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Pós-Graduação em Direito Tributário
Disciplina: Contabilidade Tributária e Planejamento Tributário
LEITURA COMPLEMENTAR – AULA 5
LEITURA OBRIGATÓRIA – AULA 1
NARLON GUTIERRE NOGUEIRA
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PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NA VISÃO DO CONSELHO DE CONTRIBUINTES
DO MINISTÉRIO DA FAZENDA BRASILEIRO A PARTIR DE 2005
TATIANA MARQUES ESTEVES
1 INTRODUÇÃO
Com o presente trabalho pretende-se verificar quais são os requisitos consi-
derados indispensáveis, pelos julgadores do Conselho de Contribuintes do Ministério
da Fazenda do Brasil, para que um determinado planejamento tributário seja consi-
derado lícito, nas hipóteses em que não haja fraude ou simulação absoluta.
Coloca-se como problema de pesquisa ser ou não suficiente a licitude dos
atos jurídicos que envolvem operações de planejamento tributário e, de outro lado, a
necessidade de um propósito negocial que as justifique, que não a economia tributá-
ria em si.
A motivação da pesquisa decorre da edição do livro Planejamento Tributário,
publicado em agosto de 2004, de autoria do Professor Marco Aurélio Greco. A partir
desta obra foi introduzida na doutrina uma nova forma de pensar o planejamento
tributário no Brasil, traduzida pela expressão Liberdade com Capacidade Contributi-
va e calcada no princípio da solidariedade social. Esta teoria conclui pela necessida-
de de haver um propósito negocial e/ou econômico que justifique determinado ato
jurídico ou operação que não seja, pura e simplesmente, a redução da carga tributá-
ria através de um ato não fraudulento. Trata-se, reitere-se, de uma releitura do prin-
cípio da capacidade contributiva, à luz do princípio da solidariedade social.
A referida teoria se contrapõe ao pensamento até então existente, de que,
não havendo patologias ou vícios que pudessem comprometer o ato jurídico, como a
fraude e a simulação, o planejamento tributário seria considerado lícito. Assim, bus-
ca-se investigar a recepção, pelo Conselho de Contribuintes, dessa nova forma de
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interpretar o planejamento tributário. Não serão abordadas eventuais decisões judi-
ciais, tanto pela escassez de apreciação desses casos no Poder Judiciário quanto
pela necessidade de delimitar o objeto da pesquisa.
O método de abordagem utilizado foi o indutivo, tendo como ponto de partida
a análise das decisões proferidas pelo Conselho de Contribuintes sobre o tema entre
janeiro de 2005 e agosto de 2007. O referido lapso temporal decorre do fato de (i) o
livro do Professor Marco Aurélio ter sido publicado em agosto de 2004; e (ii) a pre-
sente pesquisa ter se iniciado em agosto de 2007.
No levantamento das decisões, foram utilizadas as seguintes palavras-chave:
planejamento tributário, abuso de forma, propósito negocial, propósito econômico,
elisão fiscal e artificialismo. A partir dessas palavras, foram encontradas cento e seis
decisões e selecionadas inicialmente vinte e seis. Constatou-se que oitenta decisões
não tratavam do tema e, por isso, foram desprezadas.
Como o objeto do presente trabalho é a análise de situações em que não haja
ocorrido fraude, simulação absoluta, prática de crimes ou evasão fiscal de um modo
geral, mas sim a análise de negócios jurídicos lícitos, das vinte e seis decisões res-
tantes, quatro não foram utilizadas, posto que em um dos casos ocorreu simulação
e, portanto, evasão fiscal; no outro, não se considerou ter havido planejamento tribu-
tário, pois o ato estava previsto na legislação; e as outras duas decisões foram pro-
feridas antes de 2005, portanto, fora do lapso temporal proposto.
Para apresentar a pesquisa tratar-se-á das teorias acerca do planejamento
tributário e, especificamente, da teoria do Professor Marco Aurélio Greco. Apresen-
tados os pontos teóricos, tratar-se-á das normas antielisivas existentes no ordena-
mento jurídico brasileiro. A partir daí, apresentar-se-á a análise das decisões do
Conselho de Contribuintes a fim de averiguar em quais teorias do período analisado
elas se encaixam.
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Finalmente, faz-se importante ressaltar que o tema é de extrema relevância
no meio empresarial, tendo em vista o interesse crescente dos administradores em
operações que propiciem ganhos tributários, sobretudo em face da necessidade de
redução de custos e aumento da competitividade e, por óbvio, da alta carga tributá-
ria brasileira.
2 AS TEORIAS ACERCA DO TEMA “PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO”
Segundo Harry Balter (BALTER, 1940 apud SIMÕES, 1995, prefácio),
os tributos e a elisão são provavelmente irmãos gêmeos,
e certamente continuarão a coexistir até o tempo em que
haja um mundo sem tributos. Os procedimentos elisivos
são como uma grande hidra frente a um grupo de tribu-
tos... se descoberta e eliminada determinada válvula de
escape, imediatamente o contribuinte identifica outra.
(tradução nossa)i
Ainda sobre o tema, Mary Elbe Queiroz (2005, p. 87) esclarece que
O planejamento empresarial é prática ou comportamento
adotado para a boa gestão dos negócios, no sentido de auto-
organização administrativo-financeira da empresa para a ob-
tenção da maximização de resultados (lucros). Com o fim de
atingir esse objetivo é necessária a adoção de medidas que re-
sultem em redução de custos de mão-de-obra, administrativos,
financeiros, etc. Entre essas medidas coloca-se a necessidade
de ser reduzido, também, o custo tributário como forma de se
conseguir um resultado mais favorável e evitar uma diminuição
do patrimônio da empresa em decorrência do ônus fiscal que
lhe é imposto, bem como adquirir vantagem competitiva no
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mercado. Exsurge, assim, a alternativa do planejamento tribu-
tário.
De acordo com Marcial Ferreira Jardim, em sua obra Dicionário Jurídico Tri-
butário, planejamento tributário é a “atividade consistente em minimizar a carga tri-
butária de pessoas físicas ou jurídicas, utilizando fórmulas lícitas”. Segundo o autor,
evasão fiscal é a modalidade ilícita de economia tributária e distingue-se da elisão
fiscal por ser esta, ao contrário, a economia lícita de tributos.
A fraude tratada nesta pesquisa é a cível, e não a criminal, uma vez que não
serão abordadas hipóteses de economia tributária ilícita. A fraude à lei, tratada na
obra do professor Marco Aurélio, é toda conduta que visa a burlar a norma jurídica
mediante a utilização de meios ou instrumentos aparentemente lícitos, sempre com
o objetivo de lesar interesses de terceiros.
As teorias a respeito do tema “planejamento tributário” vêm evoluindo histori-
camente, passando de um cenário em que a liberdade individual e o direito constitu-
cional à auto-organização prevaleciam em relação aos demais princípios, para um
panorama em que não basta nem mesmo a plena licitude dos atos jurídicos para
que um negócio ou uma determinada operação, realizados com economia tributária,
sejam oponíveis ao fisco, devendo haver também um motivo, uma finalidade negoci-
al que não seja a redução da carga tributária.
Como se verá adiante, a teoria defendida pelo Professor Marco Aurélio Greco
pretende demonstrar que não apenas a simulação contamina um negócio jurídico,
mas também outras patologias que viciam o ato jurídico praticado com o fim exclusi-
vo de proporcionar a economia fiscal e que o direito à auto-organização não é abso-
luto. Faz-se necessário uma justificativa econômica para os negócios jurídicos, co-
mumente chamado de propósito negocial ou econômico, do inglês, business purpo-
se.
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Para Ricardo Mariz de Oliveiraii, assim como para grande parte da doutrina e
da jurisprudência tributária brasileira, baseadas no Código Tributário Nacional e nos
princípios da legalidade e tipicidade - dos quais se depreende que a obrigação de
pagar tributo surge apenas após a ocorrência do fato gerador - os únicos requisitos
necessários à caracterização da elisão fiscal são, em resumo, a anterioridade em
relação ao fato gerador, a plena licitude dos atos (negócios jurídicos) ou das omis-
sões e sua veracidade e realidade, ou seja, inexistência de simulação.
Assim, para esta corrente de doutrinadores, tudo é permitido, salvo a simula-
ção, que era vista nesta primeira fase como um mero vício de vontade, ou seja, ne-
gócio é o que as partes querem.
Também em seu pró-memórias de aulas sobre planejamento tributário, o pro-
fessor Ricardo Mariz de Oliveira se opõe à tese defendida pelo professor Marco Au-
rélio Greco, pois entende que seu supedâneo é a utilização dos princípios da isono-
mia, da capacidade contributiva, da função social da propriedade e da solidariedade
social contra o contribuinte e a favor do Estado. Para Mariz de Oliveira, os direitos
individuais não podem ser utilizados contra os contribuintes, e a isonomia só pode
ser aplicada entre diferentes contribuintes após a ocorrência do fato gerador, e não
antes dela. Este é entendimento do STF, exarado no julgamento da ADIN 712-2/DF.
Desta forma, seriam objetivos legítimos da elisão, em contraposição à eva-
são, evitar-se a ocorrência do fato gerador ou incorrer em fato gerador menos one-
roso, reduzir-se a base de cálculo de determinado tributo e/ou postergar a sua inci-
dência.
Porém, com o surgimento desta nova tendência, passa a ser importante a
análise do contexto histórico do negócio jurídico realizado, ou seja,
a inserção da operação no âmbito do empreendimento
do qual a pessoa jurídica é a vestimenta; vale dizer, sintonia da
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operação com o planejamento estratégico da empresa, ligado à
atividade econômica que desempenha. (GRECO, 2006b, v. 10,
p.332).
2.1 A teoria do Professor Marco Aurélio Greco – Liberdade com capacidade
contributiva e solidariedade social
Segundo o professor Marco Aurélio Greco, as operações que visam à redu-
ção da carga tributária não podem ser analisadas apenas à luz do texto frio da lei,
sob o risco de distanciar-se da realidade. Por outro lado, não existe um modelo pré-
concebido aplicável às mais diversas situações que deverão ser analisadas caso a
caso.
Segundo sua teoria, além da legalidade do negócio jurídico realizado (come-
ter ilícito, como visto, não é planejar) e de sua não contaminação por patologias, tais
como a simulação, o abuso de direito e a fraude à lei, deve haver também uma justi-
ficação para a operação que engloba a existência de motivo e finalidade que não a
de proporcionar uma economia tributária, a congruência da manifestação de vontade
em relação ao motivo e à finalidade e a função a que se destina a operação, que
constituem o propósito negocial.
Assim, os requisitos de legalidade ou licitude dos atos e de inexistência de pa-
tologias não são suficientes para que uma operação de planejamento tributário seja
oponível ao fisco. Na opinião deste autor, restam ainda dois crivos pelos quais deve
passar a operação para que o planejamento tributário almejado seja oponível ao
Fisco, isto é, seja por ele aceito ou não: “a justificação por existência de motivo, fina-
lidade e congruência; e justificação por inserção no planejamento estratégico do
respectivo empreendimento econômico”. (GRECO, 2006, p.332).
Esta teoria se fundamenta basicamente na existência de uma liberdade indi-
vidual - que engloba a liberdade empresarial - relativa e não absoluta, já que esta
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deve ser contextualizada em relação ao interesse público titularizado pela sociedade
civil afetado pela operação, que nada tem a ver, porém, com o interesse arrecadató-
rio, que é secundário. Assume-se, assim, que há uma liberdade individual limitada
pela função social de propriedade e pelos princípios da solidariedade social e da ca-
pacidade contributiva, bem como o predomínio do interesse público da sociedade
civil em relação ao interesse arrecadatório do fisco.
Através da pesquisa realizada, verifica-se que a nova corrente demonstra
preocupação com a qualidade, com o conteúdo dos atos e não somente com sua
estrutura, com a sua forma. Deve haver coerência entre a vontade manifestada, o
motivo em que se apoia e a finalidade a que se destinada determinada operação.
A presente análise será importante também para que se tenha a compreen-
são da interpretação desta teoria pelo fisco, pelos contribuintes e pelos julgadores,
na medida em que excessos de parte a parte, certamente, foram e serão cometidos
na interpretação e aplicação destas regras.
Em relação à coerência da operação com o planejamento estratégico da em-
presa (justificação externa), o professor Greco faz uma ressalva quanto à sua apli-
cação na atualidade, posto que entende que esta não se incorporou ainda ao cotidi-
ano das companhias brasileiras. No entanto, uma operação que passe por todos os
crivos aqui tratados e também por este, terá atendido a todos os requisitos que se
poderia impor para que tenha eficácia tributária, ou seja, para que seja oponível ao
fisco.
Vale ressaltar que, de um lado, o ônus da prova relativamente à eventual ile-
galidade, ilicitude ou à existência de patologias do negócio jurídico pertence ao fisco
e, de outro lado, caberá ao contribuinte comprovar a existência de fundamentos que
justifiquem a operação realizada (motivo, finalidade e congruência ou inserção da
operação no perfil do empreendimento), tais como a economia de escala, a sinergia
dos negócios, a unificação da carteira de clientes, dentre outras justificativas.
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Como se verá adiante, esta teoria está embasada numa interpretação harmô-
nica da Constituição Federal, do Novo Código Civil e do Código Tributário Nacional.
3 AS NORMAS ANTIELISIVAS E A INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO
TRIBUTÁRIA
As normas antielisivas não são algo novo no cenário internacional. Elas exis-
tem em praticamente todos os países da Europa e nos países da common law há
construções jurisprudenciais nesse sentido e até, em alguns deles, normas escritas
antielisivas como é o caso do Canadá e da Austrália. (ANAN Jr, 2006, p.157).
No Brasil, a primeira norma tributária antielisiva geral surgiu com a Lei Com-
plementar 104, de 10 de janeiro de 2001, que introduziu um parágrafo único ao arti-
go 116 do Código Tributário Nacional. Antes disso, já havia previsão para a descon-
sideração de negócios jurídicos indiretos e simulação em nosso ordenamento, tais
como o decreto-lei 1.598/77, em relação à distribuição disfarçada de lucros, a Lei
9.430/96 relativa às regras de preços de transferência e o próprio CTN, em seu arti-
go 149, inciso VII.iii
Para Ricardo Mariz de Oliveira, o artigo 116 do CTN, cujo parágrafo único foi
acrescentado pela Lei Complementar 104/01, não é uma norma antielisiva, mas uma
norma antievasão já que desconsidera negócios jurídicos realizados com a finalida-
de de dissimular a ocorrência de fato gerador ou a natureza dos elementos constitu-
tivos da obrigação tributária.
O artigo 116, parágrafo único do CTN assim dispõe:
Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se
ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
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I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que
se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que
produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que
esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicá-
vel.
Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá des-
considerar atos ou negócios jurídicos praticados com a fi-
nalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tri-
buto ou a natureza dos elementos constitutivos da obriga-
ção tributária, observados os procedimentos a serem esta-
belecidos em lei ordinária. GRIFO NOSSO
Na verdade, não parece ter sido introduzida em nosso ordenamento grande
novidade acerca da desconsideração de atos jurídicos. Entretanto, um novo enfoque
nos métodos de interpretação das normas tributárias tem dividido os doutrinadores e
tem sido a sustentação desta nova forma de pensar o planejamento tributário.
Uma interpretação conjugada do parágrafo único do artigo 116 com o artigo
187 do Novo Código Civil - que traz em seu bojo as figuras do abuso de forma e de
direito - e a diferença existente entre as figuras da simulação e da dissimulação,
demonstram, segundo alguns doutrinadores, que a Lei Complementar 104/01 trouxe
novos ingredientes a este cenário.
O abuso de forma e o de direito nada mais são que os excessos cometidos
por determinada pessoa em relação aos limites impostos pela legislação, quanto ao
exercício regular de um direito, causando danos a terceiros.
No entanto, quando se entende que não existe diferença entre os termos si-
mular e dissimular, diz-se que o parágrafo único do artigo 116 do CTN não inovou
em nada, ou seja, continuou reprimindo a simulação dos atos jurídicos, em quais-
quer de suas modalidades e prevendo a sua desconsideração.
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Ocorre que muitos defendem a ideia de que dissimular, ademais de simular,
pode ter outros significados como os de ocultar ou encobrir com astúcia; disfarçar;
não dar a perceber; calar; fingir; atenuar o efeito de; tornar pouco sensível ou notá-
vel; proceder com fingimento, hipocrisia; ter reserva; não revelar os seus sentimen-
tos ou desígnios; esconder-se. iv
Além disso, o Professor Marco Aurélio Greco entende que a acepção do ter-
mo dissimular contida na norma em referência é diferente, pois as hipóteses de si-
mulação já haviam sido contempladas no CTN em diversas oportunidades (artigos
149, VII, 150, parágrafo 4º, 154, parágrafo único e 155, I). Deste modo, o termo dis-
simular abrangeria a simulação, mas comportaria seus outros significados, passando
o CTN a utilizar-se de ambos os termos.
No mesmo sentido, Ricardo Lobo Torres (2003, p. 122-123) entende que o ar-
tigo 116, parágrafo único do CTN, trata-se de autêntica norma antielisiva, que recep-
cionou o modelo francês. Diz ainda que nada tem que ver com a norma antissimula-
ção, que já existia no direito brasileiro (art. 149, VII, do CTN) e que tem outra estru-
tura e fenomenologia. A recente regra antielisiva tem as seguintes características:
permite à autoridade administrativa requalificar os atos e negócios praticados, que
subsistem para efeitos jurídicos não tributários; atinge a dissimulação do fato gera-
dor abstrato, para proceder à adequação entre o “intentio facti” e a “intentio juris”, o
que é característica da elisão, na qual o fingimento se refere à hipótese de incidên-
cia, e não ao fato concreto, como acontece na simulação relativa ou dissimulação no
sentido do direito civil.
Em termos práticos e resumidos, desta interpretação decorre que a elisão
deixou de ser uma variável dependente das patologias no campo do ordenamento
civil, para assumir natureza e papel próprios no campo tributário. Assim, na opinião
do professor Marco Aurélio Greco, no parágrafo único do artigo 116 do CTN estaria
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a previsão legal da necessidade de uma razão extra-tributária para que um planeja-
mento tributário seja oponível ao fisco.
Por outro lado, vale ressaltar que o dispositivo legal mencionado depende de
regulamentação, posto que meramente declaratório e, portanto, não autoaplicável.
Desta maneira, este ano foi encaminhado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei
nº 536/07, que visa justamente a regulamentar o dispositivo legal em comento. Antes
disso, a Medida Provisória nº 66/02 fizera uma tentativa de regulamentação, mas
não chegou a ser convertida em lei. Sobre este projeto de lei em comento, assim se
manifestou Pedro Annan Junior (2007), em interessante artigo, cujo trecho segue
transcrito:
O projeto de Lei apresentado pelo Ministro da Fazenda
dá poderes ao fisco de poder autuar os contribuintes de manei-
ra arbitrária e subjetiva, desconsiderando operações legítimas
praticadas pelos mesmos.
(...) o projeto de Lei prevê que são passíveis de descon-
sideração os atos ou negócios jurídicos que tenham a finalida-
de de dissimular, evitar, postergar ou ocultar os reais elemen-
tos do fato gerador do tributo.
Se a intenção do legislador era inibir a prática de opera-
ções só com o intuito de se obter um benefício fiscal, sem con-
teúdo econômico (business purpose), a exemplo do que ocorre
em outros países, ele deveria ter sido claro e objetivo em defi-
nir esse conceito, coisa que ele não fez.
A maneira que a norma está redigida dá poderes ao fis-
co de fazer o que bem entender em relação à desconsidera-
ção, não havendo critérios objetivos nem limites para a atuação
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do mesmo. Estamos diante da violação do princípio da legali-
dade e tipicidade tributária (...).
Relativamente ao Novo Código Civil, há quem sustente que nele também é
tratada a simulação dos negócios jurídicos, considerando-se para tanto o artigo 167,
e que este é inaplicável aos atos revestidos de licitude que proporcionem economia
tributária. Aliás, para este diploma legal, simulação e dissimulação seriam expres-
sões sinônimas que significariam “esconder a realidade”.
A fraude à lei também encontra previsão no Novo Código Civil, em seu artigo
166, inciso VI, que determina ser nulo todo ato jurídico quando tiver por objetivo
fraudar lei imperativa.
Como bem observou Natanel Martins (2007, p.332), Imperando no Direito Tribu-
tário o princípio da estrita legalidade, entende parte significante da doutrina ser
vedado ao estado a interpretação finalística (jurisprudência dos valores) para fins
de imposição fiscal, concluindo, em conseqüência, pela impossibilidade de o ente
arrecadador desconsiderar os negócios praticados pelo contribuinte, ainda que
executado em função de clara medida de planejamento tributário. Assim, parte
da doutrina, apesar de admitir e aceitar a desconsideração de operações pratica-
das mediante simulação, não admite que o mesmo tratamento fosse aplicado às
hipóteses de fraude à lei, abuso de direito ou de forma, muito menos a desquali-
ficação/requalificação de atos ou negócios praticados pelos contribuintes, em
homenagem, especialmente, ao princípio da estrita legalidade. Outros autores,
entretanto, entendem que a fraude à lei ou o abuso de direito podem ser coibi-
dos, inclusive na seara tributária.
Sob esta ótica, o princípio da legalidade não seria interpretado isoladamente,
mas sempre em conjunto com os demais princípios informadores do Direito, como o
da capacidade contributiva.
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Assim, para estes doutrinadores, não se trata de interpretar economicamente
as normas, mas também não se poderia deixar de se fazer uma interpretação jurídi-
ca da norma atenta, porém, à realidade econômica subjacente ao negócio jurídico.
Portanto, na análise da licitude de uma operação que conduz à economia tri-
butária, antes de tudo, segundo esta nova visão do planejamento tributário, teria de
afastar-se quaisquer das patologias dos negócios jurídicos – simulação, fraude à lei,
abuso de direito, abuso de forma, negócio jurídico indireto – e, depois, verificar-se a
existência de um propósito negocial.
Aliás, sobre negócio jurídico indireto escreveu Alberto Xavier (2001, p.67) que
os negócios indiretos (...) são verdadeiros; os negócios simulados são falsos e
mentirosos. Na simulação há uma divergência entre a vontade real e a vontade
declarada – e daí o seu caráter verdadeiro; há, isso sim, uma divergência entre a
causa-função típica e os motivos ou fins perseguidos pelas partes, divergência
essa querida realmente e revelada às claras. Por outras palavras: há a utilização
de uma estrutura ou de uma forma para atingir diretamente um resultado que não
é o típico daquela estrutura e daquela forma. O fim típico, porém, é realmente
querido pelas partes; só que se limita a funcionar como condição para a realiza-
ção de um fim ulterior que é essencial na determinação volitiva das partes.
Entretanto, muitas críticas têm sido feitas à necessidade de existência de um
propósito negocial a justificar estas operações, já que uma operação lícita e que,
portanto, afaste todas as patologias acima mencionadas, não poderia deixar de ser
oponível à Administração Tributária tão somente porque sua única finalidade tenha
sido proporcionar economia tributária.
Nesse contexto, no item 4 analisar-se-ão as decisões do Conselho de Contri-
buintes, a fim de verificar a exigência ou não do cumprimento de tais requisitos,
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mormente, da necessidade de um propósito negocial a justificar as operações de
planejamento tributário.
4 ANÁLISE DOS CASOS CONCRETOS
Inicialmente, cumpre esclarecer que a presente análise não cuidará do mérito
das diversas operações julgadas nas decisões proferidas pelo Conselho de Contri-
buintes, restringindo-se à verificação da exigência ou não de uma razão extra-
tributária para os planejamentos tributários, da aplicação das normas antielisivas e
das figuras representadas pelo abuso de forma, de direito e pela fraude à lei.
Das vinte e duas decisões analisadas, a primeira constatação que se faz refe-
re-se ao fato de que em catorze delas não se exige propósito negocial, sendo uma
delas datada de 2006, outra de 2007 e todas as demais de 2005. Oito destas deci-
sões foram proferidas pela sexta câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes,
uma pela segunda câmara do Segundo Conselho, quatro pela primeira e uma pela
segunda câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes. Assim, mais da metade das
decisões analisadas não exigem o business purpose, porém quase todas foram pro-
feridas em 2005.
Destas decisões em que não se exige uma substância econômica, constata-
ram-se nove cujo entendimento exarado foi o de que o aspecto temporal, ou seja, a
proximidade dos atos realizados, por si só, não caracteriza a simulação ou, ainda,
que a validade das operações independe do tempo de duração dos efeitos do negó-
cio jurídico realizado. Em três delas este aspecto foi relevante ao lado da constata-
ção da ocorrência do desfazimento dos efeitos do ato praticado, o que culminou com
a caracterização da simulação. Nas outras duas decisões, este aspecto não foi ven-
tilado. Observe-se trecho de decisão exarada, in verbis v:
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Não resta qualquer dúvida de que todos os negócios jurídicos
realizados tinham um único objetivo o de reduzir a carga tribu-
tária da pessoa jurídica Varga Participações Ltda.
Uma operação como a alienação da empresa Freios Varga
S/A, por sua importância e pelo valor da operação, não é reali-
zada em alguns dias, mas em meses, depois de muitos ajus-
tes. A seqüência de operações realizadas a toque de caixa é o
mais forte indício de que todas as operações foram realizadas
com o fim de impedir a ocorrência do fato gerador da obrigação
tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas caracterís-
ticas essenciais de modo a reduzir o montante do imposto de-
vido.
Mas é apenas um indício, como a validade das operações in-
dependem do tempo de duração dos efeitos dos negócios rea-
lizados e da vontade interna de pagar menos imposto, a con-
clusão a que chego é que a situação fática apresentada pela
fiscalização não se enquadra em qualquer das hipóteses fixa-
das pelo art. 102 do Código Civil de 1916. (Acórdão número
102-47.181, relator Conselheiro Romeu Bueno de Camargo, da
Segunda Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes).
Em nove decisões também se constata a utilização dos conceitos de dissimu-
lação e simulação relativa como expressões sinônimas e os julgadores deixam de
aplicar o artigo 116, parágrafo único do CTN, por ausência de regulamentação, bem
como os dispositivos do Novo Código Civil deixam de ser aplicados, pois sua edição
é posterior a ocorrência dos fatos:
(...) No tocante à penalidade imposta, esta foi aquela cominada
no art.957, inc. II, do RIR/99, aplicável nos casos de evidente
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intuito de fraude, definidos nos arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4502,
de 30 de novembro de 1964´, os quais,contemplam as hipóte-
ses de intenção dolosa, quais sejam :´Art. 71 - Sonegação é
toda ação ou omissão dolosa.´Art. 72- Fraude é toda ação ou
omissão dolosa ´Art.73 - Conluio é o ajuste doloso´. O disposi-
tivo cuja base legal são os arts. 71, 72 e 73 da Lei nº 4502/64,
deixa claro que a aplicação da multa agravada cabe nos casos
onde o evidente intuito de fraude seja patente. A ´evidência´
preconizada na lei exige a certeza desta intenção. A fraude tem
que ser patente de tal sorte que não se duvide da má fé dos
atos praticados, com o firme propósito de burlar a lei, o que não
consegui enxergar no caso dos autos. Pareceu-se que a Re-
corrente pretendeu realizar o negócio usando a evasão que a
lei concedia (inciso I do artigo 442), mas sob a qual não se al-
bergava. Assim entendo que a matéria sob exame compreen-
deu uma ´simulação relativa´ ou ´dissimulação´, e a doutrina
maciçamente alerta para a dificuldade de definir, com precisão,
a linha fronteiriça que separa o ato elisivo do negócio dissimu-
lado. Aqui lembrou o Ilustre Relator do acórdão que tomei por
suporte em minhas presentes razões que é “comum recomen-
dação de cautela, por parte do intérprete e aplicador da lei, pe-
las dificuldades práticas de se concluir por hipótese de evasão
ou elisão, pois é insuficiente o elemento temporal (antes ou de-
pois de ocorrência do fato gerador), especialmente em casos
de simulação relativa, cuja determinação vincula-se, via de re-
gra, a fatos, indícios e presunções, por isso que cada situação
deve ser analisada isoladamente. (...) Diante desta circunstân-
cia, tenho dificuldades para caracterizar a "evidência" exigida
pela lei, cumulada com o "intuito de fraude" (este de caráter
manifestamente subjetivo), porque as operações ditas simula-
das como se tratou de uma sociedade anônima, todos os atos
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praticados impuseram divulgação e registro nos órgãos públi-
cos, o que foi feito;todas as operações estavam devidamente
lançadas na escrituração comercial e fiscal,foram cumpridas,
junto à Receita Federal e demais órgãos públicos, as formali-
dades próprias aos atos de incorporação.O que não deixou dú-
vidas foi a intenção do Recorrente em economizar imposto. Ele
praticou todos os atos que entendeu válidos, na forma da lei
para tal fim. Não conseguiu materializar sua vontade mas este
é outro aspecto da questão. Contudo não tenho segurança em
afirmar que esteve configurado um ´evidente´ intuito de fraude,
como saltou a vista nos casos anteriormente analisados por es-
te Colegiado nos quais os negócios eram realizados apenas
´de fachada´ sem respaldo na verdade material.(...) – (Acórdão
número 108-09.037, de relatoria da Conselheira Ivete Malaqui-
as Pessoa Monteiro, da Oitava Câmara do Primeiro Conselho
de Contribuintes – Grifo nosso).
Além dos três casos em que ficou entendido ter havido a prática de simula-
ção, em razão da proximidade temporal dos atos praticados, em outros dois casos, o
motivo que levou a esta conclusão foi o artificialismo das operações praticadas, sen-
do que em uma delas o fator determinante foi o abuso de forma. Transcreve-se de-
cisão que bem ilustra esta situação:
(...) Há, portanto, que se perquirir se os atos praticados são
reais, e não simulados. E essa análise não há que ser feita pa-
ra cada negócio isoladamente, mas em relação ao conjunto de
negócios encadeados, como um todo. Essa a lição de Marco
Aurélio Greco ´(...) Diante de uma situação complexa, é essen-
cial considerar a figura como um todo, examinando ao mesmo
tempo os vários aspectos que a cercam, pois o conhecimento e
o enquadramento de determinada realidade será a resultante
19
das diversas circunstâncias reunidas no caso concreto. (...)
Vale dizer, ao invés de analisar cada fotografia (etapa) é impor-
tante analisar o filme (conjunto delas). Mais do que um evento
(etapa), é importante interpretar a estória (conjunto).(...) Na
medida em que o conjunto de operações corresponde apenas
a uma pluralidade de meios para atingir um único fim, a verifi-
cação das alterações relevantes deve ser feita não apenas
considerando os momentos anterior e posterior a cada etapa
mas, principalmente, os momentos anterior e posterior do con-
junto de etapas. Ou seja, é preciso indagar qual a situação
existente antes da deflagração da sequência de etapas, de
quem era determinado patrimônio, qual a composição societá-
ria, quem era o titular de certos poderes sobre determinado
empreendimento etc, e qual a situação final resultante da últi-
ma das etapas.´
É inquestionável que o verdadeiro negócio jurídico praticado,
dissimulado por operações estruturadas em seqüência, de
compra e venda de ações em tesouraria seguida de permuta
sem torna, foi a compra e venda das quotas da Pactual Partici-
pações S.A. Este o verdadeiro negócio desejado, que foi ocul-
tado pelos negócios jurídicos ostensivos. Não socorre a Recor-
rente a alegação de que as operações poderiam, no máximo,
constituir negócio jurídico indireto. É que, mesmo praticando
formas jurídicas válidas, o negócio indireto pode ser simulado.
E para representar elisão fiscal lícita, e não evasão fiscal, o ne-
gócio jurídico indireto, deve ser verdadeiro.
A acusação é de simulação. Realmente, caracterizou-se a hi-
pótese prevista no art. 102 do Código Civil de 1916, pois há di-
vórcio entre a vontade real e a vontade ostensiva. Não há a
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mais remota possibilidade de se acreditar que a Lido tenha tido
vontade real de investir na Recorrente, adquirindo 534 ações
de sua emissão (dum total de 1.010) por R$ 92.414.695,98,
quando em todo seu ativo no dia 23/09/1999, existia somente
R$ 517,25 em caixa e uma participação societária de R$
10.497.399,14 (quotas da Pactual Participações Ltda.).
O ato que realmente Marambaia e Lidô pretenderam praticar foi
a compra e venda, por aquele valor, das quotas da Pactual. Pa-
ra isso, simulou-se a venda das ações em tesouraria, seguida
da permuta sem torna.
(...)
No caso, ocorreu a proximidade temporal dos atos (1 dia decor-
rido entre a compra e venda das ações em tesouraria e a per-
muta); há desmedida disparidade entre o valor pago pelas
ações e o ativo da empresa investida; seus efeitos foram des-
feitos com a permuta das ações pelas quotas da Pactual. A si-
mulação é incontestável. (...)”
(Acórdão número 101-96.066, de relatoria da Conselheira San-
dra Maria Faroni, da Primeira Câmara do Primeiro Conselho de
Contribuintes).
Dos oito casos em que se exigiu o propósito negocial, em quatro deles sua
ausência acarretou configuração da simulação absoluta, sendo que nos outros três
casos, a conclusão foi pela dissimulação, entendida esta como a simulação relativa.
O aspecto da proximidade temporal foi considerado em cinco destes casos ao lado
da inexistência de business purpose. Nesse sentido foi proferido o acórdão número
101-95.552, de relatoria do Conselheiro Paulo Roberto Cortez:
“(...)
21
Ora, no caso, ocorreu a proximidade temporal dos atos (uma
hora entre a integralização de capital com ágio de cerca de
98% e a incorporação do ágio ao capital e cisão no dia subse-
quente); não havia causa econômica (além da economia fiscal)
para o aumento de capital, que foi usado apenas como degrau
para a objetivada alienação de participação societária; e seus
efeitos foram desfeitos com a cisão. A simulação é incontestá-
vel.
(...)”
Em nenhum destes casos a decisão é fundamentada no artigo 116, parágrafo
único do CTN. Em parte das decisões aplica-se a figura da simulação, conforme
prevista no artigo 102 do Código Civil de 1916, e apenas uma delas é fundamentada
na Constituição Federal, na mitigação dos princípios da liberdade de auto-
organização e da legalidade pelos princípios da capacidade contributiva e da solida-
riedade social.
Desta forma, verifica-se que, independente da introdução do parágrafo único
ao artigo 116 do CTN, pela Lei Complementar 104, ou da edição do Novo Código
Civil, o que se constata é a adoção desta nova teoria através de uma interpretação
finalística e sistemática da legislação, independentemente de fundamentação legal
expressa. O Professor Marco Aurélio Greco e suas obras sobre o tema são citados
em todas as decisões e o que se verifica são apenas afirmações no sentido de que
uma nova maneira de ver e analisar os planejamentos tributários, leva a considerar a
necessidade de existência de uma razão extra-tributária que os justifique, do contrá-
rio, inoponíveis ao fisco, por caracterizarem simulação.
Esta conclusão, segundo meu entendimento, é incorreta e precipitada, pa-
recendo mais uma maneira de fundamentar legalmente estas decisões, no caso no
artigo 102 do Código Civil de 1916, uma vez que o novo código e o parágrafo único
do artigo 116 não poderiam ser aplicados aos casos analisados. Ora, uma coisa é
22
existir um negócio lícito, real, cujos efeitos foram de fato assumidos pelas partes en-
volvidas, mas cuja única razão é proporcionar economia tributária e esta justificativa
exclusiva não ser mais possível em razão das normas antielisivas acima citadas; daí
a considerar uma operação como simulada, relativa ou absolutamente, tão somente
pela inexistência de business purpose, me parece completamente equivocado.
A análise das decisões aponta para uma distorção na exigência do chamado
propósito negocial. Se este é capaz por si só de descaracterizar operações lícitas,
seja pela aplicação das normas antielisivas, seja por uma interpretação sistemática e
finalística da legislação ou, ainda, por uma nova leitura dos princípios da liberdade
de auto-organização, da legalidade, da capacidade contributiva e da solidariedade
social, que sejam os atos desconsiderados sob esta justificativa, mas não sob o pre-
texto de que de tal fato decorre a simulação.
Por outro lado, em sete destas decisões constatou-se o abuso de direito, o
abuso de forma ou a fraude à lei, e em apenas um caso além da ausência do propó-
sito negocial, a simulação foi caracterizada por haver um descompasso entre a von-
tade e a declaração, forjada conscientemente com o propósito específico de produzir
o engano.
Em todos os casos em que os planejamentos não foram considerados oponí-
veis ao fisco, o que se vê em comum é a caracterização da simulação pela proximi-
dade temporal dos atos praticados, seguida da anulação de seus efeitos, bem como
a disparidade infundada de valores entre os diversos atos seqüenciais.
O tempo de duração dos atos praticados revela se as partes de fato quiseram
praticar aquele negócio jurídico ou se dele se utilizaram apenas com o intuito de dri-
blar norma imperativa, ou seja, se na verdade o ato praticado foi outro. Um exemplo
desta situação, que surgiu em diversas decisões analisadas, é o de uma sociedade
que é constituída e desfeita no mesmo dia, horas depois. Entretanto, nem sempre
isso é tão claro como no exemplo aqui citado.
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As constatações expostas até então, levaram em conta os números – quantas
decisões foram proferidas neste ou naquele sentido – mas é extremamente relevan-
te que se faça uma análise também do ponto de vista temporal.
Sob este prisma, verifica-se que, em 2005, apenas uma decisão menciona e
exige o propósito negocial como requisito de oponibilidade do planejamento tributá-
rio ao Fisco, enquanto doze decisões proferidas no mesmo ano, não fazem esta exi-
gência. Já no ano de 2006, constata-se que de oito decisões analisadas, sete exi-
gem o business purpose e somente uma não o aplica. A única decisão proferida em
2007, analisada neste trabalho, também não exigiu a razão extra-tributária para o
planejamento.
Diante do exposto, pode-se concluir que mais recentemente o Conselho vem
exigindo a justificativa extra-tributária para os planejamentos tributários e esta seria
a nova tendência.
Outra análise que pode ser feita é a relacionada à tendência maior ou menor
de as diversas câmaras que compõem os Conselhos exigirem, ou não, o propósito
negocial.
Cumpre esclarecer que a maioria das decisões analisadas no presente traba-
lho foram proferidas pelo Primeiro Conselho de Contribuintes, competente para jul-
gar os casos que envolvem o Imposto sobre a Renda e a Contribuição Social sobre
o Lucro, já que as operações que envolvem planejamento tributário normalmente
visam à economia destes dois tributos, ainda que os outros Conselhos tenham,
igualmente, sido considerados no momento da pesquisa.
Embora não seja possível ainda afirmar que uma determinada câmara, de de-
terminado Conselho decida desta ou daquela forma, pode-se dizer que há uma ten-
dência que aos poucos se revela, mas que pode seguir outros rumos, caso haja uma
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drástica mudança na composição do Conselho de Contribuintes, em razão de seu
novo regimento interno.
Assim, dos vinte e dois casos analisados, compõe-se o seguinte quadro:
Órgão Julgador
Quantidade
de decisões
analisadas
Ano em que
foram profe-
ridas
Necessidade de business
purpose
1a Câmara do 1o
Conselho 5 2005 e 2006
Não, em 3 casos cujas decisões
foram proferidas em 2005 e sim
em duas decisões proferidas em
2006
2a Câmara do 1o
Conselho 2 2005 Não
4a Câmara do 1o
Conselho 5 2005 e 2006 Sim, em todos os casos
6a Câmara do 1o
Conselho 8 2005 Não, em nenhum caso
8a Câmara do 1o
Conselho 1 2006 Sim
2a Câmara do 2o
Conselho 1 2006 Não
Quadro resumo de decisões
A sexta Câmara não exigiu o propósito negocial em nenhum caso, porém to-
das as decisões analisadas foram proferidas em 2005; a quarta Câmara que exigiu o
business purpose em todos os casos, assim procedeu em 2005 e em 2006 e; a pri-
meira câmara, em 2005, não exigiu razões extra-tributárias, enquanto em 2006, pas-
sou a exigi-las.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Da análise feita neste trabalho, constata-se que a nova teoria do planejamen-
to tributário surge como uma forte tendência no Conselho de Contribuintes do Minis-
tério da Fazenda, em todos os seus aspectos, impondo a necessidade de um busi-
ness purpose e, portanto, necessidade de substância econômica para as operações
praticadas que culminam com a redução da carga tributária; aplicação das patologi-
as que, segundo o Novo Código Civil, maculam os negócios jurídicos – abuso de
forma, abuso de direito e fraude à lei – mitigação dos princípios da legalidade, iso-
nomia e liberdade de auto-organização pelos princípios da capacidade contributiva e
da solidariedade social.
Observa-se que o Tribunal Administrativo deixa de fazer uma análise pura-
mente legalista, ou seja, não mais classifica as operações em lícitas e ilícitas, mas
passa a analisá-las sob o prisma da oponibilidade ao fisco, em razão da presença de
outros requisitos e da ausência de outras patologias, que não a fraude e a simulação
absoluta.
Assim, ainda que os administradores tenham o direito e também o dever de
maximizar os lucros de suas empresas, sobretudo num país em que a carga tributá-
ria é altíssima, não basta que o negócio realizado não seja proibido ou que não haja
fraude ou simulação absoluta. Os negócios praticados têm de ser efetivos, conecta-
dos com os objetos sociais das empresas, que devem existir de fato e de direito,
mais importando seu conteúdo do que a sua forma.
Não está proibido o planejamento tributário, a busca por um modelo fiscal-
mente mais eficiente, mas estes devem estar de acordo com os institutos de direito
privado e seus efeitos.
Necessário, por outro lado, em minha opinião, que as decisões do Conselho
sejam mais bem fundamentadas, pois ao aplicar a tese do Professor Marco Aurélio
Greco, o que se observa, em muitas delas, é a inadequação do embasamento legal
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e, quase sempre, ainda que não seja o caso, conclui-se pela existência de simula-
ção como forma de justificar a desconsideração das operações realizadas.
Tais impropriedades talvez sejam solucionadas com a regulamentação do pa-
rágrafo único do artigo 116 do CTN o que, como vimos, deve ocorrer se aprovado o
Projeto de Lei nº 536/07.
Permanece a esperança de que seja instituída tal regulamentação, porém que
não venha para que o fisco passe a estar legitimado a julgar subjetivamente as ope-
rações realizadas, com o intuito de reduzir-se a carga tributária e desconsiderá-las,
como se tudo fosse simulação. Mas que venha para proporcionar maior segurança
jurídica, interpretações harmônicas do nosso ordenamento e para evitarem-se os
constantes abusos que vimos presenciando nos últimos anos.
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prudenciais ao planejamento tributário. Revista Dialética de Direito Tributário. São
Paulo, n. 131, p. 7-19, 2006.
TATIANA MARQUES ESTEVES
Advogada em São Paulo, Especialista em Direito Empresarial pela Universidade
Mackenzie, Especialista em Direito Tributário pela Escola de Direito da FGV-SP.
Como citar este texto:
ESTEVES, Tatiana Marques. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NA VISÃO DO
CONSELHO DE CONTRIBUINTES DO MINISTÉRIO DA FAZENDA BRASILEIRO
A PARTIR DE 2005 In: ANAN JUNIOR, Pedro (Coord.). Planejamento Fiscal Teoria
e Prática II. São Paulo: Quartier Latin, 2009. Material da 5ª aula da Disciplina Conta-
bilidade Tributária e Planejamento Tributário, ministrada no Curso de Especialização
Telepresencial e Virtual de Direito Tributário – REDE LFG.
i “Taxes and tax avoidance were probably born twins, and are likely to continue their joint existence
until the millenium of a taxless world. Avoidance is hydraheaded and, as the taxes gatheres...discover and cut off one escape contrivance, the taxpayer comes up with another.” ii OLIVEIRA, Ricardo Mariz. Pró-memória de Aulas sobre Planejamento Tributário – Elisão e Evasão Fiscal – Norma Antielisão e Norma Antievasão. Anotações gentilmente cedidas em entrevista realiza-da durante a pesquisa deste trabalho, quando da apresentação do autor na empresa Votorantim. iii Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: (...) VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; (...). iv Acepções extraídas do Dicionário Aurélio século XXI, no verbete “dissimular”. v A transcrição dos acórdãos não obedeceu à regra de limite de citação, ultrapassando, por vezes, o limite sugerido de 15 linhas em razão da necessidade de comprobatória dos argumentos desta pes-quisa.