mapeamento dos pontos polemicos da reforma sindical

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Revista de Ciências Revista de Ciências Revista de Ciências Revista de Ciências Revista de Ciências Humanas e Artes Humanas e Artes Humanas e Artes Humanas e Artes Humanas e Artes Vol. 13, Nº1 janeiro/ julho de 2007 Mapeamento dos pontos polêmicos da reforma sindical Resumo: O presente artigo pretende mapear os principais pontos polêmicos em discussão na reforma sindical, segundo a perspectiva dos atores sociais. É um texto-roteiro para compreender o que está em jogo no debate sobre a reformulação do sistema de relações de trabalho brasileiro, destacando-se os aspectos em disputa na rela- ção entre capital e trabalho. Palavras-chave: Sindicalismo, Sistema de Relações de Trabalho, Reforma Sindical. Abstract: This paper intends to map the most polemical issues in the discussion of the trade union reform, from a point of view of social actors. It’s a guideline to the unders- tanding of what is in the table in relation with the Brazilian labour relations sys- tem, with a special emphasis in the labour/capital relation. Key-words: Trade Unionism, Labour Relations System, Trade Union Reform José Dari Krein Pesquisador do CESIT e Professor do Instituto de Economia da UNICAMP-SP. Agradeço os comen- tários e as importantes contribuições de Magda Bi- avaschi, Mariana Mei, Anselmo Santos, Cássio Cal- vete, Denis Maracci Gimenez. Ana Magni e Amil- ton Amoretto. O presente texto foi debatido no âmbito do projeto de pesquisa Cesit/Sebrae. Ariús, Campina Grande, Vol. 13, nº 1, jan./jul. 2007

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O presente artigo pretende mapear os principais pontos polêmicos em discussão na reforma sindical, segundo a perspectiva dos atores sociais. É um texto-roteiro para compreender o que está em jogo no debate sobre a reformulação do sistema de relações de trabalho brasileiro, destacando-se os aspectos em disputa na rela- ção entre capital e trabalho.

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Revista de CiênciasRevista de CiênciasRevista de CiênciasRevista de CiênciasRevista de CiênciasHumanas e ArtesHumanas e ArtesHumanas e ArtesHumanas e ArtesHumanas e ArtesVol. 13, Nº1janeiro/ julho de 2007

Mapeamento dos pontos polêmicosda reforma sindicalResumo:

O presente artigo pretende mapear os principais pontos polêmicos em discussãona reforma sindical, segundo a perspectiva dos atores sociais. É um texto-roteiropara compreender o que está em jogo no debate sobre a reformulação do sistemade relações de trabalho brasileiro, destacando-se os aspectos em disputa na rela-ção entre capital e trabalho.Palavras-chave: Sindicalismo, Sistema de Relações de Trabalho, Reforma Sindical.

Abstract:This paper intends to map the most polemical issues in the discussion of the tradeunion reform, from a point of view of social actors. It’s a guideline to the unders-tanding of what is in the table in relation with the Brazilian labour relations sys-tem, with a special emphasis in the labour/capital relation.Key-words: Trade Unionism, Labour Relations System, Trade Union Reform

José Dari KreinPesquisador do CESIT e Professor do Instituto deEconomia da UNICAMP-SP. Agradeço os comen-tários e as importantes contribuições de Magda Bi-avaschi, Mariana Mei, Anselmo Santos, Cássio Cal-vete, Denis Maracci Gimenez. Ana Magni e Amil-ton Amoretto. O presente texto foi debatido noâmbito do projeto de pesquisa Cesit/Sebrae.

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1. Introdução

O presente texto tem o propósito dediscutir os principais pontos polêmicosda reforma sindical, apesar de o Fó-rum Nacional do Trabalho (FNT) terproduzido um conjunto de consensossobre o tema. A questão central, quepermeia o debate, tanto na academiacomo na sociedade, trata do caráter dasmudanças no modelo de sistema derelações de trabalho a ser adotado nopaís.

O FNT, depois de um ano e meiode discussões e negociações entre re-presentantes de empregadores, de tra-balhadores e do governo, apresentou,à Casa Civil da Presidência de Repú-blica, uma versão de reforma sindical,encaminhada ao Congresso Nacionalno início do ano legislativo de 2005.O debate sobre a reforma trabalhista –conjunto da legislação que regula arelação de emprego entre trabalhadore empregador – está no começo de seuprocesso de constituição, não apresen-tando, por enquanto, conclusões sig-nificativas.

Por um lado, as entidades patronaisnão apresentam grande entusiasmo nareforma sindical e buscam abrir espa-ço para uma mudança na categoria dasnormas, possibilitando, via negociaçãocoletiva, que as medidas em vigor, se-jam ajustadas à realidade regional, se-torial, e/ou até, por empresa. Por ou-tro lado, a maioria das entidades detrabalhadores representadas no FNTconcorda com a valorização da nego-ciação coletiva, mas não admite flexi-bilização dos direitos escritos no arca-bouço legal, considerando-os como opatamar básico que garante um míni-

mo de civilidade ao mercado de tra-balho brasileiro. Esta é uma questãoque, muitas vezes, não aparece de for-ma explícita, mas está presente no cen-tro das divergências. Ela aparece emdiversos aspectos do debate da refor-ma, tais como na discussão sobre aadoção do princípio da norma maisfavorável e do papel e da abrangênciada negociação coletiva. Além dessaquestão, também serão discutidos, nopresente texto, os seguintes aspectos:1) a prevalência da norma mais favo-rável; 2) a organização sindical, comdestaque para a representação dos tra-balhadores no local de trabalho e onúmero de dirigentes sindicais comestabilidade; 3) o sistema de negocia-ção coletiva, tanto em relação ao con-teúdo (ultratividade) como aos níveisde negociação; 4) a forma de soluçãodos conflitos coletivos, evidenciado adiscussão sobre o direito de greve e asubstituição processual. O objetivo dopresente texto não é sintetizar a refor-ma, mas indicar quais são as princi-pais questões, em disputa no tema, quedevem nortear os debates na sua tra-mitação no Congresso Nacional.

A reforma sindical altera o chama-do direito coletivo. O conjunto da pro-posta está expressa em um (Parecer deEmenda Constitucional) PEC, que al-tera os artigos 8º, 11º, 37º e 114º daConstituição Federal, e num antepro-jeto de lei contendo: o sistema de or-ganização sindical; o sistema de finan-ciamento das entidades classistas; opapel e funcionamento do ConselhoNacional de Relações de Trabalho; osistema de negociação coletiva; as for-mas de solução dos conflitos; o direitode greve; e a substituição processual.

O debate é bastante complexo, apre-sentando inúmeras nuances.

Neste trabalho, serão privilegiadosos pontos polêmicos que deverão apa-recer no debate nacional durante a tra-mitação da reforma sindical, privilegi-ando os aspectos destacados pelosparticipantes do FNT.

2. Dos princípios do anteproje-to: o princípio da norma maisfavorável (disposições prelimi-nares)

A principal controvérsia, quanto aosprincípios que informam a reforma,está na inclusão ou não do princípioda norma mais favorável1. Tal polêmi-ca insere-se na questão de fundo queperpassa o debate brasileiro: a adoçãodo princípio da prevalência do nego-ciado sobre legislado. Princípio esseque estava expresso em um projeto leique propunha a inclusão de um pará-grafo no artigo 618 da Consolidaçãodas Leis do Trabalho (CLT), e que fa-vorecia a possibilidade de transformarnormas de ordem pública em normasdispositivas em nível coletivo. Esse pro-jeto chegou a ser aprovado na Câmarados Deputados em 2001, mas, depois,foi retirado da pauta do Senado Fede-ral em 2003, por iniciativa do executi-vo, já que o tema estaria em discus-são/negociação no FNT.

No Fórum, os atores sociais não fir-maram uma posição explícita sobreessa controvérsia, indicando, generica-mente, que integram o sistema sindi-cal, os princípios da Organização In-ternacional do Trabalho (OIT), e dodireito do trabalho2. Deixando, portan-

1 O Direito do Trabalho é informado por princípios próprios. Um deles, o da aplicação da norma mais benéfica ou mais favorável ao trabalhador.À luz desse princípio, havendo mais de uma regra dispondo distintamente sobre um mesmo fato (por exemplo, um artigo de lei, a cláusula de umaconvenção coletiva ou de um contrato individual de trabalho), incidirá aquela que mais benefícios trouxer ao trabalhador. É que, no Direito doTrabalho, cujo princípio fundamental é o da proteção, o qual tem como expressão, dentre outros, o da norma mais favorável, não vigora oprincípio da hierarquia formal das fontes, mas o da hierarquia dinâmica destas. É, nesse sentido, que, havendo uma pluralidade de regras vigentesaplicáveis a uma mesma situação jurídica, aplicar-se-á sempre aquela regra que for mais benéfica ao trabalhador, mesmo que de uma hierarquiainferior em relação às demais.

2 O princípio básico que informa o Direito do Trabalho é o da proteção. Dentre os quais, entre outros, são expressão o da norma mais benéfica eo da autonomia das vontades coletivas. Quanto a este último, há controvérsias de seu limite tanto na doutrina como na jurisprudência. Boa partedos doutrinadores entende que o princípio da autonomia das vontades coletivas deve ser compreendido à luz do princípio da proteção e, nesse

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to, para interpretação de cada ator so-cial, o significado de inúmeros consen-sos incluídos na proposta de reformasindical.

Nesse sentido, a questão reapareceem alguns aspectos do anteprojeto delei, especialmente, na discussão sobrea inclusão e o sentido do princípio daaplicação da norma mais favorável,que suscita grande polêmica, pois si-naliza a lógica do sistema de relaçõesde trabalho a ser adotado no Brasil.Esse princípio não estava explícito nosconsensos sistematizados do Fórum3.Mas, depois, foi incluído em uma ver-são preliminar de um anteprojeto delei, como reação às críticas de algunssegmentos de que a lógica do textoapresentado poderia abrir espaço parauma flexibilização dos direitos traba-lhistas. As entidades empresariais nãoconcordaram com sua inclusão, geran-do um impasse que, até o presentemomento, não está totalmente resolvi-do, abrindo espaço para duas interpre-tações. Por um lado, há uma correntecom a interpretação de que na propostade reforma, há aspectos que fecham aporta para a flexibilização, ao assegu-rar na PEC (art. 114) que serão “res-peitadas as disposições mínimas legaisde proteção ao trabalho, bem como asconvencionadas anteriormente”, e aoinscrever no sistema sindical, os prin-cípios do direito do trabalho. Por ou-tro lado, há os defensores da tese deque a não explicitação do princípio danorma mais favorável pode abrir ca-minho para flexibilizar as relações detrabalho. Na visão do governo, essetema será objeto de discussão na re-forma trabalhista e não na sindical.

Na lógica do presente texto é fun-damental destacar a grande polêmicaque está no centro do debate, no Bra-sil, desde 1994: reafirmação de um sis-tema de regulação pública do traba-lho ou avanço rumo à flexibilizaçãodas relações de trabalho. De formamais explicita, este é o mesmo debatesobre a prevalência do negociado so-bre o legislado, o qual define uma hie-rarquia de regras, sendo privilegiadaaquela acordada entre as partes emdetrimento à legislação vigente. Flexi-bilidade, nesse debate, é compreendi-da como a possibilidade de alterar/der-rogar direitos assegurados na legislaçãopor meio do acordo de vontades ex-presso na negociação coletiva. Em ou-tros termos, significa favorecer a pos-sibilidade, via negociação coletiva, deas partes (representação de emprega-dores e de trabalhadores) estabelece-rem regras inferiores ou conflitantescom as estipuladas pela legislação, nosaspectos previstos em lei.

Atualmente, o princípio que vige éo da “flexibilidade para cima”, isto é,as entidades de classe podem estabe-lecer normas, regras ou benefícios novácuo (lacuna) ou superiores a lei, seminfringir os patamares mínimos existen-tes. Os atores sociais têm liberdade deefetuar as negociações, desde que osdireitos assegurados não sejam infrin-gidos. Esses atores sociais, no entanto,têm percepções muito distintas sobreo sistema de regulação do trabalho ede proteção social que deve existir parao conjunto dos assalariados no país. Aseguir busca-se, de forma sintética,analisar essas correntes.

De um lado, a corrente que defen-

de uma normatização das relações detrabalho realizada, preferencialmente,pelas partes nelas envolvidas, respon-sabilizando a excessiva regulação le-gal pela alta informalidade e o eleva-do desemprego vigente no Brasil. É oprincípio da autonomia das vontadescoletivas, interpretado de forma abso-luta. Nessa visão, diante dos desafiosde uma economia aberta e exposta àconcorrência externa, a adoção denormas mais flexíveis pode ser benéfi-ca para o avanço da produtividade eda competitividade da empresa, já quea relação entre trabalhador e empre-gador deve ser marcada pela “parce-ria”. Os adeptos dessa compreensão,também advogam a necessidade dehaver regras compatíveis com a reali-dade das diferentes regiões, dos seto-res econômicos e por tamanho de em-presa. Portanto, a desregulamentaçãodas leis trabalhistas é considerada umainiciativa fundamental para as empre-sas obterem maior produtividade ecompetitividade, contribuindo, conse-qüentemente, na solução do problemado desemprego. Além disso, argumen-tam que o alto custo dos encargos so-ciais é apontado como um empecilhoà formalização, aspecto que será ob-jeto de discussão em outro texto espe-cífico. Com essa concepção, as prin-cipais entidades de representação dosempregadores, em diversas ocasiões ereiteradamente, têm manifestado a suapreferência pela reforma trabalhista edado menor importância para a refor-ma sindical. Na verdade, buscam-seformas de redução de custo por meiode uma flexibilização da legislação tra-balhista4.

sentido, a autonomia das vontades coletivas deve sempre introduzir uma flexibilização “para cima”, respeitando a normas mínimas de proteçãoem vigor. Outra parte, porém, prioriza as vontades coletivas quando manifestadas expressamente em textos normativos.

3 Relatório Final da Reforma Sindical, abril 2004.4 Segundo Dornelles, em um país de dimensão continental como o Brasil, com enormes disparidades regionais, que sedia grandes empresas e

milhares de micro-empresas, com setores extremamente avançados e outros extremamente atrasados, a evolução das relações trabalhistas jamaisconseguirá ser feita pelo legislado, mas, sim, pelo negociado, inicialmente, com maior tutela do Estado, que iria sendo reduzida na medida emque os próprios sindicatos sentissem a superioridade do sistema negociado sobre um sistema legislativo rígido. O objetivo geral da proposta éadequar as relações trabalhistas às condições de produção atuais e, com isso, facilitar as contratações e os registros – aumentando, assim, otrabalho formal. Por exemplo, a rigidez do registro obrigatório em carteira, em 48 horas, não facilita as contratações formais no meio rural – daí,a necessidade de aumentar-se esse prazo. Da mesma forma, pode facilitar a redução de custos e a conseqüente melhoria nas condições desobrevivência e desenvolvimento das empresas a possibilidade de estas desmembrarem as férias de seus empregados em três períodos de 10 dias

José Dari Krein

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A outra corrente, por outro lado,apresenta a convicção de que a pro-teção existente na legislação garanteum patamar básico de civilidade à re-lação de emprego, que já é conside-rada baixa. Abrir mão desse patamarsignifica precarizar ainda mais ummercado de trabalho que já apresen-ta grande flexibilidade, especialmen-te em relação aos aspectos centrais darelação de emprego, tais como nadefinição das funções, nas formas decontratação e despedida, na jornadae na remuneração do trabalho. Assim,em primeiro lugar, flexibilidade domercado de trabalho pode ser obser-vada pela alta rotatividade da mão-de-obra (acima dos 30% durante a déca-da de 905), mostrando que apesar damulta rescisória, há, diferentementeda maioria dos países desenvolvidos,facilidades para efetuar a despedidado trabalhador, já que o empregadortem a opção do rompimento do con-trato “sem justa causa”. Em segundolugar, a jornada de trabalho, com osexpedientes da hora extraordinária edo banco de horas também apresentagrande flexibilidade. Em terceiro lu-gar, a remuneração, nos últimos 25anos, tem variado conforme os cicloseconômicos (Baltar, 2003). Pois, porexemplo, os salários perderam poderde compra nos períodos de crise eco-nômica, após o Plano Real. Problemaque se intensifica depois do fim dapolítica salarial e da introdução da li-vre negociação dos salários (1995).Entre 1997 e 2003, os salários do se-tor privado apresentaram uma perdade 28,2% no seu poder de compra,

na região metropolitana de São Paulo(Seade/Dieese). A queda é mais acen-tuada nos anos em que o desempe-nho da economia é pior. Em 2003,segundo dados do Dieese, somente42% das negociações coletivas con-seguiram recompor o poder de com-pra vigente no ano anterior. A remu-neração do trabalho também estávinculada à liberdade das empresasem despedir, pois houve, especial-mente de 1999 em diante -dada agrande expressão do desemprego –,uma substituição dos trabalhadorescom melhor remuneração, por outros,com vencimentos mais baixos e commaior escolaridade. Portanto, nos as-pectos centrais da relação de empre-go, há grande flexibilidade, como osindicadores do mercado de trabalhoevidenciam.

Essa última corrente, ainda, contra-põe-se à tese da responsabilização darigidez da legislação com os seguintesargumentos: 1) a informalidade e hete-rogeneidade são problemas históricose estruturais do mercado de trabalho,que, nos momentos de crescimento eco-nômico, têm evidenciado um processode formalização e aumento do empre-go; 2) o nível de emprego é um proble-ma que advém da dinâmica econômi-ca e da forma como é repartido otrabalho útil na sociedade e não da le-gislação do trabalho. Além disso, asexperiências internacionais de flexibi-lização do mercado de trabalho, comoa Organização para Cooperação e De-senvolvimento Econômico (OCDE) re-conhece, não trouxeram os resultadosesperados, especialmente na criação de

postos de trabalho6. Portanto, o proble-ma não está no sistema de proteçãoexistente e, sim, na dinâmica da eco-nomia e na opção política quanto aotipo de sociedade (inclusão social) quecada nação pretende construir.

A importância da inclusão da ob-servância da norma mais benéfica partedo pressuposto de que a relação entrecapital e trabalho é marcada pela assi-metria de poder no mercado de traba-lho, garantindo-se, portanto, uma pro-teção ao elo mais frágil da relação e,assim, buscando-se uma igualdadesubstantiva, tendo como objetivo equi-parar partes desiguais7. A partir dessalógica, a não garantia legal do princí-pio da norma mais favorável pode abrircaminho para flexibilizar “para baixo”as relações de trabalho.

A questão da flexibilização é umademanda geral de diversos segmentosde empregadores com a finalidade dereduzir custos e de adquirir maior li-berdade para poder determinar as con-dições de uso e de remuneração do tra-balho. Há, inclusive, no caso italiano,a demanda de extensão para o conjun-to das empresas, independentementedo seu tamanho, de uma condiçãomais favorável de despedir, que hojeé prevista, somente, às empresas commenos de 15 empregados. As empre-sas com até 15 empregados não preci-sam justificar a demissão, algo similarao que existe no Brasil, como despe-dida sem justa causa.

Portanto, a discussão da inclusão, ounão, do princípio da norma mais favo-rável está inserida no debate mais geralda reforma e do tipo de sistema de re-

(e não apenas um de 30), ou de pagarem o 13.° salário em algumas parcelas, ou ainda de propiciarem a participação dos empregados nos lucros,por meio de periodicidade mais curta – até mensal. (http://www.academus.pro.br/site/p_detalhe_ assunto.asp?codigo=13).

5 Caged/MTE.6 Cf. CESIT (2004a e 2004b).7 É que o Direito do Trabalho nasce da compreensão de uma profunda desigualdade entre empregado e empregador, tendo a norma de proteção o

sentido de minimizar essa assimetria, e como afirma Calvo (2005: 07), “dar tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais edesigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades. A absoluta igualdade jurídica não pode, contudo, eliminar a desigualdadeeconômica; por isso, do primitivo conceito de igualdade, formal e negativa (a lei não deve estabelecer qualquer diferença entre os indivíduos),clamou-se pela passagem à igualdade substancial. E hoje, na conceituação positiva da isonomia (iguais oportunidades para todos, a serem propici-adas pelo Estado), realça-se o conceito realista, que pugna pela igualdade proporcional, a qual significa, em síntese, tratamento igual aos substan-cialmente iguais. A aparente quebra do princípio da isonomia, dentro e fora do processo, obedece exatamente ao princípio da igualdade real eproporcional, que impõe tratamento desigual aos desiguais, justamente para que, supridas as diferenças, atinja-se a igualdade substancial”.

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lações de trabalho que se pretende cons-truir no Brasil8. Em outros termos, nãoé algo específico para as MPE.

3. O sistema de representaçãosindical

As mudanças no sistema de organi-zação sindical serão significativas,combinando elementos de liberdadesindical com critérios de representati-vidade bastante objetivos previstos emlei. Além disso, as centrais sindicais eas confederações empresariais terãomaior centralidade na nova estruturade representação de interesses. Osprincipais pontos polêmicos que deve-rão nortear os debates no CongressoNacional no tema da representaçãosindical são: a) o fim do princípio daunicidade versus pluralidade sindical;b) o papel atribuído às centrais sindi-cais e às confederações patronais; c) aorganização dos trabalhadores no lo-cal de trabalho; d) o fim das contribui-ções compulsórias; e) o número de di-rigentes sindicais com estabilidade; f)o papel do Ministério do Trabalho nonovo desenho, especialmente nos con-flitos de representação.

Em síntese e de forma simplificada,no debate nacional há três posições emrelação ao redesenho da organizaçãosindical: 1) os que defendem a manu-tenção do atual sistema confederativo,com o principio da unicidade sindicale as contribuições compulsórias, masque reconhecem um papel sindical àsCentrais existentes no país; 2) os quelutam pela liberdade e autonomia sin-dical plena, baseada nas convenções daOrganização Internacional do trabalho(OIT); e 3) o sistema gestado no FNT,que, ao mesmo tempo, introduz ele-mentos de liberdade sindical e preser-va o direito “adquirido” das atuais enti-dades de classe, desde que preencham

alguns critérios de representatividade.Cada uma das três posições acima

apresenta variações, que não serãoaprofundadas no presente texto, poisserá privilegiada a discussão em tornoda proposta construída no Fórum.

3.1. A representação dos trabalha-dores no local de trabalho

O atual sistema de relações de tra-balho prevê duas formas de represen-tação dos trabalhadores no interior dasempresas: 1) a Comissão Interna dePrevenção de Acidentes (CIPA), com-posta de forma paritária, sendo que osrepresentantes dos trabalhadores sãoeleitos e os da empresa são indicadospor ela; e 2) o representante sindical,nas empresas com mais de 200 empre-gados – preceito constitucional quenão tem regulamentação em lei ordi-nária e, portanto, de difícil efetivida-de. Além disso, há a previsão legal, deforma facultativa, da constituição decomissões de negociação de PLR (Par-ticipação nos Lucros e Resultados) ede conciliação de conflitos, desde queacordado entre as partes. Com exce-ção das CIPAs, que não têm uma fun-ção de representação de interesses, osdemais institutos são pouco expressi-vos na realidade nacional. Segundopesquisa sindical (IBGE, 2002), a re-presentação mais comum é a do dele-gado sindical, existente, em pratica-mente, metade das entidades sindicaisbrasileiras, que tem característicasmuito distintas em cada categoria.

A organização sindical nos locaisde trabalho é uma experiência bastan-te comum nos países avançados, onde,inclusive, é objeto de extensa regula-mentação legal. Por exemplo, no cam-po do trabalho, uma das principais re-gulamentações construídas no âmbitoda União Européia é a previsão legaldo direito de os trabalhadores pode-rem organizar Comitês de Empresas

nas companhias instaladas em mais deum país do bloco. Inclusive, nestemomento histórico de tentativa de re-visão da regulamentação do trabalhoconstruída ao longo da história do sé-culo XX, o direito de organização dostrabalhadores no local de trabalho nãoestá no centro do debate, nem sofren-do contestação dos governos e/ou en-tidades de classe. Em outros termos,nem os críticos da excessiva rigidez daregulação do trabalho têm privilegia-do a contestação da experiência deorganização dos trabalhadores no lo-cal de trabalho.

No caso brasileiro, há, especialmen-te, por parte das entidades de repre-sentação patronal, uma grande resis-tência a qualquer garantia legal dodireito de representação dos trabalha-dores no local de trabalho. Assim, noFNT, o tema foi um dos mais contro-vertidos, não havendo, apesar das inú-meras discussões, possibilidade deacordo entre as bancadas. As entida-des patronais sugeriram remeter essaquestão para a negociação coletiva, oque não foi aceito pela bancada dostrabalhadores.

Como não houve consenso, o go-verno está apresentando uma propos-ta que institui legalmente a represen-tação dos empregados nos locais detrabalho para as empresas com maisde 30 empregados – a ser implantadoprogressivamente em 6 anos –, confe-rindo-lhe poder de negociação e desolução dos conflitos, e garantindo aestabilidade de dirigentes proporcionalao tamanho da empresa. A propostarecebeu apoio das entidades de traba-lhadores com algumas ressalvas, espe-cialmente em relação à não garantiade representação dos trabalhadores emempresas com menos de 30 emprega-dos e às brechas abertas para, na prá-tica, a representação assumir funçõesdo sindicato.

8 Ao dispor que o contratado coletivamente se sobrepõe ao legislado, a proposta impõe interesses privados localizados sobre interesses públicos.Isto porque ao regrar um contrato com direitos reduzidos, não só a remuneração será menor, como também as contribuições legais o serão. Daí,recursos deixam de ser recolhidos aos cofres públicos.

José Dari Krein

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A principal objeção das entidadespatronais à representação dos trabalha-dores no local de trabalho está relaci-onada com o objetivo de preservaruma maior autonomia na determina-ção das condições de contratação, deuso e de remuneração do trabalho.Segundo o presidente da ConfederaçãoNacional da Industria (CNI), os empre-gadores não aceitam introduzir um fa-tor de conflito no interior da empresa,por isso rejeitam a proposta. Além dis-so, questionam a possível estabilidadede ‘empregados-dirigentes’ no local detrabalho. Na verdade, dada a tradiçãoda relação de emprego existente noBrasil, grande parte dos empregadoresbrasileiros tem dificuldade de adotaruma postura de maior negociação nointerior do local de trabalho, tanto as-sim que as experiências mais bem su-cedidas estão localizadas nas filiais deempresas estrangeiras.

Para as entidades trabalhistas, a re-presentação no local de trabalho, alémde favorecer a possibilidade de esta-belecer regras e benefícios específicosno âmbito da empresa, tem grandeimportância em dar legitimidade à es-trutura sindical, pois, na avaliação cor-rente, o sindicalismo, sem Organiza-ção sindical no Local de Trabalho(OLT), fica pendurado na brocha. Naopinião de muitos dirigentes sindicais,não haverá democratização nas rela-ções de trabalho no Brasil sem a ga-rantia do direito à organização dos tra-balhadores no local de trabalho.Portanto, é considerada como um dospontos prioritários da reforma sindical.E, ainda segundo alguns dirigentes, arepresentação poderá ser uma formade resolver os conflitos da relação deemprego no próprio local de trabalho.

A garantia legal da representaçãodos trabalhadores no local de trabalho,como afirmado acima, não está sendoadmitida pela bancada patronal, ape-sar do anteprojeto de lei explicitar queo seu objetivo é promover o entendi-mento com o empregador, enfatizan-do a integração e o diálogo, e dando

poderes não só para mediar dissídiosindividuais, como para conduzir a ne-gociação coletiva, caso o sindicato seomita. Assim, abre espaço para, de umlado, legitimar a experiência das co-missões de conciliação prévia e, deoutro, criar quase um sindicato deempresa. Alguns destes aspectos sãoquestionados por setores da bancadados trabalhadores.

Por último, é importante realçar queo anteprojeto faz uma diferenciaçãoexplícita por tamanho de empresa, ex-cluindo da norma legal aquelas commenos de 30 empregados, e estabele-cendo uma limitação no número de di-rigentes proporcional à quantidade detrabalhadores no local de trabalho. Por-tanto, esse é um dos poucos aspectosna reforma sindical em que há uma di-ferenciação explícita de regras por ta-manho de empresa, com a exclusão darepresentação dos trabalhadores naque-las com menos de 30 empregados.

3.2. O número de dirigentes sindi-cais com estabilidade

Na mesma perspectiva da polêmi-ca anterior, há uma controvérsia emrelação ao número de dirigentes sindi-cais com estabilidade. Enquanto asentidades de empregadores demandama explicitação de um limite, as dos tra-balhadores concordam com a limita-ção, desde que haja o direito de orga-nização sindical no local de trabalho(OLT). Na visão da bancada dos traba-lhadores, a lógica é quanto mais diri-gentes com estabilidade na base (nolocal de trabalho), menor a necessida-de de lideranças no sindicato. Preva-leceu a limitação de até 81 dirigentescom estabilidade, admitindo-se a pos-sibilidade de ampliação desse númeromediante contrato coletivo de trabalho.As entidades de trabalhadores, especi-almente as grandes, são mais contun-dentes em não aceitar tal limitação,especialmente, com o não consensosobre o direito de OLT, dado o tama-nho de sua base de representação e aperspectiva de unificação dos atuais

sindicatos para a criação de grandesentidades.

Por outro lado, segundo previsão doanteprojeto, o pagamento do salário deeventuais dirigentes liberados para oexercício da atividade sindical é deresponsabilidade da entidade sindical,salvo acordo coletivo em sentido con-trário.

3.3. O princípio da unicidade xliberdade sindical

Em geral, as entidades oficiais, es-pecialmente as federações e confede-rações, tanto de empregadores comode trabalhadores, são defensoras damanutenção do princípio da unicida-de, isto é, a regulamentação em lei dapossibilidade de existência de umaúnica entidade sindical no âmbito decada categoria econômica ou profissi-onal. Os dois principais argumentos nasua defesa são: 1) o fim da unicidadepode significar uma grande pulveriza-ção das entidades sindicais, o que en-fraqueceria a representação de interes-ses existentes; e 2) a mudança, no atualcontexto, pode significar a desarticu-lação do atual sistema sindical, que,bem ou mal, tem defendido os interes-ses dos seus representados. Muitas dasatuais entidades poderiam desaparecerou seriam fracionadas, o que as invia-bilizaria; assim como abrir-se-ia espa-ço para as empresas criarem e fortale-cerem entidades sindicais que lhessejam dóceis. Advogam ainda que nãohá contradição entre unicidade e liber-dade e autonomia sindical. As entida-des patronais também mostram receiode aprovar o fim da unicidade, poistemem ocorrer um processo de pulve-rização da sua representação por meioda concorrência com outras entidades.Também argumentam que poderia ha-ver dificuldade de interlocução com asorganizações dos trabalhadores já queseria difícil identificar a real represen-tação de cada entidade.

Aqueles contrários à manutenção doprincipio da unicidade defendem a ado-ção do princípio da liberdade e auto-

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nomia sindical, baseados nas conven-ções da OIT, em que os trabalhadoressejam sujeitos de sua própria estruturade organização. Os argumentos utiliza-dos são os seguintes: 1) o atual sistemade unicidade já proporcionou uma gran-de pulverização de entidades sindicaisno Brasil (existem mais de 16 mil sindi-catos, segundo Pesquisa Sindical, IBGE,2002), viabilizando-se inúmeros sindi-catos puramente cartoriais, que sobre-vivem, não pela representatividade dadapela sua base, mas através de artifícioslegais; 2) os trabalhadores, baseados nasconvenções internacionais da OIT, de-vem ter absoluta liberdade e autonomiana definição do tipo, da abrangência eda função de sua entidade de represen-tação. Assim, haveria um processo deconstrução de entidades representativas,preocupadas com a legitimidade juntoà sua base (trabalhadores e empregado-res) e não por meio de medida legal.Não significa que defendem um Estadoausente na relação de trabalhos, mas deter uma função de garantir as condiçõespara que diminua a assimetria entrecapital e trabalho, através de uma le-gislação de sustento.

A reforma sindical está indicandouma saída híbrida, introduzindo a pos-sibilidade da concorrência entre enti-dades sindicais, mas preservando odireito adquirido das atuais, que po-dem, desde que tenham representati-vidade e adotem mecanismos estatu-tários democráticos – inclusive, naeleição sindical –, continuar manten-do a base de representação. Na avali-ação de parte significativa do movi-mento sindical de trabalhadores, areforma indica uma perspectiva deavanço rumo à liberdade e autonomiasindical.

3.4. Centralização de poder nascentrais sindicais e confederaçõesnacionais

A possibilidade de as centrais sin-dicais e confederações empresariaisexercerem prerrogativas sindicais, in-clusive, no campo da negociação co-

letiva e criarem, ou concederem, re-presentatividade derivada às organiza-ções sindicais de nível inferior traz, àtona, uma polêmica sobre o fortaleci-mento da chamada cúpula sindical emdetrimento dos sindicatos de base. Estaé uma crítica mais forte no interior domovimento sindical de trabalhadores.Atualmente, todo o poder está no sin-dicato de base, ficando as centrais so-mente com a função de articulaçãopolítica dos trabalhadores e de entida-des, sem exercer prerrogativas sindicaise nem estabelecer uma relação maisorgânica com as suas entidades filia-das.

Por um lado, os críticos da reformaapontam o risco de que um sistema sin-dical mais centralizado pode se tornarmais burocrático, inibindo a autono-mia e o dinamismo das entidades debase e de suas lutas. Inclusive, mani-festam um temor sobre o posiciona-mento das entidades nacionais nos te-mas em debate na sociedade brasileirae de sua relação com os governos deplantão. Nessa perspectiva, defendes-se uma maior autonomia às entidadesde base, especialmente, no campo danegociação coletiva. A crítica do for-talecimento da cúpula sindical temcomo alvo à tentativa de preservar aorientação política das tendências mi-noritárias por meio do controle da en-tidade que dirige. Há o receio de queas centrais possam enquadrar os sindi-catos filiados, tirando-lhes a autonomiapara definir as políticas que julgammais apropriadas e de acordo com oseu ideário ideológico e político.

Por outro lado, há os que indicamque o fortalecimento das centrais e dasconfederações daria a possibilidade decoesão, unidade e maior peso políticoao movimento sindical, algo que foifundamental no processo institucionaldo pós-guerra nos países avançados,quando se estabeleceu um sistema deproteção social do trabalho em gran-de parte dos países. Há, ainda, a argu-mentação sobre a importância de ascentrais adquirirem maior poder para

fazer frente ao movimento de centrali-zação e concentração de capital. Omaior poder às centrais e às confede-rações empresariais poderia significarum processo de contenção da extremapulverização do sindicalismo no Bra-sil, o que, teoricamente, proporciona-ria um maior poder de representaçãodos interesses das classes, pois a suaforça estaria na capacidade de agluti-nação da base.

Essa mesma corrente argumenta queo reconhecimento das centrais é umabandeira antiga do movimento dos tra-balhadores e relativiza a excessiva con-centração de poder. O poder das enti-dades nacionais (ou mais gerais) estádiretamente vinculado aos sindicatosde base, pois são estes que lhes pro-porcionam tanto os critérios para o seureconhecimento como as possibilida-des para expansão de sua organização.A força das entidades superiores depen-de do sindicato de base tanto para con-duzir negociações mais centralizadascomo para expandir a sua base de re-presentação por meio da criação deentidades em setores econômicos emque não têm presença. Portanto, o po-der da Central será proporcionado porseus sindicatos filiados, pois a filiaçãodos trabalhadores não será na instân-cia superior da estrutura sindical, masna base. Isto significa dizer que o po-der da chamada cúpula é limitado, poisele é proporcionado pelo sindicato debase. Além disso, o anteprojeto prevêque a decisão da negociação coletiva,em qualquer nível, é da assembléia debase, dos abrangidos pelo resultado doacordo coletivo.

Os defensores da proposta do Fó-rum também argumentam que as cen-trais e as confederações empresariais,por serem entidades nacionais, estãoem maior evidência, inclusive na mí-dia. As suas opções tendem a ser maisconhecidas e sujeitas a questionamen-tos públicos. Portanto, estão sujeitas aum debate público mais acirrado epolitizado, o que pode contribuir parauma maior transparência, já que as

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ações e opções de inúmeros sindica-tos não são do conhecimento públicoe nem dos seus representados.

O maior poder às centrais e confe-derações empresariais enfatiza a neces-sidade de estabelecer, talvez nos seuspróprios estatutos, a garantia do direi-to de expressão das forças minoritári-as (democracia interna) e a definiçãode critérios objetivos e transparentesde consulta às bases envolvidas nocaso de negociações gerais e da con-cessão da representatividade derivada9.Com exceção da negociação, que pre-vê a consulta às bases para assinaturade um contrato coletivo de trabalho,os outros aspectos não são regulamen-tados pela reforma sindical, dependen-do do estatuto de cada entidade.

3.5. Financiamento das entidadessindicais

As fontes de financiamento das en-tidades sindicais em vigor são as se-guintes: 1) a contribuição sindical obri-gatória, que corresponde a um dia deserviço dos trabalhadores ou um per-centual proporcional ao capital socialda empresa, que é distribuído da se-guinte maneira: 60% para o sindicatode base; 15% para a federação e 5%para confederação correspondente.Além disso, o 20% vai para o FAT, como objetivo de financiar o seguro desem-prego; 2) a contribuição assistencialtem a finalidade de proporcionar amanutenção dos serviços prestadospelo sindicato à categoria, cujo valoré definido durante o processo de ne-gociação da renovação do contratocoletivo de trabalho, em assembléia dosindicato de base. Na prática, ela seconstituiu a principal fonte de susten-tação das entidades sindicais de traba-lhadores e parte da de empregadores;3) a contribuição confederativa (artigo8º/CF/1988) tem seus valores fixados

em reunião de diretoria e referendadosem Assembléia da categoria e temcomo objetivo o custeio do sistemaconfederativo da representação sindi-cal respectiva, sendo independente dasoutras contribuições; 4) a mensalida-de associativa é cobrada dos filiados àentidade sindical. Em geral, as entida-des tendem a utilizar-se de três dasquatro fontes previstas, pois são exce-ção as que utilizam, ao mesmo tem-po, a contribuição assistencial e con-federativa.

A reforma sindical propõe a substi-tuição das três primeiras fontes de fi-nanciamento por uma contribuição denegociação coletiva, que será descon-tada de todos os abrangidos pela nego-ciação (empresas e trabalhadores), in-dependentemente do seu resultado. Ovalor será de, no máximo, 1% da rendalíquida do trabalhador e de até 0,8%do capital social da empresa no anoanterior. A grande novidade é que aprincipal fonte de financiamento estaráligada ao processo de negociação cole-tiva, abrindo dificuldade de sustentaçãopara as entidades cartoriais e sem re-presentatividade. A polêmica principalé a defesa, por uma série de entidadessindicais, das atuais formas de financi-amento. Mas, entre os participantes doFNT, o tema apresenta consenso. Tam-bém é importante frisar que a tendên-cia, com o limite estabelecido em lei, éinibir as cobranças abusivas que algu-mas entidades vêm praticado, especi-almente com a contribuição confede-rativa ou assistencial.

4 Negociação coletiva

A formulação acordada no FNT in-dica uma maior importância para anegociação coletiva na determinaçãodas normas e regras que regulam a re-

lação de emprego, já que ela poderáocorrer em todos os níveis, inclusive,no âmbito nacional. Também define arecusa da negociação como condutaanti-sindical. A obrigatoriedade da ne-gociação não significa, necessariamen-te, chegar a um acordo ou assinar umcontrato.

As principais divergências estão lo-calizadas nos seguintes aspectos: 1) arelação entre negociação e legislação,como já discutido no item 2 deste tex-to; 2) a previsão de que os instrumen-tos normativos de nível superior, quan-do existirem, “poderão indicar ascláusulas que não podem ser modifi-cadas em nível(eis) inferior(es), obser-vadas as peculiaridades de cada âmbi-to de representação e de empresas ouunidades produtivas”10; 3) a possibili-dade da substituição da entidade re-presentante de uma base por outra,quando esta recusar-se a negociar; epor fim, 4) a solução do impasse danegociação, no momento da renova-ção do contrato, destacando-se a ques-tão da ultratividade das cláusulas.

4.1. A relação entre os conteúdosda negociação quando existemcontratos em vários níveis

Segundo resolução do FNT, as ne-gociações mais gerais poderão indicarcláusulas que não serão alteradas emníveis inferiores, estabelecendo umcerto “enrijecimento” de algumas nor-mas gerais. Um enrijecimento tanto doponto de vista de não permitir o rebai-xamento do contrato mais geral como,também, de inviabilizar uma melhoranos conteúdos das negociações em ní-veis inferiores. Portanto, dificulta a efe-tivação do princípio da progressivida-de das normas, em que as instânciasnacionais estabelecem cláusulas maisgerais, que, de forma articulada, vãodesdobrando-se em outras no âmbito

9 As entidades de nível superior podem criar sindicatos em um determinado setor ou ramo de atividade, desde que estas excedam o seu próprioíndice de representatividade, ou seja, tenham “gordura” a perder. A forma de representatividade é a comprovada, em que a entidade sindicalprecisa englobar pelo menos 20% dos trabalhadores efetivos de sua base.

10 Relatório da Comissão de Sistematização do FNT, abril de 2004.

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regional ou local, considerando as es-pecificidades econômicas e a correla-ção de forças. No entanto, no artigoseguinte, o anteprojeto favorece a pos-sibilidade de o sindicato, vinculado aosetor abrangido pela negociação supe-rior, requerer a sua exclusão até omomento da celebração do contrato.

Nesse sentido, a divergência, espe-cialmente de parte do movimento sin-dical de trabalhadores, decorre do fatode não estar assegurado o princípio daprogressividade, trazendo o risco de selimitar a ampliação de direitos no ní-vel inferior da negociação, assim comoda imposição de regras inadequadaspara o conjunto do setor, sem, no en-tanto, valorizar as negociações coleti-vas. Há, por outro lado, segundo osdefensores da regra, a possibilidade dosindicato de base melhorar o contratomais geral, caso tenha força e mobili-zação, pois há a tendência dos contra-tos gerais estabelecerem regras míni-mas aplicáveis ao conjunto do setoreconômico.

4.2. Substituição de uma entidadeque se recusa a negociar

Como afirmado acima, a negocia-ção tornou-se obrigatória. A recusa ànegociação – não da proposta em lití-gio – por parte de uma entidade repre-sentativa pode significar a transferên-cia da titularidade para outra domesmo ramo ou setor econômico. Nes-ta hipótese, os “responsáveis diretos”estarão sujeitos a “multas e penas es-tabelecidas na lei”. Se a recusa for rei-terada, o sindicato pode perder suas“prerrogativas e atribuições” de perso-nalidade sindical.

Os riscos apontados pelos que di-vergem de tal artigo são dois. Em pri-meiro lugar, como definir a recusa de-liberada do exercício da negociaçãocoletiva? Por exemplo, estabelece-se apossibilidade de a empresa ou de umaentidade encaminhar, junto ao Conse-lho Nacional de Relações de trabalho(CNRT), um processo contra outra que,por princípio, não aceitou negociar

determinadas questões demandadas.Inclusive, pode-se utilizar como artifí-cio a concordância dos trabalhadoresna negociação, mas esta não avançadevido à postura do sindicato, que nãoaceita, por princípio, flexibilizar direi-tos existentes. Em outros termos, enti-dades que se contraponham a certasmedidas podem perder as prerrogati-vas sindicais e serem substituídas poroutras. Portanto, está estabelecida apossibilidade da concorrência entre asentidades sindicais, ficando o veredic-to, na lógica de funcionamento doCNRT, para o Ministério do Trabalho,que pode estar sujeito a pressões polí-ticas. Em segundo lugar, esta é umaquestão que só se aplica a entidadesde trabalhadores, pois é inimaginávelque outra empresa ou entidade patro-nal negocie em seu nome sem a suaautorização, pois jamais poderá assu-mir qualquer compromisso, especial-mente na questão financeira. Portan-to, essa é uma regra unilateral.

Os defensores da regra argumentamque sem a presente regra é difícil fa-zer com que a outra parte sente e via-bilize o processo de negociação cole-tiva. A inclusão da cláusula tem comoobjetivo fazer com que a outra parte,pelo menos, venha estabelecer algumanegociação, o que não ocorre, atual-mente, em muitas situações, pois asreivindicações encaminhadas, especi-almente pelas entidades de trabalha-dores às empresas, não são sequer,consideradas. Além disso, para asse-gurar a não caracterização da recusa,a entidade precisará formalizar todasas reuniões de negociações.

4.3. Conduta anti-sindicalA bancada dos empregadores que-

rem excluir os aspectos que regulam ascondutas anti-sindicais de sua parte,especialmente, os que garantem o exer-cício de greve; enquanto as entidadesde trabalhadores querem limitar e res-tringir os aspectos que os responsabili-zam por conduta anti-sindical, inclusi-ve, pelo estabelecimento de pesadas

multas. A instituição que julga a con-duta é a Justiça do Trabalho.

4.4. Solução do impasse da ne-gociação coletiva e ultratividadedas cláusulas

Na proposta acordada no FNT, háimportantes mudanças na forma comosão solucionados os conflitos coletivos,passando-se pelo incentivo à concilia-ção, mediação e arbitragem, sem a ga-rantia do princípio da ultratividade dascláusulas. Caso as partes não cheguema um acordo no término do contrato,que pode ser de três anos, haverá a suaprorrogação por 90 dias – período des-tinado às partes para completarem anegociação, viabilizando a assinaturade um novo contrato, que pode ter acolaboração de um conciliador ou me-diador ou, ainda, ser encaminhado parauma arbitragem pública ou privada,desde que essa iniciativa seja de comumacordo entre as partes. Nos consensossistematizados no FNT estava previsto,depois de percorrer, sem êxito, todasas fases anteriores, o encaminhamentodo dissídio para a Justiça do Trabalho,que atuaria como árbitro público. Mas,com a aprovação da Reforma do Judi-ciário (Emenda Constitucional 45), essapossibilidade foi inviabilizada, já que,na prática, foi abolido o instituto do Po-der Normativo, ficando a intervençãoda Justiça do Trabalho na dependênciado encontro das duas vontades: traba-lhadores e representação patronal. Por-tanto, caso não haja acordo para assi-natura de um novo contrato coletivo detrabalho, fica o impasse, pois a Justiçado Trabalho não tem o poder de nor-matizar compulsoriamente a relação deemprego e nem está garantido o princí-pio da ultratividade das cláusulas. Apro-vada a Reforma do Judiciário, a Justiçado Trabalho somente poderá intervir noconflito coletivo se provocada de co-mum acordo pelas partes e, ainda, nasgreves. Na reforma proposta apresenta-da pelo FNT, nas greves, não pode seposicionar sobre as reivindicações domovimento paredista.

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Em outros termos, a divergênciaentre os membros do FNT está locali-zada, principalmente, na adoção doprincípio da ultratividade. As divergên-cias em torno do tema são de duas or-dens: entre os atores sociais e entrediferentes correntes de pensamento nocampo do direito.

A bancada de empregadores alegaque a ultratividade desestimula a nego-ciação, pois haverá resistência em fa-zer qualquer concessão já que, dificil-mente, a cláusula poderá ser revogadaposteriormente. Em contraposição a talargumentação, advoga-se que o contra-to, em seu conjunto, sempre é fruto deuma negociação, em que cada parteavalia a pertinência das cláusulas acor-dadas, em cada momento. Portanto, arenegociação ou não está relacionadaa muitos fatores. Alega-se também quea vantagem da ultratividade é garantirque a negociação possa ocorrer de for-ma mais serena, sem ficar pressionadapelo vencimento do contrato, pois asregras só poderão ser alteradas depoisde uma nova negociação ter sido con-cluída. Trata-se de um mecanismo quepossibilita a equivalência mais efetivaentre as partes e proporciona certa se-gurança para que cada negociação co-letiva não recomece do zero.

Além disso, apesar de não ser umaposição hegemônica da jurisprudência,há juristas, como Délio Maranhão ePinho Pedreira, que entendem os be-nefícios incluídos no contrato coleti-vo como automaticamente incorpora-dos nos contratos individuais. “Todonovo direito, não importa a sua origem,incorpora-se aos contratos individuais.Torna-se cláusula. Contratualiza-se.Não se sujeita, portanto, a limites tem-porais. Além disso, mesmo um novocontrato coletivo não poderia “dimi-nuir” o anterior. Trata-se de direitoadquirido” (Viana, 2004).

Enfim, a ultratividade do instrumen-to normativo até que outro o revogueé uma questão que também suscitou

grandes polêmicas no FNT, especial-mente pela oposição da bancada pa-tronal que não admitiu a sua inclusãonos resultados dos trabalhos a seremenviados ao Congresso Nacional. Nes-sa condição, por um lado, pode ser ummecanismo de forte pressão sobre asentidades trabalhistas para efetuaremacordos rebaixados. Por outro, podesignificar a explicitação do conflitocom desdobramentos imprevisíveis.

O estabelecimento dessas regrasdependerá da força de cada entidadeno processo de negociação. Isto nãosignifica, necessariamente, que as re-gras serão maiores ou menores do queas atuais. Significa, simplesmente, queo resultado dependerá da negociaçãoem cada setor econômico. Em outrostermos, a negociação coletiva tende aadquirir maior importância na defini-ção das regras e normas que irão regu-lar a relação de emprego com a possi-bilidade de haver diferenciação porsetor econômico e região.

5. Mecanismo de solução dosconflitos

No tema das soluções de conflitos,a reforma indica aspectos contraditóri-os. Por um lado, legitima as experiên-cias extrajudiciais, tais como as Comis-sões de Conciliação Prévia, estimulandoformas de solução de conflitos a partirda dinâmica direta dos atores sociais.Por outro lado, amplia as possibilida-des de os sindicatos ajuizarem açõescoletivas, regulamentando o instituto dasubstituição processual para assegurar– aos sindicatos – legitimidade para, naJustiça do Trabalho, em nome dos tra-balhadores, ajuizarem reclamatórias de-fendendo os direitos destes, tanto cole-tivos como individuais (homogêneos oudifusos). Os pontos que apresentammaior controvérsia são: 1) a forma deregulamentação dos mecanismos extra-judiciais de solução dos conflitos; 2) a

regulamentação do direito de greve; e3) a abrangência da substituição pro-cessual.

5.1. Direito de greveO anteprojeto elaborado no âmbi-

to do FNT garante a greve como umdireito fundamental dos trabalhadores.Ao mesmo tempo, não prevê a legali-dade do lock out para os empregado-res. O anteprojeto repete, praticamen-te, a atual legislação de greve existenteno país, com pequenas novidades, quesão as seguintes:

a) a conceituação de greve am-pliou-se um pouco11, viabilizando agreve de terceirizados e de trabalha-dores não-empregados, tais como au-tônomos e estagiários. Estão ausentesas greves atípicas (operação padrão,tartaruga etc.);

b) a definição como prática anti-sindical da discriminação em razão doexercício do direito de greve, inclusi-ve, vedando a dispensa do trabalhador“durante a greve”, assim como a con-tratação “de mão de obra destinada àsubstituição de grevistas”;

c) a explicitação da garantia demanutenção de nível de atividade mí-nima em setores em que a paralisaçãopode causar danos irreparáveis, inclu-indo a possibilidade de contratação desubstitutos de grevistas, caso não hajaacerto entre as partes;

d) A Justiça do Trabalho, se acio-nada pelo Ministério Público, podejulgar a demanda que garanta os servi-ços mínimos nas atividades essenciaise a conduta anti-sindical praticada nagreve. Alem disso, tem previsto, tam-bém, uma possível aplicação de mul-ta a parte que praticar uma atitude anti-sindical ou desrespeitar a lei, mas nãoestá prevista se manifestar sobre a pau-ta de reivindicação.

Em síntese, dada a impossibilidadede consenso no Fórum, a opção foimanter a legislação atual com peque-nas modificações. Pois, por um lado,

11 Adotada como: “a suspensão coletiva e temporária, total ou parcial, da prestação de serviços”.

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os trabalhadores queriam o amplo di-reito de greve e continuam apresentan-do objeção sobre a forma de soluçãodo conflito da greve. Por outro lado, osempregadores insinuaram com a crimi-nalização de qualquer abordagem paraviabilização do exercício do direito degreve e continuam rejeitando a classifi-cação de atitudes anti-sindicais, espe-cialmente por ocasião da greve.

5.2. Os mecanismos extrajudiciaisde solução dos conflitos

Na experiência brasileira estão pre-vistas a Comissão de Conciliação Pré-via (CCP) e a Câmara de Arbitragemcomo alternativas extrajudiciais de so-lução dos conflitos individuais do tra-balho. O FNT legitima tais iniciativas,mas garante a necessidade do acom-panhamento por parte do sindicato, eassegura o princípio da não inibiçãodo acesso ao Judiciário. A Justiça doTrabalho, na visão do Fórum, continuasendo a última instância para resolveros litígios trabalhistas individuais. Nes-tes aspectos, não ocorreram grandesdivergências entre os atores sociais pre-sentes no FNT.

Na análise das experiências concre-tas, várias pesquisas12 indicam um des-virtuamento tanto das CCPs como dasCâmaras de Arbitragem, especialmen-te ao possibilitar a negociação de di-reitos líquidos e certos, ao dar quita-ção plena a contratos e ao restringir oacesso ao Judiciário trabalhista. Os ris-cos foram apontados por alguns estu-diosos que não foram abordados noanteprojeto de lei em discussão.

5.3. A substituição processualO instituto da substituição proces-

sual está previsto na Constituição Fe-deral de 1988 de forma ampla, a quallegitima os sindicatos, sem restrições,

à defesa dos direitos e interesses cole-tivos ou individuais da categoria, comoconsta do artigo 8º, III. O problema foia interpretação desse dispositivo e suadecorrente aplicação prática, circuns-tância que acabou por amesquinhar oinstituto que, de amplo, passou, na Jus-tiça do Trabalho (inclusive com Enun-ciado do TST, recentemente cancela-do), a ser objeto de muitas exigênciasque acabaram por limitar seu alcance.

No FNT, houve consenso no senti-do da importância da regulamentaçãodesse instituto para a Justiça do Traba-lho. Daí, a proposta legislativa de con-ferir, expressamente, na lei infraconsti-tucional, aos sindicatos a legitimidadedo ajuizamento da reclamatória, emnome próprio, defendendo direitos dosseus representados, os trabalhadores,quer sejam direitos coletivos da cate-goria, ou individuais, estes incluindo oshomogêneos e os difusos.

O último projeto de lei apresenta-do no seio do FNT, regulamentandopara a Justiça do Trabalho a previsãodo artigo 8º, III da Constituição Fede-ral, mantém a previsão de os sindica-tos, em nome de seus representados,fazerem uso de ações coletivas na Jus-tiça do Trabalho. Inspirando-se, con-tudo, nas disposições do Código deDefesa do Consumidor (CDC) em vi-gor, que prevê a utilização dos sindi-catos desse procedimento na defesados seguintes direitos: a) direitos difu-sos; b) direitos coletivos; c) direitosindividuais homogêneos; e. d) direitosindividuais puros, com afinidades porum ponto comum de fato ou de direi-to. Dessa forma, reduzem-se as recla-matórias, desafogam-se os Tribunais doTrabalho, agilizam-se os processos efortalecem-se as organizações sindi-cais. No entanto, apesar do consensoobtido no FNT quanto ao instituto, con-

forme consta da sistematização final,o anteprojeto apresenta alguns pontospolêmicos, com resistências tanto dealguns setores organizados dos traba-lhadores como dos empresários. Quan-to aos primeiros, pelo fato de conteralgumas regras que restringem a am-plitude do instituto tal como previstona Constituição Federal, como, porexemplo, o fato de limitar a ação dossindicatos à defesa apenas de seus as-sociados e, ainda, quanto a aspectosdirigidos à liquidação e à execução dassentenças. Aqui, há algumas regrasque, inspiradas no CDC, alteram subs-tancialmente a sistemática que vige noProcesso do Trabalho13, passando adisciplinar tanto a liquidação como aexecução da sentença como fases dis-tintas da fase de conhecimento e su-primindo o impulso processual de ofí-cio pelo juiz da causa, condicionandoeste à iniciativa da parte credora. As-sim, ainda que a previsão do institutoda substituição processual para a Jus-tiça do Trabalho conte com o apoioda representação dos trabalhadores,nos aspectos citados, há divergênciasque já têm sido formalizadas. Quantoà bancada dos empregadores, o pró-prio instituto é polêmico e sua adoçãoencontra resistências importantes soba justificativa de que ele pode alimen-tar uma “industria de reclamatórias tra-balhistas”. São, portanto, circunstânci-as que dificultam o êxito da iniciativa,tanto na gestação do consenso anteri-or ao encaminhamento à Câmaracomo nos debates e nas articulaçõesnesta.

6. Considerações finais

O presente texto para discussão ten-ta apontar os aspectos em que devem

12 Cf. Krein & Teixeira (2004).13 O processo do trabalho é unitário. No entanto, há três momentos num todo orgânico: a) a fase de conhecimento, em que o Judiciário soluciona

o litígio por meio de acordo homologado, ou pela sentença; b) a de liquidação da sentença, quando, não havendo mais recursos, a decisão vai ser“transformada em valores”, ou seja, serão quantificados os valores devidos ao credor; e, c) a execução da sentença, momento em que, iniciadopela citação para pagamento sob pena de penhora, é feito a entrega definitiva do quantum devido ao credor. No Processo do Trabalho cabe aojuiz da causa impulsionar de ofício, mediante despacho, tanto a liquidação como a execução.

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se concentrar as divergências no en-caminhamento da reforma sindical noCongresso nacional, por meio de umaPEC e, posteriormente, de um projeto-de-lei, prevendo a regulamentação dosistema de organização sindical, dasformas de financiamento das entidadesclassistas, do sistema de negociaçãocoletiva, das formas de solução dosconflitos e da estrutura e funcionamen-to do Conselho Nacional de Relaçõesde Trabalho. A reforma trabalhista,como afirmado na introdução, não seráencaminhada ao Congresso Nacionalnesse momento, pois tem uma dinâ-mica própria de discussão no FNT, que

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se encontra em um estágio ainda em-brionário.

As divergências são muitas e profun-das, pois, como foi destacado no de-correr do texto, partem de concepçõesmuito distintas sobre o sistema de rela-ções de trabalho a ser implantado noBrasil. Apesar do grande esforço e dasconcessões feitas pelos diversos atoressociais para se chegar a um consensona proposta a ser encaminhada ao Con-gresso Nacional, inúmeras polêmicasainda permanecem e devem se mani-festar na fase de tramitação do ProjetoLei e da PEC, e deverão permear o de-bate na sociedade brasileira.

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