caderno de cultura artefato - nº 2

12
Suplemento Especial de Cultura do Jornal ES de Fato | Edição Nº 2 | Maio 2013 Entrevista Conto Poesia Crônicas É EXTRAORDINÁRIO... ...QUE EU ESTEJA AQUI “Certa vez, trouxe para ele umas pitangas que colhi no sítio dos meus avós no Espírito Santo. Bom, ele plantou as sementes em casa e foi este o começo dos famosos ‘Jardins Suspensos’ que Rubem cultivava dentro de seu apartamento”. Ana Maria Machado. “O velho Braga iria gostar muito. Aquela pessoa mal humorada e ao mesmo tempo divertida. Essa é uma ótima iniciativa para seduzir um jovem para leitura, porque Rubem é uma unanimidade”. Zuenir Ventura (sobre a Bienal). “Rubem Braga é um dos autores que mais admiro e releio”. Quando recebeu convite do editor para uma das edições da Bienal Rubem Braga. Ana Miranda.

Upload: jornal-fato

Post on 22-Mar-2016

218 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

TRANSCRIPT

Page 1: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

Suplemento Especial de Cultura do Jornal ES de Fato | Edição Nº 2 | Maio 2013

Entrevista Conto Poesia Crônicas

É EXTRAORDINÁRIO...

...QUE EU ESTEJA AQUI“Certa vez, trouxe para ele umas pitangas que colhi no sítio dos meus avós no Espírito Santo. Bom, ele plantou as sementes em casa e foi este o começo dos famosos ‘Jardins Suspensos’ que Rubem cultivava dentro de seu apartamento”.

Ana Maria Machado.

“O velho Braga iria gostar muito. Aquela pessoa mal humorada e ao mesmo tempo divertida. Essa é uma ótima iniciativa para seduzir um jovem para leitura, porque Rubem é uma unanimidade”.

Zuenir Ventura (sobre a Bienal).

“Rubem Braga é um dos autores que mais admiro e releio”. Quando recebeu convite do editor para uma das edições da Bienal Rubem Braga.

Ana Miranda.

Page 2: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

2 Maio 2013 | nº2 artefato

O suplemento especial de cultura do jornal ES de Fato parte para uma nova fase. Com mais páginas, o Ar-

tefato surgiu de uma conversa informal entre eu, Célia Ferreira, Higner Mansur e Wagner Santos. A ideia, imediatamente, foi posta em prática. No papel.

No ano em que o maior cronista, se esti-vesse vivo, completaria 100 anos. Textos de Maria Elvira Tavares Costa e Beatriz Fraga exaltam o cachoeirense ilustre. Rubem Braga. Na edição também reple-ta de novidades, novos colaboradores mostram a que vieram e emprestam seus talentos para deleite dos leitores.

As mães, grandes artistas da vida, tam-bém são lembradas no Artefato, com poemas e textos de escritores e da se-cretária de Cultura de Cachoeiro de Ita-pemirim, Joana D’Arck Caetano.

O Artefato é um espaço para quem gosta de ler, escrever, criticar e acompanhar o desenvolvimento e crescimento de novos talentos. Há lugar para todos e a propos-ta é que cada edição novos colaborado-res se revezem dentro da linha editorial.

Na edição novos convidados especiais e formadores de opinião se reuniram para levar ao leitor o que há de melhor entre a literatura e arte do sul do Espírito Santo .

Para finalizar, entrevista especial com o presidente da Academia Cachoeirense de Letras (ACL), Solimar Soares da Silva.

Enfim, são tantas emoções... Espero que gostem. Boa leitura!

Roney Argeu Moraes - editor [email protected]

EDITORIAL

Mais cultura

Rabisco

Anete Lacerda: Jornalista, asses-sora de imprensa, escritora. Colabo-radora do caderno especial de cultura do Jornal ES de Fato.

Luciana Fernandes: Publicitária, es-critora, blogueira, empresária. Gradu-ada em Literatura e membro eleita da Academia Cachoei-rense de Letras.

Beatriz Fraga: Professora de Lite-ratura Brasileira e Língua Portuguesa. Técnica Pedagógica da Superintendên-cia Regional de Educação.

Roberta Lopes: Professora, pedago-ga, coordenadora escolar. Graduada em Letras/Litera-tura e Pedagogia. Articulista e funcio-nária pública.

Quem faz

LANÇAMENTO: No dia 26 de abril, às 9h, na biblioteca comunitária de Vargem Alegre a escritora e terapeuta Maria Elvira Tavares Costa lança o livro infantil “No tempo da onça”, fruto do trabalho de contação de estórias e pesquisas na comunidade quilombola.

Desde 14 de março de 2003

Jornal Espírito Santo de Fato - CNPJ.: 06056026000138 - (28) 3515-1067 [email protected] - Bernardo Horta, 81, sala 101, Guandu, CEP 29.300-782 - www.jornalfato.com.br

Diretor - Wagner Santos [email protected]

Departamento Comercial - Lília Argeu e Elenir Atalaia

Editorador/Design - Gil Velasco

Editor - Roney Moraes [email protected]

Suplemento Especial mensal de cultura, arte e literatura do Jornal ES de Fato.

Suplemento Especial de Cultura do Jornal ES de Fato

artefato

Page 3: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

3Maio 2013 | nº2cultura

Isabell Sanches: Escritora, poetisa, membro benemé-rito da Academia de Artes, Cultura e Letras de Marata-ízes e do Espírito Santo.

Maria Elvira: Terapeuta, escri-tora, contadora de histórias. Agente Cultura e colabo-radora do caderno especial de cultura do Fato.

Higner Mansur: Advogado, escritor, articulista, cronista, membro da Acade-mia Cachoeirense de Letras (ACL) e colaborador do Jornal Fato.

Maria Gabriela: Blogueira, estudante de Letras/Literatura no São Camilo e bolsista da CAPES, através do programa de iniciação à do-cência.

Joana D’Ark: Secretária de Cul-tura de Cachoeiro de Itapemirim-ES, professora, escrito-ra, cronista, poeta. Graduada em Ciên-cias Sociais.

Paula Garruth: Mãe da Alinne, cachoeirense, ba-charel em direito, servidora pública, cerimonialista, blo-gueira, intensa e hiperbólica.

Arte

Mãe, tu és como aquela estrelinha que está cintilando lá no azul do céu celestial, tua ternura maternal é esplêndida e magnífica por sinal... tu és fonte de tamanha doçura no teu colo te sinto o meu porto seguro onde com certeza posso jogar as âncoras da minha vida e me sentir em total protegida.

Mãe, “mãe” seu nome já diz tudo, és amor sem medidas algo inesquecí-vel na vida que jamais poderia deixar de existir nesse mundo esse dia todo em especial e dedicado só a ti, obrigada por todo teu zê - lo desde o ventre materno até aqui enfim: obrigada mil e tantas vezes pelos teus sonos perdidos, pelas tuas lá-

grimas derramadas e simplesmente por você “existir” saiba que é gran-dioso o sentimento que por ti cultivo e que em meu coração você tem um lugar único e que é só teu. pra resumir: mãe você é, e sempre será insubsti-tuível “feliz dia das mães” eu amo você.

Mãe Isabell Sanches

Page 4: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

4 Maio 2013 | nº2 artefato

Em assembleia geral extraordinária, a Academia Cachoeirense de Letras (ACL) elegeu no dia 20/05/2013 sua nova diretoria para o biênio 2013/2014. Na foto Roberto Al Barros (Blibliotecário), David Loss (Presidente), Roney Moraes (Diretor de Publicida-de), Valquiria Volpato (Tesoureira), Isaura Theodoro (Primeira Secretária) e Solimar Soares (Vice-presidente).

A Escola de Teatro é um Ponto de Cultu-ra administrado pela Associação Teatral de Cachoeiro, em parceria com a Secre-taria de Estado da Cultura e o Ministério da Cultura. No local são oferecidas aulas gratuitas de artes cênicas para estudan-tes, e os grupos teatrais da cidade pode-rão usá-lo para desenvolver pesquisas e ensaios.

O Grupo de Caxambu Santa Cruz, por meio de sua mestra Maria Laurinda Adão, realiza o evento “13 de Maio: Raiar da Liberdade”, que acontecerá na segunda feira às 19h na Comunidade Quilombola de Monte Alegre, em de Cachoeiro de Itapemirim-ES. O Raiar da Liberdade é um dos eventos mais antigos do Brasil, e a Comunidade de Monte Alegre mantém a tradição desde 1888, ano da Libertação dos Escravos. Ele acontece tradicionalmente no dia 13 com muita alegria ao som do Caxambu.

Cachoeiro de Itapemirim tem um novo espaço para as artes. O Centro Cultural Nelson Sylvan agora abre suas portas às sextas-feiras para oferecer ao público atividades ligadas ao teatro e ao cine-ma. A inauguração da Escola de Teatro Darlene Glória, no início do mês, contou com a apresentação de “A Culpa”, es-petáculo do Grupo Anônimos de Teatro contemplado pela Lei Rubem Braga e selecionado pelo Festival Espírito Mundo 2013 para ser encenado em Portugal.

Nova diretoria da Academia Cachoeirense de Letras

Escola de teatro

Raiar da Liberdade

Espaço das artes

Coluna

A jornalista Rosângela Venturi e a publicitária Luciana Fernades são as novas ocupan-tes das cadeiras 22 e 31, respectivamente, da Academia Cachoeirense de Letras.

Page 5: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

5Maio 2013 | nº2cultura

Imaginar todos os alunos na esco-la atualmente é algo fácil. O poder público tem o dever de incentivar a adesão e ampliar o espaço esco-lar. Entretanto nos deparamos com instituições sem estrutura física e profissionais despreparados. No Brasil percebemos os princi-pais problemas detectados em escolas públicas. Isso tem início desde as universidades que não preparam os professores para a realidade da sala de aula. Outros problemas comuns são: baixa remuneração paga aos pro-fissionais de Ensino Básico; ca-rência em capacitação e educação continuada para professores; bai-xa participação dos pais na vida escolar dos filhos e nos assuntos da escola; burocracia em excesso na administração escolar; inves-timentos públicos insuficientes para atender com qualidades as necessidades educacionais; eleva-dos índices de repetência, princi-palmente em regiões periféricas; falta de conexão entre os níveis de ensino (infantil e fundamental);

altas taxas de abandono de alunos devido ao fracasso escolar ou pro-blemas financeiros. Infelizmente alguns dizem que é utopia tentar melhorar a qualida-de de ensino e desta forma não facilitam o bom desenvolvimento do ensino na rede pública. De acordo com as problemáticas analisadas pode-se afirmar que algumas medidas podem comba-ter os problemas encontrados no sistema educacional. Tais medidas poderão auxiliar e facilitar o bom desenvolvimento escolar atra-vés de mobilização da sociedade quanto a importância da Educação na sociedade; direcionamento de recursos financeiros para escolas e professores; valorização do pro-fissional da educação e por fim a implantação de medidas políticas educacionais a longo prazo. Olhando a Educação com outros olhos é preciso acreditar que exis-te uma luz no fim do túnel, dando esperança aos profissionais da educação e suporte aos familiares de nossos alunos.

Sentado numa calçada, ali estava uma legí-tima representação da miséria humana. De estatura baixa, o velho estava com uma ca-misa, que um dia foi limpa, desabotoada, e uma bermuda jeans da década de noventa. Cabeça baixa acompanhada de um chapéu preto e uma sacola azul de supermercado ao lado. Não era nenhum mendigo, mas cha-mava atenção das pessoas. O sujeito tinha mais dinheiro no bolso do que eu, e se com-portava como um completo indigente. Ouvi a sua voz trêmula - reflexo da idade – e então percebi que o homem era “de roça”: um for-te sotaque de trabalhador rural. Ele estava sentado entre um mercadinho e o escritório onde trabalho. Era mais ou menos meio-dia, horário em que as crianças saem da escola. Elas passavam por ele com naturalidade, porém eram as mães que olhavam para ele curiosas e enojadas. Confesso que até eu, a princípio, achei aquela figura estranhíssima. O velho abriu a sacola e com as suas mãos sujas tirou dali linguiças cruas. Pensei ime-diatamente: “Não... Não. Ele não vai fazer isso...” Enquanto eu pensava, ele devorava as linguiças cruas. Fechei os olhos. A se-nhora com seu neto o olhava com repulsa. Resolvi sair da minha zona de conforto e me aproximei, então, daquela figura des-conhecida. Ele me perguntou quanto custa-va o pão, eu peguei as moedas molhadas de sangue da carne que estavam em suas mãos e fui à padaria. Todos que estavam por perto me olharam com espanto, e se envergonharam por tratá-lo tão mal. Entre-guei os pães a ele, um favor tão simples. O homem parecia eternamente agradecido, dizendo sem parar que Deus iria me de-volver tudo em dobro, e que ele nunca se esqueceria de mim. Saí logo de perto dele, estava ficando constrangida, e a última coisa que eu queria era chamar atenção. Ele dormiu na calçada. Depois de uma hora e meia acordou, agradeceu-me outra vez e foi andando, cambaleando pelas ruas, até sumir de vista. Não quero ficar com o dis-curso repetitivo de que a sociedade exclui e marginaliza, porque, na verdade, eu faço parte disso também: a cada vez que não olho nos olhos das outras pessoas, porque estou atrasada demais para fazer qualquer outra coisa; a cada vez que sinto medo quan-do um sujeito desconhecido se aproxima no meio da penumbra da noite; a cada escân-dalo de corrupção que assisto na TV e não faço nada; cada vez que ignoro um pedinte na rua; a cada vez que eu penso que tudo isso não é problema meu; assino no con-trato dos covardes que aceito a miséria do jeito que ela é, desde que não me ataque. Aquele homem mudou a minha tarde e pro-vavelmente a minha vida. Um belo tapa na mediocridade humana. A poesia de Manuel Bandeira se personificou e sussurrou nos meus ouvidos: “O bicho, meu Deus, era um homem.” Foi como uma graça concedida que trás o amargor junto com ela. Antes fosse apenas a poesia de Bandeira, an-tes fosse um quadro de Cândido Portinari, antes um livro de Graciliano Ramos, mas, não, era algo vivo e pulsante que estava bem ali na minha frente. Um ser vivo, um homem, nem melhor nem pior do que eu.

Olhando a Educação

O homem

Ela pegou o livro que estava lendo. Correu os olhos pelas linhas e o cére-bro começou a processar, seu corpo não lhe pertencia mais e o lugar físico em que estava era apenas um detalhe, sem a menor importância no momento. Acontece com quem se entrega a uma boa leitura.

Era sempre assim, como num pas-se de mágica, num processo quase hipnótico a leitura a fazia esquecer o tempo e o lugar. Problemas do dia a dia? Por algum tempo deixavam de existir. Nada mais importava além da história em suas mãos e da que a sua cabeça construía. E o livro daquela noite era algo novo. Quente, sensu-al, sexual... Um destes tantos que povoam as livrarias e viram até best sellers depois que redescobriram que a mulher também gosta de histórias sacanas. O detalhe importante é que elas devem vir envoltas em romance e enredos. A seco não descem (Figu-rativo? Literal?).

O fato é que faz tempo que a mu-lher exige mais. Um pouco mais dos

relacionamentos, amorosos princi-palmente. Uma grande parte delas não se contenta apenas com superfi-cialidades, amizades por interesses, conversas prontas, mentiras padrão e sexo fast food.

Então o livro desta noite a fazia viajar, em cenários possíveis com um aman-te que bem podia ser o seu. A pro-tagonista apresentava uma postura segura que ela já cultivava, fazendo toda a diferença na sua vida.

A fantasia do exagero literário, assim como em uma novela televisiva, é bem vinda. Diverte, instrui e dá uma sacudida na mesmice da acomoda-ção diária. Ela é necessária e renova-dora.

A história em si não é o mais impor-tante, ler e imaginar sim. É preciso uma entrega, apaixonar-se pelo livro para se aproveitar tudo de bom que podemos extrair nesse processo e no texto.

Ler é um combustível pra sonhar.

A MULHER E O LIVROLuciana Fernandes

Roberta Lopes

Maria Gabriela

Page 6: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

6 Maio 2013 | nº2 artefato

Doutor Solimar, o senhor que está à frente da Academia até o dia 14 de junho, qual balanço pode ser feito de 2012, ano em que a ACL com-pletou 50 anos de Fundação?

No dia 19, a Academia comletou 51 anos. Poderíamos resumir no seguinte: a ACL lançou, oficialmente, o selo postal comemorativo do Jubileu de Ouro da entidade (1962-2012); comemorou o centenário dos saudosos Membros Efetivos Deusdedit Baptista (Cadeira nº 11), Solimar de Oliveira (Cadeira nº 3) e Walde-mar Mendes de Andrade (Cadeira nº 27); admitiu, como Membros Honorários in memoriam, o médico, educador e geografo João de Deus Madureira Filho, por ocasião do centenário de seu nascimento; e o político e grande líder do movimento republicano em nossa cidade, Bernardo Hora de Araújo, em comemoração ao ses-quicentenário de seu nascimento; participou, ativamente, da IV Bienal Rubem Bra-ga, com palestras e lançamentos; promoveu o VII Concurso Rubem Braga de Crôni-cas, em nível nacional; publicou a edição histórica da Revista da Academia, entre outros eventos de caráter cultural.

Escritor de grande sensibilidade, o poeta Athayr Cagnin, de saudosa e imorredoura memória para nós cachoeirenses, deixou vários livros de poesia publicados. Nos últimos anos foi citado várias vezes como o maior poeta vivo de Cachoeiro. Qual foi a importância do Mestre Athayr Cagnin para a ACL, nas últimas décadas?

O emérito educador e consagrado poeta cachoeirense Athayr Cagnin, falecido no final do corrente ano, deixou um legado importante para as novas gerações de nossa terra. Notabili-zou-se por seu extraordinário amor às letras. Membro fun-dador da ACL, presidiu essa mesma instituição por dois biênios (1992/1994 e 1998/2000), deixando nela a marca de sua operosidade e a mantendo em lugar de destaque no cenário cultural cachoeirense.

Quando a ACL completava 45 anos (2007) de fundação, em artigo publicado na impren-sa local o senhor disse que a entidade vivia, desde o início dos anos 90, uma fase da “es-tabilidade”. Que fase o Sr. considera que a Academia esteja vivendo hoje? Por quê?

Nossa Academia está em plena fase de expansão. Ampliou, significativamente, sua biblioteca; mantém atualizado o site da ACL, com a inclusão de novas seções; apoiou o lançamento de vários li-vros, não apenas de seus associa-dos, como também de autores que não integram a Acade-mia. A entidade conta, atu-almente, com mais de 300 Membros Correspondentes, espalhados por todo o territó-rio nacional.

O que resta hoje da fase “Romântica” da ACL, que com-preendeu aquele início auspicioso, em 1962, e que o senhor classificou como e “uma das mais importantes”?

Resta, não só a nostalgia, como também o mesmo entusiasmo daqueles jovens idealistas que, atrevidamente, lá nos idos de 1962, resolveram criar uma instituição cultural, que resiste ao tempo e às dificuldades pela absoluta falta de apoio dos órgãos públicos.

A ACL teve seus precursores e seus fundadores. Não foram os mesmos literatos que estiveram presentes em ambas as ocasiões?

São considerados Precursores os oito que assinaram a ata da primeira reunião de fundação da Academia (Sérgio Gonçalves Lofêgo, José Elias Aoni Filho, Solimar Soares da Silva, Evandro Moreira, Bruno Torres Paraiso, José Augusto Marcos Coutinho, Marco Antônio Coelho e Paulo de Tarso Medeiros), que, inicialmente, foi denominada “Academia de Letras Benjamin Silva”, até chegar ao nome atual de “Academia Cachoeirense de Letras”. Membros Fundadores são 21 intelectuais que assinaram as atas das reuniões subsequentes, realizadas nos dias 19 e 22 de maio de 1962. Cito, por oportuno, um fato que marcou a minha vida: assinei, no dia 12 de maio de 1962, a primeira ata de fundação da ACL; e, 50 anos depois, na qualidade de presidente, assinei a ata da Sessão Solene comemorativa do Jubileu de Ouro dessa mesma instituição literária. Uma dádiva dos céus...

Presidente da ACL faz balanço de sua gestãoSolimar Soares da Silva

Doutor Solimar, o senhor que está à frente da Academia até o dia 14 de junho, qual balanço pode ser feito de 2012, ano em que a ACL com-pletou 50 anos de Fundação?

No dia 19, a Academia comletou 51 anos. Poderíamos resumir no seguinte: a ACL lançou, oficialmente, o selo postal comemorativo do Jubileu de Ouro da entidade (1962-2012); comemorou o centenário dos saudosos Membros Efetivos Deusdedit Baptista (Cadeira nº 11), Solimar de Oliveira (Cadeira nº 3) e Walde-mar Mendes de Andrade (Cadeira nº 27); admitiu, como Membros Honorários in memoriam, o médico, educador e geografo João de Deus Madureira Filho, por ocasião do centenário de seu nascimento; e o político e grande líder do movimento republicano em nossa cidade, Bernardo Hora de Araújo, em comemoração ao ses-quicentenário de seu nascimento; participou, ativamente, da IV Bienal Rubem Bra-ga, com palestras e lançamentos; promoveu o VII Concurso Rubem Braga de Crôni-cas, em nível nacional; publicou a edição histórica da Revista da Academia, entre outros

Escritor de grande sensibilidade, o poeta Athayr Cagnin, de saudosa e imorredoura memória para nós cachoeirenses, deixou vários livros de poesia publicados. Nos últimos anos foi citado várias vezes como o maior poeta vivo de Cachoeiro. Qual foi a importância do Mestre Athayr Cagnin para a ACL, nas últimas décadas?

O emérito educador e consagrado poeta cachoeirense Athayr Cagnin, falecido no final do corrente ano, deixou um legado importante para as novas gerações de nossa terra. Notabili-zou-se por seu extraordinário amor às letras. Membro fun-dador da ACL, presidiu essa mesma instituição por dois biênios (1992/1994 e 1998/2000), deixando nela a marca de sua operosidade e a mantendo em lugar de destaque no cenário cultural cachoeirense.

Quando a ACL completava 45 anos (2007) de fundação, em artigo publicado na impren-sa local o senhor disse que a entidade vivia, desde o início dos anos 90, uma fase da “es-tabilidade”. Que fase o Sr. considera que a Academia esteja vivendo hoje? Por quê?

Nossa Academia está em plena fase de expansão. Ampliou, significativamente, sua biblioteca; mantém atualizado o site da ACL, com a inclusão de novas seções; apoiou o lançamento de vários li-vros, não apenas de seus associa-

Presidente da ACL faz balanço de sua gestãopor Wagner Santos e Roberto Al Barros

Entrevista

Page 7: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

7Maio 2013 | nº2culturaQuais as maiores dificuldades

enfrentadas ao longo dos últimos 10 anos?

Para não fugir à regra, nossa Academia vem sobrevivendo, basicamente, da peque-na anuidade de seus associados e de algum patrocínio, sem contar com um único cen-tavo do Poder Público.

A ACL participou dos eventos alu-sivos ao Centenário de Newton Bra-ga, em 2011, e da Bienal Rubem Bra-ga, em 2112. Esses eventos ajudaram a divulgar a entidade de que modo?

Em 2011, a ACL, conhecida como a “Casa de Newton Braga”, foi incluída na programação festiva alusiva ao centenário desse notável poeta cachoeirense, organi-zada pela Secretaria Municipal de Cultura, promovendo o lançamento, pela Edito-ra Booklink, das reedições das seguintes obras de Newton Braga (patrono da Ca-deira nº 2): “Lirismo Perdido”, de 1945; “Histórias de Cachoeiro”, de 1947; “Cidade do Interior”, de 1959; e “Voz da Província”, além do lançamento da publicação espe-cial preparada por Rachel Braga e Marília Braga, filhas do homenageado. Durante a IV Bienal Rubem Braga, a ACL realizou Sessão Solene comemorativa de seu Jubi-leu de Ouro. Esses eventos, amplamente divulgados pela mídia, inclusive constando do programa oficial das festividades, al-cançaram enorme repercussão, ajudando, assim, a divulgar o nome da Academia nos mais longínquos recantos de nossa pátria.

A ACL tem promovido concur-sos de contos, crônicas e poesias, em âmbito nacional. Como surgiu a ideia desses Concursos Literários e como foi a receptividade inicialmen-te? Como está hoje?

Nossa intenção era e ainda é a de cum-prir, fielmente, os objetivos primordiais da entidade, divulgando a cultura e incen-tivando a produção literária. E graças aos concursos que vem promovendo, anual-mente, a Academia é, hoje, conhecida em todo o território nacional. E mais: com a ampla divulgação desses certames, não só pelos correios, mas também via internet, nossa Cachoeiro voa, nas asas da ACL por esses Brasil afora...

E hoje, qual tem sido a média de participantes em cada concurso e de quais Estados da Federação?

A ACL promove, anualmente, concur-sos em prosa (“Claudionor Ribeiro de Con-tos” e “Rubem Braga de Crônicas”), e em verso (“Newton Braga de Poemas” e “Ben-jamim Silva de Sonetos”), em homenagem a seus filhos ilustres filhos que, com seu tra-balho incessante em favor das letras, mui-to contribuíram para a formação de nosso acervo cultural. Nesses últimos concursos, a média tem sido de 300 participantes.

A edição atual da Revista da Aca-demia, presta homenagem ao Cen-tenário de Nascimento de Rubem Braga...

Trata-se de edição especial, cuja te-mática está voltada para o centenário de nosso cronista maior, Rubem Braga, que ocorrerá em 2013, quando nossa Revista estará circulando. Nesta mesma edição, a ACL registra o centenário dos insignes e saudosos acadêmicos Deusdedit Baptista, Solimar de Oliveira e Waldemar Mendes de Andrade, e também do médico e educa-dor João de Deus Madureira Filho, além de dar ênfase ao sesquicentenário do notável homem público Bernardo Horta de Araújo.

Como o senhor avalia a atual si-tuação da literatura produzida em Cachoeiro. Há jovens autores des-pontando e outros, não tão jovens assim, produzindo com mais inten-sidade. Essa quantidade, em sua opi-nião, se reflete em qualidade?

Li, há pouco tempo, uma entrevista concedida à revista Veja pelo consagrado poeta Gullar. Falou de assuntos variados, inclusive de literatura, em “Uma visão crí-tica das coisas”. Entre as perguntas, havia esta: “A idade é uma aliada ou uma inimi-ga do poeta?” Resposta: “Com o avanço da idade, diminuem a vontade e a inspira-ção.” Peço licença para discordar do mes-tre Gullar. Com o passar do tempo é que a gente se aperfeiçoa. Já não comete os mesmos erros. Cito, apenas, um exemplo: Niemeyer, o maior arquiteto que o Brasil já produziu, falecido recentemente, conta-va mais de um século de existência com a mesma vontade e a mesma inspiração dos tempos remotos. Conclui-se, portanto, que a produção literária intensa resulta em au-mento de qualidade, independentemente da idade do autor.

Hoje, os blogs são alternativas de baixo custo para aqueles que que-rem produzir literatura, mas não reúnem condições de publicar em livro. Com isso, há cada vez mais pessoas escrevendo, sobre os mais variados temas. Como o senhor ava-lia o impacto destas novas mídias na literatura?

Considero salutar essa iniciativa. Pen-so, entretanto, que é duvidoso o sucesso da obra lançada em versão digital, se não contar, em sua retaguarda, com o suporte de uma boa editora.

Acha que o caminho para elevar em número e qualidade as publica-ções está em leis de incentivo, como a Rubem Braga?

Quem se dispõe a publicar um livro, tem à sua frente três caminhos distintos: ou sai à procura de uma editora, ou publica o livro por sua conta e risco, ou se esforça

para se inserir num projeto de incentivo à cultura. Qualquer caminho pode levar ao sucesso. Basta que o autor tenha talento, disposição e coragem.

O senhor acredita que Cachoeiro mereça, ainda, o epíteto de Atenas Capixaba?

Sim, acredito, porque ainda prevalece, nos dias de hoje, os mesmos motivos que levaram o eminente cultor das letras e polí-tico cachoeirense Atílio Vivácqua (patrono da Cadeira número 9, ocupada pelo acadê-mico João Baptista Herkenhoff), no prefá-cio do livro “Escada da Vida”, de Benjamim Silva, a usar o termo “Atenas Campestre”. Referia-se à antiga Fazenda da Prosperi-dade, localizada no município de Vargem Alta, antigo distrito de Cachoeiro, pois era naquele “recanto bucólico” que “se reu-niam os jovens intelectuais do tempo”. Na Grécia antiga, a capital Atenas era a terra de sábios, como Pitágoras, Platão, Aristóte-les, Demóstenes... Daí, por corrompimen-to, surge a denominação “Atenas Cachoei-rense”, como ensina o historiador Manoel Gonçalves Maciel, em sua obra “Voltando ao Cachoeiro Antigo”, vol. II, pág. 218). Ao meu sentir, nossa Cachoeiro ainda convive com artistas, escritores, jornalistas e inte-lectuais que formam “um forte núcleo de domínio literário”, por isso ainda é mere-cedora desse cognome.

Ao escritor iniciante, e ainda iné-dito, que conselho o senhor daria para a publicação do primeiro livro?

Vá à luta! Não desista nunca!... Enfren-te os obstáculos com coragem e determina-ção!... No fim, tudo dará certo.

Em que cenário atual das Letras se insere a projeção da ACL no ce-nário nacional? Há um permanen-te intercâmbio com outras entida-des literárias?

Respondo com outra pergunta: será que existe, no Brasil, outra instituição similar com mais de 300 Membros Cor-respondentes, representando 14 Estados da Federação?

Quais são os planos para o fu-turo da Entidade? A sede própria está inserida nesses planos?

Durante esses 50 anos de existência, a ACL promoveu palestras, ciclos de con-ferências, jogos florais, concursos literá-rios... Para o futuro, planejamos, ainda, a realização de uma campanha vigorosa, nos estabelecimentos de ensino cachoei-renses, com o principal objetivo de incen-tivar a leitura, procurando demonstrar à juventude estudiosa que, quem lê, exer-cita o raciocínio, amplia o conhecimento geral, estimula a criatividade, aumenta o vocabulário, facilita a escrita... Ainda não há planos para a sede própria. No mo-mento, temos outras prioridades.

culturaEntrevista

Page 8: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

8 Maio 2013 | nº2 artefatoConcursos

Concurso de redação: Guimarães RosaA cada edição vamos publicar os textos vencedores do concurso de redação realizado na escola Guimarães Rosa, em Cachoeiro de Itapemirim, no ano de 2012. O tema foi “o uso de drogas”. Na edição apresentamos os textos vencedores.

As drogas, sem sombra de dúvida, são o mal do século. Um problema que aflige milhões de pessoas no Brasil e no mundo, em sua maioria adolescentes e jovens. Um mal qua-se impossível de suportar, e isso eu descobri por experiência própria. Eu, Roberto, 35 anos, hoje ex-usuário, vivi nesse mundo por muito tempo, e tudo começou na adolescência. Quando adolescente, vivia em uma família de classe média-alta. Sempre estudei em es-cola particular, sempre tive tudo o que quis. Frequentava diversas boates e festas “rave”, sempre com os amigos. Numa dessas ocasi-ões, meu amigo ofereceu-me “uma parada que iria fazer me soltar mais”. Sim, ecstasy. Eu, como era muito tímido, aceitei, e vivi uma noite inesquecível. Passei a usar em todas as festas, tendo que desembolsar grandes quantias de dinheiro

em curtos períodos de tempo. Já que eu tinha muito dinheiro, conseguia pagar. O vício foi aumentando e o ecstasy começou a ficar fraco. Passei a usar também cocaína. Minha mesada já não era mais suficiente, então passei a roubar coisas em casa. Dinheiro da bolsa da mãe, da carteira do pai e objetos valiosos. Vendia tudo para conseguir dinheiro. Comecei a vender para sustentar o vício. Vendia na escola, nos bares, nas festas. Meus pais começaram a desconfiar das faltas em casa, então passei a roubar na rua. Eu, advin-do de uma família rica, roubando na rua. O que fazer? O vício era mais forte que eu, mais forte que qualquer um. Passei a usar crack, por ser mais barato, aumentando cada vez mais o vício. O ápice da dependência ocorreu quando abandonei minha casa e minha famí-lia para morar na rua, junto a outros usuários.

Meus pais encontraram-me uma semana depois, na “cracolândia”, todo sujo, magro, doente, totalmente irreconhecível. Consegui-ram me tirar de lá e me internaram em uma clínica. Não foi nada fácil. Precisei ser dopa-do várias vezes e lá aprendi uma coisa muito importante: combater o vício um dia de cada vez. Aprendi que o que fazia tanto bem à minha alma fazia muito mal ao meu corpo, e que vi a morte passar diante dos meus olhos por diversas vezes. Hoje, trabalho na clínica de reabilitação que trouxe minha vida de volta, e ajudo pessoas com casos parecidos com o que eu tinha. Venci na vida e sei que estou colaborando para que o mundo não pere-ça frente às drogas. Um inimigo de cres-cimento exponencial, forte e muito, muito perigoso.

Um caminho sem volta? João Vitor Madella Frade: 1º lugar da 1ª série

Analisando a história da humanidade, é possível perceber que as drogas, substâncias que alteram o funcionamento do organismo, já eram conhecidas desde os tempos mais remotos sem, no entanto, causar tantas dis-cussões e polêmicas a respeito dos desafios que elas impõem à sociedade no mundo contemporâneo. Seus efeitos são de âmbito familiar, social e, sobretudo, pessoal, causan-do danos irreparáveis à saúde. Entre as principais vítimas do vício, encontra--se a família. A convivência torna-se de-gradante, uma vez que são presenciadas agressões, roubos para a manutenção das compras de drogas e a desestruturação fami-liar. Isso porque o consumo de estimulantes, principalmente o crack, altera o comporta-

mento do indivíduo, tornando-o hostil e vio-lento. Nesse estágio, a alternativa é a interna-ção, entretanto, em muitos casos, a falta de recursos financeiros torna esta saída inviável. Além disso, a utilização de entorpecentes tem contribuído para o aumento da criminali-dade e se torna o principal elemento respon-sável pela violência no país, causando preju-ízos para a sociedade. Na cidade de Curitiba, por exemplo, estima-se que a droga seja a causa de 77% dos homicídios. Ainda convém lembrar dos danos referentes ao próprio usuário, como a dependência, a perda de relacionamentos e as consequ-ências diretas sobre a saúde, podendo, em alguns casos, levar à morte. Ao contrário do que a maioria pensa, não são apenas as dro-

gas ilícitas que causam ameaças. Segundo a Organização Mundial da Saúde, produtos como cigarro e álcool são responsáveis por 8,1% dos malefícios ao organismo. Diante desse contexto, é notável o alto índice de periculosidade das substâncias químicas em questão e a necessidade de planos que visem, principalmente, à recuperação dos dependentes. Nesse sentido, é viável a cons-trução de mais clínicas capacitadas para a recepção e cuidado dos pacientes. Também é válida a criação de novos projetos de preven-ção, voltados para os mais jovens, que esti-mulem a preferência por uma vida saudável. Unidos, governo, sociedade e família, podem colaborar com a construção de um futuro sem drogas.

A família é a vítimaLarissa Gonçalves Rigueto: 1º lugar da 2ª série

Desde os primeiros passos dados pelo ho-mem para a formação das sociedades mais organizadas, o uso de drogas, sejam lícitas ou ilícitas, é algo marcante e frequente. Essas substâncias, além de prejudiciais à saúde, também alteram o comportamento psicológico daqueles que delas usufruem, independente do objetivo – uso medicinal ou até como forma de evasão – por isso, é um assunto que deve ser tratado com extrema cautela e prioridade. Das principais drogas contemporâneas, o cra-ck pode ser considerado o mais prejudicial. Isso porque o grau de dependência é altíssi-mo. Pessoas que usam crack uma única vez já manifestam sintomas de abstinência gra-ves e violentos. Não só essa substância, mas

outras – apesar de serem consideradas líci-tas, como as bebidas alcoólicas – em alguns casos, também tornam os dependentes bem agressivos. Por isso, o consumo de drogas possui forte ligação com o índice de violência em nosso país. Em alguns países europeus, substâncias, que por outras nações são consideradas ilícitas, são legais, como na Holanda, onde o uso da maconha e suas variedades é permitido por lei. No Brasil, a legalização da maconha é algo polêmico, já que abrange diversos inte-resses. Muitos afirmam que, com a liberação da droga, o tráfico e, por conseguinte, o índi-ce de violência diminuiriam. Nesse sentido, é válido ressaltar que a “erva” passaria a ser tributada, fato que, apesar de ser benéfico

para a economia, não impediria, ou até indu-ziria, traficantes a continuarem vendendo e transportando o produto de maneira ilegal. Frente a esse contexto, percebe-se o grau de cuidado que devemos ter com as drogas. Para que o consumo diminua, é preciso que nas famílias e escolas as crianças recebam informações dos riscos e malefícios dessas substâncias à saúde, a fim de que no futuro nem queiram experimentar. O investimento em clínicas de reabilitação também é ne-cessário, objetivando tornar mais eficaz a superação do vício; e que os usuários possam perceber que a falsa liberdade propiciada pelas drogas nem se compara à liberdade e felicidade de uma vida com saúde e equilí-brio.

Drogas: o cárcere das almasFilipe Diniz Brito: 1º lugar da 3ª série

Page 9: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

9Maio 2013 | nº2culturaCrônicas

Evento de Letras na Casa dos Braga

O tema ‘Ética’ emana dos textos de Rubem Braga, naturalmente, como que provindo de suas entranhas. Menino, filho do primeiro Prefeito de Cachoeiro de Itapemirim, estudou na escolinha de Da. Palmira – criada pelo Centro Operário e de Proteção Mútua. Mais que alfabetizar-se, Rubem recebeu ali lições de Humanidade. Ao longo de usa vida, reforçou sua op-ção pelos mais humildes - marca regis-trada de sua família: os salões formais, cheios de pessoas esnobes, o repeliam. Preferia os botequins dos bate-papos sem qualquer pretensão. Ou a solidão de seu apartamento na Barão da Torre, em Ipanema - jardim suspenso onde cultivava árvores e plantas improváveis; vigiava a chegada das Primaveras; e recebia a visita dos pássaros e dos amigos. (Difícil negar, entretanto, que as mulheres eram, para ele, as compa-nhias mais esperadas!) Mas, lançando seu olhar para o mundo,

escrevia com palavras desconcertantes e claras, denunciando a hipocrisia; a injustiça social; a exploração do homem pelo homem. Com a mesma força, po-rém, derramava uma doçura inebriante, declarando seu amor pelo homem do povo, pela natureza, pelos animais e pelas mulheres. À palavra dedicou sua vida, mas, serviu-se dessa dedicação para, como um profeta, buscar desper-tar consciências e corações em prol da construção do mundo melhor. Sua palavra foi sua grande arma, assumindo o ônus da não omissão; negando-se a si mesmo a posição confortável do silên-cio. O convite, publicado diariamente nos principais jornais do país, ao longo de décadas, permanece a desafiar nossa pouca ação. Grilo falante? Mestre? Com-panheiro? Depende de cada um de nós, do que nos vai por dentro. Uma coisa é certa: lê-lo é imprescindível... E, perigo-samente, transformador!

Lições do Velho BragaMaria Elvira Tavares Costa

Cachoeiro de Itapemirim, 25 de abril de 2013. (de Beatriz Fraga). Para Letras, Vocês tanto pediram que eu cedi – abri minha casa para vocês se regalarem. Combinamos algumas coisas e cumpri meu prometido – arrumei noite clara, com lua, sem chuva e sem fruta-pão acidental. Em contrapartida, recebi ca-rinhos cachoeirenses legítimos – sim-ples, alegres, sem cerimônia ou forma-lismos pedantes. O ambiente acolhedor – flores e velas -, o chafariz com água de novo, as mú-sicas, a percussão, o coral, os textos, as danças e os convidados me fizeram rememorar: as noites quentes da cida-de; os trovões e as enchentes; o futebol moleque; os pios, para caçar pássaros e mulheres; o córrego Amarelo; o porão com seus fantasmas arteiros; os sons antigos que ainda me embalam. Tantas imagens misturadas a sentimentos pro-fundos que o coração sofre abalos. Ontem, vocês provaram que, acima da vida comum, realmente, há outra noite – bela e intensa, capaz de mudar nos-sas vidas. Em Cachoeiro, noites assim são possíveis.

Abraços, Rubem Braga

Vivo em Cachoeiro Principalmente, nasci em Cacho-eiro. Por isso sou triste, orgulhoso: de granito e mármore. De Cachoeiro, trouxe prendas diversas que ora te ofereço: Rubem, Newton, Roberto, Sérgio, cajus, ipês e tuins, Um rio sonso, sinuoso, num some e aparece sem fim. Um Itabira que em nada acalma as noites quentes da cidade. Pios variados que abrem estra-nhas temporadas de caça. Cachoeiro antigo é apenas uma fotografia na parede, Mas como dói.

VivoBeatriz Fraga Soares

Page 10: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

10 Maio 2013 | nº2 artefato

“Gente boa o ‘Já Morreu’. Grande sujei-to. Um grande companheiro. Com ele na estrada a viagem sempre foi mais alegre”. (Deduzo que o “Já Morreu” par-tiu desta para melhor). “Menina, o remédio que estou tomando para emagrecer é um tiro. Meu médico faz milagre. Mas a consulta é muito cara. O remédio também. Por isto estou dividindo com a fulana (Por mais que minha indiscrição tente, não consigo decifrar o nome da fulana). Mas tam-bém, caminho todos os dias. Pensa que é fácil?” “Aquela firma? Quebrou. Agora foi incorporada por outro grupo e fomos todos para o novo patrão. Mas tá de bom tamanho. Legal pra todo mundo”. (Enquanto isso, nomes de pessoas co-nhecidas vão desfilando, sem nenhuma cerimônia, ao longo da conversa). “- Oi, quanto tempo ‘a gente’ não mo-lhamos (sic) a palavra junto. Precisa-mos fazer isso mais vezes”. - Pois é, responde a mulher, alguns tons acima na voz. Se esse raio de ônibus

não tivesse sido tão pontual, teria mo-lhado a palavra. Mas agora não tem jeito. Deixei um tacho enorme de mo-cotó no fogão e preciso chegar logo em casa para aprontar tudo.” Chega o seu ponto, a mulherzinha franzina que gosta de molhar a palavra desce e pega uma estradinha de terra batida, deixando o companheiro do breve percurso a elogiar a performance da colega, que molha a palavra com cachaça como poucos homens. “Uma grande companheira de copo”, conclui. Paralelo aos comentários, meu pensa-mento voa. Antes que ele alcance alti-tudes sem volta, o colega do “Já Mor-reu” informa que ele mora no IBC, perto de sua casa. Então o suposto defunto está bem vivo. Penso nas sérias conseqüências que o álcool traz para a vida das pessoas. Estudo recente numa comunidade rural do Espírito Santo mostra que o maior problema da localidade é o alcoolismo, mais do que a pressão alta e a diabe-tes.

Na escola local, há alguns anos, as pro-fessoras não podiam nem deixar o ál-cool do mimeógrafo porque as crianças bebiam. Se escondiam o álcool, es-premiam a esponja do dito cujo(como nunca trabalhei com o tal, nem sei que esponja é essa). A intromissão involuntária na vida alheia acontecia quando trabalhava em Castelo e voltava para Cachoeiro de ônibus. Absorta pelos meus pensamen-tos por breves segundos, sou chamada de volta à realidade pela entrada de “Neguinho”, uma “figuraça”, negro de cerca de 75 anos, a alegria em pessoa, que foi cumprimentando todos desde a entrada até o final do ônibus. Certa-mente com a palavra molhada. Descubro que o “Neguinho” não é ele. São todos os que cruzam o seu caminho. “Vão com Deus, Neguinhos. Se quiserem comprar uns porquinhos, galinha e ovos caipira, moro logo ali”. O recado foi dado. Privacidade zero. Mas não dá para negar que em alguns momentos fica difícil segurar o riso.

FragmentosAnete Lacerda

Era uma vez uma menina que acredi-tava em sonhos, em contos de fadas, em estórias e gigantes de bom coração. Achava que o mundo era lindo e mágico, e que ser feliz para sempre era seu ine-vitável destino. Na noite em que seu segundo dente caiu, fingiu que dormia, esperando pela fada que colocaria o dinheirinho embaixo de seu travesseiro. Ao sentir que alguém se aproximava, entreabriu os olhos e viu que era sua avozinha que depositava as moedinhas em sua cama. Percebeu que fadas não existem, mas fingiu acreditar para não deixar triste a vovó. Era domingo de páscoa e a menina resolveu acordar mais cedo e ficar es-condidinha esperando descobrir onde o coelhinho esconderia seus ovos de cho-colate. Descobriu que eram seus irmãos mais velhos que os escondiam e ainda desenhavam as patinhas do coelho com tinta branca. Sentiu-se enganada, mas não disse nada. Não queria magoar seus irmãos. Alguns anos depois, na noite de natal, a

mesma menina foi até a cozinha, e, pas-sando pela sala, viu que seus pais arru-mavam os presentes embaixo da árvore. Ao contrário do que acreditou até aqui, Papai Noel não existia, e o bom velhinho era apenas um tio que, depois de encher a cara de vinho, botava a roupa verme-lha e brincava com as crianças até que todas, exaustas, iam dormir. Depois da diversão, o tio voltava a beber até cair no sono sentado no sofá, com a barba de algodão jogada em qualquer canto. Mais uma vez não disse nada. Não que-ria estragar o natal do tio que, sem a responsabilidade de divertir as crianças, não teria mais desculpas para o vinho. A menina cresceu, se apaixonou e teve o coração partido muitas vezes. Concluiu a duras penas que príncipes encantados não existiam, mas como tinha apren-dido a ficar quietinha para preservar a felicidade dos outros, resolveu que não estragaria a sua própria, e forçou-se a acreditar que em algum lugar do mun-do, haveria um príncipe para chamar de seu. A menina crescida estudou, virou uma

mulher e foi trabalhar. Dormia tarde e acordava cedo. Teve que fazer o dia ter trinta horas, porque precisava malhar, depilar, fazer as unhas, aprender mais um idioma e depois outro. Ir ao gineco-logista, ao cabeleireiro, ao dentista, ao psiquiatra. Tinha que concluir o mestra-do, fazer o doutorado, ver aquele filme com aquela artista que ela adorava, mas esqueceu do nome... e também visitar sua mãe. Na mulher não cabia mais as ilusões da menina e ela nã mais se lembrava de que um dia havia acreditado em fadas, coelhos e prínci-pes. Acordou no feriado e viu que o céu es-tava muito, muito azul. Foi caminhar e, ao dobrar a esquina, esbarrou em um moço que sabia, já havia visto antes. Mas, quanto seus olhos se encontraram, ela teve a sensação de asas batendo em seu estomago. Fechou os olhos e fez uma oração silenciosa agradecendo ao universo por no fundo não ter deixado de acreditar que o encontraria. Os dois arrumaram tempo de, inevitavelmente, serem felizes para sempre.

Felizes Para SemprePaula Garruth

Crônicas

Page 11: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

11Maio 2013 | nº2cultura

Esta será uma espécie de segunda edição da série de minúsculas bio-grafias que publiquei entre maio de 2006 e junho de 2007. Passados sete anos da primeira, estão de vol-ta, por provocação do Wagner Santos e do Roney Moraes, no ARTEFATO. Entendi de revisar todas – 48 biogra-fias – e, quem sabe, ao fim da jorna-da, acrescer mais algumas. O obje-tivo é o mesmo de 2006: chegar às novas gerações alguma coisa – inicio que seja – sobre personagens que fizeram nossa História. Recomeço a homenagem aos vultos históricos de Cachoeiro, sem qualidades de histo-riador, é verdade; mas com grande entusiasmo, o que não é mentira. Os poucos historiadores e interes-sados de Cachoeiro têm chamado a atenção: pouca gente se importa em conservar a História - um ou outro gato pingado. Homens e mulheres que construíram

e constroem Cachoeiro são cruel-mente esquecidos; suas memórias vergonhosamente apagadas. Nenhum prefeito, inclusive o atual (essa frase a construí em 2006 e continua atual), nenhum prefeito, imagino, um dia pensou em adquirir para o domínio público o imenso material sobre a cidade ajuntado por homens como Manoel Gonçalves Ma-ciel, Levy Rocha, Paulo Herkenhoff, Joaquim Pires do Amorim, Joel Pinto, Waldemar Mendes de Andrade, Gil Gonçalves, Evandro Moreira, Paulo Henrique Thiengo e todos os mais que fizeram profissão de fé: ajuntar cacos e ecos da História de Cacho-eiro, tão rica, tão mais rica do que o momento no qual vivemos. (Isso também foi escrito em 2006 – e só piorou). Peço desculpas, desde já, por even-tuais erros que cometa, e que me apressarei a corrigir – muitos já cor-

rigi: não é fácil ao não profissional da História falar sobre tanta gente e sobre tanta história, sem equívocos, sem erros graves (quem faz honesta-mente, tem direito de errar, até gra-vemente. O que não tem direito é de se acomodar). Que os pequenos textos (que come-çam, lógico, com Bernardo Horta, o maior personagem), nada compa-ráveis com a grandeza de nossos antepassados, sirvam de início e de aperitivo para o conhecimento de nossas coisas para os mais jovens e de recordações para os mais velhos. E que daqui, ou de qualquer lugar, possam despertar muitos conhe-cedores profundos da história da cidade e da região. Gente que tenha coragem de se expor, que não tenha medo de errar.

É pedir muito?

Personagens de Nossa História

Higner Mansur

Biografias

Page 12: Caderno de Cultura ArteFato - Nº 2

12 Maio 2013 | nº2 artefato

Como dizia, fiz aquela viagem vertigi-nosa de carona na camioneta e desem-barquei em Toronto do Sul disposto a fazer meu début como hippie. Hoje vejo que estava ainda muito novo para entoar o mantra contrarevolucionário, que mais tarde iria repercutir na univer-sidade.

Abro um parêntese para falar da Uni-versidade Lino Arzverda, onde entrei algum tempo depois, na qual Dagober-to Lacan foi meu professor mais excên-trico. Os prédios de vidro do campus ficavam no alto de uma colina, e ao fim de cada tarde podíamos ver o profes-sor Lacan descendo velozmente pelo calçadão da aleia de patins – até o dia em que outros professores e alunos também passaram a acompanhá-lo. Era então um batalhão de patinadores a descer pela via arborizada que levava ao anfiteatro e à estação de metrô. Mesmo depois, com o advento do te-leférico, este era somente usado por visitantes, que deixavam o carro esta-cionado na base da colina.

Foi uma época de grande criatividade na Lino Arzverda. O teatro universitário tinha apresentações semanais; havia

concursos literários e a Tribuna Demo-crática, criada pelo professor Lacan, permitia a livre expressão dos estu-dantes através da oratória – dom, por sinal, do qual me encontrava a milhas de distância. Por essa época eu era um tímido estudante de óculos de aros e lentes verdes que participava fugaz-mente desses acontecimentos a olhar através da vidraça do salão da bibliote-ca no quarto andar da torre principal. Pesquisas literárias me levavam a ten-tativas afins: queria descobrir um novo enfoque romanesco, fonemas nasais, neologismos saxões, onomatopeias celtas... Foi na universidade, inclusive, que conheci Levínia, com quem casei dois meses depois de nossa formatura em Letras.

Três anos depois, meu projeto de ser um “Borges tropical” se transformara num magnífico fracasso. Uma após outra as editoras recusavam meus ori-ginais, apesar de alentadoras cartas de resposta. Foi assim que me tornei um escritor subterrâneo. Minha mulher, novamente grávida, durante todo esse tempo fora o pilar da casa, e não que-ria mais me ouvir falar daquele negócio de ser um “Joyce equatorial”.

Por essa altura, decidido a pelo menos resgatar um pouco do bom-senso, re-solvi fundar um tabloide literário, su-pondo ali estar um nicho de interesse midiático. E então, como editor de um jornal que parecia me dar (mas não dava) um bom rendimento, contraí dívi-das. Com o passar do tempo, não con-seguindo pagar os credores, estive qua-se a cometer um desatino. Até aonde isso seria assim tão dramático? Ora, a ponto de ainda hoje ficar perplexo com o resultado que me proporcionava a publicação, pois os lucros eram-me suficientes apenas para não ficar de-vendo no fim do mês meia de banana no boteco da esquina.

– Como assim? ...não está mais conos-co!... Onde está o professor Lacan? – retruquei aturdido.

– Você não está acompanhan-do os noticiários?

– Não! Não sei de nada! O que aconteceu com o professor Lacan? – respondi enquanto amaldiçoava minha mania de reclusão.

A Sombra do Vento (II)Roberto Al Barros - Escritor, jornalista, membro da Academia Cachoeirense de Lertras (ACL).

Continua...

Contos