desvelando a trÍade: pobreza, escola e currÍculo...
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Trabalho de Conclusão de Curso
DESVELANDO A TRÍADE: POBREZA, ESCOLA E CURRÍCULO
Jéssica Lice Santos de Arruda Torrezan1
RESUMO
Este artigo tem como tema a articulação entre a pobreza e currículo. A pobreza é uma grande
problemática social que perdura por gerações, sendo pouco abordada e discutida nas escolas.
Objetiva-se com esta pesquisa analisar e buscar alternativas para a inserção da temática sobre
pobreza no currículo escolar, a fim de propiciar ao educando a compreensão da realidade
social em que vive, oportunizando-o a alcançar desenvolvimento crítico para possível
compreensão e superação da pobreza. Este artigo tomará como base algumas pesquisas
bibliográficas e uma sondagem da realidade vigente. Espera-se com esse estudo, o encontro
de possíveis soluções para inserção da temática sobre a pobreza no currículo de forma mais
profunda e abrangente, com vistas para politização dos educandos pobres. A verdadeira
educação é aquela que tem o poder de transformar vidas. É aquela capaz de oportunizar o
educando pobre a abandonar a pobreza e, assim, ter uma vida mais justa e digna. Assim,
analisaremos um projeto em vigor em uma escola de Campo Grande-MS, que tem a
finalidade de implementar metodologias diferenciadas e orientar os(as) jovens estudantes a
adquirirem uma formação cidadã, diante da pluralidade cultural existente no modo de vida,
objetivando a formação do(a) jovem, que seja mais participativa, crítica e decisiva na vida
social.
Palavras-chave: Pobreza. Currículo. Escola.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo é fruto da inquietação em relação à falta de articulação no âmbito
escolar entre a temática sobre a pobreza e o currículo. Pretende-se, especificamente, buscar
meios para promoção de uma maior articulação. Este estudo possui grande relevância devido
ao fato de que essa vinculação proporciona aos alunos pobres uma maior compreensão de sua
realidade social. Apesar da pobreza ser uma realidade histórico-social, essa temática é
ausente ou quase ausente nos currículos escolares.
Dessa maneira, analisamos o projeto AJA (Avaliação do Jovem Aprendiz) que é realizado
na escola estadual Riachuelo, de modo que utilizando a pesquisa de opinião possamos
1 Aluna do Curso de Especialização Educação, Pobreza e Desigualdade Social. Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul, turma de 2015. Orientadora: Prof. MSc. Maria do Carmo Fajreldin Paim. E-mail:
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averiguar a atribuição do valor pedagógico dada na elaboração de projetos de trabalho com
caráter interdisciplinar, envolvendo alunos e professores.
A escola não pode simplesmente escolarizar, mas deve cumprir seu papel que é o de
educar, partindo da premissa de que a mesma tem um papel vital na sociedade, uma grande
função social. Educar pressupõe provocar no outro uma transformação social e cultural; é
combater seu conformismo e fomentar o desejo pelo novo. Para tanto, o educando pobre
necessita compreender sua realidade a partir dela própria, entendendo o porquê da pobreza e
que é possível sair dela.
Quando não se trabalha a pobreza na escola, promove-se a exclusão social dos
educandos pobres, pois se descarta todas as possibilidades destes ascenderem intelectual e
socialmente. Observa-se que os conhecimentos disseminados na escola são típicos da cultura
dominante. O descrédito pela realidade do educando pobre e sua discriminação apenas
corrobora para que a escola seja um espaço para perpetuação da pobreza.
O tema pobreza deve ser encarado como um conhecimento que todos têm direito ao
acesso. Com isso, essa pesquisa pretende buscar respostas para as seguintes questões: Como a
pobreza pode ser caracterizada? A pobreza chega à escola? Por que inserir a pobreza no
currículo? Como incorporar a pobreza ao currículo? O que o conhecimento efetivo da
pobreza possibilita aos educandos pobres? Percebe-se que o tema pobreza não tem o devido
espaço nos currículos escolares e, decorrendo assim, nas salas de aula. Daí a pertinência desta
pesquisa.
2. A POBREZA E SUAS VERTENTES
2.1 MAS AFINAL O QUE É POBREZA?
Para responder esse questionamento faz-se necessário, primeiramente, a busca de
possíveis conceituações de que vem a ser a “pobreza”. Além disso, seu enfrentamento requer
uma articulação com referenciais teóricos para sua compreensão.
Apesar das estatísticas brasileiras apontarem uma significativa diminuição no quadro de
pobreza e extrema pobreza, no Brasil, sua existência e persistência são fatos e todos têm o
dever de lidar com ela e enfrentá-la, buscando meios para sua superação.
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Conforme pesquisadores como Miguel G. Arroyo (2013), Alessandro Pinzani (2013) e
Walquíria L. Rego (2013), o fenômeno “pobreza” deve ser entendido em seus aspectos social,
histórico e cultural. Sendo assim, não há uma definição única e fechada para a pobreza.
Muitas são as tentativas de defini-la. Mas, de maneira global e genérica, a “pobreza” significa
ausência de capital para o gozo de uma vida digna, o que implica no comprometimento das
necessidades mínimas para sobrevivência na falta de recursos, no subdesenvolvimento
humano, na privação, no baixo nível de renda ou consumo, na vulnerabilidade e exclusão.
Em suma, a “pobreza” pode ser compreendida como a falta de itens básicos, como
comida, água, energia elétrica, trabalho, etc.; exigindo-se, portanto, estratégias de resistência
e sobrevivência. Porém, a “pobreza” vai além do aspecto material. É possível destacar alguns
aspectos frisados pelos pobres como sendo mais importantes do que qualquer melhoria
material. Tais como:
[...] boas condições de trabalho; a liberdade de escolher seu trabalho e as maneiras
de sustentar-se; autodeterminação, segurança e respeito de si; não ser perseguido,
não ser humilhado, não ser oprimido; não ter medo da violência e não ser
explorado; a afirmação de valores religiosos e culturais tradicionais;
empoderamento [empowerment], reconhecimento; ter tempo adequado para o lazer
e formas satisfatórias de utilizá-lo; um sentimento de que sua vida e seu trabalho
têm um sentido; a oportunidade de participar ativamente em grupos voluntários e
em atividades sociais em uma sociedade civil pluralista. [...] Nenhum legislador
pode garantir que todas estas aspirações (ou até uma maioria delas) sejam
satisfeitas, mas políticas públicas podem criar as oportunidades para sua realização.
(STREETEN, 1995, p. 50).
Com base em Arroyo (2012), podemos apreender a pobreza como fruto do sistema
capitalista em que vivemos. Infelizmente, há um forte predomínio de uma visão moralista,
reducionista da pobreza, isto é um grande equívoco, pois, em geral, as pessoas não são pobres
porque querem, mas por falta de oportunidades. Em outras palavras, ainda conforme Arroyo
(2012), “podemos pensar a pobreza como uma produção política das injustas relações de
poder”.
Outro ponto importante, conforme Arroyo (2007), é que determinados grupos sociais
são mais atingidos pela pobreza. No caso do Brasil, a população negra composta por pretos e
pardos e grupos indígenas são os mais atingidos pela condição de pobreza. Outro grupo
bastante atingido são os habitantes da área rural. Já com relação à área urbana, os habitantes
de periferia são mais atingidos.
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A pobreza não se trata apenas de uma questão social, mas de uma questão política.
Não podemos prender-nos apenas ao fator econômico e biológico para definição da pobreza,
pois a mesma possui muitas facetas advindas de muitas causas. Há outros fatores além do
econômico, fatores estes que podem ser classificados como éticos. De acordo com Pinzani
(2013) e Rego (2013), a pobreza é um círculo vicioso de exclusão econômica, social e
política; que vem acompanhada por diversos critérios como: gênero, idade, etnia ou cor da
pele, classe social ou econômica, falta de esperança, variação do rendimento, lugar de
residência e composição e estrutura da família.
Esses fatores corroboram para a perpetuação do analfabetismo total e funcional e,
sucessivamente, da miséria; fortalecendo o ciclo da pobreza e extrema pobreza. Podemos
observar, portanto, que a pobreza nunca vem sozinha. Há uma série de fatores que colaboram
para a estagnação da situação dos pobres. Inclusive, muitos pobres fazem parte do grupo do
chamado de coletividades ambivalentes. Por exemplo, há pessoas que são pobres, negras e
mulheres ao mesmo tempo, sofrendo mais ainda com o preconceito e estigmas. Os indivíduos
pobres são reféns da pobreza devido ao sistema capitalista que é produtor de desigualdades;
que continuamente coíbe o desenvolvimento crítico e, por conseguinte, profissional destes,
tolhendo as possibilidades do desfrute de uma vida digna.
2.2 A SITUAÇÃO DE POBREZA NO CONTEXTO ESCOLAR
Se a pobreza chega à escola, como a escola trabalha os aspectos inerentes a essa
problemática social? Paulo Freire (1996) afirma: “Educar para vida requer um olhar que se
projete para fora da escola e para o futuro”.
Nessa perspectiva, os jovens estudantes que buscam o Projeto de Curso AJA-MS
(Avanço do Jovem na Aprendizagem em Mato Grosso do Sul), procuram mais que
conhecimentos prontos para serem reproduzidos, mas uma formação que contemple sujeitos
ativos, participativos, em crescimento cultural e social. Além disso, há que se considerar que
este projeto atende jovens estudantes com necessidades educacionais específicas, atendendo,
também, as comunidades indígenas, quilombolas, afrodescendentes, do campo, ribeirinhas,
de periferias urbanas, a fim de garantir a formação inicial para o mundo do trabalho e a
efetiva participação social.
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Apesar de o acesso e a permanência dos alunos, sobretudo, dos pobres serem direitos
garantidos pela Constituição, mas não serem na prática, a pobreza chega à escola. Conforme
o Censo Escolar de 2013, 17 milhões de crianças e adolescentes pertencentes ao Programa
Bolsa Família estão matriculadas nas escolas. Embora a maioria do público escolar seja
pobre ou extremamente pobre, são estigmatizados e tratados como invisíveis.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8069, de 13 de Julho de 1990, em seu
art. 4º, assegura:
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público
assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1990).
Contudo, pode-se observar a escola como um espaço de reprodução da pobreza, de
desigualdade social e relações de dominação. A criança e o jovem, sobretudo pobres são
discriminados e têm, por conseguinte, sua liberdade tolhida e sua dignidade humana
subvertida. São tidos como meros objetos, não como sujeitos. Os tratam como se tivessem
baixo intelecto, violentos ou criminosos; desconsiderando sua realidade que é marcada por
problemas: carência material e de apoio moral, desestruturação familiar, etc.
A escola apenas corrobora para a perpetuação do círculo de pobreza e desigualdade
social, pois a educação, na prática, não contribui para emancipação humana2. Dessa forma, a
criança ou adolescente pobre chega à escola, o desafio é mantê-lo nela. Os índices de
reprovação e evasão escolar são altos devido a não identificação do educando pobre com os
conteúdos curriculares da cultura dominante e às grandes adversidades, como a fome,
trabalho infantil, dentre outros, a que são acometidos. Com relação à imposição da cultura
dominante, Enguita (2001) afirma que “o caminho escolhido pela escola foi o da imposição
da cultura escolar [...] a cultura dos grupos dominantes - sobre toda cultura popular, étnica,
grupal.” Desse modo, a cultura do grupo dominante passa a ser transformada, através da
escola, na cultura de todos os cidadãos de um país.
Já sob a perspectiva da escola como um espaço de resistência e transformação social,
isto deveria ser o ideal do Estado, da sociedade e de cada professor. Sob essa perspectiva, a
2 Ato de tornar-se livre e independente, em outras palavras, o gozo de uma vida digna. Giddens (1991)
afirma que “Um processo de emancipação vinculado a uma política emancipatória inclui uma política social de autorrealização e possibilidades de uma vida de satisfação pessoal para todos os indivíduos.”
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criança e o jovem são tidos como sujeitos sociais, possuidores de direitos e deveres. A
Constituição prega que todo ser humano nasce livre. Entretanto, ser livre pressupõe que todos
tenham acesso às prerrogativas que faz do ser humano um ser digno.
Logo, percebe-se que a realidade é bem diferente da teoria. Porém, os professores não
podem perder as esperanças, conformando-se com este sistema. O papel do professor não é
rotular, julgar ou fortalecer a cultura de resignação, ao contrário, é ensiná-los e politizá-los
com vistas para transformação social.
A proposta metodológica, bem como os pressupostos teóricos que fundamentam o
Projeto AJA-MS, baseia-se na concepção sociointeracionista, que compreende a constituição
do sujeito nas diversas relações dialógicas. Nesse sentido, o ensino também é visto como um
processo interativo, que evidencia o sujeito nas mais diversas interlocuções.
Trabalhar nessa perspectiva pressupõe um processo de ensino que se fulcra na
aprendizagem em que o aluno/estudante/sujeito é visto como ser social, histórico e,
culturalmente, presente no ambiente escolar. Diante disso, o trabalho com jovens estudantes
de 15 a 17 anos, remete para além do ato significativo de pensar, ao resgate de sua memória
do passado para que ela possa ser (re) construída no presente.
Estudantes pobres sofrem com os estigmas e preconceito das pessoas que o cercam. A
criança ou adolescente pobre é submetida a inúmeras situações adversas como, por exemplo,
o trabalho infantil. Adversidades estas que prejudicam seu desenvolvimento e corroboram
para repetência e evasão escolar, fortalecendo o círculo vicioso da pobreza.
Portanto, não há uma inclusão efetiva, mas um grave processo de segregação. A
desconsideração e o desrespeito pelas realidades e diversidades em que cada aluno é inserido
são fatos. E tudo isso entre outros fatores convergem para o fracasso escolar, tornando
ilusórias, desse modo, as leis e discursos referentes à democratização do acesso e da
permanência do aluno na escola.
Segundo Pinzani (2013) e Rego (2013), a dificuldade da captura social do termo
“democracia” advém do fato de o cidadão como figura histórica e teórica se originar de uma
intensa luta social das pessoas por liberdade e autonomia. Como falar em democracia se o
Brasil é um país marcado por grandes desigualdades? O Governo Federal tem um slogan:
“Brasil, um país de todos!” Entretanto, podemos afirmar que este discurso é uma pilhéria,
pois as oportunidades em geral, infelizmente, não são as mesmas para todos. A Constituição
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Brasileira versa sobre os direitos e deveres dos cidadãos, mas na prática isto não existe. No
preâmbulo da Constituição de 1988 diz:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos [...].
Muitos estudos apontam para a forte correlação entre situação de pobreza, raça e
dificuldades para a permanência na escola. Assim, sabendo-se da conjuntura que leva a
situação de vulnerabilidade e risco social e dos fatores intervenientes que podem favorecer a
exclusão social e com base nessas diferenças, as políticas educacionais devem ser repensadas
com enfoque no processo de inclusão dos sujeitos. O currículo é uma ferramenta
extremamente relevante para inclusão efetiva do educando pobre, pois através deste
aproximamos o aluno do conhecimento, fazendo com que o conhecimento disseminado na
escola faça realmente sentido para ele. Ou seja, a permanência do educando pobre não basta.
O processo de ensino-aprendizagem deve ser efetivo, objetivando o desenvolvimento
cognitivo, crítico e uma transformação social.
Cabe aos professores e gestores reorganizar o “currículo” e reverem suas práticas
pedagógicas com busca de estratégias para que alcancemos a transformação social, um ideal
contemplado em documentos como a Constituição Brasileira e a LDB - Leis de Diretrizes e
Bases da Educação de n.º 9.394/96.
[...] Considerá-los no centro do processo educativo acarreta reorganizar tempos,
espaços, agrupamentos, conteúdos escolares. Importa também em mudar o lugar de
educandos e educadores na dinâmica do trabalho e, principalmente, em transformar
a vida da escola, entendendo-a como espaço de cultura. (LEITE, 2013, p. 20).
3. ALTERNATIVAS CURRICULARES PARA O ENFRENTAMENTO DA
POBREZA NA ESCOLA
Importa iniciar a discussão desse tópico trazendo um conceito de “currículo”. De acordo
com Moreira e Silva (1999),
[...] currículo deve ser compreendido como o conjunto de todas as experiências de
conhecimento proporcionadas aos estudantes – que está no centro da atividade
educacional. O currículo constitui o núcleo do processo institucionalizado de
educação.
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Em outras palavras, “currículo é tudo que se passa na escola, tratando de todas as
experiências organizadas pela escola que se desdobram em torno do conhecimento escolar.”
(MOREIRA, 2001, p. 68).
Professores, educadores e gestores são grandes responsáveis pela vida e politização
dos educandos. Portanto, todos têm o dever de trabalhar assuntos inerentes à pobreza e
desigualdades sociais e seus desdobramentos, a fim de proporcionar aos educandos a
compreensão de sua realidade social e, assim, obter meios para superar esta grande
problemática social.
O pensamento abrangente sobre o “currículo” é que deve ser construído com o intuito
de sanar ou amenizar as carências de conhecimento, valores e moralidade do educando.
Entretanto, este pensamento é errôneo, reducionista. E, de acordo com Arroyo (2013), a
carência material produz muitas outras carências, trazendo consequências graves no que
tange a humanização, pois se compromete diretamente o direito à vida e à dignidade humana.
Há uma lacuna muito grande entre os conhecimentos contemplados pelo currículo e a
realidade dos educandos pobres. Como pontua Arroyo, os “efeitos desumanizadores da
vivência da pobreza” não podem ser ignorados pelo currículo.
Ignorar ou silenciar o peso dos processos materiais de reprodução da existência é
fazer com que os próprios grupos empobrecidos sejam ignorados. Eles chegam à escola com
séculos de atraso e a escola ignora seus conhecimentos nas formas mais precárias de
reprodução de sua existência, porque essa brutal realidade não está no terreno próprio do
curriculum do conhecimento socialmente produzido. (ARROYO, 2013, p.91).
É imprescindível que o educando pobre entenda o porquê da pobreza. Para isso, é
necessário um repensar e uma reconstrução do currículo escolar, a fim de que este de fato
garanta os direitos do aluno pobre e de que este possa entender sua condição de pobreza. A
história da pobreza e o educando são desprezados pelos currículos.
Como sair da pobreza se a maioria das escolas se prende ao tradicionalismo e estão
mais preocupadas em cumprir uma lista fechada de conteúdos do que politizar os educandos?
Enquanto o currículo se mantiver assim, sem atenção às políticas públicas de tentativa para o
combate à pobreza, aos direitos humanos e sem tratar a pobreza como um fato social e
histórico, os professores devem buscar alternativas para a inclusão dessas temáticas na sala de
aula ainda que de maneira transversal. É necessário engajamento político da parte do
professor, deixando de ser um mero transmissor de conteúdos.
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Vale salientar que, para que o currículo promova transformação social, é necessário
superar a visão moralizante sobre pobreza, tendo em vista que cada indivíduo carrega consigo
uma bagagem cultural que não pode ser rechaçada.
São necessárias políticas públicas que visem promover igualdade de oportunidades na
educação e uma reforma curricular, considerando a diversidade étnico-cultural que compõe as
escolas brasileiras. Arroyo (2007) destaca:
[...] organizar a escola, os tempos e os conhecimentos, o que ensinar e aprender
respeitando a especificidade de cada tempo de formação não é uma opção a mais na
diversidade de formas de organização escolar e curricular, é uma exigência do
direito que os educandos têm a ser respeitados em seus tempos mentais, culturais,
éticos e humanos.
Necessita-se de um currículo que contemple a diversidade com abordagens e
metodologias diversificadas. Muitas vezes o que consta nas legislações são orientações
direcionadas a grupos como se fossem homogêneos. Lidamos com crianças e adolescentes
com etnias, idade, gêneros variados. Dessa maneira Alves afirma:
[...] a problemática da igualdade do acesso à escola não pode ser confundida com
expressão de uma cultura homogênea, de padrão único. Faz-se necessário a adoção
de currículos e metodologias de ensino que levem em consideração as diferenças
regionais, culturais, de gênero, étnicas, raciais e religiosas, os perfis populacionais
etários e os contextos onde as aprendizagens se realizam. (ALVES, 2007, p.5 e 6).
Não é tão simples inserir o tema “pobreza” no currículo. Portanto, mapearmos as
pesquisas já realizadas sobre a mesma nas áreas da educação, como sociologia, antropologia,
economia, política, dentre outras, observando como os conhecimentos produzidos por área
contribuem bastante para facilitar a articulação entre pobreza e currículo.
O currículo deve abordar questões inerentes à pobreza, problemáticas que a
justifiquem e provocadas por ela, como por exemplo: o capitalismo e as desigualdades sociais
advindas desse sistema; políticas públicas, como por exemplo, programas sociais como o
Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida; o trabalho infantil, adolescente e juvenil,
desemprego a que os pobres são submetidos; os fluxos migratórios em busca da
sobrevivência; os movimentos sociais em prol da democratização social; a discriminação
racial, enfim, subtemas de teor político, econômico, social e cultural.
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Arroyo (2012) afirma que “há muita produção de conhecimento sobre a pobreza por
meio de pesquisas e análises, nas diversas áreas do conhecimento, como sociologia, História,
Geografia, Antropologia [...].” Cabe ao professor ir atrás de temas relacionados a ela e
fomentar momentos de discussões e reflexões na sala de aula, promovendo a politização de
seus educandos pobres e também não pobres.
Uma grande ferramenta que colabora para o combate da pobreza é o conhecimento
dos Direitos Humanos. É fundamental que o currículo contemple esse viés com uma maior
abrangência. O estabelecimento de contato com documentos como a “Declaração Universal
dos Direitos Humanos” é um caminho para combatermos e/ou amenizarmos a violação dos
Direitos Humanos, no que se refere à pobreza entre temas. Vale destacar que, primeiramente,
o educador deve conhecer profundamente o documento e todas essas questões relativas a ela
para que, assim, se aborde e desenvolva essa temática com propriedade e clareza na sala de
aula.
Quando se traz esses conhecimentos à tona, empodera-se o educando pobre a fim de
lutarem contra as mazelas da pobreza e desigualdade social. Muitos dos educandos sentem-se
inferiores em relação aos outros. Creem na predestinação e sentem-se resignados, ou seja,
“nasci pobre e vou morrer assim”. Indivíduos pobres sequer compreendem o significado da
palavra “cidadão” e tampouco entendem que têm plenos direitos a uma vida digna. Quando
passamos a apresentar os Direitos Humanos e a discutir questões referentes à cidadania,
podemos despertar em nos educandos o desejo pelo “novo”, pela mudança, por uma vida
digna e melhor.
Vale destacar que o professor sozinho na difusão e conscientização do conhecimento
dos Direitos Humanos não consegue combater a violação destes. Mais uma vez, nota-se a
importância do trabalho coletivo, ou seja, o Estado oferecendo suporte à escola, como por
exemplo, ações afirmativas às classes abastadas da sociedade. Portanto, a inclusão dos
Direitos Humanos e da Cidadania são elementos imprescindíveis para ajuda no combate da
pobreza a serem incluídos no currículo.
Ainda segundo a Constituição Federal em seu art. 22, que estabelece os fins da Educação
Básica:
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“A educação Básica tem por finalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação
comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no
trabalho e em estudos posteriores.”
A inserção do tema “movimentos sociais” no currículo auxilia o educando na
compreensão da pobreza e sua superação, pois é uma ‘arma’ muito importante na luta pela
educação emancipadora, que luta pelos direitos de grupos sociais que são segregados pela
sociedade em geral, os menos abastados. Esses movimentos são a favor dos educandos
pobres e seu desenvolvimento intelectual e social. Com relação aos direitos dos cidadãos, o
universalismo abstrato é visível, visto que se pode observar a falta de reconhecimento de
muitos direitos. E os movimentos sociais surgem da necessidade dos grupos sociais serem
atendidos no que diz respeito a seus desejos e direitos em geral por meio da implementação
de políticas públicas referentes a seus interesses. No que tange ao contexto escolar, os
movimentos sociais têm papel primordial no rompimento de barreiras como a pobreza que,
por sua vez, corrobora para o trabalho infantil e, inclusive, a exploração sexual e,
possivelmente, a evasão, a repetência, a defasagem na aprendizagem da criança, sem falar em
outros problemas.
Os “movimentos sociais” são ferramentas importantes no combate ou atenuação de
preconceitos e estigmas que a criança sofre com base em critérios sociais, étnicos e culturais.
Portanto, os movimentos sociais se articulam com a escola. Em outras palavras, conforme
Leite (2013), “procuram ocupar a escola, deixando nela sua marca.” Entendem a escola como
um espaço de transformação social, pois esta é um grande ideal dos movimentos sociais,
lutando pela democratização da sociedade, ou seja, a igualdade de direitos para todos.
É muito importante o apoio da comunidade e dos “movimentos sociais” para a escola,
promovendo uma articulação dos mesmos no trabalho de inserção social e desenvolvimento
do educando pobre num espírito de cooperação e atenção para as reais necessidades do aluno.
Uma ferramenta imprescindível é trabalhar, com mais afinco, o tema “cidadania” na
escola. Isto pressupõe um princípio igualitário. “Todas as pessoas são iguais em algum nível;
por exemplo, todas são iguais em direitos civis, políticos e sociais.” (ARROYO, 2012, p.15).
Contudo, se os pobres enfrentam inúmeras dificuldades para frequentar a escola, logicamente
que as noções de cidadania, bem como os direitos e deveres básicos não são difundidos em
suas mentes. Além disso, a escola pública, em geral, não está preocupada em formar cidadãos
com mentes efetivamente pensantes, pois os alunos pobres, infelizmente, são muito mais
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adestrados do que politizados. Ou seja, tem acesso meramente a uma educação tecnicista, ou
seja, aquela que enxerga pessoas como máquinas, meros objetos para mão de obra barata e
especializada para o mercado de trabalho; e não a uma educação onde o seu maior foco é a
promoção de cidadania, com pessoas politizadas e capazes de alcançar muito mais do que um
emprego formal, mas independência intelectual, pessoas que sabem posicionar-se
criticamente perante os desmandos e injustiças da sociedade.
Obviamente, que a cidadania é uma noção muito distante do aluno pobre, pois
momentos de debates sobre esse tema na escola são raros e, na prática, na experiência social
deste educando, não existe. Daí a necessidade de dialogar mais sobre isso para que o pobre se
fortaleça, a fim de ir à luta pelos seus direitos. É sabido que o caminho mais provável para
superação da pobreza é a educação, a promovedora de transformação social.
Em suma, é necessário que haja equidade, uma política justa entre os educandos.
Equidade pressupõe uma educação de qualidade para todos. Para tanto, o currículo necessita
ser reformulado para que seja um aliado na luta contra pobreza, deixando de trazer apenas
conteúdos elitizados, da ‘cultura dominante’, mas também trabalhar conhecimentos
condizentes com a realidade do educando, partindo de suas experiências sociais.
O currículo deve prezar por uma escola emancipadora, que é aquela que proporciona
ao aluno possibilidades de alcançar, sobretudo, independência intelectual. É aquela que
proporciona ao aluno compreender que possuem deveres, mas também direitos, com desfrute
de uma cidadania plena. Uma escola emancipadora é aquela que não se prende aos conteúdos,
mas é aquela que instiga o aluno a buscar conhecimentos autonomamente. É aquela que
estimula o aluno a buscar e lutar pelos seus direitos. Além disso, pode-se dizer que essa
escola é aquela que respeita e valoriza a diversidade de seu público, bem como suas
características étnicas, culturais e sociais. Em suma, uma escola emancipadora é aquela que
promove a inclusão, a politização e a transformação social.
Aqui ressaltamos o exercício do currículo de uma escola transformadora que
convoque a imaginação, em outras palavras, que potencializa a prática pedagógica em criar,
desafiar e a desenvolver as competências trazidas pelos (as) jovens/estudantes, para que eles
(as), agentes transformadores de sua realidade, possam ser mais independentes, mais críticos
(as) e, principalmente, seres ativos nas mais diversas relações sociais.
Além do currículo dos respectivos blocos que os adolescentes estejam cursando,
outras atividades deverão ser ministradas, por meio de oficinas pedagógicas, culturais e
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esportivas visando ao desenvolvimento integral das habilidades já apresentadas por eles (as) e
que tem a ver com o contexto social destes (as) estudantes.
Para que a escola atue de forma efetiva como promotora de um processo em constante
transformação, utiliza-se no projeto, a teoria da problematização que apresenta o processo de
aprendizagem vinculado a uma nova concepção de ensino, que supera o processo tradicional.
Portanto, salienta-se que o projeto potencializa as competências, trazidas pelos (as)
estudantes que visam ao crescimento intelectual, as iniciativas para o mundo do trabalho e,
principalmente, uma educação de qualidade.
Diante dessas considerações, a teoria da problematização modifica a concepção
clássica de aula que se fundamenta na exposição de conteúdo, por isso, ressalta-se que
mesmo o Curso AJA-MS tendo um currículo fundamentado nas bases comuns e dividida em
blocos de conhecimento, o/a professor (a) transforma esses conteúdos em situações de
desafio, para que os (as) estudantes, coletivamente e de forma interativa, possam construir a
resolução da situação problema.
Trata-se, portanto, de introduzir uma nova estruturação para o planejamento e para as
aulas, que consistem em um conjunto de problemas que serão definidos em cada unidade,
tendo em vista o perfil proposto a cada jovem estudante, bem como as competências previstas
para a sua formação intelectual. A ementa curricular deve enfatizar o pensar e promover a
interação entre os saberes docentes e discentes na busca de conteúdos significativos.
Esse currículo entendido, ainda, como um processo de construção coletiva do
conhecimento escolar, articulado à cultura, à ciência, ao trabalho e à tecnologia, constitui-se
no elemento principal de mediação entre educadores e estudantes e deve ser organizado de tal
forma que possibilite aos educadores o conhecimento significativo às suas práticas diárias.
4. METODOLOGIA
Foram elaborados dois questionários (apêndices I e II), um para os alunos e o outro para a
equipe pedagógica, que abordam questões referentes à prática educativa e a viabilização de
meios para que esta realmente promova um currículo capaz de modificar o seu entorno.
Apresentamos a seguir um resumo dos resultados coletados a partir do trabalho descrito
anteriormente, a título de apresentar parte do instrumento utilizado. Para a realização da
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análise dos resultados, às respostas “concordo totalmente”, “concordo mais ou menos” ou
“não concordo” foi atribuída uma pontuação em percentuais, traduzida, respectivamente,
como 100 %, 50% e 0%. A média destas notas gerou uma média percentual para cada área
temática que compunha o questionário aplicado. Realizou-se uma pesquisa exploratória, que
teve como finalidade verificar o meio de amostragem em que medida a escola cumpre as
seguintes funções:
a) Escola como transformadora da realidade social;
b) Escola como promotora de um currículo diferenciado.
Segundo Mattar, (1994, p.259), “amostra é qualquer parte de uma população” e “amostragem
é o processo de colher amostras de uma população”, ou seja, os valores das amostras são
estimativos dos valores reais da população.
No presente trabalho, a amostragem é composta por (vinte oito) alunos da instituição de
ensino pesquisada, correspondendo a 24% do total de alunos que frequentam o período
vespertino do projeto AJA. E também a análise do questionário II, correspondente a 25 % dos
professores que atuam no referido período.
5. RESULTADOS
Mediante a análise das entrevistas, podemos constatar que o percentual de alunos que se
sentem respeitados na escola é de 65%, já para segunda pergunta da entrevista, 80%
concordam que as aulas e atividades extraclasses promoveram uma melhor socialização e
engajamento na sociedade, considerando que muitos alunos tornaram-se mirins, e outros
começaram a trabalhar em empresas como jovens aprendizes. Para a questão referente à
escola como modificadora da condição social das pessoas, o resultado é 10, ou seja, todos os
entrevistados concordaram plenamente com essa pergunta. Para a pergunta quatro que
abrange diretamente a politização e discussão no âmbito escolar, 70% dos alunos concordam
plenamente, e o mesmo resultado foi observado na pergunta subsequente sobre as aulas e
atividades extraclasses do projeto AJA que auxiliam para desenvolver o seu senso crítico.
Foi encontrado um ponto que necessita ser trabalhado, considerando que 40% dos alunos
não se veem como cidadão munido por direitos e deveres. Diante desses dados, podemos
observar que a escola precisa favorecer a ampliação dos direitos educacionais, bem como os
sociais.
Trabalho de Conclusão de Curso
60% dos alunos entrevistados se sentem politizados na escola quando desenvolve
trabalhos como jogos, desafios, teatro, DJ na rádio da escola, cantores de rap, promotores de
campanhas para arrecadação de fundos, organizadores de festivais, dentre várias atividades
que propõem uma solução conjunta para um problema ou tarefa. Também concordam
plenamente que no projeto AJA todos os professores discutem sobre os problemas
relacionados à sociedade em geral.
Em relação à pergunta referente às aulas e atividades extraclasses do projeto AJA e seu
aspecto diferenciado de outras escolas, 70% respondeu que concordam plenamente. Na
última pergunta 80% concordaram plenamente que o projeto AJA influencia as suas
perspectivas de futuro.
As políticas públicas direcionadas para desenvolver cada vez mais métodos e meios que
efetivamente mudam os resultados do trabalho pedagógico são apontadas como positivas se
observarmos o resultado das entrevistas com o corpo docente.
De maneira unânime, o corpo docente considera o trabalho pedagógico como
responsabilidade de todos os integrantes da escola, o que confirma as respostas sobre prática
educativa interdisciplinar de forma que todos atuem em prol do engajamento social dos
alunos e também concordam plenamente que os alunos aprendem melhor quando eles
mesmos encontram soluções para os problemas, e assim também para a questão referente às
possibilidades dos alunos para pensar soluções para problemas práticos antes de o professor
mostrar-lhes como devem ser solucionados, corroborando a metodologia da problematização
aplicada ao currículo escolar.
Em outra questão, a média de 50% já mostra um ponto a ser melhorado referente ao
ambiente de ensino multicultural, e também as respostas concordam mais ou menos ficaram
neste percentual quando os professores responderam sobre a influência do projeto AJA em
relação às perspectivas de futuro dos alunos, e também permanecem divididos quando
respondem sobre os alunos ficarem mais politizados.
A média de 60% professores entrevistados respondem que propõem discussões relativas
às dimensões local e global da sociedade como um todo.
O maior desafio é indubitavelmente como estruturar o processo pedagógico para que ele
tenha os efeitos desejados trazendo a escola juntamente com a comunidade como
possibilitadora de transformação da realidade social dos alunos e de suas famílias fazendo
que a participação das famílias e da comunidade no projeto AJA possibilite uma nova
Trabalho de Conclusão de Curso
percepção do entorno social como forma de combate à pobreza. Aqui tivemos um resultado
de 25%.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo foi pensado partindo do fato de que a educação tem o poder para
transformar vidas e de que a temática sobre a pobreza que chega às escolas é ignorada pelos
currículos. Desse modo, foram traçados caminhos para a articulação entre a pobreza e o
currículo. Esta pesquisa dividiu-se em três partes para explanação da temática pobreza e sua
contemplação no currículo nas escolas.
Primeiramente, conceituou-se a pobreza, que conforme Pinzani (2013) e Rego (2013),
este fenômeno deve ser entendido em seus aspectos social, histórico e cultural, que por sua
vez afeta drasticamente o processo de dignidade e emancipação humana do educando. Tendo
em vista que a pobreza tem aprisionado milhares de vidas, faz-se necessária a busca de
estratégias para seu combate ou amenização.
Depois, discutiu-se sobre a pobreza na escola, revelando as problemáticas em torno da
pobreza, a segregação e a invisibilidade sofrida pelo educando pobre. Para se falar de
currículo inovador, foram propostas algumas alternativas para o enfrentamento da pobreza,
como a contemplação e aprofundamento em temas vitais para a formação de cidadãos críticos
e politizados capazes de serem libertos das mazelas da pobreza.
É de suma importância que o educando se enxergue como cidadão munido por
direitos e deveres. Para tanto, este necessita compreender a pobreza e seus desdobramentos,
saber que por meio do conhecimento da pobreza, de mundo e do senso crítico é possível
abandoná-la. Portanto, o currículo escolar necessita ser repensado, partindo do olhar e
vivência do próprio educando pobre.
Foi analisada uma escola que possui uma metodologia, um projeto ainda muito novo,
mas que demonstra na pesquisa o seu comprometimento para o desenvolvimento pleno dos
alunos. Porém ainda precisa envolver mais a comunidade escolar para que todos possam falar
a mesma linguagem, resignificando saberes e práticas. Desse modo, a instituição escolar é
desafiada a reconhecer os saberes da comunidade, além daqueles trabalhados nos seus
currículos, e assim propiciar um dialogo no qual todos possam manifestar-se, contribuindo
para uma transformação tanto dos conteúdos escolares quanto da vida social. Essa relação de
Trabalho de Conclusão de Curso
construção de saberes desvela um novo caminho a ser trilhado, com escola e comunidade
caminhando juntas. Assim, podem ir em busca de experiência de diálogo, trocas e construção
de saberes, estabelecendo uma comunidade de aprendizagem na qual as pessoas que atuam
na escola e as que vivem na comunidade se interajam e se engajem para construir um novo
quadro social onde sejam superados os preconceitos, em sua maioria calcados em
estereótipos de classe, raça/etnia, gênero, orientação sexual, dentre outros.
Encontramos inúmeros problemas sociais e econômicos que comprometem a
educação, mas sabemos do grande poder de influência do professor que precisa pensar e agir
em um contexto micro e macro de forma simultânea. Por isso como afirma Perrenoud, o
professor tem que se preparar para intervir na discussão local e global. Como discorremos
neste artigo, a consecução de um currículo direcionado para uma práxis educativa
sistematizada em uma escola transformadora que, por conseguinte, coaduna numa sociedade
transformadora, sabendo- se que precisamos ter educadores que transformem sua ação
educativa.
Conclui-se, portanto, que o currículo deve prezar temáticas que convirjam com a
produção da pobreza e que tracem novas abordagens para o enfoque da mesma. No projeto
AJA, a articulação entre pobreza e currículo é um assunto amplamente discutido para a
propiciação da redução da primeira e, por conseguinte, a ascensão social e salvação da
dignidade humana do educando pobre.
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