comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

51
1 COMENTÁRIOS SOBRE O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA DE AÇÃO DIRETA Breve síntese sobre aspectos relevantes do controle de constitucionalidade por via de ação direta: conceito, competência, legitimação, objeto, procedimento e principais efeitos. I – Introdução No Brasil, o controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta originou-se da denominada representação interventiva criada em 1934. Entretanto, foi a partir da Emenda Constitucional n o 16 de 26 de novembro de 1965, que a ação direta de inconstitucionalidade passou a ter caráter genérico e posição de destaque no ordenamento jurídico brasileiro. O controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta de inconstitucionalidade é uma atividade jurisdicional atípica, pois seu objeto é um pronunciamento sobre a própria lei em tese. Trata-se de um controle abstrato, pois não há um litígio em concreto a ser solucionado. Difere do controle de constitucionalidade por omissão, pois neste, apesar de também ser abstrato, há um reconhecimento da inércia ilegítima do Estado, enquanto naquele evita-se a presença de uma norma inválida no ordenamento. Difere também do controle de constitucionalidade por via incidental, pois este trata de questão prejudicial apontada num determinado litígio. Já no controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta o juízo de constitucionalidade é a própria validade da norma. Neste controle, a declaração de inconstitucionalidade da limita-se aos atos normativos impugnados, sendo que o tribunal constitucional atua como legislador negativo, não podendo inovar o direito. II – Ação Direta de Inconstitucionalidade 1. Competência No Brasil, a competência para Controle de Constitucionalidade por Via de Ação Direta pertence, no plano federal, ao Supremo Tribunal Federal (STF), tendo como paradigma a Constituição Federal, na ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual (ADIN),

Upload: defalla71

Post on 15-Jun-2015

972 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Controle de constitucionalidade

TRANSCRIPT

Page 1: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

1

COMENTÁRIOS SOBRE O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE POR VIA

DE AÇÃO DIRETA

Breve síntese sobre aspectos relevantes do controle de constitucionalidade por via de

ação direta: conceito, competência, legitimação, objeto, procedimento e principais

efeitos.

I – Introdução

No Brasil, o controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta

originou-se da denominada representação interventiva criada em 1934. Entretanto, foi a

partir da Emenda Constitucional no 16 de 26 de novembro de 1965, que a ação direta de

inconstitucionalidade passou a ter caráter genérico e posição de destaque no

ordenamento jurídico brasileiro.

O controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta de

inconstitucionalidade é uma atividade jurisdicional atípica, pois seu objeto é um

pronunciamento sobre a própria lei em tese. Trata-se de um controle abstrato, pois não

há um litígio em concreto a ser solucionado. Difere do controle de constitucionalidade

por omissão, pois neste, apesar de também ser abstrato, há um reconhecimento da

inércia ilegítima do Estado, enquanto naquele evita-se a presença de uma norma

inválida no ordenamento. Difere também do controle de constitucionalidade por via

incidental, pois este trata de questão prejudicial apontada num determinado litígio. Já no

controle judicial de constitucionalidade por via principal ou por ação direta o juízo de

constitucionalidade é a própria validade da norma. Neste controle, a declaração de

inconstitucionalidade da limita-se aos atos normativos impugnados, sendo que o tribunal

constitucional atua como legislador negativo, não podendo inovar o direito.

II – Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

1. Competência

No Brasil, a competência para Controle de Constitucionalidade por Via de Ação Direta

pertence, no plano federal, ao Supremo Tribunal Federal (STF), tendo como paradigma

a Constituição Federal, na ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo

federal ou estadual (ADIN), na ação declaratória de constitucionalidade (ADC) e na ação

de inconstitucionalidade por omissão (ADIN por omissão). No plano estadual e tendo

como paradigma a Constituição do Estado, o controle é realizado pelo Tribunal de

Justiça do Estado, na representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos

Page 2: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

2

estaduais ou municipais. O processo tem natureza objetiva e somente sob o aspecto

formal é possível falar-se em partes.

 

2. Legitimação

A legitimação passiva na ADIN recai sobre os órgãos ou autoridades responsáveis pelo

ato normativo impugnado. A defesa da norma impugnada, seja ela federal ou estadual,

caberá ao Advogado-Geral da União, que atua como procurador da presunção de

constitucionalidade.

No que se refere à legitimação ativa, desde a criação da ADIN genérica até a

Constituição de 1988, a legitimação ativa era privativa do Procurador-Geral da

República. O artigo 103 da Constituição de 1988 ampliou o rol de legitimados, criando

duas categorias distintas:

Os legitimados universais: cujo papel autoriza a defesa da constitucionalidade em qualquer hipótese.

Os legitimados especiais: órgãos e entidades cuja atuação é restrita a questões de interesse de seus afiliados ou

às quais possam atuar com representatividade adequada.

São legitimados universais: o Presidente da República, as Mesas do Senado e da Câmara

de Deputados, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil e partido político com representação no Congresso Nacional. Os

legitimados especiais compreendem o Governador de Estado, a Mesa de Assembléia

Legislativa de Estado, confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

 

3. Objeto

O objeto da ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) compreende lei e o ato

normativo federal ou estadual perante a Constituição Federal da República. Dentre as

espécies normativas passíveis de controle por ação direta de inconstitucionalidade

incluem-se:

a) Emenda constitucional;

b) Lei complementar;

c) Lei ordinária;

d) Lei delegada;

e) Medida provisória;

Page 3: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

3

f) Decretos legislativos e resoluções

g) Decretos autônomos;

h) Legislação estadual;

i) Tratados internacionais.

A jurisprudência do STF tem se pronunciado pelo não conhecimento de ADIN cujo objeto

versa sobre as seguintes hipóteses normativas:

a) Atos normativos secundários;

b) Leis e atos de efeitos concretos;

c) Leis anteriores à Constituição em vigor;

d) Lei que tenha sido revogada;

e) Lei municipal em face da Constituição Federal;

f) Proposta de emenda constitucional ou projeto de lei;

g) Súmula.

4. Processo e julgamento

 4.1. Procedimento

O processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade é regido pela Lei 9.868

de 10 de novembro de 1999. Os legitimados para a ADIN nos termos do artigo 2º da Lei

são os mesmos do artigo 103 da Constituição:

“Art. 2º Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito

Federal;

Page 4: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

4

V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”.

Nos termos da Lei 9.868 de 10 de novembro de 1999, a petição indicará o dispositivo da

lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a

cada uma das impugnações, bem como o pedido, com suas especificações.

A petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente será

liminarmente indeferida pelo relator, cabendo agravo da decisão que indeferir a petição

inicial. A ação direta de inconstitucionalidade não admite desistência.

O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a lei ou o

ato normativo impugnado, as quais serão prestadas no prazo de trinta dias contado do

recebimento do pedido.

O artigo 7º da Lei 9.868/99 veda intervenção de terceiros no processo de ação direta de

inconstitucionalidade. Porém, o relator, considerando a relevância da matéria e a

representatividade dos postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir,

observado o prazo fixado no parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou

entidades. Trata-se da hipótese de admissão do “amicus curiae” no processo.

Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da

União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se, cada qual, no

prazo de quinze dias.

O Art. 9º da Lei 9.868/99 traz as seguintes inovações nos §§ 1º e 2º. No § 1º diz que em

caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de

notória insuficiência das informações existentes nos autos, poderá o relator requisitar

informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para que emita parecer

sobre a questão, ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas

com experiência e autoridade na matéria. Já no § 2º O relator poderá, ainda, solicitar

informações aos Tribunais Superiores, aos Tribunais federais e aos Tribunais estaduais

acerca da aplicação da norma impugnada no âmbito de sua jurisdição. De acordo com o

§ 3º, as informações, perícias e audiências a que se referem os §§ 1º e 2º serão

realizadas no prazo de trinta dias, contado da solicitação do relator.

Page 5: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

5

4.2. Medida cautelar

O artigo 10 da Lei 9.868/99 diz que salvo no período de recesso, a medida cautelar na

ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal,

em sessão com pelo menos oito Ministros (art. 22), após a audiência dos órgãos ou

autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão

pronunciar-se no prazo de cinco dias. Já o § 1º deste artigo prevê que o relator, julgando

indispensável, ouvirá o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, no

prazo de três dias. O § 2º diz que o julgamento do pedido de medida cautelar, será

facultada sustentação oral aos representantes judiciais do requerente e das autoridades

ou órgãos responsáveis pela expedição do ato, na forma estabelecida no Regimento do

Tribunal. E o § 3º dispõe que em caso de excepcional urgência, o Tribunal poderá deferir

a medida cautelar sem a audiência dos órgãos ou das autoridades das quais emanou a

lei ou o ato normativo impugnado.

Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção

especial do Diário Oficial da União e do Diário da Justiça da União a parte dispositiva da

decisão, no prazo de dez dias, devendo solicitar as informações à autoridade da qual

tiver emanado o ato. A medida cautelar, dotada de eficácia contra todos, será concedida

com efeito “ex-nunc”, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia

retroativa. A concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso

existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário. O indeferimento de liminar

não tem efeito vinculante.

Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de

seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a

prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral

da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias,

submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar

definitivamente a ação.

5. Efeitos da decisão

A decisão proferida na ação direta de inconstitucionalidade, segundo a doutrina e após a

edição da Lei 9.868/99, tem, em regra, efeitos retroativos (“ex-tunc”), gerais (“erga

omnes”), repristinatórios e vinculantes:

ex tunc”: retroativo como conseqüência do dogma da nulidade, que por ser inconstitucional, torna-se

nula, por isso perde seus efeitos jurídicos;

Page 6: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

6

erga omnes”, será assim oponível contra todos;

Efeito vinculante: relaciona-se aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública Federal, Estadual e

Municipal. Uma vez decida procedente a ação dada pelo STF, sua vinculação será obrigatória em relação a todos

os órgãos do Poder Executivo e do Judiciário, que daí por diante deverá exercer as suas funções de acordo com a

interpretação dada pelo STF. Esse efeito vinculante aplica-se também ao legislador, pois esse não poderá mais

editar nova norma com preceito igual ao declarado inconstitucional;

Efeito represtinatório: em princípio é restaurada uma lei que poderia ser revogada.

A declaração de inconstitucionalidade de uma determinada lei está relacionada com a

matéria que foi discutida. Assim, a decisão do STF não pode ir além da matéria

discutida. Logo, todo julgado está limitado ao pedido que foi feito ao juiz. Dessa

maneira, a decisão irá versar apenas sobre a ADIN. Essa decisão poderá ser através de

sentença (decisão de um juiz monocrático), ou acórdão (decisão do tribunal colegiado).

Os atingidos pela decisão do STF são aqueles que participaram da relação jurídica

processual: o Poder Executivo, legislativo, Judiciário, STF e também toda a sociedade.

Depois de formada a decisão da coisa julgada, sua eficácia será preclusiva, ou seja,

aquela questão uma vez decidida não poderá ser mais discutida. A decisão judicial é uma

lei entre as partes.

O juiz não pode desconsiderar a decisão dada como inconstitucional pelo STF, e sim

passar a cumpri-la deixando de aplicar. Quando o juiz insistir em aplicar a lei já decidida

como inconstitucional, ocorrerá a reclamação constitucional, que é um instrumento que

busca a preservação da competência e garantir a autoridade da decisão do STF (art.102

CF I).

Conseqüências da declaração de inconstitucionalidade de uma lei nos casos julgados:

ocorre o ajuizamento de ação decisória, dentro do prazo de dois anos. Após esse período

se dá a coisa soberanamente julgada (pretensão bem maior de imutabilidade da

decisão). Após ter o título judicial, as partes podem ajuizar outro processo embargando

(contestando) a decisão.

Artigo 26 lei 9.868/99 - Embargo declaratório é um meio de impugnação de decisão

judicial “endo processual” (dentro do processo). Não tem a finalidade de reformar ou

invalidar a decisão judicial de um julgado, e sim buscar esclarecer algo que não decisão

dada pelo STF ficou omisso, contraditório ou obscuro. Poderá ter um efeito modificativo

(infringente), quando for o caso de omissão que possa resultar na modificação de um

julgado.

III – Ação Declaratória de Constitucionalidade

Page 7: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

7

A ação declaratória de constitucionalidade (ADC) é uma modalidade de controle por via

principal, concentrado e abstrato, cuja finalidade é afastar a incerteza jurídica e evitar

as diversas interpretações e contrastes que estão sujeitos os textos normativos.

Há casos em que câmaras ou turmas de um mesmo tribunal firmam linhas

jurisprudenciais contrárias. Isso tudo envolve um grande número de pessoas, onde por

essa razão se faz necessário uma segurança jurídica acerca das razões de interesses

públicos, a qual é estabelecida pela ação direta de constitucionalidade, para assim

tornar mais rápida e padronizada a definição do Poder Judiciário.

1. Competência

De acordo com o artigo 102 da Constituição Federal da República, cabe ao Supremo

Tribunal Federal processar e julgar a ação declaratória constitucional.

2. Legitimação

Em relação à propositura da ação declaratória de constitucionalidade, a Constituição

Federal define em seu artigo 103, parágrafo 4, os agentes políticos e órgãos que

possuem legitimação universal e extraordinária, bem como capacidade postulatória:

“§ 4º A ação declaratória de constitucionalidade poderá ser proposta pelo Presidente da

República, pela Mesa do Senado Federal, pela Mesa da Câmara dos Deputados ou pelo

Procurador-Geral da República”.

3. Objeto

Apenas poderá ser objeto desse tipo de ação, lei ou ato normativo federal, com o pedido

de que se reconheça a compatibilidade entre determinada norma infraconstitucional e a

Constituição. Os atos normativos em espécie que podem ser objeto da ação declaratória

de constitucionalidade são substancialmente os mesmos que se sujeitam a impugnação

por ação direta de inconstitucionalidade, desde que sejam de natureza federal.

4. Processo e julgamento

4.1. Procedimento

Inicialmente definido por ocasião do julgamento da Questão de Ordem na ADC n.1, o

procedimento da ADC também está positivado na Lei 9.868 de 10 de novembro de 1999.

Page 8: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

8

A petição inicial deverá indicar: o dispositivo da lei ou do ato normativo questionado e os

fundamentos jurídicos do pedido; o pedido, com suas especificações; a existência de

controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto da ação

declaratória.

A petição inicial, acompanhada de instrumento de procuração, quando subscrita por

advogado, será apresentada em duas vias, devendo conter cópias do ato normativo

questionado e dos documentos necessários para comprovar a procedência do pedido de

declaração de constitucionalidade. A petição inicial inepta, não fundamentada e a

manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator, cabendo

agravo da decisão que indeferir a inicial.

Proposta a ação declaratória, não se admitirá desistência (art. 16), não sendo cabível a

intervenção de terceiros, mas a exemplo da ADIN, admite-se o “amicus curiae”, nos

termos do artigo 20 da Lei 9.868/99. O Procurador-Geral da República deverá

pronunciar-se no prazo de quinze dias. Vencido este prazo, o relator lançará o relatório,

com cópia a todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento.

O relator poderá solicitar, ainda, informações aos Tribunais Superiores, aos Tribunais

federais e aos Tribunais estaduais acerca da aplicação da norma questionada no âmbito

de sua jurisdição. As informações, perícias e audiências solicitadas pelo relator serão

realizadas no prazo de trinta dias, contado da solicitação.

4.2. Medida cautelar

Apesar da Constituição não prever a possibilidade de medida cautelar na ação

declaratória de constitucionalidade a jurisprudência do STF e a Lei 9.868/99 cuidou da

questão, prevendo a suspensão do julgamento dos processos envolvendo a aplicação da

norma impugnada e determinando que, concedida a cautelar, o julgamento da ação

deverá se dar em até 180 dias, sob pena de perda da eficácia da medida.

“Art. 21. O Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus

membros, poderá deferir pedido de medida cautelar na ação declaratória de

constitucionalidade, consistente na determinação de que os juízes e os Tribunais

suspendam o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato

normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.

Parágrafo único. Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará

publicar em seção especial do Diário Oficial da União a parte dispositiva da decisão, no

prazo de dez dias, devendo o Tribunal proceder ao julgamento da ação no prazo de

cento e oitenta dias, sob pena de perda de sua eficácia”.

Page 9: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

9

4.3. Decisão final

A declaração de constitucionalidade tem eficácia contra todos e efeito vinculante em

relação aos órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública federal, estadual e

municipal. Enfim, uma norma que era válida agora mais do que nunca continua sendo,

apenas tendo sido reafirmada sua força impositiva.

5. Efeitos da decisão

Eficácia “erga omnes”

Nos termos do § 2º, do artigo 102 da Constituição, as decisões definitivas de mérito,

proferidas pelo Supremo Tribunal, nas ações declaratórias de constitucionalidade,

produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, estando assim compelidos à sua

observância todos os órgãos governamentais e judiciários.

Se as decisões proferidas em ação direta de inconstitucionalidade ou em ação

declaratória de constitucionalidade têm eficácia contra todos, pareceria incabível nova

ação tendente à declaração de constitucionalidade da mesma norma, já declarada

constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Admite-se, contudo, o ajuizamento de

nova ação direta de inconstitucionalidade nos casos de mudanças das circunstancias

fáticas ou de relevante alteração das concepções jurídicas dominantes.

Eficácia vinculante

Além da eficácia contra todos ou “erga omnes” a Emenda Constitucional nº 3/93 atribuiu

efeito vinculante às decisões definitivas de mérito do Supremo Tribunal federal, nas

ações declaratórias de constitucionalidade.

Em razão do efeito vinculante, as decisões de mérito proferidas pelo Supremo Tribunal

Federal devem ser observadas e cumpridas pelos órgãos do Poder Judiciário e do Poder

Executivo. Não está vinculado, porém, o Poder Legislativo, que tem o poder de editar

nova norma com o mesmo conteúdo de outra declarada inconstitucional. Nesse caso, só

mediante nova ação direta pode ser declarada a inconstitucionalidade da lei.

Eficácia “ex tunc”

A declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, portanto, tem efeitos “ex

tunc”. Os atos jurídicos praticados com fundamento na norma declarada

inconstitucional, em regra, são alcançados pela decisão. Alguns atos, porém, não são

Page 10: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

10

atingidos pela decisão. A doutrina dominante e a jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal estão orientadas no sentido da nulidade da lei inconstitucional. Mas em

determinadas situações excepcionais, o STF mantém os efeitos decorrentes da aplicação

da lei inconstitucional, porque a retroação da decisão declaratória de

inconstitucionalidade, em alguns casos, terminaria por produzir alterações mais graves,

nas relações jurídicas.

O artigo 27 da Lei 9868/99 traz regra nesse sentido:

            "Art. 27 – Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em

vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo

Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos

daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em

julgado ou de outro momento que venha a ser fixado."

6. Repercussão da decisão em controle abstrato sobre as situações já constituídas

6.1. Distinção entre os efeitos da decisão no plano abstrato e no plano concreto

É possível que uma norma tida como constitucional em ação direta ajuizada para esse

fim não deva ser aplicada a determinada situação concreta submetida à apreciação

judicial. Isso ocorrerá, por exemplo, quando a aplicação da norma resultar em situação

indesejada pelo ordenamento constitucional ou violar o próprio objeto que vise tutelar.

Este tipo de situação é passível de ocorrer, principalmente, quando estiver em litígio

questão relativa à dignidade da pessoa humana ou exercício de direitos fundamentais.

 

6.2. Decisão em controle abstrato e coisa julgada

No caso de decisão em concreto com base na inconstitucionalidade de norma que

posteriormente é julgada constitucional em sede de ADC, caberá recurso ordinário ou

extraordinário, se a decisão ainda comportar recurso; ou ação rescisória, se a decisão já

houver transitado em julgado. Porém, se já não for possível ajuizar ação rescisória,

prevalecerá a coisa julgada, salvo as situações extremas e excepcionais que possam

legitimar sua relativização, com base em juízo de ponderação de valores fundamentais.

IV – A Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

Há omissão inconstitucional quando o poder público abstém-se indebitamente, quando

deveria agir para tornar efetiva norma constitucional determinada e individualizada. A

Page 11: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

11

Constituição Federal de 1988, influenciada por dispositivo da Constituição Portuguesa

de 1976, criou a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADIN por omissão),

com o intuito de solucionar a própria omissão do poder estatal em relação a normas

constitucionais.

A ADIN por omissão tem a mesma natureza da ADIN genérica. Trata-se de um processo

objetivo de controle abstrato. A finalidade desta ação é também a defesa objetiva da

Constituição e preservação da integridade normativa-constitucional. O procedimento

também é semelhante ao da ADIN genérica, o qual é previsto na Lei n. 9.868/99,

ressalvadas as incompatibilidades procedimentais relativas à natureza da ação. Por

exemplo, não cabe a concessão de medida cautelar em sede de ADIN por omissão. Da

mesma forma, não há, em regra manifestação do Advogado-Geral da União, pois por se

tratar de omissão de ato normativo, não há ação do Estado para ser defendida, salvo no

caso de omissão parcial do poder público, caso em que a defesa pelo Advogado-Geral da

União é cabível.

Assim, proposta a ADIN por omissão, serão solicitadas desde logo informações aos

órgãos responsáveis pela inação, as quais devem ser prestadas em 30 dias. A seguir,

será ouvido o Procurador-Geral da República, que deverá se manifestar em 15 dias.

Caso haja necessidade de esclarecimentos poderá o relator designar perícias, ouvir

depoimentos, ou designar audiência pública, sendo possível a admissão do “amicus

curiae” no processo.

1. Legitimidade e Competência

A legitimidade para a propositura da ADIN por omissão é a mesma relativa à ADIN

genérica.

Assim, podem propor a ação direta de inconstitucionalidade:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do DF;

V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

Page 12: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

12

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional”.

Aplica-se a mesma jurisprudência do STF quanto ao requisito da pertinência temática

para os legitimados especiais.

A legitimidade passiva recai sobre os órgãos ou autoridades responsáveis pela omissão,

ou seja, responsáveis pela medida que torna efetiva a norma constitucional. Vale

lembrar, que a ADIN por omissão é um processo objetivo de controle de

inconstitucionalidade, no qual não há partes.

A competência para julgar a ADIN por omissão no plano federal cabe ao Supremo

Tribunal Federal (STF). No plano estadual, caso haja a instituição de controle de

inconstitucionalidade por omissão em Constituição do Estado, o controle é realizado

pelo Tribunal de Justiça.

2. Objeto: As omissões Inconstitucionais

De acordo com a Constituição Federal de 1988, todo ato omissivo do poder público que

inviabilize a efetividade de uma norma constitucional está sujeito ao controle abstrato

de constitucionalidade. Assim, toda e qualquer medida dos órgãos políticos ou órgãos

administrativos estão sujeitos ao controle de constitucionalidade. Entretanto, conforme

a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, somente as omissões normativas podem

ser objeto da ADIN por omissão. Dessa forma, o STF vem excluindo as omissões de

medidas concretas do conjunto de atos estatais sujeitos a este tipo de controle de

inconstitucionalidade.

3. Decisões e Efeitos

De acordo com o § 2º do art. 103 da Constituição Federal, a decisão que declarar a

inconstitucionalidade por omissão dará disso ciência ao poder de competência, para a

adoção das providências necessárias no prazo de trinta dias. A melhor doutrina vem

defendendo que, na hipótese do órgão estatal manter a omissão mesmo após o decurso

do prazo estipulado pela norma constitucional, poderá o Judiciário dispor

normativamente de forma provisória, a fim de alcançar a efetividade da Constituição e o

amparo ao direito fundamental. Este não é o entendimento do STF, que, da mesma

forma que no mandado de injunção, tem recusado dispor normativamente, para conferir

Page 13: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

13

um efeito solucionador à decisão da ADIN por omissão, ou suprir, mesmo que

provisoriamente, a omissão legislativa.

4. Mandado de Injunção e a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

Embora criados como medidas de controle de inconstitucionalidade por omissão, os

institutos do mandado de injunção e da ADIN por omissão distinguem-se pelas seguintes

características:

(a) O mandado de injunção traduz um controle concreto e incidental de

constitucionalidade que tutela direitos subjetivos. Já a ADIN por omissão é um

instrumento de controle abstrato ou principal de constitucionalidade por omissão.

Assim, o mandado de injunção é uma ação constitucional individual, enquanto a ADIN

por omissão é u ma ação constitucional de garantia da Constituição;

(b) Assim, o mandado de injunção visa a tornar viável o exercício de direitos

fundamentais, ao passo que a ADIN por omissão destina-se à efetivação de uma norma

constitucional, independente de referir-se a um direito ou não;

(c) No mandado de injunção a omissão estatal impede o exercício de um direito subjetivo

fundamental. Já na ADIN por omissão, a omissão impede a efetividade de qualquer

norma constitucional;

(d) Por isso, o uso desta via de defesa de direitos independe de qualquer prazo para a

caracterização da omissão. Já na ADIN por omissão, deve-se dar um prazo razoável para

se caracterizar a inércia estatal;

(e) Em sendo uma medida de efeitos concretos, o mandado de injunção instaura uma

relação jurídica inter partes, o que limita o alcance dos efeitos da decisão. Já na ADIN

por omissão, por se tratar de um controle de inconstitucionalidade abstrato, não há

partes e os efeitos são “erga omnes”.

(f) A legitimidade ativa no mandado de injunção recai sobre toda e qualquer pessoa

titular de direitos. Já a legitimidade ativa na ADIN por omissão limita-se ao rol previsto

na CF, art. 103, incisos I ao IX.

(g) A competência para julgar o mandado de injunção é partilhada entre vários órgãos

do Judiciário, de acordo com suas respectivas competências. Já a ADIN por omissão é

julgada perante o STF, ou, nos casos em que a Constituição do Estado prevê o instituto

de controle, pelo respectivo Tribunal de Justiça.

Page 14: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

14

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Abordagem sistemática no tocante aos temas centrais do controle de

constitucionalidade: conceitos, modalidades, legitimidade e tipos de controle, por via

incidental e ação direta.

18/fev/2005

1) Conceito:

O objetivo maior do Direito Constitucional é o que se chama de “filtragem

constitucional”. Isso quer dizer que todas as espécies normativas do ordenamento

jurídico devem existir, ser consideradas como válidas e analisadas sempre sob à luz da

Constituição Federal. Através dessa observância é que se afere se elas são ou não

constitucionais. É nesse momento que entra o controle de constitucionalidade, para

observar se as leis e normas estão compatíveis com a Carta Magna.

Chama-se de compatibilidade vertical, pois é a CF quem rege todas as outras espécies

normativas de modo hierárquico, tanto do ponto de vista formal (procedimental), quanto

material (conteúdo da norma).

Quando se tem a idéia de controle de constitucionalidade, significa dizer então que é

feita uma verificação para saber se as leis ou atos normativos estão compatíveis com a

Constituição Federal, tanto sob o ponto de vista formal, quanto o material.

2) Requisitos de constitucionalidade das espécies normativas:

Todas as espécies normativas prevista no artigo 59 da CF, devem ser comparadas com

determinados requisitos formais e materiais.

Requisitos formais - existem regras do processo legislativo constitucional que devem ser

obrigatoriamente seguidas, caso contrário terá como conseqüência a

inconstitucionalidade formal da lei ou ato normativo, possibilitando assim um controle

repressivo por parte do Poder Judiciário através do método difuso ou concentrado.

a) Requisitos formais subjetivos - ainda na fase introdutória do processo legislativo, ou

Page 15: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

15

seja, quando o projeto de lei é encaminhado ao Congresso Nacional para análise, poderá

ser identificado algum tipo de inobservância à CF. Caso aconteça, apresenta-se o

flagrante vício de inconstitucionalidade.

b) Requisitos formais objetivos - esse tipo de requisito faz referência as outras duas

fases do processo legislativo, a constitutiva e a complementar. Assim como na fase

introdutória, nestas também poderá ser verificado a incompatibilidade com à CF.

Requisitos materiais- a obediência a esse tipo de requisito deve ser feita em relação a

compatibilidade do objeto da lei ou ato normativo com a Constituição Federal.

3) Supremacia constitucional - rigidez (imutabilidade relativa):

Nos casos em que a constituição é rígida e formalmente escrita, tem-se como

conseqüência a garantia da Supremacia da mesma, pois exige a criação de leis e atos

normativos compatíveis com o que vem prescrito na constituição. Dessa forma poderá

ser feito um controle de constitucionalidade em razão das espécies normativas que

venham a confrontar a lei maior do país.

Existem constituições que não são escritas, nem flexíveis como é o caso da Inglaterra.

Nessas circunstâncias não se admiti o controle de constitucionalidade.

No Brasil a Constituição Federal é rígida e escrita, há portanto o controle da mesma.

4) O controle de constitucionalidade pode ser divido:

Quanto ao momento:

Preventivo - aquele que tem por finalidade impedir que um projeto de lei

inconstitucional venha a ser uma lei.

Repressivo - é utilizado quando a lei já está em vigor. Caso haja um erro do lado

preventivo, pode se desfazer essa lei que escapou dos trâmites legais e passou a ser uma

lei inconstitucional.

Quanto ao órgão que exerce o controle de constitucionalidade:

Page 16: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

16

Político - ato de bem governar em prol do interesse público. É a corte constitucional, não

integra a estrutura do Poder Judiciário.

Jurisdicional - é exercido por um órgão do Poder Judiciário. Só o juiz ou tribunal pode

apreciar o controle constitucional sob o aspecto jurisdicional.

Misto - assim é porque é exercido tanto sob o âmbito difuso quanto pelo concentrado,

tanto pelo órgão jurisdicional quanto pelo político (abstrato).

Em regra, cabe ao órgão jurisdicional o papel repressivo, já a prevenção ao órgão

político, porém aos dois órgãos há exceções.

5) Sistemas de controle de constitucionalidade:

5.1.) Sistema Difuso

No Brasil o sistema é misto, ou seja, difuso e concentrado. Possui sua origem do modelo

americano, criado em 1803, onde possuía como premissa a decisão arbitrária e

inafastável.

Inspirado nesse modelo, a constituição de 1891 iniciou o controle de

constitucionalidade. A partir daí qualquer juiz monocrático, ou tribunal (órgão

jurisdicional colegiado), poderia deixar de aplicar a norma no caso concreto.

Esse sistema é exercido no âmbito do caso concreto tendo, portanto natureza subjetiva,

por envolver interesses de autor e réu. Assim, permite a todo e qualquer juiz analisar o

controle de constitucionalidade. Este por sua vez, não julga a inconstitucionalidade de

uma lei ou ato normativo, apenas aprecia a questão e deixa de aplica-la por achar

inconstitucional àquele caso específico que está julgando.

Exemplo: “A” entra com uma ação de pretensão contra o Estado em face de “B” de

reintegração de posse, baseada em uma lei “x”, onde “B”, por sua vez entra com uma

resistência alegando que aquela lei que “A” utilizou como recurso é considerada

inconstitucional.

O juiz irá apreciar a questão pré-judicial, que é possessória, sem a qual não há como dá

a sua sentença final. Assim, após essa fase, o juiz faz o julgamento do mérito do processo

Page 17: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

17

como procedente ou improcedente a ação. Caso entenda como improcedente, afasta a

aplicação da lei por considerar inconstitucional no caso concreto e fundamenta a sua

sentença sob a alegação de que a lei pela qual “A” utilizou não procede, a título de ser

prejudicial na apreciação do mérito daquele caso específico.

Dessa forma, o juiz aplicou o Dogma da Nulidade da lei inconstitucional, a qual tem por

base que, caso o juiz venha a reconhecer que uma lei é inconstitucional, não cria um

novo Estado, apenas declara a inconstitucionalidade no caso concreto. A norma já é

inconstitucional desde o início da sua criação e o juiz apenas irá deixar de aplica-la.

O artigo 97 da CF consagra uma cláusula chamada de cláusula de reserva de plenário,

onde nela especifica que ao ser declarada a inconstitucionalidade de lei ou ato

normativo, esta deve ser feita através da maioria absoluta da totalidade dos membros do

tribunal, sob pena de nulidade da decisão.

Deve ser observada também a regra do “Full Bench”, apenas nos casos de

inconstitucionalidade da lei, onde toda vez que um tribunal observar a

inconstitucionalidade da norma, se o órgão for colegiado, a decisão também será

colegiada.

No sistema difuso, tanto autor quanto réu pode propor uma ação de

inconstitucionalidade, pois o caso concreto é inter partes. Assim, a abrangência da

decisão que será sentenciada pelo juiz, é apenas entre as partes envolvidas no processo.

Conseqüentemente terá efeito retroativo, pois foi aplicado o dogma da nulidade.

Há a possibilidade de que a decisão proferida em um caso concreto tenha a sua

abrangência ampliada, passando a ser oponível contra todos (eficácia erga omnes). A

constituição prevê que poderá o Senado Federal suspender a execução de lei (municipal,

estadual ou federal), declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo

Tribunal Federal. Tal atribuição prevista no artigo 52, X, CF, permitirá, portanto, a

ampliação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade originária de casos

concretos (via difusa). A suspensão da execução será procedida por meio de resolução

do Senado federal, que é provocado pelo STF, cujos efeitos vincularão a todos apenas

após a publicação da resolução. Nesses casos o efeito é irretroativo, pois é para

terceiros.

Cabe ressaltar que o Senado Federal entra nesses casos para tornar essas decisões ex

nunc, ou seja, fazer com que seus efeitos passem a valer erga omnes, a partir de sua

publicação.

Page 18: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

18

A interpretação conforme a constituição, é uma técnica de interpretação das leis

inconstitucionais, utilizada em razão do princípio da presunção de constitucionalidade

das leis e atos normativos. Este princípio faz com que a declaração de

inconstitucionalidade seja uma medida excepcional, pois não cabe ao juiz deixar de

aplicar uma lei por mera suspeita, sem que haja robusta comprovação de sua

incompatibilidade vertical.

Portanto, antes de declarar a inconstitucionalidade de uma lei, deverá o julgador aferir

se existe alguma forma de interpreta-la que seja compatível com a constituição. Pra

tanto deve existir o chamado “espaço de decisão”, ou seja, deve ser configurada a

existência de mais de uma forma de interpretação do dispositivo legal e que uma delas

seja compatível com a Carta Magna. Essa interpretação aplica-se tanto ao controle

difuso, como ao concentrado.

5.2.) Sistema Concentrado

As ações diretas no sistema concentrado tem por mérito a questão da

inconstitucionalidade das leis ou atos normativos federais e estaduais.

Não se discuti nenhum interesse subjetivo, por não haver partes (autor e réu) envolvidas

no processo. Logo, ao contrário do sistema difuso, o sistema concentrado possui

natureza objetiva, com interesse maior de propor uma ADIN para discutir se uma lei é

ou não inconstitucional e na manutenção da supremacia constitucional.

Sabe-se que o Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário e o

guardião da Constituição Federal, e o Superior Tribunal de Justiça é o guardião da

Constituição Estadual, assim cada um julga a ADIN dentro do seu âmbito. Se houver

violação da CF e CE, respectivamente, quem irá julgar é o STF e o STJ.

Só se propõe a inconstitucionalidade, quem tiver legitimidade para isso (art. 103, CF),

quando a lei ou ato normativo violar diretamente a Constituição Federal, ou Estadual.

Casos em que não cabe a ADIN:

Leis anteriores a atual constituição- se propõe em casos de leis contemporâneas a

atual Constituição. É permitido a análise em cada caso concreto da compatibilidade

ou não da norma editada antes da atual constituição com seu texto. É o fenômeno da

recepção, quando se dá uma nova roupagem formal a uma lei do passado que está

entrando na nova CF.

Contra atos administrativos ou materiais.

Page 19: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

19

Contra leis municipais

Quem estiver com legitimidade para propor uma ADIN, não pode pedir a sua

desistência, pois a mesma é regida pelo princípio da indisponibilidade, nem cabe a sua

suspensão. No controle concentrado também não cabe a intervenção de terceiros.

O STF tem o feito da “Ampla Cognição”, ou seja, amplo conhecimento para julgar o

processo. Não está limitado aos fundamentos do requerente (pedido mediato), está

apenas ao pedido imediato.

Ações que fazem parte do Sistema Concentrado

1) Ação declaratória de inconstitucionalidade (ADIN):

a) Genérica

Tem por objetivo retirar do ordenamento jurídico a lei contemporânea estadual ou

federal, que seja incompatível com a CF, com a finalidade de obter a invalidade dessa

lei, pois relações jurídicas não podem se basear em normas inconstitucionais. Dessa

maneira fica garantida a segurança das relações.

Fica a cargo do Supremo Tribunal Federal, a função de processar e julgar,

originariamente, a ADIN de lei ou ato normativo federal ou estadual.

Tem legitimidade para propor uma ADIN, todos aqueles que estão prescritos no artigo

103 CF. O STF exige a chamada “Relação de Pertinência Temática”, que nada mais é do

que a demonstração da utilidade na propositura daquela ação, interesse, utilidade e

legitimidade para propô-la. Isso é usado nos casos em que os legitimados não são

universais, que estão no artigo 103, incisos IV, V e IX.

Não é a mesa do Congresso Nacional quem propõe a ADIN, e sim a Mesa da Câmara e

do Senado.

A propositura de uma ação desse tipo, não está sujeita a nenhum prazo de natureza

prescricional ou de caráter decadencial, pois de acordo com o vício imprescritível, os

atos constitucionais não se invalidam com o passar do tempo.

O procedimento que uma ação direta de inconstitucionalidade deve seguir está prescrito

na Lei No 9.868/99.

Page 20: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

20

Uma vez declarada a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo em discussão, a

decisão terá os seguintes efeitos:

Ex tunc, retroativo como conseqüência do dogma da nulidade, que por ser

inconstitucional, torna-se nula, por isso perde seus efeitos jurídicos.

Erga omnes, será assim oponível contra todos.

Vinculante, relaciona-se aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública

Federal, Estadual e Municipal. Uma vez decida procedente a ação dada pelo STF,

sua vinculação será obrigatória em relação a todos os órgãos do Poder Executivo e

do Judiciário, que daí por diante deverá exercer as suas funções de acordo com a

interpretação dada pelo STF. Esse efeito vinculante aplica-se também ao legislador,

pois esse não poderá mais editar nova norma com preceito igual ao declarado

inconstitucional.

Represtinatório, em princípio vai ser restaurada uma lei que poderia ser revogada.

São relacionada com a matéria que foi discutida a declaração de inconstitucionalidade

de uma determinada lei. O STF não pode ir além da matéria discutida. Logo, todo

julgado está limitado ao pedido que foi feito ao juiz. Dessa maneira, a decisão irá versar

apenas sobre a ADIN. Essa decisão poderá ser através de sentença (decisão de um juiz

monocrático), ou acórdão (decisão do tribunal colegiado).

Quem será atingido pela decisão do STF são aqueles que participaram da relação

jurídica processual: o Poder Executivo, legislativo, Judiciário, STF e também toda a

sociedade.

Depois de formada a decisão da coisa julgada, sua eficácia será preclusiva, ou seja,

aquela questão uma vez decidida não poderá ser mais discutida. A decisão judicial é uma

lei entre as partes.

O juiz não pode desconsiderar a decisão dada como inconstitucional pelo STF, e sim

passar a cumpri-la deixando de aplicar. Quando o juiz insistir em aplicar a lei já decidida

como inconstitucional, ocorrerá a reclamação constitucional, que é um instrumento que

busca a preservação da competência e garantir a autoridade da decisão do STF (art.102

CF I).

Conseqüências da declaração de inconstitucionalidade de uma lei nos casos julgados:

ocorre o ajuizamento de ação decisória, dentro do prazo de dois anos. Após esse período

se dá a coisa soberanamente julgada (pretensão bem maior de imutabilidade da

decisão). Após ter o título judicial, as partes podem ajuizar outro processo embargando

Page 21: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

21

(contestando) a decisão.

Artigo 26 lei 9868/99 - Embargo declaratório é um meio de impugnação de decisão

judicial “endo processual” (dentro do processo). Não tem a finalidade de reformar ou

invalidar a decisão judicial de um julgado, e sim buscar esclarecer algo que não decisão

dada pelo STF ficou omisso, contraditório ou obscuro. Poderá ter um efeito modificativo

(infringente), quando for o caso de omissão que possa resultar na modificação de um

julgado.

b) Por omissão

A Constituição Federal determinou que o Poder Público competente adotasse as

providências necessárias em relação a efetividade de uma determinada norma

constitucional. Dessa maneira, quando esse poder cumpre com a obrigação que lhe foi

atribuída pela CF, está tendo uma conduta positiva, garantindo a sua finalidade que é a

de garantir a aplicabilidade e eficácia da norma constitucional.

Assim, quando o Poder Público deixa de regulamentar ou criar uma nova lei ou ato

normativo, ocorre uma inconstitucionalidade por omissão. Resulta então, da inércia do

legislador, falta de ação para regulamentar uma lei inconstitucional. Essa conduta é tida

como negativa. E é a incompatibilidade entre a conduta positiva exigida pela

Constituição e a conduta negativa do Poder público omisso, que resulta na chamada

inconstitucionalidade por omissão.

Os mecanismos usados para evitar a inércia do Poder Público são o Mandado de

Injunção na via difusa e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão na via

concentrada.

Os legitimados para esse tipo de ADIN são os mesmos da ADIN genérica e o

procedimento a ser seguido também.

Ao declarar a ADIN por omissão, o STF deverá dar ciência ao Poder ou órgão

competente para, se for um órgão administrativo, adotar as providências necessárias em

30 dias. Caso seja o Poder Legislativo, deverá fazer a mesma coisa do órgão

administrativo, mas sem prazo preestabelecido. Uma vez declara a inconstitucionalidade

e dada a ciência ao Poder Legislativo, fixa-se judicialmente a ocorrência da omissão,

com seus efeitos.

Os efeitos retroativos da ADIN por omissão são ex tunc e erga omnes, permitindo-se sua

Page 22: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

22

responsabilização por perdas e danos, na qualidade de pessoa de direito público da

União Federal, se da omissão ocorrer qualquer prejuízo.

Dessa maneira a a da decisão nesse tipo de ADIN tem caráter obrigatório ou

mandamental, pois o que se pretende constitucionalmente é a obtenção de uma ordem

judicial dirigida a outro órgão do Estado.

Não cabe a concessão de medida liminar nos casos de ADIN por omissão.

c) Interventiva

A representação interventiva é uma medida excepcionalíssima prevista no artigo 34, VII

da CF e fundamenta-se na defesa da observância dos Princípios Sensíveis. São assim

denominados, pois sua inobservância pelos Estados-membros ou Distrito Federal no

exercício de suas competências, pode acarretar a sanção politicamente mais grave que é

a intervenção na autonomia política.

Dessa maneira, toda vez que o Poder Público, no exercício de sua competência venha a

violar um dos princípios sensíveis, será passível de controle concentrado de

constitucionalidade, pela via de ação interventiva.

Quem decreta a intervenção é o chefe do Poder Executivo (Presidente da República),

mas depende da requisição do Supremo Tribunal Federal, o qual se limitará a suspender

a execução do ato impugnado, se essa medida bastar ao restabelecimento da

normalidade.

Esse tipo de ADIN pode ser espontânea ou provocada. A espontânea é aquela que é

decretada por vontade própria. Já a provocada é provocada por algum poder ou órgão.

A representação interventiva é uma ação que possui uma natureza (finalidade) jurídico-

político. Ao ser violado o princípio sensível pelo governo e o STF processar e julgar

procedente a representação interventiva, o Presidente da República fica obrigado a

expedir o decreto interventivo, sustando os efeitos da lei, para que deixe de utilizá-la por

ser inconstitucional.

Assim, declara a inconstitucionalidade formal ou material da lei ou ato normativo

estadual. Essa é a dimensão jurídica. Caso o governo insista, o Presidente vai expedir

um novo decreto afastando o governador do cargo. Com isso, decreta a intervenção

federal no Estado-membro ou Distrito Federal, constituindo-se um controle direto, para

Page 23: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

23

fins concretos. Essa a dimensão política.

Na ADIN por intervenção, não é viável a concessão de liminar.

A legitimidade para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade por

intervenção, está prevista na CF, artigo 36, III.

Essa espécie de ADIN é provocada por requisição. Uma vez decretada a intervenção,

não haverá controle político, pois a CF exclui a necessidade de apreciação pelo

Congresso Nacional. Sua duração, bem como os limites, serão fixados no Decreto

presidencial, até que ocorra o retorno da normalidade do pacto federativo.

2) Ação declaratória de constitucionalidade (ADC):

A ação declaratória de constitucionalidade é uma modalidade de controle por via

principal, concentrado e abstrato, cuja finalidade da medida é muito clara : afastar a

incerteza jurídica e evitar as diversas interpretações e contrastes que estão sujeitos os

textos normativos.

Há casos em que câmaras ou turmas de um mesmo tribunal firmam linhas

jurisprudenciais contrárias. Isso tudo envolve um grande número de pessoas, onde por

essa razão se faz necessário uma segurança jurídica acerca das razões de interesses

públicos, a qual é estabelecida pela ação direta de constitucionalidade, para assim

tornar mais rápida a definição do Poder Judiciário.

De acordo com o artigo 102 da CF, cabe ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar

a ação declaratória constitucional.

Em relação a legitimidade para a propositura dessa ação a Carta Magna elenca em seu

artigo 103 e também no parágrafo 4.. Todos os agentes políticos e órgãos previstos no

dispositivo constitucional possuem legitimação universal e extraordinária, bem como

capacidade postulatória.

Apenas poderá ser objeto desse tipo de ação, lei ou ato normativo federal, com o pedido

de que se reconheça a compatibilidade entre determinada norma infra constitucional e a

Constituição.

Uma vez proposta a ação declaratória, não caberá mais desistência e nem intervenção

de terceiros. A decisão será irrecorrível em todos os casos, admitindo-se apenas

Page 24: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

24

interposição de embargos declaratórios.

A declaração de constitucionalidade tem eficácia contra todos e efeito vinculante em

relação aos órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública federal, estadual e

municipal.

Enfim, uma norma que era válida agora mais do que nunca continua sendo, apenas

tendo sido reafirmada sua força impositiva.

3) Argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF):

A argüição de descumprimento de preceito fundamental é uma ação constitucional, pois

está prevista na Constituição Federal que funciona como parte integrante e

complementar do sistema concentrado.

Seu texto vem previsto na CF, artigo 102, parágrafo 1o e foi regulamentada pela lei no

9882/99.

De acordo com o que reza a lei 9882/99, em seu parágrafo 1o, a ADPF terá a finalidade

de “evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do poder

público”.Pode se entender que preceitos fundamentais são decisões políticas e rol de

direitos e garantias fundamentais.

Assim, a ADPF tem duas finalidades que são a preventiva e repressiva, de evitar ou

reparar lesão não só a preceito fundamental, mas também de ato do poder público seja

este normativo ou administrativo.

A doutrina se utiliza duas espécies de ADPF, que são:

a) Argüição autônoma- pode ser inserida no artigo 1o da lei em questão, por ter como

objetivo prevenir ou reprimir lesão a algum preceito fundamental, resultante de ato do

poder público. Logo, essa espécie tem como pressuposto a inexistência de qualquer

outro tipo de meio eficaz que possa evitar a lesividade.

b) Argüição incidental- essa espécie enquadra-se no inciso I do artigo e lei

anteriormente citados. A argüição incidental, ou por equiparação em relação ao seu

objeto, é mais restrita e exigente. Isso se justifica pelo fato de que para propô-la deve

existir controvérsia de extrema relevância a lei ou ato normativo federal, estadual, ou

municipal e tam bem as anteriores a atual constituição.

Page 25: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

25

Nas duas espécies de ADPF, compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar a

ação de acordo com os procedimentos corretos. Essa ação é proposta perante o STF, o

qual irá apreciar a questão para posteriormente, caso ache procedente, processar e

julgar.

De acordo com o artigo 2o, I da lei, pode ajuizar uma ADPF os mesmos legitimados para

a ADIN, onde estes são os que estão previstos no artigo 103 da CF. Os legitimados têm

que se ater a alguns requisitos como capacidade postulatória, legitimação universal e a

relação de pertinência temática.

O teor do princípio da subsidiariedade (que é visto por muitos como uma regra) está

inserido no artigo 4o parágrafo 1o da lei 9882/99. Desse artigo pode-se entender que ele

possui requisitos extremamente específicos, que torna essa regra tão importante que

com a ausência dele, não poderia ser proposta uma ADPF.

Como regra geral, o juízo da subsidiariedade, há de ter em vista a verificação da

exaustão de todos os meios eficazes de afastar a lesão no âmbito judicial.

É através desse princípio que torna-se possível a utilização de ADPF, quando não existir

nenhum outro meio de caráter objetivo, apto a acabar, de uma vez por todas, a

controvérsia constitucional relevante, de forma ampla, imediata e geral.

O fato primordial é a solução que esse princípio é capaz de produzir, por ter uma

natureza objetiva, seu caráter é vinculante e contra todos.

Com isso, a subsidiariedade desse princípio deve ser invocada para casos estritamente

objetivos. Onde a realização jurisdicional possa ser um instrumento disponível capaz de

sanar, de maneira eficaz a lesão causada a direitos básicos, de valores essenciais e

preceitos fundamentais contemplados no texto da CF.

Referência bibliográfica

Barroso, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro:

exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 1 ed. São Paulo:

Saraiva, 2004.

Page 26: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

26

LEGALIZANDO A JURISPRUDÊNCIA – BREVES COMENTÁRIOS À LEI N°

9.868/99 - PARTE I

Segundo informações do Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário – BNDPJ -, da

data da promulgação da Constituição de 1988 até o dia 12 de novembro de 1999 foram

distribuídas 2.100 (duas mil e cem) ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo

Tribunal Federal, sendo que ainda estão em tramitação 1.093 (mil e noventa e três). A

questão ganha contornos mais relevantes quando percebemos que, no mesmo período, o

nosso Congresso Nacional produziu pouco mais de 2.200 (duas mil e duzentas) leis

ordinárias. Ainda que computemos nessa produtividade legislativa as dezenas de leis

complementares e, ainda, as leis estaduais estes dados não deixam dúvidas de que algo

de muito sério acontece com a qualidade da leis produzidas por nosso parlamento. E não

termina aí. No decorrer do ano de 1999 foram distribuídos ao Supremo Tribunal Federal

quase 57.000 (cinqüenta e sete mil) processos novos. Sendo que foram julgados (mérito

+ liminar), por apenas onze Ministros, quase 49.000 (quarenta e nove mil) feitos.

Em um estudo comparativo tais dados assombrariam qualquer país que pretenda

merecer o título de democrático. Basta observar as estatísticas da Corte Constitucional

Alemã ou mesmo da Suprema Corte Americana para constatar que fiscalização de

constitucionalidade (abstrata e incidental) no Brasil ganha uma relevância estupenda.

Em essência cabe ao Poder Judiciário, este último bastião da democracia em nosso país,

rechaçar as sucessivas tentativas de subverter-se a ordem constitucional em nome de

uma pretensa "salvação nacional".

Com o advento da Lei n° 9.868, de 10 de novembro de 1999, inaugurou-se um novo

capítulo na história do controle da constitucionalidade das leis em nosso país. Correndo

o risco inerente daqueles que ousam analisar um sistema recém criado achamos por

bem, desde já, ressaltar alguns pontos interessantes deste inovador diploma legal.

Miguel Reale já chamava a atenção para o fato de que "a nossa jurisprudência tem

obedecido a uma crescente adequação ao mundo dos fatos, segundo o ensinamento

inesquecível de Teixeira de Freitas, em 1860, de que ‘a vida real não existe para os

sistemas, pelo contrário os sistemas devem ser feitos para a vida real’, é prevalecente,

não resta dúvida, o elemento normativo ou técnico dogmático em nossa concepção de

Direito". Inegável, portanto, seja a jurisprudência uma das fontes mais respeitáveis do

Direito, tendo a seu favor a possibilidade de alteração e conseqüente evolução de forma

mais célere que a lei formal. Essa introdução é necessária para caracterizar o enfoque

Page 27: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

27

desta nova legislação que, ao que parece, pretende "legalizar" a jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal a respeito da fiscalização abstrata.

Não pretendemos, com este breve ensaio, engrossar as fileiras do que Gilmar Ferreira

Mendes (autor do projeto que originou esta lei) denomina de "inconstitucionalistas de

plantão", mas, antes, temos o intuito de trazer à lume algumas questões a fim de

suscitar o debate que certamente advirá.

Passemos, pois, aos comentários de alguns dos seus dispositivos.

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de

inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo

Tribunal Federal.

Iremos perceber que a Lei equipara principiologicamente e de uma vez por todas a

tradicional ação direta de inconstitucionalidade com a inovadora ação declaratória de

constitucionalidade. Aproxima tanto que nos leva a considerar se não seria mais

oportuno fundir-se os dois modelos, desde que se mantivesse a legitimação ativa

ampliada para ambos.

Art. 2º Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito

Federal;

V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Parágrafo único. (VETADO)

Page 28: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

28

Inicialmente percebe-se a inclusão de legitimados ativos especiais que, originariamente,

não constam expressamente do artigo 103, caput da Constituição. O Governador do

Distrito Federal e a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal foram incluídos em

virtude de precedentes jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal autorizarem a

dilatação desse rol de legitimados ativos para propositura de ação direta de

inconstitucionalidade e de ação de inconstitucionalidade por omissão.

O parágrafo único vetado afirma que "As entidades referidas no inciso IX, inclusive as

federações sindicais de âmbito nacional, deverão demonstrar que a pretensão por elas

deduzida tem pertinência direta como os seus objetivos institucionais." Na verdade o

Presidente da República pretendia vetar apenas a expressão "federações sindicais", mas

como não é admissível o veto a palavra isolada se viu obrigado a vetar todo o dispositivo.

Reconhecendo inclusive que, com isso, contraria a jurisprudência, já consagrada, do

Supremo Tribunal Federal, que exige dos legitimados ativos especiais a demonstração

da pertinência temática como pressuposto de admissibilidade da ação direta de

inconstitucionalidade.

Art. 3º A petição indicará:

I - o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do

pedido em relação a cada uma das impugnações;

II - o pedido, com suas especificações.

Parágrafo único. A petição inicial, acompanhada de instrumento de procuração, quando

subscrita por advogado, será apresentada em duas vias, devendo conter cópias da lei ou

do ato normativo impugnado e dos documentos necessários para comprovar a

impugnação.

Resta caracterizado, exatamente como já acontecia no âmbito jurisprudencial, a

necessidade de advogado regularmente estabelecido nos autos. De todos os legitimados

ativos (universais e especiais) apenas o Procurador Geral da República não precisará

fazer-se representar por advogado. Interessante a questão de o Advogado Geral da

União postular em nome do Presidente da República e, mais adiante, ser ouvido com a

obrigação de defender a constitucionalidade do texto impugnado. Ainda que se trate de

um processo abstrato esta situação esdrúxula deve ser colmatada pela jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal. Como já conseguimos perceber, por mais que tente, a lei não

consegue sufocar a criatividade da jurisprudência.

Page 29: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

29

Art. 4º A petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente

serão liminarmente indeferidas pelo relator.

Parágrafo único. Cabe agravo da decisão que indeferir a petição inicial.

Em sede de ação direta de inconstitucionalidade o Supremo Tribunal Federal passa a

admissibilidade do pedido por três crivos genéricos: a) legitimação ativa; b)

demonstração de pertinência temática (apenas exigida aos legitimados ativos especiais;

e c) o objeto juridicamente possível (normas constitucionais originárias, leis anteriores à

Carta de 1988, atos tipicamente regulamentares, leis municipais, etc. não podem figurar

como objeto de uma Adin). Portanto, entende-se inepta a petição inicial não apenas pela

inobservância dos pressupostos do artigo anterior, mantém-se aqui, como antes, a

liberdade de interpretação do alcance da norma.

Art. 5º Proposta a ação direta, não se admitirá desistência.

Parágrafo único. (VETADO)

Dada a generalidade do processo o Supremo Tribunal Federal já tinha firmado

entendimento no sentido do descabimento da desistência da ação, indeferindo sempre

tais requerimentos, com fundamento no artigo 169, § 1º do seu Regimento Interno:

"Proposta a representação, não se admitirá a desistência, ainda que afinal o Procurador

Geral se manifeste pela sua improcedência". O artigo 16 da lei também exclui a

desistência em sede de ação declaratória de constitucionalidade.

Art. 6º O relator pedirá informações aos órgãos ou às autoridades das quais emanou a

lei ou o ato normativo impugnado.

Parágrafo único. As informações serão prestadas no prazo de trinta dias contado do

recebimento do pedido.

Consideramos que este dispositivo não está em conflito com o artigo 170, § 2° do RISTF,

quando estabelece que tais "informações serão prestadas no prazo de trinta dias

contados do recebimento do pedido, podendo ser dispensadas em caso de urgência, pelo

Relator, ad referendum o Tribunal" (gn).

Art. 7º Não se admitirá intervenção de terceiros no processo de ação direta de

inconstitucionalidade.

§ 1o (VETADO)

Page 30: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

30

§ 2º O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos

postulantes, poderá, por despacho irrecorrível, admitir, observado o prazo fixado no

parágrafo anterior, a manifestação de outros órgãos ou entidades.

A respeito dos poderes do relator já há jurisprudência corrente no Supremo Tribunal

Federal no sentido de que poderá exercer o controle prévio dos pressupostos

processuais e condições da ação, podendo arquivar ou negar seguimento a pedido ou

recurso manifestamente incabível, ou, improcedente e, ainda, contrariar jurisprudência

do Tribunal. Em uma análise perfuntória parece que o caput encontra-se em contradição

como os parágrafos. Ora, se a regra geral admite exceções de tal magnitude então seria

melhor o silêncio do legislador. Permaneceria (como tudo indica que vai permanecer), a

idéia de discricionaridade do relator devidamente referendada a posteriori pelo Plenário

como, aliás, já é entendimento tradicional no Tribunal. Decididamente reduzir os

poderes do relator implica em tornar mais lento o processo de controle, contrariando o

principal objetivo de sua existência.

Art. 8º Decorrido o prazo das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-

Geral da União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se, cada

qual, no prazo de quinze dias.

O Advogado Geral da União atuará nas ações diretas de inconstitucionalidade como uma

espécie de defensor do Princípio da Presunção de Constitucionalidade das Leis. Sua

função limita-se a lembrar ao Supremo Tribunal Federal que toda lei, ao menos em tese,

nasce compatível, material e formalmente, com a Constituição. Tem prevalecido o

entendimento de que não seria possível ao Advogado Geral da União manifestar-se pela

inconstitucionalidade da lei, concordando, portanto, com o autor da ação direta de

inconstitucionalidade. Afirma Alexandre de Moraes que ... "como curador da norma

infraconstitucional, o Advogado Geral da União está impedido constitucionalmente de

manifestar-se contrariamente a ela, sob pena de frontal descumprimento da função que

lhe foi atribuída pela própria Constituição Federal, e que configura a única justificativa

de sua função processual, neste caso".

Tão logo o Advogado Geral da União conclua a sua tarefa, será aberto vista dos autos da

ação direta para o Procurador Geral da República que terá mais quinze dias para se

manifestar por escrito nos autos..

A oitiva do Procurador Geral da República tem fundamento no artigo 103, § 1º da

Constituição da República. Funciona como custos legis devendo pronunciar-se a respeito

da controvérsia constitucional, sendo certo que pode arregimentar argumentos a favor

Page 31: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

31

do autor ou do Advogado Geral da União indistintamente. Funciona como elemento

catalizador da decisão do Supremo Tribunal Federal.

Note-se que existe a possibilidade de o Procurador Geral da República ser

concomitantemente autor (art. 103, IV) e fiscal (art. 103, § 1º) em determinada ação

direta. Tal hipótese é majoritariamente admitida pelo Pretório Excelso em sua

jurisprudência.

O dispositivo apenas teve o mérito de estabelecer um prazo de quinze dias corridos e

sucessivos para cada uma das manifestações. Deve-se entender como termo a quo do

prazo a data do recebimento dos autos. Todavia a lei não prevê uma sanção para o

descumprimento deste ou de qualquer outro prazo por ela estabelecido.

Da Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade

Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida

por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art.

22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo

impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias.

§ 1o O relator, julgando indispensável, ouvirá o Advogado-Geral da União e o

Procurador-Geral da República, no prazo de três dias.

§ 2o No julgamento do pedido de medida cautelar, será facultada sustentação oral aos

representantes judiciais do requerente e das autoridades ou órgãos responsáveis pela

expedição do ato, na forma estabelecida no Regimento do Tribunal.

§ 3o Em caso de excepcional urgência, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar sem

a audiência dos órgãos ou das autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo

impugnado.

Uma das inovações mais significativas no sistema de controle de constitucionalidade

sem dúvida foi a possibilidade de concessão de medidas liminares no controle abstrato.

Não existe dúvida que a concessão de uma medida liminar em uma ação direta de

inconstitucionalidade produz significativa alteração no ordenamento jurídico. Funciona

como uma espécie de antibiótico emergencial a fim de evitar que o "vírus" detectado

pelo sistema imunológico do organismo estatal continue a se reproduzir na corrente

sanguínea do Estado, regulando de forma metabolicamente inconstitucional inúmeras

relações jurídicas.

Page 32: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

32

Desta forma, a decisão concessiva de cautelar em Adin (art. 102, I, p da CR) há de ser

dotada de eficácia geral, uma vez que trata de suspender a aplicação de um ato

normativo até que o Supremo Tribunal Federal apresente à nação seu pronunciamento

definitivo. Insta, porém, observar que tais efeitos somente se produzirão com a

publicação em jornal autenticado da decisão liminar em tela.

Assim, não restam dúvidas que, concedida a liminar, se impede a aplicação da lei por ela

vitimada, inclusive em casos pendentes de apreciação, quer no âmbito administrativo

quer nas instâncias judiciais. É verdadeira medida de caráter legislativo e, como tal,

condiciona os poderes da República ao seu talante. Daí sua conseqüência mais imediata:

a suspensão de todos os processos judiciais que tenham como objeto a aplicação da lei

que teve sua vigência suspensa pela decisão cautelar. Ressalte-se que falamos em

suspensão e não arquivamento sumário dos processos atingidos pela medida do

Supremo.

Art. 11. Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em

seção especial do Diário Oficial da União e do Diário da Justiça da União a parte

dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo solicitar as informações à

autoridade da qual tiver emanado o ato, observando-se, no que couber, o procedimento

estabelecido na Seção I deste Capítulo.

§ 1o A medida cautelar, dotada de eficácia contra todos, será concedida com efeito ex

nunc, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa.

§ 2o A concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso

existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário.

Inicialmente cumpre perceber que o parágrafo primeiro confirma uma tendência

jurisprudencial consagrada pelo Supremo Tribunal Federal. Principalmente a partir de

1995 as cautelares são concedidas com efeitos de anulabilidade ultrativa, ou seja, ex

nunc. Agora, por imposição legal, a anulabilidade retrotativa, ex tunc deve constar

expressamente do acórdão.

Mas, sem dúvida, é o segundo parágrafo que mais estranheza causa. Tradicionalmente o

Direito brasileiro admite a repristinação apenas quando expressamente determinada,

pelo texto legal passa-se a presumir os efeitos repristinatórios. Não obstante o

entendimento de parte da doutrina de que a lei inconstitucional não produz efeitos,

desde a origem, repristinados os atos por ela revogados, a repristinação em nosso

sistema, por ser excepcional, dependia até então de expressa referência do Supremo

Page 33: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

33

Tribunal Federal. Inegável o caráter de praticidade do dispositivo analisado vez que

pretende, com a reentrada em vigor da norma revogada, evitar um vácuo jurídico que,

eventualmente, prejudicaria as relações jurídicas concretas mais do que a existência de

uma regulamentação inconstitucional.

Portanto, a suspensão da lei por medida cautelar implica, sempre que possível, na

restauração da vigência da lei anterior se acaso existir. Seria mesmo tormentoso se a

cautelar criasse uma espécie de vácuo jurídico. Em outras palavras, o efeito desse

"antibiótico emergencial" não se limita a "incubar o vírus", vai além, restaura (ao menos

temporariamente) os sistemas prejudicados pelo distúrbio metabólico.

Desta forma, podemos perceber que a concessão de medida liminar nas ações diretas de

inconstitucionalidade, além de suspender as decisões administrativas e judiciais que

envolvam a aplicação da lei questionada, também repristina provisoriamente a

legislação anterior acaso existente.

Por outro lado, esse caráter repristinatório tácito nos causará um problema técnico

quando o objeto da ação direta de inconstitucionalidade for uma medida provisória.

Como sabemos as medidas provisórias não tem poder revogativo sobre as leis ordinárias

anteriores, acaso existentes. Apenas a conversão de medida provisória em lei ordinária

tem o condão de revogar a lei anterior. Tanto é verdade que a boa doutrina, não entende

produzir efeitos repristinatórios a rejeição expressa do Congresso Nacional a

determinada medida provisória. Isso porque a medida provisória não teria o papel de lei

revogadora, e, portanto, a sua rejeição, por sua vez, não funcionaria como lei

repristinante. Pois bem, na hipótese de ser concedida uma cautelar para suspender a

eficácia de uma medida provisória como conceder-lhe efeitos repristinatórios se a lei

anterior, acaso existente, não foi revogada? Ousamos oferecer duas soluções possíveis

para o problema: ou não reconheceremos o instituto da repristinação da cautelar,

afastando o postulado de presunção de constitucionalidade da lei nova (o que seria, em

essência, um absurdo jurídico!); ou, por outro lado, passaremos a entender que a

medida provisória efetivamente revoga a lei que lhe é anterior. A primeira solução

implica na subversão de todo sistema constitucional brasileiro retirando da nossa Carta

a supremacia formal sobre as demais leis e, por via de conseqüência, extinguindo o

controle de constitucionalidade que é justamente o objeto da lei ora comentada. A

segunda solução, ainda que menos pior, não é igualmente confortável. Posto que coloca

por terra um princípio basilar do Direito segundo o qual uma espécie normativa apenas

tem o poder de revogar - no sentido mais técnico do termo - espécie normativa idêntica,

todo o resto nada mais seria do simples suspensão de eficácia.

Page 34: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

34

Sem dúvida Gilmar Ferreira Mendes buscou inspiração no sistema constitucional

austríaco quando elaborou estes parágrafos. Na Áustria a decisão de

inconstitucionalidade tem eficácia ex nunc, salvo se o tribunal estabelecer prazo para

entrada em vigor da cassação (Constituição austríaca, art. 140, § 5°), e a decisão que

proclama a inconstitucionalidade poderá repristinar o diploma pela lei julgada, após,

inconstitucional (art. 140, § 6° da mesma Constituição), propondo-se evitar a situação de

vácuo legislativo, sendo a repristinação determinada pelo Tribunal competente. E tudo

lá funciona muito bem, obrigado. Pelo simples fato de que os austríacos vivem felizes

nos seus bosques encantados (e encantadores) porque não tem o desprazer de conviver

com essa aberração genético-jurídica que surge de uma experiência frankesteiniana, ou

seja, o cruzamento de um instituto parlamentarista com uma Constituição

presidencialista: a reedição de medidas provisórias.

LEGALIZANDO A JURISPRUDÊNCIA – BREVES COMENTÁRIOS À LEI N° 9.868/99 - PARTE II

Continuando a análise dos dispositivos da Lei, temos, relativamente à ação declaratória

de constitucionalidade:

CAPÍTULO III

DA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE

Seção I

Da Admissibilidade e do Procedimento da

Ação Declaratória de Constitucionalidade

Art. 13. Podem propor a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo

federal:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa da Câmara dos Deputados;

III - a Mesa do Senado Federal;

IV - o Procurador-Geral da República.

Page 35: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

35

A lei, como só poderia acontecer, manteve os mesmos legitimados ativos universais já

previstos no texto constitucional (artigo 103, § 4° da Constituição) com competência

para provocar o controle abstrato nessa nova modalidade. A legitimação ativa

pluralizada, contudo, é bem menos abrangente do que ocorre na ação direta de

inconstitucionalidade e na ação de inconstitucionalidade por omissão.

Art. 14. A petição inicial indicará:

I - o dispositivo da lei ou do ato normativo questionado e os fundamentos jurídicos do

pedido;

II - o pedido, com suas especificações;

III - a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto

da ação declaratória.

Parágrafo único. A petição inicial, acompanhada de instrumento de procuração, quando

subscrita por advogado, será apresentada em duas vias, devendo conter cópias do ato

normativo questionado e dos documentos necessários para comprovar a procedência do

pedido de declaração de constitucionalidade.

Além dos requisitos formais já previstos no artigo 3° desta Lei, surge, para a ação

declaratória de constitucionalidade, mais um que consagra da jurisprudência do STF: a

demonstração, por parte do agente provocador, da existência de controvérsias judiciais

em número suficientemente relevante para justificar a provocação dessa modalidade

fiscalização abstrata. Ora, se a presunção é a de constitucionalidade da lei, não

consegue o Tribunal perceber-se no papel de mero consultor, exige, outrossim, que tal

presunção esteja firmemente abalada para que se justifique o acionamento do controle

abstrato de constitucionalidade.

Insta observar que esse pré requisito de admissibilidade formal não existe na ação

direta de inconstitucionalidade, até porque a tese do agente provocador, neste caso,

contraria a presunção de constitucionalidade da qual se reveste a lei nova.

Convém, por oportuno, acrescentar também que o ato normativo federal objeto desta

ação deverá, necessariamente, ter sido promulgado após setembro de 1993, data em

que a Emenda Constitucional n° 03/93 foi publicada.

Seção II

Page 36: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

36

Da Medida Cautelar em Ação Declaratória

de Constitucionalidade

Art. 21. O Supremo Tribunal Federal, por decisão da maioria absoluta de seus membros,

poderá deferir pedido de medida cautelar na ação declaratória de constitucionalidade,

consistente na determinação de que os juízes e os Tribunais suspendam o julgamento

dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto da ação até

seu julgamento definitivo.

Parágrafo único. Concedida a medida cautelar, o Supremo Tribunal Federal fará

publicar em seção especial do Diário Oficial da União a parte dispositiva da decisão, no

prazo de dez dias, devendo o Tribunal proceder ao julgamento da ação no prazo de

cento e oitenta dias, sob pena de perda de sua eficácia.

Na realidade, o exercício do poder geral de cautela, pelo STF, em sede de ação

declaratória de constitucionalidade, destina-se a garantir a própria utilidade da

prestação jurisdicional a ser efetivada no processo de controle normativo abstrato, em

ordem a impedir que o eventual retardamento na apreciação do litígio constitucional

culmine por afetar e comprometer o resultado definitivo do julgamento.

A par de toda e qualquer divergência doutrinária e discussões acadêmicas acerca do

efeito vinculante, impõe-se reconhecer, no âmbito desse novo instrumento de direito

processual constitucional, que se revela admissível o exercício, pelo Supremo Tribunal

Federal, do poder cautelar geral de que se acha naturalmente investido, quer como

Tribunal judiciário, quer, especialmente, como Corte Constitucional.

Assentada tal premissa, que confere especial ênfase ao binômio utilidade/necessidade,

torna-se essencial reconhecer - especialmente em função do próprio modelo brasileiro

de controle de constitucionalidade - que a tutela cautelar apresenta-se como

instrumento processual compatível com o sistema de fiscalização normativa abstrata,

revelando-se plenamente cabível em sede de ação declaratória de constitucionalidade,

segundo ressalta o magistério da doutrina (Nagib Slaib Filho, Ação Declaratória de

Constitucionalidade, pp 131/132, 2ª ed., 1995, Forense; Gilmar Ferreira Mendes, Da

Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade in Repertório IOB de

Jurisprudência - 2ª quinzena de outubro de 1997 - nº 20/97 - Caderno1, p 504; Alexandre

de Moraes, Direito Constitucional, p 480, 2ª ed., 1997, Atlas; Clémerson Merlin Clève,

Fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no Direito Brasileiro, pp 202/203, item n°

9, 1995, RT).

Page 37: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

37

Fundado, precisamente, em tais razões, expostas pelo Ministro Celso de Mello, o

Plenário do Supremo Tribunal Federal - ao julgar questão preliminar suscitada na ADC

nº 4-DF, Rel. Min. Sydney Sanches - reconheceu a possibilidade de aquela Corte

exercer, também em sede de ação declaratória de constitucionalidade, o poder cautelar

que lhe é inerente, enfatizando, então, no contexto daquele julgamento, que a prática da

jurisdição cautelar acha-se essencialmente vocacionada a conferir tutela efetiva e

garantia plena ao resultado que deverá emanar da decisão final a ser proferida naquele

processo objetivo de controle abstrato.

Agora nada mais faz a lei do que estabelecer que esse poder de cautela existe e pode ser

exercido pelo Tribunal sempre que for necessário.

O STF, ao conceder o primeiro provimento cautelar que foi requerido na ADC nº 4/DF,

proferiu, por expressiva maioria, decisão que foi assim sumulada na Ata de Julgamentos

do Plenário: "O Tribunal, por votação majoritária, deferiu, em parte, o pedido de medida

cautelar, para suspender, com eficácia ex nunc e com efeito vinculante, até o final

julgamento da ação, a prolação de qualquer decisão sobre pedido de tutela antecipada,

contra a Fazenda Pública, que tenha como pressuposto a constitucionalidade ou a

inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 9.494, de 10/9/97, sustando, ainda, com a

mesma eficácia, os efeitos futuros dessas decisões antecipatórias de tutela já proferidas

contra a Fazenda Pública, vencidos, em parte, o Ministro Néri da Silveira, que deferia a

medida cautelar em menor extensão e, integralmente, os Ministros Ilmar Galvão e

Marco Aurélio, que a indeferiam."

CAPÍTULO IV

DA DECISÃO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

E NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE

Art. 24. Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou

procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-

á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória.

O caráter dúplice ou ambivalente dessa modalidades de controle abstrato restou

inequivocamente demonstrado neste dispositivo. Convém notar que a jurisprudência do

STF já acenava com essa possibilidade.

Por outro lado, poucas têm sido as ações declaratórias propostas (apenas nove) no

Supremo Tribunal Federal. Talvez porque existe o risco de o "tiro sair pela culatra", ou

Page 38: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

38

seja, a lei federal ser declarada inconstitucional com efeitos ainda mais amplos do que

em uma ação direta de inconstitucionalidade, efeitos não apenas revogativos (erga

omnes), mas, também, que impeçam qualquer manifestação futura do Poder Executivo

ou do Poder Judiciário sobre aquele tema (efeitos vinculantes).

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista

razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo

Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos

daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em

julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Talvez este seja o dispositivo de maior complexidade de toda a lei. A sua exegese pode

levar a uma ampliação sem precedentes dos poderes do Supremo Tribunal Federal.

Trazendo para o direito brasileiro a concepção da Corte Constitucional alemã de

inconstitucionalidade progressiva ou da "lei ainda constitucional".

A respeito desse tema existe um precedente no Tribunal (Habeas Corpus n° 70514-6 –

Rio Grande do Sul), onde se analisava uma preliminar sobre a inconstitucionalidade de a

Defensoria Pública possuir prazo em dobro para recurso (artigo 1°, § 5° da Lei n°

1.060/50). Sobre isso destacamos alguns trechos do voto do Ministro Moreira Alves :

"A única justificativa, Sr. Presidente, que encontro para esse tratamento desigual em

favor da Defensoria Pública em face do Ministério Público é a de caráter temporário: a

circunstância de as Defensorias Públicas ainda não estarem, por sua recente

implantação, devidamente aparelhadas como se acha o Ministério Público.

"Por isso, para casos como este, parece-me deva adotar-se a construção da Corte

Constitucional alemã no sentido de considerar que uma lei, em virtude de circunstâncias

de fato, pode vir a ser inconstitucional, não o sendo, porém enquanto essas

circunstâncias de fato não se apresentarem com a intensidade necessária para que se

tornem inconstitucionais.

"Assim, a lei em causa será constitucional enquanto a Defensoria Pública,

concretamente, não estiver organizada com a estrutura que lhe possibilite atuar em

posição de igualdade com o Ministério Público, tornando-se inconstitucional, porém,

quando essa circunstância de fato não mais se verificar."

Como se percebe a lei agora exige um quorum qualificado de dois terços para que tais

efeitos sejam determinados pelo Tribunal. Não obstante, entendemos que esse

precedente é por demais perigoso, trazendo risco para independência e harmonia dos

Page 39: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

39

Poderes da República e, conseqüentemente, para o próprio Estado Democrático de

Direito.

Não questionamos a honradez e o espírito democrático dos atuais Ministros do Tribunal,

mas, como reza o dito popular, o amanhã a Deus pertence.

Supondo que num desses "amanhãs" seja criado um tributo flagrantemente

inconstitucional e que os Poderes Executivo e Legislativo, devidamente mancomunados,

consigam persuadir dois terços dos membros do Tribunal no sentido de que tal tributo é

essencial para "salvação nacional" (olha ela aí de novo!)?!. A grande questão que se

coloca é a seguinte: não estaria este dispositivo dotando a maioria qualificada dos

Ministros do Supremo Tribunal Federal de poderes semelhantes ao Poder Constituinte

Originário?

Ou ainda: o que exatamente significa "segurança jurídica" ou "excepcional interesse

social"? Ainda mais quando comparamos com conotações dadas a outras expressões

como "relevância" e "urgência" no artigo 62 da Carta.

Qualquer que seja o enfoque, o ângulo pelo qual se olhe, esse dispositivo causa pavor e

incerteza. Se nós ainda estívessemos na Alemanha, vá lá!

Art. 28. Dentro do prazo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o Supremo

Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial

da União a parte dispositiva do acórdão.

Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade,

inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de

inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante

em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e

municipal.

Este parágrafo único consagra as várias técnicas de decisão de inconstitucionalidade

adotadas pelo Supremo Tribunal Federal. Mais do que isso: estende tais técnicas e

efeitos para as ações declaratórias de constitucionalidade.

Quando exerce a fiscalização abstrata o Tribunal apenas se percebe como legislador

atípico negativo. Dessa forma consagrou-se o princípio da interpretação conforme a

Constituição para tornar possível a compatibilização da norma de conteúdo abrangente,

ou seja, aquela que admite uma multiplicidade de interpretações (algumas condizentes e

outras não com a Constituição). Trata-se, na realidade, de uma técnica que, sem reduzir

Page 40: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

40

o conteúdo do texto legal, inibe e exclui interpretações que possam conduzir a uma

exegese que se afasta do único sentido autorizado pela Carta. Convém ressaltar que,

embora o dispositivo ora comentado refira-se as decisões de mérito, tal técnica é

aplicável também em medidas cautelares eventualmente concedidas.

Mas, indubitavelmente, a maior contribuição deste dispositivo foi a dilação dos efeitos

vinculantes que, antes, apenas estavam circunscritos as decisões em sede de ação

declaratória de constitucionalidade. Entendemos, todavia, que apenas as decisões de

mérito (não as cautelares, portanto) em sede de ação direta de inconstitucionalidade

estarão a partir de agora revestidas de efeitos vinculantes.

Certamente surgirão aqueles que vislumbrarão inconstitucionalidade pelo fato de a lei

ordinária ampliar os efeitos vinculantes da decisão, estabelecendo o caráter dúplice

nestas duas modalidades de controle abstrato. Vozes se levantarão também afirmando

que não teria sentido manter-se duas ações diretas, uma para declarar constitucional e

outra para declarar inconstitucional a norma se, ambas, possuem agora os mesmos

efeitos.

Quanto ao primeiro argumento entendemos que a argüição de descumprimento de

preceito fundamental, tal como prevista no artigo 102, § 1° da Constituição, sempre

autorizou a lei ordinária a ampliar a competência do Supremo Tribunal Federal. Não

sendo necessária, portanto, a promulgação de emenda constitucional para estender-se

os efeitos vinculantes às decisões de mérito em ação direta de inconstitucionalidade. Tal

contra-argumento ganha mais relevância após a publicação da Lei n° 9.882, de 03 de

dezembro de 1999.

No que se refere ao segundo argumento defendemos a idéia de uma simplificação da

fiscalização abstrata, unificando-se as duas modalidades de controle, desde que

mantenha-se a legitimação ativa pluralizada nos termos dos nove incisos do caput do

artigo 103 da Constituição da República. Reconhecemos, todavia, que tal unificação de

procedimentos abstratos apenas poderia efetivar-se através de emenda constitucional.

Tudo em nome dos princípios da economia e celeridade do processo.

CAPÍTULO V

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E FINAIS

Art. 30. O art. 8o da Lei no 8.185, de 14 de maio de 1991, passa a vigorar acrescido dos

seguintes dispositivos:

Page 41: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

41

"Art.8º ..........................................................................

I - ..................................................................................

.......................................................................................

n) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Distrito Federal em

face da sua Lei Orgânica;

.......................................................................................

§ 3º São partes legítimas para propor a ação direta de inconstitucionalidade:

I- o Governador do Distrito Federal;

II - a Mesa da Câmara Legislativa;

III - o Procurador-Geral de Justiça;

IV - a Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Distrito Federal;

V - as entidades sindicais ou de classe, de atuação no Distrito Federal, demonstrando

que a pretensão por elas deduzida guarda relação de pertinência direta com os seus

objetivos institucionais;

VI - os partidos políticos com representação na Câmara Legislativa.

§ 4º Aplicam-se ao processo e julgamento da ação direta de Inconstitucionalidade

perante o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios as seguintes disposições:

I - o Procurador-Geral de Justiça será sempre ouvido nas ações diretas de

constitucionalidade ou de inconstitucionalidade;

II - declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma

da Lei Orgânica do Distrito Federal, a decisão será comunicada ao Poder competente

para adoção das providências necessárias, e, tratando-se de órgão administrativo, para

fazê-lo em trinta dias;

III - somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou de seu órgão especial,

poderá o Tribunal de Justiça declarar a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo

do Distrito Federal ou suspender a sua vigência em decisão de medida cautelar.

Page 42: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

42

§ 5º Aplicam-se, no que couber, ao processo de julgamento da ação direta de

inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Distrito Federal em face da sua Lei

Orgânica as normas sobre o processo e o julgamento da ação direta de

inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal."

Cumpre, inicialmente, esclarecer que a Lei n° 8.185/91 dispõe sobre a organização

judiciária do Distrito Federal e dos Territórios. Trata-se de uma lei federal em virtude de

não possuir o Distrito Federal competência constitucional para legislar ou administrar

esse tema.

O Distrito Federal é uma entidade federativa sui generis porque a vedação de sua

divisão interna em municípios autoriza ao órgão legislativo – Câmara Legislativa – a

elaborar leis que ora tratam de matérias cuja a competência é estadual, ora de matérias

próprias do interesse local ou municipal (art. 32, § 1° da CF). Tal competência híbrida

sempre encontrou obstáculo no exercício da fiscalização abstrata junto ao Supremo

Tribunal Federal. Isto porque os atos normativos editados pelo Distrito Federal no

exercício de competência legislativa reservada aos Municípios não se sujeitam ao

controle abstrato de constitucionalidade (art. 102, I, a da CF).

Essa dupla competência normativa do Distrito Federal sempre impossibilitou o exercício,

através do controle concentrado, da lei distrital de conteúdo municipal. Até porque

expressiva maioria da doutrina sempre relutou em perceber a Lei Orgânica Distrital

como norma de estatura constitucional. Não obstante a sua rigidez, exigindo a

aprovação - mediante procedimento especial - de emendas à lei orgânica distrital para

alteração de seu conteúdo, a lei orgânica não era vista como norma constitucional

distrital. Desta forma, o eventual conflito material ou formal incidente entre uma lei

distrital (de conteúdo estadual ou municipal) e a Lei Orgânica Distrital era resolvido

como conflito de ilegalidade e não de inconstitucionalidade.

Portanto, graças a essa rigidez, já era nitidamente perceptível uma relação de

subordinação hierárquica entre as espécies normativas que compunham o ordenamento

jurídico infra orgânico distrital e a Lei Orgânica do Distrito Federal.

Dentro deste contexto os dispositivos ora sob análise vem escrever um novo capítulo na

estória do controle de constitucionalidade abstrato no Brasil.

Eleva-se a categoria de norma constitucional a Lei Orgânica Distrital, aproximando-a da

natureza jurídica própria das constituições estaduais e, proporcionalmente, afastando-a

Page 43: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

43

das leis orgânicas municipais. A reação do meios acadêmicos a essa inovação ainda é

imprevisível. É possível que nem reação exista.

Por outro lado, partindo-se do princípio de, havendo hierarquia normativa, as normas

inferiores devem buscar seu fundamento de validade nas superiores, de forma que

havendo conflito entre elas este venha a ser resolvido. Queremos crer que foi esse

princípio que norteou o legislador ordinário.

Inaugura-se uma nova competência originária para o Tribunal de Justiça Distrital,

inserindo-se a alínea "n" no inciso I, do artigo 8° da Lei Ordinária 8.185/91. Interessante

este contorcionismo jurídico: uma lei ordinária modificando competência de Tribunal de

Justiça prevista em outra lei ordinária criando modalidade de fiscalização abstrata que é

matéria de essência constitucional! Em outros termos: poderia uma lei ordinária federal

elevar a categoria de norma constitucional a Lei Orgânica Distrital? E. se a Lei Orgânica

do Distrito Federal é dotada de natureza jurídica própria de uma norma constitucional

distrital, em que dispositivo da Constituição da República está a autorização para o

Congresso Nacional exercer o Poder Decorrente distrital?! Defendemos que seria

imprescindível uma emenda à Constituição da República para legitimar tal alteração.

Emenda esta que, entre outras coisas, retirasse da União e entregasse ao Distrito

Federal a autonomia para legislar sobre a organização de seu Poder Judiciário,

Defensoria Pública e Ministério Público.

Observe-se, ainda, que a simetria foi aplicada de forma canhestra no artigo 30, § 3° da

lei ora sob análise. Se nessa lógica absurda a lei ordinária federal pode tanto, por que

não permitir ao Presidente da República, as Mesas da Câmara dos Deputados e do

Senado Federal, ao Procurador Geral da República ou mesmo a partidos políticos com

representação no Congresso Nacional que figurassem como legitimados ativos? Porque,

responderiam em coro, isso seria inconstitucional! E nós replicaríamos com uma outra

pergunta: uma inconstitucionalidade a mais faria diferença?!

Este artigo 30 cria ainda a figura do custos legis na pessoa do Procurador Geral de

Justiça (§ 4°, I); a ação de inconstitucionalidade por omissão distrital (§ 4°, II); cláusula

de reserva de plenário (§ 4°, III); e termina com um parágrafo quinto que é de uma

inconstitucionalidade apoteótica. Ainda bem que o carnaval já se avizinha.

Todavia, este dispositivo não é suficiente para tirar o brilho da Lei n° 9.868/99. De um

modo geral é inegável emprestar-lhe o caráter esclarecedor e oportuno, onde o intuito

do legislador ordinário foi o de desvelar as regras processuais sobre um tema dos mais

complexos. E é justamente aí que reside o mérito da atividade legislativa profícua.

Page 44: Comentários sobre o controle de constitucionalidade por via de ação direta

44

Até a próxima!