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PESQUIS A ,Iv ¢J¢ P O POVO JULGA OS ATORES DOS B IXO P R eeltg [ti llng Editorial Ano X N° 114 Março 97 O JORNALISMO DA COMUNICAÇÃO R$ 4,00 Saiba o que pens a e como vive o repórte r Pedro Bial, o carismátic o apresentador d o Fantástic o A NOV A ICARA D O DOMINGO

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Page 1: Fantástico A NOVA ICARA DO - portalimprensa.com.brportalimprensa.com.br/tv60anos/pdfs/CERTO_IMPRENSA_MAR%C7O_1997.pdf · Não é por acaso que, menino ainda, sonhava em viver aventuras

PESQUIS A

,Iv„ ¢J¢ PO POVO JULGA OS ATORES DOS

B IXO

PReeltg [ti llng Editorial

Ano X N° 114 Março 97

O JORNALISMO DA COMUNICAÇÃO

R$ 4,00

Saiba o que pensae como vive o repórte r

Pedro Bial, o carismáticoapresentador do

Fantástico

A NOVAICARA DODOMINGO

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o, No Fantástico, o sucesso

O gato daAna e da Marina

Ele é adorado em casa e nas ruas . Derepórter de TV virou ídolo nacional . Conheça Pedro Bia l

por Lenita Outsuka

Em casa com Ana, 10 anos (no destaque, Marina de 15): "Elas me provocam e me estimulam"

o

Q uiseram os deuses, a sorte ou odestino - seja lá qual for onome que se dê a essas coisas

- que, em 13 de agosto de 1988, PedroBial desembarcasse na Inglaterra para as -sumir o posto de correspondente da TVGlobo em Londres . Esse, pelo menos, erao posto oficial . Na verdade, ele iria se

transformar em testemunha das revolu-ções que alteraram o mapa da Europa ,com derrubada de governos e formaçãode novos países . "Dei sorte . Cheguei e ,nos anos seguintes, tudo aconteceu" ,constata ele hoje, olhando para trás .

Deuses, sorte ou destino, este mê sPedro Bial está em algum ponto do ser-

tão nordestino, em busca de Diadorins eRiobaldos remanescentes dos textos deGuimarães Rosa, sobre quem está pre -parando um documentário para o seu Es -paço Aberto, programa que mantém naTV a cabo (às quartas-feiras, 21h30, naGlobo News) e um longa-metragem reu-nindo cinco contos do escritor. "O pes -

12 IMPRENSA -MARÇO 1997

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soai da produção estava numa vereda particu-larmente bonita e cruzou com um sujeito qu edisse se chamar Diadorim e nem sabia quem éGuimarães Rosa . Não é muita coincidência?" ,conta, entusiasmado .

Bial está com 38 anos e há cerca de um an ovoltou ao Brasil, para apresentar o Fantástico ,função que ele considerou "um novo desafio"em sua vida: o de se transformar em "objeto" .Conforme explica em seu livro Crônicas deRepórter (Editora Objetiva), o repórter é "su-jeito" ; vai lá, escuta, atua, interpreta, organiza ,informa, toma as decisões : "A partir do mo -mento em que boto a tal maquiagem, escud ocontra as luzes cruéis e impiedosas do estúdio ,uma transformação deve começar a se operar .Quando me sento na bancada do apresentador,e devo transformar a tensão, nervosismo e pressado fechamento em serenidade, sedução e sere -na firmeza, deixo de ser o `sujeito' . E hora deser `objeto"' .

Mas ele não acha que `objeto', nesse caso,tenha a conotação pejorativa que as feministasatribuem à palavra . Ele gosta de desafios . Não épor acaso que, menino ainda, sonhava em vive raventuras como as de Tintin, o personagem dequadrinhos criado pelo belga Hergé, "o únicorepórter que nunca escreveu uma linha ou teveuma matéria publicada em algum lugar", comen -ta, divertido . Mas a aventura, o gosto de conhe-cer lugares novos e diferentes, o atraíam muito.

Apesar disso, formou-se em cinema na PUCdo Rio, profissão difícil no Brasil, que ele sus -tentou graças à sua estatura e habilidade espor-tiva, jogando basquete no Fluminense - e nest eponto vale um parêntese : Bial corresponde ple-namente à imagem do "moreno alto, bonito esensual" na versão Loura de olhos azuis . Entrecurtas e jumps, Bial decidiu responder a umanúncio da Globo que selecionava pessoas paraum curso de telejornalismo . Eram 600 candi-datos para minguadas 20 vagas, mas ele foi oprimeiro colocado para a área de reportagem .

"Fui para a TV Aratu, na Bahia, mas fique ipouco tempo lá . Logo fui chamado de volta aoRio, para ser editor." Hoje ele qualifica essaexperiência de cerca de dois anos como a me-lhor escola que poderia ter para se dar bemdiante das câmeras . "O editor monta as matériasa partir do material bruto do repórter. Eu via oserros dos repórteres e ia aprendendo ."

O público só o viu no vídeo quando substi-tuiu Leda Nagle, que precisou se ausentar doHoje . Em 1984, foi chamado para integrar aequipe do Globo Repórter, "ainda no tempo emque o programa fazia uma espécie d ecinejornalismo", outra escola para ele, traba-lhando com grandes nomes do cinema, com oEduardo Coutinho . Até 1988, quando uma pro -posta de Walter Clark, para trabalhar numa

emissora que estava começando, provocou oconvite da Globo para trabalhar em Londres ."tenha vontade de morar fora, mas não espera-va ser lembrado . O destino me sorriu ."

O pai heróiForam quase oito anos de Europa, acompa-

nhando de perto os principais acontecimentos .Não todos : na queda do Muro de Berlim, e mnovembro de 1989, ele estava no Brasil, cobrin-do o primeiro turno das eleições presidenciai s- e lamenta essa ausência da Europa. A Ale-manha, para Bial, é cheia de significados . A mãe,Suzanne, saiu de lá aos 11 anos, em 1934. Veiopara São Paulo com o irmão, dois anos mai snovo, ao encontro dos pais . O pai, Peter, chegouem 1941, em plena guerra, beneficiado por u macordo entre o Brasil e o Vaticano .

Peter Bial morreu quando Pedro tinha 1 3anos . A famflia mudara de São Paulo para oRio - Pedro é o único carioca dos três filhos .Da curta convivência com o pai, lembra as his-tórias e os jogos de futebol que assistia n oMaracanã - é, ainda hoje, torcedor fanáticodo Fluminense - e, nos intervalos das parti -das, acompanhava a conversa de Peter com umsenhor "com aparência de sapo" que sempreficava na tribuna de imprensa . Era NelsonRodrigues .

Por meio do pai veio o gosto pelas letras epela literatura . "Meu pai se apaixonou por um apeça de Shakespeare e acompanhava todos osensaios, sabia todas as marcações . Um dia, fal-tou o iluminador e ele o substituiu . Não largoumais o teatro"

FRASESTrechos do livrode Bial, Crônicas

de Repórter

"Defendo a teoria deque o repórter dev e

inventar uma pergunt ade si para si mesm o

e perseguir a respostaa esta pergunta íntima

e secreta. Respostaque, assim como

a pergunta, muitasvezes seque r

é mencionada nahistória final . "

"A natureza denossa profissão pass a

por grandestransformações . Nãoé ficção: logo, quem

vai paginar otelejornal será o

espectador, quem va idecidir a primeira

página será o leitor."

A bandeira da revoluçãode 32: desbotada pelo tempo

IMPRENSA - MARÇO 1997 13

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"( . . .) o Greenpeac epediu desculpaspúblicas . Tinha

divulgadoinformações

erradas, que toda amídia tinh a

reproduzido . OGreenpeace se

retratou. A imprens anão. . . "

"O Brasil é o únicopaís que conheço

onde os telejornaisnão obedecem a um aordem decrescente

de importânci adurante o programa .

( . . .) Com nossalinguagem ágil ,

fluente, envolvente eeficaz, fica difícil para

o telespectado rentender quais foramas notícias de maio r

relevância ao final daedição. Mas isso faz

parte, é expressão dacultura brasileira."

"Quando um repórte rsai à rua, pode

acontecer o quesucede tão

freqüentement ena pesquisacientífica :

pesquisando um tema ,se esbarra num a

grande descoberta .Atira-se no que se vê ,alveja-se o que estava

invisível ."

"Todo mundo fala emfato, mas só conhece

versão.Você tenta falar d o

que interessa mas oque vende jornal é

fofoca . . ."

Pedro Bial se refere ao pai como a um ído-lo - "é natural, quando um garoto perde o paina idade em que perdi o meu", explica. Conta ,divertido, um episódio que resultou na comprade uma casa "num bairro afastado", chamadoIpanema : "Eles viviam numa pensão e conse-guiram juntar dinheiro para comprar a casa .Numa noite, entrou um ladrão na pensão e le -vou todo o dinheiro deles . Meu pai saiu, deses -perado, pediu dinheiro emprestado ao porteirode um teatro e jogou tudo no bicho . Por incrí-vel que pareça, ganhou e pôde comprar a cas aque minha mãe queria".

Caminho de voltaMas o passado ficou para trás e o impor-

tante, agora, é o documentário sobre Guima-rães Rosa, que ainda vai render um longa -metragem. "Não é curioso? Saí do cinema parao jornalismo e agora faço o caminho de voltapara o cinema", constata . Pelo menos por en -quanto, porém, o projeto cinematográfico sóestá consumindo muito dinheiro : "Tenho pro-blemas de financiamento, é difícil consegui rquem dê dinheiro para isso" . Só o entusiasmonão diminui, principalmente porque odocumentário, depois de exibido, será distri-buído para as escolas de todo o país . "Tenhomuita vontade de fazer alguma coisa ness esentido, de ajudar na educação."

Tudo isso consome tempo - "quando esta-va em Londres, o volume de trabalho també mera intenso, mas havia um tempo para descan-so . Agora, parece que acabou . São muitas ativi-dades simultâneas" - e Bial se desdobra paradar conta de tudo. No Fantástico, além de apre-sentador, ele é um dos editores-chefe e também

repórter. Isso repre-senta muitas horasnas ilhas de edição eem discussões d epauta, quando nãoestá viajando em fun-ção de alguma maté-ria. Neste mês, a agen-da prevê parte da se -mana no Nordeste, tra-balhando no docu-mentário, e o restanteno Rio, cuidandotambém do programaque mantém n aGloboNews.

Mas ele gostari ade ter mais tempo paracurtir o apartamentoonde está morando ,no Leblon - umduplex confortávelque ostenta, na

parede da sala, uma bandeira brasileira comple -tamente desbotada, testemunha muda da revo-lução de 32 - e para os filhos (Ana, de 10 anos ;Marina, de 15 e João, de 18) : "Adoro as meni-nas, elas me trazem paz . Me provocam e me es -timulam, são ótimas" . E pai coruja assumido eparticipante : sabe que Ana se ressente de te rvoltado ao Brasil ("ela foi para Londres aindabebê") mas, em compensação, Marina está feliz .Teme pela segurança delas : "Acho que elas sen-tem um pouco a falta de liberdade aqui, massabem que isso é necessário . Elas não vão sozi -nhas a lugar algum, contratei um motorista paraacompanhá-las a todos os lugares" .

Fora isso, ele recomenda cuidado : "Tem detravar as portas do carro, andar sempre com asjanelas fechadas" . No Brasil, foi assaltado umavez - na verdade, foi apenas uma tentativa deassalto, que ele conta dando risada : "Estava depassagem pelo Rio e me distraí no calçadão d aAvenida Atlântica. Um sujeito veio em minhadireção, com uma faca na mão . Falei algumacoisa e ele, até meio envergonhado, guardou aarma e disse : `Desculpe, pensei que você fossegringo' . Só faltou me acompanhar até o hotel" .

Sofreu outra tentativa de assalto em Mos-cou, durante o golpe frustrado contra Gor-batchev, em 1991 . "Havia um tiroteio e subi-mos num tanque para fazer uma passagem . Nis-so aparece um sujeito com um revólver na mão,pedindo cem dólares . Comecei a despejar pa-lavrões em português em cima dele e, não se ibem por quê, ele acabou desistindo. Mas o tem-po todo eu pensava : será que vou morrer assim,de assalto, uma morte tão inglória? "

Todas essas histórias e muitas outras estãono livro que Bial lançou no final do ano passa -

No escritório de casa: mais trabalho

14 IMPRENSA-MARÇO 1947

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do (ao longo desta reportagens estão transcri-tos trechos desse livro). "Já falei tantas vezessobre isso tudo que, às vezes, acho até que sãoclichês. As boas idéias, quando muito repeti -das, se transformam em lugares-comuns", afir-ma. Foram dezenas de entrevistas - Pedro Bialé uma verdadeira celebridade e convive razoa-velmente bem com essa posição.

E o jornalismo?Recebe centenas de cartas por semana, não

sabe exatamente quantas, "a maioria simpáti-cas, carinhosas mesmo . São muito raros os queescrevem para ofender" . Não se nega a dar au-tógrafos, sorri, é gentil, sempre pergunta o nom eda pessoa para fazer uma dedicatória persona-lizada . "Só que às vezes a fama se toma incon-veniente", comenta. Há algumas semanas, via-jou com a filha Ana para Brasilia e não tevetranqüilidade para comer um sanduíche com el aem uma lanchonete : "Não dá mais para ir adeterminados lugares e ficar sossegado", cons-tata. Reclama, mesmo sabendo que não adian-ta, da invasão de privacidade, dos comentáriosque são publicados a respeito da sua relaçã ocom a atriz Giulia Gam . E tem uma visão umtanto amarga do jornalismo televisivo na for-ma como ele vem sendo praticado, de"escravização" à imagem .

"A televisão precisa da imagem, o texto é se-cundário e fica à mercê da imagem . Mesmo n onoticiário internacional, por causa do pequeno

espaço que recebe, acaba prevalecendo a ima-gem do espetacular, do sensacional, sem muit apreocupação em situar o fato num contexto, ex-plicar o que provocou aquilo, as conseqüências .De vez em quando, dá para acrescentar algumacoisa e, quando isso acontece, é muito bom"

Bial reconhece que a decisão de colocar n oar determinadas imagens é muito difícil . A BBC ,durante o conflito na Bósnia, decidiu mostrarsomente imagens de homens atirando e não do scorpos mutilados, resultado dos tiroteios e bom-bardeios . E pergunta : "Foi respeito à hora dojantar do telespectador ou uma tentativa d eglamourizar a guerra?" Para ele, a Bósnia fo i"um tapa na cara da mídia internacional, qu enão conseguiu acabar com aquilo ou provoca rreações dos governos e da diplomacia do mun-do, mesmo mostrando cenas chocantes" .

E define: "Matéria de televisão tem de seratraente num primeiro momento porque a infor-mação não pode ser mostrada de maneira chata,tediosa. Mas tem de ser atraente na narrativa, naedição, e não ficar procurando emoção o temp otodo. Graças a Deus, isso está acabando" .

Ele lembra que nessa procura da emoçã oacaba-se desprezando muita coisa que não é"emocionante" do ponto de vista da imagem,mas que é importante como notícia . "Matériasde gabinete podem trazer informações útei spara as pessoas . Mesmo numa emissora comer-cial, o jornalismo não pode dar só o que as pes-soas querem ou o que as pesquisas afirmam que

"Trabalhei com umaequipe com menos d e

21 anos de idade .Sérios, rápidos e

determinados, estesrapazes e moças

chegam ao mercado detrabalho paratransformá-lo .

Durante muito tempo ,os formandos das

escolas d e`Comunicação' eram

vistos como alienados ,despreparados para o

exercício da profissão .Isto acabou . Pela

amostra que tive, anova turma vem co mtudo, gente esperta ,

informada e se milusões quanto à

natureza do ofício .Existe uma nov a

geração. "

"É um alívio jogar n olixo as manchetes

belicosas dos tablóide se se debruçar sobre oThe Independent, meujornal favorito . ( . . .) No

dia em qu edesembarquei em

Londres, o destaque naprimeira página do

jornal era, pasmem,uma notícia boa! Deveser o único jornal domundo que dá notíciaboa em manchete. "

"A televisão pod eaté transmitir a idéi ade que a sociedadeé mais violenta doque é na realidade ,

mas, depois d ever a guerra na TV,

o espectado rrepudia a guerra ,

quer a paz."O apartamento (alugado) no Leblon: sem tempo para curti r

IMPRENSA - MARÇO 1997 15

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"Por enquanto, aInternet é ummercado, de

tamanhodesconhecido, ondeninguém sabe o queestá certo, quem é o

novo e quem j áenvelheceu . Ummercado sem lei ,

onde nem sequer sesabe quem vende equem compra o quê.

Todos muitoocupados em cria rfama, de olho nafortuna futura ."

(Sobre a Internet)

"O público, comonós sabemos, não

tem rosto, mas te molhos vorazes e

amorais."

Na redação do Fantástico: "É hora de ser objeto "

"0 furo justifica quasetudo. ( . . .) Quando estáem campo, o repórte rlança mão de todos o srecursos de sedução e

ilusionismo paraconseguir sua

história . Uma históriade amor em que pelo

menos um dos lados, odo entrevistado,

quando não os dois ,termina desiludido ,

tomado pelo penososentimento de quem

foi traído .Na busca da notícia

que venda, ojornalista muitas

vezes se divorcia darealidade, à procura

daquilo que, supõe, oleitor quer. E se a

realidade contrari aesse roteiro de ficção,dane-se a realidade ."

as pessoas querem . E o princípio básico do jor-nalismo é que notícia é aquilo que ningué mpercebeu ou que ninguém sabe e que, às vezes ,está na cara"

Chegar à notícia, ele acredita, requer umavisão de mundo com olhos inocentes, exige quenão se perca a capacidade de se surpreender:"Isso acontece com freqüência . As vezes, o jor-nalista é um cara tão brilhante, tão bem infor-mado, que acaba encarando a notícia com olhararrogante . E perde a informação" .

A televisão, observa Bial, está se voltand opara as grandes reportagens, que analisam, ex-plicam e comentam os fatos - e esta é uma"exigência do espectador, que tem necessidadede sentir que está ganhando alguma coisa" .Outra tendência que ele percebe é "o ao vivo" ,essa coisa que a CNN inventou que coloca omundo em casa, no mesmo instante. Mas "o aovivo" é também uma cilada . As vezes, o repór-ter só tem o fato e mais nada . Não tem elemen-tos para analisar o que aconteceu e acaba s erepetindo" .

Percurso idea lQue Pedro Bial é um jornalista bem-sucedi-

do, disso ninguém duvida - nem ele mesmo ."Tenho um bom salário", reconhece . Mas nãorecomenda aos jovens que sigam o mesmo cami -nho : "O ideal é que comecem em jornal, para

aprender os rudimentos da profissão, as técnicasde apuração, de reportagem . Depois, é bom terum período no rádio, para ganhar voz, ritmo ecapacidade de improvisação. Só então acho qu eo sujeito estará pronto para a televisão" .

A principal recomendação, afirma, é a quesempre faz quando lhe perguntam qual o pri-meiro atributo de um bom jornalista . Quem es-pera por uma resposta tipo "busca da verdade "ou "gosto pela aventura" se desilude : "E a res-ponsabilidade . Temos de ser responsáveis comos leitores ou espectadores e, principalmente ,com as pessoas que são o objeto das matérias .Pode-se destruir uma vida com uma frase . E ,no caso do correspondente no exterior, pode-s ecriar um incidente internacional com uma fra-se mal-colocada" .

A responsabilidade remete à ética, um ter -mo que ele não leva muito a sério : "Ética é comomoda, muda de tempos em tempos . E relativa :o que é ético para nós pode não ser na China . Egeralmente só é analisada a posteriori : primei-ro eu dou o furo, depois penso no assunto" .

Ele também derruba o mito de que o corres -pondente internacional é um poliglota : "A únic alingua que falo bem é o inglês . `Arranho' um pouc ode francês, aprendi um pouco de alemão, ma snão falo . Como latino, acho que me saio bem n oespanhol e no italiano . E porque fui muitas veze sà Rússia, consigo ler o russo razoavelmente" .

16 IMPRENSA - MARÇO 1997

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A palavra escritaQuando vai escrever para a TV, Bial afirma

ter o cuidado de, primeiro, ver as imagens . Es-crever, porém, chega a ser uma forma de lazer ,de desabafo: "Sempre escrevi assim, mas nãotinha onde publicar até aparecer o convite doJornal da Tarde . E um espaço onde posso meestender, não sou escravizado pela imagem" .

Ele não descarta a possibilidade de, eventual -mente, produzir matérias para jornais e revistas ."Gostaria disso . Tem horas em que uma equip ede televisão se torna muito pesada. Adoraria via -jar sozinho" E sabe até a forma que teriam suasmatérias escritas : "Meu estilo seria mais na li-nha do jornalismo inglês do The Independent ,não necessariamente na primeira pessoa, massem a secura de informações do jornalismo ame -ricano, que é a nossa escola . A mim me informamelhor um texto que é como se alguém estives-se me contando uma história" .

E é exatamente como "um contador de his-tórias" que ele gostaria de descrever a pessoaPedro Bial . "Pode parecer pretensão, mas é iss omesmo" Ele se define como "um sujeito cuj omaior trunfo não é a inteligência, mas a sensi-bilidade . Acho que não penso muito bem, massinto direitinho" . E vai além: "Sou um sujeitoque prega a boa convivência, mas não foge d euma boa briga. Que procura transformar a triste-za em raiva; que não quer desanimar e não que rcompactuar com um discurso de tédio etampouco de desespero" .

Pedro Bial se declara ambicioso, mas não nosentido material : "Quero fazer grandes coisas navida e, com o meu trabalho, quero botar as pes-soas em movimento" . Brincando, diz que concor -da com Tom Jobim quando afirmou : "Ganho maisdo que eu preciso e menos do que eu mereço".

Os bens materiais são poucos : uma casa emLondres (hipotecada) e um carro . O apartamen-to onde mora, no Leblon, é alugado . "Tenh odificuldade em reter. Dizem que é um defeit odo meu signo astrológico (Aries, com ascen-dente em Gêmeos), mas vou tentar agora. Querodeixar alguma coisa para minhas filhas ." Nãoquer ser rico, apenas viver bem : "Vivemos numasociedade tão oferecida, de consumo, que en-tope a gente de ofertas . Acho que tenho o di-reito de aceitar algumas dessas ofertas . Se ti-vesse alguma intenção de ficar rico, não teri aescolhido o jornalismo" .

Os planos para o futuro não descartam asviagens e as aventuras - ele pensa até emmorar em outra cidade . O lado Tintin continuaforte e viagens e aventuras traduzem em atostoda a agitação interna de Bial . Mais do queisso, as viagens, para ele, são sinônimo de li-berdade : "Não há sensação de liberdade maio rdo que sair pelas ruas de uma cidade que nãose conhece . E se não se entender a língua, en -tão, é melhor ainda" . Mas faz uma ressalva :"Adoro a aventura . Mas depois da aventura ,adoro um take me to the Hilton . Adoro tam-bém um conforto" .

X

"Repórteres podemser advogados d ecausas perdidas,

padres confessores ,carrascos, redentores .

Têm noites demédicos e dias decoveiros. Alguns

diriam abutres. Mas ,como dizem os tiras ,`alguém tem de faze ro trabalho sujo' . . . "

"Não há serviço mais o umenos útil . Serviço é oque serve a alguém ."

"Creio quedeveríamos encontra r

alguma maneira debanir certas

perguntas do universojornalístico. Porexemplo, o mais

comum dos inícios d econversa: `Como você

começou a suacarreira?'

Confrontado com taldesrespeito eobtusidade, o

entrevistado tem todoo direito de encerra r

o encontroimediatamente, se m

emitir um som. Quantoao autor da estúpida

questão, a Sibérianão seria castigo

suficiente .Outra: o sujeito acabade perder a casa num

incêndio, ondemorreram

todos os seusparentes. `Como você

está se sentindo?' ,pergunta o repórter.

Um chute nagenitália seria umaresposta à altura. "

Bial e os filhos João, Marina e Ana: família unidaX

IMPRENSA - MARÇO 1997 17