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INTERAÇÕES Revista Internacional de Desenvolvimento Local Universidade Católica Dom Bosco Instituição Salesiana de Educação Superior V. 6 N. 10 Março 2005

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Universidade Católica Dom BoscoInstituição Salesiana de Educação Superior

V. 6 N. 10 Março 2005

ReitorPe. José Marinoni

Pró-Reitor AcadêmicoPe. Jair Marques de Araújo

Editora UCDBAv. Tamandaré, 6000 - Jardim Seminário79117-900 Campo Grande-MSFone/Fax: (67) 312-3373e-mail: [email protected] www.ucdb.br/editora

U n i v e r s i d a d e C a t ó l i c a D o m B o s c o

Conselho EditorialAdyr Balastreri Rodrigues (USP)

Alberto Palombo (Florida Atlantic University)Alicia Rivero (SERCAL)

Amália Ines Geraiges de Lemos (USP)Aurora García Ballesteros (Universidad Complutense de Madrid)

Cezar Augusto Benevides (UFMS)Doris Morales Alarcón (Pontificia Universidad Javeriana)

Dorivaldo Walmor Poletto (PUCRS)Emiko Kawakami Rezende (EMBRAPA)

Evaldo Gaeta Espíndola (USP)Everson Alves Miranda (UNICAMP)

Javier Gutiérrez Puebla (Universidad Complutense de Madrid)José Carpio Martín (Universidad Complutense de Madrid)

Leila Christina Dias (UFSC)Marcel Bursztyn (UNB)

Maria Adélia Aparecida de Souza (UNICAMP)Maria do Carmo Zinato (Florida Center for Environmental Studies)

Maria Helena Vallon (UFMS)Maria Encarnação Beltrão Sposito (UNESP)

Marília Luiza Peluso (UNB)Mário Cézar Leite (UFMT)

Marisa Bittar (UFSCar)Maurides Batista de Macedo Filha Oliveira (UCG)

Michel Rochefort (IFU - Université de Paris VIII)Miguel Ángel Troitiño Vinuesa (Univ. Complutense de Madrid)Miguel Panadero Moya (Universidad de Castilla - La Mancha)

Paulo TarsoVilela de Resende (Fund. Dom Cabral)Ricardo Méndez Gutiérrez del Valle (Univ. Complutense de Madrid)

Rosa Esther Rossini (USP)Sérgio Granemann (UCB)

Tito Carlos Machado de Oliveira (UFMS)

Conselheiros fundadores Milton Santos (in memoriam)

Nilo Odália (in memoriam)

I N T E R A ÇÕ E SRevista Internacional de D!esenvolvimento Local

Conselho de RedaçãoAparecido Francisco dos ReisCleonice Alexandre Le Bourle!gatEduardo José de ArrudaEmília Mariko Kashimoto

Editor ResponsávelAparecido Francisco dos Reis

Coordenação de EditoraçãoEreni dos Santos Benvenuti

Editoração EletrônicaGlauciene da Silva Lima Souza

AbstractsBarbara Ann Newman

ResúmenesMari Neli Dória

Revisão de TextoOs próprios autores

CapaProjeto: Marcelo MarinhoFoto: Acervo do Programa Kaiowá-Guarani

Tiragem: 1.000 exemplares

Distribuição: Bibliotecas universitárias

Cecília LunaBibliotecária - CRB n. 1/1.201

Interações. Revista Internacional de Desenvolvimento Local,n. 10 (Março 2005). Campo Grande: UCDB, 2005.142 p. V. 6ISSN 1518-7012Semestral1. Desenvolvimento Local.

Publicação do Programa Desenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco.Indexada em:

Latindex, Directorio de publicaciones cientificas seriadas de America Latina, El Caribe, España y Portugal(www.latindex.org)

GeoDados, Indexador de Geografia e Ciências Sociais. Universidade Estadual de Maringá(www.dge.uem.br/geodados)

Clase, Base de datos bibliográfica en ciencias sociales y humanidades(www.dgb.unam.mx/clase.html)

Neste mês de março de 2005, chega-mos ao número dez de Interações, RevistaInternacional de Desenvolvimento Local.Interações publicou seu primeiro número emsetembro de 2000 e, desde então, a cada seismeses, uma nova edição é colocada à dispo-sição da comunidade científica do Brasil ede outros países. Esse importante periódico,ligado ao Mestrado em DesenvolvimentoLocal da UCDB, surgiu pelo imperativo danecessidade, no mundo globalizado de hoje,da divulgação de informações sistematiza-das e de experiências de sucessos a respeitodo desenvolvimento local, com o intuito desubsidiar novas formas de comportamentosocial capazes de gerar desenvolvimentoendógeno, com meios e estratégias próprias,segundo os conteúdos de cada cultura e comgestão autônoma dos recursos e técnicas con-tidas em seus territórios.

Nessa ocasião, quero aproveitar paraagradecer a todos que colaboram com a re-vista: autores, revisores, tradutoras, conselhei-ros e equipe de redação. Em especial, umagradecimento ao Prof. Dr. Marcelo Marinho,editor de Interações até 2004 e com seu entu-siasmo, trabalho e liderança, consolidou esteperiódico como um importante veículo dediscussão no meio acadêmico. Isso pode serdemonstrando com o conceito A emitido peloQualis/Capes da Geografia no ano de 2004.

Para este número, Interações apresen-ta artigos que discutem conceitos e teoriasno contexto do desenvolvimento local comoé o caso do texto de Lima e Pitaguari As idéi-

Editorial

as keynesianas e o crescimento do produto naseconomias locais e de Vallon que faz uma aná-lise da noção de exclusão a partir da refle-xão de autores franceses.

Em seguida, tem-se a discussão teóri-ca de práticas de desenvolvimento local emdiferentes lugares do Brasil. Costa analisa odesenvolvimento endógeno no sudesteparaense; Oliveira e Martinelli falam a res-peito dos consórcios de exportação e dosclusters industriais; Souza e Valencio trazemà tona a problemática em torno do papel dasPequenas Centrais Elétricas e seus desdobra-mentos no contexto da reestruturação dosetor no caso brasileiro; ainda nesse contex-to, Interações apresenta um artigo da pes-quisadora argentina Susana Finquelievich arespeito da política de meios inovadores emáreas não metropolitanas.

Nos demais artigos, têm-se discussõesde Brostolin e Silva sobre o desenvolvimentolocal e a educação indígena; Martins discu-te o turismo e compromisso ético com o lu-gar; Vinhas, em colaboração com diferentespesquisadores, elabora um excelente traba-lho acerca da possibilidade do desenvolvi-mento de sistemas de criação de bovinos naregião rural de Campo Grande.

Para finalizar, uma entrevista comAntonio Elizalde, Reitor da UniversidadBolivariana de Chile, falando sobre as uto-pias que cercam o desenvolvimento local.

Aparecido Francisco dos Reis - Editor

Interações, Revista Internacional de Desenvolvimento Local, agradece os seguin-tes nomes da comunidade científica, revisores no período 2002-04.

Maria Ribeiro de Araújo – EMBRAPAAdir Casaro Nascimento – UFMSEline Jonas – UCGAntonio Elizalde – UB (Chile)Norma Felicidade Lopes da Silva Valencio – UFSCarErom Brum – UNIDERPRosa Helena Dias da Silva – UAM/CIMIJandir Ferreira Lima – UNIOESTE – UQAC (Canadá)Jose Luis Grosso – Universidad Javeriana (Colômbia)Valéria Cristina Palmeira Zago – IDATERRAJosé Zuwchiwschi – MEC/SECADJorge Kanehide Ijuim – UFMSAdelina Pusineri – Museo Etnográfico Andreas Barbeiro (Paraguai)José Zanardini – UCA (Paraguai)Marisa Bittar – UFSCarMarcel Bursztyn – UnBMiguel Ángel Troitiño Vinuesa – UCM (Espanha)Tito Carlos Machado de Oliveira – UFMSEmiko Kawasaki – EMBRAPAVera Lúcia Silveira Botta Ferrante – UNESP/UNIARALeila Christina Dias – UFSC

Agradecimento

Sumário

Artigos

As idéias keynesianas e o crescimento do produto nas economias locais .............................................. 11Keynesian ideas and product growth  in local economies ......................................................................... 11Las ideas keynesianas y el crecimiento del producto en las economías locales ...................................................... 11

LIMA, J.F.; PITAGUARI, S.O.

Elementos de análise da noção de exclusão ............................................................................................. 21Elements of the analysis of the notion of exclusion .................................................................................... 21Elementos de análisis de la idea de exclusión .................................................................................................... 21

VALLON, M.H.R.

Polaridades e desenvolvimento endógeno no sudeste paraense ............................................................ 29Polarities and endogenous development in the Southeast of Para. ........................................................... 29Polaridades y Desarrollo Endógeno en el Sudeste Paraense ............................................................................... 29

COSTA, F.A.

A internacionalização de pequenas empresas através de consórcios de exportação inseridosem clusters industriais: uma relação recíproca de contribuição .............................................................. 55The internationalization of small businesses through exportation consortiums inserted inindustrial clusters: a reciprocal relationship of contribution ..................................................................... 55La internacionalización de pequeñas empresas a través de consorcios de exportación insertos en clustersindustriales: una relación recíproca de contribución .......................................................................................... 55

OLIVEIRA, M.F.; MARTINELLI, D.P.

O papel das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH’s) no contexto político-institucional dareestruturação do setor elétrico nacional ................................................................................................... 65The role of Small Hydroelectric Centres (SHC’s) in the political institutional context of therestructuring of the national electricity sector ............................................................................................ 65El papel de las Pequeñas Centrales Hidroeléctricas (PCH’s) en el contexto político institucional de lareestructuración del sector eléctrico nacional .................................................................................................... 65

SOUZA, P.A.P.; VALENCIO, N.F.L.S.

Políticas para la implementación de medios innovadores en áreas no metropolitanas ........................ 77Political strategies for the implementation of innovating means in non-metropolitian areas .................. 77Políticas para a implementação de meios inovadores em áreas não metropolitanas ............................................. 77

FINQUELIEVICH, S.

Desenvolvimento e populações indígenas: direções possíveis e desafios necessários ......................... 85Development of indigenous populations: possible directions and necessary challenges ........................ 85Desarrollo y poblaciones indígenas: direcciones posibles y desafíos necesarios ................................................... 85

BROSTOLIN, M.R.

Educação, cultura e meio ambiente: uma aproximação das concepções indígenas a partirdo movimento dos professores indígenas da Amazônia ......................................................................... 99Education, culture and the environment: an approximation of the indigenous conceptionsbeginning with the movement of the indigenous teachers in the Amazon region .................................... 99Educación, cultura y medio ambiente: una aproximación de las concepciones indígenas apartir delmovimiento de los profesores indígenas de Amazonia ....................................................................................... 99

SILVA, R.H.D.

Desenvolvimento local e turismo: por uma ética de compromisso e responsabilidade com olugar e com a vida ..................................................................................................................................... 109Local development and tourism: towards an ethical commitment and responsibility with placeand life ....................................................................................................................................................... 109Desarrollo local y turismo: por una ética de compromiso y responsabilidad con el lugar y con la vida .............. 109

MARTINS, S.R.O.

Fatores inerentes à economicidade de sistemas de produção de bovinos de corte, no municípiode Campo Grande, Mato Grosso do Sul .................................................................................................. 119Factors inherent to the economy of beef production systems in the municipality of Campo Grande,South Mato Grosso.   .................................................................................................................................. 119Factores inherentes al economismo de sistemas de producción de bovinos de corte, en el municipio de CampoGrande, Mato-Grosso-del Sur ........................................................................................................................ 119

ÍTAVO, C.C.B.F.; ÍTAVO, L.C.V. ; DIAS, A.M.; GOMES, R.C.; SILVA, J.P.B.; EUCLIDES FILHO,K.; MORAIS, M.G.

Entrevista

Acerca de sueños, utopías y proyectos locales autónomos .................................................................... 138On dreams, utopias and local autonomous projects ................................................................................ 138Acerca de sonhos, utopias e projeto locais autônomos ...................................................................................... 138

ELIZALDE, A.

Artigos

As idéias keynesianas e o crescimento do produto nas economias locaisKeynesian ideas and product growth  in local economies

Las ideas keynesianas y el crecimiento del producto en las economías localesJandir Ferrera de Lima*

Sinival Osorio Pitaguari**

Recebido em 04/11/2004; revisado e aprovado em 03/02/2005; aceito em 17/02/2005.

Resumo: Este artigo analisa as principais idéias que compõem o pensamento de John Keynes. Além disso, ele fazapontamentos sobre a aplicação dos postulados “keynesianos” na dinamização das economias locais, principalmentena expansão da renda através das atividades de exportação e da intervenção do Estado na economia.Palavras-chave: Keynes; Teoria Econômica; Emprego; Renda; Economia local.Abstract: This article analyzes the main ideas that compose the John Keynes thought. Moreover, it makes notes on theapplication of the Keynesian postulates in the dynamics of the local economies, mainly in the expansion of the incomethrough the activities of exportation and of the intervention of the State in the economy.Key words: Keynes; Economic Theory; Employment; Income; Local Economy.Resumen: Este artículo analiza las ideas principales que componen el pensamiento de John Keynes. Por otra parte,hace notas sobre el uso de los postulados Keynesianos en la dinámica de las economías locales, principalmente sobreel crecimiento de la renta, con las actividades de la exportación y con la intervención del estado en la economía.Palabras clave: Keynes; Teoría Económica; Empleo; Renta; Economía Local.

das a partir da grande depressão de 1929,cujos efeitos se perpetuaram na década de1930. Essa crise assumiu um caráter mundi-al, em grande parte, devido a depressão ins-taurada nos Estados Unidos da América(EUA). Durante essa crise, em torno de 85mil empresas e 5 mil bancos faliram somentenos EUA. Cerca de um quarto da força detrabalho ficou desempregada e a renda na-cional reduziu-se a menos da metade. Nesteambiente, Keynes ganhou campo para exporsuas idéias e causar uma reviravolta nasdoutrinas econômicas até então.

John Keynes questionou as idéias eco-nômicas clássicas, cujos adeptos não aceita-vam a possibilidade de erro nos seus postula-dos. A classificação de Keynes, sobre a eco-nomia clássica, engloba todos os economistasque o antecederam e que aceitaram comopressuposto a “lei de Say”, ou seja, a idéiaque “a oferta cria sua própria demanda”. OConceito de economia clássica que estamosmais familiarizados é aquele classificado pelalei do valor do valor trabalho, oriundos dasobras de Adam Smith e David Ricardo. Acrítica keynesiana baseia-se na tradição“marginalista”, também chamada de escolaneoclássica.

Os neoclássicos interpretavam a crise

1 Os principais postulados da teoriageral de John Keynes

1.1 Introdução

Este artigo analisa os principais pos-tulados que compõem o chamado pensa-mento “keynesiano”, oriundo do marco te-órico proposto por John Maynard Keynes,na sua obra mais famosa: “Teoria Geral doEmprego, do Juro e da Moeda”, publicadaoriginalmente em 1936. Além disso, o artigoaborda o crescimento do produto nas eco-nomias locais tendo como base alguns con-ceitos keynesianos.

John Maynard Keynes (1883-1946),foi o economista mais influente do séculoXX. Seu pensamento foi um marco na críticaao “laissez-faire” (livre mercado) e aospostulados do equilíbrio geral. Nascido naGrã-Bretanha, ele foi professor no King’sCollege de Cambridge, sendo sua formaçãoteórica oriunda da teoria clássica de AdamSmith, David Ricardo, entre tantos outros,e teve como mestre o professor A. Pigou,sucessor de Alfred Marshall na cátedra deeconomia política.

Apesar de uma intensa vida acadêmicae pública, as idéias de Keynes serão difundi-

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 11-20, Mar. 2005.

*Pesquisador associado do Groupe de recherche et d’interventions régionale (GRIR) da Université du Québec àChicoutimi (UQAC) do Canadá, professor adjunto do colegiado de Economia e pesquisador do Grupo de Estudose Pesquisas em Desenvolvimento Regional e Agronegócio (GEPEC) da Universidade Estadual do Oeste do Paraná(UNIOESTE)/Campus de Toledo. ([email protected] e [email protected])**Professor auxiliar do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Londrina (UEL). ([email protected].)

12 Jandir Ferreira de Lima; Sinival Osorio Pitaguari

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

da década de 1930 como um desajuste cíclicode curto-prazo. Para os neoclássicos nãoeram suas teorias que estavam erradas, masas interferências artificiais, externas ao mer-cado, que provocavam as crises. O principaldesvio, segundo eles, era a inflexibilidade dossalários provocada pela interferência dos sin-dicatos no mercado de trabalho e a influên-cia danosa do Estado no sistema de merca-do. Essa seria a razão do grande número dedesempregados (HUNT & SHERMAN,1977). Frente a estas interpretações, JohnKeynes começa a construir um corpo teóri-co capaz de destruir as bases dos pressupos-tos neoclássicos e infundir um novo modode entender a economia, a partir de seusagregados.

1.2. Teoria Keynesiana do emprego

John Keynes, em um artigo intitulado“o fim do laissez-faire”, publicado original-mente em 1926, já fazia uma série de críticasas doutrinas liberais. No entanto, na suaprincipal obra “A Teoria Geral do Emprego,do Juro e da Moeda”, publicada original-mente em 1936, são montados os elementosde análise que vão questionar os pressupos-tos neoclássicos e gerar uma nova era no pen-samento econômico. Na “Teoria Geral”, oeconomista inglês começa demostrando queo desemprego não é causado pela recusa dotrabalhador em aceitar uma redução de salá-rio. Ele afirma que a taxa de desempregopode variar sem que “haja qualquer mudan-ça aparente nos salários reais mínimos exigi-dos pelo trabalhador ou na sua produtivida-de”. (KEYNES, 1970, p. 22). Assim, ele expõeda seguinte forma os dois postulados clássi-cos sobre o emprego, que vão ser alvos deduras críticas:

I. O salário é igual ao produto marginal.Quer dizer que o salário de uma pessoaempregada é igual ao valor que se perderia seo emprego fosse reduzido de uma unidade(depois de feita a dedução dos outros custosque essa redução de produção evitaria), com arestrição de que a igualdade pode ser alterada,de acordo com certos princípios, pelaimperfeição da concorrência e dos mercados”.II. A utilidade do salário, quando se empregadado volume de capital, é igual à desutilidademarginal desse mesmo volume de emprego .Significa isto que o salário real de uma pessoa éo que precisamente basta (na opinião das

próprias pessoas empregadas) para provocar oafluxo do volume de mão-de-obra e efetiva-mente ocupado, com a qualificação de que aigualdade para cada unidade individual de tra-balho pode ser alterada por combinações entreas unidades disponíveis para empregar-se,analogamente às imperfeições da concorrênciaque qualificam o primeiro postulado. ( p. 18)Keynes preservou o primeiro postula-

do e negou o segundo. Segundo a teoria clás-sica, o excesso de trabalhadores desempre-gados se deve a sua recusa em trabalhar. Ostrabalhadores desempregados não aceitari-am um salário nominal menor, que permiti-ria às empresas contratar mais mão-de-obra.

Esse argumento comete a falha técni-ca de subestimar a diferença entre o salárioreal e o salário nominal. Tanto que o traba-lhador não estaria disposto a abandonar seuemprego com a alta dos preços, embora te-nha resistência a perda do seu poder de com-pra. Em outras palavras, o trabalhador co-nhece sua posição relativa no mercado detrabalho, por isso, tenta preservar seus be-nefícios em relação às outras categorias detrabalhadores. Além disso, num período derecessão e altas taxas de desemprego, comoa de 1929, os trabalhadores demitidos acei-tariam facilmente ganhar menos num novoemprego para não ficarem desempregados.

Por outro lado, a idéia de flexibilidadedos salários (W), junto com os preços, eraum elemento fundamental para os ajustesno equilíbrio de mercado. Se os salários fos-sem rígidos, isto é, se não oferecessem modi-ficações rápidas no decorrer do tempo, a idéiado equilíbrio geral da economia no longo-prazo ficaria debilitada. Os ajustes rápidosnos salários possibilitariam com que o siste-ma buscasse sempre o ponto de equilíbrio nolongo-prazo. A idéia da flexibilidade podeser ilustrada com a figura 01.

Pela figura 1, o ponto de equilíbrio se-ria aquele em que o salário real (W/P) possi-bilitasse uma interação entre as curvas deoferta de mão-de-obra (Ns) e a demanda demão-de-obra (Nd), a um dado nível de ocu-pação da mão-de-obra (N). Assim, o pontode equilíbrio possibilitava volumes adequa-dos de produção e de demanda, ou seja, aigualdade entre a oferta e a demanda. Paraqualquer mudança que retirassem a econo-mia do ponto de equilíbrio por-se-iam emação forças que conduziriam a economianovamente ao equilíbrio (A). Teoricamente,

13As idéias keinesianas e o crescimento do produto nas economias locais

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

estes ajustes somente seriam possíveis com aidéia da flexibilidade dos salários e preços(P), já que o W/P é ponderado sobre o nívelgeral de preços. Com isso, o equilíbrio de lon-go-prazo com pleno-emprego dos fatores deprodução estaria sempre garantido. No en-tanto, para Keynes (1970), os salários nãoeram flexíveis. Ele vai demonstrar essa idéiaa partir dos seus postulados sobre a deter-minação da renda.

1.3 Considerações sobre a determinaçãoda renda.

A economia clássica desde DavidRicardo, com exceção de Thomas Malthus,aceitava o postulado de Jean B. Say de que aoferta cria sua própria demanda. Além dis-so, os clássicos acreditavam que o total dossalários pagos no processo de produção eragasto na compra do produto. J. S. Mill (1986),na sua obra “Princípios de Economia Políti-ca”, expressa da seguinte forma essa idéia:

Os meios de pagamento das mercadorias são aspróprias mercadorias. O meio de pagamentode cada pessoa pelas produções de outros indi-víduos, consiste daquilo que ela mesma possui.Todos os vendedores são inevitavelmente, epelo significado da palavra, compradores.(MILL, 1986, p. 104).Mill (1986) afirmava que qualquer au-

mento de produção leva necessariamente aum aumento equivalente dos meios de pa-gamento dessa produção. Como corolário aessa teoria, Marshall (1988) concluirá que aabstenção individual do consumo leva ine-vitavelmente a um investimento na produ-ção de riqueza.

O Total da renda de um homem é despendidona compra de serviços e de mercadorias. Defato, diz-se usualmente que um homem gastauma parte de sua renda e poupa a outra parte.Mas é um familiar axioma econômico que umhomem compre trabalho e mercadorias com

essa parte de sua renda que ele poupa, assimcomo faz com a parte que ele gasta. Diz-se queele gasta quando procura obter satisfaçãopresente dos serviços e mercadorias queadquire. Diz-se que ele poupa quando ele fazcom que o trabalho e as mercadorias que elecompra sejam aplicados na produção da riquezade que espera derivar os meios de satisfação dofuturo. (MARSHALL, 1988, p. 26-27).Ora, para a teoria clássica está implíci-

to que a renda não gasta por um indivíduoserá utilizada pelos empresários. Os empre-sários investirão essa renda poupada pelaspessoas na compra de mercadorias e nacontratação de trabalhadores para o aumen-to da produção. Em compensação, o poupa-dor espera receber no futuro, o valor poupa-do acrescido de um ganho extra1. Porém,para Keynes (1970), os clássicos enganavam-se ao pensar que as decisões de abster-se deum consumo imediato, estão ligadas a deprover um consumo futuro, quando nãoexiste nenhuma relação simples entre elas.Admitida a igualdade entre o preço de pro-cura e da oferta da produção, deduz-se entãouma série de hipóteses sobre a taxa de juros,sobre o equilíbrio entre demanda e oferta deemprego, sobre o papel da moeda no siste-ma e as vantagens do laissez-faire. Para com-provar suas hipóteses, Keynes (1970) propo-rá o princípio da demanda efetiva.

1.4 O princípio da demanda efetiva

Antes de tratar do princípio da deman-da efetiva será ocasional definir alguns con-ceitos: O primeiro é o de custo de fatores, par-ticularmente o custo do emprego da mão-de-obra. O segundo é o custo de uso, ou seja,o custo dos bens comprados a outros empre-endedores mais o custo da utilização do seuequipamento. Cabe salientar que a diferen-ça entre o valor da produção resultante e a

Figura 1: Equilíbrio no Mercado de Trabalho.

Fonte: Keynes, 1970.

W/P Ns

Nd

W/P0

N0 N

Onde: N = Nível de

ocupação da mão-de-obra.

W/P = Salário real. Ns = f (W/P) Nd= f (W/P)-1

14 Jandir Ferreira de Lima; Sinival Osorio Pitaguari

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

soma dos custos de fatores e de uso, é o lu-cro ou a renda do empreendedor.

Assim, o custo de fatores é a renda dosfatores de produção sob a ótica do empre-endedor. A soma dos custos de fatores maiso lucro será a renda total resultante do em-prego fornecido pelo empreendedor. Do pon-to de vista do empreendedor, convém algu-mas vezes chamar produto de um dado vo-lume de emprego, ao rendimento global (RE)que ele resulta, ou seja, o custo dos fatoresmais o lucro. O preço da oferta global dosprodutos resultantes do emprego é a retri-buição esperada pelo empresário. O preçoda oferta total é líquido do custo de uso, estesó será somado ao preço da oferta total, nopreço pago pelo comprador.

Dado o estágio da técnica, dos recur-sos e dos custos de fatores por unidade deemprego, o volume deste é fixado pelo mon-tante que os empresários esperam receber dacorrespondente produção, ou seja, eles fixamo emprego no ponto de máximo da diferen-ça entre o produto e o custo de fatores.

A figura 2 ilustra esta relação, onde Zé a oferta global resultante do emprego deN homens e D é a função de procura global.O volume de emprego fica estabelecido noponto de intercessão da função da procuraglobal com a função da oferta global. Nesteponto que são maximizadas as previsões delucro dos empresários. A procura efetiva édefinida como o valor de D no ponto de in-tercessão da função da procura global coma da oferta global. No momento que D formaior que Z há um estímulo para o aumen-to do emprego e a produção de novos bens,até o momento em que Z=D.

Para a doutrina clássica a qualquervolume de produção e de emprego, a fun-

ção de oferta global e a função de procuraglobal seriam iguais. Na suposição que “aoferta cria sua própria procura”, então “opreço da procura global (ou produto) sem-pre se ajusta a qual for o valor de N, o pro-duto D adquire um valor igual ao preço daoferta global Z que corresponde a N”.(KEYNES, l970, p.37 e 38). Assim, segundoos clássicos, o volume de emprego éindeterminado, salvo na medida em que adesutilidade marginal do trabalho lhe fixeum limite superior. Se isso fosse verdade, opleno emprego seria facilmente atingido, poisa concorrência entre os empresários levariasempre a um aumento do emprego, até quea oferta global desse, fosse inelástica. Nesteponto, um aumento da procura efetiva nãolevaria a um aumento da produção.

Supondo que os salários nominais eoutros custos permaneçam sem variaçãomonetária, quando o emprego aumenta,aumenta também a renda global. Como apropensão marginal a consumir é menor queum (1), o consumo aumentaria, mas não namesma proporção do aumento da renda. Adiferença entre o produto e o consumo é apoupança. A economia estará em equilíbriose a poupança for igual ao investimento re-alizado pelos empresários. Quanto a isto,Keynes (1970) afirma que a justificativa paraa criação de empregos reside na existênciade investimentos que absorvam os exceden-tes de produção, mantendo ou até mesmoaumentando a receita dos empresários, esti-mulando-os a oferta de novos postos de tra-balho. Então, dada a propensão marginal aconsumir, os empresários ampliarão ou re-duzirão o emprego, através do nível de in-vestimento. O incentivo ao investimento de-pende da relação entre a escala da eficiên-

Figura 2: Demanda Efetiva

Fonte: Keynes (1970).

RE Z

D

RE0

Onde, Z= f (N) = oferta global. D= f (N) =Demanda global. RE = Rendimento global. N= Nível de ocupação da

mão-de-obra. N N 0

15As idéias keinesianas e o crescimento do produto nas economias locais

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

cia marginal do capital e o complexo dastaxas de juros inerentes aos empréstimos deprazos e riscos diversos.

Assim só pode haver um nível de em-prego compatível com o equilíbrio: Renda =Consumo + Investimento. Caso contrário, aprocura global e a oferta global seriam dife-rentes. Este nível de emprego pode estarabaixo, mas não superior ao pleno empre-go. Este fato atesta a relação mútua entre apropensão marginal a consumir e os incen-tivos para investir.

Frente a este aspecto, não é adesutilidade marginal do capital, expressaem salários reais, que determina o nível deemprego. O nível de emprego é determina-do pela propensão marginal a consumirmais o investimento, que determina tambémo nível dos salários reais. Caso a propensãomarginal a consumir e o montante do inves-timento resultem numa insuficiência da pro-cura efetiva, o volume do emprego cai atéficar abaixo da oferta de mão-de-obra dis-posta a trabalhar pelo salário real em vigor.Ocorre assim uma situação de desempregoinvoluntário. Este fato explica o paradoxoda “pobreza em meio à abundância”, pois ainsuficiência de procura efetiva não permiteà economia de chegar ao seu ponto de ple-no-emprego. Para Keynes (1970, p. 42) “ainsuficiência da procura efetiva porá umfreio ao processo de produção, ainda que ovalor do produto marginal da mão-de-obracontinue superior a desutilidade marginaldesse volume de emprego”.

Keynes (1970) observa também a ten-dência de se alargar a distância entre o pro-duto real e o produto potencial quanto maisrica for a nação. Um país pobre tenderá aconsumir quase toda a sua produção, sendoassim, um pequeno investimento garante opleno emprego. Num país rico, a poupançaserá muito maior, pois a propensão margi-nal a consumir é mais fraca. Da mesma ma-neira, a dificuldade para que a poupança sejatotalmente investida na produção será mai-or, com a agravante do capital acumuladoser muito grande.

1.5 Poupança, taxa de juros einvestimento.

Se a satisfação dos indivíduos é a re-muneração pelo seu trabalho, se o lucro é aremuneração pelo seu investimento, entãoos juros são a remuneração pela renda não-gasta, isto é, pela poupança. Na verdade domesmo modo que o lucro é a “recompensa”ao capitalista por ele se comportar como ca-pitalista produtivo, os juros são a “recom-pensa” do capitalista pelo seu desejo de con-tinuar sendo capitalista, ainda que não sejacapitalista produtivo. Ele é recompensadopor se recusar a reter dinheiro na forma lí-quida, estéril, ou como afirma Keynes (1970),um prêmio por não entesourar sua renda.

No entanto, para haver equilíbrio naeconomia é preciso que a demanda por in-vestimentos cresça em magnitude igual aoacréscimo da oferta global menos o acrésci-mo do consumo. O problema é que ninguémgarante que isso ocorre, pois depende dasexpectativas dos empresários. Os empresá-rios comparam o lucro esperado do investi-mento com a taxa de juros. Eles verificam aeficiência do investimento frente às alterna-tivas de aplicação do capital e ao custo detomar este capital junto aos bancos(KEYNES, 1987a).

Por outro lado, na teoria clássica a taxade juros seria o preço de desequilíbrio entrea oferta de recursos existentes para o inves-timento e a procura destes pelos investido-res. Qualquer taxa de juros daria pleno em-prego e garantiria o equilíbrio entre a pou-pança e o investimento. Não se aceitava umadesigualdade entre ambos. Mas, para Keynes(1987, 1987a), a poupança depende muitomais do nível de renda, do que da taxa dejuros. Esta por sua vez, seria definida pelarelação entre a oferta (em geral inelástica,no curto-prazo) de moeda e sua procura. Odinheiro não é visto meramente como umnumerário, mas como elo entre o presente eo futuro, como reserva de valor. O dinheirocomo reserva de valor é estéril, não rendenem lucro nem juros. O desejo de manter odinheiro como reserva de valor é um barô-metro do grau de incerteza ao futuro. Comisso, a contrapartida exigida para o indiví-duo separar-se dele destaca o montante desua inquietação quanto aos dias que virão.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

A taxa de juros é apenas um dos con-dicionantes do investimento, o outro é o lucroesperado do investimento, o que Keynes cha-ma de eficiência marginal do capital. Quandoo capitalista espera alcançar uma taxa de re-torno (em forma de lucro) com o investimen-to em bens de capital, matéria prima e mão-de-obra maior do que a taxa de juros, ele cer-tamente optará pelo investimento, comomencionado anteriormente. Keynes (1970,1987a) estabelece então expectativas, basea-do nas premissas que os agentes econômicosformam na tentativa de prever o movimentodas variáveis econômicas, já que o seu ambi-ente é de incerteza. Num debate, Keynes(1987, p.151) afirmaria, que esta taxa de juros“... equipara as vantagens da posse do di-nheiro e do direito futuro sobre este”.

O investimento flutua por razões dife-rentes daquelas que determinam a propen-são a consumir. Assim, só por coincidênciaa “brecha” entre o consumo e a renda serápreenchida pelo investimento. Dada a pro-pensão marginal a consumir (curto prazo),o volume de consumo está determinado pelonível de renda. Mas, a renda é determinadapela produção de bens de consumo e de bensde capital. No entanto, decorre que os empre-sários acharão que vale a pena produzir umaquantidade de bens de consumo que vai de-pender da quantidade de bens de capital queeles estão produzindo.

Portanto, é o montante de investimen-to que determina o nível de emprego. E se oemprego e a renda global aumentam, nemtodo emprego adicional será requerido parasatisfazer as necessidades do consumo adici-onal. Este aumento do emprego só será van-tajoso se um novo investimento vier a pre-encher a nova “brecha”. Daí que Keynes(1985) admite que a regulação do investimen-to corrente não pode ficar abandonada ape-nas à iniciativa privada, caso contrário, astendências às crises seriam mais freqüentes,vinculada um fluxo circular que poderia cau-sar até mesmo uma depressão, até o momentoque um fato novo viesse reverter o processo.

1.6 As idéias de Keynes e o crescimentodo produto nas economias locais.

A análise keynesiana opera no campoda macroeconomia. No entanto, a partir de

1950 vários trabalhos científicos convergiramna adaptação dos conceitos keynesianospara explicar a dinâmica da economia regi-onal e urbana. Desses trabalhos, pode-se ci-tar os estudos clássicos de North (1956),Hirschman (1964), Isard (1972), Perroux(1982) e Lopes (1987). Conseqüentemente,essas análises clássicas forneceram elemen-tos para a compreensão da dinâmica da eco-nomia local. Para o caso brasileiro, pode-secitar como referência os estudos de Souza(1981), Haddad (1989), Rippel e De Lima(1999) e De Lima et all (2004). Esses estudostêm como elo comum a aplicação da análiseregional e dos pressupostos keynesianos parainterpretar a dinâmica regional do Brasil ede algumas regiões ou municípios brasileiros.

Esses estudos partem do pressupostoque nenhuma região ou economia local éfechada, ou seja, elas interagem com a es-trutura produtiva de outras regiões ou es-paços. Nesse sentido, as economias locaismantêm uma estrutura de comércio inter-regional para dinamizar sua demanda efe-tiva. Sem contar é claro com a participaçãodo setor público, através da política pública,visando a expansão do emprego e da renda.Assim, a base produtiva de exportação e osinvestimentos do setor público são elemen-tos essenciais na dinamização das economi-as regionais ou locais.

Tomando como exemplo a economialocal, no caso da base produtiva de exporta-ção, ela utiliza as atividades de exportaçãoou de base como elemento-chave do seu cres-cimento econômico. Nesse sentido, o produ-to agregado local pode ser expresso pela se-guinte equação:

Y= I + G + C + (X – M) (01)

Na equação (01), I são os investimen-tos ou gastos dos empresários, G os gastosdo setor público, C o consumo das famílias,X as exportações e M as importações. As-sim, um aumento nessas variáveis causaráuma expansão na renda ou produto da eco-nomia, expresso por Y. Por exemplo, umaexpansão nas exportações (X) de um setorespecífico (a) estimulara a oferta de empre-gos. Por sua vez, novos postos de trabalhosignificam mais salários pagos e um aumen-to no consumo das famílias. O acréscimo noconsumo das famílias representa um aumen-

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to da demanda efetiva, principalmente nossetores que produzem para o mercado in-terno. Por isso, o efeito expansivo no produ-to local (Y) só será reduzido se um aumentonas importações (M) for mais expressivo queas exportações (X). A dinâmica da renda lo-cal, estimulada pelo setor exportador, seráexpresso pela equação (02):

∂Y = ∂X (1/ ∂S + ∂M) / ∂Y = ∂X (1/ Sa + Ma)

Na equação (02), “a” representa o se-tor exportador e S o saldo da balança co-mercial (X-M). Sa e Ma representam a pro-pensão marginal para a formação de umexcedente de exportação. Esse excedente deexportação será o resultado da diferençaentre a demanda efetiva local e o total pro-duzido na economia. As exportações seriamum canal para complementar a demandaefetiva e garantir o dinamismo da economialocal a longo-prazo.

Nessa lógica, a produção local pode serdividida em produção para consumo inter-no local e excedente de exportação. A pro-pensão para a produção de bens para o con-sumo interno local será:

∂I=∂Yia=∂X (ia/Sa+Ma) (03)

Aceitando-se que as atividades expor-tadoras são capazes de dinamizar a econo-mia local, então 1/Sa+Ma é o efeito multi-plicador da economia local, onde i represen-ta a taxa de juros. Esse efeito multiplicadoré causado pela expansão das atividades ex-portadoras ou de base.

Deve-se ressaltar que o multiplicadorkeynesiano, transposto para as economiaslocais, é um instrumento simples para asgeneralizações do crescimento econômicolocal. Seu sucesso vai depender em muito dosucesso da escolha dos setores exportadores,da capacidade desses setores em geraremexcedentes, do perfil do consumo local aolongo do tempo e da capacidade da econo-mia local em manter os superávits na balan-ça comercial. Por isso, a hipótese dadinamização da produção e da demandalocal, através da base de exportação, requersaldos positivos na balança comercial.

O segundo elemento de dinamizaçãoda demanda efetiva e da produção local é aação do setor público, em particular dos gas-

tos públicos. Uma expansão na propensão aconsumir do setor público (G) também cau-sará um efeito de crescimento sobre a rendalocal. No entanto, esses gastos públicos sãodependentes da capacidade de financiamen-to do Estado e da natureza da despesa pú-blica. Por exemplo, uma expansão do gastopúblico na mesma proporção de um aumen-to nos impostos não surtirá um efeitomultiplicador sobre a renda total. Keynes(1970) caracteriza essa situação como oteorema do orçamento equilibrado. Por ou-tro lado, se o gasto público for efetuado paracriar uma infra-estrutura capaz de diminuiros custos de produção e viabilizar o setorprodutivo, então a economia local melhora-rá suas condições estruturais de crescimen-to e desenvolvimento.

Para Keynes (1970), através de algu-mas políticas econômicas e dos dispêndiosdo governo, é possível obter-se o pleno-em-prego ou chegar o mais próximo dele, utili-zando-se da manipulação de algumas vari-áveis macroeconômicas, como segue:1) A quantidade de moeda: Ela é tida como

uma variável exógena, mas governo podeinfluir na taxa de juros, variando a ofertade moeda. Adotando que aumentam aoferta de moeda como, por exemplo, di-minuindo a taxa de redesconto bancário,a taxa de juros do mercado deverá cair. Sea taxa de juros for baixa em relação à efi-ciência marginal do capital, a economiatende ao pleno emprego. No entanto, paraKeynes (1985), estas medidas deveriam serefetivadas de forma a não deturpar acredibilidade da moeda, o que poderia cau-sar até mesmo a ruína da nação.

2) O efeito multiplicador do investimento: Eledepende da propensão a consumir e a pou-par. Quanto mais concentrada for a ren-da nacional, menor será a propensão aconsumir e maior a propensão a pouparda sociedade como um todo, portanto oefeito do multiplicador do investimentoserá reduzido. Adotando uma política fis-cal distributiva de renda, o governo estarápossibilitando uma elevação da propensãomarginal à consumir, com isso, permitin-do que a economia possa chegar ao plenoemprego. Dado a distribuição de renda ea propensão ao consumo, se o governo nãoconseguir baixar a taxa de juros, com sua

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política econômica , o remédio é o própriogoverno acrescentar seus gastos públicos,elevando a demanda efetiva para não frus-trar as expectativas em que se baseia a efi-ciência marginal do capital. De forma irô-nica Keynes (1970, p.129) propõe:

A construção de pirâmides, os terremotos e atéas guerras podem contribuir para aumentar ariqueza, se a educação dos nossos estadistas nosprincípios da economia clássica impedem umasolução melhor (...) Se o Tesouro se dispusessea encher velhas garrafas usadas com notas debancos, as enterrassem a profundidades conve-nientes em minas de carvão - abandonadas -que logo se cobririam com os detritos urbanose deixasse à iniciativa privada, de acordo comos bens experimentados princípios do laissez-faire, o cuidado de desenterrar novamente asnotas, o desemprego poderia desaparecer e, coma ajuda das repercussões, é provável que a rendareal da comunidade bem como a sua riquezaem capital fosse sensivelmente mais altos doque o são atualmente. Claro que seria maisajuizado construir casas ou algo semelhante;mas se a tanto se opõe dificuldades políticas epráticas, o recurso citado não deixa de serpreferível a nada.Considerando as “dificuldades políti-

cas e práticas”, referidas por Keynes (1970),a produção de “inutilidades” como as pirâ-mides, perdem o sentido de desperdício eservem como soluções. O importante é queos investimentos públicos não aumentem acapacidade de produção da economia. Nes-sa situação os investimentos têm que ser im-produtivos. A contribuição principal que oEstado poderia dar ao aumento da produ-ção seria garantir a demanda efetiva aos in-vestidores privados. Frente a esta necessi-dade, a insuficiência de consumo é o grandecausador de crises.

O próprio Keynes (1970, p.309-310)reconhece que dada as dificuldades de elevaro investimento, não há “outros meios de me-lhorar o nível de emprego além do de aumen-tar o consumo”. E mais adiante, “é impro-vável que o pleno emprego possa ser manti-do com a propensão à existente, façamos oque fizermos com respeito ao investimento”.

A crise surge quando as expectativas,que geraram um determinado nível de efici-ência marginal do capital são frustradas,eram falsas ou exageradas. O resultado é umsobre investimento seguido de um corte nademanda efetiva (pela retração do investi-mento e, portanto, do próprio consumo), oque significa um mergulho na eficiência

marginal do capital, além da elevação nataxa de juros, dado o aumento da incertezae da inquietude em relação ao futuro. Nestecaso, a economia entra em recessão e se ini-cia um processo cumulativo de retração degastos e, portanto, do emprego. A saída dacrise está na recuperação da eficiência mar-ginal do capital.

Neste sentido, deve-se ressaltar que aprópria crise prepara sua recuperação quan-do “a escassez do capital pelo uso, a deteri-oração e a obsolescência se torne bastanteóbvia para aumentar a eficiência marginal”(KEYNES, 1970, p. 303). O problema é queela não se recupera tão violentamente comocai. Assim, o período de crise pode ser dolo-roso demais. O que pode ser feito para ace-lerar a recuperação? Na “Teoria Geral”, JohnKeynes sugere medidas que modifiquem opadrão de renda da população, no sentidode melhorá-la, favorecendo a tendência aoconsumo. A propensão a consumir condu-ziria a um aumento das atividades produti-vas e ao crescimento econômico, melhoran-do também os ganhos dos empresários.

Com isso, frente à insuficiência de de-manda, ou dos próprios investimentos, o Es-tado assumiria um papel preponderante eanticíclico na economia. Keynes (1970,p.356) só não admite que o Estado se envolvano setor produtivo, afirmando que “(...) nãoé a propriedade dos meios de produção queconvém ao Estado assumir”. Ao Estadointervencionista caberia aquilo que a inicia-tiva privada não pudesse ou não quisessefazer.

Deve-se ressaltar que as alterações nademanda efetiva, advinda da expansão dasatividades de exportação ou da despesa pú-blica, têm três efeitos sobre a renda da econo-mia local: um efeito direto associado à remu-neração das famílias, que dependem do setorexportador; um efeito indireto, que vai esti-mular a produção dos setores não exporta-dores; um efeito induzido pelo acréscimo derenda causado pela expansão do empregonos setores exportadores e não exportadores.

Portanto, esses dois elementos de dina-mização da economia local não são únicos.Na realidade, a análise pormenorizada docrescimento econômico, a partir dos postula-dos keynesianos, foi proposta por Harrod(1966) com seu modelo Harrod-Domar. No

19As idéias keinesianas e o crescimento do produto nas economias locais

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

entanto, os dois elementos apresentados fa-zem uma ilustração das possibilidades deadaptação dos postulados keynesianos emescala local.

1.7 A crise do keynesianismo

A política econômica keynesiana podeamenizar as crises do capitalismo, pode re-tardar seu surgimento e acelerar sua recu-peração. Porém, a intervenção do Estado temlimites econômicos e políticos, impedindoque as crises e os ciclos econômicos sejameliminados. Mais grave ainda é que as polí-ticas econômicas de que dispõe o Estado ca-pitalista tendem a agravar as contradiçõesque levarão a crises mais graves e profun-das no futuro. Neste sentido, deve-se ressal-tar as duas maiores contradições da políticaeconômica keynesiana, quais sejam:

Em primeiro lugar, a possibilidade deo capitalismo manter a economia no plenoemprego é impossível, a menos que sejameliminadas as inovações técnicas nos meiosde produção e no processo de trabalho. Noentanto, são essas inovações que permitemo aumento dos lucros.

Mesmo que fosse possível a manuten-ção do pleno emprego, isso traria sérios pro-blemas aos capitalistas, pois traria um maiorpoder de barganha aos trabalhadores, paraobter ganhos de salários reais. Isso faria bai-xar a taxa de lucro, ou a eficiência marginaldo capital, diminuiria os investimentos e aeconomia poderia entrar em crise. Para nãofalar na possibilidade de acirramento da lutapelo poder político entre os trabalhadores eos proprietários dos meios de produção. Amanutenção do pleno emprego, numa eco-nomia capitalista não só é impossível, comoé indesejável, aos capitalistas. Normalmen-te, os curtos períodos onde a economia che-ga próxima ao pleno emprego, apenas pre-coniza a crise que vem logo a frente.

Em segundo lugar, a política de inter-venção do Estado na economia, em favor daacumulação de capital, mais cedo ou maistarde, esbarra no limite da capacidade definanciamento do próprio Estado. De acor-do com Sutcliffe (1979), apesar dos dispên-dios do Estado fomentar o consumo de pro-dutos e realizar a mais-valia gerada no sis-tema produtivo, as mesmas exigem financi-

amento causando a elevação da carga tri-butária sobre salários e lucros.

Keynes (1970, 1985) defendia três ti-pos de intervenção do Estado na economia:a política monetária, para controle da taxade juros, de forma a garantir a eficiênciamarginal do capital; a política fiscal, paraintervenção na distribuição de renda, de for-ma a controlar a propensão marginal a con-sumir a poupar e a investir; e por fim, a po-lítica de gastos públicos, para sustentação dademanda efetiva. Destarte, a partir da IIGuerra Mundial, incorporou-se ao receituá-rio keynesiano, o investimento público emempresas estatais, normalmente em setoresmenos rentáveis e de um prazo maior paramaturação dos investimentos. Essas empre-sas normalmente produzem insumos, quesão vendidos a preços subsidiados às empre-sas privadas.

O conjunto dessas políticas leva aocrescimento do endividamento do Estado ea possibilidade de “espiral” inflacionária,quando o financiamento dos gastos públi-cos se dá pela emissão desordenada de moe-da. Assim, a partir de um momento o Esta-do já não é mais capaz de continuar finan-ciando a acumulação de capital. Nesse mo-mento a própria política keynesiana, passaser responsabilizada pela crise. Todos se vol-tam contra o Estado esbanjador, como o prin-cipal culpado pelo déficit público, pela in-flação e pela crise. Nesse momento a criseeconômica assume também, o conteúdo deuma crise política de Estado, levando a umareflexão sobre o seu real papel.

De certa forma, os acontecimentos quese seguiram após a década de 1970, em quea economia mundial mergulhou num pro-cesso de estagflação, contribuiu para questi-onar os “remédios’ keynesianos na atualida-de. Fato que processou a retomada dosparadigmas rechaçados pela “Teoria Geral”. O retorno dos postulados clássicos, agoracom uma “roupagem” mais moderna, vemde encontro a uma ciência econômica emcrise, principalmente frente aos “velhos”problemas, como desemprego e inflação,cujas soluções temporárias não tem garanti-do o seu extermínio no longo-prazo.

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2 Conclusão

A grande contribuição de Keynes nocampo da teoria econômica, de certa forma,foi tornar a ciência econômica novamentepolítica. Com isso, a economia, enquanto ci-ência, não está isenta de valores e conse-quentemente está à mercê das intervençõesgovernamentais e dos grupos que mantémo poder institucional. Estas intervenções te-riam como objetivo básico corrigir as distor-ções do sistema capitalista, cuja tendênciaàs crises cíclicas foi aceita por economistasde diferentes doutrinas e correntes do pen-samento. O fato da necessidade da interven-ção por si só estabelece que o sistema nãotende “necessariamente” a um equilíbrioótimo e até mesmo adequado aos agenteseconômicos. Em vista disso, a espera de umapossibilidade de equilíbrio no longo-prazopoderia conduzir a crises profundas no cur-to-prazo, causando desemprego e recessão.

Junto ao postulado da demanda efeti-va, Keynes estabelece parâmetros teóricospara a necessidade do consumo. O sistemacapitalista na sua essência não sobrevive semo consumo. Conseqüentemente, as garanti-as de renda e ocupação são os fatoresdeterminantes para que a atividade produ-tiva mantenha seu volume de investimen-tos, garantindo assim o processo de cresci-mento da economia.

Com a crise atual das economias emer-gentes, principalmente depois de ajustes efe-tuados sob o escopo da economia neoclássi-ca, a obra de Keynes serve como marco refle-xivo para a viabilidade das transformaçõesque vem sendo postas em marcha nos mer-cados emergentes, em especial o Brasil.

Nota:1 Na versão moderna da teoria clássica, elaborada já

no inicio do século XX, não se encontra na ação damoeda, um fator que pudesse distorcer gravementea teoria da produção elaborada por Mill (1986) sobreuma base de trocas reais.

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Elementos de análise da noção de exclusãoElements of the analysis of the notion of exclusion

Elementos de análisis de la idea de exclusiónMaria Helena Rossi Vallon*

Recebido em 20/10/2004; revisado em aprovado em 03/12/2004; aceito em 17/02/2005.

Resumo: Atualmente, a noção de exclusão encontra-se em todos os ramos das Ciências Sociais, em programasgovernamentais e não governamentais como um mal da sociedade que precisa ser tratado. Este artigo procura revera noção deste termo no uso indiscriminado através da reflexão de autores franceses mostrando que não se trataapenas de definir a exclusão, mas de torná-la uma questão a ser pensada e superada com meios apropriados.Palavras-chave: exclusão; conceito; problemática.Abstract: At the moment, the notion of exclusion is found in all branches of the Social Sciences, in government andnon-government programmes as an ailment of society that needs to be treated. This article seeks to examine again thisindiscriminately used term by reflecting on French authors showing that it is not just a question of defining exclusionbut of making it a question to be thought on and overcome with appropriate means.Key words: exclusion; concept; problematical.Resumen: Actualmente, la idea de exclusión se encuentra en todas las ramas de las Ciencias Sociales, en programasgubernamentales y no gubernamentales como un mal de la sociedad que necesita ser tratado. Este artículo, buscarever la noción de este término en el uso indiscriminado a través de la ponderación de autores franceses mostrandoque no se trata apenas de definir la exclusión, pero de tornarla una cuestión a ser pensada y superada con mediosapropiadosPalabras clave: exclusión; concepto; problemática.

longo dos séculos, segundo o momento histó-rico e/ou político e a formação social à qualpertencem. Os pesquisadores das CiênciasSociais e as instituições governamentais, emépoca recente, perpetuam esta necessidadede tratar a questão social mediante a atri-buição de conceitos. O mais recente deles éo de exclusão, e está aí o problema metodo-lógico, como se pelo fato de delimitar os ex-cluídos no espaço e no tempo, ou seja, ao sefixar a sua territorialização, não se impuses-se a necessidade de uma problematização e,também, de rompimento com as amarras queatam o sentido de exclusão ao de político, aode econômico, ao de histórico, ao de ideoló-gico, ao de patológico ou à combinação detodos ou de alguns destes fatores.

A necessidade de se tratar criterio-samente o conceito de exclusão é premente,porque no Brasil as pesquisas relativas aoconhecimento da realidade social são redu-zidas, limitando-se, em última análise, a de-nominar como excluídos todos aqueles indi-víduos que não estão in, perdendo-se nesteconceito, que se supõe definir tudo que é out,a oportunidade de um verdadeiro conheci-mento da sociedade brasileira. Assim, qual-quer programa social governamental paraas camadas de baixo poder aquisitivo, querseja, de saúde, de educação, de qualificação

1 Introdução

Este artigo discute o conceito de exclu-são, empregado nos diversos ramos das Ci-ências Sociais, como Sociologia e Economia,cobrindo realidades diversas, como se o sig-nificado do termo pudesse ser aplicadoindiscriminadamente em qualquer campo depesquisa destas ciências e não exigisse defi-nição específica. Ao se nomear exclusão parauma situação dada como tal, cabe ao pes-quisador desvendar a imagem que ela refle-te, porque esta noção que se aplica a todasas situações supostas out pode colocar emrisco a percepção do objeto estudado, pro-duzindo apenas uma aproximação da reali-dade retida. Para o entendimento da pro-posta colocada, este artigo compõe-se deconsiderações preliminares sobre a questãometodológica, a origem do termo exclusão ea noção antes do vocábulo; em seguida anoção recente e a entrada do termo nas ci-ências sociais, por último, discute-se o con-ceito de exclusão e seu uso indiscriminado.

2 Considerações preliminares

Às camadas pobres, miseráveis e invá-lidas (físicas e mentais) da população têmsido atribuídas terminologias diferentes ao

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 21-28, Mar. 2005.

* Professora de Sociologia e pesquisadora da Fundação João Pinheiro de Minas Gerais (31 3448-9706)

22 Maria Helena Rossi Vallon

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

profissional ou de segurança, nomeia exclu-ído o público alvo de seu interesse, como setodos os indivíduos que o compõem tives-sem uma só face. O que se verifica é que es-tes programas se perdem no curso do cami-nho, porque o que se nomeou exclusão nãose definiu apropriadamente e porque esteconceito não é uma categoria definida, está-tica. O problema metodológico ligado aoconceito de exclusão consiste, então, em seromper com a própria semântica do termo,para se permitir emergir o objeto de estudoe a sua problematização.

O emprego indiscriminado do termoexclusão não diz respeito somente ao Brasil,em decorrência, da escassez ainda de pes-quisa sobre o social, mas a países do Primei-ro Mundo, como a França, onde o social éanalisado minuciosamente.

A preocupação com este termo, queencobre as inúmeras facetas de dificuldadesda sociedade e não as define, foi motivo deum encontro de exposição de trabalhos edebates na França, em 1995, denominadoL’exclusion, définir pour en finir, o qual deuorigem a uma obra com o mesmo nome, quereúne o trabalho dos participantes.1

Karsz (2000, p.105), organizador daobra e autor de um dos artigos, afirma que“[...] a maior parte das situações que nos anos90 são descritas em termos de exclusão es-tão longe de serem específicas deste período”.

Surge daí a necessidade de tratar aexclusão sob outras apelações, como afirma oautor, porque o que se coloca sob esta “eti-queta nem conceptualmente nem pratica-mente são a mesma coisa”.

3 A origem do termo exclusão

Ao se repertoriar o termo exclusão, bemassim a sua entrada nos anos 70/90 nas Ci-ências Sociais, pode-se associá-lo a um perí-odo em que a economia dos países ditos cen-trais inicia uma fase de perda de velocidadede seu crescimento e os problemas sociaisemergem sem nitidez, pois o desenvolvimen-to da economia dos trinta gloriosos anos, prin-cipalmente na França, ainda se mantinha depé. Dito isto, pode-se dizer que esta impreci-são ao se tratar dos problemas sociais estavana crença de que os benefícios do crescimen-to econômico poderiam absorver o peso dos

problemas sociais, que se afloravam.Os países ditos periféricos, em especi-

al na América Latina, experimentavam tam-bém fases notáveis de industrialização e decrescimento econômico. A maioria dos paí-ses ainda estava mergulhada em regimesautoritários, para entrar, poucos anos maistarde, em regimes democráticos. Nestes paí-ses os excluídos ainda não eram denomina-dos com este termo; eram chamados margi-nais. Sob esta apelação, a questão era trata-da circunscrita a uma espécie de territoria-lização: expulsos do campo, para chegaremnos centros urbanos e serem prisioneiros dosbairros periféricos das cidades.

De qualquer forma, em países centraise periféricos a massa de excluídos não tinhatrajetória própria, nem identidade, mas cons-tituía uma espécie de patologia não incor-porada ao econômico, no contexto de cres-cimento, de desenvolvimento, da época. Oque se pode dizer é que a noção de exclusão,de origem franco-francesa, na década de 90ultrapassa as fronteiras dos países de línguafrancesa, sendo empregada pelos pesquisa-dores de língua inglesa, portuguesa e espa-nhola na América Latina. Ela torna-se “umacategoria supradeterminada, sem fronteiras, aomesmo tempo interprofissional e interdisci-plinar”. Karsz (2000, p. 103).

4 A noção antes do vocábulo

O termo exclusão, na língua francesa,em seu significado atual, apareceu em 1559.Anteriormente, no século XIV, conforme re-gistra Frétigné (1999, p. 151), havia dois sen-tidos para o termo: “a recusa de participa-ção” (não admitir) e a ruptura (expulsar).

Em 1559, excluir significava, como re-gistra Frétigné (1999, p 151): “[...] manteralguém fora do que ele poderia ter direi-to[...]”, em matéria de direito de sucessão.Em 1662, o registro do termo continuou comesse significado jurídico, mas é acrescido dadimensão de rejeição, relembrando a noçãooriginal. Então, exclusão passou a significar:“ação de deixar alguém fora, rejeitar”.

Como indica o autor, uma leitura datrajetória histórica dos deserdados na obra deCastel, Metamorfoses de questão social, retratao sofrimento destas massas miseráveis desdea Idade Média, mostrando que a ação de dei-

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xar fora se consumou através dos tempos paraestas categorias da população sob diversasformas: aprisionadas, expulsas, banidas.

Assim ocorreu com a expulsão dos ju-deus na Espanha, em 1492, por não serembatizados na Igreja Católica. Vale ressaltarque neste fato histórico não é a supremaciados católicos sobre os judeus que se impõeafirmar, mas a diferença entre um credo eoutro. A expulsão (exclusão) se deu porquehavia diferenciação de credo (Frétigné, 1999,p.153).

Registram-se ao longo da história ou-tras formas marcantes de exclusão que enco-brem ações de diferenciação, como os va-gabundos,2 que são banidos nos séculos XIVe XV, do meio a que pertenciam (campo oucidade); ou condenados a morte individual,para os criminosos; ou destinados a confi-namento em asilos, prisões, guetos.

Em época recente, a política deapartheid na África do Sul, é reconhecidacomo uma política de exclusão, porque distin-gue o homem branco do homem negro. As-sim também o sistema de castas na Índia,que perdura inabalavelmente.

Nos exemplos mostrados, trata-se, comafirma Frétigné, (1999, p. 157), de uma exclu-são “[...] que precede de uma lógica jurídicaou de diferenciação que se exprime pela re-jeição (rara hoje) ou uma proibição [...]”. Oautor explica que ressaltar esta diferenciaçãotorna-se importante, na medida em que existeuma tendência entre os autores da Sociologiade se fazer uma confusão entre o que é exclu-são e o que é discriminação, o que ele chamade “[...] confusão das lógicas de exclusão ede discriminação [...]”. Os desempregadosna época contemporânea na sociedade fran-cesa, não foram excluídos do mercado detrabalho, mas “[...] vítimas de um processode inferiorização, de depreciação [...]”. Emsuma, a lei não os excluiu; nada legalmenteos impede de retornar à vida normal.

Desta forma, a exclusão, no ponto devista de Frétigné, decorre de lógicas regula-mentares. Os outros fatos da realidade soci-al, a que, indiferentemente, denominam-seexclusão, são lógicas sociais de discriminação.É esta confusão que leva o pesquisador emCiências Sociais a uma análise equivocadada realidade.

Como se verá, outros autores tratam da

noção de exclusão, mas não fazem esta dis-tinção, como Frétigné, procurando ver nestanoção outras implicações, mais complexas.

5 A noção recente e a entrada do termonas ciências sociais

A introdução do termo exclusão ocor-re em 1965, na França, na obra de J. Klanfer,L’exclusion sociale. Como afirma Frétigné(1999, p. 64) o título da obra é “[...] surpre-endentemente contemporâneo”, mas “emconseqüência, a tomada de consciência deque existem ‘excluídos’ não ocasiona ne-nhum questionamento no modelo social dedesenvolvimento, nenhuma idéia de refor-ma ou de mutação do corpo social [...]” .

Em 1974, René Lenoir publica a obraLes exclus un français sur dix, em que se podeencontrar a noção que se presta a este termonos dias atuais, cobrindo toda e qualquerespécie de dificuldade social, mas sem a pre-ocupação de situar o termo como categoriaanalítica.

a) A noção de exclusão na década de 1980

Paugam (1991), entre outras de suasobras memoráveis, analisa a pobreza dosanos 1980 na França, a partir da noção dedesqualificação social, entendida como umprocesso que torna as pessoas frágeis, pelaperda do emprego, pela ruptura familiar; as-sistidas, na medida em que, desencorajadas,sem esperança de encontrar um emprego, elaspassam a depender financeiramente da pro-teção social; e marginais, porque não se be-neficiam de nenhuma proteção social e porse encontrarem no nível mais baixo da escalasocial: os miseráveis, os drogados, os alcoóla-tras. Assim, a desqualificação social é a “de-gradação moral”. Não se refere neces-sariamente a rendimentos baixos ou à faltade bens materiais, mas à dependência de ou-tros para sobreviver. (Paugam,1991, p. 219).

Na década de 1980, outros dois auto-res nomearam diferentemente esta catego-ria em dificuldade, que já incomodava estesestudiosos e para as quais os discursos dospolíticos franceses endereçavam promessascom medidas e programas. No início da dé-cada, nos discursos dos políticos, porém, ain-da se apostava na possibilidade de redução

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das taxas de desemprego, como se o mal dosocial tivesse um centro: exatamente, estastaxas crescentes de desemprego, que já as-sombravam vários países europeus.

Um dos precursores a nomear esta ca-tegoria em dificuldade foi André Gorz, dan-do-lhe o estatuto de não-classe dos não-traba-lhadores, em sua obra Adeus ao proletariado.Eles seriam os indivíduos expulsos da esferaprodutiva, mostrando que a classe operáriatradicional estaria em vias de extinção, cons-tituindo uma minoria privilegiada. Destaforma, o novo proletariado pós-industrial secomporia dos sem-classe, dos empregadosprecários, dos empregos temporários e dosempregados em tempo parcial. Fragmenta-dos, eles não representariam nenhuma for-ça sindical, “[...] sem importância social ob-jetiva, excluídos da sociedade [...]” (Gorz,1980, p. 101).

Em 1983, em sua obra Les chemins duparadis (1983), Gorz identifica na sociedadeuma divisão dualista da população ativa: tra-balhadores protegidos, de um lado, com to-das as garantias; e desempregados, de ou-tro, submetendo-se a toda sorte de precarie-dade, desde o desemprego propriamente ditoaos vários tipos de trabalho precário, semreconhecimento social.

Outros autores anteciparam sobre omovimento de dualidade da sociedade, comoA. Minc, em sua obra L’après-crise a comencé.Na década de 1980, já se faziam sentir osefeitos da crise, que refletiam duramente nomercado de trabalho. Mas ainda se acredi-tava que um tratamento para o desempregopoderia conter os efeitos negativos. Como severá nas páginas seguintes, a questão dodesemprego, a dita exclusão do mercado detrabalho, encobria outras faces da exclusão.

b) O emprego do termo “exclusão” nadécada de 1990:

Os trabalhos teóricos publicados naFrança utilizando o termo exclusão seguemos traços das análises da pós-modernidade.3

É do início desta década o relatório daCommissariat Général au Plan (1993) e de doisnotáveis artigos do primeiro teórico da ex-clusão, Alain Touraine, intitulados Face àl’exclusion (1991) e Inégalités de lá societéindustrielle, exclusion du marché (1992), os

quais introduzem uma percepção nova deapreensão da sociedade pós-moderna(Frétigné, 1999, p. 87). A análise da socieda-de vertical, com base nas análises das rela-ções de classes, cede lugar à análise da soci-edade horizontal pós-moderna, em meiourbano, onde se degeneram as condições dehabitação dos deserdados, principalmentenas periferias, dos jovens com fracasso esco-lar e dos desempregados. É a partir dessestrês tipos de população que Touraine apóiasua análise sobre “a exclusão “ ou “a parti-cipação”. Ou seja, na sociedade horizontalpós-moderna ou se está dedans4 ou se estádehors5 (ou in ou out), no centro ou na peri-feria, e não mais en haut6 ou en bas7, como nasociedade moderna, quando se prevalecia aestratificação social piramidal.

O que caracteriza a sociedade horizon-tal, na visão do autor, são as mutações dosprocessos de trabalho, do aparelho produti-vo, que enfraquecem as bases das relaçõesde trabalho, comprometendo a plena cida-dania.

No seu segundo artigo, Inégalités de lásocieté industrielle, exclusion du marché ,Touraine defende que a sociedade pós-mo-derna não está mais na configuração da so-ciedade piramidal, de desigualdade, quan-do se permitia, na noção de desigualdade,ter-se uma idéia de continuidade entre umhaut e um bas.

A situação que prevalece na socieda-de horizontal pós-moderna é estar in, inte-grado, participando dos benefícios da eleva-ção do nível de vida, social e econômico, eout, excluído, vítima das mudanças dos pro-cessos de trabalho e de produção.

Na sociedade vertical, as desigualda-des são de ordem profissional, ao passo quena sociedade horizontal o risco é a segrega-ção, pois as dificuldades estão localizadas nosbairros periféricos, onde as tensões são bas-tante acentuadas.

A visão de Touraine da sociedade hori-zontal contribui para a revisão das análisessobre os cinturões das periferias urbanas dascidades brasileiras, os quais constituem pólosde segregação, tal é a diferença dos espaçosurbanos ocupados pelos in e pelos out da so-ciedade. Desta forma, ao se etiquetar de ex-cluídos todos os que ali se encontram, tal-vez, a problemática da exclusão para estes

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lugares devesse ter como pontos de partidaa segregação e a tensão social ali existente.

Castel (1995) mostra que a exclusão,no tempo presente, mantém relação com odesmantelamento do contrato de trabalho,com a proteção social, com a sociedade sala-rial. Isto significa processo de precarização,de vulnerabilização, de marginalização, queele denomina de processo desfiliação. Mas talprocesso não é exclusão, porque a exclusãomesmo é uma lógica de processos oficiais. Oautor insiste sobre “[...] o caráter reconheci-do e oficial da verdadeira exclusão; estas re-presentam um estatuto. As exclusões sãoformas de discriminação negativa que obe-decessem às regras estritas de construção,numa sociedade dada [...]” (p. 45).

A desfiliação é, então, a situação depobreza, de desemprego, de isolamento so-cial, de inutilidade no mundo. Tal descidasocial é a inexistência social. Esta é que põeem perigo “a qualidade do tecido social e suaruptura”. Ou seja, os membros de uma soci-edade não estão na zona de integração.

Nesta amostra restrita da imensurávelcontribuição de Castel sobre o conceito deexclusão, procura-se salientar a necessidadede se buscar na dinâmica do social outrosparadigmas para este conceito, como afirmaeste último autor, de forma a se ter uma per-cepção mais aproximada da realidade social.

6 O conceito de exclusão e o seu empregoindiscriminado

Nas seções anteriores, procurou-semostrar, a partir da origem do termo, comoem momentos diferentes a noção de exclu-são foi apreendida. Percebe-se que é na dé-cada de 1990 que este termo passa a inco-modar os teóricos do social, porque até en-tão se acreditava que o que englobava a ex-clusão poderia ter solução pela adoção demedidas pontuais, ou os excluídos ficam clas-sificados na categoria “negativa” dos indi-víduos que devem receber tratamento espe-cial, como descreve Castel (1995). Em épocarecente, por exemplo, na realidade brasilei-ra, são os inaptos para o trabalho, os malan-dros, que terminam suas trajetórias de vidanesta categoria negativa, confinados, aprisi-onados, evocando os vagabundos descritospor Castel na Idade Média.

Desta forma, parece ter chegado omomento em que é preciso desmitificar o ter-mo exclusão, o qual encobre sob outras ter-minologias através do tempo um mal socialcontra o qual é preciso lutar. Como afirmaSassier (2000, p. 63), “[...] para lutar contra,é necessário conhecer como é construído oobjeto contra o qual se luta”. É a tarefa aque se propõe na última parte deste artigo.

Evidentemente que não se esgotará nospróximos parágrafos todas as questões levan-tadas pelos autores franceses no encontro de1995, quando se procurou constituir um ver-dadeiro debate sobre o conceito de exclusão.

Para Castel (1992 apud Frétigné, 1999,p. 98):

[O] risco quando se fala, por exemplo, deexclusão [é] de fazer disto um estado que sepropõe a tratar em si mesmo, sendo que [aexclusão] é a ponta extrema de um processo jáexistente antes que as pessoas caiam nasposições extremas.Quando Castel afirma que a exclusão

é um processo, compreende-se que ela nãopode ser tratada como sendo imóvel, poistodo indivíduo em estado de exclusão per-tence a uma sociedade. Assim sendo, “[...] odomínio do processo exige um tratamentopolítico, no sentido de uma política global[...]” (Castel, 2000, p. 40). Em outras pala-vras, não se pode dissociar a exclusão docontexto social que a produziu e “ocultar asoutras zonas da análise”. Então, o tratamentoda exclusão não pode ser técnico, mesmo quea resposta para a exclusão seja vista assim.

Partindo do princípio de que todos osindivíduos excluídos pertencem a uma socie-dade e que a exclusão é um processo dentrodesta sociedade, Karsz (2000, p. 111) afirmaque no fenômeno da exclusão impõe-se “[...]abordar especificamente as questões econô-micas, políticas e ideológicas [...]”. Isto, navisão do autor, é porque a exclusão não temnada de etéreo; ela é bem real. Ela não podeser dissociada da sociedade e tudo que aengaja.

Karsz (2000, p.111) afirma que “háexclusão e exclusão”. Isto não é “um jogo depalavras”, mas é “paradoxal” como escla-rece o próprio autor, há distinção entre o usogenérico de exclusão e o uso específico.

No uso genérico, a exclusão tem umsentido limitado, circunscrito a certas situa-ções (Karsz, 2000, p. 107). É o caso da ex-

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clusão escolar, da exclusão profissional, daexclusão sindical, da exclusão amorosa, daexclusão do trabalho, etc. Em todos estescasos a exclusão “suporta ser especificada”.

Já, a exclusão num sentido específicorepresenta algo mais que a exclusão circuns-crita a certas situações (exclusão do empre-go, da escola, etc.); significa situação de ex-clusão já existente. Assim sendo, acrescenta oautor, uma única palavra pode acompanharo termo exclusão: social. Esta palavra é“exemplar, paradigmática, transcendental”.

No entendimento do autor, a exclusãosocial é sem fronteiras; ela atinge o indiví-duo em qualquer hierarquia social e na cole-tividade. Por ser radical, ela atinge em pro-fundidade.

No caso da sociedade francesa, o au-tor salienta a diferença e aponta que a exclu-são social data dos anos 1985-90, porque an-teriormente a este período, ela tinha um “ca-ráter parcial, particular”: se a exclusão erahabitacional a resposta era em termos dehabitação; se escolar, em termos de escola, eassim por diante.

A exclusão social, formando o par an-teriormente mencionado, “[...] supõe umainiciativa global, tão radical como a falta quetratá-se de suprir, uma iniciativa de inser-ção” (Karsz, 2000, p. 109). A luta contra aexclusão social na França atualmente tomoutal dimensão que ela supõe “[...] assegurar acoesão social”. Como acrescenta o autor,“[...] a necessidade de tal reparação deixaentrever o que a exclusão coloca em causa.”(p. 109).

É por isto que o autor fala que “há ex-clusão e exclusão”, pois há casos em que asituação é, como se exemplificou acima, dehabitação, de escola, de qualificação profis-sional, de acesso à saúde. A demanda, en-tão, é uma resposta técnica. Mas quando aexclusão é social, esta:

[...] se consome na terra, nas conjunturashistóricas precisas: justamente, na ocasião dasexclusões plurais, particulares, datadas e loca-lizadas! A exclusão social é o que tem em comuma exclusão escolar, a exclusão profissional, aexclusão étnica, a exclusão cultural, etc [...] é oque estas podem conduzir, e o que arrisca osindivíduos ou os grupos excluídos da escola, domercado de trabalho, do acesso aos cuidadosde saúde, etc. (Karsz, 2000, p. 111).Karsz (2000, p. 112), além de fornecer

estas múltiplas facetas do termo exclusão e

de seu uso, interroga sobre o termo social queforma o “par exclusão social”. Segundo o au-tor, o desenvolvimento da exclusão socialtransformou o social; ou seja, ao invés de osocial ser “[...] o esforço de esperança, deconfiança e de promoção (social) do progres-so compartilhado, da possibilidade para to-dos de encontrar um lugar na sociedade... osocial torna-se o teatro de desigualdades tãomais intoleráveis do que elas parecemincontornáveis, senão definitivas [...]”.

Desta forma, exclusão social, tal comoanalisado pelo autor “esconde” exclusões plu-rais (diversas exclusões): o estado dodisfuncionamento do mal-estar social. A ex-clusão é uma ameaça para o social, pois con-templa todo tipo de tensão, de instabilida-de, de implosão e, mesmo, de explosão. Enu-mera o autor, em síntese: Karsz (2000, p.113)”[...] a exclusão exclui o social [...]”.

Em breve, como assinala o autor, “[...]a questão da exclusão fica suspensa à ques-tão do social [...]”. Não se pode compreen-der e nem definir um sem o outro. O proble-ma é que se fala, se propõem políticas, es-creve-se a propósito do social em CiênciasSociais, mas não se define o social, não seconstrói conceptualmente o social. Em ou-tras palavras, faz-se o social sem teoria.

Para Autès (2000, p. 2) o social não temuma existência própria, mas é uma “articu-lação da esfera econômica com a esfera po-lítica”. Completa acrescentando que, paracomplicar as coisas, duas outras esferas sejuntam a estas duas primeiras: a esfera cul-tural e a esfera doméstica. É a combinaçãodeste conjunto que forma o social.

O que ocorre, continua Autès (2000,p. 2), é que desde as evoluções políticas doséculo XVIII e a revolução industrial estabe-leceu-se uma tensão entre o indivíduo livreno mercado e o cidadão soberano na ordempolítica; a tensão fundamental: “[...] de umlado, a economia do mercado; do outro, ademocracia política. Com esta noção do in-divíduo forçado, subordinado, alienado, ex-plorado na relação de trabalho, e que é so-berano político, o fundamento da legitimi-dade [...]”.

Esta tensão é regulada pelo “compro-misso social do assalariado e da proteção soci-al”, mas o que se verifica na realidade, con-forme sustenta o autor, é que se criou uma

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série de artifícios (o contrato de trabalho éum deles) para manter esta tensão regula-da, pois acredita-se que a oposição é entre oeconômico e o social, quando “[...] a verda-deira oposição se situa entre a esfera da eco-nomia e aquela do político [...]” (p. 3).

Autès em seu artigo introduz esta suapercepção do social antes de discorrer sobrea noção de exclusão, o que vale dizer que,ao se evocar a noção de exclusão, torna-senecessário questionar os fundamentos dasociedade democrática. Neste sentido, Karsz(2000, p. 136) argumenta que “[...] a análisedas estruturas sociais, o desenvolvimento deuma crítica social, a tomada em conta deconfigurações subjetivas não esgotam emnada a importância desta categoria [...]” (osexcluídos). Para Karsz nem os apelos histó-ricos, nem os questionamentos e as relaçõessociais são suficientes para explicar a exclu-são, pois, desde que se afina a análise, mes-mo com estes elementos, as definições deexclusão tornam-se “subentendidas, em es-tado de evidência”, ou seja, enquadradas nolugar comum como: “as exigências incon-tornáveis de economia moderna”, “os impe-rativos da mundialização”, da “sociedadeassalariada” (Karsz, 2000. p. 136).

Alinhando-se à colocação de Autès,Karsz sublinha (2000, p. 137) “[...] tudo sepassa como se não houvesse motor, de prin-cípio ativo, de generador [...]”.

Ora, como interroga Karsz (2000, p.137) se a análise do que se compreende comoexclusão exige a incorporação de questio-namentos de condições históricas, quer elas,sejam políticas, econômicas e, mesmo, psí-quicas, onde se encontra a fonte primeiraque permitirá a verdadeira compreensão daexclusão? Na própria história dos homens emulheres e crianças excluídos, “[...] priva-dos de se tornarem inteiramente humanos,em situação pessoal e social, intoleráveis”.

Isso, nas palavras do autor, quer dizerque na problemática da exclusão a condi-ção de humano, daquilo que os indivíduosdeveriam ser e ter (na história social concreta,em suas lógicas subjetivas), torna-se de difícilassimilação. Perderam-se os limites da exclu-são, pois a noção de humano caiu no vazio(não se sabe por que uns possuem mais doque os outros). Diz-se:

“Humano” quando não se pode, quando não se

quer ou quando não se tem muito interesse adizer o que tratá-se de analisar, o que tratá-sede transformar ou de defender. O humanogarante que à noite todos os gatos são pardos.(Karsz, 2000. p. 139)Do exposto, nas palavras de Castel e

Karsz, fica implícito que, ao se empregar otermo exclusão, torna-se necessário desven-dar o que a exclusão representa no social. Éno social, de uma sociedade dada, que estãoas representações da exclusão. Para Castel,a exclusão reveste-se de um “caráter ofici-al”, e o que se observa na sociedade contem-porânea, o que se quer chamar de exclusãonão é outra coisa que “formas de discrimi-nação negativas”. Assim, para Castel a ex-clusão tem um sentido bem claro.

Karsz, por outro lado, não procurautilizar, como se mostrou, outro termo nolugar de exclusão, mas analisa também o seuparoxismo. Inspirando-se em uma análise deR. K. Merton, ele afirma que para ser exclu-ído de uma sociedade é preciso pertencer aesta sociedade, como foi dito nas páginasanteriores. Ou seja, os excluídos estão den-tro da sociedade concreta, o que vale dizerque para estar “excluído de uma economia”é necessário que se tenha um lugar dentrodesta economia, quer seja como desempre-gado; como exército industrial de reserva oucomo subempregado. Deste modo, as cate-gorias não estão excluídas nem do consumo,pois, caso contrário, elas pereceriam, mas,conforme assinala (Karsz, 2000. p. 123): “[...]de um certo gênero de consumo, de acesso auma multitude de bens e serviços”; ou seja,“... certas populações são excluídas, não daeconomia, mas dentro da economia [...]”.

Para Karsz, é também um paradoxoabordar os excluídos como se eles fizessem par-te de uma exterioridade social, quando se sabeque eles estão no interior desta sociedade.

À guisa de conclusão, pode-se dizerque o termo exclusão tornou-se “uma boacategoria para pensar” (une bonne catégorieà penser), como foi dito por um dos autoresque participaram do encontro de 1995 so-bre este conceito.

É uma categoria para pensar, na medi-da em que coloca inúmeras questões em dis-cussão, como aquela da própria estrutura dasociedade ou a da estratificação social, re-vista por Touraine, quando “não se pode”mais, conforme explica este autor, analisar

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a sociedade em termos de relação de classe,mas das mutações dos processos de traba-lho, as quais enfraquecem as relações de tra-balho, ocasionando as desigualdades sociais.

Para Castel há uma distinção entreexclusão e discriminação negativa. É apropri-ada e necessária esta distinção para se pen-sar o termo exclusão contemporaneamente,pois são raros os casos de exclusão no senti-do dado por Castel: o de reconhecimentooficial da exclusão. Assim, a noção de discri-minação negativa introduzida pelo autor con-tribui para o reconhecimento e reflexão dosgrupos denominados excluídos, estes estãobem dentro da sociedade, só que em um es-tado de inutilidade social, e é isto que colocaem perigo a coesão social.

Paugam atribui à pobreza três tipo-logias: as pessoas frágeis; as pessoas assisti-das; e os marginais. Todas elas entram numprocesso de desqualificação social. Desta for-ma, pessoas frágeis são aquelas que apresen-tam dificuldades de inserção no mercado detrabalho; as pessoas assistidas são aquelasque, sem recursos, passam a depender deproteção social para sobreviver; e marginaissão aqueles que se encontram no limite ex-tremo da exclusão social. Estas três catego-rias nos remetem à responsabilidade diantedas camadas da população que, em boaconsciência, os governos endereçam-lhes res-postas técnicas, confortando assim a inicia-tiva de ação, mas em nada fazendo paraarrancá-las da desqualificação social, porquenão se trabalha a degradação moral comrespostas técnicas.

Karsz introduz a dimensão mais pro-funda da exclusão, que é a dimensão huma-na, pois na exclusão encontra-se a históriade homens, mulheres e crianças em condi-ções subumanas, só que a dimensão huma-na da exclusão dilui-se no espetacular ou novazio. Assim, quando se refere ao humanoassociado à exclusão ou se faz projeção dosexcluídos de maneira espetacular, como seos excluídos fossem uma espécie à parte ouo humano fosse completamente vazio, nãose pode dar uma noção do que é condiçãohumana ou não.

Conclui-se que pensar a exclusão emtermos de noção, de categoria, não constituiem si um exercício do saber científico dos es-

tudiosos das Ciências Sociais que estão face aface com a problemática dos homens, mulhe-res e crianças em situação de exclusão; maspensá-la como foi feito neste encontro de 1995,na França, e como se procurou fazer, breve-mente, neste artigo é, em última análise, ten-tar defini-la para melhor combatê-la.

Notas:1 Complementando a informação sobre este encontro:

ele foi realizado como atividade anual da Associação“Pratiques sociales. O encontro de 1995 abordou o tema.2 Vagabundos, segundo Castel (1995, p. 97), são “os

inimigos da ordem pública”, aqueles que romperamcom o pacto social: trabalho, família, moralidade ereligião.

3 A pós modernidade, segundo Frétigné (1999, p. 85),“[...]é uma noção pouco satisfatória sobre o planoanalítico. Seu único mérito reconhecido é de marcaruma ruptura com... a modernidade, de insistir sobrea necessidade de focalizar os olhares sob a mutaçõescontemporâneas. Quanto aos traços singularizandoesta pós-modernidade, as divergências de apreciaçãosão em legião.

4 dedans: dentro5 dehors: fora6 en haut: em cima7 en bas: embaixo

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Polaridades e desenvolvimento endógeno no sudeste paraensePolarities and endogenous development in the Southeast of Para.

Polaridades y Desarrollo Endógeno en el Sudeste ParaenseFrancisco de Assis Costa*

Recebido em 03/02/05; revisado e aprovado em 16/02/05; aceito em 17/02/05

Resumo: Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a persistência e aprofundamento das desigualdadesregionais – uma expressão concreta da iniqüidade social – reitera tensões que repõem continuamente a questãoregional em foco, atrelada às possibilidades de desenvolvimento. Essas realidades têm revalorizado a abordagemespacialmente referida e permitido aflorar novas perspectivas teóricas instrumentadas nas possibilidades heurísticasda noção de auto-organização, fundamento dos paradigmas de não-linearidade na evolução dos sistemas complexos.Consoante com este movimento de idéias, este estudo faz um exercício de explicitação da hierarquia espacial damesorregião Sudeste Paraense, no Estado do Pará, na Amazônia Brasileira, articulando os “velhos” modelosgravitacionais com proposições das “novas” teorias do desenvolvimento endógeno.Palavras-chave: Desenvolvimento Regional; Pará-Amazônia; Desenvolvimento Endógeno.Abstract: In developing countries, such as Brazil, the persistence and deepening of regional inequalities – a concreteexpression for social iniquity – reiterates tensions that continually replace the regional question in focus, linked withthe possibilities of development. These realities have reappraised the approach spacially referred to, and, allowed tocome to the surface, new theoretical perspectives coordinated on the heuristic possibilities of the notion of self-organization, the foundation of the paradigms of non-linearity in the evolution of complex systems. Consonant withthis movement of ideas, this study makes an exercise of making explicit the spacial hierarchy of the mesoregion ofsoutheast Para, in the State of Para, in the Brazilian Amazon region, articulating the “old” gravitational models withpropositions of the “new” theories of endogenous development.Key words: regional development; Para-Amazon region; endogenous development.Resumen: En los países en desarrollo, como Brasil, la persistencia y la profundidad de las desigualdades regionales– una expresión concreta de la iniquidad social – reitera tensiones que reponen continuamente la cuestión regional enfoco, unida a las posibilidades de desarrollo. Esas realidades han revalorizado el abordaje espacialmente referida ypermitido aflorar nuevas perspectivas teóricas instrumentadas en las posibilidades heurísticas de la noción de autoorganización, fundamento de los paradigmas de la no linearidad en la evolución de los sistemas complejos. Consonantecon este movimiento de ideas, este estudio hace un ejercicio de aclaración de la jerarquía espacial de la mesorregiónSudeste Paraense, en el Estado de Pará, en Amazonia Brasileña, articulando los “antiguos” modelos gravitacionalescon proposiciones de las “nuevas” teorías del desarrollo endógeno.Palabras clave: Desarrollo Regional; Pará-Amazonia; Desarrollo Endógeno.

se fértil período, a noção de pólo de cresci-mento, introduzida por Perroux (1995), asso-ciada às contribuições de Hirschman (1958e 1969), atribuía os fundamentos da polari-zação que se observava empiricamente nasdiversas sociedades dinâmica aos efeitos con-catenados para frente e para trás (linkages)de cada impacto produzido por uma capa-cidade produtiva nova. As formulações adi-cionais de Myrdal (1957 e 1972) sobre arecorrência cumulativa dos eventos que pro-duzem tais efeitos, levaram a duas coisas:ao necessário tratamento do “lugar” geográ-fico na elucidação dos processos de de-senvolvimento e à ênfase no caráter comple-xo desses processos, os quais parecem sem-pre se materializar enquanto focos do entre-laçamento de dinâmicas sócio-econômicas epolítico-institucionais que conformam, se-gundo Ferreira (1989: 524), “(...) Centrosprivilegiados de um espaço geográfico”.

Recentemente, por mais de uma déca-

Introdução

Nosso objeto nesse estudo é a configu-ração espacial da economia da mesorregiãoSudeste Paraense, verificando, a partir demetodologias que integrem modelosgravitacionais com elementos das atuais te-orias do desenvolvimento regional, as prin-cipais aglomerações, a hierarquia espacialpor elas conformada e seus fundamentosagrários e urbanos.

A economia como disciplina tem tidoaltos e baixos na tarefa de internalizar asconfigurações espaciais em seus enunciados.Não obstante, a região tem sido a referênciaa partir da qual vem se consolidando um dosseus ramos, a chamada “economia regional”,que, estreitamente associada aos enunc iadossobre crescimento e desenvolvimento dassociedades capitalistas modernas, teve seumomento mais brilhante nas três décadasque seguem a segunda guerra mundial. Nes-

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 29-54, Mar. 2005.

* Professor e pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos-NAEA da UFPA (Universidade Federal do Pará).

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

da as questões regionais tiveram posição bemmodesta no interesse dos economistas, des-caso correlato ao que também se verificouno campo afim das teorias do crescimento eda macroeconomia, cujo foco centrou-se nasflutuações de curto prazo, na incorparaçãodas expectativas racionais nos ciclos econô-micos e da aplicação de métodos de equilíbriogeral nas flutuações cíclicas (Barro e Sala-I-Martin, 1995, p. 12). Paul Krugman (1995,p. 23-29) explica essa indeferença por áreatão crítica do conhecimento social pela difi-culdade de modelar matematicamente aque-las teorias apresentadas nos imediatos anospós-guerra, geralmente em estilo literário esem demonstrações formais. Isso teria, na suaopinão, produzido uma rejeição crescentepelos praticantes de uma disciplina, como aeconomia, que cada vez mais investia no ri-gor matemático de seus tratamentos comoforma de legitimação no campo científico.

Em relação às teorias do crescimento,Barro e Sala-I-Martin observam umadissociação semelhante entre o desenvolvi-mento “propriamente” científico dos mode-los explicativos e o desenvolvimento de umpensamento menos formal ou menos formal-mente sofisticado. A explicação para taisevoluções, todavia, não são encontradas nodesenvolvimento da disciplina como um pro-duto do campo estritamente acadêmico,como quer Krugman, mas sim numa tensãoentre necessidades práticas e respostas cor-respondentes em termos de requerimentosde tempo e operacionaidade. Assim,

…growth theory became excessively technicaland steadily lost contact with empiricalapllication. In contrast, development economist(…) retained a applied perspective and tended touse models that were tchnically unsophisticatedbut empirically useful. The fields of economicdevelopment and economic growth drifted apart,and the two areas became almost completelyseparated.. (1995: 12-13).Interressantes pontos de vista. Tomados

complementarmente, eles corroboram umaoutra perspectiva: a de que as questões regio-nais, ao lado da pesquisa sobre os fundamen-tos mais profundos e os determinantes delongo prazo do desenvolvimento, tiveram suaimportância empalidecida no período emquestão porque tornaram-se subordinadas àsvisões globalizantes e abstratas da dinâmicasocial e econômica que acompanharam, orien-tando, o curso das reformas políticas liberais

que marcaram as décadas de oitenta e no-venta. Poder-se-ía indicar, nessa perspectiva,que a economia regioanl foi deslocada dapauta acadêmica, porque deslocada da pau-ta política de mais elevado nível estratégico.

Em tal contexto, reafirma-se a perspec-tiva mecânica do equilíbrio geral, segundo aqual a existência de regiões é fato teorica-mente relevante somente quando diferençasmarcadas nas variáveis de renda, com impli-cações na renda per capita, são estatistica-mente correlacionáveis a referências espaci-ais. Todavia, dado que, pelos mecanismos demercado, os diferenciais de renda tenderiamnecessariamente a sumir, as regiões seriam“momentos”, referências necessariamentetransitórias. De modo que nesse período adiscussão mais acalorada que se produziuno âmbito da economia regional foi, sinto-maticamente, a relativa à convergência darenda per capita entre as regiões (Barro eSala-i-Martin, 1991). A rigor, a economiaregional assim orientada “discutia” o fim doseu objeto.

Nos últimos anos, contudo, as teoriasdo desenvolvimento em geral e do desenvol-vimento regional em particular vêm acusan-do o impacto de dois conjuntos associadosde eventos, um empírico e outro teórico.

Empiricamente, vêm se registandoreconfigurações importantes na geografiaeconômica dos países industrializados, comregiões tradicionalmente manufatureirasapresentando sinais graves de declínio, en-quanto outras demonstram continuada vita-lidade para manter, ou mesmo ampliar, suascapacidades. E mais: apresentam-se novasregiões industriais com vitalidade difícil depresumir há apenas algumas décadas. Poroutra parte, tem-se evidenciado que tal rede-senho do espaço por dinâmicas econômicasassenta-se sobre bases estruturais diversas –e, em muitos casos, inesperadas por umaperspectiva tradicional – que resultaram, porvezes, de estratégias empresarias orientadasfundamentalmente em economias de escalaque requerem (e produzem) cenários domi-nados por grandes empresas ou conglome-rados com unidade de direção; por vezes,de estratégias onde a eficiência das unidadesprodutivas depende menos (ou mesmo nãodepende) do tamanho de cada uma e maisda sua rede de relações, tanto cooperativas

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quanto competitivas, situações em que aseconomias de escala emergem da atuação deum sem número de pequenas unidades in-dependentes, não obstante disporem, em al-gum nível, de mecanismos institucionais deorientação e ação (Amaral, 2001).

Nos países em desenvolvimento, comoo Brasil, a persistência e aprofundamento dasdesigualdades regionais – uma expressãoconcreta da iniqüidade social – reitera ten-sões que repõem continuamente a questãoregional em foco, atrelada às possibilidadesde desenvolvimento.

Essas realidades têm revalorizado aabordagem espacialmente referida. E, maisimportante, têm permitido aflorar novasperspectivas teóricas instrumentadas naspossibilidades heurísticas da noção de auto-organização, fundamento dos paradigmasde não-linearidade na evolução dos sistemascomplexos. Com utilização crescente peloscientistas naturais nas últimas décadas, asabordagens complexas e não lineares têmencontrado emprego, assim, também entreos economistas, por permitir operarmetodologicamente as noções associadas de“crescimento com rendimentos crescentes,de “desenvolvimento endógeno”1 e “desen-volvimento dependente de trajetória”, quefazem a moderna economia regional.

Região e desenvolvimento endógeno

Para Paul Krugman (1995), os mode-los de desenvolvimento endógeno resultamda integração de três contribuições há mui-to incorporadas pela economia e pela geo-grafia: a abordagem do potencial de merca-do (Harris, 1954 e Isard, 1956), a noção decausação circular e cumulativa (Myrdal,1957; Hirschman, 1958) e a teoria do lugar-central (Christaller, 1933). Mais tarde, omesmo autor em companhia de MahahisaFujita e Anthony Venables (1999 e 2000, p.41-50) acrescentam como seminais as con-tribuições pós-keynesianas da teoria domultiplicador da base, em particular a ex-tensão dinâmica desse modelo empreendi-da por Pred (1966).

Uma herdeira direta dos modelosgravitacionais pioneiros, que utilizavam aspopulações como as massas, a abordagem dopotencial de mercado indica ser o poder de

compra, não simplesmente as populações, oque explica a posição hierárquica dos luga-res numa região (Krugman, 1995, p. 45).

A teoria da causação circular e cumula-tiva, por seu turno, sugere que as aglomera-ções são auto-expansivas ao estabeleceremmercados de larga escala, atraindo com issonovas empresas, as quais adicionalmenteaumentam o mercado, etc.. Tal noção indi-ca, ademais, que vantagens iniciais, dadaspor “acidentes históricos”, podem desempe-nhar papeis importantes na explicação dospadrões de localização. Há um risco tauto-lógico nessas idéias, o qual é reduzido com aincorporação das abordagens dinâmicas ba-seadas no multiplicador da base.

A teoria do lugar-central analisa a dispo-sição dos lugares a partir do papel que de-sempenham como centros mercantis e ma-nufatureiros para uma população agrícoladispersa de forma mais ou menos homogê-nea. Põe-se em relevo, nesse caso, o trade-offentre as economias de escala dos centros pro-dutores e os custos de transporte de seus pro-dutos.

As teorias de desenvolvimento endó-geno resultaram de um movimento de idéiasque constata o valor da abordagem do poten-cial de mercado, a qual se entende capaz deapresentar uma descrição bastante realistada hierarquização econômica dos lugares e,por isso, servir para descrever o sentido eco-nômico de sua distribuição espacial. Desta-ca-se, porém, que não dispõe de elementospara esclarecer como tal configuração se es-tabeleceu nem, tampouco, para indicar suastendências. Para tanto se precisaria recorrerà noção de causação circular e cumulativa ea teoria do lugar-central: à primeira, porqueé razoável supor que a tais tendências subja-zem estruturas de mercado que ao mesmotempo derivam e permitem rendimentoscrescentes como fundamento dinâmico daaglomeração; à segunda, porque ela põe emconsideração o peso dos custos de transpor-te na regulação das aglomerações.

2.1 Região e polarização

É fato empírico de notável recorrênciaque, tal como tem ocorrido nas sociedadescontemporâneas, o desenvolvimento é umprocesso que produz agrupamentos multi-

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cêntricos. Economistas regionais e geógrafos(Reilly, 1929 e Stewart, 1948) há tempos su-gerem uma descrição dessa multi-polarida-de através da relação entre duas únicas va-riáveis: a população dos lugares e a distân-cia entre eles. Por analogia à lei da gravitaçãouniversal, sugerem que os lugares se confor-mam em centros hierarquizados na razãodireta de suas populações, as quais tratamcomo as “massas” de um sistema gravi-tacional, e inversa das respectivas distânci-as2. Tal fórmula legitimou-se por ofereceruma leitura, por parcial que fosse, das con-figurações espaciais enquanto potencial hie-rárquico intuído na concentração da popu-lação, a variável a priori da existência social.

Assim proposto, o modelo produz resul-tados puramente metafóricos e estáticos. Suacapacidade heurística aumenta, todavia, coma presuposição de Isard (1969) de que seusresultados estão positivamente correlacio-nados com as probabilidades com que os luga-res, em um dado momento, produzem atraçãomútua (tenham intercâmbio) e, assim, com aprobalidade de um lugar ser centro para o ou-tro. Esta probabilidade está correlacionada coma soma das probabilidades que ambos apre-sentam, de produzir atração sobre todos osdemais lugares do universo tratado3.

Na formulação de Isard, portanto, osvalores obtidos por modelos gravitacionaisindicariam as probabilidades de uma unida-de de “massa” do conjunto de aglomeradosorientar-se para um centro diferente de suaorigem, quando um desequilíbrio qualquerse verifica. Tais probabilidades se descreve-riam para cada interação pelo valor

bij

jiij d

AAGI

.= (2.1)

Em que:- Iij indica o grau de interação entre o Cen-

tro i e o Centro j;- Ai, Aj são a dimensão dos aglomerados

(população) dos Centros i e j;- db

ij é a medida da distância entre i e j;- G é a constante semelhante à constante

gravitacional numérica;- b é um parâmetro exponencial.

O modelo de Isard supõe, ainda, queas grandezas relativas a um aglomerado sófazem sentido como expressões de sua posi-

ção em relação a todos os aglomerados deum dado sistema: as áreas de influência decada centro dependem da respectiva posiçãonum sistema amplo de gravitação, isto é,num campo de forças, para cuja representaçãoservem tais valores. E tais posições se revela-riam inicialmente em potenciais P, tais que

bij

jin

J

n

jiji d

AAGIP

.

11∑∑

==

⋅== (2.2)

O potencial Pi de interação de um aglo-merado i com o seu campo constituído adi-cionalmente pelos aglomerados j é, entretan-to, uma grandeza dimensional, uma vez quedepende dos tamanhos das aglomerações.Se, todavia, dividirmos este valor pela mas-sa do aglomerado i teremos a grandezaadimensional P*, potencial por unidade demassa, do aglomerado. Desse modo

∑∑==

⋅==n

j ij

j

i

ijn

Ji d

AG

A

IP

11

* (2.3)

Assim, como campo de forças, uma re-gião se descreveria por um conjunto deinterações entre aglomerados, cujos fluxosse orientariam provavelmente pelos centroscom maiores potenciais de atração, defini-dos, estes potenciais, pelas relações própriasà metáfora gravitacional (formalmente des-critas nas equações 2.1 a 2.3).

Cumulatividade, polaridade dinâmica edesenvolvimento: colocações conceituais

As relações de Isard permitiriam umadescrição das configurações regionais coeren-te com a teoria do potencial de mercado. Basta-ria que a massa considerada, A, fosse repre-sentada pela renda ou pelo poder de comprados lugares respectivos. Isso não é, contudo,suficiente para dar aos modelos gravitacionaispoder explanatório, pois tanto a renda en-quanto variável, quanto a polaridade nelaexpressa são resultados, sobre cujos fundamen-tos é necessário discernir. Para tanto, umaprimeira tarefa seria a de explicitar as forçasprodutivas relevantes que subjazem à polari-dade como fenômeno do desenvolvimento.Uma segunda tarefa seria a de discutir as re-lações estruturantes que se formam entre es-sas forças, com foco especial na causalidadecomplexa de suas reproduções.

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Forças produtivas: a natureza, os artefa-tos produtivos e o trabalho. As regiões se de-senvolvem marcadas pelas disponibilidadesnaturais e pelas suas capacidades sociais eculturais amalgamadas em aparatos produ-tivos e saberes. São marcadas, portanto:a.Pelos ditames produzidos por forças

definadas pela natureza enquanto quali-dade (res qualitas).

a.1 Como qualidade, a natureza entra nosprocessos produtivos na condição demeio de produção imediato. Isso acontecequando uma certa configuração das re-lações entre elementos vitais da nature-za, configuração essa espacialmente de-limitada e intransportável, é utilizada emum processso produtivo particular. Anatureza, nesse caso, pode ser tanto umecossistema originário, sobre o qual existiupouca ou nenhuma interferência huma-na, ou, apenas, um ambiente edafo-climá-tico, isto é, uma certa interação entre soloe clima. Entre um extremo e outro, hádiversas possibilidades intermediárias. Oimportante é, em qualquer dos casos, acondição irredutível de uma especificida-de da natureza espacialmente localizávelser uma força produtiva passível de com-por um acervo de capital privado.

a.2 Como qualidade, a natureza entra nosprocessos produtivos na condição demeio de produção mediato, que compõeo acervo do capital social, como um fun-damento infraestrutural. Um bioma queregula ecosistemas e ambientes edafo-cli-máticos particulares pode ser pensadonessa condição.

a.3 Como qualidade, ainda, a natureza en-tra nos processos produtivos na condi-ção de objeto do trabalho, como matériaprima. Nesse caso, não é a capacidadeprodutiva das relações próprias e locali-záveis, mas os componentes dessas rela-ções individualmente, como matéria pri-ma, que entra nos processos produtivos:a madeira que é retirada de um bioma, osolo que se usa como suporte de uma fór-mula quimica que se integra sob contro-le com um clima de estufa, etc. podemser pensados nessa condição.

a.4 Em suma: como meio de produção a natu-reza determina a fixação das atividadeseconômicas obedecendo a ditames estri-

tamente geográficos – a agricultura tendea se organizar espacialmente de acordocom a distribuição das condições edafo-climáticas e, garantidos os pressupostosda reprodução dessas condições, essasatividades podem se reproduzir em ho-rizonte de tempo não delimitado; comoobjeto de trabalho, a natureza co-deter-mina, juntamente com as condições quegerem o seu uso, a distribuição espacialdas atividades e os respectivos tempos deduração – ocorrências mineral ou flores-tal determinam, junto com a produtivi-dade dos setores que consomem o miné-rio ou madeira, a distribuição das ativi-dades que durarão precisamente o tem-po que durarem as ocorrências.

b.Pelos ditamos produzidos por forçasdefinadas pela natureza enquanto espaço(res extensa). Nesse caso,

b.1 a natureza manifesta-se enquanto dis-tâncias entre o locus do processo de tra-balho que utiliza a natureza como meiode produção mediato, imediato ou ma-téria prima e o locus de realização (utili-zação) dos seus resultados e

b.2 distâncias entre o locus do processo detrabalho que utiliza a natureza comomeio de produção imediato ou matériaprima e o locus da produção das merca-dorias que esse processo de trabalho ne-cessita, ali não disponíveis.

c. Pelos ditames das construções da socie-dade – das invenções antrópicas.

c.1 Ditames provindos da esfera propria-mente econômica,– como aqueles que definem o acesso aos

meios de produção imediatos que seajustam à noção de capital físico, isto é,capital produtivo acumulado na formade máquinas e equipamentos nas em-presas e

– como aqueles meios de produçãomediatos, que se ajustam à noção decapital físico enquanto capital infraes-trutural, grandes equipamentos de usocomum, transcendente às empresas.

c.2 Ditames provindo de esferas difíceis derecortar pelas percepções tradicionais queseccionam economia e sociedade4. É ocaso:– daqueles derivados de capacidades e

habilidades difusas atribuídas às pes-

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soas, o que se procura entender sob anoção de capital humano, ou

– daqueles atribuídos às capacidadesinstitucionais, transcendentes aos agen-tes, expressão das suas relações objeti-vas e simbólicas: tais capacidades têmsido tratadas como o capital social.Relações estruturantes entre os setores com

raízes (dependentes de capital natural) e os seto-res sem raízes e o papel do espaço. Autores dodesenvolvimento endógeno (Krugman 1998,1995, 1991 e Athur, 1994) têm ressaltado umadualidade básica da reprodução social, resul-tado das determinações do capital natural, asquais fundamentam setores produtivos comraízes físicas, naturais, em relação com as for-ças derivadas das diversas formas de capitalsocialmente produzido, que baseiam setoressem raízes físico-territoriais. Dessas forças,ressaltam-se as provindas do capital físico, tan-to enquanto acervo das empresas, como naforma de infraestrutura da sociedade. Defen-de-se, que dada a necessidade de seguir asindicações da natureza, atividades como aagricultura distribuem-se espacialmente, es-praiam-se. Não carecendo de tais fundamen-tos, outras atividades poderiam se alocar es-pacialmente tanto difusa, quanto concentra-damente. O fato de historicamente tais seto-res terem se organizado concentradamentetexplica-se sobretudo por ganhos de escala dassuas unidades produtivas associados aos efei-tos de aglomeração. Todavia, dado que aomesmo tempo que a concentração das plan-tas reduz custos, impõe distâncias crescentesentre o lugar da produção e o lugar (de parte)do seu consumo: o capital físico na formainfraestrutural tem o papel de reduzir essasdistâncias.

Tais considerações permitem enunci-ar que, tanto maior a escala de produção,tanto maiores as distâncias a serem percor-ridas pelas mercadorias produzidas e,correspondentemente, tanto maiores as prin-cipais implicações econômicas disso: os cus-tos de transporte. O que leva Krugman(Geography and Trade, 1991:21) a enunciarque se um lugar i tem ganhos de escala nummontante Fi, tal que

iji yyF −= (2.4)onde yj é o custo total da produção no

lugar j, para atender suas próprias necessi-

dades, e yi o custo de produção das necessi-dades do lujar j se atendidas pelo lugar i deum dado produto, a concentração pela am-pliação da capacidade produtiva daqueloproduto em i continuará enquanto

TXSF ji ⋅⋅> (2.5.a)onde Sj é a proporção da população

do lugar j na população total, T o custo detransporte por unidade de produto para olugar j e X a produção total. Quanto maiorFi, os ganhos de escala obtidos em i, maioresas tensões para polarização em i, as quais sãoreduzidas na razão inversa da represen-tatividade da população em j e na razão di-reta dos custos dos transportes. Se re-escre-vemos a relação (2.5) tal que

1=+ ji SS (2.5.b)

eTXSF ii ⋅⋅−> )1( (2.5.c)

em que Si é a proporção da populaçãode i no total da população de i e j,explicitamos uma dimensão da causação cir-cular e cumulativa de Myrdal: com Fi suficien-temente elevado as decisões de produção sefarão em favor de i, o que incrementará Sipor novas contratações diretas e por novascompras que induzirão a multiplicação doemprego, com efeito crescente na população,etc.; crescendo a população de i, cresce tam-bém Fi e assim por diante.

Ademais, é possível a partir daí cons-tituir Ai, a massa dos modelos gravitacionaisde Isard, na ótica do potencial de mercado.Considerando yi o dispêndio total feito em ipara a produção das necessidades de j, por-tanto sendo yi correspondente ao valor dascompras intermediáriaos (matérias primas emateriais secundários), fundos de reposiçãodo capital físico, remuneração da gestão esalários, e tomando um conjunto de n luga-res j tem-se que: para todos os lugares j emque a condição (2.5) for atendida produzir-se-á uma expansão da massa A do lugar icorrespondente a yi.

De modo que ∑=

+=n

ji yiAA

10 , sendo

A0 um valor associado às necessidades inici-ais de i.

Setores sem raízes e produtividade cres-cente. A relação (2.5.a) põe em relevo a ten-

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

são que produz a polarização, permitindo,ademais, dimensionar a força dessa tensão:tanto maior será sua força, quanto maior fora desigualdade. Dessa força resulta o que deessencial há a produzir “gravidade” (poderde atração) entre lugares. A massa A de umlugar deverá ser, por isso, uma expressão deseus fundamentos. Sobre eles, sejamos maisexplícitos. Considerando tudo em movimen-to, a continuidade do processo de polarida-de no lugar i ao longo do tempo dependeráda manutenção ou ampliação das desigual-dades que i apresenta em relação aos outroslugares, aos lugares j. Importa, pois, discutiros fundamentos dessas diferenças.

Se explicitamos a noção de ganho deescala para um conjunto de produtos k demodo que se tenha

++=

++=

jk

jkjk

kJ

jkkjkj

jk

jkjkjkjk q

wm

XS

CXSXS

q

wmCy

..... (2.6)

++=

++=

ik

ikik

k

ikkjkk

ik

ikikikjkik q

wm

XC

XSXqw

mCSy ... (2.7)

para i e j sendo os lugares, C o custofixo (depreciação do capital físico e custosde gestão) para a produção do produto k, mo valor da matéria prima necessária por uni-dade de produto k, w o salário pago porumidade de tempo, q a produçãode k portrabalhador por unidade de tempo e substi-tuindo (2.6) e (2.7) em (2.5) e o resultado em(2.4) tem-se que:

se

ik

ikik

k

ikij

jk

jkjk

k

jk

qw

mXC

Tq

wm

XSi

C+++>++

− ).1( (2.8)

então

∑∑= =

+=n

j

m

kiki yAA

1 10

Para um conjunto n de lugares j, a acu-mulação expande concentradamente em umdeles, designemos i, e com ela a concentra-ção e o poder de atração, em função do nú-mero de produtos para os quais apresentayik>0 e, para cada k

a. diretamentea.1 com a população do centro de polariza-

ção (Si),a.2 com a escala de produção de k (Xk) ea.3 com as habilidades dos trabalhadores,

tanto maiores essas, maiores também qik,estreitamente associadas ao seu grau deinstrução, treinamento e cultura, isto é,às disponibilidades de capital humano naforma de habilidades básicas e genéricas,como as propriciadas pela formação es-colar geral, e na forma de conhecimen-tos específicos relacionados à produçãode cada k, incluindo-se, nesse caso, os co-nhecimentos tácitos, entranhados na cul-tura e no saber informal – estes, em si,uma forma de capital social, tanto maisdenso, quanto maior o número de pro-dutos k para os quais manifestem-se ha-bilidades específicas.

a.4 com a redução de C, que resulta do efei-to conjunto dos preços dos elementos docapital físico, amplamente determinadospela desenvolvimento local da indústria, docomércio e dos serviço, e da eficiência da ges-tão, esta fortemente associadas às dispo-nibilidades de capital humano na formade habilidades básicas e genéricas parao planejamento e a gestão, como a pro-piciada pela formação universitária, e naforma de conhecimentos e know how es-pecíficos relacionados à produção de k,incluindo-se, nesse caso, os conhecimen-tos tácitos, entranhados na cultura e nosaber informal – este, em si, também umaforma diferenciada de capital social;

b. inversamenteb.1 com os custos de transporte (T) eb.2 com os preços das matérias primas (mi)b.3 com o salário real médio (wi).

As variáveis inclusas em a), aquelesque influem diretamente na concentração,são as forças centrípetas da polarização, dadoque fundamentam o processo enquanto re-sultado de acumulação dinâmica, assenta-da em rendimentos crescentes e, por isso,fenômeno do desenvolvimento com realsustentabilidade econômica. Em conjunto,essas forças podem produzir o que Vázquez-Bartero (2001, p. 29-30) chama de efeito Hassociado a um lugar: uma confluência decapacidades derivadas tanto de elementosextensivos da sua constituição, como o ta-manho do mercado trabalho e de produtos,quanto da qualidade desses mercados, asso-ciada ao nível da divisão social do trabalhoe ao capital humano e social nele presentes .De modo que A=A(H), isto é, a massa de um

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lugar, na metáfora de Isard, determinante eresultante do seu poder de atração, na pers-pectiva do desenvolvimento endógeno resul-tante de sua capacidade de acumulação di-nâmica, é determinada pelo efeito H, pelosinergismo das forças centrípetas da polari-zação.

As variáveis inclusas em b) se caracte-rizam por serem forças com capacidade li-mitada para favorecer a acumulação dinâ-mica de um lugar. Já se cogitou na discus-são sobre desenvolvimento a possibilidade dedesenvolvimento com base nas vantagensderivadas de vantagens locacionais em rela-ção às matérias primas e, mesmo, em rela-ção ao custo da força de trabalho. Tais van-tagens, associadas à exportação de stapleproducts altamente rentáveis poderiam pro-duzir efeitos de aglomeração pela criação,gradativa, de oportunidades de substituiçãode importações (conf. Clemente e Higashi,2000:135-136). Sem negar completamenteessa possibilidade, as discussões atuais ten-dem a realçar o fato de que tais vantagenssão estruturalmente contestadas por se as-sociarem a processos produtivos de retornotendencialmente decrescentes.

Setores com raízes e produtividade decres-cente. Há uma clara determinação provindados setores com raízes – aqueles atreladosao capital natural: eles tendem a limitar aprodutividade do conjunto, dado que assen-tados nos limites absolutos da natureza, sejaenquanto espaço (distâncias), seja enquan-to substância. Setores como a mineração oua agricultura poderiam, nessa perspectiva,fundamentar capacidades iniciais de proces-sos de desenvolvimento, de acumulação di-ferenciada de um lugar criando para ele ci-clos de produtividade crescente, mas tende-riam a se esgotar como como fonte de dife-renciação. Para Porter, por exemplo, elesseriam, em contraponto aos fatores superio-res das criações culturais do capital huma-no e capital social, fatores inferiores na for-mação da competitividade de um lugar, doseu desenvolvimento. Há uma falha teórica,aqui, sobre a qual discutiremos longamenteadiante. Por enquanto é suficiente dizer quetal compreensão só procede em contexto emque a natureza entre nos processos produti-vos como objeto da produção, como umamatéria prima.

Baixos salários e limites a acumulação. Aquestão dos salários guarda complexidadeprópria, com longo estatuto teórico. Impor-ta, nesse momento, o seguinte: se por um ladobaixos w médios elevam a competitividadede um lugar em relação a certos produtos,por outro limita o surgimento de novos pro-dutos, tolhendo, destarte, sua expansão – aampliação de sua capacidade de atração Ai– por redução do número de k para os quaisse mostra capaz de apresentar, para umnúmero significativo de lugares, mediante acondição (2.8) yik>0.

Os lugares e seus potenciais no sudesteparaense

Aplica-se, tal modelo, para a análisedo caso do Sudeste Paraense? Responder aessa pergunda exige responder a duas ou-tras:1) as variáveis mencionadas acima como for-

ças centrípetas manifestam-se na mesore-gião esclarecendo uma conformaçãomulticêntrica?

2) Elas relacionam-se entre si explicando talconformação como resultado de polarida-des estruturalmente justificáveis e susten-táveis, pois baseada em rendimentos cres-centes e competitividade dinâmica?

Encaminhemos essas questões testan-do duas hipótese. Primeiro, as variáveis em-píricas entendidas como proxys daquelas quefazem as forças centrípetas acima teorica-mente enunciadas e afetas aos setores semraízes terão, para suas distribuições espaci-ais na mesorregião, índices estatísticos deconcentração elevados; enquanto que aque-las afetas aos setores com raízes terão índi-ces de concentração baixos. Se verdadeira,essa pressuposição indica que as forças da-das como centrípetas pelas abordagens dodesenvolvimento endógeno manifestam-seconcentradamente na mesorregião, permi-tindo-nos entender que fundamentam, ali,processos de polarização. Segundo, as vari-áveis empíricas entendidas como proxys da-quelas que fazem as forças centrípetas aci-ma teoricamente enunciadas e afetas aossetores sem raízes correlacionam-se positi-vamente entre si, explicam-se mutuamente,reforçando-se. Se verdadeira, essa pressupo-sição indicaria que na mesorregião as pola-

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ridades tenderiam a se explicar também porum efeito H, por um sinergismo entre as va-riáveis que promovem o desenvolvimentopor competitividade dinâmica e sistêmica.

Concentração de forças e as variáveisque a expressam

Para o ano de 1995-96, no qual se reali-zou o Censo Agropecuário e a recontagemdo Censo Demográfico, dispõe-se de uma sérieimportante de variáveis demográficas, de go-verno e da economia. Este será, portanto, nos-sa referência temporal. Listamos na Tabela2.5 48 varíaveis, ao lado das quais anotamoso tipo de fundamento econômico (se capitalfísico, se capital humano, se capital social ouse capital natural) e o tipo de fenômeno (se aextensão do mercado, se a produtividade cres-

cente, se a industrialização, se a urbanização)aos quais elas pressupostamente estariam refe-ridas. Na quarta coluna anotamos a expecta-tiva teórica que as discussões acima nos suge-rem em relação elas, se se cumprem processosde polarização. Na quinta coluna, anotamoso Índice de Gini para aquela variável consi-derando os 33 municípios da Mesorregião Su-deste Paraense. Como é amplamente conhe-cido, o Índice de Gini é uma técnica estatísti-ca que calcula a concentração de uma variá-vel. Tal como a aplicamos aqui, o índice seobtém pela medida da dispersão entre a dis-tribuição de cada variável pelos municípios euma distribuição totalmente homogênea, emque a participação relativa de cada caso (mu-nicípio) é igual a 1 dividido pelo número decasos (32 municípios). Quanto maior a dis-persão encontrada, maior a concentração.

Tabela 1 - Variáveis de elevada concentração (Índice de Gini para todos os municípios do Sudeste Paraense) Nº Nome da Variável Indicador da importância de: Expectativa quanto a

polarização Índice de Gini

1 Pessoal Ocupado na Mineração Capital Natural Altamente Concentrado 0,96 2 VBP da Horticultura Capital Natural/Urbanização Altamente Concentrado 0,88 3 Pessoal Ocupado Educação Capital Social/Produtividade crescente Altamente Concentrado 0,84 4 Pessoal Ocupado Transportes Capital Físico/Potencial de Mercado Altamente Concentrado 0,83 5 Depósitos Bancários Capital Financeiro/Potencial de Mercado Altamente Concentrado 0,80 6 Pessoal Ocupado na Indústria Capital Físico/Industrialização Altamente Concentrado 0,79 7 Pessoal Ocupado nos Bancos Capital Físico/Potencial de Mercado Altamente Concentrado 0,78 8 Pessoal Ocupado na Saúde Capital Social/Produtividade Crescente Altamente Concentrado 0,76 9 Cabeça de família com mais 14 anos de estudo Capital Humano/Produtividade Crescente Altamente Concentrado 0,74 10 Pessoas com mais de 14 anos de estudo Capital Humano/Produtividade Crescente Altamente Concentrado 0,74 11 Quantidade de Bancos Capital Físico/Potencial de Mercado Altamente Concentrado 0,72 12 Pessoal Ocupado no Comércio Capital Físico/Potencial de Mercado Altamente Concentrado 0,71 13 Matrículas no ensino médio Capital Social Medianamente Concentrado 0,70 14 Pessoas entre 12 e 14 anos de estudo Capital Humano Medianamente Concentrado 0,70 15 Orçamento Público Receita Capital Social Altamente Concentrado 0,70 16 Orçamento Público Despesa Capital Social/Produtividade Crescente Altamente Concentrado 0,70 17 VBP da extração de madeira e carvão Capital Natural Medianamente Concentrado 0,70 18 Cabeça de família entre 12 e 14 anos de estudo Capital Humano Medianamente Concentrado 0,69 19 Leitos Hospitalares Capital Social Altamente Concentrado 0,68 20 Pessoal Ocupado no Serviço Público Capital Social Altamente Concentrado 0,67 21 Professores no ensino médio Capital Social Medianamente Concentrado 0,65 22 Cabeça de família entre 9 e 11 anos de estudo Capital Humano Medianamente Concentrado 0,65 23 Pessoas entre 9 e 11 anos de estudo Capital Humano Medianamente Concentrado 0,64 24 ICMS Altamente Concentrado 0,62 25 Quantidade de Indústrias Capital Físico Altamente Concentrado 0,60 26 População Urbana Potencial de Mercado Altamente Concentrada 0,55 27 Crédito Agrícola Capital Financeiro Medianamente Concentrado 0,55 28 Cabeça de família entre 4 e 8 anos de estudo Desconcentrado 0,53 29 VBP das Culturas Permanentes Capital Natural/Capital Físico Desconcentrado 0,52 30 Pessoas entre 4 e 8 anos de estudo Desconcentrado 0,51 31 VBP da Pecuária de Pequeno Porte Capital Natural/Capital Físico Desconcentrado 0,50 32 VBP da Pecuária de Médio Porte Capital Natural/Capital Físico Desconcentrado 0,46 33 VBP das Culturas Temporárias Capital Natural/Capital Físico Desconcentrado 0,44 35 Matrículas no ensino fundamental Desconcentrado 0,42 36 Professores no ensino fundamental Desconcentrado 0,41 37 Cab. De família até 4 anos de estudo Capital Humano Desconcentrado 0,41 38 Pessoas até 4 anos de estudo Desconcentrado 0,41 39 Eleitores Capital Social Desconcentrado 0,40 40 Pessoal ocupado na agricultura Trabalho Desconcentrado 0,40 41 VBP da Pecuária de Grande Porte Desconcentrado 0,38 42 População Rural Desconcentrado 0,37 43 Quantidade de postos de saúde Desconcentrado 0,37 44 Receita da agropecuária Desconcentrado 0,36 45 VBP total da produção animal e vegetal Desconcentrado 0,34 46 Fundo de participação dos municípios Desconcentrado 0,32 47 VBP do Extrativismo de Coleta Desconcentrado 0,25 48 Incremento da população Desconcentrado 0,19 Tabelas A.1 a A.4. Processamento do Autor.

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Uma simples leitura da mencionadaTabela 1 informa-nos que a nossa pressupo-sição foi basicamente correspondida. As va-riáveis que são indicativas do potencial demercado, da divisão intersetorial do traba-lho e do desenvolvimento do comércio, comoPessoal Ocupado em Transportes, Depósi-tos Bancários, Pessoal Ocupado na Indús-tria e Pessoal Ocupado nos Bancos e PessoalOcupado no Comércio, mostram-se nosrankings mais elevados de Índice de Gini,como se esperava. O mesmo se poderia di-zer das variáveis indicativas de capital hu-mano e prováveis condições para rendimen-to crescente (qi crescentes): se esperavam ese verificaram elevadas concentraçöes paraas escolaridades elevadas, como Cabeça deFamília com Mais de 14 Anos de Estudo ePessoas com Mais de 14 Anos de Estudo,concentração mediana para as escolarida-des médias e baixa para escolaridade em ní-vel fundamental. Para as variáveisindicativas de capital social, na forma deinfraestrutura de serviços públicos, comoPessoal Ocupado na Saúde e Pessoal Ocu-pado nos Serviços Públicos, por exemplo,esperava-se alta concentração, tal como semostrou. A População Urbana, entretanto,para a qual seria de esperar uma concentra-ção alta, apresenta Gini mediano.

Quanto às variáveis associadas ao ca-pital natural, encontram-se dois tipos de si-tuação. Primeiro, as variáveis que associam-se ao capital natural na produçãoagropecuária, como População Rural e osValores Brutos de Produção dos diversos ra-mos de produção agropecuária, para os quaisse poderia pressupor maiores probabilidadede utilização do capital natural como meio

de produção, apresentam elevadadesconcentração, como se esperava, aliás.Segundo, aquelas variáveis que associam-seà natureza como matéria prima, a exemplode Pessoal Ocupado na Mineração, de ValorBruto da Produção da Extração de Madeirae de Carvão (extrativismo de aniquilamento)apresentam elevado grau de concentração. Asrazões para a diferença são óbvias. Tratadaenquanto meio de produção, a base naturalfornece ao processo produtivo um fluxo deelementos que é, com participação variada,seu produto, e, como tal, se renova a cadaano – a natureza é, pois, em combinação como trabalho, coprodutora desse fluxo, que sefará pelo tempo que durar a combinação doselementos naturais que fazem daquele lugaro espaço da existência daquela combinaçãoparticular. Essa porção de natureza pode so-frer uma depreciação, ou não; a depreciaçãopode ser mais ou menos rápida - em qual-quer dos casos, contudo, a natureza écoprodutora, determinando duas coisas: poruma lado, uma difusão das atividades na ra-zão direta da difusão daquelas condiçõesnaturais; de outro, um fixedez espacial, tan-to mais forte, quanto menor a depreciação dabase natural – isto é, quanto maior seja asustentabilidade do uso dessa base natural.Tratada como matéria prima, todavia, umaporção de natureza é um estoque – o fluxoque daí deriva é único e não renovável. Aporção de natureza que o lugar contém,destarte, sendo um dado, dita também duascoisas: a concentração espacial das ativida-des na razão direta do estoque e a mobilida-de espacial na razão direta da rapidez daexploração. Eis o que os dados, nesse primei-ro momento, o demonstram.

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Concentração e efeito H no sudesteparaense

As variáveis com maior grau de con-centração reforçam-se entre si, correlacio-nam-se de modo a indicar uma polaridadedinâmica?

Para respondermos a isso exploremosos dados quanto à correlação estatística li-near direta entre cada variável. A Tabela 2apresenta os Coeficientes de Correlação dePearson entre todas as variáveis com Índicede Gini superior a 0,5, ordenadas do cantosuperior para o inferior pelas médias doscoeficientes de correlação da variável comtodas as demais variáveis. Assim, quantomais no alto e na esquerda se encontrar avariável, mais fortemente ela se correlacionacom todas as demais. A primeira coluna databela apresenta o Índice de Gini, de modoque se pode visualizar ao mesmo tempo ograu de concentração da variável, a médiadas correlações que apresenta com todas asvariáveis e a correlação particular com cadauma delas. Para respondermos a indagaçãoacima temos que centrar a atenção nas vari-áveis que apresentam elevado grau de con-centração e/ou elevada média de correlaçãocom as demais variáveis. São as seguintes assituações a considerar:•As 7 variáveis com mais elevados Coefi-

cientes de Correlação de Pearson comtodas as outras de Índice de Gini acima de0,5 são as que indicam o nível de educa-ção da população e dos cabeças de famí-lia: as que se associam às disponibilidadesde capital humano. Entre elas há duas so-bre as quais devemos nos deter pois com-binam altos Ginis com altas correlações:Cab. de família com mais 14 anos de estu-dos e Cab. de família entre 12 e 14 anos deestudo. Como se viu antes, a expressãoconcentrada dessas variáveis indicam a ca-pacidade da aglomeração de prover mei-os para uma dinâmica de produtividadecrescente.

•Há três outras variáveis com altos Ginis eelevadas correlações, todas relevantes paraquestões de desenvolvimento, ou comoproxys de infraestrutura social, como Pes-soal Ocupado na Saúde e Pessoal OcupadoEducação, ou do grau de desenvolvimentoda divisão social do trabalho, como Pesso-

al Ocupado no Comércio. Como se discutiu,essas variáveis são também indicadores dediferencial de produtividade e de potenci-al de produtividade crescente.

•Há duas variáveis também com elevadosGinis, mas com correlações não tão eleva-das como as anteriores, ambas proxys dograu de desenvolvimento da divisão socialdo trabalho. São elas Depósitos Bancários ePessoal Ocupado Transportes

•A variável População Urbana, de grande sig-nificado para a análises do desenvolvimen-to regional, dado que proxy importante dopotencial do mercado e de produtividadecrescente por ganhos de escala, apresentagini mediano e correlações muito elevadascom as demais variáveis de alta concen-tração, devendo constituir alvo das nossasatenções.

•Há variáveis com alto grau de concen-tração e com baixa correlação com as de-mais. Nessa condição encontram-se VBPda Horticultura, Pessoal Ocupado na Indús-tria, Pessoal Ocupado na Mineração e VBPdo extrativismo de aniquilamento. Despresa-remos a primeira pela sua pouca relevân-cia para questões de desenvolvimento e nosconcentraremos, daqui por diante, nas trêsúltimas – pela sua grande relevância paraas condições locais de desenvolvimento.

Como se relacionam essas variáveis noSudeste Paraense? Elas indicam, em sua ar-ticulação, se as aglomerações explicam-semais pelos serviços e comércio, ou mais pe-las indústrias que a elas se associam? E, oque fundamenta a formação de indústrias?As dimensões dos mercados representadospelas populações urbanas ou o capital hu-mano contido nessas últimas? Desempenhao capital social (percebido nas proxys deinfraestrutura social, por exemplo) um pa-pel relevante na polarização?

Para encaminhar tais questões, ajus-tamos modelos de regressão linear para astransformações logarítmicas das variáveisacima escolhidas. Para atender a primeira,a segunda e a última perguntas, tornamos aPopulação Urbana variável dependente detodas as demais acima escolhidas. Os re-sultados estão na Tabela: na primeira colu-na o nome da variável, na segunda os coe-ficientes originais da regressão para cadavariável independentes, na coluna seguin-

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te o desvio padrão do parâmetro, na quartacoluna os valores b (coeficientes estan-dartizados de modo a permitir a compara-ção direta entre eles), na quinta coluna o re-sultado do Teste t de Studente e, na última,o grau de significância do parâmetro (a me-dida da probabilidade de que não haja cor-relação entre as duas variáveis). Na últimalinha encontra-se o coeficiente de determi-

nação da regressão (R2). O modelo apresen-tou um elevado Coeficiente de Determina-ção Ri

2 = 0,962 e resistiu a um teste demulticolinearidade entre as variáveisdependentes: nenhuma correlação linearsimples medida pelo Coeficiente de Corre-lação de Pearson elevado ao quadrado si-tuou-se acima do coeficiente de determina-ção (nenhum ri

2> Ri2 ).

Tabela 3 - Resultados da regressão do LN da População Urbana como variável dependente do LN das demais variáveis escolhidas

Coeficientes Variáveis Independentes

B Desvio Padrão

Coeficientes Normalizados

β

Teste t de Studente Significância

(Constante) 7,697 0,270 28,543 0,000

LN(Depósitos Bancários) 0,025 0,030 0,085 0,823 0,419

LN(Cab. de fam. com mais de 14 anos de escola) 0,030 0,094 0,044 0,317 0,754

LN(Cab. de fam. Entre 12 e 14 anos de escola) 0,338 0,112 0,441 3,011 0,006

LN(Pessoal Ocupado na Saúde) 0,006 0,063 0,010 0,094 0,926

LN(Pessoal Ocupado no Comércio) 0,151 0,083 0,251 1,808 0,084

LN(Pessoal Ocupado na Educação) 0,039 0,053 0,063 0,729 0,474

LN(Pessoal Ocupado na Indústria) 0,132 0,037 0,255 3,521 0,002

LN(Pessoal Ocupado na Mineração) -0,025 0,039 -0,035 -0,621 0,541

LN(Pessoal Ocupado no Transporte) -0,014 0,060 -0,025 -0,231 0,820

LN(VBP Madeira e Carvão) -0,054 0,020 -0,147 -2,738 0,012

Coeficiente de Determinação R2 = 0,962

Tabelas A.1 a A.4. Processamento do Autor com o SPSS.

Os resultados correspondem à expec-tativa teórica do desenvolvimento endóge-no. Olhando apenas os sinais dos coeficien-tes demonstra-se que as concentrações ur-banas no Sudeste Paraense dependem po-sitivamente (isto é, são formadas pela açãocumulativa das concentrações respectivas)do grau de instrução média e superior dapopulação adulta, do desenvolvimento docomércio e da indústria, do desenvolvimen-to da infra estrutura educacional e de saúdee do desenvolvimento do mercado finan-ceiro; por outra parte, associa-se, na região,negativamente à mineração e à produçãode madeira e de carvão. Há, entretanto,relativizações a fazer que muito dizem so-bre a natureza das aglomerações na me-sorregião. Considerados os valores dos coe-ficientes b verifica-se, por exemplo, que aimportância relativa da concentração de

adultos (cabeças de família) com formaçãosuperior (indicado pelo parâmetro 0,044) é1/10 da importância da concentrações deadultos com formação média (parâmetro0,441) e que, além da concentração deadultos com formação média, só mais duasvariáveis com sinal positivo têm carga ele-vada, aproximadamente iguais (0,25): pre-cisamente o pessoal no comércio e na in-dústria. O peso do pessoal ocupado na saú-de é muito baixo (0,10), o mesmo se poden-do dizer da saúde e dos serviços bancários.Por fim, se seconsidera a significância dosparâmetros e o teste t de Student (valorcrítico de 1,717 para um grau de liberdadede 22, 33 observações para 11 parâmetros),ter-se-ía robustez apenas para os coeficien-tes relativos aos adultos com educação mé-dia, para o pessoal na indústria e para o pes-soal no comércio.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

O que explica a concentração da in-dústria, por sua vez, ou a participação daindústria na formação das aglomerações?Tomando o pessoal empregado na indústriacomo variável dependente, chegamos aosresultados da Tabela . Com um Coeficientede Determinação Ri

2 = 0,792 , o modelo in-dica, observando os sinais e os valores doscficientes b, que, correspondendo à expec-tativa teórica, a indústria depende, na re-gião, das próprias aglomerações urbanas –do tamanho do mercado (coeficiente positi-vo e muito elevado em relação às populaçãourbana); por outra parte, depende significa-tivamente da produção de madeira e de car-vão. Indica, ademais, que a indústria que seforma na meso região não se associa à existên-cia de capital humano, nem cria infra-estruturasocial, dado que os coeficientes de todas asvariáveis a isso associadas são negativos,com as cargas negativos mais expressivasprecisamente para os adultos com formaçãomédia e superior. Mas o modelo apresentaproblemas de multicolinearidade entre asvariáveis independentes, de um lado, entreas variáveis população urbana e adultos comnível superior e médio, de outro, entre asvariáveis pessoal na saúde de populaçãoadulta com instrução superior. Se aduzirmosa isso os resultados dos testes t de Studente ede significância, concluímos que o modelonos apresenta resultado robusto apenas paraos coeficientes relativos à população urbana

e valor da produção de madeira e carvão.O que dizer da concentração do co-

mércio, por sua vez, ou a participação docomércio na formação das aglomerações?Tomando o pessoal empregado no comérciocomo variável dependente, chegamos aosresultados da Tabela . Com um Coeficientede Determinação elevado, de Ri

2 = 0,923, eresistiu a um teste de multicolinearidadeentre as variáveis dependentes: nenhumacorrelação linear simples medida pelo Coe-ficiente de Correlação de Pearson elevado aoquadrado situou-se acima do coeficiente dedeterminação (nenhum ri

2> Ri2 ). O modelo

indica, observando os sinais e os valores doscficientes b, que o comércio também depen-de, fortemente, das aglomerações urbanasque ajuda a formar, bem como dos adultoscom formação média e do nível de desen-volvimento dos transportes; depende fraca-mente do valor da produção da mdeira e docarvão, dos adultos com formação superiore do pessoal ocupado na saúde. Se aduzirmosos resultados dos testes t de Studente e designificância, concluímos, entretanto, que omodelo nos apresenta resultado relativamen-te robusto (8% de probabilidade de correla-ção nula) apenas para o coeficiente relati-vos à população urbana. Poder-se-ía, comalgum risco, incorporar os parâmetros rela-tivos à população com nível médio de ins-trução (14,5% de probabilidade de correlaçãonula).

Tabela 4 - Resultados da regressão da Pessoal Ocupado na Indústria como variável dependente das demais variáveis escolhidas

Coeficientes Variáveis Independentes

B Desvio Padrão

Coeficientes Normalizados

β

Teste t de Studente Significância

(Constant) -21,409 6,046 -3,541 0,002 LN(Depósitos Bancários) -0,015 0,139 -0,026 -0,105 0,917 LN(Cab. de fam. com mais de 14 anos de escola) -0,347 0,421 -0,263 -0,824 0,419 LN(Cab. de fam. Entre 12 e 14 anos de escola) -0,471 0,600 -0,317 -0,786 0,440 LN(Pessoal Ocupado na Saúde) -0,029 0,288 -0,026 -0,102 0,920 LN(Pessoal Ocupado no Comércio) -0,171 0,405 -0,147 -0,423 0,677 LN(Pessoal Ocupado na Educação) -0,065 0,245 -0,055 -0,266 0,793 LN(Pessoal Ocupado na Mineração) 0,059 0,181 0,044 0,328 0,746 LN(Pessoal Ocupado no Transporte) 0,075 0,274 0,070 0,273 0,788 LN(População Urbana) 2,735 0,777 1,412 3,521 0,002 LN(VBP Madeira e Carvão) 0,273 0,086 0,384 3,161 0,005 Coeficiente de Determinação R2 = 0,792

Tabelas A.1 a A.4. Processamento do Autor com o SPSS.

43Polaridades e desenvolvimento endógeno no sudoeste paraense

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

Polaridade e “Massa” de Gravitação

As aglomerações urbanas no SudesteParaense parecem resultar de dinâmicascumulativas favorecidas pelos serviços decomércio, bancários, educacionais e de saú-de e pela presença de indústrias. A produ-ção industrial na mesoregião, por seu turno,associa-se fortemente à exploração madei-reira e a produção de carvão, que não cor-roboram a polaridade dinâmica centradasnas aglomerações urbanas e não formam enem requerem capital humano, sequer denível médio, muito menos de nível superior.As aglomerações de comércio e de serviços,por seu turno, apoiam-se, como fundamen-to de trabalho e consumo, dominantementeem um capital humano de nível médio e se-cundariamente, em capital humano de ní-vel superior – ambos fortemente concentra-dos na mesorregião. De modo que, emintereção complexa, as variáveis escolhidasreeferem-se a vetores determinadores dasconfigurações multipolares da mesorregião.

Não seria possível integrá-las estatistica-mente, fazê-las se comunicar entre si na cria-ção de uma expressão que pudesse estabeleceruma “massa” Ai que nas metáforas gravita-cionais representassem mais o poder de atra-ção dos lugares que os seus resultados? Comtal massa não impregnaríamos a metáfora doscampos de força de Isard com o conteúdo,mesmo que parcial, dos fatores determinantesdo do desenvolvimento endógeno?

As técnicas de análise fatorial fornece-nos meios de observar de modo eficiente a“comunicação de agregados” de variáveis(Ferreira, 1989:531) e a distribuição espacialda ocorrência dessas agregações. A análise“cria” uma ou várias variáveis, em relaçãoàs quais as variáveis tomadas inicialmenteapresentam máxima correlação. Tais variá-veis podem ter seus valores (scores) calcula-dos para todas as unidades de ocorrência dasvariáveis primárias – neste nosso caso, paratodos os municípios. Os valores das variá-veis artificiais (factors) representam, assim,a integração das variáveis (reais) que atuamreforçando-se. Para o nosso caso, proceda-mos de modo a encontrar algum factor queexpresse as interrelações das variáveis quereforçam sua condição original concentra-da (Fedorenko et alii, 1971; Friedrichs, 1980;Brosius, 1989; Kageyama e Silveira, 1997;Lemos e Assunção, 1997).

Submetemos as 11 variáveis já trata-das a uma análise fatorial. Relembrando, oitodelas são variáveis adequadas para repre-sentar proxys das forças centrípetas da acu-mulação dinâmica: capital humano (Cabe-ça de família com mais 14 anos de estudo,Cabeça de família entre 12 e 14 anos de es-tudo), capital social (Pessoal Ocupado Edu-cação, Pessoal Ocupado na Saúde),aprofundamento da divisão social do traba-lho (Pessoal Ocupado no Comérico, Depósi-tos Bancários, Pessoal Ocupado Transpor-tes, Pessoal Ocupado na Indústria) e tama-

Tabela 5 - Resultados da regressão do Pessoal Ocupado no Comércio como variável dependente das demais variáveis escolhidas

Coeficientes Variáveis Independentes

B Desvio Padrão

Coeficientes Normalizados

β

Teste t de Studente Significância

(Constant) -5,214 3,811 -1,368 0,185 LN(Depósitos Bancários) -0,003 0,073 -0,006 -0,038 0,970 LN(Cab. de fam. com mais de 14 anos de escola) 0,093 0,223 0,082 0,416 0,681 LN(Cab. de fam. Entre 12 e 14 anos de escola) 0,458 0,303 0,359 1,510 0,145 LN(Pessoal Ocupado na Saúde) 0,005 0,151 0,006 0,036 0,972 LN(Pessoal Ocupado na Educação) -0,123 0,126 -0,120 -0,975 0,340 LN(Pessoal Ocupado na Indústria) -0,047 0,111 -0,055 -0,423 0,677 LN(Pessoal Ocupado na Mineração) -0,009 0,095 -0,008 -0,098 0,923 LN(Pessoal Ocupado no Transporte) 0,154 0,140 0,167 1,096 0,285 LN(População Urbana) 0,859 0,475 0,516 1,808 0,084 LN(VBP Madeira e Carvão) 0,055 0,053 0,090 1,027 0,316 Coeficiente de Determinação R2 = 0,923 Tabelas A.1 a A.4. Processamento do Autor com o SPSS.

44 Francisco de Assis Costa

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

nho de mercado (População Urbana). Duasdelas têm a ver com a exploração de recur-sos naturais que induzem à acumulação es-pacialmente concentrada (Pessoal Ocupadona Mineração e VBP da Extração de Madei-ra e Carvão).

Resultou dois fatores com eigenvaluesmaiores que um (fronteira, a partir da qualsugere-se consideração – Hair et alii, 1998:104-113). O primeiro, com eigenvalue de 7,8explica 71% da variância total. O segundo,com eigenvalue de 1,56, explica 14,2% davariância total.

Consideremos na nossa análise apenaso primeiro fator, cujas correlações com asdiversas variáveis de origem estão na Tabe-la ordenadas por valor. O fator apresentacorrelações superiores a 0,9 para sete das oitovariáveis proxys daquelas que fundamentama polarização dinâmica. Apresenta baixacorrelação com as atividades concentradas,porém notoriamente atreladas à exploraçãoda natureza como matéria prima. Chama-remos este de Fator de Polaridade Dinâmi-ca, por explicitar a interação dominante dasvariáveis (que representam proxys dos fato-res superiores) de polarização.

Um dos recursos da análise fatorial éverificar em que medida um fator se ma-nifesta para cada um dos casos estatísticosda análise – os scores do fator para cadaunidade de informação. Em nosso estudo,isso significa que podemos ter uma medidada força da conjunção das variáveis que

fundamentam a polarização dinâmica ex-pressa pelo Fator Polarização Dinâmica – emque medida ele se manifesta para cada lu-gar. Precisamente esse valor poderá sertomada como a “massa” A do lugar, na de-limitação do campo de forças dos potenci-ais descritos na relação (2.3) – o seu poderestruturante derivado do sinergismo pro-duzido pela interação entre aquelas variá-veis. Tais valores foram encontrados econstam da Tabela 7.

Encontrado o vetor de “massas”, istoé, as grandezas Aj da relação (2.3) construiu-se uma matriz de distâncias corresponden-te aos 33 municípios, que compõem a me-sorregião Sudeste do Pará (ver Tabela A.3).Dividindo cada massa pela distância encon-tramos a atratividade de cada par i,j demunicípios. E o potencial de atração de cadamunicípio é a soma da força de atração des-se município em relação a cada um dos ou-tros municípios: o valor do campo de forçasconstituído por suas relações. O resultadoestá na Tabela A.4, cuja última linha apre-senta o potencial de cada um dos muni-cí-pios em consideração. Os cinco municípiosde maior potencial de atração na mesor-região Sudeste Paraense, aqueles que po-tencialmente configuram-se como seus pó-los, são, pela ordem de grandeza de P:Marabá (P=6,4), Parauapebas (P=3,35),Paragominas (P=3,10), Tucuruí (2,92), Con-ceição do Araguaia (P=2,39).

A Tabela 8 apresenta a distribuição dasrespectivas cargas de atração em relação atodos os municípios da Mesorregião e umadistribuição dos municípios pelas aglome-rações que apresentaram maior poder deinfluência. Apresenta, ao final, uma indi-cação de posição no Pólo a partir das cargaspotenciais que cada município apresenta emrelação aos principais centros aglutinado-res: considerou-se que um município seriatributário de um centro, se o potencial deatração que apresenta em relação aquelecentro fosse maior que o potencial de atra-ção que apresenta em relação a qualquercentro.

Tabela 6 - O fator principal da análise fatorial das variáveis básicas do Sudeste Paraense

Variáveis Coef. de

Correlação com o Fator Principal

População Urbana 0,979 Pessoal Ocupado no Comércio 0,979 Cabeça de família com mais 14 anos de estudo 0,977 Cabeça de família entre 12 e 14 anos de estudo 0,976 Pessoal Ocupado Educação 0,969 Pessoal Ocupado na Saúde 0,967 Depósitos Bancários 0,963 Pessoal Ocupado Transportes 0,934 Pessoal Ocupado na Indústria 0,443 Pessoal Ocupado na Mineração 0,303 VBP da extração de madeira e carvão 0,248 Tabelas A.1 a A.4. Processamento do Autor com o SPSS.

45Polaridades e desenvolvimento endógeno no sudoeste paraense

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

Tabela 7 - Scores dos Fatores Polaridade e Ruralidade para o Sudeste Paraense – Massa dos Municípios

Municípios Scores Polaridade Dinâmica Scores Polaridade Dinâmica Ajustados Marabá 4,59379 6,1401 Parauapebas 1,50015 3,0464 São João do Araguaia -0,53269 1,0136 São Domingos do Araguaia -0,48184 1,0644 Itupiranga -0,41601 1,1303 Bom Jesus do Tocantins -0,49303 1,0533 Jacundá -0,07421 1,4721 Tucuruí 1,10113 2,6474 Eldorado dos Carajás -0,49109 1,0552 Curionópolis -0,35782 1,1885 Rondon do Pará 0,11762 1,6639 Abel Figueiredo -0,5124 1,0339 São Geraldo do Araguaia -0,35986 1,1864 Brejo Grande do Araguaia -0,5373 1,0090 Dom Eliseu -0,06088 1,4854 Paragominas 1,37501 2,9213 Breu Branco -0,33886 1,2074 Palestina do Pará -0,52932 1,0170 Goianésia do Pará -0,44176 1,1045 Xinguara 0,01646 1,5627 Redenção 0,74664 2,2929 Água Azul do Norte -0,54628 1,0000 Conceição do Araguaia 0,64112 2,1874 Novo Repartimento -0,42859 1,1177 Ulianópolis -0,37412 1,1722 Rio Maria -0,3376 1,2087 Tucumã -0,22644 1,3198 Ourilândia do Norte -0,40838 1,1379 Pau D'Arco -0,5428 1,0035 Cumaru do Norte -0,52176 1,0245 Santana do Araguaia -0,1672 1,3791 São Félix do Xingu -0,36902 1,1773 Santa Maria das Barreiras -0,54263 1,0037

Fonte: Tabela 2.1 a Tabela 2.4. * Tornou-se o menor valor igual a 1.

Tabela 8 – Cargas dos potenciais de atração dos principais centros polarizadores do Sudeste Paraense Municípios com maior potencial de atração: Distribuição dos municípios pelos respectivos pólos de

atração (função da maior carga de atração) Município Marabá Parauapebas Paragominas Tucuruí Conceição Marabá Parauapebas Paragominas Tucuruí Conceição

Marabá 6,14007 0,05203 0,01436 0,03198 0,01263 Marabá Parauapebas 0,02582 3,04643 0,00668 0,01145 0,01219 Parauapebas S. J. Arag. 0,02413 0,00685 0,00321 0,00483 0,00307 Marabá S. Doming. 0,02129 0,00750 0,00323 0,00471 0,00343 Marabá Itupiranga 0,01700 0,00912 0,00343 0,00715 0,00327 Marabá Bom Jesus 0,01505 0,00566 0,00390 0,00560 0,00286 Marabá Jacundá 0,01502 0,00751 0,00564 0,01389 0,00352 Marabá Tucuruí 0,01379 0,00995 0,00946 2,64741 0,00521 Tucuruí Eldorado 0,01319 0,02110 0,00230 0,00409 0,00432 Parauapebas Curionóp. 0,01238 0,03962 0,00275 0,00450 0,00487 Parauapebas Rondon 0,01223 0,00666 0,00770 0,00800 0,00396 Marabá Abel Fig. 0,01124 0,00497 0,00401 0,00527 0,00274 Marabá S. Geraldo 0,00927 0,00802 0,00289 0,00368 0,00530 Marabá B. Grande 0,00747 0,00567 0,00310 0,00388 0,00325 Marabá Dom Eliseu 0,00707 0,00450 0,00952 0,00594 0,00312 Paragominas Paragomin. 0,00683 0,00641 2,92129 0,01043 0,00462 Paragominas B. Branco 0,00678 0,00451 0,00457 0,06708 0,00240 Tucuruí Palestina 0,00678 0,00565 0,00304 0,00371 0,00339 Marabá Goianésia 0,00650 0,00409 0,00489 0,01726 0,00224 Tucuruí Xinguara 0,00584 0,01421 0,00284 0,00411 0,01101 Parauapebas Ulianópolis 0,00350 0,00304 0,01429 0,00469 0,00212 Paragominas N. Repart. 0,00426 0,00543 0,00339 0,01693 0,00252 Tucuruí São Félix 0,00193 0,00491 0,00177 0,00286 0,00338 Parauapebas Ourilândia 0,00244 0,00759 0,00190 0,00308 0,00455 Parauapebas Água Azul 0,00467 0,01000 0,00181 0,00287 0,00490 Parauapebas Tucumã 0,00277 0,00815 0,00219 0,00351 0,00508 Parauapebas Cumarú 0,00210 0,00488 0,00154 0,00223 0,00551 Conceição RioMaria 0,00336 0,00863 0,00209 0,00299 0,00930 Conceição Pau D'arco 0,00231 0,00528 0,00162 0,00398 0,01091 Conceição S. M. Barr. 0,00170 0,00198 0,00142 0,00177 0,01287 Conceição Santana 0,00200 0,00383 0,00175 0,00219 0,01724 Conceição Redenção 0,00493 0,01071 0,00356 0,00476 0,02796 Conceição Conceição 0,00450 0,00875 0,00346 0,00431 2,18740 Conceição Potenciais totais 6,4182 3,35 3,05959 2,92 2,39

Fonte: Tabela A.6.

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Considerações finais

Na análise acima o município deMarabá apresentou-se como Centro de mai-or potencial polarizador no Sudeste Para-ense. Considerando a força de atração re-presentado por uma massa A, cujo valor re-sulta da inter-relação de variáveis que indi-cam tanto possibilidades de ganhos de esca-la (como população urbana) como outras queapontam para potencial de rendimentoscrescentes (como as variáveis associadas àescolaridade da força de trabalho, além dadisponibilidade de serviços públicos e priva-dos), e a ação centrífuga das distâncias en-tre o Centro e todos os municípios da Mesor-região Sudeste Paraense, estabeleceu-se ahierarquia de lugares que representam o queaqui entendemos como Pólo Marabá. Alémde Marabá, revelaram-se quatro outras aglo-merações significativas na Mesorregião:Parauapebas, Paragominas, Tucuruí e Con-ceição do Araguaia.

Notas1 Ver a avaliação de Amaral (2001:350-365) sobre a

evolução e possibilidades do conceito.2 A população constitui, nessa perspectiva, massa de

atração porque se supõe que quanto maiores osaglomerados humanos maior deverá ser a comutaçãoentre eles. Por outro lado, pressupõe-se que o custo eo sacrifício de deslocamento no espaço reduz aquelacomutação na razão direta da distância entre os

aglomerados (Ferreira, 1989:528).3 Com isso, segundo Richardson (1969:98), os modelos

gravitacionais passaram a se pretenderem nãodeterminísticos, dado não se proporem à verificaçãode posições estabelecidas (ótimas) de uma certaconfiguração espacializada da relação entre fatores,mas sim a indicarem o que é provável ocorrer nodeslocamento destes fatores numa certa configuraçãoespacial. Eles se referem a interações esperadas –resultam, isto posto, de um teoria das probabilidadese representam aspectos de teorias do comportamentoe não da maximização.

4 Alfred Marshall, um dos mais importantes teóricosda mecânica neoclássica, foi também pioneiro emapontar os efeitos positivos da aglomeração. Paraele, tais efeitos se davam porque a) a concentração defirmas de uma mesma indústria em um mesmo lugarpermite um correspondente agrupamento de traba-lhadores com as habilidades especiais por ela particu-larmente requeridas; b) em um centro urbano, quantomaior e industrializado seja, mais permite a provisãode insumos não comercializáveis – serviços especializa-dos, cultura, sistema de assistência social, formaçãotécnica, amenidades urbanas, etc. – o que Fujita,Krugman e Vebables (2000: 19) traduziram como acapacacidade das aglomerações produzirem “excessode conhecimento’ e que c) as informações sobre inova-ções de produto e processo fluem com mais facilidadeem curtas distâncias – o acesso a technological spilloversé facilitado pela aglomeração (Marshall, 1982: 231-38). Seus seguidores, contudo, têm considerado essesfatores na designação comum de externalidades, istoé, como fatores próprios ao ambiente sócio-culturale político onde funcionam as empresas, mas estranhosao processo decisório propriamente econômico e, pre-sumivelmente, alheio a seus resultados. Isso lhes per-mitiu preservar a metáfora do equilíbrio geral porgarantirem a hipótese dos rendimentos decrescentes.Ver considerações críticas de Arthur (2000).

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Tabela A.3 - Variáveis de finanças públicas e privadas, 1995-96 Finanças Públicas Bancos

Município Receita Total Despesa Total FPM1 ICMSl2 Depósitos Número Pessoal

ocupado Marabá 23.200 24.534 9.775 8,87% 25.507 18 262 Parauapebas 23.655 22.604 2.616 14,18% 3.453 4 33 São João do Araguaia 0 0 1.831 0,22% 0 0 0 Itupiranga 5.521 5.750 3.139 0,92% 990 1 11 S. D. do Araguaia 0 0 1.308 0,40% 0 0 0 Jacundá 4.597 4.478 2.093 1,06% 630 1 7 B. Jesus do Tocantins 3.279 3.349 1.831 0,43% 180 1 2 Eldorado dos Carajás 1.892 2.009 1.046 0,36% 0 1 9 Curionópolis 0 0 2.877 2,02% 0 0 0 Rondon do Pará 6.157 6.719 2.877 1,90% 1.925 3 32 S. Geraldo do Araguaia 4.247 4.678 2.354 1,54% 0 0 0 Tucuruí 22.382 23.412 4.185 24,81% 7.250 6 60 Abel Figueiredo 0 0 785 0,17% 0 0 0 Dom Eliseu 5.004 4.793 2.354 2,08% 2.964 3 25 Brejo Grande do Araguaia 2.458 2.253 1.569 0,35% 0 0 0 Xinguara 0 0 2.877 3,29% 2.102 4 31 Goianésia do Pará 0 0 1.308 1,04% 0 0 0 Breu Branco 3.286 3.609 1.308 1,19% 0 0 0 Total do Quarto Anel 10.748 10.655 9.416 0 5.066 7 56 Palestina do Pará 0 0 785 0,35% 0 0 0 Água Azul do Norte 2.096 2.409 785 0,56% 0 0 0 Conceição do Araguaia 0 0 3.662 1,60% 2.602 4 51 Novo Repartimento 0 0 1.831 2,34% 0 0 0 Redenção 0 0 2.877 4,89% 4.812 10 69 Rio Maria 0 0 2.093 1,67% 900 2 10 Tucumã 3.557 3.573 2.093 2,20% 540 1 6 Ulianópolis 3.127 2.996 1.308 2,75% 0 0 0 Ourilândia do Norte 3.521 3.836 1.831 1,60% 0 0 0 São Félix do Xingu 0 0 1.831 2,39% 1.260 3 14 Santana do Araguaia 3.070 3.315 1.569 2,12% 1.080 3 12 Pau D'Arco 1.642 1.647 785 0,47% 0 0 0 Cumaru do Norte 0 0 785 0,55% 0 0 0 Sta. Maria das Barreiras 2.315 2.316 1.046 1,76% 0 0 0 Total Sudeste Paraense 125.006 128.280 72.814 1 62.885 71 700

Fonte: IBGE, Base de Informações Municipais, 1995. Notas: 1 Fundo de Participação dos Municípios; 2Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.

Tabela A.4 - Variáveis da distribuição funcional da população por setores, 1995-96 Indústria Pessoal ocupado em serviços Saúde pública

Município Mineração P. Ocup. Número Comércio Educação Serv.

Publ. Transporte Postos de Saúde

Leitos Hosp.

Pessoal ocupado

Marabá 57 1.609 142 3.137 265 1.249 833 9 218 255 Parauapebas 1.506 276 57 1.134 123 1.074 128 12 0 160 São João do Araguaia 0 8 1 6 0 0 4 10 15 0 Itupiranga 0 62 24 47 0 92 2 7 15 0 S. D. Araguaia 0 22 6 34 0 0 0 6 0 0 Jacundá 0 350 62 292 40 235 10 6 52 26 B. Jesus do Tocantins 0 17 8 53 0 232 1 4 25 0 Eldorado dos Carajás 1 20 7 80 0 60 0 8 0 2 Curionópolis 2 12 9 123 3 0 70 2 29 1 Rondon do Pará 6 1.508 49 372 8 490 31 4 77 29 S. Geraldo do Araguaia 0 43 10 177 5 215 2 7 0 1 Tucuruí 0 526 46 902 137 622 149 7 54 79 Abel Figueiredo 0 62 10 26 0 109 1 1 0 0 Dom Eliseu 1 1.176 51 173 0 351 22 4 54 20 Brejo Grande do Araguaia 0 12 1 13 0 93 1 4 0 0 Xinguara 0 292 29 536 4 199 14 3 87 51 Goianésia do Pará 0 161 30 70 0 0 0 10 0 0 Breu Branco 0 855 34 42 3 148 0 10 0 0 Paragominas 4 6.875 178 1.413 130 10 85 23 276 110 Palestina do Pará 0 0 0 12 0 120 1 5 0 0 Água Azul do Norte 0 15 2 1 0 38 0 5 0 0 Conceição do Araguaia 17 139 42 590 63 321 91 22 195 111 Novo Repartimento 0 98 15 82 0 0 2 9 16 6 Redenção 19 596 92 1.395 46 689 141 1 182 68 Rio Maria 0 190 17 149 1 256 7 2 43 11 Tucumã 0 65 25 292 3 0 14 9 110 32 Ulianópolis 31 973 35 64 0 97 2 2 52 0 Ourilândia do Norte 0 29 4 61 0 94 0 7 50 17 São Félix do Xingu 3 29 10 174 0 12 11 7 10 7 Santana do Araguaia 0 101 13 345 2 0 101 4 43 28 Pau D'Arco 0 12 2 7 0 0 0 1 0 0 Cumaru do Norte 0 0 0 6 0 0 0 11 0 0 Santa Maria das Barreiras 2 0 0 6 0 0 1 5 0 0 Total do Sudeste Paraense 1.649 16.133 1.011 11.814 833 6.806 1.724 227 1.603 1.014

Fonte: IBGE, Base de Informações Municipais, 1995.

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A internacionalização de pequenas empresas através de consórcios de exportaçãoinseridos em clusters industriais: uma relação recíproca de contribuição

The internationalization of small businesses through exportation consortiumsinserted in industrial clusters: a reciprocal relationship of contribution

La internacionalización de pequeñas empresas a través de consorcios de exportación insertos enclusters industriales: una relación recíproca de contribución

Márcia Freire de Oliveira*

Dante Pinheiro Martinelli**

Recebido em 24/10/2004; revisado e aprovado em 20/11/2004; aceito em 17/02/2005.

Resumo: Este artigo tem como objetivo, a partir de uma revisão bibliográfica sobre internacionalização de pequenasempresas, consórcios de exportação e clusters industriais, propor um estudo para investigar a existência de umarelação recíproca de contribuição entre aspectos do desenvolvimento local pertinentes aos clusters industriais e ainternacionalização de pequenas empresas através de consórcios de exportação neles inseridos.Palavras-chave: consórcios de exportação; desenvolvimento local; pequenas empresas.Abstract:This article seeks, from a bibliographical revision on internationalization of small businesses, exportationconsortiums and industrial clusters, to propose a study for the investigation of the existence of a reciprocal relationshipof contribution between aspects of local develepment pertinent to industrial clusters and the internationalization ofsmall busiqnesses through exportation consortiums inserted in them.Key words: exportation consortiums; local development; small businesses.Resumen: Este artículo tiene como objetivo, a partir de una revisión bibliográfica sobre la internacionalización depequeñas empresas, consorcios de exportación y clusters industriales, proponer un estudio para investigar la existenciade una relación recíproca de contribución entre aspectos del desarrollo local pertinentes a los clusters industriales y lainternacionalización de pequeñas empresas a través de consorcios de exportación en ellos inseridos.Palabras clave: consorcios de exportación; desarrollo local; pequeñas empresas.

anos 90 devido à abertura comercial e fi-nanceira realizada no governo Collor, daprivatização e da desregulamentação da eco-nomia. A importância do mercado externotornou-se uma das prioridades do governo(DIAS, 2002).

Dentre desse contexto, a participaçãoda pequena empresa no comércio internacio-nal é ainda pequena, mas, ao mesmo tempo,apresenta um grande potencial de expansão,não só pelo grande número de pequenasempresas existentes no país, como pela di-versidade de produtos que elas oferecem.

Buscando incrementar a participaçãodas pequenas empresas no mercado externoo governo brasileiro, em conjunto com aAPEX Brasil (Agência de Promoção de Ex-portações), vem realizando esforços corretospara a redução das barreiras à pequena em-presa na atividade de exportação (IGLESIAS,2003). Dentre essas ações merece destaque aformação de consórcios de exportação, ondeas pequenas empresas mantêm sua própriaindividualidade no mercado doméstico e re-alizam ações conjuntas para exportarem seus

1 Introdução

O processo de globalização de merca-dos, que vem se intensificando nas últimasdécadas devido à aceleração da aberturacomercial e financeira das economias, daformação de grupos econômicos, das novastecnologias de informação, da crescentemobilidade de mercadorias e fatores de pro-dução, assim como da forte competição pe-los locais e estruturas de produção favorá-veis à obtenção de baixos custos de produ-ção e de mão-de-obra, impulsionou a con-corrência em níveis internacionais. Devidoa essa intensificação, as empresas, indepen-dentemente do tamanho, buscam, cada vezmais, novas formas de aumento decompetitividade e de expansão de mercados,sendo a estratégia de internacionalizaçãouma das principais alternativas no alcancedesses objetivos.

O Brasil apresenta uma entrada tar-dia no mercado internacional, sendo que asempresas começaram a ser realmente esti-muladas a se internacionalizar depois dos

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 55-64, Mar. 2005.

* Doutoranda em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos. ([email protected]).** Professor Doutor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo,campus Ribeirão Preto. ([email protected])

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

produtos para diferentes mercados, benefici-ando-se de uma maior eficiência operacionale de baixos custos de produção, notando-seque alguns desses consórcios se localizam nocentro de clusters industriais, enquanto ou-tros são formados por empresas dispersas ge-ograficamente.

Segundo Cavalieri & Manuelli (2001)os clusters locais podem ser considerados umexemplo de desenvolvimento industrial, noqual empresas de pequeno e médio portetornam-se produtores eficientes e exporta-dores de sucesso, ao explorar as vantagenstangíveis e intangíveis trazidas pela proximi-dade e concentração territorial.

Acredita-se que os consórcios de expor-tação se beneficiam, no que tange à interna-cionalização, de aspectos inerentes (tangíveise intangíveis) aos clusters, que estão relacio-nados ao desenvolvimento local por ele pro-porcionado, como por exemplo o desenvol-vimento de relações sociais que favorecem acooperação, utilização de mão de obra localespecializada, e também beneficiam o clusterpor fatores como o reforço da identidade daregião, a atração de compradores internaci-onais, entre outros. Assim, o objetivo destacomunicação, que consiste de um ensaio te-órico, é de propor um estudo para verificara existência desta relação recíproca de con-tribuição e, conseqüentemente, dos benefí-cios por ela gerados.

2 Fundamentação Teórica

2.1 A internacionalização de pequenasempresas

O quadro externo atual, caracterizadoem particular pela interdependência das eco-nomias, a globalização dos mercados e amundialização da concorrência, criou novasoportunidades mas também desafios, que le-varam as empresas a desenvolver esforços naadoção de estratégias de internacionalização.

De acordo com Lemaire et. al. (1997),o desenvolvimento internacional das empre-sas corresponde a uma necessidade que asmudanças recentes do ambiente econômicomundial progressivamente colocaram emevidência, sendo elas :• A tendência globalizante das economias e

mercados, que se firmou depois de uma ou

duas décadas, dentro de um cenário em queas dificuldades das trocas de bens, serviçose capitais aumentaram sensivelmente,

• O processo de abertura internacional ine-vitável e consecutivo para grande parte dasempresas.

Segundo Caldeira (2002) os processosde internacionalização não são simples enem podem ser separados das estratégiascompetitivas das empresas, implicando no-tadamente nos seguintes pontos: atitude com-petitiva, concentração geográfica das empre-sas, mecanismos de gestão e de coordenaçãode atividades, desenvolvimento interno decompetências dinâmicas, absorção e integra-ção de conhecimento, relação com outrasempresas (concorrentes, clientes, fornecedo-res) e a capacidade de adaptação e articula-ção das diferentes condições locais (especifi-cidades culturais, econômicas, regulamenta-res e linguísticas dos países ou regiões).

Para as pequenas empresas, o proces-so de internacionalização é mais complexo,em comparação com as grandes organiza-ções, devido às dificuldades peculiares queapresentam, por exemplo: fabricação de pro-dutos com um nível de qualidade aceitávelnos mercados externos, falta de tempo paragerenciar as atividades internacionais; faltade informação adequada para se desenvol-ver no mercado externo; barreiras burocrá-ticas; dificuldade em encontrar intermediá-rios no exterior (agentes de exportação, re-presentantes, empresa comercial) e etc.

Apesar das dificuldades existentes, ainternacionalização se mostra uma alterna-tiva atraente e necessária, no que tange àcompetição mundial, para as pequenas em-presas. De acordo com Dias (2002) os prin-cipais motivos que levam uma pequena em-presa a entrar no mercado externo são: adiminuição da dependência dos mercadosinternos, o aumento das receitas opera-cionais, uma maior rentabilidade da empre-sa, melhoria da qualidade e competitividadedo produto.

No Brasil, a política de promoção deexportações criou uma estrutura de ofertaexterna baseada na grande empresa. Segun-do dados da FUNCEX (2002), as pequenasempresas brasileiras representam 29,5% dototal das empresas exportadoras nacionais,mas elas são responsáveis por apenas 7% do

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

volume das exportações. Pode-se dizer en-tão que o papel da pequena empresa natransformação e no crescimento das expor-tações brasileiras ainda tem sido pouco ex-pressivo, uma vez que elas produzem pro-dutos diferenciados, mas em escalas reduzi-das, concentrando seus esforços nas vendasdestinadas ao mercado doméstico.

No entanto, espera-se que esta situaçãocomece a mudar através da inserção de ummaior número de pequenas empresas nasatividades exportadoras, uma vez que umadas orientações da Política Brasileira deApoio ao Comércio Exterior é a criação decondições necessárias para que a pequenaempresa realize seu papel na geração deempregos, na descentralização geográfica daatividade econômica e na expansão das ex-portações.

2.2 Clusters industriais einternacionalização de pequenasempresas

A literatura econômica define clustercomo um grupo de firmas interligadas e ins-tituições associadas, dispostas geografica-mente próximas. Essas aglomerações deempresas têm tido muito sucesso em váriospaíses, principalmente pelo fato de que asfirmas nelas localizadas estariam se organi-zando em redes e desenvolvendo sistemasde integração nos quais predominam, entreas firmas, vários esquemas de cooperação,solidariedade, coesão e valorização do esfor-ço coletivo. O resultado destes processos se-ria a materialização de uma eficiência cole-tiva, decorrente das externalidades geradaspela ação conjunta, propiciando uma maiorcompetitividade das empresas, em compa-ração com as firmas que atuam isoladamen-te no mercado (GALVÃO, 2000).

Essas concentrações geográficas de fir-mas interligadas, produtoras de serviços e deprodutos, congregam fornecedores espe-cializados de insumos, provedores de servi-ços, infra-estrutura especializada, governo einstituições que oferecem treinamento eeducação, informação, pesquisa e suporte téc-nico (GALVÃO, 2000). Guimarães (2002) ain-da coloca que essas firmas, além de competi-rem no mesmo mercado, também cooperampara aumentar a produtividade da comuni-

dade na qual se inserem, criando sinergias.Segundo Enright (1996) os clusters po-

dem ser divididos em duas grandes categorias:• Clusters ou aglomerados industriais: con-

junto de indústrias ligadas por relações“comprador e fornecedor” e “fornecedore comprador” ou pela propriedade comumde tecnologia e pela existência de compra-dores comuns, para uma mesma cadeia dedistribuição e ainda pela concentração ge-ográfica da mão-de-obra;

• Clusters ou aglomerados regionais: estadenominação apresenta a maior amplitu-de por descrever a aglomeração geográfi-ca de firmas, tendo como característicaprincipal o fato de estarem em uma mes-ma localização geográfica, em que as em-presas estão localizadas muito próximasumas das outras.

De acordo com Suzigan et. al. (2001),as vantagens proporcionadas pelos clusterssão decorrentes: (1) da existência de um den-so mercado local de mão de obra especializa-da; (2) das facilidades de acesso a fornecedo-res de matérias primas, componentes, insumose serviços especializados e, muitas vezes, tam-bém de máquinas e equipamentos, e (3) damaior disseminação local de conhecimentosespecializados, que permitem rápidos proces-sos de aprendizado, criatividade e inovação.A elas podem-se somar economias externasde natureza ativa resultantes de ações con-juntas deliberadas das empresas e instituiçõeslocais, como por exemplo, para compra dematérias primas, promoção de cursos decapacitação gerencial e formação profissio-nal, criação de consórcios de exportação,contratação de serviços especializados e ins-tituição de centros tecnológicos coletivos ecooperativos de crédito. Dessa soma resulta-ria a eficiência coletiva que, em princípio,determina a vantagem competitiva das em-presas locais, comparativamente a empresassimilares não aglomeradas geograficamente.

A região de inserção do cluster podeser considerada como o locus da organiza-ção produtiva e da inovação, onde o esforçoda pesquisa; da ação institucional e doaprendizado se dão de forma conjunta, atra-vés da interação; cooperação e complemen-taridade; imersos no ambiente cultural local,o qual é também o resultado do processo his-tórico cultural. Cada localidade tem sua pró-

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pria individualidade, no sentido de seus atri-butos naturais, econômicos, antropológicos,históricos, sociais e políticos, havendo, por-tanto, conteúdo tangível e intangível, nãosendo reproduzível ou copiável, sendo essesfatores de influência decisiva no desenvolvi-mento local e regional.

Segundo Martinelli & Joyal (2003) acooperação e competitividade se transfor-mam em aspectos fundamentais para justifi-car as ações dos clusters, determinando a es-tratégia a ser seguida no território. Assim, odesenvolvimento local deve ser pensadocomo um pacto territorial, tendo presentesa idéia de desenvolvimento e alta mobiliza-ção dos recursos locais, o que significa: (1)uma estratégia integrada das instituições pa-ra enfrentar a fragmentação territorial; (2)fortalecimento de lideranças locais; (3) cria-ção de uma identidade e um sentimento desolidariedade social e territorial; (4) fortaleci-mento de um controle social e de uma cultu-ra de responsabilidade pública; (5) mobili-zação de diferentes culturas, criando redes;(6) mobilização do conhecimento local, quecria uma cultura de projetos, reduzindo adependência em relação a agentes externos.

Segundo Haddad (2002), o desenvol-vimento de uma região ou localidade, no lon-go prazo, depende profundamente da suacapacidade de organização social e políticapara modelar o seu próprio futuro (proces-so de desenvolvimento endógeno), o que serelaciona, em última instância, com a dispo-nibilidade de diferentes formas de capitaisintangíveis na região (ver Tabela 1).

O processo de internacionalização nãoé contraditório a um modo de funcionamen-to territorializado, como o dos clusters, sen-do a gestão do local a serviço do internacio-nal uma necessidade para as PME. A com-posição e qualidade do meio econômico lo-cal são fatores de sucesso para a internacio-nalização de pequenas empresas. Grandeparte das pequenas empresas não se engajaindividualmente no exterior, mas junto comos atores do território em que estão implan-tados. Uma pequena empresa que exporta élevada naturalmente a privilegiar as compe-tências de proximidade e, consequente-mente, a internacionalização também se re-laciona com a problematização do desenvol-vimento local (TORRES, 2002).

Guimarães (2002) diz ainda que sobcertas condições históricas de formação declusters, os vínculos que são estabelecidosentre as empresas regionais e os demandan-tes internacionais podem ampliar os espaçosculturais, para absorver e lançar certos valo-res, costumes e comportamentos originais,consolidando uma identidade na região, di-recionada para o mercado internacional. Aampliação de mercados, o poder de negoci-ação, a representação internacional, a faci-lidade ao crédito, a distribuição de produtosnos países destino, por exemplo, são os fato-res fortificados em uma estratégia formadaem termos de clusters em relação às empre-sas que atuam isoladamente.

As empresas em um cluster podem, deforma cooperativa, criar uma estrutura com-plementar à atividade exportadora ou for-mar uma unidade de pressão sobre as auto-ridades, para obter os elementos necessáriosao desenvolvimento de seus projetos, pormeio de um sistema de ação conjunta entreempresas, através de alianças explícitas outácita, joint ventures, redes de empresas,como por exemplo, os consórcios de exporta-ção, ou outras formas de organização em-presarial/industrial. A sinergia governamen-tal com a indústria privada é máxima nessecaso, beneficiando tanto a produção localquanto a de produtos exportáveis.

De acordo com Resende & Gomes(2003), a importância dos clusters industri-ais, no plano de inserção das pequenas em-presas no mercado internacional, se deve àscaracterísticas que garantem o sucesso des-tas empresas em termos de competitividade

Quadro 1 - Formas de Capitais Intangíveis Determinantes do Processo de Desenvolvimento Regional ou Local

Algumas formas de capitais intangíveis Especificação

1. Capital Institucional

As instituições ou organizações públicas e privadas existentes na região: o seu número, o clima de relações interinstitucionais (cooperação, conflito, neutralidade), o seu grau de modernidade.

2. Capital Humano O estoque de conhecimentos e habilidades que possuem os indivíduos que residem na região e sua capacidade para exercitá-los.

3. Capital Cívico

A tradução de práticas de políticas democráticas, de confiança nas instituições, de preocupação pessoal com os assuntos públicos, de associatividade entre as esferas públicas e privadas, etc.

4. Capital Social O que permite aos membros de uma comunidade confiar um no outro e cooperar na formação de novos grupos ou em realizar ações em comum.

5. Capital Sinergético

Consiste na capacidade real ou latente de toda a comunidade para articular de forma democrática as diversas formas de capital intangível disponíveis nessa comunidade.

Fonte: Haddad (2002)

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internacional, das exportações, de longevi-dade e também em relação à geração de em-pregos e renda nas regiões onde elas estãolocalizadas. Os autores (acima citados) di-zem que as empresas de pequeno e médioporte pertencentes ao cluster apresentammelhores resultados ligados ao comércio ex-terior que o conjunto de empresas, de mes-mo porte e setor, que não pertencem a al-gum cluster, tais como: mais tempo de per-manência no mercado, melhor produtivida-de, maior rentabilidade e taxa de crescimentomais alta.

2.3 Consórcios de exportação depequenas empresas brasileiras e suainserção em clusters industriais

A crescente formação de consórcios deexportação em diversos países do mundoreflete a importância que essas redes de coo-peração vêm atingindo para auxiliar as pe-quenas empresas a exportar. Entre os paísessubdesenvolvidos pode-se citar a formaçãode consórcios de exportação na Argentina,Índia, Colômbia e no Quênia e, entre os pa-íses desenvolvidos, principalmente a Suécia,Itália e Dinamarca. Estudos efetuados, emvários países, sobre marketing cooperativode exportação mostram a formação de con-sórcios como um conceito promissor noengajamento das pequenas e médias empre-sas na exportação. Para o Brasil, que tem nocomércio exterior uma importante alavancapara a economia, a formação de consórciosde exportação é essencial (TOMELIN, 2000).

Para a APEX Brasil (2003) o consórciode exportação é um nome fantasia que des-creve o agrupamento de empresas com inte-resses comuns, reunidas em uma entidadeestabelecida juridicamente. Essa entidade éconstituída sob a forma de uma associaçãosem fins lucrativos, em que as empresas de-finem como vão trabalhar em conjunto, como objetivo de melhorar a oferta exportável ede promover a exportação.

Os consórcios de exportação podemvariar em relação às características, como(MINERVINI, 1997):• finalidade:

√ promoção de exportações: em geral sãoformados por empresas que já possuemexperiência em comércio exterior. As ven-

das no mercado externo são realizadasdiretamente pelas empresas que integramo consórcio;

√ vendas: em geral é formado por empre-sas que não possuem experiência anteri-or em comércio exterior. As exportaçõessão realizadas por intermédio de umaempresa comercial exportadora;

• região de ação: o consórcio pode concen-trar suas vendas em um país ou região ouagir em vários países;

• membros:√ monosetoriais: reúnem empresas de um

mesmo setor, trabalhando por exemplocom o mesmo produto em diferentes es-tilos ou agrupando empresas comple-mentares ;

√ multisetoriais: reúnem empresas de di-ferentes setores, que podem trabalharcom produtos complementares, a partirde uma mesma cadeia produtiva, ou comprodutos heterogêneos, destinados ounão a um mesmo cliente.

A formação de consórcios de exporta-ção no Brasil não é recente. As primeiras ini-ciativas começaram em 1975, quando o Cen-tro Brasileiro, de Apoio às Micro e PequenasEmpresas – CEBRAE, hoje denominadoSEBRAE, tomou as primeiras medidas paraconstruir um modelo de exportação adap-tado à realidade das pequenas empresasnacionais. Inicialmente, as ações feitas forama realização de seminários e cursos desensibilização e informação sobre a impor-tância da participação das pequenas empre-sas no esforço de exportação (INFANTEapud TOMELIN, 2000).

Na década de 80 o Brasil já apresenta-va consórcios de exportação formados emvários estados e em ramos como: confecções,material de construção, metalurgia, produ-tos de couro, mármore e granito, artesana-to, palmito, calçados, entre outros(TOMELIN, 2000), mas somente depois dosanos 90 é que a formação dos consórcios deexportação se intensificou.

Os consórcios e pólos de exportaçãoconcebidos no Brasil a partir da década de90 foram formados com a idéia de fortificarfatores como: expansão dos mercados exter-nos, poder de negociação, imagem dos pro-dutos, representação internacional, distribui-ção dos produtos nos países destino, entre

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outros, através de uma estratégia moldadapor ações compartilhadas por pequenasempresas que tinham objetivos comuns nomercado externo. Esses consórcios e pólos deexportação ganharam aderência políticanacional, uma vez que certos segmentos pro-dutivos encontravam dificuldades de res-ponder espontaneamente à intensificação daconcorrência internacional. As ações de es-tímulo e apoio, nas áreas de marketing etecnologia, dentro dos setores produtivosselecionados, tornaram possível um maiorengajamento das empresas, sobretudo as demenor porte, nas atividades de exportaçãode maneira conjunta (GUIMARÃES, 2002).

Mas, foi depois da criação da APEX(Agência de Promoção de Exportações), em1997, hoje denominada APEX Brasil, que aformação de consórcios de exportação seintensificou, sendo, hoje em dia, a maioriadesses consórcios instalados em territórionacional, apoiados pela Agência.

Atualmente, segundo semestre de2003, a APEX Brasil está dirigindo 49 proje-tos de formação de consórcios de exporta-ção, instalados em diferentes regiões do país.Os consórcios de exportação existentes sedividem nos seguintes segmentos: têxtil econfecções (48%) ; jóias, gemas e metais pre-ciosos (20%) ; calçados e componentes paracalçados (15%); e alimentos (4%). Os outrossetores representam cerca de 2% cada umdo número total de consórcios, sendo eles:rochas ornamentais, máquinas e equipamen-tos, brinquedos, produtos médico-odontoló-gicos, fogos de artifício, produtos e serviçosaeronáuticos, serviços de consultoria em en-genharia, moldes e matizaria. No que tangeà localização, os consórcios de exportaçãoestão concentrados principalmente nos es-tados de São Paulo (30%), Minas Gerais(26%) e Rio de Janeiro (11%). Nos outros es-tados onde os consórcios estão instalados aporcentagem é menor: Rio Grande do Sul(9%), Espírito Santo(7%) e Bahia, SantaCatarina, Paraná, Mato Grosso, Pernambu-co, Paraíba e Ceará com 1% cada um (APEXBRASIL, 2003).

No Brasil encontram-se consórcios for-mados de maneira dispersa geograficamen-te, como também dentro de alguns clusters,como é o caso do consórcio de moldes dentrodo cluster de indústria plástica de Joinville-

SC, os do setor de jóias, gemas e metais pre-ciosos dentro do cluster de jóias de Limeira-SP, o de rochas ornamentais em Soledade-RS e o de confecção dentro do cluster exis-tente em Nova Friburgo-RJ.

Como visto no item anterior, os clustersindustriais propiciam aspectos que facilitama internacionalização das pequenas empre-sas, mas pouco se sabe sobre a influência dosclusters no processo de internacionalizaçãodos consórcios de exportação existentes noBrasil, nem mesmo sobre os benefícios queestes consórcios podem gerar aos clusters noque tange ao desenvolvimento local da re-gião onde ele está inserido. Como colocamLima et. al (2003), considerando-se os con-sórcios de exportação brasileiros, cabe a aná-lise do processo de intervenção envolvido nainternacionalização, levando em conta osefeitos no desenvolvimento local.

3 Proposição de estudo

A partir do que foi relatado até aqui,propõe-se um estudo que buscará respondera seguinte questão: a internacionalização depequenas empresas brasileiras através deconsórcios de exportação, quando inseridosem clusters industriais, relaciona-se benéfi-ca e reciprocamente aos aspectos do desen-volvimento local a esses inerentes?

O estudo fará a interligação de temasde reconhecida importância em relação aodesenvolvimento econômico e social do país:pequena empresa, clusters industriais, desen-volvimento local e internacionalização.

O desenvolvimento empresarial emuma dada região ou setor econômico deveenvolver um conjunto de atividades destina-das a estimular o espírito empreendedor emuma sociedade, favorecer a criação de no-vas empresas e oferecer condições para so-brevivência e desenvolvimento das já exis-tentes. As PME são fortes geradoras de em-pregos e renda, sendo consideradas o motordo desenvolvimento econômico de uma so-ciedade, uma vez que, por uma questão na-tural, os seus negócios tendem ao crescimen-to, são estimuladores da competência e,como conseqüência, produzem grandes tro-cas nos participantes dos mercados e na po-lítica de preços e são permanente fonte deinovação, devido à necessidade de desco-

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

brir e desenvolver novas oportunidades emmercados que se encontram estancados(CÂNDIDO & ABREU, 2000).

As pequenas empresas se aproveitamde sinergias coletivas, quando localizadasem clusters, que fortalecem as chances desobrevivência e crescimento, constituindo-seem importante fonte geradora de vantagenscompetitivas duradouras.

De acordo com Torres (2002) as aglo-merações industriais do tipo distritos indus-triais - inovative millieu (meios inovantes) eclusters permitem às pequenas empresasneles inseridas a obtenção de vantagens com-petitivas, extraídas em escala local. E, inde-pendentemente destas empresas serem ino-vantes, comerciais, industriais, familiares,etc. elas podem ter um incremento de pro-dutividade nos mercados internacionais ba-seado numa forte integração local.

Esse aspecto mostra-se extremamenteimportante, pois a internacionalização daspequenas empresas contribui para que elasalcancem benefícios como: diminuição da de-pendência do mercado interno, melhoria doproduto para atender às exigências de quali-dade do mercado externo, aumento das ven-das e da produtividade, diversificação doscanais de comercialização, melhoria da ima-gem da empresa e expansão dos negócios daempresa. É importante também destacar acontribuição da internacionalização dessasempresas para o desenvolvimento da ativida-de exportável do país uma vez que permiteuma grande diversificação da pauta de ex-portações, que é hoje ainda concentrada emcommodities, de baixo valor agregado.

Assim, o estudo proposto vai ao encon-tro com o que Amaral Filho (2003) coloca: arelação entre a questão do ambiente e dodesenvolvimento da pequena empresa, es-pecificamente a questão da organização so-cial ou coletiva nos chamados agrupamentos(como é o caso dos clusters) e redes de peque-nas empresas, (como é o caso dos consórciosde exportação) traz uma grande renovaçãonas estratégias de organização dessas em-presas que se relacionam com novas possi-bilidades de geração de emprego e renda ede fortalecimento do tecido sócio-produtivo,sendo ainda uma maneira de recolocar naagenda de discussões brasileiras a questãodo desenvolvimento regional ou local.

O objetivo principal será, então, de in-vestigar se a internacionalização de peque-nas empresas brasileiras, através de consór-cios de exportação, quando inseridos emclusters industriais, relaciona-se benéfica ereciprocamente aos aspectos do desenvolvi-mento local a esses inerentes. Como objetivossecundários busca-se: (1) fazer um levanta-mento dos consórcios de exportação que es-tão inseridos em clusters industriais para pos-sibilitar a escolha dos clusters a serem estu-dados; (2) levantar os aspectos do desen-volvimento local, existentes nos clusters sele-cionados; (3) verificar quais se relacionam àinternacionalização das pequenas empresasconsorciadas; (4) propor ações de melhoriada atuação dos consórcios de exportação atra-vés de um melhor inter-relacionamento en-tre esses e aspectos do desenvolvimento localinerentes ao cluster onde estão inseridos.

A justificativa do estudo está em in-vestigar a relação entre o desenvolvimentolocal em aglomerados do tipo clusters e ainserção internacional das pequenas empre-sas pertencentes a consórcios de exportaçãoinseridos nestes clusters, evidenciando-seaqui então a importância do local para odesenvolvimento internacional. O reflexodesta investigação é extremamente impor-tante pela contribuição aos consórcios deexportação inseridos em clusters industriais,no que tange à melhoria de seu desempe-nho no mercado internacional; para osclusters industriais uma vez que a atuaçãointernacional das empresas pertencentes aoconsórcio pode contribuir para a geração deemprego, o reforço da identidade da regiãoe o estímulo para outras pequenas empresasdo cluster a se internacionalizarem, entreoutros, e até mesmo para a proposição depolíticas de apoio à formação e à melhor atu-ação de consórcios de exportação.

Para alcançar o objetivo proposto,propõe-se a realização de um estudo com-parativo de casos entre consórcios de expor-tação de pequenas empresas brasileiras in-seridos dentro de clusters industriais. A pes-quisa será qualitativa, sob a forma de estu-do exploratório, uma vez que busca maioresinformações sobre o tema, ainda pouco es-tudado.

Como técnica de coleta de dados, ter-se-á: levantamento bibliográfico, buscando

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levantar informações e dados já publicadosque estejam relacionados ao tema estudado;pesquisas na internet, por ex: em páginas deentidades como Apex Brasil e Sebrae, reali-zação de entrevistas semi-estruturadas comos gerentes dos consórcios de exportação epessoas ligadas ao sindicato e entidades deapoio aos clusters.

Assim, será possível levantar informa-ções como: desempenho dos consórcios deexportação inseridos em clusters industriais;como os aspectos do desenvolvimento localinerente aos clusters podem contribuir paraa internacionalização das pequenas empre-sas consorciadas; contribuição dos consór-cios de exportação para o desenvolvimentolocal dos clusters; melhorias necessárias paraa atuação dos consórcios, incluindo aí a for-mulação de políticas de apoio, necessidadede uma maior interação com os agentes lo-cais (sindicatos, universidades, centros detreinamento), entre outros.

4 Considerações finais

A formação de consórcios de exporta-ção no Brasil começou a se intensificar, so-bretudo depois dos anos 90, quando a APEXBrasil inicia o seu apoio a essas redes de co-operação.

No que tange ao estudo desses consór-cios, sabe-se de algumas pesquisas realiza-das (dissertações de mestrado), como a deTomelin (2000) que buscou analisar algunsconsórcios de exportação existentes no esta-do de Santa Catarina e a de Rodrigues(1999), que analisou um consórcio localiza-do na cidade de Belo Horizonte, mas nenhu-ma delas enfoca os consórcios inseridos den-tro de clusters industriais, que apresentamalgumas ocorrências no Brasil, assim comonão estabelecem uma relação com a questãodo desenvolvimento local.

A literatura levantada neste artigo nosmostra que os consórcios de exportação for-mados por pequenas empresas inseridas emclusters industriais podem se beneficiar dasvantagens trazidas pelo desenvolvimentolocal da região de inserção desses clusters,assim como a internacionalização dessaspequenas empresas pode contribuir para odesenvolvimento da região. Julga-se entãoimportante a realização de estudos empí-

ricos, em clusters brasileiros, buscando com-provar ou refutar esta afirmação.

Dessa forma, esta comunicação pro-pôs um estudo para investigar a relação dereciprocidade entre o processo de interna-cionalização de pequenas empresas brasilei-ras, através de consórcios de exportação, queestão inseridos em clusters industriais, e dodesenvolvimento local a estes pertinentes.

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O papel das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH’s) no contexto político-institucional da reestruturação do setor elétrico nacional1

The role of Small Hydroelectric Centres (SHC’s) in the political institutional contextof the restructuring of the national electricity sector

El papel de las Pequeñas Centrales Hidroeléctricas (PCH’s) en el contexto político institucionalde la reestructuración del sector eléctrico nacional

Patrícia Aparecida Pereira de Souza*

Norma Felicidade L. S. Valencio**

Recebido em 18/09/2004; revisado e aprovado em 15/12/2004; aceito em 17/02/2005.

Resumo: Na última década, o Brasil sofreu uma alteração substancial das formas político-institucionais quecomandam o setor elétrico. O mesmo passou a ser regulado de molde a favorecer a diversificação da matriz e, emespecial, a geração de hidroenergia através da iniciativa privada em empreendimentos de pequena escala. Aoprevalecer o interesse setorial sobre a política ambiental brasileira, revelam-se custos socioambientais que impendematestar que os rumos da hidroenergia sejam sustentáveis tal como o setor veicula. Este artigo objetiva refletir sobreesse contexto debruçando-se, a partir de pesquisa documental, sobre o caso das Pequenas Centrais Hidrelétricas(PCH’s).Palavras-chave: energia elétrica; PCH; barragensAbstract: In the last decade, Brazil suffered a drastic alteration in the political institutional form which comanded theelectricity sector. It came to be regulated not in the spirit of the necessary universalization of access to this publicservice, but according to the maximization of profit and private control of wealth. This article seeks to reflect on thesocial-environmental aspects of this process beginning with the case of the Small Hydroelectric Centres (SHCs).Key words: electricity; Small Hycroelectric Centres; damsResumen: En la última década, Brasil sufrió una alteración substancial en las formas político institucionales quecomandan el sector eléctrico. El mismo pasó a ser regulado, de modo a favorecer la diversificación de la matriz y, enespecial, la generación de hidroenergía a través de la iniciativa privada en propuestas de pequeña escala. Al prevalecerel interés sectorial sobre la política ambiental brasileña, se revelan costes socio ambientales que impenden testificarque los rumbos de la hidroenergía sean sustentables tal como el sector propaga. Este artículo objetiva reflexionar sobreese contexto proponiéndose, a partir de pesquisa documental, sobre el caso de las Pequeñas Centrales Hidroeléctricas(PCH’s).Palabras clave: energía eléctrica; PCH; represas

mento único. Em termos simbólicos e políti-cos, prevaleceu a estratégia de buscar emrealidades sócio-econômicas distintas da bra-sileira exemplos de sucesso na reforma doEstado, o que aqui se poderia lograr caso amesma trilha fosse seguida. As períciasapontavam oportunidades múltiplas, abran-gentes, um incitamento sem precedentes aoempreendedorismo nacional.

Em termos práticos, buscou-se reorga-nizar as estruturas imbricadas na liberali-zação do comércio exterior propiciando aabertura de oportunidades de investimentoem setores estrangulados, sobretudo os queainda persistiam sob controle estatal. Umamplo processo de descentralização e priva-tização atingiu vários segmentos dos servi-ços essenciais, dentre os quais, o de energia.Este processo permitiu que as oportunidadesde negócios atraíssem capitais estrangeirosa fim de cumprir, suplementarmente, o

Introdução

Sob os auspícios de organizações mul-tilaterais e em resposta à onda de recessãoeconômica e de desaceleração do crescimen-to da década de 80, o Brasil, do governoCollor aos de FHC, abriu terreno para queconcepções neoliberais permeassem as deci-sões ligadas ao enxugamento do Estado e aoincentivo de investimentos necessários eminfraestrutura.

Para tanto, o discurso econômicohegemônico no país cristalizou-se em tornodo argumento de que a única orientaçãopara um novo ciclo de desenvolvimento es-taria na redução das funções da máquinaestatal e austeridade fiscal; num provimen-to eficiente e eficaz desta máquina às neces-sidades do mercado, dos empresários e dosconsumidores aí abarcados; e na desquali-ficação de toda e qualquer crítica ao pensa-

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 65-76, Mar. 2005.

* Bióloga, Mestre em Hidráulica e Saneamento, Doutora em Ciências da Engenharia Ambiental (PPGSEA/USP)Apoio: CNPq. ([email protected])** Economista, Doutora em Ciências Sociais. Docente do Depto de Ciências Sociais da UFSCar e professoracolaboradora do PPGSEA/USP. ([email protected])

66 Patrícia Aparecida Pereira de Souza; Norma Felicidade L. S. Valencio

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

desiderato de recepcionar divisas e, com isso,melhorar o perfil das contas nacionais e cum-prir requerimentos de equilíbrio das mesmaspelos organismos creditícios internacionais.

A oportunidade de investimentos deempresas transnacionais, produtores priva-dos, produtores independentes2 e autopro-dutores no setor elétrico teria, contudo, quelidar com os desafios da especificidade damatriz brasileira, qual seja, a da hidroenergia,que trouxe para o bojo do processo produtivoa necessidade de garantia de acesso e uso deágua. Tal garantia não pode ser dada ofici-almente pelo Estado uma vez a Política Na-cional de Recursos Hídricos apontava paraa necessidade de, em circunstância de escas-sez do recurso e disputa entre os multi-usuários, prevalecer o setor de abastecimen-to. O compromisso não se formalizaria nes-se sentido, mas os acontecimentos recentesdemonstrariam ser, pela prática de ambos,o que prevaleceu.

O contexto coloca várias questões emtorno do novo modelo do setor elétrico. To-mando o conceito de sustentabilidade3 des-de uma definição hídrida e similar à formacomo se estabelece no imaginário social epolítico macroenvolvente atual, focaliza-seprecipuamente o caso das Pequenas CentraisHidrelétricas (PCH’s).

No referido imaginário, a sustentabi-lidade econômica costuma ser entendida,entre outros, como o propósito de alcançaruma maior eqüidade na distribuição de ren-da e bens; uma maior eficiência econômica,medida em termos macrossociais; estímulosa uma configuração rural-urbana mais equi-librada, com redução de concentrações ur-banas e industriais; por fim, a instauraçãode um sistema administrativo flexível, comcapacidade de autocorreção e retroalimen-tação4. Visto sob tal prisma, a abertura doambiente de investimentos na hidroenergiateria propiciado uma maior sustentabilidadeao setor? Haveria espaço para novos sujei-tos, capitais ainda frágeis, pequenos empre-endedores, favorecerem-se do fomento àsobras de pequeno porte, as PCH’s?

A sustentabilidade ecológica e a sócio-política têm sido, por seu turno, considera-das como o esforço de proteção aosecossistemas; a ponderação das questõesambientais em conjunto com os parâmetros

econômico e financeiro no sistema produti-vo; a verificação dos efeitos sobre o ambien-te dos diversos modos de utilização dos re-cursos naturais e das técnicas de produçãoempregadasa; e, por fim, a valorização dosprocedimentos participativos na busca desoluções para o local, afirmando as práticasdemocrática e de eqüidade5. Se for assim, hácomo afirmar que reformulação política dosetor elétrico tenha respeitado tais requeri-mentos? Haveria preocupação efetiva doEstado em submeter a política hidroener-gética à ambiental?

Quanto ao primeiro conjunto de ques-tões, é preciso considerar que a distinçãoacerca da origem de capital caiu em desusoperante as novas conformações emendadasna Constituição Federal; porém, essa distin-ção permanece relevante para a reflexão só-cio-econômica uma vez que a origem e otrânsito dos capitais revela a efetiva possibi-lidade de o Estado alcançar seu propósitode ajuste fiscal tanto quanto operar mudan-ças no nível de dependência e vulnerabili-dade em que o atual estágio da economia seencontra. Mas isso não significa que a ori-gem nacional do capital coincida com os in-teresses sociais tecidos no espaço geopolíticoda mesma nação nem tampouco que o in-vestimento setorial que se apresente comoalavancador de uma nova fase do desenvol-vimento corresponda à possibilidade deemergência de novos empreendedores debase nacional.

Quanto ao segundo conjunto, o que sepretende refletir é o quão consistente foi areorganização do Estado e do empresariadono setor elétrico no que tange à integraçãode políticas. A transferência, ao setor priva-do, da responsabilidade na produção dahidroenergia, não correspondeu ao direitode acesso irrestrito ao seu insumo fundamen-tal, a água, a qual permaneceu como bempúblico e, portanto, sob controle do Estado.Foi preciso ajustar as condições normais deatratividade ao capital a uma sinalização,geralmente caso a caso, de que quaisqueróbices socioambientais ao acesso regular dorecurso natural ao processo de geração deeletricidade seriam plenamente superados afavor da concessionária. Isto representou nãoapenas um ajuste público ao interesse pri-vado, mas um ajuste público na contramão

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

das políticas ambientais que a sociedade de-fendeu e que foram institucionalizadas. Con-tinuou sob a competência da União “explo-rar, diretamente ou mediante autorização, con-cessão ou permissão os serviços e instalações deenergia elétrica e o aproveitamento energéticodos cursos de água, em articulação com os Esta-dos onde se situam os potenciais hidroener-géticos”(alínea b do inciso XII do Art. 21 daConstituição Federal). E, embora, a Uniãopassasse a tomar unicamente como funçãoo estabelecimento de estratégias de curtoprazo no setor, além do respaldo financeiroe creditício à iniciativa privada, continuousob sua competência e da coletividade,”odever de defender o meio ambiente e preservá-lopara as presentes e futuras gerações, a fim deque todos tenham o direito ao meio ambienteecologicamente equilibrado, bem de uso comumdo povo e essencial à sadia qualidade devida”(Art. 225 da Constituição Federal). Por-tanto, é lícito supor que as circunstâncias dealteração do marco regulatório do setor elé-trico devessem considerar as implicaçõesambientais amplamente pactuadas com oconjunto maior da sociedade.

Poucos são os autores que se dedicamao tema das PCH’s num enfoque similar aosupracitado, sendo os trabalhos de Pacca(1996) e Tiago Filho (1999) um dos poucosnesse sentido. Partir-se-á de uma sucintaapresentação de aspectos do processo de re-estruturação do setor elétrico para, lastre-ando-se em pesquisa documental junto a fon-tes oficiais, dar pistas para as questões supra.

A reforma do setor elétrico brasileiro

A hidreletricidade penetrou no país noano de 1883, com a usina de Ribeirão do In-ferno, no município de Diamantina. Em1889, no despertar da República, inaugurou-se a usina de Marmelos, em Juiz de Fora, jána condição de serviço público (Centro daMemória da Eletricidade no Brasil, 1989).Mas, nesta época, o empreendedorismo pre-valeceu. Pouco a pouco, as potências insta-ladas de proprietários foram aumentando,excedendo suas necessidades e motivando-os a instalar pequenas redes de distribuição,as quais se expandiram gradativamentepara regiões vizinhas, tornando-se um ne-gócio rentável (Mariotoni e Mauad,1999).

Nas décadas de 1930/1940, o Estadoassumiu o papel de indutor do processo deindustrialização no qual setores tidos comoestratégico, como o de hidroenergia, foi pau-latinamente passando ao seu controle. Po-rém, nas décadas 1940/1950, o aceleradodesenvolvimento do parque industrial bra-sileiro mostrou a vulnerabilidade do setorelétrico, o qual passou a exibir acentuadaredução de qualidade de seus serviços, comfreqüentes e crescentes interrupções e cortesde energia que, agravando-se, obrigou o Es-tado a adotar medidas de racionamento e apensar em planejamento de longo prazo.Disso derivou a criação da CHESF6 e a ela-boração do primeiro Plano Nacional de Ele-trificação, além da criação daELETROBRÁS7 para coordenar as ativida-des de planejamento, financiamento e exe-cução da política da energia elétrica no Bra-sil8 (Chiganer et al. , 2002).

Já no início da década de 90, o Estadoacreditou ser de fundamental importânciauma nova reformulação do setor elétriconacional. A crise financeira da União e dosEstado foi o argumento central em torno deuma expansão da oferta de eletricidade atra-vés da valorização à iniciativa privada9 (Pi-res, 1999).O plano de reestruturação do se-tor foi instaurado pelo governo em 199510,com a promulgação da Lei n.º 8.987, conhe-cida como a Lei de Concessões de ServiçosPúblicos, e da Lei Setorial 9.047/95, quandoforam estabelecidos os fundamentos básicosdo novo modelo e iniciada a abertura à par-ticipação dos capitais privados.

Em 1996, o Decreto n.º 2003 regula-mentou as condições para a atuação dosprodutores independentes e dosautoprodutores. No mesmo ano, foi instituí-da a Agência Nacional de Energia Elétrica -ANEEL pela Lei n.º 9.427, com a finalidadede regular e fiscalizar a produção, transmis-são, distribuição e comercialização de ener-gia elétrica no país.

Visto da maneira mais abrangente, esteprocesso de reestruturação do mercado deenergia seguiu a tendência mundial àdesregulamentação ligada, ela própria, aduas outras tendências, também de caráterinexorável e uniforme: a globalização (a dis-solução das economias nacionais em umúnico mercado global) e a privatização (ven-

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

da de ativos anteriormente pertencentes aoEstado, com a conseqüente redefinição doslimites entre o público e o privado) (Lanzottiet al, 2002; Carpio e Pereira, 2002; Tolmasquime Campos, 2002). Houve, de fato, uma mu-dança de paradigma setorial, um modelo des-verticalizado e comercial, que se propunhaa estimular o comportamento competitivodos agentes e uma regulação independente(Sauer, 2002).

Quando comparado o processo de cri-ação de estatais que se deu no passado e oprocesso de privatização recente no setorelétrico, pode-se afirmar que o primeiro ca-racterizou-se como um processo deflagradono espaço político nacional, enquanto que osegundo caracterizou-se como um processoimpulsionado por forças exógenas, emborapactuadas com as elites locais, isto é, marca-do pela disputa dos países centrais em tornodos mercados emergentes. Portanto, a his-tória recente do setor é um aspecto, dentreoutros, que marca a heteronomia da naçãobrasileira, ou seja, a situação na qual os ru-mos nacionais são fortemente influenciadospor interesses externos e por outro, mantêm-se os compromissos com a rede de relaçõespolítico-econômico tradicionais do Estadobrasileiro, formando um compósito deleté-rio ao pleno desenvolvimento social da na-ção (Fernandes, 1981).A abertura rápida daeconomia nacional aos interesses globaliza-dos expôs as frágeis condições de competitivi-dade de vários setores, ampliando o podersobre o Estado daqueles que podiam sobre-viver e, ainda, prosperar (Cano,1994).

Para tornar a energia um produto atra-ente ao setor privado, separam-se os diver-sos setores do sistema de eletricidade em ge-ração, transmissão, distribuição ecomercialização. Tal separação seguiu aspropostas encontradas no relatório “BrazilEletricity Sector Restructuring Study” (1996)da consultoria internacional Coopers &Lybrand11 (Tolmasquim e Campos, 2002).Acriação da ANEEL, pela Lei Federal 9.427/96, foi crucial na reforma regulatória do se-tor elétrico brasileiro tendo em vista a tradi-ção de regulação das empresas de energiaelétrica pelo MME, através de seu antecessor,o DNAEE.

A natureza jurídica da ANEEL, comouma autarquia especial, permitiu ao órgão

usufruir de relativa independência em vári-os aspectos, tais como: a) autonomiadecisória e financeira; b) autonomia dos seusgestores; e c) delegação de competêncianormativa para regulamentar questões téc-nicas, conferindo neutralidade na soluçãodos conflitos e adoção de medidas(Pires,1999). Esses aspectos acabaram por dispen-sar a agência de subordinação hierárquicadireta ao ministério, embora vinculada aomesmo no cumprimento de contrato de ges-tão. Pode, além disso, estabelecer convênioscom agências estaduais12 para o controle efiscalização dos serviços e instalações deenergia elétrica, refletindo o caráter descen-tralizado do setor elétrico brasileiro. Por ou-tro lado, o fato da ANNEL ter sido criadaapós o início das reformas dificultou a afir-mação do órgão no novo ambiente institucio-nal, aumentando as incertezas regulatórias,as quais acabaram por fazer com que os in-vestimentos em geração não ocorressem novolume necessário para a garantia da expan-são da oferta. A agência limitou-se, em cer-ta medida, ao papel de incentivador junto aprodutores independentes para que estesretomassem obras paralisadas ou propuses-sem novas usinas com foco na redução desua dependência de suprimento (Pires, 1999).

O ressurgimento das PCH’s no contextode reformulação do setor elétrico

Em termos macroeconômicos, o PlanoReal também foi um dos aliados fundamen-tais da estratégia de reestruturação do setorelétrico, propiciando ao Estado passar dopapel de produtor para o de financiador (viaBNDES), fiscalizador e poder concedente.Porém, tratou-se de uma aliança forjada sobalto risco. A estabilização monetária fomen-tou um consumo desenfreado de eletro-in-tensivos sem que houvesse compasso com aoferta de energia. Os estrangulamentos fi-nanceiros das concessionárias não permiti-am acelerar os investimentos em novas obrasde grande porte tal como o país parecia ne-cessitar, recrudescendo ainda mais a crise deabastecimento, entre os anos de 2001 e 2002.Tal contexto exigiu do Ministério de Minas eEnergia (MME) novas formas de atuaçãoque, na matriz neoliberal prevalecente, re-sultavam em favorecer as condições de re-

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entrada da iniciativa privada no setor atra-vés do investimento em novas unidades ge-radoras. O MME argumentava, na ocasião,não ter condições para viabilizar a continui-dade da participação estatal no setor e, paracontornar os efeitos dos investimentos esta-tais retardatários e insuficientes um novomarco regulatório no setor precisava serconstituído.

Tal marco pautou-se, de um lado, nodeslocamento de funções e competências doministério supra para um novo espaçoinstitucional no qual a interlocução com osinteresses do setor privado fosse mais flui-do, o que veio a ser a ANNEL; de outro, es-boçou uma preocupação socioambiental aovalorizar investimentos em unidades gera-doras de pequena escala, como as PCH’s.

PCH’s são caracterizadas como usinas,com potência instalada superior a 1MW eigual ou inferior a 30MW e reservatório comárea igual ou inferior a 3 Km². Aquelas queviessem a ser construídas ou reativadas pas-sariam a ter um duplo significado, o de obraseficazes economicamente, por propiciar a ex-pansão rápida da oferta de energia, e o deobras sustentáveis. Das mesmas, se diria quegerariam eficiência no nível local, abastecen-do a menor custo de investimento inicial vá-rias regiões; induziriam o desenvolvimentonas áreas sob influência do empreendimento;reduziriam a vulnerabilidade geral do siste-ma a ciclos hidrológicos desfavoráveis e pos-sibilitariam um melhor atendimento às neces-sidades de carga de pequenos centros ur-banos, regiões rurais e centros industriais, como menor índice de impacto ambiental, dentreoutros. Por isso mesmo, representou um dosprincipais focos de prioridade da ANEEL13.

A pequena-grande solução que se tra-duzia nas PCHs conduziu à elaboração dedois programas governamentais: o PCH -COM e o Programa de Incentivo à FontesAlternativas de Energia Elétrica (PROINFA).O programa PCH - COM foi criado paraviabilizar a implantação ou revitalização dePequenas Centrais Hidrelétricas conectadasao Sistema Interligado Brasileiro. Através domesmo, o BNDES oferecia crédito ao empre-endedor e a Eletrobrás sinalizava com a com-pra de energia da usina. A concepção destePrograma esteve apoiada na idéia de proverreceita garantida aos empreendedores de

PCH´s para sustentação dos financiamentoscontratados (http://www.eletrobras.gov.br/).O PROINFA, por seu turno, foi criado noâmbito do MME, pela Lei n. 10.438, de 26de abril de 2002, tendo como objetivo a di-versificação da matriz energética brasileiraque compõem o Sistema Elétrico InterligadoNacional (SIN). Para tanto, incentiva a bus-ca de soluções de cunho regional com a uti-lização de fontes renováveis de energia taiscomo a eólica, as pequenas centrais hidre-létricas e o uso de biomassa. Em 2001, oBNDES financiou projetos de PCH’s no mon-tante de aproximadamente R$ 107 milhões,mantendo regularidade no crédito, emborao pico de 2002, com R$ 248 milhões no de-sembolso (Tabela 1). Mais de 60 projetos dePCH’s, cujos empreendedores mostraraminteresse no PROINFA, chegaram ao MMEe, na carteira do BNDES, cerca de 15 PCH’sencontram-se em avaliação (http://www.abrace.org.br/clipping/noticia). Em1999, a ANEEL contabilizava em torno de1.657 MW em potência instalada dePCH’s,(Goldemberg,2000) passando, em2001, para algo em torno de 2.600MW em2003 (http://www.eletrobras.gov.br/N_Noticias_assunto.pdf).

Quadro 1 - Desembolsos do BNDES para Pe-quenas Centrais Hidrelétricas (PCH’s) de2000 a 2004 (Valores em reais)

Assim, as PCH’s tornaram-se recep-toras privilegiadas de incentivos fiscais, alémde outros benefícios, como o de obter a outor-ga para o empreendimento sem a necessida-de de licitação; ter isenção de pagamento dataxa de compensação financeira aos Estadose Municípios; comercializar de imediato aenergia produzida com consumidores cujacarga corresponda a 500 kW ou mais; porfim, conseguir isenção de pagamento por usodas redes de transmissão e distribuição14

(http://www.eletrobras.gov.br). Caso taisobras fossem implantadas no sistema isola-do da Região Norte e viessem em substitui-

Ano Liberações 2001 107.323.555,00 2002 248.527.336,00 2003 72.163.555,00 2004 130.821.651,00

Fonte: BNDES, 2005.

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ção a geradoras térmicas movidas a diesel,poderiam também receber incentivo do Fun-do formado com recursos da Conta Consu-mo de Combustíveis Fósseis (CCC)15.

O demandante comum de eletricida-de, inserido nas grandes cidades e sofredorda crise recente, não foi o alvo do convenci-mento acerca da importância das PCH’s naresolução do problema de abastecimento.Continou, tal demandante, na expectativade ser provido pelas megaobras. Foram osgrandes consumidores de energia, ligados aosetor produtivo, aqueles diretamente apre-sentados à alternativa de oferta. Consideran-do o período de 1998-2002, o número deusinas hidrelétricas licitadas pela ANEEL,desde o início de suas atividades, alcançaum total de 50, sendo que 18 destas usinasenvolvem a participação de empresas indus-triais eletrointensivas, que se caracterizampor serem intensivas no consumo energéticocomo: alumínio, ferroligas, cimento, siderur-gia, papel e celulose, e em menor medida osprodutos químicos (Bermann, 2004). A in-dústria passou a considerar as PCH’s umcaminho para a sua autonomia no abasteci-mento de energia no longo prazo e, aindauma nova oportunidade de investimento.Frutos dessa compreensão, vários empreen-dimentos foram iniciados. Somente nas ba-cias dos Rios Tocantins e Araguaia, na Re-gião Norte, 14 usinas começaram a serconstruídas por companhias do segmento dealumínio, pressionadas pela competição aresponder através de autogeração e, por essavia, fugir dos preços elevados cobrados pe-las concessionárias de energia elétrica16 (Efi-ciência Energética, 2003). Colaborou tam-bém na resposta rápida do segmento o fatoda sua alta dependência de energia, algo emtorno de 22% do total daquela produzida nopaís. A vulnerabilidade do sistema coloca-va-o em direta susceptibilidade, ameaçandoestruturalmente seu planejamento de longoprazo. De acordo como dados da Associa-ção Brasileira do Alumínio (Abal), em 2001,13% da energia consumida pelo setor já es-taria vindo da geração própria. A associa-ção estima que, até 2006, esse percentualsalte para 50%, com um investimento esti-mado em US$ 1,5 bilhão. Livrar-se-ia, por-tanto, dos efeitos de parte significativa dosdeletérios de um novo racionamento (que é

vislumbrado) bem como de eventuais au-mentos de preços no fornecimento desse ser-viço, reduzindo o impacto do item eletrici-dade no custo final da produção (EficiênciaEnergética, 2003).

A dedicação do segmento de alumínioà autogeração de energia, para assegurar oalto consumo de suas plantas, deu-lhe a li-derança na elaboração de projetos hidrelé-tricos, comportamento salutar na medidaem que mitigou a crise da oferta, mas preo-cupante, quando considerado que o segmen-to, fortemente capitalizado e concentrado,utilizou-se desse status econômico para usu-fruir de benefícios junto ao erário através deganhos de pré-vendas, como vem fazendooutros segmentos da indústria. A disputa porrecursos públicos escassos tem impedido queiniciativas de empreendedores jovens, e nãoarticulados a outros ramos da atividade, lo-grem a elegibilidade devida. De outro lado,o número de postos de trabalho criados porunidade de energia consumida no segmen-to de alumínio se contrapõe à retórica da“geração de empregos”, comumente utiliza-da por essas empresas (Bermann, 2004). ATabela 2, abaixo, apresenta a relação entreo número de empregos de cada setor indus-trial e o respectivo consumo energético emmilhão de kWh de consumo de eletricidade(GWh) como também por toneladas equiva-lentes de petróleo (tep). Através dela, obser-va-se que o segmento de alumínio tem amenor capacidade de absorção de trabalhodireto em comparação com outros segmen-tos relevantes da indústria no país.

Tabela 1: Número de empregos por consu-mo energético segundo setores industriais

selecionados: Brasil - 2000Dois aspectos igualmente relevantes

são os que dizem respeito, de um lado, aonegócio da energia como um novo foco daconcentração de capital e, de outro, das per-

Setor No Empregos/consumo

de energia elétrica (No Empregos/GWh)

No Empregos/consumo total de energia

(No Empregos/tep) Alimentos e Bebidas 56,2 56,2 Têxtil 41,1 113,1 Prod. Químicos 16,3 28,9 Papel e celulose 3,5 4,8 Siderurgia 3,2 2,8 Cimento 3,1 2,9 Ferroligas 1,5 3,9 Alumínio primário 0,8 1,9 Fonte: Bermann, 2004.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

das que a nova política no setor provocounos direitos socioambientais que se tinhampor consolidados.

Com relação ao primeiro aspecto, oprodutor independente, como o de alumínio,foi motivado, com a anuência da ANEEL, acolocar seus excedentes de energia no mer-cado atacadista, fazendo disso um negóciorentável. Assim, a busca da eficiência eco-nômica através do auto abastecimento, aoincitar uma diversificação dos negócios deum mesmo grupo empresarial, permitiu aomesmo estender sua influência, já conside-rável, sobre um setor estratégico, criandobarreiras a entrada de capitais emergentesno ramo da energia e tornado estéril o argu-mento em torno da proteção da Estado aoempreendedorismo no setor. A Novelis, dogrupo Alcan, gera, atualmente, 30% de suaprópria energia e caminha para atingir aauto-suficiência nos próximos anos. A AlcoaAlumínio, reconhecendo que quase 40% doseu custo de produção vem do consumo deenergia, busca um portfólio de abastecimen-to composto por contratos de longo prazo eprojetos de autogeração, investindo, pormeio de participação em consórcios, na cons-trução de usinas hidrelétricas concedidas emlicitação pelo governo (http://www.abrace.org.br/perfil_energetico.asp ). A Brascan, deorigem canadense, decidiu investir em 18novas PCH’s até o ano de 2005, gerando umtotal de 500MW, quase 1/5 de toda a ener-gia atualmente produzida por essa fonte , edas quais iniciadas : a de Salto São João ePedrinho, no Paraná e a de Passo do Meio,do Rio Grande do Sul, em parceria com aAzaléia (http://www.eletrobras.gov.br/N_Noticias_assunto.pdf). Outro segmento da in-dústria, o ramo de cimento, vem adotandoa mesma estratégia. Está em fase de análise,na Ciplan, Cimentos Planalto, a implanta-ção de uma PCH e linhas de transmissãovisando atender às demandas da fábrica. AItalmagnésio Nordeste, que consome ener-gia elétrica para fins de transformação dosminérios de quartzo e de ferro, é provida,atualmente, pela Cemig, mas detém conces-sões para exploração de áreas com a inten-ção de geração própria no futuro proveni-ente de fontes hidráulica e térmica. AValesul, o segundo maior consumidor doEstado do Rio, responsável por 5% da ener-

gia consumida em todo o Estado, gera de 35a 40% de toda a sua demanda, possuindoquatro PCH’s: as usinas de Nova Maurício(29 MW) , Glória (14 MW), Ituerê (4 MW) eMello (10 MW), situadas no Estado de Mi-nas Gerais. Além dessas usinas, a Valesulpossui, ainda, uma participação de 7,28%da energia assegurada da Hidrelétrica deMachadinho, na fronteira dos estados deSanta Catarina e Rio Grande do Sul, que lhegarante 34,46 MW médios anuais, além deum contrato cativo com a Light (http://www.abrace.org.br/perfil_energetico.asp).Por fim, o incentivo do Estado à construçãode PCH’s derivou no incremento da produ-ção de turbinas, geradores, comportas eoutros equipamentos hidromecânicos, sen-do a Voith Siemens Hydro uma das grandesbeneficiárias, esperando em breve que osnegócios da empresa em torno dessa fontede energia aumente o seu faturamento totalem até 15% (http://www.eletrobras.gov.br/N_Noticias_assunto.pdf ).

Já com relação ao segundo, assistiu-sea ANNEL, através do Decreto n.o 2003, de10 de Setembro de 1996, atribuir ao produtorindependente ou autoprodutor um desmedi-do benefício. Conforme o Art. 30 deste decre-to, a requerimento justificado do interessado,o poder concedente poderia declarar a utili-dade pública, para fins de desapropriação ouinstituição de servidão administrativa, de ter-renos e benfeitorias, de modo a possibilitar arealização de obras e serviços de implanta-ção de aproveitamento hidráulico ou de usi-na termelétrica. Caberia ao produtor inde-pendente ou autoprodutor interessado pro-mover, amigável ou judicialmente, na formada legislação específica, a efetivação da me-dida e pagar as indenizações devidas. Ou seja,a ANEEL, criou marcos legais para sobreporos interesses do setor elétrico ao de outrosusuário no acesso e uso da água, o que mere-ce uma consideração à parte.

A questão socioambiental na agenda dosetor elétrico brasileiro

Quando o Estado favorece o setor elé-trico em detrimento dos direitos das popu-lações sob a área de influência do empreen-dimento, sinalizando como lícito o ato depressão ou coação para forçar famílias e

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proprietários a saírem das terras ou aceita-rem negociá-las, a política do setor colocapor terra importantes dimensões da políticaambiental, que, no tempo, e no imagináriosocial, a precede. A dimensão participativano processo decisório sobre a implantaçãoda obra é uma delas, esboroando-se qualquerpossibilidade de instituição de um ambientede stakeholders em prol da retomada de for-mas decisórias tradicionais e antidemocrá-ticas, sempre restritas a poucos interlocutorese no atendimento dos mais seletivos interes-ses o que reafirma, ao invés de dissolver, adesigualdade política, social e econômicaque é o dilema mais estrutural da nação. AsPCH’s, ao passarem a ser encaradas comonegócio, em torno novas obras ou de repo-tenciação de usinas desativadas, ficaram aolargo da necessidade de internalizar as pre-ocupações com a sustentabilidade ambiental,apesar desse ser um dos argumentos maisexaustivos em torno de tais empreendimen-tos. Apenas reproduziram, num microrre-corte e num momento histórico mais recen-te, os mesmos processos socioambientais pre-datórios que as megaobras fizeram ao longoda segunda metade do século XX (Tiago Fi-lho, 1999).

No Brasil, a importância discursiva daquestão ambiental foi traduzida não apenasno aparecimento de novas institucionalida-des, em todos os níveis de governo, mas, tam-bém, numa legislação comparativamenteavançada em relação aos países desenvolvi-dos. Mas, a extensa institucionalização su-cumbiu, em regra, ao comportamento indivi-dual-social bastante predatório. Reaco-modaram-se velhas idéias e interesses a no-vas retóricas; na prática, afrontou-se, osten-sivamente, princípios consagrados do direitosocial (Viola e Leis, 1992; Souza, et al., 2002).O problema, no caso brasileiro, é o tipo decompromisso do Estado com interesses domi-nantes internos (empresas em segmentos es-tratégicos, muitas vezes, corporações trans-nacionais) e interesses econômicos externos(organizações financeiras multilaterais), quedissolvem gradualmente a nação; novidadesque se implantam mais eficazmente quantomais desorganizada e desmobilizada perma-necer a sociedade civil no que se refere àsquestões ambientais e aos direitos de exercí-cio pleno da cidadania (Santos, 1992).

Sérias foram e têm sido as dificulda-des para a implementação da políticaambiental naquilo que interfere no processousual de acumulação, mormente no setorelétrico. A Resolução CONAMA n.º 01, de23/01/1986, por exemplo, exigia a elabora-ção de estudos detalhados, em forma de Es-tudo de Impacto Ambiental (EIA) e respec-tivo Relatório de Impacto Ambiental(RIMA), para “usinas de geração de eletricida-de, qualquer que seja a fonte de energia primá-ria, acima de 10 MW” (Art. 2, inciso XI). Anosmais tarde, no bojo da reforma do Estado, aResolução CONAMA n.º 237, de 16/12/1997, em seus Artigos 2, 3 e 12, deixava acritério do órgão ambiental licenciador adecisão quanto aos casos em que seriam ne-cessários estudos detalhados ou simplifica-dos, não havendo mais limite de potência e,sim, a consideração, a ser feita pelo órgãoambiental, do entendimento de ser o empre-endimento “potencialmente causador de signifi-cativa degradação ao meio ambiente”, ou não17.

Devido à crise energética e a necessi-dade de atender a Medida Provisória n.º2.152-2, de 1º/06/2001, a qual trata da im-plementação de ações emergenciais decor-rentes da situação hidrológica crítica, e como intuito de compatibilizar a demanda e aoferta de energia elétrica, o CONAMA pas-sou a estabelecer procedimentos para umlicenciamento ambiental simplificado, bemcomo prazo máximo de 60 dias para atramitação burocrática para a autorizaçãodos empreendimentos. Tais procedimentose prazos estabelecidos nessa Resolução apli-cavam-se, em qualquer nível de competên-cia, aos projetos energéticos de pequeno por-te, incluindo:i) Usinas hidrelétricas e sistemas associados;ii) Usinas termelétricas e sistemas associados;iii) Sistemas de transmissão de energia elétri-

ca (linhas de transmissão e subestações);iv) Usinas Eólicas e outras fontes alternati-

vas de energia. (Resolução Conama n.º279, 27/06/2001).

Na primeira metade da década de 1990,assistia-se a uma preocupação do setor elétri-co em responder à pressão institucional daárea ambiental, bem como das demais ver-tentes do ambientalismo brasileiro, adotan-do práticas que refletissem uma interna-lização paulatina das recomendações deriva-

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das da avaliação de impacto dos empreendi-mentos (Mariotoni e Badanhan, 2001). Con-tudo, já em meados daquela década e culmi-nando com a crise em 2001, a incapacidadede permitir uma genuína participação públi-ca nas decisões do setor, no qual os temas can-dentes, como normas, tarifas e impostos, per-manecem restritos ao governo e as empresasenvolvidas (Goldemberg,2000), foi favorecen-do o distanciamento dos valores socioam-bientais tinham começado a ser apreendidos.

A ação do Estado, na reestruturação dosetor elétrico, deu-se em um universo socialde interesses conflitantes, mas que negou oconflito ao construir mecanismos decisóriosde satisfação de propósitos setoriais que esta-beleceu uma convergência forçada do conjun-to mais amplo da sociedade: EIAs/RIMAspassaram a ser desnecessários, tanto quantoaudiências públicas, como se os interesses di-versos no acesso e uso da água fossem comple-mentares e previamente consensuais, o con-senso de que haja um único estilo de vida se-dento de energia, disposto a preterir quaisquercuidados maiores com a integridade da basebiofísica, preterindo-se também a necessidadede universalizar o acesso ao recurso hídrico eenergético, aspectos, enfim, que a Carta Mag-na havia conseguido pactuar, no momentoanterior, no espaço geopolítico e político-ins-titucional mais abrangente da nação. Geral-mente, na transição do plano retórico-dis-cursivo ao plano prático operacional, dimen-sões propaladas da sustentabilidade políticaem torno das PCH’s acabam sendo perdidas.A sustentabilidade sócio-política, referida aovalor da democracia e da eqüidade nos pro-cessos decisórios, remete igualmente à solida-riedade intra e intergeracional, o que a formahodierna de elaboração da política no setorelétrico não permite inferir que haja.

Se por sustentabilidade econômica,dentre outros aspectos, costuma-se entendera busca por eficiência no uso dos insumos,por sustentabilidade ecológica a variável efi-ciência relaciona-se ao reconhecimento dapotencialidade e fragilidade ambiental da re-gião frente à especificidade da obra. Aimplementação de qualquer atividade em de-terminado território acaba por repercutir nadinâmica deste ecossistema e, no caso dePCH’s, os riscos a que se tem que estar aten-to no binômio tipologia-localização são prin-

cipalmente relacionados aos recursos hídri-cos, mais especificamente quanto à sua dis-ponibilidade em quantidade e qualidadesatisfatória aos principais usos a que se pre-tende na região. Embora tais obras não seutilizem de volumosas acumulações de água,o impacto causado no nível local é passívelde causar mudanças indesejáveis na quali-dade do recurso; a diminuição do volumede água à jusante impacta a fauna aquáticaque dele depende, podendo levar à extinçãode algumas espécies endêmicas (Souza eSouza, 1999).

A escassez ecológica não deve, assim,ser tida como algo determinado pelas con-dições naturais, mas pelas formas vigentesde apropriação social e exploração econô-mica da natureza e do processo de tomadade decisão (Leff,1986; Cernea,1995). Dito deoutra forma, se deve às necessidades social-mente fabricadas e, portanto, invenções cul-turais cuja gênesis requer explicação antesde tomá-las como ponto de referência imu-tável para um plano político (Martínes-Aliere Schlpupmann, 1993).

A atual legislação do setor elétricoajustou-se aos interesses privados em hidro-energia; contudo, as necessidades de nature-za privada não podem prescindir de inte-grar com as demais políticas, sob o risco deque, mais uma vez, o país assista às tendên-cias concentracionistas e centralizadoras docapitalismo caminhando na contramão dademocracia e da república, erigindo-se bar-reiras à participação popular nas decisõesque, a dizer respeito aos rumos do desenvol-vimento, lhe dizem respeito (Oliveira, s/d).

Ainda que se possa discutir sobre a va-lidade do conceito de sustentabilidade, talcomo o mesmo é apropriado pelas períciasou pelo senso comum (o que não foi o propó-sito aqui), persiste como desafio analisar,com criticidade, o novo patamar de moder-nidade que o Estado vem deflagrando, noqual cada novo lance da acumulação leva àperecibilidade rápida as conquistas socio-ambientais da nação.

À guisa de conclusão

O setor elétrico não perdeu sua impor-tância no processo de ampliação das possi-bilidades econômicas e sociais que o Estadoantevê para a nação. Continuou sendo en-

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tendido, tal como há quase um século atrás,como um componente de infraestrutura es-tratégico para o desenvolvimento e, da mes-ma forma, como oportunidade aos interes-ses privados, inclusive transnacionais. O quefoi apresentado à sociedade civil, ao longoda década de 1990 até os primeiros anos de2000, como um novo modelo para o setorelétrico nada mais foi que a re-criação de umdiscurso em torno da insuficiência crônicade recursos públicos para justificar, em ter-mos operativos, a estruturação de um ambi-ente de negócios que livraria os empreende-dores de riscos e embaraços.

A forma unilateral e supressora de di-reitos das populações envolvidas na decisãosobre os novos empreendimentos, bem comoa minimização da importância dos estudosde impacto ambiental na área a ser afetada,descaracterizou qualquer sustentabilidadesócio-política ou ecológica da nova políticade hidroenergia. Sendo esta centrada noacesso privilegiado da água doce, subordi-na necessidades vitais, humanas ou não, àacumulação privada, o que coloca em gran-de vulnerabilidade a existência de um povo.

Da mesma forma, a propalação de umcompromisso de ajuste fiscal e incapacida-de de investimentos não retirou o Estado dosetor, apenas deslocou-o para a função debanqueiro solícito à acumulação privada,concedendo, via BNDES, apoios creditíciosa segmentos bastante capitalizados, como ode alumínio, nos seus projetos de autogera-ção, minando a possibilidade de emergên-cia de novos empreendedores no ramo deenergia e a crença na sustentabilidade eco-nômica de tal política.

Ambos os aspectos, num contexto deglobalização econômica, remetem para apreocupação sobre quais os parâmetros, nãoapenas novos, mas regeneradores, o Estadoterá que se impor para que suas políticas nãopercam a legitimidade necessária. Areestruturação do setor elétrico brasileiro sóatingirá o objetivo de expandir a capacida-de geradora do sistema, de propiciar opor-tunidades de investimento, de garantir qua-lidade e universalização do serviço e sermenos sujeito às crises, na medida em queseus aspectos institucionais e regulatóriospermanecerem abertos para um necessárioe profundo aperfeiçoamento.

Notas1 Esse paper foi originalmente apresentado no II

Encontro Nacional da ANPPAS, no GT de Energia,em maio de 2004 e sintetiza aspectos da pesquisa queculminou na tese da primeira autora, defendida emagosto do mesmo ano junto ao PPGSEA/USP.

2 Produtor Independente de Energia é a figura que tema posse, opera uma instalação de geração elétrica ecomercializa sua produção com empresas conces-sionárias ou outros consumidores. Autoprodutor deenergia elétrica é o consumidor que busca prover,por meio de geração própria, um fornecimentogarantido de eletricidade. As principais razões paraa proliferação de autoprodutores, no Brasil, nos diasatuais, são a ausência de opção de abastecimento viarede ou, ainda, porque a oferta via rede é muito caraou de regularidade pouco confiável.

3 Não se pretende, neste trabalho, partir de umaproblematização do conceito. Uma discussão acercadas limitações do mesmo pode ser buscada, dentreoutros, em Leff (2003) e Furnival & Costa (2003). Euma discussão epistemológica mais abrangente emtorno da problemática ambiental pode ser encontradaem Leff (2000), dentre outros.

4 O que encontra correspondência em Sachs, 1994;Mather e Sadsyuk, 1991; Kolluru, 1994; Elliot, 1994 eTeixeira et al., 1999, dentre outros.

5 O que encontra correspondência em Sachs, 1994;Mather e Sadsyuk, 1991; Bobbio et al , 1986; Kolluru,1994 e Elliot, 1994; Teixeira et al., 1999, dentre outros.

6 Decreto Lei n.º 8.031, de Outubro de 1945, cria aCompanhia Hidroelétrica do São Francisco.

7 Lei n.º 3.890, de Abril de 1961, cria Centrais ElétricasBrasileiras S.A..

8Em 1957, cria-se a Central Elétrica de Furnas S.A. Em1960, foi a vez do Ministério de Minas e Energia. Em1968, da Eletrosul e, em 1972, da Eletronorte. Em 1973,foi assinado o Tratado de Itaipu, entre Brasil eArgentina, para a construção da usina hidroelétricade Itaipu.

9 As primeiras bases legais para a reestruturação do setorelétrico brasileiro foram criadas em 1993, com aaprovação da emenda constitucional que permitiu aparticipação de capitais estrangeiros no setor, mas foisó em 1995 que a modernização se tornou efetivamentepossível com a regulamentação do Artigo 175 daConstituição, de 1988, que atribuiu ao governo aresponsabilidade pela prestação de serviços públicos,diretamente ou mediante concessão.

10 A lei n.º 8.987, de 1995, denominada Lei de Concessões,tornou-se o marco fundamental do início do processode privatização. No setor elétrico, ela foiregulamentada pela Lei n.º 9.074, de 1995, a qualdispõe sobre o regime concorrencial na licitação deconcessões para projetos de geração, distribuição etransmissão de energia elétrica. Adicionalmente, cria,também, a figura jurídica do produtor independentede energia elétrica e estabelece a possibilidade dosconsumidores livres - com carga igual ou superior a10 MW e que são atendidos em tensão igual ousuperior a 69 kV - terem direito à contratação deenergia, inicialmente, de produtores independentese, após cinco anos, de qualquer concessionária ouprodutora de energia.

75O papel das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH’s) no contexto político-institucionalda reestruturação do setor elétrico nacional

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11 A contratação destes consultores deu-se em agostode 1996 e o seu primeiro relatório foi entregue emoutubro deste mesmo ano, quando recebeu váriascríticas por não contemplar as característicaspeculiares e relevantes do setor elétrico brasileiro.

12 Como forma de exemplificar, citamos a Comissãode Serviços Públicos de São Paulo–CSPE, que é oórgão regulador do setor elétrico no estado supra emantêm acordos formais para execução de muitasdas competências da ANEEL no referido estado.

13"Um dos atalhos que o Governo pretende seguir paraampliar a oferta de energia elétrica é a geraçãodistribuída – consumida no local onde é gerada. Atéo final de 2004, deverão estar assinados contratos deconcessão para a geração de 3.300MW a partir defontes alternativas (biomassa, eólica e pequenascentrais hidrelétricas), dando início à primeira etapado Proinfa. A meta do Governo é que as fontesrenováveis respondam por 10% da matriz energéticabrasileira no menor prazo possível” (Laura CristinaPorto, diretora de Energia Renováveis do MME, 2003).

14Nessa nova configuração, e com a crise energéticadeflagrada, retoma-se o Programa Nacional dePequenas Centrais Hidrelétricas (PNPCH), aprovadopelo governo brasileiro no início de 1984, o qualprevia a construção ou recuperação de PCH’s comoalternativa para atendimento local das necessidadesde energia elétrica, especialmente em micro-regiõesnão alcançadas pelos sistemas de transmissão ou desub-transmissão das concessionárias de serviçopúblico de eletricidade ou, ainda, em atendimento aregiões em desenvolvimento com perspectivas deescassez de energia elétrica (Departamento Nacionalde Energia Elétrica, 1995).

15 A resolução da Aneel nº 245/1999 previa que todasas pequenas hidrelétricas, com potência entre 1 e 30MW, implantadas em sistemas elétricos isolados emsubstituição à usinas termelétricas e que usassemderivados de petróleo para geração de energia, teriamo direito a receber a CCC. Com isso, a Aneel intentouincentivar a construção, nos sistemas isolados, denovas PCH’s ou de empreendimentos de geração quefizessem uso de recursos naturais renováveis.Atualmente, duas das 11 PCH´s que tiveram direito àCCC estão em operação: a de Monte Belo (4 MW) ede Altoé II (1,1 MW), ambas em Rondônia (http://www.infoenergia.com.br).

16Em 2001, por exemplo, a produção do setor dealumínio primário recuou 11% em virtude doracionamento. E as empresas brasileiras não sãoperdulárias no consumo de energia. Juntas, asprodutoras nacionais de alumínio apresentam umconsumo específico da ordem de 14,8 MWh/kg,abaixo da média mundial de 15,2 MWh/kg . NaValesul, controlada pela Companhia Vale do Rio Docee sediada no Rio de Janeiro, o custo do MWhproduzido por seu sistema de autogeração é de R$28, enquanto o valor pago à Light é de R$ 75 – umaeconomia de 167%. Na Alcan, a usina de Fumaça podegerar 10 MW, as de Furquim e Prazeres, 8 MW, e a deCandonga, a maior de todas, 140 MW. Já a aposta daAlcoa é de proclamar sua autonomia energética até2008 (Eficiência Energética, 2003).

17De forma complementar, para empreendimentos dosetor elétrico, Resolução Conama n.º 006, de 16 deSetembro de 1987.

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Políticas para la implementación de medios innovadores en áreas no metropolitanasPolitical strategies for the implementation of innovating means in non-metropolitian areas

Políticas para a implementação de meios inovadores em áreas não metropolitanasSusana Finquelievich*

Recebido em 25/02/05; revisado e aprovado em 26/02/05; aceito em 28/02/05.

Resumen: La noción “Innovación para el desarrollo”, aplicada a ciudades y regiones en la Sociedad del Conocimiento,es una de las inquietudes fundamentales de los países desarrollados, y de un número creciente de países en desarrollo.Las ciudades y las regiones son actualmente agentes clave en el nuevo espacio industrial, que implica la instalaciónde los nuevos sectores industriales y la utilización de tecnologías innovadoras en todos los sectores. Sin embargo, losrequisitos necesarios para producir y alentar una capacidad para la innovación, así como los factores de los cualespuede emerger una cultura innovadora, aún permanecen indefinidos. Gran parte de las inversiones en infraestructurapara la innovación se ha concentrado en universidades, centros de investigación, incubadoras de empresas einfraestructuras de tecnología, generalmente en las ciudades en las que existe suficiente densidad de población, personalcalificado, y calidad de experiencia en los sistemas existentes como para justificar estas inversiones. Los “medios innovadores”–clusters empresarios, parques de ciencia y tecnología, tecnopolos, etc.- se instalan en las áreas metropolitanas, o ensus cercanías. ¿Qué ocurre entonces con las ciudades medianas y pequeñas, localizadas en áreas no metropolitanas?Los objetivos de este trabajo son reflexionar sobre lo que un modo alternativo para alentar y construir ámbitos innovadoresen las áreas urbanas no metropolitanas, desde un enfoque de desarrollo social, económico y tecnológico y analizar lascondiciones necesarias para la construcción de los sistemas locales de desarrollo y efectuar propuestas para la implementación desistemas de innovación comunitaria (SIC) en regiones no metropolitanas.Palabras clave: Desarrollo; sociedad del conocimiento; innovación.Abstratc: The notion of “Innovation for development”, applied to cities and regions in the Information Society, is oneof the fundamentally disquieting factors in developed countries, and in a growing number of developing countries.The cities and the regions are at the moment key agents in the new industrial space, which implies the installation ofnew industrial sectors and the utilization of innovating technologies in all sectors. Without a doubt, the necessaryprerequisites for the production and encouragement of the capacity for innovation, as well as the factors from whichcan emerge an innovative culture, still remain undefined. A large part of the inversions in infrastructure for innovationhave been concentrated in universities, investigation centres, company incubators and technology infrastructures,generally in the cities in which exist sufficient population density, qualified personnel, and quality of experience in the existingsystems to justify these inversions. The “innovating means” – clusters, business leaders, science and technology parks,technopoles, etc. – are installed in metropolitian areas, or in the immediate surroundings. What happens then with themedium and small cities localized in non-metropolitian areas? The objectives of this study are to reflect on analternative mode for encouragement and construction of innovating fields in non-metropolitian urban areas, beginningfrom a focus on social, economic and technological development, and analyze the necessary conditions for theconstruction of the local systems of develoment and put into effect proposals for the implementation of systems ofcommunity innovation (SIC) in non-metropolitian regions.Key words: development; information society; innovation.Resumo: A noção “Inovação para o desenvolvimento”, aplicada às cidades e regiões na Sociedade do Conhecimento,é uma das inquietudes fundamentais dos países desenvolvidos, e de um número crescente de países emdesenvolvimento. As cidades e as regiões são atualmente agentes imprescindíveis no novo espaço industrial, queimplica a instalação dos novos setores industriais e a utilização de tecnologias inovadoras em todos os setores. Noentanto, os requisitos necessários para produzir e intensificar a capacidade para a inovação, assim como os fatoresdos quais pode emergir uma cultura inovadora, ainda permanecem indefinidos. Grande parte dos investimentos eminfra-estrutura para a inovação tem se concentrado em universidades, centros de investigação, incubadoras deempresas e infra-estruturas de tecnologia, geralmente nas cidades em que existe suficiente densidade de população, pessoalqualificado, e qualidade em experiência nos sistemas existentes a fim de justificar estes investimentos. Os “meios inovadores” –clusters empresários, parques de ciência e tecnologia, tecnopolos, etc.- instalam-se nas áreas metropolitanas, o emsuas proximidades. O que ocorre então com as cidades médias e pequenas, localizadas em áreas não metropolitanas?Os objetivos deste trabalho são refletir sobre o modo alternativo para enfatizar e construir âmbitos inovadores nas áreasurbanas não metropolitanas, a partir do enfoque de um desenvolvimento social, econômico y tecnológico e analisar ascondições necessárias para a construção dos sistemas locais de desenvolvimento e efetuar propostas para a implementação desistemas de inovação comunitária (SIC) em regiões não metropolitanas.Palavras-chave: Desenvolvimento; sociedade do conhecimento; inovação.

prioritarias de los países desarrollados, y deun número progresivo de países endesarrollo. Las ciudades y las regiones se hanconvertido en actores clave en el nuevoespacio industrial, caracterizado por elemplazamiento de los nuevos sectoresindustriales y por la utilización de nuevas

Ciudades en la sociedad del conocimiento:innovación para el desarrollo

El concepto “Innovación para eldesarrollo”, referido a ciudades y regionesen la Sociedad del Conocimiento, esactualmente una de las preocupaciones

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 77-84, Mar. 2005.

* Directora, Programa de Investigaciones sobre la Sociedad de la Información Instituto de Investigaciones GinoGermani Facultad de Ciencias Sociales - Universidad de Buenos Aires, Argentina ([email protected] http://www.iigg.fsoc.uba.ar).

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

tecnologías en todos los sectores. Sin embar-go, los requisitos necesarios para producir yalentar una capacidad para la innovación,así como los factores de los cuales puedeemerger una cultura innovadora, aúnpermanecen borrosos. Gran parte de lasinversiones en infraestructura para lainnovación se ha focalizado en universida-des, centros de investigación, incubadoras deempresas e infraestructuras de tecnología,generalmente allá donde existe suficientedensidad de población, personal calificado, ycalidad de experiencia en los sistemas existen-tes como para justificar estas inversiones. Porestas razones, los “medios innovadores” –clusters empresarios, parques de ciencia ytecnología, tecnopolos, etc.- se instalangeneralmente en las áreas metropolitanas, oen sus cercanías. ¿Qué ocurre entonces conlas ciudades medianas y pequeñas, localiza-das en áreas no metropolitanas?

Los objetivos de este trabajo son lossiguientes:1.Reflexionar sobre lo que un modo alternati-

vo para alentar y construir ámbitosinnovadores en las áreas urbanas no me-tropolitanas, desde un enfoque dedesarrollo social, económico y tecnológico.

2.Analizar las condiciones necesarias para laconstrucción de los sistemas locales dedesarrollo y efectuar propuestas para laimplementación de sistemas de innovacióncomunitaria (SIC) en regiones no metropo-litanas.

La innovación tecnológica basada enel conocimiento, traducida en la producciónde bienes y servicios intensivos entecnologías de información y comunicación(TIC), o en empresas que actúan en redesorganizacionales basadas en las TIC, se con-centra en general en áreas metropolitanasde grandes ciudades, o en sus zonas de in-fluencia. Esta tendencia puede resultar enuna agravación mayor de los desequilibriosregionales, en perjuicio de las ciudades me-dianas y pequeñas y de las zonas de menordensidad poblacional, a menos que se equi-libre con estrategias de desarrollo de lainnovación basada en el conocimiento enáreas no metropolitanas. Por otro lado, elmodelo de innovación, si bien estáinevitablemente ligado a los proyectosnacionales, no es necesariamente un mode-

lo originado por el Estado central, “desdearriba hacia abajo”, sino que puede ser con-siderado como basado en las comunidadeslocales, en su red de actores sociales, o comoun medio de innovación construido desdeabajo hacia arriba. Valenti López (2002) des-taca la necesidad de definir un nuevo mar-co institucional para la Sociedad de laInformación, caracterizado el nivel macro,constituido por las organizaciones del Esta-do que establecen las reglas de accióncolectiva, y el nivel micro. Este integra a lasinstituciones formales e informales basadasen la confianza recíproca y en lacomplementariedad de funciones, denomi-nado: “sistema local de desarrollo”.

En un trabajo sobre las ciudades comomedios innovadores (Finquelievich, 2001)planteábamos algunas hipótesis. La conje-tura básica es que este cambio se caracterizapor la superación de las ciudades industriales,en cuanto elemento estructurante dominante dela organización en diferentes escalas (niveles);se identifican señales del surgimiento de unasociedad basada en formas inéditas deconvivencia social en la que coexisten los anclajesterritoriales con el tejido de redes socialesglobales. Simultáneamente, se construye unanueva jerarquía urbana en la red mundialde ciudades. Esta ya ha sido estudiada in-tensivamente por Saskia Sassen y porCastells, creando la clasificación de ciudadesglobales y ciudades nodales, de acuerdo a laimportancia de los flujos financieros y polí-ticos que concentran.

Pero también se pueden clasificar lasciudades en centrales y periféricas en el sistemaurbano de la transición a la sociedadinformacional, de acuerdo a su capacidad paraconvertirse en medios de innovación . Lasciudades – medios de innovación sonaquellas capaces de concentrar en formainterrelacionada elementos tales como:• La producción local de bienes y servicios

innovadores por empresas de basetecnológica. Esto se refiere no sólo alhardware y al software, o a productos dealto valor agregado en tecnologías de lasociedad informacional. (comoejemplificarían los casos de Seattle y SiliconValley, en EEUU, Tsukuba en Japón, yBangalore, en India), sino también a lacapacidad de las ciudades de atraer em-

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presas innovadoras, en el sentido, no (sólo)de fabricar artículos electrónicos o deproveer servicios de base tecnológica, sinode utilizar las TIC y sobre todo Internetcomo lugar y medio de organización en red.

• El consumo individual y sobre todocolectivo, de bienes y servicios intensivosen TIC: el consumo de servicios urbanosque usen TIC para su mejor funciona-miento y administración: educación, saludpública, servicios de e-salud, transportes,seguridad, etc.; redes técnicas urbanas,como agua y saneamiento, administradaspor medio de TIC; y fundamentalmente,el gobierno electrónico de estas ciudades.

• La emergencia de nuevas formas deorganización social que utilicen comosoporte las TIC, específicamente las redeselectrónicas ciudadanas, en tanto sistemasde intervención, instrumentalización,articulación y promoción del desarrollolocal en todas sus vertientes.

Estas ciudades concentrarían lasinteracciones de capitales de riesgo, accionesestatales tendientes a convertirse enciudades claves de la nueva economía, ycreación de conocimiento de alta calidad enestablecimientos universitarios y centros deexcelencia de investigación y educación,además de nuevas formaciones sociales queusan TIC como soporte y espacio de organi-zación de una ciudadanía innovadora. Elpapel de las ciudades en la Era de laInformación es ser medios productores deinnovación y de riqueza, capaces de integrarla tecnología, la sociedad y la calidad de vidaen un sistema interactivo. Las ciudades quelo logren, ocuparían un lugar central en lanueva sociedad. Las que no puedandesarrollar medios sociales, económicos ytecnológicos innovadores, permanecerían enlos márgenes. De acuerdo a las capacidadesy posibilidades de las ciudades para cumplirese rol, se establecería un nuevo mapa decentralidades y periferias urbanas, diferen-te del trazado en la sociedad industrial. Estosmedios de innovación estarían territorial-mente concentrados en ciudades o en susáreas de influencia, articulados y conectadosa través de redes de telecomunicaciones enel conjunto del mundo.

En síntesis, proponemos el enunciadode que sólo las ciudades que se planteen el obje-

tivo de transformarse en medios innovadores –sociales, tecnológicos, económicos, políticos- ylo alcancen, lograrán un nuevo protagonismoen el espacio de las redes, en la SociedadInformacional. En realidad, este protago-nismo también se dará a nivel de su provinciao región, de su país, y de su macro-región(por ejemplo, el MERCOSUR). Surge de esteconcepto una inevitable reflexión: no todaslas ciudades que creen medios innovadoresposeerán la misma proporción de innovación entodas las áreas; algunas ciudades serán notablespor sus innovaciones tecnológicas; otras, por susinnovaciones sociales, culturales, o económicas.En otras aún, es posible que una fase innovadorasea antagónica de otra, hasta el punto en queuna elimine o debilite a otra. La evolución delas investigaciones y prácticas sobre estetema, y la misma realidad compleja, confir-maran o contradecían estos conceptosiniciales.

Sistemas de innovación en ciudades nometropolitanas

Según Gurstein (2003), un “sistema deinnovación” es un conjunto de instituciones,recursos de conocimiento y practicas, quepermiten y promueven la creación yasimilación de nueva información en elproceso productivo. Habitualmente, esteproceso está relacionado con las grandesfuentes de generación de información: cen-tros de investigación y desarrollo, universi-dades, o grandes empresas provistas de unsignificativo staff dedicado a la I+D. En estoscasos, los sistemas de innovación se orientanhacia el desarrollo de nuevos productos y conprácticas de producción aplicables a losmayores sectores industriales. Los “Sistemasregionales de innovación” se concentran fun-damentalmente sobre la generación de sis-temas integrados a partir de abundantes re-cursos humanos y tecnológicos. El enfoquecomienza desde la perspectiva de centrosurbanos relativamente grandes, provistos deestructuras sociales y tecnológicas relativa-mente desarrolladas.

La necesidad de innovación para eldesarrollo económico de las ciudades yregiones surge generalmente de lasrestricciones económicas provocadas por unadeclinación en la demanda de los productos

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locales, cualquiera sea el grado deindustrialización de éstos. Se debe entonceshallar nuevos productos, nuevasherramientas, re-educar la fuerza de trabajoexistente, y reorientar a muchos de losestablecimientos educativos y los grupos yactores responsables de las políticas localesy regionales.

El desarrollo de estrategias regionalesbasadas en áreas urbanas que handesarrollado previamente capacidadessociales, científicas y/o tecnológicas es útil,porque poseen posibilidades de alcanzar re-sultados satisfactorios si se puede encontrarla formula o la estrategia correctas. Sin em-bargo, es necesario considerar que tambiénexiste la necesidad de alentar la innovaciónpara el desarrollo para otro tipo de ciudadesy regiones: ciudades medianas, áreas que ensus actuales condiciones, o en el corto plazo,no alcanzarán las condiciones de lasciudades mencionadas más arriba, pero quepadecen de las consecuencias de la carenciade un sistema productivo innovador, y deuna dependencia con respecto a la declinantebase económica local o regional.

En estas ciudades, la gestión urbanapuede facilitar la solución de los problemaslocales que dificultan la concreción de lasiniciativas de innovación y desarrollo, asícomo a la materialización de las oportuni-dades de mayor desarrollo que el mismoproceso genere. Existen lugares y oportuni-dades para desarrollar procesos innovadoresen áreas de baja densidad, o de poblaciónlimitada, pero con recursos especializadosbasados en desarrollos industriales, y parti-cularmente en comunidades creadas odesarrolladas específicamente sobre la basede extracción de recursos primarios, o de suprocesamiento. Con frecuencia estasciudades medias o pequeñas han basado sueconomía en una industria importante, obien pueden estar alejadas de otros centrosurbanos y han surgido sólo para explotardeterminados recursos locales (como lasciudades mineras o petroleras de la Patago-nia argentina). Los avatares económicos ylas transformaciones tecnológicas de las úl-timas décadas en el ámbito global, y las di-versas crisis económicas, así como estrategiaspolíticas negativas o erróneas en el ámbitonacional, han generado un entorno econó-

mico frágil o directamente desintegrado paraestos recursos en sus comunidades deproducción.

En estos ámbitos prácticamente mono-económicos se originan crisis graves cuandola fuente de empleo e ingresos desaparece,lo que frecuentemente ocurre rápidamentey sin previo aviso. La población local quedacon poca o ninguna capacidad de respuesta.Sin formación en otros oficios, sin capacidadde gestión del pequeño capital que en elmejor de los casos les queda como fruto delas indemnizaciones por los empleos queperdieron, se enfrentan a la alternativa deemigrar hacia otras ciudades, de perder suspropiedades y negocios, que han quedadodevaluadas, o de seguir en el lugar, sin pro-babilidades cercanas de obtener nuevosempleos. Los desequilibrios en un mismo paísentre ciudades y regiones así causados seagravan a partir de la nueva brecha digitalregional: la concentración de recursos deinnovación relacionados con TIC en lasregiones y ciudades más desarrolladas.

La brecha digital urbano-regional

La concentración de recursos deinnovación relacionados con TIC en lasregiones y ciudades más desarrolladas podríacrear, de acuerdo a lo expresado más arri-ba, un nuevo tipo de brecha digital: la bre-cha urbano - regional.

Esta brecha entre ciudades ricas y po-bres en innovación ligada a las herramientas dela Sociedad del Conocimiento depende de laexistencia y capacidad de interrelación defactores como: la cercanía de grandesciudades y / o áreas metropolitanas queaseguren la existencia de Universidades,casas matrices de empresas innovadoras,infraestructura de transportes y comunica-ciones internacionales, hotelería, etc.; lascapacidades existentes en CyT (existencia ocercanía de Universidades y centros deinvestigación); capital de riesgo y empresaspermeables a la innovación, capaces deinteractuar con las capacidades en CyT y conlos gobiernos locales y regionales; lacapacidad de los gobiernos locales yregionales para elaborar políticas yestrategias orientadas a la innovación parael desarrollo; parque industrial y existente y

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tipo de empresas localizadas en el ciudad oregión; el número de habitantes y sudensidad; la accesibilidad pública y privadaa las herramientas de la SC (conectividad,proveedores de servicios de Internet (ISPs),existencia de telecentros, cibercafés, etc.,costos, y otros); los recursos humanos capa-citados, y el número y tipo de institucioneseducativas, carreras, etc.; la existencia deuna sociedad civil familiarizada con el usode las herramientas de la SC y capaz de par-ticipar en emprendimientos para lacomunidad; la capacidad de los actoreslocales de establecer redes y alianzas entresí y con actores externos, nacionales einternacionales. Llama la atención, en la li-teratura actual consagrada a la innovación,la carencia o insuficiencia de debates sobrelos que podría llamarse, según Gurstein(2003) “innovación comunitaria”. Estas co-munidades son sólo fragmentos de lo que seentiende actualmente como necesario paradesarrollar un sistema regional deinnovación sustentable, pero necesitan, talvez más que otros espacios geográficas ysociales, de las oportunidades y estímulosque la innovación puede proporcionar.

Estrategias para la innovación

En la actual carrera global paramantener y expandir una base tecnológicasobre la que se puedan construir economíasnacionales más competitivas, eficientes ycreativas a nivel internacional, las empresastecnológicas juegan un rol crucial, aún enregiones no-metropolitanas. Muchos futuroseconómicos y productivos dependen de loséxitos alcanzados en esta área. El hecho deque la mayoría de los países latinoamericanosno hayan alcanzado aún el estadio anteriora éste (el establecimiento de basestecnológicas y su relación con la CYT) no sig-nifica que no se deba contemplar esta pers-pectiva para la planificación a mediano ylargo plazo de las estrategias y políticassociales y económicas.

Existe actualmente un gran interés enidentificar las estrategias que puedanproducir el crecimiento económico de lasciudades y regiones donde este desarrollo nose da en forma espontánea. Para ello, hayque emprender la tarea de investigar las

razones por las que algunas ciudades y regioneshan logrado desarrollar sistemas de innovacióny desarrollo exitosos y otras no, y más aún, porqué algunas comunidades han sido receptivas,alertas y creativas, con respecto al concepto deinnovación, y otras, en similares condicioneseconómicas y sociales, han permanecido indife-rentes a él o lo han resistido.

También existe la oportunidad deproducen innovaciones a nivel micro en lascomunidades, desarrollando nuevos (para elárea) tipos de emprendimientos, de procesosproductivos, de asociaciones, o de mercados.Para Gurstein (2003), los Sistemas deInnovación Comunitaria (SIC), en formamuy similar a otras formas de innovaciónbasados en el conocimiento, necesitan antesque nada el acceso a dicho conocimiento yla posibilidad de implementar susaplicaciones, aunque en el contexto de lascomunidades locales, la escala y nivel deinformación a asimilar será probablementemenos que en los sistemas regionales ynacionales.

Las SIC requieren fundamentalmentede los siguientes factores:• Acceso de la comunidad a niveles

avanzados de información y conocimiento.• Buena disponibilidad de información pro-

vista por el sector público;• Identificación de las necesidades en

innovación del tejido empresarial comomedio para promover proyectos innova-dores;

• Empresas innovadoras de base tecnológica;• Trabajadores bien formados en los nuevos

requerimientos tecnológicos y organiza-cionales, capaces de asimilar e implemen-tar los conocimientos;

• Capacidad local para trabajar en red, conbase en Internet, entre productores,proveedores y consumidores de bienes yservicios;

• Receptividad a la innovación.La capacidad de los sistemas productivos

y culturales locales para absorber y utilizar efi-cazmente la información a la que acceden es unelemento fundamental, agregado a lacapacidad de trabajar en redes interactivasy al mismo conocimiento que da origen a lainnovación. En el contexto comunitario,acota Gurstein (2003), esta capacidad estáíntimamente ligada a las normativas y

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prácticas culturales locales. Muchas comu-nidades, en particular las pequeñas yaisladas, se caracterizan con frecuencia porsu resistencia a experimentar o absorbernueva información. Las ideas que provienen“del exterior”, aún en los casos en queprovengan de miembros de la comunidademigrados a otros contextos, pueden encon-trar desconfianza o aún hostilidad, impidien-do que la economía local aproveche lasventajas aportadas por la información quelos actores externos a la comunidad puedenaportar, o a la que pueden facilitar el acceso.Por lo demás, algunas comunidades, en es-pecial aquéllas que no poseen una historiade actividades industriales basadas en elconocimiento, ni han experimentado lainstalación de un número significativo detrabajadores del conocimiento, puedenmostrarse desconfiadas hacia las nuevasinformaciones, y reacias o indiferentes a laoportunidad que se les presenta para ellosmismos y para sus hijos de obtener unaeducación de la cual puedan surgir inno-vaciones.

Un Sistema de Innovación (SIN)efectivo se construye sobre una base deinformación y conocimiento, lo que incluyeuna serie de procedimientos y prácticas paraexplorar el medio donde se instalará el SIN,en búsqueda de información útil para lainstalación de la innovación. Los actoresinteresados en implementar el SIN puedenobtener esta información mediante consul-toras, encuentros con los notables locales,reuniones con la población, familiarizacióncon las redes sociales locales, etc., pararecoger los procedimientos de informaciónque pueden resultarles útiles. Uno de losdesafíos de la localización de SIN en áreasurbanas medias y pequeñas es asegurarse deque estos procedimientos no resulten nega-tivamente disruptivos en el limitado medioeconómico que poseen muchas de estas co-munidades.

Políticas y estrategias para el desarrollode un sistema de innovación

El proceso de desarrollo de un sistemade innovación en un área no metropolitana(ANM) es generalmente, según Gurstein(2003) “un proceso de responder paso a paso

a las brechas que restringen el desarrollodeseado”. Estas brechas varían según lasregiones y las estructuras sociales, de modoque también cambian, necesariamente, lasetapas a implementar, por lo que aquí sehabla sobre el proceso en general, en su sen-tido amplio. Los pasos a seguir son lossiguientes:• Asegurarse de la existencia de, o implementar,

la infraestructura básica para sustentar lainnovación . En el caso de innovacióntecnológica en un ANM, este paso puedeir desde la provisión de una base detelecomunicaciones con suficientecapacidad de velocidad y volumen detransmisión de datos, a una plataforma otelepuerto que pueda sostener laspotenciales iniciativas que sean tomadasen el futuro. Las áreas de baja densidadpoblacional en las que se implanta porejemplo la banda ancha, pueden no resul-tar costo-efectivas sin subsidios estatales oprivados. O bien, los precios de losproveedores locales pueden ser demasia-do elevados en comparación con los de unárea metropolitana, por servicios similares.

• Crear una cultura local susceptible de origi-nar o recibir la innovación, por ejemplo, lainformación y concientización de unapoblación, mediante campañas informati-vas sobre el hecho de que determinadainnovación contribuirá a su desarrolloeconómico y cultural, y de que redundaráen mejor educación para ellos y sus hijos.Si una comunidad ha estado dedicadadurante décadas a una actividad deextracción, como las ciudades mineras, ode cría de ganado extensiva, la implan-tación de nuevas tecnologías y de serviciosdesconocidos hasta ese momento puedenresultar amenazadoras. (De hecho, puedenamenazar concretamente algunos interesesde grupos locales, interesados en mantenerel statu quo). En estos casos, es necesarioimplementar programas de información yconcientización sobre los beneficios y losriesgos de la innovación, por medio dereuniones con la comunidad, entrevistascon los medios de prensa, demostraciones,exposiciones, etc.

• Crear medios para que aquellos habitantesinteresados en prácticas innovadoras puedandesarrollar dichas ideas y comunicarlas a otroshabitantes con intereses similares, a las

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empresas y centros de I+D participantes,a las instituciones educativas, y a la mismacomunidad. Esto puede implicar imple-mentar reuniones periódicas entre las em-presas, las instituciones educativas, elgobierno local y los interesados en lasinnovaciones, para intercambiar informa-ción e ideas. También pueden crearseConsejos Tecnológicos Locales, queincluyan a estos y otros actores.

• Establecer relaciones entre la comunidad y el/los establecimientos de estudios e investigaciónque participarán en la innovación. Elestablecimiento de estas relaciones puedeestablecerse mediante la comunicación en-tre los docentes, padres y alumnos de losestablecimientos educativos locales y laUniversidad en cuestión, aunque ésta seencuentre físicamente alejada de lalocalidad, por medio de conferencias,charlas, visitas de los docentes locales a laUniversidad, etc. Tales contactos serviránpara familiarizar a padres y docentes conla institución científica que directa oindirectamente intervendrá en su localidad,ampliará sus percepciones y les hará ganarconfianza y entusiasmo en la innovación.

Estas actividades previas a la imple-mentación de la innovación (SIC) sonimprescindibles, pero están lejos de ser sufi-cientes. Según aseguran Gurstein (2003) yPorter (1990, 1992), cumplirlas no significanecesariamente que se logrará desarrollar uncluster innovador, pero en su ausencia pare-ce improbable que se construyan actividadesinnovadoras en comunidades no metropoli-tanas. Una vez resueltas esas brechas ocarencias, y en el caso en que actividadesrelacionadas con la innovación comiencena emerger, se hará necesario enfrentar elamplio espectro de los otros requisitosnecesarios para construir un ambienteinnovador. Cada una de las resoluciones de estosrequisitos, junto con las condiciones menciona-das más arriba, representa el costo de desarrollarun SIC en una región no metropolitana, que sesuperpone al costo de lograr un medio innovadoren una región metropolitana. Por esta razón,no resulta sorprendente el hallar pocas em-presas de base innovadora en áreas no me-

tropolitanas. En general, las que se encuen-tran operan en pequeña escala. La planifica-ción de SIC en áreas no metropolitanasdeberá contrabalancear estos costosorganizacionales y económicos con losbeneficios que pueden obtener las comuni-dades locales.

En síntesis…

Si la “Innovación para el desarrollo”en las ciudades y regiones está en camino devolverse una de las preocupacionesprioritarias de los países de América Latinay el Caribe, es necesario tener en cuenta que,para asegurar su éxito, las iniciativasregionales y locales no pueden estardesvinculadas de los proyectos nacionalescon respecto a la relación entre la ciencia yla tecnología (CyT) como motor deldesarrollo y de las transformacioneseconómicas, la innovación en las empresasy el aliento a la industria nacional paraintegrarse plenamente en la Sociedad de laInformación. Las ciudades y las regiones,actores clave en el nuevo espacio industrial,son también transformadas por estosprocesos, fundamentalmente a nivel de susredes sociales. Sin embargo, no es latecnología per se la que determinará laevolución de las ciudades ni de las socieda-des. Por el contrario, son las estructurassociales, económicas y políticas existentes lasque adaptarán los avances tecnológicos a susnuevas necesidades, ya sea aceptándolos,apropiándolos, rechazándolos o inhibién-dolos. Como plantea Manuel Castells(1995:19): “Emerge una forma social y espaci-al: la ciudad informacional. No es la ciudad delas tecnologías de la información profetizada porlos futurólogos. Ni es la tecnópolis totalitariadenunciada por la nostalgia del tiempo pasado.Es la ciudad de nuestra sociedad, como la ciudadindustrial fue la forma urbana de la sociedad queestamos dejando. Es una ciudad hecha de nuestropotencial de productividad y de nuestracapacidad de destrucción, de nuestras proezastecnológicas y de nuestras miserias sociales, denuestros sueños y de nuestras pesadillas. Laciudad informacional es nuestra circunstancia.”

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Desenvolvimento e populações indígenas: direções possíveis e desafios necessáriosDevelopment of indigenous populations: possible directions and necessary challenges

Desarrollo y poblaciones indígenas: direcciones posibles y desafíos necesariosMarta Regina Brostolin*

Recebido em 14/07/04; revisado e aprovado em 27/08/04; aceito em 17/02/05.

Resumo: O presente trabalho aborda o tema desenvolvimento em populações indígenas, coloca em discussão oprocesso de pauperização e subsistência das populações indígenas vinculado a questão territorial. Traz no bojo dadiscussão uma análise sobre a implantação e fracasso dos projetos de desenvolvimento implantados em terrasindígenas, ressaltando a importância do território para os povos indígenas como base para a construção de umetnodesenvolvimento, de modo a conformar unidades político-administrativas que lhes permita serem autônomosquanto ao seu desenvolvimento étnico e de terem a capacidade de impulsioná-lo.Palavras-chaves: Populações indígenas; território; etnodesenvolvimento.Abstract: The present study handles the theme of development in indigenous populations and brings up for discussionthe process of progressive poverty and subsistence of indigenous populations linked to the question of territory.Within this framework of discussion there is an analysis of the implantation of failure of development projects onindigenous lands, showing the importance of territory as a basis for the construction of ethno-development, so thatpolitical-administrative units can come to an understanding that will permit them to be autonomous as to their ethnicdevelopment and to have the ability to carry it out.Key words: indigenous populations; territory; ethno-development.Resumen: El presente trabajo aborda el tema desarrollo en poblaciones indígenas, coloca en discusión el proceso depauperismo y subsistencia de las poblaciones indígenas vinculado a la cuestión territorial. Trae en el inicio de ladiscusión un análisis sobre la implantación y fracaso de los proyectos de desarrollo implantados en tierras indígenas,resaltando la importancia del territorio para los pueblos indígenas como base para la construcción de un etnodesarrollo,de modo a conformar unidades político administrativas que les permita ser autónomos cuanto a su desarrollo étnicoy de tener la capacidad de impulsarlo.Palabras claves: Poblaciones indígenas; territorio; etnodesarrollo.

depende nuestra sobrevivencia... Nuestrapolítica de desarrollo se basa, primero, engarantizar nuestra autosuficiencia y nuestrobienestar material, asi como la de nuestrosvecinos... En lo sucesivo, la generación de unexcedente para el mercado debe venir de unuso racional y creativo de los recursos naturalesque desarrolle sus tecnologias tradicionales yseleccione otras nuevas adequadas.Frente às reivindicações representadas

pela relação subsistência, terra e recursosnaturais vinculada a situação fundiária bra-sileira, Gallois (2001), ao analisar a questão,aponta o descompasso existente entre a ca-racterização do índio como categoria jurídi-ca, e as suas reivindicações que refletem asatuais contradições internas à legislaçãoindigenista brasileira. De um lado, o CódigoCivil que estabelece a tutela, de outro, aConstituição brasileira que garante aos ín-dios o reconhecimento das suas formas tra-dicionais de organização social, política, lín-guas etc., e finalmente, o projeto do Estatu-to das Sociedades Indígenas2, em tramitaçãono Congresso Nacional que viabiliza alter-nativas mais adequadas de representaçãodireta e autônoma. No entanto, esse quadro

1 Contextualizando

Segundo Gallois (2001) quando se tra-ta do tema “populações indígenas e desen-volvimento”, pode-se partir de duas reivin-dicações básicas, reiteradas em inúmerosforos internacionais: de um lado, o direitode controle sobre suas terras, do outro, o re-conhecimento de sua capacidade à autode-terminação. Inúmeras declarações, regis-tradas em documentos de reuniões interna-cionais e nacionais dedicadas à questão daconservação da biodiversidade e do desen-volvimento sustentável, evidenciam que aspopulações indígenas reclamam, antes dequalquer outra medida a seu favor, o direitoà soberania e autonomia. Para exemplificaresta questão, reporta-se ao documento “De-claração dos Povos Indígenas Tribais da Flo-resta tropical 1” que afirma:

Una reorientación del proceso de desarrollodesde los proyectos a gran escala hacia lapromoción de iniciativas a pequeña escal,controladas por nuestros pueblos. Para tal esiniciativas, la prioridad es asegurar el controlsobre nuestros territorios y recursos de los que

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 85-98, Mar. 2005.

* Pedagoga, Psicopedagoga, Doutoranda em Desenvolvimento Local pela Universidad Complutense de Madrid(Espanha) e Pesquisadora na área indígena e formação de professores e Professora da Graduação e Pós-graduaçãoda Universidade Católica Dom Bosco ([email protected]).

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

legal confuso tem permitido que, dependen-do dos atores relacionados à políticaindigenista, se usa um ou outro desses parâ-metros, negando assim a possibilidade de umdiálogo em busca de igualdade.

Como se pode observar, o reconheci-mento da posse das terras ocupadas tradici-onalmente pelos povos indígenas e o conse-qüentente direito de usufruto das riquezasnaturais nelas existentes são princípios cons-titucionais há mais de meio século, desde aConstituição de 1934. Legalmente, as terrasindígenas são assim reconhecidas, indepen-dente de demarcação. Mas, do princípioconstitucional à prática correspondente, in-terpõem-se procedimentos de cunho admi-nistrativo com vista ao reconhecimento ofi-cial dessas terras. Ou seja, atualmente, agarantia, aos índios, da posse permanentedo território em que vivem, depende de re-gularização administrativa e da regulamen-tação jurídica da terra como propriedade daUnião; as áreas discriminadas pelo órgãoindigenista oficial, em processos de identifi-cação, delimitação e demarcação física, sãolevadas com a devida chancela do ministé-rio competente, à homologação por decretodo presidente da República e posterior ins-crição, tanto em cartório de registro de imó-veis das respectivas comarcas, quanto noServiço do Patrimônio da União.

Decorrido o prazo constitucional fixa-do nas disposições transitórias da Constitui-ção de 1988, para a demarcação de todas asterras indígenas no país, vê-se que poucomais da metade das áreas indígenas, isto é,292 de um total de 559 áreas, ou 56.076.382ha de 99.822.112 ha foram formalmenteidentificadas e demarcadas pelo Poder Exe-cutivo (ISA, 25.2.1997). Mesmo assim, asidentificações administrativas das terras in-dígenas já realizadas com freqüência nãocorrespondem aos territórios tradicional-mente ocupados pelos índios, devido a fato-res políticos intervenientes na etapa inicialdo processo de regularização fundiária.Acrescenta-se a isso o fato de que as áreasdemarcadas se encontram amplamente in-vadidas. Portanto, pode-se dizer que a mai-oria das populações indígenas no Brasil con-tinua a ser espoliada nos seus direitosterritoriais, o que dificulta ou de certo modoinviabiliza seu processo de subsistência e

consequentemente, o desenvolvimento euma qualidade de vida.

2 O processo de pauperização esubsistência das sociedades indígenasvinculado a questão territorial

A perda de territórios indígenas, coma demarcação de reservas de terras reduzi-das e a crescente destruição dos recursosnaturais, localizados no interior das mesmas,vem conseguindo, progressivamente, des-truir os sistemas de auto-sustentação,inviabilizando suas economias tradicionais,instaurando-se um processo de empobreci-mento, que segue até os nossos dias. Frentea essa realidade Carvalho (1981, p. 7) afir-ma que

o índio se vê compelido a participarcomo assalariado no âmbito ocupacional dosistema envolvente, em qualquer situação on-de seja possível. Os efeitos dessa participaçãose refletem internamente, desarticulando aeconomia cooperativa familiar, individuali-zando a força de trabalho, tornando a comu-nidade indígena mais vulnerável à penetra-ção das instituições do sistema dominante.

Essa situação é constatada em todo opaís, onde as bases da economia indígenaforam profundamente alteradas e essas al-terações se devem à perda de territórios e,acima de tudo, à destruição dos recursosnaturais.

Entretanto, tendo por referência a si-tuação dos territórios e das riquezas natu-rais, entende-se que existe para os povosindígenas no Brasil, fundamentalmente, trêsalternativas para suprir as necessidades bá-sicas de subsistência de acordo com sua si-tuação particular: onde ainda existe algumtipo de recurso natural, como madeira ouminério, este segue sendo explorado na maiorparte dos casos em detrimento do meio am-biente e dos próprios povos indígenas. É oque verificá-se na Amazônia, Rondônia eoutras regiões. São raros os casos onde ospróprios índios conseguem realizar a explo-ração dos recursos naturais em proveito desuas comunidades; onde apenas restou a ter-ra, esta é arrendada a terceiros, esse arren-damento, embora proibido por lei, segueviabilizado por envolvimento de determina-das lideranças indígenas com os interesses

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financeiros para explorar a terra por contaprópria nas condições impostas pela econo-mia regional (agricultura mecanizada). Ve-rifica-se isso nas áreas indígenas da regiãosul e em algumas reservas de Mato Grossodo Sul; onde nem mais a terra restou, o úni-co bem para ser vendido no “mercado” re-gional é sua mão-de-obra, aí a alternativa éo assalariamento compulsório.

Desta forma, as populações indígenas,no que se refere à subsistência, estão cadavez mais “próximas” e dependentes do mer-cado, que vai entrando de forma mais pro-funda no meio das mesmas, buscando ex-poliar o que sobrou dos recursos naturais e,na ausência destes, a mão-de-obra indígena.

Nesse contexto, Carvalho (1981, p. 8)aponta que “os grupos indígenas se caracteri-zam como elos finais dos dois modos de explo-ração que balizam o capitalismo: um se caracte-riza pela exploração mais direta realizada sobreos operários e outra pela exploração indiretaexercida sobre a forma tradicional agrícola”.Segundo o autor, esses modos de explora-ção encontram-se inteiramente combinadose subordinados ao movimento do capital.Diante disso, o perfil do mundo indígenaintegrado só poderá ser pensado como fa-zendo parte da chamada “questão agrária”,e das modalidades gerais de extração dosobretrabalho. Mas, se a exploração históri-ca dos recursos naturais localizados em seusterritórios não se traduziu em produção deoutros bens e, se os recursos advindos davenda da mão-de-obra não têm se traduzi-do em melhorias nas condições de vida, têm-se como consequência o crescimento dafome e da miserabilidade. Nesse cenáriodepauperado, parece irreal que se possa su-por a existência de uma etnicidade capaz deexpressar e superar as contradições que aco-metem as sociedades indígenas.

Porém, mais recentemente, com ocrescente acento no direito dos povos indí-genas a continuarem sendo o que são(explicitados pela Constituição de 1988), ouseja, a luta pela afirmação enquanto povosetnicamente diferenciados, emerge com maisforça a preocupação com as possibilidadeseconômicas dessas comunidades, pois é ilu-sório falar em respeito à diversidade cultu-ral e autonomia num contexto de total de-pendência econômica e ausência de recur-

sos para a sobrevivência. Inclusive a própriareconquista da terra, embora elemento in-dispensável, não basta, atualmente, paragarantir a subsistência de grande parte dospovos indígenas do país.

3 Implantação e fracasso dos projetos dedesenvolvimento em comunidadesindígenas

A partir da década de 70 surge umasérie de projetos econômicos destinados acomunidades indígenas e a literatura exis-tente aponta que “principalmente entre 1975e 1977, nas mais variadas formas, se imaginamou se implantam efetivamente pequenos progra-mas de desenvolvimento econômico” (LAFER,1981, p. 19), Esses projetos3 estão ligados se-gundo a autora a antropólogos, alguns agin-do quase que isoladamente, dispondo depoucos recursos, outros associados a entida-des, oriundos da atuação da Igreja, não sen-do citados no texto os projetos da FUNAI.Para Lafer, a idéia central dos projetos é ade autonomia indígena como melhor formade promover os interesses indígenas, emcontraposição à política protecionista ofici-al, sendo uma das características comuns dosmesmos o pressuposto implícito de que ummínimo de bem-estar material é necessáriopara que a autonomia política e a auto-va-lorização tribal possam emergir.

No entanto, após análise, percebe-seque os projetos distinguem-se muito entre si,devido as diferentes condições sócio-econô-micas das várias áreas. Muitas das terras sãode má qualidade exigindo investimento con-siderável para se tornarem produtivas. Naprodução comercial, têm que competir emtermos de custos com os empreendimentosregionais e, ainda, devem prover empregos atodos na comunidade. Pergunta-se então quepossibilidades de sucesso têm esses projetos?

Brand (1999, p. 8) ao analisar a ques-tão afirma que

Há um consenso entre os estudiosos envolvidosna problemática sobre o fracasso de projetoseconômicos junto aos povos indígenas fundadosna nossa racionalidade capitalista e ocidentalapontando como uma das razões principais dofracasso o fato dos indígenas ignorarem que,ao mesmo tempo em que as bases tradicionaisde suas economias vão sendo totalmentesolapadas, os povos indígenas seguem seorientando a partir de sua lógica específica.

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O autor esclarece que se percebe umclaro descompasso entre as bases concretasde economia, rápida e profundamente alte-radas e o modo de pensar dos mesmos po-vos, configurando-se aí, uma questão impor-tante para o pesquisador, ou seja, o ritmodas transformações do mundo dos valores eda cosmovisão não é o mesmo das transfor-mações impostas pela nossa sociedade aoterritório e ao entorno.

Brand (1999) ainda chama a atençãopara o fato de não se considerar as caracte-rísticas culturais de cada povo e a forma tra-dicional de organizar sua economia, mas sim,a preocupação apenas com o aspecto da pro-dução, já que o sistema econômico inclui adistribuição e o consumo da mesma produ-ção. Alerta também para a transferência dedeterminadas características de um grupopara outro, generalizando aspectos nãogeneralizáveis, ou transferindo para os ín-dios, desejos e aspirações dos agentes não-índios, partindo da falsa suposição de queos índios são, fundamentalmente, iguais.

Nessa mesma ótica, Bremen (1987, p.16), denuncia a tendência dos agentes pro-motores de projetos de desenvolvimento, deconsiderar as comunidades indígenas como“inseridas na mesma problemática da socieda-de envolvente. São pobres e logo inserem-se noamplo leque da marginalização social, sinalizan-do para a complexa e importante relação entreetnia e classe na América Latina”.

A título de exemplo, toma-se a ques-tão da dimensão comunitária das iniciativaseconômicas. Parte-se do princípio de que ospovos indígenas, por terem sido ou seremsociedades igualitárias e por conhecer, tal-vez superficialmente, alguns esquemas deacesso e redistribuição dos bens entre umpovo e outro, todos os projetos de desenvol-vimento têm de ser coletivos, sem a percep-ção de que cada povo tem esquemas especí-ficos que orientam a redistribuição dos benseconômicos e que esses esquemas são sus-tentados por valores/lógicas que os lubricame mantém. Entre os Guarani/Kaiowá, a tro-ca e redistribuição da produção acontecematé hoje entre membros de uma mesma fa-mília extensa, que é a unidade básica em tor-no da qual, historicamente, se articulava eainda se articula a economia e a religião. Nãoé, portanto, atribuição dos capitães redis-

tribuir colheitas e ou outros donativos(BRAND, 1999).

Complementando, Bremen (1987) cha-ma a atenção para o fato de no planejamen-to os projetos se restringirem à análise defatores tais como condições ecológicas, infra-estrutura, mercados, etc... importantes parao desenvolvimento segundo a concepçãoocidental sem levar em conta as característi-cas da economia indígena. Este autor desta-ca que a totalidade dos projetos se propõe,como primeira medida, criar uma base eco-nômico-produtiva própria, o que já indica-ria claramente não se tratar de iniciativa in-dígena. Dentro dessa lógica, deve-se criaruma produção agrícola para o auto-consu-mo e segundo o autor, isto nunca foi um pro-blema para os indígenas.

O autor ainda questiona a validade deafirmações constantes em muitos projetossobre a participação dos indígenas na suaelaboração. Ao analisar os argumentos in-dígenas para a concordância das propostasem questão, percebe-se que estes coincidemexatamente com o dos promotores e ao ana-lisar a concordância das comunidades indí-genas com as propostas formuladas poragentes externos, o autor alerta para o fatode essa concordância ocorrer não pelas ra-zões que motivam o projeto, mas porqueentendem que, ao subordinarem-se às estra-tégias propostas, conseguem, desta forma,satisfazer suas necessidades imediatas. Ocor-re, neste sentido, uma reinterpretação dosobjetivos do projeto, a partir de seus critéri-os próprios e tradicionais, ou um esforço desubordinar os aportes externos às suas ne-cessidades e estratégias internas (1987).

Bremen (1987, p. 86) ainda aponta quese a equipe técnica não tiver clareza sobreessa estratégia indígena, estarão frustados osobjetivos do projeto e este se torna um “bar-ril sem fundo” na satisfação das necessida-des imediatas de coleta dos indígenas. Nestesentido, os projetos, os órgãos oficiais e ONGsconstituem-se hoje um “novo e amplo meioambiente” para a coleta e satisfação de suasnecessidades básicas (1987, p. 89).

O autor ainda destaca o fato de quemuitos projetos, ao procurarem soluções deproblemas de curto prazo, acabam criandoou agravando problemas estruturais no sen-tido de provocarem maior dependência e, se

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provocam dependência, não levam a um de-senvolvimento pois segundo Martin (1999,p. 3), o desenvolvimento deve-se medir nãoem termos de “aumento de capital, sino enfuncion de la medida en que reduce la depen-dencia de las comunidades locales...”

Portanto, na tentativa de entender acausa do insucesso dos projetos, Bremen(1987, p. 66) conclui que culpá-se os indíge-nas pelos fracassos afirmando “serem inca-pazes de cumprir com o previsto para eles du-rante o planejamento dos projetos” ou que eles“se mostrariam, mais incapazes do que se su-punha”.

Já Brand (1999, p. 9) afirma que “aten-tos, muitas vezes, apenas as condições objetivasda economia a partir de nossos referenciais, cons-tatamos, facilmente a sua invibialização e parti-mos para nossas soluções fundamentadas emoutra lógica econômica”.

Lafer (1981), levanta algumas questõesimportantes: aponta em primeiro lugar anecessidade de um investimento considerá-vel para tornar mais produtivas as terrasindígenas; a administração descentralizadaque se busca coloca o problema da eficiên-cia pois os índios ainda são administradorespouco hábeis no que tange a comercializaçãoe financiamento da produção; a limitação demovimentos locais pelas condições sociais emque surgem na luta pela terra e pelos seusdireitos; enfim, as imposições do sistema só-cio-econômico que reprimem à atuação dosprojetos por ameaçarem a estrutura de po-der dos órgãos oficiais.

Finalizando sua análise, a autora afir-ma que:

As organizações e a defesa da liberdade degrupos étnicos ou regionais só são possíveis searticuladas com uma democracia para o paíscomo um todo, o que exige uma transformaçãoeconômica grande e, para isso, uma organizaçãocapaz de traduzir com eficácia as reivindicaçõesplurais de todos, suficientemente forte eestruturada para poder opor-se ao podereconômico e ao autoritarismo da sociedadebrasileira (1981, p. 35).

4 O território como base para odesenvolvimento em populaçõesindígenas

Dentre a literatura que aborda a rela-ção e significado de território encontra-seMesquita (1995, p. 83) que afirma “território

é o que é próximo, é o mais próximo de nós; é oque nos liga ao mundo”. Para a autora, o cri-tério de proximidade não tem a ver com di-mensões, mas com significado individual esocial onde a territorialidade seria exatamen-te a “projeção de nossa identidade sobre o terri-tório”. Esta concepção de território não podeser tomada como algo estático, mas comouma permanente recriação, um permanen-te devir, assim como a identidade. A autorafala em “consciência territorial como consciên-cia do lugar, do locus da sociabilidade mais pró-xima vivida no cotidiano” (1995, p. 89).

Nessa abordagem, o conceito de terri-tório emerge com mais clareza na ótica daspopulações indígenas. Esta questão tem sidoenfocada também pela antropologia no con-texto da discussão da garantia das terrasindígenas. Segundo Oliveira Filho (1999) anoção de território indígena com a qual tra-balha-se atualmente é uma elaboração dosbrancos e encontra-se historicamente data-da. Teria sua origem na década de 50, du-rante os debates relativos à criação do Par-que Indígena do Xingu. Relata ainda o au-tor que a proposta final apresentada pelo SPI(órgão indigenista posteriormente denomi-nado de FUNAI) incorporava argumentos esugestões de diversos antropólogos, comoDarcy Ribeiro e Roberto Cardoso de Olivei-ra. Nela se tomava como dever do Estado efinalidade explícita de uma política públicaa preservação das culturas indígenasestabelecidas há mais de um século na re-gião dos formadores do Rio Xingu, manten-do uma relação simbiótica com aquele nichoecológico, sem permitir a fixação de colonosbrancos na região, mas desenvolvendo me-canismos estáveis de convivência intertribal.Pela primeira vez, propunha-se a destinaçãoaos índios de uma parcela bastante extensado território nacional, e o argumento utili-zado para justificar os limites geográficosestabelecidos era de que os recursos natu-rais ali existentes seriam os necessários e su-ficientes para garantir aos índios a plena re-produção de sua cultura e modo de vida.

O autor ainda informa que foi estepadrão de definição de terra indígena queconstou da Emenda Constitucional de 1969e na Constituição de 1988, fundamentandoainda os critérios que subsidiam os atuaisprocessos de reconhecimento de áreas indí-

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genas. Emergia, pela primeira vez, a preo-cupação com recursos naturais necessáriose suficientes para garantir aos índios a ple-na reprodução de sua cultura e do seu modode vida, pois somente as áreas que foramobjeto de ação demarcatória pela FUNAI,na década de 70, tiveram maiores dimen-sões. Os critérios anteriormente utilizadospara definir a demarcação de terras indica-vam a necessidade de oferecer assistência eproteção aos índios.

Nesse contexto, o SPI, imbuído de umaperspectiva evolucionista e contribuindopara a regularização do mercado de terrasnas regiões de fronteira por meio de sua açãopacificadora, não costumava verbalizar aintenção de preservação cultural, nem esta-belecia uma conexão necessária entre umacultura indígena e um dado meio ambiente.As terras que eram atribuídas pelo SPI apopulações indígenas que foram objeto deum processo de pacificação, e conseqüentesedentarização e tutela, eram muito meno-res do que a região onde aquelas populaçõesconstruíam seus aldeamentos e transitavamcom certa regularidade.

Segundo Oliveira Filho, os critérios nãoexplicitados pelo SPI para definir as terrasdos índios passavam, portanto, por sua fun-ção de mediador nas situações sociais deexpansão da fronteira econômica. O objeti-vo fundamental era estabelecer um controlesobre as relações entre índios e brancos, evi-tando o conflito e prevenindo suas conseqü-ências maléficas para os índios (extermínio,correrias, escravizamento, etc.). Portanto, aterra reservada aos índios deveria servir aesse propósito: a) permitindo distanciá-losdos brancos; b) não sendo foco de interesseeconômico maior pela frente colonizadora;c) sendo aceita pelos índios (1999, p. 110).Nessa situação, constata-se então, que a re-lação entre índios e território não era trazidaà discussão.

Este fato confirma-se quando o autorafirma que embora atender a essas situaçõesfosse justamente a razão de existência do SPI,o órgão indigenista também atuou algumasvezes junto a populações indígenas com altograu de contato e de integração com a soci-edade nacional. Nessas situações, a interven-ção oficial visava reparar processos extrema-dos de pobreza, dependência e degradação

social (alcoolismo, prostituição, crimina-lidade), através da obtenção e do encami-nhamento de um grupo de famílias indíge-nas para uma gleba que lhes viesse a permi-tir atividades de subsistência. Quando osindigenistas do SPI manifestavam algumapreocupação quanto a uma possível unida-de das famílias beneficiadas por sua atua-ção, o fator básico era garantir a sua condi-ção de indígena e não levar em conta umapossível diversidade a sua composição étni-ca. Na visão assistencialista do SPI, a rela-ção entre índios e terra era instaurada peloreconhecimento ou concessão de uma deter-minada gleba, não sendo considerados de-mandas específicas quanto a outros espaçosgeográficos.

Para consolidar sua análise, o autortraz exemplos como o caso dos CAMBIUA,sua forte relação com a Serra Negra, e emtempos mais remotos, com séculos de dife-rença, a população indígena da região Nor-deste, uma das áreas mais importantes eantigas da colonização brasileira, que sofreuum profundo e persistente impacto econô-mico e sociocultural por parte dos empreen-dimentos econômicos e religiosos queviabilizaram a ocupação dos sertões e a ex-pansão territorial dos domínios portugueses.Portanto, para as etnias que sobreviveramsó restaram dois caminhos: ou buscaramtemporariamente áreas de refúgio, algumasvezes coexistindo com quilombos e sertane-jos, até que viessem a ser incomodadas pornovas pretensões territoriais das fazendas edos agregados urbanos, ou foram logo in-corporadas pelo processo civilizatório, ouseja, reunidas, reterritorializadas e discipli-nadas pelas missões religiosas, ou então co-lhidas na sua capilaridade isto é, fragmen-tadas em famílias e coletividades acabocladasou destribalizadas.

Frente a tal contexto histórico OliveiraFilho afirma que:

Não há como falar em território indígena nosentido atual e que os próprios índioscontemporaneamente reivindicam. A missão,a fazenda ou as povoações de cablocos podemno máximo constituir indícios históricos dapresença de índios naquele local, mas nãoconfiguram, de forma alguma, uma situação deposse exclusiva pelos índios de um dadoterritório ( 1999, p. 111).A Constituição Brasileira de 1988 res-

peita os direitos territoriais indígenas a par-

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tir de sua alteridade, enquanto grupos cul-turalmente diferenciados. Os fatores que umgrupo étnico considera como básicos e ne-cessários para integrar o seu território de-correm de coordenadas culturais particula-res, provenientes de seu sistema econômico,da sua forma de parentesco e organizaçãosocial, de sua vida cerimonial e religiosa. Oargumento em relação a uma área jamaispoderá ser discutido em termos quantitati-vos como uma relação índio/hectare ou fa-mília/hectare.

Desta forma, é evidente que em primei-ro lugar deve se reconhecer que índio e terrasão indissociáveis, só pode existir o índio (in-divíduo) quando estiver preservada a sua co-letividade (etnia) e esta conseguir manter umterritório próximo (OLIVEIRA FILHO, 1987).

A lei magna definiu que não existe in-compatibilidade entre a garantia dos direi-tos indígenas e a defesa da soberania e odesenvolvimento nacional e estabelece comclareza os instrumentos desta compatibi-lização dando um tratamento exaustivo aosdireitos indígenas, conferindo-lhes um iné-dito status constitucional. Pela primeira vezreconhece aos índios o seu direito à diferen-ça, rompendo com a tradição assimilacio-nista que prevalecia nas Constituições ante-riores. Institue a União como instância pri-vilegiada nas relações entre os índios e a so-ciedade nacional, ampliando enormementeas competências dos poderes legislativo ejudiciário quanto aos direitos indígenas.

Considera-se fundamental o reconhe-cimento constitucional das organizações in-dígenas que, nos termos do artigo 232, sãopartes legítimas para ingressar em juízo emdefesa dos direitos e interesses dos índios. Essaconquista estimula o surgimento e o cresci-mento das organizações locais e regionais efacilita o acesso dos índios às instânciasdecisórias do processo institucional. Nessemesmo sentido, a Constituição estabelece re-lações diretas entre os índios e o CongressoNacional e deles com o Ministério Público.Portanto, os povos indígenas adquiriram con-dições de interlocução direta junto aos pode-res da República, direito que deve ser agoraassegurado politicamente (SANTILLI, 1992).

Há um aspecto importante a se consi-derar na questão indígena atual, de um lado,assegurar de fato aos índios o usufruto ex-

clusivo das riquezas existentes em seus ter-ritórios, promovendo, além das atividadessubsistência tradicionais, novas atividadeseconômicas em bases condizentes com a pro-teção ambiental. E, por outro lado, protegeros territórios indígenas, de acordo com a lei,seja dos danos causados por grandes proje-tos desenvolvimentistas, seja das invasõescada vez mais agressivas por parte de ga-rimpeiros, de madereiras, especialmente naAmazônia. Constata-se hoje, que o grau eas formas de intrusamento das reservas in-dígenas é assustador, muito mais do que asterras indígenas, os interesses estão voltadospara os recursos de grande valor econômicoexistentes em suas terras.

Esses invasores desenvolvem as suasatividades na total ilegalidade, causandodanos irreparáveis ao meio ambiente e àscomunidades indígenas, totalmente indefe-sas frente a estas investidas predatórias. Emmuitas regiões do Brasil, principalmente naAmazônia e região Centro-Oeste as relaçõesinterétnicas vem se caracterizando por umaumento de conflitos e violência. Uma reali-dade não muito diferente daquela vivida pormuitos camponeses e segmentos marginali-zados nos grandes centros urbanos.

Nesse cenário, fica evidente que ape-nas demarcar as terras indígenas não é osuficiente. Uma vez concluída a demarca-ção, e mesmo antes, já que o direito dos ín-dios às suas terras independe da demarca-ção física, devem ser acolhidos projetos in-dígenas de manejo, controle e vigilância desuas terras, a longo prazo, com linhas espe-cíficas de apoio técnico e financeiro da par-te de órgãos públicos e privados. Devem serpromovidas práticas atualizadas para a ga-rantia das terras e o seu aproveitamentoadequado visando o desenvolvimento dascomunidades como um todo. Nessa perspec-tiva, Vidal (2001, p. 203) alerta e ressalta que“na maioria dos casos, os invasores conseguemcooptar algumas lideranças, especialmente osmais jovens, que se associam às atividades alta-mente predatórias, assinando contratos, em ba-ses absurdas em nome da comunidade”. Entre-tanto, é bom lembrar que alguns grupos,após amargas experiências, estão tratandode reverter esta situação inclusive entrandocom processos até na justiça e, por outro lado,não se pode esquecer que as pressões destes

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grupos de interesse não vão diminuir tãocedo (VIDAL, 2001).

Nesse panorama, constata-se que nasregiões de colonização mais antigas, as estra-tégias de sobrevivência para os índios têmsido sempre problemáticas. Até certo pontoo processo já é irreversível. Resgatar o sistematradicional de manejo de recursos naturaisé praticamente impossível. As soluções parao futuro deverão ser construídas em novasbases, mas que, se bem orientadas, poderãoresultar em experiências interessantes.

Para Oliveira Filho (1999) as terras in-dígenas devem ser pensadas como algoparticular frente a outras figuras fundiárias,pois resultam de uma complexa confluênciaentre uma cultura, um dado meio ambientee uma política governamental. Portanto, àsconexões entre a política indigenista e a pre-servação da diversidade cultural, são bemconhecidas e fazem parte do imaginário po-lítico nacional. Mas as conexões entre as cul-turas indígenas e os nichos ambientais emque se inserem são pouco conhecidas doponto de vista científico, tanto quanto sãosubestimadas do ponto de vista administra-tivo as interligações entre política indigenistae ambiental.

O autor ainda afirma que é um equí-voco pensar as terras indígenas de formacaricatural e preconceituosa, ou estimuladapelo romantismo ingênuo como terra queestão subtraídas ao desenvolvimento. Ressal-ta que as:

Terras indígenas são bens da União e os recursosambientais ali existentes são parte integrantedo território nacional, mas por constituíremhabitat de índios, a utilização de tais terras estádestinada prioritariamente à reproduçãosociocultural dessas populações, devendoportanto adequar-se aos seus usos e costumes ereverter-se necessariamente em benefício paraos seus moradores tradicionais (1999, p. 162).A legislação indigenista bem como o

próprio interesse dos índios, não prescreveque as terras indígenas estejam fora do sis-tema econômico nacional, ou sejam seu aves-so. O que ocorre é que o Estado, representa-do pelo órgão indigenista, não tem conheci-mento nem da especificidade das culturasnem da heterogeneidade do meio ambiente,quanto mais da relação concretamenteestabelecida entre ambas. Em sua análise,fazendo referência aos projetos econômicosda FUNAI, Oliveira Filho critica a posição

do órgão indigenista que em vez de levantaralternativas novas e explorar as potencia-lidades daquilo que chama de “encontro”,ou seja, os conhecimentos acumulados so-bre a natureza e as formas de manejo utili-zadas pelos índios, articulando-os com for-mas racionais de exploração dos recursosambientais e uso de tecnologia de ponta ,acaba por cingir-se à mera presença prote-tora, em alguns casos agindo repressivamen-te e em outros, por iniciativas clientelísticase paternalistas (1999).

Portanto, o destino das terras indíge-nas vai depender muito da capacidade deluta por parte dos índios, exercendo, cadavez mais, os seus direitos de cidadania e as-sumindo novas responsabilidades. Por par-te da sociedade brasileira não-índia vai de-pender de sua vontade em progredir, pre-servando o seu patrimônio ambiental e cul-tural e respeitando a diversidade cultural eambiental dos povos indígenas, “uma verda-deira comunidade inter-cultural, livre edemocrática”(VIDAL, 2001, p. 204).

5 É possível desenvolver programas dedesenvolvimento local em populaçõesindígenas? Sim, mas ...

A enorme saga das reivindicações deautonomia indígena já vem repercutindo háalgum tempo no discurso oficial a respeitodas relações entre índios e Estados nacionais.No Brasil, é este contexto discursivo eperformático que melhor evidencia aambiguidade da noção de desenvolvimen-to. Neste aspecto Gallois (1996, p. 167) apon-ta que

a tentativa de transmutação étnica da noção dedesenvolvimento pelas agências oficiais tendea relegar os índios a um estado natural ouaistórico. Sua apropriação ambígua emprogramas de fomento, sejam eles oficiais ounão, tende a negar a capacidade dos índios de seposicionar frente às sucessivas mudanças quealteram profundamente suas condições de vidae suas expectativas de futuro.Para a autora os mais diversos elemen-

tos do desenvolvimento cultural, social, eco-nômico e político reivindicados pelos povosindígenas atestam que, em sua perspectiva,tolerância é antes de tudo uma demanda deigualdade nas condições de acesso ao desen-volvimento com o qual eles foram levados aconviver por imposição dos Estados nações

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em que foram englobados há séculos. For-mas de desenvolvimento que representampara eles, uma longa história de perdas e queeles pretendem apreender, agora, como umarelação que pode ser transformada a favorde seus interesses. Nesse sentido, acessoigualitário ao desenvolvimento refere-se tan-to à melhoria nas condições de vida alcan-çadas ou almejadas pelo restante da popula-ção nacional, quanto a uma posição diantedo sistema de valores que tal desenvolvimen-to representa para a sociedade mais ampla.

A posição dos povos indígenas frenteao desenvolvimento em suas vertentes tra-dicional ou sustentável, é sempre, antes detudo, produto de uma demanda de autono-mia. A essa demanda, o Estado costuma res-ponder com expressões moderadas, formu-ladas em termos de “proteção” e impondolimites a “participação” dos índios na ges-tão de seu próprio desenvolvimento, comcondições que não atendem às reivindicaçõesde soberania reclamadas pelos representan-tes indígenas.

Nos últimos vinte anos, o discurso dosplanejadores governamentais se tornou mui-to mais intolerante pois consideram que ospróprios índios estão na origem dos proble-mas ambientais (GALLOIS, 1996). O difícildiálogo entre índios e as instituições tutoras(no âmbito civil e ambiental) sobre alternati-vas de desenvolvimento, quando baseadonuma visão restrita que obriga os índios aserem conservadores do seu ambiente, tempropiciado que, na prática, por decorrênciada sedentarização e da miséria, eles se tor-nem destruidores desse ambiente.

Sem dúvida, as sociedades indígenassão sociedades que viveram e desejam con-tinuar vivendo sua autonomia em formasustentável. Gallois considera que “essa op-ção não será viável se as instituições se limita-rem a formatar seletivamente o conhecimentoantropológico para reduzir, como forma corretade desenvolvimento para os índios, apenas aque-les programas caracterizados por atividades,saberes e produtos considerados tradicio-nais”(1996, p. 182).

Para ilustrar sua afirmativa, a autorausou como exemplo a venda de artesanato,onde a comercialização leva muitas comu-nidades a uma forma predatória de coleta.Ressalta ainda que a supervalorização das

formas de manejo dos recursos ditos “tradi-cionais” que delimita um conjunto muitorestrito de desenvolvimento indígena, repre-senta uma “armadilha e uma nova forma deintolerância. Tal discriminação seletiva de pro-jetos de fomento e alternativas econômicas emáreas indígenas, operadas por agências gover-namentais ou não governamentais, carece defundamentação antropológica e tende a se apoi-ar apenas em estereótipos sobre a relação entreesses povos e a natureza”.( 1996, p. 183).

Sabe-se que as soluções não são fáceis.Nem mesmo os próprios povos indígenasparecem ter clareza sobre elas. Trata-se deuma realidade nova para a qual talvez nãosejam mais suficientes os conhecimentos tra-dicionais pois o contexto mudou. As basesda economia indígena foram profundamen-te alteradas e com isso questionados seusesquemas de distribuição e consumo. Hoje énecessário pensar em excedente para a ven-da, pois há significativa parcela de produ-tos que têm que ser comprados.

Nesse aspecto, Bremen (1987, p. 94)aponta que as “sociedades indígenas têm de-monstrado historicamente uma enorme capaci-dade de viver em condições transformadas”. Oimportante é acreditar em sua capacidade eque são capazes de funcionar por si, destaforma o processo de desenvolvimento é pos-sível se “ambas as partes são consideradas comosujeitos” (1987, p. 95).

Brand (1999) ao proceder uma análisedessa questão aponta que nos diversos en-contros realizados em torno da construçãode alternativas econômicas no interior dascomunidades indígenas estão presentes al-gumas questões comuns. Por exemplo: no“Encontro sobre agricultura indígena no Sul”,realizado em agosto de 1988, em Curitiba,emergem aspectos metodológicos a seremconsiderados para conhecer a economia in-dígena e sua relação com a sociedade nacio-nal e formas de intervenção viáveis. Ressal-ta a prestação de assessoria capacitada, emvista da continuidade do modo de vida in-dígena, o que “implica em fortalecer seu siste-ma econômico...”(1999, p. 11).

Em seqüência, destaca que para queessa assessoria seja possível é necessário co-nhecer: o sistema econômico indígena comoum todo, não se restringindo às formas deprodução (inclui organização social e, em

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especial, o sistema de distribuição e valores);a visão indígena sobre sua situação econô-mica e articulação com a sociedade regio-nal, ou ainda, a leitura indígena sobre suaspossibilidades econômicas no contexto daeconomia regional; segmentos sociais, forçaspolíticas e agentes econômicos regionais esua articulação com as mesmas comunida-des indígenas; espaços na economia regio-nal para a produção e a força do trabalhoindígena e o nível de “determinação do sis-tema capitalista “ sobre a economia regionale a indígena, ou seja, quais os interesses doentorno regional sobre essas comunidades.

Para que se produza esse conhecimen-to, é proposto uma ação indigenista locali-zada, inserida na realidade concreta de cadapovo. Ao avaliar o encontro, Brand (1999,p. 11) faz críticas aos questionários como ins-trumento de levantamento de dados, cons-tando que estes muitas vezes “dizem mais so-bre quem os elabora do que sobre o objeto deestudo” ficando como sugestão a propostade trabalhar com roteiro de entrevistas, oque permitiria dados mais qualitativos.

No entanto, num encontro realizadoem Brasília, em 1989, reunindo indigenistase representantes indígenas discutindo a pro-blemática de projetos de desenvolvimento,os participantes, em resposta à pergunta so-bre o que as organizações indígenas e osagentes externos devem atender ou prestaratenção quando do encaminhamento deprojetos de produção no interior das comu-nidades indígenas, emergiu o seguinte: o gru-po de representantes indígenas acentuou aimportância da assessoria, especialmente emvista da capacitação das próprias comuni-dades indígenas para que elas mesmas pos-sam administrar os projetos; os não índiosinsistiram que antes de pensar em um proje-to, é preciso conhecer o sistema de produ-ção e trabalho que o grupo domina; incenti-var a troca de experiência entre os represen-tantes indígenas em torno de novas alterna-tivas econômicas para que possam “apren-der” uns dos outro, diretamente.

Em outro encontro sobre a mesmatemática, realizado em Cuibá/MT, a conclu-são dos participantes girou em torno daunião do conhecimento científico indígenaao conhecimento científico ocidental no di-agnóstico das práticas existentes e potenci-

ais de inovação”. Falam em “diagnósticosparticipativos multi-disciplinares” para ava-liar a situação atual e os potenciais existentes.

O autor ainda ressalta que é funda-mental atentar que determinados sinais, ges-tos, reações e palavras das sociedades indí-genas, hoje muitas vezes, na aparência,iguais aos dos regionais, vêm orientados poroutra lógica, que necessita ser desvendada,previamente, pelo interlocutor, para podercompreender o significado da mesma. Acres-centa ainda que, falas ou escritos só podemser interpretados se situados dentro do con-texto em que foram produzidos.

Mas, esse contexto de produção nãovem, em muitos casos, explícito. Paradesvendá-lo Brand (1999) considera três as-pectos importantes: a cultura que fornece o“idioma geral” dentro do qual a fala tem deser situada representando o horizonte depossibilidades; o contexto regional e a rela-ção do indivíduo e do povo com esse con-texto, que o desafia constantemente a bus-car novas estratégias de enfrentamento. Eessas estratégias são formuladas, tendo porreferência a sua cultura e o domínio que oíndio tem do contexto que o envolve e desuas possibilidades dentro desse contexto; olugar social de quem fala e do destinatárioda mesma fala, os interesse de ambos e a re-lação entre os dois.

Brand acredita que a razão principaldo fracasso da maioria dos projetos comu-nitários de desenvolvimento parece estar nofato de os mesmos ignorarem que os povosindígenas estão situados em outra cultura eafirma “sob o argumento de que a situação hojeé outra, continuamos jogando no lixo, comoimprestável, o conhecimento tradicional e pró-prio de cada povo [...] fazemos isso sem antesconhecer sua cosmovisão [...] certamente aindatemos muito a aprender com eles” (1999, p. 13).

Soluções para o impasse só poderão serencontradas através de uma busca conjun-ta, ou, através do diálogo entre as duasracionalidades. Essa busca deve abrangertodos os momentos e passos, desde o diag-nóstico até a caracterização da iniciativa.Acredita-se que a construção de alternati-vas viáveis hoje passa por uma relação deparceria entre os dois conhecimentos, lem-brando sempre que cabe a eles a palavradecisiva, como exigência da afirmação do

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protagonismo indígena, condição necessáriapara o desenvolvimento em escala humana.

Bremen (1987, p. 93) destaca tambéma importância dos técnicos e agentes exter-nos “entrar em um processo de conhecimentobaseado num verdadeiro diálogo”. Esse diálo-go ou parceria para a construção conjuntade alternativas vai muito além do forneci-mento de recursos ou de assessorias locali-zadas e tem como pré-requisitos indispen-sáveis, da parte dos técnicos, um conheci-mento cada vez mais aprofundado da eco-nomia das sociedades com as quais traba-lham e sua lógica interna e da parte das co-munidades indígenas, conhecimento cadavez mais completo sobre a lógica e funcio-namento de nossa economia.

Essa parceria na construção de alter-nativas de desenvolvimento em escala hu-mana implica em estudos sobre a incorpo-ração da experiência histórica já acumula-da por eles, e das mudanças verificadas atra-vés dos longos anos de contato com a nossasociedade, das experiências novas pelasquais passaram, fracassadas ou não, e queleitura a comunidade faz dessas experiênci-as e como as interpreta pois segundo Vinuesa(1999, p. 636)

todas las comunidades disponen de un conjuntode recursos (económicos, hunanos, ambientales,institucionales, culturales, tec.) que constituyensu potencial de desarrollo. El reto estáenencontrar, según el momento histórico, nuevasideas y proyectos que permitan movilizarlospara afrontar los problemas planteados. Lacapacidad para liderar las propias estrategiasde desarrollo territorial, unido a la movilizaciónde los recursos disponibles, conduce aldesarrollo territorial, entendido como unproceso de crecimientoeconómico y de cambioestructural, que propicia la mejora del nivel devida de la sociedad. En este proceso seidentifican, al menos, cuatro dimensiones: laeconómica, la sociocultural, la político-administrativa y la territorial.Nesta perspectiva, pode-se falar de

etnodesenvolvimento, termo já utilizadoanteriormente, mas que cabe neste momen-to dar uma palavra a mais sobre a qualifi-cação “etno” dada ao termo desenvolvimen-to. Segundo Stavenhagen, propositor do con-ceito, etnodesenvolvimento seria o desenvol-vimento que mantém o diferencialsociocultural de uma sociedade, ou seja, suaetnicidade. Na definição do autor, “oetnodesenvolvimento significa que uma etnia,

autóctone, tribal ou outra, detém o controle so-bre suas próprias terras, seus recursos, sua or-ganização social e sua cultura e é livre paranegociar com o Estado o estabelecimento derelações segundo seus interesses” (1984, p. 57).Outra referência na formulação do conceitode etnodesenvolvimento na América Latinaé Batalla apud Verdum (2002, p. 88) que as-sim o definiu

é o exercício da capacidade social dos povosindígenas para construir seu futuro,aproveitando suas experiências históricas e osrecursos reais e potenciais de sua cultura, deacordo com projetos definidos segundo seuspróprios valores e aspirações. Isto é, acapacidade autônoma de uma sociedadeculturalmente diferenciada para guiar seudesenvolvimento.Nesta concepção, o etnodesenvolvi-

mento requer que as comunidades indígenassejam efetivamente gestoras de seu própriodesenvolvimento, que busquem formar seusquadros técnicos, tais como: antropólogos,engenheiros, professores, etc, de modo a con-formar unidades político-administrativasque lhes permitam exercer autoridade sobreseus territórios e os recursos naturais nelesexistentes, de serem autônomos quanto aoseu desenvolvimento étnico e de terem a ca-pacidade de impulsioná-lo.

Em termos gerais, os princípios bási-cos para o etnodesenvolvimento seriam:objetivar a satisfação de necessidades bási-cas do maior número de pessoas em vez depriorizar o crescimento econômico; embutir-se de visão endógena, ou seja, dar respostaprioritária à resolução dos problemas e ne-cessidades locais; valorizar e utilizar conhe-cimento e tradição locais na busca da solu-ção de problemas; preocupar-se em manterrelação equilibrada com o meio ambiente;visar a auto-sustentação e a independênciade recursos técnicos e de pessoal e procedera uma ação integral de base com atividadesmais participativas (VERDUM, 2002).

Desta forma, o termo etnodesen-volvimento quando referido as sociedadesindígenas aponta os seguintes indicadores:a) aumento populacional, com segurançaalimentar plenamente atingida; b) aumentodo nível de escolaridade, na língua ou noportuguês, dos jovens aldeados; c) procurapelos bens dos “brancos” plenamente satis-feita por meio dos recursos próprios gera-dos internamente de forma não predatória,

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com relativa independência das determina-ções externas do mercado na capacitação derecursos financeiros; e) pleno domínio dasrelações com o Estado e agências do gover-no, a ponto de a sociedade indígena definiressas relações, impondo o modo como deve-rão ser estabelecidas (AZANHA 2002, p. 32).

O autor ao analisar o etnodesenvol-vimento em comunidades indígenas indicaque esses pontos podem ser tomados comograndes linhas ou metas, mas alerta que taismetas envolvem a resolução prévia das se-guintes questões: a) segurança territorial,satisfazendo plenamente as necessidades deexpansão da sociedade indígenas; b) usufru-to exclusivo dos recursos naturais; c) deman-da por produtos manufaturados e meiospara consegui-los; d) tempo empregado nageração de recursos financeiros internospara a aquisição de produtos manufatura-dos; e) escala ou nível das necessidades im-postas pelo contato e identificação de comocada sociedade indígena específica fixa essenível; e f) internalização dos recursos finan-ceiros gerados pelos canais tradicionais dedistribuição e circulação. Ao concluir,Azanha afirma que esses são os pressupostospara a execução de qualquer projeto na di-reção do etnodesenvolvimento (2002, p. 34)

Se até o início da década de 80 o Esta-do brasileiro era todo poderoso na definiçãoe implementação das políticas relacionadasa “terras indígenas” e “desenvolvimento co-munitário” como foram chamadas durantemuito tempo as ações desevolvimentistas doindigenismo oficial, tem-se assistido nos últi-mos tempos a uma flexibilização das políti-cas de desenvolvimento relacionadas aos po-vos indígenas. Tal mudança é fruto em parteda pressão do movimento indígena eindigenista e do processo mais amplo de de-mocratização verificado no Brasil desde adécada de 80. Presenciou-se ao longo dosanos 90 uma transição do modelo centraliza-do, no qual um único órgão é responsável peloconjunto da política oficial, no caso a Funda-ção Nacional do Índio (FUNAI), para umasituação na qual vários órgãos governamen-tais participam da implementação da políti-ca indigenista. Hoje têm-se o envolvimentodos setores da justiça, saúde, educação e meioambiente. São criados fóruns e conselhos, al-guns mais participativos, outros menos, en-

volvendo comunidades locais, entidades in-dígenas e ONGs. Em vários casos, essas orga-nizações de base ou assessoria passam a serproponentes e gestoras de atividades e políti-cas locais de melhoria ambiental e de saúde,de educação e capacitação e de produção egeração de renda, assumindo responsabilida-des que até então eram centralizadas naFUNAI. Ë nesse contexto que se constituemas condições para o surgimento de mecanis-mos de fomento ao desenvolvimento local,com base comunitária.

A ação de diversos atores, nacionais einternacionais, locais e globais, entidades in-dígenas, agências bilaterais e multilaterais,ONGs e agências governamentais indigenistase ambientalistas, constituem hoje o campopolítico, econômico e simbólico do novo mo-delo de desenvolvimento das sociedades in-dígenas. Segundo Verdum (2002:91) a “rou-pagem dessa nova situação sociopolíticainterétnica é tecida a partir da idéia de que asestratégias de desenvolvimento devem serestabelecidas sobre a visão dos povos indígenas,de sua seus valores, interesses e objetivos futu-ros”. Novamente se confirma que mais queimpor modelos, cabe ao Estado contribuirpara a criação de condições que tornem pos-sível a convivência e relações com o mercadoglobalizado, a superação da tutela, a geraçãode renda, enfim, o desenvolvimento a partirdos recursos materiais, humanos, os quaispassam necessariamente pela instituição es-cola ou seja, pela educação escolar que deveser um espaço de fronteira, fazendo a conexãoentre mundos, lógicas e culturas diferentes.

Notas1 Internacional Alliance, 1992, art.29, 34. In:

COLCHERST 1995, p. 502 Projeto de Lei que atualmente tramita no Congresso

Nacional e visa substituir o Estatuto do Índio aindaem vigor (Lei 6001/73), traz para si a definição dosprocedimentos administrativos que concorrem paraa demarcação das terras indígenas eliminando anecessidade de decretos presidenciais e conferindo aeles maior estabilidade.

3 A autora faz referência em seu texto há três projetos:Projeto CESIND em três áreas indígenas de São Paulo(Araribá, Icatu e Vanuire); O Projeto KAIGANG doParaná e o Projeto XOKLENG de Santa Catarina. Emsua análise informa que apenas o primeiro projetodesenvolveu uma fase experimental, os demais nãosaíram do papel.

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Educação, cultura e meio ambiente: uma aproximação das concepções indígenas apartir do movimento dos professores indígenas da Amazônia1

Education, culture and the environment: an approximation of the indigenous conceptionsbeginning with the movement of the indigenous teachers in the amazon region

Educación, cultura y medio ambiente: una aproximación de las concepciones indígenas apartirdel movimiento de los profesores indígenas de amazonia

Rosa Helena Dias da Silva*

Recebido em 28/08/04; revisado e aprovado em 21/11/04; aceito em 17/02/05.

Resumo: O presente trabalho procura, a partir da reflexão realizada pelo movimento dos professores indígenas daAmazônia, registrada nos Relatórios dos seus Encontros anuais (1988-1999), enxergar a pertinência e atualidade dopensamento indígena e as idéias e princípios centrais do Tratado de Educação Ambiental para sociedades sustentáveis eresponsabilidade global. Procura também apreender as concepções indígenas de educação, cultura e meio ambiente nasua relação com os processos de escolarização. Estes temas aparecem de forma “indireta”, por vezes intrinsicamenteacoplados às reflexões sobre a vida indígena, os projetos de futuro dos povos e o papel da educação tradicional(própria) e da educação escolar, tanto aquela que foi introduzida/imposta pelo processo colonizador como, maisrecentemente, a que tem sido pensada pelos próprios índios.Palavras-chave: etnodesenvolvimento; escola indígena; etnoeducação.Abstract: The work in hand seeks, beginning with a reflection carried out by the movement of the indigenous teachersin the Amazon region, registered in Reports of their annual Meetings (1988-1999), to see the pertinence and up-to-datedness of indigenous thought and the ideas and main principles of the Environmental education treaty for sustainablesocieties and global responsibility. It also seeks to understand the indigenous concepts of education, culture andenvironment in their relationship to the processes of formal schooling. These themes appear in “indirect” form,sometimes intrinsically connected with reflections on indigenous life, future projects of indigenous peoples and therole of traditional education (their own) and formal schooling, both that which was introduced/imposed by thecolonizing process as well as more recently, that which has been considered by the Indians themselves.Key words: ethnodevelopment; indigenous school; ethnoeducation.Resumen: El presente trabajo busca, desde la reflexión realizada por el movimiento de los profesores indígenas deAmazonia, registrada en los Informes de sus Encuentros anuales (1988-1999), ver la pertinencia y actualidad delpensamiento indígena y las ideas y principios centrales del Tratado de Educación Ambiental para sociedades sustentables yresponsabilidad global. Procura también aprender las concepciones indígenas de educación, cultura y medio ambienteen su relación con los procesos de escolarización. Estos temas aparecen de forma “indirecta “, a veces intrínsecamenteacoplados a las ponderaciones sobre la vida indígena, los proyectos de futuro de los pueblos y el papel de laeducación tradicional (propia) y de la educación escolar, tanto aquélla que fue introducida/impuesta por el procesocolonizador como, la más reciente, la que ha sido pensada por los propios indiosPalabras clave: etnodesarrollo, escuela indígena, etnoeducación.

Assim, é através da leitura e análisedos Relatórios desses Encontros que preten-demos identificar - nas falas dos professoresindígenas - as idéias mais especificamenteligadas à temática ambiental e sua relaçãocom a educação, a cultura e o processo deescolarização.

Teremos como eixo motivador da pro-blematização o Tratado de Educação Ambien-tal para sociedades sustentáveis e responsabili-dade global3 que tem como princípios básicos:

1) ter como base o pensamento crítico e inova-dor, em qualquer tempo ou lugar, em seusmodos formal, não formal e informal, promo-vendo a transformação e a construção dasociedade;2) a educação ambiental é individual e coletiva etem o propósito de formar cidadãos com cons-ciência local e planetária, que respeitem a autode-terminação dos povos e a soberania das nações;

Introdução

Dentre os inúmeros temas e problemá-ticas que emergem da discussão e das práti-cas da educação escolar indígena, escolhe-mos centrar nosso olhar nas concepções deeducação, cultura e meio-ambiente que têmsido construídas pelos professores indígenas,em especial nas reflexões explicitadas duran-te os Encontros Anuais do Movimento dosProfessores Indígenas da Amazônia2.

Ao optar por priorizar um diálogo ci-entífico com a teorização elaborada pelospróprios índios, afirmamos, com Corry(1994, p. 7), o pressuposto de que

los pueblos indigenas son sociedades viables ycontemponáneas com complejos modos de vida,así como com formas progressistas de pensa-miento que son muy pertinentes para el mundoactual.

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* Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal do Amazonas – UFAM. ([email protected])

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3) deve envolver uma perspectiva holística,enfocando a relação entre o ser humano, a natu-reza e o universo de forma interdisciplinar;4) deve estimular a solidariedade, a igualdadee o respeito aos direitos humanos, valendo-sede estratégias democráticas e interação entre asculturas;5) deve integrar conhecimentos, aptidões,valores e ações, convertendo cada oportunidadeem experiências educativas das sociedadessustentáveis;6) deve ajudar a desenvolver a consciência éticasobre as formas de vida com as quais compar-tilhamos neste planeta, a respeitar seus ciclosvitais e impor limites à exploração dessasformas de vida pelos seres humanos (Tratadodas ONGs, s. d., p. 194-196)Desde logo, percebemos uma significa-

tiva sintonia entre o movimento dos professo-res indígenas, suas reflexões, princípios epráticas e os pontos traçados no referidoTratado. Estudando os relatórios de doze en-contros anuais (1988-1999)4 pode-se identifi-car porém que, em nenhum deles, a temáticada educação ambiental foi explicitamentecolocada como ponto de pauta das discus-sões. Da mesma forma, não há registros dedebates específicos sobre a relação homem,natureza, cultura e meio ambiente. Estes te-mas aparecem de forma “indireta”, por ve-zes intrinsecamente acoplados às reflexõessobre a vida indígena, os projetos de futurodos povos e o papel da educação tradicional(própria) e da educação escolar, tanto aque-la que foi introduzida/imposta pelo proces-so colonizador como, mais recentemente, aque tem sido pensada pelos próprios índios.

Num esforço de identificação do pen-samento indígena sobre as questões delimi-tadas neste trabalho é que realizamos a lei-tura dos Relatórios. A sistematização que sesegue procura explicitar um primeiro resul-tado desta busca que é parte de Projeto dePesquisa, em pleno andamento (2002-2003).Como poderá ser percebido, estaremos tra-tando das principais questões de maneiraampla, já que, como foi anteriormente afir-mado, elas aparecem na reflexão dos pro-fessores indígenas articuladas a outras tan-tas mais diretamente ligadas à problemáticaeducacional. Será incluído também um tó-pico no qual procuramos discutir o conceitode cultura e a problemática das relaçõesinterculturais, por entendermos que esta fun-damentação é necessária no presente estudo.

Cultura: a aproximação de um conceito e odebate acerca das relações interculturais

Como sabemos, o conceito de cultura éalgo muito amplo e que até mesmo implicaem controvérsias. O termo, segundo Laraia(1992) começa a ser utilizado no final do sécu-lo XIX, em substituição à folclore. Foi definidopela primeira vez por Edward Taylor (1832-1917) no vocábulo inglês culture que incluiconhecimentos, crenças, arte, moral, leis, cos-tumes ou qualquer outra capacidade adquiri-da pelo homem como participante de umadada sociedade. Vemos desde logo que há umforte caráter de aprendizado na cultura quese opõe a idéia de aquisição inata, seja pordeterminismo biológico ou mesmo geográfico.

Entendemos cultura como as soluçõesque gerações de homens têm dado aos pro-blemas que têm enfrentado no curso de suahistória. Inclui um conjunto de conhecimen-tos, valores, técnicas, comportamentos e ati-tudes, pensamentos e regras compartilhadas.É a maneira de um grupo se relacionar en-tre si, com os outros e com o meio ambiente.Compõe-se de cultura material e simbólica;manifesta-se nos produtos do homem: arte-sanatos, construções, comportamentos indi-viduais ou grupais, sendo um de seus ele-mentos mais importantes a língua. A cultu-ra é aprendida, recriada, transformada,transmitida. Representa um valor maior -umpatrimônio de dados compartilhados portodos os seres humanos de um grupo. Não éestática, mas sim flexível, podendo-se destaforma adaptar-se ou mudar.

Em síntese, cultura é uma maneiraparticular de ver as coisas, sendo os homensdepositários e artesões de sua própria cultu-ra. Nas palavras de DaMatta (1991), “cul-tura é uma tradição viva, um estilo de vida”.

Segundo Deborah Cruz Hernandez(1995),

não podemos falar da cultura, se não falamos daterra; a cultura não pode existir por si só. A terraé o apoio, o que dá força à cultura. A cultura,entre nós, é o direito a conceber, de uma maneiraintegral, nossa relação como seres humanos,entre os povos e entre estes e a mãe terra; quenos permite ser diferentes, já que cada povo temcaracterísticas específicas e também nos faz seriguais, já que todos temos capacidade de criá-la.João Pacheco de Oliveira (1995, p.78)

problematiza a temática das relações entreíndio e não-índios ao identificar que

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há um uso muito difuso e generalizado do termoíndio, materializado nas definições do dicio-nário, expresso na fala cotidiana, no imagináriopopular, na literatura e nas falas eruditas,enraizando-se inclusive no pensamentocientífico. Nesses domínios, índio correspondesempre a alguém com características radical-mente distintas daquelas com que o brasileirocostuma se fazer representar. (...) Os elementosfixos que compõem tal representação propiciamtanto a articulação de um discurso romântico,onde a natureza humana aflora com maispropriedade no homem primitivo, quanto navisão do selvagem, cruel e repulsivo.Continuando sua análise, assinala-nos

outra perspectiva de relações, ao colocar que“melhor seria pensá-los como povos indíge-nas, como objetos de direitos e como sujeitospolíticos coletivos, distanciando-se do mitoda primitividade e das improcedentes co-branças que o senso comum instiga a cadamomento”.

Um olhar sobre as concepções indígenasexpressas nos Relatórios dos EncontrosAnuais do Movimento dos ProfessoresIndígenas da Amazônia

Procurando enxergar alguns rumospara ajudar a pensar as questões delimita-das neste texto, na perspectiva da integrali-dade humana e da reciprocidade, que, comose sabe, norteia o pensamento dos povos in-dígenas, vejamos alguns pressupostos bási-cos, ligados a um conceito fundamental: ode comunidade educativa indígena. Nela,segundo Meliá (1996), há três atores princi-pais da educação, a saber, a economia, a casae a religião. Olhar a economia como elementopedagógico, significa enxergar como circu-lam os bens, como são os modos de produ-ção, os modos de troca. Neste sentido, a reci-procidade é um valor sumamente educativo.A casa - espaço educativo doméstico - comtodas suas características próprias (o pai, amãe, a complexidade do parentesco, e suasredes de relações, com regras e normas), éum elemento da educação. Também a reli-gião, entendida como a concentração sim-bólica de todo sistema: mitos, rituais, momen-tos críticos (nascimento - vida – morte).

Efetivamente, o processo histórico co-lonial teve uma forte tendência a separar essaunidade. A consequência é que as pessoaspassaram a ter centros educativos diferen-tes e isolados. Quebra-se o que era antes uma

totalidade. A partir do contato, o sistema deeducação da comunidade nacional é intro-duzido como uma espécie de “nuvem” quepousa sobre esta realidade. Na reivindica-ção do Estado nacional, ele passa a ser o donodos símbolos. Essa, como se sabe, é uma pre-tensão de vários séculos: a educação única,universalizante.

Na comunidade educativa indígena háum domínio completo, por parte de todos,da língua, enquanto língua comunitária. Aeconomia é participativa e recíproca. Porém,cada vez mais, o Estado nacional quer inva-dir esses espaços educativos próprios. Nacomunidade educativa nacional, o saberdeixa de significar prestígio, e torna-se po-der, numa estrutura hierarquizada, numasociedade dividida, com interesses conflitan-tes. Há “línguas especializadas”; o portugu-ês do Brasil tem um mínimo que é comum atodos. Há uma fragmentação da língua. Aeconomia é a de mercado; a casa é o lugardos progenitores e a religião, hierárquica einstitucionalizada.

Passemos então aos Relatórios dos En-contros anuais, procurando destacar mo-mentos da reflexão desenvolvida pelo movi-mento dos professores indígenas da Ama-zônia nos quais a temática aqui tratada podeser percebida.

No I Encontro dos Professores Indíge-nas do Amazonas e Roraima5, realizado emManaus/AM, no ano de 1988, a partir dapergunta: “Como se aprende a viver?”, cadagrupo de participantes pode relatar o seu“jeito”, a sua maneira de educar, dentro desuas comunidades. Após os trabalhos sobrea educação tradicional de cada povo, umsegundo passo foi dado, no sentido de pro-blematizar o porquê da existência da escola,ou seja, os seus objetivos. Neste momento, areflexão foi desencadeada pela pergunta: “Sejá existia educação na originalidade, paraque funciona a escola atual?”

Ao enfocar a primeira questão, a res-peito das formas próprias de educação, per-cebemos que, desde logo, se complexifica aquestão, posto que, estão reunidos no movi-mento sempre mais de uma dezena de po-vos indígenas distintos5, e o que se constataé que “existem tantos modelos de educaçãoindígena, quantas culturas” (Meliá, 1979).

Porém, dentro da diversidade dos con-

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teúdos e formas apresentadas nas exposições,há aspectos que se repetem. Assim, estarecorrência (de atitudes, modos de atuar, prá-ticas e valores) constante em todos os relatos,sugere serem estas, algumas das característi-cas gerais da educação indígena: aprende-sea viver dentro da vida cotidiana; adquire-seos conhecimentos necessários para a vida,com o pai, a mãe, e a comunidade; aprende-se pelo exemplo e pela experimentação; a tra-dição cultural dos antepassados é valor fun-damental e base do trabalho pedagógico;preserva-se a tradição da oralidade; valoriza-se o trabalho, como meio educativo e comoinserção na vida do grupo; o valor fundamen-tal da terra é afirmado constantemente;aprende-se a conhecer e respeitar a natureza.

Para Gunter Kroemer, em seu textoEstudo da reciprocidade (2001),

as terras indígenas são a expressão maisconcreta de experiências espirituais de interaçãoentre o homem e natureza. A realidade naturalé igualmente uma realidade sobrenatural esocial. É a natureza que fornece os meios desubsistência, simbolizada por entidades dota-das de vontades e poderes sobrenaturais. Estassão organizadas num sistema de parentescoanálogo ao domínio humano com as quais aspessoas procuram estabelecer relaçõessimbólicas de complementaridade e obrigaçõesrecíprocas. A terra simboliza espaço dememória, de culto, de realização plena de vida.É uma visão integrada da vida.Quanto a questão do conhecimento da

natureza, remetamo-nos a alguns autoresque têm trabalhado esta temática. Em seutexto O impacto da conservação da biodi-versidade sobre os povos indígenas, AndrewGray (1995, p.115) coloca que

os povos indígenas têm uma vasta riqueza deconhecimentos relativos a seu ambiente, cons-truída ao longo de séculos. Este conhecimentonão inclui somente informações sobre diferen-tes espécies de animais e plantas, seus compor-tamentos e suas utilidades, mas também infor-mações sobre o modo como aspectos do uni-verso se inter-relacionam.E vai além ao afirmar que, para os po-

vos indígenas,o conhecimento do ambiente depende decontatos com o mundo invisível dos espíritosque desempenham um papel fundamental nagarantia da reprodução da sociedade, da culturae do ambiente. (...) Para eles, o conhecimento ésimultaneamente material e espiritual e os sereshumanos geralmente não estão separadosdaquilo que os povos não-índios concebemcomo o ‘mundo natural’.

Também Eduardo Viveiros de Castro(1995, p. 116) nos traz idéias acerca destarelação – sociedades indígenas, natureza esaber.

A relação entre os povos indígenas e a florestaé mediada decisivamente por suas formas deorganização sociopolítica. A natureza é naturezapara uma sociedade determinada, fora da qualse reduz a uma abstração vazia. Dessocializartal saber é expropriá-lo e inutilizá-lo pratica-mente.Este autor procura destacar que as re-

lações que se estabelecem entre homens enatureza não são naturais, mas sim imedia-tamente sociais. Este aspecto eminentemen-te social (das relações entre sociedades e na-tureza) “recebe um reconhecimento explíci-to nas culturas indígenas, em contraste coma concepção objetivante de naturezaentretida pela modernidade ocidental”.

Segundo Eduardo Carrara (1993),a natureza, para os índios, não é só o lugar deonde retiram sua subsistência através da coleta,agricultura, caça e pesca; mas é também objetode uma observação cuidadosa e atenta quenomeia, ordena e classifica as diversas espéciesnaturais do meio em que vivem. Enfim, consisteeste aprendizado da natureza em uma dasprincipais substâncias do pensamento indígena.Contudo, a consciência das contradi-

ções e complexidade dos problemas e desafiosenfrentados na realidade histórica vivida,acrescentou (para a maioria dos povos) aosconhecimentos tradicionais, a urgente neces-sidade de entender a dinâmica da socieda-de majoritária, assim como de ter o domíniosob novos saberes, que os ajudem no enca-minhamento das novas situações. Esse pro-cesso, na maioria das vezes, é permeado porconflitos/tensões e dominação, exercidos porparte da nossa sociedade. Daí o fato de que,ao falarem sobre o hoje, venha a tona ex-pressões que denotam angústias, sentimen-to de lamento - uma espécie de “saudade”de um passado não vivido. É como seaflorasse uma certa “nostalgia”, um desejode “retorno às origens” que, como se sabe,já não são as mesmas.

Suess (1987) em seu instigante artigoO menor bem amparado: a criança indígenaproblematiza a questão do contato afirman-do que

as sociedades indígenas que conseguem viverlonge e diferente da chamada sociedadenacional não conhecem o problema do menorabandonado. A preservação dos valores

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autóctones dos povos indígenas, sobretudo oseu espírito comunitário, é proporcional à suadistância da sociedade ocidentalizada.Trechos de depoimentos extraídos dos

Relatórios7 ilustram essa situação:Para saber como se aprende a viver, depende de certosfatores - por exemplo, a descaracterização cultural demuitas comunidades, motivada pela invasão das áreas(Professores Macuxi/RR).As tradições dos pais foram acabadas um pedaço. Masqueremos renascer esta tradição, fazer umrenascimento da nossa história. Por isso fazemos umestudo paralelo das duas culturas, vendo o que é bomou ma. (Professores Desano/AM).A educação era toda de pai para filho. Morávamos nabeira do Solimões e plantávamos na praia. O principalponto era não deixar faltar a alimentação. Nas praiasse plantava junto e tinha muita brincadeira, alegria.Hoje, quando queremos plantar na praia, logo aparecealguém prá falar que é dono da praia e nós não podemosplantar (Professor Kambeba/AM).Me sinto envergonhado porque não sei falar a minhalíngua. Eu não vi e nem vivi esta época de meus avós.Não vi a vida boa que eles levavam antes (ProfessorMayoruna/AM).Durante o trabalho com a questão

“que tipo de escola desejam”, travou-se umdebate a respeito do ensino profissionali-zante. Este tema vem a tona em função dasvariadas e distintas propostas de escolasprofissionalizantes e de projetos econômicos(especialmente os agropecuários), que sãooferecidos ou mesmo implantados nas comu-nidades indígenas. Encontra-se intimamen-te ligado à questão do desenvolvimentotecnológico e da visão de integração.

Conforme Roberto Cardoso de Olivei-ra (s/d), “mito ou não, a tecnologia tende aser pensada como o supra sumo do progres-so - e gera ideologias correspondentes”.

Como as sociedades indígenas, tão di-ferenciadas material e culturalmente domodelo ocidental, podem fazer frente aoavanço da sociedade moderna industrial?Pensando essas questões, Carrara (1993) vaimais além ao indagar:

qual seria a alternativa tecnológica (econômica),excluído o modelo extrativista (sem renovaçãodos recursos naturais), para garantir territóriosindígenas, dos quais dependem os índios parasobreviver física e culturalmente? Seria aaplicação de tecnologias agrícolas ou pastoris,a fim de adaptá-los forçosamente a um modelode desenvolvimento agrícola ou pastoril? ou, oresgate de conhecimentos indígenas dos ciclosecológicos, das plantas, dos animais, enfim domanejo do meio ambiente que realizam emsuas terras muito antes do contato com osbrancos e da onda ecológica estar em voga?

Voltando à elaboração de Gray (1995)em seu texto sobre povos indígenas ebiodiversidade, veremos que, na perspecti-va dos povos indígenas, os projetos própriosde desenvolvimento, além de privilegiareminiciativas locais, “se esforçam para articu-lar as dimensões ‘cultura’ e ‘política’ do de-senvolvimento a abordagens sustentáveis”.O resultado desses processos, segundo esseautor, é um“ ‘auto-desenvolvimento’ que co-loca a responsabilidade e o controle sobre osprojetos nas mãos das próprias comunida-des indígenas”.

Constatamos, no entanto, que o signi-ficado de “profissional” para os povos indí-genas não tem o mesmo teor da concepçãode nossa sociedade. Quando falam em esco-la profissionalizante, pensam em uma for-ma de aprender técnicas novas para produ-zir alimentos, com objetivo de garantir emelhorar as suas condições de vida. O valordado é o de sobrevivência, não no sentidomínimo, mas no sentido de, como já foi cita-do, “trabalhar para viver”. As categorias quese interligam, portanto, são vida e trabalho,e não trabalho e acumulação, como na soci-edade envolvente.

Castro (1995, p. 117) também se referea essas questões de contraste ao formular que

a categoria que comanda as relações entrehomem e a natureza é, para a modernidadeocidental, a produção, concebida como ato desubordinação da matéria ao desígnio humano.Para as sociedades amazônicas, a categoriaparadigmática nesse contexto é a reciprocidade,isto é, a da comunicação simbólica entre sujeitosque se interconstituem pelo ato mesmo da troca.Vejamos algumas citações, contidas no

Relatório do I Encontro/1988, onde podere-mos comprovar o exposto acima:

Precisamos de técnicas para trabalhar na agricultura.É necessário hoje, para nossa sobrevivência, a escolaprofissionalizante. (Prof. Fausto Mandulão,Macuxi/RR)A escola profissionalizante é um meio que o índio podeter. A tradição é nossa essência, vai nos acompanharsempre. Precisamos conhecer mais para defender nossosdireitos. (Prof. Domingos Sávio, Tucano/AM)Através da escola profissionalizante pode-se registraro que antes era só a cultura oral. Os projetos estãochegando, e muitas vezes nós aceitamos porque a caçae a pesca já é pouca. Estamos partindo para a escolaprofissionalizante por causa disto. (Prof. Henrique,Desano/AM)Precisamos nos profissionalizar neste sentido, usando oconhecimento para nossa sobrevivência. A escola agrícolaé para orientar para aprender a defender a terra.

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Precisamos pegar uma parte desta escola para a escola datradição continuar. (Professores Sateré/AM)Outra preocupação que também trans-

parece é a questão da saída dos jovens paraestudar fora, visualizando-se, como umapossível solução, o fato de poderem contarcom escolas, para continuidade dos estudos,dentro da própria aldeia.

Quando alguém sai da aldeia para estudar na escolaprofissionalizante na capital, esquece tudo. (Prof.Alírio Moraes, Tikuna/AM)Na minha comunidade de Vila Betânia, saiu um jovempara a escola agrícola em Manaus e ficou fora 3 ou 4anos. Quando voltou, tinha perdido a língua e nãoquer mais aprender. (Prof. Francisco Julião,Tikuna/AM)Remetendo-nos novamente ao texto de

Carrara (1993), este chama a atenção parao fato de que

a tecnologia por si só não determina a transfor-mação social. Uma tecnologia estranha à práticae ao entendimento indígena não é adotada deimediato pelos índios, mas deve adaptar-se epor eles ser adaptada ao seu modo específico deorganização cultural e social, o que inclui seusconhecimentos da natureza.Alguns relatos deixam entrever que os

professores indígenas têm levantado ques-tionamentos nos quais figuram essa proble-mática:

O sistema profissionalizante é próprio do sistemacapitalista: necessidade de produzir muito, prepararpara o mercado de trabalho. Estudamos e depoisvoltamos para a comunidade e não nos adaptamos eacabamos voltando para o branco. É o que temacontecido conosco. Muitos têm voltado para acomunidade e como não conseguem ganhar dinheiro,foram embora. No sistema da tradição, vejo a cidadaniavoltada para a comunidade (Professores Desano).A Prefeitura de São Gabriel está construindo umaEscola Agrícola. Me pergunto o que está por trazdisso; é algo necessário, é válido ou não? Uma coisa é:se esse tipo de escola é pedida pela povo e outra se éimposta pelo governo (Prof. Gersem Luciano,Baniwa).No IV Encontro8, que aconteceu em

Manaus/AM, no ano de 1991, realizou-seum trabalho inédito onde, através da meto-dologia dos “temas geradores”, os professo-res puderam vivenciar um profundo exercí-cio de interculturalidade, confrontando osdiversos saberes dos povos indígenas presen-tes no Encontro.

Para desenvolver o trabalho com “te-mas geradores”9, num exercício prático decomo incorporar aos trabalhos escolares ocotidiano da vida nas aldeias, construindoassim, propostas curriculares indígenas, nu-

ma visão interdisciplinar e global, os profes-sores primeiramente se dividiram em gruposmistos (regiões e povos distintos). Tal opçãopossibilitou uma profunda troca de conhe-cimentos, num intercâmbio entre os diferen-tes saberes tradicionais indígenas, aliados aosnovos conhecimentos, advindos da situaçãode contato com a sociedade envolvente.

Durante a realização dos trabalhos comtemas geradores, pudemos perceber clara-mente um destaque quanto a importância dopapel da instituição escolar no processo deformação, valorização e afirmação das iden-tidades indígenas. Trazemos aqui a elabora-ção do grupo de Roraima, onde esta questãoficou explicitada de maneira muito forte.

Foi escolhido o tema ‘eu’, que é a primeira lição dacartilha que estamos elaborando por nós mesmos, paraser usada nas nossas escolas. A cartilha chama-se‘Aprendendo com a natureza’. Esse tema, nósescolhemos porque lá em Roraima é muito forte apressão para o extermínio dos índios. A luta lá é brava,todos querem que terminemos não sendo índios. Todosos brancos lá querem que percamos nossas terras enossos costumes. Então começamos ensinando à crian-ça quem é ela, o ‘eu’. Que ela é índia (Macuxi,Taurepang, Wapixana, ou outro grupo); como ela vive;a língua que fala; nossos costumes e assim por diante.Ensinamos o trabalho comunitário, onde todosparticipam. Temos que nos valorizar como somos,embora haja muita diferença entre os Macuxi,Wapixana, Yanomami, Waimiri-Atroari e outrosgrupos. Agora, sabemos que possuímos algo emcomum, que é que já estávamos aqui quando osbrancos chegaram nesta terra. A partir deste tema edo estudo das coisas próprias de cada comunidade,podemos ensinar as diferentes matérias, sempre colo-cando os conhecimentos dos brancos para enriqueceros nossos. Mas sabendo que sabemos muito também!No V Encontro10, que ocorreu em Boa

Vista/RR, no ano de 1992, assim como aprimeira experiência realizada no encontroanterior, um momento significativo, dentroda perspectiva da diversidade e intercultu-ralidade, foi o trabalho realizado em gruposmistos (professores indígenas de povos dis-tintos) procurando, ao articular “currículo”e “tema gerador”, confrontar as diferençasculturais, conhecendo-se mutuamente. Di-versas foram as temáticas escolhidas: bebi-das tradicionais; alimentação; remédios ca-seiros; regras de casamento.

O VI Encontro11 (1993) foi realizado,pela segunda vez, na cidade de Boa Vista,capital do estado de Roraima. O tema esco-lhido foi: “Culturas Diversificadas”. Vemosque esta tem sido uma prioridade (feita já

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no V Encontro/1992) e demonstra a vonta-de dos professores indígenas em aproveitaresses momentos de reunião para valorizar aoportunidade de fazer-se conhecer e de co-nhecer a história e cultura dos demais povosindígenas presentes. Sabemos que esse é umprimeiro passo, fundamental, para o respei-to mútuo, assim como para as articulações ealianças, na construção da solidariedadeinterétnica. A partir do tema central, os tra-balhos em grupo foram organizados por sub-temas (de livre escolha): organização sociale política; origens; rituais; trabalho, econo-mia e produção; e educação tradicional.

Durante o VII Encontro12 (Manaus/AM, 1994), a temática da Medicina Tradici-onal foi desenvolvida através de trabalho degrupos (por regiões), seguida de apresenta-ção em plenária. Foi formulado pela coor-denação um roteiro para facilitar, tanto olevantamento das principais questões, comoo próprio debate: 1) Qual a importância daMedicina Tradicional? 2) Quem são as pes-soas que conhecem a Medicina Tradicional?3) Quais os remédios mais importantes? 4)Qual a importância da Medicina Tradicio-nal dentro da Escola Indígena?

É interessante reparar que a preocu-pação e a atenção com o tema da saúde cons-ta já desde os primeiros Encontros, de diver-sas formas. A decisão de ter esse como prin-cipal ponto de pauta surgiu já no Encontroanterior. Assim as regiões se prepararampara essa discussão, trazendo exemplares deplantas medicinais e trabalhos realizadoscom os alunos.

Desde o IV Encontro (Manaus, 1991),a opção por temas que privilegiam essa opor-tunidade das reuniões para intercambiar co-nhecimentos e informações entre os diferen-tes povos indígenas presentes, tem sido visí-vel. Tal proceder demonstra a valorizaçãoque os professores indígenas têm dado à di-versidade cultural que compõem o movi-mento e chama a atenção para o fato de quea interculturalidade - um dos princípios dasescolas indígenas, inclusive já reconhecidonas Diretrizes do MEC, não é apenas umpressuposto e necessidade nas relações en-tre as sociedades indígenas e nós, sociedademajoritária, mas também entre os própriospovos indígenas.

Diferentemente da idéia que perpassa

o senso comum na sociedade envolvente bra-sileira, que liga, automaticamente, medici-na com doença, colocações feitas mostraramque a noção de medicina tradicional está,para os povos indígenas, intrinsecamente li-gada à concepção de saúde. Esta, por suavez, remete imediatamente à idéia e concei-to de vida.

Também emerge com bastante força aquestão da medicina tradicional como valordo grupo, como um bem que deve ser pre-servado, revitalizado, cultivado, dependen-do da situação histórica vivida por cadapovo. É a sabedoria como forma de afirma-ção das identidades. Deste ponto de vista, aponte entre saúde e escola indígena é dadapela vida.

Segundo os depoimentos dos profes-sores indígenas, podemos concluir que odomínio desses e outros conhecimentos es-pecíficos e especializados não são usadoscomo poder exercido sobre o outro, mascomo serviço à comunidade, transforman-do-se assim em patrimônio coletivo.

Sobressai ainda o entendimento de queos saberes tradicionais, no caso, a medicina,contribuem para que possa se manter umarelativa independência e autonomia frentea sociedade envolvente. Poderemos percebere comprovar tais análises em algumas colo-cações a seguir.

(...) temos tratamentos também preventivos (complantas) e não só curativo. Se temos saúde temosvontade de pensar, raciocinar, ficar alegres. É gratuitoporque a natureza oferece. Para aprofundar mais,temos os pajés (Grupo do Rio Negro/AM).Nós não queremos perder essa cultura valiosa quenós temos. Prá que é que serve esse resgatamento dacultura? Prá que? Serve prá prestar assistência àspróprias comunidades, serve para curar. Muitas vezesnós perdemos isso porque não conseguimos valorizar.Então a primeira coisa é tentar elaborar um currículoapropriado para cada escola onde os ‘Programas deSaúde’ deveriam levar em conta essa medicinatradicional. Temos que sistematizar esta questão.Também socializar com os conhecimentos dos váriospovos, de várias etnias que conhecem diversosmedicinais (Prof. Sebastião Duarte, do povo Tucano,Alto Rio Negro/AM).Assim como outros temas primordiais

para a vida dos povos indígenas, a questãose complexifica no contato com a sociedadeenvolvente e no confronto de saberes e, tal-vez, principalmente, de interesses e projetosconflitantes. Segundo Darcy Ribeiro (1970,p. 193)

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o problema indígena não pode ser compre-endido fora dos quadros da sociedade brasi-leira, mesmo porque só existe onde e quandoíndio e não-índio entram em contato. É, pois,um problema de interação entre etnias tribais ea sociedade nacional.Essa realidade social e histórica traz

mudanças, e muitas vezes, prejuízos. Os pro-fessores do Rio Negro nos falam sobre isso:

A medicina tradicional existe desde os nossosantepassados. Nossa geração é que foi esquecendo,talvez por falta de interesse. Ser pajé, benzer... para arealidade de hoje parece que não tem valor. Mas agoraestamos vendo o quanto é importante para nós, e desuma importância para a saúde da população indígenada região (Professores do Rio Negro/AM).Gersem dos Santos Luciano, professor

indígena, do povo Baniwa, região do AltoRio Negro, ao participar da mesa redonda“Povos indígenas e a educação na AméricaLatina”, durante o II Congresso Ibero Ame-ricano de História da Educação Latino-Ame-ricana, UNICAMP, em setembro de 1994assim refletiu:

Então, as discussões em torno da educação, eramtambém redescobrir, planejar o que hoje os povosindígenas querem para o seu futuro. Foi o início deplanejar, de construir o futuro, a partir da realidadeem que os diversos grupos étnicos se encontravam. Eesse compromisso foi sendo assumido a partir dosprofessores, dos educadores e das organizaçõesindígenas, das lideranças indígenas. Então, nessacaminhada, hoje prá nós, na questão específica daeducação, existe uma coisa muito clara: nós nãopodemos separar a prática educacional, ou seja, aquiloque se faz, seja no ensino, na escola, mas sobretudoque está na comunidade, não dá para separar daprópria caminhada política dos povos indígenas13.Encerramos (por hora)14 esta reflexão,

que procurou enxergar, nas concepções dosprofessores indígenas da Amazônia apertinência, atualidade e contemporanei-dade destas idéias com o Tratado de Educa-ção Ambiental para sociedades sustentáveis eresponsabilidade global convencidos da neces-sidade de aprofundar este intercâmbio en-tre o pensamento dos povos indígenas – ge-rado desde o dia-a-dia nas aldeias e tambémnos seus espaços sócio-políticos mais amplosde articulação interétnica – e as elaboraçõesteóricas dos estudiosos e militantes do movi-mento por uma educação ambiental que seja

diálogo entre gerações e culturas, em busca datríplice cidadania: local, continental e planetáriae da liberdade na sua mais completa tradução,tendo implícita a perspectiva de uma sociedademais justa, tanto em nível nacional comointernacional (Reigota, 1997).

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Notas:1 Este trabalho foi apresentado na 25ª Reunião Anual

da ANPEd-Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação, no Grupo de Estudo emEducação Ambiental, Poços de Caldas, 2003. Apresen-ta resultados parciais do Projeto de Pesquisa “Forma-ção de Professores no contexto amazônico”, financi-ado pelo CNPq - PNOPG, coordenado pela Profa.Dra. Lucíola Inês Pessoa Cavalcante e desenvolvidono Programa de Pós-Graduação em Educação daUniversidade Federal do Amazonas no período 2002-2004. Participam também do grupo de pesquisa aProfa. Dra. Ana Alcídia de Araújo Moraes e maisquatro professoras pesquisadoras, além de três mes-trandas e três alunos bolsistas de graduação.

2 Há, desde 1988, ocasião da realização, em Manaus/AM, do I Encontro dos Professores Indígenas doAmazonas e Roraima, um movimento que articula eorganiza os professores indígenas da Amazônia.Desde aquela data, eles se reúnem anualmente parasocializar suas experiências, além de elaborarprincípios e propor alternativas frente à realidadedas escolas indígenas e a necessidade de uma políticaindígena de educação escolar. Também têm estadoatentos à questão das políticas públicas para educaçãoe da legislação específica.

3 Citado por Gadotti: 2000, p. 239-240.4 Optou-se por este período por caracterizar-se como

uma etapa inicial do movimento que, a partir de 2000

transforma-se em COPIAM-Conselho dos ProfessoresIndígenas da Amazônia Brasileira, inaugurando umnovo momento organizativo, passando a realizar As-sembléias anuais. Em 2003 realizou-se a III Assem-bléia do COPIAM, em Manaus/AM.

5 Realizado entre os dias 15 e 18 de outubro, reuniu 41participantes de 14 povos indígenas. Neste primeiromomento do movimento apenas os estados do Ama-zonas e Roraima estiveram presentes. A partir de 1992também professores indígenas do Acre passam aparticipar.

6 No X Encontro, em 1997, reuniram-se 33 povos.7 As falas indígenas serão apresentadas em itálico.8 Realizado entre os dias 12 a 16 de julho, reuniu 43

participantes de 17 povos indígenas.9 Os temas escolhidos, após um passeio pelo terreno

do local do encontro, foram: terra; saúva (formiga);árvores frutíferas; invasão de território; água poluída.

10 Realizado entre os dias 8 e 11 de outubro, pelaprimeira vez, fora de Manaus/AM, reuniu 90participantes de 15 povos indígenas.

11 Realizado entre os dias 7 a 10 de outubro, reuniu 115participantes, de 17 povos indígenas.

12 Realizado entre os dias 16 a 20 de outubro, reuniu 76participantes, de 21 povos.

13 Anotações pessoais.14 A pesquisa teve continuidade, numa segunda etapa,

na qual houve a aproximação e trabalho de campojunto aos professores Mura do Município de Autazes/AM.

Desenvolvimento local e turismo: por uma ética de compromisso eresponsabilidade com o lugar e com a vida

Local development and tourism: towards an ethical commitment and responsibilitywith place and life

Desarrollo local y turismo: por una ética de compromiso y responsabilidad con el lugar y con la vidaSérgio Ricardo Oliveira Martins*

Recebido em 30/06/04; revisado e aprovado em 18/09/04; aceito em 17/02/05.

Resumo: Ao tratar de desenvolvimento local e turismo, o objetivo deste trabalho é refletir a relação que se estabeleceentre os dois temas na perspectiva do desenvolvimento sustentável, entendido como uma conquista a ser socialmentealcançada, isto é, desde do indivíduo até a coletividade, processo que envolve, irremediavelmente, entender e assumiruma outra consciência da realidade, das pessoas, do ambiente. Entende-se que tal consciência ecológico-humanista,que assume a sustentabilidade como conquista possível, implica em participação ativa, isto é, em engajamento socialpautado por uma ética de compromisso e responsabilidade com a sustentação da vida.Palavras-chave: desenvolvimento local; turismo; participação popular; sustentabilidade.Abstract: In handling local development and tourism, the aim of this study is to reflect on the relationship which isestablished between the two themes in the perspective of sustainable development, understood as a conquest to besocially obtained, that is, individually and collectively, a process that involves, with all certainty, understanding andassuming another conscience of reality, of people and of the environment. It is understood thatsuch an ecological-humanistic conscience, that takes on sustainability as a possible conquest, implies active participation, that is, socialinvolvement regulated by an ethical commitment and responsibility with the sustaining of life.Key words: local development; tourism; general participation; sustainability.Resumen: Al tratar de desarrollo local y turismo, el objetivo de este trabajo es reflexionar sobre la relación que seestablece entre los dos temas en la perspectiva del desarrollo sostenible, entendido como una conquista a ser socialmentealcanzada, o sea, desde el individuo hasta la colectividad, proceso que envuelve, irremediablemente, entender yasumir otra conciencia de la realidad, de las personas, del ambiente. Se entiende que tal conciencia ecológico-humanista, que asume la sustentación como conquista posible, implica en participación activa, o sea, en contrataciónsocial pautado por una ética de compromiso y responsabilidad con la sustentación de la vidaPalabras clave: Desarrollo local; turismo; participación popular; sustentación.

de vida, ‘metabolizando’ comunitariamenteas participações efetivamente contributivasde quaisquer agentes externos” (ÁVILA,2000, p. 69). Sustentabilidade (multidimen-sional) e endogenia, portanto, não são atri-butos de uma modalidade de desenvolvimen-to local, mas qualidades intrínsecas à suaprópria essência.

Entender o desenvolvimento local im-plica, em primeiro lugar, superar no âmagode cada um de nós o pragmatismo utilitaristae a percepção de melhoria associada unica-mente à expansão material. Se, tal comoacredita Capra (1982), todas as crises atuaissão expressões de uma “crise de percepção”e indicam que estamos vivendo um momen-to de transição de paradigmas - de uma vi-são de mundo cartesiano-mecanicista, queentre outras crenças está o progresso mate-rial ilimitado, para uma visão ecológico-humanista, fundamentada na percepçãosistêmica e integrada da realidade, na valo-rização da pessoa humana e no primado do

1 Introdução

Como falar de desenvolvimento locale turismo sem ficar na tautologia dasustentabilidade ambiental ou socioeconô-mica que tem pautado os debates sobre osdois temas? Entende-se que é preciso ir alémda superfície do conceito e avançar na aná-lise dos fatores e condicionantes da insus-tentabilidade, isto é, daquilo que resulta nocaráter insustentável de uma atividade hu-mana qualquer, como o mercantilismo e oempreguismo que demarcam uma visão ma-terialista e utilitarista do desenvolvimento.

Se há uma forte tendência, no pensa-mento e na ação, de entender o desenvolvi-mento com base na localidade, na gestãoparticipativa e na geração de emprego (outrabalho, ocupação) e renda locais, aindaestamos longe da condição em que “a co-munidade desabrocha suas capacidades,competências e habilidades de agenciamentoe gestão das próprias condições e qualidade

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 109-118, Mar. 2005.

* Doutor em Geografia Humana pela FFLCH-USP e docente e pesquisador do Programa de Mestrado emDesenvolvimento Local da Universidade Católica Dom Bosco. ([email protected])

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equilíbrio - esta mudança depende direta-mente das nossas ações. Neste sentido, en-tender o desenvolvimento local, em sua es-sência ecológica e humanística, requer umaverdadeira inversão e não uma simples revi-são conceitual. A consciência “invertida” doprogresso associá-lo-á à satisfação e ao bem-estar como parâmetro e finalidade e permi-tirá enxergar o ser humano como fundamen-to da pessoa.

No âmbito do desenvolvimento local,o turismo não deve ser apenas visto comouma atividade econômica para a qual sebusca o caráter sustentável, a não ser quevejamos este processo exclusivamente comoestratégia de geração de emprego e renda.Na medida em que o turismo se funda narelação entre pessoas e não apenas entre es-tas e os lugares, sua maior contribuição po-derá ser o resgate e o fortalecimento da iden-tidade cultural, da consciência humanísticae não apenas ecológica e de uma formação/visão integrada e conectiva da realidadesocioespacial.

A caminho de uma melhor compreen-são (ou talvez melhor embasamento) dasustentabilidade, por certo será um grandepasso se entendermos que o turista (tantomais os que promovem o turismo) não devecontinuar visitando (e percebendo) os luga-res (os atrativos, as pessoas) como se estives-sem indo a um supermercado adquirir umproduto qualquer, atendendo às suas neces-sidades e desejos de consumo, sem tomarconhecimento das pessoas que ali trabalhamem prol da sua satisfação. Neste sentido,entre o desenvolvimento local e o turismo(como é ou deveria ser com qualquer ativi-dade socioeconômica) há compromissos eresponsabilidades que, em última análise,devem ser assumidos com a sustentação/promoção da própria vida (humana inclusi-ve). É nesta perspectiva que, nas linhas sub-seqüentes, procurar-se-á oferecer uma mo-desta contribuição à reflexão do tema.

2 Desenvolvimento local: A questãocrucial da participação

Em essência, o Desenvolvimento Localincorpora a perspectiva humanística de va-lorização da pessoa humana, a se tornar elamesma sujeito efetivo do seu próprio desti-

no. É desenvolvimento a escala humana quese constitui do “protagonismo verdadeiro decada pessoa” (CARPIO, 1999, p. 172). Talprotagonismo implica em uma postura pró-ativa a ser assumida por cada pessoa em sualuta cotidiana por melhor qualidade de exis-tência, o que envolve condições materiais eimateriais. Tem a ver, pois, com o interesse,disposição e disponibilidade das pessoas peloenfrentamento dos problemas que afligem asi e a comunidade que integram, portanto,numa perspectiva coletiva e não individua-lista. Eis até aqui duas das condições maisimportantes do desenvolvimento local: aparticipação e o sentido de pertencimento auma comunidade ou lugar. Tratam-se dequestões centrais que pautarão esta brevereflexão conceitual, já que não há espaçopara uma investida maior.

2.1 A participação enquanto envolvimentoe compromisso

Participação é, antes de mais nada,envolvimento que não se mede com listas depresença, nem mesmo com a própria pre-sença. É, pois, reflexa do interesse real e nãocasual que, por sua vez, depende de enten-dimento/compreensão da realidade. Avivência dos problemas (“senti-los na pele”)ensina seus efeitos, suscita a procura de meiospara contorná-los ou superá-los. E isto se dáno âmago do cotidiano, envolvendo práti-cas sociais e espaciais que, através da capa-cidade de percepção (e entendimento) doespaço vivido, afetam qualitativamente aexperiência humana (DIAS, 1994). Relaçõessociais e com o espaço ocupam o cerne daluta pela sobrevivência, é conhecimento realde dificuldades reais e de possibilidades re-ais. Uma família carente recém-chegada auma ocupação em meio urbano, por exem-plo, levará algum tempo para estabelecernovos laços de amizade e ingressar efetiva-mente em uma rede de solidariedade; leva-rá tempo igualmente para conhecer as al-ternativas e os meios de acesso a serviços ebens de consumo essenciais. Este é o proces-so em que, para essa família, o novo lugar setornará seu lugar, trata-se do estabelecimen-to de uma nova territorialidade que se cons-trói no dia a dia, confrontando seu conheci-mento e experiência anteriores com as con-

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tingências e vicissitudes sociais e territoriaisdo novo lugar. A territorialidade, que se tra-duz pela “posse e o controle exclusivo doespaço por um indivíduo ou grupo de indi-víduos”, dá-se por etapas de conquistas so-ciais e territoriais que são firmadas ao longodo tempo (DIAS, op. cit., p. 121).

O conhecimento popular e real dosproblemas tem todavia os seus limites. Noslugares, enquanto unidades conectivas domundo atual, estão também presentes as for-ças “estranhas”, representantes de interes-ses distantes, não autóctones, de uma “or-dem global” (SANTOS, 1996a). Esta é a ra-zão do porque os problemas atuais, via deregra, não podem ser completamente enten-didos (ou enfrentados) se analisados exclu-sivamente à escala humana, uma vez quehá variáveis externas. Se, por um lado, faz-se necessário a presença de especialistas,promotores de assistências técnicas especiali-zadas, por outro, a ação destes detentoresde habilidades e competências deve ser re-gulada e conduzida pela comunidade emfunção estrita dos seus interesses (ordem lo-cal). Agentes externos podem até mesmo searrogarem em uma pretensa condição depromotores de desenvolvimento local, maseste fenômeno lhe escapa às mãos. Desen-volvimento local, este “novo paradigma dodesenvolvimento, de tipo endógeno,territorial” (CARPIO, 2001), que implica emuma postura nada tradicional diante da co-munidade e do ambiente, postura esta queextrapola a mera assistência técnica, porprincípio, não pode ser promovido, mas in-duzido e assistido por agentes externos.

Participação é muito mais do que umaconquista pessoal, uma vez que para ela con-correm fatores históricos, sociais, culturais,econômicos e espaciais. Este último intervémmais claramente com as distâncias e as loca-lizações, onerando ou facilitando o exercí-cio da cidadania. Esta poderá não passar defigura de retórica se não relacionada com oterritório, pois cidadão não é todo aquele quetem direitos e deveres assegurados por lei,mas aquele que efetivamente tem condiçõesde exercer esses direitos e deveres. Isto querdizer que, ao envolver práticas territoriais,em distintas espacializações e em uma soci-edade diferenciada, a cidadania pode serplena para uns e nula para outros1. No nível

da participação, do envolvimento pessoal emações coletivas, jogam o interesse, a consci-ência compreensiva, o compromisso com ocoletivo, a solidariedade e, não se pode es-quecer, as vantagens econômicas. Participarou engajar-se efetivamente em qualquermobilização não deve ser vista como umadecisão estanque, mas é absolutamente pes-soal. A verdade é que a participação não sedelega, mas apenas a presença (representa-tividade). Carecemos de uma visão maispragmática da participação, no sentido deque ela ocorre (ou não) independente dasformalidades que envolvem uma mobiliza-ção. O que realmente nos move à participa-ção é o interesse, a insatisfação e o otimismoque vislumbra a vantagem, seja esta indivi-dual ou coletiva, ou ambas2. Se ganhos indi-viduais ou coletivos, o mais importante éconsiderar que o envolvimento pessoal pas-sa por esta racionalidade. É, pois, imprová-vel que qualquer pessoa se engaje estandoàs cegas sobre o futuro ou o resultado previ-sível de seus atos ou do grupo, tanto maisem se tratando de pessoas cuja carência eco-nômica lhes impele à busca (ou a preocupa-ção) constante com a subsistência.

Para uma maior clareza sobre estetema, são indicados a seguir os elementosaqui considerados indispensáveis a uma par-ticipação ativa e envolvente.• Compromisso e responsabilidade

Em um contexto de mobilização deveimperar o senso de compromisso e de res-ponsabilidade. As pessoas devem estar cien-tes do quê e por quê se comprometem e peloquê são (co)responsáveis. Deve se evitar oambiente assistencialista, em que há agen-tes responsáveis (externos) e beneficiários (dacomunidade). Em situações de extrema ca-rência, é a rede de solidariedade existenteentre os membros de uma comunidade quedeve ser acionada ainda que com o apoiomaterial externo (assistência social oficial).É importante considerar que o desenvolvi-mento local não nasce em ambiente pura-mente assistencialista, mas a solidariedadeativa, a que se apoia, na convivência, noslaços de amizade, na contiguidade e com-partilha dos problemas cotidianos, pode edeve ser fortalecida. O envolvimento efetivonasce, fortalece e é fortalecido pela auto-es-tima e pela valorização das pessoas e do meio

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em que vivem, com base no sacrifício e naluta do dia a dia.• Conhecimento e não apenas informação

Conhecimento é capacidade de enten-der e agir sobre a realidade vivida, portantocapacidade de conduzir a própria vida. Éindispensável que cada pessoa saiba o quequer para si e para sua família. Este é oparâmetro fundamental para avaliar as al-ternativas e os caminhos que se apresentam;para estabelecer uma relação salutar e pro-dutiva com os agentes externos. Uma cons-ciência pró-ativa, a que busca entender oproblema e superá-lo, requer uma formaçãocapaz de desenvolver nas pessoas a capaci-dade de se conhecer, de entender e interagircom a realidade a sua volta (ÁVILA, 2000).Realmente, a participação depende menosdo grau de instrução ou de informação doque do conhecimento que uma pessoa tenhaou venha a ter, pois não prescinde da suacapacidade de racionalizar os sacrifícios eos benefícios em vista das ações a seremempreendidas em prol da satisfação das suasnecessidades.• Vantagens individuais e coletivas

Vantagem é objetivamente um algomais além do previsto. Em termos de parti-cipação, o sentido admite que a vantagempossa ser traduzida na clareza de resulta-dos positivos (ou benefícios esperados) advin-dos da ação de participar. Para engajar-se(participação ativa, envolvimento) em umaação coletiva (organização, mobilização), apessoa deve estar convencida de que seus in-teresses (em prol de si mesmo, da família ouda comunidade) podem ser melhores oumais rapidamente alcançados desta formado que se agir sozinha (OLSON, 1999). Estaé a racionalidade que faz qualquer pessoacomum, por menos instruída ou mais desin-formada que seja. Obviamente, afora a in-transigência, as pessoas podem ser con-vencidas, persuadidas em seus interesses.

Estes apontamentos, que apenas intro-duzem a questão da participação, estão lon-ge de oferecer a dimensão real da sua com-plexidade. Investigá-la e discuti-la cientifi-camente é ainda uma lacuna entre os estu-dos sobre o desenvolvimento. As experiên-cias com formas de gestão aberta à partici-pação popular (como é o caso dos orçamen-tos participativos) são recentes e colocam

questões que ainda carecem de respostas.Não obstante, já se observa que há grandecomplexidade associada ao fenômeno daparticipação, dada a multiplicidade de fato-res e variáveis envolvidos.

2.2 O sentimento de pertença ao lugar

O lugar é o cenário interativo dos acon-tecimentos, onde os fenômenos naturais ehumanos acontecem e produzem seus efei-tos. Por isso não é apenas porção e sim sín-tese da totalidade socioespacial. Há, pois,uma “ordem local” diretamente associadaao cotidiano das pessoas, cujos parâmetrossão a co-presença, a vizinhança, a intimida-de e a cooperação (SANTOS, 1996a). Eis aescala humana que se identifica pela rela-ção entre as pessoas, entre estas e o seu en-torno (ambiente, empresas e instituições),pautada na interdependência e na comuni-dade de interesses, mas também, e princi-palmente, no cotidiano conflitante e solidá-rio vivido em comum.

A “força do lugar” reside no territóriocompartilhado e identificado por uma cons-ciência social e comunitária de entorno, cujaessência é a própria história vivida em co-mum (SANTOS, 1996a). O lugar se apresen-ta para as pessoas por sua materialidade,pela aparência conhecida e familiar dos ele-mentos que o compõem – casas, ruas, cam-pos, a vizinhança, o clima habitual, etc. Écerto que tal materialidade participa ativa-mente da vida das pessoas, envolvendo-aspor todos os lados, sendo assim, no territó-rio, que os fatos ganham plena significação,tornando-se fatos socioespaciais.

A existência humana é um fato espa-cial (“quem existe, existe em algum lugar”,diria Aristóteles). Como tal, feito lugar, oespaço é parte integrante da identidade deuma pessoa, portanto indissociável da cul-tura e da história. O sentimento de pertença(pertencimento) ao lugar é assim fundamen-tal à consciência coletiva (do indivíduo nolugar, integrante de uma comunidade), istoé, a percepção mais ampla do entorno e aidentidade de interesses entre o indivíduo ea coletividade. O lugar além de espaço per-cebido é também espaço sentido e este senti-mento é fundamental para estabelecer umaverdadeira relação de respeito e compromis-

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so (no sentido ecológico) com o meio social enatural.

Por identidade se entende precisamen-te o processo de construção de significadosculturalmente estabelecidos e inter-relacio-nados. Tal construção se configura como umprocesso contínuo de afirmação do indiví-duo frente a coletividade ou a “ameaças ex-ternas”. Desta construção resulta o sujeito,entendido como aquele que se individualizana construção de sua própria história ou o“ator social coletivo” que alcança o “signifi-cado holístico em sua experiência”(CASTELLS, 2000, p. 26). Uma importantequestão, que merece toda atenção de todosquantos se dedicam à compreensão da rea-lidade territorial local, é a sobrevivência dacomunidade diante dos processos cada vezmais globalizantes. Castells (op. cit.) afirmaque as lutas contra a exploração econômica,a dominação cultural ou ainda contra a re-pressão política, levaram as pessoas à orga-nização e ao auto-reconhecimento com baseno território. Tal processo, paradoxalmente,reforçou o caráter comunitário mediante aprodução de significado e de identidade (“mi-nha vizinhança”, “minha comunidade”,etc). Assim, entende o autor, tem-se uma“identidade defensiva, uma identidade deentrincheiramento no que se entende comoconhecido contra a imprevisibilidade do des-conhecido e do incontrolável” (p. 80).

O lugar, por sua essência humana, é oespaço vivido, no qual as pessoas constróemsuas vidas e com o qual elas se identificam eao qual associam a sua história. No lugar, aproximidade, que se define no cotidiano eno território compartilhados, é fator de soli-dariedade, além de reforçar a cultura e des-te modo a identidade (SANTOS, 1996a).Pertencimento a um lugar é um sentimentotão indispensável à pessoa quanto perten-cer a uma família ou a um grupo social.Tratá-se, pois de um sentimento em duplosentido, já que a pessoa tanto se sente per-tencente a um determinado lugar quanto otoma como seu. Ao longo da vida, as pesso-as tomam para si elementos do espaço queadquirem algum significado em suas vidas.A escola, um esquina, um riacho, uma casa,uma árvore entre tantas outras, podem serreferências importantes, especiais, para todaa existência de uma pessoa. O que torna o

espaço um lugar é, essencialmente, a emo-ção e o simbolismo, que o referenciam naexistência humana (TUAN, 1976).

Sem embargo, o sentimento de perten-ça ao lugar, enquanto resultado da vida co-tidiana, está entre as “energias intangíveis”e pode (deve) ser acionado como força dedesenvolvimento (LE BOURLEGAT, 2000).Assim, o desenvolvimento local expressauma concepção de desenvolvimento quevaloriza o lugar como referência territorial epropõe estabelecer uma relação de mútuofortalecimento com a identidade culturalcomunitária. A rede de solidariedade e agestão democrática e autônoma dos interes-ses locais frente aos interesses globais são,pois, fundamentos da endogenia e referên-cias da afirmação da identidade individuale comunitária.

3 Desenvolvimento local e turismo

Enquanto estratégia, o desenvolvimen-to local implica na exploração dos recursose meios disponíveis, no enfrentamento e su-peração dos entraves e no aproveitamentodas condições favoráveis e das oportunida-des. Na perspectiva de um verdadeiro de-senvolvimento local, a meta não é o progres-so material (acúmulo de bens) ou a expan-são da oferta local de emprego e renda, masa promoção da vida, a satisfação plena dasnecessidades fundamentais de uma comu-nidade3, ou um efetivo combate a todas asformas ou manifestações da pobreza huma-na. Na verdade, a produção material em sinão é problema, mas o fato de sua progres-são se pautar nas necessidades do mercado,que estimula e se sustenta do consumismo,isto é, do consumo desmedido de modismose de supérfluos4. Obviamente se está falan-do da lógica da acumulação capitalista, quedinamiza a sociedade de consumo, cujamedida de riqueza se dá pela quantidade debens (expansão patrimonialista). Aqui secoloca uma questão fundamental, que é aconquista do desenvolvimento sustentável,o desafio do momento, a ser alcançado noâmago de uma sociedade amplamente desi-gual e consumista e, portanto, insustentável,qualquer que seja a dimensão considerada.

Ainda que se entenda como reação aosinteresses e a exploração que vêm de fora,

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representantes de uma ordem globalizante,impessoal e com elevada capacidade de rea-lização, ao voltar-se para o lugar, isto é, astentativas de mobilização da população lo-cal no sentido de gerir seus recursos e pro-mover seu bem-estar de forma mais autôno-ma, ao menos parece ficar cada vez maisvisível a força que representa uma comuni-dade organizada, ciente de suas limitaçõese de suas metas. Verifica-se que a “redesco-berta do lugar”, do território que revela atotalidade sistêmica (unidade dialética) en-tre a sociedade humana e a natureza, estáassociada à busca por meios (estratégias,modalidades) sustentáveis de atender às ne-cessidades das pessoas ou do próprio capi-tal. Os desafios crescentes no sentido de su-perar as carências e as desigualdades soci-ais e econômicas, materializadas na pobre-za humana, têm levado as localidades a bus-carem alternativas que possibilitem a gestãolocal e a participação ativa da população5.

Neste contexto, a preocupação com asustentabilidade se faz presente como temade estudos e de debate nas mais variadasáreas do conhecimento. Trata-se da utopia6

herdada do último século, no sentido de que,diante da necessidade de garantir as condi-ções de futuro, exercem-se a vontade e aimaginação em busca de uma situação com-paravelmente melhor, em que a sobrevivên-cia e a felicidade humana estejam fundadasem uma relação com a natureza capaz de semanter no espaço e no tempo. O desenvol-vimento local é cada vez mais discutido edefendido como um caminho possível e rea-lista para a conquista do desenvolvimentosustentável que, conforme sua definição con-sagrada pela Agenda 21, é aquele que se fun-damenta no uso racional dos recursos natu-rais, sendo esta racionalidade pautada pelagarantia das condições de existência das ge-rações futuras, proclamando, em sua essên-cia, a justiça social (eqüidade), o projeto co-letivo, a conservação ambiental e o respeitoà integridade cultural dos povos.

No âmbito do Turismo, o debate é cadavez mais profícuo. Ali o desenvolvimentolocal parece acenar com premissas funda-mentais e voltadas para a valorização do serhumano, como são o compromisso com a ci-dadania e o respeito à natureza, sobre asquais se move a formulação do que deno-

miná-se de Turismo Sustentável, Turismocom Base Local e Ecoturismo. Entende-se,pois, que a sustentabilidade, em sentidoamplo, multidimensional (ambiental, social,cultural e econômico) seja inerente ao desen-volvimento de uma comunidade fundada embase ecológicas e humanísticas. Mas a ques-tão que se coloca aqui, sem a pretensão derespondê-la definitivamente, é a de comoencarar a atividade turística, considerandoo quão tem sido desejada por seu potencialdinamizador, isto é, seus efeitos sinérgicossobre a realidade socioeconômica local, emvista dos princípios e pressupostos do desen-volvimento local? A questão é especialmen-te válida para os lugares que apresentamvariados recursos turísticos e que, portanto,enfrentam o dilema da premência pela ge-ração de emprego e renda e a preocupaçãocom a sustentabilidade.

Etimologicamente, a palavra turismoencerra a ação de viajar, por prazer ou porconhecimento, traduzindo-se pela idéia desaída e retorno a um lugar de origem(BLANCO, 1992). Claro que não significapropriamente “dar uma volta”, mas tambémnão admite a idéia de permanência, de umaviagem permanente. O turista que por qual-quer razão resolve se fixar no lugar visitadoterá se tornado um migrante.

Não há dúvida de que a atividade tu-rística seja prazerosa, senão como explicar oseu crescimento até mesmo em conjunturaseconômicas desfavoráveis. Enquanto ativida-de econômica, o turismo vende muito maisdo que a paisagem a ser contemplada, do queo lazer, a diversão ou o exótico. Vende igual-mente expectativas, história, lendas e contos;vende todas as possibilidades de fluir a ima-ginação e o pensamento nostálgico do turistaquando em interação com a paisagem; ven-de a ilusão consubstanciada na expectativado desconhecido. Neste sentido afirmaRodrigues, A. B.: “Não há dúvidas de que osturistas compram ilusões, ou o que imaginamque o lugar escolhido para passar férias pos-sa oferecer” (2000, p. 112). Seja como for, con-sumindo o concreto ou o abstrato, o prazer ea fantasia, o que de fato se busca no turismoé a satisfação. Logo, satisfazer plenamente oturista, em suas aspirações, desejos e expec-tativas, constitui o objetivo mais elementar dosque promovem o turismo.

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Embora a atividade turística seja uni-versal em sua concepção e prática, o fenô-meno turístico tem peculiaridades e especi-ficidades que decorrem, em última análise,do conteúdo único de cada lugar. Os luga-res e as atrações naturais são únicos, nãoobstante os atrativos técnicos possam sermuito semelhantes e mesmo iguais indepen-dente de sua localização. Elementos natu-rais ou técnicos que possam ser “consumi-dos” pelo turista constituem recursos oupotencialidades susceptíveis de exploraçãoeconômica, isto é, de gerar renda, lucro, re-tornos financeiros.

Enquanto atividade econômica, o tu-rismo é reconhecidamente rentável, mas tam-bém pode ser fonte de inúmeros impactossociais, culturais e não apenas ambientais.A rigor, não há como se evitar os impactosdo turismo sobre o ambiente ou sobre a co-munidade de destino, por mais simples ourústico que seja. Isto não faz o turismo umaatividade intrinsecamente ruim ou inviável.Sobre a questão, afirma Ruschmann (2000,p. 66): “Não existe turismo bom ou mau, umque respeita o meio ambiente e outro que odestrói. (...), pois nenhum tipo de turismo,mesmo o mais brando, é capaz de não agre-dir o meio ambiente”. Isto coloca, mais umavez, a questão da sustentabilidade.

O chamado turismo sustentável seriaaquele que atende às necessidades do turis-ta sem comprometer o uso dos recursos pelapopulação local e suas condições de futuro.Seria o caso de tal como Rodrigues, A. M.(1997), proclamarmos que, em essência, aatividade turística, ou o próprio desenvolvi-mento, seja incompatível com asustentabilidade? Se a idéia de desenvolvi-mento for aquela que objetiva unicamenteincrementar a renda e a oferta de empregono local, então a resposta é sim. Ocorre quea insustentabilidade ambiental e socioeco-nômica decorre fundamentalmente:1. De uma visão/consciência que entende o

desenvolvimento exclusivamente comoprogresso material/patrimonial ilimitadoe centra no mercado, na inserção comerci-al, a expectativa de superar as desigual-dades e as carências sociais;

2. Do consumismo desenfreado alimentadopela multiplicação dos desejos, da vonta-de de ter, possuir.

De fato, a sustentabilidade sociocul-tural e ambiental não pode ser conquistadapela lógica do mercado (RODRIGUES, A. M.op. cit.). Como evoluir sobre esta constatação,isto é, refletir sobre a atividade turística en-quanto atividade econômica sem decretarsua insustentabilidade social ou ambiental?Com base no que foi tratado até aqui, é coe-rente considerar que a sustentabilidade nãodeve ser vista como um atributo de qualqueratividade em si, mas como resultado possí-vel, uma virtualidade, a ser buscada em meioa uma conjugação de fatores socioculturaise de interesses estritamente econômicos.

Acredita-se que, à escala humana, lo-cal, possa se surpreender e identificar con-cretamente os distintos interesses que jogame tentam fazer valer aquilo que, distintamen-te, cada qual entende por desenvolvimento.Qualquer que seja a modalidade ou tipo deturismo, haverá sempre os que ganham e osque perdem. Entende-se, assim como Souza(1997), que seja esta uma questão fundamen-tal, isto é, conhecer os diferentes grupos deinteresse e a capacidade (poder) que cada qualtem para concretizar seus objetivos e estraté-gias. A idéia de que com as agressões ao meioambiente natural, todos perdem, não é ime-diatamente verdade para todos. Da mesmaforma, não é absolutamente verdade que to-dos ganham com a elevação da renda localou com aumento da oferta de empregos.

A idéia do Turismo com Base Local odefine como o resgate e a promoção dasespecificidades do lugar, do “único”. Acre-dita e valoriza o conhecimento popular lo-cal na explicitação dos problemas e na bus-ca de soluções (RODRIGUES, A. B., 1997).Esta concepção parte claramente das premis-sas do desenvolvimento local quando elegeo local como escala mais realista e a comu-nidade como gestora do seu próprio desen-volvimento. É importante considerar que odiferencial deste entendimento não está pro-priamente na valorização do lugar ou naescala de ação ou ainda na proposta do pla-nejamento amplamente participativo. A dis-tinção está essencialmente na tentativa deassimilar (e obviamente por em prática) umanova compreensão do próprio desenvolvi-mento, que se volta para as pessoas não ape-nas como beneficiárias, mas como sujeitos,agentes (e não atores), na conquista da eqüi-

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dade social, dos meios de subsistência e daprópria sustentabilidade.

Volta-se neste momento a uma ques-tão crucial. Trata-se do compromisso e daresponsabilidade da pessoa em uma coleti-vidade. Já se afirmou que em um contextode mobilização deve imperar o senso de com-promisso e de responsabilidade. Compromis-so ou comprometimento envolve, a um sótempo, obrigação e empenho pessoal em re-lação aos termos de uma decisão ou mesmode um plano; significa portanto tornar outornar-se responsável. O senso de compro-misso (sentimento interior, que não se garan-te simplesmente com uma assinatura) real-mente só se estabelece na medida em que apessoa:• Tem consciência da realidade, na qual se

supõe ter mínima clareza sobre com o quêestá se comprometendo;

• Entende e sente que vale a pena se com-prometer;

• Efetivamente aceita se comprometer e,portanto, agir com responsabilidade.

Deve-se considerar que compromissoe responsabilidade envolvem questões sub-jetivas e objetivas, interesses individuais ecoletivos, que balizam o envolvimento efeti-vo e envolvem ações intencionais e racionais.E o desenvolvimento sustentável, tal comoassinala Bartholo Jr. e Bursztyn (2001), re-quer que a pessoa assuma perspectivas delongo prazo e se disponha à conquista deum futuro incerto e surpreendente7. Nestesentido, o compromisso e a responsabilida-de são realmente capacidades éticas que, emúltima análise, se voltam para a sustentaçãoda vida.

Outra questão também fundamental éobservar que a temporalidade (breve, fugaz)característica à prática do turismo, na me-dida em que dificulta (ou mesmo impede)que o turista tenha uma experiência maisintensa com a vida local, restringe igualmen-te a possibilidade do entendimento e doenvolvimento e, por conseguinte, solapam ocompromisso e o respeito. Obviamente quehá outros fatores e variáveis intervenientesneste processo que não devem ser esqueci-dos, como por exemplo, a educação e a cul-tura. A postura diante do lugar e das pesso-as, que afeta a ética e a responsabilidade, temdeterminantes que extrapolam a pessoa do

turista, colocando-se antes e depois dele. Aquestão é, pois, paradigmática e tem a vercom visão e consciência de mundo e da rela-ção sociedade e natureza. As distintas for-mas de agressão ao meio imposta pelo turis-ta não são meras ações individuais, pelasquais se deve responsabilizar unicamente apessoa do turista. Concorda-se aqui com aidéia de que, neste caso, a responsabilidadepelos efeitos certamente indesejáveis do“consumo” inadequado não cabe apenas ao“consumidor”, mas a todo o aparato “pro-dutivo” e “comercial” que se edifica e funci-ona em torno da atividade turística.

A conquista da sustentabilidade nãoparece depender unicamente da organiza-ção, do aparato técnico e de princípios e ob-jetivos ecologicamente corretos e bem inten-cionados. Acredita-se, tal como Bartholo Jr.e Bursztyn (op. cit.) que ela requer uma novaética, a ser socialmente construída, que defi-na os limites e os pressupostos da responsa-bilidade civil e de uma cidadania pautadano respeito e na promoção da vida.

Notas:1 “Há desigualdades sociais que são, em primeiro lugar,

desigualdades territoriais, porque derivam do lugaronde cada qual se encontra. (...) O cidadão é um in-divíduo no lugar” (SANTOS, 1996b).

2 Sobre o tema ver o interessante trabalho de MancurOlson, A lógica da ação coletiva, 1999.

3 Max-Neef et. al. (1986), entendem que são nove asnecessidades humanas fundamentais: subsistência,proteção, afeto, entendimento, procriação, participa-ção, ócio, identidade e liberdade.

4 “El consumismo: la enfermedad de nuestra cultura”,para Elizalde (2000, p. 53).

5 As municipalidades sul-matogrossenses por exemplo,conforme indicamos em um outro trabalho (CARPIOet al, 1999).

6 Uma boa utopia, que orienta a prática e o pensamento,na medida em que se entende que a sustentabilidadeencerra uma situação de vida melhor, possível, pelaqual vale a pena lutar.

7 “O desenvolvimento sustentável exige assumirperspectivas de longo prazo, numa visão de futuroem que a incerteza e a surpresa se fazem presentes”(p. 182).

Referências

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Fatores inerentes à economicidade de sistemas de produção de bovinos de corte,no município de Campo Grande, Mato Grosso do Sul

Factors inherent to the economy of beef production systems in the municipality ofCampo Grande, South Mato Grosso

Factores inherentes al economismo de sistemas de producción de bovinos de corte, en elmunicipio de Campo Grande, Mato-Grosso-del Sur

 Camila Celeste Brandão Ferreira Ítavo1, Luís Carlos Vinhas Ítavo2, AlexandreMenezes Dias3, Rodrigo da Costa Gomes4, João Pedro Batista da Silva5, Kepler

Euclides Filho6, Maria da Graça Morais7

Recebido em 11/11/04; revisado e aprovado em 02/02/05; aceito em 17/02/05.

Resumo: O artigo retrata a situação da produção de bovinos de corte no Estado de Mato Grosso do Sul e no Brasil,mencionando itens de relevância para o aumento da produtividade da cadeia produtiva, mercado de carne bovina eum estudo de caso sobre o efeito da castração sobre o desempenho produtivo e econômico de bovinos no municípiode Campo Grande, MS. No estudo de caso, o ganho de peso do animal não-castrado foi cerca de 10% maior, comcusto semelhante entre os animais castrados e não-castrados, o que denota maior lucro com a não-castração, devidoaos menores custos com medicamentos e perdas de peso. A pesquisa e a divulgação das mesmas são importantespara o desenvolvimento da produção de bovinos. Em conclusão, tem-se que a pesquisa, de campo e econômica, podeser uma ferramenta para o incremento de produtividade e necessita da extensão para a realização de seu papel nasociedade produtiva.Palavras-chave: cadeia produtiva; desenvolvimento; gestão rural.Abstract: The article portrays the situation of the beef cattle production, in the Mato Grosso of the South state and inBrazil, mentioning items of relevance for the increase of the productivity of the productive chain, market of bovinemeat and a study of in case on the effect of the castration on the productive and economic performance of bovine inthe municipal district of Campo Grande, MS. In the case study, the gain of weight of the no-castrated animal wasabout 10% larger, with similar cost among the castrated animals and no-castrated, what denotes larger profit with theno-castration, due to the smallest costs with medications and weight losses. The research and the popularization ofthe same ones are important for the development of the production of bovine. In conclusion, it is had that the research,of field and economic, it can be a tool for the productivity increment and needs the extension for the accomplishmentof its role in the productive society.Key words: development; market productive chain; rural administration.Resumen: El artículo retracta la situación de la producción de bovinos de corte en el Estado de Mato-Grosso-del Sury en Brasil, mencionando ítemes de relevancia para el aumento de la productividad de la cadena productiva, mercadode carne bovina y un estudio de caso sobre el efecto de la castración sobre el desempeño productivo y económico debovinos en el municipio de Campo Grande, MS. En estudio de caso, el gano de peso del animal no castrado fue cercadel 10% mayor, con un coste semejante entre los animales castrados y no castrados, lo que denota mayor logro con lano castración, debido a los menores costes con medicamentos y pérdidas de peso. La pesquisa y la divulgación de lasmismas son importantes para el desarrollo de la producción de bovinos. Finalizando, se tiene que la pesquisa, decampo y económica, puede ser una herramienta para el incremento de la productividad y necesita de la extensión parala realización de su papel en la sociedad productiva.Palabras clave: cadena productiva; desarrollo; gestión rural.

tral do país, ocupando uma posição geogra-ficamente privilegiada do ponto de vista eco-nômico, uma vez que faz fronteira com gran-des centros consumidores, e ainda dispõe doPantanal, o maior santuário ecológico domundo, que cobre aproximadamente 25% desuas terras. Sua economia baseia-se principal-mente na agropecuária.

Introdução

Criado em 1977, pelo então presidenteda república Ernesto Geisel, o estado de MatoGrosso do Sul, de acordo com dados do IBGE(2004), ocupa uma área de 357.124.962 km2

e possui uma população de 2.078.001 milhõesde habitantes. Está localizado na região cen-

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 119-136, Mar. 2005.

1Mestrado em Ciência Animal – UFMS. ([email protected]).2Professor do Curso de Zootecnia e do Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Local da UniversidadeCatólica Dom Bosco. ([email protected]).3Mestrando em Zootecnia (Produção de Ruminantes) da Universidade Estadual Sudoeste da Bahia-UESB.([email protected]).4Mestrando em Zootecnia (Qualidade e Produtividade animal) da Faculdade de Zootecnia e Engenharia deAlimentos-FZEA/USP. ([email protected]).5 Zootecnista, bolsista apoio técnico Embrapa Gado de Corte, Campo Grande. ([email protected]).6 Eng. Agr. Ph.D. Pesquisador da Embrapa Gado de Corte. Campo Grande-MS. ([email protected]).7 Med. Vet. DS. Professora do Programa de Mestrado em Ciência Animal da UFMS.

120  Camila Celeste Brandão Ferreira Ítavo; Luís Carlos Vinhas Ítavo; Alexandre MenezesDias; Rodrigo da Costa Gomes; João Pedro Batista da Silva; Kepler Euclides Filho e

Maria da Graça Morais

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

A bovinocultura surgiu no estado deMato Grosso, em meados do século XVIII,quando ainda a sua atividade econômica seconcentrava na mineração. Em decorrênciado declínio do ciclo do ouro nesta região, alavoura e a pecuária começaram a se desen-volver, expandindo com a implantação daferrovia Noroeste que liga Corumbá e Cam-po Grande, em Mato Grosso do Sul, à cida-de de Bauru, no estado de São Paulo. Porém,a prática da bovinocultura no estado aindaera considerada precária.

De acordo com MICHELS (2001):...a criação de bovinos era quase totalmenteregida pelos agentes naturais: o fazendeirointroduzia o gado na fazenda e não interferiano seu desenvolvimento, obtendo assim umabaixa produtividade. O trabalho do fazendeiroera castrar os novilhos destinados à engorda emarcar os nascidos na fazenda. Isso se estendeupor mais de um século.Até a década de 60, quando os animais

atingiam a idade de abate, eram transporta-dos para outros estados com mais recursostecnológicos. Tal procedimento promoviaalém da saída de divisas, através da carnebovina, do couro e de outros subprodutosdo abate; a renúncia de crescimento do Es-tado, pois toda e qualquer possibilidade deagregação de valor ao produto não poderiaser realizada e com isso menores eram aschances de aumento no número de empregosadvindos do setor agropecuário.

A divisão do estado de Mato Grossofoi considerada pelo governo Geisel comouma alternativa para o desenvolvimento eco-nômico e social da região, tendo em vista aenorme concentração de terras desocupadasao norte e a possibilidade de transformar aregião num grande pólo produtor de grãose de carne. Assim, surgiu o estado de MatoGrosso do Sul, em 1977.

Muitas fazendas foram abertas na re-gião sul-mato-grossense, devido ao grandenúmero de imigrantes provenientes de ou-tros estados do país, ocupando principal-mente a região pantaneira pelo menor pre-ço da terra. Com todo esse fluxo migratório,a pecuária de corte teve um crescimento sig-nificativo no novo estado, tornando-se a suaprincipal atividade econômica.

Por tal motivo, a região Centro Oesteé a região brasileira onde a produçãoagropecuária é caracterizada por estabele-cimentos excepcionalmente grandes. Segun-

do HELFAND (2003), a produtividade totalcresceu mais rapidamente a partir de 1970,quando algumas propriedades tiveram aces-so às instituições, ao crédito e aos insumosmodernos.

Com a instalação de novas tecnologiasno campo, a pecuária do Mato Grosso doSul se desenvolveu de forma progressiva,transformando-se na maior região produto-ra de carne do país. Segundo o IBGE (2004),o estado detém hoje, cerca de 22 milhões debovinos, o que o coloca na 1ª posição noranking da pecuária no Brasil. Além disso,as cinco maiores indústrias exportadoras decarne bovina estão localizadas em MatoGrosso do Sul.

Nesse contexto, produzir carne bovi-na em maior quantidade, de melhor quali-dade e o mais economicamente possível, paravender mais barato, é a meta de todos os seg-mentos da sociedade que estão diretamenterelacionados com a atividade pecuária emMato Grosso do Sul e no Brasil.

As características climáticas eterritoriais brasileiras são altamente favorá-veis à produção de bovinos de corte em regi-me de pasto. Além disso, o Brasil é detentordo maior rebanho comercial de gado de cor-te do mundo, da maior área de pastos culti-vados e do menor custo de produção daarroba bovina.

Segundo REIS e SIMÕES (2002), o cen-so agropecuário do ano de 1995 apontavaque tal setor correspondia a aproximadamen-te 30% do produto interno bruto nacional,sendo que destes 20% referiam-se a área agrí-cola e 10% à pecuária.

Dentro desse cenário, a pecuária decorte brasileira tem sofrido transformaçõesimportantes. A partir da estabilização mone-tária, fim do ciclo especulativo e, mais recen-temente, da desvalorização da moeda brasi-leira, houve uma redução progressiva dasmargens de lucro, e descapitalização do se-tor, resultando em uma busca maior por sis-temas viáveis de produção de carne bovina.

Na busca de um programa de produ-ção contínua de carne, eficiente e competiti-vo, torna-se essencial proporcionar condi-ções para desenvolvimento durante todo oano, a fim de que os animais sejam abatidosprecocemente.

Na maioria dos sistemas produtivos, a

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

nutrição animal inadequada causada pelasazonalidade da produção forrageira nostrópicos torna-se um dos principais respon-sáveis pela produção desuniforme de carnebovina (EUCLIDES, 1997), fato que desfav-orece a exportação de produtos, em quali-dade e quantidade suficientes, para suprir ademanda interna e externa.

Dessa maneira, a produtividade e efi-ciência dos sistemas de produção agrope-cuária, tem na alimentação animal seu prin-cipal componente. A utilização de alternati-vas de alimentação combinada a um bommanejo e a um genótipo animal adequado,podem resultar em boa produtividade e emviabilidade econômica do sistema de produ-ção (EUCLIDES, 2000).

No que diz respeito a terminação debovinos de corte, duas tecnologias tem sidoamplamente adotadas: confinamento e su-plementação a pasto.

A utilização do sistema de confina-mento cresceu muito na última década noBrasil, trazendo benefícios como o aumentodo ganho de peso em épocas de escassez deforragem, melhor aproveitamento da terra,concentrando animais em pequenas áreas,além de benefícios na qualidade da carcaçae da carne (FATURI et al., 2002).

Por outro lado, a suplementação ali-mentar tem se mostrado como uma alterna-tiva no incremento produtivo da bovino-cultura. Segundo Anualpec (2002), o núme-ro de animais suplementados em pastagensno país passou de 250 mil em 1992 para maisde 2,5 milhões, sendo que Mato Grosso doSul apresenta-se como o Estado com maiornúmero de bovinos semiconfinados ousuplementados em pastagens.

Paulino (1999) afirmou que embora ossistemas de produção de bovinos em pastejoapresentem maior variabilidade, estes cons-tituem uma opção viável para os pecuaristas,pois além de não requerer atividade agríco-la do porte da necessária aos confinamentos,permitem significativa melhora nos índicesde produtividade do rebanho e nas condi-ções de manejo das pastagens. Além disso,a grande extensão da área de pastagens nopaís constitui em vantagem competitiva parao mercado de produção de carne bovina,visto que o baixo custo de produção brasilei-ra, comparada aos custos dos Estados Uni-

dos e da Europa, pode ser o fator relevantepara conquista do mercado de exportaçãode carne.

A segurança alimentar apresenta-secomo outra vantagem para a produção na-cional, pois os animais produzidos em nos-so território são mantidos somente com pro-dutos de origem vegetal, afastando doenças,como a vaca louca, que trazem graves pre-juízos econômicos.

A decisão de terminar bovinos em con-dições de pastejo, utilizando-se suplemen-tação, depende da condição particular daregião, propriedade e mercado. A implemen-tação deste sistema pode viabilizar o abatede animais mais jovens, com carcaça demelhor qualidade, além de aumentar a ca-pacidade de suporte da propriedade(EUCLIDES et al., 1997).

Além da escolha do sistema a ser ado-tado, alternativas tecnológicas devem serbuscadas com o intuito de tornar a produ-ção mais eficiente e viável economicamente.Uma nova alternativa de manejo dos ani-mais destinados ao abate é a utilização demachos não castrados para a produção decarne.

A produção de carne a partir de bovi-nos de corte não-castrados no Brasil, aindaé baixa, haja vista que a maioria dos frigorí-ficos os discrimina pelo preço (RESTLE et al.,2000). A utilização de animais não castra-dos para o abate pode trazer benefícios parao produtor, devido à maior velocidade decrescimento em relação aos castrados(RESTLE et al., 1996). Entretanto, segundoEuclides Filho et al. (2001), vantagens comofacilidade no manejo, aumento dadocilidade, melhoria da qualidade da car-caça e maior aceitação no mercado faz dacastração uma prática muito comum prin-cipalmente nos sistemas produtivos mais tra-dicionais.

Os resultados de pesquisa têm demons-trado que machos não castrados crescemmais rapidamente, utilizam o alimento commais eficiência e apresentam maior rendi-mento de carcaça, com menos gordura emaior proporção de produto comercializável(SEIDEMAN et al., 1982). Ainda, de acordocom Luchiari Filho (2000), a castração exer-ce uma influência negativa no desenvolvi-mento do animal, deprimindo o desenvolvi-

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Maria da Graça Morais

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

mento do tecido muscular, promovendo de-senvolvimento do tecido adiposo.

Além das ponderações técnicas, a es-colha de um sistema de terminação de bovi-nos, além de estar baseada na potencialidadedas práticas de manejo adotadas, deve estarrelacionada ao retorno econômico da ativi-dade produtiva e sua inserção no contextoprodutivo da propriedade.

Desta forma, realizou-se um estudodos fatores inerentes à economicidade de umsistema de produção de bovinos de corte,castrados ou não-castrados, baseado na su-plementação a pasto, no município de Cam-po Grande, Mato Grosso do Sul. Objetivou-se avaliar o mercado de carne bovina no es-tado de Mato Grosso do Sul e do Brasil, noscontextos interno e externo, levantar alter-nativas de desenvolvimento através do ma-nejo de criação de bovinos de corte, com baseeconômica, indicando possíveis caminhos aserem seguidos; analisar a repercussão e aadequação de dados gerados pela pesquisa,de campo e econômica, como possíveis trans-formadores dos meios de produção.

Considerações sobre o mercado de carnebovina no Estado de Mato Grosso do Sule do Brasil, nos contextos interno eexterno

A bovinocultura tem grande importân-cia em todo mundo, pois além de ser a prin-cipal fonte de proteína animal, através dacarne e do leite, fornece matéria-prima paradiversos setores da economia, como adubosorgânicos, subprodutos para indústria decalçados, vestuário e farmacêutica. Alémdisso, em algumas regiões do país, os bovi-nos também são utilizados como animais detrabalho na exploração agrícola (CARVA-LHO et al., 2003).

O setor produtivo da carne bovina as-sume enorme importância no país, devidoao grande número de empregos gerados, àsdivisas alocadas e à possibilidade de cresci-mento a cada dia e a cada investimento.Neste contexto Bonjour (1999) afirmou queo futuro é promissor para a pecuária de cor-te, que através de um patamar tecnológico,entrará em um cenário no qual a produçãobrasileira permaneça como a maior e maiscompetitiva do mundo. Atualmente, tal fato

já está se consolidando, como pode ser de-monstrado pelo aumento das exportações dacarne bovina em 2003 e 2004.

A característica básica da pecuária decorte sempre foi a ocupação de novas áreasatravés da expansão das fronteiras agríco-las. Entretanto, a partir da década de 80, acomunidade internacional passou a questi-onar problemas como o desmatamento daregião amazônica, gerando uma intensapressão em relação a produção de carne bra-sileira (DE ZEN, 1999a). Como exemplosdisso foram realizadas campanhas em al-guns países contra a entrada de carne brasi-leira com argumento que essa carne era fru-to de desmatamento da Amazônia e váriasempresas européias e norte-americanas proi-biram a utilização de carne produzida den-tro dos limites da Amazônia Legal.

Situações como estas demonstram quea atividade pecuária subsidiada pela ocupa-ção de novas regiões chegou ao fim e que anova realidade exige acima de tudo investi-mentos em sistemas de alta produtividade.

Antigamente as pastagens eram forma-das e manejadas sem alguma preocupação,ao passo que a partir da década de 70, oscuidados foram gradualmente aumentados emuitos estudos foram conduzidos no sentidode definir as melhores pastagens para cadaregião e a melhor forma de manejo.

De Zen (1999a) relatou que no ano de1999 aproximadamente 34% das pastagensda região Centro-Oeste eram formadas ade-quadamente, com adubação e correção desolos adequados. Nos dias atuais, houve au-mento no percentual de pastagens maneja-das corretamente, devido principalmente àmaior produção e à maior sustentabilidadeobtidas através desta adoção. Somado a isso,a década de 90 também foi marcante devi-do a estabilização da economia, com aconsequente quebra dos rendimentosespeculativos e diminuição da margem delucros obtida pelos produtores, tornandonecessária a profissionalização da atividade.

Quando se objetiva um cenário comoesse, os elos da cadeia produtiva de gado decorte devem estar bem organizados de modoque possam exercer um papel na sustentaçãoda produção nacional, como um todo, tantocom vistas ao mercado interno, quanto aoexterno.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

Souza e Pereira (2003) concluíram queexiste forte interação entre os padrões estraté-gicos dos segmentos produtor e processadorna cadeia agroindustrial de carne bovina, noque diz respeito aos interesses, capacidades eexigências presentes na cadeia produtiva.

Segundo os autores, para o segmentoprodutor as estratégias são orientadas paraa qualidade sanitária e busca de produtivi-dade, as quais são limitadas ou condiciona-das pelos interesses dos processadores.

Já no segmento dos processadores, dis-tinguem-se aqueles do mercado interno, paraos quais a preocupação consiste na comer-cialização da carcaça fresca, o que determinaboa localização. Para os exportadores, atecnologia que viabilize diferenciação, ade-quação e flexibilidade à unidade processa-dora, além de bom posicionamento logístico,são condições qualificadoras essenciais.

Apesar de interesses muitas vezes dis-tintos, todos os elos da cadeia são altamentedependentes e configuram um mecanismobásico cujo funcionamento é primordial parao crescimento econômico da nação. Em ou-tras palavras, tudo que afeta alguns dos elosinfluencia, direta ou indiretamente, os de-mais, positiva ou negativamente.

Atualmente, os elos da cadeia têm seapresentado com a principal característicade individualismo exacerbado, o que deteri-ora tentativas de criar condições e alternati-vas através de alianças mercadológicas(PINEDA e ROCHA, 2002). Tal individualis-mo acarreta a falta de padronização e a ir-regularidade da oferta de novilhos, a sazo-nalidade da produção, o oportunismo nasnegociações, a falta de coordenação e entro-samento entre os elos da cadeia produtiva.

Infelizmente, a distribuição geográfi-ca do setor industrial ainda não atende anecessidade e a disponibilidade de animaise contribui para a elevação dos custos co-merciais. Além disso, existem excessivos gas-tos com frete de animais vivos, o que podesogificar prejuízo para os criadores.

Por tal motivo, as empresas ligadas aosetor cárneo iniciaram, nos últimos 20 anos,um processo de deslocamento do abate emdireção às regiões de produção. Segundo DeZen (1999a), o estado de São Paulo diminuiusua participação no setor frigorífico entre osanos de 1970 e 1994, de 34,5 a 23%, respec-

tivamente. Sendo que no mesmo períodoMato Grosso do Sul foi o estado que apre-sentou maior crescimento, de 5,16 a 17,96%entre os anos de 1979 e 1994. Tais relatoscorroboram a teoria de que as indústriasnecessitam de proximidade com o meio pro-dutivo, a fim de otimizar o funcionamentodos elos produtivos.

Nesse contexto, Rocha et al. (2003) es-tudaram a dimensão e a importância da in-dústria rural de São Paulo quanto à geraçãode renda e de emprego e estimaram que so-mente no estado de São Paulo existem 3.112unidades de produção agropecuária comatividade industrial, com valor anual da pro-dução de R$ 26,2 milhões, em 2001; e em-prego de 12 mil pessoas.

Ao se considerar o levantamento feitopor Rocha et al. (2003), pode-se delinear aspossibilidades de geração de emprego dosetor produtivo de carne bovina. Obviamen-te, o processo de industrialização não ocor-re somente em função do desejo do produ-tor, mas sim necessita de uma série de políti-cas públicas voltadas para o tema. Um bomprograma de geração de empregos tambémaumenta a capacidade de consumo do paíse promove uma maior demanda dos produ-tos, como a carne bovina.

Este ciclo de bons negócios implicariaem um sistema de crescimento econômico,no qual tanto a produção quanto o consu-mo seriam estimulados, com consequentemaior circulação de capital, maior poupan-ça do país e maior poder de investimento naprodução brasileira.

Nesse caso, a formação de aliançasmercadológicas poderia favorecer a coorde-nação do setor e contribuir para o progressofinanceiro e produtivo de toda cadeia, fazen-do com que produtores e indústria tenhammaiores lucros, supermercados tenham pro-dutos de melhor qualidade para a venda aosconsumidores, os quais estão cada vez maisexigentes na qualidade e segurança do pro-duto (PINEDA e ROCHA, 2002).

No Brasil, a carne bovina pode ser con-siderada como um bem normal ou superior,ou seja, para a maior parte da populaçãonão é comum o consumo de carnes. O fatormais interessante é que este menor consumoda carne bovina não está relacionado a ques-tões culturais e sim a questões econômicas.

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Tais afirmações podem ser comprova-das por Martins et al. (2003), que analisa-ram o comportamento do consumo físico decarne considerada de “primeira” e de “se-gunda” e suas respectivas elasticidades-ren-da. A elasticidade-renda é obtida através damedição da variação percentual do consu-mo de carne quando da ocorrência da vari-ação percentual na renda, ou seja, é a capa-cidade que um produto tem de absorver umaumento na renda.

Destaca-se que os cortes cárneos sãocomumente classificados como de “segun-da” e de “primeira”, de acordo com a locali-zação na carcaça dos animais, dianteiro etraseiro, respectivamente.

Segundo Martins et al. (2003), no Bra-sil houve um aumento no consumo, entre osanos de 1987 e 1996, de ambas as carnes:13,67% para carne de “primeira” e 6,67%para carne de “segunda”. Além disso, osautores citaram que a carne de primeira émais elástica do que a de “segunda”, ou seja,mais sensível a variações na renda da popu-lação.

Cabe destacar que este aumento noconsumo de carnes, nesse período, está di-retamente relacionado à conquista da esta-bilidade econômica e conseqüentemente àmaior capacidade de compra. Vale ressaltarque esta classificação de tipos de carnecomumente utilizada não deve ser preconi-zada pois todos os cortes bovinos podem serconsiderados de “primeira” desde que sejambem preparados. Além disso, a carne bovi-na é um alimento de alto valor biológico enutritivo, considerada uma excelente fontede proteína, ferro, zinco, tiamina, niacina evitamina B12 e de baixo valor calórico(LUCHIARI FILHO, 2000).

Segundo Reis e Simões (2002), a esta-bilização econômica promovida pelo PlanoReal, em 1994, pode ter provocado mudan-ças no padrão de crescimento da produção,consumo e exportação da carne bovina. En-tre os anos de 1994 e 1997, houve queda nasexportações brasileiras de carne bovina, de-vido à valorização da moeda interna e, con-seqüentemente, ao aumento do consumointerno. A partir de 1997, houve retomadano crescimento das exportações brasileirasda carne bovina, justificado pela desvalori-zação da moeda nacional em frente ao dó-

lar americano, o que fez com que a pecuáriade corte brasileira se tornasse mais competi-tiva.

Gomes et al. (2003) afirmaram que opreço do bovino no Brasil apresentou ten-dência de queda nos anos 80 e 90, basica-mente em razão das variações nas taxas decâmbio. Além da desvalorização cambial,ocorrida a partir de 1997, diversas externali-dades como as crises sanitárias internacio-nais também contribuíram para o aumentodas exportações brasileiras.

O ano de 2001 foi marcado pelas cri-ses sanitárias que abalaram o mercado mun-dial de carne bovina. Na América do Sul ena Europa ocorreram casos de febre aftosa eem países da Europa e no Japão surgiram osprimeros casos de encefalopatia espongifor-me bovina, doença conhecida comumentecomo “vaca louca”, devido a sintomatologianeurológica.

Lucas (2003) citou que as recentes cri-ses alimentares, difundidas através dos mei-os de comunicação, tiveram como conseqü-ência uma perda de confiança dos consumi-dores, em especial dos europeus, na comprade produtos de origem animal.

Entretanto, como a produção brasilei-ra ocorre de maneira diferenciada, tendoalimentos vegetais como base alimentar, taiscrises podem ser encaradas como um desa-fio para o nosso país e uma oportunidadepara aumento das exportações brasileiras.Como todo desafio, torna-se necessário osurgimento de estratégias que viabilizem ocrescimento sustentado das exportações decarne bovina.

Além disso, nenhum caso de encefalo-patia espongiforme bovina (doença da “vacalouca”) foi registrado até hoje em nosso paíse existem várias áreas consideradas livres dafebre aftosa e por isso autorizadas a expor-tação aos países de todo mundo.

Nesse sentido, algumas alternativascomo correta gestão ambiental, identificaçãoe certificação de origem bovina e utilizaçãode marketing estratégico da produção brasi-leira, baseada em pastagens, podem ser fa-voráveis ao aumento da competitividadebrasileira.

Segundo Gomes e Morais (2003), a pro-dução de bovinos de corte deve focalizar al-guns pontos importantes dentro do proces-

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so produtivo, como motivar profissionaispara desempenho de atividades de maneiraresponsável face ao meio ambiente; desen-volver alternativas viáveis para o tratamen-to de efluentes líquidos e sólidos; estabelecerpolíticas, programas e procedimentos quepermitam conduzir suas atividades de modoambientalmente seguro.

A correta gestão ambiental, assimcomo a utilização de alimentos vegetais, naprodução animal pode e deve ser uma fer-ramenta eficaz para o marketing estratégi-co da carne bovina para países de maiorpoder aquisitivo, principalmente pelo fatoda maior conscientização dos consumidores.

Pineda e Rocha (2002) citaram que ali-ança mercadológica pode ser definida comouma iniciativa conjunta de supermercados,frigoríficos e pecuristas objetivando levar aoconsumidor uma carne de origem conhecidae qualidade assegurada. Assim rastreabilidadepoderá certificar a origem do animal a serabatido, pois consiste em um processo no quala produção da carne é acompanhada desdeo nascimento do bezerro até a chegada aoconsumidor, interno ou externo e permite oreconhecimento da origem da carne e pro-move uma maior segurança quanto à quali-dade e à inocuidade do produto em questão.

A rastreabilidade deverá ser adotadapor todo o país já que faz parte das exigên-cias da União Européia, que representa cer-ca de 37,23% das exportações brasileiras decarne bovina “in natura” e 20,26% das ex-portações brasileiras de carne bovina indus-trializada (SARTO et al., 2003).

A montagem de um programa demarketing estratégico, demonstrando umaprodução consciente; em relação ao meioambiente e saúde dos consumidores; podepromover incrementos na demanda exporta-dora. Segundo Bonjour et al. (2003), as ex-pectativas das exportações do boi verde eorgânico são positivas devido à preferênciados consumidores internacionais por produ-tos ecologicamente corretos e sem uso deinsumos tóxicos que podem agredir a natu-reza e o homem.

Existe uma enorme necessidade de queseja melhorada a imagem da carne bovinanacional em nível internacional, entretantoa orientação deste marketing deveria ser ori-entada e financiada por um órgão que reú-

na os interesses de toda cadeia e que cadaelo colabore financeiramente por um órgãoque reúna os interesses de toda cadeia.

Há de se destacar que para os consu-midores internacionais a segurança quantoa inocuidade da carne bovina torna-se maisimportante do que a característica maciezda carne, a qual já é considerada comum nospadrões internacionais. Contrariamente,consumidores brasileiros estão atentos àmaciez da carne, ao passo que a saúde doproduto permanece em segundo plano, si-tuação provavelmente relacionada ao siste-ma de produção extensivo, no qual o ani-mal apresenta maior deslocamento, o quecontribui para o desenvolvimento das fibrasmusculares, proporcionando alguns cortescárneos a característica de menor maciez, atémesmo após a cocção.

Segundo Mello (1990), os preços exter-nos são muito favoráveis à exportação, aopasso que a maior deficiência do sistemaprodutivo de carne está no custo de trans-porte para promoção do escoamento da pro-dução. O problema de escoamento da pro-dução se faz presente também no estado deMato Grosso do Sul, principalmente devidoà ausência de vias diretas e de alternativasde transportes mais baratos, como ferroviá-rio e pluvial, por exemplo, as quais constitu-em eficaz ferramenta de ligação da matéria-prima à indústria.

Acima das questões logísticas, está ofato de que torna-se necessário a implanta-ção de uma política comercial mais agressi-va, a qual possa favorecer, em conjunto comas vantagens competitivas do país, o cresci-mento da pecuária brasileira em relação aomundo.

Além disso, a falta de estímulo às pro-priedades também se constitui em problemapara o sistema produtivo. Helfand (2004) cor-robora com esta questão afirmando que oacesso às instituições, aos créditos e aosinsumos modernos constitui em uma impor-tante ferramenta na eficiência entre estabele-cimentos, sendo primordial a promoção des-te acesso por médios e pequenos produtores.

Os médios e pequenos produtores sãoos que mais necessitam de políticas públicaspara o tema, já que os grandes conseguemobter toda assistência de maneira indepen-dente, possuem canais de comercialização

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funcionais e apresentam grandes vantagensna aquisição e venda de produtos, devido aomaior volume de negócios, apresentando,consequentemente, maior poder aquisitivo.

No que diz respeito a comercialização,existem muitas opções nos dias atuais. Se-gundo Aguiar (1998), além do contrato atermo, no qual o preço, a espécie e a quanti-dade são definidos no momento da celebra-ção do contrato; existe o contrato futuro, oqual não necessita de entrega da mercado-ria para liquidação da transação.

A utilização de contratos futuros deveser encarada como instrumentos adicionaisque podem, e devem, ser levados em consi-deração no gerenciamento da atividade decomercialização agrícola. Apesar de seremconsiderados como ferramentas úteis parafins específicos, não são a solução para to-dos os problemas de comercialização enfren-tados por agricultores e intermediários.

No Brasil, a Bolsa de Mercadoria e Fu-turos (BM e F) já negocia contratos dessanatureza para boi gordo, bezerro, algodão,açúcar, milho e soja, sendo que os indicado-res de preço são desenvolvidos e adminis-trados por fundações ligadas à universida-des, com objetivo de preservar a transparên-cia do processo.

Há de se destacar que a entrada deempresários rurais no mercado de contratofuturo requer um planejamento adequadode atividades (DE ZEN, 1999b), devido prin-cipalmente ao acompanhamento das oscila-ções do mercado de boi gordo e das metasde produtividade de cada lote de animais.

Como já comprovado, o mercado bo-vino em Mato Grosso do Sul e no Brasil sótende a crescer. Na esfera interna, existe anecessidade de uma maior capacidade decompra por parte dos consumidores brasi-leiros, que somente será alcançado no mo-mento em que ocorra crescimento econômi-co e exista maior número de empregos dis-poníveis aos cidadãos.

Já no âmbito externo torna-se impres-cindível à exploração da produção a pasto,com suplementos alimentares de origem ve-getal, gerando produtos saudáveis e isentosde malefícios à saúde humana, o que consti-tui a grande preocupação dos maiores im-portadores da carne brasileira.

Além disso, Silva e Carvalho (2003) afir-

maram que surge uma necessidade estratégi-ca de diversificação da pauta de exportaçõesalém da procura por mercados dinâmicos emexpansão, que demandem crescentemente asexportações agrícolas brasileiras.

Dentro do perfil estipulado por estesautores, os países asiáticos constituem comoum excelente mercado para o país, devidoprincipalmente à enorme população dessecontinente e à expectativa de crescimento damesma.

Segundo Pineda e Rocha (2002), o de-senvolvimento do mercado chinês, japonêse coreano só tende a aumentar, além daUnião Européia. Rússia e países da EuropaCentral e Oriental também constituem mer-cados promissores devido à limitada capa-cidade de produção relacionada a menorextensão territorial, ao rigor das leisambientais e ao destino dos efluentes, entreoutros fatores.

A maior participação da carne bovinaindustrializada, em detrimento da carne “innatura”, na exportação total de carne bovinapelo Brasil; pode ser a chave para o desen-volvimento maior do mercado de carne e dopaís, já que além de gerar mais divisas, devi-do ao maior valor agregado ao produto; ain-da colabora com o aumento do consumo in-terno, devido a fatores como geração de em-pregos na agroindústria, com conseqüenteaumento do poder de compra da população.

Estudo de caso: Adoção da técnica decastração em um sistema desuplementação a pasto, no município deCampo Grande, Mato Grosso do Sul

Realizou-se um estudo sobre os fatoresinterferentes na economicidade de um siste-ma de produção de bovinos de corte, castra-dos ou não-castrados, suplementados empastagem. O sistema produtivo foi reprodu-zido experimentalmente por Dias (2002), nasdependências da Fazenda Escola Lagoa daCruz da Universidade Católica Dom Boscoem Campo Grande, Mato Grosso do Sul, en-tre os meses de março e setembro de 2002.Foram utilizados oito novilhos F1 (½ Canchimx ½ Nelore) com idade média de 14 meses epeso médio de 276,0 kg, divididos em doisgrupos, sendo quatro animais castrados aosdez meses e quatro não-castrados, alojados

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em quatro piquetes de 0,58 hectare cada,totalizando uma área de 2,32 ha formadospor pastagem de Brachiaria decumbens, provi-dos de bebedouro e comedouro cobertos.

Em cada piquete, de 0,8 ha, permane-ceram dois animais, gerando uma taxa delotação de 3,0 UA/ha; o que reflete um va-lor acima da média, de um animal/hectare,praticada em Mato Grosso do Sul; além decaracterizar um sistema intensivo de produ-ção, conforme pode ser observado nos resul-tados de desempenho produtivo apresenta-dos na Tabela 4. Forneceu-se, em média 3,0kg de suplemento por animal (0,9% do pesovivo), diariamente, ao passo que a água foi

fornecida à vontade. O suplemento contin-ha 17,33% de PB e 72,92 % de NDT (nutri-entes digestíveis totais), a fim de suprir acarência nutricional dos animais mantidosnas pastagens. As proporções dos ingredi-entes no concentrado, e seus respectivos va-lores em Reais (R$), são apresentados naTabela 1 e a composição bromatológica doconcentrado e do volumoso na Tabela 2. NaTabela 3 está apresentada a porcentagemmédia de material senescente e vivo (verde),hastes, folhas (% do material vivo) e dispo-nibilidade de MS total e de folhas por pique-te e por hectare dos piquetes, a fim de de-monstrar as condições experimentais.

Tabela 1 - Proporções dos ingredientes no concentrado e custo por kg (em Reais - R$), em matéria natural (MN), ano base 2002

Ingredientes % Valor (R$/kg de Matéria Natural) R$/100kg

Farelo de soja 16 0,50 8,00 Farelo de arroz 20 0,20 4,00 Farelo de trigo 9 0,28 2,50 Aveia 24 0,28 5,60 Milho, quebrado 20 0,20 4,80 Alho em pó 1 0,80 2,40 Suplemento mineral 3 0,80 0,80 Ionóforo 4 0,80 2,40 Calcário 3 1,85 7,40 Custo 100 38,00

Tabela 2 - Teores de matéria seca (MS); nutrientes digestíveis totais (NDT); proteína bruta (PB); cálcio (Ca) e fósforo (P) do suplemento Ingredientes MS NDT PB Ca P % % % MS Aveia 88,39 78,51 13,96 0,1 0,3 Far. de milho 91,6 86,4 9,82 0,13 0,26 Far. de arroz 87,91 87,91 16,79 0,15 0,99 Far. de soja 88,56 81,04 47,64 0,4 0,71 Far. de trigo 88,87 79,5 14,41 0,11 1,54 Cal. Calcítico 100 0 0 38 0,02 Mineral 100 0 0 20 8 Ionóforo 100 0 0 27 5 Alho em pó 100 0 0 39 0,04 Total 89,23 72,92 17,33 1,29 0,64

Tabela 3 - Porcentagem média de material senescente e vivo (verde), hastes, folhas (% do material vivo) e disponibilidade de MS total e de folhas por piquete e por hectare dos piquetes experimentais

Piquete 1 2 3 4

Média

Área do piquete (m2) 4.597 5.039 7.932 5.639 5.801,75 Material senescente (%) 62,96 58,06 57,14 61,9 60,02 Material vivo (%) 37,04 41,93 42,86 38,1 39,98 Hastes (% do mat. vivo) 60 61,54 60 62,5 61,01 Folhas (% do mat. vivo) 40 38,46 40 37,5 38,99 kg MS-Total/piquete (0,58 Ha) 3.070,59 3.525,49 3.980,39 2.388,23 3.252,55 kg MS-Verde/piquete (0,58 Ha) 1.228,23 1.355,96 1.592,16 895,59 1.267,98 kg MS-Total/Hectare 5.294,12 6.078,43 6.862,74 4.117,65 5.607,84

Na análise econômica do experimentorealizada por Silva (2002), foram utilizadosa somatória dos dias referentes ao períodode suplementação (252 dias). Para fins deavaliação física e econômica do sistema deprodução, os resultados obtidos foram simu-lados para 12 anos e todos os preços foramdeflacionados, tendo como base o mês desetembro de 2002 de acordo com Feijó (1999)e Ribeiro (2000). A receita constituiu-se basi-camente no valor de venda dos animais, sen-do o valor da arroba obtido através da médiapraticada pela praça de Campo Grande du-rante o mês de outubro de 2002 (cinquenta

e dois reais). O preço de compra dos animaisfoi obtido através da média de preços encon-trados no Anualpec (2002), referentes a fe-vereiro de 2001 (trezentos e dez reais).

Para análise econômica financeira dosdois sistemas de produção foram utilizadosos critérios do valor presente líquido (EUCLI-DES et al., 1997; RIBEIRO, 2000 e FEIJÓ,1999), da lucratividade por animal (AGUIARet al., 2001b) e da lucratividade por hectare.Segundo Silva (2002), os tipos de sistemasadotados influenciaram significativamente arentabilidade do sistema, sendo os animaisnão-castrados mais rentáveis. Na Tabela 4

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estão apresentados os ganhos de peso porhectare e os ganhos médios diários para ani-mais não-castrados e castrados de 1527,14 e1366,38 kg/ha e 0,66 e 0,47 kg/dia, respec-tivamente.

Segundo Maraschin (1994), o ganhode peso por hectare tem sido usado comoexpressão definitiva da eficiência biológicana produção primária. Esta medida é deter-minada pelo rendimento médio diário poranimal e pela área de pastagem necessáriapara produzir o alimento consumido peloanimal. Entretanto, o autor ainda comentouque na produção de produto animalcomercializável, o objetivo do manejo deve-rá maximizar a produção por animal, sim-

plesmente porque tem relação direta com aredução dos custos pela redução do tempopara atingir o peso de abate.

Silva (2002) considerou os resultadosapresentados na Tabela 4 em uma simula-ção para uma área de 100 hectares, argu-mentando que a simulação somente acarre-taria maior diluição dos custos fixos, semmodificação da tendência dos resultadosencontrados (ARRUDA e CORRÊA, 1992).Além disso, tal simulação teve como princi-pal objetivo a padronização e extrapolaçãopara propriedades maiores.

A montagem do custo total dos investi-mentos está apresentada na Tabela 5. Em re-lação aos custos relativos, as depreciações fo-ram assumido os seguintes prazos: pastagem(cinco anos), cerca (vinte e cinco anos), tron-co, balança e piso do mangueiro (vinte anos),componentes do mangueiro (vinte e cincoanos), benfeitoria (cinqüenta anos), animais(quinze anos), máquinas e implementos (cus-to hora máquina), de acordo com Anualpec(2002). Em associação a depreciação, usou-se taxas de custo de oportunidade do capi-tal investido (COCI) à margem de 3% sobreo capital. O custo não desembolsável asso-cia o custo de oportunidade à depreciação.

Tabela 4 - Comparativo econômico dos sistemas de produção de carne a pasto em pastagem de Brachiaria decumbens Itens Não-Castrado Castrado Peso vivo inicial (kg) 275,67 278,00 Peso vivo final (kg) 442,87 396,25 Ganho médio diário (kg/dia) 0,66 0,47 Taxa de lotação (UA/hectare) 3,39 3,04 Produção em kg vivo/hectare 1527,14 1366,38 Produção de arrobas/animal 15,35 13,74 Produção de arrobas/hectare 52,94 47,37 Receita por animal (R$) 798,35 714,31 Receita por hectare (R$) 2.752,92 2.463,13

Tabela 5 - Composição do custo total anual dos investimentos em benfeitorias, instalações e custos operacionais, em reais (R$), ano base 2002 Custo Depreciação Unidade Valor COCI Anos Valor CND

INVESTIMENTOS Mangueiro - 42.087,41 - 1.089,78 1.089,78 Casa empregado - 8.000,00 50 99,42 99,42 Formação ha 41.620,00 5 5.741,23 5.741,23 Maq/Implementos - 16.500,00 15 683,51 683,51 Eqüinos cab 1.000,00 15 43,73 43,73 Terra ha 139.709,51 - 0,0 0,0 Cerca mangueiro - 3.282,63 25 81,82 81,82 Cerca piquete - 11.257,88 25 277,21 277,21 Total 263.457,43 8.016,70 8.016,70

DESPESAS Ração Kg 98.902,94 2.967,09 0,0 2.967,09 Hora-máquina H/m 988,67 29,66 0,0 29,66 Impostos - 778,91 23,37 0,0 23,37 Mão-de-obra - 4.752,77 142,58 0,0 142,58 Bovinos Cab 106.950,00 3.208,50 0,0 3.208,50 Medicamentos - 2.620,11 78,60 0,0 78,60 Formação ha 5.746,98 172,41 172,41 Total 220.740,38 6.622,21 6.622,21

RECEITAS POR CATEGORIA Animais não castrados Cab 264.110,77 Animais castrados Cab 237.368,21

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O custo relativo ao custo de oportu-nidade da terra (COT) foi desconsiderado,uma vez que sua valorização real permanen-te é suficiente para remunerá-la (COSTA eMARTINS, 1991). O custo desembolsado(CD) engloba ração, medicamentos, comprade animais, mão-de-obra, impostos, horamáquina e formação anual de pastagens(20% da área total).

Para o cálculo do valor presente líqui-do, usou-se taxas de 6,17% simulando o ren-dimento da poupança e 10% ao ano, à exem-plo de um outro tipo de aplicação. O preçousado na aquisição de terras está de acordocom valores médios para região Centro-Oes-te, conforme Anualpec (2000).

Foram também considerados como re-ceitas, para ambos os sistemas, o valor resi-dual dos bens cujo final da vida útil não coin-cidiu com o período da simulação de 12 anos(cercas, benfeitoria, máquinas e implementos,mangueiro, animais) e que haviam sido con-siderados como investimentos no primeiro

ano (FEIJÓ, 1999 e RIBEIRO, 2000). Para de-terminação do valor residual após os 12 anosda simulação foi utilizado o método linear dedepreciação, o qual leva em consideração avida útil e o valor de “sucata” do bem(HOFFMANN et al., 1987 e ANTUNES, 1999).

Observando-se os valores apresentadosna Tabela 5, verifica-se que o total das despe-sas somadas ao Coci totalizou R$ 227.362,59(duzentos e vinte e sete mil e trezentos e ses-senta e dois reais e cinquenta e nove centa-vos). Quando se faz a diferença entre recei-tas por categoria animal e despesas têm-seque os animais não castrados apresentam umlucro de R$ 43.370,39 (quarenta e três mil etrezentos e setenta reais e trinta e nove centa-vos) e os castrados um lucro de R$ 16.627,83(dezesseis mil seiscentos e vinte e sete reais eoitenta e três centavos). Tais valores suge-rem que um sistema de produção baseadono abate de animais não castrados seria omais recomendado nessas condições, devi-do à maior rentabilidade (Tabela 6).

Tabela 6 - Rentabilidade por área e por animal de acordo com o manejo adotado Rentabilidade por animal Rentabilidade por hectare Sistema de produção Não-castrado Castrado Não-castrado Castrado Custo não-desembonsável 42,43 42,43 144,23 144,23 Custo desembonsável 639,83 639,83 2.174,78 2.174,78 Custo total 682,26 682,26 2.319,01 2.319,01 Custo total/arroba 44,44 49,67 43,80 48,96 Receita bruta 798,35 714,31 2.752,92 2.463,13 Margem bruta 158,52 74,48 578,14 288,34 Margem líquida 116,09 32,05 433,91 144,12 PA/@ 15,35 13,74 52,94 47,37 Lucratividade (%) 14,54 4,49 15,76 5,85

Na Tabela 6 está apresentado o resu-mo dos dados econômicos. No custo nãodesembolsável foram considerados os custosde oportunidade do capital investido e dadepreciação dos investimentos. No custodesembolsável foram considerados todos oscustos relativos à alimentação, hora/máqui-na, implementos, impostos, mão-de-obra emedicamentos. O custo total foi estabeleci-do pelo somatório dos custos não desembol-sável e desembolsável. O custo por arrobaproduzida foi obtido através da divisão docusto total pelo número de arrobas produzi-das por animal e por hectare, com 52% derendimento de carcaça. A receita bruta foiobtida multiplicando o número de arrobasproduzidas pelo valor da arroba. A margembruta foi obtida da subtração da receita pelo

custo desembolsável e a margem liquida foiobtida da subtração da receita pelo custototal. A lucratividade animal e por hectarefoi de 14,54% e 15,76%; 4,49% e 5,85%, paranão castrados e castrados, respectivamente.

A extrapolação dos dados para 100hectares permitiu a elaboração da estimati-va do fluxo de caixa para um período de 12anos (Tabela 8), mostrando a receita, despe-sa e saldo dos respectivos anos. Preconizou-se que no décimo segundo ano ocorra a ven-

Tabela 7 - Modelos de aplicações financeiras, em função do valor presente líquido Poupança (6,17%) Aplicação Financeira

DI (10,00%) Não-Castrado 427.368,66 Castrado 229.813,09

503.433,01 262.602,17

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da da área, sendo seu valor final, referenteao investimento ocorrido no primeiro ano,descontando os valores acumulados das de-preciações dos investimentos no decorrer dos12 anos. O valor presente líquido das res-pectivas categorias está descrito na Tabela8. Verificou-se que os animais não-castradosapresentaram 427.368,66 e 503.433,01 derentabilidade em poupança ou em aplicaçãofinanceira, respectivamente (Tabela 7). Talfato sugere que a prática da castração dos

animais para crescimento e terminação re-duz a rentabilidade do sistema, devido aomaior estresse aplicado aos animais. Portan-to, em sistemas de bom nível nutricional tor-na-se aconselhável a criação de animais não-castrados. Além disso, a não castração asso-ciada ao bom manejo nutricional podem sertécnicas consistentes na busca da reduçãodo tempo necessário para o abate dos ani-mais, o que pode ser fator determinante nomaior giro de capital.

Tabela 8 - Receitas (RNC) e (RC), despesas (DNC) e (DC) e saldos (RNC) e (RC) dos animais não castrados e castrados, respectivamente em função do valor presente líquido (R$), considerando-se um investimento inicial de R$ 263.457,43 Ano RI RC DI DC SI SC

1 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 2 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 3 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 4 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 5 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 6 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 7 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 8 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 9 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51

10 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 11 275.429,71 246.435,80 235.379,29 235.379,29 40.050,42 11.056,51 12 511.581,62 482.587,71 235.379,29 235.379,29 276.202,33 247.208,42

Conforme verificado na Tabela 8, osaldo para os animais não-castrados foi511.581,62 e para os animais castrados foi482.587,71. Provavelmente a superioridadedos animais não castrados de 5,67% foi de-vido aos animais não terem sofrido ação dacastração, o que favorece seu crescimento.Além disso, animais não-castrados apresen-taram melhor desempenho em relação aosanimais castrados podendo atingir o peso deabate, 460 kg, mais rapidamente favorecen-do um maior giro de capital.

No procedimento da análise econômi-ca dos modelos de produção de bovinos decorte, foram levados em consideração osdados produzidos por DIAS (2002) e SIL-VA (2002) no contexto atual do mercado decarne bovina.

É importante ressaltar que, a produ-ção em larga escala, com aumento das vari-áveis como quantidade de animais, quanti-dade de ração, tamanho de pasto, entre ou-tros, também promove o incremento dalucratividade em decorrência do maior nú-mero de arrobas para comercialização final.

A utilização de um sistema degerenciamento pode garantir que a ativida-de não tenha seus custos de produção defi-cientemente acompanhados. Entretanto, omais comum nos dias atuais está no fato deque os custos de produção são deficien-tementes acompanhados, fazendo com quemuitos produtores apenas sobrevivam naatividade, ou até mesmo estejam apresen-tando prejuízos em seus resultados, tornan-do o sistema de produção insustentável.

Esta falta de acompanhamento ade-quado está fundamentada no histórico daprodução de bovinos de corte. Os produto-res, na década de 70 e meados de 80, esta-vam acostumados ao aproveitamento do di-ferencial, de até 40% do valor, entre safra eentressafra. Já na segunda metade da déca-da de 80, sucessivos planos econômicos que-braram a estrutura de preços e proporcio-naram ao investimento em gado a caracte-rística de segurança em momentos incertosda política brasileira. A partir de segundametade da década de 90, a estabilização eco-nômica fez com que a margem de retorno

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do investimento diminuísse, tornando neces-sária a profissionalização da atividade, fa-zendo com que as propriedades se tornas-sem empresas.

Para que uma atividade produtiva sejaconsiderada profissional é imprescindível umadequado levantamento da produção comoum todo. Entretanto a pecuária de corte ofe-rece uma diversidade muito grande em ter-mos de sistemas de produção, com a coexis-tência de sistemas extremamente obsoletose sistemas evoluídos de produção. Emboranão constitua uma regra, a pecuária exten-siva, na qual os resultados aparecem à lon-go prazo favorecem a não percepção da eco-nomia pelos produtores. Aliado a isso, a fal-ta de planejamento detalhado e de controlede custos do processo produtivo podem fa-vorecer o abandono da atividade, indepen-dentemente do tipo de sistema adotado.

A ausência de planejamento produti-vo pode acarretar várias situações indesejá-veis como o comprometimento do produtofinal pela falta de homogeneidade dos ani-mais produzidos, jovens e de mais idade,tendo como resultado cortes cárneos de di-ferentes qualidades.

Os dados levantados mostram que in-dependentemente dos manejos adotados(castração ou não) nos sistemas de criação,os animais apresentaram consumos de su-plemento nutricional semelhantes.

A análise econômica simples revela umfato importantíssimo: o custo de produçãodas opções de manejo dos animais castra-dos e não-castrados foi o mesmo. Entretan-to, na comparação entre o ganho de peso nodiferentes tipos de manejo.

Para um mesmo intervalo de tempo euma mesma quantidade de suplemento for-necido e mesma área de pastagem, o ganhode peso do animal não-castrado é cerca de10% maior do que o castrado, o que denotaque a criação de animais não-castrados é eco-nomicamente mais favorável do ponto devista da lucratividade na comercializaçãodos animais em questão.

Outra observação importante a ser fei-ta, é que, no caso de produção em larga es-cala, a tendência de lucratividade apontadae comparada a partir da observação do pa-rágrafo anterior poderá ser incrementada,já que, o produtor certamente incorrerá em

gastos para realização da castração dos ani-mais, os quais não foram contabilizados nosdados econômicos (horas de trabalho, mão-de-obra volante, depreciação das instalações,entre outros). Além disso, existe a maior pos-sibilidade de perdas de animais em funçãode prováveis processos infecciosos proveni-entes da operação de retirada dos testículos.

Quando consideramos o comparativode receitas e despesas dos dois métodos pro-dutivos (Tabela 8), podemos perceber que aofinal do ciclo produtivo, a lucratividade apre-sentada pelo modelo de não-castração é maisvantajosa do que o modelo de castração comosegue:

Como em todo mercado competitivo,o produtor deve procurar o máximo lucropossível e o modelo de criação de animaisnão castrados demonstra-se o mais lucrati-vo possível. Do mesmo modo De Zen(1999a), o produtor é um tomador de pre-ços, ou seja, o mercado determina os preçosatravés da oferta e da demanda e por issodeve estar atento para o fator custo que estásob seu controle.

O retorno econômico do sistema deprodução baseado em animais não-castra-dos foi maior que o obtido em sistemas base-ados em animais castrados. Provavelmente,o fato da maior eficiência de deposição demúsculos apresentada pelos animais não-castrados deve ter favorecido os melhoresresultados apresentados por estes animais.

Entretanto, conforme Restle et al.(2000), a produção de carne a partir de bovi-nos de corte não-castrados no Brasil, aindaé baixa, haja vista que a maioria dos frigorí-ficos os discrimina pelo preço. Tal fato nosdesperta para o fato de que a adoção da cas-tração ou não, deve levar em consideração,além dos parâmetros aqui apresentados, itenscomo acordos de compra pelos frigoríficosou por alianças mercadológicas (rede vare-jista – frigorífico – produtor rural), baseadosem um esquema de bom manejo animal.

Além disso, deve-se ressaltar que amanutenção de animais não castrados develevar em consideração a capacidade de for-necimento de nutrientes aos animais. Em si-tuações nas quais os animais terão suas exi-gências alimentares supridas, a adoção dacastração é opcional, levando-se em consi-deração o exposto acima e a idade ao abate.

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Entretanto, em situações nas quais o regimealimentar não permitir que os animais alcan-cem o abate até os 24 meses de idade, a cas-tração deve ser adotada, pois desta maneiraserá evitada a ação indesejável de hormôniosna carne do animal.

Em uma gestão empresarial adequa-da, torna-se interessante que uma proprie-dade/empresa agropecuária não escolhaapenas um manejo, e sim adote o manejoadequado para cada lote de animais, levan-do em consideração o destino dos animais,a existência de um contrato futuro, o perío-do do ano, provisão de alimentos para osbovinos, as instalações e o manejo do gado.

Além da adoção ou não da técnica decastração, verifica-se que uma grande par-cela dos gastos com a produção está relacio-nada à alimentação dos animais.

Os preços para aquisição da alimenta-ção concentrada (soja, milho, entre outros)têm sofrido uma grande variação, entretan-to tais preços se mantém elevados devido adois motivos: tais alimentos também são uti-lizados na alimentação humana, além douso na nutrição de suínos e aves; e possuemuma enorme afinidade com a exportação, oque fazem com que o preço no mercado sejabastante elevado.

Somado a isso, a situação dos merca-dos de produtos agrícolas que a cada anovêm ultrapassando recordes produtivos, temse invertido, haja vista que é alta a depen-dência de fatores climáticos e que neste anoagrícola de 2003/2004 particularmente, fo-ram grandes os prejuízos nas safras devidoa escassez de chuvas. A produção de sojano estado de Mato Grosso do Sul nunca foitão prejudicada e chegou a gerar prejuízosde aproximadamente 500 milhões de reais.

Vale ressaltar que este prejuízo estáassociado somente aos prejuízos dos agricul-tores e que se levássemos em consideração oprejuízo para todas cadeias produtivas de-pendentes da produção de soja e seus pro-dutos e subprodutos esta cifra apresentaria-se muito mais elevada.

Como alternativas para a cadeia pro-dutiva de bovino de corte, sugere-se a produ-ção de grãos dentro da própria propriedade,com consequente exclusão dos gastos comtransporte e com intermediários; e o investi-mento em pastagens de boa qualidade e a

aposta no manejo correto de pastagens, osquais permitiriam um melhor aproveitamen-to de alimentos mais baratos e uma menordependência de alimentação concentrada.

Outro fator de grande participaçãoeconômica, nos custos da produção do sis-tema estudado, consiste na aquisição dosanimais destinados a engorda. Portanto, háde se destacar a importância de se realizaruma boa compra, com preços atrativos e commaterial genético de boa aptidão para a de-posição de músculos, nosso produto final.

O momento da venda também consis-te em uma situação importante pois existemflutuações no preço de arroba, as quais po-dem estar relacionadas a épocas de safra eentressafra.

Além disso, devem ser realizados umadequado manejo sanitário e correta pro-filaxia para que não ocorram gastos excessi-vos com medicamentos, os quais compõemtambém o custo de produção.

Todas essas indagações e preocupa-ções deverão fazer parte do projeto ao quala empresa agropecuária irá seguir afim deatingir seus objetivos, seja abate de animaisprecoces ou não, castrados ou não, atravésde suplementação ou não em pastagens.

Atualmente não há condições de umapropriedade não trabalhar como uma em-presa agropecuária,com todas as preocupa-ções e atribuições de uma empresa (gestãode pessoal, de compra e venda, patrimonial,entre outras) e seguir um projeto piloto paraseu crescimento e desenvolvimento dentroda cadeia produtiva a qual está inserida.

Todavia para a implementação de qual-quer sistema de produção o produtor/empre-sário deverá consultar um profissional quali-ficado para estruturar o projeto de produção,a escolha dos animais (compra), o manejo aser adotado, a utilização das pastagens, seumanejo eficiente, a suplementação estratégi-ca e por fim o destino do produto (venda).

Assim, se há um acordo com o frigorífi-co em abater animais inteiros acima de 24 me-ses sem punição monetária (valor da arroba)há uma maior facilidade de trabalho. Porém,se a indústria somente aceitar animais não cas-trados abaixo de 24 meses (novilho precoce) oprojeto do sistema de produção deverá se ade-quar para atingir esse objetivo, sem des-considerar os custos envolvidos no processo.

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Repercussão e adequação de dadosgerados pela pesquisa, de campo eeconômica, como possíveistransformadores dos meios de produção

O aprofundamento das atividades depesquisa e desenvolvimento é primordial noprocesso de aumento de produtividade e daqualidade do setor agropecuário. Além da a-plicação de novas tecnologias, torna-se neces-sário a formação de equipes multidisciplinares;com profissionais das áreas de zootecnia, agro-nomia, veterinária, administração, economiae informática; para que sejam encontradassoluções para problemas da produção de bo-vinos de corte (LAMPERT et al., 2003).

A informação se constitui em um in-sumo básico para a administração de umaempresa rural. Neste sentido, a tecnologiada informação é imprescindível no gerencia-mento da pecuária de corte; sendo a sua efi-ciência diretamente relacionada à utilizaçãocorreta, por produtores e técnicos em con-junto, das informações processadas.

Segundo Schutz, citado por Paiva(1979), foram muitos elevados os retornoseconômicos dos investimentos feitos em pes-quisa; e citou que as pesquisas de milho, sorgoe de avicultura geraram taxas de retorno de70, 360 e 137% ao ano; respectivamente, nosEstados Unidos.

Entretanto, Paiva (1979) citou que apesquisa apresenta capacidade limitada emresolver problemas da produção agrícola dospaíses não desenvolvidos, proporcionando-lhes condições de aumento de produtivida-de, produção e redução dos custos unitári-os, especificamente em problemas de impro-priedade ou deficiência dos recursos natu-rais para a produção agrícola.

Contrariamente ao que se tem dissipa-do, a pesquisa tem sua importância funda-mental para o desenvolvimento da produ-ção e conseqüentemente do país como umtodo. O cerne da questão está na maneirade divulgação de novas técnicas e do con-vencimento da adoção das mesmas.

Assim, tem-se que o papel do exten-sionista é de fundamental importância paraa modernização da empresa rural.

Segundo Siqueira (1998), ao longo dahistória é muito comum a rotulação dospecuaristas como resistentes a mudanças

tecnológicas. Tal autor afirmou que tal idéiasurgiu principalmente pela concentração doatendimento dos agricultores patronais, pe-los extensionistas rurais, devido à ofertaabundante de crédito rural subsidiado nadécada de 60.

Antigamente, e até mesmo nos diasatuais, o produtor tem sido tratado comomero objeto passivo que poderia ser facilmen-te “treinado”, visando persuadi-lo a adotaras tecnologias modernas que eram apresen-tadas como fator determinante de melhoriade renda e da vida no campo.

Entretanto, para que uma mudançaconceitual seja realmente adotada, primeira-mente deve-se buscar um conhecimento pro-fundo da realidade e da percepção dos agri-cultores. Por isto, será fundamental que osprodutores participem da análise opera-cional da técnica, pois não se pode imporum procedimento padronizado de introdu-ção da técnica.

A partir daí, quanto maior o grau decompreensão do significado e de percepção daadequadabilidade da nova técnica ou mane-jo, maior se tornará a insatisfação com suaprodução tradicional; conseqüentemente,maiores serão as possibilidades de ocorrênciada mudança conceitual e consequente de sis-temas de produção e/ou manejo adotados.

O mais importante está no fato de acre-ditar na capacidade de análise e de compre-ensão dos produtores sobre a realidade e mu-danças necessárias, atribuindo a eles um pa-pel ativo na construção de conhecimentos téc-nicos que sejam plenamente adaptados às suascondições sócio-econômicas e ambientais.

De outra maneira, os produtores ne-cessitam sim de uma pesquisa de qualidade,com a abrangência técnica e econômica. En-tretanto, os resultados gerados pelas pesqui-sas não podem e não devem ser considera-dos como o término da questão, mas sim cominício de uma jornada a qual culminará naimplantação de um novo sistema ou nareformulação do sistema produtivo existente.

Quando resultados ou pacotes tecno-lógicos são produzidos inicia-se então o tra-balho da extensão e da validação dos resul-tados obtidos em “laboratório”.

Segundo o conceito de desenvolvimen-to local, os produtores devem sentir a neces-sidade de tais mudanças e agir como atores

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no processo de desenvolvimento ou moder-nização da empresa rural, adotando e com-preendendo as tecnologias a serem utiliza-das. Até mesmo, ainda constitui o papel dosprodutores, a busca por alternativas dentrodo sistema em que está inserido com objeti-vo de melhorar a situação atual.

Da mesma maneira, segundo Fidélis(2000), conhecimentos intelectuais e vibra-ções emocionais não são suficientes para acondução do processo de desenvolvimentolocal e que somente o trabalho de conheci-mento das próprias comunidades de produ-tores sobre o que eles possuem e o que são,apresentam a capacidade de desencadearum processo de desenvolvimento de “den-tro para fora”.

Tal expressão de “de dentro para fora”pode ser encarada como a chave para o de-senvolvimento rural, e consequentementelocal, devido à todas as consequências posi-tivas do crescimento em conjunto.

Tal crescimento sintetiza a vontade ea experiência de vida dos produtores alia-das a fatores externos como novas informa-ções, fontes financiadoras e programas demelhoria de vida para produtores e traba-lhadores rurais.

Considerações finais

A produção de bovinos de corte noEstado de Mato Grosso do Sul e no Brasilapresenta-se favorável ao crescimento, de-vido a vários fatores como a ampliação demercados consumidores, o fortalecimento dealianças mercadológicas e da cadeia produ-tiva como um todo, o surgimento de indús-trias locais, melhoria do escoamento da pro-dução, a qualidade do produto final aquiproduzido, além da possibilidade da diferen-ciação dos produtos brasileiros.

A produção e/ou compra de raçãoconcentrada e as aquisições de animais cons-tituem a maior parcela dos custos de produ-ção de bovinos de corte e por isso devem serrealizados de maneira correta e eficiente.

A pesquisa, de campo e econômica, éuma ferramenta para o incremento de pro-dutividade e necessita da extensão para arealização de seu papel na sociedade pro-dutiva. Além disso, deve ser necessário oconhecimento da realidade do produtor/tra-

balhador a fim de que este possa, e deva,contribuir imensamente para o desenvolvi-mento rural, não somente em termos de pro-dutividade, mas em relação à melhoria dequalidade de vida.

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Entrevista

Acerca de sueños, utopías y proyectos locales autónomosOn dreams, utopias and local autonomous projects

Acerca de sonhos, utopias e projeto locais autônomosAntonio Elizalde*

más! Sin embargo se rinde antes de intentarloporque ha “aprendido” que La vida es duray que cuando te atan La pata trasera, denada sirve intentarlo porque no se consigue.Y sin embargo el Elefante posee La capacidadpara mover la silla y ser libre para ir a don-de quiera... pero prefiere rendirse antes deintentarlo y se queda atado como un esclavo,a una simple silla. ¿A qué te suena eso?

Algo parecido nos ocurre a los sereshumanos. Aunque todos tenemos Lacapacidad para triunfar, a muchos la vidales ha enseñado, a costa de dolores, fracasosy golpes, que es preferible no intentar muchoy quedarse pegado a la tierra sin atreverse amirar hacia Las nubes, porque incluso esriesgoso sonar ya que se puede pagar doscostos: el del fracaso y la frustración; ytambién el del castigo y el sufrimiento, elhacerse daño o ser dañado. De allí el desen-canto y la desesperanza. Incluso lo que seha denominado elegante pero ideológi-camente: “desesperanza aprendida”.

¿Sabes como se amaestra un Ser Hu-mano?

Pensemos en alguien, sin trabajo duran-te algún tiempo y que compra todos los díasel periódico para leer Las ofertas de empleo yluego parte a recorrer La direcciones de Laofertas que allí ha leido. Donde llegado al lu-gar que busca debe hacer una larga fila, y es-perar y esperar durante horas, con Laesperanza de obtener algo y deseando secre-ta mente que todos los que están antes que élen La fila fracasen; pero luego cuando le tocaa él tampoco logra el empleo. Y parte de allí aotra dirección llegando cuando ya no haynadie, y de ahí a otro y otro lugar. Y al finaldel día cuando habiendo ido a muchos luga-res sin obtener nada se recrimina a sí mismopor haber ido primero a los lugares equivo-cados, deposita su esperanza en su buenaelección y en lo que pueda ocurrir al díasiguiente. Y así van llegando los mañanas yvan pasando los días recorriendo aviso tras

I. Sobre el achatamiento de lasesperanzas y el aplanamiento de lacapacidad de soñar

¿Sabes como se amaestra una Pulga?Se la coloca en un recipiente transpa-

rente, como un tarro de conservas, o un vaso,y se tapa La parte superior con un cristal.La pulga salta con todas sus fuerzas inten-tando escapar, pero poco a poco va viendoque sus esfuerzos son inútiles y que con cadasalto se hace daño. Así que deja de saltar altoy comienza a dar saltos cada vez máspequeños. Al cabo de una semana de amaes-tramiento, su mayor salto será de sólo 5 cen-tímetros, y ya nunca saltará más alto. Noimporta que retires el cristal, o incluso queLa saques de su tarro, porque ese insecto quees La pulga, capaz de saltar normalmentehasta 1,68 metros, saltará sólo 5 centímetros.

La vida es muy dura para muchos,mientras que algunos pueden correr libresdesde jóvenes, a otros les pasa como a Laspulgas amaestradas, que cuando les sacande su tarro, ya no se atreven a saltar másalto. Una pulga amaestrada, sigue pudiendosaltar 168 centímetros, posee La capacidadpara hacerlo, pero no se atreve porque haaprendido que intentarlo es igual a fracasar,a hacerse daño... porque ha estado muchotiempo metida en un tarro de cristal.

¿Sabes como se amaestra un Elefante?Cuando es joven y débil, se le ata una patacon una fuerte cuerda a un gran árbol. Comoel árbol es más fuerte que el pequeño elefan-te, este tira y tira intentando liberarse, perocomo es pequeño, no puede, y se acabaagotando, se frustra, y aprende a no tirarporque le es totalmente inútil. Después,cuando es mayor, vasta con atar La patatrasera del Elefante a un simple silla, y el Ele-fante se quedará quieto, sin moverse, porqueha aprendido que cualquier esfuerzo es inútil.

¿ Acaso no es capaz de mover una sillaun Elefante? iClaro que si! iY mucho, mucho

INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, p. 139-141, Mar. 2005.

* Sociólogo e Reitor da Universidad Bolivariana de Chile ([email protected])

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

aviso, sin conseguir nada. Y se va acabandoel dinero, y ya no se va en taxi o en microcorno el primer día, sino que se comienza acaminar y a levantarse más temprano parapoder llegar a tiempo, y ya sólo se puede ir alos lugares que quedan más cerca. Pero luegotampoco hay dinero para comprar el perió-dico y entonces se comienza a depender delos amigos que lo compran, o de lainformación que le dan otros. Y así continuanlos fracasos y por cada día y cada noche quetranscurre es más y más difícil recuperar Laesperanza para el mañana. Hasta que se llegaal punto en que ya no se espera nada.

¿Somos entonces tan distintos de laspulgas o elefantes?

Si, porque somos más complejos. So-mos seres sociales con capacidad autorre-flexiva y esto que digo que suena tan pom-poso y tan promisorio, se transforma noobstante para el cesante en algo que inclusohace más dolorosa e insufrible su situación.

Cada nuevo día que pasa al volver alhogar mira las caras de su pareja de sus hijos,o de quienes le rodean en su hogar. Y en cadarostro de seres queridos, cuando les cuentalo vivido en el día y lo soñado para elmañana, ve transitar las mismas emociones,ilusiones, aflicciones, desengaños, rabias yesperanzas, que él ha experimentado y ex-perimenta, y eso potencia su emociones ysiente el deber y la culpa, el sufrimiento y ladecepción incrementados, y se pregunta ¿porqué a él? Y así comienza a perder suautoestima, la escasa fortaleza y enterezaque lo mantenían en pié. Y de ese modo seva infantilizando, llora sin que nadie lo vea,putea y trata mal a todo lo que se le ponepor delante, trata de no pensar en nada, seatiborra de algo: TV, alcohol, lo que sirvapara olvidar lo que se vive. Creo que no esnecesario seguir describiendo otros ámbitosde relaciones que se ven afectados por lasituación que este ser humano vive. Sin em-bargo es necesario que reflexionemos un pocoen lo que le pasa a este ser humano en larelación con cada uno de sus hijos, con sumujer, con sus amigos, con quienes eran suspares cuando tenía trabajo, con aquellos aquienes debe dinero, con las organizacionesen las cuales participa, con su propiasexualidad, y así con todas las distintasdimensiones de su vida.

Hemos ejemplificado con el caso de uncesante, pero: ¿cuán distinta es la situaciónde cualquiera persona que gana el salariomínimo o de aquellos que ganan menos decien o doscientos dólares al mes? ; es decir, lagran mayoría de los habitantes de nuestrocontinente. La gran mayoría de quienestransitan por sus calles, de quienes ven la TV,leen la prensa o escuchan la radio, de quienesduermen y sueñan cada noche. ¿Qué pasacon ellos? ¿Qué se permiten soñar?

II. Algunas hipótesis y definiciones paraargumentar algo posible de hacer portodos quienes quieran hacerlo

Quiero construir mi argumentación apartir de algunos artefactos heurísticos: axi-omas. Definiciones, hipótesis y propuestas:

Hipótesis 1: Nuestras creenciascondicionan nuestras ideas y emociones.Ningún cambio es posible sin modificar lascreencias en las cuales nos movemos.

Hipótesis 2: La posibilidad del cambiose reduce cuando las personas no lo creenposible, e inversamente se incrementacuando creemos posible cambiar las cosas.

Hipótesis 3: La disposición al cambioestá relacionada con el grado deinsatisfacción con la situación que se vive sinembargo esta se encuentra mediada por lacreencia en la posibilidad de cambiar.

Hipótesis 4: La posibilidad de soñar eimaginar mundos distintos al que se vive esun atributo universalmente distribuido en laespecie humana, no obstante lo anterior, lacapacidad para visualizar los sueños comoposibles y de hacerlos colectivos está deter-minado por el contexto histórico.

Definición 1: A los sueños colectivos ycompartidos los denominamos habitualmen-te utopías.

Definición 2: A la capacidad de elabo-rar y articular sueños colectivos lo denomi-naremos utopización.

Hipótesis 5: La utopización escondición necesaria para el surgimiento ydesarrollo de proyectos colectivos.

Definición 3: Llamaremos proyectocolectivo a toda iniciativa humana en la cualparticipen grupos humanos y que contengaen sí la búsqueda de satisfacer interesesmayores que los intereses individuales.

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INTERAÇÕESRevista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 6, N. 10, Mar. 2005.

Definición 4: Llamaremos movilizaciónsocial al surgimiento paralelo y simultáneo endiversos puntos del sistema de utopización yde proyectos colectivos autónomos.

Hipótesis 6: Todo sistema tiende acombatir la movilización social, esto es laemergencia de sueños colectivos, deutopización y de proyectos colectivos que nole sean funcionales, esto es autónomos.

Hipótesis 7: Hay contextos queviabilizan la utopización y otros que lainhiben.

Hipótesis 8: El contexto histórico puedeactuar como factor inhibidor o potenciadorde la emergencia de sueños colectivos.

Hipótesis 9: En momentos de grandeslogros materiales de la economía y/o enmomentos de derrota política de los sectoresinconformistas, momentos de repliegue utó-pico, se produce una inhibición de los sueñoscolectivos y una inmovilización de losproyectos autónomos.

Hipótesis l0: En momentos de repliegueutópico. Las personas tienden más bien atransitar por los sueños individuales ya lomás, los del grupo familiar. Cada personatiende así a adaptarse a lo que en elimaginario colectivo construye el sistema ya actuar de forma individualista.

Hipótesis 11: Las personas, aúncuando no sean beneficiadas por el sistema,le confieren legitimidad a éste, cuandolimitan sus sueños al ámbito individual.

Definición 5: Llamamos conformismoa la creencia en La imposibilidad de cambi-ar algo o una situación, aún cuando ese algoo esa situación nos perjudique.

Hipótesis 12: En un contexto de con-formismo colectivo (cultural y/o político), laposibilidad de cambio dependerá casi exclu-sivamente de factores externos al sistema.

Hipótesis 12 a: Asumir la hipótesisanterior implica restarnos capacidad deasumir protagonismo sobre nuestro futuro,esto es de humanización.

Propuesta 1: La movilización social seproduce cuando la personas perciben laexistencia de alternativas y horizontes decambio, por lo tanto la tarea a realizar paralos inconformistas pasa por generarpropuestas de transformaciones posibles.

Hipótesis 13: El ámbito de lo posibleen el contexto actual sólo se encuentra en lo

local, ya que es éste el espacio donde laglobalización encuentra su límite, es desdeallí de donde es posible iniciar y comenzar asumar energías y fuerzas contrahegemó-nicas. Es éste por esencia el espacio de laautonomía, desde donde surge la novedady la complejidad.

Propuesta 2: Si se genera cambio,autonomía y contrahegemonía en el espaciolocal, La gente podrá nuevamente comenzara hacer La conexión entre lo inmediato y lomediato, entre La experiencia contrahege-mónica vivida en su cotidianeidad y losproyectos transformadores de mayor esca-la, y así podrá volver a creer que el cambioes posible a nivel del sistema, y estarádispuesta a entregar su tiempo y esfuerzoen proyectos colectivos.

Definición 6: Desde una perspectivasistémica, el sistema del cual forma partecualquier ser humano, en un nivel máximode abstracción, estaría conformado por dossubsistemas: a) el subsistema endógeno (lo quellamamos nuestro yo, conformado por nuestrocuerpo cuyo límite con el mundo externo loestablece nuestra piel y por nuestra mente,espíritu, alma, sentimientos, psiqué o comocada cual dese llamarlo; todo ello conformaríael unomismo; y b) el subsistema exógeno, todolo que está fuera de nuestro piei, esto es Laalteridad u otredad, o dicho de otro modo: elambiente (la pareja, la familla, la comunidadlocal (barrio, pueblo o aldea, ciudad), Lasociedad y La cultura, La naturaleza, el pla-neta, el sistema solar, la galaxia, el universo,e micro y el macrocosmos.

Axioma 1: Todos los cambios civiliza-torios según nos muestra la historia huma-na, han sido cambios producidos desdeabajo hacia arriba, desde lo local a lo global,desde lo singular alo universal, desde lo con-creto alo abstracto.

Pregunta 1: ¿Qué es más fácil cambiarel subsistema endógeno 0 el subsistemaexógeno, cambiarnos a nosotros mismos ocambiar a otros?

Pregunta 2: Iniciado el cambio, esto escomprometidas nuestra inteligencia o razón,nuestras emociones y sentimientos y nuestravoluntad al cambio deseado, ¿Qué es másfácil cambiar lo más próximo y cercano (Laescala humana) o lo más lejano?

Propuesta 3: ¡Hagámoslo!

Critérios para publicação

avanço das reflexões na área do DesenvolvimentoLocal.

Art. 6 - A entrega dos originais para a Revista deveráobedecer aos seguintes critérios:

I - Os artigos deverão conter obrigatoriamente:a) título em português ou espanhol;b) nome do(s) autor(es), identificando-se em rodapé

dados relativos à produção do artigo, ao(s) seu(s)autor(es) e respectivas instituições, bem como aauxílios institucionais e endereços eletrônicos;

c) resumo em português ou espanhol (máximo de 6linhas, ou 400 caracteres) e abstract fiel ao resumo,acompanhados, respectivamente, de palavras-chavee keywords, ambos em número de 3, para efeito deindexação do periódico;

d) texto com as devidas remissões bibliográficas nocorpo do próprio texto;

e) notas finais, eliminando-se os recursos das notas derodapé;

f) referências bibliográficas.II - Os trabalhos devem ser encaminhados dentro da

seguinte formatação:a) uma cópia em disquete no padrão Microsoft Word

6.0;b) três cópias impressas, sendo uma delas sem

identificação de autoria e outra acompanhada deautorização para publicação devidamente assinadapelo autor;

c) a extensão do texto deverá se situar entre 10 e 18páginas redigidas em espaço duplo;

d) caso o artigo traga gráficos, tabelas ou fotografias, onúmero de toques deverá ser reduzido em funçãodo espaço ocupado por aqueles;

e) a fonte utilizada deve ser a Times New Roman ,tamanho 12;

f) os caracteres itálicos serão reservados exclusiva-mente a títulos de publicações e a palavras em idiomadistinto daquele usado no texto, eliminando-se,igualmente, o recurso a caracteres sublinhados, emnegrito, ou em caixa alta; todavia, os subtítulos doartigo virão em negrito;

g) as citações virão entre aspas, em fonte normal (nãoitálica).

III - Todos os trabalhos devem ser elaborados emportuguês ou espanhol, e encaminhados em três vias,com texto rigorosamente corrigido e revisado.

IV - Eventuais ilustrações e tabelas com respectivaslegendas devem ser contrastadas e apresentadasseparadamente, com indicação, no texto, do lugaronde serão inseridas. Todo material fotográfico será,preferencialmente, em preto e branco.

V - As referências bibliográficas e remissões deverãoser elaboradas de acordo com as normas dereferência da Associação Brasileira de NormasTécnicas (ABNT - 6023).

VI - Os limites estabelecidos para os diversos trabalhossomente poderão ser excedidos em casos realmenteexcepcionais, por sugestão do Conselho EditorialInternacional e a critério do Conselho de Redação.

Art. 1 - Interações, Revista Internacional do Programade Desenvolvimento Local da Universidade CatólicaDom Bosco, destina-se à publicação de matérias que,pelo seu conteúdo, possam contribuir para aformação de pesquisadores e para o desenvolvi-mento científico, além de permitir a constanteatualização de conhecimentos na área específica doDesenvolvimento Local.

Art. 2 - A periodicidade da Revista será, inicialmente,semestral, podendo alterar-se de acordo com asnecessidades e exigências do Programa; o calendáriode publicação da Revista, bem como a data defechamento de cada edição, serão, igualmente,definidos por essas necessidades.

Art. 3 - A publicação dos trabalhos deverá passar pelasupervisão de um Conselho de Redação compostopor cinco professores do Programa de Desenvolvi-mento Local da UCDB, escolhidos pelos seus pares.

Art. 4 - Ao Conselho Editorial Internacional caberá aavaliação de trabalhos para publicação.

Parágrafo 1º - Os membros do Conselho Editorial Inter-nacional serão indicados pelo corpo de professoresdo Programa de Mestrado em DesenvolvimentoLocal, com exercício válido para o prazo de dois anos,entre autoridades com reconhecida produçãocientífica em âmbito nacional e internacional.

Parágrafo 2º - A publicação de artigos é condicionada aparecer positivo, devidamente circunstanciado,exarado por membro do Conselho EditorialInternacional.

Parágrafo 3º - O Conselho Editorial Internacional, senecessário, submeterá os artigos a consultoresexternos, para apreciação e parecer, em decorrênciade especificidades das áreas de conhecimento.

Parágrafo 4º - O Conselho Editorial Internacional poderápropor ao Conselho de Redação a adequação dosprocedimentos de apresentação dos trabalhos,segundo as especificidades de cada área.

Art. 5 - A Revista publicará trabalhos da seguintenatureza:

I - Artigos originais, de revisão ou de atualização, queenvolvam, sob forma de estudos conclusivos,abordagens teóricas ou práticas referentes à pesquisaem Desenvolvimento Local, e que apresentemcontribuição relevante à temática em questão.

II - Traduções de textos fundamentais, isto, é daquelestextos clássicos não disponíveis em língua portu-guesa ou espanhola, que constituam fundamentosda área específica da Revista e que, por essa razão,contribuam para dar sustentação e densidade àreflexão acadêmica, com a devida autorização doautor do texto original.

III - Entrevistas com autoridades reconhecidas na áreado Desenvolvimento Local, que vêm apresentandotrabalhos inéditos, de relevância nacional einternacional, com o propósito de manter o caráterde atualidade do Periódico.

IV - Resenhas de obras inéditas e relevantes que possammanter a comunidade acadêmica informada sobre o

I N T E R A Ç Õ E SRevista Internacional de Desenvolvimento Local

Art. 7 - Não serão aceitos textos fora das normasestabelecidas, com exceção dos casos previstos noartigo anterior, e os textos recusados serão devol-vidos para os autores acompanhados de justificativa,no prazo máximo de três meses.

Art. 8 - Ao autor de trabalho aprovado e publicadoserão fornecidos, gratuitamente, dois exemplares donúmero correspondente da Revista.

Art. 9 - Uma vez publicados os trabalhos, a Revistareserva-se todos os direitos autorais, inclusive os detradução, permitindo, entretanto, a sua posteriorreprodução como transcrição, e com a devida citaçãoda fonte.

Para fins de apresentação do artigo, considerem-se osseguintes exemplos (as aspas delimitando os exemplosforam intencionalmente suprimidas):

a) Remissão bibliográfica após citações:In extenso: O pesquisador afirma: “a sub-espécie Callithrixargentata, após várias tentativas de aproximação,revelou-se avessa ao contato com o ser humano”(SOARES, 1998, p. 35).Paráfrase: como afirma Soares (1998), a sub-espécieCallithrix argentata tem se mostrado “avessa ao contatocom o ser humano”...

b) Referências bibliográficas:

JACOBY, Russell. Os últimos intelectuais: a culturaamericana na era da academia. Trad. Magda Lopes. SãoPaulo: Trajetória/Edusp, 1990.SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo,razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.____. A redefinição do lugar. In: ENCONTRO NACIO-NAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA, 1995, Aracaju. Anais...Recife: Associação Nacional de Pós-Graduação emGeografia, 1996, p. 45-67.____. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1987.SOJA, Edward. Geografias pós-modernas: a reafirmaçãodo espaço na teoria social crítica. Rio de Janeiro: JorgeZahar, 1993.SOUZA, Marcelo L. Algumas notas sobre a importânciado espaço para o desenvolvimento social. In: RevistaTerritório (3), p. 14-35, 1997.WIENER, Norbert. Cibernética e sociedade: o uso humanode seres humanos. 9. ed. São Paulo: Cultrix, 1993.

c) Emprego de caracteres em tipo itálico: os programasde pós-graduação stricto sensu da universidade emquestão...; a sub-espécie Callithrix argentata tem semostrado...

Endereço para correspondência e permutas:Universidade Católica Dom Bosco

Programa de Desenvolvimento LocalAv. Tamandaré, 6000 - Jardim Seminário

Caixa Postal 100CEP 79117-900 Campo Grande-MS

Fone: (67) 312-3800e-mail: [email protected]