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INVESTIGANDO AS POTENCIALIDADES DIDÁTICAS DOS
INSTRUMENTOS HISTÓRICOS NO ENSINO DE MATEMÁTICA
Ana Carolina Costa Pereira1
Pesquisas envolvendo a relação entre História e Educação Matemática vem suscitando
diversas discussões, dentre elas, suas diferentes perspectivas pedagógicas atreladas aos
possíveis caminhos de abordagem em sala de aula. A articulação entre história e ensino
pode propiciar potencialidades didáticas que irão refletir diretamente no modo de
conceber certos conceitos matemáticos suavizando algumas dificuldades encontradas na
sua evolução. Nessa relação entre a história e o ensino de matemática, devemos ter
definido qual vertente historiográfica, tradicional ou atualizada (SAITO, 2015), o
pesquisador ou docente irá se basear para desenvolver essa efetiva articulação. Dentre
algumas possibilidades, consideramos que o instrumento matemático antigo é uma
interface didática entre os dois meios, possibilitando o estudo da teoria e da prática da
experimentação levando o aluno a estudar a produção do saber não só de quem construiu,
mas também como um elemento que conduz e difunde diferentes formas de
conhecimento. Dessa forma, nos apoiado na vertente historiográfica atualizada para
investigar o uso de instrumentos históricos no ensino de Matemática, abalizando suas
potencialidades didáticas. Nesse trabalho, apresentamos um estudo inicial sobre um
mapeamento teórico realizado no banco de teses da Capes, anais de eventos da área e em
periódicos sobre o uso de instrumentos matemáticos históricos no ensino, a fim de
compreender o cenário nacional e vislumbrar possíveis desdobramentos didáticos do
tema. Nossa proposta é que o levantamento apresentado possa direcionar pesquisas
futuras sobre instrumentos e abrir caminhos ainda não traçados nessa área que está em
vasta expansão. Consideramos que a potencialidade do instrumento para o ensino de
Matemática é algo concreto e possível de ser implantado, entretanto devemos olha-lo
como um artefato que incorpora conhecimento e não apenas sua compreensão das
relações matemática da sua construção (física e matemática) e da sua utilização, mas
entender os motivos delas estarem lá.
Palavras-chave: Instrumentos Históricos. Ensino de Matemática.
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas tem-se percebido um crescente interesse por parte de
pesquisadores brasileiros e internacionais do papel da História da Matemática melhoria
do ensino da aprendizagem matemática. Isso tem acarretado em publicações que viraram
referências na área (FAUVEL, MAANEN, 2002; BARONI, TEIXEIRA, NOBRE, 2004;
1 Docente doutora da Universidade Estadual do Ceará – UECE. E-mail: [email protected].
MIGUEL, MIORIN, 2005; ...) corroborando com pesquisas empíricas e teóricas voltadas
para a Educação Matemática.
A História da Matemática é considerada por muitos como um importante
instrumento para o docente em sala de aula, ou seja, o aspecto metodológico propriamente
dito. Sua utilização adequada por meio de fontes confiáveis e atualizadas, pode promover
entre os discentes, uma visão mais crítica em relação à matemática e à construção do
conhecimento. O contexto histórico permite observar a Matemática em sua prática
filosófica, científica e social, fornecendo ao discente a compreensão do papel que ele
desempenha no mundo.
Nesse sentido, compreendemos que a Matemática não está pronta e acabada,
assim como a história, não pelo fato de ocorrerem novas pesquisas nessas áreas, mas
“porque a própria história da matemática é reinterpretada e rescrita de tempos em tempos”
(SAITO, 2015, p. 21). Isso ocorre a medida que os “historiadores da matemática”
descobrem novos documentos, novas teorias, novos caminhos metodológicos em que os
paradigmas vigentes são transpostos.
A articulação entre história e ensino pode propiciar potencialidades didáticas que
irão refletir diretamente no modo de conceber certos conceitos matemáticos suavizando
algumas dificuldades encontradas na sua evolução. Nessa relação entre a história e o
ensino de matemática, devemos ter definido qual vertente historiográfica, tradicional ou
atualizada (SAITO, 2015), que o pesquisador ou docente irá se basear para desenvolver
essa efetiva articulação.
Para Saito (2015, p. 24) na perspectiva historiográfica tradicional “ o passado é
visto com os olhos de hoje. Admite-se que a ciência e a matemática teriam se
desenvolvido progressiva e linearmente”. Na perspectiva historiográfica atualizada tem-
se a “necessidade de se compreender o processo de construção do conhecimento
matemático por meio de acurada investigação, não só das diferentes técnicas e conteúdos
matemáticos, mas também das circunstâncias nas quais as técnicas e conteúdos foram
elaborados” (SAITO, 2015, p. 26).
Dentre as várias discussões atreladas ao tema, as potencialidades da História da
Matemática no ensino é uma delas. Tentando elencar essas qualidades direcionadas ao
ensino, Miguel e Miorin (2005) traz argumentos que justificam a participação da história
no processo de ensino-aprendizagem da Matemática, categorizando em dois diferentes
grupos: os de natureza epistemológica e os de natureza ética. Segundo os autores
a categorização foi estabelecida considerando o modo como se concebe a
natureza dos elementos considerados determinantes ou, pelo menos,
condicionadores da aprendizagem matemática e/ou da natureza das atitudes e
dos valores, isto é, da natureza da aprendizagem ética, via aprendizagem
matemática que se deseja promover ao estudante. (MIGUEL, MIORIN, 2005,
p. 61).
Percebemos que dentre as categorias propostas pelos autores, a natureza prática
da História da Matemática não foi especificada. Entretanto, ela pode estar implícita dentro
da natureza de cunho epistemológico, já que está relacionado com o conhecimento
matemático propriamente dito. Ainda nessa vertente, Baroni, Teixeira, Nobre (2004) lista
também dez argumentos de defende, a introdução da História da Matemática no processo
educacional como forma de melhorar o ensino da Matemática. Os autores também não
mencionam de forma explicita a conexão entre aspectos epistemológicos e práticos.
A prática e teoria na História da Matemática está relacionada com uma
problemática intelectual de defender ou de reorganizar o saber. No ensino a prática se dá
a partir de situações que possibilitem criar modelos concretos de alguma teoria ou
aplicação da Matemática desenvolvida ao longo da história, possibilitando uma melhor
visualização de um entre abstrato. Ressaltamos que à maior parte dos conceitos
matemáticos foram criados para resolver problemas.
Nessa vertente, consideramos que os instrumentos históricos matemáticos são
uma interface didática entre os dois meios, possibilitando o estudo da teoria e da prática
da experimentação levando o aluno a estudar a produção do saber não só de quem
construiu, mas também como um elemento que conduz e difunde diferentes formas de
conhecimento.
Associar a História da Matemática a vertentes pedagógicas e/ou didáticas
propondo novas abordagens articulando o ensino, a aprendizagem, a história e a
Matemática é um grande desafio. Esse fato se justifica principalmente pelo caráter
teórico-prático o qual direcionamos nosso estudo, pois consideramos que a união da teoria
com a prática no ensino de Matemática possibilita uma visualização de entes matemáticos
que é de difícil abstração para o aluno. Encontramos nos instrumentos históricos
matemáticos essas características.
Isso posto, esse trabalho, será apresentado um estudo inicial sobre um
mapeamento teórico realizado no banco de teses da Capes, em três revistas nacionais e
nos anais dos Seminários Nacionais de História da Matemática com trabalhos que
corroboraram com o uso de instrumentos matemáticos históricos, a fim de compreender
o cenário nacional e vislumbrar possíveis desdobramentos didáticos do tema.
INSTRUMENTOS COMO RECURSO DIDÁTICO
Durante o transcorrer da história da matemática, muitos instrumentos foram
fabricados e utilizados para simplificar não só a resolução de problemas matemáticos,
observacionais ou experimentais, “mas também para mapear a vasta e nova natureza
produzida artificialmente” (SAITO, 2013). Dentre esses instrumentos, encontramos
aqueles denominados “matemáticos”, isto é, instrumentos que foram concebidos para
medir aquilo que Aristóteles (1952) denominava “quantidades” (distâncias e ângulos).
Para empregá-lo no campo da educação, tendo-o como uma interface entre o
ensino e a história, devemos inseri-los nos contextos em que foram constituídos e
observar o processo da produção do conhecimento no seu significado real, pois a sua
construção e seu uso mostram questões importantes do fazer matemático do período
estudado (SAITO; DIAS, 2011).
Dessa forma, consideramos que os instrumentos podem adentar as salas de aula,
partindo da história da matemática, como atividades investigativas propondo cópias de
instrumentos antigos e outros artefatos, reconstruídos com base em fontes históricas.
Quase todos os instrumentos de tecnologia antiga e moderna incorporam muita
matemática escondido neles e acessíveis somente através de uma análise cuidadosa e
intencional. (BUZZI, 2000)
Em muitas ocasiões, ter cópias rústicas que possibilitem ser trabalhadas em sala
de aula (de preferência como objetos físicos, embora simulações de computador tenham
cada vez mais um papel a desempenhar nesta área) possa constituir uma ferramenta que
melhore o ensino de Matemática. Construir alguns modelos de instrumentos não é uma
tarefa fácil, especialmente os mais complexos, mas alguns exemplares podem ser
confeccionados por professores ou pelos seus próprios alunos.
Nesse sentido, o estudo de conceitos - sejam eles matemáticos ou não - por meio
de instrumentos antigos, possibilita ao aluno a compreensão acerca dos aspectos sociais,
políticos, culturais e econômicos que são relacionados ao objeto investigado, permitindo
que ações interdisciplinares, por exemplo, possam configurar no ambiente escolar como
oportunidades de demonstrar a relação entre as demais disciplinas da matriz curricular e
a Ciência Matemática. Essa interação, pode amenizar a aversão que muitos alunos
possuem a respeito dessa área do conhecimento.
O desafio é: “ampliar o foco de análise e contextualizar os instrumentos em seus
devidos quadros conceituais, de modo a compreender a complexa trama da relação entre
teoria, instrumento e experimento” (SAITO, 2012, p. 5). Dessa forma, em determinadas
situações didáticas, essas três dimensões são tratadas (teoria, instrumento e experimento),
de forma superficial, pois de acordo com os níveis de ensino, determinados elementos
conceituais históricos da matemática ainda precisam ser amadurecidos, para assim serem
tratados ao longo das aulas.
MAPEAMENTO TEÓRICO
Para essa fase inicial do estudo optamos por uma metodologia de cunho
qualitativo centrada em buscar um “estado da arte” ou um “estado do conhecimento” da
pesquisa que estamos realizando, com a finalidade de saber quais trabalhos nacionais
versão sobre nossa temática. Segundo Ferreira (2002, p. 253):
Definidas como de caráter bibliográfico, elas parecem trazer em comum o
desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes
campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm
sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas
e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses
de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de
congressos e de seminários. Também são reconhecidas por realizarem uma
metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e
científica sobre o tema que busca investigar, à luz de categorias e facetas que
se caracterizam enquanto tais em cada trabalho e no conjunto deles, sob os
quais o fenômeno passa a ser analisado.
Para iniciar a pesquisa decidimos realizar um levantamento no banco de tese da
Capes - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pois é o maior
deposito de dados contendo informações sobre teses e dissertações defendidas junto a
programas de pós-graduação do todo o país. Entretanto, ao colocar na busca2
“instrumentos” encontramos 33032 trabalhos nas diversas áreas de concentração.
Afunilamos e designamos uma nova palavra “instrumentos matemáticos” no qual
encontramos apenas seis trabalhos, em que somente um estava dentro da temática
estudada. O mesmo ocorreu quando refinamos para “instrumentos de medidas” na qual
apareceu 352 trabalhos, cuja maioria estavam ligados a avaliação educacional. Com esse
primeiro contato consideramos inexequível dá continuidade a esse levantamento tomando
como base o banco de tese da Capes. Dessa forma, direcionamos nossa pesquisa para os
periódicos e eventos nacionais que estivessem ligados a História da Matemática e das
Ciências.
Dentre os periódicos nacional que se debruçam em disseminar estudos sobre o
tema em questão, selecionamos três revistas renomadas com avaliação Qualis da
Capes: Revista Brasileira de História da Matemática (2001 a 2015), Revista de
Matemática, Ensino e Cultura (2006 a 2015) e História da Ciência e Ensino:
construindo interfaces (2010 a 2016).
A Revista Brasileira de História da Matemática (RBHM) é um boletim científico,
de caráter internacional, publicado pela Sociedade Brasileira de História da Matemática
(SBHMat) com periodicidade semestral. O periódico tem 15 anos no cenário acadêmico
e volta-se para artigos na área da História da Matemática em geral e suas relações com
outros campos como a Educação Matemática e a Filosofia da Matemática. Em uma
análise dos artigos publicados na RBHM não encontramos nenhum que versasse sobre
instrumentos matemáticos.
A Revista de Matemática, Ensino e Cultura (REMATEC) é um periódico nacional
vinculado ao Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Cultura Matemática e suas
Epistemologias na Educação Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. A REMATEC possui dez anos de contribuições no universo acadêmico,
direcionando seus artigos nas áreas de Matemática e Ensino.
Ao explorar as edições, encontramos apenas um artigo publicado no número
temático, Histórias de Práticas Matemáticas, em 2014, intitulado: Instrumentos
2 Busca realizada nos dias 08 e 09 de agosto de 2016.
matemáticos dos séculos XVI e XVII na articulação entre história, ensino e aprendizagem
de matemática, de Fumikazu Saito.
No artigo exposto, Saito (2014), faz uma proposta de articular história, ensino e
aprendizagem de matemática tendo o foco “o instrumento como suporte que veicula
conhecimentos do "saber-fazer" matemáticos do século XVI” (SAITO, 2014, p.25). Nele
o autor traz um embasamento teórico buscando pesquisas internacionais que
fundamentam sua proposta e exemplificam a inserção dos instrumentos na sala de aula
com os: o quadrante geométrico, o quadrante num quarto de círculo e o báculo; expostos
no tratado Del modo di misurare de Cosimo Bartoli, publicada em 1564.
O terceiro periódico estudado foi a Revista de História da Ciência e Ensino:
construindo interfaces, de amplitude nacional publicado pelo Programa de Estudos Pós
Graduados em História da Ciência da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo com
periodicidade semestral. A revista está a seis anos cenário acadêmico e é dirigida aos
educadores e pesquisadores em Educação e em História da Ciência.
Ao investigar as edições publicadas, encontramos dois artigos na sessão: História
da Ciência e Ensino: Propostas e Aplicações para sala de aula. O primeiro deles,
divulgado no volume 02 de 2010, tem o título, História e Ensino de Matemática:
construção e uso de instrumentos de medida do século XVI dos autores Fumikazu Saito
e Marisa da Silva Dias. No texto, Saito e Dias (2010) procuram aproximar a História da
Matemática do ensino da disciplina utilizando fontes primárias. Eles propõem atividades
que visão a construção e uso de três instrumentos de medida: o quadrante geométrico, o
quadrante num quarto de círculo e o báculo. Os três instrumentos são retirados da obra
Del modo di misurare (1564) de Cosimo Bartoli. Esse artigo, segue uma linha bem
didática, pouca fundamentação teórica e mais aplicação para a sala de aula, descrevendo
o passo a passo da construção do instrumento.
O Segundo artigo, publicado no volume 4 de 2011, tem o título, A construção de
um antigo instrumento para navegação marítima e seu emprego em aulas de Astronomia
e Matemática dos autores, Telma Cristina Dias Fernandes, Marcos Daniel Longhini e
Deividi Márcio Marques.
Eles apresentam “uma sugestão de construção e formas de explorá-lo como
ferramenta didática para o ensino de conceitos astronômicos e matemáticos” por meio da
Balestilha (FERNANDES, LONGHINI; MARQUES, 2011, p. 62). Entretanto, os autores
fazem a construção do instrumento de maneira adaptada em relação a graduação original,
não utilizando nenhuma obra original para se fundamentar historicamente, mas utilizam
um aporte bem didático descrevendo o passo a passo da graduação e utilização do
instrumento.
Partindo para os eventos nacionais3, selecionamos o Seminário Nacional de
História da Matemática (SNHM) que aconteceram entre 1995 a 2015, somando no total
de 11 edições. Nossa finalidade é apresentar uma visão das pesquisas publicadas sobre o
tema na área de História da Matemática. Ressaltamos ainda que, o SNHM, é o mais
importante evento brasileiro da área, permitindo um agradável intercâmbio entre
pesquisadores.
Para compor a análise dos trabalhos envolvendo instrumentos científicos
observamos primeiramente o título e o resumo, caso se enquadre com o tema estudado,
aprofundamos a leitura.
Numa visão geral encontramos poucos estudos sobre instrumentos matemáticos
nos anais do SNHM (Gráfico 1). Ao todo foram 12 trabalhos publicados envolvendo
Minicurso, Pôster e Comunicação Científica. Entretanto, as pesquisas propostas, na sua
maioria, trazem um apelo didático ou mesmo um possível recurso metodológico para ser
utilizado aula de matemática.
Gráfico 1 – Trabalhos sobre Instrumentos Matemáticos no SNHM
Fonte: Dados da pesquisa.
3 Nossa proposta é analisar os trabalhos do Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia (15
edições), mas devido ao pouco acesso aos anais e a programação detalhada do evento, via digital e/ou
impressa, não conseguimos ainda material suficiente para o estudo.
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2
4
6
8
I II III IV V VI VII VIII IX X XI
Qu
an
tia
de
de
Tra
ba
lho
s
Seminários Nacionais de História da Matemática
Percebemos no gráfico anterior, que as primeiras cinco edições do SNHM que vai
de 1993 a 2003, não existe trabalhos4 que versem sobre instrumentos matemáticos.
No VI SNHM, que aconteceu em Brasília - DF, em 2005, nos deparamos com
uma comunicação científica, envolvendo o quadrante náutico dos autores Rodrigues e
Mendes (2005). No estudo eles objetivam “investigar a criação e a utilização do quadrante
como instrumento de observação (...) considerando as possibilidades de uso das
informações históricas na elaboração e utilização de atividades de ensino e aprendizagem
da matemática escolar (RODRIGUES; MENDES, 2005, p. 159)”. Entretanto, os autores
não apresentaram uma proposta didática para a implementação na sala de aula.
Ainda no VI SNHM, os professores Bernadete Morey e Iran Abreu Mendes
propuseram um minicurso intitulado “Conhecimentos matemáticos na época das
navegações” que versava sobre alguns instrumentos náuticos, tais como, Quadrante,
Astrolábio, Tavoletas ou tábuas da Índia e Balestilha. No material, os autores descrevem
os instrumentos e detalham a balhestilha utilizando textos antigos como Chronografia de
Manoel Figueiredo, de 1603 e A arte de navegar de Manoel Pimentel, 1819. Não
apresentaram uma sequência didática ou atividades para o uso na sala de aula.
Em 2011, no XI SNHM, em Aracajú – SE, encontramos dois trabalhos publicados
nesse evento: o minicurso, Articulação de entes matemáticos na construção e utilização
de instrumento de medida do século XVI proposto por Fumikazu Saito e Marisa da Silva
Dias; e o pôster, Explorando A Régua de Cálculo por Meio de Atividades Históricas de
José Damião Souza de Oliveira.
No minicurso, Articulação de entes matemáticos na construção e utilização de
instrumento de medida do século XVI, teve por objetivo “trabalhar entes matemáticos
que estão incorporados em um dos muitos instrumentos, utilizados no século XVI, para
se medir distância (SAITO; DIAS, 2011, p. 7). Os autores apresentação instruções para a
construção e o uso do quadrante num quarto de círculo tomando como base a obra Del
modo di misurare (1564) de Cosimo Bartoli. Nessa publicação, eles fazem o
detalhamento do processo de construção, propõe atividades didáticas e o tratamento
didático do documento estudado, assim como a utilização do instrumento.
4 Nesse artigo, a palavra “trabalhos” de eventos, está relacionada a Palestras, Minicursos, Comunicações
Científicas, Pôsteres, Painéis, entre outros.
No pôster, Explorando A Régua de Cálculo por Meio de Atividades Históricas
teve a finalidade de “propor o uso pedagógico das práticas históricas com a criação e o
uso da régua de cálculo, considerando seu desenvolvimento prático na história e seu
potencial pedagógico para uso na sala de aula” (OLIVEIRA, 2011, p. 1). Como para a
sessão de pôster o evento só solicitava o envio de um resumo, não temos mais detalhes
sobre como foi feita a proposta pedagógica.
Em 2015, aconteceu em Natal – RN, o XI SNHM, onde encontramos sete
trabalhos (Tabela 1) envolvendo instrumentos matemáticos: quatro comunicações
científicas, dois pôsteres, e um minicurso.
Tabela 1: Trabalhos publicados nos anais do XI SNHM sobre Instrumentos Matemáticos.
Sessão Título do Trabalho Autores
Comunicação
Científica
Confecção de Artefatos de Cálculos Antigos em
Sala de Aula: O Ábaco de Napier
Benedito Fialho Machado
Medindo alturas com o uso do esquadro móvel de
Ottavio Fabri
Andressa Cesana e Circe Mary
Silva da Silva Dynnikov
Estudando Matemática por meio da construção de
Artefatos Históricos na Formação Inicial do
Professor
Ana Carolina Costa Pereira
Ensinando conceitos Geométricos e
Trigonométricos envolvidos na construção e
utilização da Balestilha
Antonia Naiara de Sousa Batista
e Ana Carolina Costa Pereira
Pôster
Estudando conceitos matemáticos através da
construção e do uso do quadrante e das tábuas da
Índia
Francisco Antônio do
Nascimento Siqueira Junior e
Hanna Mary Viana Bezerra
Estudando conceitos de logaritmos a partir da
construção e utilização régua de cálculo
Paulo Henrique Souza Fonseca e
Ana Carolina Costa Pereira
Minicurso Aspectos históricos da régua de cálculo para a
construção de conceitos matemáticos
Ana Carolina Costa Pereira
Fonte: Anais do XI SNHM, 2015.
Observando a tabela 1, percebemos que quatro trabalhos envolvem o estudo de
conceitos matemáticos por meio do instrumento matemático (PEREIRA, 2015;
FONSECA, PEREIRA, 2015; SIQUEIRA JUNIOR, BEZERRA, 2015; BATISTA,
PEREIRA, 2015).
O artigo de Pereira (2015a, p.1) visa apresentar a
contribuição do Grupo de Pesquisa em Educação e História da Matemática –
GPEHM em relação ao estudo de conceitos matemáticos por meio da
construção de renomeados instrumentos de medição utilizados no decorrer da
história da matemática, tais como, o quadrante, a balestilha, a tábua da Índia e
a régua de cálculo, para introduzir e/ou reforçar conteúdos.
Os trabalhos de Fonseca e Pereira (2015) e Batista e Pereira (2015) são bem
parecidos. Ambos propõem um curso de extensão universitária para professores em
formação da Licenciatura em Matemática da Universidade Estadual do Ceará, com o
intuito de estudar conceitos matemáticos por meio de instrumentos, no caso dos artigos,
a régua de cálculo e a balestilha, respectivamente. Enquanto, Siqueira Junior e Bezerra,
(2015) apresentam um estudo histórico a partir da construção e utilização do quadrante e
das tábuas da índia, a possibilidade de ensinar conceitos matemáticos.
O artigo de Machado (2015, p. 1), objetiva “demonstrar como recriar em sala de
aula um destes instrumentos: o ábaco de Napier”. Para isso ele não utiliza a fonte histórica
primária que é a Rabdologiae (1617) de John Napier, mas uma fonte secundária (artigo e
sites) no qual ele estuda o ábaco apresentando sua construção e utilização.
Cesana e Dynnikov (2015) não objetiva como elemento principal, o uso do
instrumento matemático para a sala de aula, mas o estudo da obra de L’Uso della Squadra
Mobile (O uso do esquadro móvel) do século XVI de Ottavio Fabri. Segundo as autoras,
(...) tema central desta pesquisa constitui-se numa abordagem interpretativa do
panorama histórico dos problemas de medição de alturas de objetos,
considerando os enunciados, as linguagens, as ilustrações, os processos
matemáticos resolutivos e os instrumentos de medidas apresentados pelo autor
(CESANA; DYNNIKOV, 2015, p. 1).
Por fim, Pereira (2015b) propõem em seu minicurso estudar os conceitos
matemáticos que estão envolvidos na construção da Régua de Cálculo Linear, tomando
como base as obras que deram origem ao instrumento, datadas no século XVII.
Entretanto, a autora não utiliza fontes originais para fazer esse estudo.
Para uma visão melhor do crescimento de trabalhos envolvendo o tema,
sistematizamos no gráfico 2 a produção pesquisada.
Gráfico 2 – Revistas e Anais de eventos analisados
Fonte: Dados da pesquisa.
Dessa forma, percebemos que dos trabalhos publicados nos periódicos e anais de
eventos pesquisados versam sobre os instrumentos em seu caráter histórico, vinculando-
os ao ensino.
NOTAS FINAIS
Estudos sobre a inserção de instrumentos matemáticos históricos voltados para
seu uso no ensino ainda está em expansão no Brasil. Percebemos que nos periódicos e
anais de eventos escolhidos para análise nessa pesquisa que ainda é incipiente publicações
que versem sobre esse tema. Percebe-se que houve um aumento visível de trabalhos
envolvendo a temática a partir de 2010 (Gráfico 2).
Dos três artigos que englobam instrumentos históricos nas revistas pesquisadas,
dois deles tem como autor principal o Prof. Dr. Fumikazu Saito, coordenador do grupo
de estudo e pesquisa História e Epistemologia na Educação Matemática (HEEMa) na
PUC-SP. Ele possui diversos artigos publicados em periódicos e eventos, não diretamente
especialistas em História da Ciência e da Matemática cujo o tema principal é a interface
entre a história e o ensino por meio do instrumento matemático. Hoje, ele pode ser
considerado uma referência nessa área tanto no que se refere a fundamentação teórica
quando em uma possível aplicação no ensino.
Anterior as publicações do Prof. Dr. Fumikazu Saito, o Prof. Dr. Iran Abreu
Mendes, já em 2005, iniciava orientações e publicações em torno da temática. Entretanto,
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2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
QTD DE TRABALHOS
esses estudos eram mais incipientes no que diz respeito a discussões do uso do
instrumento histórico como uma interface de ensino.
Já os trabalhos desenvolvidos por Pereira (2015a, 2015b), Fonseca e Pereira
(2015), Siqueira Junior e Bezerra (2015), Batista e Pereira (2015) está em uma transição
de concepção, que sofre influência de ambos os pesquisadores.
Esse levantamento ainda não acaba por aqui. Nosso intuito é analisar anais de
eventos e periódicos de grande renome internacional na área da história da Ciência e da
Matemática. Já elencamos dois eventos para uma proxima pesquisa: Scientific Instrument
Symposium, e Reunião da International Study Group on the Relations between History
and Pedagogy of Mathematics.
Um dos eventos da área é o Scientific Instrument Symposium, que já está na 35a
edição ocorrendo anualmente em vários países no mundo. Ele tem o intuito de estimular
a pesquisa acadêmica sobre a história de instrumentos científicos, e a preservação e
documentação das coleções de instrumentos, bem como a sua utilização no âmbito da
disciplina mais ampla da história da Ciência. Em 2012, o simpósio aconteceu no Rio de
Janeiro.
Outro evento são as reuniões International Study Group on the Relations between
History and Pedagogy of Mathematics que acontece de quarto em quarto ano dentro do
International Congress on Mathematical Education (ICME), organizado pelo
International Commission on Mathematical Instruction (ICMI). A cada reunião é
organizado volumes de compilação de trabalhos que são publicados posteriormente,
tendo hoje sete volumes.
Dessa forma, acreditamos que, ao final dessa pesquisa, teremos um mapeamento
dos estudos realizados nessa nova área que traz o instrumento matemático como uma
interface entre a história da Matemática e seu Ensino.
REFERÊNCIAS
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(2004). A investigação científica em História da Matemática e suas relações com o
programa de pós-graduação em Educação Matemática. In: BICUDO, Maria A. V.;
BORBA, Marcelo C. Educação Matemática: pesquisa em movimento. São Paulo:
Cortez, p. 164-185.
BATISTA, Antonia Naiara de Sousa; PEREIRA, Ana Carolina Costa. Ensinando
conceitos Geométricos e Trigonométricos envolvidos na construção e utilização da
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2015, Natal. Anais... .Natal: Sociedade Brasileira de História da Matemática, 2015. p. 1
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BUSSI, Maria G. Bartolini. Ancient instruments in the modern classroom. FAUVEL,
John.; MAANEN, Jan. Van. (Eds.). History in mathematics education: the ICMI Study.
Dordrecht/Boston/London: Kluwer Academic Publishers, vol. 6, 343-350, 2000.
CESANA, Andressa, DYNNIKOV, Circe Mary Silva da Silva MACHADO, Bendito
Fialho. Medindo alturas com o uso do esquadro móvel de Ottavio Fabri. In: SEMINÁRIO
NACIONAL DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA, 11., 2015, Natal. Anais... .Natal:
Sociedade Brasileira de História da Matemática, 2015. p. 1 - 12.
FAUVEL, John; MAANEN, Jan Van. History in Mathematics Education: the ICMI
study. New York: Klumer Academic Publishers, 2002.
FERNANDES, Telma Cristina Dias; LONGHINI, Marcos Daniel; MARQUES, Deividi
Márcio. A construção de um antigo instrumento para navegação marítima e seu emprego
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FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas “estado da arte”.
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FONSECA, Paulo Henrique Souza; PEREIRA, Ana Carolina Costa. Estudando conceitos
de logaritmos a partir da construção e utilização régua de cálculo. In: SEMINÁRIO
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MACHADO, Bendito Fialho. Confecção de Artefatos de Cálculos Antigos em Sala de
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