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FACULDADE DE DIREITO DE CAMPOS PROGRAMA DE MESTRADO EM DIREITO CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS COMBUSTÍVEIS MARCUS FRAGA RODRIGUES CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ 2005

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FACULDADE DE DIREITO DE CAMPOS PROGRAMA DE MESTRADO EM DIREITO

CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO

DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS

COMBUSTÍVEIS

MARCUS FRAGA RODRIGUES

CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ 2005

MARCUS FRAGA RODRIGUES

CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO

DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS

COMBUSTÍVEIS

Dissertação apresentada no Programa de Pós-Graduação stricto sensu em curso de Mestrado em Direito da Faculdade de Direito de Campos, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Direito, sob a orientação do Prof.º Dr. Aurélio Pitanga Seixas Filho.

CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ 2005

Rodrigues, Marcus Fraga.

Contribuição de intervenção no domínio econômico: CIDE dos combustíveis./ Marcus Fraga Rodrigues. – 2005.

117 f.

Orientador: Aurélio Pitanga Seixas Filho.

Dissertação (mestrado) – Faculdade de Direito de Campos.

1. Contribuição de intervenção no domínio econômico. I. Título.

9

MARCUS FRAGA RODRIGUES

CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS COMBUSTÍVEIS

Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito

da Faculdade de Direito de Campos, como requisito parcial para a obtenção do

Grau de Mestre em Direito na área de concentração em Relações Privadas e

Constituição.

Campos dos Goytacazes - RJ, em 15 de fevereiro de 2006.

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof.º Dr.º Aurélio Pitanga Seixas Filho

Faculdade de Direito de Campos

Orientador. (Presidente)

Prof.º Dr.º Auner Pereira Carneiro

Faculdade de Direito de Campos

Prof.º Dr.º Adilson Rodrigues Pires

10

Dedico este trabalho ao meu grande mentor Dr. Aurélio Pitanga Seixas Filho, que com seu profundo conhecimento jurídico, me orientou nos momentos difíceis de dúvidas e angústias, e contribuiu fundamentalmente para o resultado alcançado.

11

Agradeço ao pai celeste pela vida e saúde concedida e à minha família, pela compreensão e apoio nos momentos de ausência.

Agradeço especialmente, a todos os Professores do curso de Mestrado que com paciência nos conduziram ao aprimoramento intelectual jurídico.

12

RESUMO

O tema Contribuições sempre foi assunto por demasiado controverso na doutrina

e jurisprudência.

Com a promulgação da Constituição de 1988, algumas cobranças feitas pelo

Poder Público foram incorporadas ao ordenamento jurídico pelo princípio da

recepção, e outras, criadas já sob o manto da outrora nova Carta Magna.

O foco deste estudo está nas contribuições interventivas, que se busca analisar

sucintamente em seu conjunto, dando relevo à Contribuição Interventiva sobre os

Combustíveis.

Assim, atenção especial está sendo devida à Contribuição de Intervenção no

Domínio Econômico incidente sobre os Combustíveis e sua evolução normativa,

inovações legislativas, intervenção específica, etc. Será abordada sua previsão

constitucional e o advento posterior das Emendas Constitucionais n.s 33, 42 e 44,

bem como, a Lei n. 10.336/01 que criou o referido tributo, e as leis e medida

provisória que lhe alteraram a redação.

Em seguida, será examinado o tributo como ele se apresenta e interage dentro do

sistema tributário constitucional, mormente com o texto do artigo 149 da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e os princípios

constitucionais tributários.

Será estabelecida sua natureza jurídica, bem como, os critérios da regra-matriz de

incidência instituídos pela Lei n. 10.336, de 19.12.2001.

Ao final, tecer-se-á uma análise conclusiva dos elementos aqui tratados, de forma

a firmar a inconstitucionalidade do tributo em questão.

Palavras-chave: Contribuições – contribuição interventiva – intervenção – emenda constitucional – inconstitucionalidade.

13

ABSTRACT

The subject Contributions always was too much controversial subject for amongst

the doctrine and jurisprudence.

With the promulgation of the Constitution of 1988, some collections made for the

Public Power had been incorporated the legal system for the princípio da

recepção, and others, created already under the mantle of long ago the new Carta

Magna.

The focus of this study is in the interventivas contributions, which if search it in its

set analyzes, giving relief to the Contribuição Interventiva on Fuels.

Thus, special attention is being had to the CIDE of Fuels and its normative

evolution, legislative innovations, specific intervention, etc. Its constitutional

forecast will be boarded and the posterior advent of the Emendations

Constitutional n.s 33, 42 and 44, as well as, Law n. 10,336/01 that it created cited

the tribute, and the laws and provisional remedy that had modified it the writing.

After that, it will be examined this tribute as it inside presents and interacts of the

system constitutional tributary, mainly with the text of the article 149 of the CF88

and principles constitutional tributaries.

Its legal nature will be established, as well as, the criteria of the incidence regra-

matriz instituted by Law n. 10,336, of 19.12.2001.

To the end, a conclusive analysis of the elements treated here will be established

of form to firm the unconstitutionality of the tribute in question.

Keywords: Contributions – contribuição interventiva - intervention - constitutional emendation - unconstitutionality.

14

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ________________________________________________________09

1ª PARTE - Evolução normativa

1 Considerações gerais _______________________________________________16

2 Contribuições de intervenção no domínio econômico_______________________23

3 Contribuição de intervenção no domínio econômico: CIDE dos combustíveis____32

2ª PARTE - Constituição e delineamento da CIDE dos Combustíveis

4 Classificação tributária_______________________________________________50

5 Natureza jurídica ___________________________________________________64

6 Princípios constitucionais tributários ____________________________________69

7. Regra-matriz de incidência ___________________________________________76

3ª PARTE - Análise crítica da exação

8. Inovação impositiva no sistema tributário e competência residual _____________83

9. Criação da CIDE dos combustíveis por lei ordinária________________________88

10. Aplicação da receita da CIDE por ente político diverso _____________________92

11. Intervenção específica _______________________________________________97

12. Repertório jurisprudencial ___________________________________________105

CONCLUSÃO ________________________________________________________113

REFERÊNCIAS_______________________________________________________117

ÍNDICE _____________________________________________________________123

15

INTRODUÇÃO

O Governo tem majorado os tributos de forma a que cada vez mais a carga

tributária se torne demasiadamente excessiva ao contribuinte.

Historicamente, pela crescente necessidade financeira, não se pode identificar

uma real diminuição da carga tributária, de forma que o Poder Público se

compromete em suas políticas com os recursos disponíveis, sem que haja um

planejamento de quais fontes deverão ser limitadas, temporárias, como é o caso

das contribuições interventivas.

As contribuições estão previstas em sua quase totalidade, no artigo 149 da CF88.

Este artigo, como será observado, sofreu grandes alterações com as emendas

constitucionais que trataram da matéria, criando, v.g. a contribuição de custeio da

iluminação pública.

Tais alterações serão brevemente analisadas, assim como, as leis que tratam da

CIDE dos Combustíveis.

Em voga nas discussões em todas esferas, no âmbito tributário, este tributo ganha

especial destaque, fato este, aliado ao surgimento recente desta imposição

tributária e, ainda sendo tratada de modo esparso nas obras existentes, tornou-se

relevante e, particularmente interessante a abordagem do tema.

Deste modo, sobre este novo tributo que recai sobre o setor de combustíveis,

propriamente a importação e comercialização de petróleo e seus derivados, gás

natural e seus derivados e álcool combustível, é que se esteia este trabalho.

16

1ª PARTE – EVOLUÇÃO NORMATIVA

1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Desde antes do advento da Constituição da República Federativa do Brasil de

1988, muito já se discutia acerca da criação, existência e autonomia da figura

jurídica das Contribuições.

Muitas destas discussões têm se mantido até os dias de hoje, época em que este

instituto adquire notoriedade com o surgimento de novas cobranças por parte do

Estado, sob o enquadramento do regime jurídico tributário, e que, a estrutura de

criação destes novos tributos, entenda-se análise formal e material, na maioria das

vezes não guarda harmonia com o sistema tributário vigente.

Iremos observar que o Estado dentro de sua voraz diretriz arrecadadora, tendo

identificado a dificuldade de criação de novos impostos e taxas, parte por instituir

cobrança de valores do contribuinte sob as mais variadas formas, procurando

“disfarçar” sua exigência, sob a nomenclatura de Contribuição, fato que se mostra

desprovido de direito quando analisados seus aspectos e confrontados com a

exação imposta, como v.g. contribuição de iluminação pública e a própria

Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) dos Combustíveis.

Fernando Maida1 em interessante artigo sobre contribuição interventiva,

argumenta que há uma crescente majoração tributária, acompanhada pela criação

de novos tributos, em virtude do Estado estar em constante busca para ao menos

amenizar o desequilíbrio em suas contas. Fato este, que se acentuou pelo

interesse na construção e reforma das estradas, aliado ao fato do infeliz e

crescente “rombo” nas contas da previdência.

1 MAIDA, Fernando. O caráter Fiscal e extrafiscal da CIDE sobre as atividades na indústria de petróleo. Teresina, Jus Navigandi, 2003, p. 2.

17

“O desequilíbrio nas contas previdenciárias tem sido o principal

fator de agravamento dos resultados fiscais do setor público. Vale

a pena ressaltar que o desequilíbrio do sistema público de

previdência é cerca de cinco vezes maior que o do INSS, que

congrega os trabalhadores da iniciativa privada. O sistema público

gasta cerca de R$40 bilhões por ano para pagar benefícios a cerca

de 3 milhões de servidores inativos, enquanto o INSS despende

cerca de R$50 bilhões no pagamento de benefícios a

aproximadamente 18 milhões de trabalhadores. Mantidas as atuais

tendências, os gastos com aposentadorias e pensões acabarão por

inviabilizar as administrações públicas, pela compressão dos

salários dos servidores da ativa e esgotamento da disponibilidade

de recursos para execução das demais políticas públicas.

[...]

Como já observado, num contexto legal que impõe restrições a

corte ainda mais acentuado de despesas, a magnitude do superávit

primário necessário para desencadear movimento sustentado de

estabilização da relação dívida/PIB, com redução das taxas de

juros e aceleração do crescimento, torna necessária a elevação

tópica de receitas. E como pode ser materializada tal operação?

Como seria feita esta elevação de receita? Ah, qualquer um

saberia a resposta. É notório que seria por aumento de alíquotas

dos tributos existentes ou então pela gênese de novos tributos.”2

O problema aqui citado não é novo, muito ao contrário, remonta à época do

Império.

Aurélio Pitanga Seixas Filho3 em estudo sobre as Contribuições, traz a lume que:

“A ausência de recursos financeiros ordinários suficientes para cobrir as despesas

necessárias para a implantação e manutenção de uma nação independente,

2 MAIDA, 2003, p. 02. 3 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Contribuições e vinculação de sua receita. Grandes Questões Atuais de Direito Tributário. v. 8. São Paulo: Dialética, 2004.

18

levaram a administração imperial a funcionar em permanente déficit orçamentário

[...].”

Desde então, o sistema tributário vem sofrendo distorções com a criação de

cobranças pecuniárias sob variadas nomenclaturas, ora impostos, taxas ou

contribuições e, com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e

posteriormente suas Emendas, muitas destas exações foram extintas pela sua

não recepção, outras, até hoje, são alvo de críticas e debates jurídicos judiciais e

extrajudiciais.

Visto que esta análise mantém corte temporal na Constituição Federal de 1988,

passaremos sinteticamente a relacionar as contribuições recepcionadas pela

Carta Magna e as criadas a partir de sua promulgação.

1.1 ESPÉCIES DE CONSTRIBUIÇÕES GENÉRICAS

Durante a vigência das Constituições anteriores à de 1988, foram criados tributos,

cujo nomem iuris alguns doutrinadores divergem a seu respeito, entretanto,

continuam presentes em nosso sistema tributário.

Passemos deste modo a brevemente citá-las:

I – Contribuições de Interesse das Categorias Profissionais: destinam-se a

manutenção de atividades de interesse do Estado, mas não são cobradas por

este, mas sim por pessoas jurídicas de direito privado, v.g. órgãos de

encaminhamento ao emprego – SENAI, SESC e SESI, dos Conselhos das

Classes profissionais – OAB, CREA, CRC, CRM, etc.

19

Kiyoshi Harada sustenta a natureza tributária desta contribuição, fundamentando

que, por não se tratar de contribuições voltadas à seguridade social, não se lhe

aplica o disposto no artigo 195, §4º da Constituição Federal de 1988.

Na verdade, não se trata de contribuições para a expansão da

seguridade social a reclamar edição de lei complementar [...].

Também não é de se aplicar retroativamente o disposto no art.

146, III, a, da CF para definir previamente, em nível de lei

complementar, a espécie tributária, o fato gerador, a base de

cálculo e o contribuinte. Se elas foram criadas na vigência da

Constituição de 1946 (as do SENAI e as do SESI foram criadas

pelo Decreto-lei n.º 4.012/42) e na conformidade das normas

constitucionais então vigentes, esse a atual Carta Política fez

expressa referência a elas em seu art. 240 ressalvando-as do

disposto no art. 195, parece claro que houve recepção da

legislação anterior ao advento da nova ordem constitucional. Afinal,

o Excelso Pretório Nacional de há muito assentou a tese de que as

normas da legislação ordinária anterior só perdem eficácia se

conflitantes com as normas da nova Constituição.4

Compactuam com este posicionamento José Eduardo Soares de Melo5 e Ricardo

Lobo Torres, de modo que este último afirma que: “As contribuições profissionais

eram cobradas como ingressos parafiscais até a CF 1967. Com a Emenda

Constitucional n. 1, de 1969, que as incluiu no art. 21, §2º, item I, ganharam

estatura tributária, situação que permaneceu no texto atual.6

E este último doutrinador complementa: “Destinando-se à defesa dos direitos

fundamentais, entre os quais se encontra o do livre exercício da profissão, e

4 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. São Paulo: Atlas, 2003, p. 326. 5 MELO, José Eduardo. Contribuições Sociais – Lineamentos Jurídicos. In: SCHOUERI, Luiz Eduardo (coord.). Direito Tributário, vol. II. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 729. 6 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 412.

20

revertendo para os cofres das autarquias federais, a contribuição profissional, ao

contrário da social e da econômica, tem natureza tipicamente tributária.” 7

II – Contribuição Sindical: São aqueles valores devidos pelos trabalhadores

sindicalizados aos respectivos sindicatos. Hugo de Brito Machado sustenta a

natureza não tributária desta cobrança, pelo fato de que a Constituição Federal

(CF88) no art. 8º, IV, estabelece que sua cobrança seja determinada em

Assembléia Geral, opinião que compactuamos.

Há quem sustente que a contribuição referida no art. 8º, inciso IV,

da CF é uma espécie de tributo, em relação à qual não se aplica o

princípio da legalidade. Não nos parece que seja assim. Preferimos

entender que se trata de contribuição de natureza não tributária,

em tudo idêntica à contribuição cobrada por qualquer associação

civil.8

III – Contribuições da Seguridade Social: São aquelas previstas no artigo 195

da CF88 que representam aquelas devidas pelos empregadores, empresa ou

entidade equiparada (inciso I); COFINS (inciso I, alínea b); lucro (inciso I, alínea c);

do trabalhador e demais segurados da previdência (inciso II); sobre o concurso de

prognóstico (inciso III); e sobre atividades rurais e pesca artesanal (parágrafo 8º).

Nestas ainda se inclui o PASEP, que criado pela LC n.º 8 de 3.12.70, com a CF88

adquiriu natureza jurídica tributária.

Com o advento da CF/88 a contribuição passou a ter natureza

jurídica tributária, tornando-se obrigatória (STF, ADIn 1.417,

Pertence, j. em 2.8.99), tendo sua destinação por objeto o

7 TORRES, 2004, p. 412. 8 MACHADO. Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 402.

21

financiamento do seguro-desemprego e o abono devido aos

empregados menos favorecidos (CF, art. 239, 3).9

IV – Contribuição Social: possuem maior abrangência que as contribuições

destinadas à seguridade social, que não deixam de ser contribuições sociais. José

Eduardo Soares de Melo as classifica como “Contribuições Sociais Genéricas” nas

quais se incluem o PIS, o FGTS, o Salário-Educação. Incluímos, ainda, o seguro

de acidentes de trabalho, a contribuição dos clubes de futebol profissional (Lei n.º

8212/91, art. 22, §§ 6º a 11º, com redação dada pela Lei n.º 9.528/97, art. 1º), as

contribuições ao SESI, SESC, SENAI, SENAC, entre outros.

Contudo, tal fato não é bastante para que tais contribuições se misturem, como

adverte Kiyoshi Harada:

Cumpre assinalar preliminarmente que existem as contribuições

sociais gerais que não se confundem com as contribuições para a

seguridade social. São exemplos delas, a contribuição social do

salário-educação, prevista no art. 212, §5º da CF e a contribuição

ao FGTS a que se refere o art. 7º, III da CF.10

Cabe ressaltar que alguns doutrinadores, como José Eduardo Soares de Melo11,

incluem a CPMF nesta categoria posto que se destina a investir no setor de

saúde, nítido, pois, o caráter social.

V – Contribuição de Custeio da Iluminação Pública: Criada pela Emenda

Constitucional (EC) n. 39/2002, que alterou o artigo 149 da CF88, tal cobrança

objetiva que os consumidores de energia elétrica contribuam com certo valor para

custear o serviço de iluminação em ruas e logradouros públicos.

9 SCHOUERI, vol. II, pág. 735. 10 HARADA, 2003, p. 327.

22

Extremamente contestada e, de constitucionalidade muito duvidosa, esta nova

cobrança tributária com fins meramente arrecadatórios (fiscais), encontra duras

críticas na doutrina pátria.

Em singular estudo sobre o assunto, o professor Aurélio Pitanga comenta:

A iluminação pública não constitui uma prestação de serviço com

caráter de especificidade, porque não pode ser ou estar conectada

a um imóvel em particular, não sendo possível, assim, medir a

quantidade de luz distribuída nos logradouros públicos que lhe

pode ser diretamente afetada, nem sua utilidade pública pode ser

destacada em uma unidade autônoma.

A iluminação pública tem a função de clarear as ruas, avenidas,

estradas e demais logradouros públicos, sendo, então, os

beneficiários desse serviço publico aqueles que transitam

livremente por essas vias abertas a toda e qualquer pessoa.

Consequentemente, são as pessoas que passam por esses

logradouros que poderiam custear essa despesa do município

através de um sistema do tipo do pedágio.

[...]

Como visto, foge a qualquer lógica querer remunerar um serviço

público genérico ou universal através de tributos, como a taxa e a

contribuição, ou preço público ou tarifa, que somente se prestam a

custear serviços públicos específicos ou singulares.12

Inobstante, em que pesem os sólidos argumentos doutrinários neste sentido, sua

existência e exigibilidade amparam-se no princípio da presunção de legalidade,

11 MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 233. 12 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Contribuição para Iluminação Pública – EC – 39-2002. Grandes Questões Atuais do Direito Tributário, São Paulo: Dialética, v. 7, 2003, pp. 47-48.

23

ficando sua inconstitucionalidade ao aguardo de propositura e julgamento de ADIn

(Ação Direta de Inconstitucionalidade).

VI – Contribuição de Melhoria: Prevista no art. 145, inciso III, da Constituição

Federal, este tributo é vinculado a uma obra pública que acarrete benefício

econômico. O valor cobrado, por sua vez, não deve ultrapassar o custo total da

obra, nem o acréscimo financeiro gerado ao imóvel particular.

VII – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico: Objeto deste

trabalho, as contribuições de intervenção no domínio econômico serão abordadas

em separado, a seguir.

2 CONTRIBUIÇÕES DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

Ao contrário do que muitos podem pensar, as contribuições de intervenção no

domínio econômico (CIDE) não se restringem à CIDE dos Combustíveis, regulada

pela Lei n.º 10.336/01. Da mesma forma, as contribuições interventivas também

não são inovações da Carta Constitucional de 1988.

Iremos mencionar, com a brevidade que nos for possível, as contribuições

interventivas recepcionadas na CF88 e as criadas após sua promulgação.

Muitos doutrinadores inserem as contribuições de intervenção no domínio

econômico dentro da classificação das contribuições sociais, entre eles Hugo de

Brito Machado13, Kiyoshi Harada14 e José Eduardo Soares de Melo15.

13 MACHADO, 2004, p. 5. 14 HARADA, 2003, p. 15. 15 MELO. In: SCHOUERI, vol. II, 2003, p. 727; e Contribuições Sociais no Sistema Tributário, 2003, p. 7.

24

De outro lado, também renomados tributaristas as classificam de forma

independente das Contribuições Sociais, entre eles Zelmo Denari16, Marcelo

Guerra Martins17 e Ricardo Lobo Torres18.

Sem adentrarmos nesta discussão a qual se afasta do objeto deste exame,

aderimos a esta segunda corrente doutrinária que, neste estudo, serão tratadas as

Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico em capítulo próprio.

Como o próprio texto constitucional traz no artigo 149, as CIDE`s deverão incidir

somente sobre atividades as quais impera o domínio econômico, guardada

estreita relação com os princípios que norteiam a atividade econômica, elencados

no artigo 170 da CF88.

O citado dispositivo explicita ainda que a atividade interventiva, deverá ser

direcionada ao setor sobre o qual recaiu a tributação e, assim, o produto de sua

arrecadação deverá ter destinação específica, qual seja, o mesmo setor.

Dispõe o caput do art. 149 da CF88 que: “Compete exclusivamente à União

instituir contribuições [...] de intervenção no domínio econômico [...], como

instrumento de sua atuação nas respectivas áreas [...]”.

Verifica-se que a CIDE deverá realmente servir como um instrumento interventor,

de modo a efetivamente ser aplicada e ter sua receita voltada à intervenção no

determinado setor da economia.

De plano observa-se que o objetivo precípuo da CIDE é a própria intervenção –

direta: função extrafiscal; ou indireta: função parafiscal – e não o mero interesse

arrecadador – função fiscal – o qual vem se utilizando o Estado.

As CIDE`s estão intimamente ligadas à própria concepção de intervenção, de

forma que esta, como bem ensina Ricardo Lobo, pode ser verificada sob um

aspecto histórico, em que a própria figura do Estado no contexto econômico

16 DENARI, Zelmo. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Atlas, 2002, p. 7. 17 MARTINS, Marcelo Guerra. Impostos e Contribuições Federais. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 559. 18 TORRES, 2004, pp. 410; 450.

25

mudou de papel, partindo do Welfare State ou simplesmente Estado do Bem-estar

Social, para um Estado Democrático de Direito.

O primeiro, fortemente interventor, buscava gerir e suprir todas as áreas:

econômica, industrial, científica, etc., e o segundo, com característica

descentralizadora cada vez mais acentuada.

Na primeira fase, do intervencionismo paternalista, inúmeras foram

as contribuições econômicas instituídas e que já começaram a

desaparecer [...]. Na outra fase, do período da privatização e da

desregulamentação, iniciado no Governo Collor e fortalecido no

Governo Fernando Henrique, revogam-se diversas contribuições e

criam-se outras, agora destinadas a controlar o abuso do poder

econômico, zelar pela concorrência, estabilizar preços, transformar

em consumidores as populações marginalizadas, promover o

avanço tecnológico da economia [...].19

As contribuições interventivas, possuem natureza temporária, e com fundamento

no artigo 149 da CF88, devem servir de instrumento à intervenção da União

Federal nas áreas sobre as quais recaiu o encargo financeiro.

Para que não nos afastemos de nosso objeto, que visa analisar a evolução das

contribuições interventivas, especialmente, a CIDE dos Combustíveis, não será

aqui examinada a intervenção em essência, nem a conceituação de ordem e

domínio econômico do Estado por meio destas imposições tributárias, que por

serem demasiadas amplas, merecem abordagem extensa, a qual aqui remetemos

às obras de Ricardo Lobo20 e Paulo Roberto Lyrio Pimenta21.

19 TORRES. 2004, p. 410-411 passim. 20 Idem. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. Item 15.3 21 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: Dialética, 2002, p. 32, et. seq.

26

2.1. ESPÉCIES DE CONTRIBUIÇÕES INTERVENTIVAS

Como já dito, as contribuições interventivas não se limitam àquela criada pela Lei

n.º 10.336/01. Algumas contribuições desta natureza foram recepcionadas pela

Carta Magna de 1988, e outras surgiram após sua promulgação.

Quanto às primeiras, temos:

I – Contribuição ao Instituto do Açúcar e do Álcool: Criada pelos Decretos-lei

n.ºs 308/67, 1.712/79 e 1.952/82, visava intervir no setor da economia canavieira,

onde se produz o açúcar e o álcool.

Pairando divergência jurisprudencial entre o TRF da 3ª Região22 e o da 5ª

Região23 acerca de sua inconstitucionalidade, prevaleceu o entendimento deste

último em que o STJ24 reconheceu a constitucionalidade do tributo, por guardar

sintonia com o sistema jurídico tributário vigente após 1988.

II –Adicional ao Frete de Renovação da Marinha Mercante (AFRMM): Instituído

pelo Decreto-lei n.º 3.100 de 7 de março de 194125 e alterado pelo Decreto-lei n.º

2.404 de 23.12.1987, e posteriormente pelas Leis n.º 7.742/89 e 8.032/90 e MP n.º

1.109, de 29.08.95, tem como função financiar a intervenção da União nas

atividades de desenvolvimento da marinha mercante e da indústria de reparação e

construção naval.

22 TRF 5ª Região, Ap. Cível – SP, n.º 203.725, Rel. juíza Lúcia Figueiredo, DJU, 17.10.1995, p. 71.013. 23 TRF 5ª Região, Ap. Cível – PE, n.º 8.078, Rel. juiz José Maria Lucena, JSTF e TRF-53/587. 24 STJ, RESP – AL, n.º 23.750-0, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJU, 05.09.1994, p. 23.037. 25 SEIXAS FILHO, 2004, p. 47.

27

Quanto ao questionamento sobre sua inconstitucionalidade, José Eduardo Soares

de Melo comenta a decisão do STF no RESP n.º 177.137-2-RS, cujo Relator foi o

Min. Carlos Velloso:

O STF dirimiu a controvérsia na forma seguinte:

“Constitucional. Tributário. Adicional ao Frete para

Renovação da Marinha Mercante – AFRMM:

Contribuição Parafiscal ou Especial de Intervenção

no Domínio Econômico, CF, art. 149, art. 155, §2º,

IX.ADCT, art. 36.

I – O Adicional ao Frete para a Renovação da

Marinha Mercante – AFRMM – é uma contribuição

parafiscal ou especial, contribuição de intervenção

no domínio econômico, terceiro gênero tributário,

distinta do imposto e da taxa (CF, art. 149).

II – O AFRMM não é incompatível com a norma do

art. 155, §2º, IX da Constituição. Irrelevância, sob o

aspecto tributário da alegação no sentido de que o

Findo da Marinha Mercante teria sido extinto, na

forma do disposto no art. 36, da ADCT.

III – RE não conhecido.”26

Quanto ao segundo caso, quais sejam, as contribuições interventivas criadas sob

a égide da Constituição de 1988, temos:

I – Adicional de Tarifa Portuária (ATP): Tributo que se assemelha ao Adicional

de Frete de Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), foi instituído pela Lei n.º

7.700, de 21.12.1988.

26 SCHOUERI, vol. II, 2003, p. 724.

28

Destina-se à formação de recursos da Empresa de Portos do Brasil

S.A. – Portobras. Por maioria de votos, o Plenário do Supremo

Tribunal considerou-o constitucional classificando-o como

contribuição de intervenção no domínio econômico (RE n.º

209365/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 7-12-2000, p. 873).27

II – Contribuição de financiamento do Programa de Estímulo à Integração

Universidade-Empresa (CIDE-royalties): Esta contribuição interventiva recai

sobre aquelas pessoas jurídicas detentoras de licença de uso ou que adquirem

conhecimentos tecnológicos, por meio de contratos entre pessoas residentes ou

domiciliadas fora do território nacional. Foi instituída pela Lei n.º 10.168/00 e

alterada pela Lei n.º 10.332/01, e Decretos n.º 3.949/01 e 4.195/02.

Seu fundamento constitucional está inserido no art. 218 da CF88, em que prevê

como função do Estado o desenvolvimento tecnológico.

Paulo Roberto Lyrio Pimenta, ao abordar a referida contribuição, sustenta a

inconstitucionalidade desta CIDE:

Ora, na hipótese sob exame os benefícios da contribuição serão

auferidos por toda a sociedade, e não apenas pelos sujeitos

passivos. O art. 1º da Lei 10.168/00 dispões expressamente que o

Programa em pauta tem por objetivo estimular o “desenvolvimento

tecnológico brasileiro”. As finalidades do Fundo as quais se destina

o tributo, previstas no Decreto nº 4.195, que regulamenta a Lei

10.168/00, atingem vários grupos e setores econômicos.

[...]

Destarte, embora a intervenção em pauta encontre fundamentos

constitucional no art. 218 da Carta Magna, sendo válida a norma

interventiva, e inexista vício de inconstitucionalidade formal na Lei

nº 10.168/2000, parece-nos que esse documento normativo é

27 HARADA, 2003, p. 323.

29

inconstitucional, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e

da finalidade.28

III – Contribuição ao Fundo de Universalização dos Serviços de

Telecomunicações (FUST): Criada pela Lei n.º 9.998/00 e Decreto n.º 3.624/00,

tem a finalidade garantir recursos para a universalização dos serviços de

telecomunicações. Sobre a constitucionalidade deste tributo, José Eduardo Soares

de Melo comenta que: “considerando que à União compete explorar diretamente,

ou mediante concessão, os referidos serviços (art. 21, XI e XII, a, CF), não caberia

a intervenção nesta atividade econômica.”29

Em sentido diverso, Paulo Roberto Lyrio Pimenta fundamenta seu entendimento

pela constitucionalidade desta CIDE:

Indubitavelmente, essa exação tem natureza de contribuição de

intervenção no domínio econômico. De fato, a hipótese é de

existência de intervenção indireta, realizada por meio de uma

agência reguladora (Anatel), utilizando a técnica do incentivo para

implementar finalidades constitucionais, mormente o princípio

prescrito pelo art. 170, VII, da Constituição. A CIDE criada destina-

se a um Fundo Público, cujos recursos se dirigem a obtenção de

objetivos relacionados ao setor atingido com a intervenção. A

exação servirá, portanto, como fonte de custeio das atividades a

serem desenvolvidas para implementar as finalidades relacionadas

à universalização.

[...]

Do exposto conclui-se pela constitucionalidade da CIDE prevista

pela Lei n.º 9.998/2000.30

28

PIMENTA, 2002, pp. 116-117. 29 SCHOUERI, vol. II, 2003, p. 726.

30

IV – Contribuição ao Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das

Telecomunicações (FUNTTEL): Criada pela Lei n.º 10.052/00 e Decreto n.º

3.737/01, esta contribuição prima por representar uma intervenção da União no

setor de telecomunicações. Esta intervenção se dará de forma a incentivar a o

lado tecnológico do setor, capacitar mão-de-obra, enfim, tudo o mais que for

também necessário para que o setor atinja as metas desenvolvimentistas da

Administração Pública, desde que, sempre guardando relação com o tributo

imposto, voltando o produto de sua arrecadação para aquelas atividades voltadas

à finalidade do Fundo.

Paulo Roberto Lyrio Pimenta comenta a questão:

[...] evidencia-se que a arrecadação alcançará os contribuintes da

CIDE em exame, que serão beneficiados com a atividade

interventiva. No entanto, não é qualquer “interesse” do setor que

justifica a utilização da receita da CIDE. Como o tributo foi

instituído para incentivar determinadas atividades, o interesse ao

qual alude esse enunciado só pode ser aquele relacionado às

condutas desenvolvidas para que os objetivos do Fundo sejam

atingidos. 31

V – Contribuição à Pesquisa e Desenvolvimento do Setor Elétrico: Com o

advento da Lei n.º 9.991/00, posteriormente alterada pela Lei n.º 10.438/02, foi

criada mais uma contribuição no sistema jurídico tributário pátrio. Tais leis

determinam que as empresas concessionárias ou permissionárias de energia

elétrica, concessionárias de geração e empresas autorizadas à produção

independente e, as concessionárias de serviço público de transmissão de energia

elétrica, apliquem percentual sobre seu faturamento para financiar atividade de

pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico.

30

PIMENTA, 2002, pp. 113-114. 31 Idem, ibidem. 2002, p. 115.

31

VI – Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica

(CONDECINE): Instituída pela MP 2.228/01 e Lei n.º 10.454/02, esta contribuição,

como se nome demonstra, tem a finalidade de gerar recursos para o

desenvolvimento da indústria cinematográfica nacional.

Tem como fato gerador o licenciamento, produção, distribuição e a transmissão de

obras cinematográficas, feitas de forma comercial (art.32).

Esta CIDE tem esteio no artigo 215 da Carta Magna, dispondo que é dever do

Estado garantir o amplo acesso às atividades culturais, bem como, seu

desenvolvimento.

VII – Encargo de Capacidade Emergencial (SEGURO-APAGÃO): Motivado pela

falta de energia elétrica a que passou o país neste início de século XXI, o Governo

Federal editou Medida Provisória n.º 14, que foi convertida na Lei n.º 10.438/02,

para que fosse instituída uma cobrança a ser rateada entre os consumidores finais

de energia elétrica, visando a geração de um fundo de investimento apto a prever

e evitar o desabastecimento energético em tempos futuros.

Esta CIDE, de recente criação, já tendo sido analisada por diversos estudiosos da

matéria, é alvo de questionamentos acerca de sua inconstitucionalidade. Paulo

Roberto Lyrio Pimenta32 sustenta este posicionamento, sob a fundamentação de

que a dita contribuição viola os princípios da finalidade e da proporcionalidade,

posto que, cobrada de todos os consumidores finais de energia elétrica, seus

recursos serão aplicados somente em alguns setores. Da mesma forma, por

delegar à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) a competência para

alterar suas alíquotas, alega-se a afronta ao Princípio da Legalidade.

VIII – Contribuição dos Combustíveis: Chegamos ao ponto nodal desta análise,

que é a evolução normativa da contribuição interventiva dos combustíveis. Assim

sendo, a abordaremos em capítulo próprio, a seguir.

32 PIMENTA, 2002. p. 123.

32

3 CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS COMBUSTÍVEIS

Cada vez mais em foco as questões relativas ao petróleo e os negócios a ele

referentes, impulsionado pelos recentes acontecimentos na seara internacional e

as recentes descobertas de novas jazidas em território brasileiro, mormente no

litoral norte fluminense e no Estado do Espírito Santo, ao final do ano de 2001 o

Senado aprovou a Emenda Constitucional n.º 33 e, dias seguintes, a Lei n.º

10.336, de 19 de dezembro de 2001, criando a Contribuição de Intervenção no

Domínio Econômico sobre as atividades de importação e comercialização de

combustíveis, ou simplesmente por nós denominada de “CIDE dos Combustíveis”.

Como um ouro negro em que tudo a ele referenciado envolve grandes somas

pecuniárias, atento a este fato, foi criada uma nova cobrança sobre determinadas

etapas do “processo do petróleo” voltado aos combustíveis, de modo que, à União

Federal se atribuiu a competência deste novo tributo, com vistas do Governo em

“alavancar” as contas públicas, o que de fato ocorreu.

Devendo ter natureza temporária como toda contribuição interventiva, a CIDE dos

Combustíveis está vigendo no sistema tributário desde o final do ano de 2001 e,

passados mais de três anos, não se tem qualquer perspectiva de sua revogação,

posto que os recursos financeiros gerados por ela “engordaram” os cofres públicos

somente neste ano de 2004 com algo em torno de R$ 8 bilhões (oito bilhões de

reais)33.

33 Sônia Racy, em seu artigo “A CIDE e sua transformação”, informa que a CIDE dos Combustíveis arrecadou no ano de 2003 algo em torno de R$ 7,5 bilhões para a União, e destes, R$ 2 bilhões foram destinados aos Estados e sobre estes, 25% foram repassados para os Municípios. Assim, com os aumentos na gasolina em torno de 10% ao ano, sobre o litro vendido nos postos de

33

A estrutura normativa desta contribuição prevê, com a alteração do artigo 177 da

CF88 pela EC n.33, que as alíquotas poderão ser alteradas por ato do Poder

Executivo, não se lhe aplicando o Princípio da Legalidade e Anterioridade.

Embora tal aspecto possa ser discutível, posto que o Princípio da Anterioridade,

assim como os demais, insculpidos no art. 150 da Constituição Federal que

estipula as limitações ao poder de tributar, sendo este dispositivo interpretado

como clausula pétrea, tendo em vista que a CIDE dos Combustíveis tem nítida e

forte função extrafiscal, parece-nos que sob este aspecto se mostra necessário

um permissivo legal para que o Poder Executivo, em seu ato interventivo, possa

ter a “agilidade” de reduzir e restabelecer as alíquotas desta exação, conforme as

variantes do mercado.

Outro aspecto relevante convém mencionar é a inovação introduzida pela EC n.

42, determinando que 25% (vinte e cinco por cento) dos recursos da CIDE dos

Combustíveis recolhidos pela União, sejam repassados aos Estados e Distrito

Federal, e destes, 25% (vinte e cinco por cento) serão destinados aos Municípios.

Recentemente, em 30 de junho de 2004, por meio da EC n. 44, o percentual

destinado aos Estados e Distrito Federal foi elevado para 29% (vinte e nove por

cento).

Finalmente, observa-se que a CIDE dos Combustíveis foi introduzida em nosso

sistema jurídico sem a observância do que determina o art. 146 da CF88, posto

que há necessidade do veículo introdutor ser uma Lei Complementar, e não uma

Lei Ordinária, como a Lei n.º 10.336/01.

Art. 146. Cabe à Lei Complementar:

[...]

combustíveis, aproximadamente R$0,60 (sessenta centavos) – 26% – ou seja, mais de ¼ de seu valor deve-se à CIDE.

34

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação

tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em

relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos

respectivos fatos geradores, bases de cálculo e

contribuintes;34

Passamos a analisar a evolução normativa da CIDE dos Combustíveis sobre a

qual teceremos breves comentários.

3.1 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, ARTIGO 149

Originalmente, o artigo 149 da CF88 determinava que era da competência

exclusiva da União a criação de contribuições sociais, interventivas e de interesse

das categorias econômicas e profissionais. Aliada a estas, tínhamos também a

contribuição de melhoria, prevista no art. 145, inciso III.

Especificamente quanto às contribuições interventivas, como já vimos, algumas

CIDE`s foram incorporadas ao nosso sistema constitucional tributário pelo

Princípio da Recepção, como v.g. o AFRMM e o IAA.

Na década de 90, o Governo deu primazia aos impostos e taxas, como pilares

bases da tributação, ficando as contribuições interventivas em desuso, assim

como até hoje está a contribuição de melhoria.

Com o crescente aumento da carga tributária, seja pela majoração dos tributos,

seja pela criação de novas exações, o Poder Público percebeu o “esgotamento”

34 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil - 1988, art. 146.

35

de possibilidades impositivas – fatos geradores – em razão do grande número de

impostos já existentes e, compromissado com as metas de superávit firmadas com

o FMI (Fundo Monetário Internacional) e buscando recursos para financiamento de

programas de governo, a União, pressionada pelo artigo 154 da CF88, se voltou

para o artigo 149 como uma verdadeira “válvula de escape” das contas públicas,

visualizando nas contribuições interventivas uma fonte rica de geração de receita.

Entretanto, para que tal cobrança pudesse ser feita, houve a necessidade de

autorização de criação de contribuição interventiva sobre atividades relacionadas

aos combustíveis, a qual se deu pela Emenda Constitucional n. 33.

3.2 EMENDA CONSTITUCIONAL N. 33

O texto original do art. 149 da CF88, outorgava à União Federal a competência

quanto às Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico.

Porém, foi somente com a EC n. 33, de 11 de dezembro de 2001, que se prevê a

CIDE sobre os Combustíveis, dando nova redação ao artigo 149 da Constituição.

Este tributo passou a incidir sobre as operações de importações e a

comercialização de combustíveis, e suas alíquotas poderão ser reduzidas ou

aumentadas por ato do Poder Executivo – nova redação do art. 177, § 4º.

A referida Emenda Constitucional criou uma imunidade ao excluir da incidência do

tributo as receitas decorrentes de exportação.

Finalmente, quanto à destinação do produto da arrecadação constitucionalmente

vinculado ao ato interventivo, conforme preceitua o art. 149, a EC n. 33 se

desvirtuou do fato gerador e destinou os recursos para setores diversos.

36

Art. 177 [...]

§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio

econômico relativa às atividades de importação ou

comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e

seus derivados e álcool combustível deverá atender aos

seguintes requisitos:

[...]

II - os recursos arrecadados serão destinados:

a) ao pagamento de subsídios a preços ou

transporte de álcool combustível, gás natural e

seus derivados e derivados de petróleo;

b) ao financiamento de projetos ambientais

relacionados com a indústria do petróleo e do

gás;

c) ao financiamento de programas de infra-

estrutura de transportes. 35

A criação de uma contribuição sobre as atividades de importação e comércio de

combustíveis, na opinião de Marcelo Guerra Martins, afronta o princípio da

razoabilidade, porque por um lado o Governo faz a abertura do mercado pela

quebra do monopólio da Petrobrás36 e, por outro, intervém onerando os

particulares com a CIDE, justamente nas operações de importação e

comercialização de combustíveis.

35 Nova redação dada ao artigo 177 da CF88, pela EC n. 33. 36 A quebra do monopólio da Petrobrás se deu com o advento da Emenda Constitucional n. 09, que deu nova redação ao artigo 177 da CF88, de forma a permitir a atuação de novas empresas naquelas áreas, v.g. a importação de combustíveis.

37

Isto sem falar em ofensa ao princípio constitucional da

razoabilidade. É que, ou a importação e a comercialização de

combustíveis são atividades que não podem ser exploradas pela

iniciativa privada, mantendo-se o monopólio da União Federal, ou,

então, é possível à iniciativa privada atuar no setor, respeitando-se a

liberdade de iniciativa e a livre concorrência. Não é razoável,

contudo, facultar à iniciativa privada explorar a atividade e

concomitantemente onerá-la com a imposição de uma contribuição

de caráter arrecadatório, que implica no afastamento de todos os

benefícios advindos da abertura do mercado, uma vez que

representará elevado componente do preço final suportado pelo

consumidor. [...].

E, se a preocupação do legislador é relativa ao controle das

importações de petróleo e seus derivados, com o intuito de proteger

o mercado interno, o instrumento mais adequado para esta tarefa é

o imposto de importação, que não onera o produto nacional,

permitindo que este inclusive tenha condições de competir com o

produto importado, beneficiando não apenas a economia nacional

mas o balanço de pagamentos.37

Analisando a nova redação dada ao art. 177, verifica-se que a União criou

contribuição interventiva no domínio econômico sobre a importação e

comercialização de combustíveis, porém, não atendeu ao disposto no art. 149,

bem como, feriu também os Princípios da Finalidade e Proporcionalidade, posto

que interveio sobre setores estranhos à incidência da CIDE ao destinar o produto

da arrecadação ao pagamento de subsídios de transporte, financiamento de

projetos ambientais e programas de infra-estrutura de transportes.

37 MARTINS, 2004, p. 561.

38

No mesmo sentido, Paulo Roberto Lyrio Pimenta acrescenta:

O segundo objetivo perseguido pela CIDE beneficiará a toda uma

coletividade, e não apenas os contribuintes da exação. Ou seja, a

contribuição será exigida de um determinado grupo econômico

(produtor, formulador e importador de combustíveis) para custear

projetos ambientais relacionados à indústria do petróleo e do gás, os

quais proporcionarão benefícios a toda uma coletividade. [...].

Já o terceiro objetivo, atingirá, indubitavelmente, setor econômico

não alcançado pela exação: o setor de transportes. Desse modo,

neste particular um determinado grupo estará sofrendo um ônus

financeiro (contribuintes da CIDE) para que outro setor seja

beneficiado. [...].

Tais finalidades, prescritas pelos incisos II e III do § 1º do art. 1º da

Lei 10.336/2001 burlam os princípios da proporcionalidade e o da

finalidade. [...], com base na finalidade da exação extrai-se o sujeito

passivo. A sujeição passiva é, também, determinada pelo aspecto-

adequação do princípio da proporcionalidade, visto que o destino da

arrecadação do tributo deve ser o setor ou grupo econômico

alcançado pela intervenção, reafirme-se, sob pena de inadequação

entre o critério subjetivo da hipótese de incidência e a finalidade da

CIDE.38

Constata-se a não observância do disposto no art. 149 da CF88 que estabelece a

competência da União para instituir a CIDE dos Combustíveis, “como instrumento

de sua atuação nas respectivas áreas”, ferindo com isto o princípio da legalidade,

padecendo do vício da inconstitucionalidade.

Por fim, a EC n.33 alterou o artigo 155 da CF88, mudando a palavra tributo por

imposto. Tal alteração objetivou fugir à vedação constitucional imposta, pela já

existência do ICMS incidente sobre os combustíveis. Assim dispunha o texto:

38PIMENTA, 2002, p. 120-121.

39

§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste

artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro tributo poderá incidir sobre

operações relativas a energia elétrica, serviços de

telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais

do País.

(Grifo nosso)

E, após a alteração da EC n.33, assim ficou:

§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput

deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro imposto poderá

incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de

telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais

do País.

(grifo nosso)

Zelmo Denari fecha o assunto com pertinente comentário:

Tendo presente que o § 3º do art. 155 da Constituição Federal

determinado que, à exceção do ICMS, nenhum outro tributo poderá

incidir sobre operações relativas aos derivados de petróleo e

combustíveis do país, a referida emenda constitucional substituiu o

termo tributo por imposto, para obviar eventuais disputas judiciais

capazes de inviabilizar a instituição e cobrança da nova

contribuição parafiscal.39

39 DENARI, 2002, p. 123.

40

3.3 LEI ORDINÁRIA N.º 10.336 / 2001

Em 20 de dezembro de 2001, foi publicada no diário oficial da União a Lei n.º

10.336, que instituiu a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico que

viria a incidir sobre importação e comercialização de petróleo e seus derivados,

gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível.

Esta lei objetivou definir os critérios da regra-matriz de incidência deste tributo. O

parágrafo 1º, do art. 1º desta lei, repete a nova redação dada ao artigo 177, §4º,

inciso II, da CF88 pela EC n. 33, destinando o produto da arrecadação às

atividades já mencionadas no tópico anterior, fato este, que já torna insubsistente

a cobrança desta exação por manifesta inconstitucionalidade.

Os sujeitos passivos do critério pessoal da regra-matriz, estão discriminados no

artigo 2º da lei em comento, quais sejam: o produtor, o formulador e o importador

de combustíveis, descritos no art. 3º. Logo, comparando o aspecto pessoal –

sujeito passivo – e a destinação dos recursos do tributo, observa-se a não

aplicação do princípio da proporcionalidade, razoabilidade e, inclusive, isonomia

(art. 150, II, CF88), uma vez que, se toda a coletividade, ou setor diverso daquele

que é o sujeito passivo, será beneficiado com a intervenção pela destinação do

recurso da CIDE, porque instituí-la somente em determinado setor, ou setor

diverso daquele sobre o qual recairá a intervenção?

Verifica-se que os produtores, formuladores e importadores estão sendo tratados

de modo disforme em relação às demais pessoas que se beneficiam da

intervenção e recursos da imposição tributária.

Assim como a EC n.33 criou uma imunidade nas relações de exportação de

combustíveis, quanto a CIDE, e a Lei 10.336/01 criou uma isenção em seu artigo

5º, § 4º, ao dispor que: “fica isenta da Cide a nafta petroquímica, importada ou

41

adquirida no mercado interno, destinada à elaboração, por central petroquímica,

de produtos petroquímicos não incluídos no caput deste artigo, nos termos e

condições estabelecidos pela ANP”.

Em seu artigo 10º, esta lei criou nova isenção, ao dispensar o contribuinte do

pagamento do tributo quanto ao comércio dos combustíveis descritos no artigo 3º,

vendidos a empresas exportadoras, desde que efetivamente destinados à

exportação.

Finalmente, analisaremos de forma breve a adequação ou não do veículo

introdutor desta contribuição interventiva.

Sabe-se que a CIDE dos Combustíveis foi instituída pela Lei Ordinária n.º 10.336,

de 19 de dezembro de 2001. Como já dito, foi esta norma que disciplinou e

estabeleceu os critérios da regra-matriz de incidência.

Contudo, observamos que o artigo 146, inciso III, da CF88, determina que cabe à

Lei Complementar estabelecer as normas gerais em matéria tributária, mormente

os fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes. Assim, padece de vício de

forma, posto que a regra-matriz desta Contribuição deveria ser introduzida no

ordenamento jurídico por Lei Complementar, e não Lei Ordinária, como o foi.

[...] uma das principais inconstitucionalidades é formal, na medida

em que esta contribuição não está embasada em prévia lei

complementar, essencial à instituição destas exações, [...]. Assim

sendo, com base no art. 146, III da CF, lei complementar deve ser

editada para: a) caso se entenda a contribuição como espécie

autônoma do gênero tributo, defina o que se entende por

contribuição de intervenção no domínio econômico e; b) entretanto,

entendendo-se a contribuição como possuidora da natureza

jurídica de imposto ou taxa, dispensando-se a definição acima, eis

que já constante do Código Tributário Nacional (art. 16 e art. 77),

42

explicite as hipóteses de incidência, a base de cálculo e os

contribuintes.40

3.4 LEI ORDINÁRIA N.º 10.636 / 2002

Amparada nos artigos 149 e 177 da CF88, com as alterações feitas pela EC n. 33,

e pela Lei n.º 10.336/01, foi criada em 30 de dezembro de 2002 a Lei n. 10.636,

que deliberou sobre a destinação dos recursos arrecadados pela CIDE dos

Combustíveis.

Como já visto, discorda-se dos permissivos criados pela Ec n. 33, que destina os

recursos da CIDE ao pagamento de subsídios de transporte, programas

ambientais e de infra-estrutura de transportes. Contudo, a lei em comento, para

possibilitar a atuação nestes setores, criou o Fundo Nacional de Infra-Estrutura de

Transportes – FNIT, o qual terá competência para traçar os planos, metas e

políticas públicas no setor de transportes, conforme preceitua o art. 6º da mesma

lei e, em seu artigo 4º, determina que os projetos ambientais sejam administrados

pelo Ministério do Meio Ambiente.

Em seu artigo 14, altera as alíquotas sobre os combustíveis, majorando-as.

Disto tudo, se depreende que de fato há o desvirtuamento e violação ao princípio

da proporcionalidade, visto que efetuada intervenção pela aplicação dos recursos

da CIDE dos Combustíveis em setor diverso ao qual lhe recaiu o encargo

financeiro.

Em relação aos projetos ambientais, tamanha é a discrepância, que a

Contribuição Interventiva incide sobre operação de combustíveis – importação e

comercialização – o que ensejaria uma intervenção nestes setores pelo Ministério

40 MARTINS, 2004,. p. 562.

43

das Minas e Energia, por meio de sua agência reguladora ANP (Agência Nacional

do Petróleo); entretanto, o artigo 4º desta lei, determina que os recursos da CIDE

dos Combustíveis sejam destinados a custear programas ambientais, sob

administração do Ministério do Meio Ambiente, o que revela flagrante

inconstitucionalidade.

Por sua vez, a Lei 10.636 cria ainda o FNIT, que se mostra mais uma grande

inobservância do caput do art. 149 da Carta Magna. Do mesmo modo que quanto

ao setor de meio ambiente, ao setor de transporte não deve ser destinado

qualquer recurso da CIDE dos Combustíveis, pelo mesmo fundamento.

Traz o artigo 6º da lei em comento:

Art. 6º A aplicação dos recursos da Cide nos programas de infra-

estrutura de transportes terá como objetivos essenciais a redução

do consumo de combustíveis automotivos, o atendimento mais

econômico da demanda de transportes de pessoas e bens, a

segurança e o conforto dos usuários, a diminuição do tempo de

deslocamento dos usuários do transporte público coletivo, a

melhoria da qualidade de vida da população, a redução das

deseconomias dos centros urbanos e a menor participação dos

fretes e dos custos portuários e de outros terminais na composição

final dos preços dos produtos de consumo interno e de exportação.

A mera leitura do dispositivo supracitado leva à conclusão clara e inconteste do

descumprimento do preceito constitucional esculpido no artigo 149, que determina

que a instituição das Contribuições Interventivas servirão de instrumento de

atuação nas respectivas áreas.

44

3.5 EMENDA CONSTITUCIONAL N. 42

Inicialmente, a Emenda Constitucional n. 42, de 19 de dezembro de 2003, efetuou

nova alteração no artigo 149 da CF88; desta vez, dando nova redação ao inciso II,

do § 2º, que passou a dispor que as Contribuições Sociais e a CIDE “incidirão

também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços”.

Contudo, a alteração mais relevante no tocante à CIDE dos Combustíveis, veio

com a alteração do artigo 159, com a inclusão do inciso III, o qual determina que a

União deve repassar 25% dos recursos gerados por este tributo aos Estados e

DF, e destes, 25% serão destinados aos Municípios (§ 4º, do art. 159, CF88).

Depreende-se mais uma vez que o poder constituinte derivado extrapolou suas

atribuições, ao violar o caput do artigo 149 que obriga à União, ao instituir a

Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, utilizá-la como “instrumento

de sua [União Federal] atuação na respectiva área” (grifo nosso). 41

Como já visto, a cobrança da CIDE obriga a União a realizar uma intervenção no

domínio econômico e, esta intervenção, necessariamente deverá recair no setor

que suportou o ônus financeiro do tributo.

Assim, a destinação dos recursos da CIDE é específica e a atuação interventiva

também, de sorte que somente poderá ser feita por que detém a competência

impositiva, no caso, a União Federal em delimitado setor. O próprio texto

constitucional, no art. 149, frisa que a atuação interventiva é obrigatória e

exclusivamente será feita pela União Federal, tão só.

O que busca a EC n. 42 é justamente a transferência da atividade interventiva aos

Estados, Distrito Federal e aos Municípios, de forma que, uma vez recebido parte

dos recursos financeiros do tributo, atuem no setor de transportes – diga-se, setor

41 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil - 1988, art. 149, caput.

45

diverso ao da importação e comercialização de combustíveis – e apliquem

segundo suas próprias políticas públicas.

A contribuição interventiva sobre os combustíveis é tributo excepcional, tanto que

mereceu tratamento específico no § 4º do art. 177 da CF88.

Já foi afirmado que esta contribuição de intervenção no domínio

econômico, após a EC 33/2001, passou a ter tratamento

constitucional diferenciado, nos moldes do § 4º do art. 177 da CF.

Estas normas específicas não são válidas para outras

contribuições de intervenção no domínio econômico, mas apenas

para aquela acima referida (relativa às atividades de importação ou

comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus

derivados e álcool combustível).42

Ficando vinculado o produto da arrecadação a uma atuação estatal – intervenção

– por parte exclusivamente da União, não há, portanto, como se aplicar nas

contribuições interventivas a repartição de receitas tributárias que se verifica nos

impostos, previstas nos artigos 157, 158, e originalmente no artigo 159, da CF88.

Feita esta análise observa-se de modo insofismável que é absolutamente

inconstitucional qualquer instrumento normativo, frise-se, Emenda Constitucional,

que afronte no sentido jurídico traçado, texto constitucional originário.

Não pode, deste modo, prosperar uma emenda à Constituição, que implique em

contradição com outro dispositivo constitucional criado pelo legítimo e puro

interesse constituinte originário, afronta esta, que se verifica na EC n. 42.

42 MARTINS, 2004, p. 559.

46

3.6 MEDIDA PROVISÓRIA N. 161 / 2004

Com as alterações promovidas pela Ec n. 42, mormente a inclusão do inciso III,

que outorgava aos Estados e Distrito Federal o direito a 25% (vinte e cinco por

cento) dos recursos da CIDE, e o § 4º que garantia aos Municípios 25% (vinte e

cinco por cento) do valor recebido pelos Estados e DF, faltava-lhes, ainda, a

edição de lei para que os ditos percentuais fossem repassados.

Quanto aos Estados e Distrito Federal, seu direito veio regulado por força da

Medida Provisória n. 161, de 21 de janeiro de 2004, que incluiu o artigo 1º-A à Lei

n.º 10.336/01.

Entretanto, como se observa, surgiu uma lacuna em relação ao percentual a ser

destinado aos Municípios que, não incluído nesta Medida Provisória, ainda

necessitava de advento de lei.

Em análise à EC n. 42, Jorge Torres comenta:

Como bem o sabemos a Constituição Federal não cria tributos

apenas autoriza a sua instituição por lei do respectivo ente

federativo, em respeito ao princípio constitucional da legalidade (art.

150, I), que impede que a União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios exijam tributos que não tenham sido estabelecidos por

lei.

[...]

Dando cumprimento ao prescrito no recém introduzido inciso III ao

art. 159, pela EC nº 42/2003, o Governo Federal editou a

recentíssima Medida Provisória nº 161, de 21 de janeiro de 2004,

acrescentando o art. 1º-A à Lei nº 10.336, de 19 de dezembro de

2001, que instituiu a CIDE.

47

A citada MP veio a disciplinar a entrega aos Estados e ao Distrito

Federal e vinte e cinco por cento do total dos recursos arrecadados

a título da contribuição de intervenção no domínio econômico –

CIDE, estabelecendo em seu § 1º que, do montante dos recursos

que cabe a Estado, vinte e cinco por cento serão destinados aos

Municípios, nas formas e condições estabelecidas em lei federal.

Portanto, para finalizar, a edição da MP nº 161/2004, veio a dar

aplicação efetiva aos dispositivos constitucionais, mas só em relação

aos Estados e o Distrito Federal. Ficam, agora, os Senhores

Prefeitos dos mais de 5.500 Municípios na expectativa da edição da

lei federal de que trata o § 1º da MP 161/2004.43

(grifo nosso)

3.7 LEI ORDINÁRIA N. 10.866 / 2004

Com a publicação da MP n. 161/2004, os Municípios ainda necessitavam da

edição de lei para que os recursos da CIDE dos Combustíveis lhe fossem

repassados.

Ratificando o histórico das inconstitucionalidades na evolução normativa da CIDE

dos Combustíveis, para suprir tal omissão e converter em lei a MP n. 161/2004,

em 04 de maio de 2004 foi criada a Lei n.º 10.866, que alterou a Lei n.º 10.336/01.

Em essência, esta nova lei, agora também amparada nas alterações da EC n. 42,

modifica a lei instituidora da CIDE dos Combustíveis criando o artigo 1º “A” e “B”.

43 TORRES, Jorge Chrisóstomo. Emenda Constitucional nº 42/2003: modificações na Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Jus Navigandi, 2004, p. 3. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4959>.

48

A primeira parte de seu texto ocupa-se com a inclusão do artigo 1º-A ao artigo 1º

da Lei n. 10.336/01, tratando do repasse de 25% dos recursos da CIDE aos

Estados e Distrito Federal.

Interessante verificarmos que os §§ 7º e 15º da lei em questão, trazem em seu

texto verdadeira “confissão” do desvirtuamento da finalidade interventiva no setor

de importação e comércio de combustíveis.

§ 7º Os Estados e o Distrito Federal deverão encaminhar ao

Ministério dos Transportes, até o último dia útil de outubro, proposta

de programa de trabalho para a utilização dos recursos

mencionados no caput deste artigo, a serem recebidos no exercício

subseqüente, contendo a descrição dos projetos de infra-estrutura

de transportes, os respectivos custos unitários e totais e os

cronogramas financeiros correlatos.

§ 15º Na definição dos programas de trabalho a serem realizados

com os recursos recebidos nos termos deste artigo, a União, por

intermédio dos Ministérios dos Transportes, das Cidades, e do

Planejamento, Orçamento e Gestão, os Estados e o Distrito Federal

atuarão de forma conjunta, visando a garantir a eficiente integração

dos respectivos sistemas de transportes, a compatibilização das

ações dos respectivos planos plurianuais e o alcance dos objetivos

previstos no art. 6º da Lei nº. 10.636, de 30 de dezembro de 2002.

Por tais dispositivos fica demasiadamente claro que há sérias

inconstitucionalidades praticadas em seqüência pelo Poder Constituinte Derivado

em nível constitucional e infraconstitucional, por força das EC’s n.ºs 33 e 42 e leis

posteriores.

Basicamente, todo o recurso da Contribuição Interventiva sobre os Combustíveis é

direcionada ao FNIT, de modo que este efetivará a intervenção unicamente no

departamento de transportes.

49

Mais uma vez se observa que a intervenção no domínio econômico ocorre em

setor diverso do qual foi cobrado o tributo e, sequer tal atuação pública é feita pela

União Federal, mas sim pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.

3.8 EMENDA CONSTITUCIONAL N. 44 / 2004

Mantendo coerência com a finalidade desvirtuada conferida à CIDE dos

Combustíveis, foi incorporada à nossa Constituição Federal nova alteração ao

artigo 177, inciso III, que previa o repasse pela União Federal de 25% (vinte e

cinco por cento) dos recursos aos Estados e Distrito Federal.

A Emenda Constitucional n. 44, de 30 de junho de 2004, majorou o percentual de

25% para 29%, a ser destinado aos Estados e DF.

Com isto, fica clara a função fiscal dada a esta CIDE, não mais sendo um

instrumento de intervenção estatal no domínio econômico, propriamente, no setor

de importação e comercialização de combustíveis; mas sim, do mesmo modo que

na CPMF, este tributo foi inconstitucionalmente transfigurado, perdendo sua

essência e função extrafiscal, virando mais uma simples – e diga-se grande –

fonte de recursos financeiros.

50

2ª PARTE – Constituição e Delineamento da CIDE dos Combustíveis

4 CLASSIFICAÇÃO TRIBUTÁRIA

Os estudiosos do Direito Tributário têm despendido grande esforço no intuito de se estabelecer uma apropriada classificação tributária; classificação esta, que refletirá diretamente nas espécies tributárias autônomas existentes em nosso Sistema Tributário.

Existe um grande número de classificações tributárias, que são identificadas pelo número de espécies que afirmam existir.

Não é objetivo deste trabalho tratar profundamente de tais classificações. Contudo, tendo em vista a estreita relação com a matéria aqui em analise, no tocante ao exame da constitucionalidade da CIDE dos Combustíveis, entende-se que a destinação específica do produto da arrecadação desta exação está diretamente relacionada à própria instituição deste tributo. E, como partimos deste critério de classificação – destinação específica – afirmando sua validade, torna-se imperiosa a abordagem do tema, de forma a reconhecer a existência autônoma das Contribuições Genéricas, as quais a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico faz parte.

Reconhecendo o critério da destinação específica guardamos lógica em se questionar inconstitucionalidade de tributo por sua inobservância.

Diversas têm sido as formas de classificação dos tributos e as espécies tributárias identificadas. As classificações mais tradicionais, reconhecendo apenas a pertinência na utilização do critério da vinculação, classificam os tributos em vinculados e não-vinculados. Destas, a corrente clássica é a chamada Tripartite, em que existem apenas três espécies de tributos, sendo os impostos tributos não-vinculados, e as taxas e contribuições de melhoria tributos vinculados.

A explicação para a utilização somente do critério da vinculação baseia-se no não reconhecimento dos demais, em virtude da própria definição – diga-se tradicional definição de Direito Tributário – como sendo um conjunto de normas de regulam a arrecadação dos tributos.

Clássico em seu pensamento sobre o assunto, Becker afirmou que “uma vez efetuada a prestação, a relação jurídica tributária se extingue. O que acontece

51

depois com o bem que dava consistência material ao tributo, acontece em momento posterior e em outra relação jurídica [...].” 44

Nas palavras de Aliomar Baleeiro 45:

O Direito Financeiro é compreensivo do conjunto das normas sobre todas as instituições financeiras – receitas, despesas, orçamento, crédito e processo fiscal – ao passo que o Direito Fiscal, sinônimo de Direito Tributário, aplica-se contemporaneamente e a despeito de qualquer contra-indicação etimológica, ao campo restrito das receitas de caráter compulsório. [...]

O Direito Fiscal é o sub-ramo do Direito Financeiro que apresenta maior desenvolvimento doutrinário e maior riqueza de diplomas no direito positivo dos vários países.

Paulo de Barros Carvalho conceitua e delimita o campo de abrangência e estudo do Direito Tributário como um “ramo didaticamente autônomo do direito, integrado pelo conjunto das proposições jurídico-normativas que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”46.

Empregando mesmo sentido, Celso Ribeiro Bastos define Direito Tributário como “conjunto de normas e princípios enucleados pelo conceito de tributo [...] que lhe permitem arrecadar recursos financeiros de forma impositiva e coercitiva [...]”.47

Observamos que os doutrinadores mencionados, assim como muitos outros, entendem que o Direito Tributário atém-se ao momento da arrecadação do tributo, sendo irrelevante para este ramo do Direito qualquer situação que ocorra em momento posterior a este.

Logo, para onde se irá destinar os recursos arrecadados (critério da Destinação Específica) ou até mesmo sua restituição (critério da Restituição) tornam-se desprezíveis para a conceituação de Direito Tributário, podendo somente ser feita a análise de sua vinculação (critério da Vinculação).

Graficamente, podemos representar tal conceito da seguinte forma:

44 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1963, pp. 260-261. 45 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 5. 46 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 11. 47 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 95.

52

Figura 1 – Extensão do Direito Tributário e Financeiro Fonte: Pesquisa elaborada pelo próprio autor.

Assim, segundo tal corrente, o critério da Vinculação por estar adstrito ao momento de arrecadação dos tributos, estará contemplado no conceito e estudo do Direito Tributário, não podendo ser utilizados os critérios da destinação específica e da restituição, por questão de coerência. Logo, conforme referido anteriormente, com base exclusivamente neste critério de classificação, podemos afirmar que no Direito Tributário existem apenas três espécies de tributos: impostos, taxas e contribuições de melhoria, a teor do art. 145 da CF88.

Há, entretanto, correntes doutrinárias em sentido oposto48. Seus participantes sustentam que os critérios da Destinação Específica e da Restituição devem ser considerados para que se estabeleça a classificação dos tributos, em harmonia com toda a Constituição Federal, e não a consideração exclusiva do art. 145.

Analisamos que, em regra, o Direito Tributário está adstrito ao momento da arrecadação dos tributos, sendo irrelevante para seu conceito e estudo o que o Poder Público irá fazer com os valores arrecadados, objeto de estudo do Direito Financeiro.

Porém, temos que considerar que o Direito somente foi fracionado em ramos para fins meramente didáticos, permanecendo íntegro e uno; decorrência do princípio

48 Podemos citar José Eduardo Soares de Melo, Márcio Severo Marques, Tácio Lacerda, Fabiana Del Padre, Ricardo Lobo Torres e até mesmo Hugo de Brito Machado que, em seu livro Curso de Direito Tributário, apesar de não reconhecer explicitamente os critérios da destinação e restituição, afirma terem as contribuições sociais ou genéricas e o empréstimo compulsório indiscutível natureza jurídica tributária, não os enquadrando em sua classificação dos impostos, taxas e contribuições de melhoria.

53

da unicidade do Direito. Paulo de Barros Carvalho em breve consideração sobre fato, alega:

Com efeito, a ordenação jurídica é una e indecomponível. Seus elementos se acham irremediavelmente entrelaçados pelos vínculos de hierarquia e pelas relações de coordenação, de tal modo que tentar conhecer regras jurídicas isoladas, como se prescindissem da totalidade do conjunto, seria ignora-lo, enquanto sistema de proposições prescritivas. Uma coisa é certa: qualquer definição que se pretenda há de respeitar o princípio da unidade sistemática [...].49

Não basta, a nosso ver, a aceitação de que o Direito é uno e seu fracionamento em ramos se dá por razões meramente didáticas. Temos que compreender que seu fracionamento didático, ainda que tente revelar uma cisão do Direito Tributário com as demais áreas e ramos do Direito, com elas guarda relação e interdependência, o que não afeta sua definição como ramo autônomo.

Com estas considerações ousamos afirmar que mesmo sendo um ramo autônomo, sempre será interdependente e, assim, não há que se conceber, mesmo que doutrinariamente, um estudo do Direito Tributário rígido, com fronteiras precisas, “engessado”. Portanto, o alcance do Direito Tributário, em regra, fica limitado ao momento da arrecadação dos tributos, porém, excepcionalmente, poderá ir além e analisar a destinação específica e a restituição dos tributos, ocasião em que somente tal procedimento será considerado se tais momentos influenciarem diretamente na própria instituição da exação, tornando-a indevida.

Sustentamos que em virtude de expresso mandamento constitucional, previsto no artigo 148 e 149 da Constituição Federal de 1988, somente poderá ser instituído empréstimo compulsório “para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, guerra externa ou sua iminência, ou no caso de investimento público de caráter urgente e relevante interesse nacional” e instituída contribuição interventiva “como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas”.

Ainda quanto ao Empréstimo Compulsório, o legislador foi claro e objetivo ao dispor no parágrafo único, do art. 148, da CF88, que “a aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição”.

Assim é que, conclui-se objetivamente que o legislador constitucional somente autorizou a União Federal instituir tais tributos, se atendidos os fundamentos de sua instituição, quais sejam, a destinação específica e, no caso do empréstimo compulsório, sua restituição, sem os quais a própria instituição do tributo se afasta

49 CARVALHO, 1997, p. 34.

54

da permissão constitucional, sendo instituída à revelia do que a Constituição autoriza, tornando-se em sua origem (instituição), inconstitucional.

Essa é a exceção ao alcance do Direito Tributário que, nestes casos, em virtude de uma violação constitucional à destinação específica do produto da arrecadação e da restituição, a própria origem – instituição – destes tributos se torna indevida e, nesse aspecto, em se tratando de instituição indevida de tributo, é pacífico o entendimento de estarmos dentro do campo de estudo do Direito Tributário.

Para que fique mais claro, poderíamos nos valer de singelo exemplo no qual um sujeito “A” pede emprestado dinheiro a um sujeito “B”, sobre o motivo de estar devendo a agiotas. “B” somente lhe empresta, condicionando que tal valor seja de fato destinado ao pagamento da dívida. Entretanto, “A”, é viciado em jogo e faz aposta com o dinheiro vindo a perder tudo; sendo que retorna a “B” pedindo novo empréstimo. Ciente do ocorrido, este afirma que “A” não cumpriu a condição imposta à validade do primeiro empréstimo, qual seja, o pagamento da dívida com os agiotas e, neste sentido, não só não concede novo empréstimo como também exige a devolução da quantia já entregue, alegando que se soubesse que tal valor fosse aplicado em jogo jamais teria emprestado.

Analogamente, assim também ocorre na esfera tributária, quando o povo, por intermédio do poder constituinte originário – “B” – estabelece que somente possa ser instituído tributo para atender determinadas finalidades, v.g. intervenção em setor específico (art. 149, CF88) e investimento público urgente e relevante (art. 148, II, da CF88), e o Poder Público – “A” – passa a instituir tributo e exigi-lo aplicando os recursos gerados sem cumprir a exigência constitucional, o que torna a autorização de sua instituição descabida e inconstitucional, gerando direito ao sujeito passivo de exigir que o Fisco devolva os valores já arrecadados.

Sabemos que a carga tributária é extremamente elevada e o Poder Público, como um “viciado em jogo”, aplica mal os recursos gerados e sempre está a instituir novos tributos à revelia do estrito permissivo constitucional, para suprir seu eterno e crescente déficit orçamentário.

Assim, compreendemos que não há uma linha retilínea na delimitação dos ramos do direito, como a visão tradicional afirma em se tratando do Direito Tributário, que sempre progredirá até o momento da arrecadação dos tributos, nunca além. Como visto, temos que tais limites não são absolutos, havendo exceções que implicam em determinadas situações reconhecermos que o Direito Tributário vai mais além, invadindo temporariamente o campo de atuação do Direito Financeiro, vezes do Direito Administrativo, v.g. a divergência sobre lançamento como ato ou procedimento administrativo, entre outros, e reciprocamente. Tudo isso, ratificamos, em decorrência do princípio da unicidade do Direito.

Frente tais considerações, podemos representar graficamente o Direito, exemplificando alguns de seus ramos, em suas relações de interdependência da seguinte forma:

55

Figura 2 – Ciência do Direito ramificada didaticamente Fonte: Pesquisa elaborada pelo próprio autor.

Resistente à teoria clássica dos tributos e seu único critério classificatório quanto à vinculação, José Eduardo Soares de Melo analisa o tema se questionando: “Será que essa diretriz representa uma verdade científica e um dogma? Será que esse posicionamento jurídico não passa de um preconceito passível de desmistificação, uma vez que o próprio texto constitucional indica direção própria?50

Para Hugo de Brito Machado, o Direito Tributário guarda estreita relação com o Direito Financeiro posto que, juntos, regulam a dinâmica das receitas do Estado.

A atividade financeira do Estado é regulada pelo Direito Financeiro. Essa atividade inclui a tributação, que em virtude de sua importância emprestou destaque às regras jurídicas que a disciplinam, surgindo um novo ramo do Direito, o Tributário, que se destacou do Financeiro.

[...]

A Ciência das Finanças Públicas está para o Direito Tributário tal como a Ciência da Administração está para o Direito Administrativo; a Ciência Econômica, ou Economia, está para o Direito Econômico; a Criminologia está para o Direito Penal, e assim por diante.51

E mais além, ao tratar de tributos, assevera: 50 MELO, 2003, p. 31. 51 MACHADO, 2004, p. 66-67.

56

Embora se trate de matéria própria da Ciência das Finanças, não se pode deixar de fazer referência à função dos tributos. O objetivo do tributo sempre foi o de carrear recursos financeiros para o Estado. No mundo moderno, todavia, o tributo é largamente utilizado com o objetivo de interferir na economia privada, estimulando atividades, setores econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens e produzindo, finalmente, os efeitos mais diversos na economia.52

Neste mesmo sentido, atribuindo relevância à utilização dos critérios da destinação específica e restituição, aliados ao critério da vinculação, José Eduardo Soares de Melo tece suas razões guardando a relevância na utilização do critério da vinculação, sem contudo, desprezar a destinação específica e a restituição.

Não discordo da diretriz de que os tributos são vinculados (consistem numa atuação estatal ou repercussão desta) ou não-vinculados (consistentes num fato qualquer que não uma atuação estatal), preconizadas por Geraldo Ataliba. [...]

Penso, todavia, que existem distintas características nas “contribuições sociais, corporativas, econômicas” e nos “empréstimos compulsórios”, que impõe, tratamento específico.

Realmente, ao dispor sobre “empréstimo compulsório”, o art. 148 da CF deixa nitidamente implícito ser indispensável que na lei federal instituidora haja expressa previsão das características do “empréstimo forçado” (prazo, forma de reembolso e remuneração).53

Outros doutrinadores aderem a esta nova corrente, incluindo-se Tácio Lacerda Gama54 e Fabiana Del Padre Tomé55, os quais reconhecem a relevância de se utilizar os critérios da destinação específica e da restituição na classificação dos tributos, o que levará ao resultado das cinco espécies tributárias a serem identificadas: imposto, taxa, contribuição de melhoria, contribuições genéricas e empréstimo compulsório.

Reitera-se que não criticamos o resultado encontrado pela tradicional classificação tripartite (impostos, taxas e contribuições de melhoria – art. 145 da CF88), que

52 MACHADO, 2004, p. 79. 53 MELO, 2003, p. 42. 54 GAMA, Tácio Lacerda. Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 109. 55 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Contribuições para a Seguridade Social: à luz da Constituição Federal. Curitiba, Juruá, 2004, p. 76.

57

utiliza apenas o critério da vinculação. Afinal, guarda coerência o critério utilizado com o resultado encontrado, qual seja, as três espécies supracitadas.

O que se propõe é a não exclusão dos demais critérios de classificação que, uma vez utilizados, guardando a mesma coerência, produzirão o resultado das cinco espécies tributárias antes mencionadas.

Representando utilização dos critérios de classificação para a identificação das espécies tributárias, Márcio Severo Marques56 propôs o seguinte quadro:

Tributos

Identificados

1º Critério

Exigência constitucional de previsão legal de vinculação entre a materialidade do antecedente normativo e uma atividade estatal referida ao contribuinte

2º Critério

exigência constitucional de previsão legal de destinação específica para o produto da arrecadação

3º Critério

Exigência constitucional de previsão legal de restituição do montante arrecadado ao contribuinte, ao cabo de determinado período

Impostos Não Não Não

Taxas Sim Sim Não

Contribuições de Melhoria

Sim Não Não

Contribuições Não Sim Não

Empréstimo Compulsório

Não Sim Sim

Quadro 1 – Critérios de classificação tributária

TOMÉ, Fabiana Del Padre. Contribuições Sociais para a Seguridade Social, p. 92.

Ressalvamos, entretanto, nossa divergência de opinião quanto a destinação específica existente nas taxas, conforme o pensamento do referido autor. É pacífico e está representado literalmente no texto do artigo 77 do Código Tributário Nacional, que este tributo decorre do exercício do poder de polícia ou da

56 MARQUES, Márcio Severo. Classificação Constitucional dos Tributos. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 115.

58

prestação de serviço público específico e divisível. Assim, a prestação do serviço público é que deverá ser específica e não a aplicação dos recursos gerados, que detém caráter meramente remuneratório, como muito bem sustenta Aurélio Pitanga Seixas Filho57; não há previsão legal de destinação específica do produto da arrecadação no que concerne às taxas, sendo sua cobrança meramente remuneratória.

A taxa, apesar de ter como causa (fato gerador) uma atividade estatal compulsória (exercício de poder de polícia), pelo fato de ser remuneratória, ou contraprestacional, não seria um dever jurídico tributário, não se enquadrando, por natureza, no sistema tributário, que ficaria restrito a estudar o imposto, como já foi defendido por inúmeros tributaristas.

Portanto, o fato da receita das taxas ficar afetada ou vinculada ao serviço público que lhe deu causa, não justificaria a sua classificação entre as contribuições parafiscais que se limitaria aos impostos com destinação especial.58

Feitas estas considerações, podemos extrair do quadro exposto que, se utilizado apenas o critério da vinculação, necessariamente deverão ser identificados apenas três espécies tributárias: impostos, taxas e contribuições de melhoria. Aliando-se o critério da destinação ao da vinculação, surge além das três espécies já encontradas, também as Contribuições Genéricas. E, por fim, somando-se aos dois critérios já em uso o da restituição, identificaremos os Empréstimos Compulsórios.

Não nos cabe aprofundar mais no tema que, como visto, é vasto e bem controverso. Estabelecemos como premissa ao questionamento da CIDE dos Combustíveis e, frente a expressa exigência constitucional, o império de sua destinação específica ao setor que recaiu a imposição tributária– quem praticou o fato gerador ou responsável – existindo esta espécie autônoma de tributo frente a necessidade de utilização em conjunto dos critérios da vinculação, destinação e restituição, inovando e afastando-nos da tradicional classificação tripartite dos tributos.

Utilizando as palavras de José Eduardo Soares de Melo que, com grande propriedade se adeqüam à situação: 57 O professor Aurélio Pitanga, em seu artigo “Contribuições e vinculação de sua receita”, visualizando o caráter remuneratório de algumas cobranças feitas pelo Fisco, defende uma classificação dos tributos quanto ao critério da remuneração; logo, tributo seria a cobrança não-remuneratória: imposto, tendo ainda as cobranças remuneratórias: taxa e contribuição de melhoria, fora do sistema tributário. Guardando a devida importância para a classificação, que merece análise particular em momento oportuno, registramos a eloqüência e propriedade com que o doutrinador discerne a natureza específica da prestação do serviço público e a aplicação de seus recursos de forma não específica, por seu caráter meramente remuneratório. 58 SEIXAS FILHO, 2004, p. 41.

59

A ousadia de minha parte em qualificar o destino como elemento considerável na caracterização integral do tributo é justificada pelo objetivo de sempre questionar e repensar velhos e tradicionais conceitos, pois na escola de Geraldo Ataliba “não é possível construir uma ciência operante e útil do direito tributário se não dissiparmos os preconceitos”.

E, nesse passo, não se deve esquecer os ensinamentos de que, salvo para fins didáticos, o direito tributário não constitui ramo autônomo, porque não possui institutos jurídicos próprios.

[...]

Portanto, se há dificuldade em definir os contornos, os limites, enfim, um âmbito próprio do “direito tributário”, não seria desarrazoado conceber certas situações como peculiares às espécies tributárias. Melhor esclarecendo, é o caso da previsão do destino dos valores tributário, sua afetação à Administração Fazendária (ou Seguridade Social), como medida apta (ou não) para configurar uma determinada espécie tributária.59

Temos como necessária tal inovação, como resultado em essência da discussão científica sobre a Ciência do Direito, buscando sempre novas óticas sobre os postulados considerados tradicionais e/ou incontroversos; ato este de inconformismo, característico de nossa condição humana.

4.1. ESPÉCIES TRIBUTÁRIA

Como exposto em capítulo anterior, consideramos os três critérios de classificação dos tributos (vinculação, destinação específica e restituição) que nos fornecem cinco espécies tributárias, quais sejam: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, as contribuições sociais ou genéricas e os empréstimos compulsórios.

Iremos nos ater às contribuições sociais ou genéricas, tecendo breves comentários acerca das demais.

59 MELO, 2003, pp. 33-34.

60

4.1.1. Imposto

O imposto é a principal espécie tributária, e consiste na forma mais comum de cobrança tributária por parte do Fisco.

Com um grande número de impostos existentes, tal exação decorre de uma cobrança desvinculada do Estado, não havendo qualquer contraprestação pública direta a ser devida em face da arrecadação de sua receita.

Da mesma forma, ao contrário da previsão expressa contida no artigo 149 da CF88 em relação às contribuições, quanto ao imposto, previsto no inciso I, do artigo 145 da CF88, não há qualquer menção nesse sentido devendo ser feita uma interpretação restritiva do texto constitucional em sintonia com os preceitos do Código Tributário Nacional; logo, torna-se inquestionável que esta espécie tributária não pode deter destinação específica do produto de sua arrecadação, devendo sua receita integrar o orçamento público e respeitar suas diretrizes, alheio ao fato jurídico tributário que o gerou.

Fazemos ainda a ressalva em relação a não restituição da receita dos impostos, ao contrário do que ocorre com os empréstimos compulsórios. Portanto, a dinâmica dos impostos está exclusivamente relacionada ao fato jurídico tributário que o gerou.

4.1.2. Taxas

Espécie tributária em largo uso, principalmente pelas municipalidades, tem seu fundamento no artigo 145, II e parágrafo único, da CF88, e nos artigos 77 e 79 do CTN.

Decorre da prestação de serviços públicos específicos (uti singuli) e divisíveis utilizados de forma efetiva ou potencial e do exercício do poder de polícia. Frisamos, para que não se confunda, cobrança de taxa com as cobranças decorrentes de prestação de serviços públicos por preço público ou tarifa, tem-se que na primeira há solução de compulsoriedade na utilização do referido serviço, o que não ocorre com as tarifas ou preço público.

61

Como já abordado em tópicos anteriores, discordamos de Márcio Severo Marques ao afirmar que as taxas detêm destinação específica. Sustentamos a teoria de que não há destinação específica do produto de sua arrecadação, mas meramente quanto ao serviço público que lhe gerou a incidência, que deve ser específico.

Em relação a sua classificação quanto à vinculação, incluímo-na como espécie vinculada a uma contraprestação do Estado, qual seja, a prestação do serviço público nos termos dos artigos 77 do CTN ou do exercício do poder de polícia, sem os quais, não há fundamento para a exigência do tributo.

Concluímos que esta espécie de exação da mesma forma, não detém como característica a restituição posterior dos valores arrecadados.

4.1.3. Contribuições de Melhoria

Previstas no artigo 145, inciso II, da Constituição Federal de 1988, este tributo está vinculado à prestação de um serviço público, obra pública, que dê origem a uma valorização imobiliária no imóvel do sujeito passivo.

Tem como limite geral o valor da despesa pública efetuada pelo Poder Público e, como limite individual, o acréscimo patrimonial valorativo no imóvel.

4.1.4. Contribuições Sociais ou Genéricas

Tratadas por alguns autores como Contribuições Sociais60, por outros como Contribuições Especiais61, Contribuições Parafiscais62, meramente Contribuições63 60 Kiyoshi Harada, em seu livro Direito Financeiro e Tributário e José Eduardo Soares de Melo, em sua obra Contribuições Sociais no Sistema Tributário. 61 Aliomar Baleeiro, no livro Direito Tributário Brasileiro; Paulo Roberto Lyrio Pimenta, em seu livro Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico; Tácio Lacerda Gama, no livro Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico; e, Ricardo Lobo Torres, no livro Curso de Direito Financeiro e Tributário. 62 Zelmo Denari, na obra Curso de Direito Tributário. 63 Luciano Amaro, no livro Direito Tributário Brasileiro, e Fabiana Del Padre Tomé, na obra Contribuições para a Seguridade Social.

62

ou, até mesmo, Impostos com Destinação Específica64, preferimos chama-las de Contribuições Genéricas.

Adotamos tal nomenclatura por nos parecer mais apropriada visto que, conforme as premissas que adotamos, as contribuições de melhoria consistem espécie distinta de tributo, não se confundindo com estas. Por sua vez, Contribuições Sociais são subespécies da espécie Contribuições – Genéricas – de modo que nem todas estas têm como fim imediato a aplicação de seus recursos voltado à fins sociais, v.g. as contribuições interventivas cujo fim imediato é intervenção no domínio econômico.

No mesmo sentido, não nos parece que as demais contribuições previstas no art. 149 da CF88, detenham caráter de especialidade meramente por terem destinação específica, por disposição literal do texto constitucional. Isto equivocadamente poderia nos conduzir ao raciocínio questionador – e lógico – de que sendo as contribuições de melhoria única espécie de contribuição que discerne das demais, ser então ela a especial, e não as demais. Também não nos parece ser a melhor nomenclatura chamar-lhes de parafiscais, posto que nem todas gozam sempre de função parafiscal, com v.g. as de intervenção no domínio econômico. Quanto à interessante posição do professor Aurélio Pitanga, somos levados a discordar unicamente em razão de nossa predileção e adoção do critério da Destinação Específica na classificação dos tributos, que afasta a cobrança das ditas contribuições do conceito de imposto, tão só.

De qualquer forma, o nome dado às espécies não adquire maior relevância que seu conteúdo e sua análise científica, sendo certo que, havendo coerência neste, as iniciais divergências naquele se tornam superáveis.

Independentemente do emprego da palavra em seu sentido técnico ou vulgar, o que nos resta, objetivamente como cientistas do Direito é analisar a norma posta.65

Imperioso ressaltar que é justamente a destinação específica que separa as contribuições genéricas dos impostos, de forma que, quanto aos demais aspectos, estas cobranças – imposto e contribuição – detém as mesmas características (não vinculação e não restituição), o que as difere das taxas e contribuições de melhoria.

Assim é que, coerentemente, observa-se que, uma vez abandonados os critérios da destinação e da restituição, as contribuições genéricas – e até mesmo os empréstimos compulsórios – serão classificados como impostos, com base unicamente no critério da vinculação.

64 Aurélio Pitanga Seixas Filho, em artigo Contribuições e Vinculação de sua receita. 65 HOFFMAN, Susy Gomes. Contribuições no sistema constitucional tributário. Campinas: Copola, 1996, p. 48.

63

Conclui-se objetivamente que é justamente a destinação específica das Contribuições Genéricas que traça seu perfil peculiar frente as demais espécies tributárias.

4.1.5. Empréstimo Compulsório

Espécie tributária também de autonomia classificatória muito controversa. Muitos autores não reconhecendo sua particularidade pela restituição do produto da arrecadação, no estudo do direito tributário, lhe retiram tal característica e a incluem no rol dos impostos, ou até mesmo taxas, como Paulo de Barros Carvalho.

Tem fundamento constitucional no artigo 148 da CF88, que prevê duas hipóteses para sua instituição, quais sejam: (I) para atender despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, guerra externa ou sua iminência ou (II) investimento público urgente e de relevante interesse nacional.

O produto arrecadado de sua instituição deve ser necessariamente destinado ao fundamento constitucional que lhe autorizou a cobrança; possui, assim, inquestionável destinação específica.

O próprio legislador constitucional originário deixou claro este posicionamento ao dispor no parágrafo único do artigo 148 da CF88 que “a aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição”.

Findo o prazo estabelecido em Lei Complementar que originou sua instituição, deverá o valor arrecadado ser integralmente restituído aos contribuintes, visto que, como o próprio nome aponta, trata-se de mero empréstimo; compulsório, mas ainda assim, um empréstimo.

64

5 NATUREZA JURÍDICA

O artigo 4º do Código Tributário Nacional dispõe em seu caput que é relevante para se determinar a natureza jurídica de um tributo, a análise de seu fato gerador. Ainda no mesmo dispositivo, em seus incisos I e II, o CTN determina que são irrelevantes para se determinar a natureza jurídica o nome dado à cobrança e sua destinação específica.

Com base neste dispositivo a doutrina tem se debruçado no tema e divergido em demasia, a nosso ver, sem muito sentido. Parece-nos que alguns doutrinadores equivocam-se em seus métodos interpretativos e confundem os fundamentos do Direito Tributário, levando-os a conclusões impertinentes.

Alguns estudiosos do Direito Tributário afirmam que o artigo 4º do CTN dá fundamento ao não reconhecimento das contribuições genéricas e empréstimos compulsórios como espécies autônomas de tributos, que apesar de serem tratados de forma diferenciada nos artigos 148 e 149, em relação ao artigo 145, todos da CF88, seu conceito seria enquadrado em uma das espécies de tributos lá previstos: imposto, taxa e contribuição de melhoria, o que nos parece improvável.

José Eduardo Soares de Melo questiona o assunto ao abordar:

Nesse passo, é de se indagar a razão de a Constituição Federal de 1988 ter disciplinado as contribuições de forma diferenciada; as sociais genéricas, as interventivas e as corporativas no art. 149 [...]; e as sociais previdenciárias no art. 195 [...].

Trata-se de categorias diversificadas, sujeitas a regime jurídico e princípios de natureza diversa?

Essa distinção foi captada por Mizabel Derzi ao precisar que estas contribuições (as do art. 195) estão “submetidas a um regime constitucional próprio, peculiar e diferenciado das demais contribuições sociais, ou de intervenção no domínio econômico, ou ainda, corporativas”.

[...]

As contribuições sociais, especializadas pelo custeio da Seguridade Social, escapam ao clássico princípio da anterioridade da lei tributária ao exercício da cobrança (art. 195, §6º) e não podem integrar o orçamento fiscal da União, sujeitando-se a uma “parafiscalidade necessária”, razão pela qual não lhes é aplicável o art. 7º do CTN. O regime constitucional peculiar que lhes foi

65

imposto está integrado pelos arts. 149, 165, §5º, III, 167, VIII, 194 e 195 da CF. 66

(grifo nosso)

Paulo Roberto Lyrio Pimenta segue as mesmas bases de pensamento do já citado autor, quando sustenta que as contribuições genéricas teriam natureza jurídica distinta; assim, cada espécie tributária teria uma natureza jurídica própria, distinta das demais. A nosso ver, paira a confusão em se determinar o conceito e fim da natureza jurídica. Para estes autores, é através de uma natureza jurídica distinta dos tributos que identificamos as espécies tributárias, o que não nos parece de acordo.

Em verdade, porém, a natureza jurídica de determinada figura jurídica não pode ser identificada pelo seu regime jurídico, que é o conjunto de normas e princípios que regem determinada categoria do direito positivo, mas não é da essência da figura. [...].

Claro está, portanto, que as contribuições mencionadas no art. 149 da Constituição Federal se enquadram perfeitamente no conceito jurídico-positivo de tributo, sendo inquestionável, pois, a sua natureza tributária,

Fixada essa premissa, importa caracterizar essa espécie tributária, identificando-a ou não, com os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria.67

Kiyoshi Harada68 mantém posicionamento diverso. Sustenta que o artigo 4º, inciso II, do CTN estaria derrogado pelo advento da Constituição Federal de 1988, posto que afirma estar pacificado na doutrina e jurisprudência a natureza jurídica tributária da contribuição social, estando o produto de sua arrecadação vinculado especificamente ao motivo de sua instituição.

Estes não nos parecem ser os melhores entendimentos.

É a natureza jurídica que determina o regime jurídico aplicável, não podendo ser ela utilizada para buscar construir e agregar a aplicação de normas e princípios porventura peculiares a certos tributos, aptos a formar um novo regime jurídico.

Confundem-se aqueles que buscam adequar o artigo 4º do Código Tributário Nacional às espécies tributárias, como se cada tributo detivesse natureza jurídica distinta e, o que é pior, tal premissa levaria à conclusão equivocada de que cada tributo detém regime jurídico distinto um do outro. 66 MELO, 2003, pp. 81-82. 67 PIMENTA, 2002, pp. 13-16. 68 HARADA, 2003, p. 312.

66

A interpretação pertinente que se deve estabelecer quanto ao artigo 4º do CTN, é a de que a natureza jurídica determina o regime jurídico aplicável, ou seja, o regime jurídico será tributário ou não-tributário.

Segundo Américo Lacombe69:

“tudo aquilo que está sujeito ao regime jurídico tributário é tributo. Se vamos classificar as instituições pelo regime jurídico, e isto é correto, natureza de qualquer instituição é definida pelo regime jurídico ao qual eles estão submetidos e, evidentemente, essas contribuições têm natureza jurídica de tributo.”

Com grande precisão e objetividade Hugo de Brito Machado afirmou a relação de interdependência e conectividade entre a natureza jurídica de uma figura jurídica e seu respectivo regime jurídico: “a identificação da natureza jurídica de algo só tem sentido prático porque define o seu regime jurídico , vale dizer, define quais são as normas jurídicas àquilo aplicáveis”70.

Em Direito Tributário só há um regime jurídico: o regime jurídico tributário; consequentemente, só há uma análise da natureza jurídica aplicável às cobranças do Fisco: ou esta é tributária ou não.

Se for tributária, da cobrança decorre um tributo, caso contrário, não.

Conforme os ensinamentos de Becker determina-se a natureza jurídica pela análise do binômio hipótese de incidência e base de cálculo; obviamente, ao fazermos isto, estamos a analisar o próprio fato gerador, conforme previsão do artigo 4º do CTN.

Quando um tributo está posto em lei, tecnicamente correta, a base de cálculo determina o retorno ao fato descrito na hipótese de incidência. Portanto, o fato medido na base de cálculo deverá ser o mesmo posto na hipótese.71

O que nos parece é que há na doutrina divergência para uns quanto ao que vem a ser regime jurídico tributário, confundindo as normas e princípios do ramo do Direito Tributário, com normas de aplicação exclusiva a determinados tributos.

69 LACOMBE, apud TOMÉ, 2002, p. 87. 70 MACHADO, Hugo de Brito. Contribuições Sociais., in: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo: Resenha Tributária, v.17, 1992 , p. 91. 71 BALEEIRO, 2003, p. 65.

67

O conceito jurídico de regime jurídico tributário, conforme Maria Helena Diniz72, é o “conjunto de normas e princípios disciplinadores de competência tributária da instituição, arrecadação, cobrança e fiscalização dos tributos, do lançamento, das relações fático-econômicas delineadoras da capacidade contributiva, dos fins fiscais e extrafiscais da imposição, da execução fiscal etc.”

Portanto, temos como perfeitamente vigente o artigo 4º do CTN que, conforme determina, para identificarmos a natureza jurídica é irrelevante a nomenclatura da cobrança ou mesmo sua destinação específica.

É evidente que é irrelevante o nomem iuris e a destinação específica do produto da arrecadação para tal fim, visto que, como o caput do dispositivo supracitado prevê, devemos ter como elemento de análise o fato gerador, ou melhor dizendo, sua hipótese e base de cálculo, como afirmou Becker.

Entretanto, entendemos que apenas a análise do artigo 4º do CTN não é suficiente para que certa cobrança seja enquadrada no regime jurídico tributário, mas sim, sua interpretação cominada com a do artigo 3º, que traz a própria definição de tributo, posto que tal cobrança deverá atender a todos requisitos previstos neste último dispositivo.

Neste mesmo sentido Sacha Calmon Navarro Coelho tece suas considerações:

O que caracteriza o tributo é a sua essência jurídica. Por isso mesmo o CTN, no art. 4º, dispõe que: “a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II – a destinação legal do produto de sua arrecadação.”

Por outro lado, a essência jurídica do tributo é ser prestação pecuniária compulsória em favor do Estado ou de pessoa por este indicada (parafiscalidade) que não constitua sanção de ato ilícito (não seja multa) instituída em lei (não decorre de contrato). [...]

Sendo tal, a prestação pecuniária será tributo e estará, no Brasil, sob a disciplina dos princípios jurídico-tributários insertos na Constituição e nas leis de normas complementares. 73

Ao tratar das “Sobretarifas” do Fundo Nacional de Telecomunicações, Paulo de Barros Carvalho74 argumentou:

72 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998, 4º vol., p. 95. 73 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988 – Sistema Tributário. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 14. 74 CARVALHO, apud GAMA, Tácio Lacerda. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: Quartier Latin, 2003, p. 126.

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[...] aquela entidade que vier a preencher os requisitos estipulados no art. 3º do CTN será, juridicamente, um tributo, a despeito do destino que for atribuído, por lei, aos valores arrecadados. [...] quando nuamente exposta no seu esquematismo formal, apresenta-se como autêntico e verdadeiro tributo e ao seu regime jurídico-constitucional devem estar sotopostos.

Poderiam então, os estudiosos do Direito questionarem: qual a finalidade de análise da destinação específica?

Responderíamos que sua relevância não se assenta na determinação da natureza jurídica de cobrança (contribuição genérica), de modo que tal natureza só determina o regime jurídico aplicável. Reiteramos que a natureza jurídica será estabelecida pela análise do fato gerador – obliquamente, a hipótese de incidência e a base de cálculo – conforme artigo 4º do CTN e seu enquadramento ao conceito de tributo presente no artigo 3º do mesmo diploma legal, caso em que seria tributária, por pertencer ao regime jurídico tributário.

A relevância no estudo da destinação específica do tributo está em sua classificação, que nada interfere em sua natureza ou regime jurídico. Como já visto anteriormente, é exclusivamente o reconhecimento do critério da Destinação Específica na classificação dos tributos que afasta a cobrança das contribuições genéricas do conceito de imposto, assegurando-lhes autonomia classificatória.

Luciano Amaro, abordando o tema da destinação específica, acrescenta: “a destinação, quando valorizada pela norma constitucional, como nota integrante do desenho de certa figura tributária, representa critério hábil para distinguir essa figura de outras, cujo perfil não apresente semelhante especificidade.”75

Neste sentido, grande parte dos doutrinadores já reconhecem a natureza jurídica tributária das contribuições genéricas, com Hugo de Brito Machado76 Aliomar Baleeiro77 e Misabel Machado Abreu Derzi, Suzi Gomes Hoffmann78, Paulo Roberto Lyrio Pimenta79, Kiyoshi Harada80, José Eduardo Soares de Melo81, entre muitos outros.

Concluímos que as contribuições genéricas, mormente as de Intervenção no Domínio Econômico detém natureza jurídica tributária e guardam a destinação do produto de sua arrecadação como característica peculiar de sua classificação.

75 AMARO, Luciano da Silva. Conceito e classificação dos tributos. R. Direito Tributário, n.55, p. 286. 76 MACHADO, 2004, p. 359. 77 BALEEIRO, apud DERZI, 2003, p. 71. 78 HOFFMANN, 1996, p. 118. 79 PIMENTA, 2002, p. 16. 80 HARADA, 2003, p. 316. 81 MELO, 2003, p. 312.

69

6 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS

Cumpre de plano ressaltar que não é nosso objetivo abordar todos os princípios tributários, para não nos desviarmos de nosso objeto de análise que é a CIDE dos Combustíveis. Não se trata de princípios peculiares às contribuições interventivas, haja vista que todos os princípios tributários lhes são aplicáveis em regra, com algumas exceções impostas pelo legislador constitucional (como também ocorre no Imposto de Importação e Exportação, por exemplo); decorrência de sua submissão ao regime jurídico tributário.

Mais adiante, ao adentrarmos na abordagem da regra-matriz desta exação, será necessária a constante referência aos princípios, especialmente àqueles que nos interessa destacar que são: o Princípio da Legalidade, Referibilidade, Vedação de Confisco e Isonomia.

6.1. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E ESTRITA LEGALIDADE

O princípio legalidade é um princípio base, estudado em todos os ramos do Direito, se fundamentando no artigo 5º, inciso II da CF88, determinando que ninguém seja obrigado a fazer ou deixar algo senão em virtude de lei.

No ramo do Direito Administrativo, observamos que o referido princípio adquire análise peculiar, em que transportado para uma relação jurídica administrativa, vincula o Fisco e confere liberdade relativa ao administrado. Nesta ótica, determina que o administrado possa fazer tudo aquilo que a lei não veda expressamente, em contrapartida, o Poder Público só poderá fazer aquilo que a lei expressamente o autoriza.

[...] é o princípio basilar do regime jurídico-administrativo, já que o Direito Administrativo (pelo menos aquilo que como tal se concebe) nasce com o Estado de Direito: é uma conseqüência dele. É o fruto da submissão do Estado à lei. É em suma: a consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade

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administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei. 82

Voltando ao Direito Tributário, o princípio da legalidade se aperfeiçoa, mantendo o sentido dado quando de seu estudo no Direito Administrativo, por serem ambos pertencentes ao Direito Público, porém, adquirindo feições próprias.

A Lei 5.172 de 1966, que instituiu o Código Tributário Nacional, prevê em seu artigo 9º, a proibição do Estado em instituir ou majorar tributo sem expressa previsão de lei. O legislador constitucional, recepcionando a referida norma, incluiu os preceitos do artigo 9º do CTN na redação do artigo 150 da Carta Magna.

Com tal fato, admitindo o dispositivo no novo sistema jurídico em 1988, ratificou-se a nova ótica dada ao princípio da legalidade em matéria de Direito Tributário, que não mais se limitava ao artigo 5º, inciso II, mas agora, adquiria a feição de Estrita Legalidade.

Doutrina e jurisprudência deram a nomenclatura ao disposto de Princípio da Estrita Legalidade, que como visto, é simplesmente uma faceta do já consagrado Princípio da Legalidade. Deste modo, o Fisco somente poderá agir conforme o estrito permissivo legal e, quanto a criação ou majoração de tributos, somente o poderá fazer por intermédio de lei.

Não nos cabe neste estudo aprofundar na divergência quanto a instituição ou majoração de tributos por força de medida provisória. Registramos que por força do artigo 62 da Constituição Federal de 1988, admitir-se-á a edição de Medida Provisória “com força de lei” o que nos parece ser bastante claro que o vocábulo força quer significar eficácia, produção de efeitos.

Quanto este último aspecto, insta frisar que com a nova redação dada ao artigo 62 pela Emenda Constitucional n. 32/01, em seu §1º, inciso III, é vedada a edição de Medida Provisória que objetive tratar de matéria reservada a Lei Complementar. Observa-se que em relação aos tributos, cada nova exação deverá ter a matéria geral tributária que lhe seja própria instituída efetivamente por Lei Complementar, em atenção ao artigo 146, inciso III, alínea “a”, que determina cabe exclusivamente a esta norma jurídica definir os fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes. Quanto aos demais critérios da regra-matriz de incidência, que são próprios de Lei Ordinária – principal veículo normativo de criação de tributos – estes poderão ser contemplados excepcionalmente por Medida Provisória.

Resta, contudo, a observância do parágrafo segundo do artigo 62 da CF88 que determina que Medida Provisória que verse sobre instituição e majoração de impostos, tem sua eficácia diferida para o exercício em que houver sua conversão em lei.

82 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, pp. 58-59.

71

§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

Feitas estas considerações, extraímos a essência do Princípio da Legalidade e Estrita Legalidade como sendo os primados do Direito Tributário que vinculam a Administração Pública a agir sempre nos estritos permissivos legais, quais sejam, as disposições expressas em lei e, somente instituir ou majorar tributo com base em lei. Detendo natureza jurídica tributária e, consequentemente, pertencendo ao regime jurídico tributário, se reflete, pois, inquestionável a aplicação do postulado da Legalidade às Contribuições Genéricas.

6.2. PRINCÍPIO DA REFERIBILIDADE

Considerando que é a regra-matriz que sustenta toda e qualquer exação, podemos visualizá-la como sendo o próprio “esqueleto” dos tributos. Sabe-se que os critérios da regra-matriz devem guardar relação, referência, uns com os outros, para que, em harmonia, sustentem o tributo em sua constitucionalidade.

Determina-se qual o fato relevante para que ocorra a incidência de um tributo definindo-o no critério material, de modo hipotético. Uma vez praticado o fato gerador, fato este, que só detém tal conceito por subsumir-se à hipótese de incidência normativa, está instaurada a relação jurídica tributária; consequentemente, teremos um sujeito ativo e um sujeito passivo.

Por força do critério da referibilidade, só podem e devem ser considerados sujeito passivo aquelas pessoas, físicas ou jurídicas, que mantém algum vínculo com o critério material da regra-matriz. Exemplificando, só poderá integrar o pólo passivo da relação jurídica tributária em relação ao IPVA (Impostos sobre propriedade de veículos automotores) quem tem ligação com o critério material: a propriedade sobre veículo automotor.

Da mesma forma em relação ao critério territorial e o critério pessoal – sujeito ativo – em que só poderá figurar no pólo ativo da relação jurídica tributária a pessoa jurídica de direito público (não havendo parafiscalidade) que tenha sido contemplada com a prática do fato gerador ocorrido em seu território. Em novo

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exemplo, não guarda relação tais critérios em havendo instituição de ISS por lei proferida por Município “A”, sendo que o fato gerador foi praticado no território do Município “B”, haja vista que o critério territorial do Imposto Sobre Serviços é o território municipal.

Ainda quanto este Princípio, Tácio Lacerda Gama acrescenta que

o sentido de sua prescrição é determinar o necessário vínculo que deve existir entre a materialidade, os sujeitos escolhidos para o pólo passivo e a finalidade do tributo. Para que a contribuição interventiva seja constitucional, é necessário que exista um liame entre o critério material da hipótese, os sujeitos passivos e a finalidade do tributo.83

Aliando-nos às palavras do referido autor, é de se afirmar que em se tratando de Contribuições Interventivas o “peso” do tributo deve necessariamente recair sobre a parcela da população que foi ou será alvo da intervenção estatal na economia.

Ricardo Mariz de Oliveira84 afirma que “apenas pessoas atingidas pela intervenção podem ser colocadas pela lei na condição de contribuintes da respectiva contribuição”.

Este princípio é a essência da destinação específica prevista pelo legislador constitucional ordinário no artigo 149 da CF88. Não há que prosperar imposição tributária sobre certos sujeitos passivos, e o Estado, em literal afronta ao texto constitucional, destinar e aplicar os recursos gerados pelo tributo em setor diverso àquele que suportou o ônus financeiro. É justamente esta correlação entre o critério material, o sujeito passivo, a finalidade e a intervenção, que é tutelada pelo Princípio da Referibilidade.

6.3. VEDAÇÃO DE CONFISCO

Grande problema encontrado pela doutrina quanto ao Princípio da Vedação de Confisco é justamente determinar o que vem a ser confisco. Ao tratar do assunto, diversos têm sido os conceitos elaborados, não havendo um consenso quanto a utilização de nenhum deles.

83 GAMA, 2003, p. 159. 84 OLIVEIRA, apud GAMA, ibidem, p. 160-161.

73

O texto utilizado pelo legislador constitucional também dá margem a dúvidas quanto ao seu alcance: “utilizar tributo com efeito de confisco”85.

O que podemos de plano definir é que, não estando contemplada no conceito de tributo por expressa definição contida no artigo 3º do CTN, o dispositivo do artigo 150, IV, da CF88, que versa sobre a proibição do confisco, da mesma forma, não alcança as penalidades pecuniárias – multas, por serem cobranças alheias ao estudo do próprio tributo, que compreende o núcleo do regime jurídico tributário. Não queremos afirmar que só há confisco no Direito Tributário; não é isso. O que sustentamos é que somente em análise de instituto pertinente ao regime jurídico tributário é que se pode fazer uso de princípio peculiar ao Direito Tributário, sendo a Vedação de Confisco um deles. Quanto às demais áreas do Direito, o combate ao confisco adquire sustentação e fundamento em outros dispositivos, v.g. a proteção ao direito fundamental individual da propriedade, a igualdade, a legalidade, entre outros (artigo 5º caput, e incisos, CF88).

Aliomar Baleeiro sustenta em sua obra que a vedação ao confisco está diretamente ligada à própria capacidade econômica do contribuinte: “o que há de comum entre ambos – princípio que veda o confisco e o princípio da igualdade – é que se assentam na capacidade econômica do contribuinte”86.

O princípio que veda instituir tributo com efeitos confiscatórios tem nítida relação com a capacidade econômica do contribuinte, mas, ao mesmo tempo, distingue-se claramente daquele outro, estabelecido no art. 145, §1º, o qual obriga o legislador a graduar o tributo de acordo com a capacidade econômica de cada contribuinte.

A capacidade econômico-contribuitva do contribuinte é o ponto de partida do qual derivam não só o princípio que veda utilizar tributo com efeito de confisco (art. 150, IV), como também o princípio da tributação proporcional à força econômica do sujeito passivo, na forma em que se encontra inserido no art. 145, §1º, da Constituição Federal. Mas, embora assentados sob os mesmos fundamentos, os princípios se não confundem.

[...]

O princípio que veda utilizar tributo com efeito de confisco tem assim um sentido amplo, vazado em termos absolutos, que garante o direito de propriedade e seus acréscimos inclusive por ordem sucessória, a livre escolha ou o exercício de qualquer profissão e a livre iniciativa. Mas não é um princípio de justiça material ou de isonomia. 87

85 Constituição da República Federativa do Brasil - 1988, artigo 150, inciso IV. 86 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 537. 87 Idem, ibidem, p. 573-574.

74

No mesmo sentido das palavras de Aliomar Baleeiro, Kiyoshi Harada também sustenta a identificação de confisco primeiramente pela análise da capacidade econômica, seguida dos demais princípios.

[...] para se saber se um tributo é confiscatório ou não, deve-se analisar o mesmo sob o princípio da capacidade contributiva que, por sua vez, precisa ser examinado em consonância com o princípio da moderação ou da razoabilidade da tributação verificando, ainda, se a eventual onerosidade da imposição fiscal se harmoniza com os demais princípios constitucionais, garantidores do direito de propriedade, da liberdade de iniciativa, da função social da propriedade etc. 88

Verifica-se que Baleeiro tende a associar a proibição de confisco à própria capacidade econômica do sujeito passivo. Entretanto, discordamos no ponto em que afirma ser a capacidade econômica o ponto de partida para outros princípios. Temos que a ordem de influência deve sempre, necessariamente, contemplar o Princípio da Legalidade, sem a qual o Estado não pode agir.

É a legalidade a “coluna-mestra” de toda e qualquer imposição tributária, não sendo diferente em relação as contribuições genéricas.

Desta forma, analisamos e definimos o confisco como todo aquele valor que o Poder Público exige ou mantém em seu poder de forma indevida. Esta ilegalidade, portanto, pode perfeitamente decorrer de uma afronta ao próprio princípio da capacidade contributiva, previsto no art. 145, §1º, da CF88, ou mesmo em uma negatória do Fisco em repetir indébito.

Cumpre-nos resumidamente ressaltar que, aliamo-nos a manifestação do professor Aurélio Pitanga Seixas Filho, ao sustentar que a capacidade contributiva não é só aplicável aos impostos, mas também às taxas, a que estendemos sua abrangência às contribuições genéricas.

Ora, se a capacidade do usuário de pagar o serviço recebido é levada em conta no regime jurídico não-tributário, mais razão haverá, quando o serviço público é prestado compulsoriamente, de se dimensionar o valor da taxa pelas condições econômicas do destinatário.

[...] poderá o legislador dimensionar a alíquota da taxa, de maneira a ser exigida em proporção maior de quem tem capacidade contributiva, compensando a redução ou isenção do tributo que

88 HARADA, 2003, p. 359.

75

deve ser concedida aos usuários do serviço público carentes de capacidade econômica.89

E ainda argumenta o referido doutrinador:

Em um estado democrático de direito todos os seus jurisdicionados têm o dever, cívico e jurídico, de contribuir para o seu funcionamento, o que configuraria o princípio da generalidade ou isonomia. Entretanto como as pessoas não são iguais entre si, não seria justo ratear igualmente, por cabeça (imposto por capitação) todas as despesas governamentais, cabendo, assim, a cada um pagar o tributo na medida de sua capacidade econômica.

[...]

Um ponto que deve sempre ser realçado, é que todos os tributos, sejam fiscais ou parafiscais, devem respeitar a capacidade econômica do contribuinte, não sendo justo ou legítimo que, a título de custear uma obra pública ou de participação na valorização do imóvel, a contribuição de melhoria seja confiscatória, ou que a prestação governamental fique inacessível ao contribuinte por não poder pagar a taxa.90

Finalmente, o sentido do vocábulo “utilização” contido no texto do inciso IV do artigo 150 da CF88. Questionamos se a aplicação do Princípio da Vedação de Confisco tem utilidade somente na instituição do tributo ou deve ser observado também em momentos posteriores?

Já consideramos que o Princípio da Legalidade é a verdadeira bússola de todo o estudo do Direito, quanto mais o Direito Tributário – ramo de direito público – sendo observado na criação das leis, cobrança, destinação e eventual restituição da receita dos tributos; é, portanto, de utilização permanente. Da mesma forma, aliado a este, vem o princípio da vedação de confisco, acompanhado dos demais princípios, que devem ser de observância plena e contínua pelo Fisco, sob pena de afronta não só ao princípio violado, mas conseqüentemente, lesão a própria Legalidade Constitucional.

Posto isto, é de se concluir serenamente que a vedação de confisco – assim como todos os demais princípios constitucionais tributários – deve servir de constante baliza ao Poder Público quando da instituição, arrecadação, fiscalização e, excepcionalmente estas cabendo, da destinação específica e restituição dos tributos.

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SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. TAXA: doutrina, prática e jurisprudência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, pp. 71-78. 90 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Dimensão jurídica do tributo vinculado. São Paulo: Meio Jurídico, 2003, pp. 7-8.

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6.4. PRINCÍPIO DA ISONOMIA

O princípio da isonomia tributária é uma variação do princípio da igualdade, contido no artigo 5º, caput. Fazemos, contudo, tradicional ressalva a este primado no sentido de que a igualdade a ser verificada, consiste na igualdade dos iguais e desigualdade dos desiguais, na exata proporção de suas desigualdades.

Atento a isto, o legislador constitucional ao adaptar o texto do artigo 9º do CTN ao texto constitucional, incluiu no artigo 150 que estava em elaboração, o inciso II, que impõe nova limitação ao poder de tributar no sentido de que é vedado ao Poder Público “instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”.

Fica demasiado claro o intuito do legislador em não haver tratamento tributário diferenciado em relação a contribuintes que estejam na mesma situação jurídica.

Tal preceito aplica-se a todas as espécies de tributos, quaisquer que seja sua denominação jurídica ou característica peculiar, como v.g. haver ou não vinculação.

7. REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA

A regra-matriz de incidência pode ser considerada como uma verdadeira varredura intrínseca de constitucionalidade do tributo. Como já afirmado, poderíamos equipará-la ao esqueleto do tributo sendo esta sua sustentação, compreendendo a análise de seus critérios de validade, assim como um raio-x da norma impositiva.

Com o exame dos instrumentos normativos que instituem a exação, podemos identificar eventual inconstitucionalidade formal. Entretanto, é somente através da

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observância dos critérios da regra-matriz que se efetua uma análise material da imposição tributária.

A regra-matriz é o conjunto de cinco critérios que trazem elementos indispensáveis ao tributo, são eles: o critério material, temporal, espacial, pessoal e quantitativo.

Identificamos a regra-matriz como verdadeira sentença matemática, na qual somente a soma de todos os critérios trazidos de forma integral, produz como resultado um tributo constitucional, apto a ser exigido.

C.M. + C.T. + C.E. + C.P. + C.Q. = T

C.M.: Critério Material C.P.: Critério Pessoal

C.T.: Critério Temporal C.Q.: Critério Quantitativo

C.E.: Critério Espacial T.: Tributo Figura 3 – Regra-matriz de incidência matematicamente representada Fonte: Pesquisa elaborada pelo próprio autor.

A referência quanto a integralidade dos critérios da regra-matriz, diz respeito aos critérios pessoal e quantitativo, que são subdivididos em sujeito ativo e passivo, base de cálculo e alíquota, respectivamente. Assim, não prospera o critério preenchido parcialmente – meio critério (C.”X”/2) – em atenção à legalidade, v.g. falta da alíquota ou possuir base de cálculo que não guarda relação com o critério material.

7.1. CRITÉRIO MATERIAL

Feitas tais considerações pode-se definir o critério material como sendo o critério que identifica uma situação hipotética, que uma vez praticada e ocorrida a incidência tributária, instaura uma relação jurídica tributária que conduzirá a um lançamento e este, por sua vez, constituirá o crédito tributário.

Os critérios da regra-matriz de incidência da CIDE dos Combustíveis estão presentes exclusivamente na Lei n.º 10.336/01, que instituiu o referido tributo.

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Esta norma define como critério material desta exação a importação e comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível, artigo 1º da referida lei.

7.2. CRITÉRIO TEMPORAL

Não é qualquer fato que pode configurar um fato gerador; nem mesmo um fato jurídico qualquer, é necessário para desencadear uma relação jurídica tributária que esse fato jurídico seja tributário, relacionando-se com uma norma tributária.

É preciso que a lei determine qual o exato momento em que é possível ser considerado sujeito passivo de uma relação jurídica tributária. Este momento será exatamente o instante em que ocorre a própria incidência tributária, assim entendida a subsunção de um fato a uma norma.

Podemos definir critério temporal da regra-matriz como o momento exato previsto em lei, em que ocorrerá a incidência tributária.

Retornando à Lei 10.336/01, instituidora da CIDE dos Combustíveis, dois podem ser os momentos de incidência do tributo, os quais estão previstos de modo nebuloso no caput do artigo 6º e seu parágrafo único.

Interpretamos o dispositivo no sentido de que para a atividade de importação, o momento de incidência é o do registro da Declaração de Importação. Logo, para efeito deste tributo especificamente, somente ocorre importação de combustíveis no ato da emissão da Declaração de Importação, ocasião em que se opera a incidência e, somente a partir deste instante, se instaura a relação jurídica tributária.

Como verificado no critério material, outra hipótese de incidência da CIDE dos Combustíveis se dá com a comercialização dos referidos produtos. O texto legal é impreciso em determinar o exato instante em que se opera a incidência do tributo na hipótese da comercialização. Para tanto, interpretamos o artigo 6º da mesma lei, com seu próprio artigo 2º, que define quem são os respectivos contribuintes.

Chegamos a conclusão de que haverá comercialização em toda a circulação dos produtos descritos no caput do art. 1º, efetuada pelos contribuintes descritos no art. 2º. Desta forma, havendo a prática do fato gerador pela comercialização de combustíveis (precisamente o início do processo de comercialização), instantaneamente estará havendo a incidência tributária.

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7.3. CRITÉRIO ESPACIAL

O critério espacial está sempre inserido no âmbito territorial do sujeito ativo da relação jurídica tributária, detentor da competência impositiva.

Em se tratando de tributo federal, o critério espacial será todo o território nacional; em se tratando do Distrito Federal, tal critério será todo o território distrital, e assim sucessivamente em relação aos Estados e Municípios.

A relevância na determinação do critério espacial da regra-matriz reside na necessidade de identificação do espectro territorial em que poderá haver a ocorrência de um fato jurídico, porém, não alcançado pela competência impositiva do sujeito ativo, por ter ocorrido fora de seu território de competência.

A título de exemplificação, podemos citar o Imposto Sobre Serviços, o qual sustentamos a inconstitucionalidade de sua cobrança pelo Município onde há a sede da empresa, sendo o serviço prestado – fato jurídico ocorrido – em Município distinto.

É, portanto, justamente o critério espacial que determina onde pode ocorrer, dentro de um determinado território, um fato jurídico para que possa ser considerado um fato gerador apto, paralela e instantaneamente, a desencadear a incidência tributária.

Quanto à CIDE dos Combustíveis, Marcelo Guerra Martins esclarece que

a norma legal no caso (Lei 10.336/2001) não disciplinou de forma explícita e pormenorizada este local (aspecto espacial). Assim sendo, o mesmo deve ser considerado como sendo o domicílio do sujeito passivo, que necessariamente deverá se encontrar dentro do Território Nacional. O seguinte raciocínio é válido para a hipótese de incidência relativa à comercialização e não à importação.

É que, em se tratando de importação, o local (espaço físico) no qual ocorre a materialização da hipótese de incidência é, por presunção lógica, a fronteira do território Nacional. É o local da entrada nas águas brasileiras do navio que transporta a mercadoria, o mesmo raciocínio sendo válido para a via aérea ou terrestre. Não há maiores considerações a serem realizadas quanto ao aspecto espacial, sendo certo que o tributo não pode incidir fora do território nacional.91

91 MARTINS, 2004, p. 569.

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Quanto às palavras do referido autor, registramos única discordância em relação a sua colocação referente ao momento de ocorrência do fato gerador. Como já analisado em tópico anterior, precisamente no exame do critério temporal, argumentamos que haverá a ocorrência do fato gerador, no exato instante em que ocorrer a incidência tributária, nem antes, nem após.

E assim, vimos que em se tratando de hipótese de importação, a incidência tributária ocorrerá, a teor do art. 6º da Lei 10.336/01, no momento do registro da Declaração de Importação.

Tais considerações, entretanto, não afastam a idéia de determinação do critério espacial como sendo todo o território nacional.

Este critério está inserido no próprio artigo 149 da Constituição Federal de 1988 que determina ser de competência da União Federal a instituição do tributo, tanto que, uma de suas hipóteses de incidência é justamente a importação de combustíveis, extensível por esta razão, a todo o território nacional.

7.4. CRITÉRIO PESSOAL

Os sujeitos da relação jurídica tributária são identificados pela regra-matriz de incidência através do critério pessoal. Nele são definidos os sujeitos ativo e passivo desta relação jurídica.

Em se tratando do sujeito ativo, este será sempre pessoa jurídica de direito público que é quem detém a competência atribuída constitucionalmente; excepcionalmente, poderá delegar a terceiros a capacidade para cobrança da exação, como v.g. nos tributos parafiscais.

Quanto ao sujeito passivo, este se subdivide em contribuinte e responsável tributário. Contribuinte é a pessoa física ou jurídica que detém relação pessoal e direta com o fato gerador do tributo, ou seja, é quem o pratica. Responsável tributário é a pessoa física ou jurídica a quem a legislação atribua a responsabilidade pelo recolhimento do tributo.

A Lei 10.336/01 em seu artigo 13, dispõe que a administração e fiscalização do tributo compete à Secretaria da Receita Federal, órgão da União. A competência tributária deste ente político está definida na própria Constituição Federal, quando no artigo 149 determina que “compete exclusivamente à União instituir

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contribuições [...] de intervenção no domínio econômico [...] como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas [...]”. 92

O sujeito passivo tributário, por sua vez, está definido no artigo 2º, que cita os seus contribuintes (formulador, produtor e o importador dos combustíveis relacionados no art. 3º). O Responsável tributário está descrito no artigo 11 da mesma norma, sendo determinado como o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, “no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora”. 93

7.5. CRITÉRIO QUANTITATIVO

É o critério quantitativo que determina qual será o valor devido a título de tributo. Ele é definido pela operação aritmética de multiplicação da alíquota aplicável pela base de cálculo. Assim como todos os demais critérios, este também é essencial à instituição e cobrança da imposição tributária, haja vista que, sem definição do quantum debeatur não há como o sujeito passivo efetuar qualquer pagamento.

Divide-se em dois conceitos que juntos compõem um único e válido critério, a exemplo do critério pessoal: a base de cálculo e a alíquota.

A base de cálculo, como o próprio nome sugere, é a base sobre a qual irá se calcular o tributo; sobre a qual será multiplicada a alíquota. Deve sempre guardar estreita relação com o critério material, posto que representa a riqueza ou valor econômico do mesmo. Assim, exemplificando, um contribuinte que pratica o fato gerador do Imposto Sobre Serviço, terá como base de cálculo do tributo devido o valor do serviço efetivamente prestado; nem outra unidade de medida, nem outro serviço.

A alíquota é sempre um valor fixo ou ad valorem e será multiplicada pela base de cálculo. Pode ser um valor pré-determinado, e neste caso será fixa, ou poderá trazer um percentual, neste caso será ad valorem.

O artigo 4º da Lei 10.336/01 identifica como base de cálculo da CIDE dos Combustíveis a unidade de medida adotada pela mesma lei (m³ - metros cúbicos). Consideramos que o texto normativo traz nova imprecisão, posto que a mera unidade métrica adotada, ou seja, metros cúbicos, por si só não é capaz de compor a base de cálculo do tributo em questão.

92 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 149. 93 BRASIL. Lei 10.336, de 19 de dezembro de 2001, art. 11º.

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Interpretando o dispositivo, cumpre-nos frisar que a base de cálculo será o volume de combustível importado ou comercializado, medido em metros cúbicos. Defendemos esta opinião, sob argumento de que a mera utilização da unidade de medida dissociada do volume envolvido é imprestável a determinar o quantum devido, por que não se pode multiplicar qualquer alíquota que seja sobre simples unidade métrica, o que nos levaria à emblemática pergunta: multiplicar a alíquota sobre quantos metros cúbicos?

Quanto à alíquota, a mesma lei determinou no artigo 5º que esta será:

I – gasolinas, R$860,00 por m³;

II – diesel, R$390,00 por m³;

III – querosene de aviação, R$92,10 por m³;

IV – outros querosenes. R$92,10 por m³;

V – óleos combustíveis com alto teor de enxofre, R$40,90 por t;

VI – óleos combustíveis com baixo teor de enxofre, R$40,90 por t;

VII - gás liquefeito de petróleo, inclusive o derivado de gás natural e de nafta, R$250,00 por t;

VIII – álcool etílico combustível, R$37,20 por m³.

[...]

§2º Aplicam-se às correntes de hidrocarbonetos líquidos as mesmas alíquotas específicas fixadas para gasolinas.

Ratificando o já afirmado, poderíamos v.g. calcular a importação de 1.000m³ (base de cálculo) - equivalente a um milhão de litros - de gasolina, cuja alíquota seria de R$860 por m³; assim, multiplicando a alíquota pela base de cálculo teríamos: 860 x 1.000 = R$860.000,00 (oitocentos e sessenta mil reais).

É de se constatar que a CIDE dos Combustíveis nem de longe pode ser considerada um tributo de insignificante repercussão na vida do cidadão, haja vista que envolve majestosas somas em dinheiro e atinge toda a população brasileira, seja ela detentora de veículo ou usuária de transporte coletivo. Neste aspecto é que se fundamenta e justifica a análise desenvolvida, com meta a se examinar o estrito cumprimento das normas jurídicas aplicáveis, como decorrência do princípio da legalidade, o qual o Estado só está autorizado a agir (instituir, fiscalizar e arrecadar tributos) dentro do que está legalmente previsto.

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3ª PARTE – Análise crítica da exação

8. INOVAÇÃO IMPOSITIVA NO SISTEMA TRIBUTÁRIO E COMPETÊNCIA RESIDUAL

O legislador constitucional à época da elaboração do texto constitucional (poder constituinte originário) discriminou competências entre os entes políticos União Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios, e determinou que estes não haveriam de invadir a competência uns dos outros, afim de que se mantenha íntegra a própria federação, corolário do Princípio Federativo instaurado.

Recepcionando o Código Tributário Nacional de 1966, manteve a redação do artigo 7º, que lhe dava sentido expresso quanto a indelegabilidade de competência, por ser atribuição constitucional.

De certa forma, ao discriminar as competências em relação a certas situações tidas como relevantes para a tributação, v.g. grandes fortunas, circulação de mercadorias e serviços, renda e patrimônio etc., o poder constituinte originário “fechou” a possibilidade de criação de novos tributos.

Atento à dinâmica das relações sociais, objetivando eventual inovação – limitada – em relação a futuros fatos até então inexistentes ou desprezados em 1988, o legislador constitucional inseriu na Constituição Federal hipótese de criação de novos impostos, desde que compreendessem fatos novos, não alcançados pelos já discriminados pela Constituição.

Art. 154. A União poderá instituir:

I – mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprio dos discriminados nesta Constituição;94

Este dispositivo é sabiamente denominado pela doutrina como a previsão constitucional de competência residual.

Residual porque serve justamente para tutelar os fatos sociais que o Poder Público tem interesse em tributar, não estando determinada nas delimitações de competência já definidas na elaboração do texto constitucional.

94 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 154, inciso I.

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É unicamente este dispositivo que delimita a competência da União e autoriza a criação de novos tributos: impostos.

Verifica-se claramente que o intuito do legislador foi o de criar estabilidade e segurança jurídica aos contribuintes no sistema constitucional tributário ao determinar as competências e autorização de criação de tributos. E, para que a CF88 não se tornasse anacrônica com o passar dos anos e advento de novas relações e fatos, criou uma pseudo “janela” no então fechado sistema constitucional para a criação de novos tributos.

Interpretando teleologicamente o dispositivo, temos como evidente e inquestionável a intenção do Poder Constituinte Originário em somente autorizar a criação de novos tributos sob o fundamento do art. 154, inciso I da CF88.

Até mesmo em relação as contribuições sociais, a teor do artigo 195, §4º da CF88, pode-se afirmar seu enquadramento e limitação à competência residual da União, posto que o próprio legislador as referencia diretamente quanto ao artigo 154, I da carta magna.

Art. 195. [...]

§4º A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.

Do texto do §4º do art. 195 da CF88, poderíamos suscitar dúvida sobre a compatibilidade do exposto neste dispositivo, com o previsto no artigo 154, I, que se aplica aos impostos. Como poderíamos conceber um imposto com finalidade, destinação específica, como submete o primeiro artigo?

Não nos causaria surpresa tal indagação que sob certo ponto de vista guarda até lógica; mas não prospera em maior estudo.

Temos que a referência feita no parágrafo quarto do art. 195 à competência residual da União, que trata dos impostos, guarda relação somente no tocante a aplicação dos preceitos lá estabelecidos, quais sejam, a não-cumulatividade, a necessidade de Lei Complementar e, que o novo tributo não contemple base de cálculo e hipótese de incidência de tributos – diga-se, qualquer um deles – já discriminado na Constituição Federal.

A “abertura” no sistema tributário prevista quanto as contribuições sociais, sequer chegam a compor exceção à regra da competência residual, porque é feita referência constitucional direta a esta.

Neste mesmo sentido se posiciona Fabiana Del Padre que afirma:

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Diante da referência ao dispositivo que orienta a imposição de impostos residuais de competência da União (art. 154, I), Susy Gomes Hoffmann entende ser possível a instituição de impostos com a específica finalidade de financiar a seguridade social, configurando exceção ao disposto no art. 167, IV, do Texto Supremo. [...].

Divergimos de tal assertativa, pois entendemos que a referência ao art. 154, I, da Carta Maior significa tão-somente a necessidade de observância dos mesmos requisitos exigidos para instituição de impostos residuais. Não há que se falar na criação de impostos residuais com a específica destinação de custeio da seguridade social, posto que esta é vedada pelo art. 167, IV, inexistindo qualquer ressalva a essa proibição, exceto aquelas elencadas no corpo do próprio dispositivo.95

Registre-se mais uma vez, que não condenamos toda e qualquer inovação impositiva no sistema constitucional. O que examinamos como inconstitucional é toda e qualquer outra criação de tributos que não sejam os impostos residuais e a contribuição residual, esta última por expressa previsão do art. 195, §4º, da CF88.

Assim é que, concluímos ser toda nova instituição de tributo não contemplada na competência residual da União Federal como inovação de flagrante inconstitucionalidade.

Atento ao fato de que no texto originário da Constituição, elaborado pela legítima competência do Poder Constituinte Originário, já figurava a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, bem como, sua destinação específica, não há dúvidas que este tributo, neste aspecto, tem validade constitucional, ao contrário, por exemplo, da contribuição para custeio do serviço de iluminação pública, criada pela Emenda Constitucional n.º 39, que alterou a redação do art. 149, da CF.

Entretanto, a análise proposta da CIDE dos Combustíveis deve também levar em consideração a repartição de competências alterada pela EC n.º33/01.

Sacha Calmon corretamente afirma que “a Constituição não cria tributos, simplesmente atribui competências às pessoas políticas para instituí-los, através de lei” 96 e, seguindo tal preceito, constatamos que a definição imposta pela EC n. 33 de incidência da CIDE sobre a comercialização de combustíveis invade competência dos Estados e Distrito Federal para tributar este fato jurídico que provoca a incidência do ICMS, a teor do art. 155, inciso II, da CF88, visto que na comercialização há evidente circulação de mercadoria – combustível – havendo bitributação. Consideramos que esta bitributação é inconstitucional pelo fato da União Federal instituir exação incidente exatamente sobre o mesmo fato gerador, qual seja, a comercialização, circulação de combustíveis. Este fato gerador já está muito bem definido constitucionalmente como de estrita competência dos Estados e do Distrito Federal e, sua posterior alteração ou usurpação,

95 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Contribuições para a Seguridade Social: à luz da Constituição Federal. Curitiba, Juruá, 2004, p. 115. 96 COELHO, 1998, p. 3.

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atenta claramente contra a repartição de competências e até mesmo o Princípio Federativo.

[...] adotando as técnicas da competência privativa e comum e ligando-as às inspirações da teoria dos fatos geradores vinculados e não-vinculados, pôde o constituinte equacionar a repartição das competências entre as pessoas políticas, segregando as respectivas áreas econômicas de imposição, de modo a evitar conflitos de competência ou superposições competenciais, em detrimento dos contribuintes e dos próprios entes tributantes.97

O princípio federativo é elemento indispensável ao nosso sistema constitucional, de sorte que sua violação configura atentado contra todos os preceitos estabelecidos em nosso ordenamento jurídico, sob tutela da Constituição Federal. Nesse aspecto, Aurélio Pitanga defende a ilegalidade de criação de nova contribuição pela União Federal sob mesmo fato gerador próprio dos Estados e Distrito Federal:

O princípio que rege o Federalismo Fiscal no Brasil, pelo menos desde a Constituição de 1946, é de rigidez na distribuição da competência dos fatos geradores dos impostos-fiscais, não podendo os Estados invadirem a competência tributária autorizada pela constituição aos Municípios e à União Federal, sendo a recíproca também verdadeira. A doutrina tem denominado de bi-tributação toda e qualquer intromissão em uma competência tributária alheia. Em obediência ao princípio constitucional da exclusividade da competência de criar impostos, parece-me que os fatos geradores dos impostos distribuídos pela Constituição aos Estados e Municípios não poderiam ser autorizados, também, para a criação de uma contribuição (imposto) parafiscal pela União Federal. 98

Bitributação é invasão de competência de um ente político – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – em relação a outro, o que não ocorre no bis in idem, que é a criação de novos tributos sobre o mesmo fato gerador pelo mesmo sujeito político detentor de competência.

Aurélio Pitanga Seixas Filho aborda o assunto com propriedade, a qual nos curvamos às suas razões:

É verdade que a jurisprudência em geral tem inquinado de inconstitucional toda e qualquer taxa que tenha base de cálculo de

97 COELHO, 1998, p. 6. 98 SEIXAS FILHO, Contribuições no Sistema Tributário Brasileiro, enviado para <[email protected]>, 2002, p. 20.

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imposto, com apoio no parágrafo 2º do artigo 145 do texto constitucional, através de uma interpretação meramente literal do dispositivo, não distinguindo, entretanto, quando é hipótese de bitributação, isto é, invasão de competência, do “bis in idem”.

Nada impede que o titular da competência de criar um imposto institua mais de um tributo sobre o mesmo fato gerador, denominando um deles de taxa, sabendo todos, que o nome dado ao tributo é absolutamente irrelevante para caracterizar sua natureza jurídica, conforme é a lição elementar do Código Tributário Nacional, pelo inciso I, do seu artigo 4º.99

Portanto, quanto a previsão constitucional de criação pela União Federal da CIDE, podemos ab initio afirmar que não houve afronta ao texto constitucional pela determinação, através da Emenda Constitucional n.º 33/01, de autorização para criação de CIDE sobre as atividades de importação e comercialização de combustíveis, não padecendo, sob este aspecto, a Emenda Constitucional n. 33 de inconstitucionalidade. Entretanto, em outra análise, há evidente inconstitucionalidade – que diga-se, contamina toda a exação – no tocante a autorização para instituição da CIDE sobre a atividade de comercialização de combustíveis, havendo clara afronta à competência dos Estados quanto a este fato gerador, em se tratando do ICMS.

Concluímos estas razões com as palavras de Aurélio Pitanga que, mais uma vez, acresce ao tema e fecha a questão:

[...] os impostos (tributos) com destinação especial ou particular, denominados de contribuições, ou outro nome que lhe seja dado, são exceção a um princípio fundamental do ordenamento jurídico não sendo possível que sejam criados indiscriminadamente.

A criação de novos impostos sofre severa limitação constitucional, sendo exigida lei complementar, fatos geradores diferentes daqueles já autorizados, além de não cumulatividade, caracterizando uma competência tributária constitucional denominada rígida, não concorrente e limitada.

Não se pode entender que a expropriação monetária quando denominada de imposto sofra severas restrições, porém, quando apelidada de contribuição nenhuma limitação sofra à sua constituição, podendo invadir a competência dos estados, como na manutenção do Adicional ao Frete de Renovação da Marinha Mercante, bitributar o lucro e o faturamento, enfim, nenhum enquadramento constitucional venha limitar o excesso de impostos especiais que são criados com a denominação de contribuição.100

99 SEIXAS FILHO, Contribuição para iluminação pública – EC 39-2002, p. 4. 100 Idem, Contribuição e vinculação de sua receita, p. 18-21, passim.

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9. CRIAÇÃO DA CIDE DOS COMBUSTÍVEIS POR LEI ORDINÁRIA

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 146, inciso III, determina que é atribuição de Lei Complementar “estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária”. Para que não pairasse dúvidas sobre o que viria a compreender normas gerais o poder constitucional originário explicitou os casos das alíneas a, b, e c.

Fica flagrante que sempre haverá necessidade de que Lei Complementar determine o critério material (fato gerador), quantitativo (base de cálculo) e pessoal (contribuintes), sob pena de afronta a literal dispositivo constitucional.

A necessidade deste instrumento normativo é imperiosa em toda a qualquer instituição de tributos, caso em que, não existindo, tem-se por inconstitucional (inconstitucionalidade formal) a exação imposta.

Em texto conciso, porém interessante, sobre a análise da Contribuição Interventiva, Alexandre Tadeu Navarro afirma:

[...] No que toca aos seus aspectos gerais, já se manifestou o Poder Judiciário no sentido de que, em se admitindo tratar-se de uma contribuição, o seu fato gerador e a sua base de cálculo devem ser determinadas através de lei complementar, conforme prevê a Constituição Federal nos artigos 146, 154, I e 195, §4º. 101

Para que se chegue à mesma conclusão, não é sequer necessária uma interpretação teleológica ou sistemática da norma constitucional, bastando uma mera interpretação gramatical do texto do artigo 149 da CF88. O caput deste dispositivo, mais uma vez, deixa evidente que o intuito do legislador era que as contribuições de intervenção no domínio econômico seguissem a determinação do inciso III, do artigo 146. Ora, com simples leitura destes dispositivos já se conclui que qualquer contribuição interventiva, para que atenda a Constituição Federal, deve ter sua base de cálculo, contribuinte e fato gerador previstos exclusivamente em lei complementar.

Em nota de Misabel Abreu Machado Derzi, em atualização a obra de Aliomar Baleeiro, sustenta a estrita previsão constitucional das competências tributárias como essência vital ao próprio Federalismo:

101 NAVARRO, Alexandre Tadeu. Quando é legítima a cobrança de CIDE? Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, 2002, p.3.

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O fato gerador e a base de cálculo são conceitos constitucionais. Segundo os arts. 145, §2º, 154, I, e 195, §4º, tanto o fato gerador, como a base de cálculo são relevantes, cada um por si e, em conjunto, para definir a natureza jurídica específica de um tributo. Mas, ao enformá-los [SIC], o legislador deve se utilizar de conceitos determinados e especificantes, para bem realizar os desígnios constitucionais, que repelem a competência concorrente e a dupla ou tríplice imposição sobre os mesmos fatos. Por isso mesmo, em nome da segurança jurídica, e, garantindo a rigidez do sistema tributário, a Constituição prevê a edição de lei complementar de normas gerais, que devem especificar os conceitos mais abstratos nela utilizados, até que cada lei da pessoa competente, ao pôr os tributos de cada ordem parcial, complete a determinação e a especificação, que vem por graus, em nosso direito positivo.102

(grifo nosso)

Cabe registrar o posicionamento de Sacha Calmon Navarro Coelho, que no ano de 1998, se posicionou a favor de criação de contribuições interventivas sem a necessidade de lei complementar. Sua argumentação merece duas considerações: primeiramente, como já afirmado, consultamos a obra em data anterior à edição da emenda constitucional n.º 33/01. Sustentou tal posição, sob argumento de não haver discriminação expressa do fato gerador das referidas contribuições.

Em segundo lugar, mesmo admitindo tal fundamento, já não era de se concordar com sua alegação, que poderia ser elidida pelo caput do art. 149 da CF88, determinando a observância de lei complementar (art. 146, III, a, CF) para a criação das contribuições interventivas.

Assim sustentou o doutrinador:

Quanto aos impostos e contribuições virtuais afetados a finalidades específicas (contribuições corporativas e de intervenção e impostos extraordinários de guerra) por serem impostos não-discriminados na Constituição, evidentemente não exigem para a sua instituição a regra do art. 146, III, “a”, que se volta apenas para os impostos discriminados (artigos 153, 155 e 156 da CF). Os impostos virtuais e finalísticos não possuem menção constitucional expressa de fato gerador, logo são absolutamente imprevistos. A lei maior dá apenas a finalidade, a causa, da instituição do tributo, deixando ao legislador ordinário, sem outros condicionamentos, a competência necessária a estruturação do tipo tributário, o qual evidentemente, só não poderá invadir áreas já reservadas a outras incidências, salvo os extraordinários de guerra.103

102 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao poder de tributar, 2003, pp. 134-135. 103 COELHO, 1998, p. 145.

90

Na mesma linha da opinião de Sacha Calmon já vista anteriormente, segue Marco Aurélio Greco. Com respeito às opiniões destes autores, temo-las como equivocadas. Marco Aurélio Greco, no ano de 2000, publicou artigo em que sustentava a desnecessidade de lei complementar para a instituição de Contribuição Interventiva.

Não vejo na Constituição Federal exigência de as Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico serem criadas por lei complementar. A remissão que o art. 149 faz ao art. 146, III, refere-se à disciplina prevista no CTN, mas não à indispensabilidade prévia de lei complementar para instituí-la. Pode ser criada por lei ordinária federal e, por conseqüência, por medida provisória, desde que estejam atendidos os requisitos constitucionais para a edição deste veículo especial e desde que não haja abuso na sua utilização104.

É indiscutível que a lei ordinária é o principal veículo introdutor de tributos no sistema tributário; é o que se estuda em fontes do Direito Tributário. Entretanto, cabe ressaltar que mesmo sendo a lei ordinária o principal instrumento normativo criador de tributos, não será o único. Se a lei complementar está em nível hierárquico superior, é evidente que esta também o poderá fazê-lo, mesmo não sendo sua principal função. Tal conclusão decorre da lógica de quem pode o mais, pode o menos: ad maius ad minus.

Se a principal função das leis ordinárias em matéria tributária é a instituição, a criação de tributos, à lei complementar compete precipuamente a definição da matéria geral em direito tributário. Esse é o mesmo entendimento de Hugo de Brito Machado que dispôs:

Alguns doutrinadores, através de uma leitura apressada de tais dispositivos, tratam da questão como se dissesse respeito à necessidade de lei complementar como veículo para a instituição de uma contribuição de intervenção, o que os leva a de forma equivocada concluir pela completa desnecessidade de lei complementar no trato da matéria.

Na verdade, a referência feita pelo art. 149 da CF/88 ao art. 146, III, não impõe a criação de contribuições através de lei complementar. O que a Constituição preconiza é a prévia edição de lei complementar traçando normas gerais sobre as contribuições, o que é diferente.105

(grifamos)

104

GRECO, Marco Aurélio. Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico: Parâmetros para sua criação. São Paulo: Dialética, p. 28. 105 MACHADO. Hugo de Brito. Contribuições de intervenção no domínio econômico. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 314.

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Quando da realização do XXVI Simpósio Nacional de Direito Tributário ocorrido em 20 de outubro de 2001, em que houve a escolha do tema Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, elaborados seus artigos106, vários doutrinadores se manifestaram sobre a questão da lei complementar em Contribuição Interventiva, entre eles, Fátima Fernandes R. de Souza e Cláudia Fonseca Morato Pavan:

Nem se diga que a desnecessidade de lei complementar já teria sido reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar constitucional a contribuição social sobre o lucro, instituída por lei ordinária. O fundamento daquela decisão [...] foi o fato de já existir, no texto supremo, explicitação suficiente quanto às linhas estruturais do tributo – o que nem de longe ocorre, em se tratando de contribuição de intervenção. A falta de lei complementar e a inexistência de uma definição clara dos conceitos vagos que enunciam os elementos materiais desse tributo dificultam a tarefa do legislador ordinário e o controle da constitucionalidade da lei que o institui.107

E concluem:

A definição de contribuição de intervenção no domínio econômico depende de lei complementar; a teor do art. 149 da CF, sendo inconstitucional a instituição dessa espécie tributária sem o estabelecimento de normas gerais nos termos do art. 146, III, a, da CF.108

(sublinhamos e grifamos)

No mesmo sentido que as citadas autoras, manifestou-se Gustavo Miguez de Mello: “Por falta do requisito de lei complementar de normas gerais em matéria de legislação tributária, são inconstitucionais todas as contribuições de intervenção no domínio econômico já instituídas na vigência da Constituição Federal de 1988”.109

Também presente no XXVI Simpósio de Direito Tributário, Kiyoshi Harada manteve a mesma opinião acerca da inscontitucionalidade da CIDE dos Combustíveis:

106 Os vários artigos produzidos pelos tributaristas convidados, foram reunidos em obra intitulada Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico, sob a coordenação de Ives Gandra da Silva Martins. 107 SOUZA, Fátima Fernandes R. de; PAVAN, Cláudia Fonseca Morato. Contribuições de intevenção no domínio econômico. In: MARTINS, Ives Gandra (coord.). 2002, p. 109. 108 Idem, ibidem, p. 119. 109 MELLO, Gustavo Miguez. Contribuição de intervenção no domínio econômico: um convite ao legislador constituinte derivado para reduzir o direito do contribuinte estabelecido pela Assembléia Constituinte. In: MARTINS, Ives Gandra (coord.). 2002, p. 189.

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A contribuição incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool etílico combustível, instituído pela Lei 10.336, de 19.12.2001, é inconstitucional, quer pela ausência de definição dessa espécie em nível de norma geral (art. 146, III, a, da CF), quer por sua ausência de regulamentação, por lei complementar, das hipóteses de incidência única, como determinada no §4º do art. 149 da CF. 110

A criação da CIDE dos Combustíveis por lei ordinária violou frontalmente os dispositivos constitucionais previstos no art. 146, III, “a”, e art. 149, da CF88, que exigem a edição de lei complementar para a instituição do referido tributo. Aurélio Pitanga é defensor do mesmo ideal, manifestado em artigo intitulado Contribuição e vinculação de sua receita, em que defende a equiparação das contribuições aos impostos, afirmando que “a criação de novos impostos sofre severa limitação constitucional, sendo exigida lei complementar [...]” 111.

Paira, pelo exposto, evidente a inconstitucionalidade da CIDE dos Combustíveis por mais este fundamento.

10. APLICAÇÃO DA RECEITA DA CIDE POR ENTE POLÍTICO DIVERSO

Como já visto em capítulos anteriores, a CIDE dos Combustíveis, embora de curta existência, já sofreu diversas alterações legislativas em sua instituição, inclusive, sendo contemplada pela edição de três emendas constitucionais (EC`s n.º 33, 42 e 44).

A Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003, introduziu o inciso III, no artigo 159 da CF88, dispondo que caberá aos Estados e ao Distrito Federal vinte e cinco por cento do valor arrecadado da CIDE dos Combustíveis pela União Federal

A referida emenda incluiu ainda o parágrafo quarto no artigo 159 da CF88, proferindo comando aos Estados e Distrito Federal para que repassem vinte e cinco por cento dos valores que receberam da União aos Municípios.

110 MARTINS, Ives Gandra (coord.). 2002, p. 298. 111 SEIXAS FILHO, 2004, p. 43.

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Foi salientado aos entes políticos, que embora estivessem recebendo o repasse destes valores arrecadados pela União, que observassem a destinação específica incluída pela EC n. 33, prevista no art. 177, §4º, II, “c” (financiamento de programas de infra-estrutura de transportes).

Posteriormente, a EC n. 44, de 30.06.04, majorou o percentual destinado aos Estados e Distrito Federal para vinte e nove por cento.

Questiona-se a constitucionalidade dos dispositivos que, muito embora se sustentem em emendas constitucionais, podem padecer de inconstitucionalidade112.

Neste ponto é salutar estabelecermos distinção entre o que vem a ser competência e capacidade tributária ativa. A primeira é atribuição constitucional, que concede autorização para determinado ente político criar normas jurídicas tributárias. A segunda é a atribuição de determinada pessoa figurar no pólo ativo de uma relação jurídica tributária.

O Código Tributário Nacional, em seu art. 7º, esclarece que a competência tributária é indelegável, podendo o poder competente delegar apenas atribuições de “arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária [...] conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra [...]”.

Prima facie, poderia parecer que a inovação trazida pela EC n. 42 e recentemente alterada pela EC n. 44 seriam constitucionais, haja vista que é a União Federal quem legislou sobre o assunto instituindo o tributo (Leis n.s 10.336/01 e 10.866/04).

Este posicionamento não prospera em análise mais precisa.

A União foi obrigada a repassar aos demais entes políticos parte dos recursos adquiridos, delegando capacidade tributária ativa para sua execução de leis, ou seja, a aplicação dos recursos na infra-estrutura de transportes - intervenção.

É pacífico que ao contrário da competência, a capacidade tributária ativa pode ser delegada a terceiros; esta é a regra. Porém, como toda regra tem exceção, mormente em direito tributário, poderá haver hipótese de autorização de criação de tributo pela Constituição Federal, em que condicione tal autorização à limitação de transferência da capacidade tributária ativa, como é o caso das contribuições interventivas.

O artigo 149 da Constituição Federal é objetivo e preciso ao dispor que “compete exclusivamente à União instituir contribuições [...] de intervenção no domínio econômico [...] como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas [...]” (grifamos e sublinhamos).

112 Pode, sem dúvida, ser editada emenda constitucional que viole o texto constitucional existente, a exemplo de declaração de inconstitucionalidade pelo STF em ADIn n.º 939 – DF, ao analisar a EC n.º 3, no tocante a instituição do IPMF, por violação aos princípios da imunidade recíproca e da anterioridade. No mesmo sentido, Gustavo Miguez de Mello, in MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.), Contribuições de intervenção no domínio econômico, 2004, p. 177.

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Ora, a locução “sua atuação” condiciona a atuação da União Federal e de nenhum outro ente político. O legislador constitucional não inclui palavras desprezíveis no texto constitucional, devendo todas elas serem analisadas e, ao intérprete cabe buscar seu sentido e alcance.

O pronome possessivo “seu” afirma que é a União quem instituirá a CIDE e é a entidade federal que atuará nas áreas específicas; conecta o substantivo “União” ao verbo “atuação”, formando vínculo indissociável.

Temos que, em se tratando especificamente das contribuições interventivas, o poder constituinte originário expressamente proibiu a União Federal de transferir a capacidade tributária ativa de uma pessoa jurídica de direito público a outra, com a finalidade de que o poder público instituidor do tributo fosse o mesmo que providenciasse a intervenção. Esta conclusão, excepcional, não viola a repartição de receitas, posto que nem todos tributos contemplam tal propriedade e, no caso da comercialização de combustíveis, já existe distribuição da receita do ICMS dos Estados aos Municípios sobre o mesmo fato gerador (CF88, art. 158, IV).

Em observância ao artigo 6º, parágrafo único, do CTN, qualquer distribuição de receita, neste caso, mesmo que parcial, geraria competência daquele ente político que a recebeu para disciplina-la, o que não é aceitável na CIDE em razão do artigo 149 da CF88 dispor expressamente que “compete exclusivamente à União instituir [...] contribuição de intervenção no domínio econômico [...]”. Criticamos a constitucionalidade deste dispositivo, visto que a competência é indelegável.

O próprio artigo 7º do CTN, ao tratar da competência tributária, também afirma que poderá haver transferência de atribuições (capacidade tributária ativa) “por uma pessoa jurídica de direito público a outra”, o que reiteramos ser inaplicável no tributo em exame, em face do caput do art. 149 da CF.

Impende ressaltar, que a critica estabelecida nesta análise se atém ao que se refere a transferência de capacidade tributária ativa – na CIDE – de um ente político à outro, não podendo a União passar atribuição interventiva aos Estados, Distrito Federal ou Municípios. Nada impede, entretanto, que a entidade federal delegue atribuições à terceiros (art. 7º, §3º, CTN), para o cumprimento da lei, arrecadação e aplicação dos recursos, etc; nesta hipótese, a União estará efetuando intervenção indireta ao criar norma interventiva, mas transferindo uma intervenção direta à terceiros.

Paulo de Barros Carvalho comenta a questão:

Mas as críticas que deduzimos ao art. 6º e seu parágrafo único não se estendem ao art. 7º do Código. Nele, interpretou o legislador corretamente a sistemática constitucional, no que concerne à indelegabilidade da função legislativa. O constituinte acenara com o postulado no art. 6º (CF), admitindo as exceções previstas na Lei Maior. E o legislador da Lei n.º 5.172/66, reconhecendo a inexistência de ressalvas, oportunamente enuncia de novo a diretriz, aplicando-a ao território das competências tributárias. E, dentro dessa linha, os §§ 1º, 2º

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e 3º, explicitam a disciplina das atribuições de arrecadar e fiscalizar tributos, que se não confundem com o exercício da competência de legislar sobre a matéria.113

(grifamos e sublinhamos)

Ives Gandra da Silva Martins analisou a questão e concluiu pela impossibilidade de se atribuir capacidade ativa aos Estados, Distrito Federal e Municípios, em se tratando de contribuição interventiva:

A lei suprema brasileira admite apenas duas agências para regular questões vinculadas ao petróleo e às telecomunicações.

A pergunta que se faz [SIC] objetiva conhecer se, além destas agências, poderiam União, Estados e Municípios criar aquelas que desejarem.

Não estou convencido, pela excepcionalidade e pela força de que se revestem, que possam ser criadas tantas agências regulatórias quantos sejam os segmentos considerados relevantes para o governo – que, um dia, argumentando-se ad absurdum, poderão ser todos.

[...]

Para mim, portanto, apenas duas agências – de caráter regulatório – podem existir, ou seja, a Anatel e a ANP.

[...]

Estabelecida, todavia, uma contribuição de intervenção no domínio econômico de caráter excepcional e transitório para setor descompassado, entendo que a capacidade de sua arrecadação pode ser deferida, por lei, para uma das duas agências regulatórias e não para outras agências, que vicejam na inconstitucionalidade neste país, sufocado pelas instituições burocráticas, absorvendo 60% da receita tributária nos Estados e Municípios e 50% na União, para pagamento da mão-de-obra oficial.114

Mizabel Abreu Machado Derzi, em atualização da obra de Aliomar Baleeiro “Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar”, em nota esboça a rigidez do sistema constitucional como forma de manter sua integridade.

As contribuições especiais, na Constituição de 1988, continuam atribuídas à competência privativa da União (art. 149), ressalvada, em favor dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a instituição de

113 CARVALHO, 1997, p. 143. 114 MARTINS, 2002, pp. 53-55, passim.

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contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social.

[...] O princípio da legalidade foi restabelecido em sua rigidez máxima tanto para as contribuições sociais em sentido lato, inclusive aquelas destinadas ao custeio da Seguridade Social, assim como para as contribuições de intervenção no domínio econômico. Não há exceções.115

Por sua vez, Hugo de Brito Machado pondera que a Constituição Federal atribuiu à União Federal um poderoso instrumento interventor, que por esta deve ser utilizado:

Ao determinar que compete exclusivamente à União Federal instituir contribuições de intervenção no domínio econômico (CF de 1988, art. 149), a Constituição dotou a União de um instrumento para a prática de intervenções no domínio econômico, e não de um instrumento simplesmente arrecadatório de recursos financeiros. Esse instrumento deve ser usado em consonância com os demais dispositivos da mesma Constituição que cuidam da intervenção no domínio econômico. Sua utilização para outros fins configura violação à Constituição, caracterizada pelo desvio da finalidade a que se referem especialmente os cultores do Direito Administrativo.116

E complementa:

Admitir a instituição de tributo sobre quaisquer fatos de relevância econômica com o nome “contribuição de intervenção no domínio econômico” e sem essas características essenciais é admitir a total destruição do sistema constitucional tributário, com supressão das limitações constitucionais ao poder tributar e da própria Federação. É admitir que a União fique liberada para substituir aos poucos os impostos que arrecada para partilhar com os Estados e Municípios por contribuições não sujeitas a essa partilha, e até para invadir a competência tributária daqueles, superpondo contribuições ditas de intervenção no domínio econômico aos impostos estaduais e municipais.

Infelizmente o caminho para tais abusos parece ter sido aberto com a Emenda Constitucional n. 33, de 2001. Se o Supremo Tribunal Federal não fizer valer a Constituição, as contribuições de intervenção no domínio econômico serão transformadas em instrumento ordinário de arrecadação de recursos financeiros para a União, com evidente prejuízo para o Estado Brasileiro.117

(grifo nosso)

115 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, 2003, pp. 516-517. 116 MACHADO, 2004, p. 400. 117 Idem, ibidem, p. 401.

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Pelo que já foi considerado, cabe sempre ressaltar que a interpretação do texto constitucional deve ser sempre restritiva, sob pena de se alargar o conceito de postulados, onde a constituição de fato não objetivava disciplinar. O que o legislador constitucional não permitiu, não cabe ao intérprete permitir.

É de se concluir que, ao dispor expressamente o art. 149 da CF88 e vincular a atuação da União para aplicar os recursos à instituição do tributo, quanto às contribuições de intervenção no domínio econômico, impera afirmar que a interpretação plausível do artigo 7º da Lei 5.172, de 25.10.1966, está no sentido de que a competência tributária é sempre indelegável, e que não poderá haver, no caso da CIDE, delegação de capacidade tributária ativa aos Estados, Distrito Federal e Municípios.

11. INTERVENÇÃO ESPECÍFICA

Amplamente apresentado no decorrer do exame do tributo em questão, as grandes controvérsias que gravitam em torno da contribuição de intervenção no domínio econômico.

É de se perceber que ponto fundamental dos debates pode ser atribuído à problemática da intervenção específica, como efeito da destinação específica do produto da arrecadação desta cobrança tributária, prevista no art. 149, CF88.

Inicialmente, consideramos que apesar de grandes doutrinadores criticarem a validade de uma “específica destinação” do produto da arrecadação das CIDE`s, e outros tantos afirmarem sua constitucionalidade, embasamos estas considerações no sentido de, em que pesem os argumentos destas correntes, é fato inconteste entre ambas que o texto constitucional afirma categoricamente que a instituição de contribuição interventiva servirá como real instrumento de atuação da União nas áreas sobre as quais recaiu o ônus tributário.

Seja esta destinação específica ou intervenção específica, objetos de estudo do direito financeiro ou tributário, o que nos importa neste estudo é a análise da CIDE dos Combustíveis.

Neste aspecto, comparando a redação do artigo 149 da CF88 com o texto inserido pela emenda constitucional n. 33, posteriormente reprisado pela lei n. 10.336/01, não resta dúvidas de que há flagrante violação a expresso dispositivo legal constitucional.

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A dita emenda constitucional incluiu no artigo 177 o parágrafo 4º, em que seu inciso II, define a destinação específica para os recursos da CIDE ora em elaboração.

Art. 177 [...]

§4º [...]

II – os recursos arrecadados serão destinados:

a) ao pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo;

b) ao financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás;

c) ao financiamento de programas de infra-estrutura de transportes.

É evidente que as destinações consideradas não guardam qualquer relação com o fato gerador do tributo, fazendo com que o setor em que recaia o tributo seja inquestionavelmente diverso do que receberá a intervenção. Verifica-se que sob o manto das contribuições interventivas foi criado mais um imposto – pois não há respeito a destinação específica – com fins exclusivamente arrecadatórios sem qualquer observância aos preceitos estabelecidos na constituição federal.

Exatamente neste aspecto Kiyoshi Harada critica a instituição da CIDE por haver desvio de sua função:

Não bastasse a expressão “contribuição social de intervenção no domínio econômico”, o texto constitucional (art. 149) elegeu essa contribuição como instrumento de atuação da União na área econômica, de sorte a não permitir sua utilização com finalidade arrecadatória. 118

Hugo de Brito Machado também faz advertência quanto a finalidade deste tributo, sustentando que em verdade, a CIDE, especificamente, não é um tributo de função arrecadatória, porque a própria constituição indicou que sua instituição atenderá uma finalidade, qual seja, a intervenção específica.

É muito comum a afirmação segundo a qual as contribuições são espécie tributária que se caracteriza pela finalidade. No caso da CIDE, contudo, essa finalidade não é a de angariar recursos, mas realizar intervenção na

118 MARTINS, 2002, p. 296.

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economia. Em face disso, surge a controvérsia acerca do modo como essa espécie tributária deve ser utilizada pela União Federal, se diretamente, tal como um imposto extrafiscal, ou se indiretamente, custeando órgão estatal incumbido de realizar a intervenção.119

O doutrinador aborda questão de grande relevância, que podemos resumir em determinação de uma intervenção direta ou indireta. Poderia ser considerado que a CIDE dos Combustíveis teria o condão de gerar tanto uma quanto outra. Não há sentido em negar o caráter extrafiscal de contribuição interventiva que tenha como finalidade intervir em determinado setor, seja pela mera instituição e arrecadação do tributo, como ocorre nos casos de Imposto de Importação e Exportação, ou ainda, servindo para a União Federal diretamente aplicar os recursos gerados no setor sobre o qual recaiu a imposição tributária.

É até possível afirmar que a intervenção também pode ser indireta, servindo para custear determinado órgão ou setor que efetivará ações e, assim, estará a intervir indiretamente em setor respectivo, qual seja, o mesmo que arcou com o tributo. Neste caso, ficaria latente a função parafiscal dada à CIDE.

Como já abordado em capítulo anterior, interpreta-se o art. 149 da Constituição Federal no sentido de que a intervenção deverá ser feita pela União Federal, não havendo no caso das contribuições interventivas, possibilidade de transferência de capacidade ativa para sujeito – ente político – diverso.

Cabe-nos referenciar as definições de fiscalidade, extrafiscalidade e parafiscalidade, nas palavras de Ricardo Lobo Torres:

Enquanto a fiscalidade se caracteriza pela destinação dos ingressos ao FISCO, a parafiscalidade consiste na sua destinação ao PARA-FISCO, isto é, aos órgãos que, não pertencendo ao núcleo da administração do Estado, são paraestatais, incumbidos de prestar serviços paralelos e inessenciais através de receitas paraorçamentárias.

[...]

A extrafiscalidade, como forma de intervenção estatal na economia, apresenta uma dupla configuração: de um lado, a extrafiscalidade se deixa absorver pela fiscalidade, constituindo a dimensão finalista do tributo; de outro, permanece como categoria autônoma de ingressos públicos, a gerar prestações não-tributárias.120

Em outras palavras, podemos conceituar a fiscalidade como toda função dos tributos que objetivem exclusivamente fins arrecadatórios; gerar riqueza para o Estado e

119 Idem, ibidem, p. 308. 120 TORRES, Ricardo Lobo. 2004, pp.184-185.

100

dinheiro para os cofres públicos. Em outro sentido, a extrafiscalidade é a função imediata dada a um tributo para regular, atingir, determinada situação que o Estado busca alterar, interagir, sendo a arrecadação mera conseqüência deste primeiro objetivo. Por sua vez, a parafiscalidade pode ser conceituada como a função dada a tributo instituído que vise ser destinado e aplicado por setor da administração indireta e parafiscal, a exemplo dos sindicatos e órgãos de classe.

Cumpre-nos então definir o que vem a ser intervenção no domínio econômico. Para tal atribuição, poderíamos utilizar definição de Maria Helena Diniz que afirma ser a

participação estatal no fluir do processo econômico, seja na produção de riqueza, seja na sua distribuição, objetivando a correção de distorções que possam surgir no regime de liberalismo econômico e visando a realização dos fins do Estado, baseando-se na liberdade de iniciativa, na valorização do trabalho, na função social da propriedade etc.121

É de se discordar de Hugo de Brito122, ao associar intervenção exclusivamente à exploração direta de atividade econômica pelo Estado. Não resta dúvida de que exploração de atividade econômica prevista no art. 173 da CF88 configura uma intervenção estatal na economia, mas uma intervenção direta não se resume a isto. Poderá a União intervir diretamente no domínio econômico sempre que agir diretamente na regulação, instituição de tributo, fiscalização, etc.

Porém, destas intervenções diretas em atividade econômica v.g. exploração como empresário e implementador de políticas públicas como agente administrativo, somente a segunda servirá como intervenção direta específica, dando validade constitucional para que ocorra imposição da CIDE.

A intervenção indireta por sua vez, é a que não é praticada pela própria administração, mas por terceiros a ela vinculada, servindo a União como mera expedidora de normas – exercício da competência.

Ainda em relação a atuação direta do Estado na ordem econômica, é relevante destacar colocação de Hugo de Brito para que não fiquem dúvidas:

Se a contribuição há de ser instrumento de atuação da União em uma determinada área, como explicitamente indicava a redação da Carta pretérita e nos precisos termos do art. 149 da CF/88, é claro que não pode ela atuar nesta área, diretamente, cobrando preço, e cumulativamente arrecadar recurso mediante contribuição. Se assim fizesse estaria atuando por duas vias e, pior, estaria tendo dupla fonte de

121 DINIZ, vol.2, p. 893. 122 MACHADO, Hugo de Brito, in MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico. 2002, p. 67.

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custeio. Ora, tal contraria o princípio da eficiência (art. 37 da CF/88) e o da proporcionalidade.

[...]

A União, quando atua diretamente tira proveito econômico de sua atuação, mediante a cobrança de preço, cuja dimensão deverá ser suficiente para a manutenção e também para a expansão da atividade. Admitir a possibilidade de o Estado, concorrendo com a atividade privada, explorar determinada atividade econômica e, ao mesmo tempo, instituir contribuição de intervenção como instrumento para essa exploração, implica perigoso alargamento da competência impositiva da União [...]. 123

Guardamos a devida ressalva, no tocante ao preço público, que registramos ser mera compensação financeira. Neste sentido, não podemos confundir a atuação estatal direta afirmada por Hugo de Brito (art. 173, CF88), que transparece uma atividade empresarial, v.g. exploração de instituição financeira – banco, com uma atividade direta decorrente de intervenção específica motivada por imposição tributária (feita pela própria União) de cunho regulatório, temporal, excepcional, que objetive tão somente restabelecer a ordem econômica; como o próprio nome indica, restabelecer a ordem. Ambas são intervenções diretas na ordem econômica, porém, como já visto em parágrafos anteriores, somente a segunda se presta à instituição de CIDE por ser específica (arts. 170 e 174, CF88).

Quanto a intervenção indireta específica, esta ocorre quando o Estado – União Federal – intervém indiretamente no domínio econômico refletindo caso de parafiscalidade, ou seja, custeia uma atividade interventiva a ser praticada diretamente por terceiros. Este custeio estatal se opera por delegação de capacidade tributária ativa. Neste caso, a referida intervenção na economia não poderá ser feita por ente político diverso da União Federal, mas sim a terceiros a ela subordinados.

Os recursos arrecadados pela Contribuição Interventiva, jamais devem se prestar para financiar uma exploração empresarial do Estado na economia, sob os mesmos argumentos apresentados por Hugo de Brito.

O caráter extrafiscal da CIDE foi reconhecido pelo supracitado autor quando afirmou:

As contribuições devem intervir na economia ao incidir, de modo extrafiscal, e ao terem os seus recursos destinados a uma atividade de intervenção. Admitir o contrário é incorrer entre outros, no equívoco de aceitar o emprego de meio que não é o mais adequado para a consecução do fim e, portanto, inconstitucional por ofensa à proporcionalidade.124

123 Idem, ibidem, p. 70. 124 ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes questões atuais de direito tributário. São Paulo: Dialética, 2001, vol. 5, p. 179.

102

Mantemos o mesmo entendimento de Ives Gandra da Silva Martins, no sentido em que é restrita a possibilidade de intervenção na economia por imposição da CIDE, que deverá ser sempre de utilização extraordinária e temporária.

[...] sendo a contribuição de intervenção no domínio econômico instrumento de planejamento econômico, à nitidez, não pode ser utilizado de forma determinante para o setor privado e, principalmente, para segmentos que não estejam desregulados, descompassados ou vivenciando evidente crise de competitividade ou de subsistência. Sendo um instrumento interventivo, apenas pode ser adotado excepcionalmente e quando detectado desequilíbrio de mercado, que deva ser superado. Caso contrário, a contribuição conformaria uma forma de planejamento determinante para o segmento privado, o que vale dizer, se tornaria um tributo maculador da lei suprema.125

Nada impede, como já afirmado, que a CIDE dos Combustíveis seja um tributo parafiscal; para tanto, deverá delegar capacidade tributária ativa à terceiros, sendo que o dito ente político fazendo isto, já estará a intervir indiretamente no domínio econômico.

Para fixarmos nossas bases de entendimento e prosseguirmos, podemos extrair do já exposto, que é exclusivamente126 a União Federal quem deve instituir a contribuição interventiva, tributo este, que deve ser utilizado somente em situações extremas e por prazo certo. E, uma vez utilizado, gera necessariamente uma intervenção federal na respectiva área sobre a qual recaiu a imposição da exação, sob pena de afronta à Lei Maior. Tal intervenção poderá ser feita pela própria União, a que consideramos intervenção direta, onde a função do tributo será extrafiscal. Poderá do mesmo modo delegar capacidade tributária a terceiros, que não os demais entes políticos, intervindo assim indiretamente no domínio econômico adquirindo função parafiscal.

Passamos às hipóteses criadas pela EC n. 33, que destinou o produto de arrecadação da CIDE para pagamento de subsídios a preços de transporte de combustíveis, financiamento de projetos ambientais associáveis à indústria do álcool e, finalmente, ao custeio de programas de infra-estrutura de transportes.

Em relação ao primeiro fundamento de instituição da CIDE dos Combustíveis, é de se verificar em que circunstância se processará o financiamento ou subsídio, a preço de transporte de combustíveis. Analisando a questão, reconhecemos que há certa relação desta destinação específica com as atividades de importação e comercialização de combustíveis, haja vista que, em ambas, necessita-se de transporte do produto.

125 ROCHA, 2001, p. 191-192. 126 Termo literalmente utilizado pelo legislador no caput do artigo 149, da CF88.

103

Ad argumentandum, caso não houvesse qualquer outra mácula que viciasse este tributo, sob este primeiro fundamento é de ser aceita a imposição como constitucionalmente devida.

Contudo, o mesmo raciocínio não pode ser estendido aos demais fundamentos.

Não há qualquer relação entre o fato gerador do tributo e a destinação dada ao valor auferido, o que viola a destinação específica que conduz a uma intervenção específica no setor que realmente pagou o tributo.

Qualquer financiamento de projeto ambiental, mesmo que – diga-se distantemente – possa se afirmar terem algum vínculo, não atendem ao preceito constitucional do art. 149. Não guarda relação o ato de importar e comercializar, com matéria ambiental. Mesmo cogitando hipótese de grave acidente que danifique o meio ambiente, posto que já existem meios legais de se atribuir responsabilidade aos agentes causadores e, em segundo lugar, todo um grupo de empresários arcariam com o pagamento do tributo, sendo que somente uns poucos é que sofreriam a intervenção estatal.

A hipótese fica mais estranha e inconstitucional à vista que analisamos o terceiro fundamento: financiamento de programas de infra-estrutura de transportes. Esta destinação não é específica, e nem sequer se aproxima do fato gerador da CIDE dos Combustíveis. Financiamento de projetos relativos as malhas viárias deve ser arcado pela receita dos impostos, haja vista que toda uma coletividade goza de seus benefícios. O custeio desta atividade por qualquer outro tributo já constitui flagrante inconstitucionalidade, o que salta a patamares absurdos em se tratando de CIDE, que deve ter uma intervenção específica.

Ora, novamente questionamos, se apenas um grupo arca com o peso financeiro deste tributo, porque uma coletividade será beneficiada? Onde está a isonomia? Afirmamos que, se todas as pessoas indistintamente gozarem dos benefícios de uma determinada ação, ou até mesmo intervenção pública, a isonomia está em que todos arquem com seu custo.

O que não se concebe é a absoluta afronta ao artigo 149 da CF88, e do princípio da isonomia, recaindo o ônus financeiro da CIDE sobre um pequeno grupo. Não se pode utilizar os recursos da CIDE dos Combustíveis como mera receita de pedágio, apto a recuperar as estradas e rodovias.

Neste mesmo sentido, Fernando Maida sustenta a inconstitucionalidade do tributo:

[...] no que pertine a sua destinação, o artigo 1º, inciso II deste dispositivo legal retrocitado trata de projetos de meio ambiente, e até o presente momento não se demonstrou transparência a respeito dos projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo. Não seria uma redundância? Sabe-se que apesar dos vazamentos ocorridos em diversas ocasiões, as empresas de petróleo são as que possuem os maiores quadros de pessoal, maior infraestrutura [SIC] em termos de materiais e equipamentos e uma articulação conjunta com as instituições

104

governamentais de forma eficaz. Como isso seria factível, se para o empreendimento ser realizado ou já em funcionamento a legislação de meio ambiente nos três níveis – federal, estadual e municipal, faz exigências com relação às medidas preventivas e/ou corretivas contra o impacto ambiental? OU seria apenas um pretexto para manutenir a arrecadação aos níveis que são necessários para a justificativa de um Estado gastador e que vende a imagem de um Estado saneado?

[...]

Bem, diante de tal cenário normativo dantesco e extremamente entrópico, o ponto focal constata-se como apenas arrecadatório. 127

À guisa de conclusão, a intervenção determinada pela Lei 10.336/01 em seu artigo 1º, incisos II e III, criados em obediência à EC n. 33/01, são absolutamente inconstitucionais por não guardarem qualquer relação com o fato gerador e, por este motivo, serem imprestáveis a atender o preceito constitucional (art. 149, caput) que determina que a CIDE seja instituída pela União “como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas”; áreas estas, por lógica, sobre as quais houve a instituição do tributo; no caso da referida lei, a importação e comercialização de combustíveis.

Devem ser guardadas as considerações feitas acerca do inciso primeiro do supracitado dispositivo, uma vez que há uma distante – mas existente – possibilidade de que setor que importe ou comercialize combustível, venha a ser destinatário exclusivo de intervenção estatal quanto ao pagamento de subsídio a preços ou transporte de combustíveis.

Encerra-se a análise a esta imposição tributária com a consideração de que, como vastamente observado, tal tributo guarda diversas inconstitucionalidades, o que torna sua instituição mais um caso de confisco por expropriação do patrimônio particular indevidamente, inconstitucionalmente.

Fazemos nossas palavras e aplicamos à CIDE dos Combustíveis, as precisas colocações e considerações de Aurélio Pitanga Seixas Filho acerca da Contribuição para Custeio de Iluminação Pública, que servem também a todas as demais contribuições:

Não se pode entender como pode caber num Sistema Tributário, – rigidamente regulado no texto constitucional, em que os impostos são distribuídos específica e exaustivamente para cada unidade federativa, e a criação de taxas e novos impostos é rigorosamente regulada, - a existência de uma figura exótica que, desde que apelidada de contribuição, pode contrariar todos os seus princípios diretores.

[...]

127 MAIDA, Fernando. O caráter fiscal e extrafiscal da CIDE sobre as atividades na indústria de petróleo. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 181, 3 jan. 2004, p. 13.

105

A situação carnavalesca do direito tributário, para Alfredo Augusto Becker, nada mais foi que uma progressão de uma anterior situação demencial, relatada em seu festejado livro sobre a Teoria Geral do Direito Tributário:

“No Brasil, como em qualquer outro país, ocorre o mesmo fenômeno patológico-tributário. E mais testemunhas são desnecessárias, porque todos os juristas que vivem a época atual – se refletirem sem orgulho e preconceito – dar-se-ão conta que circulam nos corredores dum manicômio jurídico tributário....

“E a mais confusa e ridícula das mentalidades pseudojurídicas é a que predomina no Direito Tributário; neste campo “há burrices que de tão humildes, chegam a ser pureza e têm algo de franciscano. Outras há, porém, tão vigorosas e entusiásticas, que conseguem imobilizar por completo o nosso espírito para a contemplação do espetáculo.””

128

Constata-se objetivamente, que a expressa previsão constitucional traçada no caput do art. 149 da CF88 está sendo violado, fulminando esta exação de inconstitucionalidade.

12. REPERTÓRIO JURISPRUDENCIAL

Acentuado pela atualidade do tema e sua recente criação, torna-se imprescindível ao exame da CIDE dos Combustíveis uma análise de decisões judiciais que abordem sua validade.

Devemos considerar, em princípio, que este tributo é relativamente novo, tendo sido introduzido em nosso ordenamento jurídico somente no final do ano de 2001. Desta data até o presente momento, os Tribunais Regionais Federais ainda analisam questões processuais incidentais, não tendo proferido decisões de mérito que alcance a inconstitucionalidade da CIDE dos Combustíveis. As poucas decisões identificadas resumem-se a decisões em sede de agravos de instrumento, as quais serão algumas destas aqui elencadas.

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região tem entendido que não podem os contribuintes serem contemplados com decisões em sede liminar, que determine o não recolhimento de tributo, por suspensão da exigibilidade do crédito. Manifestaram-se no sentido de que tal ato gera grave dano à ordem jurídica e prejuízo aos cofres públicos.

128 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Contribuição para Iluminação Pública – EC – 39-2002, pp. 6-7.

106

Sustenta, ainda, que não é possível ao juízo de primeiro grau decidir sobre inconstitucionalidade de lei que tenha instituído a CIDE, merecendo ser apreciada a questão por órgão colegiado.

Este é o posicionamento firmado no AGSS 2002.01.00.038665-5/DF, proferido pelo

TRF da 1ª Região:

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA - AGRAVO REGIMENTAL - MEDIDA CAUTELAR SUSPENDENDO EXIGIBILIDADE, POR INCONSTITUCIONAL, DA CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO INCIDENTE SOBRE A VENDA DE COMBUSTÍVEIS DERIVADOS DE PETRÓLEO E ALCOOL: GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA - SUSPENSÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA.

1. O processo cautelar tem como fim assegurar a exeqüibilidade de sentença futura, se favorável ao autor, não se prestando, por isso, à declaração de inconstitucionalidade de norma legal, o que é atribuição e competência privativa do STF.

2. Evidente, então, a grave lesão à ordem jurídica e também às finanças públicas, porque eximida a empresa do recolhimento da CIDE, suprimidos os valores da arrecadação da União, o que implica não existência de valores para cumprimento da destinação legal; a sentença deve ser suspensa na sua totalidade, porque um todo orgânico.

3. "Ademais, reconhecer, em sede de liminar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, para o fim de deferir a medida, representa, de regra, precipitação, dado que a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, nos Tribunais, somente pode ser declarada pelo voto da maioria absoluta dos membros da Corte. Essa declaração, para o fim de ser concedida a liminar, não deve ocorrer, em decisão monocrática, até por medida de prudência. No caso, ocorre, ademais, que a liminar esgota o julgamento da causa, porque, na prática, é satisfativa. Se, amanhã, os Tribunais Superiores derem pela inconstitucionalidade do ato normativo, terá ocorrido, com a concessão da liminar, grave atentado à ordem pública, em termos de ordem jurídico-constitucional" (STF, SS n. 1.853/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, DJ 04/10/2000).

3. Agravo regimental provido. Sentença suspensa.

4. Autos recebidos em Gabinete aos 19/02/2003 para lavratura do acórdão. Peças liberadas pelo Relator em 24/02/2003 para publicação do acórdão.129

No mesmo sentido se manifesta a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, alegando prejuízo ao erário público e, por orientação jurisprudencial proferida pelo STF, seria incabível a decretação de inconstitucionalidade em decisão monocrática.

129 BRASIL, Tribunal Regional Federal 1ª Região. AGSS n. 2002.01.00.038665-5/DF.

107

Entretanto, no julgamento do agravo de instrumento n.º 2003.03.00.015695-3, em decisão proferida em 10.11.04, esta Corte embasou o indeferimento de medida liminar em mandado de segurança sob alegação de que não há afronta ao artigo 146, inciso III, da CF88, pela Lei 10.336/01. Para os magistrados, as normas gerais em direito tributário exigidas pela lei 146, III, da CF88, já estariam elencadas no próprio Código Tributário Nacional, que detém status de lei complementar. Neste sentido, a ressalva contida no artigo 149 da Constituição Federal que exige os preceitos básicos disciplinados em norma complementar, já estariam atendidos.

Registramos nossa divergência diametralmente oposta à defendida pela citada Corte, porque a matéria geral refere-se a cada tributo especificamente; a alínea “a”, do inciso III, do art. 149, da CF88, determina a especificação dos contribuintes, fato gerador, base de cálculo, etc., de sorte que cada tributo possui tais atributos distintamente, não podendo haver uma única lei complementar que discipline todos, como sugere este Tribunal.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO (CIDE). INCIDÊNCIA SOBRE IMPORTAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE PETRÓLEO E SEUS DERIVADOS, GÁS NATURAL E SEUS DERIVADOS, E ÁLCOOL ETÍLICO COMBUSTÍVEL. CONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 10.336/01. INEXIGIBILIDADE DE LEI COMPLEMENTAR. PREVISÃO CONSTITUCIONAL (ART.149 E 177, § 4º DA CF).

1.Para a concessão de liminar em mandado de segurança a lei exige, cumulativamente, a presença dos requisitos de fundamento relevante (fumus boni iuris) e do periculum in mora.

2.A Carta Magna não exige expressamente lei complementar para a instituição da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE).

3.A remissão que o artigo 149 faz ao artigo 146, inciso III, ambos da Constituição Federal, diz respeito à disciplina prevista no Código Tributário Nacional, não se reportando à exigência de prévia lei complementar para instituir a exação. Definição dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes, a exigência de lei complementar restringe-se a impostos (art. 146, III, a, da CF).

4.Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico que encontra previsão na Carga Magna(art.149 e 177, § 4º).

5.A Lei nº10.336/01, em cumprimento ao artigo 149 da Constituição Federal, observadas as normas estabelecidas pelo artigo 177, § 4º, instituiu a CIDE incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível. Constitucionalidade. Desnecessidade de Lei Complementar para a instituição de contribuição, em havendo exaustiva previsão constitucional.

6.Ausentes os requisitos ensejadores da concessão da medida pleiteada.

108

7.Agravo Desprovido.130

Por sua vez, a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, tem se manifestado contrário ao deferimento liminar de suspensão da exigibilidade do crédito, por entender que não seria cabível em exame de cognição sumária decretação de inconstitucionalidade de lei. Podemos observar no julgamento do agravo de instrumento n.º 111372, proferido em 05.10.2004, que este Tribunal mantém a mesma linha de fundamentação do TRF 3ª Região.

Pelos mesmos argumentos, como já abordado em capítulo próprio neste exame da CIDE dos Combustíveis, tem-se a indispensabilidade de edição de lei complementar para traçar as normas gerais quanto a este tributo, para só então, o poder legislativo poder exercer sua competência e editar lei instituidora do tributo.

Atentamos ao fato de que a supracitada decisão, afirma que “não sendo evidente o vício de inconstitucionalidade, impossível seu reconhecimento em sede de liminar”, o que nos leva a aguardar que esta Corte analise melhor a questão em cognição exauriente, quando do julgamento do mérito da ação, quando esta lhe for apresentada.

Também é de se questionar, conforme o entendimento destas Cortes, o que seria “inconstitucionalidade evidente”, apta a conceder liminar em mandado de segurança? Com o decorrer deste trabalho ficou mais que evidenciada a inconstitucionalidade da CIDE dos Combustíveis, por diversas razões, v.g. atentado contra a rigidez constitucional de distribuição de competências, repartição indevida de receita pública, descumprimento de intervenção específica, falta de lei complementar, violação de princípios.

Tais decisões nos fazem transparecer mais um dos casos em que a voracidade fiscal do Poder Público invade o patrimônio particular, alheio a qualquer limitação e mandamento constitucional, instituindo tributo “anômalo” de cunho unicamente arrecadatório, apto a cobrir os rombos estatais pela má gestão do dinheiro público; sem mencionar a corrupção.

Examinemos a decisão proferida pelo TRF 2ª Região, em julgamento de agravo de instrumento em processo de n.º 2003.02.01.002795-3, proferido em 05.10.2004:

PROCESSUAL CIVIL - LIMINAR - SUSPENSÃO DE EXIGIBILIDADE - CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - CIDE - LEI 10.336/2001 - PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE

I - A Lei 10.336/2001, que instituiu Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a importação e comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível ( Cide ), não é, em princípio, inconstitucional. Não há se falar em afronta ao art. 146-III da CF vez que, subsumindo-se a contribuição

130 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. AG n.º 176167, proc. n. 2003.03.00.015695-3/SP.

109

hostilizada a tributo, não se lhe vislumbra agressão ao CTN, cuja natureza jurídica é de Lei Complementar.

II - Não sendo evidente o vício de inconstitucionalidade, impossível seu reconhecimento em sede de liminar.

III - Precedentes jurisprudenciais.

IV - Agravo improvido.131

Interessante argumento foi utilizado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em julgamento de agravo de instrumento n.º 178512, em 10.03.2004, que em análise dos fundamentos de instituição da CIDE dos Combustíveis, previstas nos incisos I, II e III, do parágrafo 1º, do artigo 1º, da Lei n. 10.336/01, o eminente relator Min. Carlos Muta, acompanhado à unanimidade, constatou que a CIDE em questão não pode se prestar a ter uma finalidade arrecadatória, mas sim, em decorrência da exigência constitucional de específica intervenção, sua função é extrafiscal. Logo, em suas considerações, concluiu que, não sendo os supracitados incisos do parágrafo 1º do art. 1º da lei em comento incentivadores de função arrecadatória, mas sim extrafiscal, por esta única razão concluiu pela manutenção da cobrança por entender constitucional o dispositivo.

Não transparece ter havido uma análise mais profunda da questão pela conclusão da constitucionalidade do tributo por tal argumento. Como já examinado, apesar dos incisos II e III não guardarem qualquer relação com o fato gerador do tributo e, apesar de os recursos arrecadados não estarem sendo investidos no específico setor sobre o qual recaiu o tributo, existem ainda, muitas outras inconstitucionalidades a condenarem a CIDE dos Combustíveis.

Vale conferir o v. acórdão referido acima, proferido pela 3ª Turma do TRF 3ª Região, em julgamento do agravo de instrumento:

DIREITO CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. DEFESA PRELIMINAR. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE ATIVA DO IMPETRANTE. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - CIDE. COMBUSTÍVEIS. EXIGIBILIDADE.

1. Assentada a jurisprudência da Turma, no sentido de que é admissível a interposição de agravo de instrumento contra decisão proferida em mandado de segurança.

2. Não cabe, na espécie, acolher a ilegitimidade ativa de comerciante varejista para questionar a cobrança da CIDE, porquanto o exame das condições da ação, de que pode resultar a extinção do processo, sem exame do mérito, vincula-se à cognição plena e exauriente, afeta ao processo principal: ainda que não se possa, no juízo sumário do agravo

131 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Agravo de Instrumento em proc. n. 2003.02.01.002795-3/RJ.

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de instrumento, decretar e antecipar a carência de ação, a figuração de comerciante varejista no pólo ativo da ação destaca a legitimidade e o interesse processual da agravante em impugnar, por recurso, a liminar concedida.

3. A referência ao artigo 146, inciso III, da Constituição Federal, apenas define uma relação de hierarquia, determinando o conteúdo, mas não a forma legislativa válida para a instituição das contribuições de intervenção no domínio econômico que, assim, podem ser criadas formalmente por meio de lei ordinária, observadas as prescrições materiais da lei complementar de normas gerais, que são aplicáveis, por evidente, a toda e qualquer espécie tributária.

4. O que se verifica, prima facie, é que a CIDE foi instituída para custear a intervenção do Estado, em atividades e programas definidos, pela própria Constituição, como de interesse direto dos atingidos pela tributação, aos quais se reverte um benefício específico. Não se avista, pois, mero interesse fiscal de arrecadação, mas hipótese congruente de extrafiscalidade, motivo bastante para presumir-se legítima a cobrança da aludida contribuição.

5. A lei específica previu, em conformidade com o texto maior, que os recursos são vinculados às despesas efetuadas no interesse e em benefício do setor econômico tributado (incisos I, II e III do § 1º do artigo 1º da Lei nº 10.336/01). A expressão "na forma da lei orçamentária" não compromete a natureza vinculada da contribuição, mas apenas preserva a competência normativa constitucional do legislador orçamentário para, em relação a cada exercício financeiro, projetar as receitas e autorizar as despesas públicas, distribuindo contábil e financeiramente os recursos, em conformidade com as vinculações legais e constitucionais. A Lei nº 10.636, de 30.12.02, em confirmação ao caráter vinculado das receitas, previsto anteriormente na Lei nº 10.336/01, promoveu um novo detalhamento dos pagamentos e dos financiamentos de projetos e programas, a partir do que previsto, mais genericamente, no inciso II do § 4º do artigo 177 da Constituição Federal.

6. A indicação dos produtores, formuladores e importadores como contribuintes da CIDE não importa em violação ao princípio da isonomia, pois todos os demais beneficiados com a intervenção do Estado no domínio econômico, a qual é custeada pela contribuição, são onerados economicamente, a partir do custo e preço intermediários dos produtos, com a incidência fiscal situada na origem do processo econômico.

7. Precedentes.132

Na mesma base de argumentação, manifestou-se a 1ª Turma do Tribunal Regional da 4ª Região:

132 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Agravo de Instrumento em proc. n. 2003.03.00.021958-6/SP.

111

TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CIDE INCIDENTE SOBRE OPERAÇÕES COM COMBUSTÍVEIS. EXTRAFISCALIDADE. LEI COMPLEMENTAR.

DESNECESSIDADE. PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE. DEPÓSITO

JUDICIAL.

1. A prejudicial de ilegitimidade ativa deve ser objeto de decisão no juízo singular, eis temerário entancar-se, via agravo, a pretensão posta no mandamus.

2. Em juízo de prelibação, não há suspender-se a exigência da CIDE instituída pela Lei 10.336/01 com fundamento na destinação das receitas, porquanto esta Turma tem entendido, em reiterados julgamentos, despicienda a vinculação das verbas coligidas a título de contribuição interventiva ao custeio da atividade estatal.

3. As leis revestem-se de presunção de legitimidade e de constitucionalidade, restando imprudente suspender a cobrança em juízo de cognição sumária.

4. A regra-matriz da CIDE é o art. 149 da CF, sendo que a remissão ao art. 146, III, diz com a necessidade de lei complementar que defina os contornos da espécie impositiva quanto a aspectos tributários gerais, o que, com efeito, é plenamente preenchido pelo CTN.

5. O depósito judicial das quantias discutidas é medida que satisfaz ambas as partes. À União, porque eventual indeferimento do pleito importará conversão em renda. À impetrante, porquanto, se acolhida a pretensão, poderá reaver o montante mediante levantamento, sem submeter-se à sistemática dos precatórios.

6. Agravo parcialmente provido.133

O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por meio de sua 4ª Turma, expôs seu entendimento de modo sucinto sobre a questão, que mereceu breves considerações sobre a presunção de legalidade da Lei n. 10.336/01; argumento este, que fundamentou o não provimento do recurso:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CIDE. LEI Nº 10.336/01. PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO LIMINAR. AUSÊNCIA DE REQUISITO.

1. NÃO TENDO SIDO OBJETO DE EXAME DA DECISÃO ATACADA, A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA NÃO MERECE SER CONHECIDA, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

133 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Agravo de Instrumento n. 135494.

112

2. O DESCUMPRIMENTO DO DISPOSTO NO ART. 526 DO CPC SOMENTE ACARRETA A INADMISSIBILIDADE DO AGRAVO QUANDO A PARTE RECORRIDA COMPROVAR TAL FATO, O QUE NÃO OCORREU IN CASU. PRELIMINAR REJEITADA.

3. A LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA DEVE SER DEFERIDA QUANDO O DIREITO DO IMPETRANTE SE MOSTRE AO MENOS RAZOÁVEL E A DEMORA DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL VENHA A LHE PROVOCAR DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO.

4. HIPÓTESE EM QUE MILITA EM FAVOR DA NORMA IMPUGNADA A PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE. AUSENTES, PORTANTO, OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA PLEITEADA.

5. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.134

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou acerca das contribuições interventivas, especificamente a CIDE dos Combustíveis, em ação direta de inconstitucionalidade contra lei orçamentária que destinava os recursos financeiros arrecadados pelo referido tributo a atividades diversas, alheias ao fato gerador.

De extrema importância esta decisão, primeiramente, por ser a única proferida até então pela Corte Constitucional em análise da CIDE dos Combustíveis e, em segundo lugar, porque fixa o entendimento de que deve sempre haver correlação entre a aplicação dos recursos da CIDE e o fato gerador, logo, a intervenção será necessária especificamente no setor sobre o qual arcou com o ônus financeiro do tributo.

Segue a ementa do v. acórdão constitucional em julgamento de ADIn n. 2925/DF, proferido em 19.12.2004:

PROCESSO OBJETIVO - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ORÇAMENTÁRIA. Mostra-se adequado o controle concentrado de constitucionalidade quando a lei orçamentária revela contornos abstratos e autônomos, em abandono ao campo da eficácia concreta. LEI ORÇAMENTÁRIA - CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - IMPORTAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE PETRÓLEO E DERIVADOS, GÁS NATURAL E DERIVADOS E ÁLCOOL COMBUSTÍVEL - CIDE - DESTINAÇÃO - ARTIGO 177, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. É inconstitucional interpretação da Lei Orçamentária nº 10.640, de 14 de janeiro de 2003, que implique abertura de crédito suplementar em rubrica estranha à destinação do que arrecadado a partir do disposto no § 4º do artigo 177 da Constituição Federal, ante a natureza exaustiva das alíneas "a", "b" e "c" do inciso II do citado parágrafo.135

134 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, Agravo de Instrumento em proc. n. 2003.05.00.016226-0 / PE. 135 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn n. 2925 / DF.

113

Impende analisar que no v. acórdão supracitado, o STF faz referência às alíneas “a”, “b” e “c”, do inciso II, do artigo 177, incluídas pela EC n. 33. Espera-se que tais considerações não queiram exprimir concordância constitucional quanto a validade dos mesmos que, por tudo o que foi amplamente analisado neste trabalho, restam absolutamente inconstitucionais.

Aguardamos, então, que chegue e seja deliberada pela Corte Suprema ação judicial com pedido de inconstitucionalidade da lei 10.336/01, instituidora da CIDE dos Combustíveis e, até mesmo, da Emenda Constitucional n.º 33/01 e correlatas.

CONCLUSÃO

Esta análise teve como objeto a abordagem dos tributos denominados Contribuições de

Intervenção no Domínio Econômico, e destes, especificamente o exame da contribuição

incidente sobre a importação e comercialização de combustíveis, a que denominamos

“CIDE dos Combustíveis”, criada pela Lei n. 10.336/01.

Nossa análise buscou abordar inicialmente a evolução normativa deste tributo, que

constatamos padecer de inconstitucionalidade desde sua origem, qual seja, o texto da

Emenda Constitucional n. 33, de 2001.

Em nível de emenda constitucional, as aberrações jurídicas agravaram-se com a

publicação das EC`s n.º 42 e 44, que destinou 25% (vinte e cinco por cento) dos valores

recolhidos pela União aos Estados, e destes, 25% (vinte e cinco por cento) aos

Municípios. Evidenciando o já nítido caráter meramente fiscal dado ao tributo, a Lei n.

10.636, de 30.12.2002, aumentou os valores das alíquotas aplicáveis e, em 30.06.2004,

por meio da EC n. 44, ampliou o valor a ser repassado aos Estados e Distrito Federal

para a ordem de 29% (vinte e nove por cento).

Foi constatado que houve violação clara das competências tributárias ao determinar a

EC n. 33, que poderia ser instituído tributo sobre a importação e comercialização de

combustíveis, ocorrendo clara bitributação, quanto ao ICMS previsto no art. 155, inciso

II e art. 158, IV, da CF88.

114

A instituição pela lei n. 10.336/01, efetivamente criando o tributo, só ratificou a literal

violação ao primado da isonomia, uma vez que somente determinado setor suporta o

encargo tributário, mas, pela destinação dada ao recurso obtido, havendo intervenção,

esta é dirigida a setor diverso, em afronta ao que determina o caput do art. 149 da

Carta Magna.

Os contribuintes – importador, comerciante, etc – sujeitos ao ônus financeiro da

imposição tributária, sofreram discriminação por exigência indevida, haja vista que, se a

intervenção ocorre em setor diverso, qual seja, o de transportes, é sobre este que

deveria recair o encargo financeiro, sob pena de afronta ao princípio da isonomia (art.

150, II, CF) e ausência de razoabilidade.

Outros princípios vêm violados em seqüência pela não observância da isonomia, como

a capacidade contributiva, o princípio da referibilidade, a legalidade, entre outros. Nem

se diga a vedação de confisco, pelo que já se conclui maculada. Sempre que o Estado

arrecada valor indevido ou o retém ilicitamente em seu poder, como já exposto, pratica

confisco. É mais que confiscatório o valor arrecadado a título de contribuição

interventiva sobre os combustíveis, atravessando a fronteira da moralidade.

O Estado em seu insaciável apetite tributário, corroe e devora o patrimônio privado,

sempre na busca de um fato novo, ou até mesmo um já existente para criar novo

tributo, na maioria das vezes agindo ilicitamente, o que deforma nosso sistema

tributário, abala nossa credibilidade no poder público e incentiva a corrupção; afinal, o

povo brasileiro é o grande fiador deste sujeito chamado Governo Brasileiro, “sujeito

incapaz”, que vive sob a curatela de muitos políticos inescrupulosos que não respeitam

a Constituição e criam normas deformadas, inválidas, e lhe executam os atos.

Analisamos a CIDE também sobre o seu aspecto de inconstitucionalidade formal em

outro enfoque, uma vez que foi criada por lei ordinária, em desatenção a exigência do

art. 149, que determina a observância de lei complementar, a teor do art. 146, inciso III,

da CF88. Após a Emenda Constitucional n. 33, a criação da CIDE dos Combustíveis

tendo como veículo introdutor uma lei ordinária, Lei n. 10.336/01, afrontou o artigo 146,

III, da CF88 e, com as alterações que se seguiram, a inconstitucionalidade foi repetida

115

nas demais leis ordinárias que alteraram a primeira, quando todas deveriam ser Lei

Complementar.

As hipóteses das alíneas “b” e “c”, do inciso II, do parágrafo 4º, do art. 177 da CF/88,

reproduzido no art. 1º, §1º, incisos II e III, da Lei 10.336/01, em nenhum caso guardam

relação com o fato gerador do tributo, sendo que este último inciso (financiamento de

programas de infra-estrutura de transportes) o que mais se dissocia de correlação e,

por mais um absurdo jurídico, é justamente o que está sendo utilizado pelos Estados,

Distrito Federal e Municípios, por força da alteração introduzida pela EC n. 44, à

redação do art. 159, III, da CF88.

Examinamos que as Contribuições Interventivas deverão ser sempre tributos de

utilização excepcional e temporária, limitados à área de intervenção, que deve distinta

de setor explorado diretamente pelo Estado na qualidade de agente econômico. A

intervenção gerada pelo tributo, poderá ser específica direta, pela participação da

própria União Federal com agente regulador, arrecadador, etc, caso em que será

extrafiscal, ou indireta, por terceiros – excluídos os Estados, Distrito Federal e

Municípios – sendo assim, parafiscal. De qualquer sorte, é consenso que a CIDE em

nenhuma hipótese poderá ser utilizada com fins meramente arrecadatórios, por

expressa proibição contida no artigo 149 da Constituição Federal.

Assim, pela atual destinação dada ao valor auferido, a função extrafiscal da CIDE que é

a atividade interventiva foi perdida, passando a ser um tributo eminentemente

arrecadador, fiscal. Observa-se que uma das características das contribuições

interventivas que é a temporalidade de sua cobrança não será respeitada, posto que

arrecada vultosa soma em dinheiro para os cofres públicos.

Até mesmo a parte dos recursos financeiros gerados que ficaram sob atribuição da

União são utilizados de forma aleatória, conforme as políticas públicas dos Ministérios

dos Transportes, das Cidades, e do Planejamento, Orçamento e Gestão, menos do

Ministério das Minas e Energia, a quem seria lógica, própria e lícita uma intervenção

no setor de combustíveis.

116

Frente todos os argumentos levantados e analisados, conclui-se pela flagrante

inconstitucionalidade da CIDE dos Combustíveis.

117

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(Cide), e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,

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BRASIL. Lei n.º 10.636, de 30 de dezembro de 2002. Dispõe sobre a aplicação dos

recursos originários da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – Cide

incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás

natural e seus derivados, e álcool etílico combustível, atendendo o disposto no § 2º do

art. 1º da Lei nº 10.336, de 19 de dezembro de 2001, cria o Fundo Nacional de Infra-

Estrutura de Transportes – FNIT e dá outras providências. Diário Oficial [da]

República Federativa do Brasil, Brasília, 31 dez. 2002.

BRASIL. Lei n.º 10.866, de 4 de maio de 2004. Acresce os arts. 1º-A e 1º-B à Lei nº

10.336, de 19 de dezembro de 2001, com o objetivo de regulamentar a partilha com os

Estados, o Distrito Federal e os Municípios da arrecadação da Contribuição de

Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a importação e a comercialização

de petróleo e seus derivados, e álcool etílico combustível – Cide, e dá outras

providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 05 mai.

2004.

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Constituição Federal. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 13

mai. 1996.

119

BRASIL. Medida Provisória n.º 161, de 21 de janeiro de 2004. Acresce o art. 1o-A à Lei

nº 10.336, de 19 de dezembro de 2001, que institui Contribuição de Intervenção no

Domínio Econômico incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e

seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível (Cide), e dá

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UFES. 6 ed. ver. e ampl. Vitória, 2002.

123

ÍNDICE

INTRODUÇÃO ________________________________________________________15

1ª PARTE - Evolução normativa

1 CONSIDERAÇÕES GERAIS__________________________________________16

1.1 Espécies de Contribuições Genéricas__________________________________ 18

2 CONTRIBUIÇÕES DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO__________23

2.1. Espécies de Contribuições Interventivas _______________________________ 26

3 CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO: CIDE DOS

COMBUSTÍVEIS _______________________________________________________32

3.1 Constituição Federal de 1988, artigo 149 _______________________________ 34

3.2 Emenda Constitucional n. 33 _________________________________________ 35

3.3 Lei Ordinária n.º 10.336 / 2001 ________________________________________ 40

3.4 Lei Ordinária n.º 10.636 / 2002 ________________________________________ 42

3.5 Emenda Constitucional n. 42 _________________________________________ 44

3.6 Medida provisória n. 161 / 2004 _______________________________________ 46

3.7 Lei ordinária n. 10.866 / 2004 _________________________________________ 47

3.8 Emenda constitucional n. 44 / 2004 ____________________________________ 49

2ª PARTE - Constituição e delineamento da CIDE dos Combustíveis

4 CLASSIFICAÇÃO TRIBUTÁRIA _______________________________________50

4.1. ESPÉCIES TRIBUTÁRIA _____________________________________________ 59

4.1.1. Imposto_____________________________________________________________________60

4.1.2. Taxas_______________________________________________________________________60

124

4.1.3. Contribuições de Melhoria ___________________________________________________61

4.1.4. Contribuições Sociais ou Genéricas __________________________________________61

4.1.5. Empréstimo Compulsório ____________________________________________________63

5 NATUREZA JURÍDICA ______________________________________________64

6 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS ________________________69

6.1. Princípio da Legalidade e Estrita Legalidade ____________________________ 69

6.2. Princípio da Referibilidade ___________________________________________ 71

6.3. Vedação de Confisco________________________________________________ 72

6.4. Princípio da Isonomia _______________________________________________ 76

7. REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA _____________________________________76

7.1. Critério Material ____________________________________________________ 77

7.2. Critério Temporal ___________________________________________________ 78

7.3. Critério Espacial____________________________________________________ 79

7.4. Critério Pessoal ____________________________________________________ 80

7.5. Critério Quantitativo ________________________________________________ 81

3ª PARTE - Análise crítica da exação

8. INOVAÇÃO IMPOSITIVA NO SISTEMA TRIBUTÁRIO E COMPETÊNCIA

RESIDUAL____________________________________________________________83

9. CRIAÇÃO DA CIDE DOS COMBUSTÍVEIS POR LEI ORDINÁRIA ____________88

10. APLICAÇÃO DA RECEITA DA CIDE POR ENTE POLÍTICO DIVERSO ________92

11. INTERVENÇÃO ESPECÍFICA_________________________________________97

12. REPERTÓRIO JURISPRUDENCIAL __________________________________105

CONCLUSÃO ________________________________________________________113

REFERÊNCIAS_______________________________________________________117

125

ÍNDICE _____________________________________________________________123