documento protegido pela lei de direito autoral · repará-lo, ainda que o dano seja exclusivamente...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CARÁTER PEDAGÓGICO-PUNITIVO DO DANO MORAL NAS
RELAÇÕES DE CONSUMO.
Por: Roberta de Lacerda Ramos
Orientador
Prof. William Rocha
Rio de Janeiro
2014
DOCU
MENTO
PRO
TEGID
O PEL
A LE
I DE D
IREIT
O AUTO
RAL
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O CARÁTER PEDAGÓGICO-PUNITIVO DO DANO MORAL NAS
RELAÇÕES DE CONSUMO.
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito do Consumidor e
Responsabilidade Civil.
Por: Roberta de Lacerda Ramos.
3
AGRADECIMENTOS
As meus familiares, amigos, colegas de
trabalho e meu noivo que contribuíram
de várias maneiras para que eu
pudesse estar onde estou, dando
força, incentivando, orientando,
tornando minha caminhada mais fácil e
prazerosa.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a Deus, a minha
família, aos meus amigos e ao meu futuro
marido, Eduardo, que sempre esteve ao
meu lado me dando total apoio nos
momentos que mais necessitei. E, a
minha sobrinha, Giovana que trouxe
alegria a toda minha família.
5
RESUMO
O presente trabalho pretende abordar a possibilidade da aplicação do
dano moral em caráter pedagógico-punitivo no ordenamento jurídico brasileiro.
Cabe salientar que, o referido tema ainda é muito discutido pela doutrina e
jurisprudência, em razão de não haver dispositivo explicito em lei que autorize
a aplicação da indenização punitiva nas demandas envolvendo a relação de
consumo.
Verifica-se que o dano moral tem a função e o objetivo de prevenir
uma conduta, educar e reparar uma prática danosa, ou seja, de ressarcir,
prevenir e punir uma conduta ilícita, na busca de proteger a dignidade da
pessoa humana e os direitos da personalidade. A função punitiva do dano
moral, a qual teve inspiração no instituto do punitive damages oriundo dos
países do sistema Common Law, pretende desestimular, através de
indenizações vultuosas, sem causar o enriquecimento sem causa da vítima,
às práticas abusivas cometidas pelas empresas.
Ocorre que, a responsabilidade civil tradicional entende que, não
importa qual foi o ato ilícito, o proveito obtido pelo lesador, o valor da
indenização é estabelecido pela extensão do dano, conforme estipulado pelo
artigo 944 do Código Civil. Tal entendimento é aproveitado pelas empresas
lesadores, logo que tira proveito econômico da situação, o que deve ser revisto
uma vez que a simples reparação do dano não é a medida adequada para
inibição, prevenção de tal conduta reprovável e inaceitável.
Assim, é assegurado constitucionalmente a aplicação da indenização
punitiva do dano moral, uma vez que indispensável para proteger a dignidade
da pessoa humana e para a prevenção de danos a direitos personalíssimos.
6
METODOLOGIA
O método de pesquisa utilizada para o desenvolvimento do trabalho foi
realizado através de pesquisas bibliográficas, dentre as quais podemos citar os
seguintes doutrinadores, quais sejam, André Gustavo Corrêa de Andrade,
Yussef Said Cahali, Sergio Cavalieri Filho, Maria Celina Bodin de Moraes,
Guilherme Couto de Castro e Luiz Otaviano de Oliveira Amaral, pesquisa em
artigos científicos na internet e decisões jurisprudenciais nos Tribunais de
Justiça e no Superior Tribunal de Justiça.
Informa-se que, a pesquisa ficou restrita a responsabilidade civil e as
indenizações por danos morais nas relações de consumo.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - O DANO MORAL 10
1.1- A evolução do dano moral nas relações de consumo no ordenamento jurídico brasileiro 10 1.2- Conceito 12 1.3- Função e finalidade do dano moral 15
CAPÍTULO II - PUNITIVE DAMAGES 17
2.1- Origem 17 2.2- Conceito 17
CAPÍTULO III – A APLICABILIDADE DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA NO
DIREITO BRASILEIRO 19
3.1- A terminologia “Indenização Punitiva” 19
3.2- A Responsabilidade Civil 20
3.3- A dicotomia Direito Penal – Direito Civil 24
3.4- A indenização punitiva na Legislação Brasileira 26
3.5- A proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade
como instrumentos da indenização punitiva 29
3.6- Finalidades e pressupostos da indenização punitiva 30
3.7- Do enriquecimento ilícito ou enriquecimento sem causa 33
3.8- Decisões jurisprudenciais 34
CONCLUSÃO 47
BIBLIOGRAFIA 49
ÍNDICE 50
8
INTRODUÇÃO
O tema a ser abordado é o caráter pedagógico-punitivo do dano moral
e sua aplicação nas demandas movidas em razão da prática reiterada dos
descumprimentos das normas de proteção e defesa do consumidor.
A aplicação do dano moral, através do caráter pedagógico-punitivo é
alvo de diversas discussões, tanto na jurisprudência quanto na doutrina, uma
vez que não há disposição legal explícita, o que gera discussões sobre se é
possível a aplicação da figura típica dos países do sistema common law, no
ordenamento jurídico brasileiro, que possui tradição romano-germânica, qual
seria o fundamento jurídico que estaria enquadrado a referida sanção, quais as
situações que ele poderia ser aplicado, qual o quantum indenizatório deveria
ser fixado, de modo a desestimular a prática abusiva, não gerar o
enriquecimento ilícito e não estimular a indústria do dano moral.
Outro ponto que deverá ser observado, uma vez que, também é objeto
de discussão, será se as sanções judiciais, as quais tem a função de
desestímulo da prática delituosa, são exclusivas das penas estabelecidas pelo
Direito Penal. E, em caso de aplicação dessas sanções, estas deverão ocorrer
apenas como uma forma compensatória e punitiva, apenas nos conflitos de
grandes gravidades ou, também, em caráter preventivo, ou seja, com o
objetivo de prevenir e inibir a prática delituosa.
Vale verificar se a indenização por dano moral, em caráter pedagógico-
punitivo, tanto como forma punitiva, quanto em forma preventiva, caso venha a
ser arbitrado em um montante expressivo, com a finalidade de rechaçar as
práticas delituosas e abusivas reincidentes, será eficaz a desestimular e repelir
as práticas comuns e reincidentes de violação ao Direito do Consumidor.
9
E, verificar se o valor ínfimo das indenizações a título de dano moral,
nas sentenças condenatórias prolatadas, estimulam reiteradamente as práticas
abusivas em face do consumidor, figura hipossuficiente da relação de
consumo.
O que se pretende com esse trabalho é buscar dentro do ordenamento
jurídico brasileiro e, dentre os princípios constitucionais e consumeristas, a
possibilidade de aplicação do caráter pedagógico-punitivo do dano moral, com
a finalidade de proteger o consumidor, demonstrando a necessidade e/ou
utilidade dessa espécie de sanção penal, buscando o desestímulo das práticas
abusivas, com o objetivo de solucionar os conflitos de interesses existentes
entre os fornecedores e os consumidores.
10
CAPÍTULO I
O DANO MORAL
1.1 – A evolução do dano moral nas relações de consumo no
ordenamento jurídico brasileiro.
Antes da Constituição Federal de 1988, no ordenamento jurídico
brasileiro, o tema da reparação do dano moral era controvertido e gerava
algumas discussões, uma vez que se entendia pela irreparabilidade do dano
moral, logo que conceito era de que não havia como se quantificar a dor.
Ocorre que, os juízes começaram a perceber que o dano moral teria que ser
indenizado, quando então o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do
Sul, em 29.09.1976, julgou que o dano moral deveria ser indenizável, tanto
quanto o dano patrimonial.1
Conforme se pode verificar nas palavras do Ilustre Yussef Said Cahali:
“(...) se antes da Constituição Federal de 1988 o tema da
reparação do dano moral ainda se prestava a
controvérsias, já então juízes de todas as instâncias, em
antecipação meritória, sensíveis aos reclamos da
sociedade moderna, recusavam a velha e desgastada
parêmia da irregularidade do dano moral no pressuposto
de que a dor não tem preço, proclamando a necessidade
de serem revistos os antigos conceitos.” (Cahli, 2011)2
1 TJRS, 2.ª Câmara, 29.09.1976, RJTJRS 64/198; 2.ª Câmara, 06.10.1976, RJTJRS 63/254; 1.ª Câmara, 02.05.1978. RJTJRS 72/309). 2 Cahali, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.17.
11
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, se passou a
reconhecer a reparação do dano moral, cessando todas as dúvidas existentes
acerca da sua aplicabilidade, uma vez que em seu artigo 5º, nos inciso V e X,
assegurou além da indenização por dano material, a indenização por dano
moral ou à imagem.3
Como bem salientou o Ilustre André Gustavo Corrêa de Andrade:
“(...)a Constituição passou a garantir a proteção não
apenas dos direitos materiais ou patrimoniais – ou direito
de “ter” -, mas também, e, principalmente, dos direitos
imateriais ou da personalidade – que encontram sua
expressão genérica no princípio da dignidade da pessoa
humana (inciso III do art. 1º): é a consagração do direito
de “ser”.
A previsão constitucional, por um lado, sepultou as
últimas resistências ainda existentes à ideia de uma
reparação pecuniária pela ofensa ao patrimônio imaterial
ou ideal da pessoa;” (Andrade, 2009)4
O princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º,
inciso III da Constituição Federal de 1988, assegurou a reparação aos direitos
da personalidade.5
Em 1990, foi promulgado o Código de Defesa do Consumidor que, em
seu artigo 6º, inciso VI estabeleceu à efetiva prevenção e reparação aos danos
morais, ou seja, assegurou a efetiva tutela do dano extrapatrimonial.6
3 V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; 4 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.7. 5 III - a dignidade da pessoa humana; 6 Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
12
O novo Código Civil, instituído pela Lei n°. 10.406/2002, em seus
artigos 186 e 927 estabeleceu que aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, causar dano a outrem terá o dever de
repará-lo, ainda que o dano seja exclusivamente moral.7
1.2 – Conceito.
O conceito de dano moral ainda não foi assentido de forma sólida na
doutrina e na jurisprudência. Alguns acreditam que o dano moral é todo aquele
dano que não atinge ao patrimônio e causa tão somente dor moral ao lesado,
para outros, como Antonio Chaves, citado por André Gustavo Corrêa de
Andrade, o dano moral, também pode nascer de uma lesão patrimonial, logo
que as perdas patrimoniais, também podem causar ao lesado perturbações
psíquicas:
“Seu elemento característico é a dor, tomado o termo em
seu sentido amplo, abrangendo tantos os sofrimentos
meramente físicos, como os morais propriamente ditos.”
(...) “Dano moral, portanto, é a dor resultante da violação
de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão
patrimonial. Seja a dor física – dor-sensação, como a
denomina Carpenter – nascida de uma lesão material;
seja a dor moral – dor-sentimento – de causa material.”8
(...) VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; 7 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. 8 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.35.
13
Já para o Ilustre Professor Sergio Cavalieri Filho, dano moral é aquele
que atinge a personalidade, ou seja, ofende a personalidade do lesado,
causando dor, humilhação:
“O dano moral é lesão de bem integrante da
personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a
integridade psicológica, causando dor, sofrimento,
tristeza, vexame e humilhação à vítima.” (Filho, 2004)9
Nas palavras de Maria Celina Bodin de Moraes o dano moral seria:
“(...) no momento atual, doutrina e jurisprudência
dominantes têm como adquirido que o dano moral é
aquele que, independentemente de prejuízo material, fere
direitos personalíssimos, isto é, todo e qualquer atributo
que individualiza cada pessoa, tal como a liberdade, a
honra, a atividade profissional, a reputação, as
manifestações culturais e intelectuais, entre outros. O
dano é ainda considerado moral quando os efeitos da
ação, embora não repercutam na órbita de seu patrimônio
material, originam angústia, dor, sofrimento, tristeza ou
humilhação à vítima, trazendo-lhe sensações e emoções
negativas. Neste último caso, diz-se necessário,
outrossim, que o constrangimento, a tristeza, a
humilhação, sejam intensos a ponto de poderem
facilmente distinguir-se dos aborrecimentos e dissabores
do dia-a-dia, situações comuns a que todos se sujeitam,
como aspectos normais da vida cotidiana. É importante
observar que a evolução diária sofrida pela
responsabilidade civil, com a flexibilização da culpa,
assim como do nexo causal, impulsionou a criação de
14
novas demandas indenizatórias. Isto porque além da
assertiva anterior de que a Constituição Federal prevê a
reparação do dano moral, a própria responsabilidade civil,
com o advento da responsabilidade objetiva outra
dimensão de dano surgiu, o dano sem culpa, sem
ilicitude, mas sim, se cogitando, no máximo, em um dano
decorrente de uma conduta antijurídica.” (Moraes, 2009)10
O Ilustre Yussef Said Cahali conceitua o dano moral como:
“(...) a privação ou diminuição daqueles bens que têm um
valor precípuo na vido do homem e que são a paz, a
tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a
integridade individual, a integridade física, a honra e os
demais sagrados afetos; classificando-se, desse modo,
em dano que afeta a “parte social do patrimônio moral”
(honra, reputação etc) e dano que molesta a “parte
afetiva do patrimônio moral” (dor, tristeza, saudade etc);
dano moral que provoca direta e indiretamente dano
patrimonial (cicatriz deformante etc) e dano moral puro
(dor, tristeza etc). (Cahli, 2011)11
Como bem salienta André Gustavo Corrêa de Andrade, o conceito de
dano moral ainda está em construção, cabendo se analisar cada caso para
saber se há a existência ou não de dano moral:
“O dano moral é, em verdade, um conceito em
construção. Não há um dano moral ontológico, com
9 Cavalieri Filho, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Editora Malheiros, 2004, p. 35. 10 Moraes, Maria Celina Bodin de. Danos a Pessoa Humana. São Paulo: Editora Renovar, 2009, p. 157/158. 11 Cahali, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.19/20.
15
existência própria e independente daquilo que se pensa
a respeito dele. Os contornos dessa espécie de dano
dependerão sempre da concepção que dele fizer uma
dada comunidade jurídica; o que não quer dizer que o
conceito seja arbitrário. É a partir da experiência e do
compartilhamento de valores que se forja o conceito.”
(Andrade, 2009)12
Para o ilustre Guilherme Couto de Castro:
“O dano moral, em nosso ordenamento, tem duplo
caráter, compensatório e punitivo. Sua fixação tem como
fim, sob o primeiro ângulo, trazer benefício apto a, de
certo modo, permitir um alívio à vítima, ajudando-a a
liberar-se do sofrimento, ou reconfortando-a, através do
percebimento pecuniário. Não se trata de pagar a dor já
sentida, admitindo-se, isto sim, que o valor estipulado, ao
trazer benesse para que padeceu sentimentalmente,
implique uma compensação justa.” (Castro, 1997)13
1.3 – Função e finalidade do dano moral.
O instituto jurídico do dano moral tem três funções, quais sejam, a de
reparar, ou seja, compensar/ressarcir o lesado; a de prevenção, ou seja,
dissuadir o ofensor de praticar novos atos antijurídicos, com o cunho
socioeducativo, uma vez que torna público que condutas semelhantes não
serão toleradas e; a de punir, que consiste no pagamento de um valor
indenizatório capaz de demonstrar que a conduta ilícita praticada não será
tolerada.
12 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.133 13 Castro, Guilherme Couto de. A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1977, p.23.
16
Verifica-se que as funções do dano moral se confundem e todas tem o
objetivo de prevenir uma conduta, educar e reparar uma prática danosa. Resta
claro que a finalidade do dano moral é de ressarcir, prevenir e punir.
17
CAPÍTULO II
PUNITIVE DAMAGES
2.1– Origem.
A doutrina do Punitive Damages tem sua origem remota em textos da
Antiguidade, como por exemplo, no Código de Hammurabi, mas foi no século
XVIII que a doutrina teve sua origem.
Conforme salientado pelo Ilustre André Augusto Corrêa de Andrade, a
primeira aplicação explicita ocorreu em 1763, na Inglaterra, quando o júri
inglês, ao julgar o caso em que o artigo de John Wilkes, publicado pelo jornal
semanal The North Briton, ofendeu a reputação do rei George III, estabeleceu
uma indenização de soma considerável a título de punitive damages,
considerando a gravidade da conduta cometida.14
Cabe salientar que a doutrina do Punitive Damages é oriunda dos
países do sistema Common Law, em que uma das fontes do Direito é a
jurisprudência, a qual possuía força vinculante, sendo preferencialmente
aplicado em relação às normas estabelecidas.
2.2– Conceito.
O Punitive Damages define-se como uma indenização
compensatória decorrente de uma atitude danosa, buscando punir o ofensor,
aplicando uma sanção, com o objetivo de desestimular que venha a se repetir
o mesmo ato danoso, para o bem social e coletivo:
14 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.178/179.
18
“Os punitive damages são definidos como: “Indenização
outorgada em adição à indenização compensatória
quando o ofensor agiu com negligência, malícia ou dolo.”
São também usualmente denominados exemplar
damages. Constituem uma soma de valor variável,
estabelecida em separado dos compensatory damages,
quando o dano é decorrência de um comportamento
lesivo marcado por grave negligência, malícia ou
opressão. Se a conduta do agente, embora culposa, não
é especialmente reprovável, a imposição dos punitive
damages mostra-se imprópria.” (Andrade, 2009)15
Verifica-se que a função do punitivo damages é prevenir condutas
graves e punir o agente. Cabe ressaltar que as quantias vultuosas, as quais
são impostas, não tem parâmetro com o dano sofrido pelo lesado, sendo
aplicado com objetivo, repisa-se, de punir e prevenir a conduta delituosa.
15 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.186.
19
CAPÍTULO III
A APLICABILIDADE DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA NO
DIREITO BRASILEIRO
3.1 – A terminologia “Indenização Punitiva”.
A termo “Indenização Punitiva” traz contradição em sua terminologia,
uma vez que entende-se que se é indenização, não haveria que se falar em
pena, ou seja, punição. Ocorre que tal confusão terminológica não deve
prevalecer, logo que na esfera civil a punição seria a reparação na forma de
indenização, daí o termo Indenização Punitiva.
Verifica-se que, como fala André Gustavo Corrêa de Andrade:
“A resistência à indenização punitiva, transcende, por
óbvio, o aspecto terminológico. A dificuldade dos
doutrinadores em aceitar a ideia de uma indenização que
assuma feição punitiva decorre, em grande medida, do
estabelecimento da premissa de que, na esfera civil, a
resposta jurídica ao dano há de ser, única e
exclusivamente, a reparação. Esse é o modelo ou
paradigma a partir do qual são elaboradas as grandes
construções teóricas da responsabilidade civil tradicional.”
(Andrade, 2009)16
16 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.220.
20
Observa-se que o pensamento, ou seja, o entendimento tem que ser
mudado, para que se busque a evolução da responsabilidade civil, conforme a
atualidade.
3.2 – A Responsabilidade Civil.
A responsabilidade civil no decorrer dos tempos teve que passar por
mudanças para se adequar a realidade da época. Outrossim, importante
salientar que a responsabilidade civil, tem como função principal reparar o
dano decorrente de um ato ilícito.
Antigamente, e ainda hoje também, para alguns doutrinadores e
juristas, a responsabilidade civil tem a função de apenas reparar o dano
através de uma indenização, ou seja, busca-se apenas ressarcir o prejuízo
sofrido pela vítima ou compensar seu dano através de um equivalente
pecuniário.
Verifica-se que, não importa qual foi o ato ilícito, o proveito obtido pelo
lesador, o valor da indenização é estabelecido pela extensão do dano,
conforme estipulado pelo artigo 944 do Código Civil17.
“Ressarcir o dano, através de um equivalente pecuniário,
ou restabelecer a situação anterior, através de
providências específicas, são respostas jurídicas que,
apesar de suas diferenças, podem ser consideradas
espécies do mesmo gênero, reunidas naquilo que se
pode denominar função reparatória da responsabilidade
civil. Restabelecer o equilíbrio econômico-jurídico alterado
pelo dano – esse seria o papel principal da
17 Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
21
responsabilidade civil, a sua função preemitente.
(Andrade, 2009)18
O ilustre professor Luiz Otavio de Oliveira Amaral pondera que:
“A responsabilização civil tem por finalidade precípua o
restabelecimento do equilíbrio violado pelo dano. Por
isso, há em nosso ordenamento jurídico a
responsabilidade civil não só abrangida pela ideia do ato
ilícito, mas também há o ressarcimento de prejuízos em
que não se cogita da ilicitude da ação do agente ou até
da ocorrência de ato ilícito, o que se garante pela teoria
do risco, haja vista a ideia de reparação ser mais ampla
do que meramente o ato ilícito. O princípio que sustenta a
responsabilidade civil contemporânea é o da restitutio in
integrum, isto é, da reposição do prejudicado ao status
quo ante. Nesse diapasão, a responsabilidade civil possui
dupla função na esfera jurídica do prejudicado: (a)
mantenedora da segurança jurídica e, relação ao lesado;
(b) sanção civil de natureza compensatória.” (Amaral,
2011)19
Ocorre que, o entendimento mais moderno, é de que a
responsabilidade civil tem o objetivo de impedir que aconteça e/ou que cesse a
repetição do dano que está acontecendo.
“Avulta a importância hoje dada à denominada tutela
inibitória, voltada à prevenção ou cessação do dano. Sua
distinção em relação à tutela ressarcitória é assinalada
18 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.224. 19 Amaral, Luiz Otavio de Oliveira. Teoria Geral do Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p.140.
22
por Marinoni, segundo o qual: “(...) o problema da tutela
inibitória é a prevenção da prática, da continuação ou da
repetição do ilícito, enquanto o da tutela ressarcitória é
saber quem deve suportar o custo do dano,
independentemente do fato de o dano ressarcível ter sido
produzido ou não com culpa.” Seu fundamento último
está no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que
garante aproteção judiciária contra a ameaça a direito,
razão pela qual é desnecessária sua previsão no plano
infraconstitucional.” (Andrade, 2009)20
Atualmente, a responsabilidade civil busca, não só a reparação do
dano, mas a sua prevenção, com o intuito de que o mesmo, não venha a se
consumir e não seja necessário a reparação, a qual se busca proteger o
lesado e também o causador do dano. Tal entendimento é observado por
André Gustavo Corrêa de Andrade ao citar Matilde Zavala de Gonzalez,
vejamos:
“ (...)esse ramo do Direito: “Não se circunscreve a pura
técnicas de remédio, mas inclui a análise do que e como
de ser protegido contra os males injustos: é um Direito da
preservação e não unicamente um Direito de reparação.”
Na verdade, toda a primazia deve ser dada à finalidade
preventiva, com a prioridade para o “não danificar”,
porque valoriza os bens e interesses jurídicos, não o seu
valor econômico. Reconhece-se que a preservação do
direito é mais importante do que a reparação do dano a
ele causado, como frisado pela civilista argentina, para
quem “a responsabilidade por danos não é apenas
reparadora, ao contrário sua finalidade primária se orienta
20 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.225.
23
em direção à prevenção de prejuízos e, caso tenha ele
ocorrido, a evitar sua continuidade ou agravação; tal é a
mira essencial de qualquer sã teleologia jurídica.”.
(Andrade, 2009)21
Insta salientar que, o pensamento autal é o de valorizar a prevenção
do dano, tendo em vista que a prevenção ela é benefíca tanto para o lesado
quanto para o lesador, tendo em vista que se tornou insuficiente apenas a
reparação do dano, para atender os interesses e conflitos sociais. Como
observa Ramón Daniel Pizarro, citado por André Gustavo Corrêa de Andrade:
“A função preventiva do direito de danos tem aumentado
de importância nos últimos tempos. Esta atitude, de viés
claramente dissuasório, apresenta-se como um
complemento idôneo às tradicionais vias ressarcitórias.
Tanto do ponto de vista da vítima quanto do possível
responsável, a prevenção do dano é sempre preferível à
sua reparação.” (Andrade, 2009)22
Outrossim, cabe salientar que a imposição de uma sanção pecuniária
não pode estar diretamente ligada a extensão do dano, mas sim ao ato ilícito,
com o intuito de demonstrar ao ofensor e a sociedade que aquela conduta por
ele praticada é reprovável e inaceitável, na tentativa de se mostrar que tal
atitude não pode se repetir, ou seja, tem a finalidade de prevenção.
Vale ressaltar que, se deve levar em consideração, que muitas
empresas lesam os consumidores reiteradamente, uma vez que, levam em
consideração que a responsabilidade civil, tem o objetivo/função de apenas
reparar o dano, o que tornar mais barato a reparação do que o cessar o evento
21 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.226/227. 22 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.227.
24
danoso. Na mesma linha, o comentário do ilustre André Gustavo Corrêa de
Andrade:
“Forçoso reconhecer que há situações em que as
medidas preventivas não punitivas são aplicáveis. E, em
algumas dessas situações, a simples reparação do dano
não é suficiente para dissuadir o ofensor da reiteração de
condutas danosas. É o que se dá, por exemplo, quando o
custo da indenização é menor do que o custo de evita-la;
ou quando o proveito obtido com o ato danoso supera o
prejuízo resultante da reparação do dano.” (Andrade,
2009)23
Verifica-se que, o ofensor tira proveito econômico da situação,
momento em que se tem que verificar que a simples reparação do dano não é
a medida adequada para inibição, prevenção de tal conduta reprovável e
inaceitável.
3.3 – A dicotomia Direito Penal – Direito Civil.
A dicotomia Direito Penal – Direito Civil, consolida o entendimento de
que, a função da responsabilidade civil é de apenas reparar o dano e de que,
caberia ao Direito Penal, a punição do causador da conduta lesiva afim de
prevenir novos atos antijurídicos.
Ocorre que, não deve haver, a separação absoluta, entre os dois
ramos do Direito. Verifica-se que, a sociedade moderna, busca a solução dos
conflitos não apenas na tentativa de ressarcir, mas também, com o objetivo de
punir para que a conduta lesiva não venha a se repetir.
23 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.227.
25
Neste sentido, André Gustavo Corrêa de Andrade pondera citando
Júlio Manuel Vieira Gomes:
“Trazendo a debate a questão sobre a possibilidade de a
responsabilidade civil desempenhar funções de
prevenção e punição, Júlio Manuel Vieira Gomes, citando
Trimarchi, pondera que não há nenhuma razão plausível
para renunciar a esses escopos, observando que a
própria transferência do dano sofrido pela vítima para a
pessoa do ofensor (e não para outra pessoa qualquer)
clama por uma justificação, que é encontrada, ao final, no
propósito de punir o causador do mal, prevenindo, com
isso, comportamentos semelhantes. Sem essa
justificação, a responsabilidade civil perderia por completo
sua referência ético-valorativa, e não haveria razão para
abandonar de vez o sistema atual de distribuição de
responsabilidade, substituindo-o por outro, em que os
danos seriam, por exemplo, cobertos por um fundo social
universal.” (Andrade, 2009)24
Cabe observar que, já há institutos, no ordenamento jurídico brasileiro,
no ramo do Direito Civil, com sanções de natureza penal, como exemplos
podemos citar: o arras, previsto nos artigos 418 e 420, ambos do Código
Civil25; o pagamento em dobro, previsto no artigo 940 do Código Civil26; a
24 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.227. 25 Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado. Art. 420. Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.
26
cláusula penal, prevista no artigo 416 do Código Civil27; o juros de mora; e a
restituição em dobro, prevista no artigo 42, parágrafo único do Código de
Defesa do Consumidor28.
As normas de defesa do consumidor são aparadas pela Constituição
Federal, como normas de ordem pública e de interesse social, razão pela qual
se verifica a possibilidade, ainda que discutível e controversa, da aplicação de
sanções de natureza penal, com o objetivo de punir a conduta lesiva e de
reeducar para que tal conduta não venha a se repetir.
3.4 – A indenização punitiva na Legislação Brasileira.
A legislação brasileira prevê a função punitiva da indenização do dano
moral conforme podemos verificar no Código Brasileiro de Telecomunicações,
na Lei da Imprensa e na Lei de Propriedade Industrial.
A lei n°. 4.117/62 – Código Brasileira de Telecomunicações, em seu
artigo 8429 determinada que deveria ser levado em consideração, no momento
da atribuição da indenização, a situação econômica do ofensor e a intensidade
do dano, o que deixa claro o critério punitivo na referida norma.
26 Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição. 27 Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo. Parágrafo único. Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente. 28 Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. 29 Art. 84. Na estimação do dano moral, o Juiz terá em conta, notadamente, a posição social ou política do ofendido, a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa..(Revogado pelo Decreto-lei nº 236, de 28.2.1967)
27
A lei n°. 5.250/67 – Lei da Imprensa, em seu artigo 5330 determina que
deve ser verificada a intensidade do dolo ou o grau de culpa do responsável,
sua situação econômica e sua condenação anterior em ação criminal ou cível,
o que demonstra o critério punitivo.
A lei n°. 9.279/96 – Lei da Propriedade Industrial, prevê em seu artigo
21031, que os lucros cessantes do titular do direito violado, terá que ser
determinado, dentre outros, pelos benefícios que foram auferidos pelo autor da
violação do direito, demonstrando a finalidade punitiva da sanção.
Verifica-se que os diplomas legais expostos, determinam que o juiz, no
momento de arbitrar a indenização por dano moral, verifique alguns aspectos
característicos do critério punitivo da sanção, afastando a ideia de que a
indenização terá que ser arbitrada na extensão do dano.
Como já falado, o Código Civil não contempla a indenização em
caráter punitivo, determinando em seu artigo 944, que a indenização deve se
medir pela extensão do dano, trazendo em seu parágrafo único que se houver
excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz
reduzir, equitativamente, a indenização.32
30 Art. 53. No arbitramento da indenização em reparação do dano moral, o juiz terá em conta, notadamente: I - a intensidade do sofrimento do ofendido, a gravidade, a natureza e repercussão da ofensa e a posição social e política do ofendido; II - A intensidade do dolo ou o grau da culpa do responsável, sua situação econômica e sua condenação anterior em ação criminal ou cível fundada em abuso no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação; III - a retratação espontânea e cabal, antes da propositura da ação penal ou cível, a publicação ou transmissão da resposta ou pedido de retificação, nos prazos previstos na lei e independentemente de intervenção judicial, e a extensão da reparação por êsse meio obtida pelo ofendido. 31 Art. 210. Os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, dentre os seguintes: I - os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; ou II - os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou III - a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem. 32 Art. 944. (...) Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.
28
Conforme observado por André Gustavo Corrêa de Andrade:
“(...) A exceção contida no parágrafo é representativa do
conflito do legislador entre a tradição jurídica – que,
prescindindo do elemento culpa para a fixação do
montante indenizatório, associa a indenização ao dano –
e a tendência atual de “repersonalização” do Direito
Privado, através da qual se busca valorizar o homem,
ainda que em detrimento do patrimônio, com a introdução
de princípios de equidade. Com fundamento na equidade,
admite-se que a culpa possa servir como critério para
mitigar a responsabilidade civil, mas não para agravá-la.
A equidade nesse caso atua em favor do culpado
causador do dano, deixando de lado a vítima inocente. De
todo modo, a exceção trazida à regra da reparação
integral constitui uma inclinação, ainda que inconsciente,
em direção às finalidades preventiva e punitiva da
responsabilidade civil, uma vez que se reconhece que a
imposição do dever de indenizar parcialmente a vítima
pode constituir medida suficiente para o causador do
dano cuja culpa seja menos grave. (Andrade, 2009)33
A exceção prevista no parágrafo único do artigo 944 do Código Civil,
constitui uma tendência ao critério punitivo da indenização, uma vez que prevê
a possibilidade de redução do montante indenizatório de acordo com culpa do
agente, ou seja, se a culpa for menos grave, a indenização poderá ser parcial.
Ainda assim, a quem entenda que o artigo 6º, inciso VI do Código de
Defesa do Consumidor34, prevê implicitamente, a possibilidade da aplicação da
33 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.236/237. 34 Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
29
indenização em caráter punitivo-pedagógico, buscando a eficácia máxima de
proteção ao consumidor, logo que prevê não apenas a reparação, mas
também a prevenção como direito básico do consumidor.
3.5 – A proteção da dignidade humana e dos direitos da
personalidade como instrumentos da indenização
punitiva.
O critério punitivo da indenização, surge como meio de proteger a
dignidade da pessoa humana e os direitos da personalidade. Cabe salientar
que o princípio da dignidade humana, estabelecido no artigo 1º, inciso III da
Constituição Federal35 e o direito da personalidade são consagrados como um
dos fundamentos do Estado Democrático. Neste sentido, André Gustavo
Corrêa de Andrade pondera:
“A indenização punitiva surge, no sistema jurídico vigente,
não apenas como reação legítima e eficaz contra a lesão
e ao ameaça de lesão a princípios constitucionais da mais
alta linhagem, mas como medida necessária para a
efetiva proteção desses princípios.” (Andrade, 2009)36
Tais princípios tornam possível a aplicação da indenização punitiva do
dano moral nas relações de consumo, pois são direitos de natureza
fundamental, os quais garante a aplicação de todos os meios para a sua
proteção.
(...) VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; 35 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana;
30
Outrossim, insta salientar que a Constituição Federal ainda determina
em seu artigo 5º, inciso XXXII37 que o Estado deve promover a defesa do
consumidor e, em seu artigo 17038, inciso V, estabelece a defesa do
consumidor como princípio de ordem econômica.
Resta claro que, é assegurado constitucionalmente a aplicação da
indenização punitiva do dano moral, uma vez que indispensável para proteger
a dignidade da pessoa humana e para a prevenção de danos a direitos
personalíssimos.
3.6 – Finalidades e pressupostos da indenização punitiva.
A função punitiva da indenização tem a finalidade de punição e
prevenção. Enquanto alguns dos pressupostos são a ocorrência de dano
moral, culpa grave ou dolo do ofensor e a obtenção de lucro com o ato ilícito.
A finalidade punitiva tem o objetivo de atribuir uma sanção em pecúnia
ao agente do ato antijurídico, em caráter pedagógico, como retribuição ao
lesado, por uma conduta lesiva sofrida. Cabe salientar que a finalidade da
função punitiva, leva em consideração a reprovabilidade da conduta do agente.
Como pondera André Gustavo Corrêa de Andrade:
“Ao mudar o foco da figura da vítima para a do agressor,
a indenização punitiva atende a um imperativo ético,
36 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.238. 37 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; 38 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V - defesa do consumidor;
31
porque possibilita a realização de um juízo valorativo
diferenciado para comportamentos merecedores de
diferente censura. Atribuindo importância à conduta do
ofensor, e não apenas à consequência sofrida pela
vítima, distingue um comportamento mais reprovável de
um menos reprovável. Introduz, desse modo, um critério
de justiça no âmbito da responsabilidade civil.” (Andrade,
2009)39
Verifica-se que, afasta-se o entendimento emanado pelo artigo 944 do
Código Civil, e não se leva em consideração apenas o dano no momento de
aplicar a condenação, mas, também, a conduta do agente, ou seja, se esse
tem a intenção de lesar ou é omisso diante de uma prática lesiva.
A prática lesiva terá que ser punida, para que não se venha repetir a
conduta reprovável. Observa-se que as finalidades de punir e de prevenir se
confundem, logo que, ambas, tem um objetivo comum, logo que a punição tem
o objetivo de prevenir.
A finalidade de prevenir, tem o objetivo de que a sanção aplicada
cumpra o papel de conscientizar e combater que a prática lesiva volte a ser
cometida. Como salientado por André Gustavo Corrêa de Andrade:
“A indenização compensatória, nesse contexto,
funcionaria como o medicamento que ataca os sintomas
sem combater a própria doença, trazendo uma falsa
sensação de cura, pois a doença persiste e volta a cada
vez mais forte, acabando por se tornar imune ao ataque.
A relativa debilidade econômica da sanção imposta
concretamente reduz a imperatividade do ordenamento
39 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.239.
32
jurídico, eliminando a coercibilidade característica das
normas jurídicas.” (Andrade, 2009)40
O objetivo das finalidades da indenização punitiva, é inibir a prática de
atos lesivos que não são eliminados com indenização de cunho apenas
compensatório. Verifica-se que, em alguns casos é mais econômico para o
lesador a prática do ato lesivo e o pagamento da indenização compensatória,
do que a cessão da prática lesiva. Como observa André Gustavo Corrêa de
Andrade:
“Alguns fornecedores, para elevar sua margem de lucros,
deixam de investir em mecanismos de prevenção e
controle de qualidade mais rigorosos sobre os serviços
prestados, enquanto outros colocam no mercado
produtos de qualidade inferior ou que não atendem a
determinados padrões de segurança, preferindo arcar
com a reparação de danos causadas aos consumidores,
na certeza de que os valores indenizatórios serão muito
inferiores ao investimento que teriam de realizar para o
aperfeiçoamento de seus produtos e serviços.” (Andrade,
2009)41
Daí, observa-se o motivo pela qual a indenização punitiva deve ser
aplicada, ou seja, desestimular a prática da conduta antijurídica, através da
sanção pecuniária, com o intuito de dissuadir a prática extremamente
reprovável, provocando danos não somente a vítima, mas também a toda a
sociedade.
3.7 – Do enriquecimento ilícito ou enriquecimento sem causa.
40 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.244. 41 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.239.
33
Alguns doutrinadores sustentam que, em razão da indenização em
caráter punitivo-pedagógico ser atribuído com um valor acima da extensão do
dano, estaria caracterizando o enriquecimento sem causa, previsto no artigo
844 do Código Civil.42
Ocorre que, o caráter punitivo da indenização não tem o objetivo do
enriquecimento sem causa, uma vez que a fixação do quantum indenizatório
tem, o único objetivo, observado os critérios objetivos, quais sejam, a condição
econômica do ofensor, a gravidade do dano, o grau de culpa, de compensar o
lesado e ocasionar impacto no patrimônio do agente causador do dano, com a
finalidade pedagógica, objetivando a evitar a reincidência da conduta danosa.
A ilustre Maria Celina Bodin de Moraes, citada por André Gustavo
Corrêa de Andrade, entende que:
“(...) a sentença de um juiz, arbitrando o dano moral, é
razão jurídica mais do que suficiente para impedir que se
fale, tecnicamente, de enriquecimento injustificado. Esse
enriquecimento teria como causa ou justificada a própria
decisão judicial, devidamente fundamentada, e,
remotamente, a lesão provocada pelo réu.” (Andrade,
2009)43
Resta claro que, a indenização punitiva tem o objetivo de proteger a
dignidade da pessoa humana e os direitos da personalidade, atingindo o
patrimônio do lesador com o objetivo de punir e prevenir o ato ilícito. Observa-
se que, a aplicação de um montante vultuoso, não tem o objetivo do
42 Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. 43 Andrade, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009, p.275.
34
enriquecimento sem causa, mas sim, atingir a capacidade econômica do
agente da conduta ilícita, para que cesse a prática do ato lesivo.
3.8 – Decisões jurisprudenciais.
A aplicabilidade do caráter punitivo do dano moral gera controvérsia
em nosso judiciário, refletindo assim nas decisões nos Tribunais. Assim, vale
elencar algumas decisões emanadas pelos Tribunais de Justiça e pelo
Superior Tribunal Federal.
A Vigésima Sexta Câmara Cível – Consumidor do Tribunal de Justiça
do Rio de Janeiro, no julgamento da Apelação Cível n°. 0000535-
11.2011.8.19.0204, pela Desembargadora Relatora: MYRIAM MEDEIROS DA
FONSECA COSTA, estipulou o quantum indenizatório com base na função
punitiva da indenização, ao verificar a conduta abusiva cometida pela ré.
“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR.
PLANO DE SAÚDE. INCIDÊNCIA DA LEI 8.078/90.
DEMORA DE QUATRO MESES PARA AUTORIZAÇÃO
DA CIRURGIA. ABUSIVIDADE DA CONDUTA. DANO
MORAL CONFIGURADO. TEORIA DAS “PUNITIVES
DAMAGES”. DEMORA NA BUSCA DA REPARAÇÃO DO
DANO QUE INFLUENCIA NA FIXAÇÃO DO QUANTUM
INDENIZATÓRIO. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO QUE
FOI REALIZADO ANTES DA DISTRIBUIÇÃO DA AÇÃO.
COMPENSAÇÃO QUE DEVE SER ARBITRADA DE
FORMA MODERADA. IMPORTÂNCIA DE R$ 4.000,00
(QUATRO MIL REAIS) QUE ATENDE A LÓGICA DO
RAZOÁVEL. APÓLICE COLETIVA ADMINISTRADA
PELO EMPREGADOR DO CONSUMIDOR.
COBERTURA LIMITADA À REDE CREDENCIADA.
MÉDICO ASSISTENTE QUE NÃO ERA CONVENIADO.
35
REEMBOLSO PARCIAL. POSSIBILIDADE. EM QUE
PESE A FACULDADE DO PACIENTE QUANTO À
ESCOLHA DO PROFISSIONAL MÉDICO DE SUA
CONFIANÇA, TAL CUSTO NÃO PODE SER
REPASSADO INTEGRALMENTE AO PLANO DE
SAÚDE, QUE POSSUI REDE CREDENCIADA PARA
ATENDER SEUS ASSOCIADOS. PROVIMENTO
PARCIAL DO RECURSO.” (VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA
CÍVEL – CONSUMIDOR, APELAÇÃO CÍVEL: 0000535-
11.2011.8.19.0204, RELATORA: DES MYRIAM
MEDEIROS DA FONSECA COSTA)
A Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, no julgamento da Apelação Cível n°. 0329672-89.2011.8.19.0001,
pelo Desembargador Relator: JORGE LUIZ HABIB, entendeu que a reparação
pelos danos morais, em razão de uma atitude reprovável do réu, teria tríplice
caráter, quais sejam, indenizatório, punitivo e educativo.
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA.
CANCELAMENTO DE VOO. DANOS MORAIS. A
indenização por dano moral, deve ser fixada em
patamares comedidos, ou seja, não exibe uma forma de
enriquecimento para o ofendido, nem, tampouco, constitui
um valor ínfimo que nada indenize e que deixe de retratar
uma reprovação à atitude imprópria do ofensor,
considerada a sua capacidade econômico-financeira. A
reparação desse tipo de dano tem tríplice
caráter: punitivo, indenizatório e educativo, como forma
de desestimular a reiteração do ato danoso. Os juros
foram corretamente fixados na sentença, incidindo da
citação, ato processual que, na espécie, constitui em
mora o devedor (CPC, art. 219, caput). PRECEDENTES
36
DESTE TJRJ. Apelação manifestamente improcedente ao
qual se nega seguimento de plano, na forma do art. 557,
caput, CPC. (DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL,
APELAÇÃO CÍVEL: 0329672-89.2011.8.19.0001, DES.
JORGE LUIZ HABIB - Julgamento: 20/03/2014)
A Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no
julgamento da Apelação Cível n°. 0025686-92.2010.8.19.0210, pela
Desembargadora Relatora: RENATA COTTA, entendeu pelo não
reconhecimento da indenização em caráter punitivo, em razão de não haver
previsão legal.
“APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PESSOA
JURÍDICA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.
AUSÊNCIA DE ABALO À HONRA OBJETIVA.
Responsabilidade da Bradesco Saúde. Primeiramente,
deve ser mantida a sentença de improcedência em
relação à primeira ré (Bradesco Saúde), por não existir
qualquer responsabilidade quanto aos fatos narrados na
peça inicial. Com efeito, a causa de pedir da demanda
baseia-se no fato de que a empresa corretora de seguros
(2ª ré) descontou indevidamente um cheque emitido pela
parte autora. Tal cheque serviria de pagamento da 1ª
mensalidade do plano de saúde a ser contratado junto ao
Bradesco Saúde, no entanto, o negócio jurídico acabou
não se concretizando já que os eventuais segurados não
foram aprovados em exame médico. Mesmo sem a
celebração do contrato de plano de saúde, a corretora
procedeu ao desconto do cheque emitido pela autora,
conforme cópia do cheque de fls. 23. Entretanto, não há
qualquer responsabilidade da Bradesco Saúde, uma vez
que o desconto foi efetivado apenas pela corretora, que,
37
diga-se de passagem, não possui qualquer relação de
vinculação ou dependência em relação às seguradoras
que eventualmente intermediam negócios. Assim, não há
que se falar em responsabilidade da 1ª ré (Bradesco
Saúde). Dano moral. O mero descumprimento de um
dever legal não dá azo à condenação por danos morais
como forma de punição, porquanto, no ordenamento
pátrio, não há a previsão do punitive damages. A
doutrina, ao falar do caráter punitivo-pedagógico do dano
moral, estabelece apenas um requisito indispensável para
orientar o magistrado no momento do arbitramento do
valor compensatório, mas, de forma alguma, trabalha com
a idéia de que o dano moral configura-se com forma de
punição. Dessa forma, imprescindível, para a
responsabilização por danos morais, a presença de todos
os elementos da responsabilidade civil, dentre eles, a
ocorrência de dano. Tratando-se de pessoa jurídica, a
configuração do dano moral depende da prova do efetivo
abalo de sua honra objetiva, que nada é mais do que o
prestígio de que goza da comunidade. O desconto
indevido de cheques, em tese, não é apto a causar
qualquer repercussão perante a comunidade e, por isso,
não há abalo à honra objetiva da pessoa jurídica vítima
de tal ato ilícito. Dessa forma, diante da ausência de um
dos pressupostos da responsabilidade civil, qual seja, o
dano, o pedido de condenação da empresa ré ao
pagamento de compensação por dano moral foi
corretamente julgado improcedente, não merecendo
reforma a sentença nesse ponto. Parte ré que sucumbiu
em parte mínima dos pedidos veiculados na inicial.
Recurso a que se nega seguimento.” (TERCEIRA
CAMARA CIVEL, APELAÇÃO CÍVEL: 0025686-
38
92.2010.8.19.0210, DES. RENATA COTTA - Julgamento:
04/02/2014)
A Terceira Turma Recursal Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande
do Sul, no julgamento da Apelação Cível n°. 71003164399, pela
Desembargador Relator: FABIO VIEIRA HEERDT, observa a necessidade da
aplicação do instituto do punitive damage.
RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. TELEFONIA
FIXA. “112 PLANO CONTA COMPLETA” NÃO
CONTRATADO. PRÁTICA ABUSIVA. ILICITUDE.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO, AUSENTE
ERRO ESCUSÁVEL. DANO MORAL CONFIGURADO.
QUANTUM INDENITÁRIO MANTIDO. MULTA
MANTIDA. DOUTRINA DA PUNITIVE DAMAGE.
1. Ausência de prova acerca da contratação dos
serviços impugnados, que, associada à verossimilhança
da insurgência do consumidor e à sua hipossuficiência,
autorizam a conclusão da ausência de ajuste no tocante,
gerando o dever de restituir, em dobro, os valores pagos
indevidamente. Ausente erro escusável por parte do
fornecedor, correta a restituição na dobra.
2. No tocante à condenação pelo dano moral,
justifica-se no caso concreto em razão de sua função
punitiva, tendo em vista a reiteração de condutas
semelhantes à do presente feito, em que são cobrados
serviços que não foram solicitados, evidenciando
ausência de boa-fé objetiva. Danos morais que devem ser
reconhecidos, os quais derivam do próprio ato ofensivo.
3. Quantificação da indenização de R$ 2.000,00
que não comporta redução, estando suficiente para o
39
caso e em conformidade com os princípios da
proporcionalidade e razoabilidade.
4. Multa diária arbitrada na sentença, em R$
200,00, por dia/multa até o limite de 30 dias, em caso de
descumprimento do comando judicial, que deve ser
mantida, como forma de assegurar o comando judicial,
tendo em vista o abuso de direito consistente na
reiteração da conduta ilícita em milhares de casos
trazidos diuturnamente aos Juizados Especiais.
5. Necessidade de inaugurar-se a doutrina da
punitive damage e sua co-irmã, a exemplary damage, às
vezes chamadas no direito pátrio, sem muito rigor
científico, de teoria do desestímulo.
6. Em alguns casos, além da vítima, instituições
de caridade podem ser premiadas com a punição do
ofensor, ou, até mesmo o Fundo dos Direitos do
Consumidor.
7. Princípio da efetividade da decisão judicial
que merece ser avivado, mediante a proteção à defesa do
consumidor e a compensação do dano moral, direitos
fundamentais. RECURSO IMPROVIDO.”
(Apelação Cível Nº 71003164399, Terceira Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabio Vieira
Heerdt, Julgado em 30/06/2011)
A Segunda Turma Recursal dos Cível Juizados Especiais do Distrito
Federal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no julgamento do Processo
n°. 0024839-13.2011.807.0009, entendeu pela aplicação da indenização
punitiva, levando em consideração que a sua finalidade é a de evitar que o
dano imposto ao consumidor seja lucrativo para a instituição financeira.
40
“CIVIL. CDC. DIREITO DO CONSUMIDOR. TARIFAS
BANCÁRIAS. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. INDENIZAÇÃO
PUNITIVA (PUNITIVE DAMAGE). PEDIDO. SENTENÇA
MANTIDA RECURSO RECURSO IMPROVIDO.
1 - A COBRANÇA DE TAXAS E TARIFAS DE
ABERTURA DE CADASTRO, REGISTRO DE
CONTRATO, AVALIAÇÃO DE BENS E DESPESAS DE
SERVIÇOS DE TERCEIROS NÃO CONSUBSTANCIAM
CONTRAPRESTAÇÃO AO SERVIÇO PRESTADO PELA
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, PORQUANTO SÃO
SERVIÇOS INERENTES À PRÓPRIA ATIVIDADE
BANCÁRIA A FIM DE CONCEDER O CRÉDITO AO
CONSUMIDOR.
2 - O ART. 42, § ÚNICO, DO CDC TEM O OBJETIVO DE
EVITAR A CONTINUIDADE DA COBRANÇA INDEVIDA,
POIS A PERSISTÊNCIA NA COBRANÇA DAS TARIFAS
DE ABERTURA DE CADASTRO, RENOVAÇÃO DE
CADASTRO E DESPESAS DE SERVIÇOS DE
TERCEIROS CONSUBSTANCIA ABUSIVIDADE NA
RELAÇÃO CONTRATUAL COM O CONSUMIDOR, QUE
GERAM LUCRO PARA A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. A
FINALIDADE DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA (PUNITIVE
DAMAGE) É EVITAR QUE O DANO IMPOSTO AO
CONSUMIDOR SEJA LUCRATIVO PARA A
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
3- O TERMO INICIAL PARA INCIDÊNCIA DA
CORREÇÃO MONETÁRIA DEVERÁ SER A DATA DO
EFETIVO DESEMBOLSO DO PAGAMENTO DAS DE
TAXAS DE ABERTURA DE CADASTRO, RENOVAÇÃO
DE CADASTRO E DESPESAS DE SERVIÇOS DE
TERCEIROS, A FIM DE COMPENSAR A PERDA DO
PODER AQUISITIVO DA MOEDA, EVITANDO COM
41
ISSO O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO RECORRIDO.
JUROS LEGAIS A P ARTIR DA CITAÇÃO QUANDO
CONSTITUÍDO EM MORA O RECORRENTE. TODAVIA,
INCABÍVEL A REFORMA IN PEJUS, POIS O RECURSO
FOI A JUIZADO APENAS PELO BANCO, NÃO
PODENDO SER PREJUDICIAL O PROVIMENTO DO
RECURSO.
4- RECURSO CONHECIDO IMPROVIDO HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS PELO RECORRENTE EM R$ 300,00
(TREZENTOS REAIS), MAIS CUSTAS.” (Processo nº
0024839-13.2011.807.0009, 2ª Turma Recursal dos
Juizados Especiais do Distrito Federal, Tribunal de Justiça
do Distrito Federal, Relator: João Fischer, Julgado em
13/03/2012)
A Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, no julgamento
da Apelação Cível n°.0414377-3, pelo Desembargador Relator: TUFI MARON
FILHO, entendeu pela aplicação da indenização por danos morais em caráter
punitivo, para compensar a vítima, bem como punir o ofensor.
“Indenização. Danos Morais. Inscrição Indevida.
Insurgência recíproca quanto a fixação do quantum
indenizatório. Punitive Damages. Valor corretamente
arbitrado. Sentença mantida. Recursos desprovidos.
I - Restado comprovado nos autos a ocorrência do nexo
causal, imperioso é o dever de indenizar.
II - O valor arbitrado a título de indenização por danos
morais deve ser certo, representando uma compensação
à vítima e também uma punição ao ofensor, guardando-
se proporcionalidade entre o ato lesivo e a ofensa sofrida.
Se correspondente aos critérios apontados, deve ser
conservado o patamar.
42
III - Apelação e Recurso Adesivo que não merecem
provimento.” (Apelação Cível Nº 0414377-3, Nona
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Paraná, Relator:
Tufi Maron Filho, Julgado em 04/10/2007)
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso Especial n°. 210101 PR, pelo Relator Ministro CARLOS FERNANDO
MATHIAS, entendeu pela majoração da indenização por dano moral, levando
em consideração que deveria ser utilizado o critério da condição pessoal e
econômica das partes, bem como a finalidade de desestimulo para que o
ofensor não venha a praticar o mesmo ilícito.
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE
CIVIL. DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO
COM VÍTIMA FATAL. ESPOSO E PAI DAS AUTORAS.
IRRELEVÂNCIA DA IDADE OU ESTADO CIVIL DAS
FILHAS DA VÍTIMA PARA FINS INDENIZATÓRIOS.
LEGITIMIDADE ATIVA. QUANTUM DA INDENIZAÇÃO.
VALOR IRRISÓRIO. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE.
DESPESAS DE FUNERAL. FATO CERTO.
MODICIDADE DA VERBA. PROTEÇÃO À DIGNIDADE
HUMANA. DESNECESSIDADE DE PROVA DA SUA
REALIZAÇÃO.
1. É presumível a ocorrência de dano moral aos filhos
pelo falecimento de seus pais, sendo irrelevante, para fins
de reparação pelo referido dano, a idade ou estado civil
dos primeiros no momento em que ocorrido o evento
danoso (Precedente: REsp n.º 330.288/SP, Rel. Min. Aldir
Passarinho Júnior, DJU de 26/08/2002) 2. Há, como
bastante sabido, na ressarcibilidade do dano moral, de
um lado, uma expiação do culpado e, de outro, uma
satisfação à vítima. 3. O critério que vem sendo utilizado
43
por essa Corte Superior na fixação do valor da
indenização por danos morais, considera as condições
pessoais e econômicas das partes, devendo o
arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade,
atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada
caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do
ofendido, bem como que sirva para desestimular o
ofensor a repetir o ato ilícito. 4. Ressalte-se que a
aplicação irrestrita das "punitive damages" encontra óbice
regulador no ordenamento jurídico pátrio que,
anteriormente à entrada do Código Civil de 2002, vedava
o enriquecimento sem causa como princípio informador
do direito e após a novel codificação civilista, passou a
prescrevê-la expressamente, mais especificamente, no
art. 884 do Código Civil de 2002. 5. Assim, cabe a
alteração do quantum indenizatório quando este se
revelar como valor exorbitante ou ínfimo, consoante
iterativa jurisprudência desta Corte Superior de Justiça. 6.
In casu, o tribunal a quo condenou os recorridos ao
pagamento de indenização no valor de 10 salários
mínimos a cada uma das litisconsortes, pela morte do pai
e esposo das mesmas que foi vítima fatal de
atropelamento pela imprudência de motorista que
transitava em excesso de velocidade pelo acostamento
de rodovia, o que, considerando os critérios utilizados por
este STJ, se revela extremamente ínfimo. 7. Dessa forma,
considerando-se as peculiaridades do caso, bem como os
padrões adotados por esta Corte na fixação do quantum
indenizatório a título de danos morais, impõe-se a
majoração da indenização total para o valor de R$
100.000,00 (cem mil reais), o que corresponde a R$
25.000,00 (vinte e cinco mil reais) por autora. 8. Encontra-
44
se sedimentada a orientação desta Turma no sentido de
que inexigível a prova da realização de despesas de
funeral, em razão, primeiramente, da certeza do fato do
sepultamento; em segundo, pela insignificância no
contexto da lide, quando limitada ao mínimo previsto na
legislação previdenciária; e, em terceiro, pelo relevo da
verba e sua natureza social, de proteção à dignidade
humana (Precedentes: REsp n.º 625.161/RJ, Rel. Min.
Aldir Passarinho Júnior, DJU de 17/12/2007; e REsp n.º
95.367/RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJU de
03/02/1997) 9. Recurso especial provido.” (Recurso
Especial n°. 210101 PR, QUARTA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça, Relator: Ministro CARLOS
FERNANDO MATHIAS, Julgamento: 20/11/2008)
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso Especial n°. 467193 RJ, pelo Relator Ministro SIDNEI BENETI,
entendeu que a fixação do quantum indenizatório com o intuito de desestimular
a conduta agente do ato ilícito e evitar o enriquecimento sem causa.
“AGRAVO REGIMENTAL. PLANO DE SAÚDE.
ILEGALIDADE DA NEGATIVA DE COBERTURA A
TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO. DANO MORAL
CONFIGURADO. REDUÇÃO DO VALOR DA
INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO.
1.- É pacífica a jurisprudência da Segunda Seção no
sentido de reconhecer a existência do dano moral nas
hipóteses de recusa pela operadora de plano de saúde,
em autorizar tratamento a que estivesse legal ou
contratualmente obrigada, por configurar comportamento
abusivo, sem que, para tanto, seja necessário o reexame
de provas.
45
2.- A fixação dos danos morais no patamar de R$
6.000,00 (seis mil reais) cumpre, no presente caso, a
função pedagógico- punitiva de desestimular o ofensor a
repetir a falta, sem constituir, de outro lado,
enriquecimento indevido.
3.- Agravo Regimental improvido.” (Recurso Especial n°.
467193 RJ, TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de
Justiça, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Julgamento:
18/03/2014)
46
CONCLUSÃO
Apesar de não haver, no ordenamento jurídico brasileiro, a previsão
explícita da aplicação da indenização em caráter punitivo, a sua aplicação
deve ser considerada em razão da Constituição Federal consagrar o princípio
da dignidade humana e o direito da personalidade como fundamentos do
Estado Democrático de Direito.
Tais princípios tornam possível a aplicação da indenização punitiva do
dano moral nas relações de consumo, pois são direitos de natureza
fundamental, os quais garante a aplicação de todos os meios para a sua
proteção. Observa-se que, o entendimento da responsabilidade civil
tradicional, o que ainda é visto como aplicável por alguns doutrinadores, é no
sentido de que não importa qual foi o ato ilícito, o proveito obtido pelo lesador,
o valor da indenização é estabelecido pela extensão do dano, conforme
estipulado pelo artigo 944 do Código Civil.
Ocorre que, tal entendimento deve ser modificado e evoluído de
acordo com a evolução da sociedade, a fim de atender as necessidades dos
dias atuais, em razão de que muitas empresas continuaram lesando os
consumidores, logo que tiram proveito econômico da situação, da indenização
ser medida pela extensão do dano, o que deve ser revisto, logo que a simples
reparação do dano não é a medida adequada para inibição, prevenção de tal
conduta reprovável e inaceitável.
Outrossim, insta salientar que a aplicação da indenização punitiva não
tem o objetivo do enriquecimento sem causa, mas sim, atingir a capacidade
econômica do agente da conduta ilícita, para que cesse a prática do ato
lesivo.
47
Cabe ainda salientar que, para a aplicação da indenização punitiva
deve ser observado a ocorrência de dano moral, se o ofensor agiu com culpa
grave ou dolo e a obtenção de lucro com o ato ilícito a indenização punitiva, e
para a aplicação do quantum indenizatório tem que ser observado alguns
critérios, quais sejam, a condição econômica do ofensor, a gravidade do dano,
o grau de culpa, a compensação o lesado e ocasionar impacto no patrimônio
do agente causador do dano, com a finalidade pedagógica, objetivando a evitar
a reincidência da conduta danosa.
Assim, a responsabilidade civil atual, tende a buscar, não só a
reparação do dano, mas a sua prevenção, com o intuito de que o dano, não
venha a se consumir e não seja necessário a reparação, buscando, dessa
maneira se proteger o lesado e também o causador do dano, através da
aplicação do caráter punitivo do dano moral.
48
BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral E Indenização Punitiva. Rio
de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2009.
CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2011.
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo:
Editora Malheiros, 2004.
MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos a Pessoa Humana. São Paulo:
Editora Renovar, 2009.
CASTRO, Guilherme Couto de. A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito
Brasileiro. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1977.
AMARAL, Luiz Otavio de Oliveira. Teoria Geral do Direito do Consumidor. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
http://www.tjrj.jus.br/institucional/dir_gerais/dgcon/pdf/artigos/direi_civil/indeniza
cao_punitiva.pdf
http://academico.diretorio.fgv.br/wiki/Dano_Moral_Punitivo
49
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO
2
AGRADECIMENTO
3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I - O DANO MORAL 10
1.4- A evolução do dano moral nas relações de consumo no ordenamento
jurídico brasileiro 10
1.5- Conceito 12
1.6- Função e finalidade do dano moral 15
CAPÍTULO II - PUNITIVE DAMAGES 17
2.1- Origem 17
2.2- Conceito 17
CAPÍTULO III – A APLICABILIDADE DA INDENIZAÇÃO PUNITIVA NO
DIREITO BRASILEIRO 19
3.1- A terminologia “Indenização Punitiva” 19
3.2- A Responsabilidade Civil 20
3.3- A dicotomia Direito Penal – Direito Civil 24
3.4- A indenização punitiva na Legislação Brasileira 26
3.5- A proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade como
instrumentos da indenização punitiva 29
3.6- Finalidades e pressupostos da indenização punitiva 30
3.7- Do enriquecimento ilícito ou enriquecimento sem causa 33
3.9- Decisões jurisprudenciais 34
CONCLUSÃO 47
50
BIBLIOGRAFIA 49
ÍNDICE 50