imagem e percepcao de marcas de moda

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Imagem e percepção de marcas de moda. Monica Saboia Saddi Resumo : Este artigo tem como objetivo iniciar uma reflexão através dos conceitos de percepção segundo Charles Sanders Peirce, para futuros estudos sobre o desenvolvimento dos processos de construção da identidade de marcas. Parte de um breve relato dos estudos da percepção por Lucia Santaella para relacioná-los com alguns conceitos de gestão e comunicação de marcas nos pontos de venda de marcas de moda. Ao final aborda as práticas dos profissionais de diversas áreas envolvidos no processo de elaboração da identidade de marcas. Palavras-chave: percepção, signos, identidade de marcas, imagem de marca.

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Page 1: Imagem e percepcao de marcas de moda

Imagem e percepção de marcas de moda.

Monica Saboia Saddi

Resumo: Este artigo tem como objetivo iniciar uma reflexão através dos

conceitos de percepção segundo Charles Sanders Peirce, para futuros estudos

sobre o desenvolvimento dos processos de construção da identidade de

marcas. Parte de um breve relato dos estudos da percepção por Lucia

Santaella para relacioná-los com alguns conceitos de gestão e comunicação de

marcas nos pontos de venda de marcas de moda. Ao final aborda as práticas

dos profissionais de diversas áreas envolvidos no processo de elaboração da

identidade de marcas.

Palavras-chave: percepção, signos, identidade de marcas, imagem de marca.

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Em nosso século é grande o número de teorias da percepção. Em

todas elas tem havido uma tendência de redução dos processos da

percepção exclusivamente `a visualidade. “Pesquisas empíricas revelam

que, provavelmente devido a razões de especialização evolutiva, 75% da

percepção humana, no estágio atual da evolução, é visual.”

(Santaella,1983). Segundo Santaella a redução dos estudos da percepção a

visualidade e a grande atenção do que ocorre na relação entre o objeto

pecebido e a retina ou o globo ocular deixaram em suspenso os fatores que

dizem respeito ao que é percebido e a mente de quem percebe. Na primeira

metade do século XX as pesquisas da psicologia experimental praticamente

baniram a palavra “mente”.

Encontramos no pensamento de Peirce uma visão relacional da

percepção da cognição e da linguagem, na qual não há como separar os

processos mentais e sensórios, das linguagens em que eles se encontram.

(Santaella, 1993)

Para Peirce, não há, nem pode haver, separação entre percepção e conhecimento.Segundo ele, todo pensamento lógico, toda cognição, entra pela porta da percepção e saipela porta da ação deliberada. Além disso, a cognição e, junto com ela, a percepção sãoinseparáveis das linguagens através das quais o homem pensa, sente, age e se comunica.”(Santaella, 1993)

A semiótica de Peirce, teoria geral dos signos, é uma teoria do

conhecimento na qual o seu interesse é entender, através da semiótica,

como se processa a cognição. A percepção para ele, é o meio que faz a

ponte entre o mundo do pensamento ao mundo exterior, “o mundo da

linguagem, o cérebro, e o mundo lá fora”. ( Santaella, 1993)

Para Peirce, a percepção envolve não só elementos cognitivos mas

também os elementos inconscientes e que a maior parte deste processo

estaria fora de nosso controle.

Esse processo também envolveria sensações e experiências das

quais não temos plena consciência. “Trata-se de um compósito de

qualidades vagamente unidas num sentimento in totum, imediato, um mero

feeling, impressão mais ou menos indefinida.” (Santaella,1993)

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A visão de Peirce traz uma grande contribuição para a compreessão

da relação dos processos perceptivos e cognitivos da mente humana e da

complexidade dos modos com que apreendemos o mundo que nos cerca

Para uma reflexão sobre a percepção das marcas de moda pelos

indivíduos, abordaremos o conceito de marca como um conjunto de

carcterísticas, conceitos e ações, como definição de uma identidade que,

percebida pelos indivíduos e carregada de significados, exemplifica e atrai

um tipo de indivíduos ou grupos.

Mas afinal o que vemos? Diante desta foto de publicidade da marca

de moda Fendi, o que sentimos? O que pensamos e “lemos” quando

estamos diante de algo? Algo que “se impõe a nós”, como diz Peirce

Chegamos a perguntar: - “Quem” é ela?

“Associações de marca”, termo usado por David A. Aaker são

realizadas pela percepção dos indivíduos de muitas formas e através de

muitos meios. Esses meios especialmente explorados pela publicidade,

utilizam uma infinidade de símbolos, ícones e índices e nos levam a um

processo de “leitura”, de significados. Em outras palavras, levam `a

percepção das características de uma marca. A percepção da sua

identidade.

As marcas de moda, de uma maneira geral, participam da dinâmica

de empresas competindo entre si para superar marcas estabelecidas, para

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se diferenciar, para ocupar ou encontrar um lugar que ainda não foi

explorado no mercado. A necessidade de inovação constante e da

diferenciação em relação a concorrência fazem parte desse processo.

Estudos da área de Marketing demonstram que a diferenciação é um

fator importante para a valorização das marcas. Aaker considera, entre

outros aspectos, a importante característica de manter clara e única a

identificação da marca pelo consumidor.

Embora as marcas, desde longo tempo, tenham tido um papel no comércio, não foisenão no século 20 que branding e associações de marca tornaram-se centrais para osconcorrentes. De fato, uma carcterística de diferenciação do marketing moderno tem sido oseu enfoque sobre a criação de marcas diferenciadas. (Aaker, 1998)

Além da diferenciação a imagem da marca, é considerado por Mike

Baxter (2000) como o patrimônio principal de uma marca: “A imagem da

empresa é tudo que os seus consumidores pensam dela. Resulta de tudo o

que ela faz, e é o coração do sucesso empresarial.” Segundo Baxter, “Essa

imagem faz a sua empresa ser diferente das outras, na visão dos

consumidores.” E conclui que: “A imagem da empresa é o seu maior

patrimônio.”

Diversos trabalhos realizados na área de Marketing demonstram a

complexidade deste tema e indicam que são muitos os fatores que podem

influenciar a permanência das marcas no mercado e na mente do

consumidor.

Em algumas empresas no Brasil e no exterior percebemos a

construção e a manutenção de uma forte identidade de marca que, através

de um conjunto de características próprias, “visíveis“, resultam, através da

percepção do consumidor, em uma imagem singular desta marca.

A GAP Inc. nos Estados Unidos, desenvolve um trabalho de

identidade de marcas através de conceitos bem definidos em cada uma de

suas quatro empresas: Gap, Banana Republic, Old Navy e Forth & Towne.

De acordo com Pressler (2006), suas marcas são construídas através de

conceitos convincentes, verdadeiras estórias nas quais o consumidor possa

se identificar, ser apaixonado por elas e desejar fazer parte delas. “Our

brands are about building compelling stories-ones that our customers see

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themselves in, are passionate about and want to be part of.” (Paul Pressler,

President and CEO, Gap Inc.)

Entre as marcas do Rio de Janeiro podemos citar a Richards, com

principal atuação em moda masculina desde 1974. De acordo com o texto

de abertura do seu site, a Richards tem na personalidade do empresário

Ricardo a fonte das características principais de sua identidade. “Sem nunca

ter usado terno na vida, preferindo uma roupa mais livre, casual, fácil de

usar, sempre elegante, Ricardo fez do seu próprio estilo de vida sua marca”.

Uma parte expressiva da percepção da identidade de uma marca é

realizada no ponto de venda através de inúmeros elementos do Design, da

Arquitetura e do Merchandising Visual. Os indivíduos também fazem grande

parte da “leitura” da identidade de uma Marca através da percepção de um

conjunto de elementos, tais como: objetos, sons, aromas, imagens e

experiências interativas no ambiente do ponto de venda.

Segundo Santaella:

O nosso estar – no – mundo, como indivíduos sociais que somos, é mediado poruma rede intrincada e plural de linguagem, isto é, que nos comunicamos também através daleitura e/ou produção de formas, movimentos; que somos também leitores e/ou produtoresde dimensões e direções de linhas, traços, cores… Enfim, também nos comunicamos e nosorientamos através de imagens, gráficos, sinais, setas, números, luzes… Através deobjetos, sons musicais, gestos, expressões, cheiro e tato, através do olhar, do sentir e doapalpar. Somos uma espécie animal tão complexa quanto são complexas e plurais aslinguagens que nos constituem como seres simbólicos, isto é, seres de linguagem.(Santaella,1983)

A marca Nike investe fortemente nesta comunicação no ponto de

venda através do merchandising visual que segundo Dinardo (2006) faz a

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marca estar “visível”, transformando suas lojas em verdadeiros teatros

virtuais. “Nike has always devoted a great deal of attention to its in-store

merchandising presentation that makes the Nike brand stand out”

“ And also for World Football’06, Nike has turned retail locations into

virtual theaters, where the story of Joga Bonito is on display as part of an

initiative encompassing four seasons and multiple in-store change outs”.

Anne Dinardo (2006)

A Old Navy tem como definição de sua marca trazer diversão,moda e

“valor” para toda a família, “fun, fashion and value”.Essa proposta se aplica

aos projetos de interiores e merchandising visual.

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As identidades das marcas são percebidas, através das experiências

dos indivíduos com os diversos pontos de contato em que elas se

manifestam, tais como, imagens, objetos e ambientes. Desta forma,

podemos dizer que, a identidade da marca é percebida através das

linguagens e dos signos, que por sua vez, deslancham o pensamento do

indivíduo e o fazem se aproximar ou não, encontrar sentido ou identificação,

rejeitar ou gostar de uma marca.

Atualmente a construção da Identidade de uma marca e a

comunicação desta imagem é atribuição dos profissionais de Marketing,

Design, Publicidade e Estilo.

A participação desses profissionais na construção e na comunicação

da identidade da marca nas empresas de moda, em muitos momentos se

sobrepõe e exige um trabalho integrado. Essa prática profissional integrada

não é muito comum neste ramo, em especial nas marcas de moda do Rio de

Janeiro. Muitas vezes, estes profissionais não orientam o processo de

criação para a construção da imagem da marca de forma coesa,

enfatizando, em muitos projetos, um estilo pessoal que pode vir a se

dissociar das ações das outras áreas envolvidas neste processo e por fim,

alterar a identidade da marca.

Seja pela própria formação dos profissionais, ou porque alguns não

considerem esta prática interdisciplinar como caminho, isso também pode

ocorrer devido a própria política de gestão empresarial de cada marca.

Em algumas empresas de moda, a direção da identidade da marca é

gerida pela equipe de Estilo, ao passo que, em outras empresas é o

departamento de Marketing que define o posicionamento da marca e suas

ações.

A comunicação da Identidade de uma marca de moda e o que ela

representa para o consumidor, difere substancialmente do que víamos há

alguns anos atrás nas empresas desse ramo, nas quais conceitos de gestão

como o branding pressionam mudanças na política de gestão das marcas e

na atuação dos profissionais dessas áreas.

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Diante dessa complexidade e interferência de tantas áreas de

conhecimento na criação da Identidade de uma Marca poderíamos concluir

que a integração dessas áreas seria o caminho mais indicado, como

algumas empresas de Arquitetura e Publicidade se propoem ao contratar

profissionais de outras áreas nas suas empresas para contribuir com a

inteligência da mesma e buscar possíveis estratégias para obter maior

eficácia na gestão da identidade de marcas nas empresas de moda.

De uma forma ou de outra a falta de interação dessas áreas muitas

vêzes resulta em linguagens e posicionamentos diferentes, ou até

conflitantes, dentro da mesma empresa, que podem vir a comprometer a

imagem da marca. Imagem esta que deve manter de forma clara e única a

identidade da marca.

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Referências Bibliográficas

1. AAKER, David A. Marcas Brand Equity: gerenciando o valor da marca.

São Paulo: Negócio, 2003.

2. BAXTER, Mike. Projeto de Produto. São Paulo: E.Blücher,2000.

3. SANTAELLA, Lúcia. A Percepção: uma teoria semiótica. São Paulo:

Experimento,1993.

Sites

1. http://www.gapinc.com/public/OurBrands/brands.shtmlAcesso em 25 de junho de 2006.2. http://www.richards.com.brAcesso em 25 de junho de 2006.3. http://www.nike.com.Acesso em 25 de junho de 2006.

DEPARTAMENTO DE ARTES & DESIGNPROGRAMA DE MESTRADO EM DESIGN

PROF. LUIZ ANTONIO COELHO

MONICA SABOIA SADDI