carboidratos

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CARBOIDRATOS Os carboidratos constituem mais de 90% da matéria seca das plantas e, por isso, são abundantes, amplamente disponíveis e de baixo custo. Os carboidratos são componentes frequentes dos alimentos, tanto naturalmente como adicionados como ingredientes e são consumidos em grande quantidade. Eles são passíveis de modificações químicas, que são empregadas comercialmente no melhoramento de suas propriedades. Sua determinação nos alimentos é importante porque eles têm várias funções: 1. Nutricional; 2. Adoçantes naturais; 3. Matéria-prima para produtos fermentados; 4. Principal ingrediente dos cereais; 5. Propriedades reológicas da maioria dos alimentos de origem vegetal (polissacarídeos); 6. Responsáveis pela reação de escurecimento em muitos alimentos. Pela grande dificuldade na determinação de carboidratos de um alimento, o seu conteúdo nos alimentos tem sido dado pela diferença, ou seja, a porcentagem de água, proteínas, gordura e cinzas subtraída de 100. A D-glicose (composto orgânico mais abundante na natureza), a D- frutose e seus oligômeros e polímeros, como o amido, a lactose e a sacarose, são fontes de energia, suprindo cerca de 70 a 80% das necessidades calóricas da dieta humana, no mundo inteiro. O termo carboidrato sugere uma composição elementar C x (H 2 O) x , como se fossem carbonos hidratados, ou seja, os átomos de carbono estariam na mesma proporção que as moléculas de água, mas a maioria dos carboidratos naturais produzidos nos organismos vivos não apresenta essa fórmula empírica, apresentando-se como oligômeros (oligossacarídeos) ou polímeros (polissacarídeos) de açúcares simples (monossacarídeos). A ocorrência dos

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Page 1: Carboidratos

CARBOIDRATOS

Os carboidratos constituem mais de 90% da matéria seca das plantas e, por

isso, são abundantes, amplamente disponíveis e de baixo custo. Os carboidratos são

componentes frequentes dos alimentos, tanto naturalmente como adicionados como

ingredientes e são consumidos em grande quantidade. Eles são passíveis de

modificações químicas, que são empregadas comercialmente no melhoramento de

suas propriedades.

Sua determinação nos alimentos é importante porque eles têm várias funções:

1.Nutricional;

2.Adoçantes naturais;

3.Matéria-prima para produtos fermentados;

4.Principal ingrediente dos cereais;

5.Propriedades reológicas da maioria dos alimentos de origem vegetal

(polissacarídeos);

6.Responsáveis pela reação de escurecimento em muitos alimentos.

Pela grande dificuldade na determinação de carboidratos de um alimento, o seu

conteúdo nos alimentos tem sido dado pela diferença, ou seja, a porcentagem de

água, proteínas, gordura e cinzas subtraída de 100.

A D-glicose (composto orgânico mais abundante na natureza), a D-frutose e

seus oligômeros e polímeros, como o amido, a lactose e a sacarose, são fontes de

energia, suprindo cerca de 70 a 80% das necessidades calóricas da dieta humana, no

mundo inteiro.

O termo carboidrato sugere uma composição elementar Cx(H2O)x, como se

fossem carbonos hidratados, ou seja, os átomos de carbono estariam na mesma

proporção que as moléculas de água, mas a maioria dos carboidratos naturais

produzidos nos organismos vivos não apresenta essa fórmula empírica, apresentando-

se como oligômeros (oligossacarídeos) ou polímeros (polissacarídeos) de açúcares

simples (monossacarídeos). A ocorrência dos açúcares simples é baixa e a origem

destes costuma ser a despolimerização natural dos polissacarídeos.

Monossacarídeos

Açúcares simples, ou seja, que por hidrólise não são capazes de gerar outras

unidades de açúcar são denominados monossacarídeos, como no caso da glicose.

Basicamente, um açúcar ou carboidrato apresenta ao menos um carbono quiral ligado

numa estrutura orgânica com função aldeído ou cetona e poliol, ou seja, apresenta

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função química de polihidróxialdeído ou polihidróxicetona. O açúcar mais simples é o

gliceraldeído, cuja estrutura é apresentada abaixo:

CH2OH-*CHOH-COH

*carbono quiral

O gliceraldeído, que apresenta apenas um carbono quiral, possui apenas dois

isômeros ópticos (2n), o D-gliceraldeído e o L-gliceraldeído.

Os açúcares simples (monossacarídeos) mais abundantes são as hexoses (ose é

um sufixo que significa açúcar), seguido pelas pentoses. A ocorrência natural indica

que existem monossacarídeos com 3 a 9 carbonos.

A glicose é uma aldohexose (aldo que significa função aldeído) e a frutose é

uma cetohexose (ceto que significa função cetona). A glicose apresenta 4 carbonos

quirais e, portanto, 16 isômeros ópticos. A frutose apresenta 3 carbonos quirais e,

portanto, 8 isômeros ópticos. As formas abertas (acíclicas) da D-glicose, L-glicose, D-

frutose e L-frutose são apresentadas abaixo:

D-glicose L-glicose D-frutose L-

frutose

Os açúcares da forma D são mais abundantes na natureza e, por esse motivo,

configuram-se como a principal fonte energética alimentar. Os açúcares da forma L

são menos numerosos, mas desempenham funções bioquímicas importantes, como a

L-ribose (usado na síntese do RNA) e a desoxiribose (usado na síntese do DNA).

Page 3: Carboidratos

Isomerização dos Monossacarídeos

Aldoses e cetoses com mesmo número de carbonos são isômeros de função

entre si, desse modo, podem ser interconvertidas por isomerização. Uma aldose pode

ser convertida em outra aldose e a cetose correspondente e, a cetose, pode ser

convertida nas duas aldoses correspondentes. Desse modo, por isomerização, a D-

glicose, a D-manose e a D-frutose podem ser interconvertidas.

Ciclização dos Monossacarídeos

Os grupos carbonila, tanto dos aldeídos quanto das cetonas, são reativos e, com

facilidade, sofrem ataque nucleófilo do oxigênio de um grupo hidroxila. No caso dos

monossacarídeos, essa reação entre carbonila e hidroxila, pode ocorrer dentro da

própria molécula de açúcar, ocorrendo a formação de uma estrutura cíclica.

Na glicose, a carbonila que encontra-se em C1 reage com a hidroxila do C5,

formando um ciclo semelhante ao composto Pirano. Essa ciclização dá origem à

glicose cíclica, que é chamada de glicopiranose. Na frutose, a carbonila que encontra-

se em C2 reage com a hidroxila do C5, formando um ciclo semelhante ao composto

Furano. Essa ciclização dá origem à frutose cíclica, que é chamada de frutofuranose.

A hidroxila presente em C1 da glicopiranose pode estar superior ao plano da

molécula (posição β) ou inferior ao plano da molécula (posição α). Essa posição

determina o tipo de ligação glicosídica sofrida por essas moléculas na formação de

oligo e polissacarídeos.

Ciclização da D-glicose, obtendo-se a D-glicopiranose

Page 4: Carboidratos

Ciclização da D-frutose, obtendo-se a D-frutofuranose

Escurecimento não enzimático e Caramelização

Sob determinadas condições, os monossacarídeos produzem pigmentos

marrons que são desejáveis para determinados alimentos, mas indesejáveis para

outros. Em geral, esse escurecimento ocorre sob aquecimento ou durante a

estocagem, devido a reações químicas entre o monossacarídeo (açúcar redutor),

principalmente a D-glicose, e um grupo amina primário de uma molécula de proteína.

Essa reação é conhecida como reação de Maillard ou escurecimento de Maillard. Ela

também é chamada de escurecimento não enzimático para diferenciá-la do

escurecimento catalisado por enzimas que é comum em frutas e vegetais recém-

cortados.

Essas reações ocorrem em várias etapas. Os intermediários 1-amino-1-desoxi-

D-frutose-N-substituída (Produto de Amadori) e 5-hidroximetil-2-furaldeído (HMF) já

conferem coloração amarelo escuro aos alimentos mas, é o maltol e o isomaltol,

formados a partir do HMF que conferem coloração bastante escura aos alimentos pois

os mesmos apresentam coloração de marrom a preto. O maltol e o isomaltol

contribuem, por exemplo, para a formação de sabor e aroma do pão.

Maltol Isomaltol

Se o aquecimento ocorrer sem a presença de compostos nitrogenados, ocorre a

caramelização, que também consiste na formação de uma série de produtos

intermediários que já conferem cor e sabor aos alimentos. A desidratação provoca a

Page 5: Carboidratos

formação de anéis anidros que, quando insaturados, apresentam coloração marrom. O

caramelo é bastante utilizado, tanto como caramelo na indústria de doces quanto

como aromatizante.

Sorbitol e Xilitol

O sorbitol pode ser obtido a partir da redução (hidrogenação) da D-glicose em

sua forma aberta. O nome oficial do sorbitol é D-glicitol, pois a ponta aldeídica

converte-se numa hidroxila, conferindo ao sorbitol apenas a função álcool. O sorbitol

possui baixo poder adoçante e é usado na indústria alimentícia como umectante, e é

encontrado naturalmente em algumas plantas, mas em pequenas quantidades. O

mesmo processo realizado com a D-manose gera o manitol, açúcar bastante usado em

coberturas de doces, pois apresenta alto poder de cristalização.

A D-xilose, bastante encontrada em plantas de bétula, pode ser oxidada em sua

forma cíclica gerando xilitol. Soluções aquosas de xilitol apresentam comportamento

endotérmico, o que confere a sensação de refrescância na boca, e por isso o xilitol é

usado em balas e gomas de mascar sabor menta. O poder adoçante é semelhante ao

da sacarose, mas não é cariogênico, o que evidencia ainda mais sua aplicação na

confecção de doces sem açúcar.

Xilitol

Oligossacarídeos

Os oligossacarídeos de maior interesse industrial são a maltose, a lactose e a

sacarose. As três são dissacarídeos (formado por duas estruturas de

polihidroxialdeidos ou polihidroxicetonas) e, por hidrólise, geram acúcares simples.

Dessas, apenas a lactose e a sacarose são hidrolisadas por enzimas no corpo humano.

A maltose é formada por duas estruturas de D-glicose unidas por ligação

glicosídica α-1,4, e é produzida durante a malteação dos grãos, principalmente de

cevada. Industrialmente sua obtenção ocorre através da hidrólise do amido com a

enzima β-amilase de Bacillus. É usada como adoçante brando em alimentos, pois

Page 6: Carboidratos

apresenta baixo poder adoçante ou é reduzida a alditol maltitol, que é usado como

adoçante em chocolates sem açúcar.

Maltose

A lactose é formada por uma D-galactose e uma D-glicose, unidas por ligação

glicosídica β-1,4. Constitui cerca de 4,5% do leite de vaca e 7% do leite humano e é

responsável por 40% da energia do ser humano na lactação. A intolerância à lactose é

causada pela insuficiência na enzima lactase o que gera a má absorção por falta de

hidrólise do dissacarídeo.

Lactose

A sacarose, bastante conhecida como açúcar de mesa, é formada por uma D-

glicose e uma D-frutose, unidas por ligação glicosídica α-1,2 (“cabeça-cabeça”), o que

a torna um açúcar não redutor (O poder de redução encontra-se nas extremidades -

“cabeças” - não ligadas das estruturas cíclicas). Comercialmente é obtida através da

cana de açúcar e da beterraba. Por apresentar alta solubilidade, torna possível a

obtenção de soluções muito concentradas logo, possibilita a confecção de xaropes e é

o veículo do mel. Na indústria, convenientemente, é obtida uma solução de sacarose

hidrolisada chamada de açúcar invertido, que consiste na D-glicose e na D-frutose

separadas em solução. Essa solução hidrolisada apresenta maior poder adoçante, o

que determina uma menor quantidade em seu uso em relação ao dissacarídeo

sacarose.

Page 7: Carboidratos

Sacarose

Polissacarídeos

Os polissacarídeos de maior importância são o amido, que é a principal fonte de

energia na alimentação humana, e a celulose, que é o principal constituinte das fibras

dietéticas.

O amido é um polímero formado pela mistura de dois outros polímeros. Cerca

de 25% do amido é constituído por um polissacarídeo chamado amilose e 75% por um

polissacarídeo chamado amilopectina. A amilose é formada por cadeias lineares de α-

D-glicose unidas por ligações glicosídicas α-1,4 e pequenas ramificações, que se

repetem com frequência de cerca de uma a cada 180 a 320 unidades de glicose

ligadas linearmente, ligadas na cadeia linear por ligações α-1,6. A amilopectina

também é formada por cadeias lineares de α-D-glicose unidas por ligações α-1,4, mas

apresenta maior quantidade de ramificações, que se repetem com frequência de cerca

de uma a cada 9 a 18 unidades lineares, ligadas na cadeia também por ligações α-1,6.

A digestão (hidrólise) do amido no corpo começa na boca, pela enzima amilase.

Nutricionalmente apresenta um papel muito importante pois é a principal fonte de

energia na alimentação humana e confere textura aos alimentos. Industrialmente é

comum a obtenção de amidos modificados (ésteres, éteres e fosfatos de amido), com

a finalidade de obtenção de melhores propriedades.

A celulose é um polissacarídeo linear e insolúvel formado por β-D-glicose unidas

por ligações glicosídicas β-1,4. Na cadeia bastante linear da celulose, cada unidade de

glicose está voltada para baixo em comparação com a unidade precedente, e assim

sequencialmente.

Page 8: Carboidratos

Celulose

As grandes moléculas de celulose associam-se entre si por pontes de

hidrogênio, formando maços fibrosos e por não serem digeridas (hidrolisadas) no

corpo humano, não contribuem com nutrientes nem com calorias ao passar pelo trato

digestivo. Apesar disso, apresentam um importante papel na dieta humana como fibra

dietética, aumentando o volume do conteúdo intestinal e com isso reduzindo o tempo

de trânsito intestinal, prevenindo a constipação e induzindo a saciedade. Também são

capazes de carregar moléculas de gordura, como as do colesterol, diminuindo chances

de doenças cardíacas.

Diversos derivados da celulose apresentam importância na indústria

alimentícia, como a carboximetilcelulose (sal sódico do éter carboximetílico), obtido a

partir da digestão de polpa de madeira purificada com soda cáustica (18%) e posterior

reação com sal sódico do ácido cloroacético e que é bastante utilizada como

espessante e estabilizante de alimentos. A goma guar, obtida pela moagem do

endosperma de sementes, a goma xantana, produzida em grandes fermentadores a

partir da bactéria Xanthomonas campestris presente nas folhas das plantas da família

da couve, a goma carragenana, extraída de algas vermelhas e a goma arábica (goma

acácia), secreção de árvores de acácia, são também utilizadas como espessantes e

emulsificantes na indústria devido ao poder de aumentar a viscosidade das soluções.

Os polissacarídeos não digeridos no corpo humano podem ser digeridos

(fermentados) pelos microrganismos presentes nas paredes do intestino grosso. Cerca

de 7% da energia de um ser humano adulto é proveniente desse processo, em que

após a fermentação microbiana, são formados ácidos graxos de cadeia curta, que são

absorvidos na parede intestinal e metabolizados no fígado.

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Referências Bibliográficas

CECCHI, Heloisa M.; “Fundamentos Teóricos e Práticos em Análise de Alimentos”;

Campinas, SP: Editora UNICAMP, 2003;

FENNEMA, Owen; DAMODARAN, Srinivasan; PARKIN, Kirk; “Química de Alimentos de

Fennema”; São Paulo: Editora Artmed, 2010.