democracia e desempenho econômico: uma abordagem … · com a afirmação que a democracia pode...

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1 8º Encontro da ABCP 01 a 04/08/2012, Gramado, RS Área Temática: Política e Economia Democracia e Desempenho Econômico: uma abordagem comparada da América Latina Pedro Cavalcante (IPOL/Universidade de Brasílica) [email protected] Soraia M. Vieira (IESP/Universidade do Estado do Rio de Janeiro) [email protected] Augusto Neftali C. de Oliveira (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) [email protected]

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Page 1: Democracia e Desempenho Econômico: uma abordagem … · com a afirmação que a democracia pode ter problemas mas é o melhor regime de governo (Walker, 2009). Logo, podemos observar

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8º Encontro da ABCP 01 a 04/08/2012, Gramado, RS

Área Temática: Política e Economia

Democracia e Desempenho Econômico:

uma abordagem comparada da América Latina

Pedro Cavalcante (IPOL/Universidade de Brasílica) [email protected]

Soraia M. Vieira (IESP/Universidade do Estado do Rio de Janeiro)

[email protected]

Augusto Neftali C. de Oliveira (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) [email protected]

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Resumo Recentemente a América Latina vem passando por profundas transformações econômicas e políticas. Nessa última dimensão, ressaltam-se o restabelecimento dos direitos políticos e a retomada de processos eleitorais estáveis. A despeito das análises restritas à influência de períodos eleitorais, pouco se sabe acerca dos impactos da dinâmica democrática sobre o desempenho das nações. Nesse sentido, prevalece a lacuna acerca dos efeitos da ideologia partidária e da competição eleitoral, variáveis centrais na medida em que muitos países vêm vivenciando alternância de partidos no poder e aumento da competição no pleitos nacionais. Diante disso, a pesquisa aplica regressão múltipla com dados de dezoito países da região entre 1990 a 2010 para investigar os determinantes, sobretudo políticos, dos seus desempenhos econômicos, caracterizados pelas taxas de crescimento do PIB, inflação e desemprego. Palavras-chave: desempenho econômico; democracia; política comparada; América Latina.

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1. Introdução O principal objetivo deste artigo é analisar de forma comparada os

determinantes, sobretudo de natureza política, do desempenho macroeconômico

das nações latino-americanas.

Nas últimas duas décadas a América Latina vem passando por profundas

transformações institucionais pautadas, principalmente, pela abertura das economias

nacionais e pela democratização. A despeito da crença da população na democracia

como a melhor forma de governo, questões estruturais continuam afligindo os latino-

americanos. As demandas por desenvolvimento econômico e melhores serviços

sociais, assim como a necessidade de controle da inflação continuam na agenda. Na

dimensão política, ressalta-se o restabelecimento dos direitos políticos e, por

consequência, a retomada de processos eleitorais relativamente estáveis e

periódicos. A despeito do notório avanço na compreensão das causas e do

desenvolvimento da democracia na região, pouco se sabe acerca dos efetivos

impactos da dinâmica democrática sobre o desempenho das nações.

Nesse sentido, a literatura se restringe às análises da influência de períodos

eleitorais sobre o comportamento dos políticos, focadas na teoria dos ciclos políticos

de negócios (political business cycle). Contudo, prevalece a lacuna acerca dos

efeitos da ideologia partidária e da competição eleitoral, variáveis centrais na medida

em que muitos países da região vêm vivenciando alternância de partidos no poder,

inclusive com a ascensão ao poder de partidos de esquerda, como também aumento

da competição em pleitos nacionais. Assim, a presente pesquisa aplica regressão

múltipla com dados longitudinais de dezoito países latino-americanos entre 1990 a

2010 para investigar os determinantes dos seus resultados econômicos,

caracterizados pelas taxas de crescimento do PIB, inflação e desemprego.

Além desta introdução, o artigo está organizado em mais três seções.

Primeiro, é realizada uma discussão breve acerca das mudanças políticas e

econômicas que a região passou recentemente. Em seguida, o estudo desenvolve

uma análise exploratória das variáveis de desempenho econômico, contextualiza e

apresenta o modelo de análise, como também debate os principais resultados. Por

fim, algumas conclusões são discutidas.

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2. Mudanças Políticas e Econômicas na América Latina

O final do século XX foi marcado por uma série de mudanças político-

institucionais e econômicas. Na América Latina não foi diferente, a queda dos

regimes autoritários veio acompanhada de graves problemas econômicos, como os

relacionados à inflação e à dívida externa, que levaram países como o México a

decretar a moratória da dívida (1982) e a sucessivas crises que impactaram sobre a

região – no fim dos anos 1990 e início dos anos 20001 – e promoveram instabilidade

e estancamento do crescimento para maioria dos países da região.

A terceira onda de redemocratizações chegou a América Latina

deslegitimando os governos autoritários e reinstituindo a democracia em um

ambiente de grande instabilidade econômica. Como promover a mudança

institucional, consolidar a democracia e lidar com os entraves econômicos? Este foi

o grande desafio dos governantes que chegaram ao poder na região nesse período.

Ao mesmo tempo em que a América Latina experimentava o retorno à

democracia, a economia mundial experimentava uma inclinação em direção ao pólo

neoliberal2. As crises econômicas que se iniciaram com a crise do petróleo de 1974

e foram agravadas com a crise de 1979 impactaram diretamente nos governos

socialdemocratas e deram início a um processo de crise do welfare state, o que

levou a uma alteração dos programas da Social Democracia europeia e à retomada

do debate acerca do papel do Estado, ao mesmo tempo em que governos ortodoxos

apresentavam soluções que pareciam mais viáveis no contexto dessa crise.

As condições macroeconômicas impunham aos países em desenvolvimento

uma difícil escolha: adotar os preceitos macroeconômicos capitaneados pelas

agências multilaterais, leia-se Banco Mundial e FMI, ou buscar uma saída alternativa

e enfrentar o risco de retaliações. O que se observou foi que sob as pressões dos

condicionantes externos, muitos países da região optaram pela adoção do

1 As crises que atingiram os países em desenvolvimento a partir de meados dos anos 1990 – o México, em 1995, os Tigres Asiáticos, em 1997, a Rússia, em 1998, e a Argentina, em 2001; impactaram fortemente sobre as economias latino-americanas. 2 A ascensão de Margareth Thatcher na Inglaterra e Ronald Reagan nos EUA, associados à incapacidade da social democracia europeia apresentar uma solução à crise do final dos anos 70 fortaleceu a alternativa neoliberal e levou à crença de que a solução seria a adoção de uma agenda ortodoxa.

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receituário ortodoxo. Nas palavras de Cruz (2007: 27) “os países latino-americanos

vêm enfrentando, desde o início dos anos 1980, uma conjuntura severamente

adversa do ponto de vista de sua autonomia nacional”.

Assim nos anos 1990 é possível observar uma inclinação à direita na região.

Nesse contexto também foi possível observar que os governos que chegaram ao

poder, nesse período, eram coalizões de direita ou centro-direita, que aceitaram as

orientações dos mecanismos internacionais e adotaram a agenda ortodoxa3. De

acordo com Diniz (2007), a América Latina se tornou um verdadeiro laboratório de

aplicação dos preceitos neoliberais. Stiglitz (2002: 245) argumenta que “A América

Latina tornou-se o melhor aluno do Consenso de Washington, com a Argentina e o

Chile aparecendo como os pupilos mais aplicados”. O resultado foi catastrófico para

a Argentina que ingressou em uma profunda crise econômica no início dos anos

2000, tendo como resultado o agravamento dos problemas econômicos e das

questões sociais. O Chile foi mais bem sucedido por ter sido seletivo na adoção do

referido receituário, uma vez que o governo optou por não privatizar completamente

os ativos do Estado e enfatizou programas de saúde e educação.

Para os que optaram por implantar as medidas ortodoxas um dos primeiros

resultados foi o crescimento do arrocho econômico, que se refletia principalmente

nas camadas populares, os percentuais do mercado de trabalho formal se

reduziram, ao mesmo tempo em que cresceu o número de desempregados e de

pessoas vivendo na pobreza. O risco de ter seguido o receituário do Consenso de

Washington foi assumido somente pelos países, ou seja, “O sistema internacional

lava as mãos dentro da melhor tradição de que o sucesso tem vários pais, mas o

fracasso é órfão” (Dupas, 2005: 28).

Após o fracasso das políticas neoliberais da década de 1990, é possível

observar uma nova virada no pendulo, dessa vez em direção à esquerda. Os

partidos de esquerda que voltaram a se estruturar após o fim dos regimes militares,

voltaram a concorrer nas eleições e surgiram como alternativa.

De acordo com Pannizza (2006), uma verdadeira marea rosa atingiu a

América Latina. Partidos de esquerda e centro esquerda chegaram ao poder na

Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Costa Rica, Equador, Nicarágua, Panamá, Peru,

3 Importante destacar que essa agenda foi seguida em diferentes proporções.

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Venezuela, Uruguai. Embora tenham suas especificidades, marcadas pela trajetória

dos partidos e lideranças e pelo contexto específico de cada país alguns elementos

comuns podem ser observados nos governos progressistas que chegaram ao poder

no fim dos anos 1990 e inicio dos anos 2000. Um deles é o anti neoliberalismo.

“Pode-se afirmar assim que o antineoliberalismo serviu simbolicamente de “farol” e

de denominador comum aglutinador, em meio ao “nevoeiro” das grandes

transformações ocorridas na última quadra histórica” (Silva, 2010: 5). Outro elemento

comum às esquerdas é a implantação de políticas de inclusão social, esses

governos têm a preocupação em gerar políticas que visam o bem-estar social, de

modo focalizado. O terceiro é sua atuação internacional, busca de maior autonomia

em relação aos mecanismos internacionais, alternativas econômicas ao peso dos

EUA, construção de parcerias com países em desenvolvimento e integração regional

(Silva, 2010).

O inicio dos anos 2000 é marcado por dois movimentos importantes, por um

lado observamos a ascensão dos governos de esquerda e por outro a expansão

democrática. Entre 2005 e 2008, por exemplo, foram realizadas 15 eleições

presidenciais, o maior número de eleições democráticas realizadas na história da

região.

Apesar de alguns casos de não conclusão de governos eleitos

democraticamente eleitos (Walker, 2009), nas duas últimas décadas predominaram

a consolidação eleitoral e o respeito às regras do jogo. Nesse sentido, a democracia

continua sendo considerada preferível em comparação com outros regimes, 54%

dos latino-americanos optam pelo sistema, no mesmo sentido, 74% estão de acordo

com a afirmação que a democracia pode ter problemas mas é o melhor regime de

governo (Walker, 2009). Logo, podemos observar que há fortalecimento do regime.

Mesmo com situações de instabilidade política, quedas de presidentes, escândalos

de corrupção, não houve ruptura democrática na região.

3. Determinantes do Desempenho Econômico na AL

3.1. Desempenho no contexto democrático: análise descritiva

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A América Latina vem experimentando ao longo do tempo oscilações em seu

desempenho macroeconômico. Depois de um período de considerável crescimento

durante as décadas de 1960 e 1970, o que se observa é um período de

instabilidade.

Assim como a Europa, a crise do fim dos anos 1970 chega à região latino-

americana trazendo vários desafios. Os regimes militares foram encerrados em

clima de crise econômica (inflação e dívida externa), porém ainda havia crescimento.

A expectativa de que a democracia traria a solução dos problemas econômicos foi se

esvaindo com o tempo e com a constatação de que embora o ambiente democrático

favorecesse as questões políticas e institucionais, não trazia a fórmula mágica para

solucionar os problemas econômicos.

O desempenho econômico apresentou seus piores índices nos anos 1980.

Foi a pior fase de crescimento se comparar o desempenho dos países latino-

americanos nos anos 1980 com os anos 1960 e 1970, e com o desempenho dos

países do leste asiático. Além da redução nas taxas de crescimento, os anos 1980

foram marcados pela queda do PIB per capta, que apresentou resultados negativos

no período. O Estado passou a ser visto como a origem de todos os males, o

responsável pela estagnação que se apresentava, e a opção encontrada era

acreditar no mercado (Evans, 1998).

Conforme discutido no tópico anterior, as diversas transformações que os

países latino-americanos passaram nas últimas duas décadas não apenas

modificaram o funcionamento das instituições políticas dentro do processo de

democratização, como também refletiram em um novo ambiente de tomada de

decisões econômicas. A concentração de poder decisório, característica dos regimes

autoritários anteriores, deram lugar a inclusão de novos atores (stakeholders) dentro

de uma dinâmica de relações de interesse mais complexa num contexto democrático

e mais globalizado, incluindo governos subnacionais, parlamentares, grupos de

interesses, movimentos sociais, dentre outros.

Assim, os governos que assumiram a condução desses países se depararam

com os constrangimentos externos, em um ambiente de forte pressão interna e

externa pela resolução do problema maior que se impunha: a crise econômica.

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Nesse sentido, maior parte desses governos acabou optando por adotar a agenda

neoliberal que previa o equilíbrio “macroeconômico e a trilogia (estrutural): abertura

externa, mercados livres e privatização” (Valdés, 2008: 208) como a solução do

entrave que se impunha, e como o modelo capaz de garantir estabilidade e

prosperidade.

Embora tenha havido uma recuperação nos índices de crescimento, na

década de 1990, seu patamar foi inferior ao período 1950-1980. Os efeitos do lento

crescimento ultrapassaram os anos 1990 e chegaram ao inicio do século XXI. Junto

à dificuldade de superar os desafios estava o desencanto da população latino-

americana.

Em princípios do século XXI, observa-se por toda a região um sério problema de frustração de expectativas. Existe a percepção de que o crescimento econômico da America Latina pós reformas foi reduzido. Por diferentes causas, observando a situação que prevaleceu no século XXI esse conjunto de reformas não produziu uma melhoria substantiva e permanente em um segmento importante da população de muitos países latino-americanos (Valdés, 2008: 208).

No mesmo sentido, Rodrik (2006) afirma que a América Latina e outras áreas

subdesenvolvidas adotaram as reformas de liberalização econômica mais radicais já

registradas e, no entanto, o crescimento econômico obtido ficou muito aquém do

esperado. Após a constatação de que os países que seguiram uma estratégia

própria foram os que apresentaram os melhores resultados4, houve uma mudança

na ênfase da política econômica na América Latina. O Estado voltou a ser visto

como ente regulador necessário à manutenção da estabilidade econômica. Uma

importante medida foi a alteração dos preços relativos no mercado internacional, a

qual provocou um efeito positivo, o que favoreceu as balanças comerciais e

promoveu uma nova guinada em direção ao crescimento, porém um crescimento

mais tímido que o observado no período anterior. Não obstante, esse crescimento

econômico não ocorreu de maneira uniforme na região.

4 As países do leste asiático que privilegiaram as exportações e mantiveram o Estado como principal regulados da economia, apresentaram os melhores resultados econômicos da década de 1990 e se recuperaram mais rapidamente das crises.

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Com efeito, o desempenho econômico das nações apresenta um alto grau de

variabilidade. Mas como mensuramos esse desempenho? A literatura acerca do

tema é muito diversificada, entretanto, para fins desta pesquisa optamos por três

importantes indicadores macroeconômicos que, em grande medida, refletem os

resultados das políticas econômicas dos governos nacionais. São eles: crescimento

do produto interno bruto (PIB), taxa de inflação e variação no índice de desemprego.

Além de serem bons indicativos dos resultados alcançados pela política

econômica do governo, estas variáveis também exercem impacto no cotidiano da

sociedade, o que as torna ainda mais interessante nas análises dos determinantes

do comportamento e consequentemente do desempenho dos governantes.

O crescimento econômico é medido por meio do percentual de crescimento

anual do Produto Interno Bruto dos 18 países estudados, com dados do Banco

Mundial (World Development Indicators)5. O crescimento econômico médio

observado no período de 21 anos, para o conjunto dos países da pesquisa, foi de

3,8%. Todos os países apresentam um saldo positivo, sendo que o menor foi obtido

pelo México (2,8%) e o maior pelo Panamá (5,6%). Não há maiores diferenças se

considerados os blocos econômicos ou comerciais da região: os países do Mercosul

alcançaram um crescimento de 3,3%; os países da Comunidade Andina (inclusive

Venezuela e Chile), 3,8%; e os países abrangidos pelo Tratado de Livre Comércio da

América Central e República Dominicana (CAFTA-RD) obtiveram um crescimento de

3,9%.

De fato, como pode-se observar a partir da figura abaixo, a obtenção de

crescimento econômico predominou durante o período da pesquisa (1990-2010).

Considerando os 18 países, nos vinte um anos aqui analisados, em apenas 45

casos (13%) houve retração econômica. Embora a maior parte tenha passado por

pelo menos um ano com queda no Produto Interno Bruto, três países passaram todo

o período de crescimento constante: Bolívia, Panamá e Guatemala. Por outro lado,

alguns países experimentaram retração em número maior de anos: Venezuela, em 7

anos; Argentina, em 6; Uruguai, em 5 e Nicarágua, em 4. Destacam-se dois casos

com mais de dois anos de recessão, ocorridos na Argentina e no Uruguai, ambos

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entre os anos de 1999 e 2002. Reflexo das crises internacionais, os piores anos para

a economia latino-americana foram os de 2009 e 1999, com respectivamente nove e

oito países com recessão.

Figura 1 – Crescimento Econômico na América Latina, 1990-2010

Fonte: Bureau for Latin America and the Caribbean/USAID. Elaboração própria.

Quanto à inflação, a variável selecionada reflete os índices oficiais dos

governos para a média anual de inflação medida por índice de preços ao consumidor

para os 18 países da investigação, conforme dados do Departamento de Pesquisa

do Banco Interamericano de Desenvolvimento6. Neste conjunto, quatro países

alcançaram, em ao menos um ano, índice de inflação superior a 200% após 1990 –

Argentina, Brasil, Nicarágua e Peru7. Por outro lado, 13 países enfrentaram ao

menos três anos consecutivos de inflação superior a 15% entre 1990 e 2010. Na

5 Sítio do Bureau for Latin America and the Caribbean na internet, mantido pela United States Agency for International Development, disponível em http://lac.eads.usaidallnet.gov/, acessado em 6 de março de 2012. 6 Sítio do Latin American and Caribbean Macro Watch Data Tool na internet, disponível em http://www.iadb.org/Research/LatinMacroWatch/lmw.cfm, acessado em 6 março de 2012. 7 Para não comprometer as estimativas dos modelos, dez casos extremos - taxas de inflação acima de 200% - foram substituídos pelas média. Com se trata de menos de 3% do total de observações, acredita-se que tal opção não diminui a validade interna da análise.

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maioria dos casos os problemas inflacionários foram controlados no início da década

de 1990, como é possível visualizar na figura 2 a seguir. Seis países não registraram

três anos consecutivos de inflação superior a 15% após 1995, o Brasil não registrou

após 1996, Honduras e Uruguai após 1997, Colômbia após 1998, México após 1999

e Equador após 2001. Argentina destaca-se por apresentar índices negativos entre

1999 e 2001, mas o único caso destoante no que concerne ao controle da inflação é

o da Venezuela – ao longo dos anos 2000, o país continua a ostentar índices de

inflação superiores a 20%.

Figura 2 – Taxa de Inflação na América Latina, 1990-2010

Fonte: Banco Interamericano de Desenvolvimento. Elaboração Própria.

No que tange ao desemprego, foram utilizados dados da Comissão

Econômica para a América Latina e o Caribe – CEPAL8, suplementados, para os

casos ausentes, com dados do Departamento de Pesquisa do Banco Interamericano

8 Sítio do Bureau for Latin America and the Caribbean na internet, mantido pela United States Agency for International Development, disponível em http://lac.eads.usaidallnet.gov/, acessado em 6 mar. 2012.

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de Desenvolvimento9. A pesquisa opta por utilizar a variação da taxa anual de

desemprego em relação ao ano anterior. Acredita-se que essa é uma medida mais

precisa do que a simples taxa de desemprego, uma vez que possibilita mensurar os

resultados das políticas econômicas entre os anos, como também exclui a questão

do desemprego estrutural. Como pode-se observar a partir da figura abaixo, os

países apresentam uma variação da taxa anual de desemprego bastante

significativa. A situação mais grave de aumento do desemprego (6 p.p.) ocorreu na

Argentina, em 1995. No período da pesquisa (1990-2010), os melhores resultados

em queda do desemprego podem ser observados no Equador, em 2000 (-5,4 p.p.);

na República Dominicana, em 1994 (-3,9 p.p.); e no Uruguai em 2004 (-3,8 p.p.).

Figura 3 – Índice de Desemprego na América Latina, 1990-2010

Fonte: Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe – CEPAL. Elaboração própria.

9 Sítio do Latin American and Caribbean Macro Watch Data Tool na internet, disponível em http://www.iadb.org/Research/LatinMacroWatch/lmw.cfm, acessado em 6 mar. 2012.

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3.2. Modelo Explicativo

O objetivo principal deste trabalho é avaliar o impacto da dinâmica política, em

especial, competição eleitoral e ideologia sobre o desempenho econômico dos

governos nacionais na América Latina durante o presente período democrático. Este

estudo tipo de abordagem não é nova nas ciências sociais. Desde os anos 70, uma

série de trabalhos vêm investigando comparativamente o impacto de fatores de

natureza política sobre os resultados da política econômica, sobretudo, nos países

da Organização para a Cooperação e Desnvolvimento Econômico (Castles, 1978;

Castles; McKinlay, 1979; Cameron, 1978). A linha de pesquisa tem como premissa

da importância do papel da intencionalidade das decisões sobre os resultados da

economia, como fica evidente na afirmação de Douglas Hibbs (1977: 1487): “os

resultados macroeconômicos não são totalmente endógenos, mas, obviamente, são

influenciados em grande medida por escolhas políticas de curto e longo prazo”.

Nas últimas décadas, todavia, prevalece a ausência de consenso acerco da

efetiva influência política sobre a economia. Nesse contexto, Imbeau, Pétry e Lamari

(2001) a partir de uma extensa pesquisa bibliográfica classificam a literatura em

duas vertentes: ‘escola da convergência’ e os adeptos da perspectiva de que ‘a

política importa’. Os primeiros argumentam que as sociedades industrializadas do

século vinte se tornaram cada vez mais similares, encarando os mesmos tipos de

problemas e aplicando os mesmos tipos de soluções. Logo, as diferenças políticas,

culturais e institucionais pouco servem para explicar as variações das políticas

públicas. Em contrapartida, a segunda vertente, embora não negue a influência de

fatores socioeconômicos, preconiza a existência de correlação entre variáveis

relativas à dinâmica política e resultados das políticas públicas. Esse debate

continua latente nas abordagens comparadas entre nações, nos últimos anos, que

analisam uma grande variedade de temas para além do crescimento econômico

(Bjornskov, 2005), incluindo também o processo de desregulamentação do mercado

(Potratke, 2010), liberalização da industria (Belloc; Nicita, 2011) e privatização

(Bjornskov; Potrafke, 2011).

No sentido de aplicar esse debate no caso latino americano, o presente artigo

procura testar duas hipóteses relacionadas ao funcionamento do sistema

democrático. O argumento central da teoria da democracia eleitoral é que as

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eleições e seus aspectos subjacentes influenciam o comportamento dos políticos e,

por conseguinte, o desempenho dos governos. Na perspectiva de accountability, a

democracia tende a produzir governos controlados e responsivos à população, cujos

partidos políticos atuam como atores centrais dentro de processo eleitoral livre, justo

e frequente.

Autores como Castles (1982), Klingemann, Hofferbert e Budge (1994) e

Powell (2009) apontam para o papel fundamental dos partidos políticos no processo

democrático, na medida em que organizam e apresentam nas eleições pacotes de

políticas ideologicamente coerentes, permitindo assim que a democracia conecte a

preferência dos cidadãos e a política pública. Para outros autores, contudo, esta

capacidade dos partidos enfraqueceu-se devido à ampliação dos espaços insulados

da política nos governos e pela falta de clareza na distinção ideológica entre as

agremiações, entre outros fatores (Mair, 2007). Ainda que os partidos não

desempenhem um papel controlador da política pública por meio da ideologia, a

competição eleitoral periódica pode incentivar a accountability na medida em que

permite ao eleitorado julgar o desempenho dos governantes, gerando recompensas

e punições que estimulam o governo a respeitar os interesses dos cidadãos (Manin;

Przeworski; Stokes, 1999).

Assim, a presente pesquisa estuda dois importantes fatores políticos

relacionados à accountability: a competição eleitoral e a ideologia partidária. A

variável competição eleitoral10 é empregada para testar se o grau de disputa nas

eleições atua como ameaça aos políticos locais de modo a estimular e controlar o

desempenho das suas atividades, servindo como um fator gerador de accountability.

Em outras palavras, esperamos que quanto mais acirrada as eleições para

presidência dos países latino-americanos, melhor o desempenho dos governos na

economia – maior crescimento, menor inflação e menor desemprego.

Um segundo aspecto central na literatura é o impacto da ideologia do partido

do Presidente sobre o desempenho governamental. Esta pesquisa se baseia na

escala de posicionamento de Anthony Downs (1957) que ordena a esquerda e a

10 Existem diversas formas de se calcular a competição eleitoral, para fins desta pesquisa, será utilizado a margem de vitória (% de votos) entre o primeiro e o segundo colocado nas eleições presidenciais (1º turno).

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direita de acordo com a visão sobre a intervenção estatal na economia. Nas

democracias industriais, pelo menos até a década de 1970, os governos de

esquerda estiveram associados a uma política econômica direcionada para o

crescimento econômico e a geração de emprego, em detrimento do controle da

inflação (Esping-Andersen, 1998, p. 186; Hibbs, 1977). Na mesma direção,

Przeworski (1985, p. 205) defende que “a ideologia que orienta a direita é

antiestatismo [...] baseado na crença de racionalidade do mercado [...] enquanto a

esquerda pós-segunda guerra mundial preconiza o programa Keynesiano de pleno

emprego e equidade”.

Seguindo esse raciocínio, o critério básico da diferenciação remete ao papel

do estado e do mercado, no qual os partidos de esquerda apresentariam uma

postura mais intervencionista em favor do emprego e do crescimento econômico.

Para tanto, são utilizadas as estimativas de posicionamento ideológico de pesquisa

junto aos parlamentares de cada país pesquisado (câmaras baixas), nas quais os

mesmos posicionam os partidos entre as posições zero (mais à esquerda) e dez

(mais à direita)11. As expectativas em termos de resultados das políticas públicas

para a posição do partido do presidente nesta variável são os seguintes: quanto

mais baixo (esquerda), mais crescimento econômico e menos desemprego; quanto

mais alto (direita), menor a inflação.

Empregamos ainda duas outras varáveis políticas: ano eleitoral e índice de

direitos políticos da Freedom House12. A primeira se fundamenta na teoria do ciclo

político de negócios (political business cycle) e visa medir os efeitos da agenda do

ciclo eleitoral sobre o desempenho da economia. Isto é, se ocorre tendência de

maior crescimento e inflação e redução do desemprego em períodos de eleições

para melhorar a imagem da gestão perante os eleitores (Nordhaus, 1975; Tabellini;

Persson, 1999). Quanto aos direitos políticos, sua aplicação no modelo tem como

11 Foram utilizados dados das pesquisa survey Observatório de Elites Parlamentarias en América Latina, desenvolvidopela Universidad de Salamanca. Os dados cobrem quase todos os partidos dos presidentes no período e nos países estudados, sendo que foram utilizados os dados da pesquisa realizada para a legislatura nas quais ocorreram as eleições presidenciais, ou a mais próxima disponível. Os dados forma extraídos no shttp://americo.usal.es/oir/elites/series_temporales.htm, em 1 de fevereiro de 2012. 12 O índice de direitos políticos da Freedom House mensura o grau de liberdade apresentado nos países para a participação dos indivíduos no processo político, com base em três categorias: pluralismo político e participação, processo eleitoral e funcionamento do governo. Dados extraídos em http://www.freedomhouse.org.

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objetivo avaliar se o regime ou nível de democratização do país exerce ou não

efeitos sobre os resultados alcançados em termos de política econômica, algo

rechaçado por alguns acadêmicos (Przeworski et al., 2000).

Outros fatores também podem contribuir para explicar o desempenho

econômico das nações, por isso, utilizamos um conjunto de fatores de ordem

econômico como controle. O percentual das exportações em relação ao PIB e grau

de investimento externo podem ser indicativos de abertura econômica e liberalização

da economia e, por conseguinte, favorecerem um melhor desempenho deste setor.

Da mesma forma, as parcelas de gastos sociais e da indústria sobre o PIB são

utilizadas para testar se a maior propensão de investimentos nessa área e o maior

dinamismo econômico refletem em melhores resultados. Finalmente, de forma a

capturar a conjuntura internacional, o crescimento da economia dos países da

OCDE é empregado no modelo, haja vista, a histórica relação de dependência

econômica das nações latino-americanas.

3.3.Resultados

No sentido de estimar os efeitos dos determinantes políticos sobre o

desempenho econômico na América Latina foram aplicadas as técnicas tradicionais

de regressão econométrica para dados em painel: efeitos fixos e efeitos aleatórios.

Ambos os tipos de modelos para análises com dados de painel possuem vantagens

e desvantagens. De acordo com Wooldridge (2006), o estimador de efeitos fixos é

eficiente quando os erros idiossincráticos são serialmente não-correlacionados e

homoscedásticos. Já os modelos de efeitos aleatórios são mais apropriados em

situações que o efeito não observado é não correlacionado com todas as variáveis

explicativas. Em todos os casos, contudo, os resultados dos testes de Hausman

apontam para a consistência das estimativas obtidas através do método de efeitos

fixos.

Como é possível perceber na tabela 1, a seguir, de modo geral, os resultados

empíricos indicam pouca capacidade explicativa dos modelos, o que é reiterado

pelos seus baixos coeficientes de determinação.

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No primeiro modelo, determinantes do crescimento econômico, se por um

lado as evidências confirmam a hipótese da influência da ideologia, por outro, a

relativa à competição eleitoral é rechaçada.

No que tange ao impacto da ideologia partidário, as evidencias empíricas

favorecem a interpretação de que a alternância de poder na região, mais

especificamente, as vitórias de partidos mais esquerdistas geraram melhores

desempenhos econômicos. O coeficiente estimado indica que quanto menor a

medida de ideologia empregada (mais à esquerda o governo) maiores tendem a ser

as variações positivas do PIB. Isto é, um ponto a menos na medida ideológica do

partido governista tende a gerar em média cerca de 0,6 a mais de crescimento do

PIB nacional.

Quanto à competição eleitoral, o seu coeficiente positivo e significante indica

justamente o contrário do pressuposto teórico, ou seja, quanto mais acirrada as

eleições presidenciais na América Latina melhores seriam os desempenhos em

termos de crescimento do PIB dos candidatos eleitos no decorrer dos seus

mandatos. Do ponto de vista substantivo, entretanto, os efeitos são de fato bastante

residuais na medida em que a variação de um desvio padrão acima da média tende

a refletir em menos de 0,001 na variação do crescimento econômico.

Em relação às demais variáveis políticas, ano eleitoral não demonstra ser um

fator influente nesta dimensão assim como o indicador de direitos políticos

empregado no modelo. Dentre as variáveis de controle, somente o nível de

industrialização da nação parece afetar as taxas de crescimento econômico na

América Latina durante o período analisado. Esse efeito, contudo, é relevante na

medida em que o incremento de um por cento na participação da indústria no PIB

reflete em 0,3 a mais de crescimento da economia.

O modelo dos determinantes da inflação também indica significância

estatística da variável de competição eleitoral. Neste caso, o coeficiente é

significativo e negativo, o que converge com o efeito esperado. Em outras palavras,

quanto menos disputada a eleição anterior melhor tende a ser o desempenho do

Presidente no combate à inflação, mais especificamente, um ponto percentual na

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margem de vitória a menos gera uma redução no índice inflacionário de 0,15,

mantendo os demais fatores constantes.

Por outro lado, a segunda hipótese relativa ao impacto da ideologia não se

confirma na análise da inflação, assim como o fato de se realizar eleições no ano ou

de prevalecer uma regime político mais democrático. Ademais, o nível de gasto na

área social se mostrou significativo e com um efeito expressivo, haja vista que o

incremento de um desvio padrão em relação à média dos gastos sociais repercute

em aproximadamente 2% a mais nos índices de inflação anual, o que em grande

medida é compreensível.

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Tabela 1 – Determinantes do Desempenho Econômico na América Latina, 1990-2010

0,04* -0,15** -0,01**

(0,02) (0,07) (0,01)

-0,56* 1,67 0,01

(0,32) (1,04) (0,12)

-0,15 -1,63 0,02

(0,55) (1,78) (0,21)

-0,02 1,56 -0,01

(0,33) (1,09) (0,12)

0.00 0,11 -0,06***

(0,06) (0,20) (0,22)

0,18 -0,44 -0,05

(0,11) (0,19) (0,44)

0,15 -3,77*** 0,03

(0,14) (0,47) (0,55)

0,30*** -0,20 -0,05

(0,08) (0,46) (0,03)

0,18 -1,21 -0,04

(0,26) 0,084 (0,09)

-5,67 56,63 2,71*

(4,04) (13,07) (1,54)

R2 0,01 0,005 0,01

N 269 269 269

Teste de Hausman 24,13** 83,90*** 20,57**

Notas: Coeficientes estimados e erros-padrões entre parentesis.

Significância estatística: * significa valor-P < 0,1; ** valor-P < 0,05; *** valor-P < 0,01.

Exportação

Investimento Estrangeiro

Gasto Social

Industrialização

Crescimento Econômico Inflação Desemprego

Competição Eleitoral

Ideologia

Crescimento OCDE

Constante

Ano Eleitoral

Direitos Políticos

Finalmente, no modelo dos determinantes do desemprego assim como nos

demais, a variável de competição eleitoral apresenta efeitos estatisticamente

significativos. Nesse caso, entretanto, embora com efeitos mais residuais do que na

inflação, as evidências mostram a relação negativa do coeficiente estimado. Assim,

pode-se afirmar que quanto maior a competição nas eleições na América Latina

melhores tendem a ser os resultados da política de emprego. Nos demais fatores de

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caráter político não se observa impacto significativo da ideologia, ano eleitoral e

direitos políticos. Quanto aos controles, o aumento da participação da exportação no

PIB parece refletir em menores índices de desemprego, em termos substantivos, um

aumento de um ponto percentual na participação das exportações sobre o PIB tende

a gerar uma redução de 0,06 nas taxas de desemprego das nações, em média.

4. Considerações Finais

O artigo se propôs a desenvolver uma investigação sobre os efeitos da

dinâmica política nas últimas duas décadas sobre o desempenho macroeconômico

das nações latino-americanas. A temática se torna ainda mais relevante na medida

em que este período foi marcado por um conjunto de transformações políticas e

institucionais profundas que culminaram em inéditas reconfigurações das forças

políticas na região. Nessa direção, a pesquisa procurou testar se o grau de

competição nas eleições presidenciais e a postura ideológica dos partidos

governantes exerceram efeitos sobre o desempenho das economias na América

Latina, retratados pelo crescimento do PIB, inflação e desemprego.

Os modelos estatísticos, em síntese, reforçam a importância destes fatores na

explicação dos resultados econômicos, embora em menor medida do que era

esperado. No que tange à competição eleitoral, a hipótese de que quanto mais

acirrada as eleições para presidência dos países latino-americanos, melhor o

desempenho dos governos é confirmada para a inflação e o desemprego. Enquanto

que a hipótese do papel mais proativo dos novos partidos de esquerda pode ser

constatado na análise do crescimento econômico. Em relação as duas outras

variáveis de caráter político, primeiro, podemos afirmar que no período analisado o

grau de democratização do país, mensurado pelo índice de direitos políticos, não

importa, do mesmo modo que não se observou impacto de comportamento

oportunista em anos eleitorais nos resultados da economia na região, o que

converge com a literatura acerca do tema (Borsani, 2003).

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Outro aspecto interessante dos modelos está relacionado à influência de

fatores estruturais sobre o desempenho econômico das nações. Nota-se que o

impacto das variáveis selecionadas não apenas são pouco freqüentes, mas,

principalmente, variam de acordo com cada tipo de resultado macroeconômico

observado.

Em suma, podemos concluir que é inegável a relevância de se atentar para a

dimensão política na explicação do desempenho econômico dos países. Entretanto,

reconhecemos que essa tarefa não é trivial e, por conseguinte requer um

aprofundamento das análises e, principalmente, diversificação das ferramentas de

pesquisa. Dessa forma, acreditamos que o caminho de aperfeiçoamento desta

abordagem demanda novas tentativas metodológicas, seja aplicando novos métodos

estatísticos ou reconfigurando de forma distinta cada um dos modelos, ajustando

com mais propriedade a relação de variáveis estruturais de modo a minimizar

problemas de endogeneidade e/ou multicolineariedade.

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