competitividade e produtividade das algodoe iras e das...

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TEXTO PARA DISCUSSÃO N O 515 Competitividade e Produtividade das Algodoeiras e das Fiações no Sul-Sudeste do Brasil SETEMBRO DE 1997

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TEXTO PARA DISCUSSÃO NO 515

Competitividadee Produtividadedas Algodoeirase das Fiaçõesno Sul-Sudestedo Brasil

SETEMBRO DE 1997

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* Trabalho elaborado no âmbito do Convênio IPEA/IPARDES

005/96. Equipe técnica: Gracia Maria Viecelli Besen,José Sidnei Gonçalves, Maria Lúcia de Paula Urban,Paulo Wavruk e Sérgio Wirbiski.

TEXTO PARA DISCUSSÃO NO 515

Competitividade e Produtividade dasAlgodoeiras e das Fiações no

Sul-Sudeste do Brasil*

Brasília, setembro de 1997

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M I N I S T É R I O D O P L A N E J A M E N T O E O R Ç A M E N T OM i n i s t r o : A n t ô n i o K a n d i rS e c r e t á r i o E x e c u t i v o : M a r t u s T a v a r e s

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

P r e s i d e n t eF e r n a n d o R e z e n d e

D I R E T O R I A

C l a u d i o M o n t e i r o C o n s i d e r aG u s t a v o M a i a G o m e sL u í s F e r n a n d o T i r o n iL u i z A n t o n i o d e S o u z a C o r d e i r oM a r i a n o d e M a t o s M a c e d oM u r i l o L ô b o

O IPEA é uma fundação pública, vinculada ao Ministério doPlanejamento e Orçamento, cujas finalidades são: auxiliaro ministro na elaboração e no acompanhamento da políticaeconômica e promover atividades de pesquisa econômica aplicadanas áreas fiscal, financeira, externa e de desenvolvimento setorial.

TEXTO PARA DISCUSSÃO tem o objetivo de divulgar resultadosde estudos desenvolvidos direta ou indiretamente peloIPEA, bem como trabalhos considerados de relevânciapara disseminação pelo Instituto, para informarprofissionais especializados e colher sugestões.

Tiragem: 160 exemplares

COORDENAÇÃO DO EDITORIAL

Brasília — DF:SBS Q. 1, Bl. J, Ed. BNDES, 10o andarCEP 70076-900E.Mail: [email protected]

SERVIÇO EDITORIAL

Rio de Janeiro — RJ:Av. Presidente Antonio Carlos, 51, 14o andarCEP 20020-010E.Mail: [email protected]

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SUMÁRIO

SINOPSE

1 INTRODUÇÃO 7

2 ALGODOEIRAS: CRISE NO SETOR DE BENEFICIAMENTO

FUNDAMENTAL DO COMPLEXO TÊXTIL 11

3 FIAÇÕES: DINÂMICA DAS TRANSFORMAÇÕES NA PRODUÇÃO

DA MATÉRIA-PRIMA TÊXTIL 35

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS: ALARGAMENTO DAS DISTÂNCIAS

ENTRE AS ALGODOEIRAS E AS FIAÇÕES 63

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 67

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SINOPSE

m termos gerais, o estudo procura anali-sar as algodoeiras (máquinas de benefí-cio) e fiações, segmentos que interagemdiretamente na produção de têxteis de al-

godão, mas que realizam distintos movimentospara o ajuste do complexo têxtil brasileiro àstransformações econômicas dos anos 90. Essecomportamento diferenciado, a despeito de de-terminações técnicas comuns quando se visuali-za a produção de têxteis como um todo, decorredas específicas relações estabelecidas por cadasegmento com outros postos a jusante e a montan-te do complexo têxtil. Essas relações particulares,por seu turno, derivam dos processos históricosvivenciados na implantação e no desenvolvimen-to das respectivas estruturas produtivas.

O estudo objetiva mostrar, numa visualizaçãoconjunta das algodoeiras e fiações, que, emboraconstituam agroindústrias que atuam no mesmocomplexo (têxtil), é notória a diferença de dinâ-mica entre elas. Procura-se mostrar também queas políticas públicas, em especial as de financia-mento de modernização e as das relações comer-ciais externas, ajudaram a aprofundar as distân-cias na realidade da abertura do mercado brasi-leiro, que foi ampla para as algodoeiras (e cotoni-cultura) e protecionista para os demais segmen-tos da indústria têxtil.

E

O CONTEÚDO DESTE TRABALHO É DA INTEIRA E EXCLUSIVA RESPONSABILIDADE DE SEU AUTOR,CUJAS OPINIÕES AQUI EMITIDAS NÃO EXPRIMEM, NECESSARIAMENTE, O PONTO DE VISTA DO

MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 7

1 INTRODUÇÃO

A crise do complexo têxtil brasileiro, que seacentua nos anos 90, reproduz-se num processoacelerado de desestruturação da produção setori-al. No contexto de uma política econômica queabriu unilateralmente o mercado interno paratêxteis estrangeiros, sem transições estruturado-ras, os efeitos das políticas ativas de produção eexportação de outros países trouxeram transtor-nos ainda não superados pela produção nacional.

Nesse processo, inicialmente de exportador dealgodão em pluma, o Brasil passou a importanteimportador desse produto, numa realidade ple-namente caracterizada pela prática de dumping, emfunção das políticas agrícolas européias e norte-americanas. Em um segundo momento, abre-se aimportação de tecidos e vestuários, e a indústriatêxtil nacional sofre os impactos da expressivaentrada de produtos estrangeiros, em especial deorigem coreana, mais uma vez com questiona-mentos relativos a procedimentos desleais deconcorrência.

De maneira geral, os resultados da crise deriva-da da abertura de mercado parecem caminhar so-bre os elos do complexo têxtil — da produção pri-mária ao produto final.1 Os grandes grupos da in-dústria têxtil têm conseguido relativo sucesso emsuas reivindicações de proteção aos respectivosmercados, com a conquista da taxação de têxteisprocessados, deixando de lado a cotonicultura eos grupos industriais menores. Isso tem condici-

1 Uma discussão sobre o desenrolar da crise da cotonicul-

tura nacional — segmento do complexo têxtil atingidomais duramente com a abertura indiscriminada do mer-cado interno — pode ser encontrada em Gonçalves(1993) e Urban et al. (1995a). A discussão da prática de dum-ping nas transações internacionais de algodão e a fragili-dade dos mecanismos brasileiros para coibir tais ocor-rências podem ser vistas em Gonçalves (1996).

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8 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

onado o ajuste do parque têxtil brasileiro no in-tenso processo de reestruturação em curso.2

O entendimento dos contornos dessa crise exigeo aprofundamento num universo complexo de re-lações causais, que estabelecem nexos diferenci-ados entre si, formando um verdadeiro emara-nhado de explicações. A defesa da importação depluma para abastecer as fiações brasileiras, cen-trando-se na crítica à qualidade do produto nacio-nal, foi colocada em evidência por longo período.As propostas de permissão da utilização de varie-dades estrangeiras ocuparam posição destacadacomo justificativa para a retomada da cotonicul-tura nacional. Trata-se, contudo, de clara tentati-va de desvio da razão central, qual seja, as condi-ções vantajosas dos financiamentos internacio-nais na compra de produto importado, com taxasde juros anuais de 4% a 7% e prazos de pagamentode 270 a 360 dias, diante de juros mensais de 6% a9% e prazos de 30 dias no mercado interno. Fun-damentalmente, a importação de algodão em plu-ma corresponde a uma estratégia das empresas deautofinanciamento em termos de capital de giroem condições vantajosas.3

As recentes medidas governamentais adotadasem 25/3/97, e que vigorarão para contratos reali-zados após 31/3/1997, determinam:

a) a obrigatoriedade aos importadores de fecharo contrato de câmbio no momento do desembar-que para compras externas com prazos de até 360dias;

2 Cabe lembrar que os núcleos mais dinâmicos do comple-

xo têxtil brasileiro — o catarinense e o cearense — res-pondem a estímulos específicos, em especial o nordesti-no, sustentado por isenções fiscais expressivas e outrosmecanismos de atração de investimentos.

3 Essa discussão foi realizada com maior profundidadeem Urban et al. (1995b), em que é abordado o conjunto dasprincipais políticas públicas brasileiras, mostrandocomo as elevadas taxas de juros impactam negativamen-te as condições dos negócios com o algodão em pluma na-cional, gerando uma preferência pelo importado.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 9

b) a exigência de registro no Banco Central paraaquisições com prazos mais dilatados; e

c) o estabelecimento de multa para o descum-primento das determinações.

Tais medidas alteram radicalmente as condi-ções até então vigentes no mercado de algodão empluma. Em linhas gerais, isolam o mercado inter-no dos efeitos das condições de financiamento(prazos e juros), não apenas reduzindo os ganhoscom a importação de 7% a 11% no fluxo total deprodução, como também diminuindo considera-velmente os estímulos ao uso do mecanismo deimportação, para garantir capital de giro a jurosbaratos e prazos dilatados por parte da indústriatêxtil brasileira. Entretanto, na cotonicultura, econseqüentemente nas algodoeiras, os reflexos sóserão sentidos na safra 1997/98, pois a efetiva-ção das decisões ocorre no final da safra, quandoa oferta está dada e parcela importante do produtojá foi vendida. Se acompanhadas de outras medi-das de estímulo, essas decisões podem dar inícioao revigoramento da cotonicultura brasileira.

Quanto à importação de matéria-prima, convémlembrar alguns pontos fundamentais de estran-gulamento da indústria têxtil brasileira:

a) as principais nações algodoeiras assentamsua produção em variedades nacionais, e as tenta-tivas recentes de utilização de variedades impor-tadas por países membros do Mercado Comum doSul (MERCOSUL) mostraram-se fracassadas;4

4 Nesse aspecto, o Brasil deve aprender com seus vizinhos,

mesmo com o seu aparato técnico-científico menosavançado. No Paraguai, país limítrofe e parceiro comer-cial, foram cultivados cerca de 300 mil hectares de algo-dão na safra 1992/93 (22% com as variedades nacionaisRebas, e 78% com a variedade norte-americana Deltapi-ne, considerada a salvadora da cotonicultura pelos empresários gua-ranis). Na safra 1993/94, foram plantados 425 mil hec-tares (16% com Rebas, e 84% com Deltapine); entretanto,uma grande infestação de mancha azul assolou dura-mente os cultivos de Deltapine, trazendo enormes preju-ízos. Já na safra 1994/95, foram cultivados 325 milhectares — 60% com Rebas, 20% com INTA (material ar-

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10 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

b) o sistema de colheita vigente no Centro-Sul doBrasil é predominantemente manual no esquemadenominado rapa, que se consubstancia na deterio-ração da qualidade do algodão em caroço, enquan-to as principais zonas produtoras no plano mun-dial utilizam a colheita mecânica; e

c) as nações com estrutura competitiva na in-dústria têxtil têm o suprimento interno de maté-ria-prima como um importante elemento para odesenvolvimento da transformação industrial.

Dessa maneira, para o futuro da indústria têxtilbrasileira, o soerguimento da cotonicultura las-treado em variedades nacionais constitui-se emuma necessidade estratégica.

Na cadeia genérica de têxteis de algodão, pode-seperceber que os elos entre as várias etapas do pro-cesso produtivo brasileiro são ainda extrema-mente frágeis e marcados pela descontinuidade;ou seja, a produção têxtil, mesmo sendo conside-rada uma agroindústria, não desenvolveu os me-canismos característicos de uma integração ver-tical. A dinâmica desse presumível complexo édada fundamentalmente pelo jogo de mercado,sem mecanismos comerciais eficientes, predo-minando interesses e conflitos marcantes entreseus agentes, com sérios reflexos na composição edistribuição da renda entre os vários segmentos.Exemplo dessa descontinuidade está no fato deque, enquanto fiações e tecelagens se mostramexigentes na qualidade da matéria-prima, ascompras do algodão em caroço são realizadas combase em requisitos indiferenciadores, como o pa-gamento pelo sistema bica corrida tipo 6 [Urban et al.

(1995a, 1995b, 1995c)].

gentino), 10% com IAC (material brasileiro) e apenas 10%com Deltapine [Benitez (1995)]. Na Argentina, a mesmarazão conduziu à supremacia do material portenho, fa-zendo prevalecer as variedades Porá INTA, Guazuncho 2INTA, Gringo INTA [Valeiro 1995)]. Assim, a questão da va-riedade mostra-se um argumento falso.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 11

No conjunto do complexo têxtil, esse descom-passo se revela mais acentuado na passagem dasalgodoeiras para as fiações, ou seja, da plumapara o fio de algodão. Esse aspecto fica evidentena própria delimitação dos segmentos da cadeiatêxtil, uma vez que a indústria têxtil tem sidoconcebida a partir das fiações, desconsiderando-se as máquinas de beneficiamento, tratadas comoinstância pré-industrial. O estudo desses doissegmentos do complexo têxtil objetiva determi-nar os principais condicionantes do desempenhorecente das respectivas estruturas produtivas.Para tanto, são construídos indicadores de renta-bilidade e de agregação de valor nas etapas detransformação do caroço em pluma (algodoeiras)e da pluma em fio (fiações).

Espera-se que os resultados obtidos possibili-tem compreender e delinear quais as implicaçõesde possíveis tendências de localização espacial daindústria têxtil, isto é, da desconcentração espa-cial de etapas de industrialização mais complexasdo setor têxtil. No Brasil e, mais particularmente,no MERCOSUL, o setor não está completo, e sua dinâ-mica não está configurada em definitivo. Diantedisso, a avaliação mais pormenorizada da dinâ-mica e das tendências buscará compreender asformas de complementaridade ou mesmo de espe-cialização produtiva, tendo em vista que a produ-ção regional de algodão em caroço já constitui umcontínuo espacial (Paraná, São Paulo, região Centro-Oeste, Paraguai e Argentina), o qual poderá influ-enciar a definição de estratégias de fortalecimen-to dessa indústria nesse espaço.

Com esse estudo, procura-se subsidiar as políti-cas governamentais de caráter mais regionaliza-do, diante dos custos sociais — da reestruturaçãoda produção agrícola e da capacidade de sobrevi-vência das pequenas e médias indústrias — decor-rentes desse processo. No estado do Paraná emparticular, os custos sociais colocam um grande

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12 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

desafio, haja vista a importância do setor na es-trutura produtiva do estado.

As informações analisadas são resultado depesquisas de campo envolvendo:

a) pesquisadores do Instituto Agronômico doEstado de São Paulo (IAC) e do Instituto Agronô-mico do Paraná (IAPAR);

b) técnicos e empresários das algodoeiras para-naenses, paulistas, mineiras e do Brasil Central; e

c) técnicos e empresários das fiações e tecela-gens dos pólos catarinense, cearense, paulista,paranaense e mineiro.

Além destes, foram entrevistados técnicos daárea de classificação de algodão da Empresa Pa-ranaense de Classificação de Produtos (CLASPAR),da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) de SãoPaulo e da Coordenadoria de Assistência TécnicaIntegral da Secretaria de Agricultura e Abasteci-mento do Estado de São Paulo (CATI/SAA). As in-formações adicionais foram obtidas de fontestradicionais de estatísticas têxteis, como a Com-panhia Nacional de Abastecimento (CONAB), para acotonicultura, a Associação Brasileira da Indús-tria Têxtil (ABIT) e o Instituto de Estudos e Marke-ting Industrial (IEMI), importante centro de dadossobre a indústria têxtil nacional.5

5 É importante ressalvar que os dados e informações obti-

dos por entrevistas, ou pelo fornecimento de prospectoscom séries históricas, foram elaborados pelos autoresdeste trabalho, sendo sua a responsabilidade por possí-veis equívocos. Aos entrevistados, a equipe técnica agra-dece pela paciência no atendimento e pela clareza e pre-cisão das informações fornecidas.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 13

2 ALGODOEIRAS: CRISE NO SETOR DEBENEFICIAMENTO

FUNDAMENTAL DO COMPLEXO TÊXTIL

O processo de beneficiamento de algodão inicia-se com o recebimento do algodão em caroço, oqual, após a classificação visual, é disposto em tu-lhas específicas para cada tipo. O produto sofresecagem caso tenha chegado à máquina com umi-dade acima de 15%, uma vez que o índice legal estáfixado em 12%, com tolerância de até 15%. Depoisda passagem pelo secador, realiza-se a pré-limpeza (floculação), para então destiná-lo à lim-peza, a qual separa o caroço da pluma. Caso a plu-ma esteja muito suja, executa-se a pós-limpeza nolint cleaner (constelation), que significa limpeza pesada.Como subprodutos importantes do processamen-to do algodão aparecem o línter e o caroço, do qualsão extraídos basicamente o óleo e a torta, ao pas-so que do línter são obtidas 32 diferentes utiliza-ções, desde a viscose até a pólvora. As algodoeirasrepresentam o beneficiamento básico da matéria-prima agropecuária, separando componentes dedistintas utilizações.

O beneficiamento de algo-dão, em sua estrutura, temcomo característica fun-

damental o fato de constituir uma atividade abso-lutamente vinculada à produção da matéria-prima básica — o algodão em caroço. Alguns ele-mentos constitutivos das algodoeiras dão susten-tação a essa realidade:

a) a transformação do caroço em pluma não re-

presenta substancial agregação de valor ao produ-

to, pois, dado o rendimento médio de 33%, para

cada tonelada de pluma, exigem-se três de caroço;

ou seja, ao preço de R$ 24,00/@ da pluma, gasta-se

R$ 21,00 de caroço (R$ 7,00/@);

2.1 Deslocamento Espacial naTrilha da Cotonicultura

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14 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

b) o caroço de algodão, principal subproduto em

volume, tem sua aplicação viabilizada como torta

de algodão no arraçoamento animal, pois o óleo de

algodão cedeu espaço para o de soja. Nesse senti-

do, o valor econômico dos subprodutos está asso-

ciado à sua disponibilização local, sendo inviável

o transporte à distância;

c) o algodão em caroço, especialmente nas con-

dições em que é colhido no Brasil (elevados índi-

ces de impureza e umidade), pode sofrer deterio-

ração de qualidade caso o tempo decorrido entre a

colheita e o beneficiamento seja muito longo; e

d) o trabalho absolutamente sazonal torna one-

rosa a logística exigida, em especial a de transpor-

te à distância, com dimensionamento pelo pico da

colheita, gerando enorme ociosidade na entressa-

fra.

Essas características, associadas a uma histó-

rica lógica comercialista dos maquinistas — que

atuam como intermediários nas relações entre os

cotonicultores e as indústrias têxteis — contribuí-

ram para uma concentração das algodoeiras nas

regiões cotonicultoras. Dessa maneira, a distri-

buição espacial do parque de beneficiamento bra-

sileiro guarda uma relação direta com a expres-

são das áreas de cultivo de algodão. Ainda que

existam inúmeras máquinas desativadas em an-

tigas áreas cotonicultoras, a grande parcela das

unidades em funcionamento localiza-se nos esta-

dos do Paraná e São Paulo, e mais recentemente

no Brasil Central, que representam as principais

zonas cotonicultoras nacionais. A concentração

da capacidade instalada revela-se ainda mais ex-

pressiva nos territórios paranaense e paulista.

A crise da cotonicultura nacional, ao levar de

arrasto a estrutura das algodoeiras, que se viu

sem matéria-prima, provocou enorme ociosidade

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 15

nos dois estados citados.6 Tendo em vista apenas

os anos 90, período mais afetado pelo processo de

crise que se inicia com a abertura incondicional

do mercado interno em 1989, pode-se traçar um

quadro realista dessa dramática crise setorial,

mostrando a heterogeneidade da distribuição re-

gional, que impacta mais duramente algumas zo-

nas cotonicultoras. Assim, encontram-se grada-

ções nos níveis de impacto da crise de região para

região.

No estado do Paraná, nos anos 90, existem 1

070 descaroçadores, perfazendo um total de 92,6

mil serras, o que corresponde à capacidade de be-

neficiamento de 1 560 fardos/hora, ou seja, de 2

246,5 mil fardos por safra. A distribuição regio-

nal mostra a concentração no Centro-Oeste para-

naense com 860,1 mil fardos (38,3%), seguido do

Norte (584 mil fardos ou 26%), do Norte Velho

(523,9 mil fardos ou 23,3%) e do Oeste (278 mil

fardos ou 12,4%) (ver tabela 1). Essa distribuição

tem correspondência direta com as principais zo-

nas de plantio da cotonicultura paranaense no fi-

nal dos anos 80, com as estruturas de beneficia-

mento montadas no período anterior à eclosão da

crise.

6 A discussão sobre a queda da área plantada e a produção

de algodão, seus efeitos sobre o perfil dos cotonicultores eas algodoeiras em operação nesses dois estados pode servisualizada de maneira detalhada em Urban et al. (1995a).

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16 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

TABELA 1Capacidade Instalada das Algodoeiras Segundo

as Regiões Produtorasdo Paraná — Década de 90

Região Númerode

Descaro-çadores1

Númerode

Serras2

Total deSerras1

Capac.Inst. (far-

do/h)2

Total daCapac.

Inst. (emfardos) 3

Oeste 139 2 670 11 740 193 278424

Centro-Oeste

420 7 612 35 888 597 860112

NorteVelho

240 4 662 21 038 364 523872

Norte 271 5 260 23 950 406 584064

Total 1 070 20 204 92 616 1 560 2 246 472Fonte dos dados brutos: Relatório do Algodão — CLASPAR.Notas: 1 Os dados básicos por município foram obtidos por meio da agrega-

ção das máquinas de descaroçamento de algodão existentes nas usi-nas, considerando as diferentes capacidades de produção de algodãoem pluma.

2 Os coeficientes técnicos de produção por tipo de máquina em opera-ção foram fornecidos pelos técnicos da CLASPAR que fiscalizam as al-godoeiras nas regiões produtoras. Os coeficientes obtidos foram osseguintes:1 máquina de 80 serras produz 6 fardos/hora com 5 descaroçadores;1 máquina de 90 serras produz 8 fardos/hora com 5 descaroçadores;1 máquina de 120 serras produz 12 fardos/hora com 5 descaroçado-

res; e1 máquina de 142 serras produz 17 fardos/ hora com 4 descaroçado-

res.Para as máquinas fora do padrão obtido na CLASPAR, utilizaram-se aspropriedades das proporcionalidades matemáticas.

3 Para efeito de dimensionamento da capacidade instalada por muni-cípio, considerou-se um período médio de operação das máquinasigual a 60 dias/24 horas, resultando num coeficiente de operação de1 440 horas/safra.

Obs.: Dados elaborados pelo IPARDES.Esta tabela é uma síntese do conjunto de tabelas apresentadas no ane-xo do relatório.Na agregação dos municípios por regiões, foram consideradas as ma-crorregiões utilizadas pela CLASPAR:Região Oeste: Assis Chateaubriand, Cascavel, Céu Azul, Formosa do Oeste,Guaíra, Mal. Cândido Rondon, Nova Aurora, São Miguel do Iguaçu,Ouro Verde do Oeste, Terra Roxa, Toledo, Vera Cruz do Oeste.Região Centro-Oeste: Alto Piquiri, Boa Esperança, Campo Mourão, Cianorte,Cruzeiro do Oeste, Fênix, Goio-Erê, Iporã, Iretama, Ivaté, Janiópolis,Juranda, Luiziana, Mariluz, Paranavaí, Paranacity, Paulistânia,Querência do Norte, Quarto Centenário, Roncador, Ubiratã, Umua-rama.Região Norte Velho: Abatiá, Andirá, Assaí, Bandeirantes, Cambará, CornélioProcópio, Jataizinho, Santa Amélia, Santa Cecília do Pavão.Região Norte: Arapongas, Astorga, Bela Vista do Paraíso, Borrazópolis,Cambé, Centenário do Sul, Colorado, Ibiporã, Itaguajé, Ivaiporã, Li-dianópolis, Londrina, Mandaguari, Maringá, Porecatu, Rolândia,Santa Fé, São João do Ivaí, Santo Inácio.

A comparação entre a capacidade instalada e ovolume de pluma processado nas diversas safrasmostra um comportamento distinto do nível deociosidade em cada zona de produção. No Centro-Oeste paranaense, onde se localiza o atual núcleo

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 17

da cotonicultura estadual, da capacidade instala-da de 860 mil fardos, na safra 1990/91 forambeneficiados 800 mil fardos (93% de utilização);na safra 1994/95, 438 mil fardos (50,9%); e, nasafra 1995/96, 264,8 mil fardos (30,8%). Poroutro lado, no Norte Velho — antiga e tradicionalzona de plantio de algodão —, a redução dos níveisde beneficiamento mostra-se mais acentuada,pois, para uma capacidade de 523,9 mil fardos, nasafra 1990/91, foram realizados 276,9 mil far-dos (52,9%), seguindo-se 80 mil fardos na safra1994/95 (15,3%) e apenas 32,7 mil fardos em1995/96 (6,2%) (ver tabela 2). Dessa maneira, osimpactos da crise revelaram-se mais expressivosnas antigas zonas algodoeiras paranaenses quenas de expansão mais recente.

TABELA 2Produção de Pluma e Nível de Utilização da Ca-

pacidade Instalada deProcessamento de Algodão, Segundo as Regiões

Produtoras do ParanáSafras 90/91, 94/95 e 95/96

Região Total daCapac.

Inst. Dé-cada 90

(A)

Produçãode Pluma

Safra90/91

(B)

Nível deUtiliz.Capac.

Inst. (%)(B/A)

Produçãode Pluma

Safra94/95

(C)

Nível deUtiliz.Capac.

Inst. (%)(C/A)

Produçãode Pluma

safra95/96

(D)

Nível deUtiliz.Capac.

Inst. (%)(D/A)

Oeste 278424

256298

92,1 135570

48,7 83 954 30,2

Centro-Oeste

860112

800033

93,0 438203

50,9 264800

30,8

Norte Ve-lho

523872

276951

52,9 80 318 15,3 32 665 6,2

Norte 584064

443657

76,0 249058

42,6 113574

19,4

Total 2 246 472 1 776 939 79,1 903 149 40,2 494 993 22,0

Fonte dos dados brutos: Relatório do Algodão — CLASPAR.Obs.: 1) Os dados das colunas A, B, C e D correspondem à produção emfardos.

2) A produção de algodão em pluma utilizada foi convertida em fardosconforme o peso médio aferido em cada safra: 90/91 — 197,40 kg;94/95 — 199,94 kg; 95/96 — 199,69 kg.

3) Ver notas e observações da tabela 1.

A síntese do quadro de utilização da capacidadede beneficiamento mostra uma relação direta en-tre o dinamismo organizativo e estrutural da pro-dução de algodão em caroço e o comportamentodas algodoeiras. Os índices de ociosidade para oconjunto das algodoeiras paranaenses, que foram

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18 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

de 20,9%, na safra 1990/91, atingem 59,8%, nasafra 1994/95, e 78%, na safra 1995/96. Dentreas zonas produtoras, as situadas a oeste, que deti-nham níveis de ociosidade menores que 10% noinício dos anos 90, aumentam expressivamenteesse indicador, alcançando cerca de 70% na meta-de da década, num processo de queda livre, decorrentediretamente da carência de matéria-prima, o que,por sua vez, tem relação causal direta com a faltade estímulo à cotonicultura. Mais dramáticos sãoos comportamentos das antigas regiões cotonicul-toras: a Zona Norte paranaense aumenta a ociosi-dade de sua estrutura de beneficiamento de 24%para 80,6%, e o Norte Velho, de 47,1% para 93,8%(ver tabela 3), ou seja, estão num processo de ex-tinção da atividade nas economias locais.

TABELA 3Nível de Utilização da Capacidade Instalada de

Processamento de Algodão,Segundo as Regiões Produtoras do Paraná — Sa-

fras 90/91, 94/95 e 95/96Região Total da Ca-

pacidadeInstalada

Décadade 90

Nível de uti-lização da

CapacidadeInstalada

(Safra90/91)

Nível de Uti-lização da

CapacidadeInstalada

(Safra94/95)

Nível de Uti-lização da

CapacidadeInstalada

(Safra95/96)

Oeste 278424

92,1 48,7 30,2

Centro-Oeste

860112

93,0 50,9 30,8

Norte Velho 523872

52,9 15,3 6,2

Norte 584064

76,0 42,6 19,4

Total 2 246 472 79,1 40,2 22,0Fonte dos dados brutos: Relatório do Algodão — CLASPAR.Obs. : 1) A produção de algodão em pluma utilizada foi convertida em far-

dos conforme o peso médio aferido em cada safra: 90/91 — 197,40kg; 94/95 — 199,94 kg; 95/96 — 199,69 kg.

2) Ver notas e observações da tabela 1.

As zonas cotonicultoras paranaenses apresen-tam desempenho diferenciado quanto à elevaçãoda ociosidade do parque beneficiador, o que traz àluz alguns elementos para reflexão. O primeiro éa constatação de que, já no final dos anos 80, e,

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 19

portanto, antes mesmo da eclosão da crise, a pro-dução algodoeira do Norte Velho paranaense en-contrava-se problematizada, com os fatos subse-qüentes contribuindo para acirrar o processo dedesmonte da estrutura produtiva local que já es-tava em curso. O segundo se revela no percurso daradicalidade da crise em direção ao Norte parana-ense, no tocante à redução expressiva do uso dacapacidade instalada, pois essa região mostrava-se também com sua estrutura em fase inicial deretrocesso no final dos anos 80, movimento acir-rado na década de 90. O terceiro está no compor-tamento das novas zonas algodoeiras do oeste doterritório paranaense, as quais entraram, nosanos 90, com níveis de ociosidade reduzidos e en-frentaram os duros impactos da crise, que redun-dou numa redução das atividades.

Esses elementos fazem emergir aspectos inte-ressantes, pois, se é verdade que as zonas algodo-eiras mais antigas tiveram seu processo de perdade dinamismo acirrado, nem mesmo as novas zo-nas puderam sustentar-se diante da radicalidadedos impactos da crise. Desse modo, também paraas algodoeiras, como já havia sido demonstradopara a cotonicultura [Urban et al. (1995a e 1995b)],o nexo causal básico da redução da produção tempouco a ver com questões relativas a padrão tec-nológico, mas diz respeito à imersão numa reali-dade financeira, relativa ao processo de comercia-lização da pluma, na qual a disparidade entre astaxas de juros internos e externos torna as condi-ções de negócio do produto nacional não competi-tivas diante do estrangeiro.7 Como as algodoeiras

7 O que se quer aqui é mostrar o nexo causal básico da cri-

se das algodoeiras, sem entretanto negar a existência deoutros elementos característicos dessas empresas, quetêm impacto sobre o desempenho do parque têxtil nacio-nal, em especial no tocante ao não-pagamento por quali-dade. Mas, se é verdade que isso problematiza a eficiên-cia técnica do complexo têxtil como um todo, tambémnão se pode depositar todo o ônus da crise sobre esse as-pecto, pois os efeitos da lógica financeira norteadora dascompras externas são avassaladores.

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20 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

brasileiras atuam basicamente como intermediá-rias, sua frágil capacidade financeira acabou co-locando-as à margem do processo. Mesmo queatuassem como prestadoras de serviços, teriamsucumbido em face da fragilidade ainda maiordos cotonicultores.

Outro índice comprovador dessa assertiva estáno fato de que a crise afetou mais duramente aszonas cujo perfil predominante dos cotoniculto-res era o de possuir organizações de produçãomenos dinâmicas. Assim, aliando-se o tradiciona-lismo das estruturas produtivas das zonas anti-gas, em termos de relações sociais e econômicas(que entraram em desagregação mais aceleradano final dos anos 80), à fragilidade das respecti-vas organizações de produção, entende-se por queas novas zonas algodoeiras do Oeste sofreramimpactos menos expressivos, embora contunden-tes, da crise algodoeira dos anos 90. Ainda assim,as fortes organizações cooperativas do Norte e doOeste, apesar de terem realizado avanços na pro-dução vertical no complexo têxtil, não tiveramcondições de sobrepujar os efeitos desestrutura-dores da crise. Em outras palavras, mesmo ame-nizando os efeitos, essas estratégias não constru-íram alternativas viáveis para a atividade fun-damental de seus associados, qual seja, o plantiode algodão.

A realidade da crise na produção algodoeira doestado de São Paulo pode vir a confirmar essesargumentos, pois trata-se de uma estrutura pro-dutiva montada num período anterior à do Para-ná e que, de certa maneira, complementa o deslo-camento leste-oeste da produção. A capacidadeinstalada de beneficiadoras paulistas, no iníciodos anos 90, correspondia a 1 652 mil fardos, oque, para uma produção de pluma de 781 mil far-dos na safra 1990/91, significava a operação com52,7% de ociosidade. Entre as três grandes regi-ões estaduais, não havia diferença significativano tocante a esse indicador. Nas safras seguintes,

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BRASIL 21

há uma diminuição da taxa de utilização, comociosidade crescendo de 70,1%, em 1994/95, para82,6%, em 1995/96 (ver tabela 4). Desse modo, osíndices paulistas não apenas partem de níveis deociosidade maiores que os paranaenses, comomostram queda significativa no nível de utiliza-ção no período.

TABELA 4Nível de Utilização da Capacidade Instalada de

Beneficiamento de Algodão,Segundo as Regiões Produtoras de São Paulo —

Safras 90/91, 94/95 e 95/961

Região Capaci-dade

Instala-da

(A)

Produ-ção dePlumaSafra90/91

(B)

Nível deUtiliz. da

Capac.Inst.

(B/A)

Produ-ção dePlumaSafra

94/95(C)

Nível deUtiliz.Capac.

Inst.(C/A)

Produ-ção dePlumaSafra

95/96(D)

Nível deUtiliz.

DaCapac.

Inst.(D/A)

Mogia-na2

777201

358906

46,2 249823

32,1 147895

19,0

Centro3 98756

48750

49,4 6 545 6,6 4 483 4,5

Oeste4 776980

373879

48,1 237276

30,5 135959

17,5

Total 1 652 938 781 535 47,3 493 645 29,9 288 338 17,4

Fonte dos dados brutos: Bolsa de Mercadorias e Futuros.Notas: 1 Essas estimativas seguem o mesmo procedimento aplicado para o

Paraná, convertidas em fardos de 200 kg.2 Corresponde à soma das informações das regiões agrícolas deCampinas e Ribeirão Preto.3 Corresponde à soma das informações das regiões agrícolas de So-rocaba, Bauru e Marília.4 Corresponde à soma das informações das regiões agrícolas de São

José do Rio Preto, Araçatuba e Presidente Prudente.Obs.: Dados elaborados pelo IPARDES. Os dados das colunas A, B, C e D cor-

respondem à produção em fardos.

Outro aspecto está no efeito diferenciado da cri-se algodoeira sobre as estruturas beneficiadorasdas diversas regiões estaduais. Na grande regiãocentral do território paulista, zona que já não ti-nha representatividade expressiva, o algodãopraticamente desapareceu. Nas duas grandes re-giões algodoeiras paulistas — a Mogiana, caracte-rizada pela presença de cotonicultores modernos(alguns com verticalização, atuando no benefici-amento e até mesmo na fiação), e a região Oeste(em especial no entorno de Presidente Prudente)—, onde predominam os regimes de parcerias e

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DO BRASIL

arrendamento, os efeitos também foram drásti-cos, com índices mais expressivos que os das áre-as do oeste paranaense. A explicação está na op-ção pela rentabilidade do plantio de cana ou sojapelos grandes cotonicultores da região Mogiana ea reconversão para pastagem no extremo-oeste.8 Ainexistência de estruturas cooperativas sólidas,como expressão dominante na cotonicultura pau-lista, reforça a argumentação explicativa das di-ferenças em relação à realidade paranaense.

A visualização conjunta do desempenho do par-que beneficiador de algodão dos estados de SãoPaulo e Paraná mostra níveis mais expressivosde ociosidade nas máquinas instaladas nas regi-ões mais antigas (localizadas a leste desse contí-nuo geográfico) em comparação com as das regi-ões mais novas (localizadas a oeste). Ainda assim,mesmo nessas regiões consideradas modernas, acrise mostra enorme gravidade, e, se persiste essatendência, o sucateamento da estrutura de benefi-ciamento do Sul-Sudeste do Brasil parece inexo-rável.9 Essa perspectiva toma ainda mais corpocom o crescimento da produção argentina de plu-ma, que, em face do processo de integração no âm-bito do MERCOSUL, pode vir a abastecer as fiaçõesbrasileiras, em especial as catarinenses e paulis-tas e mesmo as paranaenses e nordestinas. Nesse

8 Parcela expressiva dos conflitos fundiários do Pontal do

Paranapanema deriva da aglutinação, pelo Movimentodos Sem-Terra, de ex-pequenos proprietários, ex-arrendatários e ex-parceiros da cultura de algodão. Otrabalho de Urban et al. (1995a) traz informações mais de-talhadas sobre o efeito estrutural perverso da crise da co-tonicultura, que penaliza principalmente os pequenosagricultores e arrendatários.

9 Essas perspectivas mostram-se muito concretas nas úl-timas safras e para a safra 1996/97. Isso porque "a des-peito da cultura do algodão contar com as maiores corre-ções de preços mínimos e maiores limites de financia-mento de crédito rural nas suas safras precedentes, asdificuldades para a comercialização, decorrentes de ma-ciças importações, prevaleceram na decisão do cotoni-cultor que, mais uma vez, reduziu o cultivo na última sa-fra, neutralizando as medidas de política agrícola, no pe-ríodo mais recente" [Barbosa (1996)].

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 23

contexto, ficam problematizadas as estratégiaspaulistas e paranaenses de estímulo ao investimen-to para internalização de outros segmentos docomplexo têxtil — como fiação e tecelagem —, combase na estrutura integrada de produção de têx-teis de algodão (caroço, pluma, fio, tecido e vestu-ário).

O padrão tecnológicodas algodoeiras,quanto à operaçãofundamental de des-

caroçamento por serras, não sofreu grandes mu-danças nas décadas mais recentes. As principaisalterações resultaram da maior capacidade de be-neficiamento devido ao aumento no número deserras e, conseqüentemente, à maior velocidadede operação. As máquinas encontradas no Sul-Sudeste do Brasil são predominantemente as des-caroçadoras de 90 serras, embora em muitos ca-sos continuem em operação as de 80 serras. Maisrecentemente, foram introduzidas algumas de120 e de 142 serras. A diferenciação fundamentalestá na característica da serra (de 12, 18 ou 22 po-legadas), no número de serras e na rotação daoperação. Assim, as descaroçadoras de 142 ser-ras têm capacidade de produção de 17 far-dos/hora, ou seja, 2,8 vezes a produção horária deum equipamento de 80 serras, que beneficia 6fardos/hora (ver tabela 5). A produtividade dotrabalho nessas operações eleva-se substancial-mente com equipamentos mais novos.

TABELA 5Características dos Equipamentos de Beneficia-

mento de Algodão doSul-Sudeste do Brasil — 1996

Número deSerras

Número deDescaroça-

dores

Década deIntrodu-

ção

Rotação(rpm)

Produtivi-dade (far-dos/hora)

80 serras de12"

5 40 680 6

90 serras de12"

5 50 700 8

120 serras de 5 60 1100 12

1.2 Processo Técnico das Algodoeiras e Quali-dade da Matéria-Prima e da Pluma

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DO BRASIL

18"142 serras de22"

4 70 1700 17

Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.

No tocante aos tipos de classificação visual, osequipamentos de 90 serras, operando com algo-dão seco, permitem o ganho de meio tipo na plu-ma, em relação aos de 80 serras, sendo que os de120 e 142 serras possibilitam melhorar um tipo.Entretanto, a maior rotação aumenta a quebra defibra, embora o rendimento operacional do bene-ficiamento seja superior. O constelation, utilizado nalimpeza da fibra, apesar de ganhar em tipo visual,também acaba provocando maior quebra de fi-bras e compromete o rendimento industrial futu-ro dependendo do fio a ser fabricado.

Em geral, as fibras de 30/32 mm passam a ter28/29 mm e apresentam menor uniformidadequando submetidas a processos rigorosos de lim-peza. Assim, para algodões em caroço com índicede sujeira cada vez maior, essas operações suces-sivas acabam prejudicando a qualidade intrínse-ca da fibra. Dessa maneira, existe certo antago-nismo entre os processos praticados nas algodo-eiras — de melhoria da qualidade visual (limpeza)e de aumento da produtividade operacional (mai-or rotação e maior número de serras) — e o ren-dimento industrial na fiação (qualidade intrínse-ca da fibra). Essa talvez seja a razão principal deas empresas integradas, que atuam no beneficia-mento, na fiação e na tecelagem, continuarem aoperar com equipamentos de 80 e 90 serras e nãocomprarem máquinas de lançamento mais recen-te. Isso porque, operados de maneira adequada,esses equipamentos permitem compensar a me-nor produtividade com melhor qualidade.

Além da produtividade operacional, a diferen-ciação entre os conjuntos mais antigos e os novosestá nos equipamentos de secagem, pré-limpeza elimpeza da fibra, bem como na sofisticação dossistemas de automação e controle. As máquinasmais antigas, entretanto, podem ser atualizadas

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 25

com adaptação de sistemas de secagem, pré-limpeza e limpeza da fibra, melhorando a quali-dade do produto final, inclusive com automaçãoda secagem. Muitas dessas adaptações já foramintroduzidas nos conjuntos em operação, princi-palmente nas três etapas mencionadas. Contudo,não há um padrão geral característico nas adapta-çõesrealizadas, resultando que conjuntos original-mente iguais tenham sofrido mudanças distintase, por isso, tenham rendimentos operacionais di-ferenciados em quantidade e qualidade da plumaproduzida.

O aumento da produtividade do beneficiamentodas algodoeiras brasileiras tem encontrado umalimitação relevante no sistema de alimentação. Oprocesso tradicional das algodoeiras, que rece-bem algodão em caroço concomitantemente de di-ferentes agricultores, com padrões variados,normalmente ensacado, exige um número de tu-lhas de maneira a dispor e processar separada-mente os algodões segundo as diversas caracte-rísticas visuais encontradas. A alimentação dasmáquinas realiza-se manualmente a partir decada tulha, e, mesmo com o aumento do númerode tulheiros, os descaroçadores de capacidade têmsido alimentados de maneira inadequada. Por ou-tro lado, a alimentação manual apresenta enormevariabilidade, podendo prejudicar a fibra, quandorealizada em quantidade excessiva, ou diminuir aprodutividade, quando em quantidade insuficien-te. A ânsia por apresentar resultados, dos tulhei-ros com o beneplácito da administração da algo-doeira, na busca de fazer safra, acaba por fazer predo-minar a alimentação acima do indicado.

Outro aspecto dessa realidade deriva da estru-tura da cotonicultura do Sul-Sudeste, formadapor inúmeros pequenos produtores, com padrõestecnológicos distintos, o qual cria uma amplitudede qualidades de algodão em caroço, numa com-plexidade de interações de impureza e umidade. Osistema de colheita baseado no rapa, e de transporte

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DO BRASIL

em sacarias, acaba por introduzir inúmeros ele-mentos estranhos no algodão em caroço, inclusi-ve fibras duras e sintéticas que irão prejudicar aqualidade da pluma. O sistema de tulhas, por suavez, visa essencialmente diferenciar os tipos, jun-tando produtos similares de diferentes cotonicul-tores, indiferenciando e, por isso mesmo, dificul-tando o pagamento pela qualidade da fibra. Essaperda de identificação entre cada lote de fardo e oprodutor do caroço impede o prêmio da qualidadede maneira mais transparente, em especial pornão permitir o uso de análises laboratoriais paraverificação. A tabela de quantidades por tipo vi-sual, verificáveis a posteriori, mostra inúmeros focosde conflitos entre cotonicultores e beneficiadores.

Os sistemas modernos, praticados nas regiõesalgodoeiras mundiais mais dinâmicas, corres-pondem a plantios de áreas maiores (em torno de150 a 200 hectares), com colheita predominan-temente mecânica e transporte a granel, permi-tindo a alimentação das máquinas por sucção di-retamente do caminhão. Isso reduz o índice de fi-bras estranhas e a necessidade de tulheiros. Comoesse sistema opera com grandes volumes benefi-ciados, há uma identificação da origem de cadafardo produzido, podendo-se utilizar a classifica-ção com base em análises laboratoriais. Por outrolado, a algodoeira, quer se constitua numa presta-dora de serviços, quer numa compradora do algo-dão em caroço, poderia recorrer a mecanismos depagamento por qualidade com maior transparên-cia e credibilidade. Na operação de beneficiamen-to como um todo, a sucção direta evita a degrada-ção da qualidade da fibra — pelo armazenamentopor longos períodos (60 a 90 dias) e pela presençade fibras duras e sintéticas —; reduz os custos comsacaria e mão-de-obra (especialmente tulheiros); egarante a alimentação adequada, permitindo me-lhor qualidade no beneficiamento.

No sistema que atualmente predomina no Bra-sil, as perdas econômicas são expressivas tanto

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 27

para cotonicultores quanto para beneficiadores. Aquantidade de impurezas tem crescido com a ge-neralização dos esquemas de colheita por rapa,10 oque pode ser exemplificado pelos dados das algo-doeiras paulistas que mostram um crescimentodo nível de impurezas e o conseqüente descontodos cotonicultores: de 2% (16 mil toneladas), em1984/85, passam a 15% (cerca de 50 mil tonela-das), em 1994/95. Assim, o rendimento bruto dobeneficiamento caiu de 34,3% para 29,8% nomesmo período, enquanto o rendimento líquidomantém-se em 35% (ver tabela 6). Essa situaçãotraz prejuízos aos beneficiadores, com menorprodutividade operacional e maior desgaste deequipamentos, e para os cotonicultores que incor-rem em custos adicionais desnecessários.

TABELA 6Rendimento do Beneficiamento e Nível de Impu-

reza do Algodão, no Estadode São Paulo — Safras 84/85 a 94/95

(Em toneladas)Safras Entrada

de Algo-dão emCaroço

(A)

Produçãode Algo-dão emPluma

(B)

Rendi-mento

Bruto doBenefício

(B/A)

ImpurezaRetirada

noBenef.

(C)

Nível deImpureza

doCaroço

(c/A)

Algodãoem Caro-ço s/ Im-

pureza(D)

Rendi-mento Lí-quido do

Benefício(B/D)

84/85 796811

272967

34,3 15 936 2,0 780875

35,0

87/88 726506

249918

34,4 17 291 2,4 709215

35,2

89/90 524987

178099

33,9 16 800 3,2 508187

35,0

90/91 462732

156307

33,8 17 584 3,8 445148

35,1

91/92 452789

144011

31,8 39 528 8,7 413261

34,8

92/93 258342

77 158 29,9 36090

14,0 222252

34,7

93/94 316437

92 315 29,2 49 681 15,7 266756

34,6

94/95 331717

98 729 29,8 49 658 15,0 282059

35,0

Fonte dos dados brutos: DDA/CATI, BM&F.Obs.: Dados elaborados pelo IPARDES e extraídos do DDA/CATI, para entrada

de algodão em caroço; da BM&F, para produção de pluma; e de cinco be-

10 Saliente-se que o rapa é rudimentar sob a ótica da qualidade

do produto colhido, mas muito mais eficiente do ponto devista da produtividade do trabalho, pois um colhedorbom, que colhia 4 a 6 @/dia no sistema maçã a maçã, passa a co-lher 12 a 14 @/dia com o rapa. Numa realidade de mão-de-obra escassa e cara, no período da safra, e de não-pagamento da qualidade, esses ganhos de produtividadeda colheita são importantes para o cotonicultor, e sua de-cisão está pautada na racionalidade de minimização decustos.

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28 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

neficiadoras paulistas, para nível de impureza, que foi estimado pelataxa de entrada de algodão em caroço, obtida por tabulação de apon-tamentos dessas beneficiadoras.

Os dados das algodoeiras paranaenses mostramtendência semelhante.11 O rendimento do benefici-amento diminui de um patamar de 36% na décadade 80 para 34%, no início, e 33%, na metade dosanos 90. Esse declínio mostra-se mais significa-tivo nas antigas regiões algodoeiras do Norte Ve-lho e Norte paranaense, que apresentam índicessempre inferiores à média estadual. Quanto aoíndice de perdas, observa-se que, na metade dosanos 80, seus níveis eram menores (média de5,79) que os verificados nos anos 90, situados nafaixa de 8,5%. Mais uma vez, as antigas regiõescotonicultoras revelaram maiores perdas, com oNorte Velho chegando a atingir 11,4% no últimobiênio (ver tabela 7). Essa situação mostra que aevolução do sistema de colheita contradiz a ten-dência de exigência de qualidade pelo conjunto docomplexo têxtil brasileiro.

Estimando-se essas perdas para um cotonicul-tor com produção de 3 mil arrobas, para a safra1995/96, no estado de São Paulo, a perda seria deR$ 960,00, para níveis de impureza acima de 10%de tolerância, e de R$ 1 820,00, para 20%; issoadicionado a um custo total de colheita, transpor-te e beneficiamento de R$ 9 600,00 (ver tabela 8).Simulando-se os resultados econômicos desse co-tonicultor na safra 1995/96, nota-se que sua re-ceita bruta sem perda de tipo cairia de R$ 24,5mil, no caso do algodão limpo, para R$ 20,7 mil,no caso de 10% de impureza adicional, e para R$17,3 mil, no caso de 20% de impureza adicional.Caso ainda houvesse perda de tipo por sujeira e

11 Os dados das algodoeiras paranaenses, no tocante à

quantidade produzida de algodão em pluma, incluem oalgodão de baixo padrão, ou seja, aquele cujo destino nãoseria a fiação. Dessa maneira, os níveis de perda são in-feriores aos observados para o caso paulista, que descon-tam essas quantidades e referem-se apenas a fardos comdestinação têxtil. Entretanto, a tendência e a expressivi-dade das perdas para ambos os estados são consistentesentre si.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 29

umidade, esses montantes se reduziriam para R$20,4 mil e R$ 16,5 mil para os respectivos níveisde impureza, sendo que a receita líquida entre oalgodão colhido limpo e o com 10% de sujeira cai-ria de R$ 6,4 mil para R$ 2,4 mil, chegando a sernegativa para o algodão com 20% de sujeira (vertabela 9). Dessa maneira, não há dúvidas de queexistem perdas para o cotonicultor diante dosdescontos e deságios referentes à qualidade do al-godão. Numa realidade em que o rapa constitui aprática generalizada de colheita, e em que as algo-doeiras fazem safras, essas diferenças perdem signifi-cado e expressão, tornando-se imperceptíveis pe-rante a necessidade de realizar a produção, co-lhendo e vendendo o algodão em caroço.

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30 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

TABELA 7Índice de Produtividade e Perda, Segundo as

Regiões Produtoras do Paraná MédiaBienal — Safras 84/85 a 95/96

1984/85 e 1985/86

Região Algodãoem Caroço

Kg(A)

Produçãode

Pluma kg (B)

Total deAlgodãoDesclas-

sif.* kg(C)

Rendi-mento doBenefic.(A) (%)

Índice dePerda

(C/A) (%)

Oeste 75 443645

27 512982

3 166 178 36,47 4,20

Centro-Oeste

307 664064

111 979208

15 272420

36,40 4,96

Norte Ve-lho

237 511245

85 155489

15 274233

35,85 6,43

Norte 253 906845

91 645944

16 965547

36,09 6,68

Total 874 525 797 316 293 623 50 678 377 36,17 5,79

1989/90 e 1990/91

Região Algodãoem

Caroço kg(A)

Produçãode

Pluma kg(B)

Total deAlgodãoDesclas-

sif.*

kg (C)

Rendi-mento doBenefic.(A) (%)

Índice dePerda

(C/A) (%)

Oeste 129 649487

44 667504

10 060359

34,45 7,76

Centro-Oeste

407 626596

139 685628

34 581456

34,27 8,48

Norte Ve-lho

161 202579

54 786601

14 701875

33,99 9,12

Norte 244 882153

83 577761

22 972410

34,13 9,38

Total 943 360 814 322 717 493 82 316 100 34,21 8,73

1994/95 e 1995/96

Região Algodãoem

Caroço kg(A)

Produçãode

Pluma kg (B)

Total deAlgodãoDesclas-

sif.*

kg (C)

Rendi-mento doBenefic.(A) (%)

Índice dePerda

(C/A) (%)

Oeste 64 352749

21 935371

4 663505

34,09 7,25

Centro-Oeste

206 931319

70 246188

16 446183

33,95 7,95

Norte Ve-lho

34 634091

11 290864

3 965803

32,60 11,45

Norte 106 858759

36 238137

9 463245

33,91 8,86

Total 412 776 918 139 710 560 34 538 736 33,85 8,37

Fonte dos dados brutos: Relatório do Algodão — CLASPAR.Nota: * Corresponde à agregação de algodão desclassificado, resíduos

e perdas ocorridos em cada usina deprocessamento.

Obs.: Ver descrições da tabela 1.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 31

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32 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

TABELA 8Estimativa de Prejuízos do Cotonicultor Decor-rentes de Diversos Percentuais de Impurezas,

numa Produção de 3 000 Arrobas de Algodão emCaroço,

no Sudoeste do Brasil — Safra 95/96(Em R$)

Operações Custo daOperação

Perdas Financei-ras por

Impurezas

10% 20%

Colheita Manual (R$1,70/@)

5 100,00 510,00

1020,0

0Transporte (R$ 0,30/@) 900,00 90,00 180,0

0Beneficiamento (R$1,20/@)

3600,00

360,00

720,00

Total 9 600,00 960,00 1 820,00Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.

TABELA 9Estimativa do Resultado Econômico do Cotoni-cultor, por Níveis de Impurezas do Algodão emCaroço, para uma Produção de 3 000 Arrobas,

no Sudoeste do Brasil — Safra 95/96(Em R$)

Item AlgodãoLimpo

Níveis de Impurezas

10% 20%

Receita bruta em pluma para algodãosem perda de tipo1

24480,00

20736,00

17280,00

Receita bruta em pluma para algodãocom perda de tipo por impureza e umi-dade2

24480,00

20404,00

16560,00

Receita líquida em pluma(3) 6 480,00 2404,00

-1440,00

Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.Notas: 1 Preço base de R$ 24,00/@ de pluma, com rendimento de 34% para

algodão limpo, 32% para algodão com 10% de impureza, e 30% paraalgodão com 20% de impureza acima do limite de tolerância (12% deumidade para o seco).

2 Corresponde ao deságio médio da safra, meses de março e abril, sen-do 0,5 tipo para 10% de impureza(R$ 0,50/@ de pluma), e 1 tipo para 20% de impureza (R$ 1,00/@ depluma).

3 Custo de R$ 3,80/@ de caroço, exclusive colheita.

Essas perdas, no entanto, também são expres-sivas para as algodoeiras, como demonstram osdados de produtividade e desgaste de equipamen-tos. O algodão em caroço mal colhido perde produ-

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 33

tividade no beneficiamento, com índices de 33% a43% inferiores em relação ao algodão limpo. Poroutro lado, o desgaste de componentes das máqui-nas mostra-se mais expressivo para elevados ní-veis de impurezas e umidade do algodão em caro-ço, reduzindo a durabilidade das serras (tantonovas como afiadas), além de maior nível de per-das (troca irreversível mesmo de serras novas), omesmo ocorrendo com as costelas. Destaque-seque tais prejuízos existem em todos os modelos demáquinas ou limpadores utilizados (ver tabela10). Em outros componentes gerais dos conjuntosde beneficiamento, os prejuízos da má colheitatambém são grandes, como no desgaste e menordurabilidade de serrilhas e escovas. As condiçõesde trabalho tambémpioram, com níveis de poluição seis vezes maio-res, gerando maior rotatividade e doenças nostrabalhadores, aumento do risco de acidentes, doesforço físico, etc. (ver tabela 11).

TABELA 10Prejuízos Decorrentes da Má Qualidade da Co-

lheita do Algodãono Beneficiamento, por Tipo de Conjunto, no Sul-

Sudeste do Brasil — 1995Tipos de Conjunto de Beneficiamento

Indicadores 90 c/ LimpadoresMitchell

90 c/ Limpadores Big-Dun

142 Serras

Bem Co-lhido

Mal Co-lhido

Bem Co-lhido

Mal Co-lhido

Bem Co-lhido

Mal Co-lhido

Produção porhora (fardos)

7 a 8 4 a 5 7 a 8 3 a 4 18 12

DurabilidadeSerras novas(fardos)

3 000 a 4000

2 000 a 3000

3 000 a 4000

1 500 a 2000

18 000 12 000

Serras afiadas(fardos)

2 000 a 2500

1 200 a 1500

- - - -

Perdas e/ou des-gaste

Serras (%) 20 50 30 55 10 40Costelas (%) 15 a 20 60 a 70 50 80 10 40

Fonte: Mello e Palandri (1995).

TABELA 11Outros Prejuízos Associados à Qualidade da Co-

lheita do Algodão nas

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34 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

Operações de Beneficiamento, no Sul-Sudeste doBrasil — 1995

Indicadores Tipo de AlgodãoBem Colhido Mal Colhido

DesgastesDas serrilhas doH.L.S.T.(%)

30 70

Das escovas do H.L.S.T.(%) 30 70Das serrilhas do Mitchell 15 40Das escovas Mitchell 15 40Com rolamentos 20 50Ventilador de casquinha 20 60

Gasto do limpador de plumas70"

Rolo de serrilha por safra 1 1a2Rolo de escovas por safra 1 2

Poluição de pó, fumaça e re-síduos (%)

0 a 10 10 a60

Mão-de-obraTrabalhadores por turno 7 a 10 10 a 14Rotatividade e doença 0 a 5 5 a 15Aumento do risco de aciden-tes (%)

0 20

Aumento no esforço físico(%)

0 40

Fonte: Mello e Palandri (1995).

Os rendimentos, de 33% a 43% inferiores, dasoperações com algodão com maior percentual deimpureza e umidade, os custos de reposição decomponentes, em média 35% superiores, e a ne-cessidade de 30% de mão-de-obra adicional con-formam um quadro de redução da produtividadeglobal das algodoeiras a custos crescentes. Issosem levar em conta as constantes necessidades delimpeza dos galpões e dos equipamentos e as pa-radas para troca de componentes desgastados(serras, serrilhas e escovas), que impactam o de-sempenho geral de cada conjunto no total da safra.Assim, premidas pela necessidade de maximiza-ção do volume beneficiado a cada safra e pela faltade qualidade da matéria-prima, que reduz seurendimento operacional, as algodoeiras acabamatuando abaixo de sua capacidade instalada, demaneira deficiente e lançando mão de inúmerosexpedientes para acomodar a situação. O acirra-mento da crise provoca a perda de seu grau de li-berdade no repasse do ônus da tarefa de ajustar aexigência de qualidade da pluma à piora das con-dições de colheita do caroço.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 35

Dessa maneira, fica claro que a qualidade doproduto final no beneficiamento depende direta-mente da qualidade do produto na entrada da má-quina, resultado de colheita bem ou mal feita. Poroutro lado, esse processo produz impactos eco-nômicos negativos, seja por prejuízos econômicosdiretos com maior custo unitário, seja por depre-ciação da qualidade da pluma, originando desá-gios nos preços de venda. O mais grave, entretan-to, é a dificuldade de colocação do produto nacio-nal, que, enfrentando condições adversas de con-corrência com o importado, no tocante às opera-ções de financiamento, sofre críticas do ponto devista qualitativo. Isso porque a colheita no siste-ma rapa, associada a condições naturais desfavorá-veis, acaba produzindo algodão em caroço comalto grau de impurezas, com coloração creme aavermelhada, e alto nível de umidade, sendo im-possível corrigir esses problemas no beneficia-mento.

No beneficiamento, a fibra pode ser danificadase a secagem for executada de forma brusca e comtemperatura muito alta e se a limpeza for feitacom elevadas velocidades da esteira. Embora aregulagem dos secadores a óleo seja mais fácil, eos níveis de temperatura mais estabilizados queos movidos a lenha, os erros podem trazer gran-des prejuízos, como nos possíveis descuidos ope-racionais que acabam manchando a fibra. Essaspráticas de desrespeito às exigências técnicas dobeneficiamento resultam, em boa medida, da ân-sia do maquinista em fazer safra, ou seja, compor esto-ques de pluma (mínimo de 4 500 toneladas, 300mil @, por conjunto). Alguns fatores prejudiciaissão: ressecamento da fibra; alteração na cristali-nidade da celulose; e quebra da fibra no benefici-amento, aumentando o número de fibras curtas ediminuindo a uniformidade exigida nas etapasindustriais posteriores. Esses problemas ocor-rem principalmente porque as máquinas de bene-ficiamento não estão preparadas para processaralgodão úmido e com elevado nível de impureza.

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36 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

Em geral, do ponto de vista técnico, uma carac-terística das algodoeiras brasileiras, que interfe-re diretamente na competitividade, é a desatuali-zação do parque descaroçador. As máquinas debeneficiamento, em geral, são muito antigas e têmpadrões tecnológicos semelhantes, equivalendo-se em termos de produtividade. Os parques de al-godoeiras nordestino e paulista são os mais anti-gos do país — o primeiro, em função de estar naregião pioneira do cultivo de algodão arbóreo(mocó), e o segundo, por reter, em suas áreas agrí-colas, boa parte da expansão do algodão herbáceo,verificada nos anos 30 e 40. Saliente-se a incom-patibilidade dos referidos parques de máquinasdessas regiões, que foram construídos para aten-der a diferentes mercados de fibras (no nordesti-no, fibra longa, no paulista, fibra média). O Para-ná, apesar de constituir o parque mais recente,também apresenta unidades antigas, pois recebeugrande parte das usinas paulistas desativadas,em função da redução da expressão da cotonicul-tura nesse estado.

Entretanto, cabe salientar que o fato de o parquede beneficiamento ser antigo, o que interfere dire-tamente na produtividade operacional, não repre-senta necessariamente perdas em qualidade. As-sim, máquinas antigas, de 80 serras, datadas dosanos 50, desde que atualizadas, adaptando equi-pamentos de secagem e limpeza, e operadas nanormalidade, podem propiciar algodão em plumade qualidade superior, mesmo apresentando me-nor produção horária de fardos. Por outro lado,equipamentos mais modernos, de 142 serras,ainda que com maior produtividade operacional,podem depreciar a fibra se operados de maneirainadequada.

Outro problema é o fato de, numa realidade deescassez de matéria-prima, as algodoeiras, sejamprivadas ou de cooperativas, não privilegiaremqualidade e sim quantidade — trabalham para fa-zer safra e premiam quem entrega mais, e não

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 37

quem entrega bem. Esse comportamento pode, emparte, ser explicado pelo fato de que os sistemasgerenciais e de comercialização das algodoeirasprivadas e das cooperativas são os mesmos, hajavista que boa parte dos gerentes das cooperativastem, como trajetória de trabalho, a passagem porgrandes grupos privados. No início, as cooperati-vas paranaenses tentaram transferir aos produ-tores os ganhos do processamento do algodão emcaroço. Entretanto, isso não se concretizou, tendoem vista que as cooperativas, pelas característi-cas concorrenciais desse mercado, tiveram queadotar os mecanismos tradicionais de comercia-lização, sob pena de não conseguirem captar aprodução, pois não existe o compromisso do asso-ciado de entregar a safra na cooperativa.12

Essa operação, centrada na busca de realizar omaior volume beneficiado possível por safra, ali-ada à necessidade de operar com custos reduzidospara fazer frente à crise, muitas vezes redundaem procedimentos que prejudicam a qualidade dafibra, como o retardamento da troca de compo-nentes desgastados. Em geral, para o algodão emcaroço colhido limpo, as serras devem ser troca-das a cada 3 mil fardos, mas, no auge da safra,chega-se a processar entre 3,5 e 4 mil fardos, sen-do comum, após esse volume, realizar-se a amola-gem para processar outros 3,5 mil fardos. Tam-bém pode ocorrer, quando efetuada a afiação dasserras, de ficarem rebarbas nas suas pontas, o quetende a prejudicar a fibra. Para o algodão sujo,pelo maior desgaste, essas trocas deveriam serrealizadas entre 2 e 2,5 mil fardos, e nem sempre

12 Cabe salientar, porém, que a contabilidade realizada com

base apenas nos preços pagos na safra não reflete a rela-ção econômica entre a cooperativa e o cooperado, poisanualmente, se o balanço for positivo, há distribuiçãodas sobras líquidas proporcionais ao movimento do coo-perado; ou seja, na maioria dessas organizações, a parteda conta algodão é distribuída proporcionalmente à en-trega de algodão em caroço feita pelo cooperado. Com acrise do sistema cooperativista, essas sobras são meno-res ou inexistentes.

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38 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

as serras teriam condições de reaproveitamentoapós a amolagem.

Do ponto de vista técnico, a realidade das algo-doeiras do Sul-Sudeste brasileiro revela um com-plexo de determinações, que envolve distintosnexos causais, e nenhum aspecto deve ser tomadode maneira isolada para se obter um quadro ex-plicativo. A profundidade e a extensão da crise dacotonicultura nos anos 90 correspondem a umponto crucial, uma vez que as algodoeiras, en-quanto estruturas reflexas do desenvolvimentoda produção de matéria-prima, enfrentam pro-blemas ainda mais graves por não terem como al-terar a atividade, não restando-lhes outra alterna-tiva senão operar passivamente com maior capa-cidade ociosa, até o limite do aceitável do ponto devista econômico. A tentativa de obter o maior vo-lume possível de matéria-prima em cada safra,ainda que piore a qualidade ao aceitar algodãocom altos índices de impureza e umidade, repre-senta na verdade um capítulo da luta pela sobre-vivência numa realidade em que muitas máqui-nas estão paradas.

A crise desencadeia a estagnação dos investi-mentos atualizadores das máquinas e a saturaçãodos componentes, operados até seu limite. Essecomportamento mostra-se genérico, indeferenci-ando as empresas que trabalham com equipamen-tos antigos ou modernos, com maior ou menor po-tência; ou seja, trata-se de beneficiar o máximopossível reduzindo custos ao limite. A competiti-vidade das algodoeiras em termos de produtivi-dade e qualidade, no tocante a aspectos técnicos,não depende de índices determinados exclusiva-mente pelo desempenho dos equipamentos, masda produção de matéria-prima. A quantidade,nesse caso, determina a qualidade, pois a existên-cia de critérios mais rígidos esbarra na elevadaociosidade.

Não basta, na situação atual, afirmar que o sis-tema de alimentação manual mostra-se incompa-

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 39

tível com o atingimento da potencialidade de ren-dimento das máquinas modernas de 142 serras.Essa prática intensiva em mão-de-obra — que re-presenta em torno de 23% do custo do beneficia-mento — decorre da própria estrutura da cotoni-cultura do Sul-Sudeste, onde predominam peque-nas lavouras. O transporte de pequenas quanti-dades do produto em sacos de polietileno, além deprovocar a contaminação da pluma, aumenta oscustos do processo (em cerca de 7%). A introduçãode sistemas de sucção direta, de caminhões de al-godão transportado a granel, aumentaria a produ-tividade do trabalho e eliminaria a necessidade desacaria, reduzindo custos operacionais. Mas essesistema exige colheita mecânica, que, por sua vez,necessita de algodoais de áreas contíguas maio-res, ou seja, outro padrão de cotonicultura.

Na busca de maior qualidade, as tentativas deacordo entre as algodoeiras —para o não-recebimento de algodão em caroço que não aten-desse a especificações determinadas de impure-zas e umidade – fracassaram mais de uma vez.Não basta o retorno da aplicação do aparato regu-latório com maior efetividade e rigidez num mer-cado que chancela, por suas próprias regras, ascondições vigentes. Numa conjuntura de escassezde matéria-prima, as algodoeiras, por estaremoperando com enormes índices de capacidade oci-osa, não têm conseguido fazer valer exigências dequalidade. Em outras palavras, como a meta tra-çada para cada safra contempla a quantidade, enão aspectos qualitativos, não há como recusarum carregamento de algodão com impurezas eumidade elevada, porque a máquina da esquina aceita, derru-bando o mercado. Para fazer frente ao menor de-sempenho operacional e aos custos de desgastedos componentes, muitas algodoeiras operamacima do limite das especificações, prejudicandoa fibra. Além disso, lançam mão de vários meca-nismos, nem sempre transparentes, para ressar-cir seus custos e obter lucros. Nessa realidade decrise, como talvez em nenhuma outra operação

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40 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

agrícola, a quantidade mostra-se inimiga da qua-lidade.

A característica de vin-culação estreita entre acotonicultura e as algo-doeiras cria certa confu-

são sobre o próprio caráter da atividade. A maio-ria dos estudos da indústria têxtil parte da fiaçãocomo início da estrutura industrial, seguindo atradição de que, nas principais nações produtorasde algodão do mundo, os cotonicultores pagam oserviço de beneficiamento e vendem, eles mes-mos, a pluma e os subprodutos (caroço e línter).Outro fato que reforça essa visão decorre de que,por limitações de ordem técnica, não há comérciode algodão em caroço, existindo apenas o mercadode pluma nas transações inter-regionais em umanação ou no mercado internacional. Entretanto,não há nenhuma grande nação têxtil no contextomundial que não sustente sua estratégia de longoprazo na produção interna de parcela preponde-rante da matéria-prima, ou seja, na construção decotoniculturas e algodoeiras fortes e competiti-vas.

Uma análise mais aprofundada das algodoeirasbrasileiras faz emergir necessariamente umadiscussão sobre seu caráter: são indústrias, es-truturas de atravessadores ou prestadoras deserviços? Esses são os ângulos sob os quais as al-godoeiras têm sido apresentadas, e a resposta àindagação revela que são os três ao mesmo tempo.São indústrias porque, na passagem pelos equi-pamentos, ocorrem mudanças na forma da maté-ria-prima, que se transforma em novos produtos,distintos dos originais, embora, tal qual os produ-tos agropecuários em geral, guardem relação comas qualidades intrínsecas da matéria-prima ori-ginal. Desse ângulo, se os estudos consideram ofrango produto de uma agroindústria (o frigorífi-co), e suas transformações de forma, são menosradicais, é possível dizer que as algodoeiras são

2.3 Dilemas de Uma Agroindústria Ultra-Especializada em UmaMatéria-Prima

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 41

também agroindústrias, talvez a mais antigaforma de indústria da agricultura. Mas trata-se deuma agroindústria particular, tal como a agroin-dústria sucroalcooleira, que tem uma associaçãodireta com a produção da matéria-prima. Sua es-pecificidade revela-se particularmente na sazona-lidade de seu funcionamento, que acompanha deperto a estacionalidade da produção de algodão.As algodoeiras trabalham apenas três a quatromeses do ano no beneficiamento de algodão, per-manecendo com suas estruturas subutilizadasnos demais meses. As empresas contratam mão-de-obra temporária para operar a safra, manten-do apenas o pessoal de escritório e de manutençãode equipamentos no restante do período. Nessecaso, para garantir o funcionamento no resto doano, as algodoeiras funcionam como depósitos depluma e, na maioria das vezes, adentram na co-mercialização, atuando como agentes atravessa-dores, comprando a safra na forma de algodão emcaroço, beneficiando e vendendo pluma e subpro-dutos. Assim, para operarem doze meses, e nãoapenas três ou quatro, as algodoeiras passaram aconstituir, no caso brasileiro, canais de comercia-lização, mesmo porque a capilaridade dessas es-truturas próximas da cotonicultura foi importan-te para fluir a produção, em especial nos períodosde expansão dos plantios.

As algodoeiras, em certas áreas do Sul-Sudeste,apresentam uma tendência de se tornarem sim-plesmente prestadoras de serviços aos cotonicul-tores, tal como ocorre nos grandes países produ-tores de algodão. Essa alternativa pode mostrar-se viável numa situação em que existam outrasopções de atividade compatíveis, uma vez que oconjunto de equipamentos de beneficiamento dealgodão não se presta ao benefício de outros pro-dutos agrícolas. Assim, nos custos de beneficia-mento não apenas deve estar embutida a depreci-ação global das máquinas por todo o período, mastambém os gastos fixos dos meses de não-operação. Em outras palavras, ao não atuar como

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42 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

comerciante de pluma após a safra, o proprietáriodas algodoeiras, de alguma forma, para sobrevi-ver, vai repassar, aos preços cobrados pelo servi-ço de beneficiamento, adicionais que compensema inexorável ociosidade sazonal. Isso porque nemtodas as algodoeiras são de empresas integradaspara frente, atuando na fiação e tecelagem.

O segmento brasileiro das algodoeiras, como de-corrência dos efeitos da crise e das transforma-ções do complexo têxtil, enfrenta ao mesmo tem-po a necessidade de recompor-se, elevando os ní-veis de utilização dos equipamentos, e o desafio damodernização tecnológica e da alteração de suafunção no complexo têxtil. Não é sem razão quesuas principais lideranças têm sido solidárias àsreivindicações dos cotonicultores nos enfrenta-mentos com a indústria têxtil. Não há como resol-ver a crise das algodoeiras sem a solução da criseda cotonicultura, que, por sua vez, envolve a ree-quação das relações internas de orquestração deinteresses do complexo têxtil brasileiro, incluin-do a produção de matéria-prima como elementoestratégico.

Outro aspecto pouco ressaltado é o elevado in-vestimento global de montagem de uma unidadealgodoeira, que, para os padrões medianos, giraem torno de US$ 5 milhões, enquanto uma unida-de sofisticada com processos informatizados esucção direta alcançaria cerca de US$ 12 milhões.Numa realidade de crise e elevada ociosidade, tra-ta-se de inversões irrealizáveis mesmo paragrandes grupos. Esses montantes aproximam-sedos níveis necessários para outros segmentos docomplexo têxtil, como a fiação e a tintura-ria/acabamento. Não é sem razão que a maioriados grandes grupos têxteis não adentrou o negó-cio de beneficiamento, montando, em vez de algo-doeiras próprias, excepcional estrutura comerci-al capaz de identificar agentes idôneos e garantir,desse modo, à indústria têxtil, a aquisição de ma-téria-prima na quantidade e qualidade necessári-

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 43

as a seus usos. No máximo, certos grupos operamcom algumas unidades de beneficiamento paragarantir um mínimo de matéria-prima e elevar opoder de barganha no mercado de pluma.

O desafio das algodoeiras, como de toda estrutu-ra produtora de algodão em caroço e pluma do Sul-Sudeste, está em ultrapassar esse quadro difícilem que se defronta com a concorrência desleal,tendo de suportar a entrada maciça de pluma es-trangeira, ancorada em condições favoráveis definanciamento. O nível de sucateamento da estru-tura produtiva das algodoeiras torna-se a cadaano mais expressivo, pelo abandono e não-realização de manutenção adequada. Por sua vez,a expansão da cotonicultura no Brasil Centraltem propiciado a crença na inexorabilidade da in-viabilização da cotonicultura e, conseqüentemen-te, das algodoeiras do Sul-Sudeste. Assim, com apecha de não-competitiva em custos e qualidade,aliada à menor produtividade, em razão da su-premacia das condições naturais de plantio e doclima estável das chapadas do Centro-Oeste, con-dena-se à morte e escreve-se antecipadamente oepitáfio de uma atividade que, até pouco tempo,era o exemplo maior do sucesso da modernizaçãoe orgulho nacional em termos de capacidade degeração de base técnica autóctone. Esses determi-nismos, da supremacia inexorável do mercadoauto-regulável e do indelével fim da cotoniculturado Sul-Sudeste, causam arrepios à história. Piorainda quando se verifica que, com base neles,abandona-se a atividade à decadência.

A análise da rentabili-dade e competitividadedas algodoeiras, diante

darealidade vivida por essas agroindústrias nas úl-timas safras, deve levar em conta não apenas seuscustos e receitas, operando à plena capacidade,mas também o resultado econômico efetivo des-

2.4 Rentabilidade e Competitividade das Al-godoeiras

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44 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

sas estruturas, a partir do percentual médio deutilização da capacidade instalada dos descaroça-dores em funcionamento. Ressalta-se que, noBrasil, as algodoeiras são ainda, preponderante-mente, um agente intermediador no processo decomercialização da pluma, ou seja, compram al-godão em caroço para vendê-lo em pluma, grão elínter, e não um prestador de serviços, no que de-veria se basear a verificação de sua rentabilidade.Dessa maneira, o algodão em caroço surge comomatéria-prima numa estrutura agroindustrialque o transforma em pluma, tendo esta uma des-tinação específica aos segmentos posteriores docomplexo têxtil.

Operando à plena produção, os diferentes mode-los de algodoeiras instalados no Sul-Sudeste bra-sileiro apresentam distintos custos finais de pro-dução da pluma, distribuindo-se as posições entreos modelos de maneira inversa à produtividadeoperacional. Embora haja diferenças de custosentre as algodoeiras que processam algodão pró-prio — como no caso do Grupo Maeda, que obtémmatéria-prima a custos inferiores — e as que com-pram todo algodão em caroço de terceiros, paraefeito de comparação, utiliza-se o mesmo custo damatéria-prima para todos os modelos.13 Nessascondições, o custo médio do fardo de pluma varia-ria de R$ 311,61, na máquina de 142 serras, a R$323,52, na de 80 serras, da mesma forma que oscustos, apenas do beneficiamento, seriam de R$31,61/fardo e R$ 43,52/fardo para os respectivos

13 A heterogeneidade como marca do parque algodoeiro

conforma um leque muito vasto de situações, ampliando-se as particularidades a cada nova variável flexibilizada.Nesse mercado, existem empresas algodoeiras individu-ais, algodoeiras ligadas a grupos empresariais especiali-zados apenas nesse segmento, algodoeiras pertencentesa indústrias têxteis integradas para trás, algodoeiras deempresas agrícolas integradas para frente e algodoeirasde cooperativas agropecuárias integradas para frente. Aessa realidade ainda se sobrepõem os quatro tipos bási-cos, cada qual em diferente situação de manutenção eatualização. Os dados colhidos representam a média deequipamentos que operaram nas safras 94/95 e 95/96.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 45

equipamentos. Nota-se de maneira inequívoca oimpacto da maior produtividade das máquinas demaior porte e o reduzido valor adicionado na ope-ração de beneficiamento, variando de 10% a 13%.Além disso, em termos de pluma expressa em cen-tavos de real por libra-peso, as diferenças são re-duzidas, pois a matéria-prima corresponde aoitem majoritário no custo da pluma (87% a 90%)(ver tabela 12).

Nas safras 94/95 e 95/96, as algodoeiras ope-raram, em média, com apenas 30% da capacidade.Considerando-se essas realidades, os custos dobeneficiamento se elevam por deseconomias deescala, muito embora praticamente se igualemaqueles custos derivados da opção pelos diferen-tes modelos de descaroçadores. Para o fardo depluma custando de R$ 333,39 a R$ 334,08, oscustos de beneficiamento tornam-se muito pró-ximos, situando-se entre R$ 53,39/fardo e R$54,08/fardo. Isso decorre do fato de que as má-quinas mais potentes exibem maiores custos dedepreciação em relação às de menor capacidade(R$ 23,92/fardo, para a de 142 serras, contra R$20,32/fardo, para as de 80 serras) — ver tabela13. Isso de certa maneira explica o porquê de ape-nas as grandes cooperativas e as empresas agro-pecuárias integradas investirem na montagem dealgodoeiras de maior capacidade, que não apenasexigem maior volume de algodão para operaremuma safra (o que na crise só pode ser garantidocom plantios próprios), como também, ao funcio-narem com capacidade ociosa, apresentam sériasdificuldades de reposição do capital investido.

TABELA 12Custo de Produção de Algodão em Pluma, Segun-

do os DiferentesTipos de Descaroçadores Operando à Plena Capa-

cidade,1

no Sul-Sudeste do Brasil — 1996

(Em R$/fardo de 200 kg)

Item 80 Serras 90 Serras 120 Serras 142 Serras

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46 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

(6 far-dos/hora)

(8 far-dos/hora)

(12 far-dos/hora)

(17 far-dos/hora)

Matéria-prima 2 280,00 280,00 280,00 280,00

Material e embalagem 2,77 2,74 2,58 2,32

Energia 3,02 8,97 2,74 2,52

Mão-de-obra 17,02 15,78 13,54 11,03

Manutenção 5,21 5,12 4,56 3,76

Depreciação da indústria 11,12 10,14 9,76 8,56

Despesas financeiras 4,38 4,26 3,86 3,42

Custo do beneficiamento3 43,52 41,01 37,04 31,61

Custo total da plu-ma/fardo

323,52 321,01 317,04 311,61

Custo total por libra-peso 0,73 0,73 0,72 0,70

Fonte: Pesquisa de Campo — IPARDES.Notas: 1 Três turnos de 8 horas diárias durante quatro meses do ano, ou

seja, 2 880 horas por safra.2 40 @ de algodão em caroço (600 kg)/fardo de 200 kg (rendimento de33%), ao preço de R$ 7,00/@.3 Excluindo-se o custo da matéria-prima.

TABELA 13Custo de Produção de Algodão em Pluma, Segun-

do os DiferentesTipos de Descaroçadores Operando com 30% da

Capacidade,1

no Sul-Sudeste do Brasil — 1996

(Em R$/fardo de 200 kg)

Item 80 Serras(6 far-

dos/hora)

90 Serras(8 far-

dos/hora)

120 Serras(12 far-

dos/hora)

142 Serras(17 far-

dos/hora)

Matéria-prima 2 280,00 280,00 280,00 280,00

Material e embala-gem

2,84 2,76 2,62 2,52

Energia 3,47 3,32 3,12 2,96

Mão-de-obra 17,39 16,78 15,92 15,58

Manutenção 5,21 5,12 4,56 3,76

Depreciação da in-dústria

20,32 21,36 22,78 23,92

Despesas financei-ras

4,56 4,72 4,88 4,65

Custo do beneficia-mento 3

53,79 54,08 53,88 53,39

Custo total da plu-ma/fardo

333,70 334,08 333,88 333,39

Custo total por librapeso

0,75 0,76 0,75 0,75

Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.Notas: 1 Três turnos de 8 horas diárias durante quatro meses do ano, ou

seja, 2 880 horas por safra.2 40 @ de algodão em caroço (600 kg)/fardo de 200 kg (rendimento de

33%), ao preço de R$ 7,00/@.3 Excluindo-se o custo da matéria-prima.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 47

Os resultados econômicos dos diferentes tiposde algodoeiras exigem, para se obter uma repre-sentação adequada do negócio, que se leve em con-sideração não apenas as receitas obtidas com avenda de pluma, mas também as provenientes dacomercialização do grão (caroço), subproduto devalor econômico. À receita bruta da obtenção deum fardo de algodão em pluma, a R$331,86/fardo, deve ser acrescido o montante deR$ 38,40, decorrente da venda do grão, que foitambém produzido no descaroçamento. Dessemodo, a margem bruta do beneficiador seria deR$ 90,26/fardo — igual para todos os modelos,pois, para o mesmo preço dos produtos finais (1fardo de pluma e 320 kg de grão), tem-se tambémo mesmo custo da matéria-prima. Subtraindo-se ocusto de produção da pluma da receita bruta total,obtém-se a margem líquida do beneficiador. Ope-rando à plena capacidade, esse indicador varia-ria de R$ 46,74/fardo, para a máquina de 80 ser-ras, a R$ 58,65/fardo, para a de 142 serras. Com30% da capacidade, a renda líquida seria seme-lhante, variando em torno de R$ 36,47/fardo(ver tabelas 14 e 15).

TABELA 14Resultados Econômicos dos Diferentes Tipos de

Descaroçadoresdo Sul-Sudeste do Brasil — 1996

(Em R$/fardo de 200 kg)

Tipo de Máquina Custo doBenefício

Custo doFardo

Preço daPluma1

Preço doCaroço2

ReceitaTotal

80 Serras

Plena capacidade 43,52 323,52

331,86

38,40 370,26

30% da capacidade 53,79 333,79

331,86

38,40 370,26

90 Serras

Plena capacidade 41,01 321,01

331,86

38,40 370,26

30% da capacidade 54,08 334,08

331,86

38,40 370,26

120 Serras

Plena capacidade 37,04 317,04

331,86

38,40 370,26

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48 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

30% da capacidade 53,88 333,88

331,86

38,40 370,26

142 Serras

Plena capacidade 31,61 311,61

331,86

38,40 370,26

30% da capacidade 53,39 333,39

331,86

38,40 370,26

Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.Notas: 1 Para o algodão em pluma a R$ 0,75/libra-peso, o preço do fardoseria de R$ 331,86.

2 Uma @ de algodão em caroço, produz 8 kg de semente (caroço), 40 @produzem 326 kg, ao preço deR$ 0,12/kg; o total seria R$ 38,40/fardo produzido.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 49

TABELA 15Rentabilidade dos Diferentes Tipos de Descaro-

çadoresdo Sul-Sudeste do Brasil — 1996

Tipo de Máquina Benefí-cio Mat.Prima

(%)

BenefícioCus-

to/fardo(%)

MargemBruta

Benefici-ador1

(R$/fardo)

Margem Lí-quida Bene-

ficiador2

(R$/fardo)

Margem Lí-quida

Beneficia-dor3

(R$/fardo)

80 SerrasPlena capacida-de

15,54 13,45 90,26 46,74 8,34

30% da capaci-dade

19,21 16,11 90,26 36,47 -1,93

90 SerrasPlena capacida-de

14,65 12,78 90,26 49,25 10,85

30% da capaci-dade

19,31 16,19 90,26 36,18 -2,22

120 SerrasPlena capacida-de

13,23 11,68 90,26 53,22 14,82

30% da capaci-dade

19,24 16,14 90,26 36,38 -2,02

142 SerrasPlena capacida-de

11,29 10,14 90,26 58,65 20,25

30% da capaci-dade

19,07 16,01 90,26 36,87 -1,53

Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES

Notas: 1 Diferença entre a receita total e o preço da matéria-prima.2 Margem bruta menos os custos de produção de pluma.3 Margem líquida excluindo-se da receita total os ganhos com a venda

do caroço.

Resultado interessante obtém-se quando se ex-clui, da receita bruta total, os valores obtidos coma venda do grão. As margens se reduzem conside-ravelmente, variando de R$ 8,34/fardo, paramáquinas de 80 serras, a R$ 20,25/fardo, para asde 142 serras. Em outras palavras, para um preçodo fardo de pluma de R$ 331,86, os ganhos ficari-am na faixa de 2,5% a 17,6%. A situação torna-semais grave quando os descaroçadores operamcom 30% da capacidade, pois as margens são ne-gativas, variando de R$ 1,53 a R$ 2,22/fardo. Es-ses números explicam o porquê de as algodoeirasficarem com os subprodutos do algodão em caro-ço, não os levando em conta nas transações comos cotonicultores, uma vez que é exatamente o ca-roço que remunera a operação do equipamento,ainda mais quando tem de operar com capacidadeociosa. Também aí encontra-se a razão de ter-setornado freqüente a afirmação, aceita por todos os

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50 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

agentes no mercado de algodão em caroço, de que avenda do caroço paga o benefício. Ainda que as transações sejamrealizadas com base nesse escambo, as perdaspara o beneficiador, proprietário de máquinas demenor porte, seriam expressivas, pois para umareceita da venda do grão estimada em R$ 38,40,seus custos seriam deR$ 41,01/fardo e R$ 43,52/fardo, na condição deoperar à plena capacidade. Entretanto, com capa-cidade ociosa, em nenhuma hipótese esse escam-bo seria satisfatório ao beneficiador.

Tenha-se claro que a comparação da rentabili-dade das algodoeiras do Sul-Sudeste deve restrin-gir-se aos tipos de máquinas em operação, pois serealizada no plano internacional, na verdade, se-riam as estruturas das distintas cotoniculturasque estariam sendo cotejadas. A realidade atual,de baixo nível de utilização da capacidade insta-lada, forja uma situação em que o maquinista, en-quanto intermediário, tende a transferir para aoperação de compra da matéria-prima sua espe-rança de ganhos. Apenas comprando a maiorquantidade possível ao menor preço, a empresaalgodoeira poderá aumentar sua massa de lucros.Dessa maneira, explica-se o imenso número deunidades fechadas e também a expressiva pro-porção daquelas que estão trabalhando sob condi-ções inadequadas de manutenção. Ressalte-se,contudo, que as algodoeiras integradas a coopera-tivas e/ou empresas agropecuárias e/ou indústri-as têxteis, na medida em que consigam garantirquantidade razoável de algodão em caroço paraprocessarem, podem obter rentabilidades satisfa-tórias.

Portanto, a verificação da competitividade dasalgodoeiras no contexto internacional exige queseja considerada, na mesma análise, a cotonicul-tura que lhe fornece a matéria-prima. Nesse con-texto, as atuais estruturas genéricas da produçãode algodão em pluma do Sul-Sudeste do Brasil,centradas no mosaico de reduzidas áreas de la-voura, colhidas manualmente, processadas emalgodoeiras que operam com alta capacidade ocio-

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 51

sa, etc., de maneira alguma seriam competitivasdiante dos padrões internacionais, em especial osexistentes na Argentina, maior produtor de plu-ma do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). Entre-tanto, as modernas cotoniculturas de escala brasi-leiras, com grandes algodoais de elevada produti-vidade, colhidos mecanicamente, sejam oriundosde lavouras próprias ou de lavouras contratadas,como as realizadas pelos Grupos Maeda, Tadashi,Maggi e Sachetti, quando associadas a algodoeirasde porte, são competitivas diante dos padrões in-ternacionais. Esse padrão, se difundido para asoutras regiões do Paraná e São Paulo, consolida-rá a nova estrutura algodoeira brasileira. Por ou-tro lado, se fosse introduzida a colheita mecânicae recuperada a produção local de algodão em caro-ço, mesmo as máquinas de 80 e 90 serras seriamcompetitivas.

3 FIAÇÕES: DINÂMICA DASTRANSFORMAÇÕES

NA PRODUÇÃO DA MATÉRIA-PRIMATÊXTIL

A fiação consiste na segunda etapa industrial daprodução de têxteis de algodão. Nas principaisempresas, a primeira decisão nessa fase repre-senta a determinação do blend de algodão em pluma,composto de vários tipos, escolhidos a partir decaracterísticas intrínsecas, medidas em análiseslaboratoriais pelo High Volume Instruments (HVI). Essa mistu-ra decorre da destinação do fio a ser produzido,fixando-se o título e a qualidade. Os fardos sãoabertos e, no filatório convencional, destinadosaos batedores, e, em seguida, às cardas, nas quaissão penteados de maneira a dispor as fibras para-lelas e numa mesma direção, para, nas fases se-guintes, serem presas umas às outras por suces-sivas torções, formando fios contínuos com diâ-metro definido (quanto menores os títulos, maio-res são os diâmetros do fio).

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52 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

A passagem pelas cardas permite a retirada deparcela das fibras imaturas que irão formar neps,pontos indesejáveis no tecido a ser fabricado. Dascardas, as mechas vão para os passadores e, daí,para as maçaroqueiras, que as estiram, impri-mindo pequena torção, para então, nos filatóriosde fusos, receberem maior estiramento e torção,formando os fios que são enrolados em cones nasconicaleiras, onde são limpos e embalados. Essasoperações são mais simplificadas no filatório open

end, que reduz os processos, eliminando os batedo-res e as maçaroqueiras, sendo que estiramento,torção, monitoramento, limpeza e enrolamentoem cones são realizados por único equipamentoconjugado. As fiações representam o início da de-finição do produto têxtil final, uma vez que a cadatipo de fio está associado um determinado uso natecelagem e nas fases seguintes de processamen-to.

As fiações brasileiras en-frentam um processo dereestruturação que tem

produzido profundos impactos na base técnica ena distribuição regional da estrutura industrial.A produção de fio apresenta níveis de integraçãovertical superiores aos encontrados nas etapasanteriores do complexo têxtil. A especializaçãoencontrada decorre de distintas opções de produ-tos finais e do uso de diferentes tipos de matéria-prima, pois cada padrão de tecido define a exigên-cia de um tipo específico de fio, ou de uma combi-nação deles, ao que se relaciona a combinação dematérias-primas.14 O parque produtivo de fiaçõesconstitui um mosaico de estruturas de mercado,associando-se seu desenvolvimento a diferencia-

14 As possibilidades são amplas diante do leque de opções

existente. Pode-se obter: tecidos puros de algodão com-postos de blends de algodão de várias classificações; tecidosmistos de algodão com outras fibras naturais, sintéticasou artificiais; tecidos puros dessas outras fibras; ou, ain-da, não-tecidos. De qualquer maneira, o algodão constituia principal matéria-prima.

3.1 Estrutura de Produção eDistribuição Regional

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 53

das estratégias de inserção competitiva das em-presas. Por essas razões, os impactos da reestru-turação produtiva mostram-se diferentes em cadarealidade.

O número de empresas atuantes na fiação, queatingia 1 254 unidades, em 1989, mostrou grandecrescimento, chegando a 1 620, em 1990 (22,6%).A partir de então, ocorre uma redução significati-va (-42%), caindo para 939 unidades, em 1994(ver tabela 16). No tocante ao parque instalado,nota-se uma redução nos filatórios a anel de 24,7mil máquinas e 9,6 milhões de fusos, em 1989,para 24,4 mil máquinas e 9,2 milhões de fusos,em 1994. Isso representa um recuo de 1,2 % nasmáquinas convencionais de fiação e de 4,2% nosfusos, ou seja, uma desativação maior na propor-ção de fusos. Nos filatórios a rotor, aumentou-se onúmero de máquinas em 11,8%, passando de 1004 para 1 122; e o de rotores em 12,7%, passandode 165,6 mil para 186,1 mil (ver tabela 17). Mos-tra-se, assim, a tendência de crescente substitui-ção dos filatórios convencionais por equipamen-tos open end no parque de fiações brasileiro.

TABELA 16Evolução do Número de Fiações, no Brasil —

1989—1994

Ano Número de Empresas

1989 1 2541990 1 6201991 1 1231992 9901993 9541994 939

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

TABELA 17Parque Instalado de Máquinas de Fiação —

1989—1994

Ano Filatório a Anel Filatório a Rotor

Máquinas Fusos Máqui- Rotores

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54 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

qui-nas

1989 24 715 9 587690

1004

165583

1990 24 328 9 420174

1041

171 945

1991 23 844 9 197132

1062

175 461

1992 23 497 9 388788

1093

181282

1993 24 354 9 285788

1 117 184945

1994 24 464 9 218509

1122

186102

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

Essa transformação da estrutura produtiva,com a diminuição do número de empresas reali-zando-se concomitantemente ao crescimento dosfilatórios open end, ocorre em fábricas mais compac-tas, pois essa nova tecnologia de fiação permiteobter maior produção por unidade de área cons-truída, ao eliminar fases do processo de fiação.Quando há substituição de filatórios a anel por fi-latórios a rotor, aumenta-se a capacidade de pro-dução da fábrica devido à maior capacidade deprocessamento desses novos equipamentos. En-tretanto, no Brasil, tem-se, em muitos casos, amanutenção de filatórios convencionais em ope-ração e a montagem de novas fábricas no novosistema. Com isso, aumenta-se a ociosidade dasvelhas fiações, pois, dos quase 10 milhões de fu-sos existentes, estima-se que apenas cerca de 6,4milhões estão em pleno funcionamento.15

No tocante à distribuição geográfica, os filatóri-os convencionais concentram-se principalmenteno estado de São Paulo — 47,3% dos fusos existen-tes no Brasil, em 1994 —, onde o número de fusos,após ter crescido de 4,3 para 4,6 milhões (7%), noperíodo 1988/90, apresenta redução nos anosposteriores, retrocedendo para 4,4 milhões em

15 Essas informações, colhidas em entrevistas com lide-

ranças do segmento de fiações, decorrem de vários fato-res, como a paralisação de fábricas, por obsolescência,dificuldades concorrenciais de custos, ou por operaremcom menos turnos.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 55

1994 (-4,4%). Santa Catarina mostra um compor-tamento diferente, com manutenção da capacida-de em torno de 1,14 milhão de fusos, ou seja,12,4% do total nacional. O terceiro parque de fia-ções está localizado em Minas Gerais, com núme-ro de fusos crescendo em 5,6%, passando de cercade 800 mil para 843 mil no período 1988/94,atingindo 9,1% dos filatórios brasileiros (ver ta-bela 18). Desse modo, a distribuição regionalpermite verificar a concentração no Sul-Sudeste,com mais de 80% dos fusos instalados, ou seja, amaioria do parque convencional das fiações bra-sileiras.

TABELA 18Filatórios a Anel nos Estados Produtores de Fios

— 1988—1994

(Número de fusos)

Ano

SãoPaulo

SantaCata-rina

Mi-nasGe-rais

Per-nam-buco

Riode Ja-neiro

RioGrande doNorte

RioGrande do

Sul

Ser-gipe

Ceará Para-íba

Pa-raná

1988

4 303636

1 077366

797632

442136

515566

341121

286339

269633

215629

190375

175611

1989

4 604341

1 178143

836765

543878

531852

345258

290560

264568

220344

192413

195905

1990

4 607475

1 167454

780239

635420

489827

299795

286927

217615

207160

190897

182766

1991

4 387191

1 146749

804614

548495

505680

304334

294305

234618

221018

198646

182446

1992

4 478507

1 168105

830010

555525

521214

309567

299929

239789

222807

196612

186974

1993

4 393894

1 144609

849878

550190

520831

305407

301213

236395

224575

193691

186066

1994

4 362063

1 140457

842793

544324

518735

302541

298552

234265

222382

191638

184246

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

Essa realidade não se altera significativamentequando se analisam as informações relativas aonúmero de rotores, em que o parque paulista cres-ceu de 81,1 para 98,2 mil, entre 1988 e 1994 (-21,1%), nível superior à media nacional, fazendocom que a participação estadual atingisse 52,7%no último ano considerado. O estado de Santa Ca-tarina também evoluiu nesse período, de 22,3para 26,3 mil rotores (17,9%), consolidando-se

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56 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

como o segundo mais importante centro de filató-rios open end do Brasil (14,1%). O mesmo acontececom Minas Gerais, que, tendo saltado de 10,4 milpara 12,3 mil rotores (18,3%), solidifica-se na ter-ceira posição (ver tabela 19). Regionalmente, oSul-Sudeste detém mais de 83% dos rotores, con-centrando, dessa maneira, a parcela mais expres-siva dos filatórios modernos brasileiros.

TABELA 19Filatórios Open End nos Estados Produtores de Fios

— 1988—1994

(Número de rotores)

Ano SãoPaulo

SantaCata-rina

MinasGerais

Pernambuco

Para-ná

Sergi-pe

Rio deJanei-

ro

RioGran-de doNorte

Ceará

1988 81128

22306

10409

7 601 7 766 8922

6774

5783

2 974

1989 87409

23749

11380

9 236 8 741 8741

7092

5937

3 298

1990 91506

25106

11232

10571

8589

8754

7102

5946

3 138

1991 93513

25278

11565

10574

9087

9087

7104

5948

3 304

1992 96861

25874

11776

10781

9620

9288

7464

6137

3 483

1993 97688

26161

12252

11425

9769

9272

7616

6292

4 470

1994 98170

26300

12338

11510

9 817 9350

7693

6366

4 588

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

O algodão constitui a principal matéria-primautilizada nas fiações brasileiras, com consumosaltando de 270,3 mil toneladas, em 1965, para803,7, em 1995, ou seja, praticamente triplicandoem três décadas. A participação do algodão, queera de 66,5% na metade dos anos 60, caiu para52,8% em 1975, mas recupera-se e ultrapassa opatamar dos 62% nos anos 90. As demais fibrasnaturais, artificiais ou sintéticas também tive-ram seu consumo crescente, passando de 135 miltoneladas, em 1965, para 507 mil, em 1995, apre-sentando um aumento de 275,5% no período. En-tretanto, a participação dessas fibras, que haviacrescido de 33,5% para 47,3% entre as metadesdas décadas de 60 e 70, retrocede para 37,7% em

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 57

1995. O consumo total de fibras saltou de 416 milpara 1 344 mil toneladas no período 1965—95(223,1%) — ver tabela 20.

TABELA 20Consumo Industrial de Fibras Têxteis, Segundo o

Tipo — 1965/1995

Algodão Outras Fibras* TotalAno Volu-

me(1 000

t)

% Vo-lume

(1000

t)

% (1 000 t)

1965 270,3

66,5 135,0

33,5 416,3

1970 291,3 56,3 225,7

43,7 517,0

1975 420,0

52,8 355,1

47,2 768,4

1980 572,4

56,8 436,0

43,2 1 008,4

1985 631,4

64,4 306,7

35,6 978,6

1990 730,0

65,6 382,4

34,4 1 107,8

1995 803,7

62,3 507,0

37,7 1 344,5

Fonte: ABIT/SINDITÊXTIL.Nota: * Outras fibras naturais, artificiais e sintéticas.

Os principais centros consumidores de algodãoem pluma do Brasil distribuem-se de maneira dis-tinta daquela verificada para o parque de filatóri-os. Isso não identifica necessariamente distintascapacidades ociosas em função da quantidade dematéria-prima utilizada, mas sugere a especiali-zação das fiações, que podem estar fabricando fi-os com preponderância de misturas de outras fi-bras, como os lanifícios gaúchos (lã) e as empre-sas que utilizam outras fibras naturais (seda), ar-tificiais (viscose) ou sintéticas (poliéster). Oprincipal centro consumidor de algodão em plu-ma localiza-se em São Paulo, com média de 173,8mil toneladas no biênio 1973/74, ou seja, 44,8%do total nacional médio de 388,2 mil toneladas doperíodo. No triênio 1993/95, o consumo paulistafoi de 246,8 mil toneladas, ou seja, 42% de cres-cimento em relação ao início da década de 70, com

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58 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

o que a participação paulista atinge 30% do usonacional de 823,3 mil toneladas de algodão empluma dos últimos três anos considerados(112,1%) — ver tabela 21. Esse desempenho, abai-xo da média nacional, revela um deslocamentoespacial das fiações de algodão.

TABELA 21Consumo Industrial de Algodão em Pluma, Se-

gundo Estados — 1973/1995

Ano Ceará Paraná MinasGerais

São Pau-lo

SantaCatarina

Brasil

1973 11,2 7,6 65,0 173,4 26,8 379,31974 11,2 8,5 68,3 174,2 32,7 397,01983 30,0 19,3 88,0 233,2 71,0 556,71984 31,5 19,6 95,2 228,9 72,6 555,21993 144,8 55,3 130,9 257,1 90,7 829,51994 145,0 62,2 126,8 247,9 97,8 836,61995 147,4 64,5 113,6 235,5 91,7 803,7

Fonte: BM&F, ABIT/SINDITÊXTIL.

Essa redução vem acompanhada de grandecrescimento do consumo de algodão, no mesmoperíodo, nos estados:

a) do Ceará, passando de 11,2 mil para 145,7 miltoneladas (1 200,9%), com aumento da participa-ção nacional de 2,9% para 17,7%, tornando-se o se-gundo centro consumidor nacional;

b) de Minas Gerais, passando de 66,6 mil para123,8 mil toneladas (85,9%), com pequena redu-ção na participação de 17,1% para 15,0%;

c) de Santa Catarina, de 29,7 mil para 93,4 miltoneladas (214,5%), com participação nacionalsubindo de 7,7% para 11,3%; e

d) do Paraná, passando de 8 mil para 60,6 miltoneladas, com a participação nacional saltandode 2,1% para 7,4% no período (ver tabela 17).

Essas mudanças são respostas a distintas estra-tégias adotadas e, grosso modo, correspondem à repre-sentatividade de cada estado na produção nacio-nal de fios de algodão.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 59

A reflexão sobre o comportamento do parqueindustrial de fiações e o consumo de matéria-prima no Brasil revela aspectos importantes arespeito da estrutura desse segmento e seu desen-volvimento recente. O primeiro aspecto refere-seà concentração industrial com redução do núme-ro de empresas, num processo de reestruturaçãoda base técnica com a crescente participação dosfilatórios open end no total nacional. Assim, com omesmo espaço físico de construção, ainda queseja necessária a climatização do ambiente, au-menta-se a capacidade de produção. Além disso,essas transformações seguem rigidamente o per-fil de automação da agroindústria mundial, commenor uso de mão-de-obra e substituição dos re-cursos humanos genéricos, por meio de adestra-mento de pessoal desqualificado, por recursoshumanos especializados, dos quais se exige nãosomente o saber operacional do equipamento es-pecífico, mas também a capacidade de reflexãosobre o processo em sua totalidade.

O segundo aspecto diz respeito ao fato de queessa concentração no âmbito das empresas nãosignificou alteração na distribuição nacional donúmero de fusos ou rotores, com a continuidadeda preponderância do Sul-Sudeste e, neste, do es-tado de São Paulo. Desse modo, a modernizaçãodo parque têxtil não tem alterado o perfil da dis-tribuição regional das fiações, ou seja, a trans-formação opera-se fundamentalmente na moder-nização das empresas instaladas e, mesmo com osurgimento de novos pólos, proporcionalmentefirma-se a importância das regiões tradicionais.Ressalte-se que a existência do parque de máqui-nas não significa necessariamente que não tenhahavido alteração na participação da produção glo-bal de fios.

O terceiro aspecto relaciona-se ao tipo de maté-ria-prima, em que mantém-se, e até mesmo alarga-se, no período recente, a preponderância do algo-dão. Isso é consoante à tendência mundial de

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60 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

maior demanda de fibras naturais, a despeito dogrande desenvolvimento das fibras artificiais ousintéticas, notadamente nos anos 70. No períodosubseqüente, há uma retomada da participação doalgodão, invertendo-se a trajetória anterior. Res-salte-se que grande parte do volume de produçãode tecidos passou a compor-se de misturas de fi-bras artificiais ou sintéticas com algodão. Sãocomuns peças de vestuário que utilizam porcen-tagens de poliéster ou náilon, mas com preponde-rância do algodão.

O quarto aspecto está na evolução do consumode algodão pelas fiações de diferentes estadosbrasileiros, em que São Paulo perde importânciarelativa, ainda que com crescimento absoluto nasúltimas décadas. O principal destaque é atribuídoao crescimento do consumo de algodão pelas fia-ções cearenses na década de 90, como resultadoda adoção de políticas de investimentos calcadasnas práticas de guerra fiscal, que proliferaramnos anos recentes. Do ponto de vista alocativo, di-ante da inexistência de cotonicultura no Cearácapaz de atender a crescimento tão expressivo dademanda, esse deslocamento mostra-se incoeren-te com um projeto nacional global para o comple-xo têxtil como um todo. Isso porque pereniza-seuma estrutura importadora de matéria-prima, emrazão da grande distância entre o Sul-Sudeste, emesmo o Brasil Central, região produtora depluma, e esse centro consumidor de matéria-prima, encarecendo o transporte. Numa realidadede pluma importada com grandes vantagens,quanto às condições de pagamento em face doproduto nacional, a política cearense parece terconsistência, mas certamente enfrentaria pro-blemas com a redução das disparidades entre ascondições de financiamento da comercializaçãonos mercados interno e externo. Também preçosinternacionais mais elevados podem complicaressa realidade, pois os custos de transporte entreas zonas produtoras de pluma do Centro—Sul e oparque cearense de fiações ficariam mais eleva-

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 61

dos. Essa situação, contudo, pode ser alterada se oaumento da produção do Brasil Central vieracompanhado da construção dos corredores mul-timodais de transporte para o escoamento das sa-fras, permitindo que a pluma chegue ao Nordestebrasileiro a custos inferiores aos produtos es-trangeiros.

Destaque-se que o estado do Paraná, ainda omaior produtor brasileiro de pluma, aumentouconsistentemente sua participação no consumode algodão para fiações, como resultado de bem-sucedida estratégia de atrair agroindústrias nossegmentos em que existe grande produção agro-pecuária. Mas a pluma paranaense enfrenta atu-almente a concorrência desleal da pluma impor-tada, numa situação inversa à do Ceará. A soluçãoda disparidade nas condições de financiamentoda comercialização da pluma revigoraria a capa-cidade produtiva da cotonicultura paranaense,com reflexos nas fiações locais e nos estados limí-trofes do Centro-Sul.

Num quadro geral, a distribuição geográfica re-vela com nitidez os efeitos das políticas unilate-rais de atração de investimentos, notadamente asdo Ceará, que têm criado enormes distorções alo-cativas no complexo têxtil nacional.16 Essa políti-ca, numa realidade de elevado nível de pobreza efalta de emprego, ainda que promova o crescimen-to do produto interno estadual, não tem grande

16 O pacto de cooperação entre o governo cearense e os em-

presários locais para alavancagem dos investimentostem sido contestado quanto à sua eficácia, mesmo juntoao empresariado local. O empresário Edson Queiroz Fi-lho, vice-presidente do Grupo Edson Queiroz, com recei-ta anual de R$ 800 milhões em 1995, declara: "[...] essemodelo de investimento em infra-estrutura, seguido deincentivos fiscais para atrair empresas para o estado,está fatigando [...]. Os investimentos que estão sendo fei-tos em infra-estrutura e os programas de incentivos fis-cais são insuficientes para enfrentar o grande problemados estados nordestinos, que é a falta de uma política fe-deral de desenvolvimento [...]. Quando o prazo de isençãodos impostos passar, as empresas vão embora" [Oliveira(1996)].

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62 COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE

DO BRASIL

expressão no nível de empregos, diante da insta-lação de plantas com níveis cada vez mais eleva-dos de automação, ou seja, poupadoras de mão-de-obra e exigentes de pequeno número de trabalha-dores qualificados, o inverso da situação local.Assim, as vantagens se restringem tão-somente aefeitos derivados das práticas de guerra fiscal eda situação conjuntural de favorecimento dapluma estrangeira por mecanismos de financia-mento das transações. Tudo isso mostra-se insu-ficiente para garantir o sucesso dessa estratégiano médio e longo prazos.

O segmento brasileirode fiações vem passan-do por profundas trans-formações tecnológicas

nas últimas décadas. Trata-se da internalizaçãode novos paradigmas, centrados não somente naautomação, mas nos próprios fundamentos dabase técnica. Tradicionalmente, a fiação estavaassentada nos filatórios a anéis, baseados na esti-ragem da mecha conjugada com a torção, podendoproduzir fios de todos os títulos. Os filatórios open

end, ou a rotores, apresentam maior produtividade,eliminando etapas da fiação convencional. Es-tando, no princípio, restritos à aplicação de fiosmais grossos (títulos menores), têm conhecidogrande desenvolvimento e atingem fios de títuloscada vez maiores. Mais recentes são os filatóriosjet spinner, ainda de importância reduzida no Brasil,que procuram aliar elevada produtividade à pro-dução de fios mistos de títulos maiores. A essestrês sistemas sobrepõe-se uma crescente automa-tização de processos, o que gera rápida mudançanos padrões inerentes a cada um deles, ou seja,mesmo entre os denominados filatórios conven-cionais a anéis, há enormes diferenciações noprogresso técnico internalizado pelas empresas.

A fiação tradicional, calcada nos filatórios aanéis, apresenta seis fases de processamento, o

3.2 Modernização da EstruturaProdutiva e Exigências deQualidade da Matéria-Prima

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que demanda grande área de construção civil,maior volume de capital e mão-de-obra especiali-zada. Com isso, há maior aporte de recursos naconstrução das instalações, pois as máquinas e osequipamentos custam valores elevados, além de aautomação desse sistema exigir mão-de-obra qua-lificada, tornando necessárias inversões na for-mação de recursos humanos. Já a fiação open end ca-racteriza-se pela drástica redução das fases deprocessamento e pela excepcional elevação daprodutividade, sendo fábricas mais compactas,que demandam menores gastos na construção ci-vil, menor número de máquinas instaladas e depessoal ocupado. Essas diferenças produzem,como resultado, enormes vantagens de custos,com redução nos itens de depreciação do capitalpelo menor valor unitário e nos custos variáveis,em face da menor exigência de pessoal em relaçãoao sistema convencional.

Na fiação tradicional, as fases são: abertura,carda, primeira passadeira, segunda passadeira,maçaroqueira, filatório e conicaleira. Na fiaçãoopen end, têm-se abertura, carda, primeira passadeirae filatório, eliminando-se todo o processo inter-mediário de segunda passadeira, maçaroqueira econicaleira. Outro ponto é a diferença de veloci-dade de processamento, pois o filatório convenci-onal opera entre 10 e 20 mil rotações por minuto(r.p.m.), ao passo que os filatórios open end de últimageração não trabalham abaixo de 120 mil r.p.m.Tecnicamente, a mudança fundamental está nofato de que, no filatório a anel, executa-se a torçãodo feixe fibroso, e, no filatório a rotor, torce-seapenas a camada externa do fio.

Essa reestruturação do parque brasileiro de fi-ações ocorre em meio à crise do complexo têxtil,que, nos últimos dois anos, produziu o fechamen-to de cerca de 2 milhões de fusos. Os filatórios quedeixaram de produzir o fizeram por obsolescên-cia tecnológica, fato notado tanto na indústriaverticalizada quanto na não-verticalizada. Isso

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porque, mesmo no sistema convencional, têmocorrido avanços tecnológicos expressivos quenecessitam ser acompanhados para se manteremcompetitivos. Por exemplo, uma fábrica montadaem 1986, com menor automatismo, numa área deconstrução civil em torno de 10 mil metros qua-drados, permite produzir 8 toneladas de fio pordia, com 260 funcionários. Em outra fábrica,montada em 1990, com maior automatismo, paraos mesmos 10 mil metros quadrados de área cons-truída, a produção aumenta para 12 toneladas defio por dia, com 190 trabalhadores. Assim, há ex-pressivo aumento da produtividade de fatorescomo capital imobilizado em construção civil emão-de-obra. Entretanto, um condicionante im-portante quanto aos recursos humanos está namaior qualificação exigida para operar uma fá-brica mais moderna.

Observando-se a relação entre os custos de umafiação convencional e de uma open end de mesma ca-pacidade de produção, nota-se que esta apresentauma redução de 40% no investimento em capitalfixo e 50% na exigência de mão-de-obra, sendoque, em termos de matéria-prima, energia elétricae outros custos, os dispêndios são semelhantes.Estima-se, desse modo, uma redução de 11% nadepreciação do capital fixo, e de 13% na mão-de-obra por unidade de produto, o que gera ganhos daordem de 24% nos custos unitários totais para fi-os produzidos pelo sistema open end. Como os preçosde mercado para fios de mesma titulação e carac-terísticas são semelhantes, independentementedo tipo de filatório que os produziu, a lucrativida-de das empresas que realizaram a internalizaçãorevela-se muito mais expressiva.

A comparação entre o desempenho dos diversossistemas, centrada na universalização da produ-ção de fios mistos, permite aquilatar os impactosdo progresso técnico em curso. Na produção de fiomisto, com 50% de algodão e 50% de fibras sinté-ticas, tem-se que:

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a) a fiação convencional, operando a 14 milr.p.m., produziria em torno de 18 m de fio por mi-nuto, ou seja, 30 kg/hora de fio 20;

b) a fiação open end, a 90 mil r.p.m., produziria 117m por minuto, ou 48 kg/hora de fio 20; e

c) a fiação jet spinner, a 150 mil r.p.m., possibilitariaa obtenção de 270 m por minuto, ou seja, 110kg/hora de fio 20.

Assim, trata-se de uma mudança na base técni-ca, com profundos reflexos estruturais no com-plexo têxtil. No caso brasileiro, há um longo ca-minho a ser percorrido no aprofundamento dessareestruturação.

Como os filatórios jet spinner só permitem fabricarfios mistos, e ainda não têm expressão na fiaçãobrasileira, a questão que atualmente se colocapara os técnicos têxteis nacionais diz respeito aoslimites da ocupação de fatias de mercado pelos fi-os open end, a saber:

a) no fio de título 8, o domínio revela-se quaseabsoluto;

b) no fio 12, a proporção chega a 80% do volumeutilizado;

c) no fio 16, cerca de 60% do fio consumido; e

d) no fio 24, chega a 35% do total.

Existe a perspectiva de crescimento na faixa dofio 24, e fiações adaptando seus equipamentospara produção de fio 30. Nesse sentido, a viabili-zação de fios cada vez mais finos no sistema open end

vai pressionando o sistema tradicional para titu-lações superiores e fios especiais, em que sejammaiores as exigências de qualidade. A rapidezdesse processo de avanço da tecnologia de fiaçãoopen end e sua internalização no Brasil acabam pordefinir o horizonte de sobrevivência e o espaço aser mantido pelo processo de fiação a anéis, aindaque com elevadaautomação.

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DO BRASIL

No Brasil, como regra geral, as plantas de fia-ções convencionais estão defasadas se compara-das ao padrão de outras nações têxteis, apesar dese notar intenso processo de atualização. Comisso, a característica fundamental é uma enormeheterogeneidade. As plantas mais antigas, ex-pressas em idades médias, estão localizadas nosestados do Rio de Janeiro (16,12 anos), São Paulo(15,28 anos) e Minas Gerais (13,33 anos). Asmais recentes estão no Paraná (6,55 anos), Para-íba (7,73 anos) e Rio Grande do Sul (9,28 anos).Assim, têm-se desde médias acima do padrão deatualidade mundial de 10 anos até outras bemabaixo desse indicador (ver tabela 22). Ressalte-se que, em todas as unidades da Federação, nota-se intenso processo de reestruturação com sensí-veis reduções nas idades médias, que atingiramdiminuições de 10 anos (Rio de Janeiro), 7 anos(Minas Gerais) e 6 anos (São Paulo), o que indicaritmo intenso de modernização, ao mesmo tempoem que, nas unidades em que as plantas são maismodernas, essa atualização também se faz pre-sente.

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BRASIL 67

TABELA 22Idade Média em Anos dos Filatórios a Anel, Se-

gundo Estados Produtores 1988—1994

Ano SãoPaulo

SantaCata-rina

Mi-nasGe-rais

Pernambuco

Riode Ja-neiro

RioGran-de doNorte

RioGran-de do

Sul

Ser-gipe

Cea-rá

Pa-raí-ba

Pa-raná

1988

21,00

15,00

20,00

19,00 26,00

12,00 11,00 11,00

17,00

9,00

9,00

1989

19,43

13,25

17,84

15,12 22,82

11,34 10,67 10,60

14,89

8,39

7,80

1990

18,33

13,06

16,42

12,83 20,71

12,77 10,42

12,53

13,81

8,28

7,23

1991 17,56

12,90

15,29

14,39 19,54

12,05 10,07

10,96

12,97

7,88

6,99

1992

16,38

12,50

14,58

14,09 18,62

11,69 9,86 10,54

12,48

7,84

6,78

1993

15,93

11,82

13,75

13,96 17,34

11,51 9,52 10,36

12,09

7,81

6,66

1994

15,28

10,97

13,33

13,83 16,12

11,27 9,28 10,11

11,88

7,73

6,55

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

Nos filatórios a rotores, essa mesma perspecti-va modernizadora se faz notar com muita clareza.Nesse sistema de introdução mais recente, a idademédia das plantas brasileiras é inferior a 10 anose mantém-se também em decréscimo. As fiaçõesmais antigas localizam-se em Pernambuco, que,contudo, da média de 14 anos, em 1988, moderni-za-se rapidamente e chega a 7,43 anos em 1994.Depois desse estado nordestino, tradicional cen-tro têxtil, os filatórios de idades mais avançadasestão em Sergipe (6,81 anos) e São Paulo (6,09anos), enquanto as menores médias correspon-dem a Minas Gerais (3,15 anos), Ceará (3,84anos) e Paraná (3,96 anos) — ver tabela 23. As fi-ações open end não apenas são relativamente novaspara padrões mundiais, como estão em francoprocesso de renovação, como mostram as idadesmédias cadentes em todas as unidades da Federa-ção.

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DO BRASIL

TABELA 23Idade Média em Anos dos Filatórios Open End, Se-

gundo Estados Produtores 1988—1994Ano São

PauloSantaCata-rina

MinasGerais

Per-nambu-

co

Para-ná

Sergi-pe

Rio deJanei-

ro

RioGran-de do

Norte

Ceará

1988 8,00 6,00 4,00 14,00 5,00 8,00 6,00 6,00 10,00

1989 7,43 5,54 3,65 11,21 4,57 7,87 5,79 5,89 8,20

1990 7,03 5,24 3,61 9,62 4,50 7,89 5,81 5,92 7,82

1991 6,74 5,10 3,55 9,06 4,32 7,65 5,59 5,94 6,80

1992 6,46 4,98 3,47 8,57 4,17 7,55 5,41 5,84 6,13

1993 6,26 4,82 3,27 7,80 4,04 7,20 5,02 5,33 4,42

1994 6,09 4,68 3,15 7,43 3,96 6,81 4,71 4,91 3,84

Fonte: Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).

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BRASIL 69

Essa transformação das fiações enquadra-se naperspectiva de modernização da indústria têxtilcomo um todo, na qual constitui um dos segmen-tos que exige maior aporte de recursos concen-trados pela indivisibilidade dos equipamentos degrande escala. No período 1990—95, os investi-mentos totais na indústria têxtil saltaram de US$738 milhões para US$ 1,96 bilhão anual(165,9%). Destes, os recursos fixos, principal-mente em construção civil, aumentaram de US$101 milhões para US$ 643 milhões (536,6%), e osem máquinas e equipamentos cresceram de US$637 milhões para US$ 1,3 bilhão (107,1%). Quantoaos equipamentos, os dispêndios das aquisiçõesde fabricação nacional elevaram-se de US$ 126milhões para US$ 319 milhões (153,2%), e os im-portados, de US$ 510 milhões para US$ 1 bilhão(95,9%) — ver tabela 24.

TABELA 24Estimativa dos Investimentos Realizados na In-

dústriaTêxtil Brasileira — 1990—1995

(Em US$ 1 000)Ano Investimen-

tosMáquinas e Equipa-

mentosTotal

Fixos Nacionais Importa-dos

1990 101 003 126 530 510437

737 970

1991 120 030 107 120 463606

690 766

1992 150 773 79 410 339250

569 433

1993 225 670 130 927 456708

813 305

1994 319 943 172 947 827200

1 320 090

1995 643 173 319 313 999925

1 962 411

Fonte: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES).

Essa preponderância na compra de máquinas eequipamentos importados decorre do fato de que aindústria interna de bens de capital, apesar deproduzir equipamentos para cardas e filatórios aanéis de boa qualidade, não produz a fiadei-ra/bobinadeira para o sistema open end. Essa situa-ção resulta diretamente da preferência pela subs-tituição dos filatórios a anéis pelos filatórios a ro-

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DO BRASIL

tores, principalmente nas novas unidades fabris.Outro indicador dessa realidade está no númerode fusos produzidos, que apresenta notório de-créscimo nos anos 90, pois de 162 mil fusos, em1990, a produção brasileira reduz-se para poucomais de 26 mil, em 1994 (ver tabela 25). Dessamaneira, ficam problematizadas as perspectivasfuturas dessa indústria, a menos que internali-zem a base técnica da produção dos novos siste-mas de fiação. Isso porque, ainda que continuehavendo espaço para o filatório convencional, omercado para essas máquinas será mais restrito.

TABELA 25Produção Brasileira de Filatórios a Anel —

1990—1994Ano Número de Fusos Índice

1990 162 000 1001991 110 000 681992 65 000 401993 101 000 621994 26 224 16

Fonte: ABIMAQ/SINDIMAQ.

Ainda na análise da importação de maquinariapara a indústria têxtil, as aquisições externascresceram de US$ 269,7 milhões para US$ 737,9milhões no período 1989—1995 (173,6%). Todosos segmentos aumentaram seus dispêndios:

a) na malharia — de US$ 43 milhões para US$152,8 milhões (255 %);

b) na fiação — de US$ 58 milhões para US$ 109milhões em 1995 (87,9 %); e

c) na tecelagem — de US$ 43,9 milhões paraUS$ 99,6 milhões (126,9 %) —, mostrando maiorcrescimento nas fases de processamento posteri-ores ao fio (ver tabela 26).

TABELA 26Importação de Maquinaria para a Indústria Têx-

til, no Brasil — 1989—1995

(Em US$ 1 000)

Ano Fiação Malharia Tecela-gem

Outros Total

1989 58251

43060

43920

124500

269 731

1990 80 69 111 55 172 377 040

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BRASIL 71

606 313 0101991 55

74861

25030

519194938

342 455

1992 34080

34230

33 911 148370

250 591

1993 43140

56005

30729

207479

337 353

1994 80396

99520

79785

351320

611 021

1995 109221

152847

99623

376192

737 883

Fonte: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES).

Essas diferenças nos montantes despendidoscom importações de maquinaria revela um des-compasso no ritmo de modernização entre ossegmentos, ou seja, para acompanhar o ritmo dastransformações globais da indústria têxtil, asmudanças na fiação devem ser ainda mais acele-radas, o que exige montantes substanciais de re-cursos.

Essa transformação acelerada na base técnicada indústria têxtil permite elevar drasticamente aprodutividade e, ao mesmo tempo, avançar naqualidade do produto final. Tais característicasimpactam diretamente as fiações, obrigando-as aoferecer fios de qualidade superior, o que, associ-ando-se a requisitos adicionais impostos pelosmodernos filatórios para obter rendimento ope-racional compatível com suas potencialidades,acaba por rebater na pluma utilizada. Nessa pers-pectiva, o complexo têxtil, centrado no princípioda qualidade, irá inexoravelmente refletir-se nãoapenas nas algodoeiras e nas propriedades coto-nicultoras, mas em todo o complexo produtor deinsumos, em especial na semente selecionada.Tudo isso exige formas de coordenação verticalcompatíveis com a prevalência e transmissãodesse princípio da qualidade em todo o complexotêxtil.

A fiação tem sua produtividade e qualidade de-terminadas pela matéria-prima, sendo que a ima-turidade da fibra representa uma das principaislimitações e pode derivar de:

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DO BRASIL

a) problema genético, pois as variedades muitoprecoces apresentam maior probabilidade de des-envolverem fibras imaturas; ou

b) problema de cultivo, pois a não-aplicação detratos culturais recomendados, ou a ocorrênciade queda de folhas, causada por condições natu-rais, como ataque de lagartas, ou químicas, comodesfolhantes, influenciam de forma significativaa maturidade da fibra.

Se o desfolhamento ocorrer antes que 70% doscapulhos estejam abertos, fatalmente a imaturi-dade será elevada. Assim, o surgimento de neps porimaturidade da fibra, verificados principalmenteno tingimento, deriva das condições de produçãodo algodão em caroço, na propriedade rural, sen-do assim impraticáveis mudanças que não preco-nizem maior interação entre a indústria têxtil eas operações geradoras de sua matéria-primafundamental.

O comprimento da fibra representa outra de-corrência direta das características do materialgenético e acaba por definir o título do fio a serproduzido. Atualmente, cerca de 10% da produçãode fio tem como destino a fabricação de tecidos fi-nos e linha, constituindo a parcela do mercadobrasileiro demandante de fibra longa; os demais90% da produção de fios é de fibra média. Os fiosbrasileiros apresentam as seguintes característi-cas quanto à espessura:

a) títulos 8 a 16, fios grossos destinados basi-camente a jeans e moletons;

b) títulos 20 a 26, fios médios para tecelagemem geral e malharia mais fina;

c) títulos superiores a 35, fio fino para tecela-gem fina; e

d) títulos superiores a 45, fio finíssimo, paraalta sofisticação de produtosfinais.

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As importações brasileiras de pluma concen-tram-se nas fibras médias, ou seja, naquelas quetêm as mesmas características do algodão nacio-nal, não sendo a variedade, na essência, a limita-ção fundamental. A fibra longa utilizada no Bra-sil, para fios finos ou misturas, para obter fiosmais resistentes, era proveniente do algodão ar-bóreo nordestino (mocó), duramente atingidopela crise da cotonicultura. Dada a necessidade deimportar fibras longas, e o comprimento da fibraconstituir um atributo da variedade, faz-se neces-sário buscar a geração de material nacional paraesse nicho de mercado.

As operações de beneficiamento nas algodoei-ras, ao produzirem algodão em pluma com eleva-do percentual de fibras curtas ou quebradiças, ge-ram grande quantidade de micropó no processode fiação e podem comprometer o rendimento in-dustrial e a qualidade do fio. Com máquinas open end

trabalhando a 150 mil r.p.m, diante de uma enor-me força centrífuga, as partículas de 40 mm ade-rem ao rotor fazendo-o perder a forma, gerandofios de espessura desuniforme. Esse problemapode surgir pela exposição da fibra a processosrápidos de secagem aliados à realização de limpe-za drástica (às vezes mais de uma), razão pelaqual algumas fiações têm rejeitado o algodãoconstelado. Na verdade, apesar de o problema defibras curtas ou quebradiças decorrer do proces-so de beneficiamento, sua origem remonta, namaioria das vezes, ao sistema de colheita realiza-do, que deprecia a qualidade do algodão em caroço.Em outras palavras, a solução para essa deficiên-cia notada na fiação está na produção rural.

Quanto aos problemas do uso de plumas de vá-rias procedências,17 detectados por técnicos têxteis 17 A dicussão da qualidade do algodão em pluma nacional,

se analisada isoladamente, pode levar a conclusões pre-cipitadas e muitas vezes sem aderência à realidade. Aanálise, a seguir, calcada em informações obtidas napesquisa de opinião realizada por Ferreira (1995), comtécnicos têxteis de diferentes empresas brasileiras, so-

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DO BRASIL

de distintas empresas, no Paraná a coloração foi aprincipal limitação encontrada, seguida do tipo,da contaminação, da resistência e do comprimen-to da fibra. Destaque-se que todos os entrevista-dos apontaram a coloração e o tipo como um pro-blema, sendo que 69% deles os identificaram en-tre os três problemas principais, e 31% apontarama coloração como o principal problema, seguido dotipo com 23% (ver tabela 23). Discorrendo sobreas causas mais relevantes, deve-se ressaltar que acoloração é decorrente do tipo de solo das regiõesalgodoeiras desse estado, que acaba definindouma tonalidade mais creme que branca à pluma,podendo atingir tons mais avermelhados e acin-zentados se sujeita a umidade excessiva.

Os demais problemas destacados, como tipo econtaminação, decorrem diretamente do sistemade colheita, que apresenta significativo percentu-al de impureza, situação ainda piorada pela pre-sença de umidade elevada. A resistência e o com-primento da fibra podem estar associados a essacausa básica, pois a tentativa de realizar limpezadrástica no algodão sujo e úmido pode quebrar afibra e diminuir sua resistência. Pela mesma ra-zão, a maturidade da fibra aparece com realce,pois o rapa, ao misturar capulhos de diferentes ida-des, pode introduzir maior percentual de fibrasimaturas, mesmo com uso de desfolhantes. Dequalquer maneira, trata-se da não-transmissãodas exigências das fiações para os segmentos an-teriores do complexo têxtil, uma vez que a colhei-ta adequada minoraria os problemas. A coloraçãopendendo mais para o creme que para o brancogera dificuldades na tinturaria e no acabamento,enquanto que a contaminação e a imaturidadeproduzem elevado número de neps.

No estado de São Paulo, o quadro mostra-se se-melhante. O tipo e a coloração são destacados

bre os problemas enfrentados com plumas de diversasprocedências, esclarece muitos aspectos e desfaz algunsmitos.

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

BRASIL 75

como problemas por todos os entrevistados, se-guido da resistência (91%), uniformidade (81%),contaminação e proporção de fibras curtas (73%)e comprimento da fibra e maturidade (64%). En-tre os três principais problemas, têm-se o tipo, aresistência e o comprimento da fibra (45%), se-guidos da contaminação e da proporção de fibrascurtas (36%). Como principal problema surgem otipo, a resistência e a contaminação com igualnúmero de citações (27%) — ver tabela 27. Essasrespostas mais uma vez reforçam a constataçãodos problemas quanto à qualidade da pluma, cau-sados pelo sistema de colheita, uma vez que se re-pete a linha de causalidade.

Seguindo a avaliação da pluma de outros esta-dos cotonicultores brasileiros, em Minas Gerais,a coloração, o tipo, o comprimento da fibra, a pro-porção de fibras curtas, a resistência e a unifor-midade aparecem como problemas. O destaquepara o comprimento da fibra, como principal, se-guido da resistência, pode estar indicando umarealidade deficiente de condução técnica da coto-nicultura, em especial no tocante à adubação. EmMato Grosso, a coloração e o enrolamento nos ci-lindros são unanimidade como problemas cita-dos, sendo que mais uma vez a coloração aparececomo principal problema junto com o comprimen-to da fibra e o tipo. A menção ao enrolamento noscilindros, presenciado apenas para pluma proce-dente do Centro-Oeste, pode estar indicando umadecorrência do uso de variedades não adaptadas,pois sabe-se do plantio de variedades estrangei-ras, sem teste prévio, nesse estado.

No caso da pluma de Goiás, outro estado do Bra-sil Central, entre os problemas, aparecem o com-primento da fibra, a resistência, o tipo e a unifor-midade como os mais citados (91%), seguidos dacoloração e maturidade (82%). Como principalproblema, o destaque mais uma vez para o enro-lamento nos cilindros (27%), o que vem reforçar oargumento do uso inadequado de variedades es-

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trangeiras. Outro aspecto a destacar é o alto índiceglobal obtido pela uniformidade, só superado pelode fibras curtas, o que revela que as condições su-periores de clima e solos do Brasil Central não sãotão fundamentais na determinação da suprema-cia perante a cotonicultura do Sul-Sudeste. Cer-tamente, trata-se de vantagens competitivas deri-vadas da nova cotonicultura mecanizada comgrandes áreas de lavouras, em comparação à an-tiga cotonicultura, realizada com mão-de-obra in-tensiva e em pequenas áreas oriundas do colona-to. As diferenças são definidas mais pela constru-ção estrutural, decorrente de distintos processoshistóricos de ocupação e transformação, que pelapropalada superioridade natural.

As opiniões sobre as diferentes plumas estran-geiras são as mais surpreendentes, pois derru-bam mitos importantes. Avaliando a matéria-prima oriunda dos países limítrofes e parceiroscomerciais intra-MERCOSUL, observa-se que:

a) no algodão paraguaio, o comprimento da fibra(86%), a coloração e a proporção de fibras curtas(71%) são os problemas destacados, sendo o com-primento da fibra (43%) e a contaminação (29%)os principais; assim, o argumento da diferencia-ção do algodão paraguaio, pelo fato de que a colhei-ta manual naquele país seria superior, não pareceter sustentação na realidade;

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b) no algodão argentino, a coloração (71%), aproporção de fibras curtas (57%), o tipo e conta-minação (43%) e o comprimento da fibra (43%)são os problemas mais citados, com a coloraçãoconstituindo o problema principal (57%).

Mais uma vez a contaminação parece colocarem questão o sistema de colheita, isso numa reali-dade como a cotonicultura portenha, em que pre-domina a colheita mecânica. Assim, mitos da su-perioridade desses algodões apenas com base emimpressões genéricas sobre coloração e contami-nação não encontram respaldo na realidade.

Quanto a algodões de outros continentes, nota-seque:

a) a pluma africana destaca o enrolamento doscilindros (91%) e a coloração (82%) não apenascomo os problemas mais citados, mas tambémcomo os principais; o enrolamento nos cilindrosparece estar mais uma vez associado ao problemada variedade;

b) no caso norte-americano, surgem a resistên-cia, a proporção de fibras curtas e a uniformidade(71%), seguidas da coloração e do comprimento dafibra (57%), como as deficiências mais represen-tativas, sendo a coloração e o comprimento da fi-bra os principais problemas (29%); trata-se dequestões de intensidades distintas, porém visua-lizáveis na mais moderna e mais importante co-tonicultura mundial, e também presentes no Bra-sil; e

c) na pluma russa, os casos mais enumeradosforam o aparecimento de neps nas cardas (100%),seguido da coloração e enrolamento nos cilindros(78%), sendo o enrolamento nos cilindros (44%) eos neps nas cardas (33%) os problemas principais —a variedade é mais uma vez fator explicativo.

Numa síntese dos problemas detectados nas fia-ções brasileiras, no tocante à qualidade da maté-ria-prima, chega-se à conclusão de que o sistema

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de colheita constitui realmente um fator limitantepara a pluma brasileira. Entretanto, a colheitamecânica não representa o esgotamento da ques-tão, tampouco uma solução definitiva, pois, aindaque menos expressivos, problemas como conta-minação, proporção de fibras curtas e uniformi-dade aparecem em países que utilizam a colheitamecânica. Mais uma vez, elementos de cunhoeconômico e estrutural, relacionados à escassezde mão-de-obra e ao alto custo da empreita no picode safra, mostram mais sustentação na realidadeque o simples enumerar dos efeitos do rapa na qua-lidade. Em outras palavras, equivalendo-se emqualidade o algodão colhido no rapa e o colhido me-canicamente, as vantagens de custos fazem a me-canização vantajosa. Em contrapartida, a limpezado algodão traz prejuízo à fibra independente-mente do sistema de colheita, daí a perda de uni-formidade nas situações em que essa operação serealiza com muita freqüência.

Outro aspecto está na coloração, que seria umalimitação intransponível do algodão paranaense,pois decorre do tipo de solo onde a cultura preva-lece. Essa afirmação precisa ser mais qualificadapois, em todas as plumas analisadas, esse proble-ma aparece com destaque, o que faz supor que,ainda que o solo paranaense e do nordeste paulis-ta, em especial as áreas de latossolo roxo, possamestar influindo decisivamente na coloração maiscreme da pluma aí produzida, tal limitação apare-ce mesmo em situações de solos arenosos. Essaconstatação no mínimo exige a relativização des-se tipo de crítica, o mesmo acontecendo no tocanteao material genético. As experiências de introdu-ção de material não testado trazem preocupaçõesrelevantes, notadas tanto no algodão africano erusso como no do Brasil Central, onde o enrola-mento nos cilindros aparece como problema des-tacado. No geral, a discussão em torno da qualida-de da pluma necessita um aprofundamento maissério das relações causais, e não o simples enu-merar de argumentações que, sendo mais dogmas

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e mitos, nem sempre são verificáveis na realida-de.

Ainda no tocante à matéria-prima, uma limita-ção enfrentada pela fiação revela-se no fato de quea maioria dos países não tem sistemas de verifi-cação de qualidade, não havendo sequer numera-ção ou identificação dos fardos. Os técnicos enu-meram casos em que a classificação combinadano ato do negócio não corresponde à do produtodesembarcado no Brasil. Ocorreram graves pro-blemas, especialmente com algodões asiáticos.Entretanto, mesmo no Brasil, onde prevalecemcritérios visuais, essa questão não está plenamen-te equacionada, trazendo dificuldades de compra.Na verdade, no contexto mundial, o sistema dosEUA, com base em rígida regulamentação estatal eestrutura de fiscalização eficiente, é o único dequalidade assegurada no mercado internacional.A implantação no Brasil do sistema de qualidadeintrínseca, aferido em análises laboratoriais noHigh Volume Instruments (HVI), já realizado pela maioria dasfiações para determinação das misturas para otipo de fio desejado, parece ser o caminho maisadequado, desde que acompanhado pelo prêmio àqualidade nos negócios do caroço, ou seja, queesse critério seja transmitido até a base produtorada principal matéria-prima do complexo têxtil.

Centrando a discussão na qualidade do produtofinal das fiações, técnicos das malharias e tecela-gens argumentam que, nesse aspecto, o fio nacio-nal tem perdido excelência. A maioria afirma queisso deriva eventualmente da qualidade da maté-ria-prima nacional, o que mais uma vez não pare-ce ter sustentação, pois a metade da pluma fiadaprovém do exterior. Parcela relevante afirmaque, quando o mercado está muito bom, realiza-semaior aceleração na máquina, e a qualidade se re-duz, pois a fibra de algodão exige operação normalpara obtenção de fios de qualidade superior, ouseja, a fibra é que determina o ritmo da operação, enão o contrário, se o quesito determinante for a

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excelência. Assim, as empresas de tecelagem oude malharia mais exigentes montam redes defornecedores de fios com base na credibilidade.

Outro aspecto está na prevalência do sistema open

end em relação ao convencional, o que interfere naqualidade média do fio. O fio open end, para adquirirmaior resistência e ser utilizado em teares a jatode ar, é engomado. Comparando-se a qualidade dofio, a resistência obtida no sistema convencional ébem superior, mas, quando colocado no tear, o fioopen end supera-o pela uniformidade, gerando umandamento superior ao convencional. O númerode pontos finos, derivado da menor uniformida-de, produz maior número de rupturas. No fio con-vencional, observam-se cerca de 300 pontos finospor mil metros, enquanto no fio open end, nenhum.

Entre os equipamentos mais modernos, o open end,sendo sistema a rotor, permite baixa estiragemem alta velocidade. O jet spinner, como um sistema a ja-to de ar, permite alta estiragem e supervelocidade,gerando fio com qualidade superior, sendo contu-do um processamento para fio misto, 50% algodãoe 50% fibra sintética. No open end — pela alta veloci-dade do rotor (até 90 mil r.p.m) —, as fibras de po-liéster se fundem e criam pontinhos na roupa decama denominados biller, enquanto no jet spinner issonão ocorre. Este exige fibra de qualidade diferen-ciada, em especial no tocante à uniformidade, masse mostra superior no segmento de fios mistos.

A análise das transformações em curso no par-que brasileiro de filatórios mostra clara tendên-cia de crescimento das fiações open end, com reduçãodo espaço das fiações convencionais. Essa mu-dança deriva de vantagens relacionadas ao menorcusto de implantação, tanto das instalações quan-to dos equipamentos, e maior rendimento opera-cional, com diminuição do uso de mão-de-obra.Nesse sentido, as vantagens de custos das fiaçõesopen end são expressivas em relação ao filatório con-vencional, sendo que para fios mistos surgem osfilatórios jet spinner, com melhoria na qualidade e

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maior produtividade. O panorama de ocupaçãocrescente de fatias de mercado pelos fios produzi-dos no sistema open end confina as empresas de fila-tórios convencionais a nichos de fios especiais ede alta titulação. O desenvolvimento dos equipa-mentos open end vem estreitando cada vez mais a fai-xa de atuação dos convencionais.

Entretanto, num complexo têxtil marcado pelaextrema heterogeneidade, não há como definirconcretamente os limites dessas mudanças emcurso, mesmo porque, também nos filatórios con-vencionais, ocorre intensa modernização com au-tomatização de processos. Esta, aliás, constituioutra característica marcante da restruturaçãodo parque de fiações, pois permitiu produzir fá-bricas com operações internas totalmente meca-nizadas, existentes na Itália e em outros paíseseuropeus, mas não no Brasil, ou seja, em que amão-de-obra, em número reduzido, realiza apenasas funções de controle. Assim, com a sensível di-minuição de mão-de-obra e elevada exigência dequalificação, não apenas se eliminam funções dooperário têxtil convencional, como se contrataoutro perfil de trabalhadores para o setor.

No tocante à qualidade da matéria-prima, doisaspectos gerais devem ser destacados. O primeirorevela-se no fato de que o desenvolvimento tecno-lógico das fiações ocorre numa realidade de piorada qualidade do algodão brasileiro, derivada dosistema de colheita. Mais uma vez, o perfil de mão-de-obra intensiva cede lugar à mecanização. O se-gundo aspecto decorre de que o desenvolvimentodo sistema open end, e a conseqüente obtenção de ren-dimentos operacionais mais elevados, trazempressões pela melhoria da qualidade da pluma.Em outras palavras, os segmentos parecem ca-minhar em vias opostas, o que deve ser resolvidode maneira consistente para garantir a harmonianecessária à competitividade global do complexotêxtil, e que exige enorme esforço de orquestraçãode interesses.

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A fabricação de fios open end de maiores titulaçõestorna imprescindível pluma de melhor qualidade,tornando o sistema de colheita o ponto de estran-gulamento mais visível de todo o complexo. Dessemodo, a perspectiva que se vislumbra indica a ne-cessidade, no caso de se pensar numa estratégiaglobal para o complexo têxtil brasileiro, de procu-rar romper com visões estreitas de cunho emi-nentemente localizado em dado segmento. Issoexige entender que a transformação da pluma emfio não altera características intrínsecas da fibra,mantendo-se a regra de que o fio de qualidade de-riva de pluma de qualidade, sendo plantado naroça e não resultante dos robôs das unidades fa-bris.

A reestruturaçãodo complexo têxtilbrasileiro, no quediz respeito ao

segmento de fiação, revela distintas empresas se-guindo estratégias variadas. A grande maioriadas fiações integra grupos empresariais que atu-am também na tecelagem, tinturaria e acabamen-to, ou seja, é parte integrante de estruturas indus-triais verticalizadas. As fiações isoladas, predo-minantes no caso paranaense, ocupam parcelareduzida do mercado (em torno de 10%). Entre-tanto, a necessidade de ajustar-se ao processo detransformação não resultou na adoção de cami-nhos semelhantes, conduzindo a apostas específi-cas, decorrentes de expectativas diversas sobre ofuturo. O que leva as empresas a configuraremprojetos particulares de inserção competitiva.

A heterogeneidade encontrada no segmento defiações conduz ao fato de que as empresas partemde situações diferenciadas, ou seja, os impactosdas mudanças não são similares em todas elas.Nesse sentido, o ajustamento segue procedimen-tos que atendem a essa diversidade, encontrandorespaldo inclusive na própria estrutura de mer-cado de fios. A fragmentação da utilização do fio

3.3 Especialização ou Integração: Diferentes Destinosdo Fio Produzido e DistintasEstratégias Empresariais

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constitui outro elemento condicionador, abrindoespaço para uma enorme gama de tecidos especia-lizados, com diferentes requerimentos de quali-dade. A estrutura social brasileira, marcada pelaenorme desigualdade de poder de compra, comoresultante da distribuição desigual de renda, aca-ba por chancelar a profunda diferenciação deprodutos.18

Outro elemento decisivo na definição da estra-tégia empresarial está no aporte de capital neces-sário ao investimento em fiação, exigindo escalassignificativas, derivadas da própria base técnica.Em outras palavras, a decisão de modernizar o fi-latório envolve somas elevadas de capital, o mes-mo ocorrendo com as estratégias de aumento daparticipação de mercado. Uma unidade fabril deporte razoável exige obras de construção civil(prédios e logística) que consomem recursos daordem de R$ 5 milhões, a que devem ser adicio-nados cerca de R$ 6 milhões para obras de clima-tização, de modo a adequar o ambiente para rece-ber máquinas e equipamentos sofisticados e maissensíveis. Um filatório open end, para 400 tonela-das/mês, todo robotizado, atingiria os R$ 15 mi-lhões em investimentos com equipamentos, en-quanto no padrão atual, com 70% de automatiza-ção, exigiria algo em torno de R$ 8 milhões. Ummoderno filatório convencional, com a automa-ção disponível, não ficaria por menos de R$ 16milhões.

18 No Brasil, há que se tomar cuidado na interpretação da

diferenciação da demanda, que não resulta necessaria-mente de processo de incremento da sofisticação de pro-dutos, após estarem atendidas as necessidades básicasda população, sendo ao contrário, incremento na popularizaçãode produtos, des-sofisticando-os para atender à grande massa derenda mais baixa que adentra o mercado consumidor. Asestratégias de inúmeras empresas, adotadas após a esta-bilização de 1994, revelam com clareza esse aspecto,pois mesmo produtos importados têm essa característi-ca. Esse acontecimento revela-se promissor, mas nãopode ser interpretado como a criação de produto diferen-ciado no sentido clássico, mas na standartização de cer-tos bens, antes inacessíveis à massa, para ocupar essa fa-tia de mercado.

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O aporte elevado de capital exigido não pode sermobilizado por todo o universo de empresas, con-figurando diferenciadas estratégias adaptativas.Assim, a fiação corresponde a um dos dois blocosda indústria têxtil de base técnica calcada na esca-la e que consome elevados investimentos. O outrosegmento estaria representado por tinturaria eacabamento, cujos montantes são similares aosobservados nos filatórios. Para base de compara-ção, cite-se que um tear atualizado fica em tornode R$ 60 mil, e uma máquina open end em cerca de R$600 mil, ou seja, dez vezes mais. Assim, cadaunidade de aumento na tecelagem consome muitomenos recursos que a unidade adicional da fia-ção, ao que devem ser somados proporcionalmen-te todos os gastos de infra-estrutura. As empresasde fiação moldam-se então a essa realidade ditadapelo mercado e por sua própria estrutura econô-mica.

Na modernização dos filatórios, a questão quese coloca é a manutenção da estrutura convencio-nal, aprimorando seus processos e automatizan-do a fábrica com a aquisição de novos equipamen-tos. Muitas empresas, em especial aquelas queoperam na produção de fios de qualidade, apos-tam na prevalência de um importante mercadopara fios convencionais. Nessa estratégia, ado-tam a perspectiva de aprimorar processos paracompetir com produtos diferenciados, ou seja, dequalidade superior, para atender a clientes tam-bém específicos no Brasil e no exterior. Nada in-dica que essa estratégia esteja fadada ao insuces-so, mas de forma alguma poderia ser um proce-dimento generalizado em todos os filatórios con-vencionais. A montagem de sistemas open end, paraatender ao mercado de massas, algumas vezesoperando com produtos de diferentes caracterís-ticas, surge como estratégia complementar em al-gumas empresas. Esse início pode servir de basepara a reestruturação da empresa, alterando abase técnica com a substituição do filatório con-vencional.

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Outro grupo de fiações, o mais relevante da es-trutura brasileira, corresponde a filatórios inte-grados no corpo da indústria têxtil, em que o fioproduzido destina-se a linhas de tecelagem, tintu-raria e acabamento da própria empresa, que con-formam as etapas sucessivas de produção de umdeterminado produto final, na maioria das vezesadentrando o segmento de confecções. Nesse gru-po de fiações, encontram-se três estratégias dis-tintas de ajustamento ao processo de transforma-ção:

a) a estratégia passiva de operação dos atuais fi-latórios convencionais, prolongando a vida útildos equipamentos com pequenos aprimoramen-tos;

b) a concentração dos investimentos apenas nosegmento de fiação, modernizando-o com a intro-dução de automatismos e do sistema open end, quepassaria, primordialmente, a operar como fiação,ou seja, seguindo a estratégia de especialização; e

c) a modernização de toda a indústria têxtil, dafiação ao acabamento, mantendo a perspectiva deprocesso integrado.

As distintas estratégias correspondem a expec-tativas diferenciadas, que consubstanciam vari-adas metas de inserção competitiva.

A estratégia passiva de operação dos atuais fila-tórios convencionais centra-se num processo deajuste da empresa para a sobrevivência diante dacrise, impactada diretamente com a abertura domercado nacional. Essas empresas descapitali-zadas, não podendo mobilizar o montante de re-cursos necessário para o salto modernizador,adotam a capacidade instalada, deslocando, al-gumas delas, seus investimentos para a tecela-gem, em que o montante de recursos mostra-se in-ferior e a modernização pode ser feita por etapas,ou seja, com a substituição progressiva dos tea-res. A manutenção dessa estratégia tem suportena intensificação do uso dos equipamentos de fia-ção que, operando com fios próprios, possibilitam

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descontar as possíveis perdas de eficiência nessafase e nas seguintes. Outra medida complementarestá na atuação em nichos de mercado em que nãoenfrentem a concorrência direta das modernas egrandes indústrias têxteis integradas. De qual-quer maneira, trata-se de estratégia que não pre-coniza a liderança de mercado.

Outra estratégia levada a efeito pelas empresascorresponde à especialização no segmento de fia-ção, concentrando-se todos os recursos na mo-dernização produtiva, seja automatizando filató-rios convencionais, seja, principalmente, com asubstituição dos convencionais pelo sistema open

end. A aposta fundamental está numa leitura parti-cular do processo de transformação, pois houveenormes investimentos em tecelagem, tintura eacabamento da indústria têxtil mundial e brasi-leira, e conseqüentemente aumento significativoda demanda do fio produzido pelas fiações inde-pendentes. Em contrapartida, as malharias e tece-lagens podem ter sua estrutura flexibilizada peladivisibilidade dos investimentos, abrindo pers-pectiva para multiplicação de empresas, em facedas reduzidas barreiras à entrada, notadamentequanto ao montante de investimento necessário.Essas fiações reduzem investimentos em teares,tinturaria e acabamento e deslocam recursos paramodernizar as fiações.

Essa estratégia, de produzir fios com alta pro-dutividade e qualidade, garantindo a credibilida-de como produto diferenciado junto a malharias epequenas e médias tecelagens, depende de que ou-tras empresas se especializem no outro bloco deinvestimento pesado da indústria têxtil — a tintu-raria e o acabamento. Especialmente nas grandesmalharias, encontram-se empresas que seguemessa estratégia complementar, qual seja, de com-prar o fio e realizar as etapas restantes do com-plexo têxtil, o que permite continuar no processode diferenciação de produtos, pois, tendo oferta defio no título desejado, adquirido de empresa comcredibilidade, pode-se realizar a contento estraté-

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gias competitivas diferenciadoras de produto.Nesse sentido, mesmo atuando numa etapa de re-duzida agregação de valor, como se caracteriza aprodução de fio, a especialização na fiação podeser uma estratégia bem-sucedida como opção par-ticular de algumas empresas de inserção subor-dinada, mas nada indica que seria uma estratégiagenérica do segmento de fiação.

Como terceira estratégia de ajustamento ao pro-cesso de transformação está a manutenção daprodução têxtil integrada, que tem sido seguidapelas empresas líderes nos vários segmentos demercado de produto final (cama e mesa, jeans, ma-lharias de marca, camisaria e outros). Essas em-presas, competindo nos respectivos espaços demercado com base na produtividade e qualidade,concebem a indústria têxtil como um todo har-mônico e, dessa maneira, produzem seus fios comas características determinadas pelo arco de pro-dutos finais. Isso permite maior flexibilidade nadefinição dos designs e o sucesso de estratégias dife-renciadoras associadas a custos, ou seja, compe-tição baseada simultaneamente em diferenciaçãoe custos. Assim, nessas empresas, estão em fran-ca substituição os filatórios convencionais poroutros automatizados, majoritariamente do sis-tema open end, e surgem projetos de introdução doavançado sistema jet spinner. Em linhas gerais, essaestratégia preconiza a integração, em níveis maiselevados, do conjunto do complexo têxtil.

Numa realidade heterogênea em movimento,como a do complexo têxtil brasileiro, decorrentede um particular processo histórico e de estruturasocial calcada na diferença como elemento mar-cante, não há como definir concretamente as pro-babilidades de sucesso das distintas estratégias.Todas se consubstanciam em leituras de fatos ob-jetivos e observáveis concretamente no movi-mento de transformação, sendo que tanto a espe-cialização como a integração podem produzir re-sultados expressivos. O movimento de reestrutu-ração vai exigir esforços muito mais efetivos das

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fiações convencionais, pois o avanço do sistemaopen end sobre as fatias de mercado dos fios conven-cionais aparece com significativas vantagens decusto. Com isso, os fios convencionais tendem aconfinar-se em nichos de mercado específicos,centrados na qualidade e na diferenciação, alémdo que a automação revela-se uma necessidadeinexorável.

A restruturação em curso das fiações brasilei-ras escreveu apenas os contornos iniciais do ím-peto transformador e, conquanto surjam indica-ções dos contornos futuros desse segmento, osdesdobramentos ainda poderão evidenciar sur-presas. O movimento de transformação industri-al, como processo social e político, além de eco-nômico, conforma-se como decorrência de requi-sitos determinados na estrutura social que lhe dáconcretude. A história não se escreve de véspera,nem resulta da livre manifestação de forças natu-rais que lhe configurariam um destino determi-nado. As distintas estratégias são nada mais queações construtoras da história e, mesmo tendosido concebidas com base concreta, nada pode sergarantido quanto ao futuro. Certamente essasapostas podem ou não ser chanceladas pelos acon-tecimentos.

A análise da rentabi-lidade das fiações se-gue procedimentos

semelhantes aos adotados para as algodoeiras,considerando-se a operação à capacidade normal,em turnos contínuos para os diferentes padrõesde filatórios, da mesma maneira que se mantêm omesmo custo da matéria-prima e o mesmo rendi-mento industrial. Além disso, os indicadores es-tão calculados para fios título 20, compostos com100% de fibras de algodão. Quanto aos filatórios,observa-se uma heterogeneidade, decorrente donível de modernidade dos equipamentos, muitomais visível nos filatórios convencionais, emfunção dos diferentes níveis de aplicação da in-

3.4 Rentabilidade e Competitividadedas Fiações

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formática, que vão do convencional não-tradicional ao convencional informatizado nassuas principais operações. No sistema open end, essasdiferenças são menores, principalmente por serrecente a expansão de seu uso nas fiações brasi-leiras.

Os custos finais do fio são expressivamente di-ferentes conforme o padrão do filatório utilizado— de R$ 2,86/kg, no open end, passam a R$ 3,22/kg,no convencional informatizado, chegando a R$3,30 no convencional tradicional. São diferençassignificativas que atingem 15% a mais quando secomparam seus extremos (ver tabela 28). Outroaspecto a destacar está na incrível diferença deprodutividade, que faz com que esses diferenciaisde custo assumam montantes expressivos de so-brelucro, dado que os preços finais são os mes-mos. É exatamente essa maior capacidade de pro-dução que alarga a distância aparentemente redu-zida entre os filatórios convencional, informati-zado e tradicional. Destaque-se que essa compa-ração não se aplica para as empresas de fiação deponta, que operam com filatórios convencionaisinformatizados. Isso porque essas empresas, aooperarem com fios de maior titulação, com produ-tos diferenciados, obtêm vantagens de preços quecompensam a menor produtividade. Entretanto, acomparação entre padrões deve basear-se numtipo geral de fio equivalente, para ser factível.

TABELA 28Custo de Produção de Fio Têxtil, Título 20 (100%

Algodão) Segundo o Tipode Filatório, Operando à Plena Capacidade, no

Sul-Sudeste do Brasil — 1996(Em R$/Kg)

Item ConvencionalTradicional

ConvencionalInformatizado

Open End

Matéria-prima* 1,59 1,59 1,59Energia 0,15 0,09 0,08Mão-de-obra 0,35 0,20 0,09Custos financeiros 0,24 0,29 0,21Depreciação 0,97 1,05 0,89Total 3,30 3,22 2,86

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Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.Nota: * Considerando rendimento de 94%.

Outro aspecto a destacar está na elevada parti-cipação da matéria-prima no custo final do fio,passando de 48%, nos fios oriundos dos filatóriosconvencionais tradicionais, a 59%, nos fios pro-duzidos em open end. Como os diferenciais derivamdos custos operacionais dos filatórios, excluída amatéria-prima, a vantagem mais expressiva doopen end em relação aos filatórios convencionais estános menores custos com mão-de-obra e energia,ainda que sejam relevantes as diferenças no itemdepreciação. Tem-se aí o perfil fundamental damudança tecnológica — automatização de proces-sos reduzindo gastos com pessoal. Em qualquersituação, a intensificação da informatização pro-duz vantagens de custos em detrimento da utili-zação da força de trabalho. Essa tendência, veri-ficável no contexto mundial, revela-se claramentenas mudanças recentes das fiações brasileiras.

Avaliando o resultado econômico final, com aressalva de que a maioria das fiações brasileiras éintegrada para frente em indústrias têxteis maisamplas — e com isso a utilização de preço de mer-cado do fio deve ser vista com cautela —, têm-sereceitas líquidas crescentes do filatório conven-cional tradicional (R$ 0,19/kg de fio), para o fila-tório convencional informatizado (R$ 0,54/kg defio) e, deste, para o filatório open end (R$ 0,90/kg defio). Em porcentagem, esses indicadores variamde 5,1% a 23,9%, ou seja, mostram que a rentabili-dade dos filatórios convencionais está cada vezmais determinada pela capacidade de operaremem nichos de mercado com fios de qualidade, comtitulação não acessível aos open end (ver tabela 29).

TABELA 29Resultados Econômicos das Fiações, na Produ-

ção de Título 20 (100% Algodão),Segundo o Tipo de Filatório, Operando à Plena

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DO BRASIL

Capacidade, noSul-Sudeste do Brasil — 1996

(Em R$/Kg)

ItemCusto de

Produ-ção

Preço doFio*

ReceitaLíquida

%

Convencional tradici-onal

3,30 3,76 0,19 5,1

Convencional infor-matizado

3,22 3,76 0,54 14,4

Open end 2,86 3,76 0,90 23,9Fonte: Pesquisa de campo — IPARDES.Nota: * Valor convertido para pagamento à vista.

Mais uma vez, esses resultados devem ser ava-liados em certos limites, pois, como os filatóriosconvencionais que operam em nichos de mercado,na verdade trabalham com outro tipo de fio, emque os diferenciais de preços são superiores, a in-tegração vertical caracterizadora da indústriatêxtil pode viabilizar sua operação no curto prazo,sob determinadas condições, notadamente com ainformatização de alguns processos ou mesmocom a depreciação final dos equipamentos. Dequalquer maneira, no longo prazo, não restamdúvidas de que, para as faixas de fios de menor ti-tulação, os filatórios open end tenderão, como estáocorrendo no Brasil, a serem amplamente majo-ritários. Isso fica ainda mais claro se os fios sedestinam à fabricação de tecidos mistos de algo-dão e fibras artificiais ou sintéticas.

Chamam atenção, por outro lado, os níveis devalor adicionado nas fiações. Excluindo-se o pre-ço da matéria-prima, o diferencial de custo em re-lação ao preço final do fio, expresso em porcenta-gem, que equivale à margem bruta da fiação, mos-trando-se igual para todos os sistemas, é de 57,7%.Os custos de fiação, exclusive matéria-prima, secomparados com essa margem bruta, consomem78,8% da diferença nos filatórios convencionaistradicionais, 75,5% no convencional informati-zado e, no open end, 58,5% da margem bruta da fiação.Esses índices mostram que, se as fiações não re-presentam o segmento têxtil em que o valor adici-onado se revela mais expressivo, sem sombra de

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COMPETITIVIDADE E PRODUTIVIDADE DAS ALGODOEIRAS E DAS FIAÇÕES NO SUL-SUDESTE DO

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dúvida seus índices para essa variável são subs-tancialmente superiores.

O nível de ocupação da capacidade instalada cer-tamente altera os indicadores de resultado eco-nômico das fiações, que são mais importanes paraos filatórios convencionais, em que o montante decapital fixo empregado se mostra praticamente odobro do filatório open end, com maior preço dosequipamentos e gastos superiores pela maior exi-gência de área construída. As fiações convencio-nais não-integradas, que não operam em nichosde mercado de qualidade, não têm a mínima chan-ce na concorrência com as open end. Essas chances,inclusive, tendem a tornar-se progressivamentemais reduzidas, diante do ritmo de modernizaçãodas fiações brasileiras. Resultado disso configu-ra-se no elevado número de empresas com esseperfil fechadas, com o que o número de fusosexistentes no Brasil beira os 10 milhões para umaquantidade em operação estimada em torno dos6,5 milhões.

Quanto à competitividade, os filatórios brasilei-ros mais modernos se inserem internacional-mente no mercado de produtos finais de váriasespecificações, e algumas fiações modernas for-necem fios a empresas instaladas em outros paí-ses, ainda que esse mercado seja restrito. No âm-bito do MERCOSUL, as fiações complementam umaindústria têxtil progressivamente mais competi-tiva com a continuidade do processo de transfor-mação em curso. A heterogeneidade setorial mui-to elevada, diante do fato de o complexo têxtil re-presentar a mais antiga agroindústria, tanto nocontexto mundial — foi a base da 1a Revolução In-dustrial inglesa — quanto no Brasil, revela aenorme amplitude de realidades que pode ser no-tada em uma mesma linha de produtos e até emfábricas de um mesmo grupo empresarial. Taisdiferenciações conformam estratégias dísparesde ajustamento e, conforme o indicador utilizado,

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podem mascarar a real posição competitiva da in-dústria têxtil brasileira.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS:ALARGAMENTO DAS DISTÂNCIAS

ENTRE AS ALGODOEIRAS E AS FIAÇÕES

As algodoeiras e as fiações representam doissegmentos do complexo têxtil brasileiro que pro-tagonizam a ruptura mais extrema nas relaçõesinternas. Quando se visualiza o comportamentode ambos, nota-se a conformação de um enormeprecipício, virtualmente incompatível com aconstrução de uma totalidade harmonicamenteorquestrada em interesses e procedimentos, demaneira a sustentar uma inserção competitiva daprodução têxtil brasileira no contexto internaci-onal, e mesmo num mercado interno aberto a umaeconomia globalizada. A análise em separadomostra uma algodoeira como uma agroindústria,a qual, por sua extrema especialização, se subor-dina à dinâmica do deslocamento da cotonicultu-ra, enquanto a fiação se insere numa dinâmica deintegração para frente na cadeia industrial.

A distância entre as algodoeiras e as fiaçõespode ser mensurada de maneira clara quando seadentra a estrutura interna de empresas que pos-suem fábricas de ambos os segmentos. Isso inde-pende de serem grandes empresas com interessesnos demais elos da cadeia têxtil, ou cooperativasagropecuárias, cuja base do poder e o fim precípuovoltam-se aos agropecuaristas a elas associados.Mesmo nessas empresas, cooperativas ou socie-dades anônimas, as algodoeiras e as fiações sãoelos independentes, e funcionam como elementosestanques com estratégias próprias, ainda que sobo domínio do mesmo capital. A integração visua-lizada no organograma dessas estruturas empre-sariais esconde a enorme distância entre os de-partamentos, o que, em última instância, repre-senta apenas uma empresa atuando em dois seg-

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mentos contíguos do complexo têxtil, e não atu-ando de maneira a integrar verticalmente.

As diferenças começam no sistema de pagamen-to da matéria-prima: as algodoeiras não procedemà valorização da qualidade, usando o velho siste-ma de pagar o algodão em caroço pelo sistema debica corrida tipo 6, enquanto as fiações escolhem seusfardos pelas características desejáveis para com-porem um dado padrão de fio a ser fabricado e ne-gociam com seus fornecedores na base de ágios edeságios. Em outras palavras, as algodoeirascompram algodão em caroço pelo volume, e as fia-ções, o fardo classificado. Nas algodoeiras, a esco-lha segue o padrão de mensuração de característi-cas extrínsecas por critérios visuais, e nas fia-ções cresce a utilização do High Volume Instruments (HVI) nadeterminação de qualidades intrínsecas da fibra.Portanto, abre-se aqui parte do precipício que im-pede a transmissão dos requerimentos de quali-dade para o setor produtor da matéria-prima fun-damental — a cotonicultura.

A visão comercialista das algodoeiras, cujaperspectiva fundamental está calcada em fazerfrente a seus concorrentes buscando beneficiar omaior volume possível de algodão em caroço porsafra, reproduz-se para trás com a não-exigênciade qualidade do produto, em especial no que dizrespeito à umidade e às impurezas relacionadasao sistema de colheita. Verifica-se uma contínuapiora do tipo médio beneficiado nas principais re-giões cotonicultoras, fato incompatível com umaestrutura de fiação que tem na qualidade da fibrasua principal exigência. As discussões em tornoda qualidade da fibra brasileira sustentam-se emargumentações nem sempre precisas por partedos empresários têxteis; além disso, não há comonegar a incompatibilidade entre estratégias cen-tradas na quantidade processada e outras calca-das em requerimentos qualitativos específicos elimitantes do desempenho operacional.

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A distância acirra-se com a própria operaciona-lidade dos segmentos, pois, enquanto as algodoei-ras têm funcionamento sazonal típico, operandotrês a cinco meses do ano, as fiações trabalhamdurante todo o ano, conformando-se em ativida-des industriais contínuas, com os picos determi-nados pela demanda do fio. Assim, enquanto nasalgodoeiras a safra de algodão determina o ritmoda operação fabril, ou seja, determina-se o anda-mento da fábrica pela oferta de matéria-prima,nas fiações é a demanda do produto final que aca-ba determinando o ritmo. Diferentemente daoferta de fio, a oferta de matéria-prima não repre-senta uma variável programável pelas algodoei-ras. A produção de algodão em caroço, passado oplantio, não pode ser ajustada, e sobre ela a algo-doeira não exerce controle, enquanto nas fiaçõesse pode reduzir ou aumentar a produção de fio.

O algodão em caroço não apenas tem forneci-mento limitado no tempo e no volume, como nãopode ser estocado por longos períodos nem suademanda suprida por produto de outras regiões.Já no algodão em pluma, o armazenamento podeser realizado, e seu fornecimento pode ser consi-derado no tempo e no volume numa situaçãonormal do comércio internacional. Essa rupturaconforma-se ainda mais visível quando a ofertade algodão em pluma, em condições vantajosas definanciamento, adentra o mercado brasileiro empleno pico de safra da cotonicultura, e as fiaçõesnão se interessam pela compra do produto nacio-nal, mesmo a preços mais vantajosos. O mercadointerno aberto impacta mais duramente as algo-doeiras, aprofundando o precipício, que alarga-secom base em interesses regionais. Nesse aspecto,não bastasse a ruptura de interesses entre a in-dústria têxtil (fiação e tecelagem) e os cotonicul-tores, apoiados pelas algodoeiras, no caso brasi-leiro, esses interesses ainda estão localizados emáreas geográficas distintas.

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BRASIL 97

Enquanto a cotonicultura se concentra nos es-tados do Paraná, São Paulo e no Brasil Central, asfiações, embora com unidades importantes nosterritórios paulista e paranaense, têm núcleos ex-pressivos e muito articulados politicamente noCeará e em Santa Catarina, para os quais a lógicade importação de pluma estrangeira se torna maisvantajosa. Essa força política revela-se no con-junto de medidas para o complexo têxtil, que temprivilegiado alguns segmentos em detrimento deoutros, principalmente com a adoção de medidasde proteção da indústria têxtil, que, embora corre-tas, não guardam similaridade com a cotonicultu-ra e as algodoeiras.

O próprio financiamento estatal contempla asfiações, e não as algodoeiras, as quais, para mui-tos, sequer são consideradas parte integrante docomplexo têxtil, ainda que seja por excelênciauma atividade agroindustrial como as demais. Areestruturação do complexo têxtil brasileiro ope-rada nos anos recentes vem aprofundando essadistância, pois, enquanto algumas algodoeiras lu-tam para manter-se em operação, e muitas fechamsequer podendo ser reaproveitadas, as fiações re-alizam intenso processo de modernização que re-voluciona a própria base técnica do segmento.Desse modo, as perspectivas visualizáveis paracada um desses segmentos contíguos são radi-calmente opostas — um segmento está em francamodernização, e o outro em acelerado sucatea-mento.

O precipício entre algodoeiras e fiações torna-seainda maior quando os indicadores de compara-ção são as respectivas rentabilidades. Enquanto amaioria das algodoeiras opera no limite de sobre-vivência — quase que exclusivamente buscandoganhos na compra de matéria-prima, ao menorpreço possível e, com isso, tentanto transferir oônus do ajuste ao contonicultor, e na venda de ca-roço —, as fiações, mesmo as não integradas, tra-balham com maior folga de rentabilidade. Ressal-

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te-se que tanto as fiações convencionais tradicio-nais quanto a grande maioria das algodoeiras es-tão em condições econômicas de falta de perspec-tivas. A grande distância entre algodoeiras e fia-ções torna-se clara devido aos modernos filatóri-os convencionais, já bastante expressivos na es-trutura da indústria têxtil brasileira. Mas tam-bém nas algodoeiras nota-se o embrião das mu-danças, com as grandes empresas agropecuáriasintegradas para frente, centradas na nova cotoni-cultura mecanizada, com alta produtividade e co-lheita mecânica (com lavouras próprias ou con-tratadas), associadas a algodoeiras também mo-dernas.

As empresas com o perfil de uma moderna coto-nicultura integrada ainda são minoritárias naprodução nacional de pluma. Essa parece ser atendência que marcará as algodoeiras brasileirasnum futuro próximo — a integração para trás in-tensificando suas raízes rurais, associada a umnovo padrão de produção que irá paulatinamentesuplantar a velha estrutura produtiva de algodãoem pluma no Brasil. O Sul-Sudeste, de estruturamais tradicional, ainda não caminhou muito nes-sa direção, mas parece ser esse o destino inexorá-vel de suas estruturas mais sólidas, como as coo-perativas do oeste do Paraná. Em outras pala-vras, o revigoramento da produção brasileira depluma exige uma redefinição profunda do status queaté hoje tem sido reservado às algodoeiras. Con-tudo, as evidências disponíveis até o momentoapontam para o sentido contrário, ou seja, pareceque as distâncias insistem em alargar-se.

Escavando nesse precipício existente no com-plexo têxtil brasileiro, vislumbra-se que a descon-tinuidade se revela como seu elemento constitui-dor, pois raízes de cunho histórico/econômicovêm impedindo movimentos decisivos no sentidode se forjarem estruturas econômicas integradas.A orquestração de interesses entre os segmentos amontante do complexo têxtil, em especial na

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agroindústria de beneficiamento e na fiação, re-presenta um desafio na formulação de políticasnacionais de inserção competitiva a longo prazo.Os industriais têxteis, em especial aqueles nãoseguidores do imediatismo do curto prazo, têmconsciência de que se torna imprescindível a es-tratégia de cimentar os alicerces de mecanismosmais eficientes de coordenação vertical entre osdois segmentos, como suporte ao complexo têxtilnacional. Enquanto isso, o precipício abre-se ra-pidamente a cada safra, em decorrência da inun-dação de algodão estrangeiro. As barrancas dolado das algodoeiras e da cotonicultura já despen-cam, jogando no buraco capacidade produtiva eexperiência. Mas como lembrou um velho planta-dor de algodão: a voçoroca não desbarranca de um lado só e, quanto maior,

mais difícil fica de tampar. E tampar o buraco para refazer-seno seu lugar o solo fértil perdido na enxurradaleva tempo e gasta dinheiro. Fica, então, como in-cógnita, se a fiação ficará imune à destruição dosegmento nacional produtor de sua matéria-prima.

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A PRODUÇÃO EDITORIAL DESTE VOLUME CONTOU COM O APOIO FINANCEIRO DA ASSOCIAÇÃO

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