as vivências com a natureza enquanto prática de educação

15
VIII EPEA - Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Rio de Janeiro, 19 a 22 de Julho de 2015 Realização: Unirio, UFRRJ e UFRJ 1 As vivências com a natureza enquanto prática de educação ambiental na escola: a atuação do Programa Núcleo de Ensino da Unesp, câmpus de Rosana/SP 1 Fernando Protti Bueno Unesp, Câmpus de Rosana Jéssica Rosa da Silva Unesp, Câmpus de Rosana Carolina Caldeira de Paula Unesp, Câmpus de Rosana Cléia da Silva Unesp, Câmpus de Rosana Resumo A educação ambiental na escola tem se mostrado passível de ser implantada por inúmeras modalidades. O presente trabalho buscou evidenciar os resultados da intervenção pedagógica vivências com a natureza realizada com discentes do ensino fundamental e médio de uma escola pública localizada no município de Rosana/SP. A pesquisa e ação se utilizaram da metodologia do aprendizado sequencial de Cornell (1996; 1997; 2005; 2008), bem como de um roteiro de observação para a coleta e análise de dados. Os resultados evidenciam que as vivências com a natureza, realizadas a partir da metodologia do aprendizado sequencial dispõem de condições para contribuir com a sensibilização e a ampliação da consciência ambiental dos participantes, além de se verificar que estas por trabalharem com os sentidos e os sentimentos podem se tornar significativas estratégias pedagógicas no âmbito da educação ambiental na escola, podendo inclusive contribuir com a relação ensino-aprendizagem, bem como com a formação social dos indivíduos. Palavras-chave: Vivências com a natureza. Aprendizado Sequencial. Educação ambiental na escola. Abstract Environmental education in school has proved capable of being deployed by numerous modalities. This study aimed to highlight the results of the pedagogical intervention - sharing nature - carried out with students of elementary and secondary education at a public school in the municipality of Rosana / SP. The research and action were used the methodology of flow learning of Cornell (1996; 1997; 2005; 2008), as well as an observation script for data collection and analysis. The results show that the sharing nature, made from the flow learning methodology have conditions to contribute to the awareness and the expansion of environmental awareness of the participants, in addition to assessing these for working with the senses and feelings can become significant pedagogical strategies in environmental education in school, and may even contribute to the teaching-learning as well as social education of individuals. Keywords: Sharing nature. Flow Learning. Environmental education in school. 1. Introdução A educação ambiental ao ser considerada enquanto um campo de conhecimento e também de diversificadas práticas pedagógicas, inseridas em um contexto de intrínsecas relações entre a sociedade, a educação e o meio ambiente, tem ao longo do tempo buscado compreender a complexidade em torno dos problemas socioambientais, 1 Financiado pela Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) Programa Núcleos de Ensino da UNESP.

Upload: tranngoc

Post on 10-Jan-2017

218 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

VIII EPEA - Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Rio de Janeiro, 19 a 22 de Julho de 2015

Realização: Unirio, UFRRJ e UFRJ

1

As vivências com a natureza enquanto prática de educação ambiental na escola: a

atuação do Programa Núcleo de Ensino da Unesp, câmpus de Rosana/SP1

Fernando Protti Bueno – Unesp, Câmpus de Rosana

Jéssica Rosa da Silva – Unesp, Câmpus de Rosana

Carolina Caldeira de Paula – Unesp, Câmpus de Rosana

Cléia da Silva – Unesp, Câmpus de Rosana

Resumo

A educação ambiental na escola tem se mostrado passível de ser implantada por

inúmeras modalidades. O presente trabalho buscou evidenciar os resultados da

intervenção pedagógica – vivências com a natureza – realizada com discentes do ensino

fundamental e médio de uma escola pública localizada no município de Rosana/SP. A

pesquisa e ação se utilizaram da metodologia do aprendizado sequencial de Cornell

(1996; 1997; 2005; 2008), bem como de um roteiro de observação para a coleta e

análise de dados. Os resultados evidenciam que as vivências com a natureza, realizadas

a partir da metodologia do aprendizado sequencial dispõem de condições para contribuir

com a sensibilização e a ampliação da consciência ambiental dos participantes, além de

se verificar que estas por trabalharem com os sentidos e os sentimentos podem se tornar

significativas estratégias pedagógicas no âmbito da educação ambiental na escola,

podendo inclusive contribuir com a relação ensino-aprendizagem, bem como com a

formação social dos indivíduos.

Palavras-chave: Vivências com a natureza. Aprendizado Sequencial. Educação

ambiental na escola.

Abstract

Environmental education in school has proved capable of being deployed by numerous

modalities. This study aimed to highlight the results of the pedagogical intervention -

sharing nature - carried out with students of elementary and secondary education at a

public school in the municipality of Rosana / SP. The research and action were used the

methodology of flow learning of Cornell (1996; 1997; 2005; 2008), as well as an

observation script for data collection and analysis. The results show that the sharing

nature, made from the flow learning methodology have conditions to contribute to the

awareness and the expansion of environmental awareness of the participants, in addition

to assessing these for working with the senses and feelings can become significant

pedagogical strategies in environmental education in school, and may even contribute to

the teaching-learning as well as social education of individuals.

Keywords: Sharing nature. Flow Learning. Environmental education in school.

1. Introdução

A educação ambiental ao ser considerada enquanto um campo de conhecimento

e também de diversificadas práticas pedagógicas, inseridas em um contexto de

intrínsecas relações entre a sociedade, a educação e o meio ambiente, tem ao longo do

tempo buscado compreender a complexidade em torno dos problemas socioambientais, 1 Financiado pela Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD) – Programa Núcleos de Ensino da UNESP.

Page 2: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

2

bem como oferecer condições plenas para fundamentar e subsidiar uma variada gama de

intervenções sociais, posicionadas no campo da educação, na tentativa de promover

transformações em distintas realidades ante as problemáticas ambientais globais e/ou

locais (LIMA, 2011).

Diante disso e com base na Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA),

que institucionalizou a educação ambiental e estabeleceu diretrizes norteadoras a sua

prática, a educação ambiental inserida no contexto escolar (educação ambiental no

ensino formal), basicamente visa promover práticas educativas nos diferentes níveis de

ensino (BRASIL, 1999). As escolas, prioritariamente as públicas por concentrarem a

maior quantidade de público alvo abrangido, são consideradas enquanto espaços

privilegiados para a prática de educação ambiental, dessa forma, se acentua o desafio

em criar estratégias pedagógicas e metodológicas para o trabalho com educação

ambiental na escola (LIMA, 2011).

A partir da pesquisa coordenada por Trajber e Mendonça (2007) sobre a

educação ambiental desenvolvida no ensino fundamental público brasileiro, Loureiro e

Cossío (2007) e ainda Lima (2011) identificaram a expansão quantitativa da educação

ambiental inserida nos espaços escolarizados, prioritariamente concentradas em projetos

de ação, que em sua maioria objetivam sensibilizar para o convívio com a natureza,

perfazendo, desse modo, o que Cascino (2003) já mencionava sobre o âmbito das

práticas pedagógicas na contemporaneidade, as quais tem buscado promover mudanças

na relação homem-natureza.

Nesse sentido, Mendonça e Neiman (2003) pontuam que o trabalho com

educação ambiental inserido no contexto escolar ao se utilizar de atividades extraclasse,

prioritariamente para promover o contato com a natureza, tem o potencial de modificar

as formas de sentir e na visão destes isso desencadeia o processo de auto percepção, e,

portanto, a partir disso se faz emergir a ampliação e o conhecimento de si e do mundo

ao seu redor, de modo a promover mudanças na relação homem-natureza.

Tendo por base esse contexto, desenvolveu-se um projeto de educação ambiental

na escola2, o qual se utilizou das vivências com a natureza, a partir do uso da

metodologia do aprendizado sequencial (CORNELL, 1996; 1997; 2005; 2008), como

forma de proporcionar o contato direto dos discentes com a natureza. Desse modo, este

trabalho evidencia os resultados oriundos da intervenção pedagógica realizada com

discentes do ensino fundamental e médio de uma escola pública localizada no município

de Rosana/SP. O objetivo aqui proposto é descrever as vivências com a natureza

realizadas, bem como discutir os resultados provenientes da realização das mesmas,

enquanto possíveis contribuições à sensibilização e a ampliação da consciência

ambiental destes discentes.

As vivências com a natureza foram realizadas em dois momentos distintos: o

primeiro no ano de 2013 junto a área da sede e na Trilha do Cedro; e o segundo, já no

ano de 2014, junto a Trilha do Mico, ambos na Estação Ecológica do Caiuá, unidade de

conservação de proteção integral, localizada no município de Diamante do Norte (PR), 2 O referido projeto de educação ambiental na escola, foi intitulado Vivências com a Natureza: sentir,

pensar e agir, e compôs durante o período de 2013-2014, um dos projetos do Programa Núcleos de Ensino

da UNESP, que basicamente visa desenvolver ações de intervenção educativa em parceria com as escolas

públicas. O projeto foi desenvolvido pelo Curso de Turismo da UNESP, campus de Rosana em parceria

com a Escola Estadual Professora Maria Audenir de Carvalho, localizada no Distrito de Primavera,

município de Rosana/SP.

Page 3: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

3

divisa com o município de Rosana (SP). A amostra da execução do projeto e,

consequentemente da pesquisa, foi intencionalmente selecionada pela escola3, e,

basicamente, compreendeu as turmas A, B e C do 6º ano do ensino fundamental, as

turmas B e C do 7º ano do ensino fundamental e a turma B do 1º ano do ensino médio,

totalizando em torno de 150 discentes4.

A proposta se utilizou prioritariamente dos referenciais de Cornell (1996; 1997;

2005; 2008), tanto no aspecto de suporte teórico e metodológico da pesquisa, bem como

à execução das vivências. A coleta e análise de dados, foi possível a partir de um

processo de pesquisa-ação, que se utilizou de um roteiro de observação sistematizado

(MARCONI; LAKATOS, 2010) desenvolvido com base nos pressupostos evidenciados

no quadro do aprendizado sequencial (quadro 01), bem como ordenado a partir de

fatores comportamentais; atitudinais; valorativos; perceptivos e afetivos, sendo este

roteiro preenchido ao longo da execução das atividades. Além deste, também se utilizou

do registro fotográfico das atividades realizadas, como forma de ilustrar as diferentes

situações experienciadas pelos discentes e os supostos potenciais atingidos pela

sensibilização. Assim, a partir da abordagem qualitativa e do caráter exploratório e

descritivo da pesquisa (LUDKE; ANDRÉ, 1986), buscou-se explorar, analisar e

aprofundar sobre as qualidades e as vantagens que o uso da metodologia do aprendizado

sequencial pode despertar no indivíduo durante um processo de vivência com a

natureza, sendo este tratado como forma de desenvolver educação ambiental no

contexto escolar. A análise dos dados gerados, tanto pelas anotações realizadas durante

as observações e preenchimento do roteiro, quanto das descrições dos registros

fotográficos, foi realizada por meio de análise descritiva (MARCONI; LAKATOS,

2010).

Por fim, as vivências com a natureza são consideradas uma forma de interação e

de contato direto com a natureza, pela qual ocorre o aprendizado a partir do aspecto

sensitivo inserido no corpo e na mente dos indivíduos que vivenciam aspectos relativos

à natureza (física e humana) e, com isso, apreendem sobre si, sobre os outros e sobre a

sua relação com o ambiente, produzindo assim conhecimento. No campo da educação

ambiental consiste em uma proposta de experimentação de conceitos de observação das

emoções, sentimentos e pensamentos, com o objetivo de contribuir para as relações

consigo, com o outro e para com o meio ambiente, bem como para ampliar a

consciência ambiental, por meio do contato direto e profundo com a natureza.

2. As vivências com a natureza como forma de educação ambiental na escola

Ao considerar a educação ambiental, a partir dos preceitos da Conferência

Intergovernamental de Tbilisi, como “[...] um processo de reconhecimento de valores e

clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando

as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre os seres

humanos, suas culturas e seus meios biofísicos” (1977 apud SATO, 1999, p. 23-24), 3 A escola fez a escolha das turmas baseadas em suas características sócio comportamentais, as quais

compreendem a realidade da escola, e especialmente por nestas estar envolvidas as chamadas turmas

vulneráveis (recuperação intensiva). 4 Cabe ressaltar que estas características se referem ao ano de 2013 (primeiro momento), pois no ano de

2014, as turmas foram as mesmas, porém em anos subsequentes (7º e 8º anos do ensino fundamental e 2º

ano do ensino médio).

Page 4: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

4

parte-se do pressuposto de que a concepção sobre mera transmissão de informações e de

conhecimentos, tida por muitos como elementos base da educação, dificilmente consiga

atingir o que se preconiza nesta definição.

E ao se vislumbrar a educação ambiental brasileira, institucionalizada por meio

da Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA (BRASIL, 1999), como um

“componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de

forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo em caráter

formal e não-formal” e devendo ser desenvolvida como uma prática educativa

integrada, contínua e permanente, tanto para estudantes quanto para professores,

verifica-se a oportunidade de desenvolvimento de diferentes propostas que envolvam

processos educativos voltados às diferentes concepções de educação ambiental,

trabalhadas tanto nos âmbitos formal e não formal, bem como nos contextos escolar e

não escolar.

Assim, a partir da inserção da educação ambiental no contexto escolarizado,

permeado por atividades extraclasse, inseridas no espaço não formal de aprendizagem,

se apresenta a proposta de trabalho de ‘Vivências com a Natureza’ como forma de atuar

com ensino e aprendizagem de modo integral e em conjunto com a escola, a partir das

realidades globais e locais, e refletindo sobre questões ambientais problematizadoras,

porém de modo lúdico, interativo e a partir do aspecto sensitivo, inserido no corpo, na

alma e no espírito, e ainda centrado no sentimento de amor desenvolvido entre educador

e aprendiz (MENDONÇA; NEIMAN, 2003).

Parte-se do pressuposto de que as vivências com a natureza além de ter a

finalidade de aprendizado por intermédio do lúdico, por ser social e natural, diferente do

que as tradicionais tentativas de transmitir conhecimento, também estimulam os atos de

cuidado, de zelo e carinho entre os alunos. É preciso que conversem, que troquem

experiências, que se conheçam mais profundamente, ampliando suas percepções da

realidade em que vivem. Sua prática deve buscar assegurar um ensino aprendizagem

que torne os estudantes aptos a compreenderem o conceito de meio ambiente, seus

processos e dinâmicas e o papel e a responsabilidade de cada um para a conservação

deste. Uma vivência pode fazer o participante perceber a diferença entre a explicação e

a compreensão, além de criar bases pessoais para refletir sobre os fenômenos estudados.

Essa percepção leva a uma modificação nas formas de sentir e agir (MENDONÇA;

NEIMAN, 2003).

Desse modo, a proposta das vivências com a natureza está centrada e é

desenvolvida a partir da metodologia do aprendizado sequencial, considerada enquanto

uma metodologia original de educação ambiental que visa facilitar o aprofundamento e

a interação que os indivíduos podem ter em contato com a natureza, possibilitando o

aprendizado e o desenvolvimento de sentimentos e valores, necessários para uma

transformação social. O aprendizado sequencial, busca estabelecer e proporcionar uma

melhor relação dos indivíduos com a natureza, e isto advém das experiências de Cornell

com a natureza, nas quais percebeu que havia um fluxo a ser trabalhado, fazendo com

que as pessoas reajam favoravelmente a uma determinada sequência, em função desta se

harmonizar aos aspectos da natureza humana (CORNELL, 1997; 2005).

A metodologia se baseia nos estágios que auxiliam os indivíduos a alcançarem

uma estrutura mental permitida pelo potencial de uma experiência direta e profunda

com a natureza. O aprendizado sequencial tem o poder de auxiliar as pessoas a

esquecerem as suas preocupações, a partir da descontração, da diversão e da apreciação

Page 5: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

5

da natureza, sugerindo que o aprendizado seja por inteiro (corpo e mente), pois a

metodologia é, ao mesmo tempo, pedagógica e terapêutica, sendo que diante do

processo de desenvolvimento dos estágios o indivíduo acalma a mente e realiza melhor

suas atividades, aprendendo a ouvir, a respeitar os outros e a refletir sobre suas

necessidades e seus desejos (CORNELL, 1997; MENDONÇA, 2000; 2006).

Cornell (1997; 2005) considerou o aprendizado sequencial como uma simples,

porém, poderosa estratégia de ensino, que consiste na escolha de atividades lúdicas5

baseadas em princípios universais de consciência e de educação vivencial, organizadas e

direcionadas perante uma sequência de 04 estágios – despertar do entusiasmo;

concentrar a atenção; experiência direta; e compartilhar a inspiração (Figura 01) –

desenvolvidos de forma sutil, gradativa e divertida, com a intenção de criar um fluxo de

energia, de maior agitação para maior concentração da atenção.

Figura 01: Fluxo dos estágios do aprendizado sequencial

Fonte: Cornell (1996; 1997; 2005; 2008)

Ao deter atenção aos estágios, Cornell (1997, 2008) vislumbra suas qualidades e

vantagens (Quadro 01).

Quadro 1 – Qualidades e vantagens dos estágios da metodologia do aprendizado sequencial

Fonte: adaptado a partir de Cornell (1997, p. 46-47)

Nesse sentido, Cornell (1997, 2008) explica que o estágio ‘Despertar o

entusiasmo’ é marcado pela diversão e por atividades que geram um intenso fluxo de

energia e um crescente interesse pelo que está sendo feito. O estágio ‘Concentrar a

atenção’, busca conduzir o entusiasmo na direção de uma atenção mais refinada, sendo

que assim será possível perceber a natureza e, ao mesmo tempo, dispor de calma, 5 Cornell (1996; 1997; 2005; 2008) criou uma série de atividades para o trabalho com o aprendizado

sequencial, as quais serão melhor abordadas no próximo item.

Page 6: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

6

atenção e entusiasmo. No estágio ‘Experiência direta’, o intuito é experimentar o

contato direto com a natureza, abrir o coração das pessoas e intensificar um ou mais

sentidos, para que se possa descobrir um íntimo e profundo sentimento de

pertencimento e compreensão. E o estágio ‘Compartilhar a inspiração’, é o momento em

que os integrantes do grupo estão calmos, alegres e sensíveis a ouvir e contar suas

estórias, seus sentimentos, suas emoções etc.

Em relação ao processo educativo proporcionado por meio das ‘vivências’,

Mendonça (2007, p. 119) infere que este “[...] considera os indivíduos de forma integral,

incluindo e priorizando o aprendizado através do corpo, dos sentidos e da percepção

mais sutil de si mesmos, dos outros, do mundo, da natureza, e dos processos vitais que

dão origem e sustentam a vida [...]”. Portanto, como fundamentos dessa metodologia há

a crença de que o aprendizado efetivo deva incluir e, por vezes até priorizar, a vivência

e a experiência, sendo que apenas as transmissões de informações, por mais importantes

que sejam não são suficientes para promover o aprofundamento, o enraizamento e o

estímulo às mudanças de comportamentos (MENDONÇA, 2006; 2007).

3. Resultados e discussões

As vivências com a natureza foram realizadas em dois momentos distintos. O

primeiro entre os meses de novembro e dezembro do ano de 2013 e o segundo no mês

de outubro do ano de 2014. Estes dois momentos foram realizados com o mesmo grupo

de discentes6 (as 6 turmas de ensino fundamental e médio) da Escola Estadual Profª.

Maria Audenir de Carvalho, localizada no Distrito de Primavera, município de

Rosana/SP. Ambas vivências foram realizadas na Estação Ecológica do Caiuá

(localizada em Diamante do Norte/PR, divisa com o município de Rosana/SP). No

primeiro momento utilizou-se da área gramada ao lado da estrutura da sede e também na

Trilha do Cedro (localizada ao lado desta área gramada), que conta com 500 metros de

extensão e é considerada uma trilha pequena, fácil de ser percorrida e sem muitos

atrativos. No segundo momento, optou-se por fazer uso da Trilha do Mico, localizada

distante da sede da unidade, bem como necessita-se caminhar cerca de 1,5 km até

chegar a trilha, que possui cerca de 2,5 km de extensão e se refere a uma trilha mais

fechada, de fácil percurso, mas que está mais imersa na natureza. Os dois momentos

tiveram uma duração média de até 3 horas.

O objetivo principal da realização das vivências com a natureza esteve centrado

no desenvolvimento de um processo vivencial em contato com a natureza, na tentativa

de contribuir com a sensibilização e a ampliação da consciência ambiental dos

estudantes, bem como visar à melhora na relação ensino-aprendizagem a partir do

estímulo, da proposta de atividade extraclasse, do divertimento, do trabalho de

percepção e de atenção, e da possibilidade de relação com os outros fora do ambiente

escolar.

Especificamente em relação às vivências realizadas, nos dois momentos, buscou- 6 Tratava-se do mesmo grupo de discentes, sendo que em 2013 a amostra totalizava um quantitativo

aproximado de 150 indivíduos, tendo em torno de 105 participantes efetivos. No ano de 2014, já em seus

anos letivos subsequentes, contabilizou-se o quantitativo de 65 participantes efetivos (destes, poucos

foram os discentes que não haviam participado da vivência no ano anterior). O quantitativo reduzido de

público participante no ano de 2014 se explica devido as vivências terem sido marcadas para datas em

uma semana de planejamento escolar, portanto, houve uma menor quantidade de discentes que

compareceram a realização das vivências.

Page 7: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

7

se basicamente realizar as mesmas atividades, com algumas exceções, dentre um rol de

atividades disponíveis e possíveis de serem realizadas para cada estágio do aprendizado

sequencial de Cornell (1996; 1997; 2005; 2008). O roteiro de atividades inicialmente

criado para as vivências buscou adequar às atividades tanto em relação ao local

(dimensão das trilhas utilizadas, infraestrutura disponível e disponibilidade de tempo a

cada grupo) quanto em relação ao perfil dos discentes, que segundo a coordenação da

escola, tratavam-se de discentes que em geral apresentavam aprendizado heterogêneo e

grandes dificuldades de relacionamento interpessoal. Desse modo, no intuito de tentar, a

exemplo dos enunciados de Cornell, conseguir envolver a todos em uma experiência

profunda em contato direto a natureza, de modo a proporcionar uma sensibilização

ambiental, buscou-se realizar algumas das mesmas atividades com cada um dos grupos

e, basicamente nos dois momentos, para que pudesse ser possível avaliar o potencial de

cada atividade, do conjunto de atividades de cada um dos estágios e, por fim, da

proposta como um todo, afinal, cada estágio da metodologia busca uma qualidade

específica e possui vantagens atingidas por meio do desenvolvimento de uma ou mais

atividades de cada estágio. Cada atividade escolhida para compor os estágios e,

consequentemente a proposta, foi definida a partir dos potencias descritos por Cornell

(2005; 2008), gerando um suposto roteiro de atividades possível de serem

desenvolvidas7, conforme se apresenta na tabela 1.

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4

Que animal sou eu? Duplicação Trilha cega Trilha de belezas

Partes do animal Trilha de surpresas Encontre a árvore Janelas da terra

Arca de Noé Jogo da identificação Personificar uma árvore Poema dobrado

Corvos e corujas Senhor dorminhoco Máquina fotográfica Meditações com a natureza

Morcego e mariposas Sons Auto carta

Olho vivo

Passeio da lagarta

Tabela 1 – Atividades propostas para o roteiro de vivências com a natureza

Fonte: própria

Enquanto resultados do desenvolvimento das atividades e dos estágios, bem

como da aplicação da metodologia do aprendizado sequencial em vivências com a

natureza, verificou-se que a experiência de vivenciar o contato com a natureza

proporcionou aos discentes um momento de aprendizagem (socialização e interação), no

mínimo, diferente ao qual estão acostumados (as salas de aula do ensino formal e sua

relação com os professores), além de uma possibilidade de imersão e (re)integração com

a natureza e de se trabalhar a partir de seus sentidos e sentimentos.

Assim, o projeto por meio das vivências possibilitou aos participantes entrarem

em contato direto com a natureza e por meio do uso da metodologia do aprendizado

sequencial potencializar uma harmonização dos ânimos e do entusiasmo dos

participantes, de modo a canalizarem suas atenções para buscarem explorar seus 7 Esse suposto roteiro se refere as atividades previamente elencadas e possíveis de serem realizadas tendo

em vista os elementos de espaço físico, tempo disponível, quantidade de público participante, entre

outros, ou seja, não havendo uma sequência prévia de atividades a ser seguida, pois a única sequência da

metodologia se refere à dos estágios, exceção feita a uma ou outra atividade a qual pelas experiências

anteriores no desenvolvimento das atividades e da metodologia, denotam a necessidade de serem

realizadas em sequência para surtirem mais efeito de acordo com as qualidades e as vantagens dos

estágios da metodologia do aprendizado sequencial descritos no quadro 1.

Page 8: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

8

sentidos e seus sentimentos nas relações consigo, com os outros, bem como para com a

natureza.

Devido a diferentes motivos, bem como a existência de uma série de fatores

internos e externos à proposta desenvolvida, os resultados objetivados por cada

atividade e também por cada um dos estágios, puderam sofrer significativas

interferências, de modo a não atingir parcialmente a proposta executada. Dentre estes,

destacam-se o tempo limite de 3 horas para execução das atividades, por ser horário de

aula dos discentes na escola, contando com o tempo de deslocamento; a forma pela qual

a proposta foi explicada no contexto escolar (tratava-se de um passeio), o que pode ter

gerado equivoco em relação a sua finalidade; a incidência de um forte calor que gerou a

necessidade de hidratação e isto em alguns momentos passou a ser o principal atrativo;

os horários já acostumados e pré-determinados na escola para realização de

alimentação; e, especificamente no ano de 2013, o local utilizado por ser próximo a sede

da unidade de conservação passou a influenciar a dispersão da atenção, devido a

infraestrutura disponível8.

Contudo, em ambos os anos, as vivências também enfrentaram outras

dificuldades instauradas a partir de algumas atitudes e comportamentos dos discentes

participantes, tais como a apatia, a falta de vontade e de interesse, certa falta de atenção,

negação em participar, extrapolação de brincadeiras físicas e/ou de duplo sentido, e

certa falta de respeito9. Além disso, a ausência de participação, auxílio, atenção,

disposição e acompanhamento, além do inadequado comportamento de alguns

professores e demais auxiliares de ensino que acompanhavam as vivências também

influenciaram nos comportamentos dos discentes, bem como nos resultados das

vivências. Ao que se transpareceu, relativo a alguns casos e alguns indivíduos, parece

haver uma exacerbada necessidade de se literalmente reencontrar com a natureza, tanto

a física quanto a natureza humana de cada indivíduo.

Considerando estes itens expostos, bem como a proposta do aprendizado

sequencial, e as qualidades e as vantagens da metodologia descritas no quadro 01, e em

ambos os momentos das vivências, foi possível verificar que a proposta, independente

do grupo trabalhado, realmente tem o potencial de imergir os indivíduos com a natureza

e isso se deve prioritariamente aos estágios e as brincadeiras idealizadas por Cornell, as

quais atreladas a escolha, a sequência e a forma de condução, bem como ao local de

natureza conservada (mais especificamente a imersão no ano de 2014) e o interesse e

envolvimento dos participantes, possibilitam uma real sensibilização e o início de um

processo de ampliação da consciência humana e ambiental.

Desse modo, no intuito e na tentativa de descrever, assim como de analisar o

desenvolvimento de algumas das atividades10

, prioritariamente aquelas elencadas

enquanto atividades chaves em cada um dos estágios (ver as Figuras 2 a 5), bem como

as qualidades e as vantagens dos estágios da metodologia do aprendizado sequencial

atingidas pela intervenção pedagógica realizada pelo projeto de educação ambiental na 8 Já no ano de 2014, alguns destes fatores não puderam ou não foram percebidos como intervenientes,

pois os discentes já conheciam a proposta, bem como desta vez estavam distantes da sede da unidade de

conservação, ao mesmo tempo, criou-se certa expectativa frente a desconhecida trilha e seu espaço físico

que seriam utilizados. 9 Estas normalmente eram mais visíveis e perceptíveis nos discentes dos anos letivos finais do ensino

fundamental, bem como e principalmente nos discentes do ensino médio. 10

Ver Cornell (1996; 1997; 2005; 2008) para uma maior e mais detalhada descrição de cada uma das

atividades elencadas na metodologia do aprendizado sequencial.

Page 9: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

9

escola, em ambos os anos de atuação, passar-se-á a discussão destes, tendo em vista a

contribuição alcançada à sensibilização e a ampliação da consciência ambiental do

público participante.

Figura 2: Corvos e corujas (estágio 1)

Fonte: autoria própria

Figura 3: Passeio da lagarta (estágio 2)

Fonte: autoria própria

Figura 4: Encontre a árvore (estágio 3)

Fonte: autoria própria

Figura 5: Trilha de belezas (estágio 4)

Fonte: autoria própria

No estágio 1 – Despertar o entusiasmo – a atividade Corvos e Corujas, possui

plenas condições para além de despertar o entusiasmo, também garantir o divertimento

e a vivacidade dos participantes. Isto ocorre devido a dinâmica e funcionamento da

atividade, já que nesta o grupo está organizado em duas equipes alinhadas, na qual os

corvos representam a mentira e as corujas representam a verdade, e ao comando do

educador, que fará afirmações verdadeiras e falsas, corvos e corujas buscam-se caçar ou

se esconder (CORNELL, 2008). Ao executá-la, conseguiu-se uma boa dinâmica de

grupo, com envolvimento, entusiasmo, receptividade e com a superação da passividade

por parte dos indivíduos – elementos considerados essenciais para se trabalhar as

atividades mais sensíveis do próximo estágio (ver a figura 02). Além disso, a atividade

possibilitou, ainda que de modo lúdico, no âmbito pedagógico, rever alguns conceitos

ecológicos ou simples conceitos do cotidiano, a partir do desenvolvimento do raciocínio

rápido e perspicaz, na escolha das alternativas de verdadeiro e falso, e isso, no momento

Page 10: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

10

da ação para caçar a presa ou fugir do predador, trabalha a coordenação motora dos

indivíduos.

No estágio 2 – Concentrar a atenção – destacaram-se algumas atividades que

dispõem de condições para converter o entusiasmo e a alegria despertados no primeiro

estágio em poder de concentração, pois atuam diretamente sobre um dos sentidos (visão

ou ausência da visão e audição). Este caso se refere as atividades Trilha de surpresas,

Olho vivo, Passeio da Lagarta e Sons, respectivamente.

Na atividade Trilha de surpresas, em um determinado trecho de uma trilha ou

mesmo fora da trilha, é montado um percurso, delimitado por um barbante, no qual se

encontram camuflados certa quantidade objetos não naturais. Em fila, cada participante

caminha em silêncio, observando os objetos escondidos no caminho traçado pelo

barbante, a fim de encontrar a maior quantidade possível de objetos (CORNELL, 2008).

Assim, a atividade se torna fundamental para concentrar e atenção e para aumentar o

poder de observação, de modo a acalmar os participantes. A realização da mesma, nos

dois momentos, conseguiu de modo intenso e duradouro focar a atenção dos

participantes, por meio da percepção visual, e, com isso, atingiu seu principal objetivo

junto a todos os indivíduos dos grupos, principalmente no segundo momento das

vivências por ocasião das características do ambiente. Basicamente, a proposta de

encontrar os objetos escondidos estimulou a participação e despertou a curiosidade e o

interesse dos participantes, aprimorando suas habilidades perceptivas (observação

visual).

A atividade Olho vivo busca despertar a curiosidade de explorar o desconhecido,

gera ansiedade e ao mesmo tempo vontade de encontrar os elementos e compartilhar

com os demais do grupo. Basicamente é realizada dentro de uma trilha, onde os

indivíduos do grupo a partir de uma caminhada passam a buscar os elementos naturais

descritos em uma lista. Ao encontrar algum elemento, o participante compartilha a

descoberta com os demais membros do grupo (CORNELL, 2008). Em ambos

momentos das vivências, esta atividade permitiu o contato direto com a natureza,

possibilitando uma caminhada em grupo, tranquila e silenciosa ao longo da trilha, onde

cada participante teve a oportunidade de poder observar e de compartilhar ideias e

opiniões sobre os elementos naturais encontrados/observados. Acredita-se, inclusive,

que além do interesse e da curiosidade, o alto grau de observação somente foi possível,

pois na lista constavam elementos físicos naturais que compõem o meio ambiente e

também elementos subjetivos, os quais dependeriam da imaginação ou do poder de

interpretação para serem observados, como, por exemplo, um grande sorriso. Em função

disso, a atividade possibilitou novas e diferentes descobertas, fazendo com que os

participantes pudessem por meio da habilidade perceptiva de observação e dos demais

sentidos experienciar o contato com a natureza, e ao mesmo tempo pudessem se

envolver e se relacionar com os demais, por meio da parceria e do companheirismo.

E a atividade Passeio da lagarta se refere a realização de uma caminhada pela

trilha com os olhos vendados, a fim de sentir e de ver a natureza de uma outra maneira

(ver figura 03). Os participantes organizados em uma fila colocam suas mãos no ombro

da pessoa da frente como se fosse uma lagarta, assim cada qual direciona o caminho do

outro. O educador conduz a fila em silêncio, caminhando pela trilha, passando entre as

árvores, em lugares de mata mais aberta e fechada, de modo a estimular os sentidos

auditivos, olfativos e a percepção sensorial dos participantes. Nesta atividade é

fundamental o silêncio do grupo e a confiança no colega que te guia, pois ao trabalhar

Page 11: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

11

com o sentido da audição e a percepção sensorial, lida com o cuidado para com os

demais e desperta diferentes sentimentos como medo, euforia, insegurança e confiança

(CORNELL, 2008). Nos dois momentos de realização dessa atividade, em função da

mesma ser realizada a partir dos olhos vendados e em uma caminhada em um local

supostamente desconhecido, ainda mais no segundo momento das vivências, por ser um

ambiente ainda mais imerso na natureza, isso naturalmente gerou certo medo,

desconforto, insegurança e angústia nos participantes. Estes foram expressos na forma

de gritos (contidos) e euforia (muitas vezes também expressos como forma de chamar a

atenção ou divulgar aquilo que estavam sentindo aos demais), por isso, foi preciso

trabalhar e despertar a confiança no colega, para que em conjunto pudessem perceber o

espaço, de modo a despertar a curiosidade, o interesse, a participação e a vontade de

explorar o desconhecido de uma forma diferente, afinal, se trata de uma outra forma de

ver e de caminhar pela trilha11

.

Assim, de modo a estarem mais calmos, mas não menos entusiasmados, e com

elevado nível de habilidades perceptivas, principalmente devido as atividades do estágio

2, chega-se ao momento de proporcionar-lhes uma experiência rica em empatia e

compaixão em termos pessoais e de ideias ecológicos. Com isso, no estágio 3 – Dirigir a

experiência ou também denominado de Experiência direta – a atividade Encontre a

árvore é particularmente uma das principais atividades não só do estágio, mas da

metodologia (trata-se de uma das maiores expressões da proposta das Vivências com a

natureza), pois proporciona um contato direto, intenso e duradouro, despertando o

sentimento de afeto (compaixão) para com a natureza por meio do sentir (do

experienciar). Nesse sentido, seu reconhecimento não está apenas ou pura e

simplesmente em seus aspectos físicos, mas sim na sinergia que pode haver entre o

indivíduo e a natureza no momento do encontro, da descoberta. A atividade consiste em

organizar o grupo em duplas, onde uma pessoa é vendada e a outra conduzirá o

companheiro para uma árvore que lhe pareça atraente. Ao conduzir o companheiro

vendado a explorar sua árvore por meio do tato e do olfato, após o reconhecimento de

toda singularidade da árvore e de seu entorno, o guia conduz seu companheiro de volta

ao ponto de partida, retirando a venda e lançando o desafio de conseguir encontrar a sua

árvore (CORNELL, 2008). No desenvolvimento desta atividade em ambos momentos

das vivências, principalmente no segundo12

, foi possível observar, em alguns

grupos/indivíduos, o interesse e o imaginário dos participantes, que na interação com a

natureza, conseguiu-se promover o contato direto, despertando admiração, empatia,

amor, carinho, e cuidado para com a natureza por meio do contato tátil, olfativo e

perceptivo ao tocar, encontrar e reencontrar a árvore (ver figura 04). Assim, cada

indivíduo pode aprender a partir de suas descobertas pessoais, inclusive se auto

descobrindo.

O estágio 4 – Compartilhar a inspiração – é o momento mais calmo e sensível,

onde os integrantes do grupo compartilham suas experiências, seus sentimentos e

emoções com os demais, consolidando a experiência que ficou marcada, principalmente 11

Elementos melhor ainda trabalhados pela atividade Trilha cega, já que neste caso, os participantes

percorrem a trilha sozinhos, guiados apenas por um barbante. 12

Um fato curioso e marcante neste segundo momento das vivências foi quando ao propor a atividade aos

grupos, alguns discentes oportunamente relembraram a atividade anteriormente realizada, bem como

relembraram uma pequena história contata naquele primeiro momento sobre o coração da árvore, e,

assim, seguiram a realizar a atividade buscando ouvir as batidas de seu coração (uma metáfora a vida que

pulsa na natureza), demostrando ter sido esta uma atividade possivelmente inesquecível.

Page 12: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

12

nas atividades do estágio 3 (CORNELL, 2008). Nesse estágio, trabalhou-se com duas

atividades no primeiro momento (Trilha de belezas e Poema dobrado) e outras duas no

segundo momento (Meditações com a natureza e Auto carta).

A atividade Trilha de belezas, se refere a uma caminhada pela trilha, onde os

participantes devem caminhar sozinhos com intervalos de espaço e tempo uns dos

outros. Ao longo do percurso são espalhadas placas com frases para reflexão e que

tratam sobre a interação com o meio natural (CORNELL, 2008). O caminhar sozinho e

a leitura das frases, estimularam a admiração e apreciação pela beleza da natureza (ver

figura 05). Durante a execução da atividade foi possível perceber em alguns indivíduos

do grupo certo medo em caminhar sozinhos, além de certa euforia, e, ao mesmo tempo,

a ansiedade para terminar rapidamente a atividade. Ao percorrerem a trilha individual e

calmamente, e lerem as frases, denotaram de modo nítido a afeição de bem estar, a

serenidade, o alivio e o conforto, o estado de espírito elevado refletido na calma e na

tranquilidade, na admiração e na apreciação, itens passíveis de serem verificados nos

contextos e conteúdo dos poemas dobrados criados.

Já o Poema dobrado, é uma atividade onde os participantes são convidados a

expor seus sentimentos e a compartilhar suas experiências a partir da criação de um

poema coletivo. Trata-se de uma atividade para encerrar a experiência, na qual estarão

em círculo e com calma cada membro deverá escrever uma frase do poema em uma

linha, sem que os demais vejam as estrofes anteriores a esta (CORNELL, 2008). O

Poema dobrado é considerado uma das melhores formas para se encerrar uma vivência

com a natureza, que de maneira escrita busca no processo de reflexão, juntamente com

os sentimentos externados, compartilhar a inspiração a partir da experiência vivida.

Assim, em alguns grupos, os participantes se acalmaram e respeitaram o tempo de cada

participante para se expressar. Parecia nítida a expressão de tranquilidade e elevação do

estado de espírito, a serenidade ao interpretar o meio, permanecendo atenciosos e

concentrados, de modo a refletir sobre suas experiências pessoais vividas. Em geral, os

resultados ou conteúdo dos poemas em sua maioria recorriam à beleza da natureza, bem

como ao uso e consumo de recursos naturais pelo ser humano e também aos ideiais de

preservação/conservação da natureza.

Mendonça (2006) pontua que nas atividades de encerramento, o intuito é a

consolidação da experiência proporcionada por uma vivência com a natureza, no sentido

de ficar marcada no coração e na memória de cada participante, o que foi possível de se

verificar nos resultados de todas as atividades do estágio 4, mas principalmente nos

poemas dobrados e nas auto cartas.

Por fim, a atividade de auto carta13

basicamente consiste na confecção de uma

carta pessoal a si próprio. O intuito desta atividade é gravar a experiência vivida na

mente dos participantes, bem como ao receber a carta (mesmo sem desconfiarem,

posteriormente as cartas serão destinadas a si próprios - alguns meses depois) reforçar a

experiência vivida e estimular um novo contato com a natureza (CORNELL, 2008). O

desenvolvimento da atividade revelou desde elementos considerados simplórios, como

uma simples descrição daquele dia, permeada por expressões, como, por exemplo, ‘foi 13

A atividade de auto carta foi desenvolvida apenas com dois grupos, pois nestes, a partir da atividade

Meditações com a natureza, sentiu-se que seus indivíduos estavam entusiasmados com o momento de

compartilhar aquilo que sentiam, normalmente conduzidos pelas experiências vividas, bem como pelo

efeito das frases lidas e refletidas na atividade de meditações (basicamente as mesmas frases utilizadas na

atividade Trilha de belezas).

Page 13: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

13

legal’, até elementos possíveis de serem considerados valorativos da e à natureza

humana, como, por exemplo, a exaltação e referência à mãe natureza, a simplicidade de

modos de vida, a valorização a relação e a união do grupo naquele dia (em comparação

aos demais dias em sala de aula), os sentimentos e legados de perdas e saudades

pessoais e/ou de crença e valorização às condições humanas, entre outros, além da

esperança e conquista de seus sonhos, não necessariamente vinculados a bens materiais,

pelo contrário, normalmente voltados a modos e condições de uma vida digna e feliz,

inclusive, em alguns casos relacionados ao contato com a natureza. Estes elementos,

definitivamente, demonstram a elevação do estado de espírito, o fortalecimento das

experiências pessoais vividas e inspiram a outros modos de vida, normalmente em

contradição as reais situações vistas e vividas no cotidiano escolar e muito diferente dos

comportamentos e atitudes que apresentaram ao iniciar a vivência.

4. Considerações

Diante do exposto, considerou-se que as vivências com a natureza realizadas a

partir da metodologia do aprendizado sequencial, e, nesse caso, em particular, a partir

do desenvolvimento do Projeto Núcleo de Ensino da UNESP junto a escola participante,

tem se mostrado para além de uma simples estratégia pedagógica, sendo considerada

como um recurso metodológico flexível e adaptável a diferentes contextos (grupos,

locais, situações, entre outros).

Especificamente em relação a escola, é passível de ser considerada como uma

forma de educação ambiental por possibilitar uma sensibilização e a ampliação da

consciência ambiental, principalmente, a partir da interação e do aprofundamento em

relação ao contato e na (re)aproximação com a natureza, tanto física quanto humana de

cada indivíduo participante, e, prioritariamente, a partir do trabalho com os sentidos e os

sentimentos, que permitem emanar atenção e preocupação para com a natureza.

Dessa forma, considera-se que dispõe de potencial para contribuir com a relação

ensino-aprendizagem, bem como com a formação social dos indivíduos, a partir do

trabalho relativo aos seus valores, as suas atitudes e aos seus comportamentos, bem

como em relação aos sentidos e aos sentimentos emanados a si, aos outros e ao

ambiente no qual está inserido. Nesse aspecto, nos chama a atenção, por exemplo, as

distintas formas de demonstração de afeto, carinho, cuidado, respeito, atenção,

compaixão e solidariedade para consigo, com o outro e com a natureza, já que os

indivíduos mais novos demonstravam maior facilidade e espontaneidade, bem como

também se expunham mais nas práticas corporais.

Por fim, considera-se ainda que mesmo diante da significativa pertinência da

metodologia em conseguir acalmar a mente e proporcionar uma genuína experiência em

contato com a natureza, ainda sim, a experiência, bem como os resultados da pesquisa,

mostraram certa dificuldade instaurada a partir de algumas atitudes e de alguns

comportamentos dos discentes, além de por diferentes motivos, bem como pela

existência de uma série de fatores internos e externos, os resultados objetivados por

cada atividade e também por cada um dos estágios, puderam sofrer significativas

interferências, de modo a não atingir em partes a proposta das vivências com a natureza,

sendo necessário um trabalho ainda maior junto a escola e ao público participante.

Page 14: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

14

Referências

BRASIL. Decreto-Lei nº9.795, de 27 de abril de 1999. Lex: legislação federal. Brasília:

DF; 1999. Disponível em:

<http://www.mec.gov.br/se/educacaoambiental/pdf/lei979599.pdf> Acesso em: 23 out.

2005.

CASCINO, Fabio. Educação ambiental: princípios, história, formação de professores.

3ed. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2003.

CORNELL, Joseph. Brincar e aprender com a natureza: um guia sobre a natureza

para pais e professores. São Paulo: Companhia Melhoramentos: Editora SENAC São

Paulo, 1996.

__________. A alegria de brincar com a natureza: atividades na natureza para todas

as idades. São Paulo: Companhia Melhoramentos: Editora SENAC São Paulo, 1997.

__________. Vivências com a natureza: guia de atividades para pais e educadores.

São Paulo: Aquariana, 2005.

__________. Vivências com a natureza 2: novas atividades para pais e educadores.

São Paulo: Aquariana, 2008.

LIMA, Gustavo Ferreira da Costa. Educação ambiental no Brasil: formação,

identidades e desafios. Campinas: Papirus, 2011.

LOUREIRO, Carlos Frederico B.; COSSÍO, Maurício F. Blanco. Um olhar sobre a

educação ambiental nas escolas: considerações iniciais sobre os resultados do projeto

“O que fazem as escolas que dizem que fazem educação ambiental”. In: MELLO,

Soraia Silva de; TRAJBER, Rachel (Coord.). Vamos cuidar do Brasil: conceitos e

práticas em educação ambiental na escola. Brasília: Ministério da Educação,

Coordenação Geral de Educação Ambiental: Ministério do Meio Ambiente,

Departamento de Educação Ambiental: UNESCO, 2007, p. 57-63.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli. Pesquisa em educação: abordagem qualitativa. São

Paulo, EPU, 1986.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho

científico. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1986.

MENDONÇA, Rita. A experiência na natureza segundo Joseph Cornell. In:

SERRANO, Célia (Org.). A educação pelas pedras: ecoturismo e educação ambiental.

São Paulo: Chronos, 2000, p. 135-154.

__________. A proposta da Sharing Nature do Brasil. In: MINISTÉRIO DO MEIO

AMBIENTE. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. O desafio do movimento Sharing

Nature na educação ambiental contemporânea. Série Documentos Técnicos. Brasília:

Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental, 2006, p. 16-20.

Page 15: As vivências com a natureza enquanto prática de educação

15

__________. Educação ambiental vivencial. In: FERRARO JR., Luiz Antonio (Org.).

Encontros e caminhos: formação de educadoras(es) ambientais e coletivos educadores.

vol.2. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2007, p. 117-129.

MENDONÇA, Rita; NEIMAN, Zysman. À sombra das árvores: transdisciplinaridade

e educação ambiental em atividades extraclasse. São Paulo: Chronos, 2003.

SATO, Michèle. Educação ambiental. São Carlos: Rima, 2002.

TRAJBER, Rachel; MENDONÇA, Patrícia Ramos (Orgs.). Educação na diversidade:

o que fazem as escolas que dizem que fazem educação ambiental. Brasília: Secretaria de

Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2007.