la-tina e afro-caribenha da região alcançam 150 milhões de pessoas, o que significa em torno de 30% da população total da região. Com relação a sua localização geográfica, estão especialmente no Brasil (50%), Co-lômbia (20%) e Venezuela (10%).

Negros e indígenas trazem consigo séculos de exclusão e dominação, apre-sentam os piores indicadores econô-micos e sociais e tem escasso reconhe-cimento cultural e acesso a instâncias decisórias. Ademais, a discriminação étnica e racial também está na base dos sentimentos xenofóbicos em todos os países da América Latina. Tal discrimi-nação se transfere ao outro estrangeiro, sobre tudo se não é branco, e migra de países caracterizados por uma maior densidade de população indígena, afro-latina ou afro-caribenha.

Censo de 2010 No censo de 1980, o Brasil apresen-

tava 55% de pessoas brancas, 38,6% eram pardos e apenas 5,8% identificavam-se como sendo pretos. Este era o reflexo so-bre como as pessoas negras se vêem em ambientes ideológicos e discriminatórios. No ano de 1990, o Governo lançou a cam-panha nacional voltada à população negra, que declarasse a sua cor (não deixe sua cor passar em branco). Resultado foi que, no

RegiõesHomens Mulheres Ambos os sexos

1991 1996 2000 2005 1991 1996 2000 2005 1991 1996 2000 2005

Brasil 6,8 7,3 7,8 8,3 7,8 8,5 9,3 10,0 7,3 7,9 8,6 9,2

Norte 4,6 5,1 5,4 5,8 4,6 5,0 5,5 5,9 4,6 5,0 5,5 5,9

Nordeste 7,0 7,4 7,8 8,2 7,5 8,2 9,0 9,8 7,3 7,8 8,4 9,0

Sudeste 7,2 7,7 8,3 8,8 8,7 9,4 10,3 11,0 7,9 8,6 9,3 10,0

Sul 7,1 7,7 8,3 8,9 8,3 9,1 10,0 10,9 7,7 8,4 9,2 9,9

Centro-Oeste 5,2 5,9 6,6 7,2 5,1 5,8 6,7 7,4 5,2 5,9 6,6 7,3

Censo 2001, houve um incremento de 40% na auto-identificação de pessoas como ne-gras. A partir disto, movimentos iniciaram a luta por visibilidade e espaços sociais e políticos que resultaram em leis que ga-rantem vagas em universidades públicas, entre outras ações.

O problema de identidade alcança os po-vos de toda a América Latina e Caribe e trás dificuldades para a construção de indicado-res nacionais sobre a condição sócio-econô-mica da população de origem africana, assim como a indígena. Para que se tenha um estu-do demográfico real, governos de países da ALC pretendem implementar para o Censo 2010 novos modelos que terão entrevistado-res indígenas que conheçam os idiomas das tribos, mudança no enfoque de algumas per-guntas que incluirão etnias até então “invisí-veis” no mapeamento da população Latina e, em especial, na brasileira.

Proporção de idosos na população Brasil e grandes regiões, 1991, 1996, 2000 e 2005

Fonte: IBGE: Censo Demográfico 1991 e 2000, Contagem Populacional 1996 e Estimativas Demográficas 2005.

Nota1O estudo SABE (Salud y Bienestar de las Personas Mayores) conduzido pela Fundação PAHO, em colaboração com instituições nacionais e internacionais, realizou pesquisa em mais de 10.000 pessoas, representativos da população com 60 anos ou mais que viviam na comunidade de sete capitais latino-americanas (Buenos Aires, Argentina; Santiago de Chile, Chile; Bridgetown, Barbados; Habana, Cuba; Ciudad de México, México e Montevideo, Uruguay).

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Neo Mondo - Agosto 2009 27

Dilma de Melo Silva

N osso país, no processo de sua formação cultural, teve matrizes culturais diversas,desde a gama di-

ferenciada de nações autóctones existentes em nosso território, passando pelos diferen-tes matizes de povos ibéricos até a enorme diversidade étnica dos grupos africanos es-cravizados que para cá foram trazidos, pela violência, no período do tráfego negreiro.

Contudo,isso não se reflete no modelo de desenvolvimento erigido pelas elites he-gemônicas, que optaram pela não inclusão de milhões de brasileiros,estabelecendo um eixo norteador favorecendo a matriz branca/cristã/européia, vista como “mode-lo” universal de humanidade.

No aspecto legal, tanto no período da Colônia, Império, como na República, a postura dessa elite foi ativa e permissiva, permitindo a discriminação e o racismo, que até hoje atingem os descendentes de africanos e indígenas.

Os indicadores de exclusão registrados por inúmeras pesquisas demonstram a de-sigualdade econômica e de acesso aos direi-tos por esses segmentos sociais,que vivem há séculos numa condição de “cidadania mutilada”(na afirmação de Milton Santos).

A Constituição de 1988 busca efetivar a construção de um Estado democrático de direito, com ênfase na cidadania plena e na dignidade da pessoa humana, mas a realidade social ainda permanece marca-da por posturas subjetivas e objetivas de preconceito,racismo e discriminação.

No que se refere aos meios de comu-nicação de massa, desde a implantação da Industria Cultural, nos anos 50, os mesmos atuam no reforço dos estereó-tipos que acentuam a pseudo “suprema-cia” branca.

O que vemos, diariamente, na telinha? A ausência de negros e de indígenas na televisão, principalmente nas telenovelas, reforçando a tese da supremacia do homem branco /europeu, dentro da tolerância opressiva do “outro” considerado como inferior.

Vivemos hoje num mundo embebido pela lógica midiática e,como afirma Sodré:

...a mídia funciona,a nível macro,como um gênero discursivo capaz de catalisar expressões políticas e institucionais sobre as relações inter-raciais ,em geral estrutu-rada por uma tradição intelectual elitista que, de uma maneira ou de outra, legitima desigualdade racial pela cor... (1)

E se os personagens que aparecem são sempre mostrados em situação de inferioridade,apresentando a imagem do(a) negro(a) em três l’s:lúgubre,lúdico e luxurioso,no dizer de Conceição:

O negro lúgubre está no noticiário na parte policial, ou como serviçal cabisbaixo,ou gaia-to bêbado;o lúdico, em ocasiões eventuais,no Carnaval, em ambientes de alegoria, com ins-trumentos de batuques,muitas vezes fanta-siados a maneira selvagem;luxurioso, ligado á libido,ao exagero sexual(2)

Os estereótipos negativos reafirmam o imaginário surgido no período escravocrata, os afro descendentes vistos como integrantes da classe subalterna;a quase total invisibilida-de do negro em situações positivas;a cultura e religiosidade negra sempre folclorizada; a situação social mostrada é a de favelado e/ou pobre,ignorante, drogado, criminoso.

Como consequência, a auto estima dos descendentes de africanos é baixa,a ideo-logia do embranquecimento é introjetada em crianças e adolescentes que rejeitam suas ancestralidades milenares.

Cabe a nós brasileiros(as) lutarmos por uma sociedade mais justa, igualitá-ria, combatendo esse imaginário perver-so e injusto.

Professora doutora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade

de São Paulo, socióloga pela FFLCH\USP, mestre pela Universidade

de Uppsala, Suécia, e Professora convidada para ministrar aulas sobre

Cultura Brasileira na Universidade de Estudos Estrangeiros.

modelo de desenvolvimento excludente e os meios de comunicação

DiversiDaDe cultural,

Notas(1)SODRE, Muniz.Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis:Vozes, 1999(2)CONCEIÇÃO, Fernando. Mordendo um cachorro por dia in MUNANGA(org.) Estratégias e políticas de combate à discriminação racial. SP: EDUSP.1996

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Quando se trata de diversidade cul-tural, aí também o Brasil é bom de leis. A prática é que precisa - e

deve - ser aprimorada, num esforço con-junto constante em que parceria é bem mais que uma palavra da moda, mas con-ceito fundamental. A instituição da Políti-ca Nacional de Desenvolvimento Sustentá-vel de Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) é que fixa as bases para que o

País não somente alcance a imprescindível inclusão política e social desses povos e comunidades, mas também concretize um pacto entre o poder público e esses grupos. Metas que dependem diretamente de obri-gações das várias partes, alicerçadas num modelo de sociabilidade. Do seu lado, o Estado acena com um comprometimento maior ao assumir a diversidade no trato com a realidade social brasileira.

Especial - Diversidade Cultural

Neo Mondo - Agosto 200928

No Simpósio Internacional sobre Desenvolvimento Social, realizado no início de agosto, em Brasília, o presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva defen-deu que é preciso transformar em lei todas as políticas sociais. E ressaltou a importância das parcerias para que se chegue a bons resultados, como os que têm sido alcançados nas políticas públi-cas, das quais a PNPCT é exemplo.

Estado fixa as bases que norteiam relacionamento com povos e comunidades tradicionaisGabriel Arcanjo Nogueira

Simpósio reuniu mais de 600 participantes, entre eles

representantes da Índia, Indonésia, África do Sul, Suécia,

Reino Unido e países da América Latina

Compromisso com a

Brun

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Neo Mondo - Agosto 2009 19

Aderval Costa Filho, coordenador do Núcleo de Povos, Comunidades Tradicio-nais e Específicas, da Secretaria de Articula-ção Institucional, e Parcerias do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), diz que, antes de mais nada, é preciso considerar que o conceito comu-nidades tradicionais é relativamente novo, seja na esfera governamental, seja na acadê-mica ou social. “A expressão ‘comunidades ou populações tradicionais’ surgiu no seio da problemática ambiental, no contexto da criação das unidades de conservação (UCs), para dar conta da questão das comunidades tradicionalmente residentes nestas áreas: povos indígenas, comunidades remanes-centes de quilombos, extrativistas, pesca-dores, dentre outras”, esclarece.

No processo de organização desses grupos, ao sair da invisibilidade em que se encontravam, surge a necessidade de bali-zar a intervenção governamental junto a eles. Daí a importância de se criar, em de-zembro de 2004, a Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável das Comu-nidades Tradicionais (CNPCT), presidida pelo MDS e secretariada pelo Ministério do Meio Ambiente, ressalta Aderval. Co-missão esta que “foi reeditada e reconfor-mada em julho de 2006”, acrescenta.

Fórum paritárioAderval define a CNPCT como “fórum

de composição paritária, para elaborar uma política nacional que reflita a socio-diversidade brasileira”. Coube a ela estabe-lecer uma política nacional específica para esses segmentos, apoiando, propondo, avaliando e harmonizando os princípios e diretrizes das políticas públicas relaciona-das ao desenvolvimento sustentável das comunidades tradicionais nas esferas fe-deral, estadual e municipal. Iniciativa que, para o coordenador do Núcleo, representa um avanço.

Para o MDS, “a instituição da PNPCT é fundamental não somente por propiciar a inclusão política e social dos povos e comunidades tradicionais, como também por estabelecer um pacto entre o poder pú-blico e esses grupos, que inclui obrigações de parte a parte e um comprometimento maior do Estado ao assumir a diversidade no trato com a realidade social brasileira”. Política esta construída no âmbito da Co-missão Nacional e instituída pelo Decreto Presidencial nº 6040, de 2007.

Direitos individuais e coletivosAderval cita o Decreto para conceitu-

ar que “povos e comunidades tradicionais são grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que pos-suem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhe-cimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.

Trata-se, lembra o doutor em Antropo-logia Social, de “conceito operativo, cons-truído em comum acordo com as represen-tações da sociedade civil, do governo e da academia”. O que permitiu criar a CNPCT e PNPCT como “espaço de reconhecimento de direitos individuais e coletivos, numa acepção aberta, não estritiva”. Em outras palavras: todos os povos e comunidades que se sentirem contemplados por esse dispositivo e instância podem requerer seu reconhecimento e inclusão, conforme estabelece o princípio da autodefinição (Convenção 169, da Organização Interna-cional do Trabalho - OIT).

A sociodiversidade brasileira é signi-ficativa, e não foi por outra razão que o governo federal fixou as bases do desen-volvimento sustentável desses segmentos mediante quatro eixos temáticos (ver Qua-dro Decreto 6040).

Pressões e desafiosAderval - que também é assessor da

Secretaria de Articulação Institucional e Parcerias do MDS - é, ao mesmo tempo, didático e realista quando fala da impor-tância da PNPCT no desenvolvimento do País, nos aspectos sociais, de sustentabili-dade, ambientais, econômicos e culturais. Se há avanços, reconhecidos até por ou-tros organismos, restam desafios e a cons-ciência de que resta muito a fazer.

Em sua diversidade étnica, racial e cultural, o Brasil deve encarar o grande desafio de estabelecer e implementar po-líticas públicas para promoção do bem-estar social da população, sobretudo dos povos e comunidades tradicionais. “Sabe-mos que boa parte deles encontra-se ain-da na invisibilidade, silenciados por pres-sões econômicas, fundiárias, processos discriminatórios e de exclusão sociopolí-tica”, afirma o especialista, para discorrer sobre cada item:

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Compromisso com a

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enquanto, “nem todas as comunidades po-dem beneficiar-se delas”, diz Neide Esterci, presidente do Instituto.

A contribuição que essas populações e comunidades podem dar ao desenvol-vimento harmonioso do País passa pelo aprimoramento de mecanismos que tor-nem a PNPCT mais efetiva no que diz res-peito ao meio ambiente. O ISA reconhece que, desde os anos 1990, as áreas de prote-ção ambiental têm sido geridas a partir de modelos mais democráticos.

Neide compara: “Se nos anos de 1970, por exemplo, expulsavam-se habitantes a pretexto de conservar a biodiversidade, a orientação mudou nas últimas décadas, com leis e políticas governamentais menos restritivas aos grupos sociais e povos resi-dentes”. A presidente da ONG lembra que as terras indígenas são exemplares nesse aspecto, por apresentar as áreas mais am-bientalmente conservadas do País.

Outro ponto positivo ressaltado por ela é que cresce de modo muito significativo o en-volvimento desses grupos e povos em alian-ça com ambientalistas. “Nada que signifique que estamos num mar de rosas”, afirma.

Plano e recursosComo parte desse modelo, Ader-

val informa que, para além do amplo processo de mobilização e organização promovido pela criação da Comissão e pela construção da PNPCT - que, para ele, resultou na visibilização sociopolí-tica desses segmentos, - cabe ressaltar que “hoje temos um Plano Prioritário para Povos e Comunidades Tradicionais (2009-2010), construído sob a supervi-são da Casa Civil, que tem por objetivo promover o fortalecimento, reconheci-mento e garantia dos direitos territo-riais, sociais, ambientais, econômicos e culturais desses grupos”.

O cordenador de Núcleo cita que há re-cursos disponíveis, até o momento, da ordem de R$ 253.239.469,98, por 17 órgãos governa-mentais federais, nos quatro eixos da PNPCT: acesso aos territórios tradicionais e aos recur-sos naturais, infraestrutura, inclusão social e fomento e produção sustentável.

• “Em termos do desenvolvimento do País, esses territórios tradicionalmen-te ocupados e essa parcela da popula-ção brasileira historicamente excluída e negligenciada pelas políticas públicas costumam refletir indicadores sociais que não permitem grandes avanços. Temos aí verdadeiros bolsões de ex-cluídos, nos quais se insere o recorte racial, geralmente em municípios com alto grau de vulnerabilidade, com bai-xo IDH, altas taxas de morbidade e mortalidade infantil e analfabetismo”.

• “Do ponto de vista ambiental, muitos desses territórios constituem reservas de sociobiodiversidade, ao ponto de podermos afirmar que boa parte dos povos e comunidades tradicionais po-dem ser considerados guardiões da bio-diversidade, considerando-se a escala da produção, geralmente voltada para autoconsumo e produção de pequenos excedentes, o uso mais racional dos recursos naturais renováveis, o uso de tecnologias de baixo impacto (na maior parte das vezes), dentre outros aspec-tos que marcam a sua realidade”.

• “Do ponto de vista cultural, são povos e comunidades que guardam uma rela-ção estreita com a ordem da tradição, guardam expressões culturais próprias (expressões linguísticas, festas, rezas,

comidas, modo de fazer as casas, rou-pas, etc.), mitos e ritos associados às atividades de cultivo, pesca, caça e extrativismo, mantêm a transmissão oral de geração em geração dos co-nhecimentos culturais e ambientais, com ênfase no papel dos idosos, que geralmente figuram como guardiões da memória. Cabe ressaltar também, na esfera produtiva, que são comuni-dades com ritmo e lógica próprios, que nem sempre se coadunam ao mercado, embora não estejam, naturalmente, privadas de se articularem economi-camente, em escala regional, nacional ou até mesmo internacionalmente. De qualquer forma, essas manifestações conformam uma diversidade que inte-gra o patrimônio cultural brasileiro”.

• “Em termos de políticas públicas, con-sidero que o maior desafio, no que diz respeito às categorias identitárias tradicionais que integram a sociedade brasileira, é assegurar universalização dos direitos individuais e coletivos e a implementação de recortes diferen-ciados, adequados às suas realidades. A ordem da tradição, conjugada com as inovações introduzidas pelas fren-tes econômicas e pelo próprio Estado, configura uma dinâmica e ritmos pró-prios, nem sempre levados em consi-deração pelas políticas públicas”.

O maior desafio de todos, para Ader-val, é transformar a PNPCT em uma polí-tica de Estado.

Modelo democráticoO Instituto Socioambiental (ISA) con-

sidera que se a PNPCT é um avanço, “por-que concretiza o reconhecimento do Es-tado à diversidade dessas populações” (e cita a inclusão dos produtos da sociobiodi-versidade na política de preços mínimos, que permite a extrativistas assegurar boas condições de comercialização a produtos da floresta), todavia ainda falta ao governo vencer a dificuldade que enfrenta de fazer essas políticas chegarem a cada local. Por

Aderval: Plano Prioritário pelo forta-lecimento, reconhecimento e garantia dos direitos territoriais, sociais, am-bientais, econômicos e culturais

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Especial - Diversidade Cultural

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Inclusão político-social e pacto do poder público com esses grupos são as metas“ ”

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No balanço, referente ao exercício de 2008, Aderval lembra que o governo federal inves-tiu recursos da ordem de R$ 676.989.455,38 em ações realizadas junto aos povos e comu-nidades tradicionais. “Sem contar que muitos programas governamentais são universais, e não há dados desagregados por segmento ou categoria identitária, que nos permite inferir que são dados subestimados”.

Ele considera importante, entre as estra-tégias da CNPCT, a promoção de audiências públicas nas assembléias legislativas dos estados, visando a apresentação de projetos de lei favoráveis aos povos e comunidades tradicionais; além da construção e pactuação de agendas com governos estaduais e mu-nicipais, do fomento à criação de instâncias governamentais para atendimento desses grupos nos governos estaduais e municipais e, naturalmente, criação de ações e progra-mas nos seus planos plurianuais.

Pesquisa participativaEntre o que classifica como “ainda muito

por fazer”, Aderval aponta que a Comissão Na-cional já tem o seu Plano Prioritário, feito no primeiro semestre deste ano, e lhe cabe agora fazer o seu monitoramento e avaliação. O que não deixa de ser mais um desafio. Mas há ou-tros, como a criação de comissões estaduais nos moldes da Nacional; e o levantamento sociodemográfico dos povos e comunidades tradicionais no Brasil. O que é feito a partir do Censo Agropecuário do IBGE, de 2007, e tem a participação de membros não-governamen-tais da CNPCT. “O objetivo deles é a realização de uma pesquisa participativa, com o envol-vimento direto de agentes locais de pesquisa, oriundos desses povos e comunidades; o que, para eles, é como uma primeira aproximação”.

Expectativas não faltam e, entre as prio-ridades para concretizá-las positivamente, Aderval lembra que o Plano Prioritário - com a participação de dezenas de ministérios, secre-tarias, institutos oficiais e não oficiais, como o Chico Mendes, confederações e empresas de pesquisa - estão o acesso ao território, melho-ria da capacidade produtiva e da autosusten-tação, e melhoria da qualidade de vida dos povos e comunidades tradicionais. Para tanto, os critérios de seleção de áreas de atuação prio-ritária levam em conta: a concentração dessas comunidades; potencial de desenvolvimento socioambiental; situações de risco e pobreza; e sinergia com outras ações governamentais.

As bases estão lançadas, e toda a so-ciedade brasileira é chamada a dar sua contribuição.

Sociodiversidade – Comunidades Tradicionais

• Povos Indígenas – 734.127 habitantes (220 etnias, 180 línguas) – 110 milhões de ha.

• Quilombolas – 2 milhões de habitantes – 30 milhões de ha.• Seringueiros – 36.850 habitantes – 3 milhões de ha.• Seringueiros e Castanheiros – 815.000 habitantes – 17 milhões de ha.• Quebradeiras de coco-de-babaçu – 2 milhões habitantes – 18 milhões de

ha.• Atingidos por barragens – 1 milhão de pessoas expulsas de suas terras e

territórios.• Fundo de pasto – 140 mil pessoas.• Além desses, constam os faxinais, pescadores, ribeirinhos, caiçaras, praiei-

ros, sertanejos, jangadeiros, açorianos, campeiros, varjeiros, pantaneiros, geraizeiros, veredeiros, caatingueiros, barranqueiros, dos quais ainda não temos dados confiáveis.

• Aproximadamente: ¼ do território nacional - 5 milhões de famílias - 25 milhões de pessoas.

Fonte: MDS

31 Neo Mondo - Agosto 2009

Inclusão político-social e pacto do poder público com esses grupos são as metas“ ”

Decreto 6.040, de 7 de fevereiro de 2007

Eixo estratégico 1 - Acesso aos Territórios Tradicionais e aos recursos naturais• Garantia e efetivação do acesso de povos e comunidades

aos seus territórios e aos recursos naturais;• Interação entre territórios tradicionais e o Sistema Nacional

de Unidades de Conservação da Natureza.

Eixo estratégico 2 – Infra-estrutura • Infra-estrutura básica ;• Implementação de projetos com impactos diretos e/ou indiretos

em territórios tradicionais.

Eixo Estratégico 3 - Inclusão Social • Educação diferenciada;• Reconhecimento, fortalecimento e formalização da cidadania;• Atenção diferenciada à saúde;• Adequação do sistema previdenciário;• Acesso às políticas públicas de inclusão social;• Gênero;• Acesso e gestão facilitados para recursos públicos;• Segurança pública e direitos humanos.

Eixo estratégico 4 – Fomento e Produção Sustentável• Proteção e valorização das práticas e conhecimentos tradicionais;• Reconhecimento e fortalecimento das instituições e

formas de organização social;• Fomento e implementação de projetos de produção sustentáveis.

Fonte: MDS

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A ntes de nos entendermos como seres no mundo, antes de nos darmos conta de cada coisa

no mundo, antes de descobrirmos que, neste mesmo mundo de que fazemos parte, cada coisa tem um nome, enfim, muito antes de cada um de nós, a fim de que pudéssemos nos tornar alguém no mundo e nos pudéssemos reconhecer a nós mesmos e ter um nome que nos individualizasse neste mundo, havia a realidade da língua – da língua materna de cada um, sem a qual não saberíamos quem somos e não conheceríamos nosso próprio mundo.

Pode às vezes parecer exagero dos linguistas, como se estivessem a valorizar o objeto de seu escrutínio diário, mas, se pensamos na vivência de uma criança em formação, partindo da pré-consciência das coisas que começa a descobrir no mundo em que se vai ela mesma descobrindo, te-mos de admitir que a língua materna é mui-to mais do que um simples instrumento de comunicação – ela é uma estrutura social na qual se configura e se desenvolve necessa-riamente a psique de todo indivíduo, isto

é, sua vida mental e emocional. A partir do domínio das palavras, o mundo torna-se pouco a pouco cognoscível, e os sentidos que dele emanam se fazem cada vez mais apreensíveis através da linguagem.

É, sem dúvida, visceral, intensa e pro-funda a relação que se estabelece entre o ser e a língua materna. Instrumento sutil e eficiente a promover a interação dos indiví-duos em sociedade, é através dela, ou me-lhor, nela mesma, que as noções e os con-ceitos mais fundamentais em relação a toda a vida se cristalizam no espírito. É na língua materna que reconhecemos nossa própria identidade. No poema “A língua mãe”, Ma-noel de Barros nos oferece um belo teste-munho desse sentimento de encontro de si mesmo, de seu próprio ser ecoando praze-rosamente na intimidade de sua língua:

“Não sinto o mesmo gosto nas pala-vras:/ oiseau e pássaro./ Embora elas te-nham o mesmo sentido./ Será pelo gosto que vem de mãe? de língua mãe?/ Seria porque eu não tenha amor pela língua/ de Flaubert?/ Mas eu tenho./ (Faço este registro/ porque tenho a estupefação/ de

não sentir com a mesma riqueza as/ pa-lavras oiseau e pássaro)/ Penso que seja porque a palavra pássaro em/ mim reper-cute a infância/ E oiseau não repercute./ Penso que a palavra pássaro carrega até hoje/ nela o menino que ia de tarde pra/ debaixo das árvores a ouvir os pássaros./ Nas folhas daquelas árvores não tinha oiseaux/ Só tinha pássaros./ É o que me ocorre sobre língua mãe”.

Pode-se dizer que a língua é o co-ração de uma cultura e o estilo de uma nação. Enquanto mantém seu idioma, a coletividade possui um poderoso fa-tor de agregação. Afastando-se de sua língua, uma sociedade tende a se desar-raigar, a perder sua unidade natural, e consequentemente a fragmentar-se. Foi o caso do Império Romano com o latim, de onde vem o nosso português.

Segundo contavam os próprios an-tigos romanos, sua cidade havia sido fundada em 753 a. C. (é claro que eles não diziam “antes de Cristo”), na região centro-oeste da Itália conhecida como Lácio. Com o passar do tempo, enquanto o latim se enriquecia sob a influência de

Uma língUa latina

Neo Mondo - Agosto 200932

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33 Neo Mondo - Agosto 2009

outras culturas mais antigas, principal-mente a etrusca e a grega, Roma foi-se tornando uma importante cidade naquela região, mas até meados do IV século a. C. havia expandido pouco suas fronteiras. No século III, no entanto, já se tornara praticamente dona da parte meridional da Península Itálica e, no século II a. C., após vencer a guerra contra Cartago, der-rotando enfim o general africano Aníbal, em 202, a cidade latina criou as condições para dominar todas as terras em torno do Mar Mediterrâneo. Conforme alargavam seu Império, os romanos levavam suas instituições sociais, seus valores e cos-tumes para os novos territórios e impu-nham o latim como língua oficial entre os povos conquistados, que assim iam pouco a pouco assimilando a cultura dos latinos e se romanizando.

Deve-se dar aqui uma breve expli-cação a respeito da distinção que se costuma fazer entre “latim clássico” e “latim vulgar”. Com tranquilidade po-de-se entender que o latim clássico é a língua literária, altamente estilizada e lapidada pelos prosadores e poetas sob a influência da cultura grega, que chegou até nós por meio de inúmeras obras cujos registros escritos tiveram a felicidade de superar a ação devoradora dos séculos. Já o chamado latim vulgar (denominação tradicional um tanto im-própria por seu caráter depreciativo) não é senão a língua popular, coloquial e corrente, que abrangia as incontáveis variações da fala cotidiana, e cujo regis-tro é naturalmente escasso.

Penetrando as mais distantes localida-des do Império, o latim falado, vale dizer, a língua materna dos antigos romanos, ia tomando os matizes regionais que convi-nham às populações anexadas, de acordo com o substrato linguístico e cultural que esses povos guardavam como herança de suas tradições mais particulares. Com o passar do tempo, a relativa unidade linguís-tica do Império começa a dissolver-se; e, a partir do século III de nossa era, a cultura geral transforma-se rapidamente. O cris-tianismo torna-se dominante em relação às religiões politeístas, e um progressivo enfraquecimento político de Roma leva à descentralização do poder do Estado. No IV século, o vasto domínio é divido entre Império Oriental e Ocidental, e já no sécu-lo V, o Império Romano do Ocidente, cuja capital permanecia sendo Roma, acaba por ruir inteiramente sob o peso de sucessivas invasões de povos diversos. Todos esses fa-tos, como se pode bem compreender, con-tribuíram decisivamente para o aprofunda-mento da dialetação do latim. E então, às portas da Idade Média, inicia-se o período do chamado romanço, a língua coloquial in-termediária entre o latim dos antigos roma-nos e as línguas neolatinas ou românicas, isto é, derivadas do latim, que se tornariam os idiomas maternos das futuras nações europeias, como o francês, o espanhol, o romeno, o italiano e o português.

Da Península Ibérica, no tempo das Grandes Navegações, o português foi leva-do para as diversas regiões conquistadas pelos lusitanos em todo o globo e chegou ao Brasil, com o início da colonização, já

no século XVI. Aqui, assim como os roma-nos faziam em suas antigas colônias, os portugueses impuseram sua língua e seus costumes. As populações indígenas, desde sempre, foram sendo aculturadas; em se-guida, grandes levas de escravos vieram da África, e a língua portuguesa aos poucos foi-se aclimatando aos falares tropicais.

Mal se pode avaliar a importância de um país tão grande como o nosso ter um único idioma, sem maiores variações dia-letais. A notável coesão nacional de nossa língua materna em seus falares regionais é, sem dúvida, um dos principais fato-res que nos permitem perceber quanto o Brasil todo é sempre Brasil mesmo, quero dizer, quanto a identidade histórica, sin-crética e singular, desse país se entrelaçou de norte a sul para dar no que deu em cada canto. Por trás de toda a riqueza das di-versidades regionais, se entrevê um subs-trato cultural unificador que faz a gente se sentir em casa, muito à vontade, entre gente de aspecto e hábitos às vezes bem diferentes. Temos aqui uma língua latina com certeza!

Uma língUa latina

Márcio Thamos

Doutor em Estudos Literários. Professor de Língua e Literatura Latinas

junto ao Departamento de Linguística da UNESP-FCL/CAr,

credenciado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da

mesma instituição. Coordenador do Grupo de Pesquisa

LINCEU – Visões da Antiguidade Clássica.E-mail: [email protected]

Réplica da escrita cursiva romana inspirada pelos tabletes de Vindolana

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Neo Mondo - Agosto 200934

Especial - Diversidade Cultural

A formação do português brasileiro, suas influências e seu papel como espelho da diversidade cultural

Roseane Arújo

Í ndios, portugueses, negros e posterior-mente imigrantes de várias nacionali-dades. O caldeirão cultural em que se

formou o povo brasileiro é mesmo singular e reflete na língua toda essa diversidade.

“Não poderia deixar de ser diversa e particular a história do português falado aqui, inserido em um novo contexto e numa nova realidade social. Se a língua é o principal meio de expressão da cultura de um povo, e se a cultura brasileira é tão rica e singular em seus sincretismos étnicos, é natural que, com o passar do tempo, o nosso falar tenha adquirido características próprias”, disse o doutor em Estudos Lite-rários, professor do Departamento de Lin-guística da UNESP-FCL/CAr e colaborador da Neo Mondo, Márcio Thamos.

A história de formação do português brasileiro, a qual se refere o professor, é repleta de capítulos interessantes.

“Ele deriva do português médio (século XV - primeiro quartel do século XVI), que foi a língua adquirida pelos portugueses que povoaram o país”, explica o doutor em Lin-guística e pesquisador da USP (Universidade de São Paulo) e Unicamp (Universidade de Campinas), Ataliba Teixeira de Castilho.

Em seu trabalho “A hora e a vez do português brasileiro”, disponível no site do Museu da Língua, o pesquisador relata a trajetória de formação da língua falada no Brasil, destrinchando as influências re-cebidas ao longo de sua história.

“Até o momento, a mudança natural da língua portuguesa e esses contatos que ela teve não deram origem a uma nova lín-gua, fato que poderá ocorrer daqui a cerca de 200 anos”, completou.

Influências indígenas e negrasSegundo o estudo do pesquisador Ata-

liba de Castilho, quando os portugueses chegaram ao Brasil havia entre um a seis milhões de índios, falantes de cerca de 300 línguas, as quais se organizavam em dois grupos: Grupo Jê e Grupo Tupi-Guarani.

Os falantes do grupo Tupi-Guarani, devido à sua distribuição geográfica mais costeira, influenciaram de forma mais ati-va a língua falada no país. Já no século XVI, o tupi misturado ao português originou a Língua Geral Paulista, falada no interior

de São Paulo, Mato Grosso, Minas Gerais e Paraná, e que começou a ser extinta na segunda metade do século XVIII.

Paralelamente às influências indígenas, entre 1538 a 1855, foram trazidos 18 mi-lhões de escravos negros originários das culturas Banto (Congo, Angola e Moçam-bique) e Sudanesa (Sudão, Senegal, Guiné, Costa do Ouro, Daomé e Nigéria) que tam-bém passaram a influenciar a língua. As palavras Banto atingiram maior dispersão, enquanto as Sudanesas foram utilizadas de forma mais ativa na liturgia do candomblé.

Estima-se que 10.000 vocábulos foram cedidos do Tupi-Guarani para o português brasileiro, na maioria substantivos pró-prios de lugares e pessoas. Já o número de palavras africanas incorporadas ao portu-guês brasileiro é 300.

Palavras indígenas: Caipira, pipoca, maracujá, goiaba, mandioca, pitanga jacaré, tatu, arara;

Nomes próprios de lugares: Moema, Butantã, Jaçanã, Maracanã, Guanabara, Canindé, Itu, Araraquara;

Palavras africanas: fubá, caçula, angu, jiló, carinho, bunda, quiabo, dendê, dengo, samba;

Exemplos de contribuições linguísticas no português

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Neo Mondo - Agosto 2009 35

O Brasil é o principal responsável pela atual posição da língua portuguesa entre as línguas mais faladas no mundo: 8º lu-gar, com 191 milhões de falantes, dos quais 171 milhões vivem no país.

Com tanta gente, é natural que a língua adquira diferentes nuances. Pode-mos, então, dizer que existem dialetos no Brasil?

O pesquisador Ataliba de Castilho esclarece. “Depende do que entender-mos por dialeto. Se assim designarmos as variedades geográficas que não difi-cultam a compreensão, temos dialetos. Se por dialeto se entende a variação geográfica de uma língua de difícil com-preensão para falantes de outras regiões, então não temos dialetos do Português no Brasil. Nota-se atualmente a tendên-

cia a usar o termo para qualquer variação geográfica”, disse.

O professor Márcio Thamos concorda com a explicação do pesquisador, mas ad-mite que o uso do termo “dialeto” causa certo estranhamento. “Nos entendemos muito bem em qualquer parte do país, apesar das marcantes diferenças regionais. Não é o que acontece, por exemplo, com relação à Itália, onde as variações da lín-gua podem ser tão grandes que ninguém estranha quando se diz que se trata de dia-letos”, ponderou.

Consideradas como dialetos ou não, o fato é que o português brasileiro apre-senta, além das variações regionais, dife-renças socioculturais.

Além do falar caipira, nordestino ou gaúcho, temos o português culto e o

A unidade do português brasileiro

popular. Este chegou primeiro, já que os portugueses que vieram para o país eram na grande maioria representantes das ca-madas populares de Portugal. Somente com a urbanização, o português culto foi se firmando, também como forma de dis-tinção de classes sociais: os alfabetizados e os analfabetos.

Mas entre o português culto e o popular, qual deles é mais correto? Quem respondeu a forma culta enganou-se. Segundo o estudo do pesquisador Ataliba, no Brasil, ao con-trário de outros lugares do mundo, a forma popular é menos valorizada e seus falantes são acusados de “falarem errado”, o que é contestado pelo pesquisador. “Quem pratica o português popular não fala errado, apenas opera com a variedade correspondente ao seu nível sociocultural”, diz no estudo.

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Fotos: Luciano Bogado

Neo Mondo - Agosto 200936

Especial - Diversidade Cultural

Em 2007, com apenas um ano de funcionamento, já foi eleito o “mais querido do Brasil” pela revista Veja. Um título merecido, já que só naquele primeiro ano recebeu quase 900 mil visitantes, mais do que o do-bro do que tradicionalíssimo Masp (Museu de Arte de São Paulo).

O Museu da Língua Portuguesa completou três anos de vida este ano, contabilizando mais de 1,7 mi-lhão de visitantes.

Localizado no centenário pré-dio da Estação da Luz, no Centro de São Paulo, tem aproximada-mente 4 mil metros quadrados abertos para a visitação, nos quais é possível conhecer a história, a importância e as variações da lín-gua Portuguesa, considerada como grande elo da identidade cultural do povo brasileiro.

Museu da Língua PortuguesaPioneirismo na preservação do patrimônio imaterial

No mundo inteiro, só existe um outro similar: na África do Sul, o mu-seu da língua Africâner.

“A ideia do museu surgiu em 2001, quando a CPTM comunicou ao Governo do Estado sua disposição de transferir seus escritórios do edi-fício da Estação da Luz. Na ocasião, o governo decidiu implantar no pré-dio um equipamento cultural, pois fazia parte de uma política iniciada em 1998 de recuperação da região central da cidade. De início não se falava em museu, mas sim em um equipamento cultural dedicado ao nosso idioma. Em 2002, foi firmado um convênio com a Fundação Ro-berto Marinho para a conceitualiza-ção deste novo espaço, captação de recursos e implantação. Entre 2002 e março de 2006, uma equipe de mais de 40 profissionais, entre mu-

seólogos, arquitetos, professores, sociólogos e artistas, trabalharam na criação do novo espaço, que ga-nhou o nome de Museu da Língua Portuguesa alguns meses antes de sua inauguração (até então o nome era Estação Luz da Nossa Língua)”, conta o diretor do Museu, Antonio Carlos Sartini.

Para superar o desafio de traba-lhar com o conteúdo imaterial que é o idioma, o museu teve que investir em tecnologia. “Foi a solução para dar materialidade a este rico e varia-do acervo. Muitos recursos de áudio e vídeo são usados nas exposições per-manentes, o que o torna um espaço muito moderno e interativo. E novas tecnologias foram desenvolvidas espe-cialmente para o museu, caso do Beco das Palavras, um divertido e educativo jogo etimológico”, explicou.

Museu da Língua Portuguesa – Mais de 1,7 milhões de visitantes em três anos

Conhecer a origem e desenvolvimento do português brasileiro fica mais fácil na completíssima Linha do Tempo

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Neo Mondo - Agosto 2009 37

Além do conteúdo permanente, há exposições temporárias, cuja pauta já está fechada até 2011.

Atualmente e até 11 de outubro, está em cartaz “O Francês no Bra-sil em Todos os Sentidos”, que tem como tema as relações entre o idio-ma português e a língua francesa, bem como os pontos de contato en-tre as duas culturas.

“É a primeira mostra binacional do museu, com curadores brasileiros e fran-ceses, e nasceu face ao Ano da França no Brasil, comemorado em 2009”, expli-cou o diretor.

Em setembro, será inaugurada uma mostra em homenagem à poeta Cora Coralina. Outros importantes nomes da literatura brasileira já mereceram mostras temporárias: Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Gilberto Freyre e Ma-chado de Assis foram os principais.

Não são só os nomes de peso, porém, que fazem o sucesso do Museu da Língua Portuguesa. A boa localização e os preços aces-síveis dos ingressos ajudam a de-mocratizar a visitação. “A política adotada pela Secretaria de Estado da Cultura e pela diretoria do mu-seu facilita muito o acesso da po-pulação: preços baixos, gratuidade para todos aos sábados, participa-ção em inúmeros projetos de cunho social e outras ações. O público do museu é muito variado, mas todos, ou a grande maioria, têm algo em comum: falam português, são os usuários e donos da nossa língua. Assim, com este elo entre todos, as reações costumam ser de identifi-cação imediata, reconhecimento e orgulho pelo belo idioma que usa-mos”, encerrou Sartini.

Nos totens multimídia, é possível conhecer as influências de outros idiomas

SERVIÇO - Museu da Língua Portuguesa

Praça da Luz, s/nº, Centro - São Paulo – SP

Horários Bilheteria: de terça a domingo, das 10 às 17hs

Museu: de terça a domingo, das 10 às 18hs (não abre às segundas-feiras)

Ingresso: R$ 6,00 (seis reais) – pagamento somente em dinheiro

Estudantes com carteirinha pagam meia-entrada

Isentos do pagamento de ingresso:

Professores da rede pública com holerite e carteira de identidade;

Crianças até 10 anos;

Adultos a partir de 60 anos.

Telefone: (11) 3326-0775

www.museudalinguaportuguesa.org.br

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Especial - Diversidade CulturalA

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Para garantir a preservação do patrimônio cultural brasileiro, surgem novas propostas e mecanismos

Rosane Araujo

S e desde sua origem, o povo bra-sileiro recebe influências tão di-versas, é de se esperar que sua

produção cultural seja diversificada na mesma medida.

Em tempo, a questão da preservação da diversidade cultural vem recebendo atenção não só de governo e Ongs (Organizações Não-Governamentais) brasileiras, como também de instituições pelo mundo afora.

Em 2002, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) divulgou sua “Declaração Universal Sobre a Diversidade Cultural”, na qual afir-mou que “o respeito à diversidade das cultu-ras, à tolerância, ao diálogo e à cooperação, em clima de confiança e de entendimento mútuos, estão entre as melhores garantias da paz e da segurança internacionais”.

Para o órgão, “a diversidade cultural apresenta um duplo desafio: assegurar a co-existência harmoniosa entre indiví-duos e grupos de culturas diferentes en-quanto defende a criatividade por meio de inúmeras expressões de culturas, estas denominadas como criação contemporâ-nea e patrimônio cultural. O patrimônio cultural é subdivido em patrimônio tan-gível e intangível”.

Os conceitos citados são colocados em prática por meio de “ações a favor da di-versidade”, que incluem preservação dos direitos humanos, apoio aos indígenas, combate ao racismo, entre outras.

Patrimônios tangível e intangívelEnquanto o patrimônio cultural tan-

gível, composto por bens materiais, como monumentos, achados arqueológicos, obras de arte, etc, sempre recebeu aten-

resguardada

ção de órgãos e governos, é relativamente nova a defesa do patrimônio intangível, composto por expressões culturais ima-teriais, como danças, lendas e tradições diversas, as quais são passadas por ances-trais aos seus descendentes.

A expressão foi oficializada pela UNESCO em 1997 e, desde 2001, o órgão divulga, a cada dois anos, a Lista Repre-sentativa do Patrimônio Cultural Imate-rial da Humanidade. Para obtenção da lista, os bens inscritos pelos países sig-natários da Convenção para a Salvaguar-da do Patrimônio Cultural Imaterial são avaliados por um júri internacional.

Os bens imateriais inseridos na lista passam a receber incentivo para sua salva-guarda, como é o caso das expressões orais

O frevo pernambucano é um bem cultural imaterial reconhecido pelo IPHAN

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e linguagem gráfica dos índios Wajãpi, do Amapá e do Samba de Roda do Recôncavo Baiano, ambos expressões brasileiras que já integram a lista (saiba mais sobre elas no quadro abaixo).

Iniciativas governamentais brasileirasA Constituição Federal atribui ao po-

der público, com o apoio da comunidade, a proteção, preservação e gestão do pa-trimônio histórico e artístico do país. No Ministério da Cultura, existe uma seção especial própria para a questão da diversi-dade. A Secretaria de Identidade e Diver-sidade (SID) subdivide-se em oito áreas de atuação: culturas ciganas, indígenas, LGBT, do idoso, na infância, na juventu-de, na saúde e culturas populares.

Neo Mondo - Agosto 2009 39

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As áreas organizam encontros, se-minários e prêmios para seus segmen-tos. Um dos destaques da programação atual é o Prêmio Culturas Populares, que chega à quarta edição em 2009 e contemplará 195 iniciativas com um prêmio de 10 mil reais. “Queremos ho-menagear todas as expressões das cul-turas tradicionais que fazem parte de nossa diversidade cultural”, declara o Secretário da Identidade e Diversidade, Américo Córdula, no portal eletrônico da Secretaria.

Quem empresta o nome a esta edição do prêmio é a mestra Dona Izabel, artesã ceramista do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, que ficou famosa na região pela produção de noivas de cerâmica, ofício que continua ensinando.

Prêmio Culturas Populares 2009 leva o nome da artesã Izabel Mendes, do Vale do Jequitinhonha (MG)

Também vinculado ao Ministério da Cultura, o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) é o responsá-vel pela preservação, divulgação e fiscali-zação dos bens culturais brasileiros. Além dos 20 mil edifícios tombados, 83 centros e conjuntos urbanos, 12.517 sítios arque-ológicos cadastrados e mais de um milhão de objetos cadastrados, o Instituto também viabiliza projetos de identificação, reconhe-cimento, salvaguarda e promoção do patri-mônio imaterial.

Na lista de bens imateriais já registrados pelo IPHAN, além da arte dos índios Wajãpi e do Samba de Roda do Recôncavo Bahiano, também reconhecidos pela UNESCO, figu-ram outros 13 itens. Confira a seguir.• Ofício das paneleiras de Goiabeiras (ES)• Círio de Nossa Senhora de Nazaré (PA)

• Modo de Fazer Viola de Cocho (MT/MS)• Ofício das Baianas de Acarajé (BA)• Jongo no Sudeste (RJ)• Cachoeira de Iauaretê – Lugar sagrado

dos povos indígenas dos Rios Uaupés e Papuri (AM)

• Feira de Caruaru (PE)• Frevo (PE)• Tambor de Crioula• Matrizes do Samba no Rio de Janeiro:

Partido Alto, Samba de Terreiro e Sam-ba-Enredo (RJ)

• Modo artesanal de fazer Queijo de Mi-nas, nas regiões do Serro e das serras da Canastra e do Salitre (MG)

• Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira

• O modo de fazer Renda Irlandesa pro-duzida em Divina Pastora (SE)

Tambor de Crioula

Ofício das Paneleiras de Goiabeiras (ES)

Círio de Nossa Senhora de Nazaré (PA)

Edgar Rocha- Iphan

Acervo Iphan

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Especial - Diversidade Cultural

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Arte Kusiwa dos Wajãpi

• De acordo com o dossiê do IPHAN so-bre o assunto, atualmente os Wajãpi do Amapá são 670 pessoas distribuídas em 48 aldeias, os remanescentes de um grupo que chegou a 6 mil pessoas no início do século XIX.

• Sua arte é peculiar, porque a tradição de decorar corpos e objetos são motivadas por prazer estético e não usados como marcas étnicas ou símbolos rituais. Eles possuem um repertório codificado de padrões gráficos que representam par-tes do corpo ou da ornamentação de animais e objetos. Esse sistema de re-presentações é chamado de kusiwa.

• Parque Nacional do Jaú (AM)• Ouro Preto (MG)• Olinda (PE)• São Miguel das Missões (RS)• Salvador (BA)• Congonhas do Campo (MG)• Parque Nacional do Iguaçu (RS)• Brasília (DF)• Parque Nacional Serra da Capivara (PI)• Centro Histórico de São Luís (MA)• Diamantina (MG)• Pantanal Matogrossense (MS)• Costa do Descobrimento (BA / ES)• Reserva Mata Atlântica (SP / PR)• Reservas do Cerrado (GO)• Centro Histórico de Goiás (GO)• Ilhas Atlânticas (PE)

Fonte: IPHAN - www.iphan.gov.br

Bens Imateriais reconhecidos pela UNESCO

Bens Culturais brasileiros na lista do Patrimônio da Humanidade

• O Samba de Roda é uma expressão musical, coreográfica, poética e festiva. Exerceu in-fluência no samba carioca e até hoje é uma das referências do samba nacional. Permeia atividades econômicas, religiosas e lúdicas no contexto do Recôncavo Bahiano.

Samba de Roda do Recôncavo Bahiano

Ouro Preto (MG)

Samba de Roda do Recôncavo Bahiano

Índios Wajãpi pintam a pele com urucum

Acervo Iphan

Fotos: Luiz Santos - Iphan

Neo Mondo - Agosto 2009 41

Marcelo da Mota Silva

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42 Neo Mondo - Agosto 2009

Q uando pensamos em meio am-biente no Brasil, as imagens re-correntes são da fauna e da flo-

ra nacionais, com toda a sua diversidade biológica. Não é para menos, o nosso País possui uma das maiores concentrações de plantas e animais do mundo.

No entanto, o meio ambiente não se restringe ao meio natural, pois o seu con-ceito também está ligado ao meio artificial, social e cultural. Assim, quando se fala em proteção do meio ambiente, não se está restringindo o cuidado apenas aos exem-plares da flora e da fauna, já que a defi-nição de meio ambiente é ampla e abarca tanto o homem quanto a natureza.

Seguindo essa linha, percebe-se que o patrimônio cultural nacional é parte do meio ambiente. No meio ambiente cultu-ral, estão inseridas as criações artísticas, os objetos, os documentos históricos e tantas outras manifestações culturais, como a dança, a literatura, a música, e outras expressões que fazem parte da cultura brasileira.

Os bens que compõem o patrimônio cultural podem ser materiais, como as

construções históricas, ou até mesmo ima-teriais, como os dialetos de algumas comu-nidades indígenas. Ambos são importan-tes e merecem ser preservados, para que possamos garantir a identidade e memória dos diferentes grupos da sociedade e a das diferentes regiões do Brasil. Festas popu-lares e de longa tradição, como a do Boi, em Parintins, o Guerreiro, em Alagoas, e a Semana Farroupilha, na região Sul, são exemplos da riqueza regional do nosso meio ambiente cultural.

A Constituição brasileira de 1988 protege o meio ambiente cultural brasi-leiro, incumbindo ao Poder Público, com a colaboração da comunidade, a proteção desse patrimônio por meio de inventá-rios, registros, vigilância, desapropriação e tombamento.

O tombamento é uma medida admi-nistrativa usada para preservar bens de valor histórico, cultural, arquitetônico e ambiental. Tanto pode ser realizado em âmbito federal, pelo Instituto do Patri-mônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, como pode ser proveniente de ato estadual ou municipal. Na verdade, um

bem pode ser tombado simultaneamente em âmbito local, regional ou nacional. É o que acontece com o centro histórico da cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais, que é tombado pelo Município, pelo Esta-do, pela União, e até pela UNESCO como Patrimônio Cultural da Humanidade.

A lista do Patrimônio Mundial da UNESCO é formada por 878 locais es-colhidos em razão de suas propriedades naturais ou culturais. Desse total, 689 são propriedades culturais, 176 são proprieda-des naturais e 25 são mistas. O Brasil pos-sui 17 locais na lista, dos quais dez foram escolhidos por suas qualidades culturais. Assim, além da Cidade Histórica de Ouro Preto, também integram a lista por razões culturais os Centros Históricos das cida-des de Olinda, Salvador, São Luís do Ma-ranhão, Diamantina e Goiás; bem como as Ruínas de São Miguel das Missões; o Santuário do Bom Jesus do Congonhas; a Cidade de Brasília e o Parque Nacional da Serra da Capivara.

Além dos centros históricos de algu-mas cidades brasileiras, os modos de criar e de produzir enraizados no cotidiano de

Meio AMbiente CulturAl no brAsil:Reflexos da Identidade de um Povo

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Meio AMbiente CulturAl no brAsil:

Neo Mondo - Agosto 2009 43

Natascha TrennepohlAdvogada e consultora ambiental

Mestre em Direito Ambiental (UFSC)Doutoranda na

Humboldt Universität (HU) em Berlim.E-mail: [email protected]

net. Atualmente, o Ministério da Cultu-ra está apoiando um projeto de reforma da lei que visa ampliar a capacidade de fomento à cultura. Tal projeto ficou dis-ponível para consulta pública até o início do mês de maio desse ano e propõe a instituição do Programa Nacional de Fo-mento e Incentivo à Cultura (Profic) com o objetivo de mobilizar recursos e aplicá-los em projetos culturais.

Além dos instrumentos que já estavam previstos na Lei Rouanet, como o Fundo Nacional da Cultura (FNC), o Fundo Na-cional de Investimento Cultural e Artístico (Ficart) e os incentivos a projetos culturais, o Projeto de Lei inclui o “Vale-Cultura”, a ser regulamento por lei específica.

O propósito central do vale está re-lacionado com a idéia do ex-ministro Gilberto Gil em fazer da cultura um ele-mento da cesta básica dos brasileiros. Assim, de acordo com o Projeto de Lei, o Vale-Cultura (no valor de 50 reais) deverá ser fornecido ao trabalhador que receba até cinco salários mínimos, podendo-se descontar de sua remuneração até 10% do valor, ou seja, 5 reais.

Natascha Trennepohl

Correspondente especial de Berlim – Alemanha

comunidades também integram o patri-mônio cultural brasileiro. Um exemplo disso são as técnicas tradicionais de cons-trução de embarcações (e de navegação oceânica) desenvolvidas pela comunidade caiçara de Cairuçu, no Município de Parati (RJ), as quais são patrimônio cultural da referida comunidade. Neste caso, o meio idôneo para a sua proteção não é o tomba-mento, mas o registro.

De acordo com a Constituição Brasi-leira, a proteção de documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, bem como de monumentos, paisagens naturais notáveis e sítios ar-queológicos faz parte da competência comum, o que significa dizer que cabe a todos os entes da federação. A Consti-tuição prevê, ainda, o estabelecimento de incentivos para a produção e o acesso a bens culturais.

O acesso às fontes culturais está previsto na lei que criou o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), em 1991. Essa lei ficou mais conhecida como Lei Rouanet, por causa do então ministro da cultura Sérgio Paulo Roua-

O Vale-Cultura pretende estimular a visitação de estabelecimentos culturais e artísticos, bem como incentivar o acesso a eventos e espetáculos, como peças de teatro, shows, museus etc. É interessante ressaltar que o vale inclui na área de ativi-dades culturais a literatura, o que permiti-rá o seu uso para a aquisição de livros.

É bem vinda a criação de diferentes meios para incentivar as manifestações culturais que refletem a identidade de um grupo. Assim como meios para proporcio-nar o acesso aos bens culturais e as formas de expressão, criações científicas ou cul-turais. Dessa forma, ajudamos a construir essa identidade e a fortalecer a história e o meio ambiente cultural de um povo. Afi-nal, é de todos nós o dever de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Reflexos da Identidade de um Povo

Page 44: Neomondo 25

Neo Mondo - Agosto 200944

H istoricamente convencionou-se con-siderar como imigrantes as pessoas de outras nacionalidades que entra-

ram no Brasil a partir de 1822, ano em que o país tornou-se independente de Portugal.

E essas entradas não foram poucas. Segundo dados do Memorial do Imigran-te (confira detalhes no final da matéria), só entre 1908 e 1953, mais de 2,5 milhões de imigrantes chegaram no país, principal-mente, portugueses, italianos, espanhóis, japoneses e alemães.

Essa imigração aconteceu gradativa-mente, em diversas fases, começando de forma mais organizada em 1824, com a chegada dos alemães para povoamento da região Sul, principalmente dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.

A campanha para trazer os ale-mães ao país foi incentivada pela im-peratriz do Brasil, Dona Leopoldina, que era austríaca.

Os colonos recebiam a terra e as se-mentes para o plantio, mas tinham que construir suas próprias casas.

A partir de 1875, o processo de povoa-mento do Sul deu continuidade agora com a vinda de italianos, já que a Alemanha havia criado mecanismos para impedir a imigração para o Brasil.

E enquanto no Sul, os imigrantes rece-biam terras, em São Paulo, sua vinda teve outro objetivo: a formação de mão-de-obra para as prósperas fazendas de café.

Com o fim do tráfico de escravos, em 1850, a mão-de-obra foi ficando

cada vez mais escassa, levando o gover-no à busca de trabalhadores imigrantes, no final do século XIX.

A expansão das colheitas de café atraiu 70% dos imigrantes desembarca-dos no Brasil. Entre 1870 e 1907, chega-ram no país cerca de 1,2 milhão italianos, 519 mil portugueses, 287 mil espanhóis e 56 mil alemães.

A história se repetiu e, em 1902, a Itá-lia proibiu a imigração subsidiada para o Brasil, diminuindo drasticamente a mão-de-obra dos cafezais e levando o governo brasileiro a permitir a entrada de japone-ses em 1908.

A partir de 1912, a vinda de japoneses se intensificou chegando a mais de 42 mil apenas durante o ano de 1926.

A entrada de imigrantes no Brasil e seus impactos na cultura brasileira Rosane Araujo

O fator imigração

Especial - Diversidade Cultural

O fator imigração

Page 45: Neomondo 25

Neo Mondo - Agosto 2009 19

Ano Alemães Espanhóis Italianos Portugueses Russos Diversos Total

1.870 6 38 7 4.458 0 649 5.158

1.871 296 510 1.626 8.124 4 1.871 12.431

1.872 1.103 727 1.808 12.918 7 2.656 19.219

1.873 1.082 0 0 1.310 41 12.309 14.742

1.874 1.435 0 5 6.644 30 12.219 20.333

1.875 1.308 39 1.171 3.692 956 7.424 14.590

1.876 3.530 763 6.820 7.421 3.011 9.202 30.747

1.877 2.310 23 13.582 7.965 2.115 3.473 29.468

1.878 1.535 929 11.836 6.236 1.904 2.016 24.456

1.879 2.022 911 10.245 8.841 7 762 22.788

1.880 2.385 1.275 12.936 12.101 426 1.232 30.355

1.881 1.851 2.677 2.705 3.144 305 866 11.548

1.882 1.804 3.961 12.428 10.621 19 756 29.589

1.883 2.348 2.660 15.724 12.509 10 764 34.015

1.884 1.719 710 10.102 8.683 457 3.219 24.890

1.885 2.848 952 21.765 7.611 275 1.989 35.440

1.886 2.414 1.317 20.430 6.287 146 2.892 33.486

1.887 1.147 1.766 40.157 10.205 0 2.690 55.965

1.888 782 4.736 104.353 18.289 0 5.093 133.253

1.889 1.903 9.012 36.124 15.240 0 2.967 65.246

1.890 4.812 12.008 31.275 25.174 27.125 7.080 107.474

1.891 5.285 22.146 132.326 32.349 11.817 12.837 216.760

1.892 800 10.471 55.049 17.797 158 1.928 86.203

1.893 1.368 38.998 58.552 28.986 155 6.746 134.805

1.894 790 5.986 34.872 17.041 57 2.238 60.984

1.895 973 17.641 97.344 36.055 275 15.330 167.618

1.896 1.070 24.154 96.505 22.299 592 13.512 158.132

1.897 930 19.466 104.510 13.558 569 7.329 146.362

1.898 535 8.024 49.086 15.105 258 5.101 78.109

1.899 521 5.399 30.846 10.989 412 6.462 54.629

1.900 217 4.834 19.671 8.250 147 7.181 40.300

1.901 166 8.584 59.869 11.261 99 5.327 85.306

1.902 265 3.588 32.111 11.606 108 4.526 52.204

1.903 1.231 4.466 12.970 11.378 371 3.646 34.062

1.904 797 10.046 12.857 17.318 287 4.859 46.164

1.905 650 25.329 17.360 20.181 996 5.779 70.295

1.906 1.333 24.441 20.777 21.706 751 4.664 73.672

1.907 845 9.235 18.238 25.681 703 13.085 67.787

Total 56.416 287.822 1.208.042 519.033 54.593 202.679 2.328.585

Entrada de imigrantes no Brasil - 1870/1907

Portugueses Recém-Chegados (1938)

O fator imigração

Acervo Memorial do Imigrante

Page 46: Neomondo 25

Neo Mondo - Agosto 2009

Especial - Diversidade Cultural

Entrada de imigrantes no Brasil - 1908/1953

Estudo releva bom convívio interétnico

Sob o ponto de vista cultural, é instigan-te imaginar como tantas etnias distintas pas-saram a conviver pacificamente no Brasil.

“Num cenário comparativo com outros pa-íses receptores de imigrantes, a sociedade bra-sileira, de modo geral, e mais particularmente a paulista normalmente foram vistas como integradoras ou diluidoras das características de afirmação étnica dos grupos que receberam. No Brasil, existiu (e ainda existe) uma ideolo-gia erigida em uma quase doutrina oficial, mas também amplamente difundida na sociedade,

Ano Alemães Espanhóis Italianos Portugueses Russos Japoneses Diversos Total1.908 2.931 14.862 13.873 37.628 5.781 830 14.631 90.536

1.909 5.413 16.219 13.668 30.577 5.663 31 12.519 84.090

1.910 3.902 20.843 14.163 30.857 2.462 948 13.576 86.751

1.911 4.251 27.141 22.914 47.493 14.013 28 17.735 133.575

1.912 5.733 35.492 31.785 76.530 9.193 2.909 16.245 177.887

1.913 8.004 41.064 30.886 76.701 8.251 7.122 18.305 190.333

1.914 2.811 18.945 15.542 27.935 2.958 3.675 7.366 79.232

1.915 169 5.895 5.779 15.118 640 65 2.667 30.333

1.916 364 10.306 5.340 11.981 616 165 2.473 31.245

1.917 201 11.113 5.478 6.817 644 3.899 2.125 30.277

1.918 1 4.225 1.050 7.981 181 5.599 756 19.793

1.919 466 6.627 5.231 17.068 330 3.022 3.283 36.027

1.920 4.120 9.136 10.005 33.883 245 1.013 10.640 69.042

1.921 7.915 9.523 10.779 19.981 1.526 840 7.912 58.476

1.922 5.038 8.869 11.277 28.622 279 1.225 9.697 65.007

1.923 8.254 10.140 15.839 31.866 777 895 16.778 84.549

1.924 22.168 7.238 13.844 23.267 559 2.673 26.303 96.052

1.925 7.175 10.062 9.846 21.508 756 6.330 26.870 82.547

1.926 7.674 8.892 11.977 38.791 751 8.407 42.194 118.686

1.927 4.878 9.070 12.487 31.236 616 9.084 30.603 97.974

1.928 4.228 4.436 5.493 33.882 823 11.169 18.097 78.128

1.929 4.351 4.565 5.288 38.879 839 16.648 25.616 96.186

1.930 4.180 3.218 4.253 18.740 2.699 14.076 15.444 62.610

1.931 2.621 1.784 2.914 8.152 370 5.632 5.992 27.465

1.932 2.273 1.447 2.155 8.499 461 11.678 4.981 31.494

1.933 2.180 1.693 1.920 10.695 79 24.494 5.020 46.081

1.934 3.629 1.429 2.507 8.732 114 21.930 7.686 46.027

1.935 2.423 1.206 2.127 9.327 29 9.611 4.862 29.585

1.936 1.226 355 462 4.626 19 3.306 2.779 12.773

1.937 4.642 1.150 2.946 11.417 52 4.557 9.913 34.677

1.938 2.348 290 1.882 7.435 19 2.524 4.890 19.388

1.939 1.975 174 1.004 15.120 2 1.414 2.979 22.668

1.940 1.155 409 411 11.737 17 1.268 3.452 18.449

1.941 453 125 89 5.777 23 1.548 1.923 9.9381.942 9 37 3 1.317 0 0 1.059 2.425

1.943 2 9 1 146 0 0 1.150 1.308

1.944 0 30 3 419 20 0 1.121 1.593

1.945 22 74 180 1.414 2 0 1.476 3.168

1.946 174 203 1.059 6.342 28 6 5.227 13.039

1.947 561 653 3.284 8.921 18 1 5.315 18.753

1.948 2.308 965 4.437 2.751 1.342 1 9.764 21.568

1.949 2.123 2.197 6.352 6.780 36 4 6.352 23.844

1.950 2.725 3.808 7.342 14.739 59 33 6.786 35.492

1.951 2.858 9.636 8.285 28.731 103 106 12.875 62.594

1.952 2.326 14.082 15.254 40.561 140 261 12.096 84.720

1.953 2.149 17.010 16.379 30.675 496 1.255 12.106 80.070Total 154.409 356.647 357.793 951.654 64.031 190.282 471.639 2.546.455

Família Italiana na Hospedaria (1930)

Acervo Memorial do Imigrante

Page 47: Neomondo 25

Neo Mondo - Agosto 2009 47

Por meio de depoimen-tos de moradores das várias etnias, o estudo descreve os diversos tipos de relações que se formavam entre eles, desde as de vizinhan-ça até as comerciais.

Apesar dessas relações se desenrolarem em cli-ma harmônico, os relatos também dão conta da resistência ao casamento interétnico e outras for-mas de preconceito.

A maior parte dos depoimentos colhi-dos entre os mais idosos tendeu à aproxi-mação entre os judeus e os italianos, con-trapondo suas experiências e costumes com os dos coreanos.

“De qualquer modo, podemos afir-mar que essas apreciações pouco in-terferiram na trajetória, de modo geral bem sucedida, dos imigrantes coreanos em São Paulo e, em particular, no Bom Retiro”, conclui Truzzi no artigo publi-cado na revista.

Em um prédio centenário próximo às estações de trem e metrô Brás, na ca-pital paulista, funciona o Memorial do Imigrante, órgão vinculado à Secretaria da Cultura do Governo do Estado de São Paulo, que reúne acervo memorável sobre a imigração no país, incluindo do-cumentos textuais e livros de registros da antiga Hospedaria de Imigrantes.

O local é carregado de história. Cons-truído entre 1886 e 1888, era lá mesmo que funcionava a Hospedaria, um enor-me conjunto de prédios em forma de “E”, destinado a abrigar os recém–chegados nos seus primeiros dias em São Paulo.

Após a cansativa viagem, os imi-grantes ficavam lá hospedados por até oito dias. Nesse período, utilizavam gratuitamente todos os serviços dispo-níveis, dormiam, faziam suas refeições, recebiam atendimento médico e conse-guiam seus empregos.

O Memorial recebe atualmente cer-ca de 10 mil visitantes por mês e quase 60% desse total é representado por es-tudantes do ensino fundamental.

Os visitantes podem conferir a pro-dução museológica, documentação, reserva técnica, iconografia, acessar pesquisas e a biblioteca.

Entre os serviços oferecidos pelo Me-morial estão ainda a emissão de certidões de desembarque, documento oficial, acei-to nos países europeus e no Japão.

De acordo com a diretora-executiva da instituição, Ana Maria da Costa Leitão Viei-ra, a intenção é que o Memorial se firme cada vez mais como Centro de Excelência no estudo dos movimentos migratórios, históricos e contemporâneos. “Buscamos cada vez mais acentuar o seu papel de referência nacional e internacional sobre

a história e memória dos imigrantes por meio da adoção de políticas museológicas que valorizem o fenômeno da diversidade cultural”, destacou por meio da assessoria.

A própria estrutura do Memorial, com seus belíssimos jardins e uma plata-forma de trem ambientada nos idos de 1900, propicia uma viagem no tempo. O trem funciona aos sábados, domingos e feriados, transportando os visitantes por um trajeto de mil metros, com dura-ção aproximada de 20 minutos.

a respeito da assimilação de grupos étnicos: quanto mais rapidademente esta se processar, melhor”, afirma o doutor em Ciências Sociais e professor da Universidade Federal de São Car-los, Oswaldo Mário Serra Truzzi, em artigo pu-blicado na edição 28 da revista Sociabilidades, da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

O professor tem trabalhos na área da sociologia voltados à História Social da Imigração, dentre eles a pesquisa conclu-ída em 2001, “Imigrantes, elites e socieda-de em São Paulo”, da qual foi coordenador tendo Maria do Carmo Carvalho Campello de Souza como pesquisadora.

O primeiro bloco do estudo, intitula-do “Etnias em convívio”, é ambientado no bairro paulistano do Bom Retiro, que foi utilizado como microcosmo social, por ter recebido uma grande variedade de imigran-tes ao longo de sua história.

Inicialmente ocupado por italianos, o bair-ro recebeu judeus durante as décadas de 1920 e 1930 e, posteriormente, por volta dos anos 60, foi a vez dos coreanos e gregos também se instalarem por lá. Atualmente, os dois últimos são majoritários.

História acessível - Memorial do Imigrante preserva dados e curiosidades

Imigrantes japoneses passaram a ser aceitos no Brasil, a partir de 1908

Serviço – Memorial do Imigrante

Rua Visconde de Parnaíba, 1.316, Mooca, perto do Metrô Bresser. Tel.: (11) 2692.1866 Horário de funcionamento: De terça a domingo, das 10h às 17h horas (inclusive feriados) Ingressos: R$ 4,00 e ½ entrada para estudantes Entrada gratuita para menores de 7 (sete) anos e adultos com mais de 60 (sessenta) anos. Obs: A entrada é gratuita no último sábado do mêsMais informações: www.memorialdoimigrante.org.br

Acervo Memorial do Imigrante

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Memorial do Imigrante

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48 Neo Mondo - Agosto 2009

A globalização da economia eliminou os limites de nacionalidade e contri-buiu para que grandes corporações,

sem domicílio declarado, encontrassem justi-ficativas para se eximirem da responsabilidade pelos atos de seus dirigentes, especialmente quando fora de seus países de origem. Enfra-queceram, também, os conceitos de Estado ou Nação, como conjunto de poderes de um povo, e de Governo, como autoridade respon-sável pela gestão dos bens públicos, em con-sequência da apropriação privada do ambiente público.No conjunto das organizações interes-sadas em aprimorar suas atividades, na cons-trução de bens socioambientais e em prevenir os efeitos maléficos, resultantes de impactos para a saúde humana e qualidade dos ecossis-temas, às empresas produtoras de bens e ser-viços, com fins lucrativos. Mas, a responsabili-dade alcança os demais agentes da sociedade humana: organismos públicos; organizações supostamente e verdadeiramente sem fins lu-crativos; organizações não governamentais de representação social e empresarial; e cidadãos, enquanto consumidores.

O modelo econômico prevalecente fez com que as relações entre o sistema indus-trial e o consumo de bens e serviços pela sociedade humana gerasse a emissão e deposição de resíduos (poluição) no nosso planeta, em consequência de:• acumulação de resíduos devido à apli-

cação de trabalho sobre os recursos, representada por mineração e extra-ção de materiais da crosta da terra;

• liberação de resíduos industriais, por aplicação de trabalho para produção e consumo de bens e serviços e;

• utilização de capital no consumo de bens e serviços, resultando no des-carte de produtos, embalagens e de restos, ao final da vida útil dos produ-tos. A deposição de resíduos constitui principal foco da crítica de várias or-ganizações sociais e governamentais. A principal razão é que as emissões geraram volumes gigantescos e preo-cupantes, especialmente de materiais tóxicos e perigosos ao final da década, permitindo previsões sombrias, caso

os modelos econômico e industrial não fossem modificados.1989400 milhões de toneladas de lixo

tóxico e perigoso, sendo 98% ge-rados nos países europeus, que gastavam US$22 bilhões por ano, para o manejo.

1990 o número mais real, para as ONGs, es-tavam acima de 1 bilhão de toneladas.

1999 seriam necessários US$185 bilhões para remediar (clean up) áreas de-gradadas já existentes nos EUA.

2030 a previsão é de que seriam 3 bilhões de toneladas de lixo in-dustrial perigoso. As questões socioambientais têm implicações socioeconômicas drásticas.

• Os bens comuns estão mal distribuí-dos e, por isso, há descontentamen-tos, agressões e ações mais violentas.

• Os erros do modelo econômico do pas-sado não foram suficientes para modi-ficar os paradigmas do presente.

• 90% da biomassa colhida e mais de 90% dos materiais não-renováveis

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Neo Mondo - Agosto 2009 49

tante reconhecer que, para as empresas, predomina o entendimento de que o Valor Líquido Presente (VLP) representa o prin-cipal indicador de desempenho econômi-co e que a obrigatoriedade legal para tratar as questões (sócio) ambientais constitui motivo para despesas e perda de competi-tividade. A partir da Cúpula da Terra (Rio - 92), houve aumento notável do interesse para temas como: sustentabilidade do pla-neta; correlações entre impactos e efeitos maléficos socioambientais, decorrentes do crescimento dos depósitos de resíduos in-dustriais tóxicos e perigosos, comprome-tendo a saúde e qualidade de vida humana e a qualidade, integridade e funcionamen-to dos ecossistemas naturais.

As razões são atribuídas a fracassos como:i. o modelo econômico centrado no

homem, como “senhor do universo”, que negligencia os efeitos sobre os bens naturais;

ii. a produção industrial, baseada no modelo de fim-de-tubo (end-of-pipe), responsável pelo quadro geral de acu-mulação de resíduos e

iii.a sociedade do desperdício, carac-terizada pelo consumo de bens e serviços que privilegiam a obsoles-cência programada, o descarte de embalagens e de restos de produtos ao final da vida útil.Depois da Reunião Rio-92, houve au-

mento da diversidade e número de partes interessadas em questões relacionadas ao desenvolvimento econômico e nos impac-tos socioambientais.

Programas internacionais e nacionais foram lançados. Cresceu o número de ONGs de interesse social e ambiental. A mídia passou a dar maior atenção ao as-sunto. As legislações ficaram mais rígidas, o consumidor mais exigente e as empresas assumiram melhores padrões de desempe-nho social e ambiental, embora não neces-sariamente socioambiental.

(abióticos) são perdidos como resídu-os, antes de serem entregues como produtos aos usuários finais.Os impactos causados pelo sistema

produtor de bens e serviços e o modelo de consumo da sociedade humana afetam a qualidade dos ecossistemas, comprome-tendo a capacidade assimilativa (princi-palmente de oxigênio). Esta, por sua vez, garante três importantes níveis de integri-dade ambiental:• A integridade ecológica, representada

pela estrutura e funcionamento das características locais.

• A integridade estrutural expressa os organismos que utilizam a energia solar para sua própria alimentação, os que necessitam de alimentos produzidos pelos primeiros e os que se alimentam de restos alimentares dos anteriores.

• A integridade funcional, caracterizada pela cadeia nutricional, dissipação de energia e eficiência ecológica.

A carga crítica é outro tipo de dado causado pelos resíduos no ambiente. Os volumes despejados comprometem com-ponentes específicos, com reflexos sobre determinados organismos ou sob determi-nados efeitos biológicos. É o que acontece, por exemplo, com as emissões de óxidos de enxofre (SOx), óxidos de nitrogênio (NOx), dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4).

Até o início dos anos 90, as principais preocupações a respeito das questões (só-cio) ambientais aconteciam nos países de-senvolvidos e tinham como maiores inte-ressados: o meio acadêmico, do ponto de vista da ecologia; as Organizações Não-Go-vernamentais, envolvidas em ativismo so-cial e ambiental; e os organismos governa-mentais multilaterais, principalmente no âmbito das Nações Unidas, interessados na formulação de políticas globais e nacio-nais para prevenção de problemas causa-dos pelo aumento da poluição. É impor-

Grandes empresas – em geral mul-tinacionais ou transnacionais – criaram unidades encarregadas de meio-ambien-te, ecologia industrial ou de sistema de gestão ambiental. Mas predominou a condição em que as questões sociais e ambientais continuaram a serem tratadas separadamente. Quando mencionadas juntas, há predominância do âmbito so-cial, exceto nas organizações que man-têm Sistema de Gestão Ambiental (SGA) certificado. Neste caso, a questão ambien-tal resume-se, praticamente, ao SGA. No geral, entretanto, as iniciativas sociais e ambientais não são alinhadas ao plano de negócios, nem, portanto, ao planeja-mento estratégico. Diante dessa situação, cabe indagar:• qual a responsabilidade dos produto-

res e dos consumidores para a produ-ção e consumo de bens e de serviços em bases ecologicamente apropriadas? Quais os caminhos e estratégias para a mudança de paradigmas?O tratamento dado a estas questões

não é exaustivo nem completo, mas ser-ve para ilustrar a pluralidade de conceitos. Em determinadas situações, são destaca-das as contradições no entendimento de questões sensíveis, como as relações entre a sociedade civil e o papel das empresas de negócios, globalização, comércio inter-nacional e códigos de conduta.

João Carlos MucciacitoQuímico da CETESB, Mestre em

Tecnologia Ambiental pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas da

Universidade de São Paulo, professor no SENAC, no Centro Universitário Santo André - UNI-A e na FAENG -

Fundação Santo AndréE-mail: [email protected]

João Carlos Mucciacito

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O cerrado, segunda maior formação vegetal brasileira, estende-se por uma área de aproximadamente 2

milhões de km², abrangendo 12 estados bra-sileiros: Maranhão, Piauí, Bahia, Minas Ge-rais, Tocantins, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Pará e Ron-dônia, além do Distrito Federal e de aparecer em manchas em Roraima e no Amapá.

O bioma detém um terço da biodiversida-de brasileira, 5% da fauna e flora mundiais (es-

e outra chuvosa, entre outubro e março. O solo, característico de savanas tropicais, é deficiente em nutrientes e rico em ferro e alumínio, fazendo assim com que sua pai-sagem abrigue plantas com aparência seca, pequenas arvores de troncos retorcidos e curvados, além de folhas grossas e espar-sas em meio a uma vegetação rala e rastei-ra, misturando-se, às vezes, com campos limpos ou matas de árvores de porte mé-dio, chamadas de Cerradões.

Biomas BrasileirosUma viagem pelos

Visto como um tipo de vegetação pobre e como uma fronteira, o bioma abriga uma das maiores biodiversidades brasileiras

Caio Martins

tima-se que 10 mil espécies de vegetais, 837 de aves e 161 de mamíferos vivam na região) e é o nascedouro das águas que formam as bacias hidrográficas Amazônica, do Rio São Francisco e do Paraná/Paraguai. Além disso, sob o solo de vários estados do Cerrado, está o Aquífero Guarani, maior manancial de água doce subterrânea transfronteiriço do mundo.

Seu clima é típico das regiões tropi-cais, com duas estações climáticas bem de-finidas: uma seca, entre abril e setembro,

As verdades por trás do Cerrado

Edison Luís Zanatto

Biomas

Neo Mondo -Agosto 200950

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Biomas BrasileirosUma viagem pelos

As verdades por trás do Cerrado

O ipê-amarelo, árvore típicas do cerrado brasileiro

1. Sucuri verde (Eunectes murinus): chamada também de Anaconda, vive em áreas alagadas do Cerrado. É a maior e mais conhecida sucuri brasi-leira, tendo a fama de ser uma cobra enorme e perigosa.

2. Tamanduá-bandeira (Myrmecopha-ga tridactyla): é um animal que não tem dentes e que, portanto, utiliza sua língua longa e pegajosa para faci-litar a captura de alimentos. Tem em seu cardápio formigas, cupins e lar-vas de besouros, chegando a comer cerca de 30.000 insetos por dia. É um animal solitário, que se aproxima de outros da mesma espécie somente na hora do acasalamento e da ama-mentação.

3. Veado Campeiro (Ozotoceros bezo-articus): é um veado campestre que mede cerca de 1 metro de comprimen-to. Tem a pelagem dorsal marrom, com barriga, contorno da boca e círcu-

lo ao redor dos olhos brancos. Possui uma galhada com três pontas e cerca de 30 cm de altura.

4. Urubu-rei (Sarcoramphus papa): é uma ave de rapina da família Catharti-dae, que tem sua caça proibida no Bra-sil, pois é considerada uma ave impor-tante na limpeza do meio ambiente.

5. Lobo-guará: (Chrysocyon brachyu-rus): é o maior mamífero canídeo nati-vo da América do Sul. A sua distribui-ção geográfica estende-se pelo sul do Brasil, Paraguai, Peru e Bolívia, estan-do extinto no Uruguai e na Argentina. É considerado espécie ameaçada de extinção no Brasil.

Cerrado Social O aparecimento de pessoas na região

data de pelo menos 12 mil anos. Grupos de caçadores e coletores de frutos e outros alimentos naturais começaram a povoação no bioma. No entanto, o aumento no nú-

Tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla) Lobo-guará (Chrysocyon brachyurus)

João Antonio de Lima Esteves

Malene Thyssen

Cerrado FlorestalApesar de ainda pouco conhecida, a flo-

ra do cerrado é uma das mais ricas do mun-do. Estima-se que existam 10 mil espécies de plantas, sendo 3.000 delas do estrato ar-bóreo-arbustivo e 7.000 do herbáceo-subar-bustivo. Em termos de riqueza de espécies, este bioma é superado apenas pelas floras da floresta Amazônica e da Mata Atlântica. Entre as plantas, destacam-se as famílias das Leguminosas (Mimosaceae, Fabaceae e Caesalpiniaceae), das Gramíneas (Poaceae) e das Compostas (Asteraceae). Uma das ca-racterísticas do bioma é a heterogeneidade de sua distribuição, havendo espécies endê-micas em cada região do Cerrado.

Cerrado AnimalSeguindo a linha de sua vegetação, a

fauna do bioma é pouco conhecida. Mesmo assim, ela apresenta números impressio-nantes. Existem cerca de, no mínimo, 161 espécies de mamíferos, 837 espécies de aves (4º lugar em diversidade no mundo), 150 es-pécies de anfíbios (8º lugar em diversidade no mundo), 120 espécies de répteis, além de uma grande concentração de invertebrados, na qual predomina o grupo dos Insetos.

Entre os vertebrados, o destaque fica para os animais de maior porte, como a jibóia, a cascavel, várias espécies de jara-raca, o lagarto teiú, a ema, a seriema, o urubu-comum, o urubu-caçador, o urubu-rei, as araras, os tucanos, os papagaios, os gaviões, o tatu-peba, o tatu-galinha, o ta-tu-canastra, o tatu-de-rabo-mole, o taman-duá-bandeira, o tamanduá-mirim, o veado campeiro, o cateto, a anta, o cachorro-do-mato, o cachorro-vinagre, o lobo-guará, a jaritataca, o gato mourisco, a onça-parda e a onça-pintada. Conheça as características de alguns deles:

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Divulgação

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Formações de arenito do Parque Nacional de Chapada dos Guimarães vistas do mirante da “Cidade de Pedra”

mero de habitantes foi lento. Há cerca de 40 anos é que esse panorama mudou. Um grande número de pessoas começou a mi-grar para a região por causa das novas polí-ticas econômicas instaladas nas décadas de 60 e 70. Atualmente, vivem no bioma cerca de 20 milhões de pessoas. Essa população é majoritariamente urbana e enfrenta proble-mas como desemprego, falta de habitação e poluição, entre outros, principalmente por causa do desenvolvimento desigual dentro do bioma, segundo Análises realizadas pelo Laboratório de Processamento de Imagens da Universidade Federal de Goiás.

Apesar dos dados negativos em rela-ção ao desemprego, à falta de habitação e à poluição, algumas das áreas onde a agricultura comercial conseguiu se desen-volver mais intensamente apresentaram avanços significativos em termos de de-senvolvimento humano, com diminuição dos índices de pobreza e aumentos impor-

tantes do IDH (Índice de Desenvolvimen-to Humano). Por outro lado, algumas áreas de ocupação mais recente mostram uma tendência ao acentuamento na concentra-ção de renda na mão de poucos.

Cerrado Econômico Na economia, o destaque fica para a

agricultura mecanizada de soja, milho e algodão, que começa a se expandir, prin-cipalmente, a partir de 1960. Naquela época, o Cerrado sofreu uma forte expan-são da fronteira agropecuária, estimula-das por políticas de crédito nacionais e internacionais voltadas para exploração de grãos e de carnes.

Em 1970, novas políticas de de-senvolvimento, o surgimento de novas tecnologias e investimentos em infra-estrutura ajudaram na geração de uma nova dinâmica econômica, que resultou na abertura e ocupação de grandes áreas

Estrada no Cerrado

de Cerrado através da expansão da agri-cultura comercial.

Ainda por causa das novas tecnolo-gias, as produções de grãos começaram a aumentar. Um exemplo é a soja. A região Centro-Oeste aumentou em quase 900% sua produção, chegando, hoje, a produzir 50% da soja do todo e Brasil e 13% da soja de todo o planeta. Outros exemplos de produção do Cerrado são: o milho (20% da produção nacional), o arroz (15% da produ-ção nacional) e o feijão (11% da produção nacional). Na pecuária, o Centro-Oeste de-tém mais de um terço de todo rebanho bo-vino nacional e cerca de 20% dos suínos.

Por outro lado, a expansão da frontei-ra agropecuária e a evolução tecnológica de agricultura no Cerrado fizeram com que a absorção de mão-de-obra ficasse cada vez menor. Em 1985, por exemplo, as áreas mais evoluídas tecnologicamen-te da agricultura geravam praticamente quatro vezes menos emprego que as áre-as ainda não incorporadas à economia de mercado. Sem atividades no campo, a população começou a migrar para as cidades, que também não conseguiram receber e empregar todo o contingente de migrantes. Hoje, as áreas de agricultura comercial consolidada no Cerrado ainda são aquelas onde há menor disponibilida-de de empregos por área utilizada.

Problemas biológicosA vasta riqueza biológica que o Cerra-

do possui acaba trazendo problemas para seu ecossistema. Inclusive, ele é o sistema ambiental brasileiro que mais sofreu alte-ração com a ocupação humana. A caça e o comércio ilegal de animais é um deles, o que acaba fazendo com que grande parte dos animais entre em extinção.

Mapa da ecoregião do Cerrado Os limites da ecorregião mostrados em amarelo

João Antonio de Lima Esteves

Imagens: NASA.

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Biomas

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Neo Mondo - Setembro 2008 A

Imagens: NASA.

Curiosidades

• A ocupação do Cerrado iniciou-se no século XVIII com a mineração, que se desenvol-veu num rápido ciclo de exploração intensiva.

• O Cerrado é uma região com algumas peculiaridades: conta apenas com duas es-tações climáticas bem marcadas (seca e chuvosa) e tem uma rica biodiversidade associada a uma aparência árida, decorrente dos solos pobres e ácidos.

• Somando-se as áreas da Espanha, França, Alemanha, Itália e Inglaterra, chegamos ao espaço ocupado pelo Cerrado.

• Por não ser considerado “Patrimônio Nacional” pela Constituição Federal, diferente-mente da Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e Zona Costeira, a tarefa de conservar o Cerrado é ainda mais difícil e debilitada.

• As árvores do Cerrado são responsáveis por cerca de 80% do carvão vegetal consu-mido no Brasil.

• O Cerrado possui um grau de endemismo (exclusividade) altíssimo e é uma das regiões de maior diversidade do planeta, mesmo sendo um bioma pouco conhecido e estudado.

• Das 837 espécies de aves registradas no Cerrado, 759 se reproduzem na região e o restante são aves migratórias.

• O Cerrado é uma das regiões do Brasil com o maior número de insetos. Apenas na área do Distrito Federal, há 90 espécies de cupins, 1000 espécies de borboletas e 500 tipos diferentes de abelhas e vespas.

• O Cerrado abriga as nascentes de importantes bacias hidrográficas da América do Sul: Platina, Amazônica e São Francisco, sendo assim considerado o “berço das águas”,

Observação: Só se come a camada amarela e macia que envolve o caroço do pequi. A parte interna da fruta é cheia de espinhos e, se morder com força, pode acabar machucando a boca.

Receita Típica do Cerrado: Frango com Pequi*

Ingredientes:• 1 frango caipira picado e sem pele • 12 caroços de Pequi • 1 cebola média picada• 4 dentes de alho amassados com sal • 1 colher de sopa de óleo • 1 litro de água • Salsa, cebolinha e pimenta-de-cheiro

Preparo:1. Ponha óleo na panela;2. Assim que o óleo esquentar, coloque a cebola para dourar;3. Depois disso, acrescente o alho com o sal e o frango;4. Deixe refogar bem e acrescente o Pequi;5. Adicione a água aos poucos;6. Quando a água estiver toda na panela, acrescente a pimenta e

o cheiro verde, e deixe cozinhar por mais ou menos 30 minutos;7. Se necessário, adicione mais água;8. Quando o frango estiver bem cozido, está pronto para servir.

Fontes:- Almanaque Brasil Socioambiental -

ISA 2008- Mundo de Sabores: www.mundode-

sabores.com.br - Portal Brasil: www.portalbrasil.net- WWF Brasil – www.wwf.org.br

*O pequi (Caryocar brasiliense) é uma árvore nativa do cerrado brasileiro, cujo fruto é muito utilizado na cozinha do nordeste, do centro-oeste e do norte de Minas Gerais.

Outro problema é a atividade garim-peira na região. Ela acaba contaminando os rios com mercúrio e contribui para seu as-soreamento, além de favorecer o desgaste dos solos. Solo que também sofre com outro problema: a erosão. O manejo pouco cuida-doso do mesmo tem ocasionado perdas ex-pressivas desse precioso recurso natural. Se-gundo estimativas do WWF, para cada quilo de grãos produzido no Cerrado, perdem-se de 6 a 10 quilos de solo por erosão.

O meio aquático também é afetado pela agricultura. Há um grande consumo de água para irrigação, o que, na maioria das vezes, acaba gerando um desperdício excessivo desse bem. O resultado disso é o número crescente de conflitos pela água entre agricultores, e entre uso agrícola e uso urbano da água em muitos estados.

Desmatamento e Degradação O Cerrado, assim como todos os bio-

mas brasileiros, sofre com a destruição de sua paisagem. Avaliações recentes aponta-ram uma perda entre 38,8% (segundo da-dos da Embrapa Cerrado) e 57% (segundo dados Conservação Nacional) na cobertura vegetal nativa da região.

A diferença nos dados apresentados está diretamente ligada a grande dificuldade de se mapear os diferentes ecossistemas do bioma, principalmente na diferenciação de pastagens naturais e pastagens plantadas. Outro dado, também da Conservação Internacional, apon-tou que a taxa de desmatamento no bioma, até o ano de 2004, era de 2,6 hectares por mi-nuto, ou seja, 111 mil hectares por mês. Parte

da culpa dessa destruição está ligada ao efeito do desenvolvimento das agriculturas em lar-ga escala. A abertura de estradas durante o mesmo desenvolvimento também resultou no desmatamento de boa parte do bioma.

Uma contradição disso tudo é que, mesmo com esses números alarmantes, o Cerrado é um dos biomas mais desampa-rados e esquecidos em termos de proteções legais. Até 2003, menos de 2% de sua área encontrava-se protegida em unidades de conservação de uso sustentável. Além dis-

so, o Cerrado não é considerado Patrimônio Nacional na Constituição Federal, diferen-temente da Amazônia, da Mata Atlântica, da Zona Costeira e do Pantanal.

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ditório que essa espécie vive, são perdas e ganhos em frações de segundos, de me-nina passa a mulher, de filha passa à mãe, de mãe a filha e de filha a filha da mãe.

São sentimentos opostos vividos durante a sua trajetória, são alegrias, fracassos, sonhos sonhados, sonhos abortados, esquecidos e paralisados, mas descobertas vividas profun-damente no tempo e espaço de sua existência.

Bicho mãe tem desejo de VIDA, vida que nasce a cada dia, vida que transforma e amadurece, vida que envelhece, mas que nunca perde a essência da infância.

Bicho mãe tem alma de anjo “encapetado” e sensibilidade guerreira.Bicho mãe ama incondicionalmente, se entrega neste ofício sem vacilar.Bicho mãe tem um profundo sentimento de posse e pertence. Ama a sua continuida-de e a continuidade de sua continuidade.

Bicho mãe, quando tem uma prole, sabe o que cada um deles precisa e sente.Bicho mãe, quando tem um único filhote, sufoca-o de carinhos, preocupações e super-proteção. Bicho mãe é admirável mesmo!

Bicho mãe surta numa explosão de raiva e rapidamente se recompõe com a mesma velocidade do surto como se nada fosse. Bicho mãe conhece o perdão e exerce-o com uma naturalidade quando se trata de aplicá-lo ao seu filhote.Bicho mãe é o bicho que mais se culpa, pois não aceita de forma alguma errar na criação de seu filhote.Bicho mãe é maluco mesmo!!

Bicho mãe aproxima-se de Deus com tanta facilidade quando necessita suplicar pelo seu

Luciana Stocco de Mergulhão

Que bicho estranho e esquisito é esta es-pécie feminina, ao mesmo tempo em que deseja ver sua cria crescida com indepen-dência, deseja ardentemente que ela nunca saia de perto se aventurando demais.

Afinal, o bicho mãe é quem sabe o que é melhor...

Tem uma boca que professa e uma língua felina e doce que educa com firmeza e suavidade.

Até pouco tempo atrás era apenas bicho filha, e reinava no âmbito de filha, mas ao se tornar bicho mãe pode compreender o que intensamente a espécie tem como instinto de proteção e preservação.

Nossa! Os cientistas deveriam observar atentamente este animal mãe para busca-rem maneiras mais eficientes de preservar o planeta, pois é um animal que a todo custo e sem limites olha, ora e cuida com muita dedicação da sua continuidade. Provavelmente, o bicho mãe é a única espécie que não será extinta do planeta.

E, ai de quem ousar mexer com seus filhotes, vira, verdadeiramente, uma fera irracional envolvida por uma raciona-lidade que só a sua categoria consegue compreender.Proteger com seus filhotes é uma tarefa exclusiva da mãe felina.

Bicho mãe é estranho mesmo!

Bicho filha que se deliciava na sua filiação percebeu que aos quarenta anos algo novo acontecia, modificações ocorriam, bicho fi-lha seria bicho mãe da filha ou filha da mãe.Este universo que se descortinou a sua frente revelou o ciclo inevitável e contra-

filhote. Para o bicho mãe, este filhote nunca cresce, é seu menininho ou sua menininha crescidinho, mas pequeninos e indefesos.Bicho mãe é viajante mesmo!

Tem um espírito astuto que sabe direiti-nho fisgar seu filhote, seja pelo estômago ou com suas sábias palavras. Só o bicho mãe consegue isso com tanta desenvol-tura, traz seu filhote de volta ao longo de sua vida para baixo de suas asas.

Bicho mãe tem asas para acolher todos, presas para afastar qualquer perigo e nadadeiras para incentivar mergulhos.Bicho mãe arrasta, rola, voa e salta quan-tas vezes forem necessárias para ver os seus filhos saudáveis e satisfeitos.Bicho mãe tem medo quando seu filhote vai alçar o primeiro vôo, mas acompanha-o no primeiro, segundo, terceiro, quantos vôos forem necessários, com a mesma vibração, empolgação do primeiro.Bicho mãe é incansável mesmo!!!

Bicho mãe é engraçado, consegue nos alegrar nos momentos mais complicados, nos distraindo e acalentando.Bicho mãe é um bicho esquisito mesmo!!! Mas um bicho eternamente apaixonante e apaixonado por sua cria.

“Uma homenagem sempre atual a todas as mães do Planeta “.

Luciana Stocco de MergulhãoMestre em Educação, especializada

em Psicopedagogia e graduada em Pedagogia.

Professora universitária dos cursos de Pedagogia,Psicopedagogia e atendi-mento psicopedagógico. Experiência

profissional de professora e coordena-dora pedagógica de educação básica.

BICHO MÃE

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Neo Mondo - Outubro 2008 A

BICHO MÃE

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Neo Mondo - Outubro 2008A

O Programa Nutrir da Nestlé completa 10 anos de trabalho voltado para o combate à desnutrição e à obesidade em comunidades de baixa renda do país.Conheça mais sobre essa iniciativa que já capacitou11 mil educadores e benefi ciou 1,2 milhão de crianças.www.nestle.com.br/nutrir

“Elaborar o cardápio de 8 mil crianças de 90 escolas e creches,

considerando o valor nutricional indicado para cada idade,

é o que chamo de um gigantesco desafio. Mas, nas ocasiões em

que eu conto com o Programa Nutrir, tudo fica mais fácil.

Ele funciona como uma ferramenta que

me ajuda a estar próxima das merendeiras

e a trabalharmos motivadas e unidas.

No meu trajeto de Programa Nutrir,

aprendi muito. Especialmente

que é fundamental colocar o coração

no que fazemos.”

Kizze Fajardo,

Fortaleza, CE

Nutricionista

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