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1706 • ATUALIZAÇÃO TERAPtUTlCA MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO pela UP-date software (maiores informações no site do Centro Cochrane do Brasil - www.centrocochranedobrasiLorg Outra fonte importante de .evidências é o Best Evidence, publicado pela editora do British Medical Iournaí- www.bmj.com O Medline é o maior banco de dados disponível, porém requer grande experiência na avaliação crítica das informações. Interações Medicamentosas e latrogenia por Drogas Álvaro Nagib Atallah Orsine Valente Duílio Ramos Sustovich , A medida que a medicina progride, descobrem-se drogas cada vez mais eficazes, que ao mesmo tempo, não aumentam o potencial de efeitos tóxicos. Desta maneira, se entendermos a medicina como "a arte de diminuir os riscos dos pacientes", o médico que não estiver ciente sobre a farmacodinâmica, as interações e possíveisefeitos colaterais das drogas poderá incorrer na possibilidade de estar aumentando os riscos de seu paciente a níveis, possivelmente, maiores do que aqueles inerentes à própria doença tratada. Para que seja avaliado o risco da terapêutica com relação ao da doença em si, é necessário que se tenham à disposição informações sobre as vias de administração, absorção, metabolização e excrcção dos medicamentos e ainda sobre as possíveis interaçõcs entre duas ou mais drogas prescritas. Isto se torna mais importante quando se verifica que os pacientes internados, podem estar recebendo mais de seis medicamentos simultaneamente; nos consultórios o número médio de drogas prescritas é de três. Neste capítulo não temos a pretensão de citar as inrerações medicamentosas de todas as drogas. Pretendemos apenas chamar a atenção para a existência destas possibilidades e orientar como obter as informações quando necessário. Além de estabelecermos alguns princípios gerais, daremos ênfase a aspectos farmacocinéticos e intcrações entre alguns dos medicamentos mais comumente utilizados na prática diária. As interações medicamentosas podem ocorrer tanto aumentando quanto diminuindo os efeitos desejados das drogas em questão. Estas interações portanto podem ser administradas pelo médico para aumentar efeitos benéficos ou prevenir interações com efeitos adversos das prescrições simultâneas. As inrerações podem ocorrer de diversas maneiras, podendo já se iniciar antes mesmo da administração. Como exemplos podem ser citadas as penicilinas que são inativadas pelo pH ácido das soluções glicosadas e as tetraciclinas, cuja absorção pode ser diminuída quando administradas VO, devido à sua propriedade de quelação de íons di e trivalentes. Alguns aminoglicosídeos também estio sujeitos a este tipo de interações. A interação pode ocorrer ainda: I. Na absorção digestiva. Ex.: antiácidos diminuem absorção de prednisona e digitálicos. 2. Por competição nos locais de fixação de proteínas. 3. Por competição no nível de receptores, podendo ocorrer potcncialização, antagonismo ou aumento da toxicidade. 4. Por aceleração ou inibiçãseda rnetabolização. Anticoagulantes orais Geralmente são utilizados por períodos longos, aumentando a probabilidade de associação inadvertida com drogas que podem aumentar seu efeito e causar hemorragias ou diminuir sua ação terapêutica, Os anticoagulamentes orais, que são ácidos, têm a sua absorção digestiva diminuída pelo uso dos antiácidos. Os barbitúricos aumentam sua metabolização hepática, reduzindo sua ação. Desta forma, as doses devem ser reavaliadas com a prescrição de barbitúrico. Os antiinflamatórios não hormonais aumentam seu .efeito, competindo e liberando-os e proteínas plasmáticas. Antibióticos por destruírem a flora intestinal e por conseqüência a absorção de vitamina K, potencializam os efeitos dos anticoagulantes orais. Os digitálicos podem diminuir os efeitos dos anticoagulantes orais, ao passo que a quinidina pode potencializar sua ação. Os corticosteróide, o ACTH e os anticoncepcionais orais têm ação inibitória dos anticoagulantes orais, requerendo reajustes das dosagens na presença destas drogas. Os anticoagulantes orais e as sulfamidas antidiabéticas se potencializam mutuamente requerendo doses menores de ambos quando associados. Antiinflamatórios não hormonais têm também sua absorção digestiva diminuída pelos antiácidos. A aspirina aumenta o risco de sangramento em pacientes em uso de anticoagulantes orais. A cimetidina também aumenta a ação destas drogas. Álcool Alguns medicamentos inibem a oxidação de um metabolito do álcool, o acetaldeído, provocando efeito "antabusc" (náuseas, vômitos, cefaléia, etc.). São eles: metronidazol, sulfas antidiabéticas, principalmente a clorproparnida, a furazolidina e o cloranfenicol. O uso prolongado do álcool, por indução enzimática, acelera o metabolismo e reduz o efeito terapêutico das sulfas antidiabéticas, dos anticoaguIantes orais, da diferul-hidantoína e da isoniazida. O uso ocasional pode potcncializar o efeito depressivo sobre o sistema nervoso central dos benzodiazepínicos e barbitúricos, podendo ocasionar coma e parada respiratória. A aspirina aumenta o poder tóxico do álcool sobre a mucosa gástrica. Antibióticos As tetraciclinas têm a sua absorção digestiva diminuída pela ação do sulfato ferroso (quelação) e dos antiácidos. A neomicina diminui a absorção digestiva da digitoxina. As penicilinas têm sua absorção digestiva diminuída pela rnetoclopramida, pela neomicina e pelos antiácidos. Os aminoglicosídeos têm seu efeito ototóxico potencializado pelo ácido etacrínico. Os diuréticos e as cefalosporinas aumentam o efeito nefrotóxico dos aminoglicosídeos. Penicilinas inibem o efeito anticoagulante da heparina, sendo necessário aumentar a dose de heparina quando do uso concomitante com a penicilina e diminuição da heparina quando da retirada da penicilina. A rifampicina utilizada por longos períodos aumenta o metabolismo dos digitálicos e diminui o efeito dos anticoagulantes orais. Os aminoglicosídeos, a polimixina e cZl1istinapotencializam os curarizantes, podendo causar parada respiratória, complicação que pode ser controlada com uso de cálcio intravenoso e anticolinesterásicos. Quanto à penicilina, ainda é importante enfatizar os riscos de hiperpotassemia e morte, quando do uso de altas doses de

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1706 • ATUALIZAÇÃO TERAPtUTlCA • MANUAL PRÁTICO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO •

pela UP-date software (maiores informações no site do CentroCochrane do Brasil - www.centrocochranedobrasiLorg

Outra fonte importante de .evidências é o Best Evidence,publicado pela editora do British Medical Iournaí- www.bmj.com

O Medline é o maior banco de dados disponível, porémrequer grande experiência na avaliação crítica das informações.

Interações Medicamentosas elatrogenia por Drogas

Álvaro Nagib AtallahOrsine ValenteDuílio Ramos Sustovich,A medida que a medicina progride, descobrem-se drogas cada

vez mais eficazes, que ao mesmo tempo, não aumentam opotencial de efeitos tóxicos. Desta maneira, se entendermos amedicina como "a arte de diminuir os riscos dos pacientes", o médicoque não estiver ciente sobre a farmacodinâmica, as interações epossíveisefeitos colaterais das drogas poderá incorrer na possibilidadede estar aumentando os riscos de seu paciente a níveis, possivelmente,maiores do que aqueles inerentes à própria doença tratada.

Para que seja avaliado o risco da terapêutica com relação aoda doença em si, é necessário que se tenham à disposiçãoinformações sobre as vias de administração, absorção, metabolizaçãoe excrcção dos medicamentos e ainda sobre as possíveis interaçõcsentre duas ou mais drogas prescritas. Isto se torna mais importantequando se verifica que os pacientes internados, podem estarrecebendo mais de seis medicamentos simultaneamente; nosconsultórios o número médio de drogas prescritas é de três.

Neste capítulo não temos a pretensão de citar as inreraçõesmedicamentosas de todas as drogas. Pretendemos apenas chamar aatenção para a existência destas possibilidades e orientar como obteras informações quando necessário. Além de estabelecermos algunsprincípios gerais, daremos ênfase a aspectos farmacocinéticos eintcrações entre alguns dos medicamentos mais comumenteutilizados na prática diária.

As interações medicamentosas podem ocorrer tantoaumentando quanto diminuindo os efeitos desejados das drogasem questão. Estas interações portanto podem ser administradaspelo médico para aumentar efeitos benéficos ou prevenir interaçõescom efeitos adversos das prescrições simultâneas.

As inrerações podem ocorrer de diversas maneiras, podendojá se iniciar antes mesmo da administração. Como exemplos podemser citadas as penicilinas que são inativadas pelo pH ácido dassoluções glicosadas e as tetraciclinas, cuja absorção pode serdiminuída quando administradas VO, devido à sua propriedade dequelação de íons di e trivalentes. Alguns aminoglicosídeos tambémestio sujeitos a este tipo de interações.

A interação pode ocorrer ainda:I. Na absorção digestiva. Ex.: antiácidos diminuem absorção

de prednisona e digitálicos.2. Por competição nos locais de fixação de proteínas.3. Por competição no nível de receptores, podendo ocorrer

potcncialização, antagonismo ou aumento da toxicidade.4. Por aceleração ou inibiçãseda rnetabolização.

Anticoagulantes orais

Geralmente são utilizados por períodos longos, aumentandoa probabilidade de associação inadvertida com drogas que podem

aumentar seu efeito e causar hemorragias ou diminuir sua açãoterapêutica,

Os anticoagulamentes orais, que são ácidos, têm a suaabsorção digestiva diminuída pelo uso dos antiácidos. Osbarbitúricos aumentam sua metabolização hepática, reduzindo suaação. Desta forma, as doses devem ser reavaliadas com a prescriçãode barbitúrico. Os antiinflamatórios não hormonais aumentam seu.efeito, competindo e liberando-os e proteínas plasmáticas.

Antibióticos por destruírem a flora intestinal e porconseqüência a absorção de vitamina K, potencializam os efeitosdos anticoagulantes orais.

Os digitálicos podem diminuir os efeitos dos anticoagulantesorais, ao passo que a quinidina pode potencializar sua ação. Oscorticosteróide, o ACTH e os anticoncepcionais orais têm açãoinibitória dos anticoagulantes orais, requerendo reajustes dasdosagens na presença destas drogas.

Os anticoagulantes orais e as sulfamidas antidiabéticas sepotencializam mutuamente requerendo doses menores de ambosquando associados.

Antiinflamatórios não hormonais têm também sua absorçãodigestiva diminuída pelos antiácidos. A aspirina aumenta o risco desangramento em pacientes em uso de anticoagulantes orais. Acimetidina também aumenta a ação destas drogas.

Álcool

Alguns medicamentos inibem a oxidação de um metabolitodo álcool, o acetaldeído, provocando efeito "antabusc" (náuseas,vômitos, cefaléia, etc.). São eles: metronidazol, sulfas antidiabéticas,principalmente a clorproparnida, a furazolidina e o cloranfenicol.

O uso prolongado do álcool, por indução enzimática,acelera o metabolismo e reduz o efeito terapêutico das sulfasantidiabéticas, dos anticoaguIantes orais, da diferul-hidantoína eda isoniazida.

O uso ocasional pode potcncializar o efeito depressivo sobreo sistema nervoso central dos benzodiazepínicos e barbitúricos,podendo ocasionar coma e parada respiratória.

A aspirina aumenta o poder tóxico do álcool sobre a mucosagástrica.

Antibióticos

As tetraciclinas têm a sua absorção digestiva diminuída pelaação do sulfato ferroso (quelação) e dos antiácidos. A neomicinadiminui a absorção digestiva da digitoxina. As penicilinas têm suaabsorção digestiva diminuída pela rnetoclopramida, pela neomicinae pelos antiácidos. Os aminoglicosídeos têm seu efeito ototóxicopotencializado pelo ácido etacrínico. Os diuréticos e as cefalosporinasaumentam o efeito nefrotóxico dos aminoglicosídeos.

Penicilinas inibem o efeito anticoagulante da heparina, sendonecessário aumentar a dose de heparina quando do usoconcomitante com a penicilina e diminuição da heparina quandoda retirada da penicilina.

A rifampicina utilizada por longos períodos aumenta ometabolismo dos digitálicos e diminui o efeito dos anticoagulantesorais.

Os aminoglicosídeos, a polimixina e cZl1istinapotencializamos curarizantes, podendo causar parada respiratória, complicaçãoque pode ser controlada com uso de cálcio intravenoso eanticolinesterásicos.

Quanto à penicilina, ainda é importante enfatizar os riscosde hiperpotassemia e morte, quando do uso de altas doses de

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penicilina cristalina potássica. Esse produto contém 1j7<inEq depotássio por milhão de unidades. De forma que. tanto, aadministração rápida intravenosa de pequenas quantidades quantoa administração lenta de grandes quantidades podem 'acarretarhipercalemia e parada cardíaca. "

As penicilinas e ,cefalosporinas são inativadas em soluçõesglicosadas.

A anfotericina B deve de preferência ser injetada isoladamenteem solução glicosada. Precipita-se com anti-histamínicos, turva-secom gentarnicina, inativa-se com penicilina G, com soro fisiológicoe água.

Existem tabelas que orientam quando às compatibilidadesdas misturas de antibióticos em soluções com outras drogas.

Drogas hipotensoras

Inúmeras são as interações entre as drogas utilizadas notratamento da hipertensão arterial e outras drogas. Gostaríamosde ressaltar as seguintes:

1. Os ~-bloqueadores, particularmente o propranolol,diminuem a secreção de insulina pela célula ~ do pâncreas.Não raramente estão associados a diuréticos, que têmefeito semelhante, de tal maneira que podem desencadearo diabetes tipo II e precipitar o coma hiperosmolar oudiabetes. Por bloquearem as respostas adrenérgicas nashipoglicemias mascaram seus sintomas.

Os ~-bloqueadores potencializam ainda os anestésicos geraise os depressores do sistema nervoso central. Têm o efeitobraquicardizante potencializado pelos digitálicos.

2. O captopril, inibidor, da enzima conversora daangiotensina I (ECA), diminui os níveis plasmáticos dealdosterona e portanto pode aumentar o potássioplasmático. O risco é muito maior, se for associado comdiuréticos retentores de potássio como o triantereno, aamilorida ou a espironolactona. Os inibidores da sãofomalmente contraindicados na gestação.

Amiodarona

É antiarrítmico muito usado na prática clínica que interagecom muitas outras drogas aumentando suas concentraçõesplasmáticas. Os mais importantes são digoxina, fenantoína,procainamida, quinidina e a warfarina. O exato mecanismoresponsável por esta interação é desconhecido.

Em pacientes que fazem uso de digoxina e iniciamterapêutica com amiodarona, a dose de digoxina terá que serdiminuída e monitorizada até que se alcance a dose de manutençãode amiodarona. Isto ocorre provavelmente por diminuição dadepuração renal e não renal da digoxina na presença deamiodarona.

O efeito anticoagulante da warfarina é potencializado quandoo paciente faz uso de amiodarona. Fortes evidências mostram queisto ocorre por bloqueio direto dos fatores de coagulaçãodependentes de vitamina K

Sulfaniluréias

São medicamentos muito usados para controlar as alteraçõesglicêmicas em pacientes portadores de diabetes do tipo lI,fundamentalmente aumentando a liberação de insulina pelopâncreas. Uma das mais usadas é a clorpropamida, que temduração de ação muito prolongada podendo causar graves

hipoglicemias principalmente. em pacientes idosos ou comdisfunção renal. '

Existem muitas drogas que ..podem· interagir com assulfaniluréias aumentando o seu efeito hipoglicerniante pelosseguintes mecanismos: •• ' '. ,

1. Drogas que deslocam os hipoglicerniantes da proteínaligadora: clofibrato, fenibutazona, salicilatos e sulfonamidas.

2. Drogas que reduzem o metabolismo hepático dassulfaniluréias: dicumarínicos, cloranfenicol, fenibutazona,inibidores da MAO e sulfafenazol.

3. Drogas que diminuem a excreção renal das sulfaniluréiasou seus metabólitos: halopurinol, probenecida,fenilbutazona, sacililatos e sulfonamidas.

4. Drogas que têm atividade hipoglicêrnicanre: insulina,álcool, antagonistas ~-adrenérgicos, salicilatos, ini bidorcsda MAO, guanetidina.

Cimetidina

Interage com muitos medicamentos. Entre eles, diminui ometabolismo hepático e aumenta a vida média da aminofilina e dosantideprcssivos tricíclicos. Interage também com os anticoagulantcsorais diminuindo seu metabolismo com potencialização efeitoanticoagulante.

Anticoncepcionais

Têm seus efeitos reduzidos por ampicilina, barbitúrios,srifampicina e tetraciclina. Drogas estas que por indução enzimáticaaumentam o metabolismo dos estrógenos, reduzindo a eficácia dosanticoncepcionais orais, com risco de gravidez não planejada.

Considerações finais

Há diversas maneiras práticas de se obter informações sobreo uso seguro de drogas. M. Neuman em seu "Guia das InteraçõesMedicamentosas" apresenta o disco farmacêutico que mostra demaneira simples as possíveis interações em diversas drogas.Programas de computadores já disponíveis, como o PDR.,Physicians Desk Reference mostram a farmacodinâmica, os efeitoscolaterais e as possíveis interações entre as drogas, e, no nossoentender, devem entrar em uso rotineiros nos consultórios e nasenfermarias. Consideramos também altamente recomendável o usodo livro AMA Drug Evaluation, editado pela American MedicalAssociation - Chicago - IL, USA.

Dependência de Drogas:Intoxicação Aguda, Síndrome deAbstinência e Conduta

José Carlos F. GaldurózE. A. de Araújo Carlini

O Homem, considerado em sua totalidade, é ser biopsicossocial.Talvez em nenhum outro campo da medicina estes três fatores

interajam tão fortemente como no campo da dependência dedrogas, somando-se aqui quarta vertente - a droga em si - e todasas suas peculiaridades farmacológicas.

A avaliação clínica deve constar de anamnesc detalhada dosantecedentes pessoais, familiares e sociais, história do consumo desubstâncias psicoarivas, exame físico completo (incluindo