história da igreja cristã, w. walker

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IEJA I

A pi~biica~o deste livro foi possvel graas as contribuies daEvangelisches Missionswerk iii Deutschialid (Hamburgo, Alemanha) e das Igrejas Pro~estantesUnidas na Holanda - Ministrios Globais (Utrecht),

s q~iais a hsociao de Semi~irios 'kolgicos Evanglicos agradece.

Associao de Seminrios Teolgicos Evanglicos I'resideni-e: Prof. Manoel Bernardino de Santana Filho (Rio de Janeiro) Vice-Preide~ite: Prof. Dr. Gerson Luis Linden (So Leopoldo) Secretrio: Prof. Dr. Nelson Krlpp (So Leopoldo) Tesoureiro: Prof. Gerson Correia de tacerda (So Paulo)Vogais:

Profa. Maria Betnia Arlijo (Recife) Prof. Carlos Getlio Halbero, ( ~ o r c o hlgre) ' l'rof. Dr. Paulo Roberto Garcia (So Bernardo do Campo)Diretor Executivo

Prof. Fernando Borrolleto Filho

DA IGREJA CRISTE RICHARD A. NORRIS DAUID W. LOTZ ROBERT T. HANDY

3' ediotraduo de Paulo Siepierski

Ttulo original: A Hiitory oj'tbe Christian Chuwh - Charles Scribner's Sons, New York 1959 O . Primeira ediio em irigua portuguesa: ASTE O 1967. Segunda edico em lngua portuguesa: 1980. Tesccira edi5o cm Krig~iaportuglicba; AS'l'E (baseada na 4nedico em ASTEIjUERP ingls) O 2006. Todos os direitos reservados.

Direo Editora1

Frliaildo BoitolltSOU

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O ofcio apost-

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lico, entretanto, na perspectiva de Cipriano havia recado sobre os bispos, os sucessores dos apstolos, que exerciam separadamente a autoridade de um ministrio coletivo nico. "H um s Deus e Cristo uin s, e h uma s ctedra [episcopado] fundamentada sobre a rocha, pela palavra do Senhor."" Ein conseqncia, sair da comunho com o bispo em qualquer local era, muito simplesmente, sair da igreja, a arca da salvaco. Pela mesma medida, sobre o princpio de que "o bispo est na igrejaSnhm n IJzidude d u Igreja 6. Cipriano, Fp~~o/u 55(51).6. ' Epstolik 43(39).5.

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e a igreja no bispo"," o carter da igreja como a morada do Esprito de Deus e a Me dos santos tambtm dependia, conforme a perspectiva de Cipriano sobre isso, da legitimidade, integridade e santidade do bispo. Se o lder c presidente da igreja, o qual ensinava o evangelho, administrava o sacramento do batismo e oferecia a Deus o sacrifcio da igreja lia eucaristia, fosse indigno ou impuro, ento a prpria comunidade deixaria de ser "igreja." Esras perspectivas - as quais de fato tornaram a unidade e santidade da igrcja

dependentes da pessoa do bispo - tiveram conseqncias tanto lgicas como histricas. Em primeiro lugar, elas levaram diretamente ao sistema de governo sinodal pelos bispos, um sistema que Cipriano encorajou e ao qual ele se submeteu. Cada bispo em seu Iocal sucedia autoridade apost1ica e por sua vez a exercia. Cada bispo tinha portanto direiro a voz nas preocupaes comuns da igreja em sua totalidade, a qual era sovernada apropriadamente no por qualquer indivduo mas pelo prprio colgio de bispos. Mesmo o bispo de Roma - quem certamente desfrutava uma dignidade especial e um especial direito liderana, porquanto sucessor de So Pedro - era no obstante, substantivamente, colega e portanro igual aos seus irmos. Ao mesmo tempo, a maneira de Cipriano focalizar a sanridade, e desra maneira a identidade da igreja na pessoa do bispo, levou quase ineviravelmence posio teolgica assumida pela igreja donatis~a no quarto e quinto sculos (ver 1II:l).

A Teologia do Logos e o MonarquianismoRoma foi, durante os episcopados de Vtor (189-198), Zeferino (198-217) e Calixto (217-222), a principal arena para um debate sobre as implicaces da teologia do I.ogos, conforme ela havia sido desenvolvida por Justino Mrtir e ourros apologistas. O interesse desse debate cnconrra-se menos em qualquer questo til do qual ele veio (ele parece ter sido conduzido pela maior parte com excessivo calor e ainda mais confuso) do que no faro que ele representa um primeiro encontro com

PER1000 II

OA CRISE GNSTICA A COISTANTIHO

111.3

problemas, os quais iriam engajar as igrejas na grande controvdrsia rrinitria do quarro sculo - probiemas em primeira instncia sobre a compreenso crist de Deus. No pode haver dvida que a teologia do Logos suscitou muitas questes srias. Enraizada nas cristologias da sabedoria do primeiro sculo (ver I:7), ela ~itilizava as expresses "FiIho de Deus" e "Cristo" para denotar uma figura mediatria a qual era, na frase de Justino, "outro Deus"' junramence com "o nico no criado",' o Pai. Essa distino entre Pai e Filho era, insistia Justino, simplesmente de "nmero" e no de "~onrade"; o~Logos era como uma tocha acendida dc outra,' divino como seu progenitor era divino. No obsranre, na descrico de Justino, como mais tarde iia de Tertirliano, a gerao do Logos ocorre apenas com uma perspectiva para a criao do mundo. O Filho, portanto, no co-eterno com Deus; ademais, ele existe para fornecer um mediador entre Deus e o cosmo na criaco e revelao, como a linguagem dc Joo 1:3 e 1:18, para no mcncioriar 1 Corncios 8:6, parecia sugerir. Assim, a teologia do Logos surgiu para introduzir um "segundo Deus", de modo no compatrar 1 0

tvel com o princpio do monoresmo; e mais ainda, eia sugeria que o Logos representava um grau ou tipo secundrio de divindade. Ela "subordinava" o Filho ao Pai. Foi contra a primeira destas implicaes da doutrina do Logos - a de uma Jualidade (ou trindade) de seres divinos - que um pequeno movimento surgiu tomando comoseu lema o termo grego monn~chiu, que significava (toscamente) "singularidade do

primeiro princpio." Esse "monarquianisrnon cIiegou em Roma, provenienct: da Asia Menor, em duas ondas sucessivas que representavam ponros de vista significativamente diferentes. Ambos foram repudiados por causa da maneira na ual seu monotcsmo estrito os levava a compreender a pessoa de Jesus.

A primeira dessas ondas chegou por 170lta de 190 na pessoa de um ccrto Tedoto,um curtidor de Bizncio. Este homem, apesar de sua excomunho por Vitor, encontrou discpulos erirgicos em um certo Asclepidoto e outro Tedoto, chamado "o banqueiro", os quais rapidamente estabe1eceram unia igreja cismrica. O crc~ilo deles no foi popular entre os crisros comuns ern Roma, porque seus membros se deleitavam com o estudo de Ariscteles e seu comentarista Tcofrasto, para no mencionar Euclides o marcmtico e Galeno o escritor sobre medicina, e praticavam raciUiioi em:ande .nsntei.

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N.T. Boicio, cujo nome latino r r a Anicius Manlius Srveririus, cscrevcu a Consolao da Filosofia quando csrava na priso. acusado de r r a i ~ o Em . sua obra BoCcio argumnra que a aIina pode alcangar a felicidade Dor meio da ailico, ao compreender o valor da bondade e meditar sohrc a realidade de Deus. Devedor ranro ao esroicismo como a o neopiatonismt>. Bogcio tarnbCm crnriu sentimentos cristos. Sua obra r r r r c r u rrande influncia durante todo o perodo mdicval.^

visigodos, e, finalmenre, a a1ian.a dos burgndios com Constantinopla, colocara~n Teodorico c seus sucessores em uma posio de isolamento poltico. Com razgo, portanto, Teodorico ficou inquiero com a lealdade de muitos de seus funcionrios carlicos com mentalidade independente. O prprio Bocio morreu na priso sob a acusao de traio, e Cassiodoro por fim afastou-se do servio pblico para fundar uma escola e mosteiro. Mais importante ainda, tais tenses se manifestaram com a determinaqo do imperador Justiniano em reconquistar a Itlia para o imprio, um empreendimento que foi iniciado dez aiios aps a morte de Teodorico (526). Como conseqncia, a Itlia foi submetida a uma srie de campanhas militares destrutivas que deixaram em seu rastro fome, doenas e diminuico da populao. A prpria Roma - que no decurso destas guerras uma vez teve a totalidade de sua deportada - torilou-se uma cidade cheia de runas, seu povo to reduzido em nmero que muitas partes da cidade foram abandonadas e o mato tomou conta.

A reconquista bizantina, ademais, foi seguida quase imediatamente pela igualmentedebilitadora invaso dos pagos lombardos (568), cujos lderes,1 1 0 final

do sexto

sculo, controlavam a maior parte da Itlia cencral e setentrional, isolando Roma de Ravena, a sede do exarca imperial, como tambdm dos rerritrios bizantinos ao sul. Estes eventos no poderiam deixar de afetar a vida da igreja na Itlia. O papado, como a populao de fala latina em geral, esteve, durante a primeira metade do sexto sculo, envolvido na luta entre Coilstantinopla e os ostrogodos e tornou-se por um perodo instrumento de lealdades e partidos polticos conflicantes, perdendo no processo muito de sua aueoridade moral. A sicuao foi modificada, enrretanto, com o advento dos Iornbardos. Com Roma separada da sede do exarca imperial, que crn todo caso estava sem recursos militares suficientes para desafiar o domnio lombardo,O

bispo romano foi forado a se rorriar o Ider tanto espiritual como poltico dosgeral das igrejas no Ocidcnie.

cristos em Roma e circunvizinhana, mesmo enquanto mantinha, ou procurava manter, sua superviso Exatamente ncsse pon[o na histria, chegou ao trono papal um homem que no apenas aceitou os desafios de sua prpria Cpoca, mas tambm forneceu s igrejas ocidenrais um corpo de escritos que ~iiuitofizeram para modelar o pensamento, piedade e ideal da cristandade medieval: Gregrio I, corretamente cngnominado "Magno" e tradicionalmente coilsiderado um dos quatro "dourores da igreja" latinos. Gregrio nasceu (ca. 540) em Roma, filho de uma proeminente famlia senarori-

Paiono III

U ESTADO IMPERIAL OA IGREJA

al. Alcanando a eminncia civil ainda jovem, ele tornou-se prefeito (governador) de Roma antes de 573. Atrado para a vida monstica, entretanto, ele se desfez de sua vasta herana, dedicando-a ao cuidado dos pobres c fundago de mosteiros - seis na Siclia e um em Roma, que ocupava o antigo palcio de sua famlia na colina Ctlia. Gregrio entrou nesse mosteiro como um simples monge. Aps trs anos, contudo, o papa da poca fez de Gregrio um dos sete diconos de Roma, responsvel pela ad~ninistra~o de uma regio da cidade. O papa Pelgio 11 (579-590) ento enviouo a Constantinopla como seu embaixador residente (aporrisa~ixs), onde Gregrio serviu com habilidade, embora, curiosamente, sem adquirir um conhecimento do grego. Por volta de 586, ele estava novamente em Roma, agora agindo como abade de seu mosteiro de Santo AndrC. Em 590, ele foi escolhido papa, aceitando a responsabilidade com grande relutncia, em um momento quando uma praga estam devastando a cidade. Ele morreu catorze anos depois, em 12 de marco de 604.

Com um sentimento de dever e uma ateno para detalhes prprios de um magisrrado romano, Gregrio buscou cumprir as obrigaces de seu ofcio. Ele cumpriu-as, todavia, no esprito de um fiel cristo que nos eventos de sua poca percebiaa evidncia de que a era presente estava aproximando-se de seu fim e sabia que havia

sido chamado para cuidar do povo do Senhor em vista do juzo, que esrava chegando em breve para eles como tambm para ele. Consciente de sua dignidade e das prerrogativas de seu ofcio, ele no obstante coiisiderou-se como "servo dos servos de Deus",em cadeias de amor para admoestar, proteger, e assistir a todos que estivessem sob

sua responsabilidade. Foi em vista de sua misso pastorai que ele imediatamente passou a reformar a administrao das vastas propriedades da igreja romana na Siclia, Itlia e Provena Gzendas cuja renda na maioria das vezes era apropriada por bispos locais ou sovernantcs seculares. N o que se refere a Gregrio, essas propriedades pertenciam de direito aos pobres, que deveriam ser alimeniados, vestidos e assistidos com a renda delas. Correspondeiitemente, ele indicou representantes pessoais para supervisionar2

administraco delas e dedicou muito de seu prprio tenipo, dando instru~es prc-

~ i s a sobre s assuntos que variavam desde a plarirao de lavouras at a alimentaG~o de ;ado. Dessa maneira, ele recuperou parri a igreja romana a renda do "patrirnonio de d o Pedro" e foi capaz de prosseguir e 1 1 1 sua poltica de sustencar os desrirudos, os ~i;cludos e oucras vitimas da "insegurana de ilossos tempos."

Ao mesmo tempo, Gregrio achou-se compelido a lidar com os lombardos, os

254

HISTORII DA IGREJA CRISTi

quais no exato momento em que ele chegara ao trono papal estavam ameacando a cidade de Roma. Sem consultar o !governador imperial em Ravena, em 592 Gregrio efetuou, atravs do pagamento de tributo, uma trgua com os duques lombardos de Espolero e Benevento e continuou, por todo seu ponrificado, a lidar com as autoridades lombardas nesse estilo independente, pressionando todo o tempo o relutante imperador Maurcio a realizar uma trgua geral entre Constantinopla e o reino lombardo - uma resoluo que cle percebia ser necessria, no apenas por causa da debilidade militar do imprio na Irlia, mas tambm por causa da necessidade de paz para a Itlia e seu povo. Da mesma maneira, sua preocupao com o estado corrupto da igreja e seu ministrio sob as polticas exploradoras dos governantes riierovngios (francos) da Glia (ver IV:2), levou-o tanto a se corresponder com os reis merovngios como advogar um matado de paz permanente entre eles e o imperador. Somente assim, julgava, poderia ser mantido o bem-escar da igreja e de seu povo. Gregcrio assim estabeleceu-se, na busca do cumprimento de suas preocupaes pastorais, como um governante virtualmente independente na Itlia central e o principal benfeitor do povo comum da Itlia. Suas polricas tambm forneceram um precedente para a deciso de seus sucessores do oitavo sculo para renuilciarem k dependncia ao imprio oriental e entrarem em alianp com uma monarquia franca reconstituda. Nem estes empreendimenros polticos nem sua preocupao com a administra-

io das propriedades da igreja romana exauriram as energias de Gregrio. Foi elequem, Joo, o Jejuador, patriarca de Constantinopla (582-595), comeou a utiIizar o ttulo "parriarca ecurnfnico", protestou em defcsa tanto do sistema dos cinco patriarcados independentes como das prerrogativas de sua prpria s. Em sua perspectiva, no havia nenhum bispo que pudesse reivindicar tal ttulo. Novamente, foi Gregrio quem, ao saber do casamento do rei saxo Etelberto de Kent com uma princesa crist e catlica, prontamente despachou missionrios para a Inglaterra (ver

IV: I), ganhando assim a Inglaterra no apenas para o cristianismo mas tambCm paraa fidelidade ao papado e para seu prprio projeto de uma igreja reformada por meio

da purificao de seu ministrio.Nada, na realidade, estava mais perto do c o n ~ o dc Gregrio do que a regulamenra~o c reforma do ofcio rninisrerial, a no ser o aumento e melhoria das instituies monsticas. Naquilo que talvez tenha sido sua maior - e certamente uma de suas mais influentes - obra, a Regi-a Pdsmrdl, o papa expressou seu ideal elevado do bispo cristo como pastor de almas. Esta obra, traduzida para o grego antes da morte

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I

PIAIOI III

O kPIADD IMPERIAL DA IliIIEJR

275

de Gregrio e em angio-saxilico pelo rei Alfredo, o Grande, na sculo nono, tornou-se, no Ocidente medieval, o traramento padro de seu rema. A extensa correspondncia de Gregrio (da qual restam cerca de 850 cartas) mosrra como ele tornou suas idias em prtica quando dirigia os negcios das igrejas itaiianas imediammentesob sua autoridade. Ele no limitou seu inreresse, todavia, apenas s igrejas da Itlia.

Ao limite que a condio das comunicaes permitia, Crtgrio fez sua autoridade sentida em correspondncia com os bispos metropolitanos em outros setores do

Ocidente - Espanka (onde o rei visigodo, Recaredo, renunciou ao arianismo em

5 S 7 ) , Glia (oride ele reest-dbeleceu uni vicariato papal eiri Arlesj, hica e ar&mesmona Ilria.

Se a Regm Paxtorui foi a contribuio de Gregrio compreenso ocidental do ofcio pastoral, sua Moralem]b (escrita, pelo menos em forma preliminar, enquanto ele residia em Constantinopla) foi seu legado a espiritualidade monstica. Nesta obra, um tratamento alegrico de seu texto, ele lida no apenas com a vida ativa de moraIidade mas tambm com a vida contemplativa do reino vindouro de Deus, que para ele como para Agosrinho era a meta do esforo humano. De no menor importncia do que a Moral, entretanto, foram os quatro livros de Gregrio sobre os D i -. >

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logo$ sobw u Vidu e Milagres dos Pais Italiu~zox, uma obra que nos sculos aps a morte de seu autor circulavam no apenas enrre clrigos e monges mas tambm entre o Iaicato e assim muito fez para formar a picdade medieval popular. Este livro, repleto de estrias de sonhos, visiies e maravilhas que demonstram o poder da sanridade, uma indicaco admirdvel da forma na qual a f e vida crist fizeram seu apelo em uma poca de viol9ncia, deslocaciio e declnio cultural. Ele tambm contm digresses teolgicas nas quais, quando Gregrio na realidade interpre~a e funde sua heranqa teolgica agosriniana com a f prrica de sua tradio romana, podem ser discernidas os contornos da piedade e do pensamento medieval posterior. Pode haver pouca dvida que o pensamento teolgico de Gregrio revela as 1Emi[aes impostas por sua siruao cultural e histhrica. Pot um lado, seus recursos e equipamento eram insuficientes. Ele pouco conhecia as obras de seus predecessores, ranto gregos como latinos, fora os ensinos de Agostinho (cujos escriros elr havia diligentemente resumido em um momento de sua vida). Por outr-o lado, as circunsrancias dr sua poca forneciam pouco encorajamento para grandes empreendimenros especulativos ou crticos. A preocupao de Gregrio era com o formato prtico da vida crist e do caminho do ser humano para a nova era do reino de Deus, cuja luz

L 56

HISTORIA DA IGREJA CRISTR

mesino em seus dias estava comecando a manifestar-se. Seu pensamento portanto voltou-se para os remas do pecado, juzo e o sacrificio expiatrio de Cristo; e nesses tpicos ele desenvoiveu as concluses de Agostinho (seno as idias c pcrcepes nas quais essas conclusfies estavam enraizadas) de uma maneira essencialmente consoan[c conl a posiqao do sriodo de Orange (ver 1lT;lS). A raa humana est algemada

pelo pecado de Xdo, coino C evidenciado pelo fato de que coda pessoa concebida por meio da concupisc?ncia. O indivduo C resgatado dessa condio pela obra de Cristo, cujos benefcios so conferidos no batismo por meio do perdo dc pecados edo dom do Esprito Santo. No obstante, deve ser feira satisfao pelos pecados corneridos depois do batismo: nenhum p a d o pode prosseguir sem uma expiao.Os meios essenciais de satishqo so as boas obras realizadas c 1 1 1 amor, que so pos-

sibilitadas

ela g r a p prevenience

de Deus e pela coopera~joda vontade iiumana

com aquela graca. Tal satisfaco uni dos tres momentos essenciais de poe~zitfntia (arrependimento, ~enitncia), sendo os outros confisso (reconhecimento de pecado) e contrico. O pecador que busca reconciliaco com Deus arravs de Cristo C ademais assistido ~ c l eucaristia, a que possui poder expiatrio porque nela os beneficios da auto-oferta de Cristo a Deus so aplicados a rodos seres humanos, canto morcos como os vivos.cis

H ; tambm

o auxlio dos sanros mrtires, cujas orahes so

ouvidas por Dcus. Os ~ e c a d o selos quais no foi feira satisfao tiesta vida presente sero purgados nas chamas do purgatrio aps a morte. Esra idia da purgao de pecado aphs a morte, to central na piedade mcdieval posterior, no foi ino~rao de Gregrio. Cipriano e Agostinho a haviam considerado. Para Cesrrio de Arles isso era um fato certo. Gregrio, portanto, ao propor a doutrina do purgatrio como iim elcmcnto essencial da f6, estava simplesmente tomando seu lugar em uma tradico que se desenrolava e que tinha suas razes nas antigas discusses crists sobre a possibilidade e necessidade de um "segundo arrcpendirnento" (ver 11:1 5 ) . Gregrio, cnto, foi uin telogo de pouca originalidade. Suas idias, 1150obstante, foram cruciais em cada ponro para o formara do pensamenro e das instiruies medievais. Nesse aspecto, ele se posiciona ao lado de outros dc sua poca que transmiriram, embora de uma forma limirada e restrita, a sabedoria da igreja antiga para as igrejas do Ocidenrc latino medieval. Encre estes deve ser mencionado no apenas Cassiodoro e Bobio (cujas tradues de Aristteles esiimuiarain os primrdios da filosofia medieval), mas tambm Isidoro de Sevilha (ca. 560-636), um quase exato

~r~ioa IIIo

O E S I A 0 0 IMPERIAL DA IGREJA

25;

contemporneo de Gregrio. O Livro dar Seenten~as,de Isidoro - breves declaraes doutrinrias - foi o livro-texto da igreja ocidental ac o sculo doze. Sua obra irititulada

Origens ou Etirnologir*.s abrangia o mbito quase completo dos conhecin~entosda poca, ranto eclesisticos como seculares, [ornando-se para a Idade mdia uma das principais fontes de iilformaco a respeico da Antiguidade. No obsrante, Gregrio Magno se projeta como algum cuja obra formacou no simplesmente as idias mas rarnbim a vida e as instituiqes da igreja em uma poca de grandes problemas eportanto contribuiu em muito para assegurar sua sobrevivncia como uma forca significativa no novo mundo brbaro. N30 sem justiga Gresrio foi descrito para a posteridade como "cnsul de Deus."

Periodo IV A Idade Mdia e o Encerramento da Controvrsia da Investidura

Captulo 1

Misses nas Ilhas BritnicasNo h nenhuma indicao mais marcante da vitalidade das igrejas ocidentais durance os scuios, quando a autoridade romana estava sendo substituda pela dos reinos brbaros, do que a fora e persistncia dos esforos feitos para cristianizar as tribos pags que haviam ocupado territrios anteriormente romanos ou territrios imediatamente adjuntos s antigas fronteiras do imprio. Em nenhum lugar esses esforos foram mais bem sucedidos do que nas ilhas britnicas, cuja converso final ao cristianismo romano e carlico redundou para o benefcio no apenas do papado mas das igrejas continentais de modo geral.

O cristianisino havia existido na Gr-Bretanha mesmo antes da converso deConstantino. Parece ter havido no oeste da Inglaterra um cristianismo cltico, intimamente aparentado com aquele da Giia romana, desde um perodo razoavelmente cedo. Glastonbury, em particuIar, que - como sua IocaIizao perto da desembocadura do rio Severno atesta - era um porto antigo engajado no comrcio com a Glia e o Medirerrneo, aparentemente era um primirivo local sagrado cristo. O cristianismo tambm existia nas cidades e vilas da ocupao romana. Trs bispos bretes de fala farina estiveram presentes ao conclio de Arles (314). Perto do final do quarto sculo, as tropas romanas foram gradualmente removidas da Gr-Bretanha (na maioria das vezes por usurpadores imperiais procurando fazer suas fortunas na Glia), com o resultado que os habitant-es da anriga provncia tiveram que se arranjar sozinhos para rechaarem as incurses dos saxes pagos na costa oriental da Inglaterra e, no norte, a presso dos pictos da Esccia. Diferentemente d a Glia e da Espanha, a Gr-Bretanha nunca havia sido completamen[e

PERIO~B IY

A IDADE MEDIA E U ENCERAMEFITO DA EONiRUYERSIA DA INVESTIDURA

259

romanizada, e a partida dos oficiais e das tropas imperiais significou que, no decorrer do quinto sculo, o pas gradualmente reverteu para Litiia organizan tribal e as cidades foram lentamente despovoadas, mesmo quando as incurses dos saxes, anglos e jutos se tornaram em invaso tord e ocupao.

O cristianismo, entretanto, sobreviveu. No livro Histu'riu Eclesirstica da NQ@U Inglesa, de Beda, o Venervel, encorirra~nosque o bispo Germano de Auxerre fez duas visitas Gr-Bretanha a pedido de seus colegas dali (429 e 444-4451, A primeira dessas teve como objetivo uma aco contra a propagao do pelagianismo, ernbciIa, como veio a acontecer, ele tambm fora convocado, como um antigo dux (i.e., general) na Glia, a liderar uma fora bret contra uma in~raso conjunta de saxes e pictos no norte. Na poca de sua segunda visita, os adversrios da Gr-Breranha provenientes do outro lado do niar do Norte haviam comeado a ocupar as costas orienta1 e meridional da Gr-Bretanha. No decorrer do sculo seguinte, os bretes, e com eles o cristianismo, foram expulsos mais e mais para o oeste, ate evenrualmentc serem confinados a Cornwall, Gales e, no norte, Strathclyde. Mesmo na poca de Gerniano, entretanto, os laborcs missionrios que iriam resultar na cor-iverso das ilhas j estavam a caminho. Ncssa obra, n nome mais notvel

o de Patrcio (ca. 389-ca. 461), "o apstolo da Irlanda." Um breto cujo local denascimento permanece tbpico de especulaqo, Patrcio era filho de um certo Calprnio, dicono cristo e homem de categoria curiai em sua cidade nativa. Sequestrado por corsrios irlandeses quando jovem e transformado cm escravo, o futuro missionrio escapou depois de seis anos e chegou Glia (raIvez apcs uma visita a sua casa na Gr-Bretanha). Pouco conhecido de sua carreira nesse perodo, embora parece que eIe passou alg~im tempo como membro dafarnilin episcopal de Germano

de Arixerre. Em 43 1, o papa Celestino (422-432) enviou um certo Paldio para serbispo para "os escoceses [i.e., irlandeses] que criam em Cristo", mas Paldio morreu dentro de um ano, e Patrcio, agora ordenado bispo, foi enviado L Irlanda em seu lugar. Trabalhando no norte da ilha, em uma sociedade organizada de acordo com territrios tribais, Patricio parece ter conquistado conversas significantcs entre as realezas locais. Ele aparentemente estabeleceu bispados territoriais (mas sobre uma base tribal, uma vez que as "cidades" da sociedade galo-romana no existiam na Irlanda) e estabeleceu sua prpria s em Armagh. No h razo para duvidar de que Patrcio inrroduziu alguma forma de vida asceta comunitria na Irlanda, mas foi somente aps sua morte - e na realidade no

sculo seguinte - que as comunidades monsticas se tornaram os centros pastorais da igreja irlandesa. Este desenvolvimento pode ser datado de modo grosseiro a partir da fundaco do mosteiro de Clo~iard, em Meath, por So Finiano (ca. 540), que foi rapidamente seguida por outras fundaes tais como Bangor (uma palavra que significa simplesmente "mosteiro"), estabelecido no Ulster por So Congall, e Moville, criao do outro So Fjniano (m. 579). Os abades que governavam tais comunidades normalmente pertenciam s famlias reais de suas tribos e frequenrement.e tambm eram bispos. Dessa maneira, o episcopado territorial do imprio romano foi substitudo por um episcopado monasticamente baseado, e essencialmente tribal. As comunidades monsticas se tornaram no apenas o foco da obra missionria e pasrorai mas tambtm centros de aprendizagem, das artes e da educaco. De certa forma contemporneo do florescimento do monasticismo irlands, e possivelmenre mesmo uma fonte dele, houve um desenvolvimento paralelo do monasticismo em Gales.

A origem de tal movimento costumeiramerite atribuda obra de Santo Iltide (m. ca. 5 3 5 ) , o fundador do mosteiro posteriormente denominado Laniltide ("igreja de Iltide"), que pode ter estado localizado na ilha de Caldey. O sucessor de Iltide como j . ca. 560), fundador da abadia em lder do monasticismo gals foi So David (Menvia (presentemente de So David) e o santo patrono de Gales. Mesmo antes desse crescimento do monasticismo irlands e gals, entretanto, e na realidade durante os anos da misso de Patrcio Irlanda, o cristianismo breto tambm se estendeu para o norte em direco Esccia. O lder dessa misso foi So Niniano. Sobre ele, a Hjtria Eclesi~ticade Beda, relata que ele era um breto nativoque havia sido instruido na f em Roma. Ele era, como Patrcio, bispo ( o que sugere

que j havia cristos na rea para a qual ele foi enviado). Niniano estabeleceu sua se2 em Whithorn (Candida Casa) e trabalhou no territrio ao norte da muralha de Adriano, onde sem dvida havia tribos celtas parcialmente romanizadas e parcialmente cristianizadas.

A converso da Esccia propriamente dita, porm - ou seja, a rea ao norte dos esturios do Llyde e d o Forth - foi obra de monsticos da Irlanda. Desde o seu inicio, o moriasticismo irlands foi um movimento missionrio expansivo. Ns j vimos (111:7) como, caminhando para o final do sexto sculo, Columbano, um rnongeda abadia de Bangor, em urna longa peregrii~ayo, estabeleceu casas monsticas (que por sua vez se corliaram centros missionrios) na Borgonlia, onde atualmente a Suia, e mesmo no norte da Itlia. Semelhantemente, So Kiliano (m. ca. 689), de

ptiloeo i v

A IDADE MOIA E O ENCERAMENIO DA EONTRIIV~RSIADA INUESTIOURA

261

uma gerao posterior, trabalhou na Francnia e Turngia, estabelecendo a s de Wurzburg. O primeiro e mais notvel desses peregrinos inonsricos irlandeses, enIretanto, foi Columba (521-597). Um produco da abadia em Clonard e membro da famlia real dos O'Neill de Connaught, Columba esrabeleceu uma comunidade monstica na ilha de Iona, sob o patrocnio e proteo do rei de Dalrada (mais ou menos o atual Argyleshire), que era ele prprio, com seu povo, de origem irlandesa.

De Iona, Columba executou trabalho missionrio entre os povos pictos da Calednia, conquistando seus chefes para a nova f e organizando a igreja l nas mesmas basesmonsiicas que ela possua na Irlanda.

A obra missionria da comunidade de Iona continuou depois da morte deColumba, e no incio do segundo tero do stimo sculo ela foi estendida aos colonizadores anglo-saxes pagos do nordeste da Inglaterra. A oportunidade para esse desenvoivimenco foi a solicitao do rei Osvaldo da Berncia (Nortmbria), que durante sua juventude havia sido criado em exlio entre os escoceses e pictos da Calednia crist. Recuperando seu trono em 633, Osvaldo solicitou o auxlio de Iona para a cristianizao de seu povo. A resposta foi a misso de Santo Aidano (m.

651), que sob o patrocnio de Osvaldo estabeleceu um mosteiro na "Ilha Santa" deLindisfarne (634),e dali, durante os reinados de Osvaldo (m. 641) e seu irmo Oswy

(641-670), enraizou o cristianismo na Nortmbria. Aidano tambm treinou um grupo de jovens para continuar sua obra, entre eles os irmos Chad (m. 672),que por fim se tornou parte da misso, iniciada em 654, ao reino de Mrcia e esrabeleceua s de I,ichfield, e Cedd, que trabalhou entre os saxes orientais, para os quais fora zonsagrado bispo em 654. Na poca em que a misso de Aidano e seus sucessores havia sido iniciada, uma misso enviada pelo papa Gregrio Magno j havia chegado no sudeste da Inglaterra2

sc cstabelecido em Kent e Anglia Orienral. A iniciativa do papa foi calculada para

romar vantagem do casamento de Etelberto, rei de Kent e Bretwalda (rei supremo) Aos territcrios saxes ao sul do Hu~ribcr, com uma princesa franca crist, Berta. A xisso originalmente consistiu de Agostinho, o prior do mosteiro de Santo A~ldr-m Roma, o prprio mosreiro de Gregrio, e um pequeno grupo de monges. Che-

:ando em Kenc em 597, Agostinho - um missionrio algo relutante, cujo zelo foi 2lantido cm grande parte por um fluxo de correspondncia com o papa Gregrio conseguiu converter Etelberto, que foi batizado na Pscoa de 601. De acordo com o ,'ano de Gregrio, Agostinho deveria estabelecer uma s metropolitana para si em

L62

HlSTOBlA DA IGREJA E R ~ X T

Londres, com doze bispados sob sua jurisdio. Ainda segundo o plano concebido pelo papa, Agostinho teria jurisdiqo sobre as igrejas clticas do oeste e, conforme a oportunidade surgisse, estabeleceria uma segunda s metropolitana em York (no reino de Deira) para o norte da Inglarerra. Estes planos entusisticos do papa, contudo, no foram tocalmente realizados. Agosrinho estabeleceu sua prpria si no em Londres mas em Canturia, onde ele construiu uma igreja e, nas proximidades, um mosteiro. Em 604 ele j havia fundado bispados em Rochester (em Kent) e Londrcs (em Essex). Aps sua morte (cm 604 ou 605), entretanto, e depois da morte do rci Etelberto ( G l G ) , uma reaio pag revelou a falta de profundidade das razes que a igreja possua fora de Kent. A misso enviada (625) sob Paulino para York e o reino

de Deira extinguiu-se em 632, quando Edwin de Deira foi morto em combare. Nofoi seno at a segunda metade do stimo sculo, portanto, e ento em grande medi-

da por causa do mpeto missionrio oriundo de Ihdisfarne e de uma misso papalindependente para os saxes ocidentais iniciada por um cei-to Birino (ca. 6351, que a Inglaterra foi conquistada substancialrnence para o cristianismo. Mesmo naquele rnomenro, contudo,restava

um

problema significativo. Havia:

permanente atrito entre os cristos do norte e do oeste de tradico cdirica e irlandesa por um lado c, pelo outro, os novos cristos saxes do sul, cujas igrejas no apenas forani organizadas segundo o padro continental sob bispos rerritoriais mas tambm eram conscientemente Ieais a Roma e ao papado. Em parte, esse atrito tinha suas origens na lutri militar mais antiga, e muito Ionga, entre cristos bretes e invasores pagos. Para os breces do Ocidente, no era fcil co~iceber os anglos e saxes, seus inimigos tradicionais, como companheiros cristos. Mas o conflito tambm possua razes eclesisticas. Bastance separados das questcs bvias e definveis, como uma diferena sobre a data da pscoa, o carter e organiza550 peculiares do cristianismo clrico eram diferentes daquele da misso romana. Felizmente para o futuro do cristianismo nas ilhas britnicas, esse atrito foi fonte de grande irritao para o rei Oswy da Nortrnbria. Correspondentemente, cle convocou uma conferncia ou conclio pata resolver a questo para seu reino. O conclio reuniu-se em 664, em Whitby, no litoral do mar do Norte, onde recentemente (659) havia sido estabelecido sob a orientao da nobre abadessa Sanra Hilda (m. 680) um magnfico mosreiro duplo, com casas para homens e casas para mulheres. Wilfrido, abade de Ripon e mais tarde bispo de York (ele prprio um produto da comunidade cltica em Lindisfarne), defendeu o caso pela lealdade a Roma, enquanto Colman, abade de Lindisfarne, advo-

i

. . .. .... .

-

--

PERIOIO IY

h IOABE MEDIA E 0 ENEERhMENTil DA CI1NIROYfRSIA DA INYESTIDUAA

263

gou a tradio cltica. A questo foi resolvida quando o rei Oswy ouviu que o bispo de Roma era o sucessor e representante do apstolo Pedro, a quem o prprio Senhor

havia dado as chaves do reino dos cus.' A deciso que resultou dessa descobertaeventualmente trouxe a totalidade da Inglaterra sob a obedincia romana, e o cristianismo ingls eventualmente provou ser um aliado principal do papado tanto no estabelecimento como na reforma das igrejas no continente europeu.

O vigor e disciplina desse novo cristianismo clrico-ingls deveu muito felizcircunsrncia que, cm 668, o papa Vitalino indicou Teodoro (ca. 602-690), nativo deTarso, na sia Menor, como arcebispo de Canturia - o primeiro ocupante daquela s cuja autoridade era reconhecida por toda a Ingiarerra. Teodoro comecou sua incumbncia conduzindo visitao sistemtica a todas as igrejas sob sua jurisdi~o. Como resultado dessas viagens de inspeco, ele se disps a reorganizar as dioceses mais antigas e a estabelecer novas dioceses. Ele presidiu o snodo de Hertford (673), que promulgou leis bsicas para o governo das igrejas e constituiu-as em um corpo nacional em uma poca onde a soberania poltica ainda estava dividida. Foi sua poltica que encorajou a adoo da prtica monstica cltica de confisso privada e absolvio, que, seguindo o cosrume irlands, d e imps sobre pessoas leigas nomonsticas como uma obrigaGo anual. A capacidade pastoral e organizacional de Teodoro foi revelada acima de tudo no fato de que ele no favoreceu nem os saxes nem os celtas, mas reconciliou todos em um nico corpo no complementavam e alimentavam uma outra. O s frutos da deciso do rei Osmy e da habilidade de Teodoro como governante logo se manifesraram na vida das igrejas inglesas. Elas tinham uma reputao de Iealdade s dc Roma e aos padres que estabeleceram para doutrina e disciplina: um fato atestado pela freqncia de peregrinos anglo-saxes aos santurios dos apstolos Pedro e Paulo em Roma, como tambm pela introduqo da Regra de So Bento na vida monstica inglesa na poca de Teodoro e seus sucessores imediatos. Ao mesmo tempo, o amor pelo estudo que havia caracterizado a tradio irlandesa foi preservado e desenvolvido em uma srie de escolas monsticas, das quais talvez a mais brilhante tenha sido a do mosteiro conjunto de Wearmouth elarrow naNortmbria. as duas rradies se

L Beda, o Venervel (672-735),estudou e escreveu nos campos da cronologia, grarnstica, exegese bblica e histria. Lembrado acima de tudo por sua Histria Ecleszs-

ticn dn Naido Iiiglcsa, ele e seus contemporiIneor provocaram um pcqucno

renascimenro de erudi~o que iria, no final, produzir frurus no ienaimenro carolingio do sculo nove no continente.

1I

Captulo 2

O Cristiaiiismo e o Reino FrancoA converso de Clvis ao cristianismo catlico em 496 (ver ITI:5) foi um eventodecisivo tanto para o futuro reiigioso como poltico da Europa continental. Sob a lideranca de Clvis e de seus filhos, os francos conquisraram os antigos terri~rios romanos na Glia c na Aiemanha e criaram o que veio a ser chamado de repuin

F~a!ncorum ("rcino dos francos"). Deslocando-se de suas cerras originais entre os riosReno e Somme, eles primeiramente invadiram e ocuparam a regio anreriormente governada pelo dtcc romano Sigrio, aproximadamente a rea entre o Somme e o Loire. Depois Clvis liderou seus seguidores contra os alamanos, cujo reino abarcava o sul e o oeste do Rcno. Finalmente, ele atravessou o Loire na Aquitnia, onde, em Vouill (Vogladensis) em 507, derrotou os visigodos e assumiu o controle do sudoeste da Giia art a linha dos Pirineus. O s sucessores imediatos de Clvis continuaram a expanso da hegemonia franca. Eles incorporaram a Turingia aos seus territrios e eventualmente, aps 532, o reino da Burgndia, que controlava o vale do Rdano e o oesce da Suia. Na metade do sexto sculo, ento, a dinastia franca ou "merovngia" dominava a totalidade do que havia sido territrio romano na Glia e Alemanha. Este domnio era frequentemente dividido entre diversos reis, pois o costume franco ditava que a propriedade d o pai fosse dividida entre todos os seus filhos vivos. Parcialmer-ite em conscquncia desse fato, surgiram divises regionais dentro do imprio, que tinhain carter quase poltico, quase tnico. A primeira destas, Austrsia, englobava a ptria franca ao redor do baixo Reno e cambm a Turngia e os antigos territrios dos alamanos. A segunda, chamada Nuscria, tinha seu centro em Paris, onde Clvis havia feito sua capital, e se estendia ao sul at o Loire e ao norte at o Somme. D e

importncia central menor na histbria poltica dos francos esravam as regies meridionais da Aquitnia e Rurgndia. Apesar destas divises, entretanto, o reino franco era entendido como sendo um nico patrimnio, e de fato, nos ltimos anos de Lotaro I (m. 56lj, filho de Clvis, e durante grande parte do reinado de Dagoberto

1 (623-639), ele teve um nico soberano.

Os habitanres galo-romaiios desras reas no ficaram descontentes com seus novos conquistadores. Como eles mesmos eram catlicos, ficaram felizes em Ter um soberario catlico; e de qualquer modo, os imperadores romanos em Coiistanti~io~laderam aos lderes francos reconhecimenro, assistncia financeira ocasional c, no caso do prprio Clbvis, o trulo, ca~egoriae insgnia de cbnsul. Este gesro no foi um mero smbolo. Clvis e seus sucessores assumiram o que restava da a d m i n i ~ t r a ~ o financeira e civil romana na Glia. O r e p z m Fi-dncorum era, e em cerro sentido permaneceu, o representante formal da autoridade e tradio romana. Os francos, adeniais, diferrntemence de seus predecessores, os no se mantiveram como uma casta governante separada, mas se misturaram e se casaram com os povos que eles conquistaram, criando assim o f~ndamenro de iima c~ilr~ira misra para a qnal o latirri vulgar permaneceu, na maioria das antigas provncias roirianas, a lngua comum. Eni sua prliria maneira, tambm, eles fomenraram a disseminao do cristi-

anismo. Valendo-se iiiiciaimence da vitalidade e da liderana cicrical das igrejas gaioromanas n o sul e no ocsre de seus rerrirrios, eles apoiaram miss6cs para aquelas reas do norre e do Icstc onde o paganismo persistia e onde igrejas crists previamcnrr estabelecidas rinllam sido expulsas ou grandenirnte enfraquecidas pelas rnigraces

Drbaras. EIes encorajaram ainda mais o movimento mondsrico, o qual - talvez espe:ialmenre depois da misso de Culumbano (ver III:7) - rendeu a se rnrnar, como

>;i\.ia sido na Gr-Bretanha, o principal veculo para a disserninaco do cristianismo.Isto no quer dizer, entreranto, que igreja e soiedaclc 1130 continuaran, nesse

ri'ino merovngio, a mostrar sinais de declnio e mesmo desintegraco. A decadnciai3S

cidades antigas, como tambm do oinrcio e da cornunica~o,coririnuou crn

?asso acelerado. 0 s cencros dc vida verdadeiros tornaram-se propriedadcs rurais rizendas que reiitavani ser, e na prcrics eram, auto-suficienres no que se refere s xccessidades da vida cotidiana. Governadas direta ou indiretamente por um senhorGJS

poderia ser algum magnata ou o prprio rei, tais fazendas proporcionavanl scguesse sisteniti senhoria1 encorajava a desccnrrali~a~o de autaridade e garantia que

:ina tanto para o proprietrio como para seus ~ r \ ~ ou o s locatrios. Ao mesmo temi ' : ) .

266

HISTORIII DA IGREJA CRISTi

poder, assim como riqueza, acompanhariam a posse da terra, uma vez que era a fazenda que produzia nLo apenas ayimento e vestimenta mas tambm os homens e equipamentos necessrios para a guerra quase permanente que marcou a sociedade franca.

I1 descentralizao foi encorajada ainda mais pelo fato de que os francos, comotodos os povos germnicos, no concebiam o estado como algo que, em suas leis e estruturas, durava independeiiternente de pessoas individuais. Para eles, a ordem poltica era uma questo de lealdade pessoal de guerreiros para com seu lder; uma lealdade que tradicionalmente dependia da habilidade do rei para recompensar seus seguidores com os esplios de guerras vitoriosas. Essa comprcenso da natureza dos laqos polticos teve aigumas conseqiincias no reino merovngio. Primeiramente, isto significava que os recursos econmicos do "estado" eram identificados como propriedade pessoal ou riqueza do rei - uma situago na qual a prpria noco de propriedade "pblica", c portanto de taxaco, era totalmente inconcebvel. Isso tambm significou, portanto, que para assegurar lealdade, os reis merovngios - uma vez que as oportunidades para novas conquistas se exauriram - tiveram que "beneficiar" seus seguidores com E~zendas de seu domnio real. Esta prtica teve o efeito inevitvel de enfraquecer o monarca, ainda que tais benefcios fossem tecnicamente garantidos apenas durante o tempo de vida do recipiente. Em tal sociedade - violenta, descentralizada, insegura - as estruturas e maneiras da igreja estavam destinadas a ser afetadas de alguma forma. Um dos desenvolvimentos mais importante, talvez, e conectado com o surgimento do sistema senhorial, foi o aparecimento rnuiro mais frequente de igrejas "proprietrias": i.e., edifcios eclesisticos construdos ein uma fazenda s custas privadas de um senhor e sustentados por ele com uma dotao para os servicos de um sacerdote. Nesse desenvolvimento, podem ser viscos os incios d o sistcma paroquial posterior, assim como de muitos debates posteriores sobre o conrrole laico de i n d i ~ a ~ clericais. es Os bispos do novo reino continuaram seu hbito antigo de se reunir em conclio para regulamentarem assuntos comuns, embora cais conclios no testemunhem nem freqncia nem regularidade. Os bispos reagiram a questes externas como a luta sobre osTrs Captulos (ver 111:10) e a controvrsia monotelita (ver III: 1I). Crescentemente, porm, as igrejas francas parecem ter-se tornado isoladas, at mesmo da liderana do p p a d o , embora o respeito aos sucessores de Pedro e a prtica da peregrinao s tumbas dos apsrolos em Roma no tenham acabado de forma alguma.

Nos assuntos do reino franco em si, entreranto, a igreja desempenhou um papel cencral e essencial. Para os reis, magnatas, e campesinato igualmente, a proteo e ajuda de Deus e dos sancos eram essenciais para a ordem e a jusriqa em um mundo desordenado. O bispo cristo, ademais., ocupava um lugar especial. Defendendo simultaneamente as tradi5es da ordem romana antiga e as propenses singulares do

Deus cristo por jusriya e misericrdia, o bispo era aiternarivarnence magnata poltico, homem santo, e profeta. Alfabetizao e erndiqo estavam em grande medida confhados ao clero, pois eram apenas nas casas monsticas, e nos lares episcopais onde os jovens eram educados para o servico como clrigos, que exs~iaqualquer coisa sernelllante a escolas. Progressivamente, portantci, as igrejas e comunidadesmonsticas eram recompensadas com concesso de terras pelos ser\'$os inconresr-

veis que presravam. Isto significou, todavia, conforme o Tempo passava, que os bispos dispunham de recursos que poderiam ser de grande uso para os reis merovingios. Estes, em decorrncia, deixaram de lado o anrigo costume da elcio dos bispos pelo povo e pelo clero e assumiram para si o direito da iiidicao de bispos, urilizando esse direito, na reaIidade, como uma marieira de conferir benefcios para servidores Ieais. Com frequ2ncia, um govcrnante iria alm e permitiria que uma s permanecesse vaga enquailto ele se apropriava dos I-endimentos dela. Tais prticas - uma expressso natiiral seno inevitvel da poca - foram uma fonte de pavor para sucessivos papas; mas do tempo de Gregrio Magno em diante, os bispos de Roma no eiveram suces50

em seus esfornoclssmo, portanto, tinha razes tia rradiqo crisc e pode ser enrendido, pelo :?-os ds uin ponto de vista, como uma reaqo religiosamente motivada a uma di piedade popular dominante. Os hisroriadorcs tm ressaltado, ademais, que' -, ,-.-.A

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1 . : ; .\:;.rior do qual os imperadores isurios - e o grosso de seus exrcitos

2 74

HISTRIA DA IGREJA CRISTI

- eram provenientes, eram reas onde atitudes iconoclastas podem ter sido esrimula-

das pela presena de judeus e muculmanos, para quem a venerao de imagens era simples idolatria. Infelizmente, quase no h dados para apoiar esta hiptese, ainda que ela seja piausvel. Pode ser, tambm, que o movimento tenha sido influenciado por correntes de pensamento gnsticas ou maniquestas; os icoi~oclastasparecem s vezes ter estado beira de uma espcie de dualismo, opondo "adoraao em esprito e em verdade" ao uso de representaes materiais de Crisco e dos santos. Os monofisitas, tambm, evidentemente tendiam para o ponto de vista iconoclasta, uma vez que para eles qualquer retrato de Cristo era na realidade uma rentativa, simultaneamente impossvel e idlatra, de retrarar a segunda pessoa da Trindade. Tais atitudes e motivaes religiosas, entretanto, tm sido rninimizadas por alguns inrrpretes das polticas iconoclastas dos imperadores isurios. Muitos eruditos tm visto no iconoclasmo uma atitude poltica disfarada. Como evidncia para esse ponto de visca, eles apontam para o faro de que as principais vtimas do iconoclasmo eram as institui~es monsticas, cujo nmero, tamanho e indeperidncia faziam delas um fardo na vida do estado e um obstculo para a autoridade imperial absolura. Ao mesmo tempo, evidente que os iconoclastas defendiam uma viso do papel do imperador em uma sociedade crist que fazia deie a autoridade religiosa suprema, e um elemento na polmica dos defensores de imagens era um protesro contra a ii~terferncia indevida do imperador em assuntos que deveriam ficar reservados aos lderes eclesisticos. Certamente, esse era um elemento proeminente na atitude do papa Gregrio 11, para quem o iconoclasmo, como temos visto, represenrava um duplo

mal: uma nega~o teolgica do ingresso de Deus na ordem natural e histrica, e umafalsa percepgo da autoridade do chefe-de-estado em questes religiosas.

Captulo 4-~ -

Os Francos e o PapadoA oposifo de Gregrio II s polticas iconoclastas de Leo 111 e Constaritino V foi concinuada por seus sucessores na s romana, com conseqncias que dificilmenre algum poderia prever. Foi o destino de Gregrio 1 1 1 (731-741), em um conclio

reunido em Roma apenas oito meses aps sua asce~iso, proclamar a excomunh,Lo de qualquer que profanasse imagens sagradas. Esta atitude, uma reao ao conclio de

730

por Leo 111, produziu uma resposta imperial imediata. O impera-

dor confiscou as propriedades da igreja romana no sul da Itlia e na Siclia e removeu da jurisdio eclesistica papal as igrejas daquelas regies, como tambm dos Blcs. Contudo, ele no poderia ir, e no foi, alm disso. No foi feira nenhuma tentativa para impor polticas iconoclastas sobre a prpria igreja de Roma, presumivelmente porque Leo tinha sido convencido por eventos anteriores que ele no poderia impor sua vontade conrra os papas nos territrios bizantinos na Itlia central. Assim, as regies de Rairen, a Pentpolis, e Roma foram deixadas ria prtica a seus prprios dispositivos, embora os papas concinuassern, at 772, a reconhecer formalmente a soberania dos imperadores orientais.

A independncia desses territrios, entreranto, era esseilcial para o papado. Somente se garanrissem sua integridade os bispos de R o m poderiam evirar a possibilidade de trocar a dominao do imperador em Constancinopla pela dos reis lombardosem Pavia. Coilseqtienremence, em

739, aprs alguns anos jogando com o balano de

poder entre os duques lombardos ao sul e o reino lonibardo ao norte, Gregrio I11 buscou o auxlio de CarIos hlartelo contra seus inimigos. Ademais, por v o l r ~ da rnetade do sculo, o secretariado papal produziu uma das mais influenres falsifica-

rs na histria: a assim chamada Doa2o de Cunstmtino. Este docuinento, utilizando a lenda bem conhecida de que o papa Silvescre havia curado o imperador Conscantino de lepra,' pretendia ser uma carta de agradecimento do prprio imperador. Ele atribua aos bispos de Roma jurisdio sobre os quacro patriarcados de Antioquia, Acxandria, Consrantinopla e Jerusalm e - ainda mais do que isso - decretava que "a sagrada S do bem-avenrurado Pedro deve ser gloriosamente exaltada sobre todo o nosso imprio e trono terreno."' De interesse mais especfico, alegavase que Constantino havia Icgado aos papas "todas as provncias, palcios e distritos da cidade dc Roma e da Itlia e das regies do Ocidente."' Em outras palavras, esse documento (cujo coiitedo no fazia mais d o que declarar o que a corte -papal da

poca honestamente acreditava ser verdade) no apenas reiterava a reivindicao pa-

pal tradicional a uma autoridade universai na igreja e a crenGa p p a l tradicional de\ i r Gregrio deTours, Histrzu do^ Praizcos 2.3 1, para uma aluso estI

Uma vez na Europa, eles deixaram de ser eremitas, comearam a viver em conventos em reas urbanas e assumiram o cuidado pastoral das almas. Estas mudanas, queprecipitaram uma crise na ordem, foram regularizadas sob a liderana de um carmelita ingls, Simo Stock (1 165?-1265),que em 1247, j bem idoso, tornou-se o ministro gerd da ordem. Naquele mesmo ano, o papa Inocncio IV aprovou a transformao da ordem semelhana das linhas dos dominicanos. Os frades carmelitas procuraram unir a vida contemplativa pregao, ao ensino e ao servio pastoral, e desde o comeo ficaram caracterizados pela sua ardence devogo Virgem Maria. Uma ordem de freiras carrnelitas, estritamente reclusas e devotadas aos ideais de conternplao, foi instituda oficialmente pelo papa Nicolau V, em 1452.

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A ltima das quatro principais ordens mendicantes - a Ordem dos Frades Eremitas de Santo Agostinho, tambm conhecidos como frades agostinhos - foi uma combinao de diversos grupos de eremitas italianos dos sculos doze e treze. Em 1243, aparentemenre agindo a pedido deles, Inocncio T V prescreveu a "regra" de Santo Agostinho para os eremitas daToscana e deu ao cardeal Ricardo Anibaldi a responsabilidade da tarefa de unificao, que foi alcancada em 1244 (a "pequena unio"). Sob a orientao de Alexandre IV, em 1255, outras comunidades eremitas na Itlia foram submetidas regra agosriniana e, em 1256, todos esres grupos estavam consolidados em uma Ordem de Eremitas de Santo Agostinho (a "grande unio"), com uma constituico baseada naquela dos dominicanos. Eles deixaram de ser eremitas (no obstante seu nome, que aponra apenas para suas origens histricas) e em vez disso se tornaram frades mendicantes. Como as outras ordens mendicantes, os frades agostinianos receberam iseno da jurisdio episcopal, e passaram a ser uma ordem pregadora devotada vida ativa ou "apostlica" de servio ao mundo. Como os dominicanos em particular, eles se dedicaram ao estudo teolgico, sobretudo ao escudo da Bblia e dos escritos de Santo Agostinho, e logo se estabeleceram nas cidades, principalmente

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P~RIOIO Y

A IDAOE MEDIA POSTERIOR

371

as universitrias. Gregrio de Rimini (m. 1358), que tanto estudou quanto ensinou em Paris e foi eleito ministro geral da ordem em 1357, foi considerado o melhor erudito agostiniano da Idade Mdia. As obras de Gregrio foram aitamente valorizadas e louvadas por um membro ulrerior dessa ordem, Martinho Lurero, que se tornou um eremita agostiniano em 1505.

A piedade da poca encontrou muitas outras expresses que no as ordens mendicantes. Uma manifestaco importante foi a das Begu~nas: um movimento de mulheres, de proporces considerveis que emergiu, por volta de 1210, nas cidades do norte da Frana, na Holanda e na Rennia alem. As beguinas eram mulheres leigas piedosas que viviam juntas em pequenos conventos ou sozinhas com suas famlias, sustentando-se com trabalho manual e praticando pobreza, castidade e obras de caridade. Elas no pertenciam a nenhuma ordem monstica, no observavam nenhuma regra fixa e no faziam nenhum voto irrevogvel. Devido ao fato de elas nunca terem tido nem proculado autorizao eclesistica oficial, frequentemenre elas eram suspeitas de heresia ou tendnuas heterodoxas. O nome "beguina" fol provavelmente derivado de "albigense", o nome utilizado para o herege ctaro do sul da Frana. Algumas das beguinas parecem ter s~icumbido aos ensinos dos valdenses e ctaros, mas a grande maioria era ortodoxa, dedicadas vida sacramental da igreja, e receptivas superviso eclesistica. Suas casas normalmente estavam encroscadas ao redor dos conventos dos frades, nos quais elas encontravam seu principal amparo...v

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O movimento era espontneo e local, e ilustra bem a poderosa atrao da vidaapostlica sobre as mulheres e os homens medievais. Nas vilas e cidades, ademais, parece que o nmero de mulheres era agora consideravelmente maior que o de homens. As beguinas forneceram assim um escape para as energias fsicas e espirituais de grande nmero de mulheres devotas, especialmente aquelas que no poderiam esperar encontrar maridos e que, em rodo caso, eram numerosas dernars para serem atendidas pelas ordens religiosas existentes. Tambm havia uma associaco de homens paralela, mas menos numerosa, conhecida como os "begardos", cujo sustento em grande parte era proveniente de esmolas. O conclio de Lyon, em 1274, incluiu as beguinas e os begardos entre as associaces religiosas no autorizadas e repetiu a proibio do Quarto Conclio de Lacro (1215) contra as novas ordens. O conclio de Viena, em 1312, rejeitou explicitamente a maneira de vida deles e at mesmo excluiu-os da igreja. Estas medidas duras podem ser explicadas, em parte, pela implicao deles na assim chamada heresia Esprito Livre (ver V:9). Em 1400, a maioria

-

das beguinas e dos begardos havia sido absorvida nas ordens estabelecidas. J havia aparecido dissenso na ordem franciscana, enquanto Francisco ainda vivia, entre aqueles que defendiam o ideai original de simplicidade, auto-sacrificio e pobreza pessoal e corporativa completa, e aqueles que valorizavam um grau relativo de estabilidade, segurana e influncia, semelhante quele desfrutado pelas ordens [radicionais. O partido mais rigoroso, posteriormente conhecido como "observantes", buscou a lideranca do irmo Leo (m. 1271), que havia sido confessor de Francisco e seu amigo mais nrimo. O partido mais flexvel, posteriormente conhecido como "conventuais", apoiou Elias de Cortona (m. 1253), vicrio de Francisco depois de 1221 e ministro geral da ordem de 1232 a 1239. A poltica papal favoreceu os conventuais, uma vez que as necessidades da igreja seriam melhor atendidas com o crescimento e a conso1idac;o da ordem segundo as iinhas do monasticismo anrerior. Em 1230, Gregrjo IX declarou que o Testamento de Francisco de 1226 era um documento puramente privado e portanto no tinha efeito vinculador sobre a ordem em sua totalidade. Ele tambm permitiu ao frades o "uso" (usur rerum) simples de casas, mveis e livros, como tambm doaes em dinheiro, conquanto entregassem a "possesso" (dominium) ou propriedade legal destas coisas a "amigos espirituais" da ordem, tais como seu cardeal-~rotetore o papa. Em 1245, o papa Inocncio

IV (1243-1254) recebeu a propriedade de bens legados aos frades na prpria SancaS t , mas permitiu que dinheiro e propriedade fossem usados no apenas para as "necessidades" deles mas tambm para a sua "convenincia", abrindo assim a porta para futuros relaxamentos da regra de 1223. Os observantes se opuseram vigorosamente a esses desenvolvimentos e encontraram um lder capaz e popular em Joo de Parma (1209-1289), ministro geral de

1247 a 1257. Os convenruais, por outro lado, que se posicionaram segundo as inrerpretaes papais da regra, reuniram-se ao redor de Boavenrura, sucessor de Joo de Parma como ministro geral de 1257 a 1274. Um dos maiores telogos escolsticos, Boavenrura sustentou a co11struo de mosteiros, apelando para a "teoria do-=-c.::

uso" de Gregrio IX, argumentando que o estudo teolgico - a busca da verdade divina - melhor do que o trabalho manual, e defendeu a atividade dos frades como pregadores e confessores como uma correo necessria das deficincias do clero secular. Ele defendeu o ideal de pobreza absoluta de Francisco, mas considerou-o apenas um meio para a perfeio crist, no um fim em si mesmo. Seu perodo como ministro geral marcou um ponto de virada na histria da ordem franciscana, e ele

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.

VERIODO Y

A IDADE MEDIA POSTERIOR

. 3 7 3

tem sido chamado corretamente de "segundo fundador" da ordem. Alguns membros da ala observante logo caram em uma ortodoxia dbia, ou em direta heresia, mediante sua associaco com o "joaquimismo". Joaquim de Fiore

(11322-1202), um ex-monge cistercieiise e abade na Calbria, no extremo sul daItlia, era considerado por muitos ter sido o profeta de uma "nova era". Em uma seqncia de obras conhecidas coletivamente como "O Evangelho Eterno", Joaquim dividiu a histria do mundo em trs eras, correspondendo s Trs Pessoas da Trindade. A do Pai, que foi de Ado at o nascimento de Cristo - o do Antigo Testamento e da cultura "patriarcal". A do Filho, que ia de Crisco at os dias de Joaquim - o perodo do Novo Testamento e da igreja crist, com uma cultura "clerical-sacerdotal". Joaquim acreditava que a nova era do Esprito estava iminente - uma era igualitria de liberdade e amor que ele rotulou "monstica", pois seria formada pelos valores comunitrios dos mosteiros. Seria a era, de fato, quando o "evangelho eterno"' seria por fim revelado totalmente. Joaquim era mais um poeta e simbolista do que telogo ou exegeta, e seus escritos tm estado sujeitos s mais diversas interpretaes. improvvel que ele percebesse o evangelho da nova era como um Terceiro Testamento, substituindo o Antigo e o Novo Testamento, ou aguardasse a emergncia de uma nova "igreja espiritual" para suplantar a velha igreja de papa, sacerdotes, sacramentos, Bblia e preparo teolgico. Porm, sua filosofia da histria poderia ser, e de fato foi, lida como uma afirmaco radical do carter puramente contingente e temporrio da igreja medieval - isto , a igreja da Segunda Era. Nesse ponto encontra-se o ~ o d e ideolgico r explosivo do joaquimismo, a fonte de sua permanenre atrao sobre os oponentes da igreja hierrquica e a base para hostilidade eclesistica aos devotos de Joaquim na Baixa Idade Mdia. Na dcada de 1250, muitos dos rigoristas franciscanos, incluindo Joo de Parma, estavam usando a profecia de Joaquim como uma estrutura para interpretar a significao hisrrico-mundial de sua ordem e do ideal frnciscano original de pobreza pessoal e corporativa completa. Estes frades de f proftica foram apelidados "espirituais". Um deIes, Gerardo de Borgo San Donnino, escreveu um livro, em 1254, intitulado introdudo do Evangelho Eterno, no qual identificava So Francisco com o "anjo do sexto selo" no Apocalipse5

-

isto , com o anunciador ou precursor da

' Apocaiipse 14:6.j

Apocalipse 7:2.

Terceira Era predita por Joaquim. Geraldo tambm saudou os franciscanos rigorosos como os monges espiriruais que pregavam verdadeiramente o "evangelho eterno" e que desse modo introduziriam a nova dispensao (cujo advento Geraldo datou para 1260). O papa Alexandre IV (1254-1261) condenou o livro de Geraldo em 1255, e Boaventura iniciou seu termo como ministro geral em 1257 sentenciando Geraldo priso perptua (enquanto que Joo de Parma escapou por pouco de condenaco e retirou-se para um eremitrio pelo restante de sua vida). Os espiriruais mantiveram vigorosa resistncia por toda a ltima metade do sculo treze e nas primeiras dcadas do catorze, encontrando seu principal porta-voz em Pedro Joo Olivi (1248-12981, um frade do convento em Narbonne. Olivi admitiu

que os franciscanos poderiam "usar" propriedade, mas insistiu em que fosse um "usopobre" (ususpuper) genuno - um uso marcado pela austeridade e simplicidade tocal na vida do dia-a-dia de um frade. Em seu Comentdrio sobre o Apoculipse, publicado por volta de 1297, Olivi uniu o franciscanismo espiritual com a profecia de Joaquim. Ele imaginou uma luta csmica aproximando-se, na qual a "igreja carnal", oposta ao ususpauper, seria destruda por Deus e subscituida pela verdadeira "igreja espiritualn. Embora Olivi mesmo nunca tenha comparado a igreja carnal com a igreja romana, ele demonstrou profunda hostilidade para com a igreja hierrquica de sua poca. Seus discpulos menos cautelosos dentre os franciscanos radicais no sul da Frana, para quem ele tornou-se uma figura de veneraco, logo tornaram suas idias em uma doutrina revolucionria.

A espinha dorsal destes movimenros de oposio foi quebrada durante o pontificado de Joo XXII (1 3 16-1334), a quem os espirituais mais extremados consideravam o anticrisro predito no Apocalipse.%m uma seqncia de bulas emitidas entre 1317 e 1329, Joo XXII declarou que a obedincia uma virtude maior do que a pobreza; acusou os espirituais de abracar a antiga heresia donatista; rejeitou a validaentre "uso" e "posse" que havia sido primeiramente reconhccida de legal da distin~o por Gregrio IX em 1230 e posteriormente havia sido afirmada por Nicolau I11 (1277-1280) em 1279; e condenou como hertico o ensino de que Cristo e os apsto1os no possuram nenhuma propriedade seja individual ou comunitria. Tem sido argumentado que a doutrina da infalibilidade papal em questes de f e moral proclamada pela primeira vez como dogma da igreja Catlica Romana no Primeiro

" Apocalipse 17:l-14.

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h 1DhOE MEMIA POSTERIOR

375

Conclio Vaticano em 1870 - na verdade originou-se com Olivi e o crculo de franciscanos radicais, que defendiam, em oposico a Joo XXII, que os decreros de Gregrio IX e Nicolau 111 eram inerrantes e incontesrveis e portanto no poderiam ser descartados por papas posteriores. De qualquer forma, os decrecos de Joo XXII foram fatdicos medida que colocaram em questo os fundamentos papai as correntes de "reforma" dentro da igreja. Rapidamente formou-se oposio a Joo XXII ao redor de Miguel de Cesena (m.

teolgicos de

todo o "movimento de pobreza" da Baixa Idade Mdia e afasraram da lideranga

1342), ministro geral franciscano de 1316 atb sua deposiFo. . .

papa em 1328.

-

Cesena fora uma voz moderada dentro da ordem e no incio se opusera aos espirituais, mas os decretos do papa o radicdizaram. Em 1328, ele escapou da corte papal em Avinho, onde havia sido derido, em companhia de outro derento, o grande

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.-

filsofo franciscano ingls Guilherme de Occam. Ambos se refugiaram na corte do imperador Lus da Baviera. Foi ali que Occam escreveu quatro tratados acusando o papa de heresia. Cesena e Occam enconrraram seguidores nos assim chamados Fraricelli italianos, mas os quadros dos espirituais foram reduzidos severamente pela Inquisio e sua causa foi perdida. As divises mais amigas entre franciscanos observantes e conventuais continuaram atravs dos sculos carorze e quinze. No obstante as muitas tenrarivas de reforma para manter as duas partes unidas sob a jurisdio de um nico ministro !geral, a Ordem dos Frades Menores por fim foi dividida em duas ordens disrintas, os observantes e os convencuais, pelo papa Leo X em 15 17, cada uma com seus prprios oficiais e cabidos gerais.

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Capitulo .. ...

Escolascticisrno Inicial; Anselmo de Canturia e Pedro AbelardoO mesmo esprito dinmico na igreja e sociedade europia que encontrou expresso nas cruzadas e em novos movimentos leigos, clericais e monsticos estava tambm em a5o no domnio das idias. Dessa forma, os historiadores do pensamento medieval falam da "renascenqa" dos sculos onze e doze - um renascimento dos estu-

..

dos humansticos e do pensamento especulativo realizado nas escolas medievais.

O trabalho educacional das escolas monsticas e das catedrais durante a AltaIdade Mdia j foi assinalado em coiiexo com Alcuno e os principais representantes da "renascena carolngia" do sculo nove (ver IV:5, 6). A erudico do incio do perodo medieval em grande parte reproduziu o ensino dos pais da igreja, especialmente de Agostinho e Gregrio Magno. Exceto no caso notvel de Joo Escoto Ergena, quase no houve originalidade. Ademais, de 800 at bem depois de 1000, a educaco ao norte dos Alpes foi primariamente de carrer lirerrio, baseada no estudo da gramtica e retrica. Durante esses dois sculos, tambm, a Europa esteve assediada por invases do norte, sul e Ieste - pelos riquingues, muulmanos e hngaros (rnagiares). Assim, no domnio do pensamento, houve pouco mpeto ou oportunidade para atividade filosfica e especulao teolgica. N o decorrer do sculo onze, ficou por fim Iivre de invases externas, auentretanto, quando a Europa ociden~al mentou o nmero de escolas, especialmente na Frana. Com sua multiplicao veio um rcnascimento marcante de interesse na Igica, ou diaItica, e na aplicao do mtodo lgico aos problemas filosficos e reolgicos. O resultado foi um novo e frtil desenvolvimenro intelectual, que culminou nas impressionantes snteses teolgicas (summde) do sculo treze. Uma vez que esse movimento originou-se nas escolas, h m ~ i i t o tem sido conhecido como "escolasticismo".L..

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As escolas medievais diferiam amplamente em seu carter e influncia. Por todo osculo onze, as antigas escolas monsticas ou conventuais, cujo objetivo era o preparo de oblaras c jovens monges, ainda eram considerveis. Frequentemente, como no caso das grandes abadias beneditinas de Bec, na Normandia, e Monce Cassino, na Itlia central, elas estavam na vanguarda do despertamento intelectual. Mas por volta de 1100, pelo menos ao norce dos Alpes, a liderana havia passado para as escolas das catedrais urbanas sob a direo de mestres seculares. As mais famosas dessas escolas das catedrais se locaiizavani no norte da Frana e ao longo da fronteira da Blgica moderna: Orlans, Chartres, Paris, Reims, Laon, Lige e Tournai. Ao sul dos Alpes, a educao superior floresceu nas escolas urbanas do norte da Itlia. Estas eram escolas laicas, independentes do controle eclesistico direto, nas quais a medicina e o direito, em vez de teologia, eram os principais objetos de estudo. Comeando no sCulo onze, tambm havia surgido uma nova classe de professor profissional: o mestre peripattico ou itinerante (scholasticus vagans), que se deslocava de lugar em lugar e atraa estudantes por seu magnetismo pessoal e argcia dialtica.

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A 10ADE MEDIA POSTERIBR

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O mais expressivo representante dessa classe de erudiro foi Pedro Abelardo, mas otipo j visto em Anselrno de Besate (ca. 1050). Os peripatticos desempenharam um papel de lideranp na vida intelectual dos sculos onze e doze. Sua prpria mobilidade - um fenmeno novo, contrastando com a "estabilidade" dos telogos monsticos tradicionais - espeIhava a vitalidade e inquietaco intelectual da primeira grande poca do escolaseicismo. Conquanto o escolasricismo, porranro, fosse o tipo de pensamento tpico das escolas e mestres medievais, tal definico muito abrangente para ser de bastante utilidade. tambm enganosa, uma vez que nem todas as escolas e nem todos os mestres eram "escolsticos" no sentido estrito. A teologia ensinada nas escolas monsticas, sob a tutela de um abade ou outro diretor espiritual, era dedicada ao escudo da Bblia e dos pais da igreja, dentro do contexto do ciclo dirio da adora~o monstica. Ela era de inclinaco predominantemente conternplat.iva ou "mstica' e seu objetivo era "sabedoria" (sapirntilz) - uma experincia prtica das realidades do mundo celestial e compromisso pessoal em relaco a elas. O monge estudava um livro, sobretudo a Bblia ou "pgina sagrada" (sacrapagiiza), lendo-o em voz alra, uma vez que se compreende apenas o que se ouve, e meditando ou refletindo sobre ele, e desse modo fixando-o na mente e no corao de forma a colocar seu ensino em pritica. Bernardo de Claraval foi um tpico teologo monstico (um fato que explica parcialmente sua hostilidade para com Abelardo).

A teoiogia escolsrica, por outro lado, era ensinada principalmente nas escolas das catedrais urbanas, onde os clrigos que j haviam sido preparados nas artes liberais eram preparados para uma vida pastoral ativa no mundo, sob a direso de um

scholasticz~,ou professor. Tal estudo era em grande parte de inclinaco especulativa ou "terica" e tinha como propsito a obceno de "conhecimento" (scientia), ouverdade logicamente defensvel. Estudava-se a Bblia, e as autoridades aprovadas, pelo uso do mtodo dialtico ou "questionador". Pedro Abelardo e Pedro Lombardo foram eminentes telogos escolsricos no sculo doze. Certamente, no havia separao absoluta entre a teologia monstica e a escolsrica. h s e l m o de Canturia combinou algo de ambos os modos de fazer teologia, conduzindo uma rigorosa investigaco dialtica dos ensinos cristos bsicos dentro de uma estrutura de meditaco sobre a Escritura Sagrada e orao por ilurninao divina. A mesma combinaco t a m b h pode ser vista nos escritos de Hugo.

A marca distintiva do cscolast~cismo,em Itima anlise, foi sua adoco de um

378

HiSTbUlA DA IGREJA C R ~ S T A

mtodo de inquirio comum: o mcodo de descobrir e defender a verdade teolgica e filosfica por meio da dialtica ou lgica aristotlica. O mtodo dialtico envolvia trs passos bsicos: a apresentao de uma questo (qz~aestio), seguida pela argumentao a favor e contra as resposras propostas por autoridades anteriores (diputatio

esii

noter.. res

p1.0 et contra), terminando em uma concluso que logicamente justificada (sententia).At o reaparecimento do conjunto compleco das obras de Aristteles, comeando em meados do sculo doze, o conhecimento do mtodo dialtico era derivado de tradues de pores dos escritos lgicos de Aristteles - seu Categorias e Sobre a lizterpre-

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ta@o (De Inteipretatione) - e da Introduo (Isagoge) de Porfrio a esta ltima obra.Essas tradues, com importantes comentrios nelas includos, eram todas da pena de Bocio (4802-524),um dos verdadeiros iniciadores da Idade Mdia. No domnio da teologia crist, onde a resrelao bblica era percebida como algo concedido de uma vez por todas a mentes maculadas pelo pecado, o mtodo dialtico no presumia gerar novas verdades. Seu propsiro expresso, em lugar disso, era analisar, explicar e defender a f crist como um corpo de verdades divinamente reveladas (corpus dactrinae) depositado na Sagrada Escritura e transmirido pelos mestres autorizados da igreja. A teologia escolstica, portanto, movia-se dentro da estrutura da revelato e da tradito de interpretao da igreja. Neste aspecto, o escoiasricismo pode ser definido como uma tentativa racional para penetrar, por meio de um aparato lgico, nos dados de f revelados. A f crist, segundo os escoIsticos, no um convite ao obscurantismo intelectual; os crentes esto obrigados a compreender aquilo que j crem ser verdadeiro. Os telogos escolsticos, porm, diferiam entre si quanto ao grau ao qual eles sustentavam ser a revelao crist susceptvel a tal verificao e discusso racional, bem como em sua avaliao da capacidade da razo em penetrar as verdades reveladas. Eles tambm diferiam quanto ao grau ao qual concediam a razo, ou a filosofia, autonomia relativa em face da f ou da teologia.

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O desenvolvimento do escolasticismo foi acompanhado por uma discusso sobrea natureza dos "universais" - isto , sobre a existncia de gneros e espcies - um debate ocasionado pela Isdgoge de Porfrio. Eram tomadas trs posies principais. Os "realistas" extremados, seguindo influncias platnicas, afirmavam que os universais existem iparte dos objetos particuiares e antes destes - ante em; i.e., o gnero "homem" anterior ao homem particular e determinante deste. Os "realistas" moderados, sob a orientao de Aristteles, ensinavam que os universais existem apenas em conexo com objetos particuIares - in Te. O S L ' n ~ m i n a l i ~ t a defendendo ~", que

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A IDADE MEDIA POSTERIOR

379

existem apenas coisas articulares, diziam que os universais so simples palavras ou nomes abstratos (nomina)para as semelhancas dos particulares, e no possuem existncia seno no pensamento - post rem. Costumava-se pensar que essa querela entre realismo e nominalismo dominara o pensamento medieval e cra virtualmente sinnima de escolasticismo. Na realidade, esse debate foi agudo por apenas meio sculo, mais ou menos, de cerca de 1080 a 1130. Mais tarde, emergiram novos problemas filosficos, quando o campo da especulaco se ampliou, estimulado pela redescoberta do Aristteles "complero".

A primeira controvrsia escolsrica de importncia foi o despertamento da questo que outrora existira entre Pascsio Radberto e Ratramno sobre a natureza da presena de Cristo na Eucaristia (ver IV:6). Berengrio (998?-1088), diretor da escola da catedral de Tours, por volta de 1049, atacou a concepo predominante de que os elementos po e vinho so transformados no verdadeiro corpo e sangue de Cristo. Ele argumentou que de acordo com as normas da lgica, uma "substncia" (po, vinho) deve permanecer inalrerada enquanto os "acidences" (a aparncia exrerna dos elementos) permanecerem inalterados. Ele foi imediatamente refutado por Lanfranc (1010?-1089),que na poca era o superior do famoso mosteiro de Bec, na Normandia e posteriormente (1070) o aclamado arcebispo de Canturia nos dias de Guilherme,o Conquistador. Lanfranc, o telogo mais influente de sua poca, dcfendeu um uso

moderado da dialtica na teologia, enquanto advogando a autoridade primeira da Escritura e tradico. Conclios em Roma (1050) e Tours (1054), devendo muito aos esforos de Lanfranc, condenaram as perspectivas de Berengrio. O debare mostrou que a perspectiva posteriormente (ca. 1140) conhecida como "rransubsranciaco" tornara-se a opinio dominante na crisrandade latina. Ela receberia total aprovao no Quarto Conclio de Latro em 1215, onde foi proclamada como dogma.

O mtodo dialrico tambm foi empregado, com resultados bascante diferentesdos de Berengrio, por Anselrno de Canturia, frequenremente chamado de pai do escolasticismo. Nascido de uma famlia nobre em Aosta, no norce da Itlia, em 1033, Anselrno tornou-se monge em Bec, em 1060 sob a lideranca de Lanfranc, a quem sucedeu como prior, em 1063, tornando-se abade em 1078. Sob Anseimo, a escola

de Bec alcanou grande distino. Em 1093 ele tornou-se arcebispo de Canturia, durante o reinado de Guilherme I1 (1087-1 100), e teve um episcopado tempestuosodevido a seus princpios hildebrandianos. Ele morreu no cargo, em 1109. Anselmo, um dos mais originais de todos os pensadores medievais, estava con-

vencido da plena capacidade de uma dialtica apropriada para provar as verdades da teologia. Para ele, de fato, nenhuma parte da f crist estava alm da provncia da dernonstraco racional. No apenas a existncia de Deus, mas mesmo tais 'Tnistrios" como a Trindade, a Encarnao, e a redeno, poderiam ser demonstrados como sendo verdades "necessrias" - isto , doutrinas que so congruentes com os cnones da lgica. Diferentemente dos escolsticos posteriores, tais como Toms de Aquino, Anselrno no fez nenhuma distino clara entre verdades naturais da razo e verdades superriaturais conhecidas apenas pela f. Ainda faltavam os termos tcnicos para tal distino. F e razo eram vistas como fluindo juncas para formar um corpo harmonioso da sabedoria crist. Contudo, como um discpulo principal de Agostinho, Anselmo defendia que a compreenso racional pressupe f. "Creio para poder compreender" (c~edo ut intelLigum) um moto que expressa bem sua atitude e a de todos os agostinianos medievais.

A famosa prova de h s e l r n o para a exisrncia de Deus, expressa em seu Proslogion, era tipicamente agostiniana, e nesse mbito ~ieo~latnica, no sentido de que ela moviase inteiramente dentro da mente c seus concciros, no levando em consicierao a experincia dos sentidos. Alinhando-se com o novo mtodo diaItico, Anselrno comeou com uma definio da palavra "Deus", e ento analisou logicamente essa dcfinico. "Deus" "o ser em relaco ao qual no possvel conceber nenhum outro maior." Ele tem portanto que existir na realidade ( i n re), como tambCm em pensamento (in intellectz.~), pois se ele exisrisse apenas no pensamento, poderia ser concebido um ser ainda maior, existindo na realidade como tambm em pensamento, o que imposs.r.el por definico. Esta prova, que j durante os dias de Anselrno suscitara a

oposio de Gauniio, inonge de Marmourier, cem parecido a muitos uin jogo cie palavras, embora no tenha faltado eminentes defensores de sua validade, entre eles Descartes, Leibniz e Hegel. Em seguida Anselmo dirigiu sua atenco para o cnego dc Compigne, Roscelino

(1050-1 125), que afirmara, sob a irifluncia nominalista, que oii o Pai, o Filho e oEsprito Santo so idnticos ou cnco so rrs deuses. No conclio de Soisstins, em

1092, ele foi forcado a abjurar esse criresmo. De acordo com Anselmo, que C apriilcipal fonte de informao sobre as perspectivas de Roscelino, a raiz de sua heresia era sua falha em reconhecer universais, tratando-os simplesmerire como "sol-is vocais"(jdtz~s vocis).

Conseqentemente, disse Anselmo, da mesma forma que

Roscelino no poderia expIicar como diversos indivduos so, em substncia, um

r~ninno v

A IDADE MfDlh POSTERIOR

381

homem, ele no pode explicar como trs pessoas divinas so substancialmente um Deus. Como um realista extremado, Anselmo situava toda a realidade em universais atemporais em vez de situ-la em seres individuais, transitrios. A controvrsia mostra que o debate sobre universais assumiu importncia especial devido sua implicao direta sobre o dogma cristo.

A contribuio mais influeme de Anselmo teologia foi sua discusso da expiao em seu Cur Deus homo (Porque Deus se tornou homem), o mais hbil estudoaparecido at ento. Ele se props a tratar essa quaestzo sem recorrer a qualquer autoridade e demonstrar apenas por argumenro racional, que a Encarnaco e a redenco mediante Cristo eram necessrias, ou logicamente adequadas. Seu tratamento foi no menos revoiucionrio no sentido de que rejeicava totalmente qualquer pensamento, tal como a igreja primitiva havia entretido, de um resgate pago ao diabo. O homem, por seu pecado, desonrara Deus e perrurbara a ordem divinamente desejada(uertirudo) do universo. Seu dbito de justica, portanro, para com Deus somente;

ao diabo nada devido seno desprezo. Mas a justia, ou retido, de Deus tal que ele tem de punir o pecado se no for feita adequada satisfaqo sua honra ferida (aut

poena nut satisfdctio). Para que seu propsito original em criar o homem no fossefrustrado, Deus, em sua misericrdia, escolheu o caminho da satisfao. O homem, entretanto, que deve obedincia a Deus sempre, nada tem com que compensar a desobedincia passada, muito menos suprir a satisfaco infinita que ir sanar a injria honra infinita de Deus. Da, se deve haver a l ~ u m a satisfat;o, ela s pode ser realizada por algum que participe da natureza humana, que seja ele mesmo homem, e, contudo, tenha algo de valor infinito para oferecer. Tal ser singular o Deushomem puro, sem pecado. C ~ n s e ~ u e n t e r n e n ta e Encarnao , necessria. Ser visto adiante que a tcoria de Anselmo depende da convicco "rcalism." de que existe um universal tal como humanidade existindo objetivamente, de forma que Cristo pudesse assumir. O auto-sacrifcio volunrrio de Cristo, ademais, no apenas uma ~ a t i s f a ~ mas o tambtm merece uma recompensa. Esta recompensa 6 a bem-

aventuranca crcrna de seus discpulos, por quem ele inrcrcede perpetuamente e que so unidos a ele, em uma morte semelhante a sua, mediante os prbprios atos repetidos de penitncia deles e pela participaco fiel deles no sacramento de seu corpo e sangue. Assim, a reoria da expiao altamente influente de Anselmo tambm repousava sobrc um raciocnio ecolgico desrinado prtica penirencial-eucarsrica em desenvolvimenro da igreia medieval.

No obstante sua radicalidade em 'Lprovar"as doutrinas crists, Anselmo permaneceu um eclesistico fiel e defensor da autoridade primeira da Escritura e da tradio da igreja. Ele estava persuadido de que a explicao dialtica poderia apenas apoiar as doutrinas da igreja. Sua corajosa confiana na razo era decorrncia de sua firme confianqa na razo do Criador e na racionalidade inerente da criao. O ttulo origina1 de seu Pvoslogian - Fides quaerens intellectum (F em busca de compreenso), com sua nfase na busca ativa da mente pelas bases racionais da crenca crist - resume os impulsos cenrrais do escolasricismo e evidencia a excitao intelectual que acompanhou o reavivamento da dialrica. Outro defensor do uso "igrejeiro" da dialtica foi Guilherme de Champeaux

(10702-1121), que levou a escola monstica de So Vtor, perto de Paris, a grandefama e morreu como bispo de Chalons. Como Anselmo, ele era um realista extrema-

do na questo dos universais, at que foi forpdo a modificar sua posio devido spesadas objees de seu ex-aluno, Pedro Abelardo. Abelardo ( I 079-1 142), o mais hbil dialtico do sculo doze, era um homem de charme, eloqncia, vaidade e esprico hipercrtico, mas de forma alguma um irreligioso. Nascido em PalIet (Palais), na Breranha, ele estudou com Roscelino e Guilherme de Champeaux, aos quais se ops e sem dvida superou bastante em capacidade. Quanto mriito debatida questo dos universais, ele assumiu a posio intermediria entre o nominalismo de um mestre e o realismo do outro. O universal no 6 uma simples palavra (uox),mas uma palavra ou termo ( s e ~ m o que ) pode ser predicado de coisas. Ele prprio no uma coisa, mas existe em conexo com coisas (cumfikndamento in re). O conhecimento de um universal vem atravs da atividade da mente, por meio da qual, trabalhando com as evidncias apresentadas pelos sentidos, ela "abstrai" de coisas particulares certas caractersticas partilhadas. Conquanto no possuindo existncia independente, portanto, o univei-sal denota algo real no uma essncia separada ([a1 como "homem"), mas uma condiqo ou estado (stdtus) que um grupo de particulares tem em comum (tal como "ser um homem"). Tal perspectiva tem sido frequentemente chamada "realismo moderado", mas a designao imprecisa, uma vez que Abelardo no tratou os universais metafisicarnente, sob a categoria de ser, mas apcnas logicamente, como predicados de coisas. Assim Abelardo permaneceu antes de tudo um lgico, e neste sentido demonsrrou mais afinidade com o nominalismo que com o realismo. A vida de Abelardo, relatada em sua Historia calamitatum (Histria de calamida-

PERIODO Y

R IDADE MEDIA POSTERIOR

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des), foi rempesruosa. J em 1103, eIc estava ensinando as artes liberais com muitos seguidores em Melun, perco de Paris. Mais tarde, almejando a eminncia teolgica, montou uma escola para si em Laon, para rivalizar com a de Anselmo de Laon (I-

1117)) o mais aclamado erudito bblico de sua poca, a quem Abelardo rejeitoudesdenhosamente como "fumaa sem fogo". A por 1 115 era cnego de Norre Dame, com tantos seguidores como jamais um mestre conseguira ter. Entzo, no auge de sua fama, apaixonou-se por Heloisa, sobrinha de seu colega cnego Fulberto, com quem ele morava. Helosa teve um filho, ao qual deu o nome de Astrolbio, e o casal contraiu matrimnio secreto, apesar da vigorosa objeo de Helosa, que no queria comprometer as brilhantes perspectivas de Abelardo como professor de teologia. O furioso Fulberco, acreditando que sua sobrinha fora enganada e ele prprio desonrado, vingou-se mandando cmascular Abelardo. S~bse~iicntemente, a pedido de Abelardo, Helosa tornou-se freira em Argenteuil, e ele Tornou-se monge em So Dionsio. Ensinar era, no entanto, sua vida, e ele logo retomou as conferncias, com a permisso do abade. Seu primeiro cratado teolgico publicado, uma rplica ao tritesmo de Roscelino, pendeu por demais para a direco conrrria, de forma que seus inimigos acusaram-no de sabelianismo, e suas idias foram condenadas no Conclio de Soissons. Entrementes, a negao de Abelardo de que o fundador de So Dionsio fora o famoso Dionsio, o Areopagita, provocou sua expulso daquele mosteiro, e ele passou a viver como eremita em um Iocal desolado fora de Paris. Novamente os estudantes acorreram em grande nmero atrs dele e ele fundou um pequeno estabelecimento ao qual chamou Paracleto. Por seu prprio relato, porm, suas crticas haviam suscitado a hostilidade daquele que era o lder religioso mais poderoso da poca, Bernardo de Claraval, e ele ento procurou refgio, como abade do desordeiro e indisciplinado mosteiro de So Gildas, na distante Bretanha. Incapaz de reformar os intratveis monges, aps muitos anos miserveis de contenda, Abeiardo rerornou sua carreira de ensino por volta de 1133, primeiramente em Reims e depois uma vez mais em Paris, no Monte Santa Genoveva. Entrementes, Helosa havia se tornado a abadessa de um pequeno convento de freiras no Paracleto, e Abelardo havia iniciado sua correspondncia com ela. A autenticidade das cartas de Helosa ainda debatida (alguns eruditos atribuem toda a coleo ao prprio Abelardo), mas a correspondn-

cia permanece como uma evidncia notvel do novo "humanismo" do sculo doze.

O perodo de intensa arividade literria de Abelardo foi entre os anos de 1135 a

384

HISTRIA DA IGREJA CRIST

1 140, quando ele escreveu, e revisou constantemente, sua Tbealagia christidna (Teologia Crist), por~es de sua Intvoductio ad tbeolagiam (Introduo Teologia), seu tratado tico Scita te zpsunz (Conhece-te a Ti Mesmo), e seu Szc et non (Sim e No). Verses destas obras foram logo levadas ateno do temvd Bernardo, que procue a rejeiqo rou uma segunda condenao de Abelardo no conclio de Sens, em 1i41, de seu apelo ao papa Inocncio 11. Abelardo agora era um homem submisso. Ele submeteu-se e encontrou um amigo magnnimo em Pedro, o Venervel, abade de Cluny, que relata haverem Abelardo e Bernardo por fim se reconciliado. Em 1142, Abelardo morreu em um dos mosteiros sob a jurisdio de Cluny. Abelardo no era nem racionalista nem ctico. Ele no reverteu o moto de Anselmo e declarou: "Compreendo para que possa crer" (intelIigo ut credam). Seu esprito era essencialmente crtico e, medida em que procurou testar a doutrina da igreja pela dialtica, inovador. Sem rejeitar as Escrituras, os pais ou os credos, ele defendeu que todosOS

dogmas de f devem ser submetidos ao exame lgico e no crido leviana-

mente. Mas ele no pensava ser possivel compreender (comprehendere)totalmente as verdades divinas; quando muito, algum poderia apenas entend-las (intelLigeere) a

um grau consoante com a f. Esta condio levou-o a definir a crena crist comouma "exis~imao" (existimatio) ou "estimao" (aestirnatio),pela qual ele queria dizer, no uma simples "opinio", como Bcrnardo erroneamente avaliou, mas uma da verdade completa, ainda a ser revelada no apreenso mental, ou "apr~xima~o", ltimo Dia, quando a f dar lugar viso. Diferentemente de Anselmo, portanto, ele no procurou dcmonscrar as doutrinas crists cardeais como verdades "necessrias". Como Anselmo, porm, ele tinha grande confiana no poder da dialtica para explicar a doutrina, exceto que suas explicaes fossem julgadas como sendo menos ortodoxas, e mais ofensivas s sensibilidades do momento, do que as de Anselmo. Em seu Sim e No, por exemplo, Abelardo exps uma srie de textos aparentemente conrraditrios das Escrituras e dos pais sobre os principais tpicos teolgicos, sem nenhuma tentativa explcita de harmonia ou explicaao. Esse procedimento no era or