cultura.sul 67 - 7 mar 2014

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MARÇO 2014 | n.º 67 www.issuu.com/postaldoalgarve Mensalmente com o POSTAL em conjunto com o PÚBLICO RICARDO CLARO Grande ecrã: Faro convida a Ambivalências p. 3 Aqui há espectáulo: MED prepara três dias de luxo para Junho p. 4 Sala de leitura: A vida numa chávena de café Letras e leituras: Nuno Júdice: o poeta escritor p. 8 D.R. D.R. D.R. p. 6 D.R. ALEXANDRA GRADIM 8.252 EXEMPLARES p. 5 A Nordeste sempre há algo de novo p. 8 e 9 Património:

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• Veja o CULTURA.SUL DESTE MÊS• Sexta-feira (dia 7/3) nas bancas com o PÚBLICO e o POSTAL • Partilhe o seu caderno mensal de Cultura no Algarve • EM DESTAQUE: > GRANDE ECRÃ: Faro convida a Ambivalências > AQUI HÁ ESPECTÁCULO: MED prepara três dias de luxo para Junho > PANORÂMICAS: Bívar: uma nova forma de sentir Faro, por Ricardo Claro > LETRAS E LEITURAS: Nuno Júdice - O poeta escritor, por Paulo Serra > SALA DE LEITURA: A vida numa chávena de café, por Paulo Pires > ESPAÇO PATRIMÓNIO: A nordeste sempre há algo de novo, por Alexandra Gradim > DA MINHA BIBLIOTECA: Fernando Pessanha: os livros não se medem aos palmos, por Adriana Nogueira

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MARÇO 2014 | n.º 67

www.issuu.com/postaldoalgarvewww.issuu.com/postaldoalgarve

Mensalmente com o POSTALem conjuntocom o PÚBLICO

RICARDO CLARO

Grande ecrã:

Faro convida a Ambivalências

p. 3

Aqui háespectáulo:

MED prepara três dias de luxo para Junho

p. 4

Sala de leitura:

A vida numa chávena de café

Letras e leituras:

Nuno Júdice: o poeta escritor

p. 8

D.R.

D.R.

D.R.

p. 6

D.R.

ALEXANDRA GRADIM

8.252 EXEMPLARES

p. 5p. 5p. 5p. 5p. 5p. 5

Bívar: Bívar: Bívar: Bívar: Bívar: Bívar: Bívar: Bívar: Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma Uma nova forma de sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Fade sentir Farorororororororororo

A Nordeste sempre há algo de novo p. 8 e 9

Património:

07.03.2014 2 Cultura.Sul

A iniciativa é que faz mover o mundo e é ela que em muitas ci-dades por essa Europa e mundo fora tem feito a diferença.

À escala de cada uma, Barce-lona, Londres, Madrid, Porto ou Lisboa têm sabido reinventar-se e a iniciativa tem feito destas ci-dades maiores e melhores.

Em grande parte dos casos as cidades reinventaram-se além de outras maneiras pela Cultura e muitas iniciativas que são hoje verdadeiros fenómenos come-çaram pela afirmação de uma programação cultural.

Parece que Faro está a dar os primeiros passos neste que é um dos caminhos possíveis para re-formar a cidade capital de dis-trito e tirá-la de um atoleiro em que salvo honrosas excepções está mergulhada.

Com a iniciativa Bívar está provado que é possível e que a cidade responde a estímulos desde que certos e bem realiza-dos. De parabéns está a orga-nização de ilustres anónimos que prova uma vez mais que a vontade pode quase tudo e que a determinação se encarrega do que faltar para o sucesso.

As cidades e vilas algarvias têm, grande parte delas, sabido levar a cabo esta que é uma das suas tarefas fundamentais, se-rem cidades vivas. Olhe-se para São Brás de Alportel, veja-se Monchique, atente-se em Lou-lé. Perceba-se o que se faz em Olhão, Lagos ou Vila Real de Santo António e rapidamente se vê que o caminho do futuro se faz também por aqui e desta forma.

E depois do tempo das au-tarquias tudo podem e tudo pagam é chegado o tempo do todos temos de fazer e o custo tem de ser diluído tanto quanto possível. A sociedade civil tem esta força de alcançar o me-lhor de si dividindo engenho e arte com os outros de forma dada e recompensada. Sinergias querem-se e recomendam-se, o dinheiro essse não jorrará aos milhões, mas não terá de ser também sempre um percurso feito de tostões.

Iniciativa com a Cultura como pano de fundo

Ficha Técnica:

Direcção:GORDAAssociação Sócio-Cultural

Editor:Ricardo Claro

Paginação:Postal do Algarve

Responsáveis pelas secções:• O(s) Sentido(s) da Vida a 37º N:

Pedro Jubilot• Espaço ALFA:

Raúl Grade Coelho• Espaço AGECAL:

Jorge Queiroz• Espaço CRIA:

Hugo Barros• Espaço Educação:

Direcção Regionalde Educação do Algarve

• Espaço Cultura:Direcção Regionalde Cultura do Algarve

• Grande ecrã:Cineclube de FaroCineclube de Tavira

• Juventude, artes e ideias: Jady Batista• Da minha biblioteca:

Adriana Nogueira• Momento:

Vítor Correia• Panorâmica:

Ricardo Claro• Património:

Isabel Soares• Sala de leitura:

Paulo Pires

Colaboradoresdesta edição:Helena Silva CorreiaMaria do Carmo LoureiroPaulo SerraSofia Vairinho

Parceiros:Direcção Regional de Cul-tura do Algarve, Direcção Regional de Educação do Algarve, Postal do Algarve

e-mail redacção:[email protected]

e-mail publicidade:[email protected]

on-line em: www.issuu.com/postaldoalgarve

Tiragem:8.252 exemplares

Uma abordagem pragmática sobre a transferência de conhecimento

Nas Universidades são ge-rados ativos passíveis de ser comercializados e é neste par-ticular que assume importân-cia falar da Investigação Apli-cada e da possibilidade de se comercializar o conhecimento que é gerado no seu seio.

A transferência do conheci-mento gerado nas universida-des pode incidir sobre ativos intelectuais merecedores de atenção comercial e existem algumas perspetivas sobre o modo e a abordagem que devemos adotar aquando da possibilidade de transferir co-nhecimento ou tecnologia.

Os ativos intelectuais trans-feríveis podem ser passíveis de ser protegidos como direi-to de propriedade industrial e é muito frequente avançar--se, num primeiro momento e considerando a existência de determinados requisitos le-

gais, com um pedido de paten-te nacional ou com um pedido provisório de patente de modo a salvaguardar uma eventual invenção nova, detentora de suficiente atividade inventiva e aplicabilidade industrial.

Contudo, nem sempre o re-curso à patente representa a opção mais óbvia ou economi-camente mais viável. As paten-

tes, a par de outros direitos de propriedade industrial, como as marcas, o design ou modelo industrial, enquadram-se nos direitos de propriedade inte-lectual, onde, por exemplo, também se inclui o direito de Autor e direitos conexos.

Perante estas circunstân-cias, comummente se recorre

a acordos de confidencialida-de, no âmbito das negocia-ções preliminares com em-presas para as quais poderá ser transferida a tecnologia. Os acordos de confidencialidade funcionam como elemento apaziguador face a eventuais exposições preliminares de tecnologias a potenciais inves-tidores ou interessados na sua

comercialização, protegendo, de certa forma, quem divulga a informação e quem a recebe.

Muitas vezes os acordos de confidencialidade antecedem a celebração de contratos de li-cenciamento, ou contratos de transferência de tecnologia, que representam um dos mo-dos de formalização da trans-

ferência de conhecimento. Por outro lado, alguns pro-

motores ou investigadores universitários optam por, na sequência dos trabalhos de-senvolvidos e considerando a existência de equipas multidis-ciplinares, criar uma empresa: essas empresas são vulgarmen-te apelidadas de ‘spin-off’, uma vez que as mesmas resultam do conhecimento gerado no seio da Universidade.

O percurso para a trans-ferência de tecnologia nem sempre é linear, óbvio ou fácil e normalmente requer um pe-ríodo para estudo do caso con-creto, definição de uma estra-tégia, de abordagem e estudo de mercado, de identificação de potenciais parceiros ou in-teressados na tecnologia e de um período de negociação antes de se começar a receber algum valor relativo ao esforço de transferência realizado.

Pelo que vem de se dizer urge concluir que muitas tec-nologias devem ser apresen-tadas ao mundo e testadas na sua viabilidade para que não permaneçam ocultas. Em re-sumo, esta nova missão, ou desafio, para as universidades e empresas pode representar um importante mecanismo para o estímulo económico e desenvolvimento empresarial.

«Ler é maçada, / Estudar é nada.»

«Ó meninos, calados e a trabalhar!», dizia o professor, enquanto escrevia no qua-dro. Mas, o barulhinho con-tinuava. Irritado, o professor voltava-se. A turma parecia sossegada. Silêncio. Minutos, aulas depois, a cena repetia--se. O professor voltava-se, silêncio! Virava-se e aí vai disto. Risinhos e conversi-nhas cruzadas cada vez mais insuportáveis. Cansado e irri-

tado, o professor, às vezes, lá conseguia apanhar um aluno em flagrante! «Rua!» Contra-riado, o aluno saía. Os outros sorriam…

Um dia, decidido que estava a pôr fim “àquilo”, o professor, ao voltar-se, reparou na “car-pete” que cobria o chão…

– Quem foi? – perguntou. – Quando entrámos, a sala esta-va limpa!...

Ninguém se acusava. O chão estava imundo, cheio de borrachinhas e afins. Nesse dia, o professor não perdoou. Feita a participação, apurou--se a verdade. Os alunos, em vez de estarem a trabalhar, entretinham-se, divertidís-simos, a “guerrear” à revelia dos docentes! Para espanto de todos, a sala de aula era uma arena de combates surdos!

Não seria tão grave se fos-se apenas uma criancice de putos! Mas não! Alguns “in-teligentes estrategas”, para os quais tudo é «uma seca», arrastavam os colegas para esta verdadeira guerra «bor-rachosa», quando não gostam das matérias, quando elas já

não são novidade para eles, quando não há divertimento envolvido «tudo é uma seca». Quando gostam, é porque acham que “sabem (quase sempre) mais que os profes-sores”!... Génios! Não sabem que esforço e persistência são 80% do sucesso!

D.R.

D.R.

Ricardo [email protected]

Editorial Espaço CRIA

Sofia Vairinho Advogada/Colaboradora do CRIA - Divisão de Empreendedorismo e Transferência de Tecnologia da Universidade do Algarve

Sofia Vairinho

Juventude, artes e ideias

Maria do Carmo LoureiroProfessora do Ensino Secundário

Fernando Pessoa

07.03.2014  3Cultura.Sul

Espaço AGECAL

Recentemente, as grandes operadoras de telecomunicações móveis estiveram reunidas em Barcelona, no Congres-so Mundial de Telefonia Móvel, para apresentarem as novidades, como é o caso do fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, que apresentou o projecto ‘Internet.org’, resultado da colaboração de inúmeras operadoras. Com a recen-te aquisição da aplicação móvel ‘What-sApp’, Zuckerberg tem como objectivo ligar os dois terços do mundo que falta terem acesso à internet.

Com o qual, a cultura digital está inerente a todo este movimento que se iniciou em 1991 pelo fundador da in-ternet, Sir Tim Berners-Lee, que veio per-mitir a possibilidade de um terço dos ci-dadãos do mundo ter acesso à internet; e agora, recentemente, a comunicação móvel. A internet veio permitir o aces-so a um mundo de informação, como a

Wikipedia, ou quem se interessar em vi-sitar os museus do mundo o Google Art Project, ou assistir a um Google ArtTalks com um curador ou historiador de arte, num dos museus do Mundo.

O mundo tornou-se mais pequeno e mais acessível. Faz com que as organi-zações ligados à cultura, quer públicas, público-privadas, privadas, associações e afins, precisem de ir ao encontro dos seus seguidores ou amigos, se preten-dem aproximar-se dos seus públicos.

Mais do que ir ao encontro dos seus públicos, é necessário criar conteúdos que acrescentem valor à vida dos utili-zadores. Pensar numa estratégia de co-municação desde o primeiro momen-to. Conteúdos, timing, e onde partilhar os seus conteúdos. Com a fragmenta-ção dos meios de comunicação, a es-tratégia é essencial, quer ao longo do dia, semana ou mês, além de ter uma visão integrada dos meios disponíveis.

No caso das redes sociais, a moeda de troca é a partilha. Partilhar conte-údos de qualidade passa por saber o que partilhamos, quando partilhamos e como. Na internet, a proliferação de conteúdos é enorme, o desafio é selec-cionar o que é realmente importante. Num só dia, são consumidos 34 giga-

bytes de conteúdos e cem mil palavras de informação por um americano, em média. Fazer com que uma organiza-ção cultural sobressaia no meio de mi-lhões de mensagens, imagens e vídeos, é um enorme desafio.

Curiosamente, as redes sociais como o Facebook, Twitter, Youtube, Insta-gram, vieram introduzir um novo pa-radigma digital que passa sem dúvida pelo ‘cultural empowerment’, mas, também, pela criação de experiências participatórias online, que até então eram inexistentes à grande parte da

população. A possibilidade de editar e comunicar para um grande número de pessoas estava restringida aos grandes grupos de media – televisão, rádio e jor-nais. Para acrescentar às redes sociais, surgem também mais tarde, as apli-cações para dispositivos móveis, para mais de 6.8 biliões de utilizadores em todo Mundo.

No entender da UNESCO, o sécu-lo XXI passa pela educação através dos dispositivos móveis, como tam-bém pelo diálogo intercultural entre povos. As seis linhas de actuação da

UNESCO na área da educação, são a criação de sistemas de educação para toda a vida, literacia para todos, um programa para professores, criação de ferramentas para o trabalho e para a vida, monitorização e coordenação do desenvolvimento educacional como a preocupação com o género, a educa-ção das mulheres e jovens.

Hoje, o desafio que se coloca às co-munidades é comunicar o património material ou imaterial de uma forma clara numa era em que há uma fraca literacia digital em grande número de escolas ou exclusão digital em fai-xas etárias mais avançadas, sem qual-quer contacto com o mundo online ou móvel.

Como é que as diferentes instituições irão reagir aos desafios da mudança do paradigma comunicacional? Está nas mãos de cada instituição cultural co-municar os conteúdos que acrescen-tem valor à vida do utilizador e criem envolvimento, a medio, longo prazo.

Abriu-se uma porta para elevar a Humanidade, para tornar a geração de hoje e as vindouras mais informa-das mas também para terem um papel mais participativo na melhoria da cida-dania. Estamos preparados?

Grande ecrã

Cineclube de TaviraProgramação: www.cineclubetavira.com281 971 546 | 965 209 198 | 934 485 [email protected]

SESSÕES REGULARESCine-Teatro António Pinheiro | 21.30 horas

13 MAR | THE BROKEN CIRCLE BREAKDO-WN (CICLO INTERROMPIDO), Felix Van Groeningen, Bélgica/Holanda, 2012, 111’, M/16

20 MAR | VIRGEM MARGARIDA, Licínio Azevedo, Moçambique/França/Portugal, 2012, 90’, M/1227 MAR | STORIES WE TELL (HISTÓRIAS QUE CONTAMOS), Sarah Polley, Canadá, 2012, 108’, M/1229 MAR | FESTIVAL EXPRESS (entrada gra-tuita), Bob Smeaton, Reino Unido/Holan-da, 1970-2003, 90’, M/12

Jia Zhang-Ke mostra “China - um toque de pecado”

O mês de Março do CCF traz o final do ciclo Eroticidades, com as duas partes da “Ninfo-maníaca”, de Lars Von Trier, em destaque. Viramos as ob-jectivas depois a 11 de Março para apresentar um ciclo de três filmes em que as ambiva-lências são o prato forte. Co-meçamos então com o mais recente filme de Teresa Vila Verde, “Cisne”. A sua sexta longa-metragem conta com uma Beatriz Batarda soberba na pele de Vera, uma fadista (a quem Ana Moura empresta a voz), numa busca a roçar o exorcismo catártico e reden-tor (característico do cinema de Teresa Vila Verde) sobre o amor e a família. A segunda proposta deste ciclo, a 18 de Março, é “China – um toque de pecado”, de Jia Zhang-Ke, vencedor em Cannes 2013 do prémio de melhor argumen-to, um filme em que diferen-

tes histórias se cruzam reflec-tindo a falência moral numa China encurralada entre um pseudo-comunismo e um ca-pitalismo selvagem aparente-mente exuberante e lumino-so, mas absolutamente atroz nas consequência humanas.

Por último, o regresso de um dos maiores Mestres às salas nacionais, com a repo-sição do cinema de Ingmar Bergman vem a oportunidade para (re)ver ou conhecer um cineasta fundamental, a 25 de Março propomos um dos seus filmes mais populares que lhe valeu o reconhecimento in-ternacional com a atribuição do Prémio Especial do Júri em Cannes em 1956, “Sorrisos de noite de Verão”.

Na sede do CCF, às 5ªs, 21.30, propomos uma retros-pectiva imperdível de um ci-neasta e-spanhol tão genial quanto desconhecido do

grande público, Victor EriceDestaque ainda para as

colaborações com a Alliance Française (dia 28) e o Poesia & Cª (dia 22).

Cena do Filme China - um toque de pecado

FOTOS: D.R.

Mark Zuckerberg

D.R.

Cineclube de Faro Programação: cineclubefaro.blogspot.pt

IPJ | 21.30 HORAS | ENTRADA PAGACICLO AMBIVALÊNCIAS

11 MAR | CISNE, Teresa Villaverde, Portu-gal, 2011, 103’, M/12

18 MAR | CHINA - UM TOQUE DE PECADO, Jia Zhang-Ke, China, 2013, 133’, M/1625 MAR | SORRISOS DE UMA NOITE DE VE-RÃO, Ingmar Bergman, Suécia, 1955, 108’

Cultura acessível para todos

Helena Silva CorreiaGestora Cultural, Curadora, DesignerSócia da AGECAL – Associação de Gestores Culturais do Algarve

Helena Silva Correia

07.03.2014 4 Cultura.Sul

Aqui há espectáculo

MED já mexe em Loulé

Esperar vale sempre a pena quando no horizonte está um dos mais marcantes pontos da agenda anual cultural da região, o MED.

Agendado para Junho, o fes-tival que coloca há anos Loulé na rota dos eventos culturais nacionais de relevo regressa este ano ao formato de três dias e tem um cartaz de nota maior nesta que será a 11ª edição que integra o roteiro de excelência dos festivais europeus de World Music.

As primeiras confirmações foram apresentadas recente-mente pela autarquia louleta-na e dão mostra da força que o MED tem. Este ano, a cidade de Loulé prepara-se para acolher a fadista Gisela João, a cantora e compositora galega Mercedes Peón e os colombianos Bomba Estéreo.

Dona de uma voz singular, Gisela João foi a grande reve-lação na área do fado em 2013 e vai estar no dia 28 de Junho, no Palco da Cerca, para mostrar as razões pelas quais é um dos grandes nomes da nova vaga do Fado. A artista esteve no passa-do dia 26 de Fevereiro na apre-sentação do MED e manifestou o seu antigo desejo de subir ao palco deste Festival.

Da Galiza para Loulé, Merce-des Péon traz a ancestralidade das aldeias da sua terra natal, vestida de uma roupagem con-temporânea e alternativa. A ac-tuação está agendada para o dia 27 de Junho, no Palco da Cerca.

A energia e força em palco dos Bomba Estéreo, um dos nomes mais importantes da América Latina no actual panorama mu-sical, vai incendiar o Palco da Ma-triz, para o encerramento do pri-meiro dia do MED (26 de Junho).

Mais uma vez a qualidade ar-tística é uma das grandes apostas da organização, que acredita que “estes e os outros nomes poderão

proporcionar experiências musi-cais únicas ao público”, garante a organzação.

Este ano, terão lugar assegura-do no cartaz do festival bandas representantes de países que, pela primeira vez, irão marcar presença no MED. No total, serão cerca de 40 as bandas que irão passar por esta edição do evento, representantes de 16 países.

O 11º Festival MED vai ser também apresentado no recin-to da BTL – Bolsa de Turismo de Lisboa, no dia 13 de Março, data em que o site oficial do Festival vai para o ar.

Para o presidente da Câmara de Loulé, Vítor Aleixo, o Festival MED “é um dos cartazes de re-ferência do panorama da músi-ca em Portugal e é, ainda, uma marca de Loulé, responsável, nos últimos anos, por projectar no país e no estrangeiro o nome desta cidade”.

O autarca salientou ainda o facto de o MED decorrer “no casco histórico da cidade reno-vado”, já que neste momento estão a decorrer no local obras de reabilitação. Com os novos achados arqueológicos nos Ba-nhos Islâmicos, o presidente da câmara acredita que esta “será mais uma peça de valorização para o festival em si”.

“A Câmara de Loulé tem neste festival uma referência cultural de primeira linha”, sublinhou ainda o edil, garantindo que “os grandes eventos que projectam a cidade de Loulé são para conti-nuar e valorizar e infundir uma nova dinâmica”.

Quanto ao impacto económi-co no turismo, Desidério Silva, presidente da Região de Turis-mo do Algarve, falou do facto do Festival MED ser “um evento diferenciador”, uma mais-valia já que “os turistas que nos visi-tam também querem experiên-cias diferentes e o MED encaixa perfeitamente aí”.

Mercedes Peón integra o cartaz já anunciado

Teatro Municipal de Faro Programação: www.teatromunicipaldefaro.pt

8 MAR | Comemoração do Dia Mundial da Mulher, programação variada, 15.30 horas, 150 min., preço: 2 €14 e 15 MAR | X Festival de Flamenco de Faro, Workshop de Flamenco (dia 14 às 19 horas e dia 15 às 15 horas), com Yasaray Rodriguez, preço: 20 €

15 MAR | Solera Flamenca, espectáculo, 21.30 horas, 65 min., 10 €

AMO - Auditório Municipal de Olhão Programação: www.cm-olhao.pt/auditorio

8 MAR | A Princesa Mimada, teatro infantil, 16 horas15 MAR | Luís Guilherme, música, 21.30 horas

TEMPO - Teatro Municipal de PortimãoProgramação: www.teatromunicipaldeportimao.pt

22 MAR | Orlando Santos & Jahmmin, música, 21.30 horas, 90 min., 5 €28 e 29 MAR | Filminhos Infantis, Pequeno Auditório, 28 Março, 10 horas (escolas) e 29 Março, 16 horas (famílias), preço: escolas com entrada gratuita, restante público 3 €Filmes em exibição: A grande migração; Ex-et; As aventuras de Míriam: a batedeira eléctrica;Os porcos-espinhos e a cidade; Lengalenga da panqueca; Música para um apartamento e seis bateristas; Rumores.5 ABR | As Canções d’a Naifa, 21.30 horas, música

Espectáculo que envolve em palco qua-tro conceituados fadistas (António Pinto Basto, Maria Armanda, José da Câmara e Teresa Tapadas), com um alinhamento que chega a incluir mais de 50 temas in-terpretados parcialmente, ora em solos, duetos, ou quarteto de vozes.

A constante projecção de mais de 400 imagens ao longo de toda a actuação, é também elemento inovador em espectá-culos de fado, transportando os espec-tadores para recordações dos fadistas e dos ambientes que fizeram os grandes fados.

Dest

aque 21 MAR | Quatro Cantos, fado, 21.30 horas

D.R.

A Associação Ideias do Levante apresenta um recital pelo Dell’Aqua Trio (voz, piano e flauta). Neste recital, que é um tributo à natureza, serão interpretadas obras de Benedict, Saint-Saëns, Fauré, Godard, Dé-libes e Débussy.

Espaço para apreciar a voz como instru-mento por excelência.Em palco estarão a soprano Carla Pontes acompanhada ao piano por Cristina Silva e à flauta por Grace Borgan.

Dest

aque 15 MAR | Natureza cantada, canto, 21 horas, 50 min., 6 €

Hombres Flamencos é um espectáculo que une dois grandes bailaores flamencos, Francisco Mesa “El Nano” e Jesus Herrera e enfatiza uma das características mais re-levantes do baile flamenco masculino, ou seja, a velocidade e a força do sapateado

que são verdadeiramente estonteantes.Oportunidade de ver em duo dois grandes nomes da arte maior do país vizinho, numa verdadeira experiência de raízes andaluzas que nos transporta além-fronteira para o lado de lá do Guadiana.

Dest

aque 14 MAR | Hombres Flamencos, espectáculo, 21.30 horas, 60 min., preço 10 €

Cine-Teatro LouletanoProgramação: http://cineteatro.cm-loule.pt

8 MAR | Auto da Vida e da Morte, teatro, 21.30 horas, 75 min., preço: 5 €

Nascida a 8 de Dezembro de 1894, Florbela Espanca era uma mulher incomum e fora do seu tempo. O filme segue a sua história no período de crise literária, em que deixou de conseguir expressar-se através da escrita, por altura da morte de Apeles, o seu ado-rado irmão oficial da Aviação Naval, cujo

hidroavião se despenhou no Rio Tejo.Depois da curta-metragem “Entre o Dese-jo e o Destino” e da longa “Quinze Pontos na Alma”, o argumentista Vicente Alves do Ó regressa à realização com um filme que pretende homenagear uma das poetisas portuguesas mais relevantes do séc. XX.

Dest

aque 13 MAR | Florbela, cinema, 21 horas, 115 min., gratuito

07.03.2014  5Cultura.Sul

Bívar: o impossível e improvável feito incontornável

Teresa Correia e Davide Alpestana (Palácio do Tenente), Ana Palmeiro (Sardinha de Papel) e António Lacerda (Associação Nacional de Designers)

FOTOS: RICARDO CLARO

“ORLANDO & JAHMMIN”22 MAR | 21.00 | Grande Auditório do TEMPO- Teatro Municipal de PortimãoConcerto pela banda que acompanha Aka Lion, também conhecido como Orlando Santos, um compositor portu-guês admirador da cultura jamaicana. A sua música mer-gulha em territórios próximos do reggae, do rock e do soul

“ROSTOS E TRANSFIGURAÇÕES”Até 29 MAR | CECAL – Centro de Experimentação e Criação Artística de LouléExposição de fotografia de Jaime Machado, que tem como principal enfoque a “máscara” enquanto re-gisto e caracterização de um rosto que se transfigura durante os festejos do CarnavalAg

endar

Panorâmica

Deus quer, o Homem sonha e a obra nasce, as palavras do Mar Português pessoano encai-xam na perfeição na afirmação de Bívar como um evento que já marca a agenda cultural de Faro.

A iniciativa, que tem na sua génese vários parceiros, pro-vou que o dito impossível e o propalado improvável, podem ser de facto transformados em realidade incontornável. Haja para tanto inspiração e vonta-de ‘divinas’, a força do engenho humano e a obra faz-se.

A prová-lo estão a delegação regional da Associação Nacio-nal de Designers, a Sardinha de Papel, o Palácio do Tenente, o Hotel Faro e a autarquia local, que se uniram numa aposta que não sendo absolutamente original era até há bem pouco tida como inusitada para a ci-dade de Faro. Dinamizar uma rua da cidade capital de distrito - a Rua Conselheiro Bívar - com o ensejo de ser a génese de um outro ‘olhar e fazer’ para a di-namização alargada da baixa da cidade.

O pontapé de saída dado pela vontade desta paleta di-versa de actores locais - que em comum têm aquela rua de Faro - de unirem as suas activi-

dades de dinamização cultural e comercial fez o primeiro Bívar sair à luz dos dias em Outubro de 2013.

Surpresa... ou talvez não, a Conselheiro Bívar encheu-se de gentes para ver, ouvir, sentir e percorrer a artéria pedonal. Com apenas as redes sociais e pouco mais como base de co-municação, como referiu ao Cultura.Sul António Lacerda, da Associação Nacional de De-signers, o evento ganhou uma dinâmica inusitada.

“Não prevíamos um sucesso tão grande na primeira edição”, refere. Mas a uma programa-ção diversificada que engloba artesanato, teatro, performan-ces de rua, música, animação quantidade bastante, exposi-ções, instalações e muito mais nessa infinda planície de pos-sibilidades que é a cultura, se juntarmos uma vontade férrea, muito trabalho e uns toques de muita alma, o resultado é por vezes agradavelmente surpre-endente e ei-lo tornado facto visível no Bívar.

Se se havia de esperar, depois de uma primeira edição bem sucedida e do rescaldo da sur-presa dos organizadores, uma ressaca capaz de garantir o sucesso de um novo Bívar, o

longo se fez curto e de súbito em Dezembro estava na rua o segundo evento.

Ainda antes do Natal, o Bívar fez-se à rua e novamente com estrondo e sucesso capazes de garantir ter pernas lestas para andar.

Afinal, a obra deste grupo de verdadeiros empreendedores sociais e culturais era capaz de fazer jus ao nome do ilustre fa-rense que é a marca do evento, Manuel Bívar.

A força da uniãodas diversidades

“Somos todos muito diferen-tes, mas completamo-nos”, diz António Lacerda sobre os mem-bros do núcleo duro, numa or-ganização, que afirma ter sido “muito fácil” pôr de pé para dar corpo à realização do conceito inicial.

Às dificuldades que sempre se apresentam a iniciativas deste género, sem financia-mento de arranque e sem co-brança de entradas, os orga-nizadores responderam com a congregação de vontades e o que se procura é que o evento “seja auto-sustentável”.

Os artistas e performers, os voluntários, os comerciantes e

lojistas e demais forças vivas da Conselheiro Bívar - e já de ou-tros espaços da baixa farense - perceberam, vão percebendo e perceberão decerto melhor com o tempo, que em cada uma des-tas iniciativas trazem à baixa a cidade e os visitantes, os turistas e os simples passantes e que esta é uma das formas de devolver ao centro de Faro uma pujança há muito perdida para as novas centralidades comerciais.

Entretanto, não se baixam os braços e faz-se de cada Bívar a força vital do próximo que há-de vir. No passado fim-de--semana, a fechar Fevereiro e em uníssono com o Carnaval, a terceira edição levou à Rua Conselheiro Bívar, tarde e noi-te fora, muitos visitantes e nem o sobressalto de uns pingos de chuva puseram em causa o su-cesso da iniciativa, com o con-certo dos RareFolk a encher o espaço do antigo Chiado como há décadas se não via.

Na rua o Te-Atrito deu vida a personagens, o Palácio do Te-nente mostrou às hostes exposi-ções e instalações, o Mercado da Traça deu nota do artesanato e a Sardinha de Papel mostrou o muito que se pode descobrir na Conselheiro Bívar. As esplanadas convidaram a sentar-se entre um copo e dois dedos de conversa, os espectáculos de novo circo animaram miúdos e graúdos e muito mais houve para se des-cobrir na centenária rua farense com apenas as pedras da calçada como testemunhas, elas e mais umas centenas largas de convi-vas que não deixaram de visitar mais esta edição do Bívar.

Seis edições este ano

Na calha estão, adianta Antó-nio Lacerda, mais cinco edições do Bívar para 2014. “A ideia é a promoção de seis edições por ano” deste que é um novo con-ceito para a cidade e que em breve ganhará um novo espaço de comunicação com uma pla-taforma própria que promete institucionalizar o evento numa plataforma on-line talhada sob

medida com o apoio de uma empresa local.

Nesta terceira edição, que a ligar o Bívar com o Carna-val teve um notório bigode como imagem de marca - ou não fosse Manuel Bívar dono de um desenhado bigode ele também - o evento rompeu já os limites da Rua Conselheiro Bívar e há espaços comerciais espalhados pela baixa farense a associar-se-lhe levando a ini-ciativa para outras geografias farenses. Exactamente o que se pretendia e pretende com uma iniciativa que se quer orgânica na evolução e capaz de atrair à baixa todos os públicos com uma oferta tão diversificada quanto possível, tendo como âncora um evento em que a aposta se faz pela qualidade da oferta em todos os domínios.

Afinal o desafio de unir vontades numa baixa desa-gregada e desgarrada entre si é uma aposta que provou que

pode ser ganha e o Bívar a pro-va de que os farenses podem ter como destino mais do que as grandes superfícies comerciais.

A diferença faz-se exercen-do-se, as dificuldades vencem--se enfrentando-as e os suces-sos ganham-se atrevendo-se e o Bívar é isso mesmo, um enorme, desejável e frutuoso atrevimento.

Faro está diferente e para prová-lo basta que se atreva. No próximo Bívar em vez de ficar em casa vá até à Conselheiro Bí-var no centro de Faro e deixe-se arrebatar, porque a cidade tem muito mais do que se pensa para mostrar.

De resto, a cidade apenas tem de se render à evidência de que há sempre espaço para inovar e vencer, olhar para o exemplo e seguir os passos de uma nova forma de estar.

A Faro resta aprender a ‘Bívar’.

Ricardo Claro

07.03.2014 5

Desenho visível no Palácio do Tenente, alusivo a Manuel Bívar

07.03.2014 6 Cultura.Sul

“A BRINCAR SE FEZ HISTÓRIA”Até 31 MAR | Mercado Municipal de LouléExposição retrata alguns dos momentos vibrantes do Carnaval “civilizado” mais antigo de Portugal, desde 1906 até aos nossos dias, mostrando ao pú-blico as diversas fases por que passa a criação do corso carnavalesco

“A ALMA DO MAR”Até 31 MAR | Centro Cultural de LagosExposição de Eva Jacobsen. Paralelamente à profissão de psicóloga, a artista criou uma colecção de escultu-ra que ainda não foi exibida, as peças são executadas com vários materiais, tais como, ouro, prata, fio de cobre, pedras, conchas, entre outrosAg

endar

O poeta escritor - Nuno Júdice

Nuno Júdice é um autor contem-porâneo e conterrâneo (para os lei-tores algarvios) bastante conhecido pela sua poesia, pela qual tem sido particularmente apreciado e premia-do. Na linha de outros poetas do sé-culo XX, a tradição e a antiguidade clássica renascem em força na sua obra poética. Ganhou, este ano, o XXII Prémio Reina Sofia de Poesia Ibero--Americana. É ainda ensaísta, escritor e professor associado na Universidade Nova de Lisboa.

Este poeta algarvio nasceu na Mexi-lhoeira Grande, em 1949, e formou-se em Filologia Românica pela Univer-sidade Clássica de Lisboa. É reconhe-cido e publicado internacionalmen-te, em mais de onze línguas. Além disso, Nuno Júdice dirige ainda um dos últimos baluartes da crítica lite-rária a resistir nos dias que correm, a revista Colóquio Letras. Dedica-se ainda ao estudo e à escrita de ensaios sobre teoria da literatura e literatura portuguesa, como o pequeno ABC da crítica, que explica de forma simples e atual essa ciência que alguns con-sideram uma inutilidade que é a de pensar ou escrever sobre literatura.

Mas, como habitualmente, interes-sa-nos particularmente explorar a sua obra ficcional. Os seus livros em pro-sa são pequenas novelas que se leem facilmente, mesmo que a sua escrita seja elaborada, escorreita, raramen-te complexa, mesmo quando incorre numa filosofia que serve apenas para debater algum dilema pessoal.

Existem algumas marcas que unem estas obras aparentemente tão díspa-res. Por Todos os Séculos (1999), é um livro particularmente interessante, onde se preconizam esses aspetos que vigoram, regra geral, na ficção deste poeta. O livro é contado na primeira pessoa, como aliás todos os outros aqui abordados, sendo esse “eu”, ali-ás, um professor ou um investigador: alguém que deambula pelo mundo (dos livros) em busca de algum es-clarecimento que, no fim, acaba por afetar a sua própria vida pessoal. O

“eu lírico” parece assim manter essa sua voz na primeira pessoa, como se fosse a sua “persona” quem nos fala diretamente. O próprio autor já ad-mitiu, em entrevista, ter “falta de ima-ginação”, o que o leva a rememorar na escrita aspetos da sua vida pessoal.

O tom da prosa é intimista, invo-cando o leitor para dentro de um abraço caloroso na história que se conta, quase sempre uma memória, como páginas de um diário pessoal, onde se recorda algum momento em particular da sua vida. Por outro lado, a história por muito atual que seja, como acontece em A Implosão (2013), acaba sempre por cruzar dois planos diferentes, o do presente a partir do qual se projeta a voz do eu e o de um passado relembrado ou até mesmo (como a madalena de Proust permite) reencontrado. Exem-plificando, no livro Por Todos os Sécu-los, o autor/narrador, essa figura que parece confundir-se numa só, assiste à enchente nos meios de comunica-ção social das reportagens que explo-ram o escândalo do presidente norte--americano Bill Clinton e do seu caso com Monica Lewinski, enquanto tra-ça curiosas e ironicamente divertidas analogias com o caso de uma jovem que, em tempos idos da Idade Média se deixou enganar por um padre, que se aproveitou sexualmente dela ale-gando que, ao deitarem-se lado a

lado completamente nus, ela poderia mais facilmente atingir a santidade.

Em A Implosão traça-se outro qua-dro bipartido, como forma de abor-dar um tema tão pertinentemente atual como a crise económica que se vivia (ou vive?) nos países europeus do sul, como Portugal e Grécia, en-quanto dois homens ligeiramente conhecidos relembram os tempos da sua juventude, quando se vivia a Revolução de Abril. O livro foi escrito em 2011, aquando da situação vivida na Grécia e da “bomba” em Chipre, sendo essa bomba o dinheiro, na sua forma mais virtual e abstrata, capaz, no entanto, de lançar estilhaços em toda a volta e atingir as mais diver-sas vidas. Esta novela tem assim uma clara dimensão política, onde se pro-cura retratar o quadro geral vivido na Europa, ainda que se refira, especifi-camente, o espaço lisboeta. A ação decorre durante um velório, frente a um caixão, onde nunca se percebe muito bem qual o corpo que lá possa estar, se bem que possa ser identifica-do como a mulher que tão insistente-mente relembram. O livro constrói-se assim em torno de um diálogo entre essas duas personagens, sendo um deles referido como suspeito de ser informador da PIDE. Estes dois ho-mens conheciam-se apenas de vista, dos ambientes de café próprios dos tempos da revolução, onde se teciam

conspirações e se trocavam as novi-dades, quer políticas quer culturais.

Noutras novelas, que aqui desta-camos, de entre a cerca de dezena e meia que Nuno Júdice escreveu, é claramente notória a rememora-ção não só de um passado pessoal (e talvez veridicamente vivencia-do) mas, principalmente, a forma como a imaginação e a memória livresca de uma biblioteca pessoal se podem sobrepor à realidade em-pírica do mundo exterior que nos circunda. Os Passos da Cruz (2009) fala-nos de um investigador ou es-tudante de literatura, que parte pelo país até uma aldeia para os lados de Coruche, que dá pelo nome de La-marosa, onde, em 1670, terá vivido uma mulher, Antónia Margarida de Castelo Branco, que se viu obrigada a casar com Brás Teles, um homem explorador e agressivo que a vio-lentou para o resto da sua vida, en-quanto o marido a procurava matar de dor e sofrimento para mais de-pressa se apoderar da sua fortuna. Ora a vida de quem viveu há mais de trezentos anos é, afinal, assunto para «ratos de biblioteca» como re-conhece o próprio narrador que se pode identificar como um jovem no final da adolescência. Mas é no cami-nho para essa terra que esse mesmo jovem aparentemente se perde e é guiado por um homem que mais

parece a reencarnação desse fidal-go marialva em tempos modernos e que conduz o jovem até sua casa, onde o apresenta à sua mulher, An-tónia Margarida. Cria-se assim uma história aparentemente surreal ou fantástica, em que o jovem não sabe se está a ser manipulado, se se abriu uma brecha no tempo ou se a Histó-ria tem mesmo, tão simplesmente, tendência a repetir-se.

O Complexo de Sagitário (2011) inicia com um episódio quase gro-tesco de uma matança do porco, testemunhada por um jovem leitor, envergonhadamente agarrado a um livro forrado com papel grosso, para disfarçar a sua leitura da polémica obra, noutros tempos proibida, A Filosofia na Alcova, do Marquês de Sade. Este jovem vai viver obcecado com a visão de uma mulher com as mãos sujas de sangue, por ajudar na matança, numa cena que tem algo de ritual iniciático feminino, na aura de mistério em que fica envolta ou no modo como é filtrada aos olhos e à rememoração subjetiva do nar-rador. O tema do amor e o erotismo, bem como as alusões à cultura clás-sica, como os homens transforma-dos em porcos por Circe, devido à sua estupidez amorosa, ou ao tecer incessante de Penélope (analogia da escrita?) são igualmente recorrentes e distinguem um autor que tem tan-to de culto como de atual.

Paulo SerraInvestigador da UAlgassociado ao CLEPUL

Letras e Leituras

D.R.

O escritor Nuno Júdice

D.R.

O escritor Nuno Júdice

07.03.2014  7Cultura.Sul

Momento

Inverno chuvoso

Foto de Vítor Correia

Assim nasceu uma fotógrafa profissional

Nasceu na Alemanha em 1983 e veio bastante jovem para Portugal, mantendo no entanto o contacto com o seu país de origem.

Desde muito jovem se manifestou uma enorme paixão pela fotografia e ainda hoje guarda com carinho as primeiras fotografias que tirou à fa-mília com sete anos de idade. Tudo não passou de um pedido do pai que meio a brincar, meio a sério, lhe pe-diu que fotografasse a família. Quem diria que esse momento iria ser tão marcante para a sua vida futura.

Todo o seu percurso académico incidiu propositadamente na área das artes para complementar a sua área de eleição.

Licenciou-se em Fotografia pelo Instituto Politécnico de Tomar e du-rante este percurso, teve oportuni-dade de participar em várias expo-sições colectivas em Lisboa, Setúbal, Porto e Tomar.

Assim que finalizou os seus es-tudos, estagiou e trabalhou como assistente em Produções Fotográfi-cas tanto na Alemanha (Ruprecht Stempell) como em Portugal (1.4).

O seu gosto pela fotografia pas-sa também pela partilha de conhe-cimentos, o que a levou a tirar  o Certificado de Competências Pe-dagógicas (CCP), reconhecido pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP).

Actualmente trabalha na Euro-pean ProjectStudios que criou com Ricardo Gonçalves, em 2013. A EPS é uma empresa parceira da ALFA que presta serviços em diversas áreas da fotografia como: Casamento, Ni-ghtlife, Still Life e desenvolve tam-bém formações nas mais distintas vertentes fotográficas.

Espaço ALFA

D.R.

Sandra NascimentoFotógrafa e Formadora da ALFA - Associação Livre Fotógrafos do Algarve

07.03.2014 8 Cultura.Sul

A vida numa chávena de café

A Nordeste sempre há algo de novo… uma viagem ao património alcoutenejo

A seleção do tema foi, sem dúvida, um desafio que se ins-taurou face ao convite para a colaboração com esta crónica. O leque planteava-se diverso e vasto ante a possível abor-dagem de assunto relativo à atividade profissional, desen-volvida ao longo de quase duas décadas, na autarquia de Alcoutim. E também não era de excluir a possibilidade de dissertação pelos meandros quer da história local, quer da museologia, que desde cedo prenderam a minha atenção por estas paragens.

Após alguma reflexão achei por bem convidar o leitor a uma viagem que, no imedia-to, será apenas uma expedição mental mas cujo percurso pre-tende provocar a vontade de uma visita aqui, ao canto mais nordeste do Algarve, onde po-derá descobrir, como sempre há algo de novo, no multiface-tado património alcoutenejo.

Decidi começar o meu ro-teiro pela vila que, longe de ser um ponto central no vasto território que hoje constitui o

concelho de Alcoutim (o quar-to maior da região, com os seus cerca de 577 km2), é sem dúvida aquele que permite ao visitante um maior acesso a serviços e informações, para além de lhe facultar a opção de chegar por via fluvial. Uma hipótese a ter em conta, pois o grande rio do sul, com es-cassa humanização das suas margens, permite-nos des-frutar dessa sensação ímpar de recuar no tempo, quando o Guadiana passa a Uádi Ana (Odiana - denominação du-rante o período islâmico) e se converte em simples Anas (no período romano).

Erguida na margem direita do Guadiana, a vila de Alcou-tim localiza-se a cerca de 33 Km da foz e a meio percurso do limite navegável, marcado pela vila de Mértola (68 Km da foz), o que lhe conferiu desde cedo, uma condição estratégi-ca nesta autoestrada do pas-sado. No despontar do século XIV, esse dado não terá sido alheio à vontade de D. Dinis aqui mandar adquirir terrenos “pera a pobra d’Alcoutym”, ou seja, para a criação da povoa-ção num território que tinha sido integrado no reino pelas mãos da ordem de Santiago, cerca de seis décadas antes.

Posicionemo-nos na praça central, hoje denominada “da República” e apertada entre edifícios. Junto ao rio, cos-tas voltadas para o curso de

água, temos à nossa direita a igreja matriz em cujo portal se poderá observar a divisa «alleo», invocadora dos seus patrocinadores, os condes de Alcoutim que, no século XVI, transformaram o pequeno templo quatrocentista na sua volumetria atual, isto se ex-cluirmos os acrescentos mais recentes na parte traseira do

edifício. Ao franquearmos a porta o seu interior revelará um conjunto de colunas com os seus capitéis e bases que, tal como o portal, revelam a mestria do pedreiro tavirense André Pilarte, tornando este monumento religioso dedi-cado ao Salvador, um bom exemplar do primeiro renas-cimento algarvio.

Para conhecer melhor a arte sacra concelhia temos mesmo à nossa frente a opção de vi-sitar a capela de Santo Antó-nio, o edifício religioso mais recente da vila, que ocupa na zona ribeirinha a parte central da praça. Edificado no século XVII, o seu interior alberga hoje um dos núcleos museo-lógicos da rede polinucleada

de Alcoutim.Rodando agora para o lado

esquerdo é impossível deixar-mos escapar um edifício de es-tilo apalaçado, com escadaria dupla e que é conhecido pela “casa dos condes”. Este espaço público municipal, ao serviço da cultura, há já algumas dé-cadas que perdeu a sua fun-ção residencial de gente ilus-

Espaço ao Património

Sala de leitura

FOTOS: ALEXANDRA GRADIM

Alexandra GradimArqueóloga do Município de Alcoutim

Os menires do Lavajo, Alcoutim

Paulo PiresProgramador culturalno Município de [email protected]

“Dos lugares que os ho-mens criaram para se abrigar, o café é o que mais rua tem” – escreveu o cronista José Ma-nuel dos Santos a propósito de Cesariny e da sua vivência em cafés onde se incendiava a si próprio e ao mundo, e onde o poeta surrealista se sentia verdadeiramente em casa por achar que não havia

melhor sítio para estar. Gosto da ideia de um café

onde não se ensina nada, mas onde se aprendem a so-ciabilidade e o (des)encan-to (Claudio Magris), onde se viaja sentado e podemos “livrar-nos do eu como de uma casca” (idem), “lendo” o colectivo pela construção dos puzzles das experiências soli-tárias. Um lugar que concilia, como poucos, uma fidelidade conservadora feita de rituais quotidianos e o pluralismo libertador do convívio-par-tilha, indissociáveis do bur-burinho de vozes, talheres e louças, passos, tosses, brindes

e risos em fundo.Falo de cafés de verdade,

isto é, formadores por se-rem autênticas lições de to-lerância (pois aí cabem não apenas os iguais), onde não se pode fazer comícios mas onde já se sabe como o “es-pectáculo” termina. Penso em espaços onde se renova e reinventa a vida, onde lava-mos “as nossas mãos de de-sencontro e poeira” (Sophia de Mello Breyner Andresen) em rios que vão correndo nos intervalos de um gole, cigar-ro, palavra, silêncio, olhar…

Em arquipélagos de me-sas, na multidão dos cafés,

há quem procure “um sor-riso, alguém que das mesas lhe acene e o convide a sen-tar” (como diz um poema de João Luís Barreto Guimarães), pois alguns “apenas” preten-dem “um espaço menos fe-rido para pousar as feridas à procura de si próprio[s]” (idem). Cafés que são espon-jas da história dos outros e também contribuintes para narrativas alheias, que teste-munham quem entra e quem sai, que ficam com o rasto da gente que passa, como a “fa-miliar chávena esquinada” ainda com marcas dos lábios que a tinham beijado com

afago pela manhã, de que Barreto Guimarães também fala num dos seus belíssimos textos (obra Lugares Comuns [1994-1995]). O pensador George Steiner proporia mes-mo, num volume de ensaios editado em 2004, que se de-senhasse o mapa dos cafés para se captar a verdadeira identidade cultural europeia, feita de uma apaixonante ge-ografia nómada que se pode percorrer a pé.

Tudo isto para falar de tertúlias. A influência dessa moda europeia, sobretudo fervilhante nas ruas de Paris, chegaria a terras lusitanas

ganhando crescente impac-to a partir de finais do séc. XIX em locais feitos de elites, conspiração, arte, política e cultura, como A Brasileira, Martinho da Arcada, Nicola, Café Gelo, Herminius ou o Royal, entre outros.

António José Forte, mem-bro do mítico Grupo do Café Gelo (em Lisboa), fala de um “grupo iconoclasta e libertá-rio onde se falava de tudo, até de literatura e artes, e de rosas também”, “que inven-tava os seus infernos e para-ísos, que usava a liberdade de expressão ora voando, morrendo, desaparecendo,

07.03.2014  9Cultura.Sul

A vida numa chávena de café

A Nordeste sempre há algo de novo… uma viagem ao património alcoutenejo

Espaço ao Património

escrevendo às vezes”. O res-peito pela diferença e o estí-mulo à criatividade eram re-cordados por Sarah Affonso, esposa de Almada Negreiros, lembrando que o marido, quando chegava à Brasileira para tomar o pequeno-al-moço, ia aos saltos por cima das mesas até ao balcão do fundo para encomendar o que queria, não sem primei-ro dar um pontapé rasteiro na balança (com uns pratos grandes para pesar os sacos de café) que havia à entrada do estabelecimento.

Depois de uma diluição gradual da tradição das ter-

túlias nas últimas décadas, várias instituições, grupos informais, associações cultu-rais, cafés/bares/restaurantes e galerias de arte têm vindo, um pouco por todo o país e com impacto crescente, a recuperar a ideia nos últi-mos anos, quer em forma-tos mais espontâneos e im-provisados, quer em registos mais performativo-artísticos e encenados, incidindo ape-nas em conteúdos literários ou sendo mais abrangentes, tudo isto conforme o públi-co-alvo, o contexto e os ob-jectivos de cada promotor.

No Algarve há boas prá-

ticas de tertúlias em vários concelhos, dinamizadas por portugueses e pela comuni-dade estrangeira. Em Silves, por exemplo, quinzenal-mente às segundas-feiras, reúne-se a Tertúlia mais Pe-quena do Mundo, rodando por espaços intimistas e não convencionais da cida-de (quiosques, cafés, sacris-tias de igrejas, barbearias, farmácias, domicílios) em sessões livres que conjugam leituras literárias com con-versas sobre temas diversos, difundidas em: http://ami-nhafreguesiaalermais.blo-gspot.ptA Tertúlia mais Pequena do Mundo (SIlves)

tre, como os nobres Menezes, marqueses de Vila Real e con-des de Alcoutim, permitindo--nos hoje que no seu interior possamos ler um livro ou um jornal, ver uma exposição ou consultar a internet e, se de-cidirmos pernoitar por estas paragens, podermos mesmo participar numa das tertúlias, que em noite de sexta-feira, uma vez por mês, por aqui se efetuam.

Predispomo-nos agora a vencer a orografia serrana e franquear o castelo de ori-gem medieval, que constitui um dos vértices do triângulo fundacional da urbe dionisina, composto por castelo, igreja matriz e igreja Nossa Senhora da Conceição, esta no extremo sudoeste da vila.

Se optarmos por seguir junto ao rio, em artéria pro-movida a avenida e paralelos à “casa dos condes”, ao fun-do deparamo-nos com a re-partição de finanças, que foi noutros tempos alfândega e mais recentemente posto da guarda-fiscal.

Será sempre uma lacuna se, face à hesitação de adquirir uma entrada no castelo, virar-mos as costas à oportunidade. A fortificação foi erigida com o propósito claro da defesa fronteiriça e sofreu diversas remodelações e reconstruções à medida que o tempo ou os confrontos bélicos assim o exigiam. Se deixarmos correr

os olhos pelos panos de mura-lha e dedicarmos tempo ao seu interior, seremos testemunhas desse passado. A memória temporal alarga-se assim que penetrarmos no museu de ar-queologia, localizado à direita da entrada. Aqui já não serão só os séculos a revelar-nos es-paços e atores, vitórias e der-rotas, mas sim todo um per-

curso milenar resgatado sob camadas de poeira, por mãos pacientes e persistentes no co-nhecimento das comunidades que ocuparam este território há mais de cinco mil anos.

Um conjunto de objetos e estruturas desvendam-nos a vida e a morte numa viagem que se inicia no neolítico, em finais do IV milénio a. C., e se

estende até ao século XIX. O espaço museológico lan-

ça-nos igualmente o repto para sairmos da vila e deam-bularmos pelo concelho à des-coberta do património arque-ológico. Se elegermos o norte como direção, então teremos a possibilidade de observar os únicos menires do sotavento algarvio, organizados origi-

nalmente num alinhamento de três monólitos de grauva-que. No terreno só iremos en-contrar dois (o terceiro, muito danificado, vimo-lo no museu de arqueologia), um dos quais o maior menir de grauvaque existente em Portugal é pro-fusamente decorado com ins-culturas geométricas de cunho simbólico.

Para sul, percorrendo a bela marginal fluvial encon-traremos, a cerca de 9 km, a Villa Romana das Laranjeiras. As ruínas que foram lavadas pela grande cheia de 1876, despertaram a curiosidade da imprensa da época. Tal facto teve como feliz consequência a vinda desse incomparável arqueólogo algarvio, Está-cio da Veiga, que liderou em 1877 a primeira investigação arqueológica realizada neste território. Mas o sítio oferece muito mais ao visitante do que a simples exploração agrícola romana, comum nestas férteis várzeas do Guadiana. Por aqui persistiram as almas depois da ocupação romana, tendo edifi-cado um templo no século VI, já sob influência visigótica e, mais tarde, após a invasão is-lâmica construíram também habitações que ocuparam até à reconquista cristã.

Será talvez ocasião de fazer uma pausa, deixar descansar os olhos, sentarmo-nos e dei-xarmos despertar distintos sentidos, entre eles olfato e paladar. É que outro patri-mónio a ter em conta e a des-cobrir, ou redescobrir, é sem dúvida o gastronómico.

Para além de tudo isto há sempre, claro está, a vanta-gem de se deixar deleitar pela serra do caldeirão, esse imenso património natural, de cujas novidades se encarrega a na-tureza ciclicamente.

Vista parcial do Museu de Arqueologia, Castelo de Alcoutim

D.R.

07.03.2014 10 Cultura.Sul

“RAÍZES”Até 28 MAR | Paços do Concelho de AlbufeiraExposição de pintura de Zorba (Luís Romão), residente em Albufeira desde os dois anos. Autodidacta, utiliza pouco os pincéis, uma vez que o que lhe interessa so-bretudo são as texturas e movimentos que os materiais possam criar quando utilizados de forma ‘grosseira’Ag

endar

“VOZES DE MULHERES”7 MAR | 21.30 | Centro Cultural de LagosEspectáculo com Yiliana Labrada. Após integrar vá-rias iniciativas, a artista cubana tem o seu próprio projecto musical que se baseia em temas tradicionais da trova cubana, boleros, sones e temas originais

Março

Pedro [email protected]

O(s) Sentido(s) da Vida a 37º N

~ Estofo de Maré ~

folhas molhadas, frias páginas soltas de um livro de poesia, passam na superfície da correntequalquer que tenha sido a razão deste arremes-so pelo autor da fragmentaçãoficarão nas margens húmidas da vazante e/ou seguirão para a barra

a mão na água agarra uma pasta de papel de onde caracteres esmaecidos deixam ainda ler

«por mais que te digaamo-te, a voz esvai-se,ou o escreva por todo o ladonem mesmo a palavra escrita é eternao que não se poderá dizer do meu amor por tique resistirá à minha morteà tua morte»

Mercadinho de Primavera

Um segredo muito bem guardado entre as muralhas de Cacela Velha , a que «foi desejada só pela beleza», escreveu Sophia M.B.A., aconte-ce ali trimestralmente, desta vez a abrir a esta-

ção de 23 de Março (10h30-17h00). Artigos de segunda-mão, artesanato tradicional e urbano, trocas e baldrocas, novas criações e ainda pro-dutos alimentares da região… tudo organizado pela ADRIP / CIIPC.

Postais da Costa Sul ~ não será o enevoado litoral que escurecerá

o dia. nem a falta de luz levará aesperança. e a ausência de vento não impe-

dirá o prosseguir. o tempo que fazagora não condicionará o que se quer deste

momento do hoje. quandochegares já terei partido. tenho de me ausen-

tar por umas horas. continua sobreo etager o teu livro preferido de Casimiro de

Brito. no frigorífico tens o doce deabóbora acabadinho de fazer, que tanto apre-

cias com queijo fresco. no portátilpodes ouvir o último álbum da Viviane. quan-

do te reencontrar na madrugadabeijarei o teu bom dia com vista para o mar ~

‘Espuma Evanescente’

O mais recente livro do autor Vítor Gil Cardei-ra (Conceição de Tavira, 1958) teve o seu lança-mento no Clube de Tavira, no mês passado. Na sessão organizada pela editora CanalSonora, e segundo frisou Miguel Godinho, que apresen-tou a obra, esteve presente um largo número de pessoas conhecedoras e interessadas que aco-lheram com entusiasmo a música da guitarra de Orlando Almeida, bem como as leituras de textos da obra, por Andreia Carlota, José Mário Carolino, Mário Rosário e Paulo Ferreira. Do li-vro, pág. 19, ouviu-se: «Primeiro ato neste início

de ano diluviano. O caminho faz-se caminhan-do e em janeiro os pés far-se-ão desenhar nas lamas fecundas do restolho agonizante. A vida irrompe onde a morte alimentou os campos de ausência e asperidade. Os dias de março virão e batizaremos a terra de luz e cor. Siga a ação que comando eu. A continuidade é uma mal dita palavra nas noites que introduzem a pe-renidade das coisas. Das coisas que precedem o silêncio.»

Armação do Artista O inspirado nome que esta associação – a es-

palhar emoções desde 2006 -foi buscar às es-truturas de pesca do atum do século passado, trouxe-lhes, ironicamente, um presente tam-bém ele assolado pelo desinteresse da tutela, pela iminente possibilidade de extinção da sua veia artística.

Quando há pouco por onde buscar felicidade, salvamo-nos da cultura. Quando conseguirem de vez acabar com a cultura, nada mais haverá. As (não) escolhas de hoje poderão bem ser o vazio de amanhã.

Poesia(dia mundial: 21 de Março)

A poesia basta-se ao se expor nos pequenos grandes gestos do quotidiano.

Não tem de ser uma conjugação que se con-sidere feliz de palavras alinhadas. Pode até mesmo encontrar-se num banco com ou sem jardim, aí onde reside sempre um pouco mais de esperança para a poesia, isto é para a vida.

Sentar, esticar as pernas, respirar fundo e es-perar que um livro nos caia nas mãos e se abra num sonho de letras em palavras.

Depois de arrefecer a tarde, fecha-se o livro e vivemos melhor.

Roberto Nobre

Artista plástico, ilustrador, caricaturista, reali-zador, ensaísta e crítico de cinema, publicitário, é sobretudo conhecido pelas ilustrações que fez para a capa de ‘A Selva’ (e outros livros) de Fer-reira de Castro, bem como as capas da grande magazine mensal- ‘Civilização’. Roberto Nobre nasceu em S.Brás de Alportel (27.03.1903 - Lis-boa-27.09.69) mas a adolescência, esse campo/estádio neutro onde se joga o despertar dos sen-tidos, passou-a em Olhão, onde o pai era mé-dico e presidente da câmara. Por isso a vila da restauração é recorrente na sua obra pictórica.

Viver o que se faz aquiViver neste tempo de globalidade faz com que

tenhamos acesso a tudo o que se passa em cada pedacinho do mundo. O conhecimento da diver-sidade traz o fascínio do longínquo. Por isso, temos de ser activos e temos de defender e divulgar o que aqui também se faz. Se nos limitarmos a consumir o que vem de fora, estamos a perder uma identidade formada desde tempos remotos e que chegou aos nossos dias absorvendo cultura das mais diversas civilizações que por aqui passaram. E mais impor-tante: - daquilo que se está a passar hoje, aqui e ago-ra. Se não vivermos e consumirmos a nossa arte, cultura, e modos de vida, estamos a deixar escapar a nossa idade. Privamo-nos, e aos outros, desta li-berdade autoral característica deste novo sul. Todos nós devíamos apoiar e divulgar a cena cultural local. Vamos também viver o que se faz aqui.

FOTOS: D.R.

07.03.2014  11Cultura.Sul

Fernando Pessanha: os livros não se medem aos palmos

Da minha biblioteca

Adriana NogueiraClassicistaProfessora da Univ. do [email protected]

Adriana Nogueira

“X FESTIVAL DE FLAMENCO DE FARO”14 e 15 MAR | 21.30 | Teatro das Figuras - FaroO primeiro espectáculo é Hombres Flamencos, que une dois grandes bailaores flamencos: Francisco Mesa “El Nano” e Jesus Herrera. No sábado apresenta-se Solera Flamenka, um cuadro flamenco que tem como protagonistas Víctor Bravo e Yasaray RodriguezAg

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“DELL’AQUA TRIO”15 MAR | 21.00 | Pequeno Auditório do TEMPO- Teatro Municipal de PortimãoA Associação Ideias do Levante apresenta um recital (voz, piano e flauta), num tributo à natureza e em que serão interpretadas obras de J. Benedict, C. Saint--Saëns, G. Fauré, B. Godard, L. Délibes, e C. Débussy

Fernando Pessanha (Faro, 1980), um jovem investiga-dor e formador na área da História, publicou os seus dois primeiros livros de ficção em 2013, ambos pela 4águas editora.

Já no primeiro livro, Encon-tros improváveis, as seis ilus-trações que iniciavam cada história, da autoria de Artur Filipe, captavam os ambien-tes «improváveis» do texto, com o traço do conto «O Aci-dente» a anteceder o preto e branco, ou melhor, o preto com algum branco, do Hotel Anaidaug. Neste, talvez por ser mais pequeno (22 páginas de tamanho A6), o trabalho des-te ilustrador ganhe um maior destaque.

«O mundo às avessas»

A primeira impressão quan-do pegamos na obra: a estra-nheza do título e o tom noir da capa, que se sucede no texto.

Percebendo que está perante o nome «Guadiana» invertido, pode o leitor mais atento pen-sar no topos literário do «mun-do às avessas»: quer pelo nome do hotel que está, literalmente, ao contrário, quer também por este topos ser ainda caracteri-zado pela vivência de «impos-sibilidades», aplicando-se essa circunstância, cabalmente, a este livro.

A narrativa segue por um caminho de contrastes: entre a tempestade e a calmaria, a escu-ridão e a luz, o silêncio e o som. E assim somos transportados de um temporal terrível para uma tranquila navegação, de uma rua sem iluminação para

uma inesperada luminosidade, de um silêncio quase palpável para uma música alegre, de um ambiente festivo e de esplendor para a decrepitude da realidade.

Livro ou filme?

Todo livro é construído com base no suspense, toca as fímbrias do género «horror» e todo ele apela a ambientes visuais do estilo a que poderí-amos chamar noir.

Poderiam os leitores agora perguntar: está a falar de um li-vro ou de um filme? É um livro, mas muito cinematográfico.

No início, onde é descrita a luta de um marinheiro para conseguir entrar numa barra, temos uma visão muito débil: o horizonte é descrito como «ostentando um singular tur-vo cinza-esverdeado, coroado de indefinida visibilidade» e as formas que se percebiam eram, afinal, «as embaciadas mar-gens», como se uma lente nos separasse dos acontecimentos.

A noite e o negro que a caracteriza sobrepõem-se a tudo: «Um relâmpago rasgou os céus, iluminando por bre-ves instantes o negrume que, sorrateiramente, se começava a instalar».

Depois, já em terra, o silên-cio acompanha a noite («Os seus passos (…) ecoavam na imensidão daquela avenida deserta, encoberta pela leve neblina da maresia outonal»), sendo interrompido apenas pelo «som da ondulação e as assobiantes rajadas de vento».

Já com os sentidos aguçados, ouve-se um sino que toca, de súbito, à meia-noite. E, como na história da Gata Borralheira (mas, mais uma vez, ao contrá-rio), «várias luzes se acenderam repentinamente, ao dar o vigé-simo quarto passo, ao bater da décima segunda badalada».

E os contrastes sucedem-se: «a porta pesada do edifício ran-geu ligeira e lugubremente» e «[o)uvia-se uma suave música, que parecia vir do andar de

cima (…), estilo Fox Trot». A partir daqui, o marinhei-

ro deixa-se embalar pela ale-gria da festa que está a acon-tecer no bar do hotel, onde se ri, dança, bebe e conversa. E o «marujo, de copo na mão, experimentava uma saboro-sa sensação de relaxamento, afundando-se cada vez mais na sua poltrona».

Mas este ambiente prazen-teiro ensina-nos que não nos podemos fiar sempre nos nos-sos cinco sentidos.

Ou seis sentidos?

Como um livro pequenino pode transportar-nos para tan-tos lados. Poder-se-ia dele dizer, adaptando a voz popular, que os livros não se medem aos pal-mos: a riqueza de interpretações que podemos dar ao que lemos é tão variada quantos os leitores.

Provavelmente, a explora-ção literária dos cinco sentidos (principalmente visão e audi-ção, mas também com referên-

cias ao tato, paladar e olfato) foi um dos fatores que tornou a história mais vívida, chamando, inclu-sive, a atenção para o que pode acontecer quando ignoramos o nosso «sexto sentido» que o narrador ajuda a aguçar. Em vários momentos, descobrimos pistas que nos vão preparando: «O vento norte soprava cada vez mais impertinente e obstinado, como que desesperado por pro-teger o porto do pequeno velei-ro intruso e forasteiro, oriundo de um mundo alheio àquela re-alidade…» (p.6); «tudo naquele hotel parecia encantado, enfei-tiçado, como que curiosamente parado no tempo» (p.15); mas a própria personagem principal também é avisada: «– O senhor não pertence aqui.../ – Que quer dizer com isso?/ – Exatamente o que ouviu. Aconselho-o a não dormir neste hotel».

Mas ele só entende demasia-do tarde.

A Históriae uma notinha

Considero sempre enrique-cedores os livros que me levam a aprender outras coisas. Por exemplo, despertou-me a aten-ção que nada (não sabemos de

que terra se trata) nem nin-guém tivessem nome: a perso-nagem principal é chamada de tripulante, marinheiro ou ma-rujo; depois há «o recepcionis-ta» «a mulher de cigarrilha», o «barman», etc. Surpreende, pois, que o gerente do hotel se apre-sente tão completamente, com nome («Conrrado Wissmam») e local de nascimento («Nieder Ri-msuigen, na Alemanha»), expli-cando a história do hotel e apre-sentando o seu proprietário, «o Sr. Manuel Ramirez». Com um pouco de investigação cheguei à informação da existência, real, de um hotel chamado Guadia-na, em Vila Real de Santo Antó-nio, num deplorável estado de abandono. Depois de ler o livro, vim a saber que uma das moti-vações do autor foi, precisamen-te, a vontade de denunciar essa situação, sendo esta ficção uma forma de manifesto contra o es-tado em que se encontra aquele edifício.

Faço aqui uma notinha: estas informações são muito interes-santes, pois confirmam a arte como forma assumida de inter-venção social, mas é importan-te que não as deixemos limitar as leituras, pois a grandeza de uma obra literária é conseguir ser lida, apreendida, explorada sem que o desconhecimento so-bre a realidade em que se ins-pirou seja condição para essa fruição e apreciação. Que não se entenda, das minhas pala-vras, que devamos menosprezar esse conhecimento, mas apenas que não nos deixemos esparti-lhar com «o autor quis dizer» ou por interpretações únicas. Uma das grandes qualidades desta obra é o de não ter uma loca-lização definida, por exemplo, e de, por isso mesmo, deixar a nossa imaginação voar livre-mente. Fim da notinha.

Como terminar esta página? Pedindo a Fernando Pessanha, que tão destramente explora o suspense e nos deixa presos do princípio ao fim, que não nos faça esperar muito tempo por outro livro.

Fernando Pessanha autografando a sua última obra

D.R.

cias ao tato, paladar e olfato) foi um dos

D.R.

07.03.2014 12 Cultura.Sul

A par de dispositivos de transporte, acolhimento e se-gurança, as práticas de turis-mo requerem na atualidade que a estada dos turistas se organize em função de mo-delos variados e específicos de fruição. Isto ocorre, em parti-cular, no campo do turismo cultural. Novas formas e no-vos consumos turísticos estão a emergir, focalizados na ideia de uma experiência coprodu-zida pelo próprio turista.

Com a globalização, a pro-cura turística tem sofrido mudanças significativas que requerem que destinos e ter-ritórios se questionem seria-mente sobre os seus modelos de oferta. Impulsionado pelo desenvolvimento da Internet, o turista encontra-se cada vez mais capacitado para procu-rar e optar por viagens indi-viduais, o que força o merca-do turístico a adaptar-se e a inovar, o mesmo ocorrendo com os diferentes agentes da Administração Central e Lo-cal que interagem com a ati-vidade turística. Os serviços turísticos, em variadas áreas, têm evoluído para uma co-produção na qual o turista é como que um expert ativo.

Se a fruição de um lugar se mantém fortemente ligada ao imaginário da descober-ta do espaço e do outro, no sentido de que se mantém a procura e a perceção da rea-lidade de um qualquer lugar, simbolicamente, distanciado do quotidiano, é também

um facto que, na atualidade, se concretiza por processos cada vez mais personalizados, para satisfação de objetivos pessoais, bem definidos pelo turista-expert mesmo quando ainda está no seu ponto de origem. É essa a nova realida-de para a qual a estratégia de promoção turística da Cultura se deve orientar.

Considerando que o Patri-mónio é a manifestação visí-vel da memória do territó-rio, portanto da identidade, e partindo da realidade do Algarve e do seu enquadra-

mento no mundo global, é necessário atualizar concei-tos e conteúdos e escrutinar a fruição do património e o modo como ele contribui para tornar o território atra-tivo a turistas e a moradores.

À Direção Regional de Cultura do Algarve e aos de-mais agentes que interagem no território cabe, no âmbi-to da moderna fruição, que se afasta cada vez mais do turismo de massas, consi-derar o Património Cultural algarvio na diversidade dos seus componentes, nomea-damente: Património edifi-cado, monumental e arqueo-lógico; Património imaterial e etnográfico, musealizado ou vivido; Património paisa-gístico, natural e urbano. A região carece de plataformas e bases de dados que inven-tariem, atualizem e tornem pública a diversidade regio-nal, situação patente em al-guns inquéritos que são pre-sentes à Direção Regional de Cultura, oriundos dos mais diferentes setores da ativida-de turística. Por isso, impõe--se uma reflexão, reunindo especialistas, académicos e agentes de marketing de turismo, agentes turísticos e outros interessados, para traçarem um perfil atualiza-do dos resultados, nas suas áreas de investigação, sobre as particularidades e especi-ficidades do Algarve.

Direção Regionalde Cultura do Algarve

Promoção de experiências em turismo cultural: que respostas à globalização?

D.R.

Com a globalização, a procura turística teve mudanças sig-nificativas que re-querem que destinos e territórios se ques-tionem seriamente sobre os seus mode-los de oferta. Parece fundamental discu-tir as ações que pos-sam promover a di-mensão patrimonial dos territórios, cuja descoberta se apoie em ferramentas su-ficientemente atra-tivas e facilitadoras de experiências que promovam, a apren-dizagem e a efetiva-ção da partilha por quem nos visite

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Os desafios impostos à Cultura implicam, cada vez mais, apostar nas sinergias