apostila sociologia 2014 2 ano

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1. Cultura 1.1. Cultura popular 1.2. Cultura erudita 1.3. Cultura de massa 2. Identidade cultural 3.Relativismo cultural e etnocentrismo 4. Alteridade, tolerância e convivência 1. Conceito de raça, cor e etnia 2. Preconceito racial e movimentos afirmativos

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Sociologia

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Page 1: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

1. Cultura

1.1. Cultura popular

1.2. Cultura erudita

1.3. Cultura de

massa

2. Identidade cultural

3.Relativismo cultural

e etnocentrismo

4. Alteridade,

tolerância e

convivência

1. Conceito de raça,

cor e etnia

2. Preconceito racial

e movimentos

afirmativos

2.2. Políticas de

ações afirmativas

Page 2: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

2. Relações de

gênero

2.2. Marxismo

2.3. Feminismo

3. Dominação

APOSTILA DE SOCIOLOGIA

2º Ano

Aluno:

Professor:

Turma:

Page 3: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

1º Bimestre

Car ta de um antropólogo perdido

 

Roniel Sampaio

Por Roniel Sampaio Silva

Acordei, hoje, na manhã e me deparei com uma das experiências mais marcantes que um homem de 40 anos pode ter. Saí de minha terra natal rumo a uma cultura totalmente desconhecida, estava envolto por um ambiente inóspito e hostil. O lugar era envolto por uma bruma espessa a qual me entorpecia e me embaçava a visão. Subitamente um nativo me barrou, perguntando-me algo sobre uma contagem, ele olhava para o pulso, ao passo que me indagava sobre perguntas as quais não sabia responder.

Outros nativos pareciam estar à procura de algo. Eles se deslocavam em multidões para salas movediças onde havia ilustrações de pessoas trajadas de alegrias, algumas delas quase sem roupa. Muitos destesdesenhos eram acompanhados de símbolos que eu não conseguia compreender. Andando por estes estranhos me indaguei: Quem são estas pessoas? Muito assustado, resolvi explorar mais o local para descobrir mais sobre sua cultura.

Rumei em direção à multidão, perdido entre eles. Observei que as vestimentas eram das mais variadas e algumas não condiziam com as condições climáticas. Percebi que este povo aparentava ser muito supersticioso, uma vez que, eles carregavam consigo um amuleto o qual observavam compulsoriamente; pareciam querer receber auspícios de oráculos... Algumas pessoas utilizavam uma espécie de concha sobre os olhos a fim, possivelmente, de destacar-se sobre as demais.

Page 4: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Havia templos espalhados por toda aldeia. Alguns símbolos eram enfatizados não apenas nos templos, e sua repetição nestes lugares indicava que o local era uma espécie de santuário. As pessoas se dirigiam a estes locais e reverenciava os tais símbolos. No ensejo entregava oferendas para sacerdotes uniformizados para receberem graças na forma de escambo. Antes disso acontecer, havia um momento de reverências às estátuas em redomas de vidro, as quais as os nativos sempre interessavam em se parecer num gesto de devoção. Algumas destas pessoas carregavam consigo artefatos que lembravam folhas e lascas e utilizavam destes estranhos materiais como tributo às diversas divindades cultuadas nestes templos.

As mulheres caminhavam livremente entre os homens sem que suas famílias pudessem orientá-las. Elas, ao invés de cuidar da prole, seguiam sem destino junto à multidão desregrada e desorientada.  Por esta razão, em muitos casos, cabia as crianças serem educadas por amuletos com imagens de estranhos. Como as pessoas poderiam confiar seus filhos a estranhos? As crianças eram deixadas a mercê de manifestações espirituais caóticas e não havia sequer um pajé para protegê-las.

Como se não bastasse, os idosos eram tratados com desdém e sua sabedoria parecia não ser atrativa o suficiente para competir os tais amuletos, dos mais variados tamanhos e cores. Em contrastes com as cores vivas desses, as florestas pareciam mortas e desgastadas; os rios pareciam emanar uma atmosfera de agonia. Não sei como eles poderiam caçar e pescar num ambiente como aquele. Como as pessoas se alimentavam? É um absurdo imaginar que as pessoas não se sentissem pertencentes ao próprio local em que moravam.

Por fim, cheguei a uma conclusão: esta sociedade está fadada à ruína. Eu, representante real do povo Thearpam estou convencido de que aqui em São Paulo há poucos dos ideais que conhecemos como civilizatórios. Preciso sair urgentemente daqui, alguém pode ajudar?

Questões pare reflexões:Como é possível refletir sobre a noção de estranhamento a partir do texto?Em que trecho fica claro a ideia de etnocentrismo?Como o texto pode nos ajudar a refletir sobre relativismo cultural?Como provalemente era vista a mulher na cultura Thearpam e como esta visão pode ser contrastada com a nossa sociedade?A partir do texto, tente estabelecer como as diferentes culturas conceituariam civilização e progresso.

Introdução aos Estudos Culturais

 

Roniel Sampaio

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Por Roniel Sampaio Silva

Page 5: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Em postagem anterior, apresentei o conceito de Sociologia e parte das ferramentas que esta ciência nos fornece para compreendermos a realidade social. Mencionei, também, que a sociologia está preocupada com o comportamento social e que esta ciência busca identificar e explicar uma espécie de “regularidade” existente em cada fenômeno ou grupo social. Buscarei neste texto apontar que o ser humano, diferente dos outros animais, transmitem para seus descendentes não apenas características biológicas, mas também, conhecimentos complexos acumulados e transmitidos uns aos outros, ou seja, produz e transmite cultura.

No entendimento do senso comum, cultura é tida como um gosto cultural refinado, erudito o qual marca determinada pessoa num patamar de status maior que as demais. Quem está mais próximo desse patamar é tido como mais civilizado.Tal associação se dá por conta da semelhança da palavra alemãKultur, que quer dizer altas formas de manifestação artística.No entanto, cultura não é somente os gostos. Cultura vai além disso. Vamos tentar conceituá-la? Para tanto, é necessário entender que cultura é o objeto de estudo de uma ciência social chamada Antropologia (Antros, homem. Logia, Ciência[1]), embora não sendo estudada apenas por ela. Sociologia, Geofrafia, Artes, literatura, História, e outras, também se apropriam do entendimento. Para Lakatos cultura tem um significado amplo: “engloba os modos comuns e aprendidos da vida, transmitidos pelos indivíduos e grupos em sociedade”.

Conceito

Existem centenas de conceituações para este termo. Ainda não existe um consenso sobre o mais apropriado. Além do conceito, apresentaremos algumas abordagens em torno do termo. Para que fique mais claro o entendimento, vamos pensar em cultura da seguinte forma, ainda que preliminar:Quando pensar na palavra cultura, lembre-se de sutura ou costura. Grosso modo, cultura é um entendimento que “costura” você no mundo e se refere a aspectos materiais e imateriais do ambientes tais quais, conhecimentos, habilidades e crenças que são aprendidas como padrão por determinado grupo. Ou seja, é a maneira com que o grupo social explica e vincula o indivíduo ao mundo.

Cultura segundo os antropólogos clássicos

Edward Tylor – “Todo complexo que inclui conhecimento, crenças, arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. (Kahn apud Lakatos, 2010:131)

Lévi-Strauss – “Conjunto de sistema simbólico, entre os quais se incluem a linguagem, as regras matrimoniais, a arte, a ciência e religião. Estes sistemas se relacionam e

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influenciam a realidade social e física de diferentes sociedades.” (Tomazi, 2010:173)

Franz Boas – “Totalidade de reações e atividades mentais que caracterizam o comportamento dos indivíduos que compõe o grupo social”. (Lakatos, 2010:132)

Malinowski – “O todo global, consiste de implementos e bens de consumo, de cartas constitucionais para vários agrupamentos sociais, de ideias e ofícios humanos, de crenças e costumes.” (Idem)Kroeber e Kluckholn – uma abstração de comportamento concreto, mas em si próprio não é comportamento.” (Idem)

Beals e Hoijer – “A cultura é uma abstração de comportamento e não deve ser confundida com atos do comportamento ou com artefatos materiais, tais como ferramentas, recipientes, obras de arte e demais instrumentos que o homem fabrica ou utiliza”. (Idem)Leslie A. White, para esclarecer a diferença entre cultura e comportamento as difere da seguinte forma:

Comportamento: “quando as coisas e acontecimentos dependentes de simbolização são considerados e interpretados face à sua relação com o organismo humano.Cultura: “quando as coisas e acontecimentos dependentes de simbolização são considerados e interpretados em si, independentes do organismo humano.”

Portanto, o comportamento biológico é objeto da Psicologia e a cultura da Antropologia.

Contribuição de antropólogos contemporâneos

Clifford Geertz–“A cultura deve ser vista como um conjunto de mecanismos de controle- planos receitas, regras, instituições – para governar o comportamento.” (Idem)

Margaret Mead – “Estudou a influencia da cultura na formação da personalidade e concluiu que as diferenças de personalidade não estão vinculada a fatores biológicos, como sexo, mas a maneira como cada sociedade define a educação das crianças” (Idem)

Ruth Benedict – “a cultura tem um padrão cultural coerente em si mesmo. Em suas pesquisas identificou dois padrões culturais extremos; apolítico, representado por indivíduos tranquilos, solitários, respeitadores e comedidos na expressão de seus sentimentos, e o dionisíaco, que reunia os ambiciosos agressivos e individualistas, com uma tendência ao exagero afetivo. Para ela ainda haveria dois tipos intermediários que mesclariam características dos dois tipos extremos. (Tomazi, 2010:173).

A abrangência da cultura e a relação com outras áreas do conhecimento

No início do texto apontamos que a ideia de cultura é usada por diferentes ciências. Entendendo o conceito e seu caráter multidimensional, podemos buscar, agora,compreendemos que esta categoria tem ligação direta com outros campos de conhecimento baseado nas suas ramificações.

Por fim, podemos concluir a ideia de cultura como algo bem complexa e multidimencional. Embora as ciências sociais, classifiquem sociedades como mais complexas e menos complexas é impossível classificar uma cultura superior a outra em função de cada sistema cultural ter uma lógica própria que só faz sentido em si.

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Você sabia?A antropóloga estadunidense Ruth Benedict foi contratada pelo serviço secreto  para fazer um estudo minucioso da cultura japonesa com imigrantes nipônicos nos EUA. O fruto do estudo pode é apresentado no livro “O crisântemo e a espada: os padrões da cultura japonesa”, de 2006, da editora Perspectiva.

Questão para reflexão:1-      Baseado na visão dos antropólogos elabore um conceito de cultura que julga melhor descrevê-la.2-      A cultura leva em conta aspectos materiais ou imateriais? Justifique sua resposta.

Referências:LAKATOS, Eva Maria. Sociologia Geral. 7ª edição. Atlas: São Paulo, 2010.Tomazi, Nelson Dácio. Sociologia para o Ensino Médio. 2ª Edição. Saraiva: São Paulo, 2010.

[1] O termo ao pé da letra é muito genérico uma vez que muitas ciências tem o homem como objeto: medicina, psicologia, antropologia, sociologia e história, por exemplo. Para facilitar o entendimento lembre-se que a preocupação desta ciência está em comprar as semelhanças e diferenças de culturas através de métodos próprios.

Page 8: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Uma pitada de “relativismo cultural”: uma breve definição

 

Cristiano Bodart

2

Por Cristiano Bodart

Mulher-girafa da

Birmânia. Argolas são símbolo de beleza para esse grupo.

É muito comum ouvirmos a expressão “temos que relativizar”. Mas a final, o que é Relativizar? Grosso modo, é a compreensão de que não existindo normas e valores absolutos não devo avaliar a partir de meus valores e normas, como se eles fossem um padrão a ser copiado.

No campo sociológico utiliza-se com frequência o termo “relativismo cultural”. A lógica é a mesma da expressão anterior, porém envolvendo a observação da cultura do outro. Relativismo cultural é a atitude de olhar uma cultura ou um elemento cultural de forma a compreender que os indivíduos são condicionados a terem um modo de vida específico e particular de acordo como processo de endoculturação. Seus sistemas de valores são próprios de sua cultura.

Lakatos e Marconi apresentam duas sentenças que nos possibilita maior esclarecimento:

É justamente ao fato de que é comum a formulação de juízos em relação a cultura do outro que a Sociologia e a Antropologia aponta a necessidade de nos afastarmos de tais julgamentos, evitando classificar a cultura do outro como inferior, feia, atrasada ou algo nessa direção. O relativismo cultural é importante para que as culturas não sejam

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estratificadas em camadas hierárquicas.

Os usos e costumes de cada povo só tem sentido a partir do próprio povo e não é possível compreende-los a partir de nosso lugar. Para compreendê-los, ainda que em parte, o sociólogo ou o antropólogo deve buscar se colocar no lugar do outro. Certamente esse “se colocar no lugar do outro” nunca ocorrerá de forma plena ou próximo a isso, haja visto que ele levará consigo toda a sua bagagem cultural, seja como membro de seu grupo cultural, seja como pesquisar “indiferente”.

ReferênciaLAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Sociologia Geral. 7ª ed.  Atlas: Sã Paulo, 2010. 

Relativismo cultural

 

Cristiano Bodart

Membro da Tribo de L'omo, Etiópia.

Manifestações culturais e patrimônio cultural

 

Cristiano Bodart

2

O que se entende por manifestações culturais?

Para a Antropologia Cultural, manifestação cultural é toda forma de expressão humana, seja através de celebrações e rituais ou através de outros suportes como imagens fotográficas e fílmicas.

Além disso, sabemos que as expressões das culturas humanas também são veiculadas através de outras linguagens, escritas ou verbais. O patrimônio também se constitui como uma linguagem que expressa uma forma de sentir e pensar um acontecimento, um tempo, uma dada forma de ver as coisas do mundo.

Em sua origem, o patrimônio estava ligado às estruturas familiares, econômicas e jurídicas de uma sociedade estável, enraizada no tempo e no espaço. Hoje a idéia de patrimônio designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade, constituído pela acumulação contínua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado

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comum: obras e obras primas das belas artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes das comunidades humanas.

A idéia de um patrimônio comum a um grupo social, definidor de sua identidade e enquanto tal merecedor de proteção perfaz-se através de práticas que ampliaram o círculo dos colecionadores e apreciadores de antiguidades e se abriram a novas camadas sociais: exposições, vendas públicas, edição de catálogos das grandes vendas e das coleções particulares.Inicialmente, a categoria do patrimônio que mereceu atenção foi a que se relaciona mais diretamente com a vida de todos, qual seja o patrimônio histórico representado pelas edifi cações e objetos de arte.

Paulatinamente, ocorreu a passagem da noção de patrimônio histórico para a de patrimônio cultural, de tal modo que uma visão inicial reducionista que enfatizava a noção do patrimônio nos aspectos históricos consagrados por uma historiografia oficial foi-se projetando até uma nova perspectiva mais ampla que incluiu o “cultural”, incorporando ao “histórico” as dimensões testemunhais do cotidiano e os feitos não-tangíveis.

Portanto, a noção moderna de patrimônio cultural não se restringe mais à arquitetura, mesmo sendo indiscutível que a presença de edificações é um ponto alto da realização humana.Deste modo, o significado de patrimônio cultural é muito mais amplo, incluindo diversos produtos do sentir, do pensar e do agir humano.

No âmbito internacional, durante as últimas décadas, delinearam-se uma série de instrumentos jurídicos, convenções, declarações, resoluções e recomendações relativas à proteção do patrimônio cultural, de tal maneira que as convenções e recomendações aprovadas pela UNESCO vêm enriquecer o Direito Internacional da cultura e os direitos internos com a elaboração de leis próprias no sentido dado pela UNESCO. Como “Patrimônio Mundial” a UNESCO define todos os bens que possuam um caráter excepcional. Ao considerarmos o “Patrimônio” um bem herdado do passado, investimo-lo de um significado de “referência”. Em outras palavras, tornamos o “Patrimônio” insubstituível para nossa identidade, portanto cabe a nós a efetiva defesa da preservação e divulgação desse legado cultural.

De acordo com a Constituição Brasileira de 1988, os bens sócio-ambientais diferem-se em culturais, históricos, artísticos, arqueológicos, etnográficos e paisagísticos. São bens que têm a característica de estarem vinculados à história, memória ou cultura do país.

Portanto, tem-se que o patrimônio pode abarcar manifestações culturais intangíveis, como as tradições orais, a música, idiomas e festas, além dos bens artísticos.

Neste sentido, as festas populares expressam as formas identitárias de grupos locais, onde o motivo de encontro, de fé ou simplesmente de celebrar atrai e identifca devotos e indivíduos de mesma identidade. As manifestações populares possuem um caráter ideológico uma vez que comemorar é, antes de mais nada, conservar algo que ficou na memória coletiva (Paiva Moura, 2001) e forma de manifestação cultural.

É importante ressaltar que patrimônio histórico-cultural não é apenas o acervo de obras

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raras ou da cultura de um passado distante; é a valorização e o conhecimento dos bens culturais que podem contar a história ou a vida de uma sociedade, de um povo, de uma comunidade. Será através do contato com tais bens que conheceremos a memória ou até mesmo a identidade de um povo.Cabe lembrar ainda que todos os bens naturais, ou culturais, materiais ou imateriais, constituem o patrimônio cultural do Brasil, desde que estes sejam portadores de referência à identidade, à ação e à memória de diferentes elementos étnicoculturais formadores da nação brasileira.Através do conhecimento do nosso patrimônio cultural, podemos aprender sobre nossa memória e, conseqüentemente, exercer a cidadania.

Cultura Popular e CulCultura Popular e Cultura Erudita

Fonte: http://culturaturma3002.blogspot.com.br/2012/05/cultura-popular-e-cultura-

erudita.htmltura Erudita

Cultura Popular

A cultura popular aparece associada ao povo, às classes excluídas socialmente, às

classes dominadas. A cultura popular não está ligada ao conhecimento científico, pelo

contrário, ela diz a respeito ao conhecimento vulgar ou espontâneo, ao senso comum.

A cultura popular é conservadora e inovadora ao mesmo tempo no sentido em que é

ligada à tradição mas incorpora novos elementos culturais. Muitas vezes a incorporação

de elementos modernos pela cultura popular (como materiais como plástico por exemplo)

a transformação de algumas festas tradicionais em espetáculos para turistas (como o

carnaval) ou a comercialização de produtos da arte popular são, na verdade, modos de

preservar a cultura popular a qualquer custo e de seus produtores terem um alcance

maior do que o pequeno grupo de que fazem parte.

Exemplos de manisfestações da cultura popular: carnaval, danças e festas folclóricas,

literatura de cordel, provérbios, samba, frevo, capoeira, artesanato, cantigas de roda,

contos e fábulas , lendas urbanas, superstições, etc.

Page 12: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Cultura Erudita

Os produtores da chamada cultura erudita fazem parte de uma elite social, econômica,

 política e cultural e seu conhecimento ser proveniente do pensamento científico, dos

 livros, das pesquisas universitárias ou do estudo em geral (erudito significa que 

tem instrução vasta e variada adquirida sobretudo pela leitura). A arte erudita e de 

vanguarda é produzida visando museus, críticos de arte, propostas revolucionárias

 ou grandes exposições, público e divulgação. 

A cultura erudita exige um alto grau de instrução, de formação específica, de

 conhecimento de história da arte (muitas vezes universal), dos movimentos

 artísticos, da própria história geral, etc. Consequentemente acaba sendo mas elaborada.

Diferença entre Cultura Popular e Cultura Erudita

A Cultura popular e cultura erudita podem ter a mesma sofisticação, mas na sociedade

não possuem o mesmo status social - a cultura erudita é a que é legitimada e transmitida

pelas escolas e outras instituições. É importante ressaltar que os produtores da cultura

popular não têm consciência de que o que fazem têm um ou outro nome e os produtores

de cultura erudita têm consciência de que o que fazem tem essa denominação e é

assunto de discussões, mesmo porque os intelectuais que discutem esses conceitos

fazem parte dessa

Hegemonia

Page 13: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Fonte: http://www.infoescola.com/sociologia/hegemonia/

Por Emerson Santiago

É denominada hegemonia econômico, militar ou político superior que exerce sobre outras

populações, mesmo contra a vontade destas.

 simplesmente liderança, derivada diretamente de seu sentido etimológico (do grego

"hegemon" = líder). O termo ganhou um segundo significado, mais preciso, desenvolvido

por Gramsci para designar um tipo particular de dominação. Nessa acepção hegemonia é

dominação consentida, especialmente de uma classe socialou nação sobre seus pares.

Na sociedade capitalista, a burguesia detém a hegemonia mediante a produção de uma

ideologia que apresenta a ordem social vigente, e sua forma de governo em particular,

a democracia perfeita, a melhor organização social possível. Quanto mais difundida a

ideologia, tanto mais sólida a hegemonia e tanto menos necessidade do uso de violência

explícita.

O termo "Hegemonia mundial mundo por parte de uma única nação ou grupo de nações.

No âmbito social, entende-se como "Hegemonia cultural" –segundo Antonio Gramsci:

"A dominação e manutenção de poder que exerce uma pessoa ou grupo em posição de

domínio a outro(s) minoritário(s), impondo seus próprios valores, crenças e ideologias que

configuram e sustentam o sistema majoritário, conseguindo assim um estado de

homogeneidade no pensamento e ação como também uma restrição das produções e

publicações culturais".

Ainda segundo Gramsci, há hegemonia quando a classe dominante é capaz de obrigar

uma classe social subordinada ou minoritária que satisfaça seus interesses, renunciando

à sua identidade e cultura grupal, exercendo também total controle sob as formas de

relação e produção da segunda ao restante da sociedade. Cabe salientar que Gramsci

afirmava que este processo não possui um caráter explícito, demonstrando-se de forma

sutil. A classe social subordinada ou minoritária adota as concepções da classe

dominante, incorporando-as a seu repertório ideológico, ligado ao que comumente

denomina-se "sentido comum".

Atualmente a hegemonia se consegue através do controle dos agentes culturais,

especialmente os que se destacam por seu impacto social, como os meios de

comunicação. Exemplo é a teoria do imperialismo cultural, destacando-se

Page 14: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

o imperialismoda indústria cinematográfica norte-americana, dando a entender que a

tendência atual de hegemonização se concentra na exposição de modelos de

pensamento e conduta próprios da sociedade americana, para que outras sociedades

adotem estes mesmos modelos (fenômeno conhecido como "processo definido" na Teoria

da reprodução).

Por outro lado existem outros agentes socializadores que são utilizados, entidades de

poder utilizados como ferramentas de hegemonização do status quo (religiosas,

educacionais (mediante estabelecimento de um curriculum acadêmico que favorece a

aprendizagem daquelas matérias mais afinadas com a ideologia dominante), artísticas e

os meios de consumo (mediante asociação destes com determinados valores realçados

pela publicidade).

Em regimes totalitários não é possível hegemonizar o pensamento dominante; sempre

existem minorias que mantêem postura diferente, mesmo vivendo de modo invisível pela

sociedade e, devido à impossibilidade de ação ante a realidade de controle social

exercida pelo regime, não podem expressar-se, ficando relegadas a um segundo plano.

Bibliografia:

http://www.usp.br/fau/docentes/depprojeto/c_deak/CD/4verb/hegemon/index.html - Página

do professor Csaba Deák - Hegemonia

http://pt.shvoong.com/social-sciences/1751464-gramsci-hegemonia/ - Página Shvoong -

Gramsci e a Hegemonia

Crise de identidade

 

Cristiano Bodart

2

A identidade é formada por um processo complexo de socialização. Processo esse que se dá a partir dos contatos sociais que o indivíduo vai tendo ao longo de sua vida.

O conceito "identidade" vem sendo reutilizado com grande freqüência entre as ciências humanas devido ao que tem sido chamado de "crise de identidade".

Tal crise se dá devido aos impactos da sociedade moderna sobre o indivíduo. Como

Page 15: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Bauman bem apresentou em seu livro “Modernidade Líquida”, vivenciamos um período de grande fluidez, marcado por rápidas mutações.

Se a identidade é formada pelo contato social e este tem sido cada dia mais superficial e transitório, consequentemente haverá uma tendência de estarmos sujeitos a sermos influenciados por um número cada vez maior de tendências, a qual, devido ao rápido e superficial contato, produzirá  influência sobre nossos hábitos, gostos, preceitos, etc; porém de forma momentânea. Ao mesmo tempo em que as influências superficiais e transitórias deixam uma pequena marca em nossa personalidade, via socialização, o número de influências será cada vez maior e variada, o que nos traz a sensação de não possuirmos uma identidade. Aí está a crise.

Mas a crise é apenas um processo, também transitório da modernidade líquida. A liquidez moderna deixa uma sensação de ausência de identidade em meio a uma sociedade em rápida transformação. Mas não seria essa “metamorfose ambulante (para lembrar o Raul Seixas)” a identidade da sociedade moderna?

Eu? “Eu prefiro ser aquela metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo...”.

TEXTOS:

Ralph Linton, antropólogoªO cidadão norte-americano 

“O cidadão norte-americano desperta num leito construído segundo padrão originário do Oriente Próximo, mas modificado na Europa Setentrional, antes de ser transmitido à América. Sai debaixo de cobertas feitas de algodão, cuja planta se tornou doméstica na Índia; ou de linho ou de lã de carneiro, um e outro domesticados no Oriente Próximo; ou de seda, cujo emprego foi descoberto na China. Todos esses materiais foram fiados e tecidos por processos inventados no Oriente Próximo. Ao levantar da cama faz uso dos “mocassins” que foram inventados pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos e entra no quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura de invenções européias e norte-americanas, umas e outras recentes. Tira o pijama, que é vestiário inventado na Índia e lava-se com sabão que foi inventado pelos antigos gauleses, faz a barba que é um rito masoquístico que parece provir dos sumerianos ou do antigo Egito.

Voltando ao quarto, o cidadão toma as roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu meridional e veste-se. As peças de seu vestuário tem a forma das vestes de pele originais dos nômades das estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles curtidas por um processo inventado no antigo Egito e cortadas segundo um padrão proveniente das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores vivas que amarra ao pescoço é sobrevivência dos xales usados aos ombros pelos croatas do séc. XVII. Antes de ir tomar o seu breakfast, ele olha ele olha a rua através da vidraça feita de vidro inventado no Egito; e, se estiver chovendo, calça galochas de borracha descoberta pelos índios da América Central e toma um guarda-chuva inventado no sudoeste da Ásia. Seu chapéu é feito de feltro, material inventado nas estepes asiáticas.

De caminho para o breakfast, pára para comprar um jornal, pagando-o com moedas, invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda uma série de elementos tomados de empréstimo o espera. O prato é feito de uma espécie de cerâmica inventada na China. A

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faca é de aço, liga feita pela primeira vez na Índia do Sul; o garfo é inventado na Itália medieval; a colher vem de um original romano. Começa o seu breakfast, com uma laranja vinda do Mediterrâneo Oriental, melão da Pérsia, ou talvez uma fatia de melancia africana. Toma café, planta abssínia, com nata e açúcar. A domesticação do gado bovino e a idéia de aproveitar o seu leite são originárias do Oriente Próximo, ao passo que o açúcar foi feito pela primeira vez na Índia. Depois das frutas e do café vêm waffles, os quais são bolinhos fabricados segundo uma técnica escandinava, empregando como matéria prima o trigo, que se tornou planta doméstica na Ásia Menor. Rega-se com xarope de maple inventado pelos índios das florestas do leste dos Estados Unidos. Como prato adicional talvez coma o ovo de alguma espécie de ave domesticada na Indochina ou delgadas fatias de carne de um animal domesticado na Ásia Oriental, salgada e defumada por um processo desenvolvido no norte da Europa.

Acabando de comer, nosso amigo se recosta para fumar, hábito implantado pelos índios americanos e que consome uma planta originária do Brasil; fuma cachimbo, que procede dos índios da Virgínia, ou cigarro, proveniente do México. Se for fumante valente, pode ser que fume mesmo um charuto, transmitido à América do Norte pelas Antilhas, por intermédio da Espanha. Enquanto fuma, lê notícias do dia, impressas em caracteres inventados pelos antigos semitas, em material inventado na China e por um processo inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas dos problemas estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma divindade hebraica, numa língua indo-européia, o fato de ser cem por cento americano.”

ª LINTON, Ralph. O homem: Uma int rodução à ant ropologia. 3ed. , São Paulo, Li vrar ia Mar t ins Editora, 1959. Ci tado em LARAIA, Roque de Bar ros. Cul tura: um concei to ant ropológico. 16ed. , Riode Janei ro, Jorge Zahar Edi tor , 2003, p.106-108Texto disponível em http://www.saogabriel.pucminas.br/csociais/textos/r/ralphlinton-ocidadaonorte-americano.pdfCULTURA

IDENTDADE CULTURAL: IDENTIDADE BRASILEIRA

 

Cristiano Bodart

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A cultura faz parte da totalidade de uma determinada sociedade, nação ou povo. Essa totalidade é tudo o que configura o viver coletivo.São os costumes, os hábitos, a maneira de pensar, agir e sentir, as tradições, as técnicas utilizadas que levam ao desenvolvimento e a interação do homem com a natureza. Ou seja, é tudo mesmo! Tudo que diz respeito a uma sociedade. Muitos sociólogos e historiadores brasileiros, a partir do século XIX, buscaram explicar a formação do povo brasileiro, caracterizado pela diversidade cultural, enquanto uma nação. E o olhar de alguns desses autores foi exclusivamente dedicado ao aspecto cultural. O legado cultural que herdamos dos povos que se misturam deu origem aos brasileiros.Fomos colonizados primeiramente pelos europeus, especificamente pelos portugueses e espanhóis. Temos também uma marcante presença dos africanos, que foram trazidos para cá como escravos e os indígenas que aqui já viviam... depois, por volta de 1870 em diante, é que imigraram muitos outros povos, como os italianos, alemães e holandeses, em busca de trabalho e de uma vida melhor e promissora no Brasil! Somos um povo que surgiu de uma grande confluência! Miscigenados! Ou seja, o povo brasileiro foi formado, a princípio, a partir de uma miscigenação, que foi a mistura de basicamente três “raças”, quais sejam: o índio, o branco e o negro. Vamos entender o que é raça, etnia e cultura.O conceito de etnia distingue-se do conceito de raça e cultura. Etnia é um conceito associado a uma referência e/ou origem comum de um povo. Ou seja, são grupos que compartilham os mesmos laços lingüísticos, intelectuais, morais e culturais.Embora possuam uma mesma situação de dependência de instituições e organização social, econômica e política, não constitui ainda em uma nação, mas apenas um agrupamento étnico. Etnia é, portanto, um conceito diferente de raça e cultura.São exemplos de grupos étnicos, entre outros, os índios xavantes e javaés do interior de Goiás, que são reconhecidos pelo etnômino de tapuios. Hoje habitam no Parque Nacional do Xingu, em número extremamente reduzido.Já a cultura é tudo que as diferentes raças e as diferentes etnias possuem em matéria de vida social, o conjunto de leis que regem o país, a moral, a educação-aprendizagem, as crenças, as expressões artísticas e literárias, costumes e hábitos, ou seja, é a totalidade que abrange o comportamento individual e coletivo de cada grupo, sociedade, nação ou povo.O termo raça significa dizer que há grupos de pessoas que possuem características fisiológicas e biológicas comuns. No entanto, o uso do termo raça acaba classificando um grupo étnico ou sociedade, levando também à hierarquização.Como se todos nós, seres humanos, fôssemos postos em uma grande escadaria, e em ordem de classificação e hierarquização pelo grau de importância das características físicas de cada grupo étnico; os mais importantes ficariam no topo e assim iria descendo até chegar nos menos importantes. Contudo, qual raça ou grupo étnico pode dizer que é melhor ou mais desenvolvido que outro?Muitas críticas a esse pensamento foram levantadas, principalmente no final do século XIX, pois tais concepções ajudaram a reforçar a discriminação e o preconceito e, conseqüentemente a legitimação das desigualdades sociais. Apesar de todas as críticas, ainda é possível observar que nos séculos XIX e XX houve um retorno de práticas racistas como, por exemplo, a eugenia e estudos do genoma, que foram muito defendidas por estudiosos adeptos às teorias evolucionistas sobre o progresso físico e comportamental do homem. Tais teorias concebiam que determinadas raças e etnias deveriam ser conservadas, por serem modelos de pureza, de superioridade, etc.Contudo, outras que não se enquadrassem nos modelos estabelecidos, ou que fossem, pela situação social que viviam, vítimas de doenças ou epidemias tornavam-se um perigo para o progresso da humanidade e não deveriam existir. Podemos tomar como um exemplo claro deste pensamento, o apartheid ocorrido na África do Sul nos anos de 1948 a 1991, quando toda a população negra foi obrigada a seguir normas e regras rígidas com

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relação ao convívio social, trabalho, etc., além de toda a forma de violência e discriminação sofrida. Ou ainda, quem não se lembra do genocídio dos judeus ou mais conhecido como o Holocausto dos Judeus, durante a II Guerra Mundial?O pensamento ideológico que estava por trás daquele terrível ato que exterminou cerca de 6 milhões de judeus, que não eram reconhecidos como seres humanos, era a idéia de superioridade da “raça ariana” alemã. A perseguição e o extermínio dos nazistas alemães contra os judeus ficou conhecido na história por anti-semitismo, uma forma de repudiar tudo o que era contrário à ideologia nazista.Quando olhamos os três grupos étnicos que se miscigenaram no Brasil Colônia, séculos XVI e XVII, com suas características biológicas específicas e também sócio-culturais, suas tradições, vemos como fizeram toda a diferença no processo de colonização e formação do povo brasileiro, diferentemente de outras colonizações empreendidas pelo mundo.Nosso país é uma “aquarela” de grupos étnicos! Constituída por meio da colonização (século XVI) e depois, pelas imigrações por volta dos séculos XVIII e XIX. Temos então uma pluralidade de identidades, caracterizada pelas diferenças. Por conta dessa variedade de identidades, povos e tradições, os diferentes grupos étnicos fizeram com que ocorressem em nosso país, um processo chamado de etnicidade.É interessante saber que o contato interétnico é um fenômeno que não ocorreu somente no período das colonizações, ainda ocorre, a ocupação por parte de alguns grupos, como por exemplo, os madeireiros, garimpeiros, e etc., em territórios indígenas, assim como pela utilização do trabalho manual dos índios.A situação de conflito, como já sabemos, decorre do sentimento e da atitude etnocêntrica, que foi uma característica do pensamento evolucionista, apoiando o empreendimento colonialista pelo mundo.

Conceito de Regionalismo

 

Cristiano Bodart

O regionalismo é uma manifestação ideológica, marcada pôr uma identidade social imposta. Como força política, apresenta a possibilidade de mobilizar a sociedade em torno de um dado interesse ou de um projeto identitário da região. O regionalismo manifesta-se pôr porta-vozes, as lideranças regionais, que são legitimadas a falar em nome do grupo.

Bourdieu se refere ao regionalismo como uma manifestação étinico-cultural, mas é possível analisa-la com uma óptica política, de um jogo de dominação. A identidade “consensual” podendo ser interpretada como uma afirmação das relações de poder, sendo ela a manifestação de uma visão da classe hegemônica. O regionalismo é uma expressão da luta de classe dentro do território, representando as manifestações hegemônicas ideológicas.

O fenômeno do regionalismo possibilita uma abordagem dos elos entre os processos e relações internos à região e os externos a ela. A noção de região é bem delimitada pelo regionalismo, portanto, podemos afirmar que o regionalismo proporciona a legitimidade de uma região.

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Conceito de Região

 

Cristiano Bodart

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Podemos abordar a região como uma construção social material e simbólica, podendo também ser vista como um espaço de dominação, onde frações do capital controlam as condições de reprodução local, sendo uma forma de classificação do território legitimado. Construção social material, pois está, quase sempre, bem delimitada fisicamente, e simbólica por ser dotada de significados subjetivos e reconhecimento social, o que possibilita a noção de unidade.

A noção de unidade compartilhada entre os atores sociais, legitima uma “realidade” que é, antes de mais nada, representação subjetiva. A região é portanto, um espaço dotado de simbolismo.A região é um espaço onde se dar os embates sociais, estando sua identidade vinculada aos conflitos sociais ali desencadeados. A região é um segmento de território como o locus. Se limitando às relações e elementos nele localizados.

É na região que ocorre o processo de dominação de frações do capital e portanto as lutas de classe. Para a sociologia esse espaço, chamado região é o palco das relações sociais, ou seja, das relações de dominação. Nesse sentido a região caracteriza-se pela manutenção/reprodução ou pela dialética das relações de dominação.

A identidade regional é inerente a formação/delimitação de uma região. As metodologias meramente cartográficas, em sua especificidade física, têm habitualmente delimitado regiões a fim de facilitar pesquisas, produzindo consequentemente uma problemática metodológica. Essas pesquisas de caráter quantitativas podem apresentar distúrbios em seus resultados. Ao delimitar uma região para estudo é fundamental respeitar os limites socialmente constituídos e legitimados pelos grupos sociais locais em seus processos históricos de conflitos de poder.(Bodart, Cristiano das N.)

2º Bimestre: Diversidade, gênero, etnia, raça, minorias

Minorias Étnicas , Lingüísticas e Religiosas  

Fonte: http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/dh/br/pb/dhparaiba/5/minorias.html

Introduçao

Ao analisarmos o processo de formação da sociedade brasileira sob qualquer aspecto, torna-se indispensável mencionar o relevante papel desempenhado pelos grupos minoritários em relação ao restante da sociedade.

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Para podermos entender e defender tais grupos não apenas em nome dos seus próprios direitos individuais e coletivos, mas também em defesa dos interesses de todo o restante da população, torna-se fundamental que conheçamos e discutamos aspectos básicos do tema. O próprio conceito de minoria e as dificuldades e conseqüências de sua conceituação; a situação desses grupos perante o direito como um todo e especificamente perante o direito brasileiro; alguns exemplos de grupos minoritários; os tratados internacionais sobre o tema; a situação concreta do posicionamento da sociedade e das autoridades públicas para com o mesmo: essas são visões que devem ser analisadas cuidadosamente, sem se perder de vista o objetivo maior de promover a integração dos grupos mais discriminados às parcelas majoritárias da população, no sentido de eliminar quaisquer tipos de estereótipos, preconceitos ou discriminação em relação aos primeiros.

Assim, mesmo com a notável escassez de informações sobre o tema e a desconsideração freqüente para com as mesmas, torna-se importante realizar e incentivar pesquisas na área, que venham a contribuir com o acréscimo de informações e, conseqüentemente, com melhores resultados nas ações implementadas em defesa da manutenção das minorias étnicas, lingüísticas e religiosas.

1. Conceito de minorias

Para iniciarmos nosso estudo sobre minorias, faz-se necessária uma análise de seu conceito, o que não é questão das menos polêmicas. De fato, até a Organização das Nações Unidas não conseguiu formalizar um conceito universalmente aceito. Vale salientar que sempre houve muita hesitação sobre o assunto: a Declaração Universal não tratou particularmente dos Direitos das Minorias, de modo que o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos  de 1966 foi o primeiro instrumento normativo internacional da ONU [1], a tratar sobre o tema, ainda assim, sem fornecer uma definição de minoria, apenas exigindo o respeito aos direitos dos grupos minoritários, como evidenciado em seu artigo 27[2].

José Augusto Lindgren Alves salienta que as argumentações para tamanha hesitação provinham da dificuldade de conciliação das posições assimilacionistas dos Estados do Novo Mundo (formados por populações imigrantes) e as dos Estados do Velho Mundo, com grande gama de grupos distintos em seus territórios nacionais. O mesmo autor adverte, porém, que as razões mais profundas para as hesitações nessa área acham-se expostas no Prefácio de Francesco Capotorti ao seu estudo sobre minorias em 1977 (para a regulamentação do artigo 27 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos), a saber: desconfianças dos Estados em relação aos instrumentos internacionais de proteção dos direitos das minorias, vistos como pretextos para interferência em assuntos internos; ceticismo quanto ao fato de se abordar, em escala mundial, as situações distintas das diversas minorias; a crença na ameaça à unidade e à estabilidade interna dos Estados pela preservação da identidade das minorias em seu território e, finalmente, a idéia de que a proteção a grupos minoritários constituiria uma forma de discriminação.

Dada a necessidade de  uma definição de minoria, a Subcomissão para a  Prevenção da Discriminação e a Proteção das Minorias, criada pela ONU, encomendou ao perito italiano Francesco Capotorti (anteriormente citado) um estudo que resultou na seguinte definição de minoria: “Um grupo numericamente inferior ao resto da população de um Estado, em posição não-dominante, cujos membros - sendo nacionais desse Estado - possuem características étnicas, religiosas ou lingüísticas diferentes das do resto da população e demonstre, pelo menos de maneira implícita, um sentido de solidariedade, dirigido à preservação de sua cultura, de suas tradições, religião ou língua. ”Como verificado no artigo inédito O Direito das Minorias Étnicas, de Luciano Mariz Maia,  esse conceito de Capotorti assemelha-se ao do antropólogo Fredrik Barth, que o situa na autoperpetuação biológica, compartilhamento de valores culturais comuns, integração de um campo de comunicação e interação e identificação dos membros do grupo entre si.

Cabe aqui salientar que há duas definições com que caracterizar minorias, envolvendo as concepções sociológica e antropológica. Segundo Moonen[3], “na sociologia o termo minoria normalmente é um conceito puramente quantitativo que se refere a um subgrupo de pessoas que ocupa menos da metade da população total e que dentro da sociedade ocupa uma posição privilegiada , neutra ou marginal”.

No aspecto antropológico, por sua vez, a  ênfase é dada ao conteúdo qualitativo, referindo-se a subgrupos marginalizados, ou seja, minimizados socialmente no contexto nacional, podendo, inclusive, ser uma maioria em termos quantitativos. Moonen observa ainda que uma das primeiras definições nesse sentido foi a de L. Wirth, sendo minoria “um grupo de pessoas que, por causa de suas características físicas ou culturais, são isoladas das outras na sociedade em que vivem, por um tratamento diferencial e desigual, e que por isso se consideram objetos de discriminação coletiva“. Verifica-se, portanto, que, no conceito antropológico, a diferença não está em termos quantitativos, mas no tratamento e no relacionamento entre os vários subgrupos, nas relações de dominação e subordinação. Sem nos pautarmos em números, o grupo dominante é a maioria, sendo minoria o grupo dominado.

Assim, permanecem as dificuldades para o alcance de uma definição consensual para o termo minorias. Nem a Declaração sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Lingüísticas (a ser tratada mais adiante no presente trabalho) se propõe a uma definição, nem em seu

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preâmbulo, nem em sua parte dispositiva. Entretanto, a criação de um Grupo de Trabalho pela Subcomissão para Prevenção da Discriminação e Proteção às Minorias (através da Resolução 1994/4, de 19 de agosto de 1994) promete avanços nessa área conceitual.

2. Minorias Étnicas, Lingüísticas e Religiosas

As minorias referidas são as únicas listadas para proteção no Pacto dos Direitos Civis e Políticos (artigo 27), pelo que é muitas vezes criticado.

As minorias étnicas são grupos que apresentam entre seus membros, traços históricos, culturais e tradições comuns, distintos dos verificados na maioria da população.

Minorias lingüísticas são aquelas que usam uma língua (independentemente de ser escrita) diferente da língua da maioria da população ou da adotada oficialmente pelo Estado. Vale salientar que não é considerado língua mero dialeto com sutis diferenças em relação à língua predominante.

Minorias religiosas, por sua vez, são grupos que professam uma religião distinta da professada pela maior parte da população,  mas não apenas uma outra crença, como o ateísmo .

Delimitadas essas considerações, passemos aos critérios de identificação das minorias, que envolvem aspectos objetivos e subjetivos. O aspecto objetivo envolve a observação da realidade concreta das minorias, tendo provados seus laços étnicos, lingüísticos e culturais através de documentos históricos e testemunhos comprovadamente verídicos dos fatores característicos distintivos. O critério subjetivo envolve o reconhecimento da minoria (de existência já objetivamente demonstrada ) pelo Estado, sendo importante observar que o não reconhecimento, por parte do Estado, de uma minoria, não o dispensa de respeitar os direitos do grupo minoritário em questão, conforme visão de Capotorti, também compartilhada por Luciano Maia: “nem membros de um grupo nem o Estado podem, discricionariamente, arbitrar se o grupo possui os fatores característicos distintivos, e se incide no conceito de minoria.”

3. Direitos das Minorias

Ao iniciarmos nossas apreciações sobre os direitos das minorias, cabe analisarmos se tratam de direitos individuais ou coletivos.

Sobre essa questão, o Pacto dos Direitos Civis e Políticos, em seu artigo 27, confere ênfase aos direitos dos indivíduos pertencentes aos grupos minoritários, ”embora eles possam ser gozados em comunhão com os demais integrantes do grupo”,[4] o que pode impedir a utilização de remédios processuais de defesa coletiva desses direitos[5]. Entretanto, o Comitê de Direitos Humanos determinou que essa é uma questão que depende do caso, devendo também haver a defesa dos direitos das minorias enquanto direitos coletivos. Assim, nos casos de respeito à língua, etnia ou religião de uma determinada pessoa pertencente a uma minoria, estamos tratando de direitos individuais. Quanto ao reconhecimento dos direitos à existência e identidade de um grupo minoritário enquanto tal, trata-se de direitos coletivos.

3.1. Conteúdo dos direitos das minorias

Os direitos das minorias são regidos pelo princípio da igualdade e não discriminação, não havendo delimitação de um conjunto mínimo de direitos. Possível é observar que, além dos direitos comuns a todas as pessoas (como direito à vida, liberdade de expressão, direito de não ser submetido à tortura, entre outros), as minorias têm certos direitos básicos - direito à existência, direito à identidade e direito a medidas positivas.

O direito à existência é o direito coletivo à vida, contra a dizimação física do grupo minoritário, conforme conteúdo proporcionado pela Convenção para Prevenção e Repressão  do Crime de Genocídio. Entretanto, outros direitos são requeridos para que as minorias se desenvolvam plenamente; é o caso do direito à identidade, já que a simples existência física não garante a permanência das manifestações culturais. As pessoas pertencentes a grupos minoritários devem ter o direito de desenvolver, individualmente ou com os demais membros do grupo, suas manifestações culturais, como traço distintivo de seu modo de ser.

As medidas positivas, por sua vez, são necessárias no sentido de tornar efetiva a promoção da identidade das minorias e proporcionar condições para a efetividade no gozo de direitos. Desse modo, os Estados devem dar apoio às minorias em equilíbrio com o apoio conferido à maioria da população (ou , até mesmo, um tratamento diferenciado de modo a se obter igualdade de condições na prática de direitos). Os direitos das minorias, também englobados nos direitos sociais e culturais, exigem uma participação eficaz do Estado em seu processo de implementação.

É importante verificar que o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em seu artigo 11, reconhece, por exemplo, o direito de todos à moradia adequada, tendo o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais formulado um Comentário Geral em que acentuou a necessidade de adequação cultural da moradia e de políticas públicas que visem a adequá-la  à expressão da identidade cultural dos diversos grupos.

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O que é Raça e Etnia para Sociologia e Biologia

Na aula anterior, definimos o primeiro conceito antropológico de "cultura" e vimos de que

forma a elaboração desse conceito se opõe às explicações deterministas biológicas para o

comportamento humano. Vimos também que a antropologia trabalha com uma cisão que

revisitaremos muito ao longo do ano: a oposição dicotômica entre natureza e cultura. [ leia

aqui o resumo da Aula #1 ]

Durante a aula e aqui no blog, trouxemos exemplos de comportamentos e ações facilmente

identificáveis como produto da cultura. Alguns exemplos dados em sala de aula de no blog,

foram: depilação, uso de certos tipos de roupa para homens e mulheres, formas de cortar o

cabelo, hábitos de higiene como frequência dos banhos ou limpeza dentária, fazer xixi sentado

ou agachado, ou até mesmo as posições em que nos sentimos mais (ou menos) confortáveis

para descansar.

Existem, porém, algumas categorias e conceitos que são utilizados, ao mesmo tempo, para

designar uma determinação social e uma condição biológica. Nesta aula e na próxima,

abordaremos um caso desse tipo: a categoria "raça".

 * * *

I. Conceito analítico e conceito nativo

A palavra "cultura" adquire um sentido próprio na antropologia e na sociologia, e por este

motivo precisamos delimitar o conceito quando formos usá-lo, que é o que fizemos na última

aula. Quando falamos em "cultura" no dia-a-dia, no senso comum, nem sempre estamos

querendo falar daquilo que o conceito antropológico de cultura está falando. O "Ministério da

Cultura", por exemplo, não pode ser considerado um órgão governamental que se ocupa de

"tudo aquilo que pode ser ensinado e aprendido"; certo? O conceito também não se aplica

quando estamos discutindo uma certa "cultura" vegetal, ou uma "cultura de fungos" em um

laboratório.

Há uma série de outros conceitos, como "cultura", que são interpretados de diferentes formas

no senso comum, nas ciências sociais e nas ciências "naturais" (como a física ou a biologia).

Um exemplo excelente é o conceito de "trabalho". "Trabalho", no senso comum, pode

significar um calhamaço de papel com informações sobre algum assunto (um "trabalho"

escolar), ou alguma atividade que fazemos de forma remunerada. Na física, a palavra

"trabalho" diz respeito a uma medida de energia. Na sociologia, podemos dizer, grosso modo,

que "trabalho" é toda ação humana que modifica o ambiente a seu redor. São compreensões e

conceitos distintos, embora associados a uma mesma palavra.

Sociologicamente, fazemos uma distinção entre o uso corrente, cotidiano, senso-comum de um

termo e seu uso científico para as ciências sociais. Chamamos conceito nativo o

entendimento não-científico de certo termo, e chamamos conceito analítico o uso de um

conceito sociológico explicativo associado a esse termo. Podemos dizer, então, que cultura,

enquanto conceito nativo, pode se referir, por exemplo, ao conjunto de formas de expressão

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artística e folclórica de uma sociedade ou grupo social. Enquanto conceito analítico, porém,

o termo "cultura" adquire um sentido mais amplo, englobando "tudo aquilo que pode ser

ensinado e aprendido".

Analítico ou nativo, é importante que os conceitos e categorias sejam sempre

contextualizados, como explica o sociólogo Antônio Sérgio Alfredo Guimarães, professor

titular do departamento de sociologia da FFLCH-USP:

"Um conceito ou categoria analítica é o que permite a análise de um determinado conjunto de fenômenos, e faz sentido apenas no corpo de uma teoria. Quando falamos de conceito nativo, ao contrário, é porque estamos trabalhando com uma categoria que temsentido no mundo prático, efetivo. Ou seja, possui um sentido histórico, um sentido específico para um determinado grupo humano. A verdade é que qualquer conceito, seja analítico, seja nativo, só faz sentido no contexto ou de uma teoria específica ou de um momento histórico específico. Acredito que não existem conceitos que valham sempre em todo lugar, fora do tempo, do espaço e das teorias. São pouquíssimos os conceitos que atravessam o tempo ou as teorias com o mesmo sentido. Se é assim, os termos de que estamos falando são termos que devem ser compreendidos dentro de certos contextos." (leia o texto completo aqui)

A distinção entre conceitos analíticos e nativos é fundamental para a sociologia e para as

ciências de forma mais geral. Quando trabalhamos cientificamente, mesmo que utilizemos

ferramentas matemáticas e fórmulas, em diversos momentos é preciso comunicar propostas,

resultados e conclusões da pesquisa. Tanto uma aula de química quanto uma aula de

sociologia, por exemplo, tratam de conhecimentos científicos, mas utilizam a linguagem para

fazê-lo. O mesmo ocorre com livros, artigos científicos, conferências, palestras, etc.

No caso específico das ciências humanas, em que praticamente todas as suas categorias

analíticas também podem ser usadas de alguma forma como categorias nativas, a linguagem é

ao mesmo tempo ferramenta e barreira a ser transposta. Diferenciar esses dois tipos de uso

de certas categorias (nativoversus analítico) é uma forma de evitar esse tipo de impasse.

Também falamos, na sociologia, em alguns conceitos que são utilizados por outras ciências.

Isso acontece em parte pela necessidade da sociologia, desde sua criação, de se diferenciar

das ciências naturais e exatas, oferecendo sempre explicações baseadas no mundo social, em

vez de explicar o mundo social por fatores biológicos, como vimos na aula anterior. Como

discutiremos a seguir, o conceito de "raça", por exemplo, tem mais de um sentido analítico. 

II. O conceito de "raça" para a sociologia e para a biologia

Buscando explicar a vida social pela própria vida social, para isso tomando como central o

conceito antropológico de cultura, que analisamos na aula passada, a sociologia questionou e

reorganizou diversos conceitos que já eram usados de forma analítica em outras ciências. Se

voltarmos às aulas de história que abordam, por exemplo, as potências europeias

escravocratas no período da economia da escravidão, e o conhecimento científico produzido

na época, veremos o embrião da ideia biologicista de "raça".

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A biologia usava o conceito de "raças" humanasde maneira científica/analítica. Clique para ampliar.

As ciências biológicas por um longo tempo classificaram os seres humanos hierarquicamente

em "raças", ou seja, em grupos que possuiriam certas características físicas diferentes uns

dos outros. A elaboração desse conceito pela ciência (que, ainda bem, hoje já não é mais

considerada ciência) embasou a escravidão e o genocídio de povos indígenas latinoamericanos

e africanos. Mesmo quando já havia sido refutada pela própria biologia, a ideia de "raças"

humanas permaneceu em muitas sociedades modernas, sendo usada inclusive na Segunda

Guerra como justificativa para o holocausto. O conceito analítico de "raças humanas"

elaborado pelas ciências biológicas desde o século XVII também embasa a ideia de eugenia.

No século XX, porém, em especial após o nazismo alemão, houve um esforço políticos dos

cientistas das áreas biomédicas para demonstrar que a ideia de "raças" como dados biológicos

e naturais não era verdadeira. Dessa maneira, diversos estudos genéticos, fisiológicos,

anatômicos, neurológicos, etc. mostraram ao mundo que a ideia de raça é um produto da

cultura.

Isso passou a significar que, enquanto criação da vida social, a ideia de "raça" deveria ser

estudada, legitimamente, pelas ciências sociais. As "raças" fazem parte da nossa cultura

simbólica, na esfera do discurso. Em vez de tomar as "raças" como um dado, um fato

concreto, a sociologia interpreta que elas são parte de um discurso sobre as origens de certo

grupo. Esse discurso, mesmo que não tenha relação com a constituição biológica de diferentes

grupos humanos, tem muitas vezes uma função agregadora, identitária e política.

"O que são raças para a sociologia, portanto? São discursos sobre as origens de um grupo, que usam termos que remetem à transmissão de traços fisionômicos, qualidades morais, intelectuais, psicológicas, etc., pelo sangue (conceito fundamental para entender raças e certas essências)." 

(Antônio Sérgio Alfredo Guimarães - leia o texto completo aqui)

Compreendendo "raça" como um conceito analítico da sociologia, discutiremos na próxima

aula de que forma a ideia de "raça" organiza a vida social no Brasil, e como ela se relaciona

com o Estado e com a ideia uma "nação" brasileira, ou de um "povo" brasileiro.

* * *

Conceitos-chave: categoria analítica, categoria nativa, raça

Resumo: Uma mesma palavra pode ser significada de diferentes formas. Entendemos por

categoria nativa a interpretação dada a um termo na vida prática, cotidiano. A categoria

analítica é a compreensão desse mesmo termo, feita dentro de uma teoria científica. Alguns

termos, como "raça", possuem mais de um significado analítico. Enquanto, para a biologia, a

ideia de "raça humana" usada até o século XX e depois refutada, dizia respeito a

características biológicas e genéticas de grupos de seres humanos que determinavam seu

comportamento, para a sociologia "raça" passou a ser um discurso socialmente construído

sobre as origens de um grupo.

* * *

Page 25: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

Leitura de estudo para prova:

GUIMARÃES, Antônio Sérgio Alfredo. Como trabalhar com 'raça' em sociologia. São

Paulo, Educação e Pesquisa, v.29, nº1, jan-jun/2003. Disponível

em  http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022003000100008  . Acessado em 12/02/2013.

Indicação de leitura:

http://www.fflch.usp.br/sociologia/asag/Raca%20cor%20cor%20da%20pele%20e

%20etnia.pdf

Octavio Ianni: o preconceito racial no Brasil

 Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000100002

 

Entrevista de Octavio Ianni

 

 

 

A CHAMADA ESCOLA de sociologia paulista abriu um caminho novo na análise das questões relacionadas com a situação dos negros e os preconceitos raciais na vida brasileira. Para registrar essa importante contribuição teórica,ESTUDOS AVANÇADOS entrevistou Octavio Ianni, professor emérito da Universidade de São Paulo, que teve uma participação destacada nessas pesquisas, como um dos principais colaboradores de Florestan Fernandes e Roger Bastide.''

 

 

Na entrevista realizada no dia 11 de dezembro passado, Octavio Ianni revela vários traços de sua personalidade como o autêntico scholar, ao examinar a trajetória do pensamento acadêmico paulista dentro do panorama brasileiro, relembrando a contribuição dos grandes mestres e definindo os dados principais das controvérsias em que a USP se engajou. Ele não se furta à oportunidade de emitir sua opinião a respeito de um tema que hoje se tornou candente – as cotas para os estudantes negros na universidade brasileira.

Como sua postura como scholar é completada por um outro traço de sua personalidade – o militante que dá o melhor de si a fim de contribuir para a alteração de uma realidade social inaceitável e injusta –, Ianni analisa o preconceito racial em termos mundiais, onde ''esses surtos de diferentes manifestações de racismo e intolerância estão imbricados com a dinâmica da sociedade''.

Aqui apresentamos os principais trechos de sua entrevista.

Alfredo Bosi – Seria interessante recuperarmos a evolução do estudo do negro na sociologia paulista, porque você teve uma importante participação nesse movimento e, também, porque esse estudo tem raízes na formação de nossa universidade.

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Como você se colocou, no que chamamos de escola sociológica paulista, em sua formação nos anos de 1940, em relação às pesquisas de campo e às interpretações de Florestan Fernandes e de sua escola? Gostaria também que você falasse a respeito do seu interesse para com o problema do negro e como inovou em relação a outras posições.

Octavio Ianni – É possível afirmar que os estudos sobre as relações raciais no Brasil, desenvolvidos em São Paulo a partir da Universidade de São Paulo, com a participação ativa e pioneira de Roger Bastide e Florestan Fernandes, têm uma inspiração muito evidente e conhecida graças à contribuição e ao interesse da Unesco para que se esclarecesse e se estudasse qual era a situação racial no Brasil. De certo modo, Alfredo Metraux, em contato com Roger Bastide e Florestan Fernandes (este relacionado com professores de outras partes do país), foi o portador de uma mensagem da Unesco para que fossem feitos tais estudos. Naturalmente, ela encaminhou contribuições materiais para a realização dessa atividade. Nessa época, também houve estudos realizados por norte-americanos, dentre eles Charles Wagley e Marvin Harris – mencionados no capítulo Preconceito de marca e preconceito de origem do livro de Oracy Nogueira Nem preto, nem branco. Nesse capítulo estão listados todos os que participaram desses estudos nessa época. Ou seja, brasileiros e norte-americanos inspirados na proposta da tese de que o panorama racial brasileiro seria diferente da situação nos EUA e em outras partes do mundo, como na África do Sul.

A hipótese mais evidente (confirmada em vários estudos) é de que a Unesco foi inspirada pela idéia de que o Brasil era uma democracia racial. Isso numa época em que o mundo saía de uma guerra em que o racismo era parte intrínseca das batalhas ideológicas e também militares. Pois a brutalidade do racismo, que se desenvolveu com o nazismo (incorporado pelo fascismo), seguramente reacendeu o racismo em outras partes da Europa e do mundo. Impressionados com a tese da democracia racial, os membros da Unesco decidiram fazer estudos para incentivar o esclarecimento do problema.

 

 

A hipótese de que o Brasil seria ou era uma democracia racial foi adotada com muito entusiasmo e a proposta era apresentar dados substantivos que comprovassem essa tese. Aliás, vários estudos feitos por norte-americanos e por alguns brasileiros seguiam na mesma direção. Ou seja, de que no Brasil havia preconceito de classe e de que o preconceito racial era apenas um ingrediente do preconceito de classe, tese decorrente de análises oriundas das obras de Gilberto Freyre. E que, inclusive, tem uma raiz no trabalho que Donald Pierson realizou na Bahia.

 

Arhtur Ramos e Oracy Nogueira

Marco Antônio Coelho – Arthur Ramos também tinha essa visão?

Ianni – Ele estava, num certo nível ''ideológico'', ligado a essa idéia de que o Brasil era um caso diferente e que teria um potencial democrático, mas se concentrou mais nos estudos da cultura, de religiões e de tradições afro-brasileiras. Escreveu um livro denso e abrangente sobre as várias etnias que participaram da formação do Brasil. Trata-se de um livro monumental, tanto pela documentação como pelos problemas que levanta. Sua preocupação estava no que seria a aculturação, a assimilação, o sincretismo etc. Mas tinha uma tônica a favor da hipótese do caráter ameno das relações raciais no Brasil. Aliás, Artur Ramos esteve em alguma instância da Unesco. Enfim, havia no âmbito do poder intelectual no Brasil uma forte inclinação pela prevalência da tese da democracia racial.

Marco Antônio Coelho – Qual era a posição do Oracy Nogueira em relação a isso?

Ianni – Ele participou da pesquisa ao lado de Roger Bastide, Florestan Fernandes e outros, como Virgínia Bicudo e Aniela Ginsberg – as duas no âmbito da psicologia e dos aspectos educacionais. Oraci Nogueira primeiro fez um estudo sobre Itapetininga e depois elaborou ensaios em que reflete sobre a questão racial de forma mais completa. Incorpora em seus estudos sua experiência na Universidade de Chicago, onde teve contato com a bibliografia norte-americana sobre a questão racial. Seu ensaio, que mencionei anteriormente, é uma boa síntese de sua visão: ele aceita o preconceito racial e procura deslindar sua peculiaridade no

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Brasil. Nos EUA, é a origem: se o indivíduo for branco, mas tiver miscigenação, é classificado de uma certa maneira. No Brasil, aquilo que é mais evidente do ponto de vista fenotípico é que define se se é negro ou não, ou se se é moreno etc. Ele trabalhou muito com essas nuanças. Dá para dizer que ele foi solidário com a tese de Roger Bastide e Florestan Fernandes sobre a realidade de que o preconceito racial no Brasil é um dado fundamental das relações sociais.

 

A tese da democracia racial

O impacto desses estudos foi assimilado de modo traumático porque havia na ideologia brasileira e na academia, como ambiente cultural, um certo compromisso com a tese da democracia racial. Com os trabalhos de Roger Bastide e Florestan Fernandes, em Negros e brancos em São Paulo, é que foi revelada a realidade do preconceito racial de par em par com o preconceito de classe e, portanto, o preconceito racial constitutivo da sociabilidade na sociedade brasileira.

Um fato estranho reside em que vários estudos financiados pela Unesco foram publicados em inglês e francês. Mas por alguma razão ainda não esclarecida (suponho que tem a ver com a interpretação), esse livro de Roger Bastide e Florestan Fernandes não foi publicado nessas duas línguas. E esse livro – por ser fruto de uma pesquisa empírica, historiográfica em vários níveis (tanto pesquisas de campo como de reconstrução histórica) – incomodou grandemente setores intelectuais e elites no Brasil. Mas também fecundou de maneira surpreendente diversos estudos sobre a questão racial no Brasil, que foram influenciados por essa visão mais rigorosamente científica e fundamentada em entrevistas, depoimentos, relatos e documentos.

 

 

 

 

É preciso reconhecer que um mergulho na história social do Brasil mostra que durante a escravatura formou-se uma poderosa cultura racista. Essa idéia, em grande medida, já está em Caio Prado Júnior. Em seu livro A formação do Brasil contemporâneo, há um estudo primoroso sobre o que foi o escravismo na formação da colônia, inclusive com desenvolvimentos fundamentais em termos do que é a sociabilidade, a cultura e o contraponto escravo-senhor. Esta questão pode ser encontrada parcialmente está em trabalhos de Roger Bastide e de forma mais elaborada em textos de Florestan Fernandes.

 

O impacto da realidade paulista

Apresento uma hipótese que acho interessante. Levando em conta a formação acadêmica de Roger Bastide, de Florestan Fernandes e de Oracy Nogueira e também o patamar representado pela sociedade no Centro-Sul, especialmente em São Paulo, podemos identificar o porquê da teoria desses grandes pesquisadores. São Paulo já era uma sociedade mais urbanizada, mais de classes e não de castas, como no escravismo. Mesmo ainda existindo castas em São Paulo (e ainda hoje temos resquícios), a sociedade de classes estava em franco desenvolvimento, havendo, portanto, uma sociabilidade diferente daquela existente no Nordeste. Acredito que isso levou Caio Prado, Florestan Fernandes, Roger Bastide e Oracy Nogueira a perceberem que esse cenário era um laboratório excepcional para a análise de problemas sociais. Aqui a questão racial aparecia de uma maneira mais explícita.

Temos elementos biográficos que também ajudam, mas acho que não devem ser postos em evidência. A vivência de Florestan Fernandes como criança, adolescente e adulto, na cidade de São Paulo, deu a ele uma percepção aguda do que era a cidade. Isso aparece em seu livro A integração do negro na sociedade de classes. É patente que ele vê a questão racial inclusive a partir de sua vivência em São Paulo. Em outros termos, Bastide, por se interessar em religiões, mergulhou na vivência das relações negros e brancos de maneira muito forte. Não é ironia e

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nem é injusto dizer que alguns autores brasileiros vêem a questão racial da janela, desde longe ou desde o alpendre da casa-grande.

Enfatizo esse argumento de que no patamar em que eles estavam – a sociedade do Centro-Sul – havia uma urbanização intensa e recente, classes sociais evidentemente em formação e a industrialização, onde foi possível descortinar que o preconceito racial não se reduzia ao preconceito de classe. Mesmo porque os estudos posteriores, que eles fizeram, demonstraram que, na fábrica, dois operários na mesma seção se discriminavam segundo sua etnia.

 

Os imigrantes

Alfredo Bosi – Será que a presença do imigrante também foi um elemento de peso nessa discriminação racial? Isso porque parece um cenário diferente daquele do Nordeste, já que São Paulo, nos anos de 1930, era uma cidade fortemente impregnada pelo imigrante europeu.

Ianni – Não há dúvida que essa multiplicidade étnica deve ter sido um elemento forte porque, inegavelmente, havia discriminação em relação aos imigrantes – italianos, árabes etc. Nas pesquisas que fiz na equipe que Florestan Fernandes montou no Paraná, Florianópolis e Porto Alegre, ficava evidente que havia uma pluralidade étnica que implicava uma escala de preconceitos. Isto é, alguns eram mais discriminados do que outros. No Paraná, por exemplo, a freqüência de negros em Curitiba era relativamente pequena (entre 10 e 15% no máximo da população) e meus informantes da cidade afirmavam: ''Aqui não há negros'' e acrescentavam uma fala fatal: ''o nosso negro é o polaco''. Isto é, inconscientemente, eles assimilaram o preconceito que os alemães desenvolveram na Europa contra os poloneses. O negro e o polonês eram colocados na escala mais baixa da discriminação; em segundo lugar vinham os italianos (com alguns outros, como os ucranianos); em terceiro, os brasileiros do povo e no topo da pirâmide os alemães. A acentuada valorização de alguns e a classificação diferenciada para outros. Logo, esse laboratório de etnias também funcionou como elemento fertilizante.

Marco Antônio Coelho – Como, em suas pesquisas, você sentiu o grupo dos sírio-libaneses, os chamados turcos?

Ianni – Sempre que eram discriminados. Aliás, um amigo escritor disse-me que o preconceito contra os árabes tem crescido. Esse dado era evidente. Florestan Fernandes chegou a iniciar uma pesquisa sobre eles. Existem alguns estudos mais densos sobre eles, mas nunca se pesquisou sistematicamente essa questão. Atualmente há estudos sobre os japoneses e um mapeamento básico e interessante sobre a questão racial no Brasil. Mas é necessário ampliar muito mais essas pesquisas.

Sobre a democracia racial temos que observar que esse mito não está só no pensamento brasileiro. Ele está ao lado de outros emblemas e mitos que são constitutivos da ideologia dominante no Brasil. Por exemplo, a idéia de que a escravatura foi branda e não muito brutal. Na verdade, a escravatura na casa-grande foi diferente da do eito, mas não é aquela que explica a questão racial no Brasil, porque o convívio das pessoas na casa-grande acaba sendo comunitário, influenciado pelo companheirismo.

 

Gilberto Freyre

Farei agora uma digressão. Assisti a última conferência que Gilberto Freyre fez em São Paulo num clube de empresários. (Quase não me deixaram entrar porque exigiam gravata.) Ele iniciou sua fala com muita graça: ''Dizem que sou saudoso da escravatura'' e depois de um silêncio longo: ''Sou. Sou sim!''. Passou então a relatar sua infância, sua convivência com pessoas oriundas do escravismo (da casa-grande), contando as histórias de Felicidade, uma negra chamada afetivamente por ele de Dadade. Ao narrar essas experiências afetivas, algumas até engraçadas, outras alusivas ao erótico etc. – notei que não havia referência alguma ao eito, ao trabalho pesado do escravismo. Observei algo que tem a ver com a literatura, com a oralidade dos contadores de causos. Percebi que quando falava de Dadade ele estava fortemente impressionado com aquelas histórias que ele assimilou, com aquela oralidade que transcreveu em seus escritos, principalmente da primeira fase.

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A questão racial vem junto com a idéia de que a escravatura no Brasil foi diferente, a idéia de que houve revoluções brancas (também de Gilberto Freyre) e a idéia de índole pacífica do povo brasileiro. Há vários emblemas do que seria a ideologia das elites dominantes no Brasil que tem a ver com uma certa invenção de tradições e uma pasteurização da realidade.

Nesse contexto, se vocês permitem a provocação, é que o homem cordial faz parte dessa visão. Não foi essa a intenção de Ribeiro Couto nem de Sérgio Buarque, mas vendo esses emblemas, tomados em conjunto na história do pensamento brasileiro, concluímos que há uma tradição forte de se pensar o Brasil como um país diferente, com uma história incruenta.

A produção de Ciências Sociais na USP começou a pôr em causa essa visão, tanto no que se refere à questão racial, quanto à questão social. Colocou em causa inclusive a idéia de nação que vinha sendo elaborada. Enfim, começamos a formular (na base de Caio Prado, de Manuel Bonfim e de uma literatura de esquerda) a hipótese de que o país podia ser diferente. Isto é, um país mais democrático, com um estado de bem-estar social mais avançado – quem sabe até uma nação socialista etc.

 

 

Coloco a seguinte interrogação: como é possível afirmar e reafirmar a democracia racial num país em que as experiências de democracia política são precárias e que a democracia social, se existe, é incipiente? Isso é minimamente uma contradição, um paradoxo num país oriundo da escravatura, autocrático, com ciclos de autoritarismos muito acentuados.

Acrescento ainda (algo muito pessoal) que o mito da democracia racial não é só das elites dominantes. Quando pensamos que as relações sociais estão impregnadas pela idéia de democracia racial, descobrimos, então, que se trata de um mito cruel porque neutraliza o outro.

 

Cenário contraditório no Brasil

Alfredo Bosi – Nos centros urbanos, penso que temos experiências dos dois lados: pessoas que se sentem marginalizadas e outras que se sentem inseridas. Há personalidades democráticas e também autoritárias. Você pode dizer se há uma hegemonia da exclusão ou da integração? Há duas teorias paralelas: a de que o Brasil é um país autoritário e a de que há democracia racial.

Ianni – A situação, de fato, é a que você está apresentando. Há uma gama nuançada de situações que, mesmo visível nas relações entre as pessoas, mostra, numa interpretação mais ou menos rigorosa, a descoberta de que essa situação está apoiada numa cultura de tradições, que vão até o escravismo, além de serem reiteradas no contexto da sociedade de classes.

Tenho observado um retorno de estudos que têm a ver com a orientação das idéias de Gilberto Freyre. Alguns trazem contribuições inovadoras, uma vez que Gilberto Freyre foi uma matriz importante de estudos, no sentido de que fez um mergulho na sociabilidade com muita percepção – tendo suas idéias fundadas na fenomenologia ehola, pois foi um precursor dos estudos sobre identidade, cotidiano etc. Contudo, há um certo contrabando, porque alguns estão valorizando esses estudos para contrapô-los às teses de Florestan Fernandes e de Caio Prado, já que estas são muito incômodas. As elites sempre foram contra esses estudos. Ou, frente a eles, ficam indiferentes. Esse pensamento está presente em Jorge Amado, Roberto DaMata, Darci Ribeiro etc., todos com a melhor das intenções, pensando que aproveitando esse potencial democrático ilusório, ele se tornaria verdadeiro.

Esse mito da democracia racial antes de ser político e social acaba servindo aos interesses das elites dominantes. Há um elemento implícito nas falas que é o fato de alguns negros terem êxito. Um deles é um grande ícone brasileiro e cabe perguntarmos se ele é mesmo negro. A resposta é que não é mais. Nos EUA estudou-se o processo, chamado, na época, de branqueamento social. Ou seja, de como um indivíduo de uma certa etnia passa a circular (seja por competência, seja por capacidade de circulação) em certos meios sociais sem nunca tocar na questão racial. É algo que serve para as pessoas reativarem a idéia de democracia racial, já que fulano de tal é um grande artista, futebolista etc. Mas, na verdade, a relação que essa pessoa tem com a questão sociallato sensu e com a questão racial não aparece. Aliás, essa

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figura a quem estou me referindo, durante a ditadura militar declarou, recitando uma tese dos militares, que o povo brasileiro não estava apto a votar. Traduzo isso como: ''eu sou branco. Eu sou como vocês''. Penso essa afirmação como uma adesão total.

 

Os movimentos dos negros

Alfredo Bosi – A partir dos anos de 1920 ou 1930 começaram a se formar movimentos, organizações negras, como o teatro experimental de Abdias Nascimento. Daí por diante eles ficaram cada vez mais radicais, como os movimentos atuais, que lembram um pouco os dos norte-americanos, com a música de contestação e protesto que é o rap. Pergunto se hoje, quando há um refinamento tão grande dos estudos antropológicos, o pensamento acadêmico ainda repete o mito da democracia racial. Gostaria que você fizesse um balanço da situação atual, na qual tudo parece estar misturado: de um lado, a tradição dos estudos da questão racial, mostrando a realidade do preconceito (Roger Bastide e Florestan Fernandes) – tradição essa que se encontra radicalizada nos movimentos negros atuais; e de outro lado essa revivescência do pensamento de Gilberto Freyre. Gostaria que você falasse como vê a coabitação dessas duas tendências.

Ianni – Sinto essa problemática nas leituras e nos eventos de que participo. Na verdade, o movimento negro hoje está bastante diversificado e podemos dizer que está orientado para diferentes situações: alguns são politizados, outros são quilombistas no sentido de regressar às origens e tradições africanas; outros, mais liberais, se movimentam no sentido de conseguir maior mobilidade na sociedade aproveitando as brechas que esta abre para uma integração mais plena. Há também movimentos que têm a ver com a cultura, a música etc. Dá para dizer que esses movimentos atualmente têm vínculos fortes com o Caribe, assim como com os norte-americanos e africanos. Em geral, são mais cosmopolitas e mais plurais em relação ao diálogo e às influências.

Não tenho um balanço sistemático desses movimentos, mas acho que cresceram muito e hoje há muitos negros já formados na universidade que estudam a questão racial. Eles estão questionando o que você chama de escola paulista. O pioneiro nesse debate foi o Clóvis Moura (de uma geração equivalente à de Florestan Fernandes) que escreveu sobre a questão social do negro e as rebeliões e, inclusive, iniciou um debate crítico sobre os estudos da escola paulista. Outros negros mais jovens estão também fazendo estudos, questionando etc.

 

As cotas nas universidades

Alfredo Bosi – Qual sua opinião sobre as cotas para os alunos negros nas universidades?

Ianni – Não tenho uma opinião amadurecida, somente algumas impressões. Num primeiro momento, a definição e a obrigação de cotas aparecem como conquistas sociais do movimento negro. Ou, como diriam outros, como concessões dos donos do poder. Aqui está o problema, já que nenhum fato social tem apenas um significado. Os setores dominantes (seja o Congresso, seja o governo, sejam aqueles que decidem) aceitando o sistema de cotas, estão, de certo modo, concordando com uma determinada interpretação e o atendimento de algumas reivindicações. Então, numa primeira avaliação, o estabelecimento de cotas aparece como uma conquista positiva; mas, simultaneamente, é a reiteração de uma sociedade injusta, fundada no preconceito. Ela é tão evidentemente fundada no preconceito que é preciso estabelecer espaços bem determinados e limitados para que eles tenham a possibilidade de participação. Tem algo de esquizofrênico e imitativo do padrão norte-americano, onde o preconceito continua a existir da mesma forma, ainda que tenha havido o reconhecimento da questão racial.

Acompanhei através de publicações, em certo momento, o debate que ocorreu nos EUA e, quando, nos anos de 1960, houve esse reconhecimento através das lutas de Luther King etc. Houve uma decisão deliberada, por parte das elites norte-americanas, no sentido de abrir créditos para empreendedores negros, a fim de propiciar a emergência do pequeno empresário negro. E também abrir espaços em diferentes instituições, pouco a pouco, com o estabelecimento de cotas. Isso tudo ao mesmo tempo em que essa sociedade mandou bala, já que é só nos perguntarmos quem matou Luther King. Ele cometeu um pecado capital, do ponto de vista das elites, ao dizer aos negros para não irem à guerra no Vietnã. Como os negros são numerosos e combativos, esse tipo de declaração criou um grande mal-estar nas elites.

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As cotas são uma conquista e uma concessão, uma legitimação de uma sociedade preconceituosa. É contraditório porque a sociedade é contraditória, já que se formos ao fundo nesse problema, veremos que esses negros não tiveram condições de estudar a ponto de não serem classificados nos exames de seleção. Portanto, já vêm de uma condição social com limitação. E, em vez de enfrentarmos o problema na raiz – melhorando as condições sociais de brancos e negros de diferentes níveis sociais – se estabelece a cota. Não se mexe na ordem social que é uma fábrica de preconceitos, mas somente num nível restrito, que é o nível do acesso a certos espaços.

É uma negação da idéia de democracia racial porque se ela existe, todos estão participando em situação de igualdade, mas sabemos que não é isso o que acontece. É também muito cruel, já que futuramente as elites dirão: ''por que vocês estão reclamando? Nós abrimos espaços em nossas repartições públicas, nas universidades, etc.''. Como se isso fosse a conquista plena, quando na realidade é um contrabando de concessão.

 

Etnias e raças

Passo para um problema muito importante: como se transforma a etnia em raça? Porque, tecnicamente, os grupos humanos distinguem-se por etnias – orientais, africanos, europeus etc. No entanto, nas relações sociais, por serem não só hierarquizadas, mas também desiguais, propiciando várias modalidades de alienação e de não participação na economia, na política e na cultura, ocorre essa transformação de etnia em raça.

Falamos de preconceito racial, mas na verdade trata-se de como as relações sociais estão fabricando continuamente o outro. Daí a excelente frase de Sartre em seu livro sobre a questão judaica: ''O anti-semita inventa o judeu''. A sociedade é tão injusta, desigual e competitiva que se produz o preconceito como uma técnica política de poder. No limite, o preconceito racial é uma técnica da dominação.

Lembro-me de uma entrevista de um negro em Florianópolis, que dizia em tom exaltado: ''O problema de preconceito no Brasil é que você não tem onde pegar''. É um preconceito alusivo, não explicitamente revelado. Ele aparece da maneira mais surpreendente: o negro chega ao restaurante e fica esperando enquanto o garçom atende a outros; no hotel ouve ''não temos vagas''; as crianças brancas e pretas convivem na escolinha em plena igualdade, até que vem a adolescência e ocorre a demarcação.

E, para radicalizar com Sartre e Adorno, a sociedade propicia a formação da personalidade autoritária que é o intolerante. Esta tanto discrimina o negro, como a mulher, o árabe, o índio, o comunista etc. É aí que se dá a metamorfose da marca ou do traço fenotípico em estigma.

Assim, dá para formular a hipótese de que a sociedade é uma fábrica de intolerâncias. Mas também está nessa fábrica a possibilidade da formação de uma personalidade democrática, de um indivíduo que tenha uma visão comunitária e ética, até mesmo socialista. Mas por enquanto tenho uma conclusão, se não pessimista, ao menos realista, de pensar que essa sociedade é uma fábrica de intolerância e esta é uma dinâmica daquela.

 

A racialização do mundo

Sempre que há um contexto de crise social, há o risco de que as intolerâncias se acentuem. Aliás, queria colocar o que está acontecendo: uma incrível racialização do mundo. (Embora seja algo que existe desde as grandes navegações.) Verdadeiramente, os acontecimentos nos últimos anos estão acentuando a intolerância racial em escala mundial. Agravou-se a intolerância na Europa; cresceu muito a vigilância dos indivíduos nos EUA, além de em outros países. O pretexto pode ser o terrorismo ou o narcotráfico, mas aquela intolerância forte que os europeus há algumas décadas imaginavam que acontecia só na África, na América Latina, nos EUA, também está sucedendo na Europa. Há barcos de negros e árabes que no Mediterrâneo são afundados porque servem de transporte a imigrantes que querem entrar de qualquer modo nos países europeus.

A potencialidade de democratização das relações sociais existe em qualquer lugar do mundo, mas é anulada ou bloqueada devido ao jogo das forças sociais, à disputa pelo poder e pelas

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posições. Esse potencial de modo evidente existe em nossa cultura (mundial), seja via budismo, cristianismo, islamismo etc. E ele foi criado pelas lutas sociais. Contudo, esse potencial tem condições limitadas porque prevalecem os princípios do mercado, da dinâmica do capital. Em estatísticas de desemprego nos EUA, que acompanhei, crescem os contingentes negros e porto-riquenhos, seguidos pelas mulheres e, de maneira mais relativa, pelos jovens. Nas guerras, como a do Vietnã, mostra-se essa hierarquização já que os negros vão à guerra por estarem desempregados. O primeiro homem que morreu no Iraque não foi um norte-americano tradicional, mas um guatemalteco.

Gostaria de reiterar que a história do mundo moderno é uma história da racialização do mundo. O que foi o mercantilismo? O que foi o colonialismo que se estabelece com os impérios português e ehol? O que foi o imperialismo? E o que está sendo agora o globalismo com esses movimentos que estão ocorrendo em escala mundial? São diferentes ciclos da história do mundo moderno, do capitalismo e da racialização do mundo.

E aí que surgem figuras notáveis como Martin Luther King, Gandhi, Mandela etc. O que é o livro de Conrad O coração das trevas? É um livro que está pondo em questão a maneira como a Europa está chegando na África. Não trata da questão racial propriamente, mas de um estado de espírito de grande inquietação.

A racialização do mundo está em curso. Numa reflexão sobre a questão racial no Brasil somos obrigados a reconhecer que, simultaneamente, está havendo algo de diferentes gradações em muitas partes do mundo e que esses surtos de diferentes manifestações de racismo e intolerância estão imbricados com a dinâmica da sociedade.

Estudos de gêneroFonte: http://www.infopedia.pt/$genero-(sociologia )

O conceito de género tem a ver com a diferenciação social entre os homens e

as mulheres. Tem a vantagem, sobre a palavra "sexo", de sublinhar as

diferenças sociais entre os homens e as mulheres e de as separar das

diferenças estritamente biológicas.

Os estudos das relações sociais de género foram bastante marcados pelo

trabalho de investigação levado a cabo pela socióloga feminista norte-americana

Jessie Bernard, que, em meados dos anos 40 do século XX, iniciou a abordagem

da importância do "género" na organização da vida em sociedade. A obra mais

conhecida desta autora, The Future of Marriage (1982), procura mostrar como é

que o casamento constitui um contexto institucional de cristalização de normas,

valores, papéis e padrões de interação entre o homem e a mulher, que são

ideologicamente dominantes e que subjugam e oprimem a mulher. Esse estudo

tornou-se já um clássico, num dos domínios de investigação sobre as relações

sociais de género que mais se tem desenvolvido: a divisão tradicional dos papéis

sexuais e as suas repercussões ao nível da família e do trabalho, ou em relação

ao domínio privado e ao domínio público.

Page 33: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

A investigação sociológica no domínio das relações sociais de género centra-se

em dois pressupostos de análise principais:

1) a posição ocupada na sociedade pelos homens e pelas mulheres não são

apenas diferentes, mas também desiguais;

2) a desigualdade social entre homens e mulheres resulta, principalmente, da

organização da sociedade e não de diferenças biológicas ou psicológicas

significativas entre os mesmos.

Em relação ao princípio analítico de que não há apenas uma diferenciação

socialmente construída entre homens e mulheres, mas também, e sobretudo,

uma desigualdade social, isto significa que os estudos em função do género

supõem que as mulheres têm menos recursos materiais, estatuto social, poder

e oportunidades de auto-realização do que os homens com quem partilham a

mesma posição social.

O género é, assim, considerado um elemento que condiciona a posição social

dos indivíduos, tais como a classe, os rendimentos económicos, a profissão, o

nível de escolaridade, a idade, a raça, a etnia, a religião e a nacionalidade.

Neste âmbito, têm-se desenvolvido estudos sociológicos centrados na

discriminação e na diferenciação social, em função do género, em diversas

áreas da vida em sociedade, tais como, por exemplo, as desigualdades no

acesso ao poder e ao emprego e na atribuição de rendimentos salariais.

No que respeita ao princípio de que as diferenças entre os dois sexos são

sobretudo socialmente instituídas e não predeterminadas, o conceito explicativo

principal é o de "socialização".

Por outras palavras, uma parte significativa dos estudos no domínio das relações

sociais de género supõe que a diferenciação de comportamentos e de traços de

personalidade consoante o género resulta de expectativas socialmente incutidas

nos indivíduos desde a infância, pelas quais as crianças são socializadas no

sentido de desempenharem diferentes papéis, "masculinos" ou "femininos".

Basicamente, trata-se de investigar como é que, ao nível das interações entre

os indivíduos, são construídas e recriadas de um modo permanente as

dicotomias entre o homem e a mulher. Neste domínio, são de salientar os

trabalhos da socióloga feminista britânica Dorothy Smith (1987) e da teórica

feminista francesa Luce Irgaray (1985), sobre o modo como as linguagens

atuais estão dominantemente ancoradas em experiências e conceitos

Page 34: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

masculinos.

O conceito de gênero por Pierre Bourdieu: a dominação

masculina

Conceitos de grande importância para a sociologia e antropologia, cunhados e/ou trabalhados ao longo da

obra do sociólogo francês Pierre Bourdieu, como violência simbólica, habitus e arbitrário cultural, são

estendidos para uma análise da questão de gênero em um artigo, publicado originalmente em 1990,

chamado A dominação masculina (1995), que pouco mais tarde se transforma num livro homônimo.

Conforme já afirmado nesse blog, Bourdieu não trabalhou com um conceito de gênero

propriamente dito. Na sua referida obra, esse conceito não dá as caras. Entretanto, o seu pensamento

sobre o masculino e o feminino passa por um trajeto em alguma medida similar ao das autoras até então

discutidas, sendo válido chamá-lo para o debate.

Pierre Bourdieu (1930-2002), sociólogo francês, escreveu sobre a dominação masculina, estendendo ao

campo do que chamamos de debate de gênero os conceitos desenvolvidos ao longo de sua obra.

Bourdieu, condizente com sua teoria, trata a questão da “dominação masculina” principalmente a

partir de uma perspectiva simbólica. Para ele, a dominação masculina seria uma forma particular

de violência simbólica. Por esse conceito, Bourdieu compreende o poder que impõe significações,

impondo-as como legítimas, de forma a dissimular as relações de força que sustentam a própria força.

Desculpem-me pelo jargão complicado, típico dos escritos de Bourdieu, mas o que o sociólogo quis dizer

com isso é justamente a manutenção de um poder que se mascara nas relações, que se infiltra no nosso

pensamento e na nossa concepção de mundo.

Para o gênero, essa visão é rica, afinal de contas, não estamos discutindo justamente as maneiras

marcadas por relações de poder de conceber o masculino e o feminino? Tanto é verdade que Bourdieu

denuncia um modo de pensar pautada pelas dicotomias e oposições. Aqui, falamos de

masculino/feminino, mas o mesmo se opera em alto/baixo, rico/pobre, claro/escuro etc.

Além disso, Bourdieu enfatiza que essas concepções “invisíveis” que chegam a nós nos levam à formação

de esquemas de pensamentos impensados, ou seja, quando acreditamos ter a liberdade de pensar

alguma coisa, sem levar em conta que esse “livre pensamento” está marcado por interesses,

preconceitos e opiniões alheias. Não é à toa que o sociólogo afirma que uma relação desigual de

poder comporta uma aceitação dos grupos dominados, não sendo necessariamente uma

aceitação consciente e deliberada, mas principalmente de submissão pré-reflexiva.

Capa da sua principal incursão no debate feminista, A dominação masculina (1990), que reforça a

noção de uma dominação incrustada nos esquemas de pensamento, nos corpos e no que mais for alvo

dos símbolos e da linguagem (ou seja, tudo!).

Em decorrência disso, a própria socialização dos corpos estaria tingida por essas ideias. “O corpo

biológico socialmente modelado é”, conclui Bourdieu (1995, p. 156),“um corpo politizado, ou se

preferimos, uma política incorporada. Os princípios fundamentais da visão androcêntrica do mundo são

naturalizados sob a forma de posições e disposições elementares do corpo que são percebidas como

Page 35: Apostila Sociologia 2014 2 Ano

expressões naturais de tendências naturais.”

Trocando em miúdos, a biologia e o corpo seriam espaços onde as desigualdades entre os sexos,

aqui resumidas na ideia de dominação masculina, seriam naturalizadas. Essa noção nos remete

à Joan Scott e àJudith Butler, bem como ao conjunto das feministas pós-estruturalistas.

Ainda que Bourdieu tenha trabalhado nesse campo com sua maestria usual, ele criou uma teoria que, do

ponto de vista político, esteriliza as possibilidade de mudanças: como quebrar a dominação masculina se

ela está tão imbricada no nosso inconsciente e nas formas mais simples de organização do pensamento e

da linguagem? Há muitos outros problemas que poderiam discutidos nessa obra, que são apresentados

por Corrêa (1999) e Carvalho (2011).

Neste blog, até agora não desenvolvemos com mais sistematização o pensamento de Bourdieu, mas você

pode ler um pouco sobre ele aqui. Acompanhe os próximos textos. Se quiser ler sobre o conceito de

gênero por outras autoras, clique aqui.