análise de conjuntura e correlação de forças

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  • 7/30/2019 Anlise de Conjuntura e Correlao de Foras

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    Como Fazer Anlise de Conjuntura (com exerccios)1

    Helder Molina

    1) O que Anlise de Conjuntura

    A analise de conjuntura nos leva a conhecer e descobrir a realidade de um acontecimento ou de um quadro atual, deuma situao, para que tenhamos condies de interferir no seu processo e transform- lo.

    2) Como se faz Anlise de Conjuntura

    Buscando identificar na realidade surgida o que a constitui, quais so os seus ingredientes, os seus atores e osinteresses que esto em jogo.

    3) Metodologia de Anlise de Conjuntura

    Abaixo, esto alguns elementos bsicos, metodolgicos que devemos observar e que nos daro um caminho para seperceber e melhor analisar a conjuntura. Vejamos, sucintamente, o que vem a ser cada um destes elementos:

    A) Categorias

    As categorias so as ferramentas com as quais trabalhamos. So elas:

    - Os acontecimentos

    Neles esto englobados os fatos e os acontecimentos propriamente ditos. Os fatos so mais corriqueiros, sem maiorrelevncia. J os acontecimentos contm, em si, um sentido especial para determinada pessoa, ou grupo, classe e sociedade.

    - Os cenrios

    So os espao onde os acontecimentos se desenrolam. Esto sempre mudando e isto influi, tambm, na mudana doprocesso, pois faz descolar as foras em conflito.

    - Os atores

    O ator tudo aquilo que representa determinado papel dentro de um contexto. No necessariamente, umindividuo, mas pode ser uma classe social, uma categoria. Um ator social representa uma idia, uma reivindicao ou umadenncia para determinado grupo, Pas, ou os representa diretamente.

    - A relao de foras

    a articulao, entre os diversos atores, do seu poder da fora poltica, de deciso, influencia.Essas relaes podem ser de confronto, de coexistncia, de cooperao e esto sempre relevando uma relao de

    fora de domnio, igualdade ou de subordinao. A relao de foras sofre mudanas permanentes.

    - A articulao entre estrutura e conjuntura

    A conjuntura2se relaciona com estrutura3. Podemos ler a conjuntura de 2 formas:

    - a partir do ponto de vista do poder dominante (lgica do poder) ou,- a partir das classes subordinadas, da oposio, dos movimentos populares.

    - A estratgia e a ttica

    So tambm elementos importantes na anlise de ao dos atores sociais.

    B) Sistema do Capital Mundial

    o pano do fundo do processo econmico, social, e poltico.As empresas transnacionais se caracterizam pelo uso de tecnologia mais avanada, pela produo de bens

    sofisticados e so em escalas de massa e em nvel mundial. A lgica do capital transnacional busca e maximizao do uso dacincia, no em atendimento as necessidades da sociedade, mas para ter maior lucro.

    1 In heldermolina.blogspot.com.br/2011/01/como-fazer-analise-de-conjuntura.html.2 Conjuntura refere-se a: dados, acontecimentos, atores sociais.3 Estrutura refere-se: a histria, o passado, as relaes sociais, polticas e econmicas

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    O capital mundial4no a soma de corporaes, empresas transnacionais do mundo ou do interior dos pases, mas um sistema produtivo articulado em escala mundial sob a liderana de grandes corporaes e bancos transnacionais.

    Este processo explora o trabalho pelo capital, faz a expropriao dos capitais menores pelos mais fortes, faz comque os Estados Nacionais tenham dupla funo: transnacional e nacional, centralize o poder estatal no Executivo, aprofunda as delegitimidade.

    Sistema do Poder Poltico Transnacionalizado

    O econmico no pode estar separado do poltico, pois o ato de produzir poltico. O capital uma relao social

    de produo. Neste sistema do poder poltico transncionalizado, o Estado, passa a ser centralizado, desnacionalizado tecnocrticoe repressivo.O Estado praticamente reduzido ao Poder Executivo Federal. Da o seu controle sobre os meios de comunicao

    de massa, sendo o monoplio da produo e difuso de informao, fazendo com que milhes de pessoas recebam o pacote deimagens que se pretende passar como realidade inquestionvel.

    Este sistema faz com que a nao perca sua soberania econmica, poltica, tecnolgica, cultural, militar. Perde-setambm a substancial popular, a substancia democrtica.

    Formas de Controle

    So os mecanismos existentes para manter a estabilidade e a ordem dos regimes.

    - coero econmica (impostos, taxas, salrios)

    - controle sobre a organizao social (legalizao dos sindicatos)- controle de informao5

    Estratgias em Jogo

    A idia de estratgia serve para identificar as instrues dos grupos e classes socias e tentar descobrir os sentidosmais globais dos acontecimentos e da ao dos diferentes atores.

    Quadro Atual

    Na anlise de conjuntura importante caracterizar as questes centrais e em evidencia na luta social e poltica dedeterminado perodo. Questes sindicatos, nos movimentos sociais, etc. So as questes que constituem o quadro da atualidade.

    Campos de Confronto

    Eles caracterizam os tipos de oposio e os conflitos entre os diferentes atores. tambm de grande importncia naanlise da correlao de foras, por que o enforque basicamente o do conflito So exemplos de campos de confronto: Estado eSociedade, partidos polticos, igreja, Movimentos populares, etc.

    Exemplo de uma anlise de conjuntura com movimentos populares

    Um mtodo pratico usado o da representao da conjuntura, atravs de um teatro realizado pelos prpriosparticipantes. Os passos seriam os seguintes:

    1) Levantar as grandes questes e list-las.2) Identificar e selecionar as foras sociais nelas envolvidas.

    3) Identificar e selecionar os atores que representam estas foras.4) Escolher, entre os participantes, as pessoas que iro representar estes atores.5) Dispor estas pessoas um palco improvisado e organizar um debate entre esses atores como se estivessem falando

    para o pas, debatendo suas idias, confrontado opinies6) Permitir a liberdade de debate para que no haja nenhum tipo de direo e de interveno do plenrio7) Avaliar a representao e comparar com a realidade

    Anlises das situaes. Correlaes de foras6

    Nota escrita a propsito dos estudos das situaes e do que se entende por "correlaes de foras". O estudo decomo analisar "situaes", isto , de como estabelecer os diversos graus de correlaes de foras, pode se prestar a uma exposioelementar de cincia e arte polticas, entendidas como um conjunto de regras prticas de pesquisas e observaes particularesdestinadas a despertar o interesse pela realidade efetiva e suscitar intuies polticas mais rigorosas e vigorosas. Deve-seacrescentar exposio o que se entende em poltica por estratgia e ttica, por "plano" estratgico, por propaganda e agitao,

    por orgnico ou cincia da organizao e da administrao em poltica. Esses elementos de observao emprica que so expostos

    4 Ou sistema produtivo mundial.5 Referencia a informao submetida lei de segurana nacional, lei de imprensa, presses fiscais, financeiras, etc.6 In www.socialismo.org.br/portal/filosofia/157-livro/1733-analises-das-situacoes-correlacoes-de-forcas.

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    confusamente nos tratados de cincia poltica7 deveriam, na medida em que no so questes abstratas ou construes semfundamento, encontrar seu lugar nos variados graus das correlaes de foras, a comear pela correlao de foras internacionais 8

    para passar s correlaes objetivas sociais, isto , aos graus de desenvolvimento das foras produtivas, s correlaes de foraspolticas e de partidos9e s correlaes polticas imediatas (ou ainda, potencialmente militares).

    As correlaes internacionais precedem ou seguem (logicamente) as relaes sociais fundamentais? Seguem,indubitavelmente. Qualquer inovao orgnica na estrutura modifica organicamente as correlaes absolutas e relativas no campointernacional, atravs de suas expresses tcnico-militares. Mesmo a posio geogrfica de um Estado nacional no precede massegue (logicamente) as inovaes estruturais, ao mesmo tempo que reagem sobre elas numa certa medida10. Por outro lado, ascorrelaes internacionais reagem passiva e ativamente sobre as correlaes polticas (de hegemonia dos partidos). Quanto mais a

    vida econmica imediata de uma nao subordinada s correlaes internacionais, tanto mais um determinado partido representaesta situao e a explora para impedir o avano dos partidos adversrios11. Dessa srie de fatos, pode-se chegar concluso de queo partido que se chama de "partido do estrangeiro" 12 no propriamente aquele que como tal vem vulgarmente indicado, masexatamente o partido mais nacionalista, o que, mais que representar a fora vital do prprio pas, representa a subordinao e asubservincia econmica s naes ou a um grupo de naes hegemnicas13.

    o problema das relaes entre estrutura e superestrutura que preciso colocar exatamente e resolver para sechegar a uma anlise justa das foras que operam na histria de um determinado perodo e determinar suas correlaes. precisomover-se no mbito de 2 princpios:

    1) o de que nenhuma sociedade se coloca problemas para a soluo dos quais j no existam as condiesnecessrias e suficientes ou que no estariam ao menos em vias de aparecimento e de desenvolvimento;2) e o de que nenhuma sociedade se dissolve ou pode ser substituda se antes no desenvolveu todas as formas devida que esto implcitas nas suas relaes (controlar o enunciado exato destes princpios).

    "Uma formao social no perece antes de desenvolver toda a fora produtiva de que ainda capaz e de que umanova relao de produo mais elevada no lhe tenha tomado o lugar, antes que as condies materais de existnciadesta ltima no tenham surgido no seio esgotado da velha sociedade. Por isso, a humanidade se coloca sempreapenas os problemas que est a ponto de resolver; quando se observa com mais acuidade, se verificar sempre que aquesto s se coloca depois que j existam as condies materiais de sua resoluo ou estas estejam em vias desurgir"14.

    A partir da reflexo sobre esses 2 cnones, pode se chegar a desenvolver toda uma srie de outros princpios demetodologia histrica. Entretanto, no estudo de uma estrutura preciso distinguir os movimentos orgnicos (relativamente

    permanentes) dos movimentos que se pode chamar de conjuntura15 (e se apresentam como ocasionais, imediatos, quaseacidentais). Os movimentos de conjuntura certamente tambm so dependentes dos movimentos orgnicos, mas sua significaono tem um vasto alcance histrico: propiciam uma crtica poltica mesquinha, do dia a dia, que se prende aos pequenos grupos

    dirigentes e s personalidades imediatamente responsveis pelo poder. Os fenmenos orgnicos do lugar crtica histrico-social, que se preocupa com os grandes agrupamentos, para alm das pessoas imediatamente responsveis e para alm do pessoaldirigente. No curso do estudo de um perodo histrico, aparece a grande importncia desta distino. s vezes, aparece uma criseque se prolonga por dezenas de anos. Essa durao excepcional significa que na estrutura se revelaram (chegaram maturidade)contradies insanveis e que a fora poltica que opera positivamente a conservao e a defesa da estrutura ainda est seesforando para sane-las dentro de certos limites e super-las. Estes esforos incessantes e perseverantes (pois nenhuma forasocial vai confessar que est superada) formam o terreno do "ocasional" sobre o qual se organizam as foras antagonistas quetendem a demonstrar16que j existem as condies necessrias e suficientes para que determinadas tarefas possam e devam estarento em vias de serem resolvidas historicamente17.

    O erro em que se cai constantemente nas anlises histrico-polticas consiste em no saber encontrar a justa relaoentre o que orgnico e o que ocasional. Arrisca-se assim a expor como imediatamente operantes causas que, ao contrrio, sooperantes de uma maneira mediata, ou a afirmar que as causas imediatas so as nicas causas eficientes; num caso h excesso de

    7 Pode-se tomar como exemplo a obra de G. Mosca: Elementos de Cincia Poltica.8 Nas quais teriam lugar as notas escritas sobre o que uma grande potncia, sobre os reagrupamentos de Estados em sistemas hegemnicos e por conseguintesobre o conceito de independncia e de soberania no que diz respeito a pequenas e mdias potncias.9 Ou seja, o sistema hegemnico no interior do Estado10 Ou seja, precisamente na medida em que as superestruturas reagem sobre as estruturas, a poltica sobre a economia, etc.11 Recordar o famoso discurso de Nitti sobre a revoluo italiana tecnicamente impossvel!12 Ver a subordinao do fascismo italiano Alemanha hitlerista, apesar de sua fraseologia nacionalista, e a poltica de demisso nacional dos partidos francesesditos "nacionalistas".13 Um aceno a este elemento internacional "repressivo" da energia interna se encontra nos artigos publicados por G. Volpe no Corriere della Sera de 22-23/03/193214 In Marx, Karl. Introduo Contribuio crtica da economia poltica.15 "Conjuntura. Pode-se definir a conjuntura como o conjunto de circunstncias que determinam o mercado numa dada fase, desde que essas circunstncias sejamconcebidas em movimento, isto , como um conjunto que sempre d lugar a um processo de novas combinaes, processo que o ciclo econmico. Estuda-se aconjuntura para prever e, mais ainda, dentro de certos limites, determinar o ciclo econmico no sentido favorvel aos negcios. Assim a conjuntura foi definidacomo a oscilao da situao econmica ou o conjunto de suas oscilaes.

    "Origem da expresso: serve para compreender melhor o conceito. Em italiano = flutuao econmica. Ligado aos fenmenos do ps-guerra, muitorpidos no tempo. (Em italiano, o significado de 'ocasio econmica favorvel ou desfavorvel' est ligado palavra 'conjuntura'; diferena entre 'situao' e'conjuntura'; a conjuntura apreende o complexo das caractersticas imediatas e transitrias da situao econmica, e por isso o conceito de situao precisaentender agora as caractersticas mais fundamentais e permanentes dela prpria. O estudo da conjuntura fica ligado mais estreitamente poltica imediata, 'ttica'e agitao, ao passo que a 'situao' 'estratgia' e propaganda, etc.)". In Gramsci, Antonio. Passato e presente. Turim: Editori Rriuniti, 1975, pp. 194-195.16 Isto , a demonstrao que em ltima anlise s "verdadeira" se faz surgir uma nova realidade, quando as foras antagonistas triunfam, mais imediatamente sedesenvolve uma srie de polmicas ideolgicas, religiosas, filosficas, polticas, jurdicas etc., cuja concretude pode ser avaliada pela maneira como conseguemconvencer e pela maneira como deslocam o antigo dispositivo de foras sociais17 Isto , devam, porque ficar aqum do dever histrico aumenta a desordem necessria e prepara catstrofes mais grave

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    economismo ou doutrinarismo pedante, noutro excesso de ideologismo; num caso se superestrima a causa mecnica, no outrose exalta o elemento voluntarista e individual18. O nexo dialtico entre as 2 ordens de movimentos e, por conseguinte, de pesquisasdificilmente pode ser estabelecido com exatido, e, se o erro grave em historiografia, ainda mais grave ser na arte poltica,quando se trata no de reconstruir a histria passada, mas de construir a do presente e futuro: os prprios desejos e as paixesdeterioradas e imediatas so a causa do erro, na medida em que substituem a anlise objetiva e imparcial e em que os veem nocomo "meio" concebido para estimular a ao, mas como auto-engano. A serpente, neste caso, morde o charlato, ou seja, odemagogo a primeira vtima da sua demagogia.

    O no haver considerado o momento imediato das "correlaes de foras" est ligado aos resduos da concepoliberal vulgar, da qual o sindicalismo uma manifestao que acreditava ir mais frente quando na realidade dava um passo atrs.

    De fato, a concepo liberal vulgar dando importncia correlao das foras polticas organizadas nas diversas formas departido19era mais avanada do que o sindicalismo que dava importncia primordial correlao fundamental econmico-social es a ela. A concepo liberal vulgar tambm levava em conta implicitamente tal correlao (como aparece em tantos sinais), masinsistia mais sobre a correlao da fora poltica que era uma expresso do outro e, na realidade, o continha. Este resduo daconcepo liberal vulgar pode ser rastreado em toda uma srie de tratativas que se consideravam relacionadas filosofia da prxise que logo deram lugar a formas infantis de otimismo e de loucura.

    Esses critrios metodolgicos podem alcanar visvel e didaticamente todo o seu significado quando aplicados aoexame dos fatos histricos concretos. Poder-se-ia faz-lo utilmente com os acontecimentos que se desenrolaram na Frana de1789 a 1870. Parece-me que para uma maior clareza de exposio seja verdadeiramente necessrio abarcar todo esse perodo.Com efeito, foi s em 1870-1871, com a tentativa da Comuna, que se exaurem historicamente todos os germes nascidos em 1789,vale dizer, que no s a nova classe que luta pelo poder esmaga os representantes da velha sociedade que no quer se confessardecisivamente superada, mas esmaga tambm os grupos novssimos, que pretendem que j est superada a nova estrutura sada dasublevao iniciada em 1789, e demonstra assim sua vitalidade em confronto com o velho e em confronto com o novssimo. De

    outra parte, em 1870-1871, perde eficcia o conjunto de princpios de estratgia e ttica polticas nascido praticamente em 1789 edesenvolvidos ideologicamente em torno de 184820.Um elemento que mostra a justeza desse ponto de vista o fato de que os historiadores no esto em absoluto de

    acordo (e impossvel que o estejam) quando se trata de fixar os limites a esse conjunto de acontecimentos que constituem aRevoluo Francesa. Para alguns21, a Revoluo est completa em Valmy: a Frana criou um novo Estado e soube organizar afora poltico-militar que afirma e defende a soberania territorial. Para outros, a Revoluo continua at o Termidor, assim falamde mais revolues22. O modo de interpretar o Termidor e a obra de Napoleo oferece as mais speras contradies: trata-se derevoluo ou de contra-revoluo? etc. Para outros ainda, a histria da Revoluo continua em 1830, 1848, 1870 e persiste at aGuerra Mundial de 1914.

    Em todos esses modos de ver h uma parte de verdade. Na realidade, as contradies internas da estrutura socialfrancesa que se desenvolve desde 1789 s encontra sua composio relativa com a III Repblica, e a Frana tem 60 anos de vida

    poltica equilibrada, aps 80 anos de sublevaes em ondas sempre mais espaadas: 1789-1794-1799-1804-1815-1830-1848-1870. justamente o estudo dessas "ondas" com diferentes oscilaes que permite reconstruir a correlao entre estrutura e

    superestrutura de uma parte outra entre o desenvolvimento do movimento orgnico e o do movimento de conjuntura daestrutura. Em todo caso, pode-se dizer que a mediao dialtica entre os 2 princpios metodolgicos enunciados no incio dessanota pode ser encontrado na frmula poltico-histrica de revoluo permanente.

    Um aspecto desse mesmo problema a dita questo das correlaes de foras. Seguidamente se l nas narrativashistricas a expresso genrica: correlaes de foras favorveis, desfavorveis a esta ou quela tendncia. Assim, abstratamente,essa formulao no explica nada ou quase nada, porque no se faz que repetir o fato que se deve explicar, apresentando-o umavez como fato e outra como lei abstrata e como explicao. O erro histrico consiste ento em dar uma regra de pesquisa e deinterpretao como "causa histrica". No entanto, nas "correlaes de foras" preciso distinguir diversos momentos ou graus,que so fundamentalmente estes:

    1) Uma correlao de foras sociais estreitamente ligada estrutura, objetiva, independente da vontade dos homens,que pode ser mesurada com os sistemas das cincias exatas ou fsicas. Sobre a base do grau de desenvolvimento dasforas materiais de produo, se do os reagrupamentos sociais, cada um dos quais representa uma funo e ocupa

    uma posio dada na prpria produo. Essa correlao a que , uma realidade rebelde: ningum pode modificar onmero de empresas e de seus funcionrios, o nmero de cidades e da populao urbana, etc. Essa disposiofundamental permite estudar se na sociedade existem as condies necessrias e suficientes para sua transformao,

    permite assim controlar o grau de realismo e de oportunidade das diversas ideologias que nasceram sobre essemesmo terreno, no terreno das contradies que foram geradas durante o seu desenvolvimento.

    2) Um momento seguinte a correlao de foras polticas, quer dizer, a avaliao do grau de homogeneidade, deautoconfiana e de organizao atingido pelos diferentes grupos sociais. Esse momento, por sua vez, pode seranalisado e distinguido em diferentes e vrios graus, que correspondem aos diferentes momentos da conscincia

    18 A distino entre "movimentos" e fatos orgnicos e movimentos e fatos de "conjuntura" ou ocasionais deve ser aplicada a todos os tipos de situaes, no squelas em que se verifica um desenvolvimento regressivo ou de crise aguda, mas quelas em que se verifica um desenvolvimento progressivo ou de prosperidadee quelas em que se verifica uma estagnao da fora produtiva.19 Referencia a leitores de jornais, eleies parlamentres e locais, organizaes de massas dos partidos e dos sindicatos em senso estrito.20 E que se resume na frmula da "revoluo permanente": seria interessante estudar quando tal frmula fica ultrapassada na estratgia mazziniana - por exemplona insurreio de Milo de 1853 (Uma sublevao estoura em Milo em 06/02/1853 contra o regime austraco restabelecido aps o fracasso das revolues de1848. Animado pelos membros de sociedades secretas, notadamente mazzinianas, ela foi duramente reprimida (24 condenaes morte). O sequestro pela ustriados bens dos milaneses emigrados em seguida aos acontecimentos, d lugar a uma crise diplomtica entre a ustria e o governo sardo dirigido por Cavour.)- e seisso se produziu conscientemente ou no21 Por exemplo, Salvemini.22 O 10 de agosto seria uma revoluo em si, etc. Cf. A Revoluo Francesa de A. Mathiez na coleo A. Collin.

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    poltica coletiva, tal como se manifestaram at agora na histria. O 1 e mais elementar o econmico-corporativo:um comerciante sente que deve ser solidrio com outro comerciante, um fabricante com outro fabricante, etc., mas ocomerciante no se sente ainda solidrio como o fabricante; sente-se a a unidade homognea, e o dever deorganiz-la, do grupo profissional, mas ainda no do grupo social mais vasto. Um 2 momento o que alcana aconscincia da solidariedade de interesses entre todos os membros do grupo social, mas ainda no campo meramenteeconmico. Nesse momento j se coloca a questo do Estado, mas s no terreno de alcanar uma igualdade poltico-

    jurdica com os grupos dominantes, pois se reivindica o direito de participar na legislao e na administrao, e nasoportunidades de modific-los, de reform-los, mas no quadro fundamental existente. Um 3 momento aquele emque se alcana a conscincia de que os prprios interesses corporativos, no seu desenvolvimento atual e futuro,

    ultrapassam os limites da corporao, do grupo meramente econmico, e podem e devem vir a ser os interesses deoutros grupos subordinados. Essa a fase mais francamente poltica, que marca a passagem da estrutura ssuperestruturas complexas, a fase na qual as ideologias que anteriormente germinaram tornam-se partidos, seconfrontam e entram em luta at que um s deles, ou ao menos uma s combinao deles, tenda a prevalecer, a seimpor, a se difundir sobre toda a rea social, determinando, alm da unicidade dos fins econmicos e polticos,tambm a unidade intelectual e moral, colocando todas as questes em torno dos quais se intensifica a luta no sobreo plano corporativo, mas sobre um plano "universal", e criando assim a hegemonia de um grupo social fundamentalsobre uma srie de grupos subordinados. O Estado concebido como organismo prprio de um grupo, destinado acriar as condies favorveis mxima expanso do prprio grupo, mas esse desenvolvimento e essa expanso soconcebidos e apresentados como a fora motriz de uma expanso universal, de um desenvolvimento de toda aenergia "nacional", quer dizer, o grupo dominante vem coordenado concretamente com os interesses gerais dosgrupos subordinados, e a vida estatal vem concebida como uma contnua formao e superao de equilbriosinstveis (no mbito da lei) entre os interesses do grupo fundamental e dos grupos subordinados, equilbrios nos

    quais os interesses do grupo dominante prevalecem, mas at certo ponto, no at o estreito interesse econmico-corporativo. Na histria real, esses momentos se implicam reciprocamente, pode se dizer horizontal e verticalmente,isto , segundo a atividade econmico-social (horizontalmente) e segundo o territrio (verticalmente), combinando-se e cindindo-se de forma variada: cada uma dessas combinaes pode ser representada por sua prpria expressoorganizada econmica e poltica. Deve-se levar em conta ainda que as relaes internas de um Estado-nao seentrelaam com as relaes internacionais, criando novas combinaes originais e historicamente concretas. Umaideologia nascida num pas mais desenvolvido se difunde em pases menos desenvolvidos, incidindo no jogo localdas combinaes23. Essa correlao entre foras internacionais e foras nacionais complica-se ainda pela existnciano interior de cada Estado de vrias sees territoriais de estruturas diferentes e de diferentes correlaes de forasem todos os graus24.

    3) O 3 momento o da correlao de foras militares, imediatamente decisivo segundo a ocasio 25. Mas tampoucoisso qualquer coisa instintiva e identificvel imediatamente de forma esquemtica; pode-se ainda a distinguir 2

    graus: o militar em sentido estrito ou tcnico-militar e o grau que se pode chamar de poltico-militar. Nodesenvolvimento da histria esses 2 graus se apresentaram numa grande variedade de combinaes. Um exemplotpico que pode servir como demonstrao-limite o da relao de opresso militar de um Estado sobre uma naoque est tentando alcanar a sua independncia estatal. A correlao no puramente militar, mas poltico-militar, ede fato tal tipo de opresso seria impensvel sem o estado de desagregao social do povo oprimido e a passividadede sua maioria; portanto, a independncia no poder ser alcanada com foras puramente militares, mas militares e

    poltico-militares. Se a nao oprimida, de fato, para iniciar a luta pela independncia devesse esperar que o estadohegemnico lhe permita organizar um exrcito prprio, no sentido estrito e tcnico da palavra, teria de esperar porum bom tempo26. A nao oprimida opor ento inicialmente fora militar hegemnica uma fora que s"poltico-militar", isto , opor uma forma de ao poltica que tem a virtude de reflexos de carter militar nosentido:

    a) que seja eficaz para desagregar intimamente a eficincia blica da nao hegemnica;

    b) que constranja a fora militar hegemnica a se diluir num grande territrio, anulando-lhe grande parte daeficincia blica.

    No Renascimento Italiano, se pode notar a ausncia desastrosa de uma direo poltico-militar, especialmente noPartido de Ao (por incapacidade congnita), mas tambm no partido piamonts-moderado, antes e depois de 1848, nocertamente por incapacidade, mas por "maltusianismo econmico-poltico", isto , porque nunca se quis acenar possibilidade deuma reforma agrria e porque no se queria a convocao de uma assembleia nacional constituinte, mas se tentava apenas que amonarquia piamontesa, sem condies ou limitaes de origem popular, se estendesse a toda a Itlia, com a pura sano dos

    plebicitos regionais.Outra questo conexa precedente a de ver se as crises histricas fundamentais so determinadas imediatamente

    23 A religio, por exemplo, sempre foi de tais combinaes ideolgico-polticas nacionais e internacionais, e como a religio outras formaes internacionais, amaonaria, o Rotary Club, os judeus, a diplomacia de carreira, que sugerem experincias polticas de origens histricas diferentes e as fazem triunfar emdeterminados pases, funcionando como partido poltico internacional que opera em cada nao com toda a sua fora internacional concentrada; mas religio,maonaria, Rotary, judeus etc. podem reentrar na categoria social dos "intelectuais", cuja funo, em escala internacional, a de mediar os extremos, de"socializar" os expedientes tcnicos que fazem funcionar cada atividade de direo, de selar compromissos e achar os meios de escapar das solues extremas24 Assim a Vendea estava aliada com a fora internacional reacionria e a representava no seio da unidade territorial francesa; assim Lion na Revoluo Francesaapresentava um ncleo particular de relaes, etc.25 O desenvolvimento histrico oscila continuamente entre o 1 e o 3 momento, com a mediao do 2.26 Pode acontecer de a reivindicao de ter um exrcito prprio seja satisfeita pela nao hegemnica, mas isso significa que uma grande parte da luta j foi travadae ganha no terreno poltico-militar

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    pelas crises econmicas. A resposta questo est contida implicitamente nos pargrafos precedentes, que so um outro modo deapresentar o que se trata agora, embora seja sempre necessrio, por razes didticas, dado o pblico particular, examinar cadamodo de se apresentar uma mesma questo como se fosse um problema independente e novo. Se pode excluir que, por si mesma,a crise econmica imediata produza eventos fundamentais; s pode criar um terreno mais favorvel difuso de certos modos de

    pensar, de definir e resolver as questes que envolvem todo o ulterior desenvolvimento da vida estatal. De resto, todas asafirmaes que concernem os perodos de crise ou de prosperidade podem dar lugar a juzos unilaterais. No seu compndio deHistria da Revoluo Francesa (ed. Colin), Mathiez, opondo-se histria vulgar tradicional, que aprioristicamente "encontra"uma crise em coincidncia com as grandes rupturas dos equilbrios sociais, afirma que por volta de 1789 a situao econmica eramais que tudo boa imediatamente, pelo qual no se pode dizer que a catstrofe do Estado absoluto fosse devido a uma crise de

    empobrecimento27

    . Deve-se observar que o Estado era presa de uma mortal crise financeira e se colocava a questo de sobre qualdas 3 ordens sociais privilegiadas deveria recair o sacrifcio e o peso para recolocar em ordem as finanas estatais e reais. Dito deoutro modo: se a posio econmica da burguesia era florescente, certamente no era boa a situao das classes populares dacidade e do campo, especialmente destas, atormentadas pela misria endmica. Em cada caso, a ruptura do equilbrio de forasno ocorreu por causa mecnica imediata de empobrecimento do grupo social que tinha interesse em romper o equilbrio e de fatoo rompeu, mas ocorreu no quadro dos conflitos superiores ao mundo econmico imediato, relacionados ao "prestgio" das classes(interesses econmicos futuros), uma exasperao do sentimento de independncia, de autonomia e de poder. A questo particulardo mal-estar ou do bem-estar econmico como causa das novas realidades histricas um aspecto parcial da questo dascorrelaes de foras nos seus vrios graus. Podem-se produzir novidades seja porque uma situao de bem-estar est ameaada

    pelo egosmo mesquinho do grupo adversrio, como porque o mal-estar tornou-se intolervel e no se v na velha sociedadenenhuma fora que seja capaz de mitig-lo e de restabelecer uma normalidade por meios legais. Pode-se dizer, portanto, que todosesses elementos so a manifestao concreta das flutuaes de conjuntura do conjunto das correlaes sociais de foras, em cujoterreno se faz delas as correlaes polticas de foras para culminar na correlao militar decisiva. Se falta esse processo de

    desenvolvimento de um momento em outro, e esse essencialmente um processo que tem por atores os homens, e a vontade e acapacidade dos homens, a situao fica inoperante e podem ocorrer concluses contraditrias: a velha sociedade resiste e se d otempo de "respirar", exterminando fisicamente a elite adversria e aterrorizando as massas de reserva, ou ainda a destruiorecproca das foras em conflito, com a instaurao da paz dos cemitrios, sob a guarda de um sentinela estrangeiro.

    Mas a observao mais importante a fazer a propsito de toda anlise concreta das correlaes de foras esta: quetais anlises no podem e no devem ser um fim em si mesmas (a menos que no se escreva seno um captulo de histria do

    passado), mas que s adquire um significado se serve para justificar uma atividade prtica, uma iniciativa da vontade. Elasmostram quais so os pontos de menor resistncia, sobre os quais a fora da vontade pode ser aplicada com maior proveito,sugerindo as operaes tticas imediatas, indicando como se pode lanar melhor uma campanha de agitao poltica, quelinguagem ser melhor compreendida pela multido, etc. O elemento decisivo de cada situao a fora permanentementeorganizada e de longa data predisposta, que se pode fazer avanar quando se julga que uma situao favorvel (e s favorvelquando essa fora exista e esteja plena de ardor combativo); porque a tarefa essencial a de cuidar sistemtica e pacientemente aformar, desenvolver, tornar sempre mais homognea, compacta, consciente essa fora. Isso visto na histria militar e na

    preparao com que em todos os tempos esto predispostos os exrcitos para iniciar uma guerra a qualquer momento. Os grandesEstados foram grandes Estados exatamente porque a cada momento estavam preparados para se inserir eficazmente nasconjunturas internacionais favorveis, que eram tais porque havia a possibilidade concreta deles se inserirem eficazmente nelas.

    Fonte primria: Gramsci, Antonio. Note sul Machiavelli. Organizao de Valentino Gerratana. Turim: EditoriRriuniti, 1975, pp. 49-61

    Fonte secundria: Gramsci, Antonio. Gramsci dans le texte. Organizao de Franois Riccie e Jean Bramant.Traduo de Jean Bramant e outros. Paris: Editions Sociales, 1975, pp. 489-504

    27 Conforme a afirmao exata de Mathiez. Cf. A Revoluo Francesa de A. Mathiez na coleo A. Collin.