apontamentos direito penal[1]

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  • 8/4/2019 Apontamentos Direito Penal[1]

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    INTRODUO

    1. Direito Penal

    Conjunto de normas jurdicas que associam factos penalmente relevantes uma

    determinada consequncia jurdica, uma sano jurdica ou, conjunto de normasjurdicas que fazem corresponder a uma descrio de um determinado comportamentouma determinada consequncia jurdica desfavorvel.

    A esses factos penalmente relevantes correspondem determinadas sanes jurdico-penais, que so basicamente:- As penas, e as principiais so: Priso; Multa.

    - As medidas penais, e as principiais so:

    Medidas de segurana; Medidas de correco.

    a) Medidas de seguranaTm um carcter essencialmente preventivo, embora sejam sempre ps-delituais e so

    baseadas na perigosidade do delinquente.No mbito do Direito Penal vigora o princpio da culpa que significa que toda a penatem como suporte axiolgico normativo uma culpa concreta; a culpa simultaneamenteo limite da medida da pena.Ou seja, quanto mais culpa o indivduo revelar na prtica de um facto criminoso, maiorser a pena, quanto menor a culpa menor ser a pena.O fundamento para a aplicao de uma medida de segurana, no pode ser a culpa, massim a perigosidade, ou seja, justifica-se a imposio daquela medida de seguranaquando h suspeita de que aquele indivduo que cometeu aquele facto penalmenterelevante volte a cometer novo ilcito, de gravidade semelhante.

    b) Medidas de correcoSo medidas (penais) que se aplicam a jovens delinquentes.A partir dos 16 anos, o indivduo tem plena capacidade de culpa e sobre ele pode recairuma pena: pena de priso ou pena de multa. Antes dos 16 anos, o indivduo inimputvel.

    c) PenasSano caracterstica do Direito Penal. Prevista e regulada nos arts. 40 segs. CP.A pena de priso tem um limite mnimo de um ms e um limite mximo de 20 anos

    podendo ir at aos 25 anos em determinados casos (art. 41 CP).A pena de multa tem um limite mnimo de 10 dias e um limite mximo de 360 dias (art.47 CP).

    A pena de priso distingue-se da pena de multa:- A pena de priso uma pena privativa da liberdade, em que o indivduo encarceradonum determinado estabelecimento prisional onde cumpre a pena, vendo a sua liberdade

    de movimentao coactada;

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    - A pena de multa uma pena de natureza essencialmente pecuniria, se o juiz condenaralgum pela prtica de um crime com uma pena de multa e esta no paga, ela tem avirtualidade de ser convertvel em priso.

    2. Definio estrutural de Direito Penal

    Direito Penal composto por um conjunto de normas jurdicas com uma determinadaestrutura. Essa estrutura a descrio de um facto, de um comportamento humano que considerado crime ou contraveno, a que corresponde uma sano jurdico-penal[1].

    Estrutura da norma penal:- A descrio de um facto previso;- A sano jurdica que corresponde prtica desse facto estatuio.

    Mas nem sempre as incriminaes ou crimes esto descritos pressupondo da parte doagente, um comportamento activo; em Direito Penal so crimes no s determinadas

    aces, como tambm determinadas omisses.Pune-se no a actividade, mas precisamente o non facere, uma omisso, umainactividade, quando a lei obrigava, naquelas circunstncias, a que a pessoa actuasse. Anorma tem uma estrutura decomposta numa previso e numa estatuio.- A estrutura das normas penais insertas na parte especial tem, de um modo geral, esta

    bipartio entre uma previso e uma estatuio;- As normas da parte geral permitem de alguma forma encontrar princpios e preceitosque contemplam o que est na parte especial.

    3. Crtica h definio estrutural da norma penal

    Esta definio estrutural do Direito Penal no nos resolve o problema de saber se, emdeterminados campos em que tambm so aplicadas consequncias jurdicasdesfavorveis a pessoas que cometem determinados factos relevantes, se isso ou noDireito Penal, poder no ser: poder ser por hiptese direito disciplinar, ilcito da meraordenao social; ilcito das contravenes (coimas) etc.Tambm nestes casos cominada uma consequncia jurdica desfavorvel (umaestatuio) para quem incorre num determinado facto previsto.O objecto do Direito Penal so os factos penalmente relevantes, sendo os de maiorimportncia os crimes.

    4. Definio formal e material de crimeFormalmente pode-se dizer que o crime uma aco ou um facto tpico, ilcito eculposo.Portanto, os crimes principais encontram-se na parte especial do CP. Mas encontram-semuitos crimes tipificados em outros diplomas legislativos: Decreto-lei[2], leis.Materialmente, crime todo o comportamento humano que lesa ou ameaa de leso(pe em perigo) bens jurdicos fundamentais.Existe um princpio basilar e que d consistncia criminalizao de comportamentosque o princpio da subsidiariedade do Direito Penal.O Direito Penal ao intervir, s deve emprestar a sua tutela, s est legitimada a intervir

    para tutelar determinados bens de agresses humanas quando essa tutela no puder sereficazmente dada atravs de outros quadros sancionatrios existentes no ordenamento

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    jurdico. Ou seja, quando do direito civil, do direito administrativo, no foremsuficientemente eficazes para acautelar esses bens jurdicos que as normas de DireitoPenal procurem acautelar.

    Bens jurdicos so valores da ordem ideal que o legislador considera, muitas vezes por

    opo de para poltica, outras por opo de poltica penal ou poltica criminal,procurando dar tutela jurdica. So bens jurdicos:- Vida;- Integridade fsica;- Honra;- Liberdade;- Propriedade;- Patrimnio em geral;- Liberdade de movimentao;- Liberdade de deciso; etc.

    Por detrs de cada tipo legal de crime, encontram-se sempre a necessidade de tutelar umou mais bens jurdicos.

    No legtima a criao de um comportamento criminoso, a criao de umaincriminao, sem que por detrs dessa incriminao se tentem proteger bens jurdicosfundamentais.Formalmente o Direito Penal est legitimado pelas normas constitucionais, mormente oart. 18 CRP, a Constituio aponta determinados critrios que o legislador ordinrio emmatria penal no pode ultrapassar. As normas penais tm de estar em harmonia com asorientaes constitucionais.Mas, no o legislador penal que cria o bem jurdico. O bem j existe porque umvalor de ordem ideal, de ordem moral. Simplesmente o legislador, ao atribuir-lhe tutela

    penal, transforma-o em bem jurdico.A interveno do Direito Penal por fora do princpio da subsidiariedade s se justificaquando seja para acautelar leses ou ameaas de leses de bens jurdicos fundamentais.

    5. Direito Penal no quadro das cincias penais

    O Direito Penal composto por um conjunto de normas jurdicas que tm a virtualidadede associar a factos penalmente relevantes os crimes e as contravenes determinadas consequncias jurdico-penais.- Formalmente, o Direito Penal legitimado pelas prprias normas constitucionais e a

    viso constitucional do funcionamento do Estado e da sociedade reflectida depois pelolegislador em sede de Direito Penal;- Materialmente, aquilo que legitima o Direito Penal a prpria manuteno do Estadoe da prpria sociedade.Portanto, o Direito Penal s deve intervir quando e onde se torne necessrio paraacautelar a inquebrantibilidade social.

    Saber quais os bens estes valores da ordem moral e ideal que devem carecer dedisciplina jurdica e de tutela penal, pode fazer-se atravs de duas maneiras:1) Atravs de um processo intra-sistemtico, ou seja, inerente ao sistema: averiguarquais so as incriminaes constantes de legislao penal, quer da parte especial do

    Cdigo Penal, quer de legislao penal extravagante ou avulsa; verificar quecomportamento que o legislador penal, face ao direito vigente, considera como tal;

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    saber depois de por detrs dessas incriminaes se encontram sempre bens jurdicos queo legislador pretende tutelar.2) Atravs de um plano sistemtico crtico: indagam que valores, que bens, carecem detutela penal.O Direito Penal talvez o ramo de direito que mais prximo se encontra do

    ordenamento moral. Muitos comportamentos que so considerados como criminosos,no deixam de reflectir uma certa carga moral.

    6. Princpio da subsidiariedade do Direito Penal

    O Direito Penal s deve intervir quando a tutela conferida pelos outros ramos doordenamento jurdico no for suficientemente eficaz para acautelar a manuteno desses

    bens considerados vitais ou fundamentais existncia do prprio Estado e da sociedade.A este carcter subsidirio do Direito Penal, que se resume dizendo que o Direito Penalintervm como ultima ratio no quadro do ordenamento jurdico instrumental, deveopor-se um outro princpio que o princpio da fragmentariedade do Direito Penal, o

    Direito Penal no deve intervir para acautelar leses a todos e quaisquer bens, mas tos queles bens fundamentais, essenciais e necessrios para acautelar ainquebrantibilidade social.O carcter subsidirio e fragmentrio do Direito Penal deve ser tambm analisado emconsonncia com outro princpio fundamental que o princpio da proporcionalidade.Tal como Gallas dizia: no se devem disparar canhes contra pardais, mesmo que sejaa nica arma de que disponhamos.Significa isto que h que medir em termos de proporo, em termos de grandeza, anecessidade que h de tutelar um bem fundamental, sendo certo que a interveno doDireito Penal, por fora das sanes jurdicas que lhe so caractersticas, colide com odireito de liberdade que um direito fundamental do cidado.O Direito Penal s deve intervir quando a sua tutela necessria e quando se revela til,quando tem alguma eficcia.

    7. mbito e disciplina do Direito Penal

    Segundo um critrio que separa entre aplicao, criao e execuo dos preceitos denatureza penal, pode-se distinguir entre:- Direito Penal material ou substantivo;- Direito Penal adjectivo, formal ou Direito Processual Penal;- Direito Penal da execuo, tambm designado por Direito Penal executrio ou direito

    da execuo penal.A dogmtica jurdico-penal, ou dogmtica penal, uma cincia normativa que temcomo fundamento e limite lei positivada, a lei vigente. Neste caso, a lei penal.

    A dogmtica parte da elaborao de conceitos que arruma num edifcio lgico e quevem permitir uma aplicao certa, segura e uniforme da lei penal, ou seja:- Afirma-se que um crime uma aco ou um facto tpico, ilcito, culposo e punvel obra dogmtica;- Afirmar-se, por exemplo, que um facto ilcito um facto tpico no justificado, tambm obra da dogmtica jurdico-penal.

    8. O que a culpa?

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    um juzo de censura formulado pela ordem jurdica a um determinado agente.Censura-se ao agente o facto de ele ter decidido pelo ilcito, o facto de ele ter cometidoum crime, quando podia e devia ter-se decidido diferentemente, ter-se decidido deharmonia com o direito.

    Dentro do mbito e delimitao do Direito Penal, pode-se distinguir trs conceitos:1) Crimes;2) Contravenes;3) Contra-ordenaes.

    9. Principais diferenas de regime entre contraveno e crime

    Nas contravenes no se pune nunca a tentativa, diferentemente do que acontece nombito dos crimes por fora do preceituado nos art. 22 e 23 CP, ou seja, no h factocontravencional tentado, enquanto que h responsabilidade por crimes praticados naforma tentada.

    No se pune a cumplicidade no mbito das contravenes; ao passo que os cmplicesdos crimes so punidos com as penas fixadas para os autores, especialmente atenuadas,conforme preceitua o art. 27/2 CP.Quanto aos prazos de prescrio do procedimento criminal, tanto maiores so quantomaiores forem as penas.Tendencialmente verdade que as contravenes so menos graves que os crimes; porfora do princpio da proporcionalidade, que tambm um princpio de poltica penal, afacto menos graves devem corresponder sanes menos graves; onde, as contravenesso menos sancionadas que os crimes; logo, se os prazos de prescrio do procedimentocriminal so mais amplos consoante maiores forem as penas, ento se pode dizer que os

    prazos de prescrio do procedimento criminal so mais curtos no mbito dascontravenes do que no mbito dos crimes (art. 117 CP). admissvel a extradio em matria de crime; no se admite extradio se se tratar deuma contraveno.

    No mbito dos crimes, s h responsabilidade criminal se os factos forem praticadosdolosamente; ressalva-se a excepo do art. 13 CP, e a responsabilizao criminal porfacto negligente, quando a lei expressamente o disser.

    Nas contravenes indiferente a responsabilizao fundada em facto doloso ou factonegligente.

    10. Semelhanas entre ilcito penal e o ilcito de mera ordenao social

    Ambos os ilcitos tentam proteger valores dignos de proteco legal.O ilcito penal empresta, efectivamente, a proteco jurdico-penal, e o ilcito de meraordenao social empresta uma tutela administrativa.Para prevenir violaes a esses interesses que carecem de proteco legal, ambos osilcitos impem aos infractores consequncias jurdicas desfavorveis.Por outro lado, o crime tem de ser um facto tpico. Tambm a contra ordenao tem deser tipificada na lei; conforme a definio do art. 1 CP.O crime tem de ser um facto ilcito, contrrio lei. Por fora do disposto no art. 1 DL433/82, tambm a contra-ordenao.O crime um facto censurvel e a contra-ordenao tambm.

    11. Diferenas entre ilcito penal e ilcito de mera ordenao social

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    Os seus fins:mbito de aplicao, enquanto que no mbito do ilcito penal se exige sempre ainterveno judicial, no se pode aplicar nenhuma sano jurdico-penal sem ainterveno dos tribunais.

    Quem aplica as coimas no ilcito da mera ordenao social a administrao; s emcaso de no conformao que poder haver recurso para os tribunais comuns[3].

    As sanes dos ilcitos so diferentes:- A sano caracterstica do ilcito penal a pena que assume duas modalidades: Pena de multa, de natureza essencialmente pecuniria, mas que, quando no paga,

    pode ser convertida em pena de priso; Pena de priso, que consiste numa privao da liberdade humana.- A sano do ilcito de mera ordenao social a coima, que tem uma natureza

    pecuniria e que, quando no paga, no pode ser convertida em priso.

    No ilcito penal possvel a priso preventiva. No ilcito da mera ordenao social, no admissvel a priso preventiva; , contudo possvel a deteno por 24 horas paraidentificao do suspeito.

    No mbito do ilcito penal, por regra e por fora do art. 11 CP, vigora o princpio dapersonalidade, salvo disposio em contrrio, s as pessoas singulares so susceptveisde responsabilidade criminal. Diferentemente sucede no ilcito da mera ordenaosocial, em que as pessoas colectivas podem ser sancionadas (art. 7 DL 433/82). No himpedimento conceitual aplicao de coimas a pessoas colectivas, diferentemente doque sucede enquanto regra no mbito do Direito Penal.

    12. Direito Penal geral e Direito Penal especial

    A base da distino encontra-se no art. 8 CP.Quando se fala no artigo em Direito Penal militar e Direito Penal da marinha mercante,isso so fundamentalmente leis penais especficas, ou seja, leis que tm a ver com acategoria funcional de determinadas pessoas e que valem, portanto, dentro dedeterminados limites. Aplicam-se, como os nomes indicam, aos agentes que detmessas qualidades.Portanto, as disposies deste cdigo penal aplicam-se no s ao Direito Penal, como restante legislao especial.

    Significa, pois que o cdigo penal est dividido em duas partes:- Uma parte geral, que vai at o art. 130 CP, inclusive;- Uma parte especial, que vai do art. 131 CP, em diante.

    H leis de carcter pessoal[4] que saram posteriormente feitura e elaborao docdigo penal.Leis h que ainda no esto suficientemente maduras ou experimentadas, para passarema integrar imediatamente a parte especial do cdigo penal, e consequentemente no tmaquele carcter de estabilidade que devem ter as normas constantes de um cdigo.

    [1] Vulgarmente uma pena.

    [2] Mediante autorizao da Assembleia da Repblica.[3] E no tribunais administrativos.

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    [4] Direito Penal especial.

    TEORIA DO BEM JURDICO

    13. Noo

    Essncia do Direito Penal como objectivo de proteger bens jurdicos fundamentais.O Prof. Figueiredo Dias define bem jurdico como, expresso de um interesse de uma

    pessoa ou da comunidade, integridade do Estado, vo-se sentar na prpria pessoa ou nacomunidade.Trata-se do objecto do Direito Penal, objecto que em si mesmo socialmente relevantefundamental para a integridade do Estado.A noo material de crime era todo o comportamento humano que lesava ou ameaavade leso bens jurdicos fundamentais.A ideia de que o crime lesa bens fundamentais e no direitos remonta a Birnbaum (sc.XIX), que vem dizer que os crimes no lesam direitos, mas sim bens, isto , entidades

    para alm da prpria ordem jurdica.Os bens jurdicos no so realidades palpveis, concretas, so antes valores daexistncia social.

    No efectivamente o legislador que cria esses bens, pois eles j existem, preexistem,sendo certo obviamente que quando o legislador lhes confere tutela jurdica transformaesses bens em bens jurdicos.Estes bens so interesses da coexistncia social, so valores reputados fundamentais

    prpria existncia da sociedade organizada em termos de Estado. Os comportamentosque agridam lesem, ponham em causa, faam perigar esses interesses, devem serobjecto de uma reaco.O Direito Penal no deve intervir para tutelar todo e qualquer bem jurdico; o DireitoPenal deve intervir apenas para tutelar as ofensas mais graves a esses bens jurdicos que,

    por outro lado, tm de ser bens jurdicos fundamentais, da carcter subsidirio efragmentrio do Direito Penal.O Direito Penal s deve intervir para proteger bens jurdicos fundamentais, ou seja,valores, interesses sociais e individuais juridicamente reconhecidos quer do prprio,quer da colectividade, em virtude do especial significado que assumem para a sociedadee das suas valoraes ticas, sociais e populares.O Direito Penal justifica a sua interveno no s devido natureza dos bens jurdicosem causa, que tm de ser bens jurdicos fundamentais, mas tambm atendendo intensidade da agresso que levada a cabo para com esses bens jurdicos

    fundamentais.14. Evoluo do conceito de bem jurdico

    Existem vrias perspectivas

    a) Concepo liberal ou individualLigada ao liberalismo e a Ferbach, constata-se que h crime quando se verifica umaleso de bens jurdicos que esto concretizados na esfera jurdica de um certo indivduo.Portanto, uma leso de valores ou interesses que correspondem a bens jurdicossubjectivos.

    b) Concepo metodolgica de bem jurdico

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    Procuram ver no bem jurdico um papel voltado para uma funo interpretativa.Fornecer frmulas para interpretar as normas. Instrumento de interpretao dos tiposlegais de crimes. O bem jurdico tem como papel fundamentar a interveno do DireitoPenal.

    c) Concepo socialIndependentemente destes valores e interesses estarem subjectivados, concretizados naesfera jurdica de um indivduo, podendo estar efectivamente imanentes colectividadesocial.

    No necessitam, de ser individualmente encabeados na esfera social de umdeterminado sujeito em concreto. Os bens jurdicos so vistos numa ptica social, como

    bens universais pertencentes colectividade.

    d) Concepo funcionalPodia-se ver nos bens jurdicos, funes que esses mesmos bens jurdicosdesempenhavam para o desenvolvimento da prpria sociedade, as funes sociais

    desempenhadas por esses bens.

    15. O bem jurdico hoje: concepo mista

    O Prof. Figueiredo Dias, diz que os bens jurdicos so uma combinao de valoresfundamentais, por referncia axiologia constitucional.So bens jurdicos fundamentais por referncia Constituio, aqueles que visam o bomfuncionamento da sociedade e das suas valoraes ticas, sociais e culturais. Portanto,uma concepo mista em que se d nfase a uma combinao individualista, social oumesmo funcional do bem jurdico.Os bens jurdicos tutelados pelas diferentes incriminaes tm de estar de acordo com aConstituio, significando isto que: tem de estar em harmonia com o princpio darepresentatividade poltica e com o princpio da reserva de lei formal, a Assembleia daRepblica que deve efectivamente escolher quais esses valores, quais esses interessesque carecem de tutela jurdico-penal.

    16. Princpios fundamentais[5]

    De harmonia com os princpios imanentes a um Estado de direito democrtico deve-sedizer que s deve haver criminalizao de comportamentos humanos quando a tutelaconferida por outros ramos de direitos no seja suficiente para acautelar esses bens

    jurdicos, o princpio da subsidiariedade do Direito Penal.As restries limitam-se ao necessrio, ou seja, se outros ramos do direito atravs dassuas sanes, forem suficientes para acautelar a manuteno destes bens jurdicos, entono se impe a tutela do Direito Penal, porque ela deixa de ser necessria, o princpioda necessidade.Conjugam-se os princpios da necessidade e da subsidiariedade, o Direito Penal s deveintervir quando estejam em causa bens jurdicos fundamentais e que outros ramos dedireito no sejam suficientes para salvaguardar os bens jurdicos. A ideia de necessidade

    a pena deve ser necessria.Por outro lado, de harmonia com o princpio ou com o carcter fragmentrio do DireitoPenal, no so todos os bens jurdicos que o Direito Penal deve tutelar, mas to s os

    que o art. 18 CRP indica: os bens fundamentais.

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    O princpio da proporcionalidade, a intensidade com que se devem restringir direitosfundamentais do cidado varivel consoante a necessidade maior ou menor que h detutelar outros bens jurdicos fundamentais, por referncia gravidade dos bens jurdicosem questo.A teoria do bem jurdico, legtima a interveno do Direito Penal nos quadros

    valorativos do art. 18 CRP, tendo efectivamente um poder muito forte de criticaargumentativa e permite ao legislador, ou ao jurista verificar:

    Por um lado, se esses bens jurdicos que o legislador resolve tutelar quando criaincriminaes so:- Bem jurdico fundamental, se o no forem, a tutela do Direito Penal inconstitucional;- Permite verificar se a intensidade da agresso justifica a tutela do Direito Penal, isto ,se efectivamente necessria a tutela do Direito Penal ou se outra tutela ser suficiente.

    Por outro lado, permite dizer se o legislador ordinrio respeitou a axiologiaconstitucional nas diferentes incriminaes e nas inseres sistemticas dos diferentes

    tipos legais de crime; permite verificar tambm se o princpio da proporcionalidade doDireito Penal, assente em que, as diferentes gravidades de ilcito devem corresponderdiferentes penas, se isso ou no observado.

    17. Relao ordem jurdica penal e ordem jurdica constitucional

    O Prof. Figueiredo Dias, diz que existe uma axiologia constitucional, os bens jurdicos,so exclusivamente definidos na Constituio. Mtua referncia, s no ordemconstitucional, possvel identificar os bens jurdicos que a ordem jurdica vai defender.A restrio do Direito Penal a restrio de uma tutela de bens jurdicoconstitucionalmente consagrados. Compromisso de ter de proteger os bens jurdicosconstitucionalmente consagrados.- Direito Penal de justia ou clssico ou primrio: corresponde ao ncleo de bens

    jurdicos consagrados constitucionalmente, estando consagrados no Cdigo Penal;- Direito Penal secundrio: todos os bens jurdicos que estavam na Constituio, masno nos direitos, liberdade e garantias, no devem ser tratados no Cdigo Penal, mas emlegislao avulsa.

    No h uma exclusiva vinculao da ordem penal constitucional. A ordemconstitucional identifica valores fundamentais, na ordem social, encontram-se valoresque podem fazer intervir o Direito Penal, valores que podero no estar referidosconstitucionalmente.

    No h correspondncia total da ordem penal na ordem constitucional[5] Art. 18/2 CRP.

    TEORIA DOS FINS DAS PENAS

    18. Introduo

    O Direito Penal pode encontrar legitimao a partir de duas ideias fundamentais:- Da teoria do bem jurdico;- Da teoria dos fins das penas.

    No mbito dos fins das penas, pode-se distinguir, fins de duas naturezas: fins mediatos efins imediatos:

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    - Como fins mediatos das penas tem-se os fins do Estado;- Como fins imediatos das penas tem-se a ideia de retribuio e de preveno.

    O Direito Penal um ramo de direito produzido pelo Estado e como tal, deve em ltimaanlise prosseguir fins imanentes a esse mesmo Estado.

    A finalidade das penas[6] pode ser vista no numa ptica mediata de finalidades aprosseguir pelo prprio Estado, mas numa ptica formal e abstracta.

    Trs finalidades podem ser prosseguidas com os fins imediatos das penas:1) I2) Ideia de preveno:a) Geral;

    b) Especial.

    As penas servem para retribuir o mal a quem praticou o mal, esta a teoria retributivadas penas: tem uma finalidade retributiva.

    Ou ento poder-se- dizer que as penas servem para fazer com que as pessoas em geralno cometam crimes, uma finalidade de preveno geral.Ou dizer que as penas servem para que a pessoa que condenada a uma pena e que atenha de cumprir no volte ela prpria a cometer crimes, tem-se aqui uma finalidade de

    preveno especial.

    A estas ideias subjacentes aos fins das penas, h que distinguir entre:- Teorias absolutas das penas;- Teorias relativas das penas.

    19. Teorias absolutas teoria da retribuio ou retributiva

    Apresenta a ideia de que as penas so um mal que se impe a algum, por esse algumter praticado um crime. Significa a imposio de um mal a quem praticou um mal, umaideia de castigo. Escolhe-se uma pena que corresponde a determinado facto, deve tercorrespondncia com a proporcionalidade na responsabilidade do agente. uma teoria inadequada para fundamentar a actuao do Direito Penal, embora estetenha um fim de retribuio, no pode ter a teoria da retribuio como fim em simesmo.

    20. Teorias relativas

    a) Teoria da preveno[7]:Numa ptica de preveno geral, pode-se dizer que as penas pretendem evitar que aspessoas em geral cometam crimes.Numa ptica da preveno especial, pode-se verificar que o direito penal, ao submeterum indivduo a uma sano por um crime que ele cometeu, pretende evitar que esseindivduo volte a cometer crimes. F-lo por duas vias:1) Ou porque esse indivduo segregado, isto , enquanto est a cumprir pena tem aimpossibilidade de reincidir;2) Ou ento, j no assente na ideia de segregao, mas numa ideia de regenerao, derecuperao ou de ressociabilizao, atravs de um tratamento que lhe ser submetido

    no mbito do cumprimento da pena.

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    O Direito Penal chamado a retribuir um crime, mas concebido com uma ideia deprevenir (teoria da preveno geral). O objectivo da pena essencialmente o objectivode exercer uma influncia na comunidade geral ameaar se cometer um crime, pois aocometer fica submetido a uma determinada pena prevenir a prtica de crimes.Ferbach, cria a teoria psicolgica da coaco, as infraces que as pessoas cometem

    tm, um impulso psicolgico, a funo da pena combater esse impulso de cometercrimes.

    Intimida-se as pessoas, com esta coaco para que os cidados em geral no cometamcrimes. Esta preveno geral divide-se em:- Preveno geral positiva, revelar comunidade o que acontece se praticar um crime;- Preveno geral negativa revelar a intimidao.

    Aparece a teoria da preveno especial, tem tambm a ideia de preveno, mas apreveno j no a comunidade em geral, mas sim a preveno do indivduo, ou seja,que o agente no volte a cometer um crime. Pretende evitar a reincidncia.

    Os principais defensores da teoria da preveno especial asseguram-na de trsformas[8]:1) Salvaguardar a comunidade do delinquente;2) Intimidar o autor [9]com a pena;3) Evitar a reincidncia[10].

    a teoria que mais se ope retributiva. O Direito Penal cada vez mais dirigido pessoa do criminoso, criando condies para o sociabilizar. alvo de crticas.Tal como a preveno geral, no nos fornece um critrio de quanto e a durao das

    penas. Os sistemas (teorias) desenvolvidos por si s so falveis, comeando a sedesenvolver teorias mistas.

    21. Teoria dialctica dos fins das penas

    Klaus Roxin desenvolve esta teoria mista, dizendo que cada uma das teorias per si, deimportncia solada so insuficientes para justificar os fins das penas. Engloba trs fases:1) Fase da ameaa penal: a formulao de um preceito legal, abstractamente definido nalei, em que existe a tipificao do comportamento como criminoso e osestabelecimentos da sano correspondente; os fins das penas seriam

    predominantemente de natureza, de preveno geral;

    2) Fase da condenao: fase em que o indivduo que cometeu um crime vai ser julgadoe em que o juiz lhe comunica a pena aplicvel, momento da retribuio;3) Fase da execuo da pena: em que a finalidade da pena estaria aqui numa ptica de

    preveno especial, de recuperao ou ressociabilizao do delinquente.

    22. Outras teorias

    a) Teorias unificadoras retributivasViam no Direito Penal o fim retributivo (fim essencial), mas partindo das insuficinciasda retribuio iam apontar ao Direito Penal a finalidade de preveno.

    b) Teorias unificadoras preventivas

    Dois objectivos:- Aproveitar o que tm de positivo a preveno especial e geral;

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    - Criar o que falta nelas, a preveno.

    Caractersticas:- Os fins das penas so essencialmente e exclusivamente preventivos;- Renncia de toda a ideia de retribuio;

    - Princpio da culpabilidade para a limitao da pena vai-se ter em conta a culpa doagente[11]. Apenas no pode ultrapassar a medida de culpa. Ao grau de culpa vai-seencontrar a medida da pena[12].

    O Cdigo Penal assume princpios de preveno especial e um misto de preveno geral teorias unificadoras preventivas.

    Sistema exclusivamente preventivo em que se procura fazer uma coexistncia dosprincpios de preveno especial e geral.Funo da tutela necessria dos bens jurdicos objectivos de ressociabilizao doagente encontrando o limite da pena, a culpa.

    [6] Pena, sano caracterstica do Direito Penal determinadas pela lei.[7] Geral ou especial.[8] Quando se aplica uma pena a um indivduo.[9] Aquele que praticou o facto.[10] A pena serve para corrigir o delinquente.[11] Limita a interveno penal.[12] Vai limitar a medida da pena.

    TEORIA DA LEI PENAL

    23. Sntese histrica

    A primeira manifestao de direito organizado na pennsula ibrica perodo visigtico relativo ao Direito Penal foi o Cdigo Visigtico, que tentava restringir o poder doimperador, e o mximo de obedincia lei, referncia a incriminaes de carcterdoloso.Influncia rabe, perodo da reconquista, no h uma lei concreta.

    No sc. XII e XIII, formas de organizao do Estado perodo afonsino. Concentra-senos reis os poderes, tendo o mesmo monoplio do poder de punir. H tentativas deorganizar o poder centralizao do poder real, limitar as questes de justia privada.

    Atribuir exclusividade de represso pblica. As penas eram marcadas por grandecrueldade. Nos livros das ordenaes h uma linha idntica na matria de punio, estasordenaes mantiveram-se at ao sc. XIX (1852).

    Caractersticas das ordenaes:- Casusmo: direito casusta evolui na aplicao concreta de casos a caso;- Arbitrariedade: o juiz tinha uma longa margem de discricionariedade de fazerfuncionar as penas daquele que estava perante si, as penas eram transmissveis;- Desigualdade: as penas eram aplicadas em conformidade com a posio social doacusado.

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    Este perodo dura at ao constitucionalismo liberal[13]. H uma tentativa de criao deum Cdigo Penal em 1779, inspirado pelos movimentos europeus de DireitoPenal[14].

    No sc. XIX 1822 com a constituio liberal vem reorganizar o Estado portugus corte com o regime das ordenaes contendo princpios de Direito Penal.

    - Princpio da humanizao das penas passou a ser proibido certas penas cruis;- Combater a desigualdade das penas;- Necessidade das penas;- Princpio da proporcionalidade das penas;- Acabar com a transmissibilidade da responsabilidade criminal.

    Em 1852 feito o primeiro Cdigo Penal Portugus, transpe para o Direito Penal osprincpios penas consagrados.Em 1886 feito um novo Cdigo Penal, no mais do que o Cdigo Penal de 1852 comalgumas alteraes.Em 1954 reformado, autoria de Cavaleiro Ferreira.

    O Cdigo Penal de 1982 consiste nos projectos e ante-projectos do Prof. EduardoCorreia:- De 1963, no que parte geral diz respeito;- De 1966, no que parte especial diz respeito.

    Sofre alteraes em 1984 e uma profunda alterao de 195, dirigida por FigueiredoDias, alterao parte especial.

    [13] Carta constitucional de 1822.[14] Projecto de Melo Freir procura a humanidade das penas.

    PRINCPIO DA LEGALIDADE

    24. Fundamentos

    O Direito Penal funda-se na Constituio, as normas penas ordinrias so autorizadas,so delegadas por outras normas, essas de natureza constitucional.

    Na Constituio encontram-se vrios conjuntos de normas que conexionamdirectamente com o Direito Penal.Em primeiro lugar encontram-se um grupo de normas que probem certas penas e certas

    medidas de segurana[15]. Neste sentido pode-se ver aqui que este conjunto de normasconstitucionais que probem certas penas ou certas medidas de segurana filiam-se numprincpio de poltica penal, que o princpio da humanidade das penas.Mas na Constituio encontram-se tambm normas que probem a transmissibilidadedas penas; o art. 30/3 CRP, consagra assim, o princpio da intransmissibilidade das

    penas e acolhe o carcter pessoal da responsabilidade penal (art. 11 CP).

    A Constituio contm tambm um conjunto de normas que delimitam a aplicao notempo das leis penais e fixam o mbito da sua interpretao (art. 29 CRP):- Art. 29/1, probe-se a retroactividade das leis penais incriminadoras;- Art. 29/3, probe a integrao de lacunas em Direito Penal por analogia;

    - Art. 29/4, impe obrigatoriamente a retroactividade das leis penais mais favorveis aoagente;

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    - Art. 29/5, consagra-se o princpio ne bis in idem, ou seja, o princpio de queningum pode ser condenado mais do que uma vez pela prtica do mesmo facto.Tambm os princpios gerais de direito internacional so fonte de Direito Penal (art.29/2 CRP).O Direito Penal funda-se tambm no sentido de que o legislador ordinrio deve de

    alguma forma dar acolhimento e plasmar a axiologia ou a valorao constitucional.

    Diz-se que as valoraes, as opes axiolgicas constitucionais devem ser respeitadaspelas normas penais, porque a Constituio que contem os valores que o Direito Penaldeve proteger (art. 18 CRP):- Princpio da necessidade da pena: da mxima restrio da pena e das medidas desegurana;- Princpio da interveno mnima do Direito Penal, ou da subsidiariedade do DireitoPenal;

    A lei, s pode intervir para restringir ou limitar direitos, liberdades e garantias

    fundamentais quando isso se revele absolutamente imprescindvel para acautelar outrosdireitos to fundamentais.- Princpio da jurisdicionalidade da aplicao do Direito Penal ou princpio da mediao

    judicial (arts. 27/2, 33/4, 30/2 CRP):

    As sanes de Direito Penal e a responsabilidade criminal de uma pessoa s podem serdecididas pelos tribunais, que so rgos de soberania, independentes, rgos que

    julgam com imparcialidade.Outro princpio fundamental que norteia todo o Direito Penal o princpio dalegalidade, na sua essncia visa a submisso dos poderes estabelecidos lei, traduz-senuma limitao de poderes estabelecidos pela prpria lei.

    25. Decorrncia do princpio da legalidade

    Princpio nullum crimen, nulla poena sine lege, ou seja, princpio de que no h crimenem pena sem lei, extrai-se o seguinte:- No pode haver crime sem lei;- A lei que define crime tem de ser uma lei precisa nullum crimen nula poena sinelege certa;- Probe-se a retroactividade da lei pena nullum crimen nulla poena sine lege previa;- Probe-se a interpretao extensiva das normas penais incriminadoras nullum crime

    nulla poena sine lege strica;- Probe-se a integrao de lacunas por analogia e impe-se a retroactividade das leispenais mais favorveis.

    Por outro lado, o princpio da legalidade impe particularidades no mbito dacompetncia para a criao de normas penais incriminadoras e normas penaisfavorveis.O princpio da legalidade impe a exigncia da interveno judicial ou da imediao

    judicial na aplicao ou na apreciao da responsabilidade criminal do agente. Oprincpio da legalidade impe ainda a proibio de uma dupla condenao pelo mesmofacto.

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    Uma lei penal no deve conter to s a descrio de um comportamento consideradocrime; deve conter, em conexo com essa descrio, a correspectiva sano jurdico-

    penal.O princpio da legalidade tem um fundamento poltico, um fundamento sado daRevoluo Francesa, do Iluminismo, e que assenta na ideia de que existe uma razo

    comum a todos os homens que encontram expresso comum na lei e evitam o arbtrio.Neste sentido, o princpio da legalidade tem como fundamento a garantia dos direitosindividuais.O princpio da legalidade, mesmo no domnio do Direito Penal tem uma justificao eum fundamento de constituir uma garantia de direitos individuais do cidado.Enquanto submisso do poder de punir o Estado lei, o princpio da legalidade tem essefundamento: garantir os direitos individuais do cidado.

    26. Decorrncias do princpio da legalidade enquanto garantia dos direitosindividuais do cidado

    a) Misso de fazer leis penaisUma delas afere-se pelas pessoas que tm a misso de criar crimes e estabelecer as coDo princpio da legalidade decorre a ideia de que no h crime nem pena sem lei(escrita), a definio de um comportamento como crime e a correspondente sano quese lhe aplica tem de constar de uma lei escrita. Tem competncia para criar normasincriminadoras[16], a Assembleia da Repblica (art. 165 CRP).

    b) No h crime nem pena sem lei prvia outra concretizao do princpio da legalidade na garantia de direitos individuais, aexigncia de lei prvia, nullum crimen nulla poena sine lege prvia.Impe que as leis a aplicar sejam a lei que vigora no momento da prtica do facto.Outro princpio que o da imposio de leis penais retroactivas quando as leis penais

    posteriores forem favorveis ao arguido, ao agente.

    c) Exigncia de lei expressaPode ser analisada a partir de duas outras decorrncias:1) O princpio de que no h crime nem pena sem lei certa nullum crimen nulla

    poena sine lege certa;2) Decorrncia de que no existe crime nem pena sem lei escrita nullum crimen nulla

    poena sine lege scripta.

    d) Exigncia de interveno judicial, nullum crimen nulla poena sine juditio.Neste sentido, as sanes jurdico-penais sejam elas penas ou medidas penais, tm deser sempre aplicadas por um rgo de soberania independente, com a finalidade deaplicar a justia, que entre ns so os tribunais.

    e) Proibio de dupla condenao pelo mesmo factoConsagra-se o princpio ne bis in idem, isto , o princpio de que ningum pode ser

    julgado mais do que uma vez pela prtica do mesmo facto.

    Existem categorias analticas e sistemticas da teoria do facto punvel: so as categoriasda tipicidade, da ilicitude e da culpabilidade. Muito genericamente dir-se-:

    1) O crime um facto humano;

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    2) Tem de ser tpico, ou seja, tem de estar descrito numa lei, tem de corresponder a umadescrio legal;3) Este facto tem ainda de ser simultaneamente ilcito.

    27. Fontes de Direito Penal

    a) A lei (escrita)Aqui est a tal decorrncia do princpio da legalidade nullo crimen nulla poena sinelege scripta, no h crime nem pena sem lei escrita (art. 165 CRP).

    b) CostumeComo fonte de incriminao no admissvel em Direito Penal, de contrrio violaria odisposto no art. 1 CP, e arts. 29 e 165/1-c CRP, nomeadamente estaria a violar o

    princpio da representatividade poltica e da reserva da lei formal.No entanto o costume tem valia quando visa, no criar ou agravar a responsabilidadepenal do agente, mas quando a sua interveno resulte benfica para o agente: ou seja,

    quando o costume se venha traduzir no mbito de uma norma favorvel, isto , quandoo costume de alguma forma venha atenuar ou mesmo excluir a responsabilidadecriminal do agente.

    c) JurisprudnciaNo fonte imediata de direito.Reconduz-se aplicao da lei ao caso concreto.H uma grande tendncia para que os tribunais se orientem para decises anteriores.

    d) DoutrinaNo fonte imediata de direito, mas sim fonte mediata. Corresponde ao conjunto dasopinies dos eminentes penalistas.

    e) Fontes de direito internacional tratadoSo fonte de Direito Penal, tal como a lei, porque depois de todo o processo deassinatura, aprovao, ratificao, eles entram na ordem jurdica nacional como leiescrita.28. Interpretao da lei penal

    Tem-se de dividir as normas penais em dois grupos: normas incriminadoras e normas

    favorveis.Deve entender-se por normas incriminadoras aquelas que criam ou agravam aresponsabilidade jurdico-penal do agente. So aquelas normas que de alguma formacontm a criao de crimes, ou que contm agravamentos dos pressupostos de

    punibilidade ou de punio.Normas favorveis, so aquelas normas que visam diminuir a responsabilidade jurdico-penal do agente, ou atenu-la, tornando mais suaves os pressupostos da punibilidade ouda punio.

    a) Normas penais incriminadorasProbe-se a interpretao extensiva das normas penais incriminadoras, de outra forma

    estar-se-ia a violar o princpio da legalidade na sua decorrncia nullum crimen nullapoena sine lege stricta, ou seja, de que as normas penais devem ser estritamente

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    aplicadas; admissvel a interpretao restritiva; probe-se a aplicao analgica nombito das normas penais incriminadoras, quer por analogia legis, quer por analogiaiuris.

    b) Normas penais favorveis

    Probe-se a interpretao restritiva de normas penais favorveis; admite-se ainterpretao extensiva; relativamente ao problema da analogia:1) Alguns autores Teresa Beleza, etc., admitem a analogia, nas normas penaisfavorveis;2) Outros autores Cavaleiro Ferreira a analogia em Direito Penal, quer de normasfavorveis, quer de normas incriminadoras, est vedada;3) Outros ainda Frederico da Costa Pinto entende que no mbito das normasfavorveis a analogia est de todo excluda. Em certos casos pode-se admitir ainterpretao extensiva de normas favorveis, mas no possvel o recurso analogiano mbito de normas favorveis.

    29. Normas incriminadoras

    A interpretao extensiva em normas incriminadoras no possvel. S possvel, nombito de normas incriminadoras uma interpretao declarativa lata. Tudo aquilo que aexceda e que vise harmonizar a letra da lei sua razo de ser, sua ratio, seultrapassar este sentido literal mximo possvel j se est a fazer interpretaoextensiva. Esta no deve ser admitida em Direito Penal, porque se entende que por forado princpio da legalidade, na sua vertente garantia, se exige que a lei penal seja uma lei

    penal expressa. Assim a norma deve dizer expressamente quais so as condutas, activasou omissivas que, a serem ou no adoptadas, constituem objecto de incriminao emsede de Direito Penal. No entanto admite-se a interpretao restritiva.Afirma-se rotundamente que no possvel integrar lacunas por analogia. Isto , peranteum caso omisso que o legislador penal ano tipificou, no classificou como crime, o juizno pode, ao contrrio de que acontece no domnio do direito civil regular esse casoomisso, nem recorrendo analogia legis, nem analogia iuris, nem to pouco criar anorma de harmonia com o esprito do sistema. O juiz pura e simplesmente julga,absolvendo.

    30. Normas favorveis

    As normas favorveis so aquelas que visam, ou que traduzem para o agente, uma

    posio mais benfica porque:- Ou excluem a ilicitude de um facto tpico e portanto justificam o facto e tornam-noilcito, tornando-o ilcito, excluem a responsabilidade penal, porque no hresponsabilidade penal por factos lcitos.- Ou tornam-se mais brandos, mais suaves, os pressupostos da punibilidade e da

    punio.

    Pode-se fazer interpretao extensiva, mas com limites.Mas j no se aceita que se faa interpretao restritiva de normas penais favorveis,isto porque, a ser possvel, diminuir-se-ia o campo de aplicabilidade destas normasfavorveis, o que significa aumentar o campo de punibilidade.

    Quanto analogia:

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    Existem vrias posies. Uma (Teresa Beleza) admite-se a integrao de lacunas nombito de normas penais favorveis.Outra posio a de que se admite por princpio a integrao de lacunas por analogia nombito de normas penais favorveis, desde que essa analogia no se venha a traduzirnum agravamento da posio de terceiros, por ele ter de suportar na sua esfera jurdica

    efeitos lesivos ou por ter auto-limitado o seu direito de defesa.

    31. Leis penais em branco

    uma norma que contem uma sano para um pressuposto ou um conjunto depressupostos de possibilidade ou de punio que no se encontram expressos na lei, massim noutras normas de categoria hierrquica igual ou inferior norma penal em

    branco[17].Levantam-se problemas quanto constitucionalidade de tais normas, precisamente

    porque no entender de determinada doutrina, estas normas seriam inconstitucionais porconsistirem numa violao de uma decorrncia do princpio da legalidade que a

    existncia de lei penal expressa, mais concretamente a existncia de lei penal certa nullum crimen nulla poena sine lege certa.A doutrina maioritria defende a constitucionalidade e validade das normas penais em

    branco, dentro de certos limites ou desde que sejam respeitados determinados limites.Desde que as normas penais em branco contenham os pressupostos mnimos de

    punibilidade e de punio, ou seja, que digam quem so os destinatrios e em queposio que eles se encontram e que contenham a respectiva sano; desde quecorrespondam a uma verdadeira necessidade que o legislador tem de tutelar bens

    jurdicos fundamentais atravs desta tcnica, sob pena de no o fazendo, a alternativaresultaria da sua desproteco, estas normas no sero inconstitucionais.

    32. Concurso legal ou aparente de normas

    Na determinao da responsabilidade criminal dos agentes que praticam factospenalmente relevantes podem suceder situaes de anulao ou concurso de infraces,sempre que o agente com a sua conduta cometa uma pluralidade de infraces. As quais

    podem traduzir o preenchimento de vrios tipos de crimes, ou do mesmo tipo mais doque uma vez.A teoria do concurso permite distinguir os casos nos quais as normas em concursorequerem uma aplicao conjunta, das situaes em que o contedo da conduta absorvido por uma nica das normas.

    - Concurso efectivo ou concurso de crimes: constitui a situao em que o agente cometeefectivamente vrios crimes e a sua responsabilidade contempla todas essas infracespraticadas;- Concurso aparente ou concurso de normas: uma vez que a conduta do agente sformalmente preenche vrios tipos de crimes, na concretizao da sua responsabilidadea aplicao de um dos crimes afasta a aplicao de outro ou outras de que o agentetenha tambm preenchido os elementos tpicos.Em rigor no se pode falar em verdadeiro concurso de crimes, mas to s em concursode normas (concurso legal), o qual se traduz num problema de determinao da normaaplicvel[18].O tema do concurso de infraces deve ser integrado no mbito da teoria da infraco,

    constituindo uma forma de crime.

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    O que se depreende da prtica judiciria, em consonncia com a maioria da doutrina que a resoluo concreta do concurso de normas opera no momento final da teoria dainfraco. Sendo sempre um dos ltimos passos na resoluo da responsabilidade dosintervenientes no crime.A relao de concurso aparente consagra-se por conexes de subordinao e hierarquia,

    podendo identificar-se essencialmente trs tipos de relaes:

    1) Relao de especialidadeUma norma encontra-se numa relao de especialidade em relao a outra quandoacrescenta mais um tipo incriminador, no a contradizendo contudo.

    Neste sentido, v-se que por fora de uma relao de especialidade em que as normas sepodem encontrar, tanto pode subsistir a norma que contenha a moldura penal maiselevada, como a norma que contenha a moldura penal mais baixa.

    2) Relao de subsidiariedadeNos casos em que a norma v a sua aplicabilidade condicionada pela no aplicabilidade

    de outra norma, s se aplicando a norma subsidiria quando a outra no se aplique. Anorma prevalecente condiciona de certo modo o funcionamento daquela que lhe subsidiria. Distinguem-se dois tipos:a) Subsidiariedade expressa: a prpria lei que afirma expressamente que uma normas se aplica se aquela outra no se puder aplicar;

    b) Subsidiariedade implcita ou material: resulta quando em face de um raciocnioimperativo, se chega mesma concluso, ou seja, quando por fora de umainterpretao verificar-se que a relao que existe entre as normas no pode deixar deser uma relao de subsidiariedade.

    Existem tendencialmente ou em princpio quatro grandes situaes em que as normas seencontram numa relao de subsidiariedade implcita ou material:1 Diz-se que as incriminaes de perigo ou os crimes de perigo se encontram numarelao de subsidiariedade implcita ou material em relao aos crimes de leso.2 Casos em que subsiste uma imputao a ttulo negligente e doloso, sendo certo que aresponsabilidade por facto negligente subsidiria imputao por facto doloso;3 Diferentes formas de participao ou autoria;4 Entre as condutas de omisso e por aco.

    3) Relao de consunoQuando um certo tipo legal de crime faa parte no por uma definio do cdigo, mas

    por uma forma caracterstica, a realizao de outro tipo de crime, ou seja, quando temuma discrio tpica suficientemente ampla que abranja os elementos da discrio tpicada outra norma.A finalidade das normas concentra-se sempre na tutela de bens jurdicos, sendo possvelidentificar em cada tipo legal a ratio da conduta descrita.A relao de consuno acaba por colocar em conexo os valores protegidos pelasnormas criminais. No deve confundir-se com a relao de especialidade, pois aocontrrio do que se verifica naquela relao de concurso de normas, a norma

    prevalecente no tem necessariamente de conter na sua previso todos os elementostpicos da norma que derroga.

    [15] Arts. 24/2, 25/2, 30/1 e 2, 33/1 e 3, 30/4 CRP.

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    [16] Normas incriminadoras: so aquelas que criam crimes ou que agravam ospressupostos de punibilidade ou de punio.[17] Exs arts. 278, 213/1-b, 150/1 CP.[18] O concurso estabelecido entre as normas revela-se meramente aparente, sendo deexcluir a aplicao cumulativa, pois no se aplicam todos os preceitos normativos.

    VIGNCIA TEMPORAL DA LEI

    33. Introduo

    Uma das decorrncias do princpio da legalidade que no h crime sem uma leianterior ao momento da prtica do facto que declare esse comportamento como crime eestabelea para ele a correspondente sano[19].Em Direito Penal vigora portanto a lei do momento da prtica do facto. Mas a aplicaoexterna ou exacerbada deste princpio poderia levar a situaes injustas. Donde o

    princpio geral em matria penal de que as leis penais mais favorveis aplicam-se

    sempre retroactivamente.

    34. Aplicao da lei

    Qual a lei que no momento do julgamento o juiz devia aplicar ao arguido? a lei domomento da prtica do facto, que a mas favorvel, do que a lei posterior, ainda queessa lei tenha revogado aquela. Existe ultra-actividade da lei penal, porque se aplicasempre a lei penal de contedo mais favorvel ao arguido.O momento da prtica do facto sempre aquele em que, no caso de se tratar de umcrime comissivo ou por aco, o agente actuou, ou, no caso de se tratar de um crimeomissivo, no momento em que o agente deveria ter actuado.

    Duas situaesUma nova lei vem descriminalizar uma determinada conduta. Como deve reagir aordem jurdica? Se a conduta vier a ser descriminalizada no deve ser condenado poressa conduta, mesmo que o agente tenha j sido condenado e se encontre detido (art.2/2 CP). Cessa os efeitos penais princpio da aplicao da lei mais favorvel.

    Regime que se revela concretamente mais favorvel, deve-se aplicar este regime aoagente.

    No entanto a lei no art. 2/4 CP coloca um limite para o efeito retroactivo salvo se

    este j tiver sido condenado por sentena transitada em julgado. diferente dos efeitosda descriminalizao.H autores que defendem a inconstitucionalidade do art. 2/4 CP, outros defendem a suaconstitucionalidade.

    35. Constitucionalidade do art. 2/4 CP

    A Constituio de 1976 foi revista em 1982, o Cdigo Penal de 1982 e entrou emvigor em 1983; donde, o legislador penal deveria ter conhecimento das disposiesconstitucionais e se legislou ordinariamente consagrando esta ressalva, porque aressalva no incompatvel com o disposto na Constituio, por ser legislao

    posterior.

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    No incompatvel o art. 2/4 CP com o art. 29/4 CRP, na medida em que aConstituio manda aplicar retroactivamente a lei de contedo mais favorvel aoarguido, e arguido tem um sentido tcnico-jurdico rigoroso: uma coisa arguido, outra condenado e outra ainda ru.O art. 2/4 CP, diz que a lei penal de contedo mais favorvel s no se aplica ao

    condenado, e isto porque, se j h trnsito em julgado da sentena condenatria, porque esse indivduo j foi condenado, no se estando a falar em arguido mas sim emcondenado.A entender-se o contrrio, ou seja, a entender-se a aplicabilidade da lei mais favorvel,

    pr-se-ia em causa o princpio ne bis in idem, e tambm se poria em causa aintangibilidade no caso julgado.Se realmente se pudesse aplicar retroactivamente esta lei mais favorvel, ento estava-sea julgar outra vez o mesmo indivduo pela prtica do mesmo facto. E o princpio in bisin idem, de que ningum deve ser julgado/condenado duas vezes pelo mesmo facto(art. 29/5 CRP) era posto em causa.

    36. Inconstitucionalidade do art. 2/4 CP

    O Direito Penal tem carcter subsidirio, o princpio da subsidiariedade do DireitoPenal. Logo o Direito Penal s deve intervir quando se torne necessrio a suainterveno.

    No faz sentido que o Estado, equacionando uma valorao eminente a um determinadocrime, se abstenha a partir de determinado momento de impor uma determinada

    punio; como tambm no faz sentido continuar a aplicar uma punio que o Estadorecusou num determinado momento.Esta ressalva inconstitucional porque viola o princpio da igualdade, e tambm existeo princpio da igualdade dos cidados na administrao da justia.Um outro argumento para a inconstitucionalidade da ressalva do art. 2/4 CP,substancialmente no existem diferenas a que se aplique retroactivamente as normasque operam a descriminalizao, das normas que no operam uma descriminalizaomas principalmente uma despenalizao, porque nos dois casos se altera o regime penal.O que est em causa uma diferente valorao do legislador quanto aos factosconsiderados crimes.

    37. Leis temporrias e leis de emergncia

    As leis temporrias so as leis que marcam ab initio, partida, o seu prazo de

    vigncia; so as normas que se destinam a vigorar durante um determinado perodo detempo pr-fixado. So leis temporrias que caducam com o terminus da vigncia quepr-fixaram.As leis de emergncia so as leis que face a determinado circunstancialismo anormalvm penalizar, criminalizar determinadas condutas que at a no eram consideradascrime, ou vm efectivamente agravar a responsabilidade penal por determinado factoque at a j era crime, mas em que esse agravamento se deve to s a situaes oucircunstncias anormais que reclamam a situao de emergncia.Ressalva-se no art. 2/3 CP, que continua a ser punido o facto criminoso praticadodurante o perodo de vigncia de uma lei de emergncia.Significa que, no obstante no momento do julgamento a lei j no estar em vigor por j

    ter caducado ou j ter sido revogada, deve continuar a ser punido pelo facto quepraticou durante esse perodo em que a lei estava efectivamente em vigor.

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    Em bom rigor, no mbito das leis temporrias no h uma verdadeira sucesso de leisno tempo, porque:- A lei temporria em sentido estrito, no necessita de nenhuma outra lei para que se

    possa afirmar uma sucesso de leis penais no tempo; a lei s uma s faz sentido falar

    em sucesso de leis penais no tempo e em retroactividade ou irretroactividade quandoesto em causa mais do que uma lei, pelo menos duas leis. Aqui a lei s uma.- No h uma lei diferente, no h uma sucesso de regimes, donde tambm no fazsentido falar em aplicao retroactiva porque a lei sempre a mesma.

    38. Aplicao da lei no espao

    No so s conexes geogrficas que o legislador utiliza para tornar aplicvel a lei penalportuguesa, para que seja competente para julgar factos penalmente relevantes.O legislador utiliza tambm a conexo dos valores ou dos interesses lesados ouameaados de leso com as actividades criminosas, o valor dos interesses postos em

    causa pela prtica do crime. Isto evidencia-se em sede de dois princpios:- Princpio da tutela ou da proteco dos interesses nacionais.- Princpio da universalidade ou de aplicao universal.Vindo estes princpios consagrados no art. 5 CP.

    39. Princpio da tutela ou da proteco dos interesses nacionais

    Quando se trate de crimes expressamente consagrados no art. 5/1 CP, so crimes que oEstado portugus entende ferirem a sensibilidade jurdica nacional, so crimes que

    pem em causa valores ou interesses fundamentais do Estado portugus.Os factos penalmente relevantes ocorridos em territrio nacional, a lei portuguesa competente para os julgar princpio da territorialidade.Este princpio da territorialidade depois complementado pelo princpio do pavilho ouda bandeira pelo qual independentemente do espao areo ou das guas, a lei penal

    portuguesa tambm se aplica a factos praticados no interior de navios com pavilhoportugus, ou a bordo de aeronaves registadas em Portugal.

    40. Princpio da universalidade ou da aplicao universal

    So de alguma forma crimes que todos os Estados tm interesse em punir. De um modogeral, independentemente da nacionalidade dos seus autores, so crimes que reclamam

    uma punio universal e da que as ordens jurdicas se reclamem competentes para fazeraplicar a sua lei penal a esses factos descritos no art. 5/1-b CP.Da alnea c) do art. 5/1 CP retira-se o princpio da nacionalidade, tambm dito

    princpio da personalidade activa ou passiva.O princpio da nacionalidade activa diz basicamente que a lei portuguesa se aplica afactos praticados no estrangeiro por portugueses. de harmonia com o princpio danacionalidade activo, que a lei penal portuguesa aplica-se a factos praticados noestrangeiro que sejam cometidos por cidados nacionais.O princpio da nacionalidade passiva diz que a lei penal portuguesa se aplica a factoscometidos no estrangeiro contra portugueses.

    Condies para o princpio da nacionalidade:1 Condio: os agentes sejam encontrados em Portugal (art. 5/1-b CP);

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    2 Condio: que os factos criminosos sejam tambm punveis pela legislao do lugarem que foram praticados, salvo quando nesse lugar no se exera poder punitivo;3 Que constituam crime que admite extradio e esta no possa ser concedida, no seadmite a extradio de cidados nacionais.

    Esta condio prevista na 3 condio, s funciona cumulativamente quando se trate deum caso de nacionalidade passiva, quando se trate de um crime praticado no estrangeiropor um estrangeiro contra um, portugus.

    41. Teoria da ubiquidade

    Visa abranger os delitos distncia.O art. 7 CP importante: se considerar que a conduta ou o resultado tpico tiveramlugar em Portugal, ento pode-se considerar que o facto ocorreu em territrio nacional;e a poder-se- aplicar a lei penal portuguesa por fora do preceituado no art. 4 CP eque consagra o princpio da territorialidade, uma vez precisamente que este princpio

    vem dizer que a lei penal portuguesa aplicvel a factos praticados no territrionacional.

    Uma vez em sede do art. 5 CP vai-se analisar caso a caso:- Se ser o princpio da proteco dos interesses nacionais, poder ser um dos crimeselencados no aliena a);- Se haver afloramento do princpio da universalidade (alnea b));- Se ser eventualmente o princpio da nacionalidade activa ou passiva previsto naalnea c); e aqui verificar se esto reunidas todas as condies previstas e se existem ouno restries aplicabilidade da lei portuguesa[20].

    42. Princpio da dupla incriminao e princpio da especialidade

    O princpio da dupla incriminao, significa que s admitida a extradio se o Estadoportugus considerar tambm crime o facto pelo qual se pede a extradio ou o factoque fundamenta a extradio.O princpio da especialidade significa que a extradio s pode ser concedida para ocrime que fundamenta o seu pedido, no podendo o extraditado ser julgado por umainfraco diferente e anterior que fundamenta o pedido de extradio.Por outro lado, tambm em princpio no se admite a extradio quando seja

    prioritariamente aplicvel a lei penal portuguesa.

    43. Princpio da administrao supletiva da justia penal (art. 5/1-e CP)

    Admite que o Estado portugus julgue um criminoso que tenha cometido um crime noseu pas de origem contra um cidado desse pas e fuja para Portugal. Pressupostos:- Que o agente se encontre em Portugal;- A extradio seja pedida;- Seja possvel a extradio mas no seja admitida.

    O art. 6 define as condies gerais de aplicao da lei penal portuguesa a factoscometidos por estrangeiros:

    - Princpio de que ningum pode ser responsabilizado por um facto mais do que umavez (art. 29 CRP);

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    - Art. 6/2 CRP, depois de ver que lei penal competente, tem-se que ter em ateno alei do lugar onde o facto foi cometido, e mais favorvel, mas que puna o facto.

    As condies no art. 6/2 CP no funciona quando est em causa o princpio daproteco dos interesses nacionais (art. 6/3 CP).

    [19] Nullum crimen nulla poena sine lege previa[20] O art. 6 CP s tem conexo com o art. 4 CP e com os princpios dauniversalidade/proteco de interesses nacionais e nacionalidade.

    TEORIA DO FACTO PUNVEL OU TEORIA DA INFRACO

    44. Introduo

    a teoria que tem por objecto o estudo do crime. O conjunto dos pressupostos de punibilidade e de punio que so comuns a todos os crimes, a todos os factostipificados na lei como crime.

    Os requisitos comuns que um facto deve ter para ser considerado criminoso e para quedele decorra uma responsabilidade jurdico-penal para o seu autor, para o agentedaquela infraco.Pode-se formalmente definir crime como um comportamento humano que consistenuma aco penalmente relevante, aco essa que tpica, ilcita, culposa e punvel.Esta teoria permite desde logo uma aplicao certa, segura e racional da lei penal.Passa-se dum casusmo, de verificar caso a caso o que crime para atravs da teoria dainfraco, ter-se uma vocao generalizadora de factos penalmente relevantes, de factoscriminosos.E atravs do estudo destas categorias analticas pode-se determinar a responsabilidade

    jurdico-penal duma pessoa, pode-se firm-la ou exclua, atravs duma anlise desubsuno progressiva.

    45. Aco penalmente relevante

    todo o comportamento humano dominado ou dominvel pela vontade.Atravs deste conceito, j se est a excluir a responsabilidade jurdico-penal decomportamentos que provm no de pessoas mas de animais.Ter-se- depois de verificar o seguinte: se est em presena de um comportamentohumano dominado pela vontade, tem-se de ver se esse comportamento humano

    preenche ou no um tipo legal de crime.

    Tem-se de ver se essa aco preenche a tipicidade de um dos tipos previstos na parteespecial do Cdigo Penal, ou ento em legislao penal lateral.Para isso preciso verificar se essa aco tpica, isto , necessrio verificar se esto

    preenchidos os elementos objectivos[21] e subjectivos[22] de um tipo legal.

    Como se verifica se a aco tpica?Tem-se efectivamente de analisar esta categoria que a tipicidade, tem-se de verificarse aquela actuao humana se subsume ao tipo normativo na previso dos seuselementos objectivos e subjectivos.Depois, tem-se de ver se o elemento objectivo do tipo est preenchido.

    O elemento subjectivo geral do tipo o dolo. Tem-se de se ver ento o que o dolo:consiste na conscincia e vontade de realizar os elementos objectivos de um tipo legal.

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    Estando preenchida a tipicidade, vai-se verificar que esta categoria analtica que composta por elementos subjectivos e objectivos, estando integralmente preenchidaindicia a ilicitude.

    46. Ilicitude

    A ilicitude num sentido formal, a contrariedade ordem jurdica na sua globalidade,de um facto ilcito um facto contrrio ordem jurdica, contrrio ao direito.Mas numa ptica material, o facto ilcito consiste numa danosidade social, numa ofensamaterial a bens jurdicos.Em princpio da lei penal s tipifica factos que so contrrios ao direito. Mas a ilicitudeindiciada pelo facto tpico ou pela tipicidade pode ser excluda.Pode estar excluda pela interveno de normas remissivas, que vem apagar o juzo deilicitude do facto tpico, so as designadas causas de justificao que, a estarem

    presentes, justificam o facto tpico, excluindo a ilicitude indiciada pela prpriatipicidade.Mas pode acontecer, que preenchido um tipo mediante uma aco penalmente relevante

    e a ilicitude indiciada pelo tipo, pode ser que no se verifique nenhuma causa dejustificao ou de excluso da ilicitude.Na maior parte dos casos em que as pessoas cometem crimes no esto a actuar aoabrigo de nenhuma causa de excluso da ilicitude.

    47. Culpa

    a categoria analtica do facto punvel.Sabendo-se que s se pode formular um juzo de censura de culpa sobre um imputvel,

    porque as penas s se aplicam a quem seja susceptvel de um juzo de censura de culpa;quelas pessoas a quem no for susceptvel formular um juzo de censura de culpaaplicam-se medidas de segurana, nomeadamente o caso dos inimputveis e dosmenores de 16 anos.Logo, para que o juzo de culpa possa ser formulado preciso que o agente tenhacapacidade de culpa. O agente no tem capacidade de culpa se tiver menos de 16 anos,ou se for portador de uma anomalia psquica ou de um estado patolgico equiparado.Mas para alm de ter capacidade de culpa, o agente tambm tem de ter conscincia dailicitude do facto que pratica; e para alm da capacidade de culpa e da conscincia dailicitude preciso, para se formular sobre o agente um juzo de censura de culpa, que oagente no tenha actuado em circunstncias to extraordinrias que o desculpem.

    48. PunibilidadePara alm de o facto ter consistido numa aco tpica, ilcita e culposa, ainda precisoque seja punvel.Ento chega-se concluso que por vezes existem determinados factos praticados noseio de aces penalmente relevantes, tpicas, ilcitas culposas, mas contudo os agentesno so punidos. E porque que no h punibilidade em sentido estrito?- Ou porque no se verificam condies objectivas de punibilidade;- Ou ento porque se trata de uma iseno material, no caso de desistncia;- Ou porque se trata de uma causa pessoal de iseno de pena.

    Porque que se fala numa subsuno progressiva?

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    Porque quando se analisa a responsabilidade jurdico-penal de algum, tem-se deanalisar detalhadamente todas estas categorias.Ainda que intuitivamente se possa dar automaticamente a resposta, tem-se de percorrerestas etapas porque, por hiptese, se chegar concluso que aquele comportamento nofoi dominado nem to pouco era dominvel pela vontade humana, imediatamente se

    nega a responsabilidade criminal do agente.Os tipos, a no ser quando a lei expressamente o diga, so sempre dolosos.

    O estudo analtico do crime, da teoria da infraco, vai permitir:- Por um lado, fazer uma aplicao certa, segura e uniforme da lei penal;- Por outro lado, vai ter uma vocao de subsuno progressiva.Mas se hoje, entende-se que o crime uma aco tpica, ilcita, culposa e punvel, estatripartio entre tipicidade, ilicitude e culpa uma conquista dogmtica da EscolaClssica. E Escola Clssica segue-se cronologicamente a Escola Neo-clssica, e a estasegue-se a Escola Finalista.

    Todas estas escolas teorizam o crime tripartindo-o, dizendo que era uma aco tpica,ilcita e culposa. Agora, o que cada uma destas escolas considerava como integrante decada uma destas categorias analticas que diverge.

    Escola Clssica:- Beling/Van Listz;- Aco naturalista (aco natural);- Tipicidade correspondncia meramente externa, sem considerao por quaisquer

    juzos de valor; s elementos objectivos e descritivos;- Ilicitude formal;- Culpa psicolgica (insero de todos os elementos subjectivos dolo e negligncia).- Criticas os factos penalmente relevantes com negligncia e os comportamentosomissos.

    Escola Neo-clssica:- Prof. Figueiredo Dias;- Aco negao de valores;- Tipicidade o tipo tem tambm elementos normativos e determinados crimes tmtambm na sua tipicidade elementos subjectivos;- Ilicitude material;a) Permite graduar-se o conceito de ilicitude;

    b) Permite a descoberta ou a formao de causas de justificao.- Culpa censurabilidade: pressupostos da culpa capacidade de culpa, conscincia dailicitude, exigibilidade;- Os conceitos de aco social e a posio de Figueiredo Dias, renncia a um particularconceito de aco e os conceitos de:a) Tipo indiciador;

    b) Tipo justificador ou tipo do dolo negativo;- A teoria dos elementos negativos do tipo.

    Escola finalista:- Wessel;

    - Aco final;- Tipicidade o dolo um elemento subjectivo geral dos tipos;

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    - Ilicitude conceito de ilicitude pessoal o desvalor da aco e do resultado;- Culpa normativa; elementos da culpa.

    Todos estes sistemas partem duma anlise quadripartida do crime, como aco tpica,ilcita e culposa.

    49. O sistema clssico

    Parte de uma concepo positiva, mecnica, mesmo naturalista, lgica da teoria dainfraco.O conceito de aco para os clssicos visto como um conceito naturalista da aco,como um movimento corpreo, um esforo muscular ou nervoso que produz umaalterao objectiva do mundo real.O tipo ou tipicidade a correspondncia externa de um comportamento consideradoaco uma disposio legal, discrio legal de um tipo legal de crime.Mas a tipicidade era vista do ponto de vista meramente externo ou objectivo sem

    nenhuma considerao de valor.A ilicitude uma categoria separada. Para os Clssicos a ilicitude vista numa pticameramente formal, ou seja, como contrariedade ordem jurdica na sua globalidade.Um facto ilcito um facto contrrio lei.

    No vem permitir uma graduao do conceito de ilicitude, porque se em sentido formal,a ilicitude significa contrariedade ordem jurdica, se o facto ilcito o facto quecontraria a ordem jurdica, donde contraria a lei, e o facto lcito o facto que nocontraria a lei, ento s se pode afirmar que um comportamento ou no ilcito, ouno contrrio ordem jurdica.Quanto culpa, para os Clssicos, era nessa categoria dogmtica do facto punvel que seincluam todos os elementos subjectivos. Portanto, a ilicitude e a tipicidade erammeramente objectivas. Tudo quanto fossem elementos subjectivos estaria na culpa.A culpa era vista de uma ptica psicolgica, porque a culpa corresponde ligao

    psicolgica entre uma pessoa e o seu comportamento, e essa ligao poderia ser umaligao dolosa ou uma ligao negligente.Logo, o dolo e a negligncia so meras formas de culpa.A tipicidade meramente objectiva. depois em sede de culpa que se ter de verificarque relao existe entre o agente e o seu facto, para se poder afirmar uma culpameramente psicolgica.

    50. Criticas ao sistema Clssico

    A primeira crtica diz respeito ao conceito de aco. Este conceito de aco comomovimento corpreo que produz a alterao objectiva no mundo exterior um conceitocriticvel por vrias razes.Mas talvez a crtica mais forte que se pode tecer ao conceito de aco dos clssicos

    precisamente a omisso porque a responsabilidade penal afirmada por factoscometidos por aco, mas tambm por omisses penalmente relevantes.O conceito de aco dos clssicos deixa de fora as omisses, ou os crimes omissivos.Da que os clssicos tenham reformulado um pouco esta noo, dizendo ento que aaco homicida a aco que se esperava que o agente tivesse.Em relao ilicitude, sendo uma ilicitude meramente formal, s nos permite afirmar se

    um comportamento, se um facto, se uma aco, ou no ilcita, no nos permitindograduar o conceito de ilicitude.

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    Em relao culpa.Sendo a culpa vista numa ptica meramente psicolgica, pergunta-se como que osClssicos explicam a culpa negligente, mormente os casos de negligncia inconsciente.

    Nos comportamentos dolosos, o agente conhece e quer empreendida com determinadoresultado tpico, ou assumir uma determinada conduta consubstanciada num tipo legal

    de crime.51. Sistema Neo-clssico

    desenvolvido na Alemanha a partir dos anos 20, procurando limar alguns defeitosou arestas do sistema clssico.

    A aco para os Neo-clssicos:Vem dizer que no importante verificar se ouve ou no um movimento corpreo que

    produziu uma alterao objectiva no mundo exterior, porque as actuaes humanas sopautadas por determinadas valoraes.

    O que interessa efectivamente o valor que est subjacente a um determinadocomportamento. Assim, os Neo-clssicos passam a ver a aco (o crime) como anegao de valores atravs de um comportamento. Portanto, o crime todo aquelecomportamento que nega valores.Klaus Roxin entende que o que importante em sede de Direito Penal, em sedecomportamental so to s os factos ou as aces voluntrias, isto , aquelescomportamentos dominados ou dominveis pela vontade.Dentro da vertente Neo-clssica surge outro conceito de aco, que a aco social,desenvolvida por Smith.Este autor defende que mais importante que tudo para afirmar a existncia duma aco

    penalmente relevante verificar se aquele comportamento, se aquela actuao deve sertido como uma aco em termos sociais. Isto , se socialmente aquele comportamentomerece a qualificao de aco.E isto porque, desde logo, h aces que prtica, podem parecer negar valores, masque no devem ser aces penalmente relevantes de harmonia com a prpria conceposocial de aco.A tipicidade, os Neo-clssicos vm dizer que a tipicidade composta por uma srie deelementos, e o tipo no valorativamente neutro, implica j um juzo de valor paraquem preenche a tipicidade. Referem que o tipo tem tambm elementos normativos,elementos que, descrevendo entidades do mundo real, carecem duma interpretaocomplementar pelo recurso a normas.

    Para estes autores, o tipo composto por elementos positivos e por elementosnegativos:- Elementos positivos: aqueles que fundam positivamente a responsabilidade penal doagente;- Elementos negativos: so as causas de justificao que, quando relevantes, justificamo facto tpico.

    A culpa para os Neo-clssicos, no uma culpa psicolgica, como pretendiam osClssicos, mas antes um conceito que integrado j por um critrio de censurabilidadeassente na existncia de determinados pressupostos, nomeadamente a capacidade de

    culpa e a conscincia da ilicitude.

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    A culpa j uma culpa com ingredientes normativos e implica um juzo decensurabilidade pela prtica de um facto.

    52. Criticas ao sistema Neo-clssico

    O conceito de aco: um comportamento humano que nega valores. Ora, na negao devalores cabe no s o comportamento activo, como existem tambm omisses quepodem de igual modo lesar valores.Portanto, aqui neste conceito de crime como comportamento socialmente relevante quelesa valores, j se pode enquadrar de alguma forma o comportamento omissivo ou aomisso, coisa que ficava de fora do conceito meramente causal e naturalstico de acodos Clssicos.H determinados comportamentos cuja apreenso da negao ou de valores s pode serdada pela finalidade do comportamento, ou da aco.Os Neo-clssicos no incluam o dolo em sede de tipo ou de tipicidade.O dolo um elemento da culpa, ou uma forma de culpa, porque s excepcionalmente a

    tipicidade integrada por elementos subjetivos, chamados elementos subjetivosespecficos, com a inteno de apropriao no crime de furto, etc.Tambm os Neo-clssicos no resolvem correctamente problema da negligncia e doscomportamentos negligentes.

    53. Sistema finalista

    Os finalistas propem um conceito de aco que um conceito de aco final. Chagam concluso que o direito, a realidade normativa, no pode aparecer totalmentedivorciada e desligada da realidade ntica, da realidade do ser que anterior realidadenormativa.Se o direito visa regular comportamentos humanos, estabelecer regras de conduta, entoo direito, sob pena de ser uma falcia, tem de respeitar a natureza ntica, a natureza doser, e o que prprio do ser humano para os finalistas, dentro de um conceito de aco, o agir com vista obteno de um fim servindo-se de conhecimentos objectivos ecausais que permitem essa obteno, este conceito de aco deve ser respeitado em sedede tipicidade.Portanto, a inteno que preside a uma determinada aco, que a sua finalidade, deveser espelhada no tipo. Logo, o dolo que a inteno, o fim da actuao, deve ser umelemento subjectivo do tipo.Quanto ao conceito de ilicitude: comea a falar-se de um conceito de ilicitude pessoal.

    Actuar ilicitamente j no tanto actuar contrariamente ordem jurdica na suaglobalidade, como pretendiam os Clssicos (ilicitude formal). J no interessar tantoactuar lesando bens jurdicos fundamentais, como pretendiam os Neo-clssicos(ilicitude material).Interessar mais, verificar se aquela pessoa que actua de determinada forma actuailicitamente, se se lhe pode atacar um juzo de desvalor na aco ou no facto que pratica.Existe aqui uma certa concepo tica do direito.

    Dentro deste conceito de ilicitude pessoal de se poder reprovar uma pessoa por adoptarum determinado comportamento, podem-se distinguir dois desvalores:1) O desvalor da aco, da conduta empreendida pelo agente;

    2) O desvalor do resultado, em que se traduz o comportamento ou a conduta do agente.

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    A aco, embora no mbito dos crimes negligentes seja tambm desvaliosa[23], porcomparao dos crimes dolosos em que o agente actua querendo e conhecendo umdeterminado resultado, o desvalor da aco nos crimes dolosos muito superior.

    Quanto culpa.

    Os finalistas tm um conceito de culpa puramente normativo.A conscincia da ilicitude, a capacidade de culpa e a exigibilidade dos comportamentospassam a ser elementos da culpa. Faltando um destes elementos da culpa, j no possvel formular sobre uma pessoa um juzo de culpa.A capacidade de culpa consiste no fundo em a pessoa ter capacidade para avaliar asexigncias. So incapazes de culpa:a) Os inimputveis em razo da idade (menores de 16 anos);

    b) Os portadores de anomalias psquicas, que so inimputveis em razo da anomaliapsquica.A conscincia da ilicitude um elemento autnomo da culpa.

    54. Criticas ao sistema finalista

    O conceito de aco, um conceito de aco final e os finalistas nunca conseguiramcom este conceito justificar muito bem os crimes de negligentes. Sendo assim tambm

    para as omisses.Da que quem segue a sistemtica finalista opte por uma quadripartio do facto

    punvel, em que se distingue:- Crime doloso por aco;- Crime doloso por omisso;- Crime por aco negligente;- Crime por omisso negligente.55. Aco

    Aco penalmente relevante todo o comportamento humano, com relevncia nomundo exterior, que dominado ou dominvel pela vontade. Fica logo excludo oscomportamentos ou as aces das coisas, das foras da natureza e dos animaisirracionais.Dentro do ponto de vista dos fins das penais, quer numa ptica retributiva, quer numaptica preventiva, no faz sentido criminalizar comportamentos que no sejamdominados pela vontade.

    Uma aco penalmente relevante pode consistir:- Num comportamento positivo num facere;- Num comportamento negativo num non facere.

    A aco tem relevncia quer consista num comportamento positivo, quer numa omisso.A nossa lei equipara a omisso aco; essa equiparao dada pelo art. 10 CP.H duas formas de comportamento omissivo penalmente relevante, que se diferenciam:so designadas omisses puras (ou imprprias) e as omisses impuras (ou imprprias).Quando o legislador descreve as incriminaes, atravs de normas proibitivas e denormas que pressupem um determinado resultado tpico do tipo, para estar preenchido,

    para ser consumado exige uma conduta e um resultado.

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    No caso das omisses impuras nem toda a gente pode incorrer em responsabilidadejurdico-penal por omisso impura, porque o legislador s responsabiliza pelas omissesimpuras aqueles sobre quem recaa ou impendia um dever jurdico que pessoalmente oobrigasse a evitar a produo do resultado tpico.Os clssicos consideravam por aco penalmente relevante todo o movimento corpreo,

    esforo nervoso ou muscular, que produz uma alterao objectiva no mundo real.O conceito de aco causal criticvel, isto porque:- Torna-se mais difcil de explicar como que nestes casos das omisses impuras podehaver a aco omissiva;- Crime de injria: este crime s concebvel a partir de uma certa ponderao socialdaquele comportamento como negao de um determinado valor, s crime porquesocialmente se convenciona que aquele comportamento uma aco relevante;- Este conceito de aco causal no afasta, de per si, comportamentos dominados pelavontade.S atravs de um critrio exterior ao prprio conceito de aco causal que se conseguedelimitar os comportamentos com relevncia penal e os comportamentos que no tm

    essa relevncia.Para os Neo-clssicos, o conceito de aco todo o comportamento que nega valores uma negao de valores.Smith vem com um conceito social de aco, dizendo que aco penalmente relevante aquilo que socialmente adequado a ser aco.Mas este conceito no explica de per si porque que algumas omisses negam valoresno dada tanto pela aco, mas pela ordem jurdica.Muitas vezes tambm, a relevncia social da aco no pode estar desligada daquilo queo agente quis.Por outro lado, no h dvida que o mesmo comportamento pode ter vria e diferenterelevncia social, consoante a inteno do agente.Finalmente o conceito de aco final para os finalistas. todo o comportamento em que a pessoa se serve dos conhecimentos objectivos ecausais para atingir uma determinada finalidade.

    O processo causal nos crimes omissivos representa especialidades face aos crimesactivos. Essas especialidades fazem com que os prprios finalistas tivessem de chegar auma anlise quadripartida do facto punvel (ou da infraco):- Crimes dolosos por aco;- Crimes dolosos por omisso;- Crimes negligentes por aco;

    - Crimes negligentes por omisso.Este conceito de aco final no compreensvel para abarcar todas as realidades ecomportamentos que podem dar origem responsabilidade jurdico-penal.H autores que, em relao ao conceito de aco penalmente relevante, como categoriaautnoma da punibilidade, porque no um conceito isento de crticas em qualquerformulao, dizem que ns devemos renunciar a um particular conceito de aco e

    prpria tipicidade que englobamos os comportamentos por aco e por omisso (Prof.Figueiredo Dias).H outros autores que discordam e que dizem que o conceito de aco penalmenterelevante e efectivamente uma categoria que no se deve descurar, porque o conceito de

    aco tem um determinado rendimento em sede de dogmtica jurdico-penal.

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    56. Tipo ou tipicidade

    Por detrs de cada tipo incriminador, o legislador h-de pretender sempre a tutela de umou mais bens jurdicos, porque o direito penal encontra a sua justificao na tutela de

    bens jurdicos fundamentais.

    O bem jurdico algo distinto do chamado objecto do facto ou objecto da aco.Enquanto que o bem aquela realidade que no uma realidade palpvel, um valor,um interesse.O objecto do facto ou da aco o quid concreto sobre o qual incide a actividadecriminosa do agente.

    57. Estrutura do tipo

    Por detrs de cada tipo legal encontra-se sempre a tutela de um ou mais bens jurdicos.Os tipos tm na sua descrio elementos descritivos, predominantemente, mas tambm concebvel que nalguns tipos apaream elementos normativos. Alis foram os Neo-

    clssicos que chamaram ateno para a existncia destes elementos normativos dotipo.Os elementos descritivos so aqueles elementos que expressam entidades do mundoreal, quer no foro exterior quer interior, quer para a sua cabal compreenso, nonecessitam de nenhuma valorao suplementar feita pelo recurso a uma norma.Os elementos normativos so aqueles que, expressando tambm entidades do mundoreal, para seu cabal entendimento carecem do recurso a uma valorao suplementar, dorecurso por exemplo a outra norma.H quem diga, como Ihering, que no existem elementos puramente descritivos: todoseles so mais ou menos normativos; postulam sempre, para seu cabal entendimento ecompreenso, uma valorao suplementar, seja tica, seja de ordem jurdica.O tipo integrado sobretudo a partir duma abordagem finalista, por uma estruturamista: composto por elementos objectivos e por elementos subjectivos.

    Referindo, agora, to s ao crime comissivo por aco, ou crime doloso por aco,pode-se encontrar os seguintes elementos objectivos do tipo:a) O agente;

    b) A conduta ou descrio da aco tpica;c) O resultado;[24]d) O nexo de imputao, tambm designado de causalidade[25];e) Algumas circunstncias que rodeiam a conduta ou descrio da aco tpica.

    Estes elementos objectivos do tipo referenciam entidades nticas que existemindependentemente de qualquer representao entre a mente do agente e o facto por ele

    praticado, por isso se dizem elementos objectivos.Os elementos subjectivos, so aqueles que pressupem j uma relao com o forontimo do agente, ou seja, entre a representao da mente do agente daquilo que ele

    pensa e quer aquilo que objectivamente se verifica, por isso se designam elementossubjectivos.Como elementos subjectivos e no mbito do crime doloso, encontram-se os chamadoselementos subjectivos especficos, que so elementos que tm de existir para que ostipos legais de crime se considerem efectivamente preenchidos. So as especiais

    tendncias, as especiais intenes.O elemento subjectivo geral ser o dolo, no mbito dos crimes dolosos.

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    O dolo consiste no conhecimento e vontade de empreender um determinado tipo legalde crime. O dolo consiste no conhecer e querer os elementos objectivos de um tipo legalde crime.O dolo apresenta pois, uma estrutura bipartida, integrada por um elemento anegligencia. es, o elemento geral serva determinadade natureza volitiva, o que crime. o

    ao _____________________________________ intelectual que o conhecimento oconhecimento de uma determinada realidade objectiva; e um elemento de naturezavolitiva, o querer efectivamente essa realidade objectiva de determinada forma.

    Nos crimes negligentes, o elemento geral ser a negligncia.

    58. Elementos objectivos do tipo especial

    a) AgenteO agente aquela (s) pessoa (s) que adopta uma conduta tpica descrita numdeterminado tipo legal de um crime e que empreende a realizao tpica o agente dotipo legal de crime.

    b) Aco tpica ou condutaA conduta tpica, tambm dita descrio da aco tpica, ou to s a aco tpica,aparece como um elemento objectivo do tipo legal de crime e encontra-se efectivamentedescrita no tipo.

    c) Resultado tambm um elemento objectivo do tipo, nos chamados crimes materiais ou deresultado: o prprio resultado tpico.H crimes em que, para alm da descrio da conduta tpica, se exige que espao-temporalmente se desprenda ou se destaque da conduta tpica algo diferenciado que oresultado o resultado tpico para que o facto possa estar efectivamente consumado.

    Nestes crimes materiais ou de resultado, que para alm da conduta pressupe, ainda,para a sua consumao, a verificao do resultado tpico.

    d) Nexo de causalidadeIsto traduz-se, em saber se um determinado resultado pode ser imputado a uma condutado agente; se aquilo que se verifica pode ser efectivamente considerado como obradaquela actuao tpica do agente. um elemento no escrito do tipo, isto porque, nos crimes materiais ou de resultado,naqueles crimes que se designam normalmente por crimes de forma livre. Ou seja, so

    crimes cuja obteno do resultado tpico previsto pela norma pode ser obtido, porreferncia conduta do resultado tpica que matar, pelas mais diferentes formas.Por vezes, muito raramente, o legislador pode pretender dar cober