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Apresentação A idéia do livro surgiu da necessidade de resgatar a história da entidade que há mais de sete décadas luta pelos direitos e defesa dos trabalhadores das Distribuidoras de Combustíveis, da BR Distribuidora, das empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito, da Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais (CPRM), dos Postos de Gasolina de todo o estado do Rio de Janeiro e trabalhadores da categoria Transportador Revendedor-Retalhista (TRR). Por ser um dos sindicatos pioneiros do Brasil, a história do Sitramico-RJ não poderia deixar de ser contada. O título Sitramico-RJ 75 anos de luta e história marca a trajetória do sindicato e a evolução do movimento sindical no desenvolvimento do país. O livro conta um pouco da história da entidade, descrevendo os tempos pelos quais passou, os governos com os quais conviveu, os desafios e as lições aprendidas, as vitórias e os homens que lutaram pelos ideais da categoria. O projeto relata também os principais fatos da classe, como era o mundo quando o sindicato começou, como pensavam seus trabalhadores e quais forças o dirigiam. A história do SITRAMICO-RJ está ligada aos grandes acontecimentos no mundo. Ela relata o inicio das atividades da entidade em 1931, quando o Estado do Rio de Janeiro era a capital do país. A narrativa percorre o tempo, passando por várias décadas e Livro Sitramico.pmd 16/8/2006, 15:33 1

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Apresentação

A idéia do livro surgiu da necessidade deresgatar a história da entidade que há mais de setedécadas luta pelos direitos e defesa dos trabalhadoresdas Distribuidoras de Combustíveis, da BRDistribuidora, das empresas Distribuidoras de GásLiquefeito, da Companhia de Pesquisa e RecursosMinerais (CPRM), dos Postos de Gasolina de todo oestado do Rio de Janeiro e trabalhadores da categoriaTransportador Revendedor-Retalhista (TRR).

Por ser um dos sindicatos pioneiros do Brasil, ahistória do Sitramico-RJ não poderia deixar de sercontada. O título Sitramico-RJ 75 anos de luta ehistória marca a trajetória do sindicato e a evoluçãodo movimento sindical no desenvolvimento do país.

O livro conta um pouco da história da entidade,descrevendo os tempos pelos quais passou, osgovernos com os quais conviveu, os desafios e aslições aprendidas, as vitórias e os homens que lutarampelos ideais da categoria. O projeto relata também osprincipais fatos da classe, como era o mundo quandoo sindicato começou, como pensavam seustrabalhadores e quais forças o dirigiam.

A história do SITRAMICO-RJ está ligada aosgrandes acontecimentos no mundo. Ela relata o iniciodas atividades da entidade em 1931, quando o Estadodo Rio de Janeiro era a capital do país. A narrativapercorre o tempo, passando por várias décadas e

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Dedicatória

Esse livro é dedicado a todos os trabalhadores dasDistribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes, BRDistribuidora, Companhia de Pesquisa e RecursosMinerais, Distribuidoras de Gás Liquefeito, dos Postosde Gasolina e trabalhadores da categoria TransportadorRevendedor-Retalhista (TRR) que sempre acreditaramno Sitramico-RJ. A todos sindicatos co-irmãos, quenos ajudaram nessa longa trajetória. E a todossindicalistas que lutaram e que continuam lutando emdefesa dos direitos dos trabalhadores.

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Sitramico-RJ 75 anos de luta e história

� Direitos Reservados - Lei 5988 de 14/12/1973Proibida Reprodução total ou parcial sem autorização

� Capa, Projeto Gráfico - Frank Augusto

Dagoberto Souto Maior é jornalista e já passou por alguns dos

maiores veículos de comunicação do país. Em sua experiência

profissional constam passagens pelos Jornais do Brasil e pelo O Dia,

nos quais foi redator, repórter e editor, respectivamente, editoras

de revistas, televisão.

Atualmente é produtor de reportagens na Rede Globo, onde

participou da produção das séries Estradas e Fronteiras,

vencedoras dos prêmios da Confederação Nacional do Transporte de

Jornalismo e do prêmio espanhol Príncipe de Astúrias.

Para garantir que a história do sindicato não fosse manipulada

ou sofresse influências, a diretoria do Sitramico-RJ convidou o

jornalista para desenvolver o projeto do livro.

Para escrever sobre a história do Sitramico-RJ, o jornalista

se dedicou durante mais de seis meses a um trabalho ininterrupto,

período durante o qual releu documentos históricos, entrevistou

alguns dos principais nomes do sindicalismo brasileiro e do

Sitramico-RJ e pesquisou a história de luta dos trabalhadores

brasileiros pelos seus direitos.

Autor

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Agradecimentos

O Sitramico-RJ agradece a todos os sindicalistas queajudaram para tornar esse livro realidade. Agradecetambém a todos que se empenharam para que a históriada entidade fosse contada de forma transparente ecom total isenção política.

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Índice - União e Força

CAPÍTULO I

Como tudo começou ---------------------------------- 8 a 16

CAPÍTULO II

Os Pioneiros -------------------------------------------- 17 a 23

CAPÍTULO III

O Caso Atlantic--------------------------------------- 24 a 27

CAPÍTULO IV

Uma Greve nos Postos --------------------------- 28 a 31

CAPÍTULO V

O Primeiro Jornal ----------------------------------- 32 a 34

CAPÍTULO VI

Os Anos 50 e 60------------------------------------- 35 a 45

CAPÍTULO VII

A Compra da Sede Própria --------------------- 46 a 48

CAPÍTULO VIII

O Adicional de Periculosidade -------------- 49 a 54

CAPÍTULO IX

Esporte, Lazer e Sindicalização ----------- 55 a 58

CAPÍTULO X

Unidos pela Democracia ------------------------- 59 a 69

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CAPÍTULO XI

A Luta da Mulher no Sindicato ------------- 70 a 73

CAPÍTULO XII

A Compra da Colônia em Teresópolis ---- 74 a 76

CAPÍTULO XIII

Junta Governativa, A Luta contra o Metanol e

o Auto-Serviço----------------------------------------- 77 a 82

CAPÍTULO XIV

A Batalha contra o Metanol ------------------ 83 a 88

CAPÍTULO XV

A Batalha contra o Auto-serviço----------- 89 a 91

CAPÍTULO XVI

2004 Olhando para o Futuro ---------------- 92 a 96

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Depois de mais um longo dia de trabalho, todos sedirigiram para o local combinado - a sede social do

Centro dos Operários e Empregados da Light e CompanhiaAssociados. Já era noite, e o grupo era formado por maisde cem homens, todos trabalhadores das companhias depetróleo do Rio de Janeiro, a capital da República que fervianaqueles idos de 1931. Às oito da noite, já estavamreunidos. Em comum, tinham o desejo de transformar emrealidade a idéia de meia dúzia de trabalhadores de suaclasse: formar um sindicato. Os motivos podem ter sidoa inspiração de outras categorias que estavam fazendoo mesmo, a vontade de lutar por melhores salários, abusca por condições mais dignas de trabalho, umaalternativa para enfrentar com mais força as poderosasmultinacionais do setor do petróleo, que recém instalavamsuas bases no Brasil.

A idéia não era nova. Afinal, organizações para lutarpelas causas trabalhistas existiam no Brasil desde a épocada escravidão, quando funcionavam irmandades, juntasde alforrias, alianças de camponeses livres. A diferençaagora era que, graças ao novo governo, liderado pelosrevolucionários de 1930, os sindicatos eram finalmentelegais. Mais do que isso, eram a principal bandeira dapresidência de Vargas.

Como tudo começouComo tudo começouComo tudo começouComo tudo começouComo tudo começouUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

I

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8 União e Força

E por isso mesmo, aquela reunião na sede social dosoperários da Light deve ter sido cercada de entusiasmo,alegria e orgulho. Orgulho por serem os pioneiros na lutapelos ideais de sua categoria. Estavam lá trabalhadores daThe Caloric Company, The Standard Oil of Brazil, The Te-xas Company, Atlantic Refining of Brazil e Anglo-MexicanPetroleum Company. O primeiro a falar foi Gonçalo, da co-missão organizadora. Depois de alguns pedidos de silên-cio, sugere à assembléia que o Antônio, Antônio Neves doRosa, provavelmente por sua experiência como primeirosecretário da União dos Operários e Empregados em Mari-nhos, Fábricas de Biscoitos e Massas Alimentícias, sejaaclamado para presidir a mesa. Ele aceita de imediato. Paracomeçar, Antônio acha importante explicar as condiçõeslegais dadas pelo novo governo para que os sindicatos fun-cionem. Era coisa nova, conceitos que nem todos conheci-am, leis recém promulgadas, por isso comenta a Lei deSindicalização e faz uma exposição sobre os fins daquelaassembléia. Feito isso, ele prossegue os trabalhos. Sãoescolhidos o primeiro e segundo secretários daquela reu-nião, Mario Epaminondas da Silva e Antônio Pinto.

Mário lê o anteprojeto dos estatutos do novo sindicato,item por item, para que sejam ouvidos e aprovados por to-dos os cento e trinta companheiros presentes. Todos escu-tam atentamente, ele segue lendo, parando em alguns arti-gos, que são discutidos. O valor de certos benefícios, auxí-lios para funerais, a composição do conselho deliberativo,que, por decisão de todos, seria formado por dez represen-tantes, de todas as companhias. O estatuto então é apro-vado integralmente pela assembléia. Chega a hora de ele-ger a primeira diretoria e o primeiro conselho fiscal, para oano de 1931. São aclamados por unanimidade Armando do

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Espírito Santo, como presidente. Antônio Pinto seria seuvice-presidente. Plínio Gama, primeiro-secretário, Walde-mar Aquino, segundo-secretário. Gonçalo Berlitz da Silva,primeiro-tesoureiro, Severino Francisco da Silva, segundo-tesoureiro. O procurador era José Estevam de Assis. OConselho Fiscal seria formado por Mario Epaminondas daSilva, Wanderlino Alves, Octacílio França Monteiro e ArthurLeonardo dos Santos, Raymundo dos Santos.

Todos então se cumprimentam. Vários companheirosfalam, a noite segue em discussões acaloradas, todos que-rem dizer como estão felizes com a formação do sindica-to, e não faltaram também muitos discursos de apoio aotrabalho que vinha sendo realizado pelo Governo Provisó-rio, liderado pelo gaúcho Getúlio Vargas. A reunião vai che-gando ao fim. O presidente da assembléia então parabe-niza os colegas sindicalistas e diz mais uma vez que onovo sindicato terá total apoio da União dos Operários eEmpregados em Fábricas de Biscoitos e Massas Alimen-tícias. Antônio Pinto é o responsável por lavrar a ata.

Eram onze da noite de 7 de agosto. O dia seguinte, 8de agosto de 1931, passaria para a história como a dataem que o sindicato seria formalmente criado. Todos estãocansados, mas com o coração mais tranqüilo, sabendoque, se algum dia precisassem de apoio, teriam naquelesindicato a ajuda necessária de um companheiro, um tra-balhador como ele, e isso era confortador.

E foi desta maneira que se passou a primeira reuniãodo Syndicato dos Operarios e Empregados nas Empre-zas de Petroleo e Similares do Districto Federal.

* * *O empenho, o trabalho, a luta do Sitramico-RJ pelos

trabalhadores não vem de hoje. As conquistas atuais co-

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meçaram a ser perseguidas por um grupo de meia dúziade homens, funcionários do então promissor setor de pe-tróleo, em um tempo no qual falar em direitos dos trabalha-dores era caso de segurança nacional, combatido com aforça policial. Uma lei de 1907, a lei Adolfo Gordo, era for-mada de quatro artigos que determinavam, sem mais deta-lhes, prender e expulsar do país todo o estrangeiro que fa-lasse de anarquismo, anarcosindicalismo e greve. Não ha-via descanso semanal aos domingos, férias, pagamento dehora extra ou licença gestante. Trabalhava-se, e os donosdo emprego, em sua maioria, antigos barões do café, trafi-cantes de escravos e demais representantes da elite bur-guesa brasileira, achavam que a simples oferta do empre-go era, em si, uma dádiva. O mais comum era estabelecercomo prática de tratamento dos empregados assalariadosos castigos físicos, uma carga horária abusiva de trabalho– que poderia chegar a 16 horas por dia – e quase nenhumdescanso ou segurança em seu local de trabalho.

Quando o Sitramico-RJ começou foi um dos pionei-ros. Um dos primeiros do Brasil a defender os direitos dostrabalhadores, o primeiro de sua classe. No início dos agi-tados anos 30, um período de conturbação política no Bra-sil, mas de grandes avanços nas conquistas trabalhistase sociais. Um tempo em que os operários eram citadosnos discursos dos principais líderes políticos do país.

- Trabalhadores do Brasil!Era Getúlio Vargas, o advogado de São Borja, presi-

dente do Rio Grande do Sul, que desta maneira costuma-va se dirigir à multidão que o ouvia como presidente daRepública do Brasil. Era assim que se referia aos brasilei-ros, ao falar pelo rádio, em seus pronunciamentos públi-cos, ou, quem sabe, para a multidão que o escutava com

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atenção no estádio lotado do Vasco da Gama, em SãoCristóvão, no Rio de Janeiro, para mais uma das come-morações do Dia do Trabalhador.

- Aqui estou, como de outras vezes, para compartilhardas vossas comemorações e testemunhar o apreço quetem o homem do trabalho como colaborador direto da obrade reconstrução política e econômica da pátria! – dizia.

A multidão aplaudia. Ela entendia a mensagem: Var-gas falava aos trabalhadores, a eles havia escolhido comobase principal de seu jeito de governar, e em favor delesprometia exercer o poder. Getúlio chegou ao poder em 1930como líder civil de uma revolução que tinha como objetivomudar a ordem política e econômica do Brasil, então umestado de economia rural, dominado por grupos oligárqui-cos que se revezavam no comando político. Era a políticado “café com leite”, na qual os estados de São Paulo eMinas Gerais, que tinham como principais representantesos barões do café, escolhiam os presidentes da jovemRepública, ora um paulista, ora um mineiro, para que, como comando do Estado, pudessem negociar e obter vanta-gens para a comercialização do café, que já apresentavaqueda em suas cotações nos mercados internacionais.Mas, ao indicar o paulista Júlio Prestes, do PRP, comoseu sucessor, e não um mineiro, como era o esperado, opresidente Washington Luís quebra o equilíbrio político exis-tente. O partido Republicano Mineiro, até então governo,passa para a oposição e forma, com o apoio de um grupode políticos e militares insatisfeitos com essa hegemoniapolítica que deixava à margem do poder estados impor-tantes do Brasil, como o Rio de Janeiro, o Rio Grande doSul e outros estados do nordeste, a Aliança Liberal. Getú-lio Vargas era o líder desse grupo, que incluía nomes como

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Oswaldo Aranha, Góis Monteiro, Lindolfo Collor, Flores daCunha e tenentes que tinham tomado parte da ColunaPrestes ao lado de Luís Carlos Prestes.

A Aliança Liberal indica Vargas a presidente, contraJúlio Prestes. Mas a chapa de Prestes e de seu vice, VitalSoares, vence as eleições de março de 1930. Inconfor-mada, a Aliança Liberal ainda pressionava, politicamente,para que a vitória de Júlio Prestes não se consumasse. Oassassinato do então presidente da Paraíba, João Pes-soa, vice de Getúlio na chapa da Aliança Liberal, provocoucomoção popular e fez com que o Exército apoiasse o gru-po de Vargas, que decidira fazer uma revolução, um golpearmado contra o governo. O crime tinha sido passional,mas a Aliança Liberal atribuía ao fato caráter político. Di-ante da recusa de Washington Luís em renunciar, os mili-tares que apoiavam os revoltosos cercam o Palácio daGuanabara e ordenam a prisão do presidente. Numa de-monstração de poder, os revolucionários amarraram seuscavalos no Obelisco da Avenida Rio Branco. A RepúblicaVelha (1889-1930) chegava ao fim.

Sendo o Rio Grande do Sul o estado com maior poderdentro do grupo revolucionário, a decisão é que o poderseria entregue a Vargas. A ele caberia concretizar os obje-tivos deste grupo: a realização de reformas sociais e acentralização do poder. Uma das metas sociais a serempostas em prática era a legalização dos sindicatos. O ho-mem escolhido para ser o primeiro ministro do Trabalhodo Brasil, Lindolfo Collor, deveria dar os direitos que ostrabalhadores exigiam, criar sindicatos, mas por meio de-les manter o controle sobre a classe trabalhadora. E oministério foi criado em menos de um mês depois de Ge-túlio chegar ao poder, a 26 de novembro de 1930. Neste

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novo Brasil, fruto de uma revolução armada, repleto de in-satisfações de sua classe trabalhadora, é que começama aparecer as condições para a criação dos sindicatosorganizados, que permitiram a criação do Sitramico-RJ.

O foco dos revolucionários de 1930 nos anseios dostrabalhadores tinha origem no panorama mundial à épo-ca. Ainda estava recente na memória de todos o episódioque ficou conhecido mundialmente como a morte dos “Már-tires de Chicago”, quando, em novembro de 1886, quatrolíderes operários foram enforcados em Chicago, nos Es-tados Unidos, porque lutavam para garantir oito horas detrabalho à sua categoria. Um quinto operário do grupo sematou. As mortes foram o desenlace de um movimentotrabalhista ocorrido nos Estados Unidos e que havia tidoseu início em 4 de maio, quando numa gigantesca greveem Chicago, a polícia montada reagiu violentamente, seaproximando do palanque onde falavam os líderes do mo-vimento, prendendo sete de seus representantes e dispa-rando na direção dos outros manifestantes, matando de-zenas de pessoas. A tragédia foi tão chocante que serviupara, mais tarde, estabelecer o dia primeiro de maio comodata em homenagem aos trabalhadores de todo o mundo.

E de fato o mundo tremia em greves e manifestaçõesda classe proletária. A economia mundial passava uma desuas piores crises. A crise da Bolsa de Nova Iorque, em1929, derrubava governos e deixava um rastro de falênci-as por todos os países, milhares de vagas desaparece-ram da noite para o dia. E tudo se transformava rapida-mente. No Brasil, se no fim dos anos 20 os trabalhadoresnas cidades não passavam de cerca de 300 mil pessoas,no fim da década de 30 eles chegariam a mais de um mi-lhão. Os grupos de desempregados somavam-se aos de

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trabalhadores que, quando exigiam seus direitos, eramreprimidos à bala. As questões trabalhistas eram tratadaspelo Ministério da Agricultura. As manifestações eram tra-tadas como distúrbios sociais. Os velhos coronéis, acos-tumados com a economia escravocrata, consideravamreivindicações trabalhistas uma afronta ao poder estabe-lecido. Por isso, Collor passa a chamar sua pasta de “OMinistério da Revolução”.

Tendo este mundo em ebulição como pano de fundo,o governo Vargas promulga, em março de 1931, o Decre-to 19.770, que estabelecia a Lei de Sindicalização. Se, porum lado, atendia a exigências dos trabalhadores, manti-nha os sindicatos sob rédeas curtas. Criava o princípio daunidade sindical, que fortaleceu as entidades reconheci-das oficialmente pelo Governo, pois só elas poderiam re-presentar legalmente os trabalhadores sindicalizados nasJuntas de Conciliação, criadas em 1932, e posteriormenteperante a Justiça do Trabalho, criada em 1934. Por outrolado, jogou na clandestinidade centenas de associaçõese sindicatos informais que, criados por anarquistas e co-munistas, lutavam pelas causas trabalhistas. Apenas umsindicato de cada categoria era reconhecido pelo gover-no. A lei proibia a propaganda política e religiosa dentrodos sindicatos. Caberia ao Ministério do Trabalho supervi-sionar a vida política e – o mais importante – as contasdos sindicatos.

A reação da sociedade foi imediata. A Igreja, parte doempresariado e antigos líderes de esquerda temiam per-der força com a nova legislação. Mas o governo não ce-deu, e provou que sua estratégia se tornou vitoriosa. Cen-tenas de sindicatos começaram a se formar nos primei-ros anos após a Lei de Sindicalização para que seus as-

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sociados gozassem dos benefícios da nova Lei. As jorna-das de trabalho começaram a ser regulamentadas na in-dústria e no comércio em oito horas. Assim como foramregulamentados também o trabalho das mulheres e dosmenores de idade. As Caixas de Aposentadorias e Pen-sões – fundos para garantir o futuro dos trabalhadoresaposentados, antes restritos aos marítimos, portuários eferroviários – foram estendidas a outras categorias.

Getúlio Vargas assina lei de Sindicalização

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Beneficiado por esta série de ações do Governo Vargas,o Sitramico-RJ inicia suas atividades, em 1931. A fun-

dação ocorreu em agosto, mas a primeira reunião de atapara a organização do que seria o sindicato ocorreu em 22de julho de 1931. Sua carta patente data de 10 de setembrode 1931, quando era formado oficialmente perante o Gover-no o então Syndicato dos Operarios e Empregados nas Em-prezas de Petroleo e Similares do Districto Federal. A pri-meira sede do Sitramico-RJ funcionou na Rua do Acre, nú-mero 78, no centro do Rio de Janeiro. Os pioneiros, umgrupo de funcionários da empresa de petróleo Atlantic, umasdas principais do setor no mundo e recém-chegada ao Bra-sil. A partir de então, o sindicato passa a representar osinteresses e desejos dos funcionários de escritório e dospostos das empresas de petróleo em atividade na capitalfederal. Um anúncio publicado no jornal A Pátria, em marçode 1935, fazia um apelo para que os colegas da StandardOil se unissem ao sindicato, numa demonstração de coe-são e força da categoria.

“Só o Syndicato pode conduzir uma classe à victoria desuas aspirações, porque elle é a única arma com que todosos trabalhadores devem preparar-se para defender-se daopressão que as vezes exercem certos patrões, dominadospelo excesso de ambição e pela influencia seductora do ca-

Os PioneirosOs PioneirosOs PioneirosOs PioneirosOs PioneirosUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

II

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17SITRAMICO-RJ

pital”, dizia um artigo escrito no sindicato em 1935 para serdistribuído entre seus associados.

Era a época dos pioneiros, daqueles que primeiro luta-ram por seus direitos no Brasil, e acreditaram que, pela for-ça da lei, poderiam garantir condições dignas para a classetrabalhadora. No Sitramico-RJ, entre esses pioneiros esta-vam François Lima Aguiar, Nilo Pinheiro Barroso, José Al-ves da Cunha Bastos, Severino Francisco da Silva, RaulBraga, Fausto de Souza, Damião Macedo Barradas, Ama-zor Ventura Boscoli, Manoel Vieira da Silva, José Fiúza Cor-rêa de Sá. Entre os motivos que teriam levado a criação dosindicato, de fato, nada de extraordinário. A pista está noprimeiro jornal do órgão, editado em 1937, que relata o iní-cio das atividades da instituição.

“A classe do petróleo foi uma das primeiras que semesmorecimentos atendeu a esse sopro de innovação que aLei lhe acenou; talvez por ser uma das mais necessitadas”.A lei a que se referia o texto era o decreto 24.694 de 12 dejulho de 1934, uma modificação da Lei de Sindicalização.

Além da sede própria na Rua México, onde funciona hoje,o Sindicato funcionou também na Rua Luís de Camões, 34,na Rua Buenos Aires, 125, 1o andar, na Rua do Mercado, 22,2o andar, esquina com a Rua do Ouvidor, que depois viria ase chamar Rua Paulo Bregaro.

O projeto de uma das primeiras convenções coletivasda categoria data de 1o de janeiro de 1935. Nela constamavanços importantes na regulamentação do trabalho no se-tor, como o período de 8 horas diárias, podendo chegar adez horas, com previsão de horas extras contratuais, basede 200 horas de trabalhos mensais e uma base para cálculodo ordenado pago diária e mensalmente. No caso do que erapraticado à época pela empresa Atlantic, eram valores esti-

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pulados em 17$000 réis por dia, ou 510$000 réis por mês.O Sindicato prossegue em sua função de defender os

direitos da categoria. Lutando pela readmissão e recoloca-ção de funcionários demitidos injustamente, buscando inde-nizações para viúvas de trabalhadores da categoria, ensi-nando inglês gratuitamente a seus associados – já que to-das as empresas do setor eram americanas.

Nesta época, o setor de petróleo revelava-se como umdos mais poderosos do mundo, principalmente porque aju-dava a mover a economia dos tempos modernos. Na pri-meira década do século, Henry Ford havia feito uma revolu-ção capitalista ao apresentar à humanidade, em 1908, seumodelo de automóvel, o Ford-T. O mundo nunca mais seriao mesmo. Andaria mais rápido, as distâncias desaparece-riam, as fábricas se tornariam cada vez mais comuns, osempregos nas fábricas se multiplicariam, as pessoas sairi-am dos campos e das fazendas. E tudo era movido a pe-tróleo, a gasolina, óleo diesel, querosene.

Para produzir e comercializar esses produtos, as indús-trias precisavam de muita mão-de-obra, e eram estes traba-lhadores que formavam o sindicato. Era uma época marca-da pelo crescimento industrial, quando as empresas do se-tor do petróleo chegavam ou apareciam e se desenvolviamno país. A Esso, que primeiro tinha o nome de Standard OilCompany of Brazil, foi a pioneira no Brasil na distribuição dederivados do petróleo, vendia em latas a novíssima gazolinae o kerozene. Suas atividades começaram graças a um de-creto do presidente Hermes da Fonseca, assinado em 17 dejaneiro de 1912. Ela foi uma das primeiras também a instalaras bombas de abastecimento na rua, a construir vagões-tan-que e a usar caminhões-tanque para transportar combustí-vel, a abastecer as primeiras aeronaves comerciais brasilei-

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ras. A Shell também era recém-chegada em terras brasilei-ras. Seu início data do ano de 1913, ainda com o nome deAnglo-Mexican Petroleum Products Company. Um ano de-pois, a multinacional inaugura, na Ilha do Governador, um dosprimeiros depósitos de óleo combustível do Brasil. A empre-sa começa então a distribuir, no lombo de burro, óleos com-bustíveis industriais, o tradicional kerozene Aurora, lubrifican-tes e a gasolina Energina. Em 1922, a Shell instalava suasprimeiras bombas de gasolina em ruas e garagens.

A Texaco também começou a operar no Brasil na mes-ma época. Em setembro de 1915, um decreto do então pre-sidente da República, Wenceslau Brás, autorizava a The Te-xas Company South America Ltd. a se instalar no país. Quan-do a Ipiranga começou a sua história, o Sitramico-RJ já esta-va em atividade. A empresa começou sua atividades na ci-dade gaúcha de Rio Grande no dia 7 de setembro de 1937,era a Ipiranga S.A. Companhia Brasileira de Petróleo que ini-ciava sua trajetória, com uma pequena refinaria de petróleo,o que já era o resultado positivo de uma empreitada que ha-via começado três anos antes, em 1933, na cidade de Uru-guaiana, também no Rio Grande do Sul.

O setor de gás, embora mais timidamente, começoutambém na década de 30 a dar seus primeiros passos noBrasil. Em 1927, já instaladas no Brasil, entram no mercadode Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) as grandes multinacio-nais: Philips Petroleun, Shell, Standard Oil. Uma década maistarde, em 1937, é feita a primeira importação de GLP no Bra-sil. No Rio de Janeiro e no interior de São Paulo, em Santos,são construídos os primeiros terminais do produto. A popula-ção, entretanto, ainda consumia muito pouco o produto, jáque os principais combustíveis usados nos fogões domésti-cos e aquecedores eram o querosene e o carvão vegetal.

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A partir daí, o setor começou a experimentar um desen-volvimento. Em 1939, cerca de 400 famílias cariocas já usa-vam o gás engarrafado. Em 1942, este número pulou rapida-mente para o patamar de mais de cinco mil famílias. Comoas oportunidades para a utilização do produto não paravamde aparecer, em 1946, convencida de que o mercado para ouso do gás no país era promissor no Brasil, a Standard Oilabre no Rio de Janeiro a Companhia Nacional de Gás Esso,atual Supergasbrás. O início da industrialização do produtono Brasil só ganharia verdadeiro impulso mesmo em 1955,no governo desenvolvimentista de Juscelino, no qual decide-se, para dinamizar o setor energético, iniciar a produção doGLP no país por meio das refinarias da Petrobras. De lá paracá, o setor não parou de se desenvolver e se popularizar.

O anos 30 presenciaram um crescimento sem igualda atividade sindical, recém-legalizada e motivada pelachancela federal. Em junho de 1931 o novo governo deGetúlio, recém-instalado no Catete, já tinha expedido cercade 400 cartas a sindicatos de trabalhadores e mais de 70 aorganizações da mesma natureza que reuniam empresári-os. Números divulgados em 1939 pelo Departamento deEstatística e Publicidade do Ministério do Trabalho mostra-vam um quadro ainda mais animador. Naquele ano, o go-verno propagandeava que, se em 1931 existiam 36 sindica-tos no Brasil, em 1 de janeiro de 1939 este número haviapassado a 2.103 associações de classe, sendo 1.039 deempregados, 889 de empregadores, 112 de profissionaisliberais e 63 classificadas por “trabalhadores por conta pró-pria”. Funcionavam 15 federações, 13 uniões e uma confe-deração. Entre as federações, a predominância era de gru-pos formados por empregadores, enquanto que, entre asuniões, a grande maioria era de sindicato de operários. Por

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isso o governo getulista, populista e centralizador por natu-reza, buscou controle total dos sindicatos. O ponto positivodesta política foi que a luta da classe trabalhadora deixoude ser crime para ser regulamentada por Lei. Mas, em al-guns casos, o excesso deste controle, incrementado como início do Estado Novo em 1937 – com a unicidade sindi-cal, o imposto sindical e a fundação dos sindicatos oficiais– acabou criando o peleguismo, espécie de movimento sin-dical atrelado e subserviente ao Estado, chegando a trairseus compromissos com os trabalhadores.

Nesta época de aparecimento e desenvolvimento da ati-vidade sindical no país, a resistência de alguns setores dasociedade era flagrante, e não foram poucos os momentosem que trabalhadores, sindicalizados ou não, tiveram quelutar por direitos que muitas vezes já estavam previstos emlei. A classe dominante, o que havia restado da Velha Repú-blica, se recusava a aceitar os novos tempos. Ficou famosonaqueles tempos o caso em que um juiz substituto da 1ªVara Federal do Rio de Janeiro, Edgard Ribas Carneiro, anu-la a vitória obtida na Justiça pelo Sindicato dos Professoresdo Distrito Federal contra um militar dono de um colégio, quetinha demitido o professor por este ser sindicalizado. Em suaargumentação para anular todo o caso, Ribas Carneiro sus-tentou que os sindicatos só eram aptos a representarem ostrabalhadores em causas coletivas, e não individuais, comodizia ser o caso do professor demitido. Para estes casos,afirmava o juiz, era necessário que o professor tivesse dadouma procuração para que o sindicato defendesse seus inte-resses. O assunto provocou enorme polêmica à época, todoo meio sindical se agitou contra a decisão do juiz, argumen-tando que a mesma feria de morte toda a legislação traba-lhista aprovada e o próprio Ministério do Trabalho. Se o juiz

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tivesse razão, argumentavam os sindicalistas, qualquer as-sociação, munida de uma procuração, defenderia os traba-lhadores, e acabariam os sindicatos.

As dificuldades eram inúmeras, em muitos setores. Mui-tos deputados, em discurso na Câmara, denunciavam queempresas ameaçavam seus empregados de demissão,caso pensassem em fundar um sindicato. Em outros ca-sos, os funcionários sindicalizados eram simplesmente su-mariamente demitidos. Um outro exemplo, citado na épocaem um discurso na tribuna do deputado Chrisostomo deOliveira, em Santos, no litoral de São Paulo, um sindicatolocal era limitado pela empresa a ter no máximo sessentasócios, quando a categoria possuía no local mais de 600trabalhadores em atividade. O que hoje parece desmandoe abuso de poder, na época era uma atitude corriqueira porparte dos empregadores.

As críticas a novíssima legislação trabalhista eram vari-adas. Argumentava-se que o Brasil era grande demais, paraque se pudesse, com uma legislação única, contemplar to-dos os seus trabalhadores.

Em 1935, uma vitória conquistada pelos trabalhadoresfoi a aprovação, pela Câmara dos Deputados, que na épocafuncionava no Rio de Janeiro, do projeto que finalmente as-segurava uma indenização aos trabalhadores, caso viessema ser demitidos sem uma justa causa. O projeto, do ex-de-putado Vasco de Toledo, previa como algumas das razõespara demissão do trabalhador embriaguez em serviço, aban-dono do serviço, prática constante de jogos de azar. Era umgrande passo para que houvesse uma garantia legal para otrabalhador assalariado da indústria e do comércio.

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O Governo Vargas mal tinha começado, e com eles todos os sindicatos formais do Brasil, quando o Sitramico

do Rio começa a sua luta pelos direitos dos trabalhadores.Uma das provas históricas dessa luta ocorreu no ano de 1935,com o que ficou conhecido ruidosamente como o caso Atlantic.Com apenas quatro anos de fundação, o Sindicato dos Tra-balhadores em Petróleo parou a cidade em defesa de seupresidente, da democracia e da liberdade.

O caso começou com a perseguição iniciada pela em-presa a um de seus funcionários. Mais precisamente, a per-seguição do então presidente da Atlantic Refining Company,H. E. Tscherfinger, ao chefe da contabilidade da companhia,Samuel Moysés Xaminitz, que chegou a ser ameaçado dedemissão pelo simples fato de ser sindicalizado. Nos agita-dos anos 30, o Sitramico-RJ tomou a defesa de Samuel Xa-minitz. O presidente do sindicato à época, François Lima deAguiar, que era guarda-livros na mesma empresa, defendeuo colega, chegando a enviar ofícios ao Ministério do Trabalhodenunciando os abusos da empresa. O envio dos documen-tos bastou para que o caso se agravasse ainda mais, o quelevou, numa atitude extremada, à demissão do presidentedo Sitramico sem uma causa justa.

A classe reagiu com um vigor surpreendente. A onda deprotestos, inesperada pela empresa, fez com que, em se-

O Caso AO Caso AO Caso AO Caso AO Caso AtlantictlantictlantictlantictlanticUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

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III

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tembro daquele ano, um grupo de quinhentos funcionáriosda Atlantic fosse ao Ministério do Trabalho em protesto pelademissão de François. Funcionários dos escritórios e dasilhas rumaram à sede do Ministério, e não saíram de lá atéque o ministro, Agamenon Magalhães, encaminhasse o casoà procuradoria do Departamento Nacional do Trabalho. Maso que parecia estar se resolvendo, se complicou ainda mais.O que ninguém poderia suspeitar é que o caso resultaria emuma greve que ameaçou parar a cidade do Rio de Janeiro,então capital da República.

A luta do Sitramico-RJ naquele setembro de 1935, pelarecontratação pela Atlantic de seu então presidente, Fran-çois Lima de Aguiar, ganhou as páginas dos principais jor-nais da capital, que destacavam a luta de um sindicato pelainjusta demissão de seu líder. “A diretoria da Atlantic perse-gue os trabalhadores”, dizia o Correio da Manhã. “Protestode um syndicato contra a demissão do seu presidente”, pu-blicava A Noite. “Protestando contra uma demissão”, traziaem sua manchete O Globo de 26 de setembro de 1935. Apedido do ministro do Trabalho, Agamenon Magalhães, foiaberto inquérito. O então presidente da companhia no Brasil,H. E. Tscherfinger, foi convocado ao ministério para se expli-car. Mas o caso não se resolvia. A Atlantic não recontratavaFrançois. E o caso foi parar na Junta de Conciliação.

Com o passar dos meses, casos como o da Atlanticajudou a formar entre os trabalhadores brasileiros e a opi-nião pública a convicção de que as leis trabalhistas e sociaiscriadas pelo governo de Getúlio Vargas eram simplesmenteignoradas pelas empresas brasileiras. Até que, no dia 2 denovembro de 1935, o Sitramico decide mobilizar todos ostrabalhadores do setor para uma greve geral, em protestopelo caso Atlantic. Os jornais estamparam que a cidade do

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Rio estava ameaçada de ficar sem gasolina. A capital iriaparar. Dois mil homens cruzaram os braços. O serviço detransporte de combustíveis estava suspenso. Os trabalha-dores da Atlantic suspenderam o transporte do combustíveldos depósitos, nas ilhas, para a cidade.

O Ministério do Trabalho promete então ao Sitramicoque François Lima de Aguiar seria recontratado. A procura-doria, depois de analisar o caso, decide que o presidentedo Sitramico deveria voltar ao trabalho. Mas na sua reapre-sentação à empresa, a presidência da Atlantic anuncia queele seria posto em disponibilidade remunerada se ele acei-tasse em pedir demissão.

Vencida, mesmo que parcialmente, a batalha pela vol-ta de François Lima ao trabalho na Atlantic, a classe come-ça a voltar, aos poucos, ao trabalho. No dia quatro de no-vembro do mesmo ano, os empregados do setor voltaramao trabalho pela manhã. A greve prossegue parcial, com aameaça de convocação para os movimentos dos funcioná-rios dos postos de gasolina. François Lima é então presopela polícia política de Getúlio Vargas. Outros três trabalha-dores que faziam greve também foram detidos: AntônioBento da Cruz, mecânico da Caloric, Dioclécio Barbosa,ajudante de caminhão da Caloric, e João Vigerio, emprega-do no armazém da Stender no cais do porto. No dia cincode novembro, todos se reúnem no Ministério e chegam aum acordo. Satisfeito pela demonstração de força do movi-mento da categoria, François cede e aceita ser reintegradoao seu posto, mesmo sendo colocado em disponibilidaderemunerada. Mas avisa que pediria demissão, pois não que-ria continuar trabalhando na empresa.

- Combinou-se que a companhia me readmitirá e meconsiderará em disponibilidade remunerada. Em seguida,

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por vontade própria, pois não desejo continuar como funci-onário da Atlantic, mesmo em disponibilidade pedirei exo-neração do cargo. Por seu lado, as empresas de petróleose comprometerão a não demitir quaisquer empregado dosque tomaram parte do movimento de protesto. – declarouFrançois de Aguiar ao O Globo.

O Sitramico RJ fortalecia-se como legítimo represen-tante de sua classe, no enfrentamento de todas as batalhas.

Protesto dos funcionários da Atlantic

FOTO: JORNAL “A MANHÔ (27 DE SETEMBRO DE 1932)

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Em plena transformação, o Rio de Janeiro se modificavarápido nos anos 30. À medida que a sociedade sentia os

benefícios do progresso tecnológico, o modo de vida ia setransformando drasticamente, retificando parâmetros, inau-gurando novas modas, estabelecendo novos conceitos. Eum dos setores que mais sentiu as mudanças foi o dos fun-cionários das empresas de petróleo. Um dos exemplos des-sas mudanças radicais de hábitos que se notava naquelaépoca foi a paralisação feita pela categoria em 1935, prova-velmente a primeira realizada especificamente na luta pelamanutenção dos postos de trabalho. Motivo: um projeto delei municipal queria acabar com todos os recém-instaladospostos de gasolina na cidade, que tinham recebido autoriza-ção precária de funcionamento da municipalidade.

O projeto número 149 era de autoria do vereador JansenMuller, que dizia combater os planos de monopólio das em-presas de petróleo. O problema é que, até então, no Rio deJaneiro daquele tempo, o mais comum era que as garagensabrigassem os automóveis e também vendessem a varejo ocombustível e demais produtos necessários para o seu funci-onamento. Isto começou a mudar quando as empresas depetróleo resolveram também vender diretamente ao consumi-dor a gasolina que até então entregavam aos garagistas. Osfuncionários de garagens – que também faziam parte do Sin-

Uma GrUma GrUma GrUma GrUma Greve nos Peve nos Peve nos Peve nos Peve nos PostosostosostosostosostosUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

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IV

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dicato dos Trabalhadores das Empresas de Petróleo – viamnos planos das empresas uma ameaça aos seus empregos.Os frentistas e funcionários de postos também clamavam peloseu emprego. Seriam cerca de 800 homens demitidos, casoo projeto fosse sancionado. A causa recebeu também o apoioda União dos Empregados do Comércio, que passou a apoiarmais diretamente os funcionários dos postos.

A discussão do impasse comercial crescia à medida quea nova lei era aprovada na Câmara dos Vereadores, em primei-ra discussão e em segunda discussão. O assunto mobilizouos principais parlamentares municipais. Alguns diziam que ca-bia ao prefeito decidir sobre as licenças concedidas a estabele-cimentos comerciais. Outros, que o monopólio dos postos eraindecente. Os frentistas protestavam contra o fim dos seusempregos. Os garagistas argumentavam que, com a venda degasolina pelos postos, deixariam de ganhar os cem réis querecebiam das companhias petrolíferas como comissão pelavenda dos combustíveis. Teriam que fechar as portas, o queprovocaria duas catástrofes ao mesmo tempo: todos os auto-móveis, novidade absoluta no Rio antigo sem garagens em casa,teriam que ser guardados na rua, atrapalhando o deslocamentode pedestres e demais veículos, como bondes, carroças. Alémdisso, diziam em tom de desespero os garagistas, se os pos-tos se instalassem definitivamente na cidade, terminariam tam-bém com os motoristas de praça, pois, enquanto as garagenspagavam pela gasolina à vista às empresas de petróleo, reven-diam a crédito aos motoristas. Os frentistas reagiam, dizendoque monopolistas eram os garagistas, que queriam garantir aexclusividade na venda dos produtos.

O Sitramico-RJ então convocou diversas assembléiasextraordinárias para que seus associados discutissem o as-sunto, e fazia severas críticas à União dos Empregados do

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Comércio, por se fazer representante dos frentistas que, se-gundo o sindicato, não eram comerciários, mas locadoresde serviço. A União dos Empregados do Comércio rebatia,afirmando que o Sindicato havia esquecido de defender osdireitos de parte da categoria.

Apesar da aprovação do projeto ter sido dada como certaà certa altura, a lei não emplacou. O componente político, co-mercial e principalmente tributário – já que ambos os setoreseram fortes arrecadadores de impostos – fizeram com que oprefeito Pedro Ernesto adiasse a análise do projeto, para quetivesse prazo para ouvir todas as partes envolvidas.

Todas essas lutas se davam em um Rio de Janeiro bemdiferente do que temos hoje, uma cidade que já era agitada,mas estava em constante transformação. Em 1931, a cidade,então Distrito Federal, possuía 1.544.612 habitantes, muito maisdo que contava na virada do século, quando tinha pouco maisdo que 600 mil pessoas, a maioria ex-escravos e imigrantes,que se espremiam em suas vielas sujas, de uma cidade ondeas epidemias encontravam terreno propício para seu apareci-mento e desenvolvimento. Se em 1900 o Rio de Janeiro não eraem nada amistoso para seus moradores e visitantes, que vivi-am atormentados pelas epidemias de febre amarela e de varío-la, em 1931 a capital é uma outra cidade, transformada logo noinício do novo século pela ação do prefeito Pereira Passos, quetinha o apoio integral do presidente Rodrigues Alves. Neste mes-mo ano a estátua do Cristo redentor tinha acabado de ser inau-gurada. Até a iluminação pública da cidade passava por umamudança histórica: no fim de 1933, saiam de cena os acende-dores de lampião a gás e entrava a iluminação da Light. Era oprogresso chegando. No verão de 1931, a principal preocupa-ção dos banhistas era finalmente proibir os passeios a cavalona praia. Até na música, a década de 30 foi marcada pelo su-

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cesso de grandes nomes, a chamada Época do Ouro, na qualficariam famosas as vozes e as canções de Carlos Galhardo,Francisco Alves, Geraldo Pereira, Orlando Silva.

Se a Revolução proclamava um novo Estado, e o climanas ruas era de agitação, beirando a uma guerra civil, era pre-ciso que tudo se renovasse, e o Rio de Janeiro era uma cida-de que crescia, principalmente em direção aos subúrbios e àzona sul. Depois da destruição do Morro do Castelo, o Centrose consolidava como local para encontro de negócios. Era oRio de Janeiro uma cidade moderna e cada vez mais urbana.

Primeiras bombas de gasolina no Rio de Janeiro

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A imprensa sindical sempre foi valiosa arma para se co- municar com os trabalhadores, isto porque a informa-

ção sempre foi um dos princípios básicos dos revolucionári-os, principalmente dos revolucionários de esquerda. Segun-do o historiador Edgar Rodrigues, num relato de como funci-onavam os primeiros organismos de luta da esquerda noBrasil, um dos desafios era informar o proletariado, para queele pudesse reagir aos desmandos do capital. A maioria dosoperários, descreve Rodrigues, havia deixado a escola aindana infância. O destino eram as oficinas, as fábricas que tra-balhavam a todo o vapor. Sabedores desta situação, os mem-bros mais articulados do grupo tinham que ler os jornais epanfletos em voz alta, em grupo, em todos os locais onde ostrabalhadores se reuniam, para trabalhar ou para conversar,para que os analfabetos pudessem ouvir. E ouvindo pudes-sem compreender as idéias, os métodos de luta.

Jornais voltados aos trabalhadores eram comuns noBrasil desde que os anarcosindicalistas eram os represen-tantes da esquerda no país. Segundo o sindicalista Vito Gia-notti, de 1880 a 1930, circularam em todo o país mais dequinhentos jornais anarquistas, principalmente no Rio de Ja-neiro, em São Paulo, Recife, Porto Alegre, Curitiba e até emJuiz de Fora, no interior de Minas Gerais. Para alguns estudi-osos, os primeiros veículos de comunicação da imprensa

O PO PO PO PO Primeiro Jornalrimeiro Jornalrimeiro Jornalrimeiro Jornalrimeiro JornalUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

V

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com fins políticos foram criados no Recife, em 1848, espa-lhando-se depois por todo o país.

Os líderes de esquerda sempre souberam a importânciada propaganda, da divulgação de suas idéias para os traba-lhadores. E tanto que muitos destes primeiros jornais chega-ram a ser publicados no Brasil em várias línguas, para seremlidos pelos imigrantes – italianos, espanhóis, alemães -, par-cela da população formadora dos grupos anarquistas e sindi-calistas do Brasil do fim do século 19 e início do século 20.

Desde os primeiros anos de seu funcionamento, o Si-tramico-RJ soube reconhecer a importância da informaçãona estruturação de uma ideologia e na luta pelos direitos dostrabalhadores da classe.

Em 25 de setembro de 1935, já se fazia circular o pri-meiro número do boletim de notícias do Sindicato dos Traba-lhadores do Petróleo. O informativo descrevia a esperançaem se aprovar o projeto de uma convenção de trabalho dosempregados em empresas de petróleo, os serviços presta-dos pelo Sindicato, entre eles aulas de inglês para seus as-sociados e assistência jurídica, e contava sobre uma visitada diretoria às primeiras instalações das fábricas localiza-das na Ilha do Governador, para verificar as condições detrabalho dos funcionários das empresas de petróleo.

O primeiro jornal da categoria – existente até hoje – co-meça a circular dois anos depois, em 6 de janeiro de 1937,em grande parte uma conquista de Nilo Barroso, que assinagrande parte dos artigos do primeiro número. Distribuído gra-tuitamente, O Petróleo era saudado com muita alegria peloSindicato. Em seu principal artigo, diz que, há muito tempo adireção sentia falta de um veículo de comunicação própriopara conversar com a classe, para contar sobre suas con-quistas, para discutir seus problemas, para chamar e moti-

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var para novas lutas. E, desde o primeiro número, faz ques-tão de chamar a atenção para umas das características maismarcantes do Sitramico-RJ: a independência política. “Nãoseremos nunca órgão de ataque systematico aos patrões emuito menos de propaganda política. A nossa campanha jor-nalística se firma na defesa intransigente dos direitos de to-dos os trabalhadores...”, dizia o artigo de apresentação.

O Sitramico-RJ seguia assim o modelo já praticado poroutros sindicatos que já possuíam seus veículos de impren-sa. A União dos Empregados do Comercio com o jornal UEC,a União dos Metalúrgicos com o informativo A Forja, o Sindi-cato dos Empregados em Hotéis, Restaurantes e Congêne-res com a Tribuna da União.

O jornal elogia o ministro do Trabalho, Agamenon Maga-lhães, os êxitos do Governo getulista no setor trabalhista, enão perde a oportunidade de conclamar a classe a participardo sindicato. “A União Faz a Força. Um por Todos, e Todospor Um”, trazia em sua primeira página. Um dos principaisartigos do jornal explica a importância e descreve que a clas-se proletária aguardava ansiosa aquela que seria a sua mai-or conquista: a criação da Justiça do Trabalho, um avançopara época, apesar de todas as leis instituídas pelo governoVargas que protegiam o trabalhador. Pois de nada valiam asleis, se não houvesse o foro próprio a que os trabalhadorespudessem recorrer quando discordassem de seus patrões.

Hoje, com uma tiragem de dez mil exemplares, O Pe-tróleo prossegue em sua tarefa de informar adequadamen-te aos trabalhadores da classe, representando e defenden-do seus direitos.

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No fim da década de 40 e início da década de 50, os trabalhadores começam a se reorganizar e superar as bai-

xas impostas pelo regime do Estado Novo de Getúlio Var-gas. Em 1945, movimentos populares sob o comando doPartido Comunista Brasileiro, conquistam a anistia ampla eirrestrita, obtendo a libertação de presos políticos e comu-nistas que estavam presos durante o regime ditatorial getu-lista. Com o fim do primeiro governo Vargas e com sua de-posição, em 1945, a intervenção do Ministério do Trabalhosobre os sindicatos torna-se mais branda. No mesmo ano,cria-se o Movimento Unificador dos Trabalhadores, que que-ria romper definitivamente com esse poder do Estado sobreas organizações sindicais e retomar a luta dos trabalhado-res por seus direitos. O movimento pede também o fim doDepartamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e do Tribu-nal de Segurança Nacional, ambos instrumentos de repres-são usados pela ditadura do Estado Novo.

Entretanto, o golpe de 29 de outubro de 1945, levandoao governo o presidente Eurico Gaspar Dutra, ameaçou se-riamente as lutas das classes trabalhadoras, que, no entan-to, não pararam de crescer em número de integrantes, emgrande parte devido ao desenvolvimento econômico pelo qualo país começava a passar, principalmente na área urbanas.O Partido Comunista Brasileiro tinha se tornado o maior par-

Os Anos 50 e 60Os Anos 50 e 60Os Anos 50 e 60Os Anos 50 e 60Os Anos 50 e 60UNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

VI

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tido comunista da América Latina com cerca de 200 mil mem-bros, conseguindo eleger 14 deputados e um senador, LuísCarlos Prestes, que volta a cena política como o senadormais votado da República.

A situação política da classe operária, entretanto, nãoera das melhores. A União Democrática Nacionalista (UDN)e o PSD – representantes políticos das oligarquias e corren-tes tradicionalistas – detinham 70% das cadeiras do Con-gresso, que impediam ações legais do PCB. Em 1946, Du-tra proíbe as atividades do MUT e suspende as eleições sin-dicais. Um ano depois, torna o PCB ilegal. Se o aparelho doEstado aumenta sua força contra os movimentos organiza-dos da classe trabalhadora, esta permanece em sua evolu-ção, favorecida pelas transformações da economia brasilei-ra, que deixava de ter como base a atividade rural para darcada vez mais espaço as indústrias.

Em 1950, Vargas está de volta ao poder, no Palácio doCatete. “Bota o retrato do velho, outra vez/ bota no mesmolugar!/o sorriso do velhinho faz a gente trabalhar!”, era umdos refrões populares mais ouvidos nas ruas. Era a sauda-ção popular pela volta do pai dos pobres. Mas Getúlio voltaao poder com uma política de dois pesos e duas medidaspara os trabalhadores. Se por um lado tenta fortalecer ossindicatos, por outro dá apoio irrestrito às ações anticomu-nistas, mantém o Partido Comunista na ilegalidade e com-bate com violência os movimentos grevistas.

De 1940 a 1953, o número de operários das indústrias che-ga a um milhão e quinhentos mil. As greves aumentam. Em1951, são quase 200 paralisações, envolvendo mais de 400 miltrabalhadores. No ano seguinte, o número de paralisações pas-sa para 300. Ainda em 1953, com o apoio do PCB, trabalhado-res da indústria têxtil, metalúrgicos e gráficos realizam em São

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Paulo uma greve com mais de 300 mil trabalhadores. Mais doque movimentos reivindicatórios de aumento salarial de clas-ses específicas, eram ações políticas, que pediam mais aber-tura, redução da intervenção do Governo sobre os sindicatos edefesa das riquezas nacionais, pela criação da Petrobras.

O Sitramico-RJ participou destes movimentos e fezmuitas greves neste período. Élcio Amaral – que na épocaera delegado sindical e que viria a ocupar, mais tarde, a pre-sidência do sindicato-, chegou a ser preso em uma destasgreves, na luta pelo pagamento do abono de periculosidade,no Posto Oval, na Avenida Brasil, no Rio de Janeiro.

Enquanto os movimentos de trabalhadores permaneci-am intensos, o crescimento econômico é retomado com en-tusiasmo histórico no governo de Juscelino Kubitschek, elei-to em 1955 com o apoio dos sindicatos. Alguns setores daindústria experimentam uma época de franca ampliação deseus lucros e de desenvolvimento, principalmente o setor au-tomobilístico e de petróleo. Este último começa a ganhar umimpulso jamais visto, principalmente com a concretização,há dois anos, de um velho sonho: a criação da Petrobras,uma empresa nacional, que seria finalmente responsável pelaprospecção, perfuração e beneficiamento do ouro negro, opetróleo. O Brasil assumia assim o controle de um setor es-tratégico, e tomava conta, soberano, dos poços de petróleodo país, petróleo que movia toda a sociedade moderna. Aassinatura por Getúlio Vargas da Lei nº 2004, que previa acriação da Petrobras, num sábado, dia 3 de outubro de 1953,era o resultado de uma ferrenha campanha que tinha come-çado com força no início do século, mas tinha suas raízesainda no século 19, quando os primeiros empreendedoresacreditaram que no Brasil poderia se achar depósitos sub-terrâneos do produto. Com o passar do tempo a campanha,

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importante, estratégica do ponto de vista político e econômi-co, e de irresistível caráter nacionalista, foi abraçada por in-telectuais – dentre eles o mais destacado foi Monteiro Loba-to, que chegou a criar uma empresa para perfurar o solo eprocurar petróleo – e pelos combativos integrantes da UniãoNacional dos Estudantes. Petrobras criada, tornou-se rapi-damente a menina dos olhos dos orgulhosos brasileiros. Em1959, estourava em todas as rádios o sucesso na voz deLuís Gonzaga, o Rei do Baião, a Marcha da Petrobras. Emtom ufanista e entusiasmado, a marcha-hino feita por Gon-zaga, Nelson Barbalho e Joaquim Augusto bradava:

Brasil, meu Brasil

Tu vais prosperar, tu vais

Vais crescer inda mais

Com a Petrobrás

Agora a coisa vai mudar

O sangue da terra vai jorrar

Porque o nacional monopólio

Nos deu o nosso rico petróleo

Somos assim donos dum grande país

Um povo forte, futuroso e bem feliz

Petroleiros conduzindo pelo mar

O ouro-negro para o Brasil refinar

Assim Mataripe e Cubatão

O óleo do Brasil destilarão

Candeias, Maceió e Nova Olinda

Os campos de nossa riqueza infinda

Terão de dar produção para o Brasil

E nossa terra não será só ouro-anil

No conselho mundial entre as nações

Nós, brasileiros, temos de ser campeões

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Se o país tinha mais fábricas, mais indústrias, tambémé verdade que tinha um número incalculável de greves. Umagreve geral em São Paulo, em 1957, paralisou cerca de meiomilhão de pessoas. A inflação dispara a partir de 1958, eum ano depois o crescimento industrial começa a ser redu-zido, o que faz reaparecer o fantasma do desemprego. Nosfim dos anos 50 e início dos 60, as muitas greves exigiamdos dirigentes sindicais saídas originais para nacionalizaros movimentos. Num tempo em que a televisão não era tãopopular, e que outros mecanismos de informação como aInternet, não existiam, para falar com os trabalhadores emtodo o Brasil era preciso usar certos artifícios. Por exem-plo, quando os aviões eram abastecidos nos aeroportos,integrantes e simpatizantes do Sindicato aproveitavam achance em suas asas eram colados papéis do Sindicato,contando sobre as greves, os planos de paralisação, asconquistas obtidas. Quando o avião pousava, o companheiroencarregado de receber o avião lia e retirava o papel cola-do, espalhando a notícia. Era comum também usar cami-nhões de carga de combustíveis para levar os panfletos queestimulavam a mobilização nacional.

Em 1959, os sindicatos lutavam pelas chamadas re-formas de base, e entravam em greve por demandas políti-cas. No início dos anos 60, O país estava em ebulição polí-tica. Em 1961, Jânio Quadros, que tinha ficado no lugar deJuscelino, pede para deixar o Governo por razões até hojenão esclarecidas. Atônito, o país elege João Goulart, umamigo dos sindicatos. Mas Jango enfrentava forte resistên-cia de setores mais tradicionalistas da população. E mes-mo as centrais sindicais, que deveriam apoiá-lo, partem parauma postura de reivindicação, fazendo uma grande greveem julho de 1962. Os setores sociais conservadores afir-

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mavam que o país era “ingovernável” com Jango no poder,argumentando que ele cedia demais aos líderes sindicais,principalmente ao Comando geral dos Trabalhadores. Em31 de março de 1964, o movimento militar depõe o presi-dente, põe as instituições em pedaços.

Durante este tempo, os dirigentes do Sitramico-RJ, umsindicato que jamais se submeteu a interesses políticos,lutavam para manter a classe unida, mesmo sob as condi-ções mais adversas, pelos direitos dos trabalhadores. Pas-sou para a história o momento em que Sérgio Marques Gar-cia, quando realizava uma assembléia na Rua do Livramen-to, no Sindicato dos Arrumadores, esteve diante de uma clas-se que buscava a revolta, a saída pela paralisação. A cate-goria clamava pela greve. Sérgio então fecha as portas doSindicato e diz que ninguém sairia ou entraria. Era um perí-odo em que os trabalhadores estavam mobilizados em qua-se todos os setores.

Sérgio Marques Garcia, que entrou na diretoria do Sindi-cato em 1959, foi testemunha deste período explosivo na po-lítica Brasileira, como expressivo dirigente sindical e presi-dente do Sitramico-RJ a partir de 1961. Ele viu o clima deconvulsão social e presenciou o início do período dos gene-rais no poder, a partir do golpe militar de 1964.

- Nós tínhamos que ter um salvo-conduto, uma libera-ção do DOPS, o Departamento de Ordem Política e Social,que era aqui na Rua da Relação. Qualquer candidato a umcargo dentro do sindicato tinha que possuir este documen-to. Ao formar uma chapa, você tinha que submeter ao Mi-nistério do Trabalho. Era a sua folha corrida. Não tanto porter cometido algum tipo de crime, mas para o governo sa-ber se você era comunista. – lembra Sérgio.

A partir do golpe militar, o governo interveio em 761 sin-

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dicatos, número que aumentou para 967 até 1978. O Sitra-mico-RJ foi um dos poucos sindicatos a não sofrer inter-venção, lembra Antônio Miguel, um dos principais dirigen-tes da entidade. Os sindicatos passavam então a se torna-rem mais passivos e assistencialistas.

No ano de 1963, o Sindicato obtém outra de suas maissignificativas vitórias para a categoria: a assinatura do Con-trato Coletivo de Trabalho. Todo o trabalho político de ne-gociação e convencimento dos empregadores para que ocontrato fosse aceito e assinado contou com a importanteajuda de Alberto Bettamio. Entre as vitórias para os traba-lhadores da categoria conquistadas pela primeira vez es-tavam os 30 dias de férias remuneradas – até então, ostrabalhadores só tinham direito a 20 dias de férias – e opagamento de horas extras.

Mas o poder que o regime exercia sobre os movimentosdos trabalhadores era intenso. O controle exercido pelo Go-verno militar sobre os sindicatos começava a partir do mo-mento da publicação do edital para as novas eleições, queteria que ser enviado imediatamente ao Ministério do Traba-lho. Neste instante se instaurava o controle pelo governo doprocesso eleitoral. Tudo o mais que o Sindicato deveria fazerestava previsto em uma portaria, então vigente no ministério,uma espécie de cartilha com que o que deveria ser seguidopara a realização de uma eleição sindical. A apuração da elei-ção era feita por um promotor do Ministério Público do Traba-lho. A Delegacia Regional do Trabalho comunicava o fato aoMinistério do Trabalho, que designava o representante. Elechegava e ninguém mais mexia nas urnas.

Sérgio Marques, então presidente do Sindicato, conhe-ceu de perto este processo quando foi apresentada a chapapara a nova eleição no Sitramico-RJ, no fim de 1964 para

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1965. Tão logo o Ministério foi avisado do início do processo,ele foi chamado ao DOPS.

- E lá já estava cheio de gente presa. E eu nunca fuicomunista. Sempre fui independente. Nunca tive nenhumaligação com nenhum partido de esquerda. Nós não tínhamosvinculação alguma. Tanto que, quando estourou a revolução,eu e o vice-presidente estávamos no Ministério do Trabalho.O rapaz que nos atendeu perguntou: o que vocês estão fa-zendo aqui? Podem ir embora. Eu respondi: toma aqui a chavedo sindicato. Vai lá. Até a contabilidade era submetida ao Mi-nistério do Trabalho. O contador fazia a escrituração, nóstínhamos que pegar os livros e levar a um setor específicodo ministério. Era uma sala enorme, ficava aquelas pilhas delivros de sindicatos, e os contadores do ministério davamum carimbo dizendo que as contas estavam aprovadas.

Casado, pai de quatro filhos, Sérgio Marques ficou preo-cupado por ter de comparecer ao Departamento de OrdemPolítica e Social naqueles tempos de incertezas. Para a ta-refa, recebeu o apoio de um diretor do Sindicato, que tam-bém integraria a chapa, Noé de Simone. Quando viu SérgioMarques com ar apreensivo e soube o motivo, prontamentese colocou a disposição para ir com ele ao DOPS. Quandochegaram ao prédio, o diretor do Departamento vinha sain-do, mas quando viu Simone, levou um susto. Perguntou oque ele fazia ali. “Eu é que pergunto o que você quer commeu amigo”, respondeu Simone. O diretor do DOPS pergun-tou se Sérgio era mesmo amigo de Simone, pediu os docu-mentos. Começou a conversa, perguntando se Sérgio eracomunista, ele negou. Na esperança de demonstrar que nãoera vinculado a nenhum partido de esquerda, Sérgio tinhalevado para a reunião até alguns artigos escritos para jornaisde Recife, e jornais católicos do Rio. O diretor do DOPS en-

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tão pede para ler os artigos e, depois de alguns minutos,pergunta se Sérgio Marques era datilógrafo. Sérgio respon-deu afirmativamente. “Então senta aí!”, disse, e começou aditar o depoimento. Passado algum tempo, Sérgio Marquesdescobriu a razão de tratamento tão cordial. Simone tinhasido da polícia especial do Governo, que funcionava no Mor-ro de Santo Antônio, e o diretor do DOPS, seu colega de ati-vidades no aparelho policial do Estado.

Sérgio Marques Garcia sabia tratar com situações depressão por parte do poder político e econômico. Ele mes-mo tinha sido alvo de uma ação injusta por parte da em-presa onde trabalhava, a Gasbrás, assim que começou avida sindical. Quando foi eleito segundo-secretário do Sin-dicato, em 1959, a empresa o demitiu, sumariamente. Porsua exemplar atuação na conscientização da classe, le-vando inúmeros colegas do setor do gás a se filiarem aoSindicato, a empresa usava esta manobra para que de-sistisse da atividade sindical. Sérgio ainda não tinha dezanos na companhia, tinha sido admitido em 1954, mas ti-nha direito à estabilidade provisória enquanto fosse diretordo Sindicato. E optou por resistir. Levou a situação ao co-nhecimento da diretoria do Sitramico-RJ, que por assem-bléia decidiu continuar pagando o mesmo salário que Sér-gio recebia da empresa, integralmente. Quando ele fossereintegrado, o dinheiro seria devolvido.

E assim foi feito. A batalha pela integridade do trabalha-dor e pela liberdade de atuação do líder sindical foram assu-midas pelo Sitramico-RJ, e Sérgio continuou a luta. Primeiro,perdeu na decisão da Junta do Trabalho. Ele recorreu ao Tri-bunal Regional do Trabalho, e venceu. A Gasbrás recorreuem uma outra instância, obtendo nova vitória. Sérgio recor-reu novamente ao TST e teve nova decisão favorável a sua

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causa. O caso foi parar ao Supremo Tribunal Federal, ondea Gasbrás foi finalmente derrotada. Sérgio Marques Garciafoi reintegrado aos quadros da empresa, solenemente, em1963, acompanhado por um oficial de Justiça.

No fim de seu mandato, no mesmo ano de sua readmis-são pela Gasbrás, Sérgio Marques comandou a categoria nadisputa de um dissídio, em resposta a novas pressões feitaspelas empresas, que faziam com que funcionários fossemobrigados a assinar abaixo-assinados concordando com aproposta salarial. A demissão era a punição prevista paraaqueles que não assinassem a lista. Mais de 140 funcionári-os resistiram a manobra, só no Rio de Janeiro. A categoriaacabou vencendo na Justiça o dissídio.

Durante todo o período do regime militar, houve umcaso de repressão com resultados graves para um dosintegrantes do sindicato. Um delegado do Sitramico-RJ nasub-sede em Niterói chegou a ser preso. Seu destino foi asede do Clube Canto do Rio, para onde habitualmenteeram levados os detidos por motivos políticos. Imediata-mente o advogado do sindicato entrou no caso, e conse-guiu a libertação do companheiro.

Durante a década de 60, a categoria representada peloSitramico-RJ sofreu também uma de suas mais marcan-tes derrotas: o fim do 14º salário, como os trabalhadores ochamavam. Desde o fim da década de 40, os empregadosdo setor do petróleo e do gás recebiam o abono de Natal,um “décimo terceiro salário”, quando este pagamento ain-da não existia formalmente na legislação brasileira e porisso não era pago pela maioria das empresas privadas. Erauma das grandes conquistas da classe.

Quando o décimo terceiro salário foi finalmente instituí-do pelo Governo, com a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962,

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durante o governo do João Goulart, as empresas do setor depetróleo e gás então começaram a trabalhar para extinguiresse benefício que a categoria tinha acumulado.

As empresas então começaram a usar o fim da esta-bilidade no emprego para acabar também com esse salá-rio extra no fim do ano. Aconteceu assim: antes de 1966,quando foi criado o Fundo de Garantia por Tempo de Servi-ço, os funcionários com mais de 10 anos em uma empresagozavam de estabilidade, não poderiam ser demitidos, senão fosse por justa causa. Com o FGTS, a estabilidade ter-minou, e os novos contratados estavam então mais vulne-ráveis a certo tipo de pressão dos patrões. Inúmeros rela-tos de funcionários dão conta de que as empresas do setorde petróleo e gás então pressionaram os novos funcionári-os a assinar um termo no qual aceitavam incorporar o abo-no de Natal ao salário, caso o contrário, poderiam ser man-dados embora. Não há nada de oficial sobre este tipo demanobra, mas não faltam relatos e testemunhos de que defato tal pressão foi feita pelos empregadores.

A grande maioria concordou, alguns trabalhadores quepossuíam estabilidade tiveram o benefício cortado pelas em-presas, por se recusarem a assinar o termo de aceite. Nes-tes casos, alguns recorreram à Justiça para tentar manter oabono. Mas o fato é que, com a aposentadoria dos trabalha-dores estáveis, e a renovação do quadro de funcionários,esse benefício simplesmente desapareceu, pois os traba-lhadores já eram contratados sem o direito ao abono de Na-tal. E assim a categoria perdeu o 14º salário, apesar de todaa luta empreendida pelo Sitramico-RJ.

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Antes de todas as greves e paralisações que culminari-am com o regime de exceção da ditadura militar, o Si-

tramico-RJ teve um grande momento ainda na década de50, que começa para o Sindicato com uma data histórica: acompra da sede atual da entidade, na Rua México, número11, grupo 501, adquirida no dia primeiro de julho daquele ano.A aquisição da sede foi alcançada graças, em grande parte,ao trabalho de Julio Peixoto, então presidente do Sindicato,mas atuante em sua diretoria desde os anos 40.

A compra da sede foi possível graças a perseverançae empenho pessoal, abnegado de Júlio Peixoto, e tambémàs articulações políticas de Alberto Bettamio, um funcioná-rio da Esso, na época presidente da Federação Nacionaldos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivadosde Petróleo, outro destacado diretor do Sitramico-RJ desdea década de 40 e que viria a ser seu presidente.Para a aqui-sição da tão sonhada sede própria do Sindicato, Bettamio,que também era representante do sindicato junto ao IAP-TEC (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Emprega-dos em Transportes e Cargas), contou com a ajuda do en-tão presidente da República, João Goulart, de quem era ami-go. Uma amizade que nascera da luta pelas causas traba-lhistas, que uniu os dois na noite da agitada capital federalno fim da década de 50. A ligação entre os dois passa por

A Compra da SedeA Compra da SedeA Compra da SedeA Compra da SedeA Compra da Sede

PPPPPrópriarópriarópriarópriarópriaUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

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VII

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uma boate que os dois freqüentavam, no Edifício do JornalA Noite, onde funciona a Rádio Nacional, na Praça Mauá,pertencente a Frederico Semelo, empresários de muitosnegócios, incluindo postos de venda de combustíveis. Bet-tamio e Jango dividiam as conversas recheadas de afinida-des políticas, de um governo que tinha muito próximas rela-ções com as entidades sindicais de sua época.

A proximidade de João Goulart não era surpresa. Des-de pelo menos 1953 ele já era identificado como um líderpolítico muito querido pela classe trabalhadora. Jango sem-pre foi identificado como o elemento mais “à esquerda” dogoverno de Getúlio Vargas, no qual chegou ao Ministério doTrabalho, ainda jovem, aos 35 anos. Foi nomeado para olugar de José Segadas Viana, também petebista como Jangoe que pedia para sair da pasta por discordar de como ogoverno tratava a grande greve dos marítimos que atingiaos portos do Rio de Janeiro, de Santos e de Belém naqueleinício da década de 50. Com o apoio de Vargas, João Gou-lart tinha uma outra estratégia para lidar com os trabalha-dores. Ao invés do confronto, a conversa, no lugar da puni-ção, a negociação para ter na classe trabalhadora uma basepolítica de sustentação do Governo. Então, em vez de con-vocar o contingente disponível na reserva da Marinha deGuerra para substituir os grevistas – que abriria um claroconfronto com os dirigentes do movimento – Jango nego-cia com os sindicalistas e esvazia a greve.

Dez dias depois de Jango tomar posse, a greve estavaencerrada. Muitas exigências foram atendidas, muitas vezescom o próprio João Goulart sentando à mesa de negocia-ção, e o presidente da Federação dos Marítimos foi afasta-do. Estava lavrada a marca registrada de Jango, ministro epresidente: a grande proximidade aos trabalhadores.

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E foi com uma grande ajuda de Jango também que oSitramico-RJ conseguiu aprovar junto ao Ministério do Tra-balho e às empresas a Lei de Periculosidade, desta vezpara todos os funcionários da categoria, e não apenas paraaqueles que trabalhavam em áreas de risco, uma de suasgrandes conquistas nos anos 60. Os caminhos para a apro-vação da Lei foram, como de costume, muito duros, inclu-indo movimentos de base, realização de greves e mobiliza-ção da categoria, até que Jango intercedeu politicamentepara que a meta fosse alcançada. O próprio João Goulartesteve na sede da Rua México quando da assinatura daLei. A princípio, o adicional de periculosidade não era comohoje, para todos os trabalhadores que laboravam em áreaperigosa, e diretamente no salário. Eram pagos por horatrabalhada e excluía do benefício, por exemplo, os trabalha-dores dos escritórios dessas áreas. Só os funcionários quemantinham contato direto com produtos comprovadamen-te perigosos tinham direito a receber o abono.

A luta pelo adicional de periculosidade, uma das mai-ores conquistas doSindicato, come-çou muito antes, nadécada de 40.

Inauguração de sede

do Sitramico-RJ na

Rua México

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A primeira classe a receber um adicional em seu salário por trabalhar em área reconhecidamente de risco foi a

dos marítimos. Era a conhecida Taxa de Inflamável. Aindanos anos 40, o Sitramico-RJ começou a planejar requerertambém para os trabalhadores de sua categoria o mesmobenefício. Numa reunião em 14 de março de 1950, na antigasede do sindicato ainda na Rua Senador Dantas, Julio Peixo-to fala aos companheiros mais uma vez sobre os planos doSindicato a este respeito. Presente ao encontro, o então ad-vogado do sindicato, Flávio Rodrigues, explica que a taxa erapaga aos marítimos por força de uma portaria do Ministérioda Viação, Portaria 265, de 13 de março de 1946. Flávio ex-plica que, a princípio, os armadores se negaram a pagar obenefício, alegando que era inconstitucional.

Para que os marítimos conseguissem o adicional, foinecessário um acordo entre as partes, que por fim resultouem um aumento no preço dos fretes dos navios para fazerfrente ao novo gasto. Então, a partir de 12 de maio de 1946,os marítimos conseguiram sua Taxa de Inflamável, um abo-no pago junto ao salário por trabalharem em contato diretocom produtos extremamente perigosos. O advogado com-plementou ainda que, se quisessem o mesmo benefício, ostrabalhadores em empresas de petróleo dificilmente o con-seguiriam em uma batalha judicial. Certamente a Justiça di-

O Adicional deO Adicional deO Adicional deO Adicional deO Adicional de

PPPPPericulosidadeericulosidadeericulosidadeericulosidadeericulosidadeUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

VIII

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ria que a taxa era ilegal. Mas havia uma saída, disse Flávio.Politicamente, o Sindicato deveria procurar um político comquem tivesse boas relações para que apresentasse um pro-jeto de lei à Câmara dos Deputados.

Uma vez apresentada, caberia ao Sindicato mobilizarsuas bases e também buscar o apoio político necessário paraaprovar o pagamento do benefício.

E assim foi feito. E entra em cena o deputado EuzébioRocha, também presente à reunião onde a idéia era discuti-da por todos os delegados. Euzébio, eleito pelo PTB de SãoPaulo, diz que, apesar do ânimo dos integrantes do Sindica-to em lutar pelo direito na Justiça do Trabalho, apresentariacom prazer um anteprojeto de lei à Câmara Federal, paraque então começasse a luta também no flanco político.

No dia 20 de julho de 1950, Alberto Bettamio entra narecém-inaugurada sede do Sindicato com um jornal na mão.Entusiasmado, mostra a todos os colegas. Era do Diário doCongresso do dia anterior, que já trazia publicado em suaspáginas o projeto de lei número 575/1950, de autoria de Eu-zébio Rocha e Ruy Almeida, que instituía o adicional de trintapor cento sobre os salários dos que trabalham com inflamá-veis, o qual passaria a receber o nome de “adicional de peri-culosidade”. Todos ficaram tão animados e felizes com anotícia que a primeira providência foi mandar imprimir cincomil exemplares do documento para distribuir para todos ostrabalhadores, para que soubessem da boa nova. Depois,decidiu a diretoria, seria enviado um ofício a todos os sindi-catos do Brasil pedindo apoio para a mobilização de suasbancadas políticas para a aprovação da nova lei.

O resultado foi a aprovação da lei e a conquista da Taxade Inflamável pela classe dos trabalhadores em empresas depetróleo, hoje conhecido como adicional de periculosidade.

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Julio Peixoto, responsável pela compra da sede própriae um dos principais motivadores da luta pelo adicional depericulosidade, foi um presidente que deixou sua marca noSitramico-RJ. Negro, de pouca instrução, era pai de famílianumerosa, oito filhos, e um defensor ferrenho da causa dostrabalhadores. Apesar de sua baixa escolaridade – ou talvezpor esse motivo – fez questão de manter funcionando a Es-cola Panamericana na Ilha do Governador no mesmo prédioonde funcionava o Sindicato. Durante muitos anos, aquelafoi a escola primária que serviu às crianças do bairro.

Peixoto ficou no Sitramico-RJ até 1950, exatamente oano da aquisição da sede própria. Em seu lugar continuouAlberto Bettamio, este, por sua vez, um dos principais res-ponsáveis pelo pagamento do chamado “abono de Natal” fei-to pelos empregadores do setor, espécie de décimo terceirosalário que a categoria recebia, muito antes de o décimo ter-ceiro salário existir no Brasil, ainda em 1949. Mas, antes desair, Júlio Peixoto protagonizou um dos momentos maisemocionantes entre os associados.

Depois de muitos anos de dedicação constante ao Si-tramico-RJ, Julio Peixoto anuncia que deixaria o Sindica-to. Estava doente, cansado, não suportava mais as inú-meras responsabilidades e tarefas que cabiam ao cargode presidente. Mas pede que seja lida uma carta aos dire-tores. O documento é lido por Jorge Acarino, tesoureiro dosindicato, e dizia:

“Senhores diretores:Na qualidade de presidente deste sindicato desde 1946,

percebendo então o salário humilde de um trabalhador bra-çal de acordo com os salários de trabalhadores da categoriaque representa; morando na Ilha do Governador e prestandomeus serviços na cidade e recebendo como gratificação a

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importância de CR$ 300 (trezentos cruzeiros) mensais e paraalimentação CR$ 325. Como venho reclamando que tais gra-tificações não vem cobrindo as despesas para tais finalida-des. Tendo por várias vezes, meus nobres colegas de dire-toria, respondido afirmativamente que reconhecem a defici-ência da da importância para atender a tais despesas e queisto deveria ter sido chamado atenção dos demais diretoreshá mais tempo, para que em reunião de diretoria pudesse seestudar uma gratificação que viesse finalmente atender asdespesas do companheiro presidente. Assim sendo, comu-nico-vos que não será preciso uma reunião de diretoria paraharmonizar minha situação angustiosa pelo motivo que pas-so a declarar. Revendo os livros de ata da Assembléia Geralpude verificar que foi estabelecida uma verba para os direto-res quando a serviço do sindicato, o dia todo CR$ 35, meiodia CR$ 20, à noite CR$ 12, isto aprovado na reunião dediretoria de 29 de janeiro de 1946, importância esta que meuscolegas vem recebendo normalmente e que, por qualquermotivo alheio à nossa vontade o presidente não vem rece-bendo integralmente. Solicito que me seja paga a diferençade CR$ 13.750,00, que por justiça me é devida. Parece, com-panheiros, que a Providência Divina foi minha advogada, de-pois de cinco anos de luta à frente deste sindicato sem ne-nhum estremecimento, deixo doente esta direção para abra-çar o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Emprega-dos em Transportes e Cargas. O que venho a receber aocerto não corresponderá sequer ao menos à minha manu-tenção. Sou pai de oito filhos menores, cinco estão na esco-la, sem nenhum recurso, por isso creio que esta diferençaem tão boa hora vem amenizar a situação angustiosa de umafamília composta de dez pessoas. (...) espero que os com-panheiros consultem os livros de Atas de Assembléias e reu-

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niões de diretoria no sentido de me efetuar o pagamento, ime-diatamente, da referida diferença, devendo dar conhecimen-to à classe na primeira assembléia que se realizará e paratais finalidades passarei um recibo com os devidos esclare-cimentos”.

O assunto é aberto para discussão dos presentes à reu-nião no sindicato. Júlio Peixoto, o presidente responsável pelacompra da sede própria e por tantas outras conquistas daclasse, que havia aumentado e muito o patrimônio do Sitra-mico durante sua gestão, que acompanhava o sindicato des-de suas primeiras lutas, estava em sérias dificuldades finan-ceiras, e recorria a seus colegas em um pedido de ajudaformal, sincero e emocionado. Os participantes se dividem.Alguns acham o pedido justo, mas a carta os colocava dian-te de um dilema: a CLT, Consolidação das Leis do Trabalho,proibia qualquer remuneração a diretores de sindicatos. Dooutro lado, diziam todos, o sentimento de humanidade queenvolvia os presentes àquele encontro. Alguns diziam que alei não poderia ser desrespeitada. Outros diziam que a rei-vindicação era justa, já que o próprio sindicato tinha previsto,em seu Estatuto, o pagamento de uma verba de representa-ção. Bettamio pede que o assunto fosse decidido por votosecreto. Nelson Borges, entretanto, lembra que o voto se-creto só poderia ser usado para votação de prestação decontas da diretoria. Outros pediam que a decisão sobre oassunto fosse adiada, até que uma assembléia geral commaior número de integrantes fosse convocada. A proposta énegada, e o pedido de Júlio Peixoto é posto em votação, ederrotado pela maioria.

Foi então que o presidente da mesa diz ter encontradoentão uma saída para o pedido de Júlio Peixoto. A fórmulaconsistia em pagar a metade do pedido pelo presidente

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como verba de representação daquele ano, e não de anosanteriores. O pagamento seria como uma gratificação pe-los serviços prestados ao Sindicato, no momento em quedeixa a diretoria. A proposta é aprovada por unanimidade.Todos se levantam, e aplaudem a decisão e a Júlio Peixotoque, comovido, com lágrimas nos olhos, abraça seus com-panheiros, e agradece a Deus por encontrar quem reco-nhecesse toda a dedicação e zelo com os quais sempreadministrou o Sitramico-RJ.

Assembléia de trabalhadores no sindicato

FOTO: JORNAL “A NOITE” (4 DE NOVEMBRO DE 1935)

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Com o golpe militar de 1964, as atividades sindicais fica-ram praticamente paralisadas. Os movimentos civis or-

ganizados eram intensos, e severamente reprimidos, masas movimentações de base organizadas pelos sindicatoseram quase inexistentes. Os trabalhadores tinham medo.As negociações permaneciam, mas a força do patronatona mesa de conversa com os trabalhadores era pratica-mente intransponível. O empregado aceitava o que o pa-trão queria dar. As negociações eram truncadas, não avan-çavam. Os salários eram controlados pelo Governo, quetrabalhava com rígidas metas para o controle de inflação. Omais normal era que as demandas resultassem em um dis-sídio coletivo, e o dissídio era julgado em última instânciapelo Tribunal Superior do Trabalho que, na maioria das ve-zes, decidia em favor do Governo. As ações militares dire-tas e indiretas significaram intervenções em cerca de duasmil entidades sindicais e representativas da classe traba-lhadora em todo o país. As diretorias dos sindicatos que semostravam mais combativos eram presas, cassadas, exi-ladas. O governo adota uma forte política de controle dainflação, com arrocho salarial, cria a lei Anti-greve (número4.330) e o fim do regime de estabilidade no emprego.

No início do Governo militar, as assembléias ficavampraticamente vazias. Os trabalhadores que ousavam parti-

Esporte, Lazer eEsporte, Lazer eEsporte, Lazer eEsporte, Lazer eEsporte, Lazer e

SindicalizaçãoSindicalizaçãoSindicalizaçãoSindicalizaçãoSindicalizaçãoUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

VIX

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cipar de movimentos de questionamento social eram rari-dade. Quando as assembléias ocorriam, eram vigiadas deperto por agentes do Serviço Nacional de Informação (SNI)infiltrados entre aos trabalhadores.

Mesmo acuado, o Sindicato não se acovarda. Em 1972,a entidade realiza uma campanha para pressionar os pa-trões e conquistar o direito de receber o adicional de peri-culosidade, previsto em lei. Em 1974, os patrões ameaçamcom demissão cerca de 30% dos frentistas, alegando pre-juízos com o preço do combustível. Com uma forte campa-nha de mobilização, o Sitramico-RJ denuncia a manobrapara reverter a decisão.

Neste momento, o Sitramico-RJ começa a usar umanova estratégia para atrair os trabalhadores para suaações: por meio de torneios esportivos, o Sindicato con-seguia reunir os trabalhadores de todas as categorias. Defrentistas a gerentes, juntos, no campo de futebol, discuti-am sobre seus problemas e tomavam consciência dasdificuldades e das necessidades das conquistas trabalhis-tas e sociais. Naqueles momentos de congregação, os lí-deres do Sindicato aproveitavam ainda para informar aosassociados e não associados a importância do trabalhosindical, as conquistas que já tinham sido feitas e outraslutas que deveriam ser travadas no futuro.

- Gerentes, executivos e outros profissionais dos altosescalões das empresas se interessavam em participar dostorneios esportivos promovidos pelo Sitramico-RJ, mas agente dizia: só participa quem for sindicalizado – lembra Hum-berto Segreto Gonçalves, diretor do sindicato e um dos res-ponsáveis pelo uso do esporte para agregar a categoria. –Com os torneios esportivos conseguimos resultados maispositivos do que em muitas assembléias – garante.

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Depois de aceitarem a condição, os funcionários de car-gos de chefia, já sindicalizados, compareciam às festas ecampeonatos e, uma vez no meio dos trabalhadores maissimples, ouviam a história de um e de outro, as dificuldadesde sobreviver com os baixos salários, com a falta de benefí-cios oferecidos pelas próprias empresas, o que colaboroupara a criação da consciência de que muitas coisas deveri-am mudar. Havia uma mudança principal na mentalidade detoda a categoria, e tudo através do esporte. À época, a políti-ca das multinacionais do setor era de dar aumento diferenci-ados para funcionários em cargos de chefia e demais funci-onários do escritório, justamente para estabelecer assim maisuma separação entre as duas classes.

No duro regime militar que tomava conta do país, estafoi a saída encontrada pela direção do Sindicato para uniros funcionários mais simples aos “gravatinhas”, comoeram conhecidos os trabalhadores dos escritórios. Um tra-balho descrito como silencioso por Ronaldo Magalhães,então um dos diretores do Sindicato, mas que tinha comoum dos objetivos preparar os trabalhadores para um futu-ro que àquela altura parecia ruim, em razão do recrudes-cimento do regime militar.

O movimento seguiu dando bons frutos, fortalecendo aestrutura sindical. Os grandes eventos se repetiam, juntan-do muita gente para desfrutar juntas as atividades de lazerpromovidas pelo Sitramico-RJ. Em 1976, com o incentivo deHumberto Segreto Gonçalves, é realizado um torneio paracomemorar os 45 anos de fundação do Sindicato. A festaacontece em um clube na Ribeira, na Ilha do Governador. Osucesso foi tão grande que no ano seguinte, 1977, foi reali-zado, no Dia do Trabalhador, um novo campeonato, destavez no clube do Sindicato dos Portuários, na região do Cais

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do Porto do Rio de Janeiro, que reuniu mais de mil pessoas.O êxito obtido com o uso do esporte para atrair os trabalha-dores começou então a preocupar as empresas do setor,que sentiam o fortalecimento do Sindicato. O modelo do usodo esporte para congregar os trabalhadores, entretanto, es-tava consolidado. Em 1977 foi criado um campeonato de fu-tebol de salão, realizado no campo do São Cristóvão Futebole Regatas, que teve como campeão a equipe da Castrol, ecomo vice, a Esso. Em 1984, foi a vez da criação do Cam-peonato Especial, quando foi criado o Troféu Petróleo. A equi-pe que vencesse por três vezes consecutivas ficaria com otroféu. Em sua primeira edição, a vencedora foi a Atlantic,campeã em 1984, 1986 e 1987. No ano seguinte, começamos torneios de veteranos. Neste mesmo ano, são realizadostorneios de futebol soçaite. E nos anos de 1986, 1987 e 1988é a vez do voleibol ajudar a unir e fortalecer o Sindicato.

No fim dos anos 60, mais precisamente em 24 de julhode 1968, o Sitramico-RJ inaugura a sua maior sub-sede, emDuque de Caxias. As outras sub-sedes viriam mais tarde,com o objetivo de atender os trabalhadores em todo o Esta-do do Rio. Em Niterói, o Sitramico-RJ começa a funcionarem 25 de setembro de 1970. A sub-sede da Ilha do Governa-dor é comprada em 2 de outubro de 1980. Nova Iguaçu co-meça a funcionar em 1º de maio de 1992, para atender tam-bém os trabalhadores de Nilópolis e de bairros vizinhos. ECampos é inaugurada em maio de 1993.

Depois do mandato de três anos de Élcio Amaral, Ro-naldo Magalhães decide então se candidatar a presidência,contra uma chapa de oposição apoiada pelo presidente daFederação, Nelson Melgaço. Essas eleições, ocorridas nofim dos anos 70, marcariam para sempre a história do Sitra-mico do Rio de Janeiro.

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No fim dos anos 70, o Brasil clamava por democracia.Com o fim do chamado Milagre Econômico, em 1973, o

governo do general Ernesto Geisel, pressionado pela criseinternacional do petróleo, busca o apoio popular para enfren-tar as dificuldades econômicas. No que se convencionou cha-mar de Abertura Política, que Geisel queria “lenta, gradual esegura, o Governo militar permite a propaganda eleitoral gra-tuita no rádio e na TV, e o partido de oposição, o MDB, venceas eleições. Além da repressão política, o Brasil passava poruma recessão histórica. O crescimento industrial sofre re-dução, o desemprego aumenta. Neste quadro de retomadada democracia, o Sitramico-RJ teve papel fundamental.

Os militares contrários a volta do regime democráticoreagem, os casos de tortura e morte aumentam. Em 1977Geisel fecha o Congresso, com medo de uma nova vitóriada oposição. Em 1978, são proibidas greves em setores con-siderados como de Segurança Nacional, como o de Energia.

Mas o engajamento do Sitramico-RJ na luta pela reto-mada da democracia começa com a eleição, em 1978, deRonaldo Cabral Magalhães. Era uma época perigosa paraos que lutavam por igualdade e pelos direitos dos trabalha-dores e, ao mesmo tempo, o ano de 78 é um marco para ahistória do sindicalismo no Brasil. Com o sentimento de frus-tração com o retrocesso da abertura prometida por Geisel e

Unidos pelaUnidos pelaUnidos pelaUnidos pelaUnidos pela

DemocraciaDemocraciaDemocraciaDemocraciaDemocraciaUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

X

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o fracasso da política econômica do governo militar, os ní-veis de exploração dos trabalhadores chegavam a patama-res insuportáveis. O sindicalismo então retoma a luta comoprioridade de sua atividade, reativando as comissões de fá-brica e propondo um sindicato livre da estrutura sindical atre-lada ao governo. É o amadurecimento de um movimento quecomeçou a se esboçar dez anos antes. Em 1969, um meta-lúrgico de nome Luís Inácio da Silva participava pela primeiravez da diretoria de um sindicato, como suplente. Em 12 demaio de 1978, os trabalhadores da montadora Saab-Scaniado Brasil, em São Bernardo do Campo, em São Paulo, en-traram na fábrica, bateram o cartão, vestiram os macacõese cruzaram os braços. Era uma reivindicação por melhoressalários para os metalúrgicos. A classe metalúrgica queriaver reposta nos contra-cheques dos trabalhadores de suacategoria os prejuízos provocados pela diferença entre a in-flação que tinha sido anunciada até então pelo governo mili-tar para o período de 1973 a 1974, 15,4%, mas que o BancoMundial, numa nota pé em seu relatório, diz ser, na verdade,de 23,5%. O gesto, simbólico, se transformou em um marcode luta pelo direito do trabalhador, um desafio ao Regimemilitar ditatorial. Além de ser uma afronta declarada à Lei deGreve imposta pelo Governo. Com discursos fortes contra aexploração dos patrões e o regime político, Lula inspiravauma reação à violência contra movimentos sociais. A açãoinspirou a luta política de grupos e outros sindicatos por todoo país, entre eles o Sitramico-RJ.

- Eu estava vendo televisão em setembro de 1978 quan-do, às 10 da manhã, vi o Lula falando numa assembléia dosmetalúrgicos. Fiquei maravilhado. Com as minhas raízes detrabalhador, de operário, aquele discurso me parecia perfei-to. Ele falava de um setor no qual só tinha multinacionais, o

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de automóveis. Eu pensei: meu Deus, nós temos que fazero mesmo aqui, porque só temos multinacionais do petróleo!Estávamos em plena campanha política no sindicato, e fica-mos muito entusiasmados com aquilo – relembra Ronaldo.

Com a vitória da chapa, Ronaldo Magalhães, que viriaa se tornar uma das figuras políticas e líderes sindicais maiscombativos do Brasil no fim dos anos 70, colocava o Sitra-mico-RJ na vanguarda da luta pela retomada da democra-cia. Com a ajuda de um assessor do sindicato, José Expe-dito Teixeira, a chapa vencedora teve a idéia de convidar opresidente do Sindicato dos Metalúrgicos, Luís Inácio Lulada Silva, para comparecer à cerimônia de posse. Na épo-ca, O Sitramico significava, no Rio, o apoio político de umaclasse formada por mais de 15 mil trabalhadores, sem contarcom os funcionários dos postos de gasolina, o que elevariao número para mais de vinte mil pessoas. A repressão im-posta pelo regime inibia a sindicalização de grande partedestes trabalhadores, mas não reduzia a representativida-de do Sindicato. E a prova da importância do sindicato éque Lula aceitou o convite.

Uma comissão da chapa vencedora foi receber o sindi-calista no aeroporto e depois seguiram para a cerimônia deposse, na Associação Brasileira de Imprensa. Ao chegar, Lulafoi cercado pela imprensa, que queria ouvi-lo mais uma vez.A cerimônia de posse da nova diretoria do Sitramico-RJ ha-via se transformado em assunto nacional, mais uma bandei-ra na luta contra a ditadura militar.

A movimentação em torno do evento foi tão grande eadquiriu dimensões políticas tão importantes que acabou cri-ando um impasse. Quando viu que Luís Inácio iria tomar par-te da cerimônia de posse, o Delegado do Trabalho, respon-sável pela transmissão do cargo, se recusou a dar posse

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aos novos diretores. Iniciou-se então, naquele breve momentoque antecedeu à posse, um intenso movimento nos bastido-res. O problema foi contornado graças a intervenção do se-nador Vasconcelos Torres, que finalmente garantiu que a novadiretoria tomasse posse.

Com a vinda de Lula ao Rio legitimando a importânciapolítica da organização, o Sitramico-RJ ganhou projeção na-cional e força política para lutar pelos interesses da classe. Anova diretoria, respaldada pela imprensa, aproveitou o cres-cimento do sindicato para intensificar os movimentos juntoàs bases, negociando com as empresas com mais firmeza,indo para as portas das fábricas, distribuindo panfletos.

- Fomos um dos primeiros sindicatos do Rio a assumiresse papel, a fazer declarações mais duras contra as multi-nacionais -, diz Ronaldo.

Aproveitando o fortalecimento do Sindicato, a nova dire-toria começou a lutar pela classe, agora com mais força,mesmo sob a ditadura. A tarefa era principalmente melhoraros salários dos empregados das multinacionais do setor, dosfuncionários dos postos, além disso, buscava-se garantir queas empresas adotassem a prática de oferecer o benefício dovale refeição, já que muitas não ofereciam alimentação nasfábricas. Neste momento, ocorre uma mudança importantedo ponto de vista administrativo do Sitramico-RJ. Para me-lhorar as negociações, o Sindicato contrata economistas paraanalisar os números apresentados pelas empresas e anali-sados pelo Governo. Um dos primeiros a exercer a funçãofoi Silvio Renan, ex-perseguido político do regime. Seu nomefoi indicado por Guaraci Gonçalves, então assessor do sindi-cato, cargo que veio a ocupar por muitos anos. Como pre-sos políticos do Governo Federal no presídio da Ilha Grande,o pai de Guaraci e Silvio Renan tinham fortes laços de ami-

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zade. Guaraci trazia para o sindicato uma sólida experiêncianas lutas pelas causas dos trabalhadores, adquirida em suaspassagem pelo Sindicato dos Ferroviários da Leopoldina epelo Sindicato dos Rodoviários do Município do Rio de Janei-ro. A presença de um economista à mesa de negociaçõessurpreendeu o sindicato patronal, que não estava acostuma-do com esse grau de profissionalismo. E as dificuldades aserem transpostas nessas negociações eram muitas. Ro-naldo lembra que, naquela época, fins dos anos 70 e iníciodos anos 80, os profissionais do setor do Gás, por exemplonão tinham um piso salarial. Os trabalhadores desse setorganhavam por tarefa, por botijão vendido. Não eram raros oscasos em que os trabalhadores pagavam até as botinas eas roupas que usavam para o trabalho.

- Entramos com firmeza para reverter isso. Já tínhamosuma convenção coletiva que garantia esses direitos, mas osempresários, talvez aproveitando a Revolução, não respei-tavam esses direitos. Começamos então um movimento pe-sado, forte para fazer valer a Convenção. Falando nas por-tas das fábricas e nos depósitos – conta Ronaldo.

Mesmo na época de maior endurecimento da ditadura,o sindicato prosseguiu obtendo vitórias na defesa dos direi-tos dos trabalhadores assim como nos avanços sociais. Osaposentados foram chamados a participar das atividades sin-dicais. A atividade política continuava intensa. Políticas de par-tidos de esquerda e de correntes socialistas procuravam osindicato, que tinha acabado de ganhar projeção política na-cional ao integrar o grupo de sindicatos combativos. Saturni-no Braga, Walter Pinto, entre outros, procuravam o sindicatooferecendo respaldo político para as lutas políticas que eramtravadas. O Sitramico-RJ então integrava passeatas pela voltada democracia, participava de grupos supra-partidários que

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visitavam presos políticos encarcerados nas celas dos quar-téis. O contato com Lula aproximou o sindicato do então tam-bém líder sindical Jacob Bittar, que vinha tentando realizaratos sindicais no Rio mas encontrava dificuldades, pois osdemais sindicatos da área de refino, os petroleiros, fecha-vam suas portas para quaisquer reuniões de trabalhadores.Era a ditadura da Petrobras. O Sitramico-RJ deu seu apoio aOlívio Dutra, então presidente do Sindicato dos Bancários doRio Grande do Sul, Arnaldo Gonçalves, do Sindicato dos Me-talúrgicos de Santos. Com a ajuda do Sitramico-RJ, estes eoutros líderes trabalhistas encontravam espaço, no Rio, parase encontrarem, discutir ações e esboçar planos de luta. Pri-meiro nas instalações do próprio Sitramico-RJ, depois nasede do Sindicato dos Rodoviários do Rio, na Rua Cameri-no, o segundo sindicato no Rio a se aliar a Lula em seusmovimentos de luta pelos trabalhadores e contra as políticaseconômicas do Governo militar. Neste época, o sindicatocontou com a força política e com o apoio de Sebastião Ata-íde, presidente do Sindicato dos Rodoviários, que incorporoutotalmente o movimento e chegou a realizar a primeira grevedos rodoviários do Rio, durante a ditadura militar.

Por diversas vezes, o engajamento custou o policiamentoconstante dos agentes do Governo. Ronaldo Magalhães, en-tão presidente, teve que comparecer ao SNI para depor so-bre as atividades do sindicato.

A luta pela melhoria salarial dos trabalhadores continua-va, e o foco era conseguir o piso salarial para os funcionáriosdas empresas de gás. No início dos anos 80, a diretoria dosindicato fez inúmeras viagens a São Paulo na esperançade falar com o então presidente do Conselho Nacional dePetróleo, general Oziel Almeida Costa. O assunto era tãodelicado e tão prioritário, que a Ultragás, um dos gigantes do

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fornecimento do produto, disponibilizou um avião para que adiretoria do sindicato fosse a Brasília negociar a questão dopiso salarial. Ronaldo Magalhães, então conhecido em todoo Brasil como Ronaldo Petroleiro, queria mostrar ao Gover-no a realidade dos trabalhadores, que eles comiam “farofacom siri” nas fábricas, e que as empresas não dispunhamde refeitórios nem ofereciam nenhum tipo de benefício paraa alimentação de seus funcionários. Depois de muitas nega-tivas, o responsável pelo CNP (Conselho Nacional de Petró-leo) concordou em realizar uma reunião entre o Sitramico-RJ e os empresários do setor do gás. Ao mesmo tempo, osindicato procurava mobilizar a categoria em favor da luta.Um evento no Clube do 500, em Duque de Caxias, no Rio deJaneiro, reuniu mais de dois mil trabalhadores da categoria etambém representantes do CNP, que queriam comprovar aunião da classe em favor da causa, o que impressionavaGoverno e patronato. Para que este evento obtivesse o su-cesso esperado, foi fundamental a participação dos motoris-tas dos caminhões que serviam às empresas de gás, trazi-dos pelo Sindicato dos Rodoviários de Duque de Caxias, coma ajuda de seu presidente, Antônio de Freitas Tristão.

A partir desta reunião, Oziel Almeida Costa chegou aconclusão de que realmente os trabalhadores tinham razãoem seus pedidos. Para ajudar nas negociações, o diretor doCNP marcou então uma reunião entre a diretoria do Sindica-to e o então Ministro das Minas e Energia, Aureliano Chaves.A partir destas negociações foi obtido – pela primeira vez noBrasil para os trabalhadores do Rio – o piso salarial para acategoria dos trabalhadores do setor de gás. Depois o bene-fício seria estendido para o Brasil todo. O Sitramico-RJ fezessa luta praticamente sozinho, sem nem mesmo o apoioda Federação. O único sindicato que participou das negocia-

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ções para obtenção do piso foi o Sitramico de Santos. De-pois, a luta foi encampada também pelo Sitramico de Goiás.

Com a conquista do piso salarial dos trabalhadores dosetor de gás, o Sitramico-RJ partiu, ainda na década de 80,para realizar o mesmo trabalho desta vez em favor dos tra-balhadores de postos de gasolina. A diretoria do Sitramico-RJ alugou um carro de som, e com ele rodavam o Brasiltodo, panfletando, conversando com trabalhadores, nego-ciando com patrões. Quando questionadas sobre a possi-bilidade de existência de um piso para a categoria, os do-nos de postos de petróleo eram taxativos: o preço era tabe-lado pelo CNP, e a margem de lucro não permitia essa pos-sibilidade, apenas o pagamento do salário mínimo e mais oadicional de periculosidade, previsto em Convenção. O sin-dicato começou então a sua luta para identificar se estasituação era mesmo verdadeira, mas as dificuldades erammuitas para se obter os dados junto ao Conselho Nacionalde Petróleo. Mais uma vez, o sindicato contou com a ajudade dois nomes importantes para alcançar a vitória nestaluta. O primeiro foi o general Oziel Costa, e o outro nomede fundamental importância para o Sindicato neste momentofoi o do então ministro do Trabalho, Murilo Macedo, incan-sável na defesa dos trabalhadores da categoria. Graçastambém a Murilo Macedo, o sindicato conseguiu uma reu-nião com o ministro Aureliano Chaves e um representantedo então todo-poderoso da economia do Governo, o minis-tro Delfin Netto. Depois de muitas negociações, o Governoacabou se convencendo que teria que dar o aumento quepossibilitasse o piso para a categoria.

Em 1972 foi criada a BR Distribuidora. Um novo desafiopara o Sitramico-RJ. Como seria lidar com uma empresaestatal? Até então, o Sitramico-RJ estava acostumado a ne-

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gociar somente com empresas multinacionais.Mas o Sitramico-RJ não fugiu à sua responsabilidade.

Um dos embates mais duros foi a conquista do pagamentode adicional de periculosidade para esses trabalhadores (as),funcionários das fábricas de lubrificantes.

Na época, a repressão por parte da diretoria da BR eratão intensa, que os funcionários tinham receio de se envol-ver nas demandas trabalhistas, participar de assembléias,ou de qualquer encontro que pudesse significar ato de reivin-dicação da classe. Mas um dos funcionários da Petrobrasprocurou a diretoria do Sindicato e informou que havia umprocesso na Justiça do Trabalho do Rio tramitando há mui-tos anos. O processo tratava sobre um pedido de adicionalde periculosidade, visto que a área onde os funcionários daBR trabalhavam era notoriamente de risco. O Sitramico en-tão começou a trabalhar para que o processo fosse aprecia-do e concluído. A empresa e o Governo fizeram forte pres-são, alegando que nenhum laudo técnico assegurava que talsituação de risco realmente acontecia. Foi quando a diretoriadescobriu que um laudo feito por um fiscal do Ministério doTrabalho no Rio definia a área como perigosa. Mas as dificul-dades políticas para que o processo seguisse seu caminhona Delegacia Regional do Trabalho permaneciam. Não erafácil encaminhar o assunto, sendo a Petrobras já um dosgigantes do Governo, com muitos cargos políticos.

O Sitramico-RJ começou então uma série de longas econtínuas visitas de negociações à Delegacia Regional doTrabalho do Rio e à Petrobras, e quanto mais a questão eraprovocada, mas aumentava a resistência. A cada dia surgiaum problema. E a pressão política aumentava. Em todos osmovimentos de porta de fábrica feitos na frente da Petrobrase da BR e que resultavam em reuniões de negociação o as-

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sunto era colocado à mesa. E a empresa resistia. Foi umadas mais longas negociações efetuadas pelo Sitramico-RJ,com o objetivo de convencer os diretores da Petrobras deque a reivindicação era legítima. A situação começava ficarmais tensa. Em janeiro, o sindicato chegou a marcar umagreve da categoria. A paralisação começaria no dia seguinteao Dia de São Sebastião.

Durante o feriado, a diretoria toda reunida, foi procura-da pela diretoria da Petrobras, que pedia que a greve nãofosse feita. O Sitramico-RJ ponderou que o processo erairreversível, a categoria aguardava aquela paralisação. Vol-tar atrás seria uma demonstração de fraqueza no mínimo,e talvez de subserviência e até conivência com a empresa,contra os trabalhadores.

Foi quando o presidente da BR Distribuidora, CarlosSantana, se comprometeu a levar a frente o processo para aaprovação do pagamento do adicional de periculosidade paraos funcionários da fábrica de lubrificantes da companhia –caso a greve fosse abortada. Ele próprio viria ao sindicato sereunir com os trabalhadores, o que fez, dias depois do pro-metido. O Sitramico-RJ então decidiu transformar a greveem um ato público. A decisão, fruto de uma negociação coma Petrobras, seria uma saída honrosa para não decepcionara categoria e, ao mesmo tempo, não atrapalhar as negocia-ções com a empresa, que passavam por um momento capi-tal. Ônibus repletos com trabalhadores pararam em frenteda sede da Petrobras para o ato público, previsto para durartrinta minutos, mas que acabou durando três horas. O ato foitumultuado, com direito a um atrito entre a diretoria do Sitra-mico-RJ e a direção da BR. Um dos diretores da estatal aca-bou saindo com os óculos quebrados. A imprensa criticoufortemente o sindicato, por ter voltado atrás na decisão da

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paralisação. A direção do Sindicato argumentava que o re-cuo traria vitórias no futuro. Nos dias seguintes, a empresaencampou o movimento do Sindicato pela periculosidade,acompanhando inclusive reuniões no Ministério do Trabalho.Até que, finalmente, foi conquistado o pagamento de pericu-losidade para os profissionais da fábrica de lubrificantes.

Nos anos 80, a categoria dos aposentados receberia tra-tamento especial pelo Sitramico-RJ, com a criação da Asso-ciação dos Aposentados da Categoria Profissional do Co-mércio de Minérios e Derivados de Petróleo do Rio de Janei-ro, em 30 de junho de 1980. A idéia era fazer com que o pro-fissional sindicalizado permanecesse em atividade, discu-tindo questões específicas dos profissionais aposentados daclasse e conservando as relações que tinha feito durante operíodo em que estava na ativa. Inicialmente, a associaçãocontava com 50 integrantes, mas evoluiu rapidamente, pas-sando a ter 200 sócios nos anos 90.

O sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva participa da posse

da diretoria do Sitramico-RJ em 1978

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Apesar de tão democrático, sindicato nunca foi lugar de mulher. Primeiro, porque as mulheres trabalhadoras são

um fato recente na história moderna, data do início do século20. Se a mulher não era trabalhadora, não teria porque lutarpelos seus direitos. O homem sempre assumiu essa fun-ção. Além disso, a própria organização do movimento sindi-cal pelos seus líderes – na maioria homens – jamais facilitoua inserção das mulheres neste mundo. Sabe-se que a mu-lher conquistou e vem ampliando o seu lugar no mercado detrabalho, mas as tarefas da casa ainda são sua responsabi-lidade principal. As várias jornadas tornam quase impossívelsua participação nas assembléias, quase sempre realizadaà noite ou aos sábados. É uma agenda difícil para as mulhe-res que trabalham fora.

A dificuldade de participação na vida sindical é um refle-xo dos problemas enfrentados pelas mulheres na sociedadede uma maneira geral. Segundo o Centro Feminista de Estu-dos e Assessoria, a exclusão das mulheres da vida política éum fenômeno mundial e muito antigo. No Brasil, as mulheressó conseguiram o direito de voto em 1932, graças a um Có-digo Eleitoral que previa o direito de voto apenas a mulherescasadas, e que tivessem a autorização dos maridos, e àssolteiras ou viúvas, com renda própria. As primeiras organi-zações políticas formadas por mulheres ou que tinham como

A LA LA LA LA Luta da Mulheruta da Mulheruta da Mulheruta da Mulheruta da Mulher

no Sindicatono Sindicatono Sindicatono Sindicatono SindicatoUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

XI

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objetivo alcançar direitos das mulheres datam de um Brasildo início do século passado. Em 1910, é fundado o PartidoRepublicano Feminino. Em 1922, surge a Federação Brasi-leira pelo Progresso Feminino. Isto no Rio de Janeiro, a capi-tal federal. Nos rincões do país, pode-se dizer que a situaçãofamiliar e profissional da mulher era quase que feudal, sub-serviente ao homem e obediente às suas ordens. Quandoousava desobedecer, era vítima de castigos físicos severos.

E esta situação perdurou até o fim do século 20, quan-do, apesar de todos os avanços dos movimentos feministasdos anos 60 e das organizações surgidas em favor dos direi-tos feministas, poucas mulheres conseguiram ocupar espa-ço em cargos de decisão política. A representação política émais difícil para as mulheres por causa da falta de profissio-nalização e do alto custo das candidaturas. As mulheres têmmenos recursos financeiros, menos tempo para a práticapolítica, para vida pública, são preteridas em relação aoshomens nos partidos, e enfrentam a cultura patriarcal de elei-tores - homens.

Mas este panorama se modificou a partir da evoluçãodas mulheres nas empresas e na vida política do país. Setrabalham, se votam, podem cobrar. E passam a querer co-brar cada vez mais direitos específicos para as mulheres.No fim da década de 70 e início dos anos 80, as centraissindicais começam a criar grupos específicos para estudara condição da mulher trabalhadora e estabelecer ações paraincluir a mulher no mundo sindical. A maioria dos estudiosostoma a década de 80 como definitiva para a consolidação damulher nos sindicatos.

O Sitramico-RJ teve, em Lúcia Maria Cardoso, a mate-rialização dessa figura feminina que é, ao mesmo tempo,competente no campo profissional e dona de grande luci-

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dez, o que a faz lutar pelos benefícios da classe. Lúcia foi aprimeira mulher a assumir um cargo de diretoria no movi-mento sindical do setor de comércio de petróleo e simila-res, em 1983, mas sua luta no sindicalismo já tinha come-çado há muito tempo.

Sua história começou na companhia Ipiranga, em 1959,e tão logo entrou tinha a certeza que queria participar dosmovimentos sindicais da categoria. Sempre envolvida emações sociais e beneficentes, Lúcia estava decidida a parti-cipar ativamente nos rumos da classe. Em 1963, passa aintegrar o conselho fiscal, e a partir daí não deixa mais departicipar das atividades do sindicato. Vencendo preconcei-tos, barreiras e desafios, procura fazer de seu trabalho sindi-cal uma ferramenta para trazer melhorias para todos. Umade suas bandeiras de luta e conquistas foi, por exemplo, ocusteio dos estudos de terceiro grau para todos os filhos dossindicalizados, que acabou virando realidade. Lúcia Maria Car-doso era mulher, mas, sem abandonar sua vaidade, partici-pava de assembléias e subia nos carros de som e falavapalavras de ordem, discursando contra os desmandos dasempresas. Quando entrava em assembléias onde os deba-tes estavam mais acalorados, era comum ouvi-la dizer, quan-do os homens exageravam nos palavrões: “Não se preocu-pem, eu aqui sou homem”.

- Decidi entrar para o sindicato por paixão, sempre sou-be que queria participar. E fiz no sindicato o que já estavaacostumada a fazer na minha vida particular, estender a mãoao próximo e ajudar. -, lembra Lúcia.

Ao mesmo tempo, dedicava-se com afinco à organiza-ção da sede campestre de Teresópolis, para que tudo ficas-se impecável para os associados. Cuidava da compra detudo, talheres, copos, roupas de cama. Com o rigor de uma

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dona de casa e de um gerente bem treinado, sempre preo-cupada com as licitações e com a economia, para que osrecursos não fossem desperdiçados.

Lúcia ficou no Sitramico-RJ por dez anos, e continuou atrabalhar no sindicato mesmo depois de sua aposentadoria,mostrando que seu destino era mesmo o de trabalhar sem-pre para o bem do grupo. Sem ter a intenção, ela se tornouum símbolo não só do início da participação feminina no Si-tramico-RJ, mas também representante de uma tendênciaque se consolida a cada dia, de maior participação femininaem sindicatos, associações, partidos políticos, empresas edemais entidades organizadas da sociedade civil. Sua maiorparticipação resultou, na prática, em uma maior quantidadede leis defendendo os interesses das mulheres – licença ma-ternidade, estabilidade da gestante, igualdade de oportunida-des, equiparação salarial.

Mas ainda há muito para se conquistar. Com certezaos sindicatos precisam das mulheres, nós sabemos lidarmelhor com os problemas – afirma Lúcia.

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Dando prosseguimento a iniciativa do Sitramico-RJ de usaro esporte como atrativo para os trabalhadores, no início

dos anos 80, o Sindicato começou a se planejar para adqui-rir sua sede campestre, um lugar que pudesse servir comocolônia de férias, como local de descanso e lazer dos traba-lhadores do setor de petróleo, gás e minério. No jornal, a di-retoria encontrou o anúncio de venda de alguns terrenos, quetinham o perfil desejado para o empreendimento. Para maio-res informações, dizia o anúncio, procurar Levi.

Numa primeira reunião no Sindicato, o corretor Levientão tomou conhecimento dos planos para a construçãoda sede campestre. Primeiro foi visitado um terreno emGuapimirim, um lindo local banhado por um rio. Depoisoutro, em Petrópolis, que possuía uma casa sede colos-sal, mas o terreno era pequeno demais para que pudessereunir todos os trabalhadores em atividades esportivas aoar livre, que necessitam de locais amplos. Por fim, Leviinformou que levaria os dirigentes do Sitramico ao localque tanto desejavam. Foi então que o grupo chegou pelaprimeira vez onde hoje funciona a colônia de férias de Te-resópolis. O local, conhecido como ponto turístico pelonome de Clube do Lago, era um terreno com muito porfazer, sem sequer ser cercado, mas que já trazia as ca-racterísticas necessárias para se transformar na sede cam-

A Compra da ColôniaA Compra da ColôniaA Compra da ColôniaA Compra da ColôniaA Compra da Colônia

em Tem Tem Tem Tem TerererereresópolisesópolisesópolisesópolisesópolisUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

XII

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pestre dos trabalhadores do Sitramico-RJ. O valor: CR$150 mil cruzeiros, parcelado em quatro vezes. A dívida foiquitada com os recursos de uma conta poupança abertana Caixa Econômica Federal. O proprietário, entretanto,fazia questão que o pagamento fosse à vista, pois consi-derava o preço pedido barato demais.

O corretor Levi então garantiu que faria o que fossepossível para que o Sitramico-RJ se tornasse proprietáriodo terreno. Dias depois, Levi telefonava para Ronaldo Ma-galhães, então presidente do Sindicato, informando que onegócio estava fechado, com o parcelamento. A compraseria efetuada em 7 de outubro de 1986. Na hora da assi-natura da escritura, a proprietária e seu filho comparece-ram. A senhora, muito elegante, contou um pouco da his-tória do terreno. Seu marido, o médico Jorge Lourenço,tinha comprado a fazenda há muitos anos, para transfor-má-la em um haras. A casa branca até hoje existente nasede guarda uma história. Um dia, a mulher vira numa re-vista americana uma casa, e virou-se para ele dizendo:esta é a casa dos meus sonhos. Sem que ela soubesse,Jorge Lourenço entrou em contato com a revista, que en-viou, a seu pedido, a planta descrita na publicação. E ele areproduziu fielmente no terreno em Teresópolis, dando depresente a sua mulher.

Com os olhos embargados, no momento da assinaturada escritura, a senhora olhou para seu filho, que tinha toma-do a frente na decisão de vender o terreno, e, com os olhoscheios de lágrimas disse que, enquanto vivesse, jamais operdoaria, e jamais esqueceria daquele momento.

Depois da escritura assinada, uma surpresa. O corre-tor Levi resolveu dizer porque se empenhara tanto para queo negócio fosse fechado: ele tinha sido trabalhador da cate-

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goria também, funcionário da Shell e depois da Ultragás, eainda arrematou, dizendo que todos estavam de parabéns,pois em momento nenhum fizeram qualquer irregularidadeno fechamento de um negócio de tamanho valor.

Obra de infra-estrutura na Colônia de teresópolis

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A década de 90 trouxe novos desafios para oSitramico-RJ. Em 1987, Hamilton da Silva Vieira chega

à presidência do Sindicato, eleito em chapa única. Ele tomaposse no dia primeiro de março e, em setembro do mesmoano, já enfrenta seu primeiro desafio: a primeira greve dosetor do gás.

Depois de muita negociação sem qualquer avanço juntoao setor patronal, a categoria se organizou e decidiu pelaparalisação Foram sete dias de greve.

- Era a primeira greve, e eu comandava o movimento.Nós radicalizamos. Não deixamos que um botijão fosse ven-dido, para ninguém. Nem hospital, nem Exército, ninguém. –lembra Hamilton.

Os patrões se recusavam a conceder o aumento pedi-do pela categoria, então todos os funcionários da distribui-ção e comércio de gás do Rio pararam, na época, cerca desete mil pessoas. A força do movimento e a união da catego-ria fizeram com que as empresas melhorassem a propostae, depois de uma semana, o movimento se encerrou. De-pois de fechado o acordo para a volta ao trabalho, mais umavitória: o Sindicato conseguiu que não fossem descontadosos dias parados e que não fosse aplicada qualquer tipo depunição aos grevistas.

Em setembro do ano seguinte, 1988, um ano depois da

Junta Governativa, A Luta contraJunta Governativa, A Luta contraJunta Governativa, A Luta contraJunta Governativa, A Luta contraJunta Governativa, A Luta contra

o Metanol e o Auto-Serviçoo Metanol e o Auto-Serviçoo Metanol e o Auto-Serviçoo Metanol e o Auto-Serviçoo Metanol e o Auto-ServiçoUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

XIII

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primeira greve, o setor do gás parte para outro movimento,ainda mais radical. Desta vez, a paralisação duraria 15 dias.Se o Sindicato mostrava ainda mais força no comando dacategoria, as empresas reagiam com mais intensidade aoaumento do movimento sindical. Os patrões decidem entãousar do aparelho policial para reprimir os atos em frente dasempresas e calar os líderes da greve. A polícia agiu com fir-meza. Houve uma tentativa de prender o presidente do Sin-dicato, Hamilton Vieira. A diretoria anunciou então que, se elefosse preso, todos deveriam ir presos também. A radicaliza-ção chegou a tal ponto que o ministro-chefe do Gabinete daPresidência da República do governo de José Sarney, umgeneral, ligou para a direção do sindicato, afirmando que Ha-milton estava intimado a terminar com a greve no Estado doRio. Mas a direção não cedeu. Nas assembléias, o clima en-tre os trabalhadores era de que, a qualquer momento, ocor-reria um confronto entre os grevistas e a polícia. Entretanto,depois de duas semanas de paralisação, mais uma vez omovimento foi vitorioso, e conseguiu aumentar a propostade aumento para a categoria.

A primeira greve realizada pelos trabalhadores da BRDistribuidora, que se tornaria histórica, também ocorreu nesteperíodo, desta vez no início do ano de 1987, por causa deuma negociação salarial. Depois de muito negociar, catego-ria e empregadores não chegaram a um acordo. O local es-colhido pelos trabalhadores para o movimento foi a Praça 22de abril, próximo ao aeroporto Santos Dumont, no centro doRio. O movimento, que durou dois dias, chegou a reunir maisde quinhentos trabalhadores no local. Grande parte deles foitrazida também de ônibus, da fábrica de lubrificantes daempresa, que se uniram com os funcionários que trabalha-vam na sede da companhia. Graças ao endurecimento na

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negociação, a categoria conseguiu alcançar algumas das van-tagens propostas pelo sindicato, como, por exemplo, fazercom que o abono do qüinqüênio fosse transformado em anu-ênio, incorporando ganhos ao salário dos funcionários.

A contrapartida, entretanto, foram dramáticas para ostrabalhadores. Tão logo o sindicato finalizou o movimento,as empresas começaram a perseguir os trabalhadores quehaviam participado. Começou a vigorar então uma determi-nação de que quem desejasse ser chefe na BR não poderiaser associado do Sindicato. Apesar disso, para Wilson Agos-tinho de Pinho, funcionário da BR há 24 anos e um dos queparticiparam do movimento em 1988, diz que valeu a pena,pois a partir deste momento as reivindicações da categoriapassaram a ser ouvidas com mais atenção pela empresa.

O sucesso destes movimentos não só fortaleceu o Sin-dicato como também, da mesma forma como aconteceu emoutras épocas, incentivou a filiação de novos trabalhadores,que sentiam que seus interesses eram de fato defendidospela entidade. Em três anos, o Sitramico-RJ passou de cer-ca de dois mil trabalhadores sindicalizados para dez mil as-sociados. A receita proveniente deste crescimento se rever-teu em benefício dos trabalhadores. Os recursos foram uti-lizados para inaugurar novas sub-sedes e aprimorar os ser-viços oferecidos nas sub-sedes que já estavam funcionando– Duque de Caxias e Ilha do Governador. Começa a funcio-nar então o consultório odontológico na sub-sede de Caxias.

Se no campo das conquistas para os trabalhadores oSitramico-RJ seguia obtendo vitórias importantes, as dispu-tas políticas internas criaram, no início dos anos 90, umasituação instável. Mais uma vez em sua história o Sindicatoviria a ser dirigido por uma Junta Governativa. Desta vez, arazão era uma divisão na diretoria. As propostas para modi-

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ficar o estatuto do Sindicato, propondo aumentar o númerode integrantes da diretoria e o mandato da direção de trêspara quatro anos eram as causas para esse racha interno,que acabou levando o processo eleitoral para os tribunais.Uma liminar obtida na Justiça então suspendeu as eleiçõesna época da formação das chapas, e o Sindicato permane-ceu, de março a setembro de 1990, sendo administrado poruma Junta Governativa, que tomava as decisões sobre tudo.

Enquanto os dois grupos aguardavam a palavra final daJustiça, outra decisão judicial permitiu que fosse feita outraeleição, mas com base no estatuto anterior.

- Tínhamos uma chapa com 35 nomes, e tivemos quecortar 13 nomes. Isso era muito ruim, porque, uma vez que otrabalhador entra para a direção do sindicato oficialmente elefica marcado pela empresa e, ao mesmo tempo, recebe aestabilidade provisória. Se ele deixa de ser líder sindical, ficatotalmente vulnerável. Uma das saídas para não ser injustocom ninguém foi analisar caso a caso e, conversamos comaqueles companheiros que já estavam para se aposentar, eusamos isso também como critério para selecionar quaissairiam – lembra Hamilton.

A eleição da Justiça finalmente veio, mas sem as mu-danças no estatuto previstas. Hamilton lamenta que essasmudanças não tenham sido feitas, pois o aumento do núme-ro de diretores significaria maior representatividade de cate-gorias e de municípios de todo o Estado do Rio de Janeiro.

Apesar do contratempo em sua administração interna,o Sitramico-RJ, na década de 90, efetuou muitas inovaçõesem sua comunicação e no contato com os trabalhadores,para conseguir aumentar seu número de associados. Umadas primeiras decisões neste sentido, durante a gestão deHamilton Vieira, foi fazer com que as assembléias fossem

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realizadas aos domingos. Só desta forma os frentistas po-deriam comparecer. Durante a semana, os trabalhadoresdesta categoria argumentavam que era impossível ir a qual-quer reunião promovida pelo Sindicato. No início, as assem-bléias contavam com tímidos vinte ou trinta frentistas. Masesse número logo passou para cinqüenta, setenta, cem, atéque conseguia-se encher as assembléias. Os trabalhadoresse espremiam até nas escadas. O trabalho de convencimentoera contínuo. Uma kombi do Sindicato passava duas vezespor dia nos postos avisando do encontro.

Um dos assuntos mais discutidos nas assembléias do-minicais eram os índices de reajuste salarial. Em pleno go-verno Sarney, com inflação galopante, os números muda-vam mês a mês. Por isso foi necessário que, mensalmente,o Sitramico-RJ distribuísse nos postos uma tabela com osíndices corretos de reajuste previstos para a categoria. OSindicato não possuía então a estrutura de cadastro como ade hoje, e essa foi então a iniciativa seguinte para bem infor-mar ao trabalhador. Era preciso modernizar os métodos detrabalho. Com uma lista de empresas cadastradas no Con-selho Nacional de Petróleo, o Sitramico-RJ passou a obterum controle maior sobre quantos funcionários haviam, ondetrabalhavam e quanto ganhavam. Foi criado então um efici-ente sistema de arrecadação da contribuição sindical, o queaumentou a receita do Sindicato.

O próximo passo para aumentar o número de sindicali-zados – e a conseqüente arrecadação – foi fazer uma parce-ria com a Empresa de Correios e Telégrafos. Os dados pes-soais dos milhares de frentistas estavam disponíveis nos for-mulários de contribuição sindical que as empresas eramobrigadas a fornecer. Pelos Correios, o frentista recebia noposto uma proposta de sindicalização, em seu nome, expli-

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cando os benefícios de ser um associado ao sindicato. Gra-ças a esse conjunto de medidas, o Sitramico-RJ chegou ater 10 mil sócios. Outra grande iniciativa desse período foi acriação do “Odontomóvel”, um consultório dentário dentro deuma Kombi, para atender os frentistas no local de trabalho.

Muitas conquistas da categoria de frentistas acontece-ram a partir de 1990. Antes desta época, as empresas fazi-am muita pressão sobre os funcionários sindicalizados, queacabavam sendo coagidos a terem a carteira assinada comoauxiliar de posto, para que os patrões não fossem obriga-dos a pagar o adicional de 30% relativo a periculosidade, nocaso dos frentistas, ou 20% como adicional de insalubrida-de, para os lavadores. Foi um tempo de muitas greves, de-núncias e intenso trabalho de fiscalização nos postos degasolina, para que os cerca de 20 mil trabalhadores de postode gasolina em todo o estado do Rio de Janeiro aproveitemhoje de seus benefícios.

Odontomóvel projeto pioneiro do Sitramico-RJ

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Mas a década de 90 guardava para o Sitramico-RJ duaslutas muito importantes: a primeira, contra a mistura do

Metanol à gasolina e a segunda, contra a implantação dospostos automatizados de combustível.

A batalha do Metanol começou em 1992, depois de oGoverno ter tomado inúmeras ações para, com o produto,resolver um problema energético brasileiro. O combustível,o álcool metílico, era anunciado pela Petrobras como a sa-ída para regularizar os estoques de gasolina e reduzir o preçodo produto. Em 1989, quatro ministros de Estado, preocu-pados com a crise do abastecimento de álcool, decidemque o país importaria 1,5 bilhão de litros de metanol, paraenfrentar as dificuldades no mercado interno. Em 1990, acrise de abastecimento atingia nove estados brasileiros. Aação tinha como objetivo enfrentar uma situação que naépoca era dramática. Em todos os postos do Brasil, as filasde carros esperando para serem abastecidos com álcoolcombustível se multiplicavam. E muitas vezes os motoris-tas saíam dos postos com os tanques vazios. Em todo opaís, em 1989, a frota de veículos a álcool era composta dequatro milhões de unidades. O Brasil era o primeiro país domundo a usar a mistura do metanol ao álcool combustívelem larga escala, já que não existia nenhum estudo que com-provasse sua segurança.

A Batalha contraA Batalha contraA Batalha contraA Batalha contraA Batalha contra

o Metanolo Metanolo Metanolo Metanolo MetanolUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

XIV

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A situação chegava ao caos provocado pelo desabaste-cimento, e muitos afirmavam que a crise era o resultado deuma política de controle da inflação desastrada. Num pano-rama que já tinha acontecido em outras épocas, sem preçosque estimulassem o plantio da cana de açúcar para atendero consumo de álcool combustível, os estoques dos usinei-ros ficaram aquém da demanda estimulada pela criação doProálcool, programa governamental lançado no inícios dosanos 70 que tinha no uso do álcool a grande saída do Brasilpara o mercado do petróleo, comandado pelos países doOriente Médio. E a matemática do mercado entrou em ação.Se não havia cana, o álcool rareava, e se rareava, o preçofinal aumentava nas bombas, resultando em inflação, umafórmula que o Governo queria evitar a qualquer custo.

Para reduzir os efeitos da enorme crise de abastecimen-to causada pela falta de entendimento entre usineiros e oGoverno Federal, o metanol precisaria ser misturado à gaso-lina em todos os postos do país. O que foi feito. A misturacontinha 33% de metanol, 7% de gasolina e 60% de álcooletílico veicular. Entretanto, rapidamente especialistas e enti-dades de classe envolvidas com a questão – entre elas ecom destaque o Sitramico-RJ – chamaram a atenção para operigo de se fazer tal mistura, já que o metanol é comprova-damente tóxico, expondo a risco consumidores, frentistas,operadores de plataforma e caminhoneiros.

O Sindicato então começou a realizar intensas mani-festações contra a medida. O caminho mais uma vez era ode conscientizar a classe, alertar a população e denunciaraos órgãos do Governo sobre os riscos da mistura.

Era preciso panfletar, usar o carro de som, falar altopara que a idéia de se usar o metanol não fosse à frente.Hamilton Vieira, presidente do Sindicato nesta época, era

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taxativo: se o metanol fosse misturado ao combustível, acategoria entraria em greve. “Essa decisão não pode sertomada sem a participação dos trabalhadores. Se issoacontecer, vamos parar”, ameaçava. “Os trabalhadores doEstado do Rio não serão cobaias”, alertava Hamilton, falan-do em nome dos mais de 20 frentistas dos postos revende-dores do Rio de Janeiro. A categoria estava insatisfeita ain-da porque, para lidar com o produto, era necessário usaruma roupa especial, que muitos chamavam de “roupa deastronauta”, que se constituía de vestes impermeáveis elacradas, além de proteção para o rosto. A vestimenta cau-sava estranheza aos consumidores e extremo desconfortoaos frentistas. Todos esses cuidados eram necessáriosporque o metanol era perigosamente tóxico para o ser hu-mano, podendo provocar cegueira e alterações no sistemanervoso, entre outros danos ao organismo.

A questão ganhou os tribunais, em ações movidas portodas as partes interessadas. Uma decisão da Justiça doRio chegou a proibir a mistura do produto no Estado. Masum juiz do Tribunal Federal de Brasília anulou todas as limi-nares que proibiam o uso e a importação do produto.

E tanto foi firme o movimento que o governador do Es-tado do Rio à época, Moreira Franco, recebeu para umareunião no Palácio Guanabara todos os sindicatos envolvi-dos com o tema. O Sitramico-RJ deu um passo à frente e,para este encontro, levou um técnico da CPRM (Compa-nhia de Pesquisa e Recursos Minerais), para sustentar ci-entificamente a argumentação de que o metanol era peri-gosamente tóxico. Foi o único sindicato na época a fazeruma demonstração, com a ajuda de um técnico do própriogoverno, contra a medida da Petrobras.

Diante de tantos apelos e de tão forte campanha lidera-

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da pelo Sitramico-RJ, o Governo do Estado então decidiu: noEstado do Rio não entraria o metanol, e o Rio de Janeiro foide fato o único estado em que a mistura não foi feita, graçasà lei estadual. Com o decorrer do tempo, outros estados se-guiram o modelo do Rio e proibiram também o uso do com-bustível misturado à gasolina.

A união entre os trabalhadores da CPRM e o Sindicatoteve início ainda nos anos 80. O primeiro a tentar mostraraos trabalhadores da companhia a importância de possuiruma eficiente representação sindical foi Jorge Bittar, entãopresidente do Sindicato dos Engenheiros. Ele conversoucom os funcionários, mas ponderou que, apesar de a em-presa ser formada, em sua maioria, por um quadro de tra-balhadores com curso superior, o Sindicato dos Engenhei-ros não poderia se tornar o sindicato majoritário, já que acategoria fazia parte do setor de minério. A direção da CPRMdecide então fazer uma consulta ao Ministério do Trabalho,para identificar qual sindicato seria o mais apropriado paradefender os interesses dos trabalhadores. O Sitramico-RJfoi a entidade apontada.

A partir daí, o sindicato começou intensamente a de-fender os direitos dos funcionários da companhia. Gran-des movimentos de base foram realizados, entre elesuma greve que chegou a durar 19 dias, na luta pelo rea-juste salarial e outros benefícios, como auxílio creche ea licença paternidade.

Mas talvez a mais significativa batalha travada pelo Si-tramico-RJ em favor de todos os funcionários da Compa-nhia tenha ocorrido no ano 2000, quando o Governo tentoufechar os escritórios da CPRM no Rio, levando as ativida-des completamente para Brasília, onde a sede da empresafunciona há 30 anos. Em fevereiro do mesmo ano, os cer-

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ca de 500 funcionários da companhia iniciaram a campa-nha contra a mudança.

- O Sindicato agiu com força, buscando apoio junto àbancada parlamentar do Rio para obter a força política ne-cessária para lutar contra esta decisão – lembra João Leo-nel, diretor do Sindicato há 10 anos e funcionário da Compa-nhia de Pesquisa e Recursos Minerais há 31 anos.

A Assembléia Legislativa do Rio aprova uma moção aser entregue ao então presidente da República, FernandoHenrique Cardoso, pedindo que a empresa continuasse nacidade. Ainda em fevereiro, 300 empregados da Companhiainterrompem suas atividades por três horas e fazem um atode protesto em frente à empresa, na Urca. Essa situação seprosseguisse conforme os planos traçados pelo Governo paraa chamada reestruturação do papel do Estado, poria em ris-co o emprego de muitos dos funcionários que a companhiamantinha no Rio. O cálculo é que a mudança faria com quepelo menos 70% dessas pessoas perdessem o emprego, jáque não conseguiriam restabelecer sua família e vínculos pes-soais em Brasília em curto espaço de tempo. Segundo cál-culos feitos à época, o Rio perderia importância como pólocientífico gerador de conhecimento geológico – fundamentalpara o setor energético – além de R$ 117 milhões por ano. Oempenho do Sindicato e a mobilização da categoria foramvitoriosos, e conseguiram reverter a decisão governamentale manter no Rio os escritórios da companhia.

Um outro grande avanço obtido graças ao crescimentodo Sindicato nesta época foi a transformação da sede cam-pestre de Teresópolis na atual colônia de férias do Sitramico-RJ, com muito mais estrutura a oferecer aos associados. Otrabalhador já encontrava três piscinas – adulto, infantil e ju-venil -, mas as acomodações começaram a ser ampliadas.

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Primeiro, foram construídos oito chalés. Depois, vinte e qua-tro. A partir de então, o associado não precisa ir a sede cam-pestre e voltar no mesmo dia, poderia prolongar sua estada,com lazer e esporte a sua disposição. O terreno, de 15 milmetros quadrados, ganha ainda salão de jogos, sala de tele-visão, auditório e salão de festas.

Muitas outras batalhas importantes para a categoria fo-ram travadas nesta época, entre elas a luta para a readmis-são dos funcionários da BR-Distribuidora demitidos pelo go-verno do presidente Fernando Collor, a criação do ComandoNacional Unificado, que fortaleceu o Sindicato nas mesas denegociações salariais, as campanhas contra a terceirizaçãoda venda do gás e a requalificação dos botijões e a batalhapara que os frentistas não fossem mais obrigados a pagarpelos cheques sem fundo que recebiam. Nesta época, pelaprimeira vez na história do Sitramico-RJ, um frentista passaa ocupar a diretoria do Sindicato, era Paulo César Freitas,que passou a integrar a direção do Sitramico-RJ em 1990.

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Cinco anos depois, em 1997, o Sitramico-RJ deveria lu-tar uma de suas mais combativas lutas, para impedir

que fosse imposto aos trabalhadores do setor o sistema deself-service nos postos de gasolina. A implantação do sis-tema poderia significar, segundo os primeiros cálculos doSindicato, a demissão de 250 mil frentistas em todo o país,uma das maiores perdas da história da categoria. E o Sin-dicato reagiu à altura. À época, os postos de gasolina em-pregavam mais de 20 mil trabalhadores no Estado. E o cál-culo das empresas distribuidoras de combustível era sim-ples: com as máquinas de auto-serviço, muito popularesnos Estados Unidos, o gasto com pessoal nos postos seriamuito reduzido, o preço do combustível sofreria uma pe-quena redução, mas a um preço alto demais. Parte da re-muneração do frentista é composta pelo adicional de peri-culosidade, incluído no preço final do combustível, e issonão foi conquistado por acaso. O trabalho é realizado emárea de alta periculosidade, com manuseio direto de líqui-dos inflamáveis. Com as bombas self-service, este traba-lho teria de ser feito pelo próprio consumidor, passando estea correr o mesmo risco.

As empresas chegaram a implementar os postos comauto-serviço em alguns estados. São Paulo chegou a ter105 postos automatizados. O Rio de Janeiro, 42. Em um

A Batalha contraA Batalha contraA Batalha contraA Batalha contraA Batalha contra

o Auto-serviçoo Auto-serviçoo Auto-serviçoo Auto-serviçoo Auto-serviçoUNIÃO E FORÇA – Este era o lema do SITRAMICO-RJ em 1931

CAPÍTULO

XV

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ano, 420 pessoas perderam o emprego por conta das bom-bas automatizadas.

Mais uma vez, assim como já tinha ocorrido na batalhado Metanol, o protesto do Sitramico-RJ contra os planos dasempresas neste sentido foi incansável. Além das campanhas,passeatas e movimentos nas portas das empresas, o Sindi-cato buscou apoio dos meios de comunicação, da popula-ção e demais entidades da sociedade civil, além de denunci-ar seguidamente as falhas do sistema e o funcionamento depostos irregulares ao Ministério do Trabalho. Mas a tarefaexigiria também um esforço político para que, em Brasília, oGoverno e o Congresso voltassem atrás e proibissem a im-plantação do sistema no país. Foi então que o Sindicato re-correu até ao ministro do Trabalho em favor da categoria. OSITRAMICO-RJ foi recebido em Brasília pelo ministro Fran-cisco Dornelles, o que demonstrou a força do movimento.Foram mais de trezentas pessoas à capital fazer pressãopara que o auto-serviço não fosse implantado no país.

A primeira vitória foi fazer com que a Agência Nacionalde Petróleo lacrasse as bombas automáticas no Rio. O Si-tramico-RJ então buscou ajuda com o deputado federal AldoRebelo, que elaborou um projeto de lei para proibir as bom-bas de auto-serviço em território nacional.

Começava então uma das mais intensas batalhas doSindicato em favor da categoria. Para pressionar a aprova-ção do projeto, o Sitramico levou à Brasília cinco ônibus lota-dos de frentistas. O movimento foi fundamental para o proje-to ser aprovado no Congresso.

Até que as vitórias começaram a aparecer. Em agostode 1999, o município de Magé sanciona uma lei proibindo aautomação dos postos, seguindo o exemplo de Campos, oprimeiro do estado a impedir a implantação do sistema na

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cidade. Em setembro, a categoria obtém uma grande vitóriajunto ao Governo Federal e à Agência Nacional do Petróleo.Um acordo entre governo, distribuidoras, postos de gasolinadeterminava a proibição e a criação de postos com essascaracterísticas durante um ano, em todo o Brasil. O Sitrami-co-RJ começa então a denunciar os postos que, clandesti-namente, adotam este modelo de comercialização de com-bustível. É feita e entregue aos fiscais do Ministério do Traba-lho uma lista com postos irregulares em 20 estados do país.

Durante dois anos, a partir de 1998, data limite para oacordo assinado em Brasília, a implementação do sistemaself-service se dava por meio de batalhas judiciais. Commandados de segurança obtidos na Justiça, a Esso conse-gue implantar o sistema em 190 de seus 2.700 postos emtodo o país. Até que, em 12 de janeiro de 2000, o presidenteFernando Henrique Cardoso assina a lei que proíbe em todoo país o funcionamento de bombas de combustível opera-das pelo consumidor, com punições que variavam de multaaté o fechamento do posto. Como previsto pelo Sindicato, aredução de custo do combustível não compensaria o riscoa que o consumidor seria exposto. Além disso, em suasvistorias realizadas na época, os fiscais do Ministério doTrabalho constataram que na maioria dos postos que ado-taram o sistema vários itens de segurança não estavamfuncionando, e que muitos consumidores fumavam enquantoabasteciam os veículos.

Segundo cálculos do Sindicato, à época, existiam cercade 290 destes tipos de bombas no Brasil. A Esso volta atrás,anuncia o fechamento das bombas de self-service e a con-tratação de mil novos funcionários. Uma vitória histórica paraos cerca de 300 mil frentistas em todo o país e 20 mil no Rio.

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O início de um novo século trouxe desafios não só para oSitramico-RJ, mas para todos os sindicatos brasileiros.

As grandes transformações na política econômica brasileirae mundial, a globalização e a tendência ao individualismo,em contraposição às lutas coletivas, exigem dos sindicatosuma nova postura na representação de suas classes. Osobjetivos dos sindicatos e das principais centrais sindicaispassam a ser – além de buscar sempre a conciliação, nolugar de partir para a mobilização das bases – agir de acordocom o mercado de trabalho.

No ano de 2004, quando uma parte da diretoria se unepara compor uma chapa de oposição, acontece um novo ca-pítulo na estória do Sitramico-RJ. Eleita com expressiva vitórianas urnas, contabilizando cerca de 70% dos votos da catego-ria, que assim demonstrou a sua enorme vontade de mudan-ça, elege-se a diretoria atual. Ocorre então o renascimento doSindicato. Havia muito trabalho a ser feito, e vem sendo feito.Era hora de reformular o sindicato, arrumar a casa e, o maisimportante, fazer a reaproximação com o trabalhador.”

Depois de um período de dificuldades no início do man-dato, a atual direção do Sitramico-RJ trabalha agora para re-cuperar a imagem e a credibilidade do sindicato junto à cate-goria, para provar que, como fez nos últimos 75 anos, seuobjetivo principal é amparar e defender os interesses do tra-

2004 Olhando para2004 Olhando para2004 Olhando para2004 Olhando para2004 Olhando para

o Fo Fo Fo Fo FuturouturouturouturouturoRENOVAÇÃO E LUTA – Este é o atual lema do SITRAMICO-RJ

CAPÍTULO

XVI

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balhador. Reconhecendo que a classe tem sofrido muito, prin-cipalmente com as mudanças no cenário dos últimos anoscom os efeitos da globalização, com a terceirização, o fimda entrega automática do gás de cozinha e o aparecimentode novas tecnologias, dentro e fora dos escritórios.

Para a atual diretoria do Sitramico-RJ , uma das priori-dades na luta pelos direitos dos trabalhadores do setor dogás e das distribuidoras de combustível, por exemplo, é re-pensar o problema da terceirização. A terceirização, que ga-nhou força no país com a abertura do mercado brasileiro du-rante o Governo de Fernando Collor, reduziu drasticamenteos postos de trabalho nesses setores, o que acabou resul-tando também em uma diminuição do número de associa-dos no sindicato, que hoje é de cerca de cinco mil integran-tes. Em todo o Estado, o setor de gás chegou a reunir no Riode Janeiro mais de oito mil trabalhadores. Hoje são poucomais de dois mil. O caminho a ser seguido é pensar juntocom a categoria estratégias de luta para combater esse mo-delo, que não pode se limitar a apenas cortar funcionárioscontratando prestadores de serviço, perdendo com isso qua-lidade de serviço e de produtos. É preciso valorizar a dedica-ção, a produtividade apresentada e o empenho do profissio-nal contratado, que pode ser obtido, por exemplo, com a con-tratação dos próprios trabalhadores terceirizados. É impres-cindível construir uma visão mais atual, mais objetiva, enca-rando o mercado de trabalho com todas as suas novas ca-racterísticas, mais moderno, mais exigente, mas sem per-der de vista as necessidades dos trabalhadores.

Nos postos de gasolina, a realidade é diferente, e o Si-tramico-RJ está atento aos problemas que impedem umamelhoria nos salários da categoria. A livre concorrência entreos postos, que não têm mais como repassar seus custos

Renovação e Luta

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em preços que antes eram tabelados pelo Governo, se vêemobrigados a reduzir mão-de-obra e a contratar cooperativasque não estimulam a sindicalização e não se preocupam emlutar para que seus trabalhadores tenham direitos a benefíci-os básicos da categoria. Atualmente, dos cerca de 20 miltrabalhadores em postos de serviço no estado do Rio de Ja-neiro, pelo menos 20% são cooperativados. O Sitramico-RJvem realizando uma intensa campanha para acabar com esseproblema, verdadeira exploração da mão-de-obra disponívelem nosso país, uma distorção que deve ser corrigida pormeio da representação sindical conseqüente e responsável.

Ainda nos postos de gasolina, o Sitramico-RJ está preo-cupado e vem obtendo sucessos a tarefa de reduzir a rotati-vidade encontrada entre os trabalhadores deste setor, quali-ficando os funcionários. Para isso, em 2005, foram realiza-dos cursos em parceira com o Sindicato Patronal para aju-dar os trabalhadores de postos de serviço a melhorarem suaqualificação e seus conhecimentos do mundo do trabalho.

As relações de trabalho estão se modificando com rapi-dez, e o Sitramico-Rj tem demonstrado agilidade nas res-postas aos novos tempos e desafios impostos á categoria.É preciso pensar essas novas relações de trabalho à luz depropostas como a flexibilização da Consolidação das Leisdo Trabalho (CLT), o fim do imposto sindical, a explosão dotrabalho informal, o fortalecimento do neoliberalismo. Paraanalisar as grandes mudanças que deverão se efetuar peloProjeto de Lei da Reforma Sindical, que ainda está no Con-gresso Nacional, o Sitramico-RJ criou uma comissão espe-cial que estuda e avalia quais mudanças são boas para ostrabalhadores para que seu posicionamento seja, como sem-pre, ao lado de sua classe.

Estes são desafios para o sindicato que vai garantir o

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seu lugar no futuro como digno representante de seus asso-ciados, que sempre acreditaram, desde aquela primeira reu-nião, em 1931, que, entre os seus pares estariam protegi-dos, seriam fortes e poderiam enfrentar o poder econômico,que nem sempre promove justiça social. É preciso se man-ter fiel à luta pelos direitos dos trabalhadores, e avaliar cadaproposta sob esta ótica.

O importante, diante deste quadro de mudanças cadavez mais velozes, é lembrar sempre que uma das princi-pais características, das quais o Sitramico-RJ sempre seorgulhou, é ser um sindicato que não perde seus concei-tos principais - isenção e honestidade na representaçãodo trabalhador.

O Sindicato se prepara também para enfrentar as mu-danças históricas que estão ocorrendo no setor petróleo,quando o Brasil acaba de alcançar a tão buscada auto-sufi-ciência na produção do produto. Com o funcionamento dasplataformas P-43 e P-48, a Petrobras passa a produzir 1,8milhão de barris por dia, aumentando a produção em 13% aoano. Sem dúvida, um marco na história do desenvolvimentodo país. A empresa consolida-se assim como uma máquinacada vez mais poderosa que, por exemplo, conseguiu do-brar o seu número de fornecedores desde 2003, chegando atrabalhar hoje com mais de 1.300 empresas. Segundo o Go-verno, esta mesma engrenagem será capaz de gerar, nospróximos cinco anos, 665 mil novos postos de trabalho.

As boas notícias na economia dão a certeza de que,com trabalho sério e dedicação, o Sitramico-RJ já vem con-seguindo obter os sucessos almejados. O sindicato se tor-na mais do que nunca um parceiro do trabalhador. Juntos,vencerão a batalha pelo emprego: treinando os novos pro-fissionais, defendendo direitos da classe trabalhadora, ino-

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vando na aproximação com seus associados. Todas as lu-tas que o Sindicato travou nestas sete décadas serviramcomo modelo, de caminho a ser seguido, para que novasbatalhas se construam, e para que a classe dos trabalha-dores (as) obtenha novas vitórias.

Todos os trabalhadores (as) representados pelo Sitra-mico-RJ, sejam eles de postos de serviço, de empresas dis-tribuidoras de combustíveis e GLP, do setor de minérios, aDiretoria do Sitramico-RJ conclama: junte-se ao seu Sindi-cato na construção de novo sindicalismo, forte, combativo,de olho no presente e no futuro.

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Page 96: Apresentação - Sitramicositramico-rj.org.br/wp-content/uploads/2014/01/Livro-75... · 2015. 10. 9. · go era, em si, uma dádiva. O mais comum era estabelecer como prática de

DIRETOR PRESIDENTE – SERGIO VIEIRA - BR

DIRETOR VICE-PRESIDENTE – JOSÉ MARIA A. RIBEIRO - IPIRANGA

DIRETOR ADMINISTRATIVO – LIGIA ARNEIRO T. DESLANDES - BR

DIRETOR FINANCEIRO – KLEBER FERREIRA - TEXACO

DIRETOR JURÍDICO – JAIR SANTOS OLIVEIRA - NACIONAL-GÁS

DIRETOR DE PATRIMÔNIO – ELEASAR DOS ANJOS CORRÊA -

SUPERGASBRÁS

DIRETOR SOCIAL – MARCOS ANTONIO SERTÓRIO - ROCHA E FILHO

DIRETORES SUPLENTE DA DIRETORIA: LUIZ CARLOS RUFINO - SHELL

/ PAULO CÉSAR FREITAS - POSTO / HUMBERTO ALEXANDRINO -

IPIRANGA / PAULO ALVES - COPAGÁS / PAULO CÉSAR DOS SANTOS -TEXACO / ALMIR DE ALMEIDA XAVIER - TEXACO / JOÃO DA SILVA LIMA -

CASTROL / JORGE JOSÉ GOMES DA SILVA - SUPERGASBRÁS / LUIZ

ANTONIO F. DE MACEDO - BR / ALDIRA B. C. DE ARAÚJO - APOSENTADA/ JAIRO FERREIRA - BR / ANTONIO DE O. SILVA - POSTO / ROBERTO DA

S. PATROCÍNIO - SHELL / PEDRO PAULO R. SALVADOR - IPIRANGA

CONSELHO FISCAL (EFETIVOS): ONIVALDO ALVES DE OLIVEIRA - ESSO/ JOÃO LEONEL - CPRM / LUCIANO PASCALE - SHELL

CONSELHO FISCAL (SUPLENTES): MARCOS DA CONCEIÇÃO -

NACIONAL-GÁS / MARIO CESAR O. ALMEIDA - POSTO / GERALDO B.

DOS SANTOS - SUPERGASBRÁS

DELEGADOS REPRESENTANTES DA FEDERAÇÃO (EFETIVOS):HUMBERTO SEGRETO GONÇALVES - IPIRANGA / ADILSON MEDEIROS

AGUILERA - POSTO

DELEGADOS REPRESENTANTES DA FEDERAÇÃO (SUPLENTES): JOSÉPAULINO DOS SANTOS - ULTRAGÁZ / EVANTUIL DE SOUZA - MINASGÁS

Diretoria

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