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Direito Civil Prof. Cristiano Sobral Complexo de Ensino Renato Saraiva | www.renatosaraiva.com.br | (81) 3035.0105 1 PARTE GERAL- MATERIAL DE APOIO. MPU. TEXTOS RETIRADOS DO LIVRO DIREITO CIVIL SISTEMATIZADO. ED. GEN/FORENSE AUTOR: CRISTIANO VIEIRA SOBRAL PINTO WWW.PROFESSORCRISTIANOSOBRAL.COM.BR Personalidade Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. A pessoa natural ou física é o ser humano, sem ser exigida qualquer qualidade, assim, é certo afirmar que os animais irracionais não são sujeitos de direitos. A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Personalidade Jurídica é a aptidão genérica para se titularizar direitos e contrair obrigações na ordem jurídica. 1 Momento de aquisição da personalidade jurídica a) Teoria Natalista Para essa teoria, a personalidade do ser humano se inicia com o nascimento com vida, devendo o subsequente ser registrado no Cartório de Registro das Pessoas Naturais. 2 b) Teoria concepcionista Para essa teoria se adquire a personalidade desde a concepção, e o nascituro já possui personalidade jurídica (teoria que encontra mais adpetos na doutrina). Registro civil das pessoas naturais Os atos da vida civil que dizem respeito ao estado ou capacidade das pessoas naturais devem ser inscritos no registro público competente (Registro Civil das Pessoas Naturais). O registro civil tem dupla finalidade: documentar e dar publicidade ao estado das pessoas e à situação dos bens. Serão inscritos em Registro Público os nascimentos, os casamentos, as separações judiciais e os divórcios, os óbitos, a emancipação por outorga dos pais ou a judicial, a interdição dos loucos, surdos- mudos e dos pródigos, a sentença declaratória da ausência e as opções de nacionalidade. O registro, contendo as inscrições dos momentos capitais da vida do indivíduo, atesta o seu estado, que dele se infere enquanto subsistir. Entretanto, não faz prova absoluta do que patenteia, eis que passível de anulação por erro ou falsidades. Capacidade É a medida da personalidade. Pode ser de direito ou de fato. Vejamos: 2.1.2.1. Capacidade de direito, de gozo ou jurídica 1 Art. 2º do Código Civil de 2002. 2 Natureza declaratória, posição de Silvio Rodrigues.

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PARTE GERAL- MATERIAL DE APOIO. MPU. TEXTOS RETIRADOS DO LIVRO DIREITO CIVIL SISTEMATIZADO. ED. GEN/FORENSE

AUTOR: CRISTIANO VIEIRA SOBRAL PINTO WWW.PROFESSORCRISTIANOSOBRAL.COM.BR

Personalidade Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. A pessoa natural ou física é o ser humano,

sem ser exigida qualquer qualidade, assim, é certo afirmar que os animais irracionais não são sujeitos de direitos.

A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Personalidade Jurídica é a aptidão genérica para se titularizar direitos e contrair obrigações na ordem jurídica.1

Momento de aquisição da personalidade jurídica

a) Teoria Natalista

Para essa teoria, a personalidade do ser humano se inicia com o nascimento com vida, devendo o subsequente ser registrado no Cartório de Registro das Pessoas Naturais.2

b) Teoria concepcionista

Para essa teoria se adquire a personalidade desde a concepção, e o nascituro já possui personalidade jurídica (teoria que encontra mais adpetos na doutrina).

Registro civil das pessoas naturais

Os atos da vida civil que dizem respeito ao estado ou capacidade das pessoas naturais devem ser inscritos no registro público competente (Registro Civil das Pessoas Naturais).

O registro civil tem dupla finalidade: documentar e dar publicidade ao estado das pessoas e à situação dos bens.

Serão inscritos em Registro Público os nascimentos, os casamentos, as separações judiciais e os divórcios, os óbitos, a emancipação por outorga dos pais ou a judicial, a interdição dos loucos, surdos-mudos e dos pródigos, a sentença declaratória da ausência e as opções de nacionalidade.

O registro, contendo as inscrições dos momentos capitais da vida do indivíduo, atesta o seu estado, que dele se infere enquanto subsistir. Entretanto, não faz prova absoluta do que patenteia, eis que passível de anulação por erro ou falsidades.

Capacidade

É a medida da personalidade. Pode ser de direito ou de fato. Vejamos:

2.1.2.1. Capacidade de direito, de gozo ou jurídica

1 Art. 2º do Código Civil de 2002. 2 Natureza declaratória, posição de Silvio Rodrigues.

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É própria de todo ser humano, que a adquire assim que nasce (começa a respirar) e só a perde quando morre. Em face do ordenamento jurídico brasileiro, a personalidade se adquire com o nascimento com vida, ressalvados os direitos do nascituro desde a concepção.

2.1.2.2. Capacidade de fato, de exercício ou de ação

Nem todos a possuem; é a aptidão para exercer, pessoalmente, os atos da vida civil. Só se adquire a capacidade de fato com a plenitude da consciência e da vontade. Lembre-se de que é possível que uma pessoa tenha alcançado maioridade, mas não possa exercer os atos da vida civil pessoalmente.

Nota!

Diferença entre Capacidade e Legitimação. A capacidade é a medida da personalidade, já a legitimação é uma condição especial, uma capacidade específica para um determinado ato.

Capacidade plena

Ocorre capacidade plena quando a pessoa é dotada das duas espécies de capacidade, a capacidade de direito e a capacidade de fato.

Da incapacidade

Trata-se de pessoa incapaz aquela legalmente restrita para a prática, por si só, de atos na vida civil. O instituto da incapacidade existe para proteger tais pessoas. Veja-se o que menciona o Código Civil sobre os graus de incapacidade:

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I – os menores de dezesseis anos;

II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer:

I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;

III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV – os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.

Nota!

Todos têm capacidade de direito, mas nem todos têm a capacidade de fato.

Emancipação

Emancipação é o instituto por meio do qual se antecipa a capacidade de exercício de direitos do

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menor, traduz a emancipação da capacidade plena, podendo ser de três espécies: a) voluntária;3 b) judicial4 ou c) legal.5

Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:

I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;

II – pelo casamento (ver arts. 1.517 e 1.520 do Código Civil)

III – pelo exercício de emprego público efetivo;

IV – pela colação de grau em curso de ensino superior;

V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.

A emancipação voluntária é aquela concedida por ato dos pais ou de um deles na falta do outro, por instrumento público, independentemente de homologação judicial, desde que o menor tenha 16 anos completos.

O pai que detém a guarda não pode, sozinho, emancipar o filho. É ato conjunto, só podendo fazer sozinho se o outro estiver morto ou destituído do poder familiar. Constitui ato irretratável e irrevogável, salvo existência de fraude, a qual possibilita a revogação.

A emancipação judicial é aquela concedida pelo juiz em face do menor tutelado, ouvido o tutor, desde que este menor tenha 16 anos completos.

A emancipação legal, prevista nos incs. II a V, decorre diretamente da lei.

II – casamento – idade mínima de 16 anos, entre 16 e 18 precisa de autorização. Tal regra não se estende aos casos de união estável. No direito brasileiro, admite-se exceção: art. 1.520 do Código Civil: a gravidez antes dos 16 anos .6

Extinção da pessoa física

A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva. O que marca o fim da pessoa natural é a morte. O que prevalece é a morte encefálica. Vejamos:

Art. 3º da Lei n. 9.434. A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte

3 Art. 5º, parágrafo único, I, primeira parte, Código Civil. 4 Art. 5º, parágrafo único, I, parte final Código Civil. 5 Art. 5º, II, III, IV, V, Código Civil. 6 “Art. 1.520. Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art. 1.517), para evitar

imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez.”

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encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina.

Não há como estudar o artigo acima sem observar os arts. 37 e 38 do Código Civil.

Art. 37 do Código Civil. Dez anos depois de passada em julgado a sentença que concede a abertura da sucessão provisória, poderão os interessados requerer a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas.

Art. 38 do Código Civil. Pode-se requerer a sucessão definitiva, também, provando-se que o ausente conta oitenta anos de idade, e que de cinco datam as últimas notícias dele.

A doutrina costuma afirmar que existem duas espécies de morte, a morte real

e a morte presumida. Morte real é a que tem a declaração de óbito, pressupõe a análise do corpo morto. Com relação a morte presumida o direito admite duas situações:

a) ausência – é o procedimento de passar a outro os bens de alguém que desapareceu. No momento em que se abre uma sucessão definitiva, o ausente é considerado morto presumido. O registro do ausente declarado morto é feito no registro civil com o registro de ausência, sem a certidão de óbito.

b) art. 7°– morte presumida, sem decretação de ausência, é o juiz que declara em procedimento de justificação (da morte). Nessas hipóteses o registro é feito no livro de óbito, equiparando-se à morte real. Essas pessoas não são ausentes.

Vejamos o texto legal:

Art. 7º Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:

I – se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;

II – se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.

Parágrafo único. A declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

Comoriência

Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos

comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.

Teoria do direito da personalidade

Os fundamentos da teoria dos direitos da personalidade começaram a surgir e se esquematizaram com a Declaração dos Direitos dos Homens. Com o surgimento dos direitos humanos, dos direitos fundamentais é que começaram a surgir os direitos da personalidade.

Oportuno diferençar os conceitos de personalidade dos direitos da personalidade. Verifica se no art. 2º do Código Civil que a personalidade é a aptidão genérica, reconhecida a todo ser humano para contrair

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direitos e deveres na vida civil, bem como podemos dizer que se trata de um conjunto de atributos naturais. A tutela desses atributos é o direito da personalidade, que se classifica em direito à integridade física, direito à integridade intelectual e os direitos à integridade moral.

De acordo com a doutrina clássica, os direitos da personalidade são faculdades jurídicas cujo objeto são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito.

Pode-se afirmar que são direitos subjetivos absolutos os presentes nos arts. 11 a 20 da legislação civilista que possibilitam a atuação legal, isto é, uma faculdade ou um conjunto de faculdades na defesa da própria pessoa, nos seus aspectos físicos e espirituais, dentro do autorizado pelas normas e nos limites do exercício fundado na boa-fé.

Os direitos da personalidade possuem as seguintes características: direitos inatos; vitalícios; absolutos; indisponíveis; extrapatrimoniais; intransmissíveis.

a) Direitos inatos

São direitos adquiridos como o surgimento da personalidade. Os direitos inatos da personalidade, diversamente dos demais, não necessitam de uma manifestação de vontade para firmar sua titularidade. De acordo com a Teoria Natalista, a partir do nascimento, automaticamente já se detém o direito subjetivo da personalidade, ou seja, já se possui direito ao nome, à honra, ao recato etc. Por isso, se diz que eles são inatos, já que os mesmos são inerentes ao próprio surgimento da personalidade, qualquer que seja o entendimento adotado (natalista ou concepcionista).

b) Direitos vitalícios Os direitos da personalidade perduram durante todo o ciclo vital da pessoa, ou seja, iniciam- se com a

vida e se findam com a morte.

c) Direitos absolutos Os direitos absolutos são aqueles que se exercem erga omnes, enquanto os relativos possuem sujeitos

passivos determinados ou determináveis.

d) Direitos indisponíveis

Os direitos da personalidade estão fora do comércio, mas é preciso esclarecer que isso não ocorre com todos os bens da personalidade, pois alguns, como a imagem ou o nome, são disponíveis. Conforme se pode observar com a leitura do art. 11 da legislação civilista:

Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

e) Direitos extrapatrimoniais Os direitos da personalidade não têm valor patrimonial. Não há como valorar a vida ou a honra de

uma liberdade cerceada.

f) Direitos intransmissíveis

Não há como se transmitir honra, recato, vida, já que os direitos da personalidade são ínsitos ao aspecto físico e espiritual do seu titular. O que não impede que os herdeiros demandem em caso de uma ofensa à pessoa falecida.

O art. 12 do Código Civil versa sobre os mecanismos da tutela dos direitos da personalidade,7 tanto no

7 Possibilidade de uso do art. 461 do Código de Processo Civil e art. 84 do Código de Defesa do Consumidor.

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sentido de prevenção (tutela preventiva) como de cessação da ocorrência de lesão, podendo a parte cumular estes pedidos com perdas e danos. O professor Carlos Alberto Bittar informa em seu livro8 que tal tutela compreende as seguintes medidas:

1. cessação de práticas lesivas;

2. apreensão de materiais oriundos de tal prática;

3. submissão do agente à cominação de pena;

4. reparação de danos materiais e morais;

5. perseguição criminal do agente;.

Quanto à questão da legitimação mencionada no parágrafo único do art. 12 do Código Civil, ora estudado, dá-se legitimação também ao companheiro. Veja:

Arts. 12 e 20. O rol dos legitimados de que tratam os arts. 12, parágrafo único, e 20, parágrafo único, do Código Civil também compreende o companheiro (Enunciado n. 275 da IV Jornada de Direito Civil).

Vedação de atos de disposição do próprio corpo

Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. O ato previsto no art. 13 será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial. Mediante contraprestação pecuniária, estão vedados todos os atos de disposição do próprio corpo, que reduzam a integridade física do indivíduo ou que venham a contrariar os bons costumes e a moral.

Na visão moderna, o art. 13 do Código Civil9 não veda as cirurgias de mudança de sexo, pois se deve dar ênfase à dignidade da pessoa humana; imaginem aquelas pessoas que vivem em constante conflito interno quanto a sua sexualidade. Nesse sentido foi aprovado o Enunciado n. 6 da I Jornada de Direito Civil:

Art. 13. a expressão “exigência médica”, contida no art. 13, refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente.

O princípio do consenso afirmativo10

É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo. Hoje vigora a doação consentida ou o princípio do consenso afirmativo,11 pois aqui prevalece a autonomia privada da vontade do ser humano, principalmente por se aproximar do princípio da solidariedade. É possível a feitura de um testamento manifestando a vontade de que após a morte sejam doados os órgãos.

8 Os direitos da personalidade. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 49. 9 “Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da

integridade física, ou contrariar os bons costumes. Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.“ 10 Art. 14 do Código Civil. 11 O art. 14 do Código Civil revogou parcialmente o art. 4º da Lei n. 9.434/1997.

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Os princípios da autonomia do paciente e da não maleficência

Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

O dispositivo deve ser interpretado restritivamente, não podendo jamais priorizar a liberdade do paciente em detrimento à vida, que tem primazia constitucional. O que importa para os “Testemunhas de Jeová”, por exemplo, é a liberdade religiosa12 e não a vida. Eles não fazem transfusão de sangue. Nesse caso, a posição dominante hoje é que o médico deverá fazer a transfusão e salvar a vida do paciente (ponderação dos direitos). Pablo Stolze entende que as entidades hospitalares, em determinados casos, devem obter suprimento da autorização pela via judicial.13

Nome civil

Elemento designativo do indivíduo e fator de sua identificação na sociedade é o nome, ainda, atributo da personalidade, nas lições de Caio Mario da Silva Pereira. Envolve ele, simultaneamente, um direito individual e um interesse social. É direito e é dever, nele são compreendidos o prenome (designa o indivíduo) e o sobrenome (indica a origem familiar). O mesmo possui um aspecto privado e um aspecto público. No aspecto privado o nome é um direito da personalidade ligado ao princípio da dignidade humana. O nome é um elo entre a pessoa e a sociedade, do que resulta seu aspecto público . No aspecto público, o nome é uma necessidade de todos nós sermos identificados, está ligado à ideia de uma identidade. O aspecto privado possibilita à pessoa mudar o seu nome de acordo com a trajetória da sua vida. No aspecto público há uma índole conservadora, pois a sociedade exige que o nome seja imutável para haver uma segurança na identificação de cada um.

São chamados de contingentes ou secundários: O agnome: Neto, Filho, Júnior. Ex.: Péricle Júnior. Quando há um apelido público e notório este é chamado de vocatório (Xuxa, Pelé, Lula). O hipocorístico é um designativo do nome derivado de sua raiz, destinado à expressão de afeto (Zeca, Chico)

O prenome pode ser mudado nas seguintes hipóteses:

1) adoção de um menor14

2) nome vexatório (art.55 da LRP): Graciosa Rodela, Um, dois, Três de Oliveira Quatro.

3) erro gráfico (art. 110 da LRP);

4) homonímia;

5) art. 56 da LRP15 – dos 18 aos 19 anos sem qualquer justificativa;16

12 Art. 5º, § 6º, da Constituição Federal, de 1988. 13 GAGLIANO, Pablo Stolze. Parte Geral, p. 156. 14 “Art. 8º Revogam-se o § 4º do art. 51 e os incs. IV, V e VI do caput do art. 198 da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, bem como o

parágrafo único do art. 1.618, o inciso III do caput do art. 10 e os arts. 1.620 a 1.629 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, e os §§ 1º a 3º do art. 392-A da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n. 5.452, de 1o de maio de 1943.”

15 “Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar

o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.” 16 Lei n. 12.100, de 27 de novembro de 2009 Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, com o objetivo de permitir, em caso de erros que não exijam qualquer

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6) aquelas pessoas que estão no programa de proteção de vítimas a testemunha, de acordo com o parágrafo único do art. 58 da LRP.17

7) Adoção(§ 5º do art. 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente).18

8) Casamento, separação ou divórcio (art. 1565 §§ 1º e 2º CC)

9) Substituições por apelidos públicos notórios (art. 58 da LRP)

A proteção do nome19

O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória. Mesmo que não seja exposto ao desprezo público, o nome da pessoa não pode ser utilizado por uma terceira pessoa, sem a devida autorização, sob pena de reparação, por violação À honra objetiva e subjetiva.

Vedação do uso do nome em propaganda na falta de autorização20

Casos recentes que versam sobre o tema abordado: O tribunal a quo fixou os danos morais em R$ 8 mil para o autor, médico que, em programa de televisão, teve sua honra ofendida. No caso, o jornalista teria afirmado que o médico estaria cobrando R$ 5 mil para a realização de cirurgia que poderia ser realizada pela rede pública. Além de divulgar a matéria, o jornalista

indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção, a retificação extrajudicial de registro de assentamento civil.

Art. 2º Os arts. 40, 57 e 110 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 40. Fora da retificação feita no ato, qualquer outra só poderá ser efetuada nos termos dos arts. 109 a 112 desta Lei.” (NR) “Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida

por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei.

.............................................................................” (NR) “Art. 110. Os erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção poderão ser

corrigidos de ofício pelo oficial de registro no próprio cartório onde se encontrar o assentamento, mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de pagamento de selos e taxas, após manifestação conclusiva do Ministério Público.

§ 1º Recebido o requerimento instruído com os documentos que comprovem o erro, o oficial submetê-lo-á ao órgão do Ministério Público que o despachará em 5 (cinco) dias.

§ 2º Quando a prova depender de dados existentes no próprio cartório, poderá o oficial certificá-lo nos autos. § 3º Entendendo o órgão do Ministério Público que o pedido exige maior indagação, requererá ao juiz a distribuição dos autos a um dos

cartórios da circunscrição, caso em que se processará a retificação, com assistência de advogado, observado o rito sumaríssimo. § 4º Deferido o pedido, o oficial averbará a retificação à margem do registro, mencionando o número do protocolo e a data da sentença e

seu trânsito em julgado, quando for o caso.” (NR) Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.” 17 “Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios. Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração

com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público.” 18 “Art. 47. *...+ § 5º A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a modificação

do prenome.” 19 Art. 17 do Código Civil. 20 Art. 18 do Código Civil.

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emitiu sua opinião desprovida de prova sobre o fato, acusando-o de cometer crime contra a Administração Pública. Para o Min. Relator, o dano moral decorreu de situação notoriamente mais grave, qual seja, a imputação de conduta criminosa em programa televisivo a afetar o nome do médico tanto em seu meio social como profissional, sem a comprovação da veracidade das afirmações. Entendeu o Min. Relator que o valor reparatório deve, portanto, ser elevado, de modo a se adequar aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade. Diante disso, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento para arbitrar o dano moral em R$ 30 mil, corrigidos a partir da data do julgamento do especial. REsp 879.460-AC, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 6/4/2010.

Discute-se, no REsp, se a notícia jornalística intitulada “Motorista Bêbado Bate Carro da Câmara” extrapolou seu direito de informar, atingindo a honra do recorrido. No caso, a ação de indenização por danos morais foi ajuizada contra a editora à qual pertence o jornal, visto que o motorista foi absolvido em sindicância administrativa da câmara municipal na qual não se confirmou seu estado de embriaguez. Por sua vez, anotou o Min. Relator que o acórdão recorrido, para chegar à conclusão de que o jornal extrapolou o direito de informação, consignou que o próprio motorista e algumas testemunhas confirmaram a ingestão de álcool, fato incontroverso nos autos. Ressalta que a liberdade de informação, sobretudo a amparada na liberdade de imprensa, assume um caráter dúplice, ou seja, há direito tanto de informar quanto de ser informado. Também explica que, se de um lado não se permite a leviandade por parte da imprensa, publicando matérias inverídicas que possam ofender a honra das pessoas, de outro lado também não se exigem, na atividade jornalística, verdades absolutas provadas previamente em investigação administrativa, policial ou judicial. Se houvesse tal exigência, iria colidir com a celeridade exigida nos meios de comunicação para noticiar os fatos. Destaca ainda o Min. Relator que a veracidade dos fatos noticiados na imprensa não deve consubstanciar dogma absoluto ou condição peremptoriamente necessária à liberdade de imprensa, mas um compromisso ético com a informação verossímil, o que pode eventualmente abarcar informações não totalmente precisas. Após essas considerações, entre outras, conclui o Min. Relator que, na hipótese, o jornal agiu segundo a margem tolerável de inexatidão por legítimo juízo de aparência dos fatos e interesse público, visto que, conforme consta dos autos, o autor ingeriu bebida alcoólica em festa com membros do Poder Legislativo local e, em seguida, colidiu com carro oficial à entrada de sua residência. Sendo assim, não houve erro grosseiro na reportagem divulgada, mas interesse público de informar, dar publicidade ao desvio da conduta de agente público, o que é próprio da crítica jornalística nos estados democráticos. Diante do exposto, a Turma deu provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido indenizatório, restabelecendo a sentença. Precedentes citados: REsp 957.343-DF, DJe 8/4/2008, e REsp 1.063.304-SP, DJe 13/10/2008. REsp 680.794-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/6/2010.

O uso do nome fictício21

O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome. Pseudômino significa um nome fictício usado por um indivíduo como alternativa ao seu nome legal.

21 Art. 19 do Código Civil.

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Da proteção da imagem22

Salvo autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, ao seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

O art. 20 do Código Civil, de 200223 se refere à imagem, cabendo ao prejudicado postular a proibição da divulgação, bem como requerer a reparação cabível, desde que seja atingida a honra, a boa fama, ou seja, quando é ferida a dignidade da pessoa humana. Proteção da privacidade da pessoa natural24 A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. Trata- se do direito do indivíduo a estar só, bem como, é o poder de excluir do conhecimento alheio as escolhas existenciais. Um exemplo claro de violação da privacidade ocorre quando os programas de televisão realizam a leitura labial dos jogadores de futebol.

A morte presumida com a declaração de ausência (diferente da regra do art. 7º do Código Civil de 2002)

Ausência significa o desaparecimento de uma pessoa de seu domicílio, sem deixar notícias de seu

paradeiro e sem designar procurador ou representante a quem caiba a administração de seus bens. Em síntese, ausência é LINS (Lugar incerto e não sabido

Se o indivíduo desaparece sem deixar notícias, abre-se prazo para a pessoa interessada requerer a ausência. O objetivo do instituto é a proteção do patrimônio do ausente, bem como de seus herdeiros.

São legitimados para o requerimento da ausência Ministério Público ou qualquer interessado.

Quando uma pessoa desaparece de seu domicílio sem deixar vestígios ou procurador a quem caiba administrar os bens, pode ser declarada a ausência. Veja-se a lei:

22 Art. 20 do Código Civil 23 “Art. 20. Salvo se autorizadas ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos,

a transmissão da palavra ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.”

24 “Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.”

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Art. 22. Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e nomear-lhe-á curador.

Caso uma pessoa venha a desaparecer de seu domicílio, mas, porém deixa um mandatário que não quer ou não pode exercer, ou continuar o mandato que lhe foi conferido, ou se os seus poderes forem insuficientes, veja-se a lei:

Art. 23. Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes.

Fases relacionadas ao instituto: 1) Curadoria dos bens 2) A ocorrência da sucessão provisória 3) A sucessão definitiva

Pessoas Jurídicas

Trata-se de um ente moral criado pelo ser humano e que o ordenamento jurídico atribui

personalidade. Tal personalidade jurídica é manifestação do direito de propriedade.

Quanto a natureza jurídica das pessoas jurídicas tudo irá depender de qual teoria será adotada ,

vejamos:

a) Teoria Negativista : não existe pessoa jurídica, ou seja, existe um patrimônio sem sujeito.25

b) Teoria Afirmativista: adotada pelo Código Civil, de 2002 afirmando que a pessoa jurídica possui

existência, sendo portadora de interesses próprios. A doutrina sustenta a Teoria da Realidade Técnica.

Teoria da desconsideração da pessoa jurídica, teoria da penetração ou disregard doctrine.26

O art. 50 do Código Civil consagrou tal teoria:

Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Assim, é certo afirmar que toda vez que houver abuso de personalidade, que decorre do desvio de

finalidade ou da confusão patrimonial, o juiz poderá determinar a desconsideração da personalidade jurídica,

25 BEVILÁQUA, Clóvis. In: STOLZE, Pablo; e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Parte geral. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 184. 26 Recurso especial. Desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine). Hipóteses. 1. A desconsideração da personalidade

jurídica da empresa devedora, imputando-se ao grupo controlador a responsabilidade pela dívida, pressupõe – ainda que em juízo de superficialidade – a indicação comprovada de atos fraudulentos, a confusão patrimonial ou o desvio de finalidade. 2. No caso a desconsideração teve fundamento no fato de ser a controlada (devedora) simples longa manus da controladora, sem que fosse apontada uma das hipóteses previstas no art. 50 do Código Civil. 3. Recurso especial conhecido (REsp n. 744.107/SP, rel. Ministro Fernando Gonçalves, 4ª Turma, j. em 20.05.2008, DJe, 12.08.2008).

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na busca do patrimônio dos administradores ou sócios da pessoa jurídica (afasta-se o princípio da separação

patrimonial).

Rubens Requião diz que: “Se a personalidade jurídica constitui uma criação da lei como concessão do

Estado à realização de um fim, nada mais procedente do que se reconhecer no Estado, através da justiça, a

faculdade de verificar se o direito concedido está sendo adequadamente usado. A personalidade jurídica

passa a ser considerada doutrinariamente um direito relativo, permitindo ao juiz penetrar o véu da

personalidade para coibir os abusos ou condenar a fraude através do seu uso.”

As hipóteses que geram a desconsideração:

a) Desvio de finalidade: ocorre quando objeto social é mera fachada para a exploração de atividade

diversa.: Uma pessoa que está proibida de exercer certa atividade como pessoa física, por exemplo, constitui

uma pessoa jurídica e por ela pratica o ato que não era permitido.27

b) Confusão patrimonial: nesta hipótese, os bens pessoais e sociais se misturam.

Tratando ainda sobre a questão, a doutrina e a jurisprudência sustentam a chamada teoria da

desconsideração inversa, que ocorre com a quebra da autonomia patrimonial a fim de executar bens da

sociedade por dívidas pessoais dos sócios. Nesse sentido, Enunciado n. 283 da IV Jornada do CJF:

Art. 50. É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.

Veja-se recente julgado do STJ:

Discute-se, no REsp, se a regra contida no art. 50 do CC/2002 autoriza a chamada desconsideração da personalidade jurídica inversa. Destacou a Min. Relatora, em princípio, que, a par de divergências doutrinárias, este Superior Tribunal sedimentou o entendimento de ser possível a desconstituição da personalidade jurídica dentro do processo de execução ou falimentar, independentemente de ação própria. Por outro lado, expõe que, da análise do art. 50 do CC/2002, depreende-se que o ordenamento jurídico pátrio adotou a chamada teoria maior da desconsideração, segundo a qual se exige, além da prova de insolvência, a demonstração ou de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração) ou de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração). Também explica que a interpretação literal do referido artigo, de que esse preceito de lei somente serviria para atingir bens dos sócios em razão de dívidas da sociedade e não o inverso, não deve prevalecer. Anota, após essas considerações, que a desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir, então, o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações de seus sócios ou administradores. Assim, observa que o citado dispositivo, sob a ótica de uma interpretação teleológica, legitima a inferência de ser possível a teoria da desconsideração da personalidade jurídica em sua modalidade inversa, que encontra justificativa nos princípios éticos e jurídicos intrínsecos à própria disregard doctrine, que vedam o abuso de direito e a fraude contra credores. Dessa forma, a finalidade maior da disregard doctrine contida no preceito legal em comento é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios. Ressalta que, diante da desconsideração da personalidade jurídica inversa, com os efeitos sobre o patrimônio do ente societário, os sócios ou administradores possuem legitimidade para defesa de seus direitos mediante a interposição dos

27 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. O novo Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor – pontos de convergência. RDC 48/64.

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recursos tidos por cabíveis, sem ofensa ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal. No entanto, a Min. Relatora assinala que o juiz só poderá decidir por essa medida excepcional quando forem atendidos todos os pressupostos relacionados à fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/2002. No caso dos autos, tanto o juiz como o tribunal a quo entenderam haver confusão patrimonial e abuso de direito por parte do recorrente. Nesse contexto, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 279.273-SP, DJ 29/3/2004; REsp 970.635-SP, DJe 1°/12/2009, e REsp 693.235-MT, DJe 30/11/2009. REsp 948.117-MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/6/2010.

Personalidade

Da conjugação de duas fases distintas, a volitiva e a administrativa, é que resulta a aquisição da

personalidade jurídica. O ato constitutivo é o instrumento continente da declaração da vontade criadora. É a

causa geradora primária do ente jurídico.

Todavia, o começo da existência jurídica está fixado no instante em que aquele ato constitutivo é

inscrito no Registro Público competente, seja para as sociedades ou associações, seja para as fundações.

Basicamente, o ato constitutivo da pessoa jurídica é um estatuto (associações, fundações de direito

privado e cooperativas) ou um contrato social (adotado por sociedades), e em geral é levado para o

registro na Junta Comercial (registro público de empresa) ou para o Cartório de Registro Civil de Pessoas

Jurídicas.

OBS: Na forma do Código Civil, esse registro é constitutivo da sua personalidade. Diferentemente, o

registro da pessoa física é meramente declaratório.

Será designada sociedade de fato, quando sequer houver ato constitutivo. E será designada sociedade

irregular quando, não obstante a existência de um ato constitutivo, este não tenha sido registrado.

Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo

no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo,

averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.

Espécies

a) Espécies de pessoas jurídicas de direito público:

a.1) Interno: União, Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias, Associações

Públicas e as demais entidades de caráter público criadas por lei. As pessoas mencionadas estão em

consonância com o princípio federativo, capitaneado no art. 1º da CF. Para efeitos administrativos, divide-se

a administração estatal em Administração Direta e Indireta. A primeira constitui-se dos serviços integrados

na própria estrutura administrativa do ente de direito público interno. Ex: Ministérios, secretarias,

repartições e gabinetes. Já a segunda, compreende as seguintes entidades: Autarquias, Empresa públicas,

Sociedades de Economia Mista, Fundações Públicas.

a.2) Externo: os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional

público.

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b) Espécies de pessoa jurídicas de direito privado: as associações, as sociedades, as fundações, as

organizações religiosas (incluído pela Lei n. 10.825, de 22.12.2003) e os partidos políticos (incluído pela Lei

n. 10.825, de 22.12.2003). Posicionando-se nas Jornadas de Direito Civil a doutrina afirma que o rol do art.

44 do Código Civil, que trata das pessoas jurídicas narradas, não é exaustivo

Associações

As associações são entidades de direito privado, formadas pela união de indivíduos, com o propósito de

realizarem fins não econômicos. Podem até obter lucro, desde que esse seja revertido para a própria

associação.

A principal distinção entre as associações e as sociedades consiste no fato de não existir naquelas a

affectio societatis (parágrafo único do art. 53 do Código Civil), em razão de não haver nenhuma relação

recíproca entre os associados. As sociedades possuem como ponto central o desempenho de atividades

econômicas em proveito dos sócios.28

O ato constitutivo de uma associação é um estatuto, que deve ser registrado no Cartório de Registro

Civil de Pessoa Jurídica.

O Estatuto das associações deverá conter:

a) a denominação, os fins e a sede da associação;

b) os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

c) os direitos e deveres dos associados;

d) as fontes de recursos para sua manutenção;

e) o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos;

f) o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos;

g) as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.

h) a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.

O exposto acima é de ordem pública e em caso de ausência de um dos seus elementos o ato constitutivo

da associação irá se tornar nulo.

Importante mencionar que o sindicato e as centrais sindicais têm natureza de associação.

Os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens

especiais. É lícita cláusula que proíba determinada qualidade de associado de realizarem uma atividade. A

qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário.

A qualidade de associado, em regra, é personalíssima. Não confundir a regra com a exceção. Por

exemplo, fulano associado a determinado clube de futebol. Se fulano morrer, essa qualidade não se

transmite. A regra é essa. Excepcionalmente, a qualidade de associado se transforma em título patrimonial,

que se transfere aos herdeiros, o que tem de estar previsto expressamente no título associativo.

A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que

assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto.

O fato descrito trata do devido processo legal, aplicado às situações que não são necessariamente

vinculadas ao processo civil. Permite-se até o recurso. Só é admissível a exclusão do associado se houver

justa causa, a qual deve estar definida no estatuto e nada mais é do que a manifestação do princípio da

28 OLIVEIRA, James Eduardo. Código Civil comentado e anotado. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 46.

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eticidade.29

É o estatuto que define a forma de convocação dos órgãos deliberativos, sendo garantido a um quinto

dos associados o direito de promovê-la.30

Dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso,

as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não

econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal,

estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes. Por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por

deliberação dos associados, podem esses, antes da destinação do remanescente referida neste artigo, receber

em restituição, atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da

associação. Não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território, em que a

associação tiver sede, instituição nas condições indicadas neste artigo, o que remanescer do seu patrimônio

se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União (art. 61, §§ 1º e 2º).

Caso uma associação chegue ao fim, o seu patrimônio líquido poderá ser destinado a outras entidades

de fins não econômicos, designadas no estatuto, ou sendo omisso o estatuto os bens podem ser arrecadados

pela Fazenda Pública.

Sociedades

As sociedades estão disciplinadas no capítulo do direito da empresa, a doutrina especializada em direito

empresarial criticou duramente o novo Código Civil por regulamentar o direto empresarial.

As sociedades têm por principal característica a finalidade de lucro, e este será repartido entre os sócios.

Busca-se a affectio societatis.

São constituídas por contrato social e compostas por sócios. Podem ser simples ou empresariais. As

simples ( arts. 997 a 1038 CC) são aquelas que exercem atividade econômica sem, contudo, submeter- se à

definição de empresariais. Podem essas sociedades revestir-se de outras formas constitutivas, à exceção da

sociedade por ações. Uma sociedade de dentistas pode adotar o modelo da sociedade limitada, ou seja, ela

será simples quanto ao objeto, porém, sua forma será de limitada. Lembre-se de que para que isso ocorra o

objeto da sociedade não pode ser empresarial. Já conforme o nome diz as sociedades empresariais (arts. 966

a 982 CC) são aquelas cujo objeto se traduz em uma atividade empresarial.

Fundações

As fundações não são grupos humanos personificados, resultam da personificação (afetação) de um

patrimônio, por testamento ou escritura pública, que faz o seu instituidor, com o objetivo de realizar

finalidade ideal. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação

especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de

administrá-la. A fundação somente poderá se constituir para fins religiosos, morais, culturais ou de

assistência.31

29 “Art. 58. Nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, a não ser nos

casos e pela forma previstos na lei ou no estatuto.” 30 “Art. 59. Compete privativamente à assembleia geral: I – destituir os administradores; II – alterar o estatuto. Parágrafo único. Para as deliberações com fim de destituir os administradores ou alterar o estatuto é exigido deliberação da assembleia

especialmente convocada para esse fim, cujo quorum será o estabelecido no estatuto, bem como os critérios de eleição dos administradores.”

31 Art. 62, parágrafo único, Código Civil.

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São as fases de constituição da fundação:

1a fase – dotação patrimonial e orçamentária

2a fase – elaboração do estatuto

3a fase – aprovação do estatuto

4a fase – registro do ato constitutivo

A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público interno

O tema é abordado no art. 43 da lei civilista32 e no art. 37 § 6º, da Constituição Federal, de 1988,33

sendo certo afirmar que a responsabilidade será objetiva, com fundamento na teoria do risco

administrativo.34 É necessário para que haja a dita responsabilidade a presença dos seguintes requisitos:

a) dano;

b) ação administrativa;

c) nexo de causalidade.

Pode ser abrandada ou até excluída a responsabilidade da pessoa jurídica se provada a culpa da vítima.

A regra também se aplica à pessoa jurídica prestadora de serviço público.

Extinção da pessoa jurídica

Modalidades:

• convencional: por vontades dos sócios;

• legal: decorre dos motivos expostos na legislação;

• administrativa: nas hipóteses de revogação para seu funcionamento;

• natural: quando o ato constitutivo prevê a dissolução em caso de falecimento de seus membros, não

podendo ocorrer prosseguimento pelos herdeiros.

32 “Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade

causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.” 33 “Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

34 Erro judiciário. Responsabilidade civil objetiva do Estado. Direito à indenização por danos morais decorrentes de condenação

desconstituída em revisão criminal e de prisão preventiva. Constituição Federal, art. 5º, LXXV. Código de Processo Penal, art. 630. 1. O direito à indenização da vítima de erro judiciário e daquela presa além do tempo devido, previsto no art. 5º, LXXV, da Constituição, já era previsto no art. 630 do Código de Processo Penal, com a exceção do caso de ação penal privada e só uma hipótese de exoneração, quando para a condenação tivesse contribuído o próprio réu. 2. A regra constitucional não veio para aditar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo, conforme o art. 37, § 6º, da Lei Fundamental: a partir do entendimento consolidado de que a regra geral é a irresponsabilidade civil do Estado por atos de jurisdição, estabelece que, naqueles casos, a indenização é uma garantia individual e, manifestamente, não a submete à exigência de dolo ou culpa do magistrado. 3. O art. 5º, LXXV, da Constituição: é uma garantia, um mínimo, que nem impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias que venham a reconhecer a responsabilidade do Estado em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público da Justiça. RE n. 505.393/PE.

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• judicial: determinada pelo Poder Judiciário;

Importante observar as regras do art. 1.033 do Código Civil.35

Entes ou grupos despersonalizados:

São o conjunto de pessoas e de bens que não possuem personalidade própria, vejamos os destaques deste item:

a) Família (agrupamento familiar);

b) Massa Falida;

c) Heranças Jacente e Vacante (em rodapé: atrs. 1819 a 1823 CC)

d) Espólio( em rodapé: 1797 CC e 985 CPC)

e) Condomínio Edilício (em rodapé: já fora estudado em capítulo anterior acerca da controvérsia exposta por parte da doutrina que sustenta a tese de condomíniio em edificações possuir personalidade. Veja-se os enunciados 90 e 246. )

DOMICÍLIO

O conceito legal de domicílio civil da pessoa natural contido no art. 70 do Código Civil, define-o como o lugar onde a pessoa estabelece sua residência com ânimo definitivo tendo, portanto, por critério a residência. Nesta conceituação legal há dois elementos: o objetivo, que é a fixação da pessoa em dado lugar e o subjetivo, que é a intenção de ali permanecer com ânimo definitivo. Importa em fixação espacial permanente da pessoa natural.36

Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas (Domicílio Plúrimo).37 Nossa legislação admite a pluralidade domiciliar, sendo domicílio qualquer residência desde que haja mais de uma.

É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde esta é exercida (Domicílio Profissional).38 Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as relações que lhe corresponderem. Aqui adotamos a mesma regra exposta acima, ou seja, admite-se a pluralidade domiciliar profissional. Se uma empresa tem escritórios em São Paulo, Rio de Janeiro e em Curitiba,

35 “Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: I – o vencimento do prazo de duração, salvo se vencido este e sem oposição de sócio, não entrar a sociedade em liquidação, caso em

que se prorrogará por tempo indeterminado; II – o consenso unânime dos sócios; III – a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; IV – a falta de pluralidade de sócios, não reconstituída no prazo de cento e oitenta dias; V – a extinção, na forma da lei, de autorização para funcionar. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inc. IV caso o sócio remanescente, inclusive na hipótese de concentração de todas as cotas da

sociedade sob sua titularidade, requeira no Registro Público de Empresas Mercantis a transformação do registro da sociedade para empresário individual, observado, no que couber, o disposto nos arts. 1.113 a 1.115 deste Código.”

36 SILVA, Regina Beatriz Tavares da (coord.). Código Civil comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 77. 37 Art. 71 do Código Civil . 38 Art. 72 do Código Civil.

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quaisquer deles serão considerados domicílios.

O domicílio ocasional39 é aquele em que a pessoa natural não tem residência habitual, sendo aquele onde for encontrada, v.g., caixeiro viajante, circense etc.

São as condições para a mudança de domicílio:

a) transferência da residência para local diverso;

b) ânimo definitivo de fixar a residência, constituindo novo domicílio.

Perder-se-á o domicílio pela mudança, porque este passará a ser o mais recente. Ter-se-á, como vimos, a mudança quando houver transferência de residência, com a intenção de deixar a anterior para estabelecê-la em outra parte.40

A mudança de domicílio corresponderá à intenção de não permanecer mais no local em que se encontra. O modo exigido por lei para que se dê a exteriorização da referida intentio será a simples comunicação feita pela pessoa que se mudou à municipalidade do lugar que deixa e à do local para onde vai. Como, em regra, a pessoa natural que se muda não faz tal declaração, seu ânimo de fixar domicílio em outro local resultará da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem.41

Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:

a) da União, o Distrito Federal;

b) dos Estados e Territórios, as respectivas capitais;

c) do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;

d) das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos.

Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados. Se a administração ou diretoria tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder.

Têm domicílio necessário o incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso (domicílio necessário).

O domicílio do incapaz é legal e será o de seus representantes.

O domicílio do servidor público é o local onde exerce suas funções por investidura efetiva. Logo, tem por domicílio o lugar onde exerce sua função permanente.42

O militar do Exército é o lugar onde servir e o do da Marinha ou da Aeronáutica em serviço ativo, a sede do comando a que se encontra imediatamente subordinado.

Com relação à marinha mercante é o lugar onde estiver matriculado o navio.

Aquele que está preso terá por domicílio o lugar onde cumprir a sentença.

O agente diplomático do Brasil, que citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último ponto do território brasileiro onde o teve.43

39 “Art. 73. Ter-se-á por domicílio da pessoa natural, que não tenha residência habitual, o lugar onde for encontrada.” 40 SILVA, Regina Beatriz Tavares (coord.). Código Civil comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 79. 41 Idem, ibidem. 42 SILVA, Regina Beatriz Tavares (coord.). Código Civil comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 79. 43 Art. 77 do Código Civil.

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Domicílio contratual ou de eleição é o estabelecido contratualmente pelas partes em contrato escrito, que especificam onde se cumprirão os direitos e os deveres deles resultantes. A eleição do domicílio deve ser analisada de acordo com o princípio da função social e da boa-fé objetiva.44

Nota!

No Código de Defesa do Consumidor, vale destacar a regra disposta no art. 101.

Vejamos o julgado:

A recorrente alega que houve erro de diagnóstico do réu, que atestou ser ela portadora do vírus da hepatite tipo C, o que foi comunicado a todos os bancos de sangue do país, impedindo que ela doasse sangue. Promoveu ação de indenização de danos morais em seu domicílio, na qualidade de consumidora (art. 101, I, do CDC). Oposta exceção de incompetência, ela foi acolhida ao entendimento de não se cuidar de relação de consumo. Para o Min. Relator, o serviço traduz-se, exatamente, na retirada do sangue da doadora e, inegavelmente, ela toma o serviço como destinatária final no que se refere à relação exclusiva entre essas duas partes, relação que também integra uma outra entre o banco de sangue e aquele que irá utilizá-lo. É um caso atípico, mas, nem por isso, pode ser apartado da proteção consumerista. São dois os serviços prestados e relações de consumo, sendo que a primeira é uma em si mesma, a captação de sangue pelo banco, mas faz parte de uma segunda, o fornecimento de sangue pelo banco ao recebedor. A primeira tem um custeio, sim, mas indireto, visto que pela segunda o banco é remunerado de uma forma ou de outra. Dessa maneira, pode, efetivamente, considerar-se a doadora como partícipe de uma relação de consumo em que ela, cedendo seu sangue, usa os serviços da empresa ré, uma sociedade limitada, que, no próprio dizer do Tribunal recorrido, como receptora do sangue, vende ou doa. Na espécie, a captação de sangue é atividade contínua e permanente do hemocentro. É sua matéria-prima o sangue e seus derivados. Não se cuida de um serviço que foi prestado casual e esporadicamente, porém, na verdade, constante e indispensável ao comércio praticado pelo réu com a venda do sangue a hospitais e terceiros, gerando recursos e remunerando aquela coleta de sangue da autora que se fez, ainda que indiretamente. Nessas circunstâncias, enquadra-se a hipótese, adequadamente, no conceito do art. 2º do CDC, de sorte que o privilégio do foro do domicílio do consumidor, assegurado no art. 101, I, daquele código, é de ser aplicável ao caso. Diante disso, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, para declarar competente o foro da comarca onde originariamente ajuizada a demanda. REsp 540.922-PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 15/9/2009.

Nota!

Com relação ao domicílio eleitoral, aplica-se a Lei nº 4.737/65.

Nota!

Súmulas do STF, vejamos:

60

62

80

335

363

44 Arts. 421 e 422 do Código Civil.

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406

410

483

484

517

539

583

689

Súmulas do STJ

1

58

BENS

Neste tópico da matéria é interessante a leitura da lei.

O vocábulo bem pode ser tomado em vários sentidos.

Filosoficamente, bem seria tudo quanto pudesse proporcionar ao homem uma satisfação qualquer.

Juridicamente, entretanto, bens seriam aqueles valores materiais ou imateriais que podem servir de objeto de uma

relação jurídica. Imperioso, pois, sejam economicamente apreciáveis.

Além desses bens, outros há, ainda, de ordem moral e não apreciáveis economicamente. Não entram, nem podem

entrar, na formação do patrimônio da pessoa, eis que não comportam estimação pecuniária. Seriam esses bens, não

econômicos, prolongamentos e/ou emanações da própria personalidade, como, por exemplo, a vida, a liberdade, o

nome, a honra etc.

Logo, pode-se dizer que bem jurídico seria todo interesse, todo valor, material ou imaterial, protegido pela lei,

nestes incluídos os próprios direitos da personalidade. Entretanto, somente os economicamente apreciáveis podem ser

objeto de relações jurídicas.

Os bens, especificamente considerados, comportam uma distinção: Bem é gênero onde coisas são espécies.

Coisas são materiais, corpóreas, concretas. São passíveis de alienação.

Bens, em sentido estrito, são imateriais, incorpóreos, abstratos. São passíveis de cessão.

Apenas para frisar, o nosso Código Civil não foi tão rigoroso nesta distinção, usando uma palavra pela outra, em

certos casos.

Classificação dos bens

Os bens podem ser classificados de acordo com vários critérios : a natureza física dos mesmos; as suas relações

recíprocas; os seus titulares; a possibilidade ou não de serem comercializados.

Podemos assim classificar os bens:

Bens considerados em si mesmos

5.1.1.1. Dos bens imóveis

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São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.

Podem ser classificados em:

a) imóveis por sua natureza;45

b) imóveis por acessão física artificial;46

c) imóveis por acessão intelectual.47

Vale mencionar que existe doutrina que sustenta que tais bens não existem mais diante da leitura do atual código.

Assim é o texto exposto pelas Jornadas de Direito Civil.

Art. 79. Não persiste no novo sistema legislativo a categoria dos bens imóveis por acessão intelectual, não obstante a expressão “tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”, constante da parte final do art. 79 do Código Civil (Enunciado n. 11 do CJF).

Consideram-se imóveis para os efeitos legais:

a) os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram; b) o direito à sucessão aberta.

Não perdem o caráter de imóveis:

a) as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local;

b) os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem. Aqui vale fazer uma

remissão ao art. 84 do Código Civil.48

Bem de família

Tem sua origem no homestead do Direito americano. Visa a assegurar um abrigo à família, tornando a casa onde

ela reside impenhorável e inalienável, durante um determinado período.

O bem de família pode ser legal ou voluntário.

Voluntário é aquele que é destinado pelo chefe da família para residência desta – arts. 19 a 22 do Decreto-lei n.

3.200/41 e 260 a 265 da Lei de Registros Públicos. Constitui-se por escritura pública, inscrita no Registro de Imóveis.

Tem por objeto uma coisa imóvel, ou seja, um prédio. É necessário que o imóvel seja residência dos interessados por

mais de 02 (dois) anos, não havendo limite de valor. Para evitar a fraude contra credores, não se permite a criação de

bem de família por quem já tenha dívidas no momento da instituição.

Fica isento da execução por dívidas, salvo as de impostos relativos ao próprio imóvel, isenção esta que durará

enquanto viverem os cônjuges e até que os filhos completem a maioridade civil.

Não pode ter outro destino, nem ser alienados sem o prévio consentimento dos interessados os de seus

representantes legais.

Não entra em inventário, nem é partilhado enquanto nele residirem o cônjuge sobrevivente ou filho menor.

Legal é o instituído pela Lei n. 8.009, de 02.03.1990, que estabeleceu a impenhorabilidade geral dos imóveis que

sirvam de residências familiares próprias, bem assim dos bens móveis que as guarneçam, independentemente de

qualquer ato ou providência dos interessados. No que se refere à impenhorabilidade deste tipo de bens, a própria lei

faz inúmeras ressalvas.

Na hipótese de existirem dois ou mais imóveis que sirvam de residência da mesma família, a impenhorabilidade

recairá sobre o de menor valor, salvo se houver bem de família voluntário instituído.

45 Art. 79, 1ª parte, do Código Civil. 46 Art. 79, 2ª parte, do Código Civil. 47 Art. 93 e o art. 79, 2ª parte, ambos do Código Civil. 48 “Art. 84. Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam sua qualidade de móveis;

readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio.”

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Muito embora sob a mesma designação – bem de família –, não se confundem o voluntário e o legal.

O voluntário tem natureza de afetação, tornando-o impenhorável, inalienável e insusceptível de inventário e

partilha. Depende de escritura pública e registro.

O legal tem natureza de mera impenhorabilidade geral, comportando inúmeras exceções. Não torna o imóvel

inalienável, nem isento de inventário e partilha. Independe de manifestação dos interessados.

Dos bens móveis

São aqueles que se deslocam no espaço sem fratura ou quebra, mas por força alheia (mecânica ou força humana),

por exemplo, um automóvel. Podem também se deslocar por força natural (semoventes) ou estranha (coisas

inanimadas).

Bens móveis por antecipação Seriam bens ainda incorporados ao solo, mas que se destinam a serem destacados e

convertidos em bens móveis, exemplo, os frutos pendentes, as árvores destinadas ao corte. Isto é, no plano fático tais

bens ainda seriam imóveis por acessão, mas se eles estão destinados a um destacamento futuro, entende-se que na

medida em que há essa finalidade de destacamento, esses bens desde logo podem vir a ser qualificados como móveis

por antecipação.

Consideram-se móveis para os efeitos legais:

a) as energias que tenham valor econômico;

b) os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes;

c) os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

Os materiais (madeiras, telhas, azulejos, tijolos) destinados a alguma construção, enquanto não forem

empregados, conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum

prédio. Se alguma edificação for demolida, os materiais de construção readquirirão a qualidade de móveis, porque não

mais participarão da natureza do principal. Se a separação for provisória e se for para continuar a fazer parte do

mesmo edifício, serão esses imóveis.

Dos bens fungíveis e consumíveis

São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, v.g., café.

Tal fungibilidade é própria dos bens móveis.

Em contrapartida, os bens infungíveis são aqueles que não admitem substituição, v.g., um quadro de um pintor

famoso.

Nota!

O empréstimo de bens fungíveis chama-se mútuo (se transfere a propriedade).

O empréstimo de bens infungíveis chama-se comodato (se transfere a posse).

É possível fazer comodato de bem fungível. Trata-se do comodato ad pompam vel ostentationem, no qual a

convenção das partes tem o condão de transformar a coisa fungível por sua natureza em infungível.49

Em suma: Não é

um empréstimo para consumir, apenas para ostentar, para exibir.

São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediata da própria substância, sendo também

considerados tais os destinados à alienação, v.g., uma refeição. Já os inconsumíveis são aqueles que podem ser usados

de modo contínuo.

O que torna um bem consumível ou inconsumível não é apenas a natureza da coisa, mas também a sua destinação

econômica. Pode um bem ser naturalmente consumível e juridicamente inconsumível? Uma garrafa de vinho rara é

naturalmente consumível, mas vamos supor que essa garrafa de vinho esteja gravada com uma cláusula de

49 TARTUCE, Flávio. Contratos. 2. ed. São Paulo: Método, v. 3, p. 438.

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inalienabilidade. Se isso ocorrer, ela será ao mesmo tempo naturalmente consumível e juridicamente inconsumível.

5.1.1.4. Dos bens divisíveis

Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor,

ou prejuízo do uso a que se destinam. Bem indivisível é aquele que não admite fracionamento, sob pena de perder a

natureza ou o valor econômico, v.g., semoventes, uma tela de um pintor famoso.

Nota!

A indivisibilidade pode ser convencional6 jurídica7 ou por natureza como o animal.

Dos bens singulares e coletivos

São singulares os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais. Podem ser

simples ou compostos. Serão simples se formarem um todo homogêneo, cujas partes componentes estejam unidas em

virtude da própria natureza ou da ação humana, sem reclamar quaisquer regulamentações especiais por norma jurídica.

Podem ser materiais (pedra, caneta-tinteiro, folha de papel, cavalo) ou imateriais (crédito). As coisas compostas são

aquelas cujas partes heterogêneas são ligadas pelo engenho humano, hipótese em que há objetos independentes que se

unem em um só todo sem que desapareça a condição jurídica de cada parte. Verbi gratia, materiais de construção que

estão ligados à edificação de uma casa.52

Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham

destinação unitária (uma biblioteca, um rebanho, uma galeria de quadros). Os bens que formam essa universalidade

podem ser objeto de relações jurídicas próprias. Já a universalidade de direito, é o complexo de relações jurídicas de

uma pessoa, dotadas de valor econômico, como herança; patrimônio; massa falida.

Nota!

Modernamente, a posição bastante firme é no sentido de que o complexo de relações jurídicas que envolve o patrimônio, envolve não apenas os bens, direitos e créditos, mas também as dívidas. As dívidas também compõem o patrimônio, isto é, não apenas o lado ativo, mas também o passivo ingressa na definição de patrimônio.

50 “Art. 1.326. Os frutos da coisa comum, não havendo em contrário estipulação ou disposição de última vontade, serão partilhados na

proporção dos quinhões.” “Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros. Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas

normas relativas ao condomínio.” “Art. 1.421. O pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração correspondente da garantia, ainda que esta

compreenda vários bens, salvo disposição expressa no título ou na quitação.” “Art. 28 da Lei n. 6.404. A ação é indivisível em relação à companhia.” “Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos. § 2º O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração

centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.”

51 Art. 1.386 do Código Civil . 52 SILVA, Regina Beatriz Tavares (coord.). Código Civil comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 92.

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Assim, com a morte da pessoa seu patrimônio se transmite aos herdeiros.53

Nos ensina o mestre J.M. Leoni

Lopes de Oliveira, que o patrimônio é o conjunto do lado ativo e do lado passivo.54

Dos bens reciprocamente considerados

Bens principais são aqueles que não dependem de outros, não estão presos a outros, não seguem a sorte de

outros. O solo é sempre principal, tudo o mais que está preso a ele é acessório. Já os acessórios, são aqueles que

seguem a sorte do principal. Tudo o que acontece ao principal acontece aos acessórios. As obrigações seguem esta

regra. Os bens acessórios podem ser: As pertenças, as acessões, os frutos naturais, industriais e civis, os produtos,

os rendimentos e as benfeitorias.55

Nota!

Apesar de o art. 82 do Código Civil12 mencionar que o acessório depende da existência do principal, existe regra no Código que informa opinião contraditória. Vamos ver:

Art. 1.487. A hipoteca pode ser constituída para garantia de dívida futura ou condicionada, desde que determinado o valor máximo do crédito a ser garantido.

Então, a hipoteca é garantia acessória tendo existência independentemente do principal.

Têm-se basicamente dois critérios para ser aferido o que é principal e o que é acessório:

Primeiro: Critério econômico, isto é, na verdade o valor de cada um dos bens seria determinante para se aferir o

que seria principal ou acessório.

Segundo (majoritário): Critério funcional. Principal é aquilo que atribui função ao todo, e o acessório atinge a

sua finalidade enquanto àquele se vincula.

O Código Civil apresenta norma que adota o critério econômico. Veja-se a chamada acessão invertida:

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito à indenização.

Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou adquirirá a propriedade do solo mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.

São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao

serviço ou ao aformoseamento de outro (molduras de quadros, acessórios de um automóvel, máquinas de uma

fábrica). São imóveis por acesso intelectual.

As partes integrantes são acessórios que, unidos ao principal, formam com ele um todo, sendo desprovidos de

existência material própria, embora mantenham sua identidade (as lâmpadas de um lustre).

Nota!

A pertença é um acessório sobre o qual não incide o princípio da gravitação jurídica.

53 Art. 1.784 do Código Civil . 54 OLIVEIRA, J. M. Leoni Lopes de. Novo Código Civil anotado. 1. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 164. 55 Vejamos alguns exemplos na legislação: arts. 233, 364, 366 e 1.209, todos do Código Civil. 56 “Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da

destinação econômico-social.”

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Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário

resultar da lei, da manifestação de vontade ou das circunstâncias do caso. Aqui vale observar o art. 233 do Código

Civil.

Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.

Enfim, o fato de a pertença não se aplicar à gravitação jurídica não significa dizer que a pertença é principal.

Antes, fica claro que a pertença é acessória, porque ela se instrumentaliza a servir ao uso, serviço ou aformoseamento.

Não se tem na pertença uma vinculação física, porque ela não é parte integrante. O que se tem, de fato, na pertença é

uma vinculação finalística. O piano não é pertença do imóvel residencial, mas o será de um conservatório, ante as

circunstâncias do caso, uma vez que é imprescindível para que esse possa atingir sua finalidade.

Exceção à regra do art. 94 é a do art. 566 do Código Civil :

Art. 566. O locador é obrigado:

I – a entregar ao locatário a coisa alugada, com suas pertenças, em estado de servir ao uso a que se destina, e a mantê-la nesse estado, pelo tempo do contrato, salvo cláusula expressa em contrário;

Enfim, no caso específico de locação, o art. 566, I, do Código diz que há presunção do locatário em entregar as

pertenças.

Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico.

Importa mencionar que os produtos se diferenciam dos frutos justamente em razão da renovabilidade e do abalo

ao bem. Os frutos podem ser naturais e civis. Cumpre mencionar os artigos:

Art. 1.215. Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos, logo que são separados; os civis reputam-se percebidos dia por dia.

Art. 1.398. Os frutos civis, vencidos na data inicial do usufruto, pertencem ao proprietário, e ao usufrutuário os vencidos na data em que cessa o usufruto.

Art. 1.395. Quando o usufruto recai em títulos de crédito, o usufrutuário tem direito a perceber os frutos e a cobrar as respectivas dívidas.

O usufrutuário tem o dever de conservar o bem e é considerado possuidor de boa-fé. Ele se compromete a

guardar a substância da coisa; assim, a doutrina majoritária defende que o usufrutuário só pode perceber os frutos e

não os produtos, uma vez que a percepção dos produtos abalaria a própria substância do bem.

Art. 1.394. O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.

Frutos, são as utilidades que a coisa periodicamente produz, sem desfalque da sua substancia. Podem ser

naturais, ou seja, tudo aquilo que a coisa produz por si mesma, independente do esforço ou engenho humano (p.ex:

frutos de uma árvore, crias de animais); industriais, quando as utilidades provém da coisa mas com a contribuição

necessária do trabalho do homem (produção de uma fábrica); e civis, quando, por uma extensão gerada pela

capacidade humana de abstração, os rendimentos ou benefícios são tirados de uma coisa utilizada por outrem (juros,

rendimentos, dividendos – para alguns, aluguéis).

Produtos são aquelas utilidades extraídas da coisa, mas com a perda da substância desta (as pedras de uma

pedreira, os metais de uma mina, o sal de salinas). O elemento diferenciador entre frutos e produtos é a presença ou

ausência da periodicidade da reprodução.

Benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não

aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor (construção de

piscina com mármore carrara). São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem (construção de uma garagem).

São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore (reconstrução de um assoalho que

apodreceu). Deve ser observada em conjunto à regra dos arts. 504, 878, 1.219, 1.220, 1.221, 1.660, todos do Código

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Civil, pois é normal tal indagação nas provas objetivas.

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas nem o de levantar as voluptuárias.

Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao que sofreu a evicção, serão pagas pelo alienante.

Art. 505. O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.

Art. 1.660. Entram na comunhão:

IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;

Art. 1.922. Se aquele que legar um imóvel lhe ajuntar depois novas aquisições, estas, ainda que contíguas, não se compreendem no legado, salvo expressa declaração em contrário do testador.

Parágrafo único. Não se aplica o disposto neste artigo às benfeitorias necessárias, úteis ou voluptuárias feitas no prédio legado.

Art. 2.004. O valor de colação dos bens doados será aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade.

§ 2º Só o valor dos bens doados entrará em colação; não assim o das benfeitorias acrescidas, as quais pertencerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta deste os rendimentos ou lucros, assim como os danos e perdas que eles sofrerem.

Art. 878. Aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações sobrevindas à coisa dada em pagamento indevido, aplica-se o disposto neste Código sobre o possuidor de boa-fé ou de má-fé, conforme o caso.

Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.

Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os coproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço.

O que difere as acessões das benfeitorias é que aquelas podem decorrer da intervenção humana ou da natureza.

Isso fica claro, porque o art. 1.248 traz cinco incisos tratando das acessões.

Art. 1.248. A acessão pode dar-se:

I – por formação de ilhas;

II – por aluvião;

III – por avulsão;

IV – por abandono de álveo;

V – por plantações ou construções.

Nos incs. de I a IV têm-se as chamadas acessões naturais: formação de ilhas, aluvião, avulsão e o álveo

abandonado são acessões naturais, que decorrem da natureza e no inc. V as chamadas acessões artificiais que são a

plantações ou construções que decorrem da atuação humana.

Já as benfeitorias decorrem necessariamente da intervenção humana, art. 97.

Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do

proprietário, possuidor ou detentor. A acessão é o que se acresce ao solo . Em um terreno baldio, onde se constrói uma

casa, essa não é uma benfeitoria do terreno, mas, sim uma acessão, porque sobre ele não havia . Uma árvore que nasce

em um terreno é uma acessão do terreno, porque no seu lugar não havia outra.

Uma diferença básica entre as benfeitorias e as construções é que aquelas melhoramento sobre algo pré-existente,

ao passo que as construções representam a edificação de algo novo.

Dos bens públicos

São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os

outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem. Aqueles que pertencem ao domínio nacional, ou seja,

à União, aos Estados ou aos Municípios.

Espécies:

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a) os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

b) os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração

federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias (escolas públicas, secretarias, ministérios,

quartéis etc.;

c) os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito

pessoal ou real, de cada uma dessas entidades (títulos de dívida pública, estradas de ferro, telégrafos, oficinas e

fazendas do Estado; ilhas formadas em mares territoriais ou rios navegáveis; terras devolutas. Consideram-se

dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito

privado. Importante mencionar as Jornadas de Direito Civil.

Art. 41. A remissão do art. 41, parágrafo único, do Código Civil às “pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado”, diz respeito às fundações públicas e aos entes de fiscalização do exercício profissional (Enunciado n. 141 da III Jornada de Direito Civil do CJF).

Tal enunciado se refere aos conselhos profissionais e às fundações públicas.

Nota!

Art. 98. O critério da classificação de bens indicado no art. 98 do Código Civil não exaure a enumeração dos bens públicos, podendo ainda ser classificado como tal o bem pertencente à pessoa jurídica de direito privado que esteja afetado à prestação de serviços públicos (Enunciado n. 287 da IV Jornada de Direito Civil do CJF).

Diante do enunciado acima, pode-se informar que um bem de direito privado pode ser equiparado ao status de

bem público se ele estiver afetado, destinado a uma finalidade social com os efeitos práticos daí decorrentes:

impenhorabilidade, impossibilidade de usucapião e, assim, sucessivamente.

Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis57

enquanto conservarem a sua

qualificação, na forma que a lei determinar. Tal inalienabilidade poderá ser revogada desde que: a) o seja mediante lei

especial; b) tenham tais bens perdido sua utilidade ou necessidade, não mais conservando sua qualificação; c) a entidade

pública os aliene em hasta pública ou por meio de concorrência administrativa.

Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei, daí por que esses recebem o

nome de bens patrimoniais disponíveis ou de bens do patrimônio fiscal.

Tanto o Código Civil em seu art. 10258

como a Constituição Federal, em seu arts. 183 e 19159

vetam a aquisição

de bens públicos por meio da usucapião.60

Neste sentido o STF:

Súmula n. 340. Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.

O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela

entidade a cuja administração pertencerem.61

57 Administrativo. Imóvel funcional. Servidor civil. Direito de aquisição. Lei n. 8.025/1990 e Decreto n. 99.266/90. Setor militar urbano.

Uso especial. Inalienabilidade. Os servidores públicos civis dos Ministérios militares têm direito à aquisição de imóveis funcionais situados no Distrito Federal e de propriedade da União, se atendidos os requisitos da legislação pertinente. Súmula n. 103/STJ. Os imóveis situados no Setor Militar Urbano, porque destinados a uso especial, não se incluem entre os alienáveis. Precedente. Segurança denegada (MS n. 5.900/DF, rel. Ministro Felix Fischer, Seção III, j. em 10.02.1999, DJ, 12.04.1999, p. 93).

58 “Art. 102 do Código Civil. Os bens públicos não estão sujeitos à usucapião.” 59 “Art. 183 da Constituição Federal, de 1988. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados,

por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 3º – Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.”

“Art. 191, CF/88. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.”

60 STJ REsp n. 481.959/RS. 61 Art. 103 do Código Civil de 2002.

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A regra geral é o seu uso gratuito, dado que são destinados ao serviço do povo ou da comunidade, que, para

tanto, paga impostos. Todavia, não perderão a natureza de bens públicos se leis ou regulamentos administrativos

condicionarem ou restringirem o seu uso a certos requisitos ou mesmo se instituírem pagamento de retribuição. Por

exemplo, pedágio nas estradas, venda de ingresso em museus, para contribuir para sua conservação ou custeio.62

FATOS JURÍDICOS, ATO JURÍDICO, NEGÓCIO JURÍDICO

A doutrina mais atual trabalha com a conceituação de fato jurídico e como modalidade deste, o negócio jurídico.

Apenas importa ao Direito o fato que tenha repercussão jurídica. Ou seja, todos nós, membros de uma comunidade, podemos diariamente praticar atos que não são necessariamente fatos jurídicos, como por exemplo o ato de cumprimentar um vizinho com o qual nos deparamos à porta do elevador.

Não há norma jurídica que obrigue alguém a cumprimentar seu vizinho. E se o indivíduo não o fizer, ele estará descumprindo tão somente uma regra moral, sem consequência jurídica. Essa sua falta pertence ao mundo fático. Não há importância para o Direito.

No entanto, se além de não o cumprimentar, o indivíduo fecha a porta do elevador à frente de seu vizinho, tocando-lhe e ferindo-lhe o corpo ou parte dele, esse ato passa a ter consequências jurídicas. Constitui-se ato jurídico ilícito.

O fato jurídico tem definição abrangente e se refere a qualquer tipo de acontecimento capaz de criar, modificar, conservar ou extinguir a relação jurídica.63

Verbi gratia, nascimento de uma pessoa, confecção de algo, a maioridade, a morte etc.

Podem ser:

a) Involuntários (naturais): fatos jurídicos em sentido estrito. Ocorrem independentemente da vontade do ser humano. Ocorrem pela ação da natureza (a morte, uma inundação, o nascimento etc.);

b) Voluntários (humanos): atos jurídicos em sentido amplo. Derivam da vontade direta do ser humano e podem ser:

b.1) Lícitos: quando produzem efeitos legais, conforme a vontade de quem os pratica (casamento, contrato de compra e venda);

b.2) Ilícitos: quando produzem efeitos legais contrários à Lei (o homicídio, o roubo, a agressão etc.).

O fato jurídico divide-se em fato jurídico stricto sensu e em ato jurídico lato sensu. Como exemplo dos primeiros, temos os fatos exclusivamente naturais que geram ou podem gerar consequências jurídicas, como uma avalanche de terra que abalroa um automóvel; a queda de uma árvore sobre a residência de uma pessoa; o alagamento das margens de um rio causando prejuízos aos ribeirinhos etc. Esta categoria é justamente a dos fatos jurídicos involuntários (letra “a” acima).

Os atos jurídicos lato sensu são atos praticados pelo agente, volitivamente, ou seja, com vontade de praticar. Ele se subdivide entre ato lícito e ato ilícito (classificações acima “b1” e “b2”).

62 SILVA, Regina Beatriz Tavares da (coord.). Código Civil Comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 103. 63 NADER, Paulo. Ibidem.

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O ato jurídico lícito divide-se em duas categorias: o ato jurídico stricto sensu (efeitos ex lege, ou seja necessários. Exemplo: fixação de domicílio) e o negócio jurídico (efeitos ex voluntate, ou seja, desejados pelas partes. Exemplo: Casamento). Como exemplo do primeiro tem-se a construção de uma casa, por um agente capaz. O agente é o sujeito ativo da relação que com a construção adquiriu o direito de propriedade. O sujeito passivo da relação é a coletividade que é obrigada a respeitar o direito de propriedade do agente. O nascimento e a morte, sem a mensuração de seus efeitos quanto a direitos de terceiros ou da parentela, são atos jurídicos stricto sensu, ou seja, pelos simples fato de ocorrerem se bastam a si próprios.

O negócio jurídico é uma declaração de vontade do indivíduo tendente a um fim protegido pelo ordenamento jurídico.64 No negócio jurídico há a manifestação de vontade dos contratantes. Além disso, alguns negócios jurídicos requerem, além da declaração, uma ação material posterior, como por exemplo, na compra e venda de um bem móvel, onde além de os contratantes declararem que querem celebrar a compra e venda, há a posterior tradição do bem. Sem a tradição, o negócio não se aperfeiçoa.

Em regra, o negócio jurídico envolve pelo menos a declaração de vontade de duas ou mais partes, mas pode haver negócio jurídico onde existe apenas a declaração de vontade de uma parte.

Assim, o negócio jurídico poder ser:

a) Unilateral: se existe apenas a manifestação de vontade de um agente (declaração de nascimento de filho).

b) Bilateral: se existe a manifestação da vontade de dois agentes, criando entre eles uma relação jurídica (contrato de compra e venda). Nesse caso, o Ato Jurídico passa a se chamar Negócio Jurídico (todos os contratos, o empréstimo pessoal etc.).

c) Plurilateral: duas ou mais partes, com interesses coincidentes no plano jurídico. Exemplos: Contrato de consórcio e o contrato de sociedade entre várias pessoas.

d) Gratuitos: atos que envolvem liberalidade. Exemplo: Doação pura.

e)Onerosos: pautados por sacrifícios e vantagens. Exemplo: Compra e Venda.

f) Neutros: sem atribuição patrimonial. Exemplo: Instutição do bem de família voluntário.

g) Bifrontes: dependentes de vontade, podem ser gratuitos ou oneros. Exemplo: Depósito.

h)Inter vivos: durante a vida. Exemplo: Casamento.

i) Mortis Causa: Os efeitos ocorrem após a morte. Exemplos:Testamento e Legado.

j) Formais ou solenes: obedecem madamento legal. Exemplo: Casamento.

l) Informais e não solenes: a forma nestes é livre, cito o art. 107.

m) Impessoais: não dependem de condição especial. Exemplo: Compra e Venda.

n) Personalíssimos ou Intuitu Personae: vinculados a uma condição especial. Exemplo: A contratação de um pintor famoso.

o) Causais: o motivo está expresso no conteúdo. Exemplo: Divórcio.

p) Abstratos: o motivo não consta no contrato. Exemplo; A emissão de um título de crédito.

q) Consensuais: formados pelo consenso. Cito a leitura do art. 482 CC.

r) Reais: aquele que se perfaz com a entrega do bem. Exemplo: Comodato, Mútuo.

s) Constitutivos: os efeitos são da conclusão para frente, ou seja, ex nunc. Exemplo: Compra e Venda.

t) Declarativos: aqui os efeitos são ex tunc, ou seja, retroativos. Exemplo: Partilha de bens no inventário.

Validade do negócio jurídico

64 RUGGIERO, Roberto de. Apud NADER, Paulo. Ibidem.

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A falta de algum elemento substancial do negócio jurídico torna-o nulo (nulidade absoluta) ou anulável (nulidade relativa). A diferença entre o nulo e o anulável é uma diferença de grau ou gravidade, a critério da lei.

A nulidade absoluta pode ser arguida a qualquer tempo por qualquer pessoa, pelo Ministério Público e pelo Juiz, inclusive, não se admitindo convalidação nem ratificação.

A nulidade relativa, ao contrário, só pode ser arguida dentro do prazo previsto (4 anos, em regra) – somente pelos interessados diretos, admitindo convalidação e ratificação.

Negócio Jurídico inexistente é o ato que contém um grau tão elevado de nulidade e esta é tão notória que dispensa ação judicial para ser declarado sem efeito (negócio realizado sob coação física). Na verdade nunca chegou a ser ato jurídico. Exemplo: casamento de pessoas do mesmo sexo.

Negócio Jurídico ineficaz é o ato é válido e produz efeitos. Só que apenas entre as partes. Não produz efeitos perante terceiros. Quando o ato não produz efeitos em relação a certa pessoa, diz-se que a ineficácia é relativa; quando não produz efeitos perante todas as outras pessoas diz-se que a ineficácia é absoluta.

6.1.2. Elementos essenciais do negócio jurídico

a) agente capaz: o agente deve estar apto a praticar os atos da vida civil. Os absolutamente incapazes devem ser representados e os relativamente incapazes devem ser assistidos;

b) objeto lícito, possível, determinado ou determinável: o objeto do Ato Jurídico deve ser permitido pelo direito e possível de ser efetivado;

c) forma prescrita ou não defesa em lei: a forma dos Atos Jurídicos tem que ser a prevista em Lei, se houver esta previsão, ou não proibida.

Sabe- se que o negócio jurídico tem três planos, que fixam a sua estrutura:

a) plano de existência: plano do “ser”.

b) plano da validade: aqui devem ser observadas eventuais falhas. O plano do “dever ser”.

c) plano da eficácia: produção de efeitos.

Em tese, um Negócio Jurídico pode existir e não ser válido. Verbi gratia, contrato firmado por pessoa absolutamente incapaz; aqui, o negócio existe porque foi firmado por uma pessoa, mas é inválido, porquanto a parte não possui capacidade de exercício de sua vontade. Por outro lado, um Negócio Jurídico pode existir e ser válido, mas não ser eficaz, v.g., testamento revogado antes do falecimento do testador.

A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio nem aproveita aos cointeressados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum. Por ser ela uma exceção pessoal, somente poderá ser formulada pelo próprio incapaz ou pelo seu representante. Como a anulabilidade do ato negocial praticado por relativamente incapaz é um beneficio legal para a defesa de seu patrimônio contra abusos de outrem, apenas o próprio incapaz ou seu representante legal deverá invocá-lo.

Ocorrendo a impossibilidade inicial do objeto não será invalidado o Negócio Jurídico se for relativa, ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver subordinado, isto é, se a prestação puder ser realizada por outrem, embora não o seja pelo devedor, não haverá invalidade do Negócio Jurídico (aplicação do princípio da conservação do negócio jurídico). Se o Negócio Jurídico contendo objeto impossível, tiver sua eficácia subordinada a um evento futuro e incerto, e aquela impossibilidade cessar antes de realizada aquela condição, válida será a avença.

Pelo princípio da forma livre, a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, o

que significa que a declaração da vontade só dependerá de forma determinada quando a norma jurídica

explicitamente o exigir

Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à

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constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Nesses casos quando for exigido que o negócio seja praticado por escritura pública, a procuração também deve ser dada por escritura pública.

No Negócio Jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, esse é da substância do ato.

A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento. Conceituando a reserva mental pode-se afirmar que é a emissão de uma intencional declaração não querida em seu conteúdo nem tampouco em seu resultado, pois o declarante tem por único objetivo enganar o recipiente. Se, além de enganar, houver intenção de prejudicar, ter-se-á vício social similar à simulação, ensejando nulidade do ato negocial. É uma declaração sem a vontade correspondente. São seus elementos:

a) uma declaração não querida em seu conteúdo;

b) propósito de enganar o declaratório.

Sua natureza jurídica é de Negócio Jurídico inexistente.

O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a

declaração de vontade expressa. O ditado “quem cala consente” não possui juridicidade, ou seja, o

silêncio apenas terá valor jurídico se a lei o determinar, bem como, se acompanhado de certas

circunstâncias, usos e costumes. Destaca-se, de que quando o silencio for intencionalmente empregado,

visando a prejudicialidade da outra parte e esta se soubesse da real intenção, haverá anulabilidade

Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. A interpretação do Negócio Jurídico deve se ater à vontade das partes, procurando suas consequências jurídicas sem se vincular estritamente, ao teor linguístico do ato negocial (percebe-se a mitigação da pacta sunt servanda). Diante da Teoria subjetiva da interpretação dos negócios jurídicos o que importa é a vontade real e não a declarada.

Elementos acidentais: condição, termo e encargo

6.3.1. Condição

Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o

efeito do Negócio Jurídico a evento futuro e incerto.65

Pode a condição ser suspensiva66

ou resolutiva.67

A primeira é aquela que, enquanto não se verificar, o

Negócio Jurídico não gera efeitos (Venda a contento). Se alguém dispuser de uma coisa sob condição

suspensiva, e, pendente esta, fizer quanto àquelas novas disposições, essas não terão valor, realizada a

condição, se com ela forem incompatíveis. A segunda é aquela que, enquanto não se verificar, não vai haver

qualquer consequência para o negócio jurídico (Venda com reserva de domínio). Se for resolutiva a

condição, enquanto ela se não realizar, vigorará o Negócio Jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão

65 Art. 121 do Código Civil. 66 “Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o

direito, a que ele visa.” 67 “Art. 127. Se for resolutiva a condição, enquanto esta se não realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão

deste o direito por ele estabelecido.”

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desse o direito por ele estabelecido. Sobrevindo a condição resolutiva, extingue-se, para todos os efeitos, o

direito a que ela se opõe; mas, se aposta a um negócio de execução continuada ou periódica, a sua

realização, salvo disposição em contrário, não tem eficácia quanto aos atos já praticados, desde que

compatíveis com a natureza da condição pendente e conforme aos ditames de boa-fé.68

Termo

Termo é a cláusula que subordina os efeitos do ato negocial a um acontecimento futuro e certo.

Decorre de acordo das partes ou da lei.

Encargo ou modo

O encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito, salvo quando expressamente imposto

no Negócio Jurídico, pelo disponente, como condição suspensiva.69

Trata-se de cláusula acessória aderente

a atos de liberalidade inter vivos (doação) ou causa mortis (testamento ou legado).

Dos vícios de consentimento

Erro

Quando o agente, por desconhecimento ou falso conhecimento das circunstâncias, age de modo que não

seria sua vontade, se conhecesse a verdadeira situação, diz-se que se procede em erro.70

Para viciar a vontade e anular o ato negocial, esse deverá ser substancial, escusável e real.71

O erro substancial é erro de fato por recair sobre as qualidades essenciais da pessoa ou da coisa. Poderá abranger o erro de direito (art. 139, III, do Código Civil), relativo à existência de uma norma jurídica dispositiva, desde que afete a manifestação da vontade, caso em que viciará o consentimento. Será escusável, no sentido de que há de ter por fundamento uma razão plausível ou ser de tal monta que qualquer pessoa de atenção ordinária seja capaz de cometê-lo em face da circunstância do negócio. Real, por importar efetivo dano para o interessado.

Dolo

É o artifício empregado pelo agente para enganar outra pessoa. O agente emprega artifício para levar

alguém a prática de um ato que o prejudica, sendo por ele beneficiado ou mesmo beneficiando um terceiro

(dolo principal ou dolus causam dans

Perceba-se que existe um ato de indução, ou seja, uma provocação intencional; por essa razão pode-se afirmar que o dolo difere do erro, em razão da espontaneidade deste. De forma contrária Carvalho dos Santos entende que

68 Art. 128 do Código Civil. 69 Art. 136 do Código Civil. 70 “Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser

percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.” 71 Art. 139 do Código Civil.

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prejuízo não é elemento conceitual do dolo, sendo suficiente que o artifício seja utilizado de má-fé por outrem que seja capaz de sugerir a prática de um ato que sem esse expediente, não se realizaria da forma como o foi.72

Trata-se de vício anulável em quatro anos decadenciais segundo o art. 171, II e art. 178 do Código Civil.

Todo dolo conduz à anulabilidade? Não! O dolo acidental (dolo incidens) só obriga a satisfação de perdas e danos, sendo acidental quando a seu despeito; o negócio seria realizado, embora por outro modo. Nessa modalidade observa-se um elemento desimportante, secundário e, por isso, não seria anulável. Modalidades de dolo:

• Dolo Bom (dolo inocente ou dolus bonus) – empregado para beneficiar o autor do ato, são exageros aceitos não sendo este anulável, chamamos tal fato de Puffing (exagero publicitário).73 Destaca-se que o Puffing, a princípio não vincula o fornecedor a cumprir com a oferta, pois no mesmo falta precisão, porém quando relacionado o preço, em regra, ocorre vinculação. Exemplo: O melhor preço da região.

• Dolo Mau (dolus malus) – que prejudica o autor do ato,é passível de anulação. O dolo mau ou dolo grave pressupõe: prejuízo para o autor do ato; benefício para o autor do dolo ou terceiro. Pode ser praticado pelo silêncio, ou quando agente altera a aparência externa da coisa.

• Dolo Essencial – aquele que incide sobre elementos decisivos à celebração do contrato. Então, como o dolo nesse caso incide sobre elementos decisivos, sobre elementos determinantes, sem dúvida o dolo essencial vai gerar vício de consentimento.

• Dolo por omissão – é o silêncio intencional que fere a boa-fé objetiva, configurando-se uma violação positiva do negócio jurídico.74 Trata-se da chamada violação positiva do contrato ou adimplementum ruim, que nada mais é do que uma nova modalidade de inadimplemento. Entende-se aqui que se aplica a regra dos Enunciados n. 24 e n. 37 da I Jornada do CJF, ou seja, havendo dolo por omissão a responsabilidade irá independer de culpa.75-76

72 CC/16 Interpretado. V. II, art. 92, n. 5, p. 329. 73 RHC. Penal. Infração penal. Ilicitude. Perigo. Comércio. Concorrência. A infração penal, além da conduta, reclama resultado (dano ou

perigo de dano ao objeto jurídico). Além disso, ilicitude do comportamento do agente. quando o legislador define o ilícito penal, significa postura axiológica negativa referente à conduta descrita. a concorrência é própria do regime de economia de mercado.

A disputa entre empresas é consequência natural. O exagero é tônica dos anúncios comerciais e industriais. Nenhuma censura, inexistindo desvirtuamento da qualidade da coisa ou prestação de serviços. Os romanos, há séculos, divisaram o dolus bonus. A fantasia não se confunde com a fraude. O perigo (próprio do resultado) deve ser concreto, ou seja, ensejar probabilidade (não mera possibilidade) de dano (RHC n. 3.831/RJ, rel. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, j. em 13.09.1994, DJ, 28.11.1994, p. 32.641).

74 Art. 147 do Código Civil. 75 “Art. 422. Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie

de inadimplemento, independentemente de culpa” (Enunciado n. 24 da I Jornada do CJF). “Art. 187. A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-

finalístico” (Enunciado n. 37 da I Jornada do CJF). 76 Agravo regimental. Agravo de instrumento. Anulação de negócio jurídico por dolo. Falta de argumentos novos. Mantida a decisão

anterior. Matéria já pacificada nesta corte. Incidência da Súmula n. 83. I – Não tendo a parte apresentado argumentos novos capazes de alterar o julgamento anterior, deve-se manter a decisão recorrida. II – retendida a rescisão do contrato por omissão dolosa do vendedor do imóvel, que escondeu a existência informação relevante em curso na época da transação (silêncio intencional art. 147 do Código Civil), o ato jurídico é anulável, incidindo quanto à prescrição o art. 178, § 9º, V, b, do Código Civil, de 1916. Incidência da Súmula n. 83/STJ. Agravo improvido (AgRg no Ag n. 783.491/RJ, rel. Ministro Sidnei Beneti, 3ª Turma, j. em 20.11.2008, DJe, 12.12.2008).

Processual Civil. Civil. Recurso Especial. Prequestionamento.Publicidade enganosa por omissão. Aquisição de refrigerantes com tampinhas premiáveis. Defeitos de impressão. Informação não divulgada. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Dissídio jurisprudencial. Comprovação. Omissão. Inexistência. Embargos de declaração. Responsabilidade solidária por publicidade enganosa.

Reexame fático-probatório. O Recurso Especial carece do necessário prequestionamento quando o aresto recorrido não versa sobre a questão federal suscitada. Há relação de consumo entre o adquirente de refrigerante cujas tampinhas contêm impressões gráficas que dão direito a concorrer a prêmios, e o fornecedor do produto. A ausência de informação sobre a existência de tampinhas com defeito na impressão, capaz de retirar o direito ao prêmio, configura-se como publicidade enganosa por omissão, regida pelo Código de Defesa do Consumidor. A comprovação do dissídio jurisprudencial exige o cotejo analítico entre os julgados tidos como divergentes e a similitude fática entre os casos confrontados. Inexiste omissão a ser suprida por meio de embargos de declaração quando o órgão julgador pronuncia-se sobre toda a questão posta à desate, de maneira fundamentada. É solidária a responsabilidade entre aqueles que

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• Dolo de terceiro: Será anulável o ato negocial somente no caso de conhecimento por uma das partes.77

Dolo do representante legal ou convencional: O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos.78

• Dolo recíproco: Ambos os contratantes se valem de meios artificiosos na busca de benefícios. Também pode ser chamado de dolo bilateral, em razão de estar maculado pela má-fé; a lei não tolera o mesmo não sendo cabível a anulabilidade, bem como, pedido de indenização.79

Coação

É a pressão psicológica ou ameaça exercida sobre alguém para obrigá-lo a praticar determinado ato. Para que a coação vicie o ato é necessário que se incuta medo de dano à pessoa do coagido, à sua família ou a seus bens e que o dano objeto da ameaça seja providência física ou moral. A vítima da coação não expressa a sua verdadeira vontade, cujas rédeas foram tomadas pelo coator em função da grave ameaça perpetrada. Se a vontade, elemento nuclear do negócio jurídico, não revela a intenção do declarante, surgindo de um fio condutor ilegal, o ordenamento jurídico decreta a sua invalidade.80 Se disser respeito à pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.81 Importante mencionar, que a coação física (constrangimento corporal) é causa de inexistência de Negócio Jurídico em razão de total ausência de vontade. No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela. Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial.82 O temor reverencial por si só não constitui uma coação, pois o mesmo é estimável, e convém que uma pessoa aceda a vontade daquela que a ordem social entende que deve guiar. Se o temor reverencial ultrapassa, porém, os limites, dentro dos quais deve estar contido, a ponto de criar-se uma outra razão de coação, então o ato é anulável, como, por exemplo, se o pai sai ao filho: se não te casares, tiro-te a mesada.83

Estado de perigo

veiculam publicidade enganosa e os que dela se aproveitam, na comercialização de seu produto. É inviável o reexame fático-probatório em sede de Recurso Especial. Recursos Especiais conhecidos parcialmente e não providos (REsp n. 327.257/SP, rel.ª Ministra Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. em 22.06.2004, DJ, 16.11.2004, p. 272).

77 Art. 148 do Código Civil. 78 Art. 149 do Código Civil. 79 “Art. 150 do Código Civil. Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar

indenização.” 80 OLIVEIRA, James Eduardo. Código Civil comentado e anotado. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 134. 81 Art. 151, parágrafo único, Código Civil. 82 Art. 153 do Código Civil. 83 DANTAS, San Tiago. Programa de direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Rio, p. 295.

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No estado de perigo, há temor de grave dano moral ou material à própria pessoa, ou a parente seu,

que compele o declarante a concluir contrato, mediante prestação exorbitante.84

A pessoa natural premida

pela necessidade de salvar-se a si própria, ou a um familiar seu, de algum mal conhecido pelo outro

contratante, vem a assumir obrigação demasiadamente onerosa.

Da lesão

Vício decorrente do abuso praticado em situação de desigualdade de um dos contratantes, por estar sob premente necessidade, ou por inexperiência, visando a protegê-lo.85 Ante o prejuízo sofrido na conclusão do contrato, devido à desproporção existente entre as prestações das duas partes, dispensando-se a verificação do dolo ou má-fé da parte que se aproveitou. Neste sentido a III Jornada de Direito Civil:

Art. 157: A lesão de que trata o art. 157 do Código Civil não exige dolo de aproveitamento (Enunciado n. 150).

A desproporção das prestações, ocorrendo lesão, deverá ser apreciada segundo os valores vigentes ao tempo da celebração do negócio jurídico pela técnica pericial e avaliada pelo magistrado. Se a desproporcionalidade for superveniente à formação do negócio, será juridicamente irrelevante.

A lesão (causa concomitante) inclui-se entre os vícios de consentimento e acarretará a anulabilidade do

negócio, permitindo-se, porém, para evitá-la, a oferta de suplemento suficiente, ou, se o favorecido

concordar, a redução da vantagem, aproveitando, assim, o negócio.86

Fraude contra credores

Segundo a lei: “Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos. Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente. Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles.”87 Neste vício a vítima não participa do ato, mas sofre suas conseqüências.

Vislumbra-se prática maliciosa, realizada pelo devedor, de atos que desfalcam seu patrimônio, com o fim de colocá-lo a salvo de uma execução por dívidas em detrimento dos direitos creditórios alheios. Dois são seus elementos: o objetivo (eventus damni), que é todo ato prejudicial ao credor, por tornar o devedor insolvente ou por ter sido realizado em estado de insolvência,88 ainda quando o ignore ou ante o fato de a garantia tornar-se insuficiente; e o subjetivo (consilium fraudis), que é a má-fé, a intenção de prejudicar do devedor ou do devedor aliado a terceiro, ilidindo os efeitos da cobrança.

A fraude contra credores, que vicia o ‘negócio’ de simples anulabilidade,somente é atacável por ação pauliana ou revocatória, movida pelos credores quirografários (sem garantia suficientes para resguardar o crédito), que já o eram ao tempo da prática desse ato fraudulento que se pretende invalidar. O credor com garantia real (penhor, hipoteca ou anticrese) para o ajuizamento da ação pauliana prescinde de prévio reconhecimento judicial da insuficiência da garantia.89

84 “Art. 156 do Código Civil. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua

família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Parágrafo único. Tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias.” 85 Art. 157, Código Civil. 86 Art. 157, § 2º, Código Civil. 87 Art. 158 do Código Civil. 88 Art. 748 do Código de Processo Civil. 89 Enunciado n. 151 da III Jornada de Direito Civil.

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A ação pauliana é uma ação de natureza pessoal e por esse motivo independe de outorga conjugal

para seu exercício.

Simulação

Consiste na declaração enganosa da vontade, visando obter resultado diverso do que aparece, para iludir

terceiros, ou burlar a lei. Na simulação existe um conluio entre declarante e declaratário, denominado

pactum simulationis. Em suma: o que existe é uma declaração de vontade mentirosa. São seus requisitos:

a) divergência intencional entre a vontade real e a exteriorizada; b) acordo simulatório entre as partes; c)

o objetivo de prejudicar terceiros.

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. PODER JUDICIÁRIO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TERCEIRA

CÂMARA CÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 48099077140 - SERRA - 4ª VARA CÍVEL.

TJES. Simulação. Art. 167 do CC/2002. Quando ocorre. Há simulação quando as partes emitem,

conjuntamente, uma declaração enganosa de vontade com intenção de enganar terceiros. "(...) na simulação

há um descompasso, um desencontro, entre a declaração de vontade e o verdadeiro resultado objetivado

pelas partes". (FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direito Civil. Teoria Geral. 7ª ed.

2008. p. 459)

Quadro da invalidade

NULIDADE ABSOLUTA

NULIDADE RELATIVA

• Atinge o interesse público. Decreta-se com fundamento em interesses da coletividade.

• Atinge interesses particulares

• Opera-se de pleno direito

• não opera de pleno direito

• são legitimados para requerer a sua nulidade: qualquer interessado, o MP nos termos do art. 82 do Código de Processo Civil.

• são legitimados somente os interessados (lesados)

• Não admite conformação, ou seja, não pode ser sanada, mesmo pelo magistrado.

• admitem confirmação expressa e tácita

• Deve ser pronunciada de ofício

• Só pode ser arguida pelas partes interessadas. Não se opera antes de julgada por sentença.

A sentença declaratória de nulidade produz efeitos ex tunc

a sentença desconstitutiva produz efeitos ex nunc. Seus efeitos somente ocorrem inter partes.

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Não se sujeita aos prazos prescricionais e decadenciais, pois a ação declaratória de nulidade é imprescritível.

a via correta é a judicial, em prazos decadenciais de dois (art. 179) ou de quatro anos (art. 178). Ação anulatória cuja a natureza é desconstitutiva.

PRESCRIÇÃO x DECADÊNCIA

PRESCRIÇÃO

DECADÊNCIA

DIREITOS

Extingue a pretensão (encobrimento da pretensão)

Extingue o próprio direito potestativo em razão do não exercício. Prejudica todas as ações constitutivas

DECRETAÇÃO

Deve ser declarada de ofício pelo juiz (Lei n. 11.280/06), em qualquer fase processual.

Decadência legal deve ser reconhecida de ofício pelo juiz, o que não ocorre com a decadência convencional. Na convencional a parte que alega pode se valer em qualquer grau de jurisdição

FUNCIONAMENTO

É sujeita à interrupção, suspensão e impedimento. Atenção! Não corre contra todos (arts. 197 e 198 CC)

Não se interrompe nem se suspende, salvo disposição legal. Atenção! Corre contra todos, salvo absolutamente incapazes (art.208 CC)

PRAZOS

Somente em prazos da lei. Prazo geral 10 anos – art. 205 do Código Civil

Tem prazos legais e convencionais

INCIDÊNCIA

Incide nas ações onde se exige uma prestação

Incide nas ações em que se visa à modificação de uma situação jurídica

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ABRANGÊNCIA

Abrange todas as ações condenatórias e somente elas Abrange direitos patrimoniais (em regra)

Abrange as ações constitutivas que tem prazo especial de exercício fixado em lei

NASCIMENTO

Nasce quando o direito é violado. Lesão. Refere-se a direitos prestacionais.

Nasce junto com o direito

ORIGEM

Tem origem na lei. Prazos contados em anos.

Tem origem na lei e no ato jurídico. Prazos contados em dias meses e anos.

EXTINÇÃO

O devedor pode renunciá-la após a consumação

A decadência legal não pode ser renunciada em qualquer hipótese A decadência convencional pode ser renunciada após a consumação

Bons estudos!

Cristiano Sobral

www.professorcristianosobral.com.br