doenças contagiosas

3
94 95 Varíola Existem duas estirpes: a varíola ‘major’ e a varíola ‘minor’. Esta última distingue-se pelos sintomas serem me- nos severos e por ser menos comum.O vírus da varíola, pertencente ao género perigos da sociedade moderna descoberta a cura Doenças controladas Carbúnculo, Varíola, Peste, Raiva e Obesidade Existem muitas enfermidades que continuarão a matar enquanto não se encontrarem tratamentos eficazes para as combater. No entanto, outras já são facilmente controláveis. Por Marisa Teixeira Revisão científica Luís Mendonça, médico interno do Internato médico de psiquiatria venção deve ser feita através do uso profilático de antibióticos nos suspeitos de exposição à bactéria. A via de contágio pode causar diferentes formas de doença: • Cutânea: É a mais comum (95% dos casos) e dá-se através da inoculação dos esporos sob a pele, geralmente numa escoriação ou ferida. Na zona infectada aparece uma pápula, que ao fim de 24 a 48h evolui para uma lesão com uma ul- ceração central escura e indolor, rodeada de um ‘inchaço’ em forma de auréola, com pequenas vesículas contendo o bacilo. Habitualmente os gânglios da região afectada aumentam de volume. Se o doente for tratado a evolução é para a cura e a morte é rara. Pulmonar: Resulta da inalação de esporos da bactéria. Tosse, febre e mal- -estar são alguns dos primeiros sintomas. No 2.º ou 3.º dia a febre alta, falta de ar e alteração da consciência apontam para a gravidade da situação, que pode levar à morte devido a lesões hemorrágicas nos pulmões e nas meninges. A mortalidade é elevada e mesmo com tratamento atinge geralmente 100% dos casos. Gastrointestinal: Acontece ao in- gerirmos alimentos contaminados, sendo pouco frequente. Os sintomas passam pela febre, ulceração da faringe ou esófago, vómitos, dores abdominais, diarreia com sangue e pode desenvolver-se uma infecção generalizada (sepsia), resultando na morte do paciente em 50 a 60% dos casos, mesmo com tratamento. Algumas doenças já não causam tanto transtorno como outrora, devido, principalmente, às nobres investigações que foram sendo feitas ao longo dos anos por inúmeros especialistas, com o objectivo de descobrir a cura. Descubra alguns dos exemplos. Anthrax ou Carbúnculo É causado pela bactéria Bacilus An- tracis, que se reveste de uma cápsula formando esporos, quando em meio favorável. Estes são resistentes e so- brevivem por longos períodos de tempo, conservando no seu interior a bactéria. Atinge principalmente herbívoros, mas pode afectar acidentalmente o ser hu- mano. A contaminação do homem é feita sobretudo a partir de animais infectados, pois não se transmite de pessoa para pessoa. Desde que foi encontrada a vacina para os animais, os casos de carbúnculo são raros. Apesar disso, tem sido muito falado devido à sua possível utilização como arma biológica, por parte de grupos terroristas. Como prevenir? Através da identificação dos animais infectados, da sua declaração obrigatória e vacinação. Se houver suspeita da sua utilização como arma biológica, a pre-

Upload: marisa-teixeira

Post on 28-Mar-2016

229 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

Artigo sobre varíola, carbúnculo, peste e obesidade - Almanaque da Saúde

TRANSCRIPT

Page 1: Doenças contagiosas

94 95

VaríolaExistem duas estirpes: a varíola

‘major’ e a varíola ‘minor’. Esta última

distingue-se pelos sintomas serem me-

nos severos e por ser menos comum.O

vírus da varíola, pertencente ao género

perigos da sociedade moderna descoberta a cura

Doenças controladasCarbúnculo, Varíola, Peste, Raiva e Obesidade

Existem muitas enfermidades que continuarão a matar enquanto não se encontrarem tratamentos eficazes para as combater. No entanto, outras já são facilmente controláveis. Por Marisa Teixeira

Revisão científica Luís Mendonça, médico interno do Internato médico de psiquiatria

venção deve ser feita através do uso

profilático de antibióticos nos suspeitos

de exposição à bactéria.

A via de contágio pode causar diferentes formas de doença:

• Cutânea: É a mais comum (95% dos

casos) e dá-se através da inoculação dos

esporos sob a pele, geralmente numa

escoriação ou ferida. Na zona infectada

aparece uma pápula, que ao fim de 24 a

48h evolui para uma lesão com uma ul-

ceração central escura e indolor, rodeada

de um ‘inchaço’ em forma de auréola, com

pequenas vesículas contendo o bacilo.

Habitualmente os gânglios da região

afectada aumentam de volume. Se o doente for tratado a evolução é para a cura e a morte é rara.

• Pulmonar: Resulta da inalação de

esporos da bactéria. Tosse, febre e mal-

-estar são alguns dos primeiros sintomas.

No 2.º ou 3.º dia a febre alta, falta de ar e

alteração da consciência apontam para a

gravidade da situação, que pode levar à

morte devido a lesões hemorrágicas nos

pulmões e nas meninges. A mortalidade é elevada e mesmo com tratamento atinge geralmente 100% dos casos.

• Gastrointestinal: Acontece ao in-

gerirmos alimentos contaminados, sendo

pouco frequente. Os sintomas passam pela

febre, ulceração da faringe ou esófago,

vómitos, dores abdominais, diarreia

com sangue e pode desenvolver-se uma

infecção generalizada (sepsia), resultando

na morte do paciente em 50 a 60% dos casos, mesmo com tratamento.

Algumas doenças já não causam

tanto transtorno como outrora, devido,

principalmente, às nobres investigações

que foram sendo feitas ao longo dos

anos por inúmeros especialistas, com o

objectivo de descobrir a cura. Descubra

alguns dos exemplos.

Anthrax ou CarbúnculoÉ causado pela bactéria Bacilus An-

tracis, que se reveste de uma cápsula

formando esporos, quando em meio

favorável. Estes são resistentes e so-

brevivem por longos períodos de tempo,

conservando no seu interior a bactéria.

Atinge principalmente herbívoros, mas

pode afectar acidentalmente o ser hu-

mano. A contaminação do homem é feita

sobretudo a partir de animais infectados,

pois não se transmite de pessoa para

pessoa.

Desde que foi encontrada a vacina

para os animais, os casos de carbúnculo são raros. Apesar disso, tem sido muito

falado devido à sua possível utilização

como arma biológica, por parte de grupos

terroristas.

Como prevenir?Através da identificação dos animais

infectados, da sua declaração obrigatória

e vacinação. Se houver suspeita da sua

utilização como arma biológica, a pre-

Page 2: Doenças contagiosas

96 97

Orthopoxvirus, entra no corpo humano

através do tracto respiratório e implanta

-se nas células epiteliais da orofaringe e

na mucosa pulmonar. Depois migra para

os gânglios linfáticos, onde continua a

sua replicação. Após três a quatro dias

dá-se um período de latência, com a du-

ração de quatro a 14 dias, ao longo do

qual os vírus se multiplicam no sistema

reticuloendotelial.

Do 12.º ao 14.º dia o vírus desloca-se

para locais de crescimento das célu-

las imunes, replicando-se nos glóbulos

brancos maduros. Vinte e quatro horas

após infectar os órgãos do sistema imune

atinge a circulação sanguínea. Esta fase

caracteriza-se por erupções cutâneas e

sintomas como febre elevada, dores de

cabeça, mal-estar e prostração.

As membranas das mucosas na boca e

faringe são infectadas e o vírus invade

o epitélio capilar da camada dérmica da

pele, originando lesões. Estas acabam por

evoluir para lesões vesículas (‘bolhas’) e

pústulas, que se formam principalmente

na face e extremidades, que gradualmente

cobrem o corpo todo.

No início da infecção os pacientes são altamente contagiosos através da transmissão aérea.

Primeira vacina A elevada taxa de mortalidade (mais

de 30%) e a facilidade com que se propa-

gava transformou-a numa das maiores

pragas mundiais. Foi uma das doenças

mais estudadas e a primeira para a qual

se encontrou uma vacina.

Doença erradicadaFoi erradicada através de um programa

de vacinação e erradicação global. Em 1980 a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou oficialmente a sua erradicação, recomendando a todos os

institutos que destruíssem os stocks ex-

istentes ou os transferissem para centros

colaboradores da OMS.

Contudo, especula-se que possam haver

ainda stocks que a OMS desconheça, o

que leva a uma crescente preocupação,

visto o terrorismo com armas biológicas

ser uma realidade.

Peste Quando se fala em peste a ligação

à peste negra do século XIV é quase imediata – a designação medieval para a peste bubónica – que só na Europa matou um terço da população, fora nas

restantes regiões. Esta doença não desa-

pareceu do planeta e continua a causar, em

média, entre 100 a 200 mortes por ano.

A peste afecta animais, principalmente

ratos, cujas pulgas podem contaminar

os seres humanos. Entre as pessoas a

propagação é rápida, bastando um espirro.

A doença pode adoptar uma ou várias

formas e os sintomas variam. A bactéria

da peste denomina-se Yersinia pestis,

um organismo dinâmico que se adapta e

passa por mutações rapidamente.

Os antibióticos revolucionaram o tratamento desta enfermidade, trans-formando-a numa doença controlável. São eficazes a estreptomicina, tetracicli-

nas e cloramfenicol.

Diferentes formas de PestePeste BubónicaOs sintomas costumam aparecer dois

a cinco dias após a exposição à bactéria

– arrepios e febre até 41.ºC; batimento

cardíaco irregular; os gânglios linfáticos

inflamam-se (bubões), ficando dolorosos

ao tacto e podem encher-se de pus e

drenar durante a 2.ª semana; fígado e

baço aumentam de volume.

Mais de 60% das pessoas que não

recebem tratamento morrem entre o

3.º e o 5.º dia.

Peste Pneumónica Infecção dos pulmões pelas bactérias

da peste. Dois ou três dias depois da

contaminação os sintomas ocorrem –

arrepios, febre elevada, ritmo cardíaco

acelerado e dores de cabeça. Surge a tosse

acompanhada por uma expectoração

inicialmente clara, mas que rapidamente

começa a apresentar sinais de sangue,

até chegar a uma coloração vermelha

intensa. Sem tratamento as pessoas

morrem geralmente em 48h.

Peste SepticémicaQuando a forma de peste bubónica se

propaga ao sangue. Pode causar a morte

mesmo antes de aparecerem outros sin-

tomas da bubónica ou pneumónica.

Peste MenorForma ligeira de peste que costuma

aparecer na área geográfica em que a

doença é endémica. Gânglios linfáticos

inchados, febre, dor de cabeça e esgota-

mento são os sintomas que persistem ao

longo de uma semana.

RaivaAo vermos um cão a espumar da boca

rapidamente associamos o fenómeno à

Raiva. No entanto, apesar da forma habitual de contágio ser através do ‘melhor amigo do homem’ outros ani-mais podem contagiar os humanos.

Trata-se de uma infecção viral do tecido

cerebral que causa irritação e inflamação

deste e da espinhal medula. O vírus en-

contra-se na saliva dos animais infectados

que o transmitem ao morder ou lamber.

A partir do ponto de inoculação inicial,

o vírus propaga-se através dos nervos

até à espinal medula e ao cérebro, onde

se multiplica, instalando-se em seguida

nas glândulas salivares.

SintomasDemoram cerca de 30 a 40 dias a

aparecer, mas o período de incubação

pode variar entre os dez dias e mais de

um ano. Depressão mental, inquieta-

ção, sensação de mal-estar e febre são

os primeiros sintomas. A inquietação começa a tornar-se descontrolada e o paciente produz grande quantidade de saliva. Os espasmos musculares

da garganta e da área vocal costumam

ser terrivelmente dolorosos. Estes são

causados pela irritabilidade da área

cerebral responsável pelas acções de

engolir e respirar. Uma brisa ligeira

ou a simples tentativa de beber água

podem induzi-los.

Em 20 % dos casos, a raiva ini-cia-se com a paralisia das pernas, que se vai estendendo ao resto do corpo.

Como prevenir?Para prevenir a raiva humana

utiliza-se a vacina anti-rábica

que pode ser administrada

antes ou depois da exposição à

saliva de animal infectado.

Continua a ser bastante frequente em países da América Latina, África e Ásia e não sendo tratada convenientemente leva à morte.

descoberta a cura

Page 3: Doenças contagiosas

98

na origem deste efeito.

A investigação revela ainda a possi-bilidade da obesidade ser contagiosa, e, por isso, também poder ser combatida através de uma vacina ou tratamento antiviral.

Pesquisas anteriores já tinham asso-

ciado o adenovírus à obesidade em ani-

mais, demonstrando que frangos e ratos

infectados com o AD36 engordavam e

duplicavam a sua camada de gordura.

Mas nesta nova investigação foram

usadas células estaminais adultas de

tecido de gordura de pessoas submeti-

das a uma lipoaspiração. Metade destas

células foram expostas ao vírus e, após

uma semana, a maioria converteu-se em

células de gordura.

Estima-se que até 30% das pessoas obe-

sas e 11% de indivíduos magros possam

estar infectados com o AD-36, pelo que

o passo seguinte dos especialistas será

identificar quais os factores que levam

algumas pessoas a ganhar peso.

Ainda é desconhecido qual o tempo

que o vírus permanece no organismo

dos obesos e quanto dura o efeito de

produzir gordura.

AD36 – o vírus que engordaA obesidade é uma doença em que o

excesso de gordura corporal acumulada

pode atingir graus capazes de afectar a

saúde. Até agora muitos associavam-na

apenas à vida sedentária ou a factores

genéticos.

No entanto, descobriu-se recentemente

que a obesidade pode, muitas vezes, relacionar-se com um vírus, que des-poleta a infectobesidade. Esta nova

designação nasceu de um trabalho de

investigação de Nikhil Dhurandhar. O

médico indiano descobriu que o ade-novírus 36 (AD36) – conhecido por causar infecções respiratórias, gas-troenterites e conjuntivites – também provoca obesidade.O estudo do primeiro

departamento de Infectobesidade, na

Universidade de Louisiana, nos Estados

Unidos, indica que o AD36 pode trans-

formar as células principais do tecido

adiposo em células de gordura. Foi ainda

identificado um gene específico (E4Orfl),

presente no adenovírus, que parece estar

Obesidade em

números

Mais de 50% da população

mundial será obesa em 2025 se não

forem tomadas medidas mais sérias

para o controlo da doença.

Em Portugal, 15% da população

tem obesidade.

Só na Europa, as doenças

relacionadas com a obesidade

provocam a morte de 320 mil

pessoas por ano.