história da educação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CAMILA MARIA CHIARI EDUCAÇÃO, PEDAGOGIA E PSICOLOGIA NO PENSAMENTO EDUCACIONAL DE CARLOS DA SILVEIRA 1916 1923. SÃO CARLOS SP 2014

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Manuais, didática, história da educação

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SO CARLOS

    CENTRO DE EDUCAO E CINCIAS HUMANAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO

    CAMILA MARIA CHIARI

    EDUCAO, PEDAGOGIA E PSICOLOGIA NO PENSAMENTO EDUCACIONAL

    DE CARLOS DA SILVEIRA 1916 1923.

    SO CARLOS SP 2014

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SO CARLOS

    CENTRO DE EDUCAO E CINCIAS HUMANAS

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO

    CAMILA MARIA CHIARI

    EDUCAO, PEDAGOGIA E PSICOLOGIA NO PENSAMENTO EDUCACIONAL DE

    CARLOS DA SILVEIRA 1916 1923.

    SO CARLOS SP 2014

    Dissertao apresentada ao Programa

    de Ps-Graduao em Educao da

    Universidade Federal de So Carlos,

    como parte dos requisitos para

    obteno de ttulo de Mestre em

    Educao.

    Orientao: Prof Dr Alessandra Arce

    Hai

  • Ficha catalogrfica elaborada pelo DePT da Biblioteca Comunitria da UFSCar

    C532ep

    Chiari, Camila Maria. Educao, pedagogia e psicologia no pensamento educacional de Carlos da Silveira 1916 1923 / Camila Maria Chiari. -- So Carlos : UFSCar, 2014. 117 f. Dissertao (Mestrado) -- Universidade Federal de So Carlos, 2014. 1. Educao - histria. 2. Brasil - educao. 3. Silveira, Carlos da, 1883-1964. 4. Escola nova. I. Ttulo. CDD: 370.9 (20a)

  • queles que tanto meu apoiaram,

    meus pais

  • AGRADECIMENTOS

    Profa. Dra. Alessandra Arce Hai pela dedicao, pacincia e empenho em suas

    orientaes. Por seus conselhos que proporcionaram o enriquecimento do trabalho e tambm

    de minha formao.

    Aos meus pais, Fernando e Ana Maria, presentes nos momentos difceis e nas maiores

    alegrias, sempre me apoiando e incentivando durante os estudos. Obrigada por ajudar a realizar

    sonhos e planos!

    Ao Senhor Carlos Alberto da Silveira Isoldi Filho, bisneto do professor Carlos da

    Silveira, meus sinceros agradecimentos por todo desprendimento de tempo, dedicao,

    preocupao e apoio pesquisa. Todos os materiais que me enviou e as conversas que

    proporcionou colaboraram muito para a continuao da pesquisa. Agradeo ainda a toda a sua

    famlia que participou e se solidarizou. Meus agradecimentos especialmente senhora Maria

    Clara, que muito me contou e ensinou por meio de suas conversas, obrigada por tamanha

    simpatia.

    Aos meus irmos. Fernanda, por sempre colaborar com suas experincias acadmicas

    e por emprestar seu endereo residencial para que eu pudesse receber livros e cartas. Ao Luiz,

    por contribuir com minha fundamental aquisio de estudo e trabalho. Renata, minha

    confidente, por sempre estar presente e me apoiar em todas as decises. Ao Paulo, por me

    emprestar seu espao e escrivaninha para a minha baguna de livros e textos. Amanda, por

    manifestar seu apoio e incentivo com sua determinao. Meus agradecimentos por

    proporcionarem os risos, conselhos e os momentos mais valiosos.

    Aos meus cunhados, Thalita e Alessandro, pela pacincia e amparo nos momentos que

    mais precisei. E s minhas tias que sempre apoiaram e me emprestaram o computador por

    muitas e muitas vezes: ngela, Silvana e Cristina.

    Aos meus queridos amigos, pelas inestimveis colaboraes. Marcela B., Marcela M.,

    Marco, Camila, Juliana, Vitor, Lvia, Natlia. Obrigada pela amizade, compreenso, conselhos,

    risos, companheirismo e toda dedicao e nimo que proporcionaram durante a realizao do

    trabalho.

    Michele, pela sua confiana, fora, determinao e amizade, por contribuies e

    preocupaes e principalmente pelo seu apoio inestimvel.

    Aos professores que durante as disciplinas da ps-graduao propuseram discusses,

    atividades, encontros que ajudaram em minha formao no apenas profissional, mas cidad.

  • Ao professor Jos Carlos Rothen, por sua colaborao no desenvolvimento final e

    acompanhamento da pesquisa. Minha sincera gratido por participar de um momento to

    importante para mim.

    Aos funcionrios da Escola Estadual lvaro Guio por toda prestao de servio e

    colaborao, em especial a diretora Dona Regina, por sempre me apoiar.

    Os meus sinceros agradecimentos a todas as pessoas que fazem parte da minha vida e

    contribuem para torn-la repleta de momentos gratificantes e inesquecveis.

    Agradeo a Deus por estar sempre presente em minha vida iluminando meus caminhos.

  • Imagem 1: Carlos da Silveira lendo jornal na cidade de Santos-SP em 1916.

    Fonte: Arquivo pessoal da Famlia Silveira

    O momento que ambicionveis chegasse, da entrega de

    diplomas, significa a separao, a apreenso do

    futuro, o incio, para vs, da luta pela vida.

    (SILVEIRA, n.13, 1923, p.14)

  • RESUMO

    A presente pesquisa realizada no mbito da Histria da Educao Nacional tem seu incio em

    meio a assuntos voltados a escola normal, mais especificamente a Escola Normal de So

    Carlos SP. Valoroso espao de ensino-aprendizado que possibilitou a formao de professores durante um extenso tempo em nosso pas, coberta pelo prestgio que a destaca

    entre os demais institutos educacionais da regio. A compreenso desse processo de formao

    de professores permite descrever ainda a elite intelectual do Estado de So Paulo, pois muitos

    dos alunos formados na capital migravam para o interior no intuito de ocupar as cadeiras de

    professores disponveis nas escolas normais. No diferente disto, a Escola Normal Secundria

    de So Carlos foi tambm muito bem representada por esses intelectuais, como exemplo o

    Professor Carlos da Silveira que ocupou importante cadeira na escola normal de So Carlos

    entre os anos de 1911 a 1921. Por isso, esta dissertao tem por objetivo analisar as ideias

    educacionais do educador brasileiro Carlos da Silveira procurando apreender por meio de suas

    concepes de educao, pedagogia e psicologia a divulgao dos seus ideais e os ideais da

    Escola Nova no Brasil no perodo de 1916 a 1923. A pesquisa surgiu em meio ao trabalho do

    qual participei como bolsista treinamento no projeto As ideias Pedaggicas em movimento na Formao de Professores na Escola Estadual Dr. lvaro (1930-1969): uma anlise de seu

    acervo bibliogrfico e documental. O acervo documental e bibliogrfico da Escola Normal de So Carlos possibilitou conhecer a histria da educao brasileira, e chamou a ateno em

    especial para a riqueza investigativa nele encontrada. A frequente presena de Carlos da

    Silveira na Revista Escola Normal de So Carlos despertou a busca por maior compreenso

    sobre este grande intelectual e educador brasileiro, que apesar do seu vasto material de

    publicao, no possui estudos aprofundados sobre sua vida e obras. Silveira dedicou-se

    educao e a promover suas ideias educacionais publicando-as em revistas e jornais. Este fato

    abre a pesquisa para uma investigao profcua, que envolve reunir seus artigos para

    compreender as ideias que defendia. A relevncia desta pesquisa consiste na (re)descoberta de

    registros fundamentais para a reconstituio e compreenso da Histria da Escola Pblica

    Brasileira e, mais ainda, para a (re)construo da Histria da Educao Nacional.

    Palavras-Chave: Histria da Educao Brasileira, Carlos da Silveira, Movimento Escola

    Nova.

  • ABSTRATC

    This research carried out in the context of the history of National Education has its beginning

    in middle normal school-oriented issues, more specifically the regular school of So Carlos-

    SP. Valuable teaching-learning space that allowed the formation of teachers during a long

    time in our country, covered by the prestige that stands out among the other educational

    institutes in the region. The understanding of this teacher training process allows you to

    describe the intellectual elite of So Paulo State, because many of the graduates in the capital

    migrated inland in order to occupy the chairs of teachers available in normal schools. Not

    unlike this, the Secondary Normal School of San Carlos was also very well represented by

    these intellectuals as an example Professor Carlos da Silveira who occupied important chair

    at the Escola Normal de So Carlos from 1911 to 1921. Therefore, this dissertation aims to

    analyze the educational ideas of Brazilian Carlos da Silveira educator looking to capture

    through its conceptions of education, pedagogy and psychology the disclosure of its ideals

    and the ideals of the new school in Brazil during the period from 1916 to 1923. The research

    appeared in the midst of the work which I participated as a training in the project

    "Pedagogical ideas in motion in the formation of teachers at Escola Estadual Dr. lvaro

    (1930-1969): an analysis of his bibliographic collection and documentation". The

    documentary and bibliographic collection of the Normal School of San Carlos made know the

    history of Brazilian education, and drew attention in particular to the investigative wealth it

    found. The frequent presence of Carlos da Silveira in the Normal School of San Carlos

    sparked the search for greater understanding of this great Brazilian educator and

    intellectual, which despite its vast publishing material, has no in-depth studies about his life

    and works. Sen devoted himself to education and to promote his educational ideas by

    publishing them in magazines, newspapers etc. This fact opens the search for a productive

    research, that involves to gather their articles to understand the ideas he espoused. The

    relevance of this research consists in the (re) discovery of records fundamental to the

    reconstruction and understanding of the history of Brazilian public school and, even more,

    for the (re) construction of the history of National Education.

    Keywords: history of Brazilian education, Carlos da Silveira, New School Movement.

  • LISTA DE QUADRO

    Quadro 1: Currculo e disciplinas da Escola Normal de So Paulo a partir de 1890................47

    Quadro 2: Lentes e Cadeiras da Escola Normal de So Carlos em 1917............................... 69

    Quadro 3: Lentes que participaram da Revista da Escola Normal de So Carlos....................73

    Quadro 4: Artigos publicados por Carlos da Silveira na Revista Escola Normal.....................75

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: Quantidade de alunos e cidades provenientes que foram matriculados na Escola

    Normal de So Carlos em 1912................................................................................................64

    Tabela 2: Quantidade de alunos e cidades provenientes que foram matriculados na Escola

    Normal de So Carlos em 1913................................................................................................65

  • LISTA DE IMAGENS

    Imagem 01: Carlos da Silveira lendo jornal na cidade de Santos-SP em 1916........................06

    Imagem 02: Fachada da Escola Normal de So Paulo na dcada de 30...................................13

    Imagem 03: Entrada principal da Escola Normal de So Carlos prximo a dcada de 30.......20

    Imagem 04: Diploma do curso da Escola Normal de So Paulo em 1904...............................34

    Imagem 05: Sede da Escola Normal da Praa em 1894............................................................37

    Imagem 06: Carlos da Silveira com sua famlia: me, esposa e filhas.....................................44

    Imagem 07: Carlos da Silveira na dcada de 1930...................................................................46

    Imagem 08: Documento oficial da nomeao de Carlos da Silveira como secretrio da Escola

    Normal de So Carlos...............................................................................................................52

    Imagem 09: Documento administrativo que apresenta Carlos da Silveira como Secretrio da

    Escola Normal de So Carlos....................................................................................................53

    Imagem 10: Documento oficial da nomeao do Secretrio Carlos da Silveira para Lente de

    Pedagogia, Psicologia e Educao Cvica.................................................................................54

    Imagem 11: Livro administrativo com nome do professor e disciplina correspondente a que

    leciona.......................................................................................................................................55

    Imagem 12: Documento oficial de transferncia para a Escola Normal do Braz.....................56

    Imagem 13: Vista area da Antiga Escola Normal de So Carlos............................................59

    Imagem 14: Antigo Predito da Escola Normal de So Carlos (atualmente E.E. Eugnio

    Franco)......................................................................................................................................62

    Imagem 15: Vista da fachada da Escola Normal Secundria de So Carlos na dcada de

    1920...........................................................................................................................................63

    Imagem 16: Lentes da Escola Normal de So Carlos nos anos inicias da escola.....................66

    Imagem 17: Capa do primeiro nmero da Revista da Escola Normal de So Carlos 1916...72

    Imagem 18: Alguns nmeros da Revista Escola Normal de So Carlos..................................80

    Imagem 19: Alunos e professores da Escola Normal de So Paulo em 1908.........................101

  • SUMRIO

    1. INTRODUO ............................................................................................................... 14

    2. A EDUCAO NO BRASIL DURANTE A PRIMEIRA REPBLICA: O

    ENTUSIASMO PELA EDUCAO ...................................................................................... 21

    3. A ESCOLA NORMAL DE SO PAULO E O MODELO PAULISTA DE

    ENSINO...................................................................................................................................35

    3.1. A FORMAO DE PROFESSORES NA ESCOLA NORMAL DE SO PAULO ............................... 39

    4. CARLOS DA SILVEIRA: A TRAJETRIA DE UM INTELECTUAL .................. 45

    5. A ESCOLA NORMAL DE SO CARLOS .................................................................. 60

    5.1. A REVISTA ESCOLA NORMAL DE SO CARLOS ................................................................. 69

    5.2. CARLOS DA SILVEIRA NA REVISTA DA ESCOLA NORMAL DE SO CARLOS ....................... 75

    6. EDUCAO, PEDAGOGIA E PSICOLOGIA: CONCEPES DE UM LENTE

    DA ESCOLA NORMAL. ....................................................................................................... 81

    6.1. EDUCAO .................................................................................................................... 81

    6.2. PEDAGOGIA ................................................................................................................... 89

    6.3. PSICOLOGIA .................................................................................................................. 96

    7. CONCLUSES ............................................................................................................. 102

    REFERNCIAS....................................................................................................................108

    ANEXO A PUBLICAES NA REVISTA DA ESCOLA NORMAL DE SO

    CARLOS ............................................................................................................................... 112

  • Imagem 2: Fachada da Escola Normal de So Paulo na dcada de 30

    Intensifique o professorado nosso num trabalho no

    sentido indicado, fomentando esse credito social de

    que elle prprio se beneficiar; procurem os mestres

    tornar-se cada vez mais dignos da confiana publica,

    firmando a sua reputao em actos que no em

    promessas, pois no dia em que os brasileiros puderem

    descansar na segurana da obra educativa da escola,

    ahi ento veremos realizada a apstrophe do poeta,

    quando bradava aos moos estudantes, no famoso

    hymno:

    Mocidade, eia avante, eia avante!

    Que o Brasil vos aguarda com f!

    Esse immenso colosso gigante,

    Trabalhai por ergu-lo de p!

    (SILVEIRA, n. 13, 1923, p.9).

  • 14

    1. INTRODUO

    A pesquisa apresentada fruto do trabalho de mestrado que contou com a orientao

    da professora Dra. Alessandra Arce Hai junto ao Programa de Ps-Graduao da

    Universidade Federal de So Carlos (PPGE - UFSCar). O projeto, financiado pela CAPES,

    produto das discusses, trabalhos e pesquisas que aconteceram ainda durante a graduao,

    envolvendo assuntos sobre a histria da educao, a histria das instituies e a histria das

    ideias pedaggicas, mas principalmente da minha participao no projeto de restaurao e

    organizao do acervo da Escola Normal de So Carlos, em parceria com a Unidade de

    Educao, Informao e Memria (UEIM) do Centro de Educao e Cincias Humanas da

    UFSCar (CECH) e com a direo da Escola Estadual Dr. lvaro Guio de So Carlos,

    tombada pelo patrimnio nacional. O trabalho inserido no eixo "Historiografia, acervos e

    educao", teve como finalidade recuperar, conservar e organizar o acervo documental e

    bibliogrfico do Museu Pedaggico da antiga Escola Normal de So Carlos, atual Escola

    Estadual Doutor lvaro Guio, para possibilitar a utilizao destes materiais como fonte de

    pesquisa em histria e historiografia da educao e histria das ideias pedaggicas. Intitulado

    Ideias Pedaggicas em Movimento na Formao de Professores na Escola Estadual Dr.

    lvaro Guio (1930-1969): Uma Anlise de seu Acervo Bibliogrfico e Documental o

    trabalho foi fomentado pela FAPESP no perodo de 2009 a 2010. Tal atividade promoveu a

    possibilidade de acesso a mais de 3300 livros com obras datadas do sculo XVI, XVII, XVIII,

    XIX e XX, alm de documentos, colees referentes formao de professores e

    aproximadamente 20 peridicos alguns com mais de 40 fascculos. Esse fato possibilitou

    observar a relevncia histrica e educacional presente em seus materiais, no somente na

    formao de professores como tambm na (re)construo da histria da educao nacional. O

    contato com o acervo me levou a conhecer um pouco mais a respeito da histria da educao

    brasileira.

    A Revista da Escola Normal de So Carlos (1916 1923), peridico pertencente ao

    acervo da escola, apresentou-me ao objeto desta pesquisa. Com artigos e publicaes

    realizados apenas por lentes1 de Escola Normal, o peridico contou com a participao de 27

    colaboradores, sendo todos eles professores ou diretores. Ao analis-lo de forma mais

    aprofundada foi detectada a presena e grande relevncia dos professores Carlos da Silveira e

    de Joo Augusto de Toledo. Ambos assinam seus artigos como lentes de Psicologia e

    1 Nomenclatura utilizada para caracterizar e destacar professores do ensino normal.

  • 15

    Pedagogia da Escola Normal Secundria de So Carlos e participam na Revista de maneira

    bem enftica.

    A frequente presena de Carlos da Silveira no peridico, com textos que abordam

    assuntos importantes sobre a histria da educao do pas, demonstra discusses relevantes

    que s poderiam ser transmitidas, aparentemente, por um intelectual diferenciado e

    preocupado com questes educacionais, em busca de promover de fato melhorias. Portanto,

    analisando todas essas descobertas e impresses algumas questes surgiram em torno de tal

    personalidade. Quem foi Carlos da Silveira? Quais foram suas influncias para a educao,

    em especial a educao do Estado de So Paulo? Que concepes e ideias ele divulgou? Seria

    ele um precursor do Movimento da Escola Nova como foi Joo Toledo ao trabalhar com as

    ideias de John Dewey2?

    Com a finalidade de ampliar as informaes sobre o autor e visualizar no cenrio

    nacional sua real importncia, realizou-se um breve levantamento acerca de sua trajetria de

    vida e atuao profissional.

    Nascido em Silveiras SP em 21 de Junho de 1883, Carlos da Silveira cresceu em

    Queluz SP e mudou-se para a cidade de So Paulo. Cursou e diplomou-se pela Antiga

    Escola Normal da Praa e participou de preparatrios no curso Anexo; formou-se em Direito

    pela Faculdade de So Paulo; foi professor de Escola Isolada, professor em misso no estado

    de Sergipe, lente de Escola Normal e professor interino de Psicologia e Pedagogia; diretor de

    Escola Reunida; Secretrio de Escola Normal; inspetor de Escola Normal; Catedrtico da

    Histria da Civilizao. Ou seja, atuou organicamente na formao de professores nas

    primeiras dcadas do sculo XX no s no Estado de So Paulo, mas colaborou tambm no

    Nordeste brasileiro divulgando suas ideias e o modelo de ensino proferido em So Paulo.

    Em peridicos possvel notar uma grande colaborao e participao3 em diversos

    materiais que tratam de assuntos educacionais, mas tambm cooperou em demais jornais e

    revistas que comportam assuntos diversificados, como por exemplo, genealogia. Dentre

    grande parte destes materiais possvel acompanhar seus trabalhos em: O Incio (com

    pseudnimo de Acharat); O Pas (do Rio de Janeiro); Revista da Escola Normal;

    Educao; Nevoas; Estado de So Paulo, Jornal do Comercio, Dirio de S. Paulo,

    Dirio da Noite, Correio Paulistano, Revista do Brasil, Revista do Ensino etc.

    2 Como apresentado no trabalho de dissertao de mestrado de Varotto (2012), intitulado: As apropriaes das

    ideias educacionais de John Dewey na antiga escola normal Secundria de So Carlos SP. 3 necessrio enfatizar que o Carlos da Silveira colaborou em peridicos no apenas com publicaes de

    artigos, mas tambm como membro da comisso de organizao, a exemplo da Revista Educao (em 1928).

  • 16

    Como j mencionado, as participaes de Carlos da Silveira vo alm de um mestre do

    ensino normal, visto que sua trajetria como grande estudioso permitiu que se tornasse

    tambm: historiador, cronista, genealogista, pedagogo, ensasta, bigrafo. Suas entradas to

    diversificadas no cenrio educacional o tornam um personagem importante para a

    compreenso da histria e da educao brasileira.

    O Professor Silveira dedicou-se, em grande parte de suas obras, a desenvolver

    trabalhos e pesquisa sobre temas referentes educao, por isso possvel encontrar a maior

    parte de suas ideias publicadas em revistas e jornais. Este fato abre a pesquisa para uma

    investigao profcua, porm difcil, pois envolve reunir seus artigos para apreender e

    compreender as ideias que defendia.

    O material de anlise escolhido foi a Revista Escola Normal de So Carlos. Nela

    Silveira realizou uma sequncia de trabalhos, colaborando com o peridico em todo seu

    perodo de existncia (sete anos), ou seja, publicou em todos os 13 nmeros, abordando

    temticas de grande relevncia, com assuntos e discusses sobre temas referentes Histria

    da Educao, principalmente sobre Escolas Normais em So Paulo e sobre questes de ensino

    como o ensino da lngua ptria e o papel educativo da Escola Primria, a educao cvica,

    entre outros. Ao lado de autores que foram significativos para a educao brasileira, a

    exemplo de Joo Toledo, destaca-se a importncia de estud-lo como um intelectual

    pertencente ao conjunto de indivduos que trabalharam pela educao brasileira por meio da

    divulgao de ideias pedaggicas e educacionais impressas em jornais e revistas.

    Com estes sucintos exemplos da presena e influncia exercida pelo professor, esta

    pesquisa objetivar trabalhar com a leitura e anlise das publicaes do autor efetuadas no

    perodo de 1916 a 1923. O trabalho est centrado na hiptese de que Carlos da Silveira, assim

    como Joo Toledo, teria sido um precursor na divulgao dos ideais escolanovistas no Brasil.

    Por isso, sero analisados os seus textos publicados anteriormente ao Manifesto dos Pioneiros

    da Educao Nova em 1932. Os estudos dos intelectuais brasileiros tm sido cada vez mais

    ampliados em nosso pas. Muitos desses intelectuais que colaboraram com o Manifesto tm

    ganhado espao em estudos e pesquisas sobre suas vidas, pensamentos e ideias. Compreender

    o pensamento destes intelectuais e as redes de colaborao por eles estabelecidas contribui na

    (re)construo da histria da educao brasileira.

    O campo da Histria da Educao tem acrescido suas preocupaes com estudos por

    ser compreendido como uma rea que rene um conjunto rigoroso e atento de pesquisa, como

    descrito por Cury (2013). Trata-se de um campo que vem se impondo pela busca permanente

    de objetos de pesquisa, pela qualidade e pela pluralidade de pontos de vista. (CURY, 2013,

  • 17

    p.9) Alm do mais, ao realizar estudos sobre a histria da educao notamos que a situao

    presente da educao nacional provoca, nos pesquisadores, a busca e o reconhecimento de um

    processo de cuja herana somos atores e autores. (CURY, 2013, p.9).

    Por isso, a pesquisa proposta no buscar a escrita de uma biografia do autor, mas

    procurar compreender as ideias pedaggicas presentes em sua trajetria de vida (formao

    acadmica, trajetria profissional, as concepes etc.) e as interlocues realizadas pelo

    educador e intelectual brasileiro Carlos da Silveira, com foco em sua importante e intensa

    participao na educao e concomitantemente na histria da educao do pas.

    Para Reis Filho (1999) estudar Histria da Educao possibilita uma viso ampla e

    global ao educador, pois por meio da transmisso das heranas culturais possvel observar

    e compreender como se deu a evoluo social, visto que as organizaes sociais, para garantir

    continuidade no tempo e espao, necessitam de um conjunto de meios educativos.

    Historicamente cada sociedade elabora o seu sistema educacional de forma particular. Por este

    motivo compreende-se que a educao inseparvel do contexto sociocultural. Assim, pode-

    se dizer que a ao educativa , pois, tambm poltica. No h filosofia ou procedimento

    educativo neutro: ou promove e incorpora as foras do desenvolvimento social ou freia e

    sustenta as foras de estagnao e retrocesso social. (REIS FILHO, 1999, p.8) Por isso, os

    pesquisadores em educao devem ter cautela para obter o sentido da sntese histrica, da

    evoluo das instituies educacionais e do pensamento pedaggico que realizam. Desta

    maneira, os pesquisadores da histria da educao sero pesquisadores capazes de estudar os

    perodos mais significativos e as personalidades mais criadoras da evoluo educacional

    brasileira. (REIS FILHO, 1999, p.8).

    Existe, portanto, a necessidade de conhecer a realidade educacional composta, no se

    tratando apenas de um conhecimento do passado, mas de um conhecimento histrico que

    possibilite refletir de maneira filosfica o contedo da realidade com vistas s diretrizes e

    coordenadas da ao pedaggica. S ento, a Histria da Educao Brasileira poder adquirir

    a funo pedaggica de contribuir para a formao da conscincia crtica do educador

    brasileiro. (REIS FILHO, 1999, p.8). Pensando na importncia de desenvolver um estudo em

    Histria da Educao, pode-se dizer que o professor Carlos da Silveira, comporta as

    exigncias de uma personalidade nacional com participao na evoluo e transformao da

    educao e que faz jus a uma pesquisa pautada em suas obras e pensamento educacionais.

    Para Sirinelli (2003) compreender a histria dos intelectuais, assim como a exemplo

    de Carlos da Silveira, interpretar e estudar um campo que no se restringe a compreenso de

    si mesmo, pois carrega consigo a necessidade de interpretao de um espao aberto e que se

  • 18

    situa em um cruzamento entre as histrias poltica, cultural e social. Desta forma, ao fazer a

    anlise da histria de um intelectual no se pode estud-lo apenas de forma fechada, pois para

    interpretar suas ideias preciso realizar um estudo de maneira ampla, de modo a incluir as

    concepes individuais abarcando as representaes coletivas. Alm do mais, acredita-se que

    a histria dos intelectuais passa obrigatoriamente pela pesquisa, longa e ingrata, e pela

    exegese de textos, e particularmente de textos impressos, primeiro suporte dos fatos de

    opinio, em cuja gnese, circulao e transmisso os intelectuais desempenham um papel

    decisivo (SIRINELLI, 2003, p.245).

    Por isso, quando pensamos na leitura realizada do conjunto, ou partes, da obra de um

    autor mundo a fora nos deparamos com a ideia da partilha de cdigos culturais, de acordo

    com Carvalho (2001), apropriados, Catani (2000), a partir de relaes e prticas especficas.

    Constroem-se por vezes significados, atribuem-se sentidos muito diversos dos inicialmente

    propostos, tracejam-se rupturas, continuidades, abre-se, por vezes um hiato entre usos

    prescritos e usos efetivos, (CATANI, 2000, p. 146). Por isso pensar em um trabalho de

    histria que envolva analisar, compreender a obra de um determinado autor, como Carlos da

    Silveira nos traz dificuldades e cuidados extras no trato com as fontes e, nas anlises a serem

    realizadas. Portanto, no d para realizar a anlise a que pretendemos sem olhar as

    transformaes sofridas pelas ideias, isto significa tentar apreender o movimento de

    apropriao das mesmas.

    A produo de Carlos da Silveira situa-se neste contexto, ao mesmo tempo de

    internacionalizao e tambm de tentativa de produo de um conhecimento escolar que se

    situa no mbito das produes brasileiras. Pois nas primeiras dcadas do sculo XX no Brasil

    buscava-se apreender e implementar os debates internacionais e suas proposies

    pedaggicas, ao mesmo tempo em que trabalhava-se pela formao do homem republicano

    brasileiro.

    De acordo com Depaepe (2003) a pesquisa em histria da educao exige do

    pesquisador instrumentos e conceitos que viabilizem a compreenso, mas

    principalmente, os pesquisadores precisam ter suporte terico slido para perscrutar

    as implicaes dos paradoxos educacionais. Ademais, tais pressupostos possibilitam

    ao pesquisador em histria da educao atentar-se em suas anlises para o discurso

    pedaggico e o processo de apropriao e circulao das ideias pedaggicas. Tal

    compreenso leva o pesquisador a observar a necessidade de aprofundamento no seu

    objeto de estudo, como tambm no domnio de uma metodologia que permita uma

    anlise e um tratamento dos dados capaz de suportar a prpria dinamicidade em que

    o material/objeto/fonte foi produzida. Isto , o pesquisador em histria da educao

    e na histria das ideias pedaggicas necessita ter um arcabouo terico e uma

    instrumentalizao no processo de anlise que permita compreender o objeto dentro

    do seu tempo histrico e, portanto, o distanciamento necessrio para apreender seus

    elementos, como tambm, no isol-lo de uma complexidade histrica em que o

    mesmo foi e constitudo. Nesse caminho, Depaepe, Hermann, Surmont, VanGorp e

  • 19

    Simon (s.d2, p. 7) argumentam da necessidade de se utilizar um modelo terico

    capaz de permitir ao pesquisador captar a estrutura que marca o fenmeno a ser

    estudado em conjunto com a dinamicidade de sua constituio. (BALDAN &

    ARCE, 2012, p. 12-13)

    Concordando com a citao acima neste trabalho de pesquisa alm de procurarmos

    aprofundar a questo metodolgica, trabalharemos na tentativa de apreender, compreender e

    analisar as concepes de educao, pedagogia e psicologia presentes no perodo histrico de

    produo dos textos de Carlos da Silveira, bem como tambm de sua formao enquanto

    educador. Como procedimento metodolgico, de acordo com Toledo (2001, p. 20), buscou-se

    trabalhar a anlise dos dispositivos materiais (formato, ttulo, frontispcio e diagramao) e

    dos dispositivos do aparelho crtico dos peridicos e jornais (orelhas da capa e da contracapa,

    direitos autorais/ficha catalogrfica, dedicatria, prefcio, sumrio, ndices, bibliografia, notas

    de rodap, notas de tradutor, indicao de errata e edio/tiragem). Entretanto, como ser

    realizada a anlise do Peridico, Volume, data, nmero de pginas, Ttulo, Autor, Imagem

    Frontispcia, Estrutura do artigo, Resumo geral do artigo, Categorias de Anlise. Alm disso,

    ser realizada a busca por compreender como o perodo histrico em que o autor produziu

    caracterizou-se do ponto de vista de suas concepes de educao, pedagogia e psicologia.

    Portanto, para melhor entender a proposta da pesquisa, o trabalho foi divido em sete

    sees principais: primeiramente uma configurao da educao na fase da Primeira

    Repblica, data que abrange a formao e as publicaes de Carlos da Silveira; em seguida,

    uma breve anlise da Escola Normal de So Paulo, instituio de formao do professor

    Silveira, no empenho de vislumbrar como se deram as ideias iniciais e sua formao;

    posteriormente, a escrita de sua biografia, a fim de compreender quem foi e os lugares onde

    atuou enquanto educador e intelectual; depois disso, a realizao de uma explanao da

    Escola Normal de So Carlos, instituio de prestgio no interior paulista, onde Silveira atuou

    como secretrio e lente, alm de ser a instituio pertencente Revista; consequentemente,

    realizada a anlise geral do material: a Revista Escola Normal de So Carlos, peridico

    onde esto registradas participaes e ideias do professor Carlos da Silveira; e, por fim, uma

    breve concluso da pesquisa.

    Acredita-se que desta maneira seja possvel contemplar as interpretaes, a histria e a

    importante passagem do Professor Carlos da Silveira no campo da Educao nacional.

  • 20

    Imagem 3: Entrada principal da Escola Normal de So Carlos prximo a dcada de 30.

    Fonte: Pgina online So Carlos Antigo

    Ide-vos diplomar portanto, numa era nova, de

    rejuvenescimento geral, de salutar e nobilitante

    confiana nos destinos da Ptria. Forma-se, aos

    poucos, devido a factores vrios, um povo brasileiro

    que, at hoje no existia seno como expresso

    literria. a era de uma gerao que quer influir,

    reformar, regenerar, precisar as directizes da nacionalidade (SILVEIRA, n.13, 1923, p. 13).

  • 21

    2. A EDUCAO NO BRASIL DURANTE A PRIMEIRA REPBLICA: O

    ENTUSIASMO PELA EDUCAO

    A Primeira Repblica, conhecida tambm como Repblica Velha, a fase pertencente

    formao acadmica e s datas de publicaes realizadas por Carlos da Silveira no peridico

    da Revista da Escola Normal de So Carlos (1916-1923), por isso, compreender os ideais

    propostos e postos nesta fase tambm compreender a formao, as concepes e as

    sugestes que este educador e intelectual desenvolve e defende ao escrever seus artigos.

    Assim, ser realizada uma explanao das ideias pedaggicas4 e da educao no Brasil

    referente ao contexto da Primeira Repblica (1889 1930) com vistas a descrever brevemente

    esse momento que caracterizou a educao frente nova concepo e formao do cidado

    brasileiro republicano.

    Esse perodo caracterizado inicialmente por uma mudana de regime, ou seja,

    demarcado pelo fim do Brasil Imperial para transformao em Repblica. Novos ideais

    emergiam e, portanto, era preciso se desvencilhar das concepes passadas. Aps a

    proclamao da repblica viu-se necessrio pensar em leis que se adequassem nova fase,

    criando assim a Constituio Brasileira de 18915, que serviu como guia e foi a diretriz durante

    toda a Primeira Repblica, perodo comandado por oligarquias latifundirias e pela economia

    com bases na agricultura, principalmente na produo de caf, dominada predominantemente

    pelos estados de So Paulo e Minas Gerais6. Visto a necessidade de mudanas nas leis de

    base, outro passo que precisou ser (re)pensando para que a transformao se desse de forma

    efetiva, foi referente instruo no pas, ou seja, a educao.

    4 Segundo Saviani (2010) existe a necessidade de distinguir as ideias pedaggicas das ideias educacionais. As

    ideias educacionais so referentes educao quer seja decorrente de fenmenos educativos visando explic-las,

    quer seja advinda de determinada concepo de homem, mundo ou sociedade interpretada a partir do fenmeno

    educativo. J as ideias pedaggicas so concebidas a partir de ideias educacionais, mas no em si mesmas, pois

    so compreendidas como um movimento real da educao, como uma constituio da prpria substncia da

    prtica educativa, ou seja, so compreendidas a partir da forma como se encarna o movimento real da educao

    por meio da prtica educativa. 5Entre os principais elaboradores da Constituio de 1891 estavam Prudente de Morais e Rui Barbosa. A

    Constituio de 1891 permitiu alguns avanos polticos. Uma das principais mudanas ocorridas foi a extino

    do Poder Moderador, passando a ser composta a partir de ento por apenas trs poderes: o Executivo, o

    Legislativo e o Judicirio. O antigo papel do imperador, por no ser mais adequado a este posto, foi substitudo

    pelo de Presidente da Repblica e, alm disso, o voto, a partir da Constituio de 1891, tornou-se universal e

    aberto. Com a Constituio de 1891 inaugurou-se tambm a orientao da Repblica no Brasil, publicada no dia

    24 de fevereiro do mesmo ano e que vigorou at o ano de 1932. 6 Ao trmino do Governo Provisrio, que alcanou a durao de cinco anos e que originou a participao de dois

    militares: Marechal Deodoro e Floriano Peixoto. O primeiro Presidente civil a ser eleito foi Prudente de Morais,

    iniciando em 1894 a alternncia entre representantes das oligarquias rurais do sudeste brasileiro, por meio de

    indicaes de lderes dos Estados, principalmente de So Paulo e Minas Gerais, que promoveram um perodo de

    alternncia na presidncia, fase que pode ser caracterizada como auge da ordem oligrquica.

  • 22

    Ao tratar de assuntos sobre a educao na Repblica Velha, Fausto (2006a) recorda

    um importante dado: a fase que abrange esse perodo representada por datas que

    caracterizam um marco cronolgico e que no necessariamente encontram seu incio e fim

    delimitados por essas aes histricas, mas que so postas para estudar e compreender o

    contexto histrico, ou seja, no incio da educao da Repblica encontram-se ainda resqucios

    da educao do Imprio, e em datas finais do antigo regime j despertam novas concepes.

    Portanto, se entende que a educao foi um processo contnuo, por despertar no antigo regime

    algumas novas intenses, mas que aos poucos gerou mudanas de ideias e concretas

    transformaes.

    Para Nagle (1974) a demarcao histrica destas duas datas (1889 e 1930), pouco

    significou para o sistema educacional brasileiro, mas o que salta em especial a profunda e

    vigorosa discusso que tem incio prximo ao fim do Imprio, com expectativas, desejos e

    avanos sobre os assuntos educacionais. Nomeado como fervor ideolgico e passada essa fase

    de mudanas de regime, Nagle (1974) reconhece a partir de ento o entusiasmo pela educao

    e o otimismo pedaggico que caracterizam fundamentalmente a dcada de 1920 em diante

    com discusses sobre ideais do escolanovismo.

    No fim do Regime Imperial, os assuntos educacionais encontravam-se em uma

    situao precria frente ao sistema escolar, mas tal situao possibilitava avanos pelo desejo

    de formulao de uma poltica educacional nacional.

    Schueller e Magald (1995) relembram que as escolas imperiais eram marcadas por um

    signo de atraso, da precariedade, da sujeira, da escassez e do mofo. (SCHUELLE;

    MAGALD, 1995, p.35) e que alm das condies limitadas do espao fsico, muito maior era

    a precariedade das ideias e das prticas pedaggicas voltadas memorizao, tabuada

    cantada, palmatria, a castigos fsicos etc. A m-formao ou a ausncia da formao

    especializada, o tradicionalismo do velho mestre-escola. Casas de escolas foram identificadas

    a pocilgas, pardieiros, estalagens, escolas de improvisos imprprias, pobres, incompletas,

    ineficazes. (SCHUELLER; MAGALD, 1995, p.35). Assim, era incompreensvel a partir da

    nova viso dos intelectuais, polticos e autoridades do regime republicano seguir com essas

    mesmas ideias e aes. A proposta ento se voltou a inaugurar uma nova educao para novos

    tempos.

    Na fase inicial da dcada de 1890, duas reformas foram de grande destaque, tanto por

    seus provedores quanto para a educao nacional. Dentre as especificaes que se encontram

    pode-se dizer que tinham o carter:

  • 23

    Uma federal, representada pela Reforma Benjamin Constant (1890), na rea da

    escola secundria; outra, estadual, na rea das escolas primria e normal, ocorreu em

    So Paulo sob a direo de Caetano de Campos (1892) esta, fundamentada em princpios de natureza democrtico-liberal, no apresentou caractersticas sectrias

    apontadas naquela reforma positivista. (FAUSTO, 2006a, p. 284)

    Tratando de cada uma delas, preciso saber primeiramente que, com a implantao da

    Repblica no pas, as ideias positivistas e do liberalismo se fizeram presentes e exaltavam as

    concepes nacionalistas e a formao do novo homem frente s necessidades e realidade

    do presente momento. Por isso, com o novo regime, a organizao escolar recebe um modelo

    baseado nas ideias da filosofia positivista que se instalaram segundo as concepes de Comte.

    O princpio desta nova Reforma que foi realizada no mbito federal contou com a

    participao de Benjamin Constant, com uma proposta diferenciada do que se tinha

    vivenciado at ento. Para Fausto (2006a), esta reforma

    Representa a substituio do modelo curricular humanista por um outro de natureza cientfica. Tambm o aparecimento de uma escola primria especialmente alfabetizante representa outro exemplo, bem como sua substituio por uma escola

    primria integral. O mesmo ocorre com o esforo para combinar, na escola secundria, as cincias com as letras, para implantar o sistema universitrio e

    secundrio. Em todos esses exemplos, tentou-se ou realizou-se a substituio total

    ou parcial de um modelo por outro. (FAUSTO, 2006a, p. 287).

    Em suma, o modelo de educao implantado na Primeira Repblica apresentava

    caractersticas distintas do regime anterior, pois acreditava que, por meio da educao pblica,

    implantaria a construo da identidade nacional, utilizando-a como uma ferramenta de poder

    civilizador nacional.

    Voltando a questes estaduais, as transformaes do ensino no perodo republicano

    tm incio em So Paulo com a Escola Normal de So Paulo e a criao da Escola Modelo.

    Em 1890 o presidente Prudente de Morais encarregou o mdico Antnio Caetano de Campos

    de promover a reforma de ensino utilizando modelos de escolas primrias que deveriam ser

    seguidos em todo o estado.

    Saviani (2010) reflete a respeito da iniciativa de Rangel Pestana, juntamente com o

    diretor da Escola Normal, Caetano de Campos, de implantar as Escolas Modelo de 2 e 3

    graus, anexas Escola Normal. Tal iniciativa foi tomada com base no decreto de 12 de maro

    de 1890. A Escola Modelo era composta inicialmente por duas salas distintas, uma para

    meninos e outra para meninas. A instalao da escola modelo assinala uma nova proposta

    para a escola primria e para a formao de professores, promovendo a implantao de um

    espao de observao das prticas escolares que deveriam ser incorporadas pelos futuros

    mestres nas inmeras escolas do estado (SCHUELLE; MAGALD, 1995, p.43).

  • 24

    A Escola Modelo anexa Escola Normal da Capital se estabeleceu como referncia

    pedaggica por todo estado, por meio dela aconteceram muitas ideias e modificaes que

    passaram a ser implementadas nas escolas pblicas primrias, principalmente nos Grupos

    Escolares.

    Em 30 de dezembro de 1892 regulamentado o decreto n.144B, da reforma geral da

    instruo pblica paulista. Mesmo tratando da instruo pblica em sua totalidade, tinha como

    foco central a educao primria, com a criao dos grupos escolares7, para a substituio das

    escolas isoladas.

    Silveira (1919) analisa o perodo de 1892 a 1897 e explica que nesses anos muitos

    educadores ressaltavam o trabalho fecundo que era desenvolvido; por isso, costumavam

    classific-lo como perodo ureo. O aumento do nmero dos grupos escolares caracterizava

    o anseio pela disseminao do ensino, o sonho e o desejo de que o Brasil desse um grande

    salto educacional.

    Saviani (2010) demonstra que cada grupo escolar8 era formado por um diretor e pela

    quantidade de professores que o prprio grupo precisasse para se compor. Na verdade, a

    juno das escolas isoladas formou o grupo escolar, onde as classes correspondiam agora a

    sries anuais, assim, os alunos passavam gradativamente por todas as sries at a concluso

    do ensino primrio. Os grupos escolares se espalharam por todo o estado e em 1910 chegou a

    haver 101 grupos, sendo 24 na capital e 77 no interior. Assim, tendo sua origem em So Paulo

    e aumentando frequentemente esse nmero, o modelo irradiou por outros estados.

    A escola primria experimental paulista afirmava-se, assim, como parmetro para as

    escolas pblicas republicanas, referido, num sentido amplo, organizao do

    universo escolar. O modelo formulado e disseminado era o do grupo escolar, em que

    assumiam grande relevo aspectos como a construo de prdios considerados

    apropriados para a finalidade educativa, o trabalho escolar apoiado no princpio da

    seriao e no destaque conferido aos mtodos pedaggicos, entre os quais se situava,

    especialmente, o mtodo intuitivo; a diviso e hierarquizao da atuao dos

    profissionais envolvidos no cotidiano da escola; a racionalizao dos tempos

    escolares; o controle mais efetivo das atividades escolares, entre outros

    (SCHUELLE; MAGALD, 1995, p.43)

    7 Criado e instalado primeiramente em So Paulo em 1893, o Grupo Escolar tinha o intuito de reunir as escolas isoladas de uma regio comum. Seus criadores visavam a universalizao do ensino como forma de

    modernizao do pas. O grupo escolar era conhecido pela composio dos discentes de acordo com o grau ou a

    srie em que se situavam implicando em uma crescente forma de conhecimento. Diferentemente das Escolas

    Isoladas, que comportavam, em uma nica classe, alunos de diferentes nveis e estgios com a utilizao de

    apenas um professor, segundo as informaes de Saviani (2010).

  • 25

    Suas concepes de ensino expressavam no apenas uma nova arquitetura de

    instituio, mas muito alm disso, tinham como intuito a elevao escolar com a criao dos

    grupos escolares em 1893 e o emprego de mtodos pedaggicos renovados; dentre eles

    destaque ao mtodo intuitivo.

    Conhecido tambm como lies de coisas, o mtodo intuitivo, segundo Saviani

    (2010), em um mbito mais geral, foi desenvolvido para fins de resolver a ineficincia do

    ensino diante de adequaes sociais decorrentes da revoluo industrial, que se d entre o

    fim do sculo XVIII e meados do sculo XIX. Ao mesmo tempo, essa mesma revoluo

    industrial viabilizou a produo de novos materiais didticos como suporte fsico do novo

    mtodo de ensino. (SAVIANI, 2010, p.138). Esses materiais, utilizados no Brasil por volta

    da metade do sculo XIX, eram compostos por peas escolares como: quadros-negros

    parietais; caixas para ensino de cores e formas; quadros do reino vegetal; gravuras; objetos de

    madeira; cartas de cores (para uso da instruo primria); aros; mapas; linhas; diagramas;

    caixas com pedras e metais; madeira, loua e vidro; iluminao e aquecimento. Saviani (2010)

    explica ainda que o uso desses materiais dependia de objetivas diretrizes metodolgicas: a

    chave para desencadear a pretendida renovao a adoo de um mtodo de ensino: concreto,

    racional e ativo, denominado ensino pelo aspecto, lies de coisas, ou ensino intuitivo

    (VALDEMARIN, 2004, p.139 apud SAVIANI, 2010). Resumindo, compreendia-se que o

    mtodo intuitivo deveria partir de uma percepo sensvel, assim, o princpio da intuio

    exige o oferecimento de dados sensveis a observao e percepo do aluno. (REIS

    FILHO, 1995, p.68). Um dos manuais mais utilizados foi Primeiras lies de coisas, tendo

    como autor o americano Norman Allison Calkins. A primeira edio de seu trabalho tem

    como data 1861 e sua ampliao e reformulao possui data de 1870. A traduo do trabalho

    foi realizada por Rui Barbosa em 1886.

    Segundo Auras (2005) o mtodo desenvolvido por Calkins9, foi publicado pela

    primeira vez no Brasil em 1886 e contou com a aprovao da Congregao da Escola Normal

    e o Conselho Superior do Ensino da Bahia, pelo Conselho de Instruo do Rio de Janeiro

    (capital da Repblica) e pela Provncia de So Paulo, que adquiriu um nmero significativo de

    500 exemplares, que foram distribudos pelas escolas.

    9 Segundo os estudos de Auras (2005), Rui Barbosa cita que Calkins tentou adaptar as ideias de Pestalozzi em

    forma de um ensino prtico para implementar em sala de aula com finalidade de ajudar seus colegas professores.

    Desta forma, organizou um formulrio de lies, nomeando-o como primary objectlessons for a graduated

    course of development. Tendo sido realizada grande procura pelo material, Calkins em 1870 promove melhorias

    e ampliaes e promove a segunda verso do manual, nomeada ento como: Primary Object Lessons.

  • 26

    Para compor o quadro da Escola Normal de So Paulo, foram contratadas professoras

    que apresentavam um currculo de formao norte-americana para auxiliar e orientar os

    alunos do ensino normal e o desenvolvimento de prticas do magistrio.

    Nagle (1974) relata que outra viso que surgiu nesta ocasio estaria voltada crena

    de algumas formulaes doutrinrias sobre a escolarizao que apontavam para o caminho de

    formao do novo homem brasileiro, ou seja, os ideais escolanovistas. O destaque nessa fase

    so alguns antecedentes que esboam uma breve infiltrao at datas de 1920 e, aps essa

    data, uma maior discusso sobre esses pensamentos.

    nesse sentido que tem determinados elementos que se encontram na Reforma de

    Lencio de Carvalho, no Parecer de Rui Barbosa sobre a Reforma do ensino primrio, na fundao de escolas pelas diversas correntes do protestantismo, na

    Exposio Pedaggica de 1883, na criao de o Pedagogium, na reforma da instruo pblica paulista, realizada por Caetano de Campos, na introduo do

    mtodo de intuio analtica, ainda nas escolas paulistas, na primeira administrao de Oscar Thompson; a mesma interpretao deve ser dada criao

    de laboratrios de psicologia e pedagogia especialmente o montado por Ugo Pizzoli na Escola Normal de Praa, em So Paulo, bem como a determinados

    aspectos do contedo de obras sobre a educao por exemplo, trabalhos de Ciridio Buarque, Sampaio Dria ou o Anurio do Ensino do Estado de So Paulo, de 1917. (NAGLE, 1974, p. 239).

    possvel perceber, portanto, que a primeira fase se caracteriza por discusses sobre o

    movimento da escola nova, movimento ainda muito especfico e visvel em determinados

    espaos, como por exemplo, em determinadas reformas de ensino e especialmente na Escola

    Normal de So Paulo, um dos principais beros de formao de professores do estado de So

    Paulo, com o privilgio dos laboratrios de Pedagogia e Psicologia, recursos ainda inusitados.

    Essas reformas tambm foram influenciadas pelas ideias de Oscar Thompson10

    e

    Sampaio Dria11

    que propunham a aplicao e introduo do mtodo analtico, que

    correspondia, segundo relata Warde (2003), a um acmulo de experincias escolares, pautado

    em descontinuidades decorrentes de disputas que foram adequando o mtodo para o ensino

    dos saberes, como, por exemplo, o melhor mtodo de ensino para leitura. O mrito desse

    mtodo residia, principalmente, na sua eficcia para desenvolver a capacidade de conhecer,

    pelo fecundo contato da inteligncia com a natureza e pelo exerccio das faculdades

    perceptivas (DRIA, 1923 apud CARVALHO, 2010, p.100). Acreditava-se, que o mtodo

    de intuio analtica era totalmente conforme a psicologia da criana, compreendida, de modo

    similar a ele, como passagem de viso sincrtica para sintica, mediada pelos processos

    analticos (CARVALHO, 2010, p. 119). Desta forma, para bem compreender este mtodo

    10

    Diretor da Escola Normal de So Paulo durante o perodo de 1901 a 1911. 11

    Diretor-Geral da Instruo Pblica entre os anos de 1920 a 1924.

  • 27

    segundo alguns de seus seguidores, como a exemplo de Sampaio Dria, era preciso incorporar

    assuntos da psicologia, pois, como visto, esse mtodo partia de concepes e percepes

    amplas e discutveis para uma ideia mais concreta elaborada, para isso era necessrio a

    observao e anlise.

    J a segunda fase de introduo das ideias do escolanovismo, atingiu seu auge na

    dcada de 20, momento em que a verso tradicional da pedagogia liberal foi suplantada pela

    verso moderna (SAVIANI, 2010, p.177). Uma verso que possui uma vertente mais

    humanista e moderna da filosofia da educao e que ganha mais visibilidade com a fundao

    e criao da Associao Brasileira de Educao (ABE), construda em 1924 por Heitor Lyra e

    que teve como finalidade reunir e argumentar com pessoas de vrias tendncias e correntes da

    educao. Em sua real finalidade a ABE reuniu em seu espao indivduos que acreditavam em

    novas ideias pedaggicas e as buscavam. Surgia ento nessa dcada o incio de uma discusso

    sobre a implantao e a absoro de uma nova pedagogia. Para confrontar o ensino posto at

    ento, dito como tradicional, agora seriam abordados assuntos sobre um movimento que

    aderisse a uma nova concepo, a escola nova.

    A Escola Nova, respeitando o trinmio psquico da criana essencialmente prtica

    e experimental, um mundo em miniatura, a imagem da vida. Ela desenvolve

    energias, canaliza vontades, cria discernimentos, forma seres pensantes e coerentes.

    Educar no apenas ensina a ler, a escrever e a contar. desenvolver e dirigir as

    aptides individuais, adaptando-as s necessidades do tempo e s exigncias do

    meio. (MORAES, 1922 apud MONARCHA, 2009, p.146).

    De modo mais geral e universal, Nagle (1974) apresenta as ideias do escolanovismo

    divididas em: 1889 a 1900 como fase de criao das primeiras escolas novas e no apenas

    uma especulao sobre seus preceitos; 1900 a 1907, momento de formulao deste novo

    iderio educacional, composta por diversas correntes terico-prticas, com destaque para as

    concepes de Dewey; 1907 a 1918, fase que promove a criao e a publicao dos primeiros

    mtodos ativos e, conjuntamente, passa a ser um perodo de maturidade dessas realizaes;

    finalmente, a fase que compreende a data de 1918 at anos depois descrita como o perodo

    de difuso, consolidao e oficializao das ideias e princpios do escolanovismo.

    Diferentemente do contexto mais geral, no Brasil at a dcada de 20, esse movimento

    foi utilizado como uma preparao dessas ideias pedaggicas como estmulo para a

    escolarizao. Alm do mais, os princpios da escola nova eram associados a um modelo

    reformista e renovador, pautados pela experimentao de novos meios e, portanto, seria

    necessrio revisar os mtodos pedaggicos.

  • 28

    Aqui o papel da escola normal utilizado em prol de difundir e contribuir para as

    alteraes curriculares.

    Se a contribuio do movimento reformista da escola primria, no sentido de

    penetrao do iderio escolanovista, se d pela ampliao e diversificao curricular

    e, especialmente, por meio de transformao metodolgica, aquele movimento, no

    caso da escola normal, vai contribuir por efeito de alteraes especificamente

    curriculares. (NAGLE, 1974, p.246)

    A escola normal era o ncleo de formao de professores que iram atuar no ensino

    primrio. Uma vez incutido os ideias nos alunos normais, conjuntamente haveria alteraes

    no ensino primrio.

    Uma disciplina associada e colaborativa a esse modelo de ensino a psicologia, visto

    que:

    A posio da psicologia singular nesse quadro. Os estudos psicolgicos aparecem

    sob a forma de psicologia geral, outras vezes com determinadas especificaes que

    revelam modificaes importantes no seu contedo; por exemplo, neste caso

    englobam itens sobre o estudo da criana, do desenvolvimento humano, dos

    interesses e necessidades, das diferenas individuais. Alm disso, aparecem

    determinadas denominaes especiais, que denotam especializaes, como o caso

    da psicologia do desenvolvimento, pedologia, psicometria, psicologia educacional,

    psicologia das votaes. (NAGLE, 1974, p. 247).

    O estudo da psicologia era compreendido, principalmente nas escolas normais, como

    um dos componentes mais importantes a serem estudados e associados com a pedagogia.

    Essas cincias serviriam de complemento uma a outra e assim abrangeriam as concepes do

    novo mtodo.

    Com vistas iniciao para a mudana, que se caracterizou pela ideia de um novo

    homem, era necessrio tambm um espao fsico com atribuies referentes ao papel social da

    Instruo para esses jovens, ou seja, os prdios escolares deveriam representar o cidado

    republicano. A escola republicana tinha como papel, alm da instruo do ensino, a formao

    e o desenvolvimento moral e cvico, pensamentos que deveriam ser ensinados e agregados

    dentro das fases escolares, discutindo e ressaltando valores referentes ao calendrio cvico e

    literatura cvico-pedaggica12

    .

    Principalmente a partir de 1915 configurado um novo momento de realizaes

    significativas. So ideias, planos e solues oferecidos. De fato, pode-se notar que o

    12

    Nessa fase, a questo do nacionalismo ganhava grande repercusso, principalmente no campo da educao,

    sendo mais fortemente visvel em meados da dcada de vinte em meio aos livros didticos com contedos de

    educao moral e cvica, acentuando de forma bastante clara o patriotismo. Fato esse que se fez mais presente

    durante e aps a Primeira Guerra (1914-1918) que possibilitou desenvolver elementos para uma doutrina

    nacional.

  • 29

    surgimento de interesse para com a educao despertou, de modo mais intenso, prximo ao

    fim do Imprio e bem nos anos iniciais da Repblica, porm no muito pouco depois e de

    forma geral minimizam-se os nimos sobre tais discusses. Nagle (1974) cita que nem todas

    as aspiraes almejadas puderam ou foram alcanadas, restando a formao de uma

    Repblica possvel, haja vista que o espirito republicano que formou um embate

    ideolgico no fim do Imprio diminuiu gradualmente. Da o desnimo, mais que o desnimo,

    as desiluses e as frustraes que dominaram a mentalidade dos homens pblicos, dos

    pensadores, dos intelectuais e dos educadores que viveram durante a primeira repblica at

    cerca de 1920. (NAGLE, 1974, p.101). Apenas prximo da ltima dcada, entre os anos de

    1920 e 1929, que o pas voltou a presenciar um clima mais intenso de entusiasmo pela

    educao, um otimismo pedaggico. Acreditava-se que por meio da difuso da educao seria

    possvel incorporar grandes camadas da populao escolar, ser possvel incorporar grandes

    camadas da populao na senda do progresso nacional, e colocar o Brasil no caminho das

    grandes naes do mundo (NAGLE, 1974, p.99).

    possvel perceber que h aqui uma parcela que se liga ao fervor ideolgico do final

    do Imprio, mas, agora, este manifestado pelos prprios republicanos desiludidos com a

    Repblica existente. (FAUSTO, 2006a, p.284). Trata-se de um movimento voltado

    basicamente para a escola primria em busca de imprimir as ideias do cidado nacional, ou

    seja, questes do nacionalismo, na formao do novo cidado republicano. As conferncias de

    Olavo Bilac e a formao da Liga da Defesa Nacional em 1916 tm o intuito de promover e

    disseminar essas ideias, isto , difundir as questes do ensino cvico-patritico que sero

    expostas tambm pelas Ligas Nacionalistas; pela revista Brazlea; pela Propaganda Nativista

    e pela Ao Social Nacionalista.

    A campanha de Bilac representa a fase inicial de congregao dos espritos, que ir

    provocar a formao da Liga de Defesa Nacional. (NAGLE, 1974, p. 44). O documento que

    deu incio a essa fase foi a conferncia proferida por Olavo Bilac aos estudantes da Faculdade

    de Direito de So Paulo. Em resumo, a partir das ideias concebidas neste documento, nota-se

    a preocupao em assinalar uma identidade nacional e uma crena em aspiraes comuns para

    a construo nacional, iniciando com uma crtica apatia social frente s questes polticas:

    Com efeito, os polticos profissionais nada mais so do que pastores egostas do rebanho

    tresmalhado; as classes populares mantidas na mais bruta ignorncia, mostram s inrcia,

    apatia, superstio, absoluta privao de conscincia. (NAGLE, 1974, p.44), mas indicando

    a soluo para esta questo com a defesa do cidado cvico-patritico.

  • 30

    Qual o remdio para esse estado de coisas? So muitos, mas um deles constitui

    verdadeira promessa de salvao: a lei do sorteio militar (...). Que o servio

    generalizado? o triunfo completo da democracia; o nivelamento das classes; a

    escola da ordem, da disciplina, da coeso; o laboratrio da dignidade prpria; o

    asseio obrigatrio, a higiene obrigatria, a regenerao muscular e fsica obrigatria.

    Essas so as linhas-mestras do chamamento cvico-patritico do poeta, que iro

    fornecer o arcabouo para a formao da Liga de Defesa Nacional, a mais ampla e

    influente organizao nacionalista do perodo. (NAGLE, 1974, p. 45).

    Basicamente foram estas as palavras que se disseminaram frente organizao

    nacionalista. A Liga de Defesa Nacional, fundada em 7 de setembro de 1916 por iniciativa de

    Olavo Bilac, Pedro Lessa e Miguel Calmon, tinha como grande intuito congregar os

    sentimentos patriticos em todas as classes, respeitando as leis vigentes do pas. Dentre o

    principal objetivo, alguns menores, porm no menos importantes eram visados:

    Manter a ideia de coeso e integridade nacional; defender o trabalho nacional;

    difundir a instruo militar nas diversas instituies; desenvolver o civismo, o culto

    do herosmo, fundar associao dos escoteiros, linhas de tiro e batalhes patriticos;

    avivar o estudo de Histria do Brasil e das tradies brasileiras; promover o ensino

    da lngua ptria nas escolas estrangeiras existentes no Pas; propagar a educao

    popular e profissional; difundir nas escolas o amor justia e o culto do patriotismo;

    combater o analfabetismo. (NAGLE, 1974, p.45).

    Essa inculcao nacionalista est centralizada na formao da conscincia nacional,

    acreditando ser necessria a disciplina e a ordem como caractersticas para que haja ptria,

    tornando a formao do cidado revestida de cultura intelectual e moral. Apresenta-se assim

    uma vida na liberdade, porm sem excessos, a exemplo de respeitar as leis e as autoridades e

    ausentar-se de revoltas armadas. Nagle (1974) complementa que este programa apresentado

    pela Liga possua um fundo aristocrtico e com princpios voltados com um papel tutelar de

    determinada elite, pois os indivduos deveriam ser capazes de sobrepor-se aos interesses

    prprios, aos interesses partidrios de classe ou de campanrio (p.46) com a misso de

    governar e dirigir o povo.

    Mesmo em meio a vrias crticas e acusaes, como a de proteger partidos e governos

    desastrados e ainda a de ter relaes com o militarismo, o ideal da Liga de Defesa Nacional

    tomou propores maiores culminando em junes com instituies que tinham interesses

    semelhantes, formando assim, a Liga Nacionalista Brasileira e as ligas Nacionalistas

    estaduais. Foi um perodo de efervescncia com questes voltadas obrigatoriedade do ensino

    da lngua nacional, de Histria e Geografia nacional, da Educao Fsica, do Escotismo, da

    propaganda sobre a obrigao legal do voto, a liberdade do eleitor, a fraude e a apurao

    verdadeira dos votos etc. A Liga Nacionalista, que tinha sede em So Paulo, contribuiu

    tambm para inquietaes que ocorreram durante a Primeira Guerra, como a respeito de

  • 31

    romper relaes com a Alemanha, mesmo que esta Liga, ao contrrio a anterior, estivesse

    ligada mais a discusses polticas e menos militares, sendo esta uma das principais diferenas

    entre elas.

    Preocupada com a alfabetizao, a Liga Nacionalista Brasileira buscava impor-se no

    combate ao analfabetismo e, sabendo que o pas era dirigido para uma minoria e por uma

    minoria, um dos principais desejos da Liga era de alfabetizar a maior parte da populao para

    que pudesse gozar de seus direitos polticos, uma vez que o Art. 70, 2, da Constituio

    Federal determina que o analfabeto no pode manifestar vontade poltica (NAGLE, 1974, p.

    48)

    Acusando estas ligas de manter o programa da religio catlica, nacionalizar o

    comrcio e a imprensa lusitana, a revista Brazlea e o grupo Propaganda Nativista faziam

    crticas hegemonia paulista e defesa da civilizao agrria. Intrigavam-se com os

    portugueses que viviam em solo brasileiro e utilizavam dos benefcios deste solo e que

    mesmo assim se consideravam portugueses. Alm disso, criticavam o estado de So Paulo

    que, segundo eles, no merecia ter admirao pela hegemonia poltica que tinha alcanado at

    ento. Nagle (1974) descreve que o nacionalismo neste perodo no foi discutido apenas por

    um grupo ou associao, mas, de modo geral, eram discusses que tratavam de valores de

    grupos ou instituies que no apresentavam interesses da realidade nacional.

    precisamente nesta fase que se procura enobrecer assuntos nacionais como a

    utilizao e valorizao da lngua portuguesa, o direito e a obrigao ao voto, a importncia

    dos estudos de Histria e Geografia nacionais, entre outros, alm de preocupaes com

    alfabetizao nacional.

    Tal fato pode ser observado na descrio de Reis Filho (1995):

    Da, os republicanos paulistas atriburem ao Estado a funo de criar e manter

    escolas de todos os nveis. Essas escolas estatais teriam o cargo para preparar o

    futuro cidado para que ele pudesse desempenhar o papel poltico reservado pelo

    regime republicano a todos os brasileiros. Em contrapartida, o novo regime atribui

    escola a tarefa primordial de educao cvica, entendida como a compreenso

    fundamental dos deveres do cidado. (p.204)

    A educao passa ser, a partir de ento, o alicerce para difundir e afirmar as questes

    da nacionalidade, do patriotismo por meio da educao cvica, o que pode ser notado ao

    observar o quadro de disciplinas montado para a formao de um aluno de escola normal. Em

    um curso com durao de quatro anos se aprendiam as seguintes lnguas: portugus, francs,

    ingls e latim. As demais disciplinas eram estas:

  • 32

    o quadro das disciplinas cientificas compreendia: aritmtica, lgebra, geometria e

    trigonometria; mecnica, astronomia, fsica, qumica, histria natural, anatomia e

    fisiologia. Os estudos sociais incluam: histria universal, histria do Brasil,

    geografia geral, geografia do Brasil, economia poltica e educao cvica. Como

    conhecimentos aplicados, eram contempladas a escriturao mercantil e a

    agrimensura. As artes faziam-se presentes no plano de estudo por meio do desenho,

    da msica e dos trabalhos manuais. A educao fsica realizava-se pelos exerccios

    ginsticos apropriados a cada sexo e, ainda, para os rapazes, exerccios militares. O

    rol de disciplinas da Escola Normal completava-se com economia domstica para as

    moas e, para todos, a cadeira de Pedagogia e Direo de Escolas, colocada no

    quarto ano do curso. facilmente verificvel a pobreza da fundamentao

    pedaggica do plano de ensino: uma s disciplina com esse carter. Desse modo, o

    peso da formao pedaggica ficava a cargo dos Exerccios de Ensino da Escola-

    Modelo. (REIS FILHO, 1995, p. 206).

    H dois pontos interessantes a serem discutidos: primeiro, h de se notar as disciplinas

    que caracterizam o patriotismo, a exemplo de Histria e Geografia do Brasil, sem mencionar

    o estudo de Educao cvica, que est claramente compondo a grade curricular; em segundo

    lugar, Reis Filho (1995) faz a crtica formao desse aluno, que fica a desejar frente s

    questes da formao pedaggica e que deixa como responsabilidade participao na Escola

    Modelo.

    A preocupao referente instruo social pautada em formar o novo homem, o

    homem cidado, caracterstica desta fase. E para que fosse possvel exercer a cidadania

    eram necessrios dois elementos: ler e escrever. Carvalho (1987) explica que existiam dois

    tipos de cidado: o ativo e o simples, sendo que o primeiro possua alm dos direitos civis

    os direitos polticos e o segundo apenas direitos civis. A educao concedida populao

    como forma de esclarecer direitos e deveres. Era, portanto, um instrumento de ascenso social

    para aqueles que se encontravam margem da sociedade, mas tambm utilizado como

    ascenso do poder da burguesia. Assim o entusiasmo pela educao" apresenta a escola

    tambm como uma maneira de participao poltica, pensando-a como uma funo poltica.

    Porm, ainda nesse perodo, chamam a ateno o crescimento industrial de capital

    suficiente para desenvolver a indstria e a facilidade de importao, o que assegura o domnio

    oligrquico e o fortalecimento econmico de grupos cafeeiros. A valorizao do caf,

    principal produto do pas, auxilia a elite agrria a permanecer no comando sobre o Estado.

    Por isso, empecilhos foram postos frente luta pela industrializao por motivo dos ideais

    ruralistas. Apenas a partir da dcada de 1920 foi possvel dar um salto de fortalecimento

    industrial. Nesta fase, inquietaes sociais e perturbaes causadas principalmente pelas

    campanhas eleitorais, lutas e reivindicaes do operariado contra as presses da burguesia

    industrial promovem um clima de efervescncia ideolgica que encontra como proposta a

    busca pelo novo.

  • 33

    E, no cenrio em questo, tiveram lugar importantes debates, mas tambm, alm

    destes, foram encaminhadas intervenes significativas no campo da poltica,

    atravs de diversas reformas de instruo pblica implementadas em diferentes

    estados brasileiros, nas dcadas de 1920 e 1930. Podem ser situadas, nesse quadro,

    as reformas conduzidas por Carneiro Leo (1922-1926), Fernando de Azevedo

    (1927-1930) e Ansio Teixeira (1931-1935), no Rio de Janeiro; Sampaio Dria

    (1920), Loureno Filho (1930-1931), Fernando de Azevedo (1933) e Almeida Jr.

    (1935-1936), em So Paulo; Francisco Campos (1927-1930), em Minas Gerais;

    Loureno Filho (1922-1923), no Cear; Ansio Teixeira (1925-1927), na Bahia e

    Carneiro Leo (1928-1930), em Pernambuco (SCHUELLE; MAGALD, 1995, p.49)

    Assim, de forma mais geral, so reformas que apontam tendncias com caractersticas

    de uma cultura escolanovista ainda com termos amplos e imprecisos, mas com vistas a uma

    cientifizao progressiva e prticas educativas que se pautavam na formao de professores

    inspirados pelos ideais renovadores.

    Finalizando a fase entre 1920 a 1930, Schuelle; Magald, (1995) concluem que as

    reformas educacionais que ocorreram criaram uma instituio que estava longe de ser uma

    escola totalmente renovada, mas que tais propostas foram disseminadas pelos educadores da

    poca que construram e apoiavam estes ideais com mais ou menos intensidade. Um projeto

    renovador, que avistava o futuro na busca de romper o passado e construir um presente.

    Tendo apresentado brevemente os principais nveis de ensino e as mais importantes

    reformas que ocorreram durante a primeira Repblica, pode-se compreender que a educao

    nesta fase mostra-se bastante marcada pela formao de cidados republicanos. E no por

    menos, o estado de So Paulo ganha evidncia frente aos demais estados do pas; suas leis,

    polticas, concepes e ideias so realadas. A Escola Normal de So Paulo, a primeira do

    estado, foi participante da formao de Carlos da Silveira. Por isso, entender essa instituio

    compreender o contexto do bero de professores paulistas, mas, especialmente, os conceitos

    advindos da escolarizao e preparao para o magistrio como educador e para a vida como

    intelectual e crtico. No apenas adepto de ideias prontas, o Professor Carlos da Silveira

    demonstra incentivo aos pensamentos advindos dessa fase e tambm tem os divulga e

    anuncia.

    A seo a seguir busca demonstrar essa nova concepo de educao que estava sendo

    discutida a partir da formao de professores em Escola Normal, mas baseada em uma das

    principais instituies de ensino normal do pas, a Escola Normal de So Paulo.

  • 34

    Imagem 4: Diploma do curso da Escola Normal de So Paulo em 1904

    Fonte: Pgina online Blog caetanistas organizado no site: www.iecc.com.br.

    No h ensino primrio eficaz sem boas escolas

    normaes, sabem-no todos quantos se preocupam com

    assumptos de pedagogia. Tenhamos professores bem

    preparados, aptos para cumprirem a importante

    misso que a sociedade lhes confia e a tarefa da

    instruco e da educao do povo ser realizada de

    maneira relativamente fcil. (SILVEIRA, n.1, 1916,

    p.1).

  • 35

    3. A ESCOLA NORMAL DE SO PAULO E O MODELO PAULISTA DE

    ENSINO

    Grande responsvel por formar professores no Brasil, principalmente nos sculos XIX

    e XX, as escolas normais tiveram uma trajetria de incertezas, glrias e destaque. Destinadas

    instruo pblica e ao ensino primrio, seus passos contemplam iniciativas para a formao

    de futuros mestres da educao brasileira. A primeira escola normal foi criada no Rio de

    Janeiro em 1835 pela Lei n 10, na Capital da Provncia, destinada ao magistrio da instruo

    primria, os critrios para a seleo de candidatos para frequentar a escola limitavam-se a:

    ser cidado brasileiro, ter 18 anos de idade, boa morigerao e saber ler e escrever

    (MOACYR, 1939 apud TANURI, 2000, p.64.).

    Aps a primeira criao da escola normal na capital da provncia, outras provncias

    tambm criaram suas instituies de ensino normal a exemplo de: Minas Gerais, em 1835

    (instalada em 1840); Bahia, em 1836 (instalada em 1841); So Paulo, em 1846; Pernambuco e

    Piau, em 1864 (ambas instaladas em 1865); Alagoas, em 1864 (instalada em 1869); So

    Pedro do Rio Grande do Sul, em 1869; Par, em 1870 (instalada em 1871); Sergipe, 1870

    (instalada em 1871); Amazonas, em 1872; no Esprito Santo, em 1873; Rio Grande do Norte,

    em 1873 (instalada em 1874); Maranho, em 1874 (MOACYR, 1939 apud TANURI, 2000).

    Tanuri (2000) caracteriza a promulgao da criao de estabelecimento de ensino

    primrio, normal e secundrio a partir de 1870 nas provncias, fato que destaca a criao de

    escolas normais brasileiras como parte do sistema provincial. Ao que tudo indica, o modelo

    de ensino implantado assemelhava-se ao europeu, mais especificamente ao francs, por

    motivo de tradio colonial e do projeto nacional ser voltado formao cultural da elite.

    Uma das primeiras escolas de ensino normal a ser criada na provncia, como j citado

    anteriormente, foi em So Paulo. A criao da Escola Normal de So Paulo trilhou um

    caminho de mudanas, ajustes e adequaes. A formao do aluno-mestre, em So Paulo

    segue um percurso de destaque no ensino, principalmente quando se refere ao perodo da

    Primeira Repblica.

    No obstante a ausncia de participao federal, registram-se alguns avanos no que

    diz respeito ao desenvolvimento qualitativo e quantitativo das escolas de formao

    de professores, sob a liderana dos estados mais progressistas, especialmente de So

    Paulo, que se convertera no principal polo econmico do pas. A atuao dos

    reformadores paulistas nos anos iniciais do novo regime permitiu que se

    consolidasse uma estrutura que permaneceu quase que intacta em suas linhas

    essenciais nos primeiros 30 anos da Repblica e que seria apresentada como

    paradigma aos demais estados, muitos dos quais reorganizaram seus sistemas a

    partir do modelo paulista: Mato Grosso, Esprito Santo, Santa Catarina, Sergipe,

    Alagoas, Cear, Gois e outros. (TANURI, 2000, p.68)

  • 36

    Paradigma aos demais estados, o ensino promovido por So Paulo, especialmente

    pela Escola Normal de So Paulo era utilizado como exemplo aos demais, alm de ser

    disseminado por meio do conhecimento adquirido por seus alunos, a exemplo de Carlos da

    Silveira que frequentou a escola ainda nos primeiros anos de Repblica.

    Ao migrar de Queluz SP, cidade em que vivia, para a Capital, So Paulo, Carlos da

    Silveira inicia sua trajetria no campo da educao ao se matricular no curso normal. Aluno

    da Escola Normal da Praa entre os anos de 1900 e 1903, Silveira diplomou-se em um curso

    de renome e de referncia no ensino paulista e nacional. Porm, antes de se tornar uma

    referncia nacional, a Escola Normal de So Paulo, percorreu longos caminhos e situaes at

    culminar em seus anos de glria.

    Fundada em 184613

    e instalada na velha S da Catedral, teve de ser fechada em 1867

    pela ausncia de verba e pela ausncia do comprometimento que merecia receber dos lderes

    paulistas. Com a Reforma que impunha a obrigatoriedade do ensino primrio para meninos de

    7 a 14 anos e de 7 a 11 anos para as meninas, a escola foi reaberta anexa Faculdade de

    Direito de So Paulo, onde aconteciam as aulas para os rapazes e junto ao seminrio da

    Glria, local em que lecionavam aulas para as moas14

    . Em 1878, trs anos mais tarde, o novo

    presidente da provncia fechou-a novamente. Em 1880, a escola reaberta, agora pela terceira

    vez, graas dedicao do novo presidente, Laurindo Abelardo de Brito, conhecedor da

    importncia do ensino normal e diplomado pela mesma Escola Normal, que a partir de ento

    encontra suas instalaes juntamente ao Tesouro Provincial. Em 1881 foi transferida para um

    sobrado colonial permanecendo l at 1894, quando recebe instalaes definitivas em um

    edifcio construdo especialmente para uma escola normal, situado na Praa da Repblica,

    sendo este um dos motivos de receber a denominao de Escola Normal da Praa.

    No perodo entre a Monarquia e a Repblica, a escola normal construda em So Paulo

    recebeu vrias nominaes: Escola Normal; Escola Normal de So Paulo; Escola Normal da

    Capital; Escola Normal Secundria; Escola Normal Primria; Instituto Pedaggico; Instituto

    de Educao; Escola Caetano de Campos, entre outros, mas todas se referem mesma

    instituio de ensino normal.

    Silveira (1919), ao relatar a ltima instalao da Escola Normal de So Paulo,

    descreve que:

    13

    Nos primeiros anos de Escola Normal, o ensino era voltado apenas para alunos do sexo masculino, como pode

    ser encontrado em MONARCHA. Escola Normal da Praa: o lado noturno das luzes. 1999. 14

    Neste perodo o ensino acontecia em espaos diferenciados para os alunos do sexo feminino e masculino, por

    isso a escola encontra-se reaberta em ambientes diferenciados.

  • 37

    O Decreto n.91 de 13 de outubro de 1890 mandara empregar na construo de um

    edifcio para Escola Normal, em So Paulo, o produto da loteria, destinado a

    construo de uma igreja catedral (lei 54 de 1888). Tal produto, orando por

    duzentos contos, foi uma parcela do custo total da grande casa da Praa da

    Repblica (SILVEIRA, 1919, p.18).

    Alm de simbolizar a importncia em custo que tal construo teve, apresentada

    ainda a grandeza que se depositava na Escola Normal da Praa para a cidade de So Paulo,

    para a formao de professores e para a educao. Em 2 de agosto de 1894, concludo o

    edifcio da Escola Normal, mudou-se para ele a escola-modelo, ficando no mesmo prdio, n.

    16 na rua do Carmo, uma segunda escola-modelo, sob a direo do Prof. Oscar Thompson.

    (SILVEIRA, 1919, p. 18).

    Imagem. 5: Sede da Escola Normal da Praa em 1894

    Fonte: Poliantia Comemorativa - 1* Centenrio do Ensino Normal de So Paulo.

    Segundo Monarcha (1999), paulatinamente a Escola Normal foi conquistando

    relevncia culturalmente e intelectualmente na provncia de So Paulo, adquirindo excelncia

    e respeitabilidade por suas produes tericas e iniciativas prticas, decorrentes da

    organizao e formao de professores para o magistrio primrio.

  • 38

    Desempenhou, assim, a funo simblica de uma Escola Normal Superior. Nela se

    formou e, posteriormente, atuou parte dos intelectuais de diferentes pocas,

    responsveis pela elaborao de teses sobre a realidade social, educacional e cultural

    brasileira. Essas vanguardas projetaram-se no apenas no mbito da educao e da

    cultura como tambm na arena poltica, onde disputaram o controle do ensino

    paulista. (MONARCHA, 1999, p. 343)

    Enorme representatividade histrica, poltica, cultural e educacional promoveu a

    Escola Normal de So Paulo, tendo visto os alunos que nela se formaram, como: Carlos da

    Silveira, Jos Scaramelli, Loureno Filho, Antonio Firmino Proena, entre outros intelectuais.

    Nesse sentido, pode-se pens-la como um centro direto de produes tericas e iniciativas

    prticas - constituies de saberes articulados a prticas educacionais - vistas a organizar a

    formao de professores. (MONARCHA, 1999, p. 343).

    A Escola Normal de So Paulo engrandecia e enobrecia o diploma de seus formandos,

    dando-lhes a honra e o prestgio de ser normalista em uma instituio de formao de

    professores que ganhava sempre mais destaque. Em data prxima a 1875 descrita pelo

    inspetor geral da instruo pblica, Francisco Aurlio de Souza Carvalho, como uma escola

    capaz de garantir a formao profissional e moral de professores da instruo primria.

    (MONARCHA, 1999, p.92). Assim, promovia-se como um espao do progresso intelectual e

    gerador do conhecimento.

    A escola normal criar bons mestres; e estes, elevando o nvel das habilitaes de

    seus discpulos, derramaro pela cidade as primeiras riquezas do esprito, slida,

    estimvel e luminosa instruo. Ser, pois, um centro de luz da cincia, irradiando-

    se por toda a provncia e penetrando por todas as camadas populares. A infncia bem

    esclarecida levar seu saber famlia, aos companheiros futuros de profisses, de

    indstrias ou de servios pblicos; e esse precioso peclio da inteligncia se

    estender pela sociedade inteira. Assim se transformam as geraes, afugentando-se

    das sombras da ignorncia, clareiam-se os espritos, e dominam as cincias. Todos

    esses grandiosos benefcios dependem do professor distinto, de sua proficincia, da

    escola que aprendeu. Com ele, a juventude gravar em sua memria o vocbulo de

    maior preciso, elegncia e pompa, abandonando a vulgaridade grosseira das

    expresses que, do lar domstico, transportam as escolas. O reinado conquistado

    pelo erro ser substitudo pelo imprio da verdade. (MATTOS, 1875 apud

    MONARCHA, 1999, p.93).

    Entretanto, a Escola Normal trilhou um longo caminho at se tornar referncia de

    produes tericas. Assim, essa seo busca ilustrar brevemente a trajetria percorrida pela

    instituio a partir de sua reabertura permanente, ilustrando alguns aspectos de formao que

    ela propunha, no se restringindo apenas a sua histria em si, mas apresentando as ideias e as

    concepes que promovia no processo de formao dos futuros professores paulistas. Desta

    maneira possvel compreender tambm um pouco das ideias advindas e adeptas de Carlos da

    Silveira e a importncia que a Escola Normal da Praa teve em sua carreira como professor,

    diretor, catedrtico, educador, intelectual, e tambm em sua formao em Direito.

  • 39

    3.1. A formao de professores na Escola Normal de So Paulo

    A Reabertura definitiva da Escola Normal de So Paulo em 2 agosto de 1880 coincide

    com mudanas na capital paulista, e nesse perodo que os alunos se sentiram conquistados

    pelas doutrinas de Comte, e a influncia do professor Godofredo Furtado podia ser comparada

    a do famoso apstolo positivista, Benjamin Constant. (MONARCHA, 1999, p. 112). A

    cidade de So Paulo torna-se conglomerada e cosmopolita, visto os excedentes econmicos

    e a ampliao do seu centro urbano. A procura pela Escola Normal, a partir de ento, aumenta

    e por conta deste fato h um nmero excessivo de matrculas. Os estudantes que buscavam a

    escola em sua maioria eram indivduos pobres atrados pela promoo social. Alm do mais,

    a carta de normalista possibilita aquisio de cultura e oportunidade de um emprego (ainda

    que menor) na administrao pblica - olhos e braos da Monarquia - ou no comrcio local

    ou, ainda, o ingresso na Faculdade de Direito. (MONARCHA, 1999, p.113). Por esse ngulo,

    a grande procura pela Escola Normal determinada pela ascenso intelectual e de trabalho.

    Com o passar dos anos, gradualmente a instituio toma forma e se aproxima de sua

    relevncia histrica e educacional com caractersticas excepcionais.

    Proclamada a Repblica em 1889, o desejo por transformaes em uma nova

    sociedade se tornava cada vez mais presente. Intensificam-se as discusses no campo

    pedaggico sobre a renovao de programas de ensino, o que adquire centralidade em debates

    polticos, por se acreditar ser essencial uma renovao educacional para proporcionar a to

    desejada transformao no pas. Reis Filho (1995) descreve dois instrumentos para alcanar a

    transformao e fundar uma nova sociedade: a Constituio e Leis liberais; e a Escola

    Pblica, universal e gratuita que permita formar cidados com escolhas livres e que possam se

    autodirigir.

    De acordo com Saviani (2010), a concepo de uma reforma escolar difundida na

    poca encontra seu incio em 1890 na Escola Normal de So Paulo, abrangendo as questes

    sobre mestre e mtodos. Silveira (1916) acrescenta que nessa ocasio que Rangel Pestana

    lembrou a Prudente de Moraes o nome do ilustre mdico e eminente educador, Dr. Antonio

    Caetano de Campos, como sendo homem capaz de realizar os intuitos da reforma de 12 de

    Maro. (SILVEIRA, 1916, p.5), e relembra que o papel que coube a Caetano de Ca