aula 01 – 05022015 – pablo stolzi – personalidade jurídica – direito civil

11
1 Aula 01 – 05/02/2015 – Pablo Stolze Personalidade Jurídica, Capacidade, Incapacidade – Direito Civil. [email protected] 1. Personalidade Jurídica. 1.1 Conceito. Personalidade é a capacidade geral de adquirir direitos e contrair obrigações em sua orbita jurídica, e é verdadeira qualidade que caracteriza a pessoa física e pessoa jurídica. 1.2. Pessoa física ou natural. Teixeira de Freitas, que muito influenciou o direito Argentino, denominava a pessoa física de ente de existência visível. Em que momento a pessoa física ou natural adquire personalidade jurídica? Aparentemente a resposta à essa pergunta encontra-se na primeira parte do artigo 2º do Código Civil, que dispõe no sentido de que a personalidade da pessoa começa com nascimento com vida.

Upload: felipe-magrelo

Post on 18-Jan-2016

10 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Minhas anotações sobre a aula de Pablo Stolzi sobre personalidade Jurídica.

TRANSCRIPT

Page 1: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

1

Aula 01 – 05/02/2015 – Pablo Stolze –

Personalidade Jurídica, Capacidade, Incapacidade –

Direito Civil.

[email protected]

1. Personalidade Jurídica.

1.1 Conceito.

Personalidade é a capacidade geral de adquirir direitos e contrair

obrigações em sua orbita jurídica, e é verdadeira qualidade que caracteriza a

pessoa física e pessoa jurídica.

1.2. Pessoa física ou natural.

Teixeira de Freitas, que muito influenciou o direito Argentino,

denominava a pessoa física de ente de existência visível.

Em que momento a pessoa física ou natural adquire personalidade

jurídica?

Aparentemente a resposta à essa pergunta encontra-se na primeira parte

do artigo 2º do Código Civil, que dispõe no sentido de que a personalidade da

pessoa começa com nascimento com vida.

Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do

nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção,

os direitos do nascituro.

Todavia, a segunda parte do mesmo dispositivo dispõe que a Lei põe a

salvo desde a concepção os direitos do nascituro. Assim, não poderia também ser

ele considerado pessoa? Vez que tem direitos.

Page 2: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

2

1.3. O Nascituro.

Com base no pensamento de Limongi França, temos que o nascituro é

aquele ente concebido mas ainda não nascido, de vida intrauterina.

Obs.: Não devo confundir nascituro com os conceitos de: natimorto, e

concepturo. O primeiro é aquele que nasce morto, ao qual se aplica a tutela de

certos direitos da personalidade na perspectiva do princípio da dignidade da

pessoa humana (Enunciado 01 da 1ª Jornada de Direito Civil).

Já o concepturo é a denominada prole eventual, aquele que nem

concebido ainda foi. Possui certa proteção no direito civil, em especial no direito

da sucessão, vez que o concepturo pode ser titular de direito à herança, em

situações excepcionais.

1.3.1. Teorias explicativas do Nascituro.

Primeiramente, é fundamental registrar que se trata de uma das matérias

mais polêmicas do direito brasileiro. Existe forte debate na doutrina, mesmo após

o julgamento da Lei de Biossegurança (ADI 3510).

Basicamente, temos três teorias fundamentais:

a) Teoria Natalista (Silvio Rodrigues, Vicente Rao, ...);

Para a primeira teoria, a personalidade jurídica somente seria adquirida a

partir do nascimento com vida, de maneira que o nascituro não seria considerado

pessoa, sendo dotado de mera expectativa de direitos.

Obs.: Ainda que se defenda essa teoria, não se pode ignorar a projeção

do princípio da dignidade da pessoa humana e a eficácia horizontal dos direitos

fundamentais, para que não se incorra em equívocos como o da antiga redação do

artigo 30 do código da Espanha, que só considerava pessoa o nascido que tenha

forma humana e sobreviva às primeiras 24horas de vida.

b) Teoria da Personalidade Condicional (Serpa Lopes);

Page 3: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

3

Para a segunda teoria, o nascituro já poderia ser titular de certos direitos

personalíssimos (como o direito à vida), mas somente consolidaria a plena

personalidade no que toca à direitos materiais ou econômicos, sob a condição de

nascer com vida.

Obs.: Em verdade, uma pesquisa na jurisprudência poderá indicar que a

ideia segundo a qual o nascituro somente consolida a sua personalidade em face

de direitos materiais e econômicos ainda é muito forte. Todavia, não é adequado,

agredindo a lógica do razoável, a ideia de que o nascituro tem personalidade para

alguns direitos e para outros não.

c) Teoria Concepcionista (C. Beviláqua, Silmara Chinelato).

Finalmente, a teoria concepcionista que o nascituro é considerado pessoa

plenamente desde a concepção. Vale dizer, já seria dotado de personalidade

jurídica plena, inclusive, em determinadas situações, no que toca a direitos

materiais ou econômicos.

Obs.: Lei dos Alimentos gravídicos?

Obs.2: Conforme já mencionamos, a despeito da força que a teoria

concepcionista vêm ganhando nos últimos anos, determinados direito, no atual

estágio do nosso Direito, somente se consolida sob a condição do nascimento

com vida. Por exemplo, desconhecemos julgados que admitam a

transmissibilidade direta de um direito hereditário do nascituro para sua mãe.

Qual a teoria adotada pelo código civil Brasileiro?

De todo exposto, já podemos concluir que a matéria comporta discussão.

Ainda são atuais em nosso sentir, as palavras de BEVILÁQUA, em seus

“Comentários ao Código Civil dos Estados Unidos do Brasil”, Rio de Janeiro:

Ed. Rio, 1975, pág. 178, após elogiar abertamente a teoria concepcionista,

ressaltando os seus excelentes argumentos, conclui ter adotado a natalista, “por

parecer mais prática” (sic). No entanto, o próprio autor, nesta mesma obra, não

Page 4: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

4

resiste ao apelo concepcionista, ao destacar situações em que o nascituro “se

apresenta como pessôa” (sic). Nas vezes que apresenta como pessoa, será tratado

como pessoa.

1.3.2. Nascituro no nosso recente ordenamento jurídico.

Nos últimos anos, temos observado posições na jurisprudência que, em

nosso sentir, culminam por reforçar a teoria concepcionista. Por exemplo, há

entendimento admitindo o dano moral ao nascituro (REsp 399028, REsp

931556); na mesma linha, o S.T.J. já admitiu que pais de nascituro podem

receber indenização do seguro DPVAT, pela morte do nascituro (noticiário S.T.J.

de 15 de maio de 2011); sem mencionar, por ser fato de todos conhecido, à

aprovação da Lei de alimentos gravídicos (Lei 11.804/2008), que também tutela

materialmente a personalidade do nascituro.

2. Capacidade de Direito e de Fato e Legitimidade.

A Capacidade, segundo a teoria geral do direito civil, desdobra-se em:

Capacidade de Direito e Capacidade de Fato. A reunião da Capacidade de

Direito com a Capacidade de Fato resulta na Capacidade Civil Plena.

2.1. Capacidade de direito.

Capacidade de direito é capacidade genérica que qualquer pessoa tem,

razão pela qual Orlando Gomes (Introdução ao Direito Civil) afirma ser difícil

diferencia-la do conceito de personalidade.

Obs.: Todavia vale lembrar que determinados entes, a exemplo de um

Órgão Público, podem ter capacidade de Direito, embora não tenham

personalidade jurídica.

Page 5: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

5

2.2. Capacidade de Fato.

Por outro lado, a Capacidade de Fato ou de Exercício é uma aptidão

para pessoalmente praticar atos da vida civil (ausente esta capacidade, teremos

uma incapacidade absoluta ou relativa).

Ausente a Capacidade de Fato, haverá Incapacidade Civil Absoluta

(artigo 3º do Código Civil) – e para eles, nos atos da vida civil haverá

representação – e para os casos de Incapacidade Civil Relativa (artigo 4º do

Código Civil) – e para eles, nos atos da vida civil, haverá assistência.

2.3. Qual a diferença entre Capacidade e Legitimidade.

A Capacidade Civil, como vimos, é ampla e geral, ao passo que a

Legitimidade é uma pertinência subjetiva para prática de determinado ato. Em

outras palavras, a Legitimidade é uma autorização ou permissivo específico para

determinado ato (pertinente aquele sujeito), de maneira que uma pessoa pode ser

Capaz, mas estar impedida de praticar aquele determinado ato por falta de

Legitimidade.

3. Incapacidade Civil.

3.1. Incapacidade absoluta.

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os

atos da vida civil:

I - os menores de dezesseis anos (Menores Impúberes);

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem

o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir

sua vontade.

Page 6: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

6

Nos termos do inciso II do artigo 3º, é considerado absolutamente

incapaz (de fato), o enfermo ou deficiente mental que não tenha o necessário

discernimento para a prática dos atos da vida civil.

Esta pessoa se submete a um procedimento de interdição, artigos 1.177 e

ss. Do C.P.C. (1973), no qual, reconhecida sua incapacidade, um curador será

designado para representa-la. Proferida a sentença, devidamente publicada e

registrada, qualquer ato praticado pelo incapaz interditado, sem o seu curador,

será inválido, ainda que praticado em momento de lucidez.

Orlando Gomes, com amparo na Doutrina italiana, sustenta que o ato

praticado pelo incapaz ainda não interditado poderá ser invalidado, desde que

reunidos 3 requisitos: a incapacidade de discernimento; o prejuízo ao incapaz; e a

má-fé (pode ser aferida da circunstâncias do ato) da outra parte.

Obs.: O novo C.P.C. trouxe grandes mudanças no procedimento de

interdição, desde a legitimidade para o pedido (que também poderá ser feito pelo

representante da entidade que abriga o interditando) até a alteração na

legitimidade do M.P. (que somente proporá a Ação em havendo doença mental

grave). Regulou-se ainda a importante figura do curador provisório.

São absolutamente incapazes as pessoas, que mesmo por causa

transitória, não possam exprimir sua vontade. (Artigo 3º, III – Código Civil.).

Ex.: Intoxicação Fortuita (diferente de actio libero in causa), estado de coma.

Obs.: O Código Civil de 2002 trata o Ausente, diferentemente do Código

Civil de 1916, como pessoa morta por presunção, nos termos do artigo 6º,

segunda parte.

Quanto ao surdo que é mudo, que não tem habilidade para manifestar

vontade, entendemos que ele está implicitamente contemplado no inciso III, do

artigo 3º do Código Civil.

Page 7: Aula 01 – 05022015 – Pablo Stolzi – Personalidade Jurídica – Direito Civil

7

3.2. Incapacidade relativa.

Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os

exercer:

I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência

mental, tenham o discernimento reduzido;

III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV - os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação

especial.

O inciso IV do Artigo 4º, reconhece o pródigo como relativamente

incapaz, valendo lembrar que, em geral, a prodigalidade decorre de um transtorno

de personalidade, uma compulsão.

Prodiga é a pessoa que gasta descontraidamente o seu patrimônio,

podendo reduzir-se a miséria. O pródigo deverá ser interditado devendo-lhe

nomear um curador que irá assisti-lo nesses atos de conteúdo patrimonial (artigo

1782 do Código Civil). O curador do pródigo deve inclusive se manifestar

quanto ao regime de bens do casamento.

Na perspectiva do princípio da Dignidade da Pessoa Humana, segundo

Luiz Edson Fachin, em sua monumental tese, o Estatuto Jurídico do Patrimônio

Mínimo, as normas civis devem sempre resguardar um mínimo de patrimônio

para que toda pessoa tenha vida digna. E isso justifica a proteção do pródigo.

Obs.: A Capacidade dos Índios nos termos do §Único do artigo 4º, é

tratada por Lei especial (artigo 8º da Lei 6.001/1973 – Estatuto do Índio).

Obs.: Por fim, vale lembrar que a idade avançada por si só não é causa

de incapacidade civil.