dislexia e educação especial no brasil

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Dislexia e educação especial no Brasil 1. Introdução Estima-se que, no Brasil, cerca de 15 milhões de pessoas têm algum tipo de necessidade especial. As necessidades especiais podem ser de diversos tipos: mental, auditiva, visual, físico, conduta ou deficiências múltiplas. Deste universo, acredita-se que, pelo menos, noventa por cento das crianças, na educação básica, sofram com algum tipo de dificuldade de aprendizagem relacionada à linguagem: dislexia, disgrafia e disortografia. Entre elas, a dislexia é a de maior incidência e merece toda atenção por parte dos gestores de política educacional, especialmente a de educação especial. A dislexia é a incapacidade parcial de a criança ler compreendendo o que se lê, apesar da inteligência normal, audição ou visão normais e de serem oriundas de lares adequados, isto é, que não passem privação de ordem doméstica ou cultural. Encontramos disléticos em famílias ricas e pobres. Enquanto as famílias ricas podem levar o filho a um psicólogo, neurologista ou psicopedagogo, uma criança, de família pobre, estudando em escola pública, tende a asseverar a dificuldade persistir com o transtornos de linguagem na fase adulta. Talvez, por essa razão, isto é, por uma questão de classe social, a dislexia seja uma doença da classe média, exatamente porque, temporão, os

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Page 1: Dislexia e educação especial no Brasil

Dislexia e educação especial no Brasil

1. Introdução

Estima-se que, no Brasil, cerca de 15 milhões de pessoas têm algum tipo de necessidade

especial. As necessidades especiais podem ser de diversos tipos: mental, auditiva,

visual, físico, conduta ou deficiências múltiplas. Deste universo, acredita-se que, pelo

menos, noventa por cento das crianças, na educação básica, sofram com algum tipo de

dificuldade de aprendizagem relacionada à linguagem: dislexia, disgrafia e

disortografia. Entre elas, a dislexia é a de maior incidência e merece toda atenção por

parte dos gestores de política educacional, especialmente a de educação especial.

A dislexia é a incapacidade parcial de a criança ler compreendendo o que se lê, apesar

da inteligência normal, audição ou visão normais e de serem oriundas de lares

adequados, isto é, que não passem privação de ordem doméstica ou cultural.

Encontramos disléticos em famílias ricas e pobres.

Enquanto as famílias ricas podem levar o filho a um psicólogo, neurologista ou

psicopedagogo, uma criança, de família pobre, estudando em escola pública, tende a

asseverar a dificuldade persistir com o transtornos de linguagem na fase adulta. Talvez,

por essa razão, isto é, por uma questão de classe social, a dislexia seja uma doença da

classe média, exatamente porque, temporão, os pais conseguem diagnosticar a

dificuldade e partir para intervenções médicas e psicopedagógicas.

2. A Dislexia e a educação especial

No âmbito das instituições da Educação Básica, no Brasil, relatos de professores

registram situações em que crianças, aparentemente brilhantes e muito inteligentes, não

podem ler, escrever nem têm boa ortografia para idade. Nos exames vestibulares, as

comissões executivas descrevem casos "bizarros" (às vezes, motivo de chacotas) em que

candidatos apresentam baixo nível de compreensão leitora ou a ortografia ainda é

fonética (baseada na fala) e inconstante.

Assim, urge a realização de testes de leitura nas escolas públicas e privadas, desde cedo,

de modo a diagnosticar e avaliar a dificuldade de leitura.

Por trás do fracasso escolar ou da evasão escolar, sempre há fortes indícios de

dificuldades de aprendizagem relacionadas à linguagem. Nos casos de abandono

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escolar, em geral, também, verificamos crianças que deixam a escola por enfrentarem

dificuldades de leitura e escrita.

A dispedagogia, isto é, o desconhecimento por parte dos professores, pais e gestores

educacionais, do que é a dislexia e suas mazelas na vida das crianças e dos adultos

também só piora a aprendizagem da leitura de seus alunos. Infelizmente, a legislação

educacional (CF, LDB, resoluções etc) não trata as diversas necessidades especiais dos

educandos de forma clara, objetiva, pragmática e programática. Sua omissão tem de

certa forma dificultado ações governamentais por parte dos gestores, do professor ao

secretário de educação. A Constituição Federal, por exemplo, ao tratar sobre a educação

especial diz: " O dever do estado com a educação será efetivado mediante a garantia de

atendimento educacional especializada aos portadores de deficiência, preferencialmente

na rede regular de ensino"(Artigo 208, III, CF). E perguntaria ao leitor: uma criança,

com dislexia, isto é, com dificuldade de ler bem, é um portador de deficiência? Claro

que não. A Lei 9.394/96, a de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, apresenta uma

melhor redação sobre a matéria. Diz assim: " O dever do estado com a educação escolar

pública será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado

gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular

de ensino" (Art. 4º, LDB). Melhorou e, em muito, porque faz referências às

necessidades especiais.

Chegamos, por dedução ou exegese jurídica, à conclusão de que a dislexia é uma

necessidade especial. Mas qual a natureza dessa necessidade especial? Por exclusão,

diríamos que uma criança com dislexia não é portadora de deficiência nem mental,

física, auditiva, visual ou múltipla. O disléxico, também, não é uma criança de alto

risco. Uma criança não é disléxica porque teve seu desenvolvimento comprometido em

decorrência de fatores como gestação inadequada, alimentação imprópria ou nascimento

prematuro. A dislexia tem um componente genético, exceto em caso de acidente

cérebro-vascular (AVC).

Ser disléxico é condição humana. O disléxico pode, sim, ser um portador de alta

habilidade. Daí, em geral, os disléticos, serem talentosos na arte, música, teatro,

deportes, mecânica, vendas, comércio, desenho, construção e engenharia. Não se

descarta ainda que venha a ser um superdotado, com uma capacidade intelectual

singular, criativo, produtivo e líder. O disléxico pode, também, ser um portador de

conduta típica, com síndrome e quadro de ordem psicológica, neurológica e lingüística,

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de modo que sua síndrome compromete a aprendizagem eficaz e eficiente de leitura e

escrita, mas não chega a comprometer seus ideais, idéias, talentos e sonhos. Por isso,

diagnosticar, avaliar e tratar a dislexia, conhecer seu tipo, sua natureza, é um dever do

Estado e da Sociedade e um direito de todas as famílias com crianças disléxicas em

idade escolar.

3. A Dislexia e a delinqüência juvenil

Uma dificuldade de leitura pode levar uma criança à delinqüência juvenil? Cremos que

sim. Há uma relação muito estreita entre leitura e pensamento, entre leitura e atitude e

mais estreita ainda é a relação entre rechaço e maus leitores, de que modo que as

investigações recentes, na psicopedagogia, apontam para um grau de contiguidade entre

leitura e delinqüência juvenil.

O comportamento do delinqüente, no meio escolar, em geral está associado com

alguma dificuldade de aprendizagem relacionada linguagem. As crianças com

dificuldade parcial de ler bem, quase sempre, são alunos isolados, mas alunos que

procuram superar suas limitações lingüísticas com comportamentos mais agressivos,

rebeldes e violentos.

As notas baixas nas disciplinas escolas refletem muito as limitações cognitivas e

lingüísticas dos maus leitores, mas a destreza no esporte, na arte, muitas vezes podem,

doutra sorte, revelar um sentimento de rebeldia que pode perdurar na fase adulta. Não

há aqui, intenção de estabelecer dicotomia ou maniqueísmo, todavia os maus leitores

são potencialmente os alunos que mais oferecerão problemas de indisciplina ao setor

psicopedagógico da escola.

Durante dois anos observamos e constatamos que as dificuldades de leitura e a

delinqüência juvenil são tipos de problemas que caminham juntos e, portanto, exigem

uma intervenção por parte dos agentes e autoridades educacionais. Uma política de

leitura não apenas compensaria o déficit cultural dos alunos como também iria engajá-

los no discurso da sociedade da informação.

Enquanto isso, sobra a difícil tarefa de domesticação de atitudes dos alunos por parte

dos abnegados professores, em particular, os da rede pública de ensino, que se deparam

hoje não apenas com dificuldades domésticas, materiais e pedagógicas nas salas de aula,

mas têm , também, como tarefa árdua o enfrentamento da questão social a que a escola

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pública está inserta. Refiro-me à delinqüência juvenil revelada na gangs e nas

brincadeiras violentas e agressivas no meio escolar.

Muitos alunos cometem atos anti-sociais não porque são pobres ou por passarem

privação cultural, e sim, porque, estando nas escolas (sejam públicas ou não), não têm

rendimento escolar e padecem com transtornos de linguagem como as dificuldades de

ler e escrever bem e, conseqüentemente, têm baixo rendimento na avaliação escolar.

Quanto mais a criança é inculta, mais propensa à violência por motivos frívolos e

banais. Quanto mais a criança é arisca, mais tímida para os embates da vida.

Na minha rápida passagem pela rede estadual de ensino, tomei algumas providências

iniciais para o trabalho com os alunos agressivos e com problemas de conduta: a

primeira, conhecer seus pais e conhecendo sua família ter uma "etiologia" mais clara e

definida da forma de intervenção pedagógica a tomar com relação ao educando; a

segunda providência foi a de levar meu aluno à consciência de suas limitações

cognitivas, de natureza secundária, e mostrar-lhes, por exemplo, que, através de uma

boa orientação ou reeducação da leitura, poderiam mudar as próprias atitudes, ideais

aspirações pessoais e, finalmente, promover através da leitura aquisição de

conhecimentos e a integração social. Quanto mais a criança compreende

ideologicamente o mundo mais se envolve com uma práxis da concidadania e se

inquieta com as questões de ordem social.

Os alunos com dificuldades de leitura e, a cada tentativa, frustrados, são levados a

gazear aulas e a freqüentar companhias indesejáveis. Um aluno que fracassa na leitura,

fracassa também na hora de ler um problema na matemática ou na hora de fazer um

exercício de gramática. Um aluno que fracassa na leitura não encontra sentido algum em

ler um Machado de Assis ou ler os versos de um Camões que estão parafraseados na sua

canção predileta de Legião Urbana. Um aluno que constantemente fracassa é empurrado

de forma perversa para a delinqüência.

Uma última palavra: a privação da leitura interfere no desenvolvimento da

personalidade dos alunos. Um aluno com deficiência de leitura é triste e deprimido,

agressivo e angustiado, potencialmente um delinqüente.

Numa sociedade de informação, ler ou escrever bem é condição de superação da

desigualdade social: se alguns duvidam da tese, eis a rede mundial de computadores

Page 5: Dislexia e educação especial no Brasil

revelando um mundo de novas ocupações fundadas na fluência verbal e na comunicação

eficaz. Se desejarem, voltaremos ao assunto.

A dislexia e a intervenção pedagógica nos últimos sete anos, venho desenvolvendo

estudos sobre a contribuição da lingüística para o diagnóstico da dislexia e intervenção

pedagógica.

A dislexia é uma síndrome pouco conhecida e pouco diagnosticada por pais e

educadores, especialmente os pedagogos e médicos, que se voltam ao desenvolvimento

cognitivo das crianças na educação básica (educação infantil, ensino fundamental e

ensino médio).

A dislexia é uma perturbação ou transtorno ao nível de leitura. A criança disléxica é um

mau leitor: é capaz de ler, mas não é capaz de entender eficientemente o que lê.

O que nos chama atenção, à primeira vista, é que uma criança disléxica é inteligente,

habilidosa em tarefas manuais, mas persiste um quadro de dificuldade de leitura da

educação infantil à educação superior.

Minha estimativa, por baixo, é a de que, no Brasil, pelo menos, 15 milhões crianças e

jovens sofram com distúrbios de letras. Creio que a dislexia é a maior causa do baixo

rendimento escolar.

A linguagem é fundamental para o sucesso escolar. Ela está presente em todas as

disciplinas e todos os professores são potencialmente professores de linguagem, porque

utilizam a língua materna como instrumento de transmissão de informações.

Muitas vezes uma dificuldade no ensino da matemática está relacionada à compreensão

do enunciado do que ao processo operatório da solução do problema.

Os disléxicos, em geral, sofrem com a discalculia (dificuldade de calcular) porque

encontram dificuldade de compreender os enunciados das questões.

É necessário que diagnóstico da dislexia seja precoce, isto é, os pais e educadores se

preocupem em encontrar indícios de dislexia em crianças aparentemente normais, já nos

primeiros anos de educação infantil, envolvendo as crianças de 4 a 5 anos de idade.

Quando não se diagnostica a dislexia, ainda na educação infantil, os distúrbios de letras

podem levar crianças de 8 a 9, no ensino fundamental, a apresentar perturbações de

ordem emocional, efetiva e lingüística.

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Uma criança disléxica encontra dificuldade de lê e as frustrações acumuladas podem

conduzir a comportamentos anti-sociais, à agressividade e a uma situação de

marginalização progressiva.

Os pais, professores e educadores devem estar atentar a dois importantes indicadores

para o diagnóstico precoce da dislexia: a história pessoal do aluno e as suas

manifestações lingüísticas nas aulas de leitura eescrita.

Quando os professores se depararem com crianças inteligentes, saudáveis, mas com

dificuldade de ler e entender o que lê, devem investigar imediatamente se há existência

de casos de dislexia na família. A história pessoal de um disléxico, geralmente, traz

traços comuns como o atraso na aquisição da linguagem, atrasos na locomoção e

problemas de dominância lateral.

Os dados históricos de dificuldades na família e na escola poderão ser de grande

utilidade para profissionais como psicólogos, psicopedagogos e neuropsicólogos que

atuam no processo de reeducação lingüística das crianças disléxicas.

No plano da linguagem, os disléxicos fazem confusão entre letras, sílabas ou palavras

com diferenças sutis de grafia como "a-o", "e-d", "h-n" e "e-d", por exemplo.

As crianças disléxicas apresentam uma caligrafia muito defeituosa, verificando-se

irregularidade do desenho das letras, denotando, assim, perda de concentração e de

fluidez de raciocínio.

As crianças disléxicas apresentam confusão com letras com grafia similar, mas com

diferente orientação no espaço como " b-d". "d-p", "b-q", "d-b", "d-p", "d-q", "n-u" e "a-

e". A dificuldade pode ser ainda para letras que possuem um ponto de articulação

comum e cujos sons são acusticamente próximos: "d-t" e "c-q", por exemplo.

Na lista de dificuldades dos disléxicos, para o diagnóstico precoce dos distúrbios de

letras, educadores, professores e pais devem ter atenção para as inversões de sílabas ou

palavras como "sol-los", "som-mos" bem como a adição ou omissão de sons como

"casa-casaco", repetição de sílabas, salto de linhas e soletração defeituosa de palavras.

Por fim, com os novos recursos da sociedade informática, pais e educadores devem

redobrar os cuidados. O mau uso do computador, por exemplo, pode levar a criança a

ter algum distúrbio de letras. Até agora, não há estudos científicos sobre o assunto, mas,

pelo relato de pais e professores, dirigidos ao meu site

(http://sites.uol.com.br/vicente.martins) , na Internet, revelam que posições pouco

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ergonômicas perante a um computador, pode comprometer o sistema perceptivo da

criança, levando à dificuldade de leitura e escrita.

Acredito também que o transporte inadequado de mochilas pode também comprometer

o sistema perceptivo da crianças, de modo a embaraçar sua visão na hora de ler ou

escrever.

4. A dislexia e o Projeto Genoma Humano

A dislexia é um problema que se detecta em crianças que sofrem dificuldades de leitura.

Os testes psicopedagógicos, com uma relativa precisão, diagnosticam as dificuldades de

aprendizagem relacionadas à linguagem. Todavia, qual a origem da dislexia ou das

dislexias? Os maus leitores são conseqüências de maus métodos do ensino da leitura? A

dislexia é hereditária?

Há uma lista interminável de causas atribuídas à dislexia. Psicólogos, oftalmologistas,

neurologistas, neuropsicólogos, pediatras, pedagogos, psicopedagogos, lingüistas,

neurolingüistas e psicolingüistas, todos têm uma explicação ou uma etiologia da

dislexia, apontando, entre outros fatores, problemas sócio-efetivos, visuais, auditivos,

motores, neurológicos, fonológicos e, agora, com o Projeto Genoma Humano,

geneticistas europeus acreditam que as alterações cromossômicas estão associadas ao

transtorno da leitura.

Como lingüista, tenho uma forte inclinação para considerar que as dificuldades de

leitura são problemas de consciência fonológica das crianças, na educação infantil e no

processo de alfabetização escolar, indicando o déficit lingüístico como a principal causa

da dislexia.

Minha investigação sobre o assunto, nos últimos sete anos, revela que a incapacidade do

reconhecimento dos fonemas e letras é um componente que pesa muito na hora de a

criança ler e compreender o que lê ou no simples ato lingüístico de soletrar palavras.

Sem embargo, confesso que me rendo às recentes descobertas dos quatro genes ligados

à dislexia.

Chega-nos, através da revista britânica Journal Of Medical Genetics, a informação de

que são quatro os genes de suscetibilidade à dislexia: o DYX1, o DYX2, o DYX3 e o

DYX4. Observem que determino cada gene, antepondo o artigo definido em todos os

símbolos genéticos, o que significa que já foram localizados e mapeados pelos

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pesquisadores. São genes em diferentes posições, o que nos leva a suspeitar do caráter

heterogêneo dos transtornos de leitura.

O gene de descoberta mais recente é o DYX3, do cromossomo 2, que vem merecendo

especial atenção dos estudiosos na área de Linguagem, especialmente os neurolingüistas

e psicolingüistas, por ser resultado de uma pesquisa levada a cabo pelo doutor Toril

Fagerheim, do Hospital Universitário de Tromsoe, na Noruega. O doutor Fagerheim

coordenou uma equipe multinacional de médicos e descobriu o gene DYX3 após

estudar 36 membros de uma família noruega com antecedentes de dislexia.

O segundo passo agora é clonagem dos genes. Clonando o gene DYX3, os geneticistas

poderão demonstrar a natureza e a freqüência dos genes envolvidos nas alterações de

leitura e linguagem.

A descoberta do gene e de seu funcionamento é de extrema importância para a

pedagogia da leitura. Uma vez sendo identificado um gene ligado à dislexia, na criança

em idade escolar, provavelmente não poderemos, ainda, oferecer uma cura, não

obstante, para a pediatria ou neurologia a intervenção médica será reorientada e os

professores, por sua vez, poderão intervir pedagogicamente, isto é, de forma mais

individual, precisa e eficaz, no processo de aprendizagem da leitura.

Certo é que os pesquisadores do Projeto Genoma Humano descobrem, a cada momento,

que não existem mais dúvidas de que componentes genéticos estão envolvidos com os

transtornos de leitura e escrita. Os médicos e os profissionais da educação escolar se

rendem também à biotecnologia.

Uma outra pesquisa, não menos importante do que a de Toril Fagerheim, está sendo

feita pelo neuropsicólogo Frank Wood, da Universidade de Forest Wake, e revela que

outros cromossomos (6, 1,2 e 15) têm relações com a inabilidade de algumas crianças

no processamento do texto.

Estas descobertas genômicas, no momento, levam-nos a especulações de diversas

ordens. Uma delas é a implicação ética do fazer pedagógico. É bem provável que, no

futuro, a identificação dos leitores será feita através de um microchip, que descreverá

nossos defeitos e qualidades nas habilidades lingüísticas (leitura, escrita, fala e escuta).

Estamos aqui a esperar que a lingüística se transforme em uma biotecnolingüística(o

neologismo é meu) em que a dificuldade de leitura não será mais chamada de dislexia e

sim, simplesmente, desordem genética.

Page 9: Dislexia e educação especial no Brasil

A intervenção na reeducação das crianças disléxicas passa necessariamente no ensino

eficaz da língua materna. No caso do Brasil, no ensino eficiente da língua portuguesa.

É sempre útil começar um texto com perguntar. É a forço da ontologia que orienta a

prática dos docentes. Eis, assim, as três questões básicas para nossa reflexão sobre a

temática do ensino do português no âmbito da educação básica:

– Por que a língua portuguesa deve ser ensinada na escola, se as pessoas,

independentemente de escola, já falam o "Português" na rua, em casa, nos estádios de

futebol?

– Se é papel da escola o ensino do português, que português deve ser ministrado nos

bancos escolares?

-Que diz a LDB sobre o valor da língua materna no processo de formação escolar?

Comecemos, então, pela última indagação.

A Lei Federal 9.394/96 (a LDB), de 20 de dezembro de 1996, estabelece a seguinte

composição dos níveis escolares: I – Educação Básica, formada pela educação infantil,

ensino fundamental e ensino médio e II – Educação Superior. Não devemos, pois, falar

em 1º grau, mas em ensino fundamental, ou 2º graus, mas ensino médio. É uma

atualização terminológica que se faz necessária.

Como componente do Currículo da Educação Básica, a língua portuguesa e uma

disciplina obrigatória. A Lei determina que o estudo da língua portuguesa (e matemática

também) deva abranger, obrigatoriamente, o currículo do ensino fundamental e médio

(Art. 26). Este português é o erudito, histórico, oficial, e de raízes européias.

Especificamente para o ensino fundamental, o domínio da leitura e da escrita são meios

básicos para o desenvolvimento da capacidade de aprender nos oito anos de ensino

obrigatório.

O currículo do ensino médio, por sua vez, aponta a língua portuguesa como: a)

instrumento de comunicação; b) acesso ao conhecimento e c) exercício de cidadania.

Vejam, então, a grande missão da escola após onze anos de formação escolar: deve

deixar seus alunos prontos para a plena comunicação e expressão verbal, hábeis para

acessar os novos meios de comunicação, particularmente, a linguagem informática, e

desenvolver consciência critica para enfrentar o mundo do trabalho e os desafios das

novas formas de ocupação da sociedade pós-industrial.

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Agora, vocês poderão me colocar os limites da escola: os limitados recursos materiais e

humanos.. Entre os materiais, a carência de bom material didático-pedagógico para

alunos e professores, o espaço físico das salas de aula, a questão da merenda escolar nas

escolas públicas, entre outras dificuldades. Do outro lado, a má formação de nossos

professores e professoras, uns sem uma educação superior, outros sem ter passado por

uma pós-graduação, a questão salarial, enfim.

Muitos problemas na escola não são da escola, mas da sociedade e, sendo assim, eis um

desafio para a comunidade escolar: o equilíbrio, a solidariedade de todos que fazem a

comunidade escolar, isto é, professores, alunos, diretores, pais, governos e todos que

direta e indiretamente estão ligados à escola.

Mas, em todo caso, imaginemos uma situação mínima para começar (e enquanto a

mobilização nas instâncias reivindicatórias) e, seja como for, devemos dar o primeiro

passo.

A escola também, não deve esquecer que para alguns desafios pode contar como outros

parceiros, como as universidades públicas, que, em muito ode ajudar, por exemplos, no

processo de formação dos docentes e na abertura de entrosamente entre escola,

universidade e governo. A universidade é, quase sempre, uma excelente parceira na

intermediação entre escola e governo.

Do ponto de vista didático, os primeiros passos para o trabalho com a língua portuguesa

estão bem traçados hoje nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), do MEC. É

possível, mesmo em condições materiais e humanas mínimas, se fazer um trabalho

razoável com a língua portuguesa. Nesse caso, trabalharemos com o uso e a reflexão da

língua materna.

Para um sistema que tende a ser organizado em ciclos, o uso deverá ser trabalhado no

primeiro ciclo (1ª e 2ª séries) e a reflexão no 2º ciclo (3ª e 4ª séries).

O uso da língua como objeto de estudo do português pressupõe respeito à fala que a

criança traz à escola, isto é, papel da escola ensinar a língua portuguesa respeito o

português familiar que o aluno da interação no meio em que vive. A

A reflexão também leva em conta o que a criança traz de sua família e de sua vida fora

da escola e seu estudo leva a uma consciência dos processos de aquisição de linguagem

como leitura e escrita. Uso e reflexão lingüística andam sempre juntos no processo

ensino e aprendizagem da língua portuguesa.

Page 11: Dislexia e educação especial no Brasil

Para o trabalho com o uso e a reflexão da língua portuguesa, reonhcê-lo como língua

histórica é fundamental. Situá-la no nosso tempo e em outros estilos de época é salutar

para que as crianças percebam o portquês das diferenças do nosso português

comparados ao francês, italiano, espanhol, das semelhanças e desemelhanças

lingüísticas e, sendo todas línguas-irmãs e filhas e do Latim, língua falada na idade

medieval.

Além da visão hist´rica da língua materna, o professor deve tertr uma visão científica de

sua língua portuguesa. Assim, Ter informação científica, com base na ciência da

linguagem, a Lingüística, se faz imperiosa, especialmente na educação infantil e no

processo de alfabetização escolar, iou para colocar uma palavrinha mais hodiena, a

leituralização escolar.

Inciar o aluno no processo deleituriz\ação ou letramento sob a édigde da Lingüística é

importante para o professor porqwuer lhe dá segurança na tyrsnasmissão dos saberes e

para o aluno garante uma aquisição menos arbitária e mais consciente. Aí, muitas coisa

vão acontecer se o professor (ou professora) passar a Ter uma postura lingüística em

sala.

5. A dislexia e o ensino da lectoescrita

Cumpre-nos, agora, provocar algumas reflexões pertinentes a este momento muito

especial de início de século. Qual o papel do professores, pedagogos, psicopedagogos,

lingüistas, psicolingüistas no ensino da leitura, na perspectiva de trabalho com os bons e

maus leitores?

Surge, agora, no meio universitário, uma atmosfera acadêmica de especulações sobre a

atuação dos de magistério no novo milênio. Assim, gostaria de, nesse clima, especular

um pouco sobre a atuação dos profissionais de Letras na sociedade pós-industrial.

De logo, levanto algumas questões fundamentos para nossa reflexão: teremos nós,

educadores e letrados, espaço profissional na sociedade informática? O ensino de

línguas sobreviverá ao desenvolvimento tecnológico persistindo o modelo trabalhado

hoje em nossas salas de aula? E como fica a situação dos professores da rede pública de

ensino, enquanto servidores estaduais, portanto, participante da estrutura do poder

público, na nova organização do capitalismo pós-industrial?

Para responder a estas questões, permitam-me que me aproprie de três referências

teóricas para esta reflexão, a saber: Capitalismo desorganizado, de Claus Offe

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(Brasiliense), A sociedade de informática, de Adam Schaff (Brasiliense) e O Culto da

Informação, de Theodore Roszak (Brasiliense).

Com certeza, na sociedade informática, nós, profissionais de Letras, não vamos

desaparecer enquanto especialistas do ensino de línguas materna e estrangeira.

Perderemos, sim, a natureza do nosso trabalho que vai transcender os limites escolares e

chegará ao novo mercado de trabalho, isto é, o mercado de serviços. Claus Offe diz que

nesse processo passaremos a participar de uma espécie de "classe de serviços".

É possível, porém, que haja uma perda de identidade histórica de "professor" e com ela

todas as prerrogativas inerentes à tradição do magistério (aposentadoria especial, por

exemplo) e passaremos a ser instrutores de português, inglês, etc. atendendo a uma

clientela muito variada que vai da formação de um profissional de instrução de escolar

ao guia de turismo.

No que toca ao mercado de trabalho, o que eqüivale a dizer espaço de atuação

profissional de Letras, no século XXI, as expectativa são otimistas, melhor dizendo, são

predominantemente otimistas, pelas seguintes razões:

A sociedade informática carecerá cada vez mais de instrutores (ou professores) de

símbolos e signos lingüísticos e que lidem com pessoas na perspectiva de atenuar o

trabalho individual, pesado, da produção de material,; será intensificada o treinamento

das habilidades associadas à Escrita e à Leitura (lamentavelmente, em detrimento da

Fala e da Escuta, duas habilidades fundamentais na comunicação social) e os

profissionais de Letras atuarão na formação de trabalho (na área de turismo, em

particular, uma vez que na sociedade informática as pessoas terão mais tempo para o

lazer) resultante da política social provocada pelo Estado de Bem-Estar Social que vai

procurar evitar a crise do desempenho estrutural. Em resumo, ganharemos muito com a

chamada expansão do setor de serviços.

A demanda por serviços na área de Letras continuará a crescer como, por exemplo, o de

retreinamento ocupacional através de cursos por correspondência de leitura e escrita e

cursos de línguas. É uma realidade que, nós, professores e alunos, já no início deste

século, já nos comuniquemos mais intensamente em nossas próprias casas através de

nossas webmails.

É possível imaginarmos ainda a seguinte situação virtual para o futuro dos letrados, já

com indícios de práxis bastante reais nos nossos dias: o professor de Português, em

Page 13: Dislexia e educação especial no Brasil

particular de Redação escrita, não só dando notas aos alunos eletronicamente mas

também se comunicando com eles a qualquer hora do dia ou da noite e, talvez,

observando, via on-line, se um texto está sendo bem estruturado, obedecendo uma

planilha previamente negociada entre professor e aluno e processado tudo na tela do

vídeo, fazendo sugestões que possam auxiliar à distância.

A escrita, na perspectiva de um Theodore Roszak, exigirá a intervenção docente uma

vez que qualquer tentativa randômica, isto é, de produção textual aleatória, comunicará

palavras, informações, menos idéias e significados que levem em conta as intenções do

emissor. E nós, sabemos que, por trás de um texto bem escrito, exige muito suor, muito

ziguezague, ida e volta e um olhar, uma leitura preliminar do professor e seu jeito de

acompanhar o sucesso ou o insucesso do aluno tem muito a ver com a aprendizagem.

O ensino de línguas, da escrita, em particular, exige da escola do futuro o professor nos

moldes modernos de hoje: observador, leitor das intenções dos alunos e seu maior

interlocutor. Enfim: a escrita e a leitura são duas habilidades escolares que trazem

consigo uma espontaneidade biológica, dependem de um fluxo natural, numa palavra:

dependem do diálogo humano livre.

Se analisarmos o contexto da sociedade informática sob a ótica capitalista, ou melhor,

dos fabricantes dos computadores, a situação do ensino da Escrita e da Leitura, no

século XXI, será avassaladora: os computadores farão tudo, inclusive ajudar na

produção significativa de um texto escolar. No entanto, há nessa especulação mais

folclore do que verdade.

De qualquer maneira, sua propaganda no meio escolar poderá trazer conseqüências

funestas, entre as quais a de fazer que um profissional, por exemplo, letrado, creia que a

escrita pode ser realmente, uma questão de processamento de informação e não de

idéias e mais uma vez reafirmo: um texto vai além de informações.

A sintaxe de um texto não é apenas uma relação sintagmática de, substantivos e

adjetivos, verbos e sujeitos, mecânica; daí, dificilmente os computadores esgotarem, no

futuro, todas as possibilidades de relações de interdependência da frase (concordância,

regência e colocação) porque mais do que coerência de regras ou de imposição de

normas ou coerções gramaticais há intenção, estilo, de natureza imaginativa, criativa,

subjetiva e que surpreende todas as determinações da realidade objetiva ou descritiva.

Para não demorar mais sobre essas especulações, diria que está claro que, no Século

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XXI, profissionais que hoje estão se formando em Filosofia, História e Letras terão

grande espaço no mercado de trabalho.

Seremos nós, que dentro ou fora da escola, auxiliaremos as pessoas a perguntarem sobre

as suas perspectivas de vida e nós, de Letras, seremos ainda mais significativos, porque

todas as profissões do futuro são baseadas no literacy (capacidade de ler e escrever).

Por fim, diria que somente com a lectoescrita, isto é, com as habilidades de leitura e

escrita, as pessoas serão capazes de superar as dificuldades de aprendizagem

relacionadas à linguagem (dislexia, disgrafia e disortografia), de acessar os livros, as

idéias dos livros contidas ou não nos computadores, insights éticos e visão social do

mundo que a lógica da inteligência artificial não conseguirá decifrar a partir de um

rubor, de uma piscadela ou de um gaguejar que revelem a natureza do problema do

estudante e sejam ponto de partida para o magistério do professor-aluno.

6. A dislexia e a formação dos docentes

Os docentes das crianças disléxicas são aqueles que, além da competência, habilidade

interpessoal, equilíbrio emocional, tem a consciência de que mais importante do que o

desenvolvimento cognitivo é o desenvolvimento humano e que o respeito às diferenças

está acima de toda pedagogia..

Eis então os dez passos na direção de uma pedagogia do desenvolvimento das crianças

disléxicas

1º - Aprimorar o educando como pessoa humana – A nossa grande tarefa como

professor ou educador não é a de instruir, mas a de educar nosso aluno como pessoa

humana, como pessoa que vai trabalhar no mundo tecnológico, mas povoado de

corações, de dores, incertezas e inquietações humanas.

A escola não pode se limitar a educar pelo conhecimento destituído da compreensão do

homem real, de carne e osso, de corpo e alma.

De nada adianta o conhecimento bem ministrado em sala de aula, se fora da escola, o

aluno se torna um homem brutalizado, desumano e patrocinador da barbárie.

Educamos pela vida como perspectiva de favorecer a felicidade e a paz entre os

homens.

2º - Preparar o educando para o exercício da cidadania – Se de um lado,

primordialmente, devemos ter como grande finalidade do nosso magistério o ministério

Page 15: Dislexia e educação especial no Brasil

de fazer o bem às pessoas, fazer o bem é preparar nosso para o exercício exemplar e

pleno da cidadania.

O cidadão não começa quando os pais registram seus filhos no cartório nem quando os

filhos, aos dezoito anos, tiram suas carteira de identidade civil, a cidadania começa na

escola, desde os primeiros anos da educação infantil e se estende à educação superior,

nas universidades; começa com o fim do medo de perguntar, de inquirir o professor, de

cogitar outras possibilidades do fazer, enfim, quando o aluno aprende a fazer fazer, a

construir espaço de sua utopia e criar um clima de paz e bem-estar social, política e

econômico no meio social.

3º - Construir uma escola democrática – A gestão democrática é a palavra de ordem na

administração das escolas. Os educadores que atuarão no novo milênio devem ter na

gestão democrática um princípio em que não arredam pé, não abrem mão.

Quanto mais a escola for democrática, mais transparente. Quanto mais a escola é

democrática, menos erra, tem mais acerto e possibilidade de atender com eqüidade as

demandas sociais. Quanto mais exercitamos a gestão democrática nas escolas, mais no

preparamos para a gestão da sociedade política e civil organizada.

Aqui, pois, reside uma possibilidade concreta: chegar à universidade e concluir um

curso de educação superior e estar preparado para tarefas de gestão na governo do

Estado, nas prefeituras municipais e nos órgãos governamentais.

Quem exercita a democracia em pequenas unidades escolares, constrói um espaço

próprio e competente para assumir responsabilidades maiores na estrutura do Estado.

Portanto, quem chega à universidade não deve nunca descartar a possibilidade de

inserção no meio político e poder exercitar a melhor política do mundo, a democracia.

4º - Qualificar o educando para progredir no mundo do trabalho – Por mais que a escola

qualifique seus recursos humanos, por mais que adquira o melhor do mundo

tecnológico, por mais que atualize suas ações pedagógicas, era sempre estará marcando

passo frente às novas transformações cibernéticas, mas a escola, através de seus

professores, poderá qualificar o educando para aprender a progredir no mundo do

trabalho, o que eqüivale a dizer a oferecer instrumentos para dar respostas, não acabadas

( porque a vida é processo inacabado) às novas demandas sociais, sem medo de perdas,

sem medo de mudar, sem medo de se qualificar, sem medo do novo, principalmente o

novo que vem nas novas ocupações e empregabilidade.

Page 16: Dislexia e educação especial no Brasil

5º - Fortalecer a solidariedade humana – É papel da escola favorecer a solidariedade,

mas não a solidariedade de ocasião, que nasce de uma catástrofe, mas do laço recíproco

e cotidiano e de amor entre as pessoas. A solidariedade que cabe à escola ensinar é a

solidariedade que não nasce apenas das perdas materiais, mas que chega como adesão às

causas maiores da vida, principalmente às referentes à existência humana.

Enfim, é na solidariedade que a escola pode desenvolver, no aluno-cidadão, o sentido de

sua adesão às causas do ser e apego à vida de todos os seres vivos, aos interesses da

coletividade e às responsabilidades de uma sociedade a todo instante transformada e

desafiada pela modernidade.

6º - Fortalecer a tolerância recíproca – Um dos mais importantes princípios de quem

ensina e trabalha com crianças, jovens e adultos é o da tolerância, sem o qual todo

magistério perde o sentido de ministério, de adesão aos processos de formação do

educando.

A tolerância começa na aceitação, sem reserva, das diferenças humanas, expressas na

cor, no cheiro, no falar e no jeito de ser de cada educando.

Só a tolerância é capaz de fazer o educador admitir modos de pensar, de agir e de sentir

que diferente dos de um indivíduo ou de grupos determinados, políticos ou religiosos.

7º - Zelar pela aprendizagem dos alunos – Muitos de nós professores, principalmente os

do magistério da educação escolar, acreditam que o importante, em sala de aula, é o

instruir bem, o que pode ser traduzido, ter domínio de conhecimento da matéria que

ministra aula.

No entanto, o domínio de conhecimento não deve estar dissociado da capacidade de

ensinar, de fazer aprender. De que adiante e conhecimento e não saber, de forma

autônoma e crítica, aplicar as informações?

O conhecimento não se faz apenas com metalinguagem, com conceitos a, b ou c, e sim,

com didática, com pedagogia do desenvolvimento do ser humano, sua mediação

fundamental.

O zelo pela aprendizagem passa pela recuperação daqueles que têm dificuldade de

assimilar informações, sejam por limitações pessoais ou sociais. Daí, a necessidade de

uma educação dialógica, marcada pela troca de idéias e opiniões, de uma conversa

colaborativa em que não se cogita o insucesso do aluno.

Page 17: Dislexia e educação especial no Brasil

Se o aluno fracassa, a escola também fracassou. A escola deve riscar do dicionário a

palavra FRACASSO. Quando o aluno sofre com o insucesso, também fracassa o

professor. A ordem, pois, é fazer sempre progredir, dedicar-se mais do que as horas

oficialmente destinadas ao trabalho e reconhecer que nosso magistério é missão, às

vezes árdua, mas prazerosa, às vezes sem recompensa financeira condigna que

merecemos, mas que pouco a pouco vamos construindo a consciência na sociedade,

principalmente a política, de que a educação, se não é panacéia, é o caminho mais

seguro para reverter as situações mais inquietantes e vexatórias da vida social.

8º- Colaborar com a articulação da escola com a família – O professor do novo milênio

deve ter em mente que o profissional de ensino não é mais pedestal, dono da verdade,

representante de todos os saberes, capaz de dar respostas para tudo. Articular-se com as

famílias é a primeira missão dos docentes, inclusive para contornar situações

desafiadoras em sala de aula.

Quanto mais conhecemos a família dos nossos alunos, mais os entendemos e mais os

amamos. Uma criança amada é disciplinada. Os pais, são, portanto, coadjuvantes do

processo ensino-aprendizagem, sem os quais nossa ensinança fica coxa, não vai adiante,

não educa.

A sala de aula não é sala-de-estar do nosso lar, mas nada impede que os pais possam

ajudar nos desafios da pedagogia dos docentes nem inoportuno é que os professores se

aproximam dos lares para conhecerem de perto a realidade dos alunos e possam juntos,

pais e professores, fazer a aliança de uma pedagogia de conhecimento mútuo,

compartilhado e mais solidário.

9º - Participar ativamente da proposta pedagógica da escola – A proposta pedagógica

não deve ser exclusividade dos diretores da escola. Cabe ao professor participar do

processo de elaboração da proposta pedagógica da escola até mesmo para definir de

forma clara os grandes objetivos da escola para seus educandos.

Um professor que não participa, se trumbica, se perde na solidão de suas aulas e não

tem como pensar-se como ser participante de um processo maior, holístico e

globalizado. O mundo globalizado para o professor começa por sentir-se parte no seu

chão das decisões da escola, da sua organização administrativa e pedagógica.

10º - Respeitar as diferenças – Se de um lado, devemos levantar a bandeira da

tolerância, como um dos princípios do ensino, o respeito às diferenças conjuga-se com

esse princípio, de modo a favorecer a unidade na diversidade, a semelhança na

Page 18: Dislexia e educação especial no Brasil

dessemelhança. Decerto, o respeito às diferenças de linguagem, às variedades

lingüísticas e culturais, é a grande tarefa dos educadores do novo milênio.

O respeito às diferenças não tem sido uma prática no nosso cotidiano, mas, depois de

cinco séculos de civilização tropical, descobrimos que a igualdade passa pelo respeito às

diferenças ideológicas, às concepções plurais de vida, de pedagogia, às formas de agir e

de ser feliz dos gêneros humanos.

O educador, pois, deve ter a preocupação é reeducar-se de forma contínua uma vez que

nossa sociedade ainda traz no seu tecido social as teorias da homogeneidade para as

realizações humanas, teoria que, depois de 500 anos, conseguiu apenas reforçar as

desigualdades sociais. Nossa missão, é dizer que podemos amar, viver e ser felizes com

as diferenças, pois, nelas, encontraremos nossas semelhanças históricas e ancestrais: é,

dessa maneira, a nossa forma de dizer ao mundo que as diferenças nunca diminuem, e

sim, somam valores e multiplicam os gestos de fraternidade e paz entre os homens.

Page 19: Dislexia e educação especial no Brasil

8. Bibliografia

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