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FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS JEFFERSON PRADO SIFUENTES EFEITOS EXPANSIVOS EM DECISÕES DE CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE: O DESENVOLVIMENTO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL POUSO ALEGRE MG 2017

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FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS

JEFFERSON PRADO SIFUENTES

EFEITOS EXPANSIVOS EM DECISÕES DE

CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE:

O DESENVOLVIMENTO DA JURISDIÇÃO

CONSTITUCIONAL

POUSO ALEGRE – MG

2017

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FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS

JEFFERSON PRADO SIFUENTES

EFEITOS EXPANSIVOS EM DECISÕES DE

CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE:

O DESENVOLVIMENTO DA JURISDIÇÃO

CONSTITUCIONAL

Dissertação apresentada como exigência parcial para a

obtenção do título de Mestre em Constitucionalismo e

Democracia do Programa de Pós-Graduação da Faculdade

de Direito do Sul de Minas.

Orientador: Professor Doutor Hamilton da Cunha Iribure

Jr.

Pouso Alegre – MG

2017

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RESUMO

SIFUENTES, Jefferson Prado. Efeitos expansivos em decisões de controle difuso de

constitucionalidade: o desenvolvimento da jurisdição constitucional. Dissertação

(Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito do Sul de Minas. Programa de Pós-Graduação

em Direito, Pouso Alegre, 2016.

O presente trabalho tem por objeto central realizar uma análise críticasobre o controle de

constitucionalidade exercido pelo Supremo Tribunal Federal pela via difusa e por objetivo

principal um estudo acerca dos efeitos expansivos a propagação dos efeitos da prestação

jurisdicional no modelo incidental. Para que o objeto se construa ao longo dessa pesquisa,

utiliza-se o método analítico dedutivo, pelo qual se avalia a doutrina referente ao

tema.Consoante o disposto no ordenamento constitucional, a decisão proferida em sede difusa

de controle tem força para produzir efeitos tão somente entre as partes do processo, ante às

peculiaridades de cada caso. Porém, com o advento do instituto da repercussão geral como

requisito de admissibilidade de Recurso Extraordinário, as questões apreciadas pelo STF

deixam de apreciar pontos intimamente particulares de cada parte para contemplar temas que

ultrapassa os interesses subjetivos da causa. Nesta perspectiva, tem-se admitido que decisões

proferidas pela Suprema Corte, ainda que em sede difusa de controle, adotem a expansão de

efeitos para além das partes do processo. Não se pode olvidar ainda, do papel que as Súmulas

Vinculantes desempenham atualmente com o fortalecimento da teoria dos precedentes

judiciais, tonificando o direito exercido por juízes. Tal se justifica ante o grau ativo que o

órgão jurisdicional assume face ao legislativo e se esta posição expansiva afronta o princípio

da Separação dos Poderes pelo fato do Poder Judiciário colocar-se sobre atos aprovados pelo

legislativo. Fundamenta ainda o vigente estudo, a atuação das vias de controle de

constitucionalidade como instrumentos garantidores, ou, pelo menos viabilizadores do

exercício de direitos fundamentais. Pode-se concluir, em linhas gerais, que uma atuação de

órgão do judiciário que assuma posição de orientação de conduta para a sociedade, com

eficácia que extrapole as partes do processo, pode representar um aparente conflito com o

legislativo, no entanto, em se tratando de controle de constitucionalidade, a atuação do Poder

Judiciário se dá justamente da harmonia entre os poderes, uma vez que, neste caso, o órgão

judicante é convidado a apreciar uma questão exercendo sua função típica (julgar), para

fiscalizar eventual conduta abusiva de outros poderes, exercendo, pois, sua tarefa no

contrapeso democrático.

Palavras-Chave: Efeitos expansivos; Controle; Constitucionalidade; Jurisdição.

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ABSTRACT

SIFUENTES, Jefferson Prado. Expansive effect on decisions of diffuse control of

constitutionality: the development of constitutional jurisdiction. Dissertatio (Master in

law) – Faculdade de Direito do Sul de Minas. Programa de Pós-GraduaçãoemDireito, Pouso

Alegre, 2016.

The present work has as its central object perform a critical analysis about the control of

constitutionality exercised by the Supreme Court through diffuse and by main objective a

study about the expansive effects the spread of effects of jurisdictional provision in the

incidental model. To which the object is to build along this research, we use the deductive

method of analysis, which evaluates the doctrine concerning the theme. According to the

provisions of the constitutional planning, the decision to diffuse control headquarters has the

strength to take effect only between the parties of the process against the peculiarities of each

case. However, with the advent of the Institute of General repercussion as a requirement of

admissibility of extraordinary appeal, the issues considered by the Supreme Court fail to

enjoy private each part closely points to contemplate themes beyond the subjective interests of

cause. In this perspective, it has been admitted that decisions handed down by the Supreme

Court, albeit in Fuzzy control headquarters, adopt the expansion of effects in addition to the

parts of the process. Can't forget the role that the Precedents Binding currently play with the

strengthening of judicial precedent theory, toning the right exercised by judges. Such is

justified to the extent that the Court assumes active face to the legislature and if this expansive

position affront the principle of separation of powers that the Judiciary put on acts approved

by the legislature. The current study, still justifies the actions of control of constitutionality as

guarantors, instruments or at least enablers of the exercise of fundamental rights. It can be

concluded, in general terms, that an act of judicial organ to take a position to conduct

orientation to the society, effectively that beyond the parts of the process, can represent an

apparent conflict with the legislature, however, when it comes to control of constitutionality,

the role of the Judiciary is given precisely the harmony between the powers, once in this case,

the judicial body is invited to examine a matter exercising your typical function (judge), to

oversee any abusive conduct of other powers, exercising, because your task in the democratic

balance.

Keywords:Expansive effects;Control;Constitutionality;Jurisdiction.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADC – Ação Declaratória de Constitucionalidade

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADO – Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

AI – Ato Institucional

CF Constituição Federal

CNJ – Conselho Nacional de Justiça

CPC – Código de Processo Civil

CRJ – Coordenação-Geral da Representação Judicial da Fazenda Nacional

DJ – Diário da Justiça

DJe – Diário do Judiciário Eletrônico

EC – Emenda Constitucional

MA - Maranhão

MI – Mandado de Injunção

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

PGFN – Procuradoria Geral da Fazenda Nacional

RE – Recurso Extraordinário

RTJ – Revista Trimestral de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

STF – Supremo Tribunal Federal

TJAL - Tribunal de Justiça de Alagoas

TJDF - Tribunal de Justiça do Distrito Federal

TJMA – Tribunal de Justiça do Maranhão

TST – Tribunal Superior do Trabalho

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 8

CAPÍTULO I ................................................................................................................................. 12

CONTEXTO HISTÓRICO SOBREO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ...................................... 12

1.1 Prelúdio histórico .................................................................................................................. 12

1.2 Desenvolvimento das formas de controle de constitucionalidade nas Constituições brasileiras

........................................................................................................................................................... 12

1.3 Breves perspectivas do controle de constitucionalidade no direito comparado ....................... 17

1.3.1 O caso Marburyversus Madison ........................................................................................... 17

1.3.2 Os modelos norte-americanos e austríaco de constitucionalidade: características, efeitos e

expansão no mundo ...................................................................................................................... 19

1.4 Progresso histórico dos Poderes do Estado: Separação, interdependência e nova harmonia ... 24

CAPÍTULO II ................................................................................................................................ 37

UMA ABORDAGEM ACERCA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ...................................... 37

2.1 Controle de Constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro ....................................... 37

2.1.1 Controle concentrado de constitucionalidade ..................................................................... 38

2.1.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade .................................................................................. 40

2.1.3 Ação Declaratória de Constitucionalidade ........................................................................... 42

2.1.4 Inconstitucionalidade por omissão pela via concentrada .................................................... 43

2.1.5 Arguição de descumprimento de preceito fundamental ..................................................... 47

2.2 Controle difuso de constitucionalidade ...................................................................................... 51

2.3 Os efeitos do mandado de injunção como instrumento de controle difuso de

constitucionalidade ........................................................................................................................... 54

2.4 Controle de constitucionalidade e direitos fundamentais .......................................................... 72

2.5 O controle de constitucionalidade judicial sob a ótica da tripartição dos poderes .................... 74

2.5.1Preliminar metodológica ....................................................................................................... 74

2.5.2 Jurisdição constitucional, controle de constitucionalidade e separação dos poderes ........ 75

CAPÍTULO III ............................................................................................................................... 83

A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E A FORÇA DO PRECEDENTE

JURISPRUDENCIAL ...................................................................................................................... 83

3.1 Abertura Metodológica ............................................................................................................... 83

3.2A interpretação do direito: do legislativo ao judiciário ................................................................ 83

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3.3. Teoria dos precedentes judiciais como fonte do direito brasileiro. Uma análise sobre a súmula

vinculante e o poder normativo dos tribunais .................................................................................. 91

3.3.1 Linhas iniciais acerca da Súmula Vinculante: A força obrigatória e vinculação dos efeitos. 91

3.3.2 Súmula vinculante: orientação de conduta e reconhecimento de inconstitucionalidade ou

ilegalidade ..................................................................................................................................... 99

CAPÍTULO IV ............................................................................................................................. 102

EFEITOS ERGA OMNES EM CASO DE INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELA VIA DIFUSA ... 102

4.1 Introito metodológico ............................................................................................................... 102

4.2 Repercussão Geral como elemento de força do precedente do direito jurisprudencial .......... 102

4.3 Participação do Senado Federal no controle de constitucionalidade ....................................... 109

4.4 Possibilidade de expansão dos efeitos em sede controle pela via difusa de constitucionalidade

......................................................................................................................................................... 116

4.5 Efeitos inter partes de reconhecimento de inconstitucionalidade: uma abordagem acerca do

princípio da igualdade e segurança jurídica .................................................................................... 122

4.6 Alguns posicionamentos do Supremo Tribunal sobre inconstitucionalidade pela via difusa que

assumem eficácia extra partes ........................................................................................................ 125

4.6.1 Reclamação Constitucional n. 4335-5/AC: progressão de pena para crimes hediondos .. 126

4.6.2 Mandado de Injunção para reconhecimento do direito de greve para servidores públicos

..................................................................................................................................................... 129

4.6.3 Recurso Extraordinário n. 595.838: a inconstitucionalidade de incidência de contribuição

previdenciária incidente sobre serviços prestados por cooperativas de trabalho ..................... 131

CONCLUSÃO ............................................................................................................................. 134

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................... 139

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como objetivo central o estudo do controle de

constitucionalidade como meio hábil de garantir a supremacia da Constituição, com foco

direcionado à via incidental de controle e análise dos efeitos de tal decisão para além das

partes do processo, bem como analisar a atuação do Senado Federal nesta via difusa de

controle.

O ordenamento constitucional pátrio estabelece que, em se tratando de controle exercido

pela via difusa, os efeitos da decisão do órgão do poder judiciário serão tão somente restritos

às partes que figuram como litigantes do processo.

Já no que concerne ao controle de constitucionalidade exercido de modo concreto,

maior cautela se convoca ante a pluralidade de órgãos judiciários competentes, da mesma

maneira queaos recursos inerentes e a existência de decisões antagônicas, principalmente no

que tange a analise fático-probatória referente a cada caso. Por oportuno, cada caso merece

ser apurado com o devido respeito à individualidade que lhe é pertinente.

Contudo, no que diz respeitoà inconstitucionalidade de determinada lei ou ato

normativo reconhecido de modo definitivo pelo Supremo Tribunal Federal, é mister arguir o

interesse geral que reveste tal discussão. Caso o tribunal guardião da Constituição, o mesmo

competente para reconhecer a inconstitucionalidade de lei pela via abstrata, reconhecer, de

modo definitivo a incompatibilidade de lei ou ato normativo com a Constituição, tal efeito

deverá ser inter partes, em que pese o caráter supra individual que tal decisão se reveste? Pela

regra hodierna da forma incidental de controle, sim.

Nesta seara, convida-se a apreciar, antes do mérito objeto de uma decisão proferida pela

Suprema Corte, os requisitos de admissibilidade para que uma questão seja apreciada pelo

Supremo Tribunal Federal em sede recursal. Para que esta alta Casa de Jurisdição possa

receber um recurso para análise, é necessário reconhecer e declarar que em tal causa está

presente o fenômeno da repercussão geral.

Num primeiro plano, uma questão que trata de ordem pública, tal como o

reconhecimento de constitucionalidade ou não de uma lei, com repercussão geral reconhecida,

possuir efeitos apenas entre os litigantes pode soar como uma incongruência, pois, para o

próprio reconhecimento de repercussão geral, necessário que as questões que ultrapassem os

interesses subjetivos da causa.

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Contudo, atrativo examinar a questão segundo o grau de protagonismo que o judiciário

exerce em tais situações sob à luz dateoria da separação dos poderes. Uma decisão

declaratória de inconstitucionalidade, obtida judicialmente, que entenda pela não aplicação de

uma lei, pode usurpar competência legiferante atribuída ao órgão do Legislativo.

Desta forma, há de se ponderar a legitimidade democrática pertinente a cada Poder do

Estado, uma vez que os membros do Poder Legislativo que lá ingressam com amparo no voto,

levantam a questão acerca de um Poder, cujos membros não são eleitos pelo povo, deter

legitimidade para optar pela não aplicabilidade de ato elaborado por Poder competente,

legitimado.

Para que o objeto se construa ao longo desta pesquisa, pondera-se o contexto histórico

do instituto do controle de constitucionalidade nas Cartas brasileiras e o progresso, até a

concretização que se deu com a Carta da República de 1988, texto no qual o assunto ganhou

grande destaque.

Pontuam-se, também, parâmetros do controle de constitucionalidade em outros países,

com análise dos sistemas americano e austríaco e a influência de outras culturas na construção

do instituto do controle, tal como concretizado no Brasil contemporâneo.

Assim, guarda destaque aos atuais modelos concentrado e difuso de controle de

constitucionalidade no Brasil, suas aplicações, requisitos e resultados. Ao cabo do primeiro

capítulo, defende-se o instituto do Mandado de Injunção como meio de controle difuso de

constitucionalidade por omissão e a sistemática dos meios de controle como garantidores de

direitos fundamentais e asseguradores da supremacia da Carta Política.

Diante de toda a sistemática na qual o controle de constitucionalidade está inserido, faz-

se necessário abordar tal instituto à luz da separação e harmonia entre os poderes, os limites

da atuação jurisdicional.

O terceiro capítulo se dedica ao poder de interpretação do direito judiciário e a força dos

precedentes judiciais no ordenamento pátrio. Dentro deste tópico se propõe a analisar a

interpretação direito por parte do Poder judiciário e senesta elucidação estaria imerso um grau

de criação. É de extrema relevância, ainda, discorrer acerca dos precedentes judiciais como

fonte no direito brasileiro, sobretudo, sobre uma análise do papel das súmulas vinculantes no

arranjo jurídico brasileiro e a postura que estes verbetes assumem atualmente.

Nodesenvolvimento do tema, é fundamental evidenciar o instituto da repercussão geral

como elemento fortificante do precedente jurisprudencial brasileiro, o qual é ponto de partida

para fundamentar a adoção de efeitos erga omnes, uma vez que reconhecido este requisito de

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admissibilidade, a essência da questão ultrapassa os interesses estritamente individuais da

causa.

No capítulo derradeiro é destacada a possibilidade de efeitos expansivos, erga omnes,

para decisões acerca de inconstitucionalidade mesmo em via difusa, com apreciaçãona teoria

dos precedentes judiciais como fonte do direito.

Nesta órbita é analisada a participação do Senado Federal no controle de

Constitucionalidade e o atual significado da resolução desta Casa Congressista, que tem o

poder de suspender o ato normativo declarado inconstitucional, a teor do artigo 52, inciso X

da Constituição da República de 1988.

No avanço do capítulo, dedica-se parte à aproximação da via difusa de controle com a

concentrada e a possibilidade de efeitos erga omnes e vinculantes em decisões definitivas da

Suprema Corte, em caso de inconstitucionalidade decretada em via incidental. Outra parte é

dedicada à igualdade e segurança jurídica que se aplica na seara recursal difusa.

Por fim, é proposta uma análise da jurisprudência prática do STF, separando três casos

exemplificativos em que a possibilidade de efeitos erga omnes e vinculantes em sede difusa

de controle foi adotada e debatida. Assim, destaca-se a Reclamação Constitucional 4335-5,

interposta pela Defensoria Pública da União em face de uma decisão de um juiz singular no

Estado do Acre, que não seguiu orientação da Suprema Corte, a qual havia declarado a

inconstitucionalidade da vedação de progressão de regime de cumprimento de pena em caso

de crimes hediondos.

O segundo caso analisado diz sobre o exercício de greve para servidores públicos, que

devido à ausência de instrumento legislativo próprio, resultou inoperante, sendo que tal direito

grevista vem sido contemplado por via de Mandado de Injunção, que reconhece como

inconstitucional a omissão em legislar e adota meios para exercício de direito fundamental.

O terceiro e último caso se presta a analisar a contribuição previdenciária incidente

sobre serviços prestados por cooperativas de trabalho, prevista no artigo 22, inciso IV da Lei

n. 8.212/91, que foi julgada inconstitucional pela Suprema Corte e perdeu aplicabilidade

prática mesmo antes da resolução suspensiva do Senado Federal.

A problematização gira em torno da legitimidade democrática de órgãos do judiciário

adotarem efeitos expansivos e vinculantes às declarações de inconstitucionalidade, adentrando

na esfera constitucional de outros poderes e a possível usurpação de poderes frente ao

Legislativo. É preciso ponderar, ainda, problemática residente na insegurança jurídica que

eventualmente pode pairar dianteda sociedade em virtude de uma lei ser aplicada apenas a

algumas pessoas, em que pese a mesma situação fática.

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Para que se possa almejar o objeto proposto, utiliza-se o método analítico documental,

pelo qual se avalia a doutrina referente ao tema, além de pautar em jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal, pelo qual se propõe avaliar a conduta da Suprema Corte em casos

de declaração de inconstitucionalidade pela via difusa.

Logo, o presente trabalho se justifica ante a relevância da questão atrelada ao interesse

da população em garantir a Supremacia da Constituição e as vias democráticas plenas, na qual

se pauta a questão sob viés da independência e harmonia entre os poderes, cada vez mais em

evidência perante a constante convocação da Suprema Corte a apreciar inconstitucionalidade

de leis e atos normativos.

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CAPÍTULO I

CONTEXTO HISTÓRICO SOBREO CONTROLE DE

CONSTITUCIONALIDADE

1.1 Prelúdio histórico

A instituição de Constituições tem revelado importantes marcas para diversas nações,

que adotam uma Carta Política como lei maior, as quais traçam diretrizes para todo

ordenamento jurídico. Em muitos casos, a nível internacional, as constituições sucedem

períodos arbitrários e restritivos de direitos, em que cada Carta Política representa um grito de

Democracia, Soberania ou mesmo de organização política, jurídica e administrativa em cada

Estado.

Torna-se, pois, necessário garantir a Constituição, conferindo-lhe aplicabilidade e

eficácia, bem como controlar atos contrários aos preceitos constitucionais. Deste modo,

exercer o controle de constitucionalidade se torna tão ou mais importante do que propriamente

a criação do texto constitucional.

Nesta perspectiva, propõe-se o estudo de como as formas de controle da constituição se

desenvolveram e como se dá a aplicação deste louvável instituto em cada contexto histórico,

avaliando, para isso, não somente as Cartas brasileiras, mas, fazendo uma breve reflexão do

instituto do controle de constitucionalidade a nível supranacional.

1.2 Desenvolvimento das formas de controle de constitucionalidade nas Constituições

brasileiras

A Constituição Política do Império do Brazil, de 1824, não trouxe um sistema de

controle de constitucionalidade que apresentasse semelhança com os institutos atuais, que

contam com a participação do Poder Executivo em tal empreitada. Tal Carta Imperial trazia

que, ao Poder Legislativo, com delegação à Assembleia Geral, competia a atribuição de velar

pela guarda da Constituição, bem como a interpretação, revogação e suspensão das Leis.

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Tal concentração de poderes no Legislativo se dava por influência francesa, que no

contexto histórico, vivia o dogma da soberania do parlamento (SARMENTO, 2015, p. 269).

Neste contexto, é importante destacar que:

Só o poder que faz as leis é o único competente para declarar por via de autoridade

ou por disposição geral obrigatória o pensamento, o preceito dela. Só ele e

exclusivamente ele é quem tem o direito de interpretar o seu próprio ato, suas

próprias vistas, sua vontade e seus fins. Nenhum outro poder temdireito de

interpretar por igual modo, já porque nenhuma lei lhe deu essa faculdade, já porque

seria absurda a que lhe desse (BUENO apud MENDES; COELHO;

BRANCO 2009, p. 1083-1084).

A Carta Constitucional de 1891, por oportuno, sob a égide republicana, traz em seu bojo

a previsão de possibilidade de revisão por parte do Supremo Tribunal Federal, via recurso

“quando se contestar a validade de leis ou de atos dos Governos dos Estados em face da

Constituição”. Assim, começa-se a sedimentar a forma de controle judicial. Tal forma de

controle foi instituída sob a influência do constitucionalismo norte-americano, passando a

perdurar nas Constituições sucessivas até a vigente (SILVA, 2015, p. 52-53).

Ainda na vigência da Constituição de 1891 sobreveio no ordenamento jurídico a Lei n.

221 de 1894, que tratou do controle de constitucionalidade via judicial de forma mais

expressa ao consagrar que “Os juízes e tribunais apreciarão a validade das leis e regulamentos

e deixarão de aplicar aos casos ocorrentes as leis manifestamente inconstitucionais e os

regulamentos manifestamente incompatíveis com a lei ou com a Constituição”.

Reforça-se ainda mais a participação judicial em se tratando de controle de

constitucionalidade, não restando dúvida quanto ao poder conferido aos órgãos jurisdicionais

para exercício do controle (MENDES, 2009, p. 1086).

Nota-se, pois, a transição da Constituição do Império, em 1824, para a da República, em

1891, como marco que concretiza a via judicial como forma de exercer o controle de

constitucionalidade, até então exercido somente pelo poder legislativo.

A Constituição de 1934 ainda manteve fortalecido o modelo judicial de controle de

constitucionalidade, enfatizando, contudo, que somente pela maioria da totalidade dos

membros dos tribunais era possível a declaração de inconstitucionalidade.

Outra situação de grande valia para estudo do controle de constitucionalidade trazido

pela Constituição de 1934 diz respeito à participação do Senado Federal na suspensão ou

execução de lei ou atos normativos considerados inconstitucionais. Tal questão, além de

conferir status erga omnes à decisão acerca do controle, proporciona maior interação entre os

poderes da República, o que traz inovação no estudo deste instituto.

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Ainda acerca da Constituição de 1934, talvez a mais fecunda e inovadora proposta se

refira à declaração de inconstitucionalidade para evitar a intervenção federal (MENDES,

2009, p. 1087). Aquela Carta Constitucional, a teor do artigo 12, inciso V, estabelecia a

hipótese de intervenção federal “para assegurar a observância dos princípios constitucionais

(art. 7., n. I).

Os referidos princípios elencados no artigo 7, inciso I, estão protegidos sob pena de

intervenção federal em caso de violação. São eles: forma republicana representativa;

independência e coordenação de poderes; temporariedade das funções eletivas, limitada aos

mesmos prazos dos cargos federais correspondentes, e proibida a reeleição de Governadores e

Prefeitos para o período imediato; autonomia dos Municípios; garantias do Poder Judiciário e

do Ministério Público locais; prestação de contas da Administração; possibilidade de reforma

constitucional e competência do Poder Legislativo para decretá-la; representação das

profissões.

Contudo, a intervenção somente se dá caso a Suprema Corte declare a

constitucionalidade da lei violadora dos ditos princípios. Assim, admite-se a declaração de

inconstitucionalidade das referidas leis como forma de controle e garantia da Constituição e

seus preceitos, sem, no entanto, ser precisomedida interventiva.

A Constituição subsequente, publicada em 10 de novembro de 1937, exatamente no

mesmo dia do início da terceira fase do governo de Getúlio Vargas, denominada “Estado

Novo”, que perduraria até 1945, refletiu o contexto histórico pelo qual passava o país,

surtindo reflexos no instituto do controle de constitucionalidade.

Tal fase do governo Vargas se deu em reação à tentativa de golpe promovida pela

Aliança Nacional Libertadora, que fora controlada pelo Governo sob o argumento de

combater a “ameaça comunista”, uma vez que referida Aliança Libertadora sofria grande

influência dos altos escalões do comunismo soviético. Ante tal ameaça e sob o pretexto de um

plano comunista para tomada do poder, o plano Cohen, Getúlio Vargas cancelou o pleito

eleitoral que viria a acontecer em 1937 e anulou a Constituição de 1934, dissolvendoo Poder

Legislativo e passando a governar com concentração de poder amparado pela Carta

constitucional, que se reitera, coincidiu com o início do Estado Novo.

Essa Carta Constitucional de 1937, devido à ausência de democracia e presença de

autoritarismo governamental, representou um “hiato autoritário” (SARMENTO, 2015, p.

271). Em sede de controle de constitucionalidade, tal documento “traduz um inequívoco

retrocesso no sistema de controle” (MENDES; COELHO e BRANCO, p. 1088).

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Tangencialmente ao controle de constitucionalidade, a Carta de 1937 apresentou uma

inovação trazida pelo parágrafo único do artigo 96, com a possibilidade de submissão de lei

declarada inconstitucional à reapreciação do Parlamento, caso o Presidente da República

entendesse necessário ao bem-estar do povo a promoção de defesa ou defesa de interesse

nacional.

Sob tais argumentos ea critério do chefe do Executivo, o Parlamento deve reavaliar a

questão para a validade ou não da declaração de inconstitucionalidade. Se o quórum de dois

terços dos membros das duas casas legislativas entenderem pela validade da lei, esta continua

a produzir efeitos, “tornando-se insubsistente a decisão do tribunal” (MENDES, COELHO e

BRANCO, 2009, p. 1088).

Tal questão no ordenamento constitucional de 1937, representa o contexto histórico-

político da época, com flertes autoritários de domínio do Parlamento por Getúlio Vargas.

O Estado Novo, bem como o primeiro governo Vargas,tiveram seu fim em 1945. Com o

início da quarta República, em 1946, e com a convocação de novas eleições e instauração de

nova Assembleia Nacional Constituinte, emergiu no Estado brasileiro uma nova Constituição,

publicada em 18 de setembro daquele ano.

Este novo texto constitucional “restaura a tradição do controle judicial no Direito

brasileiro” (MENDES; COELHO e BRANCO, 2009, p. 1090). A Carta de 1946 se assemelha

à de 1934, mantendo o quórum de maioria absoluta da Suprema Corte para declarar a

inconstitucionalidade de lei ou ato normativo (artigo 200 da Constituição de 1946). Está

presente também no ordenamento constitucional de 1946 a previsão de atribuição do Senado

Federal para suspender o cumprimento de lei declarada inconstitucional, com o fito de carrear

à decisão da Corte Suprema, efeitos erga omnes.

Na Constituição de 1946 também foi mantida a possibilidade de intervenção federal em

caso de inconstitucionalidade para preservar princípios fundamentais, caso da Carta de 1946,

elencados no artigo 7., inciso VII. A novidade sustentada por este texto constitucional diz

respeito à titularidade do Procurador-Geral da República para representar perante o Supremo

Tribunal Federal a arguida inconstitucionalidade, que se declarada por esta Corte, decretar-se-

á intervenção federal.

Como se há de notar, após o período do “hiato autoritário” observado, principalmente

na terceira fase do governo Vargas, com a imposição da Constituição de 1937 a Constituição

de 1946 buscou, num primeiro plano, respirar os ares da Constituição derrubada de 1934,

mantendo, na órbita do controle de constitucionalidade, preceitos daquela Constituição.

Contudo, foi uma emenda à Constituição de 1946 que representou marco fundamental para o

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16

estudo acerca do tema, principalmente no concerne à forma abstrata do controle de

constitucionalidade.

A Emenda à Constituição de 1946, EC n.16, editada em 26 de novembro de 1965, mas

com publicação no Diário Oficial da União em 06 de dezembro do mesmo ano, introduziu

uma ação direta de inconstitucionalidade genérica (SILVA, 2015, p. 53), estabelecendo

competência originária da Suprema Corte para apreciar o mérito acerca de

inconstitucionalidade com competência para propositura a cargo do Procurador-Geral da

República, consagrando, pois, o modelo abstrato de constitucionalidade (MENDES;

STRECK, 2013, p. 1352).

Na perspectiva da proposta apresentada pela Emenda 16 de 1965, louva-se o controle

concentrado de constitucionalidade, tendo o Procurador-Geral da República legitimidade para

propositura e o Supremo Tribunal competência originária para julgamento. Há de se destacar

que em textos constitucionais anteriores, com tendências de valorizaçãodo modelo incidental

de controle, o Supremo Tribunal atuava apenas como “árbitro final do contencioso da

inconstitucionalidade” (MENDES; COELHO e BRANCO, 2009, p. 1092), apreciando a

questão em sede recursal.

Ainda no que tange à inconstitucionalidade, necessário se torna abordar que a Emenda

n.16 de 1965 trouxe à Constituição de 1946 (artigo 19, inciso III) a expressa previsão de

competência dos Tribunais de Justiça dos Estados para avaliarem a inconstitucionalidade de

Lei ou ato normativo municipal em face de Constituição estadual.

A Constituição de 1967, por seu turno, não propôs grandes modificações na sistemática

do controle de constitucionalidade, mantendo incólume o controle difuso (MENDES;

STRECK, 2013, p. 1352). A respeito de leis e atos normativos serem objeto de controle de

constitucionalidade, tal como previsto em 1965, sob vigência da Carta Constitucional de

1946, não houve prosperidade tal como previsto (SILVA, 2015, p. 53). O ordenamento

constitucional em estudo não acatou o modelo de controle no que diz respeito à

inconstitucionalidade de leis ou atos normativos de âmbito municipal.

Tal questão passou a ser abordada como possibilidade de intervenção no município, tal

como abordado pela Emenda número 1, de 1969 (artigo 15., §3., alínea d).

Após mudanças e desdobramentos ao curso da história, ao longo de textos

constitucionais, passando do Império à República e superando contextos ditatoriais, o instituto

do controle de Constitucionalidade se firmou de vez na Constituição da República de 1988,

tornando-se um dos mais importantes preceitos desta Carta.

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17

A Constituição da República de 1988 consolidou a sistemática do controle de

constitucionalidade, ampliando o modelo abstrato e o rol de legitimados, que não ficou apenas

restrito ao Procurador-Geral da República, como em outras Cartas. A partir da Constituição da

República de 1988, o Presidente da República, os Governadores dos Estados e do Distrito

Federal, as mesas do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, das Assembleias

Legislativas dos Estados e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o Conselho Federal da

Ordem dos Advogados do Brasil, Partidos políticos com representação no Congresso

Nacional, Confederação Sindical e Conselho de Classe de âmbito Nacional, passam a ter

legitimidade para questionar a constitucionalidade de lei e atos normativos pela via abstrata.

A Carta constitucional de 1988 inova os modelos de ações admissíveis de propositura

perante a Suprema Corte para se questionar a (in) constitucionalidade de leis e atos

normativos. Segundo diretrizes da atual Carta Magna, não somente atos comissivos, mas,

também, atos omissivos passam a ser objeto de controle de constitucionalidade, adotando

também o ordenamento constitucional pátrio, além da Ação Declaratória de

Inconstitucionalidade e a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão.

A hodierna Carta da República assume meios para se ratificar a compatibilidade de leis

e atos normativos por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade. A Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental completa o controle de constitucionalidade pela

via concentrada, sendo, também, uma inovação do ordenamento constitucional vigente.

Finalmente, o instituto do controle de constitucionalidade ganhou importantes traços na

Constituição da República de 1988, que devido à atualidade e grau de importância, merece ser

abordado em um capítulo específico, que não o de um efêmero horizonte histórico.

1.3 Breves perspectivas do controle de constitucionalidade no direito comparado

1.3.1 O caso Marburyversus Madison

Para alinhavar um estudo sobre controle de constitucionalidade, é importante analisar

traços deste instituto na ótica do direito estrangeiro, além de como essefenômeno surgiu e se

consagrou em outros países e o grau de influência que exercem sobre o controle no

ordenamento brasileiro.

No âmbito histórico do instituto de controle de constitucionalidade, reconhece-se o caso

Marbury versus Madison como delimitador temporal. Destarte, esta pesquisa adota um corte

providencial na linha do tempo.

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Este caso apreciado pela Suprema Corte Estadunidense no início do século XIX se

notabilizou como um dos mais clássicos casos de controle de constitucionalidade, o qual se

tornaria, mais tarde, “o mais célebre caso de constitucional de todos os tempos” (BARROSO,

2012a, p. 27).

Marburyversus Madison é tratado como a decisão mais importante do direito

constitucional americano e, sem dúvida,esse fato tem influenciado o nosso direito

constitucional e todo o sistema de controle de constitucionalidade (SOLA apud ANDRADE,

2016, p. 87).

O relevante episódio se deu no início do século XIX, devido a um envolvimento político

nos Estados Unidos. No ano de 1800 houve uma eleição presidencial na qual estavam em

disputa o então Presidente John Adams, do Partido Federalista, e Thomas Jefferson, do

Partido Republicano, que vencera as eleições.Este pleito foi um desastre para os Federalistas,

que, além de não conseguirem a reeleição do Presidente Adams, ficaram com a minoria nas

duas Casas do Congresso Nacional (ANDRADE, 2016, p. 88).

Contudo, após o resultado das eleições, às vésperas do fim de seu mandato, o Presidente

Adams tomou uma série de medidas para ter representatividade perante o Poder Judiciário,

nomeando o seu Secretário de Estado, John Marshall, para o cargo de Chief Justice. Além da

nomeação do partidário federalista para Chief Justice, Adams sancionou uma lei, criando 42

novos cargos de Juiz de Paz para o Distrito de Colúmbia, proferindo as respectivas

nomeações, dentre as quais, a de William Marbury.

Acontece que o mandato de Adams venceu, sem, no entanto, formalizar todas as

nomeações, tendo o novo Presidente, Thomas Jefferson, sido empossado em 04 de março de

1801. O Presidente empossado então nomeou para o Cargo de Secretário de Estado James

Madison e determinou a este que não entregasse a nomeação a Marbury (KELLES, 2011, p.

29), o qual ficou impossibilitado de assumir a magistratura.

Em meio a este imbróglio político, Marbory, ingressou diretamente na Suprema Corte a

fim de fazer valer sua nomeação e, finalmente, ser investido no cargo para o qual havia sido

indicado pelo Presidente anterior.

No julgamento “a Corte decidiu que Marbury tinha direito à investidura no qual havia

sido nomeado” (ANDRADE, 2016, p. 98). Entretanto, alheia ao mérito da questão

estritamente política, outra questão ganha destaque neste caso, consagrando a trama de

Marburyversus Madison como expoente caso de Controle de Constitucionalidade.

Marbury interpôs um writ mandamus diretamente perante a Suprema Corte com

fundamento no JudiciaryAct, seção 13, de 24 de setembro de 1789. Entretanto, a Constituição

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Federal dos Estados Unidos da América estabelece no artigo terceiro, seção 2, que em

questões relativas a Embaixadores, Ministros e Cônsules, e naquelas em que se achar

envolvido um Estado, a Suprema Corte exercerá jurisdição originária. Nos demais casos a

Corte terá jurisdição em grau de recurso, pronunciando tanto sobre os fatos como sobre o

direito e observando as exceções e as normas que o Congresso estabelecer.

Vislumbrou-se, pois, um obstáculo diante da Constituição, visto que esta Carta declarou

que a Suprema Corte detinha competência para apreciar a questão, tal qual Marburyversus

Madison, já que em via recursal o caso sob análise fora interposto diretamente diante da Corte

Suprema.

Defronte esta flagrante inconstitucionalidade, quanto à forma, “a Corte decidiu que não

poderia assegurar o remédio requerido numa ação originariamente ajuizada pera ela por falta

de competência” (ANDRADE, 2016, p. 98). A corte então não concedeu a ordem pleiteada

por Marbury.

Este caso emblemático “firmou as bases do judicial review e sacramentou a importância

institucional da Suprema Corte no concerto da federação norte-americana” (KELLES, 2011,

p. 29) até hodiernamente predominante nas bases do direito estadunidense que pactua o

precedente jurisprudencial como relevante fonte do direito.

A decisão proferida no caso Marburyversus Madison “declara de uma vez por todas a

doutrina da judicial reviewoflegislation, quando consagrou a supremacia da Constituição e a

competência da Suprema Corte para guarda-la frente aos abusos a arbítrios perpetrados pelos

Poderes Legislativo e Executivo” (ANDRADE, 2016, p. 94).

Neste reflexo significativo no que tange a (in) constitucionalidade de leis e atos

normativos, convida-se a estudar, além do sistema predominante na América do Norte, os

modelos difuso e concentrado e como estes criaram raízes em alguns países da Europa,

sobretudo, Áustria, Alemanha, Itália e Portugal e, finalmente, o grau de influência destes

sobre o direito brasileiro.

1.3.2 Os modelos norte-americanos e austríaco de constitucionalidade: características, efeitos

e expansão no mundo

Historicamente, o estudo do controle de constitucionalidade foi dividido em dois

grandes modelos: o americano e o austríaco. Cada um dos modelos fundamentalmente

antagônicos apresentam suas particularidades, com grau de ingerência em outros modelos

pelo mundo. O modelo americano

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gerou um sistema, fundado no critério difuso, de natureza técnico-jurídica, a ponto

de afirmar-se que não se caracteriza verdadeiramente como uma forma uma forma

de jurisdição constitucional, não tanto por ter sido entregue o controle de

constitucionalidade à jurisdição ordinária, mas pelo fato de que a jurisdição

ordinária não aprecia a Constituição em função de seus valores políticos, não se

configurando como guardiã dos valores constitucionais, por ter como objetivo

principal a decisão do caso concreto. Entendemos que também aí existe jurisdição

constitucional, tomada a expressão no sentido de modo a compor os litígios

constitucionais. Apenas não se realiza com plenitude a função de guarda dos valores

constitucionais, dada a preferência pela decisão do caso concreto. O sistema europeu

desenvolveu-se como resposta aos ataques político e ideológico da Constituição. O

sistema de defesa não poderia ser senão de natureza política e ideológica. A

evolução chegou à evolução das Cortes Constitucionais, a partir de 1920, como os

únicos tribunais competentes para solucionar conflitos constitucionais, fundado no

critério de controle concentrado (SILVA, 2015, p. 563-564).

No método americano, que inspirou o controle difuso em vários países, inclusive no

Brasil, a competência para apreciar o tema de anticonstitucionalidade é expandida. Todos os

órgãos judiciários, inferiores ou superiores, federais ou estaduais, têm, como foi dito, o poder

e o dever de não aplicar as leis inconstitucionais aos casos concretos submetidos a seu

julgamento (CAPPELLETTI, 1999, p. 77).

Neste paradigma, no curso de qualquer processo – não necessariamente uma ação

constitucional com o fito exclusivo de arguir uma inconstitucionalidade – o magistrado, ao se

deparar com uma lei contrária a Constituição, está autorizado a enfrentá-la. Este modelo

“obriga qualquer juiz ou órgão judiciário, quando deparar com uma norma que viole a

Constituição, a não a aplicar ao caso, fazendo-o incidentalmente, ou seja, no curso do

processo” (SARMENTO, 2015, p. 240).

O sistema americano, que consagra, pois, o judicial review, encontra-se, sobretudo, em

muitas das ex-colônias inglesas, como Canadá, Austrália e Índia. (CAPPELLETTI, 1999, p.

68). Característica que surge neste modelo de controle diz respeito à vinculação de demais

tribunais à posição firmada pela Corte Suprema, que notabiliza o princípio do statredecisis e

contribui para a tentativa de acabar com as divergências e, por conseguinte, proporcionar

maior segurança jurídica (SARMENTO, 2015, p. 241-242). Este sistema,

opera de modo tal que o julgamento de inconstitucionalidade da lei acaba,

indiretamente, por assumir uma verdadeira eficácia erga omnes e não se limita a

então trazer consigo o puro simples efeito da não aplicação da lei a um caso concreto

com possibilidade, no entanto, de que me outros casos a lei seja, ao invés de novo

aplicada. Uma vez não aplicada pela SupremeCourtpor inconstitucionalidade, uma

lei americana, embora permanecendo “onthe books”, é tornada a “deadlaw”, uma lei

morta (CAPPELLETTI, 1999, p. 81).

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Em posição destacadamente contrária ao sistema americano de fiscalização de

constitucionalidade das leis, encontra-se o modelo austríaco. Neste modelo há uma

concentração de competência e uma desvinculação dos casos concretos.

No sistema concentrado ou austríaco, ao contrário, os juízes comuns – civis, penais,

administrativos – são incompetentes para conhecer, mesmo incidenter tantum e, portanto,

com eficácia limitada ao caso concreto, da validade das leis (CAPPELLETTI, 1999, p. 84-

85).

Neste modelo, os juízes não possuem competência para analisar a constitucionalidade

de uma norma, somente o Tribunal Constitucional (SARMENTO, 2015, p. 243).

A concentração que caracteriza o modelo austríaco não se resume a competência para

julgamento. Reflete-se, também, na restrição aos legitimados ao questionar acerca de vícios

em face da Lei Maior. Se o modelo americano admite uma pluralidade de juízes e ações, nas

quais incidentalmente o magistrado pode apreciar uma inconstitucionalidade, é de se

reconhecer também uma universalidade de legitimados.

O sistema concentrado ou austríaco, todavia, apresenta traço diverso. Com efeito, a

questão da constitucionalidade das leis podia ser arguida perante a Corte Constitucional

austríaca somente por aqueles órgãos não judiciários, mas políticos (CAPPELLETTI, 1999, p.

105).

No entanto, com a reforma constitucional de 1929, a legitimação para instaurar o

processo à vista da Corte Constitucional austríaca foi estendida a dois órgãos judiciários: a

ObersterGerichtshof (Corte Suprema) e Waltungsgerichtshof (Corte Administrativa). Estes

órgãos judiciários, mesmo continuando a não poder efetuar, eles próprios, controle algum da

legitimidade constitucional das leis, foram, então, legitimados a requerer à Corte

Constitucional que efetue o controle (CAPPELLETTI, 1999, p. 107).

Não é demais reforçar que estes órgãos judiciários não detêm legitimidade em si para

declarar a constitucionalidade ou não de instrumento legislativo. Verificou-se, aqui, uma

abertura circunstancial da competência a fim de propor o debate constitucional e não o

julgamento.

Há, portanto, uma ruptura com o monopólio de controle constitucional, na qual os

órgãos judiciais passam a ter um juízo provisório e negativo sobre a matéria. Essa tendência

seria reforçadaposteriormente com a adoção de modelo semelhante na Alemanha, Itália e

Espanha (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1057).

O modelo austríaco ou concentrado se expandiu para Tchecoslováquia (1920), Espanha

(1931), Constituição da República Italiana (1948), Constituição da República do Chipre

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(1960), Constituição da República Turca (1961) e Alemanha, na Constituição de Bonn de

1949 (CAPPELLETTI, 1999, p. 73).

Alemanha e Itália sãoreconhecidas pelos ordenamentos jurídicos influenciados pelo

sistema austríaco de controle, no qual juízes comuns, de instâncias inferiores, não são

competentes para apreciar uma inconstitucionalidade de lei, estando, pois, a competência

reservada à Corte Constitucional.

Contudo, na Itália e na Alemanha, diferentemente da Áustria, todos os juízes comuns,

mesmo que aqueles inferiores, encontrando-se diante de uma lei que eles considerem contrária

à Constituição, em vez de serem passivamente obrigados a aplicá-la, têm, ao contrário, o

poder (e o dever) de submeter à questão da Constitucionalidade à Corte Constitucional, a fim

de que seja decidida por esta, com eficácia vinculatória (CAPPELLETTI, 1999, p. 109).

Há de se frisar neste ponto a diferença entre os institutos. No clássico modelo austríaco

de controle, os juízes comuns, de cortes diversas, penais, cíveis administrativas, não detêm

autonomia para arguir uma inconstitucionalidade, devendo tão somente aplicá-la quando o

caso determinar a subsunção à norma.

No caso Italiano e Alemão, em que pese serem influenciados pelo modelo austríaco

concentrado de constitucionalidade, os ditos juízes comuns continuam inaptos a debater uma

inconstitucionalidade. Entretanto, não são compelidos à aplicação da lei sob suspeita de vício

e podem provocar a Corte Constitucional a se manifestar a respeito.

Nota-se, pois, uma pequena aproximação ao sistema americano da judicial review,

porque, embora na Itália e na Alemanha não aconteça que todos os juízes sejam competentes

para efetuar o controle de constitucionalidade, todos, são, pelo menos, legitimados a requerer

tal controle à Corte Constitucional, por ocasião dos casos concretos que eles estejam

obrigados a julgar (CAPPELLETTI, 1999, p. 110).

Registre-se o modelo germânico, que prevê ainda mais expansão no que tange a

legitimação. O modo do exercício de controle continua monopólio da Corte Constitucional

federal alemã (MENDES, 1993, p. 15), todavia, observou-se uma significativa ampliação dos

legitimados, ao se comparar ao inspirador modelo austríaco.

A Alemanha admite que o Governo Federal, os Governos dos Länder, um terço dos

membros da bundestag -parlamento alemão - e até mesmo pessoas individualmente, quando a

lei viciada implicar uma lesão a direito fundamental, possam se dirigir em via de ação à Corte

Constitucional para suscitar uma inconstitucionalidade (CAPPELLETTI, 1999, p. 110).

Além das Cortes competentes para exercer o controle e os legitimados à propositura, os

modelos sob estudo apresentam particularidades acerca dos efeitos das decisões.

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Os efeitos das decisões de reconhecimento de inconstitucionalidade apresentam, em

cada sistema, características que merecem ponderação. No modelo americano “a lei

inconstitucional, porque contrária a uma norma superior é considerada nula e, por isso,

ineficaz pelo que o juiz, que exerce o poder de controle, não anula, mas declara uma (pré-

existente) nulidade inconstitucional (CAPPELLETTI, 1999, p. 116)”.

No sistema de controle difuso americano, o Poder Judiciário atua como “fiscal da

Constituição e da sua compatibilidade com os demais atos estatais, possuindo a competência

para declarar nulos e írritos todos os atos contrários à Constituição (SARMENTO, 2015, p.

240)”.

Diferentemente, no modelo austríaco ou concentrado, a lei pode ser anulável e não nula.

Goza o instrumento normativo de presunção de constitucionalidade, vez que a lei é

considerada válida e eficaz até que decisão posterior denuncie a sua inconstitucionalidade

(SARMENTO, 2015, p. 243).

No quesito temporal e vinculação dos impactos, há de se destacar que o sistema

americano empresta às suas decisões efeitos retroativos, ao passo que o austríaco opera efeitos

futuros, não se admitindo qualquer retroatividade da eficácia da anulação (CAPPELLETTI,

1999, p. 117).

Uma questão que ganha destaque nas decisões de inconstitucionalidade e que se

pretendedebater nestetrabalhono âmbito do direito brasileiro trata da divulgação dos efeitos da

tutela jurisprudencial que, se revestida de eficácia geral, propaga seus reflexos para todo o

ordenamento.

Pelo sistema austríaco a decisão opera efeitos erga omnes, e, uma vez sobrevindo o

pronunciamento de inconstitucionalidade, torna-se ineficaz para todos. O modelo americano,

ao contrário, admite a produção de efeitos apenas entres as partes do processo. O magistrado,

portanto, deve limitar-se a não aplicar a lei inconstitucional apenas ao caso concreto

(CAPPELLETTI, 1999, p. 118).

Na Alemanha as decisões proferidas em processo de controle de normas são publicadas

no Diário Oficial e têm efeito vinculante e força de lei (MENDES, 1993, p. 13). No modelo

germânico se nota a eficácia erga omnes da declaração de inconstitucionalidade com muito

mais impacto, sendo esta inclusive publicada no Diário Oficial.

Na Itália e na Alemanha, em que pese serem adeptas do tradicional modelo austríaco,

apresentam suas particularidades. Tanto na Itália quanto na Alemanha, considera-se, de fato,

que a sentença, com que as cortes constitucionais declaram a inconstitucionalidade de uma lei,

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tem eficácia erga omnes do mesmo modo que na Áustria. Contudo, o sistema ítalo-germânico

permite uma eficácia retroativa, operando, pois, efeito extunc (CAPPELLETTI, 1999, p. 119).

Uma vez inserido no contexto do controle de constitucionalidade sob a ótica dos

sistemas americano e austríaco e suas particularidades no que concerne à competência,

legitimação e efeitos da decisão de inconstitucionalidade nestes países, é relevante que se

passe ao estudo destes modelos à luz da Constituição vigente no Brasil e como esta

importante Carta foi influenciada por estes significativos modelos.

É neste ponto que a problemática desta pesquisa começa a se desenhar, visto que com a

produção de efeitos de norma declarada inconstitucional pela via difusanão se pode olvidar,

neste caso, da relação envolvendo os poderes da União.

1.4 Progresso histórico dos Poderes do Estado: Separação, interdependência e nova

harmonia

O Controle de atos do legislativo por órgão judiciário, necessariamente passa pela

relação e interdependência entre os poderes da União. Contudo, para tanto é necessário

contextualizar o vínculo entre os poderes sob um viés histórico e, ainda, discorrer sobre como

se deu o progresso da harmonia entre os poderes com o curso do tempo.

O poder de dominar é tentador, o domínio do poder é avassalador. A busca incessante

pelo poder sempre mereceu destaque na história, sendo que, em várias oportunidades,

dependendo do contexto, notabilizou-se a unidade do poder.

Num contexto histórico, a propriedade conduziu o poder, ficando este concentrado nas

famílias com vastas posses e bens, a exemplodo sistema feudalista ou monárquico absolutista,

nos quais o poder de todo feudo ou reino era antropologicamente centrado no senhorio

possuidor e nobre que dominava o seu território bem como seus vassalos, sendo este quem

criava a aplicava as regras.

No regime monárquico, no qual se vislumbrava a centralização do poder,

Toda a organização política estava efetivamente no Poder Moderador, concentrado

na pessoa do Imperador. Realmente, criando o Poder Moderador, enfeixado na

pessoa real, os estadistas do antigo regime armam o soberano de faculdades

excepcionais. Como Poder Moderador, ele age sobre o Poder Legislativo pelo

direito de dissolução da Câmara, pelo direito de adiamento e de convocação, pelo

direito de escolha, na lista tríplice, dos senadores. Ele atua sobre o Poder Judiciário

pelo direito de suspender os magistrados. Ele influi sobre o Poder Executivo pelo

direito de escolher livremente os ministros de Estado e livremente demiti-los. Ele

atua sobre a autonomia das províncias. E, como chefe do Poder Executivo, que

exerce por meio dos seus Ministros, dirige, por sua vez, todo o mecanismo

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administrativo do pais. Aqui o Rei reinava, governava e administrava (SILVA,

2015, p. 78).

Noutra perspectiva, o império medieval era uma federação de pessoas caracterizada pelo

domínio senhorial, não tendo sua estrutura em territórios e organização, mas nos

compromissos pessoais entre dominadores e dominados (WOLFF; BACHOF; STOBER,

2006, p. 95), também marcado pela unidade do poder.

O domínio do poder, contudo, é avassalador. Criar e aplicar o direito leva a

consequências desastrosas, sendo soberano aquele quem decide o que fazer e como fazer, não

estando sujeito às leis que ele próprio emana (BOBBIO, 1994, p. 18), tornando-se intocável,

de modo que o restante da sociedade não tenha força alguma perante o líder, sendo o poder

centrado em mãos únicas, usado em benefício próprio, beirando o descontrole.

Mais recentemente, o monopólio do poder se destacou historicamente, tal como na

Alemanha sob o governo do Führer, que alterou toda a organização administrativa do Estado,

sendo que todos os Estado federados perderam autonomia, segundo a Lei da Reestruturação

de 30 de Janeiro de 1934, ficando, pois, subordinados aos governantes, num regime que

destituiu os órgãos colegiados, substituindo-os por órgãos criados sob a égide do

Führerprinzip, isto é, do tipo monocrático (WOLFF; BACHOF; STOBER, 2006, p. 119-120).

Em se tratando da constitucionalização germânica, urge mencionar a Constituição de

Weimar de 1919, carta de reconhecido destaque no tocante à democratização e

constitucionalismo contemporâneo, cujo ponto essencial consistia na harmonia de poder entre

Executivo e Parlamento (CAENEGEN, 2009, p. 326).

À luz da Constituição de Weimar, numa análise tão somente textual, a separação de

poderes estaria resguardada. Acontece que, sob a influência do regime nazista, o pêndulo do

poder se deslocou de forma “significativa do parlamento para o Presidente” (CANEGEN,

2009. p. 328), no qual cabe destacar que o führerdetinha uma posição de força em relação ao

governo e parlamento, com poderes tecnicamente legiferantes, tais como para aprovação da

Lei de Delegação de Poderes – Ermächtigungsgeseteze(CAENEGEN, 2009, p. 330),

traduzindo, na prática, a ruína democrática lançada em Weimar.

Ante tal domínio do poder, os inimigos da democracia forjam as percepções

democráticas para obscuros propósitos íntimos, conduzindo ao suicídio da democracia,

oferecendo-a ao autocrata, como foi na Alemanha da década de 1930 (PONTES DE

MIRANDA, 2002, p. 190), anotando que “o poder absoluto arbitrário, ou governo sem leis

estabelecidas e permanentes, é absolutamente incompatível com as finalidades da sociedade e

do governo” (LOCKE, 1994, p.165).

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No Brasil, o regime militarista (1964-1985) foi marcante no prisma do poder unitário. O

Poder Executivo ficou sob o comando dos militares e, em que pesea existência de um Poder

Legislativo tecnicamente separado, a real função legiferante também ficou a cargo daqueles

que ocupavam a função executiva. Os atos institucionais decretados no período militarista

brasileiro, claramente demonstram que o Executivo estava a legislar, concentrando o domínio

da lei e o domínio da aplicação da lei.

Nesta perspectiva de unidade do poder, no tocante à incongruência unitária entre

Legislativo e Executivo num só órgão, é relevante observar o ato institucional de número 16,

de 14 de outubro de 1969, que estabeleceu no texto do artigo terceiro que a chefia do Poder

Executivo ficaria a cargo dos Ministros Militares, ante a vacância da cadeira presidencial, que

se deu devido ao estado de saúde do então Presidente Marechal Arthur da Costa e Silva.

Diante de tal cenário, os Ministros da Guerra, do Exército e da Aeronáutica, chefes do

Executivo (art. 3. do AI 16/1969), promulgaram em 17 de outubro daquele ano, a Emenda

Constitucional n. 1, que modificou substancialmente a Constituição de 1967. Deste modo, a

chefia do Poder Executivo esteve a legislar, reescrevendo a Constituição vigente à época,

reescrevendo, pois, a lei cuja aplicação dar-se-ia pelo próprio Executivo.

No ano anterior, ainda com a chefia do Executivo a cargo do Marechal Costa e Silva, e

com vigência do Ato Institucional n. 5, o chefe do Executivo estava autorizado a decretar o

recesso do Congresso Nacional, suspendendo as funções do Poder competente tecnicamente

legiferante, mesmo ausente o estado de sítio. Diante de tal cenário, o Poder Executivo,

segundo ditames do AI 5, estava expressamente autorizado “a legislar em todas as matérias e

exercer as atribuições previstas nas Constituições ou na Lei Orgânica dos Municípios” (art. 2,

§1.).

Nestes contextos do regime militar brasileiro, claramente a função de criar o direito, ou

reescrevê-lo, estava a domínio dos governantes. Apesar da existência dos poderes, a princípio

e tecnicamente independentes - tal como deixava um sopro de esperança os artigos 6da

Constituição de 1967, mantido pela emenda constitucional de 1969, sob mesmo artigo – as

funções de criar e aplicar o direito estavam nas mãos do Chefe do Executivo.

A Constituição de 1967 e Emenda Constitucional n. 1 de 1969 estabeleciam no sexto

artigo de ambos textos que: “são Poderes da União, independentes e harmônicos, o

Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. A Carta de 1967 (art. 10, inciso VII, “d”) e Emenda

Constitucional de 1969 (art. 10, inciso VII, “c”) autorizavam ainda a intervenção da União

nos Estados para garantir a independência e harmonia dos Poderes.

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No entanto, a frieza dos escritos, por vezes utópica, deve ser analisada com cautela,

pois, os inimigos da democracia insistem em deformar o conceito democrático para obscuros

propósitos (PONTES DE MIRANDA, 2002, p. 190).

Nestes cenários abordados, nota-se a reunião dos poderes referentes ao domínio da lei e

domínio da aplicação da Lei, tal como na Grã-Bretanha, com a assembleia da aristocracia

assumindo o controle do legislativo (CAENEGEN, 2009, p. 236). Aliás, exemplos não faltam

na perspectiva histórica mundial.

A história nos prova que a “principal ameaça à liberdade é a concentração do poder de

coerção, seja nas mãos de um monarca, de um ditador, de uma oligarquia” (FRIEDMAN,

apud CAPPELLETTI, 1993, P. 54). Assim, é de fundamental valia direcionar o pensamento

para a separação dos poderes e competências, pois, “a preservação da liberdade exige, na

maior medida possível a eliminação de tal concentração de poder e a diluição e distribuição

do tanto de poder que não possa ser eliminado, ou seja, um sistema de checksand balances”

(FRIEDMAN, apud CAPPELLETTI, 1993, P. 54).

Retornando ao século XVII, em uma breve e necessária retrospectiva histórica, a

revolução gloriosa, marco importante da revolução inglesa, foi determinante também para a

busca da separação dos poderes, mais notadamente, no que compete ao Legislativo e

Executivo. Neste contexto histórico, ressalta-se o conflito entre Coroa e parlamento, com

vitória deste, que acarretou na queda do Rei Jaime II.

Tal marco histórico ilustrou a desunião extrema entre os Poderes, assumindo o

Parlamento uma soberania incontrolável na feitura de leis, incidindo sobre matérias de todo o

tipo, “sem ser dificultado por uma constituição e muito menos exposto a fiscalização por parte

do poder judicial” (CAENEGEN, 2009, p. 240).

De toda sorte, a concentração do poder, mesmo que perante organismos minimamente

legislativos alheios à coroa, não conduz à percepção democrática almejada, sendo revestido

de viés autoritário também limitador de direitos, tal como no domínio de governantes.

A unidade do poder se torna perigosa, pois, “quando, na mesma pessoa ou no mesmo

corpo de magistratura, o poder legislativo é reunido ao poder executivo, não há liberdade: por

que é de temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado faça leis tirânicas, para executá-las

tiranicamente” (MONTESQUIEU 1996, p. 168)

Diante desse pressuposto, cabe ressaltar que a busca pela liberdade, liberdade esta, que

somente está presente em governos moderados (MONTESQUIEU, 1996, 166), uma vez que

liberdade e poder são termos antitéticos (BOBBIO, 1994, p. 20).

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A liberdade, um dos pilares da revolução francesa, ícone motivador das batalhas

seculares em face do autoritarismo dos governantes, motiva a busca pelo fortalecimento

legislativo, necessário em dados momentos históricos.

Após longos períodos de autoritarismos opressores, reforça-se a fé na lei, em suas

estritas e salvadoras palavras. Contudo, diante de um domínio do poder, mesmo pelo

legislativo, há de se ressaltar que “a finalidade da lei não é abolir ou conter, mas preservar e

ampliar a liberdade. Em todas as situações de seres criados aptos à lei, onde não há lei, não há

liberdade”. (LOCKE, 1994 p. 115).

Nota-se, pois, no pensamento da época, fatores influenciadores da doutrina liberalista,

que visa à subordinação dos poderes políticos às leis gerais do país, de modo a louvar o

Estado de Direito (BOBBIO, 1994, p. 18-19).

A partir daquela revolução, importante marco histórico que influenciou a teoria de John

Locke, já que este retornou à Inglaterra no auge da Revolução Gloriosa, em 1688, vê-se

publicada, então, a clássica obra Segundo Tratado sobre o governo civil, no o autor qual

propõe uma análise crítica acerca da separação dos Poderes.

Os homens se organizam e aceitam viver em sociedade e estão sujeitos às regras

impostas, contudo, sem autoritarismo. No entanto, “a liberdade do homem na sociedade não

deve estar edificada sob qualquer poder legislativo exceto aquele estabelecido por

consentimento na comunidade civil; nem sob o domínio de qualquer vontade ou

constrangimento por qualquer lei, salvo o que o legislativo decretar, de acordo com a

confiança nele depositada” (LOCKE, 1994 p. 95). Há de se ressaltar o poder legiferante como

poder supremo em toda comunidade civil, quer seja ele confiado a uma ou mais

pessoas, quer seja permanente ou intermitente. Entretanto, Primeiro: ele não é

exercido e é impossível que seja exercido de maneira absolutamente arbitrária sobre

as vidas e sobre as fortunas das pessoas. Sendo ele apenas a fusão dos poderes que

cada membro da sociedade delega à pessoa ou à assembleia que tem a função do

legislador, permanece forçosamente circunscrito dentro dos mesmos limites que o

poder que estas pessoas detinham no estado de natureza antes de se associarem em

sociedade e a ele renunciaram em prol da comunidade social. [...] Segundo: O

legislativo, ou autoridade suprema, não pode arrogar para si um poder de governar

por decretos arbitrários improvisados, mas se limitar a dispensar a justiça e decidir

os direitos do súdito através de leis permanentes já promulgadas (LOCKE, 1994 p.

163-164).

A sociedade precisa de regras que visem o bem comum, mas, para tanto, os poderes do

Estado precisam ser bem definidos e delimitados os respectivos limites. Após muita luta, “a

humanidade aprende que, sendo todos iguais e independentes, ninguém deve lesar o outro em

sua vida, sua saúde, sua liberdade ou seus bens” (LOCKE, 1994, p. 84).

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A partir deste contexto, o poder de criar e aplicar o direito devem ser separados.

Destarte, o domínio da lei e o domínio de aplicação da lei não podem pertencer ao mesmo

órgão, a fim de suprir o autoritarismo outrora enfrentado. Ademais, “para garantir a execução

das leis no tempo em que elas permanecerem em vigor, é necessário que os poderes

legislativo e executivo fiquem frequentemente separados” (LOCKE, 1994, p.171).

O Poder político, a partir da perspectiva de Locke, então é descentralizado, atribuindo a

função de dominar a lei ao Poder Legislativo e o domínio da aplicação da lei ao Executivo.

Locke ainda propõe um terceiro poder, denominado de Poder Federativo, com atribuições de

chefia de Estado, relações políticas estrangeiras, tais como propor guerra ou celebrar a paz.

Em que pese à existência do Poder Federativo tecnicamente independente, este tem

íntima ligação com o Poder Executivo, concentrando a proposta de Lockena indubitável

separação entre Poder Legislativo e Executivo.

A questão sobre a proposta de separação dos poderes se expande pela Europa. Ao fim

do século XVIII, na França, eclodiu a partir de 1789 a revolução contra o absolutismo

monárquico, que culminou na queda do Rei Luís XVI e a ascensão popular. Neste mesmo ano

de 1789, em 26 de agosto, fora proclamada a Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão, hodiernamente reconhecida como grande Carta, em se tratando de direitos humanos.

Sob a nuvem da trinca revolucionária – liberdade, igualdade e fraternidade – que

pairava sobre a França naquele contexto histórico, a Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão passava a estabelecer o respeito à dignidade da pessoa humana, a liberdade de

pensamento, a igualdade, a propriedade privada, que se tornaram elementos tendenciais diante

do constitucionalismo ocidental, presentes em Constituições nacionais e Cartas de direitos

humanos pelo mundo.

Percebe-se o fortalecimento da doutrina da Separação dos Poderes presente no corpo do

artigo 16 da Declaração: “qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos

direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”.

Os ares da revolução com viés republicano sopraram fortes, não limitados apenas ao

território francês. A partir da Revolução francesa, várias vicissitudes nos foram apresentadas,

como a proliferação das democracias nas Américas (SUORDEM, 1995, p. 14).

A partir das premissas abordadas, a concentração das funções Legislativas e Executivas

em um só órgão ou pessoa conduz ao autoritarismo, conforme a própria história já provou em

inúmeras oportunidades. A Separação destas funções é fundamental para ter início um

pensamento democrático.

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Há de se frisar, contudo, que tais funções devem ser separadas, estando distribuídas em

mãos de pessoas e órgãos diferentes. No entanto, não devem ser isoladas como água e óleo

que não se misturam ou nutrem entre si uma harmonia recíproca, pois, ao isolar

completamente os poderes do controle político, pode haver uma privação do processo

democrático de seu significado central (ACKERMAN, 2014, p. 18).

Neste ponto, há que se ressaltar que as ambições constitucionais devem ser analisadas

segundo dois paralelos: Constitucionalismo e parlamentarismo. O completo isolamento dos

Poderes, com soberania intocável do Parlamento conduz a “um regime onde o governo e

Poder Legislativo derivavam a sua autoridade da Nação, sendo responsáveis perante esta, ou

melhor, perante os seus representantes, reunidos num parlamento eleito. Isto excluía a

democracia directa e até mesmo a própria democracia” (CAENEGEN, 2009, p. 236).

Na conjuntura do constitucionalismo, contudo, exige-se um modelo de governo cuja

forma de operar se submeta à lei (CAENEGEN, 2009, p. 235). Os Poderes separados em dois

extremos, sem qualquer comunicação entre si, não conduzem ao viés verdadeiramente

democrático.

Nesta abordagem, tem-se que o isolamento dos poderes, que só pelo fato de separar as

competências não conduz, necessariamente, ao prisma democrático. Nesta seara, torna-se

importante considerar a interdependência harmônica entre os poderes. Assim, há de se pautar

na obra O Espírito das Leis, de Montesquieu, que propõe, além da Separação dos Poderes, o

fim do autoritarismo decorrente da unidade do poder, visando uma relação harmônica entre os

mesmos de modo a vislumbrar o ápice democrático.

O Fato de cada poder recobrir uma função própria sem qualquer interferência dos outros

nunca foi registrada em Montesquieu, que pregava a combinação dos poderes (CANOTILHO,

2003, p. 115) e destacava que “os poderes precisam de um poder moderador para regula-los”

(MONTESQUIEU, 1996, p.172).

No entanto, há de se frisar que a teoria de Montesquieu não propõe que este poder

moderador se situe soberana e intocavelmente acima dos poderes de legislar e aplicar o

direito, moderando estes, pois, o total isolamento dos poderes afasta o pensamento

democrático (ACKERMAN, 2014, p. 18). Além do mais, “estaria tudo perdido se o mesmo

homem, ou o mesmo corpo dos principais ou dos nobres, ou do Povo, exercesse os três

poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas; e o de julgar os crimes ou as

querelas entre os particulares”. (MONTESQUIEU, 1996, p.168).

A proposta de Montesquieu é cingida exatamente no sentido oposto: de harmonia e

interdependência recíproca, de modo que o poder moderador é também moderado.

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Criar e aplicar as regras são questões fundamentais no Poder político de um Estado e,

ainda que separadas, necessitam de interdependência. De nada valeria, em um preliminar

pensamento democrático, se, exemplificativamente, o chefe do Poder Executivo exercer suas

funções sem, contudo, prestar devida obediência aos preceitos legais. Estaria da mesma forma

sendo autoritário contra o sistema, servindo a independência do Legislativo de simples

máscara, apta apenas a transparecer uma imaginária e ilusória democracia.

De igual maneira, se o Poder responsável por criar o direito o fizer de modo contrário à

Constituição ou às demais legislações, submeterá o Poder Executivo, aplicador da lei, a

preceitos inconstitucionais e antidemocráticos. “Se o poder executivo não tiver o direito de

limitar as iniciativas do corpo legislativo, este será despótico; pois, como ele poderá outorgar-

se todo o poder que puder imaginar, anulará os outros poderes” (MONTESQUIEU, 1996,

173-174). Deste modo, ao vislumbrar a Separação dos Poderes, destaca-se

a harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no

trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos

têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os

órgãos do poder nem a sua independência são absolutas. Há interferências, que

visam ao estabelecimento de um sistema de freios e contrapesos, à busca do

equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar

o arbítrio e o demando de um em detrimento do outro e especialmente dos

governados. (SILVA, 2015, p. 112)

A teoria de Montesquieu, além de centralizar a discussão da Separação entre os poderes

tangencialmente aos órgãos executivo e legiferante, convida, ainda, a proposta de trazer o

Órgão Judiciário para esta harmonia dos Poderes políticos, passando a disciplinar a teoria

tripartite.

Para coibir eventuais abusos referentes aos independentes poderes legislativo e

Executivo, vislumbrando uma democratização, o Poder Judiciário se torna uma verdadeira

força concreta (NAGEL, 2009, p. 162) em defesa da sociedade.

No entanto, há de se ponderar a separação do judiciário na esfera dos Poderes políticos.

Até então, nas propostas de separação dos Poderes, não havia abarcado com destaque o Órgão

Judicante, que por vezes detinha a função de tão somente aplicar as leis decretadas pelo

Parlamento (MORRIS, apud CAENEGEN, 2009, p. 240), sendo o Judiciário “a boca que

pronuncia as palavras da lei; seres inanimados que não podem moderar a força nem o rigor

dessas palavras”(MONTESQUIEU, 1996, p, 175), não competindo uma fiscalização ou,

quiçá, uma discussão hermenêutica acerca do direito.

Devido ao contexto da Revolução Inglesa, na qual o conflito entre monarquia e o

parlamento incendiava o pensamento do século XVII, a teoria de Locke se concentra na

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separação entre o poder de legislar e de governar. No entanto, não se pode duvidar que a

função de julgar, tarefa fundamental ante ao poder político do Estado, também foi marcada

pelo poder unitário, sendo conferida aos próprios governantes.

Há de se ressaltar, contudo, que a questão entre a separação dos Poderes do Estado não

se esgota no que tange aos Poderes Executivo e Legislativo. É de se analisar que os tipos de

administração da antiguidade, “na maioria dos casos, os governantes, os administradores e os

juízes eram as mesmas pessoas” (WOLFF, BACHOF E STOBER 2006, p. 93). Neste aspecto,

percebe-se também uma unidade concentrada do poder também no que tange às funções

judiciais.

Nesta concepção, mesmo que o poder de julgar não esteja tecnicamente nas mãos de

uma pessoa – como Hitler, que se proclamou juiz supremo em 1934, acarretando a eliminação

radical da separação dos Poderes e na independência dos tribunais (WOLFF, BACHOF E

STOBER, 2006, p. 119) - o Executivo impede o acesso ao judiciário, convalidando todos os

seus atos, conforme ficou transparente com a edição do AI 5, em 1968, que trazia de maneira

expressa, a teor do artigo 11, que são excluídos de apreciação do Poder Judiciário, os atos

praticados de acordo com este Ato Institucional ou Atos Complementes.

Assim, o Executivo passou a julgar, ainda que indiretamente, os seus atos como

absolutos, sendo igual afronta à separação dos poderes. Nesta senda, fica evidente que não

há liberdade se o poder de julgar não for separado do poder legislativo e do

executivo. Se estiver unido ao poder legislativo será arbitrário o poder sobre a vida e

a liberdade dos cidadãos; pois o juiz será legislador. Se estiver unido ao poder

executivo, o juiz poderá ter a força de um opressor (MONTESQUIEU, 1996, p.

168).

Além da relação do Executivo com o judiciário, torna-se desarmônica a concentração de

funções tipicamente judicantes a órgão legislativo, como se pode ressaltar o Parlamento

britânico, caso dos billofattainder, que consistiam em atos legislativos autoritariamente

impositivos de uma pena de morte sem observância do dueprocess necessário para aplicação

de penas criminais (CANOTILHO, 2003, p. 674).

Desta maneira, é de grande importância para o estágio democrático considerar a

separação dos poderes, certamente. No entanto, há de se louvar a interdependência entre eles

e, além de trazer à baila o Poder Legislativo e Executivo, mister voltar os olhos para

separação dos poderes também no que tange ao Judiciário, propondo um diálogo

constitucional entre a Corte e outras agências do governo, uma sutil dialética interação de

temas morais (NAGEL, 2009, p. 174).

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Neste quesito, voltado à tripartição dos poderes, moldes propostos por Montesquieu, a

Constituição da República de 1988 estabelece no artigo segundo que os poderes Executivo,

Legislativo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si.

É importante frisar, todavia, que a Constituição da República de 1988 não foi a pioneira

ao tratar da independência e harmonia entre os poderes no ordenamento constitucional

brasileiro. A Constituição de 1891 (artigo 15), de 1946 (artigo 36), de 1967 (artigo 6) e a

Emenda Constitucional n. 1 de 1969 (artigo 6) também trazem tal previsão em seus

respectivos textos.

Além das previsões constitucionais abordadas, a Constituição de 1824 tratava da divisão

e harmonia entre os poderes políticos, sendo eles, os Poderes Judiciário, Executivo,

Legislativo e o Moderador (artigos 9 e 10). A Constituição de 1934, por sua vez, tratava da

independência e coordenação entre os Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo (artigo 3.).

Diante de tal cenário, além da clássica separação entre os poderes, surge positivada na

Constituição a harmonia entre eles. Neste diapasão os poderes, em que pese à independência,

nutrem entre si uma reciprocidade harmônica.

Destarte, como o poder de dominar é tentador, ou “todo homem investido de poder é

tentado a abusar dele” (MONTESQUIEU, 1996, p. 166), louva-se o equilíbrio entre os

poderes (ABBOUD, 2001, p. 101), consagrando-se, pois, o princípio dos freios e contrapesos,

ou checkand balances, onde um Poder tem por finalidade precípua cumprir sua função típica,

além de fiscalizar ou “frear” abusos de outros poderes.

Ademais, no que concerne à Separação dos poderes, há de se frisar a ideia da

“ordenação das funções através de uma ajustada atribuição de competências expressa na

fixação clara de regras processuais e na vinculação à forma jurídica dos poderes a quem é

feita essa atribuição. Nessa perspectiva, ou seja, como racionalização, estabilização e

delimitação do poder estadual” (CANOTILHO, 2003, p. 251).

A ordenação das funções há de delimitar os atributos típicos, além dos quais, ainda, se

dão por meio da interdependência, o poder de exercício de funções atípicas, a fim de

aperfeiçoar o sistema democrático. Além do mais,

A constitucionalística mais recente salienta que o princípio da separação dos poderes

transporta duas dimensões complementares: (1) a separação como “divisão”,

“controlo” e “limite” do poder – dimensão negativa; (2) a separação como

constitucionalização, ordenação, e organização do poder do Estado tendente a

decisões funcionalmente eficazes e materialmente justas (dimensão positiva). O

sentido referido em (1) corresponde, em rigor, à ideia de divisão dos poderes; o

sentido referido em (2) aponta, sobretudo para a ideia de separação dos poderes. O

princípio da divisão como forma e meio de limite do poder (divisão de poderes e

balanço de poderes) assegura uma medida jurídica ao poder do estado e,

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consequentemente, serve para garantir e proteger a esfera jurídico-subjectiva dos

indivíduos e evitar a concentração do poder. O princípio da separação na qualidade

de princípio positivo assegura justa e adequada ordenação das funções do estado e,

consequentemente, intervém, como esquema relacional de competências, tarefas,

funções e responsabilidades dos órgãos constitucionais de soberania. Nesta

perspectiva, separação ou divisão de poderes significa responsabilidade pelo

exercício de um poder. (CANOTILHO, 2003, p. 250).

A consagração do sistema de freios e contrapesos, idealizado por Montesquieu (1996, p.

166), para quem “para que não possa abusar do poder é necessário que, pela disposição das

coisas, o poder limite o poder”. Assim, para a plenitude democrática almejada, é, sim,

necessário que o Poder freie o Poder.

Nesta sintonia, os poderes do Estado são revestidos de funções típicas e atípicas. Diante

desta tripartite proposta de separação dos poderes, não cabe a um dos poderes do Estado o

exercício de apenas uma função.

O poder legislativo, que, de forma típica, “é aquele que tem competência para

prescrever segundo que procedimentos a força da comunidade civil deve ser empregada para

preservar a comunidade e seus membros (LOCKE, 1994, p. 170)”. Diante da perspectiva

harmoniosa de separação dos poderes, não caberá, somente, pois, a atividade legislativa. A

este compete ainda a “faculdade de examinar de que maneira as leis que criou foram

executadas” (MONTESQUIEU, 1996, p. 174).

Percebe-se, desde logo, uma função fiscalizadora por parte do Poder Legiferante. Desta

forma, vislumbra-se que os Poderes políticos irão acumular funções típicas e atípicas.

A Constituição de 1988 trata a questão em várias oportunidades, tal qual o poder de

veto, exercido pelo Presidente da República. O disposto no artigo 66, §1.da Carta

Constitucional da República estabelece que o Presidente possui a faculdade de vetar Projeto

de Lei por ser inconstitucional ou contrário aos interesses públicos, sendo, pois, o veto, uma

análise de âmbito material sobre o projeto de lei submetido à apreciação do Chefe do

Executivo, que exerce sua discordância quanto ao conteúdo por meio do veto (STRECK,

OLIVEIRA, M. 2013, p. 1161).

Tal hipótese claramente configura atuação do Executivo a frear um abuso cometido pelo

Poder Legislativo, exercendo o Executivo o contrapeso democrático.

No que tange à ritualística do processo de impeachment no ordenamento brasileiro,

claro está também a autuação dos Poderes do Estado, atuando de modo a frear e controlar

abusos de outro.

No caso citado, a Constituição da República de 1988 mostraque cabe ao Senado Federal

processar e julgar o Presidente da República por crime de responsabilidade (art. 52, I e 86).

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Destarte, vislumbra-se o Poder Legislativo exercendo o controle dos atos do Executivo, numa

sessão presidida pelo Presidente da Suprema Corte, elevando a harmonia recíproca entre os

três poderes.

A submissão de uma Lei aos órgãos do Poder Judiciário para apreciação acerca de uma

inconstitucionalidade se caracteriza como mecanismo de recíproca harmonia entre os poderes

(SILVA, 2015, p. 113).

Assim, uma limitação harmônica e recíproca dos poderes nasce contra o poder arbitrário

historicamente grande limitador de direitos, sendo a “divisão e harmonia dos poderes

princípio conservador dos direitos do cidadão e o mais seguro meio fazer efetivas as garantias

que a Constituição oferece” (STRECK; OLIVEIRA F, 2013, p. 144).

Os mecanismos consagrados pela harmonia, ou consciente colaboração e controle

recíproco entre os poderes (SILVA, 2015, p. 113) têm o claro objetivo de proteger o cidadão

dos abusos do poder (BOBBIO, 1994, p.20). Tais mecanismos visam impedir ou dificultar o

exercício de poder arbitrário.À luz da harmonia dos poderes são exercidos:

(1) pelo controle do Poder Executivo por parte do Poder Legislativo; ou, mais

exatamente, do governo, a quem cabe o Poder Executivo, por parte do parlamento, a

quem cabe em última instância o Poder Legislativo e a orientação política;(2) o

eventual controle do parlamento no exercício do Poder Legislativo ordinário por

parte de uma corte jurisdicional a quem se pede a averiguação da

constitucionalidade das leis; (3) uma relativa autonomia do governo local em todas

as suas formas e em seus graus com respeito ao governo central; (4) uma

magistratura independente do poder político (BOBBIO, 1994, p. 19).

A nova perspectiva da separação dos poderes pressupõe uma harmonia recíproca de

interdependência. Além do mais, propõe uma complexidade de funcionamento das

sociedades, numa necessária reflexão global em torno da economia e da sociedade,

(SUORDEM, 1995, p. 18), na qual a engenharia constitucional deve ser combinada com a

sensibilidade cultural e econômica (ACKERMAN, 2000, p. 724). É preciso evidenciar que o

direito necessariamente entrelaça com pressupostos estabelecidos por variados setores do

conhecimento científico (REALE 1997, prefácio), pautando a separação dos Poderes nos

novos movimentos sociais (SUORDEM, 1995, p. 29), pois,

O direito volve-se simultaneamente em critério e elemento da realidade social:

enquanto critério da realidade social o Direito assume a realização de funções de

integração, de justo reconhecimento e justa resolução dos conflitos e de instância

crítica e da validade; enquanto elemento da realidade social o direito sofre a

influência dos factores económicos (interesses), dos factores políticos (relações de

poder) e axiológicos (valores) existentes numa dada sociedade histórica concreta, (os

quais interagem entre si e com o Direito, condicionando este e sendo também por

eles condicionados) explane uma compreensão global, coerente e articulada das

relações fundamentais emergentes na abordagem das diversas problemáticas

jurídico-políticas (SUORDEM, 1995, p. 17-18).

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Quanto à atuação dos poderes Legislativo e Executivo, é convincente a proposta de

separação dos mesmos perante os longos conflitos, desde a disputa entre Monarquia e

Parlamento na Inglaterra no século XVII, sendo esta, inclusive, ponto influenciador da

separação proposta por Locke, sendo certo também que, em qualquer Estado Democrático, a

separação dos poderes deva abarcar o Judiciário. “A verdade é que apenas um sistema

equilibrado de controles recíprocos pode, sem perigo para a liberdade, fazer coexistir um

legislativo forte com um executivo forte e um judiciário forte” (CAPPELLETTI, 1193, p. 54).

Agora, tangencialmente ao Poder Judiciário, no que concerne o poder de controlar e ser

controlado vem à tona um relevante debate: a atuação do judiciário, no que toca o controle de

constitucionalidade, seria um mecanismo democrático de freios e contrapesos ou tal atuação

representa abuso deste poder julgador, devendo, pois, ensejar fiscalização e freio dos outros

poderes? Propõe-se, pois,analisar a questão no decorrer na pesquisa.

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CAPÍTULO II

UMA ABORDAGEM ACERCA DO CONTROLE DE

CONSTITUCIONALIDADE

2.1 Controle de Constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro

A Constituição da República de 1988 representa ponto fundamental no que tange aos

meios de controle. O controle de constitucionalidade é um instrumento que objetiva garantir a

supremacia dos preceitos constitucionais. Passa então o texto constitucional de 1988 a

detalhar e aprofundar mais o estudo.

No ordenamento constitucional, cumpre-se destacar que o controle pode acontecer pela

forma preventiva ou repressiva. Configura-se o controle pela via preventiva quando este se dá

antes da entrada em vigor de Lei ou ato normativo, o que se configura, por exemplo, por meio

da atuação das Comissões de Constituição e Justiça de ambas as Casas Legislativas.

No âmbito da Câmara dos Deputados, o artigo 32, inciso IV do Regimento Interno da

Casa trata da Comissão permanente. Tal comissão, perante a Câmara dos Deputados, detém

sua respectiva área de atividade: aspetos constitucionais, legal, jurídico, regimental e de

técnica legislativa de projetos, emendas ou, ainda, análise de assunto de natureza jurídica

constitucional a que lhe seja submetido, atividades institucionais previstas no artigo 32, inciso

IV, alíneas „a‟ e „c‟ do Regulamento Interno da Casa.

No Senado Federal, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, também é um tipo

de comissão permanente, segundo ditames do artigo 72 do Regimento Interno desta Casa.

Esta Comissão, conforme determinação do artigo 101 do regimento do Senado Federal deve,

por competência, opinar sobre a constitucionalidade das matérias que lhe forem submetidas

por deliberação do Plenário.

Conforme o artigo 257 desta norma regimental a qual se comenta, quando, na Comissão

de Constituição, Justiça e Cidadania, o relator se pronunciar pela inconstitucionalidade ou

injuridicidade da proposição, é permitida sua retirada, antes de proferido o parecer definitivo,

mediante requerimento ao Presidente da Comissão, que o deferindo encaminhará a matéria à

Mesa, por meio de ofício, a fim de ser arquivada.

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Este regimento determina ainda, à luz do artigo 300, inciso XVIII, que uma proposta de

emenda à Constituição declarada inconstitucional pela comissão não será votada.

Consequências estas de grande relevância e que configuram um controle de

constitucionalidade na órbita da Casa Legislativa, um modo de controle preventivo, já que

exercido ainda na fase de tramitação do projeto.

Outra forma de controle de constitucionalidade preventivo que se encontra no

ordenamento jurídico brasileiro consiste no veto presidencial. A Constituição da Repúblicade

1988 estabelece em seu artigo 66, § 1.., que o Presidente da República pode vetar projeto de

lei que considerar inconstitucional. Este ato do Chefe do Executivo será apreciado pelo

Congresso Nacional e, uma vez mantido, o projeto de lei é tido como rejeitado e arquivado

(MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 921).O veto trata, portanto, de outro relevante

instrumento de controle de constitucionalidade exercido antes que eventual lei que ofenda a

Constituição entre em vigor.

Vislumbrou-se, pois, forma de controle operado pelos poderes Legislativo e Executivo.

Todavia, neste momento, é necessário abordar o controle de constitucionalidade exercido pelo

Poder Judiciário.

O controle exercido pelo órgão judicante se dá pela forma repressiva, visando atacar lei

ou ato normativo já em vigor. Na perspectiva das constituições nacionais, a de 1988 dá pleno

destaque ao instituto, consolidando duas formas: Concentrada e Difusa, representando grande

prosperidade do tema em âmbito constitucional.

Cumpre, pois, neste cenário, abordar as peculiaridades das formas de controle de

constitucionalidade, tratando não apenas das formas comissivas, mas das omissões como

sendo objeto de controle tanto na forma abstrata, quanto na difusa.

2.1.1 Controle concentrado de constitucionalidade

A via concentrada de controle constitucionalidade aprecia a compatibilidade de leis e

atos normativos com a constituição de forma genérica, sem explorar diretamente as

peculiaridades de cada caso. Em virtude disso é também chamada de controle abstrato de

constitucionalidade.

A modalidade concentrada se dá pela restrição (ou concentração) de legitimados e órgão

competente para julgar a questão ecabe tão somente ao guardião da Constituiçãoa missão de

avaliar as ações de controle de constitucionalidade pela via abstrata. Desta forma, o Supremo

Tribunal será competente para analisar originariamente as ações do controle concentrado.

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Nota-se nesta via de controle uma delimitação de legitimados para a propositura das

ações. Os legitimados para a propositura das ações do controle abstrato de constitucionalidade

são os elencados no rol do artigo 103 da Constituição da República, com outorga

constitucional para propositura de Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória

de Constitucionalidade.

Desta feita, são, pois, legitimados na via concentrada: o Presidente da República, o

Procurador-Geral da República, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, as mesas

do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, das Assembleias Legislativas dos Estados e da

Câmara Legislativa do Distrito Federal, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do

Brasil, os Partidos políticos com representação no Congresso Nacional, a Confederação

Sindical e o Conselho de Classe de âmbito Nacional.

Dentre estes legitimados, cumpre destacar os que detêm legitimidade universal e os que

devem comprovar pertinência temática. “É evidente que a legitimidade não é a mesma para

todas as pessoas ou entidades previstas no rol do artigo 103” (STRECK, 2014, p. 693).

Alguns legitimados devem comprovar uma relação de nexo entre o assunto da norma a qual se

questiona a constitucionalidade e o interesse dos legitimados.

Deste modo, devem demonstrar o requisito da pertinência temática os Governadores de

Estado e Distrito Federal, as mesas das Assembleias Legislativas e Câmara Legislativa do

Distrito Federal, além de Entidade de classe e Confederação Sindical.

Deste modo, um Governador de Estado em que pese à legitimidade para propositura de

ações do controle concentrado só estaria legitimado para propor uma Ação Direta de

Inconstitucionalidade de Leis e atos normativos de interesse de seu respectivo Estado, o que

demonstra, pois, uma relação de pertinência entre o objeto da norma questionada e o interesse

do proponente da Ação de controle concentrado (STRECK, 2014, p. 693).

Do mesmo modo, a entidade de classe de âmbito nacional detém legitimidade para

propor Ação do Controle pela via abstrata cujo objeto atenda aos membros da respectiva

classe. O mesmo se dá com a confederação sindical.

Em outro prisma, alguns legitimados detém a chamada legitimidade Universal, na qual

não se exige demonstração de pertinência temática. Sãolegitimados universais à propositura

de Ações do controle concentrado o Presidente da República, o Procurador-Geral da

República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e as mesas da Câmara dos

Deputados e do Senado Federal.

É Importante ressaltar que o Conselho Federal da OAB, embora o nome possa sugerir,

não representa apenas os Advogados, como se fosse uma entidade representativa desta classe.

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Este Conselho Federal tem por competência o cumprimento efetivo das finalidades da

advocacia, que, por sua vez, visa defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado

democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das

leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições

jurídicas. Tal finalidade do Conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil a credencia

a possuir legitimidade universal para propositura das ações de controle concentrado.

Quanto aos efeitos de uma apreciação da Suprema Corte em sede de controle

concentrado de constitucionalidade temos que esta se reveste de efeitos erga omnes e com

efeitos vinculantes perante demais órgãos do poder judiciário. Ora, considerando essa

circunstância, e, ainda mais, que ditas sentenças têm eficácia extunc, do ponto de vista

material e erga omnes (ZAVASCKI, 2014, p. 51).

Esta esfera de controle não adquire caráter de “concentrada” apenas no que tange a

legitimados e casa julgadora competente. Os institutos jurisdicionais aptos a insurgir uma

inconstitucionalidade pela via abstrata diante da Suprema Corte também são restritos.

São ações apropriadas para perquirir a constitucionalidade ou não de lei ou ato

normativos: a Ação Direta de Inconstitucionalidade, a Ação Declaratória de

Constitucionalidade, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão e a Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental.

Pretende esta pesquisa apontar as particularidades de cada uma destas ações, da mesma

maneira que se faz neste momento.

2.1.2 Ação Direta de Inconstitucionalidade

Dentre os mecanismos para assegurar a soberania da Constituição, a Ação Direta de

Inconstitucionalidade ganha destaque no texto constitucional, sendo considerada a principal

ação de controle abstrato de constitucionalidade (SARMENTO, 2015, p. 406). Esta ação tem

por propósito, diretamente, o reconhecimento de inconstitucionalidade, assim se trata de

controle principaliter tantum de constitucionalidade.

Pela via difusa, por outro lado, por se tratar de ações diversas com pedidos igualmente

variáveis, nos quais a declaração de inconstitucionalidade surge incidentalmente no curso do

processo, na ADI a inconstitucionalidade é a causa principal, é o próprio pedido

(SARMENTO, p. 411).

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A Constituição da República estabelece ser competência originária do Supremo

Tribunal Federal processar e julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato

normativo federal ou estadual.

Neste ponto, portanto, cabe frisar que, por expressa determinação constitucional, o

controle de constitucionalidade de atos normativos municipais está excluído da Ação Direta

de Inconstitucionalidade (SARMENTO, 2015, p. 409). Contudo, tais atos podem ser objeto de

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

Ao voltar à atenção para o artigo 102 da Constituição Federal, que delineia o objeto da

Inconstitucionalidade pela via abstrata, é preciso frisar que “se entende lei em sentido amplo,

abrangendo todas as espécies primárias do artigo 59 da Constituição da República: emendas

constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias,

decretos legislativos e resoluções” (SARMENTO, 2015, p. 407).

Assim, grande destaque é dedicado à possibilidade de Ação direita de

Inconstitucionalidade em face de Emendas constitucionais, ou direito constitucional

secundário (MENDES; COELHO; BRANCO, 1999, p. 1160), que são obras do Poder

Constituinte derivado que sobrevêm ao texto originário, sendo exatamente por esta

superposição ao texto originário que é admitida ADI de normas de status constitucional.

Seria absolutamente incoerente dizer que uma norma originária é inconstitucional em

face de outra. É possível exercer controle em face de emenda porque, nesse caso, a emenda

inicialmente está fora da Constituição, logo, é possível verificar a compatibilidade de emenda

com a Constituição (SARMENTO, 2015, p. 407).

A Ação Direta de Inconstitucionalidade exige, ainda, que seu objeto, lei ou ato

normativo, tenha sido publicado após a conclusão definitiva do processo legislativo, o que

exclui a possibilidade de propor ADI de caráter preventivo (MENDES; COELHO; BRANCO,

1999, p. 1166).

A ação em comento, por fazer parte da família do controle concentrado de

constitucionalidade, possui efeitos erga omnes e vinculantes. Assim, se declarada de forma

definitiva pelo Supremo Tribunal, é retirada sua validade prática de modo geral no arranjo

jurídico brasileiro.

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2.1.3 Ação Declaratória de Constitucionalidade

Ao contrário da primeira ação, que ataca uma inconstitucionalidade o writ

constitucional em comento sustenta a validade da norma (SILVA, 2015, p. 62). Sendo

exatamente no motivo em que em reside a diferença entre esta ação constitucional e a Ação

Direta de Inconstitucionalidade.

A Ação Direta de Constitucionalidade é semelhante à Ação Direita de

Inconstitucionalidade no que diz respeito ao objeto, aos legitimados à propositura, à

competência para julgamento e aos efeitos das decisões. São, portanto, ações dúplices

idênticas, contudo, ambivalentes, com sinais trocados (SARMENTO, 2015, p. 291).

O objeto da Ação Declaratória de Constitucionalidade

segue o mesmo paradigma da ADI para o direito federal: lei ou ato normativo

federal autônomo (não – regulamentar) devidamente promulgado, ainda que não

esteja em vigor. Assim caberia ADC em face de emenda constitucional, lei

complementar, lei ordinária, medida provisória, decreto legislativos, tratado

internacional devidamente promulgado, decreto do Executivo de perfil autônomo,

resolução de órgão do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça

(MESNDE; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1184).

O instrumento legislativo uma vez em vigor goza de uma presunção de

constitucionalidade, presunção esta iuris tantum. A ADC, ao seu passo, busca constituir uma

presunção de constitucionalidade em sentido absoluto (SARMENTO, 2015, p. 292).

O fundamento para a interposição da ação constitucional em explicação surge quando,

pela via concreta, reiterada controvérsia acerca de sua constitucionalidade recai sobre

determinada lei ou ato normativo, abalando a dita presunção.

A controvérsia aqui debatida deve corroborar controvérsia jurídica relevante, capaz de

afetar a legitimidade da lei e, por conseguinte, a eficácia da decisão legislativa (MENDES;

COELHO; BRANCO, 2009, p. 1184). “Não comprovada esta controvérsia, nitidamente a

ação perde seu caráter de ser e assim, não reconhecida pelo Supremo” (SARMENTO, 2015,

p. 292).

Assim, não se demonstra admissível a propositura de ação declaratória de

constitucionalidade se não houver controvérsia ou dúvida relevante quanto à legitimidade da

norma. O manejo desta via objetiva provocar a Suprema Corte para que ponha termo à

controvérsia instaurada (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1182).

Trata-se, portanto, de uma ação que tem a característica de um meio paralisante de

debates em torno de questões jurídicas fundamentais de interesse coletivo. Terá como

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pressuposto fático a existência de decisões de constitucionalidade em processos concretos

(SILVA, 2015, p. 58-59).

A Ação Declaratória de Constitucionalidade visa garantir a segurança jurídica que paira

sobre a presunção de legalidade e constitucionalidade de lei ou ato normativo, evitando

conflitantes decisões pela via difusa.

A decisão de procedência desta ação reforça a constitucionalidade da lei ou ato

normativo debatido. Decisão esta proveniente do controle abstrato e revestida de efeitos erga

omnes e vinculantes.

É preciso muito cuidado ao enfatizar que a rejeição da ação não importará

necessariamente em reconhecimento de inconstitucionalidade (SILVA, 2015, p. 59), que será

declarada em ação pertinente no próprio modelo concentrado ou pela via difusa.

A Ação Declaratória de Constitucionalidade se apresenta como importante instrumento

em defesa da ordem jurídica (SILVA, 2015, p. 61), apta a sanar controvérsias sobre a

constitucionalidade de lei ou ato normativo, concedendo sobre estes forçaconstitucionalizante

num relevante mecanismo de controle de constitucionalidade.

2.1.4 Inconstitucionalidade por omissão pela via concentrada

Dentre os instrumentos que visam garantir a Supremacia da Constituição e efetivação de

seus preceitos, imerso no sistema de controle de constitucionalidade pela via abstrata,

encontra-se a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. Preliminarmente cumpre

evidenciar que não apenas condutas comissivas propriamente ditas são aptas a ofender a

Constituição. Omissões legislativas são igualmente danosas para o ordenamento

constitucional.

No caso de a Constituição assegurar um direito que para sua efetivação dependa de

regulamentação legislativa e esta atuação legiferante não sobrevenha por omissão do

legislador, “tal omissão se caracterizará como inconstitucional” (SILVA, 2015, p. 50).

Assim, é necessária adoção de mecanismos que busquem tornar efetiva a norma

constitucional que encontra certa omissão legislativa, que é objetivo da Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão (SARMENTO, 2015, p. 293).

Neste passo, há de se resguardar a Constituição, protegendo-a de inércia que a

contrarie.A Ação de Inconstitucionalidade por Omissão:

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(...) tem a função de compelir o Poder Executivo e instar o legislador a fazer aquilo

que, embora estipulado no texto da Constituição, não deseja fazer, de forma total ou

parcial. A ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão visa proteger a

força normativa da Constituição, estabelecendo barreiras contra um não atuar que,

sendo produto de uma decisão política, tem consequências jurídicas (a

inconstitucionalidade) (STRECK, 2014, p. 891).

A omissão inconstitucional tutelada pela via abstrata abrange omissões normativas de

modo total e absoluto ou de modo parcial (SARMENTO, p. 2015, p. 293). Assim, não apenas

textos normativos completos estão sujeitos a controle, mas também trechos.

Em dado momento, chegou-se a entender que somente a total e absoluta ausência

legislativa daria azo à proposição a ADO, assim esta ação perderia o objeto se já houvesse o

encaminhamento de projeto de lei ao Congresso Nacional sobre a matéria omitida

(SARMENTO, 2015, p. 294).

Acontece que o projeto de lei em si não está apto a dar efetividade às normas

constitucionais. De quase nada adiantam projetos de lei acerca do conteúdo omisso tramitar

no Congresso se eles não forem aprovados e, efetivamente, não entrarem em vigência.

Assim, o objeto de tutela da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão não se

concentra apenas na total ausência legislativa. A demora a exercer função legiferante,

igualmente pode ser objeto desta via de controle.

A Suprema Corte, por oportunidade do julgamento da ADI n. 2495, possuía

entendimento de que uma vez iniciado o processo legislativo não havia como se cogitar

omissão legislativa. No entanto, a mora ao legislar, mesmo após iniciada o regular processo

legislativo, pode ser considerada como omissão inconstitucional e, portanto, objeto de ADO.

Assim:

Não temos dúvida, portanto em admitir que a inertiadeliberandidas Casas

legislativas pode ser objeto da ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

Assim pode o Supremo Tribunal Federal reconhecer a mora do legislador em

deliberar sobre questão, declarando, assim, a inconstitucionalidade da omissão.

(MENDES; STRECK, 2013, p. 1418).

O objeto da ADO é amplo e por meio da atuação judicial pela via abstrata será possível

questionar a omissão total e/ou parcial de texto normativo, mesmo que ainda seja preciso

impugnar a mora legislativa.

Vale destacar que a sistemática constitucional brasileira já reconhece a omissão

inconstitucional por intermédio do Mandado de Injunção, que será estudado no tópico

subsequente. Conquanto, não há que se confundir este mandado com a inconstitucionalidade

por omissão que estamos a tratar.

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Enquanto o mandado de injunção tem por objetivoviabilizar o exercício de um direito

fundamental que se encontra obstaculizado de exercício por falta de regulamentação

legislativa, a inconstitucionalidade por omissão visa promover a efetividade de norma

constitucional (STRECK, 2014, p. 886).

O Mandado Injuncional e Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão também se

distinguem quanto à forma de controle. Esta se caracteriza por ser uma ação do controle

concentrado, com restrição de legitimados. Aquele, em que pese à concentração de

competência para julgamento nas mãos da Suprema Corte, reflete uma ampla legitimidade

ativa, competindo a qualquer pessoa natural ou jurídica a titularidade da respectiva demanda.

A inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção, pelo menos a princípio,

são aptas a produzir efeitos distintos. Ao passo que a injunção produz efeitos inter partes, a

ADO proporciona impacto erga omnes.

De modo a modo, ambos os institutos configuram importantes remédios a fim buscar a

efetividade das normas constitucionais, pois todos almejam a efetividade de seus preceitos e

da supremacia da Carta política de 1988.

A tutela da omissão inconstitucional representa grande passo para o arranjo

constitucional brasileiro. É de significativa valia acentuar que a inconstitucionalidade por

omissão pela via abstrata adotada pelo direito brasileiro apresenta íntima inspiração com a

Constituição da República de Portugal, que destaca em seu artigo 283:

1. A requerimento do Presidente da República, do Provedor de Justiça ou, com

fundamento em violação de direitos das regiões autónomas, dos presidentes das

Assembleias Legislativas das regiões autónomas, o Tribunal Constitucional aprecia

e verifica o não cumprimento da Constituição por omissão das medidas legislativas

necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais.

2. Quando o Tribunal Constitucional verificar a existência de inconstitucionalidade

por omissão, dará disso conhecimento ao órgão legislativo competente.

Destaca-se que a Constituição da República do Brasil apresenta semelhança com a de

Portugal no que se refere à Casa julgadora, aos legitimados e, sobretudo, aos efeitos da

decisão que declara a inconstitucionalidade por omissão ao estabelecer que o Tribunal

Constitucional dê conhecimento ao órgão legislativo acerca da inoperância legislativa.

Em órbita brasileira é reconhecida a omissão legislativa por esta via abstrata de

controle. A Constituição da República de 1988, a teor do parágrafo segundo do artigo 103,

estabelece que o Pretório Excelso deva se limitar a cientificar o poder competente para adoção

das providências necessárias e, se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta

dias.

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O julgamento da omissão inconstitucional proporciona uma decisão de natureza

declaratória (STRECK, 2014, p. 887). O Constituinte optou por não impor ao órgão omisso

prazos ou condições para sanar o oblívio inconstitucional, mantendo a separação dos poderes.

No entanto, os dispositivos aplicados na sentença não teriam validade se apenas atentassem à

ciência aos órgãos omissos (SARMENTO, 2015, p. 294).

Esta comunicação ao

Poder legislativo pode ser ineficaz, já que ele não está obrigado a legislar. Nos

termos estabelecidos, o princípio da discricionariedade do legislador continua

intacto, e está bem que assim esteja. Mas isso não impediria que a sentença que

reconhecesse a omissão inconstitucional já pudesse dispor normativamente sobre a

matéria até que a omissão legislativa fosse suprida. Com isso, conciliar-se-iam o

princípio político da autonomia do legislador e a exigência do efetivo cumprimento

das normas constitucionais (SILVA, 2015, p. 50-51).

Contudo, o posicionamento da Suprema Corte vem sofrendo transformações com o

avanço da orientação jurisprudencial. O STF tem admitido posição mais concretista no

julgamento da omissão inconstitucional, tanto pela via difusa, tanto na abstrata, ambas em

análise.

Pela via incidental, como se verifica adiante, no julgamento de Mandado de Injunção, a

Corte Suprema tem se posicionado para consubstancializar seus entendimentos, não se

limitando a tão somente reconhecer uma omissão inconstitucional e comunicação ao órgão

competente.

Pela via abstrata, na qual se concentra o estudo neste instante, a Corte tem reconhecido

uma postura que vai além da ciência ao órgão legiferante. Destarte, o Supremo entendeu no

julgamento da ADI 3682 ser plausível “indicar um prazo razoável para a atuação legislativa,

ressaltando as consequências desastrosas para a ordem jurídica da inatividade do legislador no

caso concreto” (MENDES; STRECK, 2013, p. 1420). Deste modo,a referida ADI 3682 foi:

(...) julgada procedente para declarar o estado de mora em que se encontra o

Congresso Nacional, a fim de que, em prazo razoável de 18 (dezoito) meses, adote

ele todas as providências legislativas necessárias ao cumprimento do dever

constitucional imposto pelo art. 18, § 4º, da Constituição, devendo ser contempladas

as situações imperfeitas decorrentes do estado de inconstitucionalidade gerado pela

omissão. (ADI 3682, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado

em 09/05/2007, DJe-096 DIVULG 05-09-2007 PUBLIC 06-09-2007 DJ 06-09-2007

PP-00037 EMENT VOL-02288-02 PP-00277 RTJ VOL-00202-02 PP-00583).

Nesta oportunidade, a Excelsa Corte considerou inconstitucional a inércia legislativa,

determinando ao Congresso Nacional prazo de 18 meses para adotar as medidas cabíveis a

fim de sanar omissão inconstitucional.

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Destaque-se ainda que o STF possua precedentes importantes para fixar 24 meses como

prazo razoável com o escopo de extirpar a omissão inconstitucional do ordenamento pátrio,

assim: as ADIs 2240/BA, 3316/MT e 3489/SC (Relator Ministro Eros Grau, julgamento

09/05/2007) e ADI 3689/PA (Relator Ministro Eros Grau, julgamento 10/05/2007).

Neste contexto, a Suprema Corte brasileira tem adotado posicionamento diverso,

destacando-se pelo pensamento hodierno, a fim de assegurar efetividade em suas decisões e

sanar concretamente a omissão legislativa que afronta a Carta da República de 1988, adotando

a postura “arrojada” de ir além da mera ciência ao Órgão administrativo ou Poder competente

para tomar as medidas cabíveis e fixando prazo minimente razoável para que a omissão seja

sanada de plano.

2.1.5 Arguição de descumprimento de preceito fundamental

O texto Constitucional, na parte dedicada ao Supremo Tribunal Federal, rege que cabe a

esta Corte apreciar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Esta

modalidade de arguição é uma forma de controle de constitucionalidade. Porém, ao revés da

Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação Declaratória de Constitucionalidade, não se

destina a reconhecer a (des) harmonia de uma lei ou ato normativo para a Constituição e

assim declará-lo.

O objeto desta esfera do controle de constitucionalidade se reúne no descumprimento de

preceitos fundamentais com o fito de garanti-los. Certamente a conceituação de preceito

fundamental se torna uma tarefa complicada e nem seria o objetivo desta pesquisa tentar fazê-

la de forma precisa.

Primeiramente, ressaltamos que “nem toda norma constitucional é um preceito

fundamental. Logo, não é qualquer norma formalmente constitucional que servirá de

parâmetro para a ADPF” (SARMENTO, 2015, p. 421).

Registre-se, por relevante, que o dispositivo que regula a arguição de descumprimento é

específico ao falar da violação (descumprimento) de preceitos fundamentais, ao passo que a

ação direta de inconstitucionalidade e a declaratória de constitucionalidade se referem às

violações genéricas do sistema (STRECK, 2014, p. 923).

Assim, o campo de abrangência da ADPF é mais afunilado, visto que além de tratar

especificamente de preceito fundamental, este deve estar em conflito com um

descumprimento. Numa comparação com as outras ações do controle abstrato de

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constitucionalidade, é certo que a arguição em estudo apresenta objeto mais restrito, pois,

enquanto naquelas

pode-se impugnar lei ou ato normativo em face da Constituição Federal como um

todo considerando todas as normas formalmente constitucionais integrantes do bloco

de constitucionalidade. Na ADPF, por seu turno, será possível arguir sobre o

descumprimento de lei ou ato normativo apenas de “preceito fundamental”, parte

menor contida no todo das normas constitucionais (SARMENTO, 2015, 421).

Este instrumento, portanto, visa tutelar particularmente preceitos fundamentais que são

mais específicos que o gênero das normas constitucionais. Por outro lado, em comparação

com as ações do controle abstrato de constitucionalidade, a arguição em apreciação engloba

maior leque de atos do poder público sob tutela, desde que claramente revestido de

fundamentalidade.

Assim, qualquer ato do poder público, inclusive com natureza não legislativa, pode ser

objeto de ADPF (SARMENTO, 2015, p.423). A Ação Direta de Inconstitucionalidade e Ação

Declaratória de Constitucionalidade, ao contrário, apreciam tão somente lei ou atos

normativos em face da Constituição, estando estabelecido no próprio texto constitucional, no

artigo 103, §3.

Dentre atos do Poder Público em tutela de ADPF, destacam-se decisões judiciais que

são inadmitidas em ADI e ADC. Porém, súmula vinculante não pode ser objeto de ADPF

(SARMENTO, 2015, p. 425-427), pois, para questionar este ato vinculante do Poder

Judiciário, existe procedimento próprio, tal como revisão e cancelamento de súmula ou

mesmo reclamação constitucional.

Além de atos de natureza não legislativa, a Arguição de descumprimento se destaca por

abranger dois importantes institutos legislativos não tutelados por ADC e ADI: atos

legislativos municipais em face da Constituição da República e instrumentos legislativos

anteriores a 1988, data da promulgação da Carta política vigente.

A apreciação de legislação municipal em face da Constituição da República de 1988 se

dava pela via incidental, a qual chegava ao Supremo através de Recurso Extraordinário. Com

a regulamentação de ADPF é possível que se apresente arguição de descumprimento com

pretensão de ver declarada a constitucionalidade de lei estadual ou municipal que tenha

legitimidade questionada nas instâncias inferiores (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p.

1206).

Além de normas municipais, caberá ADPF de normas anteriores à Constituição

(SARMENTO, 2015, p. 428). Esta possibilidade trazida pela Lei que regulamenta a arguição

de descumprimento “vem colmatar uma lacuna importante no sistema constitucional

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brasileiro, permitindo que controvérsias relevantes afetas ao direito pré-constitucional sejam

solvidas pelo STF com eficácia geral e efeito vinculante no âmbito de um processo objetivo”

(MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1209).

Aborda-se até aqui os elementos fundamentais que são objetos de preceito.Mas, afinal,

quais seriam as normas constitucionais revestidas de caráter de preceito fundamental, cujo

descumprimento serve de motivação para interposição da Arguição em estudo?

A atribuição de sentido para conceituação apresenta dificuldade de cunho hermenêutico

(STRECK, 2014, p.922). Contudo, sem se limitar a uma conceituação cerrada, é possível

chegar a um sentido do que sejam os ditos e repetidos preceitos fundamentais.

Não há dúvida de que alguns desses preceitos estão enunciados, de forma explícita no

texto constitucional. Deste modo, não se pode negar a qualidade de preceito fundamental aos

direitos e garantias individuais, traçadas no artigo 5. da Constituição da República. Destarte,

“não se poderá deixar de conferir esta qualificação a demais princípios protegidos por

cláusula pétrea, tais como, a forma federativa do Estado, a separação dos poderes e o voto

direto, secreto, universal e periódico” (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1216-

1217).

Dessa maneira, como visto, a Arguição de descumprimento protege preceitos

fundamentais não tutelados por ADI ou ADC. A Arguição age como instrumento

complementar ao controle abstrato na finalidade de proporcionar mais plenitude eficácia aos

ditames constitucionais.

A Lei n. 9.882/1999, que regulamenta a Arguição de Descumprimento de Preceito

Fundamental estabelece que esta não seja admitida quando houver qualquer outro meio eficaz

de sanar a lesividade. Trata-se, portanto, de ação subsidiária.

Não se trata, contudo, da simples existência de outro meio processual. Para que se

elimine a ADPF é necessário meio eficaz. Quando se fala em outro meio igualmente eficaz,

geralmente se fala praticamente da possibilidade de ADI ou ADC. Quer dizer, via de regra,

que o meio para ser igualmente eficaz, tem que ser também uma ação de controle

concentrado, que produza efeitos erga omnes e vinculantes (SARMENTO, 2015, 424).

A subsidiariedade de que trata a Arguição em estudo não significa um esgotamento de

instâncias ou recursos de modo que este remédio constitucional chegue para apreciação do

STF apenas excepcionalmente.

A determinação constitucional insurge que, verificando meio apto para solver a

controvérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata, há de se entender

possível a utilização de ADPF (STRECK, 2014, p. 908). Assim sendo “cabível a ação direta

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de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade, não será admissível a arguição de

descumprimento (MENDES; COELHO, BRANCO, 2009, p. 1205)”. A ADPF é um remédio

supletivo para os casos emque não caiba ação direta de inconstitucionalidade (STRECK,

2014, p. 906).

A existência de ações ou de outros recursos processuais pela via ordinária não poderá

servir de óbice à formulação da arguição de descumprimento (MENDES; COELHO;

BRANCO, 2009, p. 1207), uma vez que a via ordinária, na maior parte dos casos, produz

efeitos individuais.Logo, ela não pode ser apta a barrar a interposição da arguição de

descumprimento, que produz efeitos erga omnes e vinculantes.

A Arguição de descumprimento, no que tange ao objeto se demonstra mais restrita do

que ADI e ADC, agindo como ação complementar e subsidiária. Noutro plano, esta arguição,

pode apresentar semelhanças e outrora diferenças com as ditas ações.

Em relaçãoà legitimidade, aplicam-se aqui, fundamentalmente, as orientações

desenvolvidas a propósito da ação direta de inconstitucionalidade (MENDES; COELHO;

BRANCO, 2009, p. 1201). Assim, os legitimados estão previstos no rol do artigo 103 da

Constituição da República de 1988.

Aqui há uma concentração dos legitimados tipicamente do controle abstrato,

apresentando semelhança com as ações Direta de Inconstitucionalidade e Declaratória de

Constitucionalidade.

A Arguição de descumprimento apresenta semelhança às ações Direta de

Inconstitucionalidade e Declaratória de Constitucionalidade no que toca aos legitimados e

produção de efeitos, visto que esta arguição opera efeitos erga omnes e vinculantes. Por outro

lado, um ponto controvertido entre estes remédios constitucionais há de ser destacado: a

natureza da decisão.

Noutro plano, enquanto na ADI e ADC, as decisões produzem efeitos declaratórios, na

ADPF, a decisão da Suprema Corte produz efeitos de modo a buscar a concretização de

efeitos. A Lei n. 9882/1999, no artigo 10, estabelece que julgada a ação, far-se-á comunicação

às autoridades ou órgãos responsáveis pela prática dos atos questionados, fixando as

condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental.

É cabível destacar, neste momento, que a decisão do Supremo na Arguição de

descumprimento vai além da declaração de constitucionalidade ou não de determinado objeto

político. A questão adere uma postura proativa para a Corte que, diante de uma violação a

preceito fundamental, se encarrega de criar condições de aplicação e modo de interpretação

das normas constitucionais.

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51

Tal determinação legal apresenta questionamentos, pois, “não caberia ao Supremo

Tribunal Federal funcionar como legislador, fixando as condições em que o preceito

fundamental deverá ser cumprido, nem tampouco lhe cabe fixar o modo como este deve ser

interpretado e como deve ser aplicado” (STRECK, 2014, p. 917).

Certamente esta postura da Suprema Corte em assumir o protagonismo e fixar diretrizes

de aplicação do preceito fundamental e como este deve ser aplicado gera certo conflito,

tangencialmente ao poderio legislativo adotado por esta casa julgadora.

O STF, como será abordado no decorrer desta pesquisa, tem admitido postura mais

arrojada, de modo a proporcionar a concretização de direitos fundamentais, não se limitando a

reconhecer o status de violação ou descumprimento de normas constitucionais. A quase

interminável discussão entre a relação de tal postura da Corte e a separação dos poderes,

recorrente neste trabalho, ganha mais um contorno.

Contudo, em meio a esta emblemática proposta de conflituosas posições, a Arguição de

Descumprimento emerge como remédio apto a garantir mais ainda a Supremacia da

Constituição e dos preceitos a ela inerentes.

2.2 Controle difuso de constitucionalidade

A Carta Magna da República de 1988 proporcionou passo importante para a

democratização das formas de controle de constitucionalidade. No campo de controle

concentrado ela ampliou o rol de legitimados outrora restrito ao Procurador Geral da

República de modo a oportunizar maior gama de assuntos sob tutela de controle, no objetivo

de facilitar e majorar meios a fim de obter a supremacia da Constituição. O princípio da

supremacia requer que todas as situações jurídicas se conformem com os princípios e

preceitos da Constituição (SILVA, 2015, p. 48).

No entanto, mesmo tendo admitido maior alcance, o direito de controlar a Constituição

ainda permanece limitado, restringindo o poder de controlar ofensas à Constituição a apenas

algumas figuras. Sendo assimé pertinente ressaltar o advento da forma incidental de controle,

na qual há uma irrestrita legitimação para questionar a constitucionalidade ou não de lei ou

ato normativo.

A via difusa de controle de constitucionalidade proporciona ao cidadão ver seu direito

de supremacia da Constituição plenamente assegurado, sendo o próprio cidadão o legitimado,

uma vez que o poder emana do povo.

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Destarte, sendo o povo titular do poder democrático, a ele também deve competir

controlar o excesso do exercício do poder por ele mesmo outorgado. Se o poder emana do

povo, a ele também compete controlá-lo. Assim, o controle difuso de constitucionalidade é

uma importante ferramenta democrática. Do mesmo modo, o direito de ação para controlar a

Constituição deve ser amplo, valorizando o princípio da soberania popular, que consiste:

em essencialmente no poder constituinte do povo. Os poderes criados pela

constituição são poderes múltiplos e divididos, mas todos, sem distinção, são uma

emanação da vontade geral, todos vêm do povo, isto é, da Nação. E se o povo delega

certas partes de seu poder às diversas autoridades constituinte, ele conserva no

entanto, o poder constituinte (CANOTILHO, 1993, p. 94).

Como elemento democratizante, o direito de questionar a constitucionalidade de lei ou

ato normativo pela via difusa admite uma multiplicidade de vias eleitas para apreciar o

controle.

Ao passo que nas vias de controle concentrado somente são admitidas ações específicas

e com finalidade única de controle, difusamente é aceito o controle por diversos meios

processuais cuja questão acerca da inconstitucionalidade da norma não integre o objeto da lide

(SARMENTO, 2015, p. 231). Em outras palavras, quando no curso de uma ação cujo objetivo

protagonista não se resuma à constatação de constitucionalidade de lei, esta pode ser

questionada em segundo plano, como um pleito incidental. Daí o motivo da nomenclatura

controle incidental de constitucionalidade.

Por esta via de controle, exemplificativamente, uma ação de restituição de crédito

tributário, em que o objeto principal da ação é o reembolso de tributo indevidamente pago,

pode, incidentalmente, questionar a constitucionalidade do tributo. A instituição das garantias

constitucionais do habeas corpus e do mandado de segurança individual e coletivo ampliou,

significativamente, a via de defesa ou de exceção contra ato ou omissão inconstitucional

(MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1114).

Assim, no controle pela via difusa:

a inconstitucionalidade do acto normativo só pode ser invocada no decurso de uma

ação submetida à apreciação dos tribunais. A questão da inconstitucionalidade é

levantada, por via de incidente, por ocasião e no decurso de um processo comum

(civil, penal, administrativo ou outro), e é discutida na medida em que seja relevante

para a solução do caso concreto. Este controlo chama-se controlo por via de

excepção, porque “a inconstitucionalidade não se deduz como alvo da acção, mas

apenas como subsídio da justificação do direito, cuja reivindicação se discute

(CANOTILHO, 2003, p. 899).

Como reflexo da diversidade de ações, há também pluralidade de casas julgadoras

competentes para apreciar a questão. Enquanto que na via concentrada de controle a Casa

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competente se resume ao Supremo Tribunal Federal pela via difusa, demais órgãos do

judiciário são competentes. O judicante legítimo a apreciar a questão principal é competente

para, incidentalmente, analisar acerca de constitucionalidade.

Deste modo, com pluralidade de legitimados e casas julgadoras, por meio do controle

incidental, o direito de ação relativo à constitucionalidade fica mais acessível ao cidadão,

titular do poder. O Controle exercido pela via difusa, também chamado de controle concreto,

ao julgar a constitucionalidade, é analisado o caso in concreto de cada legitimado em cada

órgão julgador.

Além dos legitimados, casa julgadora e ações competentes para apreciar

constitucionalidade de lei ou ato normativo, os modelos de controle concentrado e difuso

apresentam resultados diametralmente opostos. Pela via concentrada o resultado da análise de

constitucionalidade proporciona efeitos gerais e vinculantes.

as sentenças de mérito proferidas nas ações de controle concentrado de

constitucionalidade têm não apenas a eficácia direta de tutelar a ordem jurídica, mas

também, indiretamente, a de autorizar ou desautorizar a incidência da norma, objeto

da ação, sobre os fatos jurídicos, confirmando ou negando a existência dos direitos

subjetivos individuais (ZAVASCKI, 2014, p. 51).

Assim, as decisões proferidas naquelas ações de controle concentrado são revestidas de

eficácia erga omnes, significando que a declaração de constitucionalidade ou

inconstitucionalidade da lei se estende a todos os feitos em andamento, paralisando-os com o

desfazimento dos efeitos das decisões neles proferidas no primeiro caso ou com a

confirmação desses efeitos no segundo caso (SILVA, 2015, p. 62).

Em outro compasso, no controle pela via difusa, como o monitoramento constitucional

é exercido concretamente por envolver uma controvérsia real entre as partes (SARMENTO,

2015, p. 233) a regra é que o resultado da apreciação de constitucionalidade produza efeitos

tão somente entre as partes do processo.

No entanto, com decisão definitiva de inconstitucionalidade proferida pela Suprema

Corte, esta Casa comunica o Senado Federal, que nos termos do artigo 52, inciso X da

Constituição da República de 1988, edita uma resolução a fim de suspender a execução do

verbete normativo declarado inconstitucional. Para que a decisão em controle difuso gere

efeitos erga omnes, há necessidade do concurso do Senado Federal (SARMENTO, 2015, p.

231).

Trata-se, pois, do efeito rotineiro do controle de constitucionalidade.Contudo, a

expansão de efeitos em caso de inconstitucionalidade tem sido admitida e será apreciada no

decorrer desta pesquisa.

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2.3 Os efeitos do mandado de injunção como instrumento de controle difuso de

constitucionalidade

Após análise acerca do histórico do controle de constitucionalidade nas constituições

brasileiras, com foco na Carta da República vigente, é proposto um estudo sobre o Mandado

de Injunção, instituto inovador na órbita constitucional pátria em consonância com a

efetividade de direitos fundamentais.

Estabelece a Constituição da República de 1988, no inciso LXXI do artigo 5., que será

concedido mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável

o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania. Depara-se, pois, com mais um remédio apto a fim

vangloriar os preceitos constitucionais.

O ordenamento constitucional vigente, consagrando o princípio da inafastabilidade da

jurisdição, já aborda que lesão ou ameaça a direitos serão objeto de apreciação do Poder

Judiciário, com o fito de garanti-los.

Tal preceito, que garante o direito de ação, já figura nos textos constitucionais pátrios

desde a Carta de 1946, que trazia nas linhas do seu artigo 141,§4.que “a lei não poderá excluir

da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual”. A Constituição de

1967 (art. 150, §4.) e a Emenda Constitucional de 1969 (art. 153, §4.), mantiveram o

dispositivo.

O direito de ação, contudo, coloca o Poder Judiciário à disposição de pessoa que tenha

sofrido lesão ou ameaça a um direito já regulamentado por atividade legislativa. Não obstante,

o princípio da inafastabilidade da jurisdição não possui o condão de assegurar a efetividade de

direitos não legalmente constituídos. É válido mencionar que ninguém é obrigado a fazer ou

deixar de fazer algo senão em virtude de lei, preceito valorizado no artigo 5., II da

Constituição da República.

Por oportuno, se ninguém pode ser compelido a fazer algo a não ser por recomendação

legal, à luz do princípio da legalidade, não caberia ao Judiciário impor a alguém, a satisfação

de um direito que, embora previsto na Constituição, não esteja formalmente regulamentado

em lei.

A partir daí surgem dois questionamentos: Em caso de inoperância legislativa, o titular

de um direito lesado não teria a quem socorrer? O controle de constitucionalidade abarcaria

tão somente atos comissivos, não sendo instrumento hábil a apreciar omissões da lei?

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Há de se ressaltar que a inércia legislativa, sobretudo, quando desta decorre o impedimento ao

exercício a direito constitucionalmente previsto, configura uma afronta à Constituição,

devendo, pois, ser objeto de apreciação do Poder Judiciário em sede de controle.

E neste contexto a Constituição da República de 1988 ataca inércia legislativa via Ação

declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão e por meio de Mandado de Injunção,

representando uma inovação no instituto do controle de constitucionalidade com o objetivo de

conferir maior efetividade às normas constitucionais.

Apesar de a previsão constitucional de que as normas definidoras dos direitos e

garantias fundamentais terem aplicação imediata o exercício dos direitos nestas normas

insculpidos, não são autoexecutáveis e de pleno exercício, dependendo muitos de

regulamentação legal.

Caso ocorra inoperância legislativa, o exercício pleno de direitos assegurados

constitucionalmente fica comprometido. O cidadão não pode ter o gozo de um direito tolhido

em face de inércia legislativa, tampouco, cabe a este ficar desamparado simplesmente

esperando o tramite de um processo legislativo, que pode sequer se iniciar, para que, enfim,

possa gozar de direito já lhe assegurado constitucionalmente.

Deste modo, é importante que não somente a lesão ou ameaça àdireitos mereça

resguardo na lei e perante o Poder Judiciário. A conduta omissa da legislação configura

igualmente lesão ou ameaça a direitos e, por oportuno, a atuação do Poder Judiciário é vinda

de formar a harmonizar a Constituição, os direitos nela previstos e os três Poderes do Estado.

A injunção, como medida excepcional, visa ser mais um elemento a tornar a

Constituição eficaz, tornando seus preceitos suficientes a produzir efeitos. Assim, reforça-se

destaque ao Mandado de Injunção cujo objetivo “é realizar, na sua plenitude, a vontade do

constituinte” (TEMER, 2015, p. 51), tendo sido este remédio constitucional festejado como

importante instituto para fazer valer os direitos previstos na Constituição (STRECK, 2014, p.

884).

Com o writinjuncional, os preceitos que demandarem regulamentação legislativa ou

aqueles simplesmente programáticos não deixarão de ser invocáveis e exequíveis em razão de

inércia do legislador, que, ao se omitir, inviabiliza a vontade do constituinte. Deste modo e

com esta forma de controle por omissão se almeja que nenhuma norma constitucional deixará

de alcançar eficácia plena (TEMER, 1996, p. 51).

Além de tutelar a omissão legislativa e criar meios a conceder mais efetividade à

Constituição, o Mandado de injunção ganha outro relevante destaque democrático: conferir

ampla legitimidade ativa à população para buscar a concretização de um direito que lhe foi

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garantido constitucionalmente, uma vez que a omissão inconstitucional é tratada via controle

abstrato, limitando, por conseguinte, os legitimados ativos ao rol taxativo previsto no artigo

103 da Constituição da República de 1988.

A Lei n. 13.300 de 23 de junho de 2016, que se propôs a regulamentar o Mando de

Injunção, traz que as pessoas naturais ou jurídicas titulares de direitos, liberdades, e

prerrogativas, cujo exercício seja obstaculizado por ausência de regulamentação legislativa

sejam legitimadas a impetrar com a referida ação constitucional.

A Legislação trouxeampla legitimidade ativa, incluindo pessoas jurídicas no rol de

legitimados. Outro ponto acerca da legitimidade ativa para o writinjuncional, que merece

destaque na Lei, trata-se da possibilidade de Mandado de Injunção coletivo, que amplia ainda

mais a possibilidade de legitimados ativos.

À luz da Lei n. 13.300 de 2016 o Ministério Público possui legitimidade ativa na defesa

da ordem jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais

indisponíveis. A Defensoria Pública atua como Impetrante quando a tutela requerida for

especialmente relevante para a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos

individuais e coletivos dos necessitados.

A Defensoria Pública e o Ministério Público, como instituições essenciais à justiça que

são, com função constitucional de garantia do regime democrático, promoção dos direitos

humanos e defesa dos direitos coletivos, possuem ampla legitimidade no que tange matéria

discutida em sede de Mandado de Injunção.

Por outro lado, demais legitimados à propositura do writinjuncional coletivo, tais como

partido político com representação no Congresso Nacional, organização sindical, entidade de

classe e associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano,

devem manter pertinência temática entre suas finalidades institucionais e a matéria omissa à

qual se pleiteia a injunção.

Há de se reforçarque a legislação a regulamentar o Mandado de Injunção conferiu

ampla legitimidade ativa para a propositura deste remédio, positivando em seu texto a pessoa

física e jurídica na qualidade de autores. Sobretudo, confere destaque ao Ministério Público e

Defensoria Pública a Autoria da injunção coletiva.

De fato, o titular do direito, sobretudo numa República democrática, deve possuir meios

de defendê-lo. Embora não se registre em sede injuncional uma pluralidade judicial

competente para sua apreciação, tal instituto constitui meio de controle concreto (SARLET,

STRECK, 2013, p, 482).

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A competência para apreciação do Mandado de Injunção, apesar de não ser restrita

exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, tal como se dá nas ações do controle

concentrado, não se configura ampla como nas demais vias de controle difuso. Quando a

elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do

Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das Mesas de uma dessas

Casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do

próprio Supremo Tribunal Federal, a competência originária para processar e julgar o

Mandado de Injunção será do Supremo Tribunal Federal. Além da competência originária,

cabe à Corte Suprema julgar em recurso ordinário o mandado de injunção decididos em única

instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão.

A Constituição da República fixa ser o Superior Tribunal de Justiça competente para

processar e julgar originariamente o Mandado de Injunção quando a elaboração da norma

regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração

direta ou indireta, com exceção dos casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos

órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.

Destaque-se, pois, que os tribunais superiores possuem competência para apreciar o

Mandado de Injunção quando a matéria mantiver pertinência. Assim, vale ressaltar que:

A competência para o Mandado de Injunção se correlaciona com a partilha

constitucional da jurisdição: matéria penal, o mandado de injunção é de competência

do Superior Tribunal Militar; matéria eleitoral, do Tribunal Eleitoral, matéria

trabalhista, do TST (PASSOS, 1989, p. 114).

A Constituição do Estado Minas Gerais, no bojo do artigo 106, inciso I, “f” trata ser de

competência do Tribunal de Justiça processar e julgar o Mandado de Injunção quando a

elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, de entidade ou de autoridade

estadual da administração direta ou indireta.

A questão da competência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais para apreciar a

Injunção é ainda tratada no artigo 33, inciso I, “e” do Regimento Interno deste Tribunal,

quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Governador do Estado, da

Assembleia Legislativa ou de sua Mesa, do Tribunal de Justiça, do Tribunal de Justiça Militar

ou do Tribunal de Contas do Estado.

O parágrafo único do artigo 113 da Constituição de Minas Gerais ainda trata ser de

competência do Juiz de Direito o julgamento de Injunção quando a norma regulamentadora

for atribuição do Prefeito, da Câmara Municipal ou de sua Mesa Diretora, ou de autarquia ou

fundação pública municipal.

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Confere-se, dessa forma, não ilimitada, mas ampla competência para julgamento em

Mandado de Injunção. Contudo, análise do caso in concreto, com efeitos atrelados às partes,

aliado à ampla legitimidade ativa, dá ao Mandado de Injunção ares de controle de

constitucionalidade por omissão pela via incidental.

Além disso, é justamente na forma de controle (concentrado e difuso) que reside um dos

pontos que diferencia a Ação de Inconstitucionalidade por Omissão do Mandado de Injunção.

Desse modo, destaca-se que:

na ação de inconstitucionalidade por omissão, que se inscreve no contencioso

jurisdicional abstrato, de competência exclusiva do STF, a matéria é versada apenas

em abstrato e, declarada a inconstitucionalidade por omissão, será dada ciência ao

Poder competente para adoção das providências necessárias e, em se tratando de

órgão adminstrativo, para fazê-lo no prazo de 30 dias (CF, art. 103, § 2). No

mandado de injunção, reconhecendo o juiz ou tribunal que o direito que a

Constituição concede é ineficaz ou inviável em razão da ausência de norma

infraconstitucional, fará ele, juiz ou tribunal, por força do próprio mandado de

injunção, a integração do direito à ordem jurídica, assim tornado-o eficaz e

exercitável (VELLOSO apud BARROSO 1993, p. 4).

Além da forma de controle de constitucionalidade, um abstrato, outro concreto, o objeto

da ação também difere a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão e o Mandado de

Injunção, embora ambos tratem da omissão inconstitucional.

A modalidade de controle da omissão pela via concentrada, já abordada, trata da

omissão no que concerne à medida para tornar norma constitucional efetiva. A proposta do

mandado de injunção, modalidade difusa de controle, é assegurar o exercício dos direitos e

liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à

cidadania. O que se objetiva em sede injuncional é garantir ao titular de um direito que,

“contemplado na Constituição, não lhe é deferido por quem de direito por falta de uma norma

regulamentadora que torne viável o exercício do aludido direito”. (BASTOS 1988-1989, p.

357).

Acerca do objeto do mandado injuncional, basta enfatizar que não é a simplesmente

afalta de norma que autoriza o mandado de injunção, mas, sim a falta de norma necessária à

operabilidade de comando constitucional. É preciso, portanto, a ocorrência de lacuna,

entendida como a ausência de norma necessária (SUNDFELD, 2011, p. 583). Se exige, pois,

“nexo de causalidade entre a omissão normativa do poder público e a inviabilidade do

exercício do direito” (SARLET; STRECK, 2013, p, 482).

No que tange aos direitos e liberdades constitucionais que podem ser tutelados por

Mandado de Injunção, reforça-se que estes não estão restritos ao título II do texto

Constitucional - Dos Direitos e Garantias Fundamentais – toda e qualquer norma de garantia

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constitucional poderá oportunizar o instrumento injuncional (SARLET; STRECK, 2013, p.

483).

Se por um lado o objeto do mandado de injunção parece ser bem delimitado, o mesmo

não se dá com a natureza da decisão e seus efeitos em caso de procedência da injunção, sendo

reconhecido que a falta de norma regulamentadora, de fato, torna inviável o exercício de

direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania

e à cidadania.

A decisão que julga procedente o Mandado de Injunção teria natureza mandamental ou

declaratória, tal como acontece em sede da ação por omissão pela via abstrata de controle de

constitucionalidade? Por outro lado, a decisão proferida neste writ constitucional teria o poder

para, por si só, garantir, de fato, a plena efetividade dos direitos outrora obstaculizados por

omissão legislativa?

Uma vez reconhecido a mora ou inércia do Poder Legislativo para editar norma apta a

regulamentar direito previsto em sede constitucional, a decisão do Supremo Tribunal Federal

teria força para impor a Casa legiferante editar ato normativo para suprir a ausência

inconstitucional ou a decisão judicial serviria para reconhecer a ausência de normatividade e

comunicar ou recomendar o poder competente para a edição da norma? Propusemos, pois, a

análise de tais questões.

Cumpre destacar que a decisão proferida em sede injuncional possui caráter obrigatório

ou mandamental (MEIRELLES, 2006, p. 283). Ademais, lição extraída da própria

nomenclatura do remédio constitucional estudado.

A sentença mandamental, por sua natureza, possui características que extrapolam o

reconhecimento de fatos tais como na sentença tipicamente declaratória. Nas decisões

mandamentais, “o juiz não constitui: manda” (PONTES DE MIRANDA, 1998, p. 224). “A

ação mandamental prende-se a atos que o juiz ou outra deve mandar que se pratique. O Juiz

expede o mandado, porque o autor tem a pretensão ao mandamento e, exercendo a pretensão à

tutela jurídica” (PONTES DE MIRANDA, 1998, p. 135).

Há de se salientar que não se trata a injunção de ação declaratória, nem mesmo ação

cognitiva (BARROSO, 1993. p. 11). O efeito principal da sentença no mandado de injunção é

assegurar o exercício do direito subjetivo, cuja fruição seja obstaculizada pela ausência de

regulamentação.

Na ação declaratória, por sua vez, o ato do juiz é dizer do ser ou não ser da relação

jurídica de modo a tornar claro, iluminar o recanto do mundo jurídico para ver se é, ou se não

é, a relação jurídica de que se trata. A prestação jurisprudencial nesta via declaratória consiste

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na simples clarificação. (PONTES DE MIRANDA, 1998, p. 132). Nas ações declaratórias há

o interesse em deixar claro se existe ou não existe uma relação jurídica sem que tenha como

efeito principal constituir, ou desconstituir, ou condenar, ou mandar, ou executar (PONTES

DE MIRANDA, 1971, p. 3).

O writinjuncional possui, portanto, o condão para, além de declarar a omissão, expedir

mandado destinado ao órgão legislativo omisso. Sim, a injunção, ainda que não seja a

principal, possui carga declarativa. Resta frisar que “não há ação mandamental pura. A

sentença, que ela pede, é sentença que mais mande do que declare” (PONTES DE

MIRANDA, 1998, p. 138-139).

O remédio injuncional, contudo, é e deve ser tido como medida excepcional a

salvaguardar os preceitos constitucionais. Assim, “a injunção é sempre supletiva, ou seja, só é

concedida quando não existe em lei um remédio adequado para a proteção dos direitos do

cidadão” (SARLET; STRECK, 2013, p. 480).

Até mesmo em virtude do caráter supletivo e, com a real finalidade de dar efetividade a

direito previsto constitucionalmente, porém, não regulamentado, admite-se a atuação do

judiciário, de forma a complementar a atuação do Poder legiferante até então omisso. Dessa

maneira não há que se admitir que o Mandado de Injunção se destine

à obtenção de uma decisão que recomende ou ordene ao órgão ou autoridade

omissos que expeçam a norma regulamentadora do dispositivo constitucional.

Recomendação dessa natureza é objeto da ação de inconstitucionalidade por

omissão, que constitui instituto diverso. (BARROSO, 1993, p. 13).

O objeto do Mandado de Injunção – tornar viável o exercício dos direitos e liberdades

constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania –

exige uma conduta cautelosamente mais atuante do judiciário que a recomendação ao Poder

competente a legislar.

O objeto do Mandado de Injunção é a tutela efetiva de direitos e, ante ao caráter

supletivo e complementar da causa, a injunção mereceria tratamento excepcional, qual seja:

que o Judiciário supra a falta de regulamentação, criando a norma para o caso concreto, com

efeitos limitados às partes do processo (BARROSO, 1993, p.13).

Há de se ponderar, contudo, os reflexos que a ordem judicial estaria a impactar no

ordenamento jurídico.Uma vez reconhecida a inércia legislativa, o mandado proveniente do

julgamento da Injunção destinar-se-á ao Poder Legislativo, para que adote as medidas

necessárias a fazer suprir a lacuna legal que impossibilita o exercício de direito previsto em

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via constitucional. Direcionamos os argumentospara a relação nem sempre pacífica entre os

independentes e harmônicos Poderes Legislativo e Judiciário.

Aprofundando nesta seara, aborda-se análise das posições sobre os efeitos da decisão

proferida pela Suprema Corte em sede injuncional e se esta teria força a concretizar a

efetividade dos direitos previstos constitucionalmente ou se o título judicial seria revestido de

cunho declaratório, com fins a comunicar ao Poder legiferante acerca da omissão

inconstitucional. Ademais, pondera-se a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal e o

progresso do entendimento desta Casa julgadora em alguns casos.

Há de se notar que a corrente que defende que as decisões proferidas em mandado de

injunção não possuem força a concretizar os direitos obstaculizados de exercício por inércia

legislativa foi dominante no início, tendo sido muito aplicada pela Suprema Corte, bem como

pela doutrina.

Esta corrente não concretista, diga-se, mais conservadora, não admite que um Poder do

Estado, no caso o Judiciário, imponha ao Poder Legislativo condições e prazos para exercício

da atividade legiferante. Tal situação poderia representar uma afronta à separação e

independência dos poderes. Para esta posição, o Judiciário ao impor coercitivamente um

prazo ou condições para que o Legislativo exerça função típica de legislar, é uma abrupta e

invasão na esfera do Poder inerte, sendo considerada ainda, usurpação de competência pelo

Órgão judicante.

Neste sentido o tribunal deveria limitar-se a constatar a inconstitucionalidade da

omissão e a determinar que o legislador empreendesse as providências requeridas.

(MEIRELLES, p. 277). Tal entendimento foi adotado pela Suprema Corte no julgamento do

Mandado de Injunção n. 456, no qual, revela-se

incomportável no âmbito do mandado de injunção, além de destituído de qualquer

suporte jurídico, o pedido alternativo formulado pelo impetrante: a fixação de prazo

para o Senado Federal editar, com fundamento no art. 52, da Carta Política, a

resolução suspensiva da execução das normas legais declaradas inconstitucionais

pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 150.764-1 (MI 456, Relator:

Sr. Ministro CELSO DE MELLO).

Este entendimento de que a o mandado de injunção teria fins mais declaratórios, não

aptos a garantir e concretizar o exercício de direitos, dá azo a teoria não concretista. Num

reflexo da teoria não concretista, destaque ainda o Julgamento do Mandado de Injunção n.

491-9 no qual a Suprema Corte chegou fixar entendimento no sentido que, além de não poder

o órgão julgador impor prazo para que a omissão legislativa seja sanada, não seria “possível

impor sanção pelo seu descumprimento” (BARBOSA SOBRINHO, 2001. p. 284).

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Além da questão de imposição de prazo, por parte do Poder Judicante ao Legiferante, é

descartada a possibilidade de o Tribunal editar ato, com viés normativo, apto a possibilitar o

exercício de direito obstaculizado por ausência de regulamentação legal. Assim foi

reconhecido pela Suprema Corte, na oportunidade de julgamento do Mandado de Injunção n.

107, no qual se decidiu que:

A opinião que sustentava a possibilidade de o Tribunal editar uma regra geral, ao

proferir a decisão sobre mandado de injunção, encontraria insuperáveis obstáculos

constitucionais. Tal prática não se deixaria compatibilizar com o princípio da divisão

de Poderes e com o princípio da democracia. Além do mais, o modelo constitucional

não continha norma autorizadora para a edição de regras autônomas pelo juizado,

em substituição à atividade do legislador, ainda que com vigência provisória, como

indicado pela doutrina. Portanto, essa posição revela-se incompatível com a

Constituição. (MI 107, Rel. Moreira Alves, RTJ 133/11 (34-35).

Acerca desta questão, o Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento do Mandado

de Injunção n. 107, que: “a corte não está autorizada a expedir uma norma para o caso

concreto ou a editar norma geral e abstrata, uma vez que tal conduta não se compatibiliza com

os princípios constitucionais da democracia e da divisão de Poderes” (MENDES; STRECK,

2013, p. 1422).

Destaque-se que no julgamento do Mandado de Injunção n. 107, que se deu em

novembro de 1990, a Suprema Corte adotou postura conservadora pornão ter autorização

constitucional para ir além de cientificar o órgão ou Poder competente. Assim, o mandado de

injunção destina-se, tão-somente, a aferir a existência de omissão que impede o exercício de

um direito constitucionalmente assegurado (FERREIRA FILHO, 2006a, p. 321-322).

Acontece que esta corrente não se tornou unanimidade nem na doutrina nem no

desenvolvimento histórico da jurisprudência do Supremo Tribunal. A corrente que defende

que a decisão proferida na injunção deveria ir além do reconhecimento de mora do legislador

e criar condições ao exercício de direito constitucionalmente assegurados ganhou mais força.

Parte do pensamento constitucional entende que as decisões proferidas em sede de

Mandado de Injunçãosão, de fato, revestidas de caráter mandamental, de modo a viabilizar o

exercício de direito obstaculizado por ausência legal. Daí surge a teoria concretista, que

defende a concretização do gozo de direitos constitucionais outrora impedidos. A Teoria

concretista, portanto,

preconiza que, diante da ausência de norma regulamentadora, cabe ao Poder

Judiciário o suprimento da lacuna. Deste modo, o Judiciário, mediante sentença,

regularia a omissão em caráter geral, ou seja, além de viabilizar o exercício do

direito pelo impetrante do MI, também estenderia os efeitos a todos aqueles em

idêntica situação (efeito erga omnes) (STF - RECLAMAÇÃO :Rcl 10278 SC,

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relator: Ministro Celso de Mello; publicação: DJe-088 DIVULG 09/05/2014

PUBLIC 12/05/2014).

Para esta posição mais concretista, a decisão em sede injuncional deveria ir além do

reconhecimento da omissão legislativa e comunicação ao Poder legiferante acerca da decisão.

Tais efeitos são os típicos da inconstitucionalidade por Omissão pela via abstrata. O Mandado

de Injunção, por sua vez, deve ser dotado de mais efetividade, tendo esta posição mais

concretista ganhado mais força, inclusive diante da Suprema Corte.

Com efeito, em decisões recentes, a mais Alta Corte, após pronunciar o estado de mora

do órgão legislativo, tem admitido - na prática - efeitos concretos ao mandado de injunção,

possibilitando ao interessado a tutela específica do direito constitucional invocado.

(BARROSO, 1993, p. 13).

No julgamento do já citado Mandado de Injunção n. 107 em que prevaleceu o

entendimento pela corrente não concretista, pode-se destacar, em sentido contrário, o voto do

Ministro Carlos Velloso que diverge

do entendimento segundo o qual o mandado de injunção obtém-se o mesmo que se

obtém com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão: procedente o

mandado de injunção simplesmente dá-se ciência ao órgão incumbido de elaborar a

norma regulamentadora de ele está omisso. Esse entendimento, data vênia, esvazia a

nova garantia constitucional do mandado de injunção, que tem por escopo, segundo

está na Constituição, art. 5º, LXXI viabilizar o exercício de direitos e liberdades

constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e

cidadania.

O voto do Ministro Velloso traz importantes argumentos que reforçam a posição

concretista. No julgamento deste Mandado de Injunção, propõe destaque ao voto do Ministro

Carlos Velloso, que diverge da posição que este remédio constitucional teria efeitos tão

somente declaratórios. O Ministro defende a tese mais concretizadora à sentença que

reconhecer a omissão legislativa e conceder a injunção. Assevera Velloso que “mediante o

mandado de injunção, o juiz cria, para o caso concreto, a norma viabilizadora do exercício do

direito”.

A teoria concretista, que ganha cada vez mais força a partir deste voto do Ministro

Carlos Velloso, merece ser estudada sob três enfoques: o que entende que o judiciário, além

de notificar o órgão legislador sobre a omissão, deva também fixar prazo para que este Órgão

edite a norma omissa, o que entende que a própria decisão judicial seria apta a garantir o

exercício de direitos ora obstaculizados mediante a mora legislativa e, por último, a posição

que entende que deveria o próprio judiciário editar a norma faltante, viabilizando, pois, o gozo

de direito constitucional.

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O primeiro enfoque da teoria concretista ganhou força ante a Suprema Corte, tendo sido

aplicada por esta casa julgadora em alguns casos. A título exemplificativo, no Mandado de

Injunção de número 283, sob relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, a Suprema Corte

entendeu pela fixação de prazo de 45 dias mais 15 dias para sanção presidencial.

Há de se destacar que nesta decisão o STF adotou postura cautelosa ao reconhecer a

omissão legislativa e conceder prazo para a edição da norma faltante, bem como para sanção

presidencial. Todavia, tal decisão não trouxe uma solução para, na hipótese de esgotado o

prazo concedido, permanecesse a inércia legislativa.

Já no julgamento do Mandado de Injunção n. 232, sob relatoria do Ministro Moreira

Alves, a Suprema Corte conheceu o writ constitucional para declarar o estado de mora em que

se encontrava o Congresso Nacional, a fim de que, no prazo de seis meses, esta casa

congressista adote as providências legislativas que se impõem para o cumprimento da

obrigação de legislar decorrente do art. 195, § 7., da Constituição da República, “sob pena de,

vencido esse prazo sem que essa obrigação se cumpra, passar o requerente a gozar da

imunidade requerida.” (MI 232, Rel. Moreira Alves, DJ 27.03.1992).

No notório julgamento do Mandado de Injunção n. 708, sob relatoria do Ministro

Gilmar Mendes, em que o objeto de debate foi a possibilidade de greve de servidores

públicos, decidiu a Corte Suprema pela fixação de prazo de 60 dias para que o Congresso

Nacional edite atividade legislativa sobre a matéria. Neste contexto entendeu a Suprema Corte

que “a decisão judicial que declara a existência de uma omissão inconstitucional constata,

igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante, insta-o a editar a norma requerida” (MI

708, Rel. Gilmar Mendes, DJ 30.10.2008).

Além de fixar um prazo, o referido Mandado de Injunção foi deferido “para determinar

a aplicação das Leis n. 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que

envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis”. (MI 708,

Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206

DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-02 PP-00207 RTJ VOL-

00207-02 PP-00471).

Importante ressaltar sobre este posicionamento que a Suprema Corte, que passou a

sentinela da Constituição a admitir que o julgamento de Mandado de Injunção legitima a

edição de outras medidas que garantam a posição do impetrante até a oportuna expedição de

normas pelo legislador (MI 708, Rel. Gilmar Mendes, DJ 30.10.2008).

Importante observar nestes dois julgamentos (Mandados de Injunção 232 e 708) que o

Supremo Tribunal Federal, além da fixação de prazo para a edição da atividade normativa,

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entendeu por já estabelecer uma consequência para caso permaneça a inércia legislativa.

Numcaso (MI 232) o Autor da Injunção passaria a gozar da imunidade requerida, mesmo sem

regulamentação legal. Já no outro caso (MI 708) entendeu as Cortes pela aplicação leis de

análogas.

Diante de tais julgamentos e mudança de enfoque, como observa Mendes (2011, p.

177-178), a Suprema Corte, sem assumir função típica legislativa,

afastou-se da orientação inicialmente perfilhada, no que diz respeito ao mandado de

injunção. As decisões proferidas nos Mandados de Injunção números 283 (BRASIL,

1991c), 232 (BRASIL, 1992a) e 284 (BRASIL, 1992b) sinalizam para uma nova

compreensão do instituto e a admissão de uma solução “normativa” para a decisão

judicial. (...) As decisões acima referidas indicam que o Supremo Tribunal Federal

aceitou a possibilidade de uma regulação provisória pelo próprio Judiciário, uma

espécie de sentença aditiva, caso se utilize a denominação do direito italiano.

(MENDES. 2011, p. 177-178).

Fácil é ver que o progresso da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca do

mandado de injunção emprestou ao instituto feições que muito contribuíram para a

efetividade do controle da omissão legislativa dentro de nosso sistema de controle de

constitucionalidade. (MENDES. 2011, p. 188).

Outro lado da posição concretista entende que a própria decisão judicial proferida em

sede injuncional seria apta a suprir a ausência de lei, competindo ao “juiz proferir decisão que

contivesse regra concreta destinada a possibilitar o exercício do direito subjetivo em questão”

(SILVA, 2006, p. 450-452; BARROSO, 2006, p. 123-124).

Esta posição concretista ganha reforço na doutrina, segundo a qual o Mandado de

Injunção é um

instrumento de tutela efetiva de direitos que, por não terem sido suficiente ou

adequadamente regulamentados, careçam de um tratamento excepcional, qual seja:

que o Judiciário supra a falta de regulamentação, criando a norma para o caso

concreto, com efeitos limitados às partes do processo (BARROSO, 1993, p.13).

Acontece que, para a satisfação de direitos constitucionalmente previstos, não basta

edição de lei que os regulamente. É necessário, em alguns casos, que para a efetividade de

direitos previsto em sede constitucional, esteja dentro dos atos de gestão do competente Poder

Executivo.

Assim, este posicionamento mais concretista encontra obstáculos na esfera da separação

dos poderes. Além de abordar sobre questão tipicamente legislativa, com sentença suprindo a

edição de ato normativo, poderia o judiciário adentrar ainda na órbita do Poder Executivo,

impondo ato de gestão não previsto em plano de governo e fora de orçamento.

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Quando, por exemplo, da decisão judicial há uma imposição ao Gestor Público a uma

realocação específica de recursos ou envolver organização prévia de serviços, o Mandado

injuncional é descabido, pois,

Nessas circunstâncias se faz inviável a tutela, inexistentes os recursos ou o serviço, e

construir-se o mandado de injunção como direito de impor ao Estado a organização

de serviços constitucionalmente reclamados teria implicações de tal monta que,

inclusive constitucionalmente, obstam, de modo decisivo, a pertinência do

mandamus na espécie. (PASSOS, 1989, p. 112).

Novamente se depara com a dicotômica relação entre efetividade dos direitos

fundamentais e harmonia entre os poderes. A preocupação com a conduta ativista por parte do

judiciário se mostra novamente presente ao analisar os efeitos da decisão de omissão

declarada pela via incidental. É preciso ter cautela também em sede de injunção para que o

Judiciário não assuma sozinho as funções de Legislador e gestor.

No estado constitucional cada Poder possui função de modo que o exercício harmônico

alcance a completa engrenagem democrática. Deste modo, ainda que se combata a

inoperância legislativa no que tange ao exercício de direitos fundamentais, propõe-se que o

poder judicante, dentro das suas funções constitucionais, proporcione viabilidade a direitos

outrora omissos, entretanto, de modo a respeitar a harmonia com os Poderes do Estado,

sobretudo, o legislativo.

Assim, o Poder Judiciário é chamado para apreciar o debate no tocante aos efeitos da

sentença proferida em sede injuncional, afinal, se se trata de uma conduta abusiva, ainda que

por omissão do Poder Legislativo que não exerceu sua típica função constitucional de legislar.

Assim, o Poder julgador tem competência para exercer o freio e democrático a fim de que as

engrenagens da máquina constitucional voltem a girar com perfeição.

Na nova separação harmônica dos poderes os juízes se tornaram, dessa maneira, os

controladores não só da atividade (civil e penal) dos cidadãos, como também, dos “poderes

políticos”. (CAPPELLETTI, 1993, p. 49). Atuação do judiciário, portanto, representa “o

necessário contrapeso democrático, segundo entendo, num sistema democrático de checksand

balances” (CAPPELLETTI, 1993, p. 19).

Assim, “a própria excepcionalidade desse novo instrumento jurídico impõe ao

judiciário o dever de estrita observância do princípio constitucional da divisão funcional do

poder” (MENDES, 2008, p. 135). Contudo, ainda que em casos excepcionais, como é o caso

da injunção, em que o contrapeso permita a um Poder o exercício de funções atípicas,

devemos nos ater às barreiras constitucionais.

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Por certo, vislumbra-se a plena eficácia dos direitos fundamentais previsto no plano

constitucional, que não podem ser obstaculizados por inércia legislativa. Porém, maior

cuidado se convida ao apreciar a “criação de regra” por parte do judiciário.

Deste modo, o Poder Judiciário, ante ao reconhecimento da omissão legislativa, deve

criar meios (e não normas) para o gozo de direitos constitucionalmente previstos até que o

Poder Legislativo providencie a edição de norma.

Numa ótica pautada na garantia da Constituição e efetividade das normas definidoras de

direitos e garantias nesta Carta prevista, pondera-se que “o juiz, ao acolher a injunção, deve

criar uma regra que cumpra, no caso específico, a função da norma omitida” (SUNDFELD,

2011, p. 587). No entanto, concretude da decisão judicial há de ser analisada com cautela para

não ultrapassar as próprias barreiras constitucionais firmadas no âmbito de cada Poder.

Como se percebe, pairou sobre a doutrina e jurisprudência da Corte Suprema o debate

acerca dos efeitos da decisão proferida em sede de Mandado de Injunção. Se a sentença teria

efeito declaratório, tendo poder de reconhecimento sobre a omissão inconstitucional e

notificação ao poder inerte para que edite a norma necessária, ou se sentença adotaria uma

posição mais concretista, por meio da qual a tutela jurisdicional seria apta a assegurar direitos

outrora obstaculizados por inércia Congressista.

Além do mais, adotada a posição concretista, o Poder Judiciário poderia impor um

prazo para que o poder inerte edite a norma ausente ou, ainda, se o órgão judicante poderia

editar a norma perante o caso concreto para a satisfação de direitos.

A prolongação deste debate acerca dos efeitos de sentença neste remédio constitucional

sem uma posição pacífica aliada à ausência de norma que efetivamente regulamente o

Mandado de Injunção faz com que este referido writ constitucional tenha sua aplicabilidade

prática posta em xeque, sendo um “complicador desnecessário à realização de direitos”

(BARROSO, 2011, p. 693).

Contudo, o mandado injuncional é um importante instrumento democrático à disposição

do povo caso, porventura, o exercício de algum direito venha a ser obstaculizado em virtude

de inoperância legislativa. Ele não pode nem merece cair no esquecimento de um instrumento

que se torne inviável justamente por ausência de regulamentação, exatamente o que visa

combater.

Assim, com o fito de regulamentar o Mandado de Injunção, foi promulgada em 16 de

junho de 2016, a Lei n. 13.300. Este instrumento legislativo disciplina o julgamento e trâmite

desta ação constitucional e enfrenta a questão dos efeitos da sentença de modo a propor uma

solução definitiva.

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A teor do artigo 8.do referido diploma legal, após o tramite regular do julgamento da

ação constitucional e, reconhecido o estado de mora legislativa, a Injunção será deferida para

determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora

e estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das

prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições em que poderá o interessado

promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo

determinado. É de se perceber, pois, que a Legislação adota a posição mais concretista com o

límpido propósito de assegurar o exercício do direito obstaculizado por omissão legislativa.

A legislação, portanto, reconhece que é preciso dar efetividade às garantias previstas em

sede constitucional, caso contrário a Carta Maior se resumirá ao epitáfio que reveste “os

túmulos das ideias mortas” (REALE, 1997, p. 99), trazendo muitas palavras e poucas ações.

“A injunção não é um modo de tornar de fato respeitadas as normas de eficácia plena, mas

sim de tornar plenamente eficazes as normas de eficácia limitada” (SUNDFELD, 2011, p.

582).

Na primeira e mais natural consequência da sentença no Mandado de Injunção, na

determinação de prazo para a edição da norma, funciona a Alta Corte como um tribunal de

alerta, avisando ao poder inerte acerca da omissão legislativa, já recomendando o início das

atividades em determinado prazo. Assim, uma vez editada a norma para o efetivo gozo de

direitos, a questão está resolvida por atividade legislativa.

No entanto, é de grande valia frisar que caso norma não seja editada dentro do prazo

estabelecido na injunção é que a sentença produzirá efeitos para estabelecer condições para o

exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania, os quais foram obstaculizados por omissão

legislativa.

Os efeitos estabelecidos na lei do Mandado de Injunção acumulam os propostos na

teoria concretista para fixar um prazo ao poder inerte e estabelecer condições para o exercício

dos direitos. A lei, portanto, ratifica o posicionamento firmado no notório julgamento do

Mandado de Injunção n. 708-DF que versa sobre o direito greve dos servidores públicos que

além de fixar o prazo de sessenta dias para que o Congresso legisle sobre a matéria

determinou a Corte pela a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às

ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis.

Sobre o posicionamento firmado pela Lei n. 13.300 de 2016, há de ser dar destaque à

hipótese de que, mesmo diante de Mandado de Injunção que determine prazo para que a

atividade legislativa se concretize ainda assim o órgão responsável pela edição de norma se

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mantenha inerte. Para tal situação, a legislação, a teor do parágrafo único do artigo 8.da Lei n.

13.300/2016, estabelece que será dispensada a fixação de prazo caso o mesmo órgão tenha

deixado de cumprir, em Mandado de Injunção anterior, o prazo para a edição da norma.

Posicionamento este que merece atenção.

Neste caso, ante uma omissão inconstitucional declarada pela via difusa injuncional, um

prazo é fixado pela Corte para que o órgão competente regulamente a matéria. Caso este

órgão, mesmo que instigado pelo STF a legislar assim não o faça, insistindo na inércia, num

eventual Mandado de Injunção posterior cujo impetrado seja o mesmo Órgão inerte, será

dispensada a determinação de fixação de prazo. Assim, a medida a ser adota pela Suprema

Corte estabelecerá condições para que se dê o exercício de direitos, sem, contudo, notificar

novamente o órgão legiferante, oportunizando ao mesmo a edição de atividade legislativa.

Nesta hipótese, configura-se conduta abusiva do Legislativo duas vezes: uma em não

legislar acerca de matéria prevista na Constituição e outra a continuar a não editar o ato

normativo mesmo tendo a determinação da Alta Casa do Judiciário. A legislação que

regulamenta o Mandado de Injunção entendeu não ser viável que o Supremo Tribunal fixe

prazos a serem desrespeitados pelos órgãos legiferantes, funcionando a Corte Constitucional

como se fosse um órgão destinado a sugerir prazos a cada julgamento de omissão

inconstitucional pela via difusa.

Por oportuno, não cabe ao Judiciário compelir o Legislativo a legislar e nem pode

assumir ele próprio a função legislativa. Contudo, a Suprema Corte, que tem como dever

precípuo a guarda da Constituição, possui interesse em que o texto constitucional se efetive.

Assim, a previsão legal de que os efeitos da sentença em Mandado de Injunção se darão para

que sejam estabelecidas condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou

das prerrogativas reclamados, reflexos da própria atuação do Judiciário na harmonia dos

poderes.

Neste contexto, a convocação do Poder Judiciário decorre da nova harmonia entre os

Poderes e ao instituto injuncional deve ser dada aplicabilidade e efetividade, a fim de

vangloriar o texto constitucional.

O órgão judicante, no exercício de sua função típica, exerce o contrapeso democrático e

objetiva o frear do duplo abuso inconstitucional do legislativo, passando, com amparo na

legislação, a criar meios para que o exercício de direito se concretize, sendo dispensada nova

notificação ao Poder inerte.

É importante argumentar que a dispensa em notificar o órgão omisso para que seja

fixado um prazo para a promoção de norma regulamentadora se trata da exceção inserida

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numa medida já excepcional, que é o Mandado de Injunção. Eis que a excepcionalidade da

questão autoriza postura mais arrojada da Corte para criar meios ao exercício de direitos.

Entretanto, a edição de norma que efetivamente regulamente a matéria tratada na

Injunção faz cessar os efeitos de decisão proferida pela Corte Suprema, à luz do artigo 9.da

Lei do Mandado de Injunção. A legislação adota postura já firmada pela Suprema Corte.

Novamente insta trazer à baila o posicionamento adotado no julgamento do writ injuncional n.

708, que tratou da greve para servidores públicos “até o momento de colmatação legislativa

específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF” (MI 708, Rel.

Gilmar Mendes, DJ 30.10.2008).

A edição de norma regulamentadora não retroagirá em relação às benesses gozadas por

meio de decisão transitada em julgado. Positiva expressamente a legislação os efeitos ex nunc

da norma regulamentadora, admitindo, contudo, a retroatividade caso for mais favorável ao

beneficiado.

O Mandado de Injunção, portanto, assegura ao titular de um direito liberdades

constitucionais e de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania de

forma provisória até a devida disciplina legislativa (MI 708, Rel. Gilmar Mendes, DJ

30.10.2008). Importante trunfo para exercício pleno das prerrogativas constitucionais.

A sentença proferida em Mandado de Injunção, produz, ainda, efeitos limitados às

partes do processo, reforçando ainda mais as características de controle difuso a este remédio

constitucional.Deste modo, a sentença que cria condições para exercício a direitos

obstaculizados por ausência de regulamentação legal produz efeitos apenas ao Autor da ação

constitucional.

Contudo, quando for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou

da prerrogativa a decisão judicial poderá ser revestida de caráter ultra partes ou ergma omnes,

como estabelece o artigo nono da Lei n. 13.300 de 23 de junho de 2016, possibilidade que

flerta intimamente com a teoria da abstrativização, objeto de estudo deste trabalho.

Em se tratando de Mandado de Injunção coletivo, cujos direitos, liberdades e

prerrogativas constitucionais pertençam a uma coletividade indeterminada, os efeitos da

Injunção naturalmente excederão os interesses subjetivos da parte.

Mais uma vez insta argumentar que o notório Mandado de Injunção n. 708 serviu de

fonte e precedente para o entendimento consolidado pela Lei. No julgamento deste notório

writ injuncional, sob relatoria do Ministro Gilmar Mendes, a decisão emprestou efeitos para

além das partes do processo, vencidos os Senhores Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim

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Barbosa e Marco Aurélio, que “limitavam a decisão à categoria representada pelo sindicato”

(MI 708, Rel. Gilmar Mendes, DJ 30.10.2008).

No entanto, salienta-se que não só o writ coletivo está sujeito a eficácia erga omnes ou

ultra partes. Além de tal possibilidade, uma decisão de Injunção transitada em julgado, pode,

em decisão monocrática do relator, estender efeitos a casos análogos caso a omissão

legislativa persista.A Lei n. 13.300 de 2016 veio a regulamentar o Mandado de Injunção e

propor medidas para sanar as angústias e debates que pairavam sobre o mesmo, sobretudo, no

que tange aos efeitos de uma decisão.

Ainda assim, mesmo com respaldo na Lei n. 13.300 de 2016, a relação a respeito da

atuação do Poder Judiciário no julgamento de Mandado de Injunção em consonância com a

Separação de Poderes ainda tende existir. Afinal, o fato do Supremo Tribunal Federal impor

prazos para que o legislativo edite normas faz com que se pense na seguinte questão: estaria a

Corte adentrando na órbita independente deste Poder legiferante? Além do mais, a situação na

qual esta Casa Julgadora passa a estabelecer meios e critérios para o exercício dos direitos

poderia ser considerada usurpação de poderes reservando o Judiciário competência

legislativa?

Entende-se, de fato, tratar de uma atuação harmoniosa do Poder Judiciário, que só foi

convidado a apreciar a questão devido a uma inercia do Poder Legiferante. À luz da

transparente harmonia dos poderes não cabe ao Executivo ou ao Judiciário adotar medidas

abusivas, de modo a dominar o poder. Entretanto, da mesma forma, não cabe ao Legislativo o

descumprimento de preceitos impostos pelo constituinte originário, sendo a inércia deste

poder um abuso comissivo inconstitucional.

Ademais, o julgamento do Mandado de Injunção obedece um rito processual específico

com observância do princípio do contraditório, afinal, a teor do artigo 5.da Lei n. 13.300, o

Poder, órgão ou autoridade com atribuição para editar norma, que figure como impetrado,

será notificado acerca do ajuizamento da Injunção, podendo prestar informações em dez dias.

Além disto, o órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada terá ciência do

feito, nele podendo ingressar.

Outrossim, o Ministério Público, instituição independente e que possui como

incumbência constitucional a defesa da ordem jurídica e do regime democrático, intervirá

nesta ação constitucional.

Assim, se trata de um procedimento constitucional, com observância ao contraditório,

ampla defesa e pertinência ao devido processo legal. A Injunção não deferida pela Corte

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Suprema de forma abrupta, inaudita altera pars. O próprio órgão inerte terá ciência do

ajuizamento, além de poder participar do mesmo.

Ademais, a determinação para legislar, mesmo com atuação do Poder Judiciário em

Mandado de Injunção, não vem deste poder Julgador. Esta determinação vem do Poder

Constituinte. A convocação da Casa julgadora decorre tão somente da harmonia dos poderes.

A injunção trata, pois, de importante e necessário remédio constitucional, ato a fazer valer os

direitos na Carta cidadã prevista.

2.4 Controle de constitucionalidade e direitos fundamentais

No item anterior foi abordado o instituto do Mandado de Injunção como instrumento de

controle difuso de constitucionalidade e sua utilização como meio garantidor do exercício de

direitos fundamentais, uma vez reconhecida a posição concretista que vem sendo adotada pela

Suprema Corte.

Objetiva-se, agora, abordar o controle de constitucionalidade de modo geral como meio

hábil a fomentar direitos fundamentais. A Constituição da República de 1988 traz em seu

texto importantes elementos norteadores e definidores de direitos fundamentais.

Na contextualização de direitos fundamentais, numa perspectiva formal, é possível

afirmar que se cuidam de conjunto de garantias atribuídas a tais direitos e que lhes assegura

um regime jurídico diferenciado e qualificado na arquitetura constitucional (SARLET, 2015,

s/p). Ainda, nada impede que se lance mão da mesma nomenclatura “direitos humanos”, ou

mesmo apenas e de modo genérico, “direitos fundamentais”, ou, “direitos humanos

fundamentais” (SARLET, 2015, s/p).

Os direitos fundamentais vêm tutelar a pessoa numa valorização do indivíduo como

credor de direitos na condição humana. O avanço de tais direitos está, pois, historicamente

correlacionado à dignidade humana após séculos de violações da condição de pessoa. Nesta

pauta se estribam os direitos e as garantias fundamentais na ordem constitucional hodierna,

que objetivam, cada vez mais, valorizar dignidade humana como um valor supremo e um

parâmetro em que devem ser valoradas todas as demais normas de conduta estatal (IRIBURE

JÚNIOR; SIFUENTES, 2016, p. 129).

A Constituição da República de 1988, vem, então, direcionar a conduta do Estado em

prol da pessoa, tornando o texto constitucional num rico texto normativo assegurador de

direitos e garantias fundamentais. Neste viés, a Constituição da República se torna mais do

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que uma simples lei (LASSALLE, 2013, p. 6), é uma Lei Fundamental. A ideia de

fundamento traz, implicitamente, a noção de uma necessidade ativa, de uma força, eficaz e

determinante que atua sobre tudo que nela se baseia, fazendo-a assim e não de outro modo

(LASSALLE, 2013. P. 9).

Contudo, apesar dessa força eficaz, as normas constitucionais não são auto executáveis,

sendo que, por diversas oportunidades, garantias fundamentais deixam de ser cumpridas na

prática.

Diante da carga crucial que o texto constitucional de 1988 carrega, o preceito

constitucional deve ser aplicado para que se possa atingir concretamente o que está previsto

abstratamente no texto constitucional. A norma constitucional não tem existência autônoma

em face da realidade. A sua essência reside na sua vigência, ou seja, a situação por ela

regulada pretende ser concretizada na realidade (HESSE, 1991, p. 14).

A Constituição não configura, portanto, apenas expressão de um ser, mas também de

um dever ser (HESSE, 1991, p. 15). A Constituição deve ser feita para ser aplicada. A Lei

fundamental da República não se limita a declarar direitos, mas vai além disso, prevendo os

mecanismos que os tornem efetivos para todos. O texto constitucional necessita prever, pois,

regras de ação (DALLARI, 1985, p. 54, 56-57).

O direito constitucional deve, portanto, explicitar as condições sob as quais as normas

constitucionais podem adquirir a maior eficácia possível, propiciando, assim, o

desenvolvimento da dogmática e da interpretação constitucional (HESSE, 1991, p. 27).

A violação a direitos fundamentais desrespeita a própria condição de pessoa humana

constituindo uma ferida aberta contra a própria existência do ser (ABBAGNANO, 2003, p.

276). É preciso, portanto, respeitar os direitos constitucionais fundamentais e colocá-los em

prática, uma vez que de nada servirá o que se escrever numa folha de papel se não se justifica

pelos fatos reais e efetivos do poder (LASSALE, 2013, p. 42).

A prática da Constituição traz, além dos demais, o grande benefício da certeza e da

segurança dos direitos (DALLARI, 1985, p. 56). Por oportuno, é preciso criar meios

degarantir a supremacia da Constituição e de seus preceitos, sendo elementar, portanto,

exercer controle sobre atos inconstitucionais.

Para manter, pois, a Magna Carta no seu patamar de soberania legislativa, é mister a

observância das vias de controle de constitucionalidade, visando eliminar do ordenamento

jurídico pátrio leis e atos normativos constitucionalmente viciados, dado que uma lei

inconstitucional representa uma afronta à Carta garantidora da democracia.

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Neste sentido, as vias de controle de constitucionalidade, seja pela via difusa, seja pela

via concentrada, representam instrumentos fortificantes e que concretizam os preceitos

previstos na Constituição. Por esse prisma, é adequado classificar e incluir as ações de

controle concentrado de constitucionalidade entre os instrumentos de tutela de direitos”

(ZAVASCKI, 2014, p.51). Na sua dimensão subjetiva,

não há como negar que o sistema de controle concentrado de constitucionalidade

constitui, mais que modo de tutelar a ordem jurídica, um poderoso instrumento para

tutelar, ainda que indiretamente, direitos subjetivos individuais, tutela que acaba

sendo potencializada em elevado grau, na sua dimensão instrumental, pela eficácia

vinculante das decisões (ZAVASCKI, 2014, p. 51).

Certamente, por possuir efeitos erga omnes, a via concentrada de controle se aproxima

com mais clareza para a realização de direitos. Contudo, a via difusa também configura

importante instrumento a garantir direitos, já que aprecia a inconstitucionalidade perante o

caso concreto.

É o caso, por exemplo, do oportunamente abordado, Mandado de Injunção n. 708, que

trata do exercício de greve por parte de servidores públicos. Devido a este instituto de

controle incidental de inconstitucionalidade, é possível a concretização de direito fundamental

constitucionalmente previsto e outrora obstaculizado devido à ausência legislativa.

A via de controle judicial objetiva assegurar melhor definição jurídico-material das

relações entre Estado-cidadão e particulares-particulares, e, ao mesmo tempo, assegurar a

defesa de direitos (CANOTILHO, 2003, p.275) e exercício de direitos fundamentais.

Observa-se, portanto, os mecanismos de controle de constitucionalidade como

elemento garantidor de direito fundamental ao corrigir a inconstitucionalidade que impedia o

gozo dos ditos direitos.

2.5 O controle de constitucionalidade judicial sob a ótica da tripartição dos poderes

2.5.1Preliminar metodológica

No contexto que se pretende apreciar a forma judicial de controle de constitucionalidade

à luz da separação dos poderesé necessário previamente argumentar sobre o poder e a sua

conjuntura.

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A sociedade precisa de regras para a convivência equilibrada de todos. O corpo social,

contudo, percebe uma transformação quanto à forma de gestão pública, extirpando a

autocracia, que admite que todas as diretrizes e mandamentos se concentrem nas mãos de uma

só pessoa, para reconhecer a democracia, cujo objetivo politicamente é a liberação do

indivíduo das coações autoritárias (SILVA, 2015, p. 136).

A essência da democracia, aliás,vem do fato do poder residir no povo. Toda democracia

para ser tal repousa na vontade popular (SILVA, 2015, p. 135), estando tal princípio

registrado no artigo inaugural da Constituição da República de 1988, o qual determina que

todo poder emana do povo.

Contudo, sobre a titularidade popular, as funções do Estado se organizam em Poderes.

Neste sentido, urge constatar que o poder envolve a energia capaz de coordenar e impor

decisões visando à realização de determinados fins. O Poder político tem que coordenar e

impor regras e limites em funções dos fins globais que ao Estado cumpre realizar (SILVA,

2015, p. 109).

Desse modo, as funções do Estado são divididas para cada órgão competente de modo

que além de separar as funções, é preciso distribuí-las a fim de organizar o convívio social. O

Poder, na esfera democrática,é capaz de ser contextualizado como repartição de funções. Na

órbita autoritária, como se deu em determinado período da história, contudo, elerepresenta a

literalidade da força e reunião das funções do Estado.

Nesta oportunidade, poder e democracia, à luz da Constituição da República de 1988,

caminham ao lado a lado, com o exercício do poder, no contexto de força ou divisão de

tarefas, adstrito ao cerne da democracia, representado a vontade popular, que é titular do

poder.

2.5.2 Jurisdição constitucional, controle de constitucionalidade e separação dos poderes

No atual patamar democrático, depara-se com maior atuação do Poder Judiciário. A

força judicante encontra amparo na garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição,

consagrada segundo ditames do artigo 5., inciso XXXV da Constituição da República de

1988, o qual estabelece que a lesão ou ameaça a direito estarão sob análise do Poder

Judiciário. Os órgãos integrantes deste poder exercem importante função para a guarda dos

direitos reservados no ordenamento jurídico, cumprindo função ímpar na efetivação de

direitos e impedindo ameaça ou cessando uma violação.

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Uma questão que merece muita atenção diz respeito à quando uma ação ou mesmo uma

omissão dos poderes executivo e legiferante dão azo à atuação judicial para sanar uma lesão e/

ou ameaça.

Pelo disposto segundo o princípio da inafastabilidade da jurisdição, o Poder Judiciário,

no exercício de sua função típica, tem a incumbência de sanar a lesão ou ameaça e, por

conseguinte, criar meios para a efetivação de direitos afim de controlar os abusos dos demais

poderes em consonância com a harmonia recíproca entre os três poderes.

Assim, o Poder Judiciário exerce um controle de abusos cometidos pelos poderes

Legislativos e Executivo, a princípio em harmonia com a separação de poderes. Nesta visão, a

jurisdição, mais notada e tangencialmente à esfera constitucional, passa a ter como função

primordial a preservação da Constituição (ABBOUD, 2011, p. 101), sendo “considerada

como elemento necessário da própria definição do Estado de Direito Democrático”

(STRECK, 2014, p.115).

Nesta ótica, a jurisdição constitucional deve se reinventar possuindo como primeira

grande tarefa

instrumentalizar a função primordial do próprio constitucionalismo, qual seja, coibir

os excessos do poder público. Nas palavras de Peter Härbele, a função da jurisdição

constitucional consiste na limitação, racionalização, e controle do poder estatal e

social, na proteção das minorias e os débeis e na reparação dos novos perigos para a

dignidade humana. Konrad Hesse enaltece que a jurisdição constitucional em última

sede assegura a preservação do direito bem como possibilita o controle judicial

amplo do Poder Executivo, em concreto a atividade da Administração Pública. É

principalmente, por meio da jurisdição constitucional que o Poder Judicial insere-se,

hoje, no equilíbrio dos poderes. A tarefa da jurisdição constitucional é decidir com

autoridade, os casos de violação ao texto constitucional. Essa atividade inclui tanto o

controle dos poderes estatais como tarefa da concretização e evolução do direito

constitucional. Imperioso ressaltar que essa tarefa, principalmente no Brasil, não se

restringe apenas à jurisdição constitucional (ABBOUD, 2001, p. 101).

Resta evidente, pelo menos a priori, que um poder do Estado manter uma

interdependência com demais e por eles ser controlado visa evitar abusos de ambos, estando

todo o ordenamento à luz da Constituição.

Deste modo, diante de uma função típica, se o Poder legiferante promulga uma lei

evidentemente inconstitucional que, em virtude deste vício, obstaculiza direitos positivados na

Constituição. Tal lei está sujeita a análise de constitucionalidade feita pelo órgão do poder

judiciário.

Assim, a análise de constitucionalidade é apreciada pelo Supremo Tribunal Federal pela

via concentrada, por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade, ação Declaratória de

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Constitucionalidade, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental e Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão.

A análise de constitucionalidade exercida pelo judiciário se dá também pela via difusa,

na qual demais órgãos do Poder Judiciário são chamados para apreciar uma incongruência

com a Constituição por meio de ações diversas, tais como um mandado de segurança ou um

habeas corpus, exemplificativamente.

O controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário cumpre com a

harmonia e interdependência entre os poderes, exercendo freio perante um abuso. Atos do

Executivo ou do Legislativo contrários à Constituição representam abuso por parte de tais

poderes, indo de encontro a princípios democráticos almejados. A autorização do Judiciário a

declarar inconstitucionalidade de leis é exemplo de mecanismo apto para consciente

colaboração recíproca entre os poderes (SILVA, 2015, p. 113).

Ante a reciprocidade harmônica entre os poderes, a atuação do Judiciário, quando

chamado a apreciar uma inconstitucionalidade seja pela via abstrata ou concreta e respeitado

os ditames do ordenamento jurídico, representam o freio e contrapeso de um abuso

inconstitucional por parte dos demais poderes, louvando-se sempre a Carta constitucional.

Uma lei inconstitucional se manter alheia a contrapeso por parte dos outros poderes do

Estado representa igual arbitrariedade assim como presenciado em outras perspectivas

históricas. É cediço que atos dos poderes Legislativo e Executivo estão sujeitos a controle de

constitucionalidade exercido pelo Judiciário, em nome da tripartição harmônica dos poderes.

Contudo, compete analisar o âmbito de atuação do órgão julgador neste processo de

frenagem controladora, destarte, vale apreciar a decisão do órgão judicante e seus efeitos.

Deste modo, é importante avaliar a natureza da decisão em sede de controle judicial de

constitucionalidade: declaratória pelo fato do órgão julgador reconhecer a

inconstitucionalidade de tal ato e assim a declarar ou, ainda, diante do reconhecimento de uma

inconstitucionalidade a consequência da decisão judicial acarretar a efetivação de direitos

outrora obstaculizados pela omissão dos demais poderes, ou mesmo atos comissivos abusivos

por parte destes.

A Constituição da República, sob diagnóstico do artigo 52, inciso X, estabelece que

ante inconstitucionalidade declarada de modo definitivo pelo Supremo Tribunal Federal cabe

privativamente ao Senado Federal suspender a execução da lei objeto de controle.

Nesta perspectiva constitucional, percebe-se, a princípio, uma harmonia entre os

poderes Judiciário e Legislativo, com o órgão julgador exercendo seu papel de controle de

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abusos de outros poderes e o Poder Legiferante retirando tal vício constitucional da órbita

jurídica pátria.

Num primeiro plano, o legislador constituinte atuou de forma precisa ante a uma

situação de extrema relevância perante o paradigma democrático. No entanto, determinadas

questões nascem com o avanço do panorama inerente ao tema.

Não se depara, pelo menos na seara positivista do texto constitucional, com uma

solução para a hipótese de inércia da Casa Congressista responsável por suspender o ato

inconstitucional se tornar inoperante diante do tema. A Carta Constitucional diz que se se trata

de competência privativa do Senado Federal suspender a execução de lei ou ato normativo

declarado inconstitucional. A primeira questão inevitável que convida o leitor a refletir

encontra amparo na seguinte indagação: “e se o Senado Federal não suspender a execução de

tal lei declarada inconstitucional? ”

Sobre tal ponto, se houver uma decisão que reconheça definitivamente uma

inconstitucionalidade e o órgão responsável não tomar providências a fim de sanar o vício

reconhecido pelo órgão controlador corremos o risco de termos uma decisão judicial inócua,

com a inconstitucionalidade continuando a reinar perante a sociedade. Deste modo:

a mera ciência ao Poder Legislativo pode ser ineficaz, já que ele não está obrigado a

legislar. Nos termos estabelecidos, o princípio da discricionariedade do legislador

continua intacto, e está bem que assim seja. Mas isso não impediria que a sentença

que reconhecesse a omissão inconstitucional já pudesse dispor normativamente

sobre a matéria até que a omissão legislativa fosse suprida. Com isso, conciliar-se-

iam o princípio político da autonomia do legislador e a exigência do efetivo

cumprimento das normas constitucionais. (SILVA, 2015, p. 50-51)

Noutro plano, na ocasião do judiciário adotar a postura de concretizar sua decisão e,

como consequência fixar condições e, em alguns casos, até mesmo prazos para que os demais

órgãos providenciem o afastamento do teor inconstitucional do ordenamento, elepode

ultrapassar os limites do controle, não competindo ao órgão julgador revogar lei ou ato

normativo da órbita jurídica.

Tal tema foi pautado pelo órgão guardião da Constituição em algumas oportunidades,

adotando, contudo, a Suprema Corte posicionamentos diversos, os quais merecem destaque.

O Supremo Tribunal Federal decidiu no julgamento do Mandado de Injunção n. 107

que: “a corte não está autorizada a expedir uma norma para o caso concreto ou a editar norma

geral e abstrata, uma vez que tal conduta não se compatibiliza com os princípios

constitucionais da democracia e da divisão de Poderes” (MENDES; STRECK, 2013, p. 1422).

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Destaque-se que neste julgamento, que se deu em novembro de 1990, a Suprema Corte

adotou postura conservadora, entendendo não ter autorização constitucional para ir além de

cientificar o órgão ou Poder competente.

Em outra perspectiva, esta mesma alta Casa julgadora adotou posicionamento diverso,

entendendo plausívelno julgamento da ADI 3682 “indicar um prazo razoável para a atuação

legislativa, ressaltando as consequências desastrosas para a ordem jurídica da inatividade do

legislador no caso concreto” (MENDES; STRECK, 2013, p. 1420). Desse modo, a referida

ADI 3682, sob relatoria do Ministro Gilmar Mendes, foi julgada procedente:

(...) para declarar o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim

de que, em prazo razoável de 18 (dezoito) meses, adote ele todas as providências

legislativas necessárias ao cumprimento do dever constitucional imposto pelo art.

18, § 4º, da Constituição, devendo ser contempladas as situações imperfeitas

decorrentes do estado de inconstitucionalidade gerado pela omissão. (ADI 3682,

Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 09/05/2007, DJe-

096 DIVULG 05-09-2007 PUBLIC 06-09-2007 DJ 06-09-2007 PP-00037 EMENT

VOL-02288-02 PP-00277 RTJ VOL-00202-02 PP-00583).

Nesta oportunidade, a Excelsa Corte considerou inconstitucional a inércia legislativa

determinando ao Congresso Nacional prazo de 18 meses para adotar as medidas cabíveis a

fim de sanar a omissão inconstitucional.

Vale frisar que ainda que o STF possui precedentes importantes para fixar 24 meses

como prazo razoável, com o escopo de extirpar a omissão inconstitucional do ordenamento

pátrio. Assim, as ADIs 2240/BA, 3316/MT e 3489/SC (Relator Ministro Eros Grau,

julgamento 09/05/2007) e ADI 3689/PA (Relator Ministro Eros Grau, julgamento

10/05/2007).

Neste contexto tem a Suprema Corte brasileira adotado posicionamento diverso, a

começar pelo pensamento hodierno. A fim de assegurar efetividade a suas decisões e sanar

concretamente a omissão legislativa que afronta a Carta da República de 1988, adota-se a

postura “arrojada” de ir além da mera ciência ao Órgão administrativo ou Poder competente

para tomar as medidas pertinentes, fixando prazo mínimo para que a omissão seja sanada de

plano.

Quanto à via (concentrada ou difusa) que se dá a análise de constitucionalidade de lei ou

ato normativo e os efeitos de tal decisão, é convidativo fazer uma releitura da separação dos

poderes ante a uma inconstitucionalidade declarada pelo poder que exerce o contrapeso.

Assim, é possível neste ponto, imergir no moderno papel da jurisdição constitucional no

âmbito da separação dos poderes.

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Talvez seja impossível imaginar a democracia contemporânea sem uma atuação

destacada do Judiciário, que cumpre importante função na harmonia dos poderes, sendo,

muitas vezes, para a sociedade a “ultimaratio”, ou seja, o último fio de esperança diante de

uma inconstitucionalidade ou desrespeito a um direito.

Entre este embate há uma angulação positiva, na qual o Judiciário consegue atender

anseios da sociedade que não puderam ser satisfeitos pelo Parlamento, contribuindo com a

redemocratização para o fortalecimento e expansão do Poder julgador, bem como a busca por

justiça. (BARROSO, 2012 p. 24-27).

Neste cenário, importante pensar e repensar o papel que o judiciário exerce

hodiernamente na seara constitucional. Sem dúvidas, um judiciário atuante é ponto

consolidado para uma real e democrática interdependência harmônica entre os poderes, mas é

necessário ponderar os limites. Ademais, o Poder julgador também está sujeito ao controle

recíproco dos demais poderes. Nesta temática, “o controle judicial de constitucionalidade é

imprescindível. Caso contrário não haveria garantia de que o legislador efetivamente se

submete a Constituição. Mas esta competência conhece várias limitações” (DIMOULIS;

LUNARDI, s/a, p. 463).

Novamente, é preciso destacar que o controle é garantido também por vontade popular,

expresso pela Assembleia Constituinte. Contudo, não se pode olvidar que o judiciário também

se encontra sujeito a controle recíproco. O fenômeno da judicialização, consagrado pela

inafastabilidade da jurisdição textualmente na Constituição da República de 1988, no artigo

5., inciso XXXV, não tem por objetivo elevar o Judiciário a um patamar inalcançável pelos

demais poderes.

A garantia de protecção jurídica impõe o contrário: a protecção é também contra o

juiz e actos do poder judicial, sendo absurdo que os juízes, detentores de poderes

públicos e vinculados aos direitos fundamentais, pudessem ficar impunes ad

infinitum no caso de violação de direitos fundamentais” (CANOTOLHO, 2003 p.

277).

A nova separação de poderes, contudo, objetiva ir muito além da absoluta separação

institucional dos Poderes, propondo também um passo adiante na harmonia recíproca entre os

mesmos. Assim sendo, o jurista moderno “não pode continuar confinado ao exame dos textos

legais, contentando-se com os horizontes traçados pelas cartas constitucionais” (REALE,

1997, prefácio). A nova engenharia constitucional deve ser combinada com a sensibilidade

cultural e econômica (ACKERMAN, 2000, p. 724), na qual há de se pautar a separação dos

poderes nos novos movimentos sociais com proposta de reflexão global em torno da

economia e sociedade (SUORDEM, 1995, p. 18 e 29).

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Neste formato da moderna reflexão social, pautada na dinamicidade e

multidisciplinaridade político-social, as decisões judiciais não podem ficar restritas apenas a

fundamentos jurídicos e talvez nem sentido fizesse se assim fosse. As decisões judiciais

devem acompanhar a prosperidade das necessidades sociais. Sendo o Poder judiciário feito

para servir a população, as decisões deste poder devem progredir de modo a suprir as novas

necessidades desta, tendo este Poder alargada sua competência, acentuando-se cada vez mais

a destinação social (REALE, 1997, p. 46).

Imerso nesta nova necessidade social, a sociedade moderna

reclama um novo conceito de neutralidade do juiz, o qual, como órgão do Estado, só

por hipocrisia pode ser concebido como politicamente asséptico. Não há como

confundir o ato político do ato judiciário com o do Executivo ou do Legislativo. A

diferença consiste no fato de que, enquanto o Legislativo e o Executivo instauram e

dão início a processos políticos, visando aos mais interesses e fins, ao juiz, fazendo

seus os valores políticos consagrados na Constituição, cabe assegurar a validade das

normas e decretos, quando constitucionalmente legítimos, mas declará-los nulos ou

ineficazes se atentarem contra os dispositivos constitucionais. Esse é talvez o maior

dos serviços que o Judiciário presta à sociedade (REALE, 1997, p. 51).

Não há que se pautar o Poder judiciário como poder supremo, intocável, pois, do

mesmo modo, seria ofensivo à dignidade da Separação harmônica entre os poderes.

No entanto, propõe-se que a atuação judicial seja analisada com amparo na Constituição

e na separação dos poderes. A defesa de direitos através dos tribunais representa uma “decisão

fundamental organizatória” (Lorenz apud CANOTILHO, 2003 p. 276), pois o controlejudicial

constitui uma espécie de “contrapeso” clássico em relação ao exercício dos poderes executivo

e legislativo (CANOTILHO, 2003, p. 276)

Assim, uma inconstitucionalidade configura uma ineficiência legiferante ou executiva

apta a autorizar atuação judicial decorrente do próprio princípio da inafastabilidade da

jurisdição e em consonância com a interdependência harmônica entre os poderes.

É de grande valia ressaltar que eventual função política que pode vir a ser exercida

como efeito de decisão judicial seria consequência da própria atuação jurisdicional decorrente

da fundamental inafastabilidade da jurisdição, que, se ressalte, em caso de declaração de

inconstitucionalidade, declara pela Suprema Corte e se dá justamente em virtude de uma

inoperância ou incongruência legislativa.

Cumpre destacar que “a mais alta Corte de Justiça, além de guardiã por excelência da

Constituição, deve exercer função político-jurídica, decorrente de sua soberania, a fim de que

o Direito concreta e oportunamente se realize em todo o território nacional” (REALE, 1997,

p. 98).

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Determinado sopro político é caracterizador da própria progressão social, pautada nas

novas necessidades sociais. Em caso de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, as

decisões judiciais nascem da própria necessidade de controle, configurando uma leve e

refrescante brisa ao passo que, características políticas ou mesmo legislativas como em edição

de resoluções, com claro caráter normativo ou decisões que acarretam nova interpretação à

Lei ou Constituição, se traduzem como um evidente vendaval que destelha o teto da separação

de poderes e derruba os muros do Estado Democrático.

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CAPÍTULO III

A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA INTERPRETAÇÃO DO

DIREITO E A FORÇA DO PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL

3.1 Abertura Metodológica

Até o presente estágio a pesquisa aborda aperspectiva histórica e conceitual acerca do

controle de constitucionalidade na estrutura jurídica.A partir desse momento é importante

analisar, conforme o contexto, a competência de interpretação e criação do direito por parte

do direito, elemento pertencente a problemática deste estudo, não se admitindo ocultar uma

observação sobre a atual conjuntura das súmulas vinculantes e o papel que exercem no

esquema constitucional brasileiro.

3.2A interpretação do direito: do legislativo ao judiciário

Como visto no contexto histórico, a concentração das funções em única mão se torna

prejudicial à democracia, com flertes próximos ao autoritarismo. Com isso, a doutrina da

separação dos poderes é cada vez mais fortalecida e evidenciada em vários textos

constitucionais, com as funções de legislar e julgar ficando a cargo de poderes independentes.

Junto com a separação dos poderes, reforça-se a fé no direito previamente escrito, que

traria maior segurança à população, traduzindo o direito legislativo a sensação de certeza

quanto ao ordenamento jurídico, que não ficaria à mercê de governantes e sujeito a mudanças

constantemente.

De certo modo, o direito legislativo passa a confiança de que todo o ordenamento e

possibilidades estariam estritamente consolidadas em leis. Assim, caso sobrevier dúvida

quanto a determinada situação bastaria que fosse consultada uma lei, a qual traria todas as

hipóteses, consequências e soluções com resguardo na segurança jurídica e alheia a arbítrios

discricionários de governantes ou julgadores.

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Dentro da harmônica separação dos poderes, modelo adotado pela Constituição da

República de 1988, cabe a um poder frear condutas abusivas dos demais, exercendo o

contrapeso democrático. Coubeao Legislativo a tarefa de criar as leis e ao judiciário as

controlar, questão que ganha destaque.Todavia,há na possibilidade de criação interpretação do

direito jurisprudencial e se este é ou pode ser uma fonte do direito.

Certamente, o direito escrito legislativo confere certo grau de certeza acerca de sua

aplicabilidade e interpretação, fator que representa certa resistência à interpretação do direito

pelo judiciário que reside na questão “incerteza, obscuridade, confusão e dificuldade na

verificação” (CAPPELLETTI, 1993, p. 18) que o direito jurisprudencial oferece.

Além do mais, em primeiro plano, o direito praticado por julgadores não é muito

prestigiado “porque nunca se sabe que conclusões eles podem extrair em seus volumes

pedantes, obscuros e excessivamente sutis. Eles tampouco são populares junto ao público em

geral, porque falam acima do nível das pessoas e complicam coisas simples” (CAENEGEN,

2010, p. 109).

A atuação por parte do órgão julgador dar-se-á perante análise de cada caso, que contém

suas particularidades que, por conseguinte, terá uma decisão individualizada. Assim sendo,

por oportuno, cada caso merece uma tutela judicial específica, tornando, pois, a princípio,

impossível obter uma previsão quanto a tutela jurisprudencial antes dela ser exercida.

Com esta análise in concreto, observadas as particularidades de cada circunstância,

torna-se dificultoso aos jurisdicionados uma previsibilidade da aplicabilidade do direito ante a

flexibilidade que cada situação pode apresentar. Por outro lado, o direito codificado

“vislumbra assegurar maior grau de certeza” (CAPPELLETTI, 1193, p. 18). A certeza no

direito codificado

encontra-se no seu ponto mais elevado, pois não apenas o cidadão sabe o que o

direito é, mas, por causa da natureza abrangente do código, ele não tem nenhuma

razão para se preocupar com toda a sorte de regras (costumeiras) antigas e

semiesquecidas que podem repentinamente surgir do nada e atrapalhar suas

expectativas legítimas (CAENEGEN, 2010, p. 90).

A interpretação do direito pelo legislador, com concentração de atos normativos em

códigos, transpareceria uma sensação de maior certeza e previsibilidade à população, pois a

codificação do direito passa a percepção que este não será aquilo que não está escrito,

reconhecendo que não havia nenhum direito fora dos códigos e nenhum direito antes deles

(CAENEGEN, 2010, p. 62). Quando falam sobre legislação, os jurisprudentes se sentem mais

à vontade, é uma posição padronizada (WALDRON, 2003, p. 34).

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O sistema do direito legislativo reunido em códigos traz “a vantagem da segurança

jurídica, que consiste no fato de a decisão dos tribunais ser até certo ponto previsível e

calculável, em os indivíduos submetidos ao Direito se poderem orientar na sua conduta pelas

previsíveis decisões dos tribunais” (KELSEN, 1998, p. 175).

Reforça-se a fé no direito escrito, pois a redução do direito ao texto solene aniquilaria a

incerteza trazida pelas diferentes posições que o direito jurisprudencial pode trazer, bastando a

alguém, caso sobrevier dúvida, consultar a legislação para sana-la.

Se por um lado a codificação apresenta esta segurança quanto a certeza da interpretação,

o direito legislativo por outro lado apresenta outras duas situações tidas como desfavoráveis

em face do direito jurisprudencial: o grau, de certa forma sutil e superficial com o qual aprecia

as questões, e a dificuldade da legislação em acompanhar o desenvolvimento e

transformações sociais.

A legislação escrita toca o direito de forma sutil e abstrata, não se permitindo explorar

as riquezas que cada caso pode proporcionar. A legislação trata o direito de forma superficial,

nada de profundidade, não sendo considerados por alguns como direito. (WALDRON, 2003,

p. 12) A falta de profundidade com a qual a lei mergulha nos concretos problemas sociais

conduz que a justiça não é necessariamente a lei (DERRIDA, 2010, p. 17). Um estatuto não é

o direito, é apenas uma possível fonte de direito (WALDRON, 2003, p. 12).

Além do mais, a legislação previamente escrita encontra o grande desafio de

acompanhar as mudanças sociais. A sociedade, a cultura, as questões econômico-políticas

mudam a cada dia e a legislação é provocada a se antecipar a todas as futuras, possíveis e

imagináveis situações e já as abarcar numa consolidação legal. E mais: já prever uma solução

para um problema que sequer existe e, quiçá, nem venha a existir. Indubitavelmente se trata

de árdua tarefa para o direito positivo, pois “a concepção prática das regras sociais é

impossível de ser legislada” (WALDRON, 2003, p. 23-24).

Certamente, “na medida em que a sociedade está em constante movimento e

transformação, os direitos de seus integrantes devem acompanhar este ritmo, sob o risco de

não conseguir proteger, defender e promover o pleno respeito à dignidade humana” (LOPES,

2001, p. 31).

A desvantagem da legislação é sua falta de flexibilidade: as regras e os códigos são

estabelecidos em textos precisos e mantem-se até que a nova legislação os modifica. A nova

legislação muitas vezes fica em descompasso com a necessidade dos tempos (CAENEGEN,

2010, p. 90).

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Claro que a legislação não é imutável. O direito legislativo pode permutar e se adaptar

às novas mudanças e exigências sociais. Acontece que a legislação, mesmo que se altere, pode

não fazer isso no tempo e modo em que a sociedade precise, correndo o risco de que, ao cabo

do devido processo legislativo que aprove a nova legislação, os anseios da sociedade tenham

mudado novamente e o instrumento legal continue a não acompanhar a nova realidade social.

Ademais, durante o curso do processo legislativo, até que sobrevenha a almejada lei, a

nova realidade social continua a permanecer desamparada de instrumento normativo que a

regulamente. Neste compasso, o direito jurisprudencial se torna importante aliado para a

interpretação do direito. O Poder Judiciário não pode simplesmente ignorar as profundas

transformações do mundo real (CAPPELLETTI, 1993, P. 46) e “por muitas vezes, a

jurisprudência se antecipa à legislação” (ALMEIDA, 1999, p. 191).

Na interpretação do direito “devem ser empregados não apenas os argumentos da

lógica abstrata, ou talvez os decorrentes da análise linguística puramente formal, mas também

e, sobretudo, aqueles da história e da economia da política, e da ética, da sociologia e da

psicologia” (CAPPELLETTI, 1993, p. 33).

Exatamente a possibilidade de análise de cada caso, com argumentos da lógica concreta,

oportuniza que a interpretação proferida pela jurisdição complemente a da legislação.

Em virtude dessas novas áreas do fenômeno jurídico em face da legislação social que se

limita, frequentemente, a definir a finalidade e os princípios gerais e diante de direitos sociais

essencialmente dirigidos, a gradual transformação do presente e formação do futuro

importantíssimas implicações impõem-se aos juízes (CAPPELLETTI, 1993, p.41).

No Direito jurisprudencial é reforçada e complementada a interpretação da legislação.

Não está a se defender ou propor que a jurisdição substitua a lei no fundamental papel de criar

o direito. Verifica-se que o legislador tem o dever de adotar medidas necessárias para a

concretização normativa dos direitos fundamentais, visando seu real exercício, mas sempre

que tal encargo não signifique uma violação ou desnaturalização aos direitos (LOPES, 2001,

p. 32), hipótese em que a jurisdição exerce uma pretensão de correção (ALEXY, 2015, p.

157).

Na interpretação do direito como ordenamento, o modelo jurisprudencial se soma

significativamente ao modelo legislativo, uma vez que “nenhum dador de leis pode criar um

sistema de normas que é tão perfeito que cada caso somente em virtude de uma simples

subsunção da descrição do fato sob o tipo de uma regra pode ser solucionado” (ALEXY,

2015, p. 36). Logo, o órgão julgadorfrenteao caso concreto pode amoldar a situação fática à

legislação e novas perspectivas.

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Não se permite duvidar que o “homem não existe para o Estado, mas o Estado que

existe exclusivamente para o homem (STEIN apud LOPES, 2001, p. 106)”. Nesse compasso é

permitido o raciocínio de que o Estado deve adequar as leis às reais e hodiernas necessidades

do homem. Espera-se, pois, que a flexibilidade do direito jurisprudencial proporcione e

permita a mais estreita interação entre norma e sociedade.

Diante de uma lacuna na lei ou ante a um caso específico que desafie a legislação, e

esta, ante a abstratividade com a qual toca o direito não possua uma solução concreta, o

direito se faz valer de intérpretes. A quem deve ser direcionado o socorro da interpretação de

modo a elucidar o direito? Tão somente seu criador ou outros intérpretes são convidados para

o debate?

De modo a modo, a apreciação do direito por parte do órgão julgador se torna

convidativa no auxílio para se decifrar os mistérios da legislação.

As palavras, mesmo as proferidas pelo legislativo, abrem espaço para variadas

interpretações. “Basta considerar que as palavras, como as notas na música, outra coisa não

representa senão símbolos convencionais, cujo significado encontra-se inevitavelmente sujeito

a mudanças e aberto a questões e incertezas” (CAPPELLETTI, 1993, p. 22).

Certamente se tornam dificultosos os esclarecimentos da legislação. Agora, mais difícil

ainda seria socorrer apenas os legisladores para dúvidas e esclarecimentos que surjam na

análise do instrumento normativo.

O texto da lei apresenta uma certeza quanto ao que ali está codificado no sentido de

garantir ao jurisdicionado que todo o ordenamento está previamente estabelecido e que o

direito não fora além daquele texto. Porém, as palavras e os sentidos da lei estão sujeitos a

interpretações e enigmas em cada caso. “O legislador é um monstro de muitas cabeças e é

difícil descobrir as reais intenções das centenas de parlamentares que votaram uma lei (...) na

interpretação de uma lei, a pior pessoa a que pode interpretá-la é a pessoa responsável pela

sua redação” (CAENEGEN, 2010, p. 13).

Ainda que os legisladores usassem “a forma mais simples e precisa da linguagem

legislativa, sempre deixam, de qualquer modo, lacunas que devem ser preenchidas pelo juiz e

sempre permitem ambiguidades e incertezas que, em última analise, devem ser resolvidas na

via judiciária” (BARWICK, apud CAPPELLETTI, 1993, p. 20-21).

Nesta atmosfera da inserção do Poder Judiciário como intérprete do direito, há de se

argumentar que este órgão, como crítico do direito, está mais próximo da população que o

órgão legiferante. Dados numéricos podem prestar auxílio.

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É cediço que hodiernamente o Brasil possui quinhentos e treze Deputados Federais (Lei

Complementar n. 78/1993) e oitenta e um Senadores, que representam o Poder Legislativo a

nível federal. Deste modo, a partir de um cálculo matemático simples, o Poder Legislativo na

esfera federal é formado por 594 pessoas, o que significa que o Brasil tem um parlamentar

para cerca de 347 mil pessoas, levando em consideração a população brasileira em cerca de

206 milhões de pessoas (FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E

ESTATÍSTICA, 2016).

Por outro lado, no Brasilatualmente - segundo dados do “Relatório Justiça em Números

2016, ano base 2015”, elaborado pelo CNJ - existem cerca 17 mil magistrados (CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, p. 10) em todos os tribunais e instâncias, o que fornece

uma representação de um magistrado para cerca de 12 mil pessoas.

O que se desejou demonstrar com esses singelos números foi que o Poder Judiciário,

como intérprete do direito, está bem mais próximo da população do que o Poder Legislativo,

em que pese este ser tecnicamente o órgão representante do povo. Pode o órgão judiciário

prestar imensurável auxílio ao Poder Legiferante na interpretação e releitura do direito.

Se a cada caso de dúvida na interpretação, lacuna no texto ou obscuridade de sentido da

lei o órgão responsável por sua edição for convocado para solucioná-la, este seria

absolutamente tomado pela atividade corretiva e repressiva, extinguindo as demais atividades

típicas deste Poder: editar novas leis, aptas a regular a sociedade e fiscalizar o cumprimento

das que já existem.

Enfim, como está a se propor nesta pesquisa um estudo acerca da via difusa, ante a uma

necessidade de interpretação do direito, há mais magistrados disponíveis do que

parlamentares, pelo menos na frieza dos números. Destarte, para a população seria mais fácil

socorrer ao judiciário do que ao legislativo para esclarecimentos acerca da interpretação do

direito.

Ademais, no que tange à interpretação do direito, o judiciário a faz de forma mais

concreta, com análise às minúcias de cada caso, além de prestar assessoria interpretativa mais

próxima à população, sendo de grande valia para complementar a atuação do legislativo.

A questão que se convida a exame reside no grau de interpretação exercido pelo Poder

Judiciário e se esta interpretação estaria revestida de certo tom criativo. O juiz, na

interpretação do direito, “como se diz, nominalmente não faça senão declarar o direito

existente pode-se afirmar ser em realidade criador do direito” (CAPPELLETTI, 1993, p. 17-

18).

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Acerca desta criação do direito pode surgir como debate o limite deste “criar” para que

o Judiciário não se aventure a legislar ou a usurpar competência típica do Poder Legislativo.

No entanto, “jamais houve controvérsia mais estéril do que a concernente à questão de se o

juiz é criador do direito. É obvio que é. Como poderia não sê-lo?” (RADCLIFFE apud

ALMEIDA, 1999, p. 191). A criatividade constitui um fator inevitável da função jurisdicional

(CAPPELLETTI, 1993. p. 73).

Contudo, basta reforçar que criar o direito não significa necessariamente editar leis.

Vale relembrar que um estatuto não é o direito, é apenas uma possível fonte deste.

(WALDRON, 2003, p. 12). Por certo, a interpretação não deve ser confundida com total

liberdade do intérprete (CAPPELLETTI, 1993, p. 23).

Por oportuno, “interpretação significa penetrar os pensamentos inspirações e linguagem

de outras pessoas com vistas a compreende-los” (CAPPELLETTI, 1993, p. 21).

A esta forma, pois, perante análise de determinado caso em que o intérprete

jurisdicional é chamado para apreciar o direito, destaca-se que o juiz está autorizado a propor

uma abertura (ALEXY, 2015, p. 37) ao cerrado direito legislativo.

A jurisdição é exitosa quando utiliza argumentos capazes e dispostos de fazer uso de

suas possibilidades racionais (ALEXY, 2015, P. 165). Assim, a magistratura exerce

importante “pela razão de que tais leis e direitos frequentemente são muito vagos, fluidos e

programático, mostra-se inevitável alto grau de ativismo e criatividade do juiz chamado a

interpretá-los. (CAPPELLETTI, 1993, p. 60).

Inevitavelmente, “o tribunal investido da árdua tarefa de atuar a constituição é desafiado

pelo dilema de dar conteúdo a tais enigmáticos e vagos preceitos, conceitos e valores (tarefa,

claro está, altamente criativa)” (CAPPELLETTI, 1993, p. 68).

É manifesto o caráter acentuadamente criativo da atividade judiciária de

interpretação e de atuação da legislação e dos direitos sociais. Deve reiterar-se, é

certo, que a diferença em relação ao papel mais tradicional dos juízes é apenas de

grau e não conteúdo: mais uma vez impõe-se repetir que, em alguma medida, toda

interpretação é criativa, e que sempre se mostra inevitável um mínimo de

discricionariedade da atividade jurisdicional. Mas, obviamente, nessas novas áreas

abertas à atividade dos juízes haverá, em regra, espaço para mais elevado grau de

discricionariedade e, assim, de criatividade, pela simples razão de quanto mais vaga

a lei e mais imprecisos os elementos do direito, mais amplo se torna também o

espaço deixado à discricionariedade nas decisões judiciárias. Esta é, portanto,

poderosa causa da acentuação que, em nossa época, teve o ativismo, o dinamismo e,

enfim, a criatividade dos juízes. (CAPPELLETTI, 1993, p. 42).

Portanto, a interpretação do direito legislativo formulada pelo direito jurisprudencial dá

ao ordenamento maior completude. O que faz de um sistema jurídico um sistema não é a

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posição estratégica de uma legislatura, mas o fato de que existe um conjunto organizado de

instituições aplicadoras de normas, como os tribunais (WALDRON, 2003, p. 18).

A questão aqui em análise gira em torno da interpretação por parte do órgão judicante,

de modo a completar aquela proferida pelos legisladores, uma vez que “nem mesmo a

completa codificação teria eliminado inteiramente do caminho do judiciário” (BENTHAN

apud CAPPELLETTI, 1993, p. 18).

O ordenamento jurídico brasileiro admite esta interpretação suplementar ativa por parte

do órgão julgador. O Decreto Lei n. 4657/1942, denominada Lei de Introdução às normas do

Direito Brasileiro, estabelece em seu artigo 4. que quando a lei for omissa o juiz decidirá o

caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Ademais, na

própria aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do

bem comum, segundo ditames do referido diploma normativo de introdução ao Direito

Brasileiro.

Na legislação já há o reconhecimento de uma interpretação criativa do órgão judicante

de modo a buscar uma mais completa interação entre legislação e sociedade. Reconhece a

legislação que detém e nem pode ter o dom profético de se antecipar a todos os eventos

sociais.

Esta interação entre analogia, costumes e princípios gerais de direito é apreciada pela

via difusa de interpretação, uma vez que cada caso é um caso, cada decisão é diferente e

requer uma interpretação absolutamente única, que nenhuma regra existente ou codificada

pode nem deve absolutamente garantir (DERRIDA, 2010, p. 44).

Por certo, atribuir ao Poder Judiciário atividade interpretativa com certo viés criativo

não o torna legislador, uma vez exercendo sua função nos limites constitucionais para

“prevenir o perigo da transformação perversa do judiciário em outro poder político”

(CAPPELLETTI, 1993, p. 50).

O direito jurisprudencial se consolida como uma fonte do direito e estas são “o costume

(como fixado e formulado pelos julgamentos), a legislação e a ciência do direito

(jurisprudence) ” (CAENEGEN, 2010, p. 47).

As fontes do direito, portanto, devem se complementar visando melhor aplicabilidade

deste. “Em vez de ver fontes disputando entre si, as pessoas, os grupos de pressão e classes

serão vistos lutando pelo poder: controlar o direito para controlar a sociedade” (CAENEGEN,

2010, p. 47-48).A intensão de se convidar o judiciário para a interpretação do direito é

justamente promover a harmonia social.

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“A importância dos mecanismos de proteção dos direitos fundamentais perante o

poder de legislar é inquestionável, na medida em que permite a conservação do

princípio da dignidade humana contido em cada direito fundamental, reafirmando-se

assim, que o centro e o fim de toda atividade estatal deve ser o ser humano”.

(LOPES, 2001, p. 198).

O direito jurisprudencial formula precedentes adotados e resguardados como fonte do

direito, sendo aliado a interpretação do direito positivado. As próximas páginas deste estudo

se propõem a analisar o grau de influência do direito jurisprudencial como fonte do direito

brasileiro e a abordagem dos recursos repetitivos à edição de súmulas vinculantes.

3.3. Teoria dos precedentes judiciais como fonte do direito brasileiro. Uma análise sobre

a súmula vinculante e o poder normativo dos tribunais

3.3.1 Linhas iniciais acerca da Súmula Vinculante: A força obrigatória e vinculação dos

efeitos.

Na teoria da interpretação criativa do direito por parte dos julgadores, o tema da súmula

vinculante ganha cada vez mais destaque. Por meio da Emenda Constitucional n. 45, foi

incluído na Constituição da República de 1988, o artigo 103-A, que estabelece que o Supremo

Tribunal Federal possa de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus

membros, depois de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a

partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais

órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta nas esferas federal,

estadual e municipal.

Este conceito extraído do texto da Constituição Federal e reiterado pela Lei n. 11.417 de

dezembro de 2006, que regulamenta a edição, revisão e cancelamento de súmula vinculante,

apresenta uma riqueza de peculiaridades, as quais permitem fazer uma análise.

Em primeira instância, a Súmula Vinculante é um importante instrumento apto a frear a

sensação de insegurança jurídica proposta pelo direito jurisprudencial, que nos oferece uma

solução diferente para cada caso.A ideia da Súmula Vinculante é reforçar a uniformização da

jurisprudência reafirmada pela Suprema Corte, evitando discrepância de entendimento e a

enxurrada de recursos sobre questões idênticas a cair nos tribunais superiores todos os dias.

Assim, depois de reiteradas decisões, pode o Supremo Tribunal Federal se posicionar

acerca de vincular os efeitos e dar voz erga omnes aos seus apontamentos. “Veda-se, desse

modo, a possibilidade da edição de uma súmula vinculante com fundamento em decisão

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isolada. É necessário que ela reflita uma jurisprudência do tribunal, ou seja, reiterados

julgados no mesmo sentido, é dizer, com a mesma interpretação” (MENDES, COELHO;

BRANCO, 2009, p. 1010-1011).

Para que uma questão decidida perante a Corte Suprema atinja o status vinculante é

preciso um “amadurecimento prévio” (Tavares, 2009, p. 18) da tese, que após vários debates

na alta casa de justiça, teve o posicionamento constantemente ratificado. “Na verdade, para

que uma súmula possa ser editada haverá uma sucessão de casos, que, reconstruídos, darão

azo a uma coagulação de sentido” (STRECK, 2013, p. 1432).

Deste modo, a ideia maturada e sólida, decidida perante a Suprema Corte, visa alcançar

maior segurança quanto ao posicionamento do direito interpretativo e criativo praticado pelos

juízes a fim de adotar uma uniformização do pensamento e evitar decisões isoladas a cada

julgado cada uma num sentido, que conduz a inquietude do direito jurisprudencial.

A ideia do precedente sumulado obrigatório ganha destaque “em razão quadro crítico

enfrentado pelo Poder judiciário, consistente na avalanche de processos submetidos aos

tribunais, na demasiada demora em solução definitiva dos casos e no consequente custo

elevado de manutenção (STRECK, 2013, p. 1425).

Para ilustrar tal situação, ressalte-se que cerca de 100 milhões de processo tramitaram

perante órgãos do poder judiciário brasileiro durante o ano de 2015 (CONSELHO

NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, p. 42). Elevado índice de processos que frequentam os

corredores do judiciário brasileiro, que representa um processo para cada 2 pessoas,

considerando a população brasileira em torno de 200 milhões (FUNDAÇÃO INSTITUTO

BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2016).

Apenas perante a Suprema Corte, o acervo atual é de cerca de 61 mil processos

(SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016), segundo estatísticas que constam no site deste

tribunal, obtidos em pesquisa a este.

Importante ainda trazer evidenciar no presente estudo que o tempo médio de tramitação

de processos na Justiça Estadual é de oito anos e onze meses e na Justiça Federal, sete anos e

nove meses (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2016, p. 69).

Tais dados representam um cenário tumultuado para o judiciário diante do elevado

número de processos e do vagaroso tempo de tramitação. As súmulas visam contribuir com o

bom andamento da máquina judiciária, de modo a tentar promover a solução dos casos, com a

redução do tempo de tramitação e o acúmulo de processos, uma vez que a questão estaria

consolidada na Corte Suprema.

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Com o amadurecimento da posição acerca de determinada matéria, as súmulas servem

para obstaculizar recursos (STRECK, 2013, p. 1432) que, em que pese ser direito do cidadão

uma reanálise do caso por outro órgão do judiciário, tornou-se instrumento de estratégia de

protelação e travamento processual, que contribui para o acúmulo de demandas e recheia

ainda mais os dados já carregados do atual cenário do judiciário brasileiro.

Assim, a Constituição da República traz que aprovado o verbete da súmula, esta passa a

ter, após publicação na imprensa oficial, aplicação vinculante. Tal propósito empresta força

obrigatória (STRECK, 2013, p. 1425) para o caso sumulado, que produz efeitos em relação

aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas

federal, estadual e municipal.

Acerca destes efeitos, duas situações são convidativas a debate: a vinculação de Órgãos

da Administração Pública à posição editada pela Corte Suprema e o caráter normativo

obrigatório que ela passa a ter.

Segundo ditames constitucionais, uma vez publicada a súmula vinculante, esta passa

ditar efeitos obrigatórios perante outros órgãos do Poder Judiciário e Administração Pública

direta ou indireta em todas as esferas.

Importante destacar que “o caráter vinculante não abrange o Poder Legislativo”

(STRECK, 2013, p. 1432). O âmbito da vinculação é, portanto, o Judiciário e a Administração

Pública (TAVARES, 2009, p. 38).

O constituinte derivado, portanto, excluiu da vinculação dos efeitos, o Poder

Legislativo. Sob o prisma da separação dos poderes, a atitude do Judiciário em consolidar

seus entendimentos em verbete obrigatório não estaria a imergir abruptamente na área de

atuação do Poder legiferante, não usurpando competência típica deste.

Por outro lado, contudo, a força vinculante do entendimento firmado pelo Poder

Judiciário envolve a Administração Pública direta e indireta nas esferas federal, estadual e

municipal. Se por um ângulo a atuação judicante vinculativa não adentra no Poder legislativo,

por outro, penetra diretamente na órbita do Poder Executivo.

Perante a regência da Súmula vinculante, os órgãos da Administração Pública passam a

seguir orientações firmadas pelo Tribunal. Neste ponto reside um conflito de entre os poderes,

nos exatos limites do órgão judiciário criar parâmetros a serem seguidos pelo Poder Executivo

e órgãos a ele adjacentes direta e indiretamente.

Primeiramente, há de se ponderar que, apesar de harmônicos, os poderes da República

são independentes. Com a vinculação do verbete jurisprudencial, o Executivo, embora

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autônomo, fica laçado aos ditames judicantes com certo grau de dependência, visto que o

Supremo detém o poder para anular ato administrativo que contrariar o enunciado sumulado.

A força produzida pela súmula vinculante parece soar mais forte que aquela propagada

da lei, basta analisar a consequência do descumprimento de uma e de outra. O

descumprimento de súmula vinculante, segundo orientação do artigo 7. da Lei n.

11.417/2006, acarreta reclamação perante o Supremo Tribunal e visa garantir a autoridade das

decisões desta Casa julgadora (artigo 156 do Regulamento Interno do STF).

No caso de constatado descumprimento da súmula vinculante e procedente a

reclamação constitucional a Corte Suprema irá anular o ato administrativo, nos exatos termos

dos artigos 103-A, § 3., da Constituição da República e 7., § 2., da Lei n. 11.417/2006. Há de

se notar aqui o tom impositivo que o Poder Judiciário atua em face do descumprimento de

posicionamento vinculante.

Paralelamente, declarada a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo pela via difusa,

caberá ao Senado Federal suspender a execução desta, segundo ditames do artigo 52, inciso X

da Carta da República. Observe-se, pois, o trato mais cauteloso aqui proposto, envolvendo o

poder legislativo.

A questão acerca de constitucionalidade pela via difusa chegará ao Pretório Excelso por

via de recurso extraordinário. A Constituição da República, dentre outros casos, admite o

recebimento de tal recurso ante uma decisão que contrariar dispositivo constitucional e

declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal.

O efeito imediato da declaração de inconstitucionalidade na via concreta se limita a

reconhecer o estado de incompatibilidade de lei ou ato normativo para com a Constituição,

sendo, pois, sentença declaratória (SILVA, 2015, p. 56). O descumprimento de súmula

vinculante, por seu turno, possui o efeito direto de anular o dito ato do Poder Executivo,

traduzindo numa imposição verticalizada do órgão judiciário sobre a Administração Pública.

A súmula vinculante ganhou força extrema e o descumprimento de uma ordem judicial

vinculante parece ser mais grave que desobedecer a uma lei. Determinado ato que descumpra

a Lei Maior será também submetido à análise por parte do Poder Judiciário, porém, com grau

escalonado de recursos e, quando finalmente é decidida definitivamente, merece uma

comunicação uma das Casas do Legislativo Federal para que possa, enfim, ser concretizada a

suspensão de cuja lei ou ato normativo.

Em outro contexto, o desrespeito a enunciado de súmula vinculante acarreta a

instantânea representação constitucional diretamente perante a Suprema Corte com trâmite

avassaladoramente mais célere que o caminhar de um processo em curso normal que chegue à

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Corte pela via extraordinária de recursos. Tal discrepância, pelo menos em se tratando do

quesito temporal, dá um ar de prevalência da súmula em detrimento da lei.

De fato, a ingerência do Judiciário sobre o Executivo é necessária ser vista com cautela.

Pois, desta maneira, os órgãos da Administração Pública serão mais vinculados à súmula

vinculante que a Lei, o que traz uma profunda indigestão na relação entre os três Poderes,

com o Judiciário não só usurpando função legislativa, como também, sobrepondo-se aos

demais órgãos, com suas decisões vinculantes justapor em alguns casos à lei e intervindo

subitamente no Executivo.

Imergido nessa questão da imposição direta e verticalizada do judiciário no Poder

Executivo, há de se resgatar um dos princípios basilares da Administração Pública, o princípio

da Legalidade, segundo o qual, os órgãos da administração Pública direta e indireta em todas

as esferas devem estrita obediência aos preceitos legais. Sendo, pois, a atividade

administrativa um gravitar na órbita da lei (BRITTO, 2013, p. 822).

Ciente deste princípio, de acordo com o qual trivialmente “a Administração Pública só

pode fazer o que está na lei”, há, pelo menos aparentemente, um choque com os efeitos das

Súmulas Vinculantes e referido princípio.

Sob o prisma da legalidade, a Administração Pública somente alcança o patamar de

legitimidade plena quando impulsionada pela lei (BRITTO, 2013, p. 822). Acontece que os

efeitos da súmula vinculante, segundo ditames constitucionais, vinculam diretamente os entes

da Administração Pública, que, por muitas vezes, passam a agir impulsionados por

orientações jurisprudencialmente vinculantes.

Ainda que não exista um eventual conflito entre lei e enunciado de súmula, tal

posicionamento vinculado regulamenta o direito de modo a enlear os entes administrativos ao

preceito jurisprudencial, sob pena, inclusive de nulidade do ato se a sentença for julgada

procedente.

Desta feita, na teoria, a Administração Pública estaria restrita a preceitos legais,

contudo, na prática, reservada a preceitos sumulares. Portanto, além da questão que se

envolve tangencialmente à harmonia dos poderes, a súmula vinculante deve enfrentar

descompasso com o princípio da legalidade, que rege os atos administrativos.

Além da vinculação de sobreposição do Judiciário em face da Administração Pública e

os traços conturbados que sobre ela pode incidir, a tese da súmula vinculante assume um novo

desafio perante o pensamento jurídico: o atributo normativo impositivo a ela essencialmente

revestida.

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O caráter compulsório que assume a posição do Pretório Excelso abandona o sentido

meramente de orientação de julgamento para flertar com uma atividade legislativa. “A

súmula, assim como a lei, é um texto do qual se extrai norma” (STRECK, 2013, p. 1431). A

partir da edição de súmula vinculante, o STF passa a exercer função de “criação de regras”

(VIEIRA, 2008, p.446).

A atividade jurisdicional abandona o apanágio de concretude com o qual investiga o

direito e passa a aprecia-lo de modo abstrato. A essência da súmula vinculante está

representada como uma forma de transposição do concreto para o abstrato-geral (TAVARES,

2009, p. 15).

Assim, os detalhes dos casos concretos, suas particularidades e interesses, apreciados

pelas decisões anteriores, serão descartados para fins de criação de um enunciado que seja

suficientemente abstrato par ter efeitos erga omnes (TAVARES, 2009, p. 15).

O texto jurisdicional vinculante que assume o papel de antecipar a solução antes mesmo

da definição do problema passa então a não resolver apenas o caso singular, mas uma

determinada concretização jurídica da constituição para o futuro (MENDES, PFLUG, 2005, p.

354).

Novamente, instigante se torna apreciar o grau de interpretação e criação do direito por

parte do judiciário. Abordou-se, ainda neste capítulo, esta atuação judicante mais destacada.

Cumpre agora analisa-la no trato com a edição de súmulas vinculantes, pois estas assumem

claramente um aspecto normativo.

A orientação sumular obrigatória assume caráter legislativo ou o verbete seria reflexo

natural democrático da jurisdição? A questão aqui gira em torno de saber se cabe ao judiciário

editar tal efeito vinculante, sendo uma dilatação normal do precedente judicial.

Por um lado, conferir a tal decisão caráter de precedente obrigatório é tão-só um

alargamento coerente da função criadora de Direito dos tribunais. (KELSEN, 1998, p. 175).

Noutra vertente, este posicionamento vinculante seria próximo de mais de tarefa legislativa,

que não cabe ao judiciário.

Numa direção, reconhecido o viés criativo da interpretação do direito jurisprudencial, a

vinculação dos efeitos do posicionamento sumular, não passa de reflexo da própria conduta

judicante.

Efetivamente, os julgadores são chamados a interpretar e, por isso, inevitavelmente a

esclarecer, integrar, plasmar e transformar e, não raro a criar ex novoo direito, o que não

significa que sejam julgadores (CAPPELLETTI, 1993, P. 74).

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Se aos tribunais é conferido o poder de criar não só normas individuais mas também

normas jurídicas gerais, (KELSEN, 1998, p. 175), derivada da própria atuação judicante. Os

tribunais têm potencialidade de ser os melhores legisladores possíveis na determinação e

constante adaptação das regras técnicas do processo (CAPPELLETTI, 1993, p. 80).

Uma proposta da súmula vinculante vista com bons olhos, consiste em tentar

desconstruir duas desvantagens da interpretação do direito, uma típica do direito legislativo e

outra do jurisprudencial. O direito praticado por legisladores apresenta o revés de não

acompanhar a atualidade do desenvolvimento social.

O posicionamento sumular almeja combater a desatualização do direito

legislativo, pois,

A súmula vinculante somente será eficaz para reduzir a crise do Supremo Tribunal

Federal e das instâncias ordinárias se puder ser adotada em tempo social e

politicamente adequado. Em outras palavras, não pode haver um espaço muito largo

entre o surgimento da controvérsia com ampla repercussão e a tomada de decisão

com efeito vinculante. Do contrário, a súmula vinculante perderá o seu conteúdo

pedagógico-institucional, não cumprindo a função de orientação das instâncias

ordinárias e da Administração Pública em geral. Nesse caso, sua eficácia ficará

restrita aos processos ainda em tramitação (MENDES, COELHO; BRANCO, 2009,

p. 1014).

O inconveniente do direito jurisprudencial que o posicionamento sumulado procura

rechaçar reside na impressão de insegurança jurídica que o direito praticado por juízes

proporciona. A súmula, por sua vez, visa se concentrar na uniformização do posicionamento

jurisprudencial.Desta feita, a súmula procura unir a contemporaneidade do direito

jurisprudencial com a segurança jurídica do direito legislativo.

Importante, contudo, redobrar a atenção e observar limites para “prevenir o perigo da

transformação perversa do judiciário em outro poder político” (CAPPELLETTI, 1993, p. 50).

Questão que frequentemente apareceu nesta pesquisa e novamente se reascende: o risco

de que o Judiciário assuma cada vez mais a tarefa legislativa usurpando competência do poder

legiferante e tornar-se, de certo modo, opressor, com a tarefa de legislar e julgar na mão, além

de anular atos do Executivo, o que pode ser prejudicial ao caminhar democrático da Nação.

Diferente do que ocorre no trato específico de inconstitucionalidade, para edição de

súmula vinculante, a atuação do órgão julgador não está limitada apenas a apreciar eventual

conduta viciosa de um dos poderes para determinar o desempenho judicante.

Em caso de inconstitucionalidade, mesmo que pela via difusa, o Judiciário é chamado a

exercer o freio em uma conduta abusiva por parte do órgão legiferante para contrabalancear o

sistema democrático. Note-se que caso a atuação legislativa fosse compatível com a órbita

constitucional, não se faria mister a tutela judicial.

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Noutra seara, excetuando um posicionamento vinculante pautado numa

inconstitucionalidade, a posição da Suprema Corte é de um protagonismo significativo, pois,

uma sequência de julgados na mesma direção tem o condão de ditar as regras, com um poder

vinculante quiçá maior que até mesmo a lei.

O que esta a se pensar aqui traduz resumidamente da seguinte forma: Se o

posicionamento vinculante se firmar devido a reiteradas declarações de inconstitucionalidade,

este decorre da própria da atuação harmoniosa e interdependente dos Poderes.

Reitera-se, a inconstitucionalidade de uma lei configura conduta abusiva por parte do

Poder legislativo com a consequente invocação do Poder Judiciário a apreciar o tema,

formalizando a participação natural desse poder julgador no contrabalancear do sistema

democrático.

Assim, a edição de súmula vinculante antes de comunicação ao Senado confere efeitos

vinculantes e erga omnes às declarações de inconstitucionalidade na via incidental.

(SILVA,2015, p. 573).

Já a súmula vinculante cujo objeto foge de uma conduta abusiva dos demais poderes,

conduz uma atuação mais impositiva do judiciário com certo destaque. Certamente, para

reiterar posicionamento sobre determinada a matéria, o órgão judicante foi instigado a tanto,

não se discute.

A questão reside em que a harmoniosa separação dos poderes pondera que um poder do

Estado interfira em outro para fazer sanar uma irregularidade por um deles praticada. Assim,

quando o teor da súmula se pautar numa orientação de conduta sem que esteja presente uma

conduta viciosa dos demais poderes, este se assemelha a um arbítrio do Judiciário, querendo

angariar mais poderio, pois, orientação de conduta está a cargo do Poder Legislativo.

No caso de inconstitucionalidade, contudo, mesmo que venha a ser sumulada, o

nascedouro do verbete vinculante se pauta em uma conduta abusiva por parte do órgão

legislativo, tendo sido a atuação do Judiciário harmoniosamente convidada, não flertando com

usurpação de competência ou concentração de poder.

Ao analisar os legitimados a propositura de posicionamentos vinculantes se percebe

uma força atuante do Supremo Tribunal Federal. Ao tratar da súmula vinculante a

Constituição da República de 1988 trouxe que a Suprema Corte pode, de ofício ou por

provocação dos legitimados para ação direta de inconstitucionalidade (STRECK, 2013, p.

1427), editar súmula vinculante. Contudo, a Lei n. 11.417/2006 que regulamenta a matéria,

expandiu os legitimados para instigar o STF a sumular um entendimento.

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Conforme a referida lei, além dos legitimados para ADI, constantes no rol do artigo 103

da Constituição da República de 1988, podem propor a edição, revisão ou cancelamento de

súmula vinculante o Defensor Público-Geral da União, os Tribunais Superiores, os Tribunais

de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os

Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.

Percebe-se, pois, uma expansão do rol de pessoas autorizadas a propor edição de

verbete vinculante. No entanto, analisando todas as súmulas já publicadas pelo Supremo

Tribunal Federal, num total de 54, – as súmulas de número 30 e 56 estão pendentes de

publicação – percebe-se uma concentração do domínio da própria Casa nas propostas de

enunciado de súmula.

Das 54 súmulas já publicadas pelo STF, 52 se deram de ofício e apenas duas por

provocação. As súmulas de número 14 e 47 foram pedidos formulados pelo Conselho Federal

da Ordem dos Advogados do Brasil, ao passo que todas as demais foram propostas pelos

próprios Ministros da Casa Julgadora.

Estes dados, que foram arguidos perante a página oficial do STF (http://www.stf.jus.br),

analisando uma a uma todas as súmulas vinculantes publicadas desde a admissão de tal

instituto no arranjo jurídico pátrio, que se deu em 2004, demonstra o protagonismo do

Pretório Excelso, que editou de ofício quase a totalidade das súmulas vinculantes.

O fenômeno ativo da Corte Suprema se mostra crescente quando se analisa o número de

súmulas publicadas. De 2007, data de publicação da primeira súmula vinculante, até 2011,

haviam sido publicadas 31 súmulas vinculantes.

Percebe-se, no entanto, um aumento gradativo de súmulas editadas a partir de 2014. De

outubro de 2014 a maio de 2016 - 20 meses - foram editadas 22 súmulas de viés vinculante, o

que representa quase uma súmula publicada por mês.

O que se pretende, com a singeleza destes números, é expor esta conduta proativa do

Poder Judiciário, que além de editar súmulas com conteúdo normativo, ele mesmo as propõe,

com certo aumento de poder.

3.3.2 Súmula vinculante: orientação de conduta e reconhecimento de inconstitucionalidade ou

ilegalidade

A súmula vinculante, como visto, é um texto do qual se extrai uma norma (STRECK,

2013, p. 1431), assumindo caráter abstrato, assim como ato legislativo, para a regular atos

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futuros. Esta regulamentação prévia que causa certa aflição no ordenamento, quando se limita

a tão somente definir uma orientação de conduta.

Algumas orientações sumuladas se concentram em analisar de fato

inconstitucionalidade ou ilegalidade, assumindo o STF a função reparadora a qual foi

convidado, dentro do controle harmônico. É o caso exemplificativo da súmula de número 2,

que reconheceu a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou distrital que

disponha sobre sistemas de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias.

Ainda, como exemplo, o caso da súmula de número 8, que se firmou entendimento que

são inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5.do Decreto-Lei n. 1.569/1977 e os artigos

45 e 46 da Lei n. 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário.

Repise-se que a atuação judicante nestes casos se deu de modo a controlar abusos

contrários à Constituição. Noutro caso, a atuação sumular revela-se claramente como fixação

de conduta, de modo a regulamentar situações futuras como se lei fosse.

É a hipótese, por exemplo, o teor da súmula vinculante n. 4, que estabelece que “salvo

nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de

base de cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído por

decisão judicial”.

Há de se notar o caráter impositivo criador para estabelecer condições de indexação do

salário mínimo como base cálculo.

Acerca deste conteúdo normativo, de orientação de conduta, destaque-se ainda, a

súmula vinculante de número 13, que trata de nepotismo. Após reiteradas decisões sobre o

tema, o Supremos Tribunal Federal firmou entendimento de que a:

“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por

afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma

pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de

cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública

direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição

Federal”.

O verbete de número 13 é revestido de viés claramente normativo e assume o papel de

positivar a prática de nepotismo. Há de se notar que o texto da súmula cria condições e define

a situações com um rigor estritamente abstrato de indicação de conduta, tal como um ato

normativo.

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Por sinal, o ato normativo a regulamentar o nepotismo, o decreto n. 7.203, de 4 de junho

de 2010, é posterior à súmula vinculante que tratara do mesmo tema, que foi publicada em 12

de novembro de 2008. O que reforça ainda mais este viés estatutário que envolve a súmula.

Argumente-se que neste caso, o direito jurisprudencial serviu de fonte para o direito

legislativo.

Não pretende se discutir neste momento a essência da questão de nepotismo e sim

reacender a conduta atuante do Poder Judiciário, a estabelecer regras e definições abstratas,

com caráter vinculante.

Não restrito apenas a casos de edição de súmulas vinculantes, em que pese a

nomenclatura do tópico, importante destacar que a Casa guardiã da Constituição adotou

noutros julgamentos reflexos tipicamente de orientações de conduta. “Tanto no caso da

fidelidade partidária, MS 26.603, como no caso da Reclamação 4.335-5/ Acre, referente à

constitucionalidade da lei de crimes hediondos, o Supremo parece ter dado um passo na

direção do exercício do poder constituinte reformador” (VIEIRA, 2008, p. 454).

A súmula vinculante, claramente traz benefícios para fortalecer os precedentes

formados pelo tribunal. Contudo, há se reforçar a extrema cautela com a atuação vinculante

impositiva e legislativa que trata as questões, engessamento da orientação de conduta para não

transformar o Judiciário noutro poder (CAPPELLETTI, 1993, p. 50).

Os enunciados vinculantes que firmam orientação de conduta, de modo a trazer novo

texto positivado se aproximam se aproximam muito de ato tecnicamente legislativo e

contribui com parcela significativa na propagação de efeitos erga omnes após reiteradas

decisões em sede difusa de controle.

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CAPÍTULO IV

EFEITOS ERGA OMNES EM CASO DE INCONSTITUCIONALIDADE

DECLARADA PELA VIA DIFUSA

4.1 Introito metodológico

Até o presente estágio esta pesquisa dedica-se à contextualização do tema acerca do

controle de constitucionalidade e fornece elementos sobre a atuação dos Poderes Legislativo e

Judiciário ante a temática com reflexos da atuação deste poder julgador como intérprete do

direito.

É importante ressaltar a problematização que a questão envolve sobre a expansão dos

efeitos em caso de inconstitucionalidade reconhecida pela via difusa. Esta forma de controle

proporciona que a decisão teria força para produzir efeitos tão somente para as partes.

No entanto, no que concerne às leis e atos normativos contrários à Constituição cuja

essência ultrapasse os interesses subjetivos da causa, inclusive com repercussão geral

reconhecida, cabe à Suprema Corte expandir os efeitos da decisão para além das partes? Esta

questão que se propõe a análise, inclusive, aborda neste capítulo um estudo acerca de alguns

posicionamentos específicos do STF sobre o tema que assumiram relevância extra partes.

4.2 Repercussão Geral como elemento de força do precedente do direito jurisprudencial

Foi abordado no tópico anterior a edição de súmulas vinculantes e o impacto que estas

produzem no âmbito do ordenamento jurídico, o que reforça precedente jurisprudencial como

fonte do direito. As súmulas vinculantes ganham renomado destaque nesse contexto diante da

real proximidade normativa obrigatória que reveste o verbete vinculante.

Contudo, o direito brasileiro admite outro fenômeno que contribui para fortalecimento

da teoria dos precedentes jurisprudenciais: a comprovação de repercussão geral para

conhecimento Recursos Extraordinários.

A Constituição da República de 1988, por meio da Emenda Constitucional n. 45, passou

a adotar o instituto da repercussão geral no ordenamento brasileiro. Referida emenda incluiu

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no Texto Magno o artigo 102, § 3., que determina que no recurso extraordinário o

recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no

caso nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente

podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

A demonstração de tal repercussão trata, então, de requisito de admissibilidade dos

recursos extraordinários (CARVALHO FILHO, 2015, p. 43). Por vezes a incansável busca

por conceituações de institutos jurídicos se depara com uma perplexidade de definição do real

valor semântico da expressão “repercussão geral”, pois, nela se tem um conceito bastante

vago (VIANA, 2011, p. 39).

A tarefa, talvez não conceitual, mas, pelo menos delimitadora e regulamentadora da

matéria, ficou a cargo da Lei 11.418/2006, que inseriu o artigo 543-A ao Código de Processo

Civil de 1973 para prescrever que para efeito de repercussão geral será considerada a

existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou

jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos da causa.

O estatuto processualista vigente manteve a determinação à luz do artigo 1.035. A

legislação desafiou o tema, o que não esgotou a vagueza conceitual da expressão e do

instituto. O diploma processualista determina ainda que haverá repercussão geral sempre que

o recurso impugnar acórdão que contrariar súmula ou jurisprudência dominante do Supremo

Tribunal Federal ou caso o motivo do recurso objetivar atacar acórdão que tenha sido

proferido em julgamento de casos repetitivos.

Há de se reconhecer a repercussão geral contra acórdão que tenha reconhecido a

inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal. Tais hipóteses estão elencadas no parágrafo

terceiro do artigo 1.035 do CPC vigente.

Trata-se de singular caso de presunção de reconhecimento de repercussão geral sem,

contudo, a necessidade de submissão ao colendo Supremo Tribunal como requisito de

admissibilidade.

Impossível seria esperar que o texto da norma constitucional ou da lei pudesse elencar

exaustivamente as hipóteses de configuração da repercussão geral. Tal situação implicaria a

inviabilização, já no plano normativo, de qualquer possibilidade de sucesso do novel instituto

(VIANA, 2011, p. 43).

Aliás, nem era de se almejar taxativamente a questão. A essência da questão preza

transcendência motivos, sendo a tutela da Suprema Corte Incompatível com os interesses

subjetivos individuais das partes (VIANA, 2011, p. 207).

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104

A tese ganha destaque para dar à Corte Suprema a possibilidade de exercer sua função

de guarda da Constituição, subtraindo desta Casa questões que possuem reflexos de ligação

para com a Carta Magna, revestidas essencialmente de interesses subjetivamente individuais.

Por certo, a Carta Constitucional da República de 1988, que quanto à extensão se

classifica como analítica, sendo que abarca nas malhas da sua normatividade todo o conjunto

da vida social (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 204), traz em seu texto dispositivos

que regulam a quase totalidade das questões em diversas áreas quotidianas e ramos do direito.

As questões sociais, salvo raras exceções, produzirão reflexos constitucionais, ainda que

indiretamente. Desta forma, toda e qualquer demanda estará sujeita à apreciação do Excelso

Tribunal Federal via Recurso Extraordinário, uma vez que o objeto deste recurso reside

exatamente, dentre outros, em decisão que contrariar dispositivo constitucional. “Em resumo,

tudo no Brasil parece exigir uma “última palavra” do Supremo Tribunal Federal” (VIEIRA,

2008, p. 451).

O objeto do recurso, pois, estende à competência da Suprema Corte à análise de quase

todas as questões sociais, o que traduz um sufocante congestionamento (VIANA, 2011, p.

212) da Casa julgadora, com várias demandas a se aglomerar pelos corredores do Judiciário.

A Corte Constitucional se viu afogada em uma crise numérica (CARVALHO FILHO,

2015, p. 23). Crise essa que se manifesta de forma radical no sistema difuso com o aumento

vertiginoso de recursos extraordinários e agravos de instrumento interpostos contra decisões

indeferitórias desses recursos (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 999).

Tal situação contribuiu para que, em dado momento, o Supremo Tribunal se

assemelhasse a uma corte revisional (VIANA, 2011, P. 212) ante ao elevado volume de

recursos a chegar todos os dias, desvirtuando esta Casa Julgadora da função para a qual foi

projetada (NEVES, 2016, p. 1753).

Intolerável, portanto, o quadro de inviabilização do exercício, pelo Supremo Tribunal

Federal, de sua função precípua de guarda da Constituição (VIANA, 2011, p. 211).

Dedicando suas forças e tempo a questões singulares e muitas vezes idênticas a várias outras a

se ajuntar na Casa.

Diante de tal cenário, com o afã de evitar o acúmulo de processos repetidos na Corte

(MENDES; STRECK, 2013, p. 1407), importante se torna estabelecer um filtro recursal

(VIANA, 2011, p. 66), submetendo à avaliação da Excelsa Corte questões que efetivamente

tenham natureza e objeto que extrapolem os limites estritamente individuais, por meio da

declaração da repercussão geral.

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105

O reconhecimento de repercussão geral como requisito de admissibilidade estabelece

um freio na distribuição de Recursos Extraordinários. Quando não é reconhecida a

repercussão geral de determinada matéria, afirma-se que a discussão envolvida não é hábil a

ensejar manifestação extraordinária do Judiciário (CARVALHO FILHO, 2015, p. 45).

O Supremo deixará de julgar processos (casos inter partes) e, objetivamente julgará

questões constitucionais, ou seja, temas constitucionais com repercussão econômica, política,

social e jurídica com a demonstração da transcendência dos interesses subjetivos das partes. É

dizer, assim, que o tema não se refere a questões que atingem exclusivamente a esfera de

interesse individual das partes (VIANA, 2011, p. 46-47)

Umas das proposições aptas a criar justificativas para o reconhecimento de repercussão

geral para apreciar recurso extraordinário se concentra na ideia de diminuir as demandas

perante o Tribunal Supremo (CARVALHO FILHO, 2015, p. 25).

De fato, a aplicação rigorosa da sistemática da Repercussão Geral tem resultado numa

abrupta diminuição da quantidade de recursos no Supremo Tribunal Federal (MENDES;

STRECK, 2013, p. 1407).

Apenas a título ilustrativo, pode-se visualizar que a quantidade de processos

distribuídos caiu de 21.103, em janeiro de 2007, para 2.991, no período equivalente a 2010.

Isso significa afirmar que a quantidade de processos distribuídos em janeiro de 2007 foi mais

de sete vezes maior que no período correspondente em 2010 (CARVALHO FILHO, 2015, p.

57).

Importante argumentar que a ideia de impedir a chegada aos tribunais superiores de

recursos que tratem de questões de menor relevância não é inédita (NEVES, 2016, P. 1753).

Na década de 1960, a Constituição de 1967 reportava a questão de relevância federal. O

recurso extraordinário tinha que demonstrar uma arguição de relevância. Era uma espécie de

excludente de inadmissibilidade do recurso que permitia ao STF inserir sua competência

recursal em questões de grande relevância (CARVALHO FILHO, 2015, p. 39).

Apesar do ideal comum de propósito de filtragem dos recursos a serem julgados pela

Corte Constitucional, elementos o diferenciam da arguição de relevância da repercussão geral:

a) arguição de relevância destinava-se a possibilitar o conhecimento do recurso,

tendo característica inclusiva, enquanto a repercussão geral é voltada para o não

conhecimento do recurso; b) a arguição de relevância era fundada somente em

relevância, enquanto a repercussão geral é mais ampla, fundada em relevância e

transcendência; e (c) a arguição de relevância era apreciada em sessão secreta e

revolvida por decisão sem fundamentação, enquanto a repercussão geral é realizada

em sessão pública e com decisão motivada (NEVES, 2016, p. 1754)

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106

No entanto, a despeito do claro intuito de reduzir a carga sufocante da Corte

Constitucional, o instituto da repercussão geral não tem como meta aniquilar o sistema

recursal da Casa Suprema ou reduzir a quase zero o volume nela a tramitar.

A repercussão geral não é mero instrumento de redução numérica de recursos

extraordinários interpostos ao Supremo Tribunal Federal, porque, na verdade, constitui um

novo programa decisório do sistema jurídico que pode dar um gigante passo rumo à

transformação do Supremo Tribunal em uma verdadeira Corte Constitucional Brasileira

(VIANA, 2011, p. 57).

A redução numérica dos recursos extraordinários traz, sem dúvida, benefícios ao

funcionamento dos programas condicionais do direito. A redução do tempo na produção das

decisões, decorrentes da redução numérica dos recursos extraordinários, deverá ser utilizada

como instrumento para a geração de efeitos na celeridade e na efetividade (VIANA, 2011, p.

206).

A repercussão geral representa um importante mecanismo que possibilita uma

generalização minimamente necessária dos casos, evitando a continuidade do processo de

fragmentação das decisões judiciais (MENDES; STRECK, 2013 p. 1408).

Uma vez reconhecida a repercussão geral, esta proporciona um novo programa do

sistema funcional do direito que pode potencializar a abertura cognitiva do sistema funcional

do direito. O que afasta a finalidade única e exclusiva da repercussão geral como simples

instrumento de redução numérica dos recursos interpostos ao Supremo Tribunal Federal é

dizer que a repercussão geral amplia a função de o direito executar operações decisórias

(VIANA, 2011, p. 214).

O escopo do instituto é a maximização da feição objetiva do recurso extraordinário,

característica que bem pode servir ao propósito republicano de dar coerência e

integridade ao direito. Em outras palavras, a repercussão geral deve ser assimilada

como instituto que otimiza a aplicação do direito democraticamente produzido,

assegurando a sua melhor interpretação na lente da coerência dos princípios

(MENDES; STRECK, 2013, p 1407.

A atuação do Supremo Tribunal Federal, uma vez estabelecido o filtro recursal, poderá

tornar mais eficientes e úteis suas prestações decisórias e gerará efeitos positivos no

desenvolvimento do sistema social como um todo, por meio de operacionalizações

condicionais ligadas à segurança jurídica no campo dos temas constitucionais com

repercussão geral que apresentem relevância econômica, política, social e jurídica e que

tenham alcance objetivo-sistêmico, que transcenda o interesse subjetivo das partes (VIANA,

2011, p. 206).

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107

O elemento determinante do instituto sob análise – questões que extrapolem os

interesses individuais das partes – proporciona maior efetividade à tutela prestada pela

Suprema Corte, que deixará de aprofundar nas minuciosas particularidades de cada caso e

passará a voltar os olhos à Constituição e preceitos gerais, o que traz contornos semelhantes à

forma concentrada de controle.

O instrumento da repercussão geral pode ser interpretado como alteração da modelagem

constitucional do controle difuso (VIANA, 2011, p. 66), caminhando rumo a abstrativização.

A repercussão geral, bem como a súmula vinculante, parece criar uma ponte sólida entre

o controle concreto-difuso e abstrato-concentrado, no complexo modelo brasileiro de controle

de constitucionalidade (TAVARES, 2009, p. 24).

A propósito, é de se notar esta aproximação com a forma de controle pela via

concentrada, primeiro pelo grau de abstração que toca o direito, e, em outro momento, pela

produção de efeitos da decisão superada a fase de admissibilidade com o reconhecimento de

repercussão geral.

A decisão de mérito proferida pela Suprema Corte não se restringirá tão somente aos

interesses dos recorrentes. A tutela jurisdicional envolverá uma questão constitucional de

natureza abstrata, ou melhor, objetiva (erga omnes), pois formará precedente a ser utilizado

para a decisão de casos futuros (VIANA, 2011, p. 63).

Pois bem, a força do precedente que advém da instituição da repercussão geral, ganha

maior destaque com as delineações trazidas no bojo do Código de Processo Civil de 2015. A

respeito do artigo 1.035, §5. do Código processualista vigente, uma vez reconhecida a

repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do

processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos que versem sobre a

questão e tramitem no território nacional.

Com esta determinação, os demais processos que versem a respeito de questão similar à

que se encontra com repercussão geral reconhecida serão suspensos até análise da Corte

Constituição para reforçar entendimento, com o intuito de evitar decisões contraditórias.

Quando se verificar a subida ou distribuição de múltiplos recursos com fundamento e

idêntica controvérsia, a Presidência do Tribunal ou Relator selecionará um ou mais

representativos da questão e determinará a devolução dos demais aos tribunais ou turmas de

juizado especial de origem (MENDES; STRECK, 2013, p. 1406).

Se há repercussão geral, o STF julga o caso-paradigma e as instâncias de origem

reproduzem as orientações fixadas (CARVALHO FILHO, 2015, p. 47). Os processos que

versem sobre o mesmo assunto do recurso-paradigma devem ficar sobrestados na instância de

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108

origem, aguardando o julgamento de mérito do processo pelo STF (CARVALHO FILHO,

2015, p. 58).

Da mesma forma, na hipótese de negativa quanto a existência de repercussão geral, os

recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos, a teordo artigo 543-B,

§ 2.ao Código de Processo Civil de 1973, texto inserido pela Lei n. 11.418/2006 e

determinação mantida no estatuto processualista de 2015 sob a égide do artigo 1035 caput e

parágrafo oitavo.

Para fins de publicidade do posicionamento firmado e com o escopo de reforçar a

homogeneidade da jurisprudência, uma vez decidida repercussão geral, a presidência do STF

deverá promover ampla e específica divulgação do teor dessas decisões, bem como diligenciar

para a formação e atualização de banco de dados eletrônico sobre o mesmo assunto

(MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1003).

Depara-se, pois, com um importante reflexo da expansão dos efeitos de decisão

proferida pelo STF num caso singular para demais casos semelhantes, reconhecido elemento

fortificador de precedente jurisprudencial pela via difusa.

A uniformização da jurisprudência é a consequência natural do instituto da repercussão

geral já que as instâncias de origem sintonizam suas orientações com o que é decidido pelo

Supremo Tribunal Federal (CARVALHO FILHO, 2015, p. 58).

O instituto da repercussão geral se propõe, pois, a enfrentar a sentimento de insegurança

que o direito jurisprudencial proporciona devido à existência de diversas decisões para

solucionar casos idênticos (CARVALHO FILHO, 2015, p. 59).

É elemento caracterizador do direito praticado por juízes a heterogeneidade das

decisões, uma vez que este se dedica às individualidades de cada caso. Entretanto, muitas

vezes se produziam decisões em sentido discrepante sobre o mesmo tema ou questão

constitucional (VIANA, 2011, p. 208). O que, como abordado anteriormente, contribui para a

insegurança jurídica que plana sobre a sociedade.

O movimento fortificante de uniformização da jurisprudência e subordinação aos

precedentes ganha mais destaque com as súmulas vinculantes e repercussão geral. Estes dois

institutos reforçam a integridade e coerência da jurisprudência (MENDES; STRECK, 2013 p.

1408).

A teoria do precedente judicial, como abordado, ganha força no ordenamento brasileiro

com a propagação dos efeitos de posicionamento firmado pela Corte Suprema para além das

partes de um processo. Inovadora tese, dado que na clássica constitucionalidade pátria, pela

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109

via incidental, a tutela judicial produziria força tão somente entre os litigantes, sendo este um

dos pontos cruciais de diferenciação entre as vias abstrata e concreta de controle.

4.3 Participação do Senado Federal no controle de constitucionalidade

Um dos assuntos constitucionais que ganha relevo hodiernamente, concerne à

participação do Senado Federal no controle de constitucionalidade no Brasil. A Constituição

da República de 1988 adota em seu artigo 52, inciso X que compete privativamente ao

Senado Federal, suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional

por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal.

A competência privativa do Senado Federal para suspensão de leis e atos considerados

inconstitucionais, de modo definitivo, pela Corte Suprema, foi introduzida no cenário

constitucional brasileiro na Constituição de 1934 (FERRAZ, 2013, p. 1061).

A Carta política de 1934 determinava, no artigo 91, inciso IV, que competia ao Senado

Federal suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou

regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário.

Das constituições posteriores, até a vigente, apenas a de 1937 que não tratou do tema de

forma expressa. Os Textos constitucionais de 1946 (artigo 64), o de 1967, no artigo 45, inciso

IV e a Emenda Constitucional n. 1 de 1969, em seu artigo 42, inciso VII, mantiveram a

essência da questão, contudo, com a seguinte redação: incumbe ao Senado Federal suspender

a execução, no todo ou em parte, de lei ou decreto declarados inconstitucionais por decisão

definitiva do Supremo Tribunal Federal.

Neste momento há de frisar uma breve diferença entre os textos constitucionais

anteriores à Constituição da República de 1988. Enquanto as Constituições anteriores

abrangiam decretos e atos, em geral, como objeto da suspensão a ser exercida pelo Senado, a

Carta Política atual adota o restrito termo “lei”, quedando-se inerte no que tange a demais atos

e decretos.

Contudo, em que pese a ausência de grafia expressa, a doutrina tende a entender que o

verbete lei, insculpido no texto constitucional, não alcança apenas o ato típico do Poder

Legislativo, lei formal ou material, mas abrange também decretos ou normas jurídicas

contidas em regulamentos, decretos e atos normativos, que contrariem a lei Suprema

(FERRAZ, 2013, p. 1066).

Destarte, calcado em outros ordenamentos anteriores, o Texto Constitucional manteve,

com poucas ressalvas, a determinação para que o Senado Federal suspenda objetos

normativos inconstitucionais assim decretados de forma imutável pela Excelsa Corte Federal.

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110

A declaração de inconstitucionalidade, só por ela, não tem a virtude de produzir o

desaparecimento da lei ou ato (MENDES, 2004b, p. 152), de modo que a pronuncia de

inconstitucionalidade não retiram do mundo jurídico, automaticamente, os atos praticados

com base na lei inconstitucional (SANTANA, 2008, p. 145).

Desta forma, em nome da harmoniosa relação entre os poderes da República, a

constituinte de 1988 entendeu por bem manter a determinação no sentido de outorgar ao

Senado a incumbência de suspender instrumento inconstitucional à luz do que disciplina o já

mencionado artigo 52, inciso X.

Portanto, ante a uma inconstitucionalidade declarada e transitada em julgado, será feita

pelo Supremo Tribunal a comunicação de tal decisão ao Senado. O art. 101, III do Regimento

interno do Senado Federal estabelece que à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania

compete propor, por projeto de resolução, a suspensão, no todo ou em parte, de leis declaradas

inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal.

Assim, o projeto de resolução encaminhado pela Comissão permanente será votado para

suspensão do conteúdo normativo viciado. Cumpre salientar, oportunamente, que “o Senado

Federal não revoga o ato declarado inconstitucional, até porque lhe falece competência para

tanto” (MENDES, 2004b, p. 154). A Constituição reserva competência ao Senado para

suspender o ato declarado inconstitucional pela Suprema Corte.

Demais, a suspensão do ato inconstitucional teria por desígnio tornar pública a decisão

da Suprema Corte ou o objetivo de conferir efeitos erga omnes às decisões categóricas do

Supremo, mesmo em sede incidental de controle.

Em dado momento, chegou-se a entender que a função do Senado consistia em tornar

pública a decisão do Tribunal, levando-a ao conhecimento de todos os cidadãos. A fórmula

relativa à suspensão de execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de

publicidade (MENDES; COELHO; BRANCO, 2009, p. 1139).

A norma contida no artigo 52, inciso X da Constituição Federal, que determina

competência do Senado Federal para suspender lei declarada inconstitucional pelo Supremo,

ganha destaque acerca dos efeitos produzidos pela resolução senatorial. Para uma corrente, a

função da Casa Congressista seria de conferir publicidade à decisão da Excelsa Corte,

levando-a a conhecimento de todos os cidadãos (SANTANA, 2008, p. 142).

Em outra vertente, há de se admitir que a resolução do Senado Federal empreste efeitos

erga omnes às decisões proferidas pela Corte Suprema (MENDES, 2004b, p. 149). Por este

lado, reconhece-se que o Senado Federal pratica ato político que confere efeito geral ao que

era particular, a fim de generalizar os efeitos da decisão (SANTANA, 2008, p. 143).

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111

Por este prisma, há de se reconhecer que o Senado pratica ato político que confere efeito

geral ao que era particular a fim de generalizar os efeitos da decisão (SANTANA, 2008, p.

143).

Diante de tal intrincada questão, este trabalho entende que a função senatorial de

suspensão de lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo STF vai além da

publicidade do cunho da decisão. Cumpre frisar, neste momento, que a decisão judicial, salvo

se estiver gravada por segredo de justiça, já é revestida de publicidade.

A legislação processualística civil já prescrevia que os atos processuais são públicos, a

teor do artigo 155 do CPC de 1973, determinação esta integralmente mantida pelo diploma

processual de 2015, Lei n. 13.105, no bojo artigo 189. O instrumento processual civil atual

ainda preleciona que o juiz, ao aplicar o ordenamento jurídico, deva observar a publicidade.

Trata-se de um princípio matriz do arranjo jurídico brasileiro não exclusivo da seara

processual. A Constituição Federal já traz este princípio expresso no artigo 37, caput, ao

abordar os atos da Administração Pública, nela imerso o Poder Judiciário. Pondera-se, pois,

que a decisão judicial já é revestida de publicidade, independente da atuação da Casa

Congressista.

Assim, reconhece que o ato senatorial é um mecanismo destinado a outorgar

generalidade à declaração de inconstitucionalidade (MENDES, 2004b, p. 150), visando

eliminar da sistemática jurídica brasileira o ato normativo viciado, não restringindo apenas

aos envolvidos na sentença que decretou a inconstitucionalidade.

Aqui certo destaque direciona-se ao controle difuso, visto que a inconstitucionalidade

declarada pela via abstrata de controle já possui efeitos erga omnes. O objeto do julgamento

constante da via abstrata, por seu caráter genérico, consiste em desfazer os efeitos normativos

(efeitos gerais) e as decisões produzirão efeitos contra todos, erga omnes (SILVA, 2015, p.

56-57).

Além do mais, o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, a teor do seu artigo

178, traz a comunicação ao Senado para os mesmos fins do que dispõe o artigo 52, inciso X

da Carta da República de 1988, em se tratando se inconstitucionalidade declarada

incidentalmente, com o fito de generalizar os efeitos.

Até o momento se vislumbra que a atuação da Casa Congressista, sob análise, se dá de

modo a complementar com simetria a decisão judicial de inconstitucionalidade. Visto que a

Corte Suprema não possui competências legislativas para retirar a vigência de uma lei por ser

inconstitucional, o Senado assim a faz.

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112

Acontece que, analisando o texto constitucional, não se desponta nem implicitamente,

nem explicitamente, uma forma de obrigatoriedade do Senado em cumprir a recomendação

judicial de suspender a vigência do ordenamento inconstitucional e tampouco se depara com

uma sanção à Casa legislativa em ignorar tal comunicado judicial.

O Regimento interno do Senado, no parágrafo primeiro do artigo 101, estabelece que

quando a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania emitir parecer pela

inconstitucionalidade e injuridicidade de qualquer proposição, será esta considerada rejeitada

e arquivada definitivamente por despacho do Presidente do Senado. Não obstante, não se

percebe também pela via regimental uma compulsoriedade ao Senado.

É pacífica a jurisprudência no sentido de que o Senado Federal não é obrigado a expedir

a resolução suspensiva do ato inconstitucional (FERRAZ, 2013, p. 1067). A competência do

Senado consiste em atividade discricionária de natureza política, cabendo a esta Casa

Congressista examinar acerca da conveniência e oportunidade de considerar, em tese,

suspensos seus efeitos, de retirar dispositivo legal ou regulamentar do ordenamento jurídico

(SANTANA, 2008, p. 146).

Pois certo, é bom que não haja uma espécie de castigo a um Poder da República por não

seguir a recomendação proferida por outro, contudo, um destes poderes não pode ser

simplesmente ignorado transfigurando obsoletas suas decisões, dado que “inúmeros ofícios

encaminhados pelo Supremo Tribunal Federal não foram atendidos pelo Senado” (FERRAZ,

2013, p. 1067).

Nesta senda, em análise aos ofícios sobre inconstitucionalidade enviados pelo Supremo

Tribunal Federal para o Senado, tem-se que em menos da metade dos ofícios, 44%, o Senado

Federal toma uma decisão em menos de um ano (DALESSIO, 2012, p. 56). Depreende-se,

portanto, que na maioria dos casos enviados pelo STF à apreciação do Senado Federal, este

órgão congressista avalia a questão em mais de um ano.

Defronta-se que, em regra, os ofícios que permanecem tramitando – ou seja, aqueles que

carecem de decisão definitiva do Senado – estão assim há mais de 11 anos (DALESSIO,

2012, p. 57).

Estes dados, que foram obtidos por meio de ferramentas de busca dos bancos de dados

disponibilizados nos sítios eletrônicos do Senado (www.senado.gov.br) e do STF

(www.stf.jus.br), tendo como marco inicial 16 de julho de 1934, até 2012 (DALESSIO, 2012,

p. 16), podem ser representados pela seguinte tabela:

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113

Lapso em anos – até: Período correspondente

em meses

Quantidade de ofícios

com resposta

Porcentagem

(aproximadamente)

1 0 - 12 186 44%

2 13 - 24 75 17,7%

3 25 – 36 32 7,6%

4 37 – 48 23 5,4%

5 49 – 60 15 3,5%

6 61 – 72 18 4,3%

7 73 – 84 26 6,1%

8 85 – 96 14 3,3%

9 97 – 108 7 1,7%

10 109 – 120 5 1,2%

11 121 – 132 8 1,9%

12 133 – 144 7 1,7%

13 145 – 156 2 0,5%

14 157 – 168 2 0,5%

15 169 – 180 1 0,2%

16 181 – 192 1 0,2%

17 193 – 204 0 0%

18 205 – 216 0 0%

19 271 – 228 0 0%

20 229 – 240 1 0,2%

Quadro 01: Tempo de tramitação dos ofícios enviados pelo STF ao Senado Federal em caso de

inconstitucionalidade declarada de modo definitivo pelo Supremo.

Desta forma, corrobora-se que os ofícios enviados à Casa senatorial para fins do artigo

52, inciso X da Constituição da República de 1988, com o escopo de que este ente legislativo

providencie a suspensão do ato declarado inconstitucional pelo STF, além de não possuírem

um viés impositivo, não gozam de um padrão, pelo menos no que tange a tempo, para serem

processados.

Acontece que mesmo que constitucionalmente ou regimentalmente não se depare com

uma sanção direcionada ao Senado Federal, “toda norma constitucional impõe um dever

constitucional ao seu destinatário, que é obrigado a cumpri-la, ainda que não haja sanção

expressa para a não observância do comando constitucional” (FERRAZ, 2013, p. 1067).

Não há que se esperar uma possibilidade de sanção para seguir orientações propostas

pela jurisdição. Ademais, a coisa julgada judicial é revestida de “força institucional do Estado,

ou seja, o poder de requisitar a colaboração irrecusável, das demais instituições estatais, para

que faça, cumpri-la” (SILVA, 1992, p.100). Assim destaca-se que

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114

a sentença contém a vontade do Estado no caso concreto. Em consequência disso, o

Poder que detém constitucionalmente o monopólio da jurisdição, e, logo, o de

produzir coisa julgada, detém também a faculdade de requisitar a colaboração de

todas as instituições do Estado, a fim de fazer com que sua decisão, sobre a qual se

operou a coisa julgada, além da eficácia que traz em si, tenha efetividade, ou seja, a

fim de fazer com que seja executada nos exatos termos limites em que foi proferida

(SILVA, 1992, p. 100).

Dessa forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à

conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá efeitos gerais,

fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que publique a decisão no Diário do

Congresso. Tal como assente, não é mais a decisão do Senado que confere eficácia geral ao

julgamento do Supremo. A própria decisão da Corte contém essa força normativa. Assim, o

Senado não terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que não cuida de decisão

substantiva, mas de simples dever de publicação. A não publicação não terá o condão de

impedir que a decisão do Supremo assuma a sua real eficácia. Essa solução resolve de forma

superior uma das tormentosas questões da nossa jurisdição constitucional (MENDES;

COELHO; BRANCO, 2009, p. 1139).

Há de se compreender que o Senado Federal deva receber a declaração de

inconstitucionalidade proferida de forma definitiva pelo Supremo Tribunal de modo derivado

da própria harmonia dos poderes, recordando que os Poderes da República são separados, mas

sustentam entre si uma relação de interdependência.

Desta maneira, a resolução do Senado Federal para suspender o ato declarado

inconstitucional vem a ser o atributo do Poder Legislativo apto a complementar a decisão do

Poder Judiciário frente a uma inconstitucionalidade reconhecida de forma definitiva.

Outra questão de relevância importância acerca da resolução senatorial para suspensão

de uma lei considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal reside se esta opera

ou não efeitos retroativos.

A propagação temporal dos efeitos do ato inconstitucional passa necessariamente por

outra questão, da nulidade ou anulabilidade deste ato. Há divergência na órbita jurídica se o

ato inconstitucional é nulo ou anulável.

Por um lado, um projeto de lei quando aprovado pelo complexo processo legislativo

brasileiro, tendo passado pelo crivo das Comissões e de Constituição e Justiça e pelo veto

presidencial, torna-se lei com presunção de constitucionalidade. “Enquanto um Tribunal

Constitucional não tiver declarado inconstitucional uma lei, este acto é válido e vinculante

para os juízes e os outros aplicadores do direito” (CANOTILHO, 2003, p. 904). Presunção

esta, pois, juris tantum, justamente por haver o controle judicial.

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Quando, todavia, uma lei ou ato normativo são declarados inconstitucionais, o vício

incompatível com a constituição se encontra insculpido em seu corpo normativo desde sua

aprovação. Assim, com a decisão do Supremo Tribunal, superada está a aludida presunção,

cultivando a ideia da nulidade do ato viciado.

Uma lei, ainda que seja declarada inconstitucional posteriormente, é viciada desde

entrada em vigor. Destarte, a lei ou ato normativo inconstitucional são inválidos a partir de

seu nascimento e não a partir da declaração proferida pela Suprema Corte.

O que torna a lei ou ato normativo inconstitucional não é a declaração da Excelsa

Corte e sim a existência do vício que torna o ato incompatível com a constituição. Assim se a

lei ou ato normativo está viciado desde o seu nascimento inconstitucional estará desde então,

sendo, portanto, nula de pleno direito, pois, “a lei declarada inconstitucional deve ser

considerada, para todos os efeitos, como se jamais, em qualquer tempo, houvesse possuído

eficácia jurídica”. (MENDES, 2004a, p. 273)

Nesta seara da nulidade da lei inconstitucional,

o efeito típico é o da nulidade e não da simples anulabilidade: a lei desaplicada por

inconstitucional é nula porque desde a sua entrada em vigor é contrária à

constituição, motivo pelo qual a eficácia invalidante se deveria tornar extensiva a

todos os actos praticados à sombra da lei constitucional – daí seu efeito

extunc(CANOTILHO, 2003, p. 904).

Destarte, os atos inconstitucionais: “não podem deixar de ser considerados

juridicamente inexistentes, não se concebendo qualquer comparação com a anulabilidade do

negócio jurídico, tão abissal é a diferença de gravidade” (MIRANDA 2002, p. 520). Sob este

prisma, a lei ou regulamentos declarados inconstitucionais são juridicamente inexistentes

entre os litigantes (RAMOS, apud MENDES, 2004a, p. 151).

Nesta esteira, se reconhece o ato como inválido e a defesa serena da sua nulidade.

Nesta visão há que se admitir que a resolução do Senado Federal que suspende a execução de

lei ou ato normativo considerados inconstitucionais pelo Supremo operam efeitos retroativos,

pois não há que se planear que um ato nulo, ou mais, inexistente, possa ter força para produzir

efeitos.

Assim, quando a lei é suspensa, por inconstitucional, produz efeitos extunc, pois

aquilo que é inconstitucional é natimorto, não teve vida, e, por isso, não produz efeitos, e

aqueles que porventura ocorreram ficam desconstituídos desde as suas raízes, como se não

tivessem existido (MENDES, 2004b, p. 152).

Desta feita, uma vez inconstitucional determinada lei ou ato normativo, os efeitos

deste reconhecimento, por esta parte da corrente, retornarão ab initio, invalidando todos os

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atos produzidos sob vigência de inconstitucionalidade. Contudo, este lado da corrente pode

proporcionar insegurança jurídica, com uma declaração de inconstitucionalidade desfazendo

atos já praticados.

Sob outro ponto de vista, o ato declarado inconstitucional deve ser anulado, com

efeitos erga omnes e para o futuro (FERRAZ, 2013, p. 1067). A suspensão proferida pelo

Senado Federal não alcança atos jurídicos formalmente perfeitos, praticados no passado, e os

fatos consumados, ante sua irretroatividade, e mesmo os efeitos futuros dos direitos

regularmente adquiridos (BANDEIRA DE MELO apud MENDES, 2004b, p. 150).

Reconhece esta visão a possibilidade de articular os efeitos da decisão, que considera o

ato inconstitucional, porém, a nulidade se opera a partir do aflorar da inconstitucionalidade,

uma vez que os atos praticados na vigência da lei, gozam como o instrumento legislativo, de

presunção de legalidade e inconstitucionalidade, não havendo, pois, que se levantar a bandeira

da retroatividade.

4.4 Possibilidade de expansão dos efeitos em sede controle pela via difusa de

constitucionalidade

O ordenamento jurídico pátrio traz que o alvo do controle difuso de constitucionalidade

é produzir efeitos restritos às partes. Além do mais, a decisão proferida por esta via de

controle não possui condão vinculante tais quais as decisões recitadas em sede de controle

concentrado.

Acontece que a natureza das questões tratadas pela Suprema Corte e o modo pelo qual

estas chegam à Casa, via Recurso Extraordinário, ascendem a discussão acerca de uma

aproximação desta via concreta àquela via concentrada, sobretudo na produção de efeitos.

Tal sensação de estreitamento das vias controle se dá pela coincidência da Casa

Julgadora. O Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, funciona como

único competente em casos de abstrato controle e último degrau na esfera recursal no modelo

difuso. Ademais, a natureza estritamente constitucional harmoniza ainda mais as duas vias de

controle.

A natureza idêntica do controle de constitucionalidade, quanto às suas finalidades e aos

procedimentos comuns dominantes para os modelos difuso e concentrado, não mais parece

legitimar a distinção quanto aos efeitos das decisões proferidas no controle direto e no

controle incidental. (MENDES, 2004b, p. 164).

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Assim, a mesma Casa julgadora apreciando questões similares, estritamente

constitucionais, proporciona um forte laço entre os modelos de controle, independente da via

eleita para impugnar uma inconstitucionalidade. Devido a esta ligação entre os métodos de

controle, há também uma aproximação dos resultados produzidos quanto à eficácia da

decisão, objetivando alcançar eficácia erga omnes, afinal

Se o Supremo Tribunal pode, em ação direta de inconstitucionalidade, suspender

liminarmente, a eficácia de uma lei, até mesmo de uma emenda constitucional, por

que haveria a declaração de inconstitucionalidade, proferida no controle incidental,

de valer tão-somente para as partes? (MENDES, 2004b, p. 155).

Além da unidade da Casa Julgadora e cunho constitucional da questão, o Recurso

Extraordinário que chega à Suprema Corte, é revestida de caráter que tende mais ainda a

aproximar a via difusa de controle à via abstrata, qual seja o reconhecimento de repercussão

geral.

Este já estudado instrumento traz que a Corte Suprema analisará uma questão por meio

de Recurso Extraordinário, se esta for munida de argumentos relevantes do ponto de vista

econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.

Trata-se de requisito de admissibilidade do recurso, que, portanto, somente será apreciado

pela Excelsa Corte se sua essência exceder interesses meramente particulares.

Neste diapasão nasce um questionamento: se a questão, para ser digna de análise

mediante Recurso Extraordinário, deve ultrapassar os interesses subjetivos das partes e do

processo, seria um contrassenso o julgamento possuir efeitos somente entre as partes?

A partir deste prisma, o perfil objetivo da repercussão geral da questão constitucional

versada no recurso extraordinário provoca uma mudança paradigmática no panorama geral do

controle difuso de constitucionalidade brasileiro, ao dotá-lo de eficácia erga omnes (VIANA,

2011, p. 212).

De fato, há uma real aproximação da via incidental com a via concentrada. Marco

característico da via difusa é a apreciação concreta da causa, na qual o órgão jurisdicional toca

o direito de modo mais profundo, analisando as particularidades de cada caso.

Contudo, o Recurso Extraordinário faz com que o STF se afaste desta concretude na

interpretação do direito. É cediço que o Recurso Extraordinário não se presta a reanalise de

provas, a teor da súmula 279 do STF. Além de que o recurso em questão não se concentra a

questões íntimas do processo, se dedicando a questões constitucionais que extrapolem os

interesses subjetivos das partes e do processo.

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Vislumbra-se, pois, que o STF, embora na via difusa, analisa a questão de forma

abstrata. Assim, há de se admitir a existência de controle difuso subjetivo quanto ao meio de

provocação, mas objetivo quanto aos resultados e efeitos de suas decisões (VIANA, 2011, p.

64).

Deste modo, o Recurso extraordinário ganha outra roupagem na atual dinâmica

constitucional. Este recurso “deixa, pois, de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa

de interesse das partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem

constitucional objetiva” (STF - RE: 309452 RJ, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de

Julgamento: 02/08/2004, Data de Publicação: DJ 25/08/2004 PP-00026).

Neste ponto, importante observar que a função da Constituição na proteção dos direitos

individuais é apenas uma das singularidades do recurso, que é “dotado de uma “dupla

função”, subjetiva e objetiva, consistindo esta última em assegurar o Direito Constitucional

objetivo" (HÄBERLE apud MENDES, STF - RE: 309452 RJ, Relator: Min. GILMAR

MENDES, Data de Julgamento: 02/08/2004; Data de Publicação: DJ 25/08/2004 PP-00026).

Nesta linha de raciocínio, o STF tem admitido, na construção de sua jurisprudência, este

novo lado do recurso extraordinário. A Suprema Corte chegou a decidir que

A função do Supremo nos recursos extraordinários ─ ao menos de modo imediato ─

não é a de resolver litígios de fulano ou beltrano, nem a de revisar todos os

pronunciamentos das Cortes inferiores. O processo entre as partes, trazido à Corte

via recurso extraordinário, deve ser visto apensa como pressuposto para uma

atividade jurisdicional que transcende os interesses subjetivos (DIDIER JR., 2013,

s/p).

A expansão, pois, dos efeitos em decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal em

questão de inconstitucionalidade, vem cada vez mais à tona, uma vez que o ordenamento

jurídico pátrio já compactua o posicionamento de que a Corte Constitucional possa adotar

efeitos erga omnes em suas decisões. É o que se nota, exemplificativamente, em Ação Direta

de Inconstitucionalidade ou edição de súmula vinculante, cujo enunciado vincula abertamente

a Administração Pública.

É relevante, ainda, ressaltar o caso de um mandado de segurança coletivo que aspire a

declaração de inconstitucionalidade de determinada norma, sendo que a Suprema Corte assim

declare tal norma. Note-se que estamos diante de via difusa de constitucionalidade. Como

mensurar que um mandado de segurança coletivo terá efeitos apenas inter partes?

A aceitação das ações coletivas como instrumento de controle de constitucionalidade

relativiza enormemente a diferença entre os processos de índole objetiva e os processos de

caráter estritamente subjetivo. É que a decisão proferida na ação civil pública, no mandado de

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segurança coletivo e em outras ações de caráter coletivo não mais poderá ser considerada uma

decisão inter partes. (MENDES, 2004b, p. 164).

Este movimento marcante da Repercussão Geral faz com que este instituto inaugure no

sistema de controle difuso brasileiro a eficácia erga omnes (VIANA, 2011, p. 61). No

ordenamento jurídico pátrio, esta tendência de expansão de efeitos ainda se encontra em fase

de início e fortalecimento de entendimento, porém, com origens e influência no direito

americano.

Por oportunidade do julgamento do Recurso Extraordinário n. 376.852 de 27/03/2003, o

Supremo Tribunal Federal reitera o posicionamento para que o tribunal deva adotar o caráter

de Corte Constitucional ao contrário de concentrar esforços a fim de solucionar conflitos de

repercussão meramente particular.

Para fundamentar esta tese, no julgamento deste Recurso Extraordinário, o relator do

caso, Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, revisita o JudiciaryAct de 1925 da Corte

Americana que já se posicionou que “para permanecer efetiva, a Suprema Corte deve

continuar a decidir apenas os casos que contenham questões cuja resolução haverá de ter

importância imediata para além das situações particulares e das partes envolvidas”(RE

376.852, Relator Ministro GILMAR MENDES, data de Julgamento: 27/03/2003, Data de

Publicação: DJ 13/06/2003).

Como se vê, a expansão dos efeitos de decisão do Supremo, com repercussão geral

reconhecida ganha cada vez mais destaque. O mesmo se dá, portanto, com a declaração de

inconstitucionalidade que, igualmente detentora de repercussão geral, produz reflexos extra

partes envolvidas no processo.

Tal circunstância reascende, então, o papel do Senado Federal no Controle de

Constitucionalidade e a real função e aplicabilidade do artigo 52, inciso X da Constituição da

República de 1988.

Já que a declaração de inconstitucionalidade pela via incidental se encontra em um

momento de aproximação com a via concentrada e, por conseguinte, admite efeitos erga

omnes pela própria força da decisão judicial, a resolução do Senado Federal assumiria tão

somente o papel de publicidade?

Uma das facetas da resolução do Senado Federal seria revestir a declaração de

inconstitucionalidade proferida pelo Supremo Tribunal de eficácia erga omnes. Porém, como

visto, esta tem admitido força expansiva. Assim,

parece legítimo entender que, hodiernamente, a fórmula relativa à suspensão de

execução da lei pelo Senado Federal há de ter simples efeito de publicidade. Desta

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forma, se o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle incidental, chegar à

conclusão, de modo definitivo, de que a lei é inconstitucional, essa decisão terá

efeitos gerais, fazendo-se a comunicação ao Senado Federal para que este publique a

decisão no Diário do Congresso. Tal como assente, não é (mais) a decisão do

Senado que confere eficácia geral ao julgamento do Supremo. A própria decisão da

Corte contém essa força normativa. Parece evidente ser essa a orientação implícita

nas diversas decisões judiciais e legislativas acima referidas. Assim, o Senado não

terá a faculdade de publicar ou não a decisão, uma vez que se não cuida de uma

decisão substantiva, mas de simples dever de publicação, tal como reconhecido a

outros órgãos políticos em alguns sistemas constitucionais (Constituição austríaca,

art. 140, 5 – publicação a cargo do Chanceler Federal – e Lei Orgânica da Corte

Constitucional alemã, art. 31 (2), publicação a cargo do Ministro da Justiça). A não-

publicação não terá o condão de impedir que a decisão do Supremo assuma a sua

real eficácia (MENDES 2004b, p. 165).

Propõe-se, então, uma releitura do artigo 52, inciso X da Constituição da República de

1988, aplicando uma interpretação que não está expressa no texto constitucional e, por

conseguinte, atribuindo função diversa ao Senado Federal, pois, as decisões proferidas pela

Corte Suprema, ainda que em via concreta de controle “acabam por ter eficácia que

transcendem o âmbito da decisão, o que indica que a própria Corte vem fazendo uma releitura

do texto constante do art. 52, X, da Constituição de 1988” (MENDES, 2004b, p. 164).

Neste ponto, é importante refletir se a atuação da Corte Suprema na interpretação do

direito foi além da autorização expressa do texto constitucional ou se o disposto na

Constituição da República de 1988 acerca da resolução do Senado Federal teria se tornado

ultrapassado, não conseguindo acompanhar o avanço da jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal, merecendo, pois, uma reinterpretação.

O texto constitucional estabelece tratar de competência privativa do Senado Federal a

suspensão de lei declarada inconstitucional. Contudo, ainda que o Supremo não venha

adotando a suspensão propriamente dita do instrumento legislativo tem admitido a eficácia

erga omnes da declaração de inconstitucionalidade, que na prática tem tornado sem efeitos a

lei viciada. Esta releitura na interpretação da Constituição pela Corte Suprema na aplicação do

direito tem configurado uma verdadeira mutação constitucional que

Consiste em uma alteração do significado de determinado norma da Constituição,

sem observância do mecanismo constitucionalmente previsto para as emendas e,

além disso, sem que tenha havido qualquer modificação de seu texto. Esse novo

sentido ou alcance do mandamento constitucional pode decorrer de uma mudança na

realidade fática ou de uma nova percepção do direito, uma releitura do que deve ser

considerado ético ou justo. Para que seja legítima, a mutação precisa ter lastro

democrático, isto é, deve corresponder a uma demanda social efetiva por parte da

coletividade, estando respaldada, portanto, pela soberania popular. (BARROSO,

2009, p. 125-126).

Contudo, este rearranjo proporcionado pela interpretação por parte do Poder Judiciário,

encontra, também, resistência no ordenamento, uma vez que “um tribunal não pode mudar a

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Constituição; um tribunal não pode inventar o direito: este não é seu papel como poder

jurisdicional, numa democracia (STRECK, OLIVEIRA; et. Al, 2007, s/p)”.

Dessa forma, novamente surge um possível conflito entre os poderes da República

adotando o Supremo Tribunal solução não amparada pelo constituinte, no caso dos efeitos da

declaração de inconstitucionalidade pela via incidental, pois esta atuação jurisdicional pode

significar, equivocadamente, a substituição do Poder Constituinte pelo Poder Judiciário. E,

com isso, arruinar a democracia (STRECK, OLIVEIRA; et. Al, 2007, s/p).

Por outro lado, contudo, a criação do direito surge diretamente do poder de

interpretação que ao judiciário compete. Na interpretação da lei segundo a Constituição,

reputando-a inconstitucional, o Magistrado, para justificar sua decisão, cria uma norma

jurídica resultado da própria apreciação do texto da lei (DIDIER JR., 2013, s/p). O juiz não

está necessariamente a criar uma nova lei, texto legislativo propriamente dito. A criação do

direito, neste caso, é fruto da própria interpretação do mesmo.

No que tange a declaração de inconstitucionalidade, não é demais reforçar que a atuação

do poder judiciário se deu em virtude de uma incompatibilidade de lei ou ato normativo em

face do disposto na Constituição. Assim, a atuação judicante decorre exatamente da

harmonização entre os poderes, justificada a frear uma conduta abusiva do legislador

ordinário a contrariar a Constituição, exercendo o órgão judicante seu papel no sistema de

contrapeso, pilar democrático do Estado.

Ademais, a matéria em que se aprecia a inconstitucionalidade de lei que chega para

análise do Supremo Tribunal Federal pela via difusa, em que pese a via concreta, chega com

certos ares de abstração e a adoção de efeitos erga omnes mesmo que pela via incidental,

traduz um reflexo da nova face que a repercussão geral deu à via difusa de controle.

Este conjunto de circunstâncias, sobretudo o reconhecimento de repercussão geral para

admissão de Recurso Extraordinário, conduzem a via difusa a um caminho cada vez mais

similar ao modelo concentrado, a começar pela expansão dos efeitos da decisão.

Outro ponto típico das ações do modelo concentrado que está a refletir sobre a via

difusa, fazendo-a aproximar daquele modelo abstrato, é a vinculação dos efeitos da decisão

proferida pela Suprema Corte. A regra adotada pelo ordenamento pátrio se resume que o

modelo concentrado de controle de constitucionalidade produz, além de eficácia erga omnes,

efeitos vinculantes, ao passo que a via incidental de controle, não produz efeitos vinculantes.

Assim como na expansão da eficácia da decisão, no que tange à vinculação dos efeitos,

também se observa uma transformação do ordenamento jurídico. A postura da jurisprudência

e progresso legal demonstra tal situação.

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Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, em recentes julgamentos, vem dando mostras

de que o papel do recurso extraordinário na jurisdição constitucional está em processo de

redefinição, de modo a conferir maior efetividade às decisões (Agravo de Instrumento n.

375.011, relatoria Ministra Ellen Gracie. Informativo STF n. 365, Brasília, 11 a 15 de outubro

de 2004).

Como já abordado, contudo, não é demais recordar o papel que as súmulas vinculantes

exercem no arranjo jurídico. Conforme própria nomenclatura denuncia, os verbetes

sumulados aprovados pela Corte Suprema subordinam os demais órgãos do Poder Judiciário.

No mais, a vinculação de posicionamento não se percebe apenas por oportunidade de

preceitos sumulares vinculantes. No próprio texto positivado da lei há este fortalecimento do

precedente vinculante do Tribunal, reiterado com o advento da Lei n. 13.105/ 2015, que

instituiu o Novo Código de Processo Civil.

O teor do art. 932, IV do Diploma processualista vigente incumbe ao relator: negar

provimento a recurso que seja contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do

Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo

Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção

de competência.

Nota-se, então, uma tendência fortificante no precedente jurisdicional e da

uniformização da jurisprudência, de modo verticalizado dos tribunais superiores, com a lei

admitindo expressamente a possibilidade de se negar um recurso que não esteja em

consonância com o posicionamento de tribunais superiores. Assim, não apenas os verbetes

detentores de status vinculantes são aptos a vincular os demais órgãos do judiciário.

Portanto, o posicionamento firmado por tribunais superiores está a produzir efeitos

vinculantes perante demais órgãos do poder judiciário em via eminentemente difusa.

Desta feita, nota-se um movimento de aproximação da via difusa com a concentrada de

controle, com efeitos expansivos e eficácias cada vez mais vinculantes de decisões proferidas

pela Corte Suprema, mesmo que em via incidental.

4.5 Efeitos inter partes de reconhecimento de inconstitucionalidade: uma abordagem

acerca do princípio da igualdade e segurança jurídica

Há de se registrar que se nota perante a Corte Suprema e em alguns estudos que a tese

de expansão dos efeitos e grau de vinculação em decisão de inconstitucionalidade, ainda que

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pela via difusa, vem ganhando aplicabilidade e sendo praticada em uns e outros casos.

Todavia, a regra consagrada no ordenamento constitucional prevê os efeitos restritos às partes

habitantes do procedimento jurisdicional e não vinculantes.

Pois bem, acerca deste efeito intimamente limitado aos litigantes, desponta a discussão

a respeito da segurança jurídica e igualdade de condições entre pessoas em similares

condições fática ou jurídica. Tal preocupação, como visto, funda-se em duas vias, as quais nos

propomos a analisar.

Por uma via, a segurança jurídica, celeridade e economia processual merecem apreço,

visto que uma declaração de inconstitucionalidade proferida de forma definitiva pela Suprema

Corte e a consequente inaplicabilidade de determinado instrumento normativo para uma parte

certamente acarretará outras inúmeras demandas com o escopo de obter a mesma decisão.

Assim, uma enxurrada de processos, com idênticos pedidos estão a habitar os

corredores do Poder Judiciário brasileiro, objetivando almejar o que já foi definitivamente

reconhecido pelo Guardião da Constituição. Essa movimentação da máquina judiciária se

apresenta como um viés negativo da via difusa produzir efeitos tão somente entre as partes.

Assim,

Ulteriores inconvenientes do método difuso de controle, porque concretizado em

ordenamentos jurídicos que não acolhem o princípio da staredecisis, são os que

derivam da necessidade de que, mesmo depois de uma primeira não aplicação ou de

uma série de não aplicações de uma determinada lei por partes das Cortes, qualquer

sujeito interessado na não aplicação da mesma lei proponha, por sua vez, um novo

caso em juízo. Exemplo típico: Tício instaura um procedimento, arguindo a

inconstitucionalidade de uma lei em matéria tributária e obtém a não aplicação dela

no caso concreto; com a consequência de que, para obter a não aplicação da lei, isto

é, para obter o mesmo tratamento de Tício, qualquer sujeito interessado deverá por

sua vez, instaurar um novo processo (CAPPELLETTI, 1999, p. 79).

Os órgãos jurisdicionais, então, das mais variadas instâncias, estão sujeitos a esta

“avalanche de processos” (STRECK, 2013, p. 1425), que certamente procrastina o caminhar

do aparato jurisdicional pátrio, além de proporcionar maiores custos.

Igualmente, a enxurrada de processos proporciona uma variante de decisões, afinal, a

declaração incidental de inconstitucionalidade manifestada pelo STF não possui, via de regra,

efeitos vinculantes. Além do mais, o controle difuso se dá em pluralidade de instituições

judiciárias competentes e multiplicidade de ações.

Neste alastrado sistema de controle, nasce outro ponto desfavorável: As decisões

desiguais sobre mesmo tema constitucional. O modelo incidental, tal como adotado no Brasil,

pode proporcionar “efeitos perversos” (FERRAZ, 2013, p. 1064), tais como adoção de

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discrepantes decisões sobre matérias de mesmo conteúdo, morosidade da prestação

jurisprudencial e proliferação de recursos.

Este é um obstáculo que o controle difuso enfrenta, visto que cada um dos diversos

competentes à análise, não estão, em regra, vinculados à declaração da Suprema Corte. Assim

sendo, corre-se o risco de ter decisões completamente antagônicas sobre situação de mesmo

conteúdo jurídico, pois alguns magistrados, pelo seu convencimento, podem seguir a

orientação da Suprema Corte declarando incidentalmente a inconstitucionalidade de

determinada lei, ao passo que outros julgadores entenderiam pela constitucionalidade.

Estaria, pois, inaugurada a insegurança jurídica que certamente fará com que

multipliquem recursos perante órgãos superiores e que fatalmente a mesma questão de direito

chegará ao STF, via Recurso Extraordinário, devido à natureza constitucional.

A própria seara recursal contribui para a incerteza jurídica a plainar sobre a questão,

uma vez que, da mesma forma, o julgador recursal não está adstrito ao decidido pelo

Supremo. Além do mais, uma sorte de recursos pode receber efeito suspensivo, ocasionando

diferentes tratamentos e aplicabilidade da mesma matéria.

No entanto, a Corte não pode admitir disparidade em tratamento de situações idênticas

(Agravo de Instrumento n. 375.011, relatoria Ministra Ellen Gracie. Informativo STF n. 365,

Brasília, 11 a 15 de outubro de 2004). O assunto merece atenção ante a este efeito desigual

produzido.

Neste caso, insta invocarmos novamente o princípio da igualdade. Segundo reza o caput

do artigo 5.da Constituição da República “todos são iguais perante a lei”. Deste modo, em

sendo uma lei declarada inconstitucional pelo STF em via difusa, esta lei seria

inconstitucional apenas para o caso de um litigante? E para o restante da sociedade a lei

continua sendo constitucional?

Este tratamento desigual adotado é dos inúmeros defeitos do controle concreto de

constitucionalidade (SILVA, 2015, p. 60). Propomos um exemplo da seara tributária em que

determinado tributo fora julgado incidentalmente inconstitucional pelo STF e, portanto,

suspenso de exigibilidade de cobrança apenas para o litigante.

Neste caso, enquanto o litigante que teve sua demanda apreciada perante a Suprema

Corte está desobrigado ao recolhimento do tributo, os demais contribuintes em mesma

situação continuam devedores do mesmo tributo e sujeitos a inscrição em dívida ativa e

execução fiscal em caso de não pagamento. Como admitir este tratamento desigual de norma

constitucional?

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125

Tão graves inconvenientes práticos, com sérias consequências de conflito, insegurança

ou incerteza, poderiam ser contidos, podendo atribuir ao órgão supremo da justiça ordinária

um poder de decisão que é suscetível de se estender, também, além do caso concreto e de

anular, como eficácia erga omnes, a lei considerada inconstitucional (CAPPELLETTI, 1999,

p. 79).

Não está a sugerir ou defender que a Corte Suprema adote postura similar à legislativa

casando instrumentos legislativos vigentes e ditando novas regras, mas a almejar que a

repercussão geral reconhecida para julgamento de Recurso Extraordinário tenha possa ter

característica típica deste instituto, qual seja, que os argumentos transcendam os interesses

subjetivos das partes. Além do mais, a própria, da norma constitucional possui viés público.

O direito constitucional expede normas de direito público e suas normas constituem

uma ordem objetivando a harmonia e vida do grupo (SILVA, 2015, p. 36). A norma

fundamental é uma lei superior na qual se definam os processos de conformação do sistema

político, das relações sociais e da própria ordem jurídica. Concretamente, além de ser a lei

básica do Estado (perspectiva jurídica), a Constituição é também a norma fundamental

ordenadora e conformadora da vida social (MENDES, 2009, p.8).

Assim, não parece prudente uma norma de direito público e com repercussão geral

reconhecida produzir efeitos tão somente individuais, como se um contrato de direito privado

fosse. A expansão dos efeitos da decisão pode propiciar efeitos benéficos, tais como,

(i) viabilizar maior segurança objetivo-material nas decisões judiciais sobre questões

constitucionais já apreciadas no Supremo Tribunal Federal; (ii) evitar reiteração de

recursos sobre a mesma matéria, agilizando o andamento dos processos e permitindo

um maior fluxo decisório e, como consequência, criando um ambiente propício a

uma efetividade da garantia real (material) de acesso à Justiça, como instrumento

constitucional assegurador da garantia razoável da duração do processo (inciso

LXXVIII do art. 5º. da Constituição de 1988); e (iii) dar racionalidade ao sistema de

controle difuso de constitucionalidade, com reflexos nas possibilidades coevolutivas

do sistema jurídico com os sistemas finalísticos da sociedade, pela identificação de

acoplamentos estruturais (VIANA, 2011, p. 209).

Nesta seara, a produção de efeito expansivo do reconhecimento da inconstitucionalidade

e consequente inaplicabilidade da lei viciada, proporciona uniformidade de entendimento,

coadunando com o reforço a segurança jurídica e vislumbrando maior aproximação com a

igualdade com a lei produzindo o mesmo efeito para todos.

4.6 Alguns posicionamentos do Supremo Tribunal sobre inconstitucionalidade pela via

difusa que assumem eficácia extra partes

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126

Ao decorrer desta pesquisa foram abordados argumentos sobre a declaração de

inconstitucionalidade proferida de forma definitiva pela Suprema Corte em via difusa de

controle. Deparou-se que a jurisprudência da desta Corte Constitucional tem destacado a

possibilidade de atribuir efeitos vinculantes e erga omnes a tal decisão, ainda que em sede

incidental.

O presente tópico se propõe então a ilustrar exemplificativamente algumas destas

decisões do Supremo Tribunal Federal que assumiram status vinculantes e de eficácia

expansiva. Apresenta-se, pois, três casos, extraídos por amostragem que, embora não possam

representar unanimidade do entendimento firmado pela Suprema Corte, representam bem a

temática aventada pelo trabalho e o amadurecimento da colocação da jurisprudência

contemporaneamente.

O tridente jurisprudencial a seguir merece destaque, pois, representa na prática uma

expansão dos efeitos da decisão do STF, concedendo eficácia geral e vinculante à mesma,

sem, contudo, uma resolução do Senado Federal a suspender a vigência da lei, ou mesmo,

antes dela. Há de sugerir, portanto, analise de tais casos.

4.6.1 Reclamação Constitucional n. 4335-5/AC: progressão de pena para crimes hediondos

Trata-se de um dos mais destacados casos sobre o controle concreto de

constitucionalidade e que fez reascender hodiernamente a discussão acerca da expansão dos

efeitos da decisão da Excelsa Corte para além das partes.

Por oportunidade do Habeas Corpus n. 82.959, sob relatoria do Ministro Marco Aurélio,

o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do artigo 2, § 1. da Lei n. 8.072

de 25 de julho de 1990 que estabelecia que os crimes considerados hediondos, a prática da

tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo deveriam ter a pena

integralmente cumprida em regime fechado.

Não obstante a decisão da Corte Constitucional, o juiz da Vara de Execuções Penais da

Comarca de Rio Branco, Acre, nos processos de números 001.02.017345-9, 001.05.012072-8,

001.05.017431-3, 001.04.000312-5, 001.05.015656-2, 001.05.013247-5, 001.02.007288-1,

001.06.003977-0, 001.05.014278-0 e 001.05.007298-7, negou a progressão de regime

alegando que como a decisão do Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus n. 82.959 fora

proferida em via difusa de controle e não havia para o caso resolução do Senado Federal para

suspender a dita norma, os efeitos daquela seriam tão somente inter partes e não vinculantes.

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Nos referidos processos, portanto, o Magistrado manteve a aplicabilidade do artigo 2,

§1 da Lei 8.072/1990, indeferindo, pois, a progressão de regime aos condenados. Diante de tal

indeferimento a Defensoria Pública da União interpôs a Reclamação Constitucional n. 4335-5

perante a Suprema Corte, uma vez ser inconstitucional a previsão de cumprimento de pena em

regime integralmente fechado.

Alheio à técnica estritamente penalista da questão, o cerne desta Reclamação

Constitucional a ser apreciado nesta pesquisa reside no tema se o posicionamento da Corte no

outrora julgado Habeas Corpus n. 82.959 havia de produzir efeitos expansivos, refletindo, em

consequência, eficácia não somente perante os condenados no Estado do Acre, mas todos em

situação fático-jurídica semelhante.

Tem se notado uma mudança paradigmática no posicionamento jurisprudencial da

Suprema Corte acerca da eficácia das decisões proferidas em sede de controle difuso. O

julgamento desta Reclamação Constitucional proporcionou votos relevantes no sentido de se

expandir os efeitos da inconstitucionalidade.

O instrumento da repercussão como requisito de admissibilidade para o STF aprecie

Recurso extraordinário se traduz no ponto de partida para a nova posição da Corte, que ao

examinar o “novo regime, deixou inequivocamente acentuado o efeito expansivo das

decisões” (Rec. Const. 4335/AC; Relator Ministro Gilmar Mendes; DJe n. 208 Divulgação

21/10/2014 Publicação 22/10/2014, Voto Teori Zavascki, p. 161).

Assim, “as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de controle

incidental, acabam por ter eficácia que transcende o âmbito da decisão” (Rec. Const.

4335/AC; Relator Ministro Gilmar Mendes; DJe n. 208 Divulgação 21/10/2014 Publicação

22/10/2014, Voto Gilmar Mendes, p. 51).

Esta nova visão do controle difuso se passa também pelo alargar do modelo concentrado

que o estreitou do modelo concreto. “O papel dos precedentes no sistema brasileiro vem

mudando ao longo do tempo. Na verdade, os dois grandes sistemas jurídicos, eles vêm se

aproximando” (BARROSO, p. 182).

O advento da Constituição da República de 1988 proporcionou uma transformação ao

modelo abstrato de controle admitindo um maior rol de legitimados. A ampliação do sistema

concentrado, com a multiplicação de decisões dotadas de eficácia geral, acabou por modificar

a efetividade, tornando comum no sistema a decisão com eficácia geral (MENDES, p. 49).

O amplificador dos legitimados para propositura de controle abstrato, realmente

aproximou as vias de controle, conduzindo a assemelhar também os efeitos desta. O poder de

propor inconstitucionalidade antes concentrado na figura do Procurador Geral da República,

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se viu expandido pela atual Constituição, o que proporciona que mais variados temas sejam

objeto de controle pela via abstrata.

É difícil admitir, portanto, “que a decisão proferida em ADI ou ADC e na ADPF possa

ser dotada de eficácia geral e a decisão proferida no âmbito do controle incidental - esta muito

mais morosa porque em geral tomada após tramitação da questão por todas as instâncias -

continue a ter eficácia restrita entre as partes” (MENDES, p. 54).

Com o necessário reconhecimento dos motivos que ultrapassem os interesses subjetivos

do processo e a aproximação das vias de controle

É inegável, por conseguinte, que, atualmente, a força expansiva das decisões do

Supremo Tribunal Federal, mesmo quando tomadas em casos concretos, não decorre

apenas e tão somente de resolução do Senado, nas hipóteses de que trata o art. 52, X

da Constituição. É fenômeno que está se universalizando, por força de todo um

conjunto normativo constitucional e infraconstitucional, direcionado a conferir

racionalidade e efetividade às decisões dos tribunais superiores e, como não poderia

deixar de ser, especialmente os da Corte Suprema (ZAVASCKI, p. 162).

Assim, vem se fortalecendo a tese de produção de efeitos expansivos das decisões do

Supremo Tribunal e ratifica o precedente, que apresenta estabilidade à jurisprudência firmada

por esta Corte Suprema (MELO, p. 192). Além da solidez da jurisprudência, o precedente

atende a outras duas finalidades:

o princípio da isonomia, na medida em que evita-se que pessoas em igual situação

tenham desfechos diferentes para o seu caso, o que é, em alguma medida, sempre

repugnante para o Direito. E, por fim, o respeito aos precedentes valoriza o princípio

da eficiência, porque torna a prestação jurisdicional mais fácil, na medida em que o

juiz ou os tribunais inferiores possam simplesmente. justificar as suas decisões à luz

de uma jurisprudência que já se formou (BARROSO, p. 182).

A força expansiva das decisões da Suprema Corte, sobretudo, no tocante à

inconstitucionalidade, depara-se necessariamente com o dispositivo constitucional que

determina que compita ao Senado Federal suspender a execução de lei pelo Supremo

declarada inconstitucional.

Ainda que diante da previsão constitucional de competência privativa da Casa

Senatorial para suspender do ordenamento jurídico lei declarada inconstitucional, cabe ao

Supremo admitir a não aplicabilidade do dito instrumento normativo para além das partes do

processo?

Por um lado, o judiciário não apenas pode, mas deve impedir a existência de leis

inconstitucionais, não podendo o Legislativo objetar e reintroduzir no ordenamento o

instrumento legislativo incongruente com a constituição (GRAU, p. 81). Portanto, as decisões

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129

do plenário tomadas por maioria absoluta devem assumir força de precedente e, por

conseguinte, serem respeitadas de uma maneira geral (BARROSO, p. 187).

Por outro lado, admitindo, portanto, o caráter expansivo das decisões judicantes, o

disposto no artigo 52, inciso X da Constituição perderia razão ou assumiria o papel de

publicidade.

É possível, sem qualquer exagero, falar-se aqui de uma autêntica mutação

constitucional em razão da completa reformulação do sistema jurídico e, por

conseguinte, da nova compreensão que se conferiu à regra do art. 52, X, da

Constituição de 1988. Valendo-nos dos subsídios da doutrina constitucional a

propósito da mutação constitucional, poder-se-ia cogitar aqui de uma autêntica

reforma da Constituição sem expressa modificação do texto (MENDES, p. 150).

Adotando este teor expansivo, a não publicação, pelo Senado Federal, de Resolução que

suspenderia a execução da lei declarada inconstitucional pelo STF, não terá o condão de

impedir que a decisão do Supremo assuma a sua real eficácia (MENDES, 2004b p. 166).

A Reclamação Constitucional em comento ganhou, subsidiariamente, destaque voltado

para o efeito de decisão proferida pela Suprema Corte em caso de inconstitucionalidade pela

via difusa e seus efeitos, contudo, a questão principal, possibilidade de progressão de regime

para condenados por crime hediondo, foi solucionada mediante outro instituto da Suprema

Corte: a edição de súmula vinculante.

No curso do julgamento da Reclamação em apreço, o Supremo Tribunal Federal editou

a Súmula Vinculante n. 26 que estabelece “que ara efeito de progressão de regime no

cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a

inconstitucionalidade do art. 2. da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990”.

O mérito da questão, o tópico protagonista, foi solucionado de modo a permitir a

progressão de regime, mesmo que em casos de crimes hediondos, pois inconstitucional a

proibição legal. É de se reconhecer que o mesmo órgão judicante produziu o mesmo objetivo:

efeitos vinculantes e expansivos, contudo, por via diversa, a sumular.

No entanto, há de se ressaltar que os debates proporcionados no plenário da Casa

contribuem para o amadurecimento da teoria vem ganhando mais respaldo até mesmo pela

legislação.

4.6.2 Mandado de Injunção para reconhecimento do direito de greve para servidores públicos

Outro assunto de recorrente questionamento na seara jurídica diz respeito ao exercício

do direito de greve de servidores públicos. A Constituição da República de 1988, no capítulo

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destinado a Administração Pública, trata que o direito de greve será exercido nos termos e nos

limites definidos em lei específica.

O texto constitucional, pois, admite o direito de greve do funcionalismo público, no

entanto, condiciona o exercício, requisitos e particularidades a lei específica. Acontece que,

ao arranjo jurídico pátrio não adveio tal instrumento legislativo, o que obstaculiza o exercício

de direito fundamental. Tal inércia legislativa fora objeto questionamento perante a Suprema

Corte, via Mandado de Injunção, a se destacar pelos writs injuncionais de números 670, 708 e

712.

A Excelsa Corte, por sua vez, no Mandado de Injunção n. 708, ao reconhecer a mora

legislativa conheceu o tema e, no mérito, deferiu a Injunção para, nos termos acima

especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às

ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis.

(MI 708, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-

206 divulg 30-10-2008 public 31-10-2008 ement vol-02339-02 pp-00207 rtj vol-00207-02 pp-

00471).

Há de se registrar que a Excelsa Corte constitucional vem adotando a posição

concretista, de modo a efetivamente proporcionar o exercício de direito e garantia

fundamental no caso em exame.

Com a sequência de julgados e a insistente inércia legislativa sobre o tema, as decisões

da Suprema Corte passaram a nortear o exercício do servidor público a exercer o direito de

greve, estabelecendo os requisitos para o gozo do direito fundamental, neste sentido,

precedentes: TJ-MA - Agravo de Instrumento: 0182582012 MA 0002874-85.2012.8.10.0000,

TJDF - PET 20150020004409 e TJ-AL - Procedimento Ordinário: 00068719820128020000

AL 0006871-98.2012.8.02.0000.

Sendo assim, enquanto a estrutura jurídica não é agraciada com o instrumento

legislativo próprio, decidiu a Corte Constitucional pela aplicação das Leis nos 7.701/1988 e

7.783/1989, atos normativos próprios da inciativa privada.

Repise-se que a decisão do STF em aplicar as regras próprias dos setores privados aos

servidores públicos não é restrita às partes dos Mandados de Injunção pela Corte examinados.

Percebe-se, pois, um alargamento dos efeitos.

A viabilização de direitos concernentes a liberdades, públicas, direitos fundamentais,

prerrogativas, entre outros, via Mandado de Injunção não se adstringirá ao caso concreto (MI

708, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206

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divulg 30-10-2008 public 31-10-2008 ement vol-02339-02 pp-00207 rtj vol-00207-02 pp-

00471, voto Min. Carmen Lucia, p. 305).

Ademais, o posicionamento da Suprema Corte proporciona vinculação a outros órgãos

do Poder Judiciário e entes da Administração Pública, sendo

possível que o Supremo Tribunal Federal determine, na ação de mandado de

injunção, a suspensão de processos administrativos ou judiciais, com intuito de

assegurar ao interessado a possibilidade de ser contemplado pela norma mais

benéfica. Essa faculdade legitima, igualmente, a edição de outras medidas que

garantam a posição do impetrante até a expedição das normas pelo legislador (MI

708, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007,

DJe-206 divulg 30-10-2008 public 31-10-2008 ement vol-02339-02 pp-00207 rtj

vol-00207-02 pp-00471, voto Min. MENDES, p. 226).

No writ injuncional n. 712, a Suprema Corte pondera que “no mandado de injunção o

Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que faltava

para, no caso, tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos” (MI 712,

Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG

30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384) Relator(a): Min.

MAURÍCIO CORRÊA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno,

julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-

02339-01 PP-00001 RTJ VOL-00207-01 PP-00011).

Assim, tem-se a omissão legislativa para assegurar o exercício de direito de greve de

servidores públicos como inconstitucional e a posição da Corte Suprema em via difusa de

controle aplicada a casos análogos, com sujeitos alheios aos originários de Mandado de

Injunção próprio.

4.6.3 Recurso Extraordinário n. 595.838: a inconstitucionalidade de incidência de

contribuição previdenciária incidente sobre serviços prestados por cooperativas de trabalho

A Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, em redação dada pela Lei n. 9.876, de 1999,

passou a estabelecer em seu artigo 22, inciso IV uma contribuição, destinada à Seguridade

Social, a cargo da empresa, de quinze por cento sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de

prestação de serviços, relativamente a serviços prestados por cooperados por intermédio de

cooperativas de trabalho.

Tal Contribuição foi objeto de diversas impugnações a respeito de sua

constitucionalidade, tal como violação ao incentivo ao cooperativismo insculpido no artigo

174, § 2., da Constituição da República e vício formal no processo legislativo para instituição

do tributo, que a teor de ditames constitucionais deveria se dar por Lei Complementar, sujeito,

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pois a quórum específico, o que não se observou na dita contribuição, que fora instituída

mediante lei ordinária.

Tal contribuição foi amplamente questionada perante o Poder Judiciário brasileiro,

tendo chegado à apreciação do Supremo Tribunal Federal por meio do Recurso Extraordinário

n. 595.838, que julgou inconstitucional tal dispositivo e, por conseguinte, a contribuição como

inconstitucional. Da ementa deste julgamento, destaca-se:

O art. 22, IV da Lei nº 8.212/91, com a redação da Lei nº 9.876/99, ao instituir

contribuição previdenciária incidente sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura,

extrapolou a norma do art. 195, inciso I, a, da Constituição, descaracterizando a

contribuição hipoteticamente incidente sobre os rendimentos do trabalho dos

cooperados, tributando o faturamento da cooperativa, com evidente bis in idem.

Representa, assim, nova fonte de custeio, a qual somente poderia ser instituída por

lei complementar, com base no art. 195, § 4º - com a remissão feita ao art. 154, I, da

Constituição. 5. Recurso extraordinário provido para declarar a

inconstitucionalidade do inciso IV do art. 22 da Lei nº 8.212/91, com a redação dada

pela Lei nº 9.876/99. (BRASIL, 2014).

Tal declaração de inconstitucionalidade se deu de modo uníssono pelo pleno do

Tribunal, com transito em julgado declarado em 09/03/2015, tratando-se, pois, de decisão

definitiva. A questão ainda teve um pedido de modulação dos efeitos, para revestir a sentença

de efeitos ex nunc, via Embargos de Declaração, negados, igualmente, por unanimidade.

Há de se ressaltar neste contexto que a Lei n. 10.522 de 19 de julho de 2002 e a Portaria

da PGFN n.294 de março de 2010 em seus artigos 19, inciso V e 1, inciso V, respectivamente,

autorizam a Fazenda Nacional a não recorrer de decisões definitivas proferidas pelo Supremo

na forma de recursos repetitivos, o que se deu com Recurso Extraordinário n. 595.838.

Com autorização expressa da legislação e da própria procuradoria para não exercer

recursos e desistir dos já interpostos, contra entendimento definitivo da Corte, admite-se a

vinculação dos efeitos da decisão do STF.

Assim, com base nestes instrumentos expostos e pautada na nota da PGFN/CRJ/n.

604/2015 a Procuradoria, com fulcro ainda na Mensagem Eletrônica PGFN/CRJ 001/2015,

admitiu não exercer o direito de contestar ou recorrer em processos que versem acerca da

contribuição prevista no artigo 22, inciso IV da Lei n. 8.212/91, declarada incidentalmente

inconstitucional pela Suprema Corte, por intermédio do Recurso Extraordinário n. 595.838.

É de se realçar, portanto, que a decisão do Supremo Tribunal Federal exerceu aqui

verdadeiros efeitos vinculantes, típicos do controle concentrado. Além do mais, se percebeu

nesta senda, uma real inaplicabilidade prática da lei declarada inconstitucional como reflexo

da própria decisão da Suprema Corte, aceitando a procuradoria em nem mesmo contestar

casos que digam respeito sobre a lei declarada inconstitucional incidentalmente.

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Percebe-se, pois, uma expansão dos efeitos da decisão proferida na Suprema para as

partes que já questionam a mesma situação pela via difusa, seja por qual instrumento for. O

que deseja destacar aqui é que a decisão da Suprema Corte passou a produzir efeitos

expansivos e vinculantes independente de atuação legislativa, que se deu em março de 2016,

quando o Senado Federal editou a Resolução n. 10 de 2016 e entendeu por suspender a dita

contribuição e a dar publicidade ao objeto de inconstitucionalidade declarada pelo STF.

Contudo, até a resolução do ente senatorial ser expedida, a decisão do Supremo

Tribunal já estava a produzir efeitos expansivos na prática, uma vez que a decisão que

entendeu pela inconstitucionalidade da referida contribuição e, como consequência, sua

inexigibilidade, estava a se propagar para pessoas alheias ao caso concreto independente de

resolução do Senado Federal, que adveio apenas um ano após o trânsito em julgado do

reconhecimento de inconstitucionalidade.

Os três casos neste tópico apresentados não traduzem um pensamento uniforme da

Suprema Corte em se tratando de efeitos expansivos da declaração de inconstitucionalidade,

mas ilustram como a temática da pesquisa vem sido aplicada pela Suprema Corte Nacional,

além de reforçar o desenvolvimento da posição jurisprudencial brasileira.

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CONCLUSÃO

A Constituição da República de 1988, em seu texto, traz direitos e garantias

fundamentais, transformando-se em um diploma de reconhecida relevância na órbita jurídica.

Desta forma, é substancial assegurar a aplicabilidade prática de todos os seus preceitos.

Neste sentido, além de garantir os ditames constitucionais, dando-lhes efetividade,

torna-se elementar exercer mecanismos de controle de modo a preservar a supremacia da

Carta Política e extirpar do sistema constitucional normas e atos com vício de

inconstitucionalidade ou impedir a vigência destes.

Destaque-se que o objetivo da pauta jurídica é dar aplicabilidade à Constituição. De

nada valeria um texto constitucional completo e elogiado sob a ótica de previsão e garantia de

direitos, se estes não são, de fato, exercidos, contribuindo para a inocuidade da Lei Maior do

Estado. Assim, o controle de constitucionalidade se reveste de importante aliado do arranjo

democrático.

Nesta seara se assente que o controle de constitucionalidade pode ser exercido pelos três

Poderes da União. O Legislativo e Executivo exercem a moderação de modo cauteloso, de

maneira a evitar que atos contrários ao texto constitucional entrem em vigência no

ordenamento brasileiro. O órgão legiferante e executivo, respectivamente, mediante atuação

das Comissões de Constituição e Justiça e exercício do veto, praticam uma análise prévia

acerca da constitucionalidade de projeto de lei.

Caso o controle não se dê preventivamente com o fito de obstar o ingresso de norma

contrária a Constituição, este poderá se dar repressivamente, com o poder de invalidar o teor

inconstitucional e eliminar tal incongruência do ordenamento.

Ao controle repressivo, ao qual se volta o foco, é convidado o Poder Judiciário, que

pode apreciar a questão pela via concentrada de controle, na qual a Suprema Corte, e somente

ela, por meio das ações específicas de controle pode declarar a inconstitucionalidade, desde

que arguida por um legitimado peculiar.

O Poder Judicante pode ainda apreciar uma inconstitucionalidade pela chamada via

difusa de controle na qual uma incompatibilidade com a Constituição pode ser levantada em

qualquer ação, sem restrição de legitimados, podendo, pois, ser proposta por seja quem for da

população, admitindo ainda, a pessoa jurídica igualmente detentora de direitos e capacidade

de estar em juízo.

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Exercendo o controle, por qualquer das vias e declarando como inconstitucional

determinado ato legislativo, o Poder Judicante estipula a não aplicação do ato incompatível

com a Constituição. Pela via concentrada, com efeitos gerais e expansivos, ou pela via

concreta ou difusa, com efeitos restritos às partes litigantes.

O ordenamento brasileiro admite, pois, as duas formas de se moderar a

constitucionalidade de leis e atos normativos, uma combinação dos tradicionais modelos: o

austríaco, o qual se destaca pelo prisma abstrato de controle, e o norte-americano, que realça o

controle difuso.

Cada um destes dois sistemas emprestou percepções e conceitos ao conjunto de controle

brasileiro que, admitindo parte das duas clássicas acepções, elaborou um modelo viável a se

fazer concretizar a soberania da Constituição.

Uma das questões, contudo, que se coloca em análise nesta pesquisa diz respeito à

legitimidade constitucional do Poder Julgador entender por não aplicar instrumento

previamente aprovado por órgão legislativo e que detém presunção de legalidade e

constitucionalidade.

A atuação do Poder Judiciário no controle de constitucionalidade encontra certa

resistência por, supostamente, haver uma invasão da área de atuação e competência

constitucional típica do Poder Legislativo, configurando-se, pois, numa afronta a teoria da

separação dos poderes.

Todavia, com o desenvolver desta pesquisa se constata que o desempenho do Judiciário

no controle de constitucionalidade decorre exatamente da teoria da separação harmônica dos

poderes.

De acordo com a melhor interpretação do princípio da separação dos poderes e,

insculpido na Constituição Federal, expresso teor do artigo segundo, os Poderes da União,

além de independentes, são harmônicos entre si. Nesta senda, deve-se apreciar a separação

dos poderes em consonância com a interdependência destes.

Não se pode olvidar neste momento que a interdependência dos poderes reside

exatamente na possibilidade de um Poder fiscalizar e frear conduta abusiva de outro. Um

Poder soberano, que não está sujeito a controle dos demais, assume perigosamente um

protagonismo arbitrário.

Deste modo, nenhum Poder está alheio ao controle dos demais. Nesta linha, na órbita

democrática, assim como os Poderes Executivo e Judiciário estão sujeitos a controle, o Poder

Legislativo também se encontra sob monitoramento dos demais. A atividade típica do Poder

legiferante que está sujeita a controle é exatamente a de legislar.

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Caso a atividade legislativa incorra em abuso, estará, pois, exposta a controle. A

conduta de legislar está limitada aos preceitos constitucionais. Desta forma, a lei que for

inconstitucional se apresenta como ato abusivo do órgão legiferante. Daí nasce naturalmente a

participação do Poder Judiciário como colegitimado a exercer o contrapeso democrático.

À luz da Constituição da República de 1988, o Supremo Tribunal Federal assume o

papel de guardião da Constituição, o qual tem a incumbência de exercer o controle dos atos do

Poder Legislativo em face dos preceitos constitucionais. Constata-se que a Suprema Corte

mantém o papel de guarda da Constituição atuando como único legitimado na esfera abstrata

de controle ou como julgador recursal, pela via difusa.

Assim, caso a autuação judiciária se dê devido a um abuso legislativo, não se vislumbra

ofensa à Constituição ou à separação dos poderes, ao contrário, decorre da sinergia dos

mesmos.

Por outro lado, uma atuação do Judiciário que não derive do poder de fiscalização

próprio da separação dos poderes e assuma resultados que extrapolem a órbita judicial e

queira vincular a Administração pública e comunidade jurídica pode configurar ofensa à

democrática independência dos poderes.

A edição de súmulas vinculantes ou resoluções que imponham orientação de conduta

típica de lei, partindo tão somente do poder judicante, sem que haja qualquer abuso

legiferante que permita ao julgador adentrar na esfera de atuação legislativa, pode, sim,

configurar ofensa à Separação dos Poderes, com certa usurpação de competência, pois, nestes

casos, a iniciativa de criação de ato normativo, na maioria das vezes, nasce do próprio

judiciário, sem convite ao exercício de controle.

Porém, contudo, adstrito ao tema ora proposto nesta pesquisa, no controle de

constitucionalidade, em ambas as vias, a atuação do Supremo Tribunal Federal se dá de modo

harmonioso com os demais poderes.

Nota-se, por outro lado, que decisões da Suprema Corte têm ganhado relevância, de

modo a refletir efeitos gerais. É possível averiguar que as decisões proferidas pelo Guardião

da Constituição têm apresentado tendência expansiva. É de se observar que o Supremo

Tribunal tem assumido cada vez mais a função de Corte constitucional e abandonando a

alcunha de tribunal recursal.

Desta forma, afastando-se detalhes meramente recursais, a Corte se esquiva de apreciar

questões tão somente íntimas, restritas às partes do processo, concentrando-se em fatores de

direito público.

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Direcionando os olhos para a via difusa de controle é sabido que, para que o STF possa

apreciar dada questão via Recurso Extraordinário, esta, além de possuir caráter

eminentemente constitucional, deve reconhecer repercussão geral.

Esse requisito de admissibilidade do recurso constitucional de que a questão a ser

apreciada pela Corte deva produzir impactos universais já admite esta expansão de efeitos da

decisão. Ora, se a causa deva demonstrar influência geral, o resultado desta interpretação

certamente deva experimentar efeitos gerais.

Nesta senda se pode ajustar que o fenômeno da repercussão geral é o liame entre o meio

de controle difuso de constitucionalidade e a produção de efeitos expansivos. O

reconhecimento da repercussão geral é determinado se a decisão tomada em sede de controle

difuso de constitucionalidade está apta a propagar efeitos para além das partes do processo.

Decerto, um conteúdo de índole constitucional cujo objeto deva extrapolar os interesses

subjetivos das partes desperta fascínio geral e não apenas entre litigantes. Fica claro que se

deva respeitar as particularidades em que o caso concreto venha a apresentar. Contudo, a

essência da questão constitucional é de interesse geral.

Com esta assemelhação de efeitos, tem-se notado, pois, uma aproximação da via difusa

com a via concentrada de controle. Ressalte-se, porém, que não apenas a produção de efeitos

contribui para a ligação entre os meios de controle, o grau em que a Corte Constitucional toca

o caso estabelece um espelhamento entre os métodos de controle.

A Corte Suprema, mesmo que em via incidental, examina a questão constitucional de

forma abstrata, uma vez que não avalia peculiaridades íntimas de cada caso e tampouco revê o

conjunto probatório, o que auxilia na abstração de sua conduta.

Esta relação de abstração e expansão de efeitos vem sendo adotada pela progressão da

jurisprudência do STF, como nos casos de greve de servidores públicos, que mediante uma

ausência legislativa própria, proporciona este direito fundamental mediante mandado de

injunção.

Outra situação jurisprudencial que clareia esta idealização se mostra no caso da

contribuição previdenciária incidente sobre cooperativas de trabalho, que foi julgada

inconstitucional pelo Supremo Tribunal e, antes mesmo da resolução do Senado Federal para

suspender tal lei, a posição do Supremo já produzia efeitos gerais e vinculantes, com

orientação expressa da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para sequer contestar ou

recorrer de questões de primeira instância que estiverem em consonância com o

posicionamento do Pretório Excelso.

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Diante de tal consolidação e perspectiva, se volta à tona o papel do Senado Federal

frente a um ofício enviado pela Suprema Corte recomendando ao Legislativo a suspensão de

ato normativo declarado inconstitucional, nos ditames do artigo 52, inciso X da Constituição

da República.

Se a resolução a que trata o texto constitucional, com o fito de suspender lei

inconstitucional do ordenamento jurídico fosse editada, tão logo o recebimento do ofício

expedido pela Suprema Corte, esta pesquisa nem haveria de ser arguida, pois a própria

decisão do STF já seria de revestida de produzir efeitos gerais retendo a execução da lei

inconstitucional.

Acontece que, além do Senado Federal não ser compelido a editar a resolução, quando

esta é editada, a maioria dos ofícios emitidos pelo STF demora mais de um ano para ser

processado.

Neste caso, mesmo que a resolução seja editada para suspender lei inconstitucional do

ordenamento, o trâmite da resolução perdura, na maioria dos casos, mais de um ano, período

em que a lei viciada continua a produzir efeitos.

Neste interstício, contudo, a lei definitivamente reconhecida inconstitucional continua a

produzir efeitos tão somente entre as partes, no qual se considera prudente a expansão de

efeitos até que a resolução venha ser editada.

Como não parece muito oportuno utilizar um termo impositivo em face do membro

legislativo, contudo, considerando o controle de constitucionalidade repressivo, exercido pelo

Poder Judiciário, como decorrente da própria interdependência dos Poderes, em sede de

controle de atos abusivos, é de se enxergar a resolução como consequência natural da

harmoniosa relação entre os Poderes da União.

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